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CENTRO UNIVERSITÁRIO CELSO LISBOA CURSO DE PSICOLOGIA Trabalho de Conclusão de Curso Elaborado por: Patrícia Fátima de Abreu Matricula: 020510030 Rio de Janeiro Dez/ 2006

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CELSO LISBOA

CURSO DE PSICOLOGIA

Trabalho de Conclusão de Curso

Elaborado por:

Patrícia Fátima de Abreu

Matricula: 020510030

Rio de Janeiro

Dez/ 2006

CENTRO UNIVERSITÁRIO CELSO LISBOA

Patrícia Fátima de Abreu

Matricula: 020510030

REPRESENTAÇÃO SOCIAL, HIV/ AIDS E

ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

Curso de Graduação em Psicologia do Centro

Universitário Celso Lisboa como requisito parcial à

obtenção de Grau em Formação de Psicólogo.

Rio de Janeiro

Dez/ 2006

CENTRO UNIVERSITÁRIO CELSO LISBOA

CURSO DE PSICOLOGIA

REPRESENTAÇÃO SOCIAIL, HIV/ AIDS E

ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Patrícia Fátima de Abreu

08 de dezembro de 2006

Apresenta o trabalho de Conclusão de Curso

Área de concentração: Ciências Humanas e Sociais

Examinadores:

___________________________________

Prof. Dr. Marcus Vinícius de Araújo Câmara

Centro Universitário Celso Lisboa

Orientador

_____________________________________

Profª. Cientista Social pela UFRJ, Mestre e

Doutoranda em Saúde Coletiva pelo

IMS/ UERJ – Ivia Maksud

Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS – ABIA

Co-orientadora

ABREU, P., F. Representação social, HIV/ AIDS e atuação dos profissionais de saúde.

Monografia, curso de Graduação em Psicologia, Centro Universitário Celso Lisboa, Rio de

Janeiro, 2006.

RESUMO

Este Trabalho de Conclusão de Curso tem como objeto de estudo as Representações Sociais dos

profissionais de saúde, que atendem pacientes com HIV/ AIDS em um Centro Municipal de

Saúde em Duque de Caxias, Estado do Rio de Janeiro. A pesquisa teve como objetivo principal

analisar as representações sociais do HIV/ AIDS na equipe de profissionais de saúde que atuam

neste local tratando pacientes soropositivos. O referencial teórico para esta pesquisa foi a Teoria

das Representações Sociais formulada por Moscovici (2003). A pesquisa contemplou como

grupo alvo os profissionais que compõe a equipe multidisciplinar desta instituição de saúde

atendendo pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS. Para interpretar as realidades sociais, foi

empregado um estudo de abordagem qualitativa. O instrumento de coleta de dados foi um roteiro

de entrevista estruturada com o fim de observar e registrar os fenômenos que aparecem na

realidade investigada. Foram realizadas oito entrevistas, considerando os seguintes profissionais:

uma ginecologista, um clínico, uma socióloga e assistente social, uma farmacêutica bioquímica,

uma psicóloga, uma enfermeira, uma técnica de enfermeira e uma auxiliar administrativo. Como

técnica de análise dos dados, foi utilizada a Análise do Discurso (BAUER & GASKELL, 2002)

com a finalidade de decompor à linguagem relativa àquele discurso local, afim de corroborar que

a linguagem não é simplesmente um meio neutro de refletir ou descrever o mundo, mas sim, que

existe algo subjacente aos discursos que é o ponto central da construção da vida social. As

representações sociais do HIV/ AIDS dos profissionais de saúde desta equipe multidisciplinar são

atribuídos aos significados elaborados socialmente, levando em consideração uma série de forças

em atravessamento a este processo – forças sociais, políticas, sexuais, econômicas, familiares,

culturais, entre outras. Sendo assim, verificou-se que estes aspectos ou forças em atravessamento

contribuem para a produção destes profissionais de saúde e dos seus modos de atuação.

Palavras-chave: Representação Social, profissionais de saúde e HIV/ AIDS.

ABREU, P., F. Social representations, HIV/ AIDS and actuacion of the heath professionals.

Monografy, Psychology Course. Centro Universitário Celso Lisboa, Rio de Janeiro, 2006.

ABSTRACT

This Course Conclusion Work has as study object the Social Representations of the health

professionals that take care of patients with HIV/ AIDS in a Municipal Center of Health in Duque

de Caxias, State of Rio de Janeiro. The main objective of the research was to analyze the social

representations of HIV/ AIDS in the team of health professionals who act in this place treating

patients soropositives for the HIV. The theorical reference for this research is the Theory of

Social Representations formulated by Moscovici (2003). The research target group were the

professionals of the multidisciplinar team of this institution who had being taking care of patients

carriers of virus HIV. To interpret the social realities, a qualitative boarding study was used. The

instrument of data collection was a script of interview structuralized to observe and to register the

phenomena that appear in the investigated reality. Eight interviews had been carried through,

considering the following professionals: a gynecologist, a physician, a sociologist and social

assistant, a biochemist pharmaceutical, a psychologist, a nurse, one nursery technician and one

administrative auxiliar. As analysis of data technique, it was used Analysis of Speech (BAUER &

GASKELL, 2002) with the purpose of decomposing the relative language to the local one, in

order to corroborate that the language is not simply a neutral way to reflect or to describe the

world, but that exists something underlying the speeches which is the central point of the

construction of the social life. The social representations of HIV/ AIDS of the professionals of

health of this multidisciplinar team are attributed to the meanings elaborated socially, taking in

consideration a series of forces crossing this process - social forces, sexual, economic, familiar,

cultural, politics, among others. Being thus, it was verified that these aspects or crossing forces

contribute for the production of these professionals of health and their ways of performance.

Key word: Social representation, professionals of health and HIV/ AIDS.

SUMÁRIO

Pág.

INTRODUÇÃO..............................................................................................................................06

1 CAP. 1 O PROFISSIONAL DE SAÚDE E SUA PRÁTICA DE TRABALHO........................13

1.1 Formação profissional e suas dimensões no campo social.......................................................13

1.2 Relações sociais na equipe multidisciplinar: conflitos e tensões.............................................15

2 CAP. 2 A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DO HIV/ AIDS.........................................................21

2.1 O significado trabalho com HIV/ AIDS para o profissional de saúde ....................................21

2.2 A representação social do fenômeno HIV/ AIDS e a imagem do paciente soropositivo.........27

2.3 Paciente soropositivo: estigma e marginalização.....................................................................33

2.4 HIV/ AIDS e sua transmissão na atualidade, a partir das representações sociais dos

profissionais de saúde.....................................................................................................................36

3 CAP. 3 RELAÇÃO PROFISSIONAL DE SAÚDE-PACIENTE SOROPOSITIVO E AS

SUAS INTERFACES...............................................................................................................40

3.1 A percepção do profissional de saúde sobre a relação profissional de saúde paciente

soropositivo..............................................................................................................................40

3.2 Tratamento do paciente e sua relação com a representação social do profissional de saúde

sobre o nível sócio-econômico: classe social e linguagem.......................................................42

3.3 A questão da vulnerabilidade: nós e os outros.........................................................................47

3.4 Estratégias para trabalhar o cotidiano das relações equipe de saúde-paciente.........................51

CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................................54

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS...........................................................................................56

APÊNDICE....................................................................................................................................58

A Roteiro de entrevista.................................................................................................................59

B Termo de consentimento livre e esclarecido..............................................................................53

INTRODUÇÃO

Neste trabalho, pretendo contribuir com uma investigação no sentido de suscitar no corpo

social1, questões que possam causar certo estranhamento e que, a partir destas, o estudo em

questão torne-se disparador de outros modos de compreensão da relação entre seres construídos

enquanto profissionais de saúde e pacientes soropositivos.

Sendo assim, abre-se espaço para expor os motivos de minha escolha por este tema. Em 2005,

assisti a Primeira Jornada Nacional sobre Transexualidade e Saúde: A Assistência Pública no

Brasil, organizado pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de

Janeiro, onde vários assuntos foram discutidos. Contudo, dois deles me deixaram bastante

mobilizada. Um deles foi o relato de uma transexual2 soropositiva, que discorreu sobre sua

dificuldade no que se refere ao seu tratamento por ser portadora de HIV e ao fato de, no seu caso,

existir um duplo agravante construindo ou produzindo a relação médico/ paciente: sua

transexualidade e sua soropositividade. A partir de então, fiz uma conexão com outro fato, o

relato de um profissional de saúde que expôs seu conflito no que diz respeito a atender e tratar

uma transexual. O conflito se dá da seguinte forma: sabe da importância de seu trabalho junto a

estas pessoas, mas ao mesmo tempo se percebe incomodado com o produto daquilo que foi

construído no imaginário social3. Então, fiquei bastante sensibilizada no sentido de refletir,

indagar, problematizar sobre as construções das representações sociais presentes na vida do

profissional da área de saúde atendendo pacientes soropositivos.

O tema nesta pesquisa concerne às representações sociais4 dos profissionais de saúde, na

atualidade, que atendem pacientes com HIV/ AIDS no Centro Municipal de Saúde em Duque de

Caxias, Estado do Rio de Janeiro. A pesquisa contemplou como grupo-alvo os profissionais que

compõem a equipe multidisciplinar desta instituição de saúde atendendo pacientes portadores de

HIV/ AIDS. A coordenadoria DST/ AIDS é composta pelo CTA – Centro de Testagem e

Aconselhamento e Ambulatório. O CTA possui assistente social, auxiliar administrativo,

farmacêutico bioquímico, psicólogo, e sociólogo. O ambulatório utiliza os profissionais assistente

1 Compreendo que Corpo Social é o conjunto de indivíduos que compõe a sociedade. 2 Transexual é aquele que tem a convicção de pertencer ao sexo oposto, cujas características fisiológicas aspira ter ou já adquiriu por meio de cirurgia, segundo o dicionário Houaiss. 3 Considera-se Imaginário Social aquilo que pertence ao domínio da imaginação e que rege as relações sociais. 4 Entende-se que Representações Sociais são os significados que atribuimos a realidade e que são elaborados socialmente

social, farmacêutico bioquímico e psicólogo do CTA, além de médicos – clinico e ginecologista,

enfermeiro e técnico em enfermagem. A delimitação desta temática se deve ao reconhecimento

da necessidade de se pesquisar este grupo alvo e o local em questão, levando-se em consideração

a importância de se pensar o cotidiano destes profissionais e suas relações a partir da

representação do HIV/ AIDS.

Considerando a investigação proposta, apresenta-se a seguinte indagação: Quais são as

representações sociais dos profissionais de saúde que trabalham no Centro Municipal de Saúde

em Duque de Caxias em relação ao fenômeno HIV/ AIDS?

Este estudo tem como principal objetivo analisar as representações sociais do HIV/ AIDS na

equipe de profissionais de saúde que atuam no Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias

tratando pacientes soropositivos. E para alcançar este objetivo faz se necessário determinar

aspectos que são os objetivos específicos:

• Refletir sobre a maneira como o profissional de saúde percebe sua formação profissional e

sua busca por novos conhecimentos (verificar se os profissionais recebem capacitação para

atender pacientes soropositivos);

• Registrar o que representa o trabalho com os portadores do HIV/ AIDS na vida do

profissional de saúde;

• Conhecer e analisar as relações entre os integrantes da equipe multidisciplinar no que se

refere às suas práticas profissionais, levando em consideração as dinâmicas de poder e a

temática em questão;

• Analisar a implicação5 dos profissionais de saúde em suas práticas profissionais a partir das

representações sociais do HIV/ AIDS;

• Analisar as representações sociais do HIV/ AIDS dos profissionais que compõe a equipe de

saúde no que toca, por exemplo, a valores sobre classe social e sexualidade;

• Observar a relação equipe de saúde- paciente;

• Propor estratégias para se trabalhar a relação equipe de saúde- paciente.

