como funciona a sociedade?

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5/10/2018 Comofuncionaasociedade?-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/como-funciona-a-sociedade-559dff6921df0 1/20 o ....... J :::J I - ,1 -- 1 a ... <C u Segundo a definição de Thomas Botiomore (veja o capítulo 1), a sociedade é uma rede de relações entre pessoas, grupos sociais e instituições. Essa imagem " dosociólogo inglês nos transmite a ideia de um conjunto dinâmico formado pelas relações sociais, que interligam e envolvem aspessoas em uma permanente troca de contatos sociais. Isso nos leva também à noção deprocesso e de transformações ao lon- go do tempo. Comoveremos neste capitulo, osprocessos sociais podem contribuir tanto para a coesão da sociedade quanto Rara a eclosão de conflitos e enfrentamentos em seu interior. Comte e Durkheim enfati- zavam a importância da coesão e do consenso na sociedade. Marx, ao contrário, priorizava o conflito em sua forma de luta de classes. Para ele, essa luta constituia o verdadeiro motor que move as engrenagens da História.

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o. . . . . . . J

: : : JI-

,1--1a.. .<Cu

Segundo a defin ição de T hom as B otiom ore (veja o capítu lo 1),

a sociedade é um a rede de relações en tre pessoas, grupos sociais ei ns ti tu iç õe s. E s sa imag em "do so ció lo g o i ng lê s n o s tr an sm i te a id eia d eum co nju nto d in âm ico fo rm ad o p ela s rela çõ es so cia is, q ue in te rlig ame e nv olv em a s p es so as em uma p erm a nen te tro ca d e co nta to s so cia is.Isso n os lev a ta m bém à noç ão d e p ro ce ss o e de t ran sformaçõe s ao lon-g o d o tempo . C omo v er emo s n es te c ap itu lo , o s p ro ce ss os s oc ia is p od emcon tr ib uir ta n to p ar a a co esã o d a so cie da de q ua nto R ara a e cl os ão d econflitos e enfrentamentos em se u in te rio r. C om te e Durk he im enfa ti-

zavam a im p ortâ nc ia d a c oe sã o e d o c on se nso n a so cie da de. M a rx , aocon trár io , pr ior izava o conflito e m sua form a de luta de classes. P arae le, essa lu ta co nstitu ia o ve rd ad eiro m oto r q ue m ov e a s en gre na ge nsda Hi stór ia .

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CAP ÍTU LO 4 C om o fu nc ion a a socie da de ?

~o

z.::

Observe e responda:

1. Você já presenciou cena semelhante à da foto, ou já viu algo parecido em noticiários de

televisão, no cinema ou em revistas e jornais? Em caso afirmativo, que cena foi essa?2. Para você, a cena da foto é algo habitual na nossa sociedade?

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1 I As relações sociais

Alguns estudiosos definem r el aç ão soc ia l como

a forma assumida pela interação social em cada si-

tuação concreta. Assim, um professor tem um tipo

de relação social com seus alunos, a relação peda-

gógica. Duas pessoas em uma operação de compra

e venda estabelecem outro tipo de relação social, a

relação comercial. As relações sociais podem ainda

ser políticas, religiosas, culturais, familiares, etc.

Da mesma forma que a interação social, a rela-

ção social tem por base um comportamento recípro-

co entre duas ou mais pessoas. Nos termos de Max

Weber, essa reciprocidade é dotada de um sentido

comum às pessoas envolvidas. Segundo essa defini-

ção, as relações de autoridade-obediência, por exem-

plo, são relações sociais, pois envolvem pessoas que

exercem a autoridade e pessoas que obedecem, pois

aceitam a autoridade reivindicada pelas primeiras,

ou se submetem a ela, às vezes a contragosto.

Em uma perspectiva diferente, Karl Marx con-

siderava que as relações sociais eram decorrentes

CAP Í T ULO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

das relações de produção, ou seja, das relações de-

senvolvidas no processo produtivo, material, da

sociedade. Um exemplo típico dessas relações se-

riam as que existem entre o dono de uma fábrica e

seus empregados, ou ainda entre um dono de terra

e seus arrendatários (pessoas que alugam um lote

dessa terra e pagam uma quantia regular ao pro-

prietário por esse arrendamento, ou aluguel).

Para Marx, contudo, as relações sociais não se

restringem ao processo de produção. Este último

constitui a base em que elas se apoiam, mas as re-

lações sociais são mais amplas. Elas estão também

na sala de aula, nos laços familiares, nos vinculos

entre as instituições e entre estas e as pessoas,

nos laços de amizade e assim por diante. Dessa

forma, pode-se dizer, com Thomas Bottomore,

como vimos na abertura do capítulo, que JJa so-

ciedade é uma rede de relações entre indivíduos,

entre grupos sociais e entre instituições", ou seja,

uma rede de relações sociais.

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C A PÍT U LO 4 C om o fu nc ion a a soc iedade?

Além disso, para Marx, essas relações não

são estáticas. Segundo ele, "as relações sociaisestão intimamente ligadas às forças produti-

vas. Adquirindo novas forças produtivas, os

homens modificam o seu modo de produção, e

modificando o modo de produção, o seu modo

de ganhar a vida, modificam também todas as

relações sociais" (MARX,K. In: BIROU,Alain. Di-c ioná ri o da s C i ênc ia s Soci ai s. Lisboa: Publicações

Dom Quixote, 1982, p. 355; para os conceitos de

forças produtivas e modo de produção, veja o

capítulo 7).

Por "re lação" social deve-se entenderuma conduta de várias pessoas - referidareciprocam en te conform e seu conteúdo sig-n ific ativ o, o rien ta nd o-s e p or e ssa r ec ip ro ci-dade [ con te údo s ign if ic a tiv o é o sen tid o, o usig nifica do , a trib uíd o p ela s p esso as à suaação. N a r ela çã o so cia l e xiste reciprocidade,ou seja , cada parte envolvida atribu i umsentid o, o u sig nifica do, à ação da outra}.

U m m ínim o de recip r oc idade na s aç õe s é,

portanto , uma característica conceituol da re-lação soc ia l. O c on te úd o p od e s er o ma is d iv er-so: conflito, inimizade , amor se xua l, am iz ade ,piedade , troca no m erca do, "ruptura" de ump ac to , " co nc or rê nc ia " ec on ôm ic a, e ró tic a o ude outro tipo, et c . O co nc eito , p ois, n ad a d izsobre se entre os agen te s e xi st e " so li da r ie da-d e" o u e xa tame nte o c ont rá ri o. [ ... }

Não afirm am os de m odo algum que numca so co ncret o os participantes da ação m u-tu am e nte r efe rid a p o nh am o mesmo sentidon essa a çã o, o u q ue a do tem a a titu de d a o utraparte. O que em um é "amizade", "amor" ,"piedade" , "fide li dade con tra tua l", pode en-

-----2 I Processos sociais

Os alunos de uma escola resolvem fazer uma

limpeza geral no salão de festas para o baile de

formatura. Organizam-se, um ajuda o outro e

logo o trabalho está acabado. Esse resultado foi

60

contrai-se no outro com atitudes com pleta-men te d if er en te s. [ E ntr eta nto , m e smo n es se scasos , e x is te re ciproc idade em relação ao sen-ti do a tr ibu ído à a çã o pelo s agentes}, na m e-dida em que o agente pressupõe uma d eter-m in ad a a titud e de seu parceiro diante d ele en es sa e xp ec ta tiv a o rie nta s ua c on du ta , o quep od erá ter co nseq uên cia s p ara o desenrolard a a çã o e para a c onf igu raç ão da r el aç ão.

