comunicação mercadológica e apropriações da indústria...

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1 MARIO AUGUSTO MANCUSO JORGE Comunicação mercadológica e apropriações da indústria cultural: Batman e o consumo infantil Universidade Metodista de São Paulo Programa de Pós- Graduação em Comunicação Social São Bernardo do Campo SP/ 2010

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MARIO AUGUSTO MANCUSO JORGE

Comunicação mercadológica e apropriações

da indústria cultural:

Batman e o consumo infantil

Universidade Metodista de São Paulo

Programa de Pós- Graduação em Comunicação Social

São Bernardo do Campo – SP/ 2010

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MARIO AUGUSTO MANCUSO JORGE

Comunicação mercadológica e apropriações

da indústria cultural:

Batman e o consumo infantil

Dissertação apresentada em cumprimento parcial

às exigências do Programa de Pós-Graduação em

Comunicação Social da Universidade Metodista de

São Paulo, para obtenção do grau de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Daniel dos Santos Galindo

Universidade Metodista de São Paulo

Programa de Pós - Graduação em Comunicação Social

São Bernardo do Campo – SP, 2010

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A dissertação de mestrado sob o título “COMUNICAÇÃO MERCADOLÓGICA E

APROPRIAÇÕES DA INDÚSTRIA CULTURAL: Batman e o consumo infantil”, elaborada

por Mario Augusto Mancuso Jorge, foi apresentada e aprovada em 07 de abril de 2010,

perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Daniel dos Santos Galindo (Presidente/

UMESP), Profa. Dra. Elizabeth Moraes Gonçalves (Titular/ UMESP) e Profa. Dra. Sonia

Maria Bibe Luyten (UNIPC).

_______________________________________________

Prof. Dr. Daniel dos Santos Galindo

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

_________________________________________

Prof. Dr. Sebastião Carlos de Morais Squirra

Coordenador do Programa de Pós-Graduação

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social UMESP

Área de concentração: Processos Comunicacionais

Linha de pesquisa: Processos de Comunicação Institucional e Mercadológica

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Dedico este trabalho a minha esposa

Patrícia Ferrari, companheira de todas as

horas, que me faz acreditar diariamente que

sonhos tornam-se realidade.

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“O produto pode ser copiado pelo

concorrente; a marca é única. O produto pode

ficar ultrapassado rapidamente; a marca bem-

sucedida é eterna.”

Stephen King

Grupo WPP, Londres

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Primeiramente, quero agradecer ao meu

grande amigo, professor Alberto Pessoa, pelo

incentivo, parceria e conversas, sempre instigantes,

ao longo destes dois anos.

Aos professores Waldomiro Vergueiro,

Elydio dos Santos e Sonia Luyten, pelo apoio e

orientação quando me encontrava sem saber para

onde ir ou o que fazer.

Aos meus amigos e colegas que me ajudaram

e participaram em algum momento, com seu

carinho, apoio e conhecimento.

À minha família amada e companheira, que

este trabalho seja motivo de alegrias.

Aos professores do POSCOM da

Universidade Metodista de São Paulo, por todo o

conhecimento e dedicação a nós, alunos e

pesquisadores.

À Universidade Metodista de São Paulo e à

CAPES por viabilizarem este projeto

Ao meu orientador, Prof. Dr. Daniel dos

Santos Galindo, pela dedicação e paciência,

indicando o caminho e contribuindo com seu

conhecimento e experiência, mesmo quando me

achava aflito e desorientado.

E a Deus, sem o qual nada existiria...

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LISTA DE TABELAS E FIGURAS

Tabelas: Página:

Tabela 1 - Comparação das Teorias Desenvolvimentais em algumas questões-

chave sobre o desenvolvimento ................................................................................

22

Tabela 2 - Estimativa do mercado de licenciamento nos últimos anos ..................... 80

Figuras: Página:

Figura 1 - Capa da edição de estreia de Batman, em maio de 1939 ............................ 40

Figura 2 - Cartaz do longa-metragem de cinema, baseado no seriado de 1966 ......... 46

Figura 3 - O Batman no traço de Neal Adams (década de 1970) e no traço de Frank

Miller (1986) ................................................................................................................

49

Figura 4 - Estrela de identidade do personagem de marca .......................................... 85

Figura 5 - Representações das linhas Batman ............................................................. 90

Figura 6 - A representação clássica de Batman e a versão do último longa-metragem

cinematográfico, respectivamente ................................................................................

95

Figura 7 - A Batcaverna , segundo representação do vídeo game Mortal Kombat vs.

DC Universe ...............................................................................................................

96

Figura 8 - Coringa e Duas-caras nas HQs de Batman ................................................ 98

Figura 9 - Exemplo de produtos com licença Batman ................................................ 105

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13

1. O TRABALHO: OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................... 14

2. DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS .......................................................................................... 17

CAPÍTULO I - A CRIANÇA: DESENVOLVIMENTO E CONSUMO ........................... 19

1. O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA ............................................................................... 19

2. DESENVOLVIMENTO COGNITIVO: APRENDIZAGEM E PROCESSAMENTO DE INFORMAÇÕES

23

3. A RELAÇÃO DA CRIANÇA COM SEU MEIO AMBIENTE E INTRODUÇÃO AO CONSUMO ........ 26

4. FATORES EXTERNOS: O INTER-RELACIONAMENTO DA CRIANÇA EM SEU MEIO SOCIAL ... 27

5. A CRIANÇA POR ELA MESMA: O AUTOCONCEITO ............................................................ 29

6. O AMBIENTE SOCIAL DA CRIANÇA.................................................................................. 30

7. A CRIANÇA E AS PRÁTICAS DE CONSUMO ....................................................................... 31

8. CONSUMO E MÍDIA ......................................................................................................... 34

CAPÍTULO II - A HISTÓRIA DE BATMAN: A TRAJETÓRIA DO HOMEM-

MORCEGO DENTRO DA CULTURA DE MASSA NORTE-AMERICANA................ 39

1. AS ORIGENS DO MORCEGO ............................................................................................. 39

2. A TRAJETÓRIA DE BATMAN DENTRO DA CULTURA DE MASSA NORTE-AMERICANA. ....... 42

3. BATMAN NAS DIVERSAS MÍDIAS .................................................................................... 55

CAPÍTULO III - COMUNICAÇÃO MERCADOLÓGICA: DA MARCA AO

CONSUMIDOR ...................................................................................................................... 60

1. UMA INTRODUÇÃO AO MARKETING ............................................................................... 60

2. A FORÇA DA MARCA ...................................................................................................... 61

2.1 Marcas arquetípicas .................................................................................................... 65

3. O CONSUMO E O CONSUMIDOR ....................................................................................... 67

4. CONSUMO E COMUNICAÇÃO: A COMUNICAÇÃO MERCADOLÓGICA ................................. 69

4.1 O mix da comunicação a serviço do marketing .......................................................... 73

5. A COMUNICAÇÃO MERCADOLÓGICA E A MARCA ............................................................ 75

CAPÍTULO IV - MARCA E PERSONAGEM NO LICENCIAMENTO......................... 78

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1. UM POUCO DE HISTÓRIA ................................................................................................ 79

2. O LICENCIAMENTO COMO FERRAMENTA DE MARKETING ............................................... 80

3. TIPOS DE LICENCIAMENTO ............................................................................................. 81

4. PERSONAGENS E O LICENCIAMENTO .............................................................................. 83

CAPÍTULO V - A MARCA DO MORCEGO: CARACTERÍSTICAS E ANÁLISE DA

MARCA BATMAN ................................................................................................................ 89

1. QUEM É BATMAN? O FÍSICO, A PERSONALIDADE E O IMAGINÁRIO DO CAVALEIRO DAS

TREVAS ..................................................................................................................................... 92

2. HOMEM-MORCEGO: O RELACIONAMENTO E O REFLEXO ENTRE BATMAN E O PÚBLICO .... 99

3. A APROPRIAÇÃO DE BATMAN NA VISÃO DO LICENCIADOR E DOS LICENCIADOS. .......... 101

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 107

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 115

ANEXO 1 - APRESENTAÇÃO DE KIT DE MÍDIA PARA LICENCIAMENTO DA

MARCA BATMAN .............................................................................................................. 121

ANEXO 2 - ENTREVISTA COM LICENCIADOR ......................................................... 122

ANEXO 3 - ENTREVISTAS COM LICENCIADOS ....................................................... 127

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RESUMO

Este estudo tem por objetivo analisar o uso do licenciamento do personagem Batman

dentro da estratégia de comunicação mercadológica, originada a partir da apropriação do

super-herói das histórias em quadrinhos norte-americano de mesmo nome e sua aplicação em

itens de consumo voltados ao público infantil (Kids), de 4 a 8 anos, e pré-adolescente

(Tweens), de 9 a 13 anos, especificamente. Buscou-se compreender a evolução e popularidade

de um super-herói sombrio da cultura de massa, com mais de 70 anos de existência,

transformado em marca comercial para produtos infantis, sem qualquer relação aparente com

sua caracterização dentro de seu universo simbólico, para um público novo que redescobre o

super-herói através de sua divulgação na mídia. O estudo foi desenvolvido através de

recuperação bibliográfica dos conceitos abordados, da revisão histórica do personagem, e da

pesquisa de campo na forma de entrevistas qualitativas com licenciador e licenciados. Na

conclusão, chegou-se às características que indicam as razões da popularidade de Batman,

como personagem e marca, bem como os motivos que levam à sua utilização comercial

através do licenciamento.

Palavras-chave: Criança; Consumo; Comunicação com o mercado; Licenciamento; Batman

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ABSTRACT

This study aims to analyze the use of licensing of the character Batman in the

marketing communication strategy, initiated from the appropriation of the superhero comics

of the U.S. of the same name and its application in consumer items aimed at Kids, from 4 to 8

years, and Tweens, 9 to 13 years, specifically. We tried to understand the evolution and

popularity of a gloomy super-hero of mass culture, with more than 70 years of existence,

turned into a brand name for products for children, with no apparent relation with his

characterization in his symbolic universe for a new public rediscovering the superhero

through its media coverage. The study was developed through the literature on recovery

concepts discussed, the historical review of the character, and field research in the form of

qualitative interviews with graduates and graduates. In conclusion, arrived at the

characteristics that indicate the reasons for the popularity of Batman as a character and brand,

and the reasons that lead to commercial use through licensing.

Keywords: Children; Consumption; Communication in Marketing; Licensing; Batman

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RESUMEN

Este estudio pretende analizar el uso de licencias del personaje de Batman en la

estrategia de comunicación de marketing, iniciado desde la apropiación de los cómics de

superhéroes de los EE.UU. del mismo nombre y su aplicación en productos de consumo

destinados a los niños (niños) de 4 a 8 años, y pre-adolescentes (tweens), 9 a 13 años,

específicamente. Tratamos de entender la evolución y la popularidad de un super-heroi

sombrío de la cultura de masas, con más de 70 años de existencia, se convirtió en un nombre

de marca para los productos para niños, sin relación aparente con su caracterización en su

universo simbólico para un público nuevo redescubriendo el superhéroe a través de su

cobertura de los medios de comunicación. El estudio fue desarrollado a través de la literatura

sobre la recuperación de los conceptos discutidos, la revisión histórica del personaje, y campo

de la investigación en forma de entrevistas cualitativas con los graduados y titulados. En

conclusión, llegó a las características que indican las razones de la popularidad de Batman

como un personaje y marca, y las razones que conducen a un uso comercial a través de la

concesión de licencias

Palabras-clave: Niños; Consumo; La comunicación con el mercado; Licencias; Batman

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INTRODUÇÃO

Durante os últimos anos do século XIX e o início do século XX, os Estados Unidos

viram proliferar em seu território novas formas de comunicação e manifestações artísticas

criadas a partir de inovações tecnológicas e linguísticas, não necessariamente oriundas de sua

cultura. Entre elas, podemos destacar as histórias em quadrinhos (ou HQs), com data de

nascimento indefinida, mas que já apareciam em diversos países há séculos.

No ano de 18951, as histórias em quadrinhos estrearam nas páginas dominicais dos

jornais norte-americanos e logo se tornando uma atração bastante notória, consumida

principalmente por crianças e adolescentes de classes populares. Com temas pitorescos, que

retravavam aventuras cômicas e o cotidiano das famílias pequeno-burguesas, as histórias em

quadrinhos logo teriam um encontro com a literatura pulp que também gozava de grande

interesse entre os garotos da época.

Os pulp magazines eram pequenos livros feitos em papel jornal de baixa qualidade que

traziam histórias fantásticas de terror, ficção científica, temas policiais e aventuras exóticas.

Como descreve Gerard Jones:

As revistas eram grossas e baratas, impressas em uma tinta de tom

marrom escuro, com centenas de páginas de ficção em cada número. As

capas eram coloridas, pintadas para inspirar terror, excitação, desejo e

curiosidade. Os enredos eram cheios de brutamontes, orientais sinistros e

namoradas seminuas de gângsteres. (JONES, 2006, p.51)

A literatura pulp era considerada de baixa qualidade e proibida por muitos pais,

contudo era bastante consumida pelos jovens adolescentes, vários deles também aficionados

em escritores de ficção e mistério como Júlio Verne, Bran Stoker, H. G. Wells, Edgar Rice

Burroughs, entre outros. Estes jovens (na sua maioria filhos de imigrantes de classe pobre)

organizavam-se em grupos de fãs para discutir e produzir suas próprias histórias, primeiro em

formato literário e posteriormente em histórias em quadrinhos (aliando imagem e texto).

Assim, em 1929, estreava nos EUA a HQ de gênero aventura, publicada em jornais,

inicialmente, mas logo passando ao formato de revistas.

Uma evolução natural do gênero levaria aos super-heróis (seres com poderes sobre-

humanos de inspiração mitológica misturados à ficção científica e às histórias policiais) e

diversos empresários - muitos, curiosamente, envolvidos com atividades criminosas, mas que

1 A data de 1895 foi a estréia, nos jornais dos EUA, das aventuras do personagem Yellow Kid, erroneamente

atribuída como a primeira HQ. Entretanto, hoje há um consenso entre pesquisadores que a arte seqüencial para se

narrar histórias, forma básica da linguagem da HQ, existe há muitos séculos, desde a antiguidade.

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buscavam diversificar seus negócios e, assim, fugir da atenção das autoridades - empregariam

estes novos artistas, criando as revistas em quadrinhos de super-heróis – comic books.

Centenas de personagens fantásticos surgiram nesta época, contudo, somente alguns

poucos obtiveram êxito, conseguindo até extrapolar as fronteiras das HQs, estrelando seriados

em outras mídias de massa. Dentre estes, destacamos o super-herói Batman.

Batman, criado nos EUA em 1939 por Bob Kane e Bill Finger, combinava todos os

elementos comuns aos personagens de ação de sua época, com grande apelo mitológico.

Porém, pequenas particularidades em torno de si o colocariam, desde sua estréia até os dias de

hoje, entre os três maiores super-heróis da cultura de massa do ocidente (ao lado de Superman

e Homem-aranha).

Criado para as histórias em quadrinhos, Batman logo figurou no cinema2 e na

literatura e, hoje, está presente na televisão3, em peças teatrais, na música, na internet (em

comunidades de redes sociais, blogs, websites e outros espaços virtuais dedicados ou

inspirados no personagem), jogos eletrônicos, etc. Batman também é frequentemente objeto

de estudo de muitos trabalhos acadêmicos e pesquisas na área de comunicação e mídia

massificada, dentro do campo das ciências sociais.

Assim como muitos outros personagens, Batman também foi apropriado como uma

importante marca comercial, licenciado para diversos produtos. Seu emblema de morcego,

bem como sua figura ao mesmo tempo sinistra e heróica estampa diversos produtos, desde

escovas de dente e mochilas até ovos de páscoa e band-aids, funcionando como um poderoso

atrativo de venda.

Estes produtos são consumidos por um público que abrange várias faixas etárias, fiel a

um ente mitológico construído ao longo de 70 anos, que empresta sua força simbólica ao ser

apropriado como marca comercial através do licenciamento de sua figura.

1. O trabalho: objetivos e procedimentos metodológicos

Esta dissertação parte de uma pesquisa exploratória na qual se busca compreender a

transposição do personagem Batman de seu universo midiático, dentro da indústria de

entretenimento, para o universo do marketing, atuando como marca através do licenciamento.

2 Batman teve dois seriados no cinema, em 1943 e 1949, e estrelou sete longas-metragens.

3 Batman foi protagonista de um seriado de TV de grande sucesso nos anos 1960, frequentemente reprisado até

hoje, e atualmente conta com dois desenhos animados, além de vários outros seriados e desenhos animados

correlatos com seu universo mítico.

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Batman é um personagem complexo e diferenciado. Possui uma aura sombria e

misteriosa pautada em referências com o grotesco, no entanto, sua popularidade ultrapassa

barreiras de classe social, idade, gênero e tempo. Por estes motivos, desempenha um papel

forte como licenciamento, promovendo produtos que não precisam necessariamente ter

relação com seu universo mítico.

Frente a nosso objetivo de compreender esta transposição, analisamos a utilização do

personagem através do licenciamento, voltado primordialmente ao público infantil (Kids - de

4 a 8 anos) e ao público pré-adolescente (Tweens – de 9 a 13 anos), abordando sua

comunicação mercadológica pelo ponto de vista dos envolvidos (licenciador, licenciados e

público). Nestas faixas etárias, a criança ainda está descobrindo e experimentando o mundo,

ou seja, construindo seus valores e modelos a partir de sua vivência em seu microcosmo,

mantendo-se permeável aos estímulos do ambiente. Assim, pretendemos estudar a forma

como a marca Batman busca atingir este público dentro de sua estratégia como ferramenta de

marketing.

Inicialmente, fizemos um levantamento bibliográfico para um embasamento teórico

sobre o público e o tema da pesquisa. Através de livros, artigos científicos, matérias em

revistas, pesquisas na Internet e documentários em vídeo, relacionou-se informações que

serviram para contextualizar o trabalho e compreender os principais fatores envolvidos na

pesquisa, como o público escolhido, análise do personagem e comunicação de mercado, e o

licenciamento. Trata-se do estabelecimento do estado da arte a partir do qual o projeto visa a

contribuir. Essa revisão busca delimitar o problema de pesquisa “dentro de um quadro de

referência teórica que pretende explicá-lo” (LUNA, 1998, p.83).

A etapa seguinte, correspondente à pesquisa de campo, na qual foram selecionados

alguns dos atores envolvidos para aplicação de entrevista qualitativa. Estas entrevistas foram

feitas através de perguntas referentes ao tema, obedecendo a um roteiro pré-estabelecido,

porém flexível conforme a opinião dos entrevistados e sua condução. Não foi intenção deste

trabalho levantar dados para propósitos quantitativos, mas ilustrar e complementar a análise

feita através das informações obtidas da revisão teórica em conjunto com a análise do objeto

de estudo, ou seja, a marca Batman. Assim, a partir das conclusões aqui obtidas, abre-se a

possibilidade de um futuro trabalho para obtenção de dados numéricos e/ou percentuais para

verificação das hipóteses levantadas.

A escolha dos entrevistados deu-se pelo papel de cada um, seguindo critérios

específicos de acordo com a particularidade do mesmo. Primeiramente, os entrevistados

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foram divididos em dois macro grupos: licenciador (proprietário do personagem e da marca

Batman), licenciados (aqueles que utilizam o personagem para fins de exploração comercial).

Dentro do grupo licenciador, temos como único representante a empresa Warner Bros.

Entertainement Inc., multinacional do ramo de entretenimento, subsidiária do grupo Time

Warner, e proprietária da DC Comics, que possui os direitos autorais e patrimoniais do super-

herói Batman. No Brasil, é representada pela Warner Bros. (South) Inc., sendo designada

nesta dissertação como Warner Bros., somente.

Inicialmente foi feito um primeiro contato via email (obtido através do website da

ABRAL - Associação Brasileira de Licenciamento4) com a área responsável pelos

licenciamentos, em março de 2008. Obteve-se uma apresentação corporativa (também

chamada de kit de mídia – anexo 01) em arquivo digital do personagem Batman, além de uma

planilha de contatos de empresas licenciadas com o super-herói no Brasil. Em final de

setembro de 2009, realizamos novo contato com a Warner, agendando a entrevista. Nesta

oportunidade, solicitamos novo kit de mídia, porém fomos informados que o anterior

permanecia válido.

A entrevista com a Warner Bros. (South) Inc. (Anexo 02) foi realizada no dia 10 de

novembro de 2009, às 14h00, na sede da empresa, com um Gerente de Produto responsável

pelo setor de licenciamento, que pediu sigilo de seu nome, sendo identificado, ao longo da

dissertação, pela designação Warner Bros., quando falando em nome da empresa e por

Gerente de Produto da Warner Bros., quando exprimindo sua opinião pessoal. Não foi

permitido o registro em áudio ou vídeo da entrevista. Um relatório sobre a entrevista foi

posteriormente redigido, aprovado pelo responsável, e consta como anexo deste trabalho.

Em relação ao grupo de empresas licenciadas, contávamos com um universo de trinta

e duas empresas, das quais algumas foram selecionadas. Descartamos:

Empresas de brinquedos (bonecos, apetrechos ou fantasias do Batman);

Artigos de festas (decoração de festas);

Confecções e vestuário (estamparia).

Esta segmentação visava excluir produtos que pudessem apresentar motivações de

consumo diferentes dos produzidos pelos da marca Batman. Desta forma, buscamos itens de

uso comum, mas que ostentassem o personagem Batman como marca - independente de sua

relevância dentro do universo fantástico do personagem - como material escolar, utensílios de

higiene pessoal, garrafas térmicas, lancheiras, etc.. Excluímos também licenças de produtos

4 http://www.abral.org.br/default.asp?tp=3&pag=menu/associados.htm#W acessado em 06/01/2010

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sazonais, no caso o ovo de Páscoa, por ser comercializado apenas em um único período do

ano.

Nossa amostragem passou para dezesseis empresas. Dentre estas contatamos cinco

empresas, sendo três através de email e duas por entrevista presencial (anexo 03). Abaixo, a

relação das empresas contatadas:

Molin do Brasil Comercial e Distribuidora Ltda - Lápis, canetas, kits escolares

- respondido por James Santos, setor de Marketing, através de email em 17 de

outubro de 2009.

M.Agostini S/A - lancheiras e garrafas térmicas - respondido por Mônica

Martins, Setor Comercial e Pós-venda/Marketing, através de email em 20 de

outubro de 2009.

Tilibra Produtos de Papelaria Ltda - Cadernos, Agendas e Fichários -

respondido por Gabriel S. Baumgartner, Desenvolvimento de Produtos e

Marketing, através de email, em 09 de novembro de 2009.

Mega Kyds Cosméticos Ltda. EPP – Cosméticos - respondido por Lucci

Vitale, Departamento Comercial, através de entrevista presencial em 19 de

outubro de 2009, às 14h00, na sede da empresa. Essa entrevista foi gravada em

áudio e sua transcrição está nos anexos.

Multilaser Industrial Ltda. – Acessórios de computador - respondido por Deise

Somayama, Departamento de Marketing, através de entrevista presencial em

21 de outubro de 2009, às 10h00, na sede da empresa. Essa entrevista foi

gravada em áudio e sua transcrição está nos anexos.

2. Descrição dos capítulos

O primeiro capítulo desta dissertação fala sobre a criança, elencando as principais

teorias sobre seu desenvolvimento físico e cognitivo, sua percepção e seu relacionamento com

o meio em que vive. Analisa também a criança e o consumo, de acordo com seu

desenvolvimento, a influência da mídia e dos meios que frequenta, além de sua percepção

quanto às marcas e à publicidade.

Já no segundo capítulo, faz-se um resgate histórico da trajetória de Batman na

Indústria Cultural, suas origens, sua atuação nas principais mídias, a construção de sua

reputação e um levantamento de parte de sua produção cultural ao longo de seus 70 anos.

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No terceiro capítulo, abordamos o marketing, desde sua definição, mecanismos do

consumo, o que é marca e suas propriedades, para chegarmos à comunicação mercadológica e

suas competências comunicacionais integradas, utilizadas dentro da estratégia de marketing.

O quarto capítulo é um complemento do terceiro, no qual são aprofundadas as

questões do licenciamento de marca e uso de personagem dentro da estratégia de

comunicação e marketing.

Por fim, no quinto capítulo, tratamos da apropriação de Batman como marca e suas

características, utilizando o modelo de análise de identidade do personagem de marca,

proposto por Nicolas Montigneaux e sua utilização no licenciamento sobre o ponto de vista do

licenciador e dos licenciados.

Nas considerações finais do fecho, reúnem-se os conceitos abordados, chegando-se a

algumas hipóteses a respeito de como a criança vê o Batman e como é seu relacionamento

com a marca. Proporemos alguns apontamentos e propostas para um posterior

aprofundamento do conhecimento.

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CAPÍTULO I - A CRIANÇA: Desenvolvimento e consumo

Como foi dito na introdução deste trabalho, esta pesquisa aborda a comunicação da

marca Batman com crianças com idade entre 4 a 13 anos, do sexo masculino. Esta delimitação

de público é proposta pela empresa detentora dos direitos autorais e industriais e licenciadora

do super-herói Batman, a Warner Bros., através da apresentação da marca a possíveis

licenciados.

Assim, para estudarmos a presença do personagem como marca e o consumo de

produtos licenciados com ele, temos de entender as características e atitudes deste público,

analisando a partir de três pontos:

O desenvolvimento cognitivo e social;

A influência das mídias de massa; e

A perspectiva de consumo.

Esta divisão, embasada por diversas referências nas áreas de pedagogia, psicologia e

marketing, é fundamental para a compreensão dos mecanismos relacionados ao consumo de

marca pelo público infantil, sua percepção e motivação dentro do mecanismo do consumo,

como um dos objetivos desta pesquisa.

É importante frisar que os conceitos discutidos aqui se referem à condições teóricas

ideais e genéricas, ou seja, podem sofrer mudanças ou mesmo não se aplicar diante de

condições extraordinárias de processos internos da criança ou processos ambientais.

1. O desenvolvimento da criança

O desenvolvimento do ser humano, desde seu nascimento até sua maturidade, é

assunto que interessa a cientistas e pesquisadores há tempos. A compreensão dos fatores

desenvolvimentais, tanto em um foco cognitivo (perceptivo e de aprendizagem) como em um

foco social (relacionamentos e personalidade), ainda não é algo totalmente desvendado.

Contudo, hoje existem várias teorias que trazem significativos esclarecimentos à questão.

Basicamente, estas teorias se dividem em:

a) Teorias Psicanalíticas: também chamadas de comportamentais, as estas teorias,

cuja origem é atribuída a Sigmund Freud (1856-1939), “explicam o

comportamento humano compreendendo os processos subjacentes da psique”

(BEE, 2003, p.46). Supõem que os comportamentos podem ser regidos por

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processos conscientes e inconscientes, que se desenvolvem ao longo do tempo ou

podem vir do nascimento.

As teorias psicanalíticas também apontam o desenvolvimento por estágios, centrados

em uma tarefa ou tensão própria. Estes estágios eram concebidos de formas diferentes nas

várias teorias, contudo o ponto crítico em comum, como apontado por Helen Bee (2003,

p.47), é que “o grau de sucesso de uma criança em satisfazer as exigências desses vários

estágios dependerá muito da sua interação com as pessoas e com os objetos do seu mundo”.

b) Teorias Cognitivo-Desenvolvimentais: As teorias cognitivo-desenvolvimentais

voltam-se para o desenvolvimento cognitivo da criança, sua relação com o mundo

inanimado – brinquedos e objetos, imagens e sons, e têm em Jean Piaget (1896-

1980) sua figura central.

Os processos de pensamento e conhecimento, chamados de

cognição, incluem prestar atenção, perceber, interpretar, classificar e lembrar

de informações; avaliar ideias; inferir princípios e deduzir regras; imaginar

possibilidades; gerar estratégias; e inventar. (MUSSEN et al, 1995, p.232)

Piaget dizia “que algumas ideias cognitivas, operações e estruturas são universais, não

por serem herdadas, mas porque todas as experiências comuns das crianças no mundo dos

objetos e pessoas forçam-na a chegar às mesmas conclusões” (MUSSEN et al, 1995, p.238).

Esses preceitos, assim como outros, desenvolvem-se como resultado das interações diárias

que ocorrem entre as crianças e outras pessoas, bem como entre as crianças e objetos.

De acordo com Piaget, as crianças constroem seu mundo ao propor uma ordem própria

ao material obtido através de sua percepção de sons, imagens e odores. O foco principal da

teoria de Piaget é entender as transformações que os seres humanos impõem às informações

que recebem através dos sentidos.

Outro importante representante das teorias cognitivo-desenvolvimentais foi Lev

Vygotsky (1896-1934). Vygotsky difere de Piaget em acreditar que “formas complexas de

pensamento têm suas origens em interações sociais e não na exploração individual de cada

criança” (BEE, 2003, p. 48), assim “a aprendizagem da criança sobre novas habilidades

cognitivas é orientada por um adulto (ou por uma criança mais experiente, como um irmão

mais velho)” (BEE, 2003, p. 48).

Vygotsky defendia a influência do meio ambiente como importante fator no

desenvolvimento da criança. Ele acreditava que os processos internos da criança ocorrem

simultâneos ao processo de construção social. Como consta em Tereza Rego, sobre as

opiniões de Vygotsky:

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Uma das principais características que distingue radicalmente o

homem dos animais é justamente o fato de que, além das definições

hereditárias e da experiência individual, a atividade consciente do homem

tem uma terceira fonte, responsável pela grande maioria dos conhecimentos,

habilidades e procedimentos comportamentais: a assimilação da experiência

de toda a humanidade, acumulada no processo da história social e

transmitida no processo de aprendizagem. Podemos entender que, nesta

perspectiva, o desenvolvimento do psiquismo animal é determinado pelas

leis da evolução biológica e o do ser humano está submetido às leis do

desenvolvimento sócio-histórico. (REGO, 2000, p.48)

Vygotsky defende a ideia de que a interação do ser humano com seu meio vai além da

influência deste. O homem também é agente ativo, que modifica e produz este contexto.

O desenvolvimento está intimamente relacionado ao contexto sócio-

cultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica (e

dialética) através de rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas

reorganizações por parte do indivíduo. (REGO, 2000, p.58)

c) Teorias de Aprendizagem: As teorias de aprendizagem diferem fundamentalmente

das teorias cognitivo-desenvolvimentais por darem ênfase a como o ambiente

molda a criança. Elas veem o comportamento humano como flexível frente a

processos predizíveis de aprendizagem, sendo os principais o condicionamento

clássico e condicionamento operante

O condicionamento clássico refere-se a situações determinadas, estímulos que, quando

reconhecidos, tornam-se um padrão e geram a mesma resposta, ou seja, estes estímulos

condicionam o indivíduo a uma ação ou resposta emocional.

O estímulo operante envolve a associação de uma nova resposta a um antigo estímulo,

através do reforço. Este reforço pode ser positivo, quando o evento aumenta a probabilidade

de o comportamento ocorrer novamente (um elogio ou um tipo de recompensa por uma tarefa

qualquer cumprida), ou negativo, quando algo que o indivíduo considera desagradável é

interrompido. Contrário ao reforço temos a punição, que busca enfraquecer um

comportamento indesejado.

Segundo Albert Bandura (BEE, 2003, p. 50), a aprendizagem pode ocorrer também

através da observação ou modelação, na qual a criança aprende através da imitação. Esta

teoria encontrou respaldo também junto ao modelo cognitivo-desenvolvimental.

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Tabela 1

Comparação das Teorias Desenvolvimentais em algumas questões-chave sobre o desenvolvimento

Questão Teoria de

Aprendizagem

Teoria Psicanalítica Teoria Cognitivo-

Desenvolvimental

Qual a principal

influência sobre o

desenvolvimento: a

natureza ou o meio

ambiente?

Principalmente o meio

ambiente

Ambos O processamento interno

que a criança faz da

experiência.

A mudança

desenvolvimental é

qualitativa ou

quantitativa?

Quantitativa (ambas, na

versão de Bandura)

Qualitativa Qualitativa

Existem estágios ou

sequências?

Nenhum estágio;

algumas sequências.

Estágios Segundo Piaget, estágios

Exemplos de temas de

pesquisas emergindo

dessa tradição teórica

Impacto da TV sobre o

comportamento; Origens

de comportamentos

sociais, como a agressão

Apego; fantasias Desenvolvimento da

lógica; conceitos de

gênero; desenvolvimento

moral

Fonte: BEE, Helen. A criança em desenvolvimento. Trad. Maria Adriana Veríssimo Veronese. 9º edição. Porto

Alegre: Artmed, 2003, p.51.

Ao englobar as teorias existentes, chegamos à conclusão que o desenvolvimento

interno da criança se dá pela soma entre sua natureza e seu meio-ambiente, apontados através

das descobertas e pressupostos presentes nestas três abordagens.

Por natureza entendemos fatores hereditários e genéticos, próprios da criança; por

meio-ambiente, influência do meio em que se vive e de sua interação (empirismo) com este

meio e com as pessoas ao seu redor. Assim, compreendemos que o desenvolvimento decorre

de dois conjuntos distintos e interdependentes: fatores internos e fatores externos.

Entre os mecanismos internos, temos fatores herdados que podem ser inclinações e

limitações inatas (BEE, 2003, p.31), um conjunto de “concepções preexistentes” ou, de modo

mais vulgar, uma “configuração inicial” do ser humano que é aceita atualmente como ponto

de partida para o desenvolvimento.

A partir disto ocorre a maturação, ou seja, sequências inteiras de desenvolvimento

(físico ou mental) programadas conforme o estágio que o indivíduo se encontre. O timing

destas mudanças difere de uma pessoa para outra, segundo influências externas, contudo

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ocorrem durante toda a vida do ser humano, do nascimento à velhice, e são determinadas por

“instruções” genéticas determinadas na concepção.

Qualquer padrão maturacional é marcado por três qualidades: é universal, aparecendo

em todas as crianças, atravessando fronteiras culturais; é sequencial, envolvendo algum

padrão de habilidade ou alguma característica que se desenvolve; e é relativamente

impenetrável à influência ambiental, ou seja, não depende (ou depende em uma porcentagem

insignificante) de fatores externos presentes no meio ambiente para ocorrer, como o

crescimento de pelos, por exemplo (BEE, 2003, p.32).

