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As opiniões e posicionamentos registados neste espaço não reflectem necessariamente as posições dos intermediários e dos doadores do Programa AGIR A presente edição do PlataformAGIR chega as mãos do caro leitor numa altura em que o país voltou a viver momentos de incertezas com ameaças à paz. Aliás, desde que o Conselho Constitucional validou os resultados das eleições gerais e das assembleias provinciais, de 15 de Outu- bro, em Dezembro do ano passado, os moçambicanos nunca sen- tiram na totalidade o conforto da paz, visto que as partes, ora em conflito, voltaram a levantar o tom da voz ameaçadora. Os encontros ao mais alto nível entre o presidente da República, Filipe Nyusi, e o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, vieram relançar esperanças que não duraram muito Elaborado por PNDH Não à guerra! Cidadãos marcham pela paz em Sofala Maputo, Moçambique * Outubro * 2015 * Nº 13 Nota de Abertura Numa acção coordenada pela Pressão Nacional dos Direitos Humanos A lgumas organizações da sociedade civil moçambicana, lideradas pelo PNDH – Pressão Nacional dos Direitos Hu- manos, realizam, recentemente, uma marcha de repúdio à vio- lência, apelando à paz e exigindo que as divergências políticas existentes entre o Governo e o maior partido da oposição, a Renamo, sejam resolvidas através do diálogo e por cedências de ambas as partes. Para as organizações da sociedade civil, a instabilidade po- lítica que se vive no país só não se chama guerra por não ter sido ainda declarada oficialmente, mas os factos levam para esse rumo. A marcha pacífica, realizada na cidade da Beira, capital pro- vincial de Sofala, centro dos principais conflitos armados, jun- tou organizações das províncias de Sofala, Tete e Zambézia (CTA-antena regional centro, Associação Comercial da Beira, FOPROSA, PNDH, ADEL, Kukumbi e a Universidade Pedagógica- -delegação da Beira), tendo aglutinado mais de 500 pessoas. Estas organizações defenderam que nenhum conflito, diver- gência ou diferença deve estar acima do direito à vida, à digni- dade e à paz, direitos universalmente consagrados e reconheci- dos pela Constituição da República de Moçambique. Segundo essas agremiações, os últimos acontecimentos da re- gião centro que culminaram com mortes e pânico, constituem muita preocupação e angústia no seio da sociedade civil, uma vez que se traduziram em episódios violentos e trouxeram mortes e intranquilidade no seio das comunidades e da popu- lação moçambicana em geral. A sociedade civil afirma que junta o seu clamor a todas vozes e estratos da sociedade e defendem que não há necessidade de se lembrar a ninguém os males que a guerra dos 16 anos cau- sou aos moçambicanos e, particularmente, às mulheres, cujas marcas e feridas nunca sararam por completo. Num outro desenvolvimento, as agremiações pedem ao Pre- sidente da República, Filipe Nyusi e o líder da Renamo, Afonso Dlhakama, para que acelerem esforços para manter a paz, atra- vés do diálogo. Para dar eco ao seu grito, os manifestantes recorram a dísti- cos com vários apelos sobre a paz, canções e orações. Dizeres como: “Paz Duradoura, um Diálogo Prático e Constru- tivo”; “queremos a paz” e “para quê a guerra se a paz não custa nada?”, abundavam no seio dos manifestantes. * Continua pág. 2

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As opiniões e posicionamentos registados neste espaço não reflectem necessariamente as posições dos intermediários e dos doadores do Programa AGIR

A presente edição do PlataformAGIR chega as mãos do caro leitor numa altura em que o país voltou a viver momentos de

incertezas com ameaças à paz.Aliás, desde que o Conselho Constitucional validou os resultados

das eleições gerais e das assembleias provinciais, de 15 de Outu-bro, em Dezembro do ano passado, os moçambicanos nunca sen-

tiram na totalidade o conforto da paz, visto que as partes, ora em conflito, voltaram a levantar o tom da voz ameaçadora.

Os encontros ao mais alto nível entre o presidente da República, Filipe Nyusi, e o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, vieram relançar esperanças que não duraram muito

Elaborado por PNDH

Não à guerra!

Cidadãos marcham pela paz em Sofala

Maputo, Moçambique * Outubro * 2015 * Nº 13

Nota de Abertura

Numa acção coordenada pela Pressão Nacional dos Direitos Humanos

Algumas organizações da sociedade civil moçambicana, lideradas pelo PNDH – Pressão Nacional dos Direitos Hu-

manos, realizam, recentemente, uma marcha de repúdio à vio-lência, apelando à paz e exigindo que as divergências políticas existentes entre o Governo e o maior partido da oposição, a Renamo, sejam resolvidas através do diálogo e por cedências de ambas as partes.

Para as organizações da sociedade civil, a instabilidade po-lítica que se vive no país só não se chama guerra por não ter sido ainda declarada oficialmente, mas os factos levam para esse rumo.

A marcha pacífica, realizada na cidade da Beira, capital pro-vincial de Sofala, centro dos principais conflitos armados, jun-tou organizações das províncias de Sofala, Tete e Zambézia (CTA-antena regional centro, Associação Comercial da Beira, FOPROSA, PNDH, ADEL, Kukumbi e a Universidade Pedagógica--delegação da Beira), tendo aglutinado mais de 500 pessoas.

Estas organizações defenderam que nenhum conflito, diver-gência ou diferença deve estar acima do direito à vida, à digni-

dade e à paz, direitos universalmente consagrados e reconheci-dos pela Constituição da República de Moçambique.

Segundo essas agremiações, os últimos acontecimentos da re-gião centro que culminaram com mortes e pânico, constituem muita preocupação e angústia no seio da sociedade civil, uma vez que se traduziram em episódios violentos e trouxeram mortes e intranquilidade no seio das comunidades e da popu-lação moçambicana em geral.

A sociedade civil afirma que junta o seu clamor a todas vozes e estratos da sociedade e defendem que não há necessidade de se lembrar a ninguém os males que a guerra dos 16 anos cau-sou aos moçambicanos e, particularmente, às mulheres, cujas marcas e feridas nunca sararam por completo.

