construção de um sistema de avaliação do relacionamento parental

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CONSTRUÇÃO DE UM SISTEMA DE AVALIAÇÃO DO RELACIONAMENTO PARENTAL PARA SITUAÇÕES DE DISPUTA DE GUARDA Vivian de Medeiros Lago Tese de Doutorado Porto Alegre/RS, 2012.

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CONSTRUÇÃO DE UM SISTEMA DE AVALIAÇÃO DO RELACIONAMENTO

PARENTAL PARA SITUAÇÕES DE DISPUTA DE GUARDA

Vivian de Medeiros Lago

Tese de Doutorado

Porto Alegre/RS, 2012.

CONSTRUÇÃO DE UM SISTEMA DE AVALIAÇÃO DO RELACIONAMENTO

PARENTAL PARA SITUAÇÕES DE DISPUTA DE GUARDA

Vivian de Medeiros Lago

Tese de doutorado apresentada como requisito parcial

para obtenção do Grau de Doutor em Psicologia

sob Orientação da Profa. Dra. Denise Ruschel Bandeira

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Instituto de Psicologia

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Porto Alegre, janeiro de 2012.

A todas as famílias, nas suas mais diferentes

configurações. Aos pais e às mães que

verdadeiramente amam seus filhos e se esforçam

para oferecer-lhes o melhor.

À minha avó Maria Ângela Marchese de Medeiros

In Memoriam

AGRADECIMENTOS

A trajetória dos quatro anos do doutorado incluiu momentos de alegria e de

decepção; de angústia e de realização; de dúvidas e de muita satisfação. Assim, as

próximas páginas são de agradecimentos àquelas pessoas que acompanharam essa

caminhada, oferecendo diferentes tipos de apoio e acreditando no trabalho desenvolvido.

Ao meu esposo, Junior, meu parceiro de vida. Obrigada por todo amor, toda

dedicação e o imenso companheirismo ao longo dessa trajetória acadêmica.

À minha mãe, Silvia, pelo apoio à realização dos meus sonhos, pela dedicação e por

todos os ensinamentos transmitidos, por meio de palavras e de atitudes.

Às minhas irmãs Simone, Silvane e Anelise: com vocês aprendo constantemente a

aceitar o diferente e tirar o melhor proveito dessas diferenças.

Ao meu pai Victor Hugo, ao Elias (Carioca), ao André e ao Veríssimo, por me

permitirem conviver com diferentes formas de ser pai e de se relacionar com seus filhos.

À Eliane, aos meus irmãos Lara e Victor Hugo, à Lívia e ao Guilherme, com quem

aprendi um jeito novo de ser família.

À família do meu esposo, especialmente ao Seu Valdir, pelo carinho e admiração.

À minha orientadora, Dra. Denise Ruschel Bandeira, por acreditar no meu projeto e

por contribuir para que o mesmo se tornasse viável. Os questionamentos surgidos

impulsionaram ideias e enriqueceram nosso trabalho, propiciando-nos um desafio mútuo.

À Claire Nee, minha orientadora em Portsmouth, pela calorosa acolhida, por toda a

preocupação com meu aprendizado e minha estada na Inglaterra. “Fantastic!”.

À Jane Heath, que não mediu esforços para que eu conhecesse mais sobre o Children

and Family Court Advisory and Support Service (CAFCASS).

A todos os assistentes sociais do FADS (Family Assessment and Development

Service), pelas entrevistas concedidas e por todas as contribuições que fizeram a partir de

suas experiências profissionais. Um agradecimento especial a Tracy, pela amizade

construída e por me apresentar a vários costumes ingleses.

Às “amigas internacionais” Lara, Jackie e Isolde, pela acolhida, pelo carinho, pelos

passeios, as risadas e o aprendizado conjunto. Foi muito bom conhecê-las!

Às alunas de graduação Patrícia, Diésica e Bruna, que compartilharam das minhas

angústias e dúvidas, auxiliando não apenas com entrevistas, transcrições e leituras, mas

também impulsionando minha motivação em momentos difíceis do doutorado.

À Eriane, pelo breve e descontraído período em que trabalhamos juntas.

À Sonia Rovinski, pelo exemplo de profissional competente, ética e disponível para

transmitir seu grande conhecimento. Obrigada por todo o auxílio, direto ou indireto, na

construção desta tese.

À Adriana Wagner e à Paula Gomide, pelas contribuições apontadas desde a

qualificação do projeto, que enriqueceram o desenvolvimento da tese.

A todos os alunos com quem convivi ao longo desses quatro anos, em aulas da

graduação e pós-graduação, em Porto Alegre e no Brasil afora. Aprendi muito com vocês,

não apenas do conteúdo em si das disciplinas, mas também da relação professor-aluno.

Aos colegas do grupo de pesquisa, com quem aprendi muito sobre avaliação

psicológica e também sobre convivência em grupo. Foi muito bom trocar experiências e

compartilhar tantos momentos importantes com vocês!

Às amigas e amigos: Lenise Nascimento, Cátula Pelisoli, Denise Yates, Sérgio

Oliveira, Wagner Machado, Nelson Hauck Filho e Jefferson Krug, por toda a ajuda com

leituras, críticas, discussões e sugestões sobre a tese. Obrigada pelo carinho e atenção!

Às amigas companheiras, que estando perto ou longe, acompanharam minha

trajetória, sempre oferecendo apoio e carinho: Adriane Arteche, Adriana Serafini, Algaídes

Rodrigues, Ana Celina Albornoz, Ana Paula Souza, Ana Paula Freitas, Elisa Roitman,

Jaque Gruppelli, Joice Segabinazi, Josiane Pawlowski, Helena Christ, Maiana Rodrigues,

Raquel Lima. Agradeço também aos amigos Marcelo Santos e Rafael Wellausen, e ao meu

cunhado Silvio Oliveira.

Ao Brandel, pelos desenhos maravilhosos que abrilhantaram o Meu Amigo de Papel.

À Andréia Schneider, Gabriela Kilian e Liara Kruger pelo tempo e dedicação

despendidos com as avaliações, e por todas as contribuições para a Escala SARP.

Às famílias participantes da pesquisa, por permitirem que suas histórias se tornassem

objeto de estudo, contribuindo para o aprimoramento do sistema de avaliação construído.

À Universidade Federal do Rio Grande do Sul e aos professores do PPG em

Psicologia pela excelência da instituição.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pela oportunidade

de dedicação exclusiva ao doutorado.

A todos que, embora não tenham sido mencionados diretamente, apoiaram meu

trabalho e torceram para que “tudo desse certo”!

“É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã Porque se você parar pra pensar, na verdade não há.

Sou uma gota d'água, sou um grão de areia. Você me diz que seus pais não te entendem,

Mas você não entende seus pais”.

Dado Villa Lobos, Renato Russo e Marcelo Bonfá

SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS ............................................................................................ 11

LISTA DE FIGURAS............................................................................................. 12

LISTA DE SIGLAS................................................................................................ 13

Resumo .............................................................................................................. 14

Abstract .............................................................................................................. 15

APRESENTAÇÃO ................................................................................................. 16

SEÇÃO I ................................................................................................................ 18

Concepções acerca do Relacionamento Parental ..................................................... 18

Capítulo 1 ........................................................................................................... 18

O Relacionamento Parental em situações de disputa de guarda: revisão sistemática

.................................................................................................................................... 18

Resumo .............................................................................................................. 19

Abstract .............................................................................................................. 20

Introdução .......................................................................................................... 21

Método .................................................................. Erro! Indicador não definido.

Resultados ............................................................. Erro! Indicador não definido.

Discussão .............................................................. Erro! Indicador não definido.

Referências ......................................................................................................... 35

SEÇÃO I ................................................................................................................ 38

Concepções acerca do Relacionamento Parental ..................................................... 38

Capítulo 2 ........................................................................................................... 38

O Relacionamento Parental sob diferentes perspectivas ...................................... 38

no contexto de disputa de guarda ........................................................................ 38

Resumo .............................................................................................................. 39

Abstract .............................................................................................................. 40

Introdução .......................................................................................................... 41

Método ............................................................................................................... 46

Participantes ....................................................................................................... 46

Instrumento......................................................................................................... 47

Procedimentos .................................................................................................... 47

Resultados .......................................................................................................... 48

Discussão ........................................................................................................... 54

Considerações Finais .......................................................................................... 57

Referências ......................................................................................................... 58

SEÇÃO II ............................................................................................................... 62

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental .......................... 62

SEÇÃO II ............................................................................................................... 65

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental .......................... 65

Capítulo 3 ........................................................................................................... 65

Construção da Entrevista SARP .......................................................................... 65

Método ............................................................................................................... 65

Participantes ....................................................................................................... 65

Procedimentos .................................................................................................... 66

Instrumento......................................................................................................... 66

Resultados e Discussão ....................................................................................... 66

Considerações finais ........................................................................................... 74

SEÇÃO II ............................................................................................................... 75

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental .......................... 75

Capítulo 4 ........................................................................................................... 75

Adaptação do Protocolo de Avaliação Infantil “Meu Amigo de Papel” ............... 75

Caracterização das etapas de adaptação do instrumento....................................... 77

Descrição do material ......................................................................................... 80

Considerações Finais .......................................................................................... 86

SEÇÃO II ............................................................................................................... 87

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental .......................... 87

Capítulo 5 ........................................................................................................... 87

Construção da Escala SARP ............................................................................... 87

Caracterização das etapas de construção da Escala SARP ................................... 88

Considerações Finais ........................................................................................ 103

SEÇÃO III............................................................................................................ 104

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental ....... 104

Capítulo 6 ......................................................................................................... 104

Evidências de fidedignidade entre juízes da Escala SARP ................................. 104

Método ............................................................................................................. 104

Participantes ..................................................................................................... 104

Instrumento e Procedimentos ............................................................................ 104

Resultados e discussão ...................................................................................... 106

Considerações Finais ........................................................................................ 113

SEÇÃO III............................................................................................................ 115

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental ....... 115

Capítulo 7 ......................................................................................................... 115

Evidências de validade clínica do Sistema de Avaliação ................................... 115

do Relacionamento Parental .............................................................................. 115

Método ............................................................................................................. 115

Participantes ..................................................................................................... 115

Instrumentos ..................................................................................................... 116

Delineamento e procedimentos ......................................................................... 117

Resultados ........................................................................................................ 118

Discussão ......................................................................................................... 137

Considerações Finais ........................................................................................ 143

SEÇÃO III............................................................................................................ 144

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental ....... 144

Capítulo 8 ......................................................................................................... 144

Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental (SARP) ......... 144

em uma perícia psicológica de disputa de guarda .............................................. 144

Método ............................................................................................................. 144

Participantes ..................................................................................................... 144

Instrumento....................................................................................................... 145

Procedimentos .................................................................................................. 145

Resultados e Discussão ..................................................................................... 145

Considerações Finais ........................................................................................ 158

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 159

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 161

Anexo A – Aprovação do Comitê de Ética da UFRGS .......................................... 169

Anexo B – Entrevista para psicólogos terapeutas de família .................................. 170

Anexo C – Entrevista para os genitores ................................................................. 171

Anexo D – Entrevista para as crianças .................................................................. 172

Anexo E – Entrevista para os Operadores do Direito ............................................. 173

Anexo F – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido do Estudo Empírico ...... 174

sobre Relacionamento Parental ............................................................................. 174

Anexo G – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ..................................... 175

da Construção da Entrevista SARP ....................................................................... 175

Anexo H - Versão Inicial da Entrevista SARP ...................................................... 176

Anexo I – Versão final da Entrevista SARP .......................................................... 178

Anexo J – Livreto de apresentação do profissional ................................................ 182

Anexo K – Meu Amigo de Papel .......................................................................... 183

Anexo L – Escala SARP ....................................................................................... 184

Anexo M – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para Estudos de Caso ... 188

11

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Informações das Categorias de Análise de um a cinco, com Indicação dos Títulos

e Autores dos Artigos (n=8) .................................................................................................21

Tabela 2. Dimensões do Relacionamento Parental Apresentadas em cada Artigo..............25

Tabela 3. Eixos e Componentes do Relacionamento Parental Derivados da Revisão

Sistemática da Literatura...................................................................................................... 89

Tabela 4. Eixos e Componentes do Relacionamento Parental Derivados do Estudo

Empírico ...............................................................................................................................90

Tabela 5. Levantamento das Dimensões dos Instrumentos Apresentados na Revisão

Sistemática de Lago et al. (2010) .........................................................................................91

Tabela 6. Componentes dos Instrumentos da Revisão Sistemática de Lago et al. (2010),

Complementares às Etapas I e II, Organizados sob Três Eixos Centrais .............................93

Tabela 7. Eixos, Dimensões e Itens da Escala SARP.......................................................... 94

Tabela 8. Sumário do Resultado da Medida de Concordância entre J1-J2, J1-J3, J2-J3 e J1-

J2-J3 das Questões da Escala SARP (n=6)........................................................................106

Tabela 9. Interpretação do Kappa para as Questões da Escala SARP...............................110

Tabela 10. Coeficiente de Correlação Intraclasse das Pontuações das Juízas para as

Dimensões da Escala SARP (n=6).....................................................................................113

Tabela 11. Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 1.............................................................................123

Tabela 12. Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 2, para o Filho Nicolas..........................................130

Tabela 13. Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 2, para a Filha Manuela.........................................131

Tabela 14. Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 3.............................................................................136

Tabela 15. Resultados das Práticas Educativas e das Dimensões da Escala SARP para os

Genitores............................................................................................................................138

12

LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Dimensões do Relacionamento Parental, Levantadas a partir desta Revisão

Sistemática............................................................................................................................33

Figura 2. Genograma da Família 1.....................................................................................119

Figura 3. Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 1............................................................................................................................123

Figura 4. Genograma da Família 2.....................................................................................124

Figura 5. Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 2...........................................................................................................................130

Figura 6. Genograma da Família 3..................................................................................... 132

Figura 7. Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 3.............................................................................................................................135

Figura 8. Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para Helena e

Raquel.................................................................................................................................156

13

LISTA DE SIGLAS

CAFCASS - Children and Family Court Advisory and Support Service

FADS - Family Assessment and Development Service

FAT – Family Aperception Test

iep – Índice de estilos parentais

IEP – Inventário de Estilos Parentais

SARP – Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

14

Resumo

A Psicologia Jurídica é uma área incipiente no Brasil, em que os estudos científicos e a

construção e/ou adaptação de instrumentos são necessários, almejando estreitar os laços

entre a Psicologia e o Direito. O objetivo desta tese foi o de construir um Sistema de

Avaliação do Relacionamento Parental (SARP) para uso no contexto forense de disputa de

guarda. Para tanto, inicialmente, foram desenvolvidos um estudo teórico e um estudo

empírico acerca do relacionamento parental. O estudo teórico consistiu em uma revisão

sistemática sobre os temas divórcio, guarda dos filhos e relação pais-filhos. O estudo

empírico contou com a participação de genitores, crianças (7 a 12 anos), psicólogos e

Operadores do Direito que atuam na área de família. As questões das entrevistas

objetivaram definir o relacionamento parental, a partir de diferentes perspectivas: pessoais

e profissionais. Após a definição do sistema psicológico relacionamento parental,

procedeu-se à realização dos estudos de construção das técnicas que compõem o sistema,

que são: Entrevista SARP, protocolo de avaliação infantil e Escala SARP. O estudo para

construção da entrevista contou com a participação de assistentes sociais do Reino Unido e

de psicólogos brasileiros, que avaliaram as questões quanto à sua relevância e adequação.

O protocolo de avaliação infantil, nomeado Meu Amigo de Papel, foi adaptado a partir do

material britânico My needs, wishes and feelings pack, sendo proposta uma nova estrutura

de atividades e de arte gráfica. O estudo da construção da Escala SARP foi composto por

três etapas, as quais abrangeram levantamentos teóricos e empíricos a fim de delimitar as

dimensões e itens que compuseram a escala. Uma vez construído o SARP, iniciou-se seu

processo de validação. A primeira etapa consistiu na busca de evidências de fidedignidade

entre juízes. Duas psicólogas e uma assistente social foram as juízas do instrumento,

pontuando, às cegas, a escala. Esse estudo apontou a necessidade de ajustes em alguns

itens da Escala SARP. A segunda etapa objetivou apresentar evidências de validade

clínica. Além do SARP, foi utilizado o Inventário de Estilos Parentais com os genitores, e

o Teste de Apercepção Familiar ou o Método de Rorschach com as crianças, com o

propósito de evidenciar a congruência interna, externa e teórica do instrumento. Por fim, o

SARP foi utilizado em uma situação de perícia de disputa de guarda, mostrando sua

aplicabilidade e relevância no contexto da avaliação psicológica forense.

Palavras-chave: Psicologia Forense; Avaliação Psicológica; Guarda da Criança; Relações

Familiares

15

Abstract

Forensic Psychology is a growing area in Brazil, in which scientific studies and

construction or adaptation of instruments are necessary, in order to narrow the ties between

Psychology and Law. This doctoral dissertation aimed at constructing an Evaluation

System of the Parental Relationship for the forensic context of child custody dispute.

Initially, a theoretical and an empirical studies were carried out, in order to define the

construct parental relationship. The theoretical study consisted of a systematic review

about divorce, child custody and parent-child relations. Parents, children (7 to 12 years

old), psychologists and Law practitioners participated in the empirical study. The questions

of the interviews aimed at defining the parental relationship from personal and professional

perspectives. After defining parental relationship, studies for the construction of the system

itself were carried out. The Evaluation System of the Parental Relationship (ESPR)

consists of an interview, an assessment protocol for the children, and a scale which is

scored by the own examiner. Social workers from the United Kingdom and psychologists

from Brazil evaluated the questions of the interview in what concerns to their relevance

and adequacy. The assessment protocol for children, named My Paper Friend, was adapted

from the British material My needs, wishes and feelings pack, with a new structure of

activities and layout being proposed. The study of the construction of the scale was

composed by three phases, which comprise theoretical and empirical components with the

purpose of delimiting the dimensions and items that formed the scale. Once it was

constructed, the validation process started. The first step consisted of searching evidences

of reliability between judges. Two psychologists and one social worker were the expert

scorers of the instrument, scoring the scale blindfolded. This study pointed out the need of

adjustments in some items of the ESPR Scale. The second step aimed at presenting clinical

validity evidences. Besides the ESPR, the Parental Styles Inventory and the Family

Apperception Test or Rorschach Inkblot Method were used, with the parents and children,

respectively. It has the purpose of evidencing internal, external and theoretical

congruence. Lastly, the ESPR was used in a child custody dispute evaluation, showing its

importance in the context of forensic psychological assessment.

Keywords: Forensic Psychology, Psychological assessment; Child custody; Parent-child

relations

16

APRESENTAÇÃO

As relações entre a Psicologia e a Justiça apresentam-se cada vez mais próximas,

com a crescente demanda do Judiciário por avaliações que auxiliem na tomada de decisão

dos juízes. As perícias no contexto de disputa de guarda são comumente realizadas por

psicólogos, assistentes sociais e, eventualmente, psiquiatras. Esses profissionais utilizam-se

de técnicas como entrevistas, observações clínicas e testes, no caso dos psicólogos, para

avaliar a dinâmica familiar envolvida. Os resultados obtidos por meio de suas avaliações

são relatados nos laudos periciais, os quais são muitas vezes utilizados pelos Operadores

do Direito para fundamentar suas peças processuais.

Nos Estados Unidos e países da Europa existem instrumentos de avaliação que foram

delineados especificamente para o contexto de disputa judicial de guarda. Entretanto, esses

instrumentos são alvo de muitas críticas, visto a dificuldade em mensurar competências

parentais ou relacionamentos familiares. Ademais, as diferenças no Sistema Judiciário

entre os países são outro fator que contribui para as apreciações negativas sobre os

instrumentos criados para avaliação de situações de disputa de guarda.

Embora existam críticas, resta evidente a importância de instrumentos de avaliação

específicos para esse contexto, a fim de uniformizar os procedimentos e facilitar a

comunicação entre profissionais da área da saúde mental e Operadores do Direito. Visando

a atender a essa demanda, a presente tese teve como objetivo construir um Sistema de

Avaliação do Relacionamento Parental, para uso em avaliações de disputa de guarda. O

referido sistema consiste num conjunto de técnicas, aplicadas a pais e filhos, cujas

informações são sistematizadas em uma escala. As dimensões dessa escala avaliam

atributos do construto relacionamento parental, aqui definido como “a capacidade dos

genitores de atender às necessidades de afeto, cuidados, proteção, educação, lazer e

segurança dos filhos”.

A tese está organizada em três seções, destinadas à delimitação do construto

relacionamento parental, à caracterização da construção do Sistema de Avaliação do

Relacionamento Parental (SARP), e à validação e aplicação do sistema de avaliação. Os

dois primeiros capítulos que compõem a seção I consistem em uma revisão sistemática e

um estudo empírico, ambos acerca do relacionamento parental no contexto de disputa de

guarda. Esses capítulos estão apresentados sob a forma de artigos científicos, com suas

17

referências citadas ao final das considerações finais. A seção II está composta por três

capítulos, os quais descrevem cada uma das técnicas que integram o Sistema de Avaliação

do Relacionamento Parental: a entrevista semiestruturada para os genitores, o protocolo de

avaliação infantil para crianças de 5 a 12 anos, e a escala, pontuada pelo próprio

examinador. A seção III tem como objetivo demonstrar a validação e aplicação do SARP, e

está composta por três capítulos. O primeiro objetiva apresentar evidências de

fidedignidade entre juízes da Escala SARP. O segundo apresenta evidências de validade

clínica do SARP, a partir de um estudo de caráter qualitativo exploratório com três

famílias. O último capítulo descreve um caso em que o SARP foi utilizado numa situação

de perícia psicológica de disputa de guarda. As seções II e III integrarão futuramente o

manual do SARP e, portanto, suas referências estão apresentadas, em conjunto, ao final do

capítulo 8.

O projeto desta tese recebeu a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do

Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob protocolo n◦

2009062 (Anexo A). Deste modo, todos os participantes (profissionais ou famílias) dos

estudos empíricos assinaram os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido.

18

SEÇÃO I

Concepções acerca do Relacionamento Parental

Capítulo 1

O Relacionamento Parental em situações de disputa de guarda: revisão sistemática

Vivian de Medeiros Lago

Denise Ruschel Bandeira

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

19

Resumo

Em situações de divórcio, os profissionais da área da saúde mental são frequentemente

solicitados a realizar avaliações para auxiliar juízes na decisão sobre a guarda dos filhos.

Uma das questões norteadoras para essas avaliações é a qualidade da relação pais-filhos.

Com o objetivo de identificar os aspectos do relacionamento parental relevantes para esse

processo, foi realizada uma revisão sistemática. Foram combinados os termos “divórcio”,

“guarda de filhos” e “relação pais-filhos”. Os resultados apontaram um total de oito artigos

analisados, a partir dos quais emergiram dimensões do relacionamento parental tais como:

envolvimento nas atividades diárias do filho, cuidados básicos, orientação, disciplina,

coparentalidade, educação, sustento financeiro e lazer. O presente artigo pretende oferecer

diretrizes sobre o que deve ser considerado no momento de fazer uma recomendação de

quem deverá ficar com a guarda, ou o tipo de guarda e sistema de visitas.

Palavras-chaves: relação pais-criança; divórcio; custódia da criança; avaliação psicológica

20

Abstract

Professionals of mental health are frequently asked to conduct psychological assessments

to assist judges in child custody proceedings. One of the guiding questions for this type of

assessment is the quality of parent-child relations. A systematic review was carried out,

aiming at identifying relevant aspects of the parent-child relations for this process,

combining the terms “divorce”, “child custody” and “parent-child relations”. The results

pointed out a total of eight papers analysed, from which the following dimensions

emerged: daily involvement in the child’s activities, basic care, guidance, discipline,

coparental responsibilities, education, financial support and leisure. The present paper

intends to provide guidelines about what should be considered at the moment of making a

recommendation of who should have the child custody, the type of custody and visit’s

schedule.

Keywords: parent-child relations, divorce, child custody, psychological assessment

21

Introdução

Em situações de divórcio, tem se revelado frequente a solicitação de avaliações a

profissionais da área da saúde mental, com a finalidade de fazer recomendações sobre a

guarda dos filhos. Nesses casos, psicólogos, assistentes sociais e psiquiatras contribuem

com seu conhecimento na avaliação do nível de conflito parental, das relações pais-filhos,

do funcionamento parental, e das necessidades desenvolvimentais, sociais, emocionais e

educacionais dos filhos (Saini, 2008).

Estudos apontam que os juízes seguem as recomendações dos profissionais de

saúde mental em mais de 90% dos casos (Ash & Guyer, 1984; Baerger, Galatzer-Levy,

Gould, & Nye, 2002; Caplan & Wilson, 1990; Johnston, 1994). Tal fato reforça a

importância do papel do avaliador e suas consequentes recomendações. O processo de

avaliação em situação de disputa de guarda é bastante desafiador, pois pode envolver

alegações de abuso físico, sexual e emocional, violência doméstica, abuso de substâncias,

doenças mentais e situações de alienação parental (Mason & Quirk, 1997). Além de um

conhecimento acerca desses temas, é importante que o profissional que realiza avaliações

para a área forense possa estar preparado para ter sua credibilidade contestada pelas partes

no processo e pelos operadores do Direito. Portanto, sempre que possível, é importante

apresentar fundamentações teóricas e empíricas em seus documentos (Bow & Quinnell,

2001).

O padrão legal dominante atualmente para a determinação da guarda de filhos é o

do melhor interesse da criança. Contudo, não existe uma definição precisa do que vem a

ser esse melhor interesse. Hall, Pulver e Cooley (1996) analisaram diferentes estatutos

americanos relacionados à concessão da guarda e observaram que os critérios mais

comumente utilizados incluem o desejo da criança, interação observada e relacionamento

da criança com pais e outras partes, e história de abuso infantil. A Associação

Americana de Psicologia estabeleceu diretrizes para as avaliações de guarda dos filhos,

entre as quais estão capacidade de paternagem, necessidades psicológicas e

desenvolvimentais da criança e a adequação entre essas necessidades dos filhos e as

capacidades dos genitores (APA, 1994). A Associação das Cortes de Família e Conciliação

encoraja os profissionais a examinarem áreas como a qualidade das relações parentais e a

violência doméstica (AFCC, n.d.). A legislação brasileira, em seu artigo 1.583 do Código

22

Civil faz referência à necessidade do genitor guardião de estar apto a propiciar aos filhos

afeto, saúde, segurança e educação.

O tema da guarda dos filhos é complexo e provavelmente uma das avaliações

forenses mais difíceis de serem realizadas devido ao conhecimento exigido, pois o

avaliador deve ser especialista em saúde mental adulta, psicopatologia da infância,

desenvolvimento infantil e práticas de paternagem (Huss, 2011). Os dados da pesquisa

realizada no Brasil por Lago e Bandeira (2008) apontaram como questão norteadora para

uma recomendação de guarda o relacionamento parental, construto que abarca as áreas

mencionadas por Huss (2011). Assim sendo, o presente artigo justifica-se pela necessidade

de buscar diretrizes, a partir de uma revisão sistemática, para definir o relacionamento

pais-filhos. Seu objetivo é, portanto, levantar as dimensões do relacionamento parental

avaliadas em situações de determinação de guarda a partir de uma revisão de literatura

acerca dos temas divόrcio, guarda dos filhos e relação pais-filhos. Por meio da análise de

artigos científicos atuais e relacionados a esses temas, pretende-se identificar os aspectos

do relacionamento parental que teóricos e pesquisadores consideram relevantes no

processo de determinação de guarda de uma criança ou adolescente. Os resultados

levantados a partir deste estudo servirão de subsídios para as avaliações de profissionais da

área da saúde mental que trabalham com situações de disputa de guarda e/ou

regulamentação de visitas.

Método

Para a realização da presente revisão sistemática, as seguintes etapas foram

seguidas: 1) identificação de indexadores para os assuntos “divórcio”, “guarda dos filhos”

e “relação pais-filhos”; 2) definição dos critérios de inclusão e exclusão de artigos; 3)

seleção dos estudos com base nos referidos critérios: 4) definição das categorias de análise;

5) levantamento e organização dos dados de acordo com as categorias de análise pré-

definidas; 6) análise dos objetivos, instrumentos e resultados de cada artigo para definição

das dimensões do construto relacionamento parental.

A busca eletrônica de artigos indexados foi realizada nas bases de dados Medline e

PsycInfo, a partir do site da biblioteca da Universidade de Portsmouth, Reino Unido. O

primeiro procedimento utilizado foi definir os termos que seriam empregados na busca.

Para tanto, foi utilizada a ferramenta de busca de indexadores (thesaurus) das referidas

23

bases de dados. O resultado deste procedimento indicou, para o assunto “divórcio”, os

termos: “divorc*”, “separation” e “remarriage”. Para o tópico “guarda dos filhos”, foram

escolhidas as palavras “child custody” e “legal processes”. Por fim, para o assunto “relação

pais-filhos”, foram selecionados os termos “parent child relations”, “family relations” e

“parenting”. A pesquisa foi realizada em janeiro de 2011, incluindo o período de 2000 a

2010, buscando apenas artigos científicos escritos na língua inglesa. Os temas: divórcio

(divorc* ou separation ou remarriage), guarda de filhos (child custody ou legal processes)

e relação pais-filhos (parent child relations ou family relations ou parenting) foram

definidos como palavras-chaves e combinados com o operador lógico booleano “and”.

Com o objetivo de buscar artigos brasileiros, o referido procedimento foi aplicado

também para consulta à base de dados Index Psi, a partir do site da Biblioteca Virtual em

Saúde da Psicologia (BVS-PSI). Inicialmente foi pesquisada a terminologia equivalente em

língua portuguesa na BVS-PSI. Foram definidos, assim, os temas: divórcio (divórcio ou

separação ou recasamento), guarda de filhos (custódia da criança) e relação pais-filhos

(relações pais-filho ou relações familiares ou parentalidade) no campo “palavras”,

combinado com o operador lógico booleano “and”.

Foram considerados critérios de inclusão: a) artigo científico; b) resultante de

trabalho teórico ou empírico; c) que discorra sobre o relacionamento pais-filhos no

contexto de divórcio/determinação de guarda. Foi definido ainda que seriam excluídos da

presente revisão os resumos de artigos cujos enfoques fossem violência doméstica, abuso

sexual, mediação e pagamento de pensão alimentícia. Ainda que esses temas possuam

relação com situações de divórcio e guarda dos filhos, incluí-los nesta discussão tornaria a

revisão muito abrangente e impediria uma análise mais específica dos aspectos do

relacionamento parental.

Com o objetivo de sistematizar os dados dos artigos selecionados, foram definidas

a priori as seguintes categorias de análise: 1) base de dados; 2) ano de publicação; 3) país

onde foi realizado o estudo; 4) tipo de produção: revisão teórica ou estudo empírico; 5)

objetivo do estudo 6) método utilizado: quantitativo e/ou qualitativo; 7) amostra utilizada;

8) instrumentos usados para levantamento das informações e 9) dimensões do

relacionamento parental.

24

Resultados

A busca na base de dados Medline resultou em um total de 23 resumos, ao passo

que na PsycInfo foram encontrados 110 resultados, e a busca na base de dados Index Psi,

feita com termos em português, não encontrou nenhuma referência. Todos os 133 resumos

foram lidos com o objetivo de avaliar se os mesmos preenchiam os critérios de inclusão

anteriormente mencionados. Após esse filtro inicial, foram identificados 20 artigos que

poderiam compor a revisão de literatura. Procedeu-se à leitura na íntegra desses 20 artigos,

o que resultou na exclusão de 12, em razão de abordarem as temáticas referidas nos

critérios de exclusão. Assim sendo, oito artigos foram os selecionados para a presente

revisão sistemática.

No que diz respeito à primeira categoria de análise (base de dados), sete dos oito

artigos selecionados pertencem à base PsycInfo, enquanto apenas um é proveniente da base

Medline. A Tabela 1 mostra os oito artigos selecionados, indicando título, autor, base de

dados, ano de publicação, país onde foi realizado o estudo, tipo de produção e objetivo da

pesquisa, abarcando as categorias de análise 2 a 5.

Tabela 1

Informações das Categorias de Análise de um a cinco, com Indicação dos Títulos e

Autores dos Artigos (n=8)

Título Autor Base de

Dados Ano de

publicação País Tipo de

produção Objetivo

1) Parental factors and the young child's postdivorce adjustment: a meta-analysis with implications for parenting arrangements

Whiteside, M. F.; Becker, B. J.

Medline 2000 EUA Teórico Investigar a influência do comportamento parental na adaptação de crianças pós-divórcio

2) A review of the empirical literature about child development and adjustment postseparation

Kushner, M. A.

PsycInfo 2009 EUA Teórico Apresentar uma revisão da literatura acerca do desenvolvimento e adaptação dos filhos pós-separação

3) Mothering, fathering, and divorce: The influence of divorce on reports of and

Schwartz, S. J.; Finley, G. E.

PsycInfo 2009 EUA Empírico Investigar a diferença de relatos de envolvimento paterno e materno

25

desires for maternal and paternal involvement

de jovens adultos de famílias intactas e divorciadas

4) Parental divorce and children's adjustment

Lansford, J. E.

PsycInfo 2009 EUA Teórico Apresentar uma revisão da literatura acerca da relação entre os temas divórcio e adaptação dos filhos

5) The relationship between contact and child adjustment in high conflict cases after divorce or separation

Trinder, L.; Kellet, J.; Swift, L.

PsycInfo 2008 Reino Unido

Empírico Explorar a relação entre o contato com os pais e a adaptação dos filhos no contexto de disputa judicial

6) Effects of father and mother parenting on children's mental health in high and low-conflict divorces

Sandler, I.; Miles, J.; Cookston, J.; Braver, S.

PsycInfo 2008 EUA Empírico Estudar a relação entre os problemas de saúde mental dos filhos e o grau de contato com os genitores guardiães e não-guardiães, e o nível de conflito entre os genitores.

7) Critical aspects of parenting plans for young children: Interjecting data into the debate about overnights

Pruett, M. K.; Ebling, R.; Insabella, G.

PsycInfo 2004 EUA Empírico Investigar as relações entre pernoites, consistência de visitas, número de cuidadores e adaptação de crianças pequenas à situação do divórcio

8) Challenges and strengths in nonresidential parenting following divorce

Bailey, S. J. PsycInfo 2003 EUA Empírico Explorar os desafios e os pontos fortes enfrentados por genitores não-guardiães que moram distantes de seus filhos

É possível evidenciar que a maior parte dos artigos foi produzida nos Estados

Unidos entre os anos de 2008-2009. Os objetivos da maior parte das pesquisas visaram a

explorar as relações parentais e sua influência na adaptação dos filhos no período pós-

divórcio.

26

A sexta categoria de análise diz respeito ao método utilizado. Dentre os três estudos

teóricos avaliados (Kushner, 2009; Lansford, 2009; Whiteside & Becker, 2000), somente o

de Whiteside e Becker (2000) é uma meta-análise. Os referidos artigos abrangem os

seguintes conteúdos: 1) uma revisão de 12 artigos publicados em inglês, no período de

1970-1994, que incluíam crianças com idade inferior a cinco anos que tivessem

experenciado o divórcio dos pais (Whiteside & Becker, 2000); 2) uma revisão dos dados

empíricos que orientaram o trabalho de profissionais experts em disputa de guarda nos

últimos 30 anos, considerando o ajustamento dos filhos após a separação (Kushner, 2009);

3) uma revisão de literatura acerca do divórcio e a adaptação de crianças a curto e longo

prazo (Lansford, 2009).

Dentre os cinco estudos empíricos sob análise, quatro são quantitativos (Pruett,

Ebling, & Insabella, 2004; Sandler, Miles, Cookston, & Braver, 2008; Schwartz & Finley,

2009; Trinder, Kellet, & Swift, 2008) e um, qualitativo (Bailey, 2003). A sétima e a oitava

categorias de análise se referem às características da amostra e aos instrumentos utilizados,

respectivamente. Portanto, essas categorias são aplicadas somente aos artigos empíricos

mencionados, e serão descritas a seguir.

Apenas estudantes universitários de famílias intactas e divorciadas, que

identificaram seus pais biológicos como as figuras parentais mais importantes em suas

vidas, participaram do estudo de Schwartz e Finley (2009). Os envolvimentos materno e

paterno foram avaliados em 20 domínios, de acordo com Hawkins e Palkovitz (1999), por

meio de relatos retrospectivos. Para cada domínio, os participantes foram solicitados a

indicar, em uma escala de 1 a 5, o quão envolvidos seus pais foram em suas infâncias e

adolescências. Os participantes também deveriam indicar, a seguir, qual o nível de

envolvimento desejado, isto é, que eles gostariam que seus pais tivessem apresentado.

Trinder, Kellet e Swift (2008) realizaram um estudo longitudinal com 156 pais

divorciados, sendo 100 residentes e 56 não-residentes com seus filhos. A avaliação ocorreu

em três momentos, sendo a segunda no período de seis meses e a terceira, no período de

dois anos. Do segundo momento, participaram 129 pais, sendo 74 residentes e 55 não-

residentes. Da terceira avaliação, participaram 108 genitores, sendo 65 residentes e 43 não-

residentes.

Os instrumentos utilizados no estudo foram: o relato dos pais do Strengths and

Difficulties Questionnaire de Goodman, para avaliar o bem-estar emocional e

27

comportamental de crianças e adolescentes entre 4 e 16 anos; o Questionário de Saúde

Mental de Goldberg e Williams, a fim de avaliar o bem-estar dos genitores; o Parenting

Concerns Scale, para avaliar a preocupação em relação ao exercício da parentalidade pelo

ex-parceiro; e o Co-parental Decision-Making Scale, com a finalidade de avaliar em que

grau os pais compartilham as decisões sobre a vida dos filhos.

O estudo de Sandler, Miles, Cookston e Braver (2008) investigou 182 famílias,

sendo os dados coletados com o pai, mãe e filhos. Um total de 104 meninas e 78 meninos

participaram do estudo, com idades entre 5 e 12 anos. Os instrumentos utilizados foram:

Children’s Perception of Interparental Conflict Scale de Grych, Seid e Fincham; Conflict

Tactic Scale de Straus, Gelles e Steinmetz; as subescalas de aceitação e rejeição do

Children’s Report of Parental Behavior Inventory de Schaefer; a subescala de

internalização do Child Behavior Checklist de Achenbach; o Child Depression Inventory

de Kovacs e a Revised Children’s Manifest Anxiety Scale de Reynolds e Richmond.

O estudo de Pruett, Ebling e Insabella (2004) trabalhou com uma amostra de 132

famílias, com filhos com idade igual ou inferior a seis anos. O instrumento utilizado para

avaliar as mudanças negativas no relacionamento pais-filhos foi a escala likert de cinco

pontos de Maccoby, Mnookin e Depner’s, composta por dez itens. O conflito parental foi

medido com o Content of Conflict Checklist de Johnston, e os problemas de

comportamento das crianças foram avaliados de acordo com o Child Behavior Checklist de

Achenbach e Edelbrock.

Por fim, o estudo exploratório de Bailey (2003) utilizou uma amostra de 36 pais

não-residentes que moravam a pelo menos 80 km de distância de seus filhos. Os

participantes responderam a uma entrevista semiestruturada, feita pelo telefone, delineada

especificamente para o estudo.

