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ATITUDE Revista de Divulgação Científica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre Construindo Oportunidades Ano X - nº19 Janeiro/ Junho 2016

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ATITUDERevista de Divulgação Científica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre

ConstruindoOportunidades

Ano X - nº19Janeiro/

Junho2016

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REVISTA ATITUDE - Construindo OportunidadesPeriódico da Faculdade Dom Bosco de Porto AlegreAno X - No 19 - janeiro a junho de 2016Porto Alegre - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.

ISSN 1809-5720

A REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades tem por finalidade a produção e a divulgação do conhecimento nas áreas das ciências aplicadas produzido particularmente pelo seu corpo docente e colaboradores de outras instituições, com vistas a abrir espaço para o intercâmbio de ideias, fomentar a produção científica e ampliar a participação acadêmica na comunidade. O Conselho Editorial reserva-se o direito de não aceitar a publicação de matérias que não estejam de acordo com esses objetivos.Os autores são responsáveis pelas matérias assinadas.É permitida a cópia (transcrição) desde que devidamente mencionada a fonte.

Endereço para permuta:Rua Mal. José Inácio da Silva, 355Passo D’Areia - Porto Alegre - RS

Tel: (51) 3361.6700www.faculdade.dombosco.net

Porto Alegre, 2016

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Revista Atitude - Construindo Oportunidades – Revista de DivulgaçãoCientífica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre

Ano X, Volume 7, número 19, jan/jun 2016 – ISSN 1809-5720

Diretor/DirectorProf. Dr. Pe. Marcos Sandrini - [email protected]

Editor/EditorProf. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Editorial/Editorial BoardProf. Dr. Renato Ferreira Machado - [email protected]

Prof. Dr. Edson Sidney de Ávila Júnior - [email protected]. Dr. Luís Fernando Fortes Garcia - [email protected]

Prof. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Científica/Scientific CommitteeProfa. Dra. Adriana Dreyzin de Klor (UNC/ Córdoba, Argentina)

Prof. Dr. José Noronha Rodrigues (Universidade dos Açores, Portugal)Prof. Me. Eduardo Viecelli (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Carlos Garulo (IUS/Roma, Itália)Prof. Dr. Erneldo Schallenberger (UNIOESTE/Cascavel, PR)Prof. Dr. Fábio José Garcia dos Reis (UNISAL/Lorena, SP)

Prof. Dr. Friedrich Wilherm Herms (UERJ/Rio de Janeiro, RJ)Profa. Me. Neide Aparecida Ribeiro (UCB/Brasília)

Profa. Dra. Letícia da Silva Garcia (FDB/Porto Alegre, RS)Pesq. Dr. Manoel de Araújo Sousa Jr. (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Profa. Dra. Marisa Tsao (UNILASALLE/Canoas, RS)Prof. Dr. Nelson Luiz Sambaqui Gruber (UFRGS/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Osmar Gustavo Wöhl Coelho (UNISINOS/São Leopoldo, RS)Prof. Dr. Stefano Florissi (UFRGS/Porto Alegre, RS)

Pesq. Dra. Tania Maria Sausen (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Avaliadores ad-hoc/Ad-hoc reviewersProf. Ms. Aécio Cordeiro Neves (FDB/Porto Alegre, RS)

Pesq. Ms. Camila Cossetin Ferreira (INPE-CRS/Santa Maria, RS)Prof. Dr. José Néri da Silveira (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Ms. José Nosvitz Pereira de Souza (FDB/Porto Alegre, RS)Profa. Ms. Luciane Teresa Salvi (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Luís Carlos Dalla Rosa (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Ms. Luiz Dal Molin (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Marcelo Schenk Duque (FDB/Porto Alegre, RS)Pof. Dr. Ricardo Alvarez (UM/Buenos Aires, Argentina)

Pesq. Ms. Silvia Midori Saito (INPE-CRS/Santa Maria, RS)Profa. Ms. Viviani Lopes Bastos (UCS/Caxias do Sul, RS)

Produção Gráfica/Graphics ProductionPropale*com

Rua Vinte e Quatro de Outubro 1330 – Auxiliadora – Porto Alegre – RS - CEP 90510-001 – Tel: (51) 3377.5297

Revisão:Diego Dornelles da Costa

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SUMÁRIO

1. Jurisdição transnacional: a atuação judicial frente ao fenômeno da mundializaçãoJennifer Leal Furtado Barreto Dalalba e Gabriela de Castro e Silva Pretto

2. Percepção de Valor da Farmácia e Livraria do Grupo Espírita Francisco XavierRafaela Cabral Almeida Trizotto, Alexandre de Melo Abicht, Maurício Moreira e Silva Bernardes

3. O processo de inclusão do aluno deficiente no ensino regular público na última década no brasilMaria de Fatima Matos Ferreira e Terezinha Vicenti

4. A crise da pena privativa de liberdade e os caminhos do direito penalAndrey Henrique Andreolla

5. Tomada da decisão apoiada no estatuto da pessoa com deficiência: alteração na capacidade civil e os reflexos nos contratosAnair Isabel Schaefer

6. Pesquisa sobre o impacto da adoção de metodologias de aprendizagem para o curso de ciências contábeis: avaliando a gincana virtualGabriela Ramos Muniz, Lívia Esquivel e Caroline de Oliveira Orth

7. O trabalho do apenado e a (des)marginalização do direito laboralLaura Machado de Oliveira

8. A perda de uma chance e o princípio da reparação integral em casos envolvendo dano morteSisnando Leiria Júnior

9. Modelo de implantação de novos serviços bancários: caso de correspondentes de negóciosMaximiliano Camargo Rodrigues, Ricardo Marques Sastre e Márcia Elisa Soares Echeveste

10. Los contratos asociativos en la normativa argentina. Institutos similares en la legislación de los estados partes del Mercosur Mateo Fusalba

11. La protección del consumidor en el Mercosur Silvio Javier Battello Calderon e Denise Artifon

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A Revista Atitude é uma publicação periódica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, que atualmente oferece à comunidade cinco cursos superiores: Administração, Ciências Contá-beis, Sistemas de Informação, Engenharia Ambiental e Sanitária e Direito.

Nosso grande objetivo é ajudar as novas gerações a se posicionarem diante da vida como profissionais e cidadãos. Queremos ser fiéis à missão que nos foi deixada por Dom Bosco (1815-1888) de educar pessoas para serem “bons cristãos e honestos cidadãos”.

Fazemos parte de uma rede de Instituições de Educação Superior chamada IUS, ou seja, Instituições Universitárias Salesianas presente em quatro continentes com mais de 70 (setenta) Instituições. Todas com o mesmo objetivo, a mesma utopia, as mesmas metodologias, o mesmo desejo de encarnação no seu entorno.

A Revista Atitude já está em seu número 19. São nove anos de publicação ininterrupta de uma revista reconhecida e conceituada no âmbito nacional e internacional, com indexação no Qualis.

Professores, alunos, convidados estão presentes em suas páginas com o grande objetivo de defender, promover e alavancar a vida, cada vida, em todas as suas dimensões. Este é o sen-tido de nossa presença no mundo da educação superior.

A partir desta edição, a Revista está disponível em novo portal:

http://faculdade.dombosco.net/revista-atitude

Nesta página é possível consultar todos os números da revista, fazer download, se comu-nicar com o conselho editorial e enviar trabalhos para avaliação. Todos de forma muito simples!

REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades!

APRESENTAÇÃO

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 9

JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL: A ATUAÇÃO JUDICIAL FRENTE AO FENÔMENO DA

MUNDIALIZAÇÃO

Jennifer Leal Furtado Barreto Dalalba1

Gabriela de Castro e Silva Pretto2

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo analisar as novas diretrizes aplicáveis à jurisdição a partir do processo de mundialização do direito. Para tan-to se partiu das premissas de que o direito moderno já não se vincula apenas à tradicional estrutura piramidal, bem como de que as relações transcendem o espaço nacional, daí porque a atuação judicial está em fase de adaptação a esse novo modelo jurisdicional cujas decisões sofrem influências transnacionais. Nesse contexto, enfrentou-se a questão do pa-pel dos juízes, tendo como base os ensinamentos de Allard e Garapon.

Palavras chave: Mundialização. Atuação Judicial. Jurisdição Transnacio-nal.

ABSTRACT

This article aims to analyze the new guidelines applicable to the jurisdic-tion on the basis of the law globalization process. For that, we started from the assumptions that modern law is no longer linked only to the pyrami-dal structure of Kelsen and that relations transcend national boundaries, hence why the judicial action is being adapted to this new jurisdictional model of which decisions suffer transnational influences. In this context, the matter of the role of judges, based on the teachings of Allard and Ga-rapon, was faced. Finally, we tried to point out how this new jurisdiction, that is not linked only to the ideals of the local constitution, has been cons-tituted.

KEY-WORDS: Globalization. Judicial action. Transnational jurisdiction.

1 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Direito Imed, Linha de pesquisa Mecanismos de Efetivação da Democracia e da Sus-tentabilidade, Assessora de Juiz de Direito e Professora da disciplina de Direito Civil na Faculdade Anhanguera de Passo Fundo. E-mail: [email protected].

2 Doutoranda em Ciências Jurídicas pela Universidade de Moron, Argentina. Especialista em Direito Internacional e Direito da Integração pela UFRGS, Professora de Direito Empresarial na Faculdade Anhanguera de Passo Fundo, RS. Advogada. E-mail: [email protected]

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10 JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL: A ATUAÇÃO JUDICIAL DIANTE DO FENÔMENO DA MUNDIALIZAÇÃO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Na perspectiva da mundialização existe uma significativa redução do valor de espaço territorial diante da constatação de que as fronteiras demarcam os territórios, mas não as relações sociais. Menos ainda as relações jurídicas, em épocas que a economia ganha força entre as demais ciências.

Se o direito está a serviço dos fatos, assim como eles, terá que se adaptar às novas condições, as quais são (im)postas pela sociedade pós-moderna, na qual os conceitos outrora consolidados e tradicionais já não servem de fundamento para explicar o “ser” ou o “dever-ser”. O direito, enquanto ciência que regulamenta a sociedade, inegavelmente está sofrendo às consequências de todas essas mudanças, e não poderia ser diferente, sob pena de perder a sua legitimidade.

A fundamentação tem grande influência nesse cenário, na medida em que o aplicador do direito, em especial, os juízes, utilizam-na para justificar a decisão a ser tomada. Porém, aspectos jurídicos e sociais nacionais não são as únicas preocupações do juiz na perspectiva da jurisdição transnacional, porque os direitos reconhecidos a nível mundial fazem parte da (pós-moderna) atuação judicial.

Nesse sentido, a presente pesquisa analisará o fenômeno da mundialização do direito e suas consequências na atuação judicial, ressaltando a importância da adaptação dos juízes às novas situações que se apresentam. Questões como a formação de juristas atentos à mundialização também serão o foco da pesquisa. Por fim, serão apontadas as diretrizes para a construção da jurisdição transnacional, a partir da ideia de “comércio de juízes” de Allard e Garapon. O método empregado é o dedutivo porque encontra fundamento em pesquisas bibliográficas.

2 (NEO)CONSTITUCIONALISMO E O SISTEMA JURÍDICO NACIONAL

No Brasil, o estudo doutrinário do neoconstitucionalismo ou, ainda, neopositivismo1, que tem como uma de suas características a busca pela eficácia dos direitos fundamentais garantidos partir de um novo Estado Democrático de Direito, teve seu auge somente no século XXI2.

A partir da promulgação da Constituição de 1988, também denominada Constituição Cidadã, foi superada a ideologia do Estado Legislativo diante do reconhecimento do Estado Constitucional, quanto então a norma constitucional passou a ser matriz do sistema jurídico nacional.

Os valores constitucionais já não estavam mais limitados ao texto meramente retórico, pelo contrário, o modelo normativo é conteudista (substancial) e axiológico, constituído de valor em si.

A relativização entre a separação de direito e moral, ou ainda, a sua reconciliação decorrentes

1 As obras de Direito Constitucional mais modernas por vezes não fazem a diferenciação entre os termos “neopositivismo” e “neoconsti-cuionalismo”. Daí porque utiliza-se, para fins de uma superficial introdução sobre judicialização e ativismo judicial, ambos os termos. Porém não se desconsidera, em uma análise mais profunda sobre o tema, a existência da diferença entre os termos: Antes de prosseguir, é bom que se frise as diferenças entre os conceitos de neoconstitucionalismo e de pós-positivismo. O primeiro é uma característica comum do constitucionalismo ocidental que tem início no segundo pós-Guerra e apogeu na contemporaneidade, enquanto o segundo é o embasamento da filosofia do direito para aquele. O primeiro traduz uma ideologia ou metodologia constitucional que abrange o segundo como pilar de sustentação de algumas de suas posições, mas com ele não se confunde; o pós-positivismo é, pois, a matriz jusfilosófica que embasa as ideias neoconstitucionais. FERNANDES, Ricardo Vieira de Carvalho; BICALHO, Guilherme Pereira Dolabella. Do Positivismo ao Pós-posi-tivimo: o atual paradigma filosófico-constitucional. Revista de Informação Legislativa, Brasilia, a. 48, n. 189, Brasília a. 48 n. 189, 2011.

2 Nesse sentido, Pedro Lenza refere: “Busca-se dentro dessa nova realidade, não mais apenas atrelar o constitucionalismo à ideia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, buscar a eficácia da Constituição, deixando o texto de ter um caráter meram ente retórico e passando a ser mais efetivo, especialmente diante da expectativa de concretização dos direitos fundamentais.” LENZA, Pedro. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010.

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do pós-positivismo3, fundamentaram novas possibilidades de aplicação da norma. Daí advém o reconhecimento do caráter ideológico da Constituição Democrática de 1988, que assume carac-terísticas material e diretiva.

A constitucionalização dos direitos fundamentais também é fruto dos novos valores advindos do neoconstitucionalismo4 e do próprio modelo de estado do bem estar social.

É nesse contexto é que estão inseridos os juristas no Brasil, ou seja, a formação jurídica, em sua grande maioria, atribui legitimidade à atuação judicial atenta a esses preceitos Constitucio-nais. E não poderia deixar de ser, se considerado apenas os aspectos locais, a Teoria piramidal de Hans Kelsen, ainda encontra fundamento nessa perspectiva.

Em artigo publicado pela Revista da Escola Nacional da Magistratura, o Desembargador José Renato Nalini teceu considerações a respeito da formação do juiz após a emenda à Constituição nº 45/04. Dentre as suas colocações, referiu que “o desafio da Escola da Magistratura é transfor-mar o produto dogmático positivista da educação jurídica, à luz da velha feição das Faculdades de Direito, em um profissional atualizado, pronto a enfrentar os desafios contemporâneos”.5 No âmbito daquele estudo, no ano de 2006, os desafios contemporâneos da necessidade do julgados extrair o conteúdo da norma constitucional.

Isso porque, há que se observar que, há pouco, a mentalidade difundida a respeito da atuação judicial constitucional ainda era aquela calcada na atuação judicial positivista. A vinculação rígida do ato à lei causava estabilidade jurídica.

O estudo dos métodos de interpretação, a partir da hermenêutica jurídica, tomou força no Brasil. A cultura jurídica pós-positivista superou o paradigma tradicionalista do “direito-objeto”.

A preocupação jurídica brasileira atual deixou de ser a vinculação da decisão à lei. A cultura da interpretação do direito encontra-se tão enraizada que encontra deveras críticas sobre a atuação do Poder Judiciário. Na verdade, o problema tem sido analisado por Juristas, como Lênio Streck, sob enfoque do fenômeno do “decisionismo”6.

Outra abordagem dada ao problema é a de que o reconhecimento das crises político-sociais pelas quais está passando o Estado Brasileiro está a legitimar a atuação judicial em casos polí-ticos e/ou sociais.

É evidente que o modelo tradicional civilista importando pelo Brasil pouco favorece tal mu-dança. Isso porque, há nesse modelo, um forte apego à Constituição Nacional, afeto à estrutura piramidal de Hans Kelsen.

3 Não se desconhece que a conciliação do direito e da moral é criticada por Jurgen Habermas por entender ser ultrapassada, devendo prevalecer a autonomia do direito. “As realizações específicas do código do direito, que deve ser acionado para responder a uma demanda crescente de organização e de regulamentação de sociedades cada vez mais complexas, não podem mais ser explicadas exclusivamente a partir da necessidade de compreensão da moral, como é sugerido pelos problemas até agora contemplados. Só se reconhecem as ver-dadeiras proporções quando se passa a considerar a moral pelo ângulo do sistema jurídico.” HABERMAS, Jurgen. Direito e Democracia: entre a facticidade e a validade. Trad.: Flávio Beno Siebneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. (p. 154)

4 Lênio Streck (2013, p. 137), em sua crítica ao neoconstitucionalismo, na obra “Constituição, Sistemas Sociais e Hermnêuticos”, refere que a ponderação é o problema do pós-positivimo/neoconstitucionalismo e que o problema da ponderação é a sua filiação ao esquema sujeito-objeto e sua dependência da discricionariedade.

5 NALINI, José Renato. A Formação do Juiz Após a Emenda à Constituição nº 45/2004. Revista da Escola da Magistratura. Associação dos Magistrados Brasileiros. Brasília: Escola Nacional da Magistratura, 2006. p. 19.

6 Para o autor a discricionariedade passível de transformar-se em arbitrariedade é aquela calcada no “uso da ponderação, que se trans-formou em álibi para decisionismos, a discricionariedade, a transformação dos princípios em valores etc.”STRECK, Lênio. Do Pamprinci-piologismo à concepção hipossuficiente de princípio. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 49, n. 194, 2012. p. 18

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12 JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL: A ATUAÇÃO JUDICIAL DIANTE DO FENÔMENO DA MUNDIALIZAÇÃO

Ao fim ou ao cabo, o ideal de Welfare State ainda está intimamente relacionado ao Estado Constitucional, daí porque haverá espaço no Brasil para fomentar uma nova concepção sobre o direito (global)? Como os juízes brasileiros poderão estar preparados para exercer uma jurisdição transnacional?

3 MUNDIALIZAÇÃO, ATUAÇÃO JUDICIAL E JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL

A invasão da ciência da tecnologia é, sem dúvida, a principal causa do fenômeno da mundiali-zação. Arnaud7 refere que a mundialização, decorrente da globalização, é o marco das mutações constatadas pelos economistas, especialistas em mercados financeiros e em relações interna-cionais. E, como todo processo de mudança, naturalmente ocasiona incertezas, inclusive para a ciência do direito8.

A mundialização deve ser vista a partir da compreensão de que questões como meio ambiente, direitos humanos e biotecnologia superam a lógica Estado-Jurisdição. Daí porque, Staffen defende que o processo de globalização necessita ser compreendido a partir da interdisciplinariedade sistêmica decorrentes de fluxos globalizatórios9.

O despertar das nações para interesses comuns se deu após as duas guerras mundiais, a partir de quando a preocupação com os direitos fundamentais aumentou em grande escala. Percebeu--se que para a efetivação desses direitos a Soberania Estatal deveria ser limitada e daí surgiu a flexibilização do Direito Nacional dentro deum Sistema Jurídico maior.10

A rigidez das Constituições não encontra justificativa diante da mundialização. Isso explica, entre outras coisas, a formidável alteração no eixo de positivação dos direitos fundamentais, que no pós-guerra passou a ser a principal preocupação da Organização das Nações Unidas.11

Como salienta Allard e Garapon12 a grande questão a ser enfrentada pela mundialização do direto é a diferença entre as culturas jurídicas. Enquanto a civil law representa a tradição ger-mânica, a common law encontra fundamento exatamente a aplicação do direito de forma menos rígida, ambas, porém, aceitam o diálogo e um possível intercâmbio de ideias. Ficam realmente de fora dessa perspectiva culturas como a asiática e mulçumana.13

7 O autor, ao iniciar seu estudo sobre governança global, assim refere: “1925! Quer dizer, então, das prondas perturbações que marca-ram o panorama que ainda se podia ter,, até o fim dos anos 70! Trata-se, bem entendido, do fenômeno da “Mundialização” ou melhor, da “globalização” de que estamos falando aqui, das mutações vastamente constatadas - e muito cedo – pelos economistas, pelos especialis-tos dos mercados financeiros e das relações internacionais. É fato que a ordem econômica, financeira e social resultante do contexto do pós-guerra e dos acordos de Bretton_Woods foi brutalmente posta em questão nos anos que se seguiram ao primeiro choque do petróleo, em 1973; a situação agravou-se ainda mais, cerca de quinze anos mais tarde, no momento da “queda” do Muro de Berlin, e, na sua esteira, a da Cortina de Ferro.” (2005, prólogo)

8 “A mundialização é dessa forma, entendida por Slaughter como um processo de propagação: não uma dialéctica da ordem e do caos, mas um alargamento progressivo que termina numa forma de cosmopolitismo.” (Allard e Garapon, 2005, p. 11).

9 STAFFEN, Márcio. Interfaces do Direito Global. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 23.

10 Essa é a constatação de Simeão: “As duas guerras mundiais interromperam o processo pelo qual os direitos humanos fundamen-tais começavam a ser entendidos como direitos naturais que extrapolam o poder de positivação estatal. Nada obstante, foi justamente o sofrimento e o horror que fizeram com que surgisse a percepção de que determinadas ações do Estado criam um “risco globalizado”, de maneira que a soberania não deve ser vista como absoluta e o direito nacional não pode, em todos os casos, ser inflexível e estar no ápice hierárquico de um sistema jurídico.” Soberania, Constitucionalismo e Mundialização do Direito. S/ ano, p. 5.

11 SIMEÃO, Álvaro Osório do Valle. Soberania, Constitucionalismo e Mundialização do Direito. S/ ano, p. 5.

12 Os Juízes na Mundialização. op. cit., p. 57.

13 “A mundialização do direito é palco de um confronto que não se limita a pôr frente a frente direitos nacionais diferentes, mas que

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 13

A importância desses novos ideais está justamente na união entre as diferenças, vale dizer: o comércio entre juízes como forma de fomentar a compreensão do processo de mundialização. Para tanto, surge a necessidade de trocas e intercâmbios entre os juízes, enquanto “engenheiros de transformação do direito”, a fim de estabelecerem relações recíprocas na esfera judicial14.

É evidente que a perspectiva do direito global não é somente àquela atrelada à esfera mundial, mas também aos problemas nacionais internos de cada Estado.15 Questões voltadas para mau uso do Meio Ambiente16 e o descumprimento dos Tratados e Convenções de Direitos Humanos têm causado repercussões mundiais.

Daí porque, pode-se dizer que o comércio entre juízes deve existir para que os países melhor preparem seus juristas no plano jurídico mundial, pois será nessa esfera que futuramente serão resolvidos os litígios.17

4 OS REFLEXOS DA MUNDIALIZAÇÃO NA ATUAÇÃO JUDICIAL: JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL E O “COMÉRCIO DE JUÍZES”

A partir do entendimento de que a mundialização se trata de um fenômeno, que não será contido pelos Estados e tão pouco pelo Direito, é que se fundamenta a necessidade do aprimoramento da atuação judicial. Allard e Garapon introduzem a ideia de um fórum mundial de juízes, porque é incontestável que a comunicação entre eles foi intensificada.

A criação de intercâmbios, na perspectiva dos autores, surge para debates a respeito de casos polêmicos: direitos dos homossexuais, crimes contra a humanidade, eutanásia, financiamento de campanhas eleitorais, etc18.

Essa proposta encontra legitimidade não na institucionalização de procedimentos em busca de decisões, porque decorre de um fórum informal de intercâmbio. Busca, na verdade, a construção

ocorre igualmente nos eternos mais subtis de uma concorrência entre culturas jurídicas. O mais importante não será tanto defender o seu direito mas sim difundir a sua cultura. Neste sentido, o comércio entre juízes é também cenário de uma competição aguerrida entre as duas grandes tradições jurídicas ocidentais – a common law e o direito civil-, ficando as outras culturas (mulçumana, asiática...), de facto, afastadas. Pelo menos, por agora. Os sinais de tensão entre estas duas grandes culturas jurídicas são múltiplos” ALLARD, Julie; GARAPON, Antoine. Os Juízes na Mundialização: a nova revolução do direito. Trad. de Rogério Alves. Lisboa: Instituto Piaget, 2005.

14 PAZ, Viviane Candeia Paz; LUZ, Vladimir de CarvalhO. Novo Constitucionalismo e Mundialização do Direito: notas sobre a atuação jurisdicional transnacional. Justiça do Direito. Justiça do Direito. v.1, n.2, jul/dez. 2011. Em complemento: “Questões relevantes são postas por Allard e Garapon (2005), que utilizam a expressão “comércio de Juízes” para indicar a necessária compreensão do processo de mundialização a partir dos juízes verificando que: a) os juízes são, hoje, os agentes mais ativos desse processo de mundialização, sendo os “engenheiros da sua transformação”; b) apesar de a literatura caracterizar tal fenômeno com expressões do tipo “mundialização judicial”, “diálogo de juízes” ou “auditório global”, os autores preferem a expressão “comércio entre juízes”. Tal expressão apresenta vantagem de representar duas facetas da mundialização: uma relativa às trocas e intercâmbio, outra referente a uma nova forma de socialização nascida do desejo de estabelecer relações recíprocas, corteses e pacíficas entre os homens.

15 Em complemento: “O Direito Global está dividido em dois níveis: o primeiro mais raso que se preocupa com os assuntos nacionais (internos) de cada Estado; e o segundo, mais amplo, diluído no cenário transnacional, constituído por uma área global, de modo que predomine a cooperação (partnership) entre seus agentes em seu duplo nível.” STAFFEN, Márcio. Interfaces do Direito Global. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 27.

16 Os problemas que o Brasil está tendo a nível internacional decorre do fato de a Amazônia ser considerada patrimônio da humanidade, sem desconsiderar, é claro, os interesses econômicos que a tornam tão cobiçada pelos países desenvolvidos como os EUA. Mas há que ser observado que em se tratando de meio ambiente “os países têm responsabilidade por ações ou omissões cometidas em seu território, ou sob seu controlem concernentes aos danos potenciais ou efetivos ao meio ambiente de outros países ou de zonas que estejam fora dos limites da jurisdição nacional. PINTO, Oriana Piske de Azevedo Magalhães. Responsabilidade por Dano Ambiental. Revista da Escola da Magistratura. Associação dos Magistrados Brasileiros. nºII, ano 3. Brasília: Escola Nacional da Magistratura, 2007. p. 146.

17 “O comércio entre juízes existe, de facto, para que cada país se prepare melhor no plano jurídico, pois é neste domínio que serão resolvidos eventuais litígios.” Allard e Garapon, 2005, p. 52.

18 Os Juizes na Mundialização. op. cit. 176.

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14 JURISDIÇÃO TRANSNACIONAL: A ATUAÇÃO JUDICIAL DIANTE DO FENÔMENO DA MUNDIALIZAÇÃO

de novos fundamentos para as decisões, vinculadas aos argumentos de bom senso.19

Não se olvida de que os autores sugerem também a criação de um “comércio entre juízes”. Isso ocorreria através de mecanismos institucionais consubstanciados em práticas mais ou menos informais, incluindo as de um processo vinculativo.20

Porém, há que se observar as considerações feitas por Staffen21 sobre o governo mundial de Juízes. O autor destaca como problema a constatação de incompletude do sistema, em razão de termos a hipotética sensação de que o sistema interno é completo.

De fato, a cultura jurídica brasileira tem maior apego às leis, o que decorre do próprio sistema adotado - Civil law -. Em sentido diverso, pode-se concluir que a estrutura jurídica da Common law está mais afeta aos ideias de Allard e Garapon.

Portanto, conforme Nalini22, “O ensino, para os futuros juízes no Brasil, haverá de ser voltado para o futuro”. Logo, não se pode rechaçar a veracidade dos fundamentos de Allard e Ga-rapon para explicar a necessidade de criação de intercâmbios entre juízes, porque, esses deverão estar preparados para compreender os acontecimentos a nível mundial.

A preparação jurídica no Brasil, de forma geral, deverá se adaptar a esse novo contexto. Não raro, se vê faculdades de direito sem disciplinas para a promoção de direito mundial, sequer de direito internacional.

Há que se difundir a cultura da mundialização, porque, esse é o fato que se apresenta. Alunos despreparados transformar-se-ão em juristas despreparados. Julgadores que ainda acreditam que as decisões proferidas em processos de proteção ambiental desimportam para o mundo não estão inseridos no contexto que se apresenta: a mundialização do direito.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

partir do presente estudo pode-se sinalizar as seguintes conclusões: 1ª A mundialização é resultado da globalização, 2ª A relações a nível global impactam as relações jurídica, 3ª O direito deve se adaptar aos fatos sociais a nível mundial, 4º A crise institucional no Brasil afasta a ob-servância aos fenômenos como o da mundialização do direito, 5º Países com o sistema jurídico Common Law estão mais propensos a adotarem à ideia de intercâmbio entre juízes, 6º O comércio de juízes auxiliará no preparo de juízes atuantes no contexto da mundialização e 7º Em países como o Brasil decisões judiais pautadas em fóruns mundiais de juízes poderá incentivar a crise

19 Em complemento: “Esta consulta a decisões estrangeiras não tem por objetivo a procura de um consenso moral, como não se verifica em outros processos, nem de uma maioria como em direito interno, mas sim de um argimento de com senso baseado na eficácia, ou seja, uma sentença de facto: o mecanismo de votação é, com efeito, separável dos contextos locais.” Os Juizes na Mundialização. op. cit. 26.

20 Em complemento, Allard e Garapon: “O novo fórum entre juízes não é um espaço legislativo à revelia, mas sim um fórum informal de intercâmbios situado, na maior parte das vezes, à margem dos mecanismos institucionais. O direito que aí se concerne não é, aliás, necessariamente provido de um caráter vinculativo. A sua força motora, a sua eficácia e sua legitimidade residem em outros fatores: em parte ligados a dispositivos institucionais como a construção europeia ou os tribunais internacionais, em parte emergentes de uma necessidade objectiva de regulação e de referências normativas, em parte assentes na autoridade da argumentação [...]”. os juízes na mundialização. op. cit.15

21 Em complemento: “Vale ressaltar que o governo mundial de juízes apresenta incovenientes e vantagens. Dentre os problemas, des-taque-se: “a necessidade de organização judiciária mundial vincular-se a corte transnacional; a ausência de um órgão ou comunidade política representativa; e, a constatação da incompletude do sistema [...]”.STAFFEN, Márcio Ricardo. O Direito na Perspectiva Global: Quo Vadis? Direito, Democracia e Sustentabilidade: Anuário do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. Passo Fundo: Imed, 2014. p. 238.

22 A formação do juiz após a emenda à constituição 45/04. op. cit. 21.

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institucional nacional.

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16 PERCEPÇÃO DE VALOR DA FARMÁCIA E LIVRARIA DO GRUPO ESPÍRITA FRANCISCO XAVIER

PERCEPÇÃO DE VALOR DA FARMÁCIA E LIVRARIA DO GRUPO ESPÍRITA FRANCISCO XAVIER

Rafaela Cabral Almeida Trizotto1

Alexandre de Melo Abicht2 Maurício Moreira e Silva Bernardes3

RESUMO

O serviço de atendimento e a qualidade dos produtos necessitam estarem alinhados com o novo perfil de consumo: mais exigentes e conscientes. Esta realidade faz parte do cenário atual do mercado, e consequentemen-te se estende a todas as formas de comércio existentes. A presente pes-quisa diz respeito ao grupo de estudantes da doutrina espírita-kardecista que trabalham mediunicamente no Grupo Espírita Francisco Xavier, deno-minados trabalhadores mediúnicos, e que usufruem da comercialização de livros espírita-kardecistas e medicamentos fitoterápicos praticados no local. Apesar de a entidade ser filantrópica e não prever lucros é impor-tante ter a percepção de satisfação pelos seus trabalhadores e melho-rar o processo das vendas visando à qualidade. A partir deste conceito, o presente artigo tece uma análise do nível de satisfação e percepção de valor que os trabalhadores do Grupo Espírita Francisco Xavier dão para a Farmácia e Livraria, além de propor ações de melhoria para os aspectos de maior relevância.

Palavras-chave: Organizações sem fins lucrativos; Marketing de Relacio-namento; Satisfação do Consumidor.

ABSTRACT

The customer service and product quality need be aligned with the new profile of consumption: more demanding and aware. This reality is part of the current market scenario, and therefore extends to all forms of existing trade. This research concerns the group of students of spiritualistic Kar-decist doctrine who exercising mediumship in Spiritist Group Francisco Xavier, called spirit mediums, who enjoy the spiritualist-Kardecists books and herbal medicines practiced on site. Although the entity be philanthro-pic and not predict profits is important get a sense of satisfaction of their spirit mediums and improve the sales process aimed at quality. From this concept, this paper presents an analysis of the level of satisfaction and perceived value that spirit mediums attribute to the pharmacy and books-

1 Graduada em Administração de Empresas pela Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.

2 Doutorando em Design – PG-Design pela UFRGS. Mestre em Agronegócios pela UFRGS. Graduado em Administração de Empresas pela ULBRA-SM. Consultor empresarial junto ao SEBRAE-RS. Professor do Curso de Administração da Faculdade CNEC Gravataí e da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.

3 Pós-doutor em Design pelo IIT. Doutor e Mestre em Engenharia Civil pela UFRGS. Graduado em Engenharia Civil pela UFAL. Professor Associado do PG-Design da UFRGS.

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tore in Spiritist Group Francisco Xavier, and propose actions for improve-ment of relevant aspects.

Keywords: Nonprofits Organization; Relationship Marketing; Customer Satisfaction.

1 INTRODUÇÃO

O Grupo Espírita Francisco Xavier é uma casa Espírita Kardecista de grande reconhecimento no país, faz parte dos membros federados pela FEB (Federação Espírita Brasileira) e recebe visitantes dos diversos lugares do Brasil. A casa espírita conta com uma equipe de funcionários remunerados que promovem a continuidade dos processos e que viabilizam a manutenção do GEFX nas suas diversas dependências. Somente com as doações voluntárias e donativos recebidos por parte dos associados, não é gerada a receita suficiente para suprir os gastos realizados para manutenção e sequenciamento das atividades oferecidas. Para o cumprimento dos seus preceitos e geração de renda, o GEFX criou a comercialização de livros espírita-kardecistas e medicamentos fitoterápicos através de sua Farmácia e Livraria.

Cabe destacar a diferença atribuída às pessoas que estão presentes no GEFX: os trabalhado-res são aqueles que participaram da escolinha de médiuns ofertada pelo próprio grupo espírita e trabalham mediunicamente na casa, normalmente possuem o hábito de frequência no grupo de uma ou mais vezes na semana, realizam o estudo da doutrina através dos livros da biblioteca ou livraria e praticam o tratamento homeopático. Os frequentadores são aqueles que frequentam esporadicamente o GEFX, estão há mais de cinco anos afastados dos tratamentos, ou ainda, são pessoas que estão chegando pela primeira vez na casa. Os funcionários estão presentes nos três turnos de funcionamento do grupo, fazendo parte do quadro funcional da biblioteca, livraria e farmácia, limpeza e manutenção.

Apesar de a entidade ser filantrópica e não prever lucros é necessário ter a percepção de sa-tisfação pelos seus trabalhadores e melhorar o processo das vendas visando à qualidade baseado no pressuposto da doutrina. A instituição não possui ainda como rotina a aplicação de pesquisas de satisfação, sobre: o atendimento oferecido, seu sistema de pagamento e se o setor possui al-gumas deficiências, como dificuldade ao acesso aos livros e ausência de máquinas para cartão de débito e crédito. Diante do exposto, faz-se a pergunta: Qual é a percepção que os trabalhadores do Grupo Espírita Francisco Xavier têm sobre os produtos e serviços de sua farmácia e livraria?

2 CARACTERÍSTICAS DA ORGANIZAÇÃO

O Grupo Espírita Francisco Xavier (GEFX) possui mais de 75 anos de funcionamento e utiliza como filosofia a Doutrina Espírita Kardecista. O Evangelho possui os ensinamentos morais que conduzem a reforma interior e conclamam todos os homens à fraternidade. É através do Evange-lho que os espíritas Kardecistas encontram uma maneira segura de adotar a Doutrina na prática.

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De acordo com seu estatuto, o GEFX foi constituído como uma associação de ordem religiosa, cultural, beneficente e filantrópica, de assistência social e sem finalidade lucrativa. Seu preceito é servir desinteressadamente à coletividade, tendo por finalidades o estudo, a difusão e a prática do Espiritismo; a orientação à infância, à juventude e à família; a assistência e promoção social orientada sob os princípios da Doutrina Espírita, que têm por base as obras de Allan Kardec.

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 3.1 ORGANIZAÇÕES SEM FINS LUCRATIVOS

As organizações sem fins lucrativos são agentes de mudança humana, tem como fundamento a transformação, a cura e o aprendizado. Drucker (2002, p. 14) define sabiamente o conceito de empresa sem fins lucrativos:

A instituição “sem fins lucrativos” não fornece bens ou serviços, nem controla. Seu “produto” não é um par de sapatos, nem um regulamento eficaz. Seu produto é um ser humano mudado. As instituições sem fins lucrativos são agentes de mudança humana. Seu “produto” é um paciente curado, uma criança que aprende, um jovem que se transforma em um adulto com respeito próprio; isto é, toda uma vida transformada.

Em complemento, o conceito de organização sem fins lucrativos é caracterizado “como o conjunto de atividades das organizações da sociedade civil fora do aparato do estado e do setor privado que têm por objetivo a prestação de serviços ao público [...] antes de competência exclusiva do estado” (LEE et al, 1997 apud CARRIO, 2000).

As organizações sem fins lucrativos têm como seu principal objetivo a ajuda, portanto, o sig-nificado literal de sua existência é não presumir lucros, e sim, direcionar a receita adquirida para aqueles que são necessitados. Estas organizações podem ser identificadas como centros religio-sos, hospitais, escolas, museus, universidades, entre tantas outras organizações da sociedade civil que não preveem lucros, e sim, uma forma de sustentabilidade. Para isso, as instituições contam com parceiros e apoiadores como associados, contribuintes e doadores que possuem papel indispensável para garantir a sobrevivência do trabalho realizado.

3.2 MARKETING NAS ORGANIZAÇÕES SEM FINS LUCRATIVOS

O marketing nas organizações sem fins lucrativos é direcionado para o incentivo do uso dos serviços da organização. Para isto, são trabalhados os mesmos elementos básicos dos com-postos de marketing, utilizados pelas empresas em geral, para gerar a receita suficiente para manutenção e sobrevivência da entidade (CHURCHILL JR., PETER, 2012). Costa (1992) já dizia sobre a importância de serem objetivadas as ações mercadológicas para as organizações sem fins lucrativos, como um dos pressupostos, a retirada do foco da contribuição mensal mediante o oferecimento de serviços.

A falta de uma pesquisa de marketing em organizações sem fins lucrativos pode ocasionar vários fatores de perdas e descontentamento perante seu público. Pode-se utilizar o termo

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“consumidor” como uma forma de traduzir aqueles que são beneficiados por estas instituições, são esses consumidores que mantém a produtividade e continuidade dos serviços prestados. É necessário entender o comportamento dos consumidores e verificar quais práticas irão fazer com que mantenham um relacionamento com a organização de forma satisfatória (DRUCKER, 2002).

Os autores Kotler (s.n.t. apud Drucker, 2002) e Drucker (2002) concordam no que diz respeito à responsabilidade de realização de marketing nas organizações sem fins lucrativos como sendo um dever de todos aqueles que têm alguma coisa a ver com o consumidor. Não está a cargo de uma única função, mas sim decorrente de um compromisso básico, que resulta em uma organização dedicada e posicionada para satisfazer sua finalidade básica.

Uma organização sem fins lucrativos atinge seus objetivos quando consegue ser clara a respeito do que quer realizar, promove a motivação dos seus membros a fim de que concordem com o cumprimento da meta e sua validade e, além destes fatores, consegue tomar providências para implementar o seu objetivo de uma forma econômica e que apresenta os resultados dese-jados. Kotler em entrevista para Drucker (2002, p.62), na mesma obra, é unânime em dizer que o “marketing é uma maneira de harmonizar as necessidades e desejos do mundo exterior com as finalidades, os recursos e os objetivos da instituição”.

3.3 PESQUISA DE MARKETING

A pesquisa de marketing para as organizações sem fins lucrativos serve como um guia para que a organização saiba o que o seu público sabe e pensa a respeito de suas práticas, afinal, o propósito da organização é atender a questão social, e nada mais justo do que identificar os as-pectos mais importantes em termos de necessidade do público dirigido.

Meneghetti (2001, p.47) salienta que “Pesquisar, de certa forma, é fazer um exercício de se colocar no lugar do outro, de tentar entender suas percepções, seus desejos”. O planejador utiliza o método de pesquisa como um condutor para a tomada de decisão, portanto, deve ser analisada com cautela. Lupetti (2002, p.177) enfatiza o seguinte aspecto: “devemos lembrar que os resul-tados de uma pesquisa são apenas orientativos, e não decisivos. A interpretação, o bom-senso e o mercado fazem parte do processo decisório”. Complementando o pensamento, Las Casas (2005, p. 87) diz que “a experiência do administrador somada à intuição pode dar aos resultados da pesquisa uma validade maior. É um importante instrumento que ajuda a minimizar o risco de tomada de decisões”.

3.5 COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR

O estudo do comportamento do consumidor envolve matérias interdisciplinares como a psi-cologia, sociologia, economia e antropologia a fim de traduzir e auxiliar na interpretação das necessidades de diversos grupos de compradores e na descoberta dos diferentes motivos da tomada de decisão pela compra (LAS CASAS, 2005).

Las Casas (2005) afirma que, apesar de aparentemente simples, o consumidor, diante de uma

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situação de compra, age em decorrência de uma série de influências de ordem interna e externa. Explica ainda que dentro dos fatores internos, estão inclusos os principais componentes da es-trutura psicológica do indivíduo, sua formação passada e expectativas futuras. Já as influências externas estão ligadas ao ambiente, aquilo que o ser humano incorpora ao seu comportamento.

Churchill Jr. e Peter (2012) mencionam a existência de fatores que conduzem à tomada de decisão do consumidor através de seus pensamentos, sentimentos e ações, além das influências exercidas sobre eles e que levam a mudanças; conforme a Figura 1 a seguir:

Figura 1 – Modelo de processo de compra do consumidor

Fonte: Adaptado de Churchill Jr.; Peter (2012, p. 149).

Etapa 1: Reconhecendo Necessidades

Las Casas (2005) e Churchill Jr. e Peter (2012) afirmam que o processo de compra é de-sencadeado com o reconhecimento de uma necessidade. Um estudo de forma a coordenar as necessidades hierarquicamente foi realizado por Maslow. “Maslow, um psicólogo e professor do Brooklyn College e Brandeis University, [...] desenvolveu a teoria de que a satisfação dos desejos e necessidades motiva o ser humano a buscar o objetivo de auto-realização” (SCHWARTZ, 1977 apud LAS CASAS, 2005, p. 137). Churchill Jr. e Peter (2012) expõem que, segundo Maslow, o que motiva os indivíduos é satisfazer as necessidades não atendidas. Para isso, as pessoas buscam saciar algumas necessidades básicas antes de se sentirem novamente motivadas a satisfazerem outras, como em uma hierarquia. Seguindo esse pressuposto, Maslow criou uma teoria para demonstrar esse processo: “as pessoas tentam primeiro satisfazer as necessidades da base da hierarquia. Quando as necessidades das categorias inferiores são satisfeitas, as pessoas movem-se para o atendimento das necessidades de categorias superiores” (CHURCHILL Jr.; PETER, 2012, p. 150).

Etapa 2: Buscando Informações

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Churchill Jr. e Peter (2012) avisam que após o consumidor identificar aquilo que lhe é uma necessidade, irá procurar informações sobre como satisfazê-la. A busca de informação pode ocorrer em cinco fontes básicas:

a) Fontes internas: são as informações que estão contidas na memória da pessoa;

b) Fontes de grupos: esta fonte é uma das mais poderosas, pois diz respeito as informações passadas por amigos, familiares ou pessoas que o indivíduo tem alta confiabilidade e credibilidade para consultar;

c) Fontes de marketing: são as informações obtidas através das ações de marketing e que são de fácil acesso, mas nem sempre ganham a confiança do consumidor;

d) Fontes públicas: normalmente são artigos produzidos na mídia ou classificações realizadas por organizações independentes, mas carecem de um maior esforço por parte do consumidor, que terá de pesquisa-las;

e) Fontes de experimentação: é realizada através do contato direto do indivíduo com o produto, com a possibilidade de visualização, manuseio, teste ou experimento.

Etapa 3: Avaliando Alternativas

Os consumidores utilizam, por meio das informações coletadas, a base da maneira de satisfazer suas necessidades e desejos. Berelson e Steiner (1964, apud LAS CASAS, 2005, p. 140) chamam esse momento de percepção, “é o processo pelo qual um indivíduo seleciona, organiza e interpreta a informação para dar significado ao mundo”.

Etapa 4: Decidindo a Compra

É neste momento que o consumidor irá considerar todas as opções para realizar a compra, então decidirá por efetuá-la, ou não, caso os atributos positivos sejam superiores aos atributos negativos. É válido ressaltar que o consumidor está em constante processo de tomada de decisão, portanto, ele pode a qualquer momento adiar ou rejeitar a decisão de consumo. Os consumidores podem agir rapidamente, em especial se o produto estiver em liquidação, desistir da compra se nenhuma das opções identificadas de fato satisfazer suas necessidades e desejos ou podem adiar a compra se decidirem economizar dinheiro. (CHURCHILL JR., PETER, 2012, p. 154).

Etapa 5: Avaliando a Compra

Após efetuada a compra, o consumidor irá avaliar se o produto ou serviço adquirido atendeu as suas expectativas e satisfez sua necessidade. Churchill Jr. e Peter (2012) explicam que esse é um momento favorável para os profissionais de marketing, visto que, se o consumidor vem obtendo uma série de experiências favoráveis em determinada marca, então, na sua avaliação pós-compra terá o fator lealdade atrelado a ela. Em contrapartida, se o consumidor entender que os benefícios de uma compra não forem superiores aos custos empregados nela ficará insatisfeito e a compra terá uma conotação negativa, de valor baixo.

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3.6 FORTALECENDO O RELACIONAMENTO

Segundo Gordon (2000, p.14) “os relacionamentos são os únicos bens verdadeiros da empre-sa”, afinal, o relacionamento fornece à empresa rendimentos em longo prazo e baixos riscos, até mesmo para organizações sem fins lucrativos. Ainda conforme Gordon (2000), as instituições de caridade e fundações necessitam administrar seus relacionamentos de forma a alcançar vanta-gens mútuas para todos os seus participantes.

Churchill Jr. e Peter (2012, p. 16) pressupõem que “as avaliações de valor dos clientes podem mudar ao longo do tempo e em diferentes situações”. Diferentes clientes podem ter alteradas percepções referentes ao mesmo produto ou serviço, por isso, é importante manter os clientes atuais. Conforme Churchill Jr. e Peter (2012, p. 17), os tipos de benefícios que os clientes podem receber da compra de produtos e serviços são:

a) Benefícios funcionais: trata-se dos benefícios tangíveis e que são recebidos em bens e serviços. Os clientes compram produtos ou serviços basicamente por seus benefícios funcionais, como saciar a fome, calçado confortável para os pés ou serviços de saúde.

b) Benefícios sociais: é a percepção positiva em resposta que os clientes recebem de outras pessoas por comprar e usar determinados produtos e serviços. Neste caso o benefício pode vir na forma de um elogio pelo bom gosto, por exemplo.

c) Benefícios pessoais: está ligada aos bons sentimentos que os clientes experimentam ao realizar a compra, pela propriedade e pelo uso de produtos, ou pelo recebimento de serviços. Neste caso o consumidor sente-se bem por ter realizado uma boa compra. Como exemplo, pode--se citar a satisfação na locomoção através de bicicleta e ter a sensação agradável de não estar poluindo o meio ambiente.

d) Benefícios experimentais: são os benefícios refletidos através do prazer sensorial que os clientes obtêm com o produto ou serviço. Aqui, estão ligados os fatores que oferecem benefícios experimentais como perfumes agradáveis, belas obras de arte, música empolgante e comidas saborosas.

Com estes benefícios, os consumidores tendem a avaliar a compra com um aspecto positivo, gerador de valor. É importante atender as expectativas não somente dos novos clientes, mas manter os antigos também. Através dos laços criados em um relacionamento de longo prazo pode-se construir uma cadeia de valor, onde há troca mútua de informações.

3.7 SATISFAÇÃO DOS CONSUMIDORES E QUALIDADE DOS SERVIÇOS

Las Casas (2005, p.150) conta que “atualmente, há uma valorização maior do consumidor no processo de comercialização. Isto se deve, em parte, à grande divulgação das técnicas de qualidade total que se iniciam com o entendimento das expectativas dos consumidores”. Ainda segundo esse autor, apesar do discurso, são poucas as empresas que realmente aplicam uma orientação verdadeira aos clientes por diversos fatores como a falta de cultura em servir por parte dos funcionários, falta de educação e baixos salários.

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Kotler e Keller (2012, p.134) conceituam satisfação como “o sentimento de prazer ou decepção que resulta da comparação entre o desempenho (ou resultado) percebido de um produto e as expectativas do comprador”. Analisando a frase, Kotler e Keller (2012) explicam que o cliente se sentirá insatisfeito caso as expectativas não alcancem o desempenho almejado, se alcançá-la, sairá satisfeito, e ainda, se o desempenho for além das expectativas, o cliente ficará altamente satisfeito ou encantado.

Fitzsimmons e Fitzsimmons (2010, p. 139) descrevem as cinco principais dimensões que os clientes utilizam para julgar a qualidade dos serviços, sendo:

a) Confiabilidade: O cliente possui uma expectativa em relação ao desempenho de um serviço, portanto, ser confiável é entregar o serviço cumprido no prazo, da mesma maneira e sem erros. Diz respeito à capacidade de prestar o serviço prometido com confiança e exatidão.

b) Responsividade: refere-se à capacidade de recuperar uma falha no serviço rapidamente e com profissionalismo. Desta forma, o cliente cria a percepção positiva da qualidade, mas no mo-mento em que o cliente fica esperando, principalmente por razões não aparentes, será gerada a percepção negativa da qualidade. É necessário ter disposição para auxiliar os clientes e fornecer o serviço prontamente.

c) Segurança: O cliente sente-se seguro quando o funcionário é cortês na relação, além de passar a ideia de ter conhecimento sobre o serviço, numa transmissão de confiança e confidencialidade. A dimensão da segurança inclui as seguintes características: competência para realizar o serviço, cortesia e respeito ao cliente, comunicação efetiva com o cliente e a ideia de que o funcionário está realmente interessado no melhor para o cliente.

d) Empatia: é relativa à importância dada ao cliente com uma atenção personalizada. A em-patia inclui as seguintes características: acessibilidade, sensibilidade e esforço para entender as necessidades dos clientes.

e) Aspectos tangíveis: diz respeito às condições do ambiente físico, mostrando o cuidado e a atenção aos detalhes exibidos pelo fornecedor de serviços. É levado em consideração a aparência das instalações físicas, equipamentos, pessoal e materiais para comunicação.

Através da percepção das cinco dimensões citadas o cliente irá julgar a qualidade dos serviços prestados, numa comparação entre o serviço esperado e o serviço percebido. “A diferença entre a qualidade do serviço esperado e o percebido é uma medida da qualidade do serviço; a satisfação é negativa ou positiva” (FITZSIMMONS, FITZSIMMONS, 2010, p. 140).

4 METODOLOGIA

Neste trabalho, optou-se pela realização de duas etapas de pesquisa, sendo apresentadas, a seguir, a formulação da pesquisa, a condução e orientação da coleta de dados, a análise e a preparação das informações coletadas.

O presente artigo se caracterizou por uma pesquisa inicialmente exploratória. Para Malhotra (2012) a pesquisa exploratória é baseada em pequenas amostras, o que acarreta numa melhor

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compreensão sobre o contexto do problema. Aplicou-se um questionário contendo questões abertas, conforme Santos (2001) o questionário aberto oportuniza ao informante dar respostas livremente, dando a possibilidade para obterem-se respostas com maior teor de detalhes, ge-rando uma percepção mais profunda e real ao pesquisador. O tipo de amostra que caracteriza a primeira etapa da pesquisa é a não probabilística. Nesta etapa, a característica analisada é restrita a população de trabalhadores do GEFX do turno da manhã, utilizando-se a quantia da amostra de 15 respondentes no período do dia 18 de abril de 2015 a 25 de abril de 2015. Santos (2001) diz que qualquer que seja o instrumento aplicado para a pesquisa, deve-se realizar a testagem das amostras para evitar erros quando a coleta de dados estiver sendo aplicada. Neste trabalho, o questionário aberto foi escolhido como método de pré-teste, visando melhorar, cortar e incluir questões na segunda etapa, após o conhecimento dos resultados.

Na segunda etapa, o objetivo da pesquisa foi descritivo. Para a segunda etapa da pesquisa a amostra foi caracterizada pela amostragem probabilística, com os elementos da amostra se-lecionados aleatoriamente dentro de um grupo, mais precisamente de trabalhadores. Por esta razão, a técnica utilizada foi a de amostragem por grupos, conforme Marconi e Lakatos (1999, p. 47) explicam que ‘o nome conglomerado ou grupos deriva do fato de os conglomerados serem considerados grupos formados e/ou cadastrados da população. Neste caso, os conglomerados foram caracterizados por turnos (manhã, tarde e noite), optando-se pelos turnos da manhã e tarde para realização da pesquisa. A aplicação para esta amostra foi de 30 pessoas, no período de 2 de maio de 2015 a 9 de maio de 2015. Para a elaboração do questionário fechado aplicado aos trabalhadores do Grupo Espírita Francisco Xavier, foram utilizados os métodos de estudos de Satisfação Simples e método Survey. Caracteriza-se ainda por uma adaptação da escala de tipo Likert de 5 pontos e mescla de perguntas dicotômicas.

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

É considerado, pelos trabalhadores do Grupo Espírita Francisco Xavier, importante ter uma livraria com acervo de livros espirita-kardecista no GEFX. Segundo os entrevistados é importan-te haver um contato com a filosofia espírita através da literatura, e mesmo quem não possui o hábito de frequentar livrarias, tem ali, uma oportunidade de conhecer livros considerados bons. Foi comentado que a livraria serve como instrumento de divulgação das obras espíritas-karde-cistas. A comercialização de medicamentos homeopáticos para tratamento mediúnico também foi considerada importante, o principal motivo levantado é pelo tratamento espiritual realizado através do receituário mediúnico, auxiliando no tratamento físico.

As formas atuais de pagamento são consideradas satisfatórias, aceite à vista ou em cheque, mas, foi identificado como forma de melhoria e praticidade o uso de máquinas para cartão de crédito e débito. O espaço físico da Farmácia e Livraria foi considerado um empecilho para o acesso do público aos livros e a possibilidade de manuseio influenciaria na decisão de compra da maioria dos entrevistados. A identificação do livro exposto foi analisada pelos trabalhadores como fácil de ser encontrado, mas, poderá melhorar a qualidade do serviço se houver livre acesso.

A quantidade de atendentes foi considerada boa, mas nos momentos de fluxo, quatro aten-

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dentes proporcionarão melhora no desempenho. Os turnos considerados com maior dificuldade são à noite e no sábado à tarde. O turno considerado com maior facilidade para efetuar compras é durante as manhãs.

O ponto forte da Farmácia e Livraria do GEFX foi descrito como o atendimento olho no olho. O fato de ter alta variedade de títulos de livros espíritas e homeopatias é um diferencial, o espaço situado na entrada da casa espírita é agradável ao público. O bom atendimento das funcionárias foi avaliado como o de maior relevância.

Após a condução da análise dos dados, foi estabelecido o plano de ação com base na ferramenta 5W2H, definida por Werkema (1995, p. 33) como “um conjunto de contramedidas com o objetivo de bloquear as causas fundamentais”. O Quadro 1 mostra o resumo das ações propostas ao GEFX com o objetivo de melhorar os aspectos com grau de insatisfação para a Farmácia e Livraria.

Modelo 5W2H

O quê (What)?Criação de cartão

vale-presente.Contratação de uma

funcionária.

Colocação de máquinas de cartão nas funções débito/

crédito.

Modificação da bancada para

acesso externo, separação física

do local reservado aos medicamentos

e ampliação da Livraria.

Por quê (Why)?

Visto que a instituição não

dispõe de nenhuma ferramenta deste

tipo, tal mecanismo possibilitará a

execução de trocas de vale-presente por

livros de literatura adulta, infanto-juvenil e obras

básicas.

Para auxiliar o atual quadro de

funcionárias com a demanda diária,

principalmente nos turnos de fluxo intenso, e para não haver desfalque no

período de férias das atuais funcionárias.

Para facilitar as formas de

pagamento dos trabalhadores e frequentadores

do grupo espírita e aumentar as

vendas da Livraria e Farmácia.

Para agregar vantagens e benefícios à

Farmácia e Livraria, tornando a instituição

mais atrativa aos seus trabalhadores e

frequentadores.

Onde (Where)? Livraria do GEFX Livraria do GEFXLivraria e Farmácia

do GEFXLivraria e Farmácia

do GEFX

Quem (Who)?Diretoria e

funcionárias da Farmácia e Livraria

Presidência PresidênciaEngenheiro, Diretores e Presidência

Quando (When)? dez/15 jun/15 jun/15 ago/15

Como (How)?

Diretoria: elabora e envia a gráfica o modelo do cartão

para o vale-presente.

Presidência: Realiza as entrevistas e

contrata uma nova funcionária para

suprir a vaga deixada em aberto.

Presidência: realiza o orçamento e contratação da empresa

fornecedora, verifica os locais passíveis de

instalação.

Engenheiro: avalia a viabilidade da

modificação física do ambiente e realiza o desenho da planta.

Caixas: efetuam a comercialização dos cartões e posterior

troca por livros.

- -

Presidência e Diretores: realiza

o orçamento e contratação da mão-de-obra, Presidência:

aprova o projeto.

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26 PERCEPÇÃO DE VALOR DA FARMÁCIA E LIVRARIA DO GRUPO ESPÍRITA FRANCISCO XAVIER

Modelo 5W2H

Quanto (How much)?30 unidades de cartão R$13,00.

R$ 1.100,00

Pagamento único de R$90,00 + taxa de administração

mensal.

De acordo com o projeto, em média de

R$80.000,00.

Quadro 1: Resumo das Ações Propostas Fonte: Elaborado pelos autores (2015)

6 CONCLUSÃO

Com base na análise das respostas obtidas neste estudo, percebe-se que o objetivo do presente trabalho foi atingido, onde buscava-se verificar de um modo geral o nível de satisfação dos traba-lhadores do GEFX perante os serviços prestados na Farmácia e Livraria, bem como a percepção de valor empregada ao local.