Num outro desenvolvimento, as agremiações pedem ao Pre-sidente da República, Filipe Nyusi e o líder da Renamo, Afonso Dlhakama, para que acelerem esforços para manter a paz, atra-vés do diálogo.

Para dar eco ao seu grito, os manifestantes recorram a dísti-cos com vários apelos sobre a paz, canções e orações.

Dizeres como: “Paz Duradoura, um Diálogo Prático e Constru-tivo”; “queremos a paz” e “para quê a guerra se a paz não custa nada?”, abundavam no seio dos manifestantes. *

Continua pág. 2

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2 Plataforma - AGIR

A absolvição do economista Carlos Nuno Castel-Branco e do jornalista Fernando Mbanze constituiu um refor-

ço à luta promovida pela Sociedade Civil (SC) moçambicana na defesa das liberdades de expressão e de imprensa. A sentença que declarou a inculpabilidade dos dois réus,

lida no passado dia 16 de Setembro de 2015, constitui na opinião de diferentes esferas da sociedade um marco na

tempo, visto que o chumbo do projecto de lei das províncias autárquicas, depositada pela Renamo na Assembleia da República, veio atear o fogo que nunca se apagou na totalida-de.

De lá a esta parte, Moçambique foi vivendo situações de tremor, mas com uma doze de esperança de que os políticos chegariam a um entendimento.

Nos últimos dias, o presidente da Renamo sofreu duas embos-cadas, e, uma delas obrigou Afonso Dhlakama a refugiar-se nas matas de Gorongosa, província de Sofala, por 14 dias.

A saída de Dhlakama das matas foi vista por muitos moçambi-canos como um momento de alívio e que o esperado encontro entre Filipe Nyusi e Afonso Dhlakama se consumaria para pôr termo a actual situação.

Porém, 24 horas depois do resgate, o presidente da Renamo é cercado pelas Forças de Defesa e Segurança que retiram armas da sua segurança. Neste momento, Afonso Dhlakama encontra-se numa situação de “prisão domiciliária”.

Perante estes factos não está a ser fácil prever o futuro do país

história da justiça moçambicana.Castel-Branco e Fernando Mbanze foram acusados de cri-

mes contra segurança de Estado e abuso a liberdade de im-prensa respectivamente. A JOINT – Liga de ONG´s em Moçambique, junto com seus

parceiros da SC, desempenhou um papel preponderante com destaque para a mobilização de vários actores da so-ciedade para que em conjunto pudessem realizar acções in-terventivas de repúdio face a acusação ora levantada contra

e a incerteza continua. A única certeza é que os moçambicanos querem a paz.

A presente edição também coincide com o Fórum Consultivo do AGIR, um encontro de partilha de informações e troca de ex-periências entre os intervenientes do programa nomeadamente os financiadores, intermediárias, organizações parceiras , bem como outros convidados, entre representantes do governo e de instituições académicas e de pesquisa.

Além do acima referido, outras empreitadas sócio-políticas, igualmente relevantes, acham-se reflectidas no presente núme-ro do PlataformAGIR, designadamente: os apelos da sociedade civil a paz; a absolvição do activista e economista Castel Branco e do jornalista Fernando Mbanze num processo visto como um verdadeiro atentado à liberdade de imprensa e de expressão; e o impacto social e ambiental da prospecção e exploração de gás natural na bacia de Rovuma.

Não poderíamos terminar a presente nota sem nos referirmos da aprovação do regulamento da Lei do Direito à Informação, pelo Governo moçambicano.

Fernando Mbanze e Castel-Branco durante a sessão de julgamento

Cont. da pág. 1

O caso Castel-Branco e Fernando Mbanze

Os desafios para o efectivo exercício da Lei do Direito à Informação

O CONTRIBUTO DA SC NA DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO:

Elaborado por Joint

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3Plataforma - AGIR

A Lei do Direito à Informação, aprovada pela Assembleia da República, em Dezembro de 2014, trás consigo

uma nobre missão de consolidar e aprofundar diferentes instrumentos jurídicos como forma de facilitar o acesso à informação por parte do cidadão. Resultado do empenho das forças vivas da sociedade mo-

çambicana, em particular da sua sociedade civil, a Lei nº 34/2014, de 31 de Dezembro, conseguiu progressos assi-naláveis na consagração de padrões de acesso à informação tais como, o princípio de máxima divulgação, do respeito pela dignidade humana, a exigência de fornecimento da in-formação não só pelas entidades da administração pública como também pelos particulares que têm informações pú-blicas entre outros. Todavia, apesar dos progressos assinaláveis acima referi-

dos, a lei trouxe vários desafios que urge ultrapassar para a boa implementação.

Dentre vários desafios, podemos destacar sete a saber: o conhecimento do direito de acesso à informação, a harmo-nização da lei com o regime vigente, a consolidação institu-cional, o aperfeiçoamento e desenvolvimento do mecanis-mo processual, aspectos culturais, corrupção generalizada e pobreza. É que sem conhecimento da lei a sua importância fica di-

minuta. Pelo que, há que apostar na sua divulgação para que os destinatários tirem o máximo proveito. A Administração Pública e a sociedade civil em geral de-

vem se empenhar bastante para que as normas de acesso à informação sejam amplamente conhecidas.No aspecto referente à harmonização com o regime vigen-

te, é importante salientar que o dispositivo consagra princí-pios e padrões inovadores e consentâneos com os padrões internacionais de acesso à informação. Porém, alguns ins-trumentos jurídicos em vigor carecem de ser harmonizados com a nova lei. Pelo que urge a sua regulamentação para

Os desafios para o efectivo exercício da Lei do Direito à Informação

Castel-Branco e Mbanze.A acusação do Ministério Público contra o economista e

o jornalista demonstrou um cenário de censura que qual-quer cidadão estaria sujeito caso manifestasse abertamente a sua opinião face a forma como os processos governativos estavam a ser conduzidos particularmente no período em que já eclodia a tensão político-militar no país. Para manifestar a indignação e repúdio face as “algemas”

que a liberdade de expressão estava a ser colocada com aquela acusação, a JOINT coordenou uma série de activi-dades interventivas que culminaram com a realização de uma acção pública com difusão de mensagens em prol da absolvição dos acusados que significaria a absolvição das liberdades de expressão e de imprensa no país.Do julgamento até a leitura da sentença, várias activida-

des foram realizadas com vista a pressionar o sistema de justiça no país e para chamar atenção para o rumo pouco democrático que o país seguia com o desencadeamento da-quele processo. O destaque vai para a realização de debates temáticos so-

bre o estágio das liberdades de expressão e de imprensa, produção de artigos de análise e sua inserção na imprensa e redes sociais para além de recurso à imprensa para dar voz ao grito da sociedade civil face a tamanha injustiça. O uso das redes sociais representou um vector importante

para a massificação de um movimento social em prol da causa de defesa das liberdades fundamentais, com a criação de uma página no facebook denominada “Confidencial”. Esta ferramenta constituiu um espaço aberto onde vários

cidadãos puderam de forma aberta expressar as suas opini-ões sobre todo processo que colocava em causa a liberdade de todos os cidadãos de poderem expressar livremente as suas opiniões.