Complementando os fatores apontados anteriormente, temos as contribuições

genéticas herdadas dos pais (características hereditárias) que ajudam, ou melhor dizendo,

influenciam na formação da criança. Estas contribuições vão além das óbvias características

físicas (cor da pele, olhos, altura, etc.), envolvendo também características comportamentais

(traços de personalidade) e, até mesmo, emocionais.

Acreditamos ser importante frisar que o ser humano é formado por um todo único e

integrado, e a análise separada de suas diversas facetas pode levar a erros de julgamento ou

conclusões imprecisas.

Segundo Piaget a maturação e a experiência não podem ter papéis isolados no

desenvolvimento da criança: ambas são exigidas. Ele pondera que:

Algumas ideias cognitivas, operações e estruturas são universais,

não por serem herdadas, mas porque todas as experiências comuns das

crianças no mundo dos objetos e pessoas forçam-na a chegar às mesmas

conclusões. (MUSSEN et al., 1995, p.238)

Para efeito prático, dentro deste capítulo começaremos pelos fatores internos (o

desenvolvimento maturacional da criança) e, depois, iremos para os fatores externos (a

influência de seu meio ambiente), visivelmente mais complexos, deixando para nos

aprofundarmos conforme seja relevante ao assunto abordado nos diferentes momentos desta

dissertação.

2. Desenvolvimento cognitivo: aprendizagem e processamento de informações

O processo de aprendizagem acontece em uma “interação entre a maturação e a

experiência” (MUSSEN et al., 1995, p. 269), e se torna cada vez mais complexo com o

avanço da idade. A capacidade cognitiva é limitada por fatores biológicos, porém a

experiência cria oportunidades e estímulos ao desenvolvimento de novas habilidades. “As

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crianças pensam e se desenvolvem ao perceber objetos e ações, ao se lembrarem deles e ao

fazer inferências sobre eles” (MUSSEN et al., 1995, p.269).

Piaget propunha que o desenvolvimento ocorria numa sequência de quatro estágios

qualitativamente diferentes e sequenciais: o estágio sensório-motor (0 a 18 meses), o estágio

pré-operacional (18 meses a 7 anos), o estágio operacional concreto (7 a 12 anos) e o estágio

operacional formal (de 12 anos em diante).

A ordem desta sequência não varia (embora possa alterar-se a duração do estágio em

cada indivíduo), uma vez que cada estágio é decorrente do anterior, derivando dele. Em cada

estágio, novas capacidades cognitivas diferentes e mais adaptativas são acrescentadas ao

repertório da criança.

Piaget cita também que o desenvolvimento da criança funciona por um mecanismo de

assimilação e acomodação. A assimilação refere-se aos “esforços (do indivíduo) para lidar

com o ambiente, fazendo-o se ajustar às estruturas já existentes no organismo – incorporando-

a” (DONALDSON, 1978, p.140, apud MUSSEN et al., 1995, p.241); a acomodação é a

adaptação dos conceitos existentes face às demandas ambientais. Ocorre quando as

características do ambiente não se ajustam bem aos conceitos existentes, havendo a

necessidade de haver uma adaptação às suas exigências.

A criança, primeiro, tenta entender uma nova experiência, usando

velhas ideias e soluções (assimilação); quando elas não funcionam, a criança

é forçada a mudar sua estrutura ou entendimento do mundo (acomodação).

(MUSSEN et al., 1995, p.241)

Este processo é verificado durante a formação dos conceitos pelas crianças dentro de

sua visão e participação no mundo.

À medida que os anos passam, tanto a capacidade perceptiva quanto o conjunto de

valores e conceitos crescem mutuamente num processo de interdependência.

É necessário ressaltar que, na abordagem vygotskiana, o que ocorre

não é uma somatória entre fatores inatos e adquiridos e sim uma interação

dialética que se dá, desde o nascimento, entre o ser humano e o meio social e

cultural que se insere. (REGO, 2000, p.93)

A assimilação e a acomodação acontecem praticamente simultâneas, de acordo com a

necessidade do momento. A criança, primeiro, tenta entender a nova experiência, utilizando

ideias e soluções já conhecidas (assimilação). Uma vez que não funcione, a criança é forçada

a mudar sua estrutura ou entendimento daquela questão (acomodação).

O processo de aprendizagem ocorre através das chamadas unidades cognitivas, ou

seja, ações empregadas pelas crianças dentro do processo de interpretação e investigação do

mundo. São eles:

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a) Esquemas ou scripts – Quando falamos de esquemas, são diferentes dos

propostos por Piaget. Os esquemas são organizações baseadas em relações

percebidas e concebidas pela criança como facilitador de seu entendimento de dada

cena. Facilitam a memória uma vez que preservam a essência em detrimento de

detalhes. “Algumas pessoas argumentam que eles constituem as primeiras

unidades cognitivas usadas pelas crianças porque representam agrupamentos de

objetos ou ações de experiência diária” (MANDLER, 1983 apud MUSSEN et al.,

1995, p.272).

b) Imagens – Uma imagem é uma impressão sensorial – uma figura, som ou

cheiro – que é recriada mentalmente. As imagens são concebidas frequentemente a

partir de esquemas e são elaboradas conscientemente.

c) Conceitos e Categorias – A conceituação é a terceira maior unidade cognitiva

dentro do desenvolvimento e se torna cada vez mais presente com o avanço em

idades mais maduras. O conceito diz respeito à capacidade de entendimento

simbólico e abstrato dentro das análises de coisas e objetos e é extremamente

dinâmico podendo variar conforme a situação, fatores ambientais e/ou idade. A

junção de conceitos gera uma proposição.

As categorias são classificações empreendidas pela criança de acordo com sua

proposta organizacional de dada situação. Pode ser basear em atributos concretos

(imagens ou esquemas) ou abstratos (conceitos).

Ao modo como a informação é processada e interpretada dentro das unidades de

cognição chamamos de processos cognitivos. Os processos cognitivos “controlam o fluxo de

informação, e estruturam e transformam as informações” (MUSSEN et al., 1995, p.277),

baseados em fatores como a percepção e o nível de atenção dispensado a dada coisa ou objeto.

A partir da percepção a captação de informações é feita por mecanismos sensórios, já

praticamente completos aos dois anos, selecionando-se (quantitativamente e qualitativamente)

a informação que será absorvida, focando-se a atenção de acordo com o interesse (este é um

processo arbitrário do indivíduo, mas que pode ser induzido por estímulos sensoriais). A

informação é registrada na memória, de acordo com sua importância, sendo organizada e

interpretada ou somente armazenada. A partir destas memórias a criança pode fazer

inferências, ou seja, usar “suas estruturas cognitivas para ir além do que é imediatamente

observável e gerar expectativas sobre o que pode ocorrer no futuro, ou hipóteses sobre

eventos passados e relações causais” (MUSSEN et al., 1995, p.285).

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Com o tempo a criança aprende a utilizar suas ferramentas cognitivas em atividades

diárias como planejar, buscar, monitorar e controlar sua atenção, memória e outros processos

cognitivos, o que chamamos de metacognição ou processos executivos. Este processo evolui

com a idade.

3. A relação da criança com seu meio ambiente e introdução ao consumo

Analisar o consumo pelo público infantil é relacionar aspectos já conhecidos do

consumo e da comunicação mercadológica com uma perspectiva do desenvolvimento

comportamental e cognitivo da criança. As crianças constroem sua participação no mundo

através de um aprendizado gradual e da compreensão de seu papel no contexto social em que

vivem. Assim, sua inserção dentro de uma esfera de consumo se dá de forma natural pela

própria influência do meio ambiente, através de fatores culturais, relacionais e de mídia, com

os quais têm contato.

A criança passa a consumir, uma vez que vive em um meio social caracterizado pelo

consumo efetivo e constante, absorvendo e aprendendo suas regras e ditames, adquirindo

também suas particularidades, positivas e negativas. “A família, os amigos, a escola, a

publicidade e a televisão influenciam a criança a desempenhar o papel do futuro consumidor”

(MARINS, 2000, p.64). Por esse motivo, há uma grande preocupação quanto à inserção do

consumo no universo infantil, envolvendo diversos atores sociais como pais, educadores e

empresários (sendo inclusos neste último grupo, os publicitários), os quais frequentemente

divergem tanto em opiniões quanto em interesses, pelo fato de a criança ainda não ter um

senso crítico totalmente formado, sendo mais facilmente persuadida pela comunicação

mercadológica.

O professor norte-americano de marketing McNeal identificou uma

série de estágios no desenvolvimento do consumo da criança, após estudos

sobre o assunto e por meio de milhares de entrevistas com famílias. Concluiu

que, inicialmente, o papel da criança é passivo, pois seus pais decidem o que

devem vestir, com o que deve brincar, etc. Em pouco tempo a criança passa

a fazer a parte ativa, começando a manifestar desejos de consumo, que

podem ou não ser atendidos pelos pais. (MARIN, 2000, p.93)

Para falarmos de consumo infantil, devemos primeiro entender duas premissas

fundamentais do consumo em si: a) o consumo é um evento social e cultural e está ligado ao

convívio interpessoal; b) o consumo opera, principalmente, em uma esfera simbólica, de

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satisfação de necessidades, muito mais psicológicas do que básicas (relacionadas com a

sobrevivência).

Baseado nisso, vamos entender como se dá o surgimento e o desenvolvimento dos

relacionamentos sociais e da interação da criança com seu ambiente.

4. Fatores externos: O inter-relacionamento da criança em seu meio social

Quando tratamos de fatores externos no desenvolvimento da criança, falamos, de um

modo mais amplo, em fatores sócio-culturais e relacionamentos interpessoais, em sua

interação com o mundo, representado nas pessoas que a rodeia e no conjunto de códigos

sociais vigentes.

No início deste capítulo, abordamos o desenvolvimento da criança de uma perspectiva

interna, ou seja, relacionada a suas aptidões inerentes e ao seu próprio desenvolvimento físico

e mental, comum a todas as crianças. Agora, em uma visão ambiental, temos a influência da

cultura na qual a criança está inserida, o impacto de seus relacionamentos com as pessoas

próximas (pais, professores e companheiros) na formação de sua personalidade, aprendizagem

e desenvolvimento de habilidades.

O meio sócio-cultural tem sua importância no fato de representar o contexto no qual a

criança cresce, ou seja, o conjunto de hábitos, valores e regras que formam o microcosmo

habitado por ela. É evidente que este conjunto cultural irá variar de sociedade para sociedade,

mas é consenso que ele determina como a criança deverá se portar, o que é certo e o que é

errado, o que é aceito, seguido e praticado. Somente com base nestes dados podemos avaliar

de forma mais segura o desenvolvimento cognitivo e social da criança, e, baseada neles, é que

ocorrerá sua sociabilização.

A partir desta premissa consideremos o universo social da criança que se expande com

a idade, e sua interação com as outras pessoas através do desenvolvimento da cognição social,

um processo de leitura, interpretação, julgamento e compreensão das mesmas.

Assim como a cognição ocorre e se desenvolve em relação a objetos, conceitos e

coisas, ela também focaliza o conhecimento das crianças e a compreensão do mundo social –

das pessoas, incluindo elas mesmas, e das relações sociais. (MUSSEN et al., 1995, p.343)

Uma maneira de pensar sobre a cognição social é apenas concebê-la

como aplicação de processos ou de habilidades cognitivas gerais a um tópico

diferente; nesse caso, as pessoas ou relacionamentos. (BEE, 2003, p. 384)

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Através de um processo de análise e interpretação das pessoas, em parâmetros físicos e

comportamentais, a criança construirá sua rede de relacionamentos, que, de forma recíproca,

irá também influenciá-la.

Ao internalizar as experiências fornecidas pela cultura, a criança

reconstrói individualmente os modos de ação realizados externamente e

aprende a organizar os próprios processos mentais. O indivíduo deixa,

portanto, de se basear em signos externos e começa a se apoiar em recursos

internalizados (imagens, representações mentais, conceitos etc.). (REGO,

2000, p.62)

A criança tem dois tipos de relacionamentos sociais: o vertical, que envolve apego a

uma pessoa com maior poder social ou conhecimento, como um dos pais, um professor ou

mesmo um irmão mais velho, sendo complementar, em vez de recíproco; e o horizontal, que

é recíproco e igualitário, envolvendo indivíduos com igual poder social, sendo que seu

comportamento mútuo vem do mesmo repertório. São os amigos ou companheiros.

A criança constrói sua atuação social através do condicionamento e da aprendizagem

por observação, com a qual não precisa passar pelo processo de tentativa e erro, aprendendo,

ao observar, uma ampla variedade de qualidades sociais e emocionais, as quais podem, às

vezes, até não agradar aos pais.

Os relacionamentos verticais são necessários para proporcionar à criança proteção e

segurança, sendo que, nesses relacionamentos ela cria seus modelos funcionais internos e

aprende habilidades sociais fundamentais. Porém, é nos relacionamentos horizontais que a

criança prática seu comportamento social e adquire aquelas habilidades sociais que só podem

ser aprendidas em um relacionamento entre pares: cooperação, competição e intimidade

(BEE, 2003, p.349).

Bronfenbrenner (1979; 1989), adepto das teorias sistêmicas nas quais “o todo consiste

das partes e de suas relações mútuas” (BEE, 2003, p.409), propõe que pensemos o universo

social da criança, também chamado de sistema ecológico, como vários sistemas dispostos em

círculos concêntricos. No menor, chamado microssistema, aparecem todos aqueles ambientes

em que a criança vive experiências pessoais diretas (família, escola, amigos próximos, etc).

No plano seguinte, temos o exossistema ao qual pertencem os elementos que afetam

indiretamente a criança através do microssistema (o trabalho de seus pais, por exemplo). Por

fim, há o macrossistema que inclui o ambiente sócio-cultural no qual o exossistema está

incluso (como o bairro no qual a criança mora, características sócio-econômicas e culturais).

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Contudo, para entendermos mais claramente a forma como os relacionamentos atuam

no desenvolvimento da criança é importante primeiro vermos como a criança constrói e

absorve os conceitos de si própria e do seu universo.

5. A criança por ela mesma: o autoconceito

Logo no início de sua vida, a criança tem consciência de sua existência À medida que

cresce e passa a descobrir o mundo, formando uma ideia dele, ela também elabora uma ideia

de si mesma, ou seja, um autoconceito. Da mesma forma como acontece com sua percepção

frente a coisas e acontecimentos externos, com o passar do tempo o autoconceito das crianças

torna-se menos centrado em características externas (físicas) e mais em qualidades internas

(personalidade). Ela aprende pouco a pouco a abstrair. A criança em idade escolar começa a

ver tanto suas características quanto as dos colegas como mais estáveis, desenvolvendo um

senso global de autovalor. É o desenvolvimento da cognição social citada anteriormente.

Conforme as crianças avançam nos períodos escolares (a partir dos seis anos) se

tornam mais comparativas, mais ligadas em sentimentos e ideias. Sua autodefinição se torna

mais complexa, passando a avaliar a qualidade de seus relacionamentos e traços de si

próprias. A partir dos nove anos incluem elementos positivos e negativos em sua

autocomparação (BEE, 2003).

A autocrítica passa a exercer um papel forte na atuação da criança, que avalia seus

próprios esforços, mediante as tarefas propostas em seu dia a dia. Dentro disso, estímulos

empreendidos por professores (ou quaisquer personagens influentes no universo da criança)

atuam como um reforço positivo no desempenho dela. Ela almeja atingir as expectativas pré-

determinadas sendo que “quando atingem bons resultados, é mais comum que atribuam seu

sucesso ao trabalho árduo mais do que à própria capacidade; quando o resultado é ruim, veem

o fracasso como culpa sua” (STIPEK; GRALINSKI, 1991 apud BEE, 2003, p.324).

As crianças formam autoconceitos pelo menos em parte, aceitando o

que as outras pessoas dizem sobre elas e julgando como as outras pessoas

reagem a elas.

Nos primeiros anos escolares, as crianças se preocupam com suas

competências e frequentemente as comparam à de seus irmãos e outras

crianças. (MUSSEN et al., 1995, p.351)

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6. O ambiente social da criança

Desde a idade pré-escolar, a criança inicia seu convívio com outras crianças. Este

convívio ocorre através de relações interpessoais, principalmente através de brincadeiras e

atividades em grupo, mas ganha contornos mais complexos com a idade. Assim como a

criança aprende a se autoavaliar, também avalia seus companheiros.

A partir dos oito anos, as percepções tornam-se mais específicas, com um uso maior

de aspectos abstratos com referência a personalidades, motivos, crenças, valores e atributos. A

criança se torna “menos inclinada aos aspectos superficiais das pessoas e abstrai cada vez

mais regularidades com o tempo e situações e infere motivos para o comportamento”

(SHANTZ, 1983, P.506 apud MUSSEN et al., 1995, p.389). As amizades se aprofundam e

passam a desempenhar um papel mais significativo.

Os relacionamentos horizontais acontecem principalmente no ambiente escolar. Nos

EUA, “para as crianças de 7 a 10 anos, brincar com os amigos (além de ver televisão) ocupa

quase todo o seu tempo quando elas não estão na escola, não estão comendo ou dormindo”

(TIMMER, 1985 apud BEE, 2003, p.367). A escola é um local rico de experiências para a

criança e onde se concentrará a maior parte das atividades, tanto com companheiros

(relacionamento horizontal) quanto com professores e educadores (relacionamento vertical).

A escola não é apenas um ambiente neutro para se adquirir

habilidades cognitivas. É um ambiente social complexo com regras e com

valores próprios, onde a criança estará diante de relacionamentos novos e

intricados com outras crianças e diante de muitas exigências novas. (BEE,

2003, p.448)

A partir dos seis anos as crianças começam a se organizar em grupos, porém com

poucas regras formais e uma mobilidade rápida na composição dos membros do grupo. A

partir dos dez anos, em média, os grupos começam a “se tornar mais formais, altamente

estruturados e coesos, com exigências especiais para o ingresso no grupo e rituais elaborados

para conduzir reuniões” (MUSSEN et al., 1995, p.395), porém ainda com certa mobilidade

em relação aos membros.

Conforme vai amadurecendo, o relacionamento dentro do grupo se torna cada vez

mais importante para a criança que busca de aceitação e aprovação do grupo. Isto significa

abraçar um código simbólico imposto pelo grupo, com regras e restrições. Algumas regras são

prescritivas (referem-se ao que alguém deveria fazer), enquanto outras são proscritivas

(referem-se ao que não se deveria fazer).

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A qualidade do comportamento interpessoal das crianças não é

apenas uma função do autocontrole e da acomodação aos padrões

socialmente aceitáveis. Isto é, o comportamento não depende somente da

adoção de regras proscritivas e restrições. De igual importância, pelo menos,

são as ações sociais baseadas em regras morais prescritivas – padrões

referentes àquilo que os membros de uma cultura deveriam fazer, quais as

respostas aceitáveis e valorizadas. (MUSSEN et al., 1995, p.403)

A empatia também desempenha um papel fundamental ao permitir à criança se pôr no

papel de outrem, compreendendo-o melhor. Ela passa a entender o papel que deve

desempenhar ou que acredita que se espere que ela desempenhe. O grupo contribui de forma

decisiva na modelação da personalidade de uma criança, em seu comportamento social,

valores e atitudes.

As crianças influenciam-se mutuamente, servindo como modelos,

reforçando, punindo e interpretando comportamentos. O mundo dos

companheiros é uma subcultura, influenciada de muitas formas pela cultura

mais ampla, mas também tendo sua própria história, organização social e

meios de transmitir seus costumes de uma geração para seguinte. A

compreensão que a criança tem do comportamento social e de que modo ela

deve se relacionar com os outros é, em grande parte, transmitida pelos

companheiros, e não pelos adultos. (MUSSEN et al., 1995, p.484 e 485).

A inserção da criança em um modo de vida grupal, ou seja, dentro de uma esfera

social, será determinante e essencial na sua formação, pois será dentro de grupos e

comunidades horizontais, principalmente, que ela moldará sua persona social daí pra frente.

7. A criança e as práticas de consumo

O ato de consumir é o ato de adquirir coisas. No início acreditava-se que o consumo

estava ligado à necessidade de suprir carências de bens e serviços para subsistência, contudo,

hoje se admite que o ato de consumir opere num patamar mais profundo dentro de uma lógica

de “produção e manipulação dos significantes sociais” (BAUDRILLARD, 1995).

Desta forma, o consumo ocorre como uma ferramenta na construção de uma nova

realidade baseada num imaginário pretendido dentro do código simbólico do objeto

consumido. Também funciona como objeto de diferenciação social no qual “o consumo de

bens de maior excelência, prova de riqueza, se torna honorífico; reciprocamente, a

incapacidade de consumir na devida quantidade e qualidade se torna uma marca de

inferioridade e demérito” (VEBLEN, 1988, p.37). Como coloca Jean Baudrillard (1995),

“nunca se consome o objeto em si (no seu valor de uso) – os objetos (no sentido lato)

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manipulam-se sempre como signos que distinguem o indivíduo”, ou seja, ocorre um processo

de diferenciação (dentro de uma esfera econômica e/ou social) baseado no objeto consumido

frente às mensagens por ele emanadas, incorporadas pelo consumidor.

Devemos considerar a prática do consumo não apenas dentro de uma esfera

econômica, mas também dentro de um contexto de significação social (CAMPBELL, C.,

2001, p.74). O consumidor adota um código simbólico, funcionando como um agente ou

representante do objeto e passa a comunicar sua concordância/participação neste conjunto de

significantes. Uma vez que realiza o ato do consumo, o consumidor incorpora os valores e

mensagens transmitidos por aquele dado objeto. Estes valores, “imagens e significados

simbólicos são tanto uma parte „real‟ do produto quanto os ingredientes que o constituem”

(CAMPBELL, C., 2001, p.75). Entretanto, quando estes novos valores são incorporados, eles

são transformados, com mais ou menos influência, pelo perfil pré-definido do consumidor,

que detém a opção de escolher e adaptar estas mensagens em consonância com suas próprias

convicções, em sintonia consigo mesmo e não como mero “condicionamento de diferenciação

e de obediência a um código” (BAUDRILLARD, 1995).

Com o crescimento das possibilidades de acumulação de riquezas, o

consumo se relaciona menos a uma lógica da necessidade e mais a um

processo sem fim de superação dos demais, pela ostentação daquilo que se

possui e da capacidade de aquisição de bens necessários à sobrevivência,

mas torna-se fundamentalmente um meio para a exibição de status e

conseqüente distinção social. (VEBLEN, 1988)

Quando adquirimos um bem, buscamos dentro de seu conteúdo simbólico uma

distinção. “A questão é que quando formulamos significativamente nossas necessidades em

relação aos recursos disponíveis, baseamo-nos em línguas, valores, rituais, hábitos, etc., que

são de natureza social, mesmo quando os contestamos, rejeitamos ou reinterpretamos no

plano individual” (SLATER, 2002, p.131), ou seja, nos baseamos em um contexto, em um

dado perfil dentro do universo social do qual participamos, valores de ascendência e distinção.

Este comportamento é apresentado pela criança, de forma que, dentro de seu processo

de formação mental e emocional, ela espelha-se continuamente em seu círculo social

próximo. É o processo que citamos acima como cognição social. A criança aprende a

consumir ao imitar os adultos, ao ver seu comportamento, ao mesmo tempo em que é

profundamente aliciada pela comunicação mercadológica presente na mídia e também pela

influência de companheiros. Pouco a pouco, a criança aprende a desejar objetos e coisas

materiais e percebe que certos objetos são mais passíveis do seu desejo que outros, que

algumas marcas se destacam mais que outras.

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Ela vai-se focando especificamente nos relacionamentos horizontais, ou seja, com

amigos e companheiros, e aprende o senso de grupo, de comunidade. Dentro desta

comunidade existe hierarquia estabelecida pela maior ou menor habilidade em se relacionar,

originando os companheiros formadores de opinião e os seguidores. “As crianças podem

considerar os companheiros como modelos mais apropriados do que os adultos porque

percebem as outras crianças como parecidas consigo mesmas” (MUSSEN et al., 1995, p.486).

É um processo que ocorre de forma diferente dos relacionamentos verticais, com pais

ou professores, aos quais a criança reconhece como superiores, porém inapropriados para

certos aspectos que julgam próprios de si mesmos.

As crianças podem adquirir seus valores sobre religião e a educação

dos pais, mas suas escolhas de gêneros musicais e maneiras de vestir são

fortemente influenciadas pelos companheiros.

[...] A cultura contemporânea americana é altamente orientada para

os companheiros. As crianças são encorajadas para interagir com os

companheiros desde muito cedo, e são fortemente influenciadas por eles.

(MUSSEN et al., 1995, p. 485)

Devemos lembrar que o consumo está ligado a uma “busca da felicidade”

(BAUDRILLARD, 1995, p.68). Esta felicidade não se dá apenas com a satisfação das

necessidades básicas do indivíduo ou a obtenção de bens, mas com uma busca mais complexa

de uma realização plena, prazerosa. Esta busca opera dentro de uma esfera subjetiva e mal-

definida, que foge de modelos econômicos racionalistas para adentrar o subjetivismo das

teorias psicológicas e comportamentais, e diz respeito a uma realização particular por parte do

indivíduo em seu convívio comunitário. Esta realização está ligada a uma ascendência social

ilusória e a criação de uma imagem e posição diferenciada perante o grupo, como apontam

Veblen (1988) e Baudrillard (1995).

O campo do consumo é um campo social estruturado em que os bens

e as próprias necessidades, como também os diversos indícios de cultura,

transitam de um grupo modelo e de uma elite diretora para outras categorias

sociais, em conformidade com seu ritmo de “promoção” relativa.

(BAUDRILLARD, 1995, p. 61)

Através do consumo, o indivíduo busca um destaque (e uma ascendência) frente aos

seus semelhantes, ao mesmo tempo, em que busca uma recolocação participativa em um

grupo seleto e exclusivo. Isto é verdade também para a criança, uma vez que ela “não gosta de

ser diferente, demonstrando, pelo contrário, o máximo desejo em se incorporar às outras

crianças pertencentes ao grupo de referência” (MARINS, 2000, p.50). A criança quer ser

aceita e ela aprende com a observação de seu meio social, mas, principalmente, pela

propaganda que este destaque se obtém na forma de itens consumidos (que podem ser

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produtos, bens ou serviços), através dos quais o consumidor molda sua persona. Don Slater

(2002, p.131) coloca que “na verdade todo consumo é cultural”, enquanto Gervasi

complementa:

As escolhas não se fazem à sorte, mas são socialmente controladas,

refletindo o modelo cultural em cujo seio se efetuam. Os bens não se

produzem nem se consomem indiferentemente; devem ter qualquer

significado em relação a determinado sistema de valores. (GERVASI, apud

BAUDRILLARD, 1995, p.69)

Assim, temos duas situações complementares: a primeira na qual a criança busca o

consumo para satisfação de necessidades psicológicas aprendidas com seus pais - e também

de outras fontes de seu contexto social – e a outra, em que segue uma conduta de consumo

orientada pelos formadores de opinião (amigos ou ídolos da mídia) dentro dos grupos de

referência com os quais se identifica na busca por construir uma identidade própria, porém

integrada ao grupo.

Este comportamento tem início em torno dos seis ou sete anos, entretanto se tornará

cada vez mais acentuado à medida que a criança cresce, entrando na adolescência (a partir

dos doze anos), fase na qual o relacionamento com amigos é muito maior que com os pais.

Neste momento o jovem consumidor começa a buscar certa autonomia ao passo que busca

construir uma identidade já com vislumbres adultos, período em que o consumismo ganha

contornos bem mais complexos e profundos.

O consumo entre as crianças varia conforme a idade, uma vez que a percepção de

marcas e produtos, bem como a compreensão de mecanismos de relacionamento com o meio

alteram-se sensivelmente ao longo do crescimento. (MARIN, 2000; MONTIGNEAUX,

2003). Porém, este fato não é levado em consideração pelas empresas que, muitas vezes,

criam estratégias de marketing focando mais de uma faixa de consumidor como público-alvo.

Ocorre uma distinção, sim, por gênero, dado que o comportamento de meninos e meninas é

bem diferente na infância até a juventude.

8. Consumo e mídia

Hoje, em nossa sociedade, vivemos uma era na qual somos constantemente

bombardeados por informação praticamente a todo o tempo em que passamos acordados:

através do rádio, TV, revistas, jornais, computadores e por telefones celulares, recebemos

diversos conteúdos, dentre os quais muitos são de caráter publicitário. Este fenômeno atinge a

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todos, inclusive as crianças de quase todas as faixas etárias, público para o qual o setor de

vendas das empresas tem dispensado uma crescente atenção nos últimos vinte anos.

No dizer de Susan Linn, psicóloga e pesquisadora norte-americana, crítica ferrenha da

publicidade voltada ao público infantil:

O que antes era campo de ação de poucas empresas de brinquedos e

entretenimento passou a ser um empreendimento enorme de múltiplos

tentáculos com um orçamento de marketing combinado, estimado [em 1999]

em mais de US$ 15 bilhões anuais – cerca de 2,5 vezes mais do que foi gasto

em 1992. (LINN, 2006, p.21)

As crianças de hoje, fruto de uma geração mais liberal na educação e que viu a

ampliação do capitalismo em um mercado consumidor global, aprendem cedo a desejar e

comprar produtos. Ao mesmo tempo, já representam uma fatia importante dentro do

faturamento de empresas, tanto por serem comprovadamente importantes influências no ato

de compra (principalmente no ponto de venda), quanto por serem cada vez mais exigentes em

relação a produtos e serviços para si próprias.

O professor Sergio Marin já apontava o importante papel da criança em sua tese de

doutorado apresentada em 2000:

Profissionais de marketing e pesquisadores acadêmicos reconhecem

que as crianças constituem um real e poderoso segmento de mercado. [O

professor norte-americano de marketing] James MacNeal aponta três papéis

de crianças relacionados a consumo: primeiro, como compradores que têm

seu próprio dinheiro para gastar; segundo, como influenciadores indiretos na

compra de uma grande variedade de artigos domésticos; em terceiro lugar,

como um mercado futuro com uma variedade maior de produtos e serviços.

(MARIN, 2000, p. 28)

É consenso o valor da criança dentro do mercado de consumo e, apesar das diversas

manifestações contra impetradas por grupos de pais, psicólogos, pedagogos, educadores e até

da interferência restritiva e regulamentadora do estado, as empresas investem cada vez mais

neste precoce público alvo, agindo principalmente através de ações de marketing mais e mais

elaboradas com um material de comunicação extremamente atrativo e sedutor, objetivando o

ato de consumo. A criança constitui um target para diversas empresas, dentre as quais muitas

que antes não dispunham de interesse ou linhas próprias para essa faixa de consumidor.

Marcas famosas passaram a criar produtos e ambientes específicos para atenderem o mercado

infantil.

Dentre os veículos de mídia destacamos a televisão, bastante presente durante a

infância, desde a mais tenra idade.

A televisão é uma “janela precoce” do mundo exterior, transmitindo

informações e valores da sociedade mais ampla na qual as crianças vivem

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muito antes de serem expostas ao processo formal de escolaridade ou aos

companheiros (LIEBERT; SPRAFKIN, 1988 apud MUSSEN, 1995, p.491)

Através da televisão a criança começa a desenvolver parte de sua visão de mundo.

Com a TV passa a ter contato com diferentes meios sociais, estereótipos e material

publicitário maciço.

O tempo despendido na atividade de ver TV varia bastante, mas sabe-se que ele é alto,

principalmente no período pré-escolar, tendendo a diminuir com os anos, à medida que a

criança começa a preencher seu tempo com outras atividades.

Várias pesquisas apontam que as crianças têm acesso a grande quantidade de

informação inapropriada para sua idade, em virtude de diversos fatores dentre eles um baixo

controle por parte dos pais, contudo, desde cedo assumem uma postura crítica em relação ao

conteúdo do que estão assistindo.

A percepção das crianças em relação à TV, em especial à publicidade, está ligada

diretamente ao seu desenvolvimento cognitivo. As mais novas, até aproximadamente cinco

anos, tem dificuldade em separar os programas das propagandas. A partir dos seis, elas já

discriminam um do outro, contudo são mais suscetíveis às mensagens por ainda não terem

claro o papel dúbio dos anúncios. Em relação aos tipos de mensagens, nessa fase realizam

apenas operações concretas, não entendendo mensagens implícitas e metáforas. Aos dez ou

onze anos já conseguem realizar operações abstratas e entender conteúdos implícitos, além de

terem claro que as propagandas e suas mensagens têm por objetivo vender algo e podem não

ser totalmente verdadeiras.

As propagandas televisivas voltadas para o público infantil usam entre seus

expedientes: histórias de fantasia, atores mirins (fato que aumenta bastante a eficácia da

mensagem), animações e presença de ídolos ou celebridades, porém devem estar atentas nas

particularidades das crianças como expectadores. As crianças conseguem escolher para o que

irão direcionar sua atenção e são críticas quanto ao conteúdo mostrado. As propagandas não

devem apenas divertir, mas despertar o interesse do jovem expectador no produto e o

consequente desejo de possuí-lo, seja por uma necessidade concreta, seja pela promessa

simbólica dele se parecer ou agir como determinado personagem ou ídolo, por exemplo.

Além da televisão, a criança de hoje também conta com a Internet e com os jogos

eletrônicos como outras fontes de material publicitário. Através da rede mundial de

computadores é possível ver conteúdos diversificados de diferentes fontes em plataformas

multimídias. Assim como a TV, os ambientes digitais contêm intenso número de mensagens

publicitárias na forma de anúncios, conteúdos vinculados, merchandising editorial, entre

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outros. Devido ao baixo custo do veículo, em comparação com outras mídias de massa, a cada

ano cresce a verba de propaganda destinada a ela.

