cinema como espaÇo de aprendizagem: as narrativas das ... · narrativas das crianÇas sobre os...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UNIRIO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - CCH ESCOLA DE EDUCAÇÃO - EE CURSO DE PEDAGOGIA RENATA COSTA FERREIRA CINEMA COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM: AS NARRATIVAS DAS CRIANÇAS SOBRE OS FILMES NO ENSINO FUNDAMENTAL Rio de Janeiro 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UNIRIO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - CCH ESCOLA DE EDUCAÇÃO - EE

CURSO DE PEDAGOGIA

RENATA COSTA FERREIRA

CINEMA COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM: AS

NARRATIVAS DAS CRIANÇAS SOBRE OS FILMES NO

ENSINO FUNDAMENTAL

Rio de Janeiro

2014

Page 2: CINEMA COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM: AS NARRATIVAS DAS ... · NARRATIVAS DAS CRIANÇAS SOBRE OS FILMES NO ... Centro de Ciências Humanas e Sociais ... apropriam do cinema visando

RENATA COSTA FERREIRA

CINEMA COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM: AS

NARRATIVAS DAS CRIANÇAS SOBRE OS FILMES NO

ENSINO FUNDAMENTAL

Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia, Escola de Educação do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), como requisito para a obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. Orientadora: Profa. Dra. Adriana Hoffmann Fernandes

Rio de Janeiro

2014

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FERREIRA, Renata Costa. Cinema como espaço de aprendizagem: as narrativas das crianças sobre os filmes no Ensino Fundamental / Renata Costa Ferreira_ _ Rio de Janeiro, 43 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Educação, 2014. Orientadora: Drª Adriana Hoffmann Fernandes 1. Cinema- 2. Criança- 3. Escola-4. Narrativa

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RENATA COSTA FERREIRA

CINEMA COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM: AS

NARRATIVAS DAS CRIANÇAS SOBRE OS FILMES NO

ENSINO FUNDAMENTAL

Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia, Escola de Educação do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), como requisito para a obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. Orientadora: Profa. Dra. Adriana Hoffmann Fernandes

Aprovada em ______/______/__________

BANCA EXAMINADORA

_________________________________ Profª. Drª. Adriana Hoffmann Fernandes

(orientadora)

_________________________________ Profª Drª Claudia Miranda

(examinador externo)

Rio de Janeiro 2014

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AGRADECIMENTOS

A todos que sempre acreditaram em mim, em especial a minha família.

À Lúcia Feitoza sempre disposta a ajudar e a Érica pela parceria na pesquisa.

À minha orientadora Adriana pelo seu carinho e por toda aprendizagem

compartilhada.

À beleza da vida que sempre nos permite recomeçar.

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RESUMO

Este trabalho monográfico não tem nenhuma pretensão de traçar um percurso, um caminho a ser seguido, mas sim o de expressar algumas reflexões e análises sobre a presença do cinema na escola e quais as possibilidades das crianças se relacionarem com o cinema de forma prazerosa e experimentá-lo de forma criativa nesse espaço. O foco da pesquisa visa perceber a relação das crianças com o cinema, além de instituir e investigar um cineclube no espaço da escola dentro de um projeto de pesquisa-intervenção. Propõe-se então a apresentar como as crianças constroem sua relação com o cinema a partir da criação desse cineclube denominado Megacine. O presente texto estrutura-se a partir das discussões realizadas no contexto do projeto de pesquisa O cinema e as narrativas de crianças e jovens em diferentes contextos educativos que tem como interesse investigar questões pertinentes à relação de crianças e jovens com o cinema na formação vivida dentro das diferentes instituições escolares participantes da pesquisa. As reflexões aqui trazidas foram realizadas em um dos campos de pesquisa: o relacionado ao ensino fundamental. O campo da pesquisa em questão constituiu-se pela criação de um cineclube com cerca de 40 crianças na faixa etária de 10 a 12 anos do 5º ano do ensino fundamental de uma escola da rede municipal de ensino no bairro Oswaldo Cruz, zona norte do Rio de Janeiro. A fim de entender o modo de relação das crianças com a cultura do cinema numa dimensão mais ampla tivemos como objetivo discutir a relação das crianças com o cinema a partir da análise dos desenhos do que é cinema para as crianças e de duas perspectivas diferentes trazidas pelas próprias crianças nas entrevistas realizadas após os debates dos filmes. Para dialogar com o campo de pesquisa no ensino fundamental trabalharei com os autores que discutem as relações entre Cinema e Educação. Por fim, no processo da pesquisa construída junto às crianças no Projeto Megacine enfatizamos que a escola pode ser local de fruição, bem como o espaço para o encontro com o outro, através das histórias vividas através do cinema.

Palavras-chaves: Cinema; Criança; Escola; Narrativa

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ABSTRAT

The main purpose of this research is to express some reflections on the use of the cinema at schools, and present some suggestions to lead children to have a pleasant and creative interaction with the cinema inside the school. Thus, the main focus of such research is on the relationship children have with the cinema. To observe and describe the way children build such a relationship with the cinema, a cineclube called Megacine was created within the school. The text is mainly based on the discussions that have taken place during the project, investigating the relationship that children have with the cinema in their educational context. The focus is on elementary students. In order to achieve the main purpose of the research, a cineclub was created. It was intended for about 40 children between 10 and 12 years old, from a public elementary school in Oswaldo Cruz, a suburb from the north of Rio de Janeiro. In order to understand the way children respond to the cinema culture, the discussion was based on interviews that happened after debates about the films, and also on drawings made by the children themselves, expressing what the cinema means for them. To promote a dialogue between such research and elementary education level, authors that discuss the relationship between the cinema and education are going to be analysed. Last but not least, The Megacine project emphasizes the role of the school as an enjoyable place for students to interact with one another, through stories told by the cinema

Key words: Cinema, Children, School, Narrative

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................................

9

1-REFLEXOES COM A TEORIA: CINEMA NA EDUCAÇÃO ..............................

11

2- METODOLOGIA: A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA .........................................

16

3- CONCEPÇÕES DO CINEMA PELO OLHAR DAS CRIANÇAS: DESENHOS E ENTREVISTAS ...........................................................................................................

20

3.1 - Cinema como lugar ...................................................................................................

20

3.2 - Cinema como diversão: uma dimensão narrativa .....................................................

22

3.3. - Cinema como consumo ............................................................................................

23

3.4 - Cinema como afetividade/alteridade..........................................................................

26

3.5 - O que é cinema para as crianças: “o cinema deixou de ser um cinema” ..................

28

3.6 - Filmes “bons” e “maus” para as crianças: questões para diálogo .............................

31

CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................................

36

REFERÊNCIAS ..............................................................................................................

39

ANEXOS..........................................................................................................................

41

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INTRODUÇÃO

No presente trabalho, busco registrar minhas impressões e reflexões

realizadas no contexto do projeto de pesquisa O cinema e as narrativas de crianças

e jovens em diferentes contextos educativos coordenado pela professora Adriana

Hoffmann Fernandes dentro do grupo de pesquisa CINENARRATIVAS. Tal pesquisa

tem como interesse investigar questões pertinentes à relação de crianças e jovens

com o cinema na formação vivida dentro das diferentes instituições escolares

participantes da pesquisa.

É importante acrescentar que minha relação com o grupo de pesquisa

Cinenarrativas se iniciou antes dele existir efetivamente. No ano de 2010, comecei

minha participação como voluntária no grupo de pesquisa, junto com outras três

graduandas no projeto de extensão Cine CCH. Nesse período, não havia uma

distinção clara entre o grupo de pesquisa e o de extensão e ambos tinham reuniões

conjuntas. Com a entrada das mestrandas em 2011, os dois grupos separaram-se

tendo cada qual uma reunião e ações diferenciadas. Eu que já atuava junto no cine

CCH percebi que foi intensa a transformação e troca no grupo. Ainda no mesmo

ano, iniciei minhas atividades como bolsista de iniciação científica e estabeleci uma

parceria com a mestranda Érica, atuando conjuntamente no campo do Ensino

Fundamental.

No processo de descobertas do fazer/acontecer na pesquisa, construí novas

conexões de saberes, além de estabelecer com Érica e os demais integrantes do

grupo, tessituras de novas redes com os sujeitos da pesquisa, (as crianças). Nesse

percurso, aprendi que há diferentes maneiras de se perceber a realidade e a

importância de dar vozes as crianças, mantendo uma escuta atenta e aberta para

elas, na construção coletiva do conhecimento.

