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i Contributo para a conservação preventiva de conjunto de desenhos científicos de Augusto Nobre do acervo da BPMP Relatório de Estágio Especialização em Conservação Preventiva de Documentos Gráficos e Fotográficos Manuela Paulos PORTO | 2018

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i

Contributo para a conservação preventiva de conjunto de

desenhos científicos de Augusto Nobre do acervo da BPMP

Relatório de Estágio

Especialização em Conservação Preventiva

de Documentos Gráficos e Fotográficos

Manuela Paulos

PORTO | 2018

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Contributo para a conservação preventiva de conjunto de

desenhos científicos de Augusto Nobre do acervo da BPMP

Relatório de Estágio

Orientadora: Professora Doutora Paula Menino Homem

Coorientadora: Dra. Lucinda Oliveira

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Agradecimentos

Várias foram as pessoas que contribuíram para a realização deste trabalho, desta forma

quero expressar o meu enorme agradecimento:

À Dra. Lucinda Oliveira, Conservadora-Restauradora e Responsável pelo SC&R da

BPMP, para possibilidade de realização do estágio, pela escolha da obra a estudar, pelos

seus ensinamentos, orientação cuidada e pelos seus incentivos.

À Professora Doutora Paula Menino Homem pelos seus ensinamentos e orientação.

À Doutora Cristiana Costa Vieira, Curadora do MHNC-UP pelo acesso ao arquivo de

desenhos de Augusto Nobre e pelo interesse e entusiasmo que demonstrou pelo estudo.

À Dra. Maria José Santos, Historiadora e Diretora do Museu de Papel de Terras de Santa

Maria pela colaboração e pelos contributos técnicos na fascinante pesquisa das marcas de

água.

À Dra. Célia Cruz, Bibliotecária da Biblioteca da Faculdade de Ciências da Universidade

do Porto pelo acesso à consulta de documentação e referências bibliográficas.

Ao Professor e Ilustrador Científico Fernando Correia da Universidade de Aveiro, pela

colaboração na análise das técnicas dos desenhos, e aos que me levaram a conhecê-lo: a

Professora Graça Magalhães e o Pedro Martins, Designer e Ilustrador Científico.

À Dra. Sofia Meira, Designer Gráfica e responsável pela Oficina de Tipografia na ESAD

de Matosinhos pela colaboração na análise da técnica de impressão.

À Doutora Helena Gonçalves, da InBIO pela colaboração na pesquisa na coleção de

peixes conservados em meio líquido.

Ao Doutor Carlos Sá, Diretor do CEMUP, pela realização da microscopia eletrónica de

varrimento às amostras dos papéis.

Aos técnicos do SC&R, Francisco Manuel Sousa e Maximina Ferreira, à Diretora e aos

funcionários da BPMP pelo acolhimento e colaboração na realização do estágio.

O meu agradecimento ainda ao Alexandre Maniés, aos professores e aos colegas de curso.

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Resumo

Este relatório é o resultado do trabalho desenvolvido durante um estágio curricular no

âmbito do Curso de Especialização em Conservação Preventiva de Documentos Gráficos

e Fotográficos - Ramo: Documentos Gráficos realizado no Serviço de Conservação e

Restauro da Biblioteca Pública Municipal do Porto que incidiu sobre a conservação

preventiva de um lote de documentos avulsos em suporte de papel constituídos por

desenhos científicos originais pertencentes ao acervo de Augusto Nobre da Biblioteca

Pública Municipal do Porto através da caracterização do seu estado de conservação e de

uma intervenção da sua limpeza e acondicionamento. Em simultâneo, investigou-se o

suporte e os elementos sustentados dos documentos, bem como os autores e as técnicas

utilizadas na elaboração dos desenhos.

Palavras-chave: Conservação preventiva, papel, desenhos científicos, Augusto Nobre,

Sara Ferreira.

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Sumário

Agradecimentos iii

Resumo iv

Sumário v

Índice de figuras vii

Índice de tabelas xi

Lista de abreviaturas xii

Introdução 1

Parte I: O estágio e a obra estudada

1. A entidade acolhedora do estágio 5

1.1. Biblioteca Pública Municipal do Porto 5

1.2. O Serviço de Conservação e Restauro 8

2. A obra e os seus autores 11

2.1. O conteúdo documental 11

2.2. A origem da obra na BPMP 12

2.3. Os autores 14

2.3.1. Augusto Nobre 14

2.3.2. Sara Ferreira 19

Parte II: A contextualização dos temas

3. A conservação de obras em papel 23

4. As causas de dano e alteração das obras em papel 28

4.1. Fatores intrínsecos 28

4.2. Fatores extrínsecos 31

5. O desenho na representação da ciência 35

5.1. Sobre a história da evolução do desenho científico 38

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Parte III: A metodologia de estudo e as atividades realizadas

6. A metodologia de estudo 46

7. As atividades realizadas 53

Parte IV: O estudo de caso

8. Os papéis dos desenhos 79

8.1. Tipos de papéis 79

8.2. Datas de fabrico e fabricantes 81

8.3.Composição dos papéis 93

9. Os materiais de registo 96

10. O estado de conservação dos desenhos 100

10.1. Caracterização geral 100

10.2. Caracterização descritiva 105

11. Sobre a iconografia dos desenhos 127

11.1. Os desenhos de Augusto Nobre 127

11.2. Os desenhos de Sara Ferreira 135

12. Sobre os usos e funções dos desenhos 139

Considerações finais 147

Referências 150

Apêndices

1- Cronologia da vida e obra de Augusto Nobre 162

2- Exemplos da ficha síntese do estado de conservação dos desenhos 164

Anexos

1- Contrato de trabalho de Sara Ferreira 168

2- Ficha de conservação do SC&R 169

3- Imagens da microscopia eletrónica de varrimento 183

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Índice de figuras

Fig. 1 – Capa (a) e 1:ª página (b) do “Legado Augusto Nobre”. 12

Fig. 2 – Páginas 78 (a) e 88 (b) do “Legado Augusto Nobre”. 13

Fig. 3 – Diário de campo – anotações do dia 25. 54

Fig. 4 – Pormenor de página do diário de campo – anotações do dia 26. 54

Fig. 5 – Desenhos originais colocados sobre a página da estampa do livro de

Nobre (1935). 58

Fig. 6 – Desenho da autoria de Sara Ferreira publicado em estampa do livro de

Nobre (1931). 58

Fig. 7 – Materiais utilizados na limpeza mecânica. 61

Fig. 8 – Limpeza mecânica: borracha em pó e algodão. 61

Fig. 9 – Caixa de limpeza. 62

Fig. 10 – Anotações sobre procedimentos de limpeza mecânica – diário de

campo: dia 4.

62

Fig. 11 – Esquema do procedimento de limpeza mecânica com borracha

granulada. 62

Fig. 12 – Identificação do desenho da amostra 2. 64

Fig. 13 – Bolsas de poliéster com as amostras. 64

Fig. 14 – Produtos utilizados (água desionizada, hidróxido de cálcio e gelatina)

e materiais de aplicação. 67

Fig. 15 – Levantamento de papel com cotonete. 68

Fig. 16 – Levantamento de papel com espátula. 68

Fig. 17 – Vestígios de adesivos em dois papéis separados. 69

Fig. 18 – Fazer o molde do papel japonês com pincel. 70

Fig. 19 – “Despentear” o papel original. 71

Fig. 20 – Plano do acondicionamento tipo livro. 73

Fig. 21 – Folha do acondicionamento tipo livro. 74

Fig. 22 – Capa do acondicionamento tipo livro. 74

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viii

Fig. 23 – Folhas do acondicionamento tipo harmónio vistas de cima. 75

Fig. 24 – Folhas do acondicionamento tipo harmónio vistas de lado. 75

Fig. 25 – Capilha de 4 abas aberta vista de cima. 75

Fig. 26 – Capilha de 4 abas fechada, vista de lado. 75

Fig. 27 – Desenho com dois tipos de papéis de escrita de tonalidades opostas. 80

Fig. 28 – Desenho e ampliação da data escrita no desenho. 82

Fig. 29 – Imagens da marca de água “cão”. 85

Fig. 30 – Página do livro “A Abelheira e o fabrico de papel em Portugal”

(Sequeira, 1935). 87

Fig. 31 – Imagens da marca de água “cavalo-marinho”. 89

Fig. 32 – Imagens das palavras “J&FH KENT”. 91

Fig. 33 – Imagens da marca em alto-relevo. 92

Fig. 34 – Cinco exemplos de perfurações nos desenhos. 106

Fig. 35 – Desgaste do suporte – peixe “Echeneis remora”. 106

Fig. 36 – Desenhos com colagem de 2 papéis. 107

Fig. 37 – Desenho com colagem de 4 papéis. 107

Fig. 38 – Desenho com colagem de 3 papéis. 108

Fig. 39 – Frente e verso do desenho com colagem de 2 papéis. 108

Fig. 40 – Papel colado com identificação de livro - verso do desenho do peixe

“Dentex vulgaris”. 109

Fig. 41 – Papel colado com identificação de livro – parte da frente do desenho

n.º 10 de Sara Ferreira. 109

Fig. 42 – Desenho e pormenor ampliado das manchas de mucilagem dos

contornos do peixe “Raia undulata”. 110

Fig. 43 – Desenho com manchas de mucilagem – peixe “Serranus gigas”. 111

Fig. 44 – Desenho com manchas de mucilagem – peixe “Umbrina cirrosa”. 111

Fig. 45 – Desenho com e escamas e manchas de mucilagem – peixe “N.V.

Chocolata”. 111

Fig. 46 – Manchas de tinta no verso do desenho do peixe “Enthynnus pelamis”. 112

Fig. 47 – Manchas de tinta no verso do desenho do papel manuscrito. 112

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Fig. 48 – Exemplos de rasgões em 4 desenhos. 113

Fig. 49 – Corte intencional na parte da frente e no verso do desenho do peixe

“Pagrus vulgaris”. 113

Fig. 50 – Corte intencional na parte da frente e no verso do desenho do peixe

“Umbrina cirrosa”. 114

Fig. 51 – Folha de papel cortada de forma irregular com instrumento cortante –

desenho sem título, n.º 5, de Sara Ferreira 114

Fig. 52 – Folha de papel cortada de forma irregular sem recurso a instrumento

cortante – desenho do peixe de menor dimensões “Gobius minutus”. 115

Fig. 53 – Dobra - pormenor do desenho do peixe “Dentex vulgaris”. 116

Fig. 54 – Enrolamento e dobra - pormenor do desenho do peixe “Cyclopterus

lumpus”. 116

Fig. 55 – Enrolamento - pormenor do desenho do peixe “Belone acus”. 116

Fig. 56 - Vincos e pormenores de zonas de rompimento de desenho sem título. 117

Fig. 57 – Pormenor de vincos em 2 desenhos. 117

Fig. 58 – Rugas em 2 desenhos – peixe “Raia asterias” e sem título. 118

Fig. 59 – Pormenor de rugas em 2 desenhos. 118

Fig. 60 – Exemplos de zonas perdidas em 4 desenhos. 119

Fig. 61 – Exemplos de suporte quebradiço em 3 desenhos. 120

Fig. 62 – Pormenor de migração de tinta para o verso em 3 desenhos. 121

Fig. 63 – Manchado de grafite no verso de 4 desenhos. 122

Fig. 64 – Zonas de sujidade entranhada por contraste com zonas que ficaram

protegidas da sujidade em 2 desenhos. 123

Fig. 65 – Zonas de sujidade entranhada em pormenores de 2 desenhos. 123

Fig. 66 – Exemplos de foxing em 6 desenhos. 124

Fig. 67– Exemplo de mancha resultante da proliferação de microrganismos. 125

Fig. 68 – Exemplo de mancha resultante da ação da iluminação. 125

Fig. 69 – Abreviaturas da assinatura de Augusto Nobre em dois desenhos

originais. 128

Fig. 70 – Assinatura de Augusto Nobre. 128

Fig. 71 – Assinatura de Augusto Nobre em desenho original. 128

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Fig. 72 – Desenho original do peixe “Coris julis” com assinatura e abreviatura

de Augusto Nobre. 129

Fig. 73 – Desenho preliminar e desenho final do peixe “Umbrina cirrosa”. 131

Fig. 74 – Desenho preliminar e desenho final do peixe “Raia asterias”. 131

Fig. 75 – Desenho final (a) e desenho preliminar (b) do peixe “Pagrus

vulgaris”. 132

Fig. 76 – Dois desenhos finais de peixes elaborados com a técnica do

pontilhado. 133

Fig. 77 – Desenho de peixe com vestígios de pigmento de cor (a) e pormenor do

desenho (b). 134

Fig. 78 – Assinatura de Sara Ferreira ampliada. 135

Fig. 79 – Pormenor ampliado do desenho n.º 9 da autoria de Sara Ferreira. 135

Fig. 80 – Desenho n.ºs 12 e 7 de Sara Ferreira. 137

Fig. 81 – Espécimes representados nos desenhos n.ºs 4 e 3 de Sara Ferreira. 138

Fig. 82 – Documento manuscrito com a letra de Augusto Nobre. 141

Fig. 83 – Desenho (a) e ampliação do papel colado (b) no verso (c) do

desenho do peixe “Dentex vulgaris”. 141

Fig. 84 – Ampliação da frase manuscrita existente em todos os desenhos de Sara

Ferreira. 142

Fig. 85 – Desenho (a) e ampliação do papel colado (b) no desenho n.º 10 de

Sara Ferreira. 142

Fig. 86 – Ampliação do título (a) de duas páginas do livro “Fauna Marinha

de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes” (b). 143

Fig. 87 – Página do livro “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes)” da estampa 22 (a) com o desenho original

do peixe “Gobius capito” (b) representado na estampa.

144

Fig. 88 – Página do livro “Moluscos marinhos e das águas salobras” com

impressão do desenho original n.º 3 de Sara Ferreira. 145

Fig. 89 – Folha com organização de desenhos impressos da estampa 41 do livro

”Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e

peixes)”.

146

Fig. 90 – Contrato de trabalho de Sara Cabral Ferreira. 168

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xi

Índice de tabelas

Tabela 1 - Inventário do acervo de desenhos de Augusto Nobre 56

Tabela 2 - Escala e critérios de avaliação do estado de conservação geral 59

Tabela 3 – Marcas de água identificadas nas obras 85

Tabela 4 – Tipo de evidências de alterações e danos detetados no conjunto

dos 72 desenhos intervencionados 100

Tabela 5 - Identificação de evidências de alterações e danos pela sua

ocorrência 101

Tabela 6 - Evidências de alterações e danos identificadas nas obras

provocados por efeitos de acondicionamento 102

Tabela 7 - Estado de conservação geral dos desenhos 103

Tabela 8 - Características dos desenhos preliminares 130

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xii

Lista de abreviaturas

BPMP Biblioteca Pública Municipal do Porto.

ESAD Escola Superior de Artes e Design.

InBIO Rede de Investigação em Biodiversidade e Biologia Evolutiva.

CEMUP Centro de Materiais da Universidade do Porto.

CMP Câmara Municipal do Porto.

SC&R

Serviço de Conservação e Restauro da Biblioteca Pública Municipal do

Porto.

MHNC-UP Museu de História Natural e Ciência da Universidade do Porto.

FCUP Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

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1

Introdução

Este relatório resulta do estágio que se insere no curso de Curso de Especialização em

Conservação Preventiva de Documentos Gráficos e Fotográficos - Ramo: Documentos

Gráficos investiga, do ponto de vista técnico e material, um lote de documentos avulsos

constituído por desenhos científicos originais do acervo de Augusto Nobre pertencente

à Biblioteca Pública Municipal do Porto.

A intervenção e a investigação incide sobre desenhos em suporte de papel de peixes e

moluscos marinhos elaborados com a finalidade de ilustrarem os livros que Augusto

Nobre publicou ao longo da sua carreira como naturalista, professor e investigador até

à década de quarenta do século passado. A maioria dos desenhos foi elaborada pelo

próprio autor e, uma pequena parte, por Sara Ferreira, desenhadora contratada pela

Secção de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

Todos os desenhos estavam acondicionados em capilhas de papel, organizados em seis

lotes e em apenas quatro deles tinha sido feita uma limpeza mecânica a seco para uma

exposição.

A seleção dos desenhos a intervencionar, feita pelas orientadoras do estágio, justifica-

se pela necessidade imperiosa da sua preservação, pela importância de Augusto Nobre

como professor e investigador na história da Zoologia e da Biologia Marinha da

Academia Politécnica e da Universidade do Porto, bem como por ser considerado o caso

mais famoso dos professores e investigadores que publicaram ao longo das suas

carreiras e que ilustraram as próprias obras. Este grupo de desenhos constitui igualmente

um caso de estudo relevante para a ilustração científica como testemunho material de

uma época e de uma determinada área. Tem, por último, relevância significativa o facto

da preservação das obras objeto de estudo permitir ser um incentivo à sua valorização e

à sua divulgação.

O estágio realizado teve como objetivo principal realizar o diagnóstico do estado de

conservação, o tratamento e o acondicionamento de setenta e dois desenhos científicos

originais em suporte de papel. Um outro objetivo foi o de identificar as atividades

profissionais inerentes à conservação de documentos gráficos a partir da observação

participante no papel de estagiária. O último objetivo centrou-se na realização de uma

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investigação sobre o suporte e os elementos sustentados dos documentos, sobre os

autores e as técnicas utilizadas na elaboração dos desenhos.

A natureza do estudo exigiu uma abordagem interdisciplinar que relacionou

metodologias e conhecimentos das áreas da conservação e da etnografia. Enquanto

objeto físico, um desenho em papel é um sistema dinâmico em permanente mutação,

guardando em si os testemunhos materiais da sua história, desde os momentos do fabrico

do papel e da execução do desenho até ao presente, por isso o estudo, tanto material

como técnico assentou, essencialmente, na observação direta, contínua e atenta da obra

enquanto suporte material das imagens. Este permitiu realizar o diagnóstico do estado

de conservação, proceder ao registo fotográfico, recolher amostras para análise, realizar

uma intervenção e o acondicionamento dos desenhos. Porque dotado de algumas

técnicas de caráter qualitativo de recolha e tratamento de dados e informações

observáveis de atividades profissionais e atividades de produção de conhecimento, o

método etnográfico foi utilizado como forma de garantir uma forma planeada e

sistemática de fazer perguntas, de recolher e registar informação, de discutir os dados

obtidos e de os comunicar de forma ordenada.

Importa salientar que a intervenção foi efetuada sob supervisão, que a recolha de dados

teve ajuda de técnicos da área documental e, para a sua análise, a colaboração de

investigadores nas áreas da história do papel e da ilustração científica.

Para a construção do relatório e exposição clara do seu conteúdo, a estrutura do texto,

após a introdução, está dividida nas seguintes partes:

A primeira faz um enquadramento do estágio e da obra estudada. O estágio foi realizado

no Serviço de Conservação e Restauro da Biblioteca Pública Municipal do Porto, uma

das três principais bibliotecas do país, a maior e a mais antiga biblioteca pública

municipal portuguesa, que tem como missão a salvaguarda e conservação do extenso,

único e valioso património que constituiu o acervo da Biblioteca. Sobre a obra estudada

apresenta-se o seu conteúdo documental, as informações recolhidas sobre a origem do

lote de desenhos na Biblioteca e sobre os dados biográficos dos autores dos desenhos.

A segunda parte centra-se na contextualização dos temas abordados na investigação, a

conservação preventiva e as causas de dano e alteração das obras em papel e no papel

do desenho na representação e na comunicação da ciência. Começa-se por fazer um

enquadramento da conservação das obras em papel, uma especialização da área da

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Conservação do património cultural que tem como objetivo principal preservar o suporte

e a informação que contém, a origem e o desenvolvimento da área dos documentos

gráficos enquanto categoria patrimonial autónoma e inclui-se a evolução da conservação

e do estatuto profissional do conservador restaurador de documentos gráficos em

Portugal. De seguida, identificam-se as principais causas que podem afetar a

conservação do papel e os efeitos que se podem produzir. Por último, sobre a ilustração

científica procurou-se identificar as características que definem esta técnica, assim como

as principais fases de desenvolvimento que a disciplina assumiu na divulgação e no

ensino das Ciências ao longo do tempo; também se analisa o percurso traçado pela

ilustração científica no nosso país.

Porque a realização de um estudo académico traz consigo certos requisitos que devem

ser estabelecidos para que seja garantido o seu caráter científico, na terceira parte

explica-se a metodologia de investigação selecionada e todas as atividades realizadas.

Assim, apresenta-se a estratégia geral, o método de investigação, as técnicas de recolha

de dados, todas as atividades realizadas para recolha, registo e análise das informações

e a forma como se procurou garantir um determinado grau de validade e fiabilidade das

técnicas utilizadas e dos dados recolhidos. A exposição das atividades realizadas

segundo a sequência em que ocorreram e de forma pormenorizada pretende ser ainda

um contributo para a identificação do que pode ser um esboço do saber profissional do

“Conservador de património cultural documental para a opção documentos gráficos”,

dos processos de trabalho e das competências que o exercício dessa atividade

profissional requer.

A última parte apresenta os dados obtidos na investigação relativamente à origem dos

papéis, ao estado de conservação dos desenhos, à iconografia e aos usos e às funções

que o autor lhes deu.

No corpo do texto foram introduzidas imagens para facilitar a compreensão do seu

conteúdo, remetendo para apêndices e anexos informações e resultados obtidos ao longo

do estudo.

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Parte I

O estágio e a obra estudada

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1. A entidade acolhedora do estágio

1.1. Biblioteca Pública Municipal do Porto

A “Real Bibliotheca Pública da Cidade do Porto”, atualmente Biblioteca Pública

Municipal do Porto (BPMP), foi fundada em 9 de Julho de 1833 por decreto de D. Pedro

IV, Regente em nome da Rainha D. Maria.

Até 1833 a cidade do Porto não disponha de uma biblioteca pública e os leigos, em certa

medida, tinham ao seu dispor as livrarias das casas religiosas, onde se incluíam a dos

Franciscanos, a dos Beneditinos, a dos Congregados, a do Colégio de S. Lourenço e a

dos Lóios, a que se juntavam as livrarias particulares, das quais se destacam a do

Visconde de Balsemão, a do Bispo D. João de Magalhães e Avelar e a de Alexandre

Almeida Garrett (Cruz, 1988).

O contexto histórico em que ocorreu a sua fundação revela a intenção do governo

Liberal em arrecadar, organizar e conservar os fundos bibliográficos das livrarias

sequestradas a particulares e a casas religiosas abandonadas ou extintas, tendo sido,

como refere Alvim (2011), o reflexo de uma nova política cultural em alargar o

conhecimento à generalidade da população, independentemente das alterações

governativas, da difícil conjuntura sócio económica e das fracas estruturas

administrativas do Estado.

O decreto de D. Pedro contém as disposições relativas aos fundos bibliográficos que

passavam a constituir a biblioteca e o edifício a ela destinado. Segundo Cabral (1998),

os fundos iniciais foram constituídos pelas livrarias sequestradas a particulares e pelas

das casas religiosas abandonadas ou extintas que foram incorporadas nos bens Nacionais

e passaram a pertencer à Fazenda Pública da cidade. Ficou também estipulado que fosse

entregue à biblioteca um exemplar de toda e qualquer publicação impressa em território

português, contribuindo assim para aumentar constante e progressivamente a existência

das espécies bibliográficas. Como afirma Alvim, “este privilégio – evidenciando o peso

e o prestígio da cidade do Porto na implantação do novo regime – era partilhado com

a Biblioteca Nacional de Lisboa tendo levado à constituição de importantes fundos”

(2011:31).

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O decreto define também a propriedade à cidade do Porto, por administração da Câmara

Municipal. Entre 1833 e 1942 a biblioteca esteve instalada em dois edifícios, o Hospício

de Vale da Piedade na Cordoaria e o Paço Episcopal, antes de, em 1939, se instalar

definitivamente no Convento de Santo António da Cidade, em S. Lázaro.

A abertura oficial ao público realizou-se em 4 de abril de 1842 e uma semana depois

teve início o serviço regular ao público. 1876 é a data da passagem definitiva e total a

Biblioteca Municipal (Cabral, 1998).

Durante o período de 1934-1947, a política de atração de ofertas e de legados revelou-

se frutuosa com a entrada para a biblioteca dos seguintes importantes fundos: António

Nobre, em 1934; Tília Dulce, em 1937; Joaquim Leitão, Aurora Teixeira de Castro, em

1938; João Alves dos Reis, António Joaquim de Oliveira Castro, em 1939; Augusto

Nobre, em 1946 (idem:27).

Ao longo dos anos, a estrutura orgânica e os serviços da BPMP foram sendo renovados

e modernizados e as coleções foram sendo sucessivamente enriquecidas por via de oferta

ou legados, permutas e aquisições.

A BPMP é uma das três principais bibliotecas do país, sendo a maior e a mais antiga

Biblioteca pública municipal portuguesa, cuja ação “ultrapassa o âmbito local e

regional, assumindo, graças à riqueza do seu espólio, um carácter nacional e

internacional que transcende o papel “normal” de uma biblioteca de município”

(Costa, 2002:74).

O seu acervo patrimonial é quantitativa e qualitativamente significativo. Constituída

sobretudo por bibliografia nacional, a BPMP possui mais de 1.200.000 volumes1,

continuando a receber, por Depósito Legal2, todas as publicações monográficas e

periódicas correntemente editadas em território nacional.

1 O termo “volume” aplica-se para documentos impressos – informação recolhida na Direção-Geral do

Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas.

2 O Depósito Legal é definido pelo envio de um exemplar de todas as publicações produzidas em território

nacional, segundo o Decreto-lei n.º 74/82 de 3 de março para serem distribuídos por bibliotecas de todo

o país. Tem como objetivos assegurar a defesa e preservação dos valores da língua e cultura portuguesas;

a constituição e conservação de uma coleção nacional; a produção e divulgação da bibliografia nacional

corrente; o estabelecimento da estatística das edições nacionais e o enriquecimento de bibliotecas dos

principais centros culturais do país. O artigo 4º do referido Decreto-lei define que é, nomeadamente,

obrigatório o depósito de livros, brochuras, revistas, jornais e outras publicações periódicas, separatas,

atlas e cartas geográficas, mapas, quadros didáticos, gráficos estatísticos, plantas, planos, obras musicais

impressas, programas de espetáculos, catálogos de exposições, bilhetes-postais ilustrados, selos,

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7

Em relação aos fundos de que é depositária, destacam-se, pela sua importância e carácter

único, o fundo manuscrito de Santa Cruz de Coimbra, o chamado Fundo Geral, a coleção

de manuscritos musicais, os fundos Azevedo e Vitorino Ribeiro, a coleção de mapas e

plantas antigos, coleções de correspondência e de manuscritos pertencentes a vários

escritores e personalidades e o denominado “Museu de Autógrafos”, fundo constituído

por espólios de diversos escritores, estudiosos e artistas. Salienta-se ainda a notável

coleção de publicações periódicas (Cabral, 1998; Costa, 2002).

Costa (2002) afirma que a BPMP é o mais desenvolvido serviço cultural da Câmara

Municipal do Porto (CMP), sob o ponto de vista de instalações, número de utilizadores,

património à sua guarda, instalações e pessoal. Acolhe anualmente mais de 12 000

livros e 50 000 publicações periódicas por ano. Com uma área útil de 5246 m², os fundos

bibliográficos ocupam mais de 17 quilómetros lineares de prateleira e a taxa de

crescimento das coleções é de cerca de 395 metros lineares por ano.

Em 2017, a BPMP serviu cerca de 108 000 leitores diretos e dispõe dos seguintes

serviços principais: Serviços Administrativos, Serviços de Leitura, Serviços de

Catalogação, Serviço de Manuscritos e Reservados, Serviços de Extensão Cultural,

Biblioteca Sonora, Biblioteca Infantil e Serviço de Conservação e Restauro3.

estampas, cartazes, gravuras, fonogramas e videogramas, obras cinematográficas, microformas e outras

reproduções fotográficas. Fonte: Decreto-lei n.º 74/82 de 3 de março.

3 Fonte: dados da BPMP preenchidos no “Questionário de Recolha de Dados Estatísticos – 2017” que é

o inquérito anual por questionário enviado às bibliotecas públicas municipais que integram a Rede

Nacional de Bibliotecas Públicas com vista a monitorizar o funcionamento das bibliotecas através da

recolha de dados sobre os seus recursos e serviços.

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8

1.2. O Serviço de Conservação e Restauro

O Serviço de Conservação e Restauro (SC&R) da BPMP4 foi criado em 1988 mas só

passou a ser representado na macroestrutura da CMP a partir de 1999. Em termos orgânicos

e funcionais, está atualmente integrado e dependente da Divisão Municipal de

Bibliotecas e é tutelado pela Direção Municipal da Cultura e Ciência. Este serviço é

transversal a toda a Divisão Municipal de Bibliotecas, contudo, desenvolve a sua

atividade quotidiana na BPMP.

Foi criado para dar resposta a uma necessidade básica sentida pelo então Diretor da

BPMP, Dr. Luís Cabral, que considerava urgente e inadiável a atuação de uma equipa

ao nível da preservação e da conservação preventiva/curativa dos documentos gráficos

à sua guarda.

Desde o seu início tem como missão a salvaguarda e a conservação do extenso, único e

valioso património que constituiu o acervo da BPMP. Ao longo da sua existência tem

dado apoio técnico a vários serviços da CMP, essencialmente a Museus e Arquivos,

assim como aconselhamento técnico a várias instituições públicas nacionais e aos

munícipes que aí se dirigem, na expectativa de resolver alguns problemas, que as suas

coleções apresentam.

Atualmente o SC&R tem como objetivos principais:

Reforçar a sua atuação ao nível da preservação, através de procedimentos como

o levantamento e diagnóstico do estado físico das coleções periódicas; dar

continuidade à monitorização e controlo ambiental e de pragas; encerrar o ciclo

de acondicionamento das espécies em depósito na “Casa-Forte” e alterar o

sistema de iluminação de alguns espaços da BPMP, que permanecem com um

tipo de iluminação desadequada.

Conservar os documentos em suporte de papel, pergaminho e couro assegurando

a sua estabilidade físico-química, através da desinfestação (temperaturas

negativas e/ou anóxia) e da higienização (máquina de higienização e/ou museum

vacuum).

4 As informações que foram utilizadas para a apresentação e caracterização do SC&R da BPMP foram

recolhidas através de entrevista realizada à sua responsável, Dra. Lucinda Oliveira.

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Implementar, progressiva mas prementemente, uma política realista de

desacidificação em massa de periódicos regionais.

Limitar a intervenção de restauro a alguns núcleos existentes na “Casa-Forte”,

muitos deles cimélios únicos no país e no mundo.

Em termos de recursos humanos, desde a criação e até 2003 o serviço foi assegurado

por uma Assistente Técnica BAD (Bibliotecas, Arquivos e Documentação)

reclassificada, em julho desse ano, para Técnica Superior de Conservação e Restauro.

Em 2005 contou com mais um elemento, um Assistente Operacional, e a partir de julho

de 2006, foram integrados mais dois Assistentes Operacionais.

Atualmente a equipa é constituída por três colaboradores, fazendo parte dos planos da

BPMP aumentar o número de técnicos, tanto Técnicos Superiores, como Assistentes

Técnicos e Operacionais, porque para além do acervo acumulado ao longo dos 185 anos

da sua existência, assiste-se a um crescimento anual muito elevado do número de

espécies bibliográficas (monografias e periódicos) que carecem de desinfestação e

higienização antes de serem integradas nos depósitos da BPMP.

O serviço está instalado no edifício da BPMP e está distribuído por dois espaços de

trabalho distintos, o da Desinfestação e Higienização e o da Conservação e Restauro. O

espaço de Conservação e Restauro está dividida nas áreas de Tratamentos Aquosos,

Tratamentos Mecânicos e Acondicionamentos. Está equipado com máquinas,

ferramentas e consumíveis considerados básicos para uma intervenção direta de

conservação ou de restauro.

