chorinho mauro rico

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Araçatuba Barbara Nascimento [email protected] A flauta e o bandolim con- duzem a melodia. O ca- vaquinho centraliza o rit- mo. E para harmonizar toda a composição é só somar o violão. O resultado dessa junção é o gê- nero musical mais resistente da MPB (Música Popular Brasilei- ra): o Choro, que tem hoje, 23 de abril, um dia especial dedica- do à sua celebração. O Dia Nacional do Choro foi criado em homenagem à da- ta de nascimento de Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana Filho), compositor e instrumentista, em especial do chorinho. Ao lado do compositor pos- suem destaque também dentro do gênero os músicos Joaquim Antônio da Silva Callado, consi- derado o autor do primeiro cho- ro (Flor Amorosa), Ernesto Naza- reth, Chiquinha Gonzaga, Jacob do Bandolim e Waldyr Azevedo. Há também Dilermando Reis, Garoto, João Pernambuco... A arte de compor chori- nhos, porém, não é só um privi- légio de músicos do passado ou dos estudiosos dos conservató- rios de música dos grandes cen- tros. O araçatubense Mauro Ri- co escreveu em junho de 1980 letra e melodia de seu primeiro e único chorinho, "Choro de Araçatuba". A música foi composta em um sítio em Guararema, a 24 quilômetros de Mogi das Cru- zes, onde Rico graduou-se em Arquitetura e Urbanismo. A sau- dade de sua cidade natal, em es- pecial dos momentos vividos no bairro Vila Mendonça, onde cres- ceu, inspirou o arquiteto a pegar o violão e compor durante uma tarde letra e partitura da canção. "Foi algo espontâneo que não consigo explicar. O curioso é que já estava com a data do meu retorno prevista. Porém, co- mecei a me lembrar do passado e a música saiu", lembra. Na letra, Rico relembra com saudosismo os momentos e situações das quais ele sentia falta, como assistir às interpreta- ções das bandas araçatubenses na Praça Rui Barbosa; nadar na prainha localizada, na época, en- tre os bairro Alvorada e Nova Iorque, e hoje extinta; e de co- lher as frutas das árvores exis- tentes por toda a cidade. "A geração de hoje não po- de viver nenhuma dessas expe- riências. Então quis eternizar nesse chorinho esses momentos marcantes para mim". ROCK Rico explica que a música sempre esteve presente em sua formação, entretanto, o rock era o estilo musical predominante em sua preferência. Já o chori- nho era ouvido somente quando estava em reuniões familiares com os pais e avós. "Acho que o choro é algo bem melancólico. Embora pulse em alguns momentos durante o uso de específicos instrumentos como o bando- lim, ele sempre nos remete a ou- tros tempos. Tal- vez por isso o te- nha utilizado na composição dessa música". Para ele, a difi- culdade não está em compor o chorinho, e sim em executá-lo, já que é um gênero instrumental que exige técnica. "Por isso, acredito que tive sorte porque saiu tudo junto: letra e partitura". Aos cinco anos de idade, o arquiteto começou a tocar de forma autodidata piano, passan- do pelo violão aos 14, até che- gar aos 17, quando começou a compor e tocar contrabaixo, considerada sua especialidade atualmente. Com as atividades profissio- nais como arquiteto, ele mescla há mais de 25 anos as apresen- tações junto ao grupo "Cia. & Música", formado ainda pelos músicos César Meneses, no vio- lão e vocal; Pepa, na bateria; e Makô e Querô na guitarra. ORIGEM O surgimento do choro é datado a partir da segunda meta- de do século 19, quando um cal- do cultural formado pela mistura dos ritmos polca, xote, maxixe, tango, samba e lundu entraram em ebulição, expulsando dos sa- lões da sociedade o público adep- to dos saraus e concertos. Cientes da necessidade de continuidade das reuniões musi- cais, os grupos se adequaram à situação adotando instrumentos de fácil manuseio como os de corda (violão, cavaquinho, ban- dolim), sopro (flauta, clarinete) e percussão (pandeiro, ganzá). O resultado foi a construção meló- dica do choro. Os primeiros conjuntos do gênero surgiram por volta de 1880, no Rio de Janeiro, antiga capital do Brasil. Entre os "cho- rões" da atualidade que ajudam a manter em atividade essa ma- nifestação instrumental popular destacam-se os músicos Pauli- nho da Viola, Isaías, Hamilton de Holanda, Hélio Delmiro, Turí- bio Santos, Altamiro Carrilho e Paulo Moura, falecido recente- mente.Barbara Nascimento MÚSICA O arquiteto e compositor Mauro Rico afirma que o cenário para a divulgação do chorinho em espaços públicos de Araçatu- ba é positivo. Segundo ele, exis- te um número satisfatório de pes- soas que apreciam o gênero mu- sical e sempre estão na expectati- va por apresentações. "Espaço tem. Basta os gru- pos ou músicos se apresentarem na Praça João Pessoa, por exem- plo. Lá já existe um público pron- to e que gosta do chorinho". Quanto à conquista dos jo- vens para o estilo, Rico é enfáti- co em dizer que tudo depende do acesso às composições. "Mui- tas vezes o jovem não gosta por- que não ouve. Duvido que exis- ta um jovem que ao ouvir chori- nho não gostará, é bem o estilo deles", diz. Para Rico, é essencial que o rádio e os programas de televisão voltem a tocar e apresentar as composições de choro. "Durante as décadas de 50 a 70, o chorinho e todas as músicas nacionais eram muito divulgadas por essas mídias. É preciso que elas retomem este trabalho para que o público se ha- bitue ao estilo", conclui. ENSINO O violonista erudito e profes- sor do instrumento no Projeto Gu- ri em Araçatuba, Paulo Renato Lourenço, explica que seus alunos se identificam com o gênero musi- cal a partir do momento que o co- nhece. Entretanto, ele explica que é preciso encontrar o momento certo para que o jovem comece a interpretar as composições. "A maioria gosta, só que eu os ensino na hora certa, quando o aluno tem técnica para tocar. Porque para interpretar o chori- nho somente no violão é preciso que o aluno consiga acompanhar com melodia e harmonia cada nota musical da composição", completa.BN Alexandre Souza/Folha da Região - 15/04/2011 Surgimento do gênero é datado a partir da segunda metade do século 19 Cinema Gosto pela música depende de divulgação SENSIBILIDADE Músico Mauro Rico compôs o “Choro de Araçatuba” em 1980: canção retrata a infância e adoles- cência vividas na Vila Mendonça O Sesc exibe na próxima terça- feira o filme “A Morte de um Bookmaker Chinês”, no Polo Avançado de Araçatuba. O lon- ga encerra a Mostra John Cassa- vetes, que exibiu parte da filmo- grafia de um dos reformadores do cinema. C3 C1 Araçatuba, sábado, 23 de abril de 2011

