conexões entre curvas e integrais elípticas

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Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas Jones Colombo Universidade Federal Fluminense 4 o Colóquio da Região Centro-Oeste Novembro de 2015

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Page 1: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Jones Colombo

Universidade Federal Fluminense

4o Colóquio da Região Centro-Oeste

Novembro de 2015

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Sumário

Introdução 1

1 Geometria das Curvas Cúbicas 31.1 Adição Sobre Curvas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31.2 Curvas no Plano Projetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61.3 Tangentes e Pontos de Inflexão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121.4 Formas Normais de Cúbicas Não Singulares . . . . . . . . . . . . . . . . 151.5 Cúbicas Singulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171.6 Cúbicas Não Singulares Não Admitem Parametrização Racional . . . . . 191.7 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

2 Funções Elípticas 212.1 Estrutura Topológica de uma Cúbica não Singular em CP2 . . . . . . . . 212.2 Propriedades Gerais das Funções Elípticas . . . . . . . . . . . . . . . . . 232.3 A Função de Weierstrass . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 272.4 Uma Equação Diferencial para a Função de Weierstrass . . . . . . . . . . 292.5 Parametrização da Cúbica com a Ajuda da Função de Weiertrass . . . . 312.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

3 Arcos de Curvas e Integrais Elípticas 353.1 Um Pouco de História . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 353.2 Integrais Elípticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 373.3 Teoremas Aditivos para F(φ) e E(φ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 413.4 As Funções Elípticas de Jacobi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 433.5 Arcos de Elipses e Hipérboles . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 463.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

4 A Lemniscata e o Teorema de Mordell 494.1 História . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 494.2 O Método das Secantes de Diofanto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 514.3 Exemplos e Teorema de Mordell . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

Referências Bibliográficas 59

iii

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Introdução

A maioria dos matemáticos sabem que existe uma conexão entre as curvas elípticase as integrais elípticas e que as mesmas medem o comprimento de arco de uma elipse,mas poucos sabe explicar como é esta conexão. O objetivo destas notas é evidenciaresta conexão.

As principais características destas notas é de darem uma abordagem elementar ede terem uma visão histórica dos assuntos. Devido a abordagem histórica introduzo aLemniscata, pois foi exatamente para tratar de problemas em cima desta curva que boaparte da teoria se desenvolveu. O que surgiu depois deste esforço de grandes nomesda matemática é uma teoria profunda e de inúmeras aplicações. Como aplicaçõespodemos citar: pêndulo simples, pêndulo esférico, órbita planetária relativística,movimento de um pião ou de um Giroscópio, Equações de movimento de Euler,Fluxo da corrente em um placa condutora retangular, movimento de Projétil sujeitoà resistência proporcional a ao cubo de sua velocidade, entre outros.

Um fato interessante, é que apesar das inúmeras aplicações pouco se houvefalar das funções elípticas nos cursos de graduação. Parece que as aplicações destetópico ficaram na lacuna - por um lado os físicos e engenheiros não tem formaçãomatemática para levar a cabo estas aplicações, por outro lado, os matemáticos nãoestão interessados em aplicações.

Em matemática, partes desta teoria são consideradas como o ponta pé inicial.Exemplo de áreas de pesquisa que aparecem partes desta teoria são: GeometriaAlgébrica (Curvas Elípticas), Formas Modulares (Grupo Modular) e GeometriaHiperbólica (Variedades de Dimensão Baixa), Teoria Analítica dos Números (FunçãoZeta).

Espero que estas notas seja o ponta pé inicial para a sua formação neste assunto.

1

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2 Introdução

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Capítulo 1

Geometria das Curvas Cúbicas

Neste capítulo vamos tratar do problema de somar pontos racionais sobre curvas,em particular, sobre as Cúbicas. Introduzir os espaço projetivo - local natural para oestudo das cúbicas. Estudo das tangentes e dos pontos de inflexão de uma cúbica,formas normais de cúbicas não singular uma rápida descrição das cúbicas singulares econcluir com a exposição que as cúbicas não singulares admitem uma parametrizaçãoracional.

1.1 Adição Sobre Curvas

Vamos iniciar falando sobre o bonito e instigante problema de somar pontos sobrecurvas de grau 2 e 3.

Uma curva algébrica plana é o conjunto de pontos (x, y) ∈ R que satisfazem aequação f (x, y) = 0, onde f (x, y) é um polinômio não nulo em duas variáveis.

Existe uma forma de adicionar pontos sobre determinadas curvas algébricas planas.Por exemplo: Considere a circunferência unitátria x2 + y2 = 1. Fixe, por conveniência,o ponto E por ser (1, 0). Sejam A e B dois pontos arbitrários sobre a circunferência.Considere a reta determinada pelos pontos A e B, vamos denotá-la por AB. Considerea reta paralela a AB passando por E, esta reta necessariamente irá passar pelacircunferência em mais um ponto, que denotamos por A + B. No caso em que A = B,considere a reta tangente à circunferência no ponto A.

Devido a escolha de E = (1, 0) é possível verificar que se A = (cos α, sen α) eB = (cos β, sen β) então

A + B = (cos(α + β), sen(α + β)) .

Este exemplo se estende para quaisquer cônicas (isto é, polinômios de grau 2). Alémdisso, esta operação torna este conjunto um grupo comutativo.

Exemplo 1.1 a) Para a parábola y = x2 com o ponto fixo E = (0, 0), então a soma deA = (x1, y1) e B = (x2, y2) é o ponto A + B = (x1 + x2, y1 + y2 + 2x1x2).

b) Para a hipérbole x2 − y2 = 1 com o ponto fixo E = (1, 0), então a soma de A = (x1, y1)e B = (x2, y2) é o ponto A + B = (x1x2 + y1y2, y1x2 + y2x1).

Uma Cúbica é uma curva algébrica plana ∑i,j aijxiyj = 0, onde i + j ≤ 3. Sobrequalquer cúbica não singular, existe uma lei natural para adicionar pontos (nós vamosdiscutir os detalhes a respeito das cúbica não singular na seção 1.3).

3

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4 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

Figura 1.1: Definição de Soma

Sobre uma Cúbica, fixe um ponto E (Ele deverá fazer o papel do elemento neutro dogrupo). Considere dois pontos A e B, e desenhe a reta AB. Esta reta deve intersectar acúbica no ponto X. O ponto de interseção da reta XE com a cúbica, deve ser denotadopor A + B.

A definição de soma usou a seguinte propriedade duas vezes: Se uma linha retaintersecta uma cúbica em dois pontos, então ela deve intersectar a cúbica em precisamente maisum ponto.

Esta propriedade é a princípio óbvia. De fato, considere a equação da retaax + by + c = 0, isole x ou y e substitua seu valor na equação da cúbica. O que nosfornece uma equação de terceiro grau. Por hipótese, duas de suas raízes são Reais,portanto, deve existir uma terceira raiz Real.

Na realidade não é tão simples, e o problema não é só que um polinômio pode tertrês raízes repetidas. Pode, também, acontecer que o grau do polinômio seja menorque 3. Nesta situação a soma não será possível de definir, vamos tratar desta situaçãomais para frente.

Com respeito as propriedades desta operação: ela é claramente comutativa. E éfácil de verificar que E faz o papel de elemento neutro. A igualdade: (A + B) + C =A + (B + C) é equivalente ao fato que a interseção de pontos de retas que conectamA + B com C e B + C com A estarem sobre a cúbica.

Denote as retas descritas na figura 1.2. como se segue

p1 = AB, p2 = E(B + C), p3 = C(A + B),q1 = BC, q2 = E(A + B), q3 = A(B + C).

Admita que todas os pontos de interceções das retas pi e qj são dois a dois distintos.Então esta afirmação pode ser demonstrada na seguinte formulação.

Teorema 1.2 Seja Aij os pontos de interseção das retas pi e qj, com 1 ≤ i, j ≤ 3 e os pontosAij dois a dois distintos. Suponha que é conhecido que todos os pontos Aij, exceto talvez, A33,estejam sobre a cúbica. Então, A33 também deve estar sobre esta cúbica.

Demonstração: Sejam pi(x, y) = 0 e qj(x, y) = 0 as equações das retas pi e qj. Então,p1p2p3 = 0 é uma equação de grau 3 determinada pela três retas p1, p2 e p3 e a equação

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1.1: Adição Sobre Curvas 5

Figura 1.2: Esquema para a notação

q1q2q3 = 0 é determinada pelas retas q1, q2 e q3. A cúbica αp1p2p3 + βq1q2q3 = 0 passaatravés de todos os pontos Aij.

Acontece que podemos representar desta forma qualquer equação cúbica passandopor 8 ou 9 pontos Aij. Vamos provar isso.

Figura 1.3: Esquema da demonstração

Escolha as retas p1 e q1 como sendo os eixos coordenados, isto é, assuma quep1(x, y) = y e que q1(x, y) = x. Considere uma cúbica determinada pela equaçãoP(x, y) = 0. As funções P(0, y) e yp2(0, y)p3(0, y) se anula nos três pontos A11,A21 e A31 sobre o eixo y. Além disso, estas funções são polinômios de grau menorou igual a 3. Portanto, P(0, y) = αyp2(0, y)p3(0, y). De maneira similar, P(x, 0) =βxq2(x, 0)q3(x, 0). Considere então o polinômio

Q(x, y) = P(x, y)− (αyp2(x, y)p3(x, y) + βxq2(x, y)q3(x, y)) .

Claramente,Q(0, y) = P(0, y)− αyp2(0, y)p3(0, y) = 0

O polinômio a0(y) + a1(y)x2 + · · · é identicamente nulo quando x = 0 se, e só se, a0(y)é identicamente igual a zero, isto é, se este polinômio é divisível por x.

De maneira similar, mostramos que Q(x, y) também deve ser divisível por y, istoé, Q(x, y) = xyQ1(x, y). O grau de Q(x, y) não excede a 3, então, Q1(x, y) ou é

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6 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

linear ou é uma constante. Recordemos que os polinômios P(x, y), p2(x, y)p3(x, y) eq2(x, y)q3(x, y) se anulam nos pontos A22, A23 e A32, e portanto, o polinômio Q(x, y)também se anula nestes pontos. Desde que xy = 0, então o polinômio Q1(x, y) devese anular também neles. Os pontos A22, A23 e A32 não estão sobre uma reta. Parauma função não nula que é no máximo linear se anula nestes pontos. Então só podeser uma função nula. Portanto, Q1(x, y) = 0, isto é, P(x, y) = αyp2(x, y)p3(x, y) +βxq2(x, y)q3(x, y).

Em particular, o ponto A33 esta sobre a curva P(x, y) = 0. E acabamos de provarque toda cúbica passando por todos os pontos Aij é dada pela equação

αyp2(x, y)p3(x, y) + βxq2(x, y)q3(x, y) = 0.

O teorema esta demonstrado e junto com ele, a prova da associatividade da somasobre cúbicas está estabelecido.

De forma semelhante ao que fazemos nos cursos de Geometria Analítica aoconsiderar uma equação quadrática da forma

A20x2 + A11xy + A02y2 + A10x + A01y + A00 = 0,

podemos classificar, se permitirmos apenas movimentos rígidos, isto é, mudança decoordenadas que preservam comprimento e ângulo e translações, estas equações emtrês famílias, fora as degeneradas. As famílias são:

x2

a2 +y2

b2 = 1 as elipses;y = px2 as parábolas;

x2

a2 −y2

b2 = 1 as hipérboles.

Gostaríamos de repetir o feito e classificar as equações cúbicas, isto é, classificar asequações do tipo:

A30x3 + A21x2y + A12xy2 + A03y3 + A20x2 + A11xy + A02y2 + A10x + A01y + A00 = 0.

Ocorre que para levar a cabo tal classificação é melhor considerar um ambientemais propício. Apesar de ser possível fazer uma classificação no plano euclideano,neste ambiente a quantidade de famílias é maior, além de que esta classificação nãonos fornece nenhum insight de algum propriedade geral. O local que acreditamos sermais adequado para fazer tal classificação se chama plano projetivo.

1.2 Curvas no Plano Projetivo

Na seção anterior escrevemos que a soma de pontos sobre uma cúbica não estadefinida, geralmente, para todos os pontos. Vamos ilustrar esta situação. Considere acúbica

y2 = x(x − 1)(x − 2) (1)

Desenhamos ela na figura 1.4. Substituindo na equação a reta x = 12 temos y2 = 3

8 .O grau desta equação é 2 e não 3. Portanto, a reta x = 1

2 intersecta a equação 1 em só

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1.2: Curvas no Plano Projetivo 7

Figura 1.4: A cúbica e x = 12

dois pontos, e os pontos de intersecção tem multiplicidade 1. Desta forma não temoscomo levar a cabo a soma destes dois pontos.

O plano projetivo vem de considerações geométricas, que são conhecidas comogeometria projetiva. A geometria projetiva é o estudo das propriedades geométricasdas figuras que não são alteradas pela projeção. Antes de passarmos para um exemploconcreto, é preciso recordar que existem dois tipos de projeção:

• Projeção Central. Dado um ponto x e um plano P que tal que x não pertence aoplano P, definimos a função projeção central por considerar o segmento [xy] e

f (y) = [xy] ∩ P.

Para cada ponto y tal que o segmento [xy] não é paralelo ao plano P. f é chamadade projeção de x em P; x é o centro da projeção f .

• Projeção Paralela. Seja v um vetor não é paralelo a um plano P . Para cada pontoy, considere a linha L(y) passando por y que é paralela a v. Defina a funçãoprojeção pela fórmula.

g(y) = L(y) ∩ P.

g é chamado projeção em H paralela a v.

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8 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

Figura 1.5: Projeção Central Figura 1.6: Projeção Paralela

A projeção paralela pode ser visto como uma projeção central cujo o centro seencontra no infinito.

Quando trabalhamos com geometria projetiva imaginamos que o nosso artista temapenas um olho e ele esta na origem do sistema de coordenadas.

Figura 1.7: Projeção de uma cena no plano

Exemplo 1.3 Considere (x, y, z) coordenadas do R3 e as linhas retas

L1 = {x = 1 e z = 1}L2 = {x = −1 e z = 1}

Ambas contidas no plano P = {(x, y, z) : z = 1}, Vamos projetar L1 e L2 através da origemno plano de visualização P1 = {(x, y, z) : y = 1}. Os pontos (x, 1, z) ∈ P1 e (x′, y′, 1) ∈ P,estão em uma mesma linha radial se, e somente se,

(x′, y′, 1) = t(x, 1, z), para alguma escalar t.

Isto é equivalente a,x′ = tx, y′ = t, e 1 = tz.

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1.2: Curvas no Plano Projetivo 9

A terceira equação nos dá t = 1/z, usando isto temos

x′ =xz

e y′ =1z

(x′, y′, 1) esta sobre L1 se, e somente se, x′ = 1. Daí, (x, 1, z) esta na projeção de L1 se,e somente se, x/z = 1, logo x = z. De maneira similar, a equação da projeção em L2 éque x′ = x/z = −1, daí x = −z. O horizonte de P é a interseção do plano com o planoz = 0, o qual é paralelo a P. A projeção L1 e L2 encontra-se em um ponto em comum,(x, y, z) = (0, 1, 0), que esta no horizonte de P1. Portanto, duas retas paralelas se encontramno infinito

Um desenho em perspectiva é criado por intersectar a projeção da cena com umplano, este plano que chamamos de plano de visualização é equivalente às cavas deum artista.

Exemplo 1.4 Considere a parábola

Q1 =

{(x, y, z) : y = 1 +

x2

4e z = 1

}.

Assim como fizemos no exemplo anterior vamos entender como esta parábola é projetadano plano de visualização P1 = {(x, y, z) : y = 1}. Das igualdades já deduzidas obtemos1/z = 1 + 1/4(x/z)2. Multiplicando por z2 e completando quadrado obtemos

4(z − 12)2 + x2 = 1

Que é uma elipse centrada em (0, 1, 12), com eixo menor igual a 1 paralelo ao eixo x e o maior

igual 2 e paralelo ao eixo z. Observe que a elipse é tangente ao horizonte no ponto (0, 1, 0).

