contribuição para a diminuição do consumo de água potável - caso de estudo de aproveitamento...

136
Rita Isabel Boléo Medeiros Licenciada em Ciências de Engenharia do Ambiente Contribuição para a diminuição do consumo de água potável - Caso de estudo de aproveitamento de águas pluviais no Município de Setúbal Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia do Ambiente, Perfil de Engenharia Sanitária Orientador: Professora Doutora Maria Gabriela Lourenço Silva Féria de Almeida, Professora Auxiliar, Faculdade de Ciências e Tecnologia - Universidade Nova de Lisboa Júri: Presidente: Professor Doutor Pedro Manuel da Hora Santos Coelho Vogais: Novembro 2014 Professor Doutor António Manuel Fernandes Rodrigues Professora Doutora Maria Gabriela Lourenço Silva Féria de Almeida

Upload: jessica-santos

Post on 09-Nov-2015

214 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre emEngenharia do Ambiente, Perfil de Engenharia Sanitária

TRANSCRIPT

  • Rita Isabel Bolo Medeiros

    Licenciada em Cincias de Engenharia do Ambiente

    Contribuio para a diminuio do

    consumo de gua potvel - Caso de estudo

    de aproveitamento de guas pluviais no

    Municpio de Setbal

    Dissertao para obteno do Grau de Mestre em

    Engenharia do Ambiente, Perfil de Engenharia Sanitria

    Orientador: Professora Doutora Maria Gabriela Loureno Silva

    Fria de Almeida, Professora Auxiliar, Faculdade de Cincias e

    Tecnologia - Universidade Nova de Lisboa

    Jri:

    Presidente: Professor Doutor Pedro Manuel da Hora Santos Coelho Vogais:

    Novembro 2014

    Professor Doutor Antnio Manuel Fernandes Rodrigues Professora Doutora Maria Gabriela Loureno Silva Fria de Almeida

  • iii

    Contribuio para a diminuio do consumo de gua potvel - Caso de estudo

    de aproveitamento de guas pluviais no Municpio de Setbal

    Copyright: Rita Isabel Bolo Medeiros, FCT/UNL, UNL.

    A Faculdade de Cincias e Tecnologia e a Universidade Nova de Lisboa tm o direito, perptuo e sem

    limites geogrficos, de arquivar e publicar esta dissertao atravs de exemplares impressos

    reproduzidos em papel ou de forma digital, ou por qualquer outro meio conhecido ou que venha a

    ser inventado, e de a divulgar atravs de repositrios cientficos e de admitir a sua cpia e

    distribuio com objectivos educacionais ou de investigao, no comerciais, desde que seja dado

    crdito ao autor e editor.

  • v

    AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar agradeo minha orientadora de dissertao, Professora Doutora Maria Gabriela

    Almeida, pela liberdade das minhas escolhas, pelas suas recomendaes e sugestes, que foram

    essenciais para o sucesso deste trabalho.

    Aos meus pais e minha irm, por me proporcionarem esta oportunidade e por me apoiarem

    sempre.

    A todos os meus colegas e amigos que me acompanharam ao longo destes 5 anos. Obrigada pela

    amizade, pelas sugestes, pelas preocupaes, pelo incentivo, e pela diverso ao longo deste

    percurso acadmico.

    Ao Joo, por toda a ajuda, disponibilidade e pacincia. Agradeo a motivao e o apoio.

  • vii

    RESUMO

    A gua um recurso natural, indispensvel para a existncia de vida na Terra, que tem sido utilizado

    de forma exaustiva e pouco controlada nas actividades antropognicas. Embora aparente ser um

    recurso renovvel, a gua doce tem sido utilizada a uma taxa superior sua capacidade de reposio,

    originado problemas de escassez de gua. Por este motivo, a gua cada vez mais valorizada em

    termos econmicos, sociais e ambientais.

    Verifica-se que o desenvolvimento econmico e o rpido crescimento demogrfico, contriburam

    para o aumento das necessidades de consumo de gua. No entanto, o volume de gua consumido

    no se restringe s s necessidades bsicas indispensveis, mas sim aos desperdcios e a consumos

    descontrolados. Desta forma, considera-se que uma melhor gesto dos recursos hdricos dever

    evitar ao mximo os desperdcios, reciclar a gua sempre que possvel e procurar fontes alternativas

    de gua.

    O aproveitamento de guas pluviais um dos sistemas de fontes alternativas de gua. Esta tcnica

    consiste em recolher as guas pluviais, que caem naturalmente nas vrias superfcies, direccionando-

    as para reservatrios de armazenamento, para posterior utilizao.

    O principal objectivo desta dissertao foi avaliar a possibilidade de aproveitar guas pluviais,

    destinadas a utilizaes que no necessitam de uma elevada qualidade da gua, por forma a

    contribuir para a minimizao do consumo de gua potvel, poupando assim o recurso gua e o

    custo de produo de gua potvel. Para isso, efectuou-se um estudo de caso no municpio de

    Setbal, avaliando a viabilidade de implementao de um sistema de aproveitamento de guas

    pluviais (SAAP) em quatro tipologias de edifcios diferentes.

    Do estudo realizado no municpio de Setbal, concluiu-se que no seria vivel a implementao de

    SAAP em edifcios de habitao, devido ao reduzido benefcio obtido em funo dos custos

    associados ao sistema. Pelo contrrio, o projecto torna-se vivel para a tipologia de edifcio do

    quartel dos bombeiros sapadores, uma vez que dispe de uma rea de captao elevada.

    Palavras-Chave: escassez de gua, consumos de gua, aproveitamento de guas pluviais, volume do

    reservatrio de armazenamento, viabilidade de um SAAP.

  • ix

    ABSTRACT

    Water is a natural resource, essential for the existence of life in the Earth, which has been used

    exhaustively and little controlled in its anthropogenic activities. Although seeming to be a renewable

    resource, fresh water has been used at a rate higher than the spare capacity, being originate water

    scarcity problems. For this reason, water is increasingly valued in economic, social and environmental

    terms.

    It turns out that the economic development and the expeditious increase of the population,

    contributed to the increase in water consumption needs. However, the volume of water consumed is

    not restricted only to the essential basic needs, but also to waste and the uncontrolled consumption.

    In this way, it is considered that a better management of water resources should keep things as

    waste, recycle water whenever possible, and to seek alternative sources of water.

    The use of rainwater is one of the systems of alternative sources of water. This technique consists in

    collecting the stormwater that falls naturally in several surfaces, directing them to storage reservoirs

    for later use.

    The main objective of this dissertation was to evaluate the possibility to harness rainwater, intended

    for uses that do not require a high water quality, to contribute to minimizing the consumption of

    drinking water. For this, it was made a case of study in the municipality of Setbal, evaluating the

    viability of implementing a rainwater harvesting system (RHS) in four types of different buildings

    The study conducted at the Setbal municipality, concluded that it would not be feasible

    implementing RHS in housing buildings, due to the reduced benefit costs associated with the system.

    On the contrary, the project becomes viable for the building typology of fire stations since it has a

    high catchment area.

    Keywords: water scarcity, water consumption, use of rainwater, storage tank volume, feasibility of a

    RHS

  • xi

    NDICE

    AGRADECIMENTOS .......................................................................................................................................... V

    RESUMO......................................................................................................................................................... VII

    ABSTRACT ....................................................................................................................................................... IX

    1. INTRODUO........................................................................................................................................... 1

    1.1. Enquadramento ........................................................................................................................................... 1

    1.1. Objectivo ...................................................................................................................................................... 2

    1.2. Plano de Trabalho ........................................................................................................................................ 2

    2. A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA ............................................................................................... 3

    2.1. Disponibilidade hdrica ................................................................................................................................ 3

    2.2. Usos antropognicos da gua ...................................................................................................................... 4

    2.3. Escassez de gua .......................................................................................................................................... 7

    2.3.1. Exemplos de escassez de gua .......................................................................................................... 10

    2.4. Situao na Europa .................................................................................................................................... 12

    2.5. Desperdcio no consumo de gua potvel ................................................................................................. 15

    3. ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL ........................................................ 17

    3.1. Aproveitamento de guas pluviais............................................................................................................. 17

    3.1.1. Descrio geral do sistema ................................................................................................................ 20

    3.1.2. Requisitos necessrios implantao de um SAAP ........................................................................... 22

    3.1.3. Tratamento da gua pluvial armazenada ......................................................................................... 25

    3.1.4. Vantagens e desvantagens do aproveitamento de guas pluviais ................................................... 27

    3.1.5. Casos reais de utilizao de SAAP ..................................................................................................... 28

    3.1.6. Legislao em Portugal ..................................................................................................................... 32

    3.2. Equipamentos economizadores de gua e medidas de incentivo poupana ......................................... 34

    4. ESTUDO DE CASO ................................................................................................................................... 37

    4.1. Pressupostos admitidos e metodologia aplicada na elaborao dos cenrios .......................................... 37

    4.1.1. Consumos de gua potvel ............................................................................................................... 37

    4.1.2. Superfcies de captao de guas pluviais ........................................................................................ 39

    4.1.3. Estudo da pluviosidade para o municpio de Setbal ........................................................................ 40

    4.1.4. Determinao dos volumes de armazenamento dos reservatrios .................................................. 45

    4.1.5. Custo - Benefcio da instalao de um SAAP ..................................................................................... 49

    4.2. Resultados.................................................................................................................................................. 51

    4.3. Discusso dos Resultados .......................................................................................................................... 58

    5. ACEITAO PBLICA RELATIVA POSSIBILIDADE DE REUTILIZAR GUAS RESIDUAIS TRATADAS .......... 61

    5.1. Discusso dos resultados ........................................................................................................................... 65

  • xii

    6. CONCLUSO ........................................................................................................................................... 67

    7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .............................................................................................................. 71

    ANEXO I.......................................................................................................................................................... 79

    ANEXO II ........................................................................................................................................................ 81

    ANEXO III ....................................................................................................................................................... 97

    ANEXO IV ..................................................................................................................................................... 111

    ANEXO V ...................................................................................................................................................... 115

  • xiii

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 2.1 - Distribuio de gua na Terra .............................................................................................................. 3

    Figura 2.2 - Consumos de gua por sector escala mundial e por continente ...................................................... 5

    Figura 2.3 - Consumos de gua por habitante e por dia em seis regies do mundo .............................................. 6