5 Entende-se Análise da Implicação, segundo Saidon e Kamkhagi (1987), como o grau de envolvimento do indivíduo com o objeto estudado, ou seja, o que o profissional pretende com sua prática, considerando-se as implicações de ordem afetiva, política, ideológica etc.

Para explicitar a relevância deste estudo faz-se necessário estabelecer conexões com algumas

idéias:

Segundo o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro

(2005), pode-se verificar que com o passar dos anos vão se modificando as taxas de incidência

nos diferentes grupos: por sexo, faixa etária, grau de instrução e região de residência.

A história da construção do fenômeno da AIDS no Brasil contribui para elucidar o nascimento

das representações sociais sobre o mesmo e levando em conta o contexto social, tentaremos

entender a conseqüência desta e o estigma que sofre a pessoa soropositiva. A AIDS chegou ao

Brasil na década de oitenta aliada à educação patriarcal repressora que tem o objetivo de

preservar as instituições casamento, família, religião e escola. No início a AIDS, estava associada

aos homossexuais masculinos de classe social média/ alta e, em função desta dimensão social

moralista, vimos a AIDS sendo construída no imaginário social como sendo uma praga, um

castigo para esta fatia desviante da ordem moral vigente. Isto contribuiu para que fôssemos

envolvidos ingenuamente por uma lógica encobridora da própria questão social da AIDS. Assim,

a doença passou a ocupar também outros territórios, mas o processo de entendimento deste

fenômeno é lento, e assim, é encarado com grande resistência pelas massas. Como resultado,

vemos os grupos que funcionam através das lógicas da normalidade social, respaldados pela

confirmação científica, serem alvos da referida doença – mulheres e homens que dizem viver

relações monogâmicas heterossexuais sendo acometidos pela doença. Isto se explica pelo fato de

que estes apenas se baseiam nestes princípios morais, mas na verdade esta é uma idéia

inadequada uma vez que vivemos em uma sociedade hedonista.

Em face desta breve perspectiva histórica, podemos concluir que as representações do

fenômeno HIV/ AIDS perpassa na atualidade outras lógicas e constantes desconstruções. Por

meio destas, outros paradigmas são construídos.

Hoje, não podemos conceber qualquer análise do fenômeno HIV/ AIDS sem antes falarmos

sobre o conceito de vulnerabilidade de alguns grupos, isto é, grupos os quais seus territórios

sociais, em função dos vários modos de socialização que norteiam as relações sociais, se tornam

sem solidez a algumas questões como, por exemplo, a AIDS. De acordo com NETO em

entrevista a TORRES (2000) alguns aspectos devem ser levados em consideração, como nível de

escolaridade, acesso à informação, situação de emprego, renda etc.

Um outro ponto de análise é a relação profissional de saúde/ paciente que é um dos grandes

desafios com que nos deparamos no campo da saúde. Isto levando em consideração os regimes de

verdades e conjuntos de poder que regem esta relação. A produção desta envolve uma série de

forças em atravessamento a este processo: forças sociais, políticas, sexuais, econômicas,

familiares, culturais e outras, que precisam ser desvendadas.

Sob este contexto, a pesquisa em questão analisará as representações sociais dos profissionais

de saúde que atuam em um Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias atendendo pacientes

soropositivos. Poucas pesquisas são realizadas na Baixada Fluminense e é neste reconhecimento

que fundamento minha escolha por este universo de pesquisa, ou seja, a necessidade de atenção

voltada para compreensão dos sentidos e significados atribuídos ao fenômeno HIV/ AIDS neste

contexto social.

Com base nesses dados, este Trabalho de Conclusão de Curso torna-se relevante pois pretende

ilustrar que o fenômeno que envolve o HIV/ AIDS, no que se refere ao seu tratamento, necessita

de constantes investigações no sentido de fortalecer esta temática rica em desafios e de constantes

modificações nos seus múltiplos aspectos: biológico, social e psíquico. Para tanto o estudo das

representações sociais torna-se necessário pois o tema em investigação perpassa questões que

envolvem o imaginário social.

Abre-se espaço para expor a hipótese deste problema de pesquisa:

Na obra “Estigma, Discriminação e AIDS” (PARKER e AGGLETON, 2006) foi citado

Jonathan Mann que em 1987 estava no papel de diretor fundador do Programa Global de AIDS

da Organização Mundial de Saúde, quando observou que é possível identificar pelo menos três

fases da epidemia da AIDS em qualquer comunidade – fases tão distintas que podem ser descritas

como três epidemias diferentes:

“A primeira destas fases como a epidemia da infecção por HIV – uma epidemia que geralmente entra em todas as comunidades de forma silenciosa e sem ser notada, e freqüentemente se desenvolve ao longo de muitos anos sem ser amplamente percebida ou entendida. A segunda fase como a epidemia de AIDS propriamente dita, a síndrome de doenças infecciosas que podem ocorrer devido à infecção pelo HIV, mas tipicamente (devido à ação particular do vírus no sistema imunológico humano) somente após um certo número de anos. Finalmente, a terceira epidemia, potencialmente a mais explosiva, a epidemia das respostas sociais, culturais, econômicas e políticas à AIDS – reações que vêm se caracterizando, principalmente, por níveis excepcionalmente altos de estigma6,

6 Podemos entender o Estigma, segundo Goffman (1988), a partir do seguinte pressuposto: a sociedade tem um padrão de normalidade, a qual o utiliza como meio para categorizar as pessoas. Se alguém foge a este padrão é estigmatizado, isto é, cria-se uma identidade depreciativa para ela.

discriminação7 e, certas vezes, negação coletiva8” ( MANN apud PARKER & AGGLETON, 2006, p. 7).

A partir desta perspectiva, entendo que estigma, preconceito9 e discriminação são construções

sociais e, em função disto, as representações sociais que os profissionais de saúde têm em

relação ao HIV/ AIDS podem ser atribuídas aos significados produzidos socialmente. Sob este

pressuposto considero que ocorra repercussões destes valores na atuação dos profissionais de

saúde durante sua ação junto aos pacientes soropositivos.

Para interpretar as realidades sociais utilizei um estudo de abordagem qualitativa. O

instrumento de coleta de dados foi um roteiro de entrevista estruturada (APÊNDICE A) com o

fim de observar e registrar os fenômenos que aparecem na realidade investigada. A entrevista é o

meio privilegiado para produção dos dados discursivos permitindo o acesso as representações

locais. Como técnica de análise dos dados usei a Análise de Discurso (BAUER & GASKELL,

2002). Neste momento pretendi decompor à linguagem relativa àquele discurso local afim de

corroborar que a linguagem não é simplesmente um meio neutro de refletir ou descrever o

mundo. Mas sim, que existe algo subjacente aos discursos que é o ponto central da construção da

vida social.

O referencial teórico para esta pesquisa é a teoria das Representações Sociais. Para elucidar tal

escolha discorrerei sobre o assunto.

O termo representações sociais foi cunhado por Serge Moscovici em 1976, a partir da sua obra

“La Psychanalyse, son image et son public” onde analisou as representações sociais da

psicanálise na população parisiense ( MOSCOVICI , 2003).

O referido autor tinha como um dos seus objetivos a necessidade de redefinir os conceitos e

problemas da Psicologia Social. Levando em conta a pluralidade dos fenômenos

representacionais das sociedades contemporânea, percebeu a necessidade de uma teoria que

buscasse este fim.

7 Considera-se Discriminação como ação ou efeito de separar, segregar, isto é, pôr à parte. Contudo, baseando-se na coleção ABIA – Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS – Estigma, Discriminação e AIDS, “as questões da discriminação, seja em relação ao HIV e à AIDS ou qualquer outra questão, é necessário, que seja entendida como processo social. Acima de tudo, precisamos enfatizar que esses processos só podem ser entendidos em relação a noções mais amplas de poder e dominação” (PARKER & AGGLETON, 2006). 8 Podemos definir Negação Coletiva como o não reconhecimento pelo campo social de determinados fenômenos que giram em torno de interesses sociais gerais. Como conseqüência conflitos sociais são originados e acabam despotencializando o corpo social. 9 Compreendo Preconceito a partir da leitura do livro Psicologia Social para principiantes de Aroldo Rodrigues (1992), como atitude negativa a priori em relação a um determinado grupo e/ ou pessoa.

De início, Moscovici (apud SÁ, 1995), se fundamentou no conceito de Representações Sociais

de Durkheim, mas após várias análises concluiu que havia algumas divergências entre o que

pretendia e a teoria de Durkheim. Para clarificar tal conclusão citarei Sá (1995, p. 23) quando

escreveu: “Em primeiro lugar, o conceito Durkheimiano abrangia uma gama muito ampla e heterogênea de formas de conhecimento, supondo-se estar nelas concentrada uma grande parte da história intelectual da humanidade. Em Moscovici, considerando seu objetivo de estabelecer uma Psicossociologia do conhecimento, as representações sociais deveriam ser reduzidas a ‘uma modalidade específica de conhecimento que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos’, no quadro da vida cotidiana. Em segundo lugar, a concepção de Durkheim era bastante estática, o que possivelmente correspondia à estabilidade dos fenômenos para cuja explicação havia sido proposta, mas não à plasticidade, mobilidade e circulação das representações contemporâneas emergentes. Em terceiro lugar, as representações coletivas eram vistas, na sociologia Durkheimiana, como dados, como entidades explicativas absolutas, irredutíveis por qualquer análise posterior, e não como fenômenos que devessem ser por eles próprios explicados”.

Considerando o exposto acima, chegamos ao ponto incisor entre as teorias de Durkheim e

Moscovici, no qual o último se aparta de uma perspectiva sociológica e engendra uma

perspectiva Psicossociológica, isto é, passa analisar como se forma o conhecimento

Psicossociológico.

As representações sociais se dão através da comunicação interpessoal, desta maneira, forma-se

o ambiente onde se desenvolve a vida cotidiana. É na comunicação que nascem as representações

sociais e isso se dá através de indivíduos que pensam coletivamente.

Em função dos diversos níveis que compõe o universo social, ou seja, questões de gênero,

econômicas, culturais, históricas, faz-se com que ocorra uma variação em termos de

representações sociais.

Para tornar didático é relevante a explicação e diferenciação dos universos de pensamentos:

consensuais e reificados. O reificado é formado pelo que compõe as ciências, considerando os

conteúdos das mesmas, seu rigor, objetividade, metodologia, hierarquização. O Consensual é

produzido através da conversação, da interação social, onde os indivíduos se comunicam

livremente expondo seus modos de pensamento, opiniões, crenças e teorias sobre determinado

assunto, e assim, através destes, formam-se as representações sociais.

Sendo assim, podemos entender que o universo consensual é fruto do universo reificado. E

isto se faz em função das constantes construções de novos paradigmas por parte dos cientistas.