Para se ter uma ideia do trabalho realizado, em 2017, os trabalhos realizados pelo SC&R

foram os seguintes: 95 acondicionamentos em cartolinas desacidificadas e à medida de

documentos provenientes da Casa-Forte; 257 encadernações de volumes de periódicos

(Jornal de Notícias e Ilustração Portuguesa); 352 espécies bibliográficas avaliadas

(sobretudo periódicos estruturalmente frágeis, que foram retirados de leitura e que farão

parte de um plano futuro de intervenção); 5887 volumes higienizados (essencialmente

Livro Antigo); 4599 volumes desinfestados (essencialmente Livro Antigo); 175

intervenções/restauros de documentos provenientes da Casa-Forte; 217 intervenções

genéricas em monografias e periódicos provenientes do Fundo Geral.

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Para além dos planos de desinfestação, higienização, monitorização e controlo

ambiental implementados pelo SC&R, até março de 2018 foi da responsabilidade deste

serviço a elaboração do processo de instalação de dois Sistemas Automáticos de Deteção

e Extinção de Incêndios, assim como a conceção e a implementação de um Plano de

Emergência, que envolveu todos os funcionários da BPMP.

Sendo várias as atividades desenvolvidas pelo SC&R, a sua responsável considera que

nenhuma pode ficar isolada, pois um plano de conservação preventiva e restauro exige

uma complementaridade para que a escolha de uma solução seja a que se aproxime mais

das necessidades prioritárias e das possibilidades mais realistas e, apesar da estratégia

ser da responsabilidade do SC&R, acredita ser importante o envolvimento de todos os

colaboradores e utilizadores/leitores. Nesse sentido, o SC&R concebe e implementa

ações de sensibilização dirigidas aos colaboradores, distribui panfletos aos leitores

adultos com conselhos a seguir na consulta das espécies bibliográficas e tem

sensibilizado as crianças que frequentam a Sala de Leitura Infanto-Juvenil com oficinas

intituladas “Hospital do Livro” para a aprendizagem de boas práticas e de pequenas

intervenções em livros.

Para além destas atividades, é um serviço que está aberto à comunidade académica

acolhendo estágios curriculares; à comunidade científica cooperando com

investigadores portugueses e estrangeiros; a outros municípios colaborando na formação

de assistentes técnicos; e na CMP desenvolvendo ações de formação a colaboradores

dos seus arquivos e museus.

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2. A obra e os seus autores

2.1. O conteúdo documental

A obra selecionada como objeto de estudo do estágio foi um lote de desenhos de

Augusto Nobre do acervo da BPMP.

Este lote é constituído por um total de 140 itens5 com os seguintes documentos originais

em suporte de papel:

Setenta e cinco desenhos de peixes e cefalópodes.

Um papel de linhas com inscrição manuscrita.

Uma impressão fotográfica de um desenho de S. Ferreira.

Sessenta e três desenhos acondicionados num envelope timbrado da Companhia

Editora do Minho endereçado a Augusto Nobre, com a morada da sua casa, com

inscrição manuscrita “Desenhos feitos ao microscópio careas de seleritis de

Echinodermes”6.

Considerando a duração do estágio, reconheceu-se que seria impossível estudar e

intervir na totalidade dos documentos do lote e, por isso, após uma avaliação inicial foi

decidido excluir os sessenta e três desenhos acondicionados no envelope, a impressão

fotográfica de desenho de S. Ferreira e quatro desenhos de peixes que antes tinham sido

intervencionados pela responsável do SC&R para fazerem parte de uma exposição7.

Assim, o estágio teve como objeto o estudo e a intervenção em setenta e dois desenhos

originais e um papel de linhas com inscrição manuscrita. Quanto à autoria, doze dos

desenhos são da autoria de Sara Ferreira e os restantes da autoria de Augusto Nobre.

5 O termo Item foi o que se encontrou na identificação do número dos desenhos agrupados em cinco folhas

de papel dobradas ao meio que os protegiam. Na publicação online “Glossário de Biblioteconomia e

Documentação” da Sociedade de Informação do Brasil, o termo Item significa “documento ou conjunto

de documentos considerado com uma entidade e, como tal, forma a base para uma única descrição

bibliográfica”. Consultado em: https://pt.slideshare.net/RodrigoRocha9/glossrio-de-biblioteconomia

6 É de referir que estes desenhos foram elaborados, na sua maioria, em papel fino de tamanho aproximado

ao A5, ou mais pequeno, com a existência de diferentes timbres no canto superior direito da Estação de

Zoologia Marítima e do Museu do Instituto de Zoologia da Universidade do Porto.

7 Exposição “Mar de Inovação – Explore as profundezas do Oceano” que decorreu entre 23 de março e

13 de maio de 2017 integrada no Porto Innovation Hub e promovida pela Câmara Municipal do Porto.

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2.2. A origem da obra na BPMP

Como antes referido, um dos tipos de fundos existentes na BPMP é constituído por

acervos de originais de obras literárias e outros documentos referentes a escritores,

estudiosos ou artistas e tem origem, essencialmente, no Museu de Autógrafos formado

nos anos trinta e quarenta do século passado.

A necessidade de recolha e divulgação de peças relativas à vida pessoal, intelectual e

atividade artística de diversos intervenientes do meio cultural foi sentida pelo diretor

Dr. Joaquim Costa que, naquele período de tempo, iniciou e manteve contactos com

escritores, artistas plásticos e respetivos familiares e amigos com a finalidade de reunir

um maior e mais completo número de espólios possível. Alguns dos nomes

representativos deste núcleo são os de Camilo Castelo Branco, Ramalho Ortigão, Júlio

Dinis, Guerra Junqueiro, António Carneiro e António Nobre. Segundo Costa & Eiras

(2010), o espólio deste último distingue-se pela qualidade e quantidade do seu espólio

oferecido à Biblioteca em 1934 pelo irmão do poeta, Augusto Nobre.

No documento existente na BPM "Legado Augusto Nobre" com 88 folhas

datilografadas e assinado por Joaquim Costa, pode verificar-se que foram doadas 6.913

"espécies bibliográficas" e 17.715 "volumes e folhetos". Deste legado faz parte o

acervodo irmão poeta mas também uma parte das obras de que Augusto Nobre foi autor,

bem como livros e coleções de revistas de temas de áreas como a Biologia, a Zoologia

e outras ciências, da sua biblioteca como se pode observar nas fotografias apresentadas

nas Fig. 1 e 2.

Fig. 1 – Capa (a) e 1:ª página (b) do “Legado Augusto Nobre”. Fotografia da autora.

(a) (b)

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Neste documento de 1934 não se encontra identificado o lote de desenhos originais

objeto de estudo do estágio e na BPMP não foi encontrado, até ao momento, qualquer

outro documento comprovativo da doação de outros documentos pertencentes a

Augusto Nobre. No entanto, na obra “Tesouros da BPMP”, Cabral & Meireles afirmam

que durante o período de 1934-1947 entraram na Biblioteca seis importantes fundos,

entre os quais o de Augusto Nobre no ano de 1947 (1998:27).

Ao procurar-se uma explicação para a inexistência de um registo escrito deste fundo, o

Coordenador do Serviço de Manuscritos e Reservados da BPMP, Dr. Sílvio Costa,

levanta a hipótese de que a possível doação do restante acervo de Augusto Nobre teria

ficado apalavrada entre o autor e o diretor da Biblioteca em 1934 para ser entregue após

a morte daquele. Como Augusto Nobre faleceu em 1946, é provável que o lote de

desenhos fizesse parte do fundo que deu entrada na BPMP no ano seguinte.

Fig. 2 – Páginas 78 (a) e 88 (b) do “Legado Augusto Nobre”. Fotografia da autora.

(a) (b)

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2.3. Os autores

2.3.1. Augusto Nobre

Augusto Pereira Nobre foi professor e cientista da Universidade do Porto8, considerado

um “notável naturalista-local português” (Almaça, 1993), “pioneiro para o estudo,

ensino e divulgação da Biologia Marinha” (Amorim, 2017) ”, uma “figura notável e

cimeira na História dos estudos zoológicos e da Ciência em Portugal” e “na criação de

estabelecimentos de museologia e de investigação” (Santos & Eiras, 2006).

Nasceu no Porto em 1865 e, como o próprio escreve na introdução do livro “Fauna

Marinha de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)”, a poderosa atração

que o mar sempre exerceu sobre ele ficou a dever-se às temporadas que, na infância,

passou à beira-mar na praia de Leça da Palmeira (Nobre, 1935). Terão sido essas

temporadas, em que observava e capturava os exemplares que podia e levava para casa,

que despertaram nele o interesse pela Zoologia e pela preferência que mais tarde deu ao

estudo dos animais marinhos (Santos & Eiras, 2006).

Fez os estudos liceais no Porto e os estudos universitários em Coimbra, no Porto e em

França. Em Coimbra matriculou-se na Faculdade de Filosofia em 1884 para estudar

Botânica e Zoologia. Durante a permanência em Coimbra publicou na revista “A

Mocidade de Hoje” os seus primeiros trabalhos sobre moluscos, equinodermes, actínias

e medusas e fez “(…) sempre que possível, as excursões zoológicas nos arredores, e

efectuou uma a Setúbal custeada com dinheiro poupado com sacrifício do seu conforto,

como afirmou. Destas colheitas resultaram mais algumas publicações sobre moluscos”

(idem: 12). Nesta universidade concluiu as disciplinas de Ciências Naturais e regressou

ao Porto para continuar os seus estudos na Academia Politécnica.

Segundo o próprio autor, foi durante os dois anos passados no Porto que a sua atividade

científica mais se desenvolveu tendo dado início aos estudos pioneiros da biodiversidade

marinha em Portugal, em especial dos moluscos, alargando relações com naturalistas

portugueses e estrangeiros e publicando algumas monografias sobre malacologia

(Nobre, 1935). Contudo, um ensino unicamente livresco e a falta de aulas práticas e de

8 Como leitura complementar, no Apêndice 1 apresenta-se uma “Cronologia da vida e obra de Augusto

Nobre”.

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laboratórios capazes de apoiar a sua investigação, levaram-no a continuar os estudos em

França.

Em Paris trabalhou sob a direção do Professor Edmond Perrier, Diretor do Museu de

História Natural, e frequentou em simultâneo várias disciplinas na Sorbonne e os

Trabalhos Práticos de Zoologia na Escola Prática de Altos Estudos. Esteve ainda na

Estação Zoológica de Cette9, ligada à Universidade de Montpellier.

Em 1890 regressou ao Porto e foi convidado para assistente nos trabalhos práticos de

Botânica na Academia Politécnica. No ano seguinte foi nomeado “naturalista adjunto

da cadeira de zoologia” e ajudante prático da disciplina de Zoologia. Como referem

Santos & Eira, inicia-se assim “a importantíssima e pioneira acção de Augusto Nobre

no estudo da Zoologia, a qual remodelou completamente com a introdução de trabalhos

práticos, iniciando os alunos no estudo da histologia e anatomia comparadas”

(2006:13). Em 1892 publicou o livro “Estudos de Zootomia”, tido como um precioso

trabalho didático dedicado a aulas práticas, abundantemente ilustrado com mais de 150

desenhos por si elaborados. Dois anos mais tarde dá início à edição da revista “Annaes

de Sciencias Naturaes”, que manteve durante doze anos, tendo tido a colaboração da

maioria dos naturalistas portugueses e de alguns estrangeiros publicando dez volumes

de estudos sobre a fauna e flora portuguesas. Em 1901 foi nomeado Naturalista Efetivo

da Academia Politécnica.

Em 1911, ano da conclusão da Estação Aquícola do Rio Ave de que era diretor, pela

necessidade de concorrer a uma das vagas de professor na recém-criada Universidade

do Porto, incluindo a Faculdade de Ciências, Augusto Nobre teve que concluir o

bacharelato em Ciências Histórico-Naturais, ocupando a vaga de “Professor

Extraordinário” com dispensa de concurso por reconhecido mérito para reger os cursos

de Zoologia Geral, Zoologia dos Invertebrados e Zoologia dos Vertebrados

(Universidade do Porto, 1915).

Em 1915 foi nomeado a “Professor Ordinário”, uma posição equivalente a Professor

Catedrático, e assume as funções de Diretor do Museu e Laboratório de Zoologia e da

Estação de Zoologia Marítima que fundara. Em 1935 deixou de exercer funções por ter

9 Estação Zoológica de Cette – tal como escrito por Augusto Nobre no livro “Fauna Marinha de Portugal.

I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)”, 1935, pág. XI. Outros autores escrevem Sète. Neste texto

utiliza-se as duas formas de escrita do nome deste local.

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atingido o limite de idade, mas continuou a sua atividade científica e editorial vindo a

falecer no ano de 1946.

Como professor, “pode-se afirmar, com toda a propriedade, que o ensino da Zoologia

em Portugal se pode dividir em duas fases – antes e depois de Augusto Nobre” (Santos

& Eiras, 2006: 14), tendo-se destacado por ter introduzido uma articulação inovadora

do ensino, observação e investigação científica pura e aplicada da Oceanografia e da

Biologia Marinha e lutado sempre para que o ensino e a investigação na Universidade

do Porto progredissem a par com as outras escolas europeias com quem mantinha

contacto científico. Durante a sua vida de professor é de realçar o papel pioneiro e o

empenho que dedicou à sua vida de investigador através dos numerosos estudos que

publicou e o apoio que prestou a outros zoólogos, entre os quais se destacam o filho –

Augusto Ferreira Nobre – e José Maria Braga, conceituado taxonomista de isópodes

dulciaquícolas e foraminíferos (Almaça, 1993: 33-34).

Como cientista e investigador salienta-se quer o papel que desempenhou pela Estação

Aquícola de Vila do Conde, que se veio a revelar “importantíssimo no desenvolvimento

da piscicultura em Portugal, nomeadamente da truticultura, e foi um notável local de

formação” (idem: 18); quer o papel que teve na criação da Estação de Zoologia Marítima

da Foz do Douro. Carlos Almaça (1993) refere que desde muito cedo Augusto Nobre se

preocupou com a criação de uma estação marítima, mantendo a custas próprias um

pequeno laboratório em Leça da Palmeira e criado, mais tarde, a Estação de Zoologia

Marítima. Para a sua construção, no local em que ainda se mantém e é conhecida como

“Aquário da Foz”, foram certamente determinantes as suas ideias pioneiras e a sua

defesa pela componente prática laboratorial no ensino da Zoologia inspirando-se no

modelo da estação de biologia marinha de Sète onde estudara.

Como autor, publicou 111 trabalhos entre 1882 e 1946 (Santos & Eiras, 2006: 18). A

sua notável obra revela, como afirma Amorim (2017), o sistemático estudo e

classificação de vários grupos biológicos, assim como uma interpretação científica

influenciada pelo darwinismo e é de consulta obrigatória para quem se dedica ao estudo

da fauna marinha portuguesa. “Compilou listas mais ou menos extensas, e fez descrições

completíssimas da nossa fauna, sendo os trabalhos mais importantes os respeitantes

aos Equinodermes, Crustáceos, Moluscos terrestres, marinhos, fluviais e de águas

salobras, e Vertebrados marinhos” (Santos & Eiras, 2006: 18). Para além de autor dos

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textos, sublinhe-se ainda o trabalho desenvolvido como desenhador das estampas de

muitos dos seus livros, como referido para o livro publicado em 1892.

Como museólogo, uma das suas grandes realizações foi a criação do Museu de Zoologia.

Apesar das vicissitudes da sua organização, e embora o seu início possa ser datado de

1892, o Museu foi aberto ao público em 1916. As coleções tiveram uma origem variada,

algumas foram compradas, outras foram oferecidas e muitos exemplares foram colhidos

pelo próprio Augusto Nobre nas excursões zoológicas que organizava sempre que podia.

“O Museu conserva abundantes exemplares colhidos e etiquetados por Augusto Nobre,

sobretudo referentes a fauna marinha e a moluscos, de que organizou uma belíssima e

importante coleção que é ainda hoje frequentemente consultada pelos especialistas em

malacologia” (idem: 16).

Na sociedade da época assumiu outros importantes cargos públicos. Foi deputado

republicano em 1913, 1915, 1919 e 1922 e foi Ministro da Instrução em três governos.

Foi ainda reitor da Universidade do Porto entre 1919 e 1926 e desempenhou vários

cargos consultivos nos domínios da piscicultura, pescas e oceanografia.

A sua vida pessoal foi caracterizada, segundo afirmações do próprio (Nobre: 1935),

pelos desgostos com a morte da esposa, do filho e do irmão poeta. A esposa faleceu em

1907, companheira de muitas excursões zoológicas como a relatada ao Algarve no livro

publicado em 1935. O filho licenciou-se em Medicina e faleceu em 1930, tendo sido

Naturalista do Museu de Zoologia desde 1915, autor de uma única obra sobre animais

venenosos de Portugal e colaborador dileto do pai.

Tal como reconhece Jorge Eiras, Augusto Nobre é “indiscutivelmente uma figura

cimeira na História da Ciência em Portugal, e constitui um exemplo de dedicação,

tenacidade e inteligência postas ao serviço de uma vocação e da Ciência” (ibidem: 18).

É considerado um dos casos mais famosos de professores e investigadores que, na

história da Academia Politécnica e da Universidade do Porto, publicaram ao longo das

suas carreiras e também ilustraram as suas próprias obras, “from 1984 to 1942 he also

illustrated his own papers, published in the yearbooks of the Academy in the Annaes de

Sciencias Naturaes, a publication series that he created, as well as in various book

volumes about the Portuguese invertebrate and vertebrate fauna” (Mateus & Vieira,

2017: 9).

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Apesar de as aulas de desenho terem sido uma componente curricular das Escolas que

precederam a fundação da Universidade do Porto, de que o autor foi aluno, desconhece-

se se frequentou aulas de desenho. Nos desenhos originais e nas placas tipográficas das

publicações dos desenhos da sua autoria assinou com a abreviatura “A.N.” ou “A.

Nobre”. Nos casos em que os desenhos que ilustram as suas obras foram por ele

elaborados, fez questão de realçar a o seu trabalho de autoria nos prefácios ou nos textos

introdutórios. Tal facto verifica-se, por exemplo, na introdução dos livros “Estudos de

Zootomia” (1892), “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e

peixes)” (1935), nos Anuários da Academia Politécnica e em artigos da revista “Annaes

de Sciencias Naturaes”.

Mateus & Vieira, 2017 afirmam que as ilustrações mais comuns de Augusto Nobre são

do tipo esquemático de gastrópodes, peixes e moluscos executadas segundo a técnica de

pontilhado e de contorno, tendo também elaborado muitas ilustrações sombreadas e

detalhadas e que o arquivo do Museu de História Natural e Ciência da Universidade do

Porto (MHNC-UP) inclui várias aguarelas da sua autoria de muito boa qualidade. No

entanto, as suas obras também foram ilustradas por desenhadores profissionais como

Sara Ferreira.

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2.3.2. Sara Ferreira

De Sara Ferreira, cujo nome completo é Sara Cabral Ferreira, para além dos desenhos

originais existentes na BPMP e no MHNC-UP, apenas se conhece o documento do

contrato de trabalho, o ano da morte e os elogios sobre o talento e a qualidade artística

do seu trabalho.

Assim, dos documentos existentes, sabe-se que a autora celebrou um contrato de

trabalho em 1919 para o exercício do “lugar de desenhadora anexo à Secção de

Sciencias Biológicas da Faculdade de Sciencias da Universidade do Porto, para que

fôra nomeada por conveniência urgente do serviço”10.

A informação sobre o ano da morte está registada num prefácio de um livro de Augusto

Nobre em que este escreve “Este trabalho, que é uma reedição ampliada do que eu

publiquei em 1913, é acompanhado de estampas, duas das quais foram ainda feitas pela

desenhadora da secção biológica desta Faculdade D. Sara Cabral Ferreira e falecida

em 1927 (…)” (Nobre, 1930c: 10). A partir deste dado foram solicitadas pesquisas ao

Arquivo Distrital do Porto e aos livros dos enterramentos dos cemitérios do Porto

existentes na Casa do Infante no entanto, não se conseguiu obter, até ao momento,

nenhuma outra informação biográfica sobre a autora. Paralelamente, foi realizada uma

pesquisa exaustiva à coluna de “Necrologia” e aos anúncios de falecimentos, funerais e

agradecimentos de missas de 7.º dia de todos os números do Jornal de Notícias

publicados no ano de 1927, que também se revelou inconclusiva.

Por outro lado, nos livros em que foram publicadas as suas ilustrações os respetivos

autores enfatizam, nos prefácios e nas notas de agradecimento, a perda precoce de uma

excelente ilustradora, o seu talento artístico e o rigor científico das suas ilustrações.

Disso são exemplo os seguintes textos:

“Os desenhos que acompanham êste trabalho são todos originais e foram

feitos, segundo exemplares frescos ou conservados, pela Senhora D. Sara

Ferreira, desenhadora da secção biológica desta Faculdade, recentemente

falecida, e que no exercício do seu cargo demostrou sempre o mais rigoroso

cumprimento dos seus deveres profissionais e um talento de artista, invulgar,

10 Consultar o contrato de trabalho no Anexo 1.

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melhor demonstrado ainda noutros trabalhos que executou e que ilustrarão

outras memórias especializadas, a publicar por êste Muzeu” – Augusto

Ferreira Nobre, no livro “Animais venenosos de Portugal” de 1928.

“Os desenhos que acompanham esta monografia foram ainda, e os últimos,

feitos pela desenhadora da secção biológica S. Sara Ferreira, com um talento

e cuidados invulgares (…)” – Augusto Nobre no livro “Crustáceos decápodes

de Portugal” de 1930.

“As estampas, em heliogravura, que acompanham êste trabalho, são

reproduções dos desenhos de exemplares do Museu desta Universidade,

devidos ao talento artístico da falecida desenhadora da secção biológica, D.

Sara Cabral Ferreira, os quais, sem favor, se podem considerar primorosos

e de rigor científico (…)” – Augusto Nobre no livro “Echinodermes de

Portugal – 1.º Fascículo – Asterídios” de 1930.

“(…) relativamente aos desenhos, bastantes foram feitos, mas a morte da

antiga desenhadora da secção biológica desta Faculdade, D. Sara Cabral

Ferreira, impediu que o seu talento artístico, bem evidenciado nas

primorosas estampas, as de cefalópodes e as dos nudibrânquios, pudesse ser

aproveitado na representação de outras espécies. (…)” – Augusto Nobre no

livro “Moluscos marinhos de Portugal” de 1931.

“A maior parte dos desenhos que acompanham êste livro foram feitos por

mim, segundo exemplares frescos, alguns ainda executados pela antiga

desenhadora da secção D. Sara Ferreira, e outros por reprodução

fotográfica ou desenho de gravuras publicadas por vários autores” –

Augusto Nobre no livro “Fauna marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes) de 1935.

“Êste livro é acompanhado de bastantes desenhos de animais, feitos pela

antiga desenhadora da secção biológica da Faculdade de Ciências da

Universidade do Porto D. Sara Cabral Ferreira; a sua morte, impediu porém,

que o seu talento artístico, bem evidenciado pelas estampas assinadas com o

seu nome, as quais podem ser consideradas como primorosas, sendo até

elogiadas por naturalistas estrangeiros e alguns desenhos de moluscos

reproduzidos em livros também estrangeiros, continuasse a prestar êste

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grande serviço à ciência e ao seu País” – Augusto Nobre no livro “Moluscos

marinhos e das águas salobras” de 1938-1940.

“A habilíssima desenhadora D. SARA CABRAL FERREIRA, sob a orientação

do PROF. SAMPAIO, meteu mãos à obra, chegando a desenhar cento e

cinquenta plantas” – Américo Pires de Lima no livro “Iconografia selecta da

fauna portuguesa” de 1949.

Os desenhos originais existentes nos arquivos do MHNC-UP da autoria de Sara Cabral

Ferreira remontam ao que se julga ser as suas primeiras obras, datadas de 1914-1916, as

quais, no entender de Mateus & Vieira (2017), eram muito promissoras e evidenciam

uma evolução muito rápida e um crescente domínio das técnicas de desenho a preto e

branco tanto nas obras de Zoologia como nas de Botânica, sobretudo as de Augusto

Nobre, Augusto Ferreira Nobre e Gonçalo Sampaio. “From her known original artwork,

the maximum exponent Sara Ferreira’s technique is revealed in the works of

echinoderms, done in monochromatic sepia tones” (idem: 5).

Tal como Augusto Nobre, a ilustradora assinou os originais dos desenhos como “Sara

Ferreira”, “Sara Cabral Ferreira” ou com a abreviatura “SF” e os desenhos impressos

nas várias publicações têm o nome ou a assinatura da autora, o que revela o

reconhecimento de um trabalho também autoral.

Não há registos da sua matrícula como estudante nem na Academia Politécnica nem na

Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Tal como no caso de Augusto Nobre,

desconhece-se se Sara Ferreira frequentou cursos ou aulas de desenho. Perante a

inexistência de informações que confirmem a existência de uma formação especializada,

o mínimo que se pode afirmar é que a elaboração dos desenhos assinados por Sara

Cabral Ferreira exigiu talento e vocação.

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Parte II

A contextualização dos temas

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3. A conservação das obras em papel

A conservação de obras em papel, também denominada como conservação de

documentos gráficos, é uma especialização dentro da área da conservação do património

cultural.

Uma das características que a distingue é a de ser uma área de conhecimento que

apresenta alguma complexidade tanto em relação aos objetos, materiais e tipologias de

acervos que dela fazem parte, quanto às especificidades das abordagens de conservação

preventiva.

No início da obra La restauración del papel, Muñoz Viñas afirma que “la conservación

y restauración de obra gráfica, libros y documentos es una de las especialidades más

extendidas” (2010a: 13) e identifica os textos impressos, manuscritos, pinturas

realizadas sobre papel, cartas náuticas, gravuras, selos filatélicos, desenhos a lápis, a

tinta, giz, globos terrestres, bonecos em papel, caixas de presentes, etc., como exemplo

da variedade de objetos que o que têm de comum é o suporte sobre o qual são aplicados,

em geral, o papel. Contudo, o autor lista outros materiais que não são fabricados em

papel como o pergaminho e o papiro, mas que também são utilizados para fins

semelhantes de suporte na elaboração de documentos, textos, livros ou registos similares

em determinada época e que podem ser encontrados nos acervos de bibliotecas e de

arquivos. Considerando o seu caráter gráfico e documental, também inclui na área da

conservação de obras em papel outros suportes de informação como as fotografias em

qualquer de suas modalidades (negativos, positivos, variedades antigas e

contemporâneas) e os registos filmográficos, fonográficos e informáticos.

Para além da dimensão e da variedade de suportes e acervos que podem ser abordados

nesta especialidade, é de referir ainda as micro especializações que surgiram,

respondendo a critérios próprios da conservação e que se estabelecem em função da

similitude de problemas e intervenções na área dos textos impressos e manuscritos, na

área de desenhos e gravuras, na área de livros e encadernações e na área da fotografia.

A maior parte dos trabalhos de conservação das obras em papel é realizada

predominantemente em bibliotecas e arquivos e em menor quantidade em museus; ainda

mais raramente também podem ser realizados em oficinas particulares ou em centros de

conservação e restauro de âmbito geral.

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O autor citado considera que este é um facto que resulta em algumas características

importantes para a área “porque cuatitativamente la mayor parte de los trabajos de

conservación y restauración de nuestro campo se desarollan en centros en los que lo

primordial no es la naturaleza artística del objeto, sino su contenido. Es decir, lo

primordial no es la capacidad del objeto para produzir sensaciones de tipo estético,

sino la información que transmite. Esto es lógico si pensamos en que, efectivamente, los

libros, los documentos, los periódicos, que se hallan en bibliotecas, en archivos o en

hemerotecas, se conservan como registros de información, y no como objetos de disfrute

visual” (idem: 21). Neste sentido, conclui que, na prática, o objetivo não é restaurar a

aparência original dos objetos mas, sim, conservar a informação que eles contêm. Ainda

nas suas palavras, “Por ello, el restaurador de este campo en realidad restaura muy

poco, pero conserva mucho. Es, con claridad, un conservador antes que un restaurador.

Su trabajo, su esfuerzo, sus técnicas, están fundamentalmente destinadas a evitar que

la información se pierda. Como veremos, esta circunstancia es crucial para entender

muchos aspectos de su trabajo” (ibidem: 22).

A perceção defendida por Muñoz Viñas de que em conservação de obras em papel se

conserva mais do que se restaura é recente e não acolhe unanimidade pelos diferentes

autores. Por exemplo, Hernampérez (1999), ao analisar a problemática da conservação

em arquivos e bibliotecas em Espanha, reconhece a existência de dois paradigmas, os

quais também podem ser identificados atualmente em instituições portuguesas. O

primeiro é o que o autor denomina por “paradigma intervencionista” em que a ação

sobre o objeto é realizada quando o dano já ocorreu, com grande protagonismo de

restaurador; e o segundo está relacionado com as propostas da conservação preventiva.

Esta coexistência de paradigmas explica-se não só pela importância que nas últimas

décadas a conservação preventiva tem assumido em museus, arquivos e bibliotecas, mas

também pelo facto do contínuo crescimento dos acervos documentais no mundo

contemporâneo tornar inviável o trabalho de restauro para o acervo como um todo,

existindo pontualmente para as obras que justificam esse tipo de intervenção. Por outro

lado, as políticas de preservação englobam várias outras ações para prolongar a vida e

dar acesso aos conteúdos informacionais dos vários suportes que constituem os acervos

de bibliotecas e arquivos como a generalização dos processos de digitalização.

Por sua vez, o estudo da origem e do desenvolvimento da área dos documentos gráficos

enquanto categoria patrimonial autónoma permite entender as especificidades das

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abordagens de preservação que tem assumido. Sem pretender uma abordagem

exaustiva, apresentam-se de seguida alguns acontecimentos, analisados a partir dos

processos de desenvolvimento do campo patrimonial ao longo do tempo e em contextos

específicos, que permitem delimitar a área dos documentos gráficos como categoria

patrimonial autónoma11.

Ainda que se reconheça que sempre existiu a tendência da humanidade para proteger e

preservar objetos valiosos, é no século XIX, com a atribuição de valor histórico ao

património, que se assiste ao início do desenvolvimento da conservação como disciplina

autónoma com a adoção de práticas e de um modelo estético representativo do gosto da

época.

No que se refere à obra de arte em papel, no seguimento das práticas do século XIX,

durante parte significativa do século XX “continuar-se-á a praticar o restauro

mimético, em busca da perfeição total, através de métodos que podem ser vistos hoje

como verdadeiros atentados à autenticidade das peças. Esta atitude manifesta-se nos

documentos gráficos de duas formas: através da limpeza de manchas e nódoas, uma

das facetas da intervenção e restauro exemplar que pretende devolver à obra de arte o

seu estado imaculado, no momento de produção inicial (o original); através da

reintegração perfeita e do retoque minucioso para disfarce de toda e qualquer anomalia

com vista à execução de um restauro invisível” (Casanova,2011: 87).

Apesar de ter a conservação e restauro da pintura como modelo, é de realçar o contraste

das práticas aplicadas no papel com os procedimentos realizados na pintura. Tanto o

valor atribuído à peça como o estatuto do operador que exerce o restauro é diferente no

caso da pintura e da obra arte em papel.

No primeiro, à obra de arte, mais difícil de manipular e com um estatuto superior numa

hierarquia patrimonial, aplicam-se-lhe diretamente as teorias de restauro consagradas ao

“monumento”. O restaurador de pintura tem que ser um artista consumado com

“paciência”, enquanto o restaurador de papel pode ser simplesmente o amador-

colecionador e o encadernador, interveniente, desde longa data, nos materiais de arquivo

e biblioteca, é apenas um artífice que tem os mesmos objetivos de intervenção perfeita,

ainda que recorrendo, por vezes, a métodos mais radicais, numa ótica de rentabilidade.

11 A abordagem assenta sobretudo nos contributos de Maria da Conceição Casanova na sua Dissertação

para obtenção do grau de Doutor em Conservação e Restauro: Teoria, História e Técnicas em 2011.

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Nos finais dos anos sessenta, duas circunstâncias vão determinar a autonomia da área

dos documentos gráficos e a sua ascensão em termos de estatuto. A primeira foi a

ocorrência de uma catástrofe, – a inundação da Biblioteca Nazionale Centrale di Firenze

de Florença em 1966 –, e a segunda foi a identificação dos processos decorrentes da

acidez nos acervos de papéis modernos.

