conteÚdo de: claudia o modo francês de educar os filhos ... · realmente é”, decreta ela, logo...

3

Click here to load reader

Upload: phamdang

Post on 15-Nov-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CONTEÚDO DE: CLAUDIA O modo francês de educar os filhos ... · realmente é”, decreta ela, logo de cara. A carapuça, em boa parte dos casos, serve para as mães brasileiras,

CONTEÚDO DE: CLAUDIA

O modo francês de educar os filhos revela: é preciso preservar os direitos dos pais

PUBLICADO 01/04/2014 - REPORTAGEM: ROSANE QUEIROZ / EDIÇÃO: MDEMULHER

As crianças devem dizer: olá, tchau, obrigada e por favor. Isso vai ajudá-las a entender que não são as únicas com sentimentos e necessidades. Foto: Getty Images

Cena 1: uma menina de 2 anos faz birra na hora de comer e atira uma batata frita no chão. Cena 2: a mesma criança causa tumulto numa festa infantil quando a mãe anuncia que devem ir embora. Talvez essas situações fossem encaradas como algo constrangedor, mas comum, se tivessem acontecido no Brasil ou nos Estados Unidos. Mas, na França, a jornalista americana Pamela Druckerman, mãe da enfant terrible em questão, sentiu o desprezo de seus vizinhos parisienses. Percebeu, então, que crianças francesas não jogam comida no chão - título do livro que escreveu sobre o modo francês de educar, lançado na Inglaterra e nos Estados Unidos, já um best-seller.

Vivendo durante dez anos em Paris com o marido britânico e três filhos pequenos (a menina e um casal de gêmeos), Pamela ficou abismada ao ver as crianças francesas comendo tomate à provençal sem sequer se sujar - e sem interromper os adultos -, diferentemente de sua filha, que solicitava atenção o tempo todo, fazendo pouco caso da comida. Ex-repórter do The Wall Street Journal, ela resolveu investigar as origens desse comportamento civilizado, que está na forma como as mães francesas criam os filhos. O segredo? Não vivem em função deles nem tratam as crianças como pequenos reis. Elas não toleram birras, não negociam nem passam o fim de semana acompanhando os pequenos em parquinhos ou festas infantis. Em resumo, educam, mas conseguem manter a vida adulta sem transformar seu mundo num playground. “Para ser um tipo diferente de mãe, você precisa de uma visão diferente sobre o que uma criança realmente é”, decreta ela, logo de cara.

A carapuça, em boa parte dos casos, serve para as mães brasileiras, já que a educação por aqui é pautada mais pela americana do que pela europeia, como observa a psicopedagoga Ceres Alves de Araújo, da PUC de São Paulo. "As francesas sabem dizer não e ponto", afirma Ceres, que morou em Paris e viu como lá a “criança é tratada como criança”. Para a psicopedagoga, a diferença é que na cultura americana os pais se perdem em longas explicações desnecessárias para os filhos pequenos. "Até os 5 anos, a criança nem sequer entende tantos argumentos. Basta dizer não", aconselha. Se houver réplica, Ceres sugere a resposta: "Porque sou sua mãe e sei o que é melhor". É na adolescência, quando caberia esticar a conversa, que muitos pais, exaustos, optam pelo "não e ponto". "São comportamentos invertidos. A criança precisa ser obediente na infância para na adolescência se tornar um ser desobediente."

Menu completo

A alimentação, tema crucial para a maioria das mães do planeta, é uma das questões sobre as quais Pamela Druckerman se debruça. Segundo a autora, as francesas prezam horários fixos para as refeições, sempre à mesa, começando com uma salada e terminando com queijo. As crianças comem uma versão

Page 2: CONTEÚDO DE: CLAUDIA O modo francês de educar os filhos ... · realmente é”, decreta ela, logo de cara. A carapuça, em boa parte dos casos, serve para as mães brasileiras,

encurtada do menu dos adultos e são encorajadas a provar de tudo. Não existe criar um cardápio diferenciado ou a hipótese de preparar outro prato porque naquele dia não tem nada que o pequeno aprecie. Comida, na França, não envolve jogo emocional. "Os pais preparam as refeições com calma e ingredientes frescos. As crianças aprendem a respeitar o alimento", diz a francesa Eileen Leazeau, secretária executiva que vive há 21 anos nos Estados Unidos e é mãe de três adultos.

Sono e polidez

O horário de ir para a cama é outro drama tratado com sabedoria à francesa. Enquanto nos Estados Unidos (e aqui!) os pais passam meses sem dormir para atender o bebê no meio da noite, os franceses aguardam até dez minutos para ter certeza de que a criança está realmente infeliz. Eles se permitem acreditar que o pequeno pode estar apenas resmungando ou sonhando. Ou que logo voltará a dormir. "Pais que se revezam no quarto do filho criam um condicionamento inadequado", acredita Ceres.

Sob diversos aspectos, os franceses esperam mais de uma criança, ainda que ela seja apenas uma criança. Isso significa que os pequenos não só devem dizer "por favor" e "obrigado" mas também bonjour e au revoir aos adultos. Eles ainda devem aprender a esperar, seja em nome da paz doméstica, seja para evitar constrangimento social. Os pais, ali, se empenham em combater o caos criado pelo mundo infantil e preservar os “direitos” paternos. Ceres aprova. "Aqui, vivemos a era do 'filiarcado', em que os filhos reinam", critica ela. Ensinar as crianças a lidar com a frustração é a regra máxima de French Children Don’t Throw Food, ainda sem data para publicação no Brasil. Na abordagem francesa, os pais estabelecem uma "moldura" de limites. A imagem sugere fixar regras, mas com certa liberdade dentro delas. Com a moldura definida, as necessidades dos adultos permanecem, ao menos, no mesmo nível que as das crianças. Criar filhos é apenas parte do plano, e não um projeto de vida.