A dap ta d o de : WEBER , M a x . A ção soc ia l e re la çã o soci a l.In : F ORAC CHI , M a ria lic e e MA RT INS, Jo sé d e S ou za (orgs .).

Soc io log ia e soci edade. R io d e Ja ne iro: L ivr os T éc nic ose Ci ent í f i cos , 1977. p . 14 2 -3.

Vamos pensar?

1. o que é o conceito de relação social

tal como foi elaborado por Max

Weber?

2. Segundo Weber, as partes envolvidas

em uma relação social atribuem o

mesmo sentido, ou significado, aessa relação?

possível porque houve cooperação. A cooperação

é um tipo de processo social.

A palavra processo vem do latim procedere, quesignifica avançar, progredir. Designa a contínua

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mudança de alguma coisa numa certa direção. Seu

significado, portanto, contém as ideias de tempoe de movimento, de pequenas alterações em um

fenômeno, de evolução, de mudanças moleculares

que podem levar a transformações mais profundas.

Processo social indica, assim, interação so-

cial, movimento, evolução, mudança nas relações

sociais e na sociedade. Os processos sociais são as

diversas maneiras pelas quais indivíduos e grupos

atuam uns com os outros, a forma pela qual os

indivíduos se relacionam e estabelecem relações

sociais no transcorrer do tempo.

Qualquer mudança proveniente dos contatos so-ciais e da interação social entre os membros de urna

sociedade constitui, portanto, um processo social.

Processos associativos e dissociativosNo grupo social ou na sociedade corno um todo,

indivíduos e grupos se reúnem e se separam, asso-

ciam-se e dissociam-se. Dessa forma, os processos

sociais podem ser associativos ou dissociativos.

Os processos associativos estabelecem formas

de cooperação, convivência e consenso no gru-po. Geram, portanto, laços de solidariedade. Jáos dissociativos estão relacionados a formas de

CAP ÍTULO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

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C A PÍT U LO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de?

divergência, oposição e conflito, que podem se

manifestar de modos diferentes. São responsáveis,assim, por tensões no interior da sociedade.

Os principais processos sociais associativos

são a cooperação, a acomodação e a assimilação.

Os principais processos sociais dissociativos

são a competição e o conflito.

Resumindo:

~ cooperação

/

associativos ~ aco"m~da~ãoassimilação

Processossociais ~ .

di iati <:competiçãolSSOCla lVOS

conflito

A seguir, vamos estudar os processos associa-

tivos e os processos dissociativos. Você vai per-

ceber que não seguimos a ordem apresentada no

esquema anterior. Isso se deve, em parte, à ne-

cessidade de se priorizarem certos processos, seja

para facilitar o entendimento de outro, seja por-

que a partir dele podem surgir novos processos.

Coope ração

A cooperação é a forma de interação social naqual diferentes pessoas, grupos ou comunidades

trabalham juntos para um mesmo fim.

São exemplos de cooperação: a reunião de vizi-

nhos para limpar a rua, ou de pessoas para fazer urna

festa; mutirões de moradores para construir conjun-

tos habitacionais; sociedades cooperativas, etc.

A cooperação pode ser direta ou indireta.

Cooperação d ir eta. Compreende as ações que

as pessoas realizam juntas, corno é o caso do mu-

tirão. Mutirões são atividades que reúnem diversas

pessoas em um esforço comum para alcançar deter-minado objetivo. Nos bairros populares da periferia

de grandes cidades no Brasil, por exemplo, não é

raro que pessoas ligadas por laços de amizade tra-

balhem juntas nos fins de semana para construir a

casa de urna delas. Quando a casa está pronta, as

mesmas pessoas passam a cooperar na construção

da casa de outra família integrante do grupo.

Cooper aç ão ind ir eta . É aquela em que as

pessoas, mesmo realizando trabalhos diferentes,

necessitam indiretamente urnas das outras, por

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não serem autossuficientes. Tomemos o exemplo

de um médico e de um lavrador: o médico nãopode viver sem o alimento produzido pelo lavra-

dor, e este necessita de cuidados médicos quando

fica doente. Existe, assim, entre eles, uma relação

de complementariedade.

Uma das diferenças entre a cooperação direta

e a indireta está no fato de, no primeiro caso, se

desenvolverem relações de solidariedade e apoio

mútuo entre as pessoas envolvidas. Isso não ocor-

re quando a cooperação é indireta, pois nesse caso

as pessoas envolvidas não estão ligadas por um

esforço coletivo destinado a conquistar um obje-tivo comum.

CompetiçãoSegundo o cientista social H. Friedsam, com-

petição é uma forma de interação que envolve luta

ou disputa por bens limitados ou escassos. Essa

interação é regulada por normas, pode ser dire-

ta ou indireta, pessoal ou impessoal, e tende a

excluir o uso da força e da violência. Os bens em

jogo, acrescenta P. Fairchild. "podem ser objetosfísicos ou materiais, assuntos de estima pessoal,

dignidade ou recompensa não material. A essência

CAP ÍTULO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

da competição é um choque tal de interesses que

o atendimento de um indivíduo ou entidade impe-de o atendimento de outro indivíduo ou entidade"

(FRIEDSAM,H. e FAIRCHILD,P. In: D ic io nário d e

C i ênc ia s Soc i a is . Rio de Janeiro: Editora da Funda-

ção Getúlio Vargas, 1987. p. 218-9).

Em outras palavras, competição é uma dispu-

ta entre indivíduos, grupos ou sociedades por bens

que não chegam para todos (bens escassos). A

competição pode levar indivíduos a agir uns contra

os outros em busca de uma situação melhor. Ela

nasce dos mais variados desejos humanos, como

ocupar uma posição social mais elevada, ter maiorimportância no grupo social, conquistar riqueza e

poder, vencer um torneio esportivo, ser o primeiro

da classe, passar no vestibular, vencer um concur-

so, etc.

Ora, nem todos podem obter os melhores

lugares nas esferas sociais, pois os postos mais

importantes são em número muito menor do que

seus pretendentes, isto é, são escassos - da mes-

ma forma que o número de vagas no vestibular é

pequeno em comparação com o número de candi-datos em disputa (veja o boxe a seguir). Assim,

os que pretendem alcançar esses postos ou vagas

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VESTIBULAR: A HORA DA DECISÃO

CAP Í T ULO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

Umexemp lo d e compet iç ão , e nt en did a c om o d isp uta

por bens escassos, é o vestibu la r. Em setem bro de

2007, os c andida to s i ns cr it os p ara o p ro ce ss o s el et iv o d e

2008 d a Fu ve st -fundação que realiza em São Paulo o

mai or v es tib ul ar d o p aís - somavam 140 803 estudantes.