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Page 1: Chorinho   mauro rico

Araçatuba

Barbara Nascimento

[email protected]

Aflauta e o bandolim con-duzem a melodia. O ca-vaquinho centraliza o rit-

mo. E para harmonizar toda acomposição é só somar o violão.O resultado dessa junção é o gê-nero musical mais resistente daMPB (Música Popular Brasilei-ra): o Choro, que tem hoje, 23de abril, um dia especial dedica-do à sua celebração.

O Dia Nacional do Chorofoi criado em homenagem à da-ta de nascimento de Pixinguinha(Alfredo da Rocha Viana Filho),compositor e instrumentista, emespecial do chorinho.

Ao lado do compositor pos-suem destaque também dentrodo gênero os músicos JoaquimAntônio da Silva Callado, consi-derado o autor do primeiro cho-ro (Flor Amorosa), Ernesto Naza-reth, Chiquinha Gonzaga, Jacobdo Bandolim e Waldyr Azevedo.Há também Dilermando Reis,Garoto, João Pernambuco...

A arte de compor chori-nhos, porém, não é só um privi-légio de músicos do passado oudos estudiosos dos conservató-rios de música dos grandes cen-

tros. O araçatubense Mauro Ri-co escreveu em junho de 1980letra e melodia de seu primeiroe único chorinho, "Choro deAraçatuba".

A música foi composta emum sítio em Guararema, a 24quilômetros de Mogi das Cru-zes, onde Rico graduou-se emArquitetura e Urbanismo. A sau-dade de sua cidade natal, em es-pecial dos momentos vividos nobairro Vila Mendonça, onde cres-ceu, inspirou o arquiteto a pegaro violão e compor durante umatarde letra e partitura da canção.

"Foi algo espontâneo quenão consigo explicar. O curiosoé que já estava com a data domeu retorno prevista. Porém, co-mecei a me lembrar do passadoe a música saiu", lembra.

Na letra, Rico relembracom saudosismo os momentose situações das quais ele sentiafalta, como assistir às interpreta-ções das bandas araçatubensesna Praça Rui Barbosa; nadar naprainha localizada, na época, en-tre os bairro Alvorada e NovaIorque, e hoje extinta; e de co-lher as frutas das árvores exis-tentes por toda a cidade.

"A geração de hoje não po-de viver nenhuma dessas expe-riências. Então quis eternizarnesse chorinho esses momentosmarcantes para mim".