Como consequência do desastre natural, a necessidade de uma resposta de tratamento

para uma gigantesca quantidade de obras muito danificadas e a necessidade de respostas

rápidas para que os danos não se agravassem, levou a uma mudança de escala em termos

de procedimentos de preservação, ao surgimento de novas técnicas de conservação, ao

fortalecimento do papel do técnico especializado e à exigência da aplicação imediata da

ciência e da tecnologia à área. É desta forma que, em finais da década de 70, se rompe,

definitivamente, com a tradição do restauro imitativo e se dá início a uma nova

abordagem: a da conservação baseada na gestão integral das coleções (idem: 89) e a

institucionalização do ensino em conservação e restauro de livros e documentos.

A segunda circunstância que marca e caracteriza o desenvolvimento da disciplina da

Conservação de obras em papel foi a identificação da acidez como um dos principais

fatores de degradação do suporte papel. Com a industrialização do processo de

fabricação do papel, em meados do século XIX, passou-se a utilizar como matéria-prima

a celulose proveniente da madeira. Ora, o uso de químicos agressivos para a obtenção

da celulose, a presença de resíduos de lenhina que tem tendência a degradar-se e a gerar

componentes ácidos e, ainda, um processo de fabricação das folhas de papel também

em meio ácido, foram determinantes para a baixa qualidade do papel industrializado e

para a autodestruição pela acidez. A intensidade da destruição ocasionada pela acidez

foi identificada e quantificada nas bibliotecas norte-americanas em princípios dos anos

1970 e, considerando o número de obras atingidas por este problema, desde então muitas

instituições investiram em pesquisas para desenvolver estudos, métodos e políticas para

deter ou reduzir o processo de deterioração dos papéis (Hernampérez,1999).

Em Portugal, e analisando a evolução da conservação e do estatuto profissional do

conservador restaurador, Conceição Casanova afirma que os documentos gráficos estão

entre as primeiras categorias de bens culturais a serem objeto de medidas de salvaguarda

e proteção, nomeadamente, a documentação de arquivo, com funções probatórias no

nosso país (2011: 109).

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Tal como se verificou noutros países, a evolução dos conhecimentos na área da

conservação de documentos gráficos ficou a dever-se aos colecionadores e aos eruditos,

mas também aos bibliotecários-arquivistas que, desde cedo, se referem aos problemas

de conservação – que são estruturais – e tentam definir as condições de preservação dos

documentos gráficos. E será em inícios do século XX que o cientista, na pessoa do

biólogo, começa, no nosso país, a posicionar-se no meio. Esta realidade é especialmente

evidente na área dos documentos gráficos onde as dificuldades, nomeadamente com o

controlo de pragas, eram grandes face às contingências por que passaram as coleções e

fundos dos mosteiros e conventos. Por seu lado, a partir da década de quarenta, foram

promovidos estudos no âmbito da conservação preventiva, mais especificamente no

âmbito do controlo de pragas, apoiando-se também trabalhos nas áreas de intervenção e

restauro dos espécimes pela Inspecção Superior das Bibliotecas e Arquivos.

É neste contexto que surge, em 1960, uma das raras publicações em português sobre

métodos de restauro: o relatório técnico de Emília Alvelos. Até esta data, a obra mais

difundida que contempla técnicas de restauro é a publicação de Manuel Macedo,

publicada em 1885, “Restauração de quadros e gravuras”. Aquela autora compara no

seu relatório as técnicas que viu utilizar nos Archives Nationales de França e na

Biblioteca Nacional de Lisboa; representando estas duas instituições as duas correntes

de restauro existentes à data: os métodos importados dos Estados Unidos, na sequência

já dos trabalhos de William Barrow, em prática nos Archives Nationales, e os métodos

mais tradicionais, do branqueamento à consolidação e restauro com adesivos naturais,

em prática na Biblioteca Nacional.

As décadas de sessenta e setenta representam, entre nós, uma nova era que

institucionaliza a área dos documentos gráficos como um dos sectores a contemplar nas

políticas estatais de salvaguarda do património.

Em regra, Portugal reflete a linha de orientação da Europa quer no que se refere às

conceções sobre as políticas culturais em geral, quer às iniciativas de salvaguarda e

recuperação do património. O paralelismo vai até o extremo da ocorrência de fenómenos

conjunturais, como a inundação que destruiu parte da coleção de Calouste Gulbenkian,

levando a novas iniciativas.

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4. As causas de dano e alteração das obras em papel

Múltiplas são as causas que podem afetar a conservação do papel e múltiplos são os

efeitos que podem produzir.

As causas de dano e alteração podem ter origem tanto em fatores intrínsecos como em

fatores extrínsecos que, por sua vez, podem ser subdivididos em função da sua natureza

conforme a sua atuação seja habitual ou ocasional. Além disso, qualquer que seja a causa

primitiva, a sua atuação poder ser complementada por diversos efeitos sinérgicos e

cumulativos, sejam eles intrínsecos ou extrínsecos, pois as causas atuam de forma

interdependente (Crespo & Vinas, 1984:21) e a natureza mecânica e química das

reações pode variar consoante a composição dos materiais.

4.1. Fatores intrínsecos

Os fatores intrínsecos de alteração são inerentes à própria estrutura do papel e dependem

da qualidade e do processamento das matérias-primas utilizadas no seu fabrico, assim

como da conceção e da montagem do objeto final. À semelhança de qualquer material,

a técnica e/ou os processos de fabrico têm implicações diretas nas caraterísticas físicas

e químicas do papel.

Pode definir-se papel como uma folha formada, seca e acabada, de uma suspensão de

fibras celulósicas, as quais foram desintegradas, refinadas e depuradas e tiveram ou não

a adição de outros ingredientes, para dar ao produto final, características de utilização

(Fritoli, 2012). No seu fabrico utilizam-se fibras vegetais (algodão, linho, cânhamo,

palha de trigo, de coco, kozo, gampi, etc.), fibras da madeira (sobretudo de árvores

resinosas e folhosas) e fibras secundárias ou recicladas.

Como referido por Crespo & Vinas (1984), originalmente, aquando da sua invenção no

Oriente, o papel era produzido apenas por restos de tecidos de origem animal (a seda) e

determinados vegetais. Na Europa, os papéis fabricados até final do século XVIII

utilizavam fibras de celulose nobres, longas e resistentes como as do algodão, do linho

e do cânhamo, através de processos de manufatura artesanais isentos de aditivos

químicos. O papel é produzido artesanalmente em pequenas quantidades e é

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essencialmente composto por celulose12 e água, tendo como únicos aditivos a cola

vegetal ou animal e a cal como agente branqueador. Nos últimos anos do século XVIII

e os primeiros do século XIX, com a invenção da imprensa, a generalização da educação

e das comunicações, o uso do papel tornou-se generalizado. A procura crescente faz

com que fosse necessário recorrer a processos de produção mais rápidos e em massa

para a obtenção de maiores quantidades de papel a baixo custo. É neste contexto que

surgem os primeiros sistemas mecânicos de fabrico contínuo, ainda de forma artesanal.

A composição do papel é essencialmente a mesma, celulose e água, contudo passam a

ser utilizados produtos químicos como o sulfato de alumínio potássico e o cloro, que

fragilizam as fibras do papel (idem: 4).

Para fazer face à escassez e ao preço elevado das matérias-primas de origem vegetal, a

indústria papeleira recorreu à pasta de madeira como matéria-prima da produção do

papel a partir de 1850. Esta profunda transformação só foi possível com o início dos

processos industriais de preparação da pasta mecânica de celulose e a industrialização

do processo químico do fabrico de pasta.

Os papéis produzidos através de processos industriais em série são constituídos

principalmente por fibras, ou seja, os elementos celulares dos vegetais de árvores

resinosas e/ou folhosas (ibidem: 5). Estes elementos entrelaçam-se formando uma rede

na folha de papel conferindo-lhe a maioria das suas propriedades. Quando são

originárias de madeiras resinosas (como pinheiro e o abeto) dão origem a estruturas

resistentes e homogéneas, uma vez que consistem em fibras longas que

microscopicamente podem ser identificadas através de uma forma alongada e de

pontuações aureoladas. As fibras que provêm de árvores folhosas (como o eucalipto, o

choupo, o castanheiro, a faia, etc.) dão origem a papéis menos resistentes por terem

fibras mais curtas e distinguem-se das primeiras por não conterem pontuações e terem

12 A celulose é um polímero de cadeia longa, muito abundante na madeira, podendo também ser

encontrado em folhosas e em frutos, como o algodão. “Esse polímero é formado por unidades

monoméricas de glicose. A característica de compostos como a glicose é conter um grupo alcoólico ligado

a um átomo de carbono vizinho a um grupo carbonila, podendo este ser um grupo aldeído ou cetona”

(Teixeira et al., 2017: 1369). A celulose é o principal componente das paredes celulares de todos os

materiais de origem vegetal, constituindo o seu elemento estrutural, mas a sua percentagem varia com a

espécie vegetal e o tipo de material em causa. Como consequência, e como referem dependendo da espécie

e da parte da planta utilizada, os materiais apresentam uma percentagem de celulose diferente. Por

exemplo, é mais alta nos materiais derivados de dicotiledóneas herbáceas e mais baixos nos derivados de

coníferas: algodão 95%, linho 80%, cânhamo 77%, juta 60%, madeira de coníferas 58-60% (Caneva et

al., 2000: 71). A deterioração da celulose produz-se, principalmente, por ação de microrganismos.

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terminações mais esguias. O algodão e o linho também são utilizados como materiais

fibrosos pois possuem alta pureza química, resistência e grau de polimerização.

Dependendo do procedimento utilizado, as pastas de madeira podem ser tratadas

mecanicamente, sem intervenção de qualquer produto químico, formando as pastas

mecânicas, ou podem ser tratadas quimicamente formando as pastas químicas (Crespo

& Vinas, 1984). Em ambos os tipos de pasta, a madeira é descascada, lavada, reduzida

a fragmentos e depois trabalhada. O papel de pasta mecânica é obtido a partir da madeira

por meios mecânicos e não é muito durável porque a celulose não é separada das

substâncias incrustantes (lenhina, pectinas, taninos, ceras) e as fibras aparecem muitas

vezes em feixes. As pastas de madeira semi-químicas sofrem um tratamento químico

moderado para dissolver a lenhina, reduzindo a sua quantidade e a de outros

componentes não celulósicos. Por sua vez, as pastas químicas são preparadas sob a ação

de produtos químicos que eliminam grande parte das impurezas aproveitando apenas a

celulose e o seu material fibroso sem a lenhina porém, a pasta assim obtida tal como a

pasta mecânica, contém resíduos de cloro e colofónia-alumina, constituída por resina e

sulfato de alumínio, uma substância ácida que degrada o papel (idem: 6).

Todavia, a alteração da matéria-prima e dos processos de fabrico teve consequências

diretas na qualidade do papel, comprometida pela queda na qualidade das fibras de

celulose – mais curtas, frágeis e com uma modelação diferente das obtidas pelo processo

artesanal – e pela utilização de aditivos químicos, passando-lhe a conferir instabilidade

química e fragilidade física. Por estes papéis terem na sua composição lenhina, aditivos

como colofónia-alumina, branqueadores à base de cloro, produtos desagregadores de

natureza ácida, entre outros, ao serem potenciados por agentes externos serão causa de

reações ácidas cuja consequência é a rutura das cadeias moleculares da celulose

(hidrólise) traduzida na maior friabilidade e na redução da resistência mecânica do

papel. A oxidação da lenhina e da colofónia provoca o amarelecimento do papel

(ibidem: 6) .

Para além do tipo de fibras e do tipo de processo de fabrico, outras causas intrínsecas de

alteração do papel são o fator oxidante de determinadas tintas, o acrescento de papéis

de origens diversas na mesma obra e a existência de formatos anormais de determinados

documentos, como por exemplo mapas e volumes de grandes dimensões, que fazem

parte das peças documentais.

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4.2. Fatores extrínsecos

Os fatores extrínsecos de alteração podem ser físico-mecânicos, ambientais, químicos,

biológicos e situações extraordinárias de catástrofe (Bendix, 2010; Crespo & Vinas,

1984; Thomson: 1990).

Os primeiros são determinados sobretudo por ações de manipulação ou manuseamento,

deficiente acondicionamento, imposição de cortes, inscrições e marcas de propriedade,

características dos adornos de alguns tipos de encadernações, que podem provocar

danos como a separação das folhas, o aparecimento de manchas de gordura, suor e

saliva, cortes, perfurações do papel, rutura da encadernação e lacunas. Todos estes danos

resultam numa diminuição da capacidade de resistência mecânica do documento.

Os fatores ambientais que afetam a conservação do papel são a humidade e temperatura

incorretas, as radiações visíveis (luz) e invisíveis. A humidade, e mais concretamente a

humidade relativa13, está intimamente relacionada com a temperatura que, entre si, têm

uma relação inversa. Em termos gerais, quanto mais alta é a temperatura mais reduzida

é a humidade relativa e, ao contrário, quanto mais baixa é a temperatura mais elevada é

a humidade relativa. Nos materiais orgânicos, o aumento da temperatura e da humidade

relativa é potenciadora da ocorrência de reações químicas que contribuem para a

degradação do papel. Um nível de humidade relativa entre 55 e 65% minimiza danos

mecânicos, pois os materiais mantêm a sua flexibilidade; contudo, acima de 65%

favorece a degradação química do papel por acidez e hidrólise, a corrosão metálica de

determinadas tintas e elementos metálicos das obras, a ondulação das folhas, a

colonização microbiológica, o aparecimento de insetos, de manchas, fissurações,

lacunas e a dissolução das colas. Abaixo dos 45%, provoca alterações das dimensões

físicas das obras como deformações várias, fissuração, quebras e ruturas nas folhas

(Bendix, 2010).

Relativamente aos efeitos da temperatura, o calor, associado à humidade relativa baixa,

pode provocar a escamação e consequente fragilização do papel; enquanto o calor

associado à falta de ventilação, provoca o crescimento de microrganismos e proporciona

13 A humidade relativa define a relação entre a quantidade de vapor de água existente num determinado

volume de ar, a determinada temperatura, e a quantidade máxima de vapor de água que esse mesmo

volume de ar poderia conter, à mesma temperatura. É expressa em percentagem. Dados consultados em:

http://www.prof2000.pt/users/LA/humidade.htm

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um ambiente favorável ao aparecimento de insetos (idem). O frio, isto é, menos de 10°C

de temperatura, associado a uma humidade relativa elevada e a uma fraca circulação de

ar, pode criar um ambiente húmido e proporcionar o aparecimento de microrganismos,

como fungos e bactérias.

Quanto mais bruscas forem as flutuações da humidade relativa e da temperatura mais

danos causam ao papel. Alterações moderadas, durante um longo período de tempo,

produzem uma tensão mínima sobre os materiais, que assim ficam protegidos dos

fenómenos nefastos de expansão e contração.

Se bem que a luz tenha uma importante ação germicida sobre determinados

microrganismos e seja nociva para alguns insetos, o seu excesso, especialmente na

presença de determinado tipo de radiação eletromagnética e na presença de poluentes

atmosféricos, provoca alterações cumulativas e danos irreversíveis por foto-oxidação no

papel. Verifica-se o aumento da fragilidade, a diminuição da resistência e a alteração

das características colorimétricas (descoloração, amarelecimento, escurecimento).

Outro aspeto importante a considerar é o facto das reações químicas desencadeadas pela

exposição à luz continuarem a ocorrer mesmo depois de a fonte de luz ter sido removida

e dos documentos terem sido colocados em locais não iluminados (Crespo & Vinas,

1984; Thomson: 1990).

Na atmosfera, para além do vapor de água que determina a sua humidade, existe uma

série de elementos químicos como o oxigénio, o nitrogénio, o ozono, pequenas

partículas de dióxido de carbono, etc., que sendo os elementos que permitem a vida,

também são os que permitem a combustão, a fermentação, a hidrólise e a oxidação dos

materiais gráficos (idem). Para além destes elementos, estão presentes uma série de

impurezas provocadas pela natureza e pela atividade humana, como a poluição sólida e

gasosa, que produzem efeitos abrasivos, catalisadores e de contaminação biológica

sobre o papel. Por um lado, os poluentes sólidos como a fuligem, as poeiras, as cinzas e

os resíduos sujam os documentos gráficos; por outro lado, absorvem os gases poluentes

existentes no ar e propiciam o desenvolvimento de reações químicas nocivas.

Muitas vezes estão presentes sais, como o cloreto de sódio e cristais de sílica resistentes

e cortantes. Nesta mistura química também se incluem os esporos de incontáveis

microrganismos, como fungos e bactérias, que vivem no material orgânico das poeiras.

Os poluentes gasosos são provocados sobretudo pela queima de combustíveis. Poluentes

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como o dióxido sulfúrico, sulfureto de hidrogénio e dióxido de azoto combinam-se com

a humidade do ar formando ácidos que atacam a danificam o papel. O ozono é um

oxidante poderoso que danifica gravemente todos os materiais orgânicos (Crespo &

Vinas, 1984: 22).

Para além da poluição de origem externa, os ambientes internos dos locais de arquivo e

exposição de coleções contêm materiais e substâncias14 que podem causar alterações e

danos aos materiais gráficos. São disso exemplo, a oxidação dos metais das

encadernações – quando é superficial e homogénea: provoca escurecimento; quando é

pontual e profunda: provoca corrosão –, a acidificação e a fragilidade física dos

materiais de suporte das obras; a alteração das caraterísticas colorimétricas dos materiais

de suporte e dos elementos gráficos dos documentos, como o amarelecimento, o

escurecimento e o desvanecimento.

Relativamente aos fatores biológicos, de entre os múltiplos agentes que produzem

alterações nos documentos em suporte de papel, destacam-se os insetos, os

microrganismos e os roedores.

A presença de insetos nos arquivos e nas bibliotecas, tanto na condição de habitantes

regulares, como na condição de habitantes ocasionais, podem originar infestações e a

perda total de documentos (ibidem: 23). Existem mais de cem variedades de insetos

bibliófagos15. A presença e o desenvolvimento de todas as variedades dos insetos

beneficiam de ambientes escuros, com temperatura e humidade relativa elevadas,

sujidade e más condições de ventilação. Os danos que provocam traduzem-se em

orifícios e manchas, sendo estas últimas provocadas pelos seus excrementos e saliva; os

danos físicos variam conforme a espécie de inseto presente.

Os microrganismos são formados por dois grandes grupos, os fungos e as bactérias. O

papel representa uma fonte de carbono orgânico para muitos microrganismos e

organismos heterotróficos16. Além disso, e como referem Caneva et al. (2000: 90) o

14 Nos ambientes internos das instituições destacamos os materiais de construção dos edifícios, os

materiais de decoração, os materiais de suporte às coleções, os produtos de limpeza, as substâncias

emitidas pelo funcionamento de certos equipamentos, as partículas e as substâncias que as pessoas

transportam e depositam nas instalações e nos documentos pelo manuseamento (Thomson, 1990).

15 Os insetos que mais vulgarmente provocam danos em bibliotecas e arquivos são o caruncho, o peixe

de prata, o piolho dos livros e as térmitas.

16 Designação do organismo que não consegue sintetizar o seu próprio alimento, necessitando de

substâncias orgânicas fornecidas pelo ambiente. Dados consultados em:

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papel utilizado para a elaboração de livros, cadernos, gravuras, etc., contém uma série

de substâncias orgânicas como colas animais e vegetais, tintas, pigmentos e

encadernações que podem aumentar a biodeterioração. A ação dos microrganismos

sobre o papel tem um caráter físico e químico, como o foxing17 e o amolecimento do

papel, podendo chegar ao estado de desintegração.

Os roedores são geralmente perigosos não só por exercerem uma ação mecânica

destrutiva sobre o papel que roem (Crespo & Vinas, 1984:23), mas porque deixam

dejetos, transportam muitas impurezas, sujidades, microrganismos e insetos e podem

atacar outro tipo de materiais e equipamentos favorecendo a ocorrência de acidentes,

como incêndios.

Além disso, as situações extraordinárias de catástrofe de maior gravidade podem

provocar a destruição em massa de milhares de documentos. As inundações e os

incêndios figuram entre as mais dramáticas. As primeiras provocam a migração de

tintas, rutura das folhas, perda de substâncias colantes, perda das encadernações,

manchas, pastas destacadas, manchas de barro ou outros produtos que a água leve em

suspensão, o favorecimento do desenvolvimento de fungos, etc.. Em relação aos

incêndios, os danos causados pelo fogo vão desde a perda total, até ao dano mais ou

menos parcial das coleções e/ou dos documentos.

Por último, tal como Crespo & Vinas referem, convém ter presente que a ação humana,

é a causa direta ou imediata de todos os processos de alteração dos documentos, ainda

que “contribuya a su conservación y sea la última razón de la misma” (1984:16)

https://www.infopedia.pt/$heterotrofico

17 O foxing é uma alteração que se manifesta através de manchas de cor castanha, com formas e dimensões

variáveis, mas na sua maioria reduzidas. A causa do foxing ainda não é conhecida com exatidão. Alguns

autores consideram os fungos como os principais responsáveis por esta alteração; outros consideram que

é a presença de impurezas de origem metálica (ferro, cobre) em áreas manchadas que favorece este tipo

de alteração; outros ainda pensam que é a coexistência dos dois fatores – o químico e o biológico – a

causa do fenómeno (Caneva et al., 2000:92).

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5. O desenho na representação da ciência

Se o desenho, como forma de expressão e de registo, surgiu do desejo do ser humano

representar aquilo que o rodeia, o desenho científico nasceu da relação entre a Arte e a

Ciência com o objetivo de “democratizar o conhecimento científico ou simplesmente

facilitar a compreensão de determinada teoria, através da sua tradução gráfica”

(Soalheiro, 2015:53). A partir do momento em que passou a ser utilizado para

representar graficamente de forma fiel o corpo humano, a fauna, a flora, os animais e o

universo, “passou a contribuir de forma relevante para a ciência, sendo elaborado de

forma objetiva e para fins científicos, dando início à nova forma de representação

gráfica: A Ilustração Científica” (Almeida, 2014:2).

A ilustração científica18, uma área específica do desenho, apresenta-se como “uma

ferramenta metódica, útil e objetiva, que possui uma capacidade comunicativa

orientada para a educação e a divulgação” (Salgado et al., 2015: 381). A sua função

básica é, portanto, a comunicação do discurso científico e técnico pela produção de

imagens desde a sua conceção à sua publicação nas mais variadas áreas temáticas.

Pode ser definida como uma imagem desenhada que é usada para acompanhar um texto

de carácter científico ou tecnológico, substituindo ou complementando a linguagem

verbal, servindo para explicar, interpretar, acrescentar ou sintetizar a informação que

nele aparece (Rodríguez, 2016). Ou seja, a ilustração científica não ocorre fora do

trabalho científico que a determina e, de alguma forma, define-se pela sua própria

designação (Migoya, 2017).

Nascida da relação entre a Arte e a Ciência, tem um propósito mais didático do que

estético, uma vez que a correta transmissão de informação é sempre mais importante do

que o aspeto visual da imagem. Tal como refere Correia “da Ciência herdou o culto

pelo rigor, pelo método e protocolos, pela explicação; da Arte, o incentivo pelo que tem

impacto visual, pelo que é esteticamente belo e apelativo. De ambas, a necessidade de

ser criativa e universal, procurando assim ser acessível e passível de ser

18 Na bibliografia consultada os termos “ilustração científica” e “desenho científico” aparecem como

termos equivalentes. Apesar de neste relatório designarmos as obras estudadas como “desenhos

científicos”, devido ao facto de um maior número de autores utilizarem o termo “ilustração científica”

apenas neste ponto será este o termo predominantemente adotado.

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apreciada/entendida/apreendida/utilizada por todos – tanto aqui em Portugal, como em

qualquer outra parte do Mundo” (2009: 39).

Apesar de poder variar muito em termos de composição, o ideal será que as ilustrações

científicas sejam a combinação, em proporções semelhantes, de suficiente verdade

científica e sensibilidade artística (Oliveira & Conduru, 2004), uma vez que a correta

transmissão de informação é sempre mais importante do que o aspeto visual da imagem.

O fundamental é que em termos de escala, forma, estrutura, cor e outras características

inerentes ao sujeito ou objeto, as ilustrações científicas sejam representadas com

exatidão e coerência, sem erros que possam implicar, por exemplo, confundir uma

espécie com outra (Rodríguez, 2016).

A ilustração científica abrange a ciência toda e mesmo que as áreas abrangidas não

estejam restritas ao âmbito científico e académico verifica-se que há áreas mais

divulgadas do que outras possivelmente, como adianta Rodríguez (2016), pela extensão

própria das mesmas e por terem sido estudadas durante mais tempo. E, como referem

Salgado et al., “em diferentes áreas da Ciência, é habitual classificar a ilustração

científica por áreas temáticas, como Biologia, Geologia, Paleontologia, Arqueologia,

Medicina, Etnografia e outras” (2015: 383) devido a diferentes exigências do ponto de

vista formal da representação dos seus conteúdos.

As ilustrações podem ser feitas por artistas ou desenhadores profissionais ou pelo

próprio investigador, seja porque este não tem acesso a um desenhador para documentar

os seus objetos ou porque prefere ser ele mesmo a fazê-lo. Evidentemente, dependendo

de quem elaborou as ilustrações de um trabalho científico e da capacidade do uso dos

artifícios pictóricos, mais ou menos liberdades artísticas poderão ser identificadas

(Oliveira & Conduru, 2004).

Em benefício da comunicação visual, a utilização de ilustrações na divulgação e no

ensino da História Natural e das Ciências foi enquadrada por um conjunto técnicas,

regras e convenções de representação gráfica que as uniformizam a execução e facilitam

o entendimento. Ainda que não exista um código internacional para a representação

visual, como refere Migoya (2017), estas técnicas e convenções evoluíram ao longo do

tempo e muitas são específicas de cada área científica. “(…) a direcção da luz,

orientação dos elementos, disposição das partes anatómicas, obedecem a normas que

os desenhadores respeitam (…), tomando partido de algumas pistas gráficas

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universalmente aceites (ex.: presença de uma linha de contorno para melhor definição

apesar de não existir de facto uma linha a bordejar os elementos, ou a omissão de partes

anatómicas para simplificação apesar de não haver amputação) (Jastrzebski, 1985;

Wood, 1994) ” (Marques, 2012: 154).

Para a obtenção de representações precisas, detalhadas e realistas os desenhadores

recorrem a um elevado número de técnicas. Na bibliografia algumas das técnicas de

utilização alargada mais citadas são a grafite, a tinta-da-china, a aguarela, o guache, o

acrílico e o lápis-de-cor. Das técnicas com utilização mais restrita são o pó-de-carvão e

superfícies como o scratchboard19, poliéster e coquille board20. Recentemente, a

utilização do computador e de programas de edição de imagem são encarados como um

acréscimo ou alternativa forte e versátil às técnicas ditas tradicionais, capazes de

melhorar a produção (ibidem: 158).

Na área das Ciências Biológicas, em termos gerais e se o desenhador utilizar exemplares

frescos das espécies21, o processo de realização de uma ilustração científica compreende

um conjunto de fases que passam pela recolha e conservação dos exemplares a ilustrar,

o estudo e observação do exemplar, a produção do desenho e o planeamento da

publicação (Soalheiro: 2014). A fase de produção do desenho propriamente dita poderá

ser a mais demorada porque implica a elaboração de um “desenho preliminar ou esboço”

e a elaboração de um “desenho final ou arte-final” implicando o conhecimento preciso

das regras e convenções de representação gráfica da área temática e a seleção das

técnicas e materiais mais adequados à representação da imagem desejada e às

capacidades do desenhador.

O “desenho preliminar” corresponde ao delinear inicial de uma ideia, geralmente sem

uma escala definida, porém, respeita as proporções do objeto representado. Este tipo de

desenho é de extrema importância para uma rigorosa e capaz ilustração científica

devendo ser realizado com o maior cuidado para esclarecer a morfologia geral da

espécie, o seu contorno, proporções e a geometria implícita dos vários elementos do

indivíduo. O desenho preliminar pode ser feito por observação direta do espécime, de

19 Scratchboard - superfície de duas camadas finas, uma de cartão coberta por outra de gesso, onde

geralmente se aplica tinta-da-china e trabalha por raspagem com uma lâmina (Marques, 2012: 159). 20 Coquille board - papel com textura circular característica onde geralmente se aplica grafite ou lápis-

de-cor (Marques, 2012: 159). 21 A ilustração científica também pode ser realizada a partir da observação de imagens de desenhos,

fotografias ou vídeos de exemplares de espécies.

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uma imagem ou fotografia ou até decalcando o contorno do exemplar para o papel

(Soalheiro, 2014). Em ilustração científica, esta fase do desenho é, geralmente,

elaborada a grafite usando o papel vegetal como suporte inicial. Também é comum a

escrita de anotações com informações sobre proporções, padrões geométricos de

determinados animais, numeração e disposição exata de determinadas estruturas. Se o

autor do desenho não foi o próprio investigador, também é frequente que o desenho

preliminar seja revisto do ponto de vista científico por um especialista. “Caso não sejam

possíveis este tipo de revisões com os especialistas no assunto, para cumprir com os

requisitos da ilustração científica pedir-se-á aos cientistas da rama mais próxima

(biólogos e/ou veterinários, quando o desenho abrange a zoologia; médicos quando o

assunto é o corpo humano, etc.) para rever os esboços” (Rodríguez, 2016:112).

Terminada revisão do desenho preliminar, a partir daí desenvolve-se o “desenho,

ilustração ou arte-final” com a sua transferência para o suporte final. A transferência

manual pode ser feita por decalque, com papel químico ou através de um manchado de

grafite realizado no verso da folha de papel. O desenho final é elaborado através das

técnicas e dos materiais escolhidos pelo ilustrador e que devem ser os mais adequados

à imagem a representar de acordo com as suas capacidades e competências.

5.1. Sobre a história da evolução do desenho científico

A realidade “objetiva” da representação da natureza ou do corpo humano é,

evidentemente, uma questão complexa e a forma como os cânones desta representação

e a objetividade se definiram e se transformaram ao longo do tempo tem uma história

própria (Rebouças et al., 2015).

Nesta história sabe-se que a origem dos desenhos ou ilustrações científicas remonta à

origem da humanidade cujo início pode ser traçado no tempo das pinturas rupestres. No

entanto, considera-se que a primeira tentativa de desenho natural foi realizada na Grécia

Clássica para acompanhar textos de Thysophrasus (372-288 a.C.); nos quatrocentos

anos que se seguiram, à exceção de ilustrações anatómicas de Aristóteles, não se

conhecem outros registos do mesmo género até Claudius Galenos (130-200 d.C.),

considerado por muitos autores o primeiro anatomista da história.

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Durante toda a época medieval, poucas ou nenhumas ilustrações científicas foram

realizadas e o Ocidente só voltou a ver desenho natural a partir do século XIV devido à

mudança de mentalidade impulsionada pelo Renascimento. “Na viragem do século XV

para o XVI, Nicolau Copérnico (1473-1543) demonstra o heliocentrismo da terra e

impulsiona assim uma grande mudança no pensamento intelectual e artístico da época.

Desta forma, a noção espacial mudou e a perspectiva foi inevitavelmente descoberta,

alterando a concepção formal dos objetos e respetiva representação gráfica. Os artistas

renascentistas, baseando-se na perspetiva, na geometria e na matemática,

demonstraram que uma representação natural de rigor científico é um patamar

alcançável pelo ser humano” (idem: 54-55).

Nesta época, destacam-se os trabalhos de Albert Dürer (1471-1528) e de Andrés

Vesálius (1514-1564). O primeiro é considerado um dos maiores e mais importantes

nomes do desenho científico do seu tempo por ter demonstrado uma grande preocupação

com a cópia fiel dos elementos naturais e com a mecânica anatómica do ser humano; o

segundo publicou, em 1543, uma obra anatómica notável pelo rigor científico,

preocupação estética e detalhe de elementos. Por curiosidade, apesar de Leonardo

DaVinci (1452-1519) ter sido um grande investigador que apoiou as suas pesquisas em

desenhos de incrível rigor, não se pode afirmar que tenha contribuído diretamente para

o desenvolvimento da ilustração científica na sua época, uma vez que os seus cadernos

de anatomia, botânica e invenções só foram encontrados e divulgados em 1898 (Le

Minor & Sick, 2012).