Além das mensagens publicitárias (slogans, jingles e textos publicitários), temos

também a presença constante de celebridades relevantes ao universo da criança (artistas e

esportistas), personagens vinculados a marcas e produtos (como o tigre Tony do Sucrilhos

Kellogs) e personagens editoriais apropriados para comunicação mercadológica (como super-

heróis e personagens de desenhos animados). A criança se identifica e busca imitar seus

ídolos como modelos de comportamento, inclusive em atitudes que não condizem com sua

faixa etária. A criança demonstra uma percepção profunda - embora muitas vezes deficiente

quanto a aspectos morais ou juízos de valor - de características sutis de seus ídolos,

procurando imitá-los através destes detalhes. O objetivo desta imitação é uma segurança

ilusória quanto a seu papel e sua participação dentro do grupo.

Por esta razão, pessoas, instituições e organizações que a criança

acredita como amigas, confiáveis, nas quais ela se projeta e com as quais se

identifica transformam-se em poderosos instrumentos formadores de

opinião, pois ela assume suas palavras e seus comportamentos como modelo,

sem contestação maior, sem a elaboração de um pensamento crítico próprio

do assunto (WHITE, 1997, p.34 apud MARIN, 2000, p.114)

As empresas, cientes deste aspecto, criam e mantêm personagens fantásticos

(interpretados por pessoas reais ou por figuras animadas), cultivando um comportamento de

idolatria por parte do público infantil e, algumas vezes, também atingindo os pais, se

aproveitando para ações de marketing constantes, implícitas e explícitas.

O desenvolvimento da criança acontece por fatores internos (seu amadurecimento

físico, mental e emocional) junto a fatores externos, o meio-ambiente ao qual a criança

pertence. Conforme citado por Vygotsky (REGO, 2000, p.59), “aos poucos as interações com

seu grupo social e com os objetos de sua cultura passam a governar o comportamento e o

desenvolvimento de seu pensamento”.

Assim os fatores culturais, junto às próprias etapas biológicas, agem no

desenvolvimento da criança de forma interdependente e atuam de modo fundamental nele.

Dentre estes aspectos, encontra-se o comportamento de consumidor.

O aprendizado e a consequente prática do consumo por parte do público infantil

representam foco de grande interesse pelas empresas. Através de ferramentas de marketing e

dos conglomerados de mídia, esta realidade já se mostra totalmente estabelecida. Isso tornou-

se uma questão que é bastante controversa, uma vez que os efeitos deste comportamento

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consumista não estão totalmente esclarecidos. Muitos autores, como a psicóloga Susan Linn

(2006) e professora Elza Pacheco (1998), apontam algumas decorrências como:

As crianças se tornam cada vez mais materialistas, dependentes da obtenção de

produtos para manutenção de sua felicidade e segurança dentro do convívio

social;

Amadurecimento precoce por vários motivos, dentre eles o contato com

comportamentos erotizados e atitudes inapropriadas para sua idade, presentes

em seus ídolos e formadores de opinião;

A simulação de ambientes adultos e a criação de linhas de produtos inspirados

em linhas adultas contribuem para que a criança adote comportamentos

precoces a sua idade; e

A alta dose de conteúdo inapropriado para a criança na mídia, em especial na

TV, Internet e jogos eletrônicos, com destaque para materiais violentos e de

sugestão erótica (que nem sempre são barrados pelo controle dos pais).

Além destes, outros efeitos podem e devem ser sentidos de modo que se torna mister

uma análise crítica e desvinculada da forma e conteúdo das mensagens publicitárias e da

prática do consumo, bem como das implicações disso no desenvolvimento e no

comportamento da criança.

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CAPÍTULO II - A HISTÓRIA DE BATMAN: A trajetória do

Homem-Morcego dentro da cultura de massa norte-americana.

1. As origens do morcego

O último longa-metragem cinematográfico do super-herói Batman, intitulado “O

Cavaleiro das Trevas5”, estreou no meio do ano de 2008, ganhando destaque em diversos

veículos da mídia internacional. Considerado pela crítica como o melhor filme já realizado

sobre o Homem-Morcego (uma das alcunhas pela qual o super-herói Batman é conhecido),

“O Cavaleiro das Trevas” atingiu o fantástico faturamento de um bilhão de dólares6 e ainda

arrematou o Oscar de melhor ator coadjuvante para Heather Ledger, que interpretou o vilão

Coringa e que falecera durante a finalização do filme.

Este último longa-metragem, escrito por Jonathan Nolan e dirigido por Christopher

Nolan, é uma seqüência de “Batman Begins7”, filme que apresentou uma abordagem do

super-herói bastante próxima da caracterização das histórias em quadrinhos mais recentes,

com um Batman bem mais soturno e violento, enfrentando vilões ensandecidos e implacáveis

em meio a uma Gothan City tomada pela corrupção e pelo crime organizado. Esta imagem

que se tem hoje de Batman é, na verdade, um resgate e uma evolução de sua imagem original,

quando criado no final da década de 1930.

Batman foi criado em 1939 pelo jovem desenhista Bob Kane e com roteiro de Bill

Finger, atendendo a uma encomenda do editor Vin Sullivan para revista Detective Comics

(figura 01), que procurava um personagem que, “além de se enquadrar no tema policial da

revista e solucionar crimes, de alguma forma tivesse o mesmo encanto fantástico do

Superman” (JONES, 2006, p.180). Conta a história que, após diversos esboços durante um

fim de semana, a dupla apareceu na segunda-feira com o desenho de um justiceiro misterioso

e escuro, vestido de morcego: Bat-man (no início o nome do personagem era grafado com

hífen).

5 Batman - O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight / Batman Begins 2, Warner Bros, Estados Unidos, 2008).

Direção: Christopher Nolan. Roteiro: Jonathan Nolan , com Christian Bale, Heather Ledger, Gary Oldman e

Aaron Eckhart. 6“Batman, Cavaleiro das Trevas faturou mais de U$ 1 bilhão de dólares e é o quarto maior filme em faturamento

mundial. Titanic lidera com U$ 1,842 bi, seguido por Senhor os Anéis: O Retorno do Rei e seus U$ 1.119 bi e

em terceiro Piratas do Caribe: O Baú da Morte e mais U$ 1,066 bilhões.” (CAVALEIRO..., 2009, on line) 7 Batman Begins (Idem, Warner Bros, Estados Unidos, 2005). Direção: Christopher Nolan. Roteiro: Jonathan

Nolan , com Christian Bale, Gary Oldman e Lian Neeson.

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No início Batman era apenas mais uma colagem dos principais personagens de

aventura e suspense da época presentes no cinema, nos pulps magazines (literatura barata com

temas policiais, de aventura e mistério) e, até mesmo, nos quadrinhos de aventura,

combinando elementos que eram comuns à maioria deles, como identidade secreta, uso de

apetrechos tecnológicos, uniforme de combate, etc. Entretanto, daquela pantomima de

referências, surgiu um justiceiro sombrio e misterioso, extremamente obstinado, avesso às

regras sociais e que seguia seu próprio código de justiça.

Figura 01

Capa da edição de estréia de Batman, em maio de 1939

Fonte: www.google.com/images

Sem possuir nenhum superpoder, Batman compensava sua condição humana com

habilidades atléticas de um campeão, inteligência acima da média e uma excepcional

capacidade dedutiva voltada para investigação e a estratégia no combate ao crime. Seu alter-

ego, Bruce Wayne, era um milionário solitário que morava em uma remota mansão nos

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arredores da sombria e perigosa cidade de Gothan City (uma caricatura das grandes

metrópoles americanas que viviam sob o domínio do crime organizado) e que, de noite,

vestia-se como um morcego humano, em um traje negro e cinza, para fazer justiça sob a

identidade de Batman.

Batman rapidamente conquistou grande popularidade junto ao público de histórias em

quadrinhos, começando a delinear uma forte identidade, fruto dos instigantes roteiros de seu

criador Bill Finger, que inovou ao explorar a psicologia do personagem e trazer elementos do

drama e da literatura clássica. Ao contar as origens de Batman, Bill Finger trouxe consistência

e alma ao super-herói: o filho único que assiste, ainda criança, ao assassinato de seus pais

durante um assalto comum e que, traumatizado, jura vingança sobre o caixão deles, crescendo

sozinho obcecado pelo desejo de vingança, pela ideia de impedir que outros sofressem o

mesmo que ele, devotando sua vida ao combate ao crime, treinando por anos a fio,

aprimorando suas habilidades físicas e intelectuais, bem como abrindo mão de qualquer

conforto ou relacionamento social (exceto aqueles que interessassem a sua autoimposta

tarefa). Uma noite, enquanto tentava descobrir o melhor método para empreender sua missão

de vida, Bruce Wayne tem sua casa invadida por um morcego (que num floreio dramático,

entra estilhaçando o vidro da janela), vendo nisso um sinal místico do que deveria ser: um

morcego humano, o sombrio combatente do crime: Batman.

Bill Finger foi o primeiro a levar uma dúvida de romancista para o

mundo do super-herói. Por que um homem haveria de escolher uma vida

dessas? Ele encontrou a resposta na dor. Bill Finger, o jovem escritor

taciturno, beberrão e sobrecarregado de trabalho percebeu que a dor da perda

poderia se endurecer e se transformar num tipo de raiva capaz de distinguir

um homem dos outros. (JONES, 2006, p.187)

Bill Finger procurou contemplar suas diversas influências artísticas dentro das

histórias do Homem-Morcego, sua percepção do drama teatral, elementos da literatura

clássica, como “O Conde de Monte Cristo”, de Alexandre Dumas, entre outros. Segundo

conta Gerard Jones (2006, p.185), Finger levava o desenhista Jerry Robinson (inicialmente

contratado como um “fantasma”8 de Bob Kane, mas que logo assumiria como artista

principal) para sessões de cinema em que assistiam a filmes do expressionismo alemão, como

referência visual para as tramas que eram elaboradas.

Batman incorpora uma forte influência gótica (muito além do que a óbvia relação do

nome Gothan City), “do conflito entre sanidade e insanidade, entre o inferno, a terra e os céus,

8 No princípio das HQs de super-heróis, praticamente todos os desenhistas dos principais personagens utilizavam

assistentes anônimos para complementar ou mesmo fazer sua arte. Esses assistentes eram conhecidos como

fantasmas (JONES, 2006).

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entre o pecado e a punição” (LOBIANCO Jr, 1998, p.24), em seu aspecto visual e textual,

uma relação com o grotesco que contribui para seu caráter fascinante junto ao público, e, sem

dúvida, para construção do mito Batman. Como define Eithel Lobianco Jr. (1998, p.95):

“Batman nasce fruto do gênio moderno fundindo grotesco e sublime ao recuperar a narrativa e

imagética gótica”.

2. A trajetória de Batman dentro da cultura de massa norte-americana.

A popularidade de Batman foi crescendo e se firmando ao longo da década de 1940.

Surgiram novos personagens, emblemáticos e inesquecíveis, como os vilões Coringa (Joker) e

Pingüim (Penguin) e o eterno companheiro Robin, o garoto prodígio, introduzido nas histórias

em quadrinhos como uma forma de amenizar o conteúdo violento e humanizar um pouco

mais a imagem do herói.

Batman logo ganhou sua própria revista em quadrinhos, tiras dominicais e espalhou-se

por novas mídias, iniciando uma trajetória de sucesso dentro da cultura de massa norte-

americana (e mundial), estrelando dois seriados de cinema, um em 1943 e outro em 1949.

Suas aventuras em quadrinhos foram lançadas em várias partes do mundo, chegando ao Brasil

em novembro de 1940, através de Adolfo Aizen, dentro da revista em quadrinho “O

Lobinho”.

Após o fim da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se o período conhecido por Guerra

Fria, caracterizado pela disputa política entre o bloco capitalista (capitaneado pelos Estados

Unidos) e o bloco comunista (liderado pela então União das Repúblicas Socialistas

Soviéticas). Este evento deflagrou em 1947, nos EUA, uma histeria anticomunista conhecida

como “caça às bruxas”, na qual “o recém ativado Comitê de Atividades Antiamericanas do

Congresso Norte-Americano começa a se preocupar com a suposta infiltração de agentes

comunistas na indústria cinematográfica” (MONDAINI in PINSKY e PINSKY, 2004, p.194).

A partir do ano de 1950 as perseguições se intensificam sob o comando do senador

republicano Joseph McCarthy, levando a interrogatório (e até para a prisão) inúmeros

intelectuais e artistas, acusados de comportamento subversivo ou envolvimento com o Partido

Comunista.

Por outro lado, muitos intelectuais e cientistas militavam dentro da causa do senador

McCarthy, como o psiquiatra alemão Fredric Wertham, um renomado clínico e pesquisador.

Fredric Werthan, ou Friedrich Wertheimer, nasceu na Alemanha em 1895, formou-se

médico na Inglaterra e especializou-se no estudo do cérebro e nas bases fisiológicas do

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comportamento. Trabalhou na clínica de Emil Kraeplin, onde estudou a psicose e suas causas

orgânicas. Foi profundamente influenciado pelas ideias de Kraeplin da “psiquiatria

comparativa” que “levava em conta as inflexões étnicas da loucura e procurava as forças

sociais e culturais que a afetavam” (JONES, 2006, p.333). Em 1920 mudou-se para os

Estados Unidos, onde se tornou psiquiatra forense em Nova York. Na década seguinte teve

contato com o pensador e filósofo Theodor Adorno, que havia feito parte da conhecida Escola

de Frankfurt e que exerceu grande influência em Fredric com sua crítica à “Indústria

Cultural”. Segundo narra Gerard Jones (2006, p. 334) em seu livro Homens do Amanhã, em

que faz uma retrospectiva histórica das histórias em quadrinhos de super-heróis nos EUA:

As ideias de Adorno conduziram os pensamentos de Wertham para

uma direção diferente, e que não era a melhor para um pensador com seus

antecedentes e suas inclinações. Começou a ver os produtos da "indústria

cultural" como elemento integrante da vida dos criminosos violentos que

estudava; porém sua compreensão de filmes, revistas baratas e quadrinhos

era limitada pelos preconceitos da elite cultural européia de onde viera e por

um entendimento demasiado literal do saber científico em que se destacava.

Uma vez que considerava os entretenimentos de massa não como produtos

racionais mas como produções mecânicas, acreditava que seus efeitos

tinham de ser mecanicistas: a violência dos quadrinhos obrigatoriamente

desencadeariam violência no leitor. E, assim como Adorno, acreditava que

as massas eram muito mais vulneráveis a essa impostura irracional que as

classes instruídas. (JONES, 2006, p. 334)

Tanto Werthan quanto Adorno, um marxista confesso, acreditavam que os membros

das classes menos favorecidas precisavam da tutela de uma elite mais instruída “para libertá-

los das armadilhas da cultura de massa” (JONES, 2006, p. 334). Com esta visão

preconceituosa que Wertham analisou os quadrinhos, gerando um estigma que persegue esta

forma de arte até os dias atuais.

Influenciado pelas ideias de Adorno e conduzindo as suas próprias pesquisas, Fredric

Werthan lançou em 1954, Seduction of the Innoncent (Sedução do Inocente), livro no qual

critica duramente as histórias em quadrinhos, frequentemente recorrendo ao exagero, expondo

suas teorias de como os quadrinhos eram responsáveis pela delinquência juvenil. Neste livro

o Dr. Fredric Werthan acusava Batman e Robin de serem um casal homossexual e de

incentivarem a prática do homossexualismo:

Constantemente eles se salvam um ao outro de ataques violentos de

um número sem fim de inimigos. Transmite-se a sensação de que nós,

homens, devemos nos manter juntos porque há muitas criaturas malvadas

que têm de ser exterminadas. [...] Às vezes, Batman acaba numa cama,

ferido, e mostra-se o jovem Robin sentado ao seu lado. Em casa, levam uma

vida idílica. São Bruce Wayne e Dick Grayson. Bruce é descrito como um

grã-fino e o relacionamento oficial de Dick, seu pupilo. Vivem em aposentos

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suntuosos com lindas flores em grandes vasos. [...] Batman, às vezes,

mostrado em um robe de chambre [...] é como um sonho de dois

homossexuais vivendo juntos. (WERTHAM, 1954 apud MOYA, 1970)

Após o lançamento do livro, o psiquiatra foi nomeado conselheiro psiquiátrico da

Subcomissão Judiciária da Comissão Parlamentar sobre Delinquência Juvenil, mas o órgão

estava mais interessada nos problemas de violência urbana e na televisão que nas histórias em

quadrinhos, alvos principais de Fredric. Contudo, após o desastroso depoimento de Bill

Gaines9, editor da EC Comics, que publicava histórias em quadrinhos de terror e a popular

revista MAD, à subcomissão em maio de 1954, os quadrinhos ganharam o foco dos

noticiários, passando a ser consideradas leituras “mais que vagabundas, depravadas”.

Com a atenção da mídia sobre as histórias em quadrinhos e um intenso movimento

contra, promovido por autoridades, pais e educadores, a Comics Magazine Association of

America, liderada pelas grandes editoras Archie Comics e DC Comics (que desde a década de

1940 passara a publicar as histórias tanto de Batman como de Superman, entre outros), criou o

Comics Code Authority, um código de autocensura da indústria, como uma tentativa de salvar

o mercado. De imediato, diversas editoras menores fecharam suas portas por não conseguirem

se adequar às duras exigências do código, ao passo que as grandes - entre elas a DC Comics,

que teve o cuidado de implantar no código exigências que já praticava comumente em suas

revistas - solidificaram ainda mais seu poder, passando a contar com a aprovação de uma

associação e das furiosas autoridades.

O Comics Code Authority gerou um efeito desastroso nas aventuras da maioria dos

personagens, que ganharam um tom mais ameno e, ao mesmo tempo, mais fantástico

perdendo muito de sua essência. No caso de Batman, especialmente, tivemos uma

descaracterização profunda de sua figura. Ele, desde então, agia à luz do dia, enfrentava

inimigos ridículos (não mais gangsteres ou criminosos insanos, mas tipos excêntricos e

coloridos, os quais, muitas vezes, pareciam oriundos de paródias de ficção científica) e ao

mesmo tempo engraçados. Havia adquirido uma família de fantasiados, realizava viagens

interplanetárias e interdimencionais e mostrava-se cada vez mais cômico e caricato, bem

longe daquele justiceiro sombrio e obcecado imaginado por Bill Finger, em 1939. As histórias

passaram a contar com muitos elementos de ficção científica e interagiam com histórias de

outros personagens em sagas cósmicas fantásticas ou apenas aventuras infantis e ingênuas.

Novos personagens foram introduzidos e as origens de outros recontadas.

9 ver JONES, 2006, p. 336 – 339.

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45

Tanto por seus primórdios quanto por seu turno, podemos entender que as histórias em

quadrinhos de super-heróis foram desde sua origem uma manifestação cultural contra-

hegemônica10

, pertencente às classes mais baixas da sociedade dos grandes centros, entretanto

o estabelecimento e o crescimento do mercado de HQs geraram um racha dentro delas no

qual, a partir desse momento, podia-se dividir os quadrinhos entre os prós e contras à cultura

predominante. Tínha-se aí a origem dos conhecidos quadrinhos underground.

Naturalmente as editoras grandes, como a Archie Comics e DC Comics articuladoras

do Comics Code, haviam se aliado e se estabelecido junto ao poder dominante, firmando-se

como representantes do conservadorismo cultural. Por outro lado, seus artistas não estavam

necessariamente alinhados a essa postura corporativa e, até mesmo dentro dos limites rígidos

autoimpostos pela cúpula das editoras, surgiam manifestações diferenciadas da ordem

dominante. Podemos considerar como um exemplo disso o seriado televisivo Batman e

Robin, de 1966 (figura 02).

Batman e Robin, que foi ao ar pela rede ABC, contou com 120 episódios e foi exibido

em diversos países, inclusive no Brasil. O produtor, William Dozier, não queria levar para

televisão um super-herói sombrio e soturno, optando por transformar Batman em um seriado

cômico, “colocando em um liquidificador a linguagem das histórias em quadrinhos, os clichês

dos antigos cine-seriados da década de 40, e a estética psicodélica daqueles tempos. Tudo

com muito exagero” (BATMAN NA TV..., 1997, on-line).

O seriado estreou em 12 de janeiro de 1966. O primeiro episódio foi

Hey Diddle Riddle, já apresentando um dos mais conhecidos inimigos do

Morcego: o Charada. O sucesso foi imediato. Ninguém tinha visto nada

parecido na TV. Aqueles uniformes espalhafatosos, os ousados ângulos de

câmara, a trilha sonora com melodias dançantes que pareciam retiradas das

festas de iê-iê-iê que os jovens faziam nos fins de semana, a indecisão dos

produtores em dirigir a série para os adultos ou para as crianças, personagens

ridículos que se levavam tão a sério, as armadilhas inverossímeis no fim dos

episódios para garantir o suspense... Todos os elementos caíram como uma

luva no gosto do público. (MARINS, 2001, on-line)

10

“Uma hegemonia é, nesses termos, como uma “cultura dominante”, mantida pelas relações de domínio e

subordinação entre classes.” (RIBEIRO, 2004, p.27)

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46

Figura 02

Cartaz do longa-metragem de cinema baseado no seriado de 1966

Fonte: www.google.com/image

A série televisiva foi importantíssima para Batman, pois aumentou vertiginosamente

sua popularidade mundialmente, contudo, descaracterizou todo conceito original do

personagem. Assim como nas histórias em quadrinhos dessa época, todo o elemento sombrio

do sinistro vigilante noturno fora perdido em meio às exigências do Comics Code, porém a

série representaria um marco na carreira do homem-morcego. Mais do que uma representação

cômica ou uma interpretação sofrível de um super-herói, ela seria um ícone da contracultura

dos anos de 1960.

Travestida de comédia camp (algo que, de tão artificial, chega a ser

divertido) a série era uma crítica ácida à sociedade americana e sua

necessidade de heróis mascarados e imaculados, onde os vilões não tinham

freio moral algum e a polícia era completamente inútil. Assim, os ilustres

desconhecidos Adam West (Batman) e Burt Ward (Robin) tornaram-se

celebridades. (AGUIAR, 2003, on-line)

A série Batman e Robin foi um divisor de águas dentro da trajetória midiática do

super-herói. Acreditamos que esta série foi bastante importante em sua época por reforçar

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uma característica sempre presente no mito do homem-morcego: sua face contestadora. O

seriado pode ser entendido como uma crítica ao universo super-heroístico, não apenas nas

histórias em quadrinhos, mas em toda esfera cultural norte-americana: Batman, levemente

acima do peso, com seu idealismo conservador e ingênuo, parecendo um escoteiro crescido,

com sua castidade incorruptível mesmo com os constantes ataques das diversas beldades

lascivas que se jogavam em seus braços, seu clima colorido, sua homossexualidade implícita.

A paródia presente nos episódios trazia tácita a crítica ao maniqueísmo totalitário do

macartismo, ao heroísmo belicoso e masculino, bastante presente na história da sociedade

norte-americana (Kellner, 2001). Mas também apresentava um Batman forte em sua forma

mítica, em seu simbolismo crítico e marginal, o outro lado, o grotesco.

Ainda, segundo Kellner (2001, p.76), “ler politicamente a cultura significa ver como

as produções culturais da mídia reproduzem as lutas sociais existentes em suas imagens, seus

espetáculos e sua narrativa”, ou seja, ao analisar a produção cultural de Batman, contrapondo

o contexto histórico com a construção mítica do personagem, podemos entender sua

importância.

O seriado de 1966, apesar de ter feito muito sucesso e ter marcado época, sendo

lembrado até hoje, teve uma vida curta e um fim melancólico em 1969, sendo cancelado no

meio da terceira temporada devido à baixa audiência.

Na década de 1970, a contracultura evoluiria da rebeldia para a agressividade. O

cinema daria vazão a essa tendência, com filmes mais densos e críticos, de forte carga

psicológica e exagerada violência, através do surgimento de uma nova geração de cineastas

como Francis Ford Coppola, Martin Scorcese, entre outros, trazendo a obscura nova

sociedade americana, esvaziada do sonho hippie em um mundo bem mais sombrio.

Havia este mesmo clima dentro da indústria das histórias em quadrinhos, não através

dos grandes executivos das principais editoras, como DC Comics, Archie Comics e Marvel

Comics, que preferiam se submeter ao conservadorismo do Estado a arriscar-se em uma nova

investida das autoridades moralistas, mas através de uma nova geração de jovens artistas,

muitos dos quais fãs antigos que cresceram lendo histórias em quadrinhos de seus super-

heróis preferidos e tinham algumas opiniões bastante particulares sobre como conduzir seus

ídolos de capa e roupa colante.

É interessante notar que, apesar das grandes editoras da época serem empresas

alinhadas ao poder econômico e político dominante, impondo uma produção cultural de massa

conservadora, formava-se dentro de suas fileiras de colaboradores outra produção diferente,

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48

com certo perfil contra-hegemônico, contestador. Muito disso se deve por uma geração de

leitores que agora assumia a produção das histórias em quadrinhos.

Um destes novos autores foi Denny O‟Neil, um jovem escritor da DC Comics, a quem

caberia, no final de década de 1960 e início da seguinte, a difícil tarefa de reformular o

homem-morcego, recuperando sua antiga aura de mistério. Iniciava-se aí um processo que

transformaria o ícone do super-herói Batman no que conhecemos hoje.

Os anos de 1960 haviam descaracterizado e perdido muito dos conceitos originais de

Batman. Era necessário que o personagem passasse por grandes transformações. Para o

público dos anos 1970 não fazia mais sentido as aventuras infantis e grandes sagas cósmicas

da década anterior. Novos personagens surgiram, mais sintonizados com a nova época,

expondo a violência presente no mundo. Pouco a pouco a maioria da produção das grandes

editoras cedeu a essa tendência. E Batman era o personagem perfeito para isso.

Primeiramente, novos vilões, mais de acordo com a realidade da época, foram

introduzidos, como o maquiavélico Ra‟s Al Ghul (Figura 03), um vilão diferente por se tratar

de um terrorista internacional e não um mero bandido urbano, personificando uma clara

referência aos Árabes. Batman também se separa de Robin que, como Dick Grayson, seu

alter-ego, ingressa na universidade enquanto Bruce Wayne transfere-se para Gothan City,

abandonando a mansão. As principais mudanças, no entanto, foram nos enredos do

personagem, que agora contavam histórias mais densas, com maior violência e até alguns

elementos sobrenaturais. O trauma da perda dos pais voltava a ser focado bem como a

obsessão do personagem.

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Figura 03

O novo Batman reformulado por Neal Adams e Denny O’Neil

Fonte: www.google.com/images

Na década de 1970, tanto nas histórias em quadrinhos quanto no cinema, popularizou-

se a figura do anti-herói, um tipo de personagem diferente do herói clássico por ter atitudes

rudes, motivações egoístas e interesseiras que não o simples altruísmo moralista. Os anti-

heróis agem de modo violento, avesso ao cumprimento de leis (acreditam na justiça), agem

por vingança, por ódio. Às vezes, chegam a executar sumariamente seus inimigos. Porém, não

são personagens essencialmente maus, até praticando atos moralmente aprováveis, contudo,

na maioria das vezes é difícil traçar uma linha que separa o anti-herói do vilão.

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Nota-se que, em termos de público, o anti-herói, oposto do vilão, sempre obtém certa

aprovação, seja através de seu carisma, seja por meio de seus objetivos, frequentemente,

justos ou, ao menos, compreensíveis (o que não os torna lícitos). O anti-herói não é um vilão,

mas um novo tipo de herói.

Alguns personagens famosos dentro das histórias em quadrinhos e que pertencem a

esta extirpe são: Justiceiro (Punisher, da Marvel Comics, criado em 1977), Wolverine

(também da Marvel Comics, criado em 1975), entre outros. E como era natural acontecer

frente a seu histórico nos quadrinhos, a partir dos anos de 1970 Batman passou a integrar este

grupo.

Apesar de sua volta às origens sombrias dentro das historias em quadrinhos, Batman

ainda se mantinha muito preso ao seriado dos anos de 1960, principalmente devido ao

desenho animado Super-Amigos11

, no qual Batman mantinha as mesmas características do

antigo show televisivo. Consequentemente, as vendagens das revistas em quadrinhos nos

Estados Unidos, apesar das boas histórias da dupla Denny O‟Neal e Neal Adams, iam muito

mal (no Brasil, a publicação era bastante inconstante, de modo que a revista Batman foi

cancelada várias vezes). A nova versão do Homem-Morcego de O‟Neal e Adams não estava

ainda madura suficientemente e, para o público, ainda que se encaixasse no tipo de produção

conservadora típica americana, faltava a ousadia que se esperava do personagem.

Entretanto, a produção setentista foi fundamental para retornar o super-herói às suas

origens e abrir caminho para uma gradual inserção de temas cada vez mais densos, voltados a

um leitor mais maduro, que culminaria na década seguinte com a história considerada por

muitos como um divisor de águas na carreira do Homem-Morcego.

Vieram os anos de 1980 e o republicano Ronald Reagan era o presidente dos Estados

Unidos. Foi um período marcado pelo grande conservadorismo político e social, pela

recuperação da economia norte-americana, por uma política externa intervencionista e

militarista (em especial na América Central e Oriente Médio) e pela queda da URSS,

resultando no fim da Guerra Fria. Douglas Kellner (2001) exemplifica esta produção cultural

orientada para a propagação da ideologia militarista dos EUA (com apoio da Inglaterra de

Margaret Thatcher), personificada na figura do personagem Rambo12

, interpretado por

Sylvester Stallone, que “representa um conjunto específico de imagens do poder masculino,

da inocência, e da força americana e do heroísmo do guerreiro” (KELLNER, 2001). Este

11

Super-amigos (Super-Friends), desenho animado produzido pelo estúdio Hanna-Barbera para rede ABC

(EUA) de 1973 a1983, baseado em personagens da DC Comics. 12

Rambo – Programado para Matar (First Blood, Orion Pictures, Estados Unidos, 1982). Direção: Ted Kotcheff.

Roteiro: Michael Kozoll, com Sylvester Stallone, Richard Crenna, Brian Dennehy, David Caruso.

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personagem do cinema é emblemático em corporificar uma série de atributos da ideologia

dominante em uma produção cultural hegemônica. Em meio a este clima político e social, em

1986, é lançada a obra considerada como a definitiva de Batman: Batman – O Cavaleiro das

Trevas, novela gráfica de Frank Miller13

.

Na novela gráfica, publicada pela DC Comics em quatro volumes com edição e

impressão diferenciadas, Gothan City é uma metrópole decadente assolada pela violência

urbana e pela omissão dos governantes. O mundo vive o auge da Guerra Fria com a iminência

de um conflito nuclear entre soviéticos e norte-americanos. Diante deste cenário apocalíptico,

Bruce Wayne, aposentado do combate ao crime há 10 anos, retorna à identidade de Batman

após um tipo de epifania provocada pela violência mostrada incessantemente pela mídia

sensacionalista, ressurgindo muito mais violento e paranóico do que nunca. Motivados pelo

retorno do herói, Duas Caras e Coringa, dois de seus principais inimigos, reaparecem

igualmente cruéis e ainda mais sanguinários. Entretanto, desta vez a opinião pública está

divida entre os prós e contra Batman. As autoridades policiais, agora sob o comando de uma

nova comissária de polícia, substituindo o velho comissário Gordon, aposentado, passam a

caçá-lo impiedosamente. Paralelamente, os Estados Unidos vivem a ameaça de um conflito

armado contra a URSS pela posse de uma ilha (fictícia) do Pacifico, sendo que os norte-

americanos contam com sua arma-secreta na figura de Superman.

Após derrotar Duas-Caras e Coringa, além de uma gangue de jovens delinquentes (que

passam a segui-lo quase religiosamente), Batman assume o controle de Gothan City durante

um apagão causado por uma bomba nuclear na tal ilha, promulgando por suas próprias mãos,

lei marcial na cidade. Assim, Superman é convocado pelo próprio presidente Reagan a

prender Batman e levá-lo às autoridades. Contudo, o Homem-Morcego não se rende à

autoridade do estado nem à de Superman, resistindo à prisão.

A história atinge seu clímax com a batalha entre Superman e Batman, numa luta final

corpo a corpo. Batman vence, mas é acometido de um infarto - ao menos é o que o super-

herói pretende que todos acreditem, já que é mostrado no final que ele sobreviveu para um

novo recomeço.

O Cavaleiro das Trevas é considerada a obra definitiva sobre o Batman, pois foi a

história que sacramentou definitivamente o mito Batman. Ela reavalia todo o universo do

super-herói, estabelecendo de uma vez por todas quem é o personagem e seu papel no mundo

(imaginário e real), ao mesmo tempo em que traça uma crítica ácida à cobertura

13

Ano de lançamento nos Estados Unidos, como The Dark Knight Returns, pela DC Comics, com texto e arte de

Frank Miller, arte final de Klaus Janson e cor de Lynn Varley.

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sensacionalista sobre violência presente nas mídias de massa e ao governo conservador de

Ronald Reagan. A história também discute o universo psicológico e mitológico de Batman

através de seus inimigos Duas-Caras (que representa a dualidade do personagem) e Coringa (a

face inversa do personagem) e o papel dentro do imaginário dos guerreiros icônicos e

conservadores norte-americanos na forma do Superman. No final a luta decisiva entre o

“Cavaleiro da Trevas” e o “Homem de aço”, formas como são tratados Batman e Superman,

respectivamente, com a consequente “morte e ressurreição” de Batman, servem para reforçar

e estabelecer definitivamente o mito do personagem.

Em meio ao contexto da história temos Bruce Wayne, uma figura solitária, afastado do

convívio social e amargurado, entregue aos vícios, refugiado em sua mansão nos arredores da

cidade, aparecendo raramente em eventos sociais. Claramente vemos que o indivíduo Bruce

Wayne deteriora-se pouco a pouco, sendo tomado pelo morcego. Porém, ao retornar como

Batman, ele se sente revivido, forte, renascido, mas excluído e sem identificação com o

mundo que encontra. Neste instante, Bruce, ao se tornar Batman, incorpora o arquétipo da

Sombra apontado por Jung, sobre o qual falaremos mais a frente.

Seus atos heróicos são contestados e Batman passa a ser perseguido pelas autoridades

que antes foram suas aliadas, se tornando uma figura controversa. Além dos seus inimigos, a

lei também se torna antagonista do herói.

