controlando o aquecimento global

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CONTROLANDO O AQUECIMENTO GLOBAL COMO REDUZIR EM 30% AS EMISSÕES DE GASES ESTUFA ATÉ 2030 SAMUEL VIDAL

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CONTROLANDO O

AQUECIMENTO GLOBAL

COMO REDUZIR EM 30% AS EMISSÕES DE

GASES ESTUFA ATÉ 2030

SAMUEL VIDAL

Índice

Capítulo 1: O aquecimento global

Capítulo 2: A origem das emissões de gases estufa

Capítulo 3: As dificuldades para substituir a matriz

energética fóssil

Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das

emissões mundiais de CO2 e do aumento da temperatura

da Terra nos próximos anos

Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais

de gases estufa até 2030

Capítulo 6: A viabilidade política da proposta da

Mckinsey

Capítulo 7: O setor de carbono terrestre: silvicultura e

agricultura

Capítulo 8: A redução de emissões na Amazônia

Capítulo 9: O sequestro geológico de CO2

Capítulo 10: Fontes energéticas limpas

Capítulo 11: Eficiência Energética

Capítulo 12: Conclusão

Capítulo 1: O aquecimento global

O planeta Terra corre sério risco de sofrer nas próximas décadas

um aumento de temperatura que provocará mudanças climáticas

expressivas e que ameaçará a existência humana. O fenômeno é

conhecido como aquecimento global. O livro busca definir o que é esse

fenômeno e apontar soluções com viabilidade temporal e econômica

para o problema. O título “Controlando o Aquecimento Global” se

refere à tentativa de se limitar o aquecimento global em 2°C, valor

considerado seguro pelos cientistas para que as mudanças climáticas

sejam brandas. Uma redução de 30% das emissões de gases estufa até

2030, e a continuação desse ritmo de redução nas décadas seguintes,

permitirá que os níveis de gases estufa se estabilizem num patamar que

possa garantir o controle do aquecimento global dentro dos 2°C de

aumento. Essa curva de redução foi defendida pelos cientistas do quarto

Painel Internacional de Mudanças Climáticas de 2007, o IPCC1.

Inicialmente precisamos entender o aumento do efeito estufa, o

causador do aquecimento global. O efeito estufa é um fenômeno natural

do planeta Terra, que consiste na retenção pela atmosfera de uma parte

do calor gerado pela radiação solar. Essa retenção de calor é feita pelos

gases do efeito estufa (GEE). Entre eles se destacam o vapor d'água

(H2O), o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4). O termo estufa se

refere à retenção de calor do sol similar a retenção provocada pelo vidro

numa estufa de plantas. O efeito estufa é responsável pelo aquecimento

natural do planeta. Esse fenômeno climático é provavelmente o mais

importante para a manutenção da vida na Terra. Sem ele a temperatura

média do globo seria de -18°C, contra os 15°C atuais. O grande

problema que estamos enfrentando é o aumento artificial desse

fenômeno devido à influência do homem. O crescimento econômico nos

últimos dois séculos da nossa sociedade foi incentivado pela Revolução

Industrial com a queima intensiva de combustíveis fósseis e com o uso

do solo em larga escala (agropecuária e desmatamento). O elemento

químico carbono presente no petróleo, gás natural e carvão, na queima

1 O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) foi estabelecido em

1988 pela organização Metereológica Mundial e o Programa das Nações

Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) para fornecer informações científicas,

técnicas e sócio-econômicas relevantes para o entendimento das mudanças

climáticas.

desses combustíveis, passou a ser lançado na atmosfera na forma de

dióxido de carbono (CO2), um dos gases que provocam o efeito estufa.

As concentrações de CO2 passaram de 280ppm (partes por milhão) para

377ppm ao longo do século XX. Esse aumento de concentração já

causou uma elevação média de 0,8°C na temperatura da Terra e já está

provocando mudanças climáticas sérias. O aumento da quantidade de

CO2 também aumenta o efeito estufa provocado pelo vapor d’água. Se

você esquenta um pouco que seja o ar, ao adicionar a ele uma

quantidade extra de dióxido de carbono, esse ar então reterá muito mais

vapor d'água. Esta quantidade extra de vapor d'água age como um gás

do efeito estufa e aquece o ar ainda mais, quase dobrando o efeito que

esses gases produziriam se agissem sozinhos2. Se as emissões de gases

do efeito estufa se mantiverem nos níveis atuais, calcula-se que haverá

um aumento mínimo de 5°C na temperatura média da Terra, variação

similar à ocorrida desde a última era glacial até os dias de hoje.

O aumento da temperatura do globo pode provocar alterações

climáticas drásticas que ameaçarão a nossa qualidade de vida, o nosso

padrão sócio-econômico e até mesmo a nossa existência. As principais

conseqüências serão:

1- Aumento do nível dos oceanos. Com o aumento da temperatura no

mundo, está em curso o derretimento das calotas polares. Ao aumentar o

nível da águas dos oceanos, pode ocorrer, futuramente, a submersão de

muitas cidades litorâneas. A subida do mar deverá inclusive inundar

países inteiros. Tuvalu, com apenas 9 mil habitantes, é atualmente um

dos menores dos cinco países localizados em atóis, e que em breve

deixarão de existir. Os outros são: Kiribati, irmã de Tuvalu no mesmo

grupo de atóis, com uma população de 78 mil habitantes; as ilhas

Marshal, com 58 mil; a pequena Tokelau (2 mil habitantes, um território

dependente da Nova Zelândia); e as Maldivas, o maior e mais

densamente povoado de todos os grupos insulares com 268 mil

habitantes. Somado à população deslocada das áreas litorâneas de outras

ilhas, que não constituem atóis, isso já totaliza cerca de meio milhão de

pessoas que repentinamente divorciadas da sua cultura e de suas

origens, terão de procurar novos lares3;

2 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o aquecimento global e

manter as luzes acesas. Página 24, 2008. 3 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para

evitar uma catástrofe. Página 60, 2008.

2- Crescimento e surgimento de desertos. O aumento da temperatura

provoca a morte de várias espécies animais e vegetais, desequilibrando

vários ecossistemas. As florestas de países tropicais como Brasil, Congo

e Indonésia, podem se "savanizar" e savanas podem se tornar áreas

desérticas. Isso afetará a produção de alimentos prejudicando

principalmente as populações mais pobres que não poderão pagar por

alimentos mais caros e escassos. Os conflitos por água e alimentos

aumentarão;

3- O desequilíbrio nos ecossistemas trará novas pragas e doenças para o

convívio humano. Um exemplo é a malaria. Ela é transmitida por

mosquitos, que em temperatura quentes toleráveis amadurecem mais

rápido e se multiplicam. A umidade também ajuda a espalhar a doença.

As mudanças climáticas levarão a malária para o norte e para as regiões

montanhosas se outros fatores ecológicos não impedirem4. Situações

como essa podem se multiplicar;

4- Aumento de furacões, tufões e ciclones. O aumento da temperatura

faz com que ocorra maior evaporação das águas dos oceanos,

potencializando estes tipos de catástrofes climáticas. Os furacões tipo 4

e 5(os furacões de maior intensidade) só se formam quando a água do

mar atinge determinada temperatura elevada;

5- Ondas de calor. As regiões de temperaturas amenas têm sofrido com

as ondas de calor. No verão europeu, tradicionalmente, muitas famílias

saem para viajar de férias e deixam os parentes idosos sozinhos em casa.

Muitos idosos acabaram morrendo devido aos picos de temperatura

nunca vistos em algumas cidades européias, como ocorreu em 2003. O

forte calor na Espanha, França, Holanda, Itália, Portugal e Reino Unido

em 2003 provocou 35 mil mortes5. Esse fenômeno tende a se intensificar

cada vez mais;

6- Degelo do permafrost, os solos permanentemente congelados da

Região Ártica. Estima-se que cerca de 500 bilhões de toneladas de

4 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O

Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 61, 2006. 5 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O

Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 21, 2006.

carbono estejam encerradas nesses solos6. Esse processo expõe ao ar

várias camadas de dejetos animais e outros tipos de matéria orgânica

deixados pelas criaturas que habitavam a tundra no passado. Isso

propicia a decomposição por bactérias dessa matéria orgânica, que

acabam "arrotando" dióxido de carbono e metano para atmosfera, dois

gases causadores do efeito estufa. O efeito estufa inicial causado pelas

emissões dos combustíveis fósseis e do desmatamento gerará, portanto

uma reação em cadeia. Então poderemos assistir a formação de uma

bomba de calor que aquecerá o planeta de uma forma incontrolável no

longo prazo.

Todas essas previsões têm feito a comunidade internacional se

movimentar. Nos anos 70 e 80 as primeiras reuniões e conferências

governamentais sobre mudanças climáticas ocorreram. Mas o tema só se

tornou central na agenda dos países na década de 90. Em 1990, o

primeiro informe com base na colaboração científica de nível

internacional foi o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança

Climática, em inglês), onde os cientistas advertiram que para estabilizar

os crescentes níveis de dióxido de carbono (CO2) – o principal gás-

estufa – na atmosfera, seria necessário reduzir as emissões de 1990 em

60%. Dois anos depois, mais de 160 governos assinam a Convenção

Marco sobre Mudança Climática na ECO-92, na cidade do Rio de

Janeiro. O objetivo era evitar interferências antropogênicas perigosas no

sistema climático. Isso deveria ser feito rapidamente para poder proteger

as fontes alimentares, os ecossistemas e o desenvolvimento social.

Também foi incluída uma meta para que os países industrializados

mantivessem suas emissões de gases estufa, em 2000, nos níveis de

1990. Em 1997 é assinado no Japão o Protocolo de Kyoto, um novo

componente da Convenção ocorrida na ECO-92. O acordo internacional

foi assinado por representantes de mais de 160 países. O objetivo do

Protocolo é reduzir a concentração dos gases causadores do efeito estufa

(GEE) na atmosfera. Por isso, os países industrializados se

comprometeram a reduzir as emissões de GEE a media combinada de

5,2% em relação aos níveis de 1990, durante o período a partir do ano

de 2008 até 2012. Para os países em desenvolvimento, como o Brasil, o

protocolo não previu compromissos de reduções de GEE.

6 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para

evitar uma catástrofe. Página 182, 2008.

Dentro do Protocolo surgiu um dispositivo chamado de

mecanismo de desenvolvimento limpo, ou simplesmente MDL, que

permite aos países desenvolvidos compensarem suas emissões de gases

causadores do efeito estufa por meio de projetos que diminuam as

emissões de países em desenvolvimento. Essencialmente, para ser

aprovado, o projeto precisa efetuar mudanças reais, mensuráveis e de

longo prazo para a mitigação da mudança do clima. O exigente processo

de aprovação inclui dois critérios fundamentais: adicionalidade e

sustentabilidade. O primeiro requer que o proponente comprove que seu

projeto é realmente importante para desacelerar o aquecimento global,

demonstrando como era a situação sem o MDL e como passa a ser com

ele. Para ser elegível, é preciso ainda que haja contribuição efetiva para

o desenvolvimento sustentável local, promovendo benefícios sócio-

econômicos. O poluidor compra créditos de carbono das empresas que

fazem o projeto de MDL. Exemplos de MDL são projetos de

reflorestamento, de geração de biogás em aterros sanitários e de energia

eólica. Uma empresa poluidora da Alemanha que teria um custo muito

elevado para diminuir a sua poluição no seu próprio país compra

créditos de carbono de um projeto de reflorestamento no Brasil, capaz

de absolver CO2 da atmosfera por um custo muito menor.

O Protocolo de Kyoto tem sua importância histórica, apesar das

críticas. Os governos do mundo ratificaram uma legislação que criava

metas de redução para os gases do efeito estufa. No entanto, o maior

poluidor do planeta, os Estados Unidos, não ratificou o Protocolo. Esse

veto limitou bastante a abrangência, juntamente com a não inclusão de

metas para os países emergentes como Brasil, China e Índia. Os países

em desenvolvimento crescem economicamente num ritmo mais

acelerado do que os países ricos e nos próximos 20 anos se tornarão o

grande grupo poluidor do planeta. No cumprimento das metas, os países

do Leste Europeu estão atingindo as metas com folga, já que em 1990

eles ainda eram países socialistas com uma indústria muito poluente, e

durante a transição para o capitalismo nos anos 90 tiveram quedas

severas nas suas economias. A maioria dos demais países está tendo

dificuldades para cumprir as metas. Entre esses países que apresentam

dificuldades, alguns como a Alemanha e o Reino Unido estão próximos

da meta devido a soluções interessantes. A Alemanha investiu pesado

em energia eólica, e o Reino Unido vem aumentando a participação das

usinas a gás natural menos poluentes. Alguns grupos ambientalistas

criticam os projetos de MDL, afirmando que se trata de uma forma de os

ricos pagarem para poluir. Discordo dessa idéia, pois se há um resultado

concreto (diminuição de emissão ou absolvição de carbono), ele deve

ser incentivado. É claro que os projetos de MDL são paliativos, não são

a solução final, mas são uma parcela da solução.

A maioria absoluta da comunidade científica concorda que o

aquecimento global é causado pelo homem. No total, o relatório IPCC

afirma que mais de 29 mil dados de observação espalhados em 75

estudos mostram mudanças significativas em sistemas físicos e

biológicos em todo o mundo. E 90% desses dados são exatamente o que

se esperaria de um cenário de aquecimento. E mais: as regiões em que

as alterações estão acontecendo coincidem com as regiões em que um

maior aquecimento foi registrado7. Com isso, a discussão central hoje é

a viabilidade econômica ou não da diminuição de emissões dos gases do

efeito estufa (GEE). O ex-presidente americano Bush não ratificou o

Protocolo de Kyoto afirmando que ele diminuiria a lucratividade das

empresas americanas. Alguns países em desenvolvimento não aceitam

metas de redução dos GEE, por afirmarem que o aquecimento global

vem sendo intensificado pelas emissões lançadas desde a Revolução

Industrial no século XVIII pelos países que atualmente são ricos. Então

argumentam que se os países ricos poluíram para se desenvolver, os

países emergentes também tem esse direito, devendo haver metas de

redução de poluição apenas para os países ricos. De fato, estima-se que

cerca de 1/3 do CO2 emitido ao longo dos últimos 200 anos ainda está

concentrado na atmosfera, sendo responsável por boa parte do efeito

estufa atual. No entanto, a responsabilidade é de todos nós, pois com o

aumento da participação na poluição global por parte dos países em

desenvolvimento, qualquer acordo de criação de metas de poluição sem

a presença desses países, não conterá o aquecimento planetário. A

maioria dos governantes do mundo discursa a favor do meio-ambiente e

defendem verbalmente metas de redução de emissões no longo prazo.

No entanto, são árduos inimigos do planeta na prática, defendendo um

suposto pragmatismo econômico e não aceitando metas de redução no

curto prazo. Contra essa posição estão a comunidade científica, os

ambientalistas e uma classe emergente de novos políticos, que defendem

uma transição rápida da nossa matriz energética viciada em carbono

para uma matriz limpa e renovável. A pergunta principal é: Quanto

7 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o aquecimento global e

manter as luzes acesas. Página 50, 2008

dinheiro temos que gastar para estabilizar a temperatura do planeta ou

mantê-la num patamar aceitável (até 2°C de aumento)? A resposta é

controversa, pois cada especialista defende uma forma diferente de

conter o aquecimento global. Mas todos convergem para a necessidade

de investirmos entre 1 e 2% do PIB Mundial para evitar uma

hecatombe climática e econômica no longo prazo. Parte do valor

investido trará retorno econômico na forma de economia no consumo de

energia. Esse investimento é viável tecnicamente, mas evidentemente

gerará uma pequena diminuição na taxa de crescimento econômico

mundial no curto prazo, que os defensores do aumento de riqueza a

qualquer custo não querem abrir mão.

Capítulo 2: A origem das emissões de gases estufa

O Quarto Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima

(IPCC), de 2007, congregou os maiores especialistas do tema

aquecimento global. Segundo o painel, precisamos diminuir entre 50% e

85% as nossas emissões de gases do efeito estufa até 2050, em relação

às emissões de 2000. Dessa forma poderemos limitar o aumento de

temperatura do planeta em 2°C, limite considerado seguro pelos

cientistas para que as conseqüências ambientais sejam brandas. Uma

redução de 30% das emissões de gases estufa até 2030, e a continuação

desse ritmo de redução até 2050, é necessária para se atingir o objetivo.

O primeiro passo é quantificar as emissões planetárias. Para isso

usaremos os dados do IPCC de 2007. No ano de 2004 o mundo emitiu

49 bilhões de toneladas equivalentes de CO2. O leitor pode perguntar: o

que isso significa? Isso significa que o aquecimento provocado pela

soma de todos os tipos de gases estufa emitidos no ano de 2004 equivale

ao aquecimento provocado por 49 bilhões de toneladas de CO2, levando-

se em conta o tempo que os diferentes gases permanecem na atmosfera.

No gráfico seguinte temos a distribuição das emissões de GEE

mundiais8:

8 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo I. O gráfico pode

ser encontrado no site em inglês: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-

report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf

O gás metano (CH4) é o segundo gás estufa com maior

quantidade de emissões em toneladas equivalentes de CO2,

representando 14,3% das emissões totais. Elas estão concentradas no

setor de agricultura e no setor de resíduos. No setor agrícola as

principais fontes emissoras são o arroto dos animais (ex. vacas, porcos)

e o cultivo de arroz. No setor de resíduos os grandes lançadores são os

lixões das grandes cidades. Uma tonelada de metano emitida equivale a

21 toneladas de dióxido de carbono, quanto ao nível de aquecimento da

atmosfera. Muitos projetos de MDL de redução de emissões do gás

metano queimam o gás e geram energia elétrica através do calor obtido

da reação. A reação também gera dióxido de carbono, diminuindo o

nível de poluição, já que como foi citado acima o aquecimento da

atmosfera provocado pelo dióxido de carbono é menor do que o

aquecimento provocado pelo metano. O óxido nitroso (N2O) é o terceiro

gás estufa com maior quantidade de emissões em toneladas equivalentes

de CO2, representando 7,9% das emissões totais. Elas estão

concentradas em sua maioria no setor agrícola, sendo lançadas

principalmente pelos solos agrícolas, após o uso indiscriminado de

fertilizantes nitrogenados.

Os gases-F representam apenas 1,1% das emissões totais em

toneladas equivalentes de CO2. Elas estão concentradas principalmente

no setor industrial. Em geral 1 tonelada desses gases apresenta um

potencial de aquecimento centenas de vezes ou até milhares de vezes

maior do que 1 tonelada de dióxido de carbono. Como exemplo pode-se

citar o SF6 (Hexafluoreto de enxofre), que tem uma capacidade de

aquecimento do planeta 22200 vezes maior que o CO2 e é usado como

isolante térmico, condutor de calor e agente refrigerante. No mercado de

crédito de carbono, um MDL que evita o lançamento do SF6, pode

vender para uma empresa poluidora 1 tonelada de SF6 evitada por

2200009 dólares. Isso torna a transição para uma indústria limpa nesses

setores altamente lucrativa. Não por acaso, 25% dos projetos redutores

de emissões no período 2004-2005 foram de eliminação de HFCs10

.

9 Se evitarmos o lançamento de 1 tonelada de SF6, estaremos anulando 22200

toneladas de CO2 emitidas ( 22200 x 10 dólares). Os 10 dólares se referem ao

preço médio de 1 tonelada de CO2 evitada no mercado de créditos de carbono.

10 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O

Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 75, 2006.

As emissões mundiais de dióxido de carbono (CO2) são

compostas basicamente da queima de combustíveis fósseis e do

desmatamento. Temos 4 "torneiras" de carbono que precisam ser

fechadas: gás natural, petróleo, carvão e desmatamento. As emissões de

CO2 foram responsáveis por 76,7% do aquecimento provocado pelos

gases estufa lançados artificialmente em 2004. Isso evidencia que o

nível de emissões de CO2 em quantidade de toneladas emitidas em

relação aos outros gases estufa é muito superior, já que mesmo sendo

menos poluente por tonelada emitida, o CO2 é o gás estufa que mais

influencia no aquecimento planetário. O desmatamento, concentrado nas

florestas tropicais remanescentes, é incentivado pela expansão da

agricultura e da pecuária em busca de novas terras baratas e pela

exploração predatória de madeira. Os combustíveis fósseis lançadores

de CO2 respondem por 56,6% das emissões totais de gases estufa e por

81% da matriz energética mundial, sustentando a produção econômica

mundial. Essa dependência energética é incentivada pelos custos

elevados das outras fontes de energia. O gráfico11

abaixo nos mostra a

participação de cada fonte primária na matriz energética mundial:

Apesar da liderança do petróleo, em relação aos outros dois

combustíveis fósseis, não podemos esquecer que o carvão mineral é

mais poluente que o petróleo por unidade de energia, sendo as emissões

11 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência

Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês: http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf

totais dos 2 combustíveis muito próximas. O gás natural é o que

apresenta menor quantidade de emissões por unidade de energia e

menor participação na matriz energética entre os três fósseis. Também é

importante especificar quais tipos de atividades econômicas mais

contribuem para o aquecimento global. O gráfico abaixo nos mostra a

participação dos principais setores da economia mundial nas emissões

globais de gases de efeito estufa em 200412

:

Esse gráfico não se refere apenas as emissões de CO2. As

emissões da agricultura são compostas basicamente dos gases metano

(CH4) e óxido nitroso (N2O). Na indústria uma parcela pequena das

emissões é de óxido nitroso, gases-F e metano. As emissões dos setores

de edifícios, de produção de energia elétrica, de produção industrial e de

transportes são compostas na maioria de CO2 produzido pelos

combustíveis fósseis. As emissões dos edifícios são lideradas pelo

petróleo. Exemplos do uso do petróleo nesse setor são o cozimento de

alimentos e o aquecimento de água com o gás liqüefeito de petróleo

(GLP). Os 7,9% de participação das emissões dos edifícios não

computam as emissões provenientes do consumo de energia elétrica dos

edifícios. Se adicionarmos as emissões provenientes do consumo de

energia elétrica nos edifícios (que estão incluídas na categoria

“produção de energia“), as emissões dos edifícios chegam

aproximadamente a 18% do total. O gás natural e o carvão mineral

12 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo I. O gráfico

pode ser encontrado no site em inglês: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf

lideram as emissões de CO2 e a quantidade de energia produzida na

geração de energia elétrica e de energia primária na indústria, os setores

com as maiores emissões. Abaixo temos um gráfico com a participação

de cada fonte na geração de energia elétrica mundial13

:

Origem da energia elétrica consumida pela economia mundial em 2005.

(Agência Internacional de Energia, WEO-2007)

A geração de eletricidade através das fontes hidráulica e nuclear

não libera gases estufa em quantidade significativa. Os líderes carvão e

gás são muito baratos e o carvão especificamente é abundante. O

petróleo em contrapartida é caro e apresenta uma participação pequena

de 6,6% do total e de 9,9% se contarmos apenas a geração com

combustíveis fósseis. Sempre que se fala em fim do petróleo, se associa

a sua substituição às fontes de energias renováveis como energia eólica

e solar, mas essas fontes limpas estacionárias deverão substituir na

maioria dos casos o carvão mineral e o gás natural. Quanto ao custo do

petróleo, uma termelétrica a diesel por exemplo, gera energia muito

mais cara do que uma similar a gás ou carvão. Então porque sendo tão

caro, o petróleo é tão importante e valioso para o setor energético?

