ceu aricanduva: urbanidade do espaço ciclope

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Trabalho Final de Graduação_Orientador Prof. Dr Luiz Recamán_Faculdade de Arquitetura e Urbanismo_Universidade de São Paulo_junho de 2012

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CEU Aricanduva:urbanidade do espaço ciclope

Larissa Guelman

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CEU Aricanduva:urbanidade do espaço ciclope

Larissa Guelman

Trabalho Final de GraduaçãoOrientador Prof. Dr Luiz Recamán

Faculdade de Arquitetura e UrbanismoUniversidade de São Paulo

junho de 2012

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in memoriam Salvador Mitidiero e Eva Irner

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sumário

ponto de partida

histórico dos projetosas built

o lugar, do lado de dentroo lugar, do lado de forachagas urbanasestratégia de projeto

vídeo pesquisa, vídeo projeto

bibliografia

anexoslinha do tempotranscrição das falas

11

2327

28394042

51

55

5759

Ao lado, córrego Cercado Fundo, em maio de 2011 e em abril de 2012.

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“The right to the city is far more than the individual liberty to access urban resources: it is a right to change ourselves by changing the city.” 1

David Harvey

1 “O direito à cidade vai além da liberdade individual de acessar os recursos urbanos: é o direito de mudarmos a nós mesmos mudando a cidade.” (tradução livre) Harvey, David. “The right to the city”. New Left Review, 53, set-out, 2008, p 23.

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Ponto de partida/chegada “caminho das pedras”: Shopping Aricanduva - Bairro Jardim Sta Terezinha.

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ponto de partida

CEU Aricanduva: urbanidade do espaço ciclope nasceu da vontade de tentar enxergar, sob determinado foco, o espaço urbano como pro-duto de nossa sociedade, construído e desconstruído continuamente.

Ao cabo de sete anos e meio de curso, seis e meio nesta facul-dade e outro na faculdade do Porto em Portugal, fez-se necessário, neste trabalho final de graduação (tfg), revisar alguns valores que nos são transmitidos durante a formação e que foram colocados em cheque no período em intercâmbio.

A aproximação ao projeto dos CEUs (Centros Educacionais Unificados) se deu em 2010, durante uma disciplina optativa desta faculdade, 2 na qual nos foi proposto escolher um projeto recente que tivesse algum caráter social e que de preferência fosse situado na cidade de São Paulo.

Escolhemos na época estudar o conjunto dos CEUs. 3 Além de estudar os projetos, nos interessamos por visitá-los e entrevistar as diversas personagens envolvidas: estudantes, professores, funcio-nários, usuários, diretores, gestores e arquitetos; tanto para perce-ber a relação do equipamento público com seus usuários, como também expor os diversos discursos que rodeiam projeto, cons-trução e uso. Esse trabalho de tiro curto, que se formalizou em um pequeno vídeo apresentado em sala, serviu para levantar algumas contradições, sem a preocupação em seguir determinada linha de abordagem. Essa faísca ativou o presente trabalho.

Apesar da história dos CEUs remeter a praticamente toda a história da arquitetura moderna escolar do Brasil, nesse trabalho, muito mais do que sua história (que, diga-se de passagem, já foi desenvolvida em outros trabalhos), 4 interessa sua contribuição como construção ou desconstrução do espaço contemporâneo, já

2 disciplina ministrada pela professora Vera Pallamin, AUT 575 Representações do espaço arquitetônico: práticas e procedimentos contemporâneos.3 participaram desse trabalho Adriana Maiolini, Guido Otero, Guilherme Cassis, Larissa Guelman e Luisa Amoroso.4 Guerreiro, Isadora de Andrade. CEUs: potencialidades e contradições. Trabalho Final de Graduação, São Paulo: FAUUSP, 2006, capítulo 1.

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que foi o projeto de espaço e equipamento público de maior im-pacto na periferia pobre da cidade na última década.

É claro que essa história da arquitetura escolar não será des-considerada aqui, até porque ela é condição fundamental para a existência dos CEUs, mas será abordada de maneira breve, pontu-ada em formato de linha do tempo, em anexo.

Mais do que pensar o projeto dos CEUs em si, pretendeu-se fa-zer uma reflexão sobre a condição do espaço geral da cidade de São Paulo, ou, se quisermos, do Brasil, expressada em suas relações. E a partir daí, como nós arquitetos da produção formal (minoritá-ria da cidade) nos relacionamos através de nossos projetos com a produção majoritariamente informal da cidade nos dias de hoje. Ou seja, a relação entre arquitetura formal (produção socialmente reconhecida, legitimada por direito e precedida de projetos) 5 e a arquitetura informal (auto-construção).

Vale lembrar que “a sociedade contemporânea se sustenta espa-cialmente por uma produção arquitetônica [informal] que, segundo as convenções dominantes nessa mesma sociedade, não deveria existir.” 6

Essa contradição incontornável, bem elaborada por Silke Kapp, não está presente apenas espacialmente na sociedade brasileira, mas também em suas relações sociais, especialmente nas precárias relações de trabalho. Fruto de um país que conseguiu, paradoxal-mente, conciliar liberalismo econômico e sociedade escravocrata, na passagem do Brasil colonial para o Brasil moderno. “Como es-perar transformações profundas em um país onde eram mantidos os fundamentos tradicionais da situação que se pretendia ultrapassar?” 7

A opção pelo CEU Aricanduva dentro do conjunto de 45 centros construídos (21 durante gestão PT e 24 na gestão PSDB seguinte) 8 não se deu como eleição de parte exemplar do conjun-

5 Kapp, Silke. “Por que teoria crítica da arquitetura? uma explicação e uma apo-ria”. In: Malard, Maria Lúcia (org.). Cinco textos sobre arquitetura. Belo Horizonte: UFMG, 2005, p 122.6 idem.7 Holanda, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p 78.8 vale lembrar que todos os 45 CEUs foram projetados e licenciados na gestão PT

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to, nem como de “bode expiatório”; apenas propiciou o tipo de aproximação que se pretendeu com o trabalho. Um dos princi-pais fatores para a escolha desse recorte da cidade de São Paulo foi a complexidade da realidade ao redor do objeto selecionado, ou seja, a riqueza da diversidade dos objetos à sua volta, tanto em escala quanto em função. Do barraco da favela de um lado ao “maior Shopping da América Latina” de outro. Situação esta não comum aos demais CEUs que estão localizados em áreas mais isoladas da cidade.

Após a definição do objeto, contudo ainda sem o foco do tra-balho definido, deu-se início a uma rotina de visitas ao CEU Ari-canduva, um desejo de sensibilização para os fenômenos do lugar que não seria possível à distância.

Em princípio a vontade era “flanar” pelo interior do objeto, ten-tar perceber como se davam as dinâmicas locais, isto é, a relação do objeto arquitetônico com seus usuários. Nesse sentido, a acolhida de um professor 9 local foi de fundamental importância para viabi-lizar minha entrada no equipamento e permanência nas aulas do ensino fundamental, em um primeiro momento, e do ensino suple-tivo (EJA, ensino para jovens e adultos) num momento posterior.

Em paralelo, a pesquisa sobre esses conjuntos indicou que todos os projetos dos CEUs passaram por um estudo inicial de viabilidade, realizados por diversos escritórios de arquitetura con-vidados por Edif 10, muitos dos quais foram amplamente alterados na passagem para o projeto executivo.