Assim, Miller reforça as características míticas dentro da construção arquetípica do

super-herói Batman como uma representação do lado negro do ser humano, um guerreiro

independente que age no lado escuro, no submundo, mas também o fora-da-lei, fazendo suas

próprias regras e seguindo um senso de justiça primordial, a despeito das convenções sociais

vigentes ou de limites políticos ou geográficos.

A obra de Frank Miller foi considerada um marco na cronologia do herói (e também

na história das histórias em quadrinhos) e até hoje, mesmo após mais de vinte anos de seu

lançamento, continua gerando reimpressões e sendo motivo de diversas discussões nos meios

artísticos e acadêmicos. Como exemplo, no ano de 2008 foi objeto de pesquisa para

dissertação de mestrado de Paulo Vinícius Pina14

, através do programa de Mestrado em

Ciências Sociais e Comunicação da Universidade Paulista – UNIP, em São Paulo. A

dimensão da obra é tamanha que dá margem a várias leituras, contudo, para nosso estudo, no

momento, nos interessa apenas a formação da imagem do personagem Batman.

14

PINA, Paulo Vincios de Omena. Configurações do Sombrio nas Histórias em Quadrinhos do Batman.

2008. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais e Comunicação) – UNIP – Universidade Paulista, São Paulo.

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Graças ao O Cavaleiro das Trevas, Batman novamente se tornou um personagem

popular e suas revistas em quadrinhos voltaram a ter boas vendagens. Apoiado na

popularidade conseguida com a novela gráfica, a Warner Bros, que tinha recém comprado a

DC Comics, faria, em meio a uma gigantesca campanha de marketing e promoção, o longa-

metragem Batman, em 1989, atingindo um grande sucesso de bilheteria e reinaugurando o

gênero super-herói nos cinemas.

Com direção de Tim Burton, estrelando Michael Keaton como Batman e Jack

Nicholson como Coringa, Batman15

seria um avanço e um retrocesso na carreira do

personagem. Avanço por enterrar definitivamente a imagem do Batman do seriado dos anos

1960 e por difundir o personagem mundialmente, transformando definitivamente a marca

Batman em uma marca comercial de sucesso.

O retrocesso seria quanto ao personagem que novamente seria retratado menos

sombrio e mais fantástico. A escolha do ator cômico Michael Keaton e a pressão exercida por

parte da Warner em se fazer um filme acessível a todo o público, esvaziou a história de seu

caráter crítico e violento presente na obra de Frank Miller, prejudicando também o aspecto

mítico do personagem.

Seguidos a Batman, houveram três outros longas-metragens cinematográficos:

Batman, o retorno (Tim Burton, 1992), Batman Eternamente (Joel Schumacher, 1995) e

Batman e Robin (Joel Schumacher, 1997), sendo estes dois últimos bastante contestados por

público e crítica, em virtude de seus roteiros fantasiosos e, até mesmo, cômicos, além da

escolha equivocada de atores, principalmente para o papel do Homem-Morcego.

Em contra partida, em 1992, com produção da Warner Bros, estreou Batman: The

Animated Serie, série feita em animação que resgata o clima das primeiras HQs do

personagem da década de 1940 e um Batman mais próximo ao mostrado por Miller.

Em 2005 Batman retorna às telas de cinema com Batman Begins, de Christopher

Nolan, mais uma vez renovando a imagem do super-herói, agora muito mais próximo da

construção feita por Frank Miller em O Cavaleiro das Trevas, baseado em outra história em

quadrinhos de Miller, Ano Um16

(Year One), na qual ele reconta os primeiros dias de Bruce

como Batman.

15

Batman (Batman, Warner Bros, Estados Unidos, 1989). Direção: Tim Burton. Roteiro: Sam Hamm e Warren

Skaaren, baseado nos personagens criados por Bob Kane, com Michael Keaton, Jack Nicholson, Kim Basinger. 16

Batman: Ano Um (Batman: Year One) foi um arco de histórias em quadrinhos, escrita por Frank Miller,

desenhada por David Mazzucchelli, publicada originalmente nas edições #404 a #407 da revista em quadrinhos

DC Comics' Batman, em 1987.

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O filme foi um grande sucesso e gerou uma continuação em 2008, intitulada Batman,

O Cavaleiro das Trevas, também de Chris Nolan, baseado na novela gráfica de 1986.

Nestes dois filmes, a imagem do super-herói volta a ser aquela sombria e amargurada,

porém sem a crítica política e social presente da novela gráfica de Miller.

Apesar de seus setenta anos de existência, Batman ainda se mantém como um dos

personagens mais populares da cultura de massa, não só norte-americana, mas mundial.

Apesar de ter surgido como uma despretensiosa criação de dois jovens de Nova York, EUA,

no final dos anos de 1930, o Homem-morcego se tornou um personagem extremamente

complexo e rico.

A soma das diversas influências que permearam sua gênese e continuaram a

transformá-lo durante sua trajetória, fizeram de Batman um ícone tanto da cultura de massa

quanto da contra-cultura, ao mesmo tempo uma personificação de manifestações arcaicas de

nossa psique dentro de nossa moderna mitologia.

Batman, o personagem de entretenimento, um super-herói das histórias em quadrinhos

e do cinema, também é um símbolo de contestação e um personagem mitológico, devido à sua

natureza própria, obstinado em seu universo, mas maleável à criatividade de seus narradores.

Seu caráter fantástico é eternamente reinventado de acordo com sua época, sempre se

caracterizando pela dualidade presente no ser humano.

Não devemos nos esquecer, no entanto, que Batman é um personagem da indústria do

entretenimento. Não uma divindade ou uma entidade mitológica, mas uma propriedade

particular pertencente a um grande conglomerado de mídia, a Time Warner Inc. e, em virtude

disso, passível de ser conduzido e direcionado conforme os interesses da mesma.

Assim, paradoxalmente, Batman é visto pelo seu público como um ser mitológico, um

super-herói diferente, um símbolo cultural de contestação, mas para sua proprietária ele é uma

importante marca dentro do universo de consumo, acima de interesses políticos (como ficou

claro na oba de Miller de 1986), mas compromissado com o sucesso e com as cifras em

vendas.

A seguir uma relação de algumas das principais incursões do personagem dentro da

indústria cultural de entretenimento.

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3. Batman nas diversas mídias

Batman, como um produto da indústria cultural, absorvido pela indústria do

entretenimento, figura em inúmeras obras ao longo de mais de setenta anos de existência,

veiculadas nas mais variadas mídias. Contabilizar toda essa produção é tarefa quase

impossível, principalmente se nos depararmos com a fama do super-herói e a dimensão de seu

público (que extrapola fronteiras e até mesmo o controle dos direitos autorais do personagem)

uma vez que temos uma enorme produção inspirada no mito feita por fãs e entusiastas.

A seguir, apresentamos pequena parte como exemplo de seu conteúdo na indústria

cultural através de diversas mídias.

Revistas em Quadrinhos - Estados Unidos17

:

Título Período Número de Edições

Batman 1940 688 Comics

Batman Adventures 2003-2004 19 Comics

Batman and Superman: World's Finest 1999-2000 10 Comics

Batman and the Outsiders 1983-1986 34 Comics

The Batman Family 1975-1978 20 Comics

Gotham Knights 2000-2004 57 Comics

Legends of the Dark Knight 1989 - 202 Comics

Batman Limited Series 284 Comics

Batman One Shots 86 Comics

Shadow of the Bat 1992-2000 103 Comics

Trades & Hardcovers 75 Comics

Revistas em Quadrinhos - Brasil18

Título Editora

Licenciador

Período N° de edições

Almanaque de Invictus (Batman & Ebal DC Comics 1968-1973 6 Edições

17

Fonte: http://www.comics-db.com/DC_Comics/B/Batman/ , acessada em 18 abr. 2009. 18

Fonte: http://www.guiadosquadrinhos.com/titulos.aspx?busca=Batman acessado em 18 abr. 2009.

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Super-Homem)

Almanaque de Batman Ebal DC Comics 1964-1979 14 Edições

Almanaque de O Herói Ebal DC Comics 1976-1980 3 Edições

O "Almanaque de Superman" foi

publicado de 1950 a 1980. De 1955 a

1960 e em 1978 foi substituído pelo

"Almanaque de Superman e Batman”

Ebal DC Comics 1950-1982 20 Edições

Batman - 1ª Série Abril DC Comics 1984-1985 10 Edições

Batman - 2ª Série Abril DC Comics 1987-1988 16 Edições

Batman - 3ª Série Abril DC Comics 1990-1992 30 Edições

Batman - 4ª Série Abril DC Comics 1995-1996 19 Edições

Batman - 5ª Série Abril DC Comics 1996-2000 46 Edições

Super-Heróis Premium-Batman - 6ª Série Abril DC Comics 2000-2002 23 Edições

Série Planeta DC Batman - 7ª Série Abril DC Comics 2002 5 Edições

Batman - 1ª Série Ebal DC Comics 1953-1961 100 Edições.

Batman - 2ª Série Ebal DC Comics 1961-1969 100 Edições

Batman - 3ª Série Ebal DC Comics 1969-1977 89 Edições

Batman - 4ª Série Ebal DC Comics 1977-1979 33 Edições

Batman Panini DC Comics 2002 -

Batman & Super-Homem (Invictus em

Cores) - 1ª Série

Ebal DC Comics 1972-1974 6 Edições

Batman & Super-Homem (Invictus) - 3ª

Série

Ebal DC Comics 1967-1973 82 Edições

Batman (Em Cores) - 1ª Série Ebal DC Comics 1969-1976 67 Edições

Batman (Em Formatinho) - 2ª Série Ebal DC Comics 1976-1983 70 Edições

Batman - O Desenho da TV Abril DC Comics 1994-1995 20 Edições

Batman Bi - 1ª Série Ebal DC Comics 1965-1977 72 Edições

Batman Bi - 2ª Série Ebal DC Comics 1977-1979 17 Edições

Batman Extra Panini DC Comics 2007 -

Superman & Batman Panini DC Comics 2004 -

Séries Televisisas

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Batman ( Batman, ABC, de 1966 a 1968), com Adan West, Burt Ward,

Neil Hamilton, Stafford Repp e Alan Napier.

Séries Televisisas em Animação19

The Batman/Superman Hour, produzida pela Filmation e exibida pela CBS

entre 1968 e 1969.

Super Amigos, produzido de 1973 a 1985 pela Hanna-Barbera, baseado na

Liga da Justiça da DC Comics.

The New Adventures Of Batman – Produzido pela Filmation em 1977 e

distribuída pela Columbia Pictures Television.

Batman: The Animated Series – Produzida pela Warner em 1993 a 1995.

New Batman Adventures – Produzida pela Warner de 1997 a 1999.

Batman do Futuro – Produzida pela Warner de 1999 a 2001·

O Batman – Produzida pela Warner de 2004 a 2008·

Os Bravos e Destemidos – Produzida pela Warner de 2008 até presente.

Longas de animação20

A Máscara do Fantasma (1993)

Batman & Mr. Freeze: Abaixo de Zero (1998).

Batman do Futuro: O Retorno do Coringa (2000).

O Mistério da Mulher-Morcego (2003).

Batman vs. Drácula (2005)

O Cavaleiro de Gotham (2008)

Séries de Cinema21

O Morcego (Batman, Columbia Pictures Corporation, 1943), Direção: Lambert

Hillyer, Roteiro: Victor McLeod, com Lewis Wilson, Douglas Croft, J. Carrol

Naish e Shirley Patterson.

A volta do Homem-Morcego (Batman & Robin, Columbia Pictures

Corporation, 1949), Direção: Spencer Gordon Bennet, Roteiro: George H.

Plympton, com Robert Lowery, Johnny Duncan e Jane Adams.

19

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Batman#Televis.C3.A3o, acessado em 26 abr. 2009. 20

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Batman#Televis.C3.A3o, acessado em 26 abr. 2009. 21

Fonte: http://www.imdb.com/, acessado em 24 abr. 2009.

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Longa metragens de Cinema

Batman: O Homem-Morcego (Batman, Twentieth Century-Fox Film

Corporation, 1966) , Direção: Leslie H. Martinson. Roteiro: Lorenzo Semple

Jr., baseado nos personagens criados por Bob Kane, com Adan West, Burt

Ward, Cesar Romero, Lee Meriwether, Burgess Meredith e Frank Gorshin.

Batman (Batman, Warner Bros, Estados Unidos, 1989). Direção: Tim Burton.

Roteiro: Sam Hamm e Warren Skaaren, baseado nos personagens criados por

Bob Kane, com Michael Keaton, Jack Nicholson, Kim Basinger.

Batman, o retorno (Batman Returns, Warner Bros, Estados Unidos, 1992).

Direção: Tim Burton. Roteiro: Sam Hamm e Warren Skaaren, baseado nos

personagens criados por Bob Kane, com Michael Keaton, Danny DeVito e

Michelle Pfeiffer.

Batman Forever, (Batman Forever, Warner Bros, Estados Unidos, 1995).

Direção: Joel Schumacher, Roteiro: Lee Batchler, baseado nos personagens

criados por Bob Kane, com Val Kilmer, Tommy Lee Jones, Jim Carrey e

Nicole Kidman.

Batman & Robin (Batman & Robin, Warner Bros, Estados Unidos, 1997).

Direção: Joel Schumacher, Roteiro: Lee Batchler, baseado nos personagens

criados por Bob Kane, com George Clooney, Arnold Schwarzenegger, Uma

Thurman e Chris O'Donnell.

Batman Begins (Batman Begins, Warner Bros, Estados Unidos, 2005).

Direção: Christopher Nolan. Roteiro: Jonathan Nolan , com Christian Bale,

Cillian Murphy, Gary Oldman e Kate Holmes.

Batman - O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight / Batman Begins 2,

Warner Bros, Estados Unidos, 2008). Direção: Christopher Nolan. Roteiro:

Jonathan Nolan , com Christian Bale, Heather Ledger, Gary Oldman e Aaron

Eckhart.

Jogos Eletrônicos22

Batman para Amstrad PCW, 1985.

Batman: The Caped Crusader para várias plataformas de 8-bits e 16-bits

22

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Batman#Televis.C3.A3o, acessado em 26 abr. 2009.

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Batman para Sega Mega Drive, NES, Atari Lynx, Commodore Amiga, ZX

Spetrum, Game Boy e PC.

Batman: Return of the Joker para NES e Game Boy

Batman Returns para NES, Super NES, Mega Drive, Sega CD, Sega Game

Gear, and Lynx.

Batman: The Animated Series para Game Boy e Game Gear.

The Adventures of Batman & Robin for Super NES, Mega Drive, Sega CD, e

Game Gear.

Batman Forever para Super NES, Game Boy, Sega Mega Drive, e Sega Game

Gear.

Batman Forever: The Arcade Game para Arcade, PlayStation e Sega Saturn.

Batman and Robin para Tiger Game.com e PlayStation.

Batman: Total Chaos para Game Boy Color.

Batman Beyond: Return of the Joker para Nintendo 64 e PlayStation.

Batman: Vengeance para GameCube, PlayStation 2, PC, e Xbox.

Batman: Rise of Sin Tzu para PlayStation 2, PC, Xbox, GameCube e Game

Boy Advance.

Batman: Dark Tomorrow para PlayStation 2, Xbox, e GameCube

Batman Begins para PlayStation 2, Xbox, GameCube e GBA.

Batman: Arkham Asylum para PlayStation 3, Xbox.

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CAPÍTULO III - COMUNICAÇÃO MERCADOLÓGICA: Da

marca ao consumidor

Para falarmos de comunicação mercadológica (comunicação a serviço do marketing),

precisamos retroceder um pouco a uma contextualização do que seja marketing, para

acompanharmos sua evolução e abrangência e, assim, entendermos mais claramente o papel

da comunicação dentro de uma perspectiva macro.

1. Uma introdução ao marketing

Markenting, segundo a American Marketing Association (AMA), a mais antiga

associação de profissionais e pesquisadores ligados à atividade, citada por YANAZE (2007,

p.7), é assim definido como “o processo de planejar e executar a concepção, estabelecimento

de preço, promoção e distribuição de ideias, bens e serviços, para criar trocas que satisfaçam

objetivos individuais e organizacionais”.

Esta definição já estabelece a concepção e a produção de bens e serviços, bem como

sua disponibilização e a consequente obtenção por um público (individual ou coletivo) através

da troca, mais comumente em espécie, deste conteúdo pelo dito produto. Entretanto,

analisando a partir desta premissa, não temos garantias do escoamento da produção, uma vez

que ela aponta o consumo, mas não aponta a motivação para o consumo. Assim, bem mais

palatável e acordada com a realidade, encontramos em Daniel Galindo uma complementação

da definição de marketing:

Marketing está ligado diretamente à produção, à capacidade

produtiva, à disponibilidade de uma determinada produção, representando a

garantia de que esta produção poderá ser escoada ou transferida para seu

destino final (consumo). (GALINDO, 2002, p.98)

Mais do que o termo, a atividade de marketing faz menção não apenas à produção,

disponibilização e troca de bens e serviços (atividades oriundas dos primórdios da sociedade

humana na qual as trocas eram motivadas por necessidades básicas como alimentação, abrigo,

etc), mas também à promoção de tais bens e serviços que visa a efetuar o convencimento –

persuasão – do público para a obtenção do produto: a prática moderna do consumo.

Esta compreensão de marketing resume-se em um esquema proposto por Jerome

McCarthy em 1960 (YANASE, 2007, p.25), conhecido como Conceito dos 4Pês (de acordo

com os termos em inglês) e utilizado até hoje. Este esquema engloba os quatro compostos

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básicos do marketing que comporiam qualquer estratégia de atuação de uma empresa no

mercado: Product (produto), Price (preço), Place (lugar de venda) e Promotion (promoção).

Em virtude das transformações ocorridas a partir dos anos da década de 1980, nos campos

econômico, político e social, esse modelo sofreu alterações modernizando-se e, hoje, se

apresenta como: produto/serviço, preço/remuneração, distribuição (em vez de lugar) e

comunicação (em vez de apenas promoção). Esta evolução do esquema de McCarthy trouxe

uma adequação conceitual mais próxima das novas realidade e possibilidades no campo de

atuação do marketing.

Dentro do objetivo desta dissertação, iremos nos aprofundar na comunicação de

marketing, ou mercadológica, como foco do nosso estudo. Antes, no entanto, convém

falarmos um pouco sobre a marca.

2. A força da marca

A utilização de desenhos ou sinais gráficos para distinguir ou identificar produtos vem

da antiguidade. Em muitas civilizações, com o estabelecimento das relações mercantis,

diversos produtores buscavam identificar seus itens, diferenciando-os dos concorrentes,

através de um sinal, uma marca própria.

Essa marca podia ser um desenho, um símbolo ou a assinatura do produtor. Nos

primeiros tempos, ela era usada apenas para ligar o produto ao fabricante, contudo já

mostrava sua importância ao determinar uma origem dos produtos e auxiliar o consumidor em

relacionar os itens confeccionados aos comerciantes de sua preferência. Com o tempo e a

evolução da civilização, as marcas passaram a ser não só um atestado de origem, mas de

qualidade também, utilizadas por artistas, artesãos e comerciantes, buscando impedir a

falsificação de suas obras. Brasões, esfinges, ícones diversos sinalizavam nobres, autoridades,

religiões, etc. No Século XVIII a corte inglesa concedeu licença a certos fornecedores da

coroa para utilizarem o brasão real como forma de atestar a qualidade de tais produtos

(SILVA, C., 2005, p.12), exemplificando a evolução da importância da marca.

Segundo Clotilde Perez:

O expediente de marcar produtos facilitava ainda a identificação de

produtos de qualidade inferior (...). Nesse momento as marcas tinham ainda

uma função meramente burocrática e até legal.

As marcas tornam-se, desde este momento, uma proteção ao

consumidor, que podia facilmente identificar a origem da mercadoria

comprada. (PEREZ, 2004, p.08)

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Com a evolução das relações de comércio, propiciadas pela Revolução Industrial e a

produção em série, surgem, em meados do Século XX, após a Primeira Guerra Mundial, os

conceitos de marketing e com eles a ideia de promoção de vendas. A marca passa a ser um

componente de grande importância, ganhando os contornos que mantém hoje.

Resumidamente, a marca inicialmente era usada apenas para identificação (útil para o

produtor e para o consumidor que sabia a origem do que obtinha), porém logo se tornou

também um modo de diferenciação entre produtores concorrentes. A marca foi evoluindo

(junto às relações mercantis e, posteriormente, à industrialização) e tornou-se uma espécie de

entidade, com personalidade e reputação. Hoje podemos dizer que a marca é muitas vezes

mais importante que o próprio produto em si.

A American Marketing Association (AMA), citada por Shimp (2002, p.33), define

marca como um: “nome, termo, sinal, símbolo ou design, ou uma combinação de tudo isso,

com a intenção de identificar bens e serviços de um vendedor ou grupo de vendedores e para

diferenciá-los do concorrente.” Clotilde Perez (2004) descreve a marca como “uma conexão

simbólica entre uma organização, sua oferta e o mundo de consumo”, enquanto Terence

Shimp (2002, p.33) complementa: “o termo „marca‟ é uma forma conveniente (e apropriada)

para descrever qualquer objeto de esforços orquestrados de marketing”.

David Aaker descreve da seguinte forma:

Uma marca é um nome diferenciado e/ou símbolo (tal como um

logotipo, marca registrada, ou desenho de embalagem) destinado a

identificar os bens ou serviços de um vendedor ou de um grupo de

vendedores e a diferenciar esses bens e serviços daqueles dos concorrentes.

Assim a marca sinaliza ao consumidor a origem do produto e protege, tanto

o consumidor quanto o fabricante, dos concorrentes que oferecem produtos

que pareçam idênticos. (AAKER, 1998, p.07)

As quatro definições acima, extraídas entre tantas que permeiam os livros de

marketing e marcas, abrangem basicamente o que já se conhece desde a antiguidade. Em Don

Schultz e Beth Barnes, encontraremos um acréscimo que nos fornece uma noção do real valor

da marca nos dias de hoje:

Mais do que uma propriedade, a marca traz para o mercado

significado para o consumidor. Representa o que o consumidor é e o que

acredita que a marca oferece para ajudá-lo a reforçar o seu lugar na

sociedade. Assim, a marca é mais do que um nome, símbolo ou ícone – é um

vínculo que somente o consumidor é capaz de criar. (SCHULTZ; BARNES,

2001, p.44)

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Desta forma, encontramos o elemento abstrato da marca, ou seja, seu componente

simbólico, que funcionará na construção de um diálogo (persuasivo) único que conduzirá cada

consumidor a um nível imaginário respaldado por suas expectativas.

A marca não é somente uma forma concreta de identificação ou diferenciação, mas um

ente real, vivo, com personalidade e “rosto”. Mais do que identificar produtos e serviços, as

marcas transmitem uma série de mensagens que formam a identidade da empresa, do produto

ou bem: suas crenças, valores e importância dentro do contexto da sociedade.

O conceito de marca se divide em componentes do produto

(atributos do produto e benefícios do produto) e componentes perceptuais

(imagem o usuário, benefícios emocionais/ psicológicos, alma da marca,

personalidade da marcam imagem e posicionamento da marca).

(RANDAZZO, 1997, p.31)

Contudo, apenas algumas marcas possuem personalidade forte e adquirem grande

aceitação e penetração junto ao público. Esta personalidade é construída ao longo de um

demorado e complexo relacionamento entre a empresa que detém a marca e o consumidor, no

qual a marca estabelece e cultiva um vínculo, até finalmente ganhar corpo e representar um

conceito. “Marcas grandes e duradouras tornam-se ícones – não só das empresas, mas da

cultura como um todo” (MARK; PEARSON, 2001, p.15).

A partir deste conjunto simbólico, promovido pela empresa dentro de sua estratégia de

comunicação de mercado, a marca adquire uma reputação. Sal Randazzo comenta:

Sem marca, um produto é uma coisa – uma mercadoria, um saquinho

de café ou uma lata de sopa. Para a maioria das categorias de produtos, a

percepção que o consumidor tem de um produto genérico, sem marca, tende

a ser dominada pela condição de coisa do produto, por seus atributos e

benefícios físicos, e/ou como pode ser usado. (RANDAZZO, 1997, p. 25)

“O significado de uma marca é seu ativo mais precioso e insubstituível” (MARK;

PEARSON, 2001, p.24), ou seja, seu conteúdo simbólico será sua identidade, a forma como

ela será reconhecida e permanecerá no inconsciente do consumidor. “O significado fala do

sentimento, ou lado intuitivo, do público; cria uma afinidade emocional, permitindo que os

argumentos mais racionais sejam ouvidos.” (MARK; PEARSON, 2001, p.24). Através deste

fator, o consumidor e a empresa criam um relacionamento baseado na representatividade

simbólica da marca (fundamentado no discurso original proposto pela empresa na

apresentação do(s) produto(s), bens ou serviços, mas que é transformado quando encontra

uma nova realidade perceptiva do contexto do indivíduo) e nas expectativas emocionais do

consumidor, que busca no produto consumido, afirmando de modo geral, um aprimoramento

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de sua realidade junto com a satisfação de necessidades emocionais e sociais

(BAUDRILLARD, 1995).

A personalidade de uma marca decorre de vários fatores:

embalagens, logotipos e publicidade são apenas alguns deles. [...] A

personalidade de uma marca é a personificação de um produto: aquilo que o

produto seria se fosse uma pessoa. (RANDAZZO, 1997, p.40)

Considerando que o consumo é um processo que une percepções práticas (de

necessidades) com percepções afetivas (dentro do campo simbólico que carrega) no ato da

compra, uma marca forte constitui um importante ativo para empresa.

Os ativos consistem nos prováveis futuros benefícios econômicos capazes de serem

obtidos pela organização em decorrência de transações ou acontecimentos passados. Devem

ter três características essenciais:

O recurso deve contribuir direta ou indiretamente para futuros fluxos de caixa

líquidos;

A empresa deve poder obter benefício e controlar o acesso de outros a ele; e

A transação já deve ter ocorrido.

Os ativos tangíveis em geral incluem terrenos e edificações, instalações e máquinas,

utensílios e acessórios, ações negociáveis, investimentos, financiamentos e caixa. Os ativos

intangíveis são direitos específicos, concessões, privilégios e vantagens detidos por um

negócio, capazes de beneficiar operações futuras pela sua contribuição à capacidade de lucro

do empreendimento. Incluem, entre outros, direitos autorais, royalties e marcas (SHULTZ,

2001).

Um bem intangível não pode ser comprovado por medições reais, mas sua dimensão é

comprovada pelo valor agregado que empresta ao(s) produto(s) que estampa. Para muitos

produtos e empresas “o nome da marca e o que ele representa são o seu mais importante ativo,

a base da vantagem competitiva e de ganhos futuros” (AAKER, 1998, p.14).

Sebastião Bonfá e Arnaldo Rabelo (2009, p.46) nos dão um interessante exemplo que

mostra a força que uma marca tem, ao citar a marca Coca-Cola (avaliada pela Interbrand, em

2008, em US$ 66 bilhões), no qual, comparativamente, a empresa enfrentaria mais

dificuldades se perdesse sua marca do que se perdesse seu patrimônio físico (máquinas,

caminhões, prédios, etc.).

As principais marcas de sucesso duradouro têm, de modo geral, uma mitologia que vai

além do produto físico. Essa mitologia, mais do que a supracitada personalidade da marca, é

todo seu conjunto de atributos subjetivos, sua esfera simbólica, quase mítica, que eleva a

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marca a um patamar superior na preferência do público, muitas vezes estabelecendo uma

legião de seguidores fiéis. Como exemplo, citamos a marca americana de motocicletas Harley

Davidson, cultuada por uma legião de fiéis consumidores (e fãs) que compram não só suas

motos, mas roupas e outros produtos com a marca (ver MARK; PEARSON, 2001, p.141). A

mitologia da marca procura “combinar os atributos/ benefícios físicos do produto com os

benefícios emocionais/psicológicos” (RANDAZZO, 1997, p.51). Acrescentamos o

comentário de David Aaker (1998, p.42) a respeito da fidelidade de marca: “Uma marca que

tenha um grupo substancial de consumidores extremamente envolvidos e comprometidos

pode ser chamada de carismática”.

No nível mais simples, as mitologias de marca funcionam para atrair

a atenção do consumidor e interessá-lo, envolvê-lo e diverti-lo. Em outro

nível, as mitologias de marca funcionam para informar o consumidor

comunicando-lhe atributos e/ou benefícios inerentes ao produto. Mas as

mitologias de marca também podem funcionar para proporcionar

importantes benefícios emocionais e psicológicos. As mitologias de marca

proporcionam muitas vezes um sentido de identidade, tanto individual

quanto cultural, refletindo e reafirmando os valores e a sensibilidade do

consumidor. (RANDAZZO, 1997, p.194)

As marcas dividem-se em (PEREZ, 2004, p.19; PEREZ; BAIRON, 2002, p.68):

Marca guarda-chuva (umbrella brand) – são marcas que representam uma

empresa (estão em todos os produtos desta empresa) ou um grupo de produtos

que apenas irá orbitar esta mesma marca;

Marcas individuais – marcas específicas para um único produto; e

Marcas mistas – que combinam marcas guarda-chuva com marcas individuais.

Permitem as seguintes combinações:

o Marca do produto + marca de empresa;

o Nome do produto + marca da empresa;

o Nome do produto/ linha / coleção + marca guarda-chuva;

o Marca da empresa + marca do produto = nome do produto.

2.1 Marcas arquetípicas

Dentre as muitas formas utilizadas pelas empresas para compor o repertório simbólico

de uma marca destaca-se a representação arquetípica.

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O termo arquétipo foi utilizado pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875:1961),

amigo e discípulo de Freud, dentro de seus estudos de psicologia analítica. Segundo seus

estudos, arquétipos “são como formas sem conteúdo próprio que servem para canalizar ou

organizar o material psicológico” (FADIMAN; FRAGER, 1976, p.50). C. G. Jung usou o

termo para se referir aos modelos inatos que servem de matriz para o desenvolvimento da

psique. São “formas ou imagens de natureza coletiva, que ocorrem em praticamente toda a

Terra como componentes de mitos e, ao mesmo tempo, como produtos individuais de origem

inconsciente.” (JUNG, 1940 apud Mark; Pearson, 2001, p.18). Esta ideia deriva da teoria do

inconsciente coletivo que, segundo o próprio Jung, seria uma estrutura herdada comum a toda

a humanidade e composta dos arquétipos. Assim, a humanidade teria um sistema comum de

códigos, na forma de símbolos e personificações, que seriam reconhecidos pelo inconsciente

das pessoas em todas as partes do mundo. Joseph Campbell (1949;1990), durante seus estudos

na área de mitos e crenças, corroborou com as teorias junguianas ao mostrar as diversas

semelhanças existentes entre crenças e padrões mitológicos nos mais diferentes povos.

As impressões, diretamente encadeadas na nossa psique, influenciam

os atributos que amamos na arte, na literatura, nas grandes religiões do

mundo e no cinema. Platão chamava essas impressões, ou matrizes

psíquicas, de “formas elementares” e as via como as estruturas ideativas que

formavam um gabarito para a realidade material. O psiquiatra C. G. Jung as

chamou de “arquétipos”. (Mark; Pearson, 2001, p.25)

Dentro da comunicação de massa encontram-se diversas referências mitológicas

presentes em seu conteúdo, como uma forma de identificar e relacionar este conteúdo às

percepções do inconsciente presentes no público, que remetem a suas raízes ancestrais de

natureza arcaica. Assim, a identificação do homem com este conteúdo fantástico faz parte da

própria história da humanidade e está presente desde quando o homem começou a atribuir

significados simbólicos às coisas, criando mitos e figuras mitológicas em todo o conteúdo

midiático de massa gerado na indústria cultural.

A comunicação mercadológica, pautada no conteúdo simbólico com vista no consumo

pela persuasão, apropriou-se dos conteúdos arquetípicos e mitológicos na elaboração de seus

discursos em propaganda e na criação do conceito de suas marcas. A construção simbólica na

publicidade usa este conteúdo simbólico para criar uma identidade mitológica da marca e

elevá-la a uma nova esfera mítica. “A Publicidade é o meio que nos permite ter acesso à

mente do consumidor, criar um inventário perceptual de imagens, símbolos e sensações que

passa a definir a entidade perceptual que chamamos marca” (RANDAZZO, 1997, p.40), ou

seja, através do discurso da comunicação de mercado cria-se um conjunto de mensagens

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multissensoriais que vai além da função prática dos objetos (ou de sua tecnologia ou

necessidade), criando uma nova forma de importância subjetiva e emblemática capaz de

transformar a marca em um código, que passa a operar em um nível diferente, dentro de uma

esfera cultural e social.

A psicologia arquetípica ajuda-nos a compreender o significado

intrínseco das categorias de produtos e, consequentemente, ajuda os

profissionais de marketing a criar identidades de marca duradouras que

estabelecem o domínio do mercado, evocam nos consumidores o significado

e o fixam, e inspiram lealdade do consumidor – tudo isso, potencialmente, de

maneira socialmente responsável. (MARK; PEARSON, 2001, p.26)

Esta esfera simbólica não é acidental nem obra do acaso, mas produto de uma série de

mensagens e manipulação de sensações e impressões, criando uma postura, uma história e

uma identidade da marca, tal como se fosse um ser independente do mercado de consumo,

como um ser vivo e humano, e não apenas um nome ou um logotipo em um produto

negociável. Como afirma Sal Randazzo (1997, p.40): “a personalidade de uma marca é a

personificação de um produto: aquilo que um produto seria se fosse uma pessoa” e ainda:

“Uma identidade de marca sedutora e apropriada humaniza e personifica o produto, o que por

sua vez facilita a criação de um vínculo emocional do consumidor com a marca em questão”.

A força da marca residirá no poder de convencimento e na ressonância simbólica com

seu público.

A mitologia latente do produto vai além dos atributos físicos/benefícios e uso do

produto. Esta mitologia abarca a totalidade das percepções, crenças, experiências e

sentimentos associados com o produto (RANDAZZO, 1997, p. 25).