Nesta empreitada coordenada pela JOINT, participaram várias organizações da sociedade civil como é o caso da Associação Moçambicana de Jornalismo Judiciário (AMJJ), SEKELEKANI, FORCOM, WLSA Moçambique, MISA Moçambi-que, Associação da Mulher na Comunicação Social (AMCS), Justiça Ambiental, CESC- Centro de Aprendizagem e Capa-citação da Sociedade Civil, Rede de Comunicadores e Ami-gos da Criança (RECAC), LAMBDA, CEMO, Associação Cen-tro do Fotojornalismo de Moçambique, CEC, CAIC e CODD.

Liberdades fundamentais dos cidadãos em causa

Num Estado de Direito Democrático como Moçambique onde a Constituição da República defende que todos os ci-dadãos são livre de expressar as suas opiniões e há abertura legal para as publicações, faz sentido que a sociedade civil manifeste abertamente o seu papel de intervenção e mobi-lização pública em defesa dessas liberdades fundamentais. Nesse contexto, a JOINT em coordenação com OSCs, or-

ganizou uma marcha horas antes do início do Julgamento no dia 31 de Agosto, onde vários segmentos da sociedade civil, defensores de direitos humanos e cidadãos protesta-ram contra aquele julgamento em frente do edifício onde funciona a quarta secção criminal do Tribunal Judicial do Distrito de KaMpfumo. O mesmo facto repetiu-se no dia da leitura da sentença. O delírio atingiu o momento mais alto com a absolvição

dos dois réus. A sentença foi descrita como tendo sido uma prova ine-

quívoca de que Moçambique é, efectivamente, um Estado de Direito e Democrático e não propriamente uma “ditadura fascista”.*

Elaborado por ACDH

Continua pág. 4

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4 Plataforma - AGIR

Andrew Heywood (2013) – seguindo a tradição de He-gel e Marx – assevera que o conceito de sociedade civil

refere-se ao domínio dos grupos e das associações autóno-mas, formadas pelos indivíduos na sua qualidade de cida-dãos privados. David Beetham e Kevin Boyle (1995) no que consideram de visão positiva, definem-na como: “…arena in-dependente de auto-organização dentro da sociedade, atra-vés da qual as pessoas podem trabalhar colectivamente para resolver os seus próprios problemas, que podem servir de canais de expressão da opinião popular e de pressão sobre o governo, podendo, também servir de mecanismo de pro-tecção contra actos de subversão/manipulação pelos pode-res vigentes. Os teóricos liberais como Alex de Tocqueville, Grabriel Almond e Sidney Verba, dentre outros, argumen-taram que o elemento político – no sentido da participação política - de muitas organizações da sociedade civil facilita uma cidadania mais consciente e melhor informada, que faz melhores escolhas eleitorais, participa da política, e assegu-ra, como resultado, que o governo seja mais responsável. Deste modo, uma visão mais completa do que é a socieda-

de civil pode ser apresentada nos seguintes moldes: como compreendendo aquele segmento de grupos e associações autónomas que interagem permanentemente com o Estado/Governo através dos seus órgãos, instituições, plataformas e outras formas associativas, tanto com o objectivo de re-solverem os seus problemas e/ou servirem de canal de ex-pressão da opinião popular e de pressão sobre o governo, quanto como um mecanismo que visa limitar o exercício arbitrário do poder Estatal para além dos ditames estabe-lecidos na Lei, prevenindo, de igual modo, a pe-netração dos poderes públicos em todas as esferas da vida social, o que pode absorver e constranger quaisquer opor-tunidades de iniciativa, inovação e talento dos cidadãos. Os interesses variam, obviamente, mas as organizações da sociedade civil têm fundamentalmente, esta missão e as suas estratégias, nalgumas instâncias, podem transformá-

-las, logicamente, de grupos de interesse em grupos de pres-são ou em partidos políticos!Nesta ordem e olhando para o contexto moçambicano, a

sociedade civil participa no processo da construção da De-mocracia entanto grupos e/ou organismos de interesse e/ou de pressão junto às entidades públicas articulando, agre-gando, veiculando, advogando interesses e políticas de vária índole e usando diversos meios – incluindo os Media – para influenciar, em última análise, os decisores públicos ou “po-licy makers” na sua acção governativa. Outras formas de in-tervenção dos grupos que integram o “corpus” da sociedade civil, incluem a aproximação directa aos “decision makers”, por exemplo, a pressão junto ao poder Legislativo ou ao Executivo, ou ainda através da promoção de fóruns públicos de diálogo/debate com a participação de entidades do Esta-do/Governo. Os interesses pelos quais os grupos da sociedade civil lu-

tam pela sua defesa numa determinada sociedade têm uma natureza igualmente diversa, segundo alguns tipicamente de interesse geral e outros de jaez particular. Uns e outros e através dos tempos, em Moçambique, cidadãos tem vindo a tomar consciência da necessidade de comungar esforços para assegurar a sua concretização, em sintonia. É daí que é massificada a participação através da formação de grupos sociais organizados que defendem agendas diversas, como por exemplo: equidade de género, transparência na admi-nistração da rés-pública, direitos das minorias sexuais e dos grupos vulneráveis, dentre outros.O desiderato de uma contribuição forte para a construção

da democracia que confronta a sociedade civil organizada (associações, redes, plataformas e outras) é desafiado, ami-úde, pelo carácter imediatista, da generalidade das inter-venções por esta encetadas na busca de soluções para os problemas com que se têm deparado. Assim, e para Moçam-bique, um dos maiores desafios da sociedade civil é o de procurar ser mais coesa e proactiva para que a sua parti-cipação no processo de consolidação da democracia possa produzir mudanças tangíveis.