Page 14: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

10 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

Então se imaginarmos que o nosso olho esta na origem do sistema, e os pontos quevemos se encontram no plano z = 1, os pontos que se encontram no infinito acontecemquando a coordenadas de z → 0

Figura 1.8: Pontos no Infinito ou Pontos ideais

Em geral, a regra é que qualquer figura que se estende para o infinito deveráadquirir um ponto "no infinito” extra quando projetada.

A partir destes exemplos vamos introduzir o conceito de espaço projetivo.

Definição 1.5 Considere o R3 − {0} e a seguinte relação de equivalência, dizemos que u ≡ vse existe t ∈ R tal que

u = tv. aqui como vetores do R3

O conjunto R3 com esta relação de equivalência é o que chamamos de plano projetivo e odenotamos por RP2.

Para não haver confusão entre os vetores de R3 e os pontos de RP2 vamos usara notação (x : y : z), para denotar os pontos do plano projetivo. Fica claro que se(x : y : z) e 0 = α ∈ R, então, (αx : αy : αz) representam o mesmo ponto projetivo.

Page 15: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

1.2: Curvas no Plano Projetivo 11

Seja (x : y : z) ∈ RP2, como vinhamos discutindo os pontos que tem coordenadasz = 0 podem ser associados aos pontos do R2, por isso dizemos que estes pontossão afins. Quando a coordenada z = 0 dizemos que são pontos ideais ou no infinito.Observe que para cada direção no plano z = 0 temos uma ponto ideal, por outro lado,os pontos (1 : 1 : 0) e (−1 : −1 : 0) são iguais do ponto de vista projetivo. Apesar destadenominação a escolha de z = 0 para ser o local do espaço afim é aleatória, isto é claroquando analisamos os exemplos, pois mudamos o plano de visualização para y = 1.

Na definição de plano projetivo x, y, z e t podem assumir valores complexos.Desta forma podemos definir o plano projetivo complexo, CP2. A geometria das curvasprojetivas complexas é mais simples que em RP2. Isto ocorre pelo fato de que cadapolinômio de grau n em C admite exatamente n raízes (contando multiplicidade).

Para a curvay2 = x(x − 1)(x − 2)

podemos associar a curvay2z = x(x − z)(x − 2z) (2)

sobre o plano projetivo. De fato, a equação 2 define uma curva no plano projetivoporque os pontos (x : y : z) e (αx : αy : αz) satisfazem ou não satisfazem aequação 2 simultaneamente. Além disso, no plano P = {(x, y, z) : z = 1} equação 1e 2 coincidem.

Em geral, para qualquer curva algébrica plana ∑ij aijxiyj = 0 podemos associar acurva

∑ij

aijxiyjzn−i−j = 0, onde n = max {i + j}

no plano projetivo. Agora vamos verificar que a reta x = 12 z e a curva projetiva

y2z = x(x − z)(x − 2z) se encontram em um ponto no infinito na direção do eixo y.substituíndo x = z

2 na equação obtemos y2z = 3z3

8 . Esta nova equação tem três tiposde soluções: (1) z = 0 e y arbitrário; (2) y = kz e (3) y = −kz, onde k =

√3/8 e z é

arbitrário. Em outras palavras, cada família de soluções corresponde a um ponto deCP2.

Portanto, a reta projetiva x = z2 intersecta a curva em 3 pontos: (1

2 :√

38 : 1),

(12 : −

√38 : 1) e (0 : 1 : 0). O terceiro ponto é um ponto no infinito na direção do eixo

y, como havíamos comentado.A passagem para o plano projetivo é proveitosa não somente no caso acima. Deixe

mostrar, por exemplo, que qualquer reta do plano projetivo ou esta inteiramentecontida na cúbica ou se intercepta com ela (contando multiplicidades) em precisamentetrês pontos em CP2; já em RP2 se intercepta com a cúbica uma ou três vezes.

Queremos encontrar os pontos de interseção da reta projetiva ax + by + cz = 0com a cúbica ∑i+j+k=3 aijxiyjzk = 0 no plano projetivo. Pelo menos um dos númerosa, b ou c é não nulo. Digamos que c = 0, então z = αx + βy, onde α = − a

c eβ = − b

c (o caso de α = β = 0 não esta excluído). Inserindo isto na expressão obtemosQ(x, y) = ∑ bpxpy3−p = 0. Podem ocorrer as seguintes situações:(1) Todos os coeficientes bp são nulos. Então ax + by + cz = 0 esta inteiramente contidana cúbica, isto é, Q é divisível por ax + by + cz.

Page 16: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

12 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

(2) Nem todos os coeficientes bp são nulos. Então

Q(x, y) = bxrys(x − t1y) · · · (x − tmy)

onde r + s + m = 3. O fator xr corresponde aos pontos (0 : 1 : β′) com multiplicidader; o fator ys corresponde aos pontos (1 : 0 : β′) com multiplicidade s; o fator (x − tiy)corresponde aos pontos (ti : 1 : α′ti + β′).

Uma cúbica Q com coeficiente Reais pode ter três ou uma raiz. Portanto, qualquerreta projetiva deve interceptar uma cúbica em três ou apenas uma vez (contandomultiplicidade). Portanto, esclarecemos como somamos pontos que não coincidemsobre uma cúbica.

Agora só temos dificuldades em tratar pontos com auto-interseção ou pontos decúspides. O problema é que qualquer reta passando através de tais pontos teminterseções múltiplas. Portanto, ao somar tais pontos com outros nunca obtemos novospontos. Vamos discutir esta situação na seção 1.5.

1.3 Tangentes e Pontos de Inflexão

Para somarmos os pontos A e B precisamos traçar a reta AB. O que acontecequando os pontos A e B são iguais? Fixemos o ponto A e deixemos o ponto B soltosobre a cúbica na vizinhança de A. Sobre certas condições (A não pode ser um pontosingular), a reta AB tende para a reta tangente à curva em A. Portanto, para realizarA + A precisamos traçar a reta tangente à cúbica em A.

Se a curva passando pelos pontos A e B é dada pela equação F = 0, então a restriçãode F a reta AB tem raízes nos pontos A e B. Na posição limite, quando B coincidir comA, a restrição de F em A tem raízes múltiplas. Portanto, a restrição de F para a tangentetem múltiplas raízes no ponto de tangência. Esta propriedade pode ser utilizada paraobtermos a equação da reta tangente.

Considere um ponto P = (p1 : p2 : p3) pertencente a curva F = 0, isto é, F(P) = 0,e seja X = (x1 : x2 : x3) um ponto arbitrário. Os pontos da reta projetiva PX são daforma λP + µX. Os pontos desta reta distintos de X são da forma P + tX. Considere arestrição de F a esta reta com função de t. No caso em que F é um polinômio de grau 3temos:

F(P + tX) = F(P) + at + bt2 + ct3 = Q(t),

onde F(P) = 0, a = ∑ Fi(P)xi e b = 12 ∑ Fijxixj (onde Fi é a derivada parcial de F com

respeito a i-ésima variável). O ponto P corresponde a t = 0. O polinômio Q(t) temmúltiplas raízes se a = 0, isto é, ∑ Fi(P)xi = 0.

Um ponto P para o qual pelo menos um dos números Fi(P) é não nulo é chamadode ponto não singular de F. Para pontos P não singulares a equação ∑ Fi(P)xi = 0determina uma reta tangente ℓ a curva F em P.

É preciso verificar que a definição de reta tangente e de ponto não singular nãodependem de uma mudança de coordenadas.

Para passar das coordenadas projetivas (x1 : x2 : x3) para as cartesianas (x1, x2)basta colocar x3 = 1. Assuma que p3 = 1. Para satisfazer a condição x3 = 1 um pontoP da reta, podemos expressar o ponto da reta PX na forma P + t(X − P). Na expressão

F(P + t(X − P)) = ∑ Fi(P)(xi − pi)t + · · ·

Page 17: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

1.3: Tangentes e Pontos de Inflexão 13

nos permite expressar a equação da reta tangente na forma

F1(P)x1 + F2(P)x2 = F1(P)p1 + F2(P)p2.

Em coordenadas projetivas, isto é, para funções homogêneas F, a expressão∑ Fi(P)pi é igual a zero. De fato, qualquer polinômio homogêneo F de grau n satisfaza fórmula de Euler

∑ Fi(P)xi = nF(X).

Considere o monômio M = xp11 xp2

2 xp33 , onde p1 + p2 + p3 = n. Claramente, para todo

pi inteiro não negativo temos xi∂i(M) = pi M.Considere P um ponto não singular de uma curva F = 0. Então a reta tangente

ℓ no ponto P esta definida. A restrição de F a ℓ tem múltiplas raízes em P. Se amultiplicidade desta raiz não é inferior a 3, então P é um ponto de inflexão. Em outraspalavras, a condição a = ∑ Fi(P)xi = 0 deve implicar que b = 1

2 ∑ Fij(P)xixj = 0, istoé, a forma quadrática ∑ Fij(P)xixj = 0 deve conter a reta ∑ Fi(P)xi = 0.

Recorde que o polinômio de segunda ordem xt Ax (xt expressa a transposta de x, eesta é a forma matricial deste polinômio) é divisível pela função linear xtℓ se, e só se,xt Ax = xtℓmtx, para algum m. Isto significa que a matriz A = ℓmt. Em particular,det A = 0. Isto é, se P é um ponto de inflexão, então det

[Fij(P)

]= 0.

Vamos mostrar que a recíproca deste resultado também é verdadeiro, isto é, se P éum ponto não singular e det

[Fij(P)

]= 0, então P é um ponto de inflexão. Considere a

forma quadrática ∑ Fij(P)xixj = 0. Então, pela fórmula de Euler

∑ Fij(P)pi pj = 2 ∑ Fj(P)pj = 6F(P) = 0

Portanto, P pertence a curva, e a reta ∑i Fi(P)xi = 0 é tangente a esta quadrática em P.De fato, a equação da tangente da quadrática ∑ Fij(P)xixj = 0 no ponto P tem a forma

∑ Fij(P)xi pj = 0

e novamente pela fórmula de Euler ∑i,j Fij(P)xi pj = 2 ∑i Fi(P)xi. Ainda não usamosque a forma quadrática é degenerada, de qualquer forma a tangente à curva em P éao mesmo tempo tangente à forma quadrática ∑ Fij(P)xixj = 0. Mas no caso que estaquadrática consiste de um par de retas elas estão contidas inteiramente na tangente.

Resumindo: o conjunto de pontos de interseção da curva F = 0 e H = 0, ondeH = det

[Fij(X)

], contém todos os pontos de inflexão da curva F = 0. A curva H = 0

é chamada de curva de Hesse ou Henssiana da curva F = 0. Se F é um polinômiohomogêneo de grau n então Fij é um polinômio homogêneo de grau n − 2. Portanto,H é um polinômio homogêneo de grau 3(n − 2). Quando F = 0 é uma cúbica então aHenssiana é também uma cúbica.

A invariânça dos conceitos de ponto de inflexão e de Henssiana para mudança decoordenadas se prova de maneira semelhante que se faz para provar a invariânça datangente.

A procura por pontos de inflexão de uma curva se reduz a procurar os pontos deinterseção da curva com a sua curva de Hesse. Então, temos que encontrar os pontosde interseção de duas curvas. Já fizemos isso, quando uma das curvas era uma reta.No caso da reta, a sua equação permite expressar uma das variáveis em termos das

Page 18: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

14 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

outras e substituindo esta variável na expressão da curva permite que esta variável sejaexcluída. Para curvas de grau arbitrário também podemos excluir uma das variáveis,mas isto não é tão fácil de ser feito.

Inicialmente vamos considerar curvas cartesianas (x, y). Por simplicidade, vamosanalisar a situação para curvas de grau 3, mas o resultado vale em geral. É possívelexpressar o polinômios de grau F(x, y) e H(x, y) da seguinte forma

F(x, y) = a0(x)y3 + a1(x)y2 + a2(x)y + a3(x),

H(x, y) = b0(x)y3 + b1(x)y2 + b2(x)y + b3(x),

onde ak(x) e bk(x) são polinômios de grau k, 0 ≤ k ≤ 3. Se (x0, y0) é um pontoem comum às curvas F(x, y) = 0 e H(x, y) = 0, então os polinômios f (y) =a0y3 + a1y2 + a2y + a3 e h(y) = b0y3 + b1y2 + b2y + b3, onde ak = ak(x) e bk = bk(x),têm y0 como raiz em comum; a recíproca também é verdadeira: se os polinômios temuma raiz em comum y0, então F(x, y) = 0 e H(x, y) = 0 tem (x0, y0) em comum.

Sobre C, dois polinômios tem uma raiz em comum se, e só se, eles tem um fatornão constante em comum (sobre R dois polinômios podem ter um fator em comumsem que tenham uma raiz em comum). Se a0b0 = 0, então os polinômios f (y) e h(y)tem um fator em comum, se e somente se, existem h1 e f1 tais que f h1 = h f1, onde ograu de h1 e de f1 são menores que H(x, y) e F(x, y), respectivamente.

De fato, se f e h tem um divisor d em comum, então podemos fazer f1 = f d−1 eh1 = hd−1. Se f h1 = h f1 e deg f1 < deg f , então todos os fatores primos de f deverãoocorrer na fatoração de h f1; além disso, eles tem o mesmo grau. Por outro lado, nemtodos eles deverão ocorrer na fatoração de f1.

A restrição a0b0 = 0 é incomoda, mas como podemos fazer mudança decoordenadas é fácil satisfazê-la.

Considere h1(y) = u0y2 + u1y + u2 e f1 = v0y2 + v1y + v2. A igualdade f h1 = h f1pode ser expressa na forma

a0u0 −b0v0 = 0a1u0 +a0u1 −b1v0 −b0v1 = 0a2u0 +a1u1 +a0u2 −b2v0 −b1v1 −b0v2 = 0a3u0 +a2u1 +a1u2 −b3v0 −b2v1 −b1v2 = 0

+a3u1 +a2u2 −b3v1 −b2v2 = 0+a3u2 −b2v2 = 0.

Esse sistema de equações lineares homogêneas com respeito a u e v tem solução nãonula se, e só se, este determinante se anula, isto é,

det

a0 a1 a2 a3

a0 a1 a2 a3a0 a1 a2 a3

b0 b1 b2 b3b0 b1 b2 b3

b0 b1 b2 b3

= 0.

Este determinante é chamado de resultante dos polinômios f e h. Os coeficientes ak ebk dependem de x e, portanto, o determinante acima é um polinômio R de x e talvez

Page 19: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

1.4: Formas Normais de Cúbicas Não Singulares 15

nulo. Para cada raiz x0 de R os polinômios F(x, y) = 0 e H(x, y) = 0 tem um ponto(x0, y0) em comum. Observe que no caso R o fato de existir x0 não necessariamenteimplica que exista y0 ∈ R. Se o polinômio R é nulo, então as curvas tem uma fator emcomum.

Vamos aplicar o resultante em F e H, para isto vamos expressar os polinômios F eH na forma

F(x, y, z) = a0(x, y)z3 + a1(x, y)z2 + a2(x, y)z + a3(x, y),

H(x, y, z) = b0(x, y)z3 + b1(x, y)z2 + b2(x, y)z + b3(x, y),

onde ak e bk são polinômios homogêneos de grau k, 0 ≤ k ≤ 3, é possível escolhercoordenadas apropriadas para as curvas F = 0 e H = 0 de tal forma que elas nãopassem pelo ponto (0 : 0 : 1). Então a condição a0b0 = 0 que necessitaremos ésatisfeita.

No caso projetivo o resultante é um polinômio em duas variáveis R(x, y). Vamosprovar que R ou é o polinômio nulo ou é um polinômio homogêneo de grau 9 (emgeral, se o grau das curvas são m e n, então o grau de R(x, y) é igual a mn). De fato,

R(λx, λy) = det

a0 λa1 λ2a2 λ3a3a0 λa1 λ2a2 λ3a3

a0 λa1 λ2a2 λ3a3b0 λb1 λ2b2 λ3b3

b0 λb1 λ2b2 λ3b3b0 λ2b1 λ2b2 λ3b3

.

Vamos multiplicar a segunda e quinta linhas por λ e terceira e sexta colunas por λ2.Como resultado, obtemos uma matriz em que a k-ésima coluna é multiplicada por λk.Portanto, λ6R(λx, λy) = λ15R(x, y), isto é, R(λx, λy) = λ9R(x, y).