Alguns desses projetos sofreram mudanças radicais, 11 como foi o caso do CEU Aricanduva que teve programa e área territorial extremamente reduzidos.

Na busca por mais informações sobre esse histórico de proje-tos elaborados para o CEU Aricanduva, tomei conhecimento, em

2001/4, porém os 24 construídos na gestão seguinte obedeceram outro projeto. O CEU Aricanduva foi construído em 2003, durante a gestão PT.9 professor Dalmo Rodrigues.10 Departamento de Edificações da Secretaria de Serviços e Obras da prefeitura de São Paulo, responsável pelo projeto dos CEUs.11 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 102-108.

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conversas na FAU com André Takiya e Alexandre Delijaicov 12 da existência de um outro projeto, também de Edif, ainda anterior à concepção dos CEUs, mas posterior às PES (Praças de Equipa-mentos Sociais) 13 - o Complexo Cultural Aricanduva. Esse dado foi importante para o processo do trabalho e será melhor abor-dado em histórico dos projetos do CEU Aricanduva mais adiante.

O registro fotográfico e um caderno de notas foram o principal suporte do trabalho nessas primeiras visitas que não se restringi-ram às salas de aula, obviamente, mas também aos espaços de uso mais coletivo, como o teatro, as quadras esportivas, a pista de skate (espaço bastante ativo pelo uso intenso), o refeitório e a bibliote-ca (que realiza atividades comunitárias como saraus, controle de saúde, leituras e etc.).

Ao final do tfg1 (primeiro semestre) o trabalho atravessou sua maior crise. Havia sido coletada uma quantidade enorme de ma-terial extremamente rico, mas o foco do trabalho, que era perceber contradições entre programa de necessidades estabelecido a priori em projeto, e uso do espaço a posteriori parecia não fazer sentido, resultara em uma perspectiva fraca de abordagem.

Entre os resultados da pesquisa do tfg1 e sua continuidade, houve um semestre de interrupção do trabalho formal, tempo im-portante para refletir sobre outra possibilidade de abordagem, que seguiu presente até o final. Procurar entender o espaço como um sistema de relações, no qual a arquitetura não aparece mais em uma perspectiva positiva 14 de causa e efeito, mas sim dentro de um sistema de interação, 15 na perspectiva fenomenológica.

Nesse segundo momento, o registro em vídeo surgiu como pos-sibilidade de apreensão espacial, que, de suporte da observação, assu-miu papel ativo de transformação de tal percepção do espaço, em con-junto com leituras propostas e conversas com o professor orientador.

12 Tanto André Takiya quanto Alexandre Delijaicov encabeçaram, ao lado de Wanderley Ariza, o time de arquitetos de Edif que projetou os CEUs.13 ver estratégia de projeto.14 Chauí, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2009, p 229.15 Santos, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Edusp, 2006.

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Ponto de chegada/partida “caminho das pedras”: Bairro Jardim Sta Terezinha - Shopping Aricanduva.

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Município de São Paulo e malha metro-ferroviária de 2010 com inserção dos 45 CEUs. Os 21 (pontos cheios) da primeira fase e os 24 (pontos vazados) da segunda fase. Com destaque para o recorte definido da área de estudo. Ao lado, imagem de satélite do respectivo recorte.

0 1 5 20 km

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Projeto Complexo Cultural Aricanduva 1999, estudo preliminar, Edif.

0 50 250 1000 m

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Projeto CEU Aricanduva abril 2002, estudo preliminar, UNA arquitetos.

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Projeto CEU Aricanduva agosto 2002, executivo, M&M arquitetas.

0 50 250 1000 m

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CEU Aricanduva 2003, as built.

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histórico dos projetos

Estudar a história dos projetos que resultou na configuração atual do CEU Aricanduva se apresentou como importante ferra-menta para perceber o projeto como processo e não como obra final completa e acabada.

Estas histórias normalmente não são contadas, provavelmente por expor limitações tanto da atuação dos arquitetos, quanto dos projetos em si. 16

Apesar do foco desse trabalho ser o espaço construído, parece importante verificar quais foram as potencialidades desejadas que culminaram na solução espacial atual.

Longe de uma perspectiva melancólica, ou aporética da atua-ção do arquiteto na cidade contemporânea, pretende-se levantar a hipótese de que a arquitetura não é antídoto da realidade social.

Em março de 1999 foi elaborado o anteprojeto do Comple-xo Cultural Aricanduva, a partir do termo de compromisso de 30 de abril de 1991 17 que previa uma contrapartida, por parte do Grupo Savoy (proprietário do Shopping Aricanduva), em função da execução, em terreno da prefeitura, de alça de acesso a esse Shopping.

O anteprojeto do Complexo Cultural Aricanduva previa a construção de um conjunto de edificações que compreendia uma Biblioteca Pública, uma Biblioteca Infanto-Juvenil, auditório, ar-quibancadas externas, cafeteria, praça, boulevar de leitura, parque, bosque e uma Casa de Cultura, além de uma passarela de pedes-tres que conectaria as duas margens do rio Aricanduva.

A discussão sobre o valor a ser restituído à prefeitura levou em consideração a área de terreno público desapropriado para cons-

16 faz-se necessário destacar aqui o empenho dos arquitetos André Takiya e Ale-xandre Delijaicov em disponibilizar o material que tinham em seus arquivos pes-soais, dado que após terem sido forçados deixar Edif com a mudança de gestão, muito material acerca desses projetos se perdeu.17 material coletado e disponibilizado pelo engenheiro Odilon Navarro Neto, jun-to à Secretaria Municipal de Cultura – Departamento de Bibliotecas Públicas em novembro de 2011.

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trução da alça de acesso, o desmembramento do terreno público e também avaliações de custos de construção.

Após divergências, chegou-se a um acordo em junho de 1999, 18 no qual o Shopping Aricanduva (representado pelo Grupo Savoy) deveria construir 1947,52m2 em equipamento público, o que abrangeria apenas a Biblioteca Pública e a Biblioteca Infanto-Juve-nil, perfazendo 1830m2, mais 330m2 de mezanino; ultrapassando em 212,48m² a área construída acordada, mas prontamente justi-ficada “em função do baixo custo por metro quadrado do conjunto, onde a estrutura pré-fabricada estaria tornando o projeto viável.” 19

Do conjunto, apenas a Biblioteca Pública, nomeada Milton San-tos, foi construída e inaugurada em novembro de 2001, com área útil aproximada de 800m2. Vale ressaltar que o projeto executivo dessa biblioteca ficou a cargo do Grupo Savoy, que deveria se responsabili-zar não só pela execução da obra como também pelo detalhamento do projeto, além de prestar contas sobre o andamento da obra ao Ministério Público. Os relatos são de que a obra foi mal executada, com problemas de infiltração de água da chuva na cobertura, o que gerou altos custos de manutenção à Secretaria de Cultura. 20 Pude ob-servar que o mezanino construído para abrigar estantes de livros não é utilizado, provavelmente por insuficiência da estrutura física.