Cont. da pág. 3

Elaborado por CEDE

Papel da Sociedade Civil na Construção de Democracia

OAM engajada na promoção da cultura jurídica nas comunidades

que se atenue a desarmonia com outros dispo-sitivos legais.

No que concerne a consolidação institucional é importan-te frisar que não bastam boas leis sem instituições fortes e actuantes que garantam a sua monitoria e implementação. Há que adaptar as que existem ou criar outras que sejam consentâneas com a nova lei.

No que se refere ao aperfeiçoamento e desenvolvimento do mecanismo processual é bom frisar que de nada valem boas normas e instituições fortes e actuantes sem um mecanismo processual simplificado e claro.

No actual cenário, a garantia do direito à informação segue um processo comum reservado a outros direitos como é o caso do processo contencioso administrativo. Esta situação pode comprometer o gozo de direito de acesso à informação como um direito humano.

Há que criar um processo próprio que atenda a especifici-dade, gratuitidade e a urgência deste direito.

Em Moçambique a cultura do secretismo continua muito ge-neralizada, fruto do percurso histórico que o país atravessou o que limita o exercício do direito de acesso à informação.

Para tal, há necessidade de apostar na remoção destes obs-táculos através de um processo planificado de aculturação.

A corrupção é outro desafio que deve ser contornada. É do conhecimento geral que as estatísticas apontam Moçambi-que como um dos países mais corruptos do mundo. A cor-rupção pode desvirtuar o acesso à informação e transforma--lo em um negócio.

Por último, a pobreza, que se resume na falta de meios e recursos básicos, limita qualquer tentativa de exercício de qualquer direito incluindo o direito de acesso à informação. A pessoa pobre não tem como receber informação muito me-nos procurar, pois para esta pessoa tudo é difícil. *

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5Plataforma - AGIR

Papel da Sociedade Civil na Construção de Democracia

OAM engajada na promoção da cultura jurídica nas comunidades

A Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), atra-vés do Instituto de Acesso à Justiça (IAJ), uma unidade

que garante a assistência jurídica gratuita aos cidadãos ca-renciados, está a implementar, desde o início de 2015, um projecto denominado “Caravana da Justiça” que consiste na prestação de assistência jurídica gratuita às comunidades. A iniciativa vem responder o preceito constitucional que

advoga o direito do acesso à justiça e de defesa a todos cidadãos.Com esta iniciativa, a OAM quer contribuir para o acesso à

justiça ao cidadão e aproximar o advogado as pessoas. A Caravana da Justiça constitui uma nova era na vida da

OAM, na medida em que se torna visível a actuação da orga-nização em prol do cidadão, facto que concorre para o cum-primento das suas atribuições previstas no artigo quatro dos Estatutos da agremiação mormente: “o de promoção do acesso à justiça e o desenvolvimento da cultura jurídica nas comunidades”.Numa primeira fase, o projecto vai abranger as cidades

de Maputo, da Beira (Sofala), Nampula, Tete e Quelimane (Zambézia).As actividades estão a ser efectivadas em coordenação

com as autoridades locais nomeadamente: os chefes dos Postos Administrativos e secretários dos bairros que têm a missão de divulgar a iniciativa junto as comunidades abran-gidas, acolher as caravanas e indicar os locais da realização das jornadas da justiça. Para além da intervenção das autoridades locais, a divul-

gação do evento é feito através da distribuição de panfletos, colagem de cartazes e dísticos bem como através dos ór-gãos de comunicação social ao nível local. A OAM definiu como critério de escolha dos lugares para a

realização das jornadas jurídicas a densidade populacional

e a probabilidade de existência de conflitos jurídicos.A Caravana concentra suas atividades em quatro áreas a

saber: Laboral, Família e Menores, Criminal e Cível. Nestas Caravanas as equipas de trabalho são constituídas

por advogados profissionais, advogados estagiários, técni-cos do IPAJ e estudantes finalistas das faculdades de Direi-to. Até ao momento foram realizadas três Caravanas tendo abrangidos 124 cidadãos. Com 49 casos apresentados, o sector laboral é que lidera

o número das queixas seguido da área civil. As actividades realizadas em Maputo e nas três províncias ao longo de 2015 permitiu que a OAM atendesse um total de 283 casos, dos quais 159 em Maputo e 124 nas províncias.

Caravana Jurídica pronta para o trabalho

Gilberto Correia, antigo bastonário da Ordem dos Advogados na companhia de advogados estagiários,

auscultando os cidadãos

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6 Plataforma - AGIR

A bacia do Rovuma, localizada no litoral do distrito de Palma, a norte da província de Cabo Delgado, agrega

97% das reservas de gás natural recuperável confirmadas, ao nível do território nacional. A petroquímica norte-americana Anadarko e a italiana ENI

lideram o grupo de empresas que pesquisam hidrocarbone-tos em águas profundas na bacia do Rovuma. Em 2006 as duas empresas adquiriram, junto do Governo

direitos exclusivos de pesquisa e produção de quantidades comerciais de hidrocarbonetos nas áreas 1 e 4. Desde então, a Anadarko e a Eni, vêm se desdobrando em

diversas acções com vista a desenvolver projectos de explo-ração do gás natural por elas descoberto.Após uma avaliação da linha costeira da Província de Cabo

Delgado, feita no início de 2011 entre a cidade de Pemba e a fronteira com a Tanzânia, a fim de identificar locais po-tencialmente adequados para a construção e operação de uma fábrica de gás natural liquefeito (GNL), a península de Afungi, no distrito de Palma, foi o local escolhido.

