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Avaliação citológica da conjuntiva de cães clinicamente sadios pelo método panóptico Cytological evaluation of conjunctiva in healthy dogs by panoptic method Gisllyana Medeiros Azevedo – Médica veterinária Autônoma Almir Pereira de Souza – Médico veterinário; Professor; Doutor; Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária (UAMV) / Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) – Campus de Patos – PB. email: [email protected] Roseane de Araújo Portela – Médica veterinária; Mestranda UFCG – Campus de Patos - PB Elaine Silva Dantas – Médica veterinária., Residente UFCG – Campus de Patos-PB Rosangela Maria Nunes da Silva – Médica veterinária; Doutoranda UFRPE – Recife – PE Joaquim Evêncio Neto – Médico veterinário; Professor; Doutor; DMFA/UFRPE – Recife-PE Azevedo GM, Souza AP, Portela RA, Dantas ES, Silva RMN, Neto JE. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009; 7(23); 473-477. Resumo Foram realizados exames de citologia conjuntival em 30 cães de raças e idades variadas os quais foram distribuídos de acordo com a idade em dois grupos: GI (até um ano de idade) e GII (mais de um ano de idade). As coletas foram realizadas com swab estéril, o qual era rotacionado sobre a conjuntiva inferior e rolado levemente sobre lâmina de vidro, obtendo uma quantidade de células suficiente para realização da avaliação, posteriormente coradas com Panóptico Rápido. Foi observado em ambos os grupos células epiteliais das camadas superficial e intermediária. Em + 67% dos animais do GII e em 27% do GI observou-se grande quantidade de células inflamatórias. Concluiu-se que a coloração pelo método Panóptico é eficaz para a avaliação citológica e que apesar dos animais não apresentarem alterações oculares evidente, a presença de células inflamatórias é marcante. Palavras-chave: Citologia, conjuntiva, cães, swab Abstract The conjunctival cytology exams were performed in 30 dogs of several breeds and ages which were distributed accordingly to the age in two groups: GI (animal until 1 year old) and GII (animals over 1 year old). The samples were collected with the use of a sterile swab; which was rotated on the lower conjunctiva, and rolled slightly on sheet of glass, obtaining enough quantity of cells to perform the evaluation, subsequently stained with quick Panoptic. In all smears it was observed the presence of epithelial cells of the superficial and intermediary layers. Around 67% of the animals of the GI and 27% of the GII, it was observed a large quantity of inflammatory cells. Concluding that the technique of the Panoptic proved to be efficient to cytological evaluation and therefore the animals didn’t have ophthalmic diseases evident, the presence of inflammatory cells is significant. Keywords: Cytology, conjunctiva, dogs, swab Trabalho de pesquisa 473 Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009;7(23);473-477.

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Avaliação citológica da conjuntiva de cães clinicamente sadios pelo método panóptico

Cytological evaluation of conjunctiva in healthy dogs by panoptic methodGisllyana Medeiros Azevedo – Médica veterinária Autônoma

Almir Pereira de Souza – Médico veterinário; Professor; Doutor; Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária (UAMV) / Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) – Campus de Patos – PB. email: [email protected]

Roseane de Araújo Portela – Médica veterinária; Mestranda UFCG – Campus de Patos - PB

Elaine Silva Dantas – Médica veterinária., Residente UFCG – Campus de Patos-PB

Rosangela Maria Nunes da Silva – Médica veterinária; Doutoranda UFRPE – Recife – PE

Joaquim Evêncio Neto – Médico veterinário; Professor; Doutor; DMFA/UFRPE – Recife-PE

Azevedo GM, Souza AP, Portela RA, Dantas ES, Silva RMN, Neto JE. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009; 7(23); 473-477.

ResumoForam realizados exames de citologia conjuntival em 30 cães de raças e idades variadas os quais foram distribuídos de acordo com a idade em dois grupos: GI (até um ano de idade) e GII (mais de um ano de idade). As coletas foram realizadas com swab estéril, o qual era rotacionado sobre a conjuntiva inferior e rolado levemente sobre lâmina de vidro, obtendo uma quantidade de células suficiente para realização da avaliação, posteriormente coradas com Panóptico Rápido. Foi observado em ambos os grupos células epiteliais das camadas superficial e intermediária. Em + 67% dos animais do GII e em 27% do GI observou-se grande quantidade de células inflamatórias. Concluiu-se que a coloração pelo método Panóptico é eficaz para a avaliação citológica e que apesar dos animais não apresentarem alterações oculares evidente, a presença de células inflamatórias é marcante.

Palavras-chave: Citologia, conjuntiva, cães, swab

AbstractThe conjunctival cytology exams were performed in 30 dogs of several breeds and ages which were distributed accordingly to the age in two groups: GI (animal until 1 year old) and GII (animals over 1 year old). The samples were collected with the use of a sterile swab; which was rotated on the lower conjunctiva, and rolled slightly on sheet of glass, obtaining enough quantity of cells to perform the evaluation, subsequently stained with quick Panoptic. In all smears it was observed the presence of epithelial cells of the superficial and intermediary layers. Around 67% of the animals of the GI and 27% of the GII, it was observed a large quantity of inflammatory cells. Concluding that the technique of the Panoptic proved to be efficient to cytological evaluation and therefore the animals didn’t have ophthalmic diseases evident, the presence of inflammatory cells is significant.