O polinômio não nulo R(x, y) pode ser representado na forma ∏9i=1(yix − xiy),

onde xi e yi não se anulam simultaneamente. Para cada um dos nove pares (xi, yi)existe um zi tal que (xi, yi, zi) é a interseção das curvas F = 0 e H = 0. O polinômioR(x, y) pode ter raízes repetidas, isto é, certos pares (xi, yi) podem ser proporcionais.Portanto, nem todos os pares de cúbicas tem os nove pontos em comum distintos. Masem CP2 cada duas cúbicas tem no mínimo um ponto em comum. Daí

qualquer cúbica não singular tem pelo menos um ponto de inflexão(nove pontos de inflexão, se contarmos multiplicidades).Isto é exatamente o que necessitaremos na próxima seção.

1.4 Formas Normais de Cúbicas Não Singulares

Uma curva cúbica é dita não singular se todos os seus pontos são não singulares.Nesta seção provaremos que sobre C as equações de uma cúbica não singular podemser reduzidas por mudanças lineares de coordenadas homogêneas para cada uma dasseguintes formas:(1) y2z = x3 + pxz2 + qz3 (forma de Weiertrass);(2) x3 + y3 + z3 = 3λxyz.

Page 20: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

16 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

No primeiro caso o polinômio x2 + px + q não pode ter raízes repetidas (se tivera curva é singular) e no segundo caso λ3 = 1 (de outra forma a curva consiste de 3linhas).

Considere uma curva cúbica ∑ aijxiyjz3−i−j = 0 não singular sobre C. Na seçãoanterior mostramos que ela tem uma ponto de inflexão. Podemos assumir que ascoordenadas do ponto de inflexão são (0 : 1 : 0) e a tangente deste ponto é dado pelaequação z = 0. Em outras palavras, a restrição da função F(x, y, z) = ∑ aijxiyjz3−i−j

para a reta z = 0 (isto é, o polinômio a30x3 + a21x2y + a12xy2 + a03y3) tem raiz x = 0de multiplicidade 3. Segue que a21 = a12 = a03 = 0 e a30 = 0, uma vez que a curvaconsiderada deve conter a reta z = 0. A tangente em (0 : 1 : 0) é dada pela equaçãopor

Fx(0, 1, 0)x + Fy(0, 1, 0)y + Fz(0, 1, 0)z = 0.

Daí, Fx(0, 1, 0) = Fy(0, 1, 0) = 0 mas Fz(0, 1, 0) = 0. Desde que de outra forma o ponto(0 : 1 : 0) deveria ser singular. O valor do polinômio homogêneo Fz(x, y, z) de grau 2em (0 : 1 : 0) é igual a a02 e podemos assumir que a02 = 1. Nas coordenadas cartesianas(não nas projetivas) a equação da curva assume a forma de

y2 − 2(ax + b)y + P3(x) = 0,

onde P3(x) é um polinômio de grau 3. Fazendo a mudança de coordenadas y1 =y − ax − b temos

y21 − (ax + b)2 + P3(x) = 0,

isto é, y21 = Q3(x), onde Q3(x) = (ax + b)2 − P3(x), e fazendo uma mudança de

coordenadas da forma x = λx1 + µ o polinômio Q3 se reduz a forma x31 + px1 + q.

O polinômio Q3 não tem raízes repetidas, do contrário a equação da curva poderiaser reduzida a forma y2 = x2(αx+ β) e tal curva tem a origem como um ponto singular.

Na seção anterior provamos que toda a cúbica tem 9 pontos de inflexão(multiplicidade contadas), mas não podemos determinar se todas ou nenhuma sãodistinta. Se a expressão da equação da cúbica não singular esta na forma y2 = Q3(x),então podemos encontrar os pontos de interseção da cúbica com a sua Henssiana emostrar que são todos distintos.

Teorema 1.6 A cúbica não singular y3 = Q3(x) em CP2 tem precisamente 9 distintos pontosde inflexão.

Demonstração: Podemos assumir que o polinômio Q3 tem a raiz x = 0, isto é, quea curva considerada é dado pela equação f = 0, onde f (x, y) = y2 − x3 − ax2 − bx.Como o polinômio Q3 não tem raízes repetidas, segue que b = 0 e a2 − 4b = 0. Paraobtermos a henssiana, passe para as coordenadas homogêneas F(x, y, z) = y2z − x3 −ax2z − bxz2. Então

H(x, y, z) = det

−6x − 2az 0 −2ax − 2bz0 2z 2y

−2ax − 2bz 2y −2bx

= 8

[(y2 + bxz)(3x + az)− (ax + bz)2z

],

Page 21: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

1.5: Cúbicas Singulares 17

dividindo por 8 temos

h(x, y) = y2(3x + a) + bx(3x + a)− (ax + b)2.

E fácil de encontrar os pontos de interseção das curvas f = 0 e h = 0. Expressandoy2 = x3 + ax2 + bx e substituindo na equação h temos

(x3 + ax2 + bx)(3x + a) + bx(3x + a)− (ax + b)2 = 0.

isto é,q(x) = 3x4 + 4ax3 + 6bx2 − b2 = 0.

Vamos provar que o polinômio q não tem raízes múltiplas. Sua derivada é igual12(x3 + ax2 + bx). Portanto,

q(x)− q′(x)12

(3x + a − b

x

)= (4b − a2)x2.

Suponha que x0 é tal que q(x0) = q′(x0). Então x0 = 0 uma vez que q(0) = −b2 = 0.Por outro lado, (4b − a2)x2

0 = 0, onde 4b − a2 = 0. Daí, x0 = 0 o que é um absurdo!Já temos provado que o polinômio q(x) tem 4 raízes distintas xi. Para cada raiz xi

existe dois valores correspondentes de y uma vez que y2 = x3 + ax2 + bx = q′(xi)12 = 0.

Disto, temos que F = 0 e H = 0 tem 8 distintos pontos em um domínio finito z = 0.Desde que F(x, y, 0) = −x3 e H(x, y, 0) = 24xy2, segue que sobre reta infinita z = 0 ascurvas F = 0 e H = 0 tem precisamente um ponto em comum (0 : 1 : 0). �

Infelizmente não temos tempo para tratar a outra forma normal de uma cúbica.

1.5 Cúbicas Singulares

A equação de uma cúbica não singular pode ser escrita da forma

y2 = (x − x1)(x − x2)(x − x3),

onde os números x1, x2 e x3 são distintos. No caso real, veja a figura abaixo

Seja x1 < x2 < x3. Se as raízes x1 e x2 se fundirem, obtemos uma curva cuja equaçãoé y2 = x2(x − 1) (veja figura 1.9); quando as raízes x2 e x3 se fundirem obtemos uma

Page 22: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

18 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

curva da forma y2 = x2(x+ 1) (veja a figura 1.10). Sobre os R estas curvas são distintas,mas sobre C a distinção entre elas desaparece.

Se todas as raízes se fundirem obtemos uma curva y2 = x3 (veja figura 1.11). Paratodos estas três curvas a origem é um ponto singular.

Qualquer reta da forma y = kx intercepta as curvas y2 = x2(x ± 1) e y2 = x3 em umponto singular com multiplicidade no mínimo 2. De fato, as equações y2 = x2(x ± 1)e y2 = x3 tem x = 0 com raiz no mínimo dupla. Portanto, para qualquer reta queconecta com qualquer outro ponto da cúbica a terceira interseção é novamente o pontozero. Portanto, a soma do ponto com qualquer outro ponto nos dá novamente o pontosingular. daí, não podemos definir a soma neste ponto. Se excluirmos este ponto entãoa soma sobre as curvas y2 = x2(x ± 1) e y2 = x3 esta bem definida, e em ambos oscasos se torna um grupo infinito. Se para o elemento nulo escolhermos um ponto noinfinito, então a curva y2 = x2(x + 1) sobre os R se torna o grupo dos números Reaisnão negativos com respeito a multiplicação e a curva y2 = x3 se torna o grupo dosnúmeros Reais com a adição.

Figura 1.9: Figura 1.10: Figura 1.11:

Vamos começar analisando a curva y2 = x3. Esta curva admite uma parametrizaçãoracional x = t−2 e y = t−3. A interseção desta curva com a reta ax + by + c = 0satisfazem a relação ct3 + at + c = 0. Se esta reta não passa pelo ponto singular,então c = 0. Neste caso, temos uma equação do terceiro grau, e como o termoque acompanha o termo t é zero, segue que as soluções desta equação satisfazemt1 + t2 + t3 = 0. Se colocarmos o elemento neutro E sobre sobre a cúbica no infinito,entáo o parâmentro correspondente é tE = 0. Assumindo que tA e tB são os valores doparâmentro t correspondentes aos pontos A e B, respectivamente. A reta AB interceptaa curva em X, então tA + tB + tX = 0. A reta EX intercepta a cúbica no ponto tA+B,isto é, tx + tE + tA+B = 0, daí, tA+B = −tX = tA + tB. Segue que somar pontos sobrey2 = x3 deve corresponder a adicionar os valores do parâmentro t. Observe que oponto singular corresponde ao parâmetro t = ∞.

A curva y2 = x2(x + 1) também admite uma parametrização racional. De fato,considere y = tx. Então t2x2 = x2(x + 1), isto é, x = t2 − 1 e y = t3 − 1. Uma retaax + by + c = 0 intercepta y2 = x2(x + 1) nos pontos cujos valores do parâmetro tsatisfazem

a(t2 − 1) + b(t3 − 1) + c = 0.

Page 23: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

1.6: Cúbicas Não Singulares Não Admitem Parametrização Racional 19

Se b = 0, então depois de dividir por b temos uma cúbica com coeficiente 1 em t3 e −1em t. As raízes de uma tal equação satisfazem t1t2 + t2t3 + t1t3 = −1.

Uma reparametrização t = (1 + u)/(1 − u), permite verificar que u1u2u3 = 1.Considere o elemento neutro E por ser um ponto no infinito, isto quer dizer que comrespeito ao parâmentro uE = 1. Para encontrar A + B, devemos considerar X sobrea cúbica e em AB. Daí, uAuBuX = 1 e uXuEuA+B = 1, segue que uAuB = uA+B.Quando adicionamos pontos sobre a curva y2 = x2(x + 1) corresponde a multiplicaro parâmetro u. Veja que o ponto singular corresponde a não somente um parâmetro,mas sim a dois, isto é, t = ±1 ou/e u = 0, ∞.

1.6 Cúbicas Não Singulares Não AdmitemParametrização Racional

As cúbicas singulares que estudamos na seção anterior admitem umaparametrização racional. Agora vamos provar que nenhum cúbica não singular admiteuma parametrização racional. Vamos admitir o fato que todo cúbica não singular podeser reduzida a uma da forma y2 = x(x − 1)(x − λ), com λ = 0, 1.

Teorema 1.7 Se λ = 0, 1, então não existe polinômios P1, P2, Q1 e Q2 tais que as funçõesnão constantes y(t) = P1(t)/P2(t) e x(t) = Q1(t)/Q2(t) satisfazem a relação y2 =x(x − 1)(x − λ).

Demonstração: Suponha que P1(t)/P2(t) e Q1(t)/Q2(t) não sejam constantes esubstituíndo

P21

P22=

Q1

Q2· Q1 − Q2

Q2· Q1 − λQ2

Q2.

Podemos assumir também que os polinômios P1, P2 e Q1, Q2 sejam relativamenteprimos. Como

P21 Q3

2 = P22 Q1(Q1 − Q2)(Q1 − λQ2),

segue o polinômio P22 , o qual é relativamente primo com P2

1 , deve ser divisível por Q32 e

o polinômio Q32, o qual é relativamente primo com Q1, Q1 − Q2, e Q1 − λQ2, é divisível

por P22 . Disso segue que Q3

2 e P22 deve ser proporcionais. Portanto, trocando P1 por um

polinômio proporcional obtemos

P21 = Q1(Q1 − Q2)(Q1 − λQ2).

Além disso, o polinômio Q32 é um polinômio quadrado, segue que Q2 é também deve

ser um polinômio quadrado.Os polinômios Q1, Q1 − Q2 e Q1 − λQ2 são dois a dois primos entre si e, portanto,

a igualdade P21 = Q1(Q1 − Q2)(Q1 − λQ2) implica que cada um deles é um quadrado

perfeito. Isto é, a família de polinômios da forma αQ1 + βQ2, onde α, β ∈ C tem 4quadrados perfeitos, que são: Q1, Q2, Q1 − Q2 e Q1 − λQ2, estes polinômios não sãoproporcionais pois λ = 0, 1.

Isto nos dá uma contradição, pois vamos mostrar que sobre a reta αQ1 + βQ2, ondeQ1 e Q2 são primos entre si, não podem aparecer mais que 4 quadrados perfeitos. Defato, suponha que sobre uma reta projetiva existam 4 quadrados perfeitos:

R21, R2

2, α1R21 − β1R2

2 e α2R21 − β2R2

2.

Page 24: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

20 Capítulo 1: Geometria das Curvas Cúbicas

Como R1 e R2 são primos entre si, segue que os polinômios√

αiR1 ±√

βiR2 devemser também quadrados perfeitos. Como resultado, na reta projetiva αQ1 + βQ2 na qualtem 4 quadrados perfeitos nos fornece outra reta projetiva αR1 + βR2 na qual tambémhá quatro quadrados perfeitos. Para esta nova reta podemos, repetindo o raciocínioobter ou reta projetiva com quatro quadrados perfeitos. Mas para cada passagemdiminuímos o grau de cada polinômio da forma αQ1 + βQ2 em um fator de 2. O quenos dá um absurdo.

1.7 Exercícios

1. As retas AB e CD se intersectam no ponto P, as retas BC e AD se intersectam noponto Q. Uma cúbica passando nos pontos A, B, C, D, P, Q. Prove que as tangentes acúbica nos pontos P e Q se intersectam em um ponto que está sobre a cúbica.

Sugestão: Aplique o teorema 1.2 para o caso A31 = A32 e A13 = A23.

2. Uma reta intersepta uma cúbica nos pontos A, B e C. As tangentes a cúbica nospontos A, B e C interceptam a cúbica nos pontos A1, B1 e C1. Prove que os pontos A1,B1 e C1 estão sobre uma reta.

3. Prove que a curva y2 = x3 + px + q intercepta a reta no infinito z = 0 em um pontode multiplicidade 3.

4. Prove que no ponto (0, 0) e qualquer reta intercepta a curva y2 = x2(x + 1) commultiplicidade no mínimo 2 e que para as retas y = ±x a multiplicidade é 3.

5. Prove que no plano projetivo a circunferência (x − a)2 + (y − b)2 = R2 passa nospontos infinitos (1 : i : 0) e (1,−i, 0).

6. Prove que o ponto (x0, y0) sobre a curva y = f (x) é um ponto de inflexão se e só sef ′′(x0) = 0.

7. Prove que todos os pontos da curva y2 = (x− x1)(x− x2)(x− x3) são não singularesse e só se os xi são distintos.

8. Prove que todos os pontos da curva y = (x − x1)(x − x2)(x − x3) são não singularesexceto (0 : 1 : 0).

9. Prove que a definição de reta tangente é invariante por mudança de coordenadas.

10. Prove que a definição de ponto de inflexão é invariante por mudança decoordenadas.

Page 25: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Capítulo 2

Funções Elípticas

Neste capítulo vamos estudar a estrutura topológica das curvas cúbicas, a definiçãodas funções elípticas, a função ℘(z) de Weierstrass e algumas de suas propriedades,parametrização racional das curvas cúbicas e terminamos com as conexões comintegrais elípticas.

A Adição de pontos sobre a circunferência esta relacionada com as funções senoe cosseno. Existe uma parametrização semelhante para cúbica, mas para obtê-lasprecisamos introduzir as funções elípticas. As integrais elípticas estão diretamenterelacionadas com a elipse uma vez que o comprimento de um arco de elipse pode serexpresso por uma integral elíptica especfiica. Por isso mesmo estas integrais levam estenome. As funções elípticas aparecem no processo de inversão de integrais elípticas queforam estudadas por outra razão que o cálculo do comprimento de arco da elipse.