De acordo com a percepção dos trabalhadores que participaram da pesquisa, a Farmácia e Livraria são vistas com importância, por propiciar o contato com a filosofia espírita através da literatura tanto quanto pelo tratamento espiritual realizado através do receituário mediúnico, auxiliando no tratamento físico.

Foi verificado que os trabalhadores atribuem valor ao bom atendimento prestado pelas fun-cionárias, a variedade do acervo de obras espíritas-kardecistas e valorizam o fato das receitas homeopáticas serem um diferencial. Em termos gerais, os trabalhadores sentem-se satisfeitos quanto ao atendimento das funcionárias, à qualidade dos produtos a eficiência e agilidade no atendimento.

O plano proposto com a ferramenta 5W2H, permitiu a criação de uma solução para cada item mencionado nas pesquisas com algum grau de insatisfação e/ou sugestão de melhoria. Conforme sugestão de melhoria, foi proposto a criação de um modelo para vale-presente, onde os consu-midores têm a possibilidade de presentar outras pessoas com as obras da doutrina espírita. A alocação de uma nova funcionária também foi sugerida, principalmente em virtude dos turnos em que há maior movimento de frequentadores no GEFX. A necessidade da ampliação das formas de pagamento foi o principal atributo marcado com grau de insatisfação nas pesquisas realizadas. Em virtude disto, foi proposto a colocação de máquina para aceite de cartões de débito e crédito. Por fim, foi proposta a abertura física do layout para visitação interna dos livros dispostos na Livraria, de forma a aumentar a interação das pessoas com o local.

Como limitação para esta pesquisa pode-se citar a dificuldade de encontrar uma maior quantidade de bibliografias atualizadas sobre o assunto marketing para organizações sem fins lucrativos. Quanto aos estudos no âmbito do marketing para organizações sem fins lucrativos, sugere-se que se realize uma pesquisa de marketing com outras instituições sem fins lucrativos e que efetuam comercialização de produtos e/ou serviços.

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28 O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA

ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

Maria de Fatima Matos Ferreira1

Terezinha Vicenti2

RESUMO

Este estudo se propôs a analisar o processo de inclusão dos alunos com deficiência no ensino regular na última década, pois, este processo teve muitos avanços, mas ainda tem muitos problemas na sua efetivação no cotidiano das escolas públicas, observando como os profissionais envol-vidos neste processo avaliam esta trajetória, como está o processo de formação dos professores, e quais as falas da comunidade escolar. Os dados foram analisados e revelaram que a pratica cotidiana de inclusão alcançou muitos avanços, mas que apresenta fragilidades na sua aplica-ção. Concluindo a pesquisa revela que ocorreram avanços na efetivação das políticas públicas, pois aumentou o número de alunos com deficiência no ensino regular, e também ocorreram mudanças positivas na Propos-ta Curricular de Santa Catarina, porém ainda temos dificuldade na efeti-vação das políticas públicas da inclusão, pois a legislação, mesmo, com avanços não garante a concretização do processo de inclusão.

Palavras Chave: Inclusão; Educação; Professores; Formação; Processo.

ABSTRACT

This study aimed to analyze the process of inclusion, of students with di-sabilities in regular education in the last decade, because this process has had many advances, but still has many problems in its effectiveness in the daily life of public schools, observing how the professionals involved in this process Evaluate this trajectory, how is the process of teacher training, and what the speeches of the school community. The data were analy-zed and revealed that the daily practice of inclusion, has reached many advances, but that presents weaknesses in its application. In conclusion, the study reveals that there have been advances in the implementation of public policies, as the number of students with disabilities in regular education has increased, and there have also been positive changes in the Curricular Proposal of Santa Catarina, but we still have difficulty in imple-menting public inclusion policies, since The legislation, even with advan-ces, does not guarantee the implementation of the inclusion process.

Keywords: Inclusion; Education; Teachers; Formation; Process.

1 Acadêmica do curso de Pós-Graduação em Educação Especial, da Universidade do Extremo Sul Catarinense.

2 Professora Orientadora, Mestre em Ciências da Educação.

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1 INTRODUÇÃO

O artigo surgiu do interesse em compreender a inclusão dos alunos com deficiência no ensino regular na última década, pois, este processo teve muitos avanços, mas ainda tem muitos pro-blemas na sua efetivação no cotidiano das escolas públicas.

A inclusão é um assunto novo, mesmo com todas as pesquisas realizadas, ainda, tem gerado inúmeros e interessantes discussões no que diz respeito à educação para todos, proporcionando um momento de valorização da diversidade humana e conduzindo a diversas transformações no contexto escolar.

Entendemos que a Educação Especial faz parte de “um todo” e para ter o seu valor reconhe-cido, é muito importante para esses alunos especiais tenham seu crescimento e desempenho educacional de qualidade, lembrando que a proposta curricular de Santa Catarina, tem em sua fundamentação essencial, a diversidade como princípio educativo.

Pensar a educação no contexto atual é refletir sobre os processos de inserção dos diversos grupos sociais nas instituições formativas e os impactos desta formação na construção de suas identidades. Analisar os processos de inserção demanda reflexões no âmbito das políticas e práticas de inclusão nos diversos espaços educativos. As políticas de inclusão social são fruto de lutas oriundas de movimentos sociais, com o olhar voltado para os excluídos e priorizados em suas necessidades, buscando promover a cidadania como direito essencial a vida.

O trabalho será realizado através de pesquisas bibliográficas, que responderá as seguintes perguntas de pesquisa: Como ocorre o processo de inclusão dos alunos com deficiência no co-tidiano escolar? Os professores estão preparados para atuar no processo de inclusão? Como a escola orienta a equipe escolar para a prática inclusiva? Esta pesquisa norteou-se pelo objetivo de: Compreender o processo de inclusão no cotidiano escolar na última década.

2 A TRAJETORIA DA INCLUSÃO ESCOLAR

A sociedade na atualidade, tem buscado novas formas de perceber e lidar com as deficiências, em suas especificidades. Neste sentido a criança com deficiência na escola regular vem conquis-tando um espaço maior, o acesso à educação com menos preconceito a respeito de sua deficiência. A história nos revela, que nem sempre a pessoa com deficiência teve reconhecimento e começar o processo de inclusão, foi uma trajetória de lutas e conquistas durante séculos, e ainda precisa continuar, pois, a inclusão deve se consolidar no coletivo.

Pois, são inúmeros os relatos dos problemas com as pessoas que apresentavam alguma forma de deficiência física ou mental, e foi só na Idade Contemporânea, a partir de políticas implementadas que teve início as conquistas de direitos das pessoas com deficiência. Assim, no decorrer da história, os países começaram a se preocupar com a reabilitação das pessoas com deficiência, enquanto o Brasil não possuía o interesse de garantir nenhum tipo de atendimento especializado para essas pessoas.

Com o passar do tempo, preocupados com a educação de pessoas com deficiência em decor-

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rência dos movimentos, no Brasil se dá o princípio da educação especial em 1854 e 1857, com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos atualmente: Instituto Beijamin Constant e o Imperial Instituto de Surdos-mudos (SOUZA, ROMERO, 2014).

No ano de 1954, no Rio de Janeiro, foi criada a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE, baseadas em um trabalho de educação e reabilitação. Nesse lugar existiam profissionais ligados à educação e também à área da saúde (SOUZA, ROMERO, 2014).

No final da década 1970 e início da década de 80, as crianças com deficiência começaram a ser integradas nas escolas regulares, e estas frequentavam apenas meio turno. Mesmo o cami-nho se abrindo, para mais tarde seguir rumo à inclusão, houve tentativas de retardar a educação inclusiva. (STAINBACK S. E STAINBACK W. 1999)

Pois, segundo os autores, no passado as pessoas que fossem deficientes eram excluídas da sociedade por causarem ameaças ao sistema social e de ensino, pois estes seriam obstáculos que prejudicariam a aprendizagem dos demais alunos. Por muito tempo o ensino acabava excluindo, gerando preconceitos e discriminação.

Na década de 1980, segundo Miranda (2003), começaram no Brasil diversos movimentos sociais em busca de direitos a pessoa com deficiência, estas conquistas foram muito significativas para reforçar a inclusão na sociedade. Nessa perspectiva, todos os alunos anteriormente excluídos devem ser inseridos na vida social e educativa, além disso, não permite que ninguém fique de fora do ensino regular, desde o início da escolaridade ao final de sua formação escolar, a meta do novo paradigma é incluir todos aqueles que se encontra em situação exclusão do sistema regular de ensino público. (MACHADO e NAZARI, 2014, p. 11)

Em 1988, então surge a Constituição Federal, que assegura novas diretrizes a Educação Es-pecial, estabelecendo que a educação seja direito de todos e dever do Estado e da família e todos devem ter igualdade de condições para o acesso e permanência na escola sem nenhum tipo de discriminação. (BRASIL, 1998, p. 2).

A Constituição garante o oferecimento da educação no ensino fundamental em seu “Art. 211.Após, surge em 1990 a Lei nº 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, que veio para reforçar “o direito a educação”. (BRASIL, 1990, p. 18). Além de assegurar educação no Ensino Fundamental, em seu Artigo I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito. (BRASIL, 1990, p.18).

Em junho de 1994, é realizada a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso E Qualidade realizada em Salamanca, na Espanha, em que estiveram presentes 88 governos e 25 organizações, inclusive o Brasil, reafirmando um compromisso com a Educação para Todos.

Esta declaração ressalta a garantia de acesso às escolas de ensino regular para crianças com deficiência e sua permanência, visando à aprendizagem. Assim, os mesmos presentes na Decla-ração demandaram aos governos que “Atribuam a mais alta prioridade política e financeira ao aprimoramento de seus sistemas educacionais no sentido de se tornarem aptos a incluírem todas as crianças, independentemente de suas diferenças ou dificuldades individuais”. E que adotem o princípio de educação inclusiva em forma de lei ou de política, matriculando todas as crianças em escolas regulares, a menos que existam fortes razões para agir de outra forma. Desenvolvam

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projetos de demonstração e encorajem intercâmbios em países que possuam experiências de escolarização inclusiva. (BRASIL, 1994, p. 02).

O educando é um cidadão que possui direito e deveres, cada qual com suas habilidades particu-lares que devem ser respeitadas. A Declaração de Salamanca ressalta que as escolas para serem realmente inclusivas, devem adotar um sistema flexível e adaptativo, levando em consideração a necessidade de cada um, para sim, contribuir para um sucesso educacional e inclusivo. Assim, “enfatizou a necessidade de uma abordagem centrada na criança objetivando a garantia de uma escolarização bem-sucedida para todas as crianças”.(BRASIL, 1994, p. 8).

Após dois anos, é sancionada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, no Brasil, que define o direito ao acesso da pessoa com deficiência no ensino regular, como estabelece o artigo 58, esta deve ser “oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.” (BRASIL, 1996, p. 19). Com a lei firmada, fez com que o país se mobilizasse para uma melhoria no sistema de ensino, em busca de uma educação de qualidade.

No ano de 2007, é lançado a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva – MEC 2008, um documento que integra os marcos históricos e normativos da educação especial, com o objetivo,

As leis vêm para garantir a educação e a cidadania, assim, para que todos os cidadãos tenham um ensino de qualidade, e as pessoas com deficiência o atendimento educacional especializado, que lhe é de direito.

“Mudanças essas que vão desde a ampliação arquitetônica, atitudinal e conceitual para as crianças com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nos contextos escolares, até a implantação de políticas públicas que visam à construção de práticas que permitam a efetiva participação desses alunos nos processos de ensino e de aprendizagem.” (DECHICHI, 2011, p.7).

Essa ação deve garantir os direitos de cada indivíduo na sociedade, reconhecendo suas po-tencialidades, diferenças e direitos. De acordo com Mantoan (2006 apud STRIEDER, 2013, p. 33) “o ato de inclusão vai muito além do simplesmente colocar o diferente dentro da escola normal, implica torná-lo parte do processo de aprendizagem, porque reconhecido em suas diferentes formas de aprender”.

O processo de inclusão deve abranger um todo, não recusando ninguém a sua prática. Pois, quando falamos em inclusão não devemos pensar somente no aluno com deficiência, mas sim, em um trabalho onde todos estejam envolvidos no processo, ou seja, inclusão é pensar no todo.

Carvalho (2008) relata que quando falamos em educação inclusiva, logo vem à mente um pressuposto, que o professor é fundamental no sucesso ou fracasso do aluno com deficiência. Sabemos que para construir uma escola inclusiva, é preciso que haja o envolvimento de todos na escola, direção, professores, funcionários, alunos e família, agindo em um papel conjunto em que todos participem do processo educacional.

A educação inclusiva hoje é uma realidade gradativamente implantada internacionalmente e

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nacionalmente que vem muito a beneficiar a todos da sociedade. Deste modo, a inclusão é um processo onde todos devem estar cientes de sua participação, principalmente a equipe de edu-cação escolar. A escola deve ser capaz de refletir seus planejamentos, práticas e espaços, a fim de aprimorar o seu ensino oferecido, e assim, possibilitar o pleno desenvolvimento e participação de seus alunos. A inclusão se faz com que os envolvidos tenham outro olhar sobre sua prática pedagógica podendo transformá-la, para que assim, compreendam e respeitem as diferenças de seus alunos. (STRIEDER, 2013, p.143)

2.2 A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA ATUALIDADE

Dos cinco milhões e setecentos mil alunos portadores de deficiência - dados oficiais do MEC de 1997, nós temos atendido a apenas a 1% da população brasileira atual. (FERREIRA, 1992)

O processo não-planejado ou uma inclusão incipiente em nosso sistema educacional. O que foi identificado através da pesquisa de ODEH (1998) apresentada no GT- de Educação Especial da Anped, que em síntese, a integração não-planeada, fenômeno difundido no hemisfério sul, se refere à presença de crianças com deficiências na sala comum sem apoio especializado, e evidentemente ocorre sem planejamento nem intervenção de caráter profissional ou legal. O fenômeno se dá em circunstâncias específicas aos países do Hemisfério Sul, onde a escassez e a baixa qualidade do atendimento especializado, bem como a carência de serviços diagnósticos precoce, fazem com que a escola regular se torne a única alternativa disponível. O assunto ganha importância na atualidade, pois as últimas propostas pertinentes a um outro tipo de integração escolar; este sim, planejado e promulgado em leis de diretrizes e bases, que vêm sendo incorpo-radas nos últimos anos ao discurso oficial dos variados países deste hemisfério (UNESCO, 1995), inclusive o Brasil”. (ODEH, 1998)

No Brasil, ocorreu um grande avanço, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996 (Lei n. 9.394/96) a educação especial passa a ser considerada como uma modalidade da educação escolar, devendo ser oferecida aos alunos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino. Conforme a LDB/1996, em seu artigo 3º, recomenda que seja composto por “professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses alunos nas salas comuns”. Sendo assim necessária toda uma estrutura ade-quada para a realização do trabalho com excelência.

Na atualidade, segundo Carneiro (2007) a Educação Especial precisa garantir a todos os alunos deficientes acesso à escola, removendo os obstáculos que impeçam a frequência e garantia de avançarem em seus estudos no ambiente escolar.

Segundo o autor deste modo a educação especial começa a ser entendida como, “uma mo-dalidade que perpassa como complemento ou suplemento, todas as etapas e níveis de ensino”. (CARNEIRO, 2007, p. 64)

Nesse sentido “olhar para essas condições é absolutamente necessário se quisermos ampliar a participação do deficiente no mundo onde várias esferas do simbólico convivem interligadas e

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interdependentes”. (PADILHA, 2005, p. 115).

“[...] antes de mais nada, definir-se quanto a sua concepção de sujeito, de mundo, tam-bém sobre sociedade, sobre deficiência e eficiência, desenvolvimento e aprendizagem para poder compreender mais e melhor sobre suas características e peculiaridades”. (Padilha, 2005, p. 108)

Deste modo a educação inclusiva é uma educação que vai além da escola, se fundamenta em “apoios e suportes, de trabalhos em equipes e de toda uma gama de mudanças institucionais que vão além da organização didática”. (CARNEIRO, 2007, p. 67).

A prática da inclusão social na atualidade se baseia em princípios diferentes do convencional: aceitação das diferenças individuais, valorização de cada pessoa, convivência dentro da diversi-dade humana, aprendizagem por meio da cooperação. E visível que a educação inclusiva é uma postura necessária no contexto educacional, e que a sua prática é fundamental e que precisa ser continua, e que não tem possibilidades de retrocesso.

No conceito de Díaz (2009) na atualidade muito tem se refletido e debatido sobre diferentes formas de organização escolar e social para acolher a diversidade humana, porém, não é ta-refa simples, pois, precisa mais do que estar incluído na escola. Sendo que, no espaço escolar apresenta múltiplos olhares sobre as práticas com distintos grupos e com relações evidentes às diferentes experiências, o que leva a refletir sobre as diferenças dessas práticas e discute a pers-pectiva do desenvolvimento pessoal que a educação inclusiva implica, todo o compromisso que a pratica verdadeira envolve em sua efetivação. Essa discussão abrange algumas das dimensões que interferem no processo de inclusão no contexto atual, e que podem favorecer o sucesso da inclusão escolar. Mesmo com os avanços, e os sistemas de ensino formulando políticas claras e decisivas em relação à inclusão, buscando aperfeiçoar os recursos da Educação Especial e da Educação em geral para qualificar as escolas de infraestrutura, equipamentos e recursos ma-teriais e didático-pedagógicos, necessários ao bom desenvolvimento das atividades escolares, ainda precisa superar várias problemas no processo de inclusão do aluno deficiente no ensino regular das escolas públicas.

3 METODOLOGIA

Esta pesquisa se caracteriza como pesquisa qualitativa do tipo explicativa e também bibliográ-fica. O tamanho da amostra, unidade de pesquisa e dimensão do trabalho seguirá a racionalidade da pesquisa qualitativa e bibliográfica.

3.1 UNIDADE DE PESQUISA

A pesquisa será realizada na biblioteca da Universidade do município de Criciúma sites e artigos da internet.

A pesquisa será realizada através de referências bibliográficas e desenvolvida nos meses de abril e maio de 2016, o instrumento utilizado para a pesquisa será pesquisa bibliográfica. Os

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34 O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

resultados serão discutidos quantitativamente.

4 ANALISE E DISCUSSÃO DE DADOS

O presente artigo tem como objetivo apresentar os resultados da pesquisa em que se discutiu e analisou as percepções e as vivências do processo de inclusão e suas implicações no contexto dos sujeitos com necessidades educacionais especiais em classes regulares na última década. Para alcançar esses objetivos, adotou-se a perspectiva teórico-metodológica, que toma como objeto de estudo o sujeito histórico, que se constitui na relação com a cultura.

Díaz (2009) relata que a educação inclusiva tem sido uma preocupação mundial, em que organizações internacionais e nacionais se mobilizam para assegurar que a escola, instituição responsável pela educação, possa receber e promover um ensino de qualidade a todos que nela ingressam. Neste sentido, requer considerar, as dificuldades individuais de cada educando sem discriminá-los, por características como: idade, sexo, etnia, língua, deficiência, classe social, entre outros.

Segundo o autor a inclusão no Brasil vem acontecendo lentamente, e nesse sentido, para que possamos ir adiante, é preciso contar com o comprometimento das instituições educacionais. A escola como o principal agente de transformação da educação, e é nela que estará ocorrendo, ou não, a busca pela garantia da educação como direito universal de todos, para tanto, ela deve estar aberta em aceitar e propor mudanças em sua organização. Desse modo, embora, não seja o único, o primeiro passo para que uma escola se torne inclusiva é garantir que todas as crianças e adolescentes dessa faixa etária, residentes nessa região, nela sejam efetivamente matricula-das (MEC/SEESP, 2004, v.3, p.15). Em outras palavras, a escola deve garantir o acesso de todos em idade escolar que residem na região onde presta seus serviços, como também garantir que:

“...Todo aluno matriculado deve estar frequentando a escola regularmente, para que possa efetivamente participar do processo educacional. Assim, é importante que a escola desenvolva estratégias para favorecer com que todos frequentem as aulas regularmente”. (MEC/SEESP, 2004, v.3, p.15).

A escola deve estar equipada e preparada para receber e ensinar a todos considerando a capacidade diferenciada de seus educandos de se interar das atividades nela realizada. Porém, a escola não basta estar fisicamente estruturada para ter resultados positivos, é preciso contar de forma efetiva com o apoio de funcionários de todo o segmento escolar, desde o porteiro que recebe os alunos num primeiro momento até o gestor responsável pelo bom funcionamento da instituição. Esta deve ainda assegurar a participação dos familiares (dos alunos) e membros da comunidade na qual o aluno está inserido buscando dessa maneira a reafirmação de uma edu-cação não excludente.

Um dos aspectos positivos do processo de inclusão é demostrado pelos dados do IBGE Dados do Censo Escolar indicam crescimento expressivo em relação às matrículas de alunos com defi-ciência na educação básica regular. Estatísticas indicam que no ano de 2014, 698.768 estudantes especiais estavam matriculados em classes comuns. Em 1998, cerca de 200 mil pessoas estavam

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matriculadas na educação básica, sendo apenas 13% em classes comuns. Em 2014, eram quase 900 mil matrículas e 79% delas em turmas comuns. “Se considerarmos somente as escolas públicas, o percentual de inclusão sobe para 93% em classes comuns”, explicou a diretora de Políticas de Educação Especial da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação. Estes dados demonstram a mudança na inclusão dos alunos no ensino regular aprestadas anteriormente por ODEH (1998), os dados mostram o crescimento do processo de inclusão no ensino regular de 1998 até a atualidade. (PORTAL BRASIL, 2015)

Diante da pesquisa observamos um crescimento muito grande dos alunos com deficiência na última década, demostrando que dar visibilidade ao problema, impulsiona mecanismos de orga-nização e implantação das lutas pela garantia de legislação especifica para garantir o processo de ampliação dos alunos com deficiência no ensino regular.

Outro aspecto positivo foi a atualização da Proposta Curricular de Santa Catarina (2014), que tem como princípio formativo a diversidade humana. O movimento exprime a necessidade de uma Educação Básica que reconheça e assuma a diversidade como um princípio formativo e fundante do currículo escolar.

Entende-se a diversidade como característica da espécie humana: seres humanos são diversos em suas experiências de vida históricas e culturais, são únicos em suas perso-nalidades e são também diversos em suas formas de perceber o mundo. Esta noção nos remete à ideia de diferenças de identidades constitutivas dos seres humanos, das suas organizações sociais, etnias, nacionalidades, gêneros, orientação sexual, religiosidades. Enfim, diversidades de grupos sociais, de identidades do ser social em sua singularidade que se constituem em espaços, em ambientes, em tempos históricos com características diversas. Essas relações socioculturais constituem os sujeitos históricos, nas organiza-ções de suas vidas sociais e políticas, nas suas relações com o ambiente e com outros grupos, na produção e reprodução de suas existências. (SANTA CATARINA, 2014, p.54)

Esta abertura da atualização das diretrizes de nosso Estado demostram a intenção de modificar a forma de estrutura o pensamento pedagógico da educação catarinense. Propondo, não somente a inclusão do aluno com deficiência no ensino regular, mas que o respeito e o conhecimento sobre as diversidades, se torne a base da educação de nosso Estado.

Porém, aspectos negativos também aparecem nas pesquisas, com maior relevância para a formação dos professores que trabalham com os alunos especiais no ensino regular. Citamos a pesquisa de Barbosa e Souza (2010) onde considera os aspectos relativos à profissão como essenciais à promoção de uma ação pedagógica de qualidade. Neste texto relata que para a ma-terialização de políticas públicas que ofereça melhores condições de trabalho aos professores, principalmente, da participação dos próprios professores, com o interesse de estudar e reivindicar as políticas públicas necessárias para a efetivação de uma prática de inclusão e não somente de o aluno estar inserido no cotidiano escolar. Portanto, é necessário um maior envolvimento dos docentes na construção de políticas públicas, pois são eles que enfrentam as barreiras e dificuldades do dia-a-dia da sala de aula. Apesar dessa importante consideração, parece que os professores não estão muito envolvidos com essas questões, conforme observa a pesquisadora

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36 O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

em seu relato no diário de campo:

Professora Maria relata que Márcio dá muito trabalho, pois não quer ficar dentro da sala de aula, além de falar muito alto e querer tirar a roupa dentro da sala, e isso está atra-palhando o desempenho dos outros alunos. Maria, no decorrer da aula, me perguntou se existia alguma lei que regulamentava a frequência de Márcio na sala de aula, e que também deveria ter alguma lei para defender os outros alunos, pois estavam sendo prejudicados pelo contato com Márcio (Observações registradas em Diário de Campo - 30/7/2009).

A fala da professora apresenta aspectos relevantes, no que concerne à sua percepção sobre inclusão: um deles é o fato de não conhecer as políticas públicas de inclusão. O autor coloca que não dizer que todas as professoras não têm esse conhecimento, mas essa ocasião chamou-nos muito a atenção, porque essa professora é tida como referência em processo de inclusão na escola, pelos inúmeros alunos que já atendeu, mesmo não tendo nenhuma especialização. Além disso, essa fala revela uma outra percepção de aluno com necessidades especiais: de que sua presença prejudica o desempenho dos outros alunos. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

Diante da complexidade revelada no processo de inclusão, fica clara a urgência de medidas a serem tomadas, sobretudo no que se refere ao professor. Apesar da grande quantidade de pes-quisas que têm como foco o professor, e dos inúmeros cursos de capacitação oferecidos pelas redes de ensino, parece que pouco tem se revertido em mudanças efetivas das práticas educa-tivas. Há necessidade, portanto, de estudos mais aprofundados que desvelem os aspectos que sustentam representações e percepções que interferem negativamente nas práticas de inclusão. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

O autor evidencia nas falas de sua pesquisa, o sofrimento das professoras manifestado pela frustração, pelo sentimento de abandono. Foi isso que vimos, também, nos momentos que pas-samos na escola: a professora fica sozinha com o aluno, no meio de todos os outros e tem de dar conta dele e de todos os outros. A primeira ideia trazida pelas professoras foi de que o processo de inclusão é válido por questões políticas e sociais.

Diante da complexidade revelada no processo de inclusão, fica clara a urgência de medidas a serem tomadas, sobretudo no que se refere ao professor. Apesar da grande quantidade de pes-quisas que têm como foco o professor, e dos inúmeros cursos de capacitação oferecidos pelas redes de ensino, parece que pouco tem se revertido em mudanças efetivas das práticas educa-tivas. Há necessidade, portanto, de estudos mais aprofundados que desvelem os aspectos que sustentam representações e percepções que interferem negativamente nas práticas de inclusão. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

Na pesquisa de Villela (2013) mostra que muitas vezes os profissionais envolvidos com a edu-cação tem se mostrado apáticos diante da estrutura educacional existente no país, e resistem em mudar o seu jeito de trabalhar, não vendo saída para alterar sua prática pedagógica cotidiana. Pois, fato de as classes serem muito numerosas, tem alunos indisciplinados, matérias inadequa-das, falta de apoio das instituições bases e da equipe gestora, falta de recursos multimídias são apenas alguns dos problemas encontrados pelos educadores.

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As indagações de Mrech, (2001) sobre a condição de preparo e formação pedagógica para os professores do ensino especial estão sendo preparados para auxiliar os professores do ensino regular, traz uma resposta negativa.

Pois, segundo o autor “ O fato da formação do professor para a educação especial ter sido incluída como habilitação dentro de um curso que, regra geral, tratou a formação docente como subproduto da formação do especialista, contribuiu, de forma decisiva, para que se formasse um docente especializado, com muita pouca formação como professor.

Da mesma forma, os professores do ensino especializado também não foram preparados para trabalhar com professores do ensino regular e os alunos comuns, eles aprenderam apenas a lidar com o contexto das especificidades das deficiências dos seus alunos. (BUENO,1998, p.15):

Assim, pode-se perceber que o Brasil tem lidado com a transição do Paradigma de Inte-gração para o da Inclusão com um enorme despreparo.  O professor do ensino regular não aprendeu a lidar com os alunos diferentes ou deficientes.

Portanto, o que acaba acontecendo, é que nem o professor do ensino regular encontra-se preparado para trabalhar com o aluno deficiente e nem o professor do ensino especial encontra--se preparado para dar uma assessoria aos professores do ensino regular. Neste situação, as práticas educativas tanto da Educação Comum, da Educação Especial e das agências formadoras acabam deixando lacunas em aberto, onde ainda não foi completado o ciclo para uma pratica educativa coerente.

Portanto, observamos que os alunos da classe especial integram o grupo de excluídos da escola, ou seja, primeiramente, da escola especial e, posteriormente, da escola regular, sendo que estes alunos são parte da história de exclusão, e a escola é parte integrante da história da sociedade, perpetua a exclusão, maquiada por discursos cheios de “inclusão”.

Diante das falas, visualizamos um cenário onde a integração não-planejada na rede regular de ensinou uma inclusão que não é ainda decidida e adotada, no plano da consciência, pelos edu-cadores tanto do ensino comum quanto do ensino especial. É neste cenário que vamos encontrar os profissionais para fazer a passagem dos professores do ensino regular para a Educação In-clusiva. É nesta transição planejada da educação especial para o ensino regular que se encontra um espaço que precisa de aproximação e integração entre os dois segmentos para resolver as lacunas deixadas pelo processo. (MRECH, 2001)

Para a análise reflexiva destacamos as palavras de Barbosa e Souza, (2010) onde os dados acessados de sua pesquisa revelam os conflitos desencadeados pela inclusão de alunos com ne-cessidades especiais: o fato de não saber como trabalhar com o aluno leva o professor a buscar fora de sua sala de aula as causas para o insucesso que vivencia. Assim, muitas vezes, trava-se uma luta entre os professores, e neste caso, as professoras da Educação Especial e as de clas-ses regulares, que, ao invés de se unirem, aproveitando uma política pública que visa promover a inclusão (independentemente de ser ou não a mais adequada), optam por competir entre si, em um jogo de culpabilização e desresponsabilização que em nada contribui para o processo de inclusão, mas, ao contrário, cria um clima prejudicial a todos os alunos e professores da escola.

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38 O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

Também constatamos nas palavras dos autores que na escola não se exercita a escuta, visto que os professores têm uma visão cristalizada sobre o que e quem são o aluno, a escola e a famí-lia, o que inviabiliza o diálogo e a reflexão. Resultam desse fato as dificuldades de comunicação, compreensão e sensibilidade em todas as instâncias de relações. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

Para Beyer (2006), a escola que se pretende inclusiva, tem o desafio de construir e colocar em prática no ambiente escolar, uma pedagogia válida para todos os educandos, “capaz de atendê-los em suas situações pessoais e, cujas características de aprendizagem requeiram uma pedagogia diferenciada. Tudo isto deve se dar sem demarcações, preconceitos ou atitudes nutridoras dos indesejados estigmas”. Ao contrário, pondo em andamento, na comunidade escolar, uma cons-cientização crescente dos direitos de cada um. Sendo assim, a inclusão caminha no sentido de garantir igualdade de direitos a todos que buscam a educação.

Segundo Serra (2008), é nesta declaração que o movimento da inclusão de alunos com neces-sidades especiais toma corpo gerando discussões importantes em todo mundo. Ainda, propõe que governos e organizações sejam guiados pelo espírito de suas propostas e recomendações e que, desta forma, cada criança possa ter a oportunidade de conseguir e manter um nível aceitável de aprendizagem. Onde os sistemas educativos sejam implementados com a devida diversidade, a fim de que cada criança ou jovem tenha acesso às escolas regulares.

Reconhecemos que, para a inclusão se concretizar, é necessária uma mobilização em vários âmbitos, como o político, o social e o institucional, no entanto, como nossa proposta era discutir o papel do professor nesse processo, priorizamos a análise da importância de seu papel nesse contexto, ressaltando, contudo, que a questão da inclusão não pode ser tomada como responsa-bilidade unicamente do professor. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

Para o autor, o empenho do professor na busca por resolver os problemas que se colocam em sua prática interfere, de forma decisiva, no desenvolvimento do aluno com necessidades especiais. Desta forma, o sucesso ou não da inclusão depende, em grande medida, das atitudes e crenças do professor. Desta forma os professores, funcionários, diretores, funções distintas, mas que precisam agir coletivamente para que haja inclusão escolar. E cabe ainda ressaltar, os processos de formação continuada a todos ligados a esse processo, pois é de extrema importância.

Segundo Prieto (2006), com o grande aumento de alunos com deficiência às classes comuns, o sistema de ensino vem exigindo investimentos, melhores formações para assegurar permanência e aprendizagem de alunos com deficiência. Assim, impondo novas exigências para educação inclusiva.

De acordo com Nascimento (2009, p. 4),

“Na medida em que a “orientação inclusiva implica um ensino adaptado às diferenças e às necessidades individuais, os educadores precisam estar habilitados para atuar de forma competente junto aos alunos inseridos nos vários níveis de ensino”.

Os educadores precisam estar em constante formação, a fim de buscar práticas que atendam às necessidades de cada um, garantindo acesso e permanência na escola, pois o professor que tem em sua sala uma criança com deficiência intelectual ou outra deficiência precisa planejar suas aulas onde todos estejam incluídos, pois o aluno com deficiência não é apenas responsabilidade

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 39

do segundo professor, mas de todos.

Padilha (2005, p.108) aponta que:

“A baixa expectativa que se tem da aprendizagem dos deficientes [...] diminui também o empenho da escola na utilização de recursos especiais para que aconteça o desenvolvi-mento das esferas do simbólico, ficando insistentemente pressas ás atividades práticas.”

Segundo Mantoan (2004, p. 79) “ensinar, realmente não é uma tarefa simples, exige novos conhecimentos, e que muitas vezes contradizem o que lhes foi ensinado e o que utilizam em suas práticas. ” Porém a formação deve lhe permitir uma visão mais ampla, novos conhecimentos, que o qualifiquem para as suas práticas, sendo possível atender a diversidade.

Outro aspecto relevante nas pesquisas e necessidade da adaptação curricular, perante as trans-formações impostas pela sociedade ao processo de inclusão, ressaltamos o papel fundamental da escola e profissionais e a adaptação curricular para um ensino que atenda toda a diversidade escolar. Pois, é necessário um currículo aberto e flexível é condição fundamental para respon-der à diversidade, já que permite tomar decisões refletidas e ajustadas às diferentes realidades sociais, culturais e individuais, mas não é uma condição suficiente. (BLANCO, 2004, p.291).

Segundo o autor, para poder assegurar a igualdade de oportunidades é preciso que cada escola reflita e planeje de forma conjunta sua ação educacional mais adequada a sua diversidade, “deve ser o referencial da educação de todos os alunos, fazendo as adaptações que sejam necessárias e proporcionando-lhes as ajudas e recursos que favoreçam a obtenção das aprendizagens nele estabelecidas”.

O que constatamos nesse estudo é que a exposição permanente dos professores ao fracasso no processo de inclusão/exclusão gera grande sofrimento, o que, a nosso ver, está na base do adoecimento que relatado por muitos profissionais. Logo, adoecimento gerado não pelo aluno com necessidades especiais ou por suas famílias, mas pelas condições em que realizam ou tentam realizar suas ações docentes, as quais envolvem aspectos organizacionais, institucionais, sociais, políticos, identitários, dentre outros. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

Enfim, esses questionamentos são sem dúvida de extrema importância para o avanço do processo de inclusão, e entendemos que os professores têm um grande papel nesse processo, ao passo que poderão oferecer contribuições para a compreensão das relações complexas e conflitantes envolvendo o processo de inclusão e buscar melhores condições de trabalho e desenvolvimento aos sujeitos envolvidos, como professores, alunos, gestão, entre outros. (BARBOSA E SOUZA, 2010)

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como observamos na pesquisa, nos leva a concluir que o processo de inclusão na escola está ocorrendo de forma irregular, e na realidade muitas vezes causando sofrimento aos alunos com necessidades educacionais especiais e aos professores, demostrando muitas fragilidades no processo destes alunos no ensino regular.

Pesquisa mostra que o processo ainda precisa de muitas reflexões e valorização, pois, desde a

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40 O PROCESSO DE INCLUSÃO DO ALUNO DEFICIENTE NO ENSINO REGULAR PÚBLICO NA ÚLTIMA DÉCADA NO BRASIL

implementação da Lei da inclusão, houve uma evolução, com um aumento de 90% dos alunos com deficiência no ensino regular na última década, porém o aluno estar inserido no ensino regular não garante que ele realmente esteja incluído no processo de ensino e aprendizagem. Durante o processo, percebemos que principalmente os professores ainda enfrentam desafios, e outros aspectos relacionados à estrutura pedagógica e física para incluir alunos com deficiência, e neste aspecto precisam avançar na efetivação da inclusão propriamente dita.

Embora discursos oficiais normatizem este processo, cada ato normativo traduz a dimensão da implementação, atingindo as diferentes etapas e modalidades educacionais em que se apre-sentam no interior das escolas. No entanto, muitas vezes falta articulação entre eles, tornando, assim, mais difícil seu cumprimento, apesar de terem como ponto comum a educação básica.

Para a efetivação do processo de inclusão é necessário que todos os envolvidos com a educação assumam o compromisso de incluir, e que os professores se tornem de fato conhecedores do processo de inclusão e trabalhem com os alunos com deficiência sem pré conceitos, buscando garantir os direitos destes alunos. Sendo que, a ausência do comprometimento das políticas públi-cas, com certeza, contribuem para o aumento das probabilidades de que as crianças abandonem as escolas ou ficarem somente inseridas no ensino regular.

Quando levamos em conta a diversidade como princípio educativo no planejamento da escola, devemos ter a consciência do trabalho em grupo e individual, de modo a contemplar as necessida-des de cada aluno e níveis e formas diferente de planejar. Ainda que leve em conta a diversidade, muitas vezes algumas necessidades do aluno não são contempladas, sendo preciso o professor adaptar o currículo de forma individual. Finalizando, podemos dizer que a adaptação curricular é significativa no processo de inclusão do aluno com deficiência, por atender as possibilidades e necessidades de cada um, de forma a tornar sua aprendizagem mais interessante e eficiente.

Finalizando, os docentes precisam conhecer os avanços da legislação e das práticas educativas, no que diz respeito ao atendimento de crianças com necessidades educacionais especiais, e exigir a efetivação das políticas públicas em todos os aspectos que envolvem o processo de inclusão. Em relação ao apoio enfatizado pelas docentes, podemos salientar a carência de apoio por parte de profissionais especializados e de materiais pedagógicos adequados para cada deficiência. Estes aspectos citados, precisam ser superados por medidas que conjuntas entre os profissionais e políticas públicas comprometidas com o sucesso do processo de inclusão.

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44 A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E OS CAMINHOS DO DIREITO PENAL

A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E OS CAMINHOS

DO DIREITO PENAL

Andrey Henrique Andreolla1

RESUMO

Objetivou-se, com o presente artigo, analisar a realidade do sistema car-cerário nos dias atuais, seus estigmas e as principais consequências que proporciona aos seus usuários. Buscando separar a teoria da realidade, se percebe um processo inverso de socialização, no qual o apenado é so-cializado para a realidade que passará a encontrar dentro da prisão, e não aquela que espera por ele ao sair de trás das grades. Constatado que as funções da pena não subsistem no meio carcerário, o instituto da privação da liberdade provoca resultados diferentes do que dele se esperam, além do alarmante índice de reincidência e a não coibição do cometimento de novos tipos penais. Dessa forma, o direito penal encontra caminhos para sanar tais problemas. Dentre os principais caminhos, destacam-se, como opostos, o direito penal máximo e o direito penal mínimo, através do ga-rantismo penal, e também a teoria abolicionista, mais radical, que busca a substituição de um sistema considerado falido por outras formas de agir pelo direito penal, a fim de diminuir a população carcerária e, com isso, as problemáticas apresentadas pelos usuários que a frequentam. Neste estudo, foi utilizado o método analítico-descritivo, por meio da pesquisa bibliográfica.

PALAVRAS-CHAVE: Funções da pena; realidade do sistema carcerário; direito penal máximo; garantismo; teoria abolicionista.

ABSTRACT

The objective of the present article analyzes the reality of the prison sys-tem today, the stigmata and the main consequences it provides to its users. Seeking to separate theory from reality, to realize a reverse process of socialization in which the convict is socialized to the reality that will find inside the prison, and no one who waits for him to come out from behind bars. Found that the functions of the penalty does not exist in the middle prison, the freedom deprivation Institute causes different results than it expected, in addition to the alarming rate of recidivism and not avoidance of the commission of new crimes. Thus, the criminal law finds ways to remedy such problems. Among the main ways, stand out as opposites, the maximum criminal law and the minimum criminal law through criminal

1 Acadêmico de curso de Direito da Universidade Regional Integrada – Campus de Erechim. E-mail: [email protected] Esse artigo é a segunda parte de um trabalho para conclusão de curso nos moldes de pesquisa monográfica para obtenção do título de bacharel de direito, que busca analisar a crise da pena privativa de liberdade e as soluções propostas pelo direito penal para sanar tal crise, com enfoque nos ideais da teoria abolicionista. A primeira parte do trabalho foi publicada na Revista Perspectiva, da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI Campus de Erechim, edição número 150.

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garantismo, and also the abolitionist theory, more radical, which seeks to replace a system considered bankrupt by other forms of action by criminal law, in order to reduce the prison population and, therefore, the problems presented by users who attend. In this study, we used the analytical des-criptive method, through bibliographic research.

KEYWORDS: Penalty functions; reality of the prison system; maximum cri-minal law; garantismo; abolitionist theory.

1 INTRODUÇÃO

A pena de prisão não cumpre as funções para as quais ela existe. A privação de liberdade, hoje, não ressocializa, não transforma seu usuário, que lá está pelo cometimento de algum tipo penal, a conviver em sociedade; pelo contrário, socializa o apenado a uma cultura carcerária em que os estigmas advindos da sua estadia na cadeia são graves. As consequências, para o apenado, para sua família e para a sociedade, comprovadamente, são o oposto daquilo para que a privação da liberdade e a instituição carcerária foram criadas. E, tão preocupante quanto, não trava a rein-cidência e não impede o cometimento de novos crimes. Com isso, a sua população só aumenta.

Demonstrados tais fatos, que se apresentam como a realidade do sistema prisional, o direito penal busca caminhos para sanar a crise em que se encontra a instituição carcerária.

Em um primeiro momento, o direito penal máximo pretende coibir toda e qualquer ação, por meio de um rigoroso sistema repressivo, almejando, com isso, a prevenção de tipos penais mais gravosos pela punição aos crimes considerados menores. Na mesma família do direito penal máximo, cabível o estudo do direito penal do inimigo, que divide o direito em dois: direito penal do cidadão, de um lado, e, do outro, o próprio direito penal do inimigo – ou seja, para o inimigo. Na dúvida, pune-se, a fim de evitar novos delitos.

Como um contraponto, o direito penal mínimo busca levar ao âmbito criminal o fato quando não existe outra possibilidade de resolução do caso, se não na seara penal. Representado no presente estudo, principalmente, pelo garantismo penal de Luigi Ferrajoli, esta corrente defende algumas garantias para o cidadão permanecer protegido do arbítrio estatal na aplicação do jus puniendi, assim como, em caso de dúvida, esta ser resolvida em favor do réu. Ou seja, na dúvida, o réu é considerado inocente.

Por fim, buscando a eliminação do sistema penal conhecido, por considera-lo falho e ineficaz, a teoria abolicionista traz novas formas de resolução dos conflitos causados pelos hoje conside-rados tipos penais.

O estudo da teoria abolicionista, seus ideais, objetivos e referenciais teóricos se dará em um próximo artigo, visto que o presente faz parte de um trabalho para conclusão de curso nos moldes de pesquisa monográfica, sendo o segundo capítulo de tal trabalho, tendo em vista que o primeiro – que trata acerca das funções da pena de prisão em um contexto histórico – já se encontra publicado.

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46 A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E OS CAMINHOS DO DIREITO PENAL

Neste estudo, foi utilizado o método analítico-descritivo, por meio de pesquisa bibliográfica.

2 SEPARANDO A TEORIA DA REALIDADE

Ao se falar em restrição de liberdade, devem-se separar as teorias da realidade prisional, buscando-se enxergar a privação de liberdade tal como funciona hoje. Analisam-se, então, em um primeiro momento, os discursos do sistema penal. Estes discursos,

[...] jurídico, criminológico, policial, penitenciário, judicial e político proclamam o fim e a função preventiva do sistema penal. Isto pode ser entendido em dois sentidos: o sistema penal teria uma função preventiva tanto “especial” como “geral”, isto é, por um lado buscaria a “ressocialização” do apenado e, por outro, advertiria aos demais sobre a inconveniência de imitar o delinquente. (ZAFFARONI, PIERANGELI, 2001, p. 73).

Entretanto, a realidade não condiz com a teoria. E tal fato demonstra-se de extrema impor-tância, uma vez que para entender o sistema penal, deve-se analisa-lo da forma tal qual hoje ele é executado. Neste sentido,

Na verdade, a questão da privação de liberdade deve ser abordada em função da pena tal como hoje se cumpre e se executa, com os estabelecimentos penitenciários que temos, com a infraestrutura e dotação orçamentária de que dispomos, nas circunstâncias atuais e na sociedade atual. Definitivamente, deve-se mergulhar na realidade e abandonar, de uma vez por todas, o terreno dos dogmas, das teorias, do deve-ser e da interpretação das normas. (BITENCOURT, 2011, p. 162).

Vista como uma espécie de solução para a problemática da criminalidade, a cadeia toma uma proporção diferente daquela que se propõe, e

Sem dúvidas, os maus tratos, a tortura, os vexames e as ameaças, usuais na prática dos órgãos policiais, tornam-se altamente deteriorantes como condicionamento criminali-zar. No entanto, a parte mais importante da deterioração condicionante fica por conta da instituição total que conhecemos com o nome de prisão. (ZAFFARONI, 1991, p. 135).

Logo, resta demonstrada a ineficácia da prisão como resposta para os problemas penais que se propôs a resolver, com os fins de ressocializar seu usuário e prevenir a criminalidade.

3 A PRISÃO COMO PRINCIPAL RESPOSTA PENALÓGICA PARA OS PROBLE MAS DE CRIMINALIDADE

A partir do momento em que a prisão converteu-se na principal resposta penalógica, a partir do século XIX, acreditou-se que ela poderia ser um meio idôneo para realizar todas as finalidades da pena e, posteriormente, reabilitar o delinquente. Tal situação não se mostrou concreta na prática, situando a pena privativa de liberdade dentro de uma verdadeira crise, que abrange, inclusive, o seu objetivo ressocializador, tendo em vista a impossibilidade deste de obter qualquer efeito positivo sobre o apenado (BITENCOURT, 2011).

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Quanto à prevenção, o entendimento de Zaffaroni e Pierangeli (2001) é de que de forma alguma se prova que o sistema penal previna condutas criminais por parte dos que não tenham delinquido. Já, no que tange à parte da ressocialização, observa-se a

[...] inevitável deterioração psíquica – às vezes irreversível – que acarreta uma prolongada privação de liberdade, o que contribuiu para evidenciar a suspeita de que o “tratamento” era um produto de justificação ideológica, o que foi reforçado pela ação direta dos próprios prisioneiros denunciando sua situação e suas técnicas de sobrevivência (organizações de presos, comissões internas nos cárceres, dirigentes e porta-vozes em motins). Isto levou a que hoje se fale abertamente no mundo do “fracasso da prisão” da franca crise da “ideologia do tratamento”, que batem em aberta retirada inclusive nos países em que realmente se quis realiza-la. (ZAFFARONI, PIERANGELI, 2001, p. 75).

Molina (1975, p. 91, apud BITENCOURT, 2011, p.162, 163) entende que a ineficácia da pena privativa de liberdade se dá, em primeiro lugar, considerando o ambiente carcerário como um todo. Ele se mostra, na prática, como uma antítese com a comunidade livre, tornando-se um meio artificial, antinatural, que não permite realizar nenhuma forma de reabilitação do recluso. Nesse sentido, entende-se

[...] que é mais difícil ressocializar a uma pessoa que sofreu uma pena do que outra que não teve essa amarga experiência; que a sociedade não pergunta por que uma pessoa esteve em um estabelecimento penitenciário, mas tão somente se esteve lá ou não. (MOLINA, 1975, P. 91, apud BITENCOURT, 2011, p. 162 e 163).

Apesar de o discurso atual se dar em face da ressocialização e reabilitação aos usuários do sistema penal, existem fatores materiais, psicológicos e morais dentro da realidade carcerária que demonstram a ineficácia quanto ao alcance dessas metas. Os alojamentos e a alimentação são deficientes, o que contribui para deteriorar a saúde dos detentos. Mesmo em realidades onde estes existem em uma melhor condição, não há uma distribuição adequada do tempo dedicado ao ócio, ao trabalho, ao lazer e ao exercício físico do apenado, causando danos em sua condição físico-psíquica. Além disso, a prisão é um lugar onde se dissimula e se mente, contribuindo para o amadurecimento criminoso do recluso. Por fim, a segregação de uma pessoa do seu meio social, principalmente quando por mais de dois anos presa, ocasiona a difícil reinserção desta à sociedade (BITENCOURT, 2011).

4 A VIDA ATRÁS DAS GRADES: A PRISIONALIZAÇÃO DO INDIVÍDUO E SEUS REFLEXOS NA VIDA DO APENADO

Ainda, há de se falar na questão da prisionalização do apenado, ou seja, todo o processo de socialização dele dentro da cadeia, visando a sua própria ressocialização. Ao invés da privação de liberdade, como já visto, buscar a possibilidade de reinserção do preso em sociedade, “a adap-tação ao mundo prisional equivale à desadaptação à vida em liberdade, uma vez que o apenado adapta-se, em verdade, é a uma subcultura carcerária” (TRINDADE, 2003). Desta feita,

[...] o recluso adapta-se às formas de vida, usos e costumes impostos pelos próprios

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internos no estabelecimento penitenciário, porque não tem outra alternativa. Adota, por exemplo, uma nova forma de linguagem, desenvolve hábitos novos no comer, vestir, aceita papel de líder ou papel secundário nos grupos de internos, faz novas amizades, etc. essa aprendizagem de uma nova vida é mais ou menos rápida, dependendo do tempo em que estará sujeito à prisão, do tipo de atividade que nela realiza, sua personalidade, suas relações com o mundo exterior, etc. A prisionalização, enfim, tem efeitos negativos à ressocialização que o tratamento dificilmente poderá evitar. (CONDE, 1987, p. 73, apud BITENCOURT, 2011, p. 191).

No entendimento de Baratta (2011), o sujeito privado de sua liberdade, no sistema carcerário, é analisado por um duplo ponto de vista. Em um primeiro momento, ocorre a desculturação, ou seja,

[...] a desadaptação às condições necessárias para a vida em liberdade (diminuição da força de vontade, perda do senso de autorresponsabilidade do ponto de vista econômico e social), a redução do senso da realidade do mundo externo e a formação de uma imagem ilusória deste, o distanciamento progressivo dos valores e dos modelos de comportamento próprios da sociedade externa. (BARATTA, 2011, pg. 184).

Ainda, há o segundo ponto de vista, que á a aculturação do apenado. Essa situação comporta a

[...] assunção das atitudes, modelos de comportamentos, dos valores característicos da subcultura carcerária. Estes aspectos da subcultura carcerária, cuja interiorização é inversamente proporcional às chances de reinserção na sociedade livre, têm sido exa-minados sob o aspecto das relações sociais e de poder, das normas, dos valores, das atitudes que presidem estas relações, como também sob o ponto de vista das relações entre os detidos e o staff da instituição penal. (BARATTA, 2011, p.184 e 185).

Pode-se concluir, portanto, que o atual sistema apresenta um resultado inverso daquele que lhe é cobrado. Então,

Ingressando no meio carcerário o sentenciado se adapta, paulatinamente aos padrões da prisão. Seu aprendizado, nesse mundo novo e peculiar, é estimulado pela necessidade de se manter vivo e, se possível, ser aceito no grupo. Portanto, longe de estar sendo ressocializado para a vida livre está, na verdade, senso socializado para viver na prisão. É claro que o preso aprende rapidamente as regras disciplinares na prisão, pois está interessado em não sofrer punições. Assim um observador desprevenido pode supor que um preso de bom comportamento é um homem regenerado, quando o que se dá é algo inteiramente diverso: trata-se, apenas, de um homem prisonizado. (PIMENTAL, 1983, p. 158, apud TRINDADE, 2003, p. 44).

O usuário do sistema carcerário, condenado, se torna vítima da própria sociedade, que o enca-minha para trás das grades por uma falsa sensação de prevenção e segurança. Enquanto a prisão não ressocializa, ela ajuda a aumentar os índices da criminalidade, seja pelos seus ineficazes meios de ressocialização, seja pelo estigma que ela causa à vida do usuário quando ele sai desse meio e busca voltar ao convívio com seus semelhantes após passar meses, quiçá anos, atrás das grades.

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5 CADEIA: A (TRÁGICA) CONSTATAÇÃO DE UMA REALIDADE QUE SE BUSCA EVITAR

Na instituição penitenciária, o preso não passa de uma figura anônima, uniformizada, nume-rada, despojada de seus bens, afastada de sua família. Torna-se amedrontado pela realidade, é frequentemente revistado, castigado, passa a utilizar o linguajar que predomina no ambiente prisional (TRINDADE, 2003). O apenado, tão logo, precisa se integrar a uma nova forma de viver, que não o torna apto à vida fora da prisão. Então,

O desejado sentido ressocializador da pena, na verdade, configura apenas um fantás-tico discurso retórico para manter o sistema, o que traduz, na realidade, um evidente malogro, desperdício de tempo par ao prego e gasto inútil para o Estado, que retira da sociedade um indivíduo por apresentar comportamento desviante e o transforma num irrecuperável, pois a reincidência atinge ao alarmante índice de mais de 70% no país, e mais de 80% no mundo. Daí, dizer-se, a prisão fabrica o reincidente. O preso primário de hoje será o reincidente de amanhã, fechando-se o círculo irreversível da prisão, que tem como consequência o custo do delinquente em si e da delinquência que produz. [...] A prisão é um mal em si mesma. Estabelecimento fechado, de regime totalitário, prisonaliza a mentalidade de todos os seus ocupantes: presos, guardas, carcereiros, funcionários, psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais e diretores, mantendo-os sob constante tensão e desconfiança. (OLIVEIRA,2003, p. 249 e 250).

Acerca da reincidência, seu elevado índice, por si só, “atesta suficientemente o fracasso e as falhas do sistema prisional que perdura há dois séculos, com todas as suas mazelas e descala-bros” (OLIVEIRA, 2003). Concluindo,

É necessário advertir que no sistema penal não se trata simplesmente de um acordo externo, mas também de sério tratamento integrado em um complexo processo de deterioração, cuja parte mais importante é feita pela prisão ou cadeia e perfeitamente legalizado através de registros de reincidência, da possibilidade de impedir ou dificultar qualquer exercício de trabalho honesto por parte das agências do sistema penal que se ocupam de propagar o status do criminalizado, de privar de liberdade periodicamente a pessoa, convertendo-a em um suspeito profissional, de tomar os antecedentes como provas de culpa, inclusive por parte dos juízes, etc. (ZAFFARONI, 1991, p. 134 e 135).

Em confronto, portanto, os objetivos que se almeja por meio da pena de prisão com a realidade que ela se apresenta aos usuários e à sociedade, percebe-se que a privação de liberdade não atinge os fins desejados. Nesse sentido,

Este primeiro mal arrasta outros, que atingem o preso em todos os níveis de sua vida pessoal. Perdendo a liberdade, aquele que vivia de salário e tinha um emprego, ime-diatamente perde este emprego. Ao mesmo tempo, perde a possibilidade de manter sua casa e assumir os encargos de família. Se vê separado desta família, com todos os problemas morais que isto acarreta: sua esposa ou companheira às voltas com forças hostis (vizinhos mal intencionados talvez, ou um patrão a exigir que ela se demita...), seus

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filhos daí pra frente marcados pelo estigma – “seu pai esteve na prisão”. Bruscamente cortado do mundo, experimenta um tal distanciamento de tudo que conhece e amou. (HULSMAN; CELIS, 1993, p. 61).

Tornando-se, portanto, uma instituição que não atinge os fins penais que almeja, pode-se concluir que

A prisão ou cadeia é uma instituição que se comporta como uma verdadeira máquina deteriorante: gera uma patologia cuja principal característica é a regressão, o que não é difícil de explicar. O preso ou prisioneiro é levado a condições de vida que nada têm a ver com as de um adulto: é privado de tudo que o adulto faz ou deve fazer usualmente em condições e com limitações que o adulto não conhece (fumar, beber, ver televisão, comunicar-se por telefone, receber ou enviar correspondência, manter relações sexuais, etc.). por outro lado, o preso é ferido na sua autoestima de todas as formas imagináveis, pela perda de privacidade, de seu próprio espaço, submissões a revistas degradantes, etc. a isso juntam-se as condições deficientes de quase todas as prisões: superpopula-ção, alimentação paupérrima, falta de higiene e assistência sanitária, etc., sem contar as discriminações em relação à capacidade de pagar por alojamentos e comodidades. (ZAFFARONI, 1991, p. 136).

Esse cenário evidencia uma crise no âmbito do sistema punitivo, pois a instituição central desse sistema, ao invés de proporcionar a reforma do apenado, transforma-o em um produto proveniente da cultura carcerária, que adota padrões de comportamento não esperados dentro do convívio em sociedade. Além do mais, essa instituição, também, não obsta o cometimento de novos crimes, sem falar no alarmante índice de reincidência dos seus usuários.

Assim sendo, o direito penal cria caminhos para tentar sanar alguns desses problemas, ou até mesmo todos, por meio de diferentes teorias, que buscam explicar, cada qual com seus ideais e procedimentos, como esta ciência deve agir para com aquele que comete um ato considerado crime pela sociedade. Apresentam-se, então, o direito penal máximo, o garantismo e o abolicionismo como sendo formas de respostas à realidade da privação de liberdade vivenciada nos dias atuais.

6 IN DUBIO, CONTRA REUM – A RÍGIDA REPRESSÃO ESTABELECIDA POR MEIO DO DIREITO PENAL MÁXIMO

Em que pese haverem sido apresentadas, no presente trabalho, as ressalvas quando às consequências da pena de prisão, a corrente do direito penal máximo defende seu uso, além de propor sua ampliação e um regime mais rígido para cumprir sua sanção. Tal corrente afirma que o direito penal é uma espécie de solução para todos os males relacionados com a violência no seio social (ROBALDO, 2009).

A teoria do direito penal máximo é facilmente visualizada quando da criação de novas leis pe-nais que aumentem a pena para determinados crimes, ou mesmo que ampliem a tutela de bens jurídicos até então não protegidos pelo direito penal.