Keywords: Cytology, conjunctiva, dogs, swab

Trabalho de pesquisa

473Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009;7(23);473-477.

Avaliação citológica da conjuntiva de cães clinicamente sadios pelo método panóptico

IntroduçãoOs olhos constituem uma das mais perfeitas obras, cria-

das para auxiliar no andamento harmonioso de nossa vida. É através dos mesmos, que podemos enxergar, traduzindo assim nossos sentimentos, gostos e sensações, atuando como uma câmara de recepção de luz e revelação de imagens. No intuito de buscar novas formas de manejar as oftalmopa-tias, torna-se necessário o conhecimento dos anexos e órgãos acessórios do olho, bem como as principais patologias que acometem esse órgão. Sabendo-se da importância da visão, para uma melhor condição de vida, a área da oftalmologia tem uma importância fundamental no ramo da Medicina, e que atualmente, vem ganhando grande destaque na Medici-na Veterinária.

Estudos têm demonstrado a eficácia dos diagnósticos obtidos pelo exame citológico, em que o mesmo apresenta-se menos dispendioso, de resultado rápido, utilizando ma-teriais de fácil obtenção e por não ser uma técnica invasiva. Na citologia, o objetivo principal é identificar o processo pa-tológico existente através da identificação e qualificação das células que dele se descamam (1). De modo que o preparo da lâmina consiste de uma etapa importante para a obtenção de um diagnóstico seguro. A coleta da amostra para a citologia é feita com auxílio de swabs de algodão, escovas para citologia esfoliativa, espátulas, lâminas de bisturi com ponta romba e agulha, que será definida de acordo com a localização anatô-mica da lesão e as características do tecido. Da mesma forma, o método de preparo da lâmina também depende dessas ca-racterísticas, podendo ser de forma aspirativa, imprint, esfo-liativa, por lavagem, ou impressão com swabs (2).

Após a coleta as amostras devem ser suavemente roladas sobre as lâminas de vidro para evitar dano celular, seguida da fixação com calor, acetona, sprays fixadores especiais para citologia ou alguma combinação dessas técnicas. Os métodos de coloração mais comumente utilizados incluem o Gram e várias colorações tipo Romanowsky (3).

Da necessidade de maiores conhecimentos sobre a citolo-gia oftalmológica, objetivou-se com esse trabalho fazer uma avaliação da secreção conjuntival de cães aparentemente sa-dios, a fim de estabelecer parâmetros de normalidade nesses casos, bem como avaliar o uso da técnica do swab de algodão e do método Panóptico para a coloração das lâminas.

Material e métodoFoi realizada a coleta da secreção ocular de 30 cães, ma-

chos e fêmeas, de idade variada com e sem raça definida, ob-tidos junto ao setor de Clínica Médica de Pequenos Animais do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Campina Grande-Campus de Patos-PB, sem sinais aparentes de altera-ções oculares, como produção de exsudato e/ou congestão, que indicassem oftalmopatias. Foram constituídos dois gru-pos, de igual número, distribuídos de acordo com a idade dos animais previamente denominados de GI (animais com até 1 ano de idade) e GII (animais com mais de 1 ano de idade).

Comprovada a ausência de problema ocular aparente, era exposta a conjuntiva inferior, sobre a qual era passado o swab estéril, em movimento de rotação (figura 1), rolando o mesmo em seguida na lâmina de microscopia, limpa e desengordu-rada, inicialmente em um olho e seguindo o mesmo processo no outro. As lâminas foram identificadas de acordo com o número do cadastro do animal e localização do olho (direito e esquerdo), e em seguida foram encaminhadas para o Labo-ratório de Patologia Clínica do Hospital Veterinário da Uni-versidade Federal de Campina Grande-Campus de Patos-PB, para posterior fixação e coloração. Após a secagem da lâmina ao ar livre, realizou-se a coloração desta com o corante Pa-

Figura 1: Coleta de secreção conjuntival com swab de algodão.

nóptico Rápido.Ato contínuo, a lâmina foi lavada em água corrente e colo-

cada para secar ao ar livre para em seguida ser analisada em microscópio óptico1, com aumento de 100x e 400x.

A avaliação foi realizada inicialmente utilizando objetiva de 10X, para a observação da disposição das células. Em se-guida, com o auxílio da objetiva de 40X, foi feita a avaliação da morfologia celular, detectando o tipo de célula presente. Realizou-se a contagem de 100 células, com o auxílio do con-tador automático de células sanguíneas, percorrendo a lâmi-na em movimentos progressivos em vai e vem, observando em seguida o número correspondente a cada tipo celular.

ResultadosEm ambos os grupos as células apresentaram-se dispostas

em grupos (figura 2) ou isoladas (figura 3), e em poucas lâmi-nas observou-se a presença de células rompidas.

Os tipos celulares mais encontrados foram as células das camadas intermediária e superficial, apresentando morfolo-gia variando de poligonal, achatadas ou redondas. Em rela-ção à predominância de um tipo celular, detectou-se em 50% das lâminas o predomínio de células intermediárias grandes e pequenas, com núcleo central, podendo estar circular ou com formato variado e citoplasma basofilico, e em outras 50% pre-

1 Microscópio Óptico modelo – Nikon Eclipse® E 200.

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dominância de células epiteliais superficiais, onde algumas apresentavam-se com tamanho maior que as intermediárias, hipocoradas e com núcleo picnótico ou ausente, observando essa variação em ambos os grupos avaliados (figura 4).