    Figura 2.4 - Regies com escassez fsica e econmica de gua .............................................................................. 9

    Figura 2.5 - Evoluo do mar Aral entre 1989 e 2009 ........................................................................................... 10

    Figura 2.7 - Lago Chade em 1972 e em 2001 ........................................................................................................ 11

    Figura 2.6 - Evoluo dos pntanos numa regio da provncia de Jilin, entre 1987 e 2000 ................................. 11

    Figura 2.8 - Desaparecimento de cursos de gua em Tquio, entre 1890 e 1985 ................................................ 12

    Figura 2.9 - Stress hdrico na Europa (%) .............................................................................................................. 13

    Figura 2.10 - ndice de Stress hdrico nos pases europeus (%) ............................................................................. 13

    Figura 2.11 - Consumo de gua doce na Europa de acordo com os vrios sectores (%) ...................................... 15

    Figura 2.12 - Desperdcio de gua nos vrios sectores, para os anos de 2000 e 2009, e metas a alcanar pelo

    PNUEA ate ao ano de 2020 ................................................................................................................................... 16

    Figura 3.1 - Representaes de um SAAP aplicado a habitaes .......................................................................... 21

    Figura 3.2 - Representao esquemtica de um SAAP aplicado a uma indstria ................................................. 22

    Figura 3.3 - Exemplo de um sistema de drenagem ............................................................................................... 23

    Figura 3.4 - Satisfao das necessidades vs dimenso dos reservatrios ............................................................ 25

    Figura 3.5 - Sequncia de tratamentos das guas pluviais armazenadas num reservatrio ................................ 26

    Figura 3.6 - Reutilizao da gua do lavatrio para o autoclismo ........................................................................ 35

    Figura 3.7 - Estrutura do consumo domstico de gua ........................................................................................ 35

    Figura 3.8 - Potencial de economia de gua com chuveiros de presso reduzida ................................................ 36

    Figura 4.1 - Postos meteorolgicos seleccionados atravs do SNIRH ................................................................... 40

    Figura 4.2 - Polgonos de Thiessen ........................................................................................................................ 41

    Figura 4.3 - Municpio de Setbal e postos meteorolgicos selecionados ........................................................... 42

    Figura 4.4 - Polgonos de Thiessen em funo dos postos meteorolgicos, aplicados ao municpio de Setbal . 42

    Figura 4.5 - Resultado da aplicao dos polgonos de Thiessen cidade de Setbal ........................................... 43

    Figura 4.6 - Ajustamento Lei de Gauss dos valores anuais da precipitao ponderada no municpio de Setbal

    .............................................................................................................................................................................. 44

    Figura 4.7 - Srie de precipitao ponderada total anual do Municpio de Setbal ............................................. 45

    Figura 5.1 - Distribuio da amostra por gnero .................................................................................................. 61

    Figura 5.2 - Faixa Etria ......................................................................................................................................... 62

    Figura 5.3 - Habilitaes Literrias ........................................................................................................................ 62

    Figura 5.5 - Resultados da questo 2: Sabe o que uma Estao de Tratamento de guas Residuais (ETAR)? . 62

    Figura 5.4 - Resultados da questo 1: Sabe o que so guas Residuais? ............................................................. 62

    Figura 5.6 - Resultados da questo 3: J ouviu falar na reutilizao de guas Residuais? ................................... 63

  • xiv

    Figura 5.7 - Resultados da questo 4: Na sua opinio, quais os usos que se podem dar s guas Residuais

    Tratadas? ............................................................................................................................................................... 63

    Figura 5.8 - Resultados da questo 5: Quais as suas preocupaes relativamente utilizao de guas Residuais

    Tratadas para usos no potveis? ......................................................................................................................... 64

    Figura 5.9 - Resultados da questo 6: Imagine um jardim pblico em que a rega feita por um sistema

    automtico, utilizando guas residuais tratadas. Nesse mesmo jardim existem vrios bebedouros de gua

    potvel. Hesitaria beber dessa gua por duvidar da sua origem, uma vez que para esse jardim so

    encaminhadas guas residuais tratadas? ............................................................................................................. 64

    Figura 5.10 - Resultados da questo 7: Sabe que existem casos de reutilizao de guas residuais indirecta, em

    que os efluentes municipais, tratados e no, so descarregados em recursos hdricos ,de onde posteriormente

    se faz extraco de gua para produo de gua potvel, a jusante da descarga?.............................................. 65

    Figura 5.11 - Resultados da questo 8: Concorda com a utilizao de guas residuais tratadas para usos no

    potveis? (rega de jardins, lavagem de carros, lavagem de ruas, combate a incndios, indstria no alimentar)

    .............................................................................................................................................................................. 65

  • xv

    NDICE DE TABELAS

    Tabela 2.1 - Consumos de gua por sector e por continente ................................................................. 5

    Tabela 2.2 - Classificao dos pases de acordo com a sua disponibilidade hdrica ............................... 8

    Tabela 4.1 - Caractersticas dos edifcios a estudar .............................................................................. 39

    Tabela 4.2 - rea de influncia de cada posto meteorolgico .............................................................. 43

    Tabela 4.3 - Resultado do teste Kolmogorov-Smirnov .......................................................................... 44

    Tabela 4.4 - Precipitao caracterstica do municpio de Setbal ......................................................... 45

    Tabela 4.5 - Valores mximos dos consumos a satisfazer, limitados pelo valor mdio das afluncias 47

    Tabela 4.6 - Consumos de gua da rede e quantidade de gua passvel de ser substituda por gua

    pluvial .................................................................................................................................................... 47

    Tabela 4.7 - Valores finais do consumo a satisfazer atravs de um SAAP ............................................ 48

    Tabela 4.8 - Oramento de reservatrios em beto ............................................................................. 50

    Tabela 4.9 - Volume dos reservatrios em funo da satisfao dos consumos atravs de um SAAP 51

    Tabela 4.10 - Custos anuais do consumo total de gua e do consumo substituvel ............................. 54

    Tabela 4.11 - Reduo do volume de gua e respectiva poupana do custo anual de gua da rede com

    instalao de SAAP ................................................................................................................................ 54

    Tabela 4.12 -Custos de instalao dos SAAP () .................................................................................... 55

    Tabela 4.13 - Retorno do investimento dos reservatrios em beto ................................................... 57

    Tabela 4.14 - Retorno do investimento dos reservatrios em PEAD .................................................... 57

  • xvii

    ABREVIATURAS

    ANQIP - Associao Nacional para a Qualidade nas Instalaes Prediais

    CAOP - Carta Administrativa Oficial de Portugal

    ETA - Especificao Tcnica da ANQIP

    ETAR - Estao de Tratamento de guas Residuais

    INE - Instituto Nacional de Estatstica

    ONU - Organizao das Naes Unidas

    PEAD - Polietileno de Alta Densidade

    PEAASAR - Plano Estratgico de Abastecimento de gua e de Saneamento de guas Residuais

    PNUEA - Programa Nacional para o Uso Eficiente da gua

    SAAP - Sistema de Aproveitamento de guas Pluviais

    SIG - Sistema de Informao Geogrfica

    SNIRH - Sistema Nacional de Informao de Recursos Hdricos

    UNEP - Programa Ambiental das Naes Unidas

  • INTRODUO

    1

    1. INTRODUO

    1.1. ENQUADRAMENTO

    A gua um recurso natural essencial vida, presente nas mais diversas actividades, e cada vez mais

    valorizado em termos econmicos, sociais e ambientais. O uso intensivo deste recurso tem

    provocado alteraes nas disponibilidades hdricas, tanto em termos quantitativos como qualitativos,

    levando procura de novas e/ou diferentes solues para a gesto dos recursos hdricos.

    Desde sempre que as civilizaes se fixam preferencialmente em locais prximos de gua, quer seja

    junto ao mar, a rios ou a lagos. Estes locais potenciam o desenvolvimento destas comunidades,

    devido s inmeras utilizaes dadas ao recurso hdrico disponvel. A gua pode ser utilizada para

    fins domsticos, irrigao de culturas, usos industriais, ou at servir de meio de deslocao a pessoas

    e mercadorias.

    No entanto, o aumento demogrfico e o uso exaustivo e pouco controlado dos recursos hdricos, tm

    originado srios problemas de poluio e escassez de gua. Estes problemas so especialmente

    relevantes ao nvel da gua doce, uma vez que esta est disponvel em menor quantidade.

    Deste modo torna-se necessrio reflectir e encontrar alternativas que permitam uma melhor gesto

    dos usos da gua. Estas alternativas passam obrigatoriamente por: - estratgias que diminuam os

    desperdcios nos vrios tipos de consumos; - utilizao de fontes alternativas de gua, como

    aproveitamento das guas pluviais e reutilizao de guas residuais tratadas.

    Embora sejam conhecidas solues que contribuem para a diminuio da escassez de gua, estas s

    so utilizadas quando no existem mais alternativas, ou seja, quando o recurso j se encontra

    limitado. Este acontecimento ocorre essencialmente por questes financeiras, uma vez que

    necessrio um grande investimento que a curto prazo no ter retorno; e tambm por questes de

    aceitao pblica. Sendo esta um factor particularmente limitante no que respeita reutilizao de

    guas residuais tratadas.

  • INTRODUO

    2

    1.1. OBJECTIVO

    Esta dissertao teve por objectivo principal avaliar a possibilidade de aproveitar guas pluviais no

    municpio de Setbal, destinadas a utilizaes que no necessitam de uma elevada qualidade da

    gua, por forma a contribuir para a minimizao do consumo de gua potvel. Como objectivo

    secundrio pretendeu-se avaliar, de forma expedita, a aceitao pblica relativa possibilidade de

    reutilizar guas residuais tratadas, como fonte alternativa.

    1.2. PLANO DE TRABALHO

    Para a prossecuo do objectivo, o presente trabalho desenvolveu-se de acordo com a seguinte

    estrutura:

    Reviso bibliogrfica - onde se abordam temas relacionados com a escassez de gua e com

    alternativas para diminuir o consumo de gua, mais especificamente os sistemas de

    aproveitamento de guas pluviais;

    Estudo de caso aplicado ao municpio de Setbal - estudo da pluviosidade e da quantidade

    de gua pluvial que se consegue armazenar em cada tipologia de edifcio: um edifcio

    multifamiliar, um edifcio unifamiliar com piscina e jardim, o mesmo edifcio unifamiliar caso

    no tivesse piscina nem jardim, e o edifcio dos bombeiros sapadores de Setbal;

    Avaliao expedita da aceitao pblica relativamente reutilizao de guas residuais

    tratadas - atravs da realizao inquritos online, escala nacional, atravs do Google Drive;

    Discusso e concluso.