Nesse raciocínio, “procura-se educar a sociedade sob a ótica do Direito Penal, fazendo com

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que comportamentos de pouca monta, irrelevantes, sofram as consequências graves desse ramo do ordenamento jurídico” (GRECO, 2009).

Ainda, segundo o mesmo autor, explicando a teoria estudada neste momento,

[...] o Direito Penal deve preocupar-se com todo e qualquer bem, não importando o seu valor. Deve ser utilizado como prima ratio, e não como ultima ratio da intervenção do Estado perante os cidadãos, cumprindo um papel de cunho eminentemente educador e repressor, não permitindo que as condutas socialmente intoleráveis, por menor que sejam, deixem de ser reprimidas. (GRECO, 2009, p. 16).

Na mesma seara do direito penal máximo, a fim de complementar seu entendimento, merece destaque o Direito Penal do Inimigo, desenvolvido pelo professor alemão Günter Jakobs, que será objeto de estudo no próximo tópico.

7 O DIREITO PENAL DO INIMIGO, POR GÜNTER JAKOBS

Por meio do Direito Penal do Inimigo, Jakobs procura distingui-lo de outra espécie, também por ele criada, a qual ele denomina de Direito Penal do Cidadão (GRECO, 2009). Acerca do Direito Penal do Inimigo e do Direito Penal do Cidadão, ele assim os diferencia:

O primeiro, em uma visão tradicional, garantista, com observância de todos os princípios fundamentais que lhe são pertinentes; o segundo, intitulado Direito Penal do Inimigo, seria um Direito Penal despreocupado com seus princípios fundamentais, pois que não estaríamos diante de cidadãos, mas sim de inimigos do Estado. (GRECO, 2009, p.18).

Segundo Jakobs, sobre o inimigo a que ele se refere,

[...] quem por princípio se conduz de modo desviado, não oferece garantia de um compor-tamento pessoal. Por isso, não pode ser tratado como cidadão, mas deve ser combatido como inimigo. Esta guerra tem lugar com um legítimo direito dos cidadãos, em seu direito à segurança; mas diferentemente da pena, não é direito também a respeito daquele que é apenado; ao contrário, o inimigo é excluído. (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 49-50, apud MORAES, 2011, p. 191).

Para Jakobs (2005, p. 31, apud MORAES, 2011, p. 191), os inimigos não são pessoas, pois o conceito de pessoa diz respeito à forma com que se constrói o sistema social. Dessa forma, é con-siderado inimigo aquele indivíduo que não admite ser obrigado a ingressar no estado de cidadania e, dessa forma, não pode participar dos benefícios do conceito de pessoa (JAKOBS; MELIÁ, 2015).

O autor analisa dois modos de o Estado tratar os criminosos, analisando-os como pessoas que tenham incorrido em erro, ou, ainda, como pessoas devem ser impedidas de acabar com o ordenamento jurídico, mediante coação. Desta feita, determinados tipos de transgressores não devem ser tratados pelo Estado como pessoas, já que este tratamento não respeitaria o direito à segurança dos demais cidadãos. Assim sendo, o Estado velaria pela proteção e segurança aos cidadãos, ao mesmo tempo em que ameaçaria os inimigos do Estado, por meio de punições mais

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rigorosas, incluindo a supressão de garantis fundamentais. (JAKOBS; MELIÁ, 2015).

Dessa forma, na visão de Conde (2012), surgem duas questões a serem analisadas:

Uma é do tipo conceitual e afeta seu próprio conteúdo: quem define o inimigo e como isso é definido? Todos os delinquentes são inimigos? Se se responde afirmativamente, então todo o Direito penal é um Direito penal do inimigo. Mas se apenas um grupo de delinquentes merece tal qualificação, temos que identifica-los com maior precisão.

A outra questão está relacionada com o marco de referência: é compatível com o Estado de Direito e com o reconhecimento a todos, sem exceções, dos direitos fundamentais que corres-pondem ao ser humano pelo fato de serem considerados inimigos? (CONDE, 2012, p. 67).

É certo que o Estado pode privar o indivíduo de sua cidadania, mas não da sua condição de pessoa, ou seja, da qualidade de portador de todos os direitos que possui um ser humano. Sendo tratado como algo perigoso, implica-se a tal privação. Logo, não é possível pretender que um tratamento diferenciado possa ser aplicado a um indivíduo sem afetar a sua condição de pessoa. (ZAFFARONI, 2001, p. 19, apud SILVA, 2013).

Possível observar que, diante de todo exposto acerca do direito penal máximo como espécie e visualizando um de seus gêneros, o direito penal do inimigo, de Günter Jakobs,

[...] o direito penal máximo caracteriza-se por ser um modelo incondicionado e ilimitado, além de ser excessivamente severo, diante da incerteza e imprevisibilidade das conde-nações e das penas, assim, configura-se como um sistema incontrolável racionalmente em face da ausência de parâmetros certos e racionais de convalidação e anulação, uma vez que ele não obedece nem mesmo às garantias e aos direitos fundamentais inerentes ao homem e previstos na Constituição da República Federativa do Brasil e nos Tratados de Direitos Internacionais (SILVA, 2013, apud FERNANDES, 2007, p. 76).

Corroborando com tal narrativa, Ferrajoli (2002) ensina que esse modelo de direito é o que apresenta, além de sua excessiva severidade, a incerteza e imprevisibilidade das condenações e das penas; afirma ainda, o citado autor, que “a certeza perseguida pelo direito penal máximo está em que nenhum culpado fique impune, à custa da incerteza de que também algum inocente possa ser punido” (FERRAJOLI, 2002).

Por óbvio, tais correntes defendem a supressão das garantias fundamentais já conquistadas pelo homem, enquanto cidadão, em contraponto aos ideais garantistas de Luigi Ferrajoli, conforme será explanado a seguir.

8 DIREITO PENAL MÍNIMO – DIALOGANDO COM O GARANTISMO DE LUIGI FERRAJOLI

A certeza do direito penal mínimo, ao contrário do direito penal máximo, estaria em que nenhum inocente seja punido à custa da incerteza de que também algum culpado possa ficar impune. A incerteza seria resolvida por uma presunção legal de inocência em favor do acusado (FERRAJOLI, 2002).

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Nas palavras do penalista Paulo Queiroz,

Dizer que a intervenção do Direito Penal é mínima significa dizer que o Direito Penal deve ser a ultima ratio, limitando e orientando o poder incriminador do Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta somente se justifica se constituir um meio neces-sário para a proteção de determinado bem jurídico. O Direito Penal somente deve atuar quando os demais ramos do Direito forem insuficientes para proteger os bens jurídicos em conflito. (QUEIROZ, 1999, apud NETO, 2009).

Pelo direito penal mínimo, se outras formas de sanção ou controle social forem eficazes, a sua criminalização não é recomendável. (NETO, 2009). O modelo garantista apresenta condições, limites ou proibições, que são as garantias do cidadão contra o arbítrio ou o erro penal (FERRA-JOLI, 2002). Segundo este modelo,

[...] não se admite qualquer imposição de pena sem que se produzam a comissão de um delito, sua previsão legal como delito, a necessidade de sua proibição e punição, seus efeitos lesivos para terceiros, o caráter externo ou material da ação criminosa, a impu-tabilidade e a culpabilidade do seu autor e, além disso, sua prova empírica produzida por uma acusação perante um juiz imparcial, em um processo público e contraditório em face da defesa e mediante procedimentos legalmente preestabelecidos. (FERRAJOLI, 2002, p. 83).

Para Ferrajoli (1998, p. 80, apud CARVALHO, 2003, p. 85), existem categorias que seriam pré-requisitos, ou até mesmo princípios, sem os quais se tornaria impossível determinar a res-ponsabilidade penal ou a aplicação da pena, sendo eles: pena, delito, lei, necessidade, ofensa, conduta, culpabilidade, juízo, acusação, prova e defesa.

O modelo garantista de Ferrajoli, então,

[...] pretende instrumentalizar um paradigma de racionalidade do sistema jurídico, criando esquemas tipológicos baseados no máximo grau de tutela dos direitos e na fiabilidade do juízo e da legislação, com intuito de limitar o poder punitivo e garantindo a(s) pessoa(s) contra qualquer tipo de violência arbitrária, pública ou privada. (CARVALHO, 2003, p. 84).

Ainda, é fato acerca de tal modelo a sua busca pela minimização da violência, vislumbrando o exercício do poder como perverso, permitindo a constante reafirmação dos direitos fundamentais. Almejando a tutela dos mais fracos, ou seja, aqueles ofendidos no momento da lesão, réus no momento do processo e condenados no momento da execução, o modelo garantista tenta contrair os processos de criminalização, formatando uma teoria jurídica de contração da violência da pena (CARVALHO, 2003, p. 262).

9 UM PASSO ALÉM DO GARANTISMO PENAL

O garantismo, “ao redesenhar teoria justificacionista da pena acaba por legitimar variadas formas de intervenção punitiva” (CARVALHO, 2013). Ferrajoli (2002) sustenta que, na ausência da pena, os grupos sociais retomariam práticas pré-civilizadas de retaliação, como o exercício

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54 A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E OS CAMINHOS DO DIREITO PENAL

arbitrário das próprias razões ou até mesmo formas de controle totalitário. O autor justifica, mesmo que a partir de uma intervenção mínima, o uso de um sistema penal que, analisado em sua realidade, conforme já demonstrado, não cumpre com o prometido. Zarrafoni e Pierangeli (2001), entendem que

Pode-se pensar num modelo de sociedade com uma estrutura de poder tão repartido e igualitário, que não exija o sistema penal. Ou melhor, pode-se pensar em uma estrutura democrática do poder, ainda que não tão longe das características atuais que não obs-tante mantenham um certo grau de tal racionabilidade para a sua solução. (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2001, p. 78).

Analisando tal afirmativa, esta aponta uma resposta no abolicionismo, consolidando o sistema penal como falho, e, assim sendo, melhor seria a sua substituição. Logo,

[...] o movimento abolicionista, tendência atual dos movimentos de política criminal al-ternativa, fornece importantes elementos ao debate sobre a contração do sistema penal/carcerário, apresentando propostas concretas que visualizam desde a sua eliminação à construção de alternativas aos regimes punitivos de apartação. (CARVALHO, 2013, p. 244).

Tal tendência oportuniza novas formas de resolução de conflitos, como, por exemplo, o con-fronto entre os envolvidos, as community boards - pessoas que, dentro da própria comunidade, buscam a solução entre seus semelhantes - e até mesmo a mediação e arbitragem para uma maior gama de tipos penais, tais como crimes contra o patrimônio, drogas e lesões corporais (HULSMAN; CELIS, 1993).

Não bastasse um novo olhar para a forma como o direito penal é hoje aplicado, excluindo da seara punitiva certos crimes e levando-os a diferentes formas de resolução, tais ações oportu-nizariam um olhar mais humano aos autores das infrações, bem com possibilitariam às vítimas uma reparação do dano no mesmo patamar em que se busca, hoje, punir o acusado, conforme o crime cometido. Por fim, proporcionariam, à sociedade em geral, uma aproximação a um dos princípios basilares do direito: o princípio da dignidade humana. Ao invés de um malhete a con-denar, entraria em cena a mão estendida, oferecendo uma chance de recomeçar.

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acreditou-se, ingenuamente, que a prisão seria a resposta para todos os males da sociedade. Seja pelo medo de adentrar em uma cadeia, por lá estar e não querer voltar, ou até mesmo pela transformação que ela proporcionaria na vida do apenado, readaptando-o à vida em sociedade, ela era a resposta para todos os problemas de natureza criminal. A conclusão a que se chega, porém, é que ela atinge o contrário dos resultados que busca evitar.

A cadeia não ressocializa. Ao contrário, socializa para a continuidade na vida do crime. Tal socia-lização, que pode ser chamada, inclusive, de prisionalização do apenado, se dá pela transformação de seus costumes e hábitos por causa de uma nova forma de vida que encontra ao passar certo período de tempo no presídio. Em um primeiro momento, o usuário do sistema penal é despido

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dos valores e modos de convivência considerados aptos para a vida em sociedade; em segundo, ele se transforma em um produto da cadeia, assumindo atitudes e modelos de comportamento que não condizem com o que se espera que a privação de liberdade surta no encarcerado. Além do mais, ao sair da prisão, o condenado passa a ser visto com outros olhos; olhos de desconfiança, que não lhe fornecem oportunidade para a retomada da vida após pagar o que devia por meio de sua condenação. O usuário do sistema penal, de culpado, se torna vítima de um sistema que não cumpre com o prometido – ou seja, não previne e não ressocializa.

Dentro desse contexto, surgem correntes no direito que buscam forma de soluções para a crise desenfreada da privação de liberdade.

O Direito penal Máximo repreende da forma mais dura possível os crimes de qualquer grau de importância; por meio dessa punição, busca intimidar e prevenir o cometimento de novos tipos penais. Por certo que tal atitude corrobora com a supressão de garantias fundamentais do ser humano; nessa linha de pensamento, portanto, na dúvida, se pune o acusado.

De outra banda, o direito penal mínimo institui o sistema penal como ultima ratio, ou seja, só se utiliza dele quando, por nenhuma outra forma, possa ser resolvido o conflito em questão. Luigi Ferrajoli explica algumas garantias que protegem o cidadão do livre arbítrio do poder de punir estatal, assim como, na dúvida, é melhor, para o autor, que permaneça solto o culpado ao invés de que se prenda o inocente. Entretanto, o garantismo também redesenha teoria justificacionista da pena, afirmando a intervenção estatal e apoiando, da mesma feita, um sistema que, como já visto, é falho, não funciona

Por outro lado, a teoria abolicionista apresenta respostas um tanto quanto diferentes e inovado-ras aos problemas da política criminal enfrentados atualmente. Por meio de inovadores sistemas de resolução de conflitos, tal corrente pode apresentar soluções coerentes para determinados tipos penais.

No horizonte de como deve agir o direito penal, e não mais encontrando justificativas para a intervenção punitiva estatal, visto que o modo em que esta é realizada é falho, deve-se estudar e analisar os casos práticos do abolicionismo, tendência atual acerca dos problemas do sistema punitivo, que apresenta propostas concretas para a sua eliminação e, também, para a construção de alternativas aos atuais regimes punitivos de solução de conflitos.

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56 A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E OS CAMINHOS DO DIREITO PENAL

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58 TOMADA DA DECISÃO APOIADA NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE CIVIL E OS REFLEXOS NOS CONTRATOS

TOMADA DA DECISÃO APOIADA NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE CIVIL E OS REFLEXOS NOS

CONTRATOS

Anair Isabel Schaefer1

RESUMO

O presente artigo analisa o instituto da tomada de decisão apoiada, pre-visto no Estatuto da Pessoa com Deficiência e a consequente alteração no código civil brasileiro. No direito comparado, aproxima-se do instituto adotado na Itália da “amministrazione di sostegno”. O instituto apresenta reflexos nos contratos. A assinatura dos apoiadores nos negócios permite identificar a assistência.

PALAVRAS-CHAVE: tomada de decisão apoiada – Estatuto da Pessoa com Deficiência – contratos.

ABSTRACT

This article analyzes the institute of “supported decision making” included in the Person with Disabilities Statute and the consequent amendment in the Brazilian Civil Code. In comparative law, it approaches the institute adopted in Italy of the “amministrazione di sostegno”. The institute is re-flected in the contracts. The signature of the supporters in the businesses allows to identify the assistance.

KEYWORDS: supported decision making – Person with Disabilities Statute – contracts.

1 Doutora em Direito pela Universidade Federal de Rio Grande do Sul – UFRGS. Professora da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

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1 INTRODUÇÃO

O presente artigo analisa a capacidade civil da pessoa com deficiência e a inclusão do instituto da tomada de decisão apoiada no Código Civil. A necessidade de processo judicial para a obtenção do Termo de Tomada de Decisão Apoiada, traduz a escolha do legislador pelo modelo italiano. O instituto apresenta reflexos nos negócios jurídicos, em especial nos contratos em espécie. A opção pela assinatura dos apoiadores nos negócios permite identificar uma natureza jurídica de assistência.

Inicia-se o estudo com a análise da alteração efetuada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiên-cia, no Código Civil, quanto à capacidade das pessoas. Passa-se a análise do instituto no Brasil, comparando-se com o sistema italiano e o francês, em especial quanto aos negócios juridicos. Posteriomente, verifica-se sua aplicação aos contratos nominados, previstos no código civil de 2002. Ao final, analisa-se a permissão prevista no instituto para que o terceiro que contratar com a pessoa apoiada poss optar pela assinatura do apoiador, o que pode configurar a manutenção assistência.

2 O ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E A CAPACIDADE CIVIL COMO REGRA

O Estatuto da Pesssoa com Deficiência2 tem por objetivo permitir a inclusão social e a cidadania às pessoas com deficiência. O Estatuto concretiza o previsto no artigo 12 da Convenção Interna-cional das Pessoas com Deficiência, internalizada pelo Decreto 6.949/0.3

Uma alteração importante com o Estatuto da Pessoa com Deficiência foi a modificação da ca-pacidade civil da pessoa natural, constituída como regra a todos os maiores de 18 anos. A regra é a capacidade plena para as pessoas com deficiência, no que diz respeito ao direito de família. Quanto ao casamento, está prevista a capacidade plena no parágrafo segundo do artigo 1550 do Codigo Civil. 4 No que pertine à prole, entre outros, há previsão expressa no artigo 6º do Estatuto da Pessoa com Deficiência.5

Para as questões patrimoniais, passou da incapacidade absoluta para a relativa, alterando os

2 BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União. Brasília, 7 de julho de 2015.

3 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas Relações Jurídico-Ne-gociais com as Instituições Financeira. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

4 Art. 1.550. É anulável o casamento: § 2o A pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

5 Art. 6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: I - casar-se e constituir união estável;

II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

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artigos 3º6 e 4º7 do código civil, respectivamente:

Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.

Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.

A capacidade, “numa perspectiva dinâmica, é o quantum – da aptidão genérica para titulari-zar situações jurídicas subjetivas que existe em todas as pessoas – que poderá ser efetivamente exercido de forma direta num dado caso concreto.8 A pessoa natural é sujeito de direitos. Contudo, poderá não ter a capacidade jurídica de exercer seus direitos, necessitando de apoio, assistência ou representação.

A capacidade de exercício ou capacidade de agir, conforme Debora Pereira Pinto dos Santos, apud Carlos Alberto Mota Pinto, é a “idoneidade para actuar juridicamente, exercendo direito ou cumprindo deveres, adquirindo direitos ou cumprindo obrigações, por acto próprio e exclusivo, ou mediante um representante voluntário ou procurador, isto é, um representante escolhido pelo próprio representado”.9

A capacidade poderá ter uma gradação, conforme o discernimento ou a possibilidade de ma-nifestação da vontade10:

A capacidade é conceito necessariamente quantitativo, que admite gradação. Mas, a pessoa, como sujeito de direito, possui subjetividade e, deve ter, ao menos, um mínimo grau de capacida-de. Por conseguinte, volta-se à ideia de discernimento, que, para as pessoas naturais, separa a capacidade da incapacidade. A gradação da capacidade para as pessoas físicas depende do grau

6 Redação anterior: “Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de dezesseis anos II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.”

7 Redação anterior: Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais, os viciados em tóxico, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III – os excepcionais, sem desenolvimento mental completo; IV - os pródigos. Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.”

8 SANTOS, Deborah Pereira Pinto dos; ALMEIDA JUNIOR, Vitor de Azevedo. O regime da (in)capacidade civil entre a autonomia e a pro-teção: uma releitura civil-constitucional. Disponivel em:< http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=75ca239fd09eb253 >. Acesso em 05 dezembro de 2016.

9 ANTOS, Deborah Pereira Pinto dos; ALMEIDA JUNIOR, Vitor de Azevedo. O regime da (in)capacidade civil entre a autonomia e a pro-teção: uma releitura civil-constitucional. Disponivel em:< http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=75ca239fd09eb253 >. Acesso em 05 dezembro de 2016. Obra citada: MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria Geral do Direito Civil. 3. ed., Coimbra: Coimbra, 1996, p. 214.

10 Idem, ibidem.

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de discernimento.

A relevância da manifestação de vontade dos considerados incapazes (absolutamente), na redação inicial do Codigo Civil de 2002, alterada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (relati-vamente) foi apontada no enunciado nº 138 da III Jornada de Direito Civil do CJF11.

Flavio Tartuci apresenta duas correntes sobre o Estatuto da Pessoa com deficiência (uma negativa e outra positiva), alinhando-se com a segunda, que concorda com a inovação12:

Percebemos, pela leitura de textos publicados na internet, que duas correntes se for-maram a respeito da norma. A primeira – à qual estão filiados José Fernando Simão e Vitor Kümpel – condena as modificações, pois a dignidade de tais pessoas deveria ser resguardada por meio de sua proteção como vulneráveis (dignidade-vulnerabilidade). A segunda vertente – liderada por Joyceane Bezerra, Paulo Lôbo, Nelson Rosenvald, Jones Figueirêdo Alves, Rodrigo da Cunha Pereira e Pablo Stolze – aplaude a inovação, pela tutela da dignidade-liberdade das pessoas com deficiência, evidenciada pelos objetivos de sua inclusão.

A Tomada de decisão apoiada constitui-se mediante processo judicial, previsto no artigo 1783-A13 do Código Civil, na qual permite eleger, pelo menos duas pessoas de sua confiança, para auxiliar nas decisões sobre os “atos” da vida civil, fornecendo elementos e informações necessários para exercer sua capacidade.14

O juiz para proferir a decisão deverá ouvir o requerente, os apoiadores, o ministério público e uma equipe multidisciplinar (Art. 1783-A, §3º).15 O requerimento da medida deve ser promovido pela pessoa com deficiência e deverá apresentar a indicação, os limites de atuação e os compro-missos dos apoiadores, bem como o prazo de vigência (Art. 1783-A, §§ 1º e 2º).16

A competência dos apoiadores, estabelecendo os limites de sua atuação e os prazos são ne-cessários para os terceiros que contratarem com os apoiados, identifiquem a qual dos apoiadores correspondem o campo de atuação. Ainda, poderá o terceiro requerer que o apoiador assine o contrato que estiver dentro de sua respectiva competência.17 Este é a posição de Maurício Requião para o qual “a tomada de decisão apoiada poderá ser diferente para cada sujeito, já que o termo que for apresentado é que especificará os limites do apoio”.18

11 a vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inciso I do art. 3º, é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto”.

12 TARTUCE, Flávio. Alterações do Código Civil pela lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Repercussões para o Direito de Família e Confrontações com o Novo CPC. Parte II. Disponível em: < http://www.migalhas.com.br/FamiliaeSucessoes/104>. Altera-coes+do+Codigo+Civil+pela+lei+131462015+Estatuto+da+Pessoa+com>. Acesso em 29 de janeiro de 2016.

13 CAPÍTULO III Da Tomada de Decisão Apoiada Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.

14 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

15 § 3o Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada, o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio.

16 § 1o Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência. 2o O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a prestarem o apoio previsto no caput deste artigo.

17 SCHAEFER, Anair Isabel. Obra citada.

18 REQUIÃO, Maurício. Conheça a tomada de decisão apoiada, novo regime alternativo à curatela. In: CONJUR - coluna Direito Civil

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62 TOMADA DA DECISÃO APOIADA NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE CIVIL E OS REFLEXOS NOS CONTRATOS

Ressalte-se que as decisões somente terão validade e eficácia, se respeitados os limites es-tabelecidos no Termo, conforme previsto no parágrafo 4º do artigo 1783-A.19

Institutos similares à tomada de decisão apoida estão presentes em diversos países do mundo. Podemos identificar, para o objeto de nosso estudo o instituto da amministratore di sostegno, da Italia.

3 A TOMADA DE DECISÃO APOIADA: APROXIMAÇÃO COM O MODELO ITALIANO

O direito italiano estabeleceu o instituto de amministrazione di sostegno (“administração de suporte”) pela Lei 6/200420, alterando o Código Civil, nos artigos 404 a 413.

O artigo 405 estabelece as condições do decreto de nomeação e a duração do mandato. Os legitimados da medida estão previstos no artigo 406 do código civil italiano. O pedido de admi-nistrador de suporte poderá ser requerido pelo próprio beneficiário, embora menor, interditado ou incapacitado.21

O decreto de nomeação do administrador de suporte deve conter a indicação: 1) da qualifica-ção da pessoa beneficiária da medida e do administrador de suporte; 2) a duração do mandato, que poderá ser prazo indeterminado; 3) o objeto da nomeação e dos atos que o administrador de suporte tem os poderes para representar o beneficiário; 4) atos que o destinatário possa executar apenas com o auxílio do administrador de suporte; 5) limites, mesmo periódicos, das despesas que o administrador de suporte pode fazer uso com os valores disponíveis do beneficiário ou que possa ter disponibilidade; 6) a frequência com que o administrador de suporte deve apresentar um relatório ao juiz sobre as atividades realizadas e as condições de vida pessoal e social do beneficiário.22

O procedimento para a administração de suporte está previsto nos artigos 406 e 407 do có-digo civil italiano. A escolha do administrador de suporte está previsto no artigo 408 do codigo civil italiano. Os efeitos da administração de suporte estão previstos no artigo 409 do código civil italiano. O beneficiário mantém sua capacidade de agir em todos os atos que não requeiram a representação exclusiva ou a assistencia do administrador de suporte. O beneficiário pode, em qualquer caso, tomar as medidas necessárias para satisfazer as exigências de sua vida cotidiana.23

Os deveres do administrador de suporte estão dispostos no artigo 410 do codigo civil italiano. Em caso de conflito, nas escolhas ou na realização de atos danosos, realizados com negligncia

Atual. Disponivel em: < http://www.conjur.com.br/2015-set-14/direito-civil-atual-conheca-tomada-decisao-apoiada-regime-alternativo--curatela.> Acesso em: 12 maio 2016. Ver também: REQUIÃO, Maurício. Considerações sobre a interdição no projeto do Novo Código de Processo Civil. In: Revista de Processo, v. 40, n. 239. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 453-465. Ver também: REQUIÃO. Maurício. As Mudanças na Capacidade e a Inclusão da Tomada de Decisão Apoiada a partir do estatuto da Pessoa com deficiência. In: Revista de Direito Civil Contemporâneo. Vol. 6, 2016. Jan - Mar / 2016. p. 37 – 54.

19 § 4o A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado.

20 ITALIA. Legge 9 gennaio 2004, n. 6. Introduzione nel libro primo, titolo XII, del codice civile del capo I, relativo all’istituzione dell’am-ministrazione di sostegno e modifica degli articoli 388, 414, 417, 418, 424, 426, 427 e 429 del codice civile in materia di interdizione e di inabilitazione, nonchè relative norme di attuazione, di coordinamento e finali. Pubblicata nella Gazzetta Ufficiale n. 14 del 19 gennaio 2004.

21 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

22 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

23 Idem, ibidem.

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na persecução dos interesses ou na satisfação das necessidades e exigências do beneficiário, poderá ser informado ao juiz para que sejam tomadas as medidas apropriadas. O administrador de suporte não necessita continuar na função após dez anos, exceto nos casos em que a atuação é desempenhada pelo conjuge, companheiro, pais ou filhos.24

Os atos da competência do beneficiário ou do administrador de suporte, cometidos com vio-lação da lei ou das determinações do juiz poderão ser anulados, conforme previsto no artigo 412 do codigo civil italiano. A ação relativa prescreve em cinco anos a contar da data do término da administração de suporte. 25

A revogação da administração de suporte está disciplinada no artigo 413 do codigo civil ita-liano. Conforme disposto no artigo 415, a pessoa maior que tem deficiência mental, cujo estado não é grave a ponto de requerer a interdição, poderá ser submetido à inabilitação (incapacidade). Poderá ser submetido à inabilitação, por prodigalidade, por abuso habitual de drogas ou álcool, ou aqueles que podem expor a si ou seus familiares a graves prejuízos econômicos. Podem ser inabilitados o surdo-mudo e o cego de nascença ou na primeira infância que não teve educação suficiente, salvo a aplicação do artigo 14, quando resulta que são incapazes de proverem seus próprios interesses.26

Paula Távora Vítor apud Maurício Requião, ao analisar a legislação europeia sobre medi-das similares à tomada de decisão apoiada, considera que, em regra, o prazo é determinado.27 Apresenta, como exemplo, o Código Civil italiano, no qual estabelece que a amministrazione di sostegno pode ser por tempo indeterminado, enquanto que o Código Civil francês determina que a medida de sauvegarde de justice não pode ser determinada por período superior a um ano, renovável uma vez.28

Constata-se, portanto, que a administração de suporte italiano se aproxima da tomada de decisão apoiada brasileira.

A tomada de decisão apoiada, apresenta reflexos nos contratos nominados previstos no Có-digo Civil, bem como em legislações especiais com terceiros. Nesta conformação, analisa-se a aplicação da tomada de decisão apoiada nos contratos previstos no código civil.

4 APOIO OU ASSISTÊNCIA NOS CONTRATOS FIRMADOS PELA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Aplica-se a tomada de decisão apoiada em todos os negócios jurídicos celebrados pela pessoa com deficiência, observados os limites estabelecidos no respectivo Termo. Os limites de atuação

24 Idem, ibidem.

25 Idem, ibidem.

26 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

27 REQUIÃO, Maurício. As mudanças na capacidade e a inclusão da tomada de decisão apoiada a partir do Estatuto da Pessoa com De-ficiencia. In: Revista de Direito Civil Contemporâneo, vol. 6/2016, p. 37 – 54, Jan - Mar / 2016. Ver também: REQUIÃO, Maurício. Conheça a tomada de decisão apoiada, novo regime alternativo à curatela. In: CONJUR - coluna Direito Civil Atual. Disponivel em: < http://www.conjur.com.br/2015-set-14/direito-civil-atual-conheca-tomada-decisao-apoiada-regime-alternativo-curatela.> Acesso em: 12 maio 2016. Sobre o tema: VÍTOR, Paula Távora. A administração do património das pessoas com capacidade diminuída. Coimbra: Coimbra, 2008, p.175-176.

28 REQUIÃO, Maurício. Obra citada.

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64 TOMADA DA DECISÃO APOIADA NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE CIVIL E OS REFLEXOS NOS CONTRATOS

deverão estar previstos no Termo. O código civil de 2002 disciplina os contratos chamados de típicos (nominados), no título VI (Das Várias Espécies de Contrato), nos artigos 481 a 853. Con-siderando tratar-se os contratos previstos no Codigo Civil como negócios jurídicos, aplica-se a eles, a tomada de decisão apoiada.

No parágrafo quinto do artigo 1783-A29 está previsto que o terceiro, ao efetivar negócios com a pessoa submetida à tomada de decisão apoiada, poderá solicitar que os apoiadores “contra-as-sinem” o contrato, especificando, por escrito, sua função em relação à apoiada.

A inclusão desta prerrogativa ao terceiro, diz respeito aos limites da responsabilidade civil do apoiado e dos apoiadores. Ressalte-se que a interpretação do artigo 92830 do Código Civil brasi-leiro requer atenção, quanto à responsabilidade civil das pessoas com deficiência. O artigo 928 do Código Civil estabelece que o incapaz responde subsidiariamente com seus próprios bens, nos termos do artigo 928 do Código Civil.31

No que pertine à tomada de decisão apoiada, a regra é a responsabilidade civil do apoiado. Para os curatelados, a responsabilidade do curador, previsto no artigo 932, inciso II32,do Código Civil, estabelece que deverá observar a limitação prevista no estatuto da pessoa com deficiência, limitando-se à questão patrimonial e negocial. Para outras situações, a responsabilidade civil será o do curatelado.33

O artigo, ao permitir a escolha do terceiro que contratar com o apoiado a decisão de requerer a assinatura do apoiador, conforme sua competência delimitada no respectivo Termo, permite distinguir o apoio e a assistência.

O apoio se configura quando o contrato for efetivado com a orientação do apoiador, sem con-tudo, firmar o instrumentoo. A assistência ocorrerá quando o apoiador assinar o instrumento que será firmado pelo apoiado. Nestas circunstâncias, ficará o apoiador submetido ao regime jurídico da assistência, com as responsabilidades a ela inerentes.

O Estatuto não apresenta distinção quanto as responsabilidades do apoiador, conforme este firme ou não o instrumento. Mas, ao permitir a prerrogativa ao terceiro, na escolha da assinatura do apoiador, permite uma interpretação favorável à aplicação da figura da assistência e a respec-tiva responsabilidade, dela decorrente.

A assistência é o instituto aplicável às pessoas menores, entre 16 e 18 anos, as quais são assistidas pelos representantes para determinados atos jurídicos. Nestas circunstâncias, há a responsabilidade do assistente pelos atos praticados pelo assistido. A atuação como assistente não retira a responsabilidade prevista para o apoiador, no parágrafo sétimo, do artigo 1783-A,34 do

29 § 5o Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.

30 Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.

31 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

32 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

33 SCHAEFER, Anair Isabel. Obra citada.

34 § 7o Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não adimplir as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.

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Código Civil. Ainda, a este Instituto aplica-se a a prestação de contas prevista na curatela, quando couber, conforme previsto no parágrafo décimo primeiro do artigo 1783-A35, do Código Civil.36

Diante da permissão do Estatuto da possibilidade de término do acordo a qualquer momento, os negócios efetuados com este acordo, deverá incluir adequadamente as responsabilidades de cada um dos integrantes até o final dos contratos ou seu adimplemento. Enfim, esta nova moda-lidade requer uma atenção especial nos contratos firmados com as pessoas envolvidas no acordo de tomada de decisão apoiada, não somente na formação, mas em sua execução.37

5 CONCLUSÃO

O presente artigo analisou o instituto da “tomada de decisão apoiada” incluído no Estatuto da Pessoa com Deficiência, mediante a alteração do Codigo Civil de 2002. Este instituto apresenta modificação na capacidade da pessoa, em virtude da aplicação nacional da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, primeiro tratado internacional do século XXI. Esta convenção tem por escopo apresentar uma proteção mínima, de caráter universal, às pessoas com deficiência, para que sejam efetivadas normas nacionais que permitam a interação social.

No Brasil, a tomada de decisão apoiada observou o sistema italiano (amministratore di sos-tegno), com similitude na forma e na temporalidade.

Nos contratos, mediante a manifestação expressa no Estatuto, quando menciona a relação com terceiros, acarreta a possibilidade de apoio ou da assistência, conforme a escolha pela assinatura do apoiador no contrato. Esta distinção parace inclinar para um aumento da responsabilidade do apoiador, se este firmar o instrumento, configurando a assistência.

6 REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União. Brasília, 7 de julho de 2015.

ITALIA. Legge 9 gennaio 2004, n. 6. Introduzione nel libro primo, titolo XII, del codice civile del capo I, relativo all’istituzione dell’amministrazione di sostegno e modifica degli articoli 388, 414, 417, 418, 424, 426, 427 e 429 del codice civile in materia di interdizione e di inabilitazione, nonchè relative norme di attuazione, di coordinamento e finali. Pubblicata nella Gazzetta Ufficiale n. 14 del 19 gennaio 2004.

REQUIÃO, Maurício. REQUIÃO, Maurício. Conheça a tomada de decisão apoiada, novo regime alternativo à curatela. In: CONJUR - coluna Direito Civil Atual. Disponível em: < http://www.

35 § 11. Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as disposições referentes à prestação de contas na curatela.”

36 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo

37 SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas relações jurídico-ne-gociais com as instituições financeiras. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

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66 TOMADA DA DECISÃO APOIADA NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ALTERAÇÃO NA CAPACIDADE CIVIL E OS REFLEXOS NOS CONTRATOS

conjur.com.br/2015-set-14/direito-civil-atual-conheca-tomada-decisao-apoiada-regime-alter-nativo-curatela.> Acesso em: 12 de maio de 2016.

SANTOS, Deborah Pereira Pinto dos; ALMEIDA JUNIOR, Vitor de Azevedo. O regime da (in)capa-cidade civil entre a autonomia e a proteção: uma releitura civil-constitucional. Disponivel em:< http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=75ca239fd09eb253 >. Acesso em 05 de dezembro de 2016

SCHAEFER, Anair Isabel. Tomada de Decisão Apoiada no Estatuto da Pessoa com Deficiência: Implicações nas Relações Jurídico-Negociais com as Instituições Financeira. Coleção Direito & Mercado. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, no prelo.

TARTUCE, Flávio. Alterações do Código Civil pela lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com De-ficiência). Repercussões para o Direito de Família e Confrontações com o Novo CPC. Parte II. Disponível em: < http://www.migalhas.com.br/FamiliaeSucessoes/104>. Alteracoes+do+Co-digo+Civil+pela+lei+131462015+Estatuto+da+Pessoa+com>. Acesso em 29 de janeiro de 2016.

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68 PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA ADOÇÃO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA O CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS: AVALIANDO A GINCANA VIRTUAL

PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA ADOÇÃO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM

PARA O CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS: AVALIANDO A GINCANA VIRTUAL

Gabriela Ramos Muniz1

Lívia Esquivel2

Caroline de Oliveira Orth3

RESUMO

O Moodle é um sistema de administração de atividades educacionais vol-tado à aprendizagem colaborativa, que possibilita a integração entre es-tudantes e docentes (PEREZ et al. 2012). Os recursos do Moodle são va-riados e podem ser utilizados para a distribuição de material de conteúdo e na avaliação do empenho de cada aluno. Ademais, entende-se que a utilização do AVA Moodle na aplicação de metodologias diferenciadas de aprendizagem pode ser muito enriquecedora, sendo assim, o presente es-tudo tem como objetivo avaliar o impacto sobre os alunos com a adoção de metodologias de aprendizagem aplicadas em uma disciplina presencial, com a utilização do AVA Moodle. Foi aplicada a técnica de análise de con-teúdo nos dados coletados através dos relatos dos alunos de uma turma de Auditoria I de uma instituição de ensino superior, quando submetidos a uma metodologia de aprendizagem denominada “gincana virtual”. Seus pareceres foram transcritos para um relatório e posteriormente submeti-das a análise de conteúdo, visando extrair os pontos positivos e negativos sobre a referida atividade. Os resultados apontam para mudanças positi-vas no comportamento e pensamento dos alunos com relação ao trabalho em grupo e desenvolvimento da disciplina, sendo o Moodle ferramenta importante para a interação entre alunos e professor e para a avaliação de alunos e da disciplina.

PALAVRAS-CHAVE: Moodle. Gincana virtual. Dinâmicas.

ABSTRACT

Moodle is a administration system of educational activities that aim col-laborative learning, which allows integration between students and teach-er (Perez et al.,2012). The resources offered by moodle tool are assorted and can be used as distribuition of contente material and as evaluation of the commitment of each student. Besides, it’s understood that AVA Moo-dle utilization in differentiated learning methodologies can be very enrich-ing, therefore, this presente study aim to evaluate the impact of this tool results when adopted learning methodologies are applied in a presential

1 Acadêmica do curso de Ciências Contábeis da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

2 Acadêmica do curso de Ciências Contábeis da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail:[email protected]

3 Professora orientadora Ms. Do curso de Ciências Contábeis na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected].

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subject, with AVA Moodle. The content analysis tchnique consists of analy-sis of collected data through the reports of the students of an Audit I class in a higher education institution, when the students were submmited toa a learning methodology known as “virtual gymkhana”. Their feedbakcs were transcribed for a report and later submmited to content analysis, willing to extract the positive and negative on the said activity. The results point to positive changes in the students behavior and thinking about working group and the development of the discipline, being Moddle a importante tool for interaction between teachers and students and evaluation of the students and the subject.

KEYWORDS: Purchase and Sale; Brazilian Civil Code; International Buying and Selling Contracts of Goods; 1980 Vienna Convention.

1 INTRODUÇÃO

Muitos estudos tratam do uso de ambientes virtuais de aprendizagem no ensino a distância (COSTA; NETO; SANTANA, 2014; SANTOS et.al, 2016; MAGALHÃES et.al, 2010). Um dos ambientes mais utilizado para desenvolver cursos EAD é o Moodle (MOODLE, 2014). Segundo Romero et al. (2008) o Moodle (Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment - Ambiente Modular de Ensino Dinâmico Orientado ao Objeto) permite que educadores enviem informações aos estu-dantes, produzam material de conteúdo, preparem tarefas e testes, se envolvam em discussões, gerenciem turmas à distância e permitam a aprendizagem colaborativa com fóruns, chats, áreas de armazenamento de arquivos, serviços de notícias, etc.

Conforme Perez et al. (2012), o Moodle é um Sistema de Gestão de Aprendizagem – SGA que se destaca dos demais por sua facilidade de manuseio e por ser um software com fonte aberta, sendo um sistema de administração de atividades educacionais voltado à aprendizagem colabo-rativa, possibilitando a integração entre estudantes e docentes. Arriada (2014) afirma que o uso de recursos do Moodle pode ser utilizado em estratégias práticas de avaliação de aprendizagem dos estudantes, vinculada à avaliação contínua e abrangente da participação e do empenho de cada um através dos registros das atividades e diálogos registrados ao longo da disciplina (Relatório de Atividades e o Relatório de Mensagens do Fórum).

Diante desta perspectiva, entende-se que, embora o Moodle seja amplamente utilizado para possibilitar o ensino à distância, nada obsta que ele seja utilizado para complementar o conteúdo desenvolvido presencialmente. Isto porque permite que, além da interação promovida pelo contato dos alunos em sala de aula, os mesmos podem continuar em contato fora dela.

Romero, Ventura e Garcia (2008) afirmam que aulas presenciais tradicionais acumulam infor-mações apenas sobre frequência dos alunos, informações sobre o curso e metas curriculares, enquanto o ensino através de um computador, com educação baseada na web, armazena muito mais informações sobre as ações dos alunos e suas atividades, permitindo uma melhor avaliação sobre o rendimento destes alunos através da interação com o uso das ferramentas do Moodle e

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70 PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA ADOÇÃO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA O CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS: AVALIANDO A GINCANA VIRTUAL

seu banco de dados.

Assim, entende-se que a utilização do AVA Moodle na aplicação de metodologias diferenciadas de aprendizagem pode ser muito enriquecedora, sobretudo para o curso de ciências contábeis que tem por característica atrair discentes mais introspectivos. Diante deste contexto, o pro-blema de pesquisa é: Qual foi o impacto sobre os alunos mediante a adoção de metodologias de aprendizagem aplicadas em uma disciplina presencial, com a utilização do AVA Moodle? Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo avaliar o impacto sobre a adoção de metodologias de aprendizagem aplicadas em uma disciplina presencial, com a utilização do AVA Moodle. Os dados foram coletados através dos relatos dos alunos de uma turma de Auditoria I de uma instituição de ensino superior, quando submetidos a uma metodologia de aprendizagem denominada “gin-cana virtual”. Seus pareceres foram transcritos para um relatório e posteriormente submetidas a análise de conteúdo, visando extrair os pontos positivos e negativos sobre a referida atividade.

Este trabalho está dividido da seguinte forma: a seção a seguir apresenta os estudos rela-cionados sobre o tema, a seção seguinte apresenta a dinâmica aplicada denominada de Gincana virtual, em seguida apresenta-se a metodologia aplicada para atingimento do objetivo principal e a última seção apresenta os resultados obtidos.

2 ESTUDOS RELACIONADOS

Ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) são estruturas criadas especialmente para o ensino a distância, mas, devido à grande diversidade de ferramentas de avaliação e interação entre alunos e tutores, o AVA pode ser utilizado como recurso complementar ao ensino nos cursos presenciais, melhorando o processo de ensino-aprendizagem (SANTOS et al., 2016).

Mozzaquatro e Medina (2008) realizaram estudo em duas instituições de ensino superior com objetivo de avaliar, comparar e analisar as customizações realizadas nos AVAs Moodle destes dois ambientes de estudo. Através de avaliação dos acessos e de questionários feitos aos alunos, os autores constataram que este AVA é considerado pelos alunos um importante instrumento de aprendizagem e discussão, sendo o fórum aceito com uma das melhores ferramentas disponíveis no Moodle, por permitir a exposição de opiniões e troca de informações entre alunos e tutores.

Perez et al. (2012) afirmam que instituições de ensino estão investindo em sistemas e tecno-logias de informação para melhorar os resultados e desempenhos de professores e alunos. Em sua pesquisa com professores de uma instituição de ensino superior, os autores constataram melhora nos serviços prestados, nos processos de ensino-aprendizagem e na interação entre alunos e professores. Conforme estes professores, era difícil implementar estas melhorias antes da adoção da ferramenta, sendo a experimentação, a facilidade de uso e o uso voluntário fatores determinantes na adoção do Moodle.

Nunes et al. (2012) realizaram estudo em uma instituição de ensino superior que utiliza o AVA Moodle tanto no ensino a distância como no ensino presencial. Neste estudo observou-se que o AVA analisado disponibiliza aos professores recursos de aquisição, distribuição, interpretação e armazenagem de informação, além de obtenção de relatórios que possibilitam a tomada de

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decisão quando aos processos de ensino.

Gottardo et al. (2012) investigaram a viabilidade de aplicação de técnicas de EDM para realizar inferências referentes ao desempenho de estudantes em diversas fases ou etapas de realização de um curso, utilizando algoritmos de classificação, concluindo ser possível obter estas inferências com taxa de aproximadamente 75% de precisão.

Paiva et al. (2013) apresentou em pesquisa cujo objetivo era descrever e analisar como alunos do curso presencial de graduação em Ciências Contábeis de duas instituições de ensino superior avaliam as atividades de educação a distância. Tal estudo, através do uso de questionários, res-salta como vantagens do ensino através do Moodle o acréscimo de conhecimentos e informações na área e otimização de tempo.

Santana et al. (2014) aplicaram técnicas de mineração de dados, conhecidas como EDM (Educational Data Mining) e questionários, respondidos por tutores de uma instituição de ensino superior, em estudo cuja finalidade era avaliar o uso e a influência das ferramentas de aprendi-zagem disponíveis no AVA Moodle. Os resultados de tal estudo mostraram que as ferramentas do Moodle estavam sendo subutilizadas e não estavam tendo influência relevante no desempenho dos estudantes.

A seguir apresenta-se a dinâmica conhecida como gincana virtual, que foi a metodologia em-pregada para desenvolver a análise proposta por esta pesquisa.

3 GINCANA VIRTUAL

A dinâmica denominada gincana virtual objetiva incentivar a colaboração e propiciar a inte-gração de alunos de diferentes grupos e discutir e revisar assuntos trabalhados na disciplina. Para concretização da gincana virtual o professor precisa disponibilizar um texto com as regras da atividade, dividir a turma em equipes e informar de que forma as “tarefas” devem ser entre-gues. No ambiente virtual podem ser disponibilizadas salas de bate papo (um para cada equipe) destinadas às discussões e às soluções dos desafios, bem como um fórum, organizado em tó-picos para a postagem das respostas (CAMPOS, SILVEIRA, 2013). Para este estudo optou-se por utilizar o glossário, para pesquisa e divulgação de termos relevantes ao estudo, as tarefas, para desenvolvimento de material de conteúdo e o fórum como meio de comunicação das atividades e interação entre alunos e professor.

O fórum foi escolhido porque, segundo a professora Mára Carneiro, estudiosa e defensora da utilização da ferramenta AVA Moodle:

O recurso do fórum do ambiente do MOODLE é um recurso de comunicação assíncrono, isto é, que pode ser utilizado a qualquer momento, mas sem a exigência de agendamento prévio para o encontro dos participantes. Dessa forma, os participantes de uma discussão através de um fórum têm a possibilidade de ler ou enviar mensagens nos horários que lhes forem mais convenientes. Em consequência, com o uso do fórum de forma assín-crona e por um determinado período de tempo previamente combinado, há mais tempo para os participantes (re) pensarem e relacionarem ideias, ampliando a qualidade e o

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aprofundamento da discussão (Carneiro, 2009, p.24).

De modo geral, o fórum é o espaço que permite a discussão de ideias sobre os temas aborda-dos no curso e, consequentemente, trocas entre colegas, professores e tutores. A comunicação no fórum de discussão permite ao usuário refletir sobre o que os outros abordam nesse espaço, inserindo nele suas próprias reflexões.

Outro recurso utilizado na gincana foi o glossário, porque, conforme Carneiro (2009) “(...) ao criar um Glossário, os alunos de um curso participam trocando conhecimentos, e esses conheci-mentos expandem-se através de todo o grupo. Além disso, como o Glossário fica visível para todos os participantes do curso, há maior possibilidade de trocas e aprendizagens”. Ainda segundo a autora, um glossário permite que alunos e professores compartilhem definições sobre palavras específicas de determinado seguimento ou pouco conhecidas utilizadas nas tarefas.

Tarefa é o termo usado pelo Moodle para identificar uma atividade onde são permitidos o envio de dados e arquivos pelo aluno ao professor, devendo ser configurado por este professor o ambiente conforme o tipo de tarefa, registrando seu conceito (CARNEIRO, 2009).

O próximo item apresenta a metodologia empregada neste estudo, seguido pela análise dos resultados.

4 METODOLOGIA

Esta pesquisa apresenta abordagem qualitativa, do tipo descritiva. Conforme Beuren et al. (2004) a pesquisa descritiva tem como objetivo principal descrever aspectos ou comportamentos de determinado grupo. Quanto aos procedimentos, o presente estudo pode ser classificado como bibliográfico, pois contém a análise de publicações sobre o tema analisado.

Utilizou-se análise qualitativa da informação, mediante a técnica conhecida como análise de conteúdo, que é um método de estudo de dados utilizado tanto para pesquisas qualitativas como para pesquisas quantitativas, tendo por objetivo investigar as comunicações entre homens, exa-minando o conteúdo simbólico das mensagens (BEUREN, 2004).

O conteúdo a ser analisado originou-se a partir de uma das tarefas da gincana virtual. Esta gincana foi uma metodologia de aprendizagem pensada para uma turma de auditoria I, disciplina do sétimo semestre do curso de ciências contábeis. A disciplina tinha 60 alunos matriculados e todos a concluíram obtendo notas que variaram de 6 a 10. Todos os 60 participantes passaram por média.

O conteúdo planejado para ser aplicado mediante a gincana virtual abrangia o equivalente a duas aulas tradicionais. O conteúdo foi proposto para ser desenvolvido parte a distância, parte em horário extraclasse e uma parte presencial. Cabe destacar que esta disciplina é programada como disciplina presencial, cujas atividades desenvolvidas a distância podem contemplar 20% da carga horária total.

No ambiente virtual a atividade foi divulgada da seguinte forma:

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Quadro 1: Divulgação da atividade.

Fonte: elaborado pelo autor.

Destaca-se a importância da clareza da linguagem ao solicitar as tarefas e a utilização de re-cursos visuais para destacar as informações mais importantes. Mesmo assim foi disponibilizado um chat para esclarecimento de dúvidas, com o seguinte texto:

“Este chat estará disponível das 19:00 às 22:10 do dia 19/04/2016 para esclarecimento de dú-vidas sobre o conteúdo e sobre as regras da gincana (antes de postar a sua dúvida com relação as regras apenas se certifique de ter “lido, lido tudo e lido até o final” as informações postadas tanto na página inicial, quanto em cada tarefa do Fórum Gincana). ”

Os grupos foram formados de forma aleatória pelo Moodle. A seguir apresenta-se os resul-tados relatados pelos alunos referentes aos sentimentos envolvidos durante o período em que a atividade foi desenvolvida (19 de abril de 2016 até 10 de maio de 2016).

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

A quinta e última tarefa da gincana virtual consistiu em postar via fórum uma análise do de-sempenho e sentimento dos integrantes do grupo, elaborado pelo relator de cada equipe. Foram constatados sentimentos comuns como receio inicial ao realizar tarefas com outros alunos, até então desconhecidos ou com pouco contato, e satisfação ao final das atividades, ao perceberem o êxito nas atividades e melhora no relacionamento interpessoal.

Os alunos foram distribuídos em dez grupos, formados aleatoriamente. Dentre os dez grupos, apenas dois não cumpriram a tarefa cinco. Abaixo seguem trechos extraídos dos relatos posta-dos, expondo os receios iniciais de alguns grupos e os relatos positivos sobre o desempenho no trabalho e seus benefícios:

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Para nós, integrantes do Grupo A, o resultado da Gincana Virtual de Auditoria foi positivo, uma vez que tal gincana nos proporcionou a oportunidade de interagir e trocar ideias com colegas, os quais não possuíamos contato, expandindo assim a relação com os demais membros da turma (...) As tarefas exigidas pela gincana serviram como uma oportuni-dade de aprendizagem mais dinâmica da matéria, de modo que o conteúdo da disciplina foi absorvido de modo mais fácil (...) Portanto, com todas as tarefas realizadas, além de nos dar a oportunidade de trocar pontos de vista diferentes com colegas diversos, os quais não costumamos trabalhar em aula, propiciou um melhor entendimento da ma-téria, auxiliando no estudo do conteúdo da disciplina de uma maneira diferente, eficaz e eficiente, e, consequentemente, servindo como base sólida para o estudo das matérias da aula para a prova. (Grupo A)

Percebe-se no relato do grupo A a ênfase nos pontos positivos da gincana virtual com relação à melhora na interação entre colegas e no entendimento dos conteúdos da disciplina, enquanto o grupo B relata inicial descrença no aproveitamento da gincana, porém, no decorrer da dinâmica, passam a ter percepções positivas com relação a experiência proposta.

(...). Em relação às opiniões dos participantes, o consenso era de que as atividades pro-postas dificilmente agregariam algo ao desenvolvimento da disciplina. (...) fez com que todos participássemos ativamente da realização das atividades, escolhendo quais concei-tos deveriam ser postados no glossário e de que forma o capítulo 13 do livro deveria ser abordado na apresentação, para englobar da forma mais satisfatória possível o conteúdo exposto. Com as atividades concluídas, o sentimento que fica entre os integrantes é de que a gincana proporcionou uma experiência nova de aprendizado e fez com que todos tivéssemos que entender os conteúdos propostos de uma forma diferente e com mais comprometimento. (Grupo B)

Abaixo apresenta-se o relato do grupo C, onde se percebe forte sentimento de individualismo:

(...) a equipe não pôde contribuir da maneira que gostaria na realização da quarta tarefa. (...). De modo geral, a atividade da gincana disponibilizou aos integrantes do grupo, uma diferente oportunidade de conhecer mais pessoas no curso. Existem diversas maneiras de como cada estudante aproveita a disciplina e seus conteúdos e os acrescenta ao seu conhecimento, e um desafio fica posto ao trabalhar com pessoas com quem se tinha pouco contato. (...). Esse formato de trabalho, onde o contato e as decisões do grupo são realizados à distância, é uma tendência que cresce. Cada integrante pôde administrar seu tempo ao longo do dia ou da semana para dar sua contribuição ao grupo. (Grupo C)

O grupo C destaca em seu relato a individualidade das relações, onde cada aluno executa suas tarefas de acordo com sua disponibilidade de tempo, limitando a interação aos momentos de tomada de decisão, não havendo significativa troca ligada ao relacionamento interpessoal. Em contrapartida, o grupo D destaca em seu relato a importância dada ao trabalho em equipe, dada à competividade imposta pela dinâmica.

A equipe não mediu esforços para concluir as tarefas e não tivemos atritos significativos a ponto de não conseguirmos cumprir as tarefas. Destacamos também que gostamos

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 75

da forma que o conteúdo foi passado - através de uma gincana. Não só pelo ensino EAD, mas também para ter um espírito competitivo, o que está muito presente no mercado de trabalho dos contadores. (Grupo D)

No relato abaixo, o grupo F dá ênfase dada ao trabalho em equipe, que lhes proporcionou me-lhorias no relacionamento entre colegas e, consequentemente, em seu rendimento na disciplina.

(...). Inicialmente houve o receio de realizar um trabalho em conjunto, com diversas ativi-dades diferentes, com pessoas das quais não conhecíamos(...). Neste ponto a gincana se tornou uma tarefa completamente diferente das que estávamos acostumados(...)Sendo assim, a gincana acabou por propiciar um conhecimento maior dos colegas e, de forma rápida, conhecer seus interesses individuais com a disciplina e com a universidade. Devido ao grande número de atividades propostas, tivemos que realizar uma distribuição de ati-vidades de acordo com o tempo e capacidade individual de cada integrando do grupo para que as atividades focem construídas da melhor forma possível, um verdadeiro trabalho de equipe, demonstrando a empatia de todos os integrantes. Por fim o grupo avaliou a atividade como positiva pelo seu aspecto inovador e didático. Certamente muito rico em aprendizado, onde acabamos, na maioria das atividades, estudando a fundo as matérias para, dali, tirar a sua essência. Contribuindo, dessa forma, para a construção da consulta para prova de forma mais prática. (Grupo F)

O grupo G, apesar de não ter apresentado o melhor rendimento entre as equipes, salienta os benefícios proporcionados pelo trabalho em equipe, como cooperação e maior envolvimento com o tema da disciplina.

(...) chegamos à conclusão de que mesmo não sendo a equipe a somar mais pontos, conseguimos desenvolver os conteúdos, realizar maior aprofundamento em assuntos anteriormente abordados em sala de aula e promover integração entre os componentes do grupo, o que é algo bastante significativo. Acreditamos que embora a modalidade de gincana tenha como resultado uma equipe vencedora, o objetivo desta atividade era propor um envolvimento diferenciado para com a disciplina, possibilitando ampliação dos conhecimentos acerca de auditoria e cooperação mutua entre os integrantes dos times e isto foi algo que conseguimos alcançar em nosso grupo. (Grupo G)

(...). Trabalhar em equipe em muitas ocasiões pode ser um problema, e a habilidade em desenvolver este atributo é válida para nós que, muito provavelmente, encararemos de-safios dessa magnitude, ou maiores, em nossos ambientes de trabalho ou em processos seletivos de diversas empresas. Após realizadas as tarefas o sentimento que fica é de um desenvolvimento muito rico de aprendizado, em que muitos atributos e capacidades foram observadas e incrementadas. Nas inúmeras conversas de “whats app” e trocas de e-mail ficou evidenciado o interesse dos alunos em se comprometer com o trabalho que para nós, com absoluta certeza, é algo inovador dentro de uma disciplina com tantas normas e regulamentos para serem vistos em um curto espaço de tempo. (Grupo I)

Os grupos I e J apresentam relatos semelhantes, onde novamente se percebe o receio inicial ao trabalhar em grupos onde os alunos não se conheciam, sendo este sentimento substituído por

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76 PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA ADOÇÃO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA O CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS: AVALIANDO A GINCANA VIRTUAL

satisfação ao realizar uma atividade que, não apenas agregou conhecimentos ligados à disciplina, mas lhes possibilitou superar as dificuldades de relacionamento.