Segundo o engenheiro Odilon Navarro, 21 a Biblioteca Infanto-Juvenil, inicialmente prevista, não foi executada pelo fato do CEU Aricanduva, construído ao lado em 2003, já conter uma Bibliote-ca. Segundo o engenheiro, a contrapartida restante está sendo uti-lizada para a construção da Biblioteca Sérgio Buarque de Holanda no centro de Itaquera. 22

Em abril de 2002, o estudo preliminar do CEU Aricanduva, realizado pelo escritório UNA, englobou por completo a parte

18 Ofício n. 202/99 – BP.G, de 14 de junho de 1999.19 idem.20 Relatos tanto do engenheiro Odilon Navarro quanto do arquiteto Alexandre Delijaicov.21 engenheiro da prefeitura que acompanhou todo o processo.22 conversa realizada em novembro de 2011 no Departamento de Bibliotecas Pú-blicas da Secretaria Municipal de Cultura.

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não construída do projeto do Complexo Cultural Aricanduva e incrementou o programa do CEU com novos usos. Um edifício para realojar os moradores da favela ao lado e a Unidade de Básica de Saúde na esquina (que também deveria ser removida) e um Telecentro para “reanimar” a outra extremidade da passarela, fo-ram incluídos nesse estudo preliminar. A escola já existente EMEI Dom José Gaspar deveria ser transformada em Centro de Capaci-tação para o Trabalho.

Ainda nesse estudo, a av. Gualtar permaneceria articulada à av. Aricanduva e o bloco cultural [paralelepípedo] associado ao bloco didático [linear] formariam juntos um único volume, paralelo à av. Olga Fadel Abarca, que, perpendicular à av. Gualtar, se sobre-poria a ela, formando uma espécie de edifício ponte. Conectando, por sua vez, todo o conjunto banhado por grandes espelhos d’água e alargamento do córrego Cercado Fundo, dentro de uma pers-pectiva de reativar o sistema hidroviário da cidade.

Em agosto do mesmo ano, foi entregue o projeto executivo de autoria de M&M arquitetas, sendo a arquiteta e professora desta faculdade Maria Luiza Corrêa uma das responsáveis. Nesse mo-mento a configuração do lote real se apresentou muito reduzida em relação ao que se pretendia de desapropriações anteriormente. Churrascaria, Posto de gasolina, Unidade Básica de Saúde e Favela permaneceram. O projeto do Complexo Cultural Aricanduva foi deixado de lado.

Considerando as dimensões dos volumes já definidos em proje-to padrão, não havia muita alternativa em relação à implantação dos edifícios adotada nessa etapa, todos seguem o mesmo sentido da Bi-blioteca Milton Santos ao lado. O alinhamento, ou desalinhamento, projetado, oblíquo tanto à av. Aricanduva quanto à rua Olga Fadel Abarca, parece ter sido fruto do único encaixe possível do volume do bloco didático para o tamanho do lote dado. A agora chama-da rua Gualtar já aparece desarticulada do sistema viário, fechada tanto para a av. Aricanduva quanto para a rua Olga Fadel Abarca, e dividida ao meio por uma travessia de pedestres que deveria ligar-bloco didático e bloco cultural ao transpor o córrego Cercado Fun-do, que seria por sua vez retificado, porém mantido a céu aberto.

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as built

Durante a construção, no primeiro semestre de 2003, realizada pela construtora Grupo Construcap (que também se ocupou da construção do CEU Rosa da China) algumas alterações em rela-ção ao projeto executivo podem ser destacadas. A primeira e mais visível de todas foi a decisão por tamponar o córrego Cercado Fundo no trecho delimitado pelo CEU Aricanduva.

A segunda alteração, um acréscimo que pode passar quase despercebido em um olhar mais rápido, foi o aparecimento de um novo e pequeno volume – a guarita, ocupada de maneira sobre-posta pela Guarda Civil Metropolitana e pela equipe de segurança privada e terceirizada do CEU.

Segundo Isadora Guerreiro, “o espaço reservado à Secretaria da Saúde foi tomado pela Secretaria de Segurança Pública, na forma de um pequeno apartamento para seguranças, dada a não organização interna da secretaria para compor o projeto.” 23

Vale ressaltar que esse volume não aparece no projeto padrão, porém foi construído em todos os CEUs dessa primeira leva, entre 2001 e 2004.

Uma terceira alteração em relação ao projeto executivo foi o recuo do gradil de divisa em frente ao bloco cultural; alinhado inicialmente à calçada da av. Aricanduva, foi deslocado para dar lugar a um pequeno bolsão de estacionamento improvisado, desta vez externo, porém contíguo ao CEU.

23 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 99.

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o lugar, do lado de dentro

Durante as idas periódicas ao CEU Aricanduva (tfg1) no dia 25 de março de 2011, sexta-feira, deu lugar na biblioteca um evento chamado “sarauteca”, organizado pelos funcionários da bi-blioteca em conjunto com o grupo de professores do EJA (ensino para jovens e adultos) e ensino fundamental, os alunos do EJA, e com participação de pessoas da comunidade. Nesse evento, que acontece desde 2010 mensalmente, vários tipos de manifestações artísticas são bem-vindos. Nesta “sarauteca” em particular houve apresentações de dança de salão, capoeira, banda de reggae, leitura de poesias, crônicas, peças de teatro, música popular e erudita.

Nele, fez-se um teste com captação de imagem, no qual, além da oportunidade de apreender o espaço através da câmera pela primeira vez, procurou-se experimentar tipos de filmagem e foto-grafia. Pôde-se também sentir a reação da comunidade em relação a uma presença externa, estrangeira de certa forma.

Das imagens registradas algumas foram selecionadas e entre-gues ao coordenador, Ricardo, da biblioteca Mario Quintana, que, por sua vez, organiza junto com os demais funcionários um blog <http://sarauteca.blogspot.com/>, onde são postadas fotos do evento. Algumas das imagens foram, então, “devolvidas” à comu-nidade através do blog.

Esse espaço de exposição, compartilhamento e reunião, que agrupa pessoas de dentro do CEU, da comunidade e de fora dela, foi percebido como uma abertura, um desvio do padrão. Um es-paço em potencial para mudar o valor das coisas.

Segundo citação de Yoko Ono, presente no texto “Experimen-tar o Experimental” de Helio Oiticida de 1972:

“Quanto à minha arte tenho a dizer: artistas não são creativos. Que mais se desejaria criar? Tudo já está aqui. Detesto artistas que dizem que sua arte é creativa. Chamo este tipo de arte de ‘peido’. Esses artistas q constroem um pedaço de escultura e o chamam de arte não passam de narcisistas... Criar não é tarefa do artista. Sua tarefa é a de mudar o valor das coisas.”

Existiu, portanto, o desejo de explorar esse espaço em poten-

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cial, a biblioteca. Mais especificamente, as possibilidades de inter-venção propiciadas pelo uso não convencional.

Na “sarauteca” do dia 30 de junho de 2011, propus uma proje-ção do lado de fora da biblioteca, na circulação avarandada con-tígua à biblioteca. Selecionei trechos de quatro filmes (Tempos Modernos, Ilha das Flores, Koyaanisqatsi e Pro dia nascer feliz) e combinei com o coordenador do evento abrir a “sarauteca” com essa projeção de uma hora de duração aproximadamente.

Foi decido começar tal projeção um pouco antes do horário habitual para não avançar no tempo das apresentações já progra-madas. Com isso, não houve a usual “introdução” que o organi-zador do evento realiza antes de cada apresentação. Resultado: as crianças que estavam saindo da aula, na hora em que a projeção iniciou, se apropriaram desse espaço de transição (aberto e fecha-do ao mesmo tempo), e os adultos, que iam chegando ao mesmo tempo, não sentiram que tal projeção tivesse qualquer relação com a “sarauteca” e, com raras exceções, ignoraram tal intervenção.

