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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP. Carmen Monteiro Fernandes Ribeirão Preto 2007

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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MESTRADO

As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o

impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP.

Carmen Monteiro Fernandes

Ribeirão Preto 2007

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CARMEN MONTEIRO FERNANDES

As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o

impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação do Centro Universitário Moura Lacerda de Ribeirão Preto, SP, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: Educação Escolar Orientadora: Prof. Dra. Natalina Aparecida Laguna Sicca.

Ribeirão Preto 2007

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CARMEN MONTEIRO FERNANDES

As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o

impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação do Centro Universitário Moura Lacerda de Ribeirão Preto, SP, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: Educação Escolar Orientadora: Prof. Dra. Natalina Aparecida Laguna Sicca.

Comissão Julgadora:

Orientadora . Dr. Natalina Aparecida Laguna Sica (CUML):___________________

2º examinador . Dr. Julio Cesar Torres (CUML): _________________________

3º examinador . Dra. Lucia Helena Lodi (MEC SEB): __________________________

Ribeirão Preto, 31 de agosto de 2007.

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Catalogação na fonte elaborada pela Biblioteca do

Centro Universitário Moura Lacerda Bibliotecária Gina Botta Corrêa de Souza CRB 8/7006

Fernandes, Carmen Monteiro As políticas curriculares na cotidianidade da escola: a análise dos professores sobre o impacto da reforma da educação profissional no CEFET-SP / Carmen Monteiro Fernandes. -- Ribeirão Preto, 2007. 190p. Orientadora: Profa. Dra. Natalina Aparecida Laguna Sicca Dissertação (Mestrado) -- Centro Universitário Moura Lacerda, 2007. 1. Ensino médio integrado. 2. Complementaridade. 3. Reforma educacional. 4. Educação profissional. 5. Currículo. I. Sicca, Natalina Aparecida Laguna. II. Centro Universitário Moura Lacerda. III. Título.

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DEDICATÓRIA

Aos colegas professores de todas as escolas,

níveis e modalidades, educadores que no

anonimato da sala de aula, constroem a

Educação desse país.

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AGRADECIMENTOS

Ao meu pai pela herança cultural.

À minha mãe por me ensinar a dizer e aceitar as verdades da vida.

À minha irmã Ignez pelas horas dedicadas ao meu filho.

Aos meus irmãos, sobrinhos e agregados pelo apoio constante.

Ao meu filho pela aceitação das minhas ausências.

À Direção do CEFET-SP pela abertura da Instituição e apoio a essa pesquisa.

Aos colegas do CEFET-SP pelo apoio direto e indireto, em especial a Carlos Roberto Matias,

José Ricardo Moraes de Oliveira e Maria Bernadete Bicalho Matias que, muitas vezes,

desempenharam minhas funções.

À Professora Doutora Natalina Aparecida Laguna Sicca pela oportunidade e pelo

aprendizado.

Aos professores do Programa de Mestrado do CUML pela qualidade da formação que

proporcionam.

Ao CUML pela abertura dos Pós-Graduação aos educadores sem restrições de faixa etária.

Aos componentes da Banca pela seriedade com que avaliaram esse trabalho.

Aos amigos Lilia de Oliveira Marques e Humberto Uribe pelo apoio nas madrugadas online.

Ao meu companheiro Toninho pela compreensão, carinho e apoio inigualáveis.

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[ ] Estou preso à vida e olho meus

companheiros.

Estão taciturnos, mas nutrem grandes

esperanças.

Entre eles, considero a enorme realidade.

O presente é tão grande, não nos afastemos.

Não nos afastemos muito, vamos de mãos

dadas. [ ] (Carlos Drummond de Andrade,

Mãos Dadas, fragmento)

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FERNANDES, Carmen Monteiro. As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP. Ribeirão Preto, SP: CUML, 2007. XXXXp. Dissertação (Mestrado em Educação). Centro Universitário Moura Lacerda.

RESUMO

Este trabalho apresenta uma análise da avaliação dos professores do Centro Federal de

Educação Tecnológica de São Paulo – CEFETSP sobre a Reforma Educacional levada a

cabo no final dos anos noventa, em especial nos resultados do currículo desenvolvido a

partir da definição da complementaridade na educação secundária brasileira, determinada

pelo Decreto 2208/97 na Educação Profissional e na Escola. Trata-se de uma pesquisa

qualitativa tipo estudo de caso, realizada por meio de estudos bibliográficos e entrevistas

narrativas, realizadas com professores. A hipótese de partida disse respeito à potencialidade

dos professores, atuando na cotidianidade da Escola, alterarem as determinações

curriculares, desenvolverem uma consciência crítica acerca das possibilidades e limites da

prática pedagógica e serem capazes de indicar caminhos que tornem a escola mais

democrática e a educação mais emancipatória.

. A reconstrução do percurso do sistema educacional brasileiro, da profissionalização e da

trajetória do CEFETSP permitiu compreender os condicionantes que interferem no modelo

escolar assim como o percurso que levou ao reconhecimento da qualidade das escolas técnicas

da Rede Federal de Educação e, particularmente, daquela que é objeto de estudo neste

trabalho. A análise dos dados coletados permitiu reconstruir a imagem que a Escola tem hoje

para seus professores e, ainda, como eles têm papel fundamental nos rumos que a Escola

deverá tomar.

Palavras-chave: Ensino Médio Integrado; Complementaridade; Reforma Educacional;

Educação Profissional e Currículo.

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FERNANDES, Carmen Monteiro. As políticas curriculares na cotidianidade da Escola: a análise dos professores sobre o impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP. Ribeirão Preto, SP: CUML, 2007. XXXXp. Dissertação (Mestrado em Educação). Centro Universitário Moura Lacerda.

ABSTRACT

This work presents an analysis of the evaluation of the teachers of the Centro Federal de

Educação Tecnológica de São Paulo – CEFETSP about the Educational Reformation taken in

the end of the Nineties, specially in the results of the resume developed from the definition of

the complement in the brazilian secondary education, determined for Decree 2208/97 in the

Professional Education and the School. It’s about a qualitative research like study of case,

carried through by means of bibliographical studies and interviews narratives, with teachers.

The initial hypothesis is about the potentiality of the teachers, acting in the daily of the

School, modifying the curricular determinations, developing a critical conscience concerning

the possibilities and limits of pedagogical practices and being capable to indicate ways that

become the school most democratic and the education more liberating. The reconstruction of

the Brazilian educational system, the professionalization and the trajectory of the CEFETSP

allowed to understand the conditions that intervene in the school model as well as the way

that took to the recognition of the quality of the schools techniques of the Federal Net and,

particularly, that it is object of study in this work. The analysis of the collected data allowed

to reconstruct the image that the School has today for its teachers and, still, as they have basic

paper in the routes that the School will have to take.

Key-words: Integrated Average Education; Complement; The Educational Reformation;

Professional education and Resume.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................................12 CAPÍTULO 1 - JUSTIFICATIVA...........................................................................................14 CAPÍTULO 2. OS CAMINHOS DA PESQUISA ...................................................................31 CAPÍTULO 3. UM POUCO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO SECUNDÁRIA BRASILEIRA...........................................................................................................................41 3.1. Do descobrimento à República (1500 a 1890): ‘escolas-quartel’ e ‘escolas-asilo’........43 3.2. A República Velha (1889 a 1930) e o movimento de construção da escola pública redentora: ‘oficina escola’ e ‘escola-oficina’. ..........................................................................45 CAPÍTULO 4. A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO CEFET-SP E SUA CONFIGURAÇÃO ATUAL.....................................................................................................................................71 CAPÍTULO 5. MOTIVAÇÃO DA REFORMA: os argumentos econômicos, políticos e sociais para a sua implementação.............................................................................................81

5.1. Categoria 1 - Motivação da Reforma ..........................................................................83 5.1.1 Subcategoria 1.1. – Argumentos Econômicos e Políticos .........................................84 5.1.2 Subcategoria 1.2. – Argumentos Sociais ...................................................................88

CAPÍTULO 6. MODELO SEQUENCIAL/CONCOMITANTE: o desenho curricular da educação profissional brasileira no contexto da complementaridade. .....................................96

6.1. Categoria 2 – Desenho Curricular ...............................................................................96 6.1.1. Subcategoria 2.1. – Modelo Integrado.....................................................................98 6.1.2 Subcategoria 2.2. – Modelo Seqüencial-concomitante ...........................................101 6.2.3 Subcategoria 2.3. – Formação de Nível Médio .......................................................106 6.2.4 Subcategoria 2.4. – Formação de Nível Superior....................................................110

CAPÍTULO 7. O PERFIL DO ALUNO DO CEFET-SP: o resultado da Reforma sob o ponto de vista da formação profissional e da democratização do acesso. ........................................120

7.1. Categoria 3 - Alunos..................................................................................................120 7.1.1 Subcategoria 3.1. – Perfil do aluno anterior à Reforma ..........................................121 7.1.2 Subcategoria 3.2. – Perfil do aluno atual.................................................................124

CAPÍTULO 8. LIMITE E PERSPECTIVAS DA AÇÃO DOCENTE: a análise da Reforma na cotidianidade da Escola. ....................................................................................................138

8.1. Categoria 4 – Prática Pedagógica ..............................................................................138 8.1.1 Subcategoria 4.1. – Possibilidades de Ação dos Professores ..................................140 8.1.2 Subcategoria 4.2. – Limites na Ação dos Professores.............................................144 8.1.3 Subcategoria 4.3. – Perspectivas de Correção de Rumos........................................149

CAPÍTULO 9 – CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................157 9.1. A globalização da economia e seus reflexos na educação profissional.....................158 9.2. A visão dos professores sobre o impacto da reforma: lentes refinadas para

compreensão do fenômeno educativo................................................................................161 9.3. O ensino integrado como pilar da recuperação da Escola e da unificação

curricular no Ensino Médio. ...............................................................................................167 9.4. O que significa democratizar a Escola: estariam garantidas as condições de

acesso e permanência dos alunos indesejáveis? .................................................................170 9.5. Os professores como sujeitos da Educação e construtores de uma nova ordem

escolar 174 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................179 Legislação Consultada:...........................................................................................................187 APÊNDICE ............................................................................................................................190 ROTEIRO PARA AS ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES.....................................190

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ÍNDICE DAS TABELAS E GRÁFICOS TABELAS

Tabela 1 – Perfil dos professores entrevistados............................................................................................. 40 Tabela 2 – Custo-aluno do CEFET-SP: 1998 a 2005. ................................................................................... 76 Tabela 3 – Vagas oferecidas pelo CEFET-SP para o primeiro semestre de 2007. ........................................ 77 Tabela 4 – Índices de retenção do CEFET-SP em 2005................................................................................ 79 Tabela 5 – Indicação das categorias e subcategorias consideradas. .............................................................. 82 Tabela 6 – Categorias e subcategorias sobre a Motivação da Reforma......................................................... 84 Tabela 7– Argumentos políticos e econômicos da Reforma ......................................................................... 84 Tabela 8 - Argumentos sociais sobre a instituição da reforma ...................................................................... 88 Tabela 9 – Categorias e subcategorias relativas ao Desenho Curricular ....................................................... 97 Tabela 10 – Modelo Integrado ...................................................................................................................... 98 Tabela 11 – Modelo Seqüencial-concomitante ........................................................................................... 101 Tabela 12 – Formação de Nível Médio ....................................................................................................... 106 Tabela 13 – Formação de Nível Superior.................................................................................................... 111 Tabela 14 – Categorias e Subcategorias relativas ao perfil dos alunos ....................................................... 121 Tabela 15 – Perfil do aluno anterior à Reforma .......................................................................................... 122 Tabela 16– Perfil do aluno atual.................................................................................................................. 126 Tabela 17 – Categorias e subcategorias relativas à Prática Pedagógica ...................................................... 141 Tabela 18– Prática Pedagógica.................................................................................................................... 141

GRÁFICOS

Gráfico 1 - Argumentos econômicos e políticos sobre a instituição da reforma. .......................................... 85 Gráfico 2- Argumentos sociais sobre a instituição da Reforma. ................................................................... 88 Gráfico 3– Avaliação sobre o modelo integrado ........................................................................................... 98 Gráfico 4 – Avaliação sobre o modelo Seqüencial-concomitante ............................................................... 102 Gráfico 5– Avaliação sobre a formação profissional de nível médio. ......................................................... 107 Gráfico 6 – Avaliação sobre a formação profissional de nível superior...................................................... 111 Gráfico 7 – Avaliação sobre o Modelo Curricular implementado pela Reforma ........................................ 114 Gráfico 8 - Avaliação do Perfil do aluno anterior à Reforma...................................................................... 123 Gráfico 9 - Avaliação do Perfil do aluno atual ............................................................................................ 126 Gráfico 10 – Avaliação sobre a Prática Pedagógica.................................................................................... 142

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INTRODUÇÃO

O objeto de estudo deste trabalho situa-se no campo específico de currículo de

formação profissional, especialmente na análise de como vem se configurando, na realidade

das escolas brasileiras, a proposta de Educação baseada na idéia de complementaridade entre

formação geral e profissional.

Seu objetivo geral foi o de analisar o impacto curricular produzido pela Reforma da

Educação Profissional, desenvolvida a partir da promulgação do Decreto 2208/97, com

ênfase nos aspectos de separação entre a formação geral e específica e a possibilidade, ou

não, da ação dos sujeitos da escola, no desenvolvimento de uma educação crítica, com

caráter politécnico e transformador.

Constituíram-se em objetivos específicos da análise a Reforma no cenário educacional

e seu impacto no CEFET-SP, tarefa executada a partir das produções documentais,

acadêmicas e dos dados colhidos sobre a cotidianidade da prática escolar.

Foi objeto particular nessa empreitada a avaliação a partir dos pressupostos de teorias

críticas de currículo, das possibilidades dos professores construírem um cenário real da

situação atual do CEFET-SP, quase uma década depois da implantação da Reforma imposta

pelo Decreto 2208/97.

Partimos da hipótese de que os professores, atuando na cotidianidade da Escola,

alteram as determinações curriculares, desenvolvem uma consciência crítica acerca das

possibilidades e limites da prática pedagógica e são capazes de propor modelos curriculares

que vão ao encontro de suas crenças.

Na organização textual desse trabalho, buscamos trabalhar com uma distribuição que

proporcionasse aos seus leitores compreenderem as bases para a sua construção, assim como

os seus resultados. Dessa forma, os motivos que levaram à realização da pesquisa estão

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indicados no Capítulo 1, denominado Justificativa. O caminho metodológico que

proporcionou o seu desenvolvimento, assim como as bases teóricas que deram sustentação

para os resultados apresentados, são contemplados no Capítulo 2, que chamamos de Os

caminhos da pesquisa. Nesse capítulo destacamos aspectos da pesquisa qualitativa, do

estudo de caso e, em especial, o papel dos professores como agentes de reflexão sobre a

realidade. O contexto histórico em que se situa a problemática é analisado no Capítulo 3:

Breve história da educação secundária brasileira. Ele traz um histórico da educação

brasileira, desde os jesuítas até os anos de 1990. No capítulo 4 denominado A trajetória

histórica do CEFET-SP e sua configuração atual é apresentada a história da Escola e

algumas características da sua situação atual. A análise das narrativas dos professores sobre

a sua percepção dos caminhos e descaminhos da educação secundária complementar, está

apresentada nos capítulos de 5 a 8: Capítulo 5 – Motivação da Reforma: os argumentos

econômicos, políticos e sociais para a sua implementação; Capítulo 6 – Modelo

Seqüencial/Concomitante: o desenho curricular da educação profissional brasileira no

contexto da complementaridade; Capítulo 7 - O Perfil do Aluno do CEFET-SP: o resultado

da Reforma sob o ponto de vista da formação profissional e da democratização do acesso;

Capítulo 8 - Limites e Perspectivas da Ação Docente: a análise da Reforma na cotidianidade

da Escola.

No Capítulo 9: Considerações Finais analisamos o conteúdo expresso pelos

professores e a possibilidade deles atuarem como interlocutores da situação atual da educação

secundária brasileira e do CEFET-SP .

Pode-se dizer que o resultado desse trabalho mostra a possibilidade de construção e

reconstrução dos espaços escolares, mesmo a despeito das configurações políticas e legais, e

acrescenta alguns elementos para quem deseja realizar uma leitura da Educação secundária

brasileira e da formação profissional.

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CAPÍTULO 1 - JUSTIFICATIVA

A partir da Reforma da Educação Profissional, imposta pelo Decreto nº 2.208/97, as

instituições de educação profissional passaram a oferecer um ensino que, entre outras

especificidades, se caracterizou pela separação entre educação geral e específica.

As justificativas do Governo Federal para a implantação desse “novo” modelo foram,

por um lado, de que era necessário garantir, na escola secundária, uma formação geral única,

portanto um Ensino Médio comum a todos os jovens, sem a dualidade secular de separação

entre o ensino propedêutico e o profissionalizante e, por outro, que os cursos técnicos,

oferecidos como complementação do Ensino Médio, permitiriam aos jovens e adultos das

classes mais desfavorecidas, sem possibilidades concretas de chegarem ao ensino superior,

ascenderem às escolas técnicas que, então, vinham sendo ocupadas por alunos de classes mais

favorecidas, sem vocação para a profissionalização em nível médio, e que se utilizavam da

qualidade do ensino dessas escolas para obterem sucesso no acesso à universidade.

O Parecer CNE/CEB nº 16/99, que trata das diretrizes curriculares para a Educação

Profissional traz indicativos da avaliação do governo sobre a distorção presente nas escolas

técnicas:

[ ] as escolas técnicas tradicionais acabaram se tornando a opção pessoal de estudos propedêuticos, distorcendo a missão dessas escolas técnicas. A separação entre educação profissional e ensino médio, bem como a rearticulação curricular recomendada pela LDB, permitirão resolver as distorções apontadas. Em primeiro lugar, eliminando uma pseudo-integração que nem preparava para a continuidade de estudos nem para o mercado de trabalho. Em segundo lugar, focando na educação profissional a vocação e missão das escolas técnicas [ ]

Entretanto, as críticas presentes na implantação e no desenvolvimento dessa Reforma,

localizadas tanto na nossa trajetória profissional quanto na fase inicial desta pesquisa, em que

foram revistas produções e experiências do período compreendido de 1997 até hoje, não

obstante indiquem que a Reforma tenha permitido acesso às escolas profissionalizantes de

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jovens e adultos que se encontravam em patamares sociais menos privilegiados, apontam

para a submissão da educação às exigências do sistema produtivo, ao distanciamento das

propostas pedagógicas das escolas profissionais do ideal progressista de uma escola unitária e

politécnica, as dificuldades de aprendizagem dos alunos que não conseguem, no Ensino

Médio, o domínio do conhecimento científico que lhes permita prosseguirem no domínio das

técnicas profissionais e, ainda, que a oferta de Ensino Médio e Superior, implantados pós

Reforma, concentram uma população bastante elitizada.

Portanto, o problema central que moveu esta pesquisa foi a busca de indicadores que

pudessem retratar a realidade presente no modelo imposto pela onda reformista dos anos 90 e,

especialmente, no impacto desse “novo” modelo de escola secundária, na realidade de

formação educacional e profissional dos alunos submetidos ao regime de complementaridade

entre formação geral e profissional.

A gênese desse projeto está no final dos anos noventa, quando, na regulamentação da

nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, foi editada a Reforma da Educação

Profissional. Sob a justificativa de que a LDB previa essa regulamentação, o governo instituiu

por meio do Decreto nº. 2.208/97, a separação completa entre a formação geral e profissional

e determinou uma matriz curricular baseada em competências profissionais.

No ano de 1996, enquanto os educadores debatiam uma nova LDB, cuja proposta já

estava em fase de tramitação no Senado, o Governo Federal enviou ao Congresso Nacional

um projeto de lei, o PLnº 1.603/96. Esse projeto tinha como espinha dorsal a instituição de

duas escolas médias: a regular e a profissional. O relator da proposta, Deputado Severiano

Alves, do PDT da Bahia, deu início a um amplo processo de discussão da proposta do

Governo. Na assessoria pedagógica do CEFET-SP, então Escola Técnica Federal,

acompanhamos as discussões sobre essa proposta, participamos de audiências públicas e, a

pedido do Deputado Relator, encaminhamos, assim como muitos outros educadores,

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propostas de emendas ao projeto que sugeriam que ele fosse alterado, de forma a permitir a

continuidade do modelo integrado.

À vista de possíveis modificações pelo Congresso, o Governo retirou o PL e, por meio

de uma ação impositiva, decretou a separação entre a formação geral e profissional. Surge,

assim, o Decreto nº2.208/97, marco da Reforma da Educação Profissional Brasileira dos anos

90.

Com a edição do Decreto nº2.208/97 e da Portaria nº106/97, o MEC impôs às

Instituições Federais que, de pronto, revisassem suas propostas pedagógicas a fim de adequá-

las aos novos ditames. Acompanhamos, na Comissão de Reformulação Curricular do

CEFET-SP e ainda participando de alguns encontros de educadores de outras instituições, as

lutas das escolas para manterem, na estrutura dos cursos técnicos, conteúdos que garantissem

maior reflexão crítica aos alunos e uma metodologia que minimizasse a separação entre o

pensar e o fazer.

O Projeto Pedagógico da Escola Técnica Federal de São Paulo, concluído em 1998,

entre outros aspectos, aponta para a importância da escola na formação de cidadãos críticos:

A filosofia que embasa esta proposta está calcada no princípio da inserção do ser humano no mundo do trabalho e na compreensão do processo produtivo e do conhecimento científico enquanto atividade humana, histórica, coletiva e sempre por fazer ou inacabada, veiculando uma visão não-reducionista do conhecimento, e negando a neutralidade da ciência, afirmando a responsabilidade de cada ser humano-cidadão em construir uma sociedade justa e igualitária. (CEFET-SP, Projeto Pedagógico, p. 35).

Para alguns autores, a centralidade em atender ao sistema produtivo levou inclusive à

perda da função social das escolas técnicas no que diz respeito à possibilidade de

requalificação de trabalhadores. Oliveira (2003) considera que a Reforma da Educação

Profissional se caracteriza como uma política deliberada de desmantelamento dos Centros

Federais de Educação Tecnológica, uma vez que o “status” dessas instituições, consideradas

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escolas de excelência na formação profissional, não justificava a edição do Decreto nº.

2.208/97.

Para Laudares (2002), esse “desmantelamento” pode ser verificado pela mudança na

oferta dessas instituições que, a partir da Reforma, passaram a priorizar os cursos superiores

de tecnologia em detrimento da formação técnica de nível médio.

Prosseguindo nossa experiência com a Reforma, acompanhamos a sua implantação na

Unidade Sertãozinho do CEFET-SP, onde sentimos, na prática, as dificuldades decorrentes da

não integração entre formação geral e profissional e a falta, pelos alunos, de domínio do

conhecimento científico para que pudessem progredir na técnica.

Apesar de uma das justificativas políticas do Governo Federal ao implementar a

reforma tenha sido a possibilidade de inclusão social de jovens e adultos trabalhadores pela

via da profissionalização média e, de fato, possa ser notada uma alteração no nível sócio-

econômico dos alunos que passaram a freqüentar a Escola, que passou a receber integrantes

de camadas sociais menos favorecidas do que aquelas que, tradicionalmente, freqüentavam o

CEFET-SP, antes da edição do Decreto nº2208/97, essa situação pode ser avaliada sob duas

perspectivas distintas.

Sacristán (2001) destaca a possibilidade real de ações educativas em atingirem as

classes menos favorecidas socialmente para garantir-lhes melhores condições sociais:

As desigualdades em relação à educação têm, hoje, conseqüências, além de causar diferenças sobre as oportunidades que se possa ter. Receber ou não educação é condição para a participação na sociedade desde o momento em que, para desempenhar o exercício de muitas atividades e postos de trabalho, se requer uma preparação prévia, assim como ferramentas e habilidades para adquiri-la. (p.65)

Santana (1998), em sua tese de doutoramento, que analisa as possibilidades da

Reforma da Educação Profissional Brasileira indica que, entre outros aspectos, ela constitui

um retrocesso, um modelo superado, dada a fragmentação e divisão social do processo

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educativo que representa e, por conseguinte, por acirrar a divisão social que caracteriza a

sociedade brasileira.

A Reforma da Educação Profissional recebe, portanto, sérias críticas, notadamente,

pelo aspecto de dualidade conferido à educação secundária. Mas, além da problemática

relativa ao desenho curricular, elas também asseveram a impropriedade da centralidade

curricular em competências.

Sacristán (2002), avaliando o modelo de currículo proposto por esse tipo de

orientação teórico-metodológico expõe:

Se olvidaba algo mui sencilho: que la educación no es totalmente equiparable a um proceso de producción industrial. El paradigma industrial permite una lectura parcial y unilateral del proceso educativo, de sus agentes, etc. Como nos sugere Tanner (1980, p.28), sencillamente habría que plantearse em que ‘el modelo industrial no es válido para el ámbito educativo, porque la educación no se ocupa de producir objetos inanimados, sino de seres humanos en desarrollo que deben ser capaces de comportarse competentemente, pero no sólo ante problemas fijos, sino ante aquellos que van a surgir’, y la propia educación, creemos, debería ayudar a aflorar. (p.25)

O debate das competências, assinalado na literatura específica a partir da década de

80, associa-se diretamente ao modelo de produção pós-taylorismo. Essa nova forma de

organização rompe com o princípio único de seriação, na produção de bens e serviços, cuja

delimitação em tarefas criava, nas empresas, postos de trabalho fixos e delimitados e que

levava, entre outras características, à uma educação profissional organizada para a formação

de trabalhadores para esses postos definidos, a partir dos quais, também, se estabeleciam os

currículos e métodos de ensino.

A idéia de competências em currículo gerou um grande debate: qualificação ou

competências, o que traz maiores possibilidades aos trabalhadores?

No âmbito específico das relações entre empregadores e trabalhadores, embora de

forma não uniforme, a definição de postos fixos de trabalho e a especificação da

qualificação requerida para esses postos permitiram avanços nas negociações coletivas. Essa

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possibilidade, como assinala Moraes (1999) e outros autores nos quais se apóia1, fica

inviabilizada quando se substitui qualificação por competência.

Cardozo (2005) ratificando a posição defendida por Morais (1999) afirma que:

[ ] compartilhando com os autores que definem a qualificação como relação social, consideramos que esse conceito ainda é atual , uma vez que expressa as contradições das relações sociais de produção. Ademais, a noção de competência está ancorada numa dimensão individual, que subestima a dimensão social das relações sociais de trabalho. E, o trabalho, na dimensão ontológica, não se restringe somente ao indivíduo, mas também está envolto no movimento contraditório de produção e reprodução da existência humana. (p.179).

Ramos (2002) discute aspectos políticos e pedagógicos que considera importantes

para a compreensão da proposta curricular presente na Reforma da Educação Profissional.

Para essa autora, a gênese dessa proposta reside no modelo de produção e de organização

empresarial que se configurou a partir dos anos 80 no qual, entre outros aspectos, destacam-

se, no que diz respeito à forma de produção, a flexibilização e a integração de diversos

setores produtivos e, na organização do trabalho, a reestruturação no quadro ocupacional e a

exigência de trabalhadores que tenham uma formação polivalente, que os torne

multifuncionais.

Para a autora, enquanto no modelo taylorista/fordista, as ocupações pertinentes a uma

determinada qualificação indicavam uma formação específica e relações contratuais para o

emprego de trabalhadores que detinham determinada qualificação, o modelo de

competências enfraquece essa dimensão social quando, por tratar-se de uma questão de

origem psicológica, se restringe às condições do próprio sujeito.

Destaca-se, portanto, o aspecto político da substituição da qualificação pela

competência presente na Reforma da Educação Profissional. Ou seja, a educação, mais uma

1 Carmen Sylvia Vidigal Moraes é doutora em Educação, atuando na Faculdade de Educação na Universidade de São Paulo, com reconhecido trabalho de pesquisa na área de formação profissional. Entre os autores citados, nos quais apóia suas idéias sobre qualificação e competências destacam-se, entre outros, L. Tanguy, H. Hirata, P. Rolle, Francoise Ropé.

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vez, é organizada de forma a atender às tendências do sistema produtivo. Com um modelo

de formação e emprego mais flexível, individualizado, as empresas têm menos dificuldades,

e menos ônus na contratação e na demissão de seu quadro de funcionários, estando, portanto

mais adaptadas às flutuações econômicas.

No aspecto educacional, Ramos (2002) destaca que:

[ ] no âmbito das relações de trabalho, o enfraquecimento do conceito de qualificação pela competência pode levar à desfiliação dos trabalhadores do frágil sistema de regulações sociais deste país; no âmbito educacional, as apropriações apressadas e limitadas desta noção podem reduzir a educação profissional a práticas voltadas para formações restritas, num triste recuo a princípios educacionais considerados superados pelo debate educacional crítico das últimas décadas. (p. 2)

Para a autora, essa orientação restritiva está presente nas orientações curriculares do

Ministério da Educação: as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e os Referenciais

Curriculares Nacionais (RCNs) e, a partir deles, a tendência nas escolas profissionalizantes é

de desenvolverem uma formação aligeirada, cujo foco está no atendimento às necessidades

imediatas das empresas:

Pelo fato de as DCNs e os RCNs da educação profissional fundamentarem-se em atividades profissionais, sem se colocar a problemática da construção do conhecimento objetivo e das aprendizagens, a concepção (neo)pragmática de conhecimento pode vir a legitimar construções curriculares centradas na prática, que subordinam os conceitos aos limites de sua instrumentalidade ou das formulações espontâneas. (Ramos, 2002, p.9)

Além do caráter de ordem política que essas diretrizes comportam, a autora destaca

que existem nelas duas inconsistências de ordem técnico-científica: se, por um lado, propõe-

se que as competências devam abarcar aspectos cognitivos ligados às teorizações piagetianas,

e elas não contemplam a complexidade dessa teoria, especialmente no que diz respeito ao

processo de construção do conhecimento pelo próprio sujeito, e se restringem mais às

teorizações condutivistas, ou seja, de formação para ações pré-definidas que possuem uma

linearidade e ordem determinadas. Por outro lado, mesmo contendo orientações sobre a

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necessidade de preparar os profissionais para as inúmeras adaptações requeridas pelos

modernos sistemas de produção, os enunciados apresentados nos documentos remetem a

funções e tarefas que se aproximam muito mais dos sistemas de organização

taylorista/fordista.

Consideradas as contradições presentes nas orientações curriculares, Ramos (2002)

aponta que o discurso que permeia essa documentação se configura com um caráter

profundamente ideológico, uma vez que há um grande abismo entre os princípios enunciados

e as orientações de como fazer o currículo. Não obstante a proposta seja apresentada como um

modelo novo, que prepare o homem para pensar e agir como protagonista do seu trabalho, há

toda uma orientação para atender às exigências das empresas, com todas as configurações de

um sistema industrial que oscila entre velhas e novas concepções de organização e normas.

Esse modelo, conclui, encerra a ideologia burguesa e reputa à educação profissional um papel

compensatório, mais uma vez para os “desvalidos da sorte”, privando a classe trabalhadora de

uma educação integral, que tenha como marca os avanços da ciência e da tecnologia.

Um dos pontos presentes na justificativa da separação propugnada pela Reforma da

Educação Profissional foi de que a educação básica deveria ser uma garantia incondicional

dos brasileiros, não podendo ser substituída pela profissionalização. Dessa forma, mesmo

centralizados no mundo do trabalho, ensino médio e educação profissional deveriam se

complementar, sendo o primeiro condição para a segunda. Caberia, então, à escola regular

desenvolver competências mais ligadas ao pensar e à educação profissional uma função mais

observável, da ordem do fazer. Enquanto a primeira deveria ser mais voltada ao mundo do

trabalho em geral, a segunda deveria atender às especificidades presentes nos diversos setores

da economia, caracterizadas nas áreas profissionais.

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Entretanto, Lopes (2001) assinala que os princípios presentes na concepção curricular

por competências permeiam, hoje, todo o currículo nacional e, especialmente, o Ensino

Médio:

Arrisco afirmar, contudo, ser no nível médio de ensino que as competências são definidas mais claramente como princípios organizadores do currículo. Também é nesse nível de ensino que a tensão entre o currículo por competências e a forma de organização curricular hegemônica – a disciplinar –apresenta-se mais patente. Tanto que a recente publicação das diretrizes curriculares da educação básica, buscando unificar orientações conferidas à educação infantil, ao ensino fundamental, ao ensino médio e à educação profissional, tem um formato próximo àquele conferido aos documentos para o ensino médio, nível terminal da educação básica, prevalecendo inclusive as listagens de competências separadas por áreas. (p.1).

A partir da constatação feita pela autora, é possível afirmar que toda educação

secundária brasileira tem como propósito atender às demandas do sistema produtivo e o que

justifica a existência de duas escolas são as próprias diferenças tecnológicas presentes nos

setores da economia. Dessa forma, os trabalhadores que não necessitam de habilidades

específicas, requeridas pelos postos de trabalho em que existem tecnologias mais definidas,

podem ser formados pela escola regular, enquanto cabe à educação profissional, de nível

básico, técnico ou superior, formar uma parcela menor, direcionada para o atendimento a

requisitos específicos dos setores econômicos.

Nesse sentido, a complementaridade presente na educação secundária adquire uma

posição que vai além da própria separação entre escolas para o trabalho e escolas para o

vestibular, pois encerra ainda uma outra dualidade: escolas para trabalhadores qualificados e

escolas para os que não necessitam de qualificação específica.

Retornando à questão do impacto da Reforma, no que se refere especificadamente ao

CEFET-SP, a revisão da literatura acerca de análises já realizadas sobre a Instituição levou ao

conteúdo de algumas dissertações de mestrado defendidas por professores da Escola.

Oliver (1998), partindo dos relatórios de estágio apresentados pelos alunos do Curso

Técnico em Mecânica procede a uma análise da então Escola Técnica Federal de São Paulo,

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mostrando que ela passou de uma escola pensada, no início do século XX, para os desvalidos

da sorte e chegou aos filhos da classe média. Na sua trajetória ela [ ] fez história no cenário

da educação profissionalizante brasileira, podendo ser entendida como um dos retratos dessa

modalidade de ensino no país. [ ] (p.284)

Indica ainda, que, embora os alunos apresentem alto grau de formação eles não se

orientam no sentido de atuarem como técnicos, mas buscam as profissões universitárias,

especialmente as engenharias.

Complementarmente ao perfil dos alunos, o autor empreende uma análise acerca do

tipo de currículo desenvolvido pela Escola. Segundo ele, há uma tendência, na área de

Mecânica, para uma linha mais tradicional e tecnicista e que se contrapõe à Pedagogia Crítica

que está proposta no Projeto Pedagógico.

Nesse sentido, propõe que sejam feitas amplas discussões a respeito dos paradigmas

curriculares, pois [ ] A elucidação do tipo de currículo que pratica é, inquestionavelmente, [ ]

o primeiro passo na busca da transformação. Como mudar se a Instituição não se conhece?

(p. 112).

Para ele, essa discussão sobre as diretrizes curriculares deveria partir do dilema muito

presente na vida da Escola: [ ] como conciliar interesses: formação do profissional

tecnicamente habilitado x formação do cidadão. [ ] (p. 297).

Destaca-se no trabalho de Oliver (1998) uma grande preocupação em indicar a

necessidade de se estabelecerem pontes entre as várias áreas envolvidas na formação dos

técnicos em Mecânica, numa forma de interdisciplinaridade que é condição para que os

alunos tenham uma formação mais ampla, requerida pelas alterações no modelo de produção.

Entretanto, segundo o autor, a escassez de recursos e o perfil de alguns professores da

área, descompromissados com seu trabalho, comprometem qualquer tentativa de melhoria. E,

para essa situação, não há ação de correção prevista para ser aplicada pelo poder público e,

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em especial, pela Escola. Entretanto, sugere que seja realizado um processo de avaliação

docente, com a participação dos alunos e de entidades externas à Escola, com a perspectiva de

mostrar aos professores o resultado do trabalho deles.

No que diz respeito à Reforma que se encontrava em trâmite, o pesquisador, embora

reconhecendo a necessidade de uma revisão na função da Escola, uma vez que os seus

técnicos não se direcionavam ao mercado de trabalho, indica certa dificuldade na sua

aceitação uma vez que ela trará uma desestabilização institucional. Será a troca de um

caminho certo, ainda que necessitando de correções, por uma trilha duvidosa, com críticas de

diversas ordens.

Fernandes (2001) também empreende uma análise acerca da possibilidade formativa

do CEFET-SP e, assim como tantos outros, destaca a posição da instituição como modelo no

cenário educacional brasileiro.

Ainda que sua pesquisa esteja centrada na possibilidade de inovação curricular por

meio do trabalho nas áreas de automação e robótica há, nela, uma avaliação dos alunos

concluintes das últimas turmas dos cursos integrados de Mecânica, em que eles se mostram

aliviados pelo fato de poderem ter concluído a educação secundária no modelo integrado, que

estava em extinção na Escola.

Um aspecto particularmente importante em Fernandes (2001) é a conclusão

apresentada pelo pesquisador de que o real motor do ensino não está na inovação tecnológica,

mas, sim, na interação que se estabelece entre os professores e alunos, condição “sine qua

non” para a aprendizagem significativa.

A conjugação da avaliação dos alunos e dos pressupostos de ensino aprendizagem que

embasaram o trabalho do Professor levaram-no a concluir que:

A dicotomia entre formação para a cidadania e formação para o trabalho, que tanto perturbou a educação no século XX, vai perdendo sua razão de ser. [ ] a educação que visa formar um cidadão crítico, participativo [ ] é também a melhor educação para um bom desempenho na moderna produção. (p.199)

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Mergulhão (2003) apresenta, em sua dissertação de Mestrado, uma análise

significativa sobre o CEFET-SP, tomando como princípios norteadores do seu trabalho a

Reforma Administrativa do Estado Brasileiro e a Reforma da Educação Profissional

desencadeada pelo Decreto nº 2208/97.

As considerações da pesquisadora mostram que houve uma tentativa de transformar a

forma de organização administrativa da Escola, dando a ela um caráter de gerenciamento

privado, inclusive com previsão de geração de lucros.

Ao mesmo tempo, no modelo de ensino, a Reforma buscou-se atingir [ ] à qualidade,

flexibilidade, atualização e alinhamento em relação às tendências mundiais, mas foi limitada

às restrições orçamentárias, às imposições do modelo de competência e moduralização e

desencadeada, na Instituição de forma arbitrária, incompleta e mal planejada. (p.4)

Um ponto extremamente interessante presente em Mergulhão (2003) é a denúncia de

que se instalou na Escola, entre os professores, uma [ ] descrença no poder de

transformação do trabalho pedagógico, diante da quantidade de tempo e energia investidos

em tarefas absolutamente inócuas, sem continuidade, forjadas para dar legitimidade aos

processos de implantação de ambas as reformas. [ ] (p.165).

Matias (2004), também analisa o impacto da Reforma no CEFET-SP, com destaque

para a realidade da Unidade Sertãozinho. Ainda que seu trabalho aponte os condicionantes

políticos e econômicos desse movimento, ele se orienta, em grande parte, para as questões

curriculares presentes no modelo de complementaridade entre formação geral e profissional.

Os dados apresentados pelo pesquisador resultam de consultas a vários segmentos da

comunidade da Escola de Sertãozinho. Considerações da análise desses dados indicam que os

professores consideram, entre outros aspectos, que a Educação Profissional de nível técnico,

na forma preconizada pela Reforma, tem propiciado uma formação aligeirada e superficial,

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sendo incoerente com as exigências demandadas pela atual organização do mundo do

trabalho. (p.107)

Um destaque nesse trabalho diz respeito à possibilidade de democratização da Escola.

Nesse sentido, discutindo o real alcance da Reforma na possibilidade de inclusão dos menos

favorecidos, o autor ratifica posição defendida por Acácia Kuenzer (2000):

[ ] também assumimos com Kuenzer (2000) que a atual formação do técnico de nível médio vai ao encontro dos interesses dos incluídos, já que transfere a especialização para níveis superiores, enquanto esvazia o currículo de nível técnico por meio da formação profissional de curta duração que capacita apenas para o exercício de ocupações precarizadas em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo. (p.107).

Em trabalho mais recente Villela (2007) apresenta o panorama atual da Escola. Por

meio dessa pesquisa, realizada quase que concomitantemente a este trabalho, o pesquisador

buscou analisar as políticas públicas para a educação profissional e a forma de organização e

gerenciamento do CEFET-SP sob o ponto de vista da administração, estratégia e da liderança

empresarial.

Os resultados dessa pesquisa apontam para a necessidade de adoção de estratégias de

gerenciamento como maior entrosamento em oferta e demanda de cursos, acompanhamento

de egressos, melhoria da infra-estrutura , etc. São indicadas também algumas ações de caráter

pedagógico tais como implantação de novos cursos e modalidades de ensino, definição de

pré-requisitos entre disciplinas e ainda a indicação de que, independentemente da modalidade

de curso a ser oferecida, os currículos deverão contemplar disciplinas de formação geral.

Embora esse trabalho esteja voltado mais aos aspectos administrativos, ele apresenta

relações entre a gestão e o processo ensino-aprendizagem, mostrando, fundamentalmente, que

as dificuldades vividas pela Escola hoje só poderão ser superadas por meio de um trabalho

coletivo.

As produções que tratam da temática da implantação da Reforma no CEFET-SP,

acima indicadas, possuem singularidades no que diz respeito à temática da Reforma, uma vez

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que todas elas trazem, em maior ou menor escala, contribuições a esse respeito. Outro ponto

de aproximação entre elas é o fato de serem pesquisas etnográficas e realizadas por pessoas

diretamente envolvidas na vida da Escola.