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    3

    2. A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    2.1. DISPONIBILIDADE HDRICA

    A gua um dos principais constituintes do planeta Terra, sendo um recurso natural e fundamental

    para todos os ecossistemas e actividades humanas (Shiklomanov, 1998). Cerca de 2/3 do planeta

    Terra constitudo por gua, no entanto apenas 2,5% desse volume corresponde a gua doce. Os

    restantes 97,5% representam gua salgada, disponvel nos oceanos (Tomaz, 2001).

    Relativamente gua doce, a sua distribuio a seguinte (Figura 2.1): cerca de 69% est sob a

    forma de gelo, presente nas calotes polares do rtico, Antrtida e regies montanhosas; cerca de

    30% encontra-se em guas subterrneas; e apenas 1% corresponde fraco de guas superficiais.

    Nas guas superficiais esto includos os rios, lagos, atmosfera e solos (Tomaz, 2001).

    Durante muitos anos o impacto causado pelo homem nos recursos hdricos foi insignificante,

    permitindo manter as propriedades de gua doce, quer em termos qualitativos como quantitativos.

    Este facto levou iluso de que a gua seria um recurso inesgotvel, provocando uma atitude

    negligente na gesto dos recursos hdricos. Assim, com o avano da cincia e da tecnologia, que

    originaram um desenvolvimento intenso nas reas de produo agrcola e industrial, a necessidade

    de captao de gua aumentou significativamente a nvel mundial (Shiklomanov, 1998).

    Ainda em funo dos avanos tecnolgicos, verificou-se um rpido crescimento demogrfico, o que

    tambm contribuiu para o aumento nas necessidades de consumo de gua. Ou seja, a captao de

    gua aumentou significativamente e, como consequncia, a disponibilidade de gua por habitante, a

    nvel mundial, tem vindo a diminuir (Shiklomanov, 1998). Contudo este resultado no se baseia

    Subterrneas

    30%Superficiais

    1%

    Rios

    Lagos

    Atmosfera

    Solos

    gua Salgada 97,5%

    gua Doce 2,5%

    Gelo 69%

    Figura 2.1 - Distribuio de gua na Terra

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    4

    apenas no volume indispensvel s necessidades bsicas, mas sim no uso compulsivo e no

    desperdcio, sem ter em conta as necessidades de consumo futuras (Tomaz, 2001).

    Embora exista gua suficiente para satisfazer as necessidades bsicas da populao mundial, a sua

    distribuio varia de local para local, existindo regies com grande dfice de gua. A desigual

    distribuio dos recursos hdricos traz srios problemas de escassez de gua, pois existem locais que

    naturalmente j tm uma reduzida disponibilidade de gua, e em simultneo contm uma elevada

    densidade populacional (Qadir et al, 2003).

    Apesar de o ciclo hidrolgico ter capacidade para renovar a gua, o reabastecimento dos recursos

    hdricos est dependente, entre outros factores, das condies climatricas de cada regio e da

    quantidade de gua captada nessa mesma regio (Qadir et al, 2003; Shiklomanov, 1998).

    Para alm das actividades humanas, existe ainda a vertente natural das alteraes climticas, o que

    tudo conjugado provoca ainda mais alteraes no ciclo hidrolgico. Os problemas relativos ao

    recurso da gua podem manifestar-se de diferentes formas: gua a mais, gua a menos e m

    qualidade da gua (Raven, P. et al, 2008).

    O consumo de gua por pessoa varia de pas para pas, dependendo da disponibilidade do recurso e

    do grau de desenvolvimento de cada pas. Esta variao vai desde as dezenas de litros de gua por

    pessoa e por dia, at s centenas de litros de gua por pessoa e por dia, em regies de escassez

    aguda e regies altamente desenvolvidas, respectivamente (Raven, P. et al, 2008).

    2.2. USOS ANTROPOGNICOS DA GUA

    O uso da gua atravs das actividades humanas engloba trs grandes sectores: o agrcola, o industrial

    e o domstico. No sector domstico esto includos os consumos nas habitaes, nos espaos

    comerciais, nos servios pblicos e na rega de jardins.

    Em termos globais, a agricultura o sector que consome mais gua (Raven, P. et al, 2008; Tundisi,

    2006; Qadir et al, 2007). Os valores diferem ligeiramente de autor para autor, mas de um modo

    geral, o sector agrcola consome 70% do volume total de gua consumido no mundo, seguindo-se a

    indstria com um consumo de 20%, e o sector domstico com um consumo de 10% do volume total

    (Figura 2.2).

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    5

    No entanto os consumos de gua por sector variam de regio para regio, de acordo com as suas

    necessidades, em funo das condies climticas, da dimenso da populao e do desenvolvimento

    econmico da regio. A Tabela 2.1 e a Figura 2.2 indicam os consumos de gua em cada continente,

    de acordo com os trs sectores acima referidos.

    Tabela 2.1 - Consumos de gua por sector e por continente

    Como se pode observar pela Tabela 2.1, excepo da Europa, o sector que consome mais gua em

    cada continente a agricultura. De acordo com estes dados, o sector que consome mais gua na

    Europa a indstria, tendo o sector agrcola e o sector domstico consumos muito idnticos.

    Figura 2.2 - Consumos de gua por sector escala mundial e por continente

    Regies Consumo de gua por sector (km

    3/ano)

    Domstico Industrial Agrcola

    frica 27 11 174

    Amrica 130 288 430

    sia 228 244 2 035

    Europa 72 188 73

    Ocenia 5 3 11

    Mundo 462 734 2 722

    Fonte: FAO, 2014

    Fonte: WWAP, 2012

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    6

    A Figura 2.2 apresenta os continentes divididos por regies, em que os resultados reforam a ideia

    de que os consumos so muito variveis de regio para regio, quer se refira a uma escala de um pas

    ou de um continente. Veja-se o exemplo da Amrica, em que na Tabela 2.1, escala do continente, o

    consumo de gua do sector industrial cerca do dobro do consumo de gua do sector domstico. No

    entanto de acordo com a Figura 2.2, os dados dos consumos para a Amrica do Sul indicam

    precisamente o contrrio, o sector domstico consome cerca do dobro de gua quando comparado

    ao sector industrial.

    Relativamente ao sector domstico, estima-se que nas grandes cidades dos pases desenvolvidos, o

    consumo de gua seja de 350 l/(hab.dia) para os Estados Unidos da Amrica e para o Japo, e de 200

    l/(hab.dia) para a Europa. J nos pases mais pobres, como a regio subsariana do continente

    africano, o consumo de gua de 10 a 20 l/(hab.dia) (World Water Council, 2014).

    A falta de acesso gua, quer por inexistncia fsica ou por questes econmicas, ocorre

    essencialmente nos pases mais pobres, ou seja nos pases em desenvolvimento. Visto de uma outra

    prespectiva, esses pases so menos desenvolvidos porque tm falta de gua, que um bem

    essencial vida e a qualquer actividade. A Figura 2.3 mostra a discrepncia dos consumos de gua,

    por habitante, em seis regies do mundo.

    Fonte: Planeta Sustentvel, 2011

    Como se pode observar pela Figura 2.3, de acordo com a Organizao Mundial de Sade, so

    necessrios 50 litros de gua por dia para satisfazer as necessidades bsicas de higiene e consumo de

    Figura 2.3 - Consumos de gua por habitante e por dia em seis regies do mundo

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    7

    gua para beber. A este valor acresce, pelo menos, o consumo de gua para a preparao de

    alimentos e para lavagens de roupa e de loia. Note-se que um indivduo africano da regio

    subsariana apenas consome 20 litros de gua por dia, ou seja menos de metade do consumo mnimo

    necessrio para a higiene e ingesto de gua.

    Quanto mais desenvolvido um pas, maior a sua envolvncia nas reas de produo agrcola e

    industrial, e portanto mais gua consome. Na indstria, a gua pode ser utilizada em torres de

    arrefecimento, na lavagem de equipamentos, como solvente, fazer parte da composio final de um

    produto, e ainda servir como meio de comunicao e transporte. J na agricultura, a gua destina-se

    irrigao das culturas.

    O volume de gua necessrio agricultura (70% do consumo de gua mundial), poder originar

    conflitos entre os restantes sectores que consomem gua, uma vez que a populao tende a

    aumentar, aumentando a procura de alimento, e diminuindo a disponibilidade hdrica (WWAP,

    2012).

    Embora o desenvolvimento seja sinnimo de riqueza, e portanto, maior consumo de gua, hoje em

    dia existe uma consciencializao social da necessidade de diminuir os consumos de gua. Esta

    consciencializao resultado das campanhas de sensibilizao realizadas junto populao, que

    conduzem tambm necessidade de utilizao de solues tecnolgicas, capazes de consumir

    menos quantidade de gua garantindo os mesmos objectivos. Assim, a evoluo social e econmica,

    passa por atenuar o consumo de gua em todos os sectores de utilizao, diminuindo o desperdcio e

    aumentando a eficincia.

    No sector industrial, uma nova abordagem de produo passa por produzir mais com menos, ou seja

    aumentar a produo sem aumentar o consumo de gua. Este sistema de produo est

    direccionado para a produo em ciclo fechado, que idealmente deveria proporcionar descargas de

    efluentes quase nulas. No caso do sector agrcola, o consumo de gua tende a diminuir em funo do

    desenvolvimento de tecnologias aplicadas nos sistemas de rega. No entanto, em alguns pases a

    disponibilidade de gua j limitada e a tendncia para piorar (WWAP, 2012).

    2.3. ESCASSEZ DE GUA

    A escassez de gua no , para j, um problema escala mundial. No entanto, existe uma percepo

    generalizada de que a gua um recurso cada vez mais escasso, resultado de condies inevitveis

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    8

    como o crescimento demogrfico e o respectivo aumento da procura de gua para produo de

    alimentos, para usos industriais e para usos domsticos (FAO, 2012).