Nesse mesmo mês de junho, poucas semanas antes da experi-ência acima citada, no dia 16 mais precisamente, acompanhei uma tarde de trabalho do carteiro Brito que entrega cartas no CEU e no bairro Jd Sta Terezinha, ao lado. Foi a primeira vez que entrei de fato bairro adentro, essa experiência de ter saído do equipamento (da zona de conforto) abriu novos horizontes para a pesquisa.

O desapontamento com a perspectiva do trabalho dentro do CEU em conjunto com a abertura de novas possibilidades de abordagem me fizeram repensar o foco do trabalho. O inicial inte-resse pelas possibilidades de apropriação do equipamento através do uso, deu lugar à aventura de explorar os espaços ao redor do CEU Aricanduva, o que veio a ocorrer depois, no tfg2. É interes-sante notar que apesar da mudança de foco, o interesse pelo objeto (CEU Aricanduva) permaneceu.

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CEU Aricanduva e adjacências.

Rua

Olg

a Fa

del A

barc

a

Avenida dos Latinos

Rua Gualtar

Córrego Cercado Fundo

“caminho das pedras”

Fave

la

Chur

rasc

aria

UBS

Post

o BR

Biblioteca M. Santos

Avenida Aricanduva

Avenida Aricanduva

Shopping Aricanduva

Telhanorte

Minha Casa,Minha Vida

0 10 50 200 m

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CEU Aricanduva e entorno: Piscinão (marrom), Shopping Aricanduva (amarelo), Loja Telhanorte (vermelho), Churrascaria Tendall Grill (vermelho escuro), Favela (lilás), Posto de gasolina BR (vinho), Minha Casa, Minha Vida (roxo); Biblioteca, CEU e Unidade Básica de Saúde (cinza escuro).

0 50 250 1000 m

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CEU Aricanduva e os novos conjuntos habitacionais financiados pelo Minha Casa, Minha Vida: os recém construídos condomínios fechados de 10 andares (roxo escuro), e o condomínio a ser construído de 20 andares (roxo claro).

0 50 250 1000 m

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Acima panorama feito a partir do rio Aricanduva e abaixo panorama transversal.

Abaixo, panorama feito a partir do “caminho das pedras” shopping-bairro.

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o lugar, do lado de fora

Talvez a maneira mais imediata de tentar compreender um lu-gar seja mapear o espaço através de seus marcos e conexões.

Os desenhos elaborados a partir de base cartográfica 24 de 2005/2006 em escala 1:1000, procuraram destacar o sistema vi-ário, hidrografia e os principais marcos da paisagem ao redor do CEU Aricanduva. A produção dessa representação espacial propi-ciou uma melhor visualização do tecido urbano em estudo.

Logo de imediato essa cartografia provoca um espanto - a desproporção entre o tamanho do Shopping Aricanduva, dito “o maior da América Latina”, e o entorno é gritante. Essa dimensão não aparece com tanta força quando se circula pela avenida Ari-canduva, provavelmente pelo fato das construções serem baixas e esparramadas pelo território.

Apesar da volumetria da arquitetura do shopping não chamar atenção, há forte presença de marcos verticais e pontuais, com destaque para a enorme caixa d’água com uma estrela na ponta que pode ser vista a quilômetros de distância, tanto à luz do dia quanto à noite graças uma iluminação colorida e randômica.

O vazio do Piscinão, também à margem do rio Aricanduva, pouco aparece na paisagem rarefeita; sua área, porém, muito pró-xima àquela ocupada pelo CEU Aricanduva, não é desprezível.

O recém construído conjunto de edifícios fomentado pelo programa do governo federal Minha Casa, Minha Vida (lançado em 2009), destaca-se de imediato pela verticalidade e densidade, diferente da paisagem horizontal e rarefeita acima mencionada.

Outras construções extremamente comunicativas através de seus letreiros também chamam a atenção nessa paisagem. Pode-mos destacar a churrascaria Tendall Grill, incrustada no lote do CEU, e a loja de construção Telhanorte na margem oposta.

Adentrando o bairro Jardim Santa Terezinha, ao caminhar pela rua Olga Fadel Abarca, é preciso um olhar mais atento para notar

24 base da prefeitura conseguida junto ao CESAD (Centro de Sistematização e Armazenamento de Dados) nesta Faculdade.

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a favela situada entre o CEU e a Unidade Básica de Saúde, imedia-tamente atrás da churrascaria acima mencionada. Isto porque os barracos situados de frente para a rua, em situação privilegiada, misturam-se às fachadas das pequenas casas em frente, também au-to-construídas do bairro (típico bairro da nossa periferia auto-cons-truída). Nesse caso, a foto aérea ajuda a melhor visualizar a favela.

A partir do reconhecimento dos objetos na paisagem, no espa-ço construído, começa a interessar as relações existentes entre os objetos, ou seja, os “sistemas de ação”. 25

Nesse momento comecei a identificar caminhos, como a pre-cária trilha que contorna o CEU, ou o "caminho das pedras" como nomeei no vídeo, feito pelo uso rotineiro dos moradores do bair-ro Jardim Santa Terezinha para acessar o supermercado Extra do Shopping Aricanduva de maneira mais direta, mais cômoda por-tanto. Espaço inusitado, mas talvez o mais verdadeiro dos espaços, no sentido de sua apropriação, não reconhecida oficialmente em projeto, ou no desenho do tecido urbano, surgiu como caminho após a construção do CEU, que ao tamponar o córrego Cercado Fundo acabou por viabilizar esse atalho.

Segundo o geógrafo Milton Santos, “o valor do espaço não é independente das ações que ele é susceptível de acolher.” 26 Nesse sentido, o espaço físico não pode ser separado do espaço social.

chagas urbana

Se admitirmos a existência de um tecido urbano, ainda que fragmentado, podemos identificar nesse recorte da paisagem for-tes irrupções do tecido, chagas urbanas ao longo da margem direi-ta do rio Aricanduva.

Piscinão, Shopping, CEU e Minha Casa, Minha Vida podem ser vistos como grandes feridas abertas do tecido, ou entraves para

25 Santos, Milton. Op. Cit, p 72.26 Santos, Milton. Op. Cit, p 86.

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o tecido se costurar. Vale ressaltar que todos eles são frutos da pro-dução formal da cidade, socialmente reconhecida, legitimada por direito e precedida de projetos.

A primeira ferida aberta, de iniciativa da prefeitura, disfarça resolver um problema por ela criado historicamente (laissez-fai-re urbano) da enchente, nesse caso do rio Aricanduva (o quarto maior rio da cidade). Da maneira mais rudimentar que se pode imaginar, cava um enorme buraco a céu aberto para receber a água que o rio não consegue absorver, devido a problemas sistê-micos que impedem uma boa circulação das águas na cidade, que por sua vez são tratadas como esgoto. A terra arrasada, a ferida aberta, dá o tom da nossa ocupação do território cada vez mais destituída de sentido urbano.