A m aioria deles concorria a 10 302 v ag as n a U nive rsi-

dade de São Paulo (USP). O s ou tro s d isputavam 250

vagas distribuídas entre a F aculdade de Ciências M é-

dicas Santa Casa e a A cademia de Polícia Militar do

B arro B ranco. A relação total, portanto, era, em m édia,

de m ais de dez candidatos por vaga. Em a lg un s cu rso s,

como o d e jo rn ali sm o, e ss a r el aç ão e ra a in da mai or.

O s vestibu la nd os sã o, em sua g ran de m aioria, jo-

v ens d e 18 a 20 anos. B oa p ar te d ele sf ic a c on fu sa d ia nte

d a n ec es sid ad e d e d ec id ir e ntr e os mu it os c ur so s d is poní -

veis. O r es ult ad o é q ue 60% do s q ue pa ssam no vestibu -

lar em São Paulo se arrependem antes da conclusão do

curso e retornam ao vestibular, às t z e z e s desperdiçando

um tem po precioso na própria form ação e ocupando va-

gas que poderiam ser m ais bem aproveitadas por outros

candidatos.

Mas há alternativas para quem chega à porta

do vestibular sem convicção quanto à carreira a seguir.

A lguns cursos oferecem ao futuro profissional um leque

de opções muito mais amplo do que se imagina. "Há

cada veZ mais engenheiros e médicos atuando como

administradores ou arquitetos no ramo de design ",e xempl if ic a Lu iz G o w z a q a Bertelli , p re sid en te d o C en tr o

de lnteqração Empresa-E scola e autor do livro Profis-

sões 2005 (E dito ra C IEE). O ptar por uma dessas

carreiras perm ite, em muitos casos, adiar por alguns

an os a difíc il esc olha da p rofissã o.

Fontes: http://gl.globo.com!NoticiasNestibular e http://

www.simplescidade.com.br - Acesso: 2.10.07.

entram em competição com os demais concorren-

tes. Nessa disputa, as atenções de cada competi-

dor estão voltadas para a recompensa e não para

os outros concorrentes.

É importante também observar que a com-

petição "tende a excluir o uso da força", nas pa-

lavras de Friedsam. Isso porque ela constitui um

tipo de interação regulada por normas, por leis,

ou mesmo pelos costumes. Quando a competição

viola essas normas, transforma-se em conflito.

Há sociedades que estimulam mais a com-

petição do que outras. Entre as tribos indígenas

do Brasil, por exemplo, as relações não são tão

acentuadamente competitivas como na sociedade

capitalista. Esta última estimula os indivíduos a

competirem em todas as suas atividades - na es-

cola, no trabalho e até no lazer -, exacerbando o

individualismo em prejuízo da cooperação.

ConfLitoQuando a competição assume características

de elevada tensão social, sobrevém o conflito.

64

Diariamente, lemos e ouvimos no noticiário

dos jornais, do rádio e da televisão relatos de

conflitos em diversas partes do mundo: com-

bates na Colômbia entre tropas do governo e

guerrilheiros ou narcotraficantes; ocupações de

fazendas pelo Movimento dos Trabalhadores Ru-

rais Sem-Terra (MST) no interior do Brasil, às

vezes seguidas (ou precedidas) de assassinatos

de líderes sindicais a mando de grandes fazen-

deiros; conflitos entre israelenses e palestinos

no Oriente Médio; choques armados entre sol-

dados norte-americanos e rebeldes muçulmanos

no Iraque.

O conflito social é um tipo de interação que

se desenrola no tempo e provoca mudanças na so-

ciedade, tal como a competição. Trata-se, portanto,

de um processo social. Em contraste com a compe-

tição, ele consiste em uma luta por bens, valores

ou recursos escassos, na qual o objetivo dos con-

tendores é neutralizar ou aniquilar seus oponentes.

Dessa forma, ao contrário da competição, o conflitoenvolve, em maior ou menor escala, o emprego da

violência.

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CA P ÍT U L O 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

Uma Lu ta por d ireitosConsideremos, por exemplo, as lutas dos ne-

gros norte-americanos por direitos civis. Elas tive-

ram início antes mesmo do fim da escravidão de

africanos e afrodescendentes nos Estados Unidos.

Como se sabe, a abolição da escravatura nesse país

só ocorreu em 1863, em meio a um conflito so-

cial de grandes proporções conhecido como Guerra

d e S ec es sã o (1861-1865). As partes em luta nesse

conflito eram a União, apoiada pelos estados do

Norte e sob a liderança do presidente AbrahamLincoln (1861-1865), e os estados do Sul. Lincoln

queria abolir a escravidão. Os estados do Sul que-

riam conservá-la.

A Guerra de Secessão terminou com o triunfo

da União, ou seja, do exército fiel ao presidente

Lincoln. A escravidão foi abolida, mas os negros

continuaram a sofrer todo tipo de discriminação

e preconceito. Por exemplo, nos estados do Sul,

crianças negras não podiam frequentar escolas

destinadas a brancos. Nos lugares públicos havia

banheiros separados para negros e para brancos.

Nos ônibus, os afrodescendentes só podiam se

sentar nos bancos de trás. Além disso, era co-

mum o linchamento de negros por pessoas bran-

cas, que não eram punidas pelo crime.

O hábito de linchar negros simplesmente

pelo fato de serem negros foi disseminado por

uma organização terrorista chamada Ku Klux

Klan. Criada logo após a Guerra de Secessão, essa

organização secreta, cujos integrantes atacavam

negros indiscriminadamente, existiu até o come-

ço dos anos 1960.

Por essa época, os negros norte-americanoscomeçaram a se mobilizar contra a segregação e a

discriminação que os atingiam. Depois de violentos

choques com a polícia durante os anos 1960, eles

conseguiram ver reconhecidos seus direitos civis.

Passados mais de trinta anos, embora certas formas

de racismo e discriminação ainda persistam nos

Estados Unidos, o negro integrou-se, pelo menos

em parte, à sociedade norte-americana. Esse é um

exemplo de processo social envolvendo conflitos

que levou a mudanças importantes na sociedade.

Assim, diversos afrodescendentes ocupam hoje

posição de destaque até mesmo no governo estadu-

65

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CAP ÍTULO 4 C om o funcion a a sociedade?

nidense, O que antes era impensável. É O caso de

Barack Obama, que em 2008 tornou-se o primeiro

negro a ser eleito presidente dos Estados Unidos.

Já no Brasil, o preconceito contra os negros

nunca foi tão ostensivo quanto nos Estados Uni-

dos. Além disso, sempre foram comuns aqui as

uniões interétnicas - a miscigenação da popula-

ção brasileira é um fato que não se pode negar (ao

contrário do que ocorre nos Estados Unidos). Por

essa razão, há quem afirme que no Brasil temos

uma "democracia racial".

No texto a seguir, você verá que não é bem as-

sim. Apesar de a legislação brasileira proibir quais-quer manifestações de preconceito e discriminação

étnica, as desigualdades sociais entre brancos e

negros ainda estão longe de terem sido superadas.

Elas indicam também alguma forma de racismo.

Existe preconceito contra os negros noBrasil? Essa é urna pergunta para a qual gos-

tamos de responder com um sonoro "não!".