Mas há entre elas algumas diferenciações uma vez que se situam em tempos distintos e

partem de fontes que também possuem alguma forma de distinção. Oliver (1998) analisa a

situação da Escola em uma fase de iniciação do movimento da Reforma a partir de dados

coletados com alunos concluintes do Curso Técnico em Mecânica e o foco do seu trabalho

está em verificar a possibilidade formativa desses alunos, em especial no que se refere ao

mercado de trabalho.

Como se trata de um tempo em que a Reforma ainda estava em fase de implantação,

não há constatações do Professor a esse respeito, exceto pela indicação de certo receio sobre

sua possibilidade de melhorar a Escola e por alguns questionamentos do modelo de ensino

não integrado. Não se registra nesse trabalho ênfase nas questões de ordem político-

econômicas que levaram à edição da Reforma e nem sobre a política institucional.

Fernandes (2001), assim como Oliver (1998), analisou a Escola a partir dos dados

coletados com os alunos do Curso Técnico em Mecânica. Seu trabalho trata da Reforma em

um tempo em que sua implantação já está concretizada, mas, ainda que traga considerações

sobre ela, especialmente mostrando a impropriedade da separação entre formação geral e

profissional, seu foco está mais direcionado a questões de ordem didático-metodológica, tais

como a inovação curricular e a interação professor-aluno.

O trabalho realizado por Mergulhão (2003) analisa a Escola de forma abrangente e

busca acentuar os condicionantes da Reforma no que diz respeito à política nacional de

educação e às micro-políticas institucionais. Embora a coleta e análise dos dados tenha se

dado de maneira não sistematizada ela incluiu desde o quadro administrativo da Escola até os

alunos e professores.

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Como já destacamos anteriormente, há no trabalho de Mergulhão (2003) uma grande

preocupação com as influências de ordem político-econômica relativas à Reforma, o impacto

delas na educação e, particularmente, com as formas de organização e de gestão implantados

na Escola que, de acordo com os pressupostos reformistas, fariam com que ela tivesse maior

produtividade.

Ainda que existam severas críticas no seu trabalho sobre os encaminhamentos da

Reforma no CEFET-SP, críticas que, por vezes, fazem referências a pessoas da Escola e

adquirem até certo tom pessoal, a autora indica o fato da Instituição carecer de maiores

estudos, numa perspectiva de busca de indicadores para o seu futuro incerto:

[ ] a análise realizada no CEFET-SP, mostrou que não se pode cair na armadilha da polarização e defender que as Escolas Técnicas Federais não necessitavam de nenhuma alteração; ao contrário, foi possível tanto para a desmistificação da imagem saudosista de ilha de saber, quanto a atenuação do futuro catastrófico, vislumbrado no mar de incertezas que caracteriza a situação atual da escola. (p.161)

Esse mar de incertezas se configura, segundo a autora, porque, entre outros aspectos, a

escola não melhorou, desestruturou-se, [ ] está desorganizada, não há motivação dos

agentes pedagógicos para a resistência ou elaboração de novas propostas; [ ] há [

]problemas em todas as áreas de ensino[ ]. (p.167)

Nos trabalhos de Matias (2004) e Villela (2007) há indicações dos resultados da

Reforma, tanto no que diz respeito às questões administrativas quanto do processo ensino

aprendizagem. Também neles há abrangência na amostra selecionada, com escuta dos

diversos sujeitos que compõem a Escola: direção, professores, alunos.

Em termos institucionais, há uma restrição relativa ao universo particular dessas

pesquisas. Enquanto Matias (2004) de restringiu à Unidade Sertãozinho que teve uma curta

história no Ensino Integrado, uma vez que houve somente uma turma de técnicos formada

antes da edição da Reforma, Villela, ainda que tenha trabalhado com documentos que

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abrangem as outras unidades de ensino, realizou entrevistas exclusivamente com servidores

da Unidade Sede.

Do ponto de vista de sistematização da análise, feita a partir do conteúdo de

entrevistas estruturadas, e do resultado apresentado, o trabalho de Matias (2004) se caracteriza

por uma excepcional qualidade, trazendo uma indicação importante, que diz respeito à

possibilidade da Escola, ainda que de forma subliminar, trabalhar contra as imposições de

ordem político-econômicas, situando os professores como agentes dessa resistência.

Como afirma Sacristán (2000a) entre as propostas legais e as práticas escolares

existem diferenças significativas, produzidas pela ação dos sujeitos da educação: ... Ao lado

do currículo que se diz estar desenvolvendo, expressando ideais e intenções, existe outro que

funciona subterraneamente, que se denomina oculto... é nessa experiência que encontramos o

currículo real.” (p.131-132).

Dessa forma, não é possível assumir, deliberadamente, que a implantação da reforma

tenha significado, integralmente, uma profissionalização restritiva, sem elementos que possam

garantir uma formação cidadã. Essa avaliação requer que sejam analisados, além das questões

mais macro, os seus espaços discricionários.

André (1991) afirma que o conhecimento da escola exige, por um lado, que as

relações internas sejam vistas com a ótica dos macro-condicionantes, mas, também que sejam

compreendidos o papel e a atuação dos sujeitos nesse complexo interacional onde ações,

relações, conteúdos são construídos, negados, reconstruídos ou modificados. (p.71)

Lopes (2001) também destaca a possibilidade de construção e reconstrução do espaço

escolar pela contraposição às orientações curriculares oficiais. Entretanto, para ela, há um

limite para essa ação, determinada pela capacidade do Estado gerenciar a proposta escolar,

utilizando-se para tanto de mecanismos como a distribuição de recursos e a avaliação da

eficiência escolar, ditadas por indicadores que privilegiam os aspectos de interesse político.

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Certamente é preciso considerar que tais orientações oficiais não são assimiladas pelas diferentes instituições educacionais da mesma maneira. [ ] Assim, nos processos de recontextualização no interior de cada uma das instituições educacionais sempre há espaço para ressignificar [ ] (p.8)

Matias (2004), tomando a situação particular de sua pesquisa, também assinala que,

não obstante exista, de fato um espaço de resistência institucional, ela não consegue

desmanchar completamente o estabelecido pelo currículo oficial:

Se por um lado, a escola com a comunidade conseguiu reverter a decisão do MEC em privatizar a escola, por outro, embora muitos esforços tenham sido desprendidos, especialmente pelos professores, não podemos afirmar que os mesmos resultados tenham sido alcançados nos aspectos curriculares. Podemos depreender pela pesquisa realizada na escola, que as principais dificuldades vividas pelos professores e alunos nas salas de aula são oriundas de um modelo de currículo extremamente fragmentado, da enorme heterogeneidade de formação dos alunos presentes nas salas de aula e, especialmente, pela falta de pré-requisitos relativos aos conhecimentos da educação básica, pressuposto da Reforma Curricular para o ensino técnico de nível médio. (p.106)

As críticas e contradições que se apresentam na revisão da literatura sobre a educação

profissional e, particularmente, o CEFET-SP , mostraram a possibilidade do desenvolvimento

desse projeto de pesquisa. Entretanto, especialmente os estudos sobre a Escola, levaram o seu

foco para o trabalho dos professores e a avaliação deles a respeito da Reforma da Educação

Profissional implantada a partir do final dos anos noventa do século XX, especialmente no

que se refere às possibilidades e limites da complementaridade curricular, tanto no aspecto de

possibilidade formativa crítica como da inserção real no sistema produtivo.

A partir daí, analisamos o impacto da Reforma com as lentes de um referencial teórico

que permite mostrá-la no espaço de sua real edificação: a sala de aula, entendendo que no

cotidiano da escola, há um espaço de recriação e que a cultura presente no seu interior permite

a formação de um espaço singular para a produção e para a resistência, sendo os educadores

verdadeiros agentes de produção de cultura e conhecimentos.

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CAPÍTULO 2. OS CAMINHOS DA PESQUISA

O significado de um objeto pode ser absorvido, compreendido e generalizado a partir das suas características definidoras e pelo seu ‘corpus’ de significação. Já o sentido implica atribuição de um significado pessoal e objetivado, que se concretiza na prática social e que se manifesta a partir das Representações Sociais, cognitivas, valorativas e emocionais, necessariamente contextualizadas. (FRANCO, 2005)

Segundo Pérez Gómes (2000) a característica de que se revestem os fenômenos

educativos está, particularmente, centrada na peculiaridade de subjetividade e complexidade.

Dessa forma, requerem uma metodologia investigativa que tome por princípio essa

caracterização e que subordine, ao caráter inacabado, parcialmente indeterminado, com

características variáveis de significante e significado, o processo de pesquisa, assim como

todas suas ferramentas de coleta e análise de dados.

Para a autora, a metodologia não pode estar dissociada da conceituação, ainda que

provisória, sobre o objeto de investigação, pois, se, por um lado, o conceito que se tem sobre

uma dada realidade condiciona a escolha dos procedimentos metodológicos, por outro, a

opção por determinada metodologia permite que o conhecimento prévio seja depurado e,

ainda, a análise da pertinência, ou não, dos métodos aplicados. Trata-se, portanto, de uma

relação dialética, com elementos profundamente interligados, condicionados pela

intencionalidade com que se principia um processo investigativo e pelo caráter profundamente

interpretativo da realidade.

Brandão (2003) ao explicitar elementos condicionadores da gênese da pesquisa

qualitativa, assinala que:

O deslocamento não é uma maneira formal: do ‘objetivo’ para o ‘subjetivo’; da ‘oposição sujeito-objeto’ para a comunicação entre ‘dois sujeitos interativos através de suas diferenças’; da ‘análise da quantidade’ para a ‘compreensão da qualidade’. Ele está situado na tomada de consciência de que quando eu convoco aquilo que procuro estudar, a sair do ‘lado da coisa e da estrutura formal’, para o ‘lado da relação e do acontecimento vivenciado’, a minha interpretação, qualquer que seja ela e de onde quer que venha não pode mais ser dada através de um discurso axionático-dedutivo e

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inevitavelmente redutivo, mas em uma compreensão fundada na aventura assumida da intersubjetividade. (p.91)

Segundo os pressupostos presentes nos estudos de Lüdke & André (1986), Trivinos

(1987), Martins ( 2004) e outros, a pesquisa qualitativa tem foco indutivo-descritivo e a maior

atenção do pesquisador deve ser com o significado que os sujeitos conferem aos fenômenos,

sendo, portanto uma forma de pesquisa em que o processo tem valor maior do que o resultado

propriamente.

Dessa forma, numa pesquisa interpretativa, o investigador, principal instrumento de

investigação, realiza um estudo de caso em que os instrumentos, flexíveis e capazes de captar

elementos e contexto, auxiliam-no a conferir significado ao fenômeno particular.

Para os autores acima indicados, o estudo de caso se caracteriza como um tipo de

pesquisa qualitativa, cujo foco é a interpretação de uma unidade estudada em profundidade,

buscando a sua identidade a partir daquilo que ela tenha de mais próprio e mais essencial.

Diferentemente de outras formas de pesquisa qualitativa, no estudo de caso o

investigador não interfere sobre o objeto de sua análise, mas busca conhecê-lo em

profundidade para, a partir da sua descoberta, produzir elementos que permitam novos

estudos e novas práticas sobre um determinado fenômeno.

Segundo os autores acima citados, questões de validade e confiabilidade de um estudo de

caso têm relação direta com a precisão do resultado da pesquisa, ou seja, com o caminho

percorrido, com a fundamentação teórica dos conceitos, com a definição dos dados. A

validade tem a ver com a forma de realização da pesquisa, a metodologia, a fundamentação

teórica, a técnicas de coleta e a análise dos dados. A confiabilidade diz respeito à

possibilidade de repetição da coleta de dados com a manutenção dos resultados, ou seja, com

a generalização do resultado de pesquisa, não necessariamente das respostas obtidas, mas das

proposições levantadas.

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Embora o estudo de casos, muitas vezes, seja mais indicado para fases introdutórias

em um processo de pesquisa ou mesmo para a descrição de um fenômeno, no caso particular

dessa pesquisa, ele se caracterizou mais como um estudo analítico que permitiu avançar no

conhecimento sobre o impacto da Reforma da Educação Profissional no Brasil.

Portanto, dado o caráter de interpretação da realidade do Centro Federal de Educação

Tecnológica de São Paulo, produzida pela Reforma da Educação Profissional concebida pelo

Decreto 2208/97, de que se revestiu essa pesquisa, consideramos se tratar de uma pesquisa

qualitativo-interpretativa do tipo estudo de caso, pois se trata de uma realidade específica,

com características peculiares e que, mantidas as semelhanças estruturais, seu resultado

poderá ser estendido a outras instituições, sendo generalizável, portanto.

Por conter elementos de análise sobre uma unidade institucional tornou-se importante

o conhecimento existente sobre a organização que se pretendia investigar, foi, portanto,

necessário estudar os documentos e produções cientificas que pudessem desvelar mais

claramente essa unidade educacional. Entretanto foi essencial captar a representação do

fenômeno estudado por parte dos sujeitos da ação institucional: os professores. Essa

representação permitiu enxergar aspectos não perceptíveis nos textos escritos.

A opção em privilegiar a fala dos professores na análise da configuração atual do

CEFET-SP é determinada pela nossa compreensão de que a prática docente, embora com

todos os condicionantes aos quais esteja submetida, é fundamental na escola e que são os

professores potencialmente capazes de refletirem sobre o processo educativo e sua função

social. Partilhamos, nessa compreensão, com as idéias de Sacristán (2000b) que reconhece,

nos professores, intelectuais capazes de pensarem a sociedade:

[ ] Longe de uma interpretação instrumentalista do papel do professor, ou de intelectual dedicado a elaborações abstratas distanciadas da prática, a imagem do professor como intelectual comprometido com sua própria realidade prática supõe dotar-lhe do poder e dos instrumentos para discutir e reelaborar sua própria ação. Proposta que exige dotar-lhe de capacidade para questionar os pressupostos morais, sociais e políticos da ação educativa

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(Smyth, 1987), do modo como Gramsci concebia o papel do intelectual na sociedade. [ ] Apenas a atitude do intelectual crítico nos professores pode contribuir para dar-lhes consciência dos valores que definem de fato suas práticas, dos efeitos das mesmas, presumíveis algumas vezes e evidentemente outras, dentro de uma perspectiva de transformação da realidade educativa e social, muito além de uma simples reflexão técnica sobre sua prática. (p.269 - 270)

Para a realização deste trabalho utilizamos, além da pesquisa documental e

bibliográfica, que permitiram o aprofundamento teórico e técnico dos objetivos, dificuldades e

possibilidades do modelo estabelecido pela Reforma da Educação Profissional implementada

pelo Decreto 2208/97 e a caracterização do Centro Federal de Educação Profissional de São

Paulo no contexto da implementação dessa Reforma, entrevistas narrativas com professores,

cuja amostra foi feita por escolha aleatória, realizada por meio de sorteio, entre os que

trabalharam no modelo precedente à Reforma e na sua implementação e desenvolvimento. O

total de sorteados entrevistados correspondeu a um percentual 15,32% do total de professores

com as características acima indicadas.

Segundo Jovchelovitch & Bauer (2002), as entrevistas narrativas permitem que os

informantes reconstruam um acontecimento ou fenômeno a partir da representação que fazem

dele. Essa técnica, considerada uma entrevista não estruturada, está diretamente vinculada à

pesquisa qualitativa, representa uma oposição ao tradicional esquema pergunta-resposta e sua

defesa se situa na perspectiva de que o sujeito se posiciona mais livremente e verdadeiramente

se estiver utilizando sua própria linguagem, de forma espontânea. Apontam dois pressupostos

básicos presentes nas entrevistas que condicionam a eficiência dessa técnica:

[ ]ela contrasta diferentes perspectivas, e leva a sério a idéia de que a linguagem, assim como o meio de troca não é neutro, mas constitui uma cosmovisão particular. A avaliação da diferença de perspectivas, que pode estar tanto entre o entrevistador e o informante, quanto entre diferentes informantes, é central à técnica. O entrevistado é alertado para que evite cuidadosamente impor qualquer forma de linguagem não empregada pelo informante durante a entrevista. (p.96)

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A aplicação e análise da entrevista exigiram o cumprimento de algumas regras que

foram:

1) Preparação da entrevista – aprofundamento no tema a ser tratado,

formulação de um tópico inicial, que desencadeou o discurso e formulação

de questões exmanentes, ou seja, de interesse do pesquisador. Essas

questões foram traduzidas, posteriormente, em questões imanentes, ou seja,

que emergiram do discurso do entrevistado.

2) Iniciação – foi explicado a cada entrevistado o contexto da investigação,

solicitada sua autorização para a gravação da entrevista e explicado o

desenvolvimento da técnica. Em seguida, foi apresentado o tópico inicial,

de forma que não induzisse o informante a tomar posições prévias,

favoráveis ou contrárias ao interesse da pesquisadora. Essa apresentação foi

feita de maneira a permitir que o informante discursasse longamente e

apresentasse uma retrospectiva histórica sobre o fenômeno, chegando aos

dias atuais.

3) Narração central – a narração não foi interrompida até que os informantes

dessem sinais claros de que sua história estava finalizada (‘coda’). Durante

a narrativa não houve comunicação entre entrevistador e entrevistado, senão

por sinais de encorajamento. Foram anotadas, durante essa fala, questões

para a próxima fase da entrevista. Essa fase foi gravada.

4) Questionamento – ao final da narração foram formuladas algumas questões

exmanentes transformadas em imanentes pela fala do entrevistado. Essas

questões foram sempre do tipo ‘como?’ e nunca do tipo ‘por quê?’, uma vez

que elas não deveriam trazer justificativas, mas a leitura do fenômeno

estudado. Não foram apontadas aos entrevistados as eventuais contradições

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presentes nas falas, somente foram registradas para análise. Essa fase

também foi gravada.

5) Fala conclusiva – Foram as últimas falas das entrevistas e não foram

gravadas. Nessa fase os entrevistados responderam perguntas do tipo ‘por

quê?’ e foram feitas observações importantes tanto sobre aspectos do

fenômeno como da pertinência da técnica e da credibilidade que pode ser

atribuída às respostas. Para poder analisar essas particularidades essa fase

foi registrada em um diário de campo.

6) Transcrição – todas as entrevistas foram digitadas. A perfeição na

transcrição condiciona o sucesso ou não da aplicação da técnica.

7) Análise do material coletado – embora existam outras técnicas para a

realização da análise dos dados, consideramos particularmente aplicável

nesse trabalho a análise de conteúdo: trabalho de construção de um

referencial de codificação por meio de redução do texto qualitativo. A partir

dessa organização são criadas categorias com base nos dados das

entrevistas. Essa categorização em contato com as categorias prévias do

investigador produz como resultado, um novo conhecimento sobre o

fenômeno investigado, que apresentamos nos capítulos seguintes.

Dado o caráter da coleta de dados, os dados coletados não podem ser considerados

verdadeiros ou falsos, mas a expressão de um ponto de vista num determinado tempo e espaço

que exige na sua análise, uma grande contextualização. Para tanto, é necessário que a análise

seja realizada com elementos que possam dar sentido a esse material. Para tanto, valemo-nos,

em especial, de princípios presentes nas teorias críticas de currículo.

Segundo Silva (2002), as teorias críticas de currículo dizem respeito a uma produção

intelectual sobre a Escola iniciada no final dos anos sessenta, com forte conotação política e

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com influência do marxismo. Aponta como representantes com maior expressividade:

Bourdieu, Baudelot e Establet, Althusser, Bowles e Gintis; Michael Young, Michael Apple,

William Pinar , Henry Giroux.

As teorias críticas representaram, segundo o autor, uma nova forma de conceber e

analisar a educação e são indispensáveis para a análise na perspectiva de que a educação

trabalha pela reprodução da organização da sociedade. Como exemplo, aponta o pensamento

de Bourdieu e Passeron acerca da reprodução cultural assumida pela escola.

A centralidade da teoria crítica está situada, segundo Silva (2002) no sujeito crítico,

com condições de analisar e transformar a sociedade, desde que munido com as armas da

sociologia crítica.

Além de alguns outros autores, indicados na seqüência deste trabalho, foram

utilizadas, para a análise do material coletado, as concepções presentes nos estudos do teórico

espanhol Gimeno Sacristán, cuja obra se mostrou importante para a eleição e para a

construção das categorias que permitiram a análise mais profunda do fenômeno estudado.

Para atingir os objetivos da pesquisa, que foi de analisar o impacto do desenho

curricular produzido pela Reforma da Educação Profissional, desenvolvida a partir da

promulgação do Decreto nº 2208/97 e, em especial, a possibilidade, ou não, a partir da ação

dos sujeitos da escola, do desenvolvimento de uma educação crítica, com caráter politécnico

e transformador, foram pensadas, inicialmente, em algumas categorias a partir das quais

pretendíamos analisar a fala dos professores e, assim, dimensionar melhor o cenário do

impacto da Reforma da Educação Profissional no CEFET-SP.

Numa primeira tentativa de análise dos dados coletados nas entrevistas, houve uma

seleção prévia de categorias, ligadas aos temas referentes à justificativa e objetivos da

Reforma. Entretanto, a conclusão da transcrição e análise das dezenove entrevistas

importou na eleição de novas categorias e subcategorias que serão apresentadas no capítulo

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seguinte, que trata da análise do conteúdo dessas entrevistas. Essas categorias de análise,

ainda que apresentem características próprias não têm forma monolítica, pois se

interpenetram e se completam.

No que diz respeito à técnica empregada para a coleta de dados, buscamos estruturar

um roteiro de orientação para as entrevistas2 que levasse os professores a responderem ao

questionamento feito por Ramos (2004): o currículo de formação profissional instituído pela

Reforma implantada a partir dos anos noventa, se direciona mais para o trabalho como

princípio ou o centraliza como contexto, tendo em vista ainda que, mesmo sob o caráter de

princípio educativo, o trabalho pode ser visto sob a perspectiva do trabalhador ou do capital?

Para a autora,

[ ] isso exige que se distinga criticamente o trabalho humano em si, por meio do qual o homem transforma a natureza e se relaciona com os outros homens para a produção de sua própria existência – portanto como categoria ontológica da práxis humana -, do trabalho assalariado, forma específica da produção e da existência humana sob o capitalismo, portanto como categoria econômica da práxis produtiva. (p.42).

Apple (2001) analisando o caráter pragmático que tem sido atribuído ao ensino pelas

reformas curriculares, aponta para o perigo desse tipo de educação romper completamente

com a possibilidade de uma formação crítica. Segundo o autor, que toma por bases algumas

das proposições de John Dewey, a educação deveria incluir:

[ ] instrução sobre o background histórico das condições atuais; formação em ciência que favoreça a inteligência e a iniciativa no lidar com materiais e meios de produção; o estudo da economia, civismo e política para colocar o futuro trabalhador em contato com os problemas diários e os vários métodos sugeridos para a sua superação. (Dewey, apud Apple, 2001, p.157).

Dessa forma, destaca que: A prática, então, nunca pode ser divorciada de uma visão

histórica, ética e política, sob pena de se perder algo no processo. E a escolaridade não

deveria nunca, portanto, ser vista simplesmente como um treinamento para o atendimento

das necessidades das indústrias. (p.157)

2 O roteiro utilizado para as entrevista está no anexo I deste documento.

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Julgamos que a possibilidade da imersão na fala dos professores de elementos que

indicassem o caráter da ênfase curricular que se desenvolve hoje na Escola se daria a partir de

questões próprias do trabalho docente, tais como o tipo de conhecimento ministrado nos

cursos, se de base científica ou essencialmente práticos, assim como, quais preocupações, em

relação aos alunos, povoam as suas mentes e corações quando preparam e desenvolvem seu

trabalho.

A segunda questão que julgamos deveria estar contida nos dados coletados, essencial

para o desvelamento do sentido em que o CEFET-SP está desenvolvendo seu trabalho, diz

respeito à visão dos professores sobre a possibilidade reconstrutiva pelo trabalho da escola e,

particularmente, na função docente.

Nesse sentido manifesta-se Sacristán (2001):

Na perspectiva de reconstrução social, agrupam-se aquelas posições que, com matizes diferentes, concebem o ensino como uma atividade crítica, uma prática social saturada de opções de caráter ético, na qual os valores que presidem sua intencionalidade devem ser traduzidos em princípios de procedimentos que dirijam e que se realizem ao longo de todo o processo de ensino-aprendizagem. O professor é considerado um profissional autônomo que reflete criticamente sobre a prática cotidiana para compreender tanto as características dos processos de ensino-aprendizagem quanto do contexto em que o ensino ocorre. (p.373).

Para tanto, julgamos essencial que o roteiro da entrevista apresentado aos professores

suscitasse, em suas falas, certo posicionamento sobre os condicionantes trazidos pela

Reforma, a avaliação deles sobre esses condicionantes e, se julgam possível a superação das

prescrições legais por meio do trabalho realizado no cotidiano da Escola, particularmente pela

ação dos próprios professores.

Um último aspecto que deveria ser avaliado pela fala dos professores diz respeito às

expectativas dos alunos em relação a sua formação, ou seja, o desvelamento do impulso que

os leva para essa Escola e, em que medida ela representa, de fato, para eles, dada a conjuntura

econômica, uma possibilidade de melhoria das condições de acesso ao emprego e renda,

assim como o retorno ao processo de escolarização formal.

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A tabela abaixo traz o perfil dos sujeitos entrevistados:

Tabela 1 – Perfil dos professores entrevistados

Como pode ser observada, a amostra se caracteriza por professores do sexo masculino,

com mais de quarenta anos e mais de dez anos de atuação na Escola, portanto com percurso

anterior à edição da Reforma e pertencentes às diversas áreas e unidades em funcionamento

do CEFET-SP.

A partir da fala dos sujeitos acima, que representam o corpo de professores da Escola,

cuja trajetória inclui o trabalho com o currículo anterior e posterior à Reforma, foi possível

construir a compreensão e avaliação deles sobre a Reforma, assim como proceder a uma

síntese interpretativa desse conteúdo, por meio de sua contextualização e sob as lentes das

teorias que sustentam esse trabalho.

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CAPÍTULO 3. BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO SECUNDÁRIA BRASILEIRA

Em um estado perfeitamente governado [...] os cidadãos não devem exercer as artes mecânicas e nem as profissões mercantis, porque esse gênero de vida tem qualquer coisa de vil, e é contrário à virtude. É preciso mesmo, para que sejam verdadeiramente cidadãos, que eles não se façam lavradores, porque o descanso lhes é necessário para fazer a virtude em sua alma, e para executar os deveres civis. (Aristóteles, apud Cunha, 2005a, p. 9).

A proposta deste capítulo é apresentar um resumo da história da Educação secundária

no Brasil, especialmente da Educação Profissional . Na busca de uma forma de periodização

da educação brasileira, partimos do princípio de que não há compreensão possível dos

fenômenos sem que estejam situados historicamente, considerados seus aspectos econômicos,

políticos e sociais e que é necessário buscar, com as lentes dos macros condicionantes, as

vicissitudes particulares a esses fenômenos, no caso específico, o desenvolvimento da

educação secundária brasileira e seu viés profissionalizante.

Saviani (2004), aponta que há sempre grande dificuldade em estabelecer uma

periodização para os fenômenos históricos que se pretende estudar, pois esse trabalho exige

que sejam feitos alguns recortes, sempre definidos pelo foco da análise, ou seja, pelo estudo

do movimento próprio do objeto ou pelo impacto que ele sofre mediante os movimentos

externos.

Considerando o caso específico da educação brasileira, o autor aponta que,

historicamente, essa periodização se organiza ora por parâmetros políticos segundo os quais

se diferencia a educação em cada um dos macros períodos históricos: Império, Colônia e

República ora por critérios econômicos, caracterizando-a, via de regra, em três períodos: ‘agro

exportador dependente’, ‘nacional desenvolvimentista de industrialização com base na

substituição das importações’ e ‘internacionalização do mercado interno’. Enfatiza que,

embora a análise sob o aspecto econômico represente uma resposta às críticas feitas sobre

aquelas que privilegiam os aspectos políticos, as duas formas têm como foco central o

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movimento externo à Educação. Entretanto, indica que está em curso uma nova tendência:

periodizar a educação brasileira tendo como referência aspectos internos.

Na construção desse trabalho buscamos tomar o caminho proposto por

Saviani(2004), ou seja, levar em consideração, além dos macros condicionamentos, os

aspectos internos desse processo histórico.

A proposta de periodização contida em Saviani (2004) divide nossa história

educacional em duas etapas. A primeira etapa denomina-se “preliminar” e é subdividida em

três períodos: de 1549 a 1756, correspondente à educação religiosa sob o domínio dos padres

jesuítas, de 1759 a 1827, a Reforma Pombalina, e de 1827 a 1890, em que há uma tentativa de

organização da educação pública, sob a tutela imperial.

A segunda etapa denomina-se “história da escola pública propriamente dita” e

subdivide-se em três períodos: de 1890 a 1931 quando ocorre a implantação progressiva nos

estados de escolas primárias graduadas e formação de professores (escolas normais), de 1931

a 1961, com o movimento escolanovista, as reformas Capanema e Francisco de Campos e

promulgação da primeira LDB e, finalmente, de 1961 a 1996, período entre a primeira e a

segunda LDB, ou seja, até os anos recentes de nossa história.

Com a divisão acima indicada, buscamos apresentar, neste trabalho, a periodização da

educação secundária brasileira e a trajetória do CEFET-SP, foco do nosso trabalho, porém

com destaque a partir do segundo período da segunda fase, ou seja, a partir dos anos trinta,

quando ela se estabelece mais regularmente como política pública.

Ressaltamos que para essa tentativa de construir uma historização da educação,

concorreram diversos autores que procuram mostrar o movimento da educação brasileira,

particularmente o próprio Saviani(2004). Entretanto, como já assinalamos essa construção não

pôde prescindir da análise dos movimentos político-econômicos que determinaram as

alterações nas propostas educativas e, para tanto, nos valemos entre outros, de Cunha (2000,

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2005a, 2005b) que cremos terem contribuído de forma especial para o desvelamento dos

fatores condicionantes da construção da escola brasileira, assim como para a percepção do

movimento que se dá na vinculação entre educação e trabalho.

3.1. Do descobrimento à República (1500 a 1890): ‘escolas-quartel’ e ‘escolas-asilo’.

A forma como a educação para o trabalho se estabelece nas sociedades tem relação

direta como o trabalho é compreendido e assumido. Segundo Cunha (2005a), embora as

dimensões do pensar e do fazer, em algumas épocas, tais como na Grécia e Roma antigas,

não tenham sido tratadas de forma dissociada, as alterações de ordem político-social, com

destaque para o escravagismo, alteraram essa ordem especialmente amparadas no ideário

filosófico de separação entre contemplação e ação. Essa forma de pensamento é que invadiu

as sociedades modernas, especialmente, as ocidentais e também o modelo escolar.

Saviani (2004) indica que desde a chegada dos jesuítas ao Brasil, em 1549, até a

expulsão da ordem pela Coroa Portuguesa, em 1759, a educação brasileira viveu sob a égide

da formação religiosa, ainda que subsidiada com recursos da monarquia. Caracteriza esse

período como de uma ‘educação pública religiosa’, porém com condicionantes de organização

e recursos que a mantinham sob o domínio privado dos jesuítas. A primeira tentativa de

estatização da educação no Brasil ocorre com a implantação das ‘Aulas Régias’, instituídas

durante o período pombalino, de 1759 a 1827, pelas quais os professores, pagos pela Coroa

Portuguesa, reuniam em suas casas os alunos para ensiná-los seguindo as diretrizes

curriculares do Estado Português.

No que se refere às formas de profissionalização, essas se restringiam, inicialmente, ao

trabalho realizado nos conventos dos jesuítas e, posteriormente, às corporações de ofício,

entidades de origem no Império Romano que reuniam e regulavam os ofícios e que, embora

em número muito reduzido, uma vez que a maioria das atividades manuais eram realizadas

por escravos, também se estabeleceram no Brasil Colônia.

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Para Saviani (2004), proclamada a Independência, as escolas ficaram sob

responsabilidade das províncias e foram criadas algumas regulamentações para a sua

organização e funcionamento, o que conferiu à Educação brasileira um sentido público.

Entretanto, não houve a instituição de uma escola nacional e nem mesmo de espaços escolares

públicos uma vez que as aulas continuaram ocorrendo na forma de aulas régias ministradas

nas casas dos professores.

Portanto, na fase denominada como ‘antecedentes’, a principal diferenciação

assinalada entre os dois períodos diz respeito ao caráter de maior intervenção do poder

público, no caso a Coroa Portuguesa e depois o Império, na organização escolar. Entretanto,

não se pode registrar que tenha existido, nessa etapa, preocupação com o caráter de extensão

educacional a toda população.

A progressiva eliminação do poder das corporações de ofício fez surgir as primeiras

iniciativas públicas de profissionalização manufatureira no Brasil, que se desenvolveram

durante o período do Império. Essas iniciativas tiveram duas marcas: terem sido criadas

dentro dos quartéis militares e/ou se caracterizarem como instituições de caráter filantrópico,

destinadas ao atendimento dos marginalizados e desvalidos da sorte. A essas ‘escolas-quartel’,

as Companhias de Artífices, ou ‘escolas-asilo’, geralmente instituições religiosas, foram

adicionadas, posteriormente, outras iniciativas, tais como a organização de cursos de

aprendizes na Academia de Belas-Artes e o surgimento dos liceus de artes e ofícios.

Uma outra tentativa de profissionalização desenvolvida durante o Império, e que

também possuía caráter de organização não-estatal, como o Liceu de Artes e Ofícios, foi

implantada pela Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional que, entre outras atividades,

fazia a tradução de revistas estrangeiras, importava máquinas e propôs-se a desenvolver

educação para formação de trabalhadores. A primeira iniciativa foi de criação de uma escola

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noturna para a instrução primária de adultos para que os alunos egressos dela pudessem

freqüentar, no futuro, uma escola de ofícios manufatureiros.

Cunha (2005a) expõe que a forma como a educação foi propagada no Brasil Colônia e

nos tempos do Império tem suas raízes em duas correntes do pensamento europeu, cujos

ideólogos eram constantemente visitados, por meio de suas leituras, pelos intelectuais

brasileiros. Uma dessas correntes defende a manutenção da ignorância das massas como

condição para o seu controle. Por outro lado, os ideólogos do progresso viam na Educação a

condição para o desenvolvimento da produção industrial e o progresso.

Como afirma o autor, não obstante uma grande efervescência de idéias sobre a

educação para o trabalho tenha sido registrada no período Imperial, o resultado é que, assim

como não se concretizaram as condições para a escolarização da população brasileira, a

profissionalização muito pouco progrediu.

Considerando-se que as atividades de grande impacto econômico nesse período

demandavam uma mão-de-obra que não precisava dispor senão das próprias mãos, pois nosso

país estava distante dos movimentos da Revolução Industrial, e eram incipientes as

necessidades de especialização, não havia por que pensar na escola para o povo senão como

formadora dos poucos especialistas requeridos, ou como forma de contenção dos problemas

sociais por meio da assistência, algumas vezes aliada à preparação para trabalho, sem uma

perspectiva de avanço econômico e social para o país.

3.2. A República Velha (1889 a 1930) e o movimento de construção da escola pública

redentora: ‘oficina escola’ e ‘escola-oficina’.

O estudo do primeiro período da segunda etapa da historiografia definida por

Saviani(2004), compreendido entre 1889 e 1931, a Primeira República, possibilita uma

compreensão da forma lenta como a educação foi se desenvolvendo, assim como o

descompasso desse desenvolvimento em relação ao ideário republicano. Ressalte-se ainda o

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papel do estado de São Paulo como precursor de um modelo escolar que buscava converter

em realidade o pensamento republicano.

Segundo Carvalho (2003), o grande lema republicano se convertia, entre os

intelectuais na formação do povo brasileiro nos moldes preconizados pela República, ou seja,

capaz de dirigir a si mesmo, “self-government”, e capaz de tornar o Brasil uma nação em que

o desenvolvimento levasse ao progresso dentro da ordem republicana. Porém, a caracterização

da nossa população deixava essa proposição muito distante e para corrigir esse problema

ressaltava-se o papel redentor da educação.

Mas, para a autora, os primeiros anos da República não fizeram florescer a educação

na medida em que julgavam necessário os intelectuais. Para esses, somente ela poderia mudar

a formação social do Brasil, profundamente marcada pelo vício da ociosidade, pelo

despreparo para o trabalho, herança do escravismo, e ainda pelo espírito anárquico sobretudo

entre os imigrantes operários.

Também Saviani (2004) aponta a falta de sintonia entre o ideário educacional

republicano e as ações de desenvolvimento da educação, pois, se a Educação do povo

brasileiro era apontada como um dos pilares da República não havia no poder central a

responsabilidade direta com ela, cabendo-lhe somente a tarefa de difusão do ensino para todo

o país. A responsabilidade pela criação e manutenção das escolas primárias se mantinha

atribuída aos estados da federação, seguindo o modelo de descentralização praticado nos

tempos imperiais.

Pode-se concluir que passada a primeira década de implantação da República a

educação republicana não havia progredido, quer seja no modelo de centralização ou na

quantidade de oferta, o que se constituiria, segundo os intelectuais em uma condição sine quo

non para a instauração do país sonhado pelas forças republicanas.

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Não obstante todas as dificuldades para a instauração da educação republicana em

todo o País, esse movimento se destaca no estado de São Paulo. Carvalho (2003) aponta que

nele a educação foi eleita como referência para a instauração da ordem e do progresso

republicanos e que suas escolas, inauguradas na República, foram apresentadas como templo

da laicidade e da visibilidade da qual sairiam os que conhecem e que, conhecendo, seriam

vencedores.

A Reforma Paulista, implantada legalmente em 1892, teve como marcas principais a

substituição das escolas primárias isoladas pelos grupos escolares e a ênfase nas questões de

metodologia e didática. Em 1890, Caetano de Campos cria uma Escola-Modelo anexa à

Escola Normal de São Paulo para que pudesse servir como laboratório pedagógico para a

formação e qualificação dos professores.

No que diz respeito à estruturação das escolas, os grupos escolares foram a solução

arquitetônica e organizacional para a implementação de um projeto educativo com base nos

ideais republicanos de valorização da instrução, uma vez que se destacavam na paisagem das

cidades em que foram construídos. Por outro lado, a seriação compreendia o princípio de

progressividade presente nas discussões pedagógicas, recurso que não se aplicava nas escolas

isoladas.

Para o cumprimento da etapa preliminar da educação foi definido, pelo Regulamento

da Instrução Pública de 1893, um tempo de quatro anos de escolaridade que, pela organização

dos grupos escolares, compreendia quatro séries. Essa organização, da seriação, importava

numa grande seleção dos que tinham condições de continuidade escolar e gerava grandes

índices de reprovação. Portanto tratava-se de um modelo de ensino que excluía dos seus

bancos, tanto pelas dificuldades de acesso como pela sua organização interna, as populações

menos favorecidas e privilegiava a formação de uma elite escolarizada. Não havia a

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preocupação das elites dirigentes com a educação das massas, ou mesmo com a simples

alfabetização da população em geral.

A questão da necessidade de alfabetização das massas surge na Reforma de 1920, com

Sampaio Dória, que propunha a redução do tempo escolar de quatro para dois anos, o que

permitiria ao Estado, com os mesmos recursos, dobrar o atendimento escolar. Essa solução

não chegou a ser implementada, tendo sido duramente criticada.

Ainda que tenham ocorrido grandes avanços na educação do estado de São Paulo na

Primeira República, não foram geradas as condições para a implantação integral da Reforma

proposta, uma vez que muitas das definições legais não se consolidaram plenamente,

especialmente no que se refere à atuação efetiva dos departamentos burocráticos de inspeção,

como o Conselho Superior de Instrução Pública, a Diretoria Geral e os inspetores de distrito.

Mas, como aponta Saviani (2004), ela tornou-se referência para a organização escolar no

Brasil.

Zotti (2004) expõe que, embora tenham ocorrido iniciativas educacionais no início da

República, entre elas a promulgação da Lei Orgânica do Ensino Primário que se constituiu em

uma iniciativa concreta por parte do Governo Federal para traçar diretrizes nacionais para a

educação, a maior parte dessas ações tiveram como resultado uma grande produção de

discussões relevantes e de projetos isolados sem solução de continuidade uma vez que

estavam à mercê das políticas estaduais. (p.114).

Cunha (2005b) aponta que a instituição da República favoreceu o fortalecimento de

grupos econômicos, em especial no estado de São Paulo, cuja receita estava vinculada ao

modelo agrário-exportador. Entretanto, as medidas que buscavam melhorar as condições para

a produção agrícola, como a construção de estradas de ferro, impulsionaram também a

industrialização, a conseqüente urbanização e o surgimento de operários tanto nas fábricas

como nas empresas públicas. Destaca, entretanto, que essa conformação social favoreceu os

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movimentos de contestação registrados no final do século XIX e início do século XX. Esses

movimentos que envolveram operários, estudantes, militares, etc., embora com diversas

motivações, mostravam mais o descontentamento da população com as condições precárias de

vida.

No bojo das discussões acerca da manutenção da ordem social, surgem idéias para

garantir ao país a ordem e o progresso, destacadamente, o desenvolvimento industrial e a

preparação de uma força de trabalho nacional. A formação de mão-de-obra especializada por

meio da preparação dos nacionais era dita como uma medida urgente para a contenção da

força insurgente do anarco-sindicalismo, com origem nos trabalhadores imigrantes.