Porque ele é o combustível portátil que sustenta o setor de transportes

no mundo. Todos os processos econômicos atuais dependem de uma

rede de transportes terrestres, marítimos e aéreos. O abastecimento do

setor de transportes pelo carvão mineral, que é sólido, não é viável

13 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência

Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês: http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf

econômicamente na maioria dos casos, apesar de o carvão poder

tecnicamente ser transformado em combustível líquido. O combustível

sintético do carvão atende metade da demanda por gasolina e diesel da

África do Sul, e com os altos preços do petróleo mundial, os

combustíveis sintéticos de carvão estão se tornando competitivos em

outras partes do mundo. A liquefação do carvão produz muito mais CO2

do que o refinamento convencional do petróleo14

. O gás natural

necessita de uma gigantesca rede de abastecimento para ser implantado,

sendo mais viável para geração de energia próximo a reserva num lugar

fixo. Temos abaixo um gráfico com a parcela de cada matriz no setor de

transportes15

:

Origem da energia consumida pelo setor de transportes da economia

mundial em 2005. (AIE, WEO-2007)

A liderança do petróleo é avassaladora. O alto valor do petróleo

acaba tornando o mercado de energia do petróleo superior

economicamente ao mercado de energia do gás natural e do carvão

mineral. Uma alternativa ao uso do petróleo no setor de transportes,

seria usar um carro elétrico abastecido na rede de energia elétrica com

energia proveniente de uma termelétrica a carvão ou mesmo de uma

usina hidrelétrica que é limpa. Um carro elétrico gasta em dinheiro até 3

vezes menos para rodar do que um carro a gasolina, apresentando uma

eficiência de 65% na conversão de energia contra 20% do carro a

gasolina, que desperdiça a maior parte da energia gerando calor. O

problema é que as baterias tem uma densidade energética muito inferior

14 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para

evitar uma catástrofe. Página 251, 2008. 15 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência

Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês:

http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf

a densidade de um tanque de gasolina, o que diminui drasticamente a

autonomia do carro elétrico, além do abastecimento que demora

algumas horas.

O petróleo e o gás natural tem reservas comprovadas para

aproximadamente mais 50 anos de consumo atual, enquanto o carvão

mineral tem reservas para sustentar o consumo mundial atual por mais

de 200 anos. O carvão mineral pode sustentar a matriz energética

mundial no futuro, abastecendo os carros elétricos(com as limitações já

citadas) através da energia proveniente das termelétricas, ou através do

caro carvão líquido. No entanto ele é o combustível fóssil mais

poluente, emitindo até 150% mais CO2 que o gás natural e 50% mais

CO2 que o diesel, com a mesma energia gerada. O uso intensivo do

carvão mineral acelerará mais ainda o aquecimento global. Temos

portanto, duas crises no setor de energia. Uma crise ambiental, pois

todos os setores dependem da geração de energia fóssil, que aumenta o

aquecimento global, e uma crise econômica restrita ao setor de

transportes dependente do petróleo e que enfrenta a sua escassez.

Capítulo 3: As dificuldades para substituir a matriz

energética fóssil

Vimos no capítulo passado que os combustíveis fósseis

representam a expressiva participação de 56,6% nas emissões mundiais

de gases estufa. Temos de lado um combustível caro e portátil, que

representa a maior fatia do mercado de energia no mundo entre os

fósseis, como o petróleo, e do outro lado o carvão mineral e o gás

natural mais baratos e predominantemente não portáteis. Uma menor

participação dessa matriz energética fóssil é essencial para alcançarmos

a meta de 30% de diminuição de gases estufa até 2030. No entanto,

existem muitas problemas que dificultam esse processo. O principal

chama-se tempo. As termelétricas fósseis, por exemplo, possuem uma

vida útil de até 40 anos, sendo portanto a substituição por novas usinas

lenta. Além disso, as empresas do setor planejam investimentos com

anos de antecedência, principalmente em pesquisa. No caso do

transporte rodoviário, que representa a maioria das emissões do setor de

transportes, ocorre um cenário parecido. Os carros e caminhões novos

têm uma vida útil de 20 anos. Temos uma infra-estrutura de

fornecimento (ex. postos de gasolina) de derivados de petróleo (diesel,

querosene, gasolina) com vida útil longa. No parque industrial, o

problema também se repete quanto ao tempo de vida útil. Um país que

decretasse o fechamento de todas termelétricas nos próximos 20 anos

teria que arcar com os custos de implantação de novas usinas de geração

de energia limpa, mais caras do que as usinas fósseis, e com os custos de

indenização das empresas proprietárias das usinas e de seus respectivos

acionistas. Uma proibição de construção de novas usinas termelétricas

também pode esbarrar nos lobbys políticos das empresas donas das

grandes jazidas de carvão, gás e petróleo, que não aceitam perder

bilhões de dólares em patrimônio na forma de reservas sem uma justa

indenização. Uma ponto dramático que piora a situação é o crescimento

econômico acelerado acima de 7% ao ano da India e da China, com

populações somadas de quase 2,5 bilhões de habitantes e que tem o

carvão barato, o combustível mais poluente do mundo, como a principal

fonte energética. Uma solução plausível seria os governos agirem nos

mercados com incentivos para as empresas renováveis ou com a

taxação de impostos sobre as termelétricas poluidoras, a fim de diminuir

gradativamente no decorrer dos próximos anos a participação das

termelétricas nas novas plantas de geração de energia elétrica. No

entanto não podemos esquecer de um detalhe: a elasticidade dos preços

dos combustíveis fósseis, tanto no mercado de geração de energia

elétrica, quanto no mercado de transportes. Se as energias renováveis se

tornarem mais baratas do que os combustíveis sujos através dos

incentivos dos governos ou de avanços tecnológicos restará ainda aos

fornecedores de combustíveis baixarem os preços para se manterem

dominantes do mercado. Não se deve subestimar a capacidade da

indústria fóssil de reduzir os preços numa concorrência direta com as

energias renováveis. Com a queda drástica do preço do petróleo na crise

financeira de 2008, por exemplo, se reduziu o interesse do consumidor

americano por carros híbridos. Essa redução não foi intencional, mas

pode se tornar no futuro para manter a soberania do petróleo, por

exemplo. O custo de exploração da maioria das jazidas de petróleo no

mundo é muito inferior as valores de mercado do líquido. O valor de

mercado elevado só se justifica pela escassez de jazidas e pelo

monopólio das jazidas em poucas mãos. Os preços são controlados pela

OPEP, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo. Uma

fornecedora de petróleo por exemplo que lucra com um barril a 80

dólares nos dias atuais, pode continuar lucrando com um barril a 40

dólares e sofrendo expressivas taxações de impostos. Empresas extraem

petróleo com sucesso econômico no longícuo Alasca americano com

pesadas taxações de impostos.

Apenas as leis do mercado não resolverão o problema. A solução

passa inicialmente pelo incentivo governamental ao aumento da

eficiência energética na indústria e na produção de energia elétrica,

possibilitando uma diminuição na demanda de combustíveis fósseis e

consequentemente uma redução no aumento de emissões. Na produção

de energia o incentivo às fontes limpas através de subsídios deve ser

acompanhada de uma forte regulação que possa impedir que os cartéis

dos combustíveis fósseis imponham temporariamente preços

artificialmente baixos para manter o domínio do mercado. Também se

faz importante o incentivo a um mix de fontes limpas (eólica, solar,

biomassa, nuclear, hidrelétrica), para que cada uma contribua no limite

do seu potencial. Uma alternativa seria os governos criarem cotas

estabelecendo que uma parcela considerável das novas plantas de

energia sejam obrigatoriamente de fontes energéticas limpas.

No setor de transportes é importante inicialmente a expansão de

tecnologias que já são viáveis economicamente hoje como o carro

híbrido e o carro a álcool. O álcool é limpo e renovável porque o CO2

emitido na combustão do carro é anulado pelo CO2 foi absolvido no

crescimento da plantação de cana ou milho. Ele pode ser usado

individualmente ou misturado numa proporção de até 24%16

na

gasolina. A melhor alternativa são os carros flex que podem rodar com

álcool e gasolina com um aumento mínimo dos custos de produção.

Esses carros rodam com um combustível renovável e limpo e protegem

o consumidor de um possível desabastecimento do álcool, com a opção

da gasolina. Os carros flex são sucesso no Brasil, constituindo a maioria

absoluta da frota de carros novos. O álcool pode substituir

adequadamente até 20% da demanda mundial de gasolina. As limitações

se referem a falta de terras para plantar cana-de-açúcar ou milho e

abastecer a população mundial de alimentos simultaneamente. Além

disso, o álcool não substitui o diesel usado nos caminhões, ônibus, trens

e navios que tem motores com uma vida útil muito superior. O

biodiesel, o substituto biológico do diesel, ainda tem um custo muito

elevado. O carro híbrido tem um motor a gasolina e outro elétrico. O

motor elétrico aproveita parte da energia desperdiçada pelo motor a

gasolina que é armazenada numa bateria (ex: energia dos freios).

Quando o carro está parado num sinal ele funciona exclusivamente

como o motor elétrico e quando se movimenta os dois motores podem

funcionar simultaneamente. Um carro híbrido tem uma diminuição de

consumo de gasolina entre 25% e 50%. Por outro lado ele é mais caro

de se produzir que um carro exclusivamente a gasolina. Se estima que

em até 8 anos esse custo extra se paga. Além da expansão das

tecnologias viáveis, um caminho vigoroso de substituição gradual do

petróleo no setor de transportes precisa incentivar melhorias de

eficiência energética e incentivar tecnologias que hoje ainda não são

viáveis como os biocombustíveis de 2ª geração.

Nesse contexto de dificuldade de substituição da matriz fóssil,

um ângulo interessante a ser avaliado é a posição dos países produtores

de petróleo. O seleto grupo de países produtores de petróleo não quer

abrir mão da prosperidade em nome do meio-ambiente. No caso do

Brasil, um novo integrante do grupo, a sociedade comemorou as

16 Proporção de álcool presente na gasolina brasileira.

descobertas de petróleo na camada do pré-sal17

, que tornaram o país

dono de mais de 80 bilhões de barris de reservas estimadas. A

descoberta acelerará o crescimento econômico do Brasil nas próximas

décadas através da exportação do petróleo. A Petrobrás, a estatal de

petroleo do Brasil, projeta investimentos em gigantescas refinarias de

petroleo em estados pobres como Ceará, Pernambuco e Maranhão. Os

governadores e as populações desses estados vêem o refino do petróleo

do pré-sal como a chegada definitiva da prosperidade econômica. Se

comemora o crescimento econômico mas se esquece dos bilhões de

toneladas de CO2 que os bilhões de barris de petróleo poderão lançar

nos próximos 40 anos. A paixão brasileira pelo petróleo também ocorre

em outros países produtores. Por outro lado a questão das emissões

passadas de gases estufa volta à tona. Os Estados Unidos cresceram

economicamente com a ajuda do petróleo. A Noruega é atualmente o

país mais rico da Europa devido principalmente a exportação de

petróleo. Então por que a pobre Angola na África deveria parar de

exportar petróleo ou o Brasil não deveria explorar o pré-sal para

melhorar os indicadores sociais de suas regiões pobres? A melhor

opção é que os países produtores tenham liberdade de produção e

exportação, desde que cada um assuma metas internas de redução de

emissões de gases estufa. O controle do volume de exportações e

conseqüentemente de consumo dos países importadores ficaria a cargo

dos países consumidores. Felizmente os países que representam a maior

fatia da economia mundial (Estados Unidos, China, Japão, grande parte

da Europa Ocidental) são importadores de petróleo e por isso tem

grande interesse na redução do consumo. Um acordo de redução de

emissões de gases estufa ratificado por todos os países geraria uma

redução no consumo do petróleo e uma redução natural e gradual no

volume das exportações dos países produtores de petróleo sem severas

imposições.

As variáveis do problema da substituição da matriz fóssil citadas

nesse capítulo apontam para a viabilidade de uma transição possível

para uma matriz limpa, mas que precisa ser custeada por incentivos

estatais e que precisa ser gradual para evitar custos econômicos

excessivos. Os incentivos governamentais precisam de apoio político

17 Camada que fica a até 7000 metros de profundidade na plataforma

marítima brasileira abaixo da camada de sal, onde foram encontradas

recentemente vultuosas reservas de pétroleo e gás natural.

para sair do papel. No entanto, em geral os governos não estão dispostos

a colaborar, trocando uma parte do crescimento econômico no curto

prazo por sustentabilidade ambiental no longo prazo. Um presidente de

um país, com uma reeleição complicada, acredita que a troca

investimentos na construção de estradas e geração de empregos por

investimentos que evitem emissões de CO2, lhe tirará votos. Mudanças

tecnológicas em direção a tecnologias mais limpas na maioria dos casos

só são implementadas quando os custos são mínimos. Um exemplo

disso é a tecnologia dos catalisadores em automóveis. Quando um carro

realiza combustão ele lança basicamente CO2 e uma pequena fração de

monóxido de carbono (CO), enxofre e outros poluentes, frutos da

combustão incompleta da gasolina. Essa pequena fração de gases são

altamente venenosos e provocam todos anos milhares de mortes por

doenças respiratórias no mundo. O catalisador evita a emissão desses

poluentes, tornando os carros até 40 vezes menos poluentes que nos

anos 70. No entanto essa poluição se refere apenas aos gases que fazem

mal diretamente a saúde do homem. O CO2, que é a maioria absoluta

das emissões, não faz mal a saúde quando é lançado na atmosfera mas é

responsável pelo aquecimento global. Ele só representa um perigo a

saúde em níveis altíssimos, geralmente só encontrados em ambientes

fechados. Então é sempre importante discernir os gases venenosos

(monóxido de carbono, enxofre e outros) causadores das doenças

respiratórias, do CO2 que não faz mal à saúde mas interfere no clima.

Os gases venenosos estão diminuindo gradativamente nas grandes

cidades por conta da frota com catalisadores, mas o CO2 está crescendo

devido ao aumento do número de veículos, sendo a emissão

proporcional ao consumo de gasolina.

Por último uma alternativa que poderia inesperadamente mudar a

rota provável de transição energética lenta seria um choque tecnológico

que reduzisse drasticamente os custos da energia, que os tornasse mais

baratos do que os custos de produção dos combustíveis fósseis. Quanto

a esse choque, a fonte revolucionária mais promissora é a fusão nuclear,

a energia das estrelas. A energia gerada pelo Sol, por exemplo, provém

da fusão nuclear. A fusão nuclear é diferente da fissão nuclear, usada

nas usinas atômicas convencionais. Tanto a fusão quanto a fissão

baseiam-se em reações nucleares, não em reações químicas como a

combustão. Uma reação química envolve apenas a eletrosfera dos

átomos: os núcleos atômicos permanecem intocados. Já em uma reação

nuclear, como a própria expressão indica, os núcleos atômicos

interagem e são transformados, em processos físicos que envolvem

muito mais energia do que nas reações químicas. A diferença entre as

duas formas básicas de liberação de energia nuclear é que, na fissão,

núcleos pesados (como o dos átomos de urânio) são divididos em

núcleos menores, enquanto na fusão núcleos leves (como o dos átomos

de deutério) são soldados e formam um único núcleo mais pesado. A

fusão nuclear tem vantagens importantes sobre a fissão, pois emite baixa

poluição radioativa e possui baixo risco de acidentes. O problema é que

um gerador de energia com fusão nuclear ainda não foi viabilizado

tecnicamente e os especialistas acreditam que dificilmente isso será

possível nas próximas décadas. A fusão nuclear ocorre apenas a

temperaturas muito altas, nas quais a matéria se encontra em um estado

conhecido como plasma (que não é líquido, sólido, nem gasoso). O

controle da reação de fusão depende do confinamento desse plasma no

interior de um reator, que possa transformar a energia gerada em alguma

forma aproveitável economicamente. Este confinamento do plasma tem

sido a principal dificuldade no desenvolvimento dos reatores de fusão.

Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das

emissões mundiais de CO2 e do aumento da temperatura

da Terra nos próximos anos

A Agência Internacional de Energia prevê em seus relatórios um

aumento das emissões ligadas aos combustíveis fósseis até 2030. Eles

são baseados no seu "World Energy Model" (Modelo da Energia

Mundial), um sofisticado modelo matemático de simulação do

comportamento dos mercados mundiais de energia, com cerca de 16.000

equações, que incorpora a extensiva base de dados da AIE sobre a

produção, comércio e consumo mundiais de energia, além de estudos

sobre o crescimento econômico mundial, investimentos no setor

energético, novas tecnologias e políticas energéticas. A AIE projeta dois

tipos de cenários: o cenário de referência e o cenário de políticas

alternativas18

. O primeiro é considerado o cenário mais provável. Nele a

agência assume que haverá avanços tecnológicos tanto no consumo

como na produção de energia e que estas mudanças serão incrementais,

por conta das longas vidas úteis dos equipamentos de conversão

envolvidos. Algumas tecnologias que hoje estão ainda em fase

experimental deverão se difundir nas próximas três décadas. Assim

como foi defendido no capítulo anterior deste livro, a AIE acredita que

existe uma grande dificuldade para substituir a matriz energética fóssil.

A Agência adota como premissa em seu cenário de referência que a

quantidade de energia necessária para prover uma dada quantidade de

serviço de energia, deverá continuar evoluindo no mesmo ritmo das

últimas três décadas. No cenário de referência, entre 2004 e 2030,

prevê-se um crescimento de 55% das emissões de dióxido de carbono

(CO2) relacionadas com a energia, isto é, uma taxa de crescimento de

1,7% por ano. No cenário de políticas alternativas, a AIE simula o

impacto de políticas que já estão sendo analisadas pelos governos,

sobretudo dos países da OCDE, mas que ainda não tinham sido

implementadas até 2004. As tendências no cenário de referência não são

imutáveis. Os governos podem tomar medidas mais vigorosas para

alterar o curso do sistema energético, o desviando para um caminho

18 Os dois cenários estão na edição 2006 do “World Energy Outlook” da

Agência Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês: http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2006/weo2006.pdf

mais sustentável. No cenário de políticas alternativas, presume-se que os

governos implementarão as políticas e medidas para melhorar a

segurança energética e reduzir as emissões de CO2. Nele se prevê um

crescimento de 29% nas emissões de CO2 em 2030, em relação a 2004.

No Cenário de Políticas Alternativas os investimentos adicionais na

geração de energia limpa e no aumento da eficiência energética são

pagos com sobra pela economia de energia gerada. Usaremos como

bússola o Cenário de Referência da AIE, onde as emissões aumentarão

55% até 2030.

Enquanto a AIE fez projeções do crescimento das emissões de

CO2 provenientes dos combustíveis fósseis se baseando em projeções

econômicas, o IPCC fez projeções científicas sobre o impacto do

crescimento das emissões de todos os gases estufa no clima. O 4°

Relatório do IPCC de 2007 (o já citado Painel Intergovernamental de

Mudanças Climáticas) avaliou 177 cenários de estabilização das

concentrações de gases do efeito estufa, e conseqüentemente da

temperatura. Eles foram agrupados em 6 categorias, de acordo com os

valores finais das concentrações de gases estufa e com os valores da

temperatura após a estabilização. As 6 categorias19

de estabilização são:

19 Fonte da tabela: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo III. A tabela

pode ser encontrada no site em inglês: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter3.pdf

Categoria

Aumento da

temperatura

global média

acima dos

níveis pré-

industriais

(°C)

Ano de pico

das

emissões de

CO2

Mudança nas

emissões

globais de

gases estufa

em 2050 em %

das emissões

de 2000

Número

de

cenários

avaliados

I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6

II 2,4 - 2,8 2000 - 2020 -60 a -30 18

III 2,8 - 3,2 2010 - 2030 -30 a +5 21

IV 3,2 - 4,0 2020 - 2060 +10 a +60 118

V 4,0 - 4,9 2050 - 2080 +25 a +85 9

VI 4,9 - 6,1 2060 - 2090 +90 a +140 5

Segundo a comunidade científica, aumentos da temperatura

acima de 2,4°C são reconhecidamente perigosos. A categoria I, que

corresponde à faixa "prudente" de perturbação do sistema climático,

exige que as emissões parem de crescer até 2015, e que em 2050 elas

sejam entre 50% e 85% daquelas do ano 2000. Esqueceremos as outras

categorias de estabilização e tomaremos como cenário de referência a

categoria I. Nosso objetivo é reduzir em 30% as emissões anuais de

gases estufa em 2030, em relação aos níveis de 2005, começando a

redução em 2010. Esse nível de redução até 2030 e a continuação desse

ritmo de redução até 2050 tem grande potencial para atingir o objetivo

final de estabilização climática prudente. Assim temos:

Categoria

Aumento da

temperatura

global média

acima dos

níveis pré-

industriais

(°C)

Ano de pico

das

emissões de

CO2

Mudança nas

emissões

globais de

gases estufa

em 2050 em

% das

emissões de

2000

Número de

cenários

avaliados

I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6

Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais

de gases estufa até 2030

Diante das dificuldades apresentadas pelas previsões dos órgãos

internacionais pode-se pensar que o aquecimento global dificilmente

será controlado. No entanto existem várias alternativas para mudar o

curso das emissões. A diminuição das emissões mundiais de gases

estufa começará a ser explicada neste capítulo. A situação é:

-Temos um cenário provável de crescimento de emissões de CO2 no

setor de energia da ordem de 55% até 2030, em relação ao ano de 2004,

segundo a AIE;

- Mesmo no cenário de políticas alternativas, teremos um crescimento

de emissões de CO2 da ordem de 29% até 2030, em relação ao ano de

2004, segundo a AIE;

- Precisamos que as emissões parem de crescer até 2015, segundo o

IPCC;

- Em 2050 as emissões precisam ser entre 50% e 85% menores do que

as emissões do ano 2000, segundo o IPCC;

- Segundo as duas grandes referências climáticas e energéticas do

planeta (IPCC e AIE), estamos caminhando para não alcançar a

estabilização do aumento de temperatura do planeta dentro dos 2°C

considerados seguros e brandos para o clima;

-Esse cenário levará a humanidade a sofrer graves conseqüências

ambientais e econômicas.

A consultoria McKinsey e Company, referência mundial em

consultoria empresarial, empreendeu um esforço global num estudo

sobre as soluções técnicas existentes para controlar o aquecimento

global e o respectivo custo dessas soluções. O estudo lançado no

começo de 2009 se chama “Caminhos para uma economia de baixo

carbono – versão 2”20

. No estudo a consultoria estimou em 45,9 bihões

de toneladas de CO2 equivalente emitidas pelo mundo em 2005. O valor

é um pouco inferior aos 49 bilhões estimados pelo IPCC 2007 emitidos

20

O estudo pode ser encontrado no site:

http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo

my.asp

pelo mundo em 2004. A pequena diferença é justificada no estudo pelo

uso de instituições distintas do IPCC como referência no cálculo das

emissões. No entanto o importante é que os valores são bem próximos

dos valores do IPCC 2007.

A consultoria Mckinsey desenvolveu uma projeção de evolução

de emissões entre 2005 e 2030 se baseando em previsões de instituições

como a AIE. Nesse cenário, chamado de caso base, as emissões

passarão de 46 bilhões de toneladas de CO2 equivalente emitidas em

2005 para 70 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2030, um

crescimento de 52% nas emissões. Essa curva de crescimento de

emissões é considerada pelo estudo a mais provável projeção de

crescimento de emissões. Evidentemente, externalidades não previstas

pelo modelo da consultoria poderão alterar a projeção de crescimento. O

estudo abrangeu todas as emissões mundiais de gases estufa e não

somente as emissões lançadas pelos combustíveis fósseis como foi feito

pelos relatórios da AIE. O gráfico a seguir mostra a distribuição das

emissões por setores econômicos em 2005 e a estimativa de emissões

desses setores segundo o caso base em 2030:

Além de projetar o caso base, a consultoria mapeou 200

iniciativas, em 10 grandes atividades econômicas, com potencial de

reduzir as emissões de 70 bilhões de toneladas de CO2 equivalente para

32 bilhões de toneladas em 2030. Todas as iniciativas apresentam um

custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada. A

diminuição de 38 bilhões de toneladas emitidas representa uma redução

de 55% em relação ao caso base. Se compararmos com as emissões de

2005 teremos uma redução de 30%, passando de 46 bilhões para 32

bilhões em 2030. Essa redução é tomada como referência no subtítulo

do livro: “Como reduzir em 30% as emissões mundiais de gases estufa

até 2030”. A proposta de redução ( linha marrom contínua) é explicitada

no gráfico a seguir:

A Mckinsey também avaliou oportunidades com custo entre 60 e

100 euros, com potencial de abatimento de 9 bilhões de toneladas de

CO2 equivalente. No entanto o foco do estudo foram as oportunidades

com custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente. No

cenário onde essas iniciativas com custo inferior a 60 euros serão

implementadas as emissões atingirão 32 bilhões de toneladas de CO2

equivalente em 2030. Nele o pico da concentração de gases estufa na

atmosfera será de 510ppm e a estabilização dos gases estufa atingirá

450ppm de concentração de CO2 equivalente. Nesse cenário a

expectativa de aumento médio da temperatura do planeta segundo o

IPCC é de 2°C. Esse valor é suficiente para evitar mudanças climáticas

bruscas. No gráfico abaixo temos o potencial de abatimento de 38

bilhões de toneladas emitidas em 2030 em relação ao caso base dividido

por setor econômico:

Na proposta de diminuição de emissões, as iniciativas devem ser

implementadas entre 2010 e 2030. Os investimentos incrementais

necessários nas iniciativas crescerão gradualmente passando de 317

bilhões de euros anuais no período 2011-2015 para 811 bilhões de

dólares anuais no período 2026-2030. Esses valores representariam um

acréscimo aos valores de investimentos normais estimados no caso base.