A última categoria de análise diz respeito às dimensões do relacionamento parental

consideradas em cada um dos estudos. A fim de delimitar as dimensões avaliadas em cada

um dos estudos, as seções “introdução”, “instrumentos” e “resultados” de cada estudo

foram analisadas. Buscou-se, dessa forma, levantar os aspectos mencionados por teóricos

e/ou avaliados pelos instrumentos utilizados, que contemplem a relação pais-filhos. Os

resultados são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2

Dimensões do Relacionamento Parental Apresentadas em cada Artigo

28

Artigo Dimensões

1 Histórico familiar pré-separação. Práticas parentais. Estado emocional dos genitores. Exercício da coparentalidade. Conflito interparental.

2 Desempenho acadêmico. Conflitos do casal anteriores à separação. Problemas sociais (redução do nível econômico/menos participação em atividades extracurriculares). Estado emocional dos genitores. Envolvimento da figura paterna.

3 Envolvimento intelectual, emocional, físico e social. Desenvolvimento moral e espiritual. Desenvolvimento de carreira. Desenvolvimento de responsabilidade, independência e competência. Lazer/diversão. Suporte financeiro. Participação em atividades da criança. Cuidados básicos. Orientação. Proteção. Disciplina. Atividades escolares. Companhia.

4 Desempenho acadêmico. Qualidade das relações sociais. Conflito interparental. Disciplina efetiva. Afeto positivo. Estado emocional dos genitores.

5 Problemas de conduta, sintomas emocionais e comportamento social da criança. Transtornos psicológicos transitórios dos genitores. Média de contatos diretos entre pais-filhos. Proteção, atenção, supervisão e disciplina para com a criança. Decisões conjuntas acerca da vida da criança. Discussão de problemas pessoais que a criança possa estar experenciando.

6 Atendimento às necessidades da criança. Disciplina efetiva. Envolvimento positivo nas atividades diárias da criança. Forte vínculo emocional, com sentimentos de intimidade e relação afetuosa positiva. Conflito interparental.

7 Participação nas atividades da vida diária da criança. Conflito interparental. Consistência parental. Atendimento às necessidades de desenvolvimento socioemocional da criança.

8 Participação nas atividades de vida diária da criança. Consistência parental. Cumprimento de promessas. Desenvolvimento de autonomia. Lazer. Dificuldades em relação à falta de tempo e energia para o filho. Orientação. Disciplina. Conflito interparental. Vínculo afetivo positivo.

Determinados aspectos do relacionamento parental foram identificados em mais de

um artigo, ainda que com denominações distintas, como é o caso de “conflito

interparental” e “conflitos do casal anteriores à separação”. Alguns estudos, por utilizarem

instrumentos de avaliação mais específicos, permitiram identificar um maior número de

dimensões. A discussão das dimensões apontadas na Tabela 2 é apresentada a seguir.

Discussão

Um dos primeiros pontos que merece atenção é o fato de que a busca pelos artigos

nas bases PsycInfo e Medline se deu a partir do site da biblioteca da Universidade de

Portsmouth/Reino Unido. Esse fato permitiu acesso a um maior número de periódicos e,

consequentemente, de instrumentos, do que se a busca tivesse sido realizada pelo site da

29

CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Já a busca na

base Index Psi ocorreu pelo site da CAPES, no Brasil, e abrangeu todos os periódicos

brasileiros.

Dentre o total de 133 resumos avaliados, apenas oito artigos foram analisados na

íntegra. Os critérios de inclusão e exclusão foram delineados de forma a selecionar apenas

artigos que pudessem contribuir efetivamente para o objetivo desta revisão, ou seja,

delimitar as dimensões do relacionamento parental no contexto de divórcio e disputa de

guarda. Considerando as informações obtidas por meio dos referidos estudos, é possível

concluir que os critérios impostos cumpriram sua função, uma vez que as pesquisas

analisadas abordavam diretamente o tema “relacionamento pais-filhos”, fornecendo assim

informações úteis e bem fundamentadas. Por outro lado, é possível que a combinação dos

termos tenha se apresentado muito restrita para o tema na busca por artigos na base Index

Psi, uma vez que não foram encontrados resultados para a referida busca. Destaque-se,

assim, a carência de estudos brasileiros nesta área. As buscas simples dos temas divórcio,

disputa de guarda e relação pais-filhos encontram resultados. Contudo, ao combinar os três

termos, conforme o propósito deste artigo, nenhum resultado foi encontrado.

Em relação às bases de dados pesquisadas, a PsycInfo ofereceu maior contribuição

em relação à Medline, uma vez que 90% dos artigos analisados pertencem àquela. Essa

desproporção provavelmente se deve às características específicas da revisão, que se

enquadram mais no perfil dos estudos indexados na PsycInfo que na Medline, a qual

abrange mais estudos na área médica.

No que diz respeito ao país onde foi realizado o estudo, foi possível observar uma

predominância de estudos realizados nos Estados Unidos. No que tange ao ano de

produção, a maioria dos artigos analisados nesta revisão data de 2008-2009. Porém, o

conteúdo teórico de artigos da década de 70 não deixou de ser incluído nesta revisão, uma

vez que os artigos teóricos analisados incluíram em suas revisões materiais que datam de

1970. Considerando-se as evoluções pelas quais a sociedade passa e a necessidade da

ciência de ajustar-se a essas modificações, optou-se por avaliar estudos conduzidos nos

últimos dez anos.

As amostras e instrumentos utilizados nos estudos empíricos buscaram, de forma

geral, dados acerca do envolvimento dos genitores na vida dos filhos após a separação,

sintomas que os filhos estivessem apresentando e os desafios da coparentalidade pós-

30

divórcio. As medidas de avaliação utilizadas foram escalas, inventários ou questionários,

revelando uma preferência dos pesquisadores por instrumentos padronizados com estudos

quantitativos. Apenas um dos estudos empíricos utilizou uma entrevista semiestruturada,

sendo este de caráter qualitativo.

Em relação aos instrumentos utilizados, importante observar que em nenhum dos

estudos verificou-se a repetição dos instrumentos mencionados na descrição da oitava

categoria de análise, tampouco foram utilizados instrumentos específicos para o contexto

de guarda. Emery, Otto e O’Donohue (2005) descrevem e tecem críticas a diferentes

instrumentos de avaliação desenvolvidos especificamente para o contexto de disputa de

guarda. Contudo, nenhum deles foi utilizado nos estudos aqui avaliados. No que concerne

ao uso desses instrumentos no Brasil, apenas o Child Behavior Checklist (Achenbach &

Edelbrock, 1983) possui estudo de adaptação e validação, feito por Bordin, Mari e Caeiro

(1995). As demais escalas e questionários citados investigam áreas importantes, como o

nível de envolvimento e preocupação dos pais e conflito interparental. Esses construtos são

relevantes no contexto de divórcio e disputa de guarda, e instrumentos que os contemplem

carecem de estudos de adaptação e validação para a realidade brasileira. As informações

obtidas por meio destes instrumentos auxiliariam profissionais especialmente da área da

Psicologia e Serviço Social a produzir documentos bem fundamentados quando solicitadas

as recomendações da guarda a um dos genitores, ou até mesmo a definição pela guarda

exclusiva ou compartilhada.

Embora nenhum dos artigos analisados apresente enfoque exclusivo na relação

pais-filhos após o divórcio, todos eles contribuem com informações relevantes a serem

investigadas nessa relação. O estudo de Whiteside e Becker (2000) aponta a importância de

investigar o histórico familiar pré-separação, destacando a avaliação do nível de

envolvimento do genitor com a criança. Os autores esclarecem ainda que envolvimento se

refere aos tipos e quantidades de atividades que o genitor desenvolvia com seu filho. Essa

busca de informações por atividades das quais os genitores participavam no período

anterior à separação permite evidenciar e comparar o grau de envolvimento na relação

parental antes e após a separação conjugal.

Há casos em que os pais passam a envolver-se efetivamente na vida dos filhos

somente após o divórcio, ao passo que enquanto residiam juntos sua participação era

reduzida. O estudo de Grzybowski e Wagner (2010) revela que as avaliações de pais e

31

mães sobre o exercício da parentalidade pós-divórcio apresentam uma mescla de aspectos

positivos e negativos. Entre os pontos positivos, os genitores destacam melhoras no papel

parental, uma vez que tentam aproveitar ao máximo o tempo que dispõem para o filho,

esforçando-se para serem melhores pais e mães. Em situações de disputa de guarda, é

importante avaliar o engajamento de cada genitor na vida do filho no período anterior à

separação, buscando entender as reais motivações para ficar com a guarda. É pouco

comum que genitores que, enquanto casados, envolviam-se pouco nas atividades diárias

dos filhos, queiram, após a separação, ter para si a guarda dos mesmos.

Considerando ainda a importância de analisar o histórico familiar pré-separação,

vários estudos discutem a influência do conflito interparental na adaptação dos filhos no

período pós-divórcio (Kushner, 2009; Lansford, 2009; Pruett et al., 2004; Sandler et al.,

2008). Altos níveis de conflito interparental influenciam de forma contínua o ajuste de

crianças e adolescentes (Davies & Cummings, 1994; Grych & Fincham, 1990). No estudo

de Pruett, Ebling e Insabella (2004), problemas somáticos e relacionados ao sono, assim

como problemas de comportamento nos filhos apresentaram-se correlacionados a um

maior nível de conflito interparental. É esperado que o nível de conflito entre os ex-

cônjuges seja reduzido após o divórcio, proporcionando bem-estar a todos os membros da

família. Entretanto, em muitos casos o conflito interparental persiste ou até mesmo se

agrava com a separação conjugal, o que traz implicações para os filhos, que permanecem

vivenciando a situação conflitiva.

Outro aspecto abordado nos artigos em análise diz respeito ao estado emocional dos

genitores (Kushner, 2009; Lansford, 2009; Trinder, Kellet, & Swift, 2008; Whiteside &

Becker, 2000). O conflito conjugal e o processo de divórcio aumentam a depressão,

ansiedade e estresse dos genitores, o que prejudica suas habilidades de

maternagem/paternagem, afetando diretamente a adaptação dos filhos (Lansford, 2009;

Whiteside & Becker, 2000). Estudos apontam que conviver com genitores

psicologicamente saudáveis é um fator de proteção para os filhos de pais divorciados

(Emery, Waldron, Kitzman, & Aaron, 1999; Hetherington, 1999).

Muitas das dimensões levantadas nesta revisão referem-se à parentalidade,

incluindo práticas parentais (Whiteside & Becker, 2000), orientação (Bailey, 2003;

Schwartz & Finley, 2009; Trinder et al., 2008; Whiteside & Becker, 2000), disciplina

(Bailey, 2003; Lansford, 2009; Sandler et al., 2008; Schwartz & Finley, 2009; Trinder et

32

al., 2008; Whiteside & Becker, 2000) e tomada de decisão conjunta em relação à vida dos

filhos (Trinder et al., 2008; Whiteside & Becker, 2000). A ruptura das práticas parentais

pode ocorrer após o divórcio, trazendo dificuldades de monitoramento e supervisão

efetivos dos pais em relação aos filhos. Oferecer uma disciplina consistente, em conjunto

com afeto, é um desafio para os pais recém-separados (Lansford, 2009).

O estudo de Schwartz e Finley (2005) aponta que as funções de disciplina, proteção

e monitoramento das tarefas escolares são mais afetadas pelo divórcio do que as funções

facilitadoras do desenvolvimento emocional, como o companheirismo e o compartilhar

atividades. Isso porque as primeiras são atividades que não podem ser desempenhadas “de

fora de casa”, isto é, pelo genitor não-residente.

A tomada de decisão conjunta sobre a vida dos filhos é uma tarefa que exige

flexibilidade e cooperação dos genitores. É importante que profissionais possam auxiliar as

famílias, de forma que os pais mantenham o foco nas necessidades de seus filhos,

fortalecendo assim sua capacidade parental. Os sentimentos e dificuldades que os filhos

estejam sentindo devem ser discutidos pelos pais, a fim de que possam em conjunto buscar

maneiras de amenizar esse sofrimento (Trinder et al., 2008).

Outros aspectos elencados na Tabela 2 poderiam ser agrupados na categoria

“necessidades de desenvolvimento dos filhos”. Nela seriam incluídos participação em

atividades diárias, envolvimento em atividades escolares, desenvolvimento da autonomia,

consistência parental, suporte financeiro e lazer.

A participação dos genitores no dia-a-dia dos filhos é essencial para o

desenvolvimento de habilidades adaptativas ao mundo externo (Pruett et al., 2003). Essa

participação é especialmente afetada para os genitores não-residentes, que têm sua relação

com o filho continuamente interrompida, já que as visitas não costumam ocorrer

diariamente. Isso faz com que a relação pais-filhos necessite ser reestabelecida a cada novo

contato, o que pode prejudicar o estabelecimento da consistência parental (Bailey, 2003).

As questões suporte financeiro e atividades de lazer são citadas com menor

frequência na literatura. O estudo de Schwartz e Finley (2009) aponta a função parental de

lazer como uma das áreas em que os participantes (estudantes universitários) gostariam que

seus pais tivessem tido maior envolvimento. Os autores associam esse desejo ao excesso de

tempo que os pais passam no trabalho, considerando a realidade do estudo norte-

americano. O mesmo estudo revelou ainda que o sustento financeiro é associado mais à

33

função paterna nos primeiros anos do divórcio. Por outro lado, à medida que os anos

passam, é esperado que as mães apresentem uma contribuição financeira maior. Essa maior

contribuição pode ocorrer pelo fato de que, à medida que os filhos crescem, as mães

ingressam ou retornam ao mercado de trabalho.

O diagrama a seguir permite identificar um resumo das dimensões do

relacionamento parental identificadas na presente revisão de literatura. As categorias estão

divididas em três eixos centrais, que foram assim definidos a partir das características

comuns evidenciadas entre as dimensões levantadas. Cada eixo contém componentes do

construto “relacionamento pais-filhos” mais comumente avaliados em situações de

determinação de guarda.

Figura 1

Dimensões do Relacionamento Parental, Levantadas a partir desta Revisão

Sistemática

Na Figura 1 é apresentado um diagrama que permite identificar três eixos que

compõem o relacionamento parental. O eixo “histórico pré-separação” abrange questões da

relação conjugal e do envolvimento parental no período anterior ao divórcio, de forma a

examinar como o genitor se relacionava com o filho quando ainda casado, e as influências

de conflitos maritais nessa relação. O eixo “parentalidade” engloba responsabilidades e/ou

características específicas dos genitores, como o estado emocional. Afeto, cuidados

Dimensões do

Relacionamento Parental

Histórico pré-separação

Envolvimento nas atividades diárias do filho Conflitos interparentais

Parentalidade

Afetividade

Cuidados básicos

Estado emocional dos genitores

Orientação

Disciplina

Coparentalidade

Necessidades dos filhos

Participação em atividades diárias

Desenvolvimento da autonomia

Educação

Consistência parental

Sustento Financeiro

Lazer

34

básicos, orientação, disciplina e coparentalidade são atributos que os genitores devem

possuir e/ou oferecer a seus filhos. Por fim, o eixo “necessidades dos filhos” indica

questões importantes do desenvolvimento cognitivo, emocional e social, que devem ser

atendidas pelos genitores.

A presente revisão sistemática teve como objetivo levantar as dimensões do

relacionamento parental considerando o contexto de divórcio e disputa de guarda. A

análise dos artigos permitiu organizar os achados de forma a sistematizar os componentes

do relacionamento pais-filhos. Assim sendo, o presente trabalho contribui com os

profissionais que atuam na área de divórcio e disputa de guarda, no sentido de oferecer

diretrizes sobre o que deve ser considerado no momento de fazer uma recomendação de

quem deverá ficar com a guarda, ou o tipo de guarda e sistema de visitas.

35

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38

SEÇÃO I

Concepções acerca do Relacionamento Parental

Capítulo 2

O Relacionamento Parental sob diferentes perspectivas

no contexto de disputa de guarda

Vivian de Medeiros Lago

Eriane Zingano Wainstein

Denise Ruschel Bandeira

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

39

Resumo

O contexto de disputa de guarda dos filhos é um campo de interesse da Psicologia e do

Direito na medida em que as avaliações psicológicas auxiliam na tomada de decisão

judicial. Nesse contexto, é relevante avaliar o relacionamento entre pais e filhos para que

recomendações acerca de quem deve ficar com a guarda possam ser feitas. Com o objetivo

de delimitar as dimensões que compõem o relacionamento parental, foram entrevistados

dez genitores, seis crianças, seis psicólogos e três operadores do Direito. Os participantes

responderam a entrevistas semiestruturadas, delineadas conforme a categoria de

respondentes. A partir da análise de conteúdo das respostas emergiram categorias como:

rotina, cuidados, disciplina, comunicação, afeto, histórico do casal e sustento financeiro.

Este estudo permitiu uma exploração qualitativa das entrevistas, contribuindo para um

entendimento aprofundado do construto relacionamento parental e corroborando a teoria

existente acerca do tema.

Palavras-chave: relações pais-crianças, custódia da criança, divórcio, psicologia forense,

avaliação psicológica

40

Abstract

The context of child custody dispute is a field of interest for both Psychology and Law, as

psychological assessments provide information to assist the judicial decision. In this

context, it is relevant to assess parent child relations so that recommendations about who

should have the custody can be made. Aiming at defining the dimensions that comprise the

parental relationship, ten parents, six children, six psychologists and three Law

practitioners were interviewed. The participants answered semi structured interviews,

designed according to the category of respondents. From the content analysis of the

answers, categories emerged: routine, basic care, discipline, communication, affection,

history of the couple and financial support. This study allowed a qualitative exploration of

the interviews, contributing to a deeper understanding of the construct parental relationship

and supporting the existing theory on the subject.

Keywords: parent child relations, child custody, divorce, psychological assessment,

forensic psychology

41

Introdução

Os índices de divórcio no Brasil têm se apresentado de forma crescente. O estudo

Síntese de Indicadores Sociais 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE) revelou uma estabilidade das separações conjugais e um aumento contínuo dos

divórcios. A taxa geral de separações permaneceu em 0,8%, ao passo que a de divórcios

cresceu em relação a 2004, chegando a 1,5%, a maior do período analisado (IBGE, 2010).

As separações de casais eram pontuais e traumáticas até meados do século XX e,

atualmente, se tornaram quase uma rotina. Programas televisivos abordam histórias de

personagens divorciados, que vivem experiências de diferentes tipos de relacionamento. E

os filhos, independentemente de participarem desse contexto na vida real ou ficção,

precisam lidar com alguma frequência com mães e pais separados, bem como com

madrastas e padrastos (Corso, 2011).

Nem todos os divórcios implicarão avaliações e discussões acerca do

relacionamento parental porque nem todos os divorciados têm filhos. Contudo, alguns

estudos americanos indicam que cerca de 40% dos filhos vão vivenciar o divórcio dos seus

pais antes dos 18 anos (Bumpass, 1984). De acordo com as Estatísticas do Registro Civil

de 2009, no Brasil o percentual de divórcios de casais sem filhos aumentou entre 1999 e

2009 (de 25,6% para 37,9% do total de divórcios), da mesma forma que aumentaram os

divórcios de casais com filhos maiores (de 12% para 24,4%). Por outro lado, os divórcios

de casais com filhos menores caíram de 43,1% para 31,4%. A guarda materna exclusiva

ainda predomina (87,6%), porém o exercício da guarda compartilhada aumentou de 2,7%

para 4,7% em 2009 (IBGE, 2010).

Diante do divórcio de casais com filhos, tem se tornado comum nos processos

judiciais a disputa pela guarda dos mesmos. Com o propósito de subsidiar a tomada de

decisão judicial desses processos, os psicólogos têm sido solicitados a realizar avaliações

psicológicas das famílias envolvidas, de forma a contribuir para a garantia dos direitos e o

bem-estar da criança e/ou adolescente (D. M. P. Silva, 2006).

Em situações de disputa de guarda, a legislação brasileira prevê que a guarda dos

filhos será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la. Mediante

subsídios da ciência psicológica, o legislador define ainda que o genitor deve apresentar,

objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos: afeto nas relações com o genitor e

42

com o grupo familiar, saúde, segurança e educação (art. 1.583, §2º, Novo Código Civil

Brasileiro). A definição contida no referido artigo auxilia na delimitação do escopo de um

processo de avaliação psicológica envolvendo disputa de guarda. A importância de avaliar

o relacionamento pais-filhos nesse contexto também é destacada pela literatura

internacional (Chasin & Grunebaum, 1981; Gardner, 1982; Goldstein, Freud & Solnit,

1973; Jackson, Warner, Hornbein, Nelson, & Fortescue, 1980; Lanyon, 1986; Levy, 1978).

Os dados da pesquisa realizada no Brasil por Lago e Bandeira (2008) corroboram a

literatura internacional, pois o relacionamento da criança com cada um de seus genitores

foi apontado como o fator mais relevante para recomendação de quem deve ficar com a

guarda do(s) filho(s).

Avaliar o relacionamento parental não é uma tarefa simples, uma vez que esse

conceito engloba diferentes aspectos, tanto do ponto de vista do desenvolvimento dos

filhos quanto das competências parentais. Faz-se necessária uma delimitação mais precisa

do que compõe o relacionamento parental, com definições das funções parentais. Essa

delimitação possibilitará que profissionais da área da saúde mental tenham à sua disposição

diretrizes gerais em relação à competência parental, formadas a partir de um embasamento

científico, que orientem de maneira mais uniformizada suas recomendações em relação à

guarda dos filhos.

Maciel e Cruz (2009) referem que o conjunto de comportamentos que os pais

utilizam para cuidar de seus filhos e assumir responsabilidades para com os mesmos define

a competência parental. Entre tais comportamentos, citam-se as funções de nutrição,

continência, controle, orientação, organização, noção de limites e contato com a realidade.

Rivera, Martínez, Fernandéz e Pérez (2002) propõem que os cuidados parentais devem

atender a três grandes áreas de necessidades da criança: de caráter físico-biológico,

cognitivas e emocionais/sociais. As necessidades de caráter físico-biológico compreendem

os cuidados com a alimentação, higiene, sono, atividade física e proteção frente a riscos

reais. As necessidades cognitivas envolvem a estimulação sensorial, exploração e

compreensão da realidade física e social, incluindo ainda a aquisição de um sistema de

valores e normas. Por fim, as necessidades emocionais e sociais envolvem segurança

emocional, identidade pessoal e autoestima, rede de relações sociais, estabelecimento de

limites e educação e informação sexual.

43

A conduta educativa é um fator importante a ser avaliado na interação pais-filhos.

Del Prette e Del Prette (2001) propõem a análise das práticas educativas a partir do

conceito de habilidades sociais educativas (HSE), definidas como “aquelas

intencionalmente voltadas para a promoção do desenvolvimento e da aprendizagem do

outro”. A. T. B. Silva (2000) analisou as diversas habilidades sociais educativas que

podem influenciar o comportamento dos filhos e identificou aspectos fundamentais para o

bom desenvolvimento das crianças. Entre eles: diálogo; cumprimento de promessas;

entendimento do casal quanto à educação do filho e à participação de ambos os

progenitores na divisão de tarefas educativas; "dizer não", "negociar" e "estabelecer

regras"; "desculpar-se".

Souza (1989) refere que os pais possuem a incumbência de ensinar aos filhos

cuidados físicos e relações familiares, tais como desenvolvimento de amor, respeito à

individualidade, solidariedade e desenvolvimento das características psicológicas. Faz

parte do relacionamento parental ainda o ensinamento de atividades produtivas e

recreativas, assim como o desenvolvimento profissional. As vivências adquiridas no

convívio familiar contribuem para a identificação dos filhos e a formação de suas

personalidades. Cabe aqui uma observação: termos como “características psicológicas” e

“atividades produtivas” podem dar margem a diferentes interpretações, não sendo

expressões objetivas. Reforça-se mais uma vez, assim, a importância de sistematizar as

várias ideias contidas no conceito de relacionamento parental, de forma a uniformizar e

esclarecer os componentes dessa definição.

A qualidade das interações entre pais e filhos interfere também no desempenho

acadêmico das crianças. O envolvimento do pai nas atividades escolares (auxílio nas

tarefas de casa e apoio quando apresenta baixo desempenho) afeta a dedicação dos filhos

aos estudos. Estudos internacionais (Amato & Gilbreth, 1999; Bacete & Betoret, 2000;

Coley,1998; Flouri & Buchanan, 2003; Hill & Taylor, 2004; Pelegrina, García-Linares &

Casanova, 2003; Vizzotto, 1988) apontam que as crianças que dispõem do

acompanhamento dos pais nas atividades escolares apresentam maior motivação para ir à

escola e revelam melhor desempenho acadêmico. De acordo com o estudo realizado no

Brasil por Cia, D’Affonseca e Barham (2004), quanto maior a frequência de comunicação

entre pai e filho e de participação do pai nas atividades escolares, culturais e de lazer do

filho, maior o desempenho acadêmico das crianças.

44

Gomide (2003) aponta a importância da qualidade da relação parental para o

desenvolvimento socioemocional saudável dos filhos. O baixo envolvimento dos genitores

na criação dos filhos constitui um fator de risco, pois aumenta a vulnerabilidade das

crianças e adolescentes a eventos ameaçadores. Portanto, é importante que os pais

ofereçam aos filhos um ambiente acolhedor, que inclua um padrão adequado de

comunicação, ou seja, pais que ajudem os filhos a identificarem emoções, que forneçam

orientações, e que estejam dispostos a conversar com seus filhos (Bohanek, Marin, Fivush

& Duke, 2006).

Um estudo realizado por Wagner, Falcke, Silveira e Mossmann (2002) com

adolescentes com idades entre 11 e 16 anos, de ambos os sexos, revelou que eles preferem

conversar com a mãe (49,8%). Na sequência foram citados: o irmão mais velho (17,6%), o

pai (12,2%) e o irmão mais novo (2,4%). Nesse estudo a mãe foi referida como uma pessoa

coerente e com boa capacidade de entendimento, referência essa mencionada tanto por

filhos do sexo feminino quanto do sexo masculino. Esses dados vão ao encontro da função

maternal de cuidadora do lar e dos filhos, a qual demanda um maior nível de comunicação

da mãe com todos os membros da família (Wagner, Halpern, & Bornholdt, 1999).

Contudo, ainda que estudos apontem um melhor nível de comunicação dos filhos com a

figura materna, o papel da figura paterna tem sofrido alterações, evidenciando-se um maior

envolvimento dos pais. O estudo de Cia, Pamplin e Del Prette (2006) revelou que os

genitores masculinos apresentaram alta frequência de comunicação e participação em

relação a seus filhos, não mostrando diferenças estatisticamente significativas entre pais e

mães em aproximadamente metade das habilidades de interação pais-filhos. Tais resultados

demonstram que os homens não possuem mais o papel exclusivo de provedores

financeiros, e sua participação torna-se cada vez mais efetiva na educação e cuidados dos

filhos (Guille, 2004; Wagner, Predebon, Mosmann & Verza, 2005).

As práticas educativas, a comunicação e a participação nas atividades diárias dos

filhos abrangem monitoramento da alimentação, do sono, da higiene e das atividades de

contato social. Arriagada (2000) e Cardoso (2005) apontam que, cada vez mais, as funções

de cuidado e socialização inicial dos filhos são compartilhadas com a escola. As

professoras auxiliam os alunos na identificação de comportamentos adequados, em

situações de higiene e no relacionamento com colegas. Entretanto, os pais devem

permanecer atentos às necessidades manifestadas pelos filhos, seus interesses e

45

curiosidades, sendo fundamentais na transmissão de valores e na inserção social (Moreira

& Biasoli-Alves, 2008).

É importante apontar resultados de um estudo de meta-análise sobre a definição

operacional da qualidade do relacionamento pais-filhos, que incluíram seis dimensões de

análise. Essas dimensões foram selecionadas com base na relevância teórica e em

sugestões de pesquisadores. São elas: qualidade global da qualidade do relacionamento

pais-filhos, consistência inter e intraparental, satisfação com a parentalidade,

encorajamento protetivo dos pais para a independência emocional dos filhos, sanção com

afeto e disciplina (Erel & Burman, 1995).

Ademais de identificar as funções que compõem o relacionamento parental, é

preciso assinalar também os aspectos que exercem influência sobre ele. As influências

podem ser de cunho tanto positivo quanto negativo. O envolvimento e apoio às mães por

parte dos genitores masculinos nos cuidados com os filhos é um desses exemplos. Os

genitores masculinos contribuem com o bem-estar dos filhos por meio não apenas dos

cuidados básicos, mas também do apoio emocional e físico oferecido às mães. O auxílio

nas tarefas domésticas, no suporte financeiro e na educação dos filhos contribui para uma

boa qualidade do relacionamento de ambos os genitores com seus filhos. As mães não se

sentem sobrecarregadas, ficando mais atentas às necessidades das crianças e facilitando o

envolvimento paterno no relacionamento com os filhos, especialmente os de mais tenra

idade (Black, Dubowitz & Starr, 1999).

Outro fator que tem influência no relacionamento parental é o relacionamento entre

os genitores (Buehler & Gerard, 2002; Cumming & Davis, 2002; Shek, 2000). Pais que

estejam satisfeitos com sua relação conjugal e sintam-se apoiados em seu papel parental,

envolvem-se mais nos cuidados com o filho (Yogman, Berman & Pedersen, 1987). Por

outro lado, pais com maiores níveis de conflitos conjugais revelam um aumento nos

comportamentos hostis e diminuição do envolvimento afetivo para com os filhos (Conger

et. al, 2002). Erel e Burman (1995) sustentam o conceito teórico denominado spillover1,

que consiste no pressuposto de que uma boa relação conjugal influencia positivamente a

1 O termo spillover pode ser traduzido por transbordamento, e refere-se aos efeitos que podem

transbordar do relacionamento conjugal para o relacionamento parental.

46

relação entre pais e filhos. Dessa forma, relacionamentos conjugais conflitivos interferem

na qualidade do relacionamento parental à medida que os genitores tornam-se pouco

pacientes e tolerantes, apresentando prejuízos na adaptabilidade para lidar com as

necessidades diárias dos filhos (Mossman & Wagner, 2008).

O estresse também é um fator que pode prejudicar o relacionamento parental, pois

implica muitas vezes falta de tempo ou de energia para participar das atividades com os

filhos (Brandth & Kvande, 2002). Esse estresse é, com frequência, decorrente das

condições de trabalho, que dificultam conciliar as obrigações familiares e profissionais,

podendo contribuir para o aumento da ansiedade e o sentimento de culpa decorrente da

pouca participação na educação dos filhos (Warren & Johnson, 1995).

Uma vez tecidas considerações sobre o que a teoria apresenta sobre o tema

relacionamento parental, é importante confrontar teoria e prática, isto é, procurar conhecer

o que as pessoas diretamente envolvidas com essa temática pensam sobre o assunto. Faz-se

necessário investigar a opinião dos próprios pais e filhos, buscando em seus relatos e

experiências pessoais características que corroborem e/ou acrescentem os pressupostos

abordados pela teoria. Da mesma forma, justifica-se a importância de levantar opiniões

profissionais sobre o assunto, considerando-se o contexto de disputa de guarda. Por isso,

destacam-se aqui os psicólogos e os operadores do Direito que atuam na área da família,

pois trabalham diretamente nesse contexto. Portanto, com o propósito de reunir questões

teóricas e práticas acerca do relacionamento parental, foi realizado um estudo empírico

com genitores, crianças, psicólogos e operadores do Direito que atuem na área de família.

Objetivou-se identificar as características do relacionamento parental sob a ótica das

diferentes categorias de participantes.

Método

Participantes

Foi realizado um estudo de caráter qualitativo exploratório com psicólogos (P),

genitores (G), crianças (C) e operadores do Direito (OD) com atuação na área de família.

Foram entrevistados seis psicólogos, terapeutas de família. Dentre os genitores,

participaram cinco mães e cinco pais, sendo quatro genitores separados e os demais,

casados. As participantes crianças foram três meninos e três meninas, com idades entre 7 e

47

12 anos, sendo três filhas de pais separados, duas que foram criadas pelo padrasto e não

conhecem o pai biológico e uma filha de pais casados. Foram entrevistados ainda um juiz

de Direito, uma Promotora de Justiça e uma advogada de família.

Instrumento

Foram desenvolvidos quatro instrumentos para o presente estudo, diferenciados

conforme as categorias de participantes. Foram aplicadas entrevistas semiestruturadas,

contendo em média dez questões. As entrevistas aplicadas aos psicólogos englobavam

questões referentes à definição de relacionamento pais-filhos e à forma de avaliá-lo (Anexo

B). Para genitores e crianças, foram feitas questões referentes às atividades que realizam

juntos, aspectos positivos e aspectos negativos do relacionamento pais-filhos (Anexos C e

D). Para os Operadores do Direito, as questões buscaram definir aspectos relevantes que

devem constar em laudos de avaliações psicológicas que os auxiliem a definir quem ficará

com a guarda dos filhos (Anexo E).

Procedimentos

A amostra foi obtida por conveniência, por meio de indicações de pesquisadores

e/ou colegas que trabalham na área de família. Aos indicados foi feito o convite para

participar do estudo e foram explicados os objetivos da pesquisa. Os que consentiram em

participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Anexo F).

No caso das crianças participantes, pelo menos um de seus genitores assinou o TCLE. O

projeto recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Psicologia da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Do total de 25 participantes do estudo, sete preferiram responder às questões por

escrito e enviá-las por e-mail. Os demais foram entrevistados pessoalmente. As entrevistas

foram gravadas em áudio e transcritas posteriormente. Foram realizadas análises de

conteúdo (Bardin, 1979) das respostas de todas as categorias de participantes. Inicialmente,

as respostas de cada conjunto de respondentes foram agrupadas. A partir de cada

agrupamento, emergiram os aspectos mais importantes que constituem o relacionamento

parental, os quais deram origem às categorias que serão descritas abaixo.

48

Resultados

Entrevistas com genitores

A análise de conteúdo das respostas dos genitores permitiu identificar seis

principais aspectos do relacionamento parental. As categorias emergidas a partir da análise

são descritas a seguir, e exemplificadas por algumas respostas dos participantes.

1. Rotina. Descrita pelos participantes como convivência familiar, abrangendo a

participação em atividades diárias como rotina escolar, refeições e cuidados de higiene. As

atividades de lazer e a energia dispensada para acompanhar as atividades dos filhos

também foram incluídas.

“Procuro conviver com a minha filha, conversamos diariamente, escutamos

músicas juntas, levo e busco na escola, fazemos refeições juntas, participo das atividades

que a escola convida os pais, viajamos juntas” (G1).

2. Comunicação. Todos os participantes citaram a importância do diálogo entre pais

e filhos, juntamente com o respeito e confiança. O brincar foi interpretado como uma

forma de comunicação, considerando-se especialmente aqueles que têm filhos menores. A

comunicação entre os genitores, estando os mesmos casados ou separados, também foi

mencionada pelos participantes como influência direta no relacionamento pais-filhos.

“Pais que se relacionam bem, ou não discordam em relação à educação dos filhos,

proporcionam segurança às crianças. Embora eu e o pai da minha filha não estejamos

mais juntos, procuramos sempre nos unir em relação à educação dela” (G2).

3. Necessidades básicas. Optou-se por englobar nessa categoria necessidades de

ordem emocional, assim como de ordem social. Os participantes enfatizaram em diferentes

respostas a importância da presença de amor, carinho, atenção, segurança, confiança,

sinceridade, amizade e transparência. Um ambiente harmonioso e bem estruturado também

foi mencionado como uma necessidade fundamental para um desenvolvimento saudável

emocional da criança.

“Acredito que o fundamental é nunca esquecer de deixar claro para seu filho todos

os dias o quanto ele é importante e o quanto você o ama. Saber ouvir os filhos, responder

suas dúvidas com prontidão e sinceridade os aproximam de você”(G5).

No que diz respeito às necessidades sociais, foram citadas as condições mínimas de

moradia e lazer, para garantir um bom desenvolvimento dos filhos.

49

“As necessidades mais importantes para o desenvolvimento saudável dos filhos são

amor, segurança, educação de boa qualidade, um conforto básico de infraestrutura de

moradia e lazer” (G1).

4. Educação. Essa categoria abrange tanto os aspectos formais da escolarização

quanto os aspectos informais. Os participantes referiram a participação em atividades

escolares, como auxílio e/ou verificação das tarefas escolares e provas, participação em

reuniões e eventos oferecidos pela escola. No que diz respeito à educação informal, foi

citada a preocupação em transmitir valores que formarão a personalidade dos filhos.

“O bem mais precioso que um pai pode transmitir a um filho é sem dúvida a

educação no seu conceito mais abrangente. Não penso somente na educação em sua

concepção escolar, mas sim no principal dever dos pais que consiste em repassar aos

filhos os valores que vão nortear a formação do seu caráter. Para tanto é necessário estar

presente, dar a devida atenção e participar ao máximo da vida dos filhos” (G5).

5. Cuidados. Nesse item foram englobados os cuidados com saúde, alimentação,

higiene, sono. Alguns pais também citaram a importância de respeitar a autonomia dos

filhos.

“Eu acho que tem que cuidar higiene, higiene bucal, tomar banho, se organizar...

elas são muito bagunceiras, então eu tô sempre em cima delas, cobrando muito delas...

sofro muito com isso, mas elas respeitam muito” (G8).

“As atividades da vida da minha filha de que eu menos participo são a execução de

suas atividades escolares, seus hábitos de higiene e sono, seus gostos na escolha de roupas

e acessórios, suas conversas com as amigas. Porque são ações que ensinei desde muito

pequena que ela fizesse, hoje percebo que ela tem autonomia e disciplina para fazer sem a

minha participação” (G1).

6. Disciplina. Essa categoria abrange o estabelecimento de limites, estipulação de

castigos, controle do uso do computador, cobrança em relação aos deveres escolares,

organização do quarto. Também foi citada a questão da hierarquia, apontando a

importância dos pais enquanto educadores e modelo para os filhos.

“Não abro mão da velha hierarquia familiar onde os pais são a referência da casa.

Pais são pais, amigos são amigos e quem educa os filhos são os pais” (G5).

Entrevistas com crianças

50

As análises de conteúdo das respostas das crianças permitiram evidenciar quatro

categorias do relacionamento parental.

1. Atividades de lazer. Atividades como brincar, praticar esportes, assistir televisão,

jogar vídeo game e passear no shopping foram descritas como as que as crianças mais

gostam de fazer com seus pais. Atividades que envolvem alimentação, como “ir na

pizzaria”, “ela me compra pastel”, “fazer comida com ele”, “quando a gente come juntas”

também foram referidas como de maior preferência das crianças.

2. Cuidados. As respostas mais frequentes das crianças, quando questionadas sobre

o que mais gostam na mãe e no pai, referiram-se à questão dos cuidados. Os mesmos foram

entendidos como preocupações em relação à higiene, alimentação, vestuário, atenção,

carinho, companheirismo, auxílio nas atividades da escola. O suporte financeiro também

foi mencionado por alguns participantes.

“É preciso tratar com carinho. Quando a gente é pequena, dar banho nos filhos...

não bater nos filhos quando não é necessário... dar comida pros filhos, e fazer os filhos

bem. Porque quando vai pra escola, com a roupa toda rasgada, toda suja, tem que ver se a

roupa tá rasgada e se a roupa tá limpa... é o que a minha mãe não faz... agora eu tô

morando com a minha avó e ela faz isso” (C1).

“Me dou bem com meu pai porque ele me leva pra passear, porque ele fica comigo,

ele brinca comigo, ele se preocupa comigo, porque ele é legal”(C3).

“Um bom pai ou uma boa mãe tem que ficar em casa. E também trabalhar, pra

ganhar dinheiro e comprar coisa pra mim” (C4).