Foram observadas em seis lâminas do GI e em sete lâmi-nas do GII presença de grânulos de melanina intracitoplas-máticos, em ambos os tipos celulares epiteliais, sendo mais evidente nas células superficiais que apresentavam-se em processo de degeneração (figura 5). Destacou-se também a presença de células epiteliais com vacuolizações intracito-plamáticas perinucleares em seis lâminas do GI e em cinco lâminas do GII (figura 6). Observou-se também pouca quan-tidade de muco em algumas lâminas. Um outro achado pre-

dominante foi a presença considerável de células com bordas citoplasmáticas dobradas (figura 7).

Em relação a presença de células inflamatórias, houve predominância no GII, independente do quadro clínico apre-sentado pelo animal. Em aproximadamente 67% das lâminas visualizou-se uma grande quantidade de células inflamatórias que estavam dispostas em grandes agrupamentos circundando as células epiteliais, desde pequenos grupos, até mesmo isola-das, evidenciando em especial a presença de neutrófilos, em sua grande maioria degenerados, macrófagos e em menor número, linfócitos e plasmócitos. Em 27% das lâminas do GI, também ve-rificou-se aumento do número de células inflamatórias, do tipo neutrófilo, da mesma forma que a encontrada no GII (figura 8).

Figura 2: Disposição das células da conjuntiva agrupadas (Panóptico; 100X)

Figura 3: Disposição das células da conjuntiva isoladas. (Panóptico; 100X)

Figura 4: Células intermediária e superficial da conjuntiva de cães, (Panóptico; 100X)

Figura 5: Célula epitelial superficial anucleada, com grânulos de melanina intracitoplasmático, da

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475Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009;7(23); 475-477.

Avaliação citológica da conjuntiva de cães clinicamente sadios pelo método panóptico

Figura 6: Células epiteliais com vacúolos intracitoplasmáticos perinucleares da conjuntiva de cães. (Panóptico; 400X)

Figura 7: Células epiteliais com bordas citoplasmáticas dobradas. (Panóptico; 400X)

Figura 8: Células epiteliais envoltas por uma grande quantidade de neutrófilos. (Panóptico; 100X)

DiscussãoA técnica de coleta por meio de swab de algodão, mos-

trou-se bastante eficaz na qual obteve-se uma boa amostra-gem celular, em praticamente todas as lâminas, sendo rea-lizada de maneira a não ter causado desconforto ao animal que apenas era contido fisicamente. A passagem do swab não causou quaisquer lesão ou irritação da mucosa. Segunod ou-tros autores o método de coleta com papel-filtro apresenta vantagens sobre o método de coleta por swab, uma vez que neste último há perda de células que não são transferidas à lâmina (4). Por outro lado, constatou-se nesta pesquisa que o método do swab pode ser considerado prático, com obtenção de resultados confiáveis para a análise citológica semelhantes à técnica utilizando papel-filtro (4,5).

Outrossim, pode-se afirmar que a técnica de coleta com swab é mais confortável e segura para o paciente do que a utilizada com escova ginecológica, a qual pode apresentar eritrócitos (6), o qual segundo os autores estariam relaciona-dos a contenção dos animais, contidos fisicamente por meio de puçá. Ademais, com a técnica do swab não se torna ne-cessário o uso de colírio anestésico para a coleta do material, conforme pode ser visto com o uso de papel-filtro de acetato de celulose (7).

O método de coloração mostrou-se bastante eficiente, uma vez que tornou possível possível a observação clara, mais especificamente núcleo e citoplasma, com apenas algu-mas lâminas com falha de coloração. A qualidade do esfrega-ço corado é fundamental para a interpretação, de forma que dependendo do que se queira observar, deve-se escolher cor-retamente o corante, de modo que existem vários tipos de co-rantes citológicos, mas rotineiramente os mais fáceis, rápidos e eficazes principalmente em relação ao custo são os corantes rápidos do tipo Romanowsky (2). Uma desvantagem desse tipo de corante é que não parecem sofrer reação metacromá-tica, não corando assim os grânulos de alguns mastócitos (8). Sendo assim, o método de coloração utilizado neste estudo mostrou-se bastante eficiente, no que diz respeito a qualidade da lâmina, com boa visualização dos constituintes celulares e de rápida realização. O corante panóptico, refere-se a um conjunto de corantes utilizados para coloração diferencial dos elementos figurados do sangue, tendo em sua composi-ção corantes ácidos e básicos, de tal modo que todas as estru-turas celulares podem ser coradas conforme sua afinidade. A escolha do corante se deu em especial pela rapidez e pratici-dade do preparo.

Foram observadas em todas as amostras presença de célu-las epiteliais conjuntivais, dispostas em sua maioria isoladas e em menor quantidade agrupadas em ambos os grupos, se-melhantes a técnica de coleta por impressão com papel filtro em gatos, discordando apenas no que diz respeito a dispo-sição das células, onde as mesmas se apresentavam em sua maioria agrupadas (5).

Em metade das lâminas de ambos os grupos, houve o pre-domínio de células da camada intermediária apresentando-se em quase sua totalidade, com núcleo grande de formato circular e central de coloração fortemente basofílica, com cito-plasma fracamente basofílico, da mesma forma encontradas

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Avaliação citológica da conjuntiva de cães clinicamente sadios pelo método panóptico

em lâminas coradas pelo método de Giemsa e Shorr (5). Nos outros 50% das lâminas as células superficiais predomina-vam, apresentando-se em sua maioria isoladas com tamanho maior que as intermediárias, com núcleo central e pequeno, com citoplasma abundante e corado eosinofilicamente (9). Algumas apresentavam-se com núcleo picnótico ou até mes-mo ausentes.