Impacto social e ecológico

De um modo geral, as actividades de perfuração para a

Até que ponto a descoberta dos recursos energéticos, na bacia de Rovuma, vai melhorar as condições de vida desta pobre população

Elaborado por CTV

Exploração do gás natural na bacia do Rovuma e seus impactos

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7Plataforma - AGIR

pesquisa e produção de hidrocarbonetos são potencial-mente poluidoras, dado que os derrames, quando ocorrem, alteram os ecossistemas marinhos e terrestres. O projecto de exploração do gás natural em Palma, não

se exime destes riscos, tanto é que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), deste empreendimento identificou um conjunto de impactos ambientais e sociais, que foram pu-blicamente apresentados. O EIA identificou algumas áreas sensíveis, que podem sofrer impactos com a implementa-ção do projecto de exploração do gás natural em Palma, a começar pelas ilhas, de Macaloe (387 hectares), no Distrito de Macomia, e Vamizi (1,181 hectares) e Rongui (969 hecta-res) no distrito de Palma, corais, tapetes de ervas marinhas e mangais na orla costeira do Arquipélago das Quirimbas. As ilhas acima referidas fazem parte do Projecto de Bio-

diversidade e Turismo de Cabo Delgado (PBTCD) que foi desenvolvido para assegurar a conservação sustentável das áreas com vida selvagem variada e intacta.De acordo com o EIA, os potenciais impactos biofísicos e

sócio-económicos, geralmente associados às pesquisas sís-micas, incluem o ruído subaquático proveniente das fontes sonoras de ar comprimido nos mamíferos e tartarugas ma-rinhas; interrupção da pesca perto da costa devido a zona de segurança à volta de embarcação sísmica e cabos rebo-cados no mar; interferência com a navegação devido à zona de segurança à volta da embarcação sísmica e dos cabos rebocados no mar; impactos no ecoturismo devido ao ruído subaquático proveniente das fontes sonoras de ar compri-mido ou exclusão das zonas de segurança à volta da em-barcação sísmica; e impactos na qualidade do ar e da água devido às emissões de poluentes e descargas de resíduos das embarcações de pesquisa.Para estes e outros impactos identificados, o EIA prevê

medidas de mitigação, embora algumas suscitem dúvidas quanto à sua eficácia, a médio e longo prazo. É o caso dos dispositivos de agregação de peixes que se-

rão instalados na baía de Palma e dos recifes artificiais, que serão colocação no mesmo ecossistema, como forma de mi-tigar a perda de áreas de pesca artesanal.Na componente social, também foram identificados vários

impactos e estabelecidos mecanismos de mitigação. Contu-do, outras implicações do projecto, sobre as comunidades afectadas foram negligenciadas.Referimo-nos aos direitos adquiridos pelas comunidades

de Afungi, sobre a terra e outros recursos naturais que fo-ram sistematicamente violados, aquando da ocupação da terra pelo projecto.Para a implantação do empreendimento, na componente

terrestre, em 2012 o Governo concedeu o Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT), numa área de 7000 hec-tares, localizada em Afungi, à empresa Rovuma Basin LNG Land, Lda (“RBLL”), constituída pela Anadarko Moçambique Área1 (AMA1) e a Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH).

Ilegalidades

Este DUAT foi atribuído à RBLL sem consultar, devidamen-te, as comunidades locais, conforme estabelece a lei de ter-

ras e, numa situação irregular, marcada pela ausência de licença ambiental do projecto, violando assim o princípio da precedência da licença ambiental, prescrito no Artigo 15 da Lei do Ambiente. O DUAT da RBLL foi atribuído sem a celebração de contra-

tos de cessão de exploração, entre aquela sociedade comer-cial e as comunidades e pessoas singulares que ocupam, há várias gerações, a área dos sete mil hectares. Foi atribuído sem a extinção do direito de uso e aprovei-

tamento da terra, ou de grande parte dela, pertencente às comunidades locais e pessoas singulares, conforme o es-tipulado na lei de terras e no seu respectivo regulamento.Uma avaliação jurídica independente aos processos de li-

cenciamento do projecto da fábrica de liquefacção do gás natural em Palma, realizada em Janeiro de 2015 por uma equipa de juristas séniores nacionais, composta pelo Juiz Conselheiro Jubilado, João Carlos Trindade e pelos advo-gados, Lucinda Cruz e André Cristiano José, concluiu que a ilegalidade do DUAT da RBLL não se cinge apenas aos aspectos da legislação sobre terras, acima indicados, como também, do ponto de vista do Código Comercial. Outro aspecto que justifica a ilegalidade daquele DUAT

prende-se pelo facto de o objecto da RBLL referir, ainda, que a sociedade pode celebrar contratos de exploração do DUAT, facto que é manifestamente ilegal, por violar a Cons-tituição da República e a Lei de Terras. Perante estas irregularidades, as Organizações da Socieda-

de Civil, membros da Plataforma da Sociedade Civil sobre Recursos Naturais e Indústria Extractiva, solicitaram ao Go-verno a revogação do DUAT do projecto e aguardam, até ao momento, que o executivo tome esta medida para a estabi-lidade do empreendimento.

Exploração do gás natural na bacia do Rovuma e seus impactos

Governo aprova Regulamento da Lei de Direito à Informação

O governo moçambicano aprovou, através de um de-creto, o Regulamento da Lei do Direito à Informação, um instrumento que estabelece as regras de aplicação da re-ferida lei.O documento foi aprovado durante a 36ª sessão do

Conselho de Ministros. Este dispositivo legal aplica-se aos órgãos e instituições

do Estado, da Administração directa e indirecta, repre-sentação no estrangeiro, autarquias locais e, ainda, às entidades privadas que, ao abrigo da lei ou contrato, re-alizam actividades de interesse público ou que, na sua actividade, beneficiem de recursos públicos de qualquer proveniência e tenham em seu poder informação de in-teresse público.A Lei de Direito à Informação, aprovada em Dezembro

de 2014, pela Assembleia da República e cuja aplicação plena estava refém da aprovação do regulamento, obriga os organismos públicos e entidades privadas, que desen-volvam actividades de interesse geral, a prestar informa-ções solicitadas pelos cidadãos.

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8 Plataforma - AGIR

Hoje [28 de Setembro] é um grande dia! Hoje comemora-mos um direito importante: o direito dos cidadãos de

saber. O direito de acesso à informação é um direito impor-tante para a concretização de outros direitos humanos, como também para que outros aspectos importantes para o de-senvolvimento aconteçam. Por exemplo, permite a redução da pobreza, a redução de conflitos, a melhoria da mídia, o fortalecimento do desenvolvimento económico e por último, mas não só, o fortalecimento da democrácia.