3. Disciplina. Às crianças foi questionado sobre atividades e características nos pais

de que elas menos gostavam. A maioria das respostas envolveu questões de disciplina,

como organização do quarto e estabelecimento de castigos.

“Quando o nosso quarto tá bagunçado, ele manda a gente arrumar tudo. Ele pega

todas as roupas, bota em cima da cama e faz a gente arrumar tudo” (C1).

“Às vezes eu fico de castigo porque tiro nota baixa” (C2).

4. Segurança emocional. Outro aspecto relatado pelas crianças como uma queixa

em relação aos pais foi a falta de atenção, de diálogo e de paciência. Um participante

ressaltou que o que menos gosta na mãe é “quando ela não cumpre o que prometeu”.

“Minha mãe só fica deitada mexendo no computador” (C2).

51

“Eu me dou mais ou menos com minha mãe, porque eu não converso muito com

ela” (C2).

“O que não é legal no meu pai é que ele grita demais e fala demais da minha mãe”

(C3).

“Para ser um bom pai ou boa mãe é preciso que sejam pessoas que cumpram as

coisas. Que quando os pais são separados, o pai pague a pensão, que a mãe cuide dos

filhos, que não deixe na casa dos outros, só” (C3).

Entrevistas com Operadores do Direito

A partir da análise de conteúdo das respostas dos Operadores do Direito, foram

identificados quatro aspectos relevantes do relacionamento parental, considerando-se as

situações de disputa de guarda. As respostas dos participantes basearam-se nas

informações contidas nos laudos psicológicos que mais contribuem para a tomada de

decisão judicial.

1. Histórico do casal. Uma das participantes ressaltou a relevância de investigar a

vida conjugal do casal, desde o início do relacionamento, buscando uma compreensão do

momento e dos motivos que levaram à ruptura e consequente gerenciamento da situação de

separação conjugal. Esses dados contribuem para o entendimento da situação conflitiva de

disputa vivenciada por meio do processo judicial.

“Eu acho que é importante que conste: a vida conjugal do casal, anterior à ruptura

do relacionamento, o momento da ruptura do relacionamento, como foi, por que foi, quais

as causas...” (OD1).

2. Rotina. Foi destacada a importância de fornecer dados sobre a rotina dos pais e

dos filhos, antes e após a separação. O objetivo é identificar a participação e

disponibilidade dos pais para com os cuidados aos filhos.

“É importante saber como era o relacionamento com o filho antes da separação,

como era a atenção, o quanto ficava perto, o quanto brincava, conferia os temas de casa, e

agora como ele vê o filho, o quanto e o que ele sente falta, o que ele gostaria de estar

fazendo, quais são os medos que ele tem em o filho não estando com ele (com a guarda).

Eu acho que tem que ter a avaliação anterior e a avaliação do momento ... com quem a

criança era acostumada a conviver antes da separação, com quem ele cresceu/conviveu,

quem ele tem de referência...” (OD1).

52

2. Estado emocional dos genitores. Os participantes referiram que uma das mais

importantes contribuições dos laudos psicológicos diz respeito às informações sobre a

estrutura emocional dos genitores, e sua compatibilidade com o exercício da guarda. São

relevantes as informações acerca do vínculo afetivo entre pais e filhos, o comprometimento

e preocupações daqueles em relação à vida destes, e sua flexibilidade em relação ao outro

genitor.

“O carro chefe das avaliações psicológicas é o vínculo afetivo, é o afeto, esse é o

que prepondera... sempre se busca um elo afetivo, se existe, e esse assim também tem o

condão de puxar todos os pontos positivos saudáveis, do ponto de vista do interesse da

criança” (OD2).

“Um aspecto relevante para auxiliar o juízo seria: ‘qual dos pais estaria em

condições de assegurar à criança o direito de um vínculo regular e saudável com o outro,

incentivando a relação parental com o outro?” (OD3).

3. Motivação para a guarda. Os participantes ressaltaram ainda a motivação que

cada um dos genitores e/ou responsáveis apresenta para ficar com a guarda da criança.

Informações acerca dos motivos e dinâmica envolvidos no desejo da guarda do filho.

“Eu acho que o mais importante é o motivo, por que ele quer a guarda. Aquela

grande questão que o pai muitas vezes pede a guarda do filho porque quer ferir a mãe.

Porque normalmente o que é mais importante pra mãe: os filhos; o que é mais importante

pro homem: o patrimônio. Então, ele pede a guarda dos filhos ‘porque é assim que eu vou

me vingar dela’. E, ao contrário, a mesma coisa, ela pede uma pensão elevadíssima, ou

ela quer ficar com determinado bem que ela sabe que é muito importante pra ele, porque

ela quer de alguma forma incomodar. Então, qual é o motivo real que tu quer a guarda?

Qual é tua intenção? O que tu quer dar pro teu filho que tu quer ficar com a guarda? Eu

acho que isso é o fundamental” (OD1).

Entrevistas com psicólogos

A análise das respostas dos psicólogos participantes da pesquisa permitiu identificar

cinco categorias relativas ao relacionamento entre pais e filhos.

1. Estado emocional dos genitores. Foi destacada a relevância de investigar

aspectos emocionais de cada um dos genitores, seu nível de maturidade e de flexibilidade

em relação ao ex-parceiro. Esta categoria abrange ainda a qualidade do afeto entre pais e

filhos, a proximidade entre os mesmos, e a constância oferecida por cada um dos genitores.

53

Foram destacadas também as necessidades emocionais, como amor, afeto, carinho,

cuidado, confiança e parceria.

“A capacidade de um pai de manter um relacionamento, um vínculo muito

rotineiro, de dar constância, de dar segurança àquela criança” (P5).

2. Cuidados. Os participantes citaram a importância de avaliar a disponibilidade dos

pais para com os filhos. A energia, tempo e atenção que colocam à disposição para exercer

suas funções parentais. Um participante destacou a importância de avaliar situações de

risco (físico, sexual e/ou emocional) que a criança possa estar envolvida. Essa categoria

abrange ainda a rede de apoio com que os pais podem contar para os cuidados do filho.

“É uma construção diária que a cada etapa evolutiva vai demandar um tipo de

energia tanto dos pais quanto dos filhos” (P1).

3. Disciplina. Nessa categoria englobam-se o estabelecimento de limites, com

ressalva para a definição de papéis e consequente hierarquia familiar. Alguns participantes

destacaram evidenciar em sua prática clínica a dificuldade de muitos genitores em impor

limites e lidar com a questão da autoridade em suas famílias. As práticas educativas foram

outro aspecto mencionado pelos psicólogos, considerando relevante investigar

principalmente as práticas punitivas.

“Um relacionamento onde existe uma hierarquia, onde os pais devem ter um poder

maior que o dos filhos. E que possa haver um diálogo, respeito das diferenças, uma

aceitação entre a individualidade de cada um, podendo ter limites” (P4).

4. Comunicação. Os respondentes apontaram a importância do diálogo e respeito

das diferenças para um desenvolvimento saudável dos filhos.

“A relação de apoio, de afeto, de amor, de parceria e de confiança (...). E nas

outras fases eu acho que está mais presente a parceria, o diálogo, apesar de ter os

confrontos” (P2).

5. Histórico do casal. Um dos participantes destacou a importância de investigar o

histórico do casal, buscando informações sobre o planejamento e contexto do nascimento

dos filhos. Da mesma forma, foi apontada a importância de questionar os aspectos

transgeracionais da família do pai e da mãe, de forma a entender o papel que esse

relacionamento com seus genitores representa na criação de seus filhos.

54

“Acho que é importante ver também aspectos transgeracionais da família do pai e

da mãe pra investigar como eles foram criados e, a partir disso, como constroem o modelo

pra cuidar da criança” (P6).

Discussão

Um dos primeiros pontos a serem apresentados na discussão do presente estudo diz

respeito aos instrumentos utilizados. Conforme descrito anteriormente, foram construídas

entrevistas semiestruturadas específicas para cada grupo de respondentes. As questões

foram elaboradas de forma diferenciada com o propósito de extrair o melhor de cada

participante, considerando as características e experiências pessoal e profissional de cada

grupo.

O grupo de participantes dos Operadores do Direito apresentou algumas

peculiaridades em relação aos demais grupos, provavelmente em decorrência do foco das

questões, mais limitado ao resultado das perícias de disputa de guarda. Uma categoria que

emergiu apenas nesse grupo foi “motivação para ficar com a guarda”. Os demais

participantes não citaram esse aspecto, provavelmente porque as questões de seus

instrumentos não enfocaram situações de perícia e disputa de guarda. Da mesma forma, a

revisão de literatura buscada não abordou a questão da motivação para a guarda, por se

tratar de algo muito específico do contexto de disputa de guarda.

Ainda em relação aos resultados dos operadores do Direito, chama a atenção que as

categorias emergidas enfocam as condições dos genitores, não sendo citada diretamente a

criança. Foram destacados o histórico do casal, o envolvimento dos genitores na rotina do

filho, as condições emocionais dos genitores e a motivação para a guarda. Todos são

aspectos relevantes, porém observou-se que a opinião e/ou preferências da criança não

foram mencionadas. Considerando-se que a maioria dos filhos cujos pais disputam sua

guarda é de tenra idade, é possível que para os juristas participantes deste estudo o foco da

avaliação não deva ser a criança, e sim os genitores. Não é possível generalizar os

resultados, mas é curioso observar que ao citarem o que é importante que conste em laudos

psicológicos, esses profissionais dirigiram suas respostas às características do pai e da mãe,

não incluindo necessariamente a criança. Vale apontar que, em termos jurídicos, crianças e

55

adolescentes com idade inferior a 18 anos são considerados incapazes para a vida civil, o

que possivelmente explique essa peculiaridade das respostas dos operadores do Direito.

Outros resultados permitem evidenciar diferenças entre aspectos de cunho mais

pessoal em contrapartida a outros de cunho profissional. As categorias dos genitores e dos

filhos destacaram aspectos como cuidados, disciplina e segurança emocional, fatores

presentes e constantes no dia-a-dia da relação pais-filhos. Por outro lado, o histórico do

casal e as condições psicológicas dos genitores foram fatores que os operadores do Direito

e psicólogos destacaram como importantes de serem avaliados no relacionamento parental.

A competência parental, o estado emocional adequado, a flexibilidade em relação ao ex-

cônjuge e o vínculo afetivo com o filho são os aspectos mais importantes de serem

avaliados em situações de disputa de guarda, de acordo com estudos internacionais e

nacionais na área (Ackerman & Ackerman, 1997; Keilin & Bloom, 1986; Lago &

Bandeira, 2008).

O conceito de spillover (Erel & Burman, 1995) abordado na literatura também foi

trazido pelos genitores participantes do estudo. Através de expressões como “ambiente

harmonioso” ou “ambiente saudável”, os pais referiram a importância de um

relacionamento conjugal tranquilo para o desenvolvimento saudável dos filhos. Genitores

que estão separados também fizeram tal afirmação, relatando a necessidade de coesão em

relação às decisões da vida do filho.

De forma geral, várias categorias do relacionamento parental trazidas pelos

participantes corroboram os dados da literatura. Entre elas, destacam-se: comunicação

(Bohanek, Marin, Fivush & Duke, 2006; Gomide, 2003; A. T. B. Silva, 2000), cuidados

(Maciel & Cruz, 2009; Rivera et al., 2002; ), disciplina (Erel & Burman, 1995; Rivera et

al., 2002; A. T. B. Silva, 2000), rotina (Moreira & Biasoli-Alves, 2008) e necessidades

básicas (Rivera et al., 2002). Essas categorias são comumente referidas na literatura, e

também foram as mais comuns entre os grupos de participantes, o que leva a concluir que

são aspectos fundamentais do relacionamento parental.

Em relação à categoria cuidados, é válido destacar a questão da autonomia e

independência dos filhos. Os cuidados dos genitores com os filhos devem implicar também

o atendimento às necessidades de forma adequada à idade dos mesmos, respeitando e

incentivando sua autonomia. Assim, o profissional ao apreciar a dimensão “cuidados” deve

56

considerar quais os cuidados tomados, e se os mesmos estão apropriados à etapa de

desenvolvimento dos filhos.

Outro aspecto englobado ainda na categoria “cuidados” foi o controle do uso do

computador, citado como uma preocupação dos genitores. Trata-se de questão bastante

atual, considerando-se a grande exposição dos filhos aos avanços tecnológicos, que nem

sempre são benéficos, e que exige atenção à proteção dos filhos a situações de risco.

O suporte financeiro, item trazido pelas crianças respondentes, foi incluído também

na categoria “cuidados”. Os participantes reconheceram a importância dos genitores

trabalharem para poder oferecer-lhes melhores condições de vida, seja em termos de

moradia, lazer ou estudo. Esse item também foi abordado pelos genitores, que

responderam ser importante oferecer condições básicas de infraestrutura de moradia e lazer

para um bom desenvolvimento dos filhos. Contudo, o suporte financeiro não foi destacado

a partir das análises das respostas dos psicólogos e operadores do Direito.

O brincar foi citado pelos genitores e também pelos filhos. Para os genitores, o

brincar e a diversão foram abordados como uma forma de comunicação, de aproximação

com os filhos, de participação ativa em suas vidas. Vários pais lamentaram a falta de

tempo e energia para atividades de lazer com seus filhos. Por outro lado, as respostas das

crianças em relação ao brincar, estar junto, transmitiram uma ideia de “cuidado”, ou seja,

as crianças revelaram sentirem-se cuidadas e protegidas quando os pais brincam com elas,

levam a parques e restaurantes. Da mesma forma que os pais lamentaram a falta de tempo

e energia, algumas crianças também lamentaram a falta de tempo e atenção dos pais,

questões referidas na literatura (Black et al., 1999; Brandth & Kvande, 2002; Warren &

Johnson, 1995).

A categoria educação também foi abordada de forma diferenciada entre pais e

filhos. Os pais trouxeram questões relacionadas à preocupação com a garantia de uma

educação formal juntamente com a educação informal, dos bons modos e transmissão de

valores. Por outro lado, os filhos abordaram a questão da escola por meio da participação e

auxílio nas tarefas e estudos para provas. Dados da literatura (Amato & Gilbreth, 1999;

Bacete & Betoret, 2000; Coley,1998; Flouri & Buchanan, 2003; Hill & Taylor, 2004;

Pelegrina et al., 2003; Vizzotto, 1988) revelam que a participação dos pais nas atividades

escolares propicia melhor desempenho acadêmico aos filhos.

57

Por fim, o item “cumprimento de promessas”, englobado na categoria “segurança

emocional”, foi destacado exclusivamente nas análises das respostas das crianças. Esse

aspecto foi mencionado por A. T. B. Silva (2000), como sendo uma habilidade social

fundamental para o bom desenvolvimento das crianças. Especialmente nas respostas das

crianças filhas de pais separados foi possível observar essa queixa em relação aos

genitores, por não cumprirem o estipulado.

Considerações Finais

O presente estudo apresenta limitações por se tratar de um estudo qualitativo, com

número reduzido de participantes, o que impede generalizações a partir da análise dos

dados. A diferenciação dos instrumentos conforme a categoria de respondentes também

aponta limitações e possíveis vieses. É possível que a diferenciação das questões das

entrevistas tenha proporcionado o surgimento de algumas categorias de respostas em uns

grupos e em outros, não. Destaque-se, por exemplo, que as entrevistas com crianças e

genitores não abordaram o tema de disputa de guarda, diferentemente das entrevistas

realizadas com os profissionais.

Por outro lado, ainda que apresente limitações, o estudo em questão permitiu uma

exploração minuciosa das respostas das diferentes categorias de respondentes, apontando

diferenças e semelhanças entre as mesmas. Dessa forma, contribuiu para um entendimento

mais completo do termo “relacionamento parental”, a partir das experiências pessoais e

profissionais dos participantes, corroborando a teoria existente acerca do tema.

58

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62

SEÇÃO II

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

A área da Psicologia Jurídica encontra-se em plena expansão, representando um

importante campo do conhecimento científico para a Psicologia em interface com as

ciências jurídicas. Dentre as áreas de atuação do psicólogo jurídico, destaca-se a área do

Direito de Família, cuja demanda pelo trabalho dos psicólogos tem se revelado crescente,

principalmente no âmbito das perícias judiciais. Conforme assinalam Costa e Cruz (2005),

no campo de atuação do Direito de Família, os psicólogos participam, predominantemente,

nos processos de separação e divórcio, disputa de guarda e regulamentação de visitas.

As perícias judiciais têm como objetivo elucidar situações e fatos controversos,

decorrentes de conflitos de interesses em relação a um direito pleiteado (Rovinski, 2004).

Ainda que a perícia não se constitua uma verdade soberana, seus resultados servem muitas

vezes de apoio aos juízes, que justificam suas decisões com base nas informações trazidas

ao processo pelo perito (Jesus, 2000). Conforme observa Taborda (2004), o resultado do

trabalho pericial deve ser apresentado através de um laudo técnico sucinto, com seus

achados descritos de forma precisa e analisados de forma a fundamentar cada conclusão.

O objetivo do trabalho pericial do psicólogo é destacar e analisar os aspectos

psicológicos das pessoas envolvidas em processos judiciais, nos quais se discutem questões

afetivo-comportamentais da dinâmica familiar. Ademais, a perícia busca contribuir para a

garantia dos direitos e o bem-estar da criança e/ou do adolescente, através do auxílio na

tomada da decisão judicial que melhor atenda às necessidades dessas pessoas (D. M. P.

Silva, 2006). Nos casos que envolvem questões relacionadas à guarda dos filhos, além de

avaliar a relação entre os ex-cônjuges, os psicólogos devem realizar uma avaliação que

contemple a dinâmica da criança, desde seus comportamentos manifestos até os

significados latentes (E. L. Silva, 2005).

Maciel e Cruz (2009) destacam que o psicólogo perito deve trabalhar no sentido de

valorizar o papel dos pais na tomada de decisão, ressaltando as responsabilidades parentais

com relação às necessidades dos filhos. De acordo com os referidos autores, o foco de uma

avaliação psicológica no âmbito do Direito de Família está na inter-relação entre as

63

competências parentais, as necessidades dos filhos, as diferenciações de papéis familiares,

os contextos em que está inserida a problemática apresentada e os ciclos de vida individual

e familiar.

A revisão da literatura internacional aponta diferentes focos que uma avaliação

psicológica envolvendo disputa de guarda deve ter. Contudo, boa parte dos autores enfatiza

a importância de avaliar a qualidade dos relacionamentos entre pais e filhos (Chasin &

Grunebaum, 1981; Gardner, 1982; Goldstein, Freud & Solnit, 1973; Jackson et al., 1980;

Lanyon, 1986; Levy, 1978). Através dos dados da pesquisa realizada pela autora (Lago &

Bandeira, 2008), foi possível corroborar tais achados, uma vez que o relacionamento da

criança com cada um de seus genitores foi apontado como o fator mais relevante para

recomendação de quem deve ficar com a guarda do(s) filho(s). Contudo, a análise dos

testes utilizados nessas avaliações, conforme a mesma pesquisa, permitiu concluir que os

vínculos parentais não são avaliados através de testagens com esse propósito, mas sim

através de entrevistas, observações clínicas e dados que outros instrumentos projetivos

possam fornecer.

Ainda que procedimentos como entrevistas e observações clínicas sejam muito

relevantes em uma perícia de disputa de guarda, os testes psicológicos apresentam algumas

vantagens importantes nesse contexto. Os testes fornecem indícios mais acurados quanto às

necessidades, defesas psicológicas e prejuízos psíquicos decorrentes da situação conflitiva

que levou as partes ao Judiciário (Shine, 2003). Ademais, são um material concreto a que

os psicólogos envolvidos (peritos e assistentes técnicos) podem reportar-se dentro de uma

polêmica (Castro, 2001). Brodizinsky (1993) aponta que a administração padronizada e os

procedimentos de levantamento dos resultados dos testes reduzem os problemas éticos e

legais, sendo uma forma de fortalecer perante o Judiciário a consistência e validade dos

achados apresentados através de uma avaliação psicológica.

Conforme apontado anteriormente, a qualidade do relacionamento pais-filhos é

destacada por vários autores como um dos objetivos de uma perícia de disputa de guarda.

A literatura corrobora essa premissa por meio de diversos estudos que comprovam a

importância da qualidade do relacionamento parental para o desenvolvimento saudável de

crianças e de adolescentes (Burman, John & Margolin, 1987; Lerner, Spanier, & Belsky,

1982; Parke & Slaby, 1983; Patterson, 1982). Portanto, é necessário que os peritos utilizem

64

técnicas e instrumentos que avaliem a qualidade do relacionamento parental, para fornecer

subsídios consistentes às avaliações de disputa de guarda.

Tendo em vista a carência de instrumentos de avaliação delineados para a área

forense no Brasil, e a importância de avaliar os relacionamentos parentais em situações de

disputa de guarda, a construção do SARP revela-se apropriada. O Sistema de Avaliação do

Relacionamento Parental, considerando o contexto de disputa judicial de guarda, permitirá

maior uniformidade nos procedimentos e facilitará a comunicação no contexto legal.

O SARP é um conjunto de técnicas que tem como objetivo avaliar a qualidade do

relacionamento entre pais e filhos, de forma a subsidiar possíveis recomendações acerca da

guarda dos filhos. O sistema é composto de, pelo menos, três técnicas: uma entrevista

semiestruturada aplicada aos genitores; um protocolo de avaliação infantil aplicado a

crianças de 5 a 12 anos; uma escala pontuada pelo próprio avaliador. A seguir serão

apresentados os estudos que deram origem a cada uma dessas técnicas que integram o

SARP.

65

SEÇÃO II

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 3

Construção da Entrevista SARP

A partir da revisão de literatura na área de avaliação psicológica e disputa de guarda

e também com base na experiência prática das autoras, foi elaborada uma entrevista

semiestruturada, com um total de 32 questões. A entrevista está dividida em oito áreas, as

quais pretendem abranger os aspectos mais relevantes do relacionamento pais-filhos,

considerando-se o contexto judicial de disputa de guarda. Após essa construção inicial,

buscou-se aperfeiçoar o instrumento, através de um estudo realizado com profissionais

com experiência na área de família e/ou disputa de guarda.

Método

Participantes

Dezesseis profissionais avaliaram as questões da entrevista semiestruturada para os

genitores. Parte da coleta foi realizada em Portsmouth, Reino Unido, em duas instituições:

CAFCASS (Children and Family Court Advisory and Support Service) e FADS (Family

Assessment and Development Service). A primeira instituição trabalha diretamente com

questões de disputa de guarda, ao passo que a segunda lida com questões de destituição do

poder familiar. Cinco assistentes sociais do CAFCASS e sete assistentes sociais do FADS

participaram da pesquisa.

A segunda parte da coleta foi realizada no Brasil, com quatro psicólogas. Destas,

uma trabalha no Núcleo de Atendimento Familiar do Foro Central de Porto Alegre, uma

trabalha no Departamento Médico-Judiciário do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

e duas são terapeutas de família com experiência clínica e acadêmica.

66

Procedimentos

Os participantes receberam o convite para participar do estudo pessoalmente

(respondentes do Reino Unido) ou por e-mail (respondentes brasileiros). Os que aceitaram

participar do estudo receberam, de antemão, o Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (TCLE) (Anexo G) e as questões da entrevista semiestruturada para que

pudessem avaliar as mesmas quanto à relevância e adequação. Após, foram agendadas

entrevistas com os participantes e as mesmas foram gravadas em áudio, para que houvesse

um registro das devoluções para posterior análise. Apenas uma participante não permitiu a

gravação. No caso dos participantes ingleses, o TCLE e as questões da entrevista foram

traduzidos pela própria pesquisadora e explicações adicionais sobre o estudo e

funcionamento das avaliações psicológicas no contexto forense no Brasil foram fornecidas.

Instrumento

O instrumento do presente estudo apresentava uma breve explicação do objetivo da

entrevista semiestruturada proposta e as orientações para preenchimento do mesmo. As

questões que compuseram essa entrevista foram criadas a partir da revisão da literatura do

tema e da experiência das pesquisadoras (Anexo H). Aos participantes era solicitado que

avaliassem cada questão quanto à relevância (pertinente ou desnecessária) e à adequação

(apropriada ou sugere reformulações). Havia espaço no instrumento para sugestões

também de outras áreas/perguntas que não houvessem sido contempladas na entrevista.

Resultados e Discussão

Inicialmente, foi realizada uma análise quantitativa (levantamento de frequências)

dos dados referentes à relevância das questões, sendo as mesmas consideradas pertinentes

ou desnecessárias. Das 32 questões propostas, 15 foram unanimemente consideradas

pertinentes. Dezesseis questões foram consideradas pertinentes por 80% ou mais dos

participantes. Apenas a questão nº 21, que trata sobre a divisão de despesas do filho entre

os cônjuges, obteve percentual de relevância inferior a 80% (69%) em relação à relevância.

Cinco participantes a consideraram desnecessária, todos do Reino Unido. O entendimento

67

dos respondentes é o de que esse é um aspecto que compete aos advogados questionarem, e

não aos assistentes sociais. Contudo, a questão foi mantida na entrevista, por entender-se

que ainda que não sejam os assistentes sociais ou psicólogos, ou sequer os advogados, que

irão definir a pensão alimentícia, esse é um aspecto importante a ser considerado em

disputas de guarda. A preocupação com a sobrevivência e condições de vida do filho deve

importar a ambos os genitores, independentemente de quem detenha a guarda. McLanahan

(1999) observou que os problemas econômicos de famílias divorciadas, como o

estabelecimento de pensões alimentícias, explicam cerca de metade dos problemas de

ajustamentos pós-divórcio evidenciados nas crianças.

A seguir, foi realizada uma análise qualitativa da adequação das questões. Foram

organizadas todas as críticas e sugestões de reformulação para cada uma das questões. As

pesquisadoras, em concordância, decidiram quais reformulações aceitar ou não, embasadas

na literatura e na experiência prática com o tema. Buscou-se ainda, nessas análises, manter

o foco do objetivo maior da pesquisa, que era a construção do Sistema de Avaliação do

Relacionamento Parental para ser utilizado em situações judiciais de disputa de guarda.

Cinco questões não receberam nenhuma crítica ou sugestão de reformulação e,

portanto, mantiveram sua redação inicial. Os resultados serão descritos por áreas,

respeitando a categorização previamente feita no próprio instrumento do estudo, qual seja:

rotina da criança, escola e amigos, comunicação, rede de apoio, estabelecimento de regras,

flexibilidade e comunicação entre os genitores, ajustes pós-separação e motivação para

ficar com a guarda. Serão apresentadas as sugestões feitas para cada área e, ao final, será

apresentada a versão final da entrevista, após as reformulações sugeridas pelos

participantes.

Rotina da Criança

A versão inicial da entrevista continha sete questões referentes à rotina da criança.

As questões nº 3 (refeições do filho) e nº 5 (cuidado com atividades de higiene) foram

consideradas por todos os participantes como apropriadas e, portanto, não sofreram

alterações.

Foi aceita a sugestão de que a questão nº 6 (atividades de final de semana) devesse

vir logo a seguir da questão nº 1 (dia de semana), de forma a proporcionar melhor

sequência para as questões. A questão nº 2 (sono da criança) recebeu várias críticas, sendo

considerada difusa e muito ampla, requerendo reformulações. Foi sugerido questionar além

68

do sono, também sobre a necessidade de cuidados especiais do filho, tais como alergias,

fraldas, asma, diabetes. Por considerar essa sugestão pertinente, e aliado ao fato de que

vários participantes salientaram a importância de questionar sobre o histórico de vida da

criança, as pesquisadoras optaram por incluir no Sistema de Avaliação do Relacionamento

Parental um roteiro de entrevista de anamnese, que abarcará essas questões do

desenvolvimento da criança. Assim, a versão final da entrevista semiestruturada contará

com um roteiro de entrevista de anamnese inicial.

A questão nº 4 (comidas que gosta) recebeu uma sugestão de reformulação

referente à redação. Foi proposto, e aceito, substituir “você saberia dizer” por uma

pergunta mais direta, restando “qual é a comida que seu filho mais gosta? E a que menos

gosta?”.

Por fim, foi apontado que a questão nº 7 abarca duas situações diferentes:

machucar-se e ficar doente. O machucar-se é uma situação mais imediata e, portanto, seria

mais interessante perguntar sobre quando fica doente. Outra crítica recebida ainda referente

a essa questão foi a pergunta “quem leva ao médico”, pois considerando a desejabilidade

social, é muito provável que cada um dos genitores responda que ele/ela é quem leva ao

médico, ainda que isso possa não ser a realidade. Portanto, optou-se por reformular essa

questão, cuja redação final ficou “quando seu filho fica doente, que cuidados são tomados?

Por quem?”.

As questões propostas nessa seção buscam colher informações sobre as

necessidades de caráter físico-biológico, cognitivas, emocionais e sociais, conforme

apontam Rivera et al. (2002). São feitos questionamentos mais gerais e alguns

detalhamentos sobre essas necessidades são explorados em outras seções da entrevista.

Ainda que tenham sido feitas sugestões de reformulações da redação das perguntas ou de

sua localização na estrutura do instrumento, todos os participantes consideraram pertinente

questionar sobre a rotina de vida da criança.

Os dados da rotina permitem investigar a qualidade e adequação da interação de

cada um dos genitores com seus filhos (Werner & Werner, 2004) e fornecem informações

acerca do cuidado diário (Patterson, 1982). Outra questão relevante apontada por Tornaría,

Vandemeulebroecke e Colpin (2001) é a da adaptação das atividades às crianças. É

importante levantar dados não apenas sobre o que os pais fazem com as crianças, mas

69

também quais as atividades que as crianças gostam de fazer e se há um ajustamento entre o

que é necessário e prazeroso conforme o nível desenvolvimental da criança ou adolescente.

Escola e amigos

Foram propostas quatro questões nessa seção da entrevista, e todas receberam

sugestões de reformulação. Dois participantes consideraram a questão nº 8 (locomoção

para escola) como desnecessária, alegando que muitas crianças utilizam transporte escolar

ou que o genitor que detém a guarda é o responsável pela locomoção da criança até a

escola e, dessa forma, a resposta seria óbvia. Contudo, as pesquisadoras optaram por

manter a questão, pois a consideram pertinente e adequada, uma vez que é importante

averiguar as preocupações dos pais acerca do manejo do transporte do filho para escola.

A questão nº 9 recebeu diferentes sugestões, de forma a torná-la mais aberta e

ampla. Assim, sua redação foi alterada para “Como tem sido o desempenho escolar de seu

filho? Como você tomou conhecimento dessas informações?”.

Da mesma forma, sugestões também foram feitas à redação da questão nº 10. A

pergunta foi alterada para “Quais são as combinações com seu filho em relação aos

temas/provas? É preciso ajudá-lo? De que forma?”.

Foram feitas sugestões com o propósito de ampliar a questão nº 11, com

informações que deverão ser exploradas caso não sejam trazidas pelos genitores. “Fale-me

sobre os amigos de seu filho” (Quem são? Você os conhece? Com que frequência os vê?

Algum amigo preocupa você?).

De certa forma, a seção “escola e amigos” também faz parte da rotina da criança.

Porém, devido às especificidades do tema, tais como contato com professores, auxílio nas

tarefas e disponibilidade para participar de atividades escolares e sociais do filho, optou-se

por elaborar essa seção em separado. O envolvimento de cada genitor nessas atividades do

filho reflete uma parte do relacionamento parental, pois é sabido que a escola e amigos são

dimensões de extrema importância na vida de crianças e adolescentes.

As informações levantadas nessa seção objetivam identificar o envolvimento dos

genitores na vida escolar e social dos filhos (Rivera et al., 2002) e o exercício da função de

apoio e responsabilidade com os filhos (Dantas, Jablonski & Féres-Carneiro, 2004;

Wagner et al., 1999). A função de orientação, apontada por Maciel e Cruz (2009) também

pode ser avaliada a partir das perguntas dessa seção. Conhecer os amigos dos filhos revela

não apenas o quanto um genitor acompanha a vida de seu filho, mas também pode ser visto

70

como uma forma de proteção. As relações afetivas com amigos auxiliam no processo de

adaptação dos filhos do divórcio, uma vez que as consequências negativas deste evento são

amenizadas a partir dos recursos pessoais trazidos pelas amizades (Brito & Koller, 1999).

Comunicação

Duas questões compõem essa seção da entrevista. A questão nº 12 foi mantida,

tendo sido consideradas desnecessárias as sugestões de acréscimo de questionamentos

sobre contatos telefônicos feitas por alguns participantes. A questão nº 13 foi reformulada,

com o objetivo de tornar a pergunta mais compatível com as diferentes idades dos filhos

que o instrumento se propõe a avaliar. Assim sendo, a nova redação ficou “Como é para

você conversar com seu filho?”. Caso o genitor não relate espontaneamente situações de

conversas agradáveis e desagradáveis, o entrevistador deverá questionar sobre as mesmas.

Diferentes autores (Hetherington & Jodl, 1994; Ceballos & Rodrigo, 1998; Rivera

et al., 2002; Werner & Werner, 2004) ressaltam a importância da comunicação para um

bom relacionamento pais-filhos. O quanto um genitor busca tomar conhecimento sobre a

vida de seu filho, ainda que não seja seu guardião, e a forma como busca estabelecer o

diálogo permite evidenciar o engajamento e participação dos pais no crescimento das

crianças, o que é vital para um desenvolvimento saudável (Burman, John & Margolin,

1987; Lerner, Spanier, & Belsky, 1982; Parke & Slaby, 1983; Patterson, 1982).

Rede de apoio

Essa seção contava com quatro questões. A questão n◦ 14 não sofreu alterações, e a

questão 16 foi deslocada para a seção “escola e amigos”. A questão 15 recebeu uma

observação para buscar mais informações sobre a pessoa com quem a criança fica em casos

de imprevistos. A questão 17 foi reformulada e passou a ter a seguinte redação: “Você

pode contar com alguém próximo para atender seu filho num momento de necessidade?”

(solicitar informações sobre convívio e a relação entre a criança e as pessoas).

A literatura aponta a importância da rede de apoio no processo de adaptação à

situação do divórcio (Britto & Koller, 1999; Bronfenbrenner, 1979/1996; McLanahan,

Wedemeyer, & Adelberg, 1981). Família de origem, amigos, vizinhos e escola contribuem

para a manutenção do bem-estar ao longo do desenvolvimento, tanto dos filhos quanto dos

pais. Ademais, é preciso considerar que, na sociedade moderna em que vivemos, é comum

que ambos os pais trabalhem fora. Assim, além de auxiliar no processo de ajustes pós-

71

divórcio, é necessário contar com uma rede de apoio para auxiliar nos cuidados com os

filhos.

Estabelecimento de regras

Uma das primeiras sugestões apontadas pelos participantes foi em relação ao termo

“regras”, com sugestão de substituição por “limites” ou alteração para “disciplina”. Optou-

se por alterar o nome da seção para “estabelecimento de limites”, julgando ser o mais

apropriado.

Inicialmente, essa seção continha três questões. Dessas, apenas uma manteve a

redação inicial. A questão 18 foi ampliada e dois termos foram alterados: “regras” foi

substituído por “combinações” e “cobra” por “monitora”. Assim, sua redação final restou

“Existem combinações em relação à rotina da criança (horários, tarefas, obrigações)?

Quais? Como são monitoradas?”.

Foi sugerido o acréscimo de uma questão sobre as recompensas, já que havia

perguntas sobre castigos. A sugestão foi aceita e, portanto, foi acrescentada a questão “O

que você faz quando seu filho cumpre o combinado?”.

A questão 20 foi considerada como suscetível a um alto grau de desejabilidade

social, gerando a incompatibilidade de uma resposta fidedigna. Assim, optou-se por

reformular a questão para “Dê um exemplo de castigo que você costuma aplicar em seu

filho. Quando esse castigo não funciona, o que você faz? E se a criança segue lhe

desobedecendo?”.

O estabelecimento de limites, disciplina e organização são aspectos que fazem parte

das práticas educativas. A literatura aborda essa questão com diferentes nomenclaturas:

autoridade (Werner & Werner, 2004), controle (Maciel & Cruz, 2009; Tornaría,

Vandemeulebroecke & Colpin, 2001), instrução (Patterson, 1982), sanção com afeto e

disciplina (Erel & Burman, 1995), estabelecimento de limites (Rivera et al., 2002). Ainda

que sob diferentes nomes, todos ressaltam a importância dos limites como uma prática

educativa saudável e necessária. É importante levantar, através das perguntas dessa seção,

não apenas o que os genitores alegam serem as combinações ou “regras” da casa. É

provável que essas respostas reflitam a desejabilidade social e, portanto, é fundamental

enfatizar o monitoramento das combinações e punições (castigos).

72

Flexibilidade e comunicação entre os ex-cônjuges

Da mesma forma que na seção anterior, foi sugerida reformulação no nome da

seção, que passou a ser “flexibilidade e comunicação entre os genitores”. A ideia é não dar

ênfase ao sistema conjugal e, portanto, evitar a terminologia “ex-cônjuge”, preferindo o

termo “genitor” ou “o pai/a mãe de seu filho”. Dentre as seis questões propostas nessa

seção, apenas uma sofreu alteração na redação, de forma a torná-la mais específica para o

contexto da parentalidade. Sugeriu-se ainda o acréscimo de uma pergunta, que deveria

iniciar a seção: “De forma geral, como você diria que é seu relacionamento com o pai/mãe

de seu filho, para tratar de assuntos de seu filho?” A seguir, vem a questão 22, com as

devidas reformulações e, logo após, as questões 21, 23 e 24, que tratam sobre as despesas

do filho. Observe-se que, assim como no título da seção, a expressão “ex-cônjuge” foi

alterada para “pai/mãe de seu filho”.

As questões 24 e 26 mantiveram sua redação original. Na questão 25, foi sugerido

substituir o verbo “estipular” por “combinar”, de forma que o genitor guardião não se sinta

“dono” da criança. Foi sugerido, ainda, acrescentar a essa questão: “E se surgirem

imprevistos como aniversários, viagens ou doenças nos dias de visita do pai/mãe de seu

filho?”.

O subsistema conjugal está associado ao funcionamento do relacionamento parental

(Erel & Burman, 1995). Assim, ainda que os pais estejam separados e, portanto, não exista

mais o subsistema conjugal, a forma como os ex-cônjuges se relacionam vai influenciar na

relação entre pais e filhos, acarretando possivelmente maiores prejuízos ao genitor não-

guardião. Genitores que alimentam altos níveis de conflito com seu ex-parceiro tendem a

refletir isso na relação com os filhos por meio de pouca paciência e tolerância para lidar

com as necessidades diárias das crianças e adolescentes (Mossman & Wagner, 2008).

O apoio financeiro também exerce papel significativo para os filhos (Amato &

Gilbreth, 1999; King, 1994; Menning, 2002), uma vez que a pensão alimentícia é vista

como uma das formas de envolvimento do genitor não-guardião nos cuidados com o filho.

A pensão, a quantidade de contato e qualidade do relacionamento são os três aspectos que

a literatura prioriza nos estudos em relação à paternidade pós-divórcio (Sandler et. al.,

2008). Da mesma forma que o suporte financeiro, o contato com ambos os pais após o

divórcio é essencial para o bom desenvolvimento emocional dos filhos (Wallerstein &

Blakeslee, 1989). Atender às necessidades sociais e acadêmicas das crianças e adolescentes

73

é outro aspecto que deve ser priorizado para proporcionar uma boa qualidade de vida aos

filhos (Berger & Thompson, 1998). Para tanto, é importante que ambos os genitores sejam

flexíveis e cooperativos, de forma a privilegiar o melhor interesse dos filhos (Ehrenberg,

1996).