    Relativamente sua disponibilidade hdrica, os pases so classificados de acordo com as seguintes

    categorias:

    Tabela 2.2 - Classificao dos pases de acordo com a sua disponibilidade hdrica

    Classificao Disponibilidade Hdrica (m3/(hab.ano))

    Absoluta escassez de gua 1700

    de salientar que a disponibilidade hdrica por habitante abrange o consumo de gua para ingesto,

    para higiene pessoal, para preparao de alimentos, para lavagens, e ainda a gua virtual. A gua

    virtual aquela que no consumida directamente pelo consumidor, mas que necessria nos

    processos de produo, como por exemplo na produo de cereais e gado. Por exemplo, para

    produzir 1kg de arroz so necessrios 1400 litros de gua (World Water Council, 2014).

    De acordo com a ONU, at 2030 quase metade da populao mundial viver em reas com escassez

    de gua. Actualmente o cenrio no muito melhor, pois cerca de um quinto da populao mundial

    (1,2 mil milhes de pessoas) vive em zonas com escassez fsica de gua, e um quarto da populao

    mundial (1,6 mil milhes de pessoas) vive em locais com escassez econmica de gua, onde os pases

    no tm as infraestruturas necessrias para conseguirem captar a gua (UN, 2014).

    Nos pases mais pobres, a crescente limitao de acesso ao recurso gua, compromete o seu

    desenvolvimento. O acesso a gua para produo de alimentos, criao de animais e usos

    domsticos, est a tornar-se mais limitado do que o acesso a cuidados de sade e educao,

    normalmente problemtico neste tipo de pases. Destacam-se a maioria dos pases do Mdio Oriente

    e do Norte de frica, bem como pases como o Mxico, Paquisto, frica do Sul, e grande parte da

    China e da ndia (FAO e UN-Water, 2007).

    O facto de a densidade populacional e os recursos de gua doce no estarem distribudos

    uniformemente no Mundo, agrava o problema da escassez de gua. Os locais com maior escassez

    fsica de gua, so aqueles que contm uma maior densidade populacional, e aqueles onde o preo

    Fonte: FAO, 2012

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    9

    de gua potvel mais elevado. Nestes locais as pessoas pagam entrem 5 a 10 vezes mais por

    unidade de gua, quando comparado a pessoas que tm fcil acesso a gua potvel proveniente da

    rede de abastecimento (FAO e UN-Water, 2007).

    Actualmente a populao mundial conta com 7 mil milhes de pessoas, mas estima-se que at 2050

    a populao aumente at aos 9,3 mil milhes de pessoas, o que se traduz num aumento contnuo de

    procura de gua (WWAP, 2014). Consequentemente, j para o ano de 2025, esperado que 1,8 mil

    milhes de pessoas vivam em locais com absoluta escassez de gua, para alm dos dois teros de

    populao que viver em locais de stress hdrico (UN, 2014).

    A Figura 2.4 apresenta as regies do mundo com escassez fsica e econmica de gua. As regies

    esto classificadas em quatro categorias: escassez fsica de gua, prximo de escassez fsica de gua,

    escassez econmica de gua e pouca ou nenhuma escassez. Existem ainda zonas para as quais no

    foram estimadas quaisquer categorias.

    A escassez fsica ocorre quando a regio no tem disponibilidade hdrica para fazer face s

    necessidades de consumo, por falta de existncia fsica do recurso. A escassez econmica ocorre

    quando a regio no tem acesso s infraestruturas necessrias para conseguir captar e tratar a gua,

    embora o recurso esteja disponvel.

    Atravs da Figura 2.4 pode-se verificar que as regies que apresentam maior escassez de gua, quer

    seja fsica ou econmica, correspondem s regies de pases em desenvolvimento.

    Figura 2.4 - Regies com escassez fsica e econmica de gua

    Fonte: WWAP, 2012

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    10

    2.3.1. Exemplos de escassez de gua

    Independentemente da sua causa, por factores naturais ou por factores antropognicos, a

    disponibilidade de gua doce tem vindo a diminuir. Seguem-se alguns exemplos, onde visvel a

    diminuio do volume de guas superficiais:

    Na sia Central, os dois rios que alimentavam o mar de Aral deixaram de chegar at ao mar,

    aps uma captao intensiva de gua para a irrigao das plantaes de algodo. Como

    consequncia, o volume de gua do mar de Aral cada vez menor, provocando alteraes profundas

    nos ecossistemas (Tomaz, 2001), como se pode observar na Figura 2.5.

    Em 1997 na China, o rio Amarelo, sexto maior rio do mundo, no chegou ao mar durante sete

    meses seguidos (Tomaz, 2001);

    No Nordeste da China, na provncia de Jilin, existe uma regio caracterizada pela abundncia

    de pntanos, os quais tm vindo a ser substitudos por terrenos agrcolas (UNEP, 2002). A Figura 2.6

    mostra a diferena na abundncia destes pntanos no ano de 1987 e no ano de 2000, representados

    a azul/preto. As reas a vermelho/laranja representam terrenos agrcolas.

    Fonte: Universidade Aberta, 2013

    Figura 2.5 - Evoluo do mar Aral entre 1989 e 2009

    Setembro 1989 Agosto 2003 Agosto 2009

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    11

    O rio Nilo, no continente africano, diminuiu o seu caudal mdio de 85 km3/ano para 53

    km3/ano (Tomaz, 2001);

    O Lago Chade, no Centro de frica, diminuiu a sua rea em 90% entre 1963 e 2001, tendo sido

    um dos maiores lagos a nvel mundial (PBLICO, 2009). A Figura 2.7 mostra essa diminuio entre os

    anos de 1972 e 2001.

    Figura 2.7 - Lago Chade em 1972 e em 2001

    No centro de Tquio, no Japo, e de acordo com a Figura 2.8, pode constatar-se o

    desaparecimento de pequenos rios e cursos de gua entre 1890 e 1985.

    Fonte: BBC News, 2007

    Figura 2.6 - Evoluo dos pntanos numa regio da provncia de Jilin, entre 1987 e 2000

    Fonte: UNEP (2002a)

    1972 2001

    1987 2000

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    12

    Figura 2.8 - Desaparecimento de cursos de gua em Tquio, entre 1890 e 1985

    2.4. SITUAO NA EUROPA

    Na Europa a escassez de gua pouco acentuada, mas ainda assim existe algum stress hdrico nas

    regies com grandes reas de irrigao e nos pases altamente industrializados (UNEP, 2002a). O

    stress hdrico calculado com base no consumo de gua de cada regio, relativamente

    disponibilidade total de gua doce renovvel (volume de guas superficiais e subterrneas renovado

    atravs da precipitao), servindo de indicador da presso exercida sobre os recursos hdricos

    (Wintgens et al, 2006). Ou seja a relao entre a procura e a capacidade de oferta.

    Quando os valores do ndice de stress hdrico se encontram abaixo dos 10%, significa que a relao

    entre a procura e a oferta est equilibrada, no existindo escassez de gua. Para valores entre 10% e

    20% de stress hdrico, existem algumas limitaes no desenvolvimento futuro do pas, tornando-se

    necessrio um investimento significativo para satisfazer as necessidades futuras de consumo. Valores

    de stress hdrico acima dos 20%, significa que so necessrias alteraes profundas na gesto dos

    recursos hdricos, por forma a equilibrar a oferta e a procura, e a resolver possveis conflitos com os

    usurios concorrentes (Wintgens et al, 2006). A Figura 2.9 e Figura 2.10 quantificam o stress hdrico

    de acordo com os vrios pases da Europa, atravs de dados do ano 2000.

    Fonte: Furumai, 2008

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    13

    Figura 2.9 - Stress hdrico na Europa (%)

    Figura 2.10 - ndice de Stress hdrico nos pases europeus (%)

    Como se pode verificar pelas Figura 2.9 e Figura 2.10, o stress hdrico sentido na Europa muito

    varivel de pas para pas. Relativamente a Portugal, o seu ndice de stress hdrico est entre os 10%

    e os 20%, o que significa que necessrio agir com medidas preventivas, de modo a no

    comprometer a satisfao das necessidades futuras de consumo.

    Fonte: UNEP, 2002a

    Fonte: Wintgens et al, 2006

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    14

    As variaes do ndice de stress hdrico entre os pases da Europa, tal como no resto do mundo, esto

    relacionadas com as diferentes condies climticas e actividades econmicas de cada pas, e a

    distribuio no uniforme dos recursos hdricos. Os ndices de stress hdrico mais elevados ocorrem

    em reas com baixa pluviosidade, alta densidade populacional, e elevadas reas de irrigao (UNEP,

    2002a).

    Na parte central da Europa Ocidental, grande parte do consumo de gua utilizado na indstria,

    principalmente para arrefecimento em processos industriais. Esta gua devolvida ao meio de onde

    foi captada, praticamente sem alteraes, a no ser na temperatura que ser mais elevada aps a

    passagem pelo processo industrial. J no sul da Europa Ocidental, onde os recursos hdricos so

    menos abundantes, a agricultura consome cerca de 80% dos consumos totais de gua (UNEP, 2002a).

    Tal como nos ndices de stress hdrico, tambm os diferentes consumos de gua, por pas e por

    sector, so justificados por diferentes pluviosidades, diferentes densidades populacionais e

    diferentes actividades industriais e agrcolas. A juntar a este facto, existem ainda as diferentes

    polticas aplicadas na gesto dos recursos hdricos, em que alguns pases apostam em fontes de gua

    alternativas, como guas pluviais e guas residuais tratadas, que nesse caso diminuem a necessidade

    de captao de gua doce.

    A Figura 2.11 mostra a percentagem de gua doce consumida nos vrios pases da Europa, para

    suprir as necessidades dos vrios sectores. Estes sectores esto distribuidos em consumo de gua

    domstico, consumo de gua industrial, consumo de gua agrcola, e utilizao de gua para

    refrigerao ou produo de energia.

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    15

    Figura 2.11 - Consumo de gua doce na Europa de acordo com os vrios sectores (%)

    De acordo com a Figura 2.11, verifica-se que em Portugal a maioria da gua doce consumida tem

    como destino a agricultura. Este sector poder recorrer a fontes alternativas de gua, uma vez que

    no exige uma elevada qualidade de gua. Uma fonte alternativa possvel a utilizao de guas

    residuais, tratadas a uma qualidade que garanta a inexistncia de impactos para a sade pblica.