(...). Logo que foi divulgada a atividade da gincana o grupo teve um sentimento de descon-forto, pois sabemos que em atividades em grupo as decisões se tornam mais difíceis e a realização das tarefas nem sempre fica bem distribuída. (...). Por fim, percebemos que a gincana nos trouxe resultados bastante positivos, pois além de ter gerado várias discussões acerca dos temas estudados, nos proporcionou interagir com novos colegas. (Grupo J)

Os relatos explicitam as dificuldades e preocupações de alguns alunos com relação ao rela-cionamento entre colegas desconhecidos, receio quanto à distribuição justa das tarefas e preo-cupação com o cumprimento dos prazos, pois a data e hora da postagem dos materiais no Moodle fica registrada. Ademais, nota-se que estas impressões se revertem em comentários positivos, elogios à dinâmica adotada e revés positivo para o desempenho dos alunos e o desenvolvimento da disciplina. Tais constatações são corroboradas pelo rendimento dos alunos, sendo que 32 dos 60 alunos (53%) atingiram notas entre as máximas, 9 e 10, seguidos de 17 alunos (28%) com notas entre 8 e 8,9, confirmando o resultado positivo que a dinâmica, desenvolvida através do Moodle, proporciona aos alunos usuários.

Tabela 1: Notas.

Fonte: elaborado pelo autor.

Para avaliação quanto ao entendimento do conteúdo da disciplina, foram utilizadas três principais ferramentas do Moodle (fórum, glossário e tarefas). Estas ferramentas exigiram dos alunos desempenho e desenvolvimento de materiais diversos, que podem ter contribuído para

o esclarecimento amplo da matéria em estudo, confirmados pelos resultados em suas notas.

6 CONCLUSÃO

Estudo realizado por Perez et al. (2012) infere sobre a busca que instituições de ensino superior estão fazendo para incluírem em suas metodologias de ensino o uso de sistemas e tecnologias de informação, visando melhorar os resultados e desempenhos de professores e alunos. Dentre os sistemas usados encontra-se o AVA Moodle, sendo considerado um dos sistemas mais completos e de fácil utilização. O Moodle foi criado para melhorar o ensino à distância, mas nada obsta sua aplicação como ferramenta de melhoria no ensino presencial. Diante este cenário, esta pesquisa tem como objetivo avaliar o impacto sobre os alunos com a adoção de metodologias de aprendi-

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zagem aplicadas em uma disciplina presencial, com a utilização do AVA Moodle.

Para realização deste estudo foi aplicada a análise de conteúdo sobre os relatos dos alunos de uma turma de Auditoria I de uma instituição de ensino superior. Os resultados apontam para mudanças positivas no comportamento e pensamento dos alunos com relação ao trabalho em grupo e desenvolvimento da disciplina, sendo o Moodle ferramenta importante para a interação entre alunos e professor e para a avaliação de alunos e da disciplina.

Pode-se observar nos relatos que o uso do Moodle como ferramenta para condução da dinâmica de ensino não apenas contribuiu para o melhor aprendizado dos alunos e para a melhor avalia-ção por parte do professor, como contribuiu para o desenvolvimento pessoal dos alunos, através da interação entre eles, permitindo que trocassem informações, conhecimento e experiências, aumento de seus círculos sociais/profissionais e enfrentassem dificuldades e inquietações ao interagir com desconhecidos, resultando em redução dos anseios nas relações.

O professor possui papel importante na transformação do aluno ao decorrer do ano letivo. Preocupar-se com ensinar e possibilitar melhoras no contexto pessoal do aluno, indo além da transferência de conhecimento técnico específico, contribui para a transformação da sociedade. Na busca por este diferencial, professores podem usar de tecnologias para suprir necessidades e complementar seu trabalho em sala de aula, continuando a transformação fora dela.

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78 PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA ADOÇÃO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA O CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS: AVALIANDO A GINCANA VIRTUAL

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80 O TRABALHO DO APENADO E A (DES)MARGINALIZAÇÃO DO DIREITO LABORAL

O TRABALHO DO APENADO E A (DES)MARGINALIZAÇÃO DO

DIREITO LABORAL

Laura Machado de Oliveira1

RESUMO:

O sistema de execução penal vigente no ordenamento jurídico brasilei-ro prevê a obrigatoriedade do trabalho do apenado à pena privativa de liberdade em caráter definitivo como forma de ressocialização da pes-soa e para evitar o ócio carcerário, dentre outros fins. Tal trabalho sofre a não incidência dos direitos trabalhistas previstos na CLT, possuindo, o apenado, resguardo apenas a alguns benefícios previstos na legislação penal, além da remição da pena em razão do trabalho prestado. O Estado, ao possuir a custódia do condenado, deverá devolvê-lo para a sociedade como um cidadão capaz de coexistir em condições de convivência pacífica com os demais. Contudo, a conjuntura carcerária brasileira está calcando o caminho contrário, pois há o desrespeito à dignidade da pessoa humana, condição primordial para o tratamento de reabilitação.

PALAVRAS-CHAVE: Trabalho prisional; Trabalho obrigatório; Trabalho forçado; Direito do Trabalho; Ressocialização.

ABSTRACT:

The current criminal enforcement system in the Brazilian legal system provides for compulsory work of the convict to deprivation of liberty on a permanent basis as a way of the person’s rehabilitation and to avoid prison idleness, among other purposes. Such work suffers no impact of labor rights under the Labor Code, having the convict, guard just a few benefits under the criminal law, as well as redemption of the sentence because of the work performed. The State, has custody of the condemned should re-turn it to society as a citizen able to coexist in peaceful coexistence condi-tions with others. However, the Brazilian prison environment is trampling the other way, because there is disrespect for human dignity, fundamental condition for rehabilitation treatment.

KEYWORDS: Prison labor; Compulsory labor; Forced labor; Labor Law; Resocialization.

1 Professora de direito e processo do trabalho. Advogada pós-graduada em direito e processo do trabalho. Mestra em direito do trabalho pela UFRGS. Avaliadora de diversas revistas acadêmicas. Link para currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/0555594539829843.

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1 O TRABALHO DO APENADO NO ATUAL CONTEXTO BRASILEIRO

A ciência do direito sempre deverá ser abordada sob diversos enfoques, não apenas na área pormenorizada, específica na qual se concentram os principais efeitos, mas também nas demais searas em que porventura possam ocorrer respingos desses efeitos. É o que ocorre no campo do trabalho prisional, pois se verifica um forte ponto de encontro entre as disciplinas penalista e trabalhista, visto que o trabalho é realizado em ambiente prisional.

Adentrando no aspecto do direito penal, encontra-se artigo 5°, XLVI da CRFB as penas legalmente permitidas no Brasil.2 Sem embargo, apesar desse rol de penas na Carta Magna brasileira, demais direitos poderão ser suprimidos em decorrência da sentença condenatória que determinará a pena a ser aplicada no caso concreto, que será o demonstrado abaixo: a imputação de cumprimento da pena privativa de liberdade com a consequente restrição aos direitos trabalhistas. Portanto, encontra-se, novamente, em outro contexto histórico, a colisão entre a pena e o trabalho.

1.1 A CLASSIFICAÇÃO DO TRABALHO PRISIONAL

Primeiramente, antes de se adentrar no próprio mérito do trabalho prisional, é necessária a abordagem a respeito em favor de quem tal trabalho será prestado. Para cada situação (trabalho efetuado internamente ou chamado de intramuros/externamente ou chamado de extramuros, em benefício da iniciativa pública/privada), há particularidades, pois cada Estado federativo possui a sua forma de regulamentar a questão através de suas Secretarias de Segurança Pública, com o departamento competente para tanto, podendo ser realizado tanto o trabalho interno quanto o externo em seu benefício. Por exemplo, o trabalho interno é aquele efetuado para a própria manutenção do sistema carcerário, como em serviços para manutenção, limpeza, preparo de alimentação, etc da casa prisional.

Por seu turno, a respeito do trabalho prestado para a iniciativa privada, Rodrigo Garcia Sch-warz explica:

O trabalho prisional consiste na prestação de serviços, por trabalhadores condenados a pena privativa de liberdade gerenciada por terceiros. Embora o trabalhador preso esteja sob a administração do Estado, através de um regime de direito público, mui-tas vezes a mão-de-obra [sic] prisional vem a ser utilizada por empresas privadas. (SCHWARTZ, 2011. p. 102)

1.2 BENEFÍCIOS E DIREITOS RELATIVOS AOS CONDENADOS NA EXECUÇÃO LABORAL

Inúmeras são as vantagens apontadas pela doutrina para o trabalho carcerário, dentre elas: o trabalho teria o fim de evitar o ócio dentro do sistema prisional, evitando rebeliões, impedindo a fragilização do sistema, assim como ajudando a desafogar os presídios superlotados, uma vez que a pena será diminuída com a remição dos dias trabalhados. Nesse sentido, Miguel Reale

2 Art. 5°. CRFB. XLVI. A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;

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82 O TRABALHO DO APENADO E A (DES)MARGINALIZAÇÃO DO DIREITO LABORAL

Júnior afirma:

O trabalho constitui a espinha dorsal da execução da pena privativa de liberdade. A va-lorização do trabalho justifica-se, pois, se a ociosidade do desempregado constitui um desespero, não só por falta do salário essencial, mas também por não se ter o que fazer, mal do qual sofrem os aposentados, maior ainda é a aflição do preso, já destituído de todos os demais papéis sociais. Por essa razão a Lei de Execução Penal institui o trabalho como um dever e um direito do preso. [...]

O trabalho indica quem e como é a pessoa, que, em geral, orgulha do que faz. O trabalho fixa o horizonte da pessoa, a coloca no mundo social, a situa na sociedade. O trabalho para o homem preso é tanto ou mais importante do que para o homem livre, pois é necessário para a sua higidez mental e condição de dignidade humana, art. 28 da Lei de Execução Penal, imprescindível para fazer o tempo perdido passar e assim não ser tão perdido. [...]

O trabalho é instrumento de disciplina prisional e a dedicação ao mesmo é estimulada, não só pela punição como falta grave [...], como pela possibilidade de remição da pena [...]. Outorga-se um prêmio ao trabalho, tal o relevo que possui o exercício das tarefas [...]. (REALE JÚNIOR, 2003, p. 15-16)

O autor contempla todo o resgate como pessoa que o trabalho realiza, seja para a sua higidez mental, pelo seu orgulho e para a sua própria dignidade. Além disso, o labor ajuda na disciplina prisional.

Luiz Antônio Bogo Chies aduz:

O trabalho no cárcere, portanto, principalmente na origem do sistema punitivo prisional, possui uma função muito mais relevante do que a de somente evitar o ócio do recluso.

O trabalho prisional, como primeiro e mais direito elemento de vinculação entre a prisão e o sistema de produção do modelo socioeconômico capitalista, soma-se ao aspecto retributivo da reclusão para, a partir de atuações objetivas e subjetivas sobre o detento, a comunidade carcerária reclusa e a comunidade livre, repassar padrões e valores do sistema no qual o cárcere está inserido, manifestando este, assim, já a partir de sua gênese, aspecto de repasse ideológico no cumprimento de suas funções como aparelho a serviço do estado. (CHIES, 2000, p. 82)

De acordo com o autor, a sistemática adotada com o implemento do trabalho nas penitenciárias seria, além de evitar o ócio do detento, para demonstrar ao apenado o atual sistema econômico capitalista brasileiro. Além das vantagens acima referidas, há certos benefícios e direitos cabí-veis aos condenados, como a remição da pena e a remuneração pelos serviços prestados. Cabe ressaltar que o preso não possui os direitos celetistas,3 em razão disso serão estudados apenas os direitos concedidos na execução laboral de acordo com a LEP.

3 Art. 28 LEP. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. § 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

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1.2.1 REMIÇÃO

Apontado como um dos maiores benefícios ao apenado, o trabalho, além de servir para a rein-serção social e o aprendizado, ajuda na remição de sua pena, isto é, a cada três dias trabalhados, será reduzido um dia de sua pena, de acordo com o artigo 126, § 1o, II da LEP.4 O preso, quando impossibilitado por acidente de prosseguir no trabalho ou nos estudos, continuará a beneficiar-se com a remição, consoante o § 4o do mesmo artigo. A remição deverá ser sempre declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.

1.2.2 REMUNERAÇÃO

A obrigação do pagamento ao preso foi introduzida pela Lei n. 6.416, de 1977, seguindo as diretrizes expedidas pela ONU a respeito das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos, em 1955, que estabeleceu também a forma de sua aplicação. Antes disso, nas penitenciárias em que o trabalho prisional era obrigatório, o preso não recebia remuneração e seu trabalho não era tutelado contra riscos nem amparado por seguro social. Nos estabelecimentos prisionais de qualquer natureza, os Poderes Públicos valiam-se das aptidões profissionais dos presos em trabalhos gratuitos.

Atualmente, a respeito do benefício da remuneração pelo trabalho prestado, encontra-se o artigo 29 da LEP5 sobre a matéria. O pecúlio previsto no § 2º do artigo 29 destina-se como um fundo para o preso se sustentar logo que posto em liberdade, um fundo para as suas necessida-des de sobrevivência. Isto é, o pecúlio, na maioria dos casos, é ilusório, pois os valores pagos aos detentos na maioria das vezes são baixos, e tal valor deverá, primeiramente, atender às questões dispostas no § 1°. Assim, o pecúlio só será gerado quando sobrarem quantias monetárias relati-vas à remuneração do preso. Se o dinheiro for utilizado nas outras finalidades dispostas na lei e, consequentemente, não restarem valores, o pecúlio não será fomentado.

O Código Penal, em seu artigo 39,6 determina que o trabalho do preso seja sempre remunerado, além de que sejam garantidos os benefícios da Previdência Social. A remuneração sofrerá enfo-ques diversos a respeito do benficíario do labor, uma vez que é possível ser realizado em favor da administração pública ou para a iniciativa privada. O trabalho efetuado em prol da administração pública, é claro, será remunerado pela própria administração.

Já em relação a iniciativa privada, há custos menores de produção com o emprego dos apena-dos em função da não configuração da relação de emprego, portanto o trabalho do preso torna-se uma mão de obra muito barata para o empregador, porque se utiliza da força de trabalho nos doze meses do ano (pois não há direito a férias), não implica o pagamento do Fundo de Garantia

4 Art. 126 LEP. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. § 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de: II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho. § 3o Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compa-tibilizarem. § 4o O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.

5 Art. 29 LEP. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo. § 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender: a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que deter-minados judicialmente e não reparados por outros meios; b) à assistência à família; c) a pequenas despesas pessoais; d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores. § 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.

6 Art. 39 CP. O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social.

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do Tempo de Serviço (FGTS) e o pagamento do décimo terceiro salário, além do valor pago ao apenado ser menor do que o salário-mínimo nacional.

Dessa forma, comprova-se o caráter remuneratório do trabalho carcerário, introduzido no sistema capitalista com finalidade de lucro, através do empresariado que aplica a mão de obra para obtenção dos frutos da produção que serão comercializados logo que finalizados. É nesse momento que se visualiza a problemática da remuneração, mesmo sendo conferida com status de direito ao preso.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) vem trilhando a proteção ao preso. No Estado do Pa-raná, o MPT ingressou com pedido de ação civil pública contra o Governo do Estado em razão das irregularidades no trabalho penitenciário. Há situações em que o serviço é prestado a terceiros (iniciativa privada), e os reclusos chegam a ter salários de R$ 30,00.7 Uma inspeção feita pelo MPT na fabricante de luvas Yelling mostrou que a empresa se utiliza de mão de obra carcerária com 90 presos, sendo que o total de empregados é 175. Ainda se constatou que os trabalhadores não possuem nenhum tipo de controle de saúde, sendo expostos a produtos químicos.

Dentre outras problemáticas que o MPT requer, encontram-se: exigência de atividades pro-fissionais que tenham finalidades e caráter educativo, formativo, capacitador, profissionalizante; proibição de sanções disciplinares aos trabalhadores presos que se recusarem ao trabalho; proi-bição do uso de mão de obra carcerária para suprir carência de seus quadros funcionais; proibição de transferir a terceiros a administração, manutenção e/ou operacionalização dos presídios.

Na reportagem “Indústria disputa trabalho barato do preso”, da Folha de São Paulo Online, é abordado o valor pago aos presos, que gira em torno de R$ 300,00 por mês. Além do mais, há a notícia de diversas denúncias nos sindicatos das indústrias e de trabalhadores, do final de 2005, sobre a exploração do trabalho dos presos e a consequente concorrência desleal praticada pelas empresas que utilizam essa mão de obra. Conforme informado, um metalúrgico, por exemplo, custa cerca de R$ 1.300,00 por mês para a indústria, incluindo encargos sociais. Um preso, R$ 400,00 mensais, no máximo. Isto é, o preso custa para uma indústria, em média, de 25% a 30% do que custa o trabalhador. Uma ala da Penitenciária Feminina de São Paulo parece mais uma empresa do que uma penitenciária – cerca de 480 presas trabalham para indústrias, ou 75,5% da população carcerária. (FERNANDES, 2006)

A esse fato, dá-se o nome de dumping social, fato que não está atrelhado únicamente ao tra-balho carcerário, mas a qualquer relação em que o empresariado alfira lucros de uma forma desproporcional em comparação ao restante do mercado, ferindo o princípio da livre concorrência, previsto constitucionalmente.8

Jorge Luiz Souto Maior, Ranúlio Mendes Moreira e Valdete Souto Severo conceituam tal acontecimento:

O “dumping social” constitui prática reincidente, reiterada, de descumprimento da legislação

7 ASCOM/MPT-PR. Paraná tem presos trabalhando por salário de R$ 30,00, afirma MPT-PR. MPT 9ª Região, Curitiba, 6 fev. 2014. Disponível em: <http://www.prt9.mpt.gov.br/procuradorias/45-noticias-prt-curitiba/424-parana-tem-presos-trabalhando-por-salario-de-r-30-afir-ma-mpt-pr-2>. Acesso em: 7 abr. 2014.

8 Art. 170 CRFB. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV - livre concorrência;

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trabalhista, como forma de possibilitar a majoração do lucro e de levar vantagem sobre a concorrência. Deve, pois, repercutir juridicamente, pois causa um grave desajuste em todo o modo de produção, com sérios prejuízos para os trabalhadores e para a sociedade em geral. (MAIOR; SEVERO, 2014, p. 20-21)

Ou seja, o dumping social poderá ocorrer em qualquer ramo de atividade, com qualquer ca-tegoria envolvida, inclusive no trabalho carcerário.

A LEP não prevê um percentual que limite o uso da mão de obra presidiária nas empresas que se instalarem nas penitenciárias, apenas prevê, em seu artigo 36, §1°, o limite máximo de 10% de presos do total de empregados da obra ou serviços públicos, quando há o trabalho externo, e quando esse trabalho for prestado a favor da administração pública. Consoante ao tema, Jorge Luiz Souto Maior leciona:

A confusão legislativa permitiu que se vislumbrasse no trabalho do preso uma simples alternativa de mão de obra barata, para atender a interesses tanto do próprio Estado (que, nesse aspecto, age como se estivesse defendendo um interesse da sociedade) e da iniciativa privada, para um desenvolvimento das relações capitalistas com menor custo. Chega a ser agressivo ver empresas, com fins econômicos, obtendo benefícios, ainda maiores dos que já têm, com a desgraça alheia, sob o falso argumento de que estão realizando um serviço de natureza social. O maior serviço de natureza social que alguém verdadeiramente pode prestar a outra pessoa é respeitar os seus direitos, respeitá-lo como cidadão por inteiro e não tratá-lo como cidadão pela metade, o que estaria permitido em razão da necessidade dessa pessoa.

A Constituição garante a todos o direito a dignidade, a isonomia, a cidadania, a função social da economia, a proibição de discriminação, etc.

A previsão da legislação penal, que nega direitos trabalhistas aos presos, põe em questão a própria função da pena. (MAIOR, 2008. p. 65- 66)

Dessa forma, apesar do caráter remuneratório do labor prisional, o trabalho obrigatório com-binado com a baixa remuneração desenvolveram outras problemáticas. Verifica-se que a preocu-pação do trabalho carcerário não atinge apenas o próprio apenado com o seu desgaste excessivo, mas a sociedade, ocasionando a concorrência desleal e inclusive desemprego para a população não encarcerada. Visto isso, constata-se, principalmente, um fim econômico para o empregador, visando primeiramente, ao lucro, e apenas secundariamente, ao fim social do trabalho prisional.

O trabalho carcerário não é apenas isso, ele tem outro escopo. O operariado sofre com o abuso do poder diretivo, sendo que o apenado está ali para o aprendizado e a educação, deverá ocorrer uma contrapartida a esse trabalho prestado, o que não é verificado, bem pelo contrário, o apenado sai da prisão sem nenhuma garantia monetária (FGTS, por exemplo), apenas receberá o pecúlio (frisa-se novamente: se restarem quantias monetárias para o pecúlio), sem a qualificação ne-cessária, pois muitas vezes o trabalho é meramente mecânico, além do desgaste físico e mental, pois ao preso não é conferido o direito às férias.

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1.2.3 PREVIDÊNCIA SOCIAL

O preso possui direito à Previdência Social conforme os artigos 41 da LEP e 39 do Código Penal.9 Dessa forma, o preso possui direito a todos os benefícios previdenciários dispostos na Lei n. 8.213 de 1991, desde que cumpridos os requisitos para a sua concessão. Porém, resta a dúvida a respeito de em qual tipo de segurado ele será enquadrado dentro do sistema, isto é, segurado empregado, segurado especial, contribuinte individual, etc. O artigo 11 da citada Lei, que faz o enquadramento dos segurados obrigatórios, não refere o trabalho do preso em nenhum de seus incisos.

Porém, o Regulamento da Previdência Social, Decreto n. 3.048 de 1999, elenca os segurados que poderão, facultativamente, filiar-se:

Art. 11 Decreto n° 3048/1999. É segurado facultativo o maior de dezesseis anos de idade que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, na forma do art. 199, desde que não esteja exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência social.

§ 1º Podem filiar-se facultativamente, entre outros:

IX – o presidiário que não exerce atividade remunerada nem esteja vinculado a qualquer regime de previdência social;

XI – o segurado recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto [sic], que, nesta condição, preste serviço, dentro ou fora da unidade penal, a uma ou mais empresas, com ou sem intermediação da organização carcerária ou entidade afim, ou que exerce atividade artesanal por conta própria.

§ 3º A filiação na qualidade de segurado facultativo representa ato volitivo, gerando efeito somente a partir da inscrição e do primeiro recolhimento, não podendo retroagir e não permitindo o pagamento de contribuições relativas a competências anteriores à data da inscrição, ressalvado o § 3º do art. 28.

O apenado será segurado facultativo, e não obrigatório. Assim, é necessário o interesse do apenado em contribuir para a Previdência Social. Como os presos no Brasil (a maioria) não sabem do seu direito de se tornar um segurado da Previdência, acabam por não se filiar ao sistema.

Por fim, quanto ao rol de direitos garantidos, atualmente, aos apenados, apesar de não se en-contrarem amparados pelo direito trabalhista clássico, alguns são resguardados, como a jornada de trabalho, e o respectivo descanso semanal aos domingos de acordo com o artigo 33 da LEP.10

9 Art. 41 LEP. Constituem direitos do preso: III – Previdência Social; Art. 39 CP. O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social.

10 Art. 33 LEP. A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 (seis) nem superior a 8 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados. Parágrafo único. Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal.

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1.2.4 A RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO

Um dos pontos assinalados, largamente, pela doutrina diz respeito à aplicação do trabalho carcerário, sobre o seu cunho ressocializatório. Sergio Francisco Carlos Graziano Sobrinho aborda o surgimento da ressocialização no contexto da pena:

A ideia de correção do apenado foi inicialmente difundida pela Escola Correcionalista que sustentava que o único fim da pena é a correção do delinquente, pela sua transformação interior. Suas proposições avançaram os limites da conciliação das teorias absolutas e relativas da pena, acabando por preconizar a remodelação completa do Direito Penal tradicional, a extinção da pena e a concentração de esforços dirigida ao idôneo tratamento dos delinquentes.

Assim é que, a partir do século XVIII, com as mudanças provocadas, principalmente, pela Revolução Francesa e Iluminismo, a pena de prisão passa a ocupar destacado espaço nos chamados países civilizatórios. A função de ressocialização do “delinquente” e sua correlata ideologia do tratamento são tratadas no âmbito da teoria da pena, sob a rubrica genérica de prevenção especial ou, mais especificamente, por prevenção especial preventiva.

[...] a pena passou a não ter apenas um sentido de retribuição, mas também de prevenir o crime. O fim da pena, para a teoria da prevenção especial positiva, passa a ter a cono-tação de ressocialização, consubstanciada na ideologia do tratamento, visando à rein-serção social do indivíduo condenado, com a intenção de que ele passe a respeitar a lei. (GRAZIANO SOBRINHO, 2007, p. 71).

A ressocialização seria uma forma e um fim da pena. Seria uma forma de executá-la, assim como, após o seu cumprimento, seria contemplado o fim com a recolocação da pessoa à vida em sociedade. E, fatalmente, uma das formas de atingir a ressocialização seria através do trabalho.

Do ponto de vista filosófico e pedagógico, Michel Foucault em seu livro Vigiar e Punir estabelece as vantagens do trabalho:

Essa pedagogia tão útil reconstituirá no indivíduo preguiçoso o gosto pelo trabalho, recolocá-lo-á por força num sistema de interesses em que o trabalho será mais van-tajoso que a preguiça, formará em torno dele uma pequena sociedade reduzida, sim-plificada e coercitiva onde aparecerá claramente a máxima: quem quer viver tem que trabalhar. Obrigação do trabalho, mas também retribuição que permite ao detento melhorar seu destino durante e depois da detenção. […] Entre o crime e a volta ao di-reito e à virtude, a prisão constituirá um “espaço entre dois mundos”, um lugar para as transformações individuais que devolverão ao Estado os indivíduos que este perdera. (FOUCAULT, 1999, p. 141)

Foucault ainda afirma que a modulação temporal é imprescindível para a pena, pois de acordo com ele:

Consequentemente, utilidade de uma modulação temporal. A pena transforma, modifica, estabelece sinais, organiza obstáculos. Qual seria sua utilidade se se tornasse definitiva?

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Uma pena que não tivesse termo seria contraditória: todas as restrições por ela impostas ao condenado e que, voltando a ser virtuoso, ele nunca poderia aproveitar, não passariam de suplícios; e o esforço feito para reformá-lo seria pena e custo perdidos, pelo lado da sociedade. (FOUCAULT, 1999, p. 127)

Conforme FOUCAULT, 1999, p. 128: “tempo, o operador da pena”. Todavia, para que haja efe-tivamente essa transformação da pessoa segregada para a posterior convivência com os demais, nada mais justo do que tratar-se esse sujeito como um ser dotado de direitos que fazem jus em existir mesmo ao longo da execução da pena.

Salo de Carvalho, em seu viés criminal, aborda a finalidade da sanção imposta ao criminoso:

[...] a sanção estatal deve adquirir sentido positivo, promovendo não somente coação aos não desviantes (temor pela autoridade), mas fornecendo meios para que o criminoso não incorra novamente no delito e seja integrado na e pela comunidade. O exercício do direito de punir passa a ser norteado pela ideia de prevenção especial positiva, consolidando as teorias de ressocialização, recuperação e regeneração do criminoso elaboradas pela criminologia positivista (paradigma etiológico-causal). (CARVALHO, 2008, p. 103)

De acordo com o criminalista, para evitar novos delitos não bastaria o medo da punição, mas também é necessário oferecer meios adequados para que os apenados, futuramente, não voltem a delinquir, e a ressocialização é apontada como um meio para esse fim.

Laurita Vaz, sobre o assunto, declara:

O trabalho do preso é, indiscutivelmente, um dos grandes desafios do Terceiro Milênio. Não é mais possível a passiva aceitação da injustificável ociosidade em que vive a maioria dos presos que estão recolhidos nas Penitenciárias brasileiras, com maior gravidade da-queles que estão encarcerados nas Cadeias Públicas, onde o ócio é ainda maior. Como é de notório conhecimento, as Cadeias Públicas não dispõem de acomodações compatíveis nem de condições adequadas para abrigar e muito menos “proporcionar a harmônica integração social do condenado e do internado”, objetivo da execução penal, que vem expressamente preconizado no artigo 1°, da Lei de Execuções Penais.

Com efeito, se ao homem livre de que qualquer apenação, o trabalho, de onde tira o seu sustento, por mais humilde que seja, o dignifica e ainda representa um dever moral e social, porque imputar ao preso a nociva ociosidade, reconhecida por todos como uma das causas geradoras de indisciplinas, fugas, reincidência, desestruturação familiar, motins e rebeliões nos Estabelecimentos Prisionais? Ademais, se o encarcerado não trabalha, a responsabilidade de sua manutenção recai exclusivamente no Estado, exigindo cada vez mais recursos financeiros para essa finalidade.

Criar nos Estabelecimentos Prisionais fontes de trabalho para ocupar o tempo do condenado e do internado, proporcionando-lhes sua reintegração social com dignidade é, sem dúvida, um dos maiores desafios do Estado, dos órgãos envolvidos com a execução penal, das autoridades e do cidadão, que também é responsável para que a pena em execução não seja desprovida do cárcere educativo e ressocializador que a lei lhe atribui. (VAZ, 2012, p. 19)

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Laurita ressalta que o trabalho pautado nos ditames da ressocialização é um dos maiores de-safios do Estado, pois harmonizar a forma e o objetivo da pena (que no caso é a ressocialização) com o trabalho é tarefa complicada de ser realizada.

Anabela Miranda Rodrigues ensina que, para que seja alcançada a ressocialização, deverá ocorrer a “participação” do detento:

Reconhece-se, assim, ao recluso, uma posição de sujeito da execução – enquanto partici-pante ativo e com personalidade responsável no processo de (re)socialização –afastando uma visão das coisas que o tornava em mero destinatário passivo das normas, colocado na posição de objeto das preocupações de uma execução orientada por qualquer finali-dade que fosse.

Por outro lado, evidencia-se a estrutura ressocializadora do tratamento, conformada pela participação do recluso, em último termo, dela dependente.

De fato, arranca-se aqui do reconhecimento da ideia de que a preparação para a vida em responsabilidade social é um processo cujo início se localiza já no decurso da própria execução; só assim existe uma real possibilidade de se alcançarem os objetivos preten-didos, no que a participação assume um papel de relevo.

Ela constituiu, assim, o pressuposto de um verdadeiro tratamento, sendo mesmo indis-pensável, já que não existe ressocialização sem ou contra a vontade do recluso.

O que permite o acentuar desta necessidade de participação é, por sua vez, o reforçar daquela ideia que rodeia a afirmação de um “direito” à ressocialização por parte do recluso. (RODRIGUES, 1999, p. 88-89)

Logo, consoante ao defendido pela autora, é necessário que o apenado manifeste a sua von-tade de modificar seus hábitos e que seja efetivamente ressocializado, pois não poderá haver “ressocialização forçada”. No momento em que a sociedade o segregou do convívio com os de-mais, torna-se necessário que sejam disponibilizados meios para que ao fim de seu tratamento ele esteja apto a conviver com os demais. Assim, a melhor forma de ressocializar os detentos seria em condições similares às que os aguardam do lado de fora das prisões. Seria necessário despertar nos apenados a estima do trabalho tal qual realizado pelo homem livre. Em seguida, a autora persiste com a sua ideia, agora demonstrando como poderá ser realizada:

Sublinha-se, a este propósito, por outro lado, que o regime de execução das penas privativas de liberdade de longa duração deve comportar uma aproximação crescente e progressiva à vida livre. A maior parte dos reclusos mostram-se gravemente desadaptados [sic] à vida em sociedade e não é isolando-os do mundo – tolhendo- os, pois, no assumir das suas responsabilidades sociais – que se melhorará o seu futuro comportamento. Tanto mais que a sociedade se transforma a um ritmo tal que a separação recluso-sociedade terá tendência a acentuar-se se não for obstada através de medidas que a atenuem. (RODRIGUES, 1999, p. 92)

THOMPSON, 2002, p. 12-13 realiza um comparativo: “Parece, pois, que treinar homens para

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a vida livre, submetendo-os a condições de cativeiro, afigura-se tão absurdo como alguém se preparar para uma corrida, ficando na cama por semanas”. Ou seja, conforme afirmado pelo autor, será mais fácil a chegada da estimada ressocialização do apenado quando o trabalho for realizado de forma similar ao trabalho livre. Tal conclusão é, praticamente, lógica, pois a melhor forma de preparar o indivíduo para a vida em sociedade é colocá-lo em situações parecidas com a vida que terá em sociedade. Inclusive, em relação à preparação para a volta da vida em sociedade. Porém, infelizmente, o Brasil não segue tal raciocínio, pois as condições de trabalho no cárcere estão longe daquelas do homem livre.

2 A MARGINALIZAÇÃO CELETISTA

Conforme demonstrado, o apenado que se encontra trabalhando possui poucos direitos trabalhistas em função de estar marginalizado da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).11 Inicialmente, torna-se curioso o fato de o legislador considerar apenas a CLT como norma traba-lhista, esquecendo-se da existência de leis esparsas (desvinculadas à CLT) que também tratam da relação de emprego, como é o caso do trabalho rural e doméstico. A doutrina e jurisprudência apontam diversos motivos para tal marginalização celetista, seja em função do trabalho do con-denado possuir a finalidade educativa e produtiva (princípios os quais são encontrados no caput do mesmo artigo), ou pelo fato do trabalho prisional ser considerado obrigatório.

Porém, na exposição de motivos da LEP, mensagem n. 242 de 1983, encontra-se a razão pela qual existe a exclusão do trabalho do preso do rol das relações de emprego:

56. O Projeto conceitua o trabalho dos condenados presos como dever social e condição de dignidade humana – tal como dispõe a Constituição, no art. 160, inc. II12 –, assentando-o em dupla finalidade: educativa e produtiva.

57. Procurando, também nesse passo, reduzir as diferenças entre a vida nas prisões e a vida em liberdade, os textos propostos aplicam ao trabalho, tanto interno como externo, a organização, métodos e precauções relativas à segurança e à higiene, embora não esteja submetida essa forma de atividade à Consolidação das Leis do Trabalho, dada a inexistência de condição fundamental, de que o preso foi despojado pela sentença condenatória: a liberdade para a formação do contrato. (grifo da autora)

Dessa forma, o legislador optou por não conceder os direitos celetistas ao preso em razão da sua falta de liberdade para a formação do contrato. O legislador considerou que a sentença penal condenatória retirou tal liberdade do preso. Todavia, o legislador esqueceu que a própria LEP prevê a necessidade do consentimento expresso do preso para o trabalho prestado externamente

11 Art. 28 LEP. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. § 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

12 Art. 160 CRFB. A ordem econômica e social tem por fim realizar o desenvolvimento nacional e a justiça social, com base nos seguintes princípios: [...] II – valorização do trabalho como condição da dignidade humana.

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em benefício da iniciativa priva, de acordo com o artigo 36, § 3º,13 fazendo suscitar a possibilidade da bilaterialidade exigida pela doutrina trabalhista para o surgimento da relação empregatícia.

Apesar do disposto na LEP e na sua exposição de motivos, em momento anterior à publicação da LEP, havia reivindicações a respeito da possibilidade da concessão dos direitos trabalhistas ao preso, conforme Evaristo de Morais Filho, que em 1975, já dissertava sobre o assunto:

Com o trabalho realizado – quando existente – dentro dos muros das próprias peniten-ciárias, por conta da administração ou sob seu controle direto, não chega a se configurar um contrato de trabalho entre o apenado e quem lhe exige trabalho. Mas tudo muda de aspecto quando se trata de serviço prestado a terceiros, estranhos à administração, fora do recinto da prisão. Desde que prestado a empresa, pouco importa que o prestador seja um presidiário, no cumprimento da pena – o seu trabalho se equipara ao de qualquer trabalhador livre, com direito a todos os benefícios legais. Não vale invocar incapacidade contratual do apenado, nem alegar possível obrigatoriedade nesta prestação.

Nos regimes de semiliberdade e de prisão-albergue, aberta, envolve-se o apenado na vida civil dos cidadãos comuns, com todos os direitos e deveres conferidos a estes. (MORAES FILHO, 1975, p. 214-215)

Destarte, o doutrinador já salientava a divisão em relação a favor de quem o trabalho será prestado. Se for para a administração pública, não há como se configurar o vínculo. Se o benefi-ciário for uma empresa privada, não será em razão de o trabalhador ser um preso que vinculará a aplicação ou não dos preceitos laborais.

O Projeto de Lei n. 513 de 2013 que pretende alterar a LEP continua a prever a mesma siste-mática de marginalização celetista para o trabalho carcerário.14 Porém, apesar da justificativa da “falta de liberdade” para contratação exposta na exposição de motivos de 1984 em decorrência da obrigatoriedade do trabalho do apenado, o PL não prevê mais a sua obrigatoriedade, mas sim o incentivo ao labor.15 Dessa forma, mesmo sem a obrigatoriedade do trabalho, de acordo com a nova vontade do legislador pátrio disposta no PL, a marginalização persistirá. A incongruência e ilogicidade persistem.

2.1 ARGUMENTOS PARA O NÃO RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE EMPREGO

Para o não reconhecimento da relação empregatícia é apontado como motivo principal a falta da vontade do apenado para a formação do contrato, visto que é obrigatório. De acordo com MIRA-BETE, 2012, p. 250: “Essa obrigatoriedade do trabalho no presídio decorre da falta do pressuposto liberdade, pois, em caso contrário, poder-se-ia considerar sua prestação como manifestação de um trabalho livre, que conduziria a sua inclusão no ordenamento jurídico trabalhista”.

13 Art. 36 LEP. O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina. § 3º A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso.

14 Art. 28 PL 513/2013. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e pro-dutiva. [...] § 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho, e admite-se o trabalho em função da produtividade.

15 Art. 31 PL 513/2013. A pessoa privada de liberdade será incentivada ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidades. Parágrafo único. É facultativo o trabalho do preso provisório e só poderá ser executado no interior do estabelecimento.

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Alice Monteiro de Barros disserta sobre o assunto, justificando que a marginalização celetista pode decorrer da falta da liberdade contratual aliada ao outro elemento, a finalidade do trabalho carcerário (que almeja a ressocialização do apenado, assim como a diminuição da pena):

Exatamente por faltar a liberdade contratual e de escolha do trabalho (consentimento), a legislação brasileira não reconhece o vínculo empregatício com o condenado que presta serviços com a finalidade de reeducação e reinserção na vida social, além de constituir, em determinadas situações, elemento de redução da pena. (BARROS, 2008, p. 405)

E, ao tratar da marginalização trabalhista, assegura: “A exclusão refere-se ao trabalho do preso junto à penitenciária ou a particulares”.

Tais autores que defendem a falta da liberdade na pactuação do contrato de trabalho fixam-se no artigo 442 da CLT que estabelece que o “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”. É nesse ponto que os defensores da margina-lização celetista se concentram, pois como não há o “acordo”, isto é, a vontade manifestada de forma expressa ou tácita para a formação contratual, não haveria a relação de emprego.

Por sua vez, Vólia Bomfim Cassar justifica a falta do vínculo empregatício da seguinte forma:

Não há vínculo de emprego entre o preso e o Estado, seja porque não aprovado em con-curso público (art. 37, II CRFB), seja porque a Lei se manifesta nesse sentido – art. 28, § 2°, da Lei 7210/84 (Lei de Execução Penal).

O trabalho do preso tem conotação de reabilitação e exerce forte função social. Mas não é este o motivo que impede a formação do vínculo de emprego, e sim o comando legal que expressamente determina o afastamento da legislação trabalhista (CLT). (CASSAR, 2012, p. 356)

Corroborando a justificativa da autora, também existe a Súmula 363 do TST,16 dispondo que o contrato será considerado nulo quando o servidor público não obtiver aprovação em concurso público. Realmente, quando o beneficiário do trabalho for a administração pública, a formação do vínculo é insustentável. Todavia, a doutrinadora esquece que não será apenas a administração pública a beneficiária do trabalho carcerário, mas também a iniciativa privada.

Norberto Avena leciona a respeito do trabalho do preso, conforme abaixo:

O trabalho interno do preso (realizado dentro do estabelecimento penal), sendo uma obrigação cujo descumprimento acarreta a imposição de sanções disciplinares, não está regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (art. 28, § 2º, da LEP). O vínculo que se institui, portanto, é de direito público e não um vínculo empregatício. Em consequência, também não existirão encargos sociais incidentes sobre os valores pagos pela utilização dessa mão de obra, a exemplo de aviso prévio indenizado ou não, FGTS, repouso semanal remunerado, férias e décimo terceiro salário.

16 Súmula 363 TST. CONTRATO NULO. EFEITOS. A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.

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E quanto ao trabalho externo (realizado fora do presídio)? Tratando-se de preso em regime fechado, não há, do mesmo modo, vínculo empregatício, tampouco incidência dos referidos direitos sociais. Sendo hipótese de indivíduo que cumpre pena em regime aberto, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que “o trabalho externo prestado por condenado em regime aberto não configura o trabalho prisional, previsto na Lei das Execuções Penais”, razão pela qual se reconhece “relação de trabalho que se sujeita à tutela da CLT”. O tema é discutido, porém, quando se trata de cumprimento de pena no regime semiaberto. Sem embargo da existência de corrente oposta, em inúmeras opor-tunidades têm os tribunais decidido que “o disposto no § 2º do art. 28 da LEP não pode servir de óbice ao reconhecimento da relação de emprego entre as partes”, devendo-se reconhecer a existência de vínculo trabalhista quando se trata de trabalho externo pres-tado por condenado em regime semiaberto. (AVENA, 2014, p. 48)

Conforme mencionado pelo próprio autor, aos trabalhadores situados no regime fechado não seria possível a configuração do vínculo, pois esses, realmente, não possuem a liberdade de escolha para quem trabalhar. Já no regime semiaberto o tema ainda é discutido. No tocante ao regime aberto, apesar do doutrinador considerar a configuração do vínculo como pacífico nos tribunais, existem muitas decisões não concedendo o liame empregatício. O tema apenas seria totalmente pacífico caso o legislador consagrasse o trabalho prisional do regime aberto e do semiaberto como uma nova categoria de empregados. A celeuma não poderia ficar a cargo única e exclusivamente do poder judiciário. É necessário um debate sério e preciso realizado pela doutrina para a fatídica mudança realizada pelo legislador.

3 A NECESSIDADE DE UMA NOVA REGULAMENTAÇÃO PARA O TRABALHO PRISIONAL

A maioria dos presidiários do Brasil apenas possui a sua força de trabalho como instrumento para reinserção social e para a diminuição da sua pena, dessa forma, o trabalho é considerado, para tais pessoas, como um instrumento de valor, porém, o legislador retira o valor que deveria estar agregado ao labor.

Ao marginalizar o preso dos preceitos celetistas não é possível o seu enquadramento em ne-nhuma outra espécie de trabalhador, seja ele avulso, autônomo, eventual, cooperado, qualquer que seja a modalidade existente no direito trabalhista. Cabe a nós, operadores do direito, reverter tal situação, para que o Estado, enquanto estiver com a custódia do indivíduo, aproveite esse tempo para efetivamente ressocializá-lo.

Na relação de trabalho carcerária o desequilíbrio contratual entre os polos da relação de trabalho é ainda mais contundente. Isso ocorre em razão da ausência do ente que deveria prote-gê-los coletivamente perante os abusos patronais, que seriam os sindicatos (ou inclusive outras organizações superiores, como as federações e confederações). As organizações sindicais não existem, pois aos presos não é conferida a possibilidade de associação sindical. Assim, resta apenas cada trabalhador individualmente isolado, desprotegido perante as regras mal formuladas que não são discutidas e debatidas desde a sua origem. Dessa maneira, a disparidade existente

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entre os contratantes é muito maior do que numa relação de emprego reconhecida formalmente. Assim, a proteção típica do direito trabalhista deveria, de uma forma ainda mais forte, abrigar tais trabalhadores, porém, é exatamente o contrário: mais mais fraca a parte contratual, maior é a sua desproteção.

Isabella Monteiro Gomes defende a situação de afronta aos ditames constitucionais:

Negar ao preso o reconhecimento da relação de emprego, o reconhecimento pleno do contrato de trabalho, não se compatibiliza com os mandamentos constitucionais de pro-teção ao trabalho. No caso do sujeito inserido no sistema carcerário, a diretriz deveria ser mais incisiva quanto à total integração do preso no mercado de trabalho, não apenas no aspecto da qualificação, treinamento, desenvolvimento da atividade laborativa, mas também, no aspecto do reconhecimento de direitos. Além de ser situação discriminatória, o que também é inconcebível pela ordem constitucional. (GOMES, 2011)

Novamente, cita-se Amaro Barreto, que, desde 1943, já pregava um tratamento igualitário para o trabalho carcerário:

Nos regimes carcerários predominam as considerações de ordem jurídico-social que tendem a transformar o penado de hoje no homem útil de amanhã, o que aconselha a aproximar ao máximo o trabalho carcerário daquele que é livre, não só em natureza, senão ainda em direitos e obrigações [...]. (BARRETO, 1943. p. 354)

No mesmo sentido, Epaminondas de Carvalho:

Cumpre-nos reconhecer e confessar, sem rodeios, que os futuros regulamentos carce-rários, atendendo ao fenômeno de humanização e democratização do direito, terão de plasmar ainda mais a tendência, igualando o trabalho carcerário ao livre, mesmo por-que, em hipótese alguma poderão autorizar medidas que exponham a perigo a saúde ou ofendam a dignidade da pessoa humana. (CARVALHO, 1944, p. 190)

Todavia não é possível uniformizar o preso e o trabalhador livre em igualdade de condições, pois o cerceamento da liberdade do preso (por mais que não lhe retire o direito à relação de emprego) dificulta a aplicação de diversos direitos trabalhistas dentro do cárcere. Um exemplo é o direito à jornada extraordinária: o preso que trabalha externamente possui um rígido controle de saída e entrada no estabelecimento prisional que deverá ser seguido à risca. Dessa forma, mesmo que surgissem necessidades imperiosas em seu trabalho, não seria permitida a sua permanência na empresa, pois deverá ser recolhido à prisão no horário marcado.

No mesmo sentido, Vanessa Barbosa Trama afirma que:

[...] a legislação deveria ser revista com o objetivo de adequá-la à situação fática do con-denado, não com o intuito de igualar o vínculo empregatício do encarcerado ao do cidadão livre, mas sim garantir o mínimo de proteção possível e viabilizar que o ofício desem-penhado possa servir de incentivo quando o apenado tiver sua liberdade restabelecida. (TRAMA, 2010. p. 252-253)

Ou seja, o trabalho em condições de quase equiparação com o trabalhador livre seria uma forma

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de instigar o trabalhador para demonstrar como é regulado o direito trabalhista na realidade. É necessário demonstrar para o preso como funciona a vida em sociedade com carteira assinada, sendo justamente esse o desejo da ressocialização: preparar o preso para o futuro retorno ao convívio com os demais.

Olga Espinoza relata boa parte dos atuais problemas enfrentados no trabalho no cárcere atualmente:

Não obstante o trabalho em geral seja valorizado pelas pessoas presas e considerado atividade benéfica, a realidade é muito mais complexa para aqueles que desejam traba-lhar, pois a administração penitenciária não proporciona postos suficientes para cobrir a demanda nas prisões [...]. Se a isso somarmos a legitimação da discriminação que se concretiza por meio da Lei de Execução Penal quando restringe ao preso a possibilidade de fazer uso das leis que protegem os trabalhadores, o panorama que se descortina é o que julga as mulheres e homens presos desprovidos da capacidade de exercer seus direitos sociais e de sentir em iguais condições ao cidadão livre. Paradoxalmente, a mes-ma legislação que pretende destacar as diferenças entre o cárcere e o mundo exterior proclama a integração social pós-prisão. Tais antinomias reforçam os postulados foucaul-tianos de que a prisão não responde às funções declaradas nos preceitos legais, uma vez que tem como finalidade delimitar as fronteiras entre as ilegalidades e a delinquência, estigmatizando aqueles que se encaixam no segundo grupo. (ESPINOZA, 2004, p. 137)

O trabalho do apenado é marginalizado do direito trabalhista. Porém, o direito trabalhista, seja ele o celetista ou não, é indispensável para regular a proteção cabível para o homem enquanto trabalhador. Por que não dignificá-lo como um ser que efetivamente está necessitado de prote-ção, abrangendo-o como uma nova categoria de trabalhadores, como é o aprendiz? O aprendiz também é uma pessoa que, como o próprio nome já menciona, está aprendendo, está em uma fase de integração social, de aprendizado, vinculado com o início da vida, desenvolvendo as suas atividades de maneira compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, con-forme menciona o artigo 428 da CLT. A aprendizagem encontra muita similitude com o trabalho do apenado, porém, nem em função disso, o aprendiz é marginalizado do direito trabalhista. Por exemplo, há pagamento do FGTS, mas a sua alíquota é de 2%, em vez da alíquota de 8% para os demais trabalhadores. Tal raciocínio pode e deve ser aplicado ao apenado.

O encarcerado deverá possuir o direito a uma Carteira de Trabalho e Previdência Social assi-nada, com direitos trabalhistas garantidos, nem que sejam em escala menor, mas que os tenha, e além do mais, ao término do cumprimento de sua pena poderá exibir para o novo empregador a sua CTPS assinada com as anotações pertinentes. Inclusive, a própria empresa que o contratou poderá continuar com o pacto após o cumprimento da pena. Sairá ganhando o empregado assim como o empregador, que possuirá um empregado pronto e já qualificado para as atividades a serem desempenhadas.

Além do mais, durante todo o treinamento do apenado na penitenciária poderá ser pago ape-nas um salário-mínimo, e para as demais filiais da mesma empresa o piso salarial poderá ser mais elevado, sendo vedada a equiparação salarial nesses casos, surgindo uma nova espécie de

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direito trabalhista aplicado aos empregados no cárcere, assim como existe entre os trabalhado-res urbanos, rurais e domésticos. E, para que não ocorra a concorrência desleal no setor, deverá ser estipulado o número máximo de empregados apenados, proporcionalmente ao número de trabalhadores livres contratados pela mesma empresa. Assim o empregador que utiliza a mão de obra prisional não teria grandes desonerações financeiras a ponto de ferir a livre concorrência.

Agora, suponha-se a situação de um condenado a oito anos ao regime semiaberto. Imagine--se que o mesmo preso resolva trabalhar logo no início do cumprimento de sua pena e assim se mantenha até a sua soltura para a vida em liberdade, quanto tempo essa pessoa irá trabalhar sem direito ao descanso anual, ou seja, as férias? Sem dúvidas, ao término da pena, a pessoa estará com alguma fadiga física, pois o corpo precisa de certo tempo estendido para repor suas energias. Epaminondas de Carvalho defende o mesmo ponto de vista em relação às férias, mas aplicado ao trabalho prisional:

É fácil ver que o direito ao gozo de férias remuneradas constitui uma das mais impor-tantes conquistas do trabalhador. Qual a razão de ordem jurídica ou moral invocada para a denegação do benefício ao penitenciário que trabalha durante um ano, dispensando considerável soma de energias?

Qualquer justificação, além de anti-humana, não poderá ser enquadrada na nova concepção do direito, já que não vivemos mais estribados no falso postulado da igualdade teórica.

A cessação do trabalho, com o fim de repouso, é uma necessidade que se não pode negar a pessoa humana, já porque tal direito tem uma tendência universalista, já ainda porque, a repetição de atos de atividade, leva fatalmente ao esgotamento de energias, à fadiga, causa psicológica dos acidentes.

Qualquer que seja a espécie de atividade humana, o trabalho não deve ser executado em estado de fadiga.

Sob este perfil, a sociedade exige que o penitente ao ser devolvido ao seu meio, conserve uma capacidade de trabalho revigorada, visando, assim, [sic] um melhor rendimento.

Pouco importa que o descanso seja feito no próprio estabelecimento penal, de forma intercalada ou prolongada. Pouco importa, ainda, que não possa o recluso afastar-se temporariamente do ambiente em que trabalha e vive, muito embora, possa ser trans-ferido para outro presídio de igual regime.

Cremos que, nos tempos modernos, é necessário que o trabalhador descanse para que não execute trabalhos em estado de esgotamento. O repouso, portanto, como lei biológica que é, não pode ser negado ao penado, pois seria negar a própria dignidade da pessoa humana. (CARVALHO, 1944. p. 190-191)

É evidente, até mesmo para um leigo, que o trabalho realizado ano após ano sem o período de descanso detém uma possibilidade maior de causar acidentes. O Estado, ao possuir a custódia do indivíduo, deveria guiar o trabalho de forma que a integridade física e psíquica do apenado não seja abalada. Assim, deveriam ser concedidas as férias anuais para os apenados trabalhadores.

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O preso precisa aprender, precisa ser educado de que, após tanto tempo de trabalho, há o repouso anual remunerado. Não precisaria ser o descanso anual típico celetista de 30 dias, mas, no caso, um descanso de 10 dias, inclusive para o apenado entender como funciona a sistemática trabalhista (período aquisitivo de férias, para depois ocorrer o período concessivo), configurando uma típica interrupção do contrato de trabalho, inclusive para os cálculos de remição da pena. Entende-se que o período de férias pode ser reduzido, pois as férias possuem diversas finalidades, para descansar, para viajar, para o lazer, mais tempo com a família, entre inúmeros benefícios. Como o preso encontra-se com a sua liberdade de ir e vir cerceada, muitos desses benefícios não são adimplidos, e assim o número de dias de férias poderá ser reduzido.

Se o contrário for demonstrado para ele, isto é, que apenas há trabalho sem o descanso anual, o trabalho do apenado poderá fazer o caminho contrário ao da ressocialização: além de lesionar fisicamente e psicologicamente a pessoa, poderá transformá-lo em um “revoltado contra o sis-tema”, mais do que, porventura, ele já possa ser.

O preso, assim como qualquer ser humano, é detentor de dignidade, Ingo Wolfgang Sarlet em seu livro dedicado ao assunto disserta quanto ao conceito do princípio:

A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável [sic] nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (SARLET, 2007, p. 62)

Ademais, o autor ainda aborda a aplicação do princípio:

Além disso, como já frisado, não se deverá olvidar que a dignidade – ao menos de acordo com o que parece ser a opinião largamente majoritária – independe das circunstâncias concretas, já que inerente a toda pessoa humana, visto que em princípio, todos – mesmo o maior dos criminosos – são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas – ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmos. (SARLET, 2007, p. 45)

Assim sendo, de acordo com o autor, a dignidade seria um atributo inerente ao complexo de direitos e deveres fundamentais, garantindo as condições de existência mínimas dos seres hu-manos. Além disso, não haveria motivos para retirar a aplicação do princípio aos apenados, sendo esse, justamente, o exemplo trazido pelo jurista.

Como no Brasil a situação trabalhista do preso não é encarada como uma relação especial, resta a vinculação na forma celetista, pois é a vala comum aplicada para os trabalhadores, sendo a solução existente no ordenamento jurídico brasileiro. Porém, deveria ser realizada uma legis-lação trabalhista específica para o preso, pois existe uma série de situações que não permite a equiparação total aos trabalhadores livres (a esse respeito, cita-se logo acima o exemplo das férias e da jornada extraordinária). Enquanto não for realizada a lei prevendo a relação especial,

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resta aplicar-se a relação de emprego tipicamente celetista.

Nessa senda, uma situação que não poderá deixar de ser retratada é o fato de um dos argu-mentos contra a vinculação via contrato de trabalho do apenado ser que a mão de obra prisional igualmente considerada como a dos trabalhadores livres tornaria a laborterapia um negócio sem atratividade, pois o empregador preferiria contratar trabalhadores livres, dado o fato da vida pregressa do apenado não ser recomendável.

Porém com o “barateamento” da mão de obra prisional acaba por acontecer o dumping social ferindo o direito à livre concorrência entre as empresas que seguem à risca o pagamento dos direitos trabalhistas conforme citado acima, podendo resultar no desemprego de trabalhadores livres, pois se tornam mais “caros”. Além disso, independentemente do ocasionamento de de-mais problemas sociais, o trabalho do preso não poderá ser considerado uma “mercadoria” a ser comercializada com a barganha entre trabalhadores livres e presos.

Se não fosse esse o único problema (os direitos da relação de emprego restringidos), não há garantia aos presos de que eles serão empregados da empresa que se utilizou de sua mão de obra durante o cárcere após o cumprimento da pena. O Estado, ao disponibilizar a mão de obra apena-da, geralmente, não faz nenhum incentivo para que a contratação perdure na vida em liberdade.

Rui Carlos Machado Alvim assevera a respeito da falta de proteção aos trabalhadores encarcerados:

Justamente àquelas pessoas diretamente custodiadas pelo Estado, desrespeita-se-lhes, por inaplicabilidade, o estatuto protetivo de todos os trabalhadores. Ou seja, o Estado, ao reverso de dar cumprimento ao direito posto, passa a acobertar práticas ilegais e ilegítimas.

Será que a mens legis ou a mens legislatoris dá curso, implicitamente, ao repisado argu-mento – mais falado e percebido que escrito – de que o desafogo dos encargos sociais se constituiria em irrecusável incentivo às empresas privadas nas contratações do pessoal presidiário, à medida que o trabalho presidiário se notabiliza por uma irrequieta indisci-plina, qualidade precária, desinteresse e produção lenta? Tais desmazelos, se reais, talvez provenham menos do fato de o trabalhador ser presentemente preso e preteritamente afastado do mercado de trabalho, do que efeito, e protestos, por um pagamento injusto [...]. (ALVIM, 1991, p 40)

Rui Carlos Machado Alvim critica o fato de que os direitos trabalhistas, que são imperativos estatais, são descumpridos àqueles que estão sob a custódia estatal. O próprio Estado, que deveria assegurar a aplicação do direito posto, acoberta práticas ilegítimas. De acordo com o autor, os argumentos utilizados para desafogar os encargos trabalhistas não são plausíveis de aplicação.

Paula Julieta Jorge de Oliveira observa a mesma situação, mas diante da responsabilidade social da empresa:

Não é possível admitir que a utilização da mão-de-obra [sic] prisional vise exclusivamente aos benefícios econômicos da empresa, mas deve atender aos ditames de responsabi-lidade social e participação no processo de desenvolvimento da cidadania e resgate da dignidade do apenado. Por essa razão, as empresas que se dispuserem a investir na

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recuperação desses indivíduos devem contabilizar suas ações em seu Balanço Social, e não beneficiarem-se de eventuais desonerações para melhor posicionarem-se no mercado em relação às demais empresas do ramo.