A segunda chaga urbana, a maior de todas - o Shopping Ari-canduva, da iniciativa privada (com consentimento da prefeitura que deveria regular o uso e a ocupação do solo) se apropria de uma gleba gigantesca da cidade e organiza o “feudo” da maneira que bem entende. A área de circulação, particular, diga-se de pas-sagem, confunde-se com enormes bolsões de estacionamento que ocupam os espaços residuais entre o construído e o vazio à espera de novas ampliações.

A terceira irrupção do tecido, o CEU Aricanduva, cujo proje-to será melhor abordado mais adiante, também pode ser enten-dido como uma ferida aberta no sentido que, além de não criar conexões com o tecido existente, opta no projeto executivo por fechar uma rua pré-existente. Essa medida de pretender reduzir os perigos em potencial da rua aberta, além de contraproducente por romper com a continuidade do tecido urbano 27, foi subvertida com a conversão da rua pedonal em bolsão de estacionamento. Pedestres e automóveis agora disputam o mesmo espaço, como nos bolsões de estacionamento do Shopping.

A quarta ferida que está sendo aberta, é a quadra com o re-cém construído conjunto habitacional, projetado, incorporado e construído pela iniciativa privada, mas financiado pela Caixa Eco-

27 Siza, Álvaro. Imaginar a evidência. Lisboa: Edições 70, 2009, p 101.

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nômica Federal, através do programa Minha Casa, Minha Vida. Trata-se de um conjunto de quatro condomínios fechados no qual o mercado transporta para as famílias de classe média-baixa (3 a 10 salários mínimos) 28 o mesmo padrão de consumo que está em voga nas áreas mais endinheiradas da cidade: terraço gour-met, espaço zen, estação de ginástica, entre tantas outras ilusões de qualidade de vida e segurança.

Cada condomínio contém 3 edifícios de 10 andares que so-mam 264 unidades habitacionais por conjunto. A tipologia de dois dormitórios com área útil de 43,27m² representa 88% do total dos 1056 recém construídos apartamentos. 29 Outro condomínio (Mix Aricanduva) também com financiamento do programa ‘Minha Casa, Minha Vida’ está para ser construído nessa mesma quadra, na esquina da avenida Aricanduva com a avenida dos Latinos, nes-te caso será uma única torre com 20 andares, o restante se repete.

Nessa quadra a interrupção com o tecido existente se dá tanto pela volumetria quanto pela borda, surge no tecido uma nova re-lação com a rua: muros cegos com guaritas opacas.

estratégia de projeto

O que são os CEUs?

O projeto idealizado pelos arquitetos de Edif, não saiu da prancheta sem alterações. Concebido inicialmente como Praças de Equipamentos Sociais (PES) durante a gestão petista de Luiza Erundina no início dos anos 1990, a idéia central da PES era a constituição de pontos nodais de uma futura rede de equipamen-tos públicos, que deixariam de trabalhar na lógica fragmentada da

28 Vale lembrar que 90% do déficit habitacional do país está nas famílias com renda inferior a três salários mínimos. Palestra proferida pela professora Ermínia Mari-cato, na FAUUSP, no dia 02 de maio de 2012.29 site MRV engenharia, consultado em junho de 2012: <http://imoveis.mrv.com.br/apartamentos/saopaulo/saopaulo/aricanduva/alamedaaricanduva%2Dspaziosaintinacio/>

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organização do governo e do loteamento urbano, pouco racional para a administração e para o desenvolvimento da cidade. 30 Tra-tava-se de um conjunto de edifícios culturais, educacionais e es-portivos, dispostos em terrenos amplos e traçados em linhas mo-dernas, que retomavam princípios presentes no Convênio Escolar.

O Convênio Escolar foi uma parceria estabelecida entre a Prefei-tura e o Estado de São Paulo, em 1948, para a construção de novos equipamentos educacionais que abrigassem todas as crianças até o IV Centenário da cidade. Para sua execução, foi criada a Comissão Executiva do Convênio Escolar, ligada diretamente ao gabinete do Prefeito, formada pelos arquitetos Hélio Duarte, Roberto Tibau e Eduardo Corona, entre outros, que não se restringiram a projetar escolas comuns, mas seguiram uma proposta multidisciplinar que constituiu a primeira grande realização em escala, da arquitetura moderna, na produção de edifícios públicos no Brasil. 31

A sigla CEU é compreendida até hoje de modo diverso pela pre-feitura e pelos autores do seu desenho. Enquanto oficialmente CEU significa Centro Educacional Unificado, para o arquiteto Alexan-dre Delijaicov deveria traduzir Centro de Estruturação Urbana. 32 Se no primeiro caso, a ênfase está mais direcionada ao conjunto de edifícios, entendidos como um complexo educacional dirigido aos moradores das periferias, que se diferencia das escolas comuns pela inserção do lazer e da cultura; no segundo, ressalta-se a escala me-tropolitana do projeto, que funcionaria como uma rede de equipa-mentos distribuídos pelo território urbano, de maneira a estruturá-lo através da articulação dos pólos (os CEUs) com os eixos (os rios, as ferrovias e as rodovias). Dessa forma, no conceito do projeto, a escola não seria o ponto principal, mas apenas uma parte dos 14 equipamentos da praça que serviria à comunidade. 33

30 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 75. 31 Takiya, André. EDIF: 60 anos de arquitetura pública. Dissertação de mestrado. São Paulo: FAUUSP, 2007, p 14.32 Entrevista a Alexandre Delijaicov realizada por Adriana Maiolini, Larissa Guel-man e Luisa Amoroso na FAUUSP em outubro de 2010. 33 O programa dos CEUs define para cada unidade: 2 creches, Ensino Infantil, Ensino Fundamental, Ensino de Jovens e Adultos, biblioteca, 2 salas de teatro, estú-

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Qual é a estratégia de projeto dos CEUs?

Podemos associar a estratégia de projeto dos CEUs a um progra-ma de vacinação. O projeto pensado como sistema pretendeu atacar a periferia da cidade de São Paulo, os lugares mais carentes de infra-estrutura, ao injetar em pontos estratégicos um conjunto padrão de equipamentos públicos de qualidade. Nessa perspectiva a obra exis-te como potência de transformação e demandaria desdobramentos.

Essa potência aparece em seu discurso na medida em que se coloca “como prova de que uma arquitetura transformadora do tecido urbano e da sociabilidade na cidade de São Paulo ainda seria possível.” 34

É interessante observar que essa intenção de transformação do tecido urbano e da sociabilidade está presente, em maior ou me-nor grau, em toda a genealogia da arquitetura moderna no Brasil durante o século XX. Com raras exceções, o olhar crítico à reali-dade local gerou uma arquitetura de contraste.

Neste trabalho não interessa sinalizar diferenças entre arqui-tetura carioca e paulista, como aparece recorrentemente em di-versos discursos; pelo contrário, trata-se de tentar verificar carac-terísticas comuns ao que chamaremos de sistema da arquitetura moderna brasileira, quase centenária, e da qual o CEU é fruto.

É claro que generalizações sempre contêm furos, mas nesse caso pode ajudar a tentar perceber alguns conceitos introjetados nesse sistema arquitetônico e urbanístico.