As células superficiais são encontradas em mucosas e típi-cas representantes da morte celular (10). Dessa forma, a pre-dominância dessas juntamente com as do tipo intermediárias poderiam estar associadas ao tipo de coleta de material em-pregada (swab), que, ao contrário de outras técnicas mais es-foliativas, não removeria as células basais que se encontram sobre a membrana basal, não descamando com facilidade.

Observou-se em 40% das lâminas do grupo I e em 47% das lâminas do grupo II, presença de células com pigmentos de melanina intracitoplasmáticos, em ambos os tipos celu-lares epiteliais com maior evidência nas células superficiais hipocoradas e presença de células com bordos citoplasmáti-cos dobrados, ambos de acordo com os achados citados na literatura (11,12).

Destaca-se a presença de células epiteliais vacuolizadas intracitoplasmaticamente ao redor do núcleo, totalizando 40% no grupo I e 33% no grupo II, em algumas células es-ses vacúolos chegaram a deslocar o núcleo lateralmente. Esse achado representa um sinal de degeneração celular (13), o qual não está de acordo com os resultados obtidos nesse es-tudo haja vista todos os animais não estarem com alteração ocular evidente.

Grandes quantidades de neutrófilos, foram observados, principalmente em animais do Grupo II, em que os mesmos apresentavam-se agrupados ao redor das células epiteliais, ou agrupados entre si, formando grandes feixes celulares em al-

guns casos incontáveis, sinais não normalmente encontrados em olhos de animais sadios (7). A abundância de neutrófilos em geral indica, inflamação aguda ou ativa em andamento, deven-do-se suspeitar inicialmente de uma etiologia bacteriana8. Em menor proporção porém em quantidade significativa, pôde-se observar presença de linfócitos, plasmócitos e especialmente macrófagos. Raros neutrófilos e linfócitos já foram observa-dos por outros autores (5). Se não vierem associados a achados oculares pode ser considerado normal. Os linfócitos correspon-dendo 30% a 70% costumam ser indícios de uma forte resposta imune na inflamação crônica e os macrófagos estão presentes em lesões inflamatórias quando há grande quantidade de res-tos teciduais, estimulação imune ou atração por agentes patoló-gicos específicos (8). A conjuntivite está relacionada ao tipo de célula predominante, podendo ser neutrofílica quando associa-da com agentes infecciosos, como bactérias e vírus, assim como causas não-infecciosas (1,14). Um grande número de neutrófi-los irá caracterizar sempre uma inflamação supurativa, qual-quer que seja a proveniência e o tipo do material examinado (1).

ConclusãoCom base nos achados obtidos neste estudo foi possível

concluir que a citologia de impressão com swab de algodão e a coloração pelo Panóptico são eficazes tanto no que diz res-peito à forma de coleta, de fácil execução, quanto em relação à amostragem celular que em quantidade suficiente para a elaboração de diagnósticos. Dessa forma, pode-se recomen-dar tanto a técnica de coleta como a coloração empregada para o diagnóstico de enfermidades conjuntivais.

Outrossim, é válido ressaltar que a presença de células inflamatórias na conjuntiva de cães não é um fator preponde-rante para o diagnóstico de enfermidades inflamatórias desta estrutura.

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Varela. 2005. p. 125-149.2. Hendrix, CM. Procedimentos laboratoriais para técnicas veterinárias. 4 ed. São

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gatos (Felis domestica). Revista de Educação Continuada, v. 5, n. 1, p. 41-47, 2002. 6. Sá, FB; Melo, LM; Evêncio Neto, J; Almeida Neto, JB; Baratella-Evên-cio, L. Citologia esfoliativa conjuntival em gato-do-mato (Leopardus tigrinus) clinicamente sadios. Arquivos do Instituto Biológico, v. 70, p. 453-457, 2003

6. Godoy-Esteves, CAL; Barros, JN; Cunha, LS; Mascaro, VLD; Hofling-Lima, AL; Barros, PSM. Padronização da citologia de impressão da superfície ocular cani-na. Archives of Veterinary Science, v.10, n.1, p.109-115, 2005.

7. Reppas, GP; Canfield, PJ. Citologia diagnóstica de lesões cutâneas. In: Ettin-ger, SJ; Feldman, EC. Tratado de Medicina Interna Veterinária, 5 ed. V. 1. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. p. 53-56.

8. Azevedo, ML. Citologia ocular. 1962. 88f. Tese (Doutorado). Faculdade de Medi-cina Veterinária, Universidade de São Paulo, São Paulo. 1962.

9. Vannucchi, CI; Satzinger, S; Santos, SEC. Técnica de citologia vaginal como método de diagnóstico da fase do ciclo estral em cadelas. Clínica Veterinária, n.9, p. 14-19, 1997).

10. Lavach, JD; Thrall, MA; Benjamin, MM. Cytology of normal and inflamed con-junctivas in dogs and cats. Journal of the American Veterinary Medical Associa-tion, v. 170, p.722-727, 1977.

11. Malerba, TA. Citologia esfoliativa de conjuntiva de cães (Canis familiaris) e gatos (Felis domestica). 1990. Dissertação- Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1990.