Entretanto, certos dados numéricos pare-

cem afirmar o contrário. Por exemplo: pre-

tos e pardos ganham 4,15 reais por hora, em

média, enquanto os brancos recebem 8,16

reais, também em média, quase o dobro do

que ganham negros e pardos. Em contra-

partida, quando se trata de desemprego, os

negros saem na frente: 11,8% contra 8,6%dos brancos.

No texto a seguir, você encontrará ou-

tras informações, levantadas em setembro

de 2006 pelo Instituto Brasileiro de Geogra-

fia e Estatística (IBGE).

Duas v er da de s in eg á ve is : 1) o Brasil é op aís d a m isc ig en aç ão ; 2) aqui , a igualdaderacia l não passa de m ito . É tam bém onde otom da pele resulta em d iferen ça s, q ue fa -

zem da un iversidade um espaço de m aioriabranca, e tornam as ocupações m ais bem

66

rem un era da s q ua se in acessíveis a os p reto se pa rd os. A s d esigua ldades, visíveis no diaa d ia , estão em n úm ero s d o In stitu to B ra si-le ir o d e Ge og ra fia e E sta tís tica (IBGE ), q ueon tem divulgou a Pesqu isa M ensa l de Em -p re go (PME ), c on sid er an do os c rité rio s d ecor ou de raça.

Realizada em setem bro , a p esqu isa reú-n e d ad os d e seis reg iõ es m etro po lita na s (R e-c if e, Sa lvador, B elo H o riz on te , R io , S ão P au lo

e Por to A legre) . O lev an tam en to m o str a q ue ,d esd e 2 00 2, o B ra sil vem conseguind o um aligeira m elhora na renda e n a e sc ola rid a-d e d a popu lação, m as en contra dificuldadep a ra r ed uz ir a d is tâ n cia e ntr e as raças.

A escolaridade passou de 7,6 para 8anos de estudo; porém , os b ra nc os e stu -dam mais 1,6 ano do que os n eg ro s, c om oem 2002 . A lém disso , enq uan to 45,9% dosb ra nc os h av iam c urs ad o, p elo m en os , o nível

m éd io co mp leto , en tre os pretos e pardos ap ro po rçã o e ra d e 28,5%. Na faixa de 10 a 17

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an os, qu an do tod os d evem estar estuda nd o,ha via 30% ma i s negros fora da escola - noRecife a d if er en ç a c hegava a 45 ,7%.

Na universidade, outra m arca da desi-gualdade: a proporção de pessoas com 18anos ou m ais que f re que n ta v am ou já ha-v iam e sta do em um cu rso superior sub iu napo pu lação , m as a d istâ nc ia e ntre a s raçasestá m a ior: 2 5,5% d os b ra nc os e 8,2% dospretos e pardos encaixavam -se no perfil.Entre a s p esso as o cu pa da s, co m ma i s de 18anos , 21,8% d os b ra nc os e 5,4% d os n eg ro stin ham n ív el su pe rio r.

"- 'f1s e st atí st ic a s mos tr am um a bism o en -tr e a p o pu la çã o b ra n ca e a p op ula çã o d e p re -to s e pardos . É a lg o q ue fa z p arte d o p ro cessoh istó rico d o p aís, p ois eles n ão viera m p ara o

Br as il c omo re is , mas em navi os n e gr ei ro s ",analisa o gerente d a PM E, C im a r Azeredo.

E m tese, pesso as sem instru ção ou comm enos de um ano de estudo deveriam ob ter

a m esm a rem unera ção, m as os b ra nc os g a-nham 60 re a is a m ais n essa faixa de tra ba-l hado re s. A d is par idade s e a ce ntu a c on fo rm eaumenta a esco la rid ad e. N a fa ixa d e o ito a

dez anos de estudo , a diferença é de 135re a is , ou 61 % . Com 11 anos ou m ais , é de82 9 re a is , ou 14 9% (899 ante 1 72 8 re a is ).

Em S alv ad or, os valo res são 908 r e a i s paranegros e 2 062 r e a i s p a ra b ra n co s.

P ara qu em con sid era a d is tâ n cia e ntr e

os rend im entos apenas com o um sinal dad iscrim ina ção racia l - q ue o brasileiro, emg er al, n eg a -, o e co nom ista A n dr é U ra ni f azum a le rta . " A d ife re nç a sa la ria l, em grandep arte , n ão s e deve à c or , m a s às c on d iç õe s d eacesso à ed uca çã o", a va lia ele , q ue é diretorexecutivo do Institu to de E studos do Traba-lh o e Soci edade ( Ie ts ) .

O de se qui lí br io v em s e r ep ro d uz in do e n-tr e a s ge raç õe s, ob se rv a o d ir eto r d a g ra du a-

ção em E co nom ia d a U n iv ers id ad e F e de ra l d oR io d e Ja neiro , M a rcelo P aixã o. E le d efen de

CAP Í T ULO 4 C om o f un cion a a s oc ie da de ?

a çõ es a firm ativa s, co moosistem a de cotasn as u niv er sid ad es , p ar a p ro du zir a lte ra çõ es

signif icativas.E ss a tamb ém é a v is ão d a min i s t r a de P o-

l ít ic a s d e Promoção da Igua ldade Rac ia l, Ma t il -d e R i be ir o . 'f 1 c ria çã o d e c ota s a ju d a a mudara s p er sp ec tiv as d os n eg ro s e a visã o q ue os

e mp re ga do re s tê m d o m er ca do d e tra ba lh o ':Para a p esq uisad ora do In stitu to B ra si-

leiro d e A n álises S ocia is e Ec onôm ic as , P e r-n an da C arva lh o, o p r ec onc ei to c ontr ibu i, emu i t o , para os d ad os en co ntra do s. "H á d is-crim in açã o, m uita s vezes vela da ", d iz. E lem -b ra : dia nte d a p erg unta "o nde você g ua rd a o

seu ra cism o?", feita duran te ca mp an ha co n-tr a o p r ec onc ei to , v á ri as p e ss oas c onf es sa r amm u da r d e c alç ad a q ua nd o, em l uga re s e rmos ,e n con tr am pe la f re n te um negro.

A da pta do d e: RODR IGUES, Kar in e . D e s igu a ld a d e s ra c ia is pe rs is te mna ed u c a ção e no tra ba lh o. O Estado de s . Paulo, 18.11.06.

Pesquise e responda

Faça uma pesquisa em jornais, livros,

revistas e sites da internet para saber

mais sobre a situação de negros e pardos

no Brasil atual - um livro interessante é

Ra cism o no B r as il, de Gevanilda Santos

e Maria Palmira da Silva, publicado pela

editora Perseu Abramo (2005). Depois,

escreva um texto, procurando responderàs seguintes questões.

1. O que são política afirmativa e

sistema de cotas? Você concorda ou

discorda de sua aplicação no Brasil?

2. Existe discriminação contra negros

e pardos no Brasil? Quais são suas

origens históricas e como ela se

manifesta? Caso você ache que não há

discriminação, apresente argumentos

que comprovem sua opinião.

67

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CA P Í T ULO 4 C om o fu nc ion a a soc ie da de ?