No que diz respeito às combinações em relação às visitas e o manejo diante de

imprevistos, a literatura traz o exemplo da situação de adoecimento do filho. Uma vez

mais, é preciso privilegiar as necessidades da criança para a manutenção ou não das visitas.

A doença não deve ser utilizada como uma desculpa para que não haja a visitação. Por

outro lado, se a doença for grave o suficiente para impedir a visita, é necessário que ambos

os genitores sejam flexíveis e cooperativos para ajustar o horário/dia da visita. O genitor

não-guardião deve reconhecer a necessidade do filho de ficar em casa, enquanto o guardião

deve entender a importância de garantir a visitação de seu ex-parceiro ao filho (Stolberg et

al., 2002).

Ajustes pós-separação

As três questões que compõem essa seção foram mantidas. Houve apenas uma

observação em relação à questão 29, para que a mesma fosse mais explorada, indagando

sobre como foi feita a aproximação com o novo parceiro, se ele/ela tem filhos, como são as

relações entre eles.

A literatura aponta que maior atenção tem sido dada à qualidade da relação

coparental em famílias reconstituídas, com a presença de madrastas e padrastos

(Braithwaite, McBride, & Schrodt, 2003). Isso porque o alto grau de conflito entre os ex-

parceiros é uma das influências mais prejudiciais no relacionamento pais-filhos (Amato,

Loomis, & Booth, 1995). Um dos maiores desafios de casais separados é o estabelecimento

dos limites de intimidade e poder (Cole & Cole, 1999; Graham, 2003/1997), especialmente

quando existem novos parceiros, o que frequentemente está associado a uma menor

interação coparental (Maccoby & Mnookin, 1992), menos apoio parental do ex-parceiro, e

mais atitudes negativas em relação ao outro genitor (Christensen & Rettig, 1995).

Desenvolver uma relação coparental cooperativa quando há o recasamento é um grande

desafio (Whiteside, 1998). Portanto, justifica-se a importância de investigar as situações de

recasamento, pois é sabido que as mesmas influenciam diretamente na relação pais-filhos.

74

Motivação para ficar com a guarda

Foi sugerido que a questão 30 fosse desmembrada em duas, por acreditar que a

pergunta “por que você quer a guarda de filho” explore aspectos mais subjetivos, ao passo

que “por que você é a pessoa mais indicada para ficar com a guarda de seu filho” pode

trazer à tona aspectos mais objetivos. Ambos os aspectos são importantes no contexto de

disputa de guarda e de relacionamento parental. A questão 31 manteve sua redação

original.

Considerações finais

A seção dos resultados buscou descrever as alterações, supressões e acréscimos que

foram feitos às questões da entrevista semiestruturada, além de discutir sua relevância de

acordo com a literatura do tema. Contudo, outras observações foram feitas pelos

participantes. Vários respondentes sugeriram transformar algumas perguntas em questões

mais abertas, de forma a evitar respostas pouco fidedignas. Outra sugestão importante foi a

de adaptar a redação, especialmente o tempo verbal, conforme a entrevista esteja sendo

aplicada ao genitor guardião ou ao não-guardião.

Foi sugerido o acréscimo de questões que explorem o histórico da criança, suas

necessidades emocionais e seu processo de luto em relação ao divórcio. Tais sugestões

foram consideradas pertinentes e estão contempladas no roteiro de anamnese, que

apresenta algumas perguntas mais direcionadas para o contexto de divórcio e disputa de

guarda.

O estudo apresentado contou com a participação de assistentes sociais e psicólogos,

com experiências profissionais diferentes, inclusive de contextos jurídicos distintos.

Acredita-se que essa característica enriqueceu os dados do estudo, tornando a entrevista

bastante completa e adequada. Observou-se, ainda, que os profissionais que trabalham

cotidianamente com serviços prestados ao Judiciário forneceram contribuições mais

significativas para a pesquisa.

Diante de todas as avaliações recebidas e os ajustes efetuados, acredita-se que a

entrevista para os genitores esteja apropriada ao seu objetivo (Anexo I). É importante

destacar que como se trata de uma entrevista semiestruturada, as questões poderão ser mais

aprofundadas, ou menos, conforme os casos que se apresentarem.

75

SEÇÃO II

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 4

Adaptação do Protocolo de Avaliação Infantil “Meu Amigo de Papel”

O tema de disputa judicial de guarda de filhos envolve, inevitavelmente, uma

decisão tomada por terceiros a respeito de aspectos relevantes da vida de crianças e

adolescentes, tais como: com quem vão morar e como dividirão seu tempo entre pai e mãe.

Surge, então, um dilema: como proteger os filhos dos conflitos pós-divórcio de seus pais e,

ao mesmo tempo, oportunizar-lhes o direito de expressarem suas opiniões sobre o assunto?

O princípio de que as crianças têm o direito de participar das decisões que afetam o

seu dia-a-dia está previsto na Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança, em

seu artigo 12 (United Nations, 2004). A Convenção das Nações Unidas representa o

mínimo que toda a sociedade deve garantir às suas crianças, reconhecendo em um

documento as normas que os países signatários devem adotar e incorporar às suas leis. É

necessário, assim, que cada Estado ratifique a convenção. No Brasil, essa ratificação foi

feita através do Decreto n° 99.710/90, que dispõe em seu artigo 3.1: "todas as ações

relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar

social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar,

primordialmente, o interesse maior da criança”.

Depreende-se da leitura do referido artigo que, para a determinação da guarda –

assim como em todas as questões referentes a crianças e adolescentes – o melhor interesse

da criança deve ser o critério norteador de toda e qualquer decisão. Contudo, a definição de

“melhor interesse da criança” não é clara. Quem define o que é melhor para a criança?

Seus responsáveis? A própria criança? Psicólogos? Assistentes sociais? Juízes de Direito?

O art. 1.583 do Novo Código Civil (NCC) prevê a possibilidade de guarda

exclusiva ou guarda compartilhada, e seu §2◦ determina que a “guarda unilateral será

atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la”. O referido parágrafo

76

ainda destaca que o genitor deverá ser capaz de propiciar aos filhos afeto, saúde, segurança

e educação, aspectos bastante amplos e complexos de serem avaliados.

Assim, fica clara a importância de estudos psicossociais e/ou avaliações

psicológicas que investiguem a aptidão dos genitores mencionada no art. 1.583 do NCC.

Para isso, é frequente a participação de crianças nesses estudos realizados por psicólogos

e/ou assistentes sociais. Sua participação permite que sejam ouvidas e possam expressar

seus sentimentos e vontades, além de auxiliá-las no processo de elaboração do divórcio de

seus pais.

Contudo, é importante atentar para alguns riscos que a participação de crianças

pode trazer ao processo, conforme bem destacam Parkinson e Cashmore (2008). O

primeiro deles é a criança ser colocada no meio do conflito de seus pais e ter que decidir

entre um deles. Outro risco é o da influência indevida, isto é, o quanto a vontade que a

criança expressa é a vontade própria, ou é um desejo que está influenciado por um dos

genitores. É importante que o profissional que escute a criança possa identificar suas reais

preferências e percepções, distinguindo as mesmas de meras reproduções das falas e/ou

sentimentos de seus genitores. Por fim, existe ainda o risco da responsabilidade pela

tomada de decisão. Ao expressar seus sentimentos e desejos em relação à separação dos

pais, a criança pode acreditar que ela será a responsável por decidir se ficará com a mãe

e/ou pai. Portanto, é necessário diferenciar a escuta da criança e a tomada de decisão.

Ouvir o que pensam, como estão se sentindo e quais suas preocupações e preferências não

implica que seus desejos serão atendidos.

Ainda que existam riscos e incertezas em relação a “indagar os desejos e

sentimentos da criança” ou até mesmo se a opinião das mesmas deveria sequer ser

investigada (Neale, 2002), o entendimento das autoras deste instrumento é de que as

crianças devem ser ouvidas. Considerando que crianças e adolescentes são sujeitos de

direito e acordando com dispositivos legais que lhes garantem a participação em processos

judiciais, defendemos a importância de oferecer à criança um espaço de escuta. A Lei

2.010/09, que dispõe sobre adoção, trouxe alterações ao Estatuto da Criança e do

Adolescente, dentre as quais a previsão da escuta da criança ou adolescente por equipe

interprofissional (art. 28 §1º). Fazendo uma analogia entre as situações de adoção e de

guarda, justifica-se a importância de ouvir as crianças nos processos de disputa de guarda e

regulamentação de visitas.

77

O momento de escuta da criança teria como objetivo não apenas conhecer sua

opinião sobre o assunto, mas também informar-lhe sobre o que está acontecendo de uma

forma que seja apropriada à sua idade e maturidade emocional. Pretende-se, ainda, que a

participação da criança no processo de guarda seja um momento para esclarecimento de

que a decisão da guarda não é sua responsabilidade. É necessário clarificar que seus

desejos, sentimentos e preocupações serão ouvidos, mas não necessariamente atendidos,

uma vez que essa decisão é dos adultos, os quais têm a obrigação de proteger e cuidar das

crianças.

Com o objetivo de atender à necessidade de participação das crianças nos processos

de disputa de guarda, foi desenvolvido um material gráfico para ser utilizado como meio

de comunicação com crianças com idades entre cinco e doze anos. A ideia da construção

desse material surgiu a partir da experiência de estágio de doutorado sanduíche realizada

em uma instituição do Reino Unido: CAFCASS (Children and Family Court Advisory and

Support Service – www.cafcass.gov.uk). O material britânico é intitulado My needs, wishes

and feelings pack, e é um dos recursos que a instituição utiliza para auxiliar crianças e

adolescentes a compartilharem seus sentimentos com os profissionais, em sua maioria

assistentes sociais. O My needs, wishes and feelings pack é composto por estímulos

gráficos e textuais, e possui duas versões: uma para crianças menores, e outra para maiores

de 10 anos de idade.

O protocolo de avaliação infantil aqui descrito foi delineado, inicialmente, para uso

com crianças em contexto de disputa de guarda e integra o conjunto de técnicas do SARP

(Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental). Sua construção foi baseada no

modelo britânico do My needs, wishes and feelings pack. Algumas seções do material do

CAFCASS foram adaptadas para o contexto brasileiro e outras foram acrescentadas. Para o

processo de construção e adaptação deste material, foram desenvolvidas sete etapas, que

estão descritas a seguir.

Caracterização das etapas de adaptação do instrumento

Etapa 1 – Apreciação do material britânico por psicólogas brasileiras

Uma versão impressa do material gráfico do CAFCASS foi apresentada a quatro

psicólogas. Duas profissionais trabalham no Judiciário e possuem experiência com casos

78

de disputa de guarda, e as outras duas são terapeutas de família, com experiência na área de

ensino e pesquisa.

Nesta etapa, o material britânico foi apresentado às profissionais para uma

apreciação inicial. Todas demonstraram interesse e julgaram o material de ótima qualidade

e passível de adaptação para o contexto brasileiro. Uma das participantes destacou que esse

material contribuiria para sanar uma questão trazida muitas vezes por juízes, advogados e

promotores, que é a “prova” do que a criança expressou ao longo da avaliação.

Uma das psicólogas terapeutas de família recomendou o livro “Quando os pais se

separam” (Heegaard, 1998), como uma referência que poderia complementar as ideias

apresentadas no My needs, wishes and feelings pack. Os demais comentários e sugestões

referiram-se à possibilidade de criar instrumentos diferenciados conforme a idade ou o

sexo e à sua aplicação nos setores do Judiciário.

Etapa 2 – Análise de material complementar

A segunda etapa consistiu na análise do livro sugerido na etapa anterior. “Quando

os pais se separam” (Heegaard, 1998) é um livro com ilustrações infantis que apresenta

que aspectos devem ser trabalhados por familiares, terapeutas e educadores para auxiliar

crianças que estão passando pelo processo de separação de seus pais.

O processo de análise do material consistiu em levantar os aspectos abordados no

livro que poderiam fazer parte do protocolo de avaliação infantil. Como essa produção

bibliográfica possui um foco terapêutico, muitas das atividades propostas são apropriadas

para o contexto de psicoterapia, mas não para o enquadre da avaliação. Assim, apenas dois

aspectos foram identificados como passíveis de serem incluídos no protocolo de avaliação

infantil do SARP. São eles: mudanças na família e o que a criança pensa sobre os

sentimentos dos pais. Os textos foram adaptados e foram criadas ilustrações para explorar

essas temáticas.

Etapa 3 – Organização da estrutura do protocolo

A terceira etapa consistiu na condensação dos aspectos considerados como mais

relevantes para compor o protocolo. Para tal, foram consideradas as áreas investigadas na

entrevista semiestruturada para os pais (capítulo 3) e as dimensões do relacionamento

parental levantadas nos estudos teórico e empírico (capítulos 1 e 2). Assim sendo, do

material britânico foram aproveitados os tópicos: “sobre mim”, “minha jornada”, “minhas

79

preocupações”, “planos para o futuro”, e os acolhimentos inicial e final. O material de

Heegaard (1998) contribuiu com o acréscimo dos itens “minha família” e “meus pais”.

Com o objetivo de que o protocolo apresentasse uma estrutura lógica e

encadeamento de assuntos, foram acrescentados os tópicos “vamos brincar de contar

histórias?” e “minha rotina”. O item “vamos brincar de contar histórias” possui uma função

“quebra-gelo” e, por isso, é a primeira atividade a ser realizada, logo após a apresentação

do material. O contar histórias é uma atividade com que as crianças são familiarizadas, e os

assuntos explorados buscam investigar temas comuns na rotina das famílias. As histórias

do suco derramado (história 1) e do machucado no parque (história 2) foram adaptadas a

partir do The Attachment Story Completion Test (ASCT; Bretherton, Ridgeway & Cassidy,

1990) e a história do quarto bagunçado (história 3) foi criada a partir dos resultados das

entrevistas realizadas com as crianças do estudo descrito no capítulo 2. O tema “minha

rotina” foi acrescentado com o objetivo de contrastar as informações trazidas pelos pais na

entrevista semiestruturada com as informações trazidas pelos filhos.

Etapa 4 – Seleção do ilustrador

Uma vez que a estrutura do material estava organizada, procedeu-se à busca de

ilustradores para executar o projeto gráfico do “Meu amigo de papel”. Foram feitas

reuniões com três desenhistas, a fim de apresentar o projeto e discutir as ideias, de forma a

tornar viável a execução do material. A partir desses encontros, sugestões foram feitas e,

assim, o material foi aprimorado. Uma das definições foi a criação de materiais

diferenciados conforme o sexo, com desenhos que fossem apropriados à faixa etária dos 5

aos 12 anos de idade.

Para o tema “minha rotina” foi sugerida a representação de um jogo de tabuleiro, a

fim de facilitar a organização das ideias da criança. Dessa forma, ela iniciaria contando o

que faz logo ao acordar, passando por todo o dia, até chegar à noite.

Etapa 5 – Confecção da arte gráfica

Nessa etapa foi elaborada a arte gráfica do material. O ilustrador selecionado teve

acesso ao material britânico através do site do CAFCASS, que serviu de base para a

construção do instrumento brasileiro. As atividades: “minha rotina”, “minha família”,

“meus pais” e “vamos brincar de contar histórias”, delineadas exclusivamente para este

material, não estão presentes no material do CAFCASS. Portanto, houve total liberdade

por parte do ilustrador para criá-las.

80

Etapa 6 – Avaliação do material confeccionado

Esta etapa consistiu na avaliação dos estímulos gráficos e textuais do material

brasileiro. Os layouts das páginas do instrumento foram apresentados pelo ilustrador,

inicialmente, apenas na versão para meninos. Oito psicólogos com experiência em

atendimento a crianças analisaram o material e fizeram contribuições para seu

aprimoramento. As críticas envolveram a revisão de texto e alteração de alguns desenhos e

diagramações. As solicitações foram encaminhadas ao ilustrador, que realizou diversos

ajustes e, posteriormente, criou a versão para as meninas. A versão para meninas

diferencia-se da dos meninos nos desenhos dos personagens principais e em algumas cores

do material.

Etapa 7 – Definição do nome do protocolo infantil

A última etapa consistiu na criação do nome do instrumento. As versões finais

(masculina e feminina) foram apresentadas aos integrantes do Grupo de Estudo, Aplicação

e Pesquisa em Avaliação Psicológica (GEAPAP) da Universidade Federal do Rio Grande

do Sul (UFRGS), com a solicitação de sugestões de nomes para o material produzido.

Dentre as sugestões levantadas, optou-se por nomeá-lo “Meu amigo de papel”. A eleição

do nome foi feita em razão do mesmo compreender questões de confiança (amigo), lúdicas

(de papel) e também de neutralidade em relação ao sexo, sendo uma terminologia comum

para meninos e meninas.

Descrição do material

O material gráfico que faz parte do Sistema de Avaliação do Relacionamento

Parental (SARP) é composto por um livreto de apresentação do profissional (Anexo G) e

pelo protocolo de avaliação infantil (Meu Amigo de Papel) (Anexo H). A seguir serão

apresentadas as descrições de cada um desses materiais.

Livreto de apresentação do profissional

O livreto foi adaptado tendo como referência o material do CAFCASS, com

tradução dos textos originais e criação de novos desenhos. Foram criadas duas versões

idênticas, com diferenciação apenas do personagem principal, conforme o sexo da criança.

Objetivo: Apresentar o profissional (psicólogo ou assistente social) e os objetivos

do processo de avaliação em uma linguagem acessível à criança.

81

Aplicação: O profissional deverá conversar com a criança, apresentando-se e

explicando o que acontecerá ao longo do processo de avaliação. Os textos contidos no

livreto não necessitam serem lidos ipsis litteris, mas estão ali para que não sejam

esquecidas as principais informações: objetivo da avaliação, procedimentos,

encaminhamento de resultados e a responsabilidade dos juízes pela tomada de decisão. É

importante que o profissional seja espontâneo, independentemente de fazer a leitura literal

ou não, adaptando os textos conforme a idade da criança.

Meu Amigo de Papel

Atividade 1: Meu Amigo de Papel

Objetivo: Apresentar o material que será preenchido pela criança.

Aplicação: Sugere-se o seguinte rapport:

“Esse aqui é o Meu Amigo de Papel (mostra-se o protocolo), um amigo em quem

podemos confiar. Ele gosta de conhecer seus amigos, saber seus gostos, preocupações e

seus desejos para o futuro. E como bom amigo que é, o Meu Amigo de Papel está sempre

disposto a ajudar.”

A seguir, solicita-se à criança que escreva seu nome, idade e escola em que estuda.

No caso de crianças não alfabetizadas, ou em processo de alfabetização, o profissional

deve auxiliá-las e preencher as informações solicitadas.

Atividade 2: Vamos Brincar de Contar Histórias?

Objetivo: Explorar situações da relação parental referentes a limites/disciplina e

segurança emocional.

Aplicação: O profissional deverá explicar que o “Meu Amigo de Papel” começa

contando algumas histórias que não têm um fim, e solicita, então, que a criança o ajude a

criar um final para as histórias. Sugere-se:

“O Meu Amigo de Papel gosta de contar histórias, e ele quer que você brinque com

ele. A brincadeira é a seguinte: ele começa a história e você cria o final. Vamos brincar?”

É indicado que o profissional leia as histórias para crianças menores. No caso das

crianças maiores (9 – 12 anos), a própria criança poderá fazer a leitura. Essa orientação se

deve ao fato de que crianças em processo de alfabetização comumente apresentam

dificuldade para uma leitura mais fluida, podendo prejudicar a atenção ao enredo das

histórias.

82

A criança conta, então, como termina cada uma das três histórias. O aplicador

poderá questionar informações complementares sobre a reação da mãe, pai e filho, caso a

criança não as forneça na sua história. Ao final, o profissional deverá questionar se

algumas daquelas situações, ou algo semelhante, já aconteceu com ela, e como foi.

Não se trata de um teste projetivo, e sim da utilização da técnica de contar histórias

como uma aproximação para que a criança possa trazer elementos sobre o funcionamento

da disciplina em sua família, e a quem costuma recorrer quando está com problemas. As

respostas deverão ser anotadas em material de anotações do próprio examinador.

Atividade 3: Sobre Mim

Objetivo: Apresentação da criança.

Aplicação: O profissional deve esclarecer que o Meu Amigo de Papel gostaria de

conhecer melhor seu novo amigo e, para isso, ele quer saber o que ele gosta e o que ele não

gosta de fazer (indicando os locais na folha). É importante estimular a criança, pedindo,

por exemplo, que lhe conte sobre atividades/brincadeiras que gosta de fazer, atividades

extracurriculares, comidas e bebidas de sua preferência, pessoas importantes em sua vida.

A criança deverá ser orientada a falar sobre o que gosta e depois escolher apenas uma das

coisas de que falou para desenhar ou escrever no espaço destinado no Meu Amigo de

Papel. O mesmo procedimento será repetido para completar o espaço das “coisas que não

gosto”.

Sugestão:

“Agora o Meu Amigo de Papel quer conhecer melhor você. Para isso, ele quer

saber sobre o que você gosta e o que não gosta. Vamos conversar primeiro sobre o que

você gosta, e depois você escolhe uma coisa para desenhar ou escrever neste espaço”.

Caso a criança esteja apresentando dificuldades para falar sobre o que gosta, o

aplicador poderá fazer questionamentos como “O que você gosta de fazer?” “Que

brincadeiras você gosta? Com quem você brinca? Que programas de TV você assiste?”

“Que comidas você gosta?” etc.

Depois que a criança preencher o espaço destinado às “coisas que eu gosto”, a

mesma instrução será dada para o preenchimento das “coisas que eu não gosto”. É

importante nesse momento deixar a criança mais livre para expressar-se, uma vez que as

estimulações já foram fornecidas para a atividade anterior.

83

Atividade 4: Minha Rotina

Objetivo: Conhecer a rotina da criança e quem participa da mesma.

Aplicação: A criança poderá escrever ou solicitar que o profissional escreva para

ela (indicado para crianças menores). O objetivo desta atividade é saber o que a criança faz

desde o momento em que acorda até a hora em que vai dormir. O profissional deve

explorar as situações que julgar relevantes, especialmente se o que a criança trouxer estiver

em desacordo com o que os genitores responderam na entrevista semiestruturada.

Sugestão:

“Agora o Meu Amigo de Papel gostaria de saber sobre a sua rotina, ou seja, o que

você faz desde a hora que você acorda até a hora que você vai dormir. Você mesmo pode

escrever, ou pode me contar e eu escrevo para você.”

Atividade 5: Minha Jornada

Objetivo: Explorar eventos de vida importantes para a criança.

Aplicação: A atividade se propõe a investigar fatos importantes que aconteceram

desde o nascimento da criança até o momento atual. Nesse tópico a estimulação também é

importante, questionando sobre temas como irmãos, troca de escola, mudança de casa e/ou

cidade, doenças graves na família, perdas e a própria situação da separação dos pais, em se

aplicando ao caso. Nem todos os espaços precisam ser preenchidos.

Sugestão:

“Agora vamos conversar sobre sua jornada, ou seja, sobre coisas importantes que

já aconteceram na sua vida. Troca de escola, mudança de casa, nascimento de irmãos,

doenças graves e perda de pessoas queridas são alguns exemplos de coisas importantes. O

que já aconteceu na sua vida?”

Atividade 6: Minha Família

Objetivo: Explorar os sentimentos da criança em relação à família e/ou separação

dos pais.

Aplicação: O profissional deve ler a fala da personagem do desenho e, a partir da

mesma, tentar explorar se houve mudanças na família da criança. Em não havendo

mudanças, deve-se solicitar que a criança descreva como é sua família. Espera-se que a

página anterior tenha um encadeamento direto com esta, que visa a detalhar melhor os

84

sentimentos e percepções da criança em relação às mudanças ocorridas na família ou à

separação (se aplicável). É sugerido que a criança possa fazer um desenho de sua família

nessa página. Contudo, ela pode optar por fazer o registro por escrito das mudanças que

percebeu em sua família, ou de como é sua família.

Sugestão:

“Aqui temos um bonequinho dizendo: ‘As pessoas nascem, crescem, morrem...

Casam, se separam... O que mudou na minha família?’. Vamos pensar, então, na sua

família: alguma coisa mudou na sua família?” “Você pode fazer um desenho da sua

família ou, se preferir, escrever algo sobre ela.”

Caso a criança responda que nada mudou em sua família, questionar “Então, que

tal conversarmos sobre como é a sua família?”. Da mesma forma, a criança é orientada a

desenhar a família, ou escrever algo a respeito.

Atividade 7: Meus Pais

Objetivo: Permitir que a criança exponha sua percepção sobre os sentimentos dos

pais.

Aplicação: Na atividade 6 é esperado que a criança aborde seus próprios

sentimentos sobre a situação da separação. Nesta página, abre-se a oportunidade para que

ela fale sobre como acha que seu pai e sua mãe estão se sentindo, através de desenhos ou

palavras. Em se tratando de famílias não-divorciadas, é importante que o avaliador analise

a necessidade de utilizar essa página do material ou não. Cabe ao profissional averiguar se

informações acerca dos sentimentos dos pais são relevantes à queixa apresentada. Nos

casos de disputas entre cuidadores outros que não os genitores, solicita-se que a criança

fale sobre as pessoas que estão envolvidas na disputa.

Sugestão:

“Agora que já falamos sobre sua família, vamos conversar um pouquinho mais

sobre seus pais. Os pais também têm sentimentos em relação à separação. O que você

acha que sua mãe e seu pai estão sentindo?” “Você pode desenhar o pai e a mãe, ou pode

escrever palavras para descrever como eles estão se sentindo”.

Atividade 8: Minhas Preocupações

Objetivo: Propiciar espaço para que a criança fale sobre suas preocupações.

85

Aplicação: O avaliador deverá buscar saber quais as preocupações da criança neste

momento, e qual o grau dessas preocupações, considerando o contexto da demanda da

avaliação. O espaço em branco da folha deverá ser preenchido com desenhos ou palavras

referentes às preocupações da criança. Os desenhos na escala ao lado servem para que a

criança possa mostrar o quanto ela está preocupada com cada uma das questões trazidas.

Sugestão:

“Já conversamos sobre o que você gosta e não gosta, sobre sua rotina, sua vida,

sua família e seus pais. Pensando em tudo que conversamos e nos motivos que trouxeram

você aqui, o Meu Amigo de Papel quer saber o que preocupa você.”

O aplicador deve, então, aguardar a resposta da criança. Uma vez respondido,

questionar “E essa sua preocupação é pequena, média, ou é algo que te preocupa

bastante?” (apontando para o preocupômetro).

Atividade 9: Planos para o Futuro

Objetivo: Explorar os desejos da criança em relação ao futuro.

Aplicação: O Meu Amigo de Papel quer saber agora como será daqui pra frente. O

profissional deve, então, explorar o que a criança deseja, de acordo com as áreas

apresentadas: atividades com o pai, atividades com a mãe, casa, escola, amigos e algum

outro assunto que possa ser trazido pela criança.

É importante retomar, nesse momento, a responsabilidade pela tomada final de

decisão, esclarecendo novamente à criança que seus sentimentos e seus desejos são muito

importantes, e que o Meu Amigo de Papel ouviu com muita atenção tudo que ela falou. O

examinador deve, então, explicar que agora já a conhece melhor e vai escrever sua carta

para o juiz, para que ele decida o que é melhor para a criança.

Sugestão:

“Agora vamos conversar sobre o futuro. O Meu Amigo de Papel quer saber quais

são seus planos daqui pra frente. Vamos pensar em coisas que você fará com sua mãe,

coisas que fará com seu pai, planos para sua casa, sua escola e seus amigos.”

Após o término do preenchimento da criança: “Nossa atividade está quase

terminando. Agora o Meu Amigo de Papel já conhece bastante sobre você e poderá, então,

ajudar você e seus pais”.

86

Em se tratando de situações de separação, o profissional já pode fazer um

fechamento com a atividade seguinte, do acolhimento final. Para tanto, basta proceder à

leitura do texto. Caso não seja uma situação de separação, esta página deverá ser a última a

ser aplicada.

Atividade 10: Acolhimento final

Objetivo: Propiciar um acolhimento final para a criança, delimitando as diferenças

entre avaliação e terapia, em linguagem apropriada e contextualizada.

Aplicação: O profissional poderá ler o texto desta página de forma literal, mas é

importante que seja espontâneo. A criança deve sentir-se acolhida, mas ciente de que sua

participação na avaliação está encerrada, ou terá prazo definido (conforme o planejamento

da avaliação, pois o profissional poderá marcar novos atendimentos, com utilização de

outros instrumentos).

Considerações Finais

Uma vez conhecendo a estrutura do Meu Amigo de Papel e da descrição de cada

uma das dez atividades propostas, o profissional poderá planejar e selecionar quais páginas

de atividades utilizar para sua avaliação. A proposta do protocolo infantil é a de que suas

folhas sejam avulsas, de forma que o profissional tenha a liberdade de eleger quais

atividades realizar com a criança, considerando questões como tempo e relevância para o

caso.

87

SEÇÃO II

Construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 5

Construção da Escala SARP

A Escala SARP foi construída objetivando atender um dos princípios da avaliação

mental forense (FMHA – Forensic Mental Health Assessment), que é o uso de múltiplas

fontes de informação. As diferentes fontes de dados fornecem maiores garantias da

veracidade das informações colhidas, que podem ser distorcidas intencionalmente em

situações judiciais (Heilbrun, 2003). Assim, a Escala SARP não é composta por questões

de resposta selecionada, visto a possibilidade de respostas enganosas, sejam intencionais

ou não. À semelhança da Escala Hare PCL-R, a Escala SARP é pontuada pelo próprio

examinador, com base nos dados colhidos através da Entrevista SARP e do protocolo de

avaliação infantil Meu Amigo de Papel, podendo incluir, ainda, dados colhidos através de

outros testes, entrevistas com terceiros, interação pais-filhos e observações clínicas. O

presente capítulo tem como objetivo descrever a metodologia utilizada e as etapas

realizadas para o processo de construção da Escala SARP.

De acordo com Pasquali (1999), os princípios da elaboração de um instrumento

psicológico baseado em construtos, como é o caso da Escala SARP, podem ser divididos

em três pólos: procedimentos teóricos, procedimentos empíricos e procedimentos

analíticos. Cada procedimento reúne um conjunto de passos necessários para a criação de

escalas psicológicas. O presente capítulo apresentará os procedimentos teóricos,

descrevendo as etapas de construção da Escala SARP e apresentando sua versão final.

O pólo teórico é o que fundamenta qualquer instrumento psicológico. Sua

elaboração depende da literatura existente sobre o construto psicológico que o instrumento

pretende medir. Nessa etapa, algumas questões básicas (definição constitutiva, definição

operacional, por exemplo) permitem a construção adequada de um instrumento de medida

dos construtos elaborados (Pasquali, 1998). O pólo teórico engloba também a

operacionalização da teoria em tarefas comportamentais ou itens. É necessário representar

88

no item todas as possíveis variações que o construto medido possa assumir, evitando deixar

de medir algum ponto importante do comportamento. A explicitação dos fundamentos

teóricos que orientam a criação dos itens é imprescindível para garantir a legitimidade da

medida e a melhor adequação de seus parâmetros psicométricos (Pasquali, 1999). A

sistematização dos procedimentos teóricos inicia, segundo Pasquali (1999), pela escolha do

sistema psicológico a ser avaliado – no caso em questão, o relacionamento parental. Um

sistema refere-se a um construto e, portanto, pode apenas ser enumerado, mas não medido.

Dessa forma, o segundo passo dos procedimentos teóricos foi a delimitação dos atributos

do sistema “relacionamento parental”.

Os atributos refletem algumas das propriedades do objeto de estudo, mas não

necessariamente cobrem todo o sistema psicológico. Com a finalidade de delimitar os

atributos do objeto de estudo da Escala SARP, foram utilizadas três fontes: 1) uma revisão

sistemática sobre a literatura existente acerca dos temas relacionamento entre pais e filhos,

separação conjugal e guarda de filhos (capítulo 1); 2) os dados do estudo empírico do

capítulo 2, colhidos por meio de entrevistas sobre o relacionamento pais-filhos realizadas

com psicólogos, operadores do Direito, genitores e crianças; 3) levantamento das

dimensões avaliadas nos instrumentos nacionais e internacionais que mensuram atributos

associados ao relacionamento pais-filhos, conforme revisão sistemática realizada por Lago,

Amaral, Bosa e Bandeira (2010).

Caracterização das etapas de construção da Escala SARP

Cada uma das três etapas realizadas para a delimitação dos atributos do sistema

“relacionamento parental” será descrita a seguir. Os resultados das duas primeiras etapas

serão apresentados de forma sintetizada, visto que estão descritos na seção I.

Etapa I

A primeira etapa da delimitação dos atributos do relacionamento parental consistiu

em uma revisão sistemática da literatura. Com o objetivo de levantar as dimensões do

relacionamento parental avaliadas em situações de determinação de guarda, foi realizada

uma busca em bases de dados científicas, no período dos últimos dez anos, integrando os

temas “divórcio”, “guarda dos filhos” e “relação pais-filhos”. O estudo na íntegra está

apresentado no capítulo 1.

89

Os resultados desta etapa permitiram identificar três eixos centrais do

relacionamento parental: histórico pré-separação, parentalidade e necessidades dos filhos,

conforme dispostos na Tabela 3. Essa sistematização por eixos foi adotada para as outras

duas etapas deste processo de delimitação das dimensões da Escala SARP.

Tabela 3

Eixos e Componentes do Relacionamento Parental Derivados da Revisão

Sistemática da Literatura

Eixos do Relacionamento Parental Componentes

Histórico Pré-separação Conflitos interparentais

Envolvimento nas atividades diárias do filho

Parentalidade Afetividade

Cuidados Básicos

Exercício da coparentalidade

Disciplina

Orientação

Estado emocional dos genitores

Necessidades dos filhos Participação em atividades diárias

Desenvolvimento da autonomia

Consistência parental

Sustento financeiro

Educação

Lazer

Os resultados desta primeira etapa apontaram importantes componentes do

relacionamento parental, já discutidos no capítulo 1. Tais componentes contemplam não

apenas as necessidades dos filhos de participação dos pais em suas vidas, de afeto, de

segurança, de educação e de lazer, mas também as habilidades dos genitores em atender

essas necessidades, minimizando os prejuízos advindos de conflitos interparentais e/ou

estados emocionais de ansiedade, estresse e mágoas.

Etapa II

A segunda etapa do processo de delimitação dos atributos do sistema

relacionamento parental buscou evidências empíricas sobre o construto, a partir de

90

diferentes perspectivas. Para tanto, foi realizado um estudo de caráter qualitativo

exploratório com genitores, filhos, psicólogos e operadores do Direito. O estudo na íntegra

está apresentado no capítulo 2.

Considerando a sistematização dos eixos emergida na primeira etapa deste

processo, os resultados do estudo empírico foram organizados sob os mesmos eixos. A

Tabela 4 apresenta a síntese desses resultados, não discriminando qual categoria de

participantes deu origem à qual dimensão.

Tabela 4

Eixos e Componentes do Relacionamento Parental Derivados do Estudo Empírico

Eixos do Relacionamento Parental Componentes

Histórico Pré-separação Histórico do casal

Envolvimento nas atividades do filho

Motivação para a guarda

Parentalidade Comunicação

Disciplina

Estado emocional dos genitores

Necessidades dos filhos Rotina

Cuidados básicos

Segurança emocional

Sustento financeiro

Educação

Lazer

É possível perceber que a maioria dos componentes da relação parental que

resultaram do estudo empírico já havia emergido a partir da revisão sistemática. O

componente “conflitos interparentais” está contemplado no “histórico do casal”, que por

sua vez é mais abrangente, pois diz respeito a informações sobre o histórico do

relacionamento do casal, desde o início até o rompimento. A motivação para ficar com a

guarda do filho, entretanto, é um fator que não foi citado nos artigos que compuseram a

revisão sistemática, e que foi mencionado por alguns dos participantes do estudo empírico.

A comunicação com o filho é outro componente que resultou do estudo empírico.

Os genitores participantes destacaram a importância do diálogo, juntamente com respeito e

91

confiança. No que diz respeito às necessidades dos filhos, os componentes apresentaram-

se de forma idêntica aos da etapa I, destacando aspectos como segurança emocional,

participação nas atividades, cuidados do cotidiano, e assistência às necessidades de

sustento, educação e lazer.

Etapa III

A terceira etapa desse processo utilizou como base uma revisão sistemática da

literatura que teve como objetivo verificar o estágio atual dos instrumentos nacionais e

internacionais que avaliam as relações entre pais e filhos (Lago et al., 2010). O resultado

dessa revisão indicou sete instrumentos internacionais e três instrumentos nacionais como

os mais citados nos resumos de artigos analisados.

Os instrumentos de avaliação do relacionamento parental são compostos por

diferentes dimensões ou fatores, que mensuram o construto proposto. Com base nessa

revisão sistemática, foram analisadas as dimensões dos dez instrumentos de avaliação

apontados por Lago et al. (2010), de forma a buscar componentes do relacionamento

parental que não emergiram nas etapas I e II. Inicialmente, foi realizada uma triagem, de

forma a selecionar apenas os instrumentos cujo objetivo era avaliar, especificamente, o

relacionamento parental. O resultado dessa triagem apontou sete instrumentos,

apresentados na Tabela 5, juntamente com seus objetivos e suas dimensões de análise.

Tabela 5

Levantamento das Dimensões dos Instrumentos Apresentados na Revisão

Sistemática de Lago et al. (2010)

Instrumento Objetivo Dimensões Parenting Stress Index

Identificar áreas de problemas nas relações pais-filhos

Criança: distratibilidade/hiperatividade, adaptabilidade, reforços parentais, exigência, humor e aceitabilidade Pais: competência, isolamento, apego, saúde, restrição de papel, depressão e apoio do cônjuge.

Parental Bonding Instrument

Medir a qualidade de apego ou vínculo entre pais e filhos

Cuidado: afeição, aconchego, empatia, sensibilidade, frieza emocional, indiferença e negligência Controle: superproteção, intrusão, contato excessivo, infantilização e prevenção de comportamento; permissão da independência e autonomia.

Parental Attitude Research Instrument

Avaliar atitudes parentais e buscar o quanto elas se

Equalitarismo, Supressão da Agressão, Transgressão, Rigidez, Intrusividade,

92

relacionam com o desenvolvimento de seus filhos

Supressão do Sexo, Aceleração do Desenvolvimento, Companheirismo, Deificação, Martírio, Encorajamento da Verbalização, Isolamento da Mãe, Dependência da Mãe, Medo de Machucar o Bebê, Dependência, Conflito Marital, Irritabilidade, Exclusão de Influências Externas, Rejeição do Papel no Lar, Evitação de Comunicação, Influência da Mãe, Desconsideração do Marido e Aprovação da Atividade.