A invenção da prensa móvel em 1439 por Gutenberg (1398-1468) marca um grande

desenvolvimento na ilustração científica ao permitir a reprodução de desenhos em série.

Deste modo, as ilustrações deixam de ser exemplares únicos em coleções particulares

para poderem acompanhar livros e dissertações científicas.

No decorrer dos séculos XVII e XVIII, a ilustração teve várias escolas e acompanhou

as tendências gerais e estéticas de cada época. No século XVII, devido à realização de

grandes viagens para destinos desconhecidos e exóticos por parte de artistas e jovens

das classes privilegiadas conhecidas como Grand Tour, era muito comum que estes

viajantes publicassem os seus cadernos para darem a conhecer o que tinham observado.

E, assim, ainda hoje existem inúmeros registos gráficos de animais, plantas exóticas,

ruínas de templos e construções de civilizações antigas, muitas das quais extintas ou

desaparecidas (Soalheiro, 2014). No século seguinte destacam-se os contributos dos

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naturalistas Carl Linnaeus (1707-1778) e Georges Leclerc (1707-1788) para o

aperfeiçoamento do desenho científico.

No século XIX, a revolução científica, a intensificação da Grand Tour e a abundante

publicação de livros ilustrados, são contributos decisivos para o surgimento de uma nova

realidade na arte de ilustrar o objeto de estudo da ciência levando à consolidação do

padrão do desenho “realista” e “objetivo”, assim como a ilustração científica enquanto

atividade e tema de ensino (Soalheiro, 2014: 56).

Começando por destacar a “Viagem do Beagle” de Charles Darwin (1809-1882)

acompanhado pelos ilustradores Augustus Earle e Conrad Martens da qual resultou a

publicação de um álbum de ilustrações e do livro “A origem das espécies” em 1859, a

obra científico-natural mais importante deste século; evidenciam-se ainda as ilustrações

médicas de Henry Gray; as ilustrações dos relatos dos naturalistas viajantes europeus

como as da viagem de Eugène Delacroix a Marrocos; as ilustrações do livro “Birds of

America” de John James Audubon e do “Atlas de Anatomia Humana e Cirurgia”

publicado por Bourgery (idem: 57). Como consequência das viagens do Grand Tour

surge a criação das coleções naturais nos antecessores dos Museus de História Natural,

os Gabinetes de Curiosidades de História Natural.

Paralelamente, as exigências de qualidade artística e técnica das ilustrações dos livros

para a nova burguesia foram beneficiadas por novas técnicas de reprodução de imagens

aliadas à impressa tipográfica com o uso da xilogravura, da calcogravura e mais tarde

da litogravura que, com as suas linhas incisivas deu personalidade e autoridade aos

desenhos. A partir de 1880 a impressão off-set passou a substituir as gravuras na

ilustração dos livros (Rebouças et al., 2015). Por outro lado, a criação de um formato

mais pequeno de livro, similar ao do livro atual, permitiu que as publicações

começassem a chegar a uma maior quantidade de público levando, assim, ao aumento

da atividade editorial e ao incremento do trabalho de numerosos gravadores e

desenhadores de que são exemplo os casos de Joseph Wolf (1820-1899) e de Pierre-

Joseph Redouté (1759-1840). São ainda de realçar as invenções no campo da ótica, da

fotografia e da radiografia como contributos fundamentais para estimularem o

desenvolvimento do desenho científico e do aperfeiçoamento das suas técnicas.

O século XX pautou-se pela institucionalização e pelo reconhecimento do valor da

ilustração científica como uma ferramenta fundamental e as numerosas transformações

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tecnológicas nos sistemas de captação de imagem com a fotografia, no desenho, na

impressão e na divulgação das publicações levaram a uma transformação na área. Como

afirma Marques (2012), as diferentes tendências da investigação em ciência, a

sofisticação das inovações tecnológicas, a proliferação de bancos de imagens não

sujeitas a direitos de autor afetaram a capacidade das instituições de manterem

desenhadores como colaboradores a tempo inteiro. Todavia, atualmente a ilustração tem

um papel muito maior do que aquele que lhe é tradicionalmente atribuído (Santos-Silva,

2015), verificando-se uma procura crescente dos seus serviços, pois os suportes que

absorvem a ilustração científica estão em expansão. “De facto, os suportes que o

absorvem estão até em expansão, uma vez que o que era tradicionalmente considerado

a utilização típica de um desenho científico – artigos e manuscritos científicos, posters

e apresentações orais em congressos e várias outras interacções dentro da comunidade

científica –, abarca agora novas dimensões como o tempo e espaço, fazendo uso da

internet, animação e interactividade. Encontra-se por isso regularmente em revistas e

jornais impressos e online, livros escolares, livros infantis e para o público em geral,

guias de campo, exposições de museu e parques naturais, e até selos postais (2012:

158).

Na história do desenho ou da ilustração científica no nosso país, verifica-se que até ao

século XV as representações figurativas de animais e plantas existiam apenas por entre

os pormenores das iluminuras, pintadas por monges copistas em manuscritos e códices,

e nas designadas “pinturas portuguesas primitivas”22. A partir daquela data, Fernando

Correia afirma que Portugal, enquanto potência náutica impulsionadora dos

Descobrimentos, foi um dos países que mais contribuiu para a criação de uma nova

atividade profissional – a dos desenhadores ou riscadores, naturalistas – tendo sido os

fenómenos expansionistas “os genuínos responsáveis pela primeira vaga de

Ilustradores-naturalistas e do erigir das bases fundamentais da IC, tal como hoje se

entende” (2010: 3).

22 As pinturas a que o termo se refere são da autoria de um grupo de pintores portugueses de um ciclo

criativo (1450-1550) iniciado por Nuno Gonçalves e depois prosseguido e consolidado pelos pintores da

primeira metade do século XVI, com grande influência flamenga. Informação consultada em: Wikipédia

(2018). Pintores Primitivos Portugueses, disponível em:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pintores_primitivos_portugueses

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Estes desenhadores naturalistas acompanharam as primeiras expedições marítimas com

o objetivo de registar o património natural e/ou construído dos locais descobertos. Na

época era prática comum que os desenhadores embarcassem aos pares, não apenas para

facilitar a divisão do trabalho, apressar a conclusão da gigantesca tarefa de que eram

incumbidos à partida e prevenir uma morte acidental; mas também porque entre os

desenhadores se procurava a complementaridade de saberes e habilidades, pois “muitas

vezes um deles estaria mais habilitado para ilustrar os povos, seus costumes, ou o

entorno topográfico, enquanto o outro poderia ser mais hábil e dotado para a

representação da natureza que rodeava esses povoados e da qual dependiam

directamente” (idem: 4). Surgia, assim, a complementaridade entre o naturalista e o

desenhador.

O final do século XVIII marca a criação, em 1780, do ensino da ilustração científica em

Portugal com a Casa do Risco. Funcionou como a primeira escola de desenho científico

até 1796 “e a sua vasta equipa de Riscadores tinha como missão fazer a cópia e/ou as

artes-finais dos originais enviados pelos Desenhadores-aventureiros que

acompanhavam as expedições científicas ao ultramar” (ibidem: 11). A fundação desta

Casa terá estado associada à construção do Real Jardim Botânico no Palácio Real da

Ajuda de Lisboa em 1768 e à escola de desenho da Fundição de Canhões ou Arsenal

Real do Exército, reunindo num mesmo espaço técnicos de desenho de temas que iam

da botânica à zoologia, à geografia, cartografia, arquitetura e engenharia militar. Muitos

destes técnicos seriam oriundos das oficinas de desenho técnico-militar, treinados no

rigor sistemático e no método preciso e rigoroso, na procura da perfeição e da correção

(Correia, 2010).

Correia menciona ainda que, se a Escola do Risco representa o primeiro ensaio de um

ensino formal e estatal da disciplina de ilustração científica, à época existiam outros

Riscadores que fizeram uma aprendizagem não-formal, e dá como exemplo os casos de

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Joaquim José Codina23 e Joaquim José Freire24. É importante realçar também, nesta

época, a clarividência de pensadores da ciência como Domingos Vandelli que entendeu

a importância de uma relação simbiótica entre o naturalista e o desenhador, aplicando-

a na preparação das expedições científicas em que alguns naturalistas eram capazes de

desenhar e até pintar e alguns Riscadores eram capazes de preparar e conservar

exemplares orgânicos, efetuar medidas geográficas precisas e distinguir-se na atividade

científica, como sucedeu com o já mencionado Riscador Joaquim José Freire.

Nos finais do século XVIII, a ilustração científica em Portugal restringiu-se a trabalhos

pontuais e no século XIX manteve-se o “micro-ensino” do desenho científico “com um

Desenhador-principal, considerado como técnico principal, e um Aprendiz/discípulo,

figuras estas geralmente afectas aos Museus de História Natural e ao ambiente

académico universitário (produção científica). Por vezes, esta realidade extravasava

para o domínio das artes tipográficas, já que alguns litógrafos da época eram treinados

para a correcta representação dos espécimes a reproduzir (…). Se bem que por vezes

os desenhos científicos eram primeiramente delineados pelos investigadores, outros

casos havia em que os litógrafos assumiam a responsabilidade dessa tarefa” (Correia,

2010:s.p.).

Na cidade do Porto, e como referem Mateus & Vieira (2018), nas Escolas que

procederam a origem da Universidade, as aulas de desenho foram uma componente

curricular. No período entre 1762 e 1803, a “Classe Náutica" foi a plataforma para o

ensino de capitães e tenentes da marinha que, por volta de 1779, eram instruídos com

uma obrigatória “Classe de Desenho e Esboço” de mapas, máquinas e construções

navais. Estas duas classes foram a base da fundação da Real Academia de Marinha e

23 Joaquim José Codina (Portugal séc. XVIII - s.l. 1790). Desenhista, pintor, copista e aquarelista. Entre

1783 a 1790, participa como desenhista da expedição do naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira enviada

ao Pará, Amazonas e Mato Grosso, pelo Real Gabinete de História Natural do Museu da Ajuda de Lisboa,

sob o reinado de Maria I. Realiza desenhos aquarelados e croquis, sobre as mais diversas atividades

artesanais; e sobre embarcações, construções arquitetónicas e utensílios. Biografia consultada em:

Catálogo das Artes (2006), Joaquim José Codina, disponível em:

https://www.catalogodasartes.com.br/artista/Joaquim%20Jos%E9%20Codina%20/

24 José Joaquim Freire (Portugal [17--] - s.l. ca.1814). Pintor aquarelista, desenhista, riscador. Segundo-

tenente cartógrafo da Marinha Real Portuguesa, é aluno de João de Figueiredo. Durante os anos de 1783

a 1792, integra, com Joaquim José Codina (17-- - 1790), a expedição Viagem filosófica enviada ao Pará,

Amazonas e Mato Grosso pelo Real Gabinete de História Natural do Museu de Ajuda de Lisboa, sob o

reinado de dona Maria I. Realiza croquis e desenhos aquarelados que documentam as atividades artesanais

da população nativa, espécimes da fauna e da flora, vistas de cidades e vilas, construções, embarcações.

Biografia consultada em: Catálogo das Artes (2006), José Joaquim Freire, disponível em:

https://www.catalogodasartes.com.br/artista/Jos%E9%20Joaquim%20Freire/

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Comércio do Porto (1803-1837) a que sucedeu a Academia Politécnica do Porto (1837-

1911). Segundo Mateus & Vieira (2018), nestas instituições as aulas de desenho foram

consideradas uma condição de admissão para os estudantes aplicando-se ao programa

de Engenharia Preparatória na Escola do Exército e ao Curso Preparatório na Escola

Naval. Na Academia Politécnica do Porto Guilherme António Correia (1829-1901),

António da Silva (1850-1893), Vieira Portuense (1765-1805), Domingos António

Sequeira (1768-1837), João Baptista Ribeiro (1790-1868), Raimundo Joaquim da Costa

(1778-1862), Augusto Roquemont (1804-1852) e José Teixeira Barreto (1782-1810)

foram alguns dos professores associados a essas classes de desenho.

No século XX, verificou-se a integração da ilustração científica nos curricula das

principais universidades do país, sobretudo ao nível dos cursos de Biologia, Geografia

e/ou Geologia. A partir de 1912 com a criação da Universidade do Porto e das várias

faculdades e a com a reestruturação dos programas, o curso de Desenho para os alunos

da Faculdade de Ciências foi dividido nas disciplinas “ Desenho rigoroso”, “Desenho

de máquinas”, “Desenho Topográfico”, “Desenho aplicado à Cartografia” e “Desenho

à vista de Plantas e Animais”. Incluído na secção de Ciências da História Natural, este

curso foi ensinado por Alves Bonifácio (1860-1943) em 1911-1912 e mais tarde por

Paulo Ferreira em 1912-1918. Entre 1946 e 1962, os professores encarregues de

“Desenho Aplicado às Ciências Biológicas”, foram António Lima Fernandes de Sá e

Guilherme Rica Gonçalves (1919-2011). Aquando da reforma do ensino em 1974,

várias conjunturas circunstanciais acabaram por ditar o fim do ensino do desenho

científico nas universidades até que, em 1996, a foi criada a primeira disciplina de

“Ilustração Científica Moderna” no Departamento de Biologia da Universidade de

Évora (Mateus & Vieira, 2018; Correia, 2010) e a partir daí, a par com o ensino não-

formal, têm sido criados cursos de pós-graduação de Mestrado em várias universidades.

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Parte III

A metodologia de estudo e as atividades realizadas

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6. A metodologia de estudo

A realização de um estudo académico traz consigo certos requisitos que devem ser

estabelecidos para que seja garantido o seu caráter científico.

Assim, qualquer investigação deve definir, à partida, três tipos de princípios que estão

inter-relacionados, que a caracterizam do ponto de vista teórico e prático e, que, segundo

Burgess (1997), são os seguintes:

A metodologia geral, isto é, os princípios gerais pelos quais a investigação se

norteia.

A estratégia de investigação, ou seja, os princípios que regem o desenho da

investigação e o modo como são utilizados no estudo.

Os métodos e técnicas da investigação.

A metodologia geral, bem como a estratégia de investigação, definem-se pela adoção de

uma determinada perspetiva teórica ou paradigma. Para Coutinho (2011), perspetiva

teórica pode definir-se como um conjunto de esquemas teóricos que agrupam o conjunto

de cientistas que utilizam uma dada metodologia e uma prática de investigação num

dado momento histórico. Cumpre as funções de unificação de conceitos em relação a

questões teóricas e metodológicas e de legitimação entre os investigadores e define as

questões, o tipo de dados a recolher e a informação a produzir.

Atualmente, a opinião mais consensual defende a existência de três grandes perspetivas

na investigação em ciências sociais e humanas, a saber: a positivista ou quantitativa, a

qualitativa ou interpretativa e a sociocrítica ou hermenêutica (idem:10).

Atendendo às características do trabalho de estágio em causa e ao tipo de recolha de

dados, a perspetiva teórica adotada – ainda que nenhuma investigação dependa apenas

de uma única perspetiva – é a qualitativa e, com base nas definições apresentadas por

Coutinho (ibidem), são as seguintes as principais características a nível concetual e

metodológico que justificaram esta escolha.

Por não ser fácil encontrar uma definição unívoca para a investigação qualitativa, alguns

manuais apresentam-na como a que “não é quantitativa” ou a que descreve os

fenómenos por palavras em vez de números ou medidas. A nível concetual, o objeto de

estudo centra-se nas intenções e nas situações, ou seja, dirige-se ao particular, investiga

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ideias e a descoberta de significados nas ações individuais e nas interações sociais a

partir da perspetiva dos atores intervenientes no processo. A nível metodológico, baseia-

se no método indutivo. É a inter-relação do investigador com a realidade que estuda que

faz com que a construção da teoria se processe de modo indutivo e sistemático a partir

do próprio terreno à medida que os dados empíricos emergem. Na obtenção e na análise

dos dados utilizam-se, preferencialmente, técnicas de observação com a participação

ativa do investigador, contudo, não se exclui a utilização de uma metodologia mista,

integrando o quantitativo e o qualitativo. Na relação teoria-prática a perspetiva

qualitativa é de índole prática, pois o seu objetivo é o de melhorar a prática individual,

contribuindo para a descrição e a compreensão de situações concretas.

Após a seleção da perspetiva teórica, a escolha do método de investigação não deve ser

feita de modo aleatório, deve ter em consideração, entre outros, a especificidade da

problemática a ser investigada, a habilidade do investigador, os recursos disponíveis e

os pressupostos teóricos que sustentam o estudo. Assim, para a realização deste trabalho

selecionou-se o método etnográfico porque, sendo dotado de algumas técnicas

peculiares de recolha e tratamento de dados, permite a articulação metodológica com a

utilização da técnica de observação bem como a integração da utilização de informação

documental e da técnica de entrevista, sem outras implicações relacionadas com a

análise de dados ou a aproximação teórica ou epistemológica da etnografia.

Ainda que o método etnográfico de investigação tenha sido desenvolvido originalmente

pela antropologia social, atualmente não é exclusivo dos estudos antropológicos e tem

sido amplamente utilizado na análise de processos de trabalho, atividades de produção

de conhecimento e “atividades profissionais que implicam atos profissionais como

métodos e técnicas de trabalho devidamente definidas que interessa partilhar” (Veloso;

Lucas & Rocha, 2015:11). Por outro lado, e como referem Verd; Barranco & Moreno

(2007) é importante não esquecer que este método é fruto de diversas tradições de

investigação que têm como mínimo denominador comum o interesse pela retrato do

modo de vida de uma determinada unidade social, o uso de técnicas de recolha de dados

de caráter qualitativo – principalmente a observação – e a tendência para trabalhar com

dados não estruturados.

Para Oliveira (2006), citado por Tainan & Machado, a etnografia “consiste na soma dos

atos de olhar, ouvir e escrever” (2015: 137), em que o olhar se refere ao contacto com

o contexto da coleta de dados e aos processos da observação propriamente dita; o ouvir

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evoca a participação com o universo a ser pesquisado; e o escrever é a configuração do

resultado crítico e reflexivo da investigação, sendo o ato de maior importância porque o

ato de escrever é simultâneo ao ato de pensar.

No que concerne à técnica de investigação, privilegiou-se a observação participante que

é descrita como uma forma de recolha de informação naturalista ao permitir a

investigação de fenómenos nos seus contextos de ocorrência natural e é uma solução

para o estudo de fenómenos complexos, quando se pretende realizar análises descritivas

e exploratórias ou para a obtenção de informação por vezes não apreendidas por outros

métodos.

É uma técnica que exige rigor e sistematização específicos, diferenciando-se da

observação informal por ser utilizada a partir da definição de objetivos específicos e

questões de pesquisa sobre determinado contexto social. De uma forma geral,

distinguem-se dois tipos de observação, a não participante e a participante. Na primeira,

o investigador não se envolve com o objeto investigado, tem um papel de espectador do

objeto observado, os sujeitos observados desconhecem que estão a ser observados e o

investigador apreende uma situação tal como ela realmente ocorre. A segunda é um

método qualitativo com raízes na pesquisa etnográfica tradicional em que o investigador

é o principal instrumento da investigação ao recolher os dados nos contextos reais de

interação social.

A observação participante tem um duplo objetivo, o de envolver-se nas atividades da

situação estudada e o de observar as atividades, as pessoas e os aspetos físicos da

situação. A inserção do investigador no interior do grupo observado, tornando-se parte

dele e interagindo por longos períodos com os sujeitos, tem como objetivo partilhar o

seu quotidiano para sentir o que significa estar naquela situação. No dizer de Marietto

(2014), o observador participante experimenta estar dentro e fora da situação estudada

e transforma-se, a si mesmo, num importante instrumento de pesquisa com o seu corpo

e a sua linguagem.

Ainda segundo o mesmo autor, a observação participante completa constitui uma

estratégia de campo abrangente com o emprego de múltiplas e sobrepostas estratégias

de recolha de dados ao combinar simultaneamente as notas de campo com o exame de

documentos, entrevistas a participantes e informantes privilegiados, a participação

direta, a observação e a introspeção.

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Apesar de todas as vantagens inerentes à possibilidade da recolha de dados baseados na

observação de contextos naturais, os observadores/participantes devem estar cientes dos

riscos de serem parciais (Bell, 2008) e da possibilidade de modificarem e influenciarem

o contexto de investigação tanto quanto podem ser influenciados por ele. Por isso, sobre

o rigor e a validade científica da técnica, Malinowski ressalta que, na etnografia “o autor

é, ao mesmo tempo, o seu próprio cronista e historiador; suas fontes de informação são,

indubitavelmente, bastante acessíveis, mas também extremamente enganosas e

complexas; não estão incorporadas a documentos materiais fixos, mas sim ao

comportamento e memória de seres humanos” (1978: 18).

Por outro lado, é uma técnica que consome muito tempo, gera muita informação e que

requer um processamento e uma análise detalhados. Uma vez que o contexto, o ambiente

e mesmo a disponibilização dos grupos ou situações a serem observadas podem variar

bastante, não existe um consenso entre os diferentes autores mais relevantes na área da

pesquisa qualitativa sobre a existência de um roteiro pré-estabelecido para os

procedimentos operacionais na observação participante.

A recolha de dados através da observação participante no trabalho de estágio teve como

objetivo principal a descrição dos acontecimentos, locais, pessoas, materiais e

equipamentos, que ocorreram aquando da realização das atividades profissionais a

desenvolver da estagiária em relação com a orientadora da entidade acolhedora e os

atores que aí trabalham.

O registo dos dados observados incluem notas (das observações, e também insights

teóricos e metodológicos), fotografias, filmagens, documentos e entrevistas.

O instrumento através do qual se registam as observações é o diário de campo. Neste

documento, foram registados, da forma mais minuciosa possível, os acontecimentos

ocorridos em campo, seja o local de estágio ou outros contextos de investigação e

pesquisa de informação e documentos. Durante o período de tempo em que decorreu o

estágio, manteve-se um registo sistemático, cuidado e diário, pois foi este registo que

constituiu o elo de ligação entre as observações de campo e a análise e interpretação dos

dados recolhidos.

Por sua vez, a análise dos dados constitui um processo de interação entre o investigador,

a sua experiência e os seus dados. Neste estudo, e considerando a sua duração, objetivos

e características, procedeu-se a uma análise de conteúdo para identificação dos

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princípios subjacentes aos fenómenos estudados e utilizou-se a análise documental com

o objetivo de complementar a informação obtida por outras técnicas e para estudo

daquele tipo de informação que só existe em documentos escritos, como quando o

acesso a indivíduos se torna impossível.

Como refere Burgess, “o mundo está cheio de documentos que as pessoas escrevem,

enviam, conservam, publicam, exibem e seleccionam” (1997:135). Como “documento”

pode ser “um termo geral que designa uma impressão deixada num objecto físico por

um ser humano” (Bell, 1993:103) existem diferentes tipos de suportes que podem ser

investigados, desde documentos não escritos – como, por exemplo, a fotografia e os

filmes –, a documentos impressos de vários tipos. Por sua vez, os documentos podem

constituir fontes primárias ou secundárias, As primeiras são materiais que se reúnem em

primeira mão e têm uma relação direta com pessoas, acontecimentos ou situações que

estão a ser estudados. São exemplo disso, curtos registos, minutas, contratos, notas,

diários, memorandos, autobiografias e relatos (Burgess, 1997). As fontes secundárias

referem-se a materiais já publicados.

No trabalho de estágio, recorreu-se quer a fontes primárias, quer a fontes secundárias

com o objetivo de complementar a informação obtida nomeadamente pela observação

participante e pela técnica da entrevista. Após a obtenção, seleção e organização dos

documentos, procedeu-se a uma análise crítica do seu conteúdo e à extração de

informação relevante.

A entrevista como recolha de dados sobre um determinado fenómeno é a técnica mais

utilizada no processo de trabalho de campo e pode ser definida como uma conversa

planeada entre um entrevistador e um entrevistado com o objetivo de extrair

determinada informação a este último. Assim apresentada, e como escreve Bell, pode

parecer uma técnica muito simples, mas ter êxito com uma entrevista é muito mais

complicado do que a afirmação sugere. Esta autora cita Cohen que compara a condução

de uma entrevista a uma expedição piscatória que, “«tal como a pesca, a entrevista é

uma actividade que requer uma preparação cuidadosa, muita paciência e experiência

considerável se a eventual recompensa for uma captura valiosa»” (1993: 138).

A preparação de entrevistas pressupõe, assim, um trabalho de seleção dos temas, a

elaboração das questões – considerando o tipo de questões a utilizar e a sua ordem, bem

como a adequação dos termos e da linguagem –, a análise dos dados, um plano

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preparado, se possível, testado. Após de especificada a informação a recolher, há que

decidir o tipo de entrevista que mais provavelmente fornecerá essa informação. Quanto

ao tipo, as entrevistas situam-se naquilo que se pode designar como um “continuum de

formalidade”, em que num extremo se encontra a entrevista totalmente estruturada, em

que o entrevistador se comporta tanto quanto possível como uma máquina; no outro

extremo está a entrevista não estruturada ou aberta, cuja forma é determinada por cada

entrevistado (idem: 139).

No trabalho de estágio utilizou-se a entrevista semiestruturada individual como

complemento das outras técnicas selecionadas para obtenção de informações que

aprofundam os dados recolhidos na observação participante e na análise documental

junto de entrevistados privilegiados no acesso a essas informações.

Este é o tipo de entrevista que combina perguntas fechadas e abertas, para isso irão ser

elaboradas perguntas-guias, a propósito das quais será imperativo receber informação

por parte do entrevistado. Como afirma Quivy tanto quanto possível “«deixar-se-á

andar» o/a entrevistado/a para que este possa falar abertamente, com as palavras que

desejar e pela ordem que lhe convier”(2008: 192-193). O papel do entrevistador será o

de se esforçar por reencaminhar a entrevista para os objetivos cada vez que o

entrevistado deles se afastar e por colocar as perguntas às quais não chega por si próprio

no momento mais apropriado. As informações recolhidas serão objeto de uma análise

de conteúdo simples para extração dos dados relevantes.

Por último, e considerando a especificidade da Conservação de Documentos Gráficos,

para identificação e caracterização dos diferentes tipos de papel utilizados como suporte

dos desenhos científicos, do seu estado de conservação, bem como dos elementos

sustentados, neste trabalho recorreu-se às seguintes técnicas de exame e análise:

Exame por observação visual recorrendo à observação à vista desarmada e à

lupa de ampliação com vários tipos de luz.

Registo fotográfico para documentar e digitalizar fielmente as imagens os

documentos em estudo. Para o efeito foi utilizada a fotografia a cores, com luz

visível e uma tabela de temperatura de cor.

Microscopia eletrónica de varrimento acoplada à microanálise de raios-X para

identificação da estrutura e da composição do papel.

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Outras técnicas que se tornem acessíveis para aprofundamento dos objetivos

definidos, como para a confirmação da identificação de substâncias presentes

no papel, seja pela realização de testes microquímicos ou por técnica de exame.

Em trabalhos de pequena dimensão, se os instrumentos de recolha de dados forem bem

concebidos e tiverem sido convenientemente testados, estará “feito o trabalho básico

necessário à comparação, análise e interpretação da informação” (Bell, 1993:180).

Além disso, é preciso ter presente que os dados recolhidos pouco significado têm até

serem analisados e avaliados e que a análise e a interpretação dos dados não deve ir além

daquilo que os resultados permitem, nem fazer generalizações com base em dados

insuficientes.

Apesar de, mais uma vez, não haver “regras” que possam estabelecer-se no que diz

respeito a registos, codificação, indexação, análise e interpretação de dados, Burgess

(1997: 199) concluí que “a organização, a reflexão, a responsabilidade, a ponderação

e a flexibilidade são tão essenciais para a análise de dados como o são para a colheita

de dados”.

Deste modo, no trabalho de estágio foram tidos em conta e ponderados todos os aspetos

identificados para que a apresentação dos dados recolhidos possa ser considerada válida

e fiável.

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7. As atividades realizadas

Neste ponto apresenta-se e, em alguns casos, ilustra-se todas as atividades realizadas no

estágio, de acordo com a metodologia de estudo definida e pela sua ordem de ocorrência.

Diário de campo

Tal como definido na “Metodologia de estudo” foi realizada, através da observação

participante, uma recolha sistemática dos dados ocorridos aquando da realização das

atividades de estágio em relação com a orientadora da entidade acolhedora e os atores

que aí trabalham. O instrumento principal, através do qual foram registadas as

observações, foi o diário de campo, no caso, um caderno de linhas e um lápis escolhidos

para o efeito. Como instrumento auxiliar utilizou-se a câmara fotográfica do telemóvel

para obter fotografias e pequenas filmagens.

Deste modo, no diário de campo foram identificadas e descritas da forma mais

minuciosa e completa possível, desde o primeiro ao último dia, todas as atividades,

equipamentos e materiais utilizados, locais e pessoas envolvidas na realização do

estágio.

Já depois de ter sido iniciado o estágio e de ter começado a fazer registos manuscritos

encontrou-se a proposta da elaboração de um “diário etnográfico eletrónico” criado por

Paulo Brazão (2007) da Universidade da Madeira. Foi estabelecido um contacto com o

autor que, de imediato, disponibilizou a aplicação eletrónica do diário, contudo, apesar

de ter sido experimentada e de se ter verificado que era uma forma eficiente de registar,

organizar e extrair informações, no dia-a-dia do estágio tornou-se muito mais acessível

e rápido escrever os registos no caderno.

De seguida são apresentados exemplos (Figs. 3 e 4) dos registos de duas das páginas do

diário de campo.

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Fig. 3 - Diário de campo – anotações do dia 25. Fotografia da autora.

Fig. 4 – Pormenor de página do diário de campo – anotações do dia 26. Fotografia da autora.

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Registo fotográfico antes da intervenção

O primeiro procedimento efetuado foi o registo fotográfico de todos os documentos que

constituem o acervo de desenhos de António Nobre, num total de 282 fotografias, com

o objetivo de documentar o estado inicial em que se encontravam.

Para garantir um bom esclarecimento visual, o registo foi efetuado por um técnico do

Serviço de Digitalização da BPMP, na sala do serviço, numa mesa protegida com papel

isento de ácido e com luz natural. As fotografias foram capturadas com uma câmara

digital Canon EOS 600D, usando Codec RAW e convertidas para formato TIFF. Foram

feitas fotografias da frente e do verso de cada documento com cartão escala de cor

Kodak Colour Control Patches.

Exame preliminar ao acervo

O exame preliminar ao acervo teve duas finalidades principais, sendo a primeira delas

a de verificar a contagem do número de desenhos, identificar a sua autoria, os tipos de

papéis usados como suporte dos desenhos e o tipo de elementos sustentados. A segunda

finalidade foi a de selecionar os desenhos a intervencionar. Os resultados da análise

foram organizados num inventário, como se apresenta na Tabela 1, a partir das seguintes

categorias:

Forma de organização dos documentos – os documentos estavam organizados

em cinco capilhas e um envelope.

Autoria dos desenhos – a maioria dos desenhos tem assinatura de dois autores.

Tipos de papéis – os desenhos foram elaborados em dois grandes tipos de

papéis, um papel de cor bege e um papel fino de cor acastanhada.

Tipos de elementos sustentados – os desenhos foram elaborados a tinta e/ou a

grafite.

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Tabela 1 - Inventário do acervo de desenhos de Augusto Nobre

Tipo de papel, elementos sustentados

e assinatura

Papel bege e desenhos

a grafite

Papel bege e desenhos

a tinta

Papel

acastanhado e desenhos

a carvão

Assinatura

Augusto Nobre

Assinatura

Sara Ferreira

Lotes

Envelope original* 18 45 + 1** 10 1**

31 itens 31 31

1 item 1 1

23 itens 9 3 11 23

19 itens*** 17 2 7 12

2 itens 2 2

* - Envelope timbrado da Companhia Editora do Minho endereçado a Augusto Nobre, com morada da sua casa, com inscrição manuscrita de Augusto Nobre (?) “Desenhos feitos ao microscópio careas de seleritis de Echinodermess”, com desenhos em folhas de tamanho A5 ou idêntico, a maioria folhas com o timbre da “Universidade do Porto / Instituto de Zoologia / Museu”. Deste lote faz ainda parte o próprio envelope. ** - Recorte de impressão tipográfica de desenho da autoria de Sara Ferreira. *** - Este lote inclui 4 desenhos que já tinham sido intervencionados. Um pequeno papel manuscrito com inscrição “Desenhos de peixes de Portugal” que neste inventário foi considerado como “papel bege e desenhos a tinta”.