Este dado se explica através de um processo onde os indivíduos buscam tornar o não familiar

ou a própria não familiaridade em familiar, e é por isso que criamos as representações sociais. O

universo reificado cria constantemente novas teorias, tecnologias, enfim, novos conhecimentos.

O universo consensual recebe o novo e a partir deste ocorre uma sensação de estranheza, de não

familiaridade.

Chegamos então à questão da construção da realidade social, segundo a teoria das

Representações Sociais. O universo consensual se apropria do novo ou não familiar e o torna

familiar, a partir deste processo transformam-se os conhecimentos novos em realidade e passam

a ser conhecidos para aquela sociedade.

No processo de formação das representações sociais, podemos citar o processo de ancoragem

e objetivação. A ancoragem consiste na integração cognitiva do objeto representado – sejam

idéias, acontecimentos, pessoas, relações etc – a um sistema de pensamento social preexistente e

nas transformações implicadas (JODELET apud SÁ, 1995, p.37). De acordo com Moscovici

(apud SÁ, 1995, p. 38), ancorar é classificar e denominar: “coisas que não são classificadas nem

denominadas são estranhas, não existentes e ao mesmo tempo ameaçadoras”.

A objetivação consiste em uma “operação imaginante estruturante”, pela qual se dá uma

“forma” – ou figura – específica ao conhecimento acerca do objeto, tornando concreto, quase

tangível, o conceito abstrato, “materializando a palavra” ( JODELET apud SÁ, 1995, p. 39).

Segundo Moscovici (apud SÁ, 1995, p. 40), objetivar é descobrir a qualidade icônica de uma

idéia ou ser imprecisos, reproduzir um conceito em uma imagem”.

A luz desta teoria analisei as representações sociais sobre o HIV/ AIDS e sua conseqüente

interferência na ação do profissional de saúde junto aos pacientes soropositivos.

CAPÍTULO 1 O PROFISSIONAL DE SAÚDE E SUA PRÁTICA DE

TRABALHO 1.1 Formação Profissional e suas Dimensões no Campo Social

Partindo das noções de formação, experiência profissional e dos entendimentos sobre

capacitação profissional, foram traçadas perspectivas, no sentido de buscar lógicas para as formas

de atuação encontradas neste universo de pesquisa, com o fim não de travar forças, mas de

problematizar a compreensão dos temas.

É pertinente a afirmação de que vivemos em uma sociedade onde o modo de produção é

capitalista e não há como dissociar este fato dos embates durante as práticas dos profissionais de

saúde. Nesse sentido, devemos pensar sobre a produção deste profissional pelas agências de

formação que funcionam a partir de estratégias capitalistas, isto é, é imprescindível o

questionamento dos processos de construção dos saberes, práticas e discursos que engendram este

processo de formação, que podem caraterizar ações de dominação, subjugação, hierarquização,

opressão e controle, desde os mais explícitos até os mais sutis.

Um empreendimento que urge é a reflexão sobre as agências de formação e seus possíveis

efeitos de formatação, ou seja, formação de profissionais a partir de uma lógica de reprodução de

um modo de produção dominante, que visa manter a ordem social. Isto contrapõe uma formação

de profissionais conscientes da necessidade de problematizar os processos de formação. O

profissional, independente de responder a uma lógica de reprodução ou de problematização,

sempre estará contribuindo para a formação do campo social. Esta afirmação, possibilita perceber

a complexidade destas produções e de seus efeitos nos diferentes modos de atuação e contextos

possíveis. Investigar uma conjuntura política e econômica é fundamentalmente perguntar-se pela

disposição da estrutura do Poder (político, econômico, ideológico) em um momento

historicamente situado de uma formação social. Disposição aqui significa distribuição

entre as classes e grupos sociais que compõem uma sociedade em um espaço histórico

determinado (LUZ, 1986, p. 26).

O reconhecimento destes aspectos, nos possibilita uma análise considerando que este sujeito

do conhecimento em formação responde a uma série de forças em atravessamento a este processo

– forças sociais, políticas, sexuais, econômicas, familiares, culturais, entre outras. Segundo

Foucault, “Só pode haver certos tipos de sujeito do conhecimento, certas ordens de verdade,

certos domínios de saber a partir de condições políticas que são o solo em que se formam o

sujeito, os domínios do saber e as relações com a verdade” (1999, p.27). Portanto, este processo

não é algo somente da ordem do sujeito e sim uma produção social, histórica, política e

econômica. Logo, as escolhas profissionais se fundam em um complexo de forças, conforme já

explicitado anteriormente, e isto contribui para a construção das representações dos modos de

atuação destes profissionais.

Quando um profissional expõe os motivos de sua escolha profissional, estão intrínsecos

fatores de várias ordens, fatores estes, que também estão presentes, a todo momento, produzindo

as representações de mundo desta pessoa. Então, quando um médico10 é entrevistado e diz ter

escolhido trabalhar com AIDS e gostar, porque AIDS é clínica médica pura (informação verbal),

podemos analisar a partir deste discurso que AIDS representa, para este profissional, um conjunto

de doenças que é o seu objeto de estudo, constituindo-se, assim, um especialista. Vive-se cada vez mais sob o domínio do perito. O poder tem necessidade de cada vez

mais se tornar competente para poder se enquadrar na divisão hierárquica do trabalho

que caracteriza o capitalismo. Isto porque a hierarquia na produção e na sociedade só

pode ser preservada se a qualidade do perito cientifico continuar a ser privilégio e

monopólio daqueles que foram socialmente selecionados para serem os detentores do

conhecimento e da autoridade (COIMBRA, 1988, p.10)

A construção do profissional de saúde perpassa relações de poder que estão diretamente

relacionadas às suas formas de atuação e implicação com suas práticas. Para Foucault (1999, p.

153 e 154) não há um poder, [...] dentro de uma sociedade existem relações de poder –

extraordinariamente numerosas, múltiplas, em diferentes níveis, onde umas se apoiam

sobre as outras e onde umas contestam as outras [...] essas relações de poder são sutis,

múltiplas em diversos níveis, e não podemos falar de um poder, mas sim descrever

relações de poder.

10 Médico clínico que compõe a equipe multidisciplinar deste universo de pesquisa.

Esta citação de Foucault nos auxilia no sentido de problematizar as ditas relações de poder e

seus efeitos funestos nas organizações de saúde. Como já foi analisado, até o momento, existem

influências na atuação do profissional de saúde advindas do seu processo de formação nas

academias, onde através de estratégias das sociedades capitalistas – as ciências – vão se

constituindo saberes sobre as doenças que lhes garante um poder perante o corpo social, mas

existem também influencias advindas da máquina pública que administra as instituições de saúde. A saúde é também questão política na medida em que, através de um conjunto de

instituições médicas, restringem-se a discussão e a decisão sobre a origem – social ou

não – e a extensão das doenças da população ao interior da sociedade política, isto é, ao

interior do Estado no sentido restrito e restritivo de seus aparelhos [...] na verdade, trata-

se aqui de entender, no campo específico da Saúde-setor de Estado, as ligações

estruturais entre a organização do aparelho produtivo e as políticas sociais estatais,

contrapondo essas articulações aos interesses – econômicos, políticos, da população que

essas políticas tentam enquadrar (LUZ, ibidem, p.14 e 18)

Existe uma combinação de um conjunto heterogêneo de forças que estão intrinsecamente

relacionados com as formas de atuação deste profissional de saúde e a compreensão do seu

cotidiano. Travar embates com todas essas forças instituídas, por vezes, podem designar para este

profissional, a relação entre o que considera experiência profissional e a necessidade de

capacitação para trabalhar com determinada temática, que no caso deste estudo é o HIV/ AIDS,

uma vez que as sociedades mudam e consequentemente as profissões transformam-se, ou seja, os

modos de atuação precisam ser revistos e entendidos, principalmente, quando se discute um

fenômeno tão rico em significados e representações como o HIV/ AIDS.

1.2 Relações Sociais na Equipe Multidisciplinar: Conflitos e Tensões

Analisar as relações sociais na Equipe Multidisciplinar requer discutir as posições destes

agentes sociais neste contexto de equipe e as formas de interferência destas atuações nos seus

cotidianos de trabalho.

Apesar da existência de uma diversidade de sentidos quando se pretende analisar relações

sociais, não devemos nos deixar sucumbir por esta constatação, mas sim utilizar este fato não

como paralisador, mas como um disparador de outros modos de se pensar este cotidiano. Não

com o objetivo de responder questões e sim ousar pensar aquém ou além das lógicas vigentes.

A OMS – Organização Mundial de Saúde – compreende saúde como o bem-estar bio-psico-

social. Portanto, todos os integrantes desta equipe, durante sua atuação, buscam o mesmo

objetivo, isto é, a saúde do paciente, que no caso específico deste estudo é a saúde do paciente

portador do vírus HIV/ AIDS. Enfim, todos os profissionais desta equipe tem em comum o

mesmo objetivo, conforme já foi explicitado acima, e devem interagir levando em conta as

especificidades de cada profissão. Isto com o fim de potencializar as relações, levando,

obviamente, em consideração os fluxos de forças que estão atravessando as relações em questão.

“O trabalho em equipe é, também, um fator diferenciador positivo. A união, o entrosamento, o

envolvimento entre os membros da equipe com as atividades uns dos outros e com o paciente dá

a configuração de um verdadeiro pensar e agir coletivos”(ANDRADE & TANAKA, 2002, p. 64).

Os profissionais deste universo de pesquisa, no processo de coleta de dados, quando

questionados sobre quais profissões compõe esta equipe multidisciplinar, não informaram estes

dados com precisão, o que objetiva um déficit considerável nas interações entre os diferentes

tipos de atuação. A partir da busca de circunstâncias produtoras desses modos de relação,

podemos considerar que este dado é um indicativo das relações de poder/ saber atuando de forma

a direcionar as conformações das relações.

Temos antes que admitir que o poder produz saber [...] que poder e saber estão

diretamente implicados; que não há relação de poder sem constituição correlata de um

campo de saber, nem saber que não suponha e não constitua ao mesmo tempo relações

de poder. Essas relações de poder/ saber não devem então ser analisadas a partir de um

sujeito do conhecimento que seria ou não livre em relação ao sistema do poder; mas é

preciso considerar o contrário que o sujeito que conhece, os objetos a conhecer e as

modalidades de conhecimentos são outros tantos efeitos dessas implicações

fundamentais do poder-saber e de suas transformações históricas. Resumindo, não é a

atividade do sujeito do conhecimento que produziria um saber, útil ou arredio ao poder,

mas o poder-saber, os processos e as lutas que o atravessam e que o constituem, que

determinam as formas e os campos possíveis de conhecimento [...] Esse poder, por outro

lado, não se aplica pura e simplesmente, como uma obrigação ou uma proibição, aos que

não tem; ele os investe, passa por eles e através deles; apoia-se neles, do mesmo modo

que eles, em sua luta contra esse poder , apoiam-se por sua vez nos pontos em que os

alcança (FOUCAULT, 1991, p.29 e 30).

Para que se desenvolva um cotidiano de trabalho mais potencializador, levando em conta o

fenômeno HIV/ AIDS e seus vários significados que encontram-se inerentes às formas de atuação

destes profissionais. A prática das reuniões multidisciplinares de trabalho será um dispositivo

difusor e criador de outros modos de relações, uma vez que existem redes de conflitos e tensões

produzindo situações despotencializadoras pois nem todos os profissionais desta equipe

comparecem às reuniões.