O custo de investimento para construir uma usina solar, por exemplo, é

mais elevado do que o custo de investimento para construir uma

termelétrica a carvão. Esse investimento adicional, acima do valor de

construção da termelétrica é considerado como o investimento

incremental na iniciativa citada. No entanto parte dos investimentos se

pagará, pois iniciativas de incentivo à eficiência energética

economizarão energia. O custo líquido médio das iniciativas durante o

período 2011-2030 será aproximadamente 4 euros por tonelada de CO2

equivalente evitada. O custo líquido anual atingirá 150 bilhões de euros

anuais em 2030. A consultoria também avaliou outros custos adicionais,

como os custos transacionais e os custos dos programas de

implementação de redução de emissões. Os programas de

implementação podem ser caros ou não dependendo da forma escolhida

pelos agentes. Um programa de incentivo à eficiência energética, por

exemplo, pode ser implantado através de uma campanha educativa

(forma cara e pouco intrusiva) ou através da imposição de uma

legislação obrigatória (forma barata e muito intrusiva). Os custos

adicionais foram avaliados entre 40 bilhões e 200 bilhões de euros em

2030. Somando o custo líquido das iniciativas (150 bilhões de euros)

com os custos adicionais (entre 40 bilhões e 200 bilhões de euros), o

custo total é estimado entre 200 bilhões e 350 bilhões de euros anuais

em 2030. A McKinsey estimou o PIB mundial em 60 trilhões de euros

anuais em 203021

. Então o custo líquido total pode representar menos de

0,4% do PIB global em 2030, um valor muito baixo se compararmos

com os prejuízos que o aquecimento global pode causar.

O estudo da Consultoria McKinsey não é contraditório com os

relátorios da AIE, que prevêem mesmo no cenário de políticas

alternativas um aumento de 29% nas emissões de CO2 dos combustíveis

fósseis. Além de o estudo da consultoria ser mais completo englobando

oportunidades de abatimento baratas nas emissões de CO2 provenientes

da silvicultura e nas emissões de outros gases estufa, ele assume que

haverá um custo líquido para reduzir as emissões, enquanto no Cenário

de Políticas Alternativas da AIE, os investimentos se pagarão tornando

o custo líquido negativo. Outro ponto para se salientar é o fato que as

21

No estudo da Mckinsey se utilizou uma taxa de câmbio de 1,5 dólar por

euro. Além disso, todos os custos estão expressos em euros reais corrigidos

pela inflação de 2005.

emissões de CO2 lançadas pelos combustíveis fósseis representaram

56,6% do total de emissões de gases estufa lançadas em 2004, segundo

o IPCC 2007. Os outros 43,6% não foram objeto de estudo da AIE.

Capítulo 6: A viabilidade política da proposta da

Mckinsey

No capítulo 4 se comentou sobre as previsões científicas do

IPCC 2007 quanto ao impacto das emissões de gases estufa no clima

global. A conclusão do Painel Intergovernamental é que as emissões

precisam parar de crescer ate 2015 e a partir daí declinar linearmente até

serem entre 50% e 85% menores no ano 2050 em relação às emissões

do ano 2000, para que se evitem mudanças climáticas perigosas. Por

outro lado, a Agência Internacional de Energia e a Consultoria

McKinsey, baseando-se em previsões populacionais e econômicas,

afirmam que se nada for feito, a tendência é que as emissões de gases

estufa cresçam enormemente entre 2005 e 2030. A Consultoria

McKinsey propõe o investimento em 200 iniciativas para mudar essa

situação, gerando um cenário de emissões de gases estufa capaz de

limitar o aquecimento global dentro dos 2°C seguros para o planeta.

Temos então previsões científicas e econômicas sobre o aquecimento

global. Temos também uma proposta de controle do aquecimento global

nos próximos 20 anos com um determinado custo econômico. Agora a

questão principal é responder a seguinte pergunta: Existe viabilidade

política para se implementar a proposta da Consultoria McKinsey que

busca diminuir as emissões de gases estufa?

A existência de viabilidade política passa pelos custos

econômicos de implementação. O custo líquido anual deve representar

menos de 0,4% do PIB global em 2030, um valor muito atrativo. No

entanto a implementação das iniciativas de redução de gases estufa

demandará grandes investimentos no período 2011-2030 que

aumentarão gradativamente e atingirão 811 bilhões de euros em 2030, o

que representa aproximadamente 1,35% do PIB global estimado em

2030. Existem grandes problemas à vista. Os políticos dos países em

desenvolvimento podem preferir colocar a culpa do aquecimento global

nos países desenvolvidos e não assumirem nenhum tipo de meta de

redução de emissões, defendendo demagogicamente que precisam

combater a pobreza nos seus países. Os países desenvolvidos têm

condições de custearem os investimentos nos seus próprios países, mas

o custeio completo dos países em desenvolvimento por parte dos países

desenvolvidos nas iniciativas será muito difícil. Os países em

desenvolvimento deverão ter crescimento econômico mais rápido do

que os países desenvolvidos nas próximas décadas e em 2030 poderão

representar mais de 50% da economia mundial. Dessa forma o

financiamento das iniciativas feito exclusivamente pelos países

desenvolvidos está condenado ao fracasso, já que um grupo de países

com menor fatia da economia global teria que financiar a si e a outro

grupo de países com a maior fatia da economia global. Os países

desenvolvidos já terão dificuldades políticas para obter recursos a fim de

financiar as iniciativas de redução de emissões dentro dos seus próprios

territórios, imagine financiar iniciativas mais dispendiosas em outros

países. A solução desse problema passa por uma responsabilidade

compartilhada quanto ao financiamento das iniciativas de redução de

emissões nos países em desenvolvimento. Os países desenvolvidos

financiariam as iniciativas no seu próprio território e financiariam

metade dos recursos necessários nas iniciativas localizadas nos países

em desenvolvimento. Os países em desenvolvimento financiariam a

outra metade de recursos necessários nas iniciativas dentro dos seus

próprios territórios. Com a economia de dinheiro através dos ganhos de

eficiência energética e com o financiamento de apenas 50% dos recursos

necessários nas iniciativas, o custo líquido total de se combater o

aquecimento global seria negativo para os países em desenvolvimento,

ou seja, haveria ganhos econômicos reais ao invés de custos. Isso

dissiparia a tese que afirma que os países em desenvolvimento ao

combaterem o aquecimento global, estão deixando de combater a

pobreza.

Todas as 200 iniciativas distribuídas em 10 setores que visam

reduzir as emissões de gases estufa são fundamentais para controlar o

aquecimento global dentro do limite de 2°C considerados seguros para o

planeta. Entre elas podemos apontar algumas “barganhas” no relatório

da McKinsey, aquelas iniciativas e aqueles setores que apresentam

maior potencial econômico de implementação e conseqüentemente de

apoio político. As 200 iniciativas podem ser divididas 3 grandes

categorias: carbono terrestre, eficiência energética e suprimento de

energia de baixo carbono. As grandes barganhas são o grupo de

iniciativas associadas ao carbono terrestre e o grupo de iniciativas

associadas à eficiência energética. O carbono terrestre engloba os

setores de agricultura e de silvicultura que apresentam baixo custo

líquido total e que necessitam de baixo investimento. Exemplos de

iniciativas nesses setores são a recuperação de solos degradados e o

combate ao desmatamento tropical. Mais de 90% das oportunidades de

abatimento estão localizadas nos países em desenvolvimento. Os

investimentos necessários do setor de silvicultura e de agricultura

representarão apenas 5% dos investimentos totais durante o período

2011-2030 e serão responsáveis aproximadamente por 31,5% da

redução total anual (12 bilhões de toneladas de CO2 equivalente) de

emissões em 2030. O grupo de iniciativas associadas à eficiência

energética está distribuído em sua maioria nos setores de edificações e

de transporte. Exemplos de iniciativas nesses setores são a construção

de edifícios que exigem menos climatização e o incentivo ao uso de

carros híbridos. As iniciativas de eficiência energética são aquelas que

precisam dos maiores investimentos iniciais, mas no longo prazo esses

investimentos são pagos pela economia de energia, apresentando custo

líquido negativo. Elas têm potencial de abatimento de 14 bilhões de

toneladas de CO2 equivalente anual em 2030, aproximadamente 37% do

potencial total de 38 bilhões de toneladas. O terceiro grupo, associado

ao suprimento de energia de baixo carbono, engloba iniciativas que

requerem em sua maioria alto nível de investimento e um alto custo

líquido total. Exemplos dessas iniciativas são as energias renováveis

como a energia solar e a energia eólica e o seqüestro geológico de

carbono. Apesar do custo líquido alto, todas as iniciativas apresentam

custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada. As

iniciativas estão concentradas principalmente nos setores energético e

industrial e tem potencial de abatimento de 12 bilhões de toneladas de

CO2 equivalente anual em 2030, 31,5% do potencial total. Então temos

praticamente 70% da redução de emissões concentradas em iniciativas

(carbono terrestre e eficiência energética) que possuem um potencial

econômico extraordinário de implementação. A falta de vontade política

de implementação dessas iniciativas baratas representará uma falta de

conhecimento técnico dos governantes do mundo.

O custo das iniciativas de redução de emissões também pode ser

avaliado por setor econômico. No gráfico a seguir temos a quantidade

de investimento necessário nas iniciativas com potencial de abatimento

dividido por setores econômicos em dois períodos diferentes, segundo o

estudo da Mckinsey:

Nesse gráfico podem-se evidenciar em números alguns dados

citados anteriormente como a baixa necessidade de investimentos nos

setores de agricultura e silvicultura e a necessidade de grandes

investimentos nos setores de edificação e transporte, onde a maioria das

oportunidades de eficiência energética está concentrada. Evidentemente

que os investimentos em eficiência energética serão pagos pela

economia de energia.

Mesmo com o custo líquido total de menos de 0,4% do PIB global

para se controlar o aquecimento global, o senso comum de uma grande

parcela dos políticos do mundo difere da avaliação que evitar o

aquecimento global descontrolado é viável. Sem os conhecimentos

técnicos adequados, muitos acreditam que controlar o aquecimento

exigirá vultosos investimentos que diminuirão fortemente o crescimento

econômico e que estipular metas de redução de emissões

individualmente é uma atitude típica de falta de pragmatismo e visão

realista do cenário econômico. Para eles, o mais inteligente é colocar a

culpa nos outros países, afirmar verbalmente que combatem o

aquecimento global (sem combater de fato) e estipular metas de redução

de emissões de longo prazo que serão pagas por outros governantes. A

mudança dessas opiniões só ocorrerá se uma nova forma de “vender a

idéia” do combate ao aquecimento global for gerada. O estudo da

Consultoria McKinsey tem grande importância nessa mudança. Ele não

representa um relatório conclusivo, já que trabalha com cenários que

podem não se confirmar, mas representa uma referência robusta

importante a ser seguida, além de defender posicionamentos que

coincidem com outros estudos anteriores de combate ao aquecimento

planetário. Posicionamentos como a defesa do incentivo às iniciativas de

eficiência energética, que por economizarem energia futuramente,

geram ganhos econômicos líquidos ou como o discernimento que evitar

o lançamento de CO2 provocado pelo desmatamento é mais barato do

que investir em energias alternativas. Essas direções ajudam no

momento de decidir a forma de convencer os políticos e os governos a

combaterem o aquecimento global. Alguns argumentos, não

necessariamente ligadas ao estudo da McKinsey, são fundamentais para

“vender a idéia” aos governantes mundiais:

1- O custo líquido anual de menos de 0,4% do PIB global para

combater o aquecimento global representará um peso econômico baixo

nas economias nacionais em relação aos benefícios climáticos de longo

prazo ocasionados pelas iniciativas;

2- O custo das iniciativas pode ser encarado como um seguro contra

catástrofes naturais financiado pelos governos. A indústria de seguros

movimenta cifra bilionárias no mundo, sendo que grande parte dos

prêmios pagos se referem a eventos naturais como enchentes, furacões,

incêndios e terremotos. Se os governos não combaterem o aquecimento

global, as companhias de seguros aumentarão os seus valores cobrados

no longo prazo, tendo em vista que as catástrofes naturais terão maior

probabilidade de acontecer. Isso significará um custo extra para a

sociedade que poderá ser maior do que o custo das iniciativas;

3- A quantidade de investimentos necessários para custear as iniciativas

representará um valor próximo de 1% do PIB global estimado no

período 2011-2015 e aproximadamente 1,35% do PIB global no período

2026-2030, um nível relativamente elevado. No entanto, as iniciativas

de incentivo a eficiência energética, aquelas que precisam do maior

volume de investimentos, garantem benefícios imediatos a sociedade,

proporcionais aos benefícios ocasionados por investimentos em

iniciativas não ambientais. Os governos podem subsidiar na forma de

redução de impostos a fabricação de carros híbridos, tornando os seus

preços iguais aos carros comuns. Com esse incentivo, os proprietários

dos carros terão durante toda a vida útil do veículo a condição de andar

gastando até metade do combustível consumido por um carro comum.

Esse benefício econômico é proporcional ao obtido caso o dinheiro

fosse aplicado na construção de uma nova estrada, por exemplo. Assim

como as iniciativas comuns, as iniciativas de redução de emissões

podem gerar benefícios a sociedade e conseqüentemente benefícios

eleitorais para os políticos;

4- Com a responsabilidade compartilhada dos investimentos localizados

nos países em desenvolvimento22

, esses países menos ricos só

financiarão 50% dos investimentos feitos no seu território, fazendo com

que as iniciativas tenham um custo líquido negativo. Então ao invés de

representar um peso econômico, as iniciativas gerarão um pequeno

aumento das taxas de crescimento econômico dos países em

desenvolvimento;

5- As iniciativas de redução de emissões podem significar um seguro

energético contra os altos preços dos combustíveis fósseis no futuro. O

estudo da McKinsey assume um preço médio de 60 dólares o barril de

petróleo no período de redução, seguindo projeções da AIE. No entanto

também foi avaliado o impacto do preço médio de 120 dólares o barril

no custo das iniciativas. Nesse cenário haveria uma economia adicional

de 700 bilhões de euros em 2030 (19 euros por tonelada de CO2

equivalente), tornando o custo total líquido das iniciativas negativo.

Antes da crise mundial de 2008, houve uma grande especulação no

mercado internacional de petróleo, com os preços variando entre 50

dólares e 150 dólares o barril num período inferior a um ano. O preço do

petróleo é definido pelo cartel da OPEP e não segue regras de mercado

na fixação de preços. A concentração da maioria das reservas em poucos

países e a esgotabilidade do combustível em poucas décadas favorecem

essa definição. Quando um país decide continuar dependendo

fortemente do petróleo no setor de energia, ele se sujeita ao humor da

especulação de lideres políticos instaurados em regimes instáveis como

22

Proposta defendida neste capítulo do livro

Arábia Saudita, Irã, Iraque, Venezuela, Nigéria e Líbia. No momento

em que o petróleo sobe demais, corre-se o risco de se sofrer choques

econômicos que só poderão ser aliviados em alguns anos através da

introdução de programas de eficiência energética, pois a infra-estrutura

energética não consegue sobreviver no curto prazo sem petróleo, ou

mesmo com menos petróleo. A primeira crise mundial do petróleo nos

anos 70, por exemplo, incentivou os Estados Unidos a fabricarem carros

mais econômicos. A prevenção de uma crise energética através da

diminuição da dependência dos combustíveis fósseis é a melhor

alternativa para evitar choques econômicos. O investimento nas

iniciativas de diminuição de emissões pode cumprir esse papel. No

entanto também há o outro lado da moeda. Se todas as iniciativas de

redução de emissões forem implementadas, isso pode provocar um

choque de excesso de oferta, reduzindo os preços do barril do petróleo.

Há a possibilidade de nesse cenário o cartel da OPEP tornar os preços

do petróleo artificialmente baixos temporariamente, no momento em

que se sentir ameaçado na posição de líder do mercado energético

mundial. As empresas tomam decisões econômicas com anos de

antecedência e num cenário de preço do petróleo muito baixo, podem

preferir continuar investindo em infra-estruturas que dependem do

combustível fóssil, temendo perder vantagens competitivas contra outras

empresas do seu setor econômico no futuro. Nesse momento entra uma

importante palavra para evitar esse processo: regulação. Quando um

país tem uma infra-estrutura dependente do petróleo e acontece um

choque de preços elevados, não há alternativa, senão suportar o choque

econômico. Mas quando o preço baixa muito a melhor alternativa é

evitar que as empresas do país tomem como referência esse valor que é

temporariamente ilusório. Essa é uma decisão de estratégia que evita a

sedução por preços de petróleo baratos e o poder dessa decisão está

inteiramente nas mãos dos países consumidores. A regulação através da

fixação de preços mínimos garante a implantação da infra-estrutura

energética de baixo carbono sem que as empresas temam uma

concorrência desleal contra a infra-estrutura dependente do carbono. A

consultoria McKinsey avaliou a influência do preço médio do petróleo a

40 dólares o barril, no custo líquido das iniciativas de redução de

emissões. Em 2030 esse valor baixo do petróleo representaria um

aumento de 4,5 euros por tonelada de CO2 equivalente no custo médio

das iniciativas, pois apesar de o custo das iniciativas de redução de

emissões continuar o mesmo, ele ficaria mais caro quando comparado

com a infra-estrutura dependente de carbono. Praticamente se dobraria o

preço da tonelada de CO2 equivalente evitada. Mas como sabemos o

valor médio do petróleo a 40 dólares o barril é ilusório. Alguns analistas

acreditam que o petróleo pode atingir mais de 200 dólares o barril nas

próximas 2 décadas, se mantido o ritmo atual de crescimento do

consumo. Portanto implementar as iniciativas de redução de emissões

representará um escudo contra ataques especulativos nos preços do

petróleo, garantindo a estabilidade econômica dos países;

6- O mesmo princípio que se aplica ao petróleo (citado no item anterior)

se aplica ao gás natural. Os dois combustíveis fósseis têm reservas

suficientes para suportar o consumo mundial atual por mais 50 anos

aproximadamente. No entanto se o consumo continuar subindo esse

tempo pode diminuir. A maioria das reservas mundiais está concentrada

em poucos países. No caso do gás natural a Rússia, o Irã e o Qatar

possuem mais de 50% das reservas mundiais. A forte dependência do

gás natural pode provocar no futuro um choque econômico causado pelo

aumento do preço do combustível. A Europa depende fortemente do gás

natural russo. Se a Rússia resolver, por exemplo, aumentar o preço do

gás natural no inverno (época em que a demanda energética aumenta),

restará a Europa escolher entre pagar mais caro pelo gás ou literalmente

congelar. A “Rússia sul-americana” é a Bolívia, o país mais pobre do

continente e que possui as maiores reservas de gás natural. O Brasil

sofreu no passado recente uma grave crise energética provocada por

problemas de suprimento do gás natural boliviano. As iniciativas de

redução de emissões também têm o potencial de reduzir o risco de crises

econômicas provocadas pelo mercado do gás natural;

7- Cada vez mais políticos perderão eleições se não investirem em

iniciativas de combate ao aquecimento global. Em 2005 o furacão

Katrina devastou a cidade de New Orleans nos Estados Unidos. Esse

evento prejudicou a popularidade do ex-presidente Bush, pois o furacão

foi associado ao aquecimento global, e o ex-presidente era um árduo

inimigo de iniciativas de redução de emissões. Nas eleições de 2008, o

candidato republicano John Maccain perdeu a eleição presidencial

devido principalmente a impopularidade do presidente Bush, do seu

partido. Grande parte dessa impopularidade veio da sua posição

ambiental e o furacão Katrina se tornou um símbolo dessa posição. Na

realidade provar que o furacão Katrina foi provocado pelo aquecimento

global é cientificamente difícil. O cientificamente mais correto é

associar uma série de mudanças climáticas distintas, que são explicadas

pelo aquecimento global e não associar somente um evento climático.

No entanto a opinião pública reage a cada catástrofe natural histórica

como um efeito do aquecimento global, e para azar dos políticos essas

catástrofes se tornarão cada vez mais freqüentes justamente por causa

das mudanças climáticas. Por esse motivo os eventos naturais

influenciaram as eleições da maior economia do mundo. Esse fenômeno

eleitoral já aconteceu recentemente e vai acontecer novamente com mais

força no futuro. O furacão Katrina acabou se tornando “o furacão

Bush”. Os políticos que não aceitarem as iniciativas de redução de

emissões terão que conviver com o ônus de terem sua popularidade

ameaçada por eventos naturais que não podem ser controlados,

configurando um verdadeiro “terrorismo climático”.

As iniciativas de redução de emissões deverão ser custeadas

pelos governos na forma de subsídios ou obtidas através de taxações de

empresas emissoras de gases estufa. Os incentivos governamentais

precisam ser amparados por regulações de longo prazo que garantam

segurança jurídica para os investidores. Outro ponto importante é a

implementação de normas e padrões mínimos de eficiência energética

em equipamentos. As iniciativas localizadas nos setores de silvicultura e

agricultura, fortemente concentradas em países em desenvolvimento,

devem proporcionar desenvolvimento econômico, desincentivando

práticas ambientalmente insustentáveis.

O estudo da Consultoria McKinsey avaliou individualmente com

aprofundamento as iniciativas de redução de emissões dividindo-as em

10 setores econômicos. No entanto nos capítulos seguintes utilizaremos

a divisão explicitada no capítulo anterior: carbono terrestre,

suprimento de energia de baixo carbono e eficiência energética. Essa

divisão também é abordada no estudo, mas sem aprofundamento. No

capítulo 7 se abordará o setor de carbono terrestre. No capítulo 8 se

comentará especificamente sobre a região amazônica, importante fonte

de emissões do setor de carbono terrestre. As iniciativas de suprimento

de energia de baixo carbono serão explicadas em 2 capítulos: os

capítulos 9 e 10. No capítulo 9 se falará sobre o seqüestro geológico de

carbono, que torna as fontes emissoras de CO2 em fontes limpas através

do envio do CO2 para o subsolo. No capítulo 10 se comentará sobre as

principais fontes de energia limpas, distintas das fontes do capítulo 9, já

que não há lançamentos de CO2 efetivos, nem mesmo para o subsolo.

No capítulo 11 se comentará sobre um grupo de soluções de eficiência

energética. Esses 5 capítulos farão uma abordagem geral das principais

formas de redução de emissões (energia eólica, energia solar, energia

nuclear, carros híbridos, combate ao desmatamento tropical, etc)

focando nas potencialidades e gargalos de cada tecnologia ou solução.

Os dados do estudo da McKinsey ajudarão na abordagem, mas não

serão a principal fonte de informação.