Inventory of Parent and Peer Attachment

Avaliar a qualidade de apego a pais e amigos

Confiança, comunicação e alienação

Parent Behavior Inventory

Avaliar o comportamento parental

Apoio/Engajamento Hostilidade/Coerção

Inventário de Percepção de Suporte Familiar (IPSF)

Avaliar a forma como o indivíduo percebe sua relação com a família

Afetivo-Consistente: afetividade entre os membros familiares, interesse, proximidade, acolhimento, comunicação, interação, respeito, empatia, clareza nas regras intrafamiliares, consistência de comportamentos e verbalizações e habilidades na resolução de problemas Inadaptação Familiar: sentimentos e comportamentos negativos em relação à família, tais como raiva, isolamento, incompreensão, exclusão, senso de não pertencimento, vergonha, irritação e relações agressivas Autonomia: relações de confiança, liberdade e privacidade entre os membros

Teste Aperceptivo Familiar (FAT)

Avaliar o funcionamento e estrutura de relacionamentos familiares

Resolução de conflitos familiares, estabelecimento de limites (hierarquia familiar), qualidade dos relacionamentos, fronteiras

Ao avaliar essas dimensões, pode-se perceber que nem todas têm relação direta

com a questão chave deste estudo: relacionamento parental. Algumas delas são específicas

para avaliar aspectos próprios das escalas. Portanto, para atingir o propósito deste estudo,

foi necessário avaliar o quanto cada uma das dimensões acima expostas integra,

especificamente, o sistema psicológico “relacionamento parental”, ajustando-se à

finalidade do SARP.

De forma a manter o padrão da sistematização por eixos realizada nas etapas

anteriores, os resultados desta terceira etapa também foram organizados sob três eixos.

Tendo em vista que essa terceira etapa tinha como objetivo complementar os componentes

e/ou dimensões já definidos nas etapas I e II, serão citados apenas os componentes não

93

emergidos nas etapas anteriores. Os resultados podem ser visualizados na Tabela 6, em que

os componentes com terminologia diferente, mas definição idêntica, são apresentados lado

a lado.

Tabela 6

Componentes dos Instrumentos da Revisão Sistemática de Lago et al. (2010),

Complementares às Etapas I e II, Organizados sob Três Eixos Centrais

Eixos do Relacionamento Parental Componentes

Histórico Pré-separação Apoio do cônjuge

Parentalidade Aconchego / Acolhimento

Afeição / Proximidade

Clareza nas regras intrafamiliares

Companheirismo

Empatia

Hierarquia familiar

Interação

Permissão da independência e autonomia

Reforços parentais

Necessidades dos filhos Aceitabilidade

Confiança

Consistência de comportamentos e verbalizações

É possível perceber que o apoio do cônjuge é um componente importante, e que

não havia sido contemplado nas etapas anteriores. No eixo parentalidade, os componentes

mencionados inserem-se em outros aspectos, como por exemplo: aconchego, proximidade,

empatia e companheirismo fazem parte da segurança emocional; clareza nas regras

intrafamiliares, hierarquia familiar e reforços parentais integram o estabelecimento de

limites. Por fim, a interação, a permissão da independência e autonomia, a aceitabilidade,

confiança e consistência de comportamentos e verbalizações pertencem ao

desenvolvimento da identidade e a consistência parental.

Uma vez realizadas essas três etapas, procedeu-se à definição das dimensões que

compuseram a Escala SARP. Para tal definição, os dados das Tabelas 3, 4 e 6 foram

analisados, de forma a integrá-los para o propósito da escala. Considerando-se que os

94

componentes do eixo “histórico pré-separação” abrangem aspectos da parentalidade, eles

passaram a integrar o eixo agora denominado “competências parentais”. O segundo eixo

permaneceu sob o título “necessidades dos filhos”. Revisões foram realizadas na Entrevista

SARP e no protocolo de avaliação infantil Meu Amigo de Papel, e o conjunto dessas

informações, juntamente com os resultados das três etapas descritas neste capítulo, deu

origem a dimensões e itens que compuseram uma versão preliminar da Escala SARP. As

versões preliminares da Escala SARP foram pontuadas pelas pesquisadoras utilizando os

dados de uma família do estudo piloto. Vários ajustes foram realizados, com o objetivo de

estruturar de forma organizada e coerente com a teoria as dimensões e seus respectivos

itens. A versão final da Escala SARP ficou composta por oito dimensões e 26 itens,

dispostos em dois eixos principais, conforme expostos na Tabela 7.

Tabela 7

Eixos, Dimensões e Itens da Escala SARP

Eixos Dimensões Itens Competências Parentais

Relação interparental Apoio material do genitor ao parceiro no período pré-separação Apoio emocional do genitor ao parceiro no período pré-separação Conflito conjugal pré-separação Comunicação com o outro genitor Flexibilidade em relação aos contatos do filho com o outro genitor Comportamentos de desqualificação parental

Características afetivoemocionais

Interferência do estado emocional do genitor na relação parental Manifestações de afeto do genitor

Cuidados básicos

Envolvimento nas atividades diárias do filho antes da separação Envolvimento nas atividades diárias do filho após a separação Conhecimento acerca dos cuidados básicos do filho Sustento financeiro

Proteção frente a riscos reais

Proteção frente a riscos reais na rede de apoio Proteção frente a riscos reais com o outro genitor e familiares Monitoramento das relações sociais

Sistema de normas e valores

Estabelecimento de limites Monitoramento de limites Transmissão de valores

Necessidades dos filhos

Segurança emocional

Consistência parental Manifestações de afeto do filho para com o genitor Comunicação com o filho

Desenvolvimento da identidade

Identidade pessoal Desenvolvimento da autonomia e independência

Educação e lazer

Educação formal Participação nas atividades escolares Atividades recreativas

95

A escolha das dimensões abrangidas pelo instrumento depende dos argumentos

teóricos formulados para justificar a relação do construto com o sistema psicológico que

norteia o instrumento. Assim, a seguir são apresentadas as justificativas para a escolha de

cada um dos componentes das dimensões da Escala SARP.

O Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental (SARP) é baseado nos

pressupostos da Teoria Familiar Estrutural, que estabelece que o comportamento e as

características dos indivíduos são resultantes dos processos de interação familiar. Portanto,

para avaliar o relacionamento parental é preciso analisar os padrões transacionais da

família, que regulam como, quando e com quem se relacionar no sistema familiar

(Minuchin, 1982).

Os três construtos essenciais da Teoria Familiar Estrutural são: estrutura,

subsistemas e fronteiras. A estrutura familiar diz respeito ao padrão organizado em que os

membros da família interagem. Os subsistemas são baseados em geração, gênero e

interesses comuns, sendo eles: conjugal, parental e fraternal. Os indivíduos, subsistemas e

a família inteira são demarcados por fronteiras, que são barreiras invisíveis que regulam o

contato com os outros (Nichols & Schwartz, 2007).

O Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental almeja, assim, avaliar a

qualidade do relacionamento entre pais e filhos considerando os padrões transacionais do

sistema familiar. Os conceitos de estrutura, subsistemas e fronteiras serviram de

embasamento teórico para os itens e dimensões selecionados para compor a Escala SARP.

A seguir será apresentada cada uma das oito dimensões da escala, com os itens que as

compõem.

Relação Interparental

A dimensão relação interparental é composta por fatores do subsistema conjugal

que têm influência direta no subsistema parental. Ainda que em situações de disputa de

guarda os pais estejam separados e, portanto, não exista mais o casal, é sabido que a forma

como os ex-cônjuges se relacionam reflete-se na relação com os filhos (Erel & Burman,

1995). Assim, optou-se por nomear essa dimensão como “relação interparental”, de forma

a considerar o relacionamento entre os genitores.

Os itens apoio material e apoio emocional entre cônjuges referem-se à importância

dos genitores desenvolverem uma parceria no topo da hierarquia familiar, dividindo

responsabilidades pelos cuidados dos filhos, a fim de não tornar o(a) companheiro(a)

96

sobrecarregado(a) (Minuchin, Nichols & Wai-Yung Lee, 2009). Esses itens integram o

conceito da teoria sistêmica estrutural denominado complementaridade, o qual inclui o

apoio mútuo que permite ao casal dividir funções e enriquecer-se mutuamente. A

permissividade de um dos genitores com os filhos pode ser equilibrada pela firmeza do

outro. Esses padrões complementares podem ser problemáticos quando são exagerados e

criam, assim, um subsistema disfuncional (Nichols & Schwartz, 2007).

O apoio mútuo que se espera que exista entre os genitores inclui não apenas os

cuidados com os filhos, mas também o auxílio com as tarefas domésticas e com o sustento

financeiro. Esse apoio fortalece a qualidade dos genitores com os filhos, uma vez que não

se sentem tão sobrecarregados e, portanto, podem dedicar mais atenção às necessidades de

seus filhos, contribuindo para um desenvolvimento saudável (Black, Dubowitz & Starr,

1999; Camara & Resnick, 1988; Chase-Landale & Hetherington, 1990). Dessa forma, na

Escala SARP, optou-se por subdividir o apoio entre genitores em apoio material e apoio

emocional, sendo o primeiro referente às questões de auxílio no sustento financeiro e o

segundo, à divisão de cuidados parentais e tarefas domésticas.

O item conflito conjugal diz respeito aos prejuízos que podem surgir na relação

parental a partir das conflitivas vivenciadas pelo casal. É importante que o subsistema dos

cônjuges crie uma fronteira clara que permita que os filhos interajam com os pais sem

incluí-los no subsistema do casal. Pais e filhos compartilham grande parte da vida uns dos

outros, mas há funções do casal que não precisam ser compartilhadas (Nichols &

Schwartz, 2007). O grau de conflito entre os genitores influencia de forma negativa o

relacionamento parental, pois reflete em baixos níveis de tolerância para lidar com as

necessidades dos filhos (Amato, Loomis & Booth, 1995; Davies & Cummings, 1994;

Grych & Fincham, 1990; Mossman & Wagner, 2008).

Os itens comunicação entre os genitores, flexibilidade de contatos e

comportamentos de desqualificação parental compõem o exame da coparentalidade após o

divórcio, proposto por Ahrons (1981), que inclui a investigação das formas de

comunicação, frequência da interação coparental para assuntos referentes aos filhos e a

atmosfera interparental. Ainda que o contato contínuo com ambos os pais no período pós-

divórcio seja um fator importante no ajustamento dos filhos, o nível de conflito entre os

genitores pode ser mais relevante nesse ajustamento do que a ausência paterna ou o próprio

divórcio (Peck & Manocherian, 2001). O grau de conflito interferirá diretamente na

97

qualidade da comunicação entre os genitores, refletindo-se na forma como pai e mãe

tratam sobre assuntos referentes a questões da vida de seu filho, como saúde, escola e

amigos, assim como o manejo da transição do filho entre as casas de ambos os genitores.

A flexibilidade de contatos da criança com o outro genitor também está atrelada à

coparentalidade pós-divórcio. Independentemente da determinação judicial dos horários e

dias de visitas, ou até mesmo do tipo de guarda (exclusiva ou compartilhada), é importante

considerar o quanto os genitores são flexíveis para negociar visitas de finais de semana,

datas festivas e férias. Há que se considerar se o interesse da criança é levado em conta, ou

se essas situações são transformadas em novos momentos de discórdia entre os genitores.

Peck e Manocherian (2001) destacam que o acesso contínuo a ambos os genitores se

assemelha mais à estrutura e às funções da família pré-divórcio. Esse acesso natural e a

qualidade do relacionamento com os pais serão benéficos ao desenvolvimento dos filhos,

independentemente do tipo de guarda e/ou visitas estipuladas.

A falta de flexibilidade nos contatos do filho com o outro genitor pode resultar no

impedimento ou obstrução do contato entre o filho e o genitor não-guardião. Quando o

divórcio é permeado de amarguras, ressentimentos e mágoas, os filhos correm riscos

psicológicos, se envolvidos em conflitos de lealdade (Wallerstein & Kelly, 1980). As

tentativas de enfraquecer, controlar ou excluir o contato com o outro genitor por meio da

recusa de informações sobre o filho ou da desvalorização da imagem do outro genitor são

exemplos de comportamentos de desqualificação parental.

Características afetivoemocionais

O período do divórcio pode ser caracterizado por um aumento de estresse, com

consideráveis brigas, amargura, acusações, desvalorização do parceiro, depressão,

ansiedade e ambivalência (Ahrons, 1980). Esse estado de vulnerabilidade emocional

aumentada pode interferir na capacidade de trabalhar efetivamente e na saúde (peso,

insônia, disfunção sexual), assim como provocar o abuso de substâncias (Hetherington,

1982). Todas essas alterações afetam a capacidade parental, contribuindo negativamente

para a qualidade do relacionamento com os filhos (Lansford, 2009; Peck & Manocherian,

2001; Whiteside & Becker, 2000).

As manifestações de afeto do genitor relacionam-se com a capacidade de nutrir,

guiar e controlar. As proporções desses elementos variam conforme as necessidades de

desenvolvimento das crianças e a capacidade dos pais (Minuchin, 1982). A Escala SARP

98

objetiva avaliar com esse item a capacidade de cada genitor de manifestar afeto pelo seu

filho, revelando-se capaz de nutri-lo e orientá-lo, numa relação de proximidade e

companheirismo, conforme suas necessidades.

Cuidados Básicos

A participação dos genitores em atividades diárias do filho, como hora de dormir e

despertar, ida e vinda da escola e atividades recreacionais, permite que eles permaneçam

desempenhando papéis centrais e psicologicamente importantes na vida de seus filhos

(Lamb, Stemberg, & Thompson, 1997). Whiteside e Becker (2000) destacam a importância

de avaliar essa participação em relação aos tipos e quantidades de atividades que os pais

realizam com seus filhos.

Optou-se por subdividir o item participação em atividades diárias do filho em

“envolvimento” e “conhecimento” na Escala SARP, considerando que muitos genitores

podem não participar efetivamente da rotina do filho em razão de suas atividades laborais

ou pelo fato de não estarem com a guarda da criança. Entretanto, esses genitores podem

conhecer sobre os hábitos e rotina dos filhos, ainda que não se envolvam diretamente com

os mesmos. De igual forma, é importante comparar o quanto o genitor engajava-se nessas

atividades antes da separação e o quanto o faz após a separação. Esses dados contribuem

para a compreensão da motivação para ficar com a guarda do filho.

O item “sustento financeiro” também foi inserido na dimensão “cuidados básicos”

por tratar-se de um cuidado e responsabilidade que os genitores devem ter para com os

filhos, estando ou não com sua guarda. Brown (2001) aponta que o dinheiro se torna a

maior fonte de poder no processo de divórcio, especialmente para os homens. Eles têm o

controle do dinheiro na maior parte dos casos, tanto na forma dos pagamentos regulares de

pensão quanto nas decisões sobre aceitar ou não o pagamento de despesas adicionais. É

importante considerar as maneiras pelas quais o uso do dinheiro afeta o relacionamento

com os filhos e com suas ex-esposas. O objetivo desse item na Escala SARP é o de avaliar

o comprometimento financeiro de cada um dos genitores para com o sustento do filho,

independentemente da existência ou não de acordos judiciais.

Proteção frente a riscos reais

Essa dimensão abrange os itens proteção frente a riscos reais na rede de apoio e

com a família do outro genitor, e o monitoramento das relações sociais. Os indivíduos,

subsistemas e toda a família são demarcados por fronteiras interpessoais, que são barreiras

99

invisíveis que regulam o contato com os outros. Uma fronteira clara estabelece uma

estrutura hierárquica em que os pais ocupam uma posição de liderança (Nichols &

Scwhartz, 2007). A hierarquia estabelece alguns papéis familiares para pais e filhos, entre

eles a responsabilidade que aqueles têm de cuidar e proteger estes (Minuchin & Fishman,

2003). O cuidado parental é um dos mais importantes fundamentos da vida humana, pois é

a partir dele que se aprende a cuidar e ser cuidado, o que interfere no estabelecimento das

relações interpessoais (Maciel & Cruz, 2009).

A Escala SARP subdividiu a dimensão “proteção frente a riscos reais”

considerando os diferentes contextos em que esse cuidado deve existir: na rede de apoio,

na família do outro genitor, e no relacionamento com os pares. Os genitores devem estar

atentos e buscar proteger seus filhos de possíveis riscos à integridade física e emocional

quando eles se encontram sob os cuidados de terceiros, ou com colegas e amigos.

Sistema de normas e valores

Dentre as regras universais que governam a organização familiar está a hierarquia

de poder, em que os pais e os filhos têm diferentes níveis de autoridade. A parentalidade

requer a capacidade de nutrir, guiar e controlar, funções que variam conforme as

necessidades de desenvolvimento das crianças e da capacidade dos pais. Contudo, o uso da

autoridade deve estar sempre presente, pois é um ingrediente necessário ao subsistema

parental (Minuchin, 1982).

As transações que ocorrem no subsistema parental envolvem a educação dos filhos.

Assim, de acordo com as respostas de seus genitores, a criança modelará seu senso de

adequação. Aprende quais os comportamentos que são recompensados e quais são

desencorajados (Minuchin & Fishman, 2003). A Escala SARP subdividiu o item da

autoridade em “estabelecimento” e “monitoramento” dos limites, por considerar que

alguns genitores conseguem estabelecer regras, mas não conseguem que elas sejam

cumpridas. Portanto, esses itens visam a avaliar se existem combinações na casa, quem as

impõe e quem as monitora. Deve-se averiguar se existe um sistema de recompensas e/ou

punições, e o quão efetivo isso se mostra na educação do filho.

Em se tratando de pais separados, vale destacar que independentemente de quem

esteja com a guarda dos filhos, a responsabilidade de educação e criação dos filhos

permanece. Assim, o estabelecimento de limites deve estar presente mesmo nos períodos

de visita. Atividades como colocar os brinquedos no lugar e auxiliar em pequenas tarefas

100

domésticas, que sejam apropriadas à idade da criança, ensinarão que ela tem um papel

importante enquanto membro da família (Frieman, 2003).

Ainda como parte integrante da dimensão “sistema de normas e valores”, tem-se o

item “transmissão de valores”. Minuchin e Fishman (2003) apontam que o subsistema

conjugal é vital para o crescimento dos filhos, que veem nos pais um modelo para suas

relações íntimas. A criança vê nos pais formas de expressar afeto, de se relacionar com um

parceiro em momentos de dificuldade e de lidar com conflitos, questões essas que se

tornarão parte de seus valores e expectativas. Souza (1989) faz referência à construção de

relações familiares como o desenvolvimento de amor e respeito à individualidade e

solidariedade. A Escala SARP objetiva avaliar, por meio desse item, o quanto os

comportamentos e atitudes dos genitores são condizentes com a transmissão de valores que

contribuam para o desenvolvimento de relações interpessoais saudáveis de seus filhos.

Segurança emocional

Entre as funções parentais estão a orientação e a socialização. À medida que a

criança começa a andar e falar, os pais deverão estabelecer controles que lhe deem espaço

e, ao mesmo tempo, mantenham segurança e autoridade parental. Os genitores devem

desenvolver métodos apropriados para manter a hierarquia e também encorajar o

crescimento (Minuchin & Fishman, 2003).

A comunicação entre pais e filhos é importante para que os filhos se sintam

acolhidos e possam conversar sobre suas emoções e receber orientações (Bohanek, Marin,

Fivush & Duke, 2006). A comunicação inclui o cumprimento de promessas, fator que foi

apontado por A. T. B. Silva (2000) como um dos aspectos importantes para o

desenvolvimento da criança, e que está relacionado com a consistência parental.

A Escala SARP objetiva, assim, avaliar o quanto a criança se sente segura na

companhia de seus genitores. A coerência entre comportamentos e verbalizações do

genitor é um fator que contribui para essa segurança emocional. As demonstrações de afeto

da criança e a qualidade de sua comunicação com os pais são outros indicativos do quanto

o filho se sente seguro emocionalmente.

Desenvolvimento da identidade

A criança precisa reconhecer-se nos seus pais e ser reconhecida por eles para que

possa a partir daí desenvolver sua própria identidade (Corneau, 1995). Os sentimentos de

aceitabilidade e pertencimento são fundamentais para a autoestima.

101

Para desenvolver sua identidade e autoestima, é importante que a criança adquira

autonomia, o que depende paralelamente da colaboração de seus genitores, para que

permitam essa independência. Os filhos demandam diferentes cuidados parentais, de

acordo com as diferentes idades. Enquanto os bebês necessitam de cuidados básicos, as

crianças precisam de orientação e controle e os adolescentes, independência e

responsabilidade. Os cuidados parentais para uma criança de dois anos não são adequados

para uma de sete, ou um adolescente de 12 anos (Nichols & Schwartz, 2007). À medida

que a criança cresce, suas necessidades mudam e, portanto, o subsistema parental deverá

adaptar-se às mudanças. Uma vez aumentando a capacidade da criança, a ela devem ser

dadas mais oportunidades de decisões de autocontrole. Pais de filhos adolescentes terão

que conceder-lhes mais autoridade ao mesmo tempo em que lhes pedirão mais

responsabilidade (Minuchin & Fishman, 2003).

A Escala SARP objetiva avaliar nessa dimensão, além dos sentimentos de aceitação

do filho por cada um dos genitores, o grau de adequação da autonomia e independência.

Genitores que oportunizem decisões de autocontrole a crianças que estejam em uma idade

em que necessitem de orientação e controle poderão estar prejudicando o desenvolvimento

do filho, falhando em seu dever de orientar. Da mesma forma, pais que não estimulem a

responsabilidade em adolescentes também não estarão propiciando um nível adequado de

desenvolvimento da autonomia e independência.

Educação e lazer

A entrada da criança na escola faz com que a família tenha que se relacionar com

um sistema novo, bem organizado, altamente significativo, que é a escola. A família inteira

deverá desenvolver padrões de como ajudar com as tarefas escolares e quem deverá fazê-

lo; as regras sobre a hora de dormir; o tempo para estudo e lazer; como abarcar a avaliação

escolar de seu filho (Minuchin & Fishman, 2003). A participação dos pais nas atividades

escolares tem relação com a dedicação e o desempenho dos filhos nos estudos (Amato &

Gilbreth, 1999; Bacete & Betoret, 2000; Coley, 1998; Flouri & Buchanan, 2003; Hill &

Taylor, 2004; Pelegrina, García-Linares & Casanova, 2003; Vizzotto, 1988). Portanto, o

comprometimento dos genitores com a educação formal de seus filhos e o engajamento nas

atividades escolares são itens importantes para a avaliação do relacionamento parental.

Os genitores que compartilham com os filhos parte do tempo livre, propiciando-

lhes atividades culturais e educacionais, favorecem o desenvolvimento cognitivo, o

102

desempenho escolar e o ajustamento interpessoal (Bradley & Corwyn, 2002). A falta de

tempo e de energia dos pais, que resulta na falta de atenção sentida pelos filhos, é um fator

apontado pela literatura (Black et al., 1999; Brandth & Kvande, 2002; Warren & Johnson,

1995) e evidenciado empiricamente como prejudicial à qualidade da relação pais-filhos.

Uma vez apresentadas as dimensões da Escala SARP e seus respectivos itens, é

importante fazer algumas considerações sobre seu formato e sua pontuação. O layout da

escala apresenta uma breve descrição de cada item, a fim de que o avaliador possa revisar

as informações pertinentes para a pontuação. Entretanto, é indispensável que os

profissionais que utilizem o SARP realizem treinamento e procedam à leitura do manual

do instrumento. A mera leitura da descrição dos itens disposta na Escala SARP não é

suficiente para uma avaliação acurada. O examinador pode valer-se de informações

advindas de outras técnicas que não apenas a Entrevista SARP e o Meu Amigo de Papel

para pontuar os itens descritos.

No que tange à pontuação, estão previstas quatro opções, entre as quais a

possibilidade “NA” (0), que deve ser marcada quando o item não se aplicar ao caso em

questão, ou quando as informações obtidas não forem suficientes para avaliar o item. As

demais pontuações foram divididas em nível “baixo” (3), “médio” (2) e “alto” (1),

conforme a maior ou menor presença de prejuízos na relação parental, para os itens 1 a 3.

Para os itens 4 a 26, a mesma divisão foi utilizada, porém para avaliar o grau de adequação

de cada item. Dessa forma, o valor de cada pontuação é invertido: “baixo” (1), “médio” (2)

e “alto” (3). O formato da escala permite que as pontuações para cada responsável pela

criança possam ser realizadas em conjunto na mesma folha de apuração, facilitando assim

a comparação entre os graus de adequação de cada avaliado.

Considerando o estágio inicial de desenvolvimento do SARP, seu resultado final

apontará quais atributos do relacionamento parental estão bem atendidos e quais estão

deficitários, conforme cada uma das dimensões propostas. Para tanto, far-se-á uma média

dos itens válidos em cada dimensão, ou seja, excluindo-se as pontuações “NA”. Essas

médias podem variar de 1 a 3. Quanto mais próximo a 1, mais prejudicada estará a

dimensão. Por outro lado, médias mais próximas de 3 equivalem a dimensões satisfatórias

do relacionamento parental. O escore total não é passível de interpretações até o momento.

103

Considerações Finais

A finalização da Escala SARP completou o conjunto de técnicas do Sistema de

Avaliação do Relacionamento Parental, e concluiu a etapa dos procedimentos teóricos que

Pasquali (1999) aponta como necessários para a elaboração de um instrumento psicológico.

A partir de então, iniciaram-se os procedimentos empíricos, com o objetivo de testar a

aplicação prática do SARP.

Inicialmente, foi realizado um estudo piloto, visando a realizar possíveis ajustes

necessários à entrevista, ao Meu Amigo de Papel e à própria escala. A realização desse

estudo também permitiu examinar questões de ordem prática, como tempo de aplicação,

condução de entrevistas conjuntas e individuais e instruções do protocolo de avaliação

infantil. A seguir, foi conduzido um estudo de caso coletivo com três famílias, e um estudo

de caso único, decorrente de uma perícia de disputa de guarda, ambos com o propósito de

avaliar a aplicabilidade do SARP. Os estudos de caso são apresentados na seção seguinte

desta tese.

104

SEÇÃO III

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 6

Evidências de fidedignidade entre juízes da Escala SARP

O presente capítulo visa a examinar a fidedignidade entre juízes na pontuação da

Escala SARP, com o propósito de contribuir para o processo de validação do SARP. Três

famílias foram avaliadas por meio do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental.

Os dados dessas avaliações foram transcritos, organizados e encaminhados a duas

psicólogas e uma assistente social. As profissionais pontuaram a escala, às cegas, com base

no material recebido, para que a fidedignidade entre suas pontuações fosse analisada.

Método

Participantes

As juízas participantes deste estudo foram duas psicólogas e uma assistente social,

com experiência em atendimento a famílias e/ou crianças. As psicólogas trabalham com a

abordagem psicanalítica na sua prática clínica, ao passo que a assistente social trabalha no

Sistema Judiciário e é especialista em terapia de família. A opção de que uma das juízas

fosse assistente social se deu em razão de averiguar a possibilidade do SARP ser aplicado

não exclusivamente por psicólogos, mas também por profissionais do Serviço Social.

Instrumento e Procedimentos

O instrumento utilizado para este estudo foi a Escala SARP. As juízas pontuaram

três escalas, apontando os escores para pai e mãe de cada uma das três famílias avaliadas,

totalizando, assim, uma amostra de seis casos (n=6), para análise da fidedignidade.

Com o objetivo de garantir uniformidade acerca das informações sobre o SARP, foi

realizado um treinamento com as juízas. Esse procedimento compreendeu a

105

apresentação do SARP e sua forma de aplicação, com enfoque na pontuação da Escala

SARP. Após a apresentação, as juízas receberam as transcrições dos atendimentos e cópia

do Meu Amigo de Papel de um estudo piloto realizado pelas pesquisadoras, e foram

solicitadas a pontuar a escala, com base no material recebido. As pontuações foram

discutidas entre as duas juízas presentes no treinamento e a pesquisadora. Uma das juízas

não pode estar presente no treinamento e, assim, recebeu posteriormente a gravação em

vídeo da apresentação e da discussão, bem como os materiais utilizados no treinamento. A

duração total do treinamento foi de três horas.

Após a discussão do estudo piloto, as juízas receberam um conjunto de informações

sobre cada uma das três famílias avaliadas. Esse conjunto era composto por: a) entrevista

inicial de anamnese; b) Entrevista SARP preenchida com as transcrições dos atendimentos

com os pais, organizadas conforme as perguntas; c) transcrição dos atendimentos dos

filhos; d) cópia do Meu Amigo de Papel preenchido pelas crianças; d) Escala SARP (para

pontuação). Foi estabelecido o prazo de três semanas para que as juízas pontuassem as

escalas, fazendo sua devolução às pesquisadoras.

As pontuações das juízas (J1, J2 e J3) foram organizadas em um banco de dados

para aplicação da estatística Kappa, do programa STATA, a fim de avaliar o índice de

concordância entre as avaliadoras. Para avaliar se a concordância é razoável, realizamos

um teste estatístico para avaliar a significância do Kappa. Neste caso a hipótese testada é se

o Kappa é igual a 0, o que indicaria concordância nula, ou se ele é maior do que zero,

concordância maior do que o acaso (teste monocaudal: H0: K = 0; H1: K > 0). Um Kappa

com valor negativo, que não tem interpretação cabível, pode resultar num paradoxal nível

crítico (valor de p) maior do que um.

No caso de rejeição da hipótese (Kappa=0) temos a indicação de que a medida de

concordância é significantemente maior do que zero, o que indicaria que existe alguma

concordância. Landis e Koch sugerem a seguinte interpretação:

Valor Intepretação

Abaixo de 0 Ruim

0,00 – 0,20 Leve

0,21 – 0,40 Regular

0,41 – 0,60 Moderado

106

0,61 – 0,80 Substancial

0,81 – 1,00 Quase perfeito

Fonte: Landis J. R., Koch G. G. The measurement of observer agreement.

A primeira análise das questões resultou em graus de concordância prejudicados, a

maioria sendo classificada entre ruim e regular. Assim, procedeu-se a uma análise

qualitativa da discordância entre as avaliadoras. Foram feitos ajustes em alguns itens da

escala, tornando sua redação mais objetiva, e alterando alguns termos. Foi realizado, então,

um novo treinamento em conjunto com as três juízas, em que foram discutidas as questões

de maior discordância, estabelecendo alguns novos padrões para pontuação. As juízas

receberam a nova versão da Escala SARP, e realizaram nova pontuação, às cegas, dos

genitores das três famílias.

Resultados e discussão

A Tabela 8 apresenta a concordância entre juízes e o Kappa obtido para cada uma

das questões da Escala SARP. As combinações foram feitas da seguinte forma: J1-J2; J1-

J3; J2-J3 e J1-J2-J3.

Tabela 8

Sumário do Resultado da Medida de Concordância entre J1-J2, J1-J3, J2-J3 e J1-

J2-J3 das Questões da Escala SARP (n=6)

Questão Avaliadores Concordância (%) Kappa

Q1 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

100,00

66,67

0,50

1,00

0,50

0,61

Q2 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

50,00

50,00

100,00

0,52

0,52

1,00

0,21

Q3 J1-J2

J1-J3

J2-J3

83,33

66,67

50,00

0,66

0,33

0,18

107

J1-J2-J3 0,32

Q4 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

50,00

50,00

0,42

0,25

0,33

0,27

Q5 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

100,00

83,33

0,45

1,00

0,45

0,61

Q6 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

66,67

100,00

0,40

0,40

1,00

0,55

Q7 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

83,33

83,33

0,66

0,66

0,68

0,66

Q8 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

83,33

66,67

0,73

0,71

0,50

0,63

Q9 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

50,00

50,00

0,42

0,18

0,00

0,19

Q10 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

100,00

83,33

0,68

1,00

0,68

0,78

Q11 J1-J2

J1-J3

J2-J3

100,00

100,00

100,00

1,00

1,00

1,00

108

J1-J2-J3 1,00

Q12 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

66,67

83,33

0,72

0,45

0,66

0,35

Q13 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

50,00

50,00

0,50

0,35

0,33

0,37

Q14 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

0,00

16,67

83,33

-0,28

0,03

0,66

-0,04

Q15 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

100,00

66,67

0,33

1,00

0,33

0,55

Q16 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

83,33

83,33

0,40

0,71

0,66

0,58

Q17 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

50,00

33,33

50,00

0,28

-0,09

0,28

0,14

Q18 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

100,00

83,33

83,33

1,00

0,60

0,60

0,74

Q19 J1-J2

J1-J3

J2-J3

33,33

66,67

33,33

0,17

0,42

0,20

109

J1-J2-J3 0,14

Q20 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

33,33

66,67

33,33

-0,09

0,40

0,07

0,02

Q21 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

83,33

83,33

0,50

0,73

0,71

0,63

Q22 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

50,00

66,67

50,00

0,00

0,33

0,00

0,10

Q23 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

0,00

16,67

66,67

-0,50

-0,25

0,45

-0,15

Q24 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

100,00

100,00

100,00

1,00

1,00

1,00

1,00

Q25 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

83,33

83,33

66,67

0,73

0,71

0,50

0,63

Q26 J1-J2

J1-J3

J2-J3

J1-J2-J3

66,67

83,33

50,00

0,50

0,71

0,25

0,46

Tendo em vista a amostra reduzida do estudo (n=6), o percentual de concordância

acima de 60% entre duas juízas foi considerado como aceitável. Dessa forma, a maioria

110

das questões da Escala SARP (Q1, Q5, Q6, Q7, Q8, Q10, Q11, Q12, Q15, Q16, Q18, Q21,

Q24 e Q25) obteve concordância acima do desejável, nas três combinações de juízes (J1-

J2, J1-J3 e J2-J3). As questões 14 e 23 foram as que apresentaram concordância bastante

prejudicada em, pelo menos, uma das combinações de juízes.

Para melhor compreender a interpretação dos resultados do Kappa na combinação

J1-J2-J3, os dados foram organizados na Tabela 9. São apresentadas as interpretações da

medida de concordância Kappa, conforme análise combinada das três juízas, e as questões

da escala que atingiram cada medida.

Tabela 9

Interpretação do Kappa para as Questões da Escala SARP

Interpretação Kappa Questões

Quase perfeito Q11, Q24

Substancial Q1, Q5, Q7, Q8, Q10, Q18, Q21, Q25

Moderado Q6, Q15, Q16, Q26

Regular Q2, Q3, Q4, Q12, Q13

Leve Q9, Q17, Q19, Q20, Q22

Ruim Q14, Q23

As questões que obtiveram índices de concordância quase perfeito são as que

envolvem a avaliação do conhecimento acerca dos cuidados básicos do filho e a educação

formal. Esses itens apresentaram a mesma pontuação entre as juízas, para os seis genitores

avaliados. Importante apontar que são itens mais objetivos, que não dependem muito da

interpretação por parte do aplicador. Ademais, é um indicativo de clareza das questões que,

mesmo sendo objetivas, não suscitaram dúvidas.

Os itens que apresentaram concordância substancial envolvem conflito conjugal,

apoio emocional, flexibilidade de contatos, manifestações de afeto do genitor,

envolvimento nas atividades do filho após a separação, transmissão de valores,

comunicação com o filho e participação nas atividades escolares. Vale destacar que os

itens flexibilidade de contatos e envolvimento nas atividades do filho após a separação não

se aplicavam a quatro casos, pois se tratavam de famílias casadas. Deviam, portanto,

receber obrigatoriamente a pontuação NA (não foi possível avaliar). Esse fato contribuiu

para aumentar a medida de concordância nessas questões. Os itens que examinam o

111

conflito conjugal, apoio emocional e transmissão de valores apresentaram melhora na

concordância após o novo treinamento com as juízas, a partir de combinações discutidas.

Os demais itens já haviam apresentado boa concordância desde o treinamento inicial.

A concordância moderada foi obtida nas questões que abrangem comunicação com

o outro genitor, monitoramento das relações sociais, estabelecimento de limites e

atividades recreativas. Levando em consideração o baixo número de casos avaliados (n=6),

a concordância moderada pode ser considerada como boa e, portanto, esses itens

revelaram-se adequados.

As questões que apresentaram concordância regular dizem respeito aos

comportamentos de desqualificação parental, à interferência do estado emocional do

genitor, ao apoio material do genitor, ao sustento financeiro e à proteção frente a riscos

reais na rede de apoio. Interessante observar que as questões 4 e 12, que dizem respeito ao

apoio material e sustento financeiro, respectivamente, avaliam questões mais objetivas e,

portanto, esperava-se maior concordâncias nesses casos. Tal fato implica a necessidade de

esclarecimentos acerca desses itens no treinamento pelo qual os aplicadores do SARP

deverão passar. Os itens “comportamentos de desqualificação parental” e “interferência do

estado emocional”, por outro lado, podem ter tido suas pontuações variadas em razão da

subjetividade do examinador, o que explica possíveis discordâncias. Em relação à

“proteção frente a riscos reais na rede de apoio”, foi possível perceber que, mesmo após a

discussão desse item no treinamento, ele permaneceu gerando interpretações diferenciadas

e, portanto, necessita revisão.

Os itens que apresentaram concordância leve foram os que analisam o

envolvimento nas atividades diárias do filho no período pré-separação, o monitoramento de

limites, a consistência parental, as manifestações de afeto do filho e a identidade pessoal.

Uma análise qualitativa das diferentes pontuações entre as juízas nessas questões permitiu

concluir que a discordância ocorreu em decorrência de questões subjetivas. Itens que uma

juíza considerou com poucos prejuízos, por exemplo, foram considerados pelas outras

como apresentando muitos prejuízos, ou vice-versa. A subjetividade do examinador é uma

questão presente no contexto da avaliação psicológica. É preciso, entretanto, buscar formas

de amenizar essa subjetividade, tornando as orientações de pontuação mais criteriosas, a

fim de evitar discrepâncias.

112

Por fim, apenas dois itens apresentam um grau de concordância ruim, referente às

questões “proteção frente a riscos reais com o outro genitor e familiares” e

“desenvolvimento da autonomia e independência”. Corroborando a concordância regular

do item 13, também referente à proteção frente a riscos reais, resta clara a importância de

revisar ambas as questões 13 e 14, de forma a esclarecer o que se pretende investigar por

meio do termo “proteção frente a riscos reais”, o que parece estar gerando interpretações

errôneas. A questão 23 indica, mais uma vez, a subjetividade das examinadoras,

provavelmente decorrente do que a questão aponta como “desenvolvimento apropriado

considerando a idade e estágio de desenvolvimento da criança”. Esse fato reforça a

necessidade de exigência de conhecimentos sobre psicologia do desenvolvimento infantil

por parte dos aplicadores do SARP.

Outro ponto importante a ser considerado, além do baixo número de casos

avaliados (n=6) e que pode ter contribuído para o prejuízo da concordância entre os juízes

foi o acesso das juízas às informações. Com o propósito de otimizar o tempo das

avaliadoras, as transcrições das entrevistas foram organizadas conforme as perguntas da

Entrevista SARP, nem sempre sendo transcritas integralmente. As juízas também não

tiveram acesso aos dados de outros instrumentos que foram também aplicados às famílias.

Essa restrição das informações, embora comum às três juízas, pode ter contribuído para

dúvidas no momento da pontuação, em razão da possível carência de dados. Esse fato

auxilia na compreensão da discordância das pontuações, especialmente naquelas em que a

subjetividade do examinador pode ter influenciado a maneira de pontuar a escala.

Outra questão, apontada pelas próprias juízas como um fator de interferência no

momento da pontuação da escala, seria a experiência e formação de cada uma. É possível

que as diferentes abordagens com que trabalham, assim como seu tempo de formação e

prática profissional, influenciem sua compreensão dinâmica sobre os casos, causando

diferenças nas pontuações.

Uma vez apresentados e discutidos os resultados da medida de concordância Kappa

entre as juízas para cada uma das questões da Escala SARP, foi realizada uma correlação

intraclasse para analisar as pontuações das dimensões da escala. Para tal análise, foi

utilizado o Coeficiente de Correlação Intraclasse (CCI), que é uma medida de

confiabilidade dos avaliadores. O modelo de CCI empregado foi o de efeitos mistos, do

tipo concordância absoluta. Quanto mais próximos de 1 os valores, menor a variabilidade

113

entre avaliadores. A Tabela 10 apresenta os resultados do Coeficiente de Correlação

Intraclasse (CCI) para cada um dos casos avaliados pelas juízas, com seus respectivos

valores do intervalo de confiança.