2.1 Estrutura Topológica de uma Cúbica não Singular emCP2

A equação de qualquer cúbica não singular em CP2 pode ser reduzida para a forma

y2z = (x − a1z)(x − a2z)(x − a3z), (1)

onde os números ai são dois a dois distintos. Esta equação determina em C uma curvaem CP2 de dimensão 1 e nos R de dimensão 2.

Para encontrar a estrutura topológica da curva (1) em CP2, considere a projeção

p : CP2 − {(0, 1, 0)} → CP1, (x, y, z) 7→ (x, z).

A reta projetiva complexa CP1 (Compactificação de C em um ponto) é homeomorfa auma esfera S2 de dimensão 2. Para b = 0 a equação y2 = b tem precisamente duassoluções distintas. Portanto, se z = 0 e x − aiz = 0, então o ponto (x, y) ∈ CP1 temexatamente duas pré imagens que pertencem a curva (1). Se z = 0 a equação (1) setorna a equação x3 = 0. Portanto, o ponto ∞ = (1, 0) também tem somente uma préimagem, que é, (0, 1, 0). Mais precisamente, a pré imagem do ponto (1, z) tambémtende para (0, 1, 0) quando z → 0.

No que segue vamos descrever a projeção da curva (1). Se excluirmos os pontosai e ∞ de CP1, então todos os pontos tem exatamente uma pré imagem. Devemos

21

Page 26: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

22 Capítulo 2: Funções Elípticas

estudar com mais detalhes a estrutura da aplicação nas vizinhanças de ai e de ∞. Porsimplicidade assuma que a1 = 0. Considere as coordenadas afins, isto é, coloque z = 1.A projeção da curva (1) sobre CP1 nestas coordenadas fica (x, y) 7→ x. Então (1) fica daforma

y2 = x(x − a2)(x − a3),

onde a2a3 = 0. Para os pontos x próximos de zero a quantidade (x − a2)(x − a3) équase constante, isto é, temos quase a equação y2 = cx. Esta equação tem soluçãoda forma x = cλ2e2iφ, y = cλeiφ. Como φ varia entre 0 e π, podemos percorrer umarevolução completa ao redor do ponto (0, 1) de CP1. Sobre tal revolução, y mudade sinal. Suspendendo a revolução em torno de (1, 0) de CP1 na curva (1) nós nãovoltamos ao ponto inicial. Mas executando uma outra revolução retornamos ao pontoinicial, desde que há duas mudanças de sinal para y0.

A estrutura da projeção da curva (1) sobre CP1 nas vizinhanças de ∞ é a mesmaque nas vizinhanças de ai. De fato, seja x = 1. Então em uma vizinhança de z = 0 aequação (1) se aproxima de y2 = 1

z e, daí, o sinal de y muda depois de uma revoluçãocompleta ao redor de z = 0.

Para continuar a análise vamos cortarCP1 de a1 até a2 e de a3 até ∞. O levantamentodestes cortes para a curva (1) divide ela em duas partes. De fato, avançando aolongo de qualquer caminho fechado em CP1 que não intercepta os cortes iremoscircunscrever os pontos a1, a2, a3 e ∞ apenas em pares e debaixo da passagem emtorno de dois pontos o valor de y não muda. Portanto, é impossível conseguir uma préimagem dos pontos de CP1 em outras pré imagem sem interceptar os cortes.

Se cortamos CP1 de a1 até a2 e de a3 até ∞, então o que resta de CP1 pode serrepresentado na forma de um plano com dois cortes, veja (2.1). A parte da curva (1)que esta acima deste plano consiste de duas peças. O único que ainda precisamoscompreender é como colamos estas duas partes. Atravessando um corte em CP1

marcamos um bordo com o sinal mais e o outro com o sinal menos. Então, quandoos bordos são colados, obtemos um toro.

Uma parametrização da cúbica em CP2 pode ser determinada por determinar umafunção f : C1 → CP2, onde f (z) = (F1(z), F2(z), 1). A imagem desta função deverá serum toro. Uma simples aplicação de C1 no toro é obtida por identificar todos os pontosda forma z + nω1 + mω2. Em outras palavras, ω1 e ω2 são os períodos das funções F1e F2.

Page 27: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.2: Propriedades Gerais das Funções Elípticas 23

Figura 2.1: Definição de Soma

Figura 2.2: O Toro

2.2 Propriedades Gerais das Funções Elípticas

Uma funccão é dita ser de período duplo se f (z + nω1 + mω2) = f (z) paraqualquer m, n ∈ Z e ω1 e ω2 ∈ C.

Por reticulado em C entendemos por ser o conjunto de pontos sobre C gerado pelascombinações inteiras de dois elementos de ω1, ω2 ∈ C, isto é,

{mω1 + nω2 : m, n ∈ Z} .

Por considerações elementares, mas que não gostaríamos de nos alongar aqui,podemos escolher ω1, ω2 tais que ω1/ω2 /∈ R (são linearmente independentes), parafacilitar, assumimos também que IM(ω1/ω2) > 0 (implica que a rotação de ω1 paraω2 é no sentido horário e que os vetores estão no semiplano superior).

Neste texto estaremos interessados unicamente em funções meromorfa de períododuplo. Recorde que uma função analítica é dita meromórfica se em um finito domíniode C ela não tem pontos singulares diferentes dos polos. Em uma vizinhança qualquerde um ponto a uma função meromórfica pode ser expressa como uma série depotências

f (z) = c0(z − a)r + c1(z − a)r+1 + · · · ,

onde c0 = 0 e r é um inteiro. Vamos recordar alguns exemplos de funções meromorfas

z3 − 3x + 10z5 + 3z − 1

,ez

ze

sen z(z − 1)2 ,

Page 28: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

24 Capítulo 2: Funções Elípticas

e alguns exemplos de funções que não são

ln z,1

sen(1/z)e sen

1z

.

Uma função meromorfa de período duplo é chamado de função elíptica.Se temos ω1, ω2 como acima, qualquer número complexo z pode ser representado

na forma z = a1ω1 + a2ω2, onde ai ∈ R. Os números ai podem ser representandoscomo soma de um inteiro mais a sua parte racional. Então podemos Chamamos deparalelogramo fundamental da função elíptica o conjunto

{a1ω1 + a2ω2 : 0 ≤ a1, a2 ≤ 1} .

Portanto, uma função elíptica é completamente determinada pelos seus valores noparalelogramo fundamental.

Teorema 2.1 Uma função elíptica sem polos é constante.

Demonstração: Suponha que a função elíptica f (z) não tenha polos. Então a função| f (z)| é continua sobre C. Desde que os paralelogramo fundamental é um compacto,| f (z)| ≤ M, para algum número M > 0. Mas então | f (z)| ≤ M, para todo z ∈ C. Istoé, f é uma função analítica e limitada sobre C. Portanto, pelo teorema de Liouville, f éconstante. �

Todos os pontos singulares de uma função meromorfa são isolados. Seguedisso que nos paralelogramos fundamentais só existe um número finito de pontossingulares. Portanto, deve existir uma translação paralela do paralelogramofundamental tal que não existe nenhum ponto singular sobre os seus lados. Podemosentão assumir que não há pontos singulares sobre os lados do paralelogramofundamental.

Afirmação 2.2 Seja P um paralelogramo fundamental com vértices α, α + ω1, α + ω1 + ω2 eα + ω2, e ∂P seu bordo. Então

∫∂P f (z) dz = 0 para toda f (z) função elíptica.

Demonstração: De fato, esta integral é a soma de certas expressões entre asquais estão, entre outras,

∫ α+ω1α f (z) dz e

∫ α+ω1+ω2α+ω2

f (z) dz com sinal mais ou menos(dependendo do sentido da curva), respectivamente. Estas integrais são iguais, desde

Page 29: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.2: Propriedades Gerais das Funções Elípticas 25

que f (z + ω2) = f (z). Similarmente, as integrais ao longo dos outros pares também secancelam.

Esta afirmação permite obter informações relevantes a respeito de zeros e polos deuma função elíptica.

Teorema 2.3 a) A soma dos resíduos de uma função elíptica nos pontos singulares dentro doparalelogramo fundamental é igual a zero.

b) Para cada função elíptica, seja ai seus zeros e polos que estão dentro do paralelogramofundamental, e seja ri as suas ordens (positivos para zeros e negativos para polos). Então∑ ri = 0 e ∑ riai ≡ 0(modΛ), isto é, ∑ riai = mω1 + nω2, onde m e n são inteiros.

Demonstração: Como é conhecido em Variáveis Complexas, se o bordo doparalelogramo fundamental P não tem valores singulares da função moromórfa g,então

∑P

res g =1

∫∂P

g(z)dz.

Para provar a parte a) basta usar a identidade g = f .Para provar que ∑ ri = 0 e ∑ airi = 0( mod Γ) usamos que g(z) = f ′(z)/ f (z) e/ou

g(z) = z f ′(z)/ f (z), respectivamente.Se f (z) é uma função elíptica, então g(z) = f ′(z)/ f (z) e também é uma função

elíptica.Se a ∈ C é um zero de ordem m de f , então

f (z) = (z − a)mh(z), com h(a) = 0.

e h(z) analítica. Daí,

f ′(z)f (z)

=m

z − a+

h′(z)h(z)

e1

2πi

∫C

f ′(z)dzf (z)

= m.

Se a ∈ C é um polo de ordem r de f , então deve existir ϕ(z) tal que ϕ(z) =(z − a)r f (z) onde a é um ponto regular de ϕ(z) e ϕ(a) = 0. Daí

f (z) =ϕ(z)

(z − a)r , f ′(z) = −r(z − a)r−1ϕ(z) + (z − a)−rϕ′(z).

ef ′(z)f (z)

= − rz − a

+ϕ′(z)ϕ(z)

⇒ 12πi

∫C

f ′(z)dzf (z)

= −r.

Page 30: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

26 Capítulo 2: Funções Elípticas

Disto seque que ∑ ri = 0.Para provar a identidade ∑ riai = mω1 + nω2 devemos proceder com certos

cálculos. Uma vez que g(z) = z f ′(z)/ f (z) não necessariamente é uma função elíptica.Primeiro observe que se f (z) = c0(z − a)r + c1(z − a)r+1 + · · · , então

g(z) =a + (z − a)

z − a· rc0(z − a)r−1 + · · ·

c0(z − a)r−1 + · · · =ar

z − a+ · · · ;

Daí, o resíduo de g(z) em a é igual a ar. Agora, vamos calcular a integral∫

∂P g(z) dz.A diferença das integrais ∫ α+ω1

α

z f ′(z)f (z)

dz

e ∫ α+ω1+ω2

α+ω2

z f ′(z)f (z)

dz =∫ α+ω1

α

(z + ω2) f ′(z)f (z)

dz

contribuem para esta integral. A diferença é igual a

−ω2

∫ α+ω1

α

z f ′(z)f (z)

dz = −ω2 ln f (z)|α+ω1α .

Desde que f (α + ω1) = f (α), o logarítmo de f (z) pode mudar somente 2πki, comk ∈ Z quando z varia de α até α + ω1. Como resultado vemos que a integral∫

∂Pg(z) dz

para um par de lados é nω2 e para o outro par é mω2, com m, n inteiros.�

Como já dissemos, uma função elíptica não constante deve ter no mínimo um polodentro do paralelogramo fundamental. Mas desde que a soma dos seus resíduosdeve ser nulo, a função não pode ter apenas um polo de ordem 1. Para funçõeselípticas, o número (contando multiplicidades) de polos dentro de um paralelogramofundamental é chamado de ordem de uma função elíptica. O menor ordem possível édois:1) Um polo de ordem 2, isto é, de multiplicidade 2 (isto acontece com as funções deWeierstrass que discutiremos na próxima seção).2) Dois polos simples (isto acontece com as funções de Jacobi que discutiremos maispara frente).

Não há outra forma de isto ser realizado.Pelo item b) do teorema 2.3, para qualquer função elíptica a soma das ordens de

zeros dentro de um paralelogramo fundamental é igual a soma da ordens de seuspolos, isto é, é igual a ordem desta função. Como é claro que os polos da funçãof (z) − c é o mesmo que da f (z). Concluímos que para funções elípticas de ordem r(contando multiplicidades) ela assume exatamente r vezes qualquer valor finito dentrode um paralelogramo fundamental.

Page 31: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.3: A Função de Weierstrass 27

2.3 A Função de Weierstrass

Já provamos que certas propriedades a respeito de funções elípticas mas não temosestabelecido que existe função elíptica não constante. É tempo de darmos um exemplode uma função elíptica não trivial. Considere para qualquer reticulado Λ a seguintefunção

℘(z) =1z2 + ∑ ′

[1

(z − ω)2 − 1ω2

], (2)

onde a soma deve ser feita sobre todos elementos não nulos ω ∈ Λ, o apostrofo em∑′ esta para denotar isso. Agrupar os termos em colchetes é fundamental, visto que∑(z − ω)−2 e ∑ ω−2 divergem.

Vamos provar que a série (2) converge e que esta série define uma funçãomeromórfa. Sobre qualquer compacto K que não contém nenhum ponto do reticulado,a série converge uniformemente e absolutamente. De fato,

1(z − ω)2 − 1

ω2 =2zω − z2

ω2(z − ω)2 =ω

ω4 · 2x − z2/ω

(z/ω − 1)2 .

Se |ω| é grande, então uma aproximação razoável para 2x−z2/ω(z/ω−1)2 é 2z. Portanto, para

todo ω ∈ Λ com um valor suficientemente grande de |ω| e para todo z ∈ K existe umaconstante M tal que ∣∣∣∣ 1

(z − ω)2 − 1ω2

∣∣∣∣ < M|ω|3 .

Além disso, |z − ω| > ϵ com z ∈ K e ω ∈ Λ; tal constante existe para todo ω ∈ Λ. Éfácil de se convencer que a série ∑ |ω|−3 converge. De fato,

∑ |ω|−3 =∞

∑n=1

∑max{p,q}=n

|pω1 + qω2|−3 ≤∞

∑n=1

8n(nh)−3,

onde h = min {|ω1|, |ω2|} é o menor dos dois lados do paralelogramo fundamental.Disso segue, que ℘(z) é uma função meromorfa com polos e zeros no reticulado.Chamada de função de Weierstrass. Vamos provar a periodicidade da função deWeierstrass. Para isso, considere a derivada

℘′(z) = −2 ∑(z − ω)−3.

Aqui também o somatório corre sobre todos os nós do reticulado Λ. Claramente,ω1 e ω2 são períodos da função ℘′(z). Desde que a funções ℘(z + ωi) e ℘(z) podemdiferir por no máximo uma constate c. Substituindo z = −ωi/2 na igualdade℘(z + ωi) = ℘(z) + c temos que ℘(ωi/2) = ℘(−ωi/2) + c. Mas é claro da fórmula(2) que a função é par. Daí, c = 0, isto é, ω1 e ω2 são os períodos de ℘(z).

A função ℘ tem período duplo sobre os nós do reticulado; e não tem outros pontossingulares. Dentro do paralelogramo fundamental deve existir exatamente um nó doreticulado. Portanto, dentro do paralelogramo fundamental a soma dos polos de ℘ écongruô a zero módulo Λ. Pelo teorema 2.3, dentro do paralelogramo fundamental,há dois zero u e v, tal que u + v ≡ 0( mod Λ). Para qualquer constante c os polos da

Page 32: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

28 Capítulo 2: Funções Elípticas

função ℘(z)− c e ℘(z) coincidem, e portanto, dentro do paralelogramo fundamentalhá exatamente dois pontos, para os quais ℘(u) = ℘(v) = c e u + v ≡ 0( mod Λ).Se u ≡ u( mod Λ), então estes dois pontos coincidem, isto é, o valor correspondentede ℘ é atingido duas vezes. Nos pontos onde os dois zeros de ℘(z) − c se funde aderivada ℘′(z) se anula. é possível selecionar um paralelogramo fundamental quecontém exatamente quatro pontos para os quais u ≡ −u( mod Λ), isto é, os pontos

0,ω1

2,

ω2

2e

ω1 + ω2

2.