Competição e c on flito

Comparando a competição e o conflito, pode-mos destacar as seguintes características:

• a competição pode tomar a forma de luta pela

existência, como a que se estabelece entre in-

divíduos para a obtenção de alimento ou em-

prego, por exemplo;

• o conflito pode tomar a forma de rivalidade,

disputa, revolta, revolução, litígio ou guerra. O

conflito é bem evidente na luta entre patrões

e empregados em determinadas situações (gre-

ves, por exemplo), nas disputas pela posse da

terra entre latifundiários e trabalhadores ruraissem-terra, ou ainda na guerra entre nações;

• a competição pode ser consciente ou incons-

ciente; o conflito é sempre consciente, ou seja,

os adversários sabem que estão em oposição;

• a competição é impessoal; o conflito é pessoal

e, portanto, emocional;

• o conflito pode implicar víolência ou amea-

ça de víolência; já a competição não envolve

víolência;

• enquanto a competição é contínua, o conflitonão pode durar permanentemente com o mes-

mo nível de tensão;

• no conflito, o primeiro impulso dos oponentes

é tentar neutralizar ou destruir o adversário.

Pessoas ou grupos em conflito podem canali-

zar sua tensão tanto para a guerra como para

a criminalidade, ou ainda reduzi-la a um pro-

cesso de acomodação. Nem todos os conflitos,

contudo, se resolvem pela violência. Muitos

deles comportam negociações e acordos en-

tre as partes. Esse é o caso, por exemplo, dasgreves de trabalhadores, uma forma de pres-

são para obter conquistas, como melhores sa-

lários, menos horas de trabalho, etc. Muitas

dessas paralisações são solucionadas por meio

de acordos ou concessões mútuas entre pa-

trões e empregados.

TerrorismoO conflito pode levar ainda a outra forma

extrema de violência: o terrorismo, resultado desituações extremas de opressão ou exclusão de

grupos sociais, políticos, étnicos, nacionais ou

68

religiosos. Essas situações estimulam o surgi-

mento do extremismo político ou religioso (nestecaso, chamado de fundamentalismo). Enquanto

todas as formas de conflito, inclusive as guer-

ras, levam a uma solução, seja pelos processos

de acomodação, seja pela assimilação, o mesmo

não ocorre com o terrorismo. Incapaz de impor-

se pela ação política ou pela força das ideias,

ele procura destruir o adversário sem medir as

consequências.

Durante certo tempo, cientistas sociais consi-

deraram o terrorismo uma característica de socie-

dades retrógradas. Alguns chegaram a supor que

o processo de modernização das sociedades viria,

cedo ou tarde, pôr um fim aos atentados, mes-mo que em um ou outro lugar pudessem ocorrer

atos isolados.

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Os acontecimentos mais recentes, contudo,

não comprovam essa teoria. Osacrifício de pessoasem nome de urna causa entra, dessa maneira, na

era da globalização. O atentado de 11 de setem-

bro de 2001 - quando foram destruídas as torres

gêmeas do World Trade Center de Nova York, nos

CAP Í T ULO 4 C om o fu nc ion a a s oc ie da de ?

Estados Unidos - mostra que nenhum país está

imune a esse perigo. Ele pode atingir igualmen-te militares e civis; pode ocorrer na Nigéria, na

Arábia Saudita, na Inglaterra, na Espanha, nos

Estados Unidos ou em qualquer outro lugar do

mundo (veja o boxe a seguir).

ATENTADO DA ETA NA ESPANHA

P

rovíncia espanhola situada na região de

fronteira entre a Espanha e a França, a re-gião basca abriga uma população de língua e

cultura diferentes das do povo espanhol. Em

1959, militantes bascos organizaram a ET A (Eus-

k ad i T a A ska ta su na - Pátria Basca e Liberdade),

grupo que luta pela autonomia da região. Em

1966, a ETA optou pela luta armada e desde

então tem praticado ações que o governo es-

panhol considera terroristas. Nos anos 1990,

a organização decretou um cessar-fogo, mas

recentemente voltou a cometer atentados. O

texto a seguir refere-se a um desses atentados.

Madri - U m fu rg ão c ar re ga do d e e xp lo siv os fo i

detonad o ontem na frente d e u m a delegacia de polícia em

Durango, 40 q uilôm etros ao su l de B ilbao, no prim eiro

grande ataque da organização separatista basca ETA

desde o r om pime nto , em ju nh o, d o c es sa r- fo go q ue o grupo

h av ia d ec la ra do . D ois p olicia s fic aram fe rid os n o a te n-

ta do , q ue c au so u g ra nd es d an os m ate ria is n a á re a.

D e acordo com a s autorid ades espanholas, entre

80 e 100 quilos de explosivos fo ram usa dos no ataque."F am ílias e crianças m ora m p erto da delegacia de polí-

cia, o q ue to rn a e ss e a te nta do a in da m ais d es pre zív el",

atacou o re pr ese nta nte lo ca l d o M in is tér io d o In ter io r,

P au li no L u esma .

O atentado, que ocorreu na madrugada de on-

tem , assustou os vizinhos da delegacia . V ária s pessoas

saíram correndo de suas casas para ver o q ue h av ia

o co rr id o. A fo rç a d a e xp lo sã o d estru iu c ar ro s e es tilh a-

çou janela s de vário s prédios ao lad o da delegacia.

Em março de 2006, a ETA declarou um cessar-

fogo e estava discutindo a s co ndiçõ es para o i ní ci o d as

negocia. .ç õe s d e paz com o governo do p rime iro-m in is tr o

sociqlista, José L uiz Z apatero. A falta de concessões

das autoridades, no entanto, irritou os separatistas.

U m a te nta do em d ezemb ro co ntr a o a ero po rto d e Ma-

dri, que deixou dois m ortos, prejudicou ainda mais as

n egociaçõe s ent re o governo e a ETA .

A P E REU TE RS. O Estado de S. Pal/lo, 25.8.07.

,4bed~4Ie ei a /Cir19j1/e ( j « r e ) 4 K O

EZGAUDE jlDOCentenas de pessoas protestam em Bilbao, na Espanha, em junho de 2006, contra a decisão da ETA,grupo

separatista basco, de retomar seus atentados. Contrário ao governo espanhol, a ETAuta pela independênciado chamado "pais basco" promovendo ações violentas Queatingem toda a sociedade espanhola.

69

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CA PÍTULO 4 C om o f un cion a a soc ie da de ?

Hoje, o terrorismo encontra adeptos entre pes-

soas e grupos que se sentem excluídos num mundoque está se globalizando rapidamente. Alguns deles

temem perder suas culturas e tradições religiosas,

como ocorre com os fundamentalistas muçulmanos.

Outros se desesperam porque estão impedidos de ter

sua própria pátria - ou seja, seus Estados nacionais

e soberanos. Este é o caso dos palestinos no Oriente

Médio. Emsua ação devastadora, provocam uma rea-

ção igualmente perversa: o te rr or ism o d e E sta do.

Acomodação

Nem todo conflito termina com a extinção dooponente derrotado. Em alguns casos, este pode

aceitar as condições impostas pelo vencedor para

fugir ã ameaça de destruição. Ocorre, assim, um

processo de acomodação, pois o vencido acata as

condições do vencedor e adota uma posição de su-bordinação.

A escravização dos povos vencidos, comum

na Antiguidade, é um caso típico de acomodação.