    2.5. DESPERDCIO NO CONSUMO DE GUA POTVEL

    Embora o aumento demogrfico e o desenvolvimento econmico provoquem um aumento na

    necessidade de captao de gua, nem toda a gua captada realmente utilizada. Existem

    desperdcios associados ao armazenamento, transporte, distribuio e utilizao ineficiente nos usos

    previstos (APA, 2012). Neste sentido, as principais medidas que tm sido tomadas para diminuir o

    consumo de gua incidem em evitar o desperdcio.

    A diminuio do consumo de gua benfico em muitas reas, uma vez que se poupa o recurso

    natural, poupa-se a energia necessria captao e tratamento de gua, e poupam os consumidores

    nas tarifas que tm de pagar pelo volume de gua consumido.

    Desta forma tm sido desenvolvidas tcnicas que permitem efectuar os mesmos servios mas com

    uma menor quantidade de gua. Nos usos domsticos, por exemplo, tm-se desenvolvido mquinas

    Fonte: Wintgens et al, 2006

  • A PROBLEMTICA DA ESCASSEZ DE GUA

    16

    de lavagem cada vez mais economizadoras, torneiras com redutor de caudal, e autoclismos com

    menores descargas de gua. O mesmo sucede na indstria e na agricultura, em que os equipamentos

    e sistemas de rega necessitam de consumir cada vez menos gua para exercer uma mesma funo.

    Relativamente agricultura, estima-se que at ao ano de 2030 seja necessrio captar mais 14% de

    gua doce para usos agrcolas, face ao aumento demogrfico e consequente necessidade de

    produo de alimentos. No entanto, este aumento de gua captada dar para obter 55% de aumento

    de produo de alimentos. Ou seja, h um aumento significativo na eficincia do uso da gua (FAO e

    UN-Water, 2007).

    Em Portugal, a procura total de gua reduziu cerca de 43% entre 2000 e 2009. Uma das causas para

    esta reduo foi a diminuio das perdas de gua nos sistemas de transporte e de distribuio

    (PNUEA, 2012). Esta diminuio foi, em parte, incentivada pelo Programa Nacional para o Uso

    Eficiente da gua (PNUEA) que estipulou objectivos neste sentido.

    A Figura 2.12 mostra a evoluo no desperdcio de gua, por sector, para os anos de 2000 e 2009,

    bem como as metas definidas pelo PNUEA a alcanar em 2020. As perdas apresentadas dizem

    respeito s perdas no sistema de armazenamento, transporte e distribuio.

    Figura 2.12 - Desperdcio de gua nos vrios sectores, para os anos de 2000 e 2009, e metas a alcanar pelo PNUEA ate ao ano de 2020

    Como se pode verificar pela Figura 2.12, houve uma reduo significativa do desperdcio de gua

    entre 2000 e 2009, especialmente no sector urbano e industrial. A agricultura, sendo o sector que

    consome mais gua, tambm aquele onde se verifica um maior desperdcio. Apesar dos valores

    acima referidos reflectirem uma tendncia de diminuio do desperdcio de gua, continua a existir

    uma boa parcela de gua que desperdiada. Isto quer dizer que ainda h muito a fazer at se

    atingirem eficincias perto dos 100%.

    40% 40%30%

    25%

    37,5%

    22,5%20%

    35%

    15%

    Urbano Agrcola Industrial

    Desperdcio no uso da gua por sector

    2000

    2009

    Meta para 2020

    Fonte: PNUEA 2012

    Fonte: APA, 2012

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    17

    3. ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    O problemas relativos aos recursos hdricos, tais como a escassez e a poluio da gua, devem-se

    essencialmente ao consumo exaustivo e desperdiado de gua. Desta forma, torna-se necessrio

    procurar alternativas que contribuam para diminuir o consumo de gua, que passam

    obrigatoriamente por alterar a gesto dos recursos hdricos.

    Uma vez que impossvel viver sem gua e que este recurso essencial a todas as actividades

    exercidas pelo Homem, considera-se que uma melhor gesto dever incorporar os seguintes itens:

    - Evitar ao mximo os desperdcios;

    - Reciclar a gua sempre que possvel;

    - Procurar fontes alternativas de gua, como guas pluviais, para utilizar directamente em

    situaes que no necessitam de gua potvel.

    Em 1985, o Concelho Econmico e Social das Naes Unidas estabeleceu uma poltica para as regies

    com carncia de gua, referindo que nenhuma gua de boa qualidade deve ser utilizada para usos

    que toleram qualidade inferior, a no ser que exista uma elevada disponibilidade deste recurso

    (Tomaz, 2001). Embora seja um avano no sentido de impor regras utilizao dos recursos hdricos,

    esta poltica poder ser pouco concisa e causar conflitos, uma vez que se uma regio tem uma

    elevada disponibilidade de gua, com a utilizao desordenada deste recurso, a procura ir aumentar

    significativamente mas a disponibilidade manter-se- igual. Por outro lado, pode no ser fcil definir

    o limite de disponibilidade "elevada" ou "reduzida".

    de realar que uma gesto de recursos hdricos adequada benfica tanto em termos ambientais,

    como sociais e econmicos. Assim, quanto mais se conseguir preservar o ciclo da gua, mais se

    mantm a qualidade e a disponibilidade hdrica, permitindo assegurar o equilbrio dos ecossistemas,

    a sade pblica e o funcionamento das actividades econmicas.

    3.1. APROVEITAMENTO DE GUAS PLUVIAIS

    O aproveitamento de guas pluviais uma das prticas que tem sido utilizada para combater a

    escassez e diminuir o consumo de gua potvel. Esta tcnica consiste em recolher as guas pluviais,

    que caem naturalmente nas vrias superfcies, direccionando-as para reservatrios de

    armazenamento, para posterior utilizao.

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    18

    Embora seja um tema muito discutido e praticado na actualidade, esta prtica j realizada h muito

    tempo, desde os povos nmadas pr-histricos. Existem dados de 870 a.C. que enunciam uma lei,

    feita pelo rei de um povo nmada instalado no Mar Morto, que obrigava as casas a aproveitarem as

    guas pluviais das coberturas (Tomaz, 2001). Ou seja, desde sempre que o aproveitamento de guas

    pluviais considerado como uma das possveis fontes de gua para satisfazer as necessidades

    bsicas do Homem.

    As guas pluviais recolhidas e armazenadas so usadas principalmente para usos no potveis, tais

    como descargas de autoclismos, mquinas de lavar roupa e loia, lavagem de automveis e rega de

    jardins. No entanto tambm podem ser usadas para usos potveis, desde que sujeitas a tratamentos

    especficos (Li et al, 2010). Em Portugal, a gua destinada ao consumo humano deve respeitar os

    parmetros microbiolgicos, qumicos e indicadores, constantes do anexo I do Decreto-Lei n.

    306/2007.

    Para alm dos usos domsticos, as guas pluviais tambm so adequadas para usos agrcolas e

    industriais . No caso dos usos agrcolas, as guas pluviais so uma fonte de gua natural, adequada

    para a rega. Estas guas podem ser drenadas pelo solo e armazenadas no subsolo, com recurso a

    sistemas naturais, que permitem armazenar a gua e proteg-la da evaporao (Helmreich et al,

    2008).

    Na indstria, o aproveitamento de guas pluviais tambm pode ser muito vantajoso, devido s

    grandes reas disponveis para captao e aos elevados consumos de gua necessrios. O grande

    desafio para viabilizar um projecto desta envergadura, passa por determinar o volume do

    reservatrio de armazenamento (Mierzwa et al, 2007), que est directamente associado aos custos

    destes projectos e exequibilidade dos mesmos.

    O volume de gua pluvial que se consegue armazenar est dependente das condies

    meteorolgicas, como precipitao, temperatura e evaporao, e das caractersticas da superfcie de

    captao, que influenciam o escoamento. Um factor a ter em considerao, quando se pretende

    determinar o volume de gua pluvial passvel de ser reservado, o coeficiente de escoamento da

    superfcie de captao (ou coeficiente runoff). Este est dependente da inclinao e da porosidade

    do material por onde a gua escoada.

    No caso especfico das coberturas dos edifcios, o coeficiente de escoamento varia entre 0,7 e 0,95,

    de acordo com os diferentes tipos de materiais. O que quer dizer que, para calcular o volume (V) de

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    19

    guas pluviais a armazenar, deve-se considerar: V(m3) = P(mm)*A(m2)*C. Em que P a precipitao

    da regio em causa, A a rea da superfcie de captao e C o coeficiente de escoamento

    superficial (Farreny et al, 2011). Quanto mais pequena for a escala temporal dos dados de

    precipitao, mais fiveis so os resultados. No entanto, usual trabalhar os dados de precipitao

    escala mensal, ou seja, precipitao total mensal, obtendo-se um volume de guas pluviais a

    armazenar por ms.

    Segundo a especificao tcnica da Associao Nacional para a Qualidade nas Instalaes Prediais

    (ANQIP), relativa aos Sistemas de Aproveitamento de guas Pluviais (SAAP), o valor do coeficiente de

    runoff deve ser de 0,8 para coberturas impermeveis, 0,6 para coberturas planas com gravilha, 0,5

    para coberturas verdes extensivas (vegetao leve em coberturas inclinadas) e 0,3 para coberturas

    verdes intensivas (vegetao pesada em coberturas planas).

    De um modo geral, as guas pluviais apresentam uma boa qualidade. No entanto necessrio avaliar

    cada caso, pois a qualidade das guas pluviais est dependente das condies locais, como

    proximidade a estradas com elevado trfego, proximidade a actividades industriais, presena de

    vegetao e proximidade a terrenos agrcolas onde se utilizam fertilizantes e pesticidas (Mierzwa et

    al, 2007; Sazakli et al, 2007).

    Assim, a qualidade das guas pluviais est directamente dependente da qualidade atmosfrica, o que

    quer dizer que em reas rurais, distantes da poluio atmosfrica industrial e rodoviria, a qualidade

    das guas pluviais , tendencialmente, mais elevada. Em contrapartida, nas reas urbanas com

    elevado trfego e actividades industriais, a qualidade das guas pluviais inferior pois a atmosfera

    contem partculas, metais pesados e poluentes orgnicos (Helmreich et al, 2008).