O ensino profissional, considerado como o grande aliado do desenvolvimento e da

ordem do país, passou a ser discutido de forma mais acentuada, sendo então apresentados ao

Congresso Nacional muitos projetos para sua institucionalização, sendo aprovada em 1927

uma lei, de autoria de Fidelis Reis, que pretendia a obrigatoriedade desse ensino nas escolas

primárias mantidas pela União e no Colégio Pedro II.

Em paralelo às discussões travadas no Legislativo, havia na Maçonaria uma grande

movimentação pela educação. Embora o foco desse movimento não estivesse centrado no

ensino profissional, buscava-se uma forma de se conterem as revoltas insurgentes, assim

como tirar da Igreja Católica a supremacia sobre a educação. Cunha (2005b) mostra que os

maçons, ao contrário dos representantes da Igreja Católica, adotavam os princípios da

Revolução Francesa e incorporavam a ideologia burguesa sobre os conflitos que se sucediam.

Porém se não havia na Maçonaria uma defesa expressa ao ensino profissionalizante, o

ato mais significativo para esse ensino em todo o período republicano se deu por iniciativa de

um grande vulto dos quadros maçons: o Presidente Nilo Peçanha que, em 1908, criando as

escolas de aprendizes artífices em todos os estados brasileiros, e no Distrito Federal,

institucionalizou essa modalidade educacional pela União.

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Nem todas as escolas de aprendizes artífices prosperaram. Elas foram criadas por meio

de parcerias entre a União e os estados que nem sempre dispunham dos recursos necessários

para o seu funcionamento, e muitas delas funcionaram muito precariamente durante muito

tempo.

Por outro lado, em função da própria localização dessas escolas cuja implantação

decorreu muito mais de critérios políticos sem preocupação de que elas estivessem localizadas

em áreas com maior potencial de desenvolvimento econômico, muitas delas atuavam muito

mais como escolas primárias do que propriamente profissionalizante. Uma das dificuldades

para o funcionamento dessas escolas residia na falta de professores, pois em geral, aqueles

que tinham preparo pedagógico não dispunham de conhecimentos técnicos, sendo a recíproca

verdadeira. Outra dificuldade era de ordem curricular, com grandes diversidades de

orientação.

Analisando o período de 1910 a 1942, Cunha (2005b) assinala que o resultado dessas

instituições, considerando-se o número de alunos concluintes, mostra que o maior

aproveitamento se deu em Minas Gerais, com 10,5% dos alunos formados. Muitas delas

ficaram muitos anos sem que nenhum aluno lograsse a conclusão de seu curso, como é o caso

da escola de São Paulo, no ano de 1937. No tocante ao número de matrículas, embora essas

escolas correspondessem a 1/8 dos estabelecimentos de ensino profissionalizante do país,

considerando-se os graus elementar e médio, elas possuíam apenas 1/3 dos alunos.

São Paulo foi sem dúvida também uma grande referência para a educação profissional

nos tempos da Primeira República. Nele se desenvolveram significativas experiências como o

Liceu de Artes e Ofícios, as escolas ferroviárias e a rede estadual de escolas profissionais. O

Liceu de Artes e Ofícios adotou, para a formação dos alunos, uma metodologia denominada

oficina-escola. Nesse modelo a escola atuava como um empreendimento industrial: recebia

encomendas, realizava o trabalho, que se constituía na principal forma de aprendizagem dos

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alunos, complementado com aulas de caráter formativo geral e, destacadamente, pelo

Desenho Técnico

Ao modelo de oficina-escola havia certa oposição, uma vez que seus princípios e o

próprio gerenciamento continham algumas dificuldades. Havia ainda a contraposição ao

modelo praticado nas outras escolas, em geral, escola-oficina. Mas nenhum dos modelos

obteve mais êxito do que aquele praticado a partir da criação, no próprio Liceu de Artes e

Ofícios, da Escola Profissional Mecânica: a aplicação do taylorismo como método de

organização do ensino profissional, por meio das chamadas séries metódicas. Outra

diferenciação marcante no modelo escolar se deu com a alteração dos critérios de ingresso.

Abandonados os critérios de pobreza e marginalidade como condicionantes para admissão dos

alunos, passou-se à utilização da Psicotécnica com aplicação de testes que pudessem medir a

vocação dos aprendizes para determinada profissão, assim como a sua capacidade intelectual

de assimilar os ensinamentos e as técnicas necessários.

Conforme assinalam Moraes & Ferretti (1999), os testes de aptidão também passaram

a ser utilizados para ingresso no Liceu de São Paulo, deixando de lado os critérios de pobreza.

Castro (1994), assim se refere à metodologia das séries metódicas:

[ ] Com ela passamos de uma lógica dedutiva abstrata para uma lógica mais concreta, que parece mais acessível áqueles menos acostumados com o pensamento abstrato. Na metodologia.[ ] o texto escrito é um mero complemento ou quase uma coleção de lembretes. As séries metódicas e todos os seus procedimentos antecedentes estão apoiados em um conjunto de exercícios práticos [ ] os paradigmas da física passam das mãos para a cabeça. Inacessível em sua linguagem tradicional, a ciência é absorvida por conta de observar e descrever conjuntos e procedimentos pré-organizados. (p.163)

Destaca-se como importante movimento pela profissionalização a criação pelo Estado

de São Paulo de uma rede de escolas profissionalizantes que se situaram na capital e no

interior. Essa iniciativa se deu em paralelo à criação, pela União, das escolas de aprendizes e

artífices e foi se estendendo de forma que, ao final dos anos vinte, já contavam em número de

oito unidades, chegando a dez em 1937.

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Com a Revolução de 1930 a educação brasileira passa a ter um caráter mais nacional.

Inicia-se aí o segundo período da segunda etapa definida por Saviani (2004) e que se estende

até a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1961.

3.2. A educação popular para as fábricas (1930 a 1961): entre as idéias de Getúlio

Vargas e Anísio Teixeira

Se durante a Primeira República não houve sucesso nas tentativas de envolvimento do

governo central na propagação do ensino público, essa situação se reverte de pronto com o

governo Vargas que deu os primeiros passos no sentido do estabelecimento de um sistema

nacional de educação. A educação proposta no período em questão marcou toda a organização

escolar brasileira no que diz respeito especialmente ao ideário da escola pública, laica e

gratuita e com função de reconstruir a sociedade. Esse ideário se apresenta no Manifesto dos

Pioneiros da Educação Nova, um documento que sintetizou toda a discussão político-

pedagógica presente na ABE (Associação Brasileira de Educação), criada em 1924. Além de

trazer questões de ordem pedagógica vinculadas ao movimento escolanovista, representou

uma posição política em defesa da escola pública, idéias que vinham sendo gestadas desde

1920, mas que puderam ser claramente externadas pela abertura dada no início do governo

Vargas. (SAVIANI, 2004).

Para Zotti(2004) nos primeiros anos da década de 30 do século XX o Brasil vivia sob

um modelo econômico agro-exportador. Nesse cenário há total desinteresse do governo com a

educação do povo. (p.114). Mas, a crise no modelo econômico desencadeada no final dos

anos de 1920 e a necessidade de alteração de uma economia agrícola para o processo de

industrialização que levaria à substituição das importações fez com que fossem pensadas e

desenvolvidas ações que resultassem na formação de mão-de-obra necessária para a produção

industrial e, ao mesmo tempo, para consolidação dos ideais da República.

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A forma de escolarização da povo se estabelece num jogo de contrários: de um lado a

igreja católica com os ideais da escola tradicional e religiosa e, de outro, os educadores

liberais, defensores da Escola Nova e da educação pública e laica ainda que marcada pela

intenção de atender aos novos requisitos do mercado.

Romanelli (apud Zotti, 2004) afirma que a legislação educacional da época mostra que

houve um consenso entre as duas vertentes da educação das massas. Mas que esse movimento

fez com que o Estado tomasse as rédeas do controle sobre a Educação Nacional.

Ainda que Vargas tivesse certo compromisso em ouvir os ideólogos da Escola Nova

essa situação não se fez presente quando, em 1931, Francisco Campos assume o Ministério da

Instrução e Saúde Pública e realiza uma reforma educacional na qual não há participação

daqueles intelectuais.

Com a reforma Francisco Campos, em 1931, entre outras medidas, foi criado o

Conselho Nacional de Educação e reorganizado o ensino secundário e profissional. Com ela

há um reforço na separação entre a escola para as elites dirigentes e a escola preparatória para

o trabalho, sendo estabelecidas diferenças significativas entre a escola secundária, que prepara

para a ida ao ensino superior, e os diferentes tipos de escolas profissionalizantes que

formavam para a indústria, o comércio e o magistério primário. Os alunos dessas últimas só

poderiam candidatar-se ao ensino superior pela habilitação em curso complementar aos

estudos realizados nas escolas profissionais ou via exames feitos pelas escolas estaduais ou

pelo Colégio Pedro II.

Para Cunha (2000) no Estado Novo o Brasil encontrava-se sob uma orientação

político-econômica de substituição das importações e no ideário intervencionista estatal,

voltava-se para a aceleração do processo de industrialização e havia uma grande preocupação

com a formação da força de trabalho. Entretanto, nos seis primeiros anos do governo Vargas

não houve grandes medidas para a educação profissional, especialmente no que diz respeito à

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formação para a indústria. O que se pode notar é que ocorreu um aparelhamento do Estado

para as futuras ações.

Para o autor não havia no governo Vargas, propriamente, um projeto educativo, mas a

indicação de algumas medidas para atender à necessidade de melhoria do desempenho

educativo e, por conseguinte, da formação de uma sociedade que respondesse ao processo de

produção industrial. Entre elas destaca-se que o proletariado urbano e rural necessitava de

‘dispositivos tutelares’, entre os quais a educação e a instrução, particularmente as

ministradas pelas escolas técnico-industriais e agrárias. (CUNHA, 2000. p.18). Mas para

Manfredi (2002) havia na inspiração para a política educacional do Estado Novo, a mesma

adotada por Musssolini, ou seja, um ideário de separação entre as classes sociais, fortemente

marcada, no modelo educacional, pela separação entre vários tipos de escolas.

Zotti (2004) afirma que se a Constituição de 1934 estabeleceu o compromisso do

Estado com a educação pública e gratuita, há um retrocesso desse modelo em 1937, quando a

Carta Magna confere obrigatoriedade sobre a educação às famílias, deixando o Estado com

uma função subsidiária. Outra característica marcante da Constituição de 1937 é o

estabelecimento de um tipo de parceria entre o poder público e a iniciativa privada permitindo

assim que o sistema produtivo interferisse diretamente no tipo de educação que deveria ser

oferecida para formação dos trabalhadores.

Entretanto, no âmbito federal as políticas públicas se dirigiam ao acirramento da

divisão entre escolas de preparação para o trabalho e as que formavam as elites condutoras,

surgiram, na década de 30, iniciativas de contraponto ao modelo federal. Entre elas, destacam-

se a criação da Universidade de São Paulo, da Universidade do Distrito Federal e a criação,

por Anísio Teixeira, de escolas técnicas secundárias, no Município do Rio de Janeiro. Essas

escolas possuíam especificidades, entre elas, parte programática comum a vários cursos, quer

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fossem industriais ou comerciais e matérias de livre escolha. Essa iniciativa assinalava para o

ideário do seu idealizador: uma escola secundária não dualista.

Destaca-se ainda, nos anos de 1930 de século XX um grande salto na formação

docente quando a universidade passa a atender a formação de professores para o ensino

secundário, formação que não se dava nas escolas normais, formadoras de professores

primários. O modelo de profissionalização então proposto: bacharelado + licenciatura ainda

hoje impera no sistema escolar brasileiro.

A perseguição política varguista aos partidários da Aliança Renovadora Nacional tirou

Anísio Teixeira da cena político-educacional e, prevaleceu, na escola secundária a divisão

propugnada pelo governo federal, modelo solidificado pela Reforma Capanema e as leis

orgânicas de 1942.

A partir da Reforma Capanema, o ensino primário foi desdobrado em fundamental e

supletivo, sendo o segundo desenvolvido na metade do tempo do primeiro, dois anos, e

direcionado para jovens e adultos que não puderam estudar na idade própria. O Ensino Médio

se subdividiu em ginasial, com quatro anos, e colegial, com três. Horizontalmente foram

definidas três vertentes para o ensino nacional: o secundário, o profissional e o normal, sendo

este último mais próximo do secundário. Uma característica dessa organização é que somente

o ensino secundário conduzia a qualquer carreira superior, os demais somente permitiam o

acesso a cursos correspondentes.

A Lei Orgânica do Ensino Industrial, decretada em janeiro de 1942, representou, entre

outros aspectos, a secundarização do ensino profissional no Brasil. Não obstante a formação

do primeiro ciclo ainda tivesse um caráter de atendimento aos desvalidos da sorte, a formação

técnica se inseria numa perspectiva e atender mais diretamente aos novos postos de trabalho,

presentes na organização produtiva.

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O ensino profissional secundário passou a ser reconhecido como preparatório para o

ensino superior, desde que mantida a mesma carreira. Ou seja, técnicos em Mecânica só

podiam pleitear o ingresso em cursos superiores da área da Mecânica. Registre-se que os

cursos secundários profissionalizantes poderiam ser completados com um curso pedagógico,

com duração de um ano, formando assim os professores para as escolas profissionais.

Destaca Cunha (2000) que as escolas ferroviárias paulistas, que se consolidam durante

a Era Vargas, podem ser consideradas a mola propulsora da sistematização do ensino

profissional no nosso país. O modelo dessas escolas foi difundido em outros estados

brasileiros, entretanto, a adoção de uma política nacional e a sistematização desse ensino se

consolida com o projeto de industrialização propugnado pelo Estado Novo.

O autor mostra que, em paralelo ao encaminhamento de aprendizes ao Liceu, a Estrada

de Ferro Sorocabana criou o Serviço de Ensino e Seleção Profissional (SESP). A experiência

do SESP estendeu-se às outras ferrovias e foi incorporada pelo próprio Estado de São Paulo

que criou o CEFESP, organismo de apoio à formação ferroviária. Esse Centro foi constituído

com recursos públicos, porém com administração autônoma: dois delegados do governo

estadual e um de cada companhia dele participante. Muitos desses colaboradores do CEFESP

influenciaram a educação profissional brasileira e tiveram influência nas decisões dessa

instância, atuando no Ministério da Educação.

Além da questão metodológica e das regras para ingresso, as escolas ferroviárias

caracterizavam-se pelo seu direcionamento aos filhos dos ferroviários e pela formação

exclusiva para atendimento às ferrovias, diferenciando-se das escolas de aprendizes e artífices

que, via de regra, atendiam uma população marginalizada e estavam distantes das

necessidades específicas das empresas. Do modelo das escolas ferroviárias, complementado

com os do SESP/CEFESP, surge, em 1942, o SENAI que incorpora o CEFESP.

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Como afirma Cunha (2000), a institucionalização do SENAI se configurou em uma

batalha entre governo e empresários pois, em última instância, ela significou definir qual

setor seria responsável pela sustentação econômica da formação de mão-de-obra. Esse embate

se apresenta a partir da Constituição de 1937, que define as obrigações do Estado, das

empresas e dos sindicatos sobre a aprendizagem:

Art.129 [ ] O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais. É dever das indústrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera da sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo Poder Público. (http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Brazil/brazil37.html, acesso em 20/08/2007).

Na primeira tentativa governamental de organização desse sistema houve total

negativa do empresariado, o que levou à edição do Decreto Lei n°. 1.238/39, obrigando as

indústrias a profissionalizarem seus trabalhadores menores.

Discussões e versões de modificação do Decreto levaram a um modelo que congregou,

em partes, as disposições do governo e dos empresários e é criado, então, o SENAI, cujo

modelo final dá aos empresários o poder exigido pelo patronato paulista, mantendo, porém, a

ingerência do governo e participação das confederações menos representativas.

Segundo Cunha (2000) a instituição da aprendizagem industrial sistemática

configurou-se como um movimento contraditório. Proposta pelo empresariado ela só foi

assumida por eles por meio da ação ditatorial do governo Vargas. Mas, sem dúvida, o SENAI

representa, do ponto de vista político, a expressão clara do protecionismo do Estado Novo aos

setores privados que fossem compreendidos como indutores do desenvolvimento econômico,

entre os quais se sobressaía o meio industrial.

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Saviani (2004) indica que, consolidado o modelo escolar pensado pelo Estado Novo, o

sistema educacional brasileiro se caracterizou pela dualidade entre a escola propedêutica e

profissional. Porém, a formação profissional também apresentou uma separação interna,

passando a oferecer dois percursos diferenciados: o primeiro ciclo, com cursos de

aprendizagem, formava operários para funções com exigências de ordem mais manual, os do

segundo ciclo, com cursos técnicos, formava operários para as funções que exigiam formação

intelectual mais sofisticada.

Embora, do ponto de vista do modelo de ensino, se possa indicar que o segundo ciclo

se caracterizou por certa dimensão intelectual, mesmo nos ramos profissionais, o currículo

desenvolvido nas escolas definia para o secundário e para as escolas normais o papel de

formação das elites condutoras, caracterizando, dessa forma, um sistema educacional na justa

medida dos interesses das classes mais favorecidas.

Destaca que nesse segundo período, embora no que se refere à organização de um

sistema nacional de educação as ações tenham sido pontuais, e um tanto desagregadas, houve

significativa implantação do ideário renovador escolanovista, movimento que atingiu até

mesmo a educação religiosa ministrada nas escolas católicas. Representantes da pedagogia

nova ocuparam postos estatais importantes e isso permitiu ensaios e ações que levaram à

criação de instituições que, ainda hoje, são representativas no cenário educacional, tais como

a Universidade do Distrito Federal, o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos INEP, hoje

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais; a fundação da CAPES Comissão de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, o Centro Brasileiro de Pesquisas

Educacionais - CBPE, órgão subordinado ao INEP mas com unidades e atividades regionais.

Ferreira (sd), em seu estudo sobre o Centro Regional paulista, afirma que:

O trecho inicial do Decreto n.º 38.460, que criou o CBPE e os Centros Regionais,

estabelece que estes Centros deveriam “dotar o INEP de meios adequados à pesquisa

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educacional em toda a extensão do território brasileiro, para o melhor cumprimento de seus

objetivos fundamentais de estudo e aperfeiçoamento do magistério brasileiro, primário e

normal”(Centro, 1956. p. 151 apud Ferreira, sd, p. 3).

Mariani (1982) mostra a vinculação do INEP com os idealizadores da Escola Nova,

em especial Anísio Teixeira. A autora indica que ao assumir o Instituto, em 1952, ele se

propunha a direcionar suas pesquisas e estudos para descobrir o porquê do fracasso escolar e a

mostrar como a elite brasileira desprezava a educação para as massas.

A atuação do INEP-CBPE nas diretrizes da política educacional do governo João

Goulart fizeram com que ele fosse mal visto pelos governos pós-golpe de 1964. Como afirma

Saviani (2004) no final dos anos sessenta do século XX o modelo educacional renovador

mostra sinais de esgotamento; um desses sinais é o fechamento, em 1972, do Centro

Brasileiro de Pesquisas Educacionais e dos seus centros regionais.

Zotti (2004) expõe que, não obstante a educação tenha chegado à Constituição de 1946

com indicação de que fosse assumida pelo Estado e oferecida de forma gratuita. Ela vai se

tornando cada vez mais organizada de acordo com as indicações de caráter econômico. Nos

anos de 1956 a 1961, A política educacional adotada [...] segundo o plano de metas de JK,

atrelava a educação às necessidades do desenvolvimentismo, significando uma

supervalorização do ensino profissionalizante, não só no ensino médio, mas até mesmo o

primário teria de se obrigar a ‘educar para o trabalho. [...] (p.98).

A autora afirma ainda que o final dos anos 50 e início dos anos 60 se configura como

um tempo de tensão permanente entre propostas de democratização política e ações

econômicas que contrariam a possibilidade de diminuição da concentração de riqueza e,

assim, de maior participação de todos nos ganhos decorrentes do desenvolvimento industrial.

Essa contradição criou condições para a instauração do golpe de 1964 e a posterior

conciliação entre política e economia.

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3.3. Atualidades da educação brasileira: de 1961 aos dias atuais: a escola

(imediatamente) improdutiva é (mediatamente) produtiva.

Segundo Saviani (2004), se o período escolanovista foi fortemente marcado pelos

ideais iluministas, a educação iniciada a partir dos anos sessenta é marcada por uma

concepção mais produtivista, com base teórica na teoria do capital humano, cuja centralidade

está na racionalidade e na produtividade. Nesse sentido, nos anos sessenta do Século XX, a

educação é tomada como um bem de produção, a serviço do desenvolvimento econômico.

Tendo em vista que a justificativa do golpe militar, ocorrido no Brasil no ano de 1964,

era de continuidade da ordem socioeconômica, as reformas implantadas nos anos seguintes a

esse movimento objetivaram ajustar o ensino ao modelo político vigente. Assim foram

promulgadas as leis nº 5.540/68 e nº 5.692/71 que modificaram, respectivamente, o ensino

superior e a educação básica. No que se refere à educação básica foi definida uma estrutura de

oito anos para o ensino de primeiro grau e de três anos para o segundo grau, sendo o último

mantido compulsoriamente profissionalizante. No ensino superior, as modificações tiveram

como justificativa as reivindicações dos estudantes, sequiosos pelo acesso a esse nível de

ensino, e dos professores, que pediam o fim da cátedra universitária. Entretanto, o resultado

visível dessa reforma se deu pela expansão desordenada das faculdades isoladas privadas.

Com a Lei nº. 5.692/71 o currículo nacional passou a prever, a partir da segunda

metade do ensino de primeiro grau, uma base curricular nacional comum e uma parte

diversificada que deveria ser estreitada, em direção à profissionalização, à medida que

avançava a seriação.

O cenário da formação de técnicos implementada com a Lei nº. 5.692/71 contrastava

inteiramente com as exposições que buscavam a sua justificativa. Se, de fato, o ensino

técnico, especialmente o do ramo industrial e ministrado pelas escolas técnicas federais, era

considerado como de excelente qualidade, essa excelência era medida, especialmente, pelo

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destaque que os alunos tinham no ingresso e no desempenho em cursos superiores, ou seja,

pela função propedêutica desse ramo de ensino. Entretanto, dada a procura crescente por

vagas para o ensino superior, condicionou-se, politicamente, que a profissionalização

compulsória no Ensino Secundário seria a solução para refrear essa demanda.

Kuenzer (1999) aponta que a Reforma de 1971 consagrou-se também como uma

forma de ajuste econômico, num momento em que a etapa de desenvolvimento estava

marcada pela internacionalização e hegemonia do capital, assim como pela luta para

substituição das importações, apontando assim para um crescimento industrial e conseqüente

aumento significativo de força de trabalho técnica.

Se podemos afirmar que a propaganda da reforma não se concretizou, sobremaneira

nos sistemas estaduais pela falta de investimentos para que essas escolas pudessem alcançar o

nível das escolas técnicas federais, Kuenzer (1999) afirma que a expectativa frustrada do

milagre econômico foi fator fundamental para que, no ano de 1982, por meio da Lei de nº.

7.044, fosse revogada a compulsoriedade da profissionalização no ensino de segundo grau.

Um olhar sobre a revogação da compulsoriedade da profissionalização secundária

empreendida pela Lei nº. 7.044/82 possibilita tanto enxergar nela a retomada de um modelo

educacional mais amplo, quanto à retomada da dualidade desse nível de ensino, uma vez que,

mesmo revogada a prescrição da profissionalização, foi garantida a sua permanência.

Para Kuenzer (1999) o retorno da dualidade da educação secundária, em 1982,

significou a retomada do modelo de escolas propedêuticas para as elites e

profissionalizantes para os trabalhadores, com equivalência entre os dois modelos: Retornou

à cena a velha dualidade estrutural, mesmo porque, originada na estrutura de classes, não

pôde ser resolvida no âmbito do projeto político pedagógico escolar. (p.126)

Para Saviani (2004) chegamos aos anos oitenta com três postulados sobre a função

social da Escola: a educação está a serviço das forças produtivas sem as quais não há

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desenvolvimento, como se mostra na década de 60; ela não deveria atender aos ditames do

mercado, mas que está a seu serviço, anos 70; e, para finalizar, ela não é produtivista uma vez

que pode ser descartada pelo capital, como propõe Salm (1988).

Entretanto, pela análise de Frigoto (2001), pode ser compreendida qual é a relação

entre escola e capital, ou seja, que não é possível afirmar que essa instituição preste um

serviço imediato ao capital, uma formação que sirva na justa medida às necessidades das

empresas, porém toda a sua organização e configuração, inclusive pelo papel desempenhado

pelos professores, os intelectuais orgânicos, parafraseando Gramsci, está servindo de forma

mediata às demandas do capitalismo.

Para Saviani (2004), essa concepção produtivista de educação resistiu a todos seus

detratores ao longo dos anos de 1980 e avançou no bojo do neoliberalismo do final dos anos

de 1980 e 1990 do século XX. Nesse contexto se deu a postulação e aprovação da nova Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional surgida no Senado, que descartando a possibilidade

de um projeto educacional nacional, contida no projeto da Câmara dos Deputados, impõe à

educação brasileira um caráter de ajuste à produtividade necessária para a inserção da

economia do país em um mundo globalizado, sem nenhuma referência à possibilidade

transformadora da escola pela via da qualidade social.

Sem a pretensão de desqualificar a avaliação de Saviani (2004) sobre a atual Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional, consideramos importante destacar que, ainda que

ela, de fato, possa estar longe de uma proposta ideal para a educação brasileira, contém

elementos progressistas e que foram objetos de disputas entre diversos segmentos da

sociedade, sendo resultado da luta de educadores identificados com o ideário da escola

pública, gratuita, de qualidade e extensiva a todos, como é o caso da definição de educação

básica, abrangendo a escolaridade até o final do Ensino Médio.

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Mas, retornando aos condicionantes de caráter político-econômico que determinaram

as ações na área educacional nos anos noventa do século XX, destacamos a análise de Frigoto

(2001). Para ele, a acumulação sem precedentes de riquezas que levou à formação de impérios

econômicos produziu uma concentração de capital que determina sua exportação, uma vez

que não há espaço para sua aplicação somente nos países em que ele é gerado. Assim ele vai

sendo incrementado nos países subdesenvolvidos de uma maneira que cria uma dependência

econômica e política e que transforma os estados em articulador dos interesses

intercapitalistas. (p.94)

Cunha (2000) expõe que a análise da política governamental de Fernando Henrique

Cardoso, iniciado nesse cenário, no ano de 1995, permite afirmar que os condicionantes retro-

mencionados tiveram grande impacto nas reformas educativas, levadas a cabo durante os oito

anos seguintes. O modelo proposto e implementado via reformas educacionais destacava-se

pela vinculação direta e estreita da escola com os condicionantes macroeconômicos que

determinam uma maior escolarização como forma de manutenção ou aquisição de

competitividade. Nesse sentido, há toda uma orientação para o aumento do número de

matrículas no Ensino Médio, porém sem determinações de profissionalização, uma vez que o

modelo de produção exige competências amplas e não define possibilidades concretas de

empregabilidade. A educação técnica, embora também revestida de uma maior polivalência,

determinada pelos novos formatos de produção e geração de serviços, é tomada como

estratégica para a rápida conversão do cidadão escolarizado, já possuidor de amplas

competências adquiridas no Ensino Médio, em um trabalhador moldado para responder

rapidamente às sempre nascentes necessidades do capitalismo.

Em todas as ações relativas à educação profissional se destaca a exigência de que o

gerenciamento e custeio fossem feitos fora da esfera pública federal. A União construía e

equipava as escolas técnicas e todo o custeio e administração eram delegados,

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preferencialmente, às fundações de direito privado. Ou seja, a manutenção dessas escolas

caberia à comunidade local e/ou aos próprios alunos, uma vez que cinqüenta por cento das

matrículas poderiam ser cobradas pelas mantenedoras.

Para Cunha (2000) as propostas para a educação profissional acima indicadas,

implementadas pelos Ministérios da Educação e do Trabalho, de fato representaram o ideário

de dispor ao sistema produtivo mecanismos de adaptação rápida da mão-de-obra, com

modelos moldados pelos condicionantes tecnológicos e suas exigências de escolarização, sem

que houvesse, de fato, preocupação com a adoção de mecanismos que proporcionassem

recuperação de escolaridade da população.

Expõe o autor que mesmo antes da elaboração da Constituição de 1988, havia no

Brasil muita discussão acerca do modelo de ensino secundário, particularmente quanto à

profissionalização. Em linhas gerais, essas discussões tinham dois focos principais de defesa:

a aplicação da politecnia como princípio de organização da escola média e, por outro, o

acirramento em torno do não controle estatal e/ou da organização dos trabalhadores nos

sistemas de aprendizagem. No bojo dessas discussões, e em paralelo à reforma curricular que

estava em curso desde 1995, o governo federal amparado na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Profissional, decreta a forma de organização do ensino profissionalizante, tendo

como foco principal sua separação da educação geral.

Além da questão do elevado custo das escolas técnicas, notadamente as da rede

federal, o governo usa como argumento para essa separação, o caráter propedêutico do ensino

técnico ministrado nessas escolas, ou seja, toma como problema central a trajetória dos alunos

formados como técnicos, que procuram o ensino superior ao invés de se dedicarem às

carreiras de nível médio.

Sem localizar pesquisas que pudessem corroborar a justificativa de não

aproveitamento da profissão pelos técnicos de nível médio, Cunha (2000) apresenta como

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possíveis bases para as determinações do MEC as considerações feitas pelo Banco Mundial

sobre o Ensino Secundário Brasileiro em 1989, e os estudos dos economistas Cláudio de

Moura Castro e João Batista de Oliveira, também oriundos dos organismos internacionais de

financiamento, aos quais prestaram assessorias.

O autor mostra, entre as recomendações constantes no Relatório do Banco Mundial

sobre o Ensino Secundário Brasileiro, que se destaca a ‘melhoria da eqüidade’ entre as

escolas, uma vez que a diferença de custos entre as escolas públicas em geral e as escolas da

rede federal era muito grande e a população presente nessa rede, embora não fosse a mais

abastada do país, era constituída por alunos que já vinham tendo privilégios educacionais

desde o ensino fundamental, posto estarem em condições de vencerem a barreira de acesso a

essas escolas. Sugeria, então, que houvesse a adoção de três medidas voltadas para a correção

dessa distorção: compartilhamento de custos com os alunos, atração da população de baixa

renda para usufruírem das possibilidades de profissionalização dessas escolas e expansão das

matrículas na educação profissional mediante a adoção de parcerias que não implicassem,

necessariamente, na construção de novas unidades escolares pela União, reduzindo assim o

custo unitário desse sistema.

Se nas orientações políticas e determinações legais levadas a cabo durante o governo

Fernando Henrique Cardoso estão incorporadas grande parte das idéias de Castro e Oliveira,

também são visíveis nelas a incorporação das recomendações feitas pelo BID. Nesse sentido,

com a justificativa de que a educação profissional deveria ser tomada como uma modalidade

de ensino alternativa ao ensino superior, é encaminhado ao Congresso Nacional um projeto de

lei que recebeu a denominação de PL nº. 1.603/96.

Sem que tivesse ocorrida a tramitação integral desse Projeto de Lei, o Ministro da

Educação, considerando a abertura dada pela LDB, que tanto permitiu o entendimento de que

formação geral e técnica poderiam ser tomadas de forma integrada ou desarticulada, opta pelo

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segundo ponto, advoga pela separação radical entre elas e mata a possibilidade de discussão

desta temática com a retirada do projeto de lei e a promulgação do Decreto nº. 2.208/97.

Em linhas gerais, esse Decreto estabeleceu que a educação profissional se constituísse

em paralelo aos sistemas de educação geral e fosse organizada com três níveis próprios: o

nível básico, para qualificação de forma rápida, sem condicionantes de escolaridade, o nível

técnico, para oferecer habilitações profissionais como técnicos aos alunos matriculados ou

egressos do Ensino Médio, o nível tecnológico, destinado à formação de tecnólogos.

Para Manfredi (2002), a edição da reforma propugnada pelo Decreto 2208/97 mostrou

a vinculação direta do projeto educativo brasileiro com os interesses imediatos do capital e

com as recomendações dos organismos internacionais de financiamento, ficando distante da

defesa dos projetos geridos, de forma democrática, em diversos setores da sociedade civil.

Para a autora essa forma de organização escolar em que se estabelece a dualidade de

redes educativas para a educação secundária, está subjacente a busca de barateamento do

ensino e, ao mesmo tempo, uma forma de moldar a escola ao sistema econômico vigente.

Na perspectiva apontada por Manfredi (2002), podemos dizer que a educação média

regular generalista será menos onerosa e menos comprometida com a inserção social de seus

egressos, especialmente no que diz respeito à possibilidade de trabalho remunerado. Porém

será uma garantia de ocupação dos jovens que não têm possibilidade de emprego ou que

formam um grande contingente de trabalhadores desqualificados, aptos a qualquer tipo de

ocupação, seja formal ou informal, e a qualquer tipo de pagamento.

Nesse sentido, a escola assume, por um lado, o papel de contenção social e, por outro,

com a profissionalização restrita a camadas minoritárias da população que mantém a

possibilidade de acesso a um emprego formal, via profissionalização, ela atende aos interesses

imediatos do capital, sendo financiada pelo sistema produtivo, a quem responde diretamente.

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A escola secundária se mantém ainda, em sua versão mais elitizada, voltada ao

atendimento de uma minoria restrita que, dada sua inserção social privilegiada, transfere a

profissionalização para o ensino superior.

Como forma de financiamento da Reforma instituída pelo Decreto nº. 2.208/97, o

governo brasileiro cria, em 1996, o PROEP – Programa de Expansão da Educação

Profissional, cuja meta era de implantar e/ou readequar duzentos centros de educação

profissional, distribuídos entre a iniciativa privada e as redes federal e estaduais de ensino. Os

recursos do Programa foram obtidos por empréstimo do BID, complementados com recursos

do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT e recursos do Tesouro Nacional.

Para Cunha (2000), o PROEP não garantiu a possibilidade de publicização das escolas,

chegando somente a exigências de maior participação de empresários e trabalhadores, como

meia compensação, nos conselhos consultivos e deliberativos destas, assim como a

determinação de venda de cursos e implantação de outras formas de geração de recursos

próprios.

Entretanto, desonerando a União dos gastos de custeio e investimentos, ele foi

determinante na forma privatizante com a qual se deu a expansão das escolas

profissionalizantes: o segmento comunitário.

O Projeto Segmento Comunitário, teve por objetivo a criação de centros de formação

profissional por meio de parcerias entre prefeituras, estados, grupos da sociedade civil

organizados, para as quais o MEC contribuiria com a construção do prédio e aquisição de

equipamentos e que seriam gerenciadas por fundações de direito privado, pelas quais

poderiam ser obtidos recursos provenientes de diversas fontes e ainda do pagamento de até

cinqüenta por cento das matrículas.

Cunha (2000) destaca que, não obstante o modelo das escolas do Segmento

Comunitário possuírem origem e aproximações com as propostas dos centros públicos de

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formação profissional, defendidos pelas representações dos trabalhadores e mesmo pela

Secretaria de Formação Profissional do Ministério do Trabalho, elas se constituíram na versão

privatizada desse modelo. Para ele, as medidas de enfraquecimento das escolas federais

levadas a cabo no governo Fernando Henrique Cardoso tiveram como principal foco limitar o

acesso dos técnicos ao ensino superior. Ou seja, para o governo, as escolas técnicas deveriam

levar seus egressos para o mercado de trabalho e não ao ensino superior.

Para o autor, o governo desconsiderou o fato de que por questões corporativistas e

outras, o papel do técnico está sendo exercido cada vez mais por engenheiros e/ou outros

profissionais de nível superior. Dessa forma, não era o unicamente o nível sócio-econômico

dos alunos das escolas federais que os levava a buscarem a profissionalização em nível

superior, mas também a regulação do próprio mercado impunha a busca de carreiras desse

nível.

Outro destaque feito pelo autor diz respeito às considerações sobre o alto custo das

escolas federais serem sempre vinculadas a um caráter perdulário, sem uma análise que

permita enxergar que a diferenciação entre essas escolas e as outras escolas públicas,

especialmente das redes estaduais, se dá pela deteriorização dessas últimas.

Caso os investimentos nas redes estaduais pudessem alavancar o seu nível de

qualidade, no padrão das escolas federais, certamente o afluxo de alunos que buscam uma

educação média propedêutica seria melhor distribuído, garantindo ou até mesmo

selecionando, para a rede federal, aqueles que buscam uma profissionalização na escola

média.

Saviani (2004) aponta o fato de o Brasil, mesmo com todo o crescimento quantitativo

de matrículas registrado especialmente a partir da década de 30, ainda se mantém com

patamares significativos de repetência e de analfabetismo e considera como um dos fatores

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determinantes para essa situação a dificuldade em se estabelecer em nosso país um sistema

nacional de educação que possa, de fato, resolver os grandes problemas educacionais.

Destaca que no fechamento do longo século XX, a educação brasileira conta com as

soluções para sua problemática, sobejamente estudadas dentro das possibilidades de pesquisa

geradas com o avanço da pós-graduação brasileira. Entretanto, para ele, essa condição,

positiva, torna-se inócua frente à imposição das forças dominantes em manterem essas

soluções no nível do discurso e da teorização, sem que, de fato, sejam implementadas. E aí, no

embate entre as proposições de ordem macro e as soluções parciais, segundo o autor, reside o

legado negativo da educação brasileira.

As considerações de Saviani (2004) servem como lentes para a análise dos

procedimentos que vêm sendo tomados nesse momento pelo governo federal que, mesmo a

despeito das promessas de transformação da educação, não foi capaz de realizar, de fato, uma

reforma nesse sistema, e que em nome da defesa de soluções abrangentes que atendam às

populações desescolarizadas e sem preparação profissional, deixa de atuar no sentido de uma

modificação radical na estrutura do ensino.

Paro (1999) expõe que a escola sempre assumiu um papel de não contestação dos

modelos social e econômico vigentes e que essa função se explicita muito mais quando ela

passa a se organizar dentro de um modelo neoliberal, com fortes referências ao custo-

benefício de seus resultados e com o ideário de que preparar para o trabalho é preparar para

o mercado, ou seja, para o trabalho alienado. (p.113). Entretanto, para o autor, essa

condição da escola precisa ser revista para que ela assuma sua parte na transformação da

sociedade.

É preciso que se coloque no centro das discussões (e das práticas) a função educativa global da escola. Assim, se entendemos que a educação é atualização histórico-cultural dos indivíduos e se estamos comprometidos com a superação do estado geral de injustiça social que, em lugar do bem viver, reserva para a maioria o trabalho alienado, então é preciso que nossa escola concorra para a formação de cidadãos atualizados, capazes de

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participar politicamente, usufruindo daquilo que o homem histórico produziu... (p.113-114)

As orientações políticas atuais do Ministério da Educação de tratar igualmente

situações muito diferenciadas têm produzido iniciativas importantes como é o caso dos cursos

integrados para jovens e adultos, mas há no âmbito do Ministério proposições de um modelo

de escola secundária unitária, tal como já discutimos anteriormente em Fernandes (2006):

escola unitária, no sentido dado por Gramsci (1968): escola única inicial de cultura geral,

humanista, formativa, que equilibre equanimente o desenvolvimento da capacidade de

trabalhar manualmente (tecnicamente e industrialmente) e o desenvolvimento das

capacidades de trabalho intelectual. (p.118)

Esse é o sentido da promulgação do Decreto nº. 5154/2004 que permitiu o retorno da

integração entre educação geral e formação profissional no Ensino Médio brasileiro, modelo

que se encontra em fase de implantação em alguns estados da federação. Porém, se a

revogação do Decreto nº. 2208/07 e a promulgação de uma nova legislação que proporcione

o retorno do modelo de ensino integrado na educação secundária tenha sido um passo

importante, o fim da compulsoriedade se deu nos mesmos moldes da sua introdução, por meio

de um decreto, sem uma tomada de posição sobre a hegemonia desse tipo de formação e essa

ação do governo ainda está muito distante de uma audaz decisão de substituir o

protagonismo do mercado mundial capitalista pelo novo sujeito-mundo das maiorias [...].

(CHOMSKY, et al. 1999, p.263).

Tal como aponta Ciavatta et all, 2006, parece-nos primordial que sejam aliadas às

políticas de retomada do desenvolvimento do país ações que permitam aos sujeitos sociais,

representados nas mais diversas formas de organização, não simplesmente assumirem

posições sobre o modelo ideal para a escola secundária, mas, fundamentalmente, tematizarem

sobre para qual tipo de desenvolvimento a escola serve e qual parcela da sociedade ela

representa.

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CAPÍTULO 4. A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO CEFET-SP E SUA

CONFIGURAÇÃO ATUAL

[...] se torna necessário não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com indispensável preparo técnico intelectual, como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastará da ociosidade, escola do vício e do crime [...] (BRASIL, 1909 ).

Por um ato de Nilo Peçanha, a Escola de Aprendizes Artífices de São Paulo foi

criada em 19 de fevereiro de 1910 e instalada provisoriamente no bairro da Luz, sendo logo

depois transferida para a Avenida São João onde permaneceu até 1976.

D’Angelo (2000), indica que a Escola de Aprendizes Artífices de São Paulo se

desenvolveu de forma diferenciada em relação às suas “co-irmãs”, instaladas em outros

estados. Enquanto em outras unidades da rede federal as ações se voltavam aos desvalidos da

sorte, ela atendia filhos de operários, profissionais urbanos ou os próprios operários, nos

cursos noturnos e de desenho. (p.264)

Destaca a autora que a Escola surge dentro das propostas de contenção do movimento

anarquista. A ‘nacionalização’ da força de trabalho, além de substituir o ofício dos mestres

vindos do exterior, buscava refrear a influência política desses trabalhadores dentro e fora das

fábricas.