Capítulo 7: O setor de carbono terrestre: silvicultura e

agricultura

O setor de carbono terrestre engloba as emissões de gases estufa

não ligadas ao consumo de combustíveis fósseis. Ele é composto de dois

setores econômicos: a silvicultura e a agricultura. As emissões da

silvicultura são compostas basicamente do desmatamento tropical, da

degradação da biomassa após o desmatamento, da drenagem de áreas de

turfa e da queima de solos turfosos. As emissões da agricultura são

compostas da atividade agrícola propriamente dita (exemplo: emissões

provenientes dos solos agrícolas) e também da pecuária (exemplo:

fermentação entérica dos animais). O setor de carbono terrestre é o que

provavelmente apresenta maior viabilidade de mitigação de emissões,

pois tanto o custo líquido das iniciativas é baixo, quanto à necessidade

de investimentos. No entanto também existem dificuldades como a

fragmentação dos emissores e a concentração da maioria absoluta das

emissões nos países em desenvolvimento. Enquanto poucas empresas

são responsáveis pelas emissões das termelétricas no mundo, milhões de

proprietários rurais são responsáveis pelas emissões do setor de carbono

terrestre. Essa fragmentação demanda uma forte fiscalização

acompanhada de incentivos de práticas sustentáveis, para que as

iniciativas de redução de emissões tenham êxito. A redução das

emissões nos países em desenvolvimento precisa ser financiada em

parte pelos países desenvolvidos. Países como Brasil e Indonésia que

lideram as emissões do setor de silvicultura no mundo, não possuem

apoio político interno para financiarem sozinhos as iniciativas. No caso

brasileiro a consultoria McKinsey estimou em 17 bilhões de reais23

anuais o custo para zerar o desmatamento na Amazônia. Esses

problemas não inviabilizam a redução de emissões no setor de carbono

terrestre. Na maioria dos casos reduzir as emissões tem uma viabilidade

econômica muito alta, pois as práticas agrícolas e florestais predatórias

geram um baixo ganho econômico em relação a quantidade de gases

estufa gerado, se comparadas as atividades do setor de energia. A

Consultoria McKinsey estima em 15 bilhões de euros anuais em 2015 e

em 43 bilhões de euros anuais em 2030 a quantidade de investimentos

necessários para tornar o setor de silvicultura neutro em carbono em

23

A quantia equivale a 5,5 bilhões de euros em valores de 2005

2030. Quanto ao setor agrícola a quantidade de investimentos é

considerada insignificante, já que a maioria das iniciativas é constituída

de mudanças de práticas agrícolas, que podem se tornar sustentáveis

sem investimentos adicionais. Ao total com apenas 5% dos

investimentos necessários em todas as iniciativas durante o período de

redução 2011-2030, o setor de carbono terrestre pode ser responsável

por 31,5% das reduções totais em 2030, uma relação custo-benefício

muito alta.

O setor agrícola foi responsável por 14% das emissões mundiais

de gases estufa em 2005, ou 6,2 bilhões de toneladas de CO2

equivalente. Os principais responsáveis são as emissões de metano

provenientes da fermentação entérica por parte do animais (38% do

total), a emissão de metano proveniente do cultivo de arroz (13% do

total) e a emissão de óxido nitroso (N2O) dos solos agrícolas (37% do

total). Temos, portanto três grupos bem definidos que necessitam ter

suas emissões reduzidas.

As emissões de metano (CH4) através da fermentação entérica são

oriundas de animais como vacas, ovelhas e cabras, que pertencem à

classe dos ruminantes. Os ruminantes têm quatro estômagos e digerem

seu alimento em seus estômagos ao invés de seus intestinos, como

fazem os humanos. Os ruminantes comem o alimento, expelem-no

como bolo alimentar para a boca e tornam a comê-lo.No rúmen, o

primeiro estômago dos animais, ocorre a fermentação entérica do

alimento ingerido através de um processo anaeróbico (sem a presença de

ar) realizado por bactérias. Nesse processo há a produção de metano. O

metano produzido é posteriormente arrotado pelas narinas e pela boca

dos animais. Também há produção de metano através da flatulência dos

animais, mas em menor quantidade que o arroto. A redução das

emissões lançadas pela fermentação entérica tem sido tentada através do

uso de aditivos alimentares, pílulas e vacinas. Pesquisas com aditivos

alimentares como gordura de coco, linhaça, sementes de girassol, alho e

óleo de peixe tem obtido reduções entre 20% e 50% na geração de

metano através da inibição da proliferação de bactérias responsáveis

pela produção do gás. Outra opção é o uso de pílulas. Cientistas na

Alemanha desenvolveram uma pílula que acompanhada de uma dieta

especial com algumas restrições alimentares é capaz de reduzir a

emissão de metano através da conversão do gás em glicose. Por último,

vacinas contra bactérias metanogênicas estão sendo desenvolvidas, mas

ainda não estão disponíveis comercialmente.

As plantações de arroz também são ambientes propícios para a

liberação de metano na atmosfera. O arroz é cultivado em áreas alagadas

e com grande presença de matéria orgânica. Esse ambiente pobre em

oxigênio favorece a decomposição da matéria orgânica por bactérias

anaeróbicas produtoras de metano. O gás pode ser liberado através de

bolhas dentro da água até a atmosfera quando se encontra em altas

concentrações, mas o principal responsável pelas emissões é o

transporte difuso pelo aerênquima, um tecido vascular presente nas

plantas de arroz. O aerênquima permite a circulação de ar no interior da

planta, levando o oxigênio da atmosfera até as raízes. Essa circulação de

ar facilita a liberação do metano. As plantas de arroz facilitam até 10

vezes mais o escape de metano para a atmosfera24

em comparação com

solos inundados sem cultivo de arroz. Fatores como a temperatura, a

radiação solar, o tipo de adubação, a espécie de arroz e o nível de

inundação influenciam na produção de metano. O metano resultante do

cultivo de arroz irrigado pode reduzir-se significativamente

introduzindo alterações nos sistemas de irrigação e drenagem ou através

do uso de fertilizantes. Cerca de 50% do total das terras dedicadas no

mundo aos arrozais é irrigada. O arroz irrigado libera mais metano do

que o arroz de sequeiro. A drenagem de um campo de arroz irrigado em

momentos específicos durante o ciclo de cultivo pode reduzir

drasticamente as emissões de metano sem diminuir os rendimentos da

colheita. Outras opções técnicas para reduzir as emissões de metano

consistem em agregar sulfato de sódio ou carboneto de cálcio aos

fertilizantes com base em uréia, ou substituir a uréia por sulfato de

amônio como fonte de nitrogênio para os cultivos de arroz.

A principal origem das emissões de óxido nitroso (N2O)

advindas dos solos agrícolas é a aplicação indiscriminada de

fertilizantes nitrogenados sintéticos nos cultivos. As emissões ocorrem

devido à desnitrificação a partir do nitrogênio mineral. A desnitrificação

consiste na redução microbiana dos nitratos (N3O) às formas

intermediárias de nitrogênio e então às formas gasosas (NO, N2O e N2)

que são perdidas para a atmosfera. As emissões de óxido nitroso

24

http://w3.ufsm.br/ppgcs/congressos/CBCS_Gramado/Arquivos%20trabalho

s/Efluxo%20de%20metano_Fabio%20G..pdf

originadas do setor agrícola podem minimizar-se com novos

fertilizantes e práticas de fertilização. Aumentando-se a eficiência com a

qual os cultivos utilizam o nitrogênio, é possível reduzir a quantidade de

fertilizantes necessária para produzir uma determinada quantidade de

alimento ou reduzir as emissões de N2O lançada por uma determinada

quantidade de fertilizante. As principais práticas que aumentam a

eficiência no uso do nitrogênio são: ajuste de taxas de aplicação com

base em estimativas precisas das necessidades da cultura (ou seja,

agricultura de precisão); uso de fertilizantes de liberação lenta ou

controlada ou inibidores de nitrificação (que desaceleram processos

microbianos que levam à formação de N2O); aplicação de nitrogênio

quando a perda for menos provável, geralmente logo antes do consumo

(melhor programação); ou aplicação do nitrogênio de forma mais

precisa no solo, para torná-lo mais acessível às raízes.

O setor agrícola também pode ajudar a mitigar as emissões de

CO2 através do seqüestro de carbono pelos solos. Os solos são um

importante reservatório de carbono e desempenham um importante

papel no ciclo do carbono global. Historicamente, os solos perderam

muito carbono devido à intervenção do homem, mas uma parte desse

carbono pode ser readquirido através de manejo aprimorado, retirando

assim CO2 da atmosfera. A quantidade de carbono orgânico no solo é o

resultado do balanço entre dois processos: a) deposição de resíduos

(serapilheira e raízes) de plantas que originalmente obtiveram seu

carbono do CO2 atmosférico através da fotossíntese; b) decomposição

dos resíduos depositados, resultando no lançamento de CO225

. O

primeiro processo aumenta o carbono no solo enquanto o segundo

diminui. Práticas agrícolas de baixa sustentabilidade ambiental como a

aração excessiva, a gradeação e os desmatamentos, aumentam a

decomposição do carbono orgânico, lançando CO2 para a atmosfera e

diminuindo a fertilidade dos solos. Além disso, fatores como a

fertilização inadequada, a queima de restos culturais e o cultivo

intensivo das terras, contribuem para o aumento dessa degradação dos

solos. Práticas sustentáveis podem restaurar tanto áreas de cultivos

agrícolas quanto pastos de criação de gado, reduzindo essas perdas e

fixando carbono no solo. Os solos podem ter sua fertilidade restaurada

25

http://www.cnpab.embrapa.br/pesquisas/folders/folder_sequestro_carbono.p

df

através da correção de nutrientes com fertilizantes, da aplicação de

adubos orgânicos, do cultivo com plantio direto e da retenção de

resíduos agrícolas. Solos mais férteis aumentam a produção agrícola e

conseqüentemente aumentam a quantidade de restos culturais que

acabam ficando no solo após a colheita. Para garantir que esse carbono

dos restos culturais seja fixado no solo é preciso evitar a aração das

terras. A terra arada por tratores no cultivo tradicional acelera a

decomposição da matéria orgânica porque destrói os agregados do solo

que protegem a matéria orgânica da ação microbiana, gerando

significativas emissões de CO2 para a atmosfera, que são ignoradas por

não serem visíveis a olho nu como as queimadas. No plantio direto há o

cultivo sobre a palha deixada pela cultura anterior, sem a necessidade da

remoção do solo através da aração. No plantio direto esse carbono que

seria liberado para atmosfera pela aração da terra é fixado no solo.

A expansão do setor agrícola também influencia as emissões do

outro grande setor econômico associado ao carbono terrestre: o setor de

silvicultura. O setor de silvicultura emitiu em 2005, segundo a

consultoria McKinsey, 7,4 bilhões de toneladas de CO2 equivalente,

sendo 5,4 bilhões provenientes do desmatamento e 2 bilhões

provenientes da drenagem de áreas de turfa e da queima de áreas de

turfa. Acredito que a melhor estimativa das emissões das áreas de turfa

(drenagem e queima de solos) seja superior à apontada pela consultoria.

Num estudo mais recente26 e mais abrangente, realizado pelos mesmos

pesquisadores que são citados na bibliografia do relatório da McKinsey,

as emissões das áreas de turfa são estimadas em 3 bilhões de toneladas

anuais.

O desmatamento tropical é o grande emissor do setor de

silvicultura, já que 88% das emissões do desmatamento são oriundas das

florestas tropicais localizadas em países em desenvolvimento. No

mundo todo o processo de desmatamento de florestas tropicais ocorre

basicamente por três razões: a alta lucratividade da atividade madeireira,

a expansão irracional da agropecuária e a ausência do Estado. O Brasil,

26

A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”

com os dados pode ser encontrada no site www.wetlands.org, no link

específico:

http://global.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi

d=56

o país com maior índice mundial de desmatamento anual, é uma

referência para a questão. O desmatamento de uma determinada área em

poucos meses oferece uma lucratividade que só será obtida através da

agropecuária num prazo de muitos anos. Com pouca fiscalização

ambiental, esse filão é bem aproveitado pelas madeireiras ilegais.

Depois vem a agropecuária. A agricultura de alta produtividade está

localizada nas terras mais caras e próximas das grandes cidades. A

necessidade de aumentar a produção impulsiona a compra de terras mais

distantes, onde se pratica uma agricultura menos intensiva, que devido a

isso se transfere para áreas ocupadas pela pecuária extensiva. A pecuária

extensiva por sua vez invade a floresta. O aumento da produção em

áreas que praticam uma agricultura menos intensiva e o aumento da

criação de gado extensiva também acelera essa invasão da floresta. O

problema é que essa invasão é desnecessária. Existem terras já

desmatadas suficientes pra multiplicar a criação de gado. Na Amazônia

brasileira, se cria 0,7 bois por hectare em terras desmatadas, onde se

poderia criar 3 cabeças por hectare, sem uso de ração externa. No

entanto isso não acontece. Grande parte das áreas em processo de

desmatamento são terras públicas sem ocupação e controle onde quem

desmata de forma predatória e ocupa a terra com gado bovino se torna

dono. Conquistar uma terra de graça se torna um grande estímulo para

se derrubar a floresta. Sai mais barato desmatar, do que investir na

criação intensiva em terras já desmatadas. No entanto não é apenas a

pecuária que é responsável pelo processo de desmatamento. Alguns

cultivos agrícolas como a soja no Brasil e a palma na Indonésia também

são responsáveis, com o agravante de serem atividades com maior

lucratividade por área do que a pecuária, dificultando a substituição por

uma atividade sustentável que precisa ter no mínimo o mesmo nível de

lucratividade. A união do lucro da atividade predatória com a falta de

intervenção estatal justifica plenamente o desmatamento tropical no

mundo.

O outro forte emissor de CO2 na atmosfera no setor de

silvicultura são as turfeiras. A turfa é um material orgânico de coloração

preto-amarronzada composto por restos parcialmente decompostos de

vegetais, encontrado geralmente em pântanos e em áreas frias como as

tundras. Em todos os ecossistemas terrestres, as plantas convertem CO2

atmosférico em biomassa vegetal que após a morte se decompõem

rapidamente sob a influência de oxigênio. Nas turfeiras, a planta morta

fica molhada, num ambiente de baixo oxigênio onde a decomposição é

muito mais lenta. Há um equilíbrio entre o CO2 lentamente absolvido

pela biomassa vegetal e o CO2 lentamente lançado pelas turfeiras. Se a

turfeira entra em contato com o ar pela ação humana, esse equilíbrio é

perdido e a turfeira acaba sendo decomposta e lançada rapidamente para

atmosfera na forma de CO2. Os solos turfosos representam 3% da

superfície da Terra. Um estudo recente conduzido pela ONG Wetlands

juntamente com a Universidade de Greifswald, concluiu que as

emissões provenientes da turfa chegam a 3 bilhões de toneladas de CO2

anuais sendo que 2/3 estão concentradas em 4 países do Sudeste

Asiático: Brunei, Indonésia, Malásia e Papua Nova Guiné. Entre as

emissões do Sudeste Asiático, cerca de 600 milhões de toneladas são

lançadas pela decomposição dos solos de turfa drenados e outras 1,4

bilhão de toneladas provém da queima de áreas de turfa27

. A diminuição

das emissões advindas do desmatamento tropical no Sudeste Asiático e

das emissões advindas dos solos turfosos constituem um objetivo

comum, pois a maioria das emissões dos solos turfosos na região são

causados pelos incêndios florestais, com o objetivo de plantar palma e

outros produtos agrícolas. Esses incêndios acabam se alastrando e

queimando as camadas de solos turfosos riquíssimas em matéria

orgânica. O cultivo de palma, um dos grandes causadores dos incêndios,

tem o objetivo de produzir biodiesel, que é vendido como um

combustível limpo no mercado internacional, pois o CO2 lançado pelo

combustível na queima foi absolvido pela planta no momento do

cultivo. No entanto, está se cometendo um grande crime ambiental na

prática. Vão ser necessários dezenas ou até centenas de anos para que o

CO2 absolvido pelo cultivo de palma compense o CO2 emitido pela

queima dos solos turfosos e pela queima da floresta tropical.

O ciclo de crimes ambientais e falta de presença do Estado, que

causam as emissões do setor de silvicultura, pode ser revertido através

de investimentos em práticas sustentáveis e atuação governamental em

fiscalização. O problema é que as florestas tropicais remanescentes

estão em áreas de países em desenvolvimento (Brasil, Indonésia e

Congo são exemplos de grandes desmatadores) onde a preocupação

27 A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”

com os dados pode ser encontrada no site www.wetlands.org, no link

específico:

http://global.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi

d=56

principal dos governos é o crescimento econômico e a redução da

pobreza, ficando o meio-ambiente num plano secundário. Não se

controla o desmatamento porque não há ganho econômica imediato com

isso, existindo áreas fora do controle estatal. Esses países alegam que os

países ricos desmataram suas florestas para se desenvolverem e não

podem exigir moralmente metas de redução dos países em

desenvolvimento, e que só devem existir metas de redução para o

consumo de combustíveis fósseis dos países ricos. Alguns países ricos

defendem que os governos dos países desmatadores precisam cumprir

metas de redução. Nessa disputa todos estão errados, porque devemos

pensar como "nós" e não como "eu". Um país como o Brasil, que possui

a 8ª economia do mundo, por exemplo, pode diminuir fortemente o

desmatamento na Amazônia sem recursos externos. Por outro lado os

países ricos também podem contribuir com uma fração ínfima das suas

riquezas. Essa disputa não pode impedir que o mundo aproveite uma das

formas de diminuição de emissões de gases estufa com melhor custo-

benefício. A solução passa pela já citada responsabilidade

compartilhada, onde os países desenvolvidos contribuem com 50% dos

recursos financeiros necessários para financiar as iniciativas do setor de

silvicultura e os países em desenvolvimento contribuem com os outros

50% necessários para financiar as iniciativas dentro dos seus territórios.

Iniciativas como o incentivo a práticas sustentáveis (exemplo: extração

sustentável da madeira da floresta), gerarão ganhos econômicos que

compensarão os investimentos feitos pelos países em desenvolvimento.

O fim do desmatamento tropical depende de uma grande mudança

de mentalidade na exploração das florestas. Até hoje o desmatamento

das florestas foi visto como fonte de progresso econômico inesgotável

através da exploração da madeira e da conquista de novas terras para o

cultivo agrícola. Diante do aquecimento global, onde as emissões do

setor de silvicultura são responsáveis por quase 20% do efeito estufa, da

esgotabilidade das florestas e de outros papéis ambientais como a

responsabilidade pela formação de chuvas, as florestas tropicais

apresentarão um melhor custo-benefício no longo prazo para a

sociedade se forem mantidas em pé. No curto prazo são necessárias

alternativas para manutenção dos benefícios econômicos trazidos pela

exploração predatória. Ao invés de se desmatar novas terras para

expandir a pecuária extensiva, a melhor alternativa é aumentar a criação

de gado nas mesmas terras. A exploração sustentável da madeira da

floresta, onde é desmatada apenas a parcela da floresta que possui valor

comercial, pode substituir com sucesso o desmatamento predatório. A

palavra chave desse processo é COMPATIBILIZAÇÃO. Precisamos

compatibilizar a preservação da floresta com a manutenção de

atividades econômicas lucrativas. Mesmo que essa compatibilização

consiga ser implementada com sucesso na maioria dos países, parece

pouco razoável que o mundo acabe completamente com o

desmatamento, pois mesmo que os grandes focos acabem o

desmatamento ocorrerá difusamente com baixa intensidade em qualquer

parte do globo. No entanto há um grande aliado para zerar e até mesmo

tornar negativa as emissões do setor de silvicultura: o reflorestamento.

O reflorestamento em áreas degradadas já vem sendo feito como forma

de neutralizar as emissões de CO2. Enquanto uma floresta adulta e

madura consome e emite uma quantidade similar de CO2, uma floresta

jovem e em crescimento consome muito mais CO2 do que emite. Ela

fixa carbono na forma de tronco, galhos, folhas e emite oxigênio para a

atmosfera. Essa capacidade de consumir CO2 pode anular a emissão de

uma usina ou de um carro que lança CO2 em qualquer parte do mundo.

No caso do setor de silvicultura, o reflorestamento pode neutralizar as

pequenas emissões difusas por desmatamento ao redor do planeta.

tropical.

Para se reduzir as emissões do setor de silvicultura até se atingir

emissões neutras ou negativas em 2030 basicamente 4 soluções

precisam ser implementadas:

1)Reflorestamento de matas tropicais

O reflorestamento em áreas degradadas já vem sendo feito como

forma de neutralizar as emissões de CO2 como instrumento de

conscientização ambiental, Exemplos dese processo são as

neutralizações de eventos, produtos e programas de televisão.

Precisamos aumentar exponencialmente o tamanho das áreas de

reflorestamento de matas nativas. No mundo já existem áreas

significativas de reflorestamento para fins comerciais como produção de

carvão vegetal, papel e madeira. No entanto essas áreas não devem ser

usadas como neutralizadores de outras emissões externas, pois o

carbono sequestrado pode ser lançado posteriormente na atmosfera na

queima de carvão vegetal por exemplo. O reflorestamento com espécies

nativas além de neutralizar outras emissões reecria a biodiversidade que

foi perdida no momento do desmatamento da área. O estudo da

McKinsey estima em 2,4 bilhões de toneladas de CO2 equivalente o

potencial de sequestro de carbono em 2030 através do reflorestamento

de áreas degradadas e de áreas marginais de pastos e terras agrícolas.

Para isso será necessário o plantio nos próximos 20 anos de uma área de

3,3 milhões de km², configurando um sequestro aproximado médio por

hectare de 7,2 toneladas anuais de CO2, o que equivale a um sequestro

de 2 toneladas de carbono anuais. Existem regiões como a floresta

amazônica que apresentam um potencial muito maior de sequestro de

CO2 por hectare. Um hectare reflorestado na Amazônia pode fixar entre

6 e 9 toneladas de carbono por ano28

. Outro ponto é que quando se

refloresta uma determinada área, esse seqüestro anual de carbono se

mantém por 20, 30 anos, ou seja, enquanto a mata vai crescendo. Então

o seqüestro de CO2 através do reflorestamento continuará por mais

alguns anos após 2030.

Alguns ambientalistas questionam se há terra suficiente para

fazer reflorestamentos tão extensos e ao mesmo tempo aumentar a

produção agrícola sem desmatar novas áreas. No mundo existem 25

milhões de km² de área agricultáveis sem a necessidade de novos

desmatamentos. Essa área deve aumentar um pouco mais nas próximas

2 décadas, mesmo no cenário de controle do desmatamento, já que a

diminuição ocorrerá gradativamente ao longo dos anos. O

desmatamento tropical, mesmo que num ritmo menor, gerará novas

áreas para a produção agrícola. Dos 25 milhões de km², 14 milhões de

km² (56% do total) estão sendo usados para agricultura ou para pecuária

e 11 milhões ainda podem ser aproveitadas. Em 1960, a humanidade

usava uma quantidade de terra similar a atual para alimentar 3 bilhões

de pessoas, com uma dieta de 2400 calorias diárias. Hoje essa

quantidade terra é capaz de alimentar 6 bilhões de pessoas com uma

dieta de 3000 calorias diárias. Uma grande parte da população

abandonou o campo e foi para a cidade nesse período, mas o aumento

explosivo da produtividade agrícola conseguiu quase que triplicar a

produção, com menos trabalhadores e a mesma quantidade de terra. Nas

próximas 4 décadas a taxa de crescimento populacional e a taxa de

crescimento da ingestão calórica serão menores. Por isso o aumento da

28 Revista Scientific American Brasil, edição 6, novembro de 2002, versão

eletrônica, reportagem “a Amazônia e o carbono Atmosférico”. A reportagem

na íntegra está no site:

http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/a_amazonia_e_o_carbono_atmosfer

ico_imprimir.html

produção agrícola não será tão grande quanto foi no período 1960-2008.

Através da continuação do aumento da produtividade agrícola e de uma

boa utilização dos 11 milhões de km² restantes de terras agricultáveis,

poderemos entre 2011 e 2030 aumentar a produção agrícola, diminuir

fortemente o desmatamento tropical e reflorestar grandes áreas com

espécies nativas.

O reflorestamento de matas nativas tem potencial de neutralizar

qualquer emissão em qualquer setor econômico, não somente as

emissões residuais do desmatamento tropical. Uma excelente alternativa

é a neutralização de combustível nos postos de gasolina. Sabe-se que 1

litro de gasolina emite 2,3 kg de CO2 na atmosfera. A quantificação de

emissões de um consumidor de gasolina ou de um posto é muito mais

fácil e precisa do que a quantificação de emissões de uma empresa que

necessita de cálculos complexos e muitas vezes imprecisos. Existe uma

empresa de distribuição de combustível no Brasil que está realizando a

neutralização do combustível consumido no posto de gasolina. Os

postos Ipiranga, uma rede que é responsável pela distribuição de 14

bilhões de litros de combustível no Brasil, criou um cartão de fidelidade

chamado cartão Ipiranga Carbono Zero29

. O consumidor que abastece o

carro com o cartão tem o seu combustível neutralizado, através do

reflorestamento de matas nativas em 3 estados brasileiros (São Paulo,

Rio de Janeiro, Paraná) . Inicialmente a distribuidora financiou o plantio

de uma área suficiente para neutralizar 5 mil toneladas de CO2. Apenas

uma pequena parcela de combustível da distribuidora está sendo

neutralizada, referente exclusivamente ao combustível pago com o

Ipiranga Carbono Zero, mas a idéia tem um grande potencial de

ampliação. Fazendo uma comparação, os cartões de Fidelidade

tradicionais da rede Ipiranga oferecem um desconto de 4 centavos de

real por litro de combustível consumido, enquanto o Cartão Carbono

Zero não oferece descontos no combustível, somente o ganho ambiental.

