cfess manifesta · 2017. 5. 22. · cfess manifesta dia nacional da consciência negra históricas,...

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CFESS Manifesta Dia Nacional da Consciência Negra O lançamento oficial do Ano Internacional dos Afrodes- cendentes na ONU, em 2010, foi marcado pela denún- cia da desigualdade racial no mundo e pela reivindi- cação de que os países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) promovam ações que assegurem à população afrodescendente o gozo de seus direitos e que suas culturas sejam valorizadas. A Conferência de Durban contra o racismo, xenofobia e discriminações correlatas, realizada em 2001 e conduzida po- liticamente pela maioria das mulheres presentes no evento, particularmente pelas mulheres negras brasileiras, estabeleceu metas importantes de combate à desigualdade racial. Essas me- tas foram reafirmadas em 2009, na Conferência de revisão de Durban, e dizem respeito à promoção da equidade racial esta- belecida pelos países membros da ONU. No Brasil, ações governamentais foram implementadas, mas não têm sido suficientes para enfrentar, de um lado, a his- tórica e estrutural desigualdade econômica, e de outro, a cul- tura patrimonialista, racista, patriarcal, sexista e homofóbica, enraizada na sociedade brasileira. Legado da escravidão, mas também de uma república capitalista e seletiva na garantia da cidadania, homens e mulheres negros/as têm experimentado um viver totalmente desassistido, longe de um sistema de se- guridade social e demais políticas públicas que contemplem suas necessidades como seres humanos. Em síntese, negros/ as vivenciam uma permanente violação de direitos, marcada- mente orientada pelo preconceito racial, de gênero, orienta- ção sexual e identidade de gênero, que os/as têm impedido, secularmente, do acesso aos direitos, devido às desvantagens www.cfess.org.br Ilustração: Rafael Werkema Brasília, 20 de novembro de 2011 Gestão Tempo de Luta e Resistência ZUMBIS E DANDARAS CONTRA A DESIGUALDADE RACIAL

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  • CFESS ManifestaDia Nacional da Consciência Negra

    O lançamento oficial do Ano Internacional dos Afrodes-cendentes na ONU, em 2010, foi marcado pela denún-cia da desigualdade racial no mundo e pela reivindi-

    cação de que os países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) promovam ações que assegurem à população afrodescendente o gozo de seus direitos e que suas culturas sejam valorizadas. A Conferência de Durban contra o racismo, xenofobia e discriminações correlatas, realizada em 2001 e conduzida po-liticamente pela maioria das mulheres presentes no evento, particularmente pelas mulheres negras brasileiras, estabeleceu metas importantes de combate à desigualdade racial. Essas me-tas foram reafirmadas em 2009, na Conferência de revisão de Durban, e dizem respeito à promoção da equidade racial esta-belecida pelos países membros da ONU. No Brasil, ações governamentais foram implementadas, mas não têm sido suficientes para enfrentar, de um lado, a his-tórica e estrutural desigualdade econômica, e de outro, a cul-tura patrimonialista, racista, patriarcal, sexista e homofóbica, enraizada na sociedade brasileira. Legado da escravidão, mas também de uma república capitalista e seletiva na garantia da cidadania, homens e mulheres negros/as têm experimentado um viver totalmente desassistido, longe de um sistema de se-guridade social e demais políticas públicas que contemplem suas necessidades como seres humanos. Em síntese, negros/as vivenciam uma permanente violação de direitos, marcada-mente orientada pelo preconceito racial, de gênero, orienta-ção sexual e identidade de gênero, que os/as têm impedido, secularmente, do acesso aos direitos, devido às desvantagens

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  • CFESS Manifesta Dia Nacional da Consciência Negrahistóricas, fruto do racismo e da discriminação racial em escala planetária. Basta conferirmos a situação do Haiti hoje; as consequências nefas-tas do furacão Katrina que abateu os/as negros/as moradores/as da cidade de Nova Orleans nos EUA; os contemporâneos conflitos na Europa, motivados pelo racismo e pela xenofobia e ali-mentados pelas ideologias segregacionistas de cunho racista que assistimos através dos meios de comunicação e redes sociais. No Brasil, o desgastado “paraíso racial”, os indicadores so-ciais e econômicos apresentados pelos órgãos estatísticos oficiais do governo conferem à po-pulação negra de nosso país o pior “lugar so-cial”. Tudo isso expressa a incapacidade do ca-pitalismo em atender aos segmentos oprimidos da sociedade, levando negros/as, cada vez mais, para a pobreza e a miséria.

    A cor da violência racial e de gênero O Brasil apresenta a maior população ne-gra depois da Nigéria. O resultado do censo do IBGE, de 2010, informa que a população negra (somatório de pretos e pardos) é maioria no Brasil, o que revela o avanço da consciência racial e do orgulho de parcelas da população brasileira em assumir uma identidade cultural e política marcada pelas africanidades. No en-tanto, por força do racismo, negros/as experi-mentam as piores condições de vida ou mor-rem precocemente. Vejamos: no mercado de trabalho urbano, a população negra se insere claramente em situação desvantajosa em rela-ção à população branca. As taxas de desem-prego são maiores entre os/as negros/as que recebem salários baixos e passam mais tempo à procura de emprego. Estudo realizado pelo Ministério da Justiça sobre a população carcerária brasileira consta-tou que esta é constituída por 95% de pessoas pobres. Destas, 65% são negras. Destarte, 27% dos brancos respondem em processo de liber-dade, enquanto apenas 15% dos/as negros/as têm esse direito. Em relação ao índice de con-denados que são absolvidos, os/as negros/as detêm uma porcentagem de 27% e os brancos chegam a 60% de absolvidos. A taxa de mortalidade materna é três vezes maior entre as mulheres negras em relação às mulheres brancas. Assim, 43,2% das mulheres

