consevação energia mecânica

11
CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO Paulo Jorge Carvalho 1. Introdução Pretendemos com este trabalho verificar a conservação da energia mecânica estudando o movimento de uma esfera rígida que rola por uma calha inclinada. A ideia deste trabalho surgiu com a realização da actividade experimental “Salto para a piscina”, aquando do estudo do lançamento horizontal de projécteis no décimo primeiro ano de escolaridade. Durante as nossas pesquisas, constatámos que, além do estudo do lançamento de projécteis, também se realizava a determinação da energia cinética de uma esfera à saída de uma calha através do enunciado do princípio da conservação da energia. Inevitavelmente, na determinação da velocidade de saída da esfera recorrendo à energia cinética determinada através do enunciado do princípio da conservação da energia, os alunos irão determinar sempre um valor superior ao medido experimentalmente, explicando essa diferença como consequência da existência da força de atrito. Para provarmos que tal não é verdade, e que existe conservação da energia mecânica desde que a esfera apenas tenha movimento de rolamento, iremos variar a inclinação de uma calha de 4º em 4º, desde uma inclinação inicial de 4º até 56º. Para cada ângulo estabelecido mediremos a energia mecânica no início e no fim da calha. De referir que a calha terá que ser lisa e indeformável, pois, como já vimos em alguns casos, são utilizadas calhas de cortinados no referido estudo. Esta situação resulta numa alteração do raio de rotação da esfera, pelo que não se deve realizar este estudo com esse tipo de calhas. Da observação e estudo dos resultados concluímos que a conservação da energia mecânica se verifica até um ângulo limite. 2. Fundamentação Teórica A fundamentação teórica que a seguir se explana tem por base o estudo apresentado por Almeida, Maria José B. Marques de, em Preparação de Professores de Física Uma contribuição científico- pedagógica e didáctica, Almedina (2004) Coimbra, capitulo 5. Considerações Sobre Energia. Consideremos uma esfera infinitamente rígida e que rola por um plano inclinado. A figura 1 descreve a referida situação.

Upload: profpc

Post on 11-Jul-2015

3.655 views

Category:

Education


2 download

TRANSCRIPT

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Paulo Jorge Carvalho

    1. Introduo

    Pretendemos com este trabalho verificar a conservao da energia mecnica estudando o

    movimento de uma esfera rgida que rola por uma calha inclinada.

    A ideia deste trabalho surgiu com a realizao da actividade experimental Salto para a piscina,

    aquando do estudo do lanamento horizontal de projcteis no dcimo primeiro ano de escolaridade.

    Durante as nossas pesquisas, constatmos que, alm do estudo do lanamento de projcteis, tambm se

    realizava a determinao da energia cintica de uma esfera sada de uma calha atravs do enunciado do

    princpio da conservao da energia. Inevitavelmente, na determinao da velocidade de sada da esfera

    recorrendo energia cintica determinada atravs do enunciado do princpio da conservao da energia,

    os alunos iro determinar sempre um valor superior ao medido experimentalmente, explicando essa

    diferena como consequncia da existncia da fora de atrito. Para provarmos que tal no verdade, e que

    existe conservao da energia mecnica desde que a esfera apenas tenha movimento de rolamento, iremos

    variar a inclinao de uma calha de 4 em 4, desde uma inclinao inicial de 4 at 56. Para cada ngulo

    estabelecido mediremos a energia mecnica no incio e no fim da calha. De referir que a calha ter que ser

    lisa e indeformvel, pois, como j vimos em alguns casos, so utilizadas calhas de cortinados no referido

    estudo. Esta situao resulta numa alterao do raio de rotao da esfera, pelo que no se deve realizar

    este estudo com esse tipo de calhas.

    Da observao e estudo dos resultados conclumos que a conservao da energia mecnica se

    verifica at um ngulo limite.

    2. Fundamentao Terica

    A fundamentao terica que a seguir se explana tem por base o estudo apresentado por Almeida,

    Maria Jos B. Marques de, em Preparao de Professores de Fsica Uma contribuio cientfico-

    pedaggica e didctica, Almedina (2004) Coimbra, capitulo 5. Consideraes Sobre Energia.