Seleção dos desenhos alvo de intervenção

Considerando a dimensão do acervo de desenhos – 137 desenhos, um envelope, uma

impressão tipográfica e uma inscrição manuscrita –, e considerando a duração do estágio

(160 horas), foi decidido selecionar uma parte dos desenhos para estudo e intervenção.

Os critérios de seleção assentaram na exclusão de todos os desenhos do lote “Envelope

original”, o próprio envelope, a impressão tipográfica e 4 desenhos que já tinham sido

intervencionados antes. Deste modo, foram selecionados 72 desenhos para objeto de

estudo e intervenção durante o estágio.

Análise documental

Após uma pesquisa bibliográfica prévia para identificação da biografia, percurso

profissional e obra do autor, com o início do estágio foi iniciado um levantamento

exaustivo quer das obras que o autor publicou com estampas para localizar se os

desenhos a intervencionar tiveram publicação, para fazer o estudo técnico e material da

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obra, quer da origem do acervo na BPMP. Esta pesquisa prolongou-se ao longo e após

a realização do estágio através da pesquisa e consulta de fontes primárias e fontes

secundárias.

Como fontes primárias foram consultadas, pelo menos, as seguintes: “Livros de

Aquisições” disponíveis da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP)

dos anos 1920/30 para identificação de empresas que fabricaram e/ou forneceram o

papel e as tintas utilizadas nos desenhos; outros desenhos originais da autoria de

Augusto Nobre e Sara Ferreira do acervo do MHNC-UP para confirmação de hipóteses;

documentos sobre a origem da doação do núcleo de desenhos do arquivo da BPMP. As

fontes secundárias passaram sobretudo pela consulta de livros de Augusto Nobre e de

outros autores que a eles tenham feito referência no acervo da BPMP e da Biblioteca da

FCUP; publicações e sites para identificação e interpretação contextualizada da

informação contida nas marcas de água; bibliografia sobre ilustração científica e artes

gráficas; e por jornais da época.

Caracterização do estado de conservação

No início do estágio foi definido que para cada desenho teria que ser preenchida uma

ficha e realizada uma limpeza mecânica, atividades estas que foram efetuadas em

conjunto para cada um dos desenhos.

Em paralelo, e após se ter identificado que os desenhos da autoria de Augusto Nobre

tinham sido publicados num livro também da sua autoria - “Fauna Marinha de Portugal.

I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)” de 1935 –, recorreu-se à consulta

permanente desse livro para aí localizar o desenho que estava a ser objeto de estudo e

intervenção. O procedimento utilizado foi o seguinte: a partir das informações inscritas

em cada desenho, como o nome do peixe e/ou o texto descritivo apresentado (no caso

de existir) e, na ausência destes dados, pela comparação dos desenhos no documento

original e no livro, identificava-se na ficha de conservação e no caderno de campo o

número da estampa e do desenho. Esta análise permitiu a identificação correta do nome

do peixe que, por vezes, no desenho original era difícil de decifrar, e completar eventuais

dados identificativos que faltavam no desenho original, como o nome do peixe.

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Para os desenhos da autoria de Sara Ferreira, o processo exigiu maior pesquisa

bibliográfica, que resultou na identificação de dois livros também da autoria de Augusto

Nobre, “Moluscos marinhos de Portugal” de 1931 e “Moluscos marinhos e das águas

salobras” publicado em 1938-1940.

Fig. 5 – Desenhos originais colocados sobre a página da estampa do livro de Nobre (1935).

Fotografia da autora.

Fig. 6 – Desenho da autoria de Sara Ferreira publicado em estampa do livro de Nobre (1931).

Fotografia da autora.

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A identificação das evidências de dano e alteração dos desenhos em estudo foi realizada

através do preenchimento de um modelo da “Ficha de conservação” usada no SC&R,

que se apresenta em anexo25.

Esta ficha está dividida em vários campos distintos, a saber: estado de conservação,

identificação técnica dos materiais, testes a realizar, registos diagramáticos, registos

fotográficos, proposta e plano de tratamento, identificação dos materiais utilizados,

avaliação dos resultados, conservação preventiva em depósito e referências técnicas dos

materiais utilizados no tratamento. O campo “estado de conservação” apresenta um

conjunto de danos e alterações da estrutura física do documento organizados em três

grandes categorias – “deformações”, “agentes externos” e “manchas” –; a identificação

do tipo de suporte, os elementos sustentados, sinais particulares, desinfestação anterior,

intervenções anteriores e ainda avaliação geral da obra com uma escala de quatro

parâmetros: Bom, Razoável, Mau e Muito Mau.

Como a escala para avaliação do “estado de conservação geral” da “Ficha de

conservação” não apresenta os respetivos critérios foram definidos, para cada parâmetro

da escala, os critérios ou princípios em função dos quais se emitiu os juízos de valor

aquando da realização da caracterização do estado de conservação, de modo a garantir

a realização de uma avaliação uniforme e coerente. A escala e os critérios são os

seguintes:

Tabela 2 - Escala e critérios de avaliação do estado de conservação geral

Bom Não se observa dano.

Alteração resultante do envelhecimento natural do papel.

Razoável

O dano existe pontualmente.

Tipo de dano: sujidade geral, danos mecânicos como vincos, ondulações, dobras, manchas pontuais, amarelecimento.

Mau

Dano que ocupa de 1/3 até 2/3 da obra.

Tipo de dano: lacunas, pequenos rasgões, perda de flexibilidade, evidências de biodeterioração, friabilidade, desgaste da superfície, oxidação, amarelecimento e manchas diversas.

Muito mau

Dano que ocupa 2/3 até a totalidade da peça.

Existe perda elevada de informação ou elevado risco de desagregação material.

Tipo de dano: perda de coesão física, perda de material, danos mecânicos muito acentuados, perda de resistência mecânica.

25 Ver Anexo 2. No momento da caracterização do estado de conservação a ficha foi escrita a lápis.

Contudo, por motivos de legibilidade apresentam-se exemplos de fichas preenchidas digitalmente a partir

de cópia dos originais.

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60

A caracterização do estado de conservação foi realizado por observação direta com luz

natural, na frente e no verso de cada desenho. Pontualmente foi utilizada uma lupa com

ampliação 60x, mas sem condições para proceder ao registo fotográfico dessas

observações. Utilizou-se o registo fotográfico para identificação dos principais danos.

Não foi realizado nenhum teste químico nos documentos.

Limpeza mecânica

A limpeza26 é uma das fases mais importantes num processo de conservação, pois exige

grandes doses de observação e prudência e deve ser executada com extrema delicadeza.

Segundo Ana Calvo “el concepto de limpieza incluye toda acción dirigida a suprimir la

suciedad o aditamentos que desvirtúen el aspecto ou integridade originales del objeto.

El tratamento de limpieza es una operación delicada y peligrosa, irresersible ya que

todo lo que se elimina nunca podrá ser restituído, por lo que debe ser efectuada

unicamente por especialistas” (1997: 133).

A ação de limpeza compreende, assim, um compromisso entre a eficiência (quantidade

de sujidade removida) e o fator estético, pelo que toda a sujidade deve ser devidamente

documentada antes da remoção. Através dela obtêm-se resultados imediatos e

irreversíveis (Ramón et al., 2007). Neste sentido, a seleção do processo de limpeza – a

seco ou por via húmida – deve ser devidamente ponderada.

A limpeza a seco, por via mecânica, permite eliminar as partículas sólidas depositadas

na superfície do objeto e é sempre prévia a qualquer outro tratamento. É uma fase

relativamente lenta, mas constitui um procedimento fundamental.

Nos documentos em papel, dependendo da natureza da substância a eliminar, do tipo e

do estado do suporte, a limpeza a seco é feita através do uso de borracha (o abrasivo),

trincha macia, pincéis, tecidos, aspirador com baixo poder de sucção e bisturi. Uma

limpeza deve começar por zonas pouco relevantes e significativas; a pressão a realizar

não deve ser muito grande, pois o objetivo é remover a sujidade e deixar intactas as

fibras do papel. É necessário ter ainda em conta um fator muito perigoso na limpeza,

26 “Os termos limpeza e higienização são usados frequentemente como sinônimos e podem referir-se ao

procedimento realizado tanto nos ambientes, nos acervos ou especificamente em cada obra. No entanto,

em relação às obras, o termo higienização é o mais usado para o procedimento de limpar um livro ou

documento, folha a folha, com uma trincha macia, na mesa de higienização” (Bojanoski, 2018: 21).

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61

que é o risco de provocar acidentes como o desgaste, rasgões, perda de suporte e a

eliminação dos elementos sustentados e da informação dos documentos.

Na intervenção realizada, a limpeza mecânica teve como objetivo eliminar as partículas

de diferentes tamanhos soltas ou que se foram aderindo aos papéis, em maior ou menor

grau, ao longo do tempo.

Na quase totalidade dos desenhos, a limpeza foi realizada através da utilização de

borracha sólida “Staedtler Mars plastic” (Fig. 7), com e sem aplicador. Para os papéis

com desenhos e escrita a grafite e para as zonas fragilizadas foi utilizada borracha

granulada aplicada com algodão em movimentos circulares, tal como ilustrado na Fig.

8. Os resíduos produzidos pela ação da borracha foram removidos com um pincel e

trincha de pelos macios.

Como procedimento, limpar o verso dos documentos através de pequenos movimentos

suaves e paralelos, feitos na mesma direção através de fricção controlada (Fig. 10 e 11).

Foi ainda usado um pequeno cartão que serve quer para segurar o documento, quer para

demarcar as zonas de limpeza em linha para não haver sobreposições ou falhas de

limpeza, bem como a usar uma lixa fina para remover a sujidade que se vai acumulando

na borracha sólida e, na utilização da borracha granulada, substituindo-a sempre que se

apresentassem sinais de sujidade. A limpeza foi realizada numa “caixa de limpeza” (Fig.

9).

Todos os desenhos selecionados (72) foram limpos num período de tempo de cerca de

oitenta horas.

Fig. 7 – Materiais utilizados na limpeza

mecânica. Fotografia da autora.

Fig. 8 – Limpeza mecânica: borracha em pó e

algodão. Fotografia da autora.

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Fig. 10 – Anotações sobre procedimentos de limpeza mecânica – diário de campo: dia 4. Fotografia

da autora.

Fig. 9 – Caixa de limpeza. Fotografia da autora.

Fig. 11 – Esquema do procedimento de limpeza mecânica com borracha granulada.

Fonte: Spinelli et al. (2011).

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63

Segunda seleção dos desenhos

Terminada a fase, essencial, de limpeza mecânica aplicada a todo o conjunto de 72

desenhos e ponderado o tempo de estágio, foi necessário proceder a uma segunda

seleção dos desenhos que seriam alvo de intervenção completa (da caraterização do

estado de conservação ao acondicionamento) foram selecionados 43 desenhos – pela

representatividade da presença de danos para o mesmo tipo de papel e pela exclusão dos

desenhos em papel acastanhado – e as últimas 60 horas do estágio centraram-se na

realização de um plano que incluía as seguintes atividades: limpeza por via húmida,

desacidificação, remoção de adesivos, reencolagem, remoção de colas e encolagem,

reparação de cortes, rasgões e lacunas, planificação, acondicionamento e registo

fotográfico final dos desenhos com e sem acondicionamento.

Realização de técnicas de exame e análise

Para identificação e caracterização dos diferentes tipos de papel utilizados como suporte

dos desenhos científicos, do seu estado de conservação, bem como dos elementos

sustentados, foi definido que o estudo ia recorrer a algumas técnicas de exame e análise,

tendo sido possível utilizar as que a seguir se descrevem.

O exame por observação à escala macroscópica e os registos fotográficos foram sendo

realizados à medida que decorria cada uma das fases da intervenção no local de estágio.

A microscopia eletrónica de varrimento acoplada à microanálise de raios-X para

identificação da estrutura e da composição do papel foi realizada no Centro de Materiais

da Universidade do Porto (CEMUP)27 de pequeninas amostras, uma por cada tipo de

papel, recolhidas em locais que não causam perturbação na leitura do documento, nem

põem em causa a sua estabilidade física.

27 O CEMUP é um Centro Funcional da Universidade do Porto, que tem por objetivos o apoio à

investigação e desenvolvimento e à formação científica e técnica na área dos materiais, de qualquer

natureza, servindo os diferentes departamentos e centros de investigação da Universidade do Porto, e de

outras universidades, instituições públicas e privadas, e empresas. Informação consultada em: CEMUP,

(s.d.). Centro de Materiais da Universidade do Porto, disponível em: http://www.cemup.up.pt/

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Não foi possível recorrer a outras técnicas de análise e exame pela falta de acesso aos

equipamentos e materiais necessárias para as realizar, tendo em conta a sua escassez no

local de estágio e as dificuldades inerentes a possíveis saídas e transporte dos

documentos para outras entidades.

Limpeza por via húmida

A limpeza por via húmida completa a limpeza mecânica a seco solubiliza o produto, as

substâncias ou as sujidades a eliminar. “Esta eliminación se lleva a cabo mediante

torunda o hissopos de algodón, o com compresas de um sólido inerte que mantengan

activo más tiempo el produto (polvos, materiales fibrosos o geles), o catalisadores

bioquímicos específicos (enzimas). Es imprescindible el conocimiento de los

componentes de las obras para prever su sensibilidade a los agentes mencionados, y

aclararlos adecuadamente de inmediato” (Calvo,1997: 134).

O solvente utilizado na limpeza por via húmida dos desenhos foi a água desionizada,

que é uma água purificada por um aparelho desionizador eliminando os iões positivos

(catiões) e negativos (aniões) existentes na água comum (Bojanoski, 2018).

A limpeza foi precedida de testes de solubilidade dos elementos sustentados com água

desionizada. O procedimento consistiu na aplicação de uma gota de água e na sua

Fig. 12 – Identificação do desenho da

amostra 2. Fotografia da autora.

Fig. 13 – Bolsas de poliéster com as

amostras. Fotografia da autora.

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secagem com papel mata-borrão28. Verificou-se que nem a grafite nem as tintas de

escrita e de desenho eram solúveis.

A limpeza dos papéis com água desionizada foi realizada através de cotonete e/ou

“boneca” de algodão em toda a superfície dos desenhos através de pequenos

movimentos suaves e paralelos, feitos na mesma direção e começando pelo verso de

cada documento. Tal como na limpeza a seco, também foi utilizado um cartão de papel

mata-borrão para segurar o documento e demarcar as zonas de limpeza em linha para

não haver sobreposições ou falhas. Para cada pequena área limpa era utilizado um outro

papel mata-borrão para absorção e secagem do excesso de humidade.

Desacidificação

A desacidificação faz parte dos tratamentos aquosos e consiste num tratamento químico

através da aplicação de produtos que neutralizam a acidez do papel e inserem uma carga

alcalina entre as fibras. A sua importância é fundamental para eliminar um dos fatores

mais graves de alteração do papel, contribuindo, assim, para a sua conservação

preventiva.

Existe uma ampla gama de produtos desacidificadores, desde os gasosos (pouco eficazes

ou excessivamente complexos e caros) aos líquidos, tanto aquosos (hidróxido de cálcio,

hidróxido de magnésio, carbonato de cálcio) como não aquosos (hidróxido de bário,

acetato bárico, acetato de magnésio). A maioria destes produtos, além de eliminar a

acidez, deixa no documento uma reserva alcalina funcionando como uma substância

tampão, que protege o papel dos processos de degradação ácida da celulose (Calvo,

1997).

Ainda que seja considerado uma intervenção benéfica para o papel, a sua aplicação deve

ser avaliada e previamente testada devido ao risco de alteração das cores das tintas,

escurecimento dos papéis com altos níveis de lenhina e deterioração química da celulose

por hidrólise alcalina (Bojanoski, 2018).

28 Papel mata-borrão: “Papel com pouca encolagem e com alta capacidade de absorção de líquidos”

(Bojanoski, 2018: 21).

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O produto químico utilizado foi o hidróxido de cálcio (95-100.5% Ca(OH)2 – Chem-

LabNV) através de uma aplicação pontual, com cotonete, nas manchas de oxidação tanto

no verso como frente dos papéis dos desenhos, após teste do produto.

Reencolagem

A reencolagem é o procedimento para restituir a encolagem29, ou substância adesiva

original, do papel perdido durante a limpeza, através de um adesivo (idem).

A reencolagem dos desenhos consistiu na aplicação pontual, com pincel, nos pontos

onde foi aplicado o hidróxido de cálcio para proteção e reposição da encolagem do

papel. O produto aplicado foi gelatina da Merck (sheets - food grade) de tipo alcalina

preparada no próprio dia. A preparação da gelatina consiste em misturar o produto com

água desionizada, dissolver em banho-maria e deixar arrefecer.

Para os desenhos que não necessitavam de reparo de cortes, rasgões e lacunas, procedeu-

se à sua planificação logo de seguida.

É de salientar que as atividades descritas nos três últimos pontos foram iniciadas e

terminadas para cada um dos desenhos de forma sequencial.

29 “A encolagem é o processo sofrido pelo papel após sua fabricação, quando lhe é aplicada uma

substância que tem como finalidade fixar a tinta de escrever e de impressão. O uso desta cola evita que a

tinta se espalhe sobre o papel, fixando-a sem borrões no papel impermeável. Caso o papel não receba essa

cola, ele absorverá a tinta como um mata-borrão. A encolagem surgiu no século XVIII, objetivando

aumentar a produção e reduzir os custos. À época, o processo era feito com colofónia-alumina.(…) Até a

segunda metade do século XIX, usava-se a cola de cartilagem de coelho. Posteriormente, a cola de

cartilagem foi substituída pelo breu, que é solubilizado na água com adição do alúmen, um sal ácido. Esse

composto, na presença de umidade atmosférica, gera ácido sulfúrico, acelerando a degradação do papel.

Por esse motivo, a encolagem é um fator interno que deve ser considerado numa possível política de

preservação” – Definição consultada em: Terminologia Arquivística CIN7101-UFSC (s.d.). Encolagem,

disponível em: http://terminologiaarquivistica.blogspot.com/2011/04/encolagem.html

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Remoção de adesivos

Os adesivos são uma ampla gama de produtos com capacidade de unir dois materiais,

mediante a adesão química ou mecânica entre duas superfícies (ibidem).

Os adesivos podem ser sintéticos ou semissintéticos preparados com derivados da

celulose como os éteres de celulose, e naturais. Os adesivos naturais são de origem

animal e de origem vegetal.

No conjunto selecionado de desenhos a intervencionar, cinco são compostos por dois

ou mais papéis unidos por um adesivo. Devido ao facto da união dos papéis, nas zonas

de sobreposição, se apresentar amarelecida e endurecida, foi decidido proceder à

remoção dos adesivos.

Trabalhando em cima de papel mata-borrão, a operação foi efetuada através da aplicação

de água desionizada com cotonete nas zonas de união dos papéis, para solubilização dos

adesivos, tendo sido aplicada uma tira de poliéster30 para garantir o efeito da

humidificação. De seguida, colocou-se por cima papel mata-borrão e pesos para garantir

que a água atingisse e solubilizasse os adesivos.

A remoção dos adesivos foi efetuada pelo levantamento, com o máximo cuidado

possível, do papel com a ajuda de um cotonete ou de uma espátula (Fig. 15 e 16). Os

vestígios de adesivo nos papéis separados foram removidos e limpos com água

30 Tira de poliéster Melinex® de 75 microns, Ref. 415-753-PEL, utilizada na conservação para prolongar

a humidificação de um papel, ajudar na planificação de dobras e vincos e para elaborar vários tipos de

acondicionamentos.

Fig. 14 – Produtos utilizados (água desionizada, hidróxido de cálcio e gelatina)

e materiais de aplicação. Fotografia da autora.

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desionizada e cotonete (Fig. 17). Os papéis separados foram planificados e unidos de

novo com cola de amido.

Fig. 15 – Levantamento de papel com cotonete. Fotografia da autora.

Fig. 16 – Levantamento de papel com espátula. Fotografia da autora.

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Reintegração de pequenos cortes, rasgões e lacunas

A reintegração é a ação ou o efeito de restituir uma parte perdida ou separada seja do

suporte, da decoração ou da policromia. Dependo do critério de decisão, deve limitar-se

a partes da peça e ser realizada com materiais inócuos, reversíveis e reconhecíveis em

relação ao original (Calvo, 1997: 188). Em conservação de obras em papel realizam-se

reintegrações mecânicas ou manuais, com a inserção de polpas de celulose ou um papel

novo nas áreas de perda (Bojanoski, 2018).

Em três desenhos foram executadas algumas intervenções mínimas em pequenos cortes

e rasgões para restituir/assegurar a integridade física e permitir a sua correta leitura.

Num dos desenhos foi realizada a reintegração de uma lacuna sempre sob orientação e

supervisão.

Foram as seguintes as operações realizadas em cima de papel mata-borrão numa mesa

de luz:

Medir a espessura do papel original.

Escolher papel japonês da mesma espessura do papel original.

Fazer o molde do papel japonês colocando-o por cima da lacuna e desenhar o

seu contorno com um pincel humedecido em água desionizada (Fig. 18).

Separar o molde puxando com as mãos as fibras do papel japonês. A alternativa

a esta forma de separação, foi raspar, com espátula ou lâmina de bisturi, fibras

Fig. 17 – Vestígios de adesivos em dois papéis separados. Fotografia da autora.

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de papel japonês para um pequeno recipiente com água desionizada – as fibras

obtidas servirão para reintegrar pequenos cortes e rasgões. Tanto o molde como

as fibras, devem ter um tamanho que exceda a lacuna a reintegrar de modo a que

o papel japonês fique sobreposto ao papel original e seja maior do que os limites

do suporte.

“Despentear” com bisturi as fibras dos limites do papel original que irá receber

o papel japonês (Fig. 19).

Pincelar o papel japonês com cola de amido em cima de tira de poliéster.

Fazer a união do papel japonês ao suporte com cola de amido aplicada com

pincel.

Colocar uma tira de poliéster por cima das zonas reintegradas.

Planificar a zona reintegrada com espátula.

Deixar o documento secar entre uma sanduiche de papel mata-borrão e tábuas,

por fim colocar pesos. Este procedimento permite a secagem da área reintegrada,

evitando a contração das fibras.

Fig. 18 – Fazer o molde do papel japonês com pincel.

Fotografia da autora.

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A cola de amido utilizada foi preparada no próprio dia e a preparação consistiu em

misturar amido de arroz com água desionizada em banho-maria e deixar arrefecer.

Planificação

A planificação tem como objetivo eliminar ondulações e deformações do papel,

realizada, geralmente, com a humidificação.

Usando a humidificação o processo é baseado em três fases básicas, a saber: molhar o

papel, planificar a folha molhada para obter uma forma plana e, finalmente, o papel é

seco. Neste processo o papel perde muitos dos vincos e rugas que, de outra maneira,

manteria (Viñas, 2006).

O objetivo da humidificação é reintroduzir a humidade no suporte de papel para relaxar

as fibras. A água pode ser usada de muitas formas (gás ou líquida) e tamanho (gotícula,

névoa ou vapor). A quantidade de humidade usada varia de acordo com o tipo de papel

e a humidade ambiente do espaço de trabalho. Segundo Watkins (2002), antes de se

decidir o procedimento apropriado, várias são as perguntas que devem ser feitas, as

quais podem incluir: “quais os riscos da humidificação local vs. geral?”, “qual a

quantidade de água a utilizar e com que técnica de aplicação?”, “quanto húmido deve

estar o suporte e quanto tempo é necessário para se obter o efeito desejado?”. O autor

sustenta que as decisões devem basear-se em informações obtidas por observação

empírica nos diferentes trabalhos realizados e na familiaridade com as condições

Fig. 19 – “Despentear” o papel original. Fotografia da autora.

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ambientais locais. Acrescenta ainda que, em alguns casos pode não ser necessária a

humidificação do suporte. Os procedimentos podem ser feitos por pressão ou por tensão

e, para cada um dos casos, existem várias técnicas. Pode ser necessário repetir ou alterar

os procedimentos para se garantir a obtenção do melhor resultado em cada caso.

A planificação dos desenhos teve como objetivo a eliminação de ondulações e

deformações do papel, foi realizada com humidificação e por pressão e foi sendo

realizada à medida que os documentos iam sendo terminados.

Cada documento foi humidificado com água desionizada, aplicada por névoa de spray,

colocado entre uma sanduiche de papel mata-borrão, tecido Reemay®31 e tábuas e levado

a uma prensa hidráulica ou manual. A planificação e a secagem do papel foram controladas ou

pelo reforço de humidificação ou pela mudança de papéis durante um período de tempo que foi

sendo avaliado.

Acondicionamento

O acondicionamento consiste num conjunto de operações com o objetivo de guardar,

proteger e facilitar o manuseamento de uma obra durante a reserva ou o transporte,

através da utilização de embalagens adequadas, confecionadas com materiais de boa

qualidade e inócuos. Funciona como uma barreira contra danos causados pela luz,

agentes poluentes, variação de temperatura e humidade relativa. Nos acervos

documentais são frequentemente utilizadas embalagens como capilhas, pastas, caixas,

envelopes, tubos, pass-partout’s (Bojanoski, 2018).

Decidir sobre a forma de acondicionar pressupõe ter um conhecimento das condições

ambientais das instalações da instituição, do espaço de arquivo, da forma de guarda e

das especificidades da obra ou documento. Por sua vez, a escolha do material para a

elaboração de um acondicionamento deve ter em linha de conta a estabilidade física do

material, a sua resistência aos agentes de degradação, a redução do impacto ambiental e

do manuseamento inadequado, além da proteção e do apoio físico à obra (Brito, 2010).

31 Tecido Reemay® é um tecido não tecido de fibras de poliéster dispostas aleatoriamente, estável

dimensionalmente e livre de ácidos. Consultado em: CAMEO: Conservation and art material

encyclopedia Online (s.d.). Boston: Museum of Fine Arts. Disponível em: http://cameo.mfa.org/

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Os desenhos a acondicionar são objetos em suporte de papel bidimensionais medindo

(comprimento x largura) o menor 130 x74 mm e o maior 683 x 320 mm; têm informação

na frente e no verso; dimensões muito diferentes; formatos tanto horizontais como

verticais; e vão ser guardados em gavetas horizontais no “Depósito Casa-Forte” da

BPMP em condições de temperatura e humidade relativa controladas.

Considerando estas condições e informações, as decisões sobre o acondicionamento dos

43 desenhos terminados foram as seguintes:

Material: cartolina desacidificada e poliéster Melinex®.

Embalagens: livro com folhas em cartolina e poliéster e capas com folhas

dobradas em harmónio.

Formas de organização: desenhos da autoria de Sara Ferreira: mantê-los

agrupados e separados dos restantes; desenhos da autoria de Augusto Nobre:

organizar por tamanhos.

A confeção de cada tipo de embalagem implicou planear de forma organizada, correta

e precisa formas, medidas, locais de dobras e perfuração. A concretização desse plano

consistiu na realização das seguintes ações: definir e marcar medidas, cortar, dobrar,

vincar, aparar excessos, colar, perfurar e coser os materiais.

A confeção da embalagem tipo livro não necessitou de ser testada porque é um tipo de

acondicionamento que já tinha sido confecionado e testado na BPMP, mas foi planeada

(Fig. 20). Cada desenho fica acondicionado individualmente numa folha em cartolina e

poliéster transparente (Fig. 21), para facilitar a visualização do desenho, colado em duas

faces, permitindo retirar com facilidade o desenho para observação do verso.

Fig. 20 – Plano do acondicionamento tipo livro. Fotografia da autora.

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A confeção da embalagem tipo harmónio, como nunca tinha sido antes confecionada,

para além de um plano e desenho, exigiu a construção e a testagem de protótipo em

miniatura.

Como se pode observar nas Fig. 23 e 24, cada desenho fica acondicionado

individualmente numa parte da folha de cartolina que foi dobrada e vincada do mesmo

tamanho de modo a formar o mesmo movimento, tanto na posição aberta como fechada,

como se de um harmónio se tratasse. A disposição dos desenhos permite quer o fácil

acesso e manuseamento, quer a visualização da informação existente na frente e do

verso. Deste tipo, foram construídos dois tamanhos diferentes de harmónios e de caixas,

uns para o arquivo dos desenhos de menor e outros para os de maior dimensão. Cada

harmónio é guardado numa capilha de quatro abas em cartolina.

Fig. 21 – Folha do acondicionamento tipo

livro. Fonte: BPMP.

Fig. 22 – Capa do acondicionamento tipo

livro. Fonte: BPMP.

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Recolha de informações com informantes privilegiados

Tal como definido na “Metodologia de estudo”, foi realizada uma entrevista semi-

diretiva à coorientadora de estágio e responsável pelo SC&R da BPMP para

caracterização das atividades aí desenvolvidas.

Fig. 23 – Folhas do acondicionamento tipo

harmónio vistas de cima. Fonte: BPMP.

Fig. 24 – Folhas do acondicionamento tipo

harmónio vistas de lado. Fonte: BPMP.

Fig. 58 – Acondicionamento tipo harmónio

aberto, visto de cima. Fonte: BPMP.

Fig. 26 – Capilha de 4 abas fechada vista de

lado. Fonte: BPMP.

Fig. 25 – Capilha de 4 abas aberta vista de

cima. Fonte: BPMP.

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No decorrer do estudo estabeleceu-se contacto com vários investigadores sobre as

temáticas específicas, inerentes ao objeto de estudo, que foram surgindo, como a obra e

o acervo de Augusto Nobre e de Sara Ferreira, pesquisas bibliográficas de fontes

primárias e secundárias, marcas de água, desenho ou ilustração científica e artes

gráficas. Com todos foram trocadas informações por email e realizadas reuniões

presenciais pontuais.

Na última delas, reuniram no SC&R quatro investigadores das áreas da obra e o acervo

de Augusto Nobre e de Sara Ferreira, do desenho ou ilustração científica e das artes

gráficas tendo sido muito profícua a partilha e a complementaridade de saberes para o

aprofundamento e a validação de questões que necessitavam de resposta.

Tratamento e organização dos dados recolhidos

Esta atividade começou a ser realizada ainda no decorrer do estágio, decorrente da

obtenção e do registo sistemático dos dados no diário de campo, Nesta fase, procurou-

se sobretudo organizar a informação dispersa e encontrar as primeiras regularidades.

Após o fim do estágio, foi realizada uma análise e um cruzamento dos dados recolhidos

para os seguintes grandes temas:

Avaliação do estado de conservação dos desenhos – pela análise e sistematização

dos dados constantes nas fichas de conservação. Desse trabalho resultou a

elaboração de uma “ficha síntese” do estado de conservação de cada desenho,

de que se apresentam exemplos no Apêndice 2, o mapeamento dos danos com

identificação fotográfica, a organização quantitativa e o tratamento gráfico dos

resultados.

Identificação dos papéis e elementos sustentados – pela análise e interpretação

dos dados obtidos pela observação direta, pela microscopia eletrónica de

varrimento e na pesquisa das marcas de água.

Identificação dos desenhos publicados – pela interpretação dos dados obtidos

nas pesquisas bibliográficas realizadas.

Identificação das técnicas de desenho – pela recolha de informação bibliográfica

e da avaliação realizada por biólogo e ilustrador científico.

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Identificação de informações suplementares sobre os autores dos desenhos –

pela pesquisa bibliográfica e a obtida em arquivos.

Reflexão sobre as atividades realizadas durante o estágio – pelo cruzamento das

informações sobre os objetivos do curso e do estágio realizado e da análise dos

conceitos de conservação preventiva e de restauro.

Todo este trabalho precedeu e acompanhou a escrita do presente relatório de estágio,

que foi a última atividade deste processo de trabalho e estudo.

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Parte IV

O estudo de caso

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8. Os papéis dos desenhos

O conhecimento da origem do papel é essencial para compreender os danos e os fatores

de degradação que diretamente e indiretamente podem afetar a sua conservação na

medida em que cada folha de papel testemunha os processos técnicos e tecnológicos de

fabrico e estes podem exercer influências positivas e negativas sobre a sua permanência.