O trabalho monográfico consiste em apresentar um dos campos de

pesquisa: o relacionado ao ensino fundamental. A pesquisa em questão trabalha na

perspectiva da pesquisa intervenção e seu campo constituiu-se pela criação de um

cineclube com cerca de 40 crianças na faixa etária de 10 a 12 anos do 5º ano do

ensino fundamental de uma escola da rede municipal de ensino no bairro Oswaldo

Cruz, zona norte do Rio de Janeiro.

A investigação almeja entender o modo como estas crianças estabelecem sua

relação com o cinema e que tipos de narrativas produzem a partir de sua atuação no

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cineclube criado na escola: o Megacine. A proposta do espaço escolar como campo

de pesquisa prioriza um olhar atento para o modo como essas crianças se

apropriam do cinema visando novos olhares sobre o papel do cinema na escola, que

vão além de sua compreensão de ferramenta pedagógica na aplicação dos

conteúdos.

Esse estudo será organizado da seguinte forma: no primeiro capítulo faço um

diálogo com teóricos que pensam o cinema na área da educação e que são

referência para discussão dessa pesquisa. No segundo capítulo abordarei a

metodologia e como a pesquisa foi realizada e por último apresento as análises de

dois aspectos que contribuíram ao longo do campo da pesquisa concluindo por fim

com minhas considerações depois de tudo o que foi vivido no decorrer da pesquisa.

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2- REFLEXÕS COM A TEORIA: CINEMA NA EDUCAÇÃO

É sabido que a experiência cinematográfica encanta multidões e desencadeia

diversas reações. Percebe-se o cinema como lugar de experiência de novas

interações e construtor de novos significados, que transformam a maneira dos

sujeitos se apropriarem do mundo. Diante das exigências sociais, o cinema foi se

aperfeiçoando e evoluindo e passa hoje por uma experiência globalizada, podendo

acontecer numa diversidade de situações, encontros e movimentos e são intensas

as transformações na sua relação com a tecnologia, trazendo mudanças nos

receptores e na dinâmica dos espaços. Exige dos expectadores novos aprendizados

para a sua fruição, por isso, na atualidade, é importante que a escola proporcione

aos alunos o contato e a oportunidade de aprendizagem com a linguagem

cinematográfica.

[...]o cinema constitui-se em uma matriz social singular de percepção, elaboração e transmissão de saberes e fazeres, possibilitando distintas formas de apreensão, compreensão e representação do mundo. Nesses termos, enquanto uma modalidade integrante do conhecimento humano, o cinema orienta e explica percursos individuais e grupais formados em ambiências em que a imagem em movimento constitui e possibilita aprendizados que passam a compor o estoque de experiências da sociedade (SILVA 2010, p.161-162).

Nesse processo, formador de experiência e fazeres, o cinema permite ampliar

os significados, contribui para a criação do gosto e de novos saberes, por meio das

mediações simbólicas das novas configurações sócio-históricas. Assim,

compreendendo que os universos reais e fictícios projetados na tela simulam

contextos e cenários que retratam valores individuais e coletivos, estes poderão ser

sempre discutidos e ampliados por meio do debate no ambiente escolar.

A pesquisa participa deste panorama como busca de entendimento do modo

como as crianças estabelecem sua relação com o cinema e que tipo de narrativas

produzem. No contexto da pesquisa visamos refletir sobre a formação e a relação

das crianças com o cinema a partir do espaço escolar e em que condições o

consumo do cinema se estabelece, de que forma ocorre essa cultura

cinematográfica e como experimentar o cinema para além do suporte pedagógico

das disciplinas. Percebemos que essa dinâmica requer uma construção de uma

vivência cultural escolar do cinema que faz pensar, entendendo seu papel formador.

Nesse contexto apontamos a importância de considerar os conceitos de

cultura, de consumo e de infância dentro da pesquisa realizada entendendo-a como

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parte do entendimento dos Estudos culturais que permitiram rever boa parte desses

conceitos. A compreensão de cultura era tradicionalmente visto como um espaço

complexo ocupado pela erudição, tradição literária e artística, de padrões estéticos

clássicos e elitizados, permeados de preconceitos. Nessa concepção, havia uma

ideia de cultural central, de hegemonia cultural. A partir dos Estudos Culturais a

autora Carolina Escosteguy (1999) ressalta que o olhar sobre a cultura deixa de ser

segregatório e assume um caráter investigativo das formações sociais, isto é, dos

sujeitos e dos grupos sociais, entendendo-se que os sentidos estão em constantes

movimentos. O conceito de cultura passa a incorporar o popular, torna-se plural e

relaciona as novas tendências e diferentes possibilidades de se compreender e fazer

cultura.

Segundo Escoteguy (1999) os estudos culturais consistem em um campo de

estudo em que diversas disciplinas se interseccionam no estudo de aspectos

culturais da sociedade contemporânea, constituindo uma interdisciplinaridade, cujo

apoio primordial da pesquisa são as relações entre a cultura contemporânea e a

sociedade. O estabelecimento dessas redes nos permite não só considerar as novas

tendências de pesquisas na área da cultura, como também as formas culturais,

instituições e práticas culturais e, consequentemente, as relações com a sociedade

e as transformações sociais. Os Estudos Culturais, portanto, compreendem os

produtos e processos culturais relativos aos agentes da reprodução social e

abarcam o estudo de todas as manifestações de artes, crenças e instituições de

uma sociedade.

[...] não existe um confronto bipolar e rígido entre as diferentes culturas. Na prática, o que acontece é um sutil jogo de intercâmbios entre elas. Elas não são vistas como exteriores entre si, mas comportando cruzamentos, transações, intersecções (ESCOSTEGUY, p. 147, 1999).

A abertura de novas janelas trazidas pelos estudos culturais nos ajuda a

problematizar a cultura e ampliar as possibilidades que despontam do saber popular.

De acordo com Escosteguy (1999), esse novo olhar sobre a cultura inclui atividades

e significados de gente comum. Esse deslocamento modifica o lugar de negociação,

que passa pelo consumo de massa. Essa mudança no entendimento de cultura

torna possível compreender o papel da mediação nos processos culturais e também

os conceitos de consumo e infância.

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Em nossa pesquisa em parceria com as crianças pudemos observar como a

mediação transformou a forma como elas antes se apropriavam do cinema. Houve

uma mudança na relação das crianças com algumas questões referentes ao

consumo (prevalência de filmes de origem norte-americana, a falta de acesso ao

cinema, consumo de filmes piratas, filmes próprios e impróprios) e como se

percebem como criança. Aspectos que serão analisados no capítulo 4 dessa

monografia.

Em meios a tantas questões referentes a forma de sentir, pensar e fazer

cinema na relação com os sujeitos da pesquisa, observamos ser fundamental

repensar o uso do cinema na educação. Faz-se, então, necessário desmitificar a

cultura escolar estabelecida, na qual o cinema está presente muitas vezes, como

mais uma ferramenta, mero recurso pedagógico. Considerando que toda forma de

produção cultural é importante, nesse caso, destacamos a relevância do cinema

para educação.

É preciso entender que o cinema é um fenômeno social, um encontro entre

culturas, proporcionando uma prática criativa, além de trazer possibilidades das

crianças pensarem, decidirem e expressarem seus sentimentos sobre o mundo.

Nesse sentido, o referencial teórico proposto para essa pesquisa baseia-se no

pensamento dos autores estudados no contexto do projeto de pesquisa

desenvolvido na UNIRIO “O cinema e as narrativas de crianças e jovens em

diferentes contextos educativos” sob a coordenação da professora Adriana Hoffman,

buscando refletir sobre as possibilidades de experiências bem sucedidas sobre o

fazer cinema na escola, além de repensar sobre o seu papel formador. O apoio

teórico baseou-se no pensamento de autores como: Rosália Duarte, Adriana

Fresquet, Alain Bergala, dentre outros.