O decreto de criação das Escolas de Aprendizes Artífices de São Paulo (1909) ocorre dois anos após a greve geral de 1907, em São Paulo, e possivelmente a fundação da escola, em 1910, trazia para as elites paulistanas um alento no sentido de ajudar a nacionalizar os filhos de imigrantes e melhor condicionar essa força de trabalho, culturalmente diversa e agitada. (p.195).

Ainda que a Escola de Aprendizes Artífices de São Paulo já na primeira década de

funcionamento se voltasse aos ofícios relacionados com a Mecânica, Fundição e outros,

requeridos pelo incipiente processo de industrialização, ela é readequada, no final dos anos

vinte do século XX, no sentido de se dar a ela maior racionalidade e eficiência.

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Em 1937, a Escola de Artes e Ofícios de São Paulo denominou-se Liceu Industrial de

São Paulo e passou, nessa época, da jurisdição do Ministério da Agricultura para o da

Educação e Saúde Pública.

Moraes & Ferreti (1999) indicam que essa Escola, de fato, se tornou referência na

preparação de mão-de-obra operária, especialmente para atender às demandas de

profissionalização dos novos industriais, vindos das elites cafeeiras.

No final da década de 50 e início de 60 ocorreram algumas mudanças significativas na

estrutura do ensino técnico industrial: a autonomia das escolas federais que passaram a ter

personalidade jurídica e condições de gestão sobre suas propostas pedagógicas e recursos,

acompanhadas por conselhos compostos por representantes da indústria, do Conselho de

Engenharia e Arquitetura ou de Química, além de um professor da Faculdade de Engenharia

ou um técnico do MEC que, entre outras atribuições, escolhia o Diretor da Escola e aprovava

a prestação de contas da instituição.

Essa autonomia produziu um efeito muito positivo no que diz respeito ao crescimento

do número de matrículas, à qualidade dos cursos ministrados, pela melhor aplicabilidade dos

recursos e pela resposta mais direta às necessidades formativas regionais.

Registre-se que as escolas técnicas federais, a partir da equivalência do ensino

secundário, foram deixando a formação de operários qualificados e concentrando sua oferta

em cursos técnicos de segundo grau.

Dessa forma, em 1959 o Liceu Industrial de São Paulo, denominado então Escola

Técnica de São Paulo, passou a ministrar ensino de segundo grau. Nas oficinas, com

máquinas nacionais, os alunos ficavam alguns dias, para só depois serem selecionados,

conforme a aptidão demonstrada para o curso de Mecânica ou de Edificações.

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A seleção dos alunos, que sempre foi muito rigorosa, apontava em 1959 só 20

candidatos aprovados entre os 73 que disputavam as 35 vagas oferecidas. Em 1963, todas as

35 vagas foram preenchidas, porém entre 500 candidatos.

Em 1965 ampliou-se o ensino da Escola Industrial de São Paulo com a instalação do

curso técnico de Eletrotécnica. Em 1971, o Acordo Internacional entre o Governo Brasileiro e

o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento preconiza a criação de seis

Centros de Engenharia de Operação, entre eles estava o de São Paulo. Com esse objetivo,

foram iniciadas as obras para instalação desse centro, no bairro do Canindé, próximo ao local

onde seriam construídos uma estação de METRÔ e o terminal rodoviário. Mas, o

cancelamento desse projeto propiciou a passagem do patrimônio oriundo do acordo

MEC/BIRD para a Escola Técnica Federal de São Paulo. Em 1976, procedeu-se a mudança da

Escola para a nova sede. Já em 1977 criaram-se os cursos de Eletrônica e Telecomunicações

e no ano seguinte o de Processamento de Dados.

No ano de 1987, foi criada a primeira escola do PROTEC - Programa de Expansão e

Melhoria do Ensino Técnico: a Unidade Descentralizada de Ensino de Cubatão, vinculada à

Escola Técnica Federal de São Paulo, onde foram oferecidos cursos nas áreas de Eletrônica,

Processamento de Dados e Informática Industrial. Destaca-se o fato de que havia a previsão,

no governo Sarney, de construção de 200 novas escolas técnicas, mas foram criadas apenas

37.

Dados constantes no Projeto Pedagógico da Escola Técnica Federal de São Paulo

(1999) sobre os alunos ingressos3 mostram que a população de alunos da Escola apresentava

características sócio-econômicas que os indicavam como pertencentes a duas faixas da

população: uma constituída por famílias que possuíam melhores condições e moradia, melhor

nível de instrução, inserção mais adequada no mercado de trabalho e nível de renda mais

3 Os dados sobre a clientela foram extraídos do Documento Perfil Sócio-Econômico da Clientela nos anos de 1994 e 1995, publicação do departamento de Apoio e extensão da Escola Técnica Federal de São Paulo.

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elevado (renda média familiar de 27,4 SMS) e outra que concentrava grupos familiares que

se diferenciavam, principalmente, por maior vulnerabilidade de inserção no mercado de

trabalho, menor nível de instrução e renda média aproximada de 10,3 SMS.

Dados relativos à escolaridade anterior dos candidatos à Escola mostravam um ligeiro

insucesso dos egressos do sistema público, no enfrentamento com os oriundos das escolas

particulares.

Pesquisa realizada no ano de 1995, com alunos ingressantes no período de 1982 a

1992, mostrou que, dois anos depois de formados, apenas 16% dos alunos da Escola

permanecia trabalhando como técnicos de nível médio.

Em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso, a pedido do Ministério da

Educação e em parceria com o poder municipal, foi criada uma nova Unidade do CEFET-SP

localizada no Município de Sertãozinho, interior do Estado de São Paulo. A trajetória dessa

Unidade, dada a sua vinculação com o Segmento Comunitário foi de muitos percalços e sua

vinculação ao sistema federal de ensino se constituiu em verdadeira bandeira de luta dos

professores e servidores que vieram prestar serviços na mesma. Embora reconhecida como

pertencente à Rede Federal de Ensino, desde o ano de 2003, ela ainda permanece com muitos

problemas que são resquícios do seu modelo de nascimento. 4

A partir da Reforma decretada em 1997, a Escola Técnica Federal de São Paulo

procede a uma revisão curricular que, impulsionada pela legislação, transforma sua oferta de

cursos técnicos integrados, que eram o expoente da formação dessa instituição, passando a

oferecê-los de forma seqüencial ou concomitante ao Ensino Médio. Foi instituído, também, o

Ensino Médio Regular, que hoje é a melhor propaganda da Escola, dado os resultados dos

alunos nos concursos vestibulares e no exame nacional da educação secundária.

4 Maiores informações sobre a trajetória da Unidade de Ensino Descentralizada de Sertãozinho pode ser obtida em MATIAS, (2004), referenciado na bibliografia desse trabalho.

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No final da década dos anos noventa do século XX, a Escola Técnica Federal de São

Paulo foi transformada em Centro Federal de Educação Tecnológica de São Paulo, uma

instituição federal de educação tecnológica, vinculada diretamente à Secretaria de Educação

Profissional e Tecnológica (SETEC), do Ministério da Educação e integrante do Sistema

Federal de Ensino. Suas atribuições, definidas no Decreto nº. 2.855, de 02/12/1998, podem ser

resumidas pela finalidade de formar e qualificar profissionais nos vários níveis e modalidades

de ensino para os diversos setores da economia, realizar pesquisa e desenvolvimento (P&D)

de novos processos, produtos e serviços em estreita articulação com os setores produtivos e a

sociedade, oferecendo mecanismos para a educação continuada. (CEFET-SP, 2005).

O objetivo do ensino ministrado pelo CEFET-SP, em todos os níveis e modalidades, é

o de construção de uma escola comprometida com a sociedade. Para tanto, suas ações

apontam para a formação social e crítica do cidadão, proporcionando-lhe formas de intervir

no processo de produzir cultura, conhecimento e desenvolvimento de novas tecnologias.

(CEFET-SP, 2005).

A missão do CEFET-SP é a de Ser agente no processo de formação de cidadãos

capacitados e competentes para atuarem em diversas profissões, pesquisas, difusão de

conhecimentos e processos que contribuam para o desenvolvimento tecnológico, econômico e

social da nação (CEFET-SP, 2005).

Além da oferta de cursos superiores, o CEFET-SP vem se preparando para o

desenvolvimento de pesquisa tecnológica, com um programa de Iniciação Científica e a oferta

de cursos de Pós-Graduação, caminhando assim para sua transformação em Universidade

Tecnológica (CEFET-SP, 2005).

Segundo Villela (2007) a análise do custo aluno e das matrículas, no período de 1998 a

2005, mostra que houve aumento de matrículas da ordem de 13% e que o orçamento cresceu,

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aproximadamente, 93%. Registra, ainda que, a partir da sua transformação em CEFET, a

Escola apresentou um acréscimo de 71% no custo aluno.

Os dados da Tabela abaixo, apresentada pelo autor, confirmam essa realidade.

Tabela 2 – Custo-aluno do CEFET-SP: 1998 a 2005.

Ano Orçamento Nº de alunos Custo/Aluno/Ano 1998 R$ 15.216.271,00 3.500 R$ 4.347,50 1999 R$ 14.066.503,00 4.623 R$ 3.042,72 2000 R$ 14.113.923,00 4.327 R$ 3.261,82 2001 R$ 16.621.549,78 4.086 R$ 4.071,91 2002 R$ 16.301.360,00 4.448 R$ 3.632,21 2003 R$ 19.596.305,00 4.912 R$ 3.989.47 2004 R$ 22.429.332,00 5.369 R$ 4.177,56 2005 R$ 27.207.303,00 5.226 R$ 5.206,90

Fonte: Relatórios de Gestão do CEFET-SP 2002 -2005. www.cefetsp.br, Tabela constante em (VILLELA, 2007, p.76)

Há um aspecto em relação ao orçamento, não indicado por Villela (2007) mas que, nos

parece, merece registro. Trata-se da evolução dos recursos. A relação entre os anos de 1998 e

1999 foi de um decréscimo da ordem de 7,%, não houve acréscimo no ano 2000, houve uma

recuperação da ordem de 20% de 2000 para 2001, um decréscimo da ordem de 2% em 2002 e

a partir de então há um acréscimo anual médio da ordem de 15%.

Villela (2007) analisando os dados relativos à conclusão dos alunos matriculados nos

cursos técnicos indica que [...] cerca de 60% dos alunos ingressantes conclui o curso, [...].

No ensino médio, a quase totalidade dos alunos conclui o curso e no ensino superior [...] a

análise fica prejudicada pelo fato de que este está ainda em implementação, [...]. (p. 79).

Indica ainda que há um índice de retenção nos cursos técnicos e superiores da ordem de 30%.

No que diz respeito aos professores a Escola contou, em 2005, com 292 professores

efetivos e 68 substitutos. A titulação dos professores era da ordem de 8% de doutores, 26% de

mestres, 47% de especialistas e16% de graduados. Registram-se ainda três professores com

titulação de pós-doutorado.

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A tabela abaixo mostra o total de vagas oferecidas para ingresso no primeiro semestre

de 2007:

Tabela 3 – Vagas oferecidas pelo CEFET-SP para o primeiro semestre de 2007.

SÃO PAULO-CAPITAL (SPO) Ensino superior: Manhã Tarde Noite Tecnologia em Automação Industrial - - 40 Tecnologia em Gestão da Produção - - 40 Tecnologia em Eletrônica de Sistemas Digitais 40 - - Tecnologia em Gestão de Turismo 40 - - Tecnologia em Planejamento e Gestão de - - 40 Empreendimentos na Construção Civil - - 40 Licenciatura em Física 40 - - Licenciatura em Geografia 40 - - Tecnologia em Sistemas Elétricos - - 40 Total 160 000 200 Ensino Técnico - (Concomitante com o Ensino Médio) Manhã Tarde Noite Eletrotécnica - 40 - Planejamento e Controle da Produção 40 40 - Eletrônica 40 - - Telecomunicações - - 40 Construção Civil - 40 40 Programa de Desenvolvimento de Sistemas - 80 - Total 80 200 80 Ensino Médio Manhã Tarde Noite Ensino Médio 160 160 - Ensino Médio - (Destinado aos Jovens e Adultos) Manhã Tarde Noite Certificação de Qualificação em Preparador e Operador de Máquinas

- - 40

CUBATÃO (CBT) Ensino superior: Manhã Tarde Noite

Tecnologia em Controle de Processos Industriais 40 - 40 Ensino Técnico - (Concomitante com o Ensino Médio) Manhã Tarde Noite Manutenção de Equipamentos ou Instalações de sistemas 40

Desenvolvimento de Sistemas Comerciais 40 40 Total 40 80 Ensino Médio Manhã Tarde Noite Ensino Médio 40 40 - Ensino Médio - (Destinado aos Jovens e Adultos) Manhã Tarde Noite Certificação de Qualificação em Desenvolvedor de Páginas de Internet

40

SERTÃZINHO (SRT) Ensino Técnico - (Seqüencial / Pós médio) Manhã Tarde Noite Automação Industrial - 16 16 Planejamento e Controle da Produção - 16 16 Total 32 32 Técnico Integrado - (Destinado a Jovens e Adultos) Manhã Tarde Noite Mecânica - - 40 Automação Industrial - - 40 Total - - 80

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GUARULHOS (GRL) Ensino Técnico - (Concomitante com o Ensino Médio) Manhã Tarde Noite Programação e Desenvolvimento de Sistemas - 40 40 Automação Industrial - 40 40 Total - 80 80

SÃO JOÃO DA BOA VISTA (SJB) Ensino Técnico - (Concomitante com o Ensino Médio) Manhã Tarde Noite Programação e Desenvolvimento de Sistemas - 40 40 Total - 40 40

CARAGUATATUBA (CRG) Ensino Técnico - (Concomitante com o Ensino Médio) Manhã Tarde Noite Programação e Desenvolvimento de Sistemas - 40 - Gestão - - 40 Total - 40 40

Fonte: www.cefetsp.br - Notícias. Acesso em 25/11/2006 Tabela constante em (VILLELA, 2007, p.84)

A instituição seguiu longa trajetória desde sua implantação como escola de aprendizes

artífices até sua transformação em centro universitário:

1909 - Escola de Aprendizes Artífices de São Paulo.

1937 – Liceu Industrial de São Paulo.

1959 – Escola Técnica de São Paulo.

1965 - Escola Técnica Federal de São Paulo.

1987 – Implantação da Unidade de Ensino Descentralizada de Cubatão.

1994 - Transforma-se em Centro Federal de Educação Tecnológica de São Paulo.

1996 – Implantação da Unidade de Ensino Descentralizada de Sertãozinho.

2000 - Implantam-se os Cursos Superiores de Tecnologia.

2005 – Implantação da Unidade de Ensino Descentralizada de Guarulhos.

2006 – Definida a implantação gradativa das Unidades de Ensino Descentralizadas de

Bragança Paulista, Campos do Jordão, Salto, São Roque e São Carlos.

2006 - Implantação das Unidades de Ensino Descentralizadas de Caraguatatuba e São

João da Boa Vista e criação da Unidade de Ensino Descentralizada de São Carlos

(ainda não iniciada).

2007 - Implantação das Unidades de Ensino Descentralizadas de Salto e Bragança

Paulista.

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2007 – Definição de expansão de mais quatro unidades de ensino no interior de São

Paulo (ainda em fase de definição).

Existem, hoje, muitas críticas acerca da questão de elitização das escolas

profissionalizantes por meio de sua transformação em Centro de Educação Tecnológica.

Matias (2004), analisando a investida dos CEFET’s para o ensino superior, assim como

alguns estudos que apontam as ações governamentais como tentativas de desmantelamento da

rede de escolas federais, questiona:

Estariam sendo desmantelados os CEFET’s ou as políticas públicas estariam priorizando o nível tecnológico em detrimento do nível técnico? Estaria havendo uma guinada histórica, ou seja, o ensino profissional, que fora criado para os desvalidos da sorte, agora estaria sendo elitizado ao ser transferido para o ensino superior? (p.56)

Dados da tabela 3, acima, indicam que, menos de dez anos após a sua transformação, o

CEFET-SP concentra quase 25% de suas vagas no Ensino Superior e menos de 10% em

cursos de nível básico. Se tomadas como amostra as vagas da Unidade Sede destinadas aos

cursos superiores e aos técnicos veremos que há o mesmo número de vagas nas duas

modalidades. Considerada somente as vagas oferecidas para a formação de técnicos na

Unidade Sede, elas representam menos de 40% da oferta.

A tabela abaixo apresenta o percentual de alunos retidos na Escola no ano de 2005.

Tabela 4 – Índices de retenção do CEFET-SP em 2005. Alunos Matriculados Retidos Modalidade

Sede Cubatão Sertãozinho Total Sede Cubatão Sertãozinho Total Retidos

Primeiro Semestre

Técnico 1120 584 185 1883 342 110 67 519 28%

Superior 1551 124 0 1675 448 46 0 494 29% Segundo Semestre

Técnico 1108 532 242 1895 393 220 49 662 35%

Superior 1631 144 0 1775 582 58 0 640 36%

Ensino Médio anual

E. Médio 1228 328 0 1556 33 44 0 77 4.9%

Fonte: Relatório de Gestão - 2005 - CEFET-SP. Tabela constante em (VILLELA, 2007, p.80)

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Observa-se pelos dados da tabela acima que o índice de retenção, tanto nos cursos

técnicos como nos superiores estão em torno de 30% e que não chegam a atingir 10% no

Ensino Médio. Embora esses dados sejam alarmantes, não pretendemos discuti-los nesse

momento uma vez que serão objeto de estudo na seqüência desse trabalho.

A história e configuração atual do CEFET-SP presentes nesse capítulo não se

configura como uma análise pormenorizada da estrutura e funcionamento da Instituição uma

vez que essas características não serão objeto de estudo nessa pesquisa que tem um propósito

direcionado aos condicionantes de ordem político-econômica que determinam a organização

da educação profissional e da Escola a forma como os professores enxergam e interferem

nessa realidade. Nesse sentido, cremos, essa caracterização serve mais como um pano de

fundo para que sejam situadas as considerações dos professores, apresentadas na seqüência

desse trabalho.

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CAPÍTULO 5. MOTIVAÇÃO DA REFORMA: os argumentos econômicos, políticos e

sociais para a sua implementação.

Os anos de 1990 do século XX e os anos iniciais deste século no Brasil vêm sendo palco de um conjunto de reformas na educação escolar que buscam adaptar a escola aos objetivos econômicos e político-ideológicos do projeto da burguesia mundial para a periferia do capitalismo nesta nova etapa do capitalismo monopolista. (WANDERLEY, 2004)

Conforme foi exposto no capítulo precedente, dada nossa compreensão de que a

prática docente determina o resultado do processo educacional e, que a forma como ela se

desenvolve é tributária do papel social que os professores atribuem à Escola e à sua práxis,

consideramos fundamental ouvir a voz dos professores e identificar como compreendem o

impacto da Reforma da Educação Profissional, implementada nos anos de 1990, no CEFET-

SP.

Expusemos, ainda, que para a organização dos dados coletados nas entrevistas,

realizamos uma análise de conteúdo por meio da qual buscamos extrair, da fala dos

professores, a visão que possuem sobre o impacto da Reforma na vida da Escola no tocante

aos aspectos curriculares, ao perfil dos alunos que hoje a freqüentam e ao resultado efetivo

dessa formação no ponto de vista de resposta às necessidades do sistema produtivo.

As temáticas consideradas nessa análise de conteúdo se relacionam com as

justificativas e objetivos da implementação da Reforma que, destacadamente, indicavam

maiores possibilidades formativas de um desenho em que a educação profissional

complementa a formação geral; garantiar a democratização do acesso às escolas técnicas e,

assim, maiores chances de inserção social a jovens e adultos de classes sociais menos

favorecidas economicamente; e, ainda, preconizavam que essas alterações se inseriam no bojo

de um movimento de crescimento e competitividade do país, por meio do atendimento às

necessidades emergentes de mão-de-obra qualificada.

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A primeira análise dos dados coletados nas entrevistas foi guiada por uma seleção

prévia de categorias que se relacionavam com os temas referentes à justificativa e objetivos da

Reforma, e que já havia emergido de uma análise piloto que fora feita anteriormente com o

conteúdo de quatro entrevistas: aspectos pedagógico-sociais; condicionantes político-

econômicos e possibilidades de reconstrução curricular pela via da escola.

Porém, uma análise mais minuciosa do conteúdo das dezenove entrevistas indicou a

necessidade de um rearranjo das categorias no sentido de que elas pudessem retratar, mais

fielmente, os aspectos mais particulares das falas e, dessa forma, foram selecionadas quatro

categorias que se subdividiram em onze subcategorias.

Na tabela abaixo, são apresentadas as categorias e subcategorias, o total de citações

referentes a cada uma delas, assim como os respectivos percentuais relativamente ao total de

citações consideradas.

Tabela 5 – Indicação das categorias e subcategorias consideradas.

CATEGORIAS E SUBCATEGORIAS nº % citações

1. MOTIVAÇÃO DA REFORMA 33 7,84

1.1.ARGUMENTOS ECONÔMICOS E POLÍTICOS 18 4,28

1.2.ARGUMENTOS SOCIAIS 15 3,56

2. DESENHO CURRICULAR 149 35,39

2.1. .1MODELO INTEGRADO 27 6,41

2.2.MODELO SEQUENCIAL/CONCOMITANTE 53 12,59

2.3.FORMAÇÃO DE NÍVEL MÉDIO 37 8,79

2.4 FORMAÇÃO DE NÍVEL SUPERIOR 32 7,60

3. ALUNOS 95 22,57

3.1.PERFIL DO ALUNO ANTERIOR À REFORMA 13 3,09

3.2.PERFIL DO ALUNO ATUAL 82 19,48

4. PRÁTICA PEDAGÓGICA 144 34,20

4.1 POSSIBILIDADES DA AÇÃO DOS PROFESSORES 58 13,78

4.2. LIMITES NA AÇÃO DOS PROFESSORES 58 13,78

4.3. PERSPECTIVAS DE CORREÇÃO DE RUMOS 28 6,65

TOTAL 421 100,00

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Ainda que, para fins de melhor compreensão do conteúdo expresso pelos professores

ele tenha sido subdividido em categorias e subcategorias, essa organização não significa que

se trata de temas completamente estanques. Na análise apresentada a seguir essas

imbricações se mostram de maneira bastante acentuada.

Outra característica que se fez presente na análise do conteúdo expresso pelos

professores foi a não possibilidade de realizar grandes recortes sem que houvesse

comprometimento da garantia da fidedignidade do resultado da pesquisa. Dessa forma,

optamos em apresentar esse resultado em quatro capítulos distintos, comportando cada um

deles a análise relativa a cada uma das categorias indicadas.

No presente capítulo é apresentada a análise relativa à categoria Motivação da

Reforma, subdividida nas subcategorias: argumentos econômicos e políticos e argumentos

sociais.

5.1. Categoria 1 - Motivação da Reforma

A indicação da primeira categoria decorreu das falas em que os professores indicaram

conhecer os argumentos com os quais o governo propôs e implementou a Reforma e se

posicionaram acerca deles. Do teor dessas falas emergiram duas subcategorias em que, em

uma delas, são analisados os argumentos de caráter econômico e político e, na outra, os

argumentos de caráter social.

Em cada uma das subcategorias as citações se subdividem em três grupos que,

tratando de uma mesma temática, mantém especificidades. No primeiro deles os professores

fazem constatações acerca da motivação da Reforma, no segundo os argumentos são refutados

e no terceiro há concordância com os argumentos apresentados pelo governo, à época. Os

exemplos apresentados na tabela abaixo se referem a cada um desses grupos, respectivamente.

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Tabela 6 – Categorias e subcategorias sobre a Motivação da Reforma

CATE-GORIA

SUBCATE- GORIAS EXEMPLOS

Nº.

1.1 Argumentos Econômicos e Políticos

[...] essa reforma ocorreu [...] porque o governo sinalizava que o aluno que estava fazendo o ensino integrado, na realidade ele não ia para o mercado de trabalho para atuar como técnico [...] S.10 [...] a decisão foi muito mais política do que pedagógica e de economia mesmo, para evitar o gasto com a educação. [...] S. 6 [...] nós não estávamos preparando alguém para o mercado de trabalho imediato, para atender a realidade da sociedade [...] (S.11).

18

1.

MO

TIV

ÃO

DA

RE

FO

RM

A

1.2. Argumentos Sociais

[...] a motivação principal da reforma pode ter sido essa: vamos atender a uma parcela da população mais desfavorecida, [...]. S. 12 [...] esse público não existe porque, apesar de algumas pessoas terem esse perfil elas não têm condições de acompanhar um curso técnico [...] (S. 17). [...] na medida em que se qualifica pessoas com menor poder aquisitivo e isso, [...], significa também menores chances, menores possibilidades, eu estou, socialmente, sendo mais justo. [...] S. 12

15

5.1.1 Subcategoria 1.1. – Argumentos Econômicos e Políticos

A subcategoria Argumentos Econômicos e Políticos compreende um conjunto de

citações dos professores que dizem respeito às justificativas de ordem político-econômica que

foram utilizadas para a instituição da Reforma. A tabela abaixo apresenta, relativamente ao

total de citações e de sujeitos abrangidos pela amostra geral, o percentual referente a esses

argumentos.

Tabela 7– Argumentos políticos e econômicos da Reforma

Constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 5 10 3 18

% de citações 1,19 2,38 0,71 4,28

Nº de sujeitos 3 7 2 9

% de sujeitos 15,79 36,84 10,53 47,37

Embora, relativamente ao total da amostra, a categoria Motivação da Reforma

concentre o menor número de citações, pode-se notar que nove dos sujeitos entrevistados

fizeram citações acerca dos aspectos econômicos e políticos que condicionaram a

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implementação da Reforma, constituindo-se um percentual de 47,37% da amostra. Os grupos

de constatações e aspectos positivos tiveram uma concentração de sujeitos que não passa de

16%. Mas, o grupo de aspectos negativos recebeu indicações de 36, 84% do total da amostra

e, se considerado somente o universo da subcategoria Argumentos Econômicos e Políticos,

trata-se de quase oitenta por cento dos sujeitos.

O gráfico abaixo mostra o valor que os professores atribuíram aos argumentos

econômicos e políticos acerca da Reforma, considerando-se o grupo de constatações, aspectos

negativos e aspectos positivos, reforça essa realidade.

Gráfico 1 - Argumentos econômicos e políticos sobre a instituição da reforma.

As constatações acerca dos argumentos políticos e econômicos da Reforma indicam

que os professores relacionam a Reforma com vários aspectos: a modificação da proposta da

Escola que passa a ofertar profissionalização de nível superior; com a necessidade de

“otimização” do tempo de qualificação, até mesmo como forma de barateamento do custo

dessa mão-de-obra, uma vez que ao técnico com uma formação mais restrita poderia caber um

salário menor; com a modificação do papel do técnico na estrutura produtiva; e, ainda, com a

questão de busca de maior eficiência e eficácia do serviço público.

No que diz respeito aos aspectos presentes nesses argumentos que foram considerados

positivos pelos professores destaca-se o fato do governo buscar direcionar a oferta da Escola

para atendimento ao mercado, pois [...] de uma forma geral você tinha a preparação de um

aluno que não seguia diretamente para o mercado de trabalho e, se olharmos a missão social

da escola, havia um desvirtuamento claro. [...] (S. 11)

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Enfatiza S.11 que o CEFET-SP, hoje, possui um grande mérito: possuir alunos de

maior carência econômica, uma população que valoriza a formação profissional em nível

secundário, e, dessa forma, atende às necessidades de mão-de-obra técnica das empresas que

demandam essa qualificação..

Um fato interessante é que somente professores da Unidade Sede destacam a

democratização da Escola como justificativa para a edição da Reforma. Exatamente nessa

Unidade a “falta de direcionamento ao mercado de trabalho” e a “elitização” dos alunos

sempre foram mais presentes do que nas unidades do interior.

As citações de que os argumentos políticos e econômicos apresentados na edição da

Reforma eram negativos situam-se em campos variados. Algumas dizem respeito às políticas

de Estado mínimo, vigentes na época de edição da Reforma, uma vez que há indicação de

que, junto com as mudanças de ordem curriculares, o governo tomou outras medidas que

indicaram claramente uma tentativa de “enxugamento” da máquina administrativa das

escolas: [...] embora a estrutura funcional não viesse assim por uma legislação clara que trouxesse a

modificação, ela foi aos poucos sendo introduzida no momento que se proibia as contratações, que

não repunham os funcionários que iam aposentando, falecendo. [...] (S. 3)

Esse aspecto mais abrangente da Reforma, de minimização dos custos e maximização

dos recursos, é apontada como uma forma de desqualificação da educação em geral, não

ficando restrita às escolas profissionalizantes: [...] infelizmente, dada uma série de políticas

que surgiram inclusive no bojo dessa reforma que, evidentemente, não atingiu só o ensino

profissional, mas que atingiu todas as esferas de ensino, estadual, municipal, enfim, o

fundamental e o médio, e a gente vive um reflexo disso. [...] (S. 3)

Destaca-se ainda, nessas citações, a indicação dos professores de que, mais uma vez, o

governo busca, por meio da profissionalização secundária, conter a demanda por ensino

superior e, mais especificadamente, tentando tirar da esfera federal o ensino que fosse mais

direcionado a preparar os jovens para o ingresso na universidade: [...] falava-se que a escola não

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pode ser trampolim para a faculdade. É bobagem, o governo não pode privar as pessoas de ter

desenvolvimento, segue quem quer, a escola esta lá para dar conselho e não barrar o seu

desenvolvimento vai para a faculdade quem quer. [...] (S. 5)

Um outro aspecto relevante diz respeito à desconsideração do governo com a

experiência acumulada pelas escolas e, particularmente, pelos professores, uma vez que a

política curricular foi promulgada sem a participação dos atores da escola e sem consulta

quanto à viabilidade de sua execução: [...] a cada ano que a gente passava a gente tentava

aperfeiçoar. Veio o governo em noventa e oito e acabou com isso, colocou um ensino

modular que veio de cima para baixo, não fizeram consulta para a gente, não fizeram

absolutamente nada e puseram goela abaixo [...] (S. 8).

Destaca-se o fato da Reforma ter sido instituída por meio de um Decreto,

interrompendo todo um processo de consulta pública que estava sendo realizado pelo

Congresso Nacional.

A gestão dos recursos públicos aparece como um aspecto negativo dos argumentos do

governo, mas de forma diferente daquela apresentada anteriormente, quando se tratava de

críticas ao modelo neoliberal. Dessa vez, se trata de citações que fazem referências à

incapacidade do governo em apresentar uma proposta que, de fato, buscasse dar às Escolas da

Rede Federal e, particularmente, ao CEFET-SP maior racionalidade.

[...] eu posso fazer essa comparação por estar na iniciativa privada e estar aqui na escola, o recurso público ele é jogado no lixo, o uso é absolutamente irracional [...]. A burocracia é infernal, a escola funciona por conta de alguns que carregam o piano. [...] a cada ano que passa eu fico mais desacorçoado com o modelo de gestão que a gente tem aqui, em que se joga, literalmente, dinheiro no lixo, o recurso é muito mal utilizado, não tem eficácia. [...] (S. 12)

Os aspectos de caráter político-econômico que justificaram a Reforma se

complementam nas falas dos professores, com outros que são de caráter mais social, ou seja,

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que dizem respeito à possibilidade ou não, da Reforma ter sido direcionada ao atendimento da

população, sem foco prioritário nas necessidades do sistema produtivo.

5.1.2 Subcategoria 1.2. – Argumentos Sociais

Tabela 8 - Argumentos sociais sobre a instituição da reforma

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 9 4 2 15

% de citações 2,14 0,95 0,48 3,56

Nº de sujeitos 5 4 2 9 % de sujeitos 26,32 21,05 10,53 47,37

Nove sujeitos fizeram citações acerca dos aspectos sociais que condicionaram a

implantação da Reforma, constituindo-se um percentual de 47,37% da amostra, sendo que há

certo equilíbrio entre aqueles que apenas apresentaram constatações sobre essa questão e os

que levantaram aspectos negativos nesses argumentos.

O gráfico abaixo mostra o valor que os professores atribuíram aos argumentos sociais

acerca da Reforma, considerando-se o grupo de constatações, aspectos negativos e aspectos

positivos, reforçando a prevalência de citações nos dois primeiros grupos, destacadamente no

primeiro.

Gráfico 2- Argumentos sociais sobre a instituição da Reforma.

As constatações que dizem respeito aos argumentos de caráter social prendem-se,

majoritariamente, às intenções do governo em modificar uma situação de elitização da Escola

que se relacionava diretamente com o modelo de ensino integrado. Dados seus bons

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resultados formativos, dava condições de ingresso ao ensino superior e, por essa

característica, atraía a classe média. Essa população via nos conteúdos do ensino técnico

muito mais um aprofundamento dos conhecimentos teóricos e não se preocupava com o seu

potencial de profissionalização.

Para S12, os alunos do antigo curso integrado consideravam que [...] tendo aqui uma

“formaçãozinha” técnica, “just in case”, é bom. [...] Para ele, [...] Era essa a população

que vinha pra cá, o desejo final mesmo era a universidade.

As citações que apontam a elitização do ingresso ao CEFET-SP partem do princípio

de que os alunos de classe média, via de regra, têm um melhor desenvolvimento educacional,

comparativamente aos alunos menos abastados e que, portanto, essa população tinha melhores

condições de classificação nos processos seletivos de ingresso e ocupava as vagas oferecidas

pela Escola, em detrimento dos candidatos oriundos dos segmentos sociais menos favorecidos

economicamente: [...] como era muito concorrido, somente aqueles que tinham o ensino

fundamental privilegiado, pago ou com mais recursos, isto é, o aluno na classe média é que

tinha condições de entrar na Escola [...] e o aluno carente, que realmente precisaria do

aprendizado, não tinha condições de ingressar na nossa Escola. [...] (S. 10)

Destaca-se nas constatações sobre os argumentos relativos à elitização da Escola o fato

do governo ter permitido a oferta de Ensino Médio não-profissionalizante, com um caráter

propedêutico, e que mantém como característica atendimento àquela população que a

Reforma pretendeu tirar: [...] o Ensino Médio ficou com a característica dos alunos que a

gente já tinha no integrado, alunos de classe média [...]. (S. 15)

Embora as considerações sobre os argumentos sociais para a edição da Reforma se

concentrem no modelo de ensino integrado, existem referências acerca da total

desconsideração com o outro modelo ofertado na época, que atendia alunos egressos do

Ensino Médio, o chamado Ensino Complementar.

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Os cursos complementares, segundo a ótica dos entrevistados que a ele se referiram,

eram cursos que apresentavam alunos com as características daqueles que a Reforma

pretendia atingir, tinham um modelo curricular que abarcava majoritariamente os conteúdos

de formação específica, tal como se desenhou no modelo da Reforma. Mas a característica

fundamental desses cursos é de que eles apresentavam altos índices de evasão e não eram

considerados como uma oferta regular, constituindo-se como uma formação, de certa forma,

marginal.

[...] no passado havia uma crítica muito grande de que o aluno da escola era um aluno privilegiado, porque para entrar tinha uma concorrência muito grande. Mas, volto a insistir, tínhamos dois tipos de alunos e a escola reconhecia somente um, aquele que fazia o integrado, o que fazia o complementar era considerado um subproduto da Escola e a grande maioria não dava atenção a ele. . [...] (S. 11)

Essa desconsideração com o curso complementar, especialmente com as dificuldades

que se faziam presentes nesse modelo, se mostra pela ausência também nos argumentos do

governo, quando da edição da Reforma.

No que se refere às citações que dizem respeito aos aspectos positivos, embora elas

sejam em menor quantidade, apresentam considerações relevantes sobre a possibilidade real

da Reforma em democratizar o acesso à Escola, tornando-a, assim, mais justa socialmente. A

validade desses argumentos, segundo os sujeitos que se manifestaram sobre eles, concretiza-

se pela realidade do CEFET-SP hoje, ou seja, pelo fato dela receber alunos de classes menos

favorecidas.

[...] O cara que vem para cá ele é um sujeito que, seguramente, tem menos possibilidades do que aquela clientela que vinha antes. Na medida em que se qualifica pessoas com menor poder aquisitivo e isso, na minha visão, significa também menores chances, menores possibilidades, eu estou, socialmente, sendo mais justo. Eu não tenho dúvidas disso. [...] (S. 11)

Entretanto, fica claro nas citações que essa democratização atingiu uma parte da

Escola, uma vez que a alteração significativa no nível dos alunos está concentrada na

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população matriculada nos cursos técnicos e não necessariamente se estende ao Ensino Médio

e aos cursos de nível superior.

[...] na minha visão, a reforma possibilitou que um outro tipo de clientela, uma outra parte da população, tivesse acesso à escola, não em todos os seus cursos, mas, particularmente, nos cursos técnicos. [...] No médio, assim como era no integrado, a gente tem a nata da população da grande São Paulo, uma nata intelectual. Nos cursos superiores já é diferente, a nata de intelectuais vai para a USP, para a UNICAMP, a gente tem uma segunda camada da população. [...] (S. 15)

Destaca-se novamente a vinculação com a Unidade Sede do CEFET-SP dos sujeitos

que reconhecem os argumentos sociais como verdadeiros, e a sua não ocorrência entre as

citações dos professores das unidades Sertãozinho e Cubatão. Entre esses últimos também não

são feitas constatações sobre esses argumentos, mas somente a indicação de que as

motivações do governo tinham caráter negativo.

Um dos pontos apresentados pelos professores é de que os argumentos sociais

apresentados pelo governo não tinham sustentação pedagógica. Ainda que tenha se efetivado

o ingresso de alunos de baixa renda na Escola, não foram pensadas ações que pudessem

garantir a permanência deles. Há indicação, portanto, de erro de foco na definição do público

alvo da Reforma:

[...] O grande problema da Reforma é que ela visou um público inexistente. [...] uma pessoa que teria o segundo grau completo, estaria parada, afastada dos estudos há algum tempo e que, por impossibilidade ou desinteresse em ingressar numa faculdade, faria esse curso como uma espécie de qualificação profissional. [...] esse público não existe porque, apesar de algumas pessoas terem esse perfil elas não têm condições de acompanhar um curso técnico que tem uma base de conhecimentos matemáticos [...] (S. 17).

Outro aspecto levantado pelos professores, de certa forma complementar ao anterior, é

da ausência de modelos pedagógicos que pudessem contemplar as diferenças do perfil do

aluno de cada uma das áreas profissionais em que a Escola atuava e, além disso, as

especificidades dos processos formativos de cada uma delas.

[...] ela foi uma mudança que aconteceu de forma muito autoritária, e ela acabou desconsiderando as experiências e os modelos pedagógicos que, provavelmente, deveriam ser avaliados em cada curso, para cada tipo de

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perfil, porque a gente teria que considerar as peculiaridades de cada uma das diferentes áreas do conhecimento com que a Escola trabalha. [...] (S. 13)

Não obstante as citações dos professores sobre os objetivos e justificativas

apresentadas pelo governo para a implementação da Reforma da Educação Profissional se

subdividam em argumentos de caráter mais político-econômicos e sociais, eles se orientam

em um sentido único, contemplado na categoria Motivação da Reforma, uma vez que todos

dizem respeito a esse aspecto particular. Essa característica permite, por meio da síntese dos

aspectos considerados positivos e negativos, uma tentativa de mostrar uma avaliação global

que os professores fazem a esse respeito.

Em termos gerais as falas dos professores que defendem os argumentos para a

Reforma indicam dois pontos que merecem destaque. O primeiro dele se refere ao fato da

escola, antes da Reforma, ter um grande caráter de não terminalidade, uma vez que os alunos,

técnicos de nível médio, não seguiam para o mercado, necessariamente, mas sim rumavam

para o ensino superior e isso se configurava como um desperdício de recursos. O segundo

ponto diz respeito ao não atendimento às camadas da população que, de fato, tinham interesse

em se profissionalizar no nível secundário e para quem a escola seria um forte componente

para a melhoria das condições de vida.

Dessa forma, defendem os professores, o foco atual da Escola está mais direcionado a

sua função, ou seja, de conferir às camadas mais pobres da população uma profissionalização

mais rápida, de nível médio, o que dá sustentação aos argumentos que justificaram a edição da

Reforma.

No que diz respeito aos aspectos negativos relativos à Motivação da Reforma, as

considerações dos professores indicam que se tratou de um processo que, revestido de um

caráter social, em que as palavras de ordem eram democratização do acesso e fim da

elitização, continha uma intenção subliminar de atender aos requisitos de um Estado que

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busca a diminuição de despesas relativas aos investimentos em Educação e, ao mesmo tempo,

está comprometido em oferecer mão-de-obra que atenda aos requisitos imediatos do capital,

sem relação direta com o processo de desenvolvimento tecnológico e social.

Destacam a forma autoritária com que a Reforma se deu, sendo desconsideradas as

possibilidades de intervenção da sociedade civil, uma vez que até mesmo o trabalho do poder

legislativo federal foi brutalmente interrompido, impedindo completamente qualquer tipo de

participação.

Ressaltam que foram negligenciados os aspectos pedagógicos relativos às experiências

dos professores e das escolas, as especificidades das áreas de formação e, particularmente, das

reais condições de profissionalização dos alunos.