Se conseguimos enxergar o Brasil como um país que até os dias de hoje não se livrou do trauma da lógica contaminada de dois mundos, que se quer moderno por um lado, mas que não abre mão das relações tradicionais de trabalho por outro, ou seja, da “acu-mulação entravada”. 35 Podemos entender o esforço contínuo da ar-quitetura moderna no Brasil em querer negar todos os símbolos da sociedade tradicional e, portanto da cidade tradicional como forma

dios de música, rádio e TV, museu, ginásio de esportes, parque esportivo, balneário com 3 piscinas, padaria-escola, telecentro e Conselho Gestor. 34 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 6.35 conceito trabalhado por Csaba Deák.

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de superação de uma fraqueza que permanece e incomoda. Corrobora a essa lógica dual a questão da propriedade da terra

ainda mal resolvida, que se arrasta desde 1850 com a implementa-ção da Lei de Terras, “que configurou o moderno direito de proprie-dade no Brasil. Tinha por objetivo criar dificuldade ao livre acesso à terra, no mesmo momento em que a cessação do tráfico negreiro e a substituição dos escravos por trabalhadores livres punha em risco a agricultura de exportação por falta de mão de obra.” 36 Essas ques-tões não serão aprofundadas neste trabalho, apenas recordadas.

Nesse cenário, a arquitetura moderna brasileira procurou ne-gar sistematicamente a divisão injusta da terra, através da negação do lote e a tudo o que dele implica: marcação clara do limite da propriedade, divisão entre público e privado, conformação da rua, da esquina, da quadra e etc.

Nessa impossibilidade de dialogar com a cidade, que a arqui-tetura se colocou, ela acabou por fechar-se em si mesma. “Um co-letivismo possível nos limites da unidade.” 37

Ao pretender negar o lote essa arquitetura acabou por reforçá-lo. Nesse contraste figura-fundo a cidade aparece como uma mol-dura que aprisiona.

Muitas vezes a arquitetura procurou negar também as precárias condições de trabalho ao racionalizar o projeto. Mas, sabemos que a industrialização da construção de fato nunca ocorreu no Brasil, país com abundância de mão de obra barata e desqualificada.

Com o projeto dos CEUs a história se repete, racional na idéia e irracional na construção. Apesar de inicialmente concebido den-tro de uma linha de montagem completamente industrial, ou seja, pré fabricado, se utilizou da maneira recorrente de se construir no país, como não poderia deixar de ser.

O projeto universal, padrão, de massa, em série, nesse sistema prescinde de lugar, serve teoricamente para qualquer quadrante. Quando o edifício não está sobre pilotis que se adaptam em al-

36 Martins, José de Souza. “Novas leis antigas”. Jornal O Estado de São Paulo, 3 de junho de 2012, J6.37 Recamán, Luiz. Os Impasses da Arquitetura Paulista Recente. In: 3º Seminário DOCOMOMO Brasil, 2007, São Paulo. A Permanência do Moderno, 2007.

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tura para tocar o solo, como é o caso dos CEUs, então o terreno se adapta para receber os prismas já conformados. Nesse caso é comum verificar pobres ajustes de cotas de nível, taludes próprios de um projeto que não pertence à geografia do lugar. Vale lembrar que racionalização do projeto e industrialização da construção não levam necessariamente a esse tipo de abordagem urbana.

Notemos bem, não se trata de crítica à qualidade dos equipa-mentos contidos nos CEUs, nem da qualidade da arquitetura dos edifícios em si. É apenas uma constatação de que os CEUs, assim como o sistema da arquitetura que o originou, não pertencem ao território onde estão inseridos. Não por incapacidade dos escritó-rios que fizeram seus estudos preliminares e projetos executivos, e nem mesmo pela possível incompreensão da construtora que o produziu, mas sim pela sua lógica projetual – projeto padrão e negação do lote urbano.

Se considerarmos o estudo preliminar do CEU Aricanduva, provavelmente a melhor versão do projeto, verificaremos a mesma abordagem em relação à cidade. Se a avenida Gualtar permanece é por que existe o edifício ponte. O solo urbano é tratado como impuro, perigoso, precisamos nos elevar e andar por cima dele.

Ao pensarmos na grande maioria das passarelas de pedestre na cidade de São Paulo, verificaremos que se trata apenas de prio-rizar o veículo motorizado que não precisa parar para o pedestre passar; este que desvie sua rota em 200m de rampas infinitas ou corra o risco de morrer atropelado. São lógicas fragmentadas pro-venientes de intervenções fragmentadas. Nada pode ser pensado-como projeto geral, pela inexistência da idéia de espaço geral.

Narrativa da impossibilidade urbana, a arquitetura moderna brasileira chegou ao século XXI imbuída de grandes esforços, num momento em que o Estado já havia praticamente se aposen-tado da construção de infraestrutura e equipamentos públicos na cidade, delegada à iniciativa privada. A realização dos CEUs não pode ser menosprezada, a intenção é das melhores, mas o descola-mento do real é dos maiores.

Não é uma arquitetura na cidade, é o todo na parte. “A ‘arquitetura do lugar’ defendida pelo Edif, longe de ser uma

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defesa da cidade histórica rígida e museificada (como alguns contex-tualistas a defendem, a exemplo de Aldo Rossi), entende a arquitetura como ‘fundadora’ do lugar, como consolidação do lugar através do uso das pessoas e do espaço simbólico criado pela arquitetura.” 38

Fundação de qual lugar? Não se trata aqui de defesa da cidade histórica, a periferia urbana de São Paulo (onde os CEUs se inseri-ram) é tecido frágil, ocupação recente, não chega a cem anos. Habi-tada por população instável, migrantes em geral, à procura de terre-nos mais baratos para construir a casa própria e sair do aluguel, ou pagar aluguéis mais baixos. 39 Há fraco sentimento de pertencimento.

Justamente por se tratar de tecido esfarrapado que os CEUs pu-deram ser implantados dessa maneira. Seria difícil imaginar um CEU no centro da cidade, onde o tecido urbano já está mais consolidado.

A análise retoma a questão inicial: como poderia ser dada con-tinuidade ao projeto dos CEUs em termos de melhoria da quali-dade do tecido urbano ao redor, ou seja, do espaço geral? Quais seriam os desdobramentos possíveis?

Não é possível prever os desdobramentos, a obra construída é recente, ainda não completou dez anos. Mas, o trabalho sinaliza uma incompatibilidade entre o objetivo de estruturação urbana, que o projeto pretendeu, e sua realização. A qualidade está encer-rada na grades que separam os CEUs da cidade real. Não por falta de vontade, mas por ausência de diálogo.

38 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 70.39 Em 1942 houve o congelamento dos aluguéis através da Lei do Inquilinato, o que gerou mudanças no mercado que investia na construção das chamadas “casas de aluguel”.

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vídeo pesquisa, vídeo projeto

“‘interpretar o mundo’ já é uma forma de transformá-lo, de re-configurá-lo. O espectador é ativo, assim como o aluno ou o cientis-ta. Ele observa, ele seleciona, ele compara, ele interpreta.” 40

O produto deste trabalho é o vídeo CEU Aricanduva: urbani-dade do espaço ciclope. Ele não surge apenas como resultado, ele é a própria pesquisa.

O vídeo foi se construindo de maneira análoga ao conheci-mento: observar o que está à frente, dizer o que viu e verificar o que foi dito. Um trabalho contínuo de tradução e contra-tradução da realidade observada. 41

As imagens foram capturadas ao longo de toda a pesquisa, mas a maior parte delas é do último semestre, quando se decidiu pelo vídeo como meio de expressão. No mesmo momento em que co-mecei a me interessar pelos espaços ao redor do equipamento, ou seja, suas bordas, sua relação com a cidade.