Entendendo que as crianças pesquisadas são agentes de cultura, capazes de

significar e ressignificar suas experiências e que o cinema pode trazer uma ação

formadora desses sujeitos, dialogamos com Duarte (2008), que contribui para a

pesquisa porque ao questionar o uso instrumental dos filmes na educação, destaca

ser importante considerarmos a formação estética audiovisual, ou seja, a dimensão

estética da obra, seu valor cultural e o lugar que tal obra ocupa na história do

cinema. Sua reflexão sobre o caráter educativo do cinema nos conduz a priorizar a

qualidade do que se vê, nos levando a possibilidade de dialogar com as crianças

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sobre os conhecimentos que possuem para avaliarem o que estão assistindo,

ampliando seu julgamento estético. Para a autora, o cinema tem um papel social na

educação e sua ação pedagógica consiste numa reeducação do olhar: as crianças

precisam aprender e desenvolver critérios para ler um filme criticamente. Esse

julgamento perpassa a simples ideia de filme ruim ou bom, cinema é conhecimento.

Segundo ela:

É inegável que as relações que se estabelecem entre espectadores, entre estes e os filmes, entre cinéfilos e cinema e assim por diante são profundamente educativas. O mundo do cinema é um espaço privilegiado de produção de relações sociabilidade [...] (2002, p.17).

Ao pesquisar a relação das crianças com o cinema na escola e sua ação

criativa, dialogamos com Bergala que problematiza o uso dos filmes na escola. Para

ele, o cinema não pode ser usado simplesmente como complemento do conteúdo

curricular ou entretenimento, mas trazer uma prática criativa, que leve o estudante a

uma experiência direta e pessoal, além de vivências que permitam a experiência

estética.

Observamos que as crianças pesquisadas em suas representações sobre o

cinema nos demonstram que são sujeitos de direito, que podem sentir e pensar sua

própria prática. Elas estabelecem uma relação de afetividade com os filmes e é essa

atribuição do cinema como o outro (alteridade) que desencadeia sentimentos como

afirma Bergala que entende o cinema como arte e defende que o cinema de criação

precisa ser mostrado às crianças e jovens, devendo os professores buscarem uma

pedagogia da criatividade, valorizando o processo de criação e não somente o

resultado.

O cinema precisa ser visto como o momento de encontro com outro, que gera

questionamento sobre o conhecido, instituindo novas formas de se perceber a

realidade trazendo novos caminhos para ser viver experiências antes

desconhecidas.

A perspectiva pedagógica do cinema proposta por Bergala (2008) nos

possibilita uma experiência com cinema significativa para os sujeitos da escola, para

professores, dispostos a vivenciarem com crianças e jovens outras formas

pedagógicas, de se fazer e produzir saberes, que rodeiam a criatividade, a

satisfação, o divertimento e outros afetos.

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Fresquet (2008) seguidora de Bergala discute a hipótese do cinema como

alteridade, presente na escola como “um outro”, um estrangeiro pela sua natureza,

pelos seus instrumentos, pelos seus mediadores. Devemos trazer para o espaço

escolar uma cultura do cinema, desconstruir os conceitos de cinema e educação

preestabelecidos. Pois essa aproximação com o cinema possibilita uma nova forma

de aprendizagem, um processo compartilhado que valoriza a experiência criativa e

reflexiva oriunda desse encontro, ampliando a maneira de se entender o mundo e

olhar a realidade, permitindo outra compreensão de se relacionar com o outro.

Fresquet e Bergala defendem que a criança necessita ter contato com filmes

de qualidade, porque a experiência com o cinema ainda na infância marca a

memória afetiva pessoal e a escola nesse sentido deve se aproximar dos filmes

como obras de arte e cultura.

Dialogando com Canclini, averiguamos que é nos processos culturais que o

ser humano se forma, ou seja, ao mesmo tempo em que constrói cultura é

construído por ela. Nessa relação dialética, o papel do mediador é essencial, porque

na produção do consumo é preciso existir um mediador, visto que quem determina o

consumo não é o produto e sim o sujeito que sofre mediações dos grupos sociais a

que pertence.

Ao refletir sobre a relação das crianças com o cinema, entendemos que o

consumo está atrelado aos grupos sociais, uma vez que a influência do grupo é

essencial para a formação do sujeito, pois são as redes sociais construídas que

permitem a esses produzir novos significados. Dessa forma, é a experiência que dá

sentido a existência, é aquilo que nos toca, que nos passa, conforme destaca

Larrosa (2002). Para ele, o sentido de quem somos depende das histórias que

contamos e das que contamos para nós mesmos, das construções narrativas, nas

quais cada um se constitui, simultaneamente, autor e narrador da sua própria

existência.

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3- METODOLOGIA: A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA

A pesquisa em questão trabalha na perspectiva da pesquisa intervenção e

seu campo constituiu-se pela criação de um cineclube com cerca de 40 crianças na

faixa etária de 10 a 12 anos do 5º ano do ensino fundamental de uma escola da rede

municipal de ensino no bairro Oswaldo Cruz, zona norte do Rio de Janeiro.

A pesquisa intervenção é aqui entendida como um processo imbuído de

significados tanto para o pesquisador como para o pesquisado, “aproxima de forma

singular pesquisador e pesquisado, numa atividade em que ambos conhecem,

aprendem e (se) transformam (Castro, 2008)”. Desta forma, concebe-se as crianças

como produtoras de saberes e se reconhece que através de suas experiências

construídas no meio social, no encontro com os outros, elas se tornam narradoras

de sua própria história. Para Macedo e ET al (201, p.92) “pensar as crianças como

sujeitos ativos no contexto da pesquisa implica entendê-las como dotadas de

capacidade de agir no mundo social e de construir interpretações e intervenções

singulares”.

A investigação busca o entendimento do modo como estas crianças

estabelecem sua relação com o cinema e que tipos de narrativas produzem pela sua

participação no cineclube criado na escola: o Megacine. Escolhemos o espaço

escolar como campo de pesquisa, privilegiando um olhar para o modo como as

crianças desse campo estão se apropriando do cinema com o intuito de desmistificar

a ideia corrente do cinema na escola como mera ferramenta para ilustrar ou

aprofundar conteúdos. Ao observar as relações das crianças e suas narrativas

diante dos filmes exibidos na escola pelos debates realizados livremente, ampliam-

se as possibilidades de ver e pensar sobre filmes com o objetivo de formação

estética, entendendo-se a criança, sujeito da pesquisa, como produtora de cultura

em sua relação com as imagens cinematográficas.

“O filme é um objeto estético/cultural de consumo individualizado. Sua fruição se dá dentro de uma bolha perceptiva, construída pela tecnologia da projeção das imagens em movimento em sala escura. O espectador fica “sozinho” para desfrutar das emoções proporcionadas pela história, contada através de uma linguagem que hipertrofia as percepções visual e sonora (esta última a partir de 1930)” (Franco, 2010, p. 11).

Outro autor, Teixeira Coelho, comenta que quando se fala de cinema está se

falando de um modo cultural, mas não necessariamente de filmes. Nessa

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perspectiva considera-se neste estudo, o filme como um produto cultural enquanto o

cinema é entendido como fenômeno social (Duarte, 2002). Nesse sentido, ver filmes

numa sala de projeção coletivamente com possibilidade de debater de forma coletiva

após a exibição, constitui um modo de constituição cultural diferenciado do ver filmes

sozinho em casa.

Fica claro que mesmo atuando no espaço da escola podemos trazer para

esse espaço a possibilidade de criação de uma cultura do cinema. Nossa

investigação não pretende apenas perceber a relação das crianças com filmes como

espectadores de forma isolada, mas, ao instituir e investigar um cineclube no espaço

da escola, objetiva perceber a possibilidade de captar o modo de relação das

crianças com a cultura do cinema numa dimensão mais ampla assim como a

apontada por Coelho.

A constituição do cineclube Megacine vai criando uma forma de relação com

os filmes como evento, inserindo-os numa provável construção de prática cultural

que, para esse grupo de crianças moradoras da zona norte, pode não ser tão

próxima de seu cotidiano. Como o objetivo da investigação é pensar as relações de

crianças com o cinema, a proposição desse espaço favoreceu momentos de diálogo

com as crianças que aconteceram tanto nos debates coletivos após os filmes como

nas entrevistas, aspectos que fazem parte da estratégia metodológica da pesquisa.

A investigação visa entender de que modo as crianças estabelecem sua

relação com o cinema e que tipo de narrativas produzem a partir da participação em

um cineclube criado na escola. Foi realizada através da metodologia da pesquisa-

intervenção em parceria realizada com a mestranda Érica1 integrante do grupo de

pesquisa. A implantação do cineclube, nomeado pelas crianças de Megacine, surgiu

da colocação espontânea da aluna Hanna, após a exibição do curta cearense

intitulado “Vida Maria”, de Márcio Ramos:” - Eu entendi o filme! Ele fala de várias

Marias”.