3. O consumo e o consumidor

O consumo ocorre como uma ferramenta na construção de uma nova realidade

baseada num imaginário pretendido dentro do código simbólico do objeto consumido. O

consumo também funciona como objeto de diferenciação social, como citado em Thorstein

Veblen (1988, p.37) para o qual “o consumo de bens de maior excelência, prova de riqueza,

se torna honorífico; reciprocamente, a incapacidade de consumir na devida quantidade e

qualidade se torna uma marca de inferioridade e demérito”. Baudrillard (1995) complementa

que “nunca se consome o objeto em si (no seu valor de uso) – os objetos (no sentido lato)

manipulam-se sempre como signos que distinguem o indivíduo”, ou seja, ocorre um processo

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de diferenciação (dentro de uma esfera econômica e/ou social) baseado no objeto consumido

frente às mensagens por ele emanadas, incorporadas pelo consumidor.

Assim, devemos considerar o ato do consumo não apenas dentro de uma esfera

econômica, mas também dentro de um contexto de significação social (CAMPBELL, C.,

2001, p.74) no qual o consumidor adota um código simbólico, funcionando como um agente

ou representante do objeto, comunicando sua concordância/participação neste conjunto de

significantes. Ao realizar o ato do consumo, o consumidor incorpora os valores e mensagens

transmitidos por aquele dado objeto, como “imagens e significados simbólicos que são tanto

uma parte „real‟ do produto quanto os ingredientes que o constituem” (CAMPBELL, C.,

2001, p.75), aceitando e compactuando com sua esfera simbólica.

Entretanto, quando estes novos valores são incorporados, são transformados, com mais

ou menos influência, pela visão particular do consumidor, que detém a opção de escolher e

adaptar estas mensagens de acordo com suas próprias convicções, em sintonia consigo mesmo

e não como mero “condicionamento de diferenciação e de obediência a um código”

(BAUDRILLARD, 1995).

Quando adquirimos um bem buscamos dentro de seu conteúdo simbólico uma

distinção. “A questão é que quando formulamos significativamente nossas necessidades em

relação aos recursos disponíveis, baseamo-nos em línguas, valores, rituais, hábitos, etc., que

são de natureza social, mesmo quando os contestamos, rejeitamos ou reinterpretamos no

plano individual” (SLATER, 2002, p.131), ou seja, estão baseados em um contexto, em um

dado perfil dentro do universo social do qual participamos, nossos relacionamentos sociais e

profissionais, valores de ascendência e distinção.

Don Slater (2002, p.131) diz que “na verdade, todo consumo é cultural”, enquanto

Gervasi complementa:

As escolhas não se fazem à sorte, mas são socialmente controladas,

refletindo o modelo cultural em cujo seio se efetuam. Os bens não se

produzem nem se consomem indiferentemente; devem ter qualquer

significado em relação a determinado sistema de valores. (GERVASI, apud

BAUDRILLARD, 1995, p.69)

O mecanismo de consumo opera além do nível consciente, que diz respeito à

necessidade de determinado objeto e do aspecto econômico, em particular a ostentação

(CAMPBELL, C., 2001), mas também em um plano inconsciente, dentro do imaginário do

consumidor, dentro de sua formação cultural, seus valores, suas crenças, seus gostos e

opiniões, no qual o objeto encontrará respaldo, seja pela identificação ideológica, seja pela

representação simbólica dele próprio, reflexo das aspirações abstratas do indivíduo. Quando

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se conhece (e se usa) os códigos de consumo, o conjunto semiótico de significados e

significantes dentro da cultura da qual fazem parte se reproduz e demonstra a participação em

uma determinada ordem social (SLATER, 2002. p. 131).

A prática do consumo ocorre dentro do cotidiano (BAUDRILLARD, 1995; SLATER,

2002), nas relações entre o consumidor e a sociedade, e entre os próprios consumidores. Essa

relação também acontece entre produtor e consumidor, contudo, o conjunto de significados

permanece fixo do ponto de vista do produtor, através da comunicação, uma vez que este

imputa e projeta um determinado conceito simbólico criado para fazer-nos “entrar numa

esfera de signos-mercadorias a fim de nos induzir a comprar mais, em vez de nos levar para

uma esfera de valor de uso ou utilidade onde usamos as propriedades „reais‟ dos objetos para

fazer coisas” (SLATER, 2002, p.135) e variando dentro da percepção do consumidor.

O consumo é também um evento cultural, pois “conhecendo e usando os códigos de

consumo de minha cultura, reproduzo e demonstro minha participação em uma determinada

ordem social” (SLATER, 2002, p.131), ou seja, através do consumo obtém-se acesso à

“encenação diária” do dia-a-dia da sociedade.

4. Consumo e comunicação: a comunicação mercadológica

O consumo não acontece motivado apenas pela necessidade de bens de sobrevivência.

Na verdade, uma vez que o consumo se estabeleceu como forma de diferenciação e afirmação

dentro de um contexto social e cultural, o fator “necessidades básicas” ficou relegado a um

segundo plano.

Depois que a satisfação das necessidades básicas foi materialmente

assegurada, o aspecto significativo ou cultural do consumo passa a

predominar, e as pessoas passam a se preocupar mais com o significado dos

bens do que com seu uso funcional para satisfazer uma necessidade básica

ou “real”. (SLATER, 2002, p.132)

O consumo deixa de estar ligado à sobrevivência para estar ligado a uma busca por

uma imagem simbólica irreal, compartilhada e entendida por toda a sociedade, mas que, ao

mesmo tempo, distingue e diferencia o consumidor.

Contudo, uma vez que a escolha de bens e serviços vincula-se principalmente a um

plano subjetivo simbólico pautado no afeto, o ato de consumo deste ou daquele objeto torna-

se muito mais uma questão de escolha que de necessidade, não podendo ser imposto; há a

opção do público em rejeitar e recusar determinado produto ou serviço.

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Isso se agrava em uma sociedade na qual os bens e serviços se tornam commodities e

temos um extenso leque de opções. Para que ocorra o ato de compra e que o produto chegue

às mãos do cliente, objetivo final da estratégia de marketing, o consumidor deve ser

convencido. Este convencimento acontece pela persuasão, que é feita através da

comunicação mercadológica ou de marketing.

Nas palavras de Vera França (in Hohlfeldt, 2004), comunicação é o “processo social

básico de produção e compartilhamento do sentido através da materialização de formas

simbólicas”. Terence Shimp (2002, p.31) complementa dizendo que “comunicação é o

processo pelo qual os pensamentos são transmitidos e o significado é compartilhado entre

pessoas ou entre organizações e pessoas”.

De fato, a comunicação é um processo ativo no cotidiano do homem desde seus

primórdios até os dias atuais, presente em todas suas atividades, produções intelectuais e

relações interpessoais. Através dela trocamos informações e produzimos novos conteúdos e

sentidos, resultantes desta interação. Para entendermos a comunicação em sua essência

primordial é necessário compreender o dialogismo presente em seu mecanismo fundamental:

o binômio emissor e receptor, ou seja, alguém que produz (emite) o conteúdo e alguém que o

absorve (capta), em uma relação comutativa. Contudo, a comunicação vai além da mera

profusão de conteúdo, uma vez que ela é também discurso, portadora de elementos simbólicos

e subjetivos que complementam sua mensagem explícita em um subtexto interno. Este

subtexto nunca é inócuo, sendo sempre carregado de uma intencionalidade, que pode existir

com maior ou menor força.

A comunicação não existe por si mesma, como algo separado da

vida da sociedade. Sociedade e comunicação são uma coisa só. Não poderia

existir comunicação sem sociedade, nem sociedade sem comunicação.

(BORDENAVE, 1997, p.16)

A comunicação funciona dentro da realidade, dentro do cotidiano social, econômico e

político do homem, operando através da linguagem, “a faculdade humana de produzir

sentidos que servem para o homem expressar-se, interagir com os outros, armazenar

informações, etc.” (FIORIN, 2007, on line...). A linguagem é um processo de recorte,

interpretação e reinterpretação, dentro da transmissão de informações, ou seja, dentro do

processo comunicacional.

Nosso objetivo básico na comunicação é tornamo-nos agentes

influentes, é afetarmos outros, nosso ambiente físico e nós próprios, é

tornarmo-nos agentes determinantes, é termos opção no andamento das

coisas. Em suma, nós nos comunicamos para influenciar, para afetar com

intenção [...]. (BERLO, 1968, p.20, apud GALINDO, 1986, p.21)

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A comunicação está presente em todas as áreas das ciências sociais e “ao mesmo

tempo permeia todas as áreas como um processo vital de transmissão de ideias e seu caráter

interdisciplinar a torna indispensável no composto mercadológico” (GALINDO, 1986, p.21).

Assim, dentro de uma perspectiva de marketing, podemos situar a comunicação tanto em sua

essência como dentro de um viés de mercado: “a comunicação de marketing é um aspecto

fundamental da missão geral de marketing de uma empresa e um dos principais determinantes

do sucesso” (SHIMP, 2002, p.31).

Terence Shimp (2002, p.31) define a comunicação mercadológica como “o conjunto

de todos os elementos no mix de marketing de uma marca que facilitam trocas ao estabelecer

significado compartilhado com os clientes daquela marca”, enquanto Mitsuru Yanase diz:

Definimos comunicação mercadológica como o processo de

administrar o tráfego de informações com o público-alvo, isto é, com aquelas

parcelas de público (interno ou externo) potencialmente interessadas em

reagir favoravelmente às negociações e transações oferecidas pela empresa

ou entidade emissora. (YANASE, 2007, p.334)

Englobando as duas definições, vemos que a comunicação mercadológica é o processo

final do esquema de marketing de Jerome McCarthy, pois tem como objetivo a apresentação e

promoção do produto ao consumidor por fatores objetivos (custo, necessidade e qualidade) e

subjetivos (a carga simbólica do produto, serviço ou marca), atuando como uma conversa

entre a empresa e o público, trocando informações nas quais a empresa apresentará o produto,

suas características gerais, personalidade e benefícios, introduzirá conceitos, argumentará

objetivando convencê-lo a adquirir o bem ou serviço, através de um discurso refinado e

estrategicamente definido.

Assim, a comunicação mercadológica é a voz da empresa (e da marca) que fala através

de suas diferentes ferramentas - propaganda, venda pessoal, promoção de vendas, publicidade,

relações públicas, assessoria de imprensa, mala direta, internet e outros (GALINDO, 2002) –

com o público, sempre buscando a efetivação da compra, ou seja, a concretização da troca

entre as partes envolvidas. Assim voltamos à questão da persuasão, da ferramenta

argumentativa presente na comunicação mercadológica.

Persuasão é “o processo pelo qual buscamos convencer os outros de nossas ideias, de

modo a influenciar seu pensamento e seu comportamento” (BARBOSA, 2005, p.92). Em

termos linguísticos, a persuasão ou linguagem persuasiva é um modo de argumentação no

qual se usam recursos lógico-racionais ou simbólicos para induzir alguém a aceitar uma ideia,

uma atitude ou realizar uma ação. Pode ser baseado em premissas legítimas (argumentos

válidos) ou não. Dentro do marketing utiliza-se a persuasão como carro chefe da mensagem

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publicitária, uma vez que esta tem o claro objetivo de convencer e vender o produto (serviço

ou marca) ao público.

[...] a comunicação mercadológica [ou comunicação de mercado, ou

de marketing] seria a produção simbólica resultante do plano mercadológico

de uma empresa, constituindo-se em uma mensagem persuasiva elaborada a

partir do quadro sócio-cultural do consumidor-alvo e dos canais que lhes

servem de acesso, utilizando-se das mais variadas formas para atingir os

objetivos sistematizados no plano. (GALINDO, 1986, p.37)

O discurso persuasivo trabalha através do uso de imagens e da construção de

conteúdos simbólicos que visam a convencer o consumidor da legitimidade, importância e/ou

necessidade do objeto. Através de uma estrutura coletiva na qual dilui a noção de

individualidade em prol de um convívio social em que há uma ordem grupal na qual existem

diferentes níveis de importância, status e ideologia, e no qual o consumidor busca recursos

capazes de fazê-lo transcender de patamar e ingressar em diferentes grupos, ou apenas

ascender dentro do atual. Este desejo de ascendência inerente e, por vezes, subconsciente, é o

combustível utilizado pelo discurso persuasivo dentro da comunicação mercadológica e é

descrito dentro da essência do consumo moderno. A comunicação mercadológica age na

formação e apresentação (promessa) de um mundo diferente, novo e melhor, criando sua

própria realidade: “na publicidade, o que é percebido na mente do consumidor é a realidade

mais importante.” (RANDAZZO, 1997).

Esse relacionamento semiótico sistemático constitui a dinâmica

subjacente da cultura do consumo contemporânea, pois a produção, o

marketing e a venda no varejo estão cada vez mais voltados para oferecer

aos consumidores conceitos de modos de vida atraentes, coordenados e

coerentes, a compra de um modo de vida, conselhos sobre um modo de vida,

etc, que dão tanto ao consumidor quanto ao bem de consumo uma sólida

identidade social no interior de um universo significativo. É nesse sentido

que Baudrillard afirma que o consumo de signos substituiu o consumo de

bens. (SLATER, 2002, p.144)

Como complementa Daniel Galindo (2002, p.121): “persuadir em propaganda

significa obter do consumidor uma mudança de atitude propícia a criar nele um

comportamento que o predisponha à compra”. O ato da compra é um ato consciente por parte

do consumidor, mesmo que muitas vezes impulsivo, decorrente de um desejo, de uma

necessidade de possuir algo, tanto em um caráter prático-concreto (ter) quanto simbólico

(ser), que pode nascer do zero (ser proposta) ou apenas ser alimentada quando já latente

através da comunicação persuasiva. Esta irá seduzir o consumidor, irá fazê-lo sonhar e trará

promessas de benefícios muito além da satisfação de necessidades práticas.

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4.1 O mix da comunicação a serviço do marketing

A comunicação de marketing é feita através das seguintes ferramentas:

a) Propaganda e publicidade

Segundo definição de Clotilde Perez e Sergio Bairon (2002, p.43), propaganda é “toda

e qualquer forma de divulgação de um produto, serviço, marca, empresa ou ideia com o

intuito de informar e persuadir um determinado target, levando em consideração a ação de

adoção, normalmente por meio de compra”. Daniel Galindo completa:

Propaganda em essência é a comunicação de uma mensagem que

contém basicamente os ingredientes de informação e persuasão os quais

devem ser trabalhados em consonância com as características intrínsecas e

extrínsecas do mercado consumidor a atingir em função dos objetivos

globais da empresa, definidos no sistema de marketing. (GUIMARÃES,

1981, p.182, apud GALINDO, 1986, p.36)

Propaganda vem de propagar, ou seja, divulgar uma mensagem. É uma forma de

comunicação com objetivo principal de informar, comum em vários segmentos e não apenas

no marketing. É muito usada na área política.

A publicidade é a comunicação feita com caráter persuasivo através de anúncios.

Podemos entendê-la com uma forma de propaganda, porém voltada não (apenas) a informar,

mas com objetivo de vender.

Um dos pressupostos básicos de seu trabalho é que os anúncios

devem preencher a carência de identidade de cada leitor, a necessidade que

cada pessoa tem de aderir a valores e estilos de vida que confirmem seus

próprios valores e estilos de vida e lhe permitam compreender o mundo e seu

lugar nele. [...] Evidentemente, o objetivo final desse processo de

significação consiste em ligar a desejada identidade a um produto específico,

de modo que a carência de uma identidade se transforme na carência de um

produto. (VESTERGAARD, 1996, p.74)

A propaganda é para divulgar o produto, diferente da publicidade que busca vender o

produto. No Brasil, os termos são tratados como sinônimos e utilizados em um mesmo

contexto de comunicação persuasiva (sem ser necessariamente informativa) para anúncios de

produtos, serviços e marcas.

A publicidade e a propaganda representam ainda a maior parte da verba de marketing

das empresas através, principalmente, de mídias de massa.

b) Merchandising

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Segundo Regina Blessa (2003, p.18), merchandising é “qualquer técnica, ação ou

material promocional usado no ponto-de-venda que proporcione informação e melhor

visibilidade a produtos, marcas ou serviços, com o propósito de motivar e influenciar as

decisões de compra dos consumidores”, porém aqui no Brasil também consideramos

“inserções de produtos ou serviços durante a exibição de um determinado programa de

televisão”, chamados de merchandising eletrônico ou editorial.

c) Relações Públicas

As relações públicas “têm como objetivo as organizações e seus públicos, instâncias

distintas que, no entanto, se relacionam dialeticamente” (KUNSCH, 1986, p.89). Elas

abrangem uma parte da comunicação de marketing responsável pela transmissão de

mensagens corporativas diretamente ao consumidor, através de canais como acessória de

impressa, pesquisas, consultoria e atendimento direto (ombudsman), em um trabalho de mídia

voltado à informação do público e atendimento ao cliente e colaboradores (stakeholders). As

relações públicas, também chamadas de RP, de um modo geral, operam em um nível

informacional e dialógico com o público, informando, apresentando e escutando o

consumidor fora da esfera subjetiva presente na publicidade. Agem em situações imprevistas,

momentos de crise e na divulgação de notícias relacionadas à empresa ou à marca.

d) Marketing direto

A Associação de Marketing Direto dos Estados Unidos definiu como:

Marketing direto é qualquer comunicação direta com o consumidor

ou receptor de negócios, designada para gerar: 1) reação em forma de pedido

(pedido direto); 2) solicitação de informações adicionais (geração de

perspectiva de vendas); e/ou 3)visita a uma loja ou outro local comercial

para comprar o(s) produto(s) ou serviço(s) específico(s)”. (SCHULTZ;

BARNES, 2001, p. 285)

Envolve ações como propaganda de resposta direta, vendas diretas e telemarketing.

Seu grande diferencial está em operar com um cliente (ou grupo) específico, atuando

diretamente com este, desde a prospecção até o ato da venda.

Segundo Terence Shimp (SHIMP, 2002, p.326), o marketing direto “envolve o

marketing interativo à medida que permite comunicações personalizadas entre o profissional

de marketing e o potencial cliente” e é passível de muito maior mensuração e direcionamento

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ao público-alvo certo, em relação a estratégias de comunicação dispersivas como a

propaganda televisiva.

e) Promoção de vendas

Promoção de vendas é uma ação de marketing definida como “um incentivo de curto

prazo para aquisição de produto ou serviço, criado pela mudança da relação entre preço e

valor” (SCHULTZ; BARNES, 2001, p. 261). Envolvem estratégias como descontos, brindes,

concursos e sorteios, etc.

5. A comunicação mercadológica e a marca

O componente simbólico da marca é construído a partir de seu posicionamento. Por

posicionamento entendemos o modo como se dispõe a marca “na mente do cliente potencial”

(RIES; TROUT, 2005, p.02), ou seja, a impressão que ficará em relação a esta marca na

mente do consumidor. Podemos fazer uma analogia com um indivíduo que nos é apresentado:

temos uma primeira impressão ao conhecê-lo, depois analisamos suas atitudes e ideias, e

traçamos um julgamento que nos fará ter um relacionamento ou não com esta pessoa. Este

relacionamento pode evoluir até gerar vínculos muitos fortes, dificilmente quebrados ou, ao

contrário, não gerar frutos e simplesmente se dissipar.

Com a marca não é diferente, o relacionamento entre ela e o consumidor se constrói

com o tempo e à custa de bastante trabalho, através dos processos comunicacionais

mercadológicos em um nível de marca.

O posicionamento é uma escolha da empresa. Ele ocorre pelas mensagens que ela irá

emitir, em qual discurso irá se apoiar, ou seja, o que a empresa (através da marca) irá

comunicar ao público. É importante notar que a forma como esta mensagem será entendida

pelo consumidor não pode ser totalmente prevista, uma vez que ela depende de uma série de

fatores, principalmente a absorção do discurso, face a toda experiência social e cultural do

público.

“Independente da fama da marca, o ponto que merece ênfase especial é que a maioria

das comunicações de marketing ocorre no nível da marca” (SHIMP, 2002, p.32), ou seja, a

construção da marca é feita pelo conjunto de mensagens feitas através de competências

comunicacionais integradas utilizadas pela empresa dentro da estratégia de marketing desta

marca.

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Sobre a construção da marca, David Aaker (1997, p.13) chama a atenção para o fato

que “um procedimento para introduzir uma orientação estratégica é mudar o foco primário de

gerenciar as finanças de curto prazo para o desenvolvimento e manutenção de ativos e

qualificação”, construir a personalidade de uma marca e criar um relacionamento de afeto e

confiança com o consumidor não é algo que possa ser feito em curto espaço de tempo, pois

envolve diversas ações diretas e indiretas por parte das empresas e a gradual absorção destas

por parte do público. Este processo é chamado de brand equity:

Os ativos do brand equity geralmente acrescentam ou subtraem valor

para os grandes consumidores. Podem ajudá-los a interpretar, processar e

acumular grande quantidade de informações sobre produtos e marcas.

Podem também afetar a confiança do consumidor na decisão de compra

(devido ou à experiência passada ou à familiaridade com a marca e suas

características). Potencialmente mais importante é o fato de que tanto a

qualidade percebida como as associações da marca podem aumentar a

satisfação do consumidor com a experiência de utilização. (AAKER, 1997,

p.16, grifo nosso)

Os ativos e passivos nos quais o brandy equity se baseiam vão diferir de contexto a

contexto. Contudo, podem ser agrupados em cinco categorias:

Lealdade à marca;

Conhecimento do nome;

Qualidade percebida;

Associações à marca; e

Outros ativos do proprietário da marca – patentes, trademarks, relações com

canais de distribuição.

A construção de uma imagem forte que conquistará o consumidor não é suficiente

uma vez em que vivemos uma realidade na qual diversas marcas disputam nossa atenção

diariamente. É preciso lembrar constantemente o público sobre esta marca, mantê-la sempre

viva e ativa dentro de sua mente, gerar uma grande consciência da mesma. Como afirma

Terence Shimp (2002, p.34): “através da comunicação de marketing eficaz e consistente,

algumas marcas tornam-se tão conhecidas que, em princípio, todas as pessoas de inteligência

normal podem se lembrar delas”. O autor ainda completa:

Consciência de marca é a dimensão básica do valor da marca. Do

ponto de vista de um consumidor individual, uma marca não tem valor, a não

ser que ele pelo menos saiba que ela existe. Levar à consciência de marca é o

desafio inicial para novas marcas. Manter altos níveis de consciência de

marca é a meta de todas as marcas já estabelecidas. (SHIMP, 2002, p.34)

Em Aaker (1997, p.64), encontramos também que o “conhecimento de uma marca é a

capacidade que um comprador tem de reconhecer ou de se recordar de uma marca como

integrante de certa categoria de produtos. Isto pressupõe um elo entre a classe e a marca”.

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Resumindo, a marca precisa construir uma personalidade, ser tal e qual uma pessoa em

quem o cidadão comum conhece e acredita, ter atributos de confiabilidade, conferir segurança

pelas informações que passa (muitas destas mensagens são simbólicas e vêm atreladas à

reputação da marca), mas também estar sempre presente, sempre renovada e bem disposta

para ocupar de modo constante um lugar de destaque na mente do consumidor.

Quando tratamos de marketing, falamos de estratégias que envolvem itens, serviços e

bens, da sua produção até estar nas mãos do consumidor através do ato da compra, passando

por seu preço, distribuição e promoção. O ato do consumo, no mundo de hoje, envolve uma

busca a valores simbólicos de diferenciação e satisfação psicológica e acontece impulsionado

pela comunicação mercadológica através de competências comunicacionais, muitas vezes, no

nível da marca.

A marca desempenha um papel fundamental ao funcionar como agente dos valores

conceituais prescritos pela empresa, produto ou serviço. Através dela, a empresa incorpora

um discurso, um posicionamento, em relação ao mercado e ao seu público, propondo uma

mensagem de aproximação (através da comunicação mercadológica pela argumentação

persuasiva) com o público. A marca de sucesso precisa de uma personalidade presente, de

uma reputação positiva, que conquiste a preferência do consumidor e satisfaça suas

expectativas, implícitas ou práticas, criando um vínculo forte sempre renovado pela constante

manutenção do relacionamento.

Uma estratégia de marketing eficaz deve se estabelecer pela sucessão de ações que

partam da criação de uma marca forte, uma comunicação envolvente para a constituição de

um público consumidor fiel.

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CAPÍTULO IV - MARCA E PERSONAGEM NO

LICENCIAMENTO

Neste capítulo, abordaremos uma das principais formas de promoção de marketing em

um nível de marca, o licenciamento, complementando o capítulo III desta dissertação.

De acordo com o professor Carlos Lima Silva (2005, p.03), licenciamento pode ser

definido como “a autorização e o acordo capazes de projetar sobre produtos e serviços a aura,

o carisma e o apelo encontrados em ideias, sonhos e modelos de excelência”, enquanto que

Sebastião Bonfá e Arnaldo Rabelo (2009, p.15) completam: “Licensing, ou licenciamento, é o

direito contratual de utilização de determinada marca, imagem ou propriedade intelectual e

artística registrada, que pertençam ou sejam controladas por terceiros, em um produto, serviço

ou peça de comunicação promocional ou publicitária”.

A licença é um título que permite a exploração de um personagem

real ou fictício em produtos ou serviços destinados à comercialização em

outros domínios que não aqueles de origem do personagem. [...] A cessão

desse título é objeto de um contrato entre fabricante ou a empresa

(licenciado) que irá explorar o personagem e o detentor dos direitos

(licenciador). Esse contrato prevê a cessão dos direitos de exploração e de

reprodução, mas não engloba de forma alguma a cessão dos direitos de autor

ou outros direitos de propriedade. (MONTIGNEAUX, 2003, p.188)

Resumidamente, o licenciamento é uma estratégia de marketing na qual uma empresa

adquire a permissão de utilizar uma determinada marca (que pode ser uma imagem,

personagem ou celebridade) pertencente a outro, em seus próprios produtos. Mais do que o

aspecto legal desta transação, que se pode considerar como um contrato de arrendamento dos

direitos autorais patrimoniais de determinado ente para exploração durante certo período de

tempo, o licenciamento fala sobre o empréstimo do valor simbólico de uma marca já

estabelecida para outro produto ou empresa, os quais, geralmente, ainda não possuem tal êxito

ou buscam aumentar sua popularidade ligando-se a uma marca consagrada.

As principais marcas têm sua maior força em sua esfera simbólica, no valor agregado

que trazem aos produtos a elas associados em virtude de toda sua história e relacionamento

com o consumidor. Em muitos casos, certas marcas não são necessariamente marcas na

definição do marketing, mas entidades (personagens, celebridades, organizações, esportistas,

etc.) originadas na indústria cultural, apropriadas para fins mercadológicos como itens diretos

dentro da promoção de produtos em um contexto de vendas. Como observa Terence Shimp:

Enquanto muitas marcas são comercializadas com base em sua

funcionalidade, outras são comercializadas para satisfazer desejos

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psicológicos. Os apelos a necessidades simbólicas incluem aqueles voltados

para os desejos que o consumidor tem de autovalorização, participação em

grupos, afiliação e integração. O gerenciamento de conceito de marca

voltado para as necessidades simbólicas tenta associar o uso da marca com o

grupo, o papel ou a autoimagem desejados. (SHIMP, 2002, p.38)

O licenciamento é uma importante ferramenta do marketing, pois abrevia o trabalho de

uma empresa na construção de uma marca própria. Isso não significa que o licenciado não

deverá ter um trabalho próprio de branding, mas que ele optará por associar-se com um nome

já conhecido do público e que assumirá este nome como a força motriz de suas vendas. Como

aponta Carlos Silva (2005, p.05), “quanto mais forte for a marca, mais fácil lhe será possível

alavancar as vendas de produtos e serviços e quanto mais vendas houver, mais forte será a

marca e maior e mais profundo será o seu significado para o consumidor”.

1. Um pouco de história

A história do licenciamento está diretamente ligada à própria evolução das marcas e de

seu papel nas relações sociais e mercantis. Pensando a licença de uso de determinada marca

como uma forma de atestar a qualidade e confiabilidade de tal produto encontraremos as

origens do licenciamento na Inglaterra do século XII, quando o rei Henrique II concedeu um

“Real Documento de reconhecimento da excelência dos serviços prestados” (SILVA, 2005,

p.11) à Companhia de Tecelões com o qual a empresa comprovava ser fornecedora da Casa

Real Inglesa. Este alvará era dado mediante o pagamento de uma porcentagem sobre as

vendas da Companhia, muito próximo das formas atuais de licenciamento.

Segundo Bonfá e Rabelo (2009, p.24), existe certa controvérsia sobre o início do

licenciamento nos Estados Unidos, contudo destacamos 1932, ano no qual o empresário Walt

Disney fechou um contrato completo de licenciamento do personagem Mickey Mouse com

Herman Kamen, considerado “o pai do licenciamento moderno”.

Após a Segunda Guerra Mundial, o uso de franquias nos Estados Unidos cresce e a

Warner Bros. começa a licenciar os personagens da Looney Tunes.

Na década de 1970, George Lucas, em uma negociação histórica

com a 20th Century Fox, adquiriu os ancillary rights (direitos acessórios) de

seu filme Guerra nas Estrelas e lançou o programa de licenciamento mais

bem-sucedido da história, visto por muitos observadores como o começo da

indústria do licenciamento atual. (RAUGUST, Karen, 2001 apud SILVA,

2005, p.18)

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No Brasil, citamos o uso dos personagens Disney em camisetas e doces no final da

década de 1940, controlados de escritórios em Nova York, EUA, com a posterior abertura de

um escritório em São Paulo, na década de 1960.

Em 1968 Maurício de Souza montou o primeiro licenciamento de personagens

brasileiros, com Bidu e Franjinha, através de bonecos. Logo o elefante Jotalhão iniciaria uma

longa jornada nas embalagens e anúncios do extrato de tomate da marca Cica.

2. O licenciamento como ferramenta de marketing

O licenciamento é uma das mais eficientes ferramentas de marketing da atualidade,

exatamente por sua capacidade de poder trazer para um determinado produto a força de uma

marca já estabelecida junto ao público. O pesquisador francês Nicolas Montigneaux (2003,

p.187) apontava em 2003: “O conjunto das atividades de licenciamento representa mais de

600 bilhões de francos (cerca de 113 bilhões de dólares) por ano no mundo inteiro (preço de

venda no varejo dos produtos licenciados)”, enquanto que Sebastião Bonfá e Arnaldo Rabelo

(2009) assinalam o crescimento do setor no Brasil.

Tabela 02

Estimativa do mercado de licenciamento nos últimos anos

2005 2006 2007 2008 2009

(projeção)

No. Licenciadores 63 65 70 80 90

No. Licenciados 450 650 800 850 900

No. Licenças 300 400 450 500 550

Faturam dos licenciadores (R$ milhões) 130 145 155 160 170

Receita com produtos licenciados – venda para

o varejo (R$ bilhões) 2,7 2,8 3.0 3,2 3.4

Crescimento 5% 4% 7% 7% 6%

Fonte: ABRAL apud Bonfá; Rabelo, 2009, p.26

O licenciamento oferece diversas vantagens à empresa que emprega este expediente,

principalmente no fato de se utilizar uma marca popular e com uma reputação estabelecida.

Segundo Bonfá e Rabelo (2009, p.27), “um produto com marca licenciada tem vendas

sensivelmente maiores – e com maior lucro – que produtos similares genéricos”. Carlos Lima

Silva estimou (2003, p.20) que esta vantagem competitiva poderia chegar a “25% a mais do

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81

que o similar que não seja licenciado” enquanto que a Associação Brasileira de

Licenciamento (ABRAL) calculava em 2005 que “um produto licenciado é de 12 a 15% mais

caro, mas que as vantagens são numerosas: um produto licenciado vende até 35% mais que um

produto genérico” (CRESCITELLI; STEFANINI, 2007).

Em matéria publicada na revista Impulso n°64 (agosto/2009), produzida pela empresa

Arcor, Ana Lúcia Saraiva, gerente de negócios da Redibra (licenciadora das marcas Ben10,

Cartoon Z@um e Meninas Superpoderosas), aponta uma grande vantagem no mercado

brasileiro devido a sua infraestrutura de varejo moderna: “25% das vendas de produtos

licenciados são realizadas em lojas de departamento e hipermercados”. Na mesma matéria,

Glen Migliaccio, presidente da ITC, chama atenção para o enorme potencial de crescimento

do licenciamento no Brasil, que usaria pouco mais de 22% de seu mercado total.

Uma das primeiras vantagens na obtenção da licença de exploração de marca por uma

empresa é “o instantâneo reconhecimento e valorização do público, a associação a conceitos e

valores ligados à licença, a economia em desenvolvimento de marca e o aumento das vendas”

(RABELO, 2009, on-line...) enquanto que para o licenciador “as vantagens incluem a geração

de receita adicional, a facilidade e rapidez para explorar diferentes segmentos e regiões, a

possibilidade de focar sua atividade no desenvolvimento, fortalecimento e controle da

propriedade licenciada ou de novas” (RABELO, 2009, on-line...).

Outros benefícios que uma empresa pode ter ao adquirir um licenciamento são:

Aumento de vendas, através do reconhecimento instantâneo da marca ou personagem

e da associação de determinados atributos;

Promover a exposição da própria marca (e do nome da empresa) no mercado, ao se

associar a uma marca ou personagem conhecido;

Aumentar a quantidade de clientes ou conquistar novos tipos de clientes;

Obter suporte adicional de marketing uma vez que muitas marcas licenciadas contam

com uma comunicação própria que gera marketing indireto ao licenciado;

Fazer com que os produtos próprios se beneficiem do sucesso de outros produtos

licenciados. (BONFÁ; RABELO, 2009, p.37)

3. Tipos de licenciamento

Utilizando a divisão proposta por Carlos Lima Silva (2005), temos os seguintes tipos

de licenciamento:

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82

Classificação quanto ao objeto do licenciamento

o Personagens/ Entretenimento – licenciamento que usa determinados

personagens ou universo de personagens geralmente de histórias em

quadrinhos, desenhos animados, filmes de cinema ou mesmo novelas e

seriados televisivos. Por exemplo: Batman, Ben10, Harry Potter, etc.

o Personalidade / Celebridades - O licenciamento no qual personalidades

quaisquer ou celebridades (principalmente da área de entretenimento) assinam

ou endossam determinado produto. Nesta categoria temos também as

celebridades esportivas. Não confundir com o chamado merchandising

editorial, que é a publicidade de produtos dentro do conteúdo de programas.