Ainda que os professores tenham apresentado divergências referentes aos argumentos

relativos à implementação da Reforma transparece nas falas certo consenso em relação aos

imperativos de democratização presentes no discurso governamental, levando-nos a

estabelecer relação entre essa indicação e a posição de alguns autores críticos que apontam

para a forma como os representantes do capital, por meio dos organismos de financiamento,

trabalham para vencer as resistências às reformas do Estado, entre elas, as do campo da

educação.

Santos (2004) ao analisar alguns documentos do PREAL (Programa de Promoção das

Reformas Educacionais na América Latina e Caribe), ligado ao Diálogo Interamericano,

USAID (United States Agency for International Development ) e BID (Banco Interamericano

de Desenvolvimento), indica, entre outros aspectos, que há forte orientação nas publicações

do órgão sobre a ingerência maléfica dos sindicatos e outras organizações docentes sobre a

implementação das reformas, sendo necessário estabelecer um consenso social que possa

minimizar a resistência dos professores. Para tanto é necessário estabelecer um discurso com

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forte apelo moral, capaz de vencer eventuais barreiras de caráter pedagógico e Sugerem

incentivos para que os docentes desistam de se opor às mudanças. (SANTOS, 2004, p.3)

Essa resistência, segundo a autora localiza nos documentos, é decorrente de uma

mentalidade corporativista, que busca resguardar direitos da categoria e impedir que o Estado

estabeleça um contrato direto com o mercado, comprador da mão-de-obra formada pela

Escola e que, como cliente preferencial, deve ser o orientador das características principais

para a formação desse serviço.

Segundo o conteúdo dos trabalhos apresentados pelo PREAL, a ofensiva contrária das

organizações dos professores representa a defesa do direito privado em detrimento da

eficiência do sistema público. Entretanto, para a autora, esse apelo democrático é uma forma

dissimulada de vencer as resistências à hegemonia dos interesses privados na determinação do

caminho a ser seguido pelo sistema público:

Além da negação das divergências ideológicas e políticas entre os projetos educacionais em disputa, evocando uma concepção positivista de neutralidade pedagógica, os autores classificam como mero corporativismo o movimento social atuante nesse campo, majoritariamente representado pelo sindicalismo docente, desprezando os fundamentos políticos dos projetos em questão, assim como o compromisso de amplos setores desses movimentos com a transformação social. Oculta o caráter de classe do capital, legitimando seus propósitos como se fossem os interesses de toda a sociedade, nomeando-os como interesses públicos. (SANTOS, idem, p. 6)

O principal recurso utilizado pelos organismos de financiamento para vencer as

resistências às mudanças propostas para a Educação, conforme assinala Santos (2004), é o da

possibilidade das reformas promoverem maior acesso à Escola. Essa característica pode ser

observada na análise que os professores do CEFET-SP fazem sobre os condicionantes sociais

da Reforma e com o quais demonstram certa concordância.

Poder-se-ia dizer, concordando com a autora, que, se desenvolveu entre os professores

do CEFET-SP um processo de legitimação do assujeitamento daqueles que escrevem a

história da prática educativa como um espaço de luta contra-hegemônica (p. 15). O

convencimento deles sobre a necessidade da Reforma, ainda que parcial, se deu pelo

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pressuposto de que as mudanças são necessárias e imprescindíveis face à necessidade de

instauração de uma nova ordem na qual se interligam elementos de uma economia voraz,

amplo desenvolvimento tecnológico, novas formas de produção e a adaptação social que tem

como prescrição principal a obtenção pelos sujeitos de condições de competirem em um

mercado e sociedade cada vez mais exigentes e sectários.

Dessa forma, a indicação de que a Reforma promoveria a democratização da Escola

pelo acesso a ela das camadas menos favorecidas da sociedade, ainda que complementada por

outros aspectos mesmo de ordem corporativista e de sobrevivência, pode ter sido, de fato, a

mola propulsora para a sujeição dos professores à nova dinâmica curricular imposta pela

implementação do Decreto nº. 2.208/97. A continuidade da análise das constatações presentes

nas demais categorias apresentadas na seqüência desse trabalho certamente levará ao

aprofundamento dessa problemática.

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CAPÍTULO 6. MODELO SEQUENCIAL/CONCOMITANTE: o desenho curricular

da educação profissional brasileira no contexto da complementaridade.

[...].como decía, el ya clásico autor tan querido, al menos por mi, tan clarificador de muchas cosas, Philip Jackson, el diseño es la preconcepción de la prática, el diseño es un embrión de la prática, el diseño es también una obligación derivada para los que están em la práctica. (SACRISTÁN, 1998, p.2).

No capítulo precedente apresentamos as considerações dos professores do CEFET-SP

acerca sobre os argumentos apresentados pelo poder público federal na edição do Decreto nº.

2.2208/97 que implementou a Reforma da Educação Profissional. Mas, como já assinalamos,

da riqueza de conteúdo presente na fala dos professores emergiram outras categorias de

analise, entre elas a que reúne considerações acerca do desenho de currículo imposto pela

Reforma. Nesse capítulo estaremos apresentando a análise referente a essa Categoria.

6.1. Categoria 2 – Desenho Curricular

O conjunto de citações que compõem a categoria Desenho Curricular foi subdividido em

quatro aspectos distintos e complementares que formam as subcategorias de análise.

O primeiro aspecto diz respeito às virtualidades do modelo de formação praticado pela

Escola até a edição da Reforma, o ensino integrado. Dessa forma, há uma subcategoria

denominada Modelo Integrado.

A segunda delas trata do modelo seqüencial ou concomitante, imposto pela Reforma,

que resultou da separação da educação secundária em duas partes distintas e complementares,

ou seja, formação geral e profissional não se inscrevem mais em um caminho único, mas sim

seguem rotas paralelas, em tempos iguais ou não. Essa subcategoria é chamada de Modelo

Seqüencial ou Concomitante.

O terceiro aspecto diz respeito às reais possibilidades e limites da formação de nível

médio, com destaque para o campo de trabalho dos técnicos. Trata-se da subcategoria

Formação de Nível Médio.

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Um último aspecto é o da verticalização da profissionalização rumo ao ensino

superior, pela via da implementação dos cursos de tecnologia. Essa categoria foi denominada

Formação de Nível Superior.

Assim como nas subcategorias apresentadas anteriormente, as citações se subdividem

em três grupos: constatações, aspectos negativos e aspectos positivos. Os exemplos

apresentados na tabela abaixo se referem o cada um desses grupos, respectivamente.

Tabela 9 – Categorias e subcategorias relativas ao Desenho Curricular

CATE-GORIA

SUBCATEGORIAS EXEMPLOS

Nº.

2.1. Modelo Integrado

[...]o modelo que integrava as duas vertentes de educação, a educação geral e profissional, ia muito numa linha de integração unitária, o chamado modelo de educação unitária [...] S.3 [...]. quando o aluno faz o colegial junto ele se preocupa mais com o colegial do que com o técnico. Ele quer pegar o diploma e fazer faculdade. [...] S. 14 [...] veja quantas possibilidades de trabalhar a escola tem com o aluno em quatro anos [...] (S.18). 27

2.2. Modelo Seqüencial Concomitante

[...] sobre a fase atual é difícil de dizer por que também e uma fase de adaptação e a gente não sabia o que fazer [...]. S.14 [...] eu não vejo como desvincular o ensino técnico do Ensino Médio [...] (S. 2). [...] tende a ser melhor do que era com os outros que eram jovens e às vezes estavam aí até sem saber por quê? Esse e um negócio também digno de nota. [...] S. 1 53

2.3 Formação de Nível Médio

[...] O profissional técnico [...] não é um profissional de concepção, é um profissional de execução, condução e coordenação dos processos de produção. [...] S.15 [...] A gente não forma técnico, a gente tapeia técnico no mercado e o mercado já percebeu isso, [...] eles preferem empregar tecnólogos no lugar de técnicos [...] (S.7). [...] eu acredito que o mercado para o nível técnico esteja em maior oferta ou tenha maior condição de absorver mão-de-obra do que pro ensino superior. [...] S.10. 37

DE

SEN

HO

CU

RR

ICU

AR

2.3 Formação de Nível Superior

[...]. começam a substituir o operário chão-de-fábrica pelo técnico atual, e empurra para o tecnólogo, para o nível superior, o técnico anteriormente formado pelas escolas. [...] S.3 [...]. eu penso que o tecnólogo vai ficar meio ocioso. As empresas não estão precisando de pessoal de engenharia [...]. Elas precisam de caldeireiros, soldadores, pessoal de execução. [...] S.19 [...] com os cursos de tecnologia foi possível retornar a esse nível um pouco mais alto. [...] S.15 32

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6.1.1. Subcategoria 2.1. – Modelo Integrado

A subcategoria Modelo Integrado compreende um conjunto de citações dos

professores que dizem respeito aos argumentos de ordem curricular direcionados ao modelo

de formação desenvolvido antes da edição da Reforma, em que a formação geral e específica

estavam contempladas em um único currículo.

A tabela abaixo apresenta, relativamente ao total de citações e de sujeitos abrangidos

pela amostra geral, o percentual referente a esses argumentos.

Tabela 10 – Modelo Integrado

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 6 2 19 27

% de citações 1,43 0,48 4,51 6,41

Nº de sujeitos 4 2 10 11

% de sujeitos 21,05 10,53 52,63 57,89

A categoria Desenho Curricular representa o maior percentual de citações,

relativamente ao total da amostra, com 35,39% das citações e participação de 100% dos

sujeitos entrevistados. Na subcategoria Modelo Integrado estão 6,41% das citações, com

participação de 57,89% dos sujeitos participantes, percentuais apurados sobre o total da

amostra. Destaca-se que 4,51% dessas citações apresentam aspectos positivos acerca do

modelo de ensino praticado anteriormente à Reforma.

O gráfico abaixo traz a avaliação dos professores sobre o ensino integrado e mostra a

importância atribuída a esse modelo.

Gráfico 3– Avaliação sobre o modelo integrado

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As constatações acerca do modelo integrado se subdividem em dois aspectos: o

primeiro deles diz respeito à possibilidade do currículo fazer com que os alunos construíssem

conhecimentos significativos por meio da não dissociação entre o saber e o fazer.

[...] o estudante, no momento em que via a educação geral e tinha a oportunidade de aplicar aquilo na educação profissional havia uma melhor compreensão, havia uma melhor articulação das próprias idéias e a concepção do estudante então partia da aquisição do conhecimento para a formulação de questões em cima daquilo que ele havia adquirido [...] (S. 3).

O segundo trata da peculiaridade desse modelo como potencializador da formação de

excelentes profissionais técnicos, assim como das condições de ingresso no ensino superior,

notadamente na Unidade Sede do CEFET-SP em que os alunos, oriundos de classe média,

buscavam essa condição por meio do trabalho da Escola. Esse modelo também é apontado

como formador de uma base de conhecimentos teórico-práticos que garantia aos egressos um

destaque nas carreiras universitárias: [...] fez um técnico em mecânica e foi fazer odontologia,

não restam dúvidas de que, para esses alunos, o curso técnico também trazia grandes

subsídios, porque também dava melhor base de conhecimentos [...]. (S. 11)

Porém, se constata, também, o não encaminhamento desses técnicos ao mercado de

trabalho para o exercício de funções desse nível: [...] A gente tinha uma superformacão de

técnicos no modelo integrado, eram excelentes técnicos, mas, por isso mesmo uma pequena

fração desses alunos trabalhava como técnico, a maioria ia fazer curso superior e atuar em

outras áreas. [...] (S. 15)

Complementarmente às considerações sobre a potencialidade do modelo integrado, os

professores apresentam as razões para o seu sucesso. No que diz respeito ao currículo,

apontam a integração como a garantia do desenvolvimento global dos alunos: [...]

inegavelmente, o aluno se desenvolvia. Não é a toa que muitos alunos oriundos de escola

técnica, hoje cefets, conseguiam o acesso ao vestibular. Não porque o cefet direcionava a

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educação para o vestibular, mas é que, realmente, ao integrar o aluno entendia de uma forma

mais ampla. [...] (S. 3)

Na organização escolar apontam como aspectos que foram considerados positivos para

a garantia da qualidade desse ensino a forma de ingresso e de permanência somente daqueles

que, de fato, estavam preparados para freqüentar o ensino técnico, ou seja, possuíam em

termos de conhecimentos prévios, os pré-requisitos que o aprendizado das disciplinas técnicas

exige: [...] E o modelo anterior, de educação integrada, tinha uma grande vantagem, como eu

já disse, havia de fato um aluno muito mais homogêneo, a sala era mais homogênea, havia

essa integração de pensamento, articulando o conhecimento prático com o científico. [...] (S.

3)

Ainda que parte desses pré-requisitos fosse adquirida no próprio percurso da formação

de técnicos por meio dos componentes curriculares de formação geral, havia já na entrada do

aluno, a garantia de uma base de conhecimentos do ensino fundamental, uma vez que o exame

de seleção indicava os mais preparados numa relação candidato-vaga que chegava próximo de

vinte por um.

[...] nós tínhamos em algumas áreas, [...] uma relação de dezoito candidatos por vaga, [...] eram alunos que, [...] já traziam uma boa bagagem [...] o fato de terem todas as disciplinas do núcleo comum [...] se aprimoravam muito no padrão de conhecimentos. O trabalho, principalmente das disciplinas técnicas, era muito mais tranqüilo quando comparado com ao que acontece pós-reforma. [...] (S. 11)

A garantia da qualidade do aluno no percurso formativo se dava por meio de um

processo rigoroso de avaliação, que não permitia a continuidade senão para aqueles que

lograssem sucesso no desempenho escolar: [...] O sistema de avaliação [...] ele era mais

apurado, você tinha uma visão melhor de aula por aula, nós tínhamos uma avaliação mais

direta com os alunos onde nós tínhamos a reprovação e com isso nos pegávamos alunos para

os anos seguintes mais preparados. [...] (S. 5)

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Ainda que o perfil do aluno e as possibilidades da ação dos professores sejam tratados

em subcategorias específicas, surgiram citações em que as características do modelo integrado

são apresentadas como potencializadoras da motivação dos alunos e da criação e manutenção

de vínculos entre eles e a Escola, o que se constitui segundo os professores em aspectos

altamente positivos do modelo conforme mostra a citação de S2: [...] os alunos no antigo

curso integrado eles eram muito mais motivados, muitos mais interessados no

desenvolvimento dos estudos. [...]

Somente duas citações selecionadas traduzem certa discordância em relação ao

Modelo Integrado. A primeira delas diz respeito ao fato da Escola ter valorizado mais essa

modalidade de ensino, em detrimento dos cursos complementares e a outra, em que o

professor diz não encontrar grandes diferenças entre os dois modelos (integrado e seqüencial-

concomitante) e preferir o segundo pelo fato dos alunos do antigo curso integrado

apresentarem maior preocupação com o vestibular do que com a preparação técnica:

[...]quando o aluno faz o colegial junto ele se preocupa mais com o colegial do que com o

técnico. Ele quer pegar o diploma e fazer faculdade. [...] (S. 14)

Em geral, os professores apresentaram uma contraposição entre o modelo de formação

praticado majoritariamente antes da Reforma, o Ensino Integrado, e aquele imposto a partir do

Decreto nº. 2208/97. As características relevantes atribuídas pelos professores acerca desse

modelo constituem a análise da Subcategoria Modelo Seqüencial-concomitante.

6.1.2 Subcategoria 2.2. – Modelo Seqüencial-concomitante

Tabela 11 – Modelo Seqüencial-concomitante

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 9 38 6 53

% de citações 2,14 9,03 1,43 12,59

Nº de sujeitos 6 13 3 14 % de sujeitos 31,58 68,42 15,79 73,68

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Quatorze sujeitos fizeram citações acerca do Modelo Seqüencial-concomitante,

implantado a partir da Reforma da Educação Profissional instituída por meio do Decreto nº.

2208/97, constituindo-se um percentual de 73,68% da amostra, sendo que a grande maioria

fez referência aos aspectos negativos desse modelo.

O gráfico abaixo mostra o valor que os professores atribuíram ao Modelo Seqüencial-

concomitante.

Gráfico 4 – Avaliação sobre o modelo Seqüencial-concomitante

As constatações acerca desse modelo dizem respeito a diversos aspectos. Do ponto de

vista de organização, destaca-se o fato de ser uma proposta bastante diferenciada em relação

ao modelo integrado, muito mais próxima do Curso Complementar, modalidade que fazia

parte da oferta de profissionalização anteriormente à Reforma, mas com a qual a Escola não

tinha grande preocupação: [...] nós tínhamos dois tipos tanto o integrado como o modular, o

modular pra quem já tinha o colegial, fazendo uma comparação com hoje, pra mim, foi

apenas mudança de nome, porque hoje temos só o modular onde ele precisa estar no segundo

ano, mas no anterior tinha que ter o colegial. [...] (S. 5)

Uma característica marcante da organização desses cursos, presente nas falas dos

professores entrevistados, diz respeito, exatamente ao fato dele exigir dos alunos a

complementaridade ou seqüencialidade. Ou seja, a exigência de ocupar dos alunos dois

tempos distintos de formação, um que enfatiza a formação geral, o Ensino Médio, e outro a

formação específica, o Ensino Técnico.

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Essa complementaridade, ainda que realizada na mesma Escola, como é o caso de

parte dos alunos do CEFET-SP das Unidades Sede e Cubatão, traz uma grande

heterogeneidade às turmas do ensino técnico, uma vez que elas comportam tanto o aluno que

faz o Ensino Médio na Escola quanto outros que já concluíram essa modalidade ou que estão

matriculados em escolas diversas.

A característica de organização desse modelo impacta tanto no perfil do aluno quanto

no trabalho dos professores. Ainda que algumas citações apontem que as dificuldades

encontradas pelos professores possam estar relacionadas à necessidade deles se adaptarem a

uma nova proposta, existe indicação de que, na realidade, não convencidos da possibilidade

real de sucesso desse tipo de formação, procuram realizar ações de cunho didático-pedagógica

orientadas pelo perfil dos alunos e não necessariamente à proposta curricular: [...] Essa

adaptação não é a uma adesão a um projeto educacional, mas a uma realidade de sala-de-

aula. [...] (S. 3)

Essa adaptação se mostra, em parte, vinculada ao tempo de duração do Curso

Seqüencial-concomitante, menor do que era praticado no Ensino Integrado, porém se destaca

a indicação de que ela é tributária do perfil do aluno, em especial da grande dificuldade deles

em compreenderem e assimilarem os conteúdos profissionalizantes, uma vez que possuem

uma bagagem de conhecimentos gerais muito reduzida: [...]em alguns casos, os alunos têm

dificuldades bastante grandes de escrever, de se expressarem mesmo, erros enormes de

grafia, coisas assim que você fala: caramba! [...] (S. 12)

Algumas constatações relativas ao resultado desse modelo apontam que ele não teve a

receptividade esperada pelo Governo, posto que houve uma queda na procura pela Escola: [...]

A procura para os primeiros cursos técnicos, em um primeiro momento caiu bastante, os

alunos que ingressaram nesses cursos mudaram muito. Não tínhamos mais o nosso aluno do

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Ensino Médio aprendendo as disciplinas técnicas, o aluno que passava em uma seleção de

quinze para um. [...] (S. 15)

As citações referentes aos aspectos positivos, assim como os sujeitos que fazem essa

avaliação, são bastante reduzidas. Entretanto, se destaca nessas falas, a valorização dos

professores para a experiência acumulada que os alunos desse modelo trazem para a Escola,

fazendo da sala de aula um espaço rico de troca.

[...] em que pese o prejuízo acadêmico, que inegavelmente traz a heterogeneidade, do outro traz um benefício, porque traz para a sala-de-aula toda uma experiência de vida, pessoas mais maduras e isso se, de um lado, tem suas conseqüências, do outro, permite um ambiente muito mais amistoso, permite um ambiente de confiança, permite um ambiente de troca de experiência, nesse particular é fantástica essa heterogeneidade. [...] (S. 3)

Os aspectos negativos do Modelo Seqüencial-concomitante emergem das falas da

quase totalidade dos professores, se tomada somente a amostra daqueles que fizeram citações

referentes à subcategoria esse percentual é superior a 90%.

Registra-se, ainda, a ocorrência dessas citações em todas as unidades abrangidas pela

pesquisa. Embora elas não difiram em muito daquelas que fazem constatações acerca do

modelo, têm um tom extremamente crítico, desqualificando a proposta.

No que diz respeito à formulação dos projetos desses cursos, os professores apontam a

impropriedade cometida pela Escola, em que eles mesmos se incluem, de fazer um recorte

curricular. Ou seja, segundo eles, os cursos não foram repensados para um modelo novo, mas

sim recortados dos cursos integrados e adaptados para um espaço de tempo menor. Em termos

mais específicos, houve uma separação entre os componentes de formação geral e técnica,

sendo mantidos esses últimos como os cursos do novo modelo.

Com essa proposta de cursos, os professores se depararam com a realidade da sala de

aula em que essa adaptação não se mostrou apropriada, uma vez que a falta de formação geral

dos alunos e a diminuição do tempo dos cursos se mostraram impeditivos para o

desenvolvimento dos conteúdos de formação específica.

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Dessa forma, além de terem um tempo menor de curso, os professores ainda se

obrigam a usar muito desse tempo em períodos longos de recuperação de conhecimentos,

buscando levar para os alunos uma base conceitual mínima, necessária para a compreensão

dos processos tecnológicos.

[...] os alunos vêm das escolas, de uma forma geral, com uma base muito prejudicada o que dificulta construir conteúdos mais técnicos em cima da base que eles trazem, em especial da matemática, da física, da própria língua portuguesa. Isso dificulta um crescimento, um desenvolvimento maior das aulas dentro da carga horária que a gente tem disponível [...] (S. 4).

A questão do tempo aparece como fator que determina a não seqüencialidade no

desenvolvimento dos conteúdos e não amadurecimento do aluno que não consegue, em um

tempo curto, adquirir a cultura técnica necessária para a sua atuação profissional.

Outro ponto em destaque é o de que falta aos alunos interesse e empenho e que essa

característica decorre muito do fato da formação técnica não conferir um nível de

escolaridade, mas somente de profissionalização, para a qual, inclusive, a escolaridade é

indispensável. Dessa forma o curso técnico, quando concomitante, não é objeto de maior

preocupação dos alunos que, tendo que optar entre o Ensino Técnico e o Médio, até por força

da legislação, tendem ao Ensino Médio.

Outra característica apontada para a desmotivação, aspecto muito presente nas falas

dos professores da Unidade Cubatão, é o fato dos cursos do modelo Seqüencial-concomitante

não terem vinculação com as ocupações existentes nas empresas e não darem condições do

aluno atuar como técnico pleno, uma vez que as próprias denominações remetem para

qualificações de nível básico.

Segundo o constante nessas citações as empresas não sabem bem onde encaixarem os

profissionais que chegam com títulos desconhecidos para a realidade da atuação técnica: [...]

É difícil até para [...] alguém de RH [...] classificar alguém que se formou como instalador

de sistemas de automação como uma pessoa de nível técnico. [...] parece um curso específico

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do SENAI [...] Alguma coisa parecida com Instituto Universal Brasileiro. O próprio nome já

embute uma queda na qualidade dos cursos. [...] (S. 17)

Essa queda da qualidade, segundo os professores, impactou na possibilidade de

inserção dos alunos no sistema produtivo causando grande impacto [...] na colocação dos

nossos alunos no mercado de trabalho. Nós chegávamos a colocar quarenta ou cinqüenta

alunos na COSIPA, na PETROBRÁS e, em quatro anos, essa colocação caiu para cinco, três,

dois, um. (S. 18)

Complementarmente às citações que dizem respeito aos modelos de formação, existem

outras que se orientam mais no sentido de uma avaliação acerca da real aceitação dos técnicos

e dos tecnólogos no mercado de trabalho.

Essas citações compõem as duas subcategorias apresentadas a seguir em que são

analisadas as constatações e os aspectos positivos e negativos que os professores apresentam

para a questão da formação de nível médio e de nível superior.

6.2.3 Subcategoria 2.3. – Formação de Nível Médio

Tabela 12 – Formação de Nível Médio

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 22 13 2 37

% de citações 5,23 3,09 0,48 8,79

Nº de sujeitos 10 6 2 13

% de sujeitos 52,63 31,58 10,53 68,42

Quase 70% dos professores fizeram referências à formação de técnicos de nível

médio, sendo que a maior parte deles se limitou a fazer constatações. Destaca-se, entretanto,

que 31,58% deles fazem referência a aspectos negativos em relação a essa formação.

O gráfico abaixo mostra a avaliação que os professores fazem sobre a formação de

nível médio.

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Gráfico 5– Avaliação sobre a formação profissional de nível médio.

As constatações acerca da formação profissional de nível médio, se tomadas de um

ponto de vista dedutivo tratam da existência de trabalho para técnicos de nível médio na

cadeia produtiva da organização dos processos produtivos em que esse técnico se insere, do

direcionamento do modelo de formação atual, o Seqüencial-concomitante, e do mercado de

trabalho para o técnico formado pelo CEFET-SP.

No que diz respeito ao mercado para o técnico de nível médio, há indicação clara de

que ele existe e que há diferentes posições em que esse profissional pode atuar, sendo essa

condição vinculada ao tipo de produto desenvolvido e ao grau de tecnologia empregados:

empresas com perfil tecnológico mais avançado, em geral, ocupam menos técnicos e/ou

determinam sua posição cada vez mais próxima aos processos finais de fabricação, o chamado

“chão de fábrica”, enquanto empresas menores e com emprego de tecnologias mais

convencionais, empregam o técnico para postos de média chefia, assistência técnica, etc: [...]

O técnico hoje está em funções do famoso chão-de-fábrica, é a pessoa que sabe pegar uma

furadeira, que sabe fazer, que sabe executar o trabalho. Eles não querem uma pessoa para

sentar numa prancheta, para ficar no departamento de engenharia [...] (S.19)

Ainda que as considerações sobre porte e nível tecnológico das empresas sejam

consideradas pelos professores na indicação do mercado de trabalho para o técnico, o aspecto

mais relevante das falas se situa em seu deslocamento de funções mais ligadas ao controle do

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processo para as funções terminais, de execução. Destaca-se, ainda, o fato de que algumas

empresas tenham essa formação como escolaridade mínima para ingresso:

[...] há um exemplo que eu posso dar da minha experiência pessoal: na exigência atual na nossa empresa a menor qualificação é de técnico. A gente não contrata ninguém mais que não tenha qualificação técnica. Para ser um gasista, o cara que vai fazer atendimento de emergência, e que anteriormente era um sujeito com formação primária, hoje não, o nível mínimo é técnico. [...] (S.12)

No que diz respeito à propriedade do modelo Seqüencial-concomitante na formação de

nível médio as falas abordam essa questão tanto em nível macro como no universo particular

do CEFET-SP . Mas, elas apresentam certo antagonismo na medida que trazem duas posições

diferenciadas.

Em algumas falas dos professores há indicadores de que ela é particularmente

interessante para o aprimoramento profissional de trabalhadores inseridos no mercado de

trabalho, mas que necessitam de qualificação profissional: [...] A gente tem que considerar que

existe um universo de empresas pequenas, de empresas médias, que tem muita gente

trabalhando e que o cara aprendeu a trabalhar na prática, nunca passou por uma formação

escolar que dê a ele qualificação, que coloque uma embalagem. [...] (S.12)

Mas outras falas indicam que [...] as empresas vão desprender um tempo muito maior

em pegar esse técnico e treinar para ele entrar no mercado de trabalho [...] (S. 8), uma vez

que eles saem da Escola com muitas deficiências.

No que se refere especificadamente ao mercado para o técnico formado pelo CEFET-

SP , alguns professores apontam que apesar das deficiências decorrentes do modelo de

formação, existe uma carência muito grande de trabalhadores qualificados e isso garante o

sucesso profissional dos egressos. Mas para outros, o sucesso dos alunos decorre da

manutenção, nos cursos atuais, de aspectos relevantes do modelo integrado, particularmente, o

estágio curricular obrigatório: [...] as amarrações acabam ocorrendo fora do tempo da

Escola, quando eles se colocam dentro do ambiente de trabalho, quando eles vão enfrentar,

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de fato, as dificuldades, é onde eles vão ver o fechamento de alguns conteúdos que não

puderem ser plenamente desenvolvidos aqui. [...] (S. 13)

Se consideradas somente as citações que atribuem um caráter positivo à formação de

nível médio, destaca-se que elas surgem nas falas de apenas dois professores, sendo um deles

da Unidade Sede e o outro de Sertãozinho. O primeiro deles destaca o fato do técnico de nível

médio ter maiores condições de obtenção de emprego do que os profissionais de nível

superior, e o outro o “status” do técnico frente a outras ocupações de nível de escolaridade

inferior.

Os aspectos negativos indicados pelos professores não tratam necessariamente da

inexistência de postos de trabalho potencialmente indicados para a atuação de técnicos de

nível médio, mas apontam que a formação atual, que se dá por meio do modelo Seqüencial-

concomitante, traz enormes dificuldades de aceitação desse profissional, chegando mesmo a

levar à sua substituição por profissionais de nível superior.

[...] hoje o técnico esta indo para o chão de fábrica e o tecnólogo esta ocupando o lugar do técnico, porque hoje o tecnólogo tem o nível do técnico anterior, para você ver o nível como caiu, o técnico anteriormente, [...] exercia função de gerencia, de comando, [...] e hoje em dia não, hoje o nosso técnico tem que ir para o chão de fábrica produzir, porque o conhecimento dele é muito limitado. [...] (S. 8)

Uma das razões apresentada para essa desqualificação é de que com a expansão da

educação profissional que se deu com a Reforma houve certa proliferação de cursos, com

oferta dessa modalidade educativa por escolas que não tinham experiência nesse ensino.

Como resultado mais visível da impropriedade da formação de nível médio praticada

atualmente são apresentadas, em termos de mercado, constatações da desqualificação dos

técnicos e reclamações por parte do empresariado que [...] já estão reclamando disso [...] eles

estão sentindo na pele o que é o técnico formado pelo curso modular [...]que na grande

maioria é sofrível [...] (S. 8).

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A desqualificação da formação de nível médio se mostra, segundo a avaliação dos

professores, por meio dos resultados dos cursos seqüencial-concomitantes. Para eles, hoje,

[...] o aluno quando sai daqui, sai informado, mas a formação mesmo que a gente gostaria, a

gente acabou perdendo ao longo do tempo. [...] (S. 13)

Ainda que seja tributária de um único professor há uma referência sobre a

impossibilidade educativa do Ensino Médio deslocado da formação profissional. Para esse

sujeito, ele concentra toda uma gama de dificuldades que são decorrentes da sua

desarticulação com a realidade da vida e do trabalho, o que não confere possibilidade de

motivação dos alunos e de resultado para a sociedade.

As citações referentes à formação de nível médio se complementam com aquelas que

dizem respeito à formação em nível superior, os cursos de formação de tecnólogos, o que se

constitui a próxima subcategoria de análise.

6.2.4 Subcategoria 2.4. – Formação de Nível Superior

A subcategoria Formação de Nível Superior compreende um conjunto de citações dos

professores que dizem respeito às constatações, aspectos positivos e aspectos negativos da

formação de tecnólogos e, particularmente, dessa oferta pelo CEFET-SP. Os dados relativos à

formação de nível superior dizem respeito às citações dos professores acerca dos cursos

superiores de formação de tecnólogos. Os cursos superiores de licenciatura, dada à definição

dos sujeitos da pesquisa, não fazem parte da análise apresentada nesse trabalho.

A tabela abaixo apresenta, relativamente ao total de citações e de sujeitos abrangidos

pela amostra geral, o percentual referente a esses argumentos.

Tabela 13 – Formação de Nível Superior

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 17 11 5 33

% de citações 4,04 2,61 1,19 7,84

Nº de sujeitos 8 3 4 11

% de sujeitos 42,11 15,79 21,05 57,89

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Quase 60% dos professores fizeram referências à formação de nível superior. Há um

percentual alto daqueles que fizeram constatações e apontaram aspectos positivos, e

relativamente baixos para o total daqueles que apontaram aspectos negativos. Entretanto, o

percentual de citações sobre os aspectos negativos, ainda que elas tenham sido objeto da fala

de poucos professores, é superior ao referente a aspectos positivos.

O gráfico abaixo mostra a avaliação que os professores fazem sobre essa formação.

Gráfico 6 – Avaliação sobre a formação profissional de nível superior.

As constatações acerca da formação profissional de nível superior indicam que o

profissional formado como tecnólogo ainda não tem uma posição definida dentro da cadeia

produtiva, mas está muito próximo das antigas ocupações dos técnicos de nível médio, ou

seja, [...] está ocupando o lugar do técnico, tanto em questão de conhecimento quanto em

questão de salário [...] (S. 8), em funções em geral relacionadas com assistência técnica e

outras posições intermediárias.

No que se refere ao perfil dos alunos que freqüentam os cursos de tecnologia do

CEFET-SP, há indicação de que eles não possuem condições muito diferenciadas em relação

aos dos cursos técnicos atuais, ficando entre esses e os do antigo curso integrado, e via de

regra, apresentando pior formação geral do que os anteriores.

Destaca-se ainda o fato dos professores imputarem melhores qualidades aos alunos

dos cursos de tecnologia entre aqueles que já possuem formação técnica. Segundo S. 6 [...] A

característica desse aluno é de um conhecimento inferior aos alunos que a gente formava

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como técnico, mais ainda tem alunos que fizeram curso técnico em várias escolas, SENAI,

que vêm com os conhecimentos [...]

Existem citações que fazem referências à possibilidade da Escola, à medida que vai

verticalizando sua oferta de ensino no sentido de certificações de nível superior, ir deixando

de oferecer aquelas que possuem menor apelo do ponto de vista da valorização social.

A esse respeito há uma citação que traz a seguinte indagação: [...] eu fico imaginando

se a engenharia não mata o tecnólogo, se o tecnólogo não elimina o técnico, se não haverá

uma rivalidade entre esses cursos. [...] (S. 6).

Finalmente existem citações, particularmente relativas à realidade das unidades de

Sertãozinho e Cubatão, que indicam a possibilidade dos tecnólogos formados pelo CEFET-SP

ficarem ociosos, ou seja, não encontrarem no mercado um lugar para trabalhar, uma vez que

as necessidades atuais do sistema produtivo, nessas regiões, estão muito mais concentradas no

trabalhador para ocupar funções no “chão-de-fábrica”. A esse respeito assim se manifesta S.

19: [...] sobre o tecnólogo, em princípio, penso que seja uma opção para quem não consegue

ingressar numa engenharia. Eu não sei se as nossas empresas vão absorver, porque eles

precisam mesmo é de mão-de-obra para execução [...]

As citações que apontam aspectos positivos sobre a formação de tecnólogos aparecem,

exclusivamente entre os professores da Unidade Sede, notadamente aquela que possui maior

experiência com esse tipo de formação que é muito recente em Cubatão e está em fase de

implementação em Sertãozinho.

Os aspectos positivos, de caráter mais externo, ou seja, que avaliam a possibilidade

dessa formação para o mercado e para os alunos, dizem respeito à possibilidade dessa

formação servir como um aperfeiçoamento para os técnicos, especialmente para os que se

encontram no mercado de trabalho.

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Conforme indica um dos professores entrevistados, [...] É um complemento [...] o cara

vai sair daqui melhor preparado, e, talvez, seja aquele sujeito que passou pelo técnico e que

depois experimenta mais algumas vivências profissionais e quer dar mais uma alavancada.

[...] (S. 12)

No que se refere aos cursos oferecidos pela Escola, as citações apontam a importância

deles para a diversificação da oferta que até a edição da Reforma, estava concentrada na

educação secundária e, ainda, o melhor desempenho dos alunos relativamente aos que

freqüentam os cursos seqüencial-concomitantes: [...] com os cursos de tecnologia foi possível

retornar a esse nível um pouco mais alto. Eu acho que o efeito do decreto dois mil duzentos e

oito foi de balançar, de chocalhar a Escola que estava muito estática, num modelo único,

com uma clientela muito bem classificada [...] (S. 15).

Os aspectos negativos em relação à formação de tecnólogos, indicados pelos

professores, se concentraram quase que exclusivamente nas características dos cursos

oferecidos pelo CEFET-SP e dos alunos que os freqüentam. Uma questão que emerge é a de

que existe um problema claro de não diferenciação significativa entre o currículo oferecido,

numa mesma área, para os alunos dos cursos técnicos e dos tecnólogos: [...] um problema que

a escola vai precisar resolver, brevemente, é como diferenciar o perfil de um curso e do outro

[...] os nossos alunos do técnico de nível médio e de tecnologia estão disputando as mesmas

vagas [...] de estágio e de emprego. [...] (S.13)

Outro aspecto apresentado diz respeito à característica dessa formação ser

eminentemente teórica, não desenvolvendo habilidades específicas, o que a faz mais adequada

para adicionar valor à formação técnica de nível médio: [...] hoje no primeiro módulo não

passa por oficina nenhuma, então [...] na hora que tem que dimensionar as peças e etc.

precisa ter pelo menos um conhecimento das máquinas operativas tradicionais para poder

saber como ele dimensiona aquilo [...] (S. 6).

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No que diz respeito ao perfil do aluno, ainda que alguns professores tenham feito

citações, já indicadas anteriormente, imputando-lhes um melhor desempenho em relação aos

dos cursos técnicos, essa avaliação se contrapõe à de outros professores que desconsideram

essa realidade e afirmam se tratar de uma clientela que repete o perfil dos alunos do modelo

Seqüencial-concomitante e, por isso, indicam a impropriedade dessa formação pelo CEFET-

SP, tendo em vista que [...] A maioria dos alunos não consegue trabalhar, na calculadora,

com potência de dez. Há uma grande dificuldade em convencê-los de que a exponencial que

há na calculadora não vai atrapalhar [...] (S. 17).

Ainda que para efeitos de análise a Categoria Desenho Curricular tenha sofrido

subdivisões, elas não se diferenciam totalmente uma vez que existem relações implícitas e

explícitas entre as citações que tratam dessa temática. Mesmo que com aspectos mais

direcionados às questões de organização e desempenho do modelo, e outros mais voltados às

particularidades das formações segundo sua vinculação aos diferentes níveis de escolaridade,

as falas dos professores apresentam uma avaliação do impacto da Reforma na Escola,

destacando aspectos gerais, pontos positivos e negativos dessa realidade.

O gráfico abaixo mostra a avaliação dos professores acerca do Modelo Curricular

imposto pela Reforma e seus desdobramentos nos modelos e níveis de formação.

Gráfico 7 – Avaliação sobre o Modelo Curricular implementado pela Reforma

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Pode-se observar como destaque dos dados apresentados no gráfico um maior

percentual de citações que trazem aspectos negativos sobre a formação atual oferecida pela

Escola comparativamente àquelas que fazem uma avaliação positiva, destacadamente no

modelo Seqüencial-concomitante.

Destaca-se, nas citações dos professores, o potencial do Modelo Integrado em

proporcionar condições para os alunos compreenderem teoria e prática como elementos

indissociáveis da ação humana e do trabalho, em particular, o que potencializa a formação

profissional e a continuidade de estudos.

O modelo implementado pela Reforma, denominado Modelo Seqüencial-

concomitante, ao exigir a complementaridade impacta na exigência de tempo de estudos, uma

vez que determina que o aluno que não possua o Ensino Médio freqüente duas escolas ou dois

períodos de estudos. Outra característica desse modelo diz respeito à heterogeneidade

presente nas salas de aula onde se misturam alunos com idade e níveis de escolaridade

diferenciados e oriundos de escolas diferentes, em geral de escolas públicas, e com nível de

conhecimentos teóricos bastante reduzidos o que exige dos professores um trabalho que

atenda a essa diversidade.

O tempo de formação também é citado como um fator marcante do modelo

Seqüencial-concomitante, assim como nos cursos de formação de tecnólogos, sendo apontado

como uma forma de aligeiramento da profissionalização.

No que se refere aos resultados esperados pela Reforma, há indicações de que os

professores constatam que, se de fato a Escola se tornou mais terminal, com maior foco no

mercado de trabalho, por outro lado sua proposta de cursos técnicos deixou de ser atrativa e

ela perdeu parte da procura que tinha anteriormente.

No que se refere à formação de nível médio as citações dos professores apontam no

sentido da existência de mercado de trabalho para esse tipo de formação, porém com

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ocupações que, cada vez mais, se distanciam dos aspectos de concepção e se aproximam da

execução dos processos produtivos. Dessa forma, ela deve ser pensada muito mais como uma

forma de elevação dos conhecimentos dos trabalhadores permitindo assim que eles possam

ser mais eficientes frente às exigências tecnológicas atuais.

Entretanto os professores afirmam que a formação de nível médio praticada

atualmente pela Escola exige das empresas um tempo de treinamento indispensável para a

adequação dos egressos às características do trabalho técnico, ainda que realizado nas

ocupações de execução, uma vez que a falta de conhecimentos teóricos dos alunos aliada ao

pouco tempo de trabalho da Escola impõem uma formação bastante reduzida. Mas indicam

que, a grande demanda atual por mão-de-obra qualificada e a extensão da desqualificação da

formação de técnicos por todas as escolas, em algumas até muito mais do que no CEFET-SP,

acaba garantindo o sucesso dos alunos no ingresso no mercado de trabalho.

Sobre a formação de tecnólogos há indicações de não clareza sobre as funções desse

profissional. Algumas citações indicam a possibilidade dos tecnólogos estarem ocupando

efetivamente os lugares antes reservados aos profissionais de nível técnico, e essa realidade é

apresentada, por alguns professores, como resultante da reestruturação produtiva, mas por

outros como tributária da péssima formação de nível médio que resultou das alterações feitas

pela Reforma.