Isso evidencia que os consumidores podem estar dispostos a trocar um

pequeno ganho econômico pela possibilidade de melhorar o clima do

planeta. O programa de neutralização está sendo validado pela Bureau

Veritas Certification, uma empresa certificadora presente em mais de

140 países. Veja a foto do cartão:

29 O site do cartão é: http://www.cartaoipirangacarbonozero.com.br/

O custo de 4 centavos por litro que o consumidor paga é muito

baixo, além de ser um valor próximo das estimativas do relatório da

McKinsey. O estudo afirma que o custo médio para se evitar a emissões

no período 2011-2030 no setor de silvicultura é de 9 euros por tonelada

de CO2, o que equivale a um custo de 27 reais. São necessários a queima

de 434 litros de gasolina para se emitir 1 tonelada de CO2. Aplicando-se

o custo de 27 reais por tonelada evitada, o custo para se neutralizar 1

litro de gasolina é de 6,2 centavos de real (27 : 434). No caso da

gasolina brasileira o custo ainda é menor porque há uma adição de 24%

de álcool, que tem suas emissões neutralizadas pelo crescimento da

cana-de-açúcar. Um custo entre 4 e 6 centavos de real diante de um

preço final da gasolina que ultrapassa 2 reais por litro no caso brasileiro

é plenamente viável de ser pago pelo consumidor final até mesmo de

forma voluntária.

2) Fortalecimento das instituições

Combater o desmatamento tropical no mundo exige um

aumento da participação estatal no controle do uso da terra. Sem

presença dos governos, as áreas de desmatamento se tornam terras sem

lei, onde quem desmata predatoriamente e posteriormente a ocupa se

torna dono. Na Amazônia brasileira, por exemplo, menos de 10% das

terras têm títulos de propriedade claros. O primeiro passo é fazer a

regularização fundiária, dando títulos de terra para os posseiros que já se

estabeleceram a um determinado tempo em regiões que foram

desmatadas no passado e que hoje desenvolvem atividades

agropecuárias. O segundo passo é a ocupação efetiva das grandes áreas

de florestas preservadas por parte dos governos e a posterior concessão

dessas terras para empresas que realizem a extração sustentável da

madeira. Outra opção é a transformação dessas áreas de florestas

preservadas em parques nacionais com grande presença de guardas

florestais na fiscalização. O importante é separar as áreas desmatadas

das áreas preservadas, garantindo segurança jurídica para as terras e

atraindo empresas formais e sérias para o campo. Impor que áreas

desmatadas no passado sejam reflorestadas pelos posseiros com recursos

próprios, como alguns ambientalistas defendem, geraria um impacto

econômico tão negativo que inviabilizaria no campo político a

implementação das ações. Após o estabelecimento da regularização

fundiária se faz necessário o investimento em recursos policiais e

judiciários que garantirão a manutenção da segurança jurídica no

campo.

3)Monitoramento e fiscalização

Um grande aliado no combate do desmatamento tropical é o

monitoramento via satélite das áreas efetivamente desmatadas. No

entanto é preciso que agentes ambientais de campo efetivem na floresta

a fiscalização. Os moradores das comunidades locais também podem

ajudar no trabalho de fiscalização através de incentivos financeiros.

Além dos agentes que combatem o desmatamento, se faz necessário o

aumento de fiscais que controlem as atividades predatórias que se

sustentam do desmatamento. Nesse processo é muito importante a

rastreabilidade dos rebanhos e dos produtos agrícolas, garantindo a

obrigatoriedade que a produção não provenha de áreas desmatadas. A

participação do consumidor nacional e internacional, exigindo a origem

ambiental do produto, completa o monitoramento.

4)Incentivos econômicos para atividades sustentáveis

Simplesmente apertar as causas do desmatamento não resolve o

problema. As atividades associadas ao desmatamento são fundamentais

para o funcionamento das economias locais. Se faz necessário criar

incentivos para que novas cadeias produtivas sejam criadas e que as

cadeias tradicionais sejam aperfeiçoadas. O desmatamento predatório

pode ser substituído pelo manejo sustentável da floresta através da

concessão de uso para empresas privadas certificadas. Enquanto no

desmatamento convencional se tira a madeira que a indústria precisa e

se queima o resto da floresta, no desmatamento com manejo se retira

apenas a madeira com valor comercial e se deixa o resto da floresta

quase intacta. Depois de alguns anos as árvores com valor comercial

crescem e podem ser extraídas novamente. Essa alternativa resolve com

sucesso a extração da madeira, mas as atividades agropecuárias almejam

aumentar sua produção através do aumento das áreas de plantio. Para

aumentar a produção sem precisar aumentar a área de produção é

necessário principalmente tornar a pecuária mais intensiva (a atividade

que mais ocupa terras) e reaproveitar áreas degradadas. Um exemplo de

sucesso é o sistema de criação desenvolvido na Embrapa (Empresa

Brasileira de Pesquisa Agropecuária) onde há uma integração entre

lavoura e pecuária30

. O produtor cria 3 bois por hectare ao invés da

criação de 0,7 bois por hectare extensiva. A técnica consiste em plantar

milho e outros grãos em uma área separada, para alimentar o rebanho. O

gado ocupa menos pasto e as terras são adubadas pela alternância entre

bois e lavoura. Além de reduzir os custos com a recuperação das áreas

degradadas, essa técnica aumenta os ganhos do produtor. A produção da

pecuária poderá crescer por décadas sem desmatamento ao mesmo

tempo em que parte das áreas de pecuária é substituída pela produção

agrícola de grãos como a soja. Outra forma de manter a floresta em pé é

pagar uma espécie de bolsa-floresta para que proprietários de terra e

ribeirinhos moradores da floresta conservem as matas. Por último é

importante desincentivar atividades predatórias através da proibição de

créditos governamentais e da maior taxação de impostos sobre essas

atividades.

Diante do custo mais baixo para efetivar as soluções de mitigação

de emissões no setor de Silvicultura em comparação com os setores

econômicos dependentes dos combustíveis fósseis, a ONU estuda uma

forma de incluir a preservação de florestas entre as categorias de

projetos de MDL em 2013, na próxima fase do Protocolo de Kyoto.

Esse tipo de crédito de carbono será chamado de Redd (Emissões

Reduzidas do Desmatamento e da Degradação). As nações ricas

comprariam créditos de carbono das comunidades e regiões que

evitassem o desmatamento ilegal a fim de cumprir suas metas

obrigatórias de emissão. Um grande risco é que se pague para preservar

30

Um estudo interessante sobre o Sistema integrado lavoura-pecuária pode ser

encontrado no link:

http://www.cpatu.embrapa.br/publicacoes_online/documentos-

1/2008/diagnostico-e-modelagem-da-integracao-lavoura-pecuaria-na-

regiao-de-paragominas-pa/at_download/PublicacaoArquivo

uma determinada área e que isso empurre o desmatamento para outras

regiões, os chamados “vazamentos”. O importante é que não apenas se

exija o cumprimento das iniciativas nos moldes dos projetos de MDL

tradicionais, mas que se exijam também metas nacionais de redução de

desmatamento dos países recebedores dos créditos.

Além de conter as emissões de CO2, a diminuição do

desmatamento tropical pode evitar outro tipo de mudança climática.

Graças a capacidade de evaporar enormes volumes de água, as florestas

servem para manter fria e úmida a região que as abriga, revestindo-a

com nuvens que refletem calor e trazem a chuva que as sustenta. Mais

do que isso as grandes florestas tropicais são parte do resfriamento do ar

da Terra. O desmatamento já causou o desaparecimento de 65% das

florestas naturais. Modelos de computador prevêem que se 70% das

árvores do planeta forem derrubadas, o sistema regulador de

temperatura que elas proporcionam perderá a sua eficiência31

. Sem isso

o aquecimento é inevitável. Outro serviço ambiental importante são os

chamados “Rios Voadores” 32

, onde regiões que estão longe da floresta

tropical, são beneficiadas com chuvas que se formam nas regiões

florestais. No Brasil, as regiões Centro-Oeste e Sudeste, celeiros

agrícolas do Brasil e do Mundo dependem fortemente da Floresta

Amazônica para formação de chuvas. Então o combate ao

desmatamento também proporciona essa estabilização climática como

bônus, aumentando ainda mais a sua importância.

A sociedade global deve decidir como usar o espaço terrestre

racionalmente. Se nós precisamos de um modelo de desenvolvimento

diferente (sustentável nas florestas tropicais restantes e nas áreas

agrícolas) do modelo tradicional até hoje realizado, se os países

desmatadores estão dispostos a receber dinheiro em troca desse modelo

e se é mais fácil e barato mudar as atividades econômicas marginais que

destroem a floresta do que mudar as atividades econômicas principais

do mundo para conter o aquecimento global, se faz necessário que os

países desenvolvidos e os países em desenvolvimento em conjunto

paguem por essa preservação.

31 Revista Aquecimento Global, Ano 1, nº 2, Editora Online, página 22. 32 O termo se refere as correntes de ar que carregam umidade e vapor d'água

Capítulo 8: A redução de emissões na Amazônia

Neste capítulo venho ressaltar a importância da Amazônia no

cenário de reduções de gases estufa. As emissões da Amazônia

obviamente estão incluídas no setor de silvicultura, abordado no

capítulo anterior, mas a dimensão da floresta e das suas respectivas

emissões merece uma análise mais específica. O Brasil detém mais da

metade da área de florestas tropicais remanescentes do mundo, num

total de 4,6 milhões de km², sendo que a maioria absoluta dessas áreas

está na Amazônia. Isso representa um patrimônio colossal de

biodiversidade, de estabilidade climática e de recursos naturais não só

para o Brasil, mas para o mundo inteiro. No entanto esse patrimônio

vem sendo ameaçado nas últimas décadas. A taxa de desmatamento

brasileira atingiu uma média de 19 mil km² entre 1996 e 2005. O

desmatamento brasileiro emitiu na média dos últimos anos 1,2 bilhão de

toneladas de CO2 anualmente, sendo 0,8 bilhão somente no bioma

amazônico. O Brasil sozinho é responsável por 22% das emissões

advindas do desmatamento no mundo.

A destruição da floresta amazônica é realizada através de uma

simbiose entre as madereiras e os pecuaristas. O processo começa com a

extração da madeira. As madeireiras retiram apenas as árvores de valor

comercial que estão dispersas na mata. Mas, para cada árvore retirada,

outras 27 são danificadas. Com as estradas, uma madeireira predatória

degrada 60% da floresta. Os pecuaristas, geralmente associados às

madeireiras, derrubam o que sobrou da mata e plantam capim para o

gado. Criados livres no campo, sem ração, os bois precisam todo ano de

novas áreas derrubadas para a formação de pasto. O pasto é abandonado

em pouco tempo. Cerca de 30% das pastagens duram menos que cinco

anos. Nas terras abandonadas, a floresta não se recupera porque o solo

foi compactado pelos bois e empobrecido pelo fogo. Resta uma

vegetação rala, com arbustos. Dos 72 milhões de hectares já devastados

na Amazônia, cerca de 56 milhões de hectares são ocupados por uma

pecuária de baixa produtividade e outros 16,5 milhões de hectares de

áreas foram abandonados pelo empobrecimento do solo.

Felizmente, a taxa de desmatamento caiu fortemente na

Amazônia Legal nos ano de 2008 e 2009. Em 2008 foram desmatados

12,9 mil km² enquanto que em 2009 foram desmatados 7 mil km².No

entanto o desmatamento no ano de 2009 não pode ser utilizado como

referência definitiva. Ao contrário da indústria dos combustíveis fósseis,

que apresenta pequenas variações de emissões de um ano para outro, o

desmatamento tropical apresenta grandes variações. Num ano de crise

econômica como 2009 onde a economia mundial esteve em recessão, há

pouca demanda por novas áreas para a agropecuária, enquanto num ano

de vigoroso crescimento econômico há um grande aumento na demanda

por terras. Por isso os esforços precisam aumentar para que a redução

continue. O Fundo Amazônia33

pode ser um grande aliado nessa tarefa

de redução permanente. Ele é um fundo criado pelo governo brasileiro

que tem a finalidade de captar doações para investimentos não-

reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao

desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável das

florestas no bioma amazônico. Essas doações podem vir de governos,

instituições multilaterais, organizações não governamentais e empresas.

O primeiro contrato do Fundo Amazônia foi celebrado em 2009 com o

Governo da Noruega, onde foram doados US$ 100 milhões.

A consultoria McKinsey, ciente da importância da Amazônia,

realizou o mais abrangente estudo já feito para quantificar o custo de se

zerar o desmatamento na região. No estudo “Caminhos para uma

economia de baixa emissão de carbono no Brasil”34

houve uma atenção

especial para quantificar esse desafio. O custo total foi estimado em 17

bilhões de reais (5,5 bilhões de euros) anuais nos próximos 20 anos.

Desse valor 7,2 bilhões de reais se referem ao combate do

desmatamento propriamente dito, investindo em iniciativas de

fortalecimento das instituições, de fiscalização, de monitoramento e de

incentivos econômicos a atividades sustentáveis. Outros 10 bilhões de

reais anuais foram estimados como necessários para criar empregos

urbanos com maior valor agregado nas pequenas cidades e aumentar o

investimento em dimensões básicas como saúde e educação na região

Amazônica e dessa forma melhorar os índices de desempenho humano

da população, trazendo esses índices para o patamar nacional. A

McKinsey salientou que esse custo adicional pode ser considerado como

um gasto do País necessário para trazer os Estados do bioma Amazônia

ao patamar da média nacional, ou incluído no balanço geral do custo de

33

http://www.fundoamazonia.gov.br/ 34

O estudo pode ser acessado no link:

http://www.mckinsey.com.br/sao_paulo/carbono.pdf

redução do desmatamento. Acredito que os financiadores (governos,

empresas) nacionais e internacionais do combate ao desmatamento na

Amazônia devem custear apenas os 7,2 bilhões de reais anuais iniciais.

O investimento adicional de 10 bilhões de reais por ano para melhorar

os indicadores sociais e econômicos da região não é imprescindível para

se zerar o desmatamento. No custo inicial estimado de 7,2 bilhões de

reais anuais já estão incluídos investimentos em atividades sustentáveis

no campo como a exploração sustentável da floresta, a pecuária

intensiva sem ração externa e a concessão de bolsa-floresta para manter

a floresta em pé, que poderão substituir com sucesso a agropecuária e o

desmatamento predatórios. Quanto aos empregos urbanos e a melhoria

da saúde e da educação na região, eles de fato aceleram a redução do

desmatamento porque absolvem mão-de-obra dependente de atividades

predatórias, mas podem ser fomentados por investimentos na construção

de hidrelétricas na região que não precisam de incentivos econômicos

para se concretizarem.

O Brasil precisa aumentar a sua capacidade de geração de energia

elétrica para suprir o crescimento econômico das próximas décadas. A

produção através das usinas hidrelétricas surge como a melhor

alternativa, já que apresenta o menor custo econômico de produção,

inferior ao custo dos combustíveis fósseis e das fontes alternativas.

Além disso, a energia hidrelétrica elétrica representa uma forma de

obtenção de energia limpa. Apenas 25% do potencial hidrelétrico

brasileiro está sendo aproveitado. A grande maioria do potencial não

aproveitado está localizado na Amazônia. O governo brasileiro tem

dezenas de projetos de construção de grandes hidrelétricas na região,

mas tem sofrido grandes pressões ambientais que têm dificultado a

implementação dos projetos, principalmente através de embargos

judiciais. Os grupos ambientalistas afirmam que as hidrelétricas

destruirão a biodiversidade das áreas alagadas e mudarão o curso natural

dos rios. Por outro lado o Brasil quer a energia barata da Amazônia e os

moradores da região querem os vultosos investimentos na construção

das usinas. O investimento de 20 bilhões de reais nas usinas

hidrelétricas de Jirau e Santo Antonio, por exemplo, mudarão o perfil

econômico do estado de Rondônia localizado na Amazônia brasileira.

Apesar dos possíveis impactos ambientais, temos que analisar

prioritariamente a proporcionalidade entre os benefícios econômicos e

os impactos ambientais. As hidrelétricas projetadas são usinas fios

d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina de

Jirau, que será construída no rio Madeira, alagará 0,08 km² por cada

MW gerado, a média nacional das usinas existentes é de 0,57 km²

alagado por cada MW gerado. Mesmo esse pequeno alagamento

proporcional gerará pesadas compensações ambientais (exemplo:

reflorestamentos) que serão custeadas pelos construtores das

hidrelétricas. Se compararmos o impacto ambiental das hidrelétricas

com o impacto ambiental da pecuária extensiva na Amazônia, os valores

chegam a ser ridículos. Enquanto 1 MW de energia pode abastecer uma

cidade de 50 mil pessoas, inundando uma área de 8 hectares, nessa

mesma área se cria apenas 5 cabeças de gado através da pecuária

extensiva. Uma área centenas de vezes maior é necessária para que a

pecuária forneça o mesmo resultado econômico das hidrelétricas. Torna-

se uma grande ilusão acreditar que a humanidade pode viver com

impacto ambiental zero, que a Amazônia precisa virar um santuário

virgem intocado. O que precisamos é desenvolver atividades

econômicas com BAIXO impacto ambiental. As hidrelétricas podem se

tornar na realidade protetoras da floresta amazônica gerando

desenvolvimento econômico nas zonas urbanas através dos

investimentos de construção num momento inicial e posteriormente

através dos ganhos dos estados amazônicos com os royalties e os

impostos arrecadados no momento de funcionamento. O

desenvolvimento econômico poderá absolver mão-de-obra que

atualmente se encontra dependente de atividades de alto impacto

ambiental como o desmatamento predatório e a pecuária extensiva,

enquanto a arrecadação de impostos e de royalties poderá financiar a

melhoria dos indicadores de saúde e educação da população que reside

na Amazônia.

Com o investimento de 7,2 bilhões de reais anuais, o equivalente

a 2,4 bilhões de euros, o desmatamento da Amazônia brasileira cessará e

a floresta será preservada para as futuras gerações. Temos nas próximas

2 páginas um resumo das iniciativas propostas35

pela McKinsey para a

Amazônia com os respectivos custos de cada uma em euros, inclusive

com as iniciativas de desenvolvimento econômico e social que foram

consideradas dispensáveis. Veja as iniciativas na próxima página:

35

Essas iniciativas propostas estão no estudo “ Caminhos para uma economia

de baixa emissão de carbono no Brasil”

Capítulo 9: O sequestro geológico de CO2

O sequestro geológico de CO2 transforma as fontes fósseis em

fontes de suprimento de energia de baixo carbono. Ele consiste no

princípio de devolver ao subsolo o carbono retirado, que antes estava

presente na forma de petróleo, carvão mineral e gás natural. O CO2

emitido por termelétricas, refinarias e indústrias é capturado,

transportado e armazenado em campos de petróleo antigos, camadas de

carvão, ou aquíferos salinos. As fontes fósseis que sequestram

geologicamente o CO2 diferem das fontes limpas não emissoras de gases

estufa porque produzem um passivo ambiental. O CO2 estocado precisa

ser monitorado para se evitar possíveis vazamentos. A diminuição de

emissões via armazenamento geológico possibilitará uma transição

ambientalmente segura no processo de substituição das fontes fosseis

por fontes renováveis limpas.

Com a temática do aquecimento global cada vez mais presente

na sociedade, as indústrias sujas estão como "a fera acuada". Enquanto

parte da opinião pública defende o fechamento delas, essas empresas

procuram uma forma de se tornarem ambientalmente sustentáveis e bem

vistas pela sociedade. O sequestro geológico é avaliado como única

forma de sobrevivência no longo prazo. O armazenamento de líquidos e

gases em reservatórios geológicos é uma atividade exercida a décadas

pela indústria do petróleo36

. A injeção de CO2 em campos petrolíferos

tem a função de extrair o petróleo de difícil extração. O CO2 injetado se

dissolve no petróleo, diminuindo a sua viscosidade e aumentando a sua

mobilidade, propiciando a extração de até 40% do petróleo não extraído

de forma convencional. Essa tecnologia já é empregada desde a década

de 60 nos Estados Unidos e desde a década de 80 no Brasil. Então a

tecnologia de armazenamento geológico de CO2 não foi inventada

recentemente, apenas adaptada para a mitigação de emissões

atmosféricas. O sequestro geológico de CO2 para essa finalidade, já foi

demonstrado em projetos de pequena escala, que injetam menos de 10

milhões de toneladas de CO2 por ano. O principal projeto de

demonstração no mundo é o Sleipner, operado desde 1996 pela

36 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf O CEPAC é o Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de

Carbono, localizada na PUCRS, estado do Rio Grande do Sul, Brasil.

petrolífera norueguesa StatoilHydro, que injeta CO2 separado de gás

natural na formação Utsira, um aquífero salino situado a 900m abaixo

do leito do Mar do Norte. O projeto In Salah, na Argélia, desde 2004

injeta CO2 em um aquífero salino a 2km de profundidade abaixo da

superfície do deserto do Saara. O que ainda falta é o uso comercial em

massa do armazenamento geológico de CO2, mas a tecnologia já existe.

Nos próximos anos haverá o amadurecimento comercial do processo.

Veja a imagem37

com a injeção de CO2 no subsolo:

Fgfffg

dgfgjfgjf

O processo de sequestro geológico de CO2 começa com a

captura do gás nas fontes estacionárias como indústrias e termelétricas.

A captura é feita basicamente por 4 tipos de tecnologia: pós-combustão,

pré-combustão, oxi-combustão e processos industriais. Na pós-

37 A imagem está no site:

http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAcademicaQuimica_RSI.pps

combustão e nos processos industriais o CO2 é extraído dos gases de

exaustão. No processo de pré-combustão, o carbono é extraído da sua

combustão antes da sua queima, sendo produzido o gás de síntese,

composto por hidrogênio e monóxido de carbono. Depois o gás de

síntese reage com água para a transformação de CO (monóxido de

carbono) em CO2. No processo de oxi-combustão, o combustível é

queimado com alto teor de oxigênio ao invés de ar, obtendo CO2

praticamente puro como gás de exaustão38

.

Após a captura, o CO2 precisa ser comprimido e transportado

até o seu local de injeção em formações geológicas apropriadas. O

transporte de CO2 pode ser realizado através de carbodutos ou através de

navios tanques.

O armazenamento geológico do CO2 pode ser feito de forma

segura em três tipos de reservatórios: campos de petróleo, aqüíferos

salinos e camadas de carvão. Os campos de petróleo são reservatórios

geológicos, que abrigam petróleo e gás, que ficaram aprisionados

naturalmente por milhões de anos. Muitos desses reservatórios foram

exauridos pelo consumo humano, e o espaço pode ser aproveitado para

armazenamento de CO2. Segundo a Agência Internacional de Energia,

os campos de petróleo do mundo podem armazenar 1 trilhão de

toneladas de CO2. Os aqüíferos salinos consistem em reservatórios de

água subterrânea com alta salinidade, por vezes similar ou maior que a

água do mar, e que não podem ser usadas para consumo humano. A

injeção de CO2 em aqüíferos salinos deve ocorrer em profundidades

superiores a 800m, para que o CO2 esteja em estado supercrítico, isto é,

um gás com densidade similar a de líquidos. Esses reservatórios

possuem a capacidade de armazenar 10 trilhões de toneladas de CO2 no

mundo. As camadas de carvão podem aprisionar CO2 em seus espaços

porosos, sendo o armazenamento preferencialmente realizado em

camadas profundas, isto é, camadas cuja exploração convencional não é

economicamente viável. Estima-se que 200 bilhões de toneladas de CO2

podem ser armazenados em camadas de carvão no mundo inteiro. Veja a

foto39

de um aqüífero salino:

38 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf 39 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf

Fotomicrografia de uma rocha reservatório

Após o armazenamento, vem a fase de monitoramento da

eficiência com que a formação geológica é capaz de reter o CO2 e,

portanto, evitar vazamentos para a superfície ou outras unidades

geológicas. Estima-se que o risco de operação de injeção de CO2 seja

similar ao risco de outras atividades da indústria do petróleo. Do ponto

de vista geológico, a eficiência das formações para o aprisionamento de

fluidos pode ser atestada pela ocorrência natural de campos de dióxido

de carbono. O CO2 injetado em formações geológicas pode ser

precisamente monitorado, medido e verificado periodicamente através

de tecnologias já maduras e disponíveis comercialmente. Dentre as

técnicas mais avançadas encontra-se a sísmica 4D, que permite a

obtenção de uma imagem do sub-solo, onde é possível verificar

diretamente a presença do CO2, acompanhar o eventual deslocamento

do CO2 injetado através da rocha, bem como medir o volume

armazenado. A prática de monitoramento constante do armazenamento

permite antecipar o comportamento do CO2 em sub-superfície e

eventualmente promover ações de remediação.