O primeiro destes pontos é um polo de ℘ e os outros três pontos são zeros de ℘′.Considere os valores

e1 = ℘(ω1

2

), e2 = ℘

(ω2

2

)e e3 = ℘

(ω1 + ω2

2

)de ℘ são de multiplicidade 2 e não há nenhum outro valor e multiplicidade 2. Osvalores de multiplicidade 2 correspondem aos valores em que a derivada se anula, daí,℘′(z) = 0 se, e só se,

z1 ≡ 12

ω1,12(ω1 + ω2),

12

ω2( mod Λ).

Observe que os valores e1, e2 e e3 são distintos. Suponha, por exemplo, que e1 = e3.Então a função ℘(z)− e1 tem um zero de multiplicidade 2 no ponto ω1/2 e ω2/2, istoé, dentro do paralelogramo fundamental tem no mínimo 4 zeros. Isto é impossível.

A função de Weierstrass não é o uníco exemplo de função elíptica mas nos permitedescrever a estrutura de todas as funções elípticas.

Teorema 2.4 Seja f (z) uma função elíptica arbitrária e ℘(z) uma função de Weierstrass demesmo período. Então deve existir funções racionais R e R1 tais que

f = R(℘) + R1(℘)℘′.

Demonstração: Sempre é possível representar f (z) como a soma de uma funçãopar g(z) = 1

2( f (z) + f (−z)) e de uma função ímpar h(z) = 12( f (z)− f (−z)). Como

℘′(z) é uma função ímpar, h1(z) = h(z)/℘′(z) é uma função par e para as funcçõespares g e h1 temos

f (z) = g(z) + h1(z)℘′(z).

Portanto, é suficiente provarmos que qualquer função elíptica par podem serrepresentada como uma função racional de ℘.

Para fazer isto, vamos analisar certas propriedades dos zeros e polos de uma funçãopar elíptica.

1o Seja f uma função par, e u um de seus zeros (ou polo) de ordem m. Então −utambém é um zero (resp. polo) de ordem m. De fato, no caso de ser um zero é suficienteobservar que uma função par f satisfaz

f (k)(−z) = (−1)k f (k)(z).

No caso de polos, considere 1/ f ao invés de f .

Page 33: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.4: Uma Equação Diferencial para a Função de Weierstrass 29

2o Se é uma função par e elíptica e u ≡ −u( mod Γ), então a ordem do zero ou polode f em u deve ser par. Vamos considerar somente os zeros (desde que para os polospodemos considerar 1/ f ao invés de f ). A condição u ≡ −u( mod Γ) é equivalenteao fato de

u ≡ 0,ω1

2,

ω1 + ω2

2,

ω2

2( mod Γ).

Além disso, a periodicidade de f ′ implica f ′(u) = − f ′(u). Mas a derivada de umafunção par é ímpar, f ′(u) = 0. Portanto, se a função f tem um zero em u; então estezero é de multiplicidade no mínimo 2. Para qualquer dos casos

u ≡ ω1

2,

ω1 + ω2

2,

ω2

2( mod Γ)

a função F(z) = ℘(z)− ℘(u) tem um zero de ordem 2 em u e se u ≡ 0( mod Γ), entãoa função F(z) = 1/℘(z) tem a propriedade. Usando F, podemos construir uma funçãopar elíptica f1(z) = f (z)/F(z) o qual a ordem do zero em u é no mínimo o grau de fmenos 2. Daí, se f1(u) = 0, então a ordem do zero de f em u é igual a 2 e se f1(u) = 0,então podemos aplicar o mesmo argumento para f1 ao invés de f , etc.

Pelas propriedades descritas acima para os zeros e polos de uma função elíptica parf elas podem ser divididas em pares da forma (x,-x). Selecionando um representantede cada um dos pares com a1, a2, . . . , ak representando os zeros e b1, b2, . . . , bkrepresentando os polos. Considere as funções elípticas

Q(z) = R(℘(z)) = ∏(℘(z)− ℘(ai))

∏(℘(z)− ℘(bi))),

onde tomamos apenas aqueles ai e bi que são distintos dos nós do reticulado (Desdeque os nós da função ℘ são infinitos). Se negligenciarmos os nós do reticulado, então osistema completo de zeros e polos de Q é o mesmo que de f , e desde que ℘(z) = ℘(a)se e só se z ≡ ±a( mod Γ). Mas pelo teorema 2.3b) para uma função elíptica temosque a soma das ordens de seus zeros e polos dentro de um paralelogramo fundamentalé igual a zero; daí, a ordem dos zeros ou polos em um nó do reticulado é unicamentedeterminado pelas ordens dos outros zeros e polos. Portanto, f (z)/Q(z) é uma funçãoelíptica sem polos, isto é, uma constante. Como resultado, temos que f (z) = cR(℘(z))como queríamos.

2.4 Uma Equação Diferencial para a Função deWeierstrass

No final da seção anterior provamos que podemos expressar qualquer funçãoelíptica com uma função racional em termos de ℘(z) e a expressão pode serexplicitamente determinada. Isto pode ser aplicado a função (℘′(z))2. Ela tem zerosde multiplicidade 2 sobre ω1

2 , ω1+ω22 e ω2

2 e um polo de multiplicidade 6 sobre os nósdo reticulado. Daí,

(℘′(z))2 = c(℘(z)− e1)(℘(z)− e2)(℘(z)− e3), (3)

Page 34: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

30 Capítulo 2: Funções Elípticas

onde e1 = ℘(ω1

2

), e2 = ℘

(ω22

)e e3 = ℘

(ω1+ω2

2

). Desde que ℘(z) = z−2 + · · · e

℘′(z) = z−3 + · · · , segue que c = 4.Há uma outra maneira de obter uma equação diferencial para ℘(z). Devemos usar

o fato que se os coeficientes das potências não negativas de z na série de potências deLaurent da expansão das funções (℘′(z))2 e a℘3(x) + b℘2(z) + c℘(z) + d coincidem,então estas funções são iguais. De fato, sua diferença é uma função elíptica com poloem 0 no valor igual a 0. Daí, sua diferença deve ser igual a zero.

Como (1

1 − x

)2

=d

dx

(1

1 − x

)= 1 + 2x + 3x2 + · · · ,

segue disso que

℘(z) =1z2 + ∑

[1

(z − ω)2 − 1ω2

]=

1z2 + ∑

[1

ω2

(1 + 2

+ 3( z

ω

)2+ · · ·

)− 1

ω2

]=

1z2 + 3G4z2 + 5G6z4 + · · · ,

onde Gk = ∑ ω−k (para k ímpar esta soma dá zero). Nas igualdades abaixo escrevemosapenas os termos da série de Laurent que nos interessam

℘(z) = z−2 + · · · ,℘2(z) = z−4 + 6G4 + · · · ,

℘3(z) = z−6 + 9G4z−2 + 15G6 + · · · ,(℘′(z)

)2= 4z−6 − 24G4z−2 − 80G6 + · · ·

Daí,

a℘3(x) + b℘2(z) + c℘(z) + d

= az−6 + bz−4 + (9aG4 + c)z−2 + (a℘3(x) + b℘2(z) + c℘(z) + d) + · · ·Portanto, a℘3(x) + b℘2(z) + c℘(z) + d = (℘′)2 se

a = 4, b = 0, 9aG4 + c = −24G4 e a℘3(x) + b℘2(z) + c℘(z) + d = −80G6,

isto é,a = 4, b = 0, c = −60G4 e d = −140G6.

Coloque g2 = 60G4 = 60 ∑ ω−4, e g3 = 140G6 = 140 ∑ ω−6. Então,

(℘′)2 = 4℘3(z)− g2℘(z)− g3. (4)

Comparando (3) com (4), vemos que

e1 + e2 + e3 = 0, e1e2 + e1e3 + e2e3 = −g2

4e e1e2e3 = −g3

4.

É fácil de verificar que

g32 − 27g2

3 = 16(e1 − e2)2(e2 − e3)

2(e3 − e1)2.

Na seção anterior já mostramos que os números e1, e2 e e3 são dois a dois distintos.Portanto, g3

2 − 27g23 = 0. É natural perguntar se dado os números g2 e g3 tais que

g32 = 27g2

3, existe um reticulado tal que g2 = 60 ∑ ω−4 e g3 = 140 ∑ ω−6? A resposta éafirmativa.

Page 35: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.5: Parametrização da Cúbica com a Ajuda da Função de Weiertrass 31

2.5 Parametrização da Cúbica com a Ajuda da Função deWeiertrass

A equação diferencial de ℘ nos permite esclarecer a natureza da soma de pontossobre a cúbica. Para fazer isto precisamos usar o fato que deixamos sem demonstração:

Para qualquer números g2 e g3 tais que g32 = 27g2

3 existe um reticulado para o qual a funçãode Weierstrass satisfaz a equação

(℘′)2 = 4℘3 − g2℘− g3.

Este resultado pode ser encontrado em ([3]).A curva cúbica y2 = 4x3 − g2x − g3 pode ser parametrizada com a ajuda da ℘,

colocando x = ℘(z) e y = ℘′(z). Passando para as coordenadas homogêneas em CP2

a aplicação f : C/Λ → CP2 definida por

z 7→{

(℘(z),℘′(z), 1) para z = 0,(z3℘(z), z3℘′(z), z3) = (0, 1, 0) para z = 0.

Claramente, esta aplicação é analítica em todos os pontos distintos dos nós doreticulado. Expressando da forma

z 7→(℘(z)℘′(z)

, 1,1

℘′(z)

)podemos verificar que ela é analítica em uma vizinhança de um nó do reticulado. Aaplicação f é injetora do toro C/Λ na cúbica y2z = 4x3 − g2xz2 − g3z3 em CP2.

De fato, a reta no infinito z = 0 esta sobre todos os pontos (0 : 1 : 0) desta curva;os nós do reticulado os quais corresponde a um ponto de toro são mapeados nesteponto. Para todo os outros podemos considerar uma curva afim y2 = 4x3 − g2x − g3 ea aplicação z 7→ (℘(x),℘′(z)).

A equação ℘(z) = c pode ter uma ou duas soluções. Ela tem duas soluções se℘(z) = 0. As soluções são da forma ±z. A imagem destes pontos não coincidem,desde que ℘′(z) = 0 e −℘′(z) = ℘′(−z) diferem pelo sinal.

A adição de números complexos induz a uma adição de pontos sobre o toro o qual,com a ajuda da função f , induz a adição de pontos sobre a cúbica. Esta operação deadição é exatamente a soma que definimos no capítulo 1, no qual colocamos o elementoneutro da soma no ponto no infinito (0 : 1 : 0).

Sejam P1 e P2 dois pontos sobre a cúbica que são correspondidos por z1 e z2,respectivamente, isto é, Pi = (℘(zi),℘′(zi)). Desenhando a reta y = ax + b que passapor P1 e P2. Então ℘′(zi) = a℘(zi) + b, onde i = 1, 2.

No ponto z = 0 a função elíptica ℘′(z)− a℘(z)− b tem um polo de multiplicidade3 e não tem outro polo nos outros pontos do paralelogramo fundamental. Portanto, aordem desta função é 3, isto é, ela tem precisamente 3 zeros, além disso, já conhecemosdois zeros z1 e z2 e tem um terceiro z3. Desde que a soma dos polos e zeros é igual azero, temos z1 + z2 + z3 ≡ 0( mod Λ), isto é, z3 ≡ −z1 − z2( mod Λ). Disto segueque o terceiro ponto de interseção da reta P1P2 com a cúbica é o ponto

P′3 = (℘(z3),℘′(z3)) = (℘(−z1 − z2),℘′(−z1 − z2)) = (℘(z1 + z2),−℘′(z1 + z2)).

Page 36: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

32 Capítulo 2: Funções Elípticas

Figura 2.3: Soma na Parametrização

Portanto, o ponto P3 = (℘(z1 + z2),℘′(z1 + z2)) corresponde a soma de z1 e z2 ésimétrico a P′

3 com respeito ao eixo x, veja a figura 2.3. Em outras palavras, P3 é oponto de interceção da cúbica com a reta P′

3E, onde E = (0, 1, 0) o ponto no infinitosobre a cúbica. Isto é exatamente o que queríamos verificar.

Vamos estender o argumento acima, um pouco mais, e mostrar que existe umteorema de adição algébrica para ℘, isto é, ℘(z1 + z2) pode ser expresso em termos de℘(z1) e ℘(z2). De fato, a reta y = ax + b passando através dos pontos P1 e P2 interceptaa cúbica y2 = 4x3 − g2x − g3 em três pontos (xi, yi), onde x1 = ℘(z1), x2 = ℘(z2) ex3 = ℘(x1 + x2). portanto, a equação cúbica

(ax + b)2 = 4x3 − g2x − g3

tem as raízes x1, x2 e x3. Expressando os coeficientes de x2 e termos destas raízesobtemos

℘(z1) + ℘(z2) + ℘(z1 + z2) =a2

4.

Desde que ℘′(z1) = a℘(z1) + b e ℘′(z2) = a℘(z2) + b, segue que a = ℘′(z1)−℘′(z2)℘(z1)−℘(z2)

.Portanto,

℘(z1 + z2) = −℘(z1)− ℘(z2) +14

(℘′(z1)− ℘′(z2)

℘(z1)− ℘(z2)

)2

.

Disso, ℘(z1 + z2) pode ser expresso de maneira racional em termos de ℘(zi) e ℘′(zi),com i = 1, 2. Recorde que ℘′(zi) pode ser algebricamente expresso em termos de ℘(zi),isto é:

℘′(zi) =√

4℘(zi)− g2℘(zi)− g3.

Com a ajuda da função de Weierstrass podemos também parametrizar

y2 = G4(x),

Page 37: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

2.6: Exercícios 33

onde G4(x) = a0x4 + a1x3 + a2x2 + a3x + a4, é um polinômio de grau 4 sem raízesrepetidas. Para fazer isto basta considerar a mudança de coordenadas x = 1

x1+ α,

y = y1x1

, onde α é tal que G4(α) = 0.

2.6 Exercícios

1. As funções elípticas f e g tem o mesmo período e em cada polo elas tem a mesmaparte principal

cr(x − a)r + cr+1(x − a)r+1 + · · ·+ c−1(z − a)−1 onde r < 0.

Prove que a diferença entre elas é constante.

2. As funções elípticas f e g tem o mesmo período e seus zeros e polos (contandomultiplicidade) coincidem. Prove que o quociente delas é contante.

3. Prove que ℘′′ = 6℘2 − g2/2 e ℘′′′ = 12℘′℘.

Sugestão: Diferencie (4).

4. Prove que e21 + e2

2 + e23 = g2

2 , e31 + e3

2 + e33 = 3g3

4 e e41 + e4

2 + e43 =

g22

8 .

Sugestão: Use o fato que a + b + c divide a3 + b3 + c3 − 3abc e (a2 + b2 + c2)2 − 2(a4 +b4 + c4).

Page 38: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

34 Capítulo 2: Funções Elípticas

Page 39: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Capítulo 3

Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

Neste capítulo vamos abordar o calculo do comprimento de arco para elipsee hipérbole, integrais elípticas e teoremas aditivos válidos para integrais elípticas.Funções introduzidas por Jacobi para este estudo destes problema.

3.1 Um Pouco de História

Considerações sobre as funções elípticas foram impostas pela impossibilidade deconseguir a integral de certas funções. Entre as integrais que podemos tratar com asfunções elípticas estão as funções que deram o nome para esta família de funções, elasaparecem quando tentamos calcular o comprimento de arco de uma elipse.

Por exemplo considere a elipse x2

a2 + y2

b2 = 1 que pode ser parametrizada pelasfórmulas x = a sen φ e y = b cos φ. A diferencial dl do comprimento de arco daelipse é igual

√dx2 + dy2 =

√a2 cos2 φ + b2 sen2 φdφ. Se a = 1 e b =

√1 − k2, então

dl =√

1 − k2 sen2 φdφ.Neste caso o comprimento de arco da elipse entre o ponto inicial sobre o eixo menor

B, e o ponto M = (a cos φ, b sen φ) é igual a∫ φ

0

√1 − k2 sen2 θ dθ.

A necessidade de introduzir novas funções, não é algo muito exótico, basta lembrarque para integrar ∫ dx

x,

∫ dx1 + x2 e

∫ dx√1 − x2

precisamos das funções transcendentais ln x, arctg x e arcsen x.Além disso, nos cursos de cálculo sabemos que é possível integrar todo tipo de

função racional, naquelas que contém uma raiz que contém um polinômio p(x) degrau menor ou igual 2, isto é,

R(x,√

G(x)),

onde R(x, y) são funções racionais em duas variáveis. Se o grau do polinômio G(x)dentro do radical é maior que 2 então temos dificuldades de obter a integral emtermos de funções transcendentais elementares. Em particular, se na integral se

35

Page 40: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

36 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

considera polinômios de grau 3 e 4, isto nos conduz a funções elípticas, cuja principalcaracterística é serem de período duplo.

Considerações sobre integrais racionais já apareceram em Wallis (1616 − 1703) e deGiacomo (1654 − 1705) e Giovani I Bernoulli (1667 − 1748). Um outro matemático queteve um desempenho importante no estudo das funções elípticas foi Count Fagnano(1682 − 1766) foi ele quem forjou o termo integral elíptica. Ele teve contribuiçõesnos teoremas aditivos das cúbicas e também nos processos de divisão da Leminiscatade Bernoulli, a sua produção matemática foi coletada e publicada sobre o nome deProduzioni Matematiche. A Acadêmia de Berlin pediu a Leonard Euler para eleescrever uma introdução para esta coletânea. Os trabalhos de Fagnano estimularamo interesse de Euler pelas integrais elípticas. Em seus numerosos trabalhos Euler fezprogressos e generalizações dos resultados de Fagnano.

Gauss também se interessou por estes assuntos, ele desenvolveu métodos queenvolviam as progressões aritméticas e geométricas que permite resolver as integraiselípticas, mas que não são tratados nestes material. Quem quiser saber mais sobre isso,veja ([1]). Além disso, ele se interessou nas equações para a divisão da Leminiscata. Porexemplo ele mostrou que uma equação de grau 25 relativa a divisão da Leminiscataem 5 partes era solúvel por radicais. Gauss não publicou as suas investigações masem seu livro Disquisitiones Arithmeticae (Estudos aritméticos), o qual apareceu em1801, ele menciona que os métodos que ele desenvolveu não eram somente aplicáveispara funções trignométricas, mas também para integrais da forma

∫ dx√1−x2 . E estas

afirmação intrigou Abel.Em ordem, depois de Euler, Legendre trabalhou incansavelmente por muitos anos

para desenvolver a teoria das integrais Elípticas. Ele resumiu os seus resultados emum livro Exercises de calcul intégral, publicado em 1811 e 1819. Uma edição revisitadadeste livro foi publicada entre 1827 − 1932 sobre o nome Traité des fonctions elliptiqueset des intégrales eulériennes. Estes três largos volumes contém inúmeros resultados arespeito de integrais elípticas e de suas aplicações.

Nos trabalhos de Legendre ele chegou a três tipos de integrais:

F(φ) = F(φ, k) =∫ φ

0

dφ√1 − k2 sen2 φ

E(φ) = E(φ, k) =∫ φ

0

√1 − k2 sen2 φ dφ

Π(φ) = Π(φ, c, k) =∫ φ

0

(sen φ − c)√

1 − k2 sen2 φ

que chamou de primeiro, segundo e terceiro tipo, respectivamente. Se fizermos amudança de coordenadas sen θ = x, obtemos∫ dx√

(1 − x2)(1 − k2x2)∫ √1 − k2x2

1 − x2 dx∫ dx(1 + nx2)

√(1 − x2)(1 − k2x2)

.

Page 41: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.2: Integrais Elípticas 37

Legendre chamou de funções elípticas o que hoje em dia é chamado de integraiselípticas. Depois dos trabalhos de Abel e Jacobi a importância dos livros de Legendrediluirão. No entanto, Abel e Jacobi sempre se referriam aos livros de Legendre comgrande respeito.

3.2 Integrais Elípticas

A função de Weierstrass ℘(z) satisfaz, como vimos, a equação diferencial(d℘dz

)2

= 4℘3 − g2℘− g3.

Portanto,

dz =d℘√

4℘3 − g2℘− g3,

e fazendo u = ℘(z) temos

z =∫ du√

4u3 − g2u − g3.

e como z = ℘−1(z), isto é, a inversão da integral nos dá∫ du√4u3 − g2u − g3

a função de Weierstrass.Uma integral elíptica é uma integral da forma∫

R(x,√

G(x)) dx,

onde G(x) é um polinômio de grau 3 ou 4, sem raízes multiplas e R(x, y) é umafunção racional em duas variáveis. No início, tais integrais apareceram nos cálculosde comprimento de arco de várias curvas, entre elas as elipses.

As integrais elípticas podem ser reduzidas para algumas integrais fundamentais.Mas antes vamos considerar integrais que não envolvem integrais elípticas. Para issoprovar que se R(x) é uma função racional, então a

∫R(x) dx é soma de um certo

número de termos da forma ci ln(x − ai). Para isso é suficiente provar que qualquerfunção racional pode ser expressa da forma

A(x) + ∑i,k

ci,k

(x − ai)k ,

onde A(x) é um polinômio. Seja R(x) = P(x)/Q(x), onde P e Q são polinômios.Dividindo P por Q podemos passar para uma fração S/Q, onde deg S < deg Q.Digamos que S = Q1Q2, onde Q1 e Q2 são polinômios relativamente primos. Entãodevem existir polinômios A1 e A2 tais que A1Q1 + A2Q2 = 1. Portanto,

SQ1Q2

=A1SQ1 + A2SQ2

Q1Q2=

A1SQ2

+A2SQ1

.

Page 42: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

38 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

Em cada uma das frações podemos dividir o numerador pelo denominador e obter umresto. Depois de fazer os procedimentos acima um número finito de vezes, obtemosum polinômio A(x) somado com termos do tipo P(x)/(x − a)n, onde deg P(x) < n. Ademonstração se completa ao observar que p(x) tem a forma

P(x) = b1(x − a)n−1 + b2(x − a)n−2 + · · ·+ bn.

Leibniz foi o primeiro que considerou a integração de funções racionais. Eleconsiderou somente polinômios que podiam ser fatorados, sobre R em fatores de grau1 e 2. Ele parou frente a pergunta: É verdade ou não que todo polinômio real pode ser fatoradoem fatores com coeficientes reais de grau 1 e 2? Em 1702, Leibnitz publicou um artigo noqual afirmava que era impossível fatorar o polinômio x4 + a4 uma vez que

x4 + a4 = (x2 + a2√−1)(x2 − a4

√−1)

= (x + a√√

−1)(x − a√√

−1)(x + a√−√−1)(x + a

√−√−1).

e o produto de quaisquer dois destes fatores não podia, como ele acreditava, ser umpolinômio de grau dois com coeficientes Reais. Somente 17 anos depois NicholasBernoulli (1687 − 1759) verificou que

x4 + a4 = (x + a2)2 − 2a2x2 = (x2 +√

2ax + a2)(x2 −√

2ax + a2).

Em suas correspondências Leibniz e Jacob Bernoulli também discutiram integraisde expressões irracionais que aparecerão no estudo de vários problemas físicos ematemáticos. Muitas destas integrais eram elípticas.

Vamos considerar funções racionais com uma irracionalidade simples. Paracalcular ∫

R(x,√

G(x)) dx,

onde G(x) = ax + b, em primeiro lugar fazemos a mudança de coordenadas u =ax + b, e como resultado obtemos a integral∫

R1(u,√

u) du,

onde R1 é novamente uma função racional. Agora, colocando t =√

u, du = (t2)′ =2tdt e, segue ∫

R1(u,√

u) du =∫

R1(t2, t) 2tdt =∫

R2(t) dt,

onde R2 é novamente uma função racional.Agora, se G(x) = ax2 + bx + c, podemos fazer a mudança de coordenadas, x =

1x1

+ α, y = y1x1

e passamos da curva y2 = G(x) para a y21 = G1(x1), onde G1 é uma

função linear. Vamos aplicar esta mudança de coordenadas para conseguir calcular aintegral

∫R(x, y) dx, onde y2 = G(x). Façamos, x = 1

x1+ α, y = y1

x1com a restrição de

que G(α) = 0. Então dx = − dx1x2

1e

∫R(x, y) dx = −

∫ R( 1x1+ α, y1

x1)

x21

dx1 =∫

R1(x1, y1) dx1,

Page 43: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.2: Integrais Elípticas 39

onde y21 = Ax1 + B.

Disso segue que a integral da forma∫

R(x, y) dx, onde R é uma função racional ey =

√G(x), pode ser expressa em termos mais elementares de funções de grau ≤ 2.

No caso em que deg G = 3 podem aparecer funções que são inversas das elípticas.As integrais

∫R(x, y) dx, onde y =

√G4(x), se reduz às integrais

∫Q(x, y) dx, onde

y =√

4x3 − g2x − g3. De fato, use novamente a mudança de coordenadas x = 1x1+ α,

y = y1x1

e podemos substituir o polinômio de grau 4, G4 por um de grau 3. Comoqualquer polinômio de grau 3 pode ser transformado, através de uma mudança linear,em um polinômio da forma 4x3 − g2x − g3.

Devemos nos ater ao calculo de integrais da forma∫

R(x, y) dx, onde y2 =4x3 − g2x − g3, mas em muitos casos outras integrais elípticas são mais apropriadas.Portanto, devemos iniciar calculando integrais desta forma e depois considerar asoutras formas especiais.

Seja I =∫

R(x, y) dx, onde y2 = a0x4 + 4a1x3 + 6a2x2 + 4a3x + a4, onde no mínimoum dos coeficiente a0 ou a1 é não nulo.

Teorema 3.1 (Legendre) As integrais elípticas podem ser representadas como combinaçãolinear de funções racionais em x e y, e de integrais de funções racionais de x, e das integrais

∫ dxy

,∫ xdx

y,∫ x2dx

ye∫ dx

(x − c)y.

Demonstração: Desde que y2 pode ser expresso em termos de x, podemos assumir queas funções racionais R não contem yk para k ≥ 2. Além disso,

a + byc + dy

=(a + by)(c − dy)y(c + dy)(c − dy)y

=Ay+ B,

onde A e B são funções racionais só de x. Portanto, no calculo das integrais∫

R(x, y) dxpodemos reduzir por analisar as integrais

∫B(x) dx e

∫ A(x)dxy . As funções racionais

A(x) podem ser representadas na forma

A(x) = ∑ anxn + ∑ar,m

(x − cr)m .

Daí, só nos resta considerar integrais do tipo

Jn =∫ xndx

y, (n ≥ 0) e Hm =

∫ dx(x − c)my

(m ≥ 1).

Comod

dx(xmy) = mxm−1y + xm dy

dx=

1y

[mxm−1y2 +

12

xm ddx

(y2)

]= (m + 2)a0

xm+3

y+ 2(2m + 3)a1

xm+2

y

+ 6(m + 1)a2xm+1

y+ 2(2m + 1)a3

xm

y+ ma4

xm−1

y,

Page 44: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

40 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

segue disso que

xmy =(m + 2)a0 Jm+3 + 2(2m + 3)a1 Jm+2

+ 6(m + 1)a2 Jm+1 + 2(2m + 1)a3 Jm + ma4 Jm−1.

Usando estas identidades para m = 0, 1, 2, . . . , podemos consequentemente expressarJ3 em termos de J0, J1 e J2 (e funções racionais de x e y), então J4 em termos de J0, J1, J2,etc. (No caso quando a0 = 0 podemos expressar J2 em termos de J0 e J1; e a próxima,J3 em termos de J0 e J1, etc)

Para calcular as integrais Hm, escrevendo os polinômios G(x) na forma

G(x) = b0(x − c)4 + 4b1(x − c)3 + 6b2(x − c)2 + 4b3(x − c) + b4,

onde b0 = a0. Como no caso precedente, temos a identidade

ddx

[(x − c)my] = (m + 2)b0(x − c)m+3

y+ 3(2m + 3)b1

(x − c)m+2

y

+ 6(m + 1)b2(x − c)m+1

y+ 2(2m + 1)b3

(x − c)m

y+ mb4

(x − c)m−1

y.

Integrando estas identidades para m = −1,−2,−3, . . . obtemos

yx−c = b0

∫ (x−c)2

y dx +2b1∫ x−c

y dx −2b3H1 −b4H2,y

(x−c)2 = +2b1 J0 −6b2H1 −6b3H2 −2b4H3,y

(x−c)2 = −b0 J0 −6b1 J1 −12b2H2 −10b3H3 −3b4H3,· · · · · · · · · · · · · · ·

Estas identidades nos permitem expressar H2, H3, H4, . . . em termos de J0, J1, J2 e H1e funções racionais em x e y.

Como mencionamos qualquer integral elíptica pode ser reduzida a uma integralda forma

∫R(x, y) dx onde y2 = 4x3 − g2x − g3. Desta forma as integrais elípticas

são ditas na forma de Weierstrass. No caso a0 = 0, segue que J2 pode ser expressa emtermos de J1 e J1; portanto, existem três tipos de integrais as quais restam para seremcalculadas:∫ dx√

4x3 − g2x − g3,∫ xdx√

4x3 − g2x − g3e

∫ dx(x − c)

√4x3 − g2x − g3

.

Outra forma muito usada de integrais elípticas é a forma de Legendre. Para esta aequação

y2 = (1 − x2)(1 − k2x2)

é usada. Podemos passar da forma de Weierstrass para a forma de Legendre daseguinte forma. Usando a mudança de coordenadas x = ax1 + b passamos da forma4x3 − g2x − g3 para x1(x1 − 1)(x1 − k2). O próximo passo, é fazer a mudança decoordenadas ξ2 = 1/x1, η = y2/x3

1, para obter η2 = (1 − ξ2)(1 − k2ξ2).

Page 45: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.3: Teoremas Aditivos para F(φ) e E(φ) 41

Para a forma de Legendre, todas os 4 tipos de integrais aparecem:∫ dx√G(x)

,∫ xdx√

G(x),∫ x2dx√

G(x)e

∫ dx(x − c)

√G(x)

,

onde G(x) = (1 − x2)(1 − k2x2): Mas, desde que:∫ xdx√(1 − x2)(1 − k2x2)

=12

∫ du√(1 − u)(1 − k2u)

,

onde u = x2, esta integral pode ser expressa em termos de funções elementares.Para simplificar um pouco a forma das integrais de Legendre, fazemos a mudança

de coordenadas x = sen φ. Então

dx = cos φ,√

1 − x2 = cos φ,√

1 − k2x2 =√

1 − k2 sen2 φ.

Portanto, as integrais mencionadas acima tomam a forma∫ dφ√1 − k2 sen2 φ

,∫ sen2 φdφ√

1 − k2 sen2 φ,∫ dφ

(sen φ − c)√

1 − k2 sen2 φ.

Estas integrais são chamada de integrais elípticas de primeiro, segundo e terceiro tipo,respectivamente.

Observe por um instante que a integral∫ sen2 φdφ√

1−k2 sen2 φpode ser substituída pela

integral∫ √

1 − k2 sen2 φ dφ porque

k2∫ sen2 φdφ√

1 − k2 sen2 φ=

∫ dφ√1 − k2 sen2 φ

−∫ √

1 − k2 sen2 φ dφ.

Observação 3.2 É um abuso de linguagem nos referirmos a∫ sen2 φdφ√

1−k2 sen2 φcomo integral

elíptica de segundo tipo porque na literatura este termo é aplicado para a integral∫ √1 − k2 sen2 φ dφ.

Para as integrais elípticas de primeiro e segundo tipo usando a notação deLegendre:

F(φ) =∫ φ

0

dφ√1 − k2 sen2 φ

e E(φ) =∫ φ

0

√1 − k2 sen2 φ dφ.

3.3 Teoremas Aditivos para F(φ) e E(φ)

Esta seção é um tanto técnica e os resultados dela só serão sentido nas próximasseções.

O exemplo mais simples que conheço, sem ser trivial, a respeito de teoremas deadição é o caso da função exponencial

f (u) = eu

Page 46: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

42 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

e comoeu · ev = eu+v

ouf (u) · f (v) = f (u + v)

tais equações possibilitam determinar o valor da função pela soma dos seusargumentos. Chamamos este tipo de relação de teoremas aditivos.

Um exemplo do que faremos é melhor exemplificado com a função tg(x), pois

tg(u + v) =tg u + tg v

1 − tg u tg v.

Fagnano havia provado alguns resultados que reformulados ficam da seguinteforma: Seja ϕ(u) definida como solução de

u =∫ ϕ(u)

0

dt√1 − t4

.

Então

ϕ(2u) = ϕ(u + u) =2ϕ(u)

√1 − ϕ2(u)

1 + ϕ4(u).

Euler estendeu estes resultados, faremos isso mas em outra linguagem.Seja

F(φ) =∫ φ

0

∆(φ)e E(φ) =

∫ φ

0∆(φ) dφ,

onde ∆(φ) =√

1 − k2 sen2 φ. se F(φ) + F(ψ) = F(µ), então sen µ pode seralgébricamente expresso em termo de sen φ e sen ψ. Para provar isso, considere aequação diferencial

dφ√1 − k2 sen φ

+dψ√

1 − k2 sen ψ= 0. (1)

A integral disso nos fornece F(φ) + F(ψ)− F(µ) = 0, onde µ é constante. Levandoem consideração que F é uma função ímpar, a integral pode ser expressa da formaF(φ) + F(ψ) + F(−µ) = 0. Vamos mostrar que a integral da equação diferencial 1satisfaz a seguinte relação

cos φ cos ψ − sen φ sen ψ√

1 − k2 sen2 µ = cos µ. (2)

De fato, ele pode ser reescrito, depois de elevar ao quadrado, em uma forma maissimétrica:

cos2 φ + cos2 ψ + cos2 µ − 2 cos φ cos ψ cos µ + k2 sen2 φ sen2 ψ sen2 µ = 1 (3)

O termo "simétrico” significa que não só (1) satisfazem mas também as relações:

cos µ cos φ − sen µ sen φ√

1 − k2 sen2 ψ = cos ψ (4)

cos µ cos ψ − sen µ sen ψ√

1 − k2 sen2 φ = cos φ, (5)

Page 47: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.4: As Funções Elípticas de Jacobi 43

desde que os argumentos φ, ψ e −µ nas entradas de (3) são simétricos.Dividindo ambos os lados de (2) por sen φ sen ψ e derivando obtemos a expressão.

O resultado pode ser reescrito na forma

(cos ψ − cos µ cos φ

sen φ

)+ dφ

(cos φ − cos µ cos ψ

sen ψ

)= 0

Fazendo uso das fórmulas (4) e (5) temos

dφ√1 − k2 sen φ

+dψ√

1 − k2 sen ψ= 0.

Segue, que (2) é de fato uma integral da equação diferencial (1). Mas não podemos terduas integrais independentes e, portanto, a igualdade F(φ) + F(ψ) = F(µ) implica

cos φ cos ψ − sen φ sen ψ√

1 − k2 sen2 µ = cos µ.

Esta equação nos fornece uma relação para cos µ. Fazendo x = cos µ, então sen2 µ =1 − x2. A relação (3) pode ser considerada como uma equação de segundo grau em x.Resolvendo ela em x obtemos

cos µ =cos φ cos ψ − sen φ sen ψ∆(φ)∆(ψ)

1 − k2 sen2 φ sen2 ψ. (6)

(a escolha do sinal nas fórmula (6) e (2) devem ser compatíveis para pequenos valoresde φ e ψ.)

Por transformações algébricas podemos derivar de (6) a seguintes expressões parasen µ e ∆(µ):

sen µ =sen φ cos ψ∆(ψ) + sen ψ cos φ∆(φ)

1 − k2 sen2 φ sen2 φ, (7)

∆(µ) =∆(φ)∆(ψ)− k2 sen φ sen ψ cos φ cos ψ

1 − k2 sen2 φ sen2 ψ. (8)

Dividindo (7) por (6) temos

tg µ =tg µ∆(φ) + tg ψ∆(ψ)

1 − tg φ tg ψ∆(φ)∆(ψ). (9)

3.4 As Funções Elípticas de Jacobi

A função

F(φ) =∫ x

0

dx√(1 − x2)(1 − k2x2)

=∫ φ

0

dφ√1 − k2 sen2 φ

,

onde x = sen φ, tem muitas detalhes em comum com a função

arcsen x =∫ x

0

dx√1 − x2

,

Page 48: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

44 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

Por exemplo, se F(φ) + F(ψ) = F(µ), então sen µ pode ser expresso em termo de sen φe sen ψ pela fórmula que deduzimos na seção anterior

sen µ =sen φ cos ψ∆(ψ) + sen ψ cos φ∆(φ)

1 − k2 sen2 φ sen2 ψ,

onde, ∆(φ) =√

1 − k2 sen2 φ e no caso em que k = 0, então

sen µ = sen φ cos ψ + sen ψ cos φ. (10)

Esta analogia não é acidental: para k = 0 a função F(φ) se torna a função arcsen x = φe a fórmula (7) se torna (10).

Por muitas razões é melhor considerar não a função φ = arcsen x, mas a sua inversax = sen φ. A função inversa de F(φ) é também mais conveniente que a própria F(φ).Vamos substituir a notação de Legendre pela notação de Jacobi. Faça u(φ) = F(φ). Afunção φ(u) = u−1(φ) é chamada de amplitude de u e é denotada por φ = am u. Outraforma de expressar a inversa quando envolve uma integral é definir o valor de am upor ser o valor que satisfaz a seguinte igualdade:

u =∫ am u

0

dφ√1 − k2 sen2 φ

.

Vamos definir as seguintes funções

sn u = sen am u, cn = cos am u e dn u = ∆(am u),

onde ∆(φ) =√

1 − k2 sen2 φ. E pelas fórmulas introduzidas em (6) - (8) temos que:

cn(u + v) =cn u cn v − sn u sen v dn u dn v

1 − k2 sn2 u sn2 v, (11)

sn(u + v) =sn u cn v dn v + sn v cn u dn u

1 − k2 sn2 u sn2 v, (12)

dn(u + v) =dn u dn v − k2 sn u sn v cn u cn v

1 − k2 sn2 u sn2 v. (13)

As funções sn u, cn u e dn u são usualmente chamadas de funções elípticas de Jacobi.Estas funções tem muitas propriedades estabelecidas, algumas destas propriedades,são extensões de propriedades estabelecidas por Legendre e Abel antes de Jacobi.

A propriedade mais importante das funções sn u, cn u e dn u é de serem de períododuplo. A existência de um período é claro. De fato, as funções sen φ e cos φ temperíodo 2π = 4(π

2 ) e a função sen2 φ tem período π = 2(π2 ). Portanto, as funções sn u

e cn u tem período igual 4K, onde

K =∫ π/2

0

dφ√1 − k2 sen2 φ

;

e a função dn u =√

1 − k2 sen2 u tem período de 2K. Substituíndo obtemos

sn K = 1, cn K = 0 e dn K =√

1 − k2,

Page 49: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.4: As Funções Elípticas de Jacobi 45

utilizando (11) - (13) temos

sn(u + K) =cn udn u

, cn(u + K) = −√

1 − k2 sn udn u

e dn(u + K) =

√1 − k2

dn u.

Desde que sn 2K = 0, cn 2K = −1 e dn 2K = 1, segue que

sn(u + 2K) = − sn u, cn(u + 2k) = − cn u e dn(u + 2K) = dn u.

É mais difícil mostrar que as funções elípticas de Jacobi tem outro período. Paraisso, recordemos que ∫ dφ√

1 − k2 sen2 φ

foi obtida da integral ∫ dx√(1 − x2)(1 − k2x2)

com a ajuda da mudança de coordenadas x = sen φ. Ela deverá ser mais convenienteque a integral original. Vamos considerar esta integral sobre C, a função

u(z) =∫ z

0

dz√(1 − z2)(1 − k2z2)

não esta definida pois os valores de u(z) dependem do contorno de integração. Osvalores da função u(z) em um mesmo ponto podem diferir por um número da forma

L =∫

C

dz√(1 − z2)(1 − k2z2)

onde a integral é tomada ao longo de um caminho de contorno C. Aqui o número L éo período da função inversa z(u). O integrando tem pontos singulares nos pontos ±1,±1

k .Vamos ver como a escolha dos caminhos de integração ao redor destes pontos

afetam os valores das funções sn u = z, cn u =√

1 − z2 e dn u =√

1 − k2z2.Seja

K =∫ 1

0

dz√(1 − z2)(1 − k2z2)

e α =∫ X

0

dz√(1 − z2)(1 − k2z2)

.

O caminho que aparece na figura (3.1) mostra que os valores da integral no ponto Xsão iguais a α e K + (K − α) = 2K − α. De fato, no mínimo uma parte do caminho ou osinal da função

√1 − z2 e a direção do semento de integração mudam; como resultado

destas duas mudanças a integral permanece inalterada. Portanto, sn α = sn(2K − α).Al’em disso, o sinal da função

√1 − z2 muda nesta passagem e o sinal de

√1 − k2z2

não muda. E como, cn α = − cn(2K − α) e dn α = dn(2K − α). Substituindo α por −αtemos

sn(α + 2K) = sn(−α) = − sn α,cn(α + 2K) = − cn(−α) = − cn α,dn(α + 2K) = dn(−α) = dn α.

Page 50: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

46 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

Figura 3.1: Caminho até X

Figura 3.2: Outro caminho até X

Agora, vamos considerar a integrais ao longo da curva que aparece na figura (3.2).Seja

iK′ =∫ 1

k

0

dz√(1 − z2)(1 − k2z2)

.

(o número K′ real uma vez que√

1 − z2 é imaginário puro com z ∈ (1, 1k )). Portanto,

os valores da integral no ponto X são α e K + iK′ + iK′ − (K − α). Aqui somente o sinaldo último somando precisa ser analisado.

Observe que aqui ocorre três mudanças de sinal: a direção da curva tem duasmudanças, assim como fizeram os sinais de ambas as funções

√1 − z2 e

√1 − k2z2.

Como resultado, temossn(α) = sn(α + 2iK′),

cn(α) = − cn(α + 2iK′),

dn(α) = −dn(α + 2iK′).

Portanto, as funções sn u, cn u e dn u tem período 2iK′, 4iK′ e 4iK′, respectivamente.Além disso, a função cn u tem período 2K + i2K′. De fato,

cn(α + 2K + i2K′) = − cn(α + i2K′) = cn α.

Disto, a função sn u tem períodos 4K e 2iK′; a função cn u tem períodos 4K e2K + 2iK′; e a função dn u tem períodos 2K e 4iK′.

3.5 Arcos de Elipses e Hipérboles

Vamos começar retornando a discussão que fizemos a respeito da elipse x2

a2 +y2

b2 = 1a qual pode ser parametrizada pelas fórmulas x = a sen φ e y = b cos φ. A diferencialdl do comprimento de arco da elipse é igual

√dx2 + dy2 =

√a2 cos2 φ + b2 sen2 φdφ.

Se a = 1 e b =√

1 − k2, então dl =√

1 − k2 sen2 φdφ.

Page 51: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

3.5: Arcos de Elipses e Hipérboles 47

Figura 3.3: Arcos Sobre a Elipse

Neste caso o comprimento de arco da elipse entre o ponto inicial sobre o eixo menorB, e o ponto M = (a sen φ, b cos φ) é igual a

E(φ) =∫ φ

0

√1 − k2 sen2 θ dθ.

Uma parametrização simples da hipérbole x2

a2 −y2

b2 = 1 é obtida usando as funçõeshipérbolicas x = a cosh t, y = b senh t. Para expressar o comprimento de arco dahipérbole em termos de F(φ) e E(φ), no entanto, precisamos parametrizar a hipérbolecom funções trignométricas. Uma tal parametrização é dada pelas fórmulas

x =a

cos φ, y = b tg φ.

Sobre tal parametrização a diferencial do comprimento de arco fica

1cos2 φ

√a2 sen2 φ + b2 dφ

e esta fórmula não fornece uma expressão desejada. Portanto, consideremos outraparametrização por colocar y = b2 tg φ. Então

x2 =

(a

cos φ

)2 (1 − (1 − b2) sen2 φ

).

Em particular, se a2 = 1 − b2 = k2 nos dá

x =1

cos φ

√1 − k2 sen2 φ e y = (1 − k2) tg φ

daí,

dl =(1 − k2)dφ

cos2 φ√

1 − k2 sen2 φ.

Então o comprimento do arco AM sobre a hipérbole é igual a

Γ(φ) =∫ φ

0

(1 − k2)dψ

cos2 ψ√

1 − k2 sen2 ψ=

∫ φ

0

(1 − k2)dψ

cos2 ψ∆(ψ),

Page 52: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

48 Capítulo 3: Arcos de Curvas e Integrais Elípticas

Figura 3.4: Arcos Sobre a Hipérbole

onde ∆(ψ) =√

1 − k2 sen2 ψ. Desde que ∆′(ψ) = − k2 sen ψ cos ψ∆(ψ) , disto segue que

(∆(ψ) tg ψ)′ = −k2 sen2 ψ

∆(ψ)+

∆(ψ)cos2 ψ

=1 − k2

cos2 ψ∆(ψ)− 1 − k2

∆(ψ)+ ∆(ψ)

e temosΓ(φ) = ∆(φ) tg φ −

∫ φ

0∆(ψ)dψ + (1 − k2)

∫ φ

0

∆(ψ)= ∆(φ) tg φ − E(φ) + (1 − k2)F(φ).

Disso, o comprimento de arco da hipérbole pode também ser expresso como asintegrais elípticas E(φ) e F(φ) (e o função elementar ∆(φ) tg φ).

3.6 Exercícios

1. Prove que a mudança de coordenadas 1x3 + x3 = 2t−3/2 transforma a∫

(1 + x6)−1/3 dx em uma integral elíptica.

2. Prove que a mudança de coordenadas t(1 − x) = (1 − x3)1/3 transforma a∫(1 − x3)−2/3 dx em uma integral elíptica.

Page 53: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Capítulo 4

A Lemniscata e o Teorema de Mordell

Neste capítulo vamos iniciar tratando da lemniscata de Bernoulli. Foi no estudodas divisões da Lemniscata que muito da teoria apresentada até aqui se desenvolveu,este estudo culminou com os resultados de Abel. No restante do capítulo vamos falarum pouco sobre o legado de Diofanto e concluir com alguns exemplos sobre o grupoobtido pela adição de pontos sobre as cúbicas e o Teorema de Mordell.

4.1 História

Este capítulo pretende apenas apresentar alguns fatos históricos e de como elesapareceram e se relacionaram com as integrais elípticas.

Uma lemniscata é uma curva cuja equação em coordenadas polares é da formar2 = cos 2θ. O nome "lemniscata” vem da palavra latina lemniscatus - decorada comfaixas. Em coordenadas cartesianas (x, y), onde x = r cos θ e y = r sen θ, a equação dacurva é

(x2 + y2)2 = x2 − y2.

De fato, x2 + y2 = r2 e x2 − y2 = r2 cos 2θ.O astrônomo francês de origem Italiano Jean-Dominique (Giovanni Dominico)

Cassini (1625− 1712) foi o primeiro a estudar a lemniscata. Ele considerou curvas maisgerais cujo lugar geométrico são os pontos cujo o produto da distância a dois pontosfixos F1 e F2 era uma constante (faz lembrar a definição de elipse).

Através de suas observações astronômicas Cassini acreditava que com a ajuda detais curvas o movimento dos planetas deveriam ser descritos com maior precisão doque com as elipses. Agora estas curvas são chamadas de Ovais de Cassini. Mas o livro deCasssini Eléments d’astronomie, no qual as ovais foram estudadas, só foi publicando em1749, muitos anos depois da sua morte. Para a comunidade matemática a lemniscatatornou conhecida através dos artigos de J. Bernoulli e I. Bernoulli publicados em 1694e, portanto, é chamada de lemniscata de Bernoulli.

As ovais de Cassini tem equação dada por

f (a, b)(x, y) = (((x − a)2 + y2)((x + a)2 + y2)− b4)

Dependendo dos parâmentros (a, b) temos um tipo de curva, veja figuras seguintes:

49

Page 54: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

50 Capítulo 4: A Lemniscata e o Teorema de Mordell

Figura 4.1: a = 1, b = 0, 8 Figura 4.2: a = 1, b = 0, 95 Figura 4.3: a = 1, b = 1

Quando a = b temos a lemniscata, no caso, em questão, a = b = 1 (veja figura(4.3)).