Por exemplo: Xuxa, Angélica, Luciana Gimenes, etc.

o Franquias - Licenciamentos de marcas e de know-how, principalmente o

operacional, de uma empresa específica. Muito comum na área de prestação de

serviços (lanchonetes, lavanderias, etc.). Por exemplo: Lanchonetes

McDonalds, Chocolates Kopenhagen, Frans Café, etc.

o Certificação - A certificação é licenciamento técnico que atesta que

determinado produto atende a uma série de especificações ou normas que

garantem qualidade, excelência, natureza, material utilizado ou metodologia

empregada. (p.34). Por exemplo: ISO 9000, INMETRO, etc.

o Uso de propriedade intelectual – Licença de uso de conteúdo intelectual ou

cessão dos direitos autorais patrimoniais por determinado tempo. Comum na

área editorial de mídia impressa e eletrônica e na área publicitária e áudio

visual. Por exemplo: uso de músicas em propagandas televisivas, adaptações

cinematográficas de livros, etc.

o Licenciamento corporativo - O licenciamento corporativo é feito por empresas

que têm marcas muito fortes e as ampliam para aplicações diferentes das

originais, como peças de vestuário, etc. Por exemplo: Ferrari, Benetton,

Harley-Davidson, etc.

Classificação quanto à capacidade de manutenção do significado no tempo:

o Licenciamento de ocasião, sazonal ou modismos (Bonfá e Rabelo, 2009) – São

marcas que ainda não conseguiram construir uma forte reputação e

relacionamento com o público, mas gozam de um momento de grande

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popularidade. Deve ser bem avaliada pelo licenciador por representar uma

empreitada de risco.

o Licenciamento Clássico – Marcas que já possuem um longo histórico e um

forte relacionamento junto com o público. Apresentam muito mais força e

constância. São marcas Top of Mind, ou seja, que estão no topo da lembrança

do consumidor, e como completa David Aaker: “ter uma marca dominante

proporciona uma vantagem competitiva forte. Em muitas situações de compra,

significa que qualquer outra marca não será nem mesmo considerada” (1997,

p.66).

4. Personagens e o licenciamento

A forma de licenciamento mais comum é o de personagens. Ele acontece através da

apropriação de personagens, na grande maioria provenientes de obras audiovisuais (em

especial desenhos animados, histórias em quadrinhos e filmes de cinema voltados para o

público infanto-juvenil), como marcas em produtos.

Não se deve confundir o licenciamento de personagens com promoções casadas. No

licenciamento os personagens são utilizados como a marca principal do produto, que pode ou

não fazer parte de uma linha temática, agregando este item a sua esfera simbólica. Por

exemplo, as maçãs Turma da Mônica (licenciamento dos personagens criados por Mauricio de

Souza para o Grupo Fisher).

Em promoções ocasionais, os produtos mantêm suas marcas originais utilizando o

personagem como um parceiro eventual na sua estratégia de promoção. Como exemplo, a

ação conjunta da Nestlé com a Warner Bros., em 2008, na qual a compra de alguns dos

cereais matinais dava direito a brindes ou ingressos do filme de cinema Batman, O Cavaleiro

das Trevas.

É fato que os personagens contêm grande apelo junto ao público. Seja por seu fascínio

emblemático ou mitológico, alguns atingem um grau de popularidade frequentemente maior

que celebridades ou autoridades do mundo real. A maior parte do sucesso de um personagem

reside na construção convincente e competente manutenção de sua caracterização,

personalidade e motivação. Junto a isso, temos a referência arquetípica do personagem e sua

permeabilidade para propiciar uma identificação e interação com seu público. O personagem

age como um modelo, parceiro ou substituto do espectador, ora se colocando em situações

semelhantes às vividas por ele (conflitos, sofrimentos e alegrias), ora mostrando formas de

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ação, propondo soluções, como uma espécie de laboratório da vida real. Esta relação é

especialmente forte ao considerarmos o público infantil de 4 a 9 anos, período no qual a

criança está aberta a novas descobertas e à força do mundo imaginário.

Entre 4 e 9 anos, o personagem é essencial e constitui um elemento

motor na compra de uma marca. Ela seduz as crianças pelo imaginário que

induz e no qual as crianças se projetam. O processo de identificação

funciona sobre os personagens heróis ou carismáticos.

A partir dos 9 anos, os personagens devem poder exprimir a

personalidade e a necessidade de transgressão da criança.

(MONTIGNEAUX, 2003, p.114)

Determinar o sucesso e a aceitação de um personagem não é tarefa fácil, uma vez que

os crivos por que passa junto ao público são todos de natureza subjetiva.

Personagens desenvolvidos para marcas têm como característica englobar em sua

construção os principais elementos simbólicos presentes naquela determinada marca e que são

passados ao público pelas ações de comunicação da empresa. Funcionam como uma espécie

de porta-voz da marca ao mesmo tempo em que buscam uma aceitação e aproximação junto

ao público consumidor. Como exemplo, podemos citar o Lequetreque, um pequeno frango

estilizado com óculos de motoqueiro e capacete criado na década de 1970 pelos publicitários

Francesc Petit e Washington Olivetto, da agência paulista DPZ, como personagem símbolo

dos produtos da empresa Sadia. Com mais de 30 anos de existência e utilizado até hoje nas

diversas campanhas de marketing e embalagens da marca, Lequetreque é conhecido como um

dos personagens de maior recall quando se fala de personagens de marca.

Em personagens originários da indústria de entretenimento (filmes, livros, histórias em

quadrinhos, etc.), por outro lado, temos uma construção simbólica igualmente forte, mas não

atrelada a uma marca e sim a sua história original. A reputação destes personagens é

construída pela repercussão das obras em que aparecem. Muitas vezes, estes personagens são

apropriados para funcionarem como marcas na tentativa de migrar o relacionamento que

mantém como seu público para a esfera do consumo. Neste caso, encontramos o super-herói

Batman, objeto deste estudo.

Segundo o roteirista Doc Comparato (1998), o personagem é composto de três

dimensões básicas: física (sua aparência), psicológica (sua personalidade) e social (seu

ambiente). Nicolas Montigneaux propõe um modelo de análise de personagem no qual

considera estas três dimensões, além de mais dois parâmetros baseados no prisma de marca de

J. N. Kapferer (1991 apud MONTIGNEAUX, 2003, p.92):

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Fig. 04

Estrela de identidade do personagem de marca

Fonte: MONTIGNEAUX, Nicolas. Público-alvo: Crianças. A força dos personagens e do marketing para falar

com o consumidor infantil. Tradução de Jaime Bernardes. Rio de Janeiro: Campos, 2003. p.136

a) Parâmetro “físico”

O “físico” diz respeito à aparência concreta do personagem: suas cores, forma, biótipo,

acessórios, etc. No caso de personagens de marca, é utilizado para ancorar o mesmo ao

produto e à empresa através de características gráficas e da identidade visual. Em personagens

da indústria do entretenimento, trabalha os códigos gráficos que irá localizar o personagem

em seu universo conceitual, gênero, faixa etária, etc. É a primeira impressão e comunica

através da aparência, sendo fundamental tanto do ponto de vista de forma quanto de

significado (semiótico). Irá se relacionar diretamente ao “relacionamento” e à

“personalidade”.

b) Parâmetro “Personalidade”

Outro ponto fundamental é a personalidade, ou seja, o conjunto de características

psicológicas que determinam as atitudes e pensamentos do personagem. Este parâmetro irá,

juntamente com o “físico”, comunicar-se com o público propiciando uma interação pela

apresentação de quem o personagem é e como pensa. Do mesmo modo, acontece com a

marca, relembrando Sal Randazzo (1997) que cita a personalidade da marca. “De certa

maneira, a marca assume um rosto humano através do personagem. Este se apoiará sobre a

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86

identidade da marca de que constitui uma espécie de prolongamento” (MONTIGNEAUX,

2003, p.137).

O personagem, seja dentro da área de entretenimento, seja no universo do marketing,

irá sempre configurar-se como um ser vivo (não necessariamente real), com características,

atitudes e modos próprios, os quais serão avaliados pelo público que decidirá se aceitam ou

não, concordam ou não, acreditam ou não.

c) Parâmetro “imaginário”

O “imaginário” diz respeito ao universo próprio do personagem, onde ele existe e atua:

seu ambiente. Este universo próprio do personagem pode ser: explícito – um mundo fantástico

exclusivo no qual unicamente o personagem pode existir; implícito, quando este mundo não é

descrito e a criança o deduz, podendo ser inclusive a própria realidade.

d) Parâmetro “reflexo”

O “reflexo” diz respeito ao relacionamento do público com o personagem, ou seja,

como este influenciará o espectador e como será absorvido e visto. Este parâmetro aborda o

processo comunicacional entre a criatura de fantasia e o consumidor real.

Pode acontecer em duas situações básicas:

Personagem reflete a criança, é um “espelho” - Geralmente é um personagem

infantil (outra criança) que funciona como um tipo de alter-ego do espectador,

também uma imagem desejável com a qual a criança quererá se parecer ou da

qual sonhará se aproximar. O reflexo acontece pelo físico, personalidade e

ambiente, primordialmente.

Personagem inspira a criança e é um mediador entre dois mundos - O

personagem, geralmente mais velho (ou mais experiente) que a criança,

funciona como um modelo aspiracional, algo que a criança quer ser quando

crescer. Ajuda a criança a compreender os problemas cotidianos e sugere

caminhos a seguir, pela exemplificação. Funciona como uma ponte dentro do

amadurecimento, entre a infância e a maturidade.

e) Parâmetro “relacionamento”

“O „relacionamento‟ é sem dúvida o componente do personagem imaginário mais

delicado, mas também o mais importante, visto que afeta diretamente a criança, seu

interlocutor privilegiado” (MONTIGNEAUX, 2003, p.144). Neste item, estabelece-se como

será estruturada a relação entre o público e o personagem, como será feita a troca, a interação

entre eles. Este enlace deve ser satisfatório para o espectador, “é uma condição indispensável

para que o personagem cumpra eficazmente a sua função afetiva (a criança se sente atraída

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por ele), mas, sobretudo, cognitiva (a marca transmite informações para a criança)”

(MONTIGNEAUX, 2003, p.145). Geralmente este relacionamento é fruto de um projeto, no

qual se visa a criar o vínculo que levará à aceitação do personagem e seu consequente

consumo. Ele traça as regras, o papel ocupado por ambos os lados e o sistema de valores. Sua

força será resultante do poder de convencimento e penetração do personagem.

Os três primeiros parâmetros, “físico”, “personalidade” e “imaginário”, são orientados

para o personagem; os dois outros, o “reflexo” e o “relacionamento”, são dirigidos ao público.

De uma maneira um pouco metafórica, poderíamos dizer que o

personagem de marca possui um pé no mundo da marca e o outro no mundo

da criança. É fácil entender como o personagem poderá desempenhar o papel

de mediador ou de intermediário. Sua função cognitiva permitirá transmitir à

criança toda uma série de informações relativas à marca (características dos

produtos, nome da marca, códigos de cores, etc.) e sua função afetiva

permitirá interessar e atrair a criança para o personagem.

(MONTIGNEAUX, 2003, p.149)

O licenciamento de personagens apresenta vantagens por possuir uma carga simbólica

já constituída e consagrada ao público, que vê o consumo dos produtos licenciados como um

meio de se aproximar mais deste universo mítico. Segundo BONFÁ e RABELO (2009, p.49),

“pesquisas já demonstraram que produtos que utilizam [licenciamento de] personagem,

mesmo com preço 15% superior ao mesmo produto sem personagem, podem vender de 30% a

40% mais”.

Os personagens dividem-se entre clássicos – aqueles que possuem um público já

estabelecido e possuem um apelo que atravessa gerações - e sazonais – personagens que ainda

não construíram um relacionamento duradouro e muitas vezes acabam por serem modismos.

Nenhum personagem nasce clássico, precisando galgar um longo caminho conquistando o

reconhecimento do público e fortalecendo estes atributos em uma base sólida. Outras vezes, o

personagem é propositalmente criado para durar pouco, porém arrecadando o máximo durante

este período. Exemplos são personagens de filmes que gozam de grande popularidade durante

o tempo em que o filme permanece na mídia.

Na maioria dos casos, os personagens clássicos não necessitam de grandes

investimentos em promoção, uma vez que possuem um rol de fãs bastante grande que se

autossustenta através de comunicação espontânea, necessitando-se apenas de uma ocasional

manutenção com eventos institucionais.

Uma diferença notável em relação ao licenciamento de celebridades reside no fato de

o personagem não desgastar ou prejudicar sua imagem em escândalos ou contratempos,

possuindo uma imagem mais sólida, mesmo que fantasiosa.

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O licenciamento é uma oportuna ferramenta dentro da estratégia de marketing por

complementar a carga simbólica de um produto, bem ou serviço com outra, já estabelecida e

com um público cativo. Dentre as muitas formas de licenciamento, o licenciamento de

personagens é o mais comum, principalmente ao público de menor idade.

Esta forma de licenciamento funciona da mesma maneira, sendo que a marca

emprestada constitui-se de um personagem oriundo da indústria do entretenimento. Assim

como acontece com as marcas comerciais, este personagem, apropriado como marca trará

consigo toda sua reputação junto ao seu público, agindo agora a serviço da empresa

licenciada. A força deste acordo será medida, entre outros fatores, pela penetração e retorno

deste personagem junto ao público.

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CAPÍTULO V - A MARCA DO MORCEGO: Características e

análise da marca Batman

Batman está entre os mais populares super-heróis da área de entretenimento. Em

diversos websites e revistas especializadas é frequentemente apontado como um dos três

super-heróis mais populares, ao lado de Superman e Homem-aranha.

Além da sólida carreira nas histórias em quadrinhos e desenhos animados de televisão,

Batman também protagonizou vários longas-metragens no cinema, sendo seis desde 1989.

Estrelado por Michael Keaton, com direção de Tim Burton, Batman, de 1989, deu

início à (nova) “bat-mania”, marcada por uma extensa campanha de promoção do filme e por

uma infinidade de produtos licenciados, movimentando grandes cifras em dinheiro:

Em 1989, ano do cinquentenário de Batman, o filme de Burton

arrecadou, apenas nos EUA, US$ 250 milhões em bilheteria, sem falar em

mais outros US$ 500 milhões com a venda de produtos que levavam sua

marca. No resto do mundo foram mais US$ 140 milhões nos cinemas e US$

800 milhões em produtos licenciados. No Brasil, 800 mil pessoas foram

assistir ao filme e 140 produtos diferentes foram licenciados pela Warner.

(RIBAS, 2006, p.32)

Desde então, a venda de produtos com o Homem-morcego tornou-se constante,

aumentando sensivelmente em 2005 com o filme Batman Begins, e em 2008 com O

Cavaleiro das Trevas. Atualmente, Batman figura entre os principais personagens em

produtos licenciados no mundo, sendo o Brasil, segundo a Warner Bros.23

, empresa

proprietária dos direitos do personagem, o terceiro país em volume de vendas.

Para entendermos o personagem Batman e seu relacionamento com o público dentro

do âmbito mercadológico, devemos verificar suas características próprias e os efeitos

causados em seus consumidores.

Primeiramente, utilizaremos o método de análise proposto por Nicolas Montigneaux

(2003), descrito no capítulo IV deste trabalho, que consiste da estrela de identidade do

personagem de marca, com o objetivo de analisarmos mais profundamente o super-herói.

Através deste método buscaremos compreender Batman tanto pelo lado de seu impacto

comercial na indústria de entretenimento quanto na área de licenciamento e produtos. Antes,

porém, faz-se necessário uma notação para categorizar o super-herói Batman utilizado no

licenciamento, por haver mais de um.

23

Fonte: Warner Bros. (South) Inc. em 10/11/2009.

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Basicamente, trata-se do mesmo personagem, contudo existem pequenas diferenças

que o localizam em relação a sua difusão midiática.

Segundo a Warner Bros., existem diferentes linhas de modelo do personagem, que,

entre si, distinguem-se quanto às características imagéticas, identidade visual da linha e

público-alvo específico. Estas linhas derivam principalmente do veículo midiático de origem

(cinema, história em quadrinho ou televisão) e variam, principalmente, quanto ao seu design

gráfico, sempre focado nos produtos que irão estampar e ao target. Podemos categorizá-los

em três grandes grupos:

Batman comics (figura 05A)– Apresenta a representação tradicional do super-

herói nas histórias em quadrinhos, com sua roupa cinza e capa azul e aparência

mais realista, podendo conter mais ou menos sombra. Algumas vezes, são

imagens feitas pelos mesmos artistas das revistas em quadrinhos ou mesmo

retiradas das próprias publicações.

Batman cinema (figura 05B) – Composta por imagens (fotos e desenhos)

pertencentes aos filmes de cinema (atualmente, Batman Begins e Cavaleiro das

Trevas, nos quais Batman é interpretado pelo ator inglês Christian Bale). Este

Batman veste uma armadura preta com capa.

Batman animação (figura 05C) – O personagem como é apresentado e

caracterizado nos desenhos animados, atualmente através da série The Brave and

The Bold. Basicamente é igual ao Batman dos comics, porém seu estilo gráfico é

peculiar e próprio, sendo mais caricato.

Figura 05

Representações das linhas Batman

A) Linha Comics

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B) Linha Cinema

C) Linha Animação

Fonte: www.google.com/images

Além do super-herói, incluem-se nas respectivas linhas os equipamentos, vilões e

personagens secundários (como outros heróis ou o parceiro Robin). Cada uma delas possui

uma identidade visual própria e seu próprio logo baseado no original com a silhueta do

morcego. Elas se dividem em múltiplas subcategorias, de acordo com os filmes, coleções em

HQs e desenhos de animação, com contrato e style-guide24

específicos. Cada linha é um

contrato independente.

24

Style-guide, ou guia de estilo, é uma manual de identidade visual contendo imagens, cores, fontes e estilos,

com suas variações e combinações, permitidas sobre determinado personagem ou marca.

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1. Quem é Batman? O físico, a personalidade e o imaginário do Cavaleiro das

Trevas

Batman foi criado em 1939, pelo escritor Bill Finger e pelo desenhista Bob Kane.

Mesmo sendo uma miscelânea de influências e clichês da época, Batman apresentava, desde

sua origem, elementos que o mostrariam como um personagem diferente dos outros super-

heróis, algo novo, com uma personalidade própria e que exerceria grande fascínio ao público.

Batman não possuí nenhum tipo de superpoder ou habilidade sobre-humana, conta

apenas com um grande preparo físico digno de um atleta olímpico, e um intelecto invejável

com extenso conhecimento de cultura geral, ciências, estratégia, e alta capacidade de

raciocínio dedutivo. Como complemento, é o único herdeiro de uma enorme fortuna, o que

subsidia financeiramente as atividades como Batman, municiando-o com os mais avançados

aparatos tecnológicos e inúmeros acessórios (muitos dos quais carrega em seu famoso “cinto

de utilidades”) auxiliares no combate ao crime.

Durante o dia, vive como Bruce Wayne, seu alterego milionário caracterizado como

uma espécie de dândi moderno, que alterna seu tempo entre administrar a fortuna deixada por

seu pai, e frequentar festas e badalações. Entretanto, esta faceta excêntrica e hedonista

funciona como sua verdadeira máscara, uma vez que constitui um disfarce para esconder suas

reais motivações e interesses no combate ao crime. Batman é sua real personalidade, fruto do

trauma vivido pelo assassinato dos pais quando ainda era criança (a idade é imprecisa nas

histórias em quadrinhos), produto do medo, da culpa e da solidão que o marcariam pelo resto

de sua vida.

Batman não participa de círculos sociais, não havendo irmãos, parentes, mulheres ou

amigos próximos. Relaciona-se somente com seu fiel mordomo Alfred e o parceiro Robin25

,

vivendo em um constante exílio auto-imposto, absolutamente focado em sua missão de vida.

Suas poucas amizades giram somente em torno de seus interesses como combatente do crime,

na figura de alguns outros super-heróis e do comissário de polícia, James Gordon.

Batman é um herói singular e paradoxal (LOBIANCO Jr., 1998) na medida em que

age mais como um justiceiro que como um super-herói. Fundamentalmente, os objetivos de

Batman concentram-se apenas na luta contra o crime, diferentes de outros super-heróis que

25 Alfred foi introduzido no universo de Batman em 1946 e Robin em 1940. Desde então houve três Robins:

Dick Grayson, que figurou nas HQs de 1940 a meados dos anos de 1980; Jason Tood, morto nas HQs, a pedido

do público, em 1988; e, atualmente Tim Drake, que permanece desde 1991. Na história The Dark Knight Returns

(1985), Frank Miller introduziu uma Robin mulher, Carrie Kelly.

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enfrentam ameaças cósmicas ou sobrenaturais. Dentro de sua complexa caracterização,

podemos reconhecer os arquétipos da Sombra e do Guerreiro.

Atuando somente à noite, o Homem-Morcego não possui qualquer

habilidade sobrenatural, ao contrário, é humano, errante, luta ferozmente

contra seus fantasmas. Batman deixa transparecer conflitos internos muito

claros e característicos do romantismo, como veremos mais adiante. No

universo dos Quadrinhos, Batman é a figura mais prodigiosa, aquela

que melhor representa o homem real. (PINA, 2008, p.46, grifo nosso)

Ao vestir o manto do morcego, Bruce Wayne assume seu verdadeiro lado, sua face

interna revoltada com a prematura morte de seus pais e que vê em cada criminoso o rosto do

assassino: um lado que busca recriar o mundo de acordo com sua própria visão, muitas vezes

intransigente e unilateral, sempre obsessiva. Batman é frequentemente ingênuo e ao mesmo

tempo arrogante e impiedoso, não admitindo qualquer falha ou a contestação de suas palavras.

Contudo, sua personalidade também é interpretada como absolutamente determinada.

A dor de Bruce Wayne representa muitos dos sentimentos de frustração que acometem

também a seu público frente às injustiças e dificuldades do dia a dia. No filme Batman Begins

há o medo e a culpa que Bruce imputa para si a responsabilidade por seus pais serem

assaltados e, consequentemente, mortos. Batman, por outro lado, é a sua reação frente a esta

situação, a emergência do lado negro, vingativo, frequentemente reprimido, que busca

transformar o mundo segundo sua concepção particular e egocêntrica. Batman representa o

ser que tem liberdade para caminhar à margem das leis dos homens em nome de uma justiça

primordial, às vezes divina, e que extravasa suas frustrações, seu medo, sua raiva através da

violência física e, muitas vezes, psicológica, contra aqueles a quem julga culpados.

A necessidade, o desejo pela energia do Mal26

, negada pela

modernidade, também se manifesta e se reconhece pelo que há de sombrio e

grotesco na mídia. Neste sentido, os quadrinhos do Batman suprem, de certa

forma, esta necessidade de expurgar a parte maldita reprimida em cada

leitor. O termo “Grotesco” aqui utilizado encaixa-se perfeitamente bem com

a configuração estética dos quadrinhos do Batman, por explorar exatamente

essas questões referentes à figura do rebaixamento. (PINA, 2008, p.62)

A caracterização de morcego é o modo de Bruce Wayne assumir, absorver seu próprio

medo (os morcegos que o atacaram quando criança, ao cair dentro de uma caverna em sua

propriedade) e transformá-lo em sua maior arma, durante sua transposição para o lado negro

de sua existência, a sombra junguiana presente dentro do complexo universo psicológico do

ser humano:

26

O Mal se configura numa visão dialética, como oposto imediato ao progresso, à vida em sociedade

(BAUDRILLARD, 1990 apud PINA, 2008, p.62).

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A sombra é o centro do inconsciente pessoal, o núcleo do material

que foi reprimido da consciência. A sombra inclui aquelas tendências,

desejos, memórias e experiências que são rejeitadas pelo indivíduo como

incompatíveis com a persona e contrárias aos padrões e ideais sociais.

(FADIMAN; FRAGER, 1986, p.54, grifo nosso)

Batman é a realização dos desejos inconscientes de Bruce Wayne frente às injustiças

da vida normal, ao mesmo tempo em que é a personificação de seu próprio medo como

aliado.

Dentro desta mesma linha de pensamento, encontramos a interpretação de Christopher

Knowles, que relaciona a origem de Batman com referências da mitologia judaica,

hipoteticamente influentes na criação de Bob Kane e Bill Finger, ambos judeus. Segundo sua

tese, Batman seria um reinterpretação do arquétipo do Golem:

O mito do Golem data dos guetos da Europa Oriental, onde os

judeus se viam periodicamente hostilizados por gentios hostis. Segundo a

lenda, rabinos confeccionaram o Golem com argila e o animaram usando a

magia da Cabala. Os Goléns protegiam os judeus e puniam seus inimigos.

(KNOWLES, 2007, P.163)

Os Goléns seriam criaturas místicas criadas como agentes de vingança, uma

personificação da raiva e do desejo de retaliação contra aqueles que infringiam o mal aos

judeus. Contudo, o mito adverte que é preciso ter cuidado, pois os Goléns podem se voltar

contra seus próprios criadores, trazendo consequências terríveis. Nas histórias em quadrinhos,

os Goléns costumam ser os anti-heróis.

O mito do Golem pode ser compreendido como uma expressão da Sombra junguiana

dentro da mitologia judaica, o que leva Batman ao mesmo padrão.

O arquétipo do Golem é, basicamente, o subproduto da insegurança

e do orgulho ferido. Ele proporciona um alívio material satisfatório para a

raiva reprimida, para a frustração e para a sensação da impotência causadas

por perseguições e provocações. (KNOWLES, 2007, p.166)

Desse lado de Batman transparece uma forte vocação para ser um personagem

controverso, um contestador, um opositor.

Outro aspecto importante da personalidade do super-herói é sua obstinação e

determinação. Batman não conhece limites e não mede esforços para atingir seus objetivos,

cumprir suas tarefas dentro do combate ao crime. O personagem é comumente retratado como

incansável e conhecido por não fazer distinção entre casos pequenos ou grandes aventuras,

dedicando-se ao máximo a qualquer um deles. Este lado é motivo de grande admiração e

inspiração para seu público, que reconhece em Batman um homem comum com grande força

de vontade, ao contrário de outros super-heróis que se veem facilitados por seus poderes

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sobre-humanos. Batman na condição de uma pessoa normal (portanto mais realista)

proporciona grande identificação com seu público.

Sobre o aspecto estético, Batman se destaca por sua simplicidade na concepção visual

e por seu aspecto sóbrio e escuro, aludindo ao morcego (figura 06). Apresenta um biótipo

forte e atlético e veste uma roupa colante cinza, com shorts, botas, luvas e capa em um mesmo

tom de azul. A máscara, com duas pontas simulando orelhas de um morcego, cobre quase

totalmente sua cabeça exceto a região da boca e queixo, e seus olhos se escondem em duas

tiras brancas. Em seu peito, a logomarca com a silhueta negra de um morcego estilizado

dentro de uma elipse amarela27

.

Figura 06

A representação clássica de Batman e a versão do último longa-metragem

cinematográfico, respectivamente.

Fonte: www.google.com/images

Complementando sua vestimenta, Batman carrega um cinto estilo militar com

pequenas bolsinhas nas quais guarda diversos apetrechos tecnológicos. Aliás, estes aparatos e

equipamentos se destacam como um dos aspectos mais interessantes nas aventuras do super-

herói. Tradicionalmente acompanhados pelo prefixo bat (morcego), eles surgem para auxiliá-

lo no combate ao crime, sempre aludindo às tecnologias e descobertas mais avançadas do

momento: desde o famoso bat-móvel (bat-mobile – carro do Batman) até o bat-rangue

(bumerangue do Batman), a lista envolve diversos itens de perícia criminal e investigação

27 No princípio, Batman apresentava apenas a silhueta do morcego. A elipse amarela foi introduzida na década de

1960. Atualmente, alguns desenhistas utilizam o logo sem a elipse justificando como um uniforme antigo do

herói. Nos filmes de 2005 e 2008, o morcego também é utilizado sem o fundo amarelo.

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(incluindo um laboratório de análise química completo), artigos de defesa pessoal, armas

(exceto as de fogo), meios de transporte, antídotos e remédios diversos, computadores e

equipamentos como rádios, cápsulas de gás, etc., divididos nas pequenas bolsas de seu cinto,

nos compartimentos do carro (e às vezes de seu jato ou helicóptero). Hoje, são um recurso

narrativo presente e importante, que reforçam o mito do personagem, também, ao mostrá-lo

como um “gênio da ciência”, em sua lua contra o crime.

Seu “quartel-general” é conhecido como Bat-Caverna (Bat-cave – figura 07).

Introduzida na mitologia de Batman em 1943, após aparecer na série de cinema, a Bat-

Caverna é uma grande caverna localizada sob a mansão de sua família e com saída para os

fundos da propriedade. Foi descoberta por Bruce Wayne quando este era um garoto, após cair

acidentalmente dentro dela e ser atacado por um grupo de morcegos. Quando adulto, ele a

utiliza como seu esconderijo, equipando-a com grades computadores de última geração,

maquinários e equipamentos de laboratório, além de utilizá-la também como hangar e

estacionamento.

Figura 07

A Bat-Caverna segundo representação do vídeo game

Mortal Kombat vs. DC Universe

Fonte: www.google.com/images

A caverna reforça ainda mais a mítica presente nas histórias ao estabelecer um mundo

próprio do personagem, mágico e fantástico, separado do resto do mundo, no qual ele pode

ser ele mesmo e restabelecer seu poder para retornar ao mundo real. Tradicionalmente, ela

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também comporta uma espécie de museu com troféus de inimigos derrotados e apetrechos dos

vários anos de combate ao crime.

A aparência de Batman pouco mudou ao longo dos 70 anos de existência,

apresentando grande diferença apenas no cinema com a adoção de uma armadura (figura 06),

geralmente toda negra. Diferente de outros super-heróis, a imagem de Batman corrobora com

sua personalidade com a mesma intensidade que seu universo mítico. A representação de

morcego, com a capa frequentemente imitando enormes asas negras, remete a símbolos

primordiais que tanto apavoram quanto fascinam. Esta leitura semiótica do personagem é feita

mais rapidamente e independe do conhecimento prévio das histórias do personagem. Jung

apontava que a Sombra poderia aparecer em sonhos como um animal ou como “uma figura

escura, primitiva e hostil, ou repelente, porque seus conteúdos foram violentamente retirados

da consciência e aparecem como antagônicos à perspectiva consciente” (FADIMAN;

FRAGER, 1986, p.54). O morcego, símbolo de mau agouro e geralmente associado a coisas

maléficas e sobrenaturais em quase todas as culturas do ocidente, é a personificação de seu

medo infantil retrabalhado para gerar medo nos criminosos. Em um dos diálogos de Batman

Begins, Bruce Wayne responde a Alfred que a escolha do morcego era por ser algo que temia

e que iria provocar terror nos criminosos. Esta máxima aparece também na história em

quadrinhos: “Criminosos são uma espécie supersticiosa e covarde. Então, devo usar um

disfarce que leve terror ao fundo de seus corações. Preciso ser uma criatura da noite, como

um... morcego” (MILLER, 1988 apud RIBAS, 2006, p.7).

Com uma paleta de cores frias e quase monocromática, entre o cinza, o preto e o azul-

marinho, dependendo da forma como o personagem é caracterizado visualmente, Batman é

mais que uma personificação da noite, é uma personificação das trevas míticas noturnas, o

lado negro, o mistério do desconhecido. Apesar de não haver nenhum elemento sobrenatural

presente em sua concepção, Batman carrega um forte conteúdo simbólico de natureza mágica,

diferente do mundo real. Amiúde, ele é citado como um ser mítico, quase como um elemental

da noite.

Essa estética visual traz um conjunto de influências, confessamente utilizadas pelos

autores, como o personagem Drácula, representado no cinema pelo ator Bela Lugosi, Zorro de

Douglas Fairbanks e pelo expressionismo alemão de Murneau e Kafka. Contudo, estes

elementos sombrios, longe de assustarem, fascinam o público, mesmo que seja apenas através

de uma leitura visual, e se estendem também aos vilões, importantes como em nenhuma outra

história de super-heróis, e parte integrante da mitologia do Homem-Morcego.

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Nesse sentido, o universo fabuloso de Batman se mostra prodigioso

em recriar esta estética grotesca, pois utiliza todos os elementos possíveis

para isso: o riso doentio característico do seu arquiinimigo “O Coringa”, o

horror e o espanto provocado por suas aparições (Batman quase sempre

emergindo das sombras), a repulsa por sua animalidade ou pelo animal que

ele representa – o morcego, o que há de pior na escuridão. (PINA, 2008,

p.63)

Os vilões complementam Batman por serem antônimos ou distorções dele próprio. Por

esta razão, são tão fundamentais e presentes em suas histórias, indo além de meros

antagonistas. O Coringa (figura 08A) representa a insanidade contrária à austeridade ferrenha

do herói; Duas-Caras (figura 08B), o ex-promotor de Gothan, Harvey Dent, a distorção da

dupla identidade do herói, entre o lado belo e o lado grotesco28

; Pinguim é o lado empresarial

e dominador, um mafioso típico, mas não menos insano, entre outros. Enquanto Batman é

sombrio e comedido, seus vilões são espalhafatosos e coloridos. Em comum, a crueldade dos

métodos, opondo-se quanto a interesses e escolhas morais.

Figura 08

Coringa e Duas-Caras nas HQs de Batman.

A) O Coringa

B) Duas-caras

Fonte: www.google.com/images

Em contrapartida, seus inimigos excêntricos e multicoloridos também fascinam

através do exagero e da pantomima de referências visuais, inclusa a cidade Gothan City,

28

O grotesco citado é um complexo conjunto de significados nos quais se encaixam as configurações de Batman,

tanto textualmente quanto visualmente. O grotesco abrange o riso, o ridículo, o escracho, mas também o escuro,

o soturno. Está relacionado ao mundo inferior, ao Mal, ao contrário do que é Belo (e consequentemente Bom)

(SODRÉ; PAIVA, 2002; KAYSER, 1986 apud ALONSO, 2001).