O estudo da natureza material e da história da origem dos papéis dos desenhos do acervo

da BPMP foi fundamental para a realização do trabalho de conservação e consistiu na

procura de informações sobre a origem do papel, como as fornecidas por documentos

históricos de registos com dados administrativos de produção e/ou aquisição, e na

análise de vários tipos de informações presentes no próprio papel. As que são inerentes

ao próprio processo de fabrico como os materiais, os produtos, as técnicas e as marcas

de água, as que decorrem da utilização do papel como as inscrições feitas com materiais

de registo e as suas transformações ao longo do tempo.

8.1. Tipos de papéis

Em termos gerais, e aquando do exame preliminar do lote de desenhos apresentado no

ponto “As atividades realizadas” deste relatório, foram identificados, por observação

direta, dois grandes tipos de papéis designados como “papel de cor bege” para um total

de cinquenta e oito desenhos, e “papel fino de cor acastanhada” para catorze desenhos.

Contudo, há a acrescentar ainda a existência de três pequenos papéis com textos escritos.

Destes, um deles foi considerado como “desenho”; os restantes como são de muito

pequena dimensão e estão colados em desenhos, não foram considerados na contagem

do universo dos setenta e dois desenhos estudados.

Papel de cor bege

Para o papel designado como “papel de cor bege”, existe no conjunto de desenhos um

total de cinco tipos de papéis com características semelhantes quanto à espessura, cor e

opacidade, mas com diferenças ao nível da cor e ao nível das marcas de água

identificadas.

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De facto, a observação direta, permitiu constatar que ao nível da cor, apesar de todos

estes papéis serem de cor bege, apresentam uma variação de tonalidades desde uma mais

clara a outra mais escura. O exemplo mais ilustrativo desta variação é a do desenho que

é formado pela união de dois tipos de papel, um com a tonalidade mais clara e o outro

com a mais escura, como se pode observar na Fig. 27.

Os três pequenos papéis de linhas utilizados para escrita, também apresentam cor bege

e tem uma espessura mais fina do que o papel dos desenhos a que foram associados.

Não se observa nenhum tipo de marca identificativa destes papéis.

Fig. 27 – Desenho com dois tipos de papéis de escrita de tonalidades opostas.

Fonte: BPMP.

Papel de cor acastanhada

No lote dos setenta e dois desenhos estudados, existem catorze que foram elaborados

em papel designado como “papel fino de cor acastanhada”.

As suas principais características estão definidas na própria designação, uma vez que o

exame por observação direta permite verificar que tem cor acastanhada, uma espessura

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fina, em termos de peso é leve, apresenta uma textura lisa e acetinada apenas numa das

faces. Pelo tipo de rasgões e cortes dos desenhos em estudo, poderá considerar-se um

tipo de papel pouco resistente à tensão.

Este tipo de papel não apresenta qualquer tipo de marcas identificativas e foi utilizado

exclusivamente para a execução de desenhos de esboço ou desenhos preliminares, talvez

por ser fino e permitir o decalque do desenho com facilidade.

Apesar de sumário, o exame realizado sugere que o papel de cor bege poderá ser um

papel de escrita utilizado para desenho. O papel de cor acastanhada parece tratar-se de

um papel fino de embrulho, reciclado, vendido a um preço significativamente mais

baixo do que o papel para escrita e desenho e, por isso, utilizado para os esboços. Ou

então, pelo facto de ser acetinado unicamente numa das faces. Uma outra hipótese seria

tratar-se de um papel tipo “costaneira”.

8.2. Datas de fabrico e fabricantes

O estudo de fontes e testemunhos contemporâneos da obra iniciou-se pelo exame dos

próprios desenhos e das obras publicadas por Augusto Nobre e aí foi possível identificar

algumas referências cronológicas que permitem relacioná-las com o período em que os

desenhos terão sido elaborados e, por aproximação, procurar datar o fabrico dos papéis.

As referências cronológicas encontradas foram as seguintes:

O desenho original do peixe “Chaputa” (nome vulgar) ou “Brama raii” (nome

científico), elaborado por Augusto Nobre, apresenta escrita a data “17-8-1934”,

como se pode verificar na Fig. 60.

1935 foi o ano da publicação do livro de Augusto Nobre em que foram

publicados grande parte dos desenhos do acervo da BPMP, ““Fauna Marinha

de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)”.

1927 é assinalado no prefácio por Augusto Nobre no livro “Moluscos terrestres,

fluviais e das águas salobras de Portugal” (1930c) como o ano da morte de Sara

Ferreira, autora de doze dos desenhos do acervo da BPMP.

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Considerando as décadas de 1920 e 1930 como aquelas em que terão sido elaborados os

desenhos, poderá colocar-se a hipótese de que os papéis utilizados poderão ter sido

fabricados no início do século XX ou, até mesmo, naquelas décadas.

Na tentativa de identificar empresas que fabricaram e/ou forneceram os papéis dos

desenhos o estudo recaiu na análise dos “Livros de Aquisições” e de “Conta-Corrente”

disponíveis na Biblioteca da FCUP em diferentes anos das décadas de 1920 e 1930,

como fontes contemporâneas da obra.

Apesar do registo discriminado de equipamentos, produtos e materiais nos referidos

livros, apenas foi possível identificar duas papelarias da cidade do Porto, a “Papelaria

Azevedo” e a “Araújo & Sobrinho”, como empresas fornecedoras de artigos como

papéis, tintas e pincéis. Não foi encontrada nenhuma informação sobre a identificação

das fábricas que produziram os papéis.

Na tentativa de se obter mais informações sobre estes factos, contactou-se o proprietário

pela única das duas papelarias ainda existentes, a “Araújo & Sobrinho”, para identificar

possíveis informações sobre a origem do papel que era vendido nas décadas de 1920/30,

mas apenas se conseguiu confirmar que a empresa, criada em 1829, tinha produção de

fabrico de papel com marca de água própria, mas não existe documentação que permita

identificar a(s) fábrica(s) produtoras. O proprietário fez referências às empresas

papeleiras “Arjo Marie” e “Wings Tip” como tendo sido fornecedoras de papel para a

“Araújo & Sobrinho”, contudo, não conseguiu localizar esta relação comercial no

tempo.

Fig. 28 – Desenho e ampliação da data escrita no desenho. Fotografias da autora.

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Esgotadas as fontes e os testemunhos da época, foi realizada um estudo pormenorizado

das marcas de água feitas nos papéis no momento do seu fabrico para identificação das

empresas fabricantes, locais de origem e, se possível, de datas de fabrico, pois desde que

em finais do século XIII o papel se tornou cúmplice da transparência da luz, quando, em

Fabriano, no norte de Itália, surgiu a primeira marca de água, “Desde então, uma folha

de papel tornou-se, em si mesma, fonte de conhecimento, contando a sua própria

história, através das mensagens que lhe foram impregnadas sob a forma de impressões

quase ocultas chamadas marcas de água. São imagens translúcidas que, quando

olhadas em contraluz, revelam silêncios centenários e, sem perderem a imaterialidade

que as caracteriza, nos falam dos papeleiros que as criaram, da qualidade do papel que

as sustenta, ou do moinho e região de onde provêm” (Santos, 2015:25).

Para criação de uma marca de água é necessário que, em primeiro lugar, seja desenhado

um motivo que é bordado ou aplicado por finos fios metálicos sobre a superfície da teia

da forma manual32 ou do rolo filigranador33. No processo de produção, aquando da

formação da folha de papel, nos espaços ocupados por essa filigrana, verifica-se,

necessariamente, uma menor acumulação de fibras, o que ocasiona áreas de uma maior

transparência, visíveis à contraluz. Ou seja, a filigrana dá origem a uma marca na folha

de papel no momento da sua produção, chamada marca de água (Santos, 2014:2).

Como afirma a autora citada, desde o surgimento da primeira marca de água, os

fabricantes tornaram-na uma marca pessoal do papel por eles produzido. Se no início

eram elaboradas com simplicidade, com um traço hesitante e uma dimensão reduzida;

depressa se tornaram mais significativas e personalizadas, através da referência ao local

do moinho produtor, às iniciais, ou mesmo ao nome do fabricante.

Com a marca de água, foi criada a contramarca que, não deixando de ser uma marca de

água, constitui uma informação complementar, figurando geralmente no outro lado da

folha, em simetria com a marca de água (idem:4). Como, em princípio, a marca de água

se encontra no centro da metade direita da folha, a contramarca é colocada do lado

32 A teia é o “molde de madeira, utilizado na produção manual de papel. É constituído por um quadro

solto e uma teia metálica (formada pelas vergaturas e pelos pontusais) aplicada num marco rectangular,

sendo este marco reforçado, no seu interior, por travessas de secção em cunha, paralelas ao lado mais

curto da forma. No processo de fabrico, eram usadas duas formas em simultâneo” (Santos, 2014:14).

33 O rolo filigranador é a “peça de forma cilíndrica revestida a teia metálica (sobre a qual são fixadas as

filigranas), com eixo concêntrico de pontas salientes para apoio rotativo” (idem).

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esquerdo da mesma folha, ambas perpendicularmente aos pontusais34. No entanto, esta

distribuição não é regra absoluta. Constituindo uma confirmação da identidade do

fabricante, a contramarca surge representada de um modo menos ostensivo, através de

letras isoladas ou formando siglas e monogramas.

O aumento da procura de papel de qualidade gerou um aperfeiçoamento no modo de

produção e no controle de qualidade das técnicas de fabrico do papel de escrita

suscitando, assim, uma maior concorrência entre os fabricantes. Segundo a mesma

autora, esta concorrência terá contribuído decididamente para uma cada vez maior

personalização do papel fazendo com que a marca de água passasse a ser acompanhada

por um conjunto de elementos informativos, tais como:

a qualidade do papel,

a identificação do lugar ou região onde se localizava a unidade papeleira,

a identificação do nome do fabricante produtor.

Com este conjunto de informações, tornou-se “possível estabelecer o período

cronológico de produção do papel e, a partir do século XVIII, seguindo uma tendência

que já se prefigura desde meados do século XVII, poder-se-á localizar, com rigor, o

ano de produção, uma vez que este aparece, frequentemente, assinalado na própria

marca de água” (ibidem:3). Por outro lado, se a personalização do papel através de uma

marca de água própria constitui uma afirmação do fabricante, também constitui uma

garantia de qualidade do produto apresentado, desencadeando, por isso e num processo

quase simultâneo, a falsificação da marca de água por inteiro (sobretudo nos papéis de

maior qualidade) ou através da cópia do motivo principal, passando este a ser

acompanhado por novos elementos informativos e identitários.

34 “As vergaturas e os pontusais são resultantes, na produção manual de papel, da configuração da teia

da forma. Esta, usualmente de cobre, era formada por fios muito próximos, paralelos ao lado maior da

forma (trama das vergaturas), e por fios mais distantes, paralelos ao lado menor da forma, chamados

pontusais. Deste modo, numa folha de papel avergoado são visíveis as vergaturas, linhas de cor clara,

com reduzidos espaços de separação, cruzadas pelos pontusais, linhas que apresentam um maior

espaçamento entre si. Naturalmente que, de acordo com a dobragem de uma folha de papel, estas

vergaturas e pontusais poderão aparecer na horizontal ou na vertical, condicionando a localização e

visibilidade da própria marca de água” (Santos, 2015:2).

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Assim, dos papéis dos desenhos em estudo foi realizado um exame intrínseco às marcas

de águas, pontusais e vergaturas, bem como a identificação dos papeleiros por quem

foram usados.

No conjunto dos desenhos em papel designado como “papel de cor bege”, foram

encontradas duas marcas de água, palavras do que pode ser parte de uma outra marca de

água ou de uma contramarca e uma marca em alto-relevo, num total de trinta papéis,

como a seguir se apresenta:

Tabela 3 – Marcas de água identificadas nas obras

Motivo da marca de água

N.º papéis

Cão sobre SUPER STRONG 23

Cavalo marinho + ALMAÇO A&S SEA-HORSE 1

Palavras: J&FH KENT 3

Marca em alto-relevo “Lepa” + “ie PARIS SPF” 3

De seguida, para cada uma destas tipologias, apresentam-se as fotografias à luz

transmitida, os decalques das marcas de água e o resultado das pesquisas sobre a origem

do seu fabrico.

Marca de água “Cão sobre SUPER STRONG”

Tipologia: Cão sobre SUPER STRONG

Marca de água Decalque

Fig. 29 – Imagens da marca de água “cão”. Fotografias da autora.

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Em relação à marca de água “Cão sobre SUPER STRONG”, a sua localização na folha

de papel varia consoante o modo como o papel foi cortado. Devido ao facto de grande

parte dos papéis terem sido cortados de forma irregular e sem respeitar a orientação e/ou

o sentido das fibras, constata-se que a localização das marcas de água desta tipologia é

diversa. Há motivos que aparecem no meio da folha, à direita e os que se apresentam

cortados.

É de realçar que todos os papéis desta tipologia apresentam as linhas dos pontusais e

que, um dos papéis apresenta apenas os pontusais sem a marca de água. No entanto, as

medidas das linhas e as características visuais do papel levam a crer que é um papel que

pertence ao mesmo grupo em análise.

Uma pesquisa em referências bibliográficas nacionais (Sequeira, 1935) permitiu

identificar que a marca de água “Cão sobre SUPER STRONG” pertence a um papel

produzido na Fábrica da Abelheira, no Tojal. Foi a primeira fábrica de papel a ter uma

máquina de produção em contínuo, instalada em 1841, quando era seu proprietário o

Conde de Tojal. Produziu excelente papel de escrita com uma imensa variedade de

marcas de água.

O livro publicado por Gustavo de Matos Sequeira em 1935 com o título “A Abelheira e

o fabrico de papel em Portugal” é dedicado à história da fábrica desde a sua origem,

em 1755, até à data da publicação. No capítulo sobre as marcas de água, o autor, para

além de incluir uma pequena resenha histórica da origem das marcas de água em

Portugal, faz um levantamento, com registo fotográfico, de alguns dos motivos

utilizados ao longo do tempo na fábrica da Abelheira.

A primeira marca de água conhecida desta fábrica é a legenda “TOJAL”, a que depois

se acrescentou “ABELHEIRA” ou “FAB.ca ABELHEIRA”, colocada na parte inferior.

O autor afirma que em 1848, a marca é constituída apenas pela legenda ABELHEIRA,

designação esta que se mantinha em 1863. Apresenta o motivo da marca de água do

“papel selado” que a fábrica passou a fornecer para o Estado em regime de exclusividade

a partir de 1863. Escreve que “a Abelheira usava, então, as marcas TOJAL

simplesmente, a que depois se associou o dizer Portugal como indicador do país de

origem, e (no papel almasso) os dizeres ALMASSO ou ALMAÇO acrescentados da

palavra TOJAL e da citada indicação de nacionalidade” (Sequeira, 1935: s.p.). E

acrescenta que com a entrada em uso das chamadas “marcas de fantasia” para assinalar

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diferentes tipos de papel, a fábrica passou a utilizar “uma variante do brazão da família

Graham ou as suas peças acessórias como o timbre, formado por um pelicano e um

falcão lutando, e a divisa NE OUBLIE acompanhado pelas legendas TOJAL e

PORTUGAL na parte inferior, esta sob aquela e em caracteres de menor tamanho”

(idem:s.p.). Por último, faz uma referência à utilização de várias marcas de água para a

produção de outras marcas comerciais que classifica como de “pura fantasia”. No

conjunto da descrição dessas marcas de água, identifica uma descrita como “(…) um

cão «Bull-dog» acompanhado do dístico Extra Strong (…). Em tôdas aparece a marca

«TOJAL» e a indicação da origem” (ibidem:s.p.), da qual apresenta numa página a

seguinte reprodução fotográfica:

Fig. 30 – Página do livro “A Abelheira e o fabrico de papel em Portugal” (Sequeira, 1935).

Fotografia da autora.

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Comparando a descrição e a imagem publicada com as marcas de água desta tipologia

nos desenhos em estudo, verifica-se que o motivo “um cão «Bull-dog» acompanhado

do dístico Extra Strong” está presente nas marcas de água dos papéis. Contudo, em

nenhuma das marcas de água daqueles desenhos foi observada a inclusão da palavra

«TOJAL» e a indicação da origem.

Segundo o exame da especialista em marcas de água Maria José Santos35, a não inclusão

destas palavras pode justificar-se porque era comum, quer na produção manual quer na

industrial de papel, como é o caso, o fabricante repetir o motivo principal da marca de

água numa nova filigrana sem, contudo, incorporar toda a informação que havia

figurado na anterior.

Uma outra explicação prende-se com a existência da variação dos cortes das folhas de

papel. No entanto, é uma explicação pouco plausível na medida em que, vinte e três

exemplares da mesma marca de água, é uma amostra significativa do mesmo motivo em

diferentes localizações das folhas de papel e, naquelas que têm espaço suficiente para

serem representadas sem cortes, não se observa a inclusão das palavras Tojal e Portugal.

Como se desconhecem as datas em que a fábrica da Abelheira teria fabricado o papel

com a marca de água em estudo, não se possui informações que permitam datar com

precisão o fabrico do papel utilizado nos desenhos. Porém, a confirmação que a fábrica

estava em pleno funcionamento em 1935, bem como nos anos posteriores até aos anos

setenta36, confirma a hipótese de que, pelo menos o papel de vinte e três dos desenhos

teria sido fabricado nas décadas de 1920 ou 1930, em Portugal e pela fábrica da

Abelheira.

35 Conforme exame feito por Maria José Santos às características das marcas de água em estudo.

36 Esta fábrica ainda está em atividade com a designação FAPAJAL.

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Marca de água “Cavalo-marinho”

Tipologia: Cavalo-marinho

Marca de água Contramarca

Decalque da marca de água e da contramarca

A marca de água “Cavalo-marinho” aparece localizada do lado direito da folha de papel,

com a contramarca “ALMAÇO A&S SEA-HORSE” situada à sua esquerda. Apesar de

ser apenas um exemplar, e apesar dos sinais evidentes de deterioração do papel, este foi

um papel em que o corte permitiu manter os motivos completos.

Fig. 31 – Imagens da marca de água “cavalo-marinho”. Fotografias da autora.

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A pesquisa em referências bibliográficas e na pesquisa realizada em sites

internacionais37 não foi conclusiva para esta marca de água, pois não se conseguiu

encontrar qualquer informação.

De início não se tinha percebido que as letras da contramarca eram “A&S”, pelo que só

a partir do momento em que se conseguiram decifrar estas letras, é que se constatou que

seria uma abreviatura de “Araújo & Sobrinho”. De seguida comparou-se o logotipo da

empresa de papelaria “Araújo & Sobrinho” com o motivo do desenho e conclui-se que

esta seria a marca e contramarca dessa empresa com sede na cidade do Porto. Tal como

antes referido, apesar de não existir documentação que permita identificar a fábrica de

papel produtora, o atual proprietário confirmou que ao longo do século XX a empresa

“Araújo & Sobrinho” teve produção de papel com marca de água própria.

É de acrescentar que a Dra. Maria José Santos enviou a marca de água para alguns

fabricantes portugueses, mas sem resultado porque não a conseguiram identificar.

Porém, admite que se poderá tratar de um papel fabricado em Portugal, e refere as

fábricas da Abelheira ou a Fábrica de Papel da Matrena em Tomar, ou ainda a

Companhia de Papel do Prado, também de Tomar como as possíveis produtoras.

37 Site do IPH - International Association of Paper Historians, consultado em:

http://www.paperhistory.org/index.html. e site Bernstein – The Memory of Paper consultado em:

http://www.memoryofpaper.eu/

A pesquisa foi realizada com a colaboração e a validação da Dra. Maria José Santos, Historiadora e

Consultora Científica do Museu de Papel de Terras de Santa Maria.

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Palavras “J&FH KENT”

Tipologia: Palavras J&FH KENT

Contramarca Decalque

As palavras “J&FH KENT” foram identificadas em apenas uma folha de papel. Dois

outros papéis apresentam parte daquela designação, “H KENT” e “J&FH”, sendo estes

mais dois exemplos da existência da utilização de papéis cortados sem se atender à

orientação das fibras do papel. Não se pode afirmar que seja uma contramarca porque

não se conhece a marca de água.

Para a identificação destas palavras, também se procedeu ao mesmo tipo de pesquisas

já descritas, e no site “Bernstein – The Memory of Paper” foram encontrados os

seguintes dados: “London, 1919” e “Ref. N.º DE-SFH-4088”.

É provável que o nome da cidade corresponda ao local de fabrico e que se trate de um

papel de origem inglesa. A data poderá ser de uma data significativa para a empresa que

fabricou ou que mandou fabricar o papel. Na continuação das pesquisas efetuadas com

estes dados não se encontrou o nome do fabricante, nomeadamente em duas obras de

referência38 para o estudo das marcas de água dos séculos XVII, XVIII e XIX.

38 Churchill, William Algeron (1935). Watermarks in paper in Holland, England, France etc., in the XVII

and XVIII centuries and their interconnection, Amesterdão, Menno Hertzberger & Co: Amesterdam; e

Heawood, Edward (1950). “Watermarks mainly of the 17th and 18th centuries”, in: Monumenta Chartae

Papyraceae, Hilversum, The Paper Publications Society: Hilversum.

Fig. 32 – Imagens das palavras “J&FH KENT”. Fotografias da autora.

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Marca em alto-relevo

Por último, falta mencionar que três dos papéis do conjunto dos doze desenhos da

autoria de Sara Cabral Ferreira, apresentam uma marca em alto-relevo com as palavras

“Lepa” e “ie PARIS SPF”, tal como a seguir se ilustra.

Tipologia: Marca em alto-relevo “Lepa” e “ie PARIS SPF”

Com luz natural, à reflexão Com luz artificial, com transmissão

Como seria espectável, uma pesquisa feita a partir de apenas umas palavras, não obteve

resultados. Porém, aquando do exame aos desenhos científicos do acervo do MHNC-

UP, conseguiu-se encontrar, nos desenhos originais da autoria de Sara Cabral Ferreira,

um papel de um desenho com uma marca em alto-relevo com o que parece ser a

designação completa das palavras identificadas que é: “TOCHON LEPAGE & Cie

PARIS SPF”.

Deste modo uma posterior pesquisa da designação completa na internet39, permitiu saber

que se trata de uma marca da “La maison Vernay Lepage Tochon - Lepage”, uma casa

fundada em 1865 e que entre 1913-1949 tinha a designação “TOCHON, LEPAGE et

Cie” e a atividade “papetier”, ou seja “papeleira”. No entanto, não se encontraram

informações sobre o fabrico de papel com a referida marca em alto-relevo. De qualquer

forma, estas informações autorizam que se coloque a hipótese de que os doze papéis em

que Sara Cabral Ferreira desenhou poderão ter tido origem nesta casa francesa.

39 Pesquisa realizada no site: https://www.labreuche-fournisseurs-artistes-paris.fr/maison/vernay-lepage-

tochon-lepage.

Fig. 33 – Imagens da marca em alto-relevo. Fotografias da autora.

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8.3. Composição dos papéis

Para identificação da composição dos papéis dos desenhos, recorreu-se à microscopia

eletrónica de varrimento para identificação do tipo de fibras e da composição das cargas

dos diferentes papéis.

Foram recolhidas cinco micro amostras de cada um dos cinco tipos de papéis principais

para a realização dos exames, que tinham sido categorizados, aquando da sua recolha,

com base nas marcas mais significativas que apresentam40 para os papéis de cor bege e

para o papel de cor acastanhada, com o auxílio de um bisturi e pinça. Como se trata de

um método de análise invasivo, tentou-se recolher as amostras de zonas onde já existiam

lacunas ou em zonas que não afetassem a estabilidade física nem a leitura ótica do

documento. Todas as amostras foram recolhidas após a limpeza mecânica dos desenhos,

colocadas e transportadas em saquetas individualizadas de poliéster, identificadas por

registo fotográfico e não tiveram nenhuma preparação antes de serem examinadas e

analisadas.

No estudo foi usado um microscópio eletrónico de varrimento de alta resolução, com

microanálise por raios-X para ampliações que variaram entre 250x e 1000x das

características estruturais e topográficas de cada amostra.

Durante a realização do exame foram registadas algumas notas sobre a interpretação dos

resultados que iam sendo observados por amostra pelo técnico responsável. No final,

foram enviadas os espectros resultantes da análise sem relatório técnico. No Anexo 3

apresentam-se duas micrografias referentes à estrutura e outos dois espetros relativos à

composição química. Os resultados da caracterização dos diferentes papéis serão

apresentados em termos globais, pois o exame evidenciou características muito

idênticas, não se justificando, por isso, a individualização por amostra.

Assim, através das imagens obtidas, pode verificar-se que as amostras dos quatro

“papéis de cor bege” são compostas por fibras de algodão finas, compridas e com uma

orientação mais ou menos definida. A composição química também é idêntica e

caracteriza-se pela presença de carbonato de cálcio, sulfato de bário e alumino-silicatos

em todos os tipos de papéis. Nas amostras dos papéis de cor mais clara (amostras 3 e 5)

40 Amostra 1 – Papel com marca de água “cavalo-marinho”. Amostra 2 – Papel com marca em alto-relevo.

Amostra 3 – Papel com marca de água “cão”. Amostra 4 – Papel de cor acastanhada. Amostra 5 – Papel

com marca “palavras”.

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encontra-se cloro e maior presença de sulfatos, que são substâncias que produzem papéis

mais brancos. A distribuição das cargas41 é heterogénea no caso das amostras do papel

5 e homogénea nos restantes tipos de papéis.

Quanto ao papel de cor acastanhada, já por si com características distintas por

observação macroscópica, apresenta pouca quantidade de carga, sobressaindo na

composição o carbonato e o sulfato de cálcio e fibras compridas com uma estrutura bem

preenchida e compacta.

Estas características sugerem que se trata de papéis produzidos a partir de pasta semi-

industrial. Por outro lado, cargas como sulfato de bário e carbonato de cálcio,

encontradas nos papéis agrupados na designação “papéis de escrita e desenho de cor

bege”, são utilizadas para a produção de papéis químicos especiais.

Contudo, para se poder realizar uma correta e completa identificação dos papéis em

estudo, seria necessário o cruzamento e a comparação destes resultados com os obtidos

por outras técnicas de exame e análise, como a espectroscopia FTIR (Fourier Transform

InfraRed), a espectroscopia Raman e os testes microquímicos às fibras do papel, com

dados da composição de papéis fabricados a partir de pasta semi-industrial nas primeiras

décadas do século passado.

Em síntese, em relação às datas de fabrico e aos fabricantes, Os resultados das análises

aos próprios papéis para identificar a sua origem permitem sugerir que terão sido

produzidos no início do século XX e que serão contemporâneos dos desenhos. Do estudo

pormenorizado às marcas feitas nos papéis de cor bege no momento do seu fabrico

verificou-se que o papel de vinte e três dos desenhos, com a marca de água com o motivo

“um cão «Bull-dog» acompanhado do dístico Extra Strong” foi fabricado em Portugal

pela fábrica da Abelheira e que o papel de apena sum desenho tem uma marca de água

de uma empresa papeleira com sede na cidade do Porto. Dos restantes resultados, é

provável que quinze outros papéis tenham origem francesa (os doze desenhos da autoria

de Sara Ferreira) e inglesa (três desenhos), contudo não se conseguiu confirmar outros

dados sobre a sua origem. Por sua vez, os dados das características e da composição dos

41 As cargas são produtos não fibrosos, minerais em pó, geralmente brancos, que se juntam à pasta de

madeira para aumentar a brancura, a opacidade, a inércia, a flexibilidade e a aptidão à impressão criando

superfícies mais unidas e melhor absorção às tintas. Podem, por vezes, reduzir a resistência e a colagem

(Callol, 2013).

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diferentes tipos de papéis permitem ainda afirmar que são papéis produzidos a partir de

pasta de madeira por processos industriais.

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9. Os materiais de registo

Ao longo dos tempos têm sido utilizados uma grande variedade de materiais de registo

através dos quais são representados a escrita, o desenho ou a impressão. Constituem os

elementos intrínsecos, inseparáveis do próprio papel e por vezes a causa da sua

degradação. Definem-se como as substâncias que em estado mais ou menos fluído e,

até, sólido, são aptas para escrever, imprimir ou colorir, segundo técnicas e instrumentos

apropriados a cada uma dessas possibilidades (Crespo & Vinas, 1984: 8).

Podem ser de natureza vegetal, animal e mineral e geralmente são compostos por agente

colorante (pigmento, corante, anilinas, …), solvente (que solubiliza o agente colorante),

ligante (com a função de ligar as partículas corantes e de as unir ao suporte) e mordente

(que fixa o médium ao suporte e pode substituir o ligante). A combinação destes

ingredientes originam diferentes tipos de materiais de registo como ponta metálica,

grafite, carvão, lápis de cor, crayons, sanguínea, giz, pastel seco, pastel de óleo,

aguarela, guache, têmpera, acrílicos, tintas de escrita e tintas de impressão (Callol, 2013:

24).

A grafite é um mineral, uma das quatro formas alotrópicas do carbono (as outras são o

diamante, o fulereno e o grafeno) com múltiplas aplicações industriais, embora a mais

conhecida seja a sua utilização como mina de lápis. A utilização da grafite como

material de escrita e de desenho remonta ao século XVI. Inicialmente, o mineral era

misturado com goma laca, resinas e colas, colocado numa ranhura de um pedaço de

madeira e atado com um cordel; à medida que se ia gastando a grafite, o cordel era

desenrolado e repunha-se a mina no extremo. Atualmente a grafite – em lápis ou em

barra – apresenta várias espessuras e durezas e na sua composição tem carbono ou

madeira semicarbonizada, aglutinantes gordos e outros materiais, como anilinas. É um

material pulverulento e muito sensível à abrasão. Tal como o carbono, a grafite tem

características de resistência à luz, à água e aos microoganismos e, por ser inócuo ao

papel, é aconselhável para anotações em documentos (idem).

Tinta designa uma solução líquida ou semilíquida corada composta por vários

ingredientes (material corante, solventes, resinas, aglutinantes e outros compostos) que

se fixa ao suporte, durável, inodora e com pH variável. A fixação ao suporte, que se

realiza mediante reações químicas catalisadas pela acidez, é feita através de instrumento

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manual de desenho, de escrita ou através da impressão. A combinação dos ingredientes

origina diferentes tipos de tintas: as tintas caligráficas, para escrita manual, as de

impressão (tintas impressoras) e as pictóricas para criação artística (Crespo & Vinas,

1984; Callol, 2013).

As tintas mais antigas provêm do Egipto e da China e eram compostas de negro de fumo

misturado com aglutinantes como a goma-arábica e a cola de peixe (Callol: 2013: 24).

A sua durabilidade deve-se à qualidade dos seus componentes fundamentais, em

especial o pigmento e, por isso, são tintas estáveis. A tinta ferrogálhica, composta de

sulfato de ferro, ácido tânico ou tanino e um aglutinante, é conhecida desde a

Antiguidade. Seja por oxidação ou pelo aumento da acidez, esta tinta pode causar

diversos tipos de degradação como o escurecimento, a perda das propriedades

mecânicas e fragilização do papel causado pela oxidação; por seu lado, a acidez causa a

despolimerização que também resulta na perda das propriedades mecânicas. A

observação de auréolas ao redor da tinta é um sinal inicial da sua degradação por

oxidação (Silva, 2017).

Com o desenvolvimento tecnológico, os componentes de origem vegetal e animal foram

substituídos, na sua grande maioria por sintéticos, e aos componentes básicos

associaram-se outros secundários para atender à grande diversidade de especificações,

de acordo com a sua aplicação. Exceto as tintas que se obtêm diretamente de elementos

naturais, a maioria delas resulta de misturas ou sínteses cuja determinação quantitativa

e qualitativa nem sempre é possível mesmo fazendo uso de sistemas analíticos de alto

nível (Crespo & Vinas, 1984: 9).

Do ponto de vista da conservação, denominam-se tintas estáveis aquelas que possuem

equilíbrio físico-químico perante fatores ambientais e que são neutras em relação ao

suporte que as sustenta. Por tintas instáveis, consideram-se aquelas que em cuja

constituição fazem parte elementos que, direta ou indiretamente, provocam a sua própria

alteração ou a do suporte que as contém (Callol, 2013).