Embora estes profissionais estejam implicados com suas práticas junto aos pacientes

soropositivos, as relações na equipe tornam-se um complicador para estes modos de implicação

com suas práticas e seus efeitos no cotidiano.

A sinergia de uma equipe multidisciplinar, ou melhor dizendo, entre os integrantes desta

equipe é de fundamental importância para o bem-estar bio-psico-social desta equipe como um

todo. Isto irá refletir no seu cotidiano de trabalho e nas práticas junto aos pacientes portadores do

vírus HIV/ AIDS. Portanto, problematizar a não sinergia deste cotidiano de equipe torna-se um

empreendimento relevante para este estudo.

É no cotidiano que pensamos, sentimos, agimos e consequentemente construímos as relações,

nos constituímos enquanto sujeitos – agentes e assujeitados – de algo. O que pretendo é chamar a

atenção para este espaço de atuação que deveria ser de criação, reflexão e análise, mas que por

vezes pode se tornar instrumento de jogos de poder/ saber.

Sendo assim, abre-se espaço para analisar um outro ponto gerador de diferenças entre os

integrantes da equipe multidisciplinar, que é a questão da hierarquia. Esta funciona como uma

força, ou seja, algo que não tem materialidade mas tem eficácia no cotidiano das relações de

trabalho entre os integrantes da equipe. Apesar dos integrantes da equipe não perceberem esta

ação, ela está atravessando as relações e contribuindo para a sua despotencialização.

Quando os profissionais da equipe multidisciplinar vivenciam desigualdades de poder nos

embates de trabalho, são estigmatizados pelos que possuem o poder. Logo, podemos concluir que

existe uma rede de estigma muito bem engendrada, isto é, como já foi citado, algo que por vezes

não tem materialidade, mas que por vez sim, quando os profissionais não comparecem as

reuniões de equipe. Neste caso o que é importante entender é que tendo materialidade ou não, nas

duas situações existe eficácia no cotidiano produzindo relações. São desigualdades estruturais

que funcionam através da reprodução de processos hegemônicos.

As relações de poder institucional se exprimem em uma rede de normas que instituem

dominantes e dominados. Estes se confirmam mutuamente em seus “lugares” enquanto

aceitam as regras institucionais e sua hierarquia. Na dimensão estrutural, temos

sobretudo o aspecto “organizacional” das instituições: o discurso oficial, hierárquico das

normas e também sua aparência abstrata, “universal” [...] as relações sociais seriam

reflexos de uma estrutura organizada de regras e vice-versa, a estrutura da instituição

seria o reflexo de relações sociais instituídas [...] A hierarquia, base da constituição do

poder institucional, exprime e organiza politicamente as relações sociais (LUZ, 1986, p.

35).

Especificamente falando sobre a hierarquia, esta atua de forma eficaz apesar dos integrantes

da equipe não perceberem o seu funcionamento. Sobre os embates nos momentos de decisões na

equipe multidisciplinar, alegam que existe um integrante que é o coordenador do Programa DST/

AIDS e este tem a responsabilidade pelas decisões que são tomadas. Em momento algum

estranham ou problematizam este cotidiano, uma vez que, toda a equipe trabalha com o mesmo

objeto de estudo, isto é, o fenômeno HIV/ AIDS, e saúde é o bem-estar bio-psico-social e todos,

considerando as especificidades de cada profissão, tem compreensão do processo de trabalho com

o paciente portador do vírus HIV/ AIDS. Logo, todos estão aptos a decidir sobre as ações

coletivamente.

Pierre Bourdieu (apud PARKER & AGGLETON, 2006, p. 15), se ocupou das relações entre cultura e poder. Seu objetivo era examinar como sistemas

sociais estratificados de hierarquia e dominação persistiam e se reproduziam pelas

gerações, nos casos mais típicos sem gerar grande resistência dos que estão sujeitos à

dominação e, de fato, sem o reconhecimento dos seus membros. Todos os significados e

práticas culturais englobam interesses e funcionam de forma a aumentar as distinções

sociais entre indivíduos, grupos e instituições. O poder, portanto, está no cerne da vida

social e é usado para ela, mas é empregado muito mais claramente para legitimar

desigualdades de status dentro da estrutura social.

Não é que o poder seja algo ruim, não é disto que estou falando, mas de algo que seja

potencializador de outros modos de se relacionar com essa possibilidade de poder e, segundo

minha análise, para que um profissional faça uso deste referido poder é imprescindível que este,

faça uso de um dispositivo da análise institucional chamado análise da implicação, ou seja, o que

pretende com tal prática e seus efeitos no cotidiano de ação. A serviço de que está este

profissional?

É importante traçar um cruzamento entre os modos de produção social para que esse poder

não seja um conceito cristalizado com efeitos de dominação.

Contudo, no cotidiano destas relações podemos observar além desta força hierárquica atuante,

um outro complexo de forças também construindo e/ ou produzindo estas relações, que é a

situação a qual a coordenadora11 desta equipe está vivenciando em relação a sua prática de

trabalho e seu modo de implicação com a mesma. A coordenadora considera sua saúde frágil,

fazendo a seguinte referência:

“Fiz uma cirurgia, este ano, de joelho porque levei três tombos seguidos [...] eu não sei

se os tombos foram já porque não ando prestando atenção por onde ando, por causa do

estresse que eu ando. Eu ando muito estressada, com muita insônia e por vezes

deprimida [...] eu estou fazendo tratamento [...] para ver se eu consigo dormir, porque

fico sonhando com os pacientes [...] a coisa é tão forte que por mais que a gente não

queira, leva para a casa aqueles casos mais graves [...] então está interferindo em minha

saúde e os filhos estão reclamando, eles querem que eu pare de trabalhar com AIDS”

(informação verbal).

Este modo de implicação, desta profissional, está lhe despotencializando e contribuindo para o

cotidiano destas relações, pois além destes aspectos citados, existem outras forças em

atravessamento a este processo, que são as representações sociais do HIV/ AIDS. Como bem

pode ser analisado através do discurso desta médica, que por sua vez vai, também, ao encontro

das representações sociais do HIV/ AIDS relativa aos demais integrantes da equipe, constituindo-

se assim um complexo estruturado de forças em atravessamento. Portanto, ao mesmo tempo que

as decisões ficam a cargo da coordenadora da equipe e de sua assistente, também médica do

programa, existem as representações do HIV/ AIDS compondo este cotidiano de trabalho. Enfim,

existe um complexo heterogêneo de forças construindo e/ ou produzindo as relações entre os

integrantes da equipe e seus modos de implicação, ou seja, forças de várias ordens: influências

advindas das agências de formação, influências advindas da máquina pública que administra as

11 Médica ginecologista e coordenadora neste universo de pesquisa.

instituições de saúde, influências advindas do saber/ poder, influências advindas das questões de

hierarquia, influências advindas das representações sociais do HIV/ AIDS e outras mais.

É importante problematizar estes cotidianos de relações na equipe, sempre refletindo sobre os

tipos de relações possíveis de acontecer, que não só os tipos de relações assimétricas, que por

vezes estes profissionais podem exercer. Estes devem estar atentos as implicações éticas,

estéticas e políticas que norteiam suas práticas, para que não sejam capturados por lógicas

multifacetadas de reprodução, subjugação, controle etc.

Ainda sobre os modos de atuação é de extrema pertinência citar que cada profissional entende

a finalidade e o porque das reuniões em equipe de uma forma diferente do outro, configurando

um descompasso na equipe multidisciplinar. Apesar da consideração do complexo de forças

atuantes, vale a pena a seguinte indagação: esta equipe está atuando em seu cotidiano de ação

para fazer viver ou para fazer morrer as relações?

CAPÍTULO 2 REPRESENTAÇÃO SOCIAL DO HIV/ AIDS

2.1 O Significado do Trabalho com HIV/ AIDS para o Profissional de Saúde

Analisar as Representações Sociais dos Profissionais de Saúde que trabalham com HIV/

AIDS requer problematizar o complexo de forças que produzem estas representações, conforme

estamos caminhando até o momento.

As representações sociais que os profissionais de saúde tem em relação ao HIV/ AIDS podem

ser atribuídas aos significados elaborados socialmente, logo é uma produção social, histórica,

política e econômica.

Temos que considerar neste estudo que quando se fala em representação social, já existe a

evidência de que esta investigação exige que se provoque os significados elaborados socialmente

e atribuídos àquela representação. Porém, nesta pesquisa além da pretensão em estudar as

representações sociais existe, também, a complexidade do fenômeno HIV/ AIDS no campo

social. Devemos considerar as representações sociais como meios de re-criar a realidade. Através da comunicação, as pessoas e os grupos concedem uma realidade física às idéias e imagens, a sistemas de classificação e fornecimento de nomes. Os fenômenos e pessoas com que nós lidamos no dia-a-dia não são, geralmente, um material bruto, mas são produtos, ou corporificações, de uma coletividade, de uma instituição, etc (MOSCOVICI, 2003, p. 90).

Diante de um tema tão rico em significados como o HIV/ AIDS, nós pesquisadores, somos

chamados à reflexão: estar implicado com sua prática, exige estar atento as relações que estão se

constituindo no âmbito de pesquisar. Logo, não é possível o pesquisador não se afetar com tal

processo e isto contrapõe o mito da neutralidade científica. O estudo deste fenômeno busca

desenvolver a qualidade de vida, a saúde mental e a expansão da vida social.

Para que este estudo se desenvolva devemos articular algumas idéias com o cotidiano destes

profissionais de saúde que trabalham com HIV/ AIDS:

Não podemos desconsiderar que vivemos em uma sociedade onde uma série de instituições –

família, religião, escola, entre outras – são criadas pelas classes dominantes com o fim de manter

a ordem social. Estas instituições produzidas contribuem para legitimação de representação

sociais de várias ordens.

O trabalho com HIV/ AIDS perpassa as instituições e, estas, trabalham para cristalizar as

relações sociais, mas, ora, em função de um fenômeno identificado como globalização os

sentidos destas instituições estão em processo fendente, originando outras lógicas de

entendimento do fenômeno HIV/ AIDS.

Segundo Parker e Aggleton (2006, p. 17), “é imperativo situar historicamente a análise do

HIV/ AIDS, e observar que a epidemia se desenvolveu durante um período de rápida mudança

social que costuma ser descrito como globalização”.

É pertinente a observação de que estas mudanças nas lógicas de entendimento do HIV/ AIDS

é um processo e não é de um momento para o outro que a sociedade desvencilha-se de uma

representação social.

Como estudamos até o momento, existe um complexo de forças atuantes neste processo de

representação social, construindo e/ ou produzindo as relações sociais.

A relação saber/ poder produzida pelas agências de formação estão inerentes nestes processos

de trabalho com pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS, gerando, assim, relações assimétricas

entre os profissionais de saúde e o portador do vírus. Os profissionais foram formados para

entender sua prática da seguinte forma: por possuírem um saber sobre as doenças devem fazer

algo pelos pacientes. Esta lógica precisa ser problematizada, pois pode dessa maneira

desconsiderar o saber daquela pessoa, portadora do vírus HIV/ AIDS, sobre seu próprio corpo e

passar a entender o comportamento do paciente que não segue rigorosamente as suas orientações

como um paciente difícil, que não deseja se tratar. E ai cabe a seguinte indagação: o tratamento

não é para constituir o bem-estar do paciente? Então, porque o bem-estar deve ser instituído

sempre pela lógica do profissional de saúde? Que regimes de verdade tomam corpo destes

profissionais nestes momentos de embate?