Daí em diante consolidou-se, no ano de 2011 sendo realizado até os dias

atuais com sessões de filmes seguidas de debate. No ano de 2011 alguns dos filmes

exibidos foram “Valentin”, um filme argentino, dirigido por Alejandro Agresti, “O dia

do pagamento” de Charles Chaplin e “Filhos do Paraíso”, um filme iraniano, de Majid

1 Mestranda em Educação, integrante do grupo de pesquisa “O cinema e a narrativa de crianças e jovens em diferentes contextos educativos” da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

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Majidi e como também “O Pequeno Nicolau”, cuja sessão foi mediada por alguns

alunos participantes da pesquisa, que já o tinham assistido no Festival Internacional

do Cinema-FICI.

O cineclube criado na escola continua a existir, mas nessa pesquisa o

objetivo foi analisar as entrevistas realizadas após as sessões do primeiro ano do

cineclube. Outro viés de análise dessa pesquisa serão os desenhos das crianças

produzidos dentro de uma oficina nomeado “diálogos com o cinema” realizada em

dezembro de 2011 a partir da questão “O que é um bom filme para vocês? E o que

seria cinema?”. Da oficina realizada surgiram cerca de 36 desenhos que

representam as relações delas com o cinema. Tanto as entrevistas como a oficina

foram registradas por escrito através de transcrição ou diário de campo para

posterior análise nessa monografia.

Trabalhar com os desenhos e relatos das crianças é trabalhar com suas

narrativas. Ao falar de narrativa na pesquisa entendemos que ela nos constitui, pois

como reflete Benjamin (1994) nos formamos pelas narrativas que temos acesso

rememoradas pela coletividade. Por elas criamos e damos sentido sobre o que

vivemos no mundo. O narrador “pode recorrer ao acervo de toda uma vida (uma

vida que não inclui apenas a própria experiência, mas em grande parte a experiência

alheia) (Benjamin, 1994, p.221)”.

Essa nossa constituição narradora também ocorre, em nosso entender, na

relação que as crianças estabelecem com o cinema, forma de narrativa audiovisual.

Nossa relação com o outro e com o mundo passa pela narrativa. É um modo de

percebermos o mundo e sermos afetados por ele. “O narrador assimila à sua

substância mais íntima aquilo que sabe por ouvir dizer (Idem, p.221).”

Entendendo o percurso metodológico da pesquisa-intervenção como aquela

que transforma a realidade dos sujeitos numa construção conjunta dos pesquisados

com o pesquisador (Castro,2008) ressaltamos que o Projeto Megacine favoreceu um

encontro dialógico entre as crianças e os pesquisadores ao estabelecer um espaço

para o debate coletivo, fazendo desse momento um local de fruição e construção do

gosto. De acordo com Duarte e Alegria (2008) “o cinema é arte e como tal deve

integrar o conhecimento que é transmitido pela escola, tendo como objetivo a

formação do gosto estético”. Dessa maneira, ao construirmos o projeto com elas

possibilitamos que elas expusessem seus estranhamentos e novas maneiras de se

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reconstruírem como sujeitos e autores no processo de pesquisa construindo e

ampliando suas relações com o cinema.

Entendemos dessa forma, de acordo com Xavier (2008, p.14) que a pesquisa

com o cinema pode ter uma dimensão formadora, pois como nos diz o autor “o

cinema que educa é aquele que (nos) faz pensar não somente sobre suas

propriedades, porém evidencia novos questionamentos e desestabiliza as nossas

certezas”.

Nesse sentido, temos como objetivo discutir a relação das crianças com o

cinema a partir de duas perspectivas diferentes trazidas pelas próprias crianças nas

entrevistas realizadas após os debates dos filmes. Nestas entrevistas as questões

giraram em torno do que era ser criança; a importância da imaginação e fantasia; o

que era um filme, o que entendiam por ler um filme; a diferenciação entre ler um

filme e ler um livro; a concepção de um bom filme; filmes apropriados para as

crianças; o que entendem por filme de época; quais as diferenças entre os filmes

antigos e atuais; preferência por um tipo de filme ou outro e o que entendiam como

cinema. Todas essas questões foram propostas a partir de opiniões trazidas pelas

crianças durante o debate de alguns dos filmes que foram exibidos e debatidos na

escola.

Estabelecemos como eixos de análise nesse momento os seguintes aspectos

trazidos pelas crianças: O que é cinema para as crianças e Filmes “bons” e “maus”

para as crianças. A reflexão sobre as falas e concepções das crianças será

analisada no próximo capítulo.

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4- CONCEPÇÕES DO CINEMA PELO OLHAR DAS CRIANÇAS:

DESENHOS E ENTREVISTAS

Cinema para mim é um lugar especial, que as pessoas se sentem a vontade...

(Brenda).

Cinema seria um conjunto de imagens, igual a um livro assim...o livro você lê,

o filme você lê só que com seus olhos, você pode entender de outra forma. O cinema

digamos, pode ter muito tipos de filme...

(Andressa)

O cinema para mim é o filme, filme para mim é a imagem e imagens juntas que dão

sentido de movimento... Para mim cinema é isso, imagem em movimento.

(Mylena)

Um cinema pra mim é um lugar cheio de gente, com uma tela bem grande...

(Daniela)

Diante dessas relações criadas com o cinema na escola expressas em falas

como a de Brenda, Andressa, Mylena e Daniela, escolhemos refletir a respeito do

que é o cinema para as crianças e quais os significados que atribuem a ele. Nesse

momento trazemos uma análise dos desenhos feitos pelas crianças sobre o sentido

do cinema para elas e também analisamos as falas nas entrevistas realizadas. No

primeiro momento organizei os desenhos das crianças por categorias a partir das

recorrências que apareceram e do modo como apareceram para começar a pensar

sobre como as crianças significam o cinema nesses desenhos. Os desenhos,

portanto, foram assim categorizados: cinema como lugar, cinema como diversão,

cinema como consumo e cinema como afetividade/alteridade. Em todas essas

categorias sobressai a ideia de cinema como um fenômeno social. Trago a seguir os

desenhos e suas respectivas análises e em seguida amplio o debate sobre o

cinema, trazendo as falas das crianças. Nesses dois momentos compreendo o

cinema como experiência que transforma e constitui o sujeito, priorizando assim a

observação delas sobre suas próprias experiências.

Cinema como lugar

Pelos desenhos observados percebemos que algumas crianças representam

sua relação com o cinema pela construção do espaço. Compondo uma paisagem da

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sala de exibição como espaço de convivência e socialização, os desenhos algumas

vezes representam a projeção da sala de cinema em escala priorizando uma tela

grande, o que sugere uma diferenciação de outras telas presentes em seu cotidiano.

Ao reproduzirem o espaço dessa forma demonstram sua expectativa em relação ao

cinema como um local completo, isto é, com infra-estrutura, que possui uma sala de

projeção com poltronas, corredor e portas que demarcam seus acessos, além dos

equipamentos necessários para a projeção de um filme. Representam o cinema

como um lugar em que podem vivenciar situações do cotidiano, mas também como

um local de inovações, entendendo o cinema para além do espaço físico ao

considerarem esse como um local possível para vivenciar emoções antes

desconhecidas.

Em seus desenhos também sinalizam ser o cinema um local para ir

acompanhado, para consumir determinados tipos de alimentos como pipoca e

refrigerante. Nessa relação da sala de cinema como espaço, a representação da tela

grande foi notável e frequente nos desenhos, o que sugere uma aproximação com o

cinema como propriamente dito. Aparece também a relação desse espaço com o

projeto Megacine na escola destacado em muitos desenhos, o que reflete a

importância do projeto para elas e retrata o que fala Canclini, ao afirmar que nos

apropriamos e utilizamos os produtos através do que vivemos nos processos

socioculturais.

Trazemos um dos desenhos representativos desse modo de percepção do

cinema pelas crianças. Observa-se no desenho que o consumo cinematográfico está

intimamente relacionado a representação do filme e do espaço como bens

simbólicos (Canclini, 1997). O entendimento das crianças relaciona-se com a noção

de cinema como dispositivo. Um autor que aborda essa questão é ²Philippe Dubois

quando fala do cinema como dispositivo de projeção, considerando o cinema como

um dispositivo historicamente estável. Segundo o autor em uma palestra a que

assisti durante o período da pesquisa os “ingredientes do dispositivo cinema” são a

sala, o sistema de projeção e o espectador, condição sem a qual o “cinema não

pode existir”.