No que se refere aos cursos de tecnologia desenvolvidos pelo CEFET-SP, há

indicadores de que será necessário dar a eles um caráter mais prático e mais diferenciado dos

cursos técnicos com os quais eles se confundem não só no aspecto curricular, mas também no

perfil dos alunos, tanto pelo fato de serem trabalhadores já inseridos no mercado e que

procuram a Escola como forma de requalificação, tanto nas dificuldades de formação geral

que, não obstante seja relativamente diferenciada dos alunos matriculados no Modelo

Seqüencial-concomitante, estão distantes daquela desenvolvida no Modelo Integrado.

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Particularmente entre os professores da Unidade do interior e do litoral, há certa

resistência à formação de tecnólogos. Essa situação é determinada, por um lado, pela não

indicação clara de que há funções a serem exercidas por esses profissionais e, por outro,

devido à grande demanda por profissionais de “chão-de-fábrica”, o que pode causar o

desemprego dos egressos dos cursos de tecnologia.

Ressalte-se, portanto, uma indicação de que o Modelo Curricular deva ser revisto em

diferentes aspectos, buscando garantir maior qualidade no processo educacional desenvolvido

pela Escola.

Há dois aspectos que se sobressaem na análise dos professores sobre o modelo

curricular, o primeiro deles diz respeito à impossibilidade formativa do modelo não integrado.

A sua propriedade se restringe à requalificação profissional, ou seja, a agregar conhecimentos

e técnicas aos sujeitos que já estão inseridos nos processos produtivos e que são possuidores

de uma base técnica forjada na integração dos conhecimentos teóricos e práticos adquiridos

pela via do trabalho concebidos enquanto dimensão humana que inclui as atividades

escolares e tantas outras nas quais o homem atua enquanto sujeito social.

Enquanto proposta formativa, a educação profissional não pode ser pensada

separadamente da educação geral, pois deve abranger todas as dimensões do trabalho

humano. Sendo diferente, deixa de ser educação e passa a ter um caráter de alienação.

Silva (2007), citando Marcuse (1982), afirma que por ter como propósito final não a

formação de cidadãos críticos, mas atender aos ditames emergentes do capitalismo, o modelo

de formação proposto pela Reforma não se processa com a completude e significação

necessárias:

O pensamento positivista e behaviorista, hoje dominante, serve muito frequentemente para cortar a raiz da autodeterminação no espírito do homem – uma autodeterminação que significa hoje (como no passado) a desvinculação crítica do universo dado da experiência. Sem essa crítica da experiência o estudante é privado do método e dos instrumentos intelectuais que o habilitam a compreender sua sociedade e a cultura desta como um todo na continuidade histórica, na qual realiza esta sociedade, que desfigura

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ou nega suas próprias possibilidades e promessas. O invés disso, o estudante é mais e mais adestrado para compreender e avaliar as relações e possibilidades estabelecidas somente em relação às relações e possibilidades estabelecidas: seus pensamentos, suas idéias, seus objetivos são metódica e cientificamente estreitados – não pela lógica, pela experiência nem pelos fatos, senão por uma lógica depurada, por uma experiência mutilada, por fatos incompletos. (p.196).

Diante do quadro de incompletude curricular os professores indicam que buscam

formas que permitam aos alunos a realização da síntese necessária para a compreensão dos

processos tecnológicos. Mas, essas tentativas têm sido por vezes frustradas devido à grande

heterogeneidade das turmas, processo que decorre das grandes diferenças entre idade,

interesse, experiência de vida e, fundamentalmente, bagagem de conhecimentos de formação

geral que os alunos possuem.

Decorre dessa posição dos professores a indicação de que os processos seletivos de

ingresso à Escola não têm cumprido com a sua proposta de seleção de candidatos aptos ao

acompanhamento dos cursos. Essa situação, particularmente nos cursos técnicos, pode ser

resultante da queda nas procuras por esses cursos, conforme já se evidenciou nesse trabalho.

Mas, faltam na análise dos professores, parece-nos, elementos que permitam buscar a

raiz dessa problemática e que está além da questão da forma de seleção dos alunos, uma vez

que, conforme assinala Contreras (2002), um dos princípios que sustentam as reformas

educacionais nos anos de 1990 é exatamente o da descentralização para atendimento da

diversidade.

Para o autor, a indicação da descentralização como forma de atender às diferenças

presentes na sociedade se reveste de certo hibridismo discursivo ao vincular essa orientação

como uma conquista ligada à reivindição de autonomia por parte dos professores e das

escolas, mas, ao mesmo tempo, colocá-la como um imperativo à organização da educação

reformada. Trata-se de uma maquiagem que esconde os propósitos de oferecer educação

diferente para estratos sociais diferentes e, ao mesmo tempo, responsabiliza a Escola, em

especial a pública, pelo fracasso do Estado em fornecer educação de qualidade. Cada Escola

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ou sistema passa a ter responsabilidade própria pelo sucesso ou fracasso de seus alunos e

busca formas de selecionar aqueles que apresentarão melhores resultados.

[...].O problema não é, obviamente, que as escolas realizem seus planos e projetos, mas sim em que contexto está definida esta tarefa e sob qual mentalidade hegemônica podemos entendê-la e realizá-la. [...]. esses supostos ganhos podem ser aparentes se apenas gerar processos de discussão sobre os modos da prática educativa, sem capacidade de decisão sobre os porquês e os caminhos, que têm que ser aceitos, ou sem capacidade de intervir nas condições em que transcorre a escolaridade. O êxito político destas reformas depende precisamente de que os professores aceitem essas limitações como ganho. (p.267).

Vemos então que a questão da heterogeneidade, ainda que seja um problema concreto

com o qual os professores convivem no seu dia a dia, ele não será resolvido pela via da ação

individual, que só se justifica dentro de um modelo de competitividade entre instituições,

processo que pouco ou nenhum benefício tem trazido para a Educação em nosso país quando

visto sob o ponto de vista de toda a coletividade.

A realidade da Educação brasileira no que se refere à capacidade de dotar os jovens e

adultos dos conhecimentos científicos necessários à formação profissional será apresentada no

capítulo seguinte em uma categoria específica, denominada Alunos e subdividida em Perfil do

Aluno Anterior à Reforma e Perfil do Aluno Atual.

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CAPÍTULO 7. O PERFIL DO ALUNO DO CEFET-SP: o resultado da Reforma sob o

ponto de vista da formação profissional e da democratização do acesso.

[...].De cada 10 jovens de classe média e alta, 9 estudam, enquanto somente 4 estudam a cada 10 jovens pobres, sendo 3 fora da respectiva série escolar. Mesmo que o país viesse a encontrar uma situação de pleno emprego, os jovens filhos de pais pobres ficariam no andar de baixo, enquanto os filhos das classes médias e alta no andar de cima de uma hierarquia ocupacional, reproduzindo recorrentemente o padrão execrado de desigualdade de renda. (POCHMANN (2004),apud CORDEIRO & COSTA (2006)).

Conforme já expusemos no capítulo 5, houve na fala dos professores citações que

dizem respeito ao perfil do aluno que a Reforma trouxe para a Escola. Mas, há também

grande ênfase no perfil daqueles que, a partir da extinção do modelo integrado, deixaram de

freqüentá-la. A análise dessas considerações compõe o presente capítulo e pode ser tomada

como um indicador do resultado da promessa dos ideólogos da Reforma de proporcionar

democratização do acesso às escolas técnicas a jovens e adultos de classes sociais menos

favorecidas economicamente e, assim, garantir-lhes maiores chances de inserção social.

7.1. Categoria 3 - Alunos

Assim como naquelas que foram apresentadas nos capítulos anteriores, a Categoria

Alunos se compõe de citações que se subdividem em três grupos: constatações, aspectos

positivos e pontos negativos. Entretanto, no caso específico do Perfil do aluno anterior à

reforma inexistem citações que apresentem aspectos negativos no perfil deles. Dessa forma,

essa subcategoria apresenta somente citações e aspectos positivos, enquanto a segunda

subcategoria mantém os três grupos. Os exemplos apresentados na tabela abaixo seguem essa

diferenciação entre as duas subcategorias.

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Tabela 14 – Categorias e Subcategorias relativas ao perfil dos alunos

CATE-GORIA

SUBCATEGORIAS EXEMPLOS

N

º.

3.1. PERFIL ANTERIOR À REFORMA

[...] antes da reforma nos trabalhávamos com a elite, um processo seletivo apurado, tínhamos uma relação candidato vaga muito grande [...] (S.1). [...]. eu acho que a homogeneidade da sala é muito importante [...] S. 9

13

3. A

LU

NO

S

3.2. PERFIL DO ALUNO ATUAL

[...] vem para cá o sujeito que tem esse perfil [...] que pretende mudar de emprego ou que está desempregado e precisa melhorar, [...]. S.12 [...] os alunos hoje chegam pior do que antes, estão chegando muito fracos, está pior que o complementar [...] (S. 5). [...] já o tecnólogo é mais tranqüilo. [...] ele é um aluno mais maduro, ele sabe onde buscar informação. [...] S. 10

82

Destaca-se o fato de todos os professores entrevistados terem feito citações acerca do

perfil dos alunos, sejam elas referentes ao perfil dos alunos anteriores à Reforma ou do aluno

atual.

7.1.1 Subcategoria 3.1. – Perfil do aluno anterior à Reforma

Como já foi destacado acima, a subcategoria Perfil do aluno anterior à Reforma não

apresenta citações que façam referências a aspetos negativos no perfil dos alunos que

freqüentavam o antigo modelo de formação oferecido pela Escola: o Ensino Integrado. A

tabela abaixo comprova essa situação.

Tabela 15 – Perfil do aluno anterior à Reforma

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 8 0 5 13

% de citações 1,90 0,00 1,19 3,09

Nº de sujeitos 3 0 4 7

% de sujeitos 15,79 0,00 21,05 36,84

O gráfico abaixo mostra, relativamente ao total de citações constantes da subcategoria,

a avaliação positiva dos professores acerca das características desse alunado.

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122

Gráfico 8 - Avaliação do Perfil do aluno anterior à Reforma

As constatações acerca do perfil do aluno que freqüentava a Escola antes da Reforma

se dividem entre aquelas que tratam do aluno dos cursos do Modelo Integrado, em que o

currículo se compunha de componentes curriculares de formação geral e específica e que, em

geral, atendia a adolescentes concluintes da oitava série do Ensino Fundamental, e o Modelo

Complementar, em que os alunos, jovens e adultos concluintes do Ensino Médio, cursavam

disciplinas de formação específica. Uma proposta, de certa forma, próxima aos atuais cursos

de formação de tecnólogos, no que diz respeito à seqüencialidade.

No que diz respeito ao Modelo Integrado, as citações se referem a dois pontos, um

deles é o fato desses alunos serem muito selecionados, num processo de ingresso em que a

disputa na entrada, notadamente na Unidade Sede, se aproximava de vinte candidatos por

vaga.

No outro ponto aparecem as condições de desenvolvimento que esses alunos tinham

durante o curso, uma vez que possuíam uma boa bagagem de conhecimentos teóricos e muita

facilidade e autonomia de aprendizagem: [...] a gente podia ter uma série de pressupostos de

exigências, de ações, de trabalhos, pedir para que o aluno pesquisasse mais [...] e aqui não

vai nenhum juízo de valor meu da qualificação do aluno anterior e do aluno atual, eu não

estou dizendo que um era melhor do que o outro, eu estou fazendo uma constatação. [...] (S.

12)

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As citações que trazem constatações sobre o aluno do Modelo Complementar indicam

que, embora eles formassem turmas heterogêneas no tocante aos conhecimentos científicos

necessários ao aprendizado técnico, essa diferenciação não era tão gritante como no Modelo

Seqüencial-concomitante, pois a exigência de conclusão do Ensino Médio, de alguma forma,

garantia certo nivelamento em, no máximo, dois grupos diferenciados, cada um deles com

características negativas e positivas, sendo possível estabelecer uma troca de conhecimentos,

potencializando a ação dos professores.

No que diz respeito às características de cada grupo há indicações de que em um deles

os alunos possuíam melhor base de conhecimentos gerais e, no outro, de conhecimentos

técnicos, por estarem inseridos já no mercado de trabalho.

Há, entretanto, indicação que, via de regra, os professores também não gostavam de

trabalhar nos cursos complementares, pois a heterogeneidade exigia, por um lado, fazer com

que os alunos que possuíam mais conhecimentos apoiassem os que não tinham essa condição

no sentido de vencerem essas dificuldades e, por outro, incentivar aqueles que dominavam as

tecnologias, do ponto de vista da sua execução, a mostrarem aos primeiros a aplicação das

teorias trabalhadas nas salas de aula e nos laboratórios.

Surge ainda nas falas, o indicativo que havia entre esses alunos muitos que possuíam,

especialmente do ponto de vista da sua execução, maiores conhecimentos que os próprios

professores, fazendo com que houvesse resistência na aceitação de aulas nesses cursos:

[...] eles sabiam qual material deveria ser utilizado em cada circunstância e, de certa forma, isso fazia com que, na época, grupos de professores não gostassem de trabalhar com esses alunos, um pouco pelo trabalho excessivo que você tinha para poder conciliar essas características diferenciadas dentro da sala-de-aula, ou mesmo por ter que conviver com pessoas que tinham conhecimentos sobre vários assuntos, muitas vezes, superiores a nos que estávamos trabalhando. [...] (S. 11)

Os aspectos positivos que, na visão dos professores, qualificavam os alunos do antigo

Curso Integrado tanto para a formação técnica como para o segmento dos estudos são:

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1) possuírem na entrada e no segmento do curso uma boa base de formação

geral;

2) formarem turmas homogêneas, fator considerado extremamente

importante;

3) serem motivados para a aprendizagem, uma vez que sabiam da condição de

empregabilidade que a formação oferecia, tanto em curto prazo, na atuação

como técnicos de nível médio, como no futuro, nas profissões

universitárias que seriam potencializadas pela formação técnica, pois esses

egressos sempre se caracterizaram pela excelência: capacidade

profissional, autonomia, condições de progredir, sempre se caracterizaram

por isso. [...] (S. 171)

Em contraposição ao perfil indicado anteriormente, em que os aspectos positivos são

claramente indicados, o aluno atual é reconhecido, pela grande maioria dos entrevistados, por

seus aspectos negativos.

Mas existem indicações interessantes sobre algumas qualidades que destacam os

alunos do Modelo Seqüencial-concomitante tanto em relação aos do antigo curso integrado,

como dos que estão freqüentando os cursos de formação de tecnólogos. As citações que

dizem respeito a esse aspecto da Reforma são analisadas na categoria apresentada a seguir.

7.1.2 Subcategoria 3.2. – Perfil do aluno atual

O quantitativo de citações acerca do perfil do aluno atual e dos sujeitos que o

referiram está indicado na tabela a seguir.

Tabela 16– Perfil do aluno atual

constatações Aspectos negativos Aspectos positivos Total

Nº citações 33 36 12 81

% de citações 7,84 8,55 2,85 19,24

Nº de sujeitos 14 16 5 19 % de sujeitos 73,68 84,21 26,32 100,00

Os dados da tabela acima indicam certa concentração das citações nas constatações e

aspectos negativos do perfil dos alunos, com uma pequena representatividade para os aspectos

positivos, situação que se repete na indicação dos sujeitos que a eles se referiram.

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125

O gráfico abaixo mostra a representatividade que as citações acerca das constatações,

aspectos positivos e negativos possuem, relativamente a essa subcategoria.

Gráfico 9 - Avaliação do Perfil do aluno atual

As constatações sobre o perfil do aluno atual indicam que houve uma mudança

significativa no nível sócio-econômico dos alunos matriculados nos cursos da Unidade Sede,

em especial no modelo Seqüencial-concomitante e, em uma escala um pouco menor, nos

cursos de formação de tecnólogos.

Entretanto, a alteração do perfil sócio-econômico dos alunos dos cursos técnicos se

diferencia substancialmente entre aqueles que fazem o Ensino Médio e Técnico na própria

Escola, daqueles que fazem somente a formação técnica, sendo os primeiros relativamente

comparáveis aos do antigo curso integrado, pois [...] atualmente existem alunos da tarde e

alunos da noite só que os da tarde fazem Ensino Médio de manhã, então eles continuam com

o mesmo perfil socioeconômico antigo. [...] (S.7)

Em algumas áreas da Unidade Sede essa característica se mostra muito forte, ou seja,

se mantém, no Ensino Técnico Seqüencial-concomitante, graças à vinculação com o Ensino

Médio da Escola, um perfil de aluno muito próximo daquele que freqüentava o Ensino

Integrado. Entretanto, destaca-se o fato de que os professores que fazem essas citações

ministrarem aulas em áreas em que há uma maior disputa por vagas, como é o caso da

Informática:

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[...] os nossos alunos, [...] diferentemente dos alunos que vêm de fora, eles conseguem se superar. São, especialmente, no caso do curso de informática, alunos que vêm do nosso Ensino Médio, então nos temos [...] alunos matriculados no Ensino Médio e no Técnico, em número muito grande, mais de cinqüenta por cento [...] (S.13).

Nas unidades de Sertãozinho e Cubatão as indicações que tratam da diferenciação do

perfil dos alunos indicam mais a alteração da idade, que hoje é significativamente mais

elevada, assim como a falta de conhecimentos de formação geral e de motivação que não se

mostravam nos alunos do modelo anterior, mas não há destaque para uma grande

diferenciação na situação econômica desses alunos, em relação à dos anteriores.

Há uma caracterização do perfil dos alunos do modelo Seqüencial-concomitante em

termos de conhecimentos científicos, em três grupos distintos: o primeiro deles está próximo

ao perfil dos alunos do antigo Integrado, portanto com uma boa base, outros que possuem um

nível mediano de conhecimentos e que demandam certo esforço dos professores mas

conseguem acompanhar as aulas e um terceiro grupo que não tê,m nenhuma condição de

compreenderem os princípios científico-tecnológicos indispensáveis à formação técnica e,

dessa forma, acabam deixando a Escola, pois como diz um dos entrevistados: [...] aqui no

CEFET, eu não sei no período noturno, mas no período diurno a gente tem uma evasão muito

grande, por conta de simplesmente não conseguirem acompanhar o curso [...] (S.7).

Há indicativos, em especial relativamente aos cursos noturnos, de que os alunos dos

cursos técnicos e dos cursos de formação de tecnólogos são profissionais inseridos no

mercado e que buscam na Escola a requalificação que lhes permita permanecerem

empregados, mudarem de posição dentro das empresas ou, até mesmo, obterem um novo

emprego, uma vez que alguns deles se encontram desempregados.

Ainda que algumas citações apontem que muitos desses alunos só busquem a Escola

para ter um diploma que atenda às exigências de certificação, há outras que dizem que essa

condição de trabalhador confere a eles certa motivação para o aprendizado. Entretanto se

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destacam as dificuldades dos alunos adultos que com grande gama de responsabilidades

acabam ausentes das aulas repetidamente, fator que prejudica ainda mais o aprendizado.

A questão da desmotivação dos alunos que freqüentam os cursos seqüencial-

concomitantes se destaca entre os professores que ministram disciplinas de caráter mais

teórico. Os professores entendem que essa característica decorre da dificuldade dos alunos em

relacionarem formação teórica com profissionalização: [...] eu dou matérias básicas e, muitas

vezes, o aluno pergunta onde vai usar isso. Eu respondo que, se tudo correr bem, ele não vai

usar nada do que eu estou ensinando, mas está aprendendo a buscar informações, a

generalizar, a coletar informações e usá-las para resolver seus problemas [...] (s. 17).

Algumas citações levam à constatação de falta de empenho dos alunos atuais em

vencerem suas dificuldades, de enfrentarem o desafio da profissionalização. A causa apontada

pelos professores para essa característica é de que eles possuem a cultura da promoção

automática em que o desempenho não se associa a resultados: [...] uma aluna há um mês,

quando fui marcar prova perguntou? Mas aqui tem prova, professor? Eu expliquei que aqui

tem prova controle de presença, que os alunos têm obrigações e não vêm só por vir[...] (s.

19).

Há uma constatação interessante acerca da intenção de prosseguimento de estudos por

parte de todos os alunos. Sejam dos cursos seqüencial-concomitantes ou dos cursos de

formação de tecnólogos: todos têm interesse em prosseguir seus estudos. No caso dos

tecnólogos, há uma intenção futura de busca pelo diploma de engenheiro.

Se analisadas no sentido de verificação da real possibilidade de democratização da

Escola, como propugnada nos ideais da Reforma, as constatações do perfil do aluno atual

servem como um indicador de que houve um movimento nesse sentido. Porém esse

movimento não foi uniforme, uma vez que a avaliação dos professores da Unidade Sede

indicam uma mudança acentuada no perfil sócio-econômico dos alunos atualmente

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matriculados nos cursos seqüencial-concomitantes, em relação ao daqueles que freqüentavam

o Ensino Integrado. Os das unidades de Sertãozinho e Cubatão afirmam que essa

característica não se alterou.

Em linhas gerais, os professores apontam que o remédio utilizado para solucionar o

problema da falta de acesso à Escola pelas camadas mais desfavorecidas não deveria ter sido

aplicado, necessariamente, em todas as unidades uma vez que elas apresentavam alunos dom

características sócio-econômicas bastante diferenciadas.

Os aspectos positivos relativos ao perfil do aluno atual se diferenciam, em grande

parte, nas citações que tratam dos alunos dos cursos desenvolvidos no modelo Seqüencial-

concomitante e nas que tratam daqueles que freqüentam os cursos superiores de formação de

tecnólogos.

Em linhas gerais, ao perfil de uma pequena parte dos alunos dos cursos seqüencial-

concomitantes são atribuídas qualidades que dizem respeito a dois aspectos específicos: a

experiência que eles trazem para a Escola e a possibilidade de inserção desses alunos no

mercado.

A experiência acumulada de vida e de trabalho presente em parte dos alunos, segundo

os professores, confere a eles uma melhor compreensão do discurso docente e enriquece as

aulas que, além de serem mais interessantes para o conjunto da turma, são enriquecedoras

para os próprios professores: [...] em termos de riqueza de experiências de vida, riqueza de

troca de conhecimento dentro da própria sala-de-aula, essa turma posterior, desse novo

modelo, do seqüencial, [...] me senti mais satisfeito porque eu acho que meu discurso é mais

bem entendido, melhor percebido [...]. (S. 12)

No que diz respeito ao mercado de trabalho, há indicação que, não obstante todas as

dificuldades que caracterizam esse modelo de formação e as dificuldades de aprendizado dos

alunos, eles conseguem se destacar no sistema produtivo. Segundo S. 11, [...] embora não

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tenhamos uma pesquisa de egressos atualizada, para medir isso de forma mais clara, os

comentários que temos, dos nossos ex-alunos, é de que eles têm se posicionado

razoavelmente bem no mercado. [...].

Esse relativo destaque dos alunos é apontado como uma propaganda positiva da

Escola junto aos empresários. O aluno do CEFET-SP [...] ainda consegue trazer para nossa

Escola a chance de um contato bastante interessante com as empresas que se interessam por

eles. [...] (S. 13)

Os aspectos positivos indicados sobre o perfil do aluno dos cursos superiores é,

especialmente, a possibilidade de avanços nos conteúdos. Esse aspecto é indicado como o

grande diferenciador nas turmas de ensino técnico das de tecnologia e a explicação para esse

resultado é de que os alunos dos cursos superiores têm muito mais motivação e são muito

mais esforçados do que aqueles que estão no ensino técnico.

Um ponto de destaque nas citações sobre os aspectos positivos dos atuais alunos é a

quase exclusividade de falas dos professores da Unidade Sede, uma única citação em

Sertãozinho e nenhuma em Cubatão.

Outro destaque diz respeito à indicação de que a Escola não tem realizado um trabalho

sistemático de acompanhamento de egressos que poderia permitir uma avaliação mais apurada

da inserção e desempenho dos profissionais formados pelo CEFET-SP.

A subcategoria que analisa os aspectos negativos do perfil dos alunos que freqüentam

o CEFET-SP hoje concentra o maior percentual de citações entre todas as que estão sendo

objeto desse trabalho.

Nela se destacam vários aspectos que, ainda que não possam ser considerados como

singulares, posto haver outras referências aos mesmos temas em subcategorias já analisadas

anteriormente, trazem indicações que motivaram uma análise em particular.

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Entre as citações que dizem respeito à desqualificação dos alunos que freqüentam a

Escola hoje, ainda que algumas delas façam referência ao perfil dos alunos dos cursos

superiores de tecnologia, há ênfase nos matriculados nos cursos seqüencial-concomitantes. No

que diz respeito aos temas apresentados se destacam como perfil desses alunos:

descompromisso com o ensino técnico, desmotivação, baixo nível de conhecimentos

científicos, heterogeneidade e baixo desempenho no mercado de trabalho.

Um dos motivos para o descompromisso com a formação técnica se dá, segundo os

professores, pelo fato do aluno cursar o Ensino Médio concomitantemente ao Técnico, dar

prioridade à conclusão do primeiro e trazer a cultura das escolas públicas em que o nível de

exigência é, segundo os professores, cada vez menor: [...]vêm do Ensino Médio do estado,

vêm sem interesse nenhum, vêem como uma brincadeira, como um oba-oba. [...] (S. 19)

Outro dos motivos para o descompromisso desses alunos, segundo os professores, está

mais presente entre aqueles que já concluíram o Ensino Médio. Esse alunos, via de regra, já

estão inseridos no mercado de trabalho e buscam a Escola como uma forma de regulamentar

sua função na empresa, especialmente devido aos processos de certificação de qualidade dos

processos e produtos: [...] o aluno hoje é outro, antes o aluno vinha para cá para aprender,

hoje ele quer pegar um diploma. [...] (S. 16).

As principais causas apontadas para a desmotivação desses alunos são a falta de uma

base de conhecimentos científicos que os impede de acompanharem as aulas e as incertezas

acerca da sua real condição de obtenção de emprego após a formação, uma vez que ela se dá

de forma deficiente.

Os professores apontam a falta de base que se estende por todas as áreas de formação,

mas consideram que as dificuldades em Matemática e Física é o que traz maior prejuízo à

formação técnica desses alunos: [...] os próprios alunos dizem que as maiores dúvidas deles

continuam sendo na Matemática e na Física [...] quando falo de regras trigonométricas eles

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se perdem, se mudo qualquer coisa eles se perdem, eles não têm iniciativa de enxergar os

condicionantes de um assunto sozinhos. [...] (S. 19)

Ainda que a questão do baixo nível de conhecimentos científicos por parte dos alunos

se concentre entre as citações referentes aos matriculados nos cursos do modelo Seqüencial-

concomitante, ela não deixa de estar presente nas falas que tratam do perfil dos alunos dos

cursos de tecnologia. Um dos entrevistados afirma: [...] hoje eu dou aula no tecnológico de

Eletrônica Digital e é lamentável. Você pega uns alunos que eu não sei como conseguiram se

formar no Ensino Médio: eles não sabem o básico do básico [...] (S. 8).

A problemática da falta de pré-requisitos dos alunos dos cursos do Modelo

Seqüencial-concomitante é potencializada, segundo os professores, pelo fato das turmas

serem muito heterogêneas, impedindo assim que eles possam adotar estratégias comuns para a

tentativa de homogeneização de uma base mínima, posto que as diferenças são muito

gritantes.

Essa diferença se mostra mais claramente pelo fato de uma mesma turma possuir

alunos que fazem o Ensino Médio no CEFET-SP, e que passaram por uma seleção rigorosa, e

outros de fora, que estudam em outras escolas ou que já estão há muito tempo sem estudar.

Há, portanto, uma clara distinção entre o perfil dos alunos que fazem o Ensino Médio na

Escola e os que freqüentam somente os cursos técnicos, seja na forma concomitante ou

seqüencial: [...] alunos que fazem o médio em um período e o técnico no outro, ainda

conseguem dar a esse curso certa tranqüilidade no desenvolvimento das disciplinas técnicas.

[...] alunos que fazem o médio fora ou que já tenham feito o médio [...] esses apresentam

deficiências crônicas nas disciplinas de base. [...] (S. 11)

Segundo os professores, o maior impacto do perfil negativo do aluno atual se

manifesta pelo baixo desempenho deles no mercado de trabalho, o que chega a comprometer

o nome e a tradição da Escola. Por outro lado, esse desempenho também acarreta

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desmotivação nos alunos que não enxergam a possibilidade imediata de emprego ao final do

curso: [...] aquele aluno da escola pública, aquele aluno mais carente, esse sim está

prestando o vestibular e está hoje fazendo o técnico [...]. Há um problema, como esse aluno é

deficiente, ele está tendo problemas para entrar no mercado de trabalho [...] (S. 10).

O problema de ingresso e de permanência no mercado foi bastante indicado nas

citações referentes à Unidade de Cubatão, em que os professores se mostraram bastante

preocupados com essa situação. Um deles afirma que [...] colegas da empresa, que sabem que

eu sou docente aqui na escola, vieram me perguntar o que estava acontecendo com os alunos

da federal. Isso é terrível para a própria reputação da Escola. [...] (S. 17)

Essa situação se repete na visão dos professores da Unidade Sertãozinho, ou seja, há

indicação de que a formação de saída dos alunos não é suficiente para que eles ocupem a

função técnica para as quais estão sendo preparados: [...] As empresas estão tendo

dificuldades porque eles chegam sabendo muito pouco do mínimo que precisam [...] disseram

não saber o que nós estamos fazendo, tanto nós como o SENAI. Eles pediram que a gente

revisse o estilo, a metodologia, porque eles estão tendo muita dificuldade [...] (S. 19).

Existem, em algumas áreas, particularmente na Unidade Sede, melhores perspectivas

de ingresso do sistema produtivo ao final do curso, mas elas decorrem de ações isoladas e não

representam uma política institucional. Afirma S13, relativamente à área de Informática: [...]

nos temos nichos de mercado por conta de alguns conteúdos programáticos que, mesmo a

revelia do mercado, a gente manteve, por exemplo, a disciplina de COBOL [...] (S. 13).

Em resumo, pode-se indicar que há uma avaliação dos professores de que, via de

regra, os aspectos negativos referentes ao perfil do aluno que freqüenta o CEFET-SP hoje,

caracterizado por sujeitos que chegam com poucos conhecimentos científicos e que têm baixo

rendimento durante o desenvolvimento dos cursos, impacta de forma negativa no desempenho

deles, e da própria Escola, no mercado de trabalho.

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Exceto por algumas citações que fazem aproximações entre os alunos que

freqüentavam a Escola antes da edição da Reforma e os que a freqüentam hoje, manifestações

restritas aos alunos do Ensino Médio e dos cursos de formação superior, há, relativamente a

esses perfis, uma contraposição que abrange vários aspectos.

Do ponto de vista do domínio das condições intelectuais necessárias para o

desenvolvimento da formação técnica há uma diferença significativa, uma vez que os antigos

alunos possuíam as “condições ideais” e, além disso, mantinham esse desenvolvimento

durante o curso integrado, uma vez que o currículo, como o próprio nome remete, integrava

formação geral e específica. Pode-se considerar, portanto, que o ideal de aluno presente na

fala dos professores é o do antigo curso integrado.

Em contraposição aos alunos atuais, cujo perfil é demarcado pela evasão durante o

percurso de formação, os alunos do antigo curso integrado passavam por um processo de

classificação que selecionava aqueles que tivessem melhores condições de acompanharem a

proposta da Escola. Além disso, processo rigoroso de avaliação seleciona aqueles que não

apresentavam desempenho satisfatório.

No que se refere ao comprometimento dos alunos, havia entre os antigos um

compromisso tácito com a conclusão do Ensino Médio, com o ingresso no Ensino Superior e

com a formação técnica que lhes garantia, em curto prazo, a chance de obter um emprego, e,

no futuro, um melhor desempenho nas funções de nível superior, especialmente nas

engenharias.

Os alunos de hoje, particularmente dos cursos seqüencial-concomitantes, chegam à

Escola com profundas deficiências no que se refere ao domínio dos conhecimentos

científicos, e essa condição impede que eles obtenham formação técnica no mesmo nível da

que era proporcionada aos alunos do antigo modelo.

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Parte desses alunos, entre os quais estão os matriculados nos cursos de formação de

tecnólogos, busca a Escola como uma forma de qualificação ou requalificação profissional e,

nesses casos, existe por parte deles certo comprometimento em conhecerem os fundamentos

presentes no seu trabalho e, ao mesmo tempo, em socializarem os conhecimentos que são de

seu domínio, situação que enriquece as aulas e permite certa superação das dificuldades que

eles trazem em termos de pré-requisitos.

Mas boa parte dos alunos, especialmente os dos cursos seqüencial-concomitantes, não

têm compromisso com a formação técnica, uma vez que não vislumbram condições de

obterem emprego como técnicos ou estão cumprindo a obrigação de posse de um diploma

como forma de garantia de manutenção de seus empregos e da habilitação da empresa nos

processos de certificação.

Os alunos que freqüentam os cursos de forma concomitante, sejam alunos do Ensino

Médio do CEFET-SP ou não, dão prioridade à conclusão do Ensino Médio, o que é apontado

como uma das causas para os altos índices de evasão.

A problemática da evasão também se apresenta como decorrente das dificuldades dos

alunos com baixo nível de conhecimentos gerais, em desenvolverem os conhecimentos

específicos.

Outra questão que, segundo os professores, justifica a saída dos alunos é o fato deles

não valorizarem os conhecimentos escolares, uma vez que adquiriram, no percurso da

escolaridade básica, a cultura da promoção automática.

Finalmente, há indicação de que as características que levam os alunos atuais ao

descompromisso também imputa a eles altas doses de desmotivação, o que complementa o

perfil negativo deles frente aos do antigo curso integrado.

Sem dúvida, há entre os professores do CEFET-SP certo saudosismo em relação ao

aluno no antigo curso integrado e há entre eles resistência em trabalhar com as dificuldades

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que se apresentam com o perfil do alunado atual, assim como acontecia com os do antigo

curso complementar. Mas, as considerações em relação ao perfil do aluno atual trazem

questões subliminares que dizem respeito, em especial, ao problema de democratização da

Escola.

Conforme assinala Saviani (2005) democratizar deveria se constituir como um

processo que não tem a ver somente com a possibilidade do acesso, mas sim com a garantia

de que os alunos terão direito à posse do conhecimento. Para o autor, no processo histórico da

formação escolar seu atrelamento aos ditames econômicos e aos objetivos da burguesia

deslocou o foco da Escola do conteúdo para os métodos e práticas de ensino. Esse

deslocamento do ponto central da educação escolar se dá como uma ação de cunho ideológico

na medida em que conhecimento e poder podem ser vistos como condições muito próximas e

que a falta do primeiro significa submissão ao segundo.

Segundo Sacristán (1998) todas as pessoas que trazem qualquer tipo de atuação

relacionada à educação, assim como aquelas que passaram ou estão passando pela escola têm

uma imagem do significado do processo de ensinar. Entretanto, afirma que essas imagens, em

geral, estão fixadas às atividades de ensino, às experiências escolares e, poucas vezes,

remetem ao conteúdo trabalhado nas situações de aprendizagem, deixando uma impressão de

que se trata de algo circunstancial, embutido no processo de ensino e que, por ser próprio, não

desperta a atenção.

Essa característica de desvalorização ao conteúdo do ensino, apresenta-se também no

discurso pedagógico e nas pesquisas educacionais que, via de regra, enfatizam as atividades e

não relacionam essa ação com o seu conteúdo, visto muito mais como um problema sobre o

qual há pouca possibilidade de intervenção.

Uma primeira explicação para a “despreocupação” com os conteúdos de ensino,

segundo o autor, advém da tradição tecnicista das décadas de 60 e 70, cujo cientificismo

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apontava para a importância de se estabelecer ‘objetivos’ mensuráveis e de se utilizar técnicas

de ensino que proporcionassem a mensuração dos objetivos propostos. Esse pensamento

reflete um ideário de separação, de especialização, em que questões complexas devem ser

resolvidas de forma parcelada e por diferentes agentes. Nesse sentido, não cabe à escola

discutir as questões de conteúdo, dada a complexidade desse elemento do ponto de vista

político e social.

Essa separação, ensino e aprendizagem, é conseqüente de razões de ordem intra e extra

educação escolar. Se por um lado, considerações de ordem relacional entre professor e aluno,

no sentido de valorização da figura do discente como um sujeito construtor da sua

aprendizagem, assim como questionamentos sobre a viabilidade dos conteúdos propostos pela

escola em relação às necessidades e interesses sociais, fizeram com que o conteúdo ficasse à

parte das discussões pedagógicas, por outro, esse distanciamento refletiu uma posição política

de separação entre os que pensam e os que fazem a educação.

Sacristán (1998), sem desprezar a metodologia, destaca a importância do conteúdo no

processo de ensino:

“Sem conteúdo não há ensino, qualquer projeto educativo acaba se concretizando na aspiração de conseguir alguns efeitos nos sujeitos que se educam. Referindo-se estas afirmações ao tratamento científico do ensino, pode se dizer que sem formalizar os problemas relativos aos conteúdos não existe discurso rigoroso nem científico sobre o ensino, porque estaríamos falando de uma atividade vazia ou com significado à margem do que serve. (...)” (p.120)

O autor destaca ainda a importância de uma análise mais profunda do sentido do

ensino, ou da ‘função cultural das escolas’, alertando que: No final das contas, a instrução

nas escolas é uma forma de transmissão cultural ao lado de outras que afetam muito

decisivamente os indivíduos nas sociedades modernas. (FORQUIM, apud SACRISTÁN,

2000a, pág.122).

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Se tomarmos a idéia de democratização como possibilidade de emancipação das

classes sociais menos favorecidas, podemos considerar que esse processo não se efetivou na

educação brasileira em que vivemos muito mais alternativas de eqüidade do que de igualdade.

Grande parte dos alunos matriculados ou concluintes do Ensino Médio, em especial os

oriundos das escolas públicas, sofrem duplo processo de exclusão: são direcionados à

profissionalização de nível médio com a perspectiva de que ela seja terminal, diferentemente

daqueles mais abastados aos quais se reserva a formação superior, e mesmo tendo completado

onze anos de escolaridade não obtiveram conhecimentos que lhes permita, nem mesmo essa

profissionalização.

Como já assinalamos, as considerações dos professores sobre o efeito da Reforma

ainda que tenham sido reunidas em categorias distintas não podem ser vistas de forma

estanque, uma vez que se complementam entre si. Dessa forma, ao lado de citações que dizem

respeito à “Motivação da Reforma”, ao “Desenho Curricular” implementado a partir do final

dos anos oitenta do século XX e ao perfil dos “Alunos” que hoje freqüentam o CEFET-SP, os

professores indicaram possibilidades e limites de seu trabalho diante dessa realidade, e

apresentaram sugestões para certa reorientação do caminho que vem sendo seguido pela

Escola.

Esses três pontos estão contidos na categoria apresentada no capítulo seguinte,

denominada Prática Pedagógica, e serão apresentados nas subcategorias: Possibilidades da

Ação dos Professores, Limites da Ação dos Professores e Perspectivas de Correção de

Rumos.

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CAPÍTULO 8. LIMITE E PERSPECTIVAS DA AÇÃO DOCENTE: a análise da

Reforma na cotidianidade da Escola.

Ao novo educador compete refazer a educação, reinventá-la, criar as condições objetivas para que uma educação realmente democrática seja possível, criar uma alternativa pedagógica que favoreça o aparecimento de um novo tipo de pessoas, solidárias, preocupadas em superar o individualismo criado pela exploração do trabalho. Esse novo projeto, essa nova alternativa, não poderá ser elaborado nos gabinetes dos tecnoburocratas da educação. Não virá em forma de lei nem reforma. Se ela for possível amanhã é somente porque, hoje, ela está sendo pensada pelos educadores que se reeducam juntos. Essa reeducação dos educadores já começou. Ela é possível e necessária. (GADOTTI, apud RUIZ, 2003, p. 70)

A fala dos professores sobre o impacto da Reforma da Educação Profissional no

CEFET-SP, objeto desse trabalho, pode ser considerada muito mais do que a construção de

um retrato da Escola hoje. Ela representa, mesmo que de forma às vezes um pouco difusa, a

visão dos professores sobre o processo educacional, as possibilidades e limites da ação

docente e as medidas a serem adotadas para que sejam minimizados os problemas que se

apresentam hoje.

Ainda que as considerações apresentadas nos capítulos precedentes sejam importantes

para mostrar como a Escola está configurada, tanto nos aspectos de organização como de

atendimento, o conjunto de citações que compõem a Categoria Prática Pedagógica,

apresentada nesse capítulo, mostra que a escuta aos professores faz emergir verdades,

problemas e soluções que não estão ao alcance da visão da técnico-burocracia ou que não são

considerados importantes para quem está fora da sala de aula e relativamente distante dos

alunos.

8.1. Categoria 4 – Prática Pedagógica

Diferentemente das categorias apresentadas nos capítulos anteriores, a que trata da

Prática Pedagógica, dada a especificidade das falas que a ela fazem referência, não se

subdivide em aspectos positivos e negativos. Dessa forma, nas três subcategorias que a

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compõem, o trabalho de análise compreende as constatações feitas pelos professores

relativamente a cada um dos temas tratados.

Tabela 17 – Categorias e subcategorias relativas à Prática Pedagógica

CATE-GORIA

SUBCATEGORIAS

EXEMPLOS Nº.