    negras morrem de eclampsia, enquanto entre as mulheres brancas o percentual é de 13,14%. Em relação ao abortamento inseguro, 25,23% de mulheres negras morrem em decorrência deste, contra 7,62% das mulheres brancas. E as desigualdades permanecem em relação à he-morragia pós-parto, infecção puerperal, deslo-camento prematuro de placenta e aborto. Mor-tes perfeitamente evitáveis. Outro dado alarmante é o número de mor-tes decorrentes de homicídios, que afetam drasticamente o jovem negro. O Índice de Vi-timização Negra apresentado no Mapa da Vio-lência de 2011 calcula que cada morte de um jovem branco equivale à morte de mais de 100 jovens negros/as. A realidade experimentada pela popula-ção negra informa que as políticas públicas no Brasil ainda estão muito longe de garantir a equidade entre os diferentes grupos raciais e de gênero. Este quadro se apresenta como desafio para o CFESS e demais entidades da categoria, reforçando a importância de ações de combate ao racismo, sexismo e homofobia nessas arenas de luta, fundamentadas pelos princípios do Código de Ética do/a Assisten-

    te Social. E nessa perspectiva ressaltamos a relevância do Conselho Federal em ter repre-sentação na Comissão Intersetorial de Saúde da População Negra (CISPN) do Ministério da Saúde, defendendo um SUS sem racismo, universal, público e de qualidade, ampliando e lutando pela consolidação, em todo territó-rio nacional, da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Por isso, o Dia Nacional da Consciência Negra é um momento especial para que os/as negros/as, assim como a sociedade brasileira em seu conjunto, reflitam sobre as formas de in-serção da população negra nessa realidade, tão desigual racial e economicamente. É igualmen-te um momento da resistência histórica e coti-diana da população negra, ao afirmar a luta por atendimento digno na rede pública de saúde e educação; pelo reconhecimento imediato das terras quilombolas; de acesso ao trabalho e do combate ao racismo institucional em todos os níveis; pela valorização e expressão da cultura e religiosidade de matriz africana no Brasil nos currículos escolares. Esta agenda é um processo de luta histó-rica e longínqua, dentre muitas. E também contempla a comemoração de nossas conquis-tas radicalizadas pelos sujeitos sociais com-prometidos com a liberdade, ainda que num horizonte restrito. Lembremos de Aqualtune, avó de Zumbi, Dandara e Zumbi, líderes da maior república multirracial e pluricultural que a história brasileira teve notícia; Palmares, que sobreviveu e resistiu ao governo colonial português, por mais de 100 anos, em Alagoas. Lembremos da importância de Nanny para a luta política na Jamaica e Toussaint L’Ouverture para a revolução no Haiti. Lembramos também de mulheres que romperam o instituído como Bell Hooks, Alice Walker, Chimamanda Adichi e Audre Lorde, que desafiaram o colonialismo, o sexismo e o heterossexismo. Dentre muitos antepassados, lembramos Lélia Gonzalez, Be-atriz Nascimento, Milton Santos e de todos os Zumbis e Dandaras contemporâneos que têm buscado, para a construção de suas lutas, as referências nesses sujeitos políticos que a história oficial insiste em manter no ostracis-mo e na invisibilidade social e institucional. Valeu, Zumbi! Valeu, Dandara!

    Brasília, 20 de novembro de 2011

    PrESiDENtE Sâmya Rodrigues Ramos (RN)Vice-Presidente Marinete Cordeiro Moreira (RJ) 1ª SEC. Raimunda Nonata Carlos Ferreira (DF)2ª SECrEtáriA Esther Luíza de Souza Lemos (PR)1ª tESourEirA Maria Lucia Lopes da Silva (DF) 2ª tESourEirA Juliana Iglesias Melim (ES) CoNSElho FiSCAl Kátia Regina Madeira (SC)Marylucia Mesquita (CE)Rosa Lúcia Prédes Trindade (AL)

    SuPlENtESMaria Elisa Dos Santos Braga (SP)Heleni Duarte Dantas de Ávila (BA)Maurílio Castro de Matos (RJ)Marlene Merisse (SP)Alessandra Ribeiro de Souza (MG)Alcinélia Moreira De Sousa (AC)Erivã Garcia Velasco - Tuca (MT)Marcelo Sitcovsky Santos Pereira (PB)Janaine Voltolini de Oliveira (RR)

    Gestão Tempo de Luta e Resistência (2011-2014)CFESS MANiFEStA Dia Nacional da Consciência NegraConteúdo (aprovado pela diretoria): Magali da Silva Almeida - Representante do CFESS na Comissão Intersetorial de Saúde Integral da População NegraAssessoria de comunicação: Rafael Werkema - JP/MG 11732Diogo Adjuto - JP/DF [email protected]ão: Diogo AdjutoDesign e ilustrações: Rafael Werkema

    SCS Quadra 2, Bloco C,Edf. Serra Dourada, Salas 312-318 CEP: 70300-902 Brasília - DFFone: (61) 3223.1652 Fax: (61) 3223.2420 [email protected]

    A reAlidAde experimentAdA pelA populAção negrA informA que As políticAs públicAs no brAsil AindA estão muito longe de gArAntir A equidAde entre os diferentes grupos rAciAis e de gênero. este quAdro se ApresentA como desAfio pArA o cfess e demAis entidAdes dA cAtegoriA, reforçAndo A importânciA de Ações de combAte Ao rAcismo, sexismo e homofobiA nessAs ArenAs de lutA, fundAmentAdAs pelos princípios do código de ÉticA do/A Assistente sociAl