12. Rupley, AE. Manual de clínica aviária. São Paulo: Roca, 1999. 582 p.13. Raskin, RE.; Meyer, DJ. Atlas de citologia de cães e gatos. São Paulo: Roca,

2003, p. 309-323.

Recebido para publicação em: 03/11/2009.Enviado para análise em: 03/11/2009.Aceito para publicação em: 11/11/2009.

477Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009;7(23); 477-477.

Observações clínicas e eletrorretinográficas em cães com perda súbita de visão

Electroretinographic and clinical observation in dogs with sudden vision loss Marianna Bacellar – MV,Estudante de Mestrado UFPR

Suelen B. Baldotto – MV, Residente de Oftalmologia Comparada da UFPR

Fabiano Montiani-Ferreira – MV, MSc, PhD, Professor da UFPR

Bacellar M, Baldotto SB, Ferreira FM. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009; 7(23); 479-483.

ResumoO diagnóstico diferencial da perda súbita de visão inclui doenças neurológicas como intoxicações do sistema nervoso central, amaurose idiopática, neurite óptica retrobulbar, compressão ou neoplasia no quiasma óptico, tumores pituitários e outras cegueiras centrais de manifestação brusca. Além disso, a degeneração súbita adquirida de retina (DSAR), os descolamentos de retina e as toxicidades coriorre-tinianas são outras causas importantes de cegueira súbita, assim como crises de hipertensão. A DSAR é uma doença que afeta cães de meia-idade, geralmente obesos, cujo principal sinal clínico é a perda de visão associada a fundoscopia sem alterações. Para chegar ao diagnóstico preciso, há a necessidade da realização da eletrorretinografia (ERG), a fim de se avaliar a funcionalidade da retina. O objetivo do presente trabalho é relatar a prevalência dos casos de cegueira súbita, particularmente de DSAR, atendidos na casuística do Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR. Nove animais foram enca-minhados ao Serviço de Oftalmologia comparada com a queixa de perda súbita da visão. Todos foram submetidos a consulta oftalmológica completa, seguida de indicação da ERG. Em três casos foi feita documentação fotográfica do fundo de olho empregando uma lâmpada de fenda com capacidade de oftalmoscopia indireta. Dos nove casos, quatro foram submetidos ao ERG pelo protocolo “QuickRe-tCheck”, o qual consiste em estímulos por flashes de luz com intensidade de de 3000 e 10000 mcd.s/m2. Para o exame os animais foram pré-medicados com 0,5 mg/kg midazolam e 0,5 mg/kg morfina, IM, foi instilada uma gota do colírio de Tropicamida 1% em ambos os olhos, durante a adaptação ao escuro (20 minutos). Foram anestesiados com 1,5 mg/kg/min de propofol e 0,5 mg/kg/min cetamina S(+), IV, até a perda dos reflexos palpebrais e tolerância ao blefarostato. Dos animais avaliados, três foram considerados suspeitos de DSAR, dois foram diagnosticados com retinotoxicidade induzida por drogas (fármacos) e quatro com DSAR. Não foi detectada qualquer alteração na fundoscopia dos animais e nos exames de eletrretinografia foi observada ausência de resposta. A prevalência dos casos de DSAR na casuística total do Serviço de Oftalmologia Comparada foi de 1,18% (quatro de 339 casos) e dentro dos nove casos de cegueira abrupta foi de 44,5% (quatro de nove casos). Concluindo, para um diagnóstico preciso da DSAR é necessária a eletrorretinografia, mas infelizmente, ainda se classifica a DSAR como uma doença sem cura, apesar dos animais se adaptarem com certa facilidade a vida sem visão.

Palavras-chave: Retinotoxicidade, cães, prevalência, degeneração súbita adquirida de retina

Trabalho de pesquisa

479Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2009;7(23);479-483.

Observações clínicas e eletrorretinográficas em cães com perda súbita de visão

IntroduçãoCausas de cegueira súbita

O diagnóstico diferencial da perda súbita de visão inclui doenças neurológicas como intoxicações do sistema nervoso central, amaurose idiopática, neurites ópticas, incluindo as retrobulbares (por meningoencefalite granulomatosa, por exemplo), compressão ou neoplasia no quiasma óptico, tu-mores pituitários e outras cegueiras centrais de manifestação brusca (1). Episódios agudos de hipertensão também podem causar cegueiras súbitas em cães e gatos. Além disso, a dege-neração súbita adquirida de retina (DSAR), os descolamentos de retina e as toxicidades coriorretinianas são outras causas importantes de cegueira súbita. O diagnóstico de todas es-sas condições é baseado no histórico, nos sinais clínicos, nos exames oftálmico e neurológico, com especial atenção para a fundoscopia e eletrorretinografia (2).