Este tipo de relação acaba por infantilizar e culpabilizar o paciente com HIV/ AIDS. Neste

sentido, os profissionais de saúde tecem parâmetros para constituir a sua relação de trabalho com

o paciente soropositivo e isto levando em consideração aspectos de várias ordens como, por

exemplo, aspectos sociais, políticos, sexuais, econômicos, familiares, culturais, entre outras.

Caracterizando-se, assim, relações de desigualdade entre os pares em questão.

Segundo Foucault (1999, p. 126) “poder e saber encontram-se assim firmemente enraizados;

eles não se superpõem às relações de produção, mas se encontram enraizados muito

profundamente naquilo que as constitui”.

Este poder respaldado por um saber – estratégia capitalista – funciona na manutenção da

ordem social instituída pelas classes hegemônicas, produzindo, assim, um padrão de normalidade

com o fim de regular o corpo social. Estes processos reguladores acabam criando desigualdades

sociais, e desta maneira, produzem-se diferenças individuais. Processo muito bem engendrado

que gera uma ordem onde as classes hegemônicas são isentadas de qualquer responsabilidade por

este processo perverso. Uma característica interessante deste processo é a produção de indivíduos

que legitimam este processo perverso sem se dar conta ou estranhar esta ordem, formando-se

assim uma dialética.

A construção do estigma (ou, de forma mais simples, a estigmatização12) envolve a sinalização de diferenças significativas entre categorias de pessoas e, por meio de tal marcação, sua inserção nos sistemas ou estruturas de poder. De fato, o estigma e a estigmatização funcionam, literalmente, no ponto de intersecção entre cultura, poder e diferença – e é somente explorando as relações entre essas categorias diferentes que se torna possível entender o estigma e a estigmatização não simplesmente como fenômenos isolados, ou como expressões de atitudes individuais ou de valores culturais e sim como centrais para a constituição da ordem social (PARKER & AGGLETON, 2006, p. 14).

O estigma é um dispositivo que está a serviço das forças sócioeconômicas hegemônicas para

produção e reprodução das relações de poder, gerando relações de sujeitos e assujeitados. Enfim,

uma relação assimétrica, e este fato está intrínseco no entendimento das relações sociais. O

estigma tem eficácia e produz um labirinto13 no cotidiano da pessoa estigmatizada. A

estigmatização culturalmente construída, ou seja, “a produção da diferença valorizada

negativamente” (ibidem, p. 13) faz com que aqueles que não se enquadrem neste padrão de

normalidade instituído socialmente, sintam-se inferiores, desconfortáveis, dependentes, isto é,

dominados por estas lógicas despotencializadoras da existência humana.

De fato, para a grande maior parte da humanidade a globalização está se impondo como

uma fábrica de perversidades. O desemprego crescente torna-se crônico. A pobreza aumenta e as classes médias perdem em qualidade de vida. O salário médio tende a baixar. A fome e o desabrigo se generalizam em todos os continentes. Novas

12 Segundo Parker e Aggleton, na obra “Estigma, discriminação e AIDS” (2006), o termo estigmatização refere-se ao processo de estigmatizar, diferenciando-se assim do estigma em si. 13 Entende-se por Labirinto, a estrutura que forma uma complicada rede de elementos.

enfermidades como a SIDA14 se instalam e velhas doenças, supostamente extirpadas, fazem seu retorno triunfal. A mortalidade infantil permanece, a despeito dos progressos médicos e da informação. A educação de qualidade é cada vez mais inacessível. Alastram-se e aprofundam-se males espirituais e morais, como os egoismos, os cinismos, a corrupção [...] a perversidade sistêmica que está na raiz dessa evolução negativa da humanidade tem relação com a adesão desenfreada aos comportamentos competitivos que atualmente caracterizam as ações hegemônicas (SANTOS, 2001, p. 19 e 20).

Analisar o complexo de forças que engendram o fazer dos profissionais de saúde, conforme o

estudo até o momento, é uma das possibilidades – uma vez que não tenho a pretensão em esgota-

las – de refletir sobre o significado do trabalho com HIV/ AIDS para os profissionais de saúde

neste Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias, Estado do Rio de Janeiro. Para entender

este cotidiano de trabalho ou práticas sociais é útil explicitar a relação destes profissionais com os

dispositivos – discursos – que por vezes podem caracterizar ações de dominação, subjugação,

hierarquização, competição, opressão e controle.

Antes de passar a esta fase propriamente dita é importante citar Camargo JR (1994, p. 47), A AIDS é duplamente desconfortável para a maior parte dos médicos, em primeiro lugar porque os coloca frente a questões tabu como a sexualidade tida como desviante ou o uso de drogas ilícitas, questões para as quais não se encontram preparados, uma vez que até então elas não vinham sendo objeto de reflexão para o saber da medicina.

A representação do trabalho com pacientes soropositivos para estes profissionais de saúde que

atuam no universo de pesquisa em questão, a partir da análise dos discursos, nos auxilia no

entendimento de que trabalhar com HIV/ AIDS é muito difícil e isto porque vai de encontro a

maneira como estes profissionais foram formatados nas academias de ensino, como foram

educados familiarmente e como se mobilizaram para lidar com todo este estado de coisas,

compondo assim, sua visão de mundo levando-os ao sofrimento e adoecimento. O ideal para

qualquer pessoa é que esta visão de mundo não seja algo estático e sim dinâmico afinal vivemos

em uma sociedade onde tudo é efêmero e descartável, portanto merece ser problematizada.

Cada profissional tem sua representação social do HIV/ AIDS e desta forma podem produzir

conjuntos de verdades sobre sua atuação junto aos pacientes ou atuar fundamentado em outras

vias como, por exemplo, a problematização.

Para facilitar, utilizarei citações de algumas representações sociais do trabalho com HIV/

AIDS para estes profissionais da equipe multidisciplinar, com o fim de facilitar a promoção do

entendimento destas práticas de trabalho:

14 Síndrome da Imunodeficiência Adquirida ou AIDS.

“...é muito difícil, eu acho que não só para mim, mas para todos os profissionais que

trabalham com HIV. Representa crescimento enquanto ser humano e sofrimento porque nem

sempre a gente consegue aliviar o sofrimento dele, muitas vezes a única coisa que a gente pode

fazer é chorar junto[...]a gente vai criando uma dependência com eles (pacientes) como eles tem

uma dependência da gente. A gente tem uma relação de afeto muito forte e sofre porque quando

a coisa não dá certo, quando a gente não consegue fazer o doente melhorar, quando o doente

acaba morrendo, a gente sente uma sensação muito grande de fracasso, de impotência, apesar da

gente saber que não pode tudo, mas mesmo assim vem essa sensação, é difícil. A gente depois

que começa a trabalhar com AIDS vira outra pessoa, não é mais a mesma. Tive mais necessidade

de buscar em DEUS força[...]tenho tido dificuldades para dormir, justamente porque fico

pensando nos meus doentes, depois que eu vim para cá, eu passei a tomar calmantes, coisa que eu

não fazia antes. Fiquei uma pessoa mais triste, mais deprimida, coisa que eu não era , sempre fui

uma pessoa de muito bem com a vida, a AIDS vai mexendo com a gente...” (Ginecologista –

informação verbal).

“...eu gosto muito, .são pessoas sofridas (pacientes), com uma doença grave, com uma carga

de medicamentos diário muito grande. Mas, apesar do sofrimento, são pessoas que conversam

bem, são alegres na consulta, o astral é bom [...] é uma expressão da clínica médica, a AIDS em

si quer dizer só a baixa de imunidade e isso gera uma série de doenças que é a clínica médica. A

AIDS, na verdade, se tornou hoje uma especialidade que engloba várias doenças, que são as

doenças oportunistas, por isso o clínico gosta de AIDS...” (Clínico – informação verbal).

“..representa, às vezes, uma retaguarda que a gente vai dar para ele (paciente) porque nós

temos o conhecimento, o controle emocional, o respeito a ele. Respeitar inclusive a história dele,

se ele quer ajuda, então a gente vai ajudar com todo esse instrumental [...] a gente sabe fazer uma

intervenção que não é muito comum., então isso me dá muito prestigio ou então, assim, as

pessoas se espantam: como você está trabalhando com isso! Tem tanta coisa boa para trabalhar,

existe também esse espanto [...] o HIV é uma doença complexa, tem um peso, então tem um peso

também na vida das pessoas, a gente quando vê o filho que não tá usando camisinha, é terrível...”

(Socióloga e Assistente social – informação verbal).

“...é um aprendizado diário, você nunca mais é o mesmo depois que trabalha com HIV, é uma

diferença profissional. São coisas que você não sabia que existia e passa a descobrir, é um

universo muito grande a parte de HIV/ AIDS e você leva para casa, ensina outras pessoas, é um

grande aprendizado isso para mim...” (Farmacêutica bioquímica – informação verbal).

“...é uma forma de tentar fazer da minha profissão prazerosa, no sentido de poder ajudá-los

(pacientes). Eu sou uma pessoa que não tem preconceitos e isso já ajuda muito, e através deste

contato que tenho com eles é uma forma de ajuda, estimular a autoestima, é fazer com que eles

entendam o que acontece com eles e ajudá-los a fazer o tratamento. É interessante que a partir do

momento que eu tenho esse trabalho, ele foi valorizado para os outros profissionais e isso

valorizou muito, no sentido de a equipe multiprofissional saber que existe um profissional que

tem cuidados quanto à adesão. Para minha profissão a valorização foi aumentada, acabei

deixando de fazer um trabalho que a equipe já fazia, para poder tentar abranger outros aspectos

também quanto à ajuda ao paciente, isso está sendo importante para o paciente e até para mim...”

(Enfermeira – informação verbal).

“...representa muito. Aprendi muito com todos (pacientes). Há uma ligação afetiva muito

grande entre nós. Profissionalmente, é fantástico perceber um paciente que chegou com a AIDS

instalada, recuperar-se clínica e emocionalmente, principalmente, nas dores infinitas

proporcionadas pelo medo e rejeição...” (Psicóloga – informação verbal).

“...representa um serviço muito árduo, a gente pega tanta negatividade, tanto sofrimento, a

gente acaba absorvendo essa carga mesmo. Tem dia que eu saio daqui que eu digo: ah, eu estou

sem energia, porque eu gastei minha energia com ele (paciente) da minha forma, da minha

maneira de tratá-los, estou dando um pouco da minha energia e ao mesmo tempo captando a

energia deles (pacientes). É um trabalho muito árduo, muito sofredor, mas eu acho que é um

trabalho bonito, assim em termos, não é bonito você estar com o vírus, mas é um campo diferente

que você tem que se dedicar ao máximo, tem que estar sempre pesquisando, é uma coisa bonita

ao mesmo tempo árdua. É muito duro, duro mesmo, trabalhar com o portador do vírus, porque

você vê as pessoas que estão ali, que querem tratar, que seguem direitinho. Você vê outras que

você dá aquela dura, mas eles continuam fazendo errado, continuam não querendo se tratar. Ver o

paciente que você deu um duro ali e ele vem a óbito. Pô, isso é muito triste, é uma tristeza, é a

parte que a nossa energia vai lá embaixo, tem dias que você, três pacientes de óbito, leva um

baque, o que faltou fazer? O que nós deixamos de fazer? O que eu não fiz? O que eu fiz, o que

poderia fazer além? Isso é muito triste...” (Técnica de enfermagem – informação verbal).