    Consideremos uma esfera infinitamente rgida e que rola por um plano inclinado. A figura 1 descreve

    a referida situao.

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 2 de 11

    (1.2)

    Figura 1. Situao em que uma esfera infinitamente rgida rola por um plano inclinado

    Atendendo a que o sistema em estudo a esfera, a fronteira do sistema a sua superfcie.

    As foras exteriores aplicadas sobre a esfera so: o peso do corpo , cuja componente na direco do

    movimento realiza um trabalho positivo, dado por ; a fora normal

    aplicada pelo plano sobre a esfera, que no realiza trabalho por ser perpendicular ao deslocamento e a

    fora de atrito .

    Caso no houvesse atrito, a esfera escorregaria pelo plano inclinado. Como no movimento de

    deslizamento o sentido da fora de atrito o de contrariar o movimento da esfera, o seu sentido apontaria

    na direco contrria ao do movimento, ou seja, para cima. Como o momento desta fora (

    ), no nulo, visto que a linha de aco desta fora no passa pelo centro de rotao da esfera, far com

    que a esfera role no sentido dos ponteiros do relgio, deslocando-se simultaneamente o seu centro de

    massa no sentido descendente.

    Se o movimento for de rolamento puro, isto , sem deslizamento, a fora de atrito realiza trabalho

    nulo pois quando o ponto de aplicao de se move, esta fora passa a estar aplicada noutro ponto.

    Como no h deslocamento do ponto de aplicao da fora de atrito sem que ela deixe de estar aplicada

    nesse ponto. Como resultado, a fora de atrito no realizar trabalho.

    Recorrendo ao enunciado do princpio da conservao da energia podemos escrever a seguinte

    equao matemtica:

    visto que no h trocas de calor nem de radiao entre o sistema e o seu exterior, ento ,

    e como se pode considerar a variao da energia cintica interna e da energia potencial interna

    praticamente nula, s haver alterao da velocidade do centro de massa, , e alterao da velocidade

    angular , pelo que a equao (1.2) pode escrever-se da seguinte forma:

    Hi

    Hf

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 3 de 11

    (1.3)

    (1.4)

    (1.5)

    (1.6)

    (1.7)

    (1.8)

    como s o peso do corpo que realiza trabalho e este dado por (1.1), teremos:

    ento

    2.1. Determinao da Energia Mecnica da esfera

    A energia mecnica em cada instante a soma da energia cintica do corpo com a sua energia

    potencial associada ao eventual campo de foras conservativas.

    2.1.1. Determinao da energia mecnica da esfera inicial.

    No inicio do movimento, a esfera ser sempre abandonada sem velocidade, pelo que a sua

    energia mecnica inicial ser dada por:

    Emecnica = Ecintica + Epotencial

    como

    Ecintica = 0 J

    pelo que

    Emecnica = Epotencial =

    Para o clculo da HinicialCM faremos o seguinte de acordo como o esquematizado na figura 1:

    onde a inclinao do plano.

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 4 de 11

    (1.9)

    (1.10)

    2.1.2. Determinao da energia mecnica final.

    Para o clculo da energia mecnica no ponto escolhido para o fim do plano inclinado, a

    prpria energia cintica do corpo neste ponto, pelo que,

    Emecnica = Ecintica =

    sabendo que

    e que

    , podemos reduzir a equao anterior seguinte:

    Emecnica =

    3. Trabalho Laboratorial

    3.1. Material

    Calha metlica, clula fotoelctrica, CBL2, mquina de calcular grfica com o programa EasyData

    2.00, esfera rgida, aparelho que possibilite a medio da inclinao da calha, fita mtrica, craveira,

    balana digital.

    Nesta actividade experimental utilizmos uma esfera rgida de massa 0,01632 kg e de

    dimetro 0,0155 m. O comprimento da calha (x) m. O ngulo foi

    medido com o auxlio de um transferidor acoplado ao plano que contm a calha e de um fio-de-prumo.