Tabela 10

Coeficiente de Correlação Intraclasse das Pontuações das Juízas para as

Dimensões da Escala SARP (n=6)

Coeficiente de Correlação Intraclasse

ICC Intervalo de Confiança 95%

Limite Superior Limite Inferior

Pai 1 0,872* 0,654 0,970

Mãe 1 0,894* 0,703 0,975

Pai 2 0,841* 0,581 0,962

Mãe 2 0,911* 0,745 0,980

Pai 3 0,779* 0,460 0,945

Mãe 3 0,742* 0,402 0,934

*p<0,0001

O Coeficiente de Correlação Intraclasse (ICC) apresentou-se superior a 0,75 em

todos os casos avaliados, dado que aponta para ótimos resultados de fidedignidade entre as

juízas. Levando em consideração que os resultados da Escala SARP são apresentados de

acordo com seus fatores, ou seja, indicando quais dimensões do relacionamento parental

estão bem atendidas e quais estão deficitárias, a boa correlação entre os resultados das

pontuações das juízas para os fatores da escala é um dado bastante importante. Embora,

conforme já apontado, alguns itens da Escala SARP demandem ajustes, tendo sido a

medida de concordância Kappa considerada ruim, leve ou regular, a análise conjunta dos

itens, organizados em seus fatores, revelou ótima correlação.

Considerações Finais

A análise da fidedignidade entre juízes na pontuação da Escala SARP contribuiu

para o processo de validação do sistema de avaliação. Foi assinalada a necessidade de

novos ajustes em alguns itens da escala, cujas definições precisam ser mais bem

114

esclarecidas. Outra necessidade apontada foi a de tornar a pontuação da escala mais

criteriosa, evitando discrepâncias nos escores de diferentes avaliadores. O estudo permitiu,

ainda, reforçar a ideia de realização de treinamento para aqueles profissionais que desejam

utilizar o SARP.

Uma vez realizadas as alterações indicadas, é importante que estudos futuros sejam

conduzidos, com amostras maiores. Novas análises de fidedignidade entre juízes

permitirão o aprimoramento da Escala SARP, contribuindo para torná-la um instrumento

válido e fidedigno.

115

SEÇÃO III

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 7

Evidências de validade clínica do Sistema de Avaliação

do Relacionamento Parental

O presente capítulo teve como finalidade apresentar evidências de validade clínica

do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental (SARP). Para tanto, foi realizado um

estudo qualitativo de caráter exploratório com três famílias. Os genitores que mostraram

interesse em participar do estudo o fizeram com o objetivo de avaliar a qualidade do seu

relacionamento com seus filhos. Foram aceitas para o estudo famílias intactas e

divorciadas, objetivando averiguar, também, a aplicabilidade do SARP em outros

contextos que não o de disputa de guarda.

O conceito de validade clínica implica caracterizar a adequação da informação

(nomotética ou idiográfica) a um sujeito particular. Não se trata de uma propriedade

exclusiva do instrumento, mas sim uma validade compartilhada com a totalidade do

contexto em que a informação é gerada (Tavares, 2003). Interessa, assim, avaliar a

configuração e integração dinâmica dos padrões de resposta dos sujeitos avaliados neste

estudo, buscando indicadores de congruência interna, externa e teórica que assegurem a

validade clínica do SARP.

Método

Participantes

Participaram do estudo três famílias, que contataram a pesquisadora

voluntariamente, após tomar conhecimento da pesquisa por meio de palestras realizadas

116

em escolas e em centros de formação em Psicologia. As palestras tiveram como temática

“os efeitos da conjugalidade na relação pais-filhos”, e o público alvo foi composto por

profissionais e comunidade em geral. A divulgação da pesquisa consistiu em convidar pais

que acreditassem que se beneficiariam de uma avaliação psicológica acerca da qualidade

da relação parental para integrar o estudo.

Apesar de o convite ser mais relacionado à qualidade da relação parental, as

motivações das famílias que decidiram participar da avaliação relacionaram-se a problemas

de comportamento dos filhos nos contextos escolar e social. Os genitores tinham idades

entre 22 e 49 anos, e os filhos entre 8 e 13 anos. Duas famílias eram de nível

socioeconômico baixo e uma, de nível médio alto. Dois casais apresentavam níveis de

conflito conjugal baixo e médio, e uma das famílias era composta por genitores

divorciados. Um dos casais possuía dois filhos, e os demais, filhos únicos. Os nomes

utilizados para este estudo são fictícios, para preservar a identidade dos participantes.

Instrumentos

O SARP foi utilizado com todas as famílias, com utilização da Entrevista SARP,

Meu Amigo de Papel e Escala SARP. As entrevistas iniciais de anamnese foram realizadas

apenas com as mães, em razão da disponibilidade e interesse por parte das mesmas. A

Entrevista SARP foi aplicada individualmente a cada um dos genitores, e as crianças

preencheram o Meu Amigo de Papel.

Os genitores também responderam ao Inventário de Estilos Parentais (IEP)

(Gomide, 2006), que é um instrumento de autorrelato aplicado a pais, crianças acima de

oito anos e adolescentes, e tem como objetivo avaliar a maneira utilizada pelos pais na

educação de seus filhos. É composto por 42 questões que correspondem a sete práticas

educativas, sendo duas positivas (monitoria positiva e comportamento moral) e cinco

negativas (punição inconsistente, negligência, disciplina relaxada, monitoria negativa e

abuso físico). Para o presente estudo, foram analisados os valores de três das sete práticas

educativas mencionadas: monitoria positiva, comportamento moral e negligência. A

escolha dessas práticas se deu em razão de assemelharem-se a algumas das dimensões da

Escala SARP, permitindo assim uma melhor análise dos dados.

117

Para as crianças, também foi aplicado o Teste de Apercepção Familiar (Family

Aperception Test – FAT). Um dos participantes sentiu-se bastante mobilizado pelo FAT e

solicitou para não realizá-lo, alegando que não sabia muito bem inventar histórias e que a

cena da primeira lâmina raramente tinha acontecido em sua vida. Neste caso, o instrumento

foi substituído pelo Método Projetivo de Rorschach, aplicado de acordo com o Sistema

Compreensivo de John Exner.

O FAT (Sotile, Julian III, Henry & Sotile, 1991) é um instrumento adequado para

avaliar o processo de funcionamento e estrutura familiar. É composto por 21 lâminas e

pode ser aplicado a crianças e adolescentes com idades entre 06 e 15 anos. É solicitado ao

examinando que conte uma história a partir das lâminas apresentadas, as quais induzem a

diversas associações projetivas a respeito do processo e da estrutura familiar. As temáticas

envolvem os relacionamentos entre pais, filhos, irmãos e outros integrantes da família

extensa. O FAT está em processo de validação no Brasil e, portanto, a pesquisadora

recebeu treinamento e supervisão para a aplicação do instrumento no presente estudo.

O Método das Manchas de Tinta de Rorschach é um instrumento que fornece

informações úteis sobre o funcionamento e estrutura da personalidade. Confronta os

sujeitos com uma tarefa de solução de problema à qual respondem como geralmente o

fazem em situações equivalentes de sua vida. Apresenta características objetivas e

subjetivas de avaliação e presta-se à investigação da percepção e da associação (Weiner,

2000).

Delineamento e procedimentos

Foi realizado um estudo qualitativo de caráter exploratório, buscando evidências de

validade clínica do SARP em famílias com configurações e características distintas. A

escolha pelas três famílias deste estudo justifica-se pela relevância do uso do SARP em

outros contextos que não exclusivamente o forense.

Conforme mencionado anteriormente, as famílias participantes fizeram contato com

a pesquisadora após divulgação da pesquisa em palestras direcionadas à comunidade. Os

contatos iniciais se deram por correio eletrônico, sendo que nos três casos foram as mães

que buscaram informações e manifestaram interesse em participar do estudo. Foi agendado

um contato pessoal para fornecer informações mais específicas sobre o funcionamento da

118

pesquisa e para a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando

a sua participação e também de seus filhos. Ainda no primeiro encontro foi realizada a

entrevista inicial de anamnese. Posteriormente, foram agendados mais dois encontros, um

com cada genitor, para aplicação da Entrevista SARP e preenchimento do IEP. A média de

duração dos encontros com os pais foi de 90 minutos.

Para as crianças, foram agendados dois atendimentos, ambos com duração de cerca

de uma hora. No primeiro encontro foram aplicadas cinco atividades do Meu Amigo de

Papel e 10 lâminas do FAT. No segundo encontro, foram aplicadas as onze lâminas

restantes do FAT e, a seguir, mais três atividades do Meu Amigo de Papel. No caso da

substituição do FAT, o primeiro encontro destinou-se à aplicação do Meu Amigo de Papel

na íntegra, e o segundo, ao Rorschach.

Cerca de seis semanas após a conclusão dos procedimentos de avaliação

psicológica, foi feito contato com os responsáveis para agendamento da devolução. Foram

realizadas entrevistas devolutivas com cerca de 1h de duração com cada uma das famílias.

Em apenas uma das entrevistas devolutivas compareceram ambos os pais; nas outras duas

famílias apenas a mãe compareceu, apesar da indicação da pesquisadora. Além da

devolução verbal, as famílias receberam um parecer psicológico com os principais

resultados da avaliação.

Resultados

Os resultados serão apresentados separadamente para cada uma das famílias. Com o

objetivo de facilitar a disposição das informações, os dados foram organizados da seguinte

forma: 1) Genograma e história clínica; 2) Entrevista SARP; 3) Meu Amigo de Papel; 4)

Escala SARP; 5) IEP; 6) FAT ou Rorschach.

Família 1

1) Genograma e história clínica

Carlos Elisa Guilherme

Augusto, 8 anos

119

Figura 2

Genograma da Família 1

Elisa casou-se com Carlos aos 17 anos de idade. Logo em seguida engravidou de

Augusto. Carlos era usuário de drogas e ambas as famílias dos genitores apresentam

histórico de alcoolismo. O relacionamento do casal era um pouco conturbado, sendo que os

conflitos aumentaram após o nascimento de Augusto. Elisa relatou inclusive um episódio

de agressão verbal e física por parte de Carlos contra ela. A mãe refere que Carlos era um

pai pouco participativo, não se engajando nos cuidados com o filho. A separação do casal

ocorreu quando Augusto tinha três anos. Durante algum tempo pai e filho mantiveram

contatos esporádicos. Contudo, em razão de desentendimentos e de Augusto referir não

querer mais visitar o pai, os contatos cessaram. Elisa constituiu novo relacionamento e

mudou-se para outra cidade. Carlos desde então não procurou mais o filho.

Elisa vive em união estável com Guilherme há cinco anos. Descreve seu

relacionamento conjugal como muito tranquilo, com poucos conflitos. Augusto refere-se a

Guilherme como seu pai, não fazendo nenhuma referência a Carlos. Trata-se de uma

família de nível socioeconômico baixo, em que ambos os pais possuem Ensino Médio

completo. Augusto possui uma bolsa de estudos que lhe permite estudar em uma escola

particular. A motivação desta família para participar da pesquisa foi a queixa da escola

acerca do comportamento de Augusto. Os dados considerados no presente estudo de caso

são referentes à mãe e ao pai socioafetivo (Guilherme).

2) Entrevista SARP

Rotina. Durante a manhã, Augusto toma café com o pai e depois faz suas tarefas da

escola, assiste TV ou joga vídeo game. O pai vai dormir logo após servir o café para o

filho, uma vez que trabalha como segurança à noite. Às 11h Guilherme vai para o trabalho

extra que faz no horário do almoço. Assim, entre 11h e 12:30, Augusto fica sozinho em

casa, até que a mãe chegue do trabalho para almoçarem juntos. À tarde vai para a aula com

o transporte escolar, e sua mãe vai junto, pois trabalha no mesmo colégio em que o filho

estuda. À tardinha, ao chegar da escola, Augusto janta e assiste TV com a mãe. Elisa

monitora os temas da escola e o banho do filho. Refere que muitas vezes vai dormir,

porque está cansada, e o filho segue assistindo TV. O pai não convive muito com o filho à

120

tardinha, pois trabalha quase todas as noites. Aos finais de semana às vezes vão a parques

ou shoppings.

Cuidados. Ambos os genitores monitoram as atividades de higiene, apesar de

referirem que Augusto as realiza de forma independente. Quando há situações de doença,

os cuidados se restringem mais à mãe. Guilherme e Elisa expressaram preocupação pelo

fato de Augusto ficar sozinho em casa por algumas horas. Passaram orientações ao filho e

a mãe o monitora pelo telefone durante esse período, já que não têm condições de pagar

uma pessoa para cuidá-lo.

Escola e Amigos. Elisa e Guilherme dividem-se para monitorar as tarefas escolares

de Augusto. A mãe costuma participar mais das reuniões da escola, porém o pai está ciente

do desempenho escolar do filho. Referem que Augusto não tem dificuldades de

aprendizado, mas há queixas de comportamento por parte das professoras. Em relação aos

amigos, os pais comentam que alguns já humilharam Augusto em razão das diferentes

condições financeiras. Lamentam bastante o fato e se esforçam para oferecer o melhor para

seu filho.

Comunicação. Elisa e Guilherme referiram que, de forma geral, é bastante tranquilo

conversar com o filho. Augusto conta sobre problemas na escola e, embora às vezes

demonstre-se quieto, Guilherme relata que “depois ele acaba se entregando”.

Rede de apoio. Elisa e Guilherme afirmam que podem eventualmente contar com o

auxílio da mãe de Guilherme, no caso de alguma emergência. As madrinhas de Augusto

também são pessoas em quem confiam, mas moram em outra cidade.

Estabelecimento de limites. Guilherme informou que exige mais de Augusto em

relação à limpeza e organização, enquanto Elisa monitora mais as questões de higiene. A

imposição de limites revelou-se adequada e os genitores relataram que Augusto cumpre

espontaneamente os castigos eventualmente impostos, mostrando-se bastante exigente

consigo mesmo.

3) Meu Amigo de Papel

Será apresentada a transcrição das histórias da primeira atividade. A seguir, será

descrito um resumo dos dados obtidos por meio das demais atividades.

História 1

A: Daí a mãe pede pra ele limpar o chão.

121

V: E que mais?

A: E agradece ele.

V: Como é que ele está? Como o menino ficou se sentindo?

A: Mal!

V: Por que mal?

A: Porque ele tinha derramado suco no chão.

V: E a mãe, como é que se sentiu?

A: Ficou triste com o filho.

V: Como é que termina esta historinha?

A: Com eles jantando.

V: E como é que era a relação desta mãe com este filho?

A: Se davam bem.

História 2

A: Ele cai e fica chorando, porque ele machucou o joelho e o pé também.

V: E aí?

A: Aí o pai e a mãe foram pegar um curativo para ele.

V: Daí eles pegam o curativo...

A: Daí, o filho se levanta e passeia pelo parque.

V: Quem que passeia pelo parque?

A: O filho, a mãe e o pai.

V: E como que eles estão se sentindo?

A: Bem.

V: E como é que é a relação entre eles? Entre a mãe, o pai e o filho?

A: Todas as semanas de tarde, quando o filho não tem escola, eles vão para o parque.

História 3

A: A mãe fala de novo para ele arrumar o quarto, daí ele diz: - Tá bom mãe. Vou arrumar.

Daí ele arruma todo o quarto e depois pode ir jogar vídeo game. Daí, depois o pai deixa

ele jogar vídeo game.

V: O pai deixa? Isso que tu falou?

A: Aham.

V: Tu disseste que a mãe falou de novo para ele arrumar o quarto... Como é que ele ficou

se sentindo?

122

A: Mal, por que ele queria jogar vídeo game.

V: E a mãe como é que ficou?

A: Triste, porque o filho não obedecia.

V: E onde que tava o pai nesta história, que depois tu disse que o pai deixou jogar vídeo

game? Tu me contou assim, vamos ver se eu entendi certo: a mãe fala de novo pra ele

arrumar o quarto, aí ele diz “tá bom mãe, eu vou arrumar”. Aí ele arruma e depois ele

joga vídeo game. Aí depois tu me disse que o pai deixa ele jogar vídeo game. É isso?

Entendi certo?

A: Os pais.

V: Ah, os dois. Tá, entendi. E como é que terminou esta historinha?

A: Daí o pai também queria jogar vídeo game com ele.

V: E eles jogaram?

A: Sim. E o pai ficou feliz.

A descrição da rotina de Augusto vai ao encontro das informações trazidas pelos

genitores, incluindo as refeições, temas, banho, vídeo game e TV. Informou que vai dormir

às 23h ou 24h. Em relação a eventos importantes em sua vida, Augusto comentou o

falecimento dos padrinhos e a aquisição de um novo carro pelos pais.

Quando solicitado a conversar sobre a família, afirmou que gosta de ir ao parque e

de comer pizza com os pais. Relatou que gosta de brincar com o pai, e não gosta do seu

trabalho, porque ele passa muito tempo fora de casa. Por outro lado, referiu gostar do

trabalho da mãe por ser no mesmo colégio em que estuda.

Em relação às suas preocupações, Augusto escreveu: “Eu me preocupo em me

esquecer o tema. Eu me preocupo muito com isso, muito mesmo”. Ao ser questionado

sobre o porquê dessa preocupação, respondeu: “porque a prof. briga comigo daí. Ela

manda bilhete”. Na atividade “Planos para o Futuro”, expressou o desejo em levar os pais

para uma casa melhor, com dois pisos e com piscina. Também comentou que pretende ser

juiz e que não sabe o que juiz faz, só sabe que ganha bastante.

4) Escala SARP

A pontuação da Escala SARP considerada para apresentação dos dados foi a

realizada pela própria pesquisadora, em razão de ter sido ela a avaliadora das famílias,

123

aplicando todos os instrumentos mencionados. Os resultados serão apresentados sob a

forma de gráfico, com as médias das pontuações dos itens que compõem cada dimensão,

permitindo a comparação entre genitores. A pontuação de cada item variava entre 0 e 3.

Figura 3

Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 1

É possível observar que os genitores obtiveram pontuações bastante semelhantes,

diferenciando-se apenas nas dimensões “proteção frente a riscos reais”, em que a

pontuação da mãe foi maior, e “desenvolvimento da identidade”, em que Guilherme

pontuou mais. Contudo, ainda que com essas diferenças, Guilherme e Elisa obtiveram

escores acima da média em todas as dimensões, o que permite concluir que ambos

possuem uma boa qualidade de relacionamento com seu filho.

5) IEP

Tabela 11

Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 1

Monitoria

Positiva

Comportamento

moral

Punição

inconsistente

Negligência Disciplina

relaxada

Monitoria

negativa

Abuso

físico

iep

Mãe 1 35 50 95 35 80 40 35 65

Pai 1 90 80 5 60 15 40 25 40

124

O índice de estilo parental (iep) de ambos os genitores equivale a um estilo parental

regular, estando o de Elisa acima da média, enquanto o de Guilherme encontra-se abaixo

da média. Considerando-se as três variáveis do IEP que serão analisadas, Elisa apresenta-se

dentro do resultado regular, mas abaixo da média para monitoria positiva, comportamento

moral e negligência. Guilherme apresenta monitoria positiva e comportamento moral

dentro de um nível ótimo, enquanto a negligência está no nível regular e acima da média.

6) FAT

Nas histórias de Augusto em que havia algum tipo de conflito, predominaram os

conflitos familiares, com resolução positiva para a maioria deles. A imposição de limites é

percebida como adequada e obediente, com fronteiras nítidas. O relacionamento entre pais

e filhos nas histórias muitas vezes é descrito como pouco confortável, com situações em

que o filho obedece aos limites impostos, mas revela-se insatisfeito ou brabo. As temáticas

mais frequentes nas histórias de Augusto relacionam-se com preferências de alimentação,

dificuldades financeiras e afastamento do pai em razão do trabalho, revelando

preocupações de Augusto em relação à sua família.

Família 2

1) Genograma e história clínica

Fernando Marisa

Nicolas Manuela

13 anos 8 anos

Figura 4

Genograma da Família 2

Fernando e Marisa são casados há 17 anos. Conheceram-se na empresa em que

trabalhavam, onde Marisa era nutricionista, e Fernando trabalhava na área de Recursos

125

Humanos. Pouco tempo após casarem, Fernando foi demitido e desde então não conseguiu

outro emprego. Marisa relata que com este fato os conflitos entre o casal aumentaram.

Atualmente o casal refere que discutem bastante, pois não têm paciência para sentar e

conversar. Ainda que as brigas sejam frequentes e por vezes presenciadas pelos filhos,

Fernando e Marisa afirmam que não pensam em se separar.

Fernando possui Ensino Médio completo e Marisa possui pós-graduação.

Atualmente, Fernando é do lar, realizando as tarefas da lida doméstica e gerenciando os

cuidados com os filhos. Marisa trabalha em um hospital e provê o sustento financeiro da

família. Relata que não lida com muita naturalidade com essa situação, principalmente em

razão de cobranças da sociedade. A família possui um nível socioeconômico médio alto,

com os filhos estudando em escola particular. Nicolas e Manuela estavam em atendimento

psicoterápico quando da procura para participar da pesquisa. Marisa aponta preocupações

pelo fato do filho não ter amigos meninos, apenas meninas. Preocupa-se também com

Manuela por ela apresentar enurese noturna. Esses motivos a teriam levado a procurar

psicoterapia para os filhos. Em relação à participação na pesquisa, Marisa mostrou-se um

pouco apreensiva em razão da “inversão de papéis” em sua família, e as possíveis

consequências disso para o desenvolvimento de seus filhos.

2) Entrevista SARP

Rotina. Fernando acorda cedo e prepara o café da manhã para ele, Marisa e Nicolas.

Marisa sai para trabalhar e Fernando leva Nicolas para escola, que depois retorna para casa

sozinho. Durante a manhã, Fernando fica com Manuela e monitora suas tarefas da escola.

Almoçam juntos Fernando, Manuela, Nicolas e a avó materna, com quem residem. À tarde,

Fernando leva Manuela para a escola. Nicolas assiste TV e faz seus temas. Marisa retorna

do trabalho por volta das 18h, e refere que Fernando chega em seguida com Manuela,

momento em que conversam sobre o que aconteceu durante o dia. Marisa e Fernando

relatam que a hora do banho é uma das maiores cobranças, pois “é uma briga para eles

irem tomar banho, ficam sempre se enrolando”. A família não costuma jantar reunida em

função dos horários diferentes de cada um. A exceção é às sextas-feiras, em que se reúnem

para o “dia da pizza”. Assistem à novela juntos todos os dias, e têm o hábito de ler antes de

dormir. Marisa relata que primeiro vai ao quarto da Manuela e lê com ela. Quando ela

adormece, Marisa vai para o quarto do Nicolas e fica um pouco com ele. Fernando

126

costuma dormir cedo, pois levanta às 6h. Nos finais de semana costumam andar de

bicicleta, visitar familiares e no verão vão para a praia com frequência.

Cuidados. Durante o dia, os cuidados com os filhos ficam sob a responsabilidade de

Fernando, quem monitora os estudos e cuidados de higiene, especialmente no caso de

Manuela. À noite, Marisa assume os cuidados, monitorando banho, alimentação e hora de

dormir. Em situações de doença, Marisa fica mais apreensiva e costuma pedir licença do

trabalho, ainda que saiba que Fernando cuida dos filhos. Para a psicoterapia é sempre

Marisa quem leva, pois refere que o marido fica desconfortável com esse assunto.

Escola e Amigos. O casal costuma revezar-se para as reuniões que têm na escola,

pois Fernando não gosta de deixar os filhos sozinhos com a sogra, de 90 anos. Relatam

que, ao chegarem da reunião, um sempre conta ao outro o que foi tratado. Ambos os

genitores mostraram-se a par do desempenho dos filhos na escola, não sendo este fato uma

preocupação. Referem que Manuela é bastante independente em relação aos temas, e que

Nicolas é um pouco preguiçoso, mas apresenta notas boas.

No que diz respeito às amizades, Marisa relata que se preocupa com o fato de

Nicolas se relacionar só com as meninas. Porém, refere que ele é respeitado na escola, que

“não fazem piadinhas por ele estar mais com as meninas”. Fernando concorda com a

visão de Marisa, e acredita que o filho “se sobressai e quer meio que governar, e isso as

meninas aceitam mais; os guris já ficam mais irritados com isso”. Quanto à Manuela, os

pais informam que ela se relaciona bem na escola, e conhecem suas amigas mais próximas.

Comunicação. Marisa refere que tem mais facilidade para comunicar-se com

Nicolas, enquanto Manuela a contesta mais. Acredita que os filhos são bastante reservados,

e não “abrem muito os seus problemas”. Fernando relata que sempre questiona sobre o

colégio, mas sente que se os filhos estão mais tristes, eles se dirigem à mãe.

Rede de apoio. Em razão de Fernando não trabalhar fora de casa, os filhos

dificilmente ficam sob os cuidados de terceiros. Contudo, as irmãs de Fernando foram

referidas como familiares com quem podem contar em situações de emergência, e com as

quais Nicolas e Manuela possuem uma ótima relação.

Estabelecimento de limites. Os genitores costumam impor castigos aos filhos como

“ficar sem TV, sem vídeo game, sem notebook”, quando eles não cumprem alguma

combinação. Marisa diz conseguir cumprir os castigos que estipula, mas Fernando já tem

mais dificuldade em mantê-los. Referem ainda que superprotegem Manuela, muitas vezes

127

falando com ela de forma infantilizada. Segundo eles, Manuela tem pouca autonomia para

se vestir, e que quando vai ao banheiro chama a mãe ou o pai para limpá-la.

3) Meu Amigo de Papel

Histórias relatadas por Nicolas

História 1

N: Bom, eu ia começar a reclamar da minha irmã. A minha mãe ia levantar pra pegar um

pano e o pai... (eu tô pensando o que aconteceria lá em casa)... o pai ia dizer que foi sem

querer, que não foi de propósito. E a minha irmã, eu acho que talvez ela fosse começar a

chorar. Depende. É, acho que é isso.

V: E tu? O que tu estarias fazendo?

N: Bom. Eu ia começar: “Manuela, tu não cuida, tu é meio desastrada”. Eu sou meio

assim.

V: E como é que essa família tá se sentindo nessa história?

N: Pois é... A mãe talvez fosse ficar um pouco braba. O pai ia tá na boa, assim, tudo bem,

isso acontece. E eu também não ia me importar muito, ia ficar tudo bem.

V: E como terminaria essa história?

N: A gente ia limpar o suco e continuar comendo pizza e assistindo a novela.

História 2:

N: Bom, o meu pai e a minha mãe (eu tô me baseando) iam vir me ajudar. A minha irmã,

não sei, depende, se não fosse tão grave ela ia ficar rindo da minha cara. Mas é, talvez ela

fosse se preocupar um pouco. Os meus pais viriam me ajudar a limpar o sangramento,

essas coisas. Talvez eu fosse chorar e a minha irmã... o que a minha irmã faria? Bom,

depende da situação. Se ela tivesse braba comigo ela ia ficar olhando ali de longe. Mas se

ela tivesse na boa, talvez ela fosse vir ajudar.

História 3:

N: Os pais, no caso, os meus pais iam ou desligar a TV ou iam dizer tipo: “agora tu vai

ficar sem vídeo game por uma semana ou duas”, depende. Tá, então eles iam desligar a

TV e o vídeo game e iam dizer: “enquanto tu não arrumar, tu não liga”. E se eu insistisse,

eu ia perder por uma semana, duas semanas.

V: E é comum tu levar castigos assim?

N: Depende. Em relação a provas não, porque eu vou bem no colégio. Mas às vezes eu me

enrolo pro banho e acabo perdendo alguma coisa, tipo TV.

128

Quando solicitado a falar sobre o que gosta e o que não gosta, Nicolas citou

algumas comidas, vídeo game, assistir TV, aparelhos de festa, teatro e cinema. Comentou

que deseja ser ator. Não gosta de “fazer provas de matérias chatas ou difíceis”.

Os dados que apresentou sobre sua rotina corroboram os dados trazidos por seus

pais. A respeito das coisas importantes que já aconteceram em sua vida, Nicolas fez

referência a algumas aquisições de móveis e eletrônicos, ao seu nascimento e a animais de

estimação que ganhou.

Na atividade “Minha Família”, Nicolas desenhou a si, o pai, a avó, a mãe e a irmã.

Disse também que gosta de comer pizza, de viajar e de passear com a família.

Especificamente em relação aos pais, comentou que os mesmos se preocupam com seus

estudos, mas que “eles não têm com o que se preocupar, porque eu sou bom”.

Nicolas apresentou preocupações em relação a algumas provas na escola e retomou

seu desejo em ser um ator famoso. Faz planos de mudar-se para o Rio de Janeiro com a

família, enriquecer e fazer diversas aquisições.

Histórias relatadas por Manuela

História 1:

M: A mãe limpa, alguma coisa assim...

V: O que acontece depois?

M: Ela limpa, e dá o suco de novo pra ela, e diz pra não virar.

V: Como é que a filha está se sentindo?

M: Um pouco triste, porque derrubou o suco, e daí ela pede desculpas.

V: E a mãe e o pai, como é que eles estão?

M: A mãe e o pai aceitam as desculpas, limpam e dão de novo o suco.

História 2:

M: Os pais vêm até ela e ajudam ela. Colocam um curativinho. Depois eles voltam para

casa e descansam, porque tá sangrando, essas coisas.

V: E como é que a filha tava se sentindo?

M: Ela tava sentindo dor, essas coisas, por causa do machucado. Ela chorou muito, mas

depois parou.

V: E os pais, como é que eles estavam?

129

M: Acho que também tristes, porque a filha caiu.

História 3:

M: Os pais falaram que se ela não arrumar ela perde uma coisa que ela gosta. Ela perdeu

a TV. Daí, ela teve que arrumar o quarto, porque gostava de TV. Depois ela... ai eu não

sei... daí os pais, ai eu não sei.... Daí os pais deixaram ela ver TV. Depois eles pediram

pra ela tomar banho, e ela não quis, aí ela perdeu a TV de novo. Depois ela foi, depois ela

viu TV, essas coisas.

V: Isso costumava acontecer nessa família, de a menina não fazer as coisas e perder a

TV?

M: Aham.

Manuela referiu que gosta de escrever, brincar de pega-pega, ballet e assistir Bob

Esponja. Não gosta do irmão, comentando: “às vezes eu pergunto coisas da escola e ele

diz: ‘ah, mas isso é muito fácil!’”.

Em relação à rotina, trouxe os mesmos dados já apresentados pelos pais,

acrescentando que gosta de brincar com a gatinha que a família adotou recentemente.

Informou que não gosta muito de tomar banho, “mas minha mãe me pede pra tomar

banho”. A respeito de sua jornada, relatou um episódio em que a casa da praia foi

assaltada, mas a família não estava lá. Também contou da vez que quebrou o dedo

brigando com o irmão, referindo: “eu e o mano costumamos brigar bastante, assim, de

falar, não de bater”.

Manuela desenhou sua família e referiu que às vezes seu pai e sua mãe brigam, que

eles já falaram em se separar, e o pai disse que iria morar na casa da tia. Acrescentou: “Eu

não gostei desse assunto”. Ao desenhar os pais, comentou que o pai cuida bem dela, e que

a mãe fica meio braba quando ela e o pai brigam.

Manuela expressou nitidamente sua preocupação com que os pais possam se

separar e tenham novos relacionamentos. Para o futuro, deseja abrir um restaurante para o

pai ser o chefe. Queria também trabalhar com a mãe um dia.

4) Escala SARP

130

Figura 5

Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 2

É possível identificar que ambos os genitores apresentaram médias de escores altos

na maioria das dimensões da Escala SARP. A dimensão “relação interparental” foi

prejudicada em razão dos constantes desentendimentos entre o casal. Fernando obteve

médias levemente mais baixas que Marisa nas dimensões “sistema de normas e valores” e

“segurança emocional” em decorrência de uma maior flexibilidade quanto ao

monitoramento dos limites e por considerar que a comunicação com os filhos não seja tão

boa. Em relação ao desenvolvimento da identidade, houve prejuízo na pontuação do item

“desenvolvimento da autonomia”, em razão de alguns comportamentos dos pais em

relação à Manuela. Os filhos também se revelaram mais identificados com o pai do que

com a mãe, provavelmente pelo maior tempo que o pai despende para com eles.

5) IEP

Tabela 12

Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 2, para o Filho Nicolas

Monitoria

Positiva

Comportamento

moral

Punição

inconsistente

Negligência Disciplina

relaxada

Monitoria

negativa

Abuso

físico

iep

Mãe 80 95 25 70 65 40 80 80

Pai 90 80 35 95 25 20 40 65

131

O índice de estilo parental (iep) de Marisa com Nicolas equivale a um estilo

parental ótimo, enquanto o de Fernando apresenta-se regular e acima da média.

Considerando-se as três variáveis do IEP que serão analisadas, Fernando apresenta

resultado ótimo em todas, e Marisa apresenta resultado ótimo em monitoria positiva e

comportamento moral, ficando dentro do resultado regular e acima da média na prática

educativa negligência.

Tabela 13

Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 2, para a Filha Manuela

Monitoria

Positiva

Comportamento

moral

Punição

inconsistente

Negligência Disciplina

relaxada

Monitoria

negativa

Abuso

físico

iep

Mãe 80 95 25 70 45 40 35 70

Pai 90 95 35 95 25 5 40 60

O iep de Marisa e de Fernando com Manuela indica um estilo parental regular,

acima da média. Em relação às práticas educativas monitoria positiva, comportamento

moral e negligência, os resultados foram os mesmos descritos acima em relação à Nicolas.

6) FAT

Boa parte das histórias narradas por Nicolas apresentam conflitos familiares, porém

apenas uma dessas histórias não possui uma resolução de conflito positiva. A imposição de

limites revelou-se adequada e obediente na maioria das histórias, com uma qualidade

confortável do relacionamento e fronteiras nítidas. Em várias histórias é comum a

imposição de limites pela retirada de algo que os personagens gostam (TV, vídeo game,

jogo de basquete). A temática acerca do desempenho escolar também foi algo observado

como frequente nas histórias narradas.

Nas histórias de Manuela também predominam os conflitos familiares, mas com

resolução positiva. A imposição de limites é revelada como adequada e obediente, com

relacionamento predominantemente confortável e fronteiras nítidas. A modulação

emocional que preponderou foi alegria. Em algumas histórias foram relatados conflitos

entre irmãos e conflitos entre os pais, situações descritas como ansiogênicas para o

personagem principal. Temáticas relacionadas a “comidas saudáveis” e “psicoterapia”

132

também se mostraram presentes e bastante identificadas com o momento de vida de

Manuela.

Família 3

1) Genograma e história clínica

Marcos Dora

Pedro, 11 anos

Figura 6

Genograma da Família 3

Marcos e Dora conheceram-se quando eram adolescentes e descrevem que seu

namoro foi tranquilo. As brigas iniciaram após o casamento. Dora engravidou de Pedro aos

17 anos, e sua mãe a colocou para fora de casa. Dora foi então morar com Marcos na casa

de seu pai. Marcos refere que seu relacionamento com o pai nunca foi bom, ao contrário do

relacionamento com a mãe, falecida há alguns anos.

O pai de Dora faleceu há cerca de 10 anos. Atualmente, ela mora com sua mãe e

seus irmãos em um mesmo pátio, sendo que cada irmão mora com suas respectivas

companheiras e filhos em uma casa. Refere-se à mãe como uma figura bastante

controladora e intrusiva. Conta com o auxílio dela para o sustento de Pedro, já que

atualmente está desempregada.

Marcos aponta que o fato de gostar muito de música e tocar na noite com amigos

foi um dos motivos que contribuiu para a separação do casal. Relata: “Eu era muito jovem

e veio o filho, entrei no quartel, também tentei estudar, era muita pressão. Eu ia todos os

dias no ensaio dos guris e ela encarava aquilo como um hobby; nunca me acompanhou”.

Dora refere que era um pouco “mãe” de Marcos, fazendo cobranças, exigindo que

ele participasse mais da vida em família e dos cuidados com Pedro. Estão separados há

cerca de três anos, sendo que ao longo desse tempo tentaram reconciliar-se, porém a

tentativa não foi bem-sucedida. A decisão pela separação foi comunicada a Pedro de forma

abrupta, num dia em que ele chegou da escola e não encontrou mais o pai em casa.

133

Pedro sente bastante falta do pai, fato relatado pelo próprio menino e por Dora.

Marcos não tem uma frequência estipulada de dias para visitas e tampouco contribui

financeiramente para o sustento do filho. Dora buscou a participação na pesquisa em

virtude de sua dificuldade em lidar com problemas de comportamento do filho, que tem se

revelado pouco obediente. Dora também suspeita que Pedro esteja lhe mentindo sobre

alguns acontecimentos na escola.

2) Entrevista SARP

Rotina. Dora relata que acorda Pedro e leva leite para ele na cama. Durante a

manhã, Pedro toma banho, assiste TV, almoça. A mãe relata que ficam juntos ao longo da

manhã, mas não fazem nenhuma atividade em conjunto. Pedro vai e volta sozinho da

escola. À tardinha, quando retorna, a mãe refere que ela fica olhando TV e ele fica no

computador, ou vice-versa. Depois jantam e vão dormir. Marcos desconhece a rotina atual

do filho. Quando ainda moravam juntos, relata que auxiliava um pouco com os temas e

jogava vídeo game com o filho. Os genitores não relataram atividades de lazer com o filho

aos finais de semana. Dora informa que ele costuma andar de bicicleta ou jogar com o

primo e amigos.

Cuidados. Em razão do pouco contato pai-filho, os cuidados com Pedro ficam sob

responsabilidade de Dora. Marcos comenta que se dispõe a ajudar, mas que Dora

dificilmente o chama quando o filho está doente.

Escola e amigos. Enquanto estava empregada, Dora relata que não podia

comparecer às reuniões da escola e, assim, ficava sabendo do desempenho de Pedro pelo

próprio filho. Não revelou muito interesse em participar da vida escolar do filho,

informando que se ele está mal na escola, ela é chamada. Marcos relata que pergunta ao

filho sobre a escola e ele sempre responde que “está tudo bem”. Ambos os genitores

expressam preocupação em relação às amizades e companhias de Pedro, pois acreditam

que o filho é ingênuo e acaba executando as ideias de seus amigos.

Comunicação. Marcos sente dificuldades em conversar com seu filho. Relata que às

vezes percebe que Pedro tem alguma coisa para falar, mas não fala. As informações que

sabe sobre o filho são as que Dora repassa. A mãe também descreve o filho como

“fechadão” e o percebe como triste muitas vezes.

134

Rede de apoio. Dora diz que sua mãe e sua tia são pessoas com quem

eventualmente pode contar. Em razão de toda a família morar no mesmo pátio, a mãe

refere que “todo mundo fica meio que de olho”.

Estabelecimento de limites. Marcos informa que sabe pouco sobre os limites que

são estabelecidos para Pedro, mas relata que não tem problemas quando o filho fica com

ele. Dora aponta que é difícil manter os castigos que impõe ao filho, pois às vezes se

esquece e ele acaba a “dominando”: “Ele me domina, ele mantém no controle tudo o que

ele quer”. Reconhece que ter regras é muito importante, mas não consegue manter uma

rotina.

3) Meu Amigo de Papel

História 1

P: Minha mãe pediria pra eu pegar um pano e limpar a bagunça que eu fiz.

V: E o que tu iria fazer?

P: Eu ia fazer a mesma coisa.