É impossível reconhecer iniciativas de responsabilidade social quando uma empresa emprega exclusivamente mão-de-obra [sic] prisional, a fim de minimizar seus custos e assim burlar as regras de competitividade do mercado; é ainda mais inadmissível a conivência do Poder Público que justifica essas ações como necessárias, pois se assim não o fosse não existiriam vagas para o trabalho dos sentenciados. (OLIVEIRA, 2010)

Consoante à autora, se valer do expediente como a falta de oportunidades para os presos (caso os direitos trabalhista sejam conferidos a tais pessoas) é se utilizar de artifícios maldosos para ferir a livre concorrência e a própria responsabilidade social da empresa. Se a empresa efetivamente desejasse a responsabilidade social, deveria colocar essas ações em seu balanço social e não se aproveitar de desonerações trabalhistas a fim de reduzir seus custos. Além disso, a autora ainda critica a conivência da administração pública que justifica esse expediente.

Acerca do assunto, Jorge Luiz Souto Maior explica a ausência da procura empresarial caso fossem concedidos direitos trabalhistas aos presos:

Poder-se-á argumentar que sem um incentivo, representado pela redução do custo da mão-de-obra [sic], as empresas sairão dos presídios, deixando sem alternativa os pre-sidiários. No entanto, é preciso verificar que fora dos presídios há uma gama enorme de trabalhadores desempregados que não se engajaram, ainda, no crime, e que estão sendo privados de ocupação, pois as empresas arrumaram uma fórmula de exploração do trabalho ainda mais lucrativa dentro dos presídios.

Além disso, a reabilitação dos presos é um dever do Estado e não pode este se eximir de seu dever pura e simplesmente retirando dos presidiários parcela de seus direitos trabalhistas, numa espécie de barganha.

A promiscuidade entre o público e o privado que há por detrás dessa exploração, ade-mais, é bastante denunciadora da irregularidade da situação criada. Talvez por isto que a construção de presídios para a formação de um autêntico exército de mão-de-obra [sic] barata esteja se constituindo um negócio altamente lucrativo para muitas pessoas, movimentado, aliás, pela lógica de uma bola de neve, pois quanto mais há exploração nos presídios, mais há pessoas desempregadas fora dos presídios, que, diante da neces-sidade, acabarão, cedo ou tarde, tornando-se, igualmente, habitantes da carceragem. E se a moda pega, daqui a pouco vai ter gente pedindo para ser preso, ou pior, cometendo assumidamente um crime, só para poder arrumar trabalho, mesmo sem a garantia de todos os seus direitos. (MAIOR, 2008, p. 66-67)

O doutrinador mostra o círculo vicioso, a maldosa lógica do sistema trabalhista/capitalista carcerário que atinge pessoas que não estão com a sua liberdade cerceada, mas que indireta-mente sofrem os efeitos do “barateamento” do serviço carcerário. No momento em que existe uma brecha em que os valores gastos com a produção sejam mais acessíveis aos empresários,

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será nesse nicho que eles irão se concentrar. É exatamente por isso que os direitos trabalhistas não poderão ser renunciados pelas partes, para não surgirem trabalhadores mais desvalorizados economicamente e consequentemente não haver a sua superexploração.

O fim do direito do trabalho é justamente evitar que condutas como a que a massa carcerária trabalhadora sofre continuem a existir. A argumentação da falta de incentivos aos empresários é nefasta à sociedade, não podendo ser invocada, pois fere os princípios constitucionais, assim como toda a caminhada alcançada pelo direito do trabalho, além dos demais argumentos já aqui assinalados.

Para que não ocorra essa barganha de direitos trabalhistas, é necessária uma ponderação de interesses presentes no trabalho penitenciário, e a respeito disso Gláucio Araújo de Oliveira apresenta que:

O tema ora abordado não pode ser desprezado ou posto em segundo plano, seja conferindo parcos direitos sociais ao recluso, alimentando a voracidade da indústria de exploração de mão de obra carcerária com vistas a atender exclusivamente os anseios econômicos da iniciativa privada, ou visando suprir carência de pessoal da administração pública. Da mesma forma, a complexidade do tema não permite que se autorize de forma irresponsável toda a gama de direitos trabalhistas contemplados pelo regime geral de trabalho livre. O tema é tormentoso, merece análise profunda de cada sistema penitenciário, do seu correspondente ordenamento legal, a realidade socioeconômica, entre outros elementos relevantes. Deve-se ponderar sobre quais garantias, direitos, deveres e outras obrigações devem ser conferidos ao trabalhador preso. Certamente que o trabalho penitenciário deve ser visto sob outra ótica, mais próxima de uma conduta voltada para a responsabilidade social por parte dos beneficiários dessa mão de obra diferenciada e mais distante de interesses econômicos voltados exclusivamente para a redução de custos produtivos. (OLIVEIRA, 2010, p. 166-167)

Rui Carlos Machado Alvim na sua incessante defesa ao trabalho carcerário assevera:

A efetivação dos direitos sociais ao preso trabalhador, enquanto lhe humaniza o trabalho e suas condições, resulta na humanização consciente do próprio preso, contribuindo, concomitantemente, para seu reingresso na dignidade humana, esvaída em sua condi-ção carcerária, e para a superação de sua alienação, tanto a proveniente de sua solitária rebeldia quanto a do próprio trabalho desprotegido. (ALVIM, 1991, p. 94)

As sanções penais evoluíram muito ao longo de toda a história humana, já passando por momentos de penas de mutilação, penas de morte e de caráter aflitivo. A atualidade da pena privativa de liberdade demonstra a evolução do pensamento de que a pena não precisa ser en-carada como algo doloroso para o condenado. Seguindo os passos de tal evolução, conferir os direitos trabalhistas para os apenados seria uma nova caminhada almejando a contemplação da dignidade da pessoa humana aplicada ao preso. Nesse mesmo sentido, traz-se o entendimento de Jorge Luis Souto Maior:

[...] há de se ponderar que quando esse trabalho é aproveitado no contexto de uma ex-

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ploração econômica ou mesmo para a satisfação de algum interesse do próprio Estado (econômico ou não), tem-se a inevitável formação da relação de emprego, da qual decorrem todos os direitos que lhe possam, pelas características próprias, ser aplicáveis, pois o fato de estar cumprindo pena não diminui o alcance da cidadania do preso.[…] O que se percebe é que o legislador penal não conseguiu equacionar as razões de ordem pública que se inserem na questão: de um lado, a proteção social do trabalhador, como fator da dignidade da pessoa humana; e de outro, a necessidade de apenar os atos que constituem ilícito penal, assim como não conseguiu se desapegar dos preconceitos socioculturais pelos quais se encara o trabalho manual. (MAIOR, 2008, p. 65)

Conforme destacado, o atual legislador brasileiro, diante da laborterapia, não conseguiu pon-derar o fato do apenado como um ser merecedor de dignidade em seu trabalho, conjuntamente com a questão da punição a ser aplicada a um desviante. Se essa ponderação ainda não foi criada, já está mais do que em tempo de ser idealizada. A pena no atual ordenamento brasileiro possui caráter transitório, o tempo máximo que o apenado poderá ficar detido são trinta anos, conforme artigo 75 do CP. O Brasil veda a pena de morte e a pena perpétua, dessa forma, o apenado, em um curto ou longo período de tempo, já estará no seio da sociedade novamente. Para que isso ocorra sadiamente, o apenado deverá ser ressocializado, tornando-se apto para viver pacificamente sem a ânsia de cometer novos delitos, com a expectativa de que ele não se torne um reincidente.

Para se sair desse círculo vicioso em que se encontra a sociedade, o trabalho faz parte de alternativa para a reinclusão social. Mas, para isso, o trabalho deverá ser muito bem executado. Conforme destacado por José Nabuco Galvão de Barros Filho:

Enquanto a sociedade não se preocupar em construir um sistema penal que propicie a reinserção social do preso, os alarmantes índices de criminalidade continuarão a crescer. Enfim, é preciso se conscientizar de que a segurança pública também depende do respeito aos direitos do detido. (BARROS FILHO, 1997, p. 173.)

Ou seja, diante da sentença transitada em julgado, diante do crime configurado e a autoria re-conhecida, a sociedade e os poderes públicos precisam reagir para que o já ocorrido não aconteça novamente. E, para isso, conscientização e políticas devem ser corretamente efetuadas.

A inclinação deste estudo é para a concessão de um contrato de trabalho especial, com a configuração da relação de emprego com a iniciativa privada para os apenados do regime aberto, assim como para os do semiaberto laborando externamente em benefício da iniciativa privada, visto que é dada a opção do trabalho a ser realizado. Esse seria um primeiro passo. Após a im-plementação, poderia, num futuro, ser estendido tal direito para os apenados em regime fechado. Porém, como ainda não foi construída essa modelação especial do regime de trabalho carcerário, utilizar-se-ia a CLT aplicável à laborterapia.

Uma certeza há: a situação do trabalho prisional não poderá continuar a ser enfrentada conforme o modo hoje escolhido pelo Brasil. No atual momento em que o direito trabalhista, constitucional, assim como os direitos humanos, além de outros ramos que cuidam da pessoa, se encontram, é inconcebível que situações como a do apenado sejam regulamentadas da forma como o são agora. É inadmissível que a conjuntura construída ao longo de tantos anos de lutas de classes

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seja excluída de uma parcela de trabalhadores.

A jurisprudência já vem caminhando no sentido de reconhecer o vínculo do apenado conforme os moldes celetistas, conforme verificado abaixo:

RELAÇÃO DE EMPREGO. TRABALHO PRISIONAL. Não se configura o trabalho prisional, previsto na Lei das Execuções Penais, quando se trata de trabalho externo, prestado por condenado em regime semi-aberto [sic]. Relação que se admite estabelecida sob os moldes empregatícios, sujeita à tutela da CLT.17

VÍNCULO DE EMPREGO. PRESIDIÁRIO. No direito e no sistema penal brasileiro, a execução da pena, segundo a natureza e a gravidade do crime, e, ainda, segundo o grau de periculosidade do apenado, pode se dar em “regime fechado”, “regime semi-aberto [sic]” e em “regime aberto” (por condenação mesma ou por progressão de regime), consistindo direito do preso nestes dois últimos, devidamente autorizado e atendidas às limitações de conduta decorrentes da sua condição, o acesso ao trabalho em condições normais com os demais trabalhadores urbanos.18

Nestes acordãos os desembargadores admitem a configuração da relação de emprego aos apenados do regime aberto e semiaberto, pois encontra-se desconfigurada o trabalho típico previsto na LEP.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

São louváveis os preceitos dispostos ao longo da Lei de Execução Penal brasileira, porém, eles estão distanciados e separados por um grande abismo da atualidade nacional, o que tem transformado a LEP, em muitos aspectos, em letra morta pela falta de estrutura e conjuntura do ali disposto. No atual contexto prisional brasileiro uma nova política prisional tem sido pensada. É sabido que muitos condenados saem da prisão de uma forma muito pior do que entraram, que as condições carcerárias do Brasil estão longe das ideais. Pode e deve ser pensada, dentro dessa nova política, a questão do trabalho prisional, justamente com o fim de reabilitação do condenado para a futura vida em sociedade.

Se o trabalho dentro do sistema capitalista em que se vive atualmente possui tanta relevância, este, portanto, deverá ser tratado com adequada importância, inclusive, e ainda com maior vulto para as pessoas que mais precisam desse incentivo. Para isso, o trabalho, apontado, unanime-mente, pela doutrina como fator de ressocialização do preso, deverá trilhar ações concretas ou ações bem encaminhadas e projetadas, e sair do discurso ideológico doutrinário. Para que isso

17 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. 1ª Turma. Processo n. 0074900-03.2006.5.04.0811 RO. Relatora Des.ª Ana Luiza Heineck Kruse. 27 de agosto de 2009. Disponível em: <www.trt4.jus.br>. Acesso em: 1 jul. 2013.

18 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. 4ª Turma. Processo n. 01738-2002-403-04-00-4 DIV-VT. Relator: Milton Varela Dutra. 13 de dnovembro de 2003. Disponível em: <www.trt4.jus.br>. Acesso em: 1 jul. 2013.

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ocorra, primeiramente é necessário o reconhecimento do tratamento diferenciado a respeito do trabalho diante de cada regime e de cada beneficiário do trabalho. Feito isso, regulamentações específicas visando ao tratamento do preso deverão ser realizadas, contemplando as finalidades almejadas por cada situação. Não é admissível que uma relação de trabalho realizada entre par-ticulares seja tratada perante o Estado como uma relação de índole administrativa, unicamente pelo fato do apenado encontrar-se sob a custódia do Estado. Pensamentos como esse viciam todo o sistema do trabalho prisional, equipando relações realizadas entre particulares (que deveriam ser tratadas em consonância com o direito privado) como situações de direito público.

Não se tentou adentrar na questão de se as penas cabíveis no Brasil são justas ou não, se a prisão efetivamente é a melhor alternativa para os desviados da sociedade. Estas, sim, são questões que são exclusivas para o direito penal. O que se tentou abordar é o ponto de choque entre o direito penal e o direito do trabalho. Abordou-se a consequência do desvio da vida em sociedade, quando a pena já estiver na sua execução e a incidência do labor nessa punição restritiva à liberdade.

Apesar de todos serem considerados iguais perante a lei, o apenado possui sérios cerceamentos que não permitem uma equiparação, uma equivalência de condições com os cidadãos. No entanto, não é porque inexiste a citada igualdade que deverá ser menosprezada a dignidade, afinal, a falta de um princípio não anula o outro, e mesmo o trabalhador estando adstrito da sua liberdade de ir e vir os demais direitos que não guardam relação direta com a liberdade de locomoção poderão se manter conservados.

Todavia, merece atenção o fato de que não se defende aqui a aplicação na integralidade dos direitos trabalhistas ao apenado, mas parte deles, que poderão ser flexibilizados, como é o caso do descanso anual remunerado, que é necessário não apenas para o lazer, mas principalmente para evitar a lesão e fadiga do ser humano. Assim, sustenta-se que ao preso poderá ser criada uma legislação especial, justamente em função do seu caráter situacional peculiar. Porém, como na atualidade brasileira não existe nenhuma relação especial que guarde relação com o trabalho prisional, cabe a utilização comum aplicável a (quase) todos os empregados, a CLT.

O direito do trabalho possui uma razão em existir, e a sua finalidade é, principalmente, a proteção dos trabalhadores. O preso também é um trabalhador e, consequentemente, merece atenção legislativa com os cuidados atinentes à pessoa humana na execução laboral. Políticas, planos, projetos devem ser muito bem aplicados, pois no momento em que o trabalho surge como uma alternativa de reinserção social, os cuidados devem ser redobrados. Atualmente, o trabalho, diversas vezes, acaba por ter um fim de uma sanção ainda maior, como se a pena privativa de liberdade já não fosse suficiente por si só e, por fim, não caracteriza a almejada ressocialização.

É possível a configuração do liame empregatício no momento em que um particular se utiliza da força de trabalho de outrem com o objetivo de lucro. E mesmo não sendo possível a configuração da relação empregatícia em razão da falta de algum elemento essencial, alguns direitos deverão ser conferidos, pois fazem parte da dignidade da pessoa humana.

A doutrina penalista desconhece os preceitos fundamentais do direito trabalhista e acaba se equivocando na abordagem dos temas. Por sua vez, a doutrina laboral acaba por não adentrar no mérito da questão, visto que a LEP marginaliza o trabalho do apenado da CLT e, assim, os

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trabalhistas enganam-se, deixando a problemática para o direito penal. Se a Lei e os operadores do direito continuarem a prever a marginalização celetista aos apenados, isso poderá ocasionar o caminho contrário ao desejado. O preso não verá o trabalho com o intuito de crescimento pes-soal, como uma relação recíproca de direitos e deveres, encarando-se cada vez mais abusado e inferiorizado pelo Estado e pela sociedade, apenas sendo utilizada sua mão de obra com o objetivo de produtividade e lucro. O seu labor não possui o mesmo valor que o realizado fora da prisão, simplesmente pelo fato de encontrar-se preso, porém a sua condição de preso, em regra, não deveria intervir na sua condição de trabalhador.

Não se pode continuar penalizando a pessoa que cometeu um crime, por mais grave que esse delito seja, privando-o de direitos que podem ser estendidos a ele mesmo durante o cumprimento de sua pena. O Estado, ao proibir a pena de morte e a pena em caráter perpétuo, deverá preparar o futuro egresso para que tenha condições de viver com os demais.

Cai-se na premissa de como ressocializar o preso, sendo que essa pessoa talvez nunca possa ter sido socializada. Muitas vezes é afirmado que os presos saem da prisão de uma forma pior do que entraram, esta é chamada de “a escola do crime”. O trabalho devidamente regulado poderá mudar, e muito, a situação. O apenado deverá ser reeducado, ou em casos mais graves, educado, visto que a educação pode nunca ter sido passada a ele, recebendo pela primeira vez os ditames de uma vida regrada, com uma política social, com direitos e deveres. Isso deverá ser ensinado, passado e repassado ao apenado, e, com o advento da sua liberdade, este poderá ser um cidadão efetivamente apto para colaborar com a sociedade da qual foi retirado.

À parte dessa discussão, insta frisar que uma questão que dificulta a abordagem do tema no Brasil é o fato de o direito penitenciário ser tratado como um ramo dentro do direito penal, pois a sua contribuição acadêmica ainda é pequena. O direito penitenciário deverá ser considerado isoladamente, visto que possui princípios, estrutura, pensamentos peculiares à execução da pena. Com certeza, o ramo em comento possui certo crescimento doutrinário, mas precisa muito mais, é necessário um status com autonomia para a devida discussão e importância que o segmento merece, e nessa pauta entraria a questão do trabalho carcerário.

É uma utopia imaginar que o trabalho do preso desmarginalizado dos preceitos trabalhistas será pacífico e unânime na sociedade, longe das críticas. Sempre haverá vozes contra os cuidados a tal parcela da população que está segregada da vida civil em razão de ter cometido um crime. Não se procura aqui pacificar o tema, longe disso, procura-se exatamente criar direitos que visem à proteção, calcando o embasamento para tanto no princípio da dignidade da pessoa humana, visto que o preso, apesar de recluso, continua sendo uma pessoa humana, apesar de, atualmente, ser tratado como se não fosse uma. Consequentemente, as polêmicas nascerão junto a tais direitos.

Por fim, a contínua desvalorização do trabalho carcerário continua a fomentar a descrença no sistema prisional brasileiro, que deveria servir de reabilitação, mas está por realizar o inverso, com a falta de observância aos preceitos trabalhistas. Punir o condenado não basta. São neces-sárias providências além da punição para que esse indivíduo tenha uma verdadeira reintegração pós-cárcere.

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108 A PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL EM CASOS ENVOLVENDO DANO MORTE

A PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL EM CASOS ENVOLVENDO

DANO MORTE

Sisnando Leiria Júnior1

RESUMO

O presente artigo versa sobre a análise da teoria da perda de uma chance interpretada pelo Superior Tribunal de Justiça, especificamente nos Re-cursos Especiais ns. 1.197.284 (AM), 1.254.141 (PR) e 1.335.622 (DF), vez que, foi reconhecida em casos envolvendo dano morte. Nesse contexto, será analisada a evolução do sistema de responsabilidade civil brasilei-ro, fundado no princípio fundamental da reparação integral, que concorre para a aplicação da teoria da perda de uma chance, pretendendo desta forma, apontar suas principais características.

PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade civil. Perda de uma chance. Dano morte. Princípio da reparação integral.

ABSTRACT

This article refers to the analysis of the Lost Chance Theory, interpreted by the Superior Court of Justice, specifically in the Specials Appeals num-bers. 1,197,284 (AM), 1,254,141 (PR) and 1,335,622 (DF), since it was recog-nized in cases involving death damage. In this context, it will be analyzed the evolution of the Brazilian civil Responsibility System, based on the in-tegral reparation fundamental principle, which contributes to the applica-tion of the Lost Chance Theory, intending to show its main characteristics.

KEYWORDS: Civil Responsibility. Loss of a chanche. Death damage. Inte-gral Reparation Principle.

1 Advogado. Bacharel em direito formado na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]. O autor agradece à professora dra. Roberta Drehmer de Miranda por sua valiosa contribuição na realização da presente pesquisa.

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1 INTRODUÇÃO

A globalização é um fato. Sob o ponto de vista tecnológico, a sociedade contemporânea está muito evoluída, já que com apenas alguns segundos de acesso à internet, é possível saber de notícias atualizadas de um município que fica a milhares de quilômetros de nossa localidade, se não, informações provenientes do outro lado do planeta.

Se por um lado a informação nos ajuda, por outro infelizmente evidencia uma sociedade que diariamente perde vidas de um modo não natural, mas em decorrência da violência, imprudência, imperícia ou negligência, provinda de uma conduta humana, pelo fato de uma coisa, ou ainda, de um animal. Assim, cotidianamente vivenciamos momentos tristes, nos deparando com a situação mais amargosa da vida: a morte.

É daí que surge o valoroso e difícil papel de quem compõe e trabalha no âmbito da justiça, desenvolvendo e procurando dar a melhor e mais justa resposta jurídica para o problema, embora não se possa trazer de volta a vida daquela pessoa próxima e querida que partiu precocemente.

A partir de uma breve exposição do alcance e desdobramentos em que o tema será examinado, há de se realçar a relevância do presente trabalho, pois conforme analisaremos posteriormente, o acolhimento da teoria da perda de uma chance em casos de dano morte ultrapassa a mera reparação civil pelo dano material ou moral e busca fomentar de modo a reparar de fato inte-gralmente a quem tenha sido ofendido.

O estudo da responsabilidade civil depreende-se de sua evolução histórica, observando-se suas bases mais tradicionais. O Código Civil Brasileiro de 1916, já tratava em um capítulo específico sob a responsabilidade civil. Desde lá, muitas disposições legais se perpetuaram e outras evoluíram conforme as necessidades sociais em consonância com a legislação constitucional vigente.

Por ser um instituto complexo do direito civil, não está intimamente ligado a situações taxativas. Portanto, ao nos direcionarmos aos ensinamentos de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, concebemos que “há indenizações que não resultam de infrações de dever de atividade ou de omissão. Então, quando se falar de dever de indenizar já se considera irradiado o efeito do ato, positivo ou negativo, que pode não ter sido ilícito”.2

Não obstante, estando presente o dever de indenizar, Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda assevera que “seja qual fôr o dano, mesmo o dano moral, o seu valor é fixável em dinheiro. As ofensas à personalidade têm de ser medidas pecuniariàmente, por mais estranho que seja ao patrimônio o direito feriòdo, o que sempre sustentamos”.3

Ao refletirmos sobre o propósito da responsabilidade civil na visão do direito nos anos de 1980, sob a ótica do anterior código civil de 1916, dispomos a visão lecionada pelo aludido autor:

A teoria da responsabilidade pela reparação dos danos não se há basear no propósito de sancionar, de punir, as culpas, a despeito de se não atribuir direito à indenização por parte da vítima culpada (argumento repelível de L. Hugueney, L’Idée de peine privée, 154). O fundamento – no direito contemporâneo – está no princípio de que o dano sofrido tem

2 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 46.

3 Ibidem, p. 123.

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de ser reparado, se possível, a técnica legislativa, partindo da causalidade, há de dizer qual o critério, na espécie, para se apontar o responsável. A restituibilidade é que se tem por fito, afastando qualquer antigo elemento de vingança.4 (grifo nosso).

No final do séc. XX, outro tradicional doutrinador da responsabilidade civil no direito brasileiro, José de Aguiar Dias, já sinalizava uma das funções indissociáveis da reparação civil:

Para efeito da punição ou da reparação, isto é, para aplicar uma ou outra forma de res-tauração da ordem social, é que se distingue: a sociedade toma à sua conta aquilo que a atinge diretamente deixando ao particular a ação para restabelecer-se, à custa do ofensor, no status quo anterior à ofensa. Deixa, não porque se não impressione com ele, mas porque o Estado ainda mantém um regime político que explica a sua não-intervenção. Restabelecida a vítima na situação anterior, está desfeito o desiquilíbrio experimentado. 5 (grifo nosso).

Concorrendo com a função punitiva, José de Aguiar Dias abordou sobre a busca pelo restabele-cimento do equilíbrio econômico-jurídico à vítima6, pois, uma vez que se demonstra caracterizado o dano, há uma causa geradora da legítima pretensão para a busca da devida reparação civil.

Mais recentemente, com novas evoluções no instituto, Carlos Roberto Gonçalves, trata que “a tendência, hoje facilmente verificável, de não se deixar irressarcida a vítima de atos ilícitos sobrecarrega os nossos pretórios de ações de indenização das mais variadas espécies”7. Isto posto, é notável que o instituto da responsabilidade civil só tem evoluído e se tornado crucial nos problemas que envolvem e requerem uma solução por parte da justiça.

Ainda que, embora se diga que atualmente a reparação civil esteja desvirtuada e desgastada pela quantidade de processos, isso decorre do mandamento constitucional da inafastabilidade do poder judiciário (art. 5º, inciso XXXV, CRFB/88), corroborando com Sergio Cavalieri Filho, quando dispôs sobre a ampliação das questões relativas à responsabilidade civil, pois:

Fala-se, até mesmo, em uma indústria da responsabilidade civil, no sentido pejorativo, com o que não concordamos. Não há indústria sem matéria-prima, de sorte que, se os domínios da responsabilidade civil são assim tão abrangentes, com o crescimento das demandas judiciais, é porque os danos injustos aumentaram e se tornaram mais frequentes. E, sobretudo, a consciência da cidadania ganhou um enorme impulso, pro-vocando a busca da prestação jurisdicional. Ninguém mais permanece inerte diante da lesão, sabendo que é possível alcançar a plena reparação junto ao Poder Judiciário, que passou a ser o escoadouro das aflições da população.8 (grifo nosso).

Ao abordar sobre o futuro da responsabilidade civil, Sergio Cavalieri Filho expõe sobre os novos rumos que se tem tomado, partindo de premissas que valoram a indenização como meio necessário para a proteção social:

4 Ibidem, p. 207.

5 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 8.

6 Ibidem, p. 42.

7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 33

8 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 2-3.

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Em outras palavras, a responsabilidade, antes centrada no sujeito responsável, volta-se agora para a vítima e areparação pelo dano sofrido. O dano, nessa nova perspectiva, deixa de ser apenas contra a vítima para ser também contra a coletividade, passando a ser um problema de toda sociedade.9 (grifo nosso).

Nesse sentido, com o advento da Carta Magna de 1988, que trouxe em seu texto constitucio-nal o fundamento da proteção a “Dignidade da Pessoa Humana” (art. 1º, inciso III, CRFB/88), é apreciável que o reconhecimento da perda de uma chance em nosso sistema jurídico só visa um propósito: a concretização do princípio da reparação integral.

E ao citar o princípio da reparação integral, não poderia deixar de fazer alusão a uma grande obra inspiradora, específica e profunda sobre tal tema, ilustrada por Paulo de Tarso Sanseverino, lecionando que pelo núcleo deste princípio:

Busca estabelecer uma relação de equivalência entre a extensão dos danos sofridos pela vítima (elemento do ato ilícito e pressuposto da responsabilidade civil) e a indenização correspondente (prestação da obrigação de indenizar).10

Aderindo a nova visão da responsabilidade civil, em que há uma pretensão pela reparação civil de forma mais ampla, o amparo pela aplicação da teoria da perda de uma chance em casos concretos deve observar os ensinamentos Sergio Cavalieri Filho, que acerca da teoria dispõe:

É preciso, portanto, que se trate de uma chance séria e real, que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada. Aqui, também, tem plena aplicação o princípio da razoabilidade.11 (grifo nosso).

Logo, é conclusivo que o reconhecimento da indenização por um resultado que se alcançaria, ou seja, a chance perdida, aferida por um juízo de probabilidades, atua para a reparação civil mais razoável, que observar-se-á no caso concreto as diversas complexidades que o instituto assim propõe.

Por ora, compreensível que quando corretamente aplicada, a reparação pela perda de uma chance é meio eficaz que concretiza a reparação integral em nosso sistema de responsabilidade civil, bastando saber como tem se posicionado o STJ em casos paradigmáticos em que haja o dano morte.

Em vista disso, examinando a pesquisa de jurisprudência do sítio eletrônico do STJ12, utilizando-se conjuntamente como palavras-chave “dano morte” e “perda de uma chance”, foram encontrados três acórdãos publicados no diário de justiça eletrônico entre os anos de 2012 e 2013, que abordam categoricamente este instituto, tornando-se paradigmas e fontes de aplicação e interpretação para eventos que dizem respeito ao objeto desta monografia, como analisaremos a seguir.

Em tais casos concretos, tanto o reconhecimento pela perda de uma chance no dano morte de uma criança, decorrente da imperícia em acidente de trânsito; como pela omissão de um hospital

9 Ibidem, p. 9.

10 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral: indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 32.

11 CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 98.

12 Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON> Acesso em: 26 de abril de 2015.

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que não acatou decisão judicial impressa da internet; ou ainda, do médico que deixou de realizar o tratamento de saúde ideal para uma paciente; consagram o apreço da aplicação do instituto para a reparação mais ponderada e justa.

Deste modo, a pesquisa examinará a construção da responsabilidade civil, partindo da doutrina clássica brasileira, percorrendo pelos princípios basilares, até a visão da teoria da perda de uma chance pelo direito pátrio. Após, objetivando o tema do presente trabalho de conclusão de curso, analisaremos sua aplicação no Superior Tribunal de Justiça, por meio de uma pesquisa qualitativa dos acórdãos proferidos nos anos de 2012 e 2013.

Enfim, partindo de tais premissas, o presente estudo final de curso compromete-se a esclare-cer essa nova teoria aplicada dentro de um dos órgãos superiores do poder judiciário, ratificando sua importância para a concretização da justiça, algo muito almejado e que em casos de morte demonstra-se muito complexo e extremamente delicado.

2 A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE NA RESPONSABILIDADE CIVIL

A teoria da perda de uma chance é nova vertente da responsabilidade civil, que objetiva o reconhecimento do ressarcimento pela perda de uma oportunidade de perceber uma vantagem ou de evitar um prejuízo, sendo que esta deve necessariamente ser real, atual e certa, por uma analise de probabilidade de que a vítima deixará de ter uma situação melhor no futuro.13

Diante dessa nova leitura reconhecida em nosso direito, são imprescindíveis as colocações de Sérgio Savi:

O termo chance utilizado pelos franceses significa, em sentido jurídico, a probabilidade de obter um lucro ou de evitar uma perda. No vernáculo, a melhor tradução para o termo chance seria, em nosso sentir, oportunidade. Contudo, por estar consagrada tanto na doutrina, como na jurisprudência, utilizaremos, ao longo do livro, a expressão perda de uma chance, não obstante entendermos mais técnico e condizente com o nosso idioma a expressão perda de uma oportunidade.14

Essa importante teoria foi construída pela doutrina francesa, com discussões em sua Corte de Cassação no ano de 1889, que ajudou a evoluir esse reconhecimento dentro da responsabilidade civil. De suma importância as palavras de Sérgio Savi, ao sintetizar tal criação:

Na França, houve dedicação maior ao tema por parte da doutrina e da jurisprudência. Em razão dos estudos desenvolvidos naquele país, ao invés de se admitir a indenização pela perda de uma vantagem esperada, passou-se a defender a existência de um dano diverso do resultado final, qual seja, o da perda da chance. Teve início, então, o desenvolvimento de uma teoria específica para estes casos, que defendia a concessão de indenização pela perda da possibilidade de conseguir uma vantagem e não pela perda da própria vanta-gem que não pôde se realizar. Isto é, fez-se uma distinção entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo. Foi assim que teve início a teoria da responsabilidade civil

13 Consoante CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit., p. 98.

14 SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 3.

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pela perda de uma chance.15 (grifo nosso).

A Itália também foi local de debates e do desenvolvimento desta teoria, que se aperfeiçoou ao longo do tempo. A perda de uma chance surge no Brasil após o seu desenvolvimento no conti-nente europeu, de modo que, influenciou e ajudou a renovar alguns aspectos em nosso sistema de responsabilidade civil.

Todavia, para que fosse aceita em nossa justiça, a teoria da perda de uma chance percorreu por anos nos tribunais, inicialmente no ano de 192616, até o ano de 199017, quando não era possível tal reparação. Novos entendimentos jurisprudenciais surgem em 199718, quando o STJ passou a reconhecer e aplicar tal teoria em seus julgados.

Embora nosso novo Código Civil de 2002, não fazer referência direta à mesma, era notável que em determinados casos a devida reparação não se concretizava, pois o dever de indenizar não contemplava toda a extensão do dano causado, importando uma interpretação mais ampla da cláusula geral de responsabilidade civil, já que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (vide art. 927 do CC).

Diferentemente da acepção da teoria da causalidade direta e imediata, neste instituto há um reconhecimento diverso, com a utilização da causalidade parcial, defendido enfaticamente por Rafael Peteffi da Silva da seguinte forma:

Desse modo, o padrão “tudo ou nada” de causalidade estaria, em muitos casos, patrocinando subcompensações ou ultracompensações (overcompensation and undercompensation). Com a utilização da causalidade parcial, o réu será condenado a pagar apenas pelo dano que, segundo as estatísticas, se espera que ele tenha causado.19 (grifo nosso)

Pelo ângulo da ressarcibilidade, lembremos fundamentalmente que o principal objetivo da responsabilidade civil é buscar que o ofendido possa ser ressarcido integralmente e que volte a condição que se encontrava antes do dano que lhe foi ocasionado, conhecido pela expressão status quo ante20.

Assim, Maria Helena Diniz preleciona que:

Se se caracterizar a responsabilidade, o agente deverá ressarcir o prejuízo experimentado pela vítima. Desse modo, fácil é perceber que o primordial efeito da responsabilidade civil é a reparação do dano, que o ordenamento jurídico impõe ao agente. A responsabilidade civil tem, essencialmente, uma função reparadora ou indenizatória.21

É notório que a nossa doutrina e o poder judiciário têm afirmado que a proteção da dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado, garante a valoração da proteção da vítima da situação danosa, face às adversidades e necessidades de resguardá-la. Posto isto, a teoria da

15 Ibidem, p. 3.

16 SILVA, Rafael Peteffi. Responsabilidade Civil Pela Perda de Uma Chance. São Paulo: Atlas, 2007, p. 198.

17 Idem.

18 Ibidem, p. 202.

19 SILVA, Rafael Peteffi. op. cit., p. 62.

20 Consoante GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, op. cit., p. 21.

21 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 133.

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perda de uma chance objetiva atingir seu determinado fim, reparando de modo mais amplo a pessoa ofendida.

Isso decorre dos novos rumos da responsabilidade civil, devendo nos direcionar aos ensinamen-tos de Rafael Peteffi Silva, que observou sensivelmente o reconhecimento de um novo paradigma, fundado nos preceitos constitucionais da Carta Magna de 1988:

Nesse sentido, o novo paradigma solidarista, fundado na dignidade da pessoa humana, modificou o eixo da responsabilidade civil, que passou a não considerar como seu principal desiderato a condenação de um agente culpado, mas a reparação da vítima prejudicada. Essa nova perspectiva corresponde à aspiração da sociedade atual no sentido de que a reparação proporcionada às pessoas seja a mais abrangente possível.22 (grifo nosso).

No Brasil, essa nova categoria de dano indenizável, aparente quando é retirada da pessoa que sofreu o dano, a oportunidade de atingir uma situação futura melhor em termos materiais, possui algumas interpretações na doutrina em relação à modalidade de indenização. O autor Sérgio Savi considera como dano material, subespécie de dano emergente23, enquanto Silvio de Salvo Venosa entende como terceira espécie24, dentro do dano material, entre dano emergente e lucro cessante.

Tanto na doutrina, como na jurisprudência, também há divergências em relação à aplicação da perda de uma chance como dano moral ou material, ou ainda, como agregador de ambos25. Apesar disso, se há duvidas em relação ao enquadramento de sua modalidade, algo é percebido claramente dentro do direito pátrio, conforme os mandamentos de Sergio Cavalieri Filho:

É preciso, portanto, que se trate de uma chance séria e real, que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada. Aqui, também, tem plena aplicação o princípio da razoabilidade.26 (grifo nosso).

Precisamente, esclarecendo conceitualmente a teoria da perda de uma chance, Sergio Cava-lieri Filho leciona:

A chance perdida reparável deverá caracterizar um prejuízo material ou imaterial resul-tante de fato consumado, não hipotético. Em outras palavras, é preciso verificar em cada caso se o resultado favorável seria razoável ou se não passaria de mera possibilidade aleatória. A vantagem esperada pelo lesado não pode consistir numa mera eventuali-dade, suposição ou desejo, do contrário estar-se-ia premiando os oportunismos, e não reparando as oportunidades perdidas.27 (grifo nosso).

Da mesma forma, utiliza-se o fundamento da perda de uma chance no âmbito da responsabi-lidade civil do advogado, em que Carlos Roberto Gonçalves preleciona: “Utiliza-se, nesses casos, a “expressão perda de uma chance”, simbolizando a perda, pela parte, da oportunidade de obter,

22 SILVA, Rafael Peteffi, op. cit., p. 71.

23 SAVI, Sérgio, op. cit., p. 122.

24 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol. 4. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 40.

25 SAVI, Sérgio, op. cit., p. 46.

26 CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit., p. 98.

27 CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit., p. 98.

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no judiciário, o reconhecimento e a satisfação integral ou completa de seus direitos”.28

Reforçando o entendimento do aludido autor, Silvio de Salvo Venosa categoricamente considera:

Na esfera da responsabilidade do advogado, em muitas oportunidades vem à baila sua desídia ou retardamento na propositura de uma ação judicial; perda do prazo de contes-tar ou recorrer etc. Nesse campo, tem aplicação o que falamos neste volume acerca da denominada perda de chance.29

No sentido do exposto anteriormente, frisa-se que a chance perdida deve ser séria e real, uma oportunidade plausível e provável, partindo de uma análise com base na razoabilidade, sob pena deste instituto servir como meio de enriquecimento sem causa, caso atendesse quaisquer perspectivas e possibilidades hipotéticas.

A responsabilidade civil, de modo geral, abarcando inclusive o dano morte, possui natureza jurídica “sancionatória, independente de se materializar como pena, indenização ou compensação pecuniária” 30, porquanto terá como função “compensatória do dano à vítima; punitiva do ofensor; e desmotivação social da conduta lesiva” 31.

Em relação à quantificação da reparação desta futura oportunidade perdida, após o juízo de probabilidade, que pode ser feito por estatísticas com a finalidade de conferir um caráter de chance real e séria, vale-se as palavras de Sérgio Savi:

Quanto à quantificação do dano, a mesma deverá ser feita de forma equitativa pelo juiz, que deverá partir do dano final e fazer incidir sobre este o percentual de probabilidade de obtenção da vantagem esperada.32

Conforme apresentado por Sérgio Savi, a Corte de Cassação Francesa tinha por parâmetro de indenização o seguinte cálculo, e que serve como base ponderada para a análise final da indenização:

VI = VRF x Y onde: VI = valor da indenização da chance perdida; VRF = valor do resultado final; Y= percentual de probabilidade de obtenção do resultado final.33

De forma distinta, ao dispor sobre os critérios para a determinação da devida reparação, des-tacando-se a razoabilidade, Sergio Cavalieri Filho nos ensina:

Conforme já ressaltado, não se deve olhar a chance como perda de um resultado certo porque não se terá a certeza de que o evento se realizará. Deve-se olhar a chance como a perda da possibilidade de conseguir um resultado ou de se evitar um dano; devem-se valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado para ver se são ou não relevantes para o ordenamento. Essa tarefa é do juiz, que será obrigado a fazer,

28 GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 466.

29 VENOSA, Sílvio de Salvo, op. cit., p. 296.

30 Consoante GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, op. cit., p. 62.

31 Ibidem, p. 63.

32 SAVI, Sergio, op. cit. p. 68.

33 Ibidem, p. 32.

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em cada caso, um prognóstico sobre as concretas possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado favorável.34

Então, atendidos os critérios baseados no princípio da razoabilidade, o qual o juiz irá analisar o caso concreto de forma extensa, atentar-se-á que a “indenização deve ser pela perda da opor-tunidade de obter uma vantagem e não pela perda da própria vantagem”.35 (grifo nosso).

Muitas questões atinentes já foram discutidas também no órgão guardião da Carta Constitucional, o Supremo Tribunal Federal, que visando à uniformidade e segurança jurídica na interpretação federal, sumulou as seguintes questões na acepção do reconhecimento à teoria da perda de uma chance e à indenização civil correspondente:

Súmula 490: A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores.

Súmula 491: É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.

Embora o presente trabalho tenha como objetivo a análise da aplicação da perda de uma chance em casos de dano morte, é crucial o apontamento de um processo judicial emblemático conhecido nacionalmente, julgado pelo Superior Tribunal de Justiça no ano de 2005, conhecido como “Caso do Show do Milhão”36.

Este caso tratava de uma pessoa que participou do programa Show do Milhão do SBT e que ao chegar à última pergunta, optou por não respondê-la, por considerar sua formulação incorreta, fazendo-a desistir da chance de ganhar os R$ 500.000,00, que totalizaria o prêmio máximo de 1 milhão de reais.

Sentindo-se lesada, ajuizou ação pleiteando o valor perdido, com fundamento na violação da boa fé e pela perda de uma chance. Chegando ao STJ, que levou em conta o juízo estatístico de probabilidade, pois em quatro opções da questão, teria a chance de 25% de optar pela correta, sendo provida a indenização no valor de R$ 125.000,00 para a participante do programa.

Um pouco mais complexo, mas não tão distante, o dano morte propõe um esforço para que se possa guiar a indenização mais ponderada. A idade da vítima, sua futura ou atual contribuição financeira para a família, assim como sua expectativa de vida, suas chances de vida e a contri-buição na participação do autor do fato, serão analisados no dano que indiscutivelmente é certo.

No que tange o dano morte, Celina Kazuko Fujioka Mologni trata que:

A lei protege o ser humano, desde a concepção, ainda no ventre materno, estendendo-se esta proteção após o nascimento, assegurando-lhe sua formação adulta até a morte natural, prolongando-se no tempo os direitos do falecido, como o direito à imagem, ao nome, e outros, que são exercidos pelos sucessores do falecido.

34 CAVALIERI FILHO, Sergio. op. cit. p. 154.

35 Ibidem, p. 155.

36 SAVI,Sergio.op. cit. p. 75.

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Desta forma, causando a morte da vítima, por ato ilícito, seria consequência natural a imposição da reparação a título de dano morte, por violação do direito à vida, a fim de que a indenização seja a mais completa possível.37 (grifo nosso).

Imperiosa, é a proteção da Carta Magna Brasileira, que em seu art. 5º, caput, garante a “in-violabilidade do direito à vida”, categoricamente trabalhada pela doutrinadora supracitada:

Analisou-se que, entre os direitos supremos da pessoa humana, está a tutela do seu maior bem da vida, que é a própria vida. Se a vida é lesada por ato ilícito do ofensor, quando da ocorrência do fato danoso, é porque a vítima estava viva e sofreu o dano que a conduziu à morte, caracterizando-se, daí, o dano morte.38

Mesmo que a legislação ordinária não trate expressamente do dano morte, vale-se aplicar das cláusulas gerais prescritas no código civil como meio interpretativo do jurista, assim:

Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima. (grifo nosso).

Portanto, quando presentes os pressupostos de uma chance real e séria, em que efetivamente o ofendido vai deixar de ter futuramente uma situação econômica melhor, presente pelo nexo causal com a perda desta oportunidade, em que o dano é hipotético (já que a situação futura não vai se realizar), mas avaliável por meio de um juízo de razoabilidade e probabilidades, há de ser observada a pretensão jurisdicional do ofendido e sua respectiva tutela buscada na ação judicial.

À chance perdida, por consequência lhe será atribuída um conteúdo econômico, ressaltando que a indenização jamais poderia corresponder ao prejuízo final, mas tão-somente a esta chance, ainda que se leve em consideração, os efeitos bases da responsabilidade civil, como a prevenção por meio da dissuasão.39

Após as considerações gerais acerca da teoria da perda de uma chance e do reconhecimento do dano morte, iniciaremos o estudo objeto do trabalho, analisando acórdãos proferidos entre 2012 e 2013 pelo STJ, vez que, seus Ministros desenvolveram e fundamentaram tais teorias em suas decisões.

3 A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE NO DANO MORTE VISTA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Após apresentarmos anteriormente o caso emblemático do “Show do Milhão”, que incidiu a aplicação da perda de uma chance pelo STJ, passaremos a expor os casos envolvendo dano morte,

37 MOLOGNI, Celina Kazuko Fujioka. Artigo Original: Dano Morte e Seus Efeitos Sucessórios. Disponível em: <http://www.pgss.com.br/revistacientifica/index.php/juridicas/article/download/1024/943> Acesso em 30 de março de 2015, p. 21.

38 MOLOGNI, Celina Kazuko Fujioka. Artigo Original: Dano Morte e Seus Efeitos Sucessórios. Disponível em: <http://www.pgss.com.br/revistacientifica/index.php/juridicas/article/download/1024/943> Acesso em 30 de março de 2015, p. 22.

39 Consoante BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.254.141 - PR; Rel. Ministra NancyAndrighi, DJe de 20/02/2013, p. 18.

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com o reconhecimento desta importante teoria para o direito indenizatório. Destarte, em nossa pesquisa jurisprudencial específica no sítio eletrônico do STJ, foram encontrados três acórdãos proferidos por esta corte, tornando-se casos paradigmas do tema analisado.

A escolha da análise desta teoria pelo STJ faz-se necessária, por esta corte ser um dos órgãos máximos do poder judiciário do Brasil, tendo como missão zelar pela uniformidade de interpretação da jurisprudência e da legislação federal brasileira, visando concretizar o princípio da segurança jurídica com a devida competência, estabelecida pelo artigo 105 da Carta Magna Brasileira.

O primeiro acórdão, Recurso Especial nº 1.335.622 (DF), julgado em 18 de dezembro de 2012, está pautado na reforma das decisões que não acolheram a pretensão da reparação pela perda de uma chance por falta de nexo causal. No caso, se busca caracterizar a omissão de um hospi-tal, que não aceitou a ordem de uma medida liminar impressa pela internet, que determinava a internação de uma criança de 8 (oito) meses, que acabou falecendo em decorrência da falta de tratamento médico adequado, restando aos pais da mesma procurar o judiciário, para ver satisfeita uma reparação cível por todo o ocorrido.

Partindo superficialmente ao narrado na peça inicial, os autores expuseram que sua filha de 8 (oito) meses estava com complicações graves no seu quadro de saúde, estando internada em hospital público com poucos recursos para o tratamento. Ajuizaram ação contra o Estado com pedido de liminar para transferir sua filha para um hospital privado, o qual tivesse mais condições de atender as peculiaridades ao estado de saúde da criança.

No hospital privado (demandado), os pais foram informados que se apresentassem uma cópia do deferimento da liminar, iriam receber a criança. Entretanto, assim que o pedido de urgência foi deferido, impresso via internet (já que não haveria tempo de intimação por oficial de justiça), não foi aceito pelo hospital, por considerarem o documento informal, fazendo com que a criança permanecesse no mesmo leito do hospital público. Por diante, a criança veio a falecer.

Neste caso, os pais buscavam a reparação por danos morais e materiais pelo ocorrido. Funda-mentando que a falta de aceite do demandado (liminar concedida impressa da internet) contribuiu para que sua filha não tivesse melhores condições de sobreviver, que seria possível com o pronto atendimento, do qual possuíam dever de prestar.

No juízo a quo, ratificado também pelos desembargadores no segundo grau, julgaram im-procedentes os pedidos dos pais da criança, por considerarem que havia a inexistência de nexo causal e que o hospital demandado não possuía o dever de indenizar neste caso, já que não possuía obrigação judicial de prestar o atendimento requerido, devido à falta de intimação por meio oficial.

Pela via especial, sob a relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, após dispor sobre os argumentos postos pelos autores da ação, destacando que o STJ não realizará nova análise dos fatos, por óbice da Súmula 7 da presente corte, enquadrando apenas aquilo que foi documentado e é incontroverso para a aplicação do direito material.

De plano, o relator tratou do nexo causal, algo que foi discutido durante todas as fases do processo, fazendo referência às palavras do Min. Teori Albino Zavascki:

Por nexo causal entende-se a relação – de natureza lógico-normativa, e não fática- entre

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dois fatos (ou dois conjuntos de fatos): a conduta do agente e o resultado danoso. Fazer juízo sobre nexo causal não é, portanto, resolver prova, e sim estabelecer, a partir de fatos dados como provados, a relação lógica (de causa e efeito) que entre eles existe (ou não existe). Trata-se em outras palavras, de pura atividade interpretativa, exercida por raciocínio lógico e à luz do sistema normativo. Daí não haver qualquer óbice de enfrentar, se for o caso, mesmo nas instâncias extraordinárias (recurso especial ou extraordiná-rio), as questões a ele relativas. Nesse ponto, é pacífica a jurisprudência assentada no STF (especialmente ao tratar da responsabilidade civil do Estado), no sentido de que o exame do nexo causal, estabelecido a parti dos fatos tidos como certos, constitui típica atividade de qualificação jurídica desses fatos e não de exame de prova. Paradigmático, nesse sentido, o precedente do RE 130.764, 1ª Turma, Min. Moreira Alves, DJ de 07/08/92 (REsp nº 843.060/RJ – grifou-se).

Ao analisar a omissão do hospital, foi considerado, independente do demandado não ter rece-bido intimação oficial, suas obrigações Constitucionais em respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana, direito a saúde, proteção à infância, proteção integral da criança, bem como os demais deveres legais aplicáveis no caso.

O nexo causal como liame imprescindível para a caracterização da responsabilidade estava demonstrando, pois para o relator “diante dos fatos exaustivamente analisados, que a questão envolve uma conduta (omissão) que poderia ter garantido a chance de um resultado diverso”.

O Ministro, ao justificar o nexo causal assevera que:

Com razão, a doutrina, ainda tímida no âmbito cível, tem-se firmado no sentido de que a omissão adquire relevância jurídica e torna o omitente responsável pelo dano, quando este tem o dever jurídico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado, e se omite assumindo o risco pela ocorrência do resultado.

Consequentemente, diante da omissão jurídica o hospital afastou fortemente as possibilidades de cura e tratamento da criança, vez que possuía melhores condições de atendê-la e não o fez, fazendo com que o dano ficasse evidenciado diante das circunstâncias que favoreceriam a vítima.

Por consequência, restou comprovada a relação de causalidade pela perda da chance de receber o tratamento digno, ainda que não houvesse a certeza que sua vida fosse salva, havia probabilidades de que o tratamento pudesse lhe trazer uma sobrevida.

Embora nunca se saiba o resultado final, deve-se apreciar o fato, “isso porque o que se in-deniza na responsabilidade por perda de uma chance outra coisa não é senão a própria chance perdida” (grifo nosso). Nesta condição, o relator prescreve enfaticamente:

O fato é certo: a menor faleceu. A simples chance (de cura ou de sobrevivência), no pre-sente caso, é que passa a ser considerada como bem juridicamente protegido, pelo que sua privação indevida vem a ser considerada como passível de ser reparada. A perda de chance, aqui, se arruma por inteiro, como um alerta ao cuidado dos que lidam com a vida humana.

No que tange a quantificação da indenização por dano moral, o relator condenou o réu a in-

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denizar em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para cada um dos genitores. No entanto, o tocante ao dano material (pedido de pensionamento até a data em que a vítima completaria 25 anos) não foi acolhido, por tratar de modalidade de dano material com comprovação incerta.

Em voto de divergência, a Ministra Fátima Nancy Andrighi não concordou em julgar proceden-te o pedido de danos morais e improcedente o de danos materiais (pensionamento), pois, para ela estariam se criando dois tipos de nexo causal, sendo que o liame jurídico aliado ao dano é o mesmo. No caso, Fátima Nancy Andrighi discorre:

Ocorre que, em se tratando de perda da chance, há um único nexo de causalidade a ser perquirido, ligado, como visto, não ao resultado final (morte) para o qual a conduta do agente pode ou não ter contribuído, mas apenas à oportunidade que se privou. Trata-se, pois, de quantificar em que medida a conduta do hospital contribuiu para a chance (de viver) perdida.

A despeito disso, deveria o processo retornar ao primeiro grau para a análise da conduta do réu, vez que uma perícia técnica poderia abalizar em que medida a omissão reduziu a chance da criança sobreviver, o que concordamos com a ministra, já que quando presentes os requisitos da probabilidade e da certeza que haverá o prejuízo, seria possível quantificar as indenizações provenientes do fato danoso.

Por fim, a terceira turma do STJ conheceu em parte o recurso dos autores, nos termos do voto do relator, que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino. Vencido o voto da Sra. Ministra Fátima Nancy Andrighi.

O segundo acórdão, Recurso Especial nº 1.254.141 (PR), julgado em 04 de dezembro de 2012, trata de um caso envolvendo imperícia médica, que resultou na morte de uma paciente com diagnóstico de câncer, decorrente da falta de tratamento médico adequado, restando aos filhos e ao cônjuge, procurar o judiciário para ver satisfeita uma reparação cível por todo o ocorrido.

Iniciamos a análise partindo dos fatos discutidos no juízo monocrático de segundo grau, os quais ficaram esclarecidos de que a vítima realizava tratamento médico para a cura de um câncer e que devido à suposta falta de tratamento médico adequado, ocorreu a morte precoce da vítima.

O réu do processo de reparação ofertou reconvenção, alegando que a ação principal ofendia sua honra e prejudicava sua imagem, por um erro que não existiu e uma morte que não teve culpa. Em ação cautelar, foi realizada produção antecipada de provas, a qual comprovou o erro médico.

Em primeiro grau, o juiz julgou procedentes os pedidos de danos morais e materiais para o espólio de Vilma, seu cônjuge e seus filhos. O quantum da indenização por dano moral foi de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), com o reconhecimento da perda de uma chance.

Em sede de recurso de apelação, o médico alegou inexistência de nexo causal entre sua con-duta e a morte da vítima, pois o tratamento que estava aplicando não teria lhe causado o óbito. O acórdão da segunda instância manteve os pedidos julgados procedentes no primeiro grau, fazendo com o que a parte vencida recorresse à instância superior. Após a admissão do recurso especial, a Ministra relatora Fátima Nancy Andrighi profere:

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Cinge-se a lide a estabelecer, entre outras questões de natureza processual, se é razoável o critério adotado pelo TJ/PR ao apurar, com fundamento na teoria da perda da chance, a reponsabilidade civil de um médico oncologista em hipótese em que a perícia apurou a inadequação do tratamento de câncer por ele adotado em paciente que, posteriormente, veio a óbito.

Com isso, de forma sensata a relatora analisa os argumentos do recorrente, pois aduz que as decisões pautavam exclusivamente no acolhimento da perda de uma chance e esta não ca-racterizaria por si só o nexo causal, como pressuposto base para que haja o dever de indenizar.

Nos autos, ficou comprovado que não ocorreu o procedimento médico correto para que o processo danoso fosse interrompido e não ocasionasse a morte da paciente, momento em que a extensão do dano é visível, devendo-se analisar a atuação do médico para o evento morte.

A resposta para o caso está nas palavras de Fátima Nancy Andrighi, em que “a perda da chance, em verdade, consubstancia uma modalidade autônoma de indenização passível de ser invocada nas hipóteses em que não se puder apurar a responsabilidade direta do agente pelo dano final”, sendo que “o agente não responde pelo resultado para o qual sua conduta pode ter contribuído, mas apenas pela chance de que ele privou o paciente”.

Apreciado, portanto, que não foi adotada a melhor técnica para o tratamento da vítima, restou comprovada a culpa do médico no tratamento. Ressaltamos o extraído do acórdão recorrido, utilizado como base de fundamento para a relatora:

(i) a chance de melhor qualidade de vida ou até a cura da paciente era real e concreta; (ii) que há uma relação direta entre o tratamento inadequado e a perda de oportunidade de melhor qualidade de vida ou até mesmo de obter cura da doença; (iii) o fato de a paciente ter gerado filho não rompe o referido nexo de causalidade, entre o tratamento inadequado e a chance perdida; (iv) o dano final está provado, com a morte da vítima. (grifo nosso).

Este entendimento está em consonância com os pressupostos da teoria da perda de uma chance, senão vejamos:

(i) uma chance concreta, real, com alto grau de probabilidade de obter benefício ou sofrer um prejuízo; (ii) que a ação ou omissão do defensor tenha nexo causal com a perda da oportunidade de exercer a chance (sendo desnecessário que esse nexo se estabeleça diretamente com o objeto final); (iii) atentar para o fato de que o dano não é o benefício perdido, porque este é sempre hipotético.

Destaca-se também, que em relação à legitimidade de pleitear a indenização, pode se dar aos seus herdeiros. Não é só porque o paciente que sofreu com a falta de oportunidade de cura ou de “gozar de uma sobrevida mais confortável”, que seria o único legítimo processualmente (impossível com a morte).

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A razão que assiste aos herdeiros, no que toca sua legitimidade processual, é evidenciada por Fátima Nancy Andrighi:

Contudo, a oportunidade de gozar a companhia de um ente querido, com ele convivendo livre de sua doença, ou mesmo de acompanha-lo num processo melhor de convalescência, é direito autônomo de cada uma das pessoas que com o ‘de cujus’ mantinham uma relação de afeto. O dano, portanto, causado pela morte, afeta a todos em sua esfera individual, cada qual por um motivo específico, como sói ocorrer em todas as situações em que se pleiteia indenização por força do falecimento de um ente querido.

Muito bem delineado e uma das questões mais importantes, é o valor da indenização, pois conforme exposto por Fátima Nancy Andrighi, “a indenização jamais poderia corresponder ao pre-juízo final, mas tão-somente à chance perdida”, adotando-se neste caso o critério da ponderação.

Ao aplicar no caso em tela, a relatora do recurso reformou o ponto que toca à indenização, a partir da visão das circunstâncias do caso que levaram ao valor da chance perdida no quantum de 80% do valor fixado pelo acórdão recorrido, se reportando a sentença. A Terceira turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial. Presentes a i. relatora e os Srs. Minis-tros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva.

O terceiro acórdão, Recurso Especial nº 1.197.284 (AM), julgado em 23 de outubro de 2012, discute a reparação pela perda de uma chance, em um caso envolvendo a morte de uma criança de 14 anos de idade em um acidente de trânsito, em decorrência da imperícia do condutor, restando aos pais do mesmo procurar o judiciário, para ver satisfeita uma reparação cível por todo o ocorrido.

Primeiramente, os fatos narrados na petição inicial discorrem do grave acidente automobilístico que ocasionou a morte do filho de 14 anos dos requerentes, devido à imprudência do motorista do ônibus escolar em que o transportava. A ação foi ajuizada em face da empresa de ônibus e da fundação onde estudava, requerendo que solidariamente os indenizassem por danos morais e pensão por morte decorrente da perda de uma chance.

O juízo monocrático julgou procedentes os pedidos interpostos na inicial, condenando os réus à indenização por danos morais em 3.000 salários mínimos para cada um dos genitores e o paga-mento de pensão na quantia de 2 salários mínimos até o momento em que a vítima completaria 65 anos, reduzindo pela metade quando completasse 25 anos de idade.