O direito à informação só pode ser efectivamente exercido e implementado com base em leis que irão regular esse direi-to de acordo com padrões internacionais. É, portanto muito positivo que Moçambique se tenha tornado no ano passado, o décimo quinto (15°) páis africano a ter uma lei de acesso à informação.

A Suécia e o Direito à Informação Falando sobre experiência sueca e sobre a importância que

a lei tem, poder-se-à afirmar que a Suécia talvez seja um caso extremo. A nossa lei sobre a transparência de documentos públicos é uma Lei de Imprensa (“tryckfrihetsförordningen”) que é uma das leis constitucionais. Foi com a aprovação da primeira Lei sobre a Liberdade de Imprensa em 1766 que a Suécia estabeleceu o princípio de que todos os cidadãos têm o direito de pedir e fazer parte de qualquer documen-to de qualquer autoridade governamental. Isso fez com que

a Suécia se tornasse no primeiro país do mundo a ter este tipo de legislação. Hoje, depois de 250 anos, a possibilidade e capacidade de pedir documentos públicos é um direito que todo mundo conhece. O público sueco está, portanto, bem informado sobre os seus direitos nesta área. Esta tradição ca-racteriza a sociedade sueca e constitui uma parte importante da vida de cada cidadão.

Não basta termos uma lei. É necessário que a mesma seja clara e que tenha o cidadão como ponto central. A nossa le-gislação estabelece que em princípio, todo e qualquer docu-mento pertencente a uma instituição pública deve ser entre-gue ao público, se pedido. A Lei também estabelece que uma autoridade só poderá decidir sobre a privacidade de um do-cumento com base numa disposição legal de privacidade. Os cidadãos ainda têm o direito de permanecer no anônimato ao pedirem um documento.

Outra razão pela qual o direito à informação funciona é que segundo a Lei de Procedimento Administrativo sueco todas as autoridades têm a obrigação de servir o público. Existe um sistema claro como um pedido deve ser tratado e caso não seja seguido, o cidadão pode recorrer da decisão junto do Tribunal Administrativo de Recurso ou ao Tribunal Cons-titucional.

Para a mídia Sueca e o público em geral, o acesso à infor-mação significa: a prestação de contas, a capacidade de fazer escolhas informadas, assim como, ter a função de vigia. A função de vigia por sua vez reduz o risco de abuso de poder

Moçambique tem muito a “beber” da Suécia em termos de Direito à Informação, por aquele país permitir acesso desde 1766. Na imagem a Embaixadora da Suécia em Moçambique, Irina Schoulgin-Nyoni, e a

Vice-Ministra dos Negócios Estrangeiros de Moçambique, Nyeleti Mondlane

Há que divulgar a Lei do Direito à InformaçãoPor: Irina Schoulgin-Nyoni*

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que garante a prestação de contas. Este direito à informação permite com que os meios de comunicação suecos tenham o dever moral de investigar, analisar e informar sobre questões de interesse público. Também transmite, a nós funcionários públicos - a ideia de que somos responsáveis pelas nossas ações e decisões.

Uma boa lei é um primeiro passo importante, contudo, a implementação da mesma precisa ser uma prioridade poli-tica. A Suécia conseguiu uma cultura política que hoje tira benefícios do acesso à informação de forma vantajosa para a democrácia. O acesso à informação desempenha um papel importante e determinante no fornecimento de informação aos cidadãos sobre as pessoas que elegem e sobre o que, uma vez eleitos, irão implementar. Os cidadãos baseam as suas decisões eleitorais em fatos e provas, em vez de slogans eleitorais e promessas. E os políticos têm interesse em mos-trar que o que foi prometido foi cumprido, como forma de garantir a reeleição.

O Papel da TIC no Acesso à Informação

A Suécia é, de muitas maneiras, uma importante nação de TIC - é um dos países mais conectados do mundo. Nós temos uma boa infraestrutura e serviços electrónicos avançados. Existem esforços constantes em curso para desenvolver e tornar a troca eletrônica de informações entre as autoridades e os cidadãos, bem como entre as autoridades, ainda maior e mais eficiente. Isto facilita a execução das leis e dos prin-cípios mencionados, mas a sua aplicação não é definitiva-mente dependente dele desde o princípio de abertura foi um princípio juridicamente vinculativo desde 1766. Tendo dito isso, as TIC dão a possibilidade de Moçambique “saltar” para um sistema eficiente (e não levar 250). O que é necessário, independentemente da informação tornar-se acessível via In-ternet ou manualmente pela autoridade, é que os documen-tos possam ser fácilmente procurados e encontrados. A le-gislação sueca estabelece requisitos exigentes sobre a criação de vários instrumentos de descrição e busca de documentos. Os requisitos, dizem respeito por exemplo, ao registo, a des-crição e a organização dos documentos.

Segundo a experiência sueca, o respeito pelos direitos hu-manos não se baseia somente na dignidade dos cidadãos, mas também na criação de uma sociedade activa e solidária onde exista maior desenvolvimento económico, social e po-litico. Portanto, o direito de expressão e de informação são direitos chaves nesse sentido, dai a participação activa da Su-écia nas Nações Unidas, na promoção desses direitos. Alguns anos atrás, a Suécia tomou a iniciativa de estabelecer com que todos os direitos humanos fossem respeitados “on-line” como “off-line”. Não há dúvida de que acesso livre as TIC po-dem facilitar o cumprimento parcial do direito à informação. Moçambique ainda enfrenta desafios em termos de acesso e utilização das TIC. Uma das prioridades da política externa da Suécia é manter a Internet aberta, disponível e controlada por uma variedade de fatores. Isso não é meramente para garantir o respeito pelo direito de saber, mas, tal como refe-rido inicialmente, para assegurar o desenvolvimento social e econômico. Por isso, desde 2012, a Suécia organiza a Internet Fórum Estocolmo (SIF), que reúne cerca de 450 participantes de 100 países, organizados pelo Ministério de Negócios Es-

trangeiros (MFA), Sida e a Fundação Internet. Este ano, como uma preparação para este evento em Estocolmo, a Embaixa-da da Suécia está organizando um Fórum Internet Maputo a fim de destacar estas questões importantes aqui em Moçam-bique. O evento terá lugar na próxima semana, no dia 8 de Outubro. Para obter mais informações sobre isso, é possível entrar em contato com a Embaixada.

Antes de terminar, gostaria de sublinhar que a Suécia tem muito orgulho em apoiar o sub-programa da IBIS sobre o acesso à informação (AICE: Access to Information and Citi-zens’ Engagement – Acesso à Informação e Engajamento dos Cidadãos). O sub-programa da IBIS está dentro do programa AGIR, que se encontra na sua segunda fase. O novo programa AGIR abrangerá mais seis anos. Esta é uma prova do nosso contínuo compromisso e reconhecimento da importância da liberdade de imprensa e acesso à informação com o objec-tivo de fortalecer a democrácia e desenvolvimento em Mo-çambique. A lei de acesso à informação precisa agora de ser divulgada para ser conhecida e implementada - dois desafios logísticos e financeiros onde esperamos que sub-programa da IBIS possa ser importante.

* Embaixadora da Suécia em Moçambique. Versão editada da comunicação apresentada na Conferência sobre Direito à Informação e Cidadania, realizada a 28 de Setembro último em Maputo, pelas seguintes organizações da sociedade civil moçambicana: ACDH, OAM, MISA-Moçambique, CIP e IESE.

Há que divulgar a Lei do Direito à Informação

Artigo 168

Aborto não punível

Não é punível o aborto efectuado por médico ou outro profis-sional de saúde habilitado para o efeito, ou sob a sua direcção, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhe-cido e com o consentimento da mulher grávida, quando, segun-do o estado dos conhecimentos e da experiência

da medicina:a ) constituir o único meio de remover o perigo de morteou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde

física, psíquica ou mental da mulher grávida;b ) se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de

grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física, psíquica ou mental da mulher grávida e for realizado nas pri-meiras doze semanas de gravidez;

ARTIGO 178(Castração e mutilação genital)

1. Se alguém cometer o crime de castração, amputando a ou-trem qualquer órgão necessário à procriação, será punido

com a pena de prisão de doze a dezasseis anos.2. Incorre na pena do número anterior, aquele que voluntaria-

mente mutilar os órgãos genitais.3. Se resultar a morte do ofendido dentro de quarenta dias

depois do crime, por efeito das lesões produzidas, a pena será a de prisão maior de dezasseis a vinte anos.

Código Penal, aprovado pela Lei número 35/2014 de 31 de Dezembro

Tome Nota

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Numa altura em que diferentes entidades nacionais e inter-nacionais estão engajadas na luta contra casamentos pre-

maturos, facto que muitas vezes hipoteca o futuro da rapariga, as práticas tradicionais altamente veneradas pela esmagadora maioria das comunidades rurais favorecem o crescimento deste mal.

Dados resumidos de um total de 80 estudos realizados em Mo-çambique sobre a violência contra crianças, sobretudo do sexo feminino, indicam que a luta contra casamentos prematuros está a encontrar várias barreiras devido a práticas tradicionais como lobolo, ritos de iniciação, incesto, poligamia entre outras.

Esta situação vem sendo agudizada pela falta de uma legisla-ção específica e que sanciona ilícitos relacionados com uniões forçadas bem como de violação dos direitos da criança con-sagradas na Convenção Internacional dos Direitos da Criança (CDC).

Uma análise estatística encomendada pela (CECAP) e realiza-da no início do presente ano, baseada num cruzamento de da-dos do Inquérito Demográfico e Saúde de 2011 relativos aos

O agronegócio é uma actividade realizada à volta de bens alimentares e de commodities à escala internacional e que

abrange cadeias produtivas desde a produção primária (agricul-tura, pecuária, florestas e pescas) até à distribuição através do comércio de pequena escala e grandes superfícies comerciais, passando pela industrialização, empacotamento, publicidade e marketing.

Em Moçambique existem vários investimentos que possuem características que se enquadram no que se designa por agrone-gócio. Estes concentram-se no Corredor de Nacala (ProSAVANA) e outros, sobretudo na Alta Zambézia e na província de Manica.

As formas de actuação do capital, dos governos e das suas relações com as comunidades e os sistemas de produção das economias locais podem tornar o agronegócio uma actividade abençoada ou maldiçoada.

Assim a boa gestão do agronegócio pode trazer grandes vanta-gens ao país e providenciar grandes ganhos aos seus principais intervenientes nomeadamente o governo, as multinacionais e as comunidades locais.

Bem gerido, o agronegócios trás muitas vantagens como o rá-pido aumento de produção e da competitividade da economia nos produtos abrangidos; permite a criação de emprego; trans-ferência tecnológica e a eventual transferência de conhecimen-to para os produtores locais.

Também pode dar um forte contributo para a balança de pa-gamentos bem como na colecta de receitas tributárias.

De outro lado, a má gestão do agronegócio pode criar efeitos maléficos sobretudo para as comunidades.

As falhas de gestão deste processo podem produzir efeitos nefastos como a conflitualidade social devido às novas ocupa-ções de grandes extensões de terra; reassentamentos e migra-ções forçadas com consequências sobre a segurança alimentar

casamentos prematuros, gravidezes precoces, saúde, educação, entre outros, mostra que os níveis mais altos de casamentos prematuros em Moçambique estão concentrados nas províncias do Norte do país, zonas do país com baixos índices de escolari-dades e que as práticas tradicionais são abundantes e sagradas.

Na província do Niassa, por exemplo, pelo menos uma em cada cinco raparigas casou-se antes dos 15 anos, num universo de 29.892 raparigas, sendo que 24,4% (cerca de 13.865 rapari-gas) com idade entre os 20-24 anos casaram-se antes dos 18 anos. Os distritos do Lago, Mavago e Madjune são apontados como sendo os que mais se destacam em termos de ocorrência de casos de casamentos prematuros ao nível daquela província.

A magnitude dos efeitos dos casamentos prematuros não é conhecida no país, porém, reconhece-se que o seu impacto está diretamente relacionado com aumento da incidência das gra-videzes precoces e consequente aumento das taxas de morte materna; dos índices de abandono escolar entre as raparigas; dos índices de pobreza entre a população feminina bem como de contaminação pelo HIV entre a população feminina na faixa etária 15-24 anos de idade para além dos danos físicos, mentais e emocionais graves para as raparigas.

e os níveis de rendimento das populações bem como efeitos ambientais negativos derivados dos sistemas intensivos em má-quinas, produtos químicos e intensificação do uso dos solos.