A certa altura, tudo parece funcionar bem demais para ser verdade. "Talvez Pamela seja muito afirmativa", diz Ceres. Mas, como o livro é narrado com humor e certa ironia, a autora se redime de possíveis deslizes e passa uma mensagem libertadora para aquelas que ainda veem os filhos arremessando batatas fritas: "Mesmo boas mães podem não viver a serviço constante das crianças, e não há razão para se culpar por isso", ensina Pamela.

Educação: a maior herança do mundo PUBLICADO 21/09/2011 - MARIA CLARA BRAZ

Grande parte do que somos quando crescemos tem raízes profundas na infância Foto: Getty Images

"Educar dá trabalho e leva tempo." A ideia parece óbvia à primeira vista. Ainda mais para quem tem filhos. Eles teimam em não ir para a cama, adoram ver televisão, preferem videogame a livros ... Apesar disso, se analisada com calma, a frase revela que, em vez de se fixar no trabalho e no tempo, quem educa deveria se preocupar mais em como educar.

Quando pequeno, o ser humano aprende a viver observando o outro. Um bebê, por exemplo, começa a falar as primeiras palavras depois de tanto ouvi-las. O mesmo acontece com crianças mais crescidas: elas passam a fazer coisas - boas e ruins, há que se destacar bem - percebendo quem está ao seu redor e o que

Page 3: CONTEÚDO DE: CLAUDIA O modo francês de educar os filhos ... · realmente é”, decreta ela, logo de cara. A carapuça, em boa parte dos casos, serve para as mães brasileiras,

essa pessoa faz. Natural então, que se mirem nos familiares. "Por isso, pai e mãe não podem ser adeptos do 'faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço'", explica a psicopedagoga Maria Cristina Mantovanini.

Ou seja, o desejável é que a família eduque com atitudes, e não só com palavras. Sem ação, não há discurso que se sustente. Isso não quer dizer, é claro, que os pais tenham de fazer com que os filhos se comportem como eles. Crianças não são miniadultos, como bem ilustra o psicólogo Yves de La Taille no livro Formação Ética - Do Tédio ao Respeito de Si (Artmed). Educar com exemplos significa ajudar a garotada a se constituir como ser humano, sem deixar de respeitar a infância.

Terreno fértil

A boa notícia é que, ao contrário do que muita gente grande pensa, gente miúda adora aprender. Desde que o aprendizado deixe espaço para a experimentação e não seja simplesmente algo imposto ou mesmo sonhado pelos pais.

Que tal, então, ir a exposições de arte interativas, em vez de arrastar um menino de 5 anos para uma mostra de esculturas de cristal? Só assim a arte vai passar a fazer sentido para ele e lhe despertará algum interesse. De acordo com o educador alemão Friedrich Froebel (1782-1852), brincar é um dos primeiros recursos da aprendizagem, mas, para que funcione, não pode ser simplesmente diversão. Tem de fomentar questionamentos e desafiar os baixinhos a pensar. Na essência, brincadeiras são representações do mundo que ajudam as crianças a entendê-lo.

Quanto à aula de piano, de futebol, de inglês... Será realmente necessário que seu filho aprenda isso nesse exato momento da vida? Em vez de piano, será que ele não se interessaria mais por canto? O futebol não poderia ceder lugar à natação? Antes de pensar que você está dando tudo de melhor a ele, experimente analisar se não está tutelando o amor da sua vida em demasia. Indo aos cursos obrigado, definitivamente ele não está desenvolvendo interesse por eles, muito menos vontade de aprender mais. Quando isso acontece, é normal encontrar filhos questionando os pais."Por que eu tenho de ir e você não?" Difícil apresentar um argumento válido, concorda? Ainda mais porque nenhuma resposta vai ser melhor que uma atitude sua, como acompanhá-lo na atividade e depois conversar sobre o que ele pensa a respeito dela. Do mesmo modo, pais que educam de verdade não impõem o dever de casa como condição para poder brincar, por exemplo. Demonstram a validade do que os professores ensinam e a necessidade das tarefas. E quem reserva o momento da lição dos filhos também para estudar - ainda que seja algo distante do conteúdo escolar tradicional - reforça ainda mais a importância da educação, embora essa atitude seja para muitos adultos uma privação do tempo disponível para ver televisão, por exemplo.

Antes que eles cresçam...

Quanto mais o tempo passa, mais complicado fica educar os filhos com exemplos. "As referências dos jovens mudam e o universo deles cresce. Os pais não representam o mesmo para eles", diz Maria Cristina. Por isso, há muito que se investir na infância com hábitos - ainda que alguns deles pareçam simplistas. Eliminar palavrões do seu vocabulário é bem mais eficaz que dar bronca nas crianças quando elas falam algum. Ir à biblioteca junto com elas e escolher um livro para cada uma é mais válido que terminar o ano reclamando que seus filhos não leem tanto quanto você gostaria. "Pesquisas comprovam que ler para as crianças - e não só contar histórias - é determinante para o sucesso escolar", enfatiza a pedagoga Ana Flavia Castanho, de São Paulo.

Já estamos cansadas de saber que grande parte do que somos quando crescemos tem raízes profundas na infância. Porém a companhia educativa dos pais, externalizada por exemplos, não poupa ninguém de enfrentar os grandes questionamentos da vida. Mas certamente alivia o peso deles, apontando os melhores caminhos a serem seguidos.