Em grau recursal, o Tribunal do Amazonas reduziu a indenização por danos morais na impor-tância de 1.500 salários mínimos para cada um dos pais, mantendo no resto a sentença proferida em primeiro grau. Assim, as empresas demandadas interpuseram recursos especiais, visando à reforma da decisão para reduzir o quantum indenizatório fixado pelas instâncias inferiores.

O relator do processo, Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, delineando as questões controvertidas, acolhendo inicialmente a responsabilidade solidária dos demandados, passou esclarecer e decidir acerca dos valores das indenizações pleiteadas.

Aduz primeiramente, que a jurisprudência não reconhecia pensão por morte aos pais em decorrência de filho menor que faleceu, já que em tese ele seria o “alimentado” e não os seus pais. No tocante ao dano moral pela morte de filho menor, a jurisprudência também teve que

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construir um novo entendimento, o qual acabou sendo sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, garantindo a indenizabilidade nestes casos.

Entretanto, Sanseverino dispõe que as hipóteses em que se acumula o dano moral com o dano material (pensão por morte) fundada na teoria da perda de uma chance, são restritas, assim:

(...) o que se está a reparar, em última análise, é a perda de uma chance, visto que o direito à indenização somente é reconhecido em favor de famílias de baixa renda em que a contri-buição econômica dos filhos aos pais, em sua velhice, não apenas é fato corriqueiro, mas é necessária à sua manutenção. Não se repara o dano final, mas a chance perdida pelos pais com a morte precoce do filho, o que é uma realidade nas famílias de baixa-renda. (grifo nosso).

É de crucial importância que a indenização de pensão por morte aos pais do filho falecido, deve-se voltar somente às famílias de baixa renda, “permitindo superar a objeção de que se esta-ria a indenizar dano hipotético”. Destarte, a pensão não corresponde pela indenização da morte, mas sim pela chance que a família perdeu em ter a contribuição do filho no orçamento familiar.

Para estabelecer o pensionamento, o primeiro passo é determinar o termo inicial, que ficou decidido pela data em que o adolescente poderia entrar no mercado de trabalho, utilizando-se como fundamento a idade do “menor aprendiz” (14 anos), presente no art. 7º, inciso XXXVIII da CRFB/88.

Resolvido o termo inicial, é fundamental definir o termo final, sob pena de a pensão tornar-se eterna, o que não ocorre, já que o critério definido pela jurisprudência do STJ é totalmente lúcido e fundado na realidade social brasileira. Portanto, o termo final é o ano em que o filho comple-taria 65 anos de idade, visto que é quando há a aposentadoria por idade do homem, presente na Lei 8.212/91, que dispõe sobre a “Organização da Seguridade Social”, dando razão que seria o momento em que o idoso não poderia mais trabalhar para complementar a renda familiar e ajudar os seus pais.

De forma prudente, o relator se volta à análise do quantum da pensão, vez que não é possível “adivinhar” qual seria a profissão e salário da vítima no futuro. Logo, a base de cálculo neste caso é o salário mínimo nacional vigente, levando em consideração que o de cujus gastaria 1/3 do salário consigo, restando 2/3 do salário mínimo que estaria voltado às necessidades da família.

O eminente relator estabelece que a pensão por morte deverá ser de 2/3 do salário mínimo do ano em que a vítima completou 14 anos de idade, até o ano em que completaria 25 anos de idade, após será reduzido pela metade, considerando a idade hipotética que o filho constituiria sua própria família, estendendo-se a pensão de 1/3 do salário mínimo até o ano em que completaria 65 anos de idade.

Pertinente à discussão dos valores a serem definidos nos danos extrapatrimoniais, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino considera que “constitui um dos problemas mais delicados da prática forense na atualidade, em face da dificuldade de fixação de critérios objetivos para o seu arbitramento”.

Destacando o notável livro desenvolvido com o título “Princípio da Reparação Integral”, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino utiliza os mesmos fundamentos do critério bifásico para o presente caso concreto, que ocorrerá por um arbitramento equitativo, conforme já mencionado na norma

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geral disposta no art. 953 do CC.

Há de se realçar que:

A autorização legal para o arbitramento equitativo não representa a outorga pelo legislador ao juiz de um pode arbitrário, pois a indenização, além de ser fixada com razoabilidade, deve ser devidamente fundamentada com a indicação dos critérios utilizados.

O primeiro critério utilizado no modelo bifásico de quantificação da indenização é a valoração das circunstâncias do evento danoso, elencadas por Paulo de Tarso Vieira Sanseverino da se-guinte forma:

a) A gravidade do fato em si e suas consequências para a vítima (dimensão do dano); b) A intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente (culpabilidade do agente); c) A eventual participação culposa do ofendido (culpa concorrente da vítima); d) A condição econômica do ofensor;e) As condições pessoais da vítima (posição política, social e econômica).

O segundo critério a ser analisado é o interesse jurídico lesado, levando em conta no presente caso que o bem lesado foi à própria vida do adolescente. A aplicação deste critério se dá por meio de um estudo de casos, conhecido na doutrina como “grupo de casos”, que serão levados em conta o valor de indenizações de outros casos semelhante, objetivando a coerência e igualdade nas decisões judiciais.

Confrontado os dois critérios do modelo bifásico, evidencia-se sua importância, pois:

Chega-se, com isso, a um ponto de equilíbrio em que as vantagens dos dois critérios estarão presentes. De um lado, será alcançada uma razoável correspondência entre o valor da indenização e o interesse jurídico lesado, enquanto, de outro lado, obter-se-á um montante que corresponda às peculiaridades do caso com um arbitramento equitativo e a devida fundamentação pela decisão judicial.

Destoantes as indenizações concedidas pela via especial no STJ, Paulo de Tarso Vieira Sanse-verino analisou em sua tese de doutorado mais de 150 decisões tratando de reparações por dano morte. Demonstrou, que à época da decisão a 4º Turma do STJ tinha por parâmetro o deferimento de 500 salários mínimos, enquanto a 3ª Turma tinha por base 300 Salários Mínimos.

Embora que seja importante o uso dos parâmetros em respeito ao montante da indenização, não se pode tornar um “tarifamento judicial”, pois vai contra a lógica da devida reparação, pelo princípio da reparação integral, já que diversas circunstancias devem ser observadas no caso concreto.

Posto isto, o Ministro relator observando os critérios do modelo bifásico para a indenização, considerou o importe de 400 salários mínimos pelo interesse jurídico lesado, e mais 100 salários mínimos pelas particularidades do caso, tornando definitiva a indenização de 500 salários mínimos

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para cada um dos pais. Por unanimidade, a Terceira Turma deu parcial provimento aos recursos especiais interpostos. Presentes o i. relator e os Srs (as). Ministros (as) Sidnei Beneti, Paulo Nancy Andrighi e Ricardo Villas BôasCueva. Ausente, justificadamente, o Sr. Min. Massami Uyeda.

Enfim, envolvendo a morte nos três casos, é visível a necessidade de se verificar o nexo cau-sal entre as condutas que levaram ou deixariam que acontecesse o fato danoso, caso houvesse conduta diversa. Outrossim, se indeniza a chance perdida, e não o dano pela morte em si, por um juízo equitativo levando em consideração as singularidades do caso e o interesse jurídico lesado.

4 A EFETIVAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL NO DANO MORTE

A reparação integral, na visão da doutrina possui grande importância no sistema de respon-sabilidade civil do Brasil, pois, além dos objetivos já expostos, sobretudo visa evitar que a vítima suporte prejuízos que devem ser indenizados pelo causador do fato danoso.40

De forma lato sensu, o Código Civil Brasileiro na inteligência do artigo 944, estabeleceu que “a indenização mede-se pela extensão do dano”. Assim, entendemos que a reparação integral é decorrente de tal mandamento legal, bastando observarem-se os critérios para a quantificação da indenização.

Nota-se ainda, que a valoração da reparação integral se dá por força do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, disposto no artigo 1º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 198841. Com tal característica, a dignidade da pessoa humana vem dar maior garantia à efetividade na proteção da vítima que sofreu um dano de natureza patrimonial ou extrapatrimonial.42

O critério da razoabilidade, adotado como condução da indenização pela chance perdida, é precisamente trabalhada por Sergio Cavalieri Filho:

Conforme já ressaltado, não se deve olhar para a chance como perda de um resultado certo porque não se terá a certeza de que o evento se realizará. Deve-se olhar a chance como a perda da possibilidade de conseguir um resultado ou de se evitar um dano; de-vem-se valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado para ver se são ou não relevantes para o ordenamento. Essa tarefa é do juiz, que será obrigado a fazer, em cada caso, um prognóstico sobre as concretas possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado favorável.43 (grifo nosso).

Neste sentido, o próprio legislador infraconstitucional ao dispor no parágrafo único, do artigo 944, CC/02, em que “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização”(grifo nosso), as razões de equidade nortearão a indenização. Como exemplo, ao tratar sobre a preservação do núcleo da reparação integral, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino nos orienta no sentido de que:

40 Consoante CAVALIERI FILHO, op. cit. p. 26.

41 Ibidem, p. 5.

42 Ibidem. p. 27.

43 CAVALIERI FILHO, op. cit. p. 154.

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126 A PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL EM CASOS ENVOLVENDO DANO MORTE

O valor da indenização não pode ultrapassar a extensão do dano, preservando-se a função de teto do princípio da reparação integral, mas pode ficar aquém, indenizando-se menos do que o montante total dos prejuízos sofridos pelo lesado. Ocorre quando o agente, agindo com culpa leve, causa danos de grande monta. Exemplo dessa situação é o caso hipotético do motorista de um carro popular, que colide na parte traseira de um luxuoso automóvel importado. Agindo com culpa leve, causou o agente danos materiais de grande monta. Mesmo vendendo o seu automóvel, não vai conseguir pagar a totalidade do prejuízo sofrido pelo lesado.44 (grifo nosso).

Com a distinta obra “Princípio da Reparação Integral- indenização no Código Civil”, o autor supracitado, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, leciona que:

A reparação do dano injustamente causado constitui uma exigência de justiça comuta-tiva, como já fora vislumbrado por Aristóteles na Ética a Nicômaco, devendo ser a mais completa possível, o que se chama, modernamente, de princípio da reparação integral do dano.45 (grifo nosso).

Com efeito, se busca por meio da reparação integral que o ofendido tenha recuperado seu status anterior à ofensa, entretanto, inexequível quando se trata de dano morte, já que o máximo que a justiça pode fazer é aproximar daquela situação que antecedeu a ofensa mediante uma indenização.46

Na perspectiva dos ensinamentos de Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, há três funções a serem observadas constantes neste princípio:

Decompondo-se o conteúdo do princípio da reparação integral, podem-se identificar as suas três funções fundamentais: a)reparação da totalidade do dano (função compensatória); b) vedação de enriquecimento injustificado do lesado (função indenitária); c) avaliação concreta dos prejuízos efetivamente sofridos (função concretizadora).47

Observa-se, no dano morte, que o legislador do código civil de 2002 previu objetivamente no artigo 948, os prejuízos patrimoniais a serem suportados pelo ofensor, partindo das despesas de tratamento, despesas do funeral e o luto da família, observando todas as peculiaridades do caso.

As despesas de tratamento consistem naquelas advindas dos gastos com medicamentos, in-ternação em hospital, exames médicos, etc. Já as despesas de funeral, como o próprio nome diz, decorrem dos gastos com o funeral da vítima, conjuntamente com seu local de enterro. O luto da família compõe aquelas despesas que virão após a morte, como o pagamento do período de nojo (recuperação emocional e reorganização material).

A pensão por morte de adulto ou criança dependerá da análise completa do julgador para se chegar ao devido valor com prazos de início e fim justamente ponderados. Por se tratar de indenização na modalidade de lucros cessantes, a pensão por morte também possui o caráter

44 SANSEVERINO, Paulo de Tarso. Artigo original: O Princípio da Reparação Integral e os Danos Pessoais. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/o-principio-da-reparacao-integral-e-os-danos-pessoais/4768> Acesso em 15 de junho de 2015.

45 SANSEVERINO, Paulo de Tarso. Princípio da Reparação Integral. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 34.

46 Consoante SANSEVERINO, Paulo de Tarso. op. cit., p. 48.

47 Ibidem, p. 57.

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de alimentar.

Quando se tratar de morte de adulto, seu cônjuge e filhos serão os legítimos para receber a pensão, ou ainda, outros que comprovem dependência econômica para com a vítima. Cria-se, portanto, a obrigação no momento do óbito e se extingue quando o de cujus atingisse o previsto como expectativa de vida, baseado em fonte do IBGE (entendimento mais recente do STJ). Para os filhos, o termo final será na data em que atingir a maioridade, ou, se estiver estudando será quando completar 24 anos de idade.48

Cabe destacar, que embora o cônjuge falecido não tenha contribuição econômica para a família, é considerado auxiliar em todos os encargos para a manutenção familiar. Já o valor da pensão será baseado em uma média das últimas remunerações, em 2/3, já que a outra fração presumidamente era com gastos pessoais. Quando não há uma referência salarial, a base será o salário mínimo, nas mesmas frações. 49

Um pouco mais complexo, a morte de uma criança ou adolescente também obriga o ofensor a indenizar com pensão por morte, ainda que a vítima não esteja atuante no mercado de trabalho. Entretanto, foi preciso muito tempo para ser reconhecidos direitos que garantem a aqueles que efetivamente irão perder economicamente com a morte da criança, ainda que futuramente.

A jurisprudência do STJ, conforme analisado no tópico anterior, sensivelmente aplica a teoria da perda de uma chance às famílias de baixa renda, concedendo-as pensão nos termos anali-sados, baseado em 2/3 de 1 (um) salário mínimo dos 14 anos até quando completasse 25 anos, reduzindo-se a partir daí pela metade, até quando atingisse 65 anos (aposentadoria por idade).

Os prejuízos extrapatrimoniais decorrentes da morte possuem duas modalidades, sendo que a primeira diz respeito ao sofrido pela própria vítima, e a segunda todos os danos de natureza não econômica suportados pelos seus parentes, legitimados a promover a ação indenizatória.

Diante disso, vejamos os preceitos de Paulo de Tarso Vieira Sanseverino:

A ocorrência efetiva de um dano extrapatrimonial sofrido pela vítima direta é incontestável, mesmo que o falecimento tenha sido imediato, pois, pelo menos por alguns segundos, seja em um desastre aéreo, seja em um acidente de trânsito, ela teve a noção da iminência da sua morte e pôde sentir a dor correspondente. Além disso, há a própria perda de uma chance (esperança de vida), que será tanto maior quanto mais jovem for a vítima falecida. Reconhecido o dano extrapatrimonial (pretium mortis), o crédito correspondente a essa indenização é direito patrimonial, que se transmite aos seus sucessores.50 (grifo nosso).

Concebido pelo referido autor como “prejuízo de afeição” (dano por ricochete), é a segunda modalidade, já que a morte trás uma dor inestimável ao cônjuge/ companheiro (a), aos filhos, aos pais, ou outros que mantinham relação de afeto com o ente que partiu precocemente.

Neste sentido, ao concordar e se referir as nobres palavras de Sérgio Severo, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino prescreve:

48 Consoante SANSEVERINO, Paulo de Tarso. op. cit., p. 213-224.

49 Ibidem, p. 224-232.

50 SANSEVERINO, Paulo de Tarso. op. cit., p. 292.

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128 A PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL EM CASOS ENVOLVENDO DANO MORTE

Esta última posição mostra-se como mais correta, pois, se o sofrimento psíquico ense-jado pelo evento danoso é o ponto nuclear do conceito de dano moral stricto sensu, ele apresenta-se com grande intensidade, no prejuízo de afeição decorrente do dano-morte. A dimensão da dor dos familiares com a perda de um ente querido em consequência de uma morte violenta e repentina é incomensurável, bastando pensar na dor dos filhos menores com a perda do pai em acidente de trabalho; no sofrimento psíquico da esposa com a morte do marido em um desastre aéreo; no vazio existencial dos pais com o óbito de um filho em um acidente de trânsito.51

No tocante a legitimidade processual, serão aqueles parentes próximos da vítima, com laço de parentesco como o cônjuge ou companheiro (a), os filhos, os pais, ou aqueles que comprovarem sua legitimidade especial por vínculo de afetividade que possuíam com o de cujus.52

A destinação da reparação cível dependerá do caso concreto, primando-se pela individualização da indenização, pois a caracterização e extensão do dano extrapatrimonial poderá ter diversas repercussões na vida de cada um daqueles que mantinham os laços familiares ou de afeto com a vítima.

Concluindo este capítulo, não nos resta dúvida em afirmar que o predicado pelo princípio da reparação integral é o que se busca e o que se espera pela responsabilidade civil, realçando-se sua importância para concretizar a justa e mais abrangente indenização, fundamentalmente no evento mais complexo e delicado da vida, a morte.

5 CONCLUSÃO

Diante do exposto, depois de transcorridos os estudos sobre a sistemática legal da responsa-bilidade civil e sua fundamentação doutrinária, aduzimos que a análise da perda de uma chance nos casos paradigmas do STJ, nos dá o entendimento que:

a) O sistema de responsabilidade civil brasileiro impõe por seus princípios gerais e dispositi-vos legais e constitucionais, que a reparação civil deve atender de forma ampla e profunda todos aqueles que sofreram um dano, sendo de natureza patrimonial ou extrapatrimonial, observando as peculiaridades do caso e a correspondente indenização;

b) Desde a promulgação de nossa atual Constituição Federal, tanto a doutrina como a jurispru-dência construíram e hoje fortalecem um sistema de responsabilidade civil voltado à reparação do ofendido como eixo central, vez que a proteção da dignidade da pessoa humana constitui um dos objetivos supremos da República;

c) Para caracterizar o dever de indenizar, primordialmente é necessária estar presente o nexo causal entre a conduta do ofensor e o dano suportado pela vítima, ainda que decorrente de ação judicial demandada pelos herdeiros ou outros legitimados, que buscam a reparação civil pelo falecimento do familiar;

d) A doutrina concebe pacificamente que para caracterizar a perda de uma chance é funda-

51 SANSEVERINO, Paulo de Tarso. op. cit., p. 293.

52 Consoante SANSEVERINO, Paulo de Tarso, op. cit., p. 295.

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mental que a chance perdida seja real e séria, partindo de uma análise efetiva de probabilidades, em que a pessoa ofendida concorreria plausivelmente para uma situação no futuro melhor, mas perdeu a chance pela morte daquele que faleceu precocemente;

e) Independente da modalidade em que a indenização pela perda de uma chance é aceita, como agregador do dano moral ou como dano autônomo (subespécie de dano material), o mais importante é que seu reconhecimento visa reparar integralmente de fato o ofendido, oriundo da chance perdida;

f) O reconhecimento da perda de uma chance como indenização autônoma já é percebida na jurisprudência do STJ, pois o que se indeniza é a chance perdida, ou seja, um dano diverso do resultado final em que se poderia atingir;

g) Quando inequívoco o nexo causal, não é justo diferenciar ou determinar uma condenação para uma modalidade de dano e não o reconhecê-lo para outro, pois estaria sendo dividida uma relação causal que em verdade é única;

h) Observando as condições do caso e preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil pela perda de uma chance, não há que se discutir outra coisa a não ser o valor da condenação. Sendo assim, deverá partir, dentre outros, pela contribuição do ofensor para a morte da vítima e a extensão dos bens jurídicos que foram lesados, de forma abrangente;

i) No dano extrapatrimonial, o modo bifásico para a quantificação da indenização é de certa forma, o mais prudente para se chegar ao valor final a ser pago pelo ofensor, arguindo, dentre outros aspectos, sua participação na morte da vítima e o cotejo com outras indenizações em casos análogos;

j) O juízo de probabilidade é fundamental para se chegar à porcentagem do cálculo da inde-nização no caso concreto, garantindo o caráter da seriedade da chance perdida. Para o cálculo, o valor deverá incidir do máximo e se reduzir pelo percentual de chances que a vítima teria de sobrevivência se não houvesse a conduta lesiva do ofensor;

k) No dano patrimonial, além daqueles que serão pagos quando efetivamente comprovados (lucros cessantes e danos emergente), em determinados casos o ofendido terá direito ao pen-sionamento, mesmo se tratando de filho menor, ou pessoa que não exercia atividade laborativa. Coerentemente, o termo inicial da pensão será na data em que a vítima completaria (ou comple-tou) 14 anos de idade e o seu término na data em que o de cujus completaria 65 anos de idade. Abordando o percentual da pensão com base no que a vítima auferia (salário mínimo quando não possuir parâmetro), descontando os seus possíveis gastos pessoais;

l) O direito ao pensionamento de filhos menores é possível, ainda que não estejam atuando no mercado de trabalho, todavia, somente as famílias mais carentes terão esse direito, pois certa-mente teriam a contribuição na economia familiar daquele filho que faleceu;

m) Existe um notável problema de insegurança jurídica quando há divergência em relação à quantificação dos danos extrapatrimoniais presentes nas turmas que julgam responsabilidade civil no STJ, pois conforme impõe a súmula 420 do STJ é “Incabível, em embargos de divergência, discutir o valor de indenização por danos morais”.

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130 A PERDA DE UMA CHANCE E O PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL EM CASOS ENVOLVENDO DANO MORTE

A partir do panorama posto pelos casos paradigmáticos do STJ, no que se refere a “perda de uma chance” e “dano morte”, é possível se pensar em uma indenização equitativa por uma com-plexa análise a se fazer no caso concreto, de modo a transcender a reparação do próprio ofendido e se tornar uma defesa e resposta jurídica para toda a sociedade.

Por fim, embora seja difícil de acreditar que o ofendido terá o reestabelecimento do status quo ante, vez que o dinheiro não compra e nem repara moralmente a dor e todas as demais conse-quências provindas da morte de um ente querido. Todavia, em outra reflexão, há de se concretizar a reparação civil por um “alívio” provindo da pronúncia judicial sobre tais lesões, a fim de poder acreditar e alcançar a justiça, em tempos em que se demonstra insatisfatória e angustiante pela sua morosidade e superficialidade na apreciação de determinadas causas.

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132 MODELO DE IMPLANTAÇÃO DE NOVOS SERVIÇOS BANCÁRIOS: CASO DE CORRESPONDENTES DE NEGÓCIOS

MODELO DE IMPLANTAÇÃO DE NOVOS SERVIÇOS BANCÁRIOS: CASO DE CORRESPONDENTES DE

NEGÓCIOS

Maximiliano Camargo Rodrigues1

Ricardo Marques Sastre2

Dra. Márcia Elisa Soares Echeveste3

RESUMO

A constante busca em processos de melhoria da qualidade de vida da po-pulação de baixa renda, estimulados pelo possível aumento no potencial de consumo deste segmento de mercado incentivou as instituições bancá-rias a investir em formas alternativas de atendimento capazes de alcançar esse público. Novos produtos foram criados permitindo a inclusão social através da bancarização, gerando maior rentabilidade para a instituição. Neste cenário, este artigo tem como objetivo apresentar e discutir o pro-cesso de implementação do modelo de negócios de correspondente bancá-rio em uma instituição financeira. Espera-se que a representação do mo-delo e do processo de estruturação do modelo possa servir de inspiração a outras entidades com propósitos semelhantes. O estudo se estrutura no histórico (levantamento de experiências) da inserção dos corresponden-tes bancários na sociedade Brasileira e América Latina, posteriormente detalha a forma como foi desenvolvido o modelo de implantação e encerra com um estudo de caso utilizando o método exposto. A partir da utilização deste método os resultados demonstram o atendimento as premissas de rentabilidade, promoção da inclusão social, portfólio flexível e focado em parceria comercial.

PALAVRAS-CHAVE: Inclusão social. Correspondente bancário. Desenvol-vimento de serviço.

ABSTRACT

The constant search for improving the quality of life of low-income popu-lation, stimulated by the possible increase in the consumption potential of this market segment has encouraged banks to invest in alternative forms of care able to reach this audience. New products were created allowing social inclusion through banking, generating greater profitability for the institution. In this scenario, this paper has as objective to present and dis-cuss the process of deployment of the business model of banking corres-pondents in a financial institution. It is expected that the representation and the model structuring process can serve as an inspiration to other entities with similar purposes. The study is structured in the history (ga-

1 Mestre em Engenharia de Produção. E-mail: [email protected]

2 Mestre em Design. E-mail: [email protected]

3 Departamento de Engenharia de Produção - UFRGS. E-mail: [email protected]

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thering of experiences) of banking correspondents’ insertion on Brazilian society and Latin America, then details the way the deployment model was developed and closes with a case study using the foregoing method. From the use of this method results demonstrate the attendance to premises of profitability, to promote social inclusion and flexible portfolio focused on business partnership.

KEYWORDS: social inclusion, banking correspondent, services deploy-ment.

1 INTRODUÇÃO

Estimulados por um possível crescimento de renda e a ascensão de pessoas às classes C, D e E, o sistema bancário, tendo como um de seus objetivos buscar constantemente processos de melhoria de qualidade de vida da população de baixa renda, associados a estudos de com-portamento e serviços a este segmento como oportunidade de rentabilidade e de atendimento à questões sociais. Nesse sentido, os bancos Brasileiros incentivaram uma forma de negócios que existe regulamentada no país desde 1973, que é o correspondente bancário.

Apesar da existência de regulamentação, somente após o ano de 2000 houve crescimento de ações por parte dos bancos nessa modalidade de atendimento, devido à estabilização da economia. Existe a percepção de que o movimento de inclusão bancária gera inserção social e com isso a ampliação da base de clientes, com potencial de consumo de serviços bancários. O Brasil é um dos pioneiros nessa modalidade de atendimento, sendo seguido por outros países em desenvolvimento, com o objetivo de realizarem a integração de pessoas no mercado financeiro e principalmente proporcionar a essa população melhoria em sua qualidade de vida.

Para que os Bancos possam obter ganhos no atendimento via correspondente, é preciso que se tenha volume significativo de clientes, por esse motivo percebe-se que as instituições buscam cumprir seu papel na sociedade, porém localizam-se fisicamente distantes da população, com seus pontos de atendimentos aglomerados em grandes centros e longe das periferias. Dessa forma, para que haja efetivamente essa incorporação, é preciso expandir os pontos em locais mais próximos do público alvo e que se desenvolva um modelo que possa atender uma parcela maior e mais heterogênea da sociedade.

Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir o processo de implementação do modelo de negócios de correspondente bancário em uma instituição financeira. O texto documenta e ilustra a evolução do processo de estruturação em termos humanos, físicos e de gestão de tal forma que possa servir de inspiração a outras entidades que tenham aspirações semelhantes.

O modelo compreende desde a fase de decisão da empresa pela busca desta inclusão, asso-ciado a elaboração de um modelo genérico de desenvolvimento de serviços bancários, passando pela fase de definições e implementações do modelo até a avaliação dos processos implantados e resultados encontrados.

A análise realizada está dividida em duas partes, sendo a primeira uma pesquisa relacionada

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134 MODELO DE IMPLANTAÇÃO DE NOVOS SERVIÇOS BANCÁRIOS: CASO DE CORRESPONDENTES DE NEGÓCIOS

ao conteúdo teórico envolvendo os conceitos principais sobre o correspondente bancário, ferra-mentas utilizadas e processos de abordagem para aplicação da ferramenta e a proposição de um modelo teórico para implantação de novos serviços bancários. A segunda parte relata um estudo de caso de um banco regional, um dos dez maiores do país, utilizando o processo apresentado para o desenvolvimento de um novo modelo de negócio, baseado em parceria estratégica, rentabi-lidade e inclusão social e bancária. Este estudo de caso pretende elucidar as atividades envolvidas na implantação, apresentando as ações realizadas por uma empresa durante esse processo, e apresentará a proposta de modelo de implementação e os resultados obtidos com o novo negócio, utilizando as proposições do estudo.

Com a busca de informações sobre o processo para adequação aos requisitos solicitados pelos correspondentes bancários, utilizando ferramenta QFD – Desdobramento da Função Qualidade (AKAO, 1990) foi possível avaliar a necessidade dos envolvidos.

A qualidade do serviço desempenha um papel crítico no sucesso e sobrevivência das empresas em mercado competitivo (MICIAK; DESMARAIS, 2001; STRANDBERG et al., 2012). O QFD tem sido aplicado nas indústrias transformadoras para o desenvolvimento de produtos (MIGUEL, 2005) e de marketing (LU et al., 1994), e é também empregada no setor de serviços (RAMASWAMY, 1996; PUN et al., 2000; KAY; PAWITRA, 2001; GONZÁLEZ et al., 2004) para ajudar a projetar e controlar a qualidade do serviço. Para definir bem o produto ou serviço, a equipe precisa saber o que estão projetando, e o que os usuários finais esperam (HAMILTON; SELEN, 2004; YOONJUNG et al., 2008; ZILLUR; QURESHI, 2008; MARITAN; PANIZZOLO, 2009).

2 SERVIÇO DE CORRESPONDENTE BANCÁRIO

Entendem-se como correspondentes bancários os estabelecimentos, geralmente comerciais, mas que podem ser de outro ramo (por exemplo, correios, tabacarias, etc.), que através de seus pontos de venda oferecem serviços bancários, representando uma entidade financeira, em adição às suas funções normais e corriqueiras. É importante ressaltar que, por correspondente bancá-rio, nos referimos a todo tipo de agente transacional que atua em nome e representação de uma entidade financeira, seja esta bancária ou de outro ramo.

A definição de correspondentes4 pelo Banco Central (BACEN, 2014) informa que é empresa, integrante ou não do Sistema Financeiro Nacional, contratada por instituição financeira e demais instituições autorizadas pelo Banco Central do Brasil para a prestação de serviços de atendimento aos clientes e usuários dessas instituições. Entre os correspondentes mais conhecidos encon-tram-se as lotéricas e o banco postal.

No correspondente bancário pode ser realizado o encaminhamento de propostas de cartão de crédito, conta corrente e empréstimo, e outros encaminhamentos de operações realizadas por instituições financeiras, e também o pagamento de contas, que são realizados normalmente em caixas de agências bancárias.

É possível identificar no mercado financeiro dois modelos, o Microcrédito e o Correspondente

4 Disponível em http://www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/correspondentes.asp#

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Bancário. A modalidade de Microcrédito, ressaltado pelo Nobel da Paz que foi concedido em 2006 a Muhammad Yunus através do seu trabalho no Grammen Bank, é reconhecida como um poderoso instrumento de geração de renda e redução de pobreza nos países em desenvolvimento (DINIZ, 2010). O modelo Correspondente Bancário, que tem tido um recente destaque particularmente no Brasil, está relacionado com a criação de canais de oferta de serviços financeiros em estabe-lecimentos de varejo, resultando em baixos custos de distribuição e ampliação da penetração dos serviços bancários direcionados à população de baixa renda. Apesar dos modelos de microcrédito e correspondentes bancários terem sido desenvolvidos com foco nas populações de baixa renda, na prática existe pouca interação entre eles (DINIZ, 2007).

A legislação brasileira que trata sobre esse tema é de 1973, porém suas alterações mais sig-nificativas foram em 1999, com a Resolução 2640 do Conselho Monetário Nacional, e em 2003, com as Resoluções 3110 e 3156, que compõem a base normativa (SOARES; MELO SOBRINHO, 2008). Atualmente a Resolução 3.954/2011 é a que está em vigor.

Apesar de estar prevista na legislação essa alternativa de atendimento bancário, foi nos anos 90 que a escassez de pontos de atendimento no nordeste brasileiro proporcionou o surgimento de empresas prestadoras de serviço de arrecadação e recebimento de contas de serviços públicos, como água e luz. Esses convênios foram firmados, inicialmente com uma rede de farmácias, que iniciaram a prestação desse serviço às comunidades desassistidas e para isso recebiam uma re-muneração por conta recebida e como uma estratégia de diferenciação para aumentar a receita e atrair um fluxo de clientes para seu estabelecimento (JAYO, 2009).

Com a expansão da rede, na década de 2000, o modelo se firmou como um canal de distribuição intensamente apoiado em tecnologia de informação e reconhecido como um canal intermediário de distribuição de serviços bancários. (JAYO, 2013). Conforme dados do Banco Central do Brasil (BACEN), o Brasil possui em setembro de 2016, 280.531 correspondentes, sendo o maior canal físico de distribuição de serviços bancários. O Rio grande do sul possui 20.975 correspondentes, ocupando a quarta posição em número de correspondentes bancários no País, perdendo para os estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná.

Em outros países, o potencial do canal de correspondentes bancários como uma opção para ampliar o alcance dos serviços financeiros ocorreu a partir da regulamentação do serviço por parte dos órgãos competentes. Em alguns locais, as autoridades deram os primeiros passos nesse sentido incentivando a adesão ao modelo de correspondentes bancários. No Peru, Guatemala e Chile, os bancos começaram a operar antes da existência de um marco regulatório específico que liberassem a atividade, conforme tabela 1. O Banco de Crédito do Peru desenvolveu em conjunto com o governo um quadro regulamentar que proporcionou segurança às transações já realizadas através de varejistas independentes.

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136 MODELO DE IMPLANTAÇÃO DE NOVOS SERVIÇOS BANCÁRIOS: CASO DE CORRESPONDENTES DE NEGÓCIOS

TABELA 1 – Publicação do marco regulatório para o funcionamento de correspondentes

PAÍS

Publicação do marco regulatório para

o funcionamento de correspondentes

Primeiros esforços observados na operação de

modelos comerciais

BRASIL 1973 1973

MÉXICO 2008 2010

COLOMBIA 2006 2006

PERÚ 2008 2005

EQUADOR 2008 2008

GUATEMALA 2010 2008

CHILE 2010 2005

Fonte: Vega, Rodrigo Armijo. Banca Corresponsal e Inclusión Financiera: Modelos de Negocio em América Latina, p. 18, setembro 2013.

No Brasil há 16 vezes mais correspondentes do que agências tradicionais. O México, o Equa-dor e a Guatemala denotam uma defasagem clara nesta métrica. As redes de correspondentes mais relevantes na América Latina são as do Brasil, Colômbia e Peru em escala relativa, sendo a do México a de menor relevância. A escala de redes de correspondentes pode ser associada à evolução dos marcos regulatórios. Países que iniciaram essa formalização há mais tempo pos-suem estas redes mais consolidadas. Na Figura 01 é possível identificar a escala da quantidade de correspondentes e pontos de atendimento por cada 1,000km².

FIGURA 1 – Números de Agências e Correspondentes Bancários por cada 1,000Km²

Fonte: Vega, Rodrigo Armijo. Banca Corresponsal e Inclusión Financiera: Modelos de Negocio em América Latina, p. 25, setembro 2013.

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Na América Latina houve uma grande expansão dos pontos de atendimento de correspondentes bancários devido à regulamentação dos governos, viabilizando a capilaridade e a inclusão social em diversas regiões desassistidas de serviços bancários. Atualmente, o Brasil é o país que mais possui correspondentes bancários, seguido da Guatemala, onde a regulamentação ocorreu no ano de 2010.

A população desprovida de acesso aos bancos ou que não possuem recursos para utilizar os canais virtuais, encontram nos correspondentes uma opção agradável e conveniente para usufruir dos serviços bancários. Este canal de distribuição aumentou o seu número de usuários devido à flexibilidade de horários dos estabelecimentos conveniados e a impressão de insegurança nas transações virtuais (DINIZ, 2007).

Segundo o site Agência Brasil5 o Banco Central destacou que a figura do correspondente tem como objetivo atender os municípios sem qualquer serviço bancário e periferias dos grandes centros urbanos, em função da capilaridade do atendimento. Em todo o Brasil, mais de 13 milhões de famílias são atendidas por programas sociais e 68,5% recebem este benefício por intermédio de correspondentes bancários mais próximos de suas casas ou locais de trabalho.

Desta forma, evidencia-se o potencial de mercado de atuação dos correspondentes como uma oportunidade de implantação de novos serviços, sendo esta modalidade o correspondente de negócios. Essa forma possibilita o aproveitamento do canal de distribuição já consolidado, cumprindo o papel social e ainda gerando receita para os bancos e empresas.

3 MÉTODO DE DESENVOLVIMENTO DO MODELO DE IMPLANTAÇÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO

Para o desenvolvimento do modelo de implantação do serviço de correspondente foi desenvol-vido uma metodologia composta por seis etapas fundamentais e sucessivas: (i) desenvolvimento do modelo de negócios; (ii) seleção do modelo de referência de desenvolvimento de produto e serviço; (iii) adaptação do modelo; (iv) adaptação em nível de projeto; (v) aplicação do modelo; (vi) ajustes e diretrizes.

Etapa 1 - Desenvolvimento do modelo de negócios: para esta etapa foi escolhido o Business Model Canvas como ferramenta para identificar os elementos essenciais para o desenvolvimento do negócio. O Business Model Canvas é baseado nos conceitos do Balanced Scorecard6, Osterwalder (2004) propôs uma ontologia7 para modelos de negócios, mais tarde ampliada e posteriormente aperfeiçoada e transformada em uma ferramenta gráfica por Osterwalder e Pigneur (2010).

É possível visualizar através da Figura 2, com o Business Model Canvas, os vários componentes de um negócio e como os elementos se relacionam para que o trabalho persista.

5 Disponível em http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-08-16/correspondente-bancario-fomenta-transparencia-e-concorrencia--segundo-bc, acesso em: 01 jun. 2014.

6 Conforme definição de Kaplan e Norton (1992, tradução nossa) o Balanced Scorecard é um sistema de medida de desempenho organi-zacional que traduz missão e estratégia em objetivos e medidas distribuídos conforme quatro perspectivas distintas: financeira, do cliente, de processos e de aprendizagem e desenvolvimento.

7 Conjunto de termos e conceitos alusivos a uma determinada área do conhecimento, que estão relacionados entre si e cujo significado é partilhado por um grupo de indivíduos em comum (MEDEIROS, 2010).

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FIGURA 2 - Model Canvas

Fonte: Osterwalder e Pigneur (2010)

Esta ferramenta pode ser utilizada por empresas iniciantes, auxiliando na concepção de um modelo de negócios inovador, e também por companhias já estabelecidas no mercado, auxiliando na elaboração de introdução de inovações em sua cadeia de valor (OSTERWALDER; PIGNEUR, 2010).

Etapa 2 - Seleção do modelo de referência de desenvolvimento de produto e serviço: existem inúmeros modelos de desenvolvimento de serviços, porém é possível identificar características e fases comuns dos diversos modelos (MAGNAGO e ECHEVESTE, 2012). Para seleção de um pro-cesso padrão de desenvolvimento de serviço ele tem que ser documentado em forma de modelo, que serve para representar como os projetos e processos de desenvolvimento serão definidos. O modelo de referência serve como um guia e é composto de um conjunto de macro etapas, ati-vidades e tarefas organizadas de forma a padronizar e unificar o desenvolvimento dos serviços.

O trabalho de Magnago e Echeveste (2012) faz um comparativo entre (14) catorze modelos de desenvolvimento de serviços, e distribui suas fases de acordo com o escopo das nove fases do modelo genérico de desenvolvimento de produto de Rozenfeld et al (2006). Estas etapas servirão de base teórica para o desenvolvimento do modelo genérico utilizado no estudo de caso.

O modelo mínimo de Magnago e Echeveste (2012) contempla além dos pontos comuns entre os modelos, alto nível de detalhamento e baixa complexidade o que permite a adaptação para um modelo específico de desenvolvimento de serviço. O modelo valoriza as principais inovações trazidas pelos autores que tratam de desenvolvimento de serviço desde 1984 e preserva os pontos comuns de informações entre os estudos. O Quadro 1 apresenta a adaptação das três macro fases

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e as nove fases do modelo de Rozenfeld (2006), com a descrição e os objetivos do modelo mínimo de desenvolvimento de serviços de Magnago e Echeveste (2012), e na última coluna a descrição das fases do modelo genérico desenvolvido para o estudo de caso.

QUADRO 1 – Modelo Genérico de desenvolvimento de serviços

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Tabela 7 – Modelo Genérico de desenvolvimento de serviços Fonte: Elaborado pelo autor

Fonte: Elaborado pelos autores

Etapa 3 - Adaptação do modelo de referência para modelo de implantação: após a definição do melhor modelo conceitual, foi realizada a adaptação para o modelo de implantação de cor-respondentes bancários. Este Modelo de referência apresentado na figura 3, foi desenvolvido levando em consideração os níveis de processo como o conjunto total de atividades sequenciais e de projeto com uma concentração de atividades na macro etapa de desenvolvimento. A primeira linha do modelo apresenta as macro fases de desenvolvimento de produto, a segunda contém as fases do modelo genérico conceitual e a terceira o detalhamento das atividades necessárias

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para o desenvolvimento do serviço.

FIGURA 3 – Modelo Genérico de Desenvolvimento de Serviço de Correspondente

Fonte: Elaborada pelos Autores

Etapa 4 - Adaptação em nível de projeto: a implementação desse modelo foi tratada como um projeto estratégico da empresa e seguiu a metodologia da instituição que se assemelha à dos métodos tradicionais adotados no Project Management Body of Knowledge (PMBOK).

A gestão de um projeto envolve lidar com recursos, tempo e administração do interesse entre as partes envolvidas, com o objetivo de prover um resultado. Segundo Possi (2004) a metodologia de gerenciamento de projetos é a aplicação de conhecimentos, habilidades, ferramentas e técni-cas às atividades do projeto a fim de alcançar ou exceder as necessidades das partes envolvidas (stakeholders) e as expectativas de um projeto. Para Maximiano (2002), os projetos estão asso-ciados mais a certos atributos como: inovação, desenvolvimento, renovação, busca, construção, exploração e descoberta.

Etapa 5 - Aplicação do modelo: Com o modelo de referência genérico desenvolvido e a elabo-ração do projeto de implantação, foi realizada a aplicação do modelo em um caso real que será relatado no estudo de caso a seguir.

Etapa 6 - Ajustes e diretrizes: Esta fase consiste na análise da implantação do modelo, identificando os pontos de melhoria e definições de novos projetos. As ações da macro etapa de pós-desenvolvimento são realizadas neste momento.

4 ESTUDO DE CASO

Para a aplicação do estudo de caso baseado no modelo genérico de desenvolvimento de ser-viço de correspondente será transcorrido as seguintes etapas: descrição da empresa; serviço de

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correspondente atual; modelo de negócio de correspondente para implantação; implantação e principais resultados.

4.1 DESCRIÇÃO DA EMPRESA

A empresa é um banco regional múltiplo que oferece ampla variedade de produtos e serviços financeiros, incluindo cartões de crédito, seguros, previdência privada, grupos de consórcios e administração de recursos de terceiros. Suas operações de crédito abrangem os segmentos de pessoas físicas e jurídicas, bem como financiamento imobiliário e rural.

É uma sociedade de economia mista, constituída sob a forma de sociedade anônima, com foco de atuação na região sul do Brasil e possui como perfil de clientes: pessoa física, micro, média e grandes empresas. Até a presente data de concepção deste artigo, setembro de 2016, a empresa conta com aproximadamente 12 mil colaboradores, tendo 98,25% de cobertura no estado através de aproximadamente 2.600 correspondentes, 500 agências e 880 postos de atendimento bancário.

4.2 SERVIÇO DE CORRESPONDENTE ATUAL

Algumas instituições financeiras públicas e privadas, como a Caixa Econômica Federal (CEF), Banco do Brasil (BB) e Bradesco foram pioneiros na instalação desses correspondentes. A CEF com sua rede de lojas lotéricas implantou o Caixa Aqui, e mais tarde seguiu outros competidores e implantou seu sistema de Correspondente bancário nos varejistas.

O Bradesco em parceria com os Correios, num processo de aquisição, fundou o Banco Postal, sendo adquirido pelo Banco do Brasil logo após, tendo como objetivo levar serviços de corres-pondente à população desprovida de atendimento bancário e colocar à disposição o acesso ao Sistema Financeiro. O Banco do Brasil criou uma subsidiária, o Banco Popular do Brasil que tem como público-alvo pessoas físicas desprovidas de atendimento, que trabalham, em sua maioria, no setor informal da economia, sem comprovação de renda, como vendedores, diaristas, motoboys, taxistas, entre outros. A posição tomada por estes principais competidores é discutida por alguns autores, no que diz respeito à importância da tecnologia empregada, a forma de constituição e participação no mercado (JAYO; DINIZ, 2013; KUMAR et al., 2006; DINIZ; POZZEBON; JAYO, 2008).

A estrutura do modelo atual visa atender um público antes não atendido, por causa dos custos em produtos desenhados para outros segmentos e também pela inviabilidade dos custos de es-truturas para criar agências em locais remotos, de difícil acesso ou de pouco retorno financeiro. Esta forma de serviço baseia-se na parceria entre agência e correspondente, onde também há como benefício à redução do movimento físico de clientes nas agências e dos custos de transações para a instituição financeira.

4.3 MODELO DE NEGÓCIO DE CORRESPONDENTE PARA IMPLANTAÇÃO

O novo serviço propõe uma diferenciação dos modelos já existentes no país e na América La-

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tina, pois de acordo com os atuais, a concentração de pontos em grandes centros não promove efetivamente a inclusão social, assim o serviço a ser implantado visa unir a rentabilidade dos serviços de correspondentes existentes e a efetiva inclusão social. Foram estabelecidas algumas premissas para o desenvolvimento do serviço:

a) rentabilidade para todos os envolvidos; b) promover a inclusão social; c) possuir um portfólio flexível; e d) focar na parceria comercial.

A estrutura do novo serviço será a união dos modelos de correspondentes existentes, agre-gando e ampliando o portfólio de serviços oferecidos. Esta modalidade de correspondente será baseada na parceria estratégica com outras empresas para o encaminhamento de propostas de crédito e comercialização de outros produtos e serviços bancários, tendo como foco a inclusão de pontos de atendimento em municípios desassistidos ou em regiões populosas sem atendimento bancário. Com base nessas premissas foi proposta a estrutura do serviço de correspondente conforme Figura 4.

FIGURA 4 – Adaptação do Modelo Canvas

Fonte: Osterwalder e Pigneur (2010)

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A partir da visualização do novo serviço, a empresa tomou a decisão estratégica de utilizar uma empresa especializada em comercialização de crédito fora do ambiente bancário, obtendo a ampliação do portfolio, adquirindo experiência na prestação desse serviço e obedecendo à pre-missa de estabelecer parcerias comerciais rentáveis aos envolvidos. Essa forma beneficia todos os envolvidos, pois o banco amplia sua base de arrecadação e venda de produtos e serviços e a população é favorecida com um local mais próximo e com horários flexíveis, facilitando a inclusão bancária e fomentando a inclusão social.

O setor de Marketing forneceu todos os insumos de imagem para a padronização dos estabe-lecimentos, auxiliando assim no processo de criação da nova marca. A área Comercial realizou divulgações da nova marca permitindo que os novos pontos fossem reconhecidos pela população.

4.4 IMPLANTAÇÃO

A implantação seguiu o modelo proposto, mantendo as macro etapas para o desenvolvimento de serviço, que se repetem nos modelos de Rozenfeld et al. (2006) e Magnago e Echeveste (2012), com a adaptação das etapas para a implementação de um novo modelo de negócios e serviços bancários, essas etapas são: Pré-desenvolvimento, composta pelas fases de planejamento estratégico dos serviços e planejamento do projeto; Desenvolvimento, composta por projeto Informacional, projeto conceitual, projeto detalhado, preparação da produção e lançamento; e Pós-desenvolvimento composto por acompanhamento do mercado e descontinuar o produto. As etapas e as ações estão descritas a seguir e foram apresentadas anteriormente na Figura 3.

4.4.1 PRÉ-DESENVOLVIMENTO

O desenvolvimento de um modelo de negócios é a entrada para início das etapas de desenvol-vimento de serviço. Conforme Figura 4, foi utilizado o modelo Canvas para definição das diretrizes do negócio, por ser uma ferramenta capaz de apresentar visualmente os diversos componentes do negócio e o relacionamento de seus componentes.

Assim, após a definição do modelo iniciou a primeira macro-fase, o Pré-Desenvolvimento, dedicando-se ao planejamento estratégico, desenvolvendo a proposta preliminar do projeto e sua posterior aprovação pela diretoria da Instituição. Foi definida a utilização de uma empresa do grupo especializada em créditos consignados e também foi desenvolvido um portfólio básico de produtos.

Para o planejamento do projeto partiu-se de algumas diretrizes previamente definidas e do portfólio básico, elaborando assim um plano prévio, obedecendo a metodologia já existente na empresa, que prevê a aprovação preliminar do projeto, para posterior detalhamento.

4.4.2 DESENVOLVIMENTO

Esta etapa foi a que concentrou a maior parte do esforço para a implantação. De acordo com

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o modelo de referência, figura 3. Ela é composta pelas seguintes fases: Projeto informacional, projeto conceitual, projeto detalhado, preparação para produção e lançamento. Para cada fase foram desenvolvidas as ações apresentadas no Quadro 1.

Projeto Informacional: foram desenvolvidas ações envolvendo todas as áreas da empresa e os correspondentes transacionais já existentes, tendo o gestor de correspondentes como centrali-zador de informação. A Figura 5 apresenta o diagrama com o envolvimento das diversas áreas e a interação dos correspondentes diretamente com o centralizador da informação.

FIGURA 5 – Partes Envolvidas no Projeto

Fonte: Elaborada pelos Autores

Ainda no projeto informacional reuniu-se a equipe utilizando o brainstorming, (técnica para desenvolver ideias e criar soluções durante a etapa de geração de alternativas) como ferramenta para determinar as ações necessárias para implantação do modelo desenvolvido e para o le-vantamento dos requisitos internos. Após a definição das atividades, realizou-se uma pesquisa, utilizando o QFD (Quality Function Deployment ou Desdobramento da Função Qualidade) como método para identificar os requisitos externos de qualidade e criar um portfólio de produtos para a comercialização nos pontos de atendimento. A pesquisa apontou que os correspondentes tem uma preocupação com ações voltadas à divulgação, bem como foi possível identificar que a inclusão de novos serviços é um dos requisitos demandado pelos clientes, e isso foi contemplado no modelo.

O levantamento também apontou que a remuneração não é fator decisivo para o negócio. Como requisito mais importante destaca-se o auxilio no atendimento e treinamento, e essa foi uma das ações que concentraram maior atenção. Após, foi desenvolvido o sistema para a comercialização e divulgação dos serviços.

Projeto conceitual: nessa fase foi desenvolvido o plano de ação e o modelo de negócios a ser

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implantado, com um detalhamento do fluxo dos produtos e atividades a serem desenvolvidas.

Projeto detalhado: nesta fase houve a elaboração da nova marca e padronização da programa-ção visual a ser adotada pelos correspondentes. Foram realizadas campanhas de conscientização interna do produto que seria lançado no mercado e constituída uma equipe comercial capacitada a dar treinamento interno e externo. Essas ações seguiram o alinhamento do modelo conceitual, buscando as definições de processos, habilidades e conhecimentos e estrutura física. Com base nas informações do projeto informacional, e com um sistema básico realizou-se um piloto de vendas.

Preparação para produção: após o resultado do piloto e a aprovação final do portfólio de pro-dutos, foi realizado o contato com os correspondentes já existentes, na modalidade transacional, para ofertar o novo modelo de negócios. Paralelamente a essas ações foi feito o lançamento da nova marca e a comunicação ao mercado.

Lançamento: nessa fase foi realizada a divulgação externa do novo modelo de negócios e da nova marca, bem como a prospecção de novos correspondentes.

Dentre as ações desenvolvidas em cada fase e representadas no quadro 1, ressaltam-se as seguintes como atividades essenciais para o sucesso:

a) pesquisa de levantamento de requisitos de qualidade externos: essa ação proporcionou o conhecimento das necessidades e anseios dos parceiros comerciais, correspondentes, os quais são os agentes de contato entre o Banco e os clientes. Com base nessa pesquisa e nos objetivos da empresa foram desenvolvidas as demais ações;

b) definição do portfólio: essa escolha é fundamental para o desenvolvimento do modelo, considerando que os produtos ou serviços comercializados nos correspondentes devem atender um público especifico, de baixa renda e sem acesso a serviços bancários convencionais;

c) divulgação interna e externa: nessa ação a parte de conscientização foi fundamental, pois a instituição teve que quebrar o paradigma de comercialização no modelo tradicional e entender que a parceria com outros pontos era possível, e principalmente rentável;

d) piloto de venda: nessa fase foram alteradas políticas de precificação e remuneração dos correspondentes, adequando ao mercado e possibilitando aprendizado;

e) lançamento da marca: essa ação possibilitou a padronização e o posicionamento, fazendo com que todos os pontos fossem reconhecidos por uma marca única, facilitando a comunicação com os clientes.

A macro etapa de Desenvolvimento finalizou com a divulgação pública do serviço, através do lançamento da marca e divulgação em rádio, jornais, redes sociais, etc.

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4.4.3 PÓS-DESENVOLVIMENTO

Nesta fase foram realizados esforços para a expansão da rede de correspondentes, destacando as seguintes ações:

a) meta nas agências: foi estabelecida uma meta de cadastramento de novos pontos de negócios para cada agência do Banco;

b) ampliação do portfólio: desenvolvidos novos produtos e parcerias para comercialização nos correspondentes, com utilização da rede como um canal de distribuição capaz de alcançar uma capilaridade muito maior que as agências, para atingir as classes mais baixas da população;

c) especialização da área: a gerência responsável pelos correspondentes possuía no início do projeto outras atribuições, não relacionadas a essa atividade, após a implantação foi necessário o desmembramento dessas atividades, deixando a área exclusiva para gestão desse canal;

d) levantamento de áreas desassistidas: essa atividade de pós-desenvolvimento gerou um novo projeto, de expansão da rede, com o mapeamento de todos os municípios do Estado, identificando visualmente a presença da concorrência e áreas de “vazio bancário”, onde há grande concentração populacional e pouco, ou nenhum, atendimento bancário.

Essa última ação, encerra o projeto proposto, dando início a um novo que efetivamente cum-prirá o papel de inclusão financeira e social. O projeto está em implantação na instituição, mas é possível visualizar na Figura 6 o resultado da prospecção de um dos municípios da região me-tropolitana de Porto Alegre. Verificou-se que a cidade possui apenas uma agência bancária da instituição e atuava com três correspondentes próximos a este ponto, todos localizados na região central do município.

FIGURA 6 – Mapa de prospecçãoFonte: Elaborada pelos Autores

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Após a implantação do modelo nota-se os novos pontos prospectados, sinalizados com a letra “P”, aumentando a atuação em bairros com concentração populacional e desprovidos de atendimento bancário.

4.5 PRINCIPAIS RESULTADOS

Após um ano do lançamento da marca e implantação do modelo, constata-se que ele atingiu os objetivos definidos em suas premissas:

a ) r e n t a b i l i d a d e p a r a t o d o s o s e n v o l v i d o s ; b ) p r o m o ç ã o d a i n c l u s ã o s o c i a l ; c ) p o r t f ó l i o f l e x í v e l ; e d) focado em parceria comercial. As evidências relativas a cada item foram obtidas através de pesquisas documentais em relatórios da empresa.

A rentabilidade para todos os envolvidos pode ser comprovada com o incremento de venda e de remuneração que os correspondentes obtiveram.

Para o banco houve um acréscimo no volume de crédito comercializado e o aumento de arreca-dação de contas gerou uma receita extra de tarifas, redução de custos de operação nas agências, geração de funding, (recursos disponíveis para aplicação), com o volume financeiro arrecadado bem como reconhecimento e fortalecimento da marca. No início do projeto os correspondentes apresentavam resultado negativo de aproximadamente 400.000,00 por mês e atualmente um resultado positivo de aproximadamente R$ 4.000.000,00 por mês.

O modelo também permitiu a promoção da inclusão social e oportunizou a criação de pontos de atendimento em regiões desassistidas de atendimento bancário, auxiliando as comunidades de baixa renda e a captação de um número significativo de novos clientes. Foi possível a abertura de 1.775 novas contas correntes e contas poupança no período para pessoas das classes com renda de até dois salários mínimos.

O sistema foi desenvolvido com portfólio adaptável, permitindo a inclusão de novos serviços de acordo com a necessidade do mercado e obedecendo a premissa de flexibilidade. No período de implantação foram disponibilizados produtos que não eram oferecidos inicialmente.

Seguindo a premissa da parceria comercial e sendo o sistema ajustável, foi possível estabelecer parcerias estratégicas, capacitando a inclusão de serviços de outras empresas para exploração do canal de vendas. Como exemplo citamos a disponibilidade de comercialização de chips de passa-gem automática por cancelas de pedágios e shoppings e recargas de celular de várias operadoras.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo apresentou e discutiu o processo de implementação do modelo de negócios de correspondente bancário em uma instituição financeira, sendo este uma importante estratégia para atender as premissas de rentabilidade, através de um portfólio de produtos e serviços

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flexíveis, focado em parcerias comerciais e principalmente para a promoção da inclusão social, implantando pontos de atendimento em locais mais próximos de uma parcela maior e mais he-terogênea da sociedade.

O modelo apresentado é considerado inovador no mercado, pois agrega soluções já existentes, porém tratadas separadamente, permitindo a customização das ofertas de serviços de acordo com a necessidade do público alvo e do local onde o correspondente está inserido. Foi possível também, apresentar as principais atividades desenvolvidas para a implementação desse modelo, e associar a teoria de desenvolvimento de produtos com a criação de um novo serviço. Da mesma forma foi possível criar um modelo para a implantação do serviço de correspondente bancário em qualquer instituição financeira.

Considerando a flexibilidade e adaptabilidade do modelo conceitual utilizado de base para o modelo proposto é possível assegurar que, com pequenas adaptações, este modelo pode ser utilizado de forma genérica para implantação de novos serviços bancários.

Outro ganho que podemos atribuir a este processo foi a aproximação da teoria à prática, com a utilização de diversas ferramentas de engenharia e gestão, utilizadas de forma prática e asso-ciativa, permitindo a adaptação às necessidades de agilidade que o mercado competitivo exige. Foram citados nesse artigo ferramentas como: Braistorming, QFD, modelo de desenvolvimento de produto, modelo Canvas, elaboração de planos de ação, dentre outras.

Após a implantação do modelo de negócios proposto, alguns ajustes foram necessários, de acordo com o tamanho e a necessidade da empresa e do mercado. Para tanto, abre-se a possi-bilidade para novas pesquisas que permitam aprofundar o grau de satisfação do cliente atendido no correspondente, o índice de clientes que foram incluídos no sistema financeiro através dos correspondentes e o desenvolvimento de novos produtos que ampliem a inclusão social e bancária.