“...eu gosto, aprendi muito com eles (pacientes) é tranqüilo, eu gosto do meu trabalho...”

(Auxiliar administrativa – informação verbal)

Estes relatos indicam que durante a prática de trabalho destes profissionais de saúde existe um

complexo de forças atuantes que está diretamente relacionados com a imagem do paciente

portador do vírus HIV/ AIDS para estes profissionais, que será o próximo item deste capítulo.

2.2 A Representação Social do Fenômeno HIV/ AIDS e a Imagem do Paciente

Soropositivo

As agências de formação produzem profissionais que entendem que sabem o que é melhor

para o paciente. Esta lógica ajuda as classes hegemônicas a manter a ordem e as relações de

poder. Ao mesmo tempo o corpo social leva as questões para o âmbito da responsabilidade

pessoal, isto é, algo da ordem do indivíduo, produzindo-se, desta maneira, diferenças individuais,

destituindo as classes hegemônicas de sua responsabilidade pelos jogos de força e poder

utilizados para manipularem a sociedade.

Falar em Brasil é falar em desigualdades sociais. Encontramos uma parcela de pessoas

vivendo com uma condição financeira muito boa e a grande maioria das pessoas vivendo de

maneira miserável – nas suas várias formas de apresentação. Neste contexto impõem-se também

a ditadura capitalista, com suas lógicas que são ferramentas de segregação e infantilização, onde

o ser humano vale pelo que pode consumir e o tempo para que isso ocorra – para que se tenha

condições de participar deste consumo – é o instantâneo, efêmero. Caso o indivíduo não consiga

atingir esta meta, é imediatamente segregado e infantilizado, ou seja, a culpa é sua que não

consegue sustentar sua vida. O que podemos perceber nestas produções é uma massa de pseudos

impotentes obnubilados quanto a sua potência.

As condições de sobrevivência são desiguais, gerando um processo multifacetado de

apreensão e ação sobre a vida cotidiana. São produzidos o medo, a desinformação, a baixa

escolaridade, a miséria, a fome, a violência, a morte e várias outras facetas.

A compreensão da delimitação do campo quando se fala em risco e vulnerabilidade15, a partir

de agora torna-se mais fácil. Poderíamos divagar durante horas sobre os vários motivos que

tornam alguns grupos vulneráveis ao HIV/ AIDS, mas acredito ser necessário, primeiro, indagar

as lógicas que constróem o imaginário social que os tornam impotentes frente este estado de

coisas. Que poder é este que é imperceptível aos olhos, mas que comanda as massas?

“Particularmente em sociedades com sistemas culturais que tendem a enfatizar o

individualismo, o HIV e a AIDS podem ser vistos como resultado de irresponsabilidade pessoal”

(KEGELES; COATES; CHRISTOPHER & LAZARUS apud PARKER et al., 2006, p. 23).

Por mais que os profissionais de saúde em seus discursos expressem que hoje não existem

mais grupos de risco16 como era entendido no início da epidemia HIV/ AIDS, ainda assim, tecem

comentários que reforçam a produção de diferenças individuais, de preconceito, de discriminação

e de estigma em relação ao paciente soropositivo.

Abre-se espaço para as seguintes reflexões:

A verdade não existe fora do poder ou sem poder (não é – não obstante um mito, de que seria necessário esclarecer a história e as funções – a recompensa dos espíritos livres, o filho das longas solidões, o privilegio daqueles que souberam se libertar). A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, “sua política geral” de verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciadas verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que tem o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro (FOUCAULT, 1984, P. 12).

15 Segundo Otávio Cruz Neto, em entrevista a Torres (2000), diz que o avanço apontado por alguns estudiosos demonstra que a “Vulnerabilidade” enquanto conceito explicativo e operativo no campo da prevenção às DST/ AIDS é mais adequado, pois o foco não se restringe apenas ao nível do indivíduo com seus limites e possibilidades, mas estende-se também à complexidade das relações sociais em termos políticos, econômicos, sociais e culturais. 16 Entende-se Grupo de Risco como o grupo de pessoas que já eram estigmatizados antes do fenômeno HIV/ AIDS vir a tona como, por exemplo, os homossexuais, as prostitutas, os usuários de drogas e outros grupos minoritários.

Os regimes de verdade sobre o HIV/ AIDS produzem inúmeros desdobramentos no campo

social, uma vez que as representações sociais são construídas através destes regimes de verdade,

respaldado pela confirmação científica que produz saberes através de uma concentração máxima

de forças no corpo social, produzindo-se, assim, um emaranhado de discursos e conhecimentos

diversos sobre o fenômeno HIV/ AIDS.

A pessoa portadora do vírus HIV/ AIDS através destes regimes de verdade, ora produzido, é

estigmatizada e discriminada nos seus embates cotidianos, porém este fato deve ser

problematizado. O preconceito é fruto das representações sociais que são construídas sobre a

pessoa infectada pelo vírus e, esta precisa esconder sua sorologia em função do estigma

produzido sobre o fenômeno. A pessoa portadora do vírus é responsabilizada por sua condição

sorológica e vista pela grande maioria do corpo social como uma desviante da ordem social

vigente. Em momento algum, o corpo social estranha este estado de coisas e entende a produção

perversa em torno do paciente soropositivo, por parte daqueles que detém o poder. Afinal, o

estigma funciona como um instrumento para reforçar o poder e os regimes de verdade sobre os

fenômenos sociais, constituindo-se um saber/ poder ou uma relação assimétrica. Produzem-se

paisagens cinzas a respeito do fenômeno HIV/ AIDS: paisagens de medo, pobreza, desesperança

e sofrimento.

Porém, se observado a partir da lógica da problematização, o paciente portador do vírus HIV/

AIDS, nada mais tem do que a baixa do sistema imunológico. Para se tornar didático e mais

brando o entendimento deste fenômeno que acomete a pessoa portadora do vírus, farei uma

conexão com uma explicação bem simples, mas com efeito para a compreensão: sabemos que o

nosso organismo possui um sistema imunológico que produz anticorpos – soldadinhos – que são

responsáveis pela defesa deste organismo, com a infecção pelo vírus HIV, este sistema fica

deficitário precisando então de reposição desta defesa – soldadinhos – e isto ocorre através da

utilização dos anti-retrovirais17. Esta pessoa, necessita de alguns cuidados em relação a sua saúde,

nada mais que isso.

Os desdobramentos daquilo que foi produzido no imaginário social a respeito da pessoa

infectada pelo vírus HIV/ AIDS, faz com que esta pessoa seja sinônimo de desviante,

estabelecendo assim, relações de sujeito e assujeitado, com aqueles que não possuem a mesma

condição sorológica.

17 Anti-retrovirais são os medicamentos utilizados pelo paciente portador do vírus HIV/ AIDS.

Além de nos ajudar a entender que a estigmatização é parte de um esforço social complexo em relação às estruturas de desigualdade, as noções de violência simbólica18 e hegemonia19 também nos ajudam a entender como é que as pessoas freqüentemente estigmatizadas e discriminadas pela sociedade aceitam e até internalizam o estigma a que estão sujeitas. Precisamente porque estão sujeitas a um aparelho simbólico opressivo cuja função é legitimar desigualdades de poder com base em entendimentos diferentes de valor e de valia, a capacidade dos indivíduos ou grupos oprimidos, marginalizados e estigmatizados para resistir às forças que os discriminam, é limitada (PARKER et al., 2006, p. 16).

Na análise dos discursos dos profissionais de saúde sobre os pacientes soropositivos que

utilizam os serviços deste Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias verificam-se

construções sociais de várias ordens que são produzidas por uma série de forças, ou seja, forças

sociais, políticas, sexuais, econômicas, familiares, culturais entre outras. Logo, existem

representações sociais locais que reforçam as situações de hierarquia social, uma vez que os

profissionais de saúde consideram em sua maioria que a condição sócio-econômica dos pacientes

portadores do vírus que freqüentam aquele Centro Municipal de Saúde é muito baixa,

caracterizando, assim, uma relação causal entre classe social e condição sorológica.

Existem representações de que o paciente portador do vírus HIV/ AIDS que utiliza os serviços

daquele local, por sua condição sócio-econômica, não tem conhecimentos e, em função disto,

ocorrem dificuldades na execução do trabalho junto a estes pacientes. Mas cabe agora a seguinte

indagação: sobre que produção de conhecimento estão se referindo? Seria a dos especialistas que

dissociam o saber do paciente sobre o próprio corpo? As explicações dadas pelo médico ao doente variam, efetivamente, em função da classe social do paciente; os médicos, em geral, não dão longas explicações senão àqueles que julgam “bastante evoluídos para compreender o que vai lhes ser explicado”. Para o médico, efetivamente, o doente das classes populares é em primeiro lugar um membro de uma classe inferior à sua, possui o mais baixo nível de instrução, e que, fechado na sua ignorância e seus preconceitos, não está portanto em estado de compreender a linguagem e as explicações do médico, e a quem, se quer fazer compreender, convém dar ordens sem comentários, em vez de conselhos argumentados (BOLTANSKI, 1984, p. 44 e 45).

Em relação à questão da sexualidade, os profissionais teceram considerações as mais diversas,

objetivando questões da ordem do individual, legitimando e ao mesmo tempo encobrindo a

18 Segundo Parker e Aggleton (2006), a Violência simbólica descreve o processo pelo qual os sistemas simbólicos (palavras, imagens e práticas) promovem os interesses dos grupos dominantes, bem como distinções e hierarquia entre eles, ao mesmo tempo em que legitima essa escala ao convencer os dominados da aceitação das hierarquias existentes. 19 Hegemonia, segundo Madel T. Luz (1986), é o processo que o bloco no poder aciona e organiza constantemente no sentido de universalizar seu poder.

a dominação das classes detentoras do saber/ poder. Não refletindo sobre as produções sociais, ou

as forças em atravessamento a este cotidiano de relações entre o fenômeno HIV/ AIDS, o

profissional de saúde e o paciente soropositivo. Precisamente porque a infecção pelo HIV tem sido intensamente associado à transmissão sexual, e na maior parte das sociedades teve seu impacto inicial em relação a populações cujas práticas e/ ou identidades sexuais eram de alguma maneira fora das normas ou diferentes dos padrões hegemônicos existentes. Nesse caso, a relação complicada e contínua entre as formas preexistentes de estigmatização sexual e o desenvolvimento da estigmatização, discriminação e negação relacionados ao HIV e à AIDS foi especialmente profunda (PARKER et al., 2006, p. 20).