Podem ainda contribuir para a perda de soberania dos peque-nos produtores no que respeita ao domínio dos sistemas de produção, nos modos de vida e na reprodução das economias familiares enquanto unidades económicas e sociais assim como na criação de bolsas de pobreza e aumento das desigualdades sociais e territoriais.

Pelo que, para se evitar os cenários acima descritos é neces-sário que na implantação do agronegócio se analise profunda-mente a questão da reconfiguração das relações de poder e dos grupos de interesse a vários níveis e a distribuição dos benefí-cios do negócio ao longo das cadeias produtivas.

Isto é, onde se realiza e como se distribui a acumulação (entre os agentes económico, no sistema de poder e entre os benefí-cios nacionais e os exportados).

Se for admitida a hipótese que as multinacionais e os governos (nacionais e estrangeiros) possuem entre si alianças e relações de funcionalidade na implementação e na distribuição dos re-cursos, e, se necessário, contra os interesses dos pequenos pro-dutores e as comunidades, então pode admitir-se que a defesa dos direitos constitui um elemento essencial de actuação da sociedade civil organizada de diferentes formas.

Para tal é preciso que a sociedade civil bem como as comuni-dades estejam preparadas para uma negociação construtiva na procura de entendimentos entre as partes, mas também uma boa capacidade reivindicativa.

As organizações da sociedade civil de pesquisa, advocacia e de movimento sociais devem ser articuladas e que convergem a diferentes níveis territoriais e sectoriais. Tal como os gover-nos e o capital possuem alianças a diferentes níveis, incluindo internacional, também a sociedade civil deve estruturar-se para actuar de forma conjugada nacional e internacionalmente.

Elaborado por OMR

Elaborado por Associação Othoko

Agronegócios: desafios e riscos

Práticas tradicionais favorecem casamentos prematuros

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11Plataforma - AGIR

Agronegócios: desafios e riscos

Práticas tradicionais favorecem casamentos prematuros

OXFAMIBIS

WE EFFECTDIAKONIA

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Governos africanos continuam a ignorar os direitos da mulher

A esmagadora maioria dos governos africanos, incluindo Mo-çambique, continuam a ignorar os direitos da mulher na vertente sexual e reprodutiva.

Com excepção da África do Sul, a maioria dos países africanos recusa a apoiar ou integrar a palavra direitos sexuais, na Declara-ção Política sobre os mecanismos operacionais para eliminação de todas formas de descriminação contra mulheres, alegando que a mesma atenta contra a cultura africana.

Sublinhar que a Declaração Política foi adoptada por ocasião dos 20 anos da quarta Conferência sobre a mulher, realizada em Beijing, China em 1995.

O comportamento dos governos africanos resulta da visão úni-ca de que direitos sexuais dizem respeito só a orientação sexual, o que é totalmente errado.

O erro de marginalizar os diretos sexuais resulta do facto de certas pessoas não reconhecerem que todas pessoas são sujeitos de direitos.

Os argumentos resistentes à mudança cultural, estabelecidos na sociedade e formulados por diversos actores, constituem uma forte barreira para introduzir mudanças que melhorem a condi-ção e posição da mulher nessas sociedades.

É o caso dos argumentos que defendem a preservação da cultu-ra e as “tradições” e impedem mudanças culturais nas relações de género.

Estas desculpas legitimam a violência dos maridos contra as suas mulheres e não permitem às mulheres tomarem conta do seu corpo e a sua sexualidade, porque o sexo é coisa dos homens.

Muitas vezes as barreiras culturais são colocadas pelos homens; pais e maridos que não permitem as raparigas e mulheres o aces-so a certos espaços que geram independência.

Esta situação é agudizada pelo facto da pressão social sobre os homens de que não podem ser fracos em relação as mulheres assim como não podem permitir que as mulheres ocupem deter-minados espaços de poder porque isso condiciona directamente a sua masculinidade, a sua imagem social como homem, julgado em base aos parâmetros do que “deveria ser”.

Estas resistências verificam-se numa altura em que os direitos reprodutivos englobam alguns direitos humanos já reconhecidos em tratados e outros documentos internacionais, como se pode ver na definição constante no Programa de Acção da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, realizada no Cairo, Egipto, em 1994 que determina que todo o casal e indiví-duo têm o direito de decidir livre e responsavelmente sobre o nú-mero de filhos, o espaçamento entre eles e o momento de tê-los, assim como o direito à informação e aos meios para tal decisão e também o direito a alcançar o mais alto padrão de saúde sexual e reprodutiva.

Paralelamente, as pessoas têm direito a tomar decisões sobre a reprodução que estejam livres de discriminação, coerção e vio-lência. Este instrumento é fortificado pela Declaração da Plata-forma de Acção de Beijing de 1995, assinado por 180 países, que

defende a promoção a igualdade entre homens e mulheres. Desta declaração destaca-se o preceituado no artigo 96 que

refere que: “os direitos das mulheres incluem seu direito a ter controle sobre a sua sexualidade e a decidir livre e responsavel-mente sobre os assuntos relativos a ela, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, livre de coação, discriminação e violência.

Adianta que deve haver relacionamentos igualitários entre ho-mens e mulheres nas questões referentes às relações sexuais e à reprodução, inclusive o pleno respeito pela integridade da pes-soa, o respeito mútuo, o consentimento e a divisão de responsa-bilidade sobre o comportamento sexual e suas consequências”.

Estes instrumentos vem complementar várias doutrinas ela-boradas por diferentes autoras e que defendem que o direito à autonomia da pessoa implica o direito de todas(os) crianças, ra-parigas e jovens, além de adultas(os) tomarem as suas próprias decisões em assuntos que afectam seus corpos e sua saúde; o direito de participação das pessoas na criação de estruturas, das leis e das normas que as afectam bem como o direito à integrida-de corporal e direito à saúde, englobando todos os seus aspectos (mental, física, reprodutiva e sexual).

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Maputo - Moçambique

Elaborado por Fórum Mulher