Através de um exame por observação macroscópica verifica-se que os materiais que

Augusto Nobre escolheu para elaborar os desenhos da sua autoria foram a grafite e a

tinta-da-china preta. Em apenas um dos desenhos verifica-se a utilização de um

pigmento de cor para o preenchimento de algumas partes de um peixe; neste caso poderá

ser de lápis de cor, que apesar de ser uma técnica difícil, é muito utilizada devido aos

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resultados com cores no sombreamento, nos contornos e nos preenchimentos. Os textos

e anotações manuscritas que os desenhos contêm foram escritos a grafite e a tinta.

A grafite foi utilizada para elaboração desenhos preliminares (vinte e quatro de um total

de vinte e cinco), as barras de escala nos desenhos finais (trinta e cinco) e a escrita de

anotações. Tal como referem Rapatão & Peiró, a grafite é um dos materiais mais

acessíveis que o ilustrador pode utilizar, serve como material para realização do estudo

ou desenho preliminar para posterior aplicação da técnica da tinta-da-china. É a técnica

mais elementar, “com recursos limitados, permitindo, de acordo com a habilidade e o

domínio técnico do executor, alcançar resultados notáveis por meio do uso de traços,

manchas, granulações de tons, associados a recursos como esfuminhos e borrachas”

(2016: 8).

A tinta-da-china preta, talvez aplicada com tira-linhas, foi o material selecionado pelo

autor para elaboração dos desenhos finais para a criação de linhas e efeitos de sombra

de luz com o pontilhismo. Este tipo de tinta é um dos principais materiais ou técnicas

utilizadas na ilustração biológica, permitindo a criação de linhas e efeitos de sombra de

luz com o pontilhismo, sendo aplicada com materiais diversos como o tira-linhas,

canetas recarregáveis e descartáveis (idem).

Como não foi realizado nenhum exame para identificação da tinta caligráfica, apenas se

pode referir que em todos os desenhos com anotações, nomes de peixe, medidas de

escala e assinaturas, o autor utilizou para escrever tinta de cor preta para escrever.

Os desenhos da autoria de Sara Ferreira, com uma qualidade artística mais elaborada do

que a dos desenhos de Augusto Nobre, foram elaborados com tinta-da-china preta,

grafite e guache. As anotações e as assinaturas que os desenhos apresentam foram

escritas a grafite e a tinta.

Segundo um exame dos desenhos realizada por Fernando Correia, como Sara Ferreira

utilizou uma técnica monotonal contínua com gradientes e uma técnica híbrida o recurso

à tinta-da-china preta serviu para executar o contorno externo e interno de estruturas e

para o pontilhado, enquanto a grafite e o guache foi usado para criar tonalização,

volumetria, textura e padrão.

É de salientar que os testes de solubilidade dos elementos sustentados permitiram

verificar que as tintas pictóricas, a tinta caligráfica e a grafite possuem equilíbrio físico-

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químico perante fatores ambientais e que são neutras em relação ao suporte que as

sustenta.

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10. O estado de conservação dos desenhos

10.1. Caracterização geral

A caracterização geral do estado de conservação dos desenhos em estudo foi realizada

com base nos dados registados na ficha “Estado de Conservação” utilizada no Serviço

de Conservação e Restauro da BPMP e na análise dos dados recolhidos no caderno de

campo, apoiadas pelas fotografias realizadas no decorrer do trabalho. A ficha utilizada

permitiu fazer uma avaliação e um registo detalhado do suporte, dos elementos

sustentados e da informação contida nos documentos. Foi preenchida uma ficha por

documento imediatamente antes da limpeza mecânica, num total de setenta e duas.

Pela utilização de um sistema de avaliação por observação macroscópica para suporte

de papel, foi adotado o conceito de dano definido como uma “alteração do estado e/ou

perda de valor do objeto e pode ocorrer devido ao efeito isolado de um agente em

particular ou à acumulação de um conjunto de circunstâncias, como parâmetros

ambientais inapropriados” (Marques, 2017: 98).

Foram identificadas as seguintes evidências de alteração e dano, no conjunto dos 72

desenhos intervencionados (Tabela 4), tendo o modelo de "Ficha de conservação" como

orientador, mas nela introduzindo alterações a partir de reflexão crítica:

Tabela 4 - Tipo de evidências de alterações e danos detetadas no conjunto dos 72 desenhos intervencionados

Físicas e químicas Cromáticas

Enrolamento e dobra Foxing

Perfurações por aplicação de materiais

metálicos Manchas

Vincos Migração da tinta para o verso

Rugas Deposição de partículas soltas

Rasgões Deposição de partículas entranhadas

Zonas perdidas Colas envelhecidas e amarelecidas

Desgaste do suporte

Suporte quebradiço

Corte intencional

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Como se pode observar na Tabela 5, a maioria das evidências de alterações e danos

identificados nos desenhos enquadram-se maioritariamente nas categorias “físicas e

químicas” e “cromáticas”

Tabela 5 - Identificação de evidências de alterações e danos pela sua ocorrência

Atendendo à distribuição verifica-se que as evidências de alterações e danos “físicas e

químicas” predominam quer no que se refere ao seu número como à sua ocorrência.

Aferindo as possíveis origens da maioria das alterações e danos identificados, concluiu-

se que assentam nas práticas de produção, uso e acondicionamento.

Os danos que terão sido introduzidos/produzidos aquando da elaboração dos desenhos

são as perfurações, o desgaste do suporte, as colas (que, entretanto, envelheceram,

acidificaram e amareleceram), as manchas de muco/mucilagem, as manchas de tinta e

os cortes intencionais pelas seguintes principais razões:

As perfurações são de pequena dimensão e foram feitas, na maioria dos casos,

nos quatro cantos das folhas de papel, o que sugere que teriam sido utilizados

0 10 20 30 40 50 60 70 80

Enrolamento e dobra

Perfurações por aplicação de materiais metálicos

Vincos

Rugas

Rasgões

Zonas perdidas

Desgaste do suporte

Suporte quebradiço

Corte intencional

Foxing

Manchas

Migração da tinta para o verso

Deposição de partículas soltas

Deposição de partículas entranhadas

Colas envelhecidas e amarelecidas

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objetos perfurantes como alfinetes para prender ou pendurar o desenho a um

suporte aquando da sua elaboração ou no registo fotográfico para preparação do

trabalho de impressão tipográfica. São 57 os desenhos que apresentam

perfurações.

O desgaste do suporte, por abrasão, sempre localizado junto às linhas do desenho

definitivo, revelam a correção de pequenos erros, ainda visíveis, que, pela forma

como foram feitos provocaram a rutura e laceração das fibras do papel. Foi

identificado em 17 desenhos.

Das manchas identificadas, salienta-se as de mucilagem e as escamas presentes

nos papéis dos desenhos preliminares, que pelas formas que apresentam e pelas

áreas do desenho em que se localizam, evidenciam que o desenhador colocou os

peixes diretamente em cima do papel para desenhar os seus contornos, noutros

casos, teria sido causado pela manipulação do espécime fresco (ou mesmo

conservado em meio líquido) para identificação das suas características. As

manchas de mucilagem foram identificadas em 15 desenhos.

As colas ou os adesivos foram utilizados para a união de vários papéis para a

criação de composições com determinadas intenções estéticas ou para prender

pequenos papéis aos desenhos com informações sobre eles.

Os cortes parecem ter sido executados, na maioria dos casos, para encurtar o

tamanho das folhas de papel que, originalmente, teriam maiores dimensões.

Por sua vez, os danos cuja origem terá sido um não adequado acondicionamento são os

que, na totalidade dos desenhos, se apresentam em maior número. Os danos

identificados foram os seguintes:

Tabela 6 – Evidências de alterações e danos identificados nas obras provocados por efeitos de acondicionamento

Categoria Evidências

Físicas e

químicas:

Enrolamento e dobra, vincos, rugas, rasgões, zonas perdidas,

suporte quebradiço

Cromáticas: Deposição de partículas soltas e entranhadas, foxing, manchas,

migração das tintas

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Na categoria alterações cromáticas, registam-se evidências de manchas de natureza

diversificada. Foram identificadas manchas de foxing em 61 desenhos. No que respeita

à deposição de partículas, todos os desenhos apresentam uma deposição não pontual

mas generalizada, mais solta ou mais entranhada e incrustada na superfície dos

desenhos. Estas partículas têm origem não só na poluição atmosférica mas também no

uso de grafite que, sendo material macio, se desgasta e desagrega e os seus resíduos

depositam-se nas superfícies. Foram identificadas deposições de partículas de grafite

em dezanove desenhos.

Os danos físicos e químicos, como enrolamento ou ondulação, vincos, rugas, rasgões ou

fragilização do suporte apresentam uma distribuição considerável no conjunto dos

desenhos.

É de salientar que não se verificou um padrão de distribuição específico para os dois

grandes tipos de papéis do suporte, ou seja, para o papel fino acastanhado e para o papel

de cor bege.

Como se pode observar na Tabela 7 que a seguir se apresenta, no que concerne ao estado

de conservação geral, nenhum desenho dos setenta e dois desenhos em estudo foi

avaliado como “Bom”, o que corresponderia à situação em que não são observados

danos, mas apenas alterações resultantes do envelhecimento natural do papel.

Tabela 7 - Estado de conservação geral dos desenhos

0 10 20 30 40 50 60 70

Bom

Razoável

Mau

Muito mau

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Verificou-se que a maioria das obras, sessenta e um no total, apresenta danos pontuais,

das diferentes categorias e, por isso, foram avaliadas como apresentando um estado de

conservação “Razoável”.

Com danos que incidiam até 2/3 das obras, como a zonas perdidas, pequenos rasgões,

perda de flexibilidade e fragilidade do suporte, foram classificados nove desenhos. Dois

dos desenhos apresentam um estado de conservação “Muito mau” devido à perda de

coesão física, perda de suporte, perda de resistência mecânica e à existência de danos

mecânicos muito acentuados.

É de mencionar que o grupo de desenhos resultante da segunda fase de seleção e no total

de quarenta e três terminados até ao fim do estágio foram avaliados como apresentando

um estado de conservação razoável.

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10.2. Caracterização descritiva

Neste ponto insere-se uma análise descritiva de cada tipo de alteração e dano

identificados com a sua definição, número de ocorrências, principais características e

imagens ilustrativas para facilitar a compreensão da descrição. A ordem de apresentação

considerou em primeiro lugar os danos que terão sido produzidos aquando da elaboração

dos desenhos e, de seguida, os que terão sido causados por condições de

acondicionamento ao longo do tempo.

Perfurações – são danos físicos que resultam da perda de suporte de pequenas

áreas circulares, geralmente são causadas por ataque de insetos, mas também são

causadas por objetos perfurantes.

Cinquenta e sete dos desenhos apresentam perfurações de pequena dimensão, na maioria

dos casos em quatro pontos, o que faz pensar que teriam sido utilizados objetos

perfurantes como alfinetes para prender ou pendurar o desenho a um suporte. A

necessidade de prender ou pendurar pode ter surgido na fase de elaboração do desenho,

ou na fase de preparação do trabalho tipográfico.

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Desgaste – é um tipo de dano provocado pela fricção entre materiais ou com

algum material abrasivo que resulta na perda de material das superfícies dos bens

culturais.

O desgaste do suporte foi identificado em dezassete desenhos que, pela localização –

sempre junto ao desenho definitivo – e pelo desenho original que ainda se consegue

observar, permitem perceber que foi executado como forma de correção de uma

imprecisão ou de um erro do desenho.

Fig. 35 – Desgaste do suporte – peixe “Echeneis remora”. Fonte: BPMP.

Fig. 34 – Cinco exemplos de perfurações nos desenhos. Fonte: BPMP.

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Colas envelhecidas e amarelecidas – as colas são produtos com capacidade de

unir dois materiais, mediante a adesão química ou mecânica entre superfícies

cujo processo de envelhecimento pode provocar alterações ou danos no suporte.

A colagem foi utilizada pelo autor com o objetivo de criar uma composição de desenhos

elaborados em diferentes papéis, para criar um suporte que servisse para pendurar os

desenhos e para identificar os livros em que os desenhos iriam ser publicados e que,

com o processo de envelhecimento, se apresentavam amarelecidas e acidificadas.

A colagem para criar uma composição com dois, três ou quatro papéis foi identificada

nos desenhos dos peixes “Centrophorus calceus e centrophorus squamosus”,

“Callionymus betenus” (Fig. 36), “Gobius capito” (Fig. 37) e “Belone acus” (Fig. 38).

Fig. 37 – Desenho com colagem de 4 papéis. Fonte: BPMP.

Fig. 36 – Desenhos com colagem de 2 papéis. Fonte: BPMP.

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No desenho do peixe “Epinephelus gigas” (Fig. 39), considerando as dimensões, a

posição e a perfuração central da tira de papel colada, é provável que essa colagem tenha

tido servido para prender o desenho.

Por último, foram identificados dois pequenos papéis colados em dois desenhos em que

o autor, identificou o livro em que aqueles iam ser publicados, a saber: no verso do

desenho do peixe “Dentex vulgaris” escreveu “Peixes de Portugal” (Fig. 40) e na parte

da frente do desenho n.º 10 da autoria de Sara Ferreira escreveu “Desenhos da D. Sara

Ferreira para ilustrar o meu livro sobre Moluscos Marinhos de Portugal” (Fig. 41).

Fig. 38 – Desenho com colagem de 3 papéis. Fonte: BPMP.

Fig. 39 – Frente e verso do desenho com colagem de 2 papéis. Fonte: BPMP.

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Manchas – são alterações da cor original em determinadas áreas dos

documentos, provocada por elementos externos ao papel. Podem provocar danos

ou não, em função das suas caraterísticas.

Em quinze desenhos, todos eles do tipo esboço ou desenhos preliminares, foram

identificadas manchas de cor amarelada ou acastanhada e escamas de peixe. Na maioria

dos casos, as manchas acompanham os contornos do peixe ou estão espalhadas pelo

suporte e apresentam uma maior intensidade na parte da frente do desenho.

Fig. 40– Papel colado com identificação de livro - verso do desenho do peixe

“Dentex vulgaris”.

Fonte: BPMP.

Fig. 41 – Papel colado com identificação de livro – parte da frente do desenho

n.º 10 de Sara Ferreira. Fonte: BPMP.

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Um exame cuidado, por observação direta com luz natural, permite perceber que se trata

de uma substância do próprio peixe que foi desenhado; que o autor teria usado o peixe

como modelo para desenhar os seus contornos, colocando-o em cima do papel, como

evidenciam os desenhos que se apresentam nas Figuras. 42-44.

Como, na introdução do livro em que a maioria dos desenhos estudados foi publicada,

o autor escreveu que “A maior parte dos desenhos que acompanham êste livro foram

feitos por mim, segundo exemplares frescos (…)” (Nobre,1935: LXXXIV), poderá

concluir-se que as manchas identificadas são as substâncias das secreções dos peixes,

que, no sentido botânico se designa como “mucilagem”42, sendo este o termo adotado

para designar o tipo de mancha em causa.

42 Definição consultada em Wikipédia (2018). Mucilagem. Disponível em:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Mucilagem

Fig. 42 – Desenho e pormenor ampliado das manchas de mucilagem dos contornos

do peixe “Raia undulata”. Fonte: BPMP.

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No desenho do peixe “N.V. Chocolata”, para além da presença de manchas de

mucilagem também se encontraram duas escamas de peixe coladas ao papel na área do

desenho (Fig. 45).

Para além de manchas de mucilagem, também se verifica a presença de manchas de tinta

da mesma cor e tipo da usada ou para escrever ou para desenhar na parte da frente dos

respetivos desenhos (Fig. 46 e 47).

Fig. 44 – Desenho com manchas de

mucilagem – peixe “Umbrina cirrosa”.

Fonte: BPMP.

Fig. 45 – Desenho com e escamas e manchas de mucilagem – peixe

“N.V. Chocolata”. Fotografia da autora.

Fig. 43 – Desenho com manchas de

mucilagem – peixe “Serranus gigas”.

Fonte: BPMP.

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Rasgões/cortes – os rasgões, ou rasgos, são danos resultantes da rutura do papel

por tensão, deixando as fibras do papel expostas. Os cortes são danos resultantes

da rutura do papel e verificam-se quando as fibras são separadas pela ação de

um instrumento cortante.

Em vinte e sete desenhos são evidentes danos causados por rasgões de tamanho variável,

que se localizam predominantemente nas margens do papel ou nas margens de cortes,

como se pode observar na Fig. 48.

Fig. 46 – Manchas de tinta no verso do desenho do peixe “Enthynnus pelamis”. Fonte: BPMP.

Fig. 47 – Manchas de tinta no verso do desenho do papel manuscrito. Fonte: BPMP.

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Em relação a cortes, os desenhos dos peixes “Pagrus vulgaris” e “Umbrina cirrosa”

(Figs. 16 e 17) apresentam um corte preciso, bem delimitado e sem efeitos de

enrolamento, que parece ter sido feito de forma intencional com a lâmina de um

instrumento cortante. Provavelmente os cortes foram executados pelo autor, aquando da

elaboração dos desenhos.

Fig. 48 – Exemplos de rasgões em 4 desenhos. Fotografia da autora.

Fig. 49 – Corte intencional na parte da frente e no verso do desenho

do peixe “Pagrus vulgaris”. Fonte: BPMP.

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Fig. 51 – Folha de papel cortada de forma irregular com instrumento cortante –

desenho sem título, n.º 5, de Sara Ferreira. Fonte: BPMP.

No conjunto dos desenhos, verifica-se ainda que 49 desenhos apresentam as folhas de

papel cortadas de forma irregular, com recurso a instrumento cortante.

Fig. 50 – Corte intencional na parte da frente e no verso do desenho

do peixe “Umbrina cirrosa”. Fonte: BPMP.

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Alguns destes tipos de cortes deveriam ter sido executados pelo facto de os autores

utilizarem folhas de papel de grandes dimensões que seriam cortadas, com pouco rigor,

à medida das dimensões reais dos peixes a desenhar. Os exemplos mais evidentes são o

do desenho do peixe “Belone acus” (ver Fig. 38) que mede 950 x 150 mm e cujo animal

mede, na realidade, entre 0,60 a 0,90 cm de comprimento, conforme informação das

características e descrição publicada pelo autor (Nobre, 1935:314); e o dos peixes de

menores dimensões (Fig. 52).

Enrolamento e dobra – é um tipo de alteração de forma que ocorre nos limites

e/ou margens das papel de papel provocados variações das condições

ambientais. Resultam em áreas de fragilidade do papel, que podem romper-se.

No conjunto dos setenta e dois desenhos, foram identificados três desenhos com

enrolamento e dobras nos limites superiores, inferiores e na margem das folhas.

Fig. 52 – Folha de papel cortada de forma irregular– desenho do peixe de menor dimensões

(130 x 74 mm) “Gobius minutos”. Fonte: BPMP.

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Vincos – são danos físicos originados pela dobra do papel, criando uma linha de

micro ruturas das fibras de celulose. Resultam em áreas de fragilidade do papel,

que podem romper-se.

Foram identificados vincos em cinquenta e um desenhos, causados por dobras feitas

a meio, em quatro ou mais partes das folhas de papel. Nos desenhos que apresentam

vincos com linhas mais marcadas, são visíveis zonas de rutura e de fragilidade das

fibras, como se pode observar nas Fig. 56 e 57.

Fig. 53 – Dobra - pormenor do desenho do

peixe “Dentex vulgaris”.

Fotografia da autora.

Fig. 54 – Enrolamento e dobra - pormenor

do desenho do peixe “Cyclopterus lumpus”.

Fotografia da autora.

Fig. 55 – Enrolamento - pormenor do desenho do peixe “Belone acus”.

Fotografia da autora.

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117

Fig. 57 – Pormenor de vincos em 2 desenhos. Fotografia da autora.

Fig. 56 - Vincos e pormenores de zonas de rompimento de desenho sem título.

Fotografia da autora.

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118

Rugas – são danos que se caracterizam pela deformação da superfície do papel

em pequenas áreas, formando pequenas pregas, em geral provocadas por

manuseamento ou acondicionamento inadequados.

Foram identificadas rugas num total de trinta e oito desenhos, tanto no papel fino de cor

acastanhada como no papel de escrita de desenho de cor bege, verificando-se em maior

número em desenhos de esboços.

Fig. 59 – Pormenor de rugas em 2 desenhos. Fotografia da autora.

Fig. 58 – Rugas em 2 desenhos – peixe “Raia asterias” e sem título. Fotografia da autora.

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119

Zonas perdidas – são um tipo de dano caracterizado pela perda de áreas de

papel, que podem ter sido causadas por manuseamento inadequado, ação de

insetos e outros animais e outras causas.

Foram identificados catorze desenhos com perda de suporte em pequenas zonas,

localizadas sobretudo nas margens das folhas de papel. Pela forma que as fibras do papel

apresentam, exclui-se como causa da perda de suporte a ação de insetos e outros animais.

O desenho com maior número de áreas com zonas perdidas é o que se apresenta em

primeiro lugar na Fig. 60.

Fig. 60 – Exemplos de zonas perdidas em 4 desenhos. Fotografia da autora.

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120

Suporte quebradiço – dano caracterizado pelo estado avançado de fragilidade

do papel, que se apresenta muito seco e fragmentado. É um dano associado à

acidez do papel, mas também à exposição à luz e à variação de temperatura e

humidade relativa.

Nos desenhos foram identificados vinte e seis casos de suporte quebradiço localizados

tanto nas margens como em áreas internas da folha de papel e, sobretudo, em zonas em

que verifica a acumulação de outros danos como rasgões, cortes, foxing, vincos e rugas.

Fig. 61 – Exemplos de suporte quebradiço em 3 desenhos. Fotografia da autora.

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121

Migração de tinta para o verso – é um dano causado por um fenómeno de

difusão (transferência de massa) da tinta para o verso da folha de papel ou para

outas folhas de papel por contacto.

No caso dos papéis e do cartão, como são materiais porosos e apresentam uma rede

aberta e heterogénea de fibras com grandes espaços de ar, as moléculas de baixo peso

molecular existentes nas tintas podem migrar sem qualquer impedimento. Nos desenhos

em estudo, verifica-se a migração de tinta de escrita para o verso em onze desenhos.

Sujidade – dano causado por materiais depositados ou incrustados na

Deposição de partículas – deposição, mais ou menos solta, de materiais

estranhos à elaboração do documento, nas suas superfícies, como partículas de

poluentes, detritos de insetos, alimentos, pele, etc.. Estes materiais são

considerados agentes agressores que comprometem a preservação dos bens

culturais e dos documentos gráficos em particular, e devem ser removidos no

processo de higienização e limpeza.

Na classificação dos danos da “Ficha de conservação” da BPMP, para este tipo de dano

é apresentada apenas a designação “sujidade geral”. No entanto, no exame realizado a

deposição de partículas foi avaliada consoante se apresentava não pontual mas

Fig. 62 – Pormenor de migração de tinta para o verso em 3 desenhos. Fonte: BPMP.

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122

generalizada mais solta ou mais entranhada e incrustada na superfície dos desenhos.

Assim, concluiu-se que todos os desenhos apresentam uma deposição não pontual mas

generalizada e mais solta na superfície dos desenhos.

Ao distinguir ou avaliar o nível de depositação e fixação de partículas na superfície do

papel, verifica-se a presença de um tipo de sujidade que pode ser designada como

“entranhada”, “incrustada” ou “aderente”, caracterizada por uma coloração acastanhada

e que no processo de limpeza mecânico exigiu um maior esforço de remoção mas com

resultados imediatamente visíveis. Este tipo de sujidade é mais notória nas partes dos

desenhos que ficaram mais expostas às poeiras e a outras substâncias por terem sido

armazenados sob desenhos de menores dimensões. O mesmo se verifica em zonas dos

desenhos onde foram colados pequenos papéis (Fig. 64). Nestes casos, as áreas que

ficaram mais expostas à deposição de partículas estão bem delimitadas pela sua

acumulação.

Esta será uma das razões porque os desenhos de maiores dimensões são os que

apresentam mais evidências de danos e em estados de deterioração mais grave. No

conjunto dos desenhos, a deposição de partículas entranhada foi identificada em onze

desenhos. De seguida, nas Figuras. 63 e 64, apresentam-se quatro exemplos.

Fig. 63 – Zonas de deposição de partículas entranhadas em 2 desenhos. Fonte: BPMP.

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123

É de referir que dezanove desenhos apresentam, no verso, um manchado feito com

grafite para transferência do desenho cujos resíduos migraram e aderiram a outros

desenhos quer por contacto direto entre papéis, quer pela dispersão provocada pelo

manuseamento, formando a deposição de partículas de coloração acinzentada. Na Fig.

65 apresenta-se o exemplo de quatro desenhos com manchado de grafite no verso.

Fig. 64 – Zonas de deposição de partículas entranhadas em pormenores de 2 desenhos.

Fonte: BPMP.

Fig. 65 – Manchado de grafite no verso de 4 desenhos. Fonte: BPMP.

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124

Foxing – é a designação para dano provocado por manchas pontuais de cor

castanha, com formas e dimensões variáveis, mas na sua maioria reduzidas, que

se espalham pela superfície do papel.

A causa do foxing ainda não é conhecida com exatidão. Alguns autores consideram os

fungos como os principais responsáveis por esta alteração; outros consideram que é a

presença de impurezas de origem metálica (ferro, cobre) em áreas manchadas que

favorece este tipo de alteração; outros ainda pensam que é a coexistência dos dois fatores

– o químico e o biológico – a causa do fenómeno (Caneva et al., 2000:92).

A presença de foxing foi identificada em sessenta e um desenhos, com manchas de

diferentes dimensões e formas. Na maioria dos casos localiza-se no verso dos desenhos,

nas margens, nas áreas mais expostas a condições adversas de preservação e nos papéis

que foram unidos com adesivos.

Fig. 66 – Exemplos de foxing em 6 desenhos. Fotografias da autora.

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125

Manchas – são evidências que se manifestam pela alteração da cor original em

determinadas áreas dos documentos e são provocadas por elementos externos

ao papel. Como o termo “mancha” é um termo genérico, na caracterização dos

documentos deve especificar-se a sua causa.

Nos desenhos em estudo, observou-se a presença de manchas em vários desenhos,

destacando-se as resultantes da proliferação de microrganismos (Fig. 67) e as resultantes

da ação da iluminação (Fig. 68) que mostram zonas das folhas amarelecidas ou

acastanhadas, nos extremos. As zonas de interior terão beneficiado da proteção de outros

documentos que as protegeram de tal incidência).

Fig. 67– Exemplo de mancha resultante da proliferação de microrganismos.

Fonte: BPMP.

Fig. 68 – Exemplo de mancha resultante da ação da iluminação.

Fonte: BPMP.

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126

Como é evidente, independentemente das suas causas, todas as alterações e danos

identificados, resultaram na perda de leitura e na diminuição da capacidade de

resistência mecânica dos documentos.

Acrescenta-se que as atividades de limpeza (mecânica e húmida), a desacidificação, a

reencolagem, a reintegração de pequenos cortes, rasgões e lacunas, assim como a

planificação contribuíram para reverter a maioria das evidências dos efeitos dos danos

que os desenhos terminados apresentavam e restituíram-lhes estabilidade física e

material salvaguardando a sua integridade. O acondicionamento realizado e o depósito

na “Casa-Forte”, em condições controladas de temperatura, humidade e iluminação,

permitirá a correta preservação dos documentos. As características do ambiente deste

depósito apresentam os valores de referência definidos como os adequados à

conservação preventiva dos desenhos, a saber: Humidade relativa: 45% +/- 5% e

Temperatura: 18ºC +/- 2ºC; Lux43: 0.

43 Lux é a unidade de medida para a iluminância (Thomson, 1990).

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127

11. A iconografia dos desenhos

Porque tão importante quanto conservar o suporte, os materiais de registo e a aparência

original dos desenhos, é conservar a informação que eles contêm, importa analisar a

iconografia44 dos desenhos em estudo.

Para análise da iconografia dos desenhos de cada um dos autores em estudo irá recorrer-

se à descrição das suas características formais a partir dos contributos das técnicas e das

metodologias da ilustração científica realizada por observação direta e com a

colaboração técnica do Professor e Ilustrador Científico Fernando Correia.

Em termos de nomenclatura da ilustração científica, todos os desenhos do conjunto em

estudo são desenhos biológicos, na subcategoria da ilustração zoológica. Os desenhos

dos peixes pertencem à infra categoria ilustração ictiológica e os dos invertebrados

marinhos à ilustração malacológica.

11.1 . Os desenhos de Augusto Nobre

Metade dos sessenta desenhos originais elaborados por Augusto Nobre tem a assinatura

do autor através da abreviatura “A.N.” ou da assinatura “A. Nobre”, como se reproduz

na Fig. 67. A abreviatura é a assinatura mais frequente nos desenhos e foi escrita por

baixo dos desenhos junto à parte de trás do corpo dos peixes; a assinatura “A. Nobre”,

menos frequente, aparece escrita na parte inferior direita dos desenhos.

44 Iconografia é uma palavra que vem do grego “eykon”, que significa imagem, e “graphia”, que significa

descrição, estuda a origem e a formação das imagens através de uma abordagem puramente descritiva.

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Fig. 69 – Abreviaturas da assinatura de Augusto Nobre em dois desenhos originais.

Fotografias da autora.

Fig. 71 – Assinatura de Augusto Nobre em desenho original.

Fotografia da autora.

Fig. 70 – Assinatura de Augusto Nobre. Fonte: BPMP.

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Por curiosidade, o desenho original do peixe “Coris julis” tem assinatura e abreviatura

de Augusto Nobre, como se pode observar na Fig. 71.

Os trinta desenhos que não estão assinados apresentam características e soluções

técnicas que, comparados com os desenhos assinados, permitem concluir com segurança

que foram elaborados pelo autor, a saber:

Dezoito desenhos, do tipo esboço, foram publicados no livro “Fauna Marinha

de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)” (Nobre, 1935) na

versão de desenho final e, na publicação, estão assinados pelo autor.

Sete desenhos, também do tipo esboço, apresentam textos manuscritos com a

descrição dos espécimes. O exame da caligrafia revela que as letras desenhadas

são muito idênticas às do autor existentes noutros desenhos assinados,

sugerindo que os esses textos terão sido por si escritos.

Dos cinco desenhos terminados que não foram assinados, um é o papel

manuscrito em que o autor identificou o livro em que iam ser publicados os

desenhos e que, neste estudo foi considerado como desenho; dos restantes

confirmou-se que foram publicados no livro identificado e aí estão assinados.

Em relação à fase de elaboração, o conjunto dos desenhos elaborados por António Nobre

apresenta desenhos na fase de esboço e desenhos terminados que em ilustração científica

Fig. 72 – Desenho original do peixe “Coris julis” com assinatura e abreviatura de Augusto Nobre.

Fotografia da autora.

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se designam como “desenhos preliminares” e “desenhos finais”, “ilustração ou arte-

final” 45.

O conjunto dos desenhos da autoria de Augusto Nobre inclui vinte e cinco “desenhos

preliminares” a grafite que representam peixes. A maioria destes desenhos foi executada

em papel fino acastanhado, representam peixes, apresentam manchas de mucilagem,

manchas de grafite no verso, a identificação do peixe e um texto descritivo das principais

características do peixe, conforme se sintetiza na Tabela 8.

Tabela 8 - Características dos desenhos preliminares

Apenas um dos desenhos não foi elaborado a grafite; vinte e três desenhos têm texto

manuscrito com a descrição e as características do peixe representado; dezanove

identificam o nome do peixe desenhado e apresentam manchas de grafite no verso para

transferência, por decalque indireto do desenho. Em quinze dos desenhos verifica-se a

presença de manchas de mucilagem. Quinze também é o número de desenhos que foram

elaborados em papel fino de cor acastanhado e dez em papel de escrita para desenho de

cor bege.

Acrescenta-se ainda que um desenho tem uma data e um local escrito, outro tem duas

escamas coladas ao papel de desenho e ainda outro apresenta um pequeno embrulho

preso de papel com alfinete contendo escamas, que se presume serem do peixe

representado. Nenhum dos desenhos preliminares foi assinado pelo autor.

45 Ver definições no ponto 5 deste Relatório.

0 5 10 15 20 25 30

Desenho a grafite

Texto descritivo

Identificação do peixe…

Manchado de grafite

Manchas de mucilagem

Papel fino acastanhado

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Por sua vez, os trinta e cinco “desenhos finais” elaborados por Augusto Nobre

evidenciam as seguintes características:

Todos foram elaborados a tinta em papéis de cor bege.

Todos apresentam uma barra de escala a grafite.

Trinta e dois têm escrito o nome do peixe, geralmente na parte superior direita

da folha de papel.

É de salientar que, para o mesmo peixe existe o par desenho preliminar e desenho final.

Isso acontece para os desenhos dos peixes “Umbrina cirrosa”, “Raia asterias” e

“Pragus vulgaris” conforme se pode verificar nos seguintes registos fotográficos (Fig.

72, 73 e 74).

Fig. 74 – Desenho preliminar e desenho final do peixe “Raia asterias”. Fotografia da autora.

Fig. 73 – Desenho preliminar e desenho final do peixe “Umbrina cirrosa”. Fonte: BPMP.

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Verifica-se que dois destes desenhos preliminares têm dimensões superiores

comparativamente ao desenho final.

É de mencionar ainda que na pesquisa realizada ao acervo de desenhos originais do

MHNC-UP foram identificados quatro desenhos finais do mesmo peixe de desenhos

preliminares pertencentes ao acervo da BPMP. São eles os desenhos dos peixes “Brama

raii”, “Centrina salaviani”, “Raia undulata” e “Zeus faber”.

No que concerne às técnicas de desenho verifica-se que, tanto nos desenhos preliminares

como nos finais, o autor privilegiou a técnica de contorno com recurso à linha, para

desenhar a estrutura morfológica dos peixes com traçados bem definidos. Em

determinadas partes ou pormenores dos desenhos finais o autor recorreu à técnica de

pontilhado ou stippling, usando uma carga maior ou menor de pontos para a criação de

um padrão que simula manchas ou formas utilizando pequenos pontos feitos com o

pigmento de uma única cor (Rapatão & Peiró, 2016).

Fig. 75 – Desenho final (a) e desenho preliminar (b) do peixe

“Pagrus vulgaris”. Fotografia da autora.

(a)

(b)

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O conjunto dos desenhos apresenta sempre o mesmo padrão e o mesmo plano de

representação, em vista lateral, com os peixes posicionados tanto para a direita como

para a esquerda. Em alguns desenhos o autor acrescentou pormenores para realçar

alguma especificidade do espécime que não ficaria clara nos planos pré-existentes.

Os materiais que Augusto Nobre escolheu para desenhar foram a grafite, sobretudo nos

desenhos preliminares, e a tinta-da-china preta com tira-linhas nos desenhos finais. Os

textos com as descrições das características dos peixes e as assinaturas foram escritos a

tinta de cor preta.

Apenas um dos desenhos, um desenho preliminar de um peixe não identificado em papel

fino acastanhado a grafite, apresenta vestígios de pigmentos de cor, como se ilustra na

Fig. 76.

Fig. 76 – Dois desenhos finais de peixes elaborados com a técnica do pontilhado.

Fotografia da autora.

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Fig. 77 – Desenho de peixe com vestígios de pigmento de cor (a) e pormenor do desenho (b).

Fotografia da autora.

(a)

(b)

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11.2. Os desenhos de Sara Ferreira

Os doze desenhos da autoria de Sara Ferreira representam equinodermos e moluscos

marinhos e estão todos assinados usando o nome e o último apelido, como demonstra a

Fig. 77.

Como referem Mateus & Vieira (2018), a desenhadora assinou frequentemente os

originais como “Sara Ferreira” ou com um “SF” estilizado.

Todos os desenhos são desenhos finais, desconhecendo-se se foram elaborados a partir

da observação de exemplares frescos, taxidermizados ou a partir de imagens pré-

existentes. A única informação que poderá servir de pista para esclarecer esta questão é

a que consta do desenho número 9, em que debaixo da assinatura da autora se observa

uma pequena frase, escrita pela letra de Augusto Nobre, com a afirmação “copia de

Arruda Furtado”, conforme se pode observar na Fig.78.

Fig. 78 – Assinatura de Sara Ferreira ampliada. Fonte: BPMP.

Fig. 79 – Pormenor ampliado do desenho n.º 9 da autoria de Sara Ferreira. Fonte: BPMP.

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Uma pesquisa breve na internet46 permitiu saber que Francisco de Arruda Furtado foi

um naturalista português que viveu entre 1854-1887 que dedicou os seus estudos à

malacologia e aos moluscos, utilizando o desenho como método exploratório e de

aquisição cognitiva, a par da ilustração científica, que, em regra, integrou nas suas

publicações. O desenho 9 pode, por isso, ter sido elaborado a partir de uma ilustração

daquele autor.

Em termos de plano de representação, os moluscos e os equinodermos como têm formas

frequentemente assimétricas, foram representados em mais do que uma vista realçando

pormenores de partes do corpo dos animais.

Como já antes foi referido, Sara Ferreira elaborou os desenhos em papel de escrita para

desenho de cor bege, que se presume ser de origem francesa utilizando técnicas que,

comparadas com as de Augusto Nobre, são mais elaboradas do ponto de vista estético e

artístico.

Segundo a observação macroscópica dos desenhos originais realizada por Fernando

Correia, a autora utilizou uma técnica monotonal contínua com gradientes e uma técnica

híbrida, recorrendo à tinta-da-china para contorno externo e interno de estruturas e para

o pontilhado, grafite e guache para tonalização e criação de volumetria, textura e padrão.

Como se pode observar nas Fig. 79 e 80 (e nas Fig. 51 e 64), os doze desenhos

elaborados por Sara Ferreira, para além das características da ilustração científica,

também têm qualidade artística e beleza. Nestes desenhos, as qualidades estéticas,

46 Francisco de Arruda Furtado (1854-1887), colecionador e autodidata, cria, a partir de 1880, uma vasta

rede internacional de correspondentes, a quem solicita conselhos e orientação científica para

aprofundamento de conhecimentos e de métodos de pesquisa. Neste contexto, troca correspondência com

Charles Darwin, tornando-se o único português conhecido correspondente do autor de A Origem das

Espécies. Ainda muito jovem, colabora ativamente na criação do museu de história natural do liceu de

Ponta Delgada e, a partir de 1885, trabalha na Secção Zoológica do Museu de Lisboa, sob orientação de

J. V. Barbosa du Bocage, onde prossegue estudos de malacologia, a sua área de especialidade. No estudo

dos moluscos utiliza práticas de laboratório e de anatomia comparada para compreender as relações entre

espécies e a respetiva distribuição geográfica. Também estuda antropologia. A utilização do desenho

como método exploratório e de aquisição cognitiva está, na prática científica de Arruda Furtado, a par da

ilustração científica, que, em regra, integra as suas publicações. Sócio da Sociedade de Geografia de

Lisboa, chega a ser proposto para a Academia das Ciências de Lisboa. Morre com apenas 33 anos de

idade, deixando publicados diversos trabalhos em Portugal e no estrangeiro, e manuscritos de projetos

científicos, cuja concretização ficou interrompida pelo seu desaparecimento prematuro. Informação

consultada em MUHNAC Digital, disponível em: http://digital.museus.ul.pt/exhibits/show/arruda-

furtado-vida-e-obra/biografia

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supostamente secundárias na ilustração científica, tornam o desenho do espécime mais

atraente e, também, mais inteligível.

Os autores Mateus & Vieira (2018) confirmam que a partir do seu trabalho artístico

conhecido, o expoente máximo da técnica de Sara Ferreira foi revelado nas obras de

equinodermos, em tons sépia monocromáticos.

Fig. 80 – Desenho n.º 12 e n.º 7 de Sara Ferreira. Fonte: BPMP.

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Fig. 81 – Espécimes representados nos desenhos n.ºs 4 e 3 de Sara Ferreira. Fonte: BPMP.

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12. Sobre os usos e as funções dos desenhos

Depois de realizada a descrição material da obra, a caracterização do seu estado de

conservação e obtidos resultados sobre os materiais constituintes e a iconografia dos

desenhos científicos do acervo de Augusto Nobre pertencente à BPMP, resta estudar os

usos e as funções que presidiram à sua elaboração.

Inscrita nas determinações inerentes à constituição da História Natural, a ilustração

científica foi desenvolvida sobretudo no contexto das expedições naturalistas, tão na

moda no século XIX, a territórios pouco conhecidos pelos europeus, e beneficiou da

evolução da imprensa e da gravura para a sua reprodução e publicação.

Tanto na botânica como na zoologia, a ilustração possibilitava, não apenas a

identificação de plantas e animais até então desconhecidos, como permitia uma fiel

marcação da descoberta efetuada. Neste contexto são de destacar, entre muitos outros,

os livros profusamente ilustrados que Charles Darwin (1809-1882) publicou como

resultado das suas viagens científicas. Pombo & Santos (2012) afirmam que foram mais

de 1400 as imagens, de diversos tipos, que aquele autor utilizou para ilustrar os seus

livros utilizando não apenas as espécies que examina e descreve, mas também os

conceitos, as hipóteses, os modelos e as teorias que desenvolve, esforçando-se para que

veiculassem informação científica correta e, ao mesmo tempo, fossem construídas com

elevado apuramento técnico e qualidade artística.

Tal como Darwin, muitos outros autores e investigadores, sendo os próprios autores dos

desenhos ou não, privilegiaram a utilização da ilustração nos seus artigos e livros como

forma de registo do estado do conhecimento da ciência em cada momento histórico e

enquanto meio de comunicação desses elementos à comunidade científica e ao público

em geral.

Ora, nos livros publicados por Augusto Nobre é comum que na capa e na folha de rosto,

abaixo do título e do nome do autor, esteja escrito uma referência aos desenhos e às

imagens existentes como forma de realçar a presença deste tipo de conteúdo. Eis

algumas dessas referências47:

47 É de referir que este tipo de referência não é exclusiva dos livros citados, os restantes livros do autor

que possuem desenhos, gravuras e fotogravuras também fazem esta menção na capa e folha de rosto.

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“Com 77 estampas e 64 fotogravuras” (Nobre, 1935).

“Com estampas e gravuras nos textos” (Nobre, 1931).

“Com 87 estampas e 49 fotogravuras” (Nobre, 1938-1940).

Uma “estampa” pode ser definida como “desenho” e/ou “uma imagem impressa por

meio de chapa gravada”48.

No caso das obras referidas, as estampas foram impressas em páginas sem texto no

verso, podendo conter entre dois a vinte e um desenhos49, gravuras ou fotogravuras para

ilustração do conteúdo dos textos. Estas páginas não têm a numeração do texto mas sim

a numeração da estampa, aparecendo a sua identificação num “índice sistemático” em

que consta, por ordem alfabética, o nome do objeto representado, a página, o número da

estampa e o número da figura.

Estes são exemplos claros de como o autor utilizou desenhos para descrever e comunicar

ciência. Neste contexto, os desenhos originais do acervo de Augusto Nobre pertencente

à BPMP constituem uma memória e uma fonte de informação dos usos e das funções

do desenho ou ilustração científica da Zoologia que era ensinada e investigada na

Faculdade de Ciências da Universidade do Porto nos anos vinte e trinta do século XX.

As principais fontes de informação diretas sobre os usos e as funções dos desenhos são

os próprios documentos do acervo no qual, em alguns casos, o autor inseriu e colou

papéis, e noutros casos escreveu nos próprios desenhos o nome dos livros em que iriam

ser utilizados os desenhos. Talvez tenha sido uma forma de organizar os desenhos e/ou

o meio escolhido para comunicar com os destinatários desta informação, como as

empresas tipográficas.

Assim, sabe-se, como se pode verificar pela leitura do texto manuscrito com a letra de

Augusto Nobre do documento reproduzido na Fig. 76, que os desenhos elaborados

representam peixes de Portugal e que foram elaborados segundo exemplares ao natural.

48 Significado de Estampa consultado in: Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa. Porto: Porto

Editora, 2003-2018. [consult. 2018-08-23 15:03:33].

Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/estampa

49 Este é o exemplo do número mínimo e máximo de desenhos ou fotogravuras impressas numa estampa

do livro Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes”.

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141

Um outro pequeno papel de linhas foi colado no verso do desenho final do peixe “Dentex

vulgaris” em que, também com a letra de Augusto Nobre, foi escrito “Peixes de

Portugal”, como se apresenta na Fig. 77.

Fig. 82 – Documento manuscrito com a letra de Augusto Nobre. Fonte: BPMP.

Fig. 83 – Desenho (a,) e ampliação do papel colado (b) no verso (c) do desenho do peixe

“Dentex vulgaris. Fonte: BPMP.

(a)

(b)

(c)

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142

Nos desenhos originais da autoria de Sara Ferreira, verifica-se que todos têm escrito, no

canto superior esquerdo, “A. Nobre, Mol. Portugal” (Fig. 78). A letra é de Augusto

Nobre. Para além disso, no desenho numerado com o número 10, Augusto Nobre colou,

de igual modo, um pequeno papel de linhas, manuscrito, com o seguinte texto:

“Desenhos de D. Sara Ferreira para ilustrar o meu livro sobre Moluscos Marinhos de

Portugal”.

Fig. 84 – Ampliação da frase manuscrita existente em todos os desenhos de Sara Ferreira.

Fonte: BPMP.

Fig. 85 – Desenho (a) e ampliação do papel colado (b) no desenho n.º 10 de Sara Ferreira.

Fonte: BPMP.

(a)

(b)

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143

Identificadas estas informações, pesquisou-se na vasta bibliografia da autoria de

Augusto Nobre os que tivessem os títulos “Peixes de Portugal” e “Moluscos de

Portugal”. Em relação ao primeiro título, não encontrámos nenhuma correspondência

direta, mas verificou-se que o livro “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes”) publicado em 1935 pela Companhia Editora do Minho,

apresenta nas páginas do texto e nas folhas das estampas (exceto na introdução, na

bibliografia e nos índices) o título “A. Nobre: Peixes de Portugal”, como se pode

observar na Fig. 80.

Fig. 86 – Ampliação do título (a) de duas páginas do livro “Fauna Marinha de Portugal. I.

Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes)” (b). Fotografia da autora.

(a)

(b)

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144

A partir deste momento, aquando do preenchimento da “Ficha de Conservação” de cada

desenho pesquisava-se naquele livro se o desenho tinha sido aí publicado. Fruto deste

trabalho conseguiu-se identificar que 40 dos 60 desenhos da autoria de Augusto Nobre

foram utilizados na publicação de “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes) ”. A não identificação de vinte desenhos no livro deve-se

ao facto destes não terem escrito o nome do peixe representado.

Desta pesquisa constatou-se ainda que na referida obra António Nobre publicou

duzentos e vinte e um desenhos com a sua assinatura e dezoito sem a sua assinatura,

mas que pelo estudo das características técnicas se verifica que provavelmente também

serão da sua autoria. Nessa obra também foram publicados treze desenhos de peixes

elaborados por Sara Ferreira com identificação, em cada desenho, do nome da

desenhadora.

Relativamente aos desenhos de Sara Ferreira, realizou-se o mesmo tipo de pesquisa para

o título “Moluscos de Portugal”. Apesar de, na bibliografia de Augusto Nobre, haver

mais de uma dezena de livros que têm a palavra “Moluscos” no título, conseguiu-se

identificar que, pelo menos, dois livros em que os doze desenhos da autoria de Sara

Ferreira foram publicados, e são eles “Moluscos terrestres, fluviais e das águas salobras

Fig. 87 – Página do livro “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e

peixes)” da estampa 22 (a) com o desenho original do peixe “Gobius capito”(b)

representado na estampa. Fotografia da autora.

(a)

(b)

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de Portugal”, editado em 1930 pela Direção Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas

e “Moluscos marinhos e das águas salobras” com data de edição de 1938-1940 pela

Companhia Editora do Minho. Também se verificou que, nos prefácios destes livros,

Augusto Nobre identifica a inclusão dos desenhos elaborados por Sara Ferreira e tece-

lhe rasgados elogios pelo trabalho realizado.

Os resultados obtidos permitem concluir que os desenhos elaborados por Augusto Nobre

e pela desenhadora da Secção de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do

Porto cumpriram algumas das funções essenciais do desenho ou ilustração científica que

são as de registar, divulgar e aumentar o conhecimento científico através do uso da

publicação.

Acerca da publicação, todo o trabalho realizado suscitou a curiosidade de tentar perceber

qual teria sido o processo através do qual, na época, se passou do desenho original para

Fig. 88 – Página do livro “Moluscos marinhos e das águas salobras” com impressão

do desenho original n.º 3 de Sara Ferreira. Fotografia da autora.

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146

a publicação e que tipo de impressão teria sido realizada. Deste modo, solicitou-se a

Sofia Meira, designer gráfica, investigadora e responsável pela Oficina de Tipografia

na Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos, a identificação do tipo de

impressão dos desenhos no livro “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes) ”, tendo verificado que o todo o livro (desenhos das

estampas e textos) foi impresso através da técnica da zincogravura50.

Por último, no arquivo do MHNC-UP foram encontradas impressões de vários desenhos

de peixes e uma folha com a montagem das imagens impressas e recortadas dos peixes

da estampa 41 do livro citado, com a identificação em cada recorte do número do

desenho e do nome do peixe, bem como do título do livro inserido na paginação escritos

pelo punho de Augusto Nobre (Fig. 81). O que poderá significar que seria o próprio

autor que compunha os desenhos de cada estampa a serem impressos.

Apesar de secundária, seria relevante a continuação da pesquisa para identificação dos

livros em que os desenhos foram publicados e, a existir documentação que o prove,

sobre o planeamento e o mapeamento das páginas em que foram impressos os desenhos.

50 “Zincogravura. Qualquer processo de gravura em zinco, ou a própria chapa de zinco gravada.”

“Zincogravar. Gravar no zinco, por processo fotomecânico ou outro” (Porta, 1958:420).

Fig. 89 – Folha com organização de desenhos impressos da estampa 41 do livro” Fauna Marinha de

Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes) ”. Fotografia da autora.

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147

Considerações finais

Este relatório é o resultado de uma caracterização material e técnica e de um trabalho

de intervenção no sentido da conservação preventiva de setenta e dois desenhos

científicos originais do acervo de Augusto Nobre da Biblioteca Pública Municipal do

Porto. Procedeu-se à caracterização do estado de conservação, intervenção de limpeza,

higienização e acondicionamento dos documentos. Deste conjunto, quarenta e três

foram objeto de pontuais e supervisionadas ações de estabilização física, de modo a

reduzir os riscos de alteração e dano e a proporcionar-lhes maiores condições de

estabilidade. O acondicionamento realizado e o depósito na “Casa-Forte”, em condições

controladas de temperatura, humidade e iluminação, reforçará a gestão de risco

ambiental e, adotando os princípios internacionais de conservação preventiva,

contribuirá para maior garante de preservação dos documentos.

Sobre a origem da obra na BPMP não foi encontrado qualquer documento comprovativo

da doação, mas avança-se com a hipótese avançada pelo Coordenador do Serviço de

Manuscritos e Reservados da BPMP, Dr. Sílvio Costa, de que os desenhos terão feito

parte do acervo que Augusto Nobre teria apalavrado com o então diretor da Biblioteca

em 1934 para ser entregue após a sua morte.

A análise do conteúdo documental permitiu verificar a existência de dois autores dos

desenhos, Augusto Nobre e Sara Ferreira. Se as informações disponíveis permitiram

conhecer e admirar o trabalho realizado por Augusto Nobre nas suas múltiplas facetas

como investigador, professor e, sobretudo, como autor e desenhador no ensino e na

divulgação o ensino da Zoologia no início do século XX; a quase total ausência de

informações biográficas sobre a desenhadora Sara Cabral Ferreira, que tantos elogios

mereceu por parte dos investigadores com quem colaborou na Secção de Ciências

Biológicas da Faculdade de Ciências da recém-criada Universidade do Porto, continua

a suscitar a curiosidade e a procura de respostas.

A pesquisa sobre as características e a origem dos papéis dos desenhos permitiu obter

algumas respostas a partir das informações contidas nos próprios papéis através das

marcas de água. A realização dos exames por microscopia eletrónica foi um exercício

interessante, mas por si só insuficiente para identificar a composição e as características

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148

dos papéis. Se houvesse mais recursos disponíveis, testes mais simples como os

microquímicos às fibra do papel, poderiam ter permitido obter informações relevantes

e conclusivas.

A caracterização dos danos e alterações presentes nos desenhos foi um trabalho

minucioso, executado com relativa facilidade, mas muito importante para a realização

dos procedimentos de conservação que foram ensinados e aprendidos. Por um lado, a

repetição, devido à grande quantidade de documentos a intervencionar, permitiu

consolidar as novas aprendizagens. Por outro lado, a existência de diferentes tipos de

danos nos documentos e a existência de documentos que apresentam diferentes níveis

de estado de conservação, levou a refletir e a procurar respostas sobre a existência de

uma fronteira muito ténue entre as funções e as atividades inerentes à conservação

preventiva e à conservação curativa, ou mesmo o restauro dos documentos em papel.

No que concerne aos resultados obtidos sobre o estado de conservação geral, verificou-

se que a maioria das obras, sessenta e uma no total, apresentava danos pontuais, e por

isso foi avaliada como apresentando um estado de conservação “Razoável”. Com

evidências de danos que incidiam até 2/3 das obras, como zonas perdidas, pequenos

rasgões, perda de flexibilidade e fragilidade do suporte, foram identificados nove

desenhos. Dois deles apresentavam um estado de conservação “Muito mau” devido à

perda de coesão física, perda de suporte, perda de resistência mecânica e à existência de

danos físicos muito acentuados.

Estudadas as causas que podem ter provocado este tipo de danos nos desenhos, concluiu-

se que são na sua maioria causas físico-mecânicas determinadas sobretudo por ações de

manipulação ou manuseamento, deficiente acondicionamento, imposição de cortes e

perfurações do papel. Relativamente a ações de manipulação, considerando as

características dos desenhos e o tipo de danos diagnosticados, deduz-se que uma parte

dos danos foram produzidos aquando da elaboração dos desenhos, e outra parte teve

origem nas condições de acondicionamento e armazenamento do acervo ao longo dos

anos.

A informação existente sobre o autor forneceu, desde o início, respostas às primeiras

questões de identificação da vida e da obra do autor e de identificação da data de

elaboração e da utilização que os desenhos tiveram. Os desenhos, olhados à partida

como simples desenhos científicos de peixes e moluscos, depressa ganharam vida e

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impuseram novas questões e curiosidades porque pouco se conhecia sobre a área da

ilustração científicas e sobre a importância do valor dos desenhos científicos como

documentos históricos e sociológicos.

No que se refere às técnicas de desenho constata-se que, apesar de terem sido utilizados

materiais de registo idênticos, são notórias as diferenças encontradas nas técnicas

utilizadas por cada um dos seus autores mas que, no entanto, foram elaborados com a

intenção única de descrever e comunicar ciência através da publicação dos livros do

autor ao conseguir-se identificar que cinquenta e um dos cinquenta e nove desenhos da

autoria de Augusto Nobre foram utilizados na publicação de “Fauna Marinha de

Portugal. I. Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes) ” e os doze desenhos da autoria

de Sara Ferreira foram publicados em, pelo menos, dois livros sobre moluscos. No

futuro seria importante proceder a uma análise comparativa com desenhos científicos

das áreas da Biologia e da Zoologia de outros autores seus contemporâneos para

comparação das técnicas, materiais e, até, identificação de possíveis erros.

Há que referir que a realização do estágio no SC&R da BPMP permitiu identificar,

adquirir e treinar as competências inerentes à conservação preventiva de documentos

em suporte de papel através da realização das atividades de caracterização do estado de

conservação, tratamento e acondicionamento das obras e que a definição da estratégia

metodológica foi fundamental na condução de todo o trabalho, nomeadamente a

utilização do diário ou caderno de campo que, para lá do registo das atividades

realizadas, permitiu a organização da análise e da reflexão das questões que iam tendo

resposta e das que iam sendo levantadas e, desta forma, descrever pormenorizadamente

o que se foi feito, como foi feito, porque e para que se fez e com que resultados, como

forma de validar a investigação realizada tendo permitido fazer uma investigação que

foi além das expectativas iniciais.

Por fim, uma palavra para a importância da continuação do estudo e da intervenção nos

restantes desenhos do acervo de Augusto Nobre pertencentes quer à BPMP quer ao

pertencente ao MHNC-UP, com o objetivo de assegurar a sua preservação em condições

de estabilidade e de os divulgar à comunidade científica e ao público em geral.

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Nota: Todos os links das referências apresentadas foram consultados ente maio e

setembro de 2018.

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Apêndices

1 - Cronologia da vida e obra de Augusto Nobre

2 – Exemplos da ficha síntese do estado de conservação dos desenhos

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1 - Cronologia da vida e obra de Augusto Nobre51

1865 Ano do nascimento, no Porto

?-1883 Estudos iniciais e liceais

1883 Publicação dos primeiros trabalhos na revista “A Mocidade de Hoje”,

Porto

1884 Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra – estudo de

Botânica e Zoologia

1886-1887 Academia Politécnica do Porto – estudos preparatórios de Medicina,

matrícula em Mineralogia, Geologia e Paleontologia

1887-1890

Escola Prática dos Altos Estudos de Paris – matrícula em Zoologia,

Botânica e Geologia

Estação Zoológica de Cette, anexa à Faculdade de Ciências de

Montpellier

1886 Criação da Estação Aquícola do Rio Ave. Nomeação como Diretor

1896-1914 Instalação particular de laboratório marítimo em Leça da Palmeira

1890 Assistente do Professor de Botânica Dr. Amândio Gonçalves na

Academia Politécnica do Porto

1891 Ajudante prático da cadeira de Zoologia regida pelo Professor Dr.

Aarão de Lacerda

1892

Publicação do livro “Estudos de Zootomia”. Typographia Occidental:

Porto - com mais de 150 desenhos feitos pelo autor

Início da organização do Museu de Zoologia

1894 Início da publicação da revista “Annaes de Sciências Naturaes”

1895 Excursão zoológica ao Algarve, com a mulher

1900 Morte do irmão, o poeta António Nobre

1901 Nomeação como Naturalista efetivo da Academia Politécnica do

Porto

1907

Fim da publicação da revista “Annaes de Sciências Naturaes”, ao 10.º

volume

Morte da esposa, Maria Júlia Ferreira Nobre

1911 Conclusão do curso de Bacharel em Ciências Histórico Naturais

1912 Nomeação como “Professor Extraordinário”

51 Cronologia elaborada a partir das informações consultadas nas seguintes referências: Nobre (1935),

Almaça (1993), Santos & Eiras (2016) e Amorim (2017).

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Nomeação de Diretor do Museu de Zoologia e do Laboratório de

Zoologia

1913 Deputado Republicano

1914 Início da construção do Aquário da Estação de Zoologia Marítima

1915 Nomeação como “Professor Ordinário”

Deputado Republicano

1916 Inauguração e abertura ao público do Museu de Zoologia

Criação de Laboratório para o estudo da fauna marítima

? Arrendamento do Castelo do Queijo por 2 anos para “modestíssima

instalação” provisória da Estação de Zoologia Marítima

1919 Deputado Republicano

1919-1926 Reitor da Universidade do Porto

1921

Criação do Instituto de Investigação Científica de Zoologia

constituído pelo Museu de Zoologia, pela Estação de Zoologia

Marítima, Laboratório de trabalhos práticos e Laboratório de

Entomologia económica

1922 Deputado Republicano

1927 Inauguração e abertura ao público do Aquário da Estação de Zoologia

Marítima

1930

Conclusão das obras de remodelação do Museu de Zoologia

Morte do filho, Augusto Ferreira Nobre

Abandono dos seus projetos – dedica-se à organização e publicação

dos seus trabalhos

1934 Doação à Biblioteca Pública Municipal do Porto do espólio do irmão

António Nobre

1935

Fim do exercício de funções por ter atingido o limite de idade

Publicação do livro “Fauna Marinha de Portugal. I. Vertebrados

(mamíferos, reptis e peixes”. Companhia Editora do Minho: Porto –

com 239 desenhos elaborados pelo autor

1935-1946 Organização de trabalhos e publicação de livros

1946 Ano da morte, no Porto.

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2 – Exemplos da ficha síntese do estado de conservação dos desenhos

Autor: Augusto Nobre

Título: Raia clavata

Data: Não

Assinado: A. N.

Dimensões: 447 x 400 mm

Técnica: Desenho de linha traçado a tinta-da-china

Suporte: Papel de escrita para desenho

Elementos sustentados: Tinta-da-china, tinta de caneta, grafite

Sinais particulares: Escala a lápis

Localização/Proprietário: BPMP

Publicação: Nobre, Augusto (1935). I Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes).

Companhia Editora do Minho: Pôrto – Estampa 68, desenho 210 Estado de conservação: Razoável

Observações: Perfurações, vincos, rugas, cortes, deposição de partículas geral, foxing

Testes realizados:

Plano de tratamento: Limpeza mecânica com borracha e pincel

Necessidade de restauro:

Acondicionamento:

Digitalização: Sim – fotografia

Registo fotográfico: antes

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Autor: Sara Ferreira

Título: Sem título

Data: Não

Assinado: Sara Ferreira

Dimensões: 398 x 307 mm

Técnica: Desenho traçado a tinta-da-china, com aguada a tinta-da-china, guache e grafite

Suporte: Papel de escrita para desenho

Elementos sustentados: Tinta-da-china, guache, grafite

Sinais particulares: Anotado no verso: identificação da instituição e local, numeração “1”

Localização/Proprietário: BPMP

Publicação: Nobre, Augusto (1938-1940). Moluscos marinhos e das águas salobras. Companhia Editora do Minho: Porto / Nobre, Augusto (1930). Moluscos terrestres, fluviais e das águas salobras de Portugal. Direção Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas: Porto.

Estado de conservação: Razoável

Observações: Perfurações, deposição de partículas geral, foxing

Testes realizados: Teste de solubilidade dos elementos sustentados

Plano de tratamento: Limpeza mecânica com borracha e pincel; limpeza aquosa a cotonete com água desionizada; desacidificação pontual com hidróxido de cálcio; encolagem pontual com gelatina; planificação em prensa

Necessidade de restauro: Não

Acondicionamento: Cartolina desacidificada, Melinex

Digitalização: Sim – fotografia

Registo fotográfico: antes Registo fotográfico: depois

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Autor: Augusto Nobre

Título: Gobius capito

Data: Não

Assinado: A. N.

Dimensões: 240 x 137mm

Técnica:

Suporte: Papel com marca de água cão “bull-dog” e dístico EXTRA STRONG

Elementos sustentados: Tinta da china, grafite, tinta de caneta

Sinais particulares: Escala a lápis; 4 papéis de tamanhos diferentes colados em sobreposição

Localização/Proprietário: BPMP

Publicação: Nobre, Augusto (1935). I Vertebrados (mamíferos, reptis e peixes).

Companhia Editora do Minho: Pôrto – Estampa 22, desenho 69 Estado de conservação: Razoável

Observações: Perfurações, rugas, cortes, colas, deposição de partículas geral, foxing, papel cortado de forma irregular

Testes realizados: Teste de solubilidade dos elementos sustentados

Plano de tratamento: Limpeza mecânica com borracha e pincel; limpeza aquosa a cotonete com água desionizada; desacidificação pontual com hidróxido de cálcio; encolagem pontual com gelatina; remoção da cola original; colagem com cola de amido; planificação em prensa

Necessidade de restauro: Sim

Acondicionamento: Cartolina e cartão desacidificados

Digitalização: Sim – fotografia

Registo fotográfico: antes

Registo fotográfico: depois

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Anexos

1 – Contrato de trabalho de Sara Cabral Ferreira

2 – Ficha de conservação do SC&R

3 – Imagens da microscopia eletrónica de varrimento e espetros de análise

por EDS

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1 – Contrato de trabalho de Sara Cabral Ferreira

Fig. 90 – Contrato de trabalho de Sara Cabral Ferreira. Fonte: Arquivo do MHNC-UP.

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2 – Ficha de conservação do SC&R

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3 – Imagens da microscopia eletrónica de varrimento e espetros de análise

por EDS 52

1. Papel com marca de água “cavalo-marinho”

52 Fonte: CEMUP.

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2. Papel marca em alto-relevo

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3. Papel marca de água cão

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4. Papel de cor acastanhada

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5. Papel com marca “palavras”