ROCKRico explica que a música

sempre esteve presente em suaformação, entretanto, o rock erao estilo musical predominanteem sua preferência. Já o chori-nho era ouvido somente quandoestava em reuniões familiarescom os pais e avós.

"Acho que o choro é algobem melancólico. Embora pulseem alguns momentos durante ouso de específicos instrumentos

como o bando-lim, ele semprenos remete a ou-tros tempos. Tal-vez por isso o te-nha utilizado nacomposição dessamúsica".

Para ele, a difi-culdade não está emcompor o chorinho, esim em executá-lo, já queé um gênero instrumental queexige técnica. "Por isso, acreditoque tive sorte porque saiu tudojunto: letra e partitura".

Aos cinco anos de idade, oarquiteto começou a tocar deforma autodidata piano, passan-do pelo violão aos 14, até che-gar aos 17, quando começou acompor e tocar contrabaixo,considerada sua especialidadeatualmente.

Com as atividades profissio-nais como arquiteto, ele mesclahá mais de 25 anos as apresen-tações junto ao grupo "Cia. &Música", formado ainda pelos

m ú s i c o sCésar Meneses, no vio-

lão e vocal; Pepa, na bateria; eMakô e Querô na guitarra.

ORIGEMO surgimento do choro é

datado a partir da segunda meta-de do século 19, quando um cal-do cultural formado pela misturados ritmos polca, xote, maxixe,tango, samba e lundu entraramem ebulição, expulsando dos sa-lões da sociedade o público adep-to dos saraus e concertos.

Cientes da necessidade decontinuidade das reuniões musi-cais, os grupos se adequaram àsituação adotando instrumentos

de fácil manuseio como os decorda (violão, cavaquinho, ban-dolim), sopro (flauta, clarinete) epercussão (pandeiro, ganzá). Oresultado foi a construção meló-dica do choro.

Os primeiros conjuntos dogênero surgiram por volta de1880, no Rio de Janeiro, antigacapital do Brasil. Entre os "cho-rões" da atualidade que ajudama manter em atividade essa ma-nifestação instrumental populardestacam-se os músicos Pauli-nho da Viola, Isaías, Hamiltonde Holanda, Hélio Delmiro, Turí-bio Santos, Altamiro Carrilho ePaulo Moura, falecido recente-mente.Barbara Nascimento

MÚSICA

O arquiteto e compositorMauro Rico afirma que o cenáriopara a divulgação do chorinhoem espaços públicos de Araçatu-ba é positivo. Segundo ele, exis-te um número satisfatório de pes-soas que apreciam o gênero mu-sical e sempre estão na expectati-va por apresentações.

"Espaço tem. Basta os gru-pos ou músicos se apresentaremna Praça João Pessoa, por exem-plo. Lá já existe um público pron-to e que gosta do chorinho".

Quanto à conquista dos jo-vens para o estilo, Rico é enfáti-co em dizer que tudo dependedo acesso às composições. "Mui-

tas vezes o jovem não gosta por-que não ouve. Duvido que exis-ta um jovem que ao ouvir chori-nho não gostará, é bem o estilodeles", diz.

Para Rico, é essencial que orádio e os programas de televisãovoltem a tocar e apresentar ascomposições de choro. "Durante

as décadas de 50 a 70, o chorinhoe todas as músicas nacionais erammuito divulgadas por essas mídias.É preciso que elas retomem estetrabalho para que o público se ha-bitue ao estilo", conclui.

ENSINOO violonista erudito e profes-

sor do instrumento no Projeto Gu-ri em Araçatuba, Paulo RenatoLourenço, explica que seus alunosse identificam com o gênero musi-cal a partir do momento que o co-nhece. Entretanto, ele explica queé preciso encontrar o momentocerto para que o jovem comece ainterpretar as composições.

"A maioria gosta, só que euos ensino na hora certa, quandoo aluno tem técnica para tocar.Porque para interpretar o chori-nho somente no violão é precisoque o aluno consiga acompanharcom melodia e harmonia cadanota musical da composição",completa.BN

Alexandre Souza/Folha da Região - 15/04/2011

Surgimentodo gênero é

datado a partir da

segunda metade do

século 19

Cinema

Gosto pela música depende de divulgação

SENSIBILIDADE

Músico Mauro Rico compôs o

“Choro de Araçatuba” em 1980:

canção retrata a infância e adoles-

cência vividas na Vila Mendonça

O Sesc exibe na próxima terça-feira o filme “A Morte de umBookmaker Chinês”, no PoloAvançado de Araçatuba. O lon-ga encerra a Mostra John Cassa-vetes, que exibiu parte da filmo-grafia de um dos reformadoresdo cinema. C3

C1 Araçatuba, sábado, 23 de abril de 2011