copa
DESCRIPTION
ÂTRANSCRIPT
abD8 o QSÁBADO, 19 DE JUNHO DE 2010
brancoLembrança demassacremassacremassacreocorrido em 1960,durante o apartheid,ainda norteianorteianorteialocal até poucotempo atrásdivididodivididodividido eviolentoviolentoviolento, usadohoje pela Costa doMarfim para treinarna África do Sul
DOS ENVIADOS A JOHANNESBURGO
Enquanto o Brasil se con-centra e treina na parte mais“europeia” da África do Sul,seu adversário de amanhãfrequenta diariamente um lo-cal histórico, símbolo de umpaís até pouco tempo atrásdividido e violento.
A Costa do Marfim treinano estádio George Theben,no meio da favela de Sharpe-ville, a 80 km de Johannes-burgo, palco de um dosmaiores massacres feitos pe-
la política do apartheid.Em 21 de março de 1960,
centenas de moradores pro-testaram contra a “lei do pas-se” —que limitava sua liber-dade de deslocamento a lo-cais determinados pelo go-verno branco. A data é feria-do nacional no país.
Três sobreviventes doMassacre de Sharpeville fala-ram ontem com a Folha, nafrente do memorial em ho-menagem às vítimas da tra-gédia. “Era uma festa”, afir-mou o aposentado Johannes
Sefatsa, 69. “Cantávamos pe-las ruas. Então nos disseramque a polícia nos daria infor-mações e fomos até a delega-cia. Era umaarmadilha.”
A polícia abriu fogo: 69pessoas morreram, 180 fica-ram feridas. Quem não con-seguiu escapar foi preso.Abram Mokokeng, 71, tomouum tiro nas costas —carregaa bala no corpo até hoje.
“Passei três meses no hos-pital e de lá fui para a prisão,onde fiquei mais seis meses.Era um protesto comunitário.
Fomos todos torturados, tra-tadoscomo criminosos.”
“Crianças não eram permi-tidas, os adultos mandavamque ficássemos em casa”, dizSellane Phethane, 64. “Maseu e umas amigas ficamos es-condidas atrás de um muro eseguimos a marcha. Vimosaviões passando e ficamoscertas deque era uma festa.”
Sefatsa perdeu o irmão Sa-muel, nove anos mais velho.“Meus pais não acreditavamque ele havia morrido. Maseu havia recolhido seu reló-
gio”, lembra. “O mais tristefoi depois, quando amontoa-ram todos os corpos num ca-minhão e não pudemos reco-nhecer os parentes.”
A tragédia fez Phethaneperder a inocência. “Eu tinha14 anos, vi meu avô morrer emeu irmão ser preso sem mo-tivo. No dia seguinte, entreipara a juventude do Congres-so Nacional Africano [ANC,na sigla em inglês]”, conta.Passou a vida na militância,ajudando presos políticos esuasmulheres e filhos.
PRETO NO
ab D9o QSÁBADO, 19 DE JUNHO DE 2010
Criançasjogam pertodo campoonde treinaa Costa doMarfim
Brasil se isolaaté de locaishistóricosDOS ENVIADOS A JOHANNESBURGO
A seleção brasileira está“isolada” de áreas históri-cas na África do Sul.
O Brasil se hospeda etreina em Randburg, bair-ro nobre de Johannesbur-go que, na época do apar-theid, era uma zona exclu-siva para brancos.
No Randpark, clube degolfe ao lado do hotel quea equipe de Dunga temusado como concentra-ção, só há garçons e cad-dies negros, trabalhandopara frequentadores inva-riavelmente brancos.
Até ontem, o Brasil sótreinava na HöerskoolRandburg, escola de ensi-no médio de elite, commensalidade cara para ospadrões locais (R$ 300) eque só recentemente pas-sou a admitir negros.
Desde ontem, o timebrasileiro passou a treinarno St. Stithians College, nomesmo bairro, outra insti-tuição para a elite brancade Johannesburgo.
Mesmo nas folgas, ospoucos jogadores da sele-ção que deixam o hotelFairway costumam seaventurar no MandelaSquare, shopping de luxoda cidade. (EAR, MF, PC E SR)
Edua
rdo
Knap
p/Fo
lhap
ress
Estava na arquibancadado mesmo estádio GeorgeThebe em 96, quando NelsonMandela, então presidente,assinou a Constituição. Hoje,a arena abriga os treinos daCosta do Marfim, que ignoraahistória que há nocampo.
“Estamos bem segurostreinando lá, a polícia temfeito bom trabalho”, disseEboué, ontem, quando ques-tionado sobre como se sentiaem Sharpeville. (EDUARDO AR-RUDA, MARTÍN FERNANDEZ, PAULOCOBOS E SÉRGIO RANGEL)
“Por anos, odiei osbrancos, os policiais equem trabalhasseno governoSELLANE PHETHANE, 64moradora de Sharpeville
É bom ter movimentoaqui, ver gente nova,e vocês podem vernossos problemasLEBO DIREBO, 32moradora de Sharpeville
Moradores dizem ter herdado só liberdadeDOS ENVIADOS A JOHANNESBURGO
A situação de Sharpeville,que tem cerca de 40 mil habi-tantes, hoje não é muito dife-rente da de 50 anos atrás,quando ocorreu o massacre.
Segundo os próprios mo-radores, quase não há ener-gia elétrica, água, esgoto, co-letade lixo e escolas.
“Não vivi aquela época,mas acho difícil que hoje seja
melhor”, afirma Lebo Dire-bo, 32, funcionária de umaloja de departamentos numshopping próximo dali.
“Espero que a Copa doMundo sirva para que as pes-soas olhem um pouco paranós e conheçam nossa situa-ção”, afirma. “Porque só selembram de nós no feriado[de 21 de março].”
Quem viveu de algumaforma o massacre ocorrido
em 1960 lamenta a situaçãoda favela, mas não faz com-parações com o passado.
“Não temos tudo de queprecisamos, mas podemossair daqui para tentar bus-car”, declara Abram Mofo-keng. “Não nos arrepende-mos de nada. Por causa de to-do aquele sangue, hoje pode-mos dizer que somos pessoaslivres”, afirma Sellane Phe-thane. (EAR, MF, PC E SR)