    3.2. Esquema do trabalho laboratorial

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 5 de 11

    Figura 2.

    3.3. Procedimento do trabalho laboratorial

    1- Faa a montagem esquematizada na figura 2.

    2- Mea o dimetro e a massa da esfera.

    3- Coloque uma clula fotoelctrica na posio B. Ligue a clula fotoelctrica mquina de calcular

    grfica no modo de funcionamento adequado, para medir o intervalo de tempo de passagem da

    esfera.

    Procedimento para a ligao (TI 84 Plus Silver Edition)

    3.1. Carregue no boto APPS

    B

    x

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 6 de 11

    3.2. Desloque para baixo atravs do cursor existente na mquina at encontrar a aplicao

    EasyData 2.00 seleccionando-a.

    3.3. Aps a seleco da aplicao anterior, seleccione o setup para que possa escolher o sensor

    pretendido. Neste caso, seleccione a posio trs do visor como se mostra nos esquemas

    seguintes.

    a. b.

    3.4. Em seguida, escolha o comprimento do objecto a medir e carregue OK como se mostra na

    figura.

    3.5. Aps os passos anteriores carregue no iniciar e aps o sinal sonoro que o aparelho emite

    comece o trabalho experimental.

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 7 de 11

    4- Defina uma distncia entre a posio A e B como indicado na figura.

    5- Retire a clula fotoelctrica do suporte universal e para a respectiva posio B, fixe-a calha

    recorrendo, por exemplo a fita-cola.

    6- Abandone a esfera da posio A e registe o valor do intervalo de tempo de passagem da esfera na

    posio B. Repita este procedimento pelo menos quatro vezes.

    7- Repita o procedimento 5 e 6 para cada inclinao.

    4- Resultados

    Aps a concluso da actividade experimental e depois de seleccionar a opo sair, ir

    aparecer no visor da mquina a seguinte informao:

    A informao contida da experincia encontra-se nas listas L1 (nmero de ensaios realizados), L6

    (intervalos de tempo para cada ensaio) e L7 (velocidade em m/s).

    Para visualizar as listas carregue no menu STAT e ir aparecer o seguinte ecr:

    Seleccione a opo 1 para poder visualizar as respectivas listas e os respectivos valores.

    Percorra as listas com o cursor da calculadora e encontrar na lista L1, nmero de ensaios

    realizados; L7, velocidade (m/s) de cada ensaio e na lista L6, o respectivo tempo.

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 8 de 11

    Aps a consulta das listas, atravs da aplicao TI Connect, transfira as listas para o seu

    computador para poder trabalhar com maior facilidade. No nosso trabalho utilizamos o programa

    Microsoft Office Excell.

    Resultados obtidos

    4,0 8,0 12,0 16,0 20,0 24,0 28,0 32,0 36,0 40,0 44,0 48,0 52,0 56,0

    0,0262 0,0176 0,0144 0,0125 0,0112 0,0102 0,0096 0,0088 0,0085 0,0079 0,0071 0,0069 0,0067 0,0064

    0,5925 0,8828 1,0783 1,2427 1,3873 1,5188 1,6211 1,7634 1,8267 1,9653 2,1703 2,2328 2,3168 2,4367

    Tabela 1. Velocidade do centro de massa da esfera passagem no ponto B e o respectivo

    melhor intervalo de tempo para cada inclinao.

    4,0 8,0 12,0 16,0 20,0 24,0 28,0 32,0 36,0 40,0 44,0 48,0 52,0 56,0

    0,0045 0,0089 0,0133 0,0177 0,0220 0,0262 0,0300 0,0347 0,0383 0,0432 0,0444 0,0475 0,0503 0,0529

    0,0040 0,0089 0,0133 0,0176 0,0220 0,0263 0,0300 0,0355 0,0380 0,0439 0,0537 0,0568 0,0611 0,0676

    Tabela 2. Energia mecnica inicial e final para cada inclinao.