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152 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA

LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

Mateo Fusalba1

1 INTRODUCCIÓN

El profesor VILLEGAS, expone que para comenzar el estudio de este tema, las distintas rela-ciones y combinaciones entre sociedades pueden conducir a dos tipos de vinculaciones:

a) Vinculaciones con relaciones de control o dominación entre ellas, consagrando situaciones de subordinación o dependencia (...);

b) Vinculaciones creadas con fines de cooperación (…);2

El primer tipo, se manifiesta como una vinculación entre sociedades regularmente constituidas, según lo normado en la Ley General de Sociedades en su artículo 33, ya sea como sociedades controladas o vinculadas3.

El segundo tipo, respecto del cual profundizaremos a lo largo de este trabajo, es la vinculación colaborativa manifiesta de manera contractual. Estos son los que según nuestra legislación, se conocen como “Contratos Asociativos”.

El Código Civil y Comercial de la Nación Argentina (en adelante CCCN), regula estos tipos de contratos en particular. Del análisis de dicha norma, surge que las personas humanas, empresas y sociedades regularmente constituidas o no, nacionales o extranjeras -sin perder ninguna de estas su autonomía-, pueden vincularse contractualmente con fines de colaboración, por medio de las siguientes alternativas:

• Negocios de participación;

1 Contador Público Nacional. Abogado. Profesor en Educación Media y Superior en la Disciplina de la Abogacía. Docente e investigador de la Universidad Maimónides. Director del Instituto Interdisciplinario de Derecho del Trabajo, Universidad Maimónides. Abogado e consultor jurídico en Derecho Empresarial. Email: [email protected]

2 VILLEGAS, C. G. Derecho de las Sociedades Comerciales. Buenos Aires. Ed. Abeledo Perrot. 8va. Ed. 1996. Pág. 728.

3 Ley 19.550. Ley General de Sociedades. Argentina.

Sociedades controladas.

ARTICULO 33. — Se consideran sociedades controladas aquellas en que otra sociedad, en forma directa o por intermedio de otra sociedad a su vez controlada:

1) Posea participación, por cualquier título, que otorgue los votos necesarios para formar la voluntad social en las reuniones sociales o asambleas ordinarias;

2) Ejerza una influencia dominante como consecuencia de acciones, cuotas o partes de interés poseídas, o por los especiales vínculos existentes entre las sociedades.

Sociedades vinculadas. Se consideran sociedades vinculadas, a los efectos de la Sección IX de este capítulo, cuando una participe en más del diez por ciento (10%) del capital de otra. La sociedad que participe en más del veinticinco por ciento (25%) del capital de otra, deberá comunicárselo a fin de que su próxima asamblea ordinaria tome conocimiento del hecho.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 153

• Agrupación de Colaboración;

• Unión Transitoria;

• Consorcio de Cooperación;

• Otros contratos innominados o atípicos (Ej. Joint Venture)

El objetivo de este trabajo es abordar el tema de los contratos asociativos, desde la normativa vigente en el orden nacional, considerando asimismo, el trato otorgado a los contratos asociativos de los países que junto con el nuestro, integran el MERCOSUR como Estados Partes.

2 CONTRATO ASOCIATIVO 2.1. CONCEPTO JURÍDICO

Se denomina contrato asociativo al acercamiento de colaboración entre partes interesadas en llevar adelante emprendimientos de interés reciproco, sin dejar de lado sus intereses particulares, con miras a la consecución de un fin común, que les permita obtener beneficios a cada participante4.

ECHEVERRY, puntualiza que el contrato asociativo es, en esencia, un contrato que tiene vo-cación plurilateral, es decir, aquel en el cual intervienen o pueden intervenir más de dos partes, además, en este contrato se crea una organización operativa, un sistema de desarrollo perdura-ble en el tiempo, y se distingue porque está destinado a satisfacer un bien común, generalmente gestionando un patrimonio también común5.

FARINA, continuando con los conceptos anteriores, define que el contrato asociativo es un vinculo de colaboración en el que “las partes, sin menoscabar sus intereses particulares (eco-nómicos, intelectuales, espirituales, etc.) se obligan a efectuar prestaciones y colaborar para la obtención de un fin común (…)6.

En resumen, el contrato asociativo es un vínculo de colaboración, plurilateral o de participación, con comunidad de fines, que no es sociedad7.

No son sujetos de derecho, es decir, son contratos y no sociedades.

A diferencia de la sociedad, el contrato asociativo se trata de una integración parcial y no total, ya que no existe disolución de la individualidad, ni creación de una persona jurídica”.8

Para circunscribir la noción y como lo destaca Lorenzetti, la cuestión central está en los efec-tos, entre los que destacamos:

a) No hay obligaciones correlativas como en los contratos bilaterales, sino que cada parte adquiere derechos y obligaciones respecto de los demás.

b) Se trata de contratos abiertos, en los que pueden ingresar nuevas partes.

4 BUERES, A.J. Código Civil y Comercial de la Nación. Tomo 2. Buenos Aires. Ed. Hammurabi. 2014. Pág. 57.

5 RIVERA J.C. - MEDINA G. Código Civil y Comercial de la Nación Comentado. Tomo IV. Ed. La Ley. Buenos Aires. 2014. Pág. 394.

6 GOLAB, J. “Contratos asociativos y excepción de incumplimiento”. Revista Argentina de Derecho Comercial y de los Negocios. Numero 8. Noviembre 2013. IJ Editores. http://www.ijeditores.com.ar/articulos.php?idarticulo=66692

7 Fundamentos del Anteproyecto de Código Civil y Comercial de la Nación.

8 Fundamentos del Anteproyecto de Código Civil y Comercial de la Nación. Lo subrayado es agregado por el autor.

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154 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

c) Las prestaciones pueden ser de muy distinto valor, por lo que no rige el concepto de equi-valencia y correspectividad propia de los contratos de cambio.

d) No se aplica el pacto comisorio, ni la excepción de incumplimiento contractual.

e) El vicio que afecta el vínculo de una de las partes, no afecta a los demás.9

3. EL CONTRATO ASOCIATIVO EN LA LEGISLACIÓN ARGENTINA 3.1. ANTECEDENTES LEGISLATIVOS.

En nuestro país, “en los usos y prácticas es muy habitual que se celebren vínculos de cola-boración asociativa que no constituyen sociedad. Su tutela jurídica es más evidente aun cuando se piensa en fortalecer la colaboración para alcanzar economías de escala entre pequeñas y medianas empresas, o para hacer compras o ventas en común, o desarrollos de investigación, o abordar grandes obras sin necesidad de asociarse.10

La figura del contrato asociativo fue incluida en nuestra legislación con la sanción de la Ley 22.903 en 1983, que modifica la Ley 19.550, la que diferencia dos tipos asociativos o de colabora-ción: las uniones transitorias de empresas y las agrupaciones de colaboración.

Por otro lado, en la citada norma, bajo el nombre de sociedades accidentales o de participación, introduce lo que hoy conocemos como contrato de negocios en participación.

A principios del 2005, con la entrada en vigencia de la ley 26.005, se incorpora la última figura tipificada actualmente, el Consorcio de Cooperación.

El principal problema normativo era la incorporación de institutos de naturaleza contractual, en la ley 19.550, conocida entonces como la “Ley de Sociedades Comerciales”.

Con la sanción del Código Civil y Comercial Nación unificado, mediante la Ley 26.994, la cual entró en vigencia en Agosto de 2015, se reparó la cuestión, derogando los artículos de la antigua Ley de Sociedades Comerciales referidos a los institutos contractuales mencionados, quedando encuadrados los contratos asociativos dentro del Libro Tercero, Titulo IV “Contratos en particular”, Capitulo 16 “Contratos Asociativos”.

Es así que con la entrada en vigencia del nuevo código, los contratos asociativos quedan normados como se expone en el siguiente cuadro:

ANTES DE LA UNIFICACIÓN DEL CÓDIGO CIVIL Y COMERCIAL

AGOSTO DE 2015

DESPUÉS DEL CÓDIGO CIVIL Y COMERCIAL (CCCN)

AGOSTO DE 2015

SOCIEDADES ACCIDENTES Y PARTICIPACIÓN (Ley 19.550. Arts. 361 a 366).

INCORPORADO EN EL CÓDIGO DE COMERCIO ARGENTINO.

NEGOCIOS DE PARTICIPACIÓN (CCCN. Arts. 1448 a 1452).

9 RIVERA J.C. - MEDINA G. Obra citada. Pág. 395.

10 Fundamentos del Anteproyecto de Código Civil y Comercial de la Nación Argentino.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 155

AGRUPACIONES DE COLABORACIÓN EM-PRESARIAL

(Ley 19.550. Arts. 367 a 376). INCORPORADO A LA NORMATIVA ARGENTI-

NA EN 1983.

AGRUPACIONES DE COLABORACIÓN EM-PRESARIAL

(CCCN. Arts. 1453 a 1462).

UNIÓN TRANSITORIA DE EMPRESAS (Ley 19.550. Arts. 377 a 383).

INCORPORADO A LA NORMATIVA ARGENTI-NA EN 1983.

UNIÓN TRANSITORIA DE EMPRESAS (CCCN. Arts. 1463 a 1469).

CONSORCIOS DE COOPERACIÓN (Ley 26.005).

INCORPORADO A LA NORMATIVA ARGENTI-NA EN 2005.

CONSORCIOS DE COOPERACIÓN (CCCN. Arts. 1470 a 1478).

3.2 ANÁLISIS DE LA NORMA

El Código Civil y Comercial de la Nación Argentina, en su Libro Tercero, Titulo IV “Contratos en particular”, Capitulo 16 “Contratos Asociativos”, consigna primeramente aspectos generales de los contratos asociativos y, tal como mencionaremos precedentemente, define cuatro tipos asociativos:

• Negocios de participación;

• Agrupación de Colaboración;

• Unión Transitoria;

• Consorcio de Cooperación;

3.2.1. CONTRATOS ASOCIATIVOS. GENERALIDADES

El CCCN enuncia primeramente, con disposiciones generales que regulan a todos los contratos asociativos.

Las reglas comunes que dispone el Código, se encuentran expuestas en los Arts. 1442 y sub-siguientes, siendo consideradas las mismas, como “muy importantes para resolver discusiones doctrinales.”11

Dichas disposiciones comunes a todos los contratos asociativos, enuncian; su régimen de nulidad, la libertad de formas y la calidad de vinculantes que se le otorgan a las partes, ya sea que resulte el contrato inscripto o no, según el tipo que se trate.

Las normas aplicables en los artículos antes mencionados, aplican a todo contrato de colabo-ración, de organización o participativo, con comunidad de fin, que no sea sociedad.

11 Fundamentos del Anteproyecto de Código Civil y Comercial de la Nación Argentino.

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156 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

A estos contratos no se les aplican las normas que si aplican sobres las figuras societarias, ya que, no son, ni por medio de ellos se constituyen, personas jurídicas, sociedades ni sujetos de derecho.

Los contratos asociativos, no están sujetos a requisitos de forma, en cuestiones de solemnidad (Art. 1444).

Por otra parte, además de poder optar por los tipos de contratos asociativos que se desarrol-lan en las siguientes Secciones de este Capítulo, las partes tienen libertad para configurar estos contratos con otros contenidos. (Art. 1446).

Esto facilita la concertación de figuras atípicas o innominadas, como puede ser por ejemplo, un tipo de Joint Venture, instituto que desarrollaremos más adelante.

En lo que respecta al régimen de nulidad de los contratos asociativos, el CCCN expone que si las partes involucradas son más de dos, la nulidad del contrato respecto de una de las partes, no produce la nulidad entre las demás y que el incumplimiento de una no es excusa para el in-cumplimiento de las otras, excepto que la prestación de aquella que ha incumplido lo respecto de la cual el contrato es nulo sea necesaria para la realización del objeto del contrato. (Art. 1143).

El contrato asociativo, produce efecto entre las partes, ya sea que éste no se encuentre ins-cripto, no bien que, la inscripción esté prevista para el tipo asociativo en particular.

3.2.2. NEGOCIO DE PARTICIPACIÓN

Definición y naturaleza: El Negocio en Participación, está consignado en los Arts. 1448 al 1452. Su génesis deriva de la Ley de Sociedades Comerciales 19550 (hoy Ley General de Socie-dades), reproduciendo lo estipulado en la SECCIÓN IX bajo el titulo “De la sociedad accidental o en participación”.

A partir de la unificación del Código Civil y Comercial de la Nación, queda clara la naturaleza jurídica de este tipo de contrato, eliminándose el usualmente cometido error de asimilarlo a una forma societaria, lo cual daba lugar a confusiones.

El Art. 1448 del CCCN, expone que el negocio en participación es el contrato asociativo que “tiene por objeto la realización de una o más operaciones determinadas a cumplirse mediante aportaciones comunes y a nombre personal del gestor”.

La característica principal del negocio de participación, es que tiende en la mayoría de sus casos, a ser un negocio oculto, ya que los terceros se relacionan únicamente con el Gestor, sin contactarse con los demás participes del contrato.

Requisitos de forma: No tiene denominación, no está sometido a requisitos de forma, ni se inscribe en el Registro Público.

Sujetos del contrato: Los sujetos del “negocio de participación” son los siguientes:

a) El gestor.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 157

Es la persona humana o jurídica que, a nombre propio, realiza las operaciones que son el objeto del negocio.12

El Art. 1449 del CCCN, expone la actuación y responsabilidad del gestor, argumentando que “Los terceros adquieren derechos y asumen obligaciones sólo respecto del gestor. La responsabilidad de éste es ilimitada. Si actúa más de un gestor son solidariamente responsables.”

b) El Participe

Es la persona humana o jurídica que no actúa frente a los terceros13. No tiene acción contra éstos ni éstos contra aquél, en tanto no se exteriorice la apariencia de una actuación común. (Art. 1450).

El partícipe tiene derecho a que el gestor le brinde información y acceso a la documentación relativa al negocio.

El partícipe también tiene derecho a la rendición de cuentas de la gestión en la forma y en el tiempo pactados; y en defecto de pacto, anualmente y al concluir la negociación. (Art. 1451).

El partícipe limita sus pérdidas, al valor de su aporte. (Art.1452).

3.2.3. AGRUPACIÓN DE COLABORACIÓN

Definición: El Art. 1453 de la CCCN, define que “hay contrato de agrupación de colaboración cuando las partes establecen una organización común con la finalidad de facilitar o desarrollar determinadas fases de la actividad de sus miembros o de perfeccionar o incrementar el resultado de tales actividades”.

Como partes del contrato de agrupación en el Art. 367 la Ley de Sociedades Comerciales, se enumeraban “las sociedades constituidas en la República y los empresarios individuales domi-ciliados en ella”.

Actualmente, con el Código Civil y Comercial unificado se omite14, suprime15 o elimina16 esa referencia, y tal como indican los autores, habilita a nuevos sujetos para constituir este tipo de contrato asociativo.

Conforme lo expuesto, podemos decir entonces que las partes intervinientes, pueden ser personas humanas que realizan actividad económica organizada, empresarios, empresas, socie-dades, personas jurídicas privadas y sociedades extranjeras sujetas al Art. 118 de la Ley General de Sociedades.

Finalidad: El Art. 1453 expone como finalidad, facilitar o desarrollar determinados fases de la actividad de sus miembros o de perfeccionar o incrementar el resultado de tales actividades.

Ausencia de lucro. Ventajas económicas: La característica principal de este contrato es la

12 ORENZETTI, R.L. Código Civil y Comercial de la Nación Comentado. Tomo VII. Ed. Rubinzal Culzoni. Buenos Aires. 2015. Pág. 376.

13 LORENZETTI, R.L. Obra citada. Pág. 376.

14 ICHARD, E.H, Código Civil y Comercial y Contratos Asociativos. Código Civil y Comercial de la Nación – CONTRATOS EN PARTICULAR – Suple-mento Especial. AAVV director Rubén S. Stiglitz, Ed. Thomson Reuters LA LEY, Buenos Aires abril 2015, págs. 307 a 328. en http://www.acaderc.org.ar/doctrina/el-codigo-civil-y-comercial-y-contratos-asociativos-negocio-en-participacion-y-agrupamiento-de-colaboracion-arts.-1442-a-1462

15 RIVERA J.C. - MEDINA G. Obra citada. Pág. 439.

16 LORENZETTI, R.L. Obra citada. Pág. 401.

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158 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

ausencia de finalidad lucrativa. Las ventajas económicas que genere su actividad deben recaer directamente en el patrimonio de las partes agrupadas o consorciadas. Esta característica se vincula directamente al hecho de que los contratos asociativos, no constituyen una sociedad, careciendo, por ende de personería, no siendo consideradas un sujeto de derecho.

Dirección. Resoluciones. Administración: La agrupación no puede ejercer funciones de dirección sobre la actividad de sus miembros. (Art.1454).

En cuanto a las resoluciones del contrato, en lo referente a la realización del objeto, se adoptan por el voto de la mayoría absoluta de los participantes, salvo disposición contraria.

En caso que se pretendiera realizar una modificación del contrato, la misma sólo puede lle-varse a cabo con el consentimiento unánime de los participantes. (Art.1456).

La dirección y administración debe estar a cargo de una o más personas humanas designadas en el contrato, o posteriormente por resolución de los participantes. Son aplicables las reglas del mandato17. En caso de ser varios los administradores, si nada se dice en el contrato pueden actuar indistintamente. (Art. 1457).

Forma y contenido del contrato: El Art. 1455 del CCCN expone que “El contrato debe otorgarse por instrumento público o privado con firma certificada notarialmente e inscribirse en el Registro Público que corresponda. Una copia certificada con los datos de su correspondiente inscripción debe ser remitida por el Registro al organismo de aplicación del régimen de defensa de la competencia.”

En cuanto al contenido, es mismo deberá contener:

a) el objeto de la agrupación;

b) la duración, que no puede exceder de diez años. Puede ser prorrogada por decisión unánime de los participantes por hasta diez años, excepto que si hubiese acreedores embargantes de los participantes y no se los desinteresa previamente;

c) la denominación, que se forma con un nombre de fantasía integrado con la palabra “agrupación”;

d) el nombre, razón social o denominación, el domicilio y los datos de inscripción registral del contrato o estatuto o de la matriculación e individualización, en su caso, de cada uno de los par-ticipantes. En el caso de sociedades, la relación de la resolución del órgano social que aprueba la contratación de la agrupación, así como su fecha y número de acta;

e) la constitución de un domicilio especial para todos los efectos que deriven del contrato de agrupación;

f) las obligaciones asumidas por los participantes, las contribuciones debidas al fondo común operativo y los modos de financiar las actividades comunes;

g) la participación que cada contratante ha de tener en las actividades comunes y en sus resultados;

h) los medios, atribuciones y poderes que se establecen para dirigir la organización y actividad común, administrar el fondo operativo, representar individual y colectivamente a los participantes

17 Código Civil y Comercial de la Nación Argentina. Véase Título IV, Capitulo 8 “Mandato”, Arts. 1319 a 1334.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 19 - janeiro a junho de 2016 159

y controlar su actividad al solo efecto de comprobar el cumplimiento de las obligaciones asumidas;

i) los casos de separación y exclusión;

j) los requisitos de admisión de nuevos participantes;

k) las sanciones por incumplimiento de obligaciones;

i) las normas para la confección de estados de situación, a cuyo efecto los administradores deben llevar, con las formalidades establecidas por este Código, los libros habilitados a nombre de la agrupación que requiera la naturaleza e importancia de la actividad común.

Fondo Común Operativo Del Contrato: Las contribuciones de los participantes y los bienes que con ellas se adquieran, constituyen el fondo común operativo de la agrupación.

El mismo, permanecerá indiviso, por el plazo que se extienda el contrato de agrupación, no pudiendo los acreedores particulares de los participantes hacer valer su derecho sobre ellos. (Art. 1458).

Responsabilidad de las partes: En lo que respecta a las obligaciones, los participantes respon-den ilimitada y solidariamente respecto de terceros por las obligaciones que sus representantes asuman en nombre de la agrupación.

Por su parte, el participante representado responde solidariamente con el fondo común operativo por las obligaciones que los representantes hayan asumido en representación de un participante, haciéndolo saber al tercero al tiempo de obligarse.

Extinción del Contrato: El contrato de agrupación se extingue por las razones expuestas en el Art. 1461 CCCN:

a) por la decisión de los participantes;

b) por expiración del plazo por el cual se constituye; por la consecución del objeto para el que se forma o por la imposibilidad sobreviniente de lograrlo;

c) por reducción a uno del número de participantes;

d) por incapacidad, muerte, disolución o quiebra de un participante, a menos que el contrato prevea su continuación o que los demás participantes lo decidan por unanimidad;

e) por decisión firme de la autoridad competente que considere que la agrupación, por su objeto o por su actividad, persigue la realización de prácticas restrictivas de la competencia;

f) por causas específicamente previstas en el contrato.

3.2.4. UNIÓN TRANSITORIA

Definición: Hay contrato de unión transitoria cuando las partes se reúnen para el desarrollo o ejecución de obras, servicios o suministros concretos, dentro o fuera de la República. Pueden desarrollar o ejecutar las obras y servicios complementarios y accesorios al objeto principal.

Partes del contrato: Al igual que lo establece en el caso particular del contrato de agrupación,

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160 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

el Código Civil y Comercial de la Nación omitió, suprimió o eliminó las referencias del Art. 377 “las sociedades constituidas en la República y los empresarios individuales domiciliados en ella”, lo que implica que las partes pueden ser personas humanas que realizan actividad económica orga-nizada, empresarios, empresas, sociedades, personas jurídicas privadas y sociedades extranjeras sujetas al Art. 118 de la Ley General de Sociedades.

Las empresas públicas pueden ser parte de uniones transitorias18, según agrega Lorenzetti en su obra.

Forma y contenido del contrato: El contrato se debe otorgar por instrumento público o privado con firma certificada notarialmente. El mismo debe contener:

a) el objeto, con determinación concreta de las actividades y los medios para su realización;

b) la duración, que debe ser igual a la de la obra, servicio o suministro que constituye el objeto;

c) la denominación, que debe ser la de alguno, algunos o todos los miembros, seguida de la expresión “unión transitoria”;

d) el nombre, razón social o denominación, el domicilio y, si los tiene, los datos de la inscripción registral del contrato o estatuto o de la matriculación o individualización que corresponde a cada uno de los miembros. En el caso de sociedades, la relación de la resolución del órgano social que aprueba la celebración de la unión transitoria, su fecha y número de acta;

e) la constitución de un domicilio especial para todos los efectos que deriven del contrato, tanto entre partes como respecto de terceros;

f) las obligaciones asumidas, las contribuciones debidas al fondo común operativo y los modos de financiar las actividades comunes en su caso;

g) el nombre y el domicilio del representante, que puede ser persona humana o jurídica;

h) el método para determinar la participación de las partes en la distribución de los ingresos y la asunción de los gastos de la unión o, en su caso, de los resultados;

i) los supuestos de separación y exclusión de los miembros y las causales de extinción del contrato;

j) los requisitos de admisión de nuevos miembros;

k) las sanciones por incumplimiento de obligaciones;

l) las normas para la elaboración de los estados de situación, a cuyo efecto los administrado-res deben llevar, con las formalidades establecidas en los artículos 320 y siguientes, los libros exigibles y habilitados a nombre de la unión transitoria que requieran la naturaleza e importancia de la actividad común.

Representación del contrato: El representante tiene los poderes suficientes de todos y cada uno de los miembros para ejercer los derechos y contraer las obligaciones que hacen al desarrollo o ejecución de la obra, servicio o suministro; la designación del representante no es revocable sin

18 CREO BAY, H. “Los consorcios mixtos en la contratación administrativa: uniones transitorias públicas y privadas, en L.L. 1988-E-1146; en LORENZETTI, R.L. Obra citada. Pág. 446.

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causa, excepto decisión unánime de los participantes. Mediando justa causa, la revocación puede ser decidida por el voto de la mayoría absoluta. (Art.1465).

Inscripción: Características distintivas de la Unión Transitoria, son que el contrato y la desig-nación del representante deben ser inscriptos en el Registro Público que corresponda. (Art. 1466).

Responsabilidad de las partes: En lo que respecta a las obligaciones, no se presume la soli-daridad de los miembros por los actos y operaciones que realicen en la Unión Transitoria, ni por las obligaciones contraídas frente a los terceros, excepto disposición en contrario del contrato. (Art. 1467).

Resoluciones: Los acuerdos se deben adoptar siempre por unanimidad, excepto pacto en contrario. (Art. 1468).

Quiebra o incapacidad de un miembro: Ante la quiebra de cualquiera de los participantes, y la muerte o incapacidad de las personas humanas integrantes, el contrato continúa con los res-tantes si acuerdan la manera de hacerse cargo de las prestaciones ante los terceros. (Art. 1469).

3.2.5. CONSORCIO DE COOPERACIÓN

Definición: Hay contrato de consorcio de cooperación cuando las partes establecen una orga-nización común para facilitar, desarrollar, incrementar o concretar operaciones relacionadas con la actividad económica de sus miembros a fin de mejorar o acrecentar sus resultados. (Art. 1470).

Esta última figura, es una adaptación del “joint venture” agrement o contractual, que más adelante desarrollaremos, contrato atípico o innominado utilizado en nuestro país.

Las partes en este contrato son las personas humanas o jurídicas domiciliadas o constituidas en el país.

Dirección: El consorcio de cooperación no puede ejercer funciones de dirección o control sobre la actividad de sus miembros. (Art. 1471).

Distribución de los resultados: Los resultados que genera la actividad desarrollada por el consorcio de cooperación se distribuyen entre sus miembros en la proporción que fija el contrato y, en su defecto, por partes iguales. (Art.1472).

Forma y contenido del contrato: El contrato debe otorgarse por instrumento público o privado con firma certificada notarialmente, e inscribirse conjuntamente con la designación de sus re-presentantes en el Registro Público que corresponda. (Art. 1473).

Según el Art. 1474, el contrato debe contener:

a) el nombre y datos personales de los miembros individuales, y en el caso de personas jurídi-cas, el nombre, denominación, domicilio y, si los tiene, datos de inscripción del contrato o estatuto social de cada uno de los participantes. Las personas jurídicas, además, deben consignar la fecha del acta y la mención del órgano social que aprueba la participación en el consorcio;

b) el objeto del consorcio;

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162 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

c) el plazo de duración del contrato;

d) la denominación, que se forma con un nombre de fantasía integrado con la leyenda “Con-sorcio de cooperación”;

e) la constitución de un domicilio especial para todos los efectos que deriven del contrato, tanto respecto de las partes como con relación a terceros;

f) la constitución del fondo común operativo y la determinación de su monto, así como la participación que cada parte asume en el mismo, incluyéndose la forma de su actualización o aumento en su caso;

g) las obligaciones y derechos que pactan los integrantes;

h) la participación de cada contratante en la inversión del o de los proyectos del consorcio, si existen, y la proporción en que cada uno participa de los resultados;

i) la proporción en que los participantes se responsabilizan por las obligaciones que asumen los representantes en su nombre;

j) las formas y ámbitos de adopción de decisiones para el cumplimiento del objeto. Debe pre-verse la obligatoriedad de celebrar reunión para tratar los temas relacionados con los negocios propios del objeto cuando así lo solicita cualquiera de los participantes por sí o por representan-te. Las resoluciones se adoptan por mayoría absoluta de las partes, excepto que el contrato de constitución disponga otra forma de cómputo;

k) la determinación del número de representantes del consorcio, nombre, domicilio y demás datos personales, forma de elección y de sustitución, así como sus facultades, poderes y, en caso de que la representación sea plural, formas de actuación. En caso de renuncia, incapacidad o re-vocación de mandato, el nuevo representante se designa por mayoría absoluta de los miembros, excepto disposición en contrario del contrato. Igual mecanismo se debe requerir para autorizar la sustitución de poder;

l) las mayorías necesarias para la modificación del contrato constitutivo. En caso de silencio, se requiere unanimidad;

m) las formas de tratamiento y las mayorías para decidir la exclusión y la admisión de nuevos participantes. En caso de silencio, la admisión de nuevos miembros requiere unanimidad;

n) las sanciones por incumplimientos de los miembros y representantes;

ñ) las causales de extinción del contrato y las formas de liquidación del consorcio;

o) una fecha anual para el tratamiento del estado de situación patrimonial por los miembros del consorcio;

p) la constitución del fondo operativo, el cual debe permanecer indiviso por todo el plazo de duración del consorcio.

Reglas contables: El contrato debe establecer las reglas sobre confección y aprobación de los estados de situación patrimonial, atribución de resultados y rendición de cuentas, que reflejen adecuadamente todas las operaciones llevadas a cabo en el ejercicio mediante el empleo de

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técnicas contables adecuadas.

Los movimientos deben consignarse en libros contables llevados con las formalidades esta-blecidas en las leyes.

Se debe llevar un Libro de Actas en el cual se deben labrar, aquellas correspondientes a todas las reuniones que se realicen y a las resoluciones que se adopten.

Representante: El representante debe llevar los libros de contabilidad y confeccionar los estados de situación patrimonial. También debe informar a los miembros sobre la existencia de causales de extinción previstas en el contrato o en la ley y tomar las medidas y recaudos urgen-tes que correspondan. Es responsable de que en toda actuación sea exteriorizado el carácter de consorcio. (Art. 1476).

Responsabilidad: El contrato puede establecer la proporción en que cada miembro responde por las obligaciones asumidas en nombre del consorcio. En caso de silencio todos los miembros son solidariamente responsables. (Art. 1477).

Extinción del contrato: El contrato de consorcio de cooperación se extingue por:

a) el agotamiento de su objeto o la imposibilidad de ejecutarlo;

b) la expiración del plazo establecido;

c) la decisión unánime de sus miembros;

d) la reducción a uno del número de miembros. La muerte, incapacidad, disolución, liquidación, concurso preventivo, cesación de pagos o quiebra de alguno de los miembros del consorcio, no extingue el contrato, que continúa con los restantes, excepto que ello resulte imposible fáctica o jurídicamente. (Art. 1478).

4 EL CONTRATO ASOCIATIVO INNOMINADO19: JOINT VENTURE

Concepto: La figura del joint venture aparece como un modo de aplicación práctica de esa asociación destinada a obtener un objetivo común y como un medio útil y practico de facilitar un “acuerdo entre los interesados de un proyecto común”20.

Según ARREGUI, “Los joint venture Agremente son la forma más receptada en nuestro país, así como en otras economía en vías de desarrollo”. Continua el autor, en que “Este contrato se premia de ser un mecanismo ideal para las Micro Empresas y Medianas Empresas (MIPYMES), que al poner en común una parte de su proceso productivo logran hacerlo más eficiente y econó-mico, potenciando las capacidades para poder ingresar en un mercado de empresas mayores.21”

19 Código Civil y Comercial de la Nación Argentina. Art. 970.- Contratos nominados e innominados. Los contratos son nominados e inno-minados según que la ley los regule especialmente o no. Los contratos innominados están regidos, en el siguiente orden, por:

a) la voluntad de las partes; b) las normas generales sobre contratos y obligaciones; c) los usos y prácticas del lugar de celebración; d) las disposiciones correspondientes a los contratos nominados afines que son compatibles y se adecuan a su finalidad.

20 VILLEGAS, C. G. Obra citada. Pág. 757.

21 ARREGUI, V.M, Alianza estratégica Argentina Paraguay bajo la modalidad de los “joint venture”. Revista Temas de Derecho Económico: enfoque nacional e internacional. Numero 3. Enero 2015. Buenos Aires. Ed. Tribunales

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164 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

VITOLO define, “el joint venture -aventura común o conjunta- es definido como aquella aso-ciación en participación, sociedad meramente temporal o precaria, asociación transitoria de empresas, asociación temporal de de colaboración entre empresas, unión temporal de empresas, contratos de conjunción o juxtaposicion de esfuerzos destinados a un objetivo común, limitado a la realización o consecución de un determinado emprendimiento, o concertado solo por un periodo no muy prolongado de tiempo”22

Continuando en la línea de definiciones, ARGUMEDO, en 1985, expresa que el “Joint Venture es un contrato de carácter asociativo, mediante el cual dos o más personas ya sean naturales o jurídicas convienen en explotar un negocio en común por un tiempo determinado, acordando participar en las utilidades resultantes del mismo, así como responder por las pérdidas en forma solidaria e ilimitada”23.

Características del joint venture: Las características principales distintivas de este contrato, analizando las definiciones de los autores, podemos decir que:

- Es pluripersonal, es decir, posee pluralidad de sujetos, los cuales pueden ser indistintamente sociedades, empresas o personas humanas tanto nacionales como transfronterizas.

- Negocio Único, es decir que el contrato se mantiene en el tiempo hasta la realización del proyecto en común

- Fondo común, en lo que respecta al proyecto en común, cada parte realiza un aporte, el cual puede realizarlo en dinero o en especie.

- Fin de lucro, donde lo que se persigue es obtener ganancias y distribuirlas entre las partes.

- Distribución de las pérdidas, se distribuyen las pérdidas que puedan haberse ocasionado en el proyecto en común, según grados de responsabilidad acordados en el contrato.

Clases de joint venture: Según la doctrina, este tipo de JOINT VENTURE analizado anterior-mente se lo denomina contractual o Joint Venture Agreement, ya que la forma de organización es mediante un acuerdo de partes, celebrado mediante un contrato. Es primordial aclarar que cada parte conserva su autonomía jurídica.

Por otra parte, además del Joint Venture contractual, existe el que se denomina Joint Venture societario o corporation, el que se formaliza mediante la creación de una nueva sociedad, es decir, de un nuevo Sujeto de Derecho.

MARZORATI señala que dentro de esta especie, existen dos formas de constituirlo:

1. Por Sociedad anónima, donde cada socio de la JOINT VENTURE es un accionista de la sociedad;

2. Por Sociedad colectiva, siendo una sociedad “transparente” a los fines fiscales para los estados unidos”

Sin perjuicio de esta modalidad, cabe destacar que en estos supuestos, el contrato de joint

22 VITOLO, D.R., Reformas a la Ley General de Sociedades 19.550. Ley 26.994 comentada CÓDIGO CIVIL Y COMERCIAL DE LA NACIÓN, Tomo II, Santa Fe, 2015. 1ra Edición. Ed. Rubinzal.

23 ARGUMEDO, R.P. “La naturaleza jurídica del contrato de Joint Venture”. Revista DERECHO PUCP, Numero 39, Año 1985, Pág. 313. http://revistas.pucp.edu.pe/index.php/derechopucp/article/view/5887

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venture es previo y subyacente al contrato de sociedad24.

Joint Venture y el Mercosur: El Profesor brasileño COLOMBO ARNOLDI, en el año 1995, en el marco del II Congreso Iberoamericano de Derecho Societario y de la Empresa, consideraba que la joint venture “será, por excelencia, el contrato empresarial asociativo del Siglo XXI”25. Continuaba el autor exponiendo que “las razones que pueden proporcionar la expansión de las joint venture es la rápida y dinámica actuación de esta en la circulación de su capital en diferentes regiones, facilitando su inserción en mercados económicos diversos, o sea, característica que atiende los reclamos del empresariado internacional. Cierra el autor sentenciando que “la joint venture es un mecanismo jurídico y económico de integración del Mercosur”26.

En concordancia con ello, el joint venture es concebido dentro del Programa de integración Productiva del Mercosur, como un instrumento para la asociación de empresas en proyectos de complementación productiva27.

Las consecuencias beneficiosas de los Joint Venture, en cuanto a la integración productiva, destacadas son: a) el acceso a nuevas tecnologías, conocimientos, equipamiento moderno y facilidades de producción, lo cual implica la modernización de la estructura productiva; b) la producción del efecto derrame respecto del ambiente negocial del Estado anfitrión a través de la conexión entre proveedores locales de bienes y servicios, a partir de la cual resultan procesos de innovación; c) el aumento del potencial exportador y, consecuentemente, el mejoramiento de la balanza de pagos; d) el desarrollo de nuevas y mejores capacidades y habilidades gerenciales del empresariado local necesarias para la puesta en funcionamiento de estrategias para la generación e incremento de competitividad, crecimiento e internacionalización y e) el mejoramiento de las condiciones para el crecimiento de la economía local, con efectos positivos sobre el desarrollo de los recursos humanos, creación de empleo, educación, igualdad de género.”.28

5 BREVE RESEÑA DE LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA LEGISLACIÓN DE LOS PAÍSES QUE INTEGRAN COMO ESTADOS PARTES EL MERCOSUR.

Previo a profundizar en el análisis de los distintos institutos asociativos vigentes en los estados partes del Mercosur, nos introduciremos al tema: ¿Qué es el MERCOSUR?

El Mercado Común del Sur (MERCOSUR) es un proceso de integración regional instituido inicial-mente por Argentina, Brasil, Paraguay y Uruguay al cual en fases posteriores se han incorporado Venezuela y Bolivia, ésta última en proceso de adhesión.

24 VILLEGAS, C. G. Obra citada. Pág. 761.

25 COLOMBO ARNOLDI, P. R., Formas de Asociación de Empresas en el Ámbito del Mercosur. Ponencia presentada en la comisión IV, Cuestiones internacionales y grupos societarios, del Sexto Congreso Argentino de Derecho Societario y Segundo Congreso Iberoamericano de Derecho Societario y de la Empresa. Año. BIBLIOTECA DIGITAL UADE. 1995 https://repositorio.uade.edu.ar/xmlui/handle/123456789/1948

26 COLOMBO ARNOLDI, P. R. Obra citada.

27 CONSEJO DEL MERCADO COMÚN (MERCOSUR). Programa de Integración Productiva del MERCOSUR. MERCOSUR/CMC/DEC. Nº 12/08, San Miguel de Tucumán: CMC, 2008 en TORRES RAINERI – ARJOL. Figuras legais na integração produtiva, Argentina e Brasil: Ne-gócios associativos para pequenas e médias empresas. Interfaces Científicas – Dereito- Aracaju. V.3, N 2, pág. 101 a 111, Feb.2015. ISSN ELETRONICO 2316-381X .

28 UNIDO- The United Nations Industrial Development Organization. Patterns of Internationalization for Developing Country Enterprises (Alliances and Joint Ventures). Viena, UNIDO, 2008. en Torres Raineri – Arjol. Figuras legais na integração produtiva, Argentina e Brasil: Negócios associativos para pequenas e médias empresas. Interfaces Científicas – Dereito- Aracaju. V.3, N 2, Pág. 101 a 111, Feb.2015. ISSN ELETRONICO 2316-381X .

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166 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

EL MERCOSUR es un proceso abierto y dinámico. Desde su creación tuvo como objetivo principal propiciar un espacio común que generara oportunidades comerciales y de inversiones a través de la integración competitiva de las economías nacionales al mercado internacional29.

En el siguiente apartado, analizaremos las distintas legislaciones de los países partes del Mercosur, con el fin de analizar las posibilidades que se exponen para la concreción de contratos asociativos o colaborativos en la región.

5.1. BOLIVIA

La legislación del Estado Plurinacional de Bolivia, regula dos tipos de contratos asociativos:

1. Asociación Accidental, en el Código de Comercio;

2. Contrato de Riesgo compartido, en el DECRETO SUPREMO 22.407.

Asociación accidental.

El Código de Comercio (en adelante CC), sancionado mediante el Decreto Ley Nº 14.379, entró en vigencia el 1 de enero de 1978. En su Titulo II, CAPITULO VII, bajo el texto “ASOCIACIÓN AC-CIDENTAL O DE CUENTAS EN PARTICIPACIÓN”, expone la figura de la “Asociación Accidental”.

Definición: El Art. 365 del CC, expone que en el “contrato de asociación accidental o de cuentas en participación, dos o más personas toman interés en una o más operaciones determinadas y transitorias, a cumplirse mediante aportaciones comunes, llevándose a cabo las operaciones por uno o más o todos los asociados, según se convenga en el contrato”.

Formalidad: Este tipo de asociación no tiene personalidad jurídica propia y carece de denomi-nación social. Por ende, no es un sujeto de derecho.

La asociación accidental o de cuentas en participación no está sometida a los requisitos que regulan la constitución de las sociedades comerciales ni requiere de inscripción en el Registro de Comercio. Su existencia se puede acreditar por todos los medios de prueba. (Art. 366 CC).

Tipos de socios. Obligaciones de los asociados y encargados: Es un contrato con dos tipos de socios, el gestor (asociante) y los participes (Asociados)30.

El o los asociados, encargados de las operaciones, actuarán en su propio nombre. Los terceros adquieren derechos y asumen obligaciones solamente con respecto de dichos asociados, cuya responsabilidad es solidaria e ilimitada. (Art. 367 CC).

Cuando, contando con el consentimiento de los demás asociados, el o los encargados de las operaciones hacen conocer los nombres de éstos, todos los asociados quedan obligados, ilimitada y solidariamente, frente a terceros. (Art. 368 CC).

Rendición de cuentas: Todo asociado no encargado de las operaciones tiene derecho a pedirla rendición de cuentas de las mismas.

29 Página Oficial del Mercosur: http://www.mercosur.int

30 BARRIENTOS, P. A.- SALINAS, C. Negociación & Viabilidad de un Joint Venture. Caso de Estudio: Bolivia. [Negotiation and Feasibility of a Joint Venture. Case Study: Bolivia]. Segundo Congreso Panamericano de Derecho Societario y Concursal. Fundación para la Investigación y Desarrollo de las Ciencias Jurídicas - FIDAS, San José de Costa Rica, 2015 - http://www.aacademica.org/pedro.barrientos/19

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Al término de la asociación accidental o de cuentas en participación, el o los socios encargados de las operaciones serán liquidadores y rendirán cuentas a los demás asociados. (Art 369 CC).

Control de la gestión: Sin perjuicio de que el contrato designe al o los asociados para que ejerzan el control de la gestión, todos los demás tendrán derecho a examinar, inspeccionar, verificar y vigilar las operaciones encomendadas al o los asociados encargados de la operación. (Art. 370 CC).

Normas supletorias: A falta de disposiciones especiales, son aplicables supletoriamente, las normas de la sociedad colectiva31. (Art. 371 CC).

Contratos de riesgos compartidos.

El Contrato de Riesgo compartido, o bien como lo define la norma, el joint venture, está con-templado en el DECRETO SUPREMO No 22407 del 11 de Enero de 1990, en su Capitulo V “De los contratos de riesgo compartido (en la modalidad conocida internacionalmente como “joint ventures”)32”.

Definición: El Art. 44 del Decreto, expone que “Las sociedades constituidas en el país, así como las entidades y corporaciones del Estado, incluyendo las empresas autárquicas y las personas individuales, nacionales o extranjeras, domiciliadas o representadas en el país, pueden asociarse entre sí, mediante contratos de Riesgo Compartido, para el desarrollo o ejecución de trabajos, pro-yectos, obras, servicios, suministros y otros, dentro o fuera del territorio de la República. Pueden, asimismo, desarrollar o ejecutar los trabajos, obras y servicios complementarios o accesorios al objeto principal del contrato de Riesgo Compartido.”

Las personas individuales o colectivas extranjeras que suscriban contratos de Riesgo Com-partido, se rigen por las leyes nacionales. Deben constituir domicilio legal en Bolivia y cumplir con los demás requisitos establecidos en la legislación nacional. (Art 45).

Formalidad: El contrato de Riesgo Compartido no constituye sociedad, ni establece persona-lidad jurídica. Los derechos obligaciones del Riesgo Compartido se rigen por lo acordado en el respectivo contrato, en base a la libertad contractual establecida por el artículo 454 del Código Civil.

Para surtir efecto legal respecto a terceros, el contrato de Riesgo Compartido deberá cele-brarse mediante escritura pública e inscribirse en el Registro de Comercio.

Se especificará en la escritura pública de constitución, la responsabilidad de cada uno de los socios y del manejo y administración de la sociedad. (Art. 47).

Contenido del contrato: El contrato de Riesgo Compartido contendrá, además de lo señalado en los artículos anteriores y de todo aquello que las partes convengan:

- Objeto, con especificación de las actividades a realizar y de los medios acordados para su realización;

- Duración que podrá ser fija o igual a la de realización de la obra, servicios o trabajos que constituyen el objeto;

- Denominación, que podrá ser la de alguna, algunas o todas sus partes y estar seguida de la

31 Código de Comercio Boliviano. Véase Libro Primero, Titulo III, Capitulo II “Sociedad Colectiva”, Arts. 173 a 183.

32 Decreto Supremo N° 22.407 –Portal Jurídico Libre de Bolivia. http://www.lexivox.org/norms/BO-DS-22407.xhtml

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168 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

expresión: “Riesgo Compartido” o “R. C.”;

- Nombre o denominación, nacionalidad, domicilio y datos de inscripción en el Registro de Comercio, en su caso, de cada una de las partes. Tratándose de sociedades, debe mencionarse la resolución del órgano societario que aprobó la celebración del contrato de Riesgo Compartido, con la fecha respectiva.

- Constitución del domicilio legal para todos los efectos derivados del Riesgo Compartido, tanto para las partes como para terceros;

- Obligaciones asumidas por las partes, las contribuciones o aportes comprometidos respecto del fondo común operativo y los modos de financiar las actividades comunes, en su caso;

- Designación del o de los representantes con especificación del nombre o denominación, domicilio y facultades. En el contrato se estipulará la forma de reemplazar al representante en caso de muerte, incapacidad, impedimento o renuncia;

- Sistema o forma convenidos para la participación de las partes en la distribución de los re-sultados, ingresos y gastos del Riesgo Compartido;

- Causales de separación, exclusión de alguna de las partes, así como las condiciones de admisión de nuevos miembros;

- Sanciones por incumplimiento de obligaciones, si así conviniera;

- Obligatoriedad de establecer un sistema de contabilidad y preparación de estados y balances de acuerdo con la legislación nacional; y

- Causales de disolución del contrato de Riesgo Compartido y los medios de designación del o los liquidadores; (Art. 49).

Representación del contrato: El o los representantes del contrato de Riesgo Compartido ten-drán poderes suficientes de todas las partes para ejercer los derechos y contraer las obligaciones relativas al desarrollo o ejecución del objeto respectivo. Artículo 50°.-

El contrato, sus modificaciones, la designación del representante o su revocatoria y en su caso, la designación del liquidador, deberán inscribirse en el Registro de Comercio. (Art. 51).

Responsabilidad: Salvo disposición expresa del contrato, no se presume la solidaridad ni la responsabilidad ilimitada de las partes en los contratos de Riesgo Compartido, por los actos y operaciones de las partes, ni por las obligaciones contraídas por cualquiera de las partes frente a terceros. (Art. 52).

Quiebra o incapacidad de las partes: La quiebra de cualquiera de las partes o la incapacidad o muerte de las partes individuales no produce la extinción del contrato de Riesgo Compartido, el que podrá continuar con las restantes partes, si las partes acordaren la forma de hacerse cargo de las prestaciones respectivas. (Art. 53).

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5.2. BRASIL

La República Federativa del Brasil en su Ley 6.40433 de Sociedades Anónimas, de fecha 15 de diciembre de 1976, consigna el contrato de consorcio, para la constitución de sociedades anónimas y otras sociedades, independientes o no.

En el capitulo XXII se establece una figura muy simple, en dos artículos: uno dedicado a tipificar la figura, que no es societaria, y el otro, a las condiciones de constitución y registro34.

Contrato de consorcios.

Definición y características: El Art. 278 regula que “las empresas y otras compañías bajo el mismo control o no, puede constituir el consorcio para llevar a cabo determinada empresa, con sujeción a las disposiciones del presente capítulo”.

El consorcio no tiene personalidad jurídica y consorcios sólo se comprometen en virtud de los términos del contrato, lo que representa cada una de sus funciones sin presunción de solidaridad.

La quiebra de un consorcio no se extiende a la otra, siendo el consorcio con otros contratistas; créditos que pueden tener la quiebra se calculan y se pagan según lo previsto en el acuerdo de consorcio.

Contenido del contrato: El consorcio está formado por contrato aprobado por el órgano com-petente de la sociedad para autorizar la venta de activos no corrientes de la finca, que contendrá:

I - el nombre del consorcio en su caso;

II - la empresa que constituye el consorcio del objeto;

III - la duración, la dirección y el lugar;

IV - la definición de las obligaciones y la responsabilidad de cada empresa miembro del con-sorcio, y los beneficios específicos;

V - las normas sobre la recepción de los ingresos y compartir los resultados;

VI - normas relativas a la gestión del consorcio, la contabilidad, la representación de las em-presas participantes y los gastos de administración, en su caso;

VII - la forma de la deliberación sobre asuntos de interés común, con el número de votos que le corresponde a cada participante;

VIII - contribución de cada participante a los gastos comunes, en su caso.

El contrato de consorcio y sus modificaciones serán archivados en el lugar de su registro de comercio sede, con el certificado de presentación para ser publicado.

33 Ley 6.404 – Sociedades por acciones. Palácio de Planalto, Presidência da República. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6404consol.htm

34 ETCHEVERRY, R.A. “Negocios, Contratos asociativos y Mercosur”. Revista de Derecho Privado y Comunitario. Tomo 2 Año 2003, Ed. Rubinzal Culzoni.

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170 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

5.3. PARAGUAY

En la legislación paraguaya, solo existe la figura del “Contrato de Riesgo Compartido”, con-signadas en el CAPÍTULO V, de la Ley 117/9135 de 6 de diciembre de 1991, denominada Ley de Inversiones.

Contrato de riesgo compartido.

Definición: Sobre los Contratos de Riesgo Compartido, el articulo 14 expone “Se reconoce las inversiones conjuntas entre inversionistas nacionales y/o extranjeros, bajo la modalidad de Riesgo Compartido (Joint Venture) u otros.”

Agrega el Art. 15: “Las personas naturales nacionales e extranjeras, y las personas jurídicas constituidas, domiciliadas o representadas en el país, así como las entidades del Estado, incluyen-do los entes autárquicos y las entidades de derecho público, pueden asociarse entre sí mediante contratos de Riesgo Compartido para toda actividad lícita.”

Art. 16: “Las personas naturales o jurídicas extranjeras que suscriban contratos de Riesgo Compartido se regirán por las leyes nacionales, estableciendo constituir domicilio en el Paraguay y cumplir con los demás requisitos establecidos en la legislación nacional.

Art. 17: “El Contrato de Riesgo Compartido no establece personalidad jurídica, los derechos y obligaciones de Riesgo Compartido se rigen por lo acordado en el respectivo contrato.

La característica principal de este contrato de riesgo compartido, es que es pluripersonal, oneroso, entre personas humanas o jurídicas tanto públicas como privadas, nacionales o inter-nacionales, reglando derechos y obligaciones. El contrato no constituyendo una persona jurídica diferente a las partes.

5.4. URUGUAY

En la República Oriental del Uruguay el ordenamiento jurídico expone dos tipos de contratos asociativos o de colaboración empresarial, ambos consignados en la Ley 16.06036 de Ley de So-ciedades Comerciales.

Estos son: Sociedades accidentales o en participación y Consorcio.

Sociedades accidentales o en participación.

Definición: Los contratos entre dos o más personas cuyo objeto sea la realización de negocios determinados y transitorios a cumplirse a nombre de uno o más gestores, serán considerados como sociedades accidentales o en participación. No tendrán personería jurídica y carecerán de denominación. No estarán sujetas a requisitos de forma ni a inscripción (artículos 6º y 7º). La ce-lebración y el contenido del contrato se probará por los medios de prueba del derecho comercial.

Doctrinariamente, “el nombre accidental se le da porque se constituye para negocios comer-

35 Ley 117 – Ley de Inversiones Paraguay. Sistema de Información sobre Comercio Exterior. http://www.sice.oas.org/investment/natleg/par/pry117.asp

36 Ley 16.060 Ley de Sociedades Comerciales. IMPO – Centro de Información Oficial http://www.impo.com.uy/bases/leyes/16060-1989

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ciales determinados y transitorios. El nombre utilizado de “sociedad en participación”, que alude a la obligación del socio gestor de llevar una cuenta para la operación en común, en que surja la participación de cada uno37.”

Gestor: Los terceros adquirirán derechos y asumirán obligaciones sólo respecto del gestor. La responsabilidad de éste será ilimitada. Si actuara más de un gestor, ellos serán solidariamente responsables. (Art 484)

El socio que no actúe con los terceros no tendrá acción contra éstos. (Art. 485)

Cuando el gestor haga conocer los nombres de los socios con su consentimiento, éstos que-darán obligados solidariamente hacia los terceros. (Art. 486).

Control de la administración: Si el contrato no determina el control de la administración por los socios, se aplicarán las disposiciones establecidas para los socios comanditarios. (Art. 487).

En cualquier caso, el socio tiene derecho a la rendición de cuentas de la gestión.

Estas sociedades funcionarán, se disolverán y se liquidarán a falta de disposiciones especiales, de conformidad a las normas de las sociedades colectivas38 en cuanto no contraríen lo dispuesto en esta Sección. (Art. 488).

Consorcio.

En la República Oriental del Uruguay la Ley 16.060 (de Sociedades Comerciales) expone en su CAPITULO III - DE LOS GRUPOS DE INTERÉS ECONÓMICO Y DE LOS CONSORCIOS, expone en la SECCIÓN II sobre “los consorcios”, entre los artículos 501 y 509, figura que desarrollaremos con mayor detalle, debido a su característica contractual.

Definición: El consorcio se constituirá mediante contrato entre dos o más personas, físicas o jurídicas, por el cual se vincularán temporariamente para la realización de una obra, la prestación de determinados servicios o el suministro de ciertos bienes.

El consorcio no estará destinado a obtener y distribuir ganancias entre los partícipes sino a regular las actividades de cada uno de ellos.

No tendrá personalidad jurídica. Cada integrante deberá desarrollar la actividad en las con-diciones que se prevean, respondiendo personalmente frente al tercero por las obligaciones que contraiga en relación con la parte de la obra, servicios o suministros a su cargo, sin solidaridad, salvo pacto en contrario (Art. 501).

Estamos frente a un contrato pluripersonal, entre personas humanas o jurídicas, por un deter-minado tiempo para la realización de un negocio en común, o bien la prestación de un servicio o suministro de bienes. El contrato por sí solo no buscará la distribución de ganancias, sino regula actividades propias de cada uno de los participantes.

No constituye persona jurídica, es decir, no es sujeto de derecho. Cada parte responde por lo

37 RODRÍGUEZ OLIVERA, N.E. – LÓPEZ RODRÍGUEZ, C.E. Sociedades accidentales o en participación. http://www.derechocomercial.edu.uy/ClaseSocAccid01.htm

38 Ley 16.060 Ley de Sociedades Comerciales. Véase Capitulo II, Sección I “De las sociedades colectivas”, Arts. 199 a 211. IMPO – Centro de Información Oficial http://www.impo.com.uy/bases/leyes/16060-1989

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172 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

que prevé el contrato ante terceros.

Forma y contenido del contrato: La forma del contrato y su contenido están consignados en el Art. 502. La forma del contrato es por escrito y su contenido está estipulado en los siguientes puntos del Art. mencionado:

1) Lugar y fecha del otorgamiento e individualización de los otorgantes.

2) Su denominación, con el aditamento “Consorcio”.

3) Su objeto, duración y domicilio.

4) La determinación de la participación de cada contratante en el negocio a celebrar o los criterios para determinarla, así como de sus obligaciones específicas y responsabilidades.

5) Normas sobre administración, representación de sus integrantes y control del consorcio y de aquellos, en relación con el objeto del contrato.

6) Forma de deliberación sobre los asuntos de interés común, estableciéndose el número de votos que corresponda a cada partícipe.

7) Condiciones de admisión de nuevos integrantes, causas de exclusión o alejamiento de par-tícipes y normas para la cesión de las participaciones de los miembros del consorcio.

8) Contribución de cada integrante para los gastos comunes, si existieran.

9) Sanciones por el incumplimiento de las obligaciones de los miembros.

Si bien no es una persona jurídica, el Art. 503 obliga para que tenga sus efectos, la inscripción en el Registro Público de Comercio, debiendo publicarse un extracto que contendrá la denominación, la individualización de sus integrantes, el objeto, la duración, el domicilio y los datos referentes a su inscripción, tanto del contrato como sus sucesivas modificaciones.

Administración: La administración del consorcio será en la cabeza de uno o más administra-dores o gerentes. Se le aplica normas generales de ley 16.060 y lo que respecta a las sociedades colectivas39, sobre administración40.

La representación del consorcio será ejercida por el administrador o las personas que el consorcio designe.

La actuación y responsabilidad del administrador del consorcio se regirá por las reglas del mandato41.

Resoluciones: Lo que respecta a las resoluciones del Consorcio, las modificaciones del contrato y su rescisión se resolverá por unanimidad. Las demás resoluciones se adoptarán por mayoría de votos. Todo, salvo pacto en contrario.

Muerte, quiebra o incapacidad: La muerte, incapacidad, quiebra o liquidación judicial de un consorciado será causa legítima para la rescisión del contrato de consorcio a su respecto. (Art. 509)

39 Art. 199, Ley 16.060 - Sociedades Comerciales (Caracterización). En las sociedades colectivas los socios responderán subsidiaria, solidaria e ilimitadamente por las obligaciones sociales.

40 Arts. 200 a 205 de Ley 16.060 - Sociedades Comerciales.

41 Código de Comercio Uruguayo. Título II – Del Mandato de las comisiones o consignaciones. Arts. 299 a 334.

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Consorcio de exportación.

Otra figura en la legislación uruguaya es el “Consorcio de Exportación”. Es creada por la Ley 18.323 promulgada el 25/07/2008 y Publicada el 05/08/2008.

Su artículo primero la define como: “Se denominará Consorcio de Exportación a la asociación que se constituirá mediante contrato entre dos o más personas, físicas o jurídicas, por el cual se vincularán por el tiempo contractual para la realización de actividades de comercialización de bienes o servicios al exterior. Esta asociación podrá adoptar las formas previstas en el Capítulo III, Secciones I y II (de los grupos de interés económico y de los consorcios) de la Ley Nº 16.060, de 4 de setiembre de 1989 (Sociedades Comerciales).”

5.5. VENEZUELA

La legislación interna Venezuela no contiene disposiciones específicas en la materia de los contratos de colaboración asociativos, solo lo que respecta a la figura de cuentas en participación o sociedad accidental.

Cuentas en participación o sociedad accidental.

La cuenta en participación o sociedad accidental, se encuentra consignada en el Código de Co-mercio de la República Bolivariana de Venezuela41, Título VII, Sección XII. Cuentas en Participación.

Se desarrolla en solamente 6 artículos, comprendiendo entre los Arts. 359 y 364 inclusive.

Definición y caracteres principales: La asociación en participación es aquella en que un co-merciante o una compañía mercantil, da a una o más personas participación en las utilidades o pérdidas de una o más operaciones o de todas las de su comercio.

Puede también tener lugar en operaciones comerciales hechas por no comerciantes. (Art. 359).

Los terceros no tienen derechos ni obligaciones sino respecto de aquel con quien han con-tratado. (Art. 360).