Etiologia da degeneração súbita adquirida de retina (DSAR)Pouco se sabe ainda sobre a correta etiologia e fisiopatolo-

gia da DSAR (1). Um estudo revela a possível relação entre a concentração elevada de glutamato no vítreo levando a toxi-dade da retina; embora essa teoria tenha sido explorada, ela ainda é desconhecida (2). Alguns casos de DSAR têm mostra-do uma forte relação com hepatopatia que pode cursar con-comitantemente. Tais casos geralmente apresentam níveis de

AbstractThe differential diagnosis of sudden vision loss include neurological diseases such as central nervous system in-toxication, optic neuritis, retrobulbar lesions, compression induced by a tumor in the optic chiasm, pituitary tu-mors and other sudden central blindness. Furthermore, acute hypertension, sudden acquired retinal degeneration (SARD), retinal detachment and chorioretinal toxicities are other important causes of sudden blindness. SARD is a disease that affects dogs of middle age, usually obese and the main clinical sign is the vision loss associated with normal fundus, to get to a diagnosis, there is a necessity of electroretinography to evaluate retinal function. The purpose of this study is to report the prevalence of cases of sudden blindness, particularly SARD, seen at the Com-parative Ophthalmology Service, UFPR. Nine animals were sent to the Comparative Ophthalmology Service with the complaint of sudden loss of vision. All patients were submitted to a complete ophthalmic exam, in three cases fundus photographs were taken using a slit lamp with a indirect ophthalmoscope built in, in three cases blood tests were performed. An ERG was suggested to all of them but only in four cases it was performed. The ERG protocol selected was “QuickRetCheck”, which consists of stimulation by flashes of light with intensity of 3,000 and 10,000 mcd.s/m2. For the test, animals were premedicated with 0.5 mg / kg midazolam and 0.5 mg / kg morphine, IM. A drop of 1% tropicamide in both eyes was applied during dark adaptation (20 minutes). They were then anes-thetized with 1.5 mg / kg / min of propofol and 0.5 mg / kg / min ketamine S (+), IV, until loss of eyelid reflexes and tolerance to eyelid speculum. In all nine cases of sudden blindness, three had the presumptive diagnosis of SARD; two were diagnosed with retinal toxicity induced by drugs and four with confirmed SARD. No changes in the fundus of the animals diagnosed with SARD were found and no response in ERGs was observed also. The prevalence of SARD cases seen considering the total caseload of UFPR´s Comparative Ophthalmology Service during one year was 1.18% (four out of 339 cases). Within the total of nine cases of sudden blindness a prevalence of 44.5% of confirmed SARDs was seen (four out of nine cases). In conclusion, for an exact diagnosis of SARD the electroretinography is necessary. Unfortunately, SARD still ranks as an incurable disease, despite the animals to adapt quite easily to live without vision.

Keywords: retinal toxicity, dogs, prevalence, SARD.

fosfatase alcalina sérica, aminotransferase sérica, colesterol sérico ou bilirrubina sérica elevada (3). Miller et al. (4), su-gerem que, independente da etiologia da doença, a apopto-se dos fotorreceptores leve a degeneração da retina, porém é desconhecido o caminho ou distúrbio sistêmico que leva a esse mecanismo. Entretanto, sabe-se que a apoptose é quase sempre o resultado final. Bellhorn et al (5), adicionalmente, propuseram a possibilidade da DSAR ser imunomediada, uma vez que cinco dos cães por ele estudados apresentaram anticorpos antirretina, levando a hipótese da DSAR ser uma retinopatia autoimune.

Histórico e sinais clínicos da DSARA doença afeta principalmente cães de meia idade, obe-

sos, ou que frequentemente obtiveram ganho de peso e sem predisposição racial, sendo caracterizada pela perda abrupta da visão (1). A maioria dos cães afetados apresenta moderada dilatação pupilar, reflexo pupilar presente, mas geralmente diminuído ou ausente além de leve/moderada hiperemia conjuntival em alguns casos. No inicio da doença o fundo ocular aparece sem alterações à fundoscopia, entretanto em estágios mais avançados a atenuação de vasos da retina e o aumento da reflexidade tornam-se aparentes (6).

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Observações clínicas e eletrorretinográficas em cães com perda súbita de visão

atividade elétrica da retina é presente.

Objetivos do estudoEste estudo retrospectivo tem o objetivo de relatar a pre-

valência dos casos de cegueira súbita, particularmente de DSAR, atendidos na casuística do Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR. Adicionalmente, o estudo demonstra a importância do uso da eletrorretinografia, além de outros exames complementares, como ferramenta de auxílio ao mé-dico veterinário ao diagnosticar a DSAR e outras cegueiras abruptas.

Material e métodoForam examinados 9 cães de acordo com a Tabela 1, enca-

minhados ao Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR, com a queixa principal de perda súbita de visão.

Eletrorretinografia da DSARA eletrorretinografia (ERG) é um método diagnóstico rá-

pido e não-invasivo para avaliação da funcionalidade da re-tina. Com o exame é possível realizar uma avaliação geral da função das células fotorreceptoras, que são as responsáveis pela fototransdução que, em conjunto com as outras células, transmitem a informação elétrica ao nervo óptico (7,8,9). Com frequência a ERG é usada na rotina clínica de pequenos ani-mais para auxiliar nos diagnósticos de doenças como atrofia progressiva de retina (APR) e degeneração súbita adquirida de retina (DSAR) e para avaliação da função geral da retina antes de cirurgias de catarata (10). A ERG é de grande im-portância diagnóstica para determinar a causa da cegueira, sendo uma chave para o diagnóstico diferencial já que em animais com DSAR, a atividade elétrica da retina é ausente, e nas doenças neurológicas causadoras de cegueira súbita, a

Raça Idade (anos) Sexo Peso (kg) Diagnóstico

Pinscher 8 Fêmea 2,7 suspeita de DSARSem raça definida 2 Fêmea 2,1 Toxicidade induzida por drogasDachshund 3 Fêmea 5,3 Retinotoxicidade induzida por drogasSchnauzer 10 Fêmea 8,5 Hiperadrenocorticismo, suspeita de DSARPoodle 7 Fêmea 7 DSARPoodle 6 Macho 8 DSARCocker Spaniel 5 Fêmea 10,5 DSARLhasa Apso 3 Fêmea 5 DSARPinscher 8 Fêmea 3,6 suspeita de DSAR

Tabela 1: Pacientes encaminhados ao Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR com queixa de perda súbita de visão durante o período de um ano.