    De acordo com Kahinda et al (2007), dos vrios estudos que tm sido realizados relativamente

    qualidade das guas pluviais, captadas atravs da cobertura de edifcios, verifica-se que apresentam

    diferentes concluses. Por um lado, alguns autores concluem que as guas pluviais esto dentro dos

    parmetros internacionais para a gua potvel; por outro lado, outros autores concluem que a

    presena de contaminantes qumicos e microbiolgicos superam, frequentemente, as quantidades

    mximas admissveis para uma gua potvel. Estes resultados reforam a ideia de que necessrio

    estudar cada situao de forma independente, pois a qualidade das guas pluviais est dependente

    do meio envolvente.

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    20

    A avaliao da viabilidade de um SAAP, tem de ter em conta as componentes qualitativa e

    quantitativa das guas captadas. Estes estudos devem ser feitos a vrios tipos de coberturas,

    determinando critrios que permitam s cidades estabelecer um sistema de gesto de guas pluviais

    sustentvel (Farreny et al, 2011).

    Com o aumento dos custos associados aos servios de saneamento, a implementao de SAAP tem-

    se tornado economicamente mais vivel. Sendo de referir, no entanto, a importncia dos benefcios

    ambientais, e no s a vertente econmica (Nolde, 2007). De acordo com estudos internacionais,

    sobre casas que dispem de SAAP, consegue-se uma reduo entre 30% a 92% do volume de gua

    distribudo pela rede de abastecimento pblica (Li et al, 2010).

    3.1.1. Descrio geral do sistema

    Um SAAP constitudo por uma superfcie de captao, um sistema de drenagem e um reservatrio

    de armazenamento de gua pluvial (Li et al, 2010). O sistema mais comum, aplicado a coberturas de

    edifcios, funciona da seguinte forma: as guas pluviais precipitam sobre a cobertura, que por

    inclinao da superfcie escoam at ao sistema de drenagem (constitudo por caleiras e tubos de

    queda), e este encaminha as guas pluviais at ao reservatrio de armazenamento. A partir do

    reservatrio, a gua pode ser retirada para consumo atravs de um sistema de bombas ou por

    gravidade, caso o reservatrio seja elevado.

    As guas pluviais podem ser captadas a partir de vrias superfcies onde ocorra escoamento, tais

    como coberturas de edifcios, ptios, ruas pavimentadas e estradas. As coberturas dos edifcios

    representam uma elevada percentagem de rea impermevel nas cidades, tornando-se assim nas

    superfcies ideais para instalar um SAAP (Villarreal et al, 2004).

    O escoamento proveniente de estradas contem, normalmente, concentraes de poluentes mais

    elevadas, quando comparado ao das coberturas dos edifcios. Este facto esta relacionado com a

    emisso de gases dos automveis, perdas de leo e desgaste de pneus na estrada, que aumentam

    com o aumento do trfego. No entanto continua a ser exequvel recolher as guas pluviais nestas

    superfcies, uma vez que podem ser tratadas e ficar com qualidade aceitvel para os respectivos usos

    (Nolde, 2007).

    Para garantir uma melhor qualidade das guas pluviais captadas, fundamental manter as

    superfcies de captao e os tanques de armazenamento limpos, e desviar os primeiros milmetros de

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    21

    Caleira

    Filtro

    Reservatrio

    chuva aps um perodo seco (Li et al, 2010; Kahinda et al, 2007). O perodo mais indicado para fazer

    estas lavagens no final do semestre seco, antes dos primeiros eventos de chuva (Sazakli et al,

    2007).

    A primeira chuvada arrasta consigo os contaminantes presentes na superfcie de captao,

    resultantes da deposio de vrios poluentes durante o perodo seco (Mierzwa et al, 2007; Li et al,

    2010). Estes poluentes podem ser poeiras, folhas das rvores, insectos, depsitos de produtos

    qumicos, e depsitos de fezes de aves e mamferos, sendo conveniente desviar do reservatrio de

    armazenamento (Li et al, 2010). As primeiras guas pluviais, aps um perodo seco, so tambm

    denominadas por "gua de lavagem dos telhados", precisamente por eliminar a maior parte dos

    contaminantes presentes nesta superfcie de captao (Mierzwa et al, 2007).

    As figuras que se seguem representam exemplos de aplicaes esquemticas e reais de SAAP. A

    Figura 3.1 mostra exemplos de SAAP aplicados a habitaes, enquanto a Figura 3.2 mostra um

    exemplo de SAAP aplicado a uma indstria.

    Figura 3.1 - Representaes de um SAAP aplicado a habitaes

    Fonte: Li et al, 2010 Fonte: Rainwater Solutions, 2014

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    22

    Figura 3.2 - Representao esquemtica de um SAAP aplicado a uma indstria

    3.1.2. Requisitos necessrios implantao de um SAAP

    Estudos de pluviosidade

    O principal requisito para a implantao de SAAP a existncia de precipitao. Como tal, muito

    importante que exista informao disponvel acerca da ocorrncia deste fenmeno. Os dados de

    precipitao devem ser estudados estatisticamente, por forma a determinar a precipitao

    caracterstica do local em estudo, que ser determinante para os clculos de volume de guas

    pluviais a armazenar.

    Assim, a precipitao a principal condicionante quando se verifica a viabilidade de um projecto de

    SAAP. este fenmeno natural, juntamente com os consumos de gua da populao, que

    determinam o volume de gua passvel de ser armazenado e, consequentemente, o volume do

    reservatrio.

    Superfcie de captao

    As coberturas dos edifcios so as superfcies de captao mais comuns, estas podem ser de vrios

    materiais, desde que impermeveis. O tipo de material e a inclinao das coberturas influenciam o

    escoamento das guas pluviais, devido rugosidade dos materiais (Li et al, 2010; Farreny et al, 2011).

    Fonte: Mierzwa et al, 2007

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    23

    As coberturas podem ser constitudas por telhas (cermicas, de fibrocimento, de zinco ou alumnio)

    ou apenas impermeabilizadas com manta asfltica (Campos et al, 2013).

    Sistema de drenagem

    O sistema de drenagem constitudo por caleiras e tubos de queda (Figura 3.3), que tm como

    funo drenar a gua da cobertura at ao reservatrio. As caleiras so normalmente suspensas nos

    beirais das coberturas e inclinadas em direco ao tudo de queda (Li et al, 2010). Os materiais que

    normalmente suportam este sistema de drenagem so o PVC e o metal, sendo as caleiras e os tubos

    de queda dimensionados de acordo com a precipitao de cada regio (Campos et al, 2013).

    Figura 3.3 - Exemplo de um sistema de drenagem

    Dispositivo de by-pass

    Antes da entrada no reservatrio, essencial a existncia de um sistema de by-pass a este rgo. O

    by-pass ao reservatrio serve para desviar as primeiras chuvadas e o volume de guas pluviais em

    excesso, caso a gua atinja a cota mxima do reservatrio (Campos et al, 2013; Herrmann et al,

    1999). O sistema de by-pass pode ser feito de vrias maneiras, desde uma simples vlvula manual, a

    um sistema de boias flutuantes ou um pequeno reservatrio de descarga a montante do

    reservatrio.

    Filtro

    O filtro tem como funo evitar a passagem de partculas de maiores dimenses para dentro do

    reservatrio, localizando-se no sistema de drenagem, a montante do reservatrio. Existem vrios

    Fonte: Bertolo, 2006

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    24

    tipos de filtro, de acordo com a capacidade hidrulica de filtragem e da qualidade da gua a filtrar. A

    manuteno destes filtros consiste em lavar os mesmos uma ou duas vezes por ano, para aqueles

    que no dispem de um dispositivo de autolimpeza (Ecogua, 2014).

    Reservatrio

    O reservatrio o elemento principal deste sistema, e o que mais dispendioso, representando

    cerca de 50% a 70% do custo total de um sistema de aproveitamento de guas pluviais (Li et al,

    2010). Por este motivo essencial que o reservatrio seja dimensionado correctamente, tendo como

    base os dados de precipitao, a disponibilidade financeira, e o espao fsico disponvel, de modo a

    criar um sistema sustentvel. Tambm necessrio ter em considerao as necessidades de

    consumo, por forma a evitar elevados tempos de reteno, que provocam a degradao da

    qualidade da gua no reservatrio (Li et al, 2010).

    Os reservatrios podem ser de diversos materiais, tais como beto, PEAD e fibra de vidro. De acordo

    com a Especificao Tcnica da ANQIP (ETA) 0701, os materiais devem assegurar a sua estrutura, no

    serem porosos e que no propiciarem reaces qumicas com a gua. Devem ainda ser de cantos

    arredondados, para facilitar a manuteno e evitar a deposio de biofilme. Quanto localizao, os

    reservatrios podem ser superficiais ou subterrneos. Em ambos os casos devem estar cobertos e

    impedir a entrada de luminosidade, evitando a invaso de insectos e o desenvolvimento de

    microalgas.

    Os reservatrios de superfcie so menos dispendiosos, permitem detectar facilmente fissuras e

    perdas, e, caso sejam elevados, a gua pode ser extrada por meio da gravidade. Relativamente aos

    reservatrios subterrneos, para alm dos custos de movimentos de terra, ter de prever um

    sistema de bombagem para elevao da gua, o que vai encarecer o sistema quer em termos de

    investimento inicial, quer de explorao do sistema (Li et al, 2010).

    A Figura 3.4 mostra um grfico da satisfao das necessidades de consumo de gua em funo da

    dimenso dos reservatrios. Pode-se verificar que a satisfao proporcionada por um reservatrio

    no proporcional sua dimenso. Uma das justificaes para este acontecimento facto de os

    reservatrios de menores dimenses poderem ser cheios e esvaziados com mais frequncia,

    comparativamente aos reservatrios de maiores dimenses (Kahinda et al, 2007).

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    25

    Figura 3.4 - Satisfao das necessidades vs dimenso dos reservatrios

    3.1.3. Tratamento da gua pluvial armazenada

    A gua pluvial armazenada pode posteriormente ser tratada, para melhorar a sua qualidade. Este

    tratamento s se justificar caso a gua seja utilizada para outros fins que no exclusivamente a rega.

    Um tratamento simples da gua pluvial melhora significativamente a sua qualidade, mas no a torna

    apta para gua potvel. Para isso seriam necessrios tratamentos mais sofisticados, e por isso, mais

    caros (Li et al, 2010).

    As guas pluviais sem tratamento, utilizadas nas descargas de autoclismos, devem respeitar, no

    mnimo, as normas de qualidade equivalentes s guas balneares, nos termos da legislao nacional

    e das Directivas europeias aplicveis (ANQIP, 2009). No anexo XV do Decreto-Lei n 236/98, so

    apresentados os parmetros microbiolgicos e fsico-qumicos correspondentes s guas balneares,

    com os respectivos valores mximo recomendado e mximo admissvel.