História 2

P: Essa daqui minha mãe ia perguntar se tava doendo ou não. Eu ia falar que tava. Aí ou

nós ia pra casa, ou se a mãe achasse que não, daí nós ia fica numa praça assim, vamos

supor.

V: E isso já aconteceu contigo?

P: Já, aí a minha mãe tinha as coisa ali pra limpar o machucado.

História 3:

P: Aqui a minha mãe ia colocar eu de castigo e ia pedir pra eu arrumar o quarto.

V: Isso já aconteceu?

P: Já, já aconteceu bastante vezes.

V: E aí qual foi o castigo?

P: Ficar sem vídeo game, não ir pra rua, assim...

V: E tu costuma deixar o quarto bagunçado?

P: Costumo. Aí se a mãe põe de castigo eu arrumo.

Pedro não se mostrou disposto a conversar durante a aplicação do protocolo,

preferindo escrever. Limitava-se a responder, com poucas palavras, alguns

questionamentos da aplicadora em relação ao que escrevia. Pedro gosta de jogar vídeo

135

game, ver TV, jogar bola e desenhar. Não gosta de arrumar o quarto, tomar banho, dobrar

as roupas do armário e assistir aos programas de TV que a mãe assiste.

Sobre sua rotina, os dados corroboram as informações trazidas pela mãe na

entrevista. Pedro informou que aos finais de semana às vezes assiste DVDs com a mãe.

Sobre os eventos importantes em sua vida, escreveu: “a primeira coisa que aconteceu de

ruim na minha vida foi a separação do meu pai e da minha mãe”. Também referiu como

eventos importantes quando conheceu o namorado da mãe, e gostou, e citou ainda as brigas

da mãe com a avó.

Ao ser questionado sobre mudanças na família, Pedro referiu a separação dos pais,

o falecimento do avô e as brigas dele com a mãe. Na atividade “Meus Pais”, Pedro

comentou: “Eu não sei muito que que meu pai tem de sentimento”. Lembra ainda que

quando o pai morava com ele, eles fizeram uma casa de madeira de dois andares, e que foi

muito legal. Sobre a mãe, escreveu que ela fica meio decepcionada com seu pai. Acredita

que a mãe sai do banho com cara de choro. Pedro não pergunta nada, mas fica preocupado.

Pedro se preocupa que seus pais e avó morram. Também diz preocupar-se com suas

notas no colégio. Relata que gostaria que a mãe confiasse mais nele, e gostaria de viajar

mais com ela. Gostaria ainda de ver mais o pai; sair mais vezes com ele.

4) Escala SARP

Figura 7

Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para os Genitores da

Família 3

136

É possível evidenciar por meio dos resultados da Escala SARP que a relação de

Pedro com ambos os genitores apresenta prejuízos, uma vez que as médias não se

apresentam muito altas, especialmente as de Marcos. Dora apresenta médias mais altas nas

dimensões “cuidados básicos”, “segurança emocional” e “educação e lazer”, em

decorrência de ser a genitora guardiã. As médias baixas de Marcos são decorrentes de sua

ausência na vida de Pedro, o que o impede não apenas de conhecer e participar de suas

atividades cotidianas, como também interfere na segurança emocional do filho.

5) IEP

Tabela 14

Descrição dos Percentuais para cada Prática Educativa e o Índice de Estilo

Parental para os Genitores da Família 3

Monitoria

Positiva

Comportamento

moral

Punição

inconsistente

Negligência Disciplina

relaxada

Monitoria

negativa

Abuso

físico

iep

Mãe 25 45 15 10 10 15 20 10

Pai 60 50 65 25 75 45 25 50

Dora apresentou um iep negativo (-11), o que indica que as práticas educativas

negativas se sobrepõem às positivas, sendo o percentual equivalente indicativo de um

estilo parental de risco. Os resultados do IEP de Marcos apontam para um estilo parental

regular, porém abaixo da média. Em relação às práticas que interessam ao presente

capítulo, Dora apresentou escores equivalentes a estilo parental de risco para monitoria

positiva e negligência, e estilo regular e abaixo da média para comportamento moral.

Marcos apresentou estilo parental de risco para negligência, regular e abaixo da média para

monitoria positiva, e regular e acima da média para comportamento moral.

6) Rorschach

Em função do desconforto de Pedro em relação ao FAT, foi proposta a aplicação do

Rorschach, a qual ele concordou em realizar. O protocolo de Pedro apresentou um total de

20 respostas e Lambda=4. O Lambda elevado é indicativo de falta de abertura adequada à

experiência, com tendência a encarar o mundo e a si mesmo com um foco de atenção

muito restrito. Pode ainda significar uma posição de cautela situacional por parte do sujeito

e uma resistência a se expor. Os prejuízos no relacionamento entre Pedro e seu pai e o

137

sofrimento que isso lhe causa auxiliam a compreender a postura defensiva do avaliando,

que pode representar uma finalidade construtiva de autoproteção.

Outros dados do protocolo que merecem atenção são a frequência de S e CDI

(Índice de Déficit Relacional). A frequência de respostas no espaço branco (S=3) é

indicativa de sujeitos que guardam níveis de raiva e ressentimento acima do usual contra as

pessoas e eventos de suas vidas, que consideram como injustos por não atenderem a suas

necessidades. O CDI positivo (CDI=4) é um indicador claro de dificuldade de ajustamento.

São indivíduos que geralmente tentam lidar com as experiências comuns da vida diária de

maneiras ineficientes e inadequadas. Esses indicadores confirmam as alterações de

comportamento observadas por Dora, provavelmente decorrentes dos prejuízos de sua

relação com ambos os genitores, mas especialmente com o pai.

Discussão

Os dados do presente capítulo serão discutidos com o objetivo de apresentar

evidências de validade clínica do SARP, a partir dos resultados descritos das avaliações

das três famílias. Para tanto, serão analisadas a congruência interna, externa e teórica.

Congruência Interna

A congruência interna consiste na congruência, complementariedade ou integração

de uma informação obtida de um mesmo sujeito em momentos diversos, mas em situações

análogas (Tavares, 2003). Interessa, assim, analisar a coerência entre as informações

obtidas através dos diferentes instrumentos utilizados, com pais e filhos.

Dados obtidos com os genitores: Escala SARP e IEP

Objetivando comparar os resultados trazidos por meio da Entrevista SARP com os

genitores e pontuados na escala com os dados do IEP, algumas dimensões e práticas

educativas foram selecionadas. A prática educativa “monitoria positiva” envolve a

distribuição contínua e segura do afeto, o acompanhamento e a supervisão das atividades

escolares e de lazer (Gomide, 2006). Portanto, seu resultado foi comparado com as

dimensões “características afetivoemocionais”, “segurança emocional” e “educação e

lazer” da Escala SARP. A prática “comportamento moral” implica promover condições

favoráveis ao desenvolvimento das virtudes (Gomide, 2006) e, portanto, assemelha-se à

138

dimensão “sistema de normas e valores” da Escala SARP. A prática educativa

“negligência” (ausência de atenção e de afeto) correlaciona-se com as dimensões “proteção

frente a riscos reais” e “cuidados básicos”.

Para melhor analisar os dados obtidos com os genitores dos três estudos de caso em

questão, os resultados das práticas educativas e das dimensões da Escala SARP acima

mencionados foram organizados na Tabela 15. Os resultados das práticas educativas

obedeceram à interpretação dos resultados do IEP (Gomide, 2006): estilo parental de risco

(1 a 25); regular e abaixo da média (30 a 50); regular e acima da média (55 a 75) e ótimo

(80 a 99). Para as dimensões da escala, foram considerados os seguintes valores das médias

das pontuações: baixo (0 a 1), médio (1,1 a 2,0) e alto (2,1 a 3,0).

Tabela 15

Resultados das Práticas Educativas e das Dimensões da Escala SARP para os

Genitores

Práticas Educativas

do IEP

Dimensões da Escala SARP

Monitoria Positiva Características

afetivoemocionais

Segurança

emocional

Educação e lazer

Pai 1 Ótimo Alto Alto Alto

Mãe 1 Abaixo da média Alto Alto Alto

Pai 2 Ótimo Alto Alto Alto

Mãe 2 Ótimo Alto Alto Alto

Pai 3 Abaixo da média Baixo Baixo Baixo

Mãe 3 De risco Médio Alto Alto

Comportamento

Moral

Sistema de normas e valores

Pai 1 Ótimo Alto

Mãe 1 Abaixo da média Alto

Pai 2 Ótimo Alto

Mãe 2 Ótimo Alto

Pai 3 Acima da média Baixo

Mãe 3 Abaixo da média Médio

Negligência Proteção frente a riscos

reais

Cuidados básicos

Pai 1 Acima da média Médio Alto

139

Mãe 1 Abaixo da média Alto Alto

Pai 2 Ótimo Alto Alto

Mãe 2 Acima da média Alto Alto

Pai 3 De risco Baixo Médio

Mãe 3 De risco Médio Alto

Para a maior parte dos genitores, os resultados das práticas educativas e dimensões

da Escala SARP selecionadas mostraram-se congruentes. Os dados obtidos por meio dos

diferentes instrumentos com os genitores das três famílias permitiram evidenciar, de forma

geral, uma complementariedade das informações trazidas pelos participantes em momentos

diferentes, mas em situações análogas.

Contudo, despertam atenção os resultados da Mãe da Família 1, que se

apresentaram incongruentes nas três práticas analisadas, em que os resultados do IEP se

revelaram prejudicados, ao passo que as médias das pontuações do SARP mostraram-se

altas. De modo semelhante, os resultados da Mãe da Família 3 revelaram-se incongruentes

para as práticas monitoria positiva e negligência, e incongruentes também para o Pai da

Família 3 na prática comportamento moral.

Alguns questionamentos podem ser apontados a partir das congruências e

incongruências observadas. Inicialmente, é importante observar que a Escala SARP é

pontuada pelo próprio examinador, que reúne as informações obtidas com os genitores e os

filhos e, a partir dos critérios descritos na escala, realiza sua pontuação. O IEP é uma

escala de autorrelato, em que os próprios genitores pontuam cada item, com base no que

julgam refletir a forma como educam seu filho. Essas diferenças na forma de aplicação dos

instrumentos podem ter gerado discrepâncias nas pontuações, considerando-se a

possiblidade de que esses genitores possam estar sendo muito exigentes consigo mesmos

no momento da auto avaliação ou, por outro lado, possam estar sendo mais benevolentes

em relação às suas práticas educativas.

Dados obtidos com as crianças: Meu Amigo de Papel e FAT ou Rorschach

Procedeu-se a uma análise qualitativa dos resultados desses instrumentos,

objetivando confirmar ou não uma integração dos dados trazidos pelas crianças. As

informações obtidas por meio das atividades do Meu Amigo de Papel revelaram-se

complementares ao conteúdo projetivo das histórias do FAT. As temáticas abordadas na

atividade “Vamos brincar de histórias” permitiram identificar sentimentos da relação pais-

140

filhos e imposição de limites que foram corroborados ao longo das narrações das histórias

do FAT.

As demais atividades do Meu Amigo de Papel propiciaram que as crianças

conversassem sobre suas preferências, seus conflitos familiares, suas preocupações e seus

planos para o futuro. A exploração desses tópicos permitiu a abordagem de assuntos como

alimentação, falta de atenção dos pais, preocupações com a condição financeira,

preocupações relacionadas à escola e à separação dos pais. Os temas das histórias do FAT

complementaram as informações emergidas com a aplicação do Meu Amigo de Papel,

permitindo assim, confirmar a congruência interna das informações obtidas com as

crianças.

No caso da Família 3, em que Pedro não conseguiu realizar o FAT e, assim, o

instrumento foi substituído pelo Rorschach, os dados da aplicação também corroboraram

os do Meu Amigo de Papel. Pedro mostrou-se pouco à vontade, resistente para falar sobre

sua família. Essa resistência percebida quando da aplicação do Meu Amigo de Papel foi

corroborada pelo Lambda alto no protocolo do Rorschach, confirmando sua postura

defensiva, decorrente provavelmente do sofrimento causado pelo afastamento da figura

paterna.

Congruência Externa

A congruência externa é outro quesito que integra a validade clínica. Refere-se às

confirmações obtidas via fontes ou métodos diferentes de coleta de informações. Assim

sendo, para avaliar a congruência externa, foram confrontados os dados trazidos pelos

genitores e pelos filhos. Porém, antes de discutir a congruência externa dos dados, é

importante contextualizar as famílias do presente estudo. As mães das três famílias

buscaram espontaneamente a participação na pesquisa, demonstrando interesse em

submeter-se à avaliação psicológica, pois desejavam melhorar a qualidade da relação com

seus filhos. Essa informação é importante à medida que implica uma maior validade dos

dados, no sentido de não haver interesse em manipular respostas ou apresentar respostas

socialmente desejáveis, o que é pouco habitual no contexto de disputa de guarda.

Dessa forma, as informações trazidas pelos genitores e pelos filhos mostraram-se

bastante coerentes, sendo possível evidenciar em todas as famílias uma equivalência entre

os dados obtidos com os pais e aqueles obtidos com seus filhos. Essa correspondência de

141

informações foi constatada por meio das questões da entrevista, das atividades do Meu

Amigo de Papel e também nas histórias do FAT, em que muitas vezes os personagens

reproduziam comportamentos idênticos aos descritos pelos genitores como típicos de seus

filhos.

Congruência Teórica

Por fim, para examinar a congruência teórica, os dados do SARP dos estudos de

caso foram analisados comparando os eventos da observação clínica com a rede associativa

de conceitos que se encontram teoricamente articulados (Tavares, 2003). A análise foi

embasada em cada uma das dimensões da Escala SARP, entendendo que as mesmas

definem o construto relacionamento parental.

A dimensão “relacionamento interparental” apresentou médias distintas em cada

um dos três casos apresentados: na Família 1 a média apresentada foi alta, em virtude do

baixo conflito conjugal; na Família 2 a média se apresentou mais baixa, em consequência

do maior nível de conflito do casal; na Família 3 a média foi a mais baixa dos três casos,

em razão dos conflitos pré-separação e das dificuldades de comunicação do ex-casal. A

maior ou menor qualidade da relação entre os genitores reflete-se no desenvolvimento dos

filhos (Erel & Burman, 1995; Mossman & Wagner, 2008). Na Família 1, o filho não

aborda preocupações acerca de conflitos entre seus pais, ao passo que na Família 2 a filha

Manuela deixa transparecer nitidamente o medo de que seus pais se separem, já que

discutem muito. Na Família 3, o filho expressa preocupação em razão do que descreve

como “decepção” da mãe em relação ao pai. Esses dados apontam para a congruência

teórica que diferentes autores (Amato, Loomis & Booth, 1995; Davies & Cummings, 1994;

Grych & Fincham, 1990; Nichols & Schwartz, 2007) referem em relação às implicações do

subsistema conjugal no subsistema parental.

As “características afetivoemocionais” e “segurança emocional” englobam afeto,

consistência parental e comunicação. Na Família 1, ambos os genitores obtiveram escores

máximos nessas dimensões. Na Família 2, os escores também se apresentaram excelentes,

à exceção do genitor masculino que apresentou um escore um pouco menor em razão de

prejuízos na comunicação com o filho mais velho. Na Família 3, a mãe apresentou escores

mais altos que o pai, provavelmente em decorrência de ser detentora da guarda e, assim,

despender mais tempo com seu filho, proporcionando-lhe maior segurança emocional. Os

142

filhos das Famílias 1 e 2 apresentaram-se como mais saudáveis e seguros, revelando uma

boa relação com seus pais, ao passo que Pedro (Família 3) revelou prejuízos na relação

com a mãe e, principalmente, com o pai, fatores que se refletem em seu comportamento

mais deprimido. Esses dados confirmam a importância de uma boa comunicação com os

filhos (Bohanek, Marin, Fivush & Duke, 2006), e de relações afetuosas e consistentes

(Minuchin & Fishman, 2003; Silva, 2000) para um desenvolvimento emocional saudável.

As dimensões “cuidados básicos” e “educação e lazer” englobam o conhecimento e

envolvimento dos genitores em atividades do dia-a-dia. De forma semelhante às dimensões

citadas anteriormente, os genitores das Famílias 1 e 2, e a mãe da Família 3 obtiveram

médias altas em “cuidados básicos” e “educação e lazer”. O genitor masculino da Família

3, entretanto, apresentou médias bastante prejudicadas, uma vez que seu conhecimento

acerca da vida do filho e participação em seu cotidiano está muito limitado atualmente.

Esses dados corroboram o que a literatura aponta em relação ao melhor desenvolvimento e

rendimento escolares das crianças quanto maior a participação dos pais em atividades

diárias, escolares e recreativas (Amato & Gilbreth, 1999; Bacete & Betoret, 2000; Bradley

& Corwyn, 2002; Coley, 1998; Flouri & Buchanan, 2003; Lamb, Stemberg, & Thompson,

1997; Minuchin & Fishman, 2003; Vizzotto, 1988; Whiteside e Becker, 2000).

As dimensões “proteção frente a riscos reais” e “sistema de normas e valores”

abrangem monitoramento das relações sociais, estabelecimento de limites e transmissão de

valores. Os resultados dessas dimensões apresentaram-se de forma diferenciada para cada

uma das três famílias. A Família 2 apresentou escores altos, a Família 1 apresentou escores

médios, e a Família 3, escores um pouco mais baixos, diferenciando-se a mãe do pai neste

último estudo de caso. Na Família 2, os filhos indicaram sentirem-se protegidos e estarem

de acordo com os castigos estipulados, responsabilizando-se algumas vezes eles próprios

pelo cumprimento dos limites impostos. Na família 1, o filho revelou alguns prejuízos em

decorrência de passar um tempo sozinho em casa, mas a imposição de limites revelou-se

adequada. No caso da Família 3, nenhum dos genitores parece de fato conseguir impor e

monitorar limites ao filho, nem tampouco acompanhar seus relacionamentos sociais,

questões que justificam o escore prejudicado. O estabelecimento de limites e o

monitoramento das relações sociais são fatores importantes do relacionamento parental,

pois têm relação direta com a hierarquia e estabelecimento de papéis (Minuchin &

143

Fishman, 2003). A autoridade e diferenciação de papéis familiares são indicadores

importantes de uma interação adequada com os filhos (Werner & Werner, 2004).

Por fim, o “desenvolvimento da identidade” engloba a identidade pessoal da criança

e a permissão dos pais do desenvolvimento da autonomia e independência. Nas três

famílias dos estudos de caso, os escores apresentaram-se médios. Nas Famílias 1 e 2 o

desenvolvimento da autonomia trouxe prejuízos a essa dimensão, pois na Família 1 ele foi

considerado desajustado em razão do excesso de autonomia para Augusto, que tem apenas

8 anos. Por outro lado, na Família 2 esse desajuste se deu em razão dos pais de Manuela

não permitirem, em algumas ocasiões, uma maior independência da filha. Já no caso da

Família 3, o sentimento de aceitação do filho pelo genitor foi o que trouxe prejuízos à

pontuação desta dimensão. Pedro não se sente muito aceito pela mãe, quem ele refere que

gostaria que confiasse mais nele, nem pelo pai, que não cumpre as combinações de visita,

magoando o filho. A aceitação pelos pais é fundamental para que a criança possa

desenvolver sua própria identidade (Corneau, 1995), fator que vem ocasionando prejuízos

a Pedro. No caso das Famílias 1 e 2, os cuidados parentais revelaram-se desajustados

conforme o estágio de desenvolvimento dos filhos. Minuchin e Fishman (2003) apontam a

importância do subsistema parental adaptar-se às mudanças dos filhos, oferecendo maior

ou menor controle, independência e responsabilidade.

Considerações Finais

A experiência da aplicação do SARP mostrou-se bastante produtiva. Os genitores,

de forma geral, apresentaram-se ansiosos durante as entrevistas, trazendo informações

além das solicitadas. As crianças demonstraram-se motivadas para realizar as atividades do

Meu Amigo de Papel, contribuindo com informações muito pertinentes. O cruzamento de

informações trazidas pelos pais e pelos filhos permitiu uma pontuação mais acurada da

Escala SARP.

Além da importância de aplicar o SARP em famílias com configurações distintas, o

presente estudo permitiu evidenciar a validade clínica do SARP. As congruências interna,

externa e teórica mostraram-se adequadas, o que contribui para o processo de validação do

instrumento.

144

SEÇÃO III

Validação e Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental

Capítulo 8

Aplicação do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental (SARP)

em uma perícia psicológica de disputa de guarda

O caso que apresentado refere-se a uma avaliação psicológica realizada a partir da

determinação judicial de perícia psicológica, decorrente de processo de guarda. Trata-se de

uma disputa judicial de guarda entre duas mulheres: uma amiga da madrinha da criança, e

a irmã da menina. Helena (amiga da madrinha) ingressou com ação judicial para

regulamentar a guarda da menina Gabriela, cinco anos. Raquel, irmã mais velha e

unilateral de Gabriela, também pleiteia a guarda de sua irmã. O objetivo da perícia

psicológica foi o de avaliar a situação de disputa de guarda, tendo em vista o melhor

interesse de Gabriela.

Método

Participantes

Participaram deste estudo a autora da ação de regulamentação de guarda, Helena,

52 anos, amiga da madrinha de Gabriela, assistente administrativa; Raquel, 21 anos, irmã

de Gabriela, recepcionista; Antônio, 26 anos, companheiro de Raquel, motorista; e

Gabriela, cinco anos. Gabriela é filha de Jussara, falecida há três anos e seu pai é

desconhecido. Possui dois irmãos unilaterais: Raquel, 21 anos, e Rafael, 9 anos. Rafael está

sob a guarda de Raquel, coabitando com a irmã, o cunhado, e a sobrinha, Alana, 1 ano e 8

145

meses de idade. Gabriela quando do encaminhamento para perícia estava sob a guarda de

Helena há cerca de 18 meses.

Instrumento

O instrumento utilizado para o presente estudo de caso foi o Sistema de Avaliação

do Relacionamento Parental (SARP), composto pela Entrevista SARP, o protocolo de

avaliação infantil Meu Amigo de Papel e a Escala SARP. Por não se tratar de uma disputa

de guarda entre um ex-casal, algumas questões da Entrevista SARP foram

desconsideradas, uma vez que não se aplicavam ao caso. Da mesma forma, alguns itens da

Escala SARP também não foram pontuados.

Procedimentos

Em decorrência da determinação judicial de realização de perícia psicológica, as

partes foram intimadas a comparecer para os atendimentos. Informações acerca do papel

do perito e do objetivo da avaliação foram fornecidas às partes litigantes, e lhes foi

solicitada autorização para gravação em áudio das entrevistas. Foram realizadas duas

entrevistas com Helena (autora da ação), duas entrevistas conjuntas com Raquel (ré) e seu

companheiro Antônio e um atendimento com a menina Gabriela. Ao término das

entrevistas, foi comunicado às partes a existência de uma pesquisa científica para

construção de um sistema de avaliação para situações de disputa de guarda. Foi feito o

convite para que ambas participassem da pesquisa, autorizando a utilização dos dados da

perícia para fins científicos. O convite foi feito apenas ao término do processo de avaliação

visando a não interferência nos procedimentos periciais. Foi esclarecido que o aceite ou

recusa em participar da pesquisa não prejudicaria ou beneficiaria os resultados advindos da

perícia. Ambas as partes consentiram em participar, assinando o Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido a posteriori.

Resultados e Discussão

Serão descritos e discutidos os resultados obtidos por meio de cada uma das

técnicas do SARP aplicadas. Posteriormente, serão apresentados os resultados dos escores

146

totais obtidos por cada uma das responsáveis pela criança e a média dos escores de cada

dimensão da escala. Ao final, será apresentada a conclusão emitida no laudo pericial.

Entrevista inicial

A entrevista inicial com Helena teve como objetivo coletar dados acerca de sua

história pregressa e da chegada de Gabriela em sua vida. Helena é filha única, tendo seu

pai falecido quando ela tinha três anos de idade. Foi, então, criada por sua mãe e seu

padrasto, com quem referiu ter uma boa convivência, e que faleceu há cerca de 22 anos.

Atualmente coabita com sua mãe e sua filha mais velha. Helena é separada há 18 anos e

possui três filhos e dois netos: Sheila, 29 anos; Maíra, 26 anos, casada e mãe de Laura, 4

anos; Renato, 21 anos, casado, pai de João, 9 meses. Refere que sua separação foi amigável

e até hoje possui um bom relacionamento com seu ex-marido.

Logo que se separou de seu marido, Helena e os filhos foram morar próximos à

casa de Luciane, amiga de Helena e madrinha de Gabriela. Nesse período, em razão das

constantes hospitalizações da mãe de Gabriela (Jussara), Raquel costumava deixar

Gabriela com Luciane. Helena ia até a casa de Luciane para conversar e tomar café e,

assim, conheceu e passou a conviver com Gabriela, quando esta tinha dois anos de idade.

Como a neta de Helena (Laura) tem idade próxima à de Gabriela, as meninas

frequentemente brincavam juntas na casa de Helena, mas Gabriela sempre retornava para

dormir na casa da madrinha.

Em algumas ocasiões, Helena referiu que Gabriela ia para a casa da mãe e voltava

para a casa de Luciane suja, escabelada e, às vezes, machucada. Relatou um episódio em

que Gabriela veio com os dedinhos queimados e, quando questionada sobre o que havia

acontecido, respondeu que “queria papar” e não tinha ninguém em casa, aí pegou as

panelas quentes. Luciane e Helena levaram a menina, então, ao posto de saúde. Relatou

outro episódio em que Gabriela teria voltado da casa de Raquel com marcas de cinta.

Helena refere que os cuidados para com Gabriela foram ocorrendo de forma gradual, e que

ela se preocupava muito com o estado das roupas, cabelos e os machucados que

apresentava. Auxiliava, assim, sua amiga Luciane, com os cuidados de higiene e saúde de

Gabriela. Com o passar do tempo, foi construindo uma relação de afeto com Gabriela.

Alguns meses mais tarde, a madrinha de Gabriela adoeceu e, portanto, não estava

147

conseguindo atender aos cuidados da menina. Helena relatou que, nesse período, solicitou

autorização de Raquel para levar Gabriela para sua casa, e que Raquel teria permitido.

Helena ingressou posteriormente com ação judicial para regulamentar a situação da guarda

de Gabriela, que está morando com ela há cerca de um ano e meio. Durante esse período,

Helena relata que sempre que Raquel solicitava, ela levava Gabriela para ver os irmãos.

Da mesma forma que a entrevista inicial realizada com a Helena, procedeu-se a

uma entrevista inicial com Raquel, a fim de colher informações sobre sua história de vida e

também de Gabriela. Raquel é a filha mais velha de Jussara, falecida há três anos. Relatou

que até seus 12 anos de idade convivia apenas com a mãe, apesar de conhecer o pai. Com o

nascimento de seus irmãos, Rafael (9 anos) e Gabriela (5 anos), Raquel foi quem assumiu

os cuidados com as crianças, relatando que ela os buscava e levava para a escola,

preparava almoço e ajudava com as tarefas escolares. Alega que a mãe, Jussara, ficava a

maior parte do tempo fora de casa, trabalhando e, assim, delegava os cuidados dos filhos

mais jovens a ela. Quando questionada sobre o histórico de Gabriela, Raquel relatou que

Jussara escondera a gravidez até cerca do quarto/quinto mês, alegando que a “barriga era

da cerveja” (SIC). Raquel referiu um sentimento maternal em relação à Gabriela, de quem

cuidou desde que nasceu.

Raquel se emocionou bastante ao relatar alguns acontecimentos de sua vida, como

sua gravidez não planejada na adolescência, as dificuldades em conciliar seu estudo e os

cuidados com os irmãos e com a casa, o falecimento de sua mãe quando ela estava no

sétimo mês de gestação. Especialmente quando do adoecimento de sua mãe, referiu sentir-

se muito sozinha, tendo que desempenhar os papéis de irmã, mãe, filha e enfermeira.

Atualmente Raquel coabita com seu companheiro Antônio, seu irmão Rafael e sua filha

Alana, de 1 ano e 8 meses de idade.

Raquel refere que passou por momentos muito turbulentos em sua vida, em que

coincidiram a doença da mãe e o final de sua gestação. Neste período, solicitou auxílio à

madrinha de Gabriela e à de Rafael, pois não conseguia tomar conta dos irmãos e se

preparar para a chegada de seu bebê. Entende que “levaram a Gabi” em razão do momento

fragilizado por que estava passando. Raquel informa que hoje sua vida está melhor, mais

organizada. Seu companheiro está trabalhando e ela também iniciou há pouco um trabalho

como recepcionista. Estão morando no mesmo pátio que sua sogra, e estão construindo sua

148

casa, onde pretendem que Gabriela e Rafael tenham seus quartos. Relata que atualmente

seu contato com Gabriela é esporádico e “só vê a Gabi quando a Helena deixa” (SIC).

As questões da entrevista inicial referentes ao histórico de vida de Gabriela foram

feitas tanto à Helena quanto à Raquel. Contudo, Helena não soube informar alguns dados,

tendo em vista que conheceu Gabriela quando esta já estava com dois anos de idade.

Segundo informações coletadas, Jussara não realizou acompanhamento pré-natal, tendo

inclusive feito uma tentativa de aborto. Em razão de que sua mãe era portadora do vírus

HIV, Gabriela não foi amamentada. A menina apresentou anemia e, posteriormente,

toxoplasmose, o que exige até hoje alguns cuidados especiais com sua alimentação. Outros

cuidados médicos de Gabriela englobam as consultas com pediatra, infectologista e

oftalmologista (faz uso de óculos em razão de miopia). Gabriela também realiza

acompanhamento psicoterápico há 1 ano e 4 meses.

Entrevista SARP

Os dados da Entrevista SARP serão apresentados conforme as áreas investigadas:

rotina da criança, cuidados, comunicação, rede de apoio, estabelecimento de limites,

flexibilidade e comunicação entre as responsáveis pela criança e motivação para ficar com

a guarda. A seção “ajustes pós-separação” não se aplica ao caso em questão. Inicialmente,

serão apresentadas as informações colhidas com Helena.

Rotina. Helena revelou conhecimento e participação nas atividades de higiene,

alimentação e sono de Gabriela. Relatou que Gabriela tem o sono agitado e que

frequentemente tem pesadelos. Acorda contando que sonhou que estava apanhando de

Antônio e então pede para deitar com Helena. Descreve que “Gabriela acorda, levanta,

põe a pantufinha, faz xixi, lava o rosto, toma leite, escova os dentes, arruma o cabelo,

coloca a roupa”. Refere que Gabriela retira o pijama e coloca a camiseta da escolinha sem

necessitar de auxílio. Helena auxilia com meias e calçados. Refere que Gabriela se

interessa em aprender coisas novas e é prestativa, pois ajuda a arrumar as gavetas das

roupas, pede para ajudar a guardar louça. Gabriela fica na escolinha das 9h às 17h. À noite,

depois da janta, costumam fazer uma leitura ou brincam com livros de atividades e de

colorir. Helena refere que 22h é o horário estipulado para escovar o dente, colocar o pijama

e deitar. No que diz respeito à área recreativa, Helena relatou que costuma levar Gabriela a

aniversários, cinema, parques e viagens.

149

Cuidados. Foi constatado zelo em relação a cuidados médicos, odontológicos e

psicológicos. Gabriela realiza tratamento psicoterápico semanalmente e também realiza

regularmente consultas médicas com pediatra, infectologista e oftalmologista. O sustento

de Gabriela (alimentação, moradia, educação) é custeado por Helena.

Helena revelou preocupação em relação aos cuidados de Gabriela quando esta fica

com Raquel. Relatou que no aniversário de Gabriela do ano passado, levou a menina a

pedido de Raquel para visitar os irmãos. Foi buscá-la numa segunda-feira, em torno das

17:30, e encontrou Gabriela almoçando. Helena descreve as condições de higiene da

moradia de Raquel como bastante prejudicadas, o que provavelmente tem relação com a

toxoplasmose diagnosticada em Gabriela e também em Raquel. Algumas preocupações

acerca de comportamento hipersexualizado foram trazidas por Helena, que referiu que

“Gabriela faz sexo com as almofadas”.

Escola e Amigos. Helena relatou que Gabriela se apega bastante aos colegas com

dificuldades. Ano passado ela brincava muito com uma coleguinha que era deficiente

(falava pouco e não caminhava), e esse ano ela tem um colega que é surdo-mudo, com

quem brinca bastante. “Parece que ela procura aquela criança que precisa mais” (SIC).

Helena também trouxe relatórios das professoras de Gabriela, em que há a descrição do

desempenho da criança e alguns dos trabalhos desenvolvidos na escola.

Comunicação. Quando perguntada sobre alguns momentos difíceis com Gabriela,

Helena lembrou algumas situações em que ela questiona sobre quem é seu pai e pergunta

sobre sua mãe Jussara. Relatou que Gabriela também questiona se pode chamá-la de mãe.

Por vezes chama o pai de Laura (neta de Helena) de pai. Helena revelou conduzir de forma

apropriada as respostas para os questionamentos de Gabriela, preocupando-se em manter

viva a lembrança da mãe Jussara e dos irmãos Raquel e Rafael, bem como da sobrinha

Alana. Também fornece esclarecimentos acerca dos graus de parentesco de Laura,

deixando Gabriela à vontade para chamar-lhe de mãe.

Rede de apoio. Helena tem o apoio de seus filhos, sua mãe e seu ex-marido para

ficar com a guarda de Gabriela. Sua filha mais velha e sua mãe, por residirem na mesma

casa, são pessoas com quem pode contar para auxiliar nos cuidados com Gabriela, ainda

que Helena tenha relatado que a menina é praticamente de sua exclusiva responsabilidade.

Refere que não tem companheiro e que sai pouco à noite, mas quando há aniversários ou

150

festas, costuma levar Gabriela consigo.

Estabelecimento de limites. Helena relatou combinações que são feitas em sua casa

acerca de atividades como tomar banho, escovar dentes, dormir e despertar, evidenciando

uma disciplina apropriada que é imposta a Gabriela. Helena expressou-se sempre com

muito carinho em relação à Gabriela. Contudo, admitiu que ela é uma criança “arteira” e,

às vezes, desobediente. Relatou que Gabriela tem a cadeirinha de pensar, para a qual vai

quando desobedece ou faz algo de errado.

Comunicação entre as responsáveis. Helena refere ciência em relação à importância

de Raquel e Rafael na vida de Gabriela, pois são seus únicos parentes de sangue. Contudo,

percebe pouco interesse de Raquel em conviver com Gabriela. Relatou que não há dias ou

horários estipulados para visita, e que a comunicação com Raquel é complicada, pois

muitas vezes ela não atende o celular. Não revelou comportamentos que tentem

obstaculizar as visitas de Raquel à Gabriela, porém expressou desejo de que as visitas

fossem combinadas com antecedência, para respeitar programações que queira realizar

com Gabriela aos finais de semana.

Motivação para ficar com a guarda. Helena ingressou com a ação para regularizar a

situação da guarda de Gabriela, pois não acha certo ficar com a menina em sua casa sem as

medidas judiciais cabíveis. Relata que se afeiçoou à Gabriela, sentimento despertado a

partir dos maus tratos evidenciados e da carência da menina. Referiu que não tem medo de

perder a guarda de Gabriela, pois sabe que Raquel é sua irmã e tem seus direitos. Ainda

que o juiz possa determinar que a menina não fique mais sob sua tutela, gostaria de

continuar auxiliando-a com vestuário e alimentação, e gostaria de seguir visitando-a.

A seguir serão apresentados os dados colhidos com Raquel. As informações serão

apresentadas por áreas, seguindo a disposição acima.

Rotina. Raquel não conhece muito da rotina atual e hábitos de Gabriela. Não sabia,

por exemplo, que a menina fica na escola nos turnos da manhã e da tarde. Acreditava que a

irmã ficava na escola apenas no turno da tarde. Nos finais de semana que visita a irmã, às

vezes, vão a parques e, outras vezes, leva Gabriela para sua casa. Refere que as

dificuldades financeiras a impedem de oferecer outros tipos de entretenimento à irmã.

Cuidados. Ao ser questionada sobre os cuidados médicos que Gabriela exigia,

Raquel não revelou estar a par das consultas médicas com infectologista e oftalmologista.

151

Tampouco sabia que Gabriela estava em psicoterapia, informando que nunca foi chamada

a comparecer à clínica onde a irmã é atendida. Referiu ainda que Helena teria dito que era

“besteira isso de psicólogo”, e que só estaria levando Gabriela às consultas psicológicas

porque teria sido “instruída” para tal (SIC).

Raquel e Antônio relataram que, algumas vezes, Gabriela comentou ter apanhado

de Helena. Raquel referiu que Gabriela já falou que iria fugir da casa de Helena para ficar

com a irmã. Contudo, não foram evidenciados indícios que apontassem para suspeitas de

maus tratos por parte de Helena ou desconforto de Gabriela por residir com ela.

Apesar do desconhecimento acerca de questões mais objetivas em relação aos

cuidados com a saúde de Gabriela, Raquel revelou um forte vínculo afetivo com a irmã.

Relata que “brigou pela Gabi desde que ela nasceu, porque a mãe queria deixá-la no

hospital” (SIC).

Escola e Amigos. Raquel e Antônio não souberam fornecer informações sobre a

escola de Gabriela nem tampouco de seus amigos. Referem que ano que vem Gabriela terá

que trocar de escola e, então, caso venha a morar com eles, irá estudar na mesma escola

que Rafael.

Estabelecimento de limites. Raquel relata que “sempre dava umas palmadas” nos

irmãos menores, pois acredita que essa é uma forma de educar, já que os irmãos são muito

“medonhos” (SIC). Refere que sabe que não é o correto, mas que ela apanhava de sua mãe,

e acredita que aprendeu porque sua mãe a educou. Informou, ainda, que na época em que

sua mãe faleceu e ela estava grávida, frequentemente gritava com os irmãos e perdia o

controle, reconhecendo que seu estado emocional estava alterado, prejudicando assim sua

relação com Gabriela.

Raquel e Antônio confirmaram um episódio em que Gabriela teria apanhado de

cinta. O fato teria ocorrido enquanto Gabriela e Rafael brincavam e caíram em cima da

barriga de Raquel, que estava com sete meses de gestação. Antônio teria perdido o controle

e agredido Gabriela e Rafael.

Comunicação. Raquel relata que a comunicação com Gabriela muitas vezes era

difícil, em razão da irmã ser muito desobediente. Reconhece que talvez exigisse da irmã

comportamentos aos quais ela não podia corresponder, como fazer as refeições comportada

e em silêncio.

152

Rede de apoio. Contam com o auxílio da “Tia Lis”, uma senhora de 60 anos que

reside próximo à casa de Raquel e Antônio. Tia Lis cuidou de Raquel quando criança, e

agora cuida de Alana, sendo sua remuneração paga por Antônio. Tia Lis toma conta de

quatro crianças. Caso Gabriela venha a morar com eles, ficaria sob os cuidados da Tia Lis

também.

Comunicação entre as responsáveis. Raquel refere que a comunicação com Helena

é bastante prejudicada, pois se falam muito pouco. Relata que às vezes Helena reclama do

mau comportamento de Gabriela.

Raquel afirmou que, caso fique com a guarda de Gabriela, deixará a irmã ver

Helena caso ela assim deseje. Entretanto, não fez referência a possibilidades mais

frequentes de visitação. Durante as entrevistas, Raquel e Antônio manifestaram desagrado

pelo fato de Gabriela, às vezes, referir-se à Helena como mãe. As referências à pessoa de

Helena não foram muito amistosas, ainda que ela tenha afirmado que jamais se opôs ao

convívio entre Gabriela e sua família de origem.