Todos os pacientes foram submetidos à consulta oftal-mológica completa e em 3 casos procedeu-se documenta-ção fotográfica de fundo de olho empregando uma lâm-pada de fenda com capacidade de oftalmoscopia indireta (Hawk eye, Dioptrix, L´Union, França). Exames hema-tológicos e bioquímica sérica (ALT, creatinina, fosfatase alcalina, glicose, GGT e ureia) foram realizados em três dos nove casos, uma vez que houve anuência dos pro-prietários.

Houve indicação da realização da ERG para todos os ca-sos, mas somente em quatro deles os proprietários autoriza-ram o exame. O protocolo de exame (ERG) selecionado foi o “QuickRetCheck” (RetVet™ Corp, Columbia,Missouri), o qual consiste em estímulos por flashes de luz com intensidade de de 3000 e 10000 mcd.s/m2.

Antes de cada procedimento, os animais foram submeti-dos a um jejum alimentar de 12 horas e hídrico de 6 horas. A medicação pré-anestésica, constituída por midazolam (0,5 mg/kg, Dormire®, Cristália, São Paulo-SP, Brasil) e morfina (0,5 mg/kg, Dimorf®, Cristália, São Paulo-SP, Brasil), IM, foi aplicada durante a adaptação ao escuro, que durou 20 mi-nutos, junto com a instilação de uma gota do colírio de Tro-picamida 1% (Mydriacyl®, Alcon, São Paulo, SP) em ambos

os olhos. Todos os animais receberam suporte hídrico paren-teral (fluidoterapia) e suplementação com oxigênio, quando necessário.

Realizou-se a indução anestésica com propofol (1,5 mg/kg/min, Propovan®, Cristália, São Paulo-SP, Brasil) e ceta-mina S(+) (0,5 mg/kg/min, Ketamin-S(+)®, Cristália, São Paulo-SP, Brasil), IV, até a perda dos reflexos palpebrais e tolerância do animal ao uso de um blefarostato. Na sequ-ência, eram posicionados os eletrodos do tipo subdérmicos (FD-E2-24, Grass Tecnologies, Astro-Medical, Inc., West Warwick, RI). O primeiro deles é denominado de “terra” e foi inserido na região lombar do animal, seguido do “refe-rência”, esse inserido a 2,5 cm do canto temporal da rima palpebral do olho a ser examinado. Com o auxílio de um blefarostato, o eletrodo de contato (ERG-jet, Nicolet Instru-ments , Madison ,WI) foi posicionado sobre a córnea do animal. Em seguida, deu-se início ao teste utilizando um eletrorretinógrafo portátil (HMsERG 1000, RetVet Corp, Columbia, EUA). Após completo o teste em um olho, era repetida a operação no olho contralateral. Os dados obti-dos foram observados utilizando o programa de compu-tador (software) ERGVIEW 2.1.1.0 (RetVet Corp, Columbia, EUA).

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Observações clínicas e eletrorretinográficas em cães com perda súbita de visão

ResultadosDurante a consulta oftálmica, a queixa principal de todos

os casos era que o paciente teria perdido a visão rapidamente. Nos quatro casos (dois Poodles, Lhasa Apso e Cocker Spa-niel) nos quais foram realizadas as ERGs e no caso de um dos animais (da raça Pinscher), os proprietários procuraram o Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR somente com a queixa de perda abrupta de visão.

No total concluímos que dos nove casos de cegueira abrupta atendidos pelo Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR, quatro deles receberam o diagnóstico de DSAR e três, como suspeitos de DSAR.

Com relação aos outros dois casos, em um deles o pro-prietário de um cão SRD relatou a ingestão acidental de ivermectina (comprimido de 12 mg) com queixa de vômito e perda de visão. O outro animal, da raça Dachshund, esta-va sendo tratado com carprofeno 25mg SID e cefalexina 50 mg por via oral e havia recebido pomada de cloranfenicol para o tratamento de uma conjuntivite, e o proprietário re-latou perda de visão abrupta dois dias antes do paciente ser referido ao Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR.

Nesses dois casos, atribuídos à toxicidade de sistema ner-voso central (SNC) e retina, respectivamente, induzida por drogas (fármacos), como esperado, a visão dos pacientes voltou em aproximadamente duas semanas, não sendo considerados portadores de DSAR, a despeito das ERGs não terem sido realizadas .

Dentre os casos suspeitos de DSAR, o animal da raça Sch-nauzer já estava sendo tratado para hiperadrenocorticismo quando o proprietário observou a perda da visão. Por último, um animal que o proprietário relata a perda da visão logo após um assalto em sua casa. Foi observado também que dos nove casos somente um era macho.

Com relação aos exames sanguíneos, notou-se em três animais (dois casos e um suspeito de DSAR), um aumento na ALT e FA. Sendo que em um dos casos já havia histórico prévio de hiperadrenocorticismo.