Quando alguém cumpre uma lei ou segue um cos-

tume com os quais não concorda, só para evitar

sanções ou divergências, também se enquadra

num processo de acomodação.

Da mesma forma, imigrantes que chegam a ou-

tro país são levados a passar por processos de aco-

modação: deixam de lado sua língua e seus costu-

mes, adotam modos de vida do povo que os acolheue adaptam-se às condições da nova vida. Procuram

assim se prevenir contra possíveis conflitos e viver

em equilíbrio com o meio social que os cerca.

70

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Desse modo, a acomodação é o processo so-

cial pelo qual o indivíduo ou o grupo se ajus-ta a uma situação de conflito, sem que ocorram

transformações internas. Trata-se, portanto, de

uma solução superficial do conflito, pois este

continua latente, isto é, pode voltar a se ma-

nifestar. Isso acontece porque nos processos de

acomodação continuam prevalecendo os mesmos

sentimentos, valores e atitudes internas que se-

param os grupos. As mudanças são apenas exte-

riores e manifestam-se somente enquanto com-

portamento social.

Os escravos, por exemplo, nunca aceitaram asituação de servidão que lhes era imposta. Ape-

nas se acomodavam à dominação, mas sempre

que podiam se rebelavam. Revoltas de escravos

ocorreram em diversas épocas da História. A mais

famosa delas foi a rebelião de Espártaco, gladia-

dor que liderou cerca de 120 mil escravos contra

a República romana entre 73 e 71 a.C. Nesse caso,

a acomodação se transforma em conflito social,

que pode assumir (ou não) grandes proporções.

Em Roma, a rebelião liderada por Espártaco du-rou três anos e ficou conhecida como G ue rra d os

Escravos.

No Brasil, uma das formas de resistência con-

tra a escravidão foi a fuga seguida da formação de

quilombos - aldeamentos fortificados, nos quais

os ex-escravos passavam a viver da caça, da pes-

ca, do artesanato e da agricultura. Omaior e mais

duradouro desses aldeamentos foi o quilombo de

Palmares , situado na capitania de Pernambuco.

Palmares, que chegou a reunir cerca de 20 mil

pessoas no interior de suas paliçadas e muralhas,funcionava como um pequeno Estado governado

por seu próprio rei e resistiu a inúmeros ataques

de forças portuguesas e holandesas entre 1600 e

1694, quando só então foi destruído.

Também no caso dos imigrantes, verifica-se

entre eles a tendência a preservar certos traços

fundamentais de sua própria cultura e a formar

redes de ajuda mútua que os mantêm agrupados

em comunidades no interior do país onde passam

a viver.

A acomodação é, assim, o ajustamento de indi-

viduos ou grupos apenas nos aspectos externos de

CAP ÍTU L O 4 C om o fu n cion a a soc ie da de ?

seu comportamento. Ela atenua ou previne o con-

flito. Mas este só desaparece com a assimilação.

AssimiLação

A assimilação é a solução definitiva e mais ou

menos pacífica do conflito social. Trata-se de um

processo de ajustamento pelo qual os indivíduos

ou grupos antagônicos tornam-se semelhantes.

Difere da acomodação porque implica transfor-

mações internas nos indivíduos ou grupos, sendo

estas geralmente inconscientes e involuntárias.

Tais modificações internas envolvem mudanças na

maneira de pensar, de sentir e de agir.A assimilação se dá por mecanismos de imita-

ção, exigindo um certo tempo para se completar.

É um processo longo e complexo.

Um exemplo de assimilação é o do imigran-

te que se integra inteiramente à sociedade que o

acolhe. Ele, que a princípio se acomodou por con-

veniência ao novo país, vai aos poucos deixando-

se envolver pelos costumes, símbolos, tradições e

língua do povo desse país. Não se trata, porém, de

um processo que atinja todos os imigrantes, massomente uma parte deles.

No Brasil, ocorreram casos de assimilação en-

tre os alemães em Santa Catarina e os italianos

em São Paulo. No início, esses imigrantes falavam

sua própria língua e conservavam seus valores e

costumes. Ao preservar essas características, cada

grupo se constituía em uma espécie de corpo es-

tranho na sociedade brasileira.

Apenas quando as características marcan-

tes da cultura de origem se atenuaram ou se

desfizeram - sendo substituídas pelos hábitose costumes locais - os imigrantes puderam ser

assimilados pela nova sociedade. Aos poucos,

eles se desfizeram de sua identidade cultural e

passaram a observar os sentimentos e valores da

nova cultura, tornando-se parte integrante da

sociedade adotada.

Concluindo, o aspecto importante da assimi-

lação é que ela implica uma transformação do sen-

timento de identidade. O processo de assimilação

atinge áreas profundas e extensas da personalida-

de, determinando novas formas de pensar, sentir

e agir.

71

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CAPÍTULO4 Como funciona a sociedade?

.- ....•Livros sugeridos

• MARX,Karl e ENGELS,Friedrich. Man ife sto d o P artid o C om un ista. 5. ed. R io de Janeiro: Vitória, 1963.• SANTOS,Gevanilda e SILVA,Maria Palmira. Racism o no Brasi l. São Paulo: Perseu Abramo, 2005 .

.- ....•Filmes sugeridos

• Spar tacus , de Stanley Kubrick, 1960. A história da rebelião dos escravos liderada por Espártaco contra o poder de Romaentre 73 e 71 a.C.

• Quilombo, de Cacá (Carlos) Diegues, 1984. A formação do quilombo de Palmares no começo do século XVII, no Brasilcolonial, e a luta de seus habitantes para não serem novamente reduzidos à escravidão.

• Os companhe iros , de Mario Monicelli, 1963. No século XIX, em umacidade italiana, operários de uma fábrica deflagram

movimento grevista orientados por um professor socialista.• O quatn lho , de Fábio Barreto, 1996. Sobre grupo de imigrantes de origem italiana na região de colônias do R io Grande

do Sul.

• Gaij in , de Tizuka Yamazaki, 1980. A saga de imigrantes japoneses em São Paulo.

• Pâ nico em Munique , de WiUiam Graham, 1976. Sobre o atentado de terroristas palestinos contra atletas de Israel du-rante as Olimpíadas de Munique, em 1972.

• F ahr enhe it 11 de s et embr o, de Michael Moore, 2004. Documentário sobre a responsabilidade de Bush nos atentados de11 de setembro de 2001.

Para complementar o estudo do capítulo, assista a um ou mais dos filmes indicados e reflita

sobre as seguintes questões:

• Que relações podem ser estabelecidas entre o enredo do filme e os conceitos estudados neste capítulo?• Há referências, no filme, à noção de conflito social? Quais são elas e como aparecem no filme?

• Há referências ao conceito de acomodação ou ao de assimilação? Sob que formas eles se manifestam nesse filme?

• Há referências à questão do terrorismo? Quais são elas e como aparecem no filme?

Questões propostas

1. o que são relações sociais? Por que Thomas Bottomore define a sociedade corno urna "rede de

relações"?2. Os processos sociais incluem mudanças ao longo do tempo. Para você, isso significa que só

existe processo social quando a sociedade sofre transformações radicais? Que espécie de

mudanças ocorrem nos processos sociais?