Devemos problematizar a produção de uma profissão respaldada em um saber/ poder que

garanta ao profissional de saúde o status de cuidador do paciente e, uma técnica que seja a certa

para efetuar este cuidado. Enfim, problematizar a situação em que se o paciente não faz da forma

que o profissional determinou, este não está se cuidando, desconsiderando, desta maneira, os

cuidados do próprio paciente em relação ao seu bem-estar. Logo, devemos questionar acerca dos

papéis que são construídos sobre estes agentes do saber e seus conseqüentes discursos e práticas;

como os conceitos, procedimentos e técnicas utilizados pelos profissionais de saúde tem

legitimado um certo regime de verdade. Refletindo sobre este estado de coisas, podemos

considerar que desvendar e descrever a verdade sobre o cliente portador do vírus não é a tarefa

mais importante, mas sim, refletir sobre como os sistemas de verdade sobre a pessoa soropositiva

são produzidas, torna-se a principal tarefa a ser realizada. É pertinente a observação de que há

urgência de problematização sobre as práticas de especialistas, isto é, profissionais que se fecham

em um determinado saber e não conseguem ser atravessados por mais nada, além daquilo que foi

construído socialmente sobre a sua profissão e suas representações sociais referentes àquela

forma de atuação e seus efeitos no cotidiano da pessoa que está sobre os seus cuidados. Está

questão perpassa, também, a dificuldade, deste agente de saber/ poder, de fazer parcerias com

outros profissionais da equipe multidisciplinar, conforme já explicitado, anteriormente no

primeiro capítulo.

Para exemplificar as questões apresentadas socialmente pelos profissionais de saúde a respeito

da imagem do paciente portador do vírus HIV/ AIDS, utilizarei alguns trechos das entrevistas

com estes profissionais:

“...A AIDS pegou a gente, é [...] desprevenido, a gente não estava pronto para a AIDS. A

epidemia começou nos anos 80 com um rosto que se modificou [...]é uma doença para todos,

qualquer um que se vê em uma situação de risco, quer dizer, não existe mais grupo de risco,

existe pessoa que em determinado momento se coloca em situação de risco acrescido. Entre essas

pessoas estão até as pobres donas de casas que seus maridos pulam a cerca e trazem HIV para

casa [...]a grande maioria das mulheres contaminadas, são mulheres casadas, muitas só tiveram

um parceiro sexual. Então uma das coisas que a gente observa é isso o grande aumento entre

mulheres. Caminhou para as mulheres mais pobres, houve uma pauperização da epidemia e uma

interiorização porque era uma doença só dos lugares onde havia turismo – Rio/ São Paulo – hoje

em dia tá indo para o interior do Brasil. Então a doença está se interiorizando, a doença que

começou na elite, passou para o pobre, para as mulheres, indo para o interior do Brasil [...]é

difícil lidar com a AIDS porque ela mexe justamente com a questão sexual, é uma doença ligada

à questão do prazer, da sexualidade. Como é que eu vou dizer para uma pessoa que sexo mata,

quer dizer a gente tem que trabalhar muito bem a questão da sexualidade, como viver essa

sexualidade com prazer, com afeto sem correr o risco de pegar AIDS, quer dizer, a gente tem que

mudar uma série de conceitos e comportamentos nossos e dos outros, porque nós não podemos

tirar o prazer das pessoas, nós temos que ensiná-las a como usufruir desse prazer...”

(Ginecologista – informação verbal).

“...Tudo que vem com uma carga negativa ela também tem um lado positivo, então o HIV

veio também, para colocar determinadas definições, como coisas que surgiram, como a parte da

biosegurança do profissional [...] então as pessoas hoje tem essa preocupação de sistemática, de

biosegurança, do profissional que lida na parte técnica laboratorial, enfermagem, está tendo um

treinamento, está mais preocupada com essa parte de biosegurança. O HIV veio também para

que as pessoas refletissem um pouco sobre as relações humanas, o sexo estava muito liberado,

como eu acho que ainda está, sem amor, então eu acho que o HIV, apesar de toda essa carga

negativa, também teve um ponto positivo, que é a pessoa realmente se preocupar com a relação,

não só sexual, é desencavar o amor novamente, você não transar só por transar. Esse é um lance

que o HIV trouxe de positivo, sem preconceitos mas com critérios, assim como uma coisa além

de só o prazer momentâneo [...] a mídia empurra a sexualidade muito jovem das pessoas, as

pessoas não estão prontas para a sexualidade, fazem sexo porque todo mundo está fazendo, então

o HIV fez com que a pessoa desse uma parada para pensar: poxa, porque eu estou fazendo isso?

Porque todo mundo tá fazendo? A gente (os profissionais) tem muita coisa para fazer ainda,

porque as pessoas não estão usando preservativo, não estão se preservando, na minha opinião,

elas ainda não entenderam, ainda não aceitaram que o HIV é uma epidemia...” (Farmacêutica

bioquímica – informação verbal).

“...os antigos (pacientes), muitos já estão fortalecidos quanto à aceitação do diagnóstico, mas

existe muita gente ainda que não aceita. Devido a isso tem a dificuldade de adesão, e isto

contribui para a transmissão do HIV. Encontramos ainda muitas pessoas com dificuldade, uma

dessas dificuldades é a aceitação e a discriminação, que muitos acabam tendo isolamento social e

por muitas vezes por causa desse isolamento social não assume a sua doença e ai não faz o

tratamento, ainda tem essa dificuldade...” (Enfermeira – informação verbal).

“...o HIV era só tido como doença que quem tinha eram homossexuais, prostitutas, e hoje não,

hoje o que eu vejo do fenômeno é que o HIV invadiu de uma forma que não tem mais classe

específica, qualquer um pode ter o HIV. Não tem mais cara, você pode olhar para uma pessoa e

aquela pessoa ali está limpinha, bonitinha, sadia e ela tem o vírus do HIV, então não tem mais

cara o HIV, está agora entrando para dentro de casa, qualquer pessoa pode estar levando o

vírus...” (Técnica de enfermagem – informação verbal).

“...o paciente que tem nível social mais baixo, muitas vezes, às vezes não, mas muitas vezes é

complicado um pouco entender todas as observações que a gente faz em relação à doença, desde

o medicamento, até os cuidados que ele deve ter e muitas vezes você fala e vê que a pessoa não

entendeu, você fala de novo, é um complicador...” (Clínico – informação verbal).

Estes discursos estão atravessados por um complexo de forças atuantes que produzem os

significados que atribuem à realidade social.

2.3 Paciente Soropositivo: Estigma e Marginalização

O paciente soropositivo, em função de sua condição sorológica, torna-se alvo de classificações

fundamentadas em representações sociais dadas às realidades sociais. Enfim, classificado como

desviante de padrões de comportamentos socialmente aceitos, sendo assim, produzem-se classes

sociais para o portador do vírus, a partir deste entendimento por parte do corpo social, isto é,

classes que são culpabilizadas por sua condição sorológica positiva. O senso comum está continuamente sendo criado e re-criado em nossas sociedades, especialmente onde o conhecimento científico e tecnológico está popularizado. Seu conteúdo, as imagens simbólicas derivadas da ciência em que ele está baseado e que, enraizadas no olho da mente, conformam a linguagem e o comportamento usual, estão constantemente sendo retocadas. No processo, a estocagem de representações sociais, sem a qual a sociedade não pode se comunicar ou se relacionar e definir a realidade, é realimentada. Ainda mais: essas representações adquirem uma autoridade ainda maior, na medida em que recebemos mais material através de sua mediação – analogias, descrições implícitas e explicações dos fenômenos, personalidades, economia, etc., juntamente com as categorias necessárias para compreender o comportamento de uma criança, por exemplo, ou de um amigo. Aquilo que, a longo prazo, adquire a validade de algo que nossos sentidos ou nossa compreensão percebem diretamente, passa a ser sempre um produto secundário e transformado de pesquisa científica. Em outras palavras, o senso comum não circula mais de baixo para cima, mas de cima para baixo; ele não é mais o ponto de partida, mas o ponto de chegada. A continuidade, que os filósofos estipulam entre o senso comum e a ciência, ainda existe, mas não é o que costuma ser (MOSCOVICI, 2003, p. 95).

Os pacientes portadores do vírus são discriminados e estigmatizados por grande parte da

sociedade. Estes, tem dificuldades de se relacionar com as instituições, gestadas e administradas

pelas classes hegemônicas. Sendo assim, podemos considerar que: o estigma ligado ao HIV e `a AIDS, a estigmatização e a discriminação têm diversas causas e origens e podem ter diferentes formas, podendo também surgir em vários contextos [...] gostaríamos de ressaltar seis contextos severamente mais afetado pela estigmatização e discriminação ao HIV e à AIDS: famílias e comunidades locais; escolas e outras instituições de ensino; emprego e local de trabalho; sistemas de saúde; viagens, migração e imigração e dentro do próprio contexto de programas de controle e prevenção de HIV/ AIDS (PARKER et al., p. 28).

Como a questão do HIV/ AIDS está diretamente relacionada à questão da sexualidade e por

vivermos em uma sociedade altamente repressora, baseada em uma educação patriarcal, que tem

por objetivo preservar as instituições citadas anteriormente, os pacientes portadores do vírus,

podem ser observados, muitas vezes, tendo que esconder sua condição sorológica positiva, ou

fingir que não a possui. Esta situação afeta os portadores do vírus, pois os mesmos, encontram

dificuldades de aceitar e assumir sua condição sorológica e, este fato, atrapalha sua adesão ao

tratamento com os anti-retrovirais, porque como vão fazer uso dos medicamentos, se precisam

ocultar da sociedade o fato de serem portadores do vírus.

Vivemos em uma sociedade hedonista, onde é construído e/ ou produzido que devemos ter o

máximo de prazer em nossas ações cotidianas, logo, não é justo, por exemplo, que o corpo social

seja responsabilizado, individualmente, por questões relativas ao desejo. São produzidas a todo

momento, subjetividades, que são dispositivos do capitalismo e o corpo social não se dá conta

destas produções, pois ocorrem juntas, ao mesmo tempo, produções de várias ordens. Cada vez

mais produz-se o desejo nas pessoas por corpos malhados, bustos com silicones, viagra, enfim,

são utilizados, pelas classes hegemônicas, uma série de artifícios para que o corpo social seja

capturado por estas lógicas perversas que os conduz em busca deste prazer exacerbado. Milton

Santos, escreveu sobre o elogio da lentidão, algo bem interessante para o entendimento destas

produções: O mundo de hoje parece existir sob o signo da velocidade. O triunfo da técnica, a onipresença da competitividade, o deslumbramento da instantaneidade na transmissão e recepção de palavras, sons e imagens e a própria esperança de atingir outros mundos contribuem, juntos, para que a idéia de velocidade esteja presente em todos os espíritos e a sua utilização constitua uma espécie de tentação permanente. Ser atual ou eficaz, dentro de parâmetros reinantes, conduz a considerar a velocidade como uma necessidade e a pressa como uma virtude. Quanto aos demais não incluídos, é como se apenas fossem arrastados a participar incompletamente da produção da história [...] a velocidade não apenas se define a partir do tempo utilizado para superar distâncias. A questão é a de encontrar, para a palavra “velocidade”, equivalentes na prática social e política (2002, p. 162 e 165).

Logo, existe um complexo de forças atuantes, produzindo representações sociais do que é ser

belo, interessante, saudável, atraente etc., e as pessoas vivem cada vez mais em busca deste

atributos produzidos pelas classes hegemônicas.