Motivação para ficar com a guarda. Raquel expressou desejo em reverter a guarda

da irmã para si para manter a família unida, especialmente Rafael e Gabriela, que são bem

próximos. Refere que Gabriela jamais deveria ter saído de casa, e atribui esse fato a seu

estado emocional na época, conturbado em razão do falecimento da mãe e de sua gravidez

não planejada. Revelou medo de que, em a guarda permanecendo com Helena, ela não veja

mais a irmã.

Meu Amigo de Papel

O protocolo de avaliação infantil não foi aplicado na íntegra, em razão de que

Gabriela se desconcentrou e não mostrou interesse em dar continuidade à realização das

atividades propostas. Considerando que as páginas preenchidas forneceram informações

relevantes e suficientes ao entendimento do caso, não foi agendado um segundo

atendimento com a criança. Serão apresentados os resultados de cada uma das atividades

realizadas.

Vamos brincar de contar histórias?

História 1

G: Vem formiga.

V: E aí?

153

G: Fica melado.

V: E o que acontece depois?

G: O papai tem que limpar.

V: E a mamãe e a filha, o que elas fazem?

G: Vão ajudar o papai a limpar.

V: Como eles estão se sentindo?

G: Brabos.

V: Por quê?

G: Porque a filhinha não pediu desculpa.

V: Ela costumava não pedir desculpas?

G: Sim.

V: Por quê?

G: Porque ela tinha vergonha.

História 2

G: A gente tem que botar band-aid.

V: Quem colocou?

G: A mamãe.

V: Como a filhinha ficou se sentindo?

G: Mal.

V: Por quê?

G: Porque tava doendo.

V: E a mamãe, o que ela fez?

G: Levou pro pronto socorro.

V: E como terminou a história?

G: Com ela brincando com a boneca.

História 3

G: A mamãe tem que botar ela de castigo.

V: Que castigo foi?

G: Na cadeira de pensar.

V: Como ela ficou se sentindo?

G: Braba.

V: E o que ela fez?

154

G: Ficou na cadeira de pensar.

V: E o que aconteceu depois?

G: A mamãe disse: ‘Agora pode sair. Agora vai arrumar seu quarto’.

V: E aí?

G: Daí a filhinha obedeceu.

Sobre mim. Gabriela não quis desenhar, preferindo que a avaliadora escrevesse o

que ela falava, utilizando canetas rosa e lilás, pois referiu que essas eram as cores de que

mais gosta. No espaço destinado às “coisas que eu gosto”, Gabriela referiu inicialmente

“eu gosto de ir no cinema”. Quando solicitada sobre uma comida e uma bebida que

gostasse, referiu “massa com feijão” e “pepsi-cola e guaraná”. Também referiu as cores

rosa, roxo e vermelho. Quando questionada sobre um brinquedo ou lugar que gostasse de ir

para brincar, referiu que gosta de ir a praças, a parques de diversões e ao zoológico.

Também foi lhe perguntado sobre pessoas de quem gostava, ao que respondeu: “Eu gosto

do maninho (Rafael), da Alana (bebê da Raquel), do Antônio (marido da Raquel), da mana

e da vovó Helena.”

No momento em que seria iniciado o preenchimento das “coisas que eu não gosto”,

Gabriela perguntou: “Sabe o que o Antônio fazia lá na outra casa? Ele me dava de cinta.

Não tinha leite e eu chorava”. “O maninho também apanhava, e a mana ria de nós

apanhando. Ela que mandava dar de cinta em nós”. “Eu não gosto que ele me dava banho

de mangueira, e a água tava gelada”. Nesse momento interrompeu o atendimento e quis ir

até à sala de espera, dizendo que ia falar com a mãe. Chegando à sala, falou para Helena:

“Ela me perguntou o que eu não gosto”. “Tá, depois a gente se conversa”. Em seguida,

retomou a atividade. “Eu não gosto também que ele mexia na minha teta”. “Ele mexia

quando ele me dava banho. Só isso”.

A avaliadora então questionou se esses fatos ainda estavam acontecendo, agora

nessa outra casa em que atualmente residem Raquel, Antônio, Rafael e Alana. Gabriela

então respondeu: “Aqui que tá o mal? (apontando para as coisas que não gosto). Lá na

outra casa que eles tão morando eu não tô gostando de ver que o Antônio tá sentando em

cima do maninho”.

Minha Rotina. Gabriela foi relatando o que fazia enquanto a avaliadora escrevia.

“Escovo dente e tomo café. Depois eu vou pro colégio”. Comentou sobre seus amigos da

escola, citando os nomes de todos. “Eu trabalho na escola, almoço e depois vem o

155

soninho. A gente escova o dente e vai pro seu colchonete. E o colchonete tem número. O

meu é assim ó (escreveu 22). Quando acorda, a gente entrega o colchonete pra profe e

depois a gente dobra o nosso lençol e nosso cobertor. Depois a gente vamo pro lanche. De

manhã também tem lanche”. Enquanto a examinadora escrevia essas informações,

Gabriela perguntou se esse material iria para o juiz, informando que gostaria que fosse,

para ele ver tudo que ela faz no colégio. “Depois tem janta, e depois eu vou pra casa com

a Vovó Helena, ou com a Bisa ou com a Sheila”. “Aí em casa eu tomo café e depois do

café eu janto”. “Eu brinco de mamãe e filhinha, de cachorrinho, de bebê e de fadinha”.

Minha Jornada. Ao ser solicitada a pensar sobre coisas importantes que

aconteceram em sua vida, Gabriela referiu “Eu gosto de mudar de casa”, referindo-se ao

fato de ter saído da casa da mana para a casa da Vó Helena. Gabriela esclareceu:

“Primeiro eu tava com a mana, depois eu fui pra Luciane. A mana me levava lá na

Luciane e eu morava só um dia e quando ela vinha me buscar... até que aconteceu um dia

que eu chorei e ela disse: ‘tu vai apanhar quando chegar em casa’. Isso que eu não

gostava”. Nesse momento, pediu para voltar para a página “Sobre mim” para acrescentar

nas “coisas que eu não gosto” que “a mana disse que eu ia apanhar quando chegar em

casa”.

Ainda sobre fatos importantes de sua vida, referiu que tem a mamãe Jussara, que

ela estava “dodói”, e que ela tem a fotinho dela. Solicitou ajuda para escrever Jussara, e ela

mesma escreveu na página “Minha Jornada”.

Minha família. Gabriela desenhou, inicialmente, a si e logo a seguir Helena à sua

esquerda. Do lado direito desenhou Sheila (filha mais velha de Helena). Quando já estava

concluindo o desenho, lembrou-se que precisava desenhar a “bisa”. Quis colocar a inicial

de cada familiar, interrompendo o desenho para ir até à sala de espera mais uma vez, para

perguntar à Helena com que letra começava Sheila.

Gabriela foi apresentada às atividades “Meus pais” (sendo solicitada a conversar

sobre as pessoas que cuidam dela), “Minhas preocupações” e “Planos para o futuro”.

Contudo, referiu “Essa eu não vou querer” e “Essa vamo pular”. Solicitou, então, para

fazer um desenho. Ao término do desenho livre, quis entregá-lo à Helena. Depois quis ler

alguns livros de história que estavam no consultório. Foi proposto guardar os lápis de cor,

ler uma história e encerrar o atendimento. Gabriela concordou, guardou o material e

escolheu contar a história da Branca de Neve.

156

Escala SARP

A pontuação da Escala SARP resultou num escore total de 60 pontos para Helena, e

28 para Raquel. Considerando a inexistência até o momento de estudos de normatização do

SARP, é possível apenas identificar por meio dessas pontuações a discrepância entre a

qualidade do relacionamento de cada uma das responsáveis com a menina Gabriela.

Contudo, mais importante do que o escore total, interessa analisar quais as áreas do

relacionamento parental que estão sendo bem atendidas e quais que estão deficitárias.

Assim sendo, após a pontuação da escala, os itens foram organizados de acordo com a

dimensão a que pertencem. Foi calculada a média dos itens de cada dimensão,

considerando apenas os que se aplicaram ao caso em questão. O gráfico abaixo apresenta

os resultados da Escala SARP para Helena e Raquel, dispostos conforme cada uma das

dimensões do relacionamento parental.

Figura 8

Médias das Pontuações de cada Dimensão da Escala SARP para Helena e Raquel

A análise das médias das pontuações de cada dimensão da Escala SARP permite

evidenciar que Helena atende de forma satisfatória todas as áreas do relacionamento

parental, à exceção da área “relação interparental”. O relacionamento entre Helena e

Raquel encontra-se prejudicado em virtude principalmente das dificuldades de

comunicação entre ambas e da flexibilidade em relação aos contatos de Gabriela com

Helena e a irmã.

157

O fato de Helena ser uma pessoa mais madura, já ter tido a experiência de criar seus

filhos, e ter um emprego estável contribui para que a mesma possa atender às necessidades

de Gabriela de forma mais satisfatória que Raquel. Helena preocupa-se com as questões de

higiene, saúde, educação e desenvolvimento socioemocional de Gabriela e esforça-se para

atender às demandas da menina. Gabriela, por outro lado, sente-se segura na presença de

Helena e de sua família, de quem recebe carinho, atenção e também disciplina e

orientação.

Raquel apresentou uma média de escore baixo na maioria das dimensões. O fato de

desconhecer e/ou envolver-se pouco nos cuidados diários com Gabriela contribui

negativamente para a qualidade do relacionamento com a irmã. A área que apresentou

média mais alta foi a das “características afetivoemocionais”, seguida de “cuidados

básicos”, áreas que refletem o afeto que Raquel tem por Gabriela e os cuidados parentais

que dedicava à menina quando ainda viviam sob o mesmo teto. As demandas que Raquel

enfrenta, de trabalhar, cuidar da casa e atender à sua filha Alana e seu irmão Rafael

também são fatores que contribuem para um prejuízo na qualidade de seu relacionamento

com Gabriela. O maior prejuízo foi identificado nas áreas “proteção frente a riscos reais” e

“desenvolvimento da identidade”, os quais podem ser compreendidos em função da

suspeita de maus tratos e dos sentimentos de ansiedade e medo de Gabriela em relação a

tais situações abusivas.

Considerando os resultados apresentados, a conclusão do laudo pericial foi

favorável à permanência da guarda de Gabriela com Helena. Diante do histórico de

rejeições e instabilidades na vida de Gabriela e levando em consideração seu estágio de

desenvolvimento, a continuidade dos cuidados que vem recebendo de Helena lhe seriam

mais benéficos. Helena revelou-se capaz de lhe oferecer um ambiente estável, com rotina e

disciplina que auxiliam no desenvolvimento emocional de Gabriela.

Contudo, ressalta-se a importância da manutenção dos vínculos de Gabriela com

sua família de origem. Seria importante a determinação de dias e horários de visita, para

que as mesmas ocorram com uma frequência regular e contribuam para fortalecer a

segurança emocional da criança.

158

Considerações Finais

O presente estudo de caso permitiu evidenciar a aplicabilidade do SARP em uma

situação de disputa de guarda. O sistema revelou-se apropriado, permitindo a coleta e

sistematização de informações pertinentes à situação. Embora ainda não esteja validado,

seus resultados puderam ser descritos qualitativamente no laudo pericial, contribuindo para

a compreensão do caso e apresentando embasamento teórico apropriado ao contexto.

159

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As avaliações envolvendo disputa de guarda ou regulamentação de visitas,

realizadas por peritos ou assistentes técnicos, não obedecem a um padrão comum.

Diferentes técnicas e testes, e até mesmo critérios diversos são utilizados por profissionais

da área da saúde mental para conduzir essas avaliações e produzir documentos. A

qualidade desse trabalho pode, por vezes, apresentar-se prejudicada, trazendo

consequências para o contato entre pais e filhos.

Com a construção do Sistema de Avaliação do Relacionamento Parental, e os

artigos teórico e empírico que fizeram parte de sua construção, espera-se contribuir para

uma boa qualidade das avaliações de disputa de guarda. A maneira pela qual o SARP foi

construído levou em consideração o contexto forense, e a possibilidade de manipulação

dos dados, ao mesmo tempo em que houve a preocupação em criar um método de

avaliação flexível, com a utilização de diferentes técnicas. O objetivo final é que esse

conjunto de informações obtidas a partir de fontes distintas possa ser sistematizado de

modo uniforme, por meio das dimensões que compõem a Escala SARP. Isso auxiliará na

medida em que será possível, a partir de um embasamento teórico, analisar as

competências parentais e as necessidades dos filhos que estão ou não estão sendo bem-

atendidas.

O sistema de avaliação construído necessitará de ajustes, evidenciados a partir dos

estudos de validação realizados. Em relação à Entrevista SARP, será necessário revisar seu

tempo de aplicação, que pode não ser compatível com a realidade apresentada no Sistema

Judiciário brasileiro. Para isso, algumas questões poderão ser condensadas, ou até mesmo

suprimidas, a fim de diminuir o tempo das entrevistas com os genitores. No que diz

respeito ao Meu Amigo de Papel, algumas correções nos textos deverão ser realizadas. A

atividade “Minha Rotina” possivelmente sofrerá alterações na sua arte gráfica, para torná-

la mais estruturada, solicitação recebida quando o material foi utilizado com crianças

menores. A atividade “Meus Pais” apresentará versão opcional, para situações em que ser a

disputa de guarda ocorra entre outras pessoas que não exclusivamente pai e mãe. A

sugestão apontada é criar a atividade “Quem cuida de mim”, para que a criança possa falar

sobre seus responsáveis. No que refere à Escala SARP, os treinamentos com as juízas do

160

instrumento permitiram a discussão e alteração de vários itens da escala. Contudo, ainda

existem ajustes que deverão ser realizados.

Para que o SARP possa ser amplamente utilizado, é necessário que sejam

realizados estudos de validação e padronização deste método de avaliação. Pretende-se,

para tanto, formar convênios com Tribunais de Justiça de várias capitais brasileiras, a fim

de reunir uma amostra diversificada de famílias. Assistentes sociais e psicólogos

interessados em participar do estudo receberão treinamento apropriado para garantir a

padronização das aplicações.

Espera-se, dessa forma, que o trabalho iniciado a partir desta tese contribua para

enriquecer a prática dos profissionais que realizam avaliações em situações de disputa de

guarda. A construção ou adaptação de instrumentos para o contexto forense contribui para

uma formação mais sólida e embasada em pressupostos científicos dos psicólogos.

Ademais, fortalece as relações entre a Psicologia e a Justiça e contribui para amenizar os

prejuízos na relação pais-filhos que são expostos a disputas judiciais.

161

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169

Anexo A – Aprovação do Comitê de Ética da UFRGS

170

Anexo B – Entrevista para psicólogos terapeutas de família

1. Sexo: ( ) feminino ( ) masculino

2. Ano da graduação:

3. Tempo de formação na especialização:

4. Onde trabalhas?

5. De acordo com tua experiência, como definirias “relacionamento entre pais e

filhos”?

6. Costumas trabalhar com avaliação de famílias? Como costumas avaliar os

relacionamentos?

7. Já tiveste experiência em casos de disputa de guarda ocorridos mediante

separação e divórcio?

8. Concordas que nesses casos o mais importante é avaliar a qualidade do

relacionamento entre pais e filhos?

9. Na tua opinião, quais os aspectos que deveriam ser investigados na avaliação

do relacionamento entre pais e filhos?

171

Anexo C – Entrevista para os genitores

As perguntas abaixo têm como objetivo identificar as principais características do

relacionamento pais-filhos. Suas respostas auxiliarão na construção de um instrumento

psicológico que será utilizado em avaliações de disputa de guarda.

1. Como você definiria um bom relacionamento pais-filhos?

2. Quais as necessidades mais importantes, na sua opinião, para o desenvolvimento

saudável dos filhos?

3. Quais as atividades da vida de seu filho de que você mais participa?

4. E quais as que você menos participa? Por quê?

5. Quais as maiores dificuldades em ser um bom pai / boa mãe?

6. O que há de mais gratificante em ser pai/mãe?

7. O que seu filho (a) mais gosta em você?

8. Do que seu filho (a) mais reclama em você?

9. O que você gostaria de mudar na sua relação com seus filhos? Por quê?

10. Você acredita que sua relação com seu cônjuge/ex-cônjuge influencia/influenciava

seu relacionamento com seu filho? Por quê? (De que forma?)

172

Anexo D – Entrevista para as crianças

Vamos conversar um pouco sobre sua mãe?

1. Você acha que se dá bem com ela? Por quê?

2. O que não é bom/legal na sua relação com sua mãe?

3. Que atividades você mais gosta de fazer com ela?

4. O que você gostaria que sua mãe fizesse com você mas ela não faz?

5. O que você mais gosta na mãe? E o que menos gosta?

Agora vamos conversar sobre o pai.

6. Você se dá bem com o pai? Por quê?

7. O que não é bom/legal na sua relação com ele?

8. Que atividades você mais gosta de fazer com ele?

9. O que você gostaria que seu pai fizesse com você mas ele não faz?

10. O que você mais gosta no pai? E o que menos gosta?

A pergunta que vou lhe fazer agora não é específica sobre o seu pai e/ou sua mãe.

Você pode responder pensando em pais de amigos seus, ou seus familiares também.

11. O que é preciso para ser um bom pai/boa mãe?

173

Anexo E – Entrevista para os Operadores do Direito

1. Em que casos, normalmente, são solicitadas perícias psicológicas para auxiliar na

determinação da guarda?

2. Que informações você espera que sejam fornecidas a partir dessas perícias?

3. Existe uma definição jurídica para o conceito “competência parental”?

4. Em sua opinião, qual o aspecto primordial a ser a considerado para definir com

quem a guarda de uma criança ou adolescente deve ficar?

5. Você concorda que o relacionamento entre pais e filhos deve ser explorado em uma

avaliação psicológica desse caráter? Que aspectos, a partir desse tema, seriam

relevantes para auxiliar na sua tomada de decisão em relação à guarda?

6. Você costuma utilizar as informações do laudo pericial psicológico para

fundamentar suas decisões?

174

Anexo F – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido do Estudo Empírico

sobre Relacionamento Parental

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Instituto de Psicologia

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Pelo presente Consentimento, declaro que fui informado(a), de forma clara e

detalhada, dos objetivos e da justificativa do presente Projeto de Pesquisa, que visa à

construção de uma entrevista semiestruturada que será aplicada a pais e filhos, com o

objetivo de avaliar o relacionamento pais-filhos. Minha participação/A participação de

meu filho consistirá em uma entrevista com a pesquisadora, que terá duração de cerca de

30/40 minutos.

Estou ciente de que receberei resposta a qualquer dúvida sobre os procedimentos e

outros assuntos relacionados com esta pesquisa. Terei total liberdade para retirar meu

consentimento, a qualquer momento, e deixar de participar do estudo, sem que isto traga

prejuízo a minha pessoa. A aplicação da entrevista ocorrerá em dia e horário que melhor

convenha ao participante e à pesquisadora. Os nomes das pessoas que participarem desse

estudo serão guardados em segredo, e os dados obtidos através das entrevistas não serão

divulgados. Tais dados serão utilizados apenas para atividades científicas.

Concordo em participar do presente estudo e autorizo, para fins de pesquisa e de

divulgação científica, a gravação em áudio da entrevista e a utilização dos dados obtidos

através deste estudo. Entendo que se manterá em sigilo minha identidade, e que os dados

coletados serão arquivados e destruídos depois de decorrido o prazo de cinco anos.

Os pesquisadores responsáveis por este Projeto de Pesquisa são Professora Doutora

Denise Ruschel Bandeira e a doutoranda Vivian de Medeiros Lago, as quais poderão ser

contatadas pelo fone (51) 9823 5382 ou pelo email [email protected]

Data: ______/______/_______

Nome do Participante: _________________________________________________

Assinatura do Participante: ______________________________________________

Assinatura da doutoranda responsável: _____________________________________

175

Anexo G – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

da Construção da Entrevista SARP

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Instituto de Psicologia

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Pelo presente Consentimento, declaro que fui informado (a), de forma clara e

detalhada, dos objetivos e da justificativa do presente Projeto de Pesquisa, que visa à

construção de uma entrevista semi-estruturada que será aplicada a pais e filhos, com o

objetivo de avaliar o relacionamento pais-filhos. Minha participação/A participação de

meu filho consistirá em uma entrevista com a pesquisadora, que terá duração de cerca de

30/40 minutos.

Estou ciente de que receberei resposta a qualquer dúvida sobre os procedimentos e

outros assuntos relacionados com esta pesquisa. Terei total liberdade para retirar meu

consentimento, a qualquer momento, e deixar de participar do estudo, sem que isto traga

prejuízo a minha pessoa. A aplicação da entrevista ocorrerá em dia e horário que melhor

convenha ao participante e à pesquisadora. Os nomes das pessoas que participarem desse

estudo serão guardados em segredo, e os dados obtidos através das entrevistas não serão

divulgados. Tais dados serão utilizados apenas para atividades científicas.

Concordo em participar do presente estudo e autorizo, para fins de pesquisa e de

divulgação científica, a gravação em áudio da entrevista e a utilização dos dados obtidos

através deste estudo. Entendo que se manterá em sigilo minha identidade, e que os dados

coletados serão arquivados e destruídos depois de decorrido o prazo de cinco anos.

Os pesquisadores responsáveis por este Projeto de Pesquisa são Professora Doutora

Denise Ruschel Bandeira e a doutoranda Vivian de Medeiros Lago, as quais poderão ser

contatadas pelo fone (51) 9823 5382 ou pelo email [email protected]

Data: ______/______/_______

Nome do Participante: _________________________________________________

Assinatura do Participante: _____________________________________________

Assinatura da doutoranda responsável: ____________________________________

176

Anexo H - Versão Inicial da Entrevista SARP

Rotina da criança

1. Descreva um dia de semana que você passa com seu filho.

2. Com quem seu filho passa as noites? Como é o sono dele?

3. Fale o que você sabe sobre as refeições de seu filho: quantas são feitas, horários, quem

participa das mesmas.

4. Você saberia dizer que comidas seu filho mais gosta e menos gosta?

5. Quem se responsabiliza pelo cuidado com atividades de higiene, como tomar banho e

escovar os dentes?

6. Que atividades você costuma realizar com seu filho aos finais de semana?

7. Quando seu filho se machuca ou fica doente, quem faz curativos ou leva ao médico?

Escola e amigos

8. Quem leva e busca seu filho na escola?

9. Você costuma participar das reuniões e atividades propostas pela escola?

10. Você ajuda seu filho com os temas da escola?

11. Quem são os amigos de seu filho? Você os conhece?

Comunicação

12. Com que frequência, atualmente, você vê/fala com seu filho?

13. Sobre que tipo de assunto vocês costumam conversar?

Rede de apoio

14. Você trabalha? Enquanto você trabalha, com quem fica/ficaria seu filho?

15. Quando seu filho precisa faltar à escola, com quem ele fica?

16. No caso da escola de seu filho marcar uma reunião em horário de trabalho, o que você

faz?

17. Quem são os familiares mais próximos que convivem com seu filho? Que tipos de

atividades eles fazem juntos?

Estabelecimento de regras

18. Quais são as regras da casa? Como você as cobra?

19. O que você costuma fazer quando seu filho desobedece alguma ordem sua?

20. Quando você impõe um castigo a seu filho, você consegue cumpri-lo?

177

Flexibilidade e comunicação com o ex-cônjuge

21. Atualmente, como você e seu ex-cônjuge dividem as despesas de seu (s) filho (s)?

22. Comente alguns aspectos positivos e alguns negativos de seu ex-conjuge.

23. Caso você não venha a ficar com a guarda, como pretende colaborar com as despesas

de seu (s) filho (s)?

24. Se você ficar com a guarda, como você espera que seu ex-cônjuge colabore com as

despesas de seu filho?

25. Caso você venha a ficar com a guarda de seu filho/a, como você pensa em estipular os

dias e horários de visitação de seu ex-cônjuge?

26. Imagine que você está com a guarda de seu filho e surge a necessidade de mudança de

escola. Que atitude você tomaria?

Ajustes pós-separação

27. Caso você venha a ficar com a guarda de seu filho, qual será o espaço físico destinado

a ele na sua casa?

28. E caso você não fique com a guarda de seu filho? Qual o espaço físico que destinado a

ele na sua casa?

29. Você tem um novo parceiro (a)? Como ele/ela se relaciona com seu filho?

Motivação para ficar com a guarda

30. Por que você é a pessoa mais indicada para ficar com a guarda de seu filho/a?

31. Caso a guarda de seu filho não pudesse ficar com você, com quem você gostaria que

ficasse?

178

Anexo I – Versão final da Entrevista SARP

Entrevista Inicial (roteiro)

Dados do casal:

Nome do pai:

Idade:

Data de nascimento:

Escolaridade:

Profissão:

Genograma: (família de origem do pai)

Nome da mãe:

Idade:

Data de nascimento:

Escolaridade:

Profissão:

Genograma: (família de origem da mãe)

Dados dos filhos:

Nome:

Idade:

Data de nascimento:

Sexo: ( ) Masc ( ) Fem

Escolaridade:

Genograma:

179

Histórico do Casal

- Como começou o relacionamento? (como se conheceram, namoraram, casaram)

- Como era a convivência enquanto casados? (brigas eram frequentes?)

- Como eram divididas as tarefas domésticas? E os cuidados com o filho? (investigar a rotina de

trabalho, o gerenciamento das despesas da casa)

- Por que houve a separação?

- Como foi comunicada a separação ao seu filho?

- Como ele se sentiu?

- De que seu filho mais sente falta em relação ao seu pai/mãe?

Nascimento dos filhos

- Histórico da gravidez (desejada? planejada? Houve complicações? Abortos? Foi feito pré-natal?)

- Parto (Normal? Cesariana?)

- Mudanças na vida do casal?

Desenvolvimento da criança

- Amamentação

- Engatinhar/caminhar

- Controle esfincteriano

- Linguagem

- Necessidades especiais? (fraldas, alergias, doenças)

- Hospitalizações/ Cirurgias

- Independência (o que faz sozinho/ o que precisa de ajuda)

- Como é o sono? Onde dorme?

- Impacto com nascimento de irmãos:

- Entrada na escola

180

Entrevista SARP (Lago & Bandeira, 2010)

Rotina da criança

1. Descreva um dia de semana que você passa com seu filho (pedir para o genitor descrever as

diferenças entre o período pré-separação e pós-separação, se aplicável).

2. Que atividades você costuma realizar com seu filho nos finais de semana? (idem questão

1).

3. Fale o que você sabe sobre as refeições de seu filho: quantas são feitas, horários, quem

participa das mesmas.

4. Qual é a comida que seu filho mais gosta? E que menos gosta?

5. Quem se responsabiliza pelo cuidado com atividades de higiene, como tomar banho e

escovar os dentes?

6. Quando seu filho fica doente, que cuidados são tomados? Por quem?

Escola e amigos

7. Quem leva e busca seu filho na escola?

8. No caso da escola de seu filho marcar uma reunião em horário de trabalho, o que você faz?

9. Como tem sido o desempenho do seu filho na escola? Como você tomou conhecimento

dessas informações?

10. Quais as combinações com seu filho em relação aos temas/provas? É preciso ajudá-lo? De

que forma?

11. Fale-me sobre os amigos de seu filho. (Quem são? Você os conhece? Com que frequência

os vê? Algum amigo preocupa você?)

Comunicação

12. Com que frequência, atualmente, você vê/fala com seu filho?

13. Como é para você conversar com seu filho? (explorar situações agradáveis e

desagradáveis)

Rede de apoio

14. Você trabalha? Enquanto você trabalha, com quem fica/ficaria seu filho?

15. Quando seu filho precisa faltar à escola, com quem ele fica? (buscar informações sobre

essa pessoa)

16. Você pode contar com alguém próximo para atender seu filho num momento de

necessidade? (solicitar informações sobre convívio e a relação entre a criança e as

pessoas)

181

Estabelecimento de limites

17. Existem combinações em relação à rotina da criança (horários, tarefas, obrigações)? Quais?

Como são monitoradas?

18. O que você faz quando seu filho cumpre o combinado?

19. O que você costuma fazer quando seu filho desobedece alguma ordem sua?

20. Dê um exemplo de castigo que você costuma aplicar em seu filho. Quando esse castigo não

funciona, o que você faz? E se a criança segue lhe desobedecendo?

Flexibilidade e comunicação entre os genitores

21. De forma geral, como você diria que é seu relacionamento com o pai/mãe de seu filho, para

tratar de assuntos de seu filho?

22. Atualmente, como você e o pai/mãe de seu filho dividem as despesas de seu (s) filho (s)?

23. Caso você não venha a ficar com a guarda, como pretende colaborar com as despesas de

seu (s) filho (s)?

24. Se você ficar com a guarda, como você espera que o pai/mãe de seu filho colabore com as

despesas de seu filho?

25. Caso você venha a ficar com a guarda de seu filho/a, como você pensa em combinar os dias

e horários de visitação de outro genitor? E se surgirem imprevistos como aniversários,

viagens ou doenças nos dias de visita do pai/mãe de seu filho?

26. Imagine que você está com a guarda de seu filho e surge a necessidade de mudança de

escola. Que atitude você tomaria?

Ajustes pós-separação

27. Caso você venha a ficar com a guarda de seu filho, qual será o espaço físico destinado a ele

na sua casa?

28. E caso você não fique com a guarda de seu filho? Qual o espaço físico que destinado a ele

na sua casa?

29. Você tem um novo parceiro (a)? (explorar a partir da resposta: seu filho já o/a conhece?

Como foi feita a aproximação? Como ele/ela se relaciona com seu filho?). Caso não

tenha, questionar: “E se tivesse, como seria?”

Motivação para ficar com a guarda

30. Por que você quer a guarda de seu filho?

31. Por que você é a pessoa mais indicada para ficar com a guarda de seu filho/a?

32. Caso a guarda de seu filho não pudesse ficar com você, com quem você gostaria que

ficasse?

182

Anexo J – Livreto de apresentação do profissional

183

Anexo K – Meu Amigo de Papel

184

Anexo L – Escala SARP

Orientações para pontuação: Cada item deverá ser pontuado duas vezes, uma para cada responsável pela criança,

sendo uma pontuação em cada linha. Sugere-se que seja utilizada a inicial do nome de cada pessoa, ao invés de um “x” para pontuar. A pontuação baixa, média e alta deverá levar em consideração a maior ou menor presença de prejuízos evidenciados na relação pais-filhos sob análise.

Observações:

1) Em se tratando de pais casados, desconsidere “no período pré-separação” e

considere os verbos no presente.

2) Em não havendo a separação conjugal, o item 10 obrigatoriamente receberá NA.

Para os itens 1 a 3, considere a seguinte pontuação: NA = não foi possível avaliar ou não se aplica B = nível baixo (sem prejuízos) M = nível médio (com prejuízos) A = nível alto (com muitos prejuízos)

NA B

M

A

1. Conflito conjugal pré-separação

Existência de discussões entre o casal (podendo incluir violência doméstica), e o envolvimento dos filhos com as mesmas.

2. Comportamentos de desqualificação parental

Atitudes que evidenciem intenção de denegrir a imagem do outro genitor para o filho (informações inapropriadas para o filho, incluindo ressentimentos, dificuldades financeiras, chantagens emocionais).

3. Interferência do estado emocional do genitor na relação parental Interferência do estado emocional atual do genitor na relação com a criança (presença de sintomas de depressão, ansiedade, alto grau de estresse e/ou sentimentos de mágoa e rancores).

185

Para os itens 4 a 26, pontue conforme o grau de adequação, considerando:

NA = não foi possível avaliar ou não se aplica B = baixo (com muitos prejuízos) M = médio (com prejuízos) A = alto (sem prejuízos)

NA

B

M

A

4. Apoio material do genitor ao parceiro no período pré-separação Qualidade do apoio oferecido pelo genitor ao parceiro, no que diz respeito ao sustento financeiro da casa e à divisão das despesas do filho. Avaliar esse apoio proporcionalmente aos rendimentos recebidos. Em se tratando de genitores que não exercem atividade remunerada, mas colaboram com as tarefas domésticas e cuidados com o filho, pontue NA.

5. Apoio emocional do genitor ao parceiro no período pré-separação Qualidade do apoio emocional (preocupação com a saúde e bem-estar do parceiro) oferecido pelo genitor na participação conjunta com as tarefas domésticas e criação do filho, de forma a não sobrecarregar o companheiro.

6. Comunicação com o outro genitor

Qualidade da comunicação com o outro genitor para tratar de assuntos importantes em relação à vida do filho (atividades escolares, extracurriculares, consultas médicas).

7. Flexibilidade em relação aos contatos do filho com o outro genitor Flexibilidade em relação aos contatos com o outro genitor e sua família extensa. Considerar se as determinações judiciais são rigidamente seguidas ou se há flexibilidade em, por exemplo, eventuais necessidades de novos arranjos de visitação (Ex. é aniversário do outro genitor em um final de semana que a criança ficaria com ele).

8. Manifestações de afeto do genitor

O genitor demonstra uma relação de proximidade com o filho, revelando-se afetuoso com o mesmo, expressando carinho e zelo para com ele.

186

NA

B

M

A

9. Envolvimento nas atividades diárias do filho antes da separação

Grau e qualidade da participação do genitor nas principais atividades do dia-a-dia do filho (despertar, hora do banho, escovar os dentes, refeições, transporte para a escola, auxílio com as tarefas escolares, atividades recreativas).

10. Envolvimento nas atividades diárias do filho após a separação Idem ao item anterior. Na avaliação do genitor não-guardião, considerar o envolvimento proporcionalmente ao tempo que passa com a criança, isto é, o grau e a qualidade do envolvimento durante o tempo de convívio/visitas.

11. Conhecimento acerca dos cuidados básicos do filho Conhecimento do genitor acerca dos hábitos de seu filho em relação a sono, alimentação, higiene e saúde (ainda que não participe efetivamente dos mesmos).

12. Sustento financeiro Preocupação e comprometimento do genitor em atender às necessidades básicas do filho (moradia, alimentação, saúde, educação). Não se trata de um item que visa a avaliar valores de pensões alimentícias.

13. Proteção frente a riscos reais na rede de apoio

Proteção concreta em proteger o filho frente a situações de risco à integridade física e emocional da criança. Estão incluídos riscos de abuso físico, emocional e sexual. É importante considerar a rede de apoio de que o genitor se utiliza e o grau de confiança que tem nessas pessoas. Avaliar, por exemplo, se o filho traz/ já trouxe alguma queixa de abuso físico/maus-tratos em relação a essas pessoas, e a atitude do genitor em relação a essas queixas.

14. Proteção frente a riscos reais com o outro genitor e familiares Preocupação do genitor em relação ao filho estar protegido frente a situações de risco à integridade física e emocional quando o mesmo está na companhia do outro genitor e/ou a família deste.

15. Monitoramento das relações sociais O monitoramento do genitor às atividades de contato social de seu filho (saber onde o filho está, conhecer seus amigos/colegas, buscar/levar a festas, encontros, passeios, controlar o uso do computador/internet).

16. Estabelecimento de limites

Existência e adequação das regras/combinações estipuladas em relação a horários, rotina, limites. Importante explorar o quanto os genitores buscam estabelecer limites, mesmo apenas nos períodos de visita. Os que fazem das visitas um momento apenas de recreação, sem estabelecimento de limites, devem pontuar menos nesse item.

187

NA

B

M

A

17. Monitoramento de limites

Monitoramento das combinações/regras estabelecidas, a fim de garantir (buscar garantir) que as mesmas sejam cumpridas. Analisar se existem sanções e/ou recompensas, e se as mesmas são mantidas, quando estipuladas.

18. Transmissão de valores

Preocupação do genitor em transmitir um sistema de valores e normas (respeito, solidariedade, determinação, idoneidade) para seu filho. Considerar as atitudes do genitor em relação às normas sociais. Comportamentos que evidenciem desrespeito ou transgressão a essas normas justificam um prejuízo neste item.

19. Consistência parental

Continência oferecida pelo pai/mãe: apoio oferecido ao filho, cumprimento de promessas, coerência de verbalizações e comportamentos, segurança emocional.

20. Manifestações de afeto do filho para com o genitor

Expressão de afeto do filho em relação ao genitor. A criança sente nesse pai/mãe alguém companheiro, parceiro, que se faz presente em sua vida.

21. Comunicação com o filho

Qualidade da comunicação entre genitor e filho, considerando se o genitor é uma pessoa a quem o filho costuma recorrer quando está com problemas/ dificuldades, e quando deseja compartilhar coisas boas.

22. Identidade pessoal

Sentimento do filho de aceitação pelo genitor, e o quanto esse sentimento se reflete em sua autoestima e identidade pessoal.

23. Desenvolvimento da autonomia e independência

Desenvolvimento apropriado da independência e autonomia (considerando a idade e o estágio de desenvolvimento da criança).

24. Educação formal Oferecimento pelo genitor à criança de condições de estudo adequadas, estando ela matriculada em uma escola, e frequentando-a regularmente.

25. Participação nas atividades escolares Envolvimento do genitor nas tarefas decorrentes da atividade escolar (auxílio nas tarefas, participação de reuniões e eventos promovidos, conhecimento sobre o desempenho escolar do filho).

26. Atividades recreativas Oferecimento à criança de oportunidades de lazer e diversão (vídeo game, brinquedos, jogos educativos, praças, shoppings, parques, esportes), e a satisfação demonstrada pela criança em relação à área recreativa.

188

Anexo M – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para Estudos de Caso

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS Instituto de Psicologia

Programa de Pós-Graduação em Psicologia Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Pelo presente Consentimento, declaro que fui informado (a), de forma clara e

detalhada, dos objetivos e da justificativa do presente Projeto de Pesquisa, que busca

produzir evidências de fidedignidade entre juízes e de validade clínica para o Sistema de

Avaliação do Relacionamento Parental no Contexto Forense (SARPFOR). A participação

consistirá em um encontro com cada um dos genitores, com duração de cerca de 1h30min,

e dois encontros de 1h cada com a criança (ou cada um dos filhos, em havendo mais de um

filho), para aplicação dos questionários e instrumentos. Os atendimentos serão gravados

em áudio.

Estou ciente de que eu e/ou meu filho receberemos resposta a qualquer dúvida

sobre os procedimentos e outros assuntos relacionados com esta pesquisa. Teremos total

liberdade para retirar o consentimento, a qualquer momento, e deixar de participar do

estudo, sem que isto traga prejuízo a minha pessoa e/ou meu filho. A aplicação dos

questionários ocorrerá em dia e horário que melhor convenha aos membros da família. Os

nomes das pessoas que participarem desse estudo serão guardados em segredo, e os dados

obtidos através dos questionários não serão divulgados. Tais dados serão utilizados apenas

para atividades científicas. Após a conclusão da pesquisa, a família terá direito a uma

entrevista de devolução, com os principais resultados encontrados através dos instrumentos

aplicados.

Concordo com a minha participação e de meu filho no presente estudo e autorizo,

para fins de pesquisa e de divulgação científica, a utilização dos dados obtidos através

deste estudo. Entendo que se manterá em sigilo minha identidade e de minha família, e que

os dados coletados serão arquivados e destruídos depois de decorrido o prazo de cinco

anos.

Os pesquisadores responsáveis por este Projeto de Pesquisa são Professora Doutora

Denise Ruschel Bandeira e a doutoranda Vivian de Medeiros Lago, as quais poderão ser

contatadas pelo fone (51) 9323 5382 ou pelo e-mail [email protected].

Data: ______/______/_______ Nome do Participante: ____________________________ Assinatura do Participante: ___________Assinatura da doutoranda responsável: _______