A primeira dificuldade encontrada foi conseguir registrar ima-gens dentro do CEU. Apesar de percorrer os trâmites burocráticos que me foram solicitados pela gestora Fátima (o que implicou con-seguir autorização junto ao departamento de comunicação da pre-feitura de São Paulo) pude sentir que cada espaço do CEU tem o seu “dono”, alguns mais receptivos à minha presença, outros nem tanto. Abordagens, principalmente do pessoal da segurança terceirizada e do corpo de bombeiros, eram constantes e intimidadoras.

Outro local onde o registro foi interceptado é o terreno vazio, delimitado pelo córrego Cercado Fundo e pelo CEU, pertencente ao Shopping Aricanduva. A população do bairro Jardim Sta. Terezinha usa esse espaço não cercado, sob consentimento do “exército” par-ticular do Shopping, para jogar bola (há um campo de futebol im-

40 Ranciére, Jacques. “O Espectador Emancipado”. Texto retirado da internet no dia 1 de junho de 2011, <http://antropofagia-interculturalismo.blogspot.com> Tradução de artigo publicado na revista ArtForum em março de 2007.41 idem.

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provisado), empinar pipa etc. Quando perguntada sobre de quem é esse terreno, a população local hesita. Alguns acham que é de fato do Shopping, mas muitos dizem ser do Estado, ou de algum órgão público. Não há clareza na demarcação física desse território.

O “caminho” feito pelos moradores do bairro para acessar o supermercado Extra e o restante do Shopping, também passa por esse terreno, mas a apropriação coletiva fez do lugar um espaço um pouco mais público e portanto passível de registro, desde que fora do campo visual da segurança privada.

Foi a partir desse atalho, ou “caminho das pedras”, que a pes-quisa começou a se sensibilizar para o formato do vídeo. As ima-gens fotográficas, feitas até então, não conseguiam comunicar o que o trabalho queria expressar: a relação entre os espaços.

De início registrei o que me chamava a atenção nessa realida-de, sempre me posicionando de forma visível, de frente ao que era filmado. Capturar, mas ao mesmo tempo respeitar os limites co-locados pelas pessoas. Essa dimensão corpo no espaço foi impor-tantíssima para a realização do vídeo, e fez com que eu me sentisse sempre muito a vontade no lugar, tanto para receber o interesse quanto a desconfiança das pessoas, e por ventura os insultos. 42

Toda a filmagem foi feita assim, apenas eu com a câmera na mão, pendurada ao pescoço, sem me preocupar muito com a qua-lidade da imagem nem com sua estabilidade. Na maior parte das vezes apenas observando o que se passava à minha volta, mas em outras, ao conversar com moradores deixava a câmera ligada para registrar o áudio e a movimentação na paisagem.

A conversa informal com o seo Manuel e a dona Izaura foi registrada na calçada de sua residência, de frente para o córrego Cercado Fundo, ou do mato que o encobre. Eles são moradores antigos do bairro e puderam acompanhar a construção do CEU Aricanduva, além de outras mudanças na paisagem.

42 destaco aqui a importância de ter realizado nessa faculdade dois trabalhos em grupo no formato de vídeo, o primeiro em 2009 na região da Luz, e o segundo em 2010 sobre os CEUs. Outra experiência fundamental foi ter participado do proces-so do tfg “Luz: corpo-espaço e buracos negros” de Adriana Maiolini em 2011 que também teve um vídeo como produto.

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A cada filmagem, eu passava as imagens para o computador e começava a fazer uma pré-seleção daquilo que mais me interessa-va. Muita coisa só aparecia nesse momento, pois nem tudo o olhar conseguia enxergar na hora da captação. Feita essa seleção eu co-meçava a testar algumas montagens, experimentava acrescentar alguns sons, tirar outros e etc. O que resultou em uma série de “videoclipes”, com menos de cinco minutos de duração. Em cima desse material que eram realizadas as conversas com o professor orientador, nas quais alguns caminhos eram apontados.

Em duas ocasiões convidei amigos para intervirem na paisa-gem. Da primeira vez, no “caminho da pedras” sugeri a duas ami-gas que se posicionassem no meio do caminho de maneira atípica, queria introduzir corpos estranhos a esse percurso já consolidado pelo uso. Essa experiência não resultou satisfatória e foi abando-nada, acabou transmitindo um tom artificial e caricatural que eu não queria para o trabalho. Mas foi importante para conseguir avançar com o projeto.

Da segunda vez a intervenção pareceu mais acertada. Convidei um amigo para fazer uma espécie de instalação, um site-specific, com o material disponível no lugar. Juntos escolhemos a margem do rio Aricanduva, ou “rio das pedras” como antes era chamado, e o material escolhido: as próprias pedras do rio.

No dia da intervenção fomos surpreendidos por um batalhão de homens vestidos de laranja a serviço da prefeitura – “Conservação de Áreas Ajardinadas”. 43 A ação não se encaixava muito bem com o título, parecia mais um trabalho de “limpeza”, ou de extermínio de alguma praga invisível, do que propriamente de conservação.

O que a princípio poderia ter se configurado como empecilho (a presença dos homens) para o nosso trabalho, acabou por en-riquecer tanto a instalação quanto a captura das imagens. Diante do olhar curioso da minha lente a cena dos homens de laranja era extraordinária, mas ao mesmo tempo banal. Estavam triturando o mato, podando os arbustos, retirando as pedras e jogando quase

43 Os homens a serviço da prefeitura são da mesma empresa (Tonanni) que tercei-riza o pessoal que executa a limpeza do CEU Aricanduva.

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tudo no rio. A relação da nossa sociedade com os rios não poderia ter ficado melhor representada com esse registro.

Ao final dessa etapa, ficou claro que a qualidade do espaço ur-bano nada se relaciona com o poder econômico das pessoas que o habita, talvez os nossos espaços da elite sejam os mais pobres do ponto de vista urbano. Pior do que a falta de visão para o espaço coletivo, é a visão estreita, viciada. Espaço ciclope, de um olho só, não pode se constituir como espaço geral.

O presente vídeo, apesar de ser o produto do trabalho, revela uma pesquisa em processo, uma abordagem que pretende perce-ber não as luzes, mas o escuro do presente. 44

44 Agamben, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Trad. Vinícius Nicastro Honesko. Chapecó, SC: Argos, 2009, p 62.

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bibliografia

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crédito das imagens

Fotografias:capa, foto da autora com tratamento de André Leitep 4, 8, 13, 30, 32-33, 34-35, 36, 46-47, 48, 59, 60, 62-63 e 64 autora.p 6 e 20 (embaixo) Beto Garavello (arquivo André Takiya).p 15 foto de satélite (Google maps).p 20 (em cima) David Rego Jr (arquivo André Takiya).p 24 autor desconhecido (arquivo André Takiya).

Mapas:p 14 trabalho gráfico da autora sobre base cartográfica Cesad 2010 e base fornecida por André Takiya.p 16 a 19 trabalho gráfico da autora sobre base cartográfica Cesad 2005/6 e base retirada do TFG de Isadora Guerreiro.p 28, 29 e 31 trabalho gráfico da autora sobre base Cesad 2005/6.