Neste cenário, podemos observar uma reação, por parte do corpo social, muito conhecida por

aqueles que são capturados por estas lógicas referendadas acima: o preconceito. Pessoas que por

quererem usufruir destes “benefícios” anunciados pelas classes dominantes, podem ser vítimas

de classificações perversas, ou seja, desviantes de uma norma social caso venham, por exemplo,

se infectar pelo vírus HIV. Enfim, o corpo social deve alcançar o máximo de prazer, mas caso

ocorra algum dos riscos inerentes a este processo – riscos não revelados por seus produtores,

somente são revelados os pseudos-benefícios – a responsabilidade passa ser do indivíduo e não

de forças que estão em atravessamento ao cotidiano desta pessoa. É um processo muito bem

engendrado pois o corpo social é capturado para uso dos pseudos-benefícios e para controle e

correção do próprio corpo social.

O preconceito é uma questão sócio-histórica. Podemos percebê-lo em relação as questões de

gênero, raça ou etnia, situação sócio-econômica entre outras. O preconceito é um dispositivo das

classes hegemônicas e, através deste dispositivo são construídos indivíduos, com suas identidades

deterioradas e isto é efeito das relações de saber/ poder. As verdades produzidas sobre a pessoa

portadora do vírus HIV/ AIDS, regulam suas formas de relação com o corpo social.

Neste contexto encontramos as figuras dos profissionais de saúde, ou seja, os únicos

autorizados a falar sobre o vírus HIV/ AIDS e sobre o paciente portador, muitas vezes aqueles

produzem fundamentos que classificam e moralizam o fenômeno HIV/ AIDS.

As relações de saber/ poder funcionam como formas de controle social. São instituídos para o

corpo social modos de ser, sentir e pensar. Assim, são produzidos o preconceito e a

discriminação, pois aquelas pessoas que são “entendidas” como a margem desta configuração,

são induzidas à marginalidade. Este processo é tão bem engendrado que a pessoa marginalizada,

na maioria das vezes, também se percebe como desviante desta norma, caracterizando a

naturalização deste processo perverso.

2.4 HIV/ AIDS e sua Transmissão na Atualidade, a partir das Representações Sociais dos

Profissionais de Saúde

Configura-se, na atualidade, características que definem e diferenciam questões sobre a

sexualidade, enfim, existem representações sociais do que é sexualidade. Neste sentido, o saber/

poder se configura como forma de organizar as massas, criando modos de identificação das

mesma. Instaura-se o modelo do que é sexualidade e isto através de mecanismo de controle da

conduta humana. A mídia, legitimada pela confirmação científica, a todo momento, produz

modelos de beleza, jovialidade e sensualidade. São produções um tanto quanto incongruentes,

pois as pessoas são estimuladas a usufruir das técnicas e/ ou procedimentos construídos pelas

classes hegemônicas. Estas, tem como objetivo, específico, obter lucros financeiros. Porém, ao

mesmo tempo que instaura a falta nas pessoas de todas as parafernálias advindas do capitalismo

selvagem, descreve, também, as verdades sobre o que é sexualidade e como as pessoas devem se

comportar sexualmente no campo social, sendo as mesmas culpabilizadas, caso ocorra alguma

falha neste modo estabelecido pelas classes dominantes. Existe uma controvérsia entre o que é

transmitido pelos meios de enunciação de massas e o que é cobrado pelas normas de moralidade

social, objetivando, assim, encontros e desencontros entre as várias lógicas construídas

socialmente. Cabe agora, a seguinte indagação: como andam as interações entre o conhecimento

científico e as práticas cotidianas, quanto à compreensão dos fenômenos que possam advir dos

mesmos.

A pessoa, quando infectada pelo vírus HIV/ AIDS, passa a ser destituída de seu status social,

isto é, status conferido a todos os que atuam no campo social de acordo com as normas sociais

instituídas. Passa a ser reconhecida pelo corpo social, em função de sua contaminação, como

desviante de um comportamento sexualmente aceito.

Geralmente20, com a descoberta da soropositividade, há uma suspensão momentânea das investidas afetivas e sexuais. A idéia de casamento ou mesmo de namoro representa nessa fase um “risco social”. A revelação do status soropositivo pode representar a ruptura de relacionamentos tradicionais, uma redefinição dos papéis de gênero e a assunção de identidades considerados pelo grupo de referência como socialmente desviante (ainda que a elas sejam atribuídas pesos diferentes), como traidor/ infiel, homossexual, usuário de drogas, profissional do sexo etc. [...] No caso dos solteiros, revelar a sorologia positiva, na maioria das vezes, se apresenta como um dilema, que traduz o medo de não ser aceito como companheiro devido ao HIV. Outros sentimentos conformados pela situação foram listados como “receio de uma possível infidelidade” e “medo de contaminar o parceiro”. Outros fatores, retirados de literaturas, indicam o receio de discriminação e rejeição, e, no caso daqueles que decidem não contar, a adoção de algumas estratégias para esconder a soropositividade (MAKSUD, 2002, p. 40).

Ao mesmo tempo que as instituições sociais produzem parâmetros para avaliar o que é certo

ou errado, em termos de valor moral, não problematiza os efeitos destas práticas no campo social,

pois o estigma, o preconceito e a discriminação são mais graves e mortais do que a própria ação

do vírus HIV para a pessoa infectada. É pertinente a observação de que o sexo, as drogas entre

outros, funcionam na cultura do consumo como uma possibilidade de alívio para a quantidade de

demandas instituídas pela ditadura capitalista. Logo, devem ser analisadas as forças em

atravessamento a este processo de construção dos modos de existir.

No contexto, específico desta pesquisa, podemos encontrar nos discursos dos profissionais de

saúde, várias representações sociais de condutas que o corpo social deve adotar no seu cotidiano

para não ser contaminado pelo vírus HIV, e isto, sob o prisma de determinantes de

comportamentos sexuais de risco:

“...é sexo seguro, o que é sexo seguro? É saber muito bem com quem a gente tá andando, quer

20 Esta citação é parte de um ensaio produzido no contexto de realização de um dos projetos da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), que tem como parte de seus objetivos a produção e disseminação de informações especializadas em HIV/ AIDS a partir da realização de pesquisas, intervenções, seminários e produção de materiais.

dizer, é um sexo com responsabilidade, você escolher muito bem o seu parceiro, evitar troca de

parceiros, é a alta rotatividade e se possível manter sempre o uso do preservativo, apesar que o

preservativo não é o ideal, o ideal é que a gente pudesse confiar uns nos outros, que as pessoas

não traíssem, não mentissem, quer dizer o ideal seria que houvessem fidelidade nos

relacionamentos, ai realmente a gente poderia abaixar muito a incidência da transmissão do

HIV...” (Ginecologista – informação verbal).

“...é conhecimento, a única forma de você evitar a contaminação é ter conhecimento da

doença, das suas formas de transmissão, para que possa, então, cada um evitar...” (Clínico –

informação verbal).

“...o uso da camisinha, porque é o preservativo de barreira, ele evita o HIV se usado

direitinho, nada é tão milagroso, é trazer o parceiro, os dois fazer o HIV, também é importante,

porque assistem a orientação. O homem sabe que tem que está com cuidado, garotada aí usando

drogas, fazendo tatuagens, então essa orientação é muito importante para pessoa fazer a

prevenção. A nossa cultura não favorece a prevenção, e incorporar o uso da camisinha é

importante. A gente também não tem essa cultura, nós não aprendemos, na escola a gente

aprende, sei lá, não botar o pé na lama, porque dá doença, a gente não aprendeu a usar camisinha,

é tudo muito novo. Nem sempre, também, a informação vai significar que a pessoa vai botar a

prevenção, ela teve a informação, mas ela não incorpora, então, hoje, só um método de barreira

mesmo, que é o preservativo, o amor, a religião, confiar no outro, o que você faz com seu corpo,

é você quem sabe, então a dificuldade é exatamente essa...” (Socióloga e assistente social –

informação verbal).

“...é o básico, conhecer uma pessoa, o que acontece normalmente é isso, o casal se conhece,

aí três meses é uma relação muito estável já para eles, aí param de usar o preservativo. Eu acho

que a orientação é a pessoa saber primeiro qual é a condição sorológica do parceiro para começar

a liberar o preservativo da relação. Então, eu acho, que antes de transar os dois devem fazer o

exame e continuar usando o preservativo, acho que esse é o básico. As pessoas que já estão

casadas, é ter uma conversa franca com o parceiro, vir fazer o exame e negociar com ele o

preservativo enquanto ele não fizer, porque a gente fala que tem o pacto do casal, não vai obrigar

o casal a usar o preservativo a vida toda, é uma coisa que não é real, então o que a gente

recomenda é que todo mundo saiba sua sorologia, para que tenha uma vida saudável...”

(Farmacêutica bioquímica – informação verbal).

“...é o uso do preservativo, estar fortalecido para assumir essa situação, da maneira melhor, é

colocar a rotina do uso do preservativo e fazer seu tratamento, que é importante...” (Enfermeira –

informação verbal).

“...o uso do preservativo sempre. Acredito ser a única forma de se evitar a contaminação.

Independente de se ter parceiro fixo sexual ou não. O uso é imprescindível...” (Psicóloga –

informação verbal).

“...eu acho que se preservar mais, as pessoas tem que se amar mais, como eu falei dos

adolescentes, eles não esquentam, hoje fazem sexo com um, sexo com outro, para eles isso é só

diversão, eu acho que eles tem que se conhecer, mas preservar mais o seu corpo, eu penso

assim...” (Técnica de enfermagem – informação verbal).

“...usar camisinha...” (Auxiliar administrativa – informação verbal).

É interessante fazer algumas considerações sobre os discursos, referendados nestas

representações sociais dos motivos de contaminação pelo vírus HIV. Existem subjacentes às

representações, significados que devem ser problematizados, isto é, uma vez que, para evitar a

contaminação é necessário que se tenha estes cuidados, então quem se encontra contaminado

pode ser considerado como desviante destes modos de evitar a infecção pelo vírus. Como a partir

destas representações sociais sobre a transmissão do HIV, os profissionais estão se implicando

com suas práticas de trabalho e seus efeitos no cotidiano das pessoas? A questão é: como é o

modo de implicação dos profissionais de saúde, deste Centro Municipal de Saúde, com suas

práticas? Visto que implicados todos estão, a diferença é justamente a maneira como se implica.

A resposta a esta questão deve levar em consideração o complexo de forças que atuam neste

fazer, ou seja, forças sociais, políticas, sexuais, econômicas, familiares, culturais, entre outras.

CAPÍTULO 3 RELAÇÃO PROFISSIONAL DE SAÚDE-PACIENTE

SOROPOSITIVO E SUAS INTERFACES

3.1 A Percepção do Profissional de Saúde sobre a Relação Profissional de Saúde-Paciente

Soropositivo

A relação profissional de saúde-paciente possui peculiaridades que merecem espaço para

problematização, isto é, podemos observar que o “entre” é composto por um saber, que os

diferenciam. De um modo geral, é produzido nos profissionais de saúde, um saber, um

conhecimento sobre as doenças que lhes garantem um poder sobre aquele que está sob o seu

olhar douto.

Este saber, respaldado cientificamente, autoriza os profissionais de saúde a serem os únicos

autorizados a responder por questões relacionadas a saúde, portanto, ocorre, na maioria das vezes,

quando se fala em relação entre profissionais de saúde e pacientes, uma divisão de classes: as

classes dos especialistas e as classes daqueles que não possuem o mesmo conhecimento, enfim,

um conhecimento que lhes garanