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ISSN 2176-1396 CONTRIBUIÇÕES DA EQUOTERAPIA PARA O PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DOS PRATICANTES COM SINDROME DE ASPERGER Bruna Nogueira Pereira 1 UFRRJ Giovani de Castro Lopes 2 UFRRJ Jéssica Barbosa de Figueiredo 3 UFRRJ Grupo de Trabalho Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: CAPES Resumo A equoterapia é um tratamento terapêutico realizado, através de atividades equestres e de equitação, por intermédio da interdisciplinaridade da equipe profissional que auxilia no desenvolvimento dos praticantes, como, por exemplo, pessoas com deficiência ou com necessidades especiais. Inseridos na equipe multidisciplinar estão os profissionais da educação, tais como pedagogos que são responsáveis pelas metodologias didáticos pedagógicas, adequando a faixa etária ou fase escolar da criança, em conjunto com os professores de educação física que lidam, principalmente com o aspecto psicomotor, a fim de promover e estimular a consciência corporal, coordenação motora, percepção espaço temporal, equilíbrio, força e outras habilidades. O objetivo dessa pesquisa foi investigar e identificar as contribuições da equoterapia, enquanto intervenção terapêutica, no desenvolvimento do processo de ensino aprendizagem das crianças praticantes com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), especialmente a síndrome de Asperger. O processo metodológico realizado, durante um ano letivo escolar, foi através de uma pesquisa ação combinado a uma coleta de dados por recurso audiovisuais, questionário para os pais ou responsáveis e relatórios dos profissionais da equipe do Projeto de Equoterapia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UFRRJ, localizado em Seropédica/RJ, que realizavam a terapia com aproximadamente três crianças, entre cinco a oito anos, que possuíam a síndrome de Asperger, unido ao colégio dos praticantes, CAIC Paulo Dacorso Filho. Observa-se, através dos resultados obtidos, que a prática da equoterapia contribui, de maneira significativa, no desenvolvimento das habilidades motoras e, também, nos aspectos psicossociais como a autoestima e a autoconfiança a propiciar a interação social e melhorias na qualidade de vida da criança com síndrome de Asperger. Em evidência, coloca-se o papel dos profissionais da educação na equipe multidisciplinar pois colabora com iniciativas de 1 Graduanda em Educação Física pela UFRRJ, Integrante do GPEFEA- Grupo de Pesquisa em Educação Física e Esportes Adaptados, Bolsista PIBID/CAPES. E-mail: [email protected] 2 Graduando em Educação Física pela UFRRJ, Bolsista PIBID/CAPES.E-mail: [email protected] 3 Graduanda em Educação Físca pela UFRRJ, Bolsista PIBID/CAPES. E-mail: [email protected]

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ISSN 2176-1396

CONTRIBUIÇÕES DA EQUOTERAPIA PARA O PROCESSO DE

ENSINO E APRENDIZAGEM DOS PRATICANTES COM SINDROME

DE ASPERGER

Bruna Nogueira Pereira1 – UFRRJ

Giovani de Castro Lopes 2 – UFRRJ

Jéssica Barbosa de Figueiredo3 – UFRRJ

Grupo de Trabalho – Diversidade e Inclusão

Agência Financiadora: CAPES

Resumo

A equoterapia é um tratamento terapêutico realizado, através de atividades equestres e de

equitação, por intermédio da interdisciplinaridade da equipe profissional que auxilia no

desenvolvimento dos praticantes, como, por exemplo, pessoas com deficiência ou com

necessidades especiais. Inseridos na equipe multidisciplinar estão os profissionais da

educação, tais como pedagogos que são responsáveis pelas metodologias didáticos

pedagógicas, adequando a faixa etária ou fase escolar da criança, em conjunto com os

professores de educação física que lidam, principalmente com o aspecto psicomotor, a fim de

promover e estimular a consciência corporal, coordenação motora, percepção espaço

temporal, equilíbrio, força e outras habilidades. O objetivo dessa pesquisa foi investigar e

identificar as contribuições da equoterapia, enquanto intervenção terapêutica, no

desenvolvimento do processo de ensino aprendizagem das crianças praticantes com o

Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), especialmente a síndrome de Asperger. O

processo metodológico realizado, durante um ano letivo escolar, foi através de uma pesquisa

ação combinado a uma coleta de dados por recurso audiovisuais, questionário para os pais ou

responsáveis e relatórios dos profissionais da equipe do Projeto de Equoterapia da

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ, localizado em Seropédica/RJ, que

realizavam a terapia com aproximadamente três crianças, entre cinco a oito anos, que

possuíam a síndrome de Asperger, unido ao colégio dos praticantes, CAIC Paulo Dacorso

Filho. Observa-se, através dos resultados obtidos, que a prática da equoterapia contribui, de

maneira significativa, no desenvolvimento das habilidades motoras e, também, nos aspectos

psicossociais como a autoestima e a autoconfiança a propiciar a interação social e melhorias

na qualidade de vida da criança com síndrome de Asperger. Em evidência, coloca-se o papel

dos profissionais da educação na equipe multidisciplinar pois colabora com iniciativas de

1Graduanda em Educação Física pela UFRRJ, Integrante do GPEFEA- Grupo de Pesquisa em Educação Física e

Esportes Adaptados, Bolsista PIBID/CAPES. E-mail: [email protected] 2Graduando em Educação Física pela UFRRJ, Bolsista PIBID/CAPES.E-mail: [email protected] 3Graduanda em Educação Físca pela UFRRJ, Bolsista PIBID/CAPES. E-mail: [email protected]

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ensino ou reforço da aprendizagem para o aluno, tornando a equoterapia um método

complementar para êxito no processo educacional.

Palavras-chave: Educação. Equipe Multidisciplinar. Equoterapia. Síndrome de Asperger.

Introdução

A Equoterapia é um método terapêutico e educacional que utiliza o cavalo, como um

agente colaborador, dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas da equitação, saúde e

educação, a fim de promover o desenvolvimento das pessoas com deficiência ou das pessoas

com necessidades especiais. A Equoterapia é reconhecida pelo conselho Regional de

medicina como uma prática terapêutica pela resolução 348/2008 e é regulamentada pela

ANDE-BRASIL - Associação Nacional de Equoterapia.

A prática equoterápica é citada desde Hipócrates (458 a 377 a.C) que comenta a

prática de atividades equestres traz benefícios para saúde e preservação do corpo humano

contra doenças e para tratamento de distúrbios do sono como, por exemplo, a insônia. Por isso

é recomendada para pessoas com distúrbios motores/ sensoriais, problemas ortopédicos,

problemas de comportamento e distúrbios de aprendizagem, além de síndromes e transtornos

do desenvolvimento. Diante da relevância da prática equoterápica tornou- se propicio

conduzir essa prática para o ambiente escolar, a fim de ser utilizada como método

complementar para auxiliar no processo de aprendizagem dos praticantes de equoterapia.

O presente trabalho possibilita a reflexão sobre a proposta pedagógica que considera

as contribuições da equoterapia, atividade que utiliza o cavalo como agente terapêutico no

contexto biopsicossocial dos praticantes de equoterapia, principalmente no âmbito

educacional para as crianças com deficiência ou com necessidades especiais, a fim de

beneficiar a qualidade de vida dos envolvidos.

A Equoterapia

Histórico e Definição

O uso do cavalo como instrumento terapêutico não é uma descoberta recente, desde

Hipócrates de Ló que aconselhava a equitação para o tratamento da insônia, e

também Asclepíades, da Prúscia (124-40 a.C.), que recomendou o uso do cavalo a

pacientes epilépticos e paralíticos. Galeno (130-199 d.C.) usou a equitação como

forma de fazer com que seus pacientes se decidissem com mais rapidez.

(MARTINEZ, 2005, p.19)

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A partir desta afirmação, observamos que a terapia através do cavalo é uma prática

que vem sendo utilizada ao longo dos anos e demonstra sua eficiência através dos benefícios

encontrados. A equoterapia é, portanto, a prática de atividades equestres e equitação, com fins

para saúde e/ou educação.

A palavra EQUOTERAPIA foi criada pela Ande-Brasil, para caracterizar todas as

práticas que utilizam o cavalo, com técnicas de equitação e atividades eqüestres,

objetivando a reabilitação e/ou educação de pessoas com deficiências ou

necessidades especiais. Foi criada com três intenções: a primeira homenagear nossa língua mãe, adotando o radical EQUO [...], a segunda em homenagear o pai da

medicina ocidental, o Grego Hipócrates [...] e a terceira foi estratégica: quem

utilizasse a palavra EQUOTERAPIA, [...] estaria engajado nos princípios e normas

que norteiam a prática no Brasil. (BRASIL, ANDE 2011. p.8)

Ao possuir autorização e indicação médica para realização da prática equoterápica, o

indivíduo inicia as sessões terapêuticas e passa a ser chamado de Praticante de Equoterapia.

“O Praticante de equoterapia é o termo utilizado para designar a pessoa com deficiência e/ou

com necessidades especiais quando em atividades equoterápicas. Nesta atividade, o sujeito do

processo participa de sua reabilitação, na medida em que interage com o seu cavalo.”

(BRASIL, ANDE 2011. p.9)

Os programas básicos da equoterapia são Hipoterapia, a Educação/Reeducação, o Pré

esportivo e a Prática esportiva paraequestre. Deve-se dar atenção a programação de sessões

equoterápicas, com o intuito de personalizar a terapia ao praticante e considerar as limitações

do indivíduo na organização das atividades, porém a estimular suas potencialidades.

O Cavalo

A equoterapia é a terapia que utiliza o cavalo como agente cinesioterapêutico, pois

através de sua montaria ocorre o movimento tridimensional, ou seja, o praticante se encontra

no centro de gravidade do cavalo e sofre alterações que movimentam seu corpo em diferentes

eixos.

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Figura 1 - O movimento nos três eixos.

Fonte: (TAUFFKIRCHEN, 1998, p. 38 por SILVA & GRUBITS, 2004)

[...] o cavalo tem nas ondulações vertebrais a origem dos seus movimentos, gerando uma posição corporal que provoca a perda de equilíbrio, retomado pelo

deslocamento dos seus membros, que por sua vez dão nova disposição à coluna

vertebral, e assim sucessivamente, criando uma relação de causa e efeito entre o

centro de gravidade, a inflexão da coluna e os deslocamentos dos membros. [...] Nos

deslocamentos, o cavaleiro tem a necessidade permanente de ajustar seu centro de

gravidade em harmonia com o centro de gravidade do cavalo, oscilando no sentido

lateral, no avanço de cada membro, e no sentido anteroposterior, na distensão dos

posteriores e no pouso dos anteriores. (SEVERO, 2010. p.115)

Porém a metodologia da Equoterapia não envolve somente o ato de montá-lo, mas

também estabelecer uma relação de afetividade e proporcionar a aproximação através dos

cuidados gerais com o animal.

O cavalo necessita de afeto para estabelecer uma relação, assim como o praticante. Essa relação aparecerá um dia, mas não sabemos se foi o cavalo ou o praticante

quem estabeleceu primeiro. Será positiva quando o prazer de um for igual ao prazer

do outro. (LERMONTOV, 2004, p.100)

Os profissionais da Educação na Equipe Terapêutica Multidisciplinar

O Pedagogo na Equoterapia

Os pedagogos lidam com as metodologias didáticas pedagógicas, adequando a faixa

etária ou fase escolar da criança.

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O papel do pedagogo e/ou psicopedagogo é o de criar situações que encaminhem a pessoa à utilização dos recursos disponíveis durante as sessões de equoterapia para

as atividades escolares, objetivando trabalhar as dificuldades resultantes do processo

ensino-aprendizagem, a assimilação, concentração e atenção. O próprio movimento

proporcionado pelo cavalo favorece a integração dos hemisférios cerebrais. (UZUN,

2005, p.43)

O Professor de Educação Física na Equoterapia

Os docentes de educação física são responsáveis por promover e estimular a força,

coordenação motora, percepção espaço temporal, equilíbrio e outras habilidades

psicomotoras, além dos com estímulos cognitivos por meios sensitivos ou corporais.

O recurso mais apropriado é a cinesioterapia por meio de exercícios passivos, ativo-

assistidos e ativo livres, de acordo com o propósito em questão. A cinesioterapia, ou

seja, terapêutica pelo movimento pode ser realizada pela estimulação auditiva, olfativa, gustativa, tátil, proprioceptiva e cinestésica, visando a desenvolver a

consciência corporal, a coordenação motora, o equilíbrio, a correção postural, a

marcha e a orientação no espaço. (SILVA & GRUBITS, 2004)

Além de ensinar através do movimento, o professor de educação física auxilia, nas

sessões equoterápicas, na organização de eventos e atividades lúdicas para recreação.

Ambos os profissionais da educação, devem vincular as metodologias utilizadas

durante a prática equoterápica aos objetivos educacionais propostos nos planos políticos

pedagógicos a fim de almejar o sucesso dos alunos envolvidos. Esta afirmação está de acordo

com os princípios e finalidades da Educação Inclusiva.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva tem

como objetivo assegurar a inclusão escolar de alunos com deficiência, transtornos

globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação[…] Nestes casos e outros, que implicam em transtornos funcionais específicos, a educação especial

atua de forma articulada com o ensino comum, orientando para o atendimento às

necessidades educacionais especiais desses alunos. Consideram-se alunos com

deficiência àqueles que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física,

mental, intelectual ou sensorial, que em interação com diversas barreiras podem ter

restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade. Os alunos com

transtornos globais do desenvolvimento são aqueles que apresentam alterações

qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de

interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Incluem-se nesse grupo

alunos com autismo, síndromes do espectro do autismo e psicose infantil.

(BRASIL,2008, p.14-15)

Em evidência, aborda-se o trabalho inclusivo com a pessoa com autismo:

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Nas crianças com autismo, os objetivos das intervenções educacionais dependerão, em grande medida, do grau de comprometimento presente. Nos pacientes com

prejuízos cognitivos importantes, os esforços deverão se dirigir, de forma mais

específica, para a tentativa de aumentar a comunicação e as interações sociais, para a

redução das alterações comportamentais (estereotipias, hiperatividade, etc.), para a

maximização do aprendizado, e para a independência nas atividades de vida diária.

(Schwartzmann, 2003, p.105)

A Síndrome de Asperger

Definição e características

A Síndrome de Asperger foi descrita no ano de 1944 por um médico pediatra de

Viena chamado Hans Asperger. No início de seus estudos ele nomeou a “doença”

como uma psicopatia autística. Seu trabalho ficou restrito à língua alemã por muito tempo. (ORRÚ, 2010, p.1.)

A Síndrome de Asperger se caracteriza por ser um transtorno do desenvolvimento

caracterizado pelos mesmos tipos de alterações nos processos de interação social e

comportamental presentes no autismo clássico e se diferencia pelo fato de que não demonstra

retardo ou deficiência de linguagem ou do desenvolvimento cognitivo.

A Síndrome de Asperger: difere do autismo clássico, principalmente por não ocorrer retardo mental, atraso cognitivo e considerável prejuízo na linguagem. [...]

Desenvolve interesses particulares em campos complexos, rígidos e impermeáveis a

novas idéias. (CUNHA, 2010, p.21)

O CID 10 conceitua a síndrome a seguir:

É um transtorno de validade nosológica incerta, caracterizado por uma alteração qualitativa das interações sociais recíprocas, semelhante à observada no autismo,

com um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. [...]

Os sujeitos que apresentam este transtorno são em geral muito desajeitados. As

anomalias persistem frequentemente na adolescência e idade adulta. (CID 10, 1995,

p. 84)

A quinta edição do manual de diagnóstico da Associação Americana de Psiquiatria

(DSM-5) em 2013, passa a classificar a Síndrome de Asperger como um tipo do TEA

(Transtorno do Espectro Autista).

Objetivos

O objetivo do presente artigo é investigar e identificar as contribuições da equoterapia,

enquanto uma forma de intervenção terapêutica, no desenvolvimento do processo de ensino e

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aprendizagem das crianças praticantes com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), em

especial a síndrome de Asperger.

Metodologia e Análise dos dados

Característica da Pesquisa

Foi realizada uma pesquisa exploratória, com delineamento de pesquisa ação, com

análise qualitativa dos resultados apresentados. A seguir o conceito sobre a pesquisa ação:

[…] é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em

estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no

qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema

estão envolvidos do modo cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, 1985 citado por GIL, 2008)

A coleta de dados foi realizada por meio dos relatórios, fotos e filmagens da equipe

multidisciplinar da equoterapia, como os psicólogos, psicopedagogos, pedagogos, professores

da educação, mediadores e auxiliares da terapia, além do processo de avaliação dos demais

profissionais da educação: professores e estagiários, sobre o comportamento e linguagem,

tanto verbal quanto não verbal, e desenvolvimento no processo de aprendizagem dos

praticantes e entrevistas com pais ou responsáveis.

População e Amostra

Este estudo foi realizado com o projeto equoterápico intitulado Equoterapia

Educacional, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ da cidade de

Seropédica – RJ. O trabalho foi aprovado e conduzido de acordo com as normas do Comitê de

Ética e Pesquisa desta mesma Universidade, mediante termo de consentimento livre e

esclarecido assinado pelos responsáveis legais pelos indivíduos que participaram da pesquisa.

Foram avaliados três indivíduos com Síndrome de Asperger, sendo dois do gênero masculino

e um do gênero feminino, na faixa etária entre cinco a oito anos de idade e alunos do Centro

de Atenção Integral à Criança - CAIC Paulo Dacorso Filho, também localizado no município

de Seropédica – RJ. O projeto iniciou no mês de abril do ano de 2014 e foi acompanhado até

o mês de julho de 2015, sendo composto por um ano letivo e dois bimestres escolares.

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Os critérios de inclusão na pesquisa foram: Os pacientes com diagnóstico de TEA, em

que o responsável autorizou a participação na pesquisa após assinar o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), com laudo médico para a realização da

Equoterapia e participante no projeto Equoterapia da UFRRJ. Foi excluído do estudo quem

não tinha o diagnóstico de TEA, mesmo que esteja fazendo a Equoterapia, alunos com a

síndrome, porém que não realizam a terapia e/ou não aceite a participação na pesquisa.

A equipe multidisciplinar do Projeto Equoterapia é composta por seis zootecnistas,

dois instrutores de equitação, três médicos veterinários, duas psicólogas, três pedagogas, dois

professores de educação física e sete monitores estudantes de graduação de educação física e

bolsistas PIBID/CAPES. Para a terapia equestre eram disponíveis quatro cavalos, da raça

manga larga marchador. A sessão da equoterapia possuía o tempo estimado de cinquenta

minutos de duração, uma vez por semana, sendo que o praticante permanece sobre o cavalo

por cerca trinta minutos.

Resultados e Discussões

Os programas de equoterapia utilizados pela equipe multidisciplinar durante o tempo

da pesquisa foram a hipoterapia ou a educação/reeducação, que incluem atividades de

socialização, exercícios de alongamento dos membros inferiores e superiores com atividades

psicomotoras no solo e no cavalo, montaria em circuitos psicomotores e montaria com

acompanhamento de um mediador, um auxiliar guia e um auxiliar lateral.

As sessões eram realizadas em ambiente aberto. O espaço físico, também chamado de

picadeiro, possuía dois tipos de solo: gramado ou cimentado. O espaço utilizado fazia parte do

espaço escolar, de maneira a facilitar o acesso aos pais ou responsáveis levarem seus filhos

fora horário de aula. Durante a terapia montada, os cavalos eram conduzidos entre os dois

tipos de solo devido à adequação do planejamento a prática e as necessidades do praticante.

É interessante ressaltar também a importância de o terreno possuir um solo macio,

ou seja, deve ser um terreno com solo de areia, serragem, grama ou terra fofa, para

suavizar as batidas das patas do animal ao solo, fazendo com que o impacto causado no praticante seja de menor intensidade. (LERMONTOV, 2004, p.76)

Em todas as sessões equoterápicas houve registro fotográfico e por vídeo, além de que

ao final das sessões o trabalho desenvolvido era relatado em formulários que continha: Os

nomes do praticante e do cavalo, nome do mediador que o atendeu, desenvolvimento da

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sessão, alterações ou progressos do praticante em relação à última sessão, materiais utilizados

e observações. Essa avaliação permitia debates sobre as futuras práticas equoterápicas e a

visualização novos métodos pedagógicos para intervenção.

Por serem utilizados nas sessões mediadores, auxiliares guias, auxiliares laterais

devido aos programas escolhidos, estes profissionais passavam por constantes atualizações e

treinamentos sobre os métodos de atividades ou cuidados e segurança para retirada da criança

praticante em situações de risco.

Ao iniciar as sessões equoterápicas, eram realizadas rodas de inclusão com a

finalidade de estimular a interação através de atividades lúdicas que oportunizam o

desenvolvimento social dos alunos. As atividades foram realizadas em um tapete colorido e

atrativo para as crianças e estavam divididas em dois suportes psicopedagógicos: O primeiro

era constituído de jogos, desenhos para colorir e/ou quebra cabeças, geralmente com imagens

de cavalos, para o estímulo das funções cognitivas ou estimular os sentidos e o segundo era

constituído por reforço da aprendizagem escolar adequado a série de cada aluno. Algumas

temáticas trabalhadas neste último segmento descrito eram o apoio pedagógico ao ensino da

matemática, da alfabetização e do letramento.

Os alongamentos foram compostos por auto alongamento ao final da roda inclusiva e

alongamento dos membros superiores e inferiores sobre o cavalo. Os exercícios com o

praticante montado no cavalo eram realizados, a partir de um circuito montado, com a

utilização de materiais como, por exemplo, cones, bolas e bambolês. As atividades realizadas

exigiam movimentos de rotação do tronco com braços abduzidos (Usando o método lúdico, o

mediador indicava “Imite um avião!”), flexão do tronco (Usando o método lúdico, o mediador

indicava “Abrace seu amigo cavalo”), entre outros.

Os circuitos para o aspecto motor eram individuais, a fim de buscar o perfil de cada

criança e assim trabalhar, especificamente, o praticante com suas preferências e as

necessidades de acordo com a síndrome. Observa-se o desenvolvimento corporal dos

praticantes e constata-se a afirmação sobre os objetivos da equoterapia:

Melhora o equilíbrio e a postura, rompendo o esquema patológico por ter o alinhamento cabeça-tronco; Desenvolve a coordenação motora de movimentos entre

troncos, membros e visão, assim como a dissociação de cintura pélvica e escapular;

estimula a sensibilidade tátil, visual, auditiva e olfativa pelo ambiente e pelo uso do

cavalo; promove a organização e a consciência do corpo, ocorrem o automatismo

postural e a orientação espacial; desenvolve a modulação tônica e estimula a força

muscular, sendo que a regulação tônus causa um relaxamento do estado de

contração; [...]; oferece sensações de ritmo; [...]. (MARTINEZ, 2005. p.36)

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Figura 2 - Roda Inclusiva no início das sessões equoterápicas.

Fonte: Os autores.

Figura 3 - Prática Equoterápica: Alongamentos no cavalo.

Fonte: Os Autores.

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Figura 4 - Prática Equoterápica: Alongamentos no cavalo.

Fonte: Os autores.

Figura 5 - Prática Equoterápica: Alongamentos no cavalo.

Fonte: Os autores.

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Figura 6 - Atividades pedagógicas de reforço escolar ou trabalho do aspecto cognitivo.

Fonte: Os autores

Considerações Finais

Este estudo observou desde anteriormente o início das práticas equoterápicas, a

presença dos membros da escola, incluindo a direção, coordenação e professores, que

apoiavam o projeto, a fim de formar um elo que contribuiu para a realização das sessões como

a disponibilização de espaço e materiais.

Através dos resultados obtidos por meio da coleta de dados através dos recursos

audiovisuais, questionários com os pais ou responsáveis e relatórios da equipe

multidisciplinar, pode-se concluir que ocorreu o desenvolvimento dos aspectos psicomotores

e sociais, a fim de considerar melhorias significativas na socialização dos praticantes quanto à

elevação da autoestima e autoconfiança, contribuindo para diminuição nas características da

síndrome investigada.

É evidente o efeito da prática equoterápica como terapia psicomotora pelos benefícios

demonstrados, ao longo do ano letivo, nas sessões equoterápicas como, por exemplo, o

desenvolvimento da coordenação motora – grossa e fina, da lateralidade, equilíbrio, controle

postural, entre outras, mas principalmente a consciência corpórea, estimulando a

autopercepção do praticante para considerar suas limitações individuais, porém buscar suas

potencialidades futuras. São notáveis, também, as benfeitorias quanto à socialização das

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crianças no âmbito escolar, quanto também na aprendizagem observados através das

melhorias nas avaliações escolares.

Ao observar os recursos pedagógicos utilizados, nota-se o evidente interesse infantil

pela maior parte dos assuntos abordados durante os intervalos das atividades sobre cavalo,

devido ao aspecto afetivo ligado ao animal e o conforto no local e com profissionais da

terapia, que através da ludicidade, auxiliavam o aluno no convívio e desempenho escolar. Em

evidência, observa-se a expectativa e atenção dedicada aos jogos ou brincadeiras por causa

das devidas lembranças ao, agente colaborador da terapia, cavalo a fim de estabelecer a

proximidade do animal com o praticante, mesmo que não esteja montado.

É interessante ressaltar a utilização do agente cavalo na equoterapia, pois este deixa de

ser um instrumento para tornar-se um participante colaborador como, por exemplo, os

praticantes o consideram um “amigo” e nutrem uma relação de afeto com animal, esta

situação motiva a continuação no processo terapêutico e evita alunos faltosos.

A formação continuada dos profissionais da equipe multidisciplinar é fundamental,

principalmente dos mediadores, auxiliares guia e auxiliares laterais por questão de segurança

ao praticante. Em evidência, coloca-se o papel dos profissionais da educação na equipe

multidisciplinar, pois colabora com iniciativas de ensino ou reforço da aprendizagem para o

aluno, tornando a equoterapia um método complementar para êxito no processo educacional.

A proposta da educação inclusiva é de extremamente importante constituindo, assim, a

base para uma sociedade sem preconceitos e de integradora, valorizando as diferenças. A

oportunidade de modificações na matriz curricular escolar proporciona melhores condições

para atender os alunos com deficiência, necessidades especiais ou transtornos de

desenvolvimento, como no caso do transtorno do espectro autista para efetivar os processos

de ensino aprendizagem da criança.

O presente estudo possibilita o estímulo a pesquisas posteriores de modo a instigar os

profissionais da área a pesquisar sobre a interação escolar e os métodos de

interdisciplinaridade e inclusão no cotidiano escolar.

REFERÊNCIAS

BRASIL, ANDE. Apostila do Curso Básico de Equoterapia – Brasília, Agosto, 2011.

BRASIL, Ministério da Educação. Política pública de educação especial na perspectiva da

educação inclusiva, 2008.

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CLASSIFICAÇÃO Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados com a

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