2 Philippe Dubois falou sobre tais aspectos na palestra de abertura da Pós-graduação da Faculdade

de Comunicação da UFRJ no dia 02 de abril de 2012 intitulada “O cinema de exposição”. O relato da

palestra foi realizado por integrantes do grupo de pesquisa Cine Narrativas.

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Figura 1 – a sala de cinema

Cinema como diversão – uma dimensão narrativa

Em outros desenhos analisados o cinema pode ser enquadrado na dimensão

da diversão. Isso porque para algumas crianças – segundo suas próprias falas -

esse proporciona muitas aventuras, um passeio mundo afora, uma viagem pelo

mundo, é um lugar para rir, para namorar. Perpassa nessas falas e nos desenhos

correspondentes a ideia da sala de cinema propriamente dita como favorecendo um

conjunto de situações que proporciona novos encontros e os torna divertidos. É o

filme o propulsor de novas ideias, é o que dá asas à imaginação, é a criação a partir

do encontro com ele e está ligado diretamente a convivência com o Megacine,

sendo uma experiência para ser compartilhada com seus pares.

Dentro dessa possibilidade coletiva dialogamos com Walter Benjamin. A troca

de experiências de forma coletiva é a marca da arte de narrar anunciada por

Benjamin. Segundo o autor “O narrador retira da experiência o que ele conta: sua

própria experiência ou a relatada pelos outros. E incorpora as coisas narradas à

experiência dos seus ouvintes” (Benjamin, 1994, p. 201). Diante do exposto a

narrativa tem papel fundamental, pois é pela expressão oral que o individuo traz do

contato com o outro, da percepção que ele adquire do que ele entende e concebe

seu próprio modo de existência e a capacidade de transformar e ser transformado a

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partir da história do filme. Para ele a arte de contar histórias é singular e necessária

para formação do sujeito e embora a narrativa seja produzida e transmitida na

coletividade, é uma experiência única que nunca é contada do mesmo jeito. Por

isso, requer o compartilhar de experiências e do tempo para ser contada,

aproveitada e transmitida de geração a geração assim como Benjamin a concebe. A

própria história da humanidade é a arte de mantermos vivas as nossas memórias.

Com efeito, narrativa e experiência são conceitos distintos, entretanto estão

intrinsecamente interligados. A experiência de ver um filme não é apenas lazer, mas

pode ser também uma experiência que dá sentido a existência. O cinema, encarado

dessa forma coletiva, pode ser entendido como local de trocas vividas com outros,

espaço de narrativa que ocorre no coletivo num “divertido” espaço compartilhado do

ver como aponta o desenho das crianças:

Figura 2 – Cinema como diversão

Cinema como consumo

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Outro olhar das crianças sobre o cinema refere-se à relação do cinema como

consumo. Percebe-se que as crianças trazem em seus desenhos a noção de que

para desfrutar do cinema é necessário um passaporte, adquirido mediante a compra

de um ingresso. Tal registro das crianças presente nos desenhos leva-nos a

conjecturar que entendem que o cinema não é acessível a todo mundo da mesma

forma.

Os desenhos a seguir trazem as duas dimensões do consumo apontadas

pelas crianças: retratam uma relação de consumo porque além de colocar em cartaz

o filme, comunicam que para ir ao cinema é preciso ter poder aquisitivo, isto é, para

frequentá-lo é necessário comprar um ingresso, assim como informam que a

exibição dos filmes ocorre em determinados horários estabelecidos a partir da

compra do ingresso.

Figura 3 – o caminho da bilheteria

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Figura 4 – o preço do ingresso para o filme

Essa relação de consumo do cinema parece estar relacionada nos desenhos

feitos pelas crianças com os filmes da indústria do cinema pois os desenhos

destacam, de forma muito frequente, cenas de filmes comerciais na qual percebe-se

o gosto (ou o acesso destas) a grande parte dos filmes hollywoodianos. Tal acesso

ou consumo de filmes desse tipo aparece destacado também em pesquisa realizada

por Sacramento (2007). Paralelo a esse tipo de consumo, de vender bens de

serviços dos filmes comerciais, vemos uma nova experiência de consumo também

representada nos desenhos: a experiência com o Megacine na escola. Percebe-se a

influência desse projeto para o entendimento de novas formas de consumo

relacionadas ao cinema, uma vez que várias crianças reproduziram nos desenhos

os filmes vistos neste espaço. Dessa forma os desenhos das crianças nos apontam

as diferentes formas de relação com o cinema e indicam um novo modo de

entendimento desse consumo a partir da experiência vivida no cineclube da escola:

o consumo como experiência mediada.

Partindo desse pressuposto, dialogamos com Canclini que afirma ser nos

processos culturais que ocorre a formação em que ao mesmo tempo em que

constrói cultura é construído por ela. Ao refletir sobre a relação das crianças com o

cinema entendemos que o consumo está atrelado aos grupos sociais, uma vez que

são as redes sociais construídas que permitem a elas produzirem novos

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significados. Nosso entendimento é de que como aponta o autor, o consumo pode

acontecer pela reconquista dos espaços públicos, do interesse pelo público, dando

ao consumo “um lugar de valor cognitivo, útil para pensar e agir significativamente e

renovadoramente na vida social” (Canclini,1997, p. 68). Ter acesso a “filmes

diferentes” no Megacine como nos falam as crianças da pesquisa trata-se de uma

renovação do consumo do cinema diferente do modo anteriormente vivido por elas

que, agora, passam a confrontar-se com filmes que trazem novas experiências

narrativas.

Cinema como afetividade/alteridade

Outro aspecto percebido refere-se ao fato de percebermos que, ao

descreverem nos desenhos o sentido do cinema para elas, as crianças estabelecem

com os filmes uma relação de afetividade. Atribuem ao cinema à qualidade de

despertar sentimentos nobres de amizade, de apego e de amor que proporcionam

novas emoções e relações, capazes de transformar o ser humano, trazendo novas

sensações e impressões ao espectador. A dimensão de afetividade aparece

associada também à experiência do Megacine, porque muitas destacaram ser esse

projeto muito importante e um diferencial em suas vidas, colocando-o em destaque

em suas imagens. Tal dimensão aponta a relação que estão construindo com esse

espaço que os impulsiona a seguir adiante ampliando as ações do cineclube na

escola.

Trata-se do cinema como dimensão de alteridade, assim como nos fala

Bergala, como possibilidade de pensar sobre o outro, sobre outras realidades e

culturas diferentes da nossa com um olhar de quem “está junto” assim como

transparece no desenho:

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Figura 5 – Afetividade/alteridade com o cinema

Desta discussão deriva a hipótese do cinema como alteridade discutida por

Fresquet (2008). O cinema entra na escola como “um outro”, um estrangeiro pela

sua natureza, pelos seus instrumentos, pelos seus mediadores. Pensar o cinema na

escola por essa perspectiva é desconstruir os conceitos de cinema e educação

preestabelecidos, é propor uma aproximação com o cinema a fim de possibilitar uma

nova forma de aprendizagem. Ao valorizarmos a experiência criativa e reflexiva

oriunda desse encontro descobrem-se novas maneiras de se entender o mundo e

olhar a realidade, permitindo outra compreensão de se relacionar com o outro.

Esta aproximação com o cinema sugere que a construção da aprendizagem

ocorre como um processo compartilhado. De acordo com essa autora esse tipo de

vivência cultural, a partir de uma fruição estético/emocional só pode ser

experimentada através do compartilhar das emoções vivenciadas e transcende a

visão que temos de nós mesmos e o nosso posicionar em relação a vida, nos ajuda

a nos vermos no outro, a compreender as semelhanças e aceitar as diferenças.

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O que é cinema para as crianças – “O cinema deixou de ser um cinema”

Bruno: Antigamente o cinema era como se fosse um teatro,

hoje em dia ele é como se fosse um passeio... O cinema deixou

de ser um cinema.

Ester: Porque hoje em dia eles desenvolvem um comércio...

outras coisas com o cinema.

As crianças identificam que a relação dos espectadores com o cinema sofreu

transformações, se antes o cinema, segundo elas, era como o teatro mas hoje

“deixou de ser um cinema” já que eles desenvolvem um comércio e outras coisas

lembrando como se fosse um parque de diversões em que atrelado a ele estão

outras sensações como deve ser o caso do cinema 3 D sendo muito mais um

acontecimento ou poderíamos dizer “uma atração” tal como nos filmes de Lumière.

No entanto, agora a reprodução de imagens proporcionada pela técnica do cinema

envolve muito mais que isso, ou seja, envolve mais do que o momento da exibição

em si pois envolve comércio, assim o cinema deixou de ser cinema. Talvez a fala

deles aponte que o cinema está mudando ao trazer junto com ele uma série de

produtos associados que nos remetem ao filme visto. Como percebemos no

questionário de consumo cultural feito com essas crianças a maioria delas tem

acesso apenas aos filmes de mercado que não se esgotam no momento do ver o

filme mas associam-se a brinquedos, figurinhas e outros produtos que fazem o filme

continuar a ser revisto em outros contextos fora do cinema.

Franco (2010) afirma que o “filme é um objeto estético/cultural de consumo

individualizado”. Sua fruição ocorre individualmente pelo espectador ao desfrutar das

emoções proporcionadas pela história. A autora comenta que é essa apropriação

individual do filme em larga escala, que viabiliza o cinema como negócio, como

consumo social de massa. Para ela, associado a esse cinema-negócio existe uma

rede de consumo que reforça a fruição social que determinado filme produz. E são

essas socializações das emoções proporcionadas pelo cinema-negócio em conversa

com a cultura que tornam possível o cinema como fenômeno social.

[...] o cinema negócio também oferece os consumos conexos-trilhas sonoras, figurinos, objetos, cartazes, games e um sem número de artefatos que reiteram a fruição social, exibida e compartilhada, daquele filme ou

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gênero ou autor. O filme favorece mecanismos psicológicos de projeção/identificação e o cinema, como fenômeno social, favorece mecanismos de pertencimento quando as emoções proporcionadas pelos filmes são socializadas por meio de um sem número de modos oferecidos pelo cinema-negócio e pelas ações culturais que se aprofundam em várias formas de cinefilia (FRANCO,2010,p.12)

As crianças pesquisadas parecem não dissociar cinema de filme, conforme

discussão de Franco. Um aspecto a se questionar, seria se elas não fazem essa

diferenciação de cinema e filme pelo contato com as várias telas existentes na

atualidade. Assim para as crianças o filme existe em qualquer das telas sendo do

cinema, da TV, do computador ou do celular.

Pensar essa relação com outras telas de celular, computador e outras mídias

pode ser um fator pelo quais as crianças não reconhecem o cuidado que se tinha

com o “cinema” anteriormente quando a tela do cinema era a única tela na qual se

via o filme. Nesse sentido o cinema tinha uma “aura” no sentido que a ela dava

Benjamin pois tratava-se de um momento único de exibição num local próprio para

contar as histórias com imagens em movimento. Hoje são múltiplas as telas que

exibem os filmes ou trechos de filmes sendo o cinema apenas uma delas mesmo

sendo a maior e de mais difícil acesso pelo alto custo dos ingressos.

Pinto (2005) aponta que “um novo meio não desaloja os meios existentes,

antes conquista o seu próprio espaço” pois devido às novas tecnologias, a uma

diversidade de situações e encontros em movimentos, esse olhar antes imbuído de

representações, envolto pela magia e ritual do cinema, passa por uma experiência

globalizada, tornando-se interativo. Esse aspecto interativo, fixa uma nova dinâmica

perceptiva, redirecionando a apropriação do saber, possibilitando um novo espaço

social para compartilhar experiências e significados.

De acordo com essa dinâmica o espectador também é afetado, visto que

antes não sofria nenhuma intervenção física, mas passa agora a ser bombardeado

por um movimento de imagem e som. O filme, antes projetado nas telas de cinema,

sai das grandes salas e ganha novos espaços, ocasionando uma variedade

cotidiana de imagens e telas. Segundo Rivoltella (2006) essa multiciplidade de

espaços e o surgimento dessas novas telas mudam o sentido do olhar,

proporcionam uma nova geografia do ver, ao transformar o olhar do espectador que

era antes durável, variável e isolável perante o cinema em um olhar em constante

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movimento. O filme é constantemente visto e revisto esgotando-se nas suas muitas

exibições.

Observamos que a apropriação do cinema e das novas mídias contribuem

para pensar sobre o as relações feitas pelas crianças com o cinema ao ganharem

novos sentidos culturais. Segundo as próprias crianças, o cinema proporciona

muitas aventuras, um passeio mundo afora, uma viagem pelo mundo, é um lugar

para rir e para namorar. Nesse sentido, o cinema pode ser categorizado como

entretenimento, brincadeira e diversão e para mostrar como elas representam essa

visão, trazemos abaixo dois desenhos feitos pelas crianças em uma oficina sobre o

que é o cinema para elas.

Figura 6-Cinema local de prazer

Essa ótica das crianças, sujeitos de nossa pesquisa, a respeito do cinema

como entretenimento, local de fruição e impregnado de diversão coincide com a

perspectiva do olhar de outras crianças pesquisadas por Fantin (2006). Nesse

estudo as respostas das crianças para a pergunta O que é cinema para vocês, é

similar a que encontramos. De acordo com Fantin, o caráter diversão é explicitado

pelas crianças através de termos como “uma coisa legal e divertida”, “um

passatempo”, “que faz rir”.

Entretanto ainda que o cinema seja compreendido pelas crianças dessa

forma, não podemos desconsiderar o papel do cinema como espaço para se pensar,

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porque essa ênfase na diversão não significa ausência de reflexão, muito pelo

contrário, proporciona uma ação criativa e a experiência para se viver novas

situações por meio das imagens.

Filmes “bons” e “maus” para as crianças – questões para diálogo

O leitor pode estar se perguntando por que se deu a escolha desse título. A

temática em questão surgiu da fala das próprias crianças. Diante das sensações

provocadas pelos filmes exibidos no cineclube Megacine algumas delas começaram

a apontar o que consideravam como filmes bons e filmes maus. A seguir trazemos

falas das crianças sobre o que consideram filmes “bons” e “maus” em que

discutiremos e refletiremos a respeito levantando questões dentro de nossa

pesquisa.

Luana: Pra mim, é um filme que faz a pessoa chorar. Tem várias mensagens,

que fazem a pessoa chorar. Tem imagens bonitas nos filmes, mas as pessoas

choram. Então para mim, um filme bom e emocionante seria assim.

Ester: ...ah o filme é lindo, emociona... a maioria dos filmes que a gente fala

que é lindo é de uma história real... a gente vê o que a pessoa sofreu, a gente

fica emocionado com aquilo...

Mylena: Aquele filme que desperta emoção, incentiva você a entrar no filme,

por isso pó pessoal diz esse filme é bom...faz você se emocionar, ter os

mesmos sentimentos da pessoa do filme.

Percebe-se que se destaca nas suas falas a questão da “emoção” como

definidora do filme que consideram bons: filme que faz chorar, que a gente vê que a

pessoa sofreu, que tem várias mensagens... Uma das crianças aponta que um filme

bom, bonito e emocionante é um filme que represente, mostre alguma coisa, que

induza o leitor a alguma coisa. As crianças têm o entendimento de que filme bom é

aquele que desperta bons sentimentos, emoção cheia de imaginação, o comparam a

uma fábula ao dizerem que “ele induz o leitor a alguma coisa”, porque reconhecem

que este precisa apresentar um propósito e desencadear transformações ou

sentimentos nos espectadores. A que se deveria esse entendimento delas?

Outro aspecto trazido pelas crianças é a questão da fantasia:

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Mylena: Para um filme ficar mais interessante é preciso ter fantasia,

imaginação... aí ele fica...mais fundamental...

Hozana: Eu prefiro assistir esses filmes que têm fantasia, imaginação, porque

as pessoas botam o que está dentro da sua cabeça, seu mundo pra fora,

deixa o espaço aberto para todos visualizar.

Fernanda: Um filme para mim tem que ter fantasia, porque a fantasia deixa o

filme mais legal, por exemplo, quando fui ao cinema para ver Deu a Louca no

Chapeuzinho 3, não conseguir entender o filme estava sem fantasia, sem

sentido, ainda achei o 1 bem melhor.