Mesmo com todas as medidas preventivas, alguns críticos

questionam a segurança do processo de armazenamento geológico,

quanto à possibilidade de vazamento. Eles afirmam que em 1986, 1700

camaroneses morreram asfixiados devido a uma erupção natural de CO2

no lago Nyos. No entanto não se pode comparar as emissões naturais de

um lago dentro de uma cratera de um vulcão, que se encontra na

superfície, com o CO2 armazenado a quilômetros de profundidade em

áreas propícias para o armazenamento. O incidente no Lago Nyos é na

verdade mais parecido com a erupção de um vulcão, um fenômeno

natural que não pode ser evitado pelo homem. O que mais garante

segurança para o processo de armazenamento geológico de CO2 é a

reatividade do gás no subsolo. Quando ele é lançado num aqüífero

salino ou num campo de petróleo, começam a ocorrer reações químicas

com as rochas porosas desses locais. O reservatório passa a sofrer uma

acidificação. O gás carbônico reage com os minerais presentes no

aqüífero salino, formando carbonatos. Então o dióxido de carbono acaba

se transformando em substâncias inofensivas e sólidas. Enquanto o lixo

atômico pode levar dezenas de milhares de anos para se tornar

inofensivo, o CO2 vai reagindo nas décadas seguintes ao

armazenamento e se tornando inofensivo. Isso é um diferencial a favor

do armazenamento geológico de CO2. A seguir temos a reação química

que forma a calcita e alguns exemplos40

de outros carbonatos que o CO2

forma no subsolo:

sideritaFeCO3

magnesitaMgCO3

ankeritaCa(Fe,Mg,Mn)(CO3)2

dawsonitaNaAl(CO3)(OH)2

dolomita(Ca,Mg)CO3

calcitaCaCO3

40 A imagem está no site: http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAcademicaQuimica_RSI.pps

A consultoria McKinsey estima que em 2030 o uso do seqüestro

geológico de carbono nos setores energético e industrial tem o potencial

de abater entre 3,3 e 4,1 bilhões de toneladas anuais de CO2 equivalente

a um custo entre 30 e 45 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada.

O custo líquido estimado em 2030 é ligeiramente superior ao custo de

fontes limpas como a energia solar e a energia eólica. O seqüestro

geológico pode ser muito útil para neutralizar emissões de usinas

termelétricas já em funcionamento onde a opção de fechá-las

significaria um grande prejuízo financeiro, já que a vida útil da infra-

estrutura é longa. Apesar de adaptar uma usina em funcionamento para

o seqüestro ser mais caro do que construir uma infra-estrutura de

seqüestro numa usina nova, esse custo não é o mais relevante. O custo

de implementação do seqüestro geológico tanto em usinas novas quanto

em usinas velhas é inferior a 10 euros por tonelada de CO2 equivalente

evitada. A maior parte dos custos se refere ao consumo de energia

necessária para separação do dióxido de carbono dos demais gases de

exaustão, podendo se requerer até 25% da eficiência final das plantas,

um custo de manutenção do sistema. Outra boa opção é a associação

entre fontes renováveis e fontes fósseis novas com seqüestro geológico

de carbono. Fontes renováveis como o a energia solar e a energia eólica

dependem de fatores naturais, por isso não funcionam com a mesma

intensidade 24 horas por dia. Nos horários de menor vento incidindo nos

aerogeradores, por exemplo, podem-se ligar usinas termelétricas com

seqüestro geológico de carbono, principalmente termelétricas a gás

natural que podem funcionar de forma flexível durante o dia com alta

eficiência. Por fim termelétricas novas movidas a carvão com seqüestro

geológico de carbono podem ser uma boa opção para fornecer energia

24 horas por dia com um baixo índice de emissões.

O seqüestro geológico tem potencial para se tornar um

importante passo na transição das fontes fósseis para as fontes

renováveis limpas. Os combustíveis fósseis estão se esgotando,

principalmente o petróleo e o gás natural. O estabelecimento da

obrigatoriedade do seqüestro geológico nas próximas décadas em

grandes fontes fósseis garantirá que uma parcela considerável desses

combustíveis não lance CO2 na atmosfera. A solução ideal para

controlar o aquecimento global até 2030 e também nas décadas

posteriores é aproveitar um mix de oportunidades que inclui as fontes

renováveis limpas e o seqüestro geológico de carbono.

Capítulo 10: Fontes energéticas limpas

As energias limpas constituirão o futuro energético do planeta.

Isso se deve ao crescente aumento da demanda energética humana

impulsionada pelo crescimento econômico, a esgotabilidade das fontes

fósseis e a crise climática ocasionada pelas emissões humanas de gases

estufa. A grande dúvida se refere a velocidade de transição da matriz

fóssil para a matriz limpa. O estudo da Consultoria McKinsey estimou o

potencial de redução de emissões através do suprimento de energia de

baixo carbono em 12 bilhões de toneladas de CO2 equivalente anual em

2030, implementando apenas iniciativas com custo inferior a 60 euros

por tonelada de CO2 equivalente. Desse valor entre 3,3 e 4,1 bilhões de

toneladas poderão vir de fontes fósseis com seqüestro geológico e

aproximadamente 8 bilhões através de fontes limpas, que são o assunto

deste capítulo. A principal contribuição através das fontes limpas é o

uso de energias renováveis (energia solar, eólica, geotérmica, biomassa)

no setor de energia elétrica com um potencial de abatimento de 4

bilhões de toneladas anuais em 2030. Em segundo plano está o uso da

energia nuclear no setor de energia elétrica com potencial de abatimento

de 2 bilhões de toneladas anuais e o uso de biocombustíveis no setor de

transportes com potencial de abatimento de 500 milhões de toneladas

anuais. Salienta-se novamente que todas as contribuições são sempre um

acréscimo ao caso base, ou seja, estima-se, por exemplo, um certo nível

de consumo de biocombustíveis em 2030 sem incentivos e poderemos

aumentar esse nível de consumo esperado através de incentivos

financeiros. Esse acréscimo no caso dos biocombustíveis no setor de

transporte tem potencial de abatimento de 500 milhões de toneladas

anuais em 2030.

As iniciativas de redução através das fontes energéticas limpas

necessitam de maiores investimentos e apresentam maior custo líquido

do que as iniciativas do setor de carbono terrestre (silvicultura e

agricultura). Na comparação com as iniciativas de eficiência energética

o investimento é menor, mas o custo líquido no longo prazo é maior, já

que as iniciativas de eficiência energética economizam dinheiro através

da economia de energia. Mesmo com custos maiores, as fontes

energéticas limpas constituem um pilar fundamental no combate ao

aquecimento global, pois além de um importante potencial de

abatimento de emissões entre 2011 e 2030, se olharmos no horizonte

além de 2030, os setores de carbono terrestre e de eficiência energética

apresentam um potencial que atingirá um certo limite. A humanidade

continuará crescendo economicamente e consumindo energia e quando

ela se tornar em algumas décadas muito eficiente no consumo de

energia, a única solução plausível será investir em fontes energéticas

limpas para aumenta a geração de energia. A seguir temos as fontes

energéticas limpas mais promissoras:

10.1 Energia Eólica

A energia eólica é a energia que provém do vento. Ela tem sido

aproveitada desde a antigüidade para mover os barcos impulsionados

por velas ou para fazer funcionar a engrenagem de moinhos, ao mover

as suas pás. Na atualidade utiliza-se a energia eólica para mover

aerogeradores - grandes turbinas colocadas em lugares de muito vento.

Essas turbinas têm a forma de um cata-vento ou um moinho. Esse

movimento através de um gerador produz energia elétrica. A energia

eólica é renovável, limpa e amplamente distribuída globalmente. Em

alguns países, a energia elétrica gerada a partir do vento representa

significativa parcela da demanda. Na Dinamarca ela já representa 25%

da produção e aproximadamente 10% na Alemanha. Os avanços nos

desenhos das turbinas reduziram os custos da eletricidade. No início dos

Parque Eólico, na cidade de Fortaleza, Brasil.

anos 80, a energia eólica custava cerca de US$ 0,30 por kWh. Já em

2006, a energia eólica custava em média de US$ 0,04 a 0,10. Essa

redução de custos propiciou o crescimento de 25% ao ano do mercado

de energia eólica, tornando-a a energia renovável mais barata e a com

maior participação na matriz energética mundial. No entanto a energia

eólica ainda é mais cara que a energia fóssil, principalmente se

comparada com o carvão. Os aerogeradores não consomem

combustíveis, mas apresentam um custo de instalação inicial alto. Em

2030 eles estarão mais baratos devido aos ganhos aerodinâmicos e a

redução de custos nos materiais através da nanotecnologia41

. As usinas

eólicas não produzem energia durante todo tempo nem com a mesma

intensidade porque dependem da velocidade dos ventos. Cientistas e

empresários americanos encontraram uma solução criativa para superar

esse gargalo. O excesso de energia obtido nos momentos de vento mais

forte, alimenta enormes compressores de ar, que enviam ar comprimido

para camadas de arenito a 1000 metros de profundidade. Quando falta

vento ou o consumo de energia aumenta muito (horário de pico), o ar-

comprimido armazenado é usado para gerar energia juntamente com

uma fonte extra de gás natural. O ar-comprimido consegue elevar o

rendimento da turbina movida a gás natural em até 60%, em relação a

uma turbina que não usa o ar-comprimido. Outra adequação inteligente

da energia eólica está sendo projetada no Brasil. A maior parte da

energia elétrica brasileira é gerada por usinas hidrelétricas, que barram

rios muito volumosos como o São Francisco e o Paraná. Esses rios

diminuem a vazão nos anos de baixa precipitação de chuvas, afetando a

segurança energética do sistema. Justamente nesses anos se registra as

maiores intensidades dos ventos. Então haverá uma complementaridade

entre as duas fontes. Parques eólicos construídos nas regiões Nordeste e

Sul do Brasil evitarão que os lagos artificiais das hidrelétricas lancem

muita água nas turbinas das usinas na estação seca, economizando água

para geração de energia futura e água para consumo humano.

41 A nanotecnologia é a aplicação da ciência em sistemas que tratam de

objetos mensurados em nanômetros. Um nanômetro (nm) é um bilionésimo

de metro, ou um milionésimo de milímetro.

10.2 Energia solar

A energia produzida pelo do Sol é lançada na Terra e pode ser

captada e transformada em alguma forma utilizável pelo homem, seja

diretamente para aquecimento de água ou ainda como energia elétrica

ou mecânica. A energia solar é abundante e permanente, renovável a

cada dia, não polui e nem prejudica o ecossistema. Ela soma

características vantajosamente positivas para o sistema ambiental, pois o

Sol, trabalhando como um imenso reator à fusão irradia na terra todos os

dias um potencial energético extremamente elevado e incomparável a

qualquer outro sistema de energia, sendo a fonte básica e indispensável

para praticamente todas as fontes energéticas utilizadas pelo homem.

A transformação da luz solar em energia elétrica, através do

efeito fotovoltaico, é considerada a aplicação mais promissora da

energia solar. Placa formadas de materiais semicondutores (como na

foto acima) produzem eletricidade após a absorção da luz. Como o sol

não brilha 24 horas por dia, para se ter abastecimento o dia inteiro, é

preciso uma forma de armazenar o excesso de energia durante o dia em

baterias. A energia solar tem potencial ilimitado de aproveitamento, é

silenciosa e tem baixo custo de manutenção. No entanto, os custos para

armazenar a energia na forma de baterias e os custos elevados para

produzir placas solares tornam o custo de instalação muito elevado,

mesmo tendo havido reduções importantes nas últimas décadas. A

energia solar custa em média entre US$ 0,17 e US$0,32 por kWh de

energia gerado, um valor mais elevado que a energia eólica. A energia

solar é a solução ideal para áreas afastadas e ainda não eletrificadas, que

estão longe da rede de energia. Em 2030 a energia solar fotovoltáica

deve baratear consideravelmente, fruto do surgimento de novos

materiais com maior eficiência na conversão da luz solar em energia

elétrica. Quanto ao armazenamento para uso noturno, a solução passa

pela construção de usinas que armazenem durante o dia o excesso de

energia na forma de ar-comprimido em cavernas42

, de forma similar ao

armazenamento do excesso de energia produzido por aerogeradores nos

momentos de muito vento. A redução de custos aumentará imensamente

a participação da energia solar nas próximas décadas.

Outra forma de aproveitamento da energia solar muito difundida

é o aquecimento de fluídos (líquidos ou gasosos) através do calor do sol.

Coletores concentradores ou planos absolvem o calor do sol e o

transmitem para reservatórios termicamente fechados. O calor é

aproveitado para aplicações como água quente para banho, ar quente

para secagem de grãos, ou aquecimentos de piscinas. Essa aplicação da

fonte solar proporciona redução de gastos com energia elétrica e isso

tem impulsionado o uso comercial da tecnologia. Geralmente os

sistemas se pagam entre 2 e 5 anos após a implantação. O calor do sol

também é utilizado para gerar energia elétrica. Coletores concentram o

calor do sol, que aquece um fluído. O vapor do fluído move uma turbina

gerando energia de forma similar a uma termelétrica convencional,

apenas não usando combustíveis fósseis. Nessas usinas solares térmicas

uma forma de armazenamento de energia, distinta do armazenamento de

ar-comprimido em cavernas, está sendo tentada. A usina PS10, próxima

a Sevilla na Espanha, funciona com uma tecnologia engenhosa. Ela

utiliza o calor dos raios solares, refletidos por espelhos e captados por

uma torre receptora. Esse calor é usado para aquecer um fluido,

geralmente sal liquefeito, que permanece estocado em um reservatório

com alta temperatura, como café quente numa garrafa térmica43

. Quando

há demanda por eletricidade, o fluido é conduzido até um gerador, e o

vapor que ele desprende move uma turbina, produzindo eletricidade. Por

42 Revista Scientific American Brasil, edição 69, fevereiro de 2008,

reportagem “Perspectivas para a energia solar”. 43 Mais informações podem ser encontradas no site da empresa detentora da

usina:

http://www.abengoasolar.com/corp/web/es/nuestros_proyectos/plataforma_solu

car/ps10/index.html

enquanto, ela consegue armazenar o calor produzido durante meia hora.

Quando novas tecnologias já em desenvolvimento forem utilizadas, a

nova geração de usinas térmicas como a PS10 será capaz de estocar o

calor por até vinte horas. Veja a usina44

:

Usina PS10, em Sevilla na Espanha.

44

A imagem está no link:

http://www.abengoasolar.com/corp/export/sites/solar/resources/pdf/PS10.pdf

10.3 Biocombustíveis de 1ª geração e de 2° geração

Os biocombustíveis são os combustíveis biológicos derivados

de produtos agrícolas e matéria orgânica, que não tem origem fóssil.

Exemplos de biocombustíveis são o biodiesel, o álcool (já comentado

anteriormente) e o biogás. Assim como os combustíveis fósseis, os

biocombustíveis produzem CO2 quando geram energia. O diferencial é

que o CO2 lançado foi seqüestrado no momento em que as plantas

cultivadas estavam crescendo. A produção é praticamente neutra em

carbono e renovável. Os principais biocombustíveis são o substituto

biológico do diesel (biodiesel) e o substituto biológico da gasolina

(álcool). O biodiesel, produzido através de plantas como soja, mamona,

dendê e pinhão manso, ainda é no mínimo 30% caro que o diesel fóssil.

Quanto ao álcool, produzido com plantas como a beterraba, o milho e o

trigo, a produção comercial só se sustenta através de fortes subsídios

governamentais. O único biocombustível viável na atualidade

ambientalmente e economicamente é o álcool brasileiro proveniente da

cana-de-açúcar, com um custo de produção de US$ 0,22 por litro. Um

hectare de cana produz 7500 litros de álcool e necessita apenas de 1

unidade de energia fóssil para produzir 8,3 unidades de energia

renovável. A maioria da frota brasileira de carros pode funcionar tanto

com gasolina quanto com álcool. O baixo preço do álcool chega a

pressionar os preços da gasolina para níveis mais baixos. Em países

como os Estados Unidos e em alguns países europeus a taxa de

importação imposta ao etanol brasileiro evita que o consumo de álcool

barato proveniente do Brasil se expanda.

Todos os biocombustíveis citados até agora são conhecidos

como biocombustíveis de 1ª geração. O principal problema desses

biocombustíveis é a falta de terras disponíveis para substituir todo o

consumo de combustíveis fósseis do mundo. Teríamos que usar grande

parte dos 25 milhões de km² de terras agricultáveis para produção de

biocombustíveis, gerando um grande aumento do preço das terras e

inflacionando o preço dos alimentos. Uma alternativa seria desmatar

florestas para produzir biocombustíveis, mas o resultado ambiental seria

decepcionante. Se lançaria até 700 toneladas de CO2 na atmosfera ao se

desmatar 1 hectare de floresta tropical e se evitaria apenas a emissão de

10,8 toneladas de CO2 por hectare/ano, ao se substituir a gasolina pelo

álcool. No entanto, a limitação de terras não inviabiliza que os

biocombustíveis de 1ª geração possam substituir adequadamente até

20% do consumo mundial de combustíveis fósseis no setor de

transportes, sem grandes pressões inflacionárias nos alimentos, e

possam ter relevância na matriz energética futura.

Os biocombustíveis de 2ª geração não competem fortemente por

terras com a produção agrícola. Alguns apresentam uma altíssima

produtividade por hectare plantado, não necessitando de grandes áreas

de cultivo, enquanto outros utilizam restos agrícolas como matéria-

prima. Eles não apresentam os gargalos dos biocombustíveis de 1ª

geração. Quando forem viabilizados comercialmente poderão substituir

todo o consumo mundial de combustíveis fósseis sem grandes impactos

ambientais, representando uma revolução energética. Os dois

biocombustíveis de 2ª geração mais promissores são o biodiesel

produzido a partir de algas e o etanol produzido a partir da celulose.

O biodiesel das algas é produzido em tanques de água abertos

ou fechados. Um hectare de produção de algas pode produzir 90 mil

litros de biodiesel por ano contra os 3 mil litros de biodiesel produzido

através do pinhão manso, uma das plantas mais eficientes do mundo na

produção de biodiesel convencional. O biodiesel a partir de algas não

necessita de safras, podendo ser produzido todo dia, além de a produção

poder utilizar áreas de solos pobres e o consumo de água não potável. O

fator terra afeta muito pouco o custo de produção.

O etanol celulósico é produzido de uma forma diferente do

etanol de 1ª geração. O etanol de 1ª geração da cana-de-açúcar é

produzido a partir da sacarose. A cana é exprimida para tirar o caldo e

esse caldo é levado para a fermentação. Nesse processo, um grupo de

microorganismos transforma o açúcar (sacarose) em etanol. No caso do

etanol celulósico, se utiliza a celulose encontrada nas plantas para

produzir álcool. A celulose é o recurso renovável mais abundante da

terra. A celulose pode ser extraída de restos agrícolas como lascas de

madeira, grama, palha, folhas, caules e bagaços de frutas. Dessa forma

não há competição entre a produção de alimentos e a produção de

combustível, pois numa mesma área que se produz laranja, por exemplo,

pode-se extrair etanol celulósico proveniente das cascas e do bagaço das

frutas no momento em que a fruta é processada para produção de suco

engarrafado. O etanol celulósico pode ser extraído dos cultivos que já

estão produzindo etanol de 1° geração como a cana-de-açúcar e o milho.

Se aproveitando a celulose encontrada na palha, nas folhas e no bagaço

da cana-de-açúcar e a sacarose do caldo da cana, pode-se obter uma

produção de 28 mil litros de etanol por hectare ao ano. Essa

produtividade, quase 4 vezes maior do que a obtida utilizando apenas o

etanol da sacarose, diminui fortemente a competição por terras com o

setor de produção de alimentos. O processo de produção do etanol

celulósico já foi viabilizado tecnicamente, mas o custo ainda é muito

alto. Enquanto o etanol da sacarose custa US$ 0,22 por litro para ser

produzido, o etanol da celulose, custa entre US$ 0,40 e US$ 0,60 por

litro para ser produzido. Estima-se que quando o custo atingir US$ 0,30

por litro, o álcool celulósico será viável comercialmente. Os custos mais

altos se devem ao alto custo das enzimas que são usadas no processo de

transformação da celulose em glicose. No momento está ocorrendo uma

corrida tecnológica para baratear os custos dessas enzimas, pois esse

fator é chave para viabilizar o etanol celulósico. Após a transformação

da celulose em glicose, outro açúcar, o processo é o mesmo do etanol da

sacarose. A glicose é fermentada, obtendo-se álcool.

Os especialistas afirmam que dentro de 10 anos os

biocombustíveis de 2ª geração se tornarão viáveis economicamente

podendo ser adicionados gradativamente ao diesel ou a gasolina

proveniente do petróleo, sem grandes preocupações ambientais ou

alimentares. Se essa previsão se confirmar, teremos nas próximas

décadas uma redução significativa consumo de petróleo no setor de

transportes mundial e conseqüentemente de emissões líquidas de CO2.

Poderemos ter em 2030, por exemplo, um típico carro global sendo flex

e híbrido e fazendo 30 km/l. No setor de veículos pesados poderemos ter

caminhões rodando com 50% de diesel fóssil e 50% de biodiesel. No

entanto todas essas previsões precisam de inovações tecnológicas

importantes para se concretizarem. Por esse motivo ainda é impreciso

afirmar que os biocombustíveis de 2ª geração tomarão a dianteira no

abastecimento mundial do setor de transportes.

10.4 Energia proveniente do mar

Os oceanos podem fornecer milhares de vezes a quantidade de

energia que a humanidade consome. Uma abundância de energia

renovável e limpa só comparável com a energia do sol e a energia dos

ventos. O grande problema é encontrar uma forma viável de aproveitar

esse potencial comercialmente. Apesar de centenas de inventos

desenvolvidos, as formas de obtenção de energia dos oceanos têm se

mostrado ineficientes em relação ao rendimento e aos custos. As

principais formas de obtenção de energia dos oceanos são as ondas, as

marés, as correntes marítimas e o calor dos oceanos.

O calor do sol aquece os oceanos, principalmente nas zonas

tropicais, criando uma diferença significativa de temperatura entre a

superfície quente e o fundo do mar escuro e gelado. Essa diferença é

capaz de gerar energia. O principal sistema de aproveitamento desse

gradiente de temperatura utiliza a amônia, uma substância que evapora

com facilidade. As águas mornas da superfície do mar transformam a

amônia em vapor, que movimenta uma turbina acoplada a um dínamo,

gerando energia elétrica. Posteriormente o vapor da amônia é

condensado pelo frio proveniente da água fria do fundo do mar, e em

seguida a amônia líquida volta para o evaporador para começar um novo

ciclo.