    A desinfeco um dos tratamentos simples que se pode aplicar gua pluvial armazenada, por

    forma a melhorar a sua qualidade microbiolgica. A adio de cloro a prtica mais comum, uma vez

    que de fcil aplicao e pouco dispendioso (Li et al, 2010). Esta adio deve ser feita sada do

    reservatrio (ou nos camies-cisternas caso a gua seja transportada), uma vez que o cloro pode

    reagir com a matria orgnica e formar subprodutos indesejveis nos reservatrios (Sazakli, 2007).

    No entanto, de acordo com alguns autores, a desinfeco qumica no necessria, uma vez que h

    ocorrncia de sedimentao, em que a maior parte das bactrias sedimenta com as partculas

    sedimentveis (Sazakli, 2007). Recomenda-se ento a utilizao de um crivo a montante do

    Fonte: Kahinda et al, 2007

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    26

    reservatrio, impedindo a entrada de resduos de maiores dimenses, e a sedimentao natural

    como mtodo de remoo microbiana (Herrmann et al, 1999).

    Pode-se ainda considerar a filtrao lenta como processo de tratamento biolgico, em que as vrias

    camadas de areia eliminam os microrganismos presentes, dando origem a uma gua pobre em

    nutrientes. Para que este processo seja eficaz necessrio a passagem de um fluxo contnuo atravs

    do filtro, o que quer dizer que este ter de ser instalado a jusante do reservatrio (Li et al, 2010).

    Desta forma, a utilizao da filtrao lenta dever ser apenas considerada para consumos elevados e

    contnuos, preferencialmente quando os reservatrios so subterrneos e a extraco da gua

    pluvial realizada por meio de uma bomba, garantindo um fluxo contnuo.

    A Figura 3.5 mostra um esquema de um reservatrio, evidenciando de forma sequencial o fluxo da

    gua e os tratamentos a que esta submetida.

    Figura 3.5 - Sequncia de tratamentos das guas pluviais armazenadas num reservatrio

    De acordo com a Figura 3.5, as guas pluviais armazenadas passam pelos seguintes processos de

    tratamento (Ecogua, 2014):

    1 - A gua entra no reservatrio de armazenamento aps a passagem por um filtro. Este o primeiro

    processo de tratamento da gua pluvial. A gua limpa encaminhada para o reservatrio e o

    pequeno volume de gua que contem as impurezas encaminhado para a rede de drenagem de

    guas pluviais;

    2 - A alimentao de gua no reservatrio feita no fundo do mesmo e de baixo para cima. Para

    alm dos benefcios em termos de circulao da gua dentro do reservatrio e introduo de

    oxignio no fundo, este tipo de alimentao faz com que a gua que est a entrar no agite os

    sedimentos que esto depositados no fundo. A sedimentao o segundo processo de tratamento

    1 2 3 4

    Fonte: Ecogua, 2014

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    27

    da gua, em que as partculas mais pesada descem ao longo da coluna de gua, depositando-se no

    fundo do reservatrio;

    3 - As partculas mais leves flutuam at atingir a superfcie de gua, o que torna necessrio a

    existncia de um flotador para recolher e purgar essas partculas. Este o terceiro processo de

    tratamento da gua;

    4 - Por ltimo, a gua extrada do reservatrio para ser utilizada. A captao feita abaixo do nvel

    da cota de superfcie, uma vez que esta a zona mais limpa da coluna de gua, no interferindo com

    o processo de sedimentao nem com as partculas flutuantes. Esta recolha conseguida com auxilio

    de uma boia e uma mangueira flexvel, que conseguem garantir a captao de gua sempre abaixo

    do nvel da cota de superfcie, quer o reservatrio esteja cheio ou quase vazio.

    3.1.4. Vantagens e desvantagens do aproveitamento de guas pluviais

    O aproveitamento de guas pluviais considerado um instrumento importante na gesto dos

    recursos hdricos (Campos et al, 2013). As principais vantagens so contribuir para a reduo da

    escassez de gua, garantir a disponibilidade de gua em situaes de emergncia, proteger as fontes

    de gua doce subterrneas e superficiais, diminuir a ocorrncia de cheias e diminuir o consumo de

    gua da rede de abastecimento pblica (Helmreich et al, 2009; Campos et al, 2013).

    Para alm das vantagens j referidas, destacam-se outras:

    - So sistemas que podem ser instalados tanto em edifcios que j existem, como em novas

    construes (Li et al, 2010);

    - As guas pluviais so consumidas no local onde so captadas, o que reduz os riscos de

    contaminao ao longo da rede de distribuio e os custos associados distribuio (Li et al,

    2010);

    - Nos pases em desenvolvimento, que no tm rede de abastecimento pblica de gua, evita a

    deslocao da populao a uma grande distncia para ir buscar gua. Sendo que nestes casos, a

    gua fornecida , por vezes, de pior qualidade quando comparada das guas pluviais (Kahinda et

    al, 2007);

    - As guas pluviais armazenadas podem servir para a recarga de aquferos (Furumai, 2008);

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    28

    - O custo de operao e manuteno geralmente baixo, uma vez que pode ser aplicado um

    tratamento de gua simples, que suficiente quando a gua utilizada para fins no potveis (Li

    et al, 2010);

    - Em pases como a Alemanha, Austrlia, Estados Unidos e Japo, os sistemas de aproveitamento

    de gua pluvial geram uma economia, no consumo de gua potvel da rede de abastecimento

    pblica, superior a 30% (Campos et al, 2013);

    - Quando o abastecimento de gua pblica interrompido, as habitaes dotadas de um SAAP

    podem ser auto-suficientes, relativamente aos consumos de gua no potveis (Li et al, 2010).

    A principal desvantagem de um SAAP a incerteza associada precipitao. Este sistema est

    inteiramente dependente da quantidade de gua precipitada, e por mais dados histricos que

    estejam disponveis, sempre um fenmeno que no se pode prever. Como consequncia, os SAAP

    podem ser dimensionados para uma determinada condio de precipitao, e depois vir a verificar-

    se uma situao totalmente diferente. Por forma a minimizar este tipo de situaes, os reservatrios

    devem ser dimensionados para valores de consumo inferiores mdia da afluncia.

    Existem ainda outras desvantagens, tais como:

    - Falta de conhecimento, motivao e aceitao por parte da populao (Helmreich et al, 2009);

    - Falhas de dados meteorolgicos, que impedem estudos de confiana para planear a introduo

    de SAAP (Helmreich et al, 2009);

    - Reduzida qualidade da gua e possveis impactos na sade humana devido aos contaminantes

    (Kahinda et al, 2007);

    - Os reduzidos custos praticados pelas companhias de distribuio de gua potvel tornam estes

    sistemas pouco apelativos ao consumidor, uma vez que os custos associados instalao de um

    SAAP so significativos. Existe ento um entrave na criao de um sistema de fornecimento de

    gua sustentvel (Andrade, 2013).

    3.1.5. Casos reais de utilizao de SAAP

    Exemplos Internacionais

    Alemanha

    - Em 1999, na cidade de Berlim, foi implementado um SAAP num bairro com 213 moradores, sendo a

    gua captada nas coberturas e nos pavimentos, e utilizada para rega e nas descargas de autoclismos.

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    29

    A gua armazenada num reservatrio de 160m3 e sujeita ao processo de filtrao e desinfeco

    com raios UV, garantindo em mdia uma capitao de 35 l/(hab.dia) (Tomaz, 2001);

    - Nas novas construes na Alemanha, obrigatrio por lei a armazenar as guas pluviais in situ

    (Nolde, 2007);

    - Na dcada de 90, instalaram-se mais de 100.000 reservatrios de armazenamento de guas pluviais

    em escolas, estaes de lavagem de carros e indstrias (Herrmann, 1999);

    - Muitas cmaras municipais deram incentivos e subsdios para promover a instalao de SAAP

    (Herrmann, 1999).

    Japo

    - Em Tquio existem 850 SAAP em edifcios pblicos e privados, incluindo dois estdios desportivos e

    um edifcio de escritrios, pioneiros nos SAAP a grande escala. Os estdios e o edifcio de escritrios

    localizam-se na regio de Sumida, em que a recolha de guas pluviais consegue satisfazer entre 20%

    a 60% das necessidades de gua em desta regio (Furumai, 2008).

    Singapura

    - No Aeroporto de Changi, existe um SAAP em que a gua pluvial captada nas pistas de aterragem e

    nas reas verdes envolventes, e utilizada em servios de combate a incndios e descargas de

    autoclismos. O volume de gua captado e armazenado traduz-se entre 28% a 33% do volume total de

    gua consumida (UNEP, 2002b).

    Tailndia

    - A gua pluvial armazenada em vasos de grandes dimenses, sendo um meio de obteno de gua

    a baixos custos. Os vasos tm capacidades entre os 0,1m3 e os 3 m3, e esto equipados com tampa,

    torneira e ralo. O tamanho mais comum de 2 m3, que d para suportar as necessidades de ingesto

    de gua de uma famlia de seis pessoas, durante todo o semestre seco (cerca de 2 litros/(hab.dia))

    (UNEP, 2002b).

    Brasil

    - Em 2004 a empresa Coca-Cola desenvolveu e adoptou um plano para aproveitar as guas pluviais,

    servindo de fonte alternativa nos processos industriais. Esta medida teve como objetivo minimizar o

    uso de gua proveniente das bacias hidrogrficas, protegendo assim a biodiversidade e reduzindo os

    custos associados reabilitao da natureza . O volume de guas pluviais captado e armazenado

    corresponde a 1% do consumo total de gua (Coca-Cola, 2011).

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    30

    Havai

    - No National Volcano Park foram instalados SAAP para fornecer gua a 1.000 trabalhadores do

    parque e 10 mil visitantes por dia. A captao das guas pluviais feita na cobertura de um edifcio

    com 4.000 m2 de rea, e no solo atravs de uma rea de 20.000 m2 . O armazenamento garantido

    por dois reservatrios com 3.800m3 cada, e 18 reservatrios com 95m3 (UNEP, 2002b).