Los participantes no tienen ningún derecho de propiedad sobre las cosas objeto de la aso-ciación aunque hayan sido aportadas por ellos. Sus derechos están limitados a obtener cuenta en los fondos que han aportado y de las pérdidas o ganancias habidas; pero podrán estipular en sus relaciones con los asociados que éstos les restituyan las cosas aportadas por ellos, y en su defecto, les indemnicen daños y perjuicios. (Art. 361).

En el caso de quiebra, los participantes tienen derecho a ser colocados en el pasivo de los fondos con que han contribuido, en cuanto éstos excedan de la cuota de pérdida que les corres-ponda. (Art. 362).

Salvo lo dispuesto era los artículos anteriores, la sociedad accidental se rige por las conven-ciones de las partes. (Art. 363).

Estas asociaciones están exentas de las formalidades establecidas para las compañías, pero deben probarse por escrito. (Art. 364).

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174 LOS CONTRATOS ASOCIATIVOS EN LA NORMATIVA ARGENTINA. INSTITUTOS SIMILARES EN LA LEGISLACIÓN DE LOS ESTADOS PARTES DEL MERCOSUR

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176 LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

Silvio Javier Battello Calderon1

Denise Artifon2

1 INTRODUCCIÓN

La protección de los consumidores en el Mercosur nace en el ámbito del Grupo de Mercado Común, más específicamente del Sub Grupo nº 10 de Coordinación de Políticas Económicas que contaba con la Comisión de Estudios sobre Derecho del Consumidor. Esta Comisión compuesta por Ministros de los Ministerios de Economía, de las Relaciones Exteriores y de Justicia fue instituida en 1993 y se transformó en Comité Técnico de la Comisión de Comercio en 1994, por determi-nación del Protocolo de Ouro Preto. Era competencia de esta Comisión elaborar inicialmente un documento que contenga las “Pautas Básicas de Defesa del Consumidor” estableciendo reglas mínimas y puntuales de protección y defensa del consumidor, pero que no implican la revocación de las normas imperativas vigentes en los Ordenamientos Jurídicos internos.

Confirmando la importancia de los trabajos desarrollados por esta Comisión, en 1994 el GMC editó la Resolución 126/94, única norma general de defensa del consumidor con validad en el Mercosur y determinó que la Comisión pasaría a ser denominada de Comité Técnico 07 de la Co-misión de Comercio. En 1995 se estableció la competencia del CT nº 07 para la implementación de las determinaciones observadas por la Resolución 126/943. También es importante destacar que otras Resoluciones del GMC referentes a los consumidores fueron aprobadas4. Y como resultado del Acuerdo nº 8/96 de la Reunión de Ministros de Justicia del Mercosur, aprobado por la XIª Reunión del CMC realizada en diciembre de 1996, fue firmado por Estados Partes del Mercosur el Protocolo de Santa María sobre jurisdicción internacional en materia de relaciones de consumo5. Por fin, en 1997 sufrió algunas modificaciones y paso a ser denominado como Protocolo Común de Defensa del Consumidor del Mercosur6. La exigencia de aprobación de este Protocolo en su totalidad (art. 18 del Protocolo) por los Estados Parte, puesto como condición determinante de la obligatoriedad de su incorporación en los ordenamientos jurídicos nacionales no fue cumplida, lo

1 Abogado en la Argentina y Brasil. Pos Doctor en Derecho. Profesor de la Facultad Don Bosco de Porto Alegre, Brasil. E-mail: [email protected]

2 Abogada en Brasil. Doctoranda en Derecho por la Universidad de Morón - UM, Argentina. Especialista en Derecho del Consumidor por la Universidad Federal de Rio Grande do Sul – UFRGS. Profesora de Derecho del Consumidor y Derecho Inmobiliario. Email: [email protected]

3 Este Comité no cuenta con la participación de los consumidores o de entidades civiles protectoras de sus derechos e intereses. Su composición reviste carácter intergubernamental de todos los órganos que componen la estructura institucional del Mercosur. Son fun-cionarios públicos de los Ministerios de Economía, de las Relaciones Exteriores y de Justicia.

4 Son la Resolución 123/96 relativa a la definición de consumidor, proveedor, relación de consumo, productos y servicios; Resolución 124/96 que contiene una lista no exhaustiva de los Derechos básicos del consumidor; c) Resolución 125/96 que intenta reglamentar los niveles de calidad, riesgos, salud y seguridad a ser ofrecidos por los productos y servicios comercializados; Resolución 126/96 sobre el régimen de publicidad; Resolución 127/96 que trata de las garantías contractuales, pero que no subsistieron al tiempo y los propósitos de la creación de un Reglamento Común de defensa del consumidor del Mercosur.

5 Disponible en: http://www.mre.gov.py/dependencias/tratados/mercosur/registro%20mercosur/Acuerdos/1996/espa%C3%B1ol/21.Protocolo%20de%20Santa%20Maria.pdf

6 Cf: MERCOSUR/CCM/CT Nº 7 “COMITE DE DEFENSA DEL CONSUMIDOR”/Acta Nº 08/97.

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que fue utilizado como argumento, entre otros que veremos a seguir, para el rechazo por parte de Brasil.

2 LA PROTECCIÓN A PARTIR DE PROTOCOLO DE SANTA MARÍA

El Protocolo de Santa María tiene como objetivo el tratamiento material y procesal para la protección y defensa del consumidor. Sus normas traían avances significativos en relación a los derechos nacionales. Por ejemplo podemos destacar la reglamentación de foro competente para la solución de litigios, prevaleciendo el domicilio del consumidor (artigo 4º), la aplicación de la respectiva ley procesal del lugar del proceso (artigo 10), etc. destinadas a hacer accesible los medios de defensas del consumidor en la protección de sus derechos.

Es importante recordar que al celebrarse el Protocolo de Santa María exista una dicotomía acentuada en la protección de los consumidores en el ámbito regional. Por un lado, el derecho brasileño, que en su Constitución Nacional de 1988 hace expresa mención a la a defensa del consumidor, art. 5º, XXXII, como derecho y garantía fundamental de los ciudadanos, y en el art. 170, como principio macroeconómico, como directriz del orden económico y financiero del país. Siguiendo la directiva constitucional, en 1991 entró en vigor el Código de Defesa do Consumidor, Ley No. 8.078/90, en su momento, la ley más avanzada del mundo en materia de protección de los consumidores7.

En una situación muy diferente se encontraban los demás miembros del Bloque. En el derecho Paraguayo, si bien la Constitución Nacional de 1992, en sus art. 27, 38 e 72, trata de los consumi-dores, así como de sus derechos y su vulnerabilidad ante los proveedores y demás participantes de la cadena de consumo, no poseía una legislación específica para la defensa de estos derechos, que solo fue promulgada 1998, por ley No. 1.3348. Un situación semejante era la del derecho Uru-guayo, que solo garantizo los derechos de los consumidores de forma constitucional por la Carta de 1997, art. 24,44 y 52. Y en el ámbito infra constitucional, a partir del año 2000, cuando entro en vigencia la Ley, n.º 17.250, sobre Relaciones de Consumo9. El Derecho argentino es el que más aproximaba a la legislación brasileña. La Constitución de 1994 prevé en el art. 42, los derechos relativos a os consumidores, así como los principios que fomentan la protección y defensa de los mismos. A nivel infra constitucional, desde 1993, vigoraba la Ley 24.240, Ley de de Defensa del Consumidor y del Usuario10, aunque con un grado de protección a los consumidores muy inferiores a los establecidos por el derecho brasileño.

En un profundo análisis sobre la propuesta Mercosureña, Cláudia Lima Marques constato que cerca de 26 normas del Código de Defesa do Consumidor serían dejados sin efecto si el Protocolo hubiese sido aprobado, banalizando así la fuerte doctrina ya construida y el entendimiento juris-

7 Para un análisis de la legislación brasileña, véase: FILOMENO BRITO, J. G., GRINOVER, A. P., BENJAMIN, A. H.V. et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 7aed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001; LIMA MARQUES, Claudia; BENJAMIN, A.H.V.; MIRAGEM, B. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 3 ed. São Paulo: RT, 2010.

8 Sobre el derecho paraguayo, véase: BECKER M. G. Mercado común y la protección del consumidor Paraguay: garantías constitucionales y la armonización de las legislaciones internas. In: LIMA MARQUES, C(Cord.) A proteção do consumidor no Brasil e no Mercosul . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994, p. 137 y ss.

9 Sobre el derecho uruguayo, véase: SZAFIR, D. Consumidores. Análisis exegético de la Ley 17,250. Montevideo: FCU, 2009.

10 Sobre el derecho argentino, véase: FARINA, J,. Ley del Defensa del Consumidor y del Usuario. Buenos Aires: Astrea, 2008.

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178 LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

prudencial firmado en esta área del derecho brasileño e hizo las siguientes recomendaciones:

“1. que o Ministério da Justiça assegure transparência, participação da sociedade civil, e especialização nos trabalhos de elaboração legislativa do Comitê Técnico 07 da Comissão de Comércio/Mercosul, credenciando especialistas em direito do consumidor para parti-cipar da Comissão Assessora da Delegação Brasileira, a exemplo da Portaria SDE n.º 9, de 06 de maio de 1998; 2. que o Mercosul estabeleça como referência a legislação mais exigente e os padrões internacionais de proteção dos consumidores nos seus trabalhos legislativos na Comissão de Comércio do Mercosul, uma vez que é direito fundamental dos cidadãos da região; 3. que o Mercosul, através da CT7 da Comissão de Comércio do Mercosul, utilize um método de harmonização legislativa flexível e mínimo, não revogando a Legislação Nacional, mais efetiva para a proteção do consumidor, elaborando os direitos mínimos do consumidor da região.” (grifo nosso)11.

La no aprobación de Protocolo de Santa María no fue un trabajo perdido, debido a la importante repercusión tuvo sobre las legislaciones internas sobre el Derecho del Consumidor, que de hecho eran prácticamente inexistentes en Paraguay y en el Uruguay, y que acabaron produciendo en la Agentina importantes modificaciones legislativas y jurisprudenciales. Además, y a pesar del fracaso en la aprobación del Protocolo, el Mercosur no solo continuó analizando el tema sino que intensifico sus trabajos en todas las áreas relacionadas, como son los efectos de los alimentos transgénicos, medicamentos, publicidad y propaganda, etc.

Podemos afirmar, que a partir Santa María, no existen más dudas que para intensificar el proceso de integración regional es necesario la protección de los consumidores. Como afirmaba Bittencourt, “(...) a defesa do consumidor, tanto como direito fundamental, quanto princípio macroe-conômico, deve ser considerado segundo os princípios internacionais que deram origem à norma, adaptando-se os direitos conquistados internamente, de conformidade com a importância econômico - política de cada país, às regras que disciplinam a integração do mercado econômico regional (...)”.12

3 LOS CAMBIOS SOCIOCULTURALES Y LOS NUEVOS FUNDAMENTOS DE PROTECCIÓN

Si en los años 90 de siglo pasado aún no existía en el ámbito del Mercosur una realidad y una reglamentación uniforme en materia de consumo, luego de transcurrido algunos años del nuevo milenio ya no restan dudas de que vivimos en un mercado globalizado, en la era de los servicios, que no desterró el sistema fordista de producción de bienes, muy por el contrario, los sistemas coexisten, y se abren espacio en todas las latitudes del planeta. Estos cambios económicos también están acompañados de cambios en los comportamientos. Por ello se ha afirmado que esa nueva forma de estructuración de la economía, estimulada por la sensible ampliación de los mercados mundiales, también afectará los hábitos y prácticas de consumo. El mercado de masas pasará a dar lugar a un mercado volcado para lo exclusivo, lo diferenciado y lo personalizado13.

11 LIMA MARQUES, C.. Direitos do Consumidor no Mercosul: Algumas sugestões frente ao impasse, In: Conferência Nacional dos Advo-gados - Justiça Realidade e Utopia, XVII, 1999, Rio de Janeiro. Anais. Rio de Janeiro: UERJ, 1999.

12 BITTENCOURT, R. Instituições de direito econômico. Curitiba: Juruá, 1996, p. 195-196.

13 En ese contexto, David Harvey afirma que la “acumulación flexible (o pos-fordista) fue acompañada por el lado del consumo, por una

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Delante de esta nueva realidad social, merece especial atención la situación de los consumi-dores por ser el nuevo vulnerable de las relaciones jurídicas. Hoy el consumidor es el vulnerable sistémico más característico de la globalización14. En el ámbito micro-sistémico, no aparece como una clase social específica, inclusive son protegidos aquellos consumidores de elevado poder adquisitivo. Ahora, desde un abordaje macro-sistémico, es fácil evidenciar que existen aquellos que son claramente consumidores y otros claramente proveedores.

En su vasta obra, la profesora Claudia Lima Marques15 tal vez sea quien mejor retrató el desafío que el mercado presenta para la protección del consumidor, las dificultades que el consumidor tiene frente a las nuevas tecnologías; los cambios de significado entre la protección del consumidor de bienes a la protección del consumidor de servicios, así como de los contratos relacionales; de los contratos nacionales a los contratos internacionales de consumo, éstos últimos de escasa previsión legal, de reglamentación poco clara, que en muchos casos llevan a la auto-regulación, principalmente cuando se trata de contratos on-line.

El Mercosur se caracteriza por una masa gigantesca de potenciales o futuros consumidores (muchos de los cuales siquiera forman parte del mercado de consumo) y un número elevado de pequeños proveedores, artesanos y trabajadores autónomos16, que en las últimas décadas, y fruto de la influencia cultural globalizadora, sienten la necesidad de incorporarse al mercado, ingerir fast food, usar ropas de marcas famosas, transitar en grandes camionetas importadas, viajar, estudiar en el exterior, etc.

Estos se refleja, por ejemplo, en el turismo. Hace veinte años, parecía que solo la población argentina tomaba vacaciones en el exterior, inundando el litoral brasileño, donde eran conocidos como los ‘dame dos’. En la actualidad, hay un flojo intenso y constante de brasileños en la Ar-gentina, de uruguayos Brasil y paraguayos en las otras latitudes. Muchos de ellos pasan meses, y hasta años, pagando cuotas para el viaje de sus sueños. Y para que el sueño se haga realidad, adquieren paquetes turísticos, viajan en vuelos charter, en horarios atípicos, conocen varias ciudades en pocos días, visitan innumerables locales o puntos turísticos, almuerzan y cenan en horarios y locales determinados previamente por el paquete, etc. Al final de cuentas, el viaje se vuelve una verdadera maratón, al punto tal que a su regreso el viajante precisa algunos días para recuperarse de las vacaciones. Eso sin contar que muchas veces los servicios adquiridos no son

atención mucho mayor a los cambios rápidos de moda y movilización de todos los artificios de inducimiento de necesidades y transformación cultural que eso envuelve. La estética relativamente estable del modernismo fordista dio lugar a todo fermento, inestabilidad y cualidades pasajeras de una estética pos-moderna que celebra la diferencia, lo efímero, el espectáculo, la moda y la mercantilización de las formas culturales”. Citado por PORTO MACEDO JÚNIOR. R.. A globalização e o Direito do Consumidor. Consultado en: http://bdjur.stj.gov.br/jspui/bitstream/2011/19857/1/Globalização%20e%20o%20direito%20do%20consumidor.pdf..

14 Una interesante descripción de esa realidad es hecha por BAUMAN, Z. La Globalización. Consecuencias humanas. Buenos Aires: Fondo de la Cultura Económica, 2010, p. 106 y ss.

15 A título de referencia, ver: LIMA MARQUES, C. A crise do direito na pós-modernidade e seus reflexos na pesquisa. Cidadania e Jus-tiça. Revista da AMB, ano II, n.6, 1999, p. 237 e ss; A proteção de consumidor de produtos e serviços estrangeiros no Brasil: primeiras observações. Revista de Direito do Consumidor, Vol. 41, p. 39-80; A responsabilidade do transportador aéreo pelo fato do serviço e o Código de Defesa do Consumidor – Antinomia entre norma do CDC e de leis especiais. Revista Direito do Consumidor, Vol. 3, p. 155-197; Cláusulas abusivas y el proyecto de reglamento de normas comunes de defensa del consumidor en el Mercosur. En: RAMOS, Beatrix (org.). La defensa del consumidor en el marco de la integración regional. Montevideo: Ministerio de economía y finanzas del Uruguay, 1997; Contratos bancarios en tiempos pós-modernos. Revista de Direito do Consumidor. Vol. 25, p. 19-38; Contratos de time-sharing e a proteção dos consumidores: critica ao direito civil em tempos pós-modernos. Revista de Direito do Consumidor, Vol. 22, p. 64-86; Confiança no comércio eletrônico e a proteção do consumidor. São Paulo: RT, 2004.

16 No sucede lo mismo En el hemisferio Norte se encuentran los consumidores con mayor poder adquisitivo de las Américas, así como los proveedores más poderosos del mundo. Existen varias investigaciones y trabajos doctrinarios que retratan esa realidad. A modo de ejemplo, ver: CIA Word Fact Book, Rank Order Iinternet Users, disponible en: www.cia.gov/librery/publications/the-word-factbook/ran-korder/2153rank.html.

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180 LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

de hecho ofrecidos o son deficitarios, o que muchas veces las personas no pueden viajar en la fecha establecida por cuestiones profesionales o familiares y no tienen como ‘cambiar’ la fecha establecida y deben conformarse con otro destino que no es el escogido, además, claro está, de pagar la multa contractual correspondiente.

Lo mismo podemos decir de los servicios educacionales. Cada vez más, alumnos y profesio-nales brasileños realizan sus estudios en la Argentina, así como también crece el número de argentinos que estudia en el Brasil. Esto ha hecho que en el ámbito universitario crezca a paso agigantado el número de instituciones privadas. Pero la masificación de la educación de nivel superior para brindar servicios a los alumnos extranjeros está lejos de aumentar la calidad de la educación. Los alumnos, en estos casos consumidores, son víctimas del mercado educativo. No hay, principalmente por las instituciones privadas, un verdadero interés en la integración del conocimiento, y muchas se han transformado en verdaderas vendedoras de diplomas.

Entre las diversas manifestaciones actuales de consumo internacional, la más preocupante es sin duda la indefensión de los consumidores en el ámbito del comercio electrónico17. El consumo on-line implica el análisis de dos cuestiones diferentes, si bien relacionadas: internet como me-dio de las relaciones de consumo y la propia actividad de consumo que en ella se realiza. El uso de internet como medio abre el debate sobre su control estatal vs. auto-reglamentación, como son los modelos alternativos para la resolución de conflictos y en la consagración de sustitutos de las jurisdicciones nacionales. La segunda cuestión, de la actividad de consumo en el ámbito virtual, obliga a reflexionar sobre el Derecho aplicable. Eso porque las viejas soluciones del DIPr (en especial la autonomía de la voluntad) se debaten entre reaprovechamiento o sustitución por normas especiales.

Tampoco podemos dejar de citar otra realidad vinculada al tema, que son muchos los artesanos y pequeños fabricantes, tan común en la región. A pesar de ocupar el polo activo de la relación, no con ello significa que sean la parte ‘fuerte’ de la relacionas de consumo. A título de ejemplo, Michael J. Dennis relata el caso de un pequeño comerciante argentino dedicado a la producción de piezas en plata que utiliza internet como canal de ventas18. Uno de sus clientes en Estados Unidos, después de recibir la mercadería de Argentina, hizo un pago parcial de US$ 3.000, pero no quedo satisfecho con el producto y se negó a pagar la diferencia, que también era de US$ 3.000. En una carta al comerciante, y ante el desacuerdo de las partes, el consumidor escribió: “es claro que seguiremos en desacuerdo con respecto a la queja, así que si el pago parcial de US$3.000 no resulta satisfactorio, devuélvanos nuestro cheque y dejaremos que resuelvan los jueces”. El comerciante, por su parte preguntó “qué jueces?”, ya que la justicia Argentina es lenta, y de forma alguna podría pagar el costo de un litigio en Estados Unidos.

17 Sobre el tema: DREYZIN DE KLOR, A. El derecho aplicable al comercio electrónico: un tema que interesa a los consumidores, a la CIDIP y a otros foros de codificación. En: FERNANDEZ ARROYO, D. (Org.). Protección de los Consumidores en América. Trabajos preparatorios de la CIDIP VII (OEA). Asunción: La Ley Paraguaya S.A., 2007, p 239 y ss.

18 DENNIS, Michael J. Diseño de una agenda práctica para la protección de los consumidores en las Américas. En: FERNANDEZ AR-ROYO, Diego (Org). Protección…, cit., p. 220 y ss.

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4 LOS OBSTÁCULOS NORMATIVOS

La reglamentación legal del fenómeno del consumo internacional en el Mercosur es parcial, incompleta y con una fuerte tendencia a la privatización de sus normas. Hay una crisis de las instituciones y un avance de la justicia privada, en especial sobre en el ámbito del comercio elec-trónico, donde el consumo internacional aún permanece como una especie más del género de los contratos internacionales sin considerar, salvo escasas excepciones19, que el consumo es mucho más que un simple contrato y que no se limita a las fronteras del país.

Resumiendo, actualmente la protección del consumidor se manifiesta de dos formas. Primero, las leyes o códigos de defensa y protección del consumidor que antes señalamos, por ser con-sideradas de Orden público20, son utilizados también para los casos de consumo internacional, aunque no tengan vocación para tal fin. Y en segundo lugar por la auto-regulación del mercado. Así ocurre principalmente en el comercio electrónico21, véase en este sentido el caso de eBay, empresa pionera en la creación de un sistema propio y completo para solucionar las divergencias entre sus usuarios. También sirven como ejemplo las actividades de las empresas intermediarias del comercio electrónico. Cada vez es más frecuente que después de una compra en la web se solicite al consumidor una calificación del servicio o producto adquirido. Conforme la puntuación que se le haya dado a la empresa por sus clientes, la empresa intermediaria bajará al proveedor de categoría. Es porque están esos datos a disposición del consumidor que se permite disminuyan los riesgos de futuros consumidores, cumpliéndose, así, una forma de auto-regulación del mercado22.

Esas políticas paraestatales de reglamentar el consumo, destacándose en el ámbito virtual, tienen en los doctrinadores norteamericanos a sus principales defensores23. En líneas generales, se defiende la idea de que sean los propios operadores de internet que actúen, teniendo como guías códigos de conductas creados por ellos mismos, llamados de Netiquette o Net Lex. Las voces defensoras de esta postura tuvieron más fuerza en la última década del siglo pasado24. Actualmente, buena parte de la doctrina parece defender políticas conjuntas de las empresas intermediarias del comercio electrónico sumadas a las reglamentaciones nacionales y a tratados e convenciones específicos en la materia25.

Todo esto demuestra la necesidad de armonizar el derecho de los consumidores, tanto en el Mercosur como a nivel americano en general. Sin embargo, el fracaso del Protocolo de Santa María dejo como interrogante la forma de llevar adelante esa reglamentación. Para algunos es necesario partir de un conjunto de normas básicas y así aproximar, de forma flexible, las legisla-

19 Cf.: LIMA, E. W. M. Proteção do consumidor brasileiro no comércio eletrônico internacional. São Paulo: Atlas, 2006, p. 78-79. Para el Derecho Canadiense, ver la solución del art. 3117 –Du Contrat de consommation, do Código Civil de Quebec, disponible en: http://www2.publicationsduquebec.gouv.qc.ca/dynamicSearch/telecharge.php?type=2&file=/CCQ/CCQ_A.html.

20 Sobre las leyes de protección como normas de orden público, ver: LIMA MARQUES, C.; CORREA JACQUES, D. Normas de aplicação imediata como método para o Direito Internacional Privado de Proteção do consumidor no Brasil. In: Cadernos do Programa de Pós-Gra-dação em Direito – PPGDir./UFRGS, No. IV, set. 2005. Porto Alegre: PPGDir./UFRGS, 2005, p. 65 a 96.

21 Sobre la protección del consumidor en el comercio electrónico, ver: DREYZIN DE KLOR, A. El derecho …, cit. p. 239 y ss.

22 Para más información, ver los trabajos desarrollados en el ámbito de la OCDE (organización internacional para la Cooperación y el Desarrollo Económico), disponibles en: http://www.oecd.org/department/0,3355,en_2649_34267_1_1_1_1_1,00.html..

23 La declaration of the independence of Cyberspace, fue el título dado al artículo publicado por el prof. J.P. Barlow para justificar la liberdad e independencia de las relaciones jurídicas en la Web. El texto puede ser consultado en: http://www.homes.eff.org/-barlow/Declaration-final.html.

24 En ese sentido: MEFFORD, A. Lex Informatica: Foundations of Law on the Internet. In: Indiana Journal of Global Legal Studies, No. 5, 1997, p. 211 y ss.

25 Entre otros: GARDETA, Juan Manuel Velázquez. La protección…, cit., p. 57 y ss.

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182 LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

ciones nacionales. Para otros, la mejor solución sería una reglamentación material autónoma26. Sin desconocer las divergencias que puedan existir sobre el tema27, creemos necesario hacer un análisis sobre las propuestas de la CIDIP VII para la protección de los consumidores.

5 LA REGLAMENTACIÓN DEL PROYECTO CIDIP VII

La relevancia del consumo en América y la crisis normativa antes retratada fueron motivos de-terminantes para que la OEA direccionase sus objetivos en la edición de una nueva CIDIP destinada a la protección del consumidor. Inicialmente, fueron presentados tres proyectos28: a) Proyecto de Convención (propuesta brasilera sobre el Derecho Aplicable a algunos contratos y transacciones internacionales de consumo); b) Proyecto de Ley Modelo (Anteproyecto de propuesta de legislación modelo sobre jurisdicción y leyes aplicables a los contratos con consumidores, presentada por la delegación canadiense); c) Proyecto de Guía Legislativa (Proyecto de Guía Legislativa para una Ley Interamericana respecto de la disponibilidad de medios de solución de controversias y resti-tución a favor de los consumidores, presentada por los EUA, que incluye tres anexos: Proyecto de Ley Modelo Menor Cuantía (Anexo A: proyecto de Ley Modelo para reclamos de menor cuantía); Proyecto de Ley Modelo de Arbitraje Electrónico (Anexo B: Proyecto de Normas Modelo para el arbitraje electrónico de reclamos transfronterizos de consumidores); Proyecto de Ley Modelo de Restitución Gubernamental (Anexo C: Proyecto de Ley Modelo de Restitución Gubernamental). Los proyectos se juntan en un ideal común, ya que todos buscan el reequilibrio y la igualdad en las relaciones internacionales de consumo.

El punto en común de las propuestas está representado por la regulación del consumo on-li-ne, pero la forma y el alcance de los tres proyectos son diferentes, y obedecen a las realidades y tradiciones de los países que los formularon. Son evidentes las diferencias en las posturas o ideologías que existen por detrás. Los temas abordados exceden a los títulos de los proyectos. Son tratadas cuestiones de orden general (como la autonomía de la voluntad en las relaciones de consumo), así como cuestiones específicas o incidentales (tales como los juegos on-line o las compras por subasta virtual).

Los proyectos también dejan claro que existen diferencias valorativas entre la auto-regulación (privilegiada por las propuestas de Estados Unidos y Canadá) y la aplicación de normas públicas (defendida por la propuesta brasilera). Esas diferencias obedecen a los intereses de los países proveedores (tolerantes con la auto-regulación) o las necesidades más inmediatas de los países del hemisferio Sur (carentes de una protección eficiente).

De los tres proyectos, el brasilero fue el único que se presentó como un texto completo, ter-minado, con sólidos fundamentos teóricos29. No posee lagunas ni dificultades interpretativas.

26 Sobre las formas de protección, ver: DE LUCCA, N. O Mercosul e a defesa dos consumidores brasileiros. In: Revista de Direito Mer-cantil, No. 5 (nova serie). São Paulo: Malheiros, 1998, p. 25 y ss.

27 De forma más detallada: ALL, P. M. El diseño y la progresiva construcción de in sistema de protección del consumidor a escala ame-ricana. Avances y desafío pendientes. In: ARROYO, Protección…, cit., p. 239 y ss. Los resultados de la reunión preparatoria para la CIDIP VII de Porto Alegre, El contenido completo de los proyectos, así como comentarios doctrinarios, pueden ser consultados en el sitio: http://www.oas.org/dil/esp/derecho_internacional_privado.htm

28 Los resultados de la reunión preparatoria para la CIDIP VII de Porto Alegre, El contenido completo de los proyectos, así como comen-tarios doctrinarios, pueden ser consultados en el sitio: http://www.oas.org/dil/esp/derecho_internacional_privado.htm

29 Para un estudio en profundidad: LIMA MARQUES, C. Las teorias que se encuentran detrás de la propuesta brasileña em la CIDIP VII

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Fue construido de forma democrática, respetando las particularidades sociales y jurídicas de las Américas. En 2010, a fin de simplificar la propuesta de Convención, las Delegaciones de los Go-biernos de Brasil, Argentina y Paraguay, reunidas en Buenos Aires, re-sistematizaron la versión final de la propuesta brasilera presentada en la OEA, creando una versión simplificada denominada “Propuesta Buenos Aires”30. Algunos artículos fueron transferidos para Protocolos adicionales, de manera que en el texto de la propuesta de Convención figuran solamente los artículos prin-cipales, reorganizados en protección del consumidor pasivo en la contratación a distancia y del consumidor activo o turista31.

No pueden ser hechos los mismos comentarios sobre el Proyecto de Ley Modelo propuesto por Canadá32. En primer lugar, porque se trata de Ley Modelo, mecanismo de reglamentación internacional que siempre despertó cuestionamientos en los círculos académicos. Y las dudas son fundadas, porque la flexibilidad de la Ley Modelo abre las puertas para las adaptaciones nacionales, que pueden, inclusive, llegar a desvirtuar la intención originaria de la Ley Modelo. Eso no ocurriría, por ejemplo, con el proyecto de Convención (propuesta brasilera), ya que el procedimiento previsto de firma, ratificación y publicación garantiza la aplicación obligatoria. El contenido del trabajo también deja margen a dudas sobre su utilidad futura, por ejemplo, en los contratos on-line, que no poseen referencia directa. El punto fuerte del proyecto canadiense, y que podría inclusive convivir con la propuesta brasilera, son los criterios de competencia judicial internacional (del art. 3º hasta el art. 6º). Debido a las dificultades del proyecto y para que las negociaciones se desenvuelvan mejor, Canadá decidió formalmente retirar su propuesta el 18 de octubre de 201033.

La propuesta norteamericana es la más liberal de todas. El sistema inicial, de una Guía Le-gislativa y tres Leyes Modelos, fue actualizado también en 2010. Se conserva la Guía Legislativa, titulada “Guía Legislativa para una Ley Interamericana respecto a la Disponibilidad de Medios de Solución de Controversias y Restitución a favor de los Consumidores”34, que se complementa ahora por cuatro anexos: anexo A, “Ley Modelo para la Solución Electrónica de Controversias Transfronterizas de los Consumidores en el Ámbito del Comercio Electrónico”35; anexo B, “Ley Modelo para la Solución Alternativa de Controversias para Reclamos de los Consumidores por Tarjetas de Pago (Crédito)”36; anexo C, Ley Modelo para Reclamos de Menor Cuantía37; y anexo D, “Ley Modelo de Restitución Gubernamental (incluyendo el nivel transfronterizo)”38. En su conjunto, la propuesta busca ofrecer a los consumidores mecanismos simples y eficientes para sus reclamos. Tal vez la propuesta sea muy ambiciosa para la realidad latinoamericana, ya que

En: FERNANADEZ ARROYO, Protección…, p. 161 a 177.

30 http://www.oas.org/dil/esp/CIDIP-VII_working_doc_cp_simplified_version_final_brazilian_proposal_POR.pdf..

31 En la nota introductoria de la Propuesta de Buenos Aires se explica que “Todos os outros artigos da proposta brasileira final constam da Convenção simplificada e das normas de ajuda (Hilfsnormen), especialmente as definições e regras sobre a aplicação, constantes dos Protocolos I (sobre definições) e II (sobre aplicação da convenção). A Delegação da Argentina propôs regras mínimas sobre jurisdição internacional sob a forma de um Protocolo opcional (III). Todos os Protocolos adicionais facilitam a aplicação da Convenção principal, mas os Estados Partes podem adotar ou não estes protocolos sem prejuízo de adotar a Convenção.”

32 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_canada_propuesta.pdf.

33 Conforme OEA/Ser.G CP/CAJP-2912/10, disponible en: http://www.oas.org/dil/esp/CP-CAJP_2912-10_esp.pdf

34 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_united_states_guia_legislativa.pdf.

35 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_united_states_guia_legislativa_anexo_A.pdf

36 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_united_states_guia_legislativa_anexo_B.pdf.

37 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_united_states_guia_legislativa_anexo_C.pdf.

38 En: http://www.oas.org/dil/esp/CIDIPVII_proteccion_al_consumidor_united_states_guia_legislativa_anexo_D.pdf.

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invita a los Estados miembros de la OEA a modificar radicalmente sus sistemas nacionales de solución de controversias en el ámbito de consumo (por ejemplo, con la Ley Modelo de Arbitraje Electrónico). El ámbito de aplicación material del modelo también es deficitario, porque se centra en el momento de la reclamación del consumidor y en los medios públicos y privados para llevar adelante ese reclamo, sin preocuparse por el Derecho Aplicable o por el juez competente. La téc-nica legislativa se asemeja bastante al sistema canadiense, solo que es aún más flexible, ya que la Guía Legislativa está un grado más abajo de las Leyes Modelos. La eficacia final de un modelo tan flexible es diferente de la realidad latinoamericana, es un verdadero misterio. De cualquier forma, es importante resaltar que la propuesta norteamericana no es contraria a la propuesta brasilera originaria ni a la actual ‘Propuesta Buenos Aires’. En el hipotético y poco probable caso de su utilización por los países latinoamericanos, la Propuesta Buenos Aires podría coexistir con el conjunto de soluciones de la delegación de Estados Unidos.

5.1 BREVE ANÁLISIS DE LA PROPUESTA DE BUENOS AIRES39

La versión simplificada de la propuesta final brasileña, denominada “Propuesta Buenos Aires” ha tratado con especial cuidado del orden público internacional y de las normas imperativas, como demuestran los art. 7 y 12, y el art. 6 del Protocolo Adicional sobre Aplicación de la Convención (II).

El artículo 14 se refiere específicamente al orden público internacional negativo: “Orden público internacional - No se aplicará el derecho designado por esta Convención cuando sea manifiestamente incompatible con el orden público internacional”. El carácter negativo se manifiesta por el rechazo de aquellas normas extranjeras que contradigan los principios fundamentales del ordenamiento nacional. El calificativo ‘internacional’ positiva la distinción que analizamos anteriormente sobre orden público interno y orden público internacional.

La propuesta detalla con precisión la relación de las normas imperativas del foro, del la lex causae, e inclusive viabilizan la aplicación de las normas imperativas de un tercer estado:

Art. 7. Normas internacionalmente imperativas –

1. (Normas imperativas del foro) No obstante lo previsto en los artículos anteriores, se aplicarán necesariamente a favor del consumidor las normas del Estado del foro que tengan carácter internacionalmente imperativo.

2. (Normas imperativas del Estado de domicilio del consumidor) En el caso que la con-tratación hubiera sido precedida en el Estado del domicilio del consumidor por cualquier negociación o actividad de mercadeo (marketing), por parte del proveedor o de sus representantes, en especial el envío de publicidad, correspondencia, e-mails, premios, invitaciones a ofertar y demás actividades semejantes dirigidas a la comercialización de productos y servicios y a la atracción de clientela, si fuera posible se aplicarán las normas internacionalmente imperativas de ese Estado en favor del consumidor, acumulativamente, si fuera posible, con aquellas del foro y del derecho aplicable al contrato de consumo.

39 http://www.oas.org/dil/esp/CIDIP-VII_doc_trabajo_gt_proteccion_consumidor_version_simplificada_brasil.pdf

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El articulo 7 toma como modelo el art. 5 del Convenio de Roma de 1980 y el art. 3.117 del Código Civil de Quebec de 1991, sobre la aplicación de normas imperativas del Estado del domicilio del consumidor, y permite que se apliquen cumulativamente las normas imperativas del foro y de la lex contratus, caso pertenezcan a ordenamientos jurídicos diferentes40. El proyecto no prevé la exclusión del Derecho extranjero declarado aplicable, sino una aplicación cumulativa de las normas imperativas del domicilio del demandado. Para definir aún mejor las restricciones que puedan hacerse sobre el derecho extranjero, el legislador convencional utilizo los art. 8 y 9 del Proyecto como normas explicativas y complementarias sobre aplicación e interpretación del derecho:

Art. 8. Cláusula de corrección material (hard clause) - El derecho indicado como aplicable por esta Convención puede no serlo en casos excepcionales, si, teniendo en vista todas las circunstancias del caso, la conexión con el derecho indicado como aplicable resultara superficial y el caso se encontrara más estrechamente vinculado con otro derecho más favorable al consumidor.

Art. 9. Cláusula de armonización - Las diversas leyes que pueden ser competentes para regular los diferentes aspectos de una misma transacción o relación jurídica serán aplicadas de manera armónica, procurando realizar los fines perseguidos por cada una de las referidas legislaciones, siempre a favor del consumidor.

Para dar mayor claridad al texto, se ha transferido el inc. 2 del Art. 13 de la propuesta IV del Gobierno Brasileño para el Anexo II, ahora como artículo propio:

Art. 6. Normas imperativas del Estado de localización física de los bienes inmuebles utilizados por turnos - Las normas imperativas de protección de los consumidores del Estado en el cual se encuentren localizadas físicamente las instalaciones de esparci-miento y de hotelería que utilicen como método de venta, de uso o habitación el contrato de tiempo compartido y de sistemas semejantes o contratos de utilización por turno de bienes inmuebles, localizados en los Estados Partes, pueden también ser consideradas aplicables acumulativamente a estos contratos, a favor del consumidor.

6 LA UTILIZACIÓN DEL ORDEN PÚBLICO COMO CRITERIO CORRECTOR

La aplicación del principio del Orden Público es la principal herramienta del juez foráneo para dar afectiva protección a los derechos de los consumidores en casos con elementos extranjeros. En este sentido, hay uniformidad por parte de los tribunales de los Estados Partes del Mercosur de defender los consumidores por la utilización del principio, por regla, valiéndose del carácter imperativo de las reglamentaciones nacionales, sin siquiera recurrir al sistema conflictual clásico para analizar el contenido del Derecho extranjero. Es importante destacar que buenas parte de las soluciones referidas anteriormente en el proyecto de la CIDIP VII, y son una realidad jurisprudencia en el Mercosur, y en buena medida, por causa de los tribunales brasileños, que sirvieron como

40 ara un estudio mas detallado: LIMA MARQUES, C. As lições da reunião preparatória de Porto Alegre da Conferência especializada de Direito Internacional Privado – CIDIP VII de Proteção dos consumidores e das negociações posteriores. In: FERNANDEZ ARROYO, Diego; Moreno Rodrigues, José Antonio (Org.). Protección de los Consumidores en América. Trabajos de la CIDIP VII. Asunción: La Ley Paraguaya, 2013, p. 179 e ss.

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186 LA PROTECCIÓN DEL CONSUMIDOR EN EL MERCOSUR

inspiración para los tribunales de los demás Estados Partes. Del amplio repertorio jurisprudencial brasileño, merece especial mención el Caso Panasonic, por ser el leading case latinoamericano en materia de relaciones de consumo internacional y standards mínimos de protección.

6.1 JURISPRUDENCIA FUNDADA EN LAS NORMAS IMPERATIVAS DEL FORO: EL CASO PANASONIC

Es un caso que envuelve un turista brasileño como consumidor activo, el sr. Plínio Garcia, que en junio de 1991 viajó a los Estados Unidos. Cuando estaba em la cidad de Miami, decidió comprar una máquina filmadora de la marca Panasonic, eligiendo un modelos recién lanzado en el mer-cado norteamericano. Al retornar al Brasil, la filmadora comenzó a presentar defectos. Garcia se contacto con Panasonic de Brasil para arreglarla, pero la empresa se nego a reparar el producto porque no era un artículo comercializado en Brasil. Indignado con lo ocurrido, el señor Garcia ingreso con acción judicial contra Panasonic do Brasil Ltda. Perdiendo en primera y segunda instancia, el autor ingreso con Recurso Especial (ante el STJ) quien falló a favor del consumidor, obligando a la filial brasileña a indemnizar al sr. Garcia por los vicios del producto comprado en el exterior, por ser de marca famosa y mundial, como es Panasonic. Si bien el Tribunal no analizo en el mérito de la aplicación del derecho extranjero, en los considerandos del fallo, se lee:

“I. Se a economía globalizada não mais tem fronteiras rígidas e estimula e favorece a livre concorrência, imprescindível que as leis de proteção ao consumidor ganhem maior expressão em sua exegese, na busca de equilibro que deve reger as relações jurídicas, dimensionando-se, inclusive, o fator de risco, inerente à competitividade do comércio e dos negócios mercantis, sobretudo quando em escala internacional, em que presente empresas poderosas, multinacionais, com filiais em vários países, sem falar nas vendas hoje efetuadas pelo processo tecnológico da informática e no forte mercado consumidor que representa o nosso País”.

Em su voto, el ministro Sálvio de Figueiredo, afirmo:

“Tenho para mim que, por estarmos vivendo em uma nova realidade, imposta pela econo-mia globalizada, temos também presente um novo quadro jurídico, sendo imprescindível que haja uma interpretação afinada com essa realidade (...) Não basta, assim, a proteção calcada em limites internos e em diplomas legais tradicionais, quando se sabe que o Código brasileiro de proteção ao consumidor é um dos mais avançados textos legais existentes, diversamente do que se dá, em regra, com o nosso direito privado positivo tradicional (...) Dessa forma, se a economia globalizada não tem fronteiras rígidas e es-timula e favorece a livre concorrência, é preciso que as leis de proteção ao consumidor ganhem maior expressão em sua interpretação, na busca do equilíbrio que deve reger as relações jurídicas, dimensionando-se, inclusive, o fator risco, inerente à competitividade do comércio e dos negócios mercantis, sobretudo quando em escala internacional, em que presentes empresas poderosas, multinacionais, com sucursais em vários países, sem falar nas vendas hoje efetuadas pelo processo tecnológico da informática e do mercado consumidor que representa o nosso País (...)não há como dissociar a imagem da Pana-

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sonic do Brasil da marca internacional Panasonic. Logo, se aquela se beneficia desta e vice-versa, devem uma e outra arcar igualmente com as conseqüências de eventuais deficiências dos produtos que anunciam e comercializam, não sendo razoável que seja o consumidor, a parte mais frágil nessa relação, aquele a suportar as conseqüências negativas da venda feita irregularmente, porque defeituoso o objeto”.

En el mismo la opinión del Ministro Cesar Rocha, para quien la empresa “tem que oferecer algo em contrapartida aos consumidores dessa marca, e o mínimo que disso possa decorrer é o de reparar o dano sofrido por quem compra mercadoria defeituosa, acreditando no produto”. Y por último, el Ministro Ruy Rosado de Aguiar constato que: “Se a Panasonic está em todos os lugares, ela pode prestar serviços em todos os lugares”.

La decisión del caso Panasonic buen podría provenir de tribunales argentinos, paraguayo o uruguayos también. En ese sentido, la doctrina ha afirmado, en relación a la ley 24.240, que sus disposiciones pueden constituir principios que formen parte del orden público internacional41.

6.2 JURISPRUDENCIA FUNDADA EN EL DERECHO DEL MERCOSUR

En la investigación jurisprudencial, nos deparamos con una situación muy especial y poco referida por la doctrina especializada42, que es la utilización de la normativa mercosureña como instrumento de protección de los consumidores. En este sentido, es necesario referirnos en primer lugar a dos importantes antecedentes de los tribunales brasileños.

En dos sentencias del Tribunal de Justiça de Santa Catarina, (TJSC), se utilizo el Protocolo de Santa Maria para apoyar definiciones conceptuales. En el Primer caso, una Apelação Cível sobre43 sobre Ação Monitoria (acción de cobranza sobre titulo ejecutivo que a perdido la calidad de tal), el apelante requería que se lo catalogue como consumidor, para de esta forma invocar “a necessidade da tutela legal ao consumidor, expressa na Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXII, devendo a hi-pótese em questão ser analisada sob o prisma do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o princípio da hipossuficiência foi derrogado pela sentença monocrática e o princípio do ônus da prova se deu em benefício da parte mais forte, no caso, a apelada”.Sin embargo, el tribunal desconsidero la pretensión sobre la calidad de consumidor por “tratar-se de pessoa jurídica que adquiriu produto para comercialização (calçados), não para seu consumo e sim com o escopo de revenda, não sendo, portanto, o destinatário final do produto, não se enquadrando, dessa forma, no conceito do art. 2º da Lei n. 8.078/90 Código de Defesa do Consumidor – CDC”.

En Segundo caso, también una Apelação Civil44 en Proceso de Ejecución, que tenía como objeto el cobro de una duplicata mercantil (titulo de crédito). El ejecutado apelo la decisión de primera instancia alegando, preliminarmente,violación al derecho de defensa por no serle reconocido el carácter de consumidor. Ente ello, el tribunal afirmo que “inexiste […] nos autos a comprovação de

41 Entre otros: IUD, C. Mecanismos de protección ante un acuerdo de prórroga de jurisdicción. Suplemento de Derecho Internacional y de la Integración. In: www.eldial.com, consultado el 18-12-2010; SCHÖTZ, J.C. Los acuerdos de jurisdicción en contratos de consumo interna-cional celebrados por internet. In: Revista de Derecho Comercial y de las Obligaciones. No. 36. Buenos Aires: Lexis Nexis, 2003, p. 44 y ss.

42 Como excepción, podemos mencionar el excelente trabajo de investigación jurisprudencial de: DREIZYN DE KLOR, A., PEROTTI, A. D. El rol de los tribunales nacionales de los Estados Mercosur. Córdoba: Advocatus, 2009.

43 TJSC, 3ª Turma, AC 2002.022015-4/So, rel. Des. Trindade dos Santos, 26.06.2003

44 TJSC, 3ª Turma AC 2003.001897-2/Bl, rel. Des. Trindade dos Santos, 11.09.2003

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que a apelante tenha adquirido os produtos que adquiriu na condição de consumidora final, ou seja, com o intuito de retirá-lo do mercado de consumo, para uso próprio e não para transformá-lo, incre-mentando assim, a sua atividade negocial (art. 2º CDC)”

Em ambas decisiones, o relator Desembargador Trindade dos Santos, para descaracterizar la aplicación del Código de Defesa do Consumidor, considero los termos “Consumidor”, “Forne-cedor” e “Relação de Consumo”, utilizando varias fuentes normativas, entre ellas el Protocolo de Santa Maria, y destaco que “[n]o âmbito do Mercosul, o Protocolo de Santa Maria e seu respec-tivo anexo assim definiram o consumidor e a relação de consumo: a) CONSUMIDOR: É toda a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final em uma relação de consumo ou em função dela. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, determináveis ou não, expostas às relações de consumo. Não se considera consumidor ou usuário aquele que, sem constituir-se em destinatário final, adquire, armazena, utiliza ou consome produtos ou serviços com o fim de integrá-los em processos de produção, transformação, comercialização ou prestação de servi-ços. b) FORNECEDOR: É toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, assim como os entes despersonalizados nos Estados Partes cuja existência esteja contemplada em seu ordenamento jurídico, que desenvolvam de maneira profissional atividades de produção, montagem, criação seguida de execução, construção, transformação, importação, distribuição e comercialização de produtos e/ou serviços em uma relação de consumo.”

En la opinión consultiva 1 de 2007 se ha claramente asentada la posibilidad de aplicar el Poto-colo de Santa María, aún cuando el mismo no se encuentre vigente: “Asimismo, cabe consignar que precisamente el PSM (Protocolo de Santa María) de Relaciones de Consumo a la fecha no internalizado por ningún Estado Parte, solamente puede ser invocado como un marco referencial doctrinario o como soft law dado que aún no se encuentra en vigor. Ricardo Alonso aclara: “La expresión anglosajona soft law caracteriza aquellos instrumentos carentes por si mismos de fuerza vinculante pero no de efectos jurídicos”. 45

Como elemento subsidiario, hay un segundo grupo de sentencias que no tratan del derecho del consumidor pero utilizan sus fundamentos para justificar sus decisiones. En la Argentina, El Caso de Fast Food Sudamericana S.A. (Burger King) La firma Fast Food Sudamericana S.A. (Burger King) fue sancionada por la Dirección Nacional de Comercio Interior por no informar con precisión la calidad, naturaleza y composición del producto “KING de LOMITO” que no se correspondía con el corte vacuno de Lomo46. Recordando los hechos, en Mayo del año 2001, esta autoridad solicitó a la firma Fast Food Sudamericana S.A. (Burger King) toda la publicidad gráfica, radial, televisiva, en Internet y en vía pública del producto “KING DE LOMITO”. Asimismo requirió información sobre el corte de carne que utiliza para tal producto. En cuanto a la publicidad, la empresa adjuntó la totalidad de la misma y resaltó que el rotulado había sido aprobado por SENASA. Respecto a la composición del producto “KING DE LOMITO” manifestó que consiste en un corte de carne sazo-nada, moldeada y congelada, cuya composición porcentual ha sido presentada ante el organismo de control, SENASA. En particular, informó que el producto se elabora en base a trozos de carne vacuna obtenida de tres cortes tipificados como tapa de nalga, tapa de bife y aguja, entendiéndo-

45 Disponble en www.mercosur.int/innovaportal/v/677/1/innova.front/laudos_aclaraciones_y_opiniones_consultivas_de_los_tribunales_del_mercosur.

46 Cf: Disposición D.N.C.I. N° 1217/2003, de fecha 31 de Octubre de 2003.

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se a la denominación lomito como un nombre de fantasía, ya que no existe corte vacuno con tal denominación. Puntualiza que el corte lomo no admite diminutivo, por lo tanto lomito no es un lomo pequeño. Sobre la base de lo expuesto, la autoridad de aplicación procedió a imputar a la firma Fast Food Sudamericana S.A. (Burger King) por una presunta infracción al artículo 9 de la Ley N° 22.802 pues el producto denominado como “KING DE LOMITO” , induciría a error, engaño o confusión respecto de las características, naturaleza, calidad y pureza del producto. Para así decidir esta autoridad entendió que las publicidades, tales como “Ahora tenemos un sándwich de lomito” o “Ahora, Lomito a la Parrilla”, le indicaría al consumidor que se le ofrece un sándwich con carne vacuna del corte LOMO.

En los autos “E.I. Du Pont de Nemours and Company v. Topola S.A. s/cese de oposición al registro de marca”47, la Cámara Nacional Civil y Comercial Federal, Sala 1ª, se manifestó en materia de propiedad Intelectual por enfrentamiento entre dos signos idénticos, ambos regis-trados por distintos titulares en distintas épocas: la actora, en 1988 y la demandada, en 1995, en diferentes clases del nomenclador marcario. Se solicitó extensión de la protección marcaria y se alego, entre otros, “la confusión en el público consumidor por tratarse de copia servil de una marca notoria”. La sentencia de Primera Instancia hizo lugar a la demanda y decretó la nulidad de la marca “Cordura” -n. 1552826- registrada por Topola S.A. y declaró infundadas las oposiciones que la demandada había formulado a las solicitudes presentadas por E.I. Du Pont de Nemours and Company de los signos “Cordura”, “Cordura Naturelle”, “Cordura Cat” y “Cordura Plus”. Topola S.A. apela la sentencia de primera instancia. La Cámara decide “confirmar la sentencia apelada en todo cuanto fue materia de agravios”, y hace referencia específica “al art. 9 (6) del Protocolo de Armonización de Normas sobre Propiedad Intelectual en el MERCOSUR en Materia de marcas, Indi-caciones de Procedencia y Denominaciones de Origen.”

En Paraguay, un fallo del Tribunal de Cuentas (TC), 1ª sala, que trataba específicamente so-bre la Nomenclatura Común del MERCOSUR (NCM)48, Al considerar el decreto que establece las disposiciones técnicas cuya violación dio origen al sumario, el miembro preopinante destacó que dicha norma fue dictada atendiendo a la “necesidad de contar con una reglamentación adecuada que informe al consumidor, acerca de las características de dichos productos” ya que “el consumidor tiene derecho a ser informado suficientemente”. Agregó, a su vez, que si bien el decreto de marras fue aprobado “tomando como base la NCM”, eso “no puede significar de ninguna manera que la nor-ma deba aplicarse única y exclusivamente a los productos nacionales o de los socios del MERCOSUR,

47 Juzgado el juzgado el 24-11-2004, publicado en JA 2005-IV, p. 350 e ss.

48 TC, “Camurel S.A. c/Res. N° 257 de fecha 11/05/01, Dec. por el Ministerio de Industria y Comercio”, sentencia N° 158, 06.10.2003. Ci-tado en el primer Informe del Derecho del Mercosur….. El reclamo se inició a raíz de una inspección del Ministerio de Industria y Comercio (MIC), efectuada en un local perteneciente a una firma dedicada a la comercialización de calzados (Camurel S.A.). En dicha inspección, se detectaron transgresiones a disposiciones técnicas referentes a las mercaderías en cuestión según el control de etiquetados y rotulados establecido en el Decreto N° 18.568/97, por lo que se instruyó sumario administrativo. En su demanda la firma sumariada impugnó la Resolución N° 257/01 del MIC que impuso las sanciones en virtud de las transgresiones mencionadas. En su pretensión alegó, entre otros fundamentos, que dicha resolución violaba el principio de legalidad por no existir reglamentación previa que fijara la gradación de las penas, y que el Decreto N° 18.568/97 «Etiquetado de Prendas de Vestir y Calzados», no estableció pena de ningún tipo. Asimismo, en la declaración indagatoria, el propietario de la firma expresó «que las mercaderías que figuran en el acta tenían etiquetas solamente que con el manoseo de los clientes se habían despegado».El miembro preopinante del TC efectuó un análisis de las normas vigentes que facultan al MIC para efectuar inspecciones y, en su caso, aplicar sanciones. Señaló en este contexto que la actividad del Ministerio es reglada, y que tal reglamentación se halla contenida en la Ley Nº 904/63.204 Asimismo, fue categórico al afirmar que «la pena está establecida en la Ley 904/63 y la infracción al decreto n° 18.568 fue plenamente constatada y reconocida por la parte actora al suscribir el acta y en ocasión de la declaración indagatoria».205 De este modo refutó los argumentos esgrimidos por la actora, inclinándose por la legitimidad de la resolución atacada y, en consecuencia, de las sanciones en ella contenidas. En relación con las manifestaciones vertidas por el propietario de Camurel en la declaración indagatoria, señaló el miembro preopinante que «el hecho de que los calzados hayan perdido sus etiquetas por el excesivo manoseo no resulta creíble, pues esun hecho notorio que las marcas de los calzados normalmente se hallan impresas a relieve o con etiquetas cosidas a los mismos».

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porque ello importaría una violación al principio constitucional de la igualdad”.

En Uruguay, La jurisprudencia uruguaya también ha relacionados en varios fallos la utilizado la protección del consumidor y el derecho del Mercosur. A título de ejemplo, podemos citar la causa Industrial de Tabacos Monte Paz S. A. c/ Ministerio de Industria, Energía y Minería s/acción de nulidad49. El pedido de nulidad efectuado por la tabacalera Monte Paz contra la resolución DNPI que otorgó el registro de la marca CORONA solicitada por la cadena Supermercados Disco del Uruguay S. A. para las clases internacionales (int.) 35 y 36. La actora funda su pedido en que es fabricante de artículos de la clase int. 34 con su marca CORONADO, inscripta también en la clase 35. Aduce que es notoria la similitud de su marca con la marca otorgada por la resolución que se impugna, presumiendo la existencia de concurrencia desleal.

El tribunal fundamento su decisión en los términos de los artículos 5, 6 y 7 de la ley Nº 17011, y normas relacionadas de las convenciones internacionales vigentes en el ámbito del MERCOSUR y de la Organización Mundial de la Propiedad Industrial. Hizo especial referencia a la Ley 17052, Protocolo de Armonización de Normas sobre Propiedad Intelectual en Materia de Marcas, Indica-ciones de Procedencia y Denominaciones de Origen, 1.12.1998 (DO, 8.1.1999), artículo 9, inciso 6: “Marcas irregistrables [...] Los Estados partes asegurarán en su territorio la protección de las marcas de los nacionales de los Estados partes que hayan alcanzado un grado de conocimiento excepcional contra su reproducción o imitación, en cualquier ramo de actividad, siempre que haya posibilidad de perjuicio”. Y entre otros aspectos, destaco que “en relación a la clase int. 35, parece claro que los signos en pugna no pueden coexistir [...] porque entre la marca prerregistrada CORONADO y la soli-citada CORONA existen evidentes semejanzas gráficas, fonéticas y conceptuales que pueden inducir a confusión al consumidor medio, en relación con artículos o servicios de la misma clase, no dándose la condición o requisito esencial que impone el artículo 6º de la ley Nº 17011, cuando dice: “[...] las marcas deberán ser claramente diferentes a las que se hallen inscriptas”. (griffo nosso)50

Como evaluación final, verificamos que todas las decisiones tienen un punto en común. Las dificultades de los casos en concreto fueron resueltas teniéndose en cuenta las exigencias im-puestas por la protección del consumidor y la equidad. Si bien es cierto que el principio del orden público, sean nacional o internacional, no es referido de forma expresa por los jueces en sus decisiones, no restan dudas de que este principio tal y como se lo presenta en el Proyecto para la CIDIP VII ya es una realidad jurisprudencia en los tribunales del Mercosur. Y más, los jueces no solo se preocupan en la ‘protección del consumidor’ si no que lo hacen con especial cuidado y referencia al ámbito de integración mercosureña.

7 BIBLIOGRAFÍA

ALL, María Paula. El diseño y la progresiva construcción de in sistema de protección del con-

49 TCA, Compañía Industrial de Tabacos Monte Paz S. A. c/ Ministerio de Industria, Energía y Minería s/acción de nulidad, ficha Nº 592/02, sentencia Nº 327, 27.6.2005. Publicado en el tercer informe sobre la aplicación del Derecho del Mercosur por los Tribunales Nacionales (2005) Disponible en: http://www.mercosur.int/innovaportal/file/2179/1/tercer_informe_final.pdf,.

50 “Por el contrario, entiende que no existe impedimento legal para negar el registro en la clase int. 36 a la marca impugnada, en razón de que la accionante no tiene inscripto ningún producto en ella. En ese sentido, subraya que según el principio de especialidad —artículo 11 de la ley Nº 17011— los derechos del propietario de una marca están limitados exclusivamente a los productos o servicios para los cuales se solicitó el registro respectivo. Por ello, concluye que no se puede anular el registro solicitado para la clase int. 36. Finalmente, resuelve anular la resolución DNPI impugnada en cuanto concedió el registro de la marca CORONA para la clase int. 35, confirmándola en lo demás.”

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ATITUDE nº 19