    Para interpretar os resultados finais, tracemos um grfico de energia mecnica final em

    funo da mecnica inicial. Para tal, depois dos dados tratados, inserimos na calculadora desde a

    lista 1 at lista 6 os seguintes dados:

    L1 nmero de ensaios

    L2 ngulo

    L3 tempo mdio

    L4 velocidade do centro de massa

    L5 Energia mecnica inicial

    L6 Energia mecnica final

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 9 de 11

    Figuras exemplificativas das listas.

    Em seguida, atravs da operao 2ND STAT PLOT, definimos para o eixo dos x, a lista L5

    e para o eixo dos Y a lista L6. Escolhemos um grfico de pontos e mandmos traar o respectivo

    grfico.

    Grfico 1- Energia mecnica final em funo da energia mecnica inicial.

    5- Anlise dos resultados obtidos

    Da anlise do grfico 1, verificamos que a partir de um determinado ngulo (34) no existe

    conservao da energia mecnica.

    Representando um novo grfico, e traando sobre os mesmos pontos uma recta em que a

    condio Emf =Emi, verifica-se claramente que os ltimos quatro pontos no se ajustam respectiva

    recta, porquanto resultam de erros sistemticos cometidos por ns aquando da realizao da actividade

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 10 de 11

    experimental, pois como bvio, de acordo com a actividade experimental realizada, a energia

    mecnica final nunca poderia ser superior energia mecnica inicial.

    Grfico 2 - Energia mecnica final em funo da energia mecnica inicial e uma recta que

    representa a funo ideal Emf =Emi.

    Considerando apenas os primeiros nove valores, e representando sobre estes uma recta Emf =

    a Emi + b, obtemos o seguinte grfico:

    Grfico 3 - Energia mecnica final em funo da energia mecnica inicial e uma recta que

    representa a funo Emf = aEmi + b.

  • CONSERVAO DA ENERGIA MECNICA DE UMA ESFERA AO LONGO DE UM PLANO INCLINADO

    Pgina 11 de 11

    A respectiva funo Emf = 1,019 Emi - 3,836 x 10-4

    com R = 0,999, pelo que se verifica

    que o declive de aproximadamente 1 e o ponto de interseco na origem aproximadamente 0.

    Como tal podemos concluir que a energia mecnica se conserva para estas inclinaes.

    6- Concluses

    Como resultado desta actividade experimental verifica-se que, se no existe conservao da

    energia mecnica, isso no se deve fora de atrito, pois a mesma no realiza trabalho enquanto a

    esfera rolar. Verificamos tambm que, para inclinaes pequenas inferiores a 8 e para inclinaes

    superiores a 36, a nossa actividade experimental no adequada. No primeiro caso, provavelmente, a

    componente do peso na direco do movimento (pequena nestes casos) foi afectada pela resistncia ao

    rolamento. No segundo caso (maiores inclinaes), o resultado obtido foi exactamente o oposto do

    previsto, porquanto a esfera alm de rolar tambm comeava a deslizar, pelo que os resultados obtidos

    para a energia mecnica final deveriam ser inferiores aos da energia mecnica inicial. Uma explicao

    para os resultados por ns obtidos neste caso ser a passagem pela esfera na clula fotoelctrica com

    um dimetro inferior ao real em consequncia da elevada inclinao da calha, pelo que obtivemos

    tempos inferiores aos reais e, consequentemente, energias mecnicas finais superiores. Relativamente

    aos dados por ns validados, o objectivo de alcanar uma recta que se ajustasse aos pontos com um

    declive prximo de 1 e que passasse prxima da origem foi alcanado.

    7- Bibliografia

    1- Silva, Wilton Pereira da, Revista Brasileira de Ensino de Fsica, Vol. 25, no. 4, Dezembro, 2003.

    2- Almeida, Maria Jos B. Marques de, Preparao de Professores de Fsica Uma contribuio

    cientfico-pedaggica e didctica, Livraria Almedina Coimbra (2004).

    3- Almeida, Maria Jos B. Marques de, Fundamentos de Fsica, Livraria Almedina Coimbra

    (1993).