3. Quais são as diferenças entre competição e conflito social?

4. Explique a diferença entre acomodação e assimilação.

5. J J A greve de qualquer categoria profissional é urna situação de conflito entre patrões e

empregados. Urna sociedade estável, organizada e democrática controla o conflito. Limita-o

com regras. As negociações coletivas entre os trabalhadores e a indústria são exemplos de

conflitos limitados. Urna grande parte do conflito é canalizada pelos tribunais. Encerrado o

conflito, novas relações podem surgir" (BOUDON,R. e BOURRICAUD,F. D ic io nár io c rítico de

Sociologia. São Paulo: Ática, 1993). Você concorda com esse texto?

72

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TEXTO 1

Processo social

CAPÍ TU LO 4 C om o funcio na a sociedade?

A ssim como o texto Sociologia e sociedade indus tr ia l, de R alph D ahrendoif (veja a seção Textos

complementares do caP ítulo 1J o que você vai ler ago ra revela as controvérsias existentes n o interior da

Sociologia.

Em uma ciência exata, como a M atemática, não há discordâncias ent re os estudiosos sob re c erta s

proposições. P or e xemp lo, todos concordam que a soma de 2 mais 2 é igual a 4. A s Ciência s S oc ia is , e nt re ta nto ,

são ciências interpretativas. N elas, as m argens para diverg ências são m uito am plas. Aqui, o autor do texto

contrapõe u ma Sociologia influenciada pelo l ibera l ismo à S oc io lo gia in sP ira da n o m arxismo.

A história do conceito de processo social

está intimamente ligada à história do apareci-

mento da Sociologia como ciência autônoma.

Small observou que "todos os sociólogos des-

de Com te têm considerado, mais ou menos

conscientemente, esse conceito como sua

principal premissa". É opinião de Cooley que

"0 primeiro requisito para a formação de um

sociólogo é que ele aprenda a ver as coisas

habitualmente nesse sentido". [...J

A influência de Small foi importante, se

considerarmos que ele foi principalmente um

estudioso da história das ideias e chamou a

atenção para a tradição sociológica do tem-

po de Montesquieu e Savigny [século XVIIIJ,

que era formulada principalmente em termos

da teoria do processo social. [ ... J

O conceito de processo social represen-

ta uma importante reação contra uma teoria

estática. De fato, ele se opõe à concepção da

sociedade como uma estrutura, ou como umarranjo formal ou estático de blocos de maté-

ria. Como tal, está intimamente associado, na

história das ideias, com o pensamento evolu-

cionista enquadrou o pensamento social em

uma perspectiva temporal. [... J

No centro da teoria do processo so-

cial está, assim, a noção de movimento, mu-

dança, fluxo, noção da sociedade como um

contínuo "vir-a-ser". A "sociedade", escreve

Maciver, "existe somente como uma sequên-

cia temporal. É um vir-a-ser, não um ser;um processo, não um produto. A sociedade

somente existe como um equilíbrio instável

das relações presentes". [... J

[A noção de processo J deve ser vista

como centro de uma configuração total de

conceitos, que estão historicamente relacio-

nados com ela e logicamente implícitos nela.

Estes são: 1) o próprio conceito de proces-

so; 2) o conceito de interação social, ou de

sociedade como um fluxo de relações entre

indivíduos; 3) o conceito de continuidade

histórico-social; 4) o conceito de conexão

orgânica entre indivíduo e sociedade; 5) o

conceito de herança social; 6) o conceito

de sociedade como unidade orgânica; 7) o

conceito de múltiplos fatores e a rejeição, na

problemática da causação social, de quaisquer• •elementos particularistas ou deterministas.

A concepção de sociedade como um

todo orgânico recebeu sua expressão clássica

em Hegel [1770-1831]. No pensamento de

Hegel essa teoria combinou-se com uma teo-ria da dialética histórica, acentuando a conti-

nuidade da história. [ ... J

À influência de Hegel, Com te [1798-

-1857], e mais tarde Darwin [1809-1882J, na

formação da teoria do processo social, somou-

se, no século XIX, o pensamento marxista,

com suas repercussões. Este provocou uma po-

lêmica em torno de dois pontos: 1 ) a validade

de uma teoria do conflito na interpretação da

mudança social [teoria da luta de classes], 2 ) a

validade da interpretação materialista da histó-ria, com a seleção de uma única série de fatores

~ - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ~ ~

73

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CAP Í T ULO 4 C om o f un cion a a s oc ie da de ?

~ . - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ,

~ - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ~ ~

como sendo os que determinam a dinâmica damudança histórica [o autor se refere à impor-

tância atribuída por Karl Marx aos fatores eco-

nômicos como causa das mudanças históricas;

veja o capítulo 7]. [...]

Como reação à posição marxista, di-

versos autores retomaram à teoria sobre a

complexidade da sociedade e sobre a mul-

tiplicidade de fatores que devem ser invoca-

dos para explicar a sucessão dos eventos. A

causação múltipla tornou-se o mote daqueles

que se opunham ou temiam o pensamentomarxista. [ ... ]

Representando um meio-termo entre

marxismo e tradicionalismo, outros autores

discutiram a questão da relação entre os fatores

pessoais e os impessoais no processo histórico,

e a relação entre o indivíduo e a sociedade no

processo social. O ponto de vista que prevale-

ceu foi o da unidade orgânica entre os dois.

É significativo que o livro de Ccoley,

S oc ia l P ro ce ss [Processo social], que se situano fim dessa sequência histórica na tradição

sociológica, apanhe a configuração total dos

elementos existentes na teoria do processo

social. A conexão lógica entre eles é clara. Se

a sociedade é um processo e não um produ-

to ou um aglomerado, segue-se que ela será

somente um fluir de relações ou interações

entre indivíduos. [... ]

E se a sociedade é um fluir de relações,

segue-se que a história é uma ininterrupta

continuidade dessas relações - um processoevolutivo no qual, como no mundo orgâni-

co, a natureza não dá saltos e no qual o ato

mais catastrófico é a tentativa de romper com

o passado [ou seja, a revolução]. O indivíduo

só é impotente; ele vive somente através de

suas relações com os que o precederam: é a

herança social que eles lhe transmitem - sob

forma de conhecimento acumulado, institui-

ções cristalizadas e interesses definidos - que

o capacitam a reunir habilidade e método re-queridos para sobreviver.

74

Assim, o raciocínio sobre a oposiçãode indivíduo e sociedade deixa de ter sen-

tido: o indivíduo vive somente através da

sociedade. [ ...]

A teoria marxista é também uma teoria

orgânica; mas nela a dialética da história é

movida por uma série de causas particulares:

a organização da produção [fator econômico]

está tão unida às outras manifestações sociais

que as mudanças ocorridas naquela se refle-

tem nestas [ou seja, quando as forças produti-

vas mudam, a sociedade também se transfor-ma; veja o capítulo 7].

A linha principal da teoria do processo

social é orgânica, mas num sentido completa-

mente diferente. Não admite qualquer ênfase

particularista [ou seja, em um só fator, como

o econômico], vendo uma homogeneidade

qualitativa no processo social como um todo.