Porque um filme bom para elas teria que ter fantasia? Porque não entendem

um filme quando não tem fantasia? O que isso nos faz pensar? Sugere-se nas falas

das crianças uma associação com os contos de fadas, com esse mundo imaginário

e repleto de sonhos. Assim a ênfase na fantasia parece indicar a necessidade e o

fenômeno social de um mundo ideal, em que precisamos acreditar e buscar um final

feliz para nos realizarmos completamente, sejamos crianças, jovens ou adultos.

Filmes interessantes no ponto de vista destas crianças precisam ter muita

fantasia e imaginação, necessitam ter “brilho”, que é a fantasia fundamental, já que

elas consideram ser estes itens que dão vida ao filme, além de despertar o desejo

nas pessoas em assisti-los.

Para as crianças, todo filme precisa de imaginação e fantasia para não ficar

repetitivo. Estes ingredientes trazem inovações, diversão e entretenimento.

Acreditam que é através da fantasia e da imaginação que as pessoas revelam seus

pensamentos em um filme, tornando-as mais abertas para o mundo. Deve ser

apropriado para as crianças e de preferência ser baseado em histórias reais, além

de ter muito “brilho”, porque fantasia é fundamental.

Quando nos deparamos com as colocações das crianças “filme bom precisa

de brilho” e “fantasia é fundamental”, surgiram diversas indagações e inquietações:

Que experiência é essa que elas têm de ver filmes? Não ter fantasia é sair do

formato conhecido? O fato de um filme estar mais próximo da realidade, o torna um

filme ruim ou de pouca qualidade? Qual será de fato as melhores narrativas trazidas

pelos filmes no ponto de vista delas?

Neste aspecto, as crianças mostram que as representações que têm sobre

bons filmes se configuram a partir do entendimento da relação que instauram com

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eles por meio das histórias, fantasias e emoções. Esses critérios de escolhas

instituídas por elas sugerem a ênfase de que um filme para agradar precisa ter como

ingrediente essencial despertar a capacidade criativa e a imaginação. Enfim, essa

percepção pode ser explicitada por Fernanda “É um filme que tem história, não tem

muita bobagem tipo o filme O Estranho Caso de Benjamin Button. Aquele filme é

muito emocionante” e Hozana “Pra mim um filme bom, seria com imaginação,

fantasia... como Sharkboy, a gente viu que ele representa a imaginação de uma

criança”, quando ressaltam os filmes de suas preferências e o motivo de suas

escolhas.

Fresquet (2007) afirma que a vivência do cinema permite estabelecer uma

ponte entre nossa realidade atual e a nossa infância. Nesse sentido, proporcionar

novas aprendizagens é fundamental. Partindo dessa premissa, o encontro com o

cinema proporciona um melhor aprender e um conhecimento da nossa própria

história...

Nesse contexto como entenderiam os filmes “maus”? Seriam “maus” por quê?

Bruno: Tia eu tenho um anime, do Naruto, q que é livre, mas acho que a

classificação deveria ser 10 anos, porque ele fala “ah vou te matar” e tem

armas ninjas, que até eu tenho medo... acho que não valeria para as

crianças.

Ester: Tem filmes que faz até mal para o desenvolvimento da criança.

Juliana: Lucas você não pode ver, você não entende, tem partes chocantes.

É perceptível nessas falas que as crianças não se reconhecem como

crianças. Tal afirmação pode ser percebida quando estas alegam que alguns filmes

não são nem apropriados “para as crianças” excluindo-se dessa categoria como se

não fossem elas próprias crianças. Os filmes são maus por trazerem medo, trazendo

aspectos negativos para outras crianças que não são elas. Parece-nos que há por

parte das crianças pesquisadas, uma negação da sua condição de criança, uma vez

que apresentam uma preocupação com o bem-estar dos seus pares, ao

considerarem que existem filmes danosos para o bom desenvolvimento infantil.

Entretanto, não se identificam como fazendo parte dessa mesma infância.

Dessa forma, apontam que filmes maus são os que trazem medo a ponto de

interferir no sono do espectador, apresentam cenas chocantes e inadequadas por

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tratarem de assuntos como tráfico, drogas e roubo, influenciando as crianças a

fazerem coisas ruins. São filmes impróprios que provocam terror e fixação em

pensamentos assustadores, que comprometem o crescimento das crianças.

Coaduna com essa visão das crianças entrevistadas, a concepção de criança

universal, que precisa ser tutelada. Nesse sentido essas crianças assumem uma

postura muito parecida com a concepção de infância construída na modernidade,

em que as crianças eram concebidas como incapazes e dependentes

emocionalmente. É notório, que em séculos anteriores a idade moderna, a noção de

infância não existia e a criança antes era vista como um adulto em miniatura.

Sendo assim, as crianças reproduzem em suas falas, um discurso próprio de

adultos. Questionamos se de fato há uma reprodução ou uma influência dos adultos

nessas concepções das crianças. Essa discussão a respeito de como as crianças se

percebem também aparece na pesquisa de Fernandes (2012). Nessa pesquisa

discute-se que a construção das leituras feitas pelas crianças acontece através das

mediações culturais vividas por elas e que um dos mediadores é o grupo de pares.

Nesse contexto dos pares as crianças apresentam preocupações ligadas à

construção da identidade, ao negarem sua condição de criança frente a certos

desenhos exibidos na TV os quais denominavam “programas de bebês” que não

eram vistos por elas, mas por outros as encarando como crianças e nomeando-se

como maiores, como aqueles que saberiam e poderiam ver o que os pequenos não

podem.

As crianças participantes do Projeto Megacine demonstram que para formar

sua identidade é preciso posicionar-se perante o grupo. Assim, as crianças mostram

que há tipos de filmes não recomendados por elas a outras crianças reforçando sua

identidade de “maiores”, menos crianças. Essa conjectura aponta que o aspecto da

identidade está atrelado à construção da audiência mediada pelo grupo como

constatado por Fernandes (2012), uma vez que a posição da criança nesse contexto

se dá por diversos modos de vivenciar suas práticas sociais. A necessidade de

pertencimento determina sua posição e sua identidade diante do grupo, porque fazer

parte é ser aceito e isto é de vital importância para a constituição do sujeito. Assim, a

experiência da audiência de filmes assim como de audiência de Tv ou outros

produtos audiovisuais afirma-se numa dimensão coletiva diante ou com os pares de

amigos. Essa experiência coletiva “compartilhada” de sentidos contribui para a

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ampliação de suas culturas e para o enriquecimento das relações afetivas que são

formadas.

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5- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Eu no Mega Cine me via como uma pessoa que ontem falava que filme era chato e hoje estou participando de debates, falando de filmes. Estou vendo coisas no filme que eu não via antes. Eu não tinha a visão que tenho agora, não era só porque eu era menor. Eu tinha um olhar diferente, eu não debatia, eu não tinha sentimento em relação aquele filme, eu só queria ver filme já mastigado, filme bobo, não bobo, mas assim Hello Kitty... (Juliana na entrevista ao falar sobre sua participação no Megacine).

As falas das crianças trazem pistas para compreendermos as relações

construídas com o cinema a partir das experiências culturais tecidas no contexto do

Megacine. Quando Juliana na epígrafe afirma “Estou vendo coisas no filme que eu

não via antes” e “eu tinha um olhar diferente” aponta possibilidades para pensarmos

como as crianças narram-se na relação com o cinema, tendo como precursor dessa

relação o Megacine. A partir do cineclube Megacine, as crianças refletem e dialogam

com os seus pares e pesquisadoras sobre as narrativas dos filmes, construindo suas

próprias leituras e narrativas, ao ressignificar o que viram com suas apropriações.

Com o clube do cinema, as crianças além de formularem ideias e conceitos a

respeito do acesso aos filmes “que todos conhecem” ou mesmo os chamados pelas

mesmas de “diferentes”, indicam as narrativas escolhidas para compartilhar com os

colegas e familiares e a relação que estão construindo com o cinema dentro do

cineclube criado. Da mesma forma, os desenhos das crianças acerca da relação

construída com o cinema no ano de 2011, apontam a constituição de uma cultura do

cinema. As imagens feitas em resposta a questão “O que é cinema para você?”

demonstram que entendem esse espaço para além dos filmes, mas como um local

voltado para estar com o outro, viver novas experiências junto com seus pares

ampliando o universo do ver.