4.1. Possibilidades de ação dos professores

[...] O professor tem que se preocupar em ensinar esse pouco, mas ensinar bem, garantir que o aluno tenha uma boa aprendizagem nesse pouco. E isso é suficiente para a empregabilidade, na minha visão. [...] S.15 58

4.2. Limites na ação dos professores

[...] talvez esse tenha sido nosso maior problema, a gente ao reforçar, ao pararmos nosso ensino profissional para irmos reforçar a parte que deveria ter sido feita na educação geral [...]. S.3 58

4. P

TIC

A P

ED

AG

ÓG

ICA

4.3. Perspectivas de correção de rumos

[...] a gente tem, agora, a necessidade de reverter algumas coisas porque os professores ainda têm a expectativa de voltar a trabalhar de uma maneira que sintam mais prazer do que eles vêm sentindo ao longo desses anos. [...]. S.13 28

A tabela abaixo apresenta, relativamente ao total de citações e de sujeitos abrangidos

pela amostra geral, o percentual referente a cada um dos temas tratados pelos professores, que

compõem as subcategorias de análise.

Tabela 18– Prática Pedagógica

Possibilidades de ação dos professores

Limites na ação dos professores

Perspectivas de correção de

rumos

Prática Pedagógica

Nº citações 58 58 28 144

% de citações 13,78 13,78 6,65 34,20

Nº de sujeitos 14 16 12 19

% de sujeitos 73,68 84,21 63,16 100,00

Um aspecto interessante no número de citações que tratam da Prática Pedagógica é de

que elas são idênticas no tocante às possibilidades e aos limites da ação dos professores.

Outro dado importante é de que elas foram objeto de análise pela totalidade dos sujeitos

envolvidos na pesquisa.

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O gráfico abaixo mostra, relativamente à particularidade da amostra contida na

categoria, o valor que os professores atribuíram a cada uma das subcategorias que compõem a

análise da Prática Pedagógica.

Gráfico 10 – Avaliação sobre a Prática Pedagógica

A imagem do gráfico mostra que há mais considerações dos professores acerca das

possibilidades e limites de suas ações do que sobre as perspectivas de correção de rumos. A

análise apresentada a seguir deverá permitir uma leitura mais abrangente desse

posicionamento.

8.1.1 Subcategoria 4.1. – Possibilidades de Ação dos Professores

A subcategoria Possibilidades de Ação Docente compreende um conjunto de citações

que dizem respeito à visão dos professores acerca da possibilidade do trabalho deles alterarem

os aspectos negativos que se apresentam tanto no modelo curricular, como no perfil dos

alunos atuais.

Essas citações serão analisadas a partir de três orientações, que se completam: a

filosofia que embasa as ações propostas, a metodologia que os professores entendem como a

que deva ser privilegiada, e as técnicas de ensino que potencializam o resultado do seu

trabalho, considerada a possibilidade de obtenção de maior envolvimento e desempenho dos

alunos.

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No que diz respeito aos aspectos filosóficos, os professores indicam que a relação

professor-aluno exige reciprocidade, todos devem ser considerados como sujeitos do processo

de ensinar e de aprender pois [...] seria até um despropósito você querer ficar somente no

saber e desconsiderando os saberes acumulados. Não é só o saber que eu tenho não, mas os

acumulados e numa linha de participação dos alunos de fato [...] (S. 3).

Indicam ainda que o professor precisa conhecer os alunos, em especial as suas

dificuldades de aprendizagem, para que possa partir de um padrão comum de conhecimentos.

Mas, para tanto, ele precisa se colocar no lugar do aluno: [...] eu procuro me pôr no lugar

deles para não cometer aquele erro do professor que passa da forma que quer e acha que

todo mundo tem que saber. [...] temos que nos pôr no lugar deles para saber como eles vão

entender aquilo que nós estamos passando. [...] (S. 5)

Finalmente apontam que o papel da escola não é o de transmitir conhecimentos, mas

sim de levar o aluno a desenvolver a capacidade de buscar e reelaborar os conhecimentos:

“aprender a aprender”.

[...] eu penso que o aluno não precisa aprender muita coisa na escola, ele precisa aprender a aprender, e eu tento fazer isso. [...] tenho uma mínima lembrança do que eu aprendi na faculdade. O que eu uso hoje eu tive que aprender no exercício do trabalho e tento passar isso para os alunos, fazer com que eles aprendam a aprender. [...] (S. 17)

No que diz respeito à metodologia, os professores dizem orientar seu trabalho pelo

princípio de não separação entre o saber e o fazer, numa perspectiva de valorização da teoria

como fundamentação da prática, sem que sejam consideradas de forma separada ou com

gradações de importância.

Outro aspecto que se destaca sobre o caminho que os professores assumem é à

importância da contextualização como condição para a garantia da motivação dos alunos.

Segundo S. 12, [...] é muito legal você ver que o aluno entendeu que aquela realidade que ele

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vive na empresa, que aquela coisa que às vezes é absolutamente descontextualizada para ele,

tem uma lógica [...]

Destacam, ainda, que a motivação se potencializa por estratégias que mostram a

importância da formação técnica, aos alunos: [...] conscientizando-os de que também é

importante fazer o técnico, estudar para o técnico, para a vida profissional. [...] (S. 5).

A importância da formação técnica, na visão dos professores, deve ser entendida não

somente como condição para a obtenção de um emprego, mas como desenvolvimento da

compreensão dos processos e princípios tecnológicos presentes na vida cotidiana e no

trabalho. Essa formação, indicam, será um grande diferencial na possibilidade de melhoria da

vida dos sujeitos da escola e da própria sociedade.

Surgiram nas falas dos professores, indicação dos instrumentos e técnicas de ensino

com as quais buscam atingir os propósitos dos seus componentes curriculares, considerando-

se como principal obstáculo a ser vencido as dificuldades dos alunos no que diz respeito à

falta de conhecimentos científicos necessários ao desenvolvimento da formação técnica.

Dentre esses recursos se destaca a aplicação de avaliações diagnósticas que permitem

verificar o estágio de conhecimentos de cada turma ou grupo de alunos. A partir do resultado

dessas avaliações é que são pensadas e preparadas as aulas teóricas e práticas, assim como as

atividades de revisão e de reforço, em geral direcionadas aos conteúdos de Matemática e

Física que concentram as maiores deficiências de conhecimentos entre os alunos: [...]

resistência dos materiais, que [...] necessita de uma base de física e de uma base de

matemática, [...] você tem que, necessariamente, para trabalhar seu conteúdo, fazer junto

uma revisão [...], caso contrario é fingir de dar aula e fingir de aprender. [...] (S. 11)

Há ainda forte referência, pelos professores, à necessidade de adoção de técnicas de

acompanhamento constante e sistemático do avanço dos alunos, cujo resultado indica a

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necessidade de trabalhos mais individualizados, o que significa, muitas vezes, ensinar ao

aluno o uso de recursos que, via de regra, deveria ser de domínio deles.

Essa situação pode ser constatada claramente quando o professor afirma: [...] eu

preciso ensinar os alunos a usarem a calculadora. Eu tenho que dizer aos alunos qual a

função de determinadas teclas [...] (S. 17).

Há uma indicação de que os professores evitam se utilizar de atividades que exijam

muita leitura, preferindo a internet e outros recursos visuais, como slides, uma vez que os

alunos, com muitas dificuldades de leitura, reagem melhor a outros tipos de estímulos: [...] há

uma grande dificuldade para ler. Você não pode pedir para ler livro, essas coisas, o que eu

fazia amiúde com o aluno do modelo anterior, mas, por outro lado, os recursos de internet

[...] os alunos dominam bem e você pode explorar isso também [...] (S. 12).

Há referências sobre a possibilidade de trabalhos com pesquisas, desde que claramente

inseridas no desenvolvimento de um determinado componente e com regras e normas

perfeitamente estabelecidas. Essa estratégia, segundo os professores, torna as aulas menos

entediantes, especialmente nos cursos noturnos em que os alunos chegam cansados e

propensos a dormir: [...] eles têm que pesquisar tem que fazer tem que participar mais, senão

a aula passa a ser excessivamente chata, a professora intragável, e você teria muita

dificuldade em colocar aquilo em uma condição mais operacional. [...] (S. 13)

Indicam, ainda, que a preparação da aula exige que se tenha clara a ênfase a ser dada

naquele componente curricular, uma vez que os alunos têm grande dificuldade em

trabalharem com conhecimentos teóricos e que essa dificuldade se avoluma caso não

percebam sua aplicação clara nos processos tecnológicos envolvidos nas habilitações

profissionais: [...] eu procuro trazer esses conhecimentos que eu tive, da minha atuação na

indústria [...] eu procuro sempre chamar a atenção deles da aplicação prática dos

conhecimentos que eles estão adquirindo aqui. Basicamente é isso. [...] (S. 2)

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No que diz respeito à seqüência dos conteúdos afirmam os professores que há

necessidade de divisões e subdivisões em unidades pequenas e que sejam seqüenciadas de

forma gradativa. Essa forma de trabalho permite acompanhar melhor o desempenho do aluno,

por meio de avaliações constantes, e dá maiores garantias de que, ao final do curso, tenha sido

assimilada uma base de conhecimentos mínimos da área.

A proposição de que os alunos obtenham, no mínimo, uma base conceitual e

tecnológica, requer que o processo de avaliação seja revisto e repensado. Acerca desse tema,

um dos professores expõe: [...] eu aprendi a evitar, por exemplo, grandes provas escritas,

porque a produção, normalmente, tende a ser menor. [...] (S.12)

Há indicação entre os professores de que é necessário, a cada passo, verificar se os

objetivos propostos foram atendidos, pois somente se a seqüencialidade do caminho for

levada a cabo de forma positiva haverá maior garantia de obtenção dos resultados almejados.

As ações apresentadas pelos professores como forma de buscarem uma melhor

qualidade no seu trabalho estão relacionadas às dificuldades que eles encontram para

desenvolvê-lo. Portanto, grande parte dessas dificuldades são reapresentadas na subcategoria

Limites na Ação dos Professores; mas agora sob um ponto de vista diferente, indicando a não

possibilidade de solução dos problemas pela via da sala de aula.

8.1.2 Subcategoria 4.2. – Limites na Ação dos Professores

As características apontadas pelos professores como limitadoras do trabalho em sala

de aula se relacionam, em partes, ao desenho curricular, em especial ao modelo de curso

Seqüencial-concomitante. Para eles, a separação entre formação geral e específica prejudica

muito o processo de profissionalização técnica, chegando mesmo a impedi-la, uma vez que a

essa característica se associam o curto espaço de tempo para o desenvolvimento dos cursos e

o perfil dos alunos, via de regra, não possuidores de conhecimentos científicos que dão

sustentação à prática profissional.

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[...] temos ainda que levar em consideração um desconhecimento que a gente tem da base que o aluno esta vindo lá de fora, com relação aos pré-requisitos para as disciplinas, principalmente para os conteúdos básicos dos primeiros períodos dos cursos técnicos. É uma das maiores dificuldades que eu encontro hoje é isso [...] (S.1).

Ainda que os professores busquem superar as dificuldades dos alunos em relação à

falta de pré-requisitos, essa ação compromete a qualidade da formação na medida em que tira

da parte específica o tempo que, teoricamente, deveria ser inteiramente dedicado a ela: [...] É

claro que a gente pode dizer, mas a Escola reforça aqui, reforça ali, talvez esse tenha sido

nosso maior problema, a gente ao reforçar, ao pararmos nosso ensino profissional para

irmos reforçar a parte que deveria ter sido feita na educação geral [...] (S.3).

Em uma de suas citações afirma o S. 3: [...] eu tenho tido muita dificuldade em

executar na íntegra o plano que eu penso [...]. Essa situação se repete na indicação de outros

docentes, ou seja, eles não conseguem cumprir o plano de ensino e atribuem essa situação à

necessidade de reforçar a formação geral: [...] na topografia eu preciso da Matemática, eu

preciso da trigonometria e eu dou, eu sou obrigado, eu preparo aula e já coloco [...] eu

sempre fui contra isso porque eu acho que você pode ganhar mais tempo no conteúdo da

topografia do que a gente perder tempo com isso [...] (S. 5).

Associada à questão do tempo curto de curso, sobressai-se, o perfil dos alunos. Há

indicações de que a tentativa de reforçar a formação geral para que possam prosseguir na

formação específica é muito dificultada pela heterogeneidade presente nas turmas o que torna

quase impossível estabelecerem um ponto do qual devem partir para buscar um padrão

mínimo de conhecimentos.

[...] tem alunos que estão fazendo o Ensino Médio no momento, tem alunos que acabaram o Ensino Médio há pouco tempo e tem alunos de idade que não estudam há muito tempo [...] a gente se predispõe a ensinar um determinado assunto e quando você encontra uma sala muito heterogênea e com níveis de discernimento diferentes fica muito complicado. [...] (S. 7)

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A questão da heterogeneidade traz ainda uma outra dificuldade para o andamento das

aulas: a grande quantidade de questões técnicas apresentadas pelos alunos que já se encontram

inseridos no mercado de trabalho e que nem sempre estão no nível de compreensão e do

interesse da média da turma: [...] eu tenho sido surpreendido várias vezes, porque a gente

chega com ideia de abordar um determinado assunto e os alunos, fruto dessa

heterogeneidade, levantam determinadas questões, evidentemente pertinentes ao assunto que

a gente está dando e a gente muda, quase que radicalmente, aquilo que inicialmente pensou.

[...] (S. 3)

Os problemas acima indicados, em que se associam pouco tempo do curso, falta de

pré-requisitos dos alunos e heterogeneidade da turma, trazem o problema mais visível do

limite da ação dos professores que são os altos índices de evasão: [...] você começa o ano com

um determinado número de estudante e vai reduzindo, vai reduzindo [...] a minha percepção

é essa, que há muita desistência. [...] (S. 12)

As medidas indicadas pela Escola como forma de minimizar o problema da evasão

são, na visão dos professores, determinantes na perda da qualidade da formação, uma vez que

implicam em uma espécie de promoção automática.

[...] A minha vida como professor mudou absurdamente, porque hoje você tem que baixar extremamente o seu nível de aula, [...] a pressão dos órgãos que dirigem as escolas é muito grande [...] você tem que fazer de tudo para que o aluno continue na escola [...] em contrapartida os alunos já perceberam isso, eles se prevalecem disso, dessa ineficiência do sistema em fazer com que eles aprendam efetivamente, então para mim caiu muito [...] (S. 8).

Essa forma de conter os altos índices de evasão, segundo os professores: [...]

realmente causou uma série de dificuldades [...]. A gente ficou muito desleixado na hora de

tratar com a seriedade que a Escola gostaria aquilo que é próprio da Escola. [...]. (S. 13)

Um dos sujeitos entrevistados afirma que: [...] é difícil entender um sistema

pedagógico de uma escola que acabou dando muita abertura e liberdade aos alunos

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reclamarem, tirando a autoridade do professor na hora da cobrança. [...] (S. 5). Mas, há

indicações de que, mesmo estimulados a efetivarem um tipo de promoção automática, os

professores tentam resistir a ela, especialmente aqueles que estão há tempo nos quadros do

CEFET-SP e que reconhecem o seu papel como agentes defensores da qualidade técnica dos

alunos e da própria reputação da Escola. Entretanto, existe a preocupação de que vai chegar

uma hora que [...] essas pessoas que vinham com toda aquela visão de educação. [...].

naturalmente vão saindo e a gente nao percebe nos que estão chegando esse envolvimento

[...]. (S. 3)

Esse aparente descompromisso é justificado como sendo motivado pela conformação

que a Reforma impingiu à Educação Profissional. Segundo S. 8 [...] piorou sensivelmente

para você trabalhar, piorou para você dar aula, piorou para você dirigir uma escola e piorou

para o mercado de trabalho com a mão-de-obra que a gente coloca na rua hoje, piorou tudo.

[...]

Além dos aspectos acima indicados, que dizem respeito mais diretamente ao desenho

curricular e ao perfil dos alunos atuais, especialmente do curso Seqüencial-concomitante, há

indicações de dois pontos, complementares, que limitam a ação dos professores, mais

diretamente relacionados às condições de trabalho a que estão submetidos, tanto no aspecto da

falta de condições materiais, pois [...] o acesso às novidades [...] é muito limitado[...], quanto

na necessidade de exercer jornadas duplas e triplas, [...], pois hoje a preocupação é

sobreviver, então há uma sobrecarga de trabalho muito grande. [...] (S. 18).

O último aspecto apontado nas citações dos sujeitos entrevistados traz uma

problemática que talvez seja a que carrega maior potencialidade de limitação ao trabalho em

sala de aula: a desmotivação dos professores frente ao aparente desinteresse dos alunos.

Afirma um dos entrevistados que, [...] quando você pega uma classe que pergunta, que é

interessada, que os alunos querem aprender, o negócio vai pra frente. Mas, quando você

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pega um pessoal que não quer nada, acaba ficando desmotivado, e isso e horrível. [...] (S.

18).

Em resumo, se pode afirmar que os professores do CEFET-SP apontam como

limitadores de sua ação:

1) A separação da educação geral e específica que compromete a possibilidade de uma

formação que integre teoria e prática, ou seja, o saber e o fazer;

2) A redução no tempo de formação e o uso desse tempo que, potencialmente, deveria

ser inteiramente ocupado pela formação específica, na retomada constante dos

conteúdos científicos;

3) O perfil dos alunos que não têm os conhecimentos científicos necessários ao

desenvolvimento da formação específica e que, via de regra, não se esforçam para

obter essa condição. Os alunos atuais conferem prioridade para a conclusão do

Ensino Médio, procuram pela Escola como certificadora da situação de trabalho, não

enxergam um emprego imediato e possuem a cultura da promoção automática,

reforçada pela própria Escola.

4) As condições desfavoráveis de trabalho tanto no que diz respeito às condições

materiais, como a necessidade de atuarem em várias escolas, falta de recursos

adequados às aulas e, especialmente, pela desmotivação frente às turmas de alunos

que não respondem de forma positiva às propostas de ensino.

Não obstante os professores tenham indicado uma série de problemas que se fazem

presentes na Escola hoje, eles apresentam sugestões que poderiam alterar essa situação. O

resumo das citações em que são feitas essas indicações será apresentado na última

subcategoria de análise apresentada a seguir e denominada Perspectivas de Correção de

Rumos.

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8.1.3 Subcategoria 4.3. – Perspectivas de Correção de Rumos

Ainda que as citações dos professores a respeito das perspectivas de correção dos

rumos sejam percentualmente menores em relação às que apontam os problemas que limitam

a ação deles, elas foram apresentadas por quase 65% dos entrevistados.

Mas além de trazerem contribuições importantes para uma potencial re-organização da

Escola, elas demonstram que os professores têm desejo de reverterem aquilo que julgam ruim,

e que possuem compromisso com o resultado do seu trabalho e com a Escola.

O ponto principal destacado pelos professores para que a Escola possa corrigir seus

caminhos pode ser inferido a partir da seguinte citação: [...] mais do que nunca eu penso que,

realmente, a concepção gramsciana de escola unitária é a grande saída para a educação

profissional [...] (S. 3). Trata-se de uma indicação clara de que grande parte dos professores

entrevistados, mesmo sendo pertencentes às áreas técnicas, considera ideal o retorno do

Ensino Integrado.

O ideal do ensino Integrado traz a idéia de que com ele poderão ser superadas as

deficiências de formação geral que os alunos têm hoje e permitirá aos professores das áreas

técnicas trabalharem seus conteúdos de forma proveitosa:

[...] eu acho muito interesse a volta do integrado, porque aquilo que os alunos não vêem nas outras escolas nos teremos oportunidade de passar para eles. Eles terão o necessário, um conteúdo mais forte, para que eles dêem seqüência no curso técnico [...] aqueles conteúdos que eles têm tanta dificuldade hoje nós poderemos mostrar com bastante clareza, com mais propriedade. [...] (S. 19)

Uma citação do S. 6 indica que a proposta de retomada do modelo de ensino que

integra formação geral e profissional se dá dentro de uma perspectiva de materialidade da

proposta, pois [...] felizmente, esse último decreto de dois mil e quatro que não me recordo o

número, veio permitir que a gente voltasse a ter o curso integrado médio e técnico para

formar o aluno melhor, porque ele vai ter possibilidade de saber e fazer [...].

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Registre-se o indicativo de que a Escola não pode perder sua relação com a área

tecnológica: [...].seja no médio ou no superior, o foco dela e esse, tecnologia, então é área

exata, seja engenharia, seja o tecnológico, ou seja, o técnico é essa área que ainda tem que

segurar porque é a proposta. [...]. (S. 5). Mas, ainda que o termo tecnológica careça de uma

maior explicitação quanto ao seu entendimento a fala dos professores mostra que ele está

ligado à possibilidade da congregação teórico/prática e que essa possibilidade se concretizará,

na visão dos professores, pela nova conformação do ensino médio oferecido na Escola: o

modelo integrado: eu penso que temos que ter o integrado como técnico para ter força,

porque e ele que dá força, que é a alavanca, agora precisa ser trabalhado o corpo docente.

[...]. (S. 5).

A proposição de S. 5 de que seja trabalhado o corpo docente, embora não tenha sido

pormenorizada, aponta no sentido de outras falas que destacam a necessidade da Escola e dos

professores estarem preparados para trabalhar com um alunado diferente daquele que

freqüentava os cursos integrados anteriormente à Reforma. Essas falas apontam uma clara

posição dos professores de que o CEFET-SP deve buscar a democratização do acesso aos

cursos integrados uma vez que eles se constituem em uma alternativa para jovens que

precisam ingressar no mercado de trabalho com uma profissionalização de nível médio.

[...] A minha proposta é que, se nós tivéssemos um ensino integrado em que o aluno fosse obrigado a cumprir todo o período na instituição [...] passar por todas as dificuldades das disciplinas do Ensino Médio, crescer com isso e juntar a isso as disciplinas do Ensino Técnico e, talvez, ser um técnico de qualidade melhor, melhor do esse que nós temos hoje. [...]. (S. 10)

Porém, ainda que os professores destaquem a importância do retorno do Ensino

Integrado, eles reconhecem que a Escola hoje tem um perfil diferenciado em relação ao que

existia antes da Reforma, ou seja, de quase exclusividade de sua oferta nessa modalidade de

ensino. Para eles, é importante que ela mantenha como oferta educativa outras formas de

profissionalização que atendam às necessidades dos trabalhadores: [...] eu penso que hoje a

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escola tem todos os ingredientes para cumprir o seu papel social, desde que se preocupe com

a qualificação básica, a formação integrada, a formação do pós-médio para aqueles cursos

que apresentam certa demanda momentânea numa dada região uma vocação regional, isso é

interessante [...]. (S. 3)

Mas, ainda que exista a indicação do retorno do ensino integrado pela grande maioria

dos professores, há entre eles certa discordância sobre a importancia dele no conjunto da

oferta de cursos da Escola. Enquanto algumas falas indicam que: O que poderá vir a

acontecer é que o ensino médio seja substituído pelos cursos integrados, mas hoje ele já não

é um pilar importante na instituição, talvez os dois pilares mais importantes sejam os cursos

de tecnologia e os cursos técnicos pós-médio. (S. 15), outras se orientam no sentido de que a

continuidade da expansão na oferta de ensino da Escola não tira a importância do Ensino

Técnico: O CEFET hoje é um centro tecnológico, sendo curso tecnológico ou de engenharia

ele é uma escola técnica, técnica no conteúdo e ela não pode perder essa essência de escola

técnica. Em minha opinião, eu acho que é o que vai alavancar e segurar seria o técnico, e

continuar expandindo o superior.

Ainda que mínimas, há indicações sobre a possibilidade de que sejam vencidas as

dificuldades inerentes aos cursos seqüenciais concomitantes, especialmente no que se refere à

capacidade da Escola em trabalhar com as deficiências apresentadas pelos alunos: eles têm

condições de aprender. É uma questão de adaptação. Eu penso que com um pouquinho mais

de tempo o curso técnico, mesmo sem ser pleno, vai ser ótimo, excelente. (S. 14).

Talvez a síntese das posições sobre a importância do ensino integrado possa ser

resumida na citação de S3. Para ele, além da formação técnica, por meio do ensino integrado e

outras modalidades, o CEFET-SP cumpre seu papel social de uma escola, ofertando também

à classe trabalhadora o ensino de nível superior com os tecnólogos [...] e deve completar sua

oferta até o nível de pós-graduação, passando pela licenciatura.

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A posição defendida por S3, acima indicada, é reiterada por outros professores:

[...]. a escola poderia manter o Ensino Médio, poderia manter o ensino integrado, poderia manter o tecnólogo, passar para os cursos superiores com licenciatura e formação de professores para atuar no ensino técnico e tecnológico e prosseguir com um curso de aperfeiçoamento, um curso de especialização tudo é perfeitamente possível porque a legislação permite. [...]. (S. 6)

Há, entre as citações, algumas que indicam a proposição dos professores em realizar

ações concretas para melhoria da Escola, sendo elas não somente de caráter organizacional,

mas que incluam a própria prática docente:

[...]. Proposição de novas grades curriculares, novos conteúdos, visão comportamental, postura em sala de aula, enfim, o que é que nos vamos fazer? Eu acho que para o CEFET isso é uma incógnita e, ainda bem, porque se nos tivéssemos uma escola pronta e acabada não teríamos essa escola com papel social. [...]. (S. 3)

Ressalte-se na citação de S3, acima, a consciência de que a Escola não está pronta,

mas que tem que ser revista constantemente, configurando-se, portanto, como um processo

em constante desenvolvimento, no qual é indispensável à participação de todos. A indicação a

seguir mostra a consciência dos professores das dificuldades de rompimento com a ordem

estabelecida pelas políticas educacionais, mas aponta também para a possibilidade desse

rompimento pela via da ação institucional: [...].a gente tem que batalhar para que isso que

temos hoje seja bom, é uma luta desleal, mas a gente tem que fazer, não podemos pura e

simplesmente sentar e ficar esperando que o governo modifique, nos temos que modificar.

[...]. (S. 8).

À possibilidade de alterar as condições atuais da Escola está ligada a motivação dos

professores em continuarem a luta por uma escola de qualidade que acreditam existia antes da

Reforma: [...]. a gente tem, agora, a necessidade de reverter algumas coisas porque os

professores ainda tem a expectativa de voltar a trabalhar de uma maneira que sintam mais

prazer do que eles vêm sentindo ao longo desses anos. [...]. (S. 13).

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A ligação dos professores com a Escola e a crença deles de que ela poderá ser melhor

pode ser avaliada pela indicação da expectativa deles de que seus próprios filhos venham a

estudar no CEFET: [...]. eu tenho um filho de doze anos e gostaria que ele estudasse na

federal porque eu vejo os outros professores, como eu, preocupados com a escola, com os

alunos e uma boa preparação que ela poderia ainda oferecer. [...]. Entretanto a melhoria

passa, necessariamente, pela oferta de uma educação integral : [...]: mas ela precisa ensinar

também matemática, português, para que o aluno aprenda aqui o que ele não pôde aprender

no passado. Eu ainda acredito em dias melhores, se não tivesse esperança não poderia estar

aqui, eu acredito que dias melhores virão com mais respeito ao ser humano. (S. 11).

Os professores indicam como forma de revisão do estado atual da Escola a

necessidade de que seja rompido o estigma de “ilha da fantasia” que lhe foi tantas vezes

imputado, pois, além de sugerirem que ela mantenha um constante processo de auto-

avaliação, por meio de discussões internas e de busca de consenso entre os diversos

segmentos que a compõem propõem que desenvolva mecanismos de avaliação externa,

comparando seu trabalho com o que está sendo realizado fora dela: [...].é muito interessante a

gente pegar essas informações das outras escolas, comparar e verificar o que está

acontecendo na nossa escola [...]. (S. 6).

Mas, talvez, o principal fator de abertura proposto pelos professores esteja na

disposição deles em buscarem sua atualização profissional fora do clássico modelo de cursos

de pós-graduação que, mesmo sendo de grande valor para a formação dos professores, muitas

vezes representam mais a expectativa de ascensão na carreira do que propriamente a vontade

de rever a prática pedagógica. A fala dos professores parece demonstrar neles o desejo de

aprender com os alunos e com o ambiente para o qual estão sendo preparados, enfim, o desejo

de tornarem-se melhores: [...] A gente pode, por meio dos alunos, aprender muita coisa que,

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com certeza, quando houver um investimento maior na Escola e a gente puder estar dentro

dessas empresas, pode perceber que a gente vai melhorar muito. [...] (S. 3).

Como assinalamos anteriormente, as possibilidades da ação docente indicadas pelos

professores trazem questões que dizem respeito a aspectos teórico-metodológicos dessa

prática assim como a outros, de caráter mais prático, ligados ao fazer na sala de aula. Um

aspecto contraditório dessa indicação está no fato dos professores indicarem que a Escola

deve priorizar na formação dos alunos a capacidade deles em “aprender a aprender” em

detrimento dos conteúdos de ensino e, ao mesmo tempo, afirmarem que uma das principais

dificuldades para o trabalho com os alunos está na falta de conhecimentos científicos que eles

trazem.

Outro ponto de contradição presente na fala dos professores está na indicação da

necessidade de adoção de uma metodologia de não separação entre teoria e prática, mas

reiteradas afirmações de que a falta de conhecimentos teóricos por parte dos alunos faz com

que eles deixem de adquirir as competências profissionais, de ordem mais prática.

Moreira (2000) referindo-se às possibilidades e limites das propostas curriculares,

insiste em que: “... o foco na prática não deve ser compreendido como secundarização da

teoria. No entanto, concordo com Lefebvre(1979) quando afirma que ‘a coerência abstrata,

a demonstração teórica desligada da atividade social e da verificação prática não têm

nenhum valor’” (p.131).

Ressalta-se ainda o fato da contextualização ser apresentada como um recurso para a

motivação dos alunos e, ao mesmo tempo, como forma de distanciamento do interesse deles

pelas disciplinas que tenham um caráter mais teórico. Ou seja, haveria maior interesse

quando os conteúdos apresentados tivessem ligação direta com a aplicação no sistema

produtivo, mas seria necessário desenvolver o apreço pela formação técnica como algo que

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vai além da profissionalização, configurando-se como aquisição de condições de

racionalidade que o domínio da técnica proporciona.

Ressalta-se ainda o fato dos professores fazerem sugestões de melhoria das condições

atuais da Escola, mas não apontarem no sentido de serem vencidas as dificuldades que são

apresentadas, especialmente as principais delas que são a heterogeneidade, formação

inadequada dos alunos e o fenômeno da evasão, questões que o simples retorno ao ensino

integrado e a continuidade da verticalização não deverão superar.

Entretanto, cumpre ressaltar que coube aos professores o papel relevante de fazerem

aflorar uma questão latejante na Escola hoje e que diz respeito às diferenças presentes nos

seus alunos e com as quais ela precisa operar sob pena de que sejam mantidos ou aumentados

ou níveis de desmotivação e evasão atuais.

Ainda que não tenha sido apresentada uma saída para a problemática do perfil

inadequado dos alunos ela, com certeza, não se dará pela via da exclusão das diferenças. É

necessário pensar na possibilidade de desenvolvimento de um projeto pedagógico voltado

para superação ou minimização das dificuldades. Uma das formas de alcançar essa solução

pode ser a apresentada por Giroux (1997) ao afirmar que mais do que apontar as falhas

trazidas pelos alunos à Escola, é preciso buscar resgatar o potencial que se faz presente na

experiência de vida deles e, ao mesmo tempo, mostrar-lhes a importância de apoderarem-se

do conhecimento que lhes tenha sido negado:

[...] o conhecimento e o poder interseccionam-se em uma pedagogia de política cultural para dar aos estudantes a oportunidade não apenas de compreender mais criticamente quem eles são como parte de uma formação social mais ampla, mas também para ajudá-los a apropriarem-se de maneira crítica daquelas formas de conhecimento que lhes foram negadas. (p. 142).

O trabalho voltado para a apropriação do conhecimento ainda que possa parecer

reducionista em face de tantas outras questões presentes na vida da escola, dos professores e

alunos, pode significar um passo importante na construção de uma escola democrática.

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Como afirma Saviani (1982):

(...) um professor de história ou de matemática; de ciências ou estudos sociais, de comunicação e expressão ou literatura brasileira etc., tem cada um, uma contribuição específica a dar em vista da democratização da sociedade brasileira, do atendimento aos interesses das camadas populares, da transformação estrutural da sociedade. Tal contribuição se consubstancia na instrumentalização, isto é, nas ferramentas de caráter histórico, matemático, científico, literário, etc. que o professor seja capaz de colocar de posse de alunos. (p. 83)

Vê-se, portanto, que a problemática da falta de conhecimentos científicos e a

desenvolvimento da condição de aprendizagem não poderá ser resolvida de maneira simples,

pois ela adquire contornos de caráter político-educacional que vão além da falta de condição

dos atuais alunos em adquirem uma profissão. Ela requer que essa situação seja vista à luz da

compreensão de como o ensino deve procurar dotar todos os cidadãos de recursos culturais e

intelectuais socialmente equivalentes e internamente plurais. (CONTRERAS, 2002, p. 274).

Cremos que qualquer análise que se faça sobre a educação será sempre parcial, pois

ainda que busquemos utilizar as lentes mais potentes sempre restará algo inatingível aos olhos

do pesquisador. Entretanto os dados serão sempre mais fidedignos quanto mais próximos

estiverem dos seus interlocutores.

No capítulo seguinte, com o qual pretendemos concluir esse trabalho apresentamos

algumas considerações e relações sobre o fenômeno que vimos pesquisando. Sabemos que há

sempre muito mais a ser visto e pensado do que as lentes desse trabalho puderam captar, mas,

mesmo a despeito da possibilidade de não completude dessa análise ela representa a verdade

vista por quem convive no dia a dia do espaço mais representativo do impacto da Reforma da

Educação Profissional sobre o CEFET-SP os professores.

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CAPÍTULO 9 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nestes tempos, nos quais se cantam as virtudes da educação, enquanto se restringem os recursos dedicados a ela e as políticas educativas cedem sua prioridade a outras prioridades, quando se exacerbam os controles de eficácia sobre os sistemas escolares com a vista posta na qualidade total – expressão fantasmagórica -, convém resgatar alguns princípios do senso comum: a qualidade dos professores é o limite da qualidade total que pode ser obtido no sistema educativo. (SACRISTÁN, 2001, p.121)

O resultado dessa pesquisa que buscou, fundamentalmente, avaliar a partir da prática

docente o impacto da Reforma da Educação Profissional dos anos noventa do século XX no

Centro Federal de Educação Tecnológica de São Paulo, aponta para três dimensões

específicas e complementares: a visão dos professores de que houve um grande impacto no

movimento reformista sobre a vida dessa Escola; a indicação deles de que a retomada da

qualidade da formação técnica oferecida pela Escola, ressalvadas indicações de manutenção

de outras formas de oferta, implica no retorno ao modelo de ensino integrado; e,

especialmente, a potencialidade dos professores compreenderem e avaliarem sua práxis, e,

aliando contexto e ações, participarem de um projeto educativo do qual se sintam sujeitos.

Como resultado dos estudos bibliográficos, vimos no decorrer dessa pesquisa que

historicamente o CEFET-SP, ainda na condição de Escola Técnica, construiu uma reputação

renomada na formação de profissionais para a indústria, e que até o final dos anos de 1990, o

foco do trabalho institucional era a oferta de um curso secundário que habilitava os alunos ao

exercício da função de técnico de nível médio e, ao mesmo tempo, possuindo um caráter

propedêutico, dava condições para ingresso no ensino superior.

Essa conformação de oferta do CEFET-SP se estendia por toda a Rede Federal de

Educação e, não obstante o reconhecimento público que essas escolas mereceram, elas foram

consideradas redutos da classe média, sendo severamente criticadas tanto por parte da

representação dos trabalhadores como, e especialmente, pelos economistas a serviço do

governo que buscavam formas de barateamento da educação, com o que o modelo das

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escolas federais não podia contribuir, dadas as exigências de recursos que essas escolas

demandavam.

No final dos anos de 1990, com a ascensão ao poder político de um grupo identificado

com o neoliberalismo, o Brasil se submeteu a uma série de reformas que buscavam, dentre

tanto outros objetivos, a descentralização das ações do Governo Federal em busca de uma

eficiência dos sistemas públicos, medida por critérios tomados de empréstimo dos sistemas

privados, indicados pelos organismos internacionais de financiamento e, particularmente, no

caso da Educação, propagados por meio de discursos híbridos que mesclavam propósitos

progressistas com fórmulas tradicionais, muitas delas já testadas e reprovadas nas décadas

precedentes.

9.1. A globalização da economia e seus reflexos na educação profissional

Neves (2004) indica que a gênese das reformas ocorridas no final dos anos de 1990 se

deu na primeira metade dessa década quando o Plano Real encerrou uma etapa de ajuste

econômico que compreendeu o início da abertura de mercado, especialmente no setor de

Informática, e a privatização das empresas estatais. Trata-se, portanto, do início de um

processo que tem por propósito submeter o Brasil aos ditames do capital financeiro

internacional e minimizar as oportunidades de desenvolvimento do mercado nacional.

Para a autora, o ajuste econômico do Brasil ao capital internacional se deu de forma

acentuada nos governos Fernando Henrique Cardoso com a implementação de políticas que:

[ ] regulamentaram o aumento da super exploração da força de trabalho, a transferência da ciência e da tecnologia produzidas pelos países de capitalismo avançado, o desenvolvimento de um modelo de democracia baseada em estratégias de estímulo à conciliação de classes e ao desmonte das formas de organização social que se pautaram historicamente pelo combate à exploração e à dominação burguesas. (NEVES, 2004, p.1).

Todas essas alterações foram propagadas como extremamente necessárias para que o

Brasil pudesse acompanhar o processo de globalização propagado como uma nova ordem

mundial, à qual se vinculam todas as esferas da vida. Mas, ainda que a globalização possa

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assumir também contornos de ordem cultural, ou seja, possa ser considerado um fenômeno de

aproximação das culturas uma vez que as barreiras da separação estão cada vez mais diluídas,

não se trata desse fenômeno que estamos tratando aqui, mas sim da “globalização neoliberal”,

conforme mostra Ramonet (2007).

Para o autor, a globalização é O enfrentamento global do nosso tempo. Aquele do

mercado contra o Estado, do setor privado contra os serviços públicos, do indivíduo contra a

coletividade, dos egoísmos contra as solidariedades. (p.1) Trata-se de um movimento

desenfreado do mercado no sentido de ocupar os espaços públicos e, dessa forma, tomar de

empréstimo o patrimônio público para, com ele, obter lucros.

Sendo as trocas comerciais o principal motor da globalização, pois a aplicação de

capitais é o maior fator de lucro, a produção de bens e serviços só se justifica, do ponto de

vista capitalista, se trouxer ganhos próximos aos da especulação financeira.

Dessa forma, a produção se desloca cada vez mais para os países em que são menores

as garantias aos trabalhadores e também o controle do Estado sobre o capital: [ ] a finalidade

do exercício consiste em fabricar com baixos custos nos países pobres para vender a preços

muito altos nos Estados ricos, isso leva a uma avalanche de produtos importados dos países-

fábrica e vendidos, por exemplo, na Europa. [ ] (RAMONET, idem, p. 2).

No que diz respeito às formas de produção, a globalização impõe um modelo de

organização que se orienta no sentido de flexibilização dos processos de trabalho, e dos

trabalhadores, como forma de barateamento dos custos de produção pela adaptação rápida às

alterações que se fazem necessária para a adaptação das empresas aos requisitos das

tecnologias a serem aplicadas, aos produtos a serem fabricados e aos serviços a serem

prestados. Neves (2004) mostra o papel da escola que, aplicada aos países pobres, atende a

esse modelo de globalização econômica:

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A escola torna-se mais imediatamente interessada, ou seja, muito mais pragmática. Ela se limita, em nível cognitivo, a desenvolver habilidades que, em graus diversos, apequena a atividade criadora das novas gerações. A escola dos anos de neoliberalismo restringe o processo criador brasileiro, do ponto de vista técnico, no seu mais alto nível de elaboração cognitiva, à adaptação do conhecimento científico e tecnológico produzido nos países de capitalismo central, e no nível mais elementar, à simples operacionalização das inovações tecnológicas, no trabalho e no seu cotidiano. (p. 10)

Segundo a autora, as políticas neoliberais procuraram trazer para o cenário

educacional uma escola moldada aos ditames do capital, cuja conformação se deu por meio

das reformas educacionais, especialmente as implementadas nos anos de 1990 do século XX.,

como é o caso da aplicação do Decreto nº2.2208, base para a Reforma da Educação

Profissional.

No caso específico do CEFET-SP, a reforma desmanchou um modelo de formação

que integrava a educação geral e profissional, determinou a oferta de cursos rápidos,

diferenciados de toda a cultura institucional, e ainda, como resultado da ameaça de

estadualização que as medidas indicavam para as escolas da Rede Federal, canalizou sua

oferta de ensino para o nível superior.

Medidas de resistência interna, somadas à impossibilidade de demissão dos

professores de formação geral, servidores públicos estáveis, garantiram a oferta do Ensino

Médio regular na Escola. Como justificativa política para essa manutenção, que ia de encontro

ao propugnado pela Reforma, a Escola indicou ao MEC que o seu Ensino Médio deveria ser

modelo aos sistemas estaduais. Entretanto, a realidade do currículo desenvolvido tem muito

mais a configuração de preparação para o vestibular do que propriamente de uma proposta

modelar e diferenciada.