O problema da causação social torna-se, pois,

infinitamente complexo, não permitindo sim-

plificação. Uma mudança em qualquer parte doprocesso social deve ser considerada somente à

luz de outras mudanças (que são causa e efeito

ao mesmo tempo), em termos da multiplicidade

de fatores como base do processo social e em

termos da lógica fundamental do todo.

As ír n p l ícações desse complexo teórico

quanto à mudança social e suas consequên-

cias para a ação social têm um longo alcance.

Acentuando a continuidade ininterrupta da

história e da sociedade, ele tende a sustentar

o status cuo [ou seja, o estado em que se en-contra a sociedade] e inibir a ação revolucio-

nária, que pode eliminar o passado e pôr em

perigo a herança social [posição contrária à

de Marx, que atribuía particular importância

à revolução; veja o texto a seguir].

A mudança que a teoria do processo so-

cial prevê é somente aquela que é decorrência

natural dessa continuidade, e não a mudança

radical ou revolucionária. Afirmando a ligação

orgânica de indivíduo e sociedade, situa o locus[lugar] do processo social e o lugar da mudan-

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CAP Í T ULO 4 C om o fu nc ion a a s oc ie da de ?

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ça na mente do indivíduo, negando também opapel das forças impessoais na história.

No seu todo, a teoria do processo so-

cial representa o liberalismo no domínio da

Sociologia. [Entretanto], através de sua fun-

ção de racionalizar tanto a adesão ao status

1--__Pense e responda

ouo quanto o medo à ação revolucionária, asformulações da teoria têm apresentado impli-

cações de caráter marcadamente antiliberal.

Adaptado de: LERNER, Max. Processo social. In. CARDOSO,

Fernando Henrique e IANNI, Octavio. Homem e sociedade. São

Paulo: Companhia Editora Nacional, 1973. p. 205·11.

1. O que quer dizer o autor com a frase: o conceito de processo social "enquadrou o

pensamento social em uma perspectiva temporal"? Qual a diferença entre a teoria do

processo social e a concepção estática da sociedade?

2. Quais são as diferenças entre a teoria do processo social, tal como ela é definida pelo

autor, e a concepção marxista da História e da sociedade?

3. Por que o autor afirma que "através de sua função de racionalizar tanto a adesão ao status

quo quanto o medo à ação revolucionária, as formulações da teoria [do processo social]

têm apresentado implicações de caráter marcadamente antiliberal"?

o texto que você vai ler agora foi publicado em fevereiro de 1848. Escrito por K arl M arx e F riedrich

En gels , ele e xpõ e u ma conc epção da soc iedade qu e a tr ib ui p ar tic ular importância ao conflito . Depois de lê-Ia,

responda às questões formuladas.

2. Já é tempo de os comunistas publicarem

abertamente, diante de todo o mundo, suas

ideias, seus fins, suas tendências, opondo à

lenda do comunismo um manifesto do pró-prio partido.

Para isso, comunistas de várias nacionali-

dades reuniram-se em Londres e redigiram o se-

guinte manifesto, a ser publicado em inglês, fran-

cês, alemão, italiano, flamengo e dinamarquês.

Burgueses e Proletários

A história de toda sociedade existente até

hoje tem sido a história das lutas de classes.

Homem livre e escravo, patrício e ple-

beu, senhor e servo, mestre de corporação e

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TEXTO 2

A luta de classes

Um espectro ronda a Europa - o es-

pectro do comunismo. Todas as potências da

velha Europa uniram-se numa Santa Aliança

para exorcismá-lo. o papa e o tzar (imperadorda Rúss í a), Metternich (ministro da Áustria) e

Guizot (ministro da França), os radicais fran-

ceses e os espiões da polícia alemã.

Qual o partido de oposição que não foi

acusado de comunista por seus adversários no

poder? Qual o partido de oposição que também

não lançou contra seus adversários progressistas

ou reacionários o estigma do comunismo?

Daí decorrem dois fatos:

1. O comunismo já é considerado uma força

por todas as potências da Europa.

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companheiro, numa palavra, o opressor e ooprimido permaneceram em constante oposi-

ção um ao outro, levada a efeito numa guerra

ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que

terminou, cada vez, ou pela reconstituição

revolucionária de toda a sociedade ou pela

destruição das classes em conflito.

Desde as épocas mais remotas da his-

tória, encontramos, em praticamente toda

parte, uma complexa divisão da sociedade em

classes diferentes, uma gradação múltipla das

condições sociais. Na Roma Antiga, temos ospatrícios, os guerreiros, os plebeus, os escra-

vos; na Idade Média, os senhores, os vassalos,

os mestres, os companheiros, os aprendizes,

os servos; e, em quase todas essas classes, ou-

tras camadas subordinadas.

A sociedade moderna burguesa [ou so-

ciedade capitalista], surgi da das ruínas da so-

ciedade feudal, não aboliu os antagonismos

de classes. Apenas estabeleceu novas classes,

novas condições de opressão, novas formasde luta em lugar das velhas.

No entanto, a nossa época, a época da

burguesia, tem uma característica: simplificou

os antagonismos de classes. A sociedade glo-

bal divide-se cada vez mais em dois campos

hostis, em duas grandes classes que se defron-

tam - a burguesia e o proletariado.

Dos servos da Idade Média originaram-

se os burgueses privilegiados das cidades anti-

gas. Desses burgueses, surgiram os primeiros

elementos da burguesia atual.

A descoberta da América, o contorno doCabo [da Boa Esperança, no sul da África, em

1488], abriram novo campo para a burguesia

emergente. Os mercados da Índia oriental e da

China, a colonização da América, o comércio

com as colônias, o aumento dos meios de troca

e das mercadorias em geral, deram ao comér-

cio, à navegação, à indústria, um impulso jamais

conhecido antes e, consequentemente, ao ele-

mento revolucionário da sociedade feudal ins-

tável; um rápido desenvolvimento. [...]

A indústria moderna estabeleceu o mer-cado mundial, para o qual a descoberta da

América preparou o terreno. Esse mercado

deu um imenso desenvolvimento ao comér-

cio, à navegação e à comunicação por terra.

[... ] Vemos, portanto, como a própria burgue-

sia moderna é produto de um longo curso de

desenvolvimento, de uma série de revoluções

nos modos de produção e de troca. [...]

Historicamente, a burguesia desempe-

nhou um papel revolucionário.Onde quer que tenha assumido o poder,

a burguesia pôs fim a todas as relações feu-

dais, patriarcais e idílicas. [...]

As armas com que a burguesia abateu o

feudalismo voltam-se agora contra ela mesma.

A burguesia, porém, não forjou apenas

as armas que representam sua morte; produ-

ziu também os homens que manejarão essas

armas: o operariado moderno, os proletários.

MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido

Comunista. ln. LASKI, Harold. O M an ifes to C om un is ta d e1848.

Rio de Janeiro: Zahar, 1967.

1. Para Marx e Engels há um tipo de conflito social que desempenha um papel central na

história da humanidade. Que tipo de conflito social é esse? Cite um trecho do texto que

confirme sua opinião.

2. Ot ipo de conflito social destacado por Marx e Engels ainda ocupa um lugar central na

história contemporânea?3. Que novos conflitos caracterizam nossa época?

t---.-_Pense e responda

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