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caricatura sombria dos grandes centros urbanos. Como cita Lobianco Jr, é a representação do

gótico e do grotesco no universo de Batman.

Batman tem de gótico o que tem também de gótico o grotesco. [...]

Um grotesco que vai ter base no monstruoso e no horripilante. E, a Gothan

do Cavaleiro das Trevas, Batman, é o campo onde o imaginário humano

desvela seus terrores. (LOBIANCO Jr., 1998, p.17)

Gothan City vem da tradição da DC Comics em locar muitos de seus super-heróis em

cidades imaginárias (Superman em Metropolis e Smallville; Flash em Central City, etc.).

Gothan é uma caricatura das grandes metrópoles americanas imersa nos contrastes sociais, na

falta de segurança frente à criminalidade urbana e à corrupção e a ineficiência das

autoridades, pintada em tons escuros e densos. Em termos visuais, referências claras a Nova

York e Chicago, aliada ao gótico, presente muito além da óbvia referência do nome Gothan

City (cidade gótica?) ou na proposta de monumentos grotescos (introduzidos de acordo com a

caracterização dada pelos autores), mas na configuração de valores inferiores que remetem à

tragédia, à morte e ao submundo.

Dentro das características imagéticas (físico), psicológicas (personalidade) e sociais

(imaginário) do Cavaleiro das Trevas, temos um personagem profundo e complexo, que

fascina pelos elementos míticos, pelo drama e pelo contraste em uma luta intensa entre a luz e

as trevas.

2. Homem-Morcego: o relacionamento e o reflexo entre Batman e o público

Conforme visto no capítulo IV, reflexo e relacionamento são parâmetros

direcionados ao público, ou seja, tratam diretamente da aceitação e contato do personagem

com o consumidor. Através do relacionamento, estabelece-se o papel ocupado por ambos os

lados sendo que o reflexo mostra como o personagem o influenciará e como será visto e

absorvido. Estes parâmetros abordam o processo comunicacional entre a criatura de fantasia e

o consumidor real.

O relacionamento de um personagem de marca é parte de um planejamento, visando a

conquistar novos consumidores, tornando-os adeptos de determinado produto. Entretanto, em

personagens originários do meio de entretenimento, como Batman, este relacionamento se

estabelece de forma diferente. Ele acontece de modo mais lento e profundo, através do qual o

público vai tendo contato com sua história, seu universo, conhecendo sua personalidade e

acompanhando seus atos, como se fosse uma pessoa real, apreciando e avaliando este ente

fictício e tirando suas conclusões.

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Quando falamos de Batman, estamos falando de um personagem de mais de 70 anos

de existência, com uma farta produção cultural, apresentada em diversas mídias. A despeito

das muitas interpretações dadas pelos autores que o retrataram e contaram suas aventuras ao

longo dos anos, Batman conseguiu construir uma reputação e uma caracterização sólida, bem

conhecida por seu público e fundamental na criação de seu relacionamento com este. Na

maior parte das vezes, os fãs, pessoas com maior envolvimento com o personagem, têm uma

ideia bastante clara de quem é o super-herói, chegando ao ponto de criticar (ou rejeitar)

determinada obra por acreditarem que fuja, eventualmente, do que atribuem ao personagem.

A forte conotação mitológica que envolve Batman repercute no relacionamento que ele tem

com o público, e também no reflexo que este tem do super-herói.

Os seres mitológicos e os mitos cumprem uma função bastante importante como

ferramentas de aprendizado e orientação do ser humano. Os mitos, ou as histórias mitológicas,

ajudam as pessoas na compreensão de suas próprias vidas, problemas e no aprendizado e

busca de soluções. “Quando a história está em sua mente, você percebe sua relevância para

com aquilo que esteja acontecendo em sua vida.” (CAMPBELL, J., 1990), através dos mitos

depara-se com situações pelas quais se passa, vendo-as como observadores externos, tomando

contato com um contexto maior no qual se enxergam soluções e pontos de vista novos.

Nas civilizações primitivas, o mito desempenha uma função

indispensável: ele exprime, enaltece e codifica a crença; salvaguarda e impõe

os princípios morais; garante a eficácia do ritual e oferece regras práticas

para a orientação do homem. O mito, portanto, é um ingrediente vital da

civilização humana. (ELIADE, 1963, p.23)

Batman, assim como a maioria dos heróis, cumpre sua função de mito ao ser um

modelo inspiracional, contudo, se diferencia de seus contemporâneos de capa e roupa colante

em algumas características próprias, frequentemente destacadas:

Não tem superpoderes, é um humano normal. Assim, poderia, em tese, ser

qualquer pessoa que:

o possui uma grande determinação e força de vontade ferrenha ; e

o apropria-se da ciência e da tecnologia, pelo uso dos apetrechos e

equipamentos, no combate ao crime.

Estas características são apontadas como sobressalentes no relacionamento entre

Batman e seu público-consumidor, e são pontos chaves da exploração do personagem como

marca pelas empresas licenciadas.

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3. A apropriação de Batman na visão do licenciador e dos licenciados.

Como dito anteriormente, o conceito da estrela de identidade do personagem, de

Nicolas Montigneaux, baseia-se nos estudos de J. N. Kapferer (1991, apud

MONTIGNEAUX, 2003, p.92) a respeito da identidade de marca. Basicamente, os mesmos

parâmetros aplicados à análise de uma marca podem ser aplicados à de um personagem, ou

seja, o marca e o personagem têm muitos pontos em comum em relação a sua proposta

comunicacional junto ao público. Logo, isso é um facilitador quando falamos em personagens

licenciados, como o Batman, uma vez que eles são apropriados como marca e podem ser

analisados como tal.

Para estudarmos o licenciamento da marca Batman devemos, primeiramente, entender

a opção por este super-herói dentre os milhares de outros personagens, heróis ou não, que

existem no universo do entretenimento. É consenso entre os licenciados ouvidos que a escolha

por Batman se deve principalmente a sua grande popularidade em virtude de sua carreira de

quase 70 anos, na qual estabeleceu um forte vínculo com seu público, e sua constante

presença na mídia. Dentro da classificação de licencing, Batman é considerado um

personagem clássico, ou seja, com um relacionamento antigo e já estabelecido. Ele é

apontado como um personagem bastante popular, com penetração junto ao público e com

solidez, ou seja, sua preferência pelo consumidor não é considerada uma “moda passageira”.

Outro ponto considerado é a sua presença constante nas prateleiras de lojas e

magazines através de inúmeros produtos, ou seja, a quantidade de itens com o super-herói

gera publicidade (visibilidade) para ele, o que beneficia os licenciados entre si, em um círculo

que se autossustenta.

Batman, também, tem sido presença habitual nos cinemas, protagonizando seis filmes

nos últimos vinte anos, todos com consideráveis resultados, sendo que o último longa-

metragem figura entre os cinco filmes29

de maior bilheteria da história (em termos brutos).

Além disso, aparece em desenhos animados, jogos eletrônicos, revistas em quadrinhos, etc.

(ver capítulo II). Esta superexposição midiática funciona como uma constante divulgação e

promoção do personagem, responsável pela maior parte do trabalho de manter a marca ativa

na mente dos consumidores. Segundo a Warner Bros., os desenhos animados podem ser

considerados como uma publicidade constante, promovendo e mantendo o Batman sempre

vivo na memória do público, responsável, talvez, por 50% de seu share-mind.

29

Fonte: http://www.boxofficemojo.com/alltime/world/ acessado em 14 de janeiro de 2010.

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A popularidade de Batman apresenta índices altos e estáveis30

, experimentando

melhoras durante o período promocional dos filmes, caindo em seguida, porém, estabilizando-

se em um patamar superior ao anterior. Este crescimento se dá independente de que o

consumidor assista aos filmes, mas apenas pelo fato de haver grande exposição do

personagem na mídia. Em termos de venda, estas acompanham a mesma dinâmica, entretanto,

em períodos normais (sem filme nos cinemas) crescem apenas em datas comemorativas

especiais, como o Natal e Dia das Crianças.

Outro fator de escolha da marca Batman são as próprias características do

personagem, descritas acima, das quais destacamos: a ausência de superpoderes e o uso da

tecnologia e dos bat-acessórios.

Tanto a Warner Bros. quanto as empresas licenciadas ouvidas concordam que estas

duas qualidades do super-herói contribuem decisivamente para gerar uma maior identificação

e fascínio junto ao consumidor. Como citado pelo gerente de produtos da Warner Bros., basta

o uniforme, a máscara e alguns apetrechos (vendidos como brinquedos) para que a criança “se

torne o Batman”. Existe a possibilidade de inúmeros bat-acessórios, exibidos nos filmes,

HQs, desenhos animados, ou mesmo criados pelas empresas, que podem se tornar produtos

comercializados como brinquedos, brindes ou mesmo no design das embalagens

customizadas com o super-herói.

A ausência de poderes especiais faz com que a coragem e a determinação do herói se

tornem ingredientes preponderantes no processo. Batman é visto como um homem comum,

como qualquer pessoa, porém um personagem misterioso, pois ninguém sabe sua identidade

secreta, escondida pela máscara do morcego. Esses ingredientes são especialmente

importantes quando comparamos o super-herói como outro famoso herói clássico, muito

próximo de si e que também goza de grande exposição midiática e popularidade: o Superman

- também propriedade da Warner Bros., criado por Jerry Siegel e Joe Shuster em 1938, um

ano antes de Batman.

Superman é um personagem de pouca identificação com o público devido,

principalmente, ao fato de ser extremamente poderoso (é quase indestrutível, solta raios pelos

olhos, pode voar, etc.), ser extraterrestre e ter como caracterização apenas a roupa (não

precisa de uma máscara para se tornar o herói).

A diferença entre Batman e Superman, em termos de licenciamento, reflete-se em seu

desempenho de vendas. Embora não haja números que demonstrem isso, a própria Warner

30

Não foram fornecidos pela Warner Bros números oficiais que comprovem este dado.

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admite uma maior aceitação do Homem-morcego pelo consumidor. Este fato também é

comentado por um dos licenciados, Lucci Vitale, do departamento comercial da Mega Kyds

Cosméticos, empresa que possui a licença de ambos os super-heróis, que afirma conseguir

vender produtos com o Batman por valores superiores aos similares com o Superman.

Outro personagem clássico, que consideramos com força de marca semelhante ao

Batman, e também bastante popular e presente na mídia, é o Homem-aranha. Porém, o herói

criado por Stan Lee em 1962 apresenta características distintas e um relacionamento diferente

com seu público / consumidor, expressando outros tipos de arquétipos, não sendo objetivo

deste trabalho esta comparação.

Ressaltamos também a frequente atualização visual e temática de Batman. A presença

constante na mídia gera novas interpretações visuais do personagem, novos conceitos,

introduzindo ou reestruturando personagens, alterando o visual do personagem sem, no

entanto, perder sua essência básica. Essa renovação faz com que a marca continue sempre

presente na mente do consumidor, propicie novas linhas de produtos, novos designs e

customizações e mantenha Batman atualizado frente aos concorrentes.

O público consumidor de Batman varia. Na apresentação de mídia da marca elaborada

e fornecida pela Warner Bros, o público-alvo é divido em meninos de 6 a 10 anos,

adolescentes de 12 a 17 anos, e adultos de 18 ou mais. Porém, a própria Warner revê este

target de licenciamento, localizando-o em público infantil (Kids - 4 a 8 anos) e pré-

adolescente (tweens - 9 a 12 anos), do gênero masculino31

. Entre os licenciados, há uma

amplitude maior desta faixa etária (variando conforme o produto), porém com predominância

entre o público masculino. De modo geral, produtos contendo o personagem são voltados para

o consumidor kids, porém, as empresas licenciadas reconhecem a grande penetração com

todas as idades, independente de gênero.

Como apontam James Santos, da Molin do Brasil, e Mônica Martins, da M. Agostini,

ambos do setor de marketing, um aspecto interessante é o respaldo de Batman junto com os

pais, muitos deles fãs que cresceram com o super-herói e hoje influenciam no gosto do filho.

Esta observação é bastante importante, uma vez que a decisão de compra, quando falamos de

consumidor infantil, é dos pais, ou seja, os produtos precisam de sua aceitação. Muitas vezes,

estes presenteiam os filhos com artigos do Batman por terem certa familiaridade e contato

com o super-herói, fator que não ocorre com personagens mais recentes.

31

Não existem dados ou observações a respeito de classe social.

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Batman é escolhido por ser um personagem forte com o público masculino e estar

ligado à aventura.

Para a Warner Bros., nem todos os produtos têm um rendimento alto com a marca.

Segundo o Gerente de Produtos da empresa, os produtos devem ter uma relevância dentro do

universo do super-herói, fazer parte do seu universo: são os chamados produtos story-tellers

(como uma webcam do Batman, por exemplo). Estes licenciamentos teriam melhor

resultados. Entretanto, encontramos a marca Batman presente nos mais variados artigos, como

curativos band-aid, lancheiras, cosméticos, artigos de higiene, vestuário, material escolar, etc.

Não tivemos acesso aos índices de venda para formular um comparativo, pois esses dados não

podem ser fornecidos por restrições contratuais entre licenciador e licenciados, contudo, a

maioria das empresas que ouvimos afirmaram terem tido resultados bastante satisfatórios com

a aplicação da marca.

A única exceção fica por conta da Multilaser, empresa de acessórios de informática.

Segundo Deise Somayama, do departamento de marketing, a empresa teve vendas abaixo do

previsto em virtude de erros estratégicos cometidos durante o processo de desenvolvimento

dos artigos licenciados. A obtenção da licença cinema vinculou os produtos (acessórios como

mouse, teclados, mousepads, etc.) ao filme O Cavaleiro das Trevas. Foi escolhida uma linha

de alto padrão da empresa para customização com o personagem, o que encareceu demais o

produto em relação a similares do mercado e mesmo da própria empresa. Por fim, com a saída

do filme de cartaz e a consequente diminuição de interesse sobre ele dentro da mídia, as

quedas acentuaram-se mais, gerando um estoque inesperado de produtos.

Perguntada sobre a experiência descrita, Deise afirmou que o problema, neste caso

específico, estava basicamente em ter se adquirido a licença do filme, sazonal por definição, e

aplicá-la em uma linha de produtos diferenciada, o que gerou preços muito altos e não

competitivos.

Em contrapartida, Deise afirma que possuir a licença de Batman é uma grande vitrine

e diferencial, trazendo valor agregado à marca Multilaser. A empresa possui também a licença

para linha comics, mas aguarda um melhor momento para utilizá-la.

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Figura 10

Exemplo de produtos com licença Batman

Kit escolar (caneta multicor

hidrográfica, apontador, lápis preto,

lápis de cor, caneta hidrográfica) –

Molin do Brasil. – Linha Comics

Mochila – Xeryus – Linha Comics.

Cadernos – Tilibra – Linha Comics

com imagens da HQ e Linha Cinema

Batman Begins

Xampu e condicionador - Mega Kyds –

Linha Comics

Caixas de som para computador e

Mouse – Multilaser – Linha Cinema

Batman Begins.

Bicicleta – Bandeirantes – Linha Batman

Animação.

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Curativo Band-Aid e escova de dente –

Johnson e Johnson – Linha Comics

Abajur e luminária – Startec – Linha

Comics.

Como aponta Arnaldo Rabelo:

Não é qualquer marca ou personagem que obterá sucesso no

processo de licenciamento. Algumas condições são necessárias. A marca ou

personagem deve ter não apenas um grande reconhecimento e exposição,

mas deve ter no público o que chamamos de "defensores da marca" ou "fãs

da marca". São aqueles que indicam e defendem espontaneamente a marca,

que criam fã-clubes, que até tatuam no corpo a marca. Isso exige não só uma

exposição maciça, mas o aprofundamento da essência e da personalidade da

marca, de seu contexto, o uso consistente de associações a determinados

valores, que são reconhecidos, identificados e valorizados pelo público. A

marca ou o personagem devem contar uma história que deixe claro seu valor

simbólico. (RABELO, 2009, on-line...)

Batman é um personagem que mantém um relacionamento de anos com seu público,

atravessando gerações. Este relacionamento baseia-se em uma imagem da marca forte

gravada na mente do público e mantida viva pelos filmes de cinema e desenhos animados. A

Warner Bros. procura sempre atualizar , mas conservando-se fiel a sua essência. Esta imagem

é passada aos produtos licenciados, trazendo um conteúdo simbólico forte que, mesmo não se

refletindo em vendas diretas, como o caso da Multilaser, traz visibilidade na importância da

associação da empresa com uma marca como Batman.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A apropriação de personagens da indústria do entretenimento como marca comercial

através do licenciamento, é um procedimento comum dentro do ambiente de consumo.

Diferentes dos personagens criados para a marca, os licenciados apresentam uma origem

distinta e, em virtude de seu sucesso, passam a agir como marcas também.

J. N. Kapferer (1985 apud MONTIGNEAUX, 2003, p.195) apresenta três dimensões

na qual os personagens de marca se aproximam do consumidor infantil:

Dimensão de expertise – Os personagens devem ser competentes e possuir certa

credibilidade para falar do assunto;

Dimensão da honestidade – O personagem deve acreditar naquilo que diz e falar com

o máximo de franqueza;

Dimensão afetiva – O personagem deve transmitir emoções e tocar a criança nos

aspectos e nos assuntos que lhe digam respeito.

Os personagens licenciados se apresentam basicamente nesta terceira dimensão.

Oriundos32

dos livros, HQs, filmes de cinema ou televisão, etc., são apropriados como marca

e criam um relacionamento diferenciado com o consumidor, originado na imersão

proporcionada pelas suas histórias. É neste caso que se encontra o super-herói Batman.

Batman é fruto da época conhecida como Era de Ouro dos Quadrinhos, nas décadas de

1930 e 1940, nas quais surgiram inúmeros heróis e super-heróis que lutavam contra vilões

igualmente incríveis, salvavam donzelas em perigo, defendiam os fracos e oprimidos, sempre

com segurança e coragem inabaláveis. Estes personagens extraordinários tinham em comum

as referências mitológicas e científicas, poderes e habilidades fora do comum, e uniformes de

visual ousado e extravagante, sendo apresentados ao público sempre em aventuras repletas de

ação.

Naqueles tempos, o apelo da maioria dos personagens era basicamente o mesmo,

contudo apenas alguns se destacaram e uns poucos persistem até hoje. Entre os

“sobreviventes” está Batman, que conquistou grande popularidade e conseguiu mantê-la alta,

através de seus filmes de cinema, HQs e desenhos animados, tornando-se, por meio do

licenciamento, uma das principais marcas da Warner Bros. (e a principal marca na linha de

licenciamento de super-heróis).

32

Os personagens licenciados podem também ter começado como brinquedos, como a boneca Barbie ou os

carrinhos Hot Wheels, ambos propriedades da empresa Mattel do Brasil Ltda, expandindo-se depois como marca

licenciada em outros produtos e até filmes de animação ou os chamados live action (com atores reais).

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108

Não dispomos de dados que informem precisamente sua popularidade e índices de

venda de seus produtos licenciados, porém podemos estimar grandes cifras baseados em

pesquisas publicadas anteriormente com o personagem e por informações dadas pelas

empresas que se utilizam do personagem, inclusive da própria Warner Bros., proprietária da

marca.

Através da análise do super-herói, baseada na estrela de identidade de Nicolas

Montigneaux (inspirada no estudo de identidade de marca de Kapferer), feita no capítulo V,

levantamos as principais características de Batman como marca.

Primeiramente, é importante ressaltar que este Batman é diferente do Batman visto nas

histórias em quadrinhos publicadas mensalmente. O Batman das HQs sofre ferimentos graves,

desaparece por tempos, muda de uniforme, de identidade, etc., em um sistema de histórias

seriadas e cronologicamente sequenciais típicas deste gênero de HQs, nas quais existe a

flexibilidade de se mexer em pontos importantes dentro do universo do super-herói. Como

afirma a própria Warner Bros.33

, o público que acompanha as revistas em quadrinhos é

diferente do público consumidor da marca, e as aventuras das HQs não interferem de forma

nenhuma na configuração da licença Batman.

O Batman do qual tratamos aqui é uma marca formada por anos de relacionamento

com o público, que segue características imutáveis, porém sempre atuais, propagada,

sobretudo, através dos filmes de cinema e dos desenhos animados - que por motivos

estratégicos, também são desvinculados da cronologia dos quadrinhos, e procuram alterar o

mínimo possível o personagem. Batman deixou de ser somente um personagem dramático

para ser uma marca comercial, uma entidade própria que representa um conjunto de

características emblemáticas e que age através de um vínculo que não pode ser mudado

radicalmente sob risco de quebrar-se.

Como dito acima, o público que tem afinidade pela marca Batman não é o mesmo,

necessariamente, que acompanha as HQs. São pessoas que conheceram a marca por caminhos

distintos e que se identificam pelo que ela comunica. Este público é bastante diversificado,

formado por artistas, intelectuais, pessoas comuns e consumidores, diferenciando-se quanto

ao relacionamento com a marca e perfil de público. No caso dos produtos com a licença

Batman, o público alvo, proposto pela Warner Bros. e pelas empresas licenciadas, é na

maioria masculino e com idade entre 4 e 12 anos. Não existe ainda, um estudo mais

33

A negociação para publicação das HQs do personagem Batman é feita pela empresa DC Comics, subsidiária

do grupo Time Warner, responsável pela publicação das revistas em quadrinhos nos EUA e no mundo,

diretamente com as editoras nacionais, não tendo nenhuma relação com o licenciamento de produtos feitos aqui,

no Brasil, pela Warner Bros. (South) Inc..

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109

aprofundado sobre o perfil deste consumidor. Nicolas Montigneaux nos apresenta pistas que

corroboram com este perfil:

De 4 a 9 anos, o imaginário da criança está em pleno

desenvolvimento. A marca pode lhe fazer propostas de aventuras (os piratas,

os cavaleiros...), de descobertas (as estrelas, os animais, os países

longínquos), de magia.

De 9 a 11 anos, a expressão da marca poderá modificar-se para se

abrir sobre representações mais próximas da realidade. A criança começa a

se afirmar. Vai se integrar nos grupos de amigos que assume uma

importância cada vez maior em detrimento do melhor amigo. A partir dos 11

anos, a marca deverá voltar as costas para representações infantis. Ela

comporta valores próprios ao universo do pré-adolescente (dinamismo,

transgressão). (MONTIGNEAUX, 2003, p.99 a p.101)

De um modo geral, as crianças a partir dos dois anos já buscam uma compreensão do

que acontece ao seu redor. Este processo é uma combinação de seu próprio desenvolvimento

interno relacionado com seu amadurecimento em um foco cognitivo (percepção e

aprendizagem), e fatores externos relacionados ao seu convívio no meio ambiente do qual faz

parte com foco social nos relacionamentos, interações e na formação de sua própria

personalidade. À medida que cresce, a criança adquire uma percepção cada vez mais

profunda e maior capacidade crítica. Através dos processos cognitivos, ela interpreta o mundo

ao seu redor, propondo, intuitivamente, uma adaptação dentro de sua capacidade de

entendimento. Neste processo há o convívio social que apresenta à criança, pouco a pouco, o

conjunto de regras vigente, fundamental para sua formação e atuação dentro deste meio que

ela exercerá em um processo empírico constante de imitação, tentativa e erro.

Quando se inicia o período escolar, a criança passa a ter um convívio muito maior com

outras crianças, num primeiro processo de interação social. No período do ensino

fundamental, elas passam a se organizar em grupos separados por gêneros. Os motivos dessa

separação ainda não são totalmente explicados, mas sabe-se que as meninas rejeitam as

formas de brincadeiras dos meninos. Estas formas, mais agressivas e competitivas, aliam-se à

fantasia presente nos conteúdos apresentados a eles, fascinantes e ao mesmo tempo

compreensíveis, estimulando o gosto de muitos meninos pelos super-heróis.

Os super-heróis trazem a promessa de aventura e fantasia à criança, mas também

funcionam como uma representação de pessoas pertencentes ao seu meio. A relação da

criança com estas pessoas (pais, professores, parentes, irmãos e amigos) - membros de seu

microcosmo, divididos em funções e importância e que podem agir como mentores, modelos

ou companheiros - influencia diretamente em seu processo de aprendizagem e cognição

social, ajudando-a a formar seus conceitos de si mesma e do meio, descobrindo seu papel e

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110

como exercê-lo. Encontramos respaldo em Vygotsky (REGO, 2000, p.111) que afirmava que

“a imitação de modelos fornecidos pelos sujeitos assume um papel estruturante, pois amplia a

capacidade cognitiva individual”.

No nosso caso, quando falamos de Batman estamos falando de um super-herói

singular para criança. Provavelmente, ela não estará interessada em saber que o personagem

tem 70 anos de existência ou acompanhará mês a mês suas aventuras nos quadrinhos. Para

ela, a princípio, Batman é tão importante quanto qualquer outro super-herói, pois “a origem

dos personagens não presume o status mais ou menos importante que lhe dará a criança”

(MONTIGNEAUX, 2003, p.104). Mas, se houver um eco de ressonância entre a criança e

aquilo que ela assiste nos desenhos animados ou filmes de cinema do personagem, ela

investigará mais a fundo, podendo iniciar um relacionamento com o super-herói que, a partir

daí, não será somente mais uma personagem. Neste relacionamento que se inicia que atuará a

comunicação da marca. Em Batman ela encontra vários meios para identificar-se.

No capítulo V, vimos que as características que mais se destacam no personagem

Batman são: a) ausência de super poderes (Batman é uma pessoa normal); b) sua

determinação férrea e grande força de vontade; e, c) os equipamentos usados no combate ao

crime.

Mas como a criança percebe e reage frente a este perfil do personagem? Partindo das

observações de Nicolas Montigneaux, podemos traçar algumas hipóteses.

O personagem é um modelo inspiracional que deve ajudar, conduzir

a criança para o status de adulto. É pelo fato de o personagem propor à

criança um modelo de comportamento e um projeto que o processo de

identificação poderá ocorrer. (MONTIGNEAUX, 2003, p.109)

Batman é, ao mesmo tempo, um mentor e um companheiro. Não é super-poderoso,

como outros super-heróis que fazem a criança se sentir inferiorizada ao se comparar a estes

semi-deuses34

, mas um homem comum que dá o máximo de si no cumprimento de sua

missão e na preservação de seu mundo. Batman prega valores de honestidade e determinação,

ao mesmo tempo em que assume uma atitude própria da criança, com a qual ela pode se

identificar, ao fantasiar-se de morcego para enfrentar seus inimigos, assumindo seu próprio

medoe dispondo de seus “brinquedos” para ajudá-lo em sua missão.

O herói mostra à criança, sem lhe dar lições de moral, que são as

suas qualidades que lhe permitem enfrentar as dificuldades, alcançar o

sucesso e, finalmente lhe dão uma oportunidade de crescer, de se elevar, para

34

Como o Superman, volta e meia, apontado como o exemplo do super-herói todo-poderoso com o qual “tudo é

mais fácil”.

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111

se tornar mais segura de si, mais serena e mais forte. (MONTIGNEAUX,

2003, p.128)

O universo de Batman (Gothan City e a Bat-caverna), além dos vilões, também

contribui por constituir-se do palco no qual a criança verá encenado “dramas” com os quais se

identifica, não em uma representação de um mundo infantil, mas de um mundo adulto em

uma visão infantil, através das cores, das vestimentas, dos personagens e seus apetrechos e

das batalhas.

Batman também é um personagem transgressor. Ele age de acordo com sua própria

consciência e de seu código do que é certo ou errado, muitas vezes infringindo a lei em nome

da justiça. A criança não compreende esta ambivalência, mas percebe a liberdade que o super-

herói tem ao atuar escondido por sua máscara, „agindo pelas sombras‟ (MONTIGNEAUX,

2003, p.114).

A escolha de Batman pela criança também acontece através do grupo de amigos.

Através das brincadeiras, as crianças encenam papéis dentro de um contexto de preparação

para sua atuação dentro da esfera social. Ao mesmo tempo, ela adquire, a partir dos 6 ou 7

anos, a noção de grupo no qual o pensamento coletivo tem grande importância, inclusive

sobre o pensamento individual (REGO, 2000, p.113).

A atuação de Batman em grupos de super-heróis, mostrada nos desenhos animados da

TV Liga da Justiça e Os Bravos e Destemidos, propõe uma brincadeira em grupo e um

convívio social do personagem, trazendo novas possibilidades à criança. Ao mesmo tempo,

não se perde o aspecto solitário do Homem-morcego que se explícita na cooperação ocasional

com outros personagens.

A criança também pode obter contato através dos pais, uma vez que Batman atravessa

gerações e o gosto pelo personagem pode ser passado de pai para filho, através da

apresentação direta (o pai mostra ao filho) ou indireta (o filho influencia-se pelo gosto do pai).

As crianças tendem a ser bastante permeáveis aos estímulos exteriores, porém isto não

exclui seu senso crítico, mesmo que por critérios simplistas ou superficiais. A criança aprende

a distinguir o que quer e o que gosta desde cedo. Assim como aprende a se entender e avaliar,

passa a avaliar o próximo, e isto inclui os personagens. Ela entende o uso do super-herói

como marca, mas sua primeira preocupação é o personagem e não o produto, que fica em

segundo plano. A partir dos 7 anos, a criança já entende os princípios constitutivos da marca e

a exprimir sua preferência. Ao mesmo tempo, ela identifica o personagem nos produtos

licenciados como o mesmo que está nos filmes ou desenhos animados (sua principal fonte de

conhecimento sobre ele), estendendo sua afinidade para o consumo de seus produtos, em um

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mecanismo de ação motivado pela força da marca. Através dos itens consumidos, a criança

busca se aproximar mais do super-herói e do seu universo.

O personagem é uma representação com imagens que integra a um

tempo a realidade física da marca e também a realidade psíquica da criança.

Por desempenhar o seu papel de mediador, o personagem deverá integrar

essas duas dimensões. É nessas condições que a comunicação entre a marca

e a criança poderá se estabelecer corretamente. (MONTIGNEAUX, 2003,

p.117)

Da mesma forma que acontece com marcas de grande carisma, as empresas

licenciadas não anunciam produtos, elas promovem o Batman, o contato e a interação com o

personagem através dos produtos. Para a criança, ao adquirir um produto do Batman, ela

estará ingressando no mundo do super-herói, ora como parceira, ora como o próprio herói. “A

sua escolha se faz ao se identificar de maneira espontânea e de livre vontade com o

personagem, muito simplesmente porque ela tem o desejo de se parecer com ele”

(MONTIGNEAUX, 2003, p.128). O relacionamento, identificação e admiração ao super-

herói são o motor do processo de comunicação dos produtos Batman, apresentados dentro do

universo da criança que os consome para estar ao lado do super-herói.

A utilização do licenciamento de personagens como estratégia de comunicação a

serviço do marketing é uma prática que vem crescendo bastante no Brasil. O artifício cujos

personagens, normalmente, da indústria de entretenimento, são apropriados como marca em

diversos produtos tem se mostrado eficaz, sobretudo em trazer retorno para empresa através

da exploração do relacionamento estabelecido entre o personagem e o espectador fora de um

ambiente essencialmente comercial, mas em um ambiente de diversão no qual a imersão é

maior. Contudo, não podemos generalizar supondo que qualquer personagem licenciado,

herói ou não, que apareça na embalagem irá sempre vender o produto (tomando em linhas

gerais), pois, independente do produto em si, o personagem precisa ter um relacionamento

com o público, ou seja, a criança possui um olhar crítico, sabendo escolher o que gosta ou

não, o que acredita ou não. O licenciamento não é sempre igual e cada personagem se destaca

por sua própria força e empatia com o público. As empresas devem estar atentas antes de

obterem uma licença de um personagem sobre sua presença e força com o público. Muitos

personagens experimentam momentos de grande sucesso, mas, se não tiverem um vínculo

forte e capacidade para mantê-lo, fatalmente cairão no obscurantismo, perdendo sua força

comercial.

No caso de Batman, seu sucesso como venda se apóia no relacionamento construído

ao longo de anos de contato com o público (que passa por gerações) e, entre outras coisas já

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demonstradas, por um perfil independente, ou seja, que remete a temas universais da história

do ser humano sem ligações políticas ou comerciais que possam causar desconfiança no

consumidor.

Batman logra êxito tanto ao concorrer contra personagens mais novos quanto com

outros mais antigos, chamados clássicos. Dentro do mecanismo de consumo, Batman é uma

marca com uma personalidade e um vínculo forte e duradouro já estabelecido ou facilmente

captado pelo consumidor. O ato de compra de seus produtos é visto como uma forma de

aproximação e contato e não como um negócio comercial, atraindo a atenção do público para

o universo fantástico do super-herói.

A estratégia de comunicação de mercado através do licenciamento se fundamenta

neste pólo de atração, através do relacionamento personagem-espectador, buscando fortalecê-

lo sempre e transferir suas qualidades para que haja a consumação do ato da venda,

trabalhando o super-herói, promovendo e apoiando-se em todas suas aparições na mídia. Ela

não funcionará apenas pela aparência ou qualidades do produto, muitas vezes, nem mesmo as

mencionará, mas prioritariamente pela promessa de imersão no universo imaginário do

personagem.

Batman, desde 1989, deixou de ser apenas um popular super-herói da indústria de

entretenimento para se tornar uma importante e rentável marca guarda-chuva, englobando

diversos produtos e movimentando consideráveis cifras.

A conclusão deste estudo evidencia dois pontos básicos complementares entre si.

Primeiro, que o uso de licenciamento dentro da estratégia de comunicação mercadológica é

uma opção eficaz e eficiente para a empresa que busca um diferencial ou o apoio de uma

marca consagrada. No caso do licenciamento de personagens da cultura de massa, a reputação

que estes carregam será transferida aos produtos alterando a percepção do consumidor do

âmbito comercial de compra e venda para um âmbito de entretenimento e extensão de sua

experiência junto ao personagem.