Durante o exame, foram feitas fotografias da fundoscopia realizada, e como se pode observar na figura 1, todos os ani-mais apresentaram o fundo de olho sem alterações ou lesões detectáveis.

Figura 1: Fundo de olho de três dos quatro casos atendidos e diagnosticados como DSAR (Hawk eye, Dioptrix, L´Union, França). Na fundoscopia tais animais não apresentaram qualquer lesão que indicasse perda da funcionalidade da retina. Todavia, em todos eles não havia qualquer resposta aos estímulos de flashes luminosos, indicando perda da funcionalidade da retina (“flat” ERG) – indicando DSAR. A) cão da raça Poodle, 7 anos, fêmea; B) cão da raça Cocker Spaniel, 5 anos, fêmea; e C) cão da raça Lhasa Apso, 3 anos fêmea.

Sabe-se que o eletrorretinograma é extinto nos casos de DSAR, mas permanecem nas outras causas de cegueira abrupta que não comprometem a retina (11). Com relação ao exame eletrorretinográfico dos quatro animais, sendo 8% dos exames de ERG no período de um ano de atendimento

do Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR, todos não apresentaram qualquer resposta aos estímulos de flashes lu-minosos, indicando perda da funcionalidade da retina (“flat” ERG) Figura 2, sendo assim, de acordo com histórico e exame oftálmico de cada um deles, foi diagnosticada a DSAR.

Figura 2: Resultados dos ERGs dos quatro casos confirmados de DSAR sobrepostos sobre um mesmo eixo. Nota-se que não há respostas compatíveis com relação ao tempo implícito e amplitude de onda “a” ou onda “b”.

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Observações clínicas e eletrorretinográficas em cães com perda súbita de visão

A prevalência da DSAR na casuística total do Serviço de Oftalmologia Comparada da UFPR foi 1,18% (quatro de 339 casos) e a prevalência dentro dos casos de cegueira abrupta foi 44,5% (quatro de nove casos).

DiscussãoA degeneração súbita adquirida de retina (DSAR), aco-

mete animais normalmente com mais de 5 anos de idade e a perda de visão geralmente acontece num período de 24 horas até 4 semanas, observando-se uma evolução a cegueira muito rápida (12). No estudo pôde-se observar que as idades aco-metidas pela DSAR variaram consideravelmente (2, 3 anos de idade em três dos nove casos e chegando até 10 anos de idade em um dos casos), contrariamente ao relatado pelos autores já citados. Na literatura encontra-se a citação de que a DSAR geralmente é acompanhada por um histórico de poliúiria, po-lidpsia e polifagia, o que não foi observado ou relatado pelos proprietários, a não ser pelo caso de DSAR acompanhada de hiperadrenocorticismo no qual o proprietário relatou polifa-gia, discordando assim dos achados de Montgomery et al. (1).

Assim como Montgomery et al. (1), pudemos notar um aumento nas enzimas ALT e FA em 2 casos de DSAR, nos outros dois as enzimas estavam no valor limite. Foi observa-da também essa alteração no caso de hiperadrenocorticismo. Outras alterações relatadas não foram observadas. Um dos casos (Schnauzer) mostra uma possível associação da DSAR com o hiperadrenocorticismo, corroborando com McLellan (6), que relata que os animais que demonstram anormalida-des a estimulação com ACTH ou supressão de dexametaso-na em doses baixas, apresentaram a DSAR. Todavia, a DSAR pode estar associada também a outras afecções endócrinas como o hipotireoidismo e o diabetes (6).

Concordando com Acland et al. (11) todos os animais diagnosticados com DSAR não apresentaram lesões detectá-veis na retina. Tal situação de achados clínicos fez com que originasse uma frase famosa para a DSAR: “Nesta doença o animal não vê nada e o médico veterinário não vê nada tam-bém”.

A eletrorretinografia é o exame utilizado para a confirma-ção do diagnóstico de DSAR, confirmando a perda da função das células fotorreceptoras da retina (12). Na DSAR, o exame eletrorretInográfico mostra um traçado com a ausência de on-das (Flat ERG), observado nos quatro animais submetidos ao exame (Fig. 2).

Resultados de testes recentes feitos em seres humanos com doenças de retina sugeriram que algumas doenças po-deriam ser medicadas com vitaminas e minerais, e que o uso dessas retardariam os sinais da DSAR (13). Também foi relatado em 2007 por Grozdanik, o uso imunoglobulina in-travenosa (IVIg), segundo ele, o perfil molecular da DSAR é muito semelhante ao da retinopatia imunomediada induzi-da por anticorpos em seres humanos, sendo isso a chave do tratamento com IVIg.; em seu trabalho, observou-se cura em apenas dois casos.

Apesar das informações recentes sobre tratamento, infe-lizmente ainda classificamos a DSAR como doença sem cura. A retina é uma extensão do nervo óptico e especificamente do diencéfalo e dessa forma, como célula neural, não se regenera assim como os outros tecidos nervosos, fazendo com que os animais afetados permaneçam cegos (6). Porém, diferente-mente da cegueira nos seres humanos, muitos cães adaptam-se em algumas semanas ou em alguns meses, memorizando os obstáculos e locais da casa, assim podendo deambular com certa tranquilidade em ambientes familiares.

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Recebido para publicação em: 24/11/2009.Enviado para análise em: 24/11/2009.Aceito para publicação em: 21/12/2009.

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