Podemos afirmar que Reforma imposta às escolas brasileiras no final dos anos de

1990 estava inserida num momento em que a macro orientação política em nível mundial e

nacional, o chamado neoliberalismo, produziu um modelo econômico e social que, entre

outros aspectos, destaca-se pelo crescimento do desemprego estrutural, competitividade,

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diferentes estágios de desenvolvimento entre as nações, xenofobia, segregação, violência e

narcotráfico, privatização e valorização exacerbada da economia em detrimento do social,

desencadeando assim um movimento crescente de riqueza x empobrecimento.

Trata-se, portanto, de uma proposta educacional que veio ao encontro desse modelo,

ou seja, ao mesmo tempo que buscava encaminhar a educação profissional pela via de

atendimento ao mercado fazia-o de maneira que não houvesse aumento nas despesas de

custeio das escolas. Por outro lado, há nos discursos sobre a Reforma uma conotação híbrida,

na medida que, ao mesmo tempo em que a formação aligeirada é apresentada como

estratégica para a competitividade das empresas, dadas as rápidas transformações

tecnológicas, ela também é apontada como alternativa para as classes menos favorecidas,

teoricamente excluídas das escolas federais.

9.2. A visão dos professores sobre o impacto da reforma: lentes refinadas para

compreensão do fenômeno educativo

Além da análise feita a partir dos estudos bibliográficos, essa pesquisa buscou mostrar

o impacto da Reforma no CEFET-SP hoje, a partir da visão dos atores diretamente envolvidos

em sua implantação: os professores.

Frigério (2002) aponta para as possibilidades de análise da Escola a partir da sua

cotidianidade:

[ ] o sentido da escola e da experiência que o conjunto de atores encontra nessa instituição acontece, fundamentalmente, nos múltiplos e diversos sentidos das práticas cotidianas na relação com o componente simbólico que, inevitavelmente, transpassa qualquer instituição educacional. Se as reformas encarregam-se daqueles aspectos sobre os quais também é necessário pensar - e consequentemente agir – ou os desestimula, também é parte das questões a serem analisadas a respeito do que tem ocorrido nos sistemas educativos e nas escolas nas últimas décadas. (p.209)

Na perspectiva de se manter um caráter mais naturalístico às falas dos professores,

optamos por fazer o levantamento de dados por meio de entrevistas narrativas. O material

coletado e estudado por meio de Análise de Conteúdo, indicou que as falas dos professores se

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referiram a temas e subtemas relativos à Reforma, que se constituíram em categorias e

subcategorias de análise. Essas temáticas se relacionaram aos argumentos sócio-econômicos

que condicionaram a edição da Reforma, ao desenho de currículo implementado, ao perfil dos

alunos, às possibilidades e limites de ação dos professores e, ainda, à perspectiva de correção

de rumos pela Instituição.

Os professores reconhecem que a formação oferecida pela Escola anteriormente à

Reforma não atendia diretamente a necessidade de mão-de-obra para o sistema produtivo,

uma vez que os alunos não se dirigiam ao mercado de trabalho, e que esse foi um dos fortes

argumentos para as mudanças.

Esses determinantes, além de produzirem as modificações de caráter mais pedagógico,

diminuíram profundamente as condições de trabalho presentes na Escola, tanto pelo arrocho

salarial quanto pelas medidas de contenção de gastos com custeio, recursos humanos e

investimentos, fazendo com que, além das dificuldades de compreensão da nova proposta, os

professores também não encontrassem condições materiais para a realização de seu trabalho,

especialmente no que diz respeito ao apoio pedagógico.

No que se refere aos argumentos sociais, há uma avaliação dos professores sobre uma

das premissas da Reforma de que a separação entre educação geral e profissional alteraria o

caráter elitista das escolas profissionais, especialmente da Rede Federal. Ainda que o perfil do

aluno atual, especialmente nos cursos técnicos da Unidade Sede, seja completamente

diferenciado em relação aos que freqüentavam os antigos cursos integrados, essa

diferenciação não se mostra nas unidades do interior em que a alteração se deu mais em outras

características como idade e nível de escolaridade.

No que se refere ao desenho curricular imposto pela Reforma, separando a formação

geral e profissional, ele impactou de forma acentuada no modelo da educação secundária

desenvolvida na Escola. A separação entre a formação geral e profissional praticamente

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inviabiliza a possibilidade da formação profissional inicial, sendo uma alternativa somente

para aqueles trabalhadores que já se encontram inseridos no mercado de trabalho. Os motivos

considerados pelos professores para essa realidade se mostram decorrentes, por um lado, da

falta de conhecimento científico dos alunos que procuram a Escola para serem

profissionalizados e, por outro, pela própria impropriedade de tratar de forma separada

aspectos indissociáveis ao ser humano que é a integração entre o pensar e o fazer.

Afirmam, ainda, que o ensino técnico desenvolvido na Escola está muito aquém

daquele resultante do currículo integrado, uma vez que a proposta atual, especialmente nos

cursos seqüencial-concomitantes, é de uma educação profissional com condicionantes que

limitam suas possibilidades, tanto no tocante à integralidade formativa, que deveria

caracterizar as propostas educativas progressistas, quanto na sua aplicação ao sistema

produtivo, se consideradas as exigências requeridas pelas novas tecnologias e pela

organização da produção.

Os professores apontam como perfil ideal de aluno, aquele que freqüentava o antigo

curso integrado, uma vez que além de possuir uma base sólida de conhecimentos científicos,

demonstrava motivação, originada pela possibilidade de obtenção de emprego e de

prosseguimento de estudos, garantidos pela Escola.

Diferentemente do modelo de aluno acima indicado, os que freqüentam a Escola hoje,

especialmente no curso seqüencial-concomitante, não possuem os requisitos de formação

geral que lhes permitam compreender e assimilar os conteúdos técnicos. Complementando

esse aspecto, não há neles, via de regra, demonstração de motivação para a formação técnica o

que faz com que, frente às dificuldades, abandonem a Escola.

Entre as causas para a evasão, além da falta de conhecimentos que caracteriza o perfil

dos alunos, concorre o fato do modelo seqüencial-concomitante exigir deles, quando não

possuidores de certificado do Ensino Médio, a freqüência escolar em dois turnos. A

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necessidade de obtenção do certificado de Ensino Médio também acaba fazendo com que

priorizem essa modalidade e deixem a formação profissional.

Alguns professores apontam que além das questões acima indicadas, a saída da Escola

durante o percurso de formação também é tributária da visão difusa que os alunos têm acerca

da profissão de técnico e da percepção de que, dadas as dificuldades de formação, ainda que

aprovados por mecanismos de promoção automática, não terão sucesso na profissão, uma vez

que serão rejeitados pelo mercado. Registram-se, nas falas dos professores, queixas por parte

dos empresários sobre a condição de entrada dos técnicos que, cada vez mais, se mostram

despreparados.

Contraditoriamente, entretanto, os movimentos de resistência interna para a

manutenção da qualidade da Escola e a capacitação e compromisso dos seus professores,

aliados às necessidades de mão-de-obra especializada e à situação de desqualificação das

escolas profissionalizantes, conferem certo destaque junto ao sistema produtivo que emprega

os técnicos formados pelo CEFET-SP.

A análise acerca da propriedade da formação de nível médio mostra que ela se

configura, na visão dos professores, como uma opção de emprego. Mas há no imaginário dos

alunos o desejo de ascensão acadêmica, via ensino superior. Essa orientação para a

profissionalização superior, além de estar impregnada pela cultura do saber em detrimento do

fazer, se justifica pela valorização social e econômica das profissões universitárias.

Por outro lado, os modelos de organização das empresas e das formas de produção

fizeram com que as antigas ocupações dos técnicos tenham desaparecido ou que, se mantidas,

passem a ser ocupadas por profissionais de nível superior, levando para o “chão-de-fábrica” a

atuação do técnico de nível médio.

Porém, no caso específico dos cursos de formação de tecnólogos, os professores

apontam para a necessidade de que sejam estabelecidas as diferenciações entre essa

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profissionalização e o técnico de nível médio. Segundo eles, as duas modalidades de

profissionalização se confundem, tanto no espaço da Escola como junto ao sistema produtivo.

Há, inclusive, indicações de que os alunos do técnico seqüencial-concomitante e dos

cursos de tecnologia têm perfil muito aproximado, tanto no que diz respeito à falta de pré-

requisitos, como no objetivo com o qual muitos deles procuram a Escola: obter um diploma

que os torne certificados frente às exigências das empresas.

Dessa forma, tanto a formação média realizada por meio do modelo seqüencial-

concomitante, quanto à de tecnólogos, têm maior relevância se consideradas como formas de

requalificação de uma força de trabalho empregada ou que busque reinserção profissional.

As indicações dos professores sobre as dificuldades e possibilidades formativas do

curso seqüencial-concomitante permitem inferir que esse modelo não se direciona de forma

positiva para o processo de formação inicial, sendo mais indicado na educação continuada.

Completando o conteúdo que emerge da fala dos professores, destaca-se a crença deles

acerca das ações propositivas que podem ser desenvolvidas no cotidiano da Escola, tanto por

ações coletivas como por meio do trabalho docente nas aulas e nos laboratórios.

Porém, o exame dessas considerações permite enxergar que se reflete no trabalho dos

professores uma diferenciação de entendimento. Há alguns que, até messianicamente, se

dispõem a dotar os alunos dos conhecimentos que não possuem, ainda que essa centralidade

limite o avanço dos conteúdos técnicos; outros que procuram aproveitar a experiência

acumulada dos alunos como ponto de partida de suas aulas, procurando assim garantir maior

motivação e contextualização; e ainda aqueles que não crêem ser possível outra estratégia que

não seja o recorte epistemológico do conhecimento, e subtraem os conteúdos que comportam

maior teorização, ainda que isso importe numa formação “manca”, tanto nos aspectos

formativos gerais quanto profissionais.

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Um aspecto que se destaca na fala dos professores diz respeito ao caráter contraditório

que podem adquirir as ações internas no sentido de se minimizarem os impactos negativos das

medidas externas. Ainda que possam atender, em partes, às expectativas e necessidades dos

alunos, elas não podem sombrear o aspecto deletério das medidas políticas.

Faz-se ausente na fala dos professores referências a uma questão que tem sido

reiterada nas diversas análises sobre as reformas curriculares dos anos de 1990 do século XX

que é a formação baseada em competências. Essa situação pode ser decorrente do fato dessa

discussão não estar sendo desencadeada na Escola que, mesmo com a adoção de alguns

modelos e terminologias propostos nas disposições legais não adotou, de fato, tal

metodologia.

Ramos (2001) ao estudar a pedagogia das competências aponta que essa forma de

organização dos saberes escolares retira do conteúdo a centralidade do trabalho da escola e da

qualificação o eixo da reivindicação do trabalhador. A escola perde assim o compromisso em

elevar a cultura dos seus alunos e a empresa fica livre de garantir direitos decorrentes de uma

determinada categoria de trabalhadores que, agora, têm na polivalência a obrigatoriedade de

atuarem em variadas funções e tarefas.

Certamente a discussão sobre a questão das competências em currículo demanda

estudos muito mais aprofundados que não foram objeto desse trabalho, particularmente

devido ao fato dessa questão não ter sido objeto das preocupações dos professores, uma vez

que a proposta não se consolidou na Escola, ficando na esfera do currículo prescrito. Mas

essa característica pode ser vista como uma forma de resistência institucional às orientações

legais:

As escolas técnicas estão mais diretamente que as outras submetidas às pressões oriundas do mundo do trabalho, mas respondem a essas pressões segundo dinâmicas próprias. A compreensão das aprendizagens e dos processos de socialização que aí ocorrem pressupõe a investigação no seu interior e no seu cotidiano. Se o ensino técnico oferecido na rede pública está muito distante do ensino politécnico ou da escola unitária sonhada pelos educadores, as instituições aqui referidas também estão longe de

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corresponder ao que seria, segundo Bourdieu e Boltanski (2002, p. 136), o “sonho patronal” da escola confundida com a empresa. (BURIGO, 2004, p.521)

Ainda que existam na fala dos professores, nas produções sobre a Reforma e em

diversas análises sobre o CEFET-SP, críticas sobre a sua implantação, julgamos que a Escola

está distante de oferecer uma formação na justa medida do mercado, como apregoada no

modelo das competências profissionais uma vez que, como apontam os professores, a

preocupação com a formação geral dos alunos sempre se fez presente por parte desse

segmento, devo acrescentar de muitos da equipe técnico-pedagógica, e ainda que a

possibilidade de retorno do Ensino Integrado, que traz maior possibilidade de

profissionalização dos alunos e de desenvolvimento da cidadania está, hoje, muito presente

nos planos da Escola.

Cremos, como os professores indicam que a Escola deverá, via currículo integrado,

resgatar a sua qualidade na formação inicial dos alunos trabalhadores. Mas, ressaltamos que

ela deverá manter outras possibilidades de profissionalização, especialmente por meio do

atendimento daqueles que estão fora da escolaridade regular e que, mesmo inseridos no

sistema produtivo, buscam alternativas de re-qualificação.

9.3. O ensino integrado como pilar da recuperação da Escola e da unificação curricular

no Ensino Médio.

A indicação de retorno ao ensino integrado, feita pelos professores, pode ser

concretizada, do ponto de vista legal, uma vez que a partir da edição do Decreto nº

5.154/2004 foi estabelecida a liberdade de oferta de cursos que congreguem, em um mesmo

desenho, o Ensino Médio e a Educação Profissional. Esse novo formato, mesmo mantendo a

duas escolas, permite que essa formação se dê em novas bases, ou seja, por meio da

integração das funções do Ensino Médio e da Educação Profissional.

Ainda que o retorno ao ensino integrado por meio de um decreto possa ser expressão

de que a sociedade brasileira ainda não partilha do ideal de um único modelo de escola e que

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continuamos trabalhando com iniciativas pontuais e submetidas às vontades políticas, essa

opção traz o fim do determinismo pedagógico, como é o caso da obrigatoriedade do modelo

seqüencial/concomitante, e dos modelos de gestão, como o modelo das escolas do segmento

comunitário, que acompanhamos até o início dessa década.

Frigoto, Ramos e Ciavata (2005) mostram que o Decreto nº. 5.154/2004 comporta

elementos que superam a concepção curricular dos anos 90, base para a imposição contida no

Decreto nº. 2.208/97, uma vez que contendo os elementos de uma educação politécnica,

contém também os germes de sua construção5. Para esses estudiosos da educação

profissional, a situação atual deve ser pensada como um período de passagem entre a

sociedade que temos para a sociedade que queremos e, portanto, de superação da escola

fragmentada e excludente:

O ensino médio integrado é aquele possível e necessário em uma realidade conjunturalmente desfavorável – em que os filhos dos trabalhadores precisam obter uma profissão ainda no nível médio, não podendo adiar este projeto para o nível superior de ensino – mas que potencializa mudanças para, superando-se essa conjuntura, constituir-se em uma educação que contenha elementos de uma sociedade justa. (p.44)

Entretanto, junto com a liberdade e a vontade de fazer, surgiram as indagações de

como fazer. Conforme citamos em Fernandes (2007), se a possibilidade de integração da

formação geral e técnica voltou à agenda político-educacional brasileira, com ela, ressurgem

as dificuldades para a sua concretização, pois há um grande desafio na construção de um

desenho de currículo do tipo integrado para que ele [ ] congregue a filosofia da teoria e da

técnica, esta última compreendida como prática, como fazer concreto e não,

necessariamente, como uma tarefa profissional. (p.99). Lodi (2006) indica que o modelo

integrado, na perspectiva defendida por Gramsci (1978), é decorrente de um [ ] princípio

educativo que unifica, na pedagogia, éthos, logos e técnos, tanto no plano metodológico

quanto no epistemológico. Nesse modelo [ ] O trabalho, a ciência e a cultura são princípios

5 SAVIANI, 1997 apud FRIGOTO, RAMOS e CIAVATA, op cit, p.44)

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estruturantes e devem ser resgatados como meio para a compreensão e a transformação do

mundo atual. (p.11)

Entretanto, cumpre-nos lembrar que a retomada do ensino integrado deve ser pensada

de maneira a garantir e/ou aprimorar a democratização apresentada pela Escola hoje,

especialmente no que diz respeito à sua capacidade de atender os trabalhadores que

necessitam de qualificação e requalificação, população que essa modalidade de ensino já não

atinge, pois há um grande contingente de egressos do Ensino Médio sem nenhuma formação

profissional. Dessa forma o Ensino Integrado não deve ser pensado como uma oferta

monolítica, uma vez que a Instituição deve permanecer atendendo em outros níveis de ensino,

inclusive no Ensino Superior.

O modelo de currículo para escola secundária carece de muitas discussões e opções

políticas, especialmente pelo fato de termos uma realidade educacional de múltiplas carências

e essa situação demanda alternativas que garantam condições de acesso a todos os sujeitos, de

acordo com a sua história de escolarização. Mas, a concretização do ensino integrado, tal

como indicam os professores do CEFET-SP, representa a possibilidade de estabelecimento de

um novo desenho que elimine a coexistência de duas escolas secundárias, e faça ressurgir o

sonho de uma escola politécnica.6

Ressalte-se um ponto chave no retrato construído pelos professores: a democratização

da Escola. Ainda que essa democratização seja caracterizada pela possibilidade de acesso a

jovens e adultos de baixa renda, a indicação da evasão escolar que se processa põe em dúvida

essa possibilidade.

6 Para o termo politécnica estamos utilizando o sentido apontado pela Professora Maria Ciavatta Ramos, dado por Saviani: como domínio dos fundamentos das ciências e das diferentes técnicas que compõem o sistema de produção moderno e não como “muitas técnicas, conforme denunciado por Paulo Nosella. (FRIGOTO, RAMOS e CIAVATA, 2005, p85)

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9.4. O que significa democratizar a Escola: estariam garantidas as condições de acesso

e permanência dos alunos indesejáveis?

Parece-nos que a questão da democratização da educação, ainda que careça de

maiores estudos de ordem filosófica, está localizada muito proximamente da forma como os

professores desenvolvem e analisam sua prática e ainda como enxergam as possibilidades e

limites da escola. Destaca-se aqui uma questão importante acerca do propósito educativo

escolar e do seu alcance: a própria configuração da escola. Ou seja, é preciso pensar na

possibilidade educativa dentro de um ordenamento escolar específico de tempo, idade,

controle, seleção.

Segundo Faria Filho (2000), essa marca do processo de escolarização das massas,

articula-se em torno do modelo dos grupos escolares, instituídos na República, espaços de

racionalidade do trabalho escolar, a partir dos quais foi sendo desenvolvido um “caldo de

cultura” que não pode ser desconsiderado quando se busca verificar o papel dessa instituição

no processo de culturação das massas.

Para Sacristán (1998) é preciso se pensar de que maneira os conteúdos e as atividades

de ensino, desenvolvidos dentro do espaço da escola, podem responder a questões profundas

de ordem social, política, jurídica, filosófica, organizativa, econômica e que dizem respeito

aos direitos sociais, aos deveres do estado, ao desempenho profissional dos docentes e ao

projeto de nação.

Considerando-se que os conhecimentos vinculados pela Escola implicam sempre em

um recorte cultural, se inscreve aí a dinâmica referente à definição de que partes da realidade

são relativamente mais importantes para serem transmitidas, quem determina que seja feito

um ou outro recorte e ainda como esse recorte deve ser transmitido. Para Saviani (2004b) o

significado de educação coincide com o de cultura enquanto um conjunto de práticas, das

técnicas, dos símbolos e dos valores que devem transmitir às novas gerações para garantir a

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reprodução de um estado de coexistência social, mas, quando os elementos culturais com que

a escola trabalha vêm de fora, são externos à cultura local, trata-se de uma aculturação.

(Bosi, apud Saviani, p.122)

Apple(1996), expõe que, no nosso cotidiano, os significados estão impregnados de

uma carta “branquidade” pois a cultura circulante é uma cultura capitalista, branca e patriarcal

e essa situação é acompanhada de um senso comum de que não há nada mais para pensarmos

sobre essa relação que está posta e é normal.

Segundo Sacrinstán(1998), os condicionantes curriculares sobre os quais se referem

Apple, Saviani e outros estudiosos, se estabelecem em âmbito intra e extra-escola e ainda em

âmbito intra e extra-sala-de-aula. Tanto os agentes externos: governo, sistemas de ensino,

como os internos: professores, família, alunos, interferem na ação pedagógica. Dessa forma, a

cultura escolar pode ser considerada uma representação da cultura real que vai se

transformando a cada ação dos agentes educacionais. Dessa forma indica a existência de duas

faces, nem sempre diacrônicas, no currículo: a face visível e a oculta. A primeira se

caracteriza pelo currículo oficial e compõe as orientações, planejamentos, discursos, falas

pedagógicas e registros, a segunda pelo currículo real, aquele que se desenvolve na prática

escolar e que é carregado dos valores, crenças, preconceitos, etc. presentes na sociedade, nos

alunos, nos professores, assim como das possibilidades e limites dos sujeitos fim da educação.

Considerar que o ensino se reduz ao que os programas oficiais ou aos próprios professores as dizem que querem transmitir é uma ingenuidade. Uma coisa é o que dizem aos professores / as o que devem ensinar,outra é o que eles acham ou dizem que ensinam e outra diferente é o que os alunos / as aprendem. Em qual dos três espelhos encontramos uma imagem mais precisa do que é a realidade? Os três trazem algo, mas algumas imagens são mais fictícias do que outras.O resultado que obtenhamos das duas primeiras imagens – o que se diz que ensina – forma o currículo manifesto. Mas a experiência de aprendizagem do aluno / a nem sempre se reduz, nem se ajusta, à soma de ambas as versões. Ao lado do currículo que se diz estar desenvolvendo, expressando idéias e intenções, existe outro que funciona subterraneamente, que se determina oculto. Na experiência prática que os alunos / as têm se misturam ou interagem ambos; é nessa experiência que encontramos o currículo real. (Sacristán, idem,p. 131-132)

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Sacristán (1998), destaca que o fato do currículo oculto estar presente no cotidiano da

escola não significa sua neutralidade sócio-política. Embora a escola possa elaborar seus

próprios ritos, eles refletem a posição que ela tem na sociedade e a própria forma de

organização da sociedade na qual ela está inserida. Discriminação de sexo, gênero e outras

formas de exclusão que ocorrem nas escolas são reflexos da forma como a sociedade trata

essas questões. Em geral, também o fracasso escolar está muito associado à forma como as

práticas escolares se organizam e como os conteúdos são tratados pelos professores, sendo

revestidos de uma linguagem e tratamento que não podem ser compreendidos por todas as

classes sociais.

Essa realidade de distanciamento entre o currículo real e oculto explica grande parte

das reservas com que são tratadas, no interior das escolas, as propostas de renovação

curricular. Sem compreenderem ou aceitarem as reformas proposta, ou mesmo pelos dois

motivos, os professores não chegam a levá-las até a sala de aula e, assim, elas se tornam

processos natimortos.

Moreira(op. cit), referindo-se às reformas curriculares sugere ser o currículo centrado

na escola, e não o decidido nos órgãos administrativos centrais, o que mais favorece o

comprometimento dos professores e alunos. Devidamente engajados, serão eles os mais leais

guardiões das iniciativas que ajudaram a conceber e implantar (p.126).

Arroyo(1998), aponta que:

Há uma cultura vivida, traduzida em práticas, na qual acontece o educativo, tanto nas famílias, nas igrejas, no trabalho e nas ruas quanto nas escolas. Quando se olha para essa concretude e para essa prática, os objetivos sempre proclamados para a escola (...) deixam de ser aspirações vagas ou meros discursos para ser guias de práticas, para ser prática vivida.. (p.156)

Mas Goodsom (2003) afirma que a diferenciação entre currículo escrito e prático não

pode simplesmente ser entendida como uma dicotomia entre o pensado e o realizado. Não

obstante exista uma separação que se apresenta entre essas duas faces do currículo, o que

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ocorre em sala de aula é, em grande parte, uma representação do que está proposto

formalmente e não, necessariamente, algo que fica à margem das prescrições curriculares:

O ‘currículo como fato’ precisa ser considerado não como mera ilusão, camada superficial da prática escolar de alunos e professores, mas como uma realidade social, historicamente específica, expressando relações de produção particulares entre pessoas. Semelhante currículo é uma mistificação quando se apresenta como algo que possui vida própria e confunde as relações humanas nas quais, como qualquer conceito de conhecimento, está embutido, fazendo da educação uma coisa que as pessoas não podem compreender nem controlar.” (YOUNG, apud GOODSON, 2003, p.18)

Sacristán reitera que é preciso passar o predomínio das proposições técnicas e

cientificistas no pensamento educativo, com a recuperação de perspectivas epistemológicas

desautorizadas por aquela orientação, para recuperar enfoques que entendessem a

importância das determinações históricas, sociais e subjetivas dos processos pedagógicos e

do currículo.” (p.143). Considera, então, que o entendimento de currículo como processo é

condição tanto para o desvelamento da realidade como para a sua superação. Se a

cotidianidade da escola for considerada como um espaço de criação e recriação, a perspectiva

de mudança curricular só se concretiza a partir de ações que atinjam esse nível e, então, a

mudança, ou não, depende, necessariamente, do convencimento e adesão dos professores.

Dessa forma, um estudo que pretenda alcançar a dimensão real dos problemas

curriculares, deve reunir componentes que permitam abarcar o que Arroyo(op. cit) chamou de

inovação educativa e curricular. Nesse sentido: “... a inovação consiste basicamente em

desatar, desamarrar as virtualidades formadoras inerentes às práticas, aos procedimentos,

aos rituais, às vivências que a escola propicia, que os professores intencional e

pedagogicamente potencializam. (...)”(p.157)

As considerações sobre currículo como um processo com profundas raízes sociais e

políticas, com recortes determinados por forças diversas, tanto externas como internas à

escola e ainda como uma síntese de conteúdos e práticas, reunidas numa ação política

comandada e realizada por sujeitos reais e identificáveis torna fundamental, na aproximação

entre o ideal e o realizável, a consideração aos atores da sua prática: os professores e os

alunos. Nesse sentido é preciso considerar a proposta do grande mestre Miguel Arroyo, ao

afirmar que:

Quando os professores situam a inovação nas diversas práticas do cotidiano de sua ação, captam sua complexa riqueza educativa, vão entendendo que o currículo não pode ser reduzido a um documento estático a ser cumprido (...). Essa concepção, ainda oficial, vai se distanciando da cultura escolar e

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profissional, de seu imaginário e referencial, e os mestres vão percebendo como, na prática, agem com base em uma concepção mais totalizante (...). Daí que nessas experiências não se coloca o currículo como problema nem como solução. Ele vai ao reencontro, na ressignificação da totalidade das práticas educativas da escola. (p.163).

Considerando-se que, mesmo com diferenças no nível de envolvimento com a

problemática da Reforma e com diferentes capacidades de mostrarem uma visão política

sobre o processo educacional, os professores do CEFET-SP, sujeitos dessa pesquisa,

apresentaram uma visão sobre a implementação da Reforma e o impacto que ela produziu no

CEFET-SP que permitiu a construção de um retrato claro de como a Escola se estrutura hoje e

as alternativas para a superação de suas dificuldades.

9.5. Os professores como sujeitos da Educação e construtores de uma nova ordem

escolar

O que capacita esses professores entrevistados durante a realização dessa pesquisa a

serem interlocutores privilegiados reside no fato de todos conhecerem o modelo desenvolvido

na Escola antes da Reforma, serem responsáveis por aplicarem as mudanças que se deram

sobre o currículo, dependerem das condições concretas para a efetivação da formação e

conviverem, no espaço da sala de aula, com os alunos que vieram buscar essa ‘nova’ forma de

profissionalização.

Outro fator de credenciamento dos docentes reside, como dissemos anteriormente, na

crença da possibilidade emancipatória do processo reflexivo, o que pode levar o ser humano a

vencer seu estágio de alienação. Essa alienação que muitas vezes vimos ser imputada aos

professores também é um processo forjado na sociedade, no próprio seio das escolas, no

cotidiano dos professores. Para Agnez Heller, conforme indicado por Rossler (2004), as

condições materiais que envolvem os professores podem determinar a sua possibilidade de

maior ou menor emancipação intelectual:

O cotidiano torna-se sinônimo de alienação quando sua dinâmica impede os homens de se apropriarem da genericidade para-si [ ] quando o indivíduo está preso ao reino daquelas necessidades materiais e psíquicas estritamente

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indispensáveis para reproduzir-se como indivíduo. Sendo que em nossa sociedade de classes isso significa, na maioria das vezes, estar preso ao que é necessário para sua sobrevivência quase que exclusivamente física, isto é, orgânica. (p. 112).

Semeraro (2006), denúncia que fala-se cada vez menos de intelectuais ‘orgânicos’,

das ‘classes’ trabalhadoras, de ‘militantes’ e de educadores populares. Por toda parte,

despontam gestores, intelectuais céticos e políticos pragmáticos. (p.382). Como o autor,

reconhecemos que essa possibilidade de atuação como um intelectual orgânico (roubando a

expressão de Gramsci) tem sido cada vez mais negada aos professores e, dessa forma, a opção

em ouvi-los nesse trabalho também se configurou como uma forma de resistência a esse

movimento de deteriorização que, em última instância, se inteiramente concretizado, apaga a

possibilidade de mudança social pela via da reflexão-ação e nos submete aos descaminhos que

vivemos.

Rossler (2004) aponta que:

[ ] não podemos abster nos de eleger o uso da razão, a crítica radical, a reflexão consciente, a análise coerente, a paixão pela verdade e pela transformação da realidade como as únicas formas possíveis de os indivíduos conduzirem livre e conscientemente a sua vida, alcançando, assim, um conhecimento objetivo que lhes permita desmistificar os processos de dominação e alienação da sociedade capitalista contemporânea. O que significa, em outras palavras, romper com a naturalidade com que é aceita a situação social e psicológica de alienação que marca a vida do indivíduo contemporâneo. Portanto, de forma alguma poderemos escapar à responsabilidade de nos posicionarmos criticamente ante o pensamento irracionalista que assola nossa sociedade de forma especialmente contundente neste início de século, uma vez que tal tipo de pensamento tem implicações diretas sobre o degradante quadro histórico, social e cultural atual. (p. 114)

Sacristán (2000b) reconhece nos professores um papel fundamental de transformar em

ações os anseios que a sociedade tem em relação à educação e, particularmente, à escola:

[ ] Ainda que reconheçamos o limite da atuação profissional, o certo é que o professor desempenha um papel ativo (...) É o último interprete do primitivo projeto cultural que é o currículo antes que este se converta em ações concretas e dêem lugar a aprendizagem nos alunos: toma decisões muito importantes para dar um sentido ou outro à experiência de aprendizagem que os alunos terão. [ ] (p.293)

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Trabalhos apresentados por Sicca7, em conjunto com outros pesquisadores, indicam a

importância dos professores se sentirem sujeitos dos processos educativos, sendo essa

sensibilidade crucial para o seu aperfeiçoamento. Indica, ainda, que há necessidade de um

espaço coletivo, de trocas entre os professores, para que os projetos, de fato, estendam-se na

prática escolar.

Mas a atuação do professor como um sujeito crítico e reflexivo não pode ser pensada

de maneira individual, como atributo do sujeito. Como afirma Contreras (2002), a autonomia

de pensamento que o processo reflexivo exige se desenvolve como um processo de

intervenção nos complexos, ambíguos e conflituosos espaços da prática docente. A prática

pedagógica não se dá, portanto, a partir de um receituário; é um processo permanente de

reflexão-ação-reflexão sobre todas as questões da escola e, particularmente, sobre o trabalho

dos professores. Trata-se, portanto, de uma construção permanente, para a qual, esperamos,

esse trabalho poderá contribuir.

Um aspecto particularmente relevante nas falas dos professores é a demonstração de

uma grande preocupação pedagógica refletida no resultado do processo ensino-aprendizagem.

Ainda que os aspectos de caráter econômicos e políticos tenham surgido em algumas falas e,

até mesmo de forma contundente, não ocorreram grandes encaminhamentos nesse sentido.

Essa situação pode ser decorrente do pouco espaço que o debate político tem no interior da

Instituição uma vez que temáticas dessa ordem, via de regra, não são consideradas como

prioritárias pela comunidade da Escola, ainda que, por vezes, sejam indicadas pelo sindicato

local.

Parece-nos que faltou, à época da implantação da Reforma, uma discussão mais

acentuada acerca dos propósitos políticos do Governo Fernando Henrique Cardoso, cujas

propostas educativas apontavam para um perfeito alinhamento com as recentes definições do

7 Sobre esses trabalhos ver, especialmente, Scarpini & Sicca (2006) e Gonçalves & Sicca (2006)

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Consenso de Washington, reunião realizada pelo Institute for International Economics e da

qual participaram o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Banco

Interamericano de Desenvolvimento (BID), representantes do governo estadudinense e

diversos economistas liberais.

Segundo Negrão, 1998, o encontro cujo resultado foi chamado de Consenso de

Washington visava, fundamentalmente, avaliar as reformas implantas na América Latina e,

para que elas pudessem, de fato, apresentarem resultados satisfatórios, foram apresentadas

algumas regras universais que deveriam balizar essas reformas. Entre elas, destacam-se a

eliminação do déficit público pela via da disciplina fiscal e da privatização, e a focalização

dos gastos em educação, saúde e infra-estrutura, sendo estes gastos potencializados pelo

afastamento do Estado da gestão desses serviços. Como afirma o autor, ainda que essas

indicações tivessem em princípio um caráter doutrinário, elas se materializam nas regras dos

financiamentos que são oferecidos para a implantação das Reformas e que se tornam mais

fortes quando estão de acordo com o pensamento dos governos locais, como ocorreu em

nosso país.

Parece-nos que se, em nível nacional, a ausência de discussões acerca da possibilidade

do nosso país garantir a obtenção dos recursos de que precisava sem que, necessariamente,

atendesse a todas as reivindicações dos organismos de financiamento e ainda quanto das

normas propostas nas reformas, de fato estavam nas exigências externas ou nas crenças dos

nossos governantes, levou à edição de programas e propostas que, mesmo apresentadas com

caráter progressista não representaram uma medida que pudesse atender de forma satisfatória

ao sistema educacional, em especial às escolas profissionalizantes. Por outro lado, no âmbito

do CEFET-SP, as discussões sobre a necessidade de a Escola aderir à Reforma como forma

de obter recursos e “status” necessários, ainda que para isso tivesse que travestir sua proposta

com os condicionantes impostos pelo governo, ficaram restritas a poucos servidores,

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administrativos e professores, que estiveram dispostos a participarem em alguns encontros

com essa finalidade.

Ainda que essa constatação dos idos dos anos 90 não altere a configuração atual do

CEFET-SP, e nem tampouco pretenda justificá-la, cremos que ela aponta para a necessidade

de amplas discussões e, provavelmente, de muitas revisões. Ainda que não tenhamos a

intenção nem a competência de ditar uma fórmula capaz de resolver todas as questões da

Escola, cremos que ela carece hoje de um trabalho que leve à permanente reflexão dos

professores, equipe-técnica, gestores e alunos para que possam ser fortalecidas, e até mesmo

esclarecidas, as bases políticas e teórico-filosóficas sobre as quais se apóiam a proposta

pedagógica da Escola. Dessa forma, os resultados dessas discussões certamente poderá levar a

tomadas de posição de caráter político que reverberarão em ações de caráter instrumental, tais

como revisões constantes sobre desenhos curriculares, metodologias, desenhos de cursos,

organização escolar, etc. com vistas a garantir a qualidade do ensino. No que diz respeito à

formação profissional inicial, cremos, essa reflexão levará, de fato, ao retorno do modelo de

ensino técnico que integre formação geral e específica, como apontam os professores que

protagonizaram esse trabalho, mas, reiteramos, a Escola não pode se prender sua oferta de

ensino a um único modelo.

Nesse sentido, apoiamos a política atual do governo federal que aponta para a

expansão da rede e crescimento dos CEFETs, aproximando sua autonomia com as das

universidades, mas mantendo a oferta de educação básica, em especial na modalidade de

técnico integrado e com atendimento específico para jovens e adultos alijados da escolaridade

em idade própria. Entretanto, essa orientação do governo não poderá se transformar numa

nova Reforma, ela deverá, sim, ser implantada como fruto da reflexão das comunidades das

escolas e, em especial, ser transformada em um projeto em que os professores se sintam

protagonistas.

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Currículo sem Fronteiras, v.2, n.1, pp.5-14, Jan/Jun/2002, mimeo.

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Jesuítas aos anos de 1980. Campinas, SP : Autores Associados; Brasília, DF : Plano,

2004.

Legislação Consultada:

1. Decreto Federal nº. 5840 de 13 de julho de 2006 – (Institui, no âmbito federal, o

Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica

na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA).

2. Decreto Federal nº. 5478 de 24 de junho de 2005 - (Institui, no âmbito das instituições

federais de educação tecnológica, o Programa de Integração da Educação

Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos -

PROEJA.) – revogado pelo Decreto nº 5840 de 13 de julho de 2006.

3. Decreto Federal n° 5.154, de 23 de julho de 2004 (Regulamenta o § 2° do artigo 36 e

os artigos 39 a 41 da Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

Diretrizes e Bases da Educação Nacional).

4. Resolução CNE/CEB nº. 1/05 de 03 de fevereiro de 2005. (Atualiza as Diretrizes

Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação para o Ensino

Médio e para a Educação Profissional Técnica de nível médio às disposições do

Decreto nº 5.154/2004)

5. Parecer CNE/CEB Nº 39/2004 de 08 de dezembro de 2004. (Aplicação do Decreto nº.

5.154/2004 na Educação Profissional Técnica de nível médio e no Ensino Médio.)

6. Lei Federal nº.10.172, de 09 de janeiro de 2001 – Aprova o Plano Nacional de

Educação e dá outras providências.

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7. Resolução CNE/CEB nº1/00 de 05 de julho de 2000. - (Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação e Jovens e Adultos).

8. Parecer CNE/CEB 11/2000 de 10 de maio de 2000– (Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação e Jovens e Adultos)

9. Resolução CNE/CEB n.º 04/99 de 05 de outubro de 1999. (Institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação Profissional).

10. Parecer CNE/CEB n° 16/99 de 05 de outubro de 1999. (Diretrizes operacionais para a

Educação Profissional em nível nacional).

11. Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1998 (Dispositivos sobre a

Educação).

12. Resolução CNE/CEB n° 03/98 de 26 de junho de 1998. (Institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio).

13. Parecer CNE/CEB 15/98 de 01 de junho de 1998 – (Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Ensino Médio).

14. Parecer CNE/CEB n° 17/97 de 03 de dezembro de 1997 (Institui as Diretrizes

operacionais para a Educação Profissional em nível nacional)

15. Decreto Federal nº 2406/97 de 27 de novembro de 1997 (Regulamenta a Lei nº. 8949

de 08 de dezembro de 1994 e dá outras providências)

16. Parecer CNE/CEB n° 05/97 de 07 de maio de 1997 (Proposta de Regulamentação da

Lei 9394/96).

17. Medida Provisória nº. 1549-28/97 de 14 de março de 1997. (Dispõe sobre a expansão

da oferta de Ensino Técnico por parte da União).

18. Lei Federal n° 9394/96 de 20 de dezembro de 1996 (Estabelece as Diretrizes e Bases

da Educação Nacional)

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19. Lei Federal n° 8.948/94 de 08 de dezembro de 1994 (Dispõe sobre o Sistema

Nacional de Educação Tecnológica e dá outras providências)

20. Decisão Normativa CONFEA nº44/92 de 25 de setembro de 1992. (Dispõe sobre a

titulação do Técnico Industrial e Técnico Agrícola de 2º grau).

21. Decreto Federal nº. 90922/85 de 06 de fevereiro de 1985. (Regulamenta a Lei nº.

5524 de 05 de novembro de 1968 que dispõe sobre o exercício da profissão de

Técnico Industrial e Técnico Agrícola de Nível Médio ou de 2º grau).

22. Resolução CONFEA, nº262/79 de 28 de julho de 1979. (Dispõe sobre as atribuições

dos Técnicos de 2º grau, nas áreas da Engenharia, Arquitetura e Agronomia)

23. Resolução CONFEA, nº218/73 de 29 de junho de 1973. (Dispõe sobre as atividades

das diferentes modalidades profissionais da Engenharia, Arquitetura e Agronomia)

24. Lei Federal n° 5524/68 de 05 de novembro de 1968 (Dispõe sobre o exercício da

profissão de Técnico Industrial de Nível Médio)

25. Constituição Federal de 1937, disponível na página

http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Brazil/brazil37.html, consultada em

20/08/2007. ((Dispositivos sobre a Educação)

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APÊNDICE

ROTEIRO PARA AS ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES

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ROTEIRO PARA ENTREVISTA NARRATIVA COM OS PROFESSORES

1. Esclarecer o propósito do trabalho;

2. Explicar a técnica da entrevista;

3. Solicitar autorização para gravação da entrevista;

4. Apresentar o tópico inicial:

Fale um pouco da sua experiência com a Reforma da Educação Profissional que se deu a

partir da edição do Decreto nº2208/97 e, particularmente, quais têm sido as suas

preocupações centrais em relação à formação dos alunos. Ou seja, o que você busca

atingir quando prepara seus planos e ministra suas aulas?

5. Ouvir a narrativa, sem interrupções;

6. Apresentar questões que digam respeito a esclarecimentos sobre o repertório

apresentado pelo entrevistado, sem questionamentos sobre suas posições;

7. Sem gravar, fazer questões sobre as posições assumidas pelo entrevistado.

8. Fazer o registro desse momento no diário de campo.

9. Agradecer a contribuição do entrevistado e garantir o acesso ao relatório final da

pesquisa.

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