As marés são criadas pelas forças gravitacionais que interagem

entre a Terra, a Lua e o Sol, gerando variações dos níveis do mar no

litoral durante o dia. Elas são mais previsíveis do que os ventos, o que

representa uma grande vantagem no aproveitamento energético. A

forma de aproveitamento da energia das marés mais utilizada até hoje é

através de barragens semelhantes às hidrelétricas. A barragem

construída separa geralmente uma baia do restante do mar. Na maré alta,

a água passa pela barragem através de uma turbina, gerando energia

elétrica e enchendo o reservatório (a baia). Na maré baixa a baia, que se

encontra cheia e num nível mais elevado que o mar é esvaziada e a água

passa em sentido contrário ao do enchimento pela turbina gerando

energia. Existem várias dessas usinas no mundo, mas a única de grande

porte e viável economicamente é a usina construída no estuário do rio

Rance, no norte da França, com capacidade de produzir 240 MW de

energia. As dificuldades se referem à escassez de locais propícios para a

construção, pois é preciso uma grande amplitude de maré e uma

topografia adequada para se obter energia com um custo

comercialmente viável.

As ondas oceânicas podem ser criadas por uma série de fatores

como a atração gravitacional, a atividade submarina e a pressão

atmosférica, mas sua origem mais comum é o vento. Apesar de existir

inúmeras variantes de aproveitamento da energia das ondas, a maioria

usa o mesmo princípio onde a onda pressiona um corpo oco,

comprimindo o ar ou um líquido que move uma turbina ligada a um

gerador. A desvantagem de se utilizar este processo na obtenção de

energia é que o fornecimento não é contínuo e apresenta baixo

rendimento.

As correntes marítimas são deslocamentos de massas de água

oceânicas geradas pela inércia de rotação do planeta e pelos ventos, que

se movimentam por todos os oceanos do mundo. As correntes são como

rios oceânicos que transportam grande quantidade de água. O

aproveitamento é feito com turbinas semelhantes às turbinas eólicas. A

utilização de turbinas para aproveitar tanto o deslocamento das correntes

marítimas quanto o fluxo das marés (sem a necessidade de construir

barragens) está sendo considerado pelos especialistas como a fonte mais

promissora de energia proveniente do mar O custo da geração de

energia através de turbinas em locais propícios (Escócia, por exemplo) é

próximo do custo de geração da energia eólica, com a vantagem de os

fluxos oceânicos serem mais constantes e previsíveis que os ventos.

Veja a figura da turbina marinha45

:

45

Fonte: www.marineturbines.com

10.5 Carro a Hidrogênio

O uso do hidrogênio como combustível em carros apresenta

teoricamente vantagens interessantes em relação aos combustíveis

fósseis. O hidrogênio é o mais simples e mais comum elemento do

Universo, sendo ilimitado e renovável. A queima de hidrogênio gera

energia mecânica para movimentar os carros sem emitir poluentes e um

determinado volume de hidrogênio líquido pesa menos do que um

volume semelhante de gasolina e produz quase três vezes mais potência.

Um combustível limpo, ilimitado, leve e eficiente energeticamente

poderia ser considerado perfeito. No entanto, o hidrogênio não é uma

fonte de energia como os combustíveis fósseis. O hidrogênio gasoso

puro raramente ocorre na natureza, pois ele é um elemento químico

muito reativo e está sempre procurando outro elemento para se

combinar. Como não existe nenhuma reserva de hidrogênio puro no

planeta, ele deve ser extraído de outros compostos se tiver o propósito

de ser usado como uma fonte de combustível. Nesse processo de

extração há um consumo considerável de energia. Então é necessária

uma fonte de energia primária que pode ser limpa (eólica, solar, etc) ou

emissora de CO2. Já os combustíveis fósseis, são encontrados na

natureza prontos para serem queimados no caso do gás natural ou

necessitando apenas de refino no caso dos derivados de petróleo. Na

prática, o hidrogênio combustível exerce um papel semelhante às

baterias nos carros elétricos, acumulando energia proveniente de uma

fonte primária de energia.

As duas principais formas de obtenção de hidrogênio

combustível são a eletrólise da água e o uso de combustíveis fósseis. Na

eletrólise a corrente elétrica é passada através da água para quebrá-la em

hidrogênio e oxigênio. A reação é a seguinte:

2H2O + eletricidade --> 2H2 + O2.

O hidrogênio produzido na reação é usado como combustível.

Na queima do hidrogênio para movimentar o carro, ocorre a reação

reversa. O hidrogênio reage com o oxigênio, gerando energia elétrica,

energia térmica (calor) e água. A energia elétrica move o carro e o único

subproduto do motor é vapor de água, configurando uma queima limpa.

Veja a reação química:

2H2 + O2 --> 2 H2O + energia

Também é possível obter hidrogênio através do uso de

combustíveis fósseis. O petróleo e o gás natural contêm

hidrocarbonetos, moléculas formadas por hidrogênio e carbono.

Utilizando-se um dispositivo chamado reformador, ocorre-se a

separação do hidrogênio do carbono de um hidrocarboneto. O carbono

que sobra do reformador é lançado na atmosfera como dióxido de

carbono e o hidrogênio é posteriormente utilizado como combustível

gerando vapor de água como subproduto. Essa forma de obtenção de

hidrogênio não é considerada ambientalmente correta devido a emissão

de CO2.

A produção de hidrogênio via eletrólise é a única considerada

viável ambientalmente, mas assim como os carros elétricos se faz

necessário que a fonte primária que gerou a energia elétrica seja uma

fonte não poluente. Precisa-se gerar energia elétrica através de usinas

solares ou eólicas, por exemplo. Outros problemas são as dificuldades

de transporte e armazenamento do hidrogênio. A construção de postos

de abastecimento de hidrogênio é extremamente cara, assim como o

custo dos tanques de combustível nos carros. Isso se deve as

características do hidrogênio. Além de inflamável, o hidrogênio gasoso

e mais leve e mais volumoso que o ar atmosférico, sendo que 1 grama

de hidrogênio ocupa 10 vezes o espaço de 1 grama de ar atmosférico.

Para não se construir um reservatório de abastecimento muito grande se

faz necessário armazenar o hidrogênio gasoso a uma altíssima pressão.

Por isso o reservatório de combustível tem que ser muito resistente,

tornando-se conseqüentemente caro. Uma alternativa é armazenar o

hidrogênio no estado líquido, que ocupa 700 vezes menos espaço do que

o hidrogênio gasoso, mas ele tem que ser armazenado numa temperatura

de -253 graus centígrados para conservar o estado líquido. Essas

temperaturas criogênicas também exigem tanques de combustível caros.

A solução mais promissora é o armazenamento sólido, no qual o

hidrogênio passa a fazer parte da estrutura atômica de um material,

sendo liberado aos poucos, na medida necessária para alimentar o

veículo. Já existem materiais especiais construídos que chegam a reter

10% do seu peso em hidrogênio.

O hidrogênio tem sido apresentado na mídia para o grande

público como o combustível do futuro, que abastece foguetes espaciais e

lança apenas água para a atmosfera. No entanto, ainda há a necessidade

de avanços tecnológicos imensos para que a produção do hidrogênio se

torne barata e possa ser usada em massa no setor de transportes. Os

carros elétricos e suas baterias são uma opção muito mais barata que o

carro a hidrogênio na atualidade e provavelmente continuarão sendo

também nas próximas décadas.

10.6 Carro elétrico

O carro elétrico é movido por um motor elétrico abastecido por

baterias. Como foi citado no capítulo 2, o carro elétrico tem uma

eficiência de 65% na conversão de energia contra 20% do carro a

gasolina, pois o motor a gasolina desperdiça mais energia na forma de

calor. Por esse motivo se gasta menos dinheiro com energia elétrica num

carro elétrico do que com combustível num carro a gasolina. No

entanto, 50 quilos de gasolina têm muito mais densidade energética do

que 50 quilos de bateria, ou seja, armazena muito mais energia com o

mesmo peso. Então a autonomia do carro elétrico, a quantidade de

quilômetros que o carro anda com tanque cheio, é bem menor do que a

do carro a gasolina. Outro problema é a recarga demorada do carro

elétrico. Enquanto um carro a gasolina é reabastecido em 3 minutos, um

carro elétrico demora horas para recarregar as baterias. Temos portanto

dois gargalos na tecnologia do carro elétrico: a baixa autonomia e a

recarga demorada.

Nos últimos anos tem ocorrido uma corrida tecnológica para se

obter baterias mais leves e baratas, que aumentariam a autonomia dos

carros elétricos e diminuiriam os custos. Os aperfeiçoamentos

tecnológicos obtidos na diminuição do peso das baterias dos carros

híbridos, que já são produzidos comercialmente, estão sendo

transferidos para a tecnologia do carro elétrico. Eles têm tornado o carro

elétrico próximo da viabilidade comercial. A autonomia dos novos

carros elétricos já aumentou bastante, mas ainda persiste o problema da

recarga demorada. O engenheiro Shai Agassi, em parceria com o

governo de Israel, tem desenvolvido um projeto revolucionário para

resolver o problema da recarga demorada. A idéia é criar 500 mil postos

de recargas convencionais de baterias no país, em lugares públicos

como estacionamentos, e criar 200 pontos onde se poderão trocar as

baterias descarregadas por outras previamente carregadas nos postos46

.

46 O site do projeto é: http://www.betterplace.com/

Ao invés de horas de recarga convencional, a troca de baterias demorará

poucos minutos. O governo de Israel pretende implantar o sistema em

2011. Críticos afirmam que o projeto é viável em Israel, por se tratar de

um país pequeno com pouco mais de 20 mil km² de extensão e muito

povoado, mas num país com baixa densidade populacional, é inviável

manter economicamente uma rede tão grande de abastecimento com

uma distância pequena de um ponto de abastecimento para outro. Outra

forma de resolver o problema da autonomia seria o abastecimento de

energia sem fio, chamado de witrycity. A tecnologia ainda está em fase

de desenvolvimento, mas no futuro poderemos ter carros elétricos com

pequenas baterias, que são abastecidos por pontos nas ruas e rodovias,

que enviariam energia sem necessidade de fios para uma antena do carro

enquanto ele está em movimento.

Provavelmente nas próximas décadas, com a escassez do

petróleo e com novas tecnologias, o carro elétrico se tornará viável e

terá participação importante no fornecimento energético do setor de

transportes. Mas para que o carro elétrico seja limpo ambientalmente, é

necessário saber se a fonte primária que produz energia para abastecer a

rede elétrica emite CO2 ou não. A geração de energia elétrica precisa vir

de fontes renováveis e limpas como a energia solar ou eólica, ou de

usinas com fontes fósseis que tenham o CO2 emitido seqüestrado

geologicamente.

10.7 Energia nuclear e energia hidrelétrica

Além das 6 tecnologias alternativas mais promissoras citadas

acima, ainda temos as tradicionais energia nuclear e energia hidrelétrica,

que representam 15,2% e 16% respectivamente da geração de energia

elétrica mundial, segundo a Agência Mundial de Energia (AIE). Essas

duas fontes praticamente não emitem CO2, mais pairam sobre elas

outros problemas ambientais. As usinas hidrelétricas barram rios e criam

grandes lagos artificiais que inundam imensas áreas de florestas e

obrigam milhares de famílias a desocuparem as suas moradias. As

usinas que usam a fissão nuclear apresentam riscos relacionados aos

vazamentos de radioatividade nas usinas ou ao armazenamento dos

rejeitos nucleares, que podem provocar danos à saúde humana. Diante

dos riscos a sobrevivência humana que o aquecimento global pode

representar, parece razoável continuar aumentando a participação dessas

duas fontes de energia, desde que precauções necessárias sejam

tomadas.

As usinas hidrelétricas devem ser construídas com lagos

artificiais menores e também se deve incentivar a construção de

pequenas centrais hidrelétricas, que provocam menos danos ambientais

que as grandes usinas e produzem energia com um preço competitivo.

Como foi citado no capítulo 8, o Brasil (terceiro maior potencial

hidrelétrico do mundo) apresenta a maior parte do potencial não

explorado na Amazônia. A construção de usinas hidrelétricas tem sido

muito criticada na região devido a morte de espécies de plantas e

animais pelos lagos artificiais numa região com uma biodiversidade tão

rica. No entanto, as novas hidrelétricas construídas na região são usinas

fios d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina

de Jirau, que será construída no rio Madeira, alagará 0,08 km² alagado

por cada MW gerado, a média nacional das usinas existentes é de 0,57

km² alagado por cada MW gerado. No caso brasileiro, apenas 25% do

potencial hidrelétrico de 260 gigawatts está sendo aproveitado, enquanto

no mundo o aproveitamento é de 33% do potencial hidrelétrico. Uma

parte do potencial hidrelétrico mundial esbarra nos altos custos e nos

danos ambientais, mas tanto o Brasil quanto o mundo podem no mínimo

dobrar a geração de energia elétrica proveniente das hidrelétricas com

viabilidade econômica e com danos ambientais moderados, como o

exemplo da usina de Jirau.

A geração de energia nuclear tradicional a partir da fissão dos

átomos, explicada no capítulo 3 deste livro, deve ser incentivada nos

países que já dominam a tecnologia nuclear para fins pacíficos, que

representam a maioria absoluta da economia mundial. Uma expansão de

geração de energia elétrica através da fonte nuclear em novos países

poderia incentivar o aumento do número de países que dominam a

tecnologia da bomba atômica e criar perigos desnecessários a segurança

global. Apesar das críticas, a energia nuclear tem gerado uma fatia

significativa da energia elétrica mundial a um custo competitivo, com

poucos acidentes com morte nos últimos 50 anos. A França, país com a

6º economia do mundo, gera 75% da sua energia elétrica através da

fonte nuclear, com danos ambientais mínimos. Evidentemente que o

passivo ambiental dos rejeitos nucleares, que poderão representar um

risco ambiental por milhares de anos, deve ser considerado, mas isso

não torna a energia nuclear inviável ambientalmente.

A energia hidrelétrica e a energia nuclear podem ser importantes

na transição da matriz energética fóssil para as fontes alternativas

renováveis. As usinas das duas fontes energéticas, quando bem

planejadas, geram danos ambientais moderados muito menores do que

os causados pelos combustíveis fósseis. Os danos provocados a saúde

humana pelos fósseis diminuirão nas próximas décadas com a

massificação dos catalisadores e com os testes para detectar a emissão

de gases venenosos nos automóveis e nas indústrias cada vez mais

freqüentes, mas o problema do aquecimento global provocado pelo CO2

persiste. O ideal é que uma parte das usinas de carvão e gás natural

geradoras de energia elétrica seja substituída por usinas com seqüestro

geológico de carbono, e que outra parte seja gradativamente substituída

tanto pelas usinas nucleares e usinas hidrelétricas, com danos ambientais

moderados e custos baixos, quanto por fontes alternativas renováveis,

100% limpas e com um custo um pouco mais alto. A participação da

energia hidrelétrica e da energia nuclear, que representam juntas 31,2%

da geração de energia elétrica atual, poderá aumentar ainda mais nas

próximas décadas.

Capítulo 11: Eficiência Energética

O aumento da eficiência energética busca diminuir o gasto de

energia na produção de bens e serviços. No cenário atual de

aquecimento global, a lógica é que se mantivermos o nosso padrão de

vida consumindo menos energia, estaremos conseqüentemente emitindo

menos CO2. O IPCC de 2007 estimou que a eficiência energética seja o

setor com maior potencial de redução de emissões de CO2 até 2050. Há

100 atrás a humanidade tinha poucos recursos tecnológicos e recursos

naturais abundantes, o que tornava a lógica da eficiência energética

inviável. Na atualidade, diante do consumo desenfreado de recursos,

temos um mundo com recursos naturais limitados como alimentos, água

e energia, e por outro lado tecnologia capaz de gerar conforto com a

utilização de poucos recursos naturais. Esse cenário estimula a busca

por soluções que economizem energia, pois se os recursos energéticos

naturais são escassos, ou no mínimo de difícil extração, eles

conseqüentemente são caros. O aquecimento global provocado pelas

emissões de CO2 da matriz energética torna o aumento da eficiência

energética mais importante ainda.

O maior símbolo da defesa da eficiência energética contra as

emissões de CO2 é o cientista americano Amory Lovins. Ele faz da sua

casa, localizada a 2000 metros de altitude nos vales rochosos no estado

do Colorado, um exemplo de como é possível viver com conforto,

mesmo com pouco gasto energético. Em pleno inverno, onde a

temperatura da região cai para 40 graus negativos, a sua casa consome o

mínimo possível de energia. Ele utiliza arquitetura bioclimática para

isolar termicamente a residência do ambiente externo e cultiva plantas

tropicais em estufas, além de fazer uso de energias alternativas. Lovins é

presidente e fundador do Rocky Mountain Institute47

, uma fundação que

defende o uso da eficiência energética como solução para o aquecimento

global.

Os ganhos de eficiência energética são possíveis em todos os

tipos de produtos e construções. A grande questão é saber se os preços

mais altos de instalação inicial dos produtos eficientes serão

compensados por ganhos maiores na redução de gastos com energia no

futuro. Também é importante que o conforto obtido com o produto

47 Site: www.rmi.org

tradicional seja igual ao obtido com o produto eficiente

energeticamente. O consumidor quer saber se o ar-condicionado de

baixo consumo gela tão bem quanto o de alto consumo, por exemplo.

Existem inúmeros setores produtivos que poderiam se tornar mais

eficientes com incentivos governamentais. Muitas vezes os

consumidores preferem produtos mais baratos e ineficientes

energeticamente devido ao investimento inicial menor, mas acabam

pagando 3, 4 vezes mais energia durante a vida útil do produto e acabam

perdendo dinheiro devido ao imediatismo. Se os governos diminuírem

os impostos sobre os produtos eficientes e os tornarem tão baratos

quanto os tradicionais, o consumidor escolherá sempre o produto mais

eficiente. O valor perdido com os impostos será varias vezes

compensado pelos ganhos obtidos com a redução de gastos com energia

para a população. Além do benefício econômico para a sociedade,

teremos o benefício ambiental de emitir menos gases estufa. Outra

forma de incentivo governamental é a implantação legal de um nível

máximo de consumo de energia para os produtos fabricados no país.

A Consultoria McKinsey estima em 14 bilhões de toneladas de

CO2 equivalente o potencial de redução das emissões através das

iniciativas de aumento da eficiência energética em 2030. Sempre se

salienta que esse potencial é um acréscimo ao caso base. Mesmo no

cenário onde não haja incentivos econômicos para combater o

aquecimento global (caso base) haverá ganhos de eficiência energética

entre 2011 e 2030. O potencial da eficiência energética é maior do que o

setor de carbono terrestre e do que o potencial do setor de fontes

energéticas limpas. Ele corresponde a aproximadamente 37% do

potencial de abatimento de 38 bilhões de toneladas previsto pela

consultoria. A maioria absoluta das iniciativas tem custo líquido

negativo. Podemos afirmar que a implementação das iniciativas de

eficiência energética aumentará o crescimento econômico dos países no

longo prazo. No entanto as iniciativas necessitam de grandes

investimentos iniciais. Esses altos investimentos são plenamente viáveis

diante dos benefícios econômicos que a economia de energia gerará.

A fim de facilitar a análise sobre as principais oportunidades de

aumento da eficiência energética haverá uma divisão em quatro

categorias: construção de edificações sustentáveis, uso de aparelhos

elétricos e luminárias de baixo consumo, produção de veículos de

baixo consumo de combustível e fabricação de produtos industriais

com diminuição do consumo de energia. A seguir temos as categorias

a serem analisadas:

11.1 Construções de edificações sustentáveis

As construções sustentáveis buscam reduzir os impactos

ambientais tanto no momento de construção dos edifícios residenciais e

comerciais, quanto no momento de uso deles (vida útil). O maior

impacto ambiental são as emissões de CO2 provocadas pelo consumo de

energia nesses dois momentos, que podem ser reduzidas principalmente

pelo aumento da eficiência energética. Se considerarmos as emissões de

gases estufa nos 2 momentos(construção e utilização dos edifícios), elas

chegam a 40% das emissões mundiais totais de 49 bilhões de toneladas

de CO2 equivalente48

.

No momento da construção, o cimento é o principal responsável

pelas emissões de CO2. Cada 1 tonelada de cimento gera

aproximadamente 1 tonelada de CO2. O cimento é constituído de 95%

de clínquer e 5% de gipsita. A produção do clínquer é a grande fonte

emissora da produção. O calcário é a matéria-prima principal do

clínquer, representando aproximadamente 80% da mistura rochosa que é

complementada com argila e ferro. Na produção do clínquer ocorre a

calcinação do calcário (carbonato de cálcio). O processo de aquecimento

do calcário demanda a queima de combustíveis, o que gera CO2.

Quando o calcário (CaCO3) é calcinado e se transforma em óxido de

cálcio (OCa) a reação química também produz CO2. Então temos a

produção de CO2 através dessas duas formas. Muitas pesquisas têm sido

desenvolvidas com o objetivo de reduzir a participação do clínquer no

cimento, produzindo a mesma quantidade de cimento demandando

menos energia, um típico aumento de eficiência energética. Materiais

como cinzas das centrais termelétricas, cinzas do bagaço da cana-de-

açúcar, casca de arroz e resíduos da indústria de cerâmicas, podem

substituir até 40% do clínquer usado no cimento. O cimento é o

elemento ligante do concreto, a substância mais usada pela sociedade

global nas construções. Uma forma de diminuir a demanda por cimento

48 Tanto no IPCC 2007 quanto no relatório da McKinsey, as emissões das

edificações lançadas pela fabricação dos materiais utilizados nas

construções foram classificadas como emissões do setor industrial.

nas construções é reciclar o concreto presente em demolições ou restos

de obras.

Outro importante emissor de CO2 é o tijolo tradicional de argila,

que é queimado para ser produzido. Uma alternativa é o tijolo de solo-

cimento que é produzido sem queima. Se mistura 1 parte de cimento

com 12 partes de solo, composto de areia e argila, e posteriormente a

mistura é prensada. Quando se faz o assentamento do tijolo de solo-

cimento, ao invés de usar a argamassa tradicional com cimento na

composição, se utiliza uma cola especial. A utilização de madeira

proveniente de extração de baixo impacto ou de reflorestamento

também constitui uma alternativa interessante nas construções

sustentáveis, pois quando as árvores cortadas crescem novamente,

voltando a seqüestrar CO2.

No momento da construção também se planeja formas de se

diminuir a necessidade de iluminação ou climatização durante a via útil

da edificação, a fim de se economizar energia. O planejamento inclui a

escolha dos materiais e da arquitetura do edifício. Os principais

responsáveis pelo consumo de energia e pelas emissões de gases estufa

nas edificações no momento de uso estão no gráfico49

:

49

O gráfico pode ser encontrado no link:

http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo

my.asp

Nesse gráfico a McKinsey incluiu as emissões indiretas das edificações (ex.

consumo de energia elétrica).

A climatização e a iluminação são as utilidades que apresentam o

maior potencial de redução de consumo através de uma construção

planejada para se tornar eficiente energeticamente. O aquecimento de

água tem como melhor opção o uso de uma fonte de energia renovável,

o aquecedor solar, e os aparelhos elétricos (televisão, computadores)

não dependem diretamente da construção para serem eficientes, por isso

os aparelhos serão comentados no ítem 11.2 .

A iluminação responde por importantes 15% de emissões de

gases estufa nas edificações. Elementos como paredes internas claras e

uma arquitetura que facilite a entrada da luz solar, aumentam a

quantidade de horas sem necessidade de luz artificial em residências e

diminuem a necessidade de luz artificial durante o dia nos escritórios

comerciais. Numa região fria, onde se precisa de iluminação e calor ao

mesmo tempo, janelas transparentes no teto das residências permitem a

entrada de luz e criam um efeito estufa interno, apresentando duas

utilidades. Em regiões quentes, a solução não é recomendada, pois

enquanto se aumenta a luminosidade, aumenta-se mais ainda o

indesejável calor. Uma solução para as regiões quentes são os Domus

Prismáticos. Eles são compostos de milhares de micro prismas,

localizados nos tetos das construções, que fragmentam a luz em micro

raios, direcionando-os em todo ambiente interno e gerando um leve e

agradável brilho natural de luz. Além disso, cerca de 75% do calor

transmitido pelos raios infravermelhos, o espectro de luz responsável

pela transmissão do calor, volta para atmosfera, mantendo-se o ambiente

interno com uma temperatura agradável. O aumento da iluminação

natural estimula favoravelmente o relógio biológico humano,

aumentando a produtividade no trabalho.