Em um segundo ponto, temos o personagem Batman. Ao analisarmos sua condição

como marca através do licenciamento aplicado a diversos produtos, pudemos perceber o

quanto seu desempenho em vendas é afetado pelo seu relacionamento junto ao seu público. A

construção de sua imagem e reputação, através dos anos, gerou as características da marca,

alheias a mudanças ocorridas nas HQs e em outras obras, na constituição de uma identidade

própria e única, amplamente reconhecida e facilmente captada pelo público infantil.

Por fim, este trabalho contribui com informações para outras análises de personagens

da indústria de cultura de massa apropriados para o universo das marcas na comunicação de

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mercado a serviço do marketing, na forma do licenciamento, destacando a atenção dispensada

à reputação do personagem, à relação entre licenciador e licenciado e o conhecimento do

público alvo. Contribui também ao fornecer mais pistas sobre o processo de consumo de

produtos pelo público infantil, motivado por suas crenças e opções e influenciados pelo

convívio da criança dentro de seu meio ambiente, suas percepções e sua própria formação.

Propomos a continuação deste trabalho através da verificação quantitativa das

hipóteses aqui levantadas sobre a popularidade e força deste super-herói clássico e paradoxal:

Batman.

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ANEXO 1 - Apresentação de Kit de mídia para licenciamento

da marca Batman

Fonte: Warner Bros. (South) Inc., obtido em março de 2008

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ANEXO 2 - Entrevista com licenciador

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Entrevista com a Warner Bros. (South) Inc., realizada em 10 de novembro de 2009, às

14h00, na sede da empresa, em São Paulo, com um dos Gerentes de Produto responsável pelo

setor de licenciamento. Este anexo contém um relatório da entrevista, aprovado pelo

entrevistado, uma vez que a mesma não pode ser gravada.

Mario: Qual a dimensão da marca Batman? No Brasil?

Warner Bros.: Batman está entre os principais (líderes) personagens clássicos e é o

número 1 dos super-heróis. Seu posicionamento é com o público masculino infantil (no caso

de produtos). Sua popularidade é constante, porém ela sofre grandes altas durante as

campanhas dos filmes, sempre, depois, baixando, mas voltando em um patamar maior:

WB: Este crescimento se dá mesmo que a criança não assista ao filme, mas pelo fato

de haver grande exposição do personagem na mídia.

O Brasil é o 3º pais do mundo em vendas de produtos do Batman, atrás dos EUA e da

Inglaterra.

WB: O principal público-alvo dos produtos Batman é o público infantil (4 a 8 anos),

diminuindo bastante após os 8. O público tween (9 a 12 anos) é muito pequeno.

Mario: Ela é sazonal ou se mantém regular durante os períodos de licenciamento?

WB: O Batman mantém uma popularidade constante. Obviamente suas vendas

aumentam muito quando há algum grande evento envolvendo o personagem. Em períodos

normais, suas vendas crescem bastante (podendo chegar a 70 a 80% das vendas anuais) em

Natal e dia das Crianças.

Mario: Como você avalia a influência dos desenhos, filmes e HQs do personagem em

relação a seu desempenho como marca?

F

ilme

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WB: As HQs são um nicho diferente, mais adulto, de fãs específicos, que não

consomem muitos dos produtos Batman. As aventuras da HQs não interferem nos universo

dos produtos, é outro Batman.

WB: Os filmes promovem muito e aumentam bastante a venda apenas durante sua

temporada, estabilizando depois.

WB: Os desenhos, por outro lado, são uma “publicidade” constante, promovendo e

mantendo, sustentando o personagem sempre vivo na memória do público -> Alimentação

básica da marca, atua com grande peso, talvez responsável por 50% pelo share-mind do

personagem

Mario: Qual a imagem que se tem do super-herói Batman? Pode comparar com outros

personagens (super-heróis ou não)?

WB: Bom, partindo do pressuposto que um personagem é uma entidade com

personalidade e valores, o Batman se destaca por suas características próprias:

Apetrechos (acessórios) – Batman possui uma infinidade de acessórios (que

podem ser fabricados), ou seja, possui seus próprios “brinquedos”.

O Batman é uma pessoa normal, dotado apenas de treinamento e armas;

A criança consegue se ver como o Batman, usar sua mascará, ter seus bat-

acessórios.

O Batman é sombrio, mas o sombrio que aparece nos desenhos e nos produtos

é um sombrio mais amenizado. Além que hoje as crianças tem bem menos

medo que antes.

WB: Ao contrário do Batman, o Superman não tem mascará, e ele tem tudo que a

criança não tem. Além do mais, o Super é um alienígena. O Homem-aranha tem uma grande

exposição além q também usa mascará, é bastante plástico em suas poses e movimentos e sua

é essência humana.

WB: Quanto maior a identificação e aderência do personagem maior consumo.

WB: O Ben10 (personagem que está fazendo muito sucesso atualmente) é um

modismo e não deve durar muito ao passo q o Batman é um clássico que dura muitos anos.

Mario: Existe algum trabalho de comunicação da marca Batman ou ela se apóia

apenas na popularidade do personagem?

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WB: Não existe uma comunicação especifica da marca por parte da Warner, sendo

uma comunicação inerente através do personagem em suas diversas aparições na mídia. De

tempos em tempos, são feitas ações institucionais que aumentam as vendas pela exposição.

Mario: Como é a comunicação do personagem nos produtos?

WB: Não basta ter o personagem apenas no produto. O produto deve ter uma

relevância dentro das características, do universo do personagem. São os produtos story-

tellers, tipo algo que possa fazer parte do universo do Batman, como uma webcam do

Batman. A Warner considera esses como os melhores produtos do Batman, que têm melhores

vendas. Nem todo o produto é bom para receber o licenciamento. Os story-tellers são os

melhores, mas em outros casos, o licenciamento é menos proveitoso.

Mario: Existe algum pré-requisito, restrição, ou cuidado ligado à marca para quem

quer ser licenciado?

WB: Apenas de natureza financeira (a empresa deve ter uma situação de crédito e

poder arcar com os custos) e jurídica.

Mario: Quais as formas de licenciamento disponíveis do personagem (linhas)? Quais

as diferenças entre elas em termos de marca?

WB: Basicamente há três linhas que se dividem em:

Linha filme – material sobre os filmes Batman Beggins e Batman Cavaleiro

das Trevas

Linha Comics – um Batman mais tradicional igual ao clássico das HQs

Linha Animated – o Batman dos desenhos animados.

WB: Dentro destas três divisões, temos diversas subdivisões cada uma com seu style-

guide, como é o caso do atual da linha animated, The brave and The Bold, inspirado nos

desenhos animados atuais do personagem. Os style-guides vêm com diversas ilustrações,

fundo, textos, para serem usados nos produtos, sugestões de fundos e logotipos. Não há

restrição entre o uso do símbolo ou do desenho do personagem, desde que ambos pertençam à

mesma cartilha.

Mario: A Warner faz um acompanhamento ou assistência aos licenciados

(acompanhamento de vendas, sugestão de estratégia de promoção, como usar o personagem)?

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WB: Sim, cada gerente de produto faz um acompanhamento do licenciado, vendo suas

vendas, uso da marca, propondo estratégias, ações cooperadas, dando todo suporte necessário.

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ANEXO 3 - Entrevistas com licenciados

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1. Mega Kyds Cosméticos Ltda. EPP – Cosméticos - respondido por Lucci Vitale,

Departamento Comercial, através de entrevista presencial, gravada em áudio, em

19 de outubro de 2009, às 14h00, na sede da empresa.

Mario: Como o Batman ajuda a vender os produtos?

Lucci Vitale: Não temos uma linha própria para comparar, mas com uma análise de

mercado que foi feita pegando como base outros produtos não licenciados, descobrimos que,

tendo o produto licenciado com o Batman, teríamos um acréscimo de 40% a mais na linha de

cosméticos do que numa linha própria .

Mario: E de onde foi tirada essa estimativa?

LV: Na verdade foi assim: pegamos uma linha de produtos não licenciados, como

Shampoo infantil, de amigos e concorrentes nossos e depois comparamos com os mesmos

produtos de vendas, e, é claro que não temos as mesmas vendas do concorrente, mas

conseguimos vender 40% a mais que os produtos não licenciados, isso foi comparado nos

postos de vendas. Por isso, no contexto geral, pode ser menor do que os 40%.

Mario: Em sua opinião, qual é o valor que o personagem Batman agrega ao produto?

LV: Por ser o Batman, ele agrega um valor muito alto. Em um xampu de mesma

dosagem consigo vender a um preço de R$7,00, e um não licenciado que sai a R$5,00, então,

é o que eu consigo agregar, por ser licenciado. Tenho outros produtos licenciados, como o

Superman, na qual vendo a R$6,00, então consigo maior venda até mesmo que o Bob

Esponja, até mesmo por ser um personagem antigo que os pais conhecem, então ele tem maior

influência.

Mario: Uma curiosidade: você me disse que o Batman agrega mais valores que o

Superman. Como isso pode acontecer, já que os dois são personagens contemporâneos, tendo

uma diferença de um ano e pouco, e são personagens diferentes, então porque você acha que o

Batman tem mais sucesso que o Superman?

LV: Na verdade, quando comprei a licença do Batman com a Warner, eles mesmos me

disseram que, com o Batman, a venda seria maior do que com o Superman. O Batman é mais

real; o Superman voa, porém o Batman também “voa”, mas em proporções menores: ele pula

de um prédio e usa a capa para chegar ao chão, então ele é mais próximo a realidade de uma

criança, apesar de ter todas as coisa absurdas como todo o super herói. Só que eu o considero

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mais próximo a realidade e de não ter tantos poderes quanto o Superman, que tem raios que

saem dos olhos. O Batman se machuca e isso acaba agregando mais ao personagem e as

crianças gostam mais. E outra coisa que ajuda seria o filme do Batman e, esse último, como já

foi visto “recentemente” em relação ao do Superman, que não se lançou mais filmes, sendo

assim a produção do Batman acaba estourando na mídia e ficou ainda mais conhecido

perdendo para o Titanic como o segundo filme mais assistido.

Mario: Você tem algum público-alvo?

LV: Sim, o nosso público alvo são crianças na faixa etária de 4 a 12 anos e temos a

linha teen que pode até chegar aos 16 anos, mas o nosso foco são de 4 a 12.

Mario: Teve algum critério ou parâmetro para escolher o Batman, porque pela

embalagem que tenho em mãos estou vendo o Batman dos quadrinhos.

LV: A nossa licença é da DC Comics.

Mario: E a Warner diferencia os vários Batmans... então, gostaria de saber porque

essa escolha? Teve algum motivo para isso?

LV: Não, na verdade quando eles nos ofereceram para cosméticos eles já vieram com

esse da DC Comics, por que se dividem entre eles qual o melhor Batman para esse tipo de

produto. Eles já sabem qual é o melhor para cosméticos e isso e para qual banca é escolhida.

Mario: E há quanto tempo vocês tem a licença do Batman?

LV: Temos a licença há dois anos e meio

Mario: Então essa licença foi antes do Cavaleiro das Trevas?

LV: Pegamos há um ano e pouco antes do filme

Mario: Deu para sentir uma diferença no sentido fora do período do filme que o

personagem se mantém por si?

LV: Então, logo que começamos a empresa compramos a licença do Batman e logo

em seguida veio o problema da substituição tributária e isso atrapalhou um pouco e tivemos

que aumentar um pouco o valor dos produtos. Então, no começo da empresa não deu para

fazermos um parâmetro de vendas, e ficamos 6 meses vendendo assim e conseguimos nos

estabelecer e nos manter no mercado, lembrando a nossos clientes que dali a 6 meses viria o

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filme, então logo após o filme, estouramos em vendas e dobramos o faturamento. Já neste

ano, ele deu uma estagnada maior na venda do que na época do filme.

Mario: Você acha que o Batman, sendo um personagem, ele mantém um publico,

digamos, assim fiel?

LV: Sim, ele se mantém em uma constante mesmo sendo um personagem de outros

tipos de Batman como na TV não a mão nesse tipo de CD comics ai chego re brigo com

alguém dizendo pelo elo

Mario: Quais os outros personagens você tem?

LV: Temos também o Pica Pau, da Universal, Moranguinho da Publicarte e o Batman

e Superman, da DC Comics.

Mario: E quanto a diferença do Batman com relação a outros personagens, já que no

momento estamos na onde do Ben 10.

LV: Hoje temos a onda desses novos heróis como Ben 10, mas são moda, eles duram

de 2 a 3 anos e somem. Já com o Batman, ele não sai de moda. Temos assim, o Batman

super-herói desde a sua criação (1939) e ele não acaba, por isso foi a escolha da empresa.

Mario: Porque o Batman e o Superman foram escolhidos?

LV: Foi pelo fato de uma pesquisa antes de abrir a empresa e vimos que se lançava

linha de cosméticos mais para meninas que para meninos, então optamos pelo Batman e

Superman por serem antigos e era um que não se tinha há 3 anos atrás, então optamos por eles

mais pelo Batman

Mario: Você tem uma percepção de que o publico escolheria o Batman por ser mais

realista. Você acha que o público, no caso a criança, tem essa mesma percepção para escolher

o Batman? Que ela se encanta com o Batman mais que o Superman?

LV: A criança consegue distinguir sim, por ser uma coisa mais provável de fazer do

que um super poder de outro super-herói, que ela não é capaz de fazer. Já com o Batman é

mais luta corporal, coisas mais próximas da realidade. Ela percebe que isso está ao seu

alcance. E isso faz com que ela goste mais dele. Por exemplo, com o Ben 10, que tem o

relógio em que ele se transforma em monstros, a criança acha muito legal, mas a medida que

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ela cresce, vai perceber que ela busca mais a realidade e por isso opta pelo Batman, e foi isso

que a Warner nos passou, e foi visto que a criança percebe mais.

Mario: E a criança, ela faz uma leitura do comportamento do personagem como seria

essa leitura? O que podemos ter como base nisso?

LV: Explicar isso é difícil, mas como temos estudos realizados pela Warner e pelo

Cartoon Network, eles nos mostram que as crianças gostam mais de coisas próximas a

realidade, que podem acontecer com elas.

Mario: A respeito dos produtos vejo que tem squeeze, esponjinha Xampu, e isso

agrega em que já, que vimos que nos filmes ou desenhos não se mostra cenas do Batman, por

exemplo, tomando banho, escovando os dentes, fazendo a barba ou outras coisas do

cotidiano?

LV: O interessante é que temos uma linha de produtos como Xampu, condicionador,

Xampu 2x1, Gel fixador, enfim e temos alguns itens que fazemos de brinde, tipo um quite

onde se tem um Xampu e um condicionador e mais uma máscara do Batman, ou um

bumerangue, ou um squeze, isso para se dar de presente e, como você mesmo disse, nunca

vimos o Batman tomar banho, mas a criança vê isso como uma necessidade dela e por ser do

Batman ela acaba gostando ainda mais, e já vai imaginando o Batman também fazendo.

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2. Multilaser Industrial Ltda. – Acessórios de computador - respondido por Deise

Somayama, Departamento de Marketing, através de entrevista presencial, gravada

em áudio, em 21 de outubro de 2009, às 10h00, na sede da empresa.

Mario: Como o personagem Batman ajuda a vender os produtos da Multilaser?

Deise Somaya: Na verdade não só o Batman como o licenciado em geral...

DS: Os produtos de informática se comotizam muito fácil. Boa parte das empresas que

produzem acessórios de informática, principalmente, são de fora do Brasil, normalmente da

China, e por conta disso, também, a gente acaba produzindo produtos muito parecidos uns

com os outros. Assim, se você for a uma loja de informática procurar um mouse, encontrará

muitos produtos, que se não forem iguais, serão muito parecidos. E para gente se destacar no

mercado, a Multilaser sempre buscou fazer um trabalho de marketing em paralelo com a área

de produtos, então a gente sempre trabalhou com promotor, expositor, melhor embalagem,

enfim tudo que está em torno do produto em si. E nisso tivemos a ideia de lançar um produto

licenciado. Ao invés de vender o mouse comum, a gente pode vender o mouse com

personagem. Isto é realmente uma forma de destacar, não só o produto em si, mas a marca, a

gente acaba sendo uma empresa um pouco mais ousada nesse sentido, nós fomos os pioneiros

na área de acessórios de informática com licenciamento (o primeiro licenciamento que saiu

foi o da Moranguinho, que é nosso, inclusive), e foi realmente um meio de fazer um destaque.

Hoje nossos produtos licenciados não tem volume de venda, o volume é baixo em

comparação aos outros produtos, mas ele acaba sendo um produto vitrine. As vezes a gente

consegue entrar em um cliente novo (lojistas), não vendendo nosso mouses ou teclados que a

gente costuma vender, pois isso todo mundo vai lá oferecer. A gente chega dizendo: nós

somos uma empresa que tem linha de licenciados; nós somos uma empresa que recebeu uma

homologação de uma Warner, de uma Hasbro, de uma Mattel (empresa grandes) então isso dá

um respaldo muito grande para a empresa e o produto acaba sendo um produto que, querendo

ou não, ele capta o comprador, nosso cliente. Então, ele bate o olho e não vai lembrar do

mouse preto e prata porque isso é comum, mas ele vai se lembrar do mouse Batman, ou do

teclado Batman. É uma forma de diferenciação.

DS: Como eu disse, aqui [na Multilaser] a gente não ganha por volume de vendas, até

por que o produto é um pouco mais caro que o produto normal, mas é um produto âncora, é

um produto que faz o cliente olhar para o resto do portfólio.

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Mario: Inclusive uma coisa que eu ia perguntar era sobre a comparação entre o

produto com o Batman e o sem o Batman, o genérico.

DS: O produto Batman é mais caro, obviamente, porque ele tem uma customização

que gera um custo maior (diferenciação nas cores, embalagens, design), o custo do royalt que

a gente paga para o licenciador, aqui no caso é a Warner, e se você contabilizar tudo, ele fica

de 30 até, em alguns casos, 50% mais caro que o preço normal. Vai do grau de dificuldade de

personalização e percentual de royalt. No caso, o da Warner é um dos mais caros que a gente

paga hoje.

Mario: E o Batman tem uma perfomance diferenciada que outro personagem? Você

citou o Hot Wheels, a Moranguinho...

DS: Focando em Batman, especificamente, ele é um dos que tem menos vendas...

Porque ele foi vinculado a um filme, no nosso caso, e o filme já passou. A gente apostou

muito no começo, quando o filme estava em cartaz ou tinha acabado de estrear, mesmo assim

, honestamente, ao repercutiu o volume que a gente esperava e hoje a gente tem um

dificuldade enorme de vender este produto por conta do tema. Pra gente vender temas como

Betty Boop, Hot Wheels e Moranguinho, outros licenciamentos que temos, são temas

atemporais e no caso do Batman, especificamente, foi feito uma linha de acordo com aquele

filme [Cavaleiro das Trevas].

Ds: Isso foi uma coisa que a gente aprendeu: não vincular com um filme porque um

filme tem uma periodicidade de, no máximo, seis meses, e se a gente não vender dentro destes

seis meses a gente perde o produto.

Mario: O Batman que vocês pegaram foi o do filme, não o genérico, da linha comics?

DS: A gente tem também a licença do Batman comics, mas como a gente começou

com o Batman do filme, que estava na época naquele grande “boom”, a gente deixou o

comics um pouco de lado naquele momento. A gente tem de fato aquele licenciamento mas

não produzimos porque temos um grande estoque do Batman do filme, então decidimos

trabalhar com aquele primeiro para depois partir para o comics. Isto foi uma opção da

empresa.

DS: Mas independente disso, nós não conseguimos vender bastante porque o produto é

mais caro e acaba ficando mais como uma questão de vitrine. Ter um produto que é diferente

de qualquer outro e só a gente tem. Esse é o ponto.

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Mario: Por que o personagem Batman foi escolhido? Houve algum critério ou

parâmetro para esta escolha?

DS: A gente começou procurando um licencimento um pouco mais infantil, porque

quisemos entrar nesse mercado, a gente percebeu que o público infantil palpitava, e muito, nas

decisões dos equipamentos de valor, sendo o computador um deles e a gente também

percebeu que hoje em dia as famílias não tem um computador para todos, mas cada um tem o

seu (o pai tem um notebook, a mãe um desktop, a criança também tem um desktop no quarto)

e fomos procurar algo mais na linha infantil. Encontramos na época a Moranguinho, um

personagem mais feminino, que cabia no que estávamos procurando; fizemos a negociação e

lançamos a linha. Quando saiu a Moranguinho, muita gente perguntou: “só tem feminino e o

masculino, vocês não tem nada?” Então tivemos dificuldade em encontrar um personagem

infantil masculino quando pensamos: “por que não o Batman?”.

DS: O Batman é um personagem que cabe não só para criança, mas cabe para adulto,

então a gente pegaria um faixa muito maior de público, desde a criança, o pré adolescente, o

adolescente e o adulto. Naquele momento, era um personagem que se encaixa muito expansão

da linha de licenciados que a gente tava buscando. E, realmente, a negociação coma Warner

saiu bem, e caminhou para isso. Com o tempos percebemos que precisávamos de um

personagem feminino mais adulto e um masculino mais infantil, então pegamos a Betty Boop

e o Hot Wheels, completando a linha de licenciamento.

Mario: E você acha que o Batman tem alguma característica especial em comparação a

algum outro personagem?

DS: O Batman é um personagem forte, bem tradicional, e por que ele e não algum dos

heróis Marvel, ou Superman, ou qualquer um do tipo? No nosso caso, sendo bem honesto, é

por que calhou de estar lançado o filme do Batman e a Warner veio nos sugerir. Ela disse:

“olha eu tenho um leque de personagens, mas o grande „boom‟ agora vai ser com o Batman.

O que eu tenho de oferecer de melhor, de mais atual, é o Batman vinculado a esse filme.”

DS: Na verdade, veio da Warner essa sugestão. Eles já tinham feito um estudo, tinha a

questão do plano de lançamento do filme, e eles trouxeram uma proposta que a gente sentiu

que era mais interessante, ou seja, tinha todo o filme ajudando a divulgar nosso produto, um

filme que servia de âncora para nossas vendas e, em contra partida, existiam outros

personagens que não tinham isso. Os heróis Marvel, por exemplo, são tradicionais, mas não

tinham nada disso. Não foi por acaso, mas foi muito por conta do filme. A Warner trouxe essa

sugestão e a gente gostou.

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Mario: Não foi especificamente pela força do personagem, mas pelo momento?

DS: Na verdade a gente juntou as duas coisas, o personagem e o filme. Se tivessem

trazido para nós o Homem de Ferro, por exemplo, que tinha um filme, mas não é um

personagem tão tradicional como o Batman. Acho q foi muito oportuna a proposta da Warner.

Mario: O que você atribui como ponto forte da marca Batman?

DS: O Batman é um personagem bem tradicional. Se você fizer uma pesquisa rápida

sobre os personagens mais famosos, como certeza entre os três aparece Batman e Superman.

E existe uma legião de apaixonados que acompanham todos os filmes, tem vários produtos...

quase que um fanatismo, é envolvido. A gente sentiu que era um personagem que tem toda

uma paixão envolvida. Obviamente não faz parte da maioria do público brasileiro, é um grupo

bem específico, mas existe um fã clube forte de Batman, então para gente, comercialmente, o

Batman tinha esse ganho, ele não era simplesmente um personagem, um herói... Ele é um

personagem que tinha um grande grupo de adeptos, existe toda uma paixão envolvida que

contou. E outra coisa, é um personagem que vem numa escala de filmes, de tempos em

tempos, então ele sempre ressurge, sempre renova. Diferente do Superman que teve por aí

durante um bom tempo, no passado, mas parou, sumiu. O Batman não, sempre ressurge, se

renova. Existe também um complemento que evolve o Batman, que o Batman nunca vem

sozinho. Há muitos personagens que vêm juntos e também dá para trabalhar. Isto da força

também.

Mario: Você acha que teria havido um resultado diferente se a estratégia de vocês não

tivesse se apoiado tanto no filme e sim no personagem de uma forma mais clássica?

DS: Acho que falhamos em duas coisas na estratégia: 1) a gente optou por uma linha

de médio para high tech, que já custa um pouco mais, e quisemos customizá-lo, mais o royalt

(a gente paga 10%, que não é pouco). Assim, chegamos a um produto que ficou muito caro no

preço final. Então as vezes um cliente é super-apaixonado pelo Batman, mas vê um teclado

comum vendendo a R$ 30,00 e o teclado Batman a R$ 80,00, isso assusta. Por mais

apaixonado que ele seja, vai pensar duas vezes. Então a gente errou um pouco no

posicionamento de preço dele. Aí, a gente foi lá e veiculou uma coisa temporal.

DS: Realmente, foi uma junção das coisas: a gente tinha um produto caro e gente

vinculou um período. Passou esse período e a gente na conseguia vender mais ao preço que

vendia, se vendêssemos a menos, teríamos prejuízo. Foi quando o produto começou a perder o

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posicionamento dele. A forma acertada: se a gente pegasse um produto de médio pra standart,

teria feito uma customização um pouco mais elaborada, um trabalho de embalagem mais

elaborado, então chegaria num preço médio próximo do high tech, então não seria tão mais

caro, e posto a figura de um Batman mais atemporal. Então isso tivesse feito que o produto

tivesse um preço bacana, com um Batman mais atemporal.

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3. Molin do Brasil Comercial e Distribuidora Ltda - Lápis, canetas, kits escolares -

respondido por James Santos, setor de Marketing, através de email em 17 de

outubro de 2009.

Mario: Como o personagem Batman ajuda a vender os seus produtos? Qual, em sua

opinião, o valor que o personagem agrega ao produto?

James Santos: O personagem Batman é uma marca muito forte no mercado dos

licenciados, pois atinge consumidores e adoradores de todas as idades, o Batman conquistou

seu mercado e tornou-se um clássico mundial, que vem conquistando gerações.

JS: O personagem em si, já agrega muito valor ao produto, pois é reconhecido por

todo o público, mas vale ressaltar que a junção entre Qualidade, Responsabilidade e a Ética

existente entre a Marca Molin e o Clássico Batman, fortalecem a relação de ambos.

Mario: Por que o personagem Batman foi a escolhido? Teve algum critério ou

parâmetro para esta escolha?

JS: O personagem foi escolhido pela potência de marca, ou seja, o reconhecimento é

muito grande, raramente encontrara pessoas que não tem conhecimento do Batman, todos

conhecem, ouviram falar, assistiram filmes ou desenhos animados, leram as histórias em

quadrinhos, tem ou ja tiveram algum produto do personagem.

JS: O critério utilizado foram os citados acima, sobre tudo isso existe a Marca Warner

Bros, que atua com um marketing muito forte, atuação esta que reflete de forma super positiva

aos licenciadores, como é o caso da Molin.

JS: Vale ressaltar que as primeiras aparições do Batman no mercado, foi em meados

de 1.939, passaram-se anos e anos, personagens e personagens e o Batman esta sempre

presente e com muita personalidade.

Mario: Existe um target específico de público?

JS: Este target de público não existe, pois a aceitação do personagem é algo

impressionante, não é em vão que o Batman é um Clássico Mundial, uma adoração que passa

de pais para filhos, o Batman esta sempre em evidência e tem uma marca super consolidada,

onde crianças, adolescentes e adultos admiram este Super-Herói, que apesar de ser um Astro

masculino, também é flertado pelo público feminino.

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Mario: Em sua opinião, o Batman tem alguma característica especial em relação aos

outros personagens (heróis ou não)?

JS: O Batman atualmente é um personagem diferente de tudo o que tem no

mercado, suas principais características hoje em dia, são os poderes pessoais, que "não fogem

muito da realidade", quando comparado a muitos outros super-heróis, ele utiliza muita

tecnologia, habilidades pessoais e extremo raciocínio, como destacado em seu último filme

"O Cavaleiro das Trevas".

Mario: Vocês acham que há diferença no uso do personagem Batman ou poderia ser

algum outro super-herói aplicado aos produtos? Ou ainda um personagem diferente dos super-

heróis?

JS: Existe diferença sim, o Batman como já destacado é um personagem que já

conquistou e vem conquistando milhares de adoradores, existe uma grande gama de

personagens no mercado, muitos famosos outros nem tanto, um bom produto aliado a um

forte personagem é uma ótima relação, para agradar consumidores e consequentemente

alavancar boas vendas.

Mario: Vocês podem fornecer um comparativo do desempenho de venda dos produtos

com o Batman diante de outros (com personagens ou não)?

JS: Mario, esta informação não posso lhe passar, por critérios contratuais entre a

Molin e o Licenciador, mas posso te garantir que o Batman tem uma grande fatia no mercado,

muitos personagens chegam e se vão, o Batman tem uma media de vendas muito boa

e estável, o tempo não desgastou a imagem do personagem e ele é sempre bem aceito.

Mario: O que você atribui como ponto forte ou de sucesso da marca Batman?

JS: Nas respostas anteriores já ressaltei, mas destaco a consolidação da marca, sua

trajetória durante todos esses anos de existência, seu público totalmente diversificado, seu

charme e seus poderes próprios, suas evidências nas telas, quadrinhos e a grande variedade de

produtos Batman, pois existem as vendas casadas, uma criança que adquiri uma bolsa escolar

do Batman, ela quer um caderno, canetas, borrachas e apontadores do mesmo personagem.

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4. M.Agostini S/A - lancheiras e garrafas térmicas - respondido por Mônica Martins,

Setor Comercial e Pós-venda/Marketing, através de email em 20 de outubro de

2009.

Mario: Como o personagem Batman ajuda a vender os seus produtos? Qual, na sua

opinião, o valor que o personagem agrega ao produto?

Mônica Martins: O personagem é um ícone muito popular, tem um público variado o

que acaba impulsionando a venda. Como trabalhamos com o público infantil a opinião dos

pais quanto ao personagem muitas vezes é decisiva na hora da compra. Sendo o Batman um

herói há 60 anos o apelo emocional com os pais é muito forte.

Mario: Por que o personagem Batman foi a escolhido? Teve algum critério ou

parâmetro para esta escolha?

MM: O personagem tem um excelente recall, é sucesso nas bilheterias mundiais, ter

um personagem com vínculo no cinema é muito atrativo.

Mario: Existe um target específico de público?

MM: Trabalhamos o personagem Batman na nossa linha escolar infantil: lancheiras e

garrafinhas. O nosso target são meninos entre 3 e 5 anos.

Mario: Em sua opinião, o Batman tem alguma característica especial em relação aos

outros personagens (heróis ou não)?

MM: O Batman faz sucesso em todas as idades e vem atravessando várias gerações.

Mario: Vocês acham que há diferença no uso do personagem Batman ou poderia ser

algum outro super-herói aplicado aos produtos? Ou ainda um personagem diferente dos super-

heróis?

MM: Há diferença sim, o personagem tem o seu diferencial e poucos personagens

poderiam vender tão bem quanto o Batman.

Mario: Vocês podem fornecer um comparativo do desempenho de venda dos produtos

com o Batman diante de outros (com personagens ou não)?

MM: Não foi possível fornecer essas informações.

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Mario: Dentro da proposta de Warner temos diferentes representações do Batman

(oriunda do desenho animado, ou do filme do cinema ou dos comics). Este fator foi pesado na

escolha do personagem?

MM: Sim

Mario: Como?

MM: Com essas diferentes representações temos um público muito amplo. O que

torna a marca BATMAN conhecida de todos.

Mario: O que você atribui como ponto forte ou de sucesso da marca Batman?

MM: A visibilidade e longevidade do personagem.

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5. Tilibra Produtos de Papelaria Ltda - Cadernos, Agendas e Fichários - respondido

por Gabriel S. Baumgartner, Desenvolvimento de Produtos e Marketing, através de

email, em 09 de novembro de 2009.

Mario: Como o personagem Batman ajuda a vender os seus produtos?

Gabriel Baumgartner: Pelo reconhecimento/força do personagem.

Mario: Qual, na sua opinião, o valor que o personagem agrega ao produto?

GB: O valor de um produto confiável.

Mario: Por que o personagem Batman foi a escolhido? Teve algum critério ou

parâmetro para esta escolha?

GB: A decisão da escolha depende de muitas variantes, algo que influencia muito é o

fato de ser um personagem forte (reconhecimento), pelo suporte de outras categorias no

mercado (ex: brinquedos, calçados, desenho animado, filmes etc) e pelas ações desenvolvidas

em volta do personagem (campanhas, comerciais etc)

Mario: Existe um target específico de público?

GB: O target primário do personagem é o infantil. Mas direcionamos o foco de acordo

com a categoria de produto & ao style guide a serem aplicados, justamente tentando “casar”

linguagem visual e itens a serem colocados no mercado.

Mario: Em sua opinião, o Batman tem alguma característica especial em relação aos

outros personagens (heróis ou não)?

GB: Sua “marca registrada” (morcego) é inconfundível, sua personalidade e o fato de

ser um herói que não tem “super poderes”, além de trazer incríveis/modernas “engenhocas”

que o torna capaz de combater seus inimigos.

Mario: Vocês acham que há diferença no uso do personagem Batman ou poderia ser algum

outro super-herói aplicado aos produtos? Ou ainda um personagem diferente dos super-

heróis?

GB: Atualmente trabalhamos com diversas categorias de produtos, e às vezes, na mesma

categoria encontramos variedade de personagens. Há uma diferença entre utilizar um “herói

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sólido” e um “herói do momento”, o Batman é um personagem clássico que passou por

diversas gerações em décadas de sucesso, porém no mercado encontra-se também “herói do

momento” que explodem no gosto do consumidor, mas podem não perdurar ao longo dos

anos.

Mario: Vocês podem fornecer um comparativo do desempenho de venda dos produtos

com o Batman diante de outros (com personagens ou não)?

GB: Infelizmente não fornecemos números.

Mario: O que você atribui como ponto forte ou de sucesso da marca Batman?

GB: Reconhecimento imediato e suporte em volta da marca, como:

Renovações de linguagem do personagem (herói sempre se atualiza).

Filmes / desenhos / HQs / etc (visibilidade e força nas vendas).

Diversidade de categorias de produtos no varejo (ajuda a manter o herói no

“consciente” do consumidor).

Seus incríveis “gadget” (Ícones de tecnologia).

Campanhas & ações de marketing.

Etc.