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linha do tempo

_educador Anísio Teixeira em conjunto com o arquiteto Enéas Silva consegue realizar a construção de 28 prédios escolares no centro e subúrbio do Rio de Janeiro; após co-nhecer as escolas Platoon nos Estados Unidos.

_fundação do IAB SP (Instituto de Arquitetos do Brasil, sede de São Paulo). Formado pelos arquitetos Eduardo Kneese de Mello, João Villanova Artigas, Anhaia Melo, entre outros.

_construção da sede do IAB SP na esquina da rua Bento Freitas com a rua General Jardim, onde permanece até os dias de hoje._Convênio Escolar, acordo entre Estado e Município de São Paulo para a construção de novos prédios escolares. Comissão executiva formada por profissionais ligados ao grupo do IAB SP e influenciados pela arquitetura pro-duzida no Rio de Janeiro, principalmente pelo arquiteto Afonso Eduardo Reidy (arquitetos Hélio Duarte, Eduardo Corona, Roberto Tibau, Ernest Mange, entre outros). Tal comissão “não chegou ao final dos seus cinco anos de ati-vidade, por falhas no repasse de recursos, provavelmente devido às obras do Parque do Ibirapuera, em 1954.” 1

_Criação da FAUUSP [Faculdade de Arquitetura e Ur-banismo da Universidade de São Paulo], descolada da Politécnica.

_educador Anísio Teixeira vai à Salvador e formula o sis-tema de Escolas-classe e Escolas Parque. Foram constru-ídas apenas 4 Escolas-classe e 1 Escola-parque, apesar do projeto prever 30 Escolas-classe e 4 Escolas-parque para atender ao déficit educacional de Salvador.

1 Guerreiro, Isadora. Op. Cit, p 48.

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_IV Centenário de São Paulo, construção do parque do Ibirapuera, projeto de Oscar Niemeyer, absorção de boa parte dos recursos públicos.

_em desdobramento do Convênio Escolar de 1948, é cria-do Edif [Departamento de Edificações da Secretaria de Serviços e Obras da prefeitura de São Paulo] responsável por orçar, projetar e executar todas as construções e refor-mas de prédios públicos do município.

_Gestão Leonel Brizola, PDT, no estado do Rio de Janeiro. _CIEPs [Centros Integrados de Educação Pública] com Darcy Ribeiro à frente do projeto educacional e Oscar Niemeyer do projeto arquitetônico. _Fábrica de Escolas, coordenada por Lelé, para a pro-dução pública de elementos pré-fabricados leves para a construção de escolas, que no caso não abrangeram os CIEPs, mas apenas seus equipamentos complementares.

_Gestão Luiza Erundina, PT, na prefeitura de São Paulo. Secretário de Educação: Paulo Freire, Secretária de Cultu-ra: Marilena Chauí, Diretora de Edif: Mayumi Watanabe de Souza Lima._PES [Praças de Equipamentos Sociais], já bastante pró-ximas do que viria a ser o projeto dos CEUs, não chega-ram a ser construídas._CEDEC [Centro de Desenvolvimento de Equipamentos Urbanos e Comunitários], desenvolvido por Mayumi em colaboração com Lelé, um projeto muito próximo à Fá-brica de Escolas, que à sua semelhança não serviu para a construção das PES, que por sua vez nem foram construí-das, mas sim a pequenas escolas e equipamentos.

_Gestão Pitta-Maluf, PPB, na prefeitura de São Paulo.

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_1999, anteprojeto do Complexo Cultural Aricanduva, realizado por Edif, a partir de um termo de compromis-so de 1991, em contrapartida pela execução, em terreno da prefeitura, de alça de acesso ao Shopping Aricanduva [pertencente ao Grupo Savoy]

_Gestão Marta Suplicy, PT, na prefeitura de São Paulo. _CEUs [Centros Educacionais Unificados], dos 45 proje-tados e licitados, 21 foram construídos._abril de 2002, estudo de viabilidade do CEU Aricanduva, realizado pelo escritório UNA._agosto de 2002, projeto executivo do CEU Aricanduva, realizado pelo escritório M&M arquitetas._ 2º semestre de 2003, inauguração do CEU Aricanduva.

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transcrição das falas

Segue abaixo transcrição das falas do vídeo por ordem de aparecimento:

Madame: 1

- Mas acontece que também é um povo muito indolente, é um povo que às vezes ele não sabe receber quando a pessoa quer dar meios melhores pra ele melhorar.dona Izaura:- A gente gosta porque aqui, aqui é muito sossegado, aqui é...seo Manuel:- Só que fizeram isso aqui muito estreitinho. Isso aqui ainda vão melhorar. Eles vão canalizar esse rio [córrego Cercado Fundo] e vai sair avenida pra lá [pra avenida Aricanduva]. A largura que tá lá [rua interna do CEU Aricanduva] vai sair avenida aqui.

1 excerto do documentário “Maioria Absoluta” de Leon Hirszman de 1964.

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Português:- Agora eles querem fazer aqui uma avenida até Gualtar, até lá em cima [bairro]. Aí fica bonito.seo Manuel:- Não, mas vão fazer.- Córrego do Gualtar?!Português:- Córrego do Gualtar! Ué, aqui não é Gualtar, aqui? Então, rua Gual-tar... Agora, rio Aricanduva, não é Aricanduva? Rio Aricanduva!seo Manuel:- É, rio Aricanduva.Português:- Não sei, não sei explicar pra senhora!dona Izaura:- (risadas). Agora ta melhorando...- Alí é um catador de lixo que vem aí. Um português bem de vida!Português:- Eu sou português, não nego a minha nação! Eu não sou como você, que é de lá e diz que não!- Do Shopping tudo. Do Shopping é tudo. É tudo do Shopping, né? Ouvi falar.seo Manuel:- É, mas do Shopping mesmo não é não.Português:- Não sei, isso eu não sei. Ouvi falar! Não sei também.dona Izaura:- Muito bom aqui, muito bom, muito sossegado...Português:- Com o suor do teu rosto ganharás o pão de cada dia. Assim falou Jesus, para mim.- Eu, eu ando a catar coisas no lixo, sabe o que é? Eu cismei agora, já falei aqui pro seo Manuel. Vou ficar rico a pegar coisas no lixo! Se está, se está ali de graça, como é que eu não vou levar pra casa se me é preciso!

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Seo Manuel e dona Izaura, sentados, com a neta no portão de casa à rua Gualtar.

Rua Gualtar.

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agradecimentos

Gostaria de dividir esse trabalho com todos aqueles que de alguma forma contribuíram para que ele se concretizasse. Luiz Recamán pela confiança e por ter orientado o trabalho de manei-ra tão precisa e perspicaz. Klara Kaiser pelos questionamentos sensíveis. Dalmo Rodrigues pelo acolhimento e estímulo. Vera Pallamin por afirmar a “igualdade de inteligências”. Marly Ro-drigues pelas conversas esclarecedoras. Lika, Le Sass e Mi pelo incentivo. Nana Maiolini por me contaminar com seu olhar apaixonado pelo vídeo. Ju Risi por compartilhar essa jornada. Lu Espósito e Rebs Alcântara por terem topado experimentar no trabalho. Gubaró (Gustavo Barros Rocha) por ter entrado de corpo e alma no vídeo. Carol Müller pela leitura atenta do texto. André Leite pela diagramação primorosa deste caderno. Alberto e Mariza pelo apoio sempre.

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