Ao propor pesquisar a relação das crianças com o cinema na escola,

percebemos que o cinema como dispositivo constrói sonhos que atravessam o

imaginário infantil e, através da leitura dos filmes, os debates “valorizam a

imaginação da criança” como afirma Juliana, criança mediadora da pesquisa. Nesse

contexto precisamos ouvir suas vozes, ver seus olhares e sentir o encontro delas

com os filmes e as leituras que estes proporcionam (Fresquet, 2009). Somente

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assim, como afirma Fresquet (2009, p. 153) “[...] eles são os reais protagonistas na

recepção e produção de uma cultura que lhes é própria”.

Como afirma Xavier (1988, p. 370) “No cinema, posso ver tudo de perto, e

bem visto, ampliado na tela, de modo a surpreender detalhes no fluxo dos

acontecimentos, dos gestos. A imagem na tela tem sua duração, ela persiste, pulsa,

reserva surpresas”. Assim como no cinema, a pesquisa reserva surpresas, faz as

nossas reflexões pulsarem e amplia os detalhes que no cotidiano poderiam passar

despercebidos. Detalhes que as próprias crianças revelam. Os processos sociais

significados pelas crianças ao assistir e experienciar os filmes, atribuem novos

sentidos à cultura e nos permitem ampliar o olhar ao perceber a relação das

mesmas com o cinema.

Nessa trajetória de pesquisa construída junto às crianças no Projeto

Megacine percebi que a escola pode ser local de fruição, bem como o espaço para

se experimentar o significado da existência e o encontro com o outro, aqui em

questão, o cinema. Porém esse encontro não acontece ao acaso, ele é permeado de

sentidos e significados, é o meio pelo qual passa uma sucessão de movimentos,

impregnados de afeto e possibilidades estéticas.

Pensando sobre o que as crianças nos trazem nos remetemos a Benjamin em

seu artigo O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov: “A experiência

que passa de pessoa a pessoa é a fonte, a que recorreram todos os narradores

(1994, p.198)”. As crianças apontam que constroem-se em suas trocas, na relação

com seus pares nesse contexto de fruição. Sendo assim, a experiência do outro, das

outras crianças –seus pares – e das outras crianças dos filmes - modifica o

conhecimento de si mesmo.

A pesquisa nos possibilitou refletirmos sobre a educação e a escola de modo

geral vendo que, embora a escola muitas vezes ainda veja o cinema como mera

ferramenta para ilustrar ou aprofundar conteúdos, podemos sim considerá-la um

espaço de convivência para o cinema que educa, forma e faz pensar. A capacidade

de pensarmos o cinema como transformador da realidade e aquele que facilita o

contato com outras culturas nos faz considerar que o cinema como fenômeno social

nos auxilia a entender o percurso histórico cultural da infância.

Para compreendermos como vivem e pensam é preciso ter uma escuta e um

olhar atento sobre essas realidades, faz-se necessário observar uma multiplicidade

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de infâncias e respeitar as crianças como sujeitos plurais em permanentes

construções.

Cabe ressaltar, que a experiência do Projeto Megacine viabiliza a reflexão

que o cinema pode estar na escola formando para a cidadania, entendendo-o como

educativo, experimentado na coletividade e aquele que impulsiona o narrar de novos

eventos. Tal fato se dá devido a ação instigante e provocativa do cinema, que por

meio de sua capacidade inventiva amplia o repertório dos sujeitos ao trazer

modificações em seus cotidianos, transformando-os em suas maneiras de ser.

As colocações trazidas pelas crianças nos dão pistas para compreendermos

as relações construídas com o cinema a partir das experiências culturais vivenciadas

no contexto do Projeto Megacine. Essa experiência com o outro acrescenta um

passo maior no conhecimento de si mesmo, como afirma Juliana “Estou vendo

coisas no filme que eu não via antes” e “eu tinha um olhar diferente”.

Presenciar através do cinema, a narrativa de outras histórias, de outras

culturas, permite ao sujeito estar em constante contato com outras realidades, faz o

ser humano posicionar-se melhor no mundo e ficar ciente de que não existe

somente uma única maneira de ver as coisas, de se viver. Essa sensibilidade em

perceber o mundo, constatamos no relato de Mylena “Quando eu comecei a

participar do Megacine eu vi que filme era muito bom”, “passei a gostar de filmes

mais antigos e a gostar mais de cinema, porque não gostava de ficar naquele escuro

e hoje eu gosto muito”. “Hoje se alguém criticar o cinema, eu debato com a pessoa”.

Ao estabelecer uma relação com o diferente, com o outro, as crianças

ampliam o seu conhecimento em todos os sentidos, reinventando suas relações com

o mundo. Além de reflexão e diálogo com os seus pares e pesquisadoras sobre as

narrativas dos filmes esse ressignificar do que viram com suas apropriações aponta

possibilidades para pensarmos que elas narram-se na relação com o cinema, tendo

como precursor dessa relação o Megacine.

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ANEXOS

Roteiro da entrevista

1) O que é ser criança?

2) Vocês consideram a imaginação e a fantasia importantes para a produção de

filmes?

3) Para vocês qual é o papel da imaginação e da fantasia no cinema?

4) O que é uma história para vocês?

5) Quem seria o narrador da historia para vocês?

6) O que vocês entendem por ler um filme?

7) Ler um filme é o mesmo que ler um livro?

8) Qual a diferença entre a leitura de um filme e de um livro?

9) O que é um bom filme para vocês?

10) O que é um filme bom, bonito e emocionante?

11) O que são filmes de crianças para vocês?

12) O que são filmes próprios para as crianças e impróprios? É importante que os

filmes tenham classificação etária? Por quê?

13) O que é um filme de época e de antigamente para vocês?

14) Há diferença de filme de época para filmes antigos?

15) Vocês gostam desse filme e por quê?

16) O que é um filme para vocês? O que um filme precisa ter?

17) O que é cinema para vocês?

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Relato da Oficina Diálogos sobre Cinema na Escola -02 de Dezembro de

2011.

A oficina se iniciou a partir de uma tempestade de ideias com a pergunta: O

que é um bom filme para vocês? A medida que as crianças falavam, a professora

registrava o que achavam em uma cartolina. A seguir, destacamos as principais

colocações do que é um bom filme para elas:

“Ter ação”...

“Ser engraçado”...

“Ter diversão, drama, aventura, suspense e vários gêneros”

“Pra mim um bom filme é um filme antigo” (Mylena)

“Que chame a atenção e a pessoa se sinta dentro dele...”.

“Poder se inspirar no filme...”.

“Um bom filme é quando apresenta dúvidas.”

Outra questão lançada foi “O que é cinema para elas?” As falas das crianças foram as seguintes:

“Telão, cadeira, pipoca, gente, pessoas...”

“Hoje em dia virou um lazer, diversão (Esther)”

“Cinema é lugar de suspense e onde ficamos a vontade, lugar onde podemos viver a aventura do filme (Mylena)”

“Lugar para ver filme e não para namorar”

“É um lugar que tem animação”

Após a tempestade de ideias, a professora fez uma leitura das inferências das

crianças que comemoraram esse momento com aplausos. Então, solicitou-se que

todas representassem com um desenho o significado do cinema para cada um e

ainda se instigou as crianças com a pergunta: quando você pensa em cinema, que

ilustração vem em sua cabeça? Imediatamente, Juliana que filmava a oficina

respondeu: “o telão”.

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A criação das ilustrações foi feita em grupo, o que favoreceu a troca de ideias

sobre os desenhos. Após, a confecção dos desenhos, aconteceu um breve relato

por parte das crianças sobre o que foi desenhando e o porquê dessa escolha.

Juliana iniciou a apresentação, mostrando sua produção e explicando para o grupo

que o símbolo que desenhou foi o telão com Mega Cine escrito e o Valentin, pois

quando pensa em cinema vem em sua cabeça essas representações simbólicas.

Fala também sobre a importância do Mega Cine em sua vida “A importância do

Mega Cine na minha vida é que estou aprendendo cada vez melhor, outras

interpretações dos filmes... estou aprendendo várias coisas”.

“Às vezes as pessoas vão ao cinema em busca de uma aventura, por isso desenhei isso” (Daniela)

“Eu fiz uma câmera que está registrando fotografias pq para mim o cinema são fotografias em movimento, pq qdo eu penso no cinema penso em várias fotografias juntas formando um filme”. (Mylena)

É importante, apontar que apesar de todos participarem com suas ilustrações, alguns demonstraram certa dificuldade em justificar a relação do símbolo desenhado com a sua relação com o cinema.

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