A manutenção da temperatura interna (climatização) nas

edificações constitui a principal forma de reduzir gastos com energia. A

busca principal é o isolamento térmico da construção, evitando a

transmissão do calor em locais quentes e a transmissão do frio em locais

gelados. Dessa forma evitam-se gastos de energia com a calefação ou

com a refrigeração do ambiente. Projetos de isolamento térmico podem

reduzir drasticamente a perda de calor e ajudar a deter as mudanças

climáticas. A demanda de energia para aquecimento nos prédios

existentes pode ser reduzida de 30% a 50%, em média. Em prédios

novos, a demanda de energia para aquecimento pode ser reduzida de

90% a 95%, usando-se tecnologia e projetos amplamente disponíveis e

competitivos50

. Nas regiões frias as casas devem ser construídas sobre

pedras para se proteger do frio que vem do solo e precisam de paredes

grossas para isolar termicamente do frio externo do ar. Nas regiões

quentes as construções devem facilitar a entrada de ventilação, ser

pintadas externamente com cores claras para refletir a luz solar e

principalmente apresentarem um telhado que impeça a passagem do

calor para o interior da residência ou edifício comercial. O alumínio é

um excelente refletor da luz solar e conseqüentemente um excelente

isolador térmico. Ele é usado em forma de telhas de alumínio ou em

forma de folhas finas que cobrem as telhas convencionais. Outra

maneira de combater o calor nos telhados é o resfriamento evaporativo,

onde se utiliza uma irrigação periódica com água fria no telhado. A água

fria retira o calor do telhado, evaporando em seguida. O telhado diminui

de temperatura e transfere menos calor para o interior da edificação. Os

50 Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf

telhados verdes também representam uma alternativa interessante de

climatização de casas ou edifícios. Eles constituídos de uma cobertura

de grama ou de um jardim e são usados a milhares de anos, tornando a

temperatura amena em locais quentes. Veja a imagem51

:

A vegetação absolve menos calor do que os telhados

convencionais, e parte da pequena energia absolvida é perdida através

do processo de evaporação da água da planta. O uso coletivo de telhados

verdes pode potencializar economia de energia e bem-estar climático

numa cidade inteira. Em cidades como Teresina, na região Nordeste do

Brasil, onde a qualidade de vida é muito prejudicada pelo calor, o

incentivo governamental ao uso de telhados verdes teria grande sucesso.

Um exemplo prático da importância dos vegetais são as diferenças de

temperatura de até 6,0 C° entre áreas distintas das grandes cidades

tropicais. Enquanto regiões ricas, cheias de jardins, apresentam

temperaturas mais amenas, as regiões mais pobres, sem áreas verdes,

apresentam temperaturas mais altas.

51

A imagem está no site: www.ecotelhado.com.br

11.2 Fabricação de aparelhos elétricos e luminárias de baixo

consumo

Os aparelhos elétricos e a iluminação são responsáveis juntos por

35% das emissões de gases estufa nas edificações. No caso da

iluminação uma construção bem planejada diminui a sua demanda,

como vimos no ítem 11.1, mas não exclui a necessidade de iluminação

mesmo que em menor intensidade. Nesse caso a alternativa para

diminuir mais ainda o gasto de energia com iluminação é o uso de

luminárias de baixo consumo.

A forma mais simples de aumentar a eficiência energética em

aparelhos elétricos e eletrônicos é a imposição de marcos regulatórios

fortes pelos governos. Os padrões de eficiência energética que são

classificados como "A" pelas agências reguladoras devem mudar

freqüentemente. Como em quase todas as iniciativas de aumento de

eficiência energética, um aumento no custo de aparelhos elétricos

através da imposição de exigentes padrões de eficiência gerará uma

economia de dinheiro várias vezes maior durante a vida útil do

equipamento através da economia de energia. Essas exigências corrigem

as compras inadequadas dos consumidores, que muitas vezes escolhem

aparelhos elétricos ineficientes mirando de forma míope apenas o preço

de venda do produto. O uso da energia por utensílios domésticos como

máquinas de lavar roupas, lava-louças, TVs e refrigeradores pode ser

reduzido em 30% usando as melhores opções disponíveis no mercado, e

em 80% com tecnologias avançadas. O uso da energia por aparelhos

elétricos de escritório pode ser reduzido entre 50% a 75% através de

uma combinação de gestão energética e sistemas de computação

eficientes52

.

O aumento de funcionalidades desnecessárias nos aparelhos

elétricos também tem incentivado o consumo ineficiente de energia nos

últimos anos. As indústrias têm aumentado a fabricação dos aparelhos

elétricos que consomem energia mesmo quando estão desligados, no

modo conhecido como standby. O modo standby mantém recursos

desnecessários nos aparelhos eletrônicos como a marcação da hora. O

consumo de energia no modo standby é baixo, mas como ocorre 24

horas por dia pode representar um consumo total de energia maior do

52

Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf

que o consumo ocorrido pelo uso do aparelho. A Agência Internacional

de Energia estima que o modo standby pode ser responsável por 1% das

emissões mundiais de gases estufa, o que eqüivale as emissões de toda a

indústria da aviação53

. Em 1999, a AIE lançou a “iniciativa do watt

único”, a fim de incentivar fabricantes a limitar o modo standby a um

watt ou menos.

Na iluminação os ganhos de eficiência energética passam pela

substituição das lâmpadas incandescentes e fluorescentes por LEDs. Os

LEDS são materiais semicondutores semelhantes aos usados nos chips

de computador, que emitem luz quando percorridos por uma corrente

elétrica. As lâmpadas incandescentes apresentam a pior eficiência

energética, mas ainda representam uma fatia importante no uso de

luminárias. No Brasil, por exemplo, 50% das lâmpadas utilizadas ainda

são incandescentes. As lâmpadas incandescentes apresentam uma

capacidade luminosa de apenas 12 lumens por watt. As lâmpadas

fluorescentes fluorescentes são 5 vezes mais econômicas do que as

lâmpadas incandescentes, apresentando uma capacidade luminosa de 60

lumens por watt. Substituir todas as lâmpadas incandescentes do mundo

por lâmpadas fluorescentes reduziria o consumo mundial de eletricidade

em 12%. As lâmpadas fluorescentes têm uma vida útil 10 vezes superior

às incandescentes. No entanto a melhor solução é a substituição de todas

as lâmpadas incandescentes e fluorescentes pelos LEDs. As lâmpadas

com LED são mais econômicas do que as fluorescentes e apresentam

maior vida útil, possuindo uma extraordinária capacidade de 150 lumens

por watt. Elas são mais caras do que as fluorescentes, mais vêm

diminuindo de preço nos últimos anos e vem sendo utilizadas de modo

crescente nas residências. No longo prazo as lâmpadas com LED

possuem um custo líquido muito menor do que as lâmpadas

fluorescentes. Por ultimo ainda há o potencial de diminuição da energia

gasta com iluminação através do uso em massa de sistemas inteligentes

como o sensor de presença. A iluminação de um corredor num prédio

comercial, por exemplo, só é acionada quando o sensor detecta a

presença de uma pessoa.

53 Fonte: www.iea.org/textbase/papers/2005/standby_fact.pdf

11.3 Fabricação de veículos com baixo consumo de

combustível

No capítulo 10 foram citadas formas importantes de diminuição

de emissões nos veículos como o uso de carros movidos a

biocombustíveis e como o uso de carros elétricos que utilizam energias

limpas como fontes primárias. Quanto ao aumento da eficiência

energética em veículos, o assunto a ser tratado neste item, as

oportunidades se referem às tecnologias que tornam os carros mais

econômicos. A fabricação de veículos mais eficientes diminuirá as

emissões de CO2 para a atmosfera através do menor consumo de

combustível fóssil. O transporte rodoviário é responsável por 71% das

emissões de gases estufa no setor de transportes, contribuindo com 5

bilhões de toneladas de CO2 equivalente emitidas anualmente. Os

automóveis atuais consomem a metade do que os automóveis similares

de 30 anos atrás consumiam. O problema é que o mundo está mais rico

e comprando automóveis muito maiores e confortáveis. Isso anulou os

ganhos de diminuição de consumo, fazendo com que os carros atuais

tenham um consumo médio similar aos de 30 anos atrás. De olho nisso

os governos do mundo estão criando metas de consumo médio de

combustível para a frota inteira das montadoras.

As tecnologias de redução de consumo nos veículos se aplicam

tanto ao trem de força dos veículos quanto à estrutura física. O trem de

força dos veículos pode ser mais eficiente através de ganhos técnicos

nos motores e nas caixas de transmissão dos veículos. No entanto a

forma de se conseguir os maiores ganhos de economia de combustível é

a implantação de uma propulsão adicional elétrica ao trem de força

movido a gasolina ou a diesel. O carro híbrido tem um motor a gasolina

e outro elétrico. O motor elétrico aproveita parte da energia

desperdiçada pelo motor a gasolina (ex: energia dos freios) e armazena

essa energia numa bateria. Quando o carro está parado num sinal ele

funciona exclusivamente como o motor elétrico, o que evita consumo de

combustível, e quando se movimenta os dois motores podem funcionar

simultaneamente. O carro híbrido básico tem uma redução de consumo

apenas com a ajuda da eficiência energética. Não se utiliza energia

elétrica externa, não precisando portanto de uma estrutura de

abastecimento de energia elétrica complementar. Qualquer local do

mundo está preparado para receber os carros híbridos. Um carro híbrido

é entre 25% e 50% mais econômico que um carro comum. Um Toyota

Prius, por exemplo, é capaz de fazer 25 km/l na cidade, enquanto um

carro do mesmo padrão faz 12km/l. Os avanços tecnológicos devem

tornar a diferença de custos em relação aos carros comuns bem menor e

tornar a obrigatoriedade de fabricação dos carros híbridos menos

onerosa para o consumidor. Evidentemente que os custos adicionais na

aquisição dos carros híbridos serão compensados com gastos menores

com combustível.

Com a massificação dos carros híbridos, os automóveis

fabricados em 2030 poderão ter um consumo médio de 25 km/l. Com a

inclusão de melhoras na estrutura física dos veículos que aumentam a

eficiência energética, como a diminuição do peso e a melhora

aerodinâmica dos veículos, os carros poderão fazer 30 km/l.

Basicamente, os carros gastam energia através das perdas por atrito,

influenciadas pelo peso, e através da resistência do ar. O peso do veículo

pode ser diminuído com o uso de materiais mais leves. Uma diminuição

de peso dos veículos gera uma grande economia de combustível. O uso

do aluminío na carroceria e nas peças torna os carros mais leves e

resistentes. Enquanto o típico carro americano tinha 40 quilos de

alumínio em 1974, em 2006, ele tinha em média 160 quilos. O alumínio

é muito caro, principalmente por exigir muita energia na fabricação.

Esse gasto energético inicial, gerará uma redução de consumo de

energia muito maior durante a vida útil do veículo. Uma alternativa é

reciclar o aluminío, que gasta apenas 10% da energia usada na

fabricação para ser reciclado porque envolve o derretimento do metal ao

invés do processo tradicional de redução eletroquímica. Não é por acaso

que em todo mundo as latinhas de refrigerante e cerveja compostas de

alumínio lideram os índices de reciclagem. O incentivo governamental a

um forte aumento do uso de alumínio nos carros ajudará o atendimento

da meta de se fabricar carros que façam 30 km/l em 2030. Com o passar

dos anos, os carros feitos de alumínio que acabarem a vida útil, terão o

seu alumínio reciclado, diminuindo os custos de fabricação dos carros

novos e gerando um ciclo virtuoso. Algumas empresas estão mirando

mais a frente, adaptando materiais da era espacial super leves ao invés

de focarem em materiais leves convencionais como o alumínio. Entre

esses materiais super leves se destaca o produzido pela empresa

Fiberforge54

. Ela fabrica compostos de termoplástico avançado

reforçado com fibra de vidro ou carbono. Outra forma de diminuição de

54

http://www.fiberforge.com/

consumo é a fabricação de carros com melhor coeficiente aerodinâmico,

afim de que se diminua a resistência do ar. Os governos devem exigir

níveis mínimos de coeficientes aerodinâmicos para cada categoria de

carros novos. Um exemplo de veículo super eficiente eficiente é o

Loremo, carro fabricado pela empresa do mesmo nome. Ele faz 67

quilômetros com 1 litro de combustível e é um carro tão funcional

quanto um automóvel comum do seu porte, transportando 4 pessoas55

. O

carro é feito com materiais leves e pesa apenas 450 kilos, além de

apresentar um excelente coeficiente aerodinâmico de 0,20. O motor é

movido a diesel e o carro chega a 160km/h de velocidade máxima. Veja

a foto do Loremo:

Nos próximos 20 anos se prevê um aumento proporcionalmente

maior nas emissões do setor de transportes em relação aos outros setores

econômicos devido a previsão de aumento de quase 100% na quantidade

de veículos no mundo. Construir veículos mais eficientes juntamente

com o aumento da participação de fontes limpas como os

biocombustíveis evitará que essa explosão de emissões ocorra.

55 O site da empresa é: www.loremo.com

11.4 Fabricação dos produtos industriais com diminuição do

consumo de energia

Os processos industriais geram emissões diretas e indiretas. As

emissões diretas ocorrem na própria planta industrial (ex. produção de

ferro gusa com a queima de carvão) e as emissões indiretas ocorrem

essencialmente através do consumo de energia elétrica na indústria,

sendo a produção da energia numa usina termelétrica externa. Nas

emissões indiretas através do consumo de energia elétrica, inúmeros

ganhos de eficiência energética têm ocorrido, principalmente com a

ajuda da informatização das fábricas. Um exemplo desse aumento de

eficiência é o uso de motores de alto rendimento com controle

eletrônico de partida, velocidade e freqüência. Aproximadamente 65%

do consumo de eletricidade industrial destina-se a impulsionar sistemas

de motores elétricos56

em máquinas como bombas, compressores e

ventiladores. Um motor que opera de modo contínuo e flexível em

velocidades relativamente baixas usa muito menos energia do que um

motor que liga e desliga em uma velocidade muito alta57

. No entanto,

esses ganhos não avançam mais rapidamente devido a grande vida útil

(superior a 30 anos) de aparelhos obsoletos energeticamente, mas que a

substituição custa caro. Existem caldeiras funcionando há mais de 50

anos e motores há mais de 30 anos. Substituir equipamentos significa, às

vezes, alterar todo o projeto de um processo ou de uma planta industrial.

Isso implica em investimentos com um tempo de retorno financeiro

longo. As grandes indústrias normalmente apresentam capital aberto e

alegam que os investimentos dependem dos acionistas. A melhor forma

de se obter ganhos cada vez maiores de eficiência energética na

indústria é a imposição de marcos regulatórios pelos governos que

estabeleçam consumos de energia cada vez menores na fabricação dos

produtos juntamente com incentivos financeiros governamentais para

mudanças estruturais nas indústrias.

A diminuição das emissões diretas dos processos industriais

através do aumento da eficiência energética tem grande potencial de

implementação. Os setores industriais que apresentam as maiores

56

Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf

57 Gabrielle Walker e Sir David King.Como combater o aquecimento global e

manter as luzes acesas. Página 110, 2008

emissões são os setores químico, siderúrgico e petrolífero. O setor

cimenteiro também poderia ser incluído grupo, mas resolvi explicá-lo no

ítem 11.1 (Construções de edificações sustentáveis), por estar

intimamente associado às edificações. A maioria das iniciativas se refere

a processos técnicos específicos de cada indústria, mas existem

alternativas que se aplicam as 3 principais indústrias como a

manutenção preventiva de equipamentos, a otimização de processos de

gestão e logística e a co-geração. Na co-geração o calor gerado pelos

gases de um forno siderúrgico, por exemplo, é reaproveitado para gerar

energia elétrica. Essa energia elétrica pode abastecer a própria indústria

ou pode ser vendida para um consumidor externo. Uma fonte de calor é

usada eficientemente para duas funções ao invés de uma só. Quanto à

diminuição de emissões diretas através da melhoria dos processos

específicos de cada indústria podemos citar:

a) Indústria química – Otimização de catalisadores. Os catalisadores são

aquelas substâncias que aceleram a velocidade das reações químicas. O

aumento da velocidade das reações diminui a necessidade da queima de

combustíveis fósseis;

b) Indústria petrolífera – redução do “flaring”. O “flaring” é a queima

de gás natural em poços de petróleo. Quando o petróleo bruto é trazido à

superfície, vem com ele também o gás natural. Este gás pode ser

transportado por gasodutos e vendido, ou pode ser reinjetado no próprio

campo. Entretanto, em áreas que não dispõem de infra-estrutura ou

mercados, este gás associado é usualmente liberado na atmosfera,

queimado ou não. Embora a queima de gás natural seja um método

seguro e efetivo de eliminar o excesso de gás associado à produção de

petróleo (a liberação deste gás, em grande parte metano, sem queimá-lo,

é muito mais nociva do ponto de vista ambiental), o "flaring" desperdiça

uma valiosa fonte de energia e emite dióxido de carbono. A construção

de infra-estrutura para o uso do gás, o acesso a novos mercados

consumidores e o estabelecimento de marcos regulatórios que

estimulem o uso racional do combustível são fundamentais para a

redução do “flaring”.

Capítulo 12: Conclusão

Nós faremos inicialmente uma recapitulação. Ao longo do livro

foram avaliadas as possibilidades de mitigação do aquecimento global

sob os ângulos científico, econômico e político, apresentando dados de

estudos realizados por instituições que são referências mundiais no

tema. Essa avaliação começou com as previsões científicas do IPCC

2007 sobre o impacto que as nossas emissões futuras de gases estufa

trarão ao clima da Terra. Posteriormente mostramos estudos importantes

da Agência Internacional de Energia e da Consultoria McKinsey sobre

as estimativas de emissões de gases estufa até 2030. Também foi

apresentada a proposta de mitigação de emissões da consultoria

McKinsey que tem o objetivo de reduzir em 30% as emissões de gases

estufa lançadas em 2005 até o ano de 2030. A proposta a ser

implementada no período 2011-2030 pode controlar o aquecimento

global, limitando o aumento da temperatura da Terra em 2°C. O nível de

viabilidade política da proposta foi avaliado. Posteriormente os três

principais grupos de mitigação de emissões foram abordados focando

nos potenciais e gargalos de cada iniciativa. Os capítulos explicaram

com aprofundamento o título do livro: “Controlando o aquecimento

global - como reduzir em 30% as emissões de gases estufa até 2030”.

No entanto essa proposta se refere apenas a um caminho técnico que a

humanidade pode seguir ou pode não seguir. Não adianta provar que o

custo líquido para controlar o aquecimento global é baixo e viável de ser

implementado, se a sociedade e os governantes não se convencerem

disso. Por isso é tão importante que as informações corretas sejam

disseminadas e que se procurem formas adequadas de financiamento das

iniciativas.

Quanto à disseminação correta da informação é fundamental que

as pessoas saibam que as florestas tropicais, por exemplo, podem ser

salvas com uma quantidade muito pequena de investimento em relação

as suas rendas. Com um volume de investimento que cresce

gradativamente e atinge 0,07% do PIB global estimado em 2030 esse

objetivo pode ser alcançado. Também é importante que as pessoas

saibam que a implementação de iniciativas de aumento da eficiência

energética as tornará mais ricas ao invés de diminuírem as suas rendas

como muitos pensam. Os sete argumentos apresentados no capítulo 6

deste livro para se “vender a idéia” do combate ao aquecimento global

aos governantes mundiais representam informações de grande valia. A

sociedade na forma de ONGs, associações de classe, cidadãos, políticos

e partidos políticos tem grande potencial de realizar a missão de

informar.

Quanto ao financiamento das iniciativas é preciso que os

governos cumpram essa missão com a contribuição dos cidadãos na

forma de impostos. A contribuição espontânea e direta dos

consumidores para financiar as iniciativas é muito difícil. Se um

consumidor tiver que escolher entre um carro híbrido, 20% mais caro,

mas que economizará combustível, e um carro comum ele

provavelmente escolherá um carro comum vislumbrando a economia no

curto prazo. Apesar de existirem pessoas engajadas com a causa

ambiental, que trocam um ganho econômico por um ganho ambiental

difuso para sociedade, a maioria das pessoas só responde as causas

ambientais se tiverem estímulos econômicos. Isso se agrava pelo fato de

a maioria dos impactos ambientais negativos do aquecimento global

ainda não estarem acontecendo. Por outro lado uma grande parte dos

cidadãos do mundo está disposta a contribuir através de impostos com

1% das suas rendas para financiar iniciativas que combaterão o

aquecimento global e que trarão benefícios econômicos futuros como a

economia de energia que compensarão a maioria dos impostos pagos. A

disposição de contribuir dos cidadãos, mesmo que com uma pequena

fatia das suas rendas, precisa ser aproveitada pelos governos. Essa é a

forma mais adequada de se obter recursos para financiar as iniciativas.

A nossa sociedade apresenta cada vez mais uma economia de serviços

baseada em setores como saúde, educação e tecnologia da informação,

setores que não dependem de muitos recursos físicos e

conseqüentemente não lançam muito gases estufa. Então é mais fácil

diluir o custo de investimento das iniciativas entre os setores de alta

emissão (minoria da economia) e os setores de baixa emissão (maioria

da economia) do que esperar que os consumidores troquem produtos

mais baratos por produtos mais caros em nome da consciência

ambiental. Os custos são os mesmos, mas as abordagens são diferentes.

Uma isenção de impostos para carros híbridos para que tenham o

mesmo preço de carros convencionais pode ser compensada com um

pequeno aumento de impostos em todos os setores econômicos. Como

complemento podemos ter aumentos de impostos para setores

poluidores a fim de incentivar o uso de tecnologias limpas, assim como

uma boa regulação estatal para incentivar o aumento da eficiência

energética. Por fim os consumidores conscientes têm muita importância,

pois aquilo que faltar em termos de implementação de políticas pelos

governos pode ser complementado pelas iniciativas individuais

espontâneas como trocar o carro por transporte coletivo, fazer coleta

seletiva de lixo e comprar apenas produtos ambientalmente sustentáveis.

Grande parte da escolha do clima que teremos nas próximas

décadas dependerá de decisões políticas. No final do ano de 2009

tivemos a COP 1558

, uma reunião entre governantes do mundo em

Copenhague na Dinamarca onde se discutiu o que faremos para

combater as mudanças climáticas nas próximas décadas. Na conferência

poucos resultados concretos foram alcançados. Essa conferência e

outras conferências posteriores nos próximos anos serão fundamentais

para decidir o rumo que a sociedade e os governos tomarão. Muitos

analistas acreditam que o ponto de controlar o aquecimento global,

diante dos relatórios científicos mais recentes, já passou. Outros acham

que não conseguiremos nos desviciar da nossa matriz energética suja.

Esse pessimismo não é compartilhado por mim. Acredito que diante do

bombardeio de informações na mídia sobre o tema aquecimento global

nos últimos anos e diante dos estudos técnicos que os tomadores de

decisões políticas têm nas mãos, alertando sobre os perigos das

catástrofes climáticas futuras, ocorrerá uma MUDANÇA. A pressão

ambiental será muito mais forte nas próximas duas décadas por parte da

sociedade organizada do que foi nas duas décadas anteriores, e isso

provavelmente modificará a estimativa de crescimento de emissões de

gases estufa. No entanto é uma grande incógnita saber se essa mudança

será suficiente para controlar o aquecimento global. Nesse processo de

mudança qualquer atitude favorável conta, mesmo que o objetivo final

de aumento de temperatura global dentro do limite de 2°C não seja

alcançado. Quanto menos gases estufa lançarmos, independente do

aumento final da temperatura do planeta, menos mudanças climáticas

teremos. Os três conselhos básicos que eu sugiro ao leitor para ajudar

nesse esforço coletivo são: consumir produtos com o maior nível de

sustentabilidade ambiental possível, disseminar informar corretas sobre

o aquecimento global às pessoas do seu convívio social e votar em

políticos que tenham compromisso com a diminuição das mudanças

climáticas.

58

O endereço eletrônico oficial da Conferência é: www.en.cop15.dk

A Terra, o mundo azul onde vivemos, é o único lugar do universo

que propicia a sobrevivência da humanidade. Nós precisamos agir agora

para que ela continue nos fornecendo o clima estável dos últimos

milhares de anos que garantiu o florescimento da nossa civilização. Essa

decisão provará que somos verdadeiramente racionais.