Figura 4.4: a = 1, b = 1, 05 Figura 4.5: a = 1, b = 1, 2 Figura 4.6: a = 1, b = 1, 5

As propriedades mais interessantes da lemniscata foram descobertas pelomatemático italiano Count Fagnano. Fagnano descobriu que o comprimento de arcoda lemniscata podia ser expresso em termos de uma integral elíptica de primeiro tipo.Ele obteve os teoremas de adição para estas integrais e, portanto, demonstrou que adivisão dos arcos da lemniscata em n partes iguais era um problema algébrico. Em1750 Fagnano publicou a sua coleção de artigos que Euler tomou conhecimento e fezinúmeros generalizações dos resultados de Fagnano.

Fagnano já sabia que a divisão da lemniscata podia ser reduzida a solução deequações algébricas. No entanto, os métodos para a solução por quadratura (tirarraiz quadrada) não estavam desenvolvidos a época. O primeiro a fazer progressosneste campo foi o jovem Gauss que na época estava com 19 anos. Ele encontrou queo 17-ésimo polígono regular era construtível com régua e compasso, isto é, a equaçãox17 − 1 = 0 é solúvel por raízes quadradas. Depois, Gauss mostrou que todo polígonoregular com n lados era construtível com régua e compasso se n era da forma 2p1 · · · pk,onde pi é um primo de Fermat, isto é, se é da forma 22m

+ 1. Gauss escreveu que todosos outros n era impossível construir o polígono regular com régua e compasso, masnão temos evidência de que ele provou isso.

Gauss também se interessou pelo problema da divisão da Lemniscata. Por exemplo,ele mostrou que para a divisão da lemniscata em 5 partes iguais caia em uma equaçãode grau 25 e que esta equa¸ao era solúvel por quadratura. Em seu argumento eleutilizou que 5 podia ser representado com o produto de 2 + i por 2 − i. Gauss nãopublicou os seus resultados mas o seu livro Disquisitiones Arithmeticae, o qual apareceuem 1801, ele mencionou que os métodos que ele havia desenvolvido eram aplicáveisnão somente para funções trignométricas mas também para funções relativas a integral∫ dx√

1−x4 .Esta afirmação intrigou Abel. Abel investigou os detalhes da equação da divisão

da lemniscata e provou que a lemniscata podia ser dividida em n partes desde que

Page 55: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

4.2: O Método das Secantes de Diofanto 51

n fosse da forma 2a p1 · · · pk, onde pi é um primo de Fermat. Abel considerou esteteorema como um de seus mais importantes resultados. Isto aparece na segunda partede seu trabalho Recherches sur les fonctions elliptiques. A prova dada por Abel é longa ecomplicada.

Depois, Eisenstein (1823 − 1852) obteve uma prova mais simples. Ele fez algumasdescobertas a respeito de certas porpriedades dos polinômios relacionandos com adivisão da Lemniscata. As provas de Eisenstein permaneceram desconhecidas.

Recentemente Rosen (veja ([7])) encontrou uma prova elegante do teorema de Abel.Sua prova é bastante simples, além disso, claramente demonstra o papel decisivodesempenhado pela invariância do período do reticulado das funções envolvidas nalemniscata com respeito a multiplicação por i.

4.2 O Método das Secantes de Diofanto

Antes do tempo de Euclides, um novo método para resolver as equações nosinteiros foi desenvolvido, no século III, por Diofanto. Ele foi um matemático que viveuem Alexandria, no Egito. Pouco se sabe sobre a sua vida, tendo até dificuldades deestabelecer a época que ele viveu. Ele desenvolveu métodos para encontrar as soluçõesinteiras ou racionais de quadráticas e de certas cúbicas com duas ou mais variáveis.Com as suas construções ele fundou uma nova disciplina hoje chamada de equaçõesdiofantinas, em sua homenagem. Ele resumiu os seus estudos em 13 livros cujo títulose chamava arithmetics.

Este livro é impressionante. Depois de escritos estes trabalhos se perderam. Só setinha notícia de sua existência por citações de outros autores. Os tratados de Diofantoficaram perdidos por mais de mil anos. Foi somente em 1464 que um cientista alemãoRegiomontanus acidentalmente encontrou 6 dos 13 livros da Arithmetics. Ele publicouuma tradução em latin no ano de 1745. Depois houve uma edição francesa, preparadapor Bachet de Mesiriac, que foi publicada em 1621 e tornou-se o livro de cabeceira deinúmeros matemáticos, como Peire de Fermat e René Descartes entre outros. E foi namargem de uma cópia da Arithmetics de Diofanto que Fermat escreveu a sua maisnotório recado que entrou para a história da matemática.

Cubum autem in duos cubos, aut quadrato-quadratum in duosquadrato-quadratos, et generaliter nullam in infinitum ultra quadratumpotestatem in duas ajusdem nominis fas est divedere; cujus reidemonstrationem mirabilem sane detexi. Hanc marginis exiguitas noncaperet.

Vamos examinar um pouco como funcionava o método das secantes desevolvidapor Diofanto. Recordamos que uma tripla (a, b, c) de inteiros positivos é chamadatripla pitagórica se ela satisfaz a2 + b2 = c2. Se (a, b, c) é uma tripla pitagórica então

( ac

)2+

(bc

)2

= 1,

Page 56: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

52 Capítulo 4: A Lemniscata e o Teorema de Mordell

é um ponto da circunferência de raio 1, centrada na origem, cuja equação é x2 + y2 = 1.Dividir por c2 é uma boa ideia, pois, a tripla (6, 8, 10) e (3, 4, 5) são levadas no mesmoponto racional (3/5, 4/5).

Iniciamos parametrizando todos os pontos P sobre a circunferência unitária.Escolha um ponto fora do primeiro quadrante, por exemplo, (−1, 0) e considereℓ = ℓ(P) a reta unindo ele ao ponto P. Vemos que conforme alteramos o declive dareta ℓ percorremos todos os pontos da circunferência unitária.

Proposição 4.1 Os pontos P sobre a circunferência unitária e diferentes de (−1, 0) sãoparametrizados por

P =

(1 − t2

1 + t2 ,2t

1 + t2

), onde − ∞ < t < ∞.

Demonstração: Considere a reta que passa pelo ponto (−1, 0) e P = (x, y) tem equaçãoy = t(x + 1). Procurando as soluções do sistema{

y = t(x + 1)

x2 + y2 = 1

Uma solução óbvia é (−1, 0). Se t = 0, então a reta ℓ fica sobre o eixo x e a outrasolução é (1, 0). Para encontrar as outras soluções considere t = 0 e isolando x naprimeira equação x = (y − t)/t e substituindo na segunda(

y − tt

)2

+ y2 = 1,

expandindo e simplificando obtemos

y[(1 + t2)y − 2t

]= 0.

É fácil de entender as soluções do tipo y = 0, então vamos considerar y = 0 e temos

y =2t

1 + t2 ,

Page 57: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

4.2: O Método das Secantes de Diofanto 53

e resolvendo e simplificando temos

x =y − t

t=

2t1+t2 − t

t=

1 − t2

1 + t2 .

Este método funciona não só para x2 + y2 − 1, mas todo polinômio em duasvariáveis do tipo

p(x, y) = Ax2 + 2Bxy + Cy2 + Dx + Ey + F.

Em sua Arithmetic Diofanto não se confinou ao estudo de equações de grau 2. Eleteve sucesso em resolver certas equações cúbicas e deu métodos para encontrar ospontos racionais da equação

y(6 − y) = x3 − x.

O problema da antiguidade de encontrar soluções racionais para a cúbica x3 + y3 =1, são caso particulares do problema de encontrar soluções racionais sobre cúbicasem geral f (x, y) = 0 e por sua vez estas são casos particulares de encontrar soluçõesracionais sobre curvas quaisquer.

Vamos examinar alguns detalhes a respeito de encontrar soluções racionais sobrecúbicas.

Inicialmente, suponha que a cúbica f (x, y) = 0 tem um ponto singular O e que eleé um ponto racional. Qualquer reta passando por este ponto intercepta a cúbica em nomínimo dois pontos. Isto implica, em particular, que a cúbica não pode ter dois pontossingulares, O e O1, porque a reta passando por OO1 deverá interceptar a cúbica empelo menos 4 pontos.

Dada a reta x = x0 + at, y = y0 + bt, a, b ∈ Q e passando por O = (x0, y0).A interseção desta reta com a curva corresponde as raízes do polinômio F(t) =f (x0 + at, y+bt). Os coeficientes de F são todos racionais e para quase todas as retaso grau de F é 3. O polinômio F tem uma raíz quando t = 0 de multiplicidade2 correspondente ao ponto O. Então a terceira raiz também é racional, isto é, elacorresponde a um ponto racional sobre a curva. Isto mostra que a reta que conectaO com outro ponto sobre a curva é racional. Isto nos dá uma completa descrição doconjunto d pontos racionais sobre uma curva cúbica singular.

No que segue vamos considerar somente cúbicas não singulares. Recorde de comofazíamos para somar pontos no primeiro capítulo. Se escolheremos o ponto E comcoordenadas racionais então sempre que somarmos A e B racionais obtemos comoresultado um ponto racional.

A curva y2 = x3 + ax2 + b é não singular, se e só se, o seu discriminante ∆ =−(4a3 + 27b2) é não nulo. Se tomarmos um ponto no infinito como sendo o elementoneutro da soma, então é fácil explicitarmos as fórmulas de soma de dois pontos. Sejamy = px + q uma reta que encontra a curva em (xi, yi), i = 1, 2, 3. Então

(px + q)2 = x3 + ax + b,

Page 58: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

54 Capítulo 4: A Lemniscata e o Teorema de Mordell

para x = x1, x2, x3. A soma das raízes desta equação é igual a p2; desde que

x3 = −x1 − x2 + p2 = −x1 − x2 +

(y1 − y2

x1 − x2

)2

,

y3 = px + q =y1 − y2

x1 − x2(x3 − x1) + y1.

Claramente, as coordenadas da soma de pontos (x1, y1), (x2, y2) são (x3,−y3). Sex1 = x2 e y1 = y2, é suficiente notar que

limx2→x1

y1 − y2

x1 − x2= y′(x1) =

3x21 + a2y1

.

Deveremos considerar separadamente os casos x1 = x2 e y1 = y2. Neste caso a somados pontos é um ponto no infinito.

As fórmulas obtidas mostram que se for conhecido um ponto racional P da curvay2 = x3 + ax + b podemos encontrar 2P, 3P, etc. Consideremos, por exemplo, a curvay2 = x3 − 2 e o ponto (3, 5). Então

2P = (129100

,− 3831000

)

o qual é um novo ponto racional. Podemos calcular 3P, 4P, etc. Em cada passo docalculo o valor cresce consideravelmente.

Vale a pena observar que os pontos 2P, 3P, 4P não são necessariamente distinto. Sealgum deles coincidem, então deve existir um menor valor m positivo para o qual mPé o elemento neutro do grupo, isto é, o ponto no infinito, chamamos este valor m deordem de P.

4.3 Exemplos e Teorema de Mordell

Nesta seção vamos considerar alguns exemplos de cúbicas não singularesdeterminado por equações em sua forma normal

y2 = x3 + ax + b

ou pory2 + 2cy = x2 + ax + b

a qual podemos reduzir ao caso precedente por fazer a seguinte mudança decoordenadas y 7→ y + c.

Mantendo o foco nos pontos racionais da curva E; que deveremos denotar porE(Q). Este conjunto, como já dissemos é um grupo abeliano, cujo o elemento neutro éo ponto no infinito da curva.

Exemplo 4.2 Considere o seguinte problema: Represente o produto de dois inteirosconsecutivos y(y + 1) na forma do produto de três inteiros consecutivos (x − 1)x(x + 1) =x3 − x. Este problema nos fornece uma curva E determinada pela equação

y2 + y = x3 − x.

Page 59: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

4.3: Exemplos e Teorema de Mordell 55

Sobre esta curva, existem 6 soluções óbvias (veja figura 4.7)

(0, 0), (1, 0), (−1, 0), (0,−1) e (−1,−1).

Figura 4.7:

Colocando P = (0, 0). Então

(1, 0) = 2P, (−1, 0) = −3P, (0,−1) = −P, (1,−1) = −2P, (−1,−1) = 3P.

O ponto P gera um grupo cíclico infinito. Todos os pontos da forma (2n + 1)P pertence acomponente que contém o ponto P; os pontos da forma 2nP estão na componente não limitadae tendem ao infinito.

Exemplo 4.3 A curva E dada pela equação

y2 + y = x3 − x2

tem 4 soluções inteiras relativamente fáceis de encontrar que são

(1, 0), (0, 0), (0,−1) e (1,−1).

A tangente a curva E em (1,0) intercepta a curva E no ponto (0,-1); isto significa que2(1, 0) = (0, 0); como 2(1,−1) = (0, 1). A tangente a E no ponto (0, 0) intercepta E no

Page 60: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

56 Capítulo 4: A Lemniscata e o Teorema de Mordell

Figura 4.8:

ponto (1,0), isto dá que 2(0, 0) = (1,−1). A equação 2(1, 0) = (0, 0), 2(1,−1) = −(1, 0)implicam 4(1, 0) = (1,−1) = −(1, 0), isto é, 5(1, 0) = 0. Segue que

{0, (1, 0), (0, 0), (0,−1), (1,−1)}

e temos um subgrupo de ordem 5 em E(Q). Usando outras técnicas que não abordamos nestasnotas se pode mostrar que não há outros pontos racionais sobre esta curva.

Exemplo 4.4 Considere a curva E dada por

y2 + y = x3 + x2.

Esta curva tem 4 pontos fáceis de localizar (conforme figura 4.9)

(0, 0), (−1, 0), (0,−1) e (−1,−1).

O ponto P = (0, 0) gera um subgrupo cíclico infinito de E(Q).De fato, não é difícil calcular que

2P = (−1,−1), −3P = (1, 1), 3P = (1,−2), 4P = (2, 3), 5P = (−34

,−94).

A tangente T no ponto −2P intersecta a curva o ponto 4P, a reta L que passa por 2P e Pintersecta a curva em ponto −3P; o ponto −5P é construído ou usando L1 através de P e 4Pou usando L2 através de 2P e 3P.

Exemplo 4.5 Considere a curvay2 = x3 + k, (1)

onde k é um inteiro.

Page 61: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

4.3: Exemplos e Teorema de Mordell 57

Figura 4.9:

A correspondente equação diofantina foi primeiro considerada no séc. XVII porFermat e Bashe de Mesiriac no caso particular de k = −2 e foi alvo de intenso estudo.Ainda é desconhecido para quais inteiros k a equação 1 tem no mínimo uma soluçãoracional. Bashe afirmou (sem provas) que se a solução racional (x, y), com xy = 0existe, então o método dsa tangentes nos leva a um número infinito de soluçõesracionais.

Em termos modernos isso significa que se o grupo E(Q) de pontos racionais dacurva (1) é não nulo, então ele é infinito. Com certas restrições este resultado foiprovado em 1930 pelo matemático alemão Fueter. Em 1966 uma prova impressionantee curta do resultado de Fueter foi dada peolo matemático inglês Mordell.

Em 1901 o grande matemático francês A. Poincaré conjecturou que todos os pontosracionais de E(Q) de uma curva elíptica podem ser obtidos como soma de um númerofinito de pontos. Em termos algébricos esta afirmação pode ser reformulado como nopróximo teorema.

Teorema 4.6 (Mordell) O grupo E(Q) de pontos racionais de qualquer curva racionalelíptica E é finitamente gerado como grupo abeliano.

Poincaré considerou esta afirmação óbvia. Em 1922 o matemático inglês Mordellobteve a primeira prova rigorosa da conjectura de Poincaré. Durante as 7 décadas quese seguiram houve várias generalizações e novas variantes da prova deste teorema.

Page 62: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

58 Capítulo 4: A Lemniscata e o Teorema de Mordell

Page 63: Conexões entre Curvas e Integrais Elípticas

Referências Bibliográficas

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