    Ilhas Virgens

    - Em So Toms, uma ilha com 4,8 km de largura e 19 km de comprimento, e uma precipitao mdia

    anual entre os 1000 e 1500 mm, a implementao de um SAAP um requisito obrigatrio para uma

    licena de construo residencial nesta ilha. Assim, uma casa unifamiliar deve prever uma rea de

    captao de 112m2 e um reservatrio de armazenamento com capacidade de 45m3 (UNEP, 2002b).

    Exemplos Nacionais

    Matosinhos

    - O empreendimento cooperativo da Ponte da Pedra, em Lea do Balio, co-financiado pelo Instituto

    Nacional da Habitao (INH), engloba 101 casas ecologicamente optimizadas. Todas as casas so

    dotadas de um SAAP, em que a gua armazenada utilizada em descargas de autoclismos (RTP,

    2006).

    Castelo Branco

    - A torre de controlo do aerdromo de Castelo Branco dispe de um SAAP em que a gua captada

    na cobertura, com uma rea de 120m2, e o reservatrio localizado no 4 piso desta torre (num total

    de 6 pisos), com capacidade para 7m3. A gua armazenada utilizada nas descargas de autoclismos

    no 1 piso. Quando a gua pluvial no suficiente para que a gua do reservatrio atinja um nvel

    mnimo, o reservatrio abastecido pela rede pblica, por intermdio de uma vlvula e duas boias,

    que accionam o sistema mecanizado (Bertolo, 2006).

    Aveiro

    - O Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro instalou um SAAP para apoio ao

    laboratrio de hidrulica. O sistema foi instalado no mbito da cooperao entre o departamento de

    Engenharia Civil da Universidade de Aveiro e a ANQIP, tendo o equipamento necessrio para a

    instalao sido cedido Universidade por um dos associados da ANQIP, a empresa Ecogua

    (Eficincia Hdrica, 2012).

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    31

    bidos

    - Moradia unifamiliar com SAAP para rega de jardim e lavagens, instalado em 2008. O reservatrio

    em beto e tem uma capacidade de 15m3 (Ecoagua, 2014).

    Lisboa

    - As Natura Towers, complexo de escritrios de dois edifcios em Telheiras, dispem de um SAAP em

    que a gua recolhida nas coberturas e armazenada nas caves (Natura Towers, 2014);

    - O edifcio de sede da Seth, construdo em 2009, dispe de um SAAP em que a gua armazenada,

    aps sujeita a processos de tratamento, utilizada em descargas de autoclismos, torneiras de servio

    de garagens e rega de espaos verdes na envolvente do edifcio (Seth, 2014);

    - Moradia unifamiliar com SAAP para rega de jardim, abastecimento de casas de banho e mquinas

    de lavar roupa, instalado em 2006. O reservatrio de polietileno e tem uma capacidade de 20m3,

    sendo a rea de captao de 90 m2 (Ecoagua, 2014);

    - Moradia unifamiliar com SAAP para rega de jardim, abastecimento de casas de banho e mquinas

    de lavar roupa, instalado em 2007. O reservatrio de polietileno e tem uma capacidade de 15m3,

    sendo a rea de captao de 100 m2 (Ecoagua, 2014).

    Corroios

    - Moradia unifamiliar com SAAP para rega de jardim, abastecimento de casas de banho e mquinas

    de lavar roupa, instalado em 2008. O reservatrio de polietileno e tem uma capacidade de 20m3,

    sendo a rea de captao de 170 m2(Ecoagua, 2014).

    Setbal

    - A Escola Secundria Dom Manuel Martins instalou em 2013 um SAAP. O equipamento foi instalado

    junto a um dos edifcios do recinto escolar, fazendo ligao ao sistema de rega existente, para

    utilizao nas vrias reas ajardinadas e canteiros de flores. A cisterna de armazenamento de gua

    tem uma capacidade de 30m3 (Cmara Municipal de Setbal, 2013).

    Vila Real de Santo Antnio

    - Parte do consumo necessrio rega de zonas verdes e jardins no Hotel Resort Quinta da Ria

    provm do SAAP instalado (APA, 2003).

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    32

    3.1.6. Legislao em Portugal

    Em Portugal no existe legislao especfica para o aproveitamento de guas pluviais como fonte

    alternativa de gua. Pelo contrrio, as guas pluviais so consideradas como uma das componentes

    das guas residuais (Andrade, 2013).

    De acordo com a Agncia Portuguesa do Ambiente (APA), existem duas directivas principais inseridas

    no contexto da poltica da gua. So elas a Directiva Quadro da gua (transposta para o direito

    nacional atravs da Lei n. 58/2005, de 29 de Dezembro) e a Directiva relativa ao Tratamento das

    guas Residuais e Urbanas (transpostas para a legislao portuguesa, respectivamente, pelo Decreto-

    Lei n. 152/97, de 19 de Junho e pelo Decreto-Lei n. 348/98, de 9 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.

    149/2004, de 22 de Junho e pelo Decreto-Lei n. 198/2008, de 8 de Outubro).

    As guas pluviais vm mencionadas no Decreto-Lei n. 152/97, de 19 de Junho, na descrio das

    guas residuais. Este facto refora a ideia de que ainda h um longo caminho a percorrer a nvel

    nacional, por forma a estipular o aproveitamento das guas pluviais como fonte alternativa de gua

    doce.

    Os decretos-lei que regem a qualidade da gua para consumo e a proteco das guas so: o

    Decreto-lei 306/2007, de 27 de Agosto, que "estabelece o regime da qualidade da gua destinada ao

    consumo humano, tendo por objectivo proteger a sade humana dos efeitos nocivos resultantes da

    eventual contaminao dessa gua e assegurar a disponibilizao tendencialmente universal de gua

    salubre, limpa e desejavelmente equilibrada na sua composio"; e o Decreto-lei 236/98 de 1 de

    Agosto, que "estabelece normas, critrios e objectivos de qualidade com a finalidade de proteger o

    meio aqutico e melhorar a qualidade das guas em funo dos seus principais usos".

    Como complemento legislao, tm surgido planos e programas que visam optimizar a gesto dos

    recursos hdricos, apresentando medidas e metas a alcanar, que permitem proteger e conservar a

    gua nos diversos sectores. Destacam-se o Programa Nacional para o Uso Eficiente da gua (PNUEA)

    e o Plano Estratgico de Abastecimento de gua e de Saneamento de guas Residuais (PEAASAR).

    O PNUEA tem por objectivo melhorar a eficincia da utilizao da gua nos diversos sectores

    (urbano, agrcola e industrial), propondo medidas que permitem minimizar os riscos de escassez

    hdrica e melhorar a qualidade dos meios hdricos, sem pr em causa as necessidades vitais e a

    qualidade de vida das populaes, bem como o desenvolvimento socioeconmico do pas (PNUEA

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    33

    2012-2020). As medidas deste programa que contemplam o aproveitamento de gua pluvial em usos

    no potveis so:

    Medida 8 - reutilizao ou uso de gua de qualidade inferior;

    Medida 38 - utilizao da gua da chuva em jardins e similares;

    Medida 45 - utilizao da gua da chuva em lagos e espelhos de gua;

    Medida 48 - Utilizao de gua da chuva em campos desportivos, campos de golfe e outros

    espaos verdes de recreio.

    O PEAASAR o plano responsvel pela estruturao de todo o sector de abastecimento de gua e

    saneamento de guas residuais urbanas. Foi elaborado pela primeira vez em 2000 (PEAASAR I 2000-

    2006), como documento orientador dos objectivos e polticas desta rea, procurando solues

    sustentveis a nvel social, ambiental e econmico. Seguiu-se o PEAASAR II 2007-2013, que definiu

    trs grandes objectivos estratgicos: universalidade, continuidade e qualidade do servio;

    sustentabilidade do setor; e proteco dos valores de sade publica e ambientais. Quanto s guas

    pluviais, so encaradas como um problema ou uma soluo no dimensionamento das redes de

    drenagem e das Estaes de Tratamento das guas Residuais (ETAR). As medidas recomendadas para

    a gesto das guas pluviais so:

    - Separar progressivamente guas pluviais dos efluentes domsticos e industriais;

    - Aplicar solues locais de renaturalizao do ciclo das guas pluviais, com vista a reduzir as

    afluncias aos sistemas colectores;

    - Melhorar a qualidade das infraestruturas para minimizar a infiltrao de guas pluviais em redes

    de guas residuais e as fugas de guas residuais das respectivas redes.

    Um novo plano estratgico dever estar concludo at ao final do presente ano, o PEAASAR III 2014-

    2020. Os objectivos deste plano devero incidir na (gua Global, 2014):

    - Proteco do ambiente e melhoria da qualidade das massas de gua;

    - Melhoria da qualidade dos servios prestados;

    - Optimizao e gesto eficiente dos recursos;

    - Sustentabilidade econmica e financeira.

    Para alm destes planos e programas, existem as Especificaes Tcnicas da ANQIP para a instalao

    de SAAP em edifcios, a ETA 0701 e a ETA 0702. A ETA 0701 estabelece critrios tcnicos para a

    construo de SAAP nas coberturas de edifcios, para fins no potveis; a ETA 0702 estabelece as

    condies para a certificao de SAAP, executados de acordo com a ETA 0701.

  • ALTERNATIVAS PARA DIMINUIR O CONSUMO DE GUA POTVEL

    34

    O quinto captulo da ETA 0701 aquele que apresenta critrios, regras e recomendaes prticas

    para a instalao de SAAP, denominando-se por "Prescries Tcnicas". Este captulo est dividido

    em oito subcaptulos: Pluviosidade de clculo, Desvio das primeiras guas, Volume de gua a

    aproveitar, Cisternas e filtros, Instalaes Prediais, Usos e qualidade da gua, Instalaes de

    bombagem e Suprimento. Enumeram-se alguns dos critrios apresentados:

    - Os estudos de pluviosidade devero recorrer a dados de fontes oficiais, sendo desejvel que

    recorram a sries histricas de precipitao correspondentes a perodos no inferiores a 10 anos;

    - Recomenda-se a instalao de um dispositivo de funcionamento automtico para desvio do

    escoamento inicial (first flush);

    - As cisternas devero ser dotadas de overflow, descarga de fundo e filtro a montante. Os cantos

    devem ser arredondados para facilitar a manuteno e para evitar o desenvolvimento de

    biofilmes. A cisterna dever ser coberta, ventilada e permitir a inspeco, respeitando todas as

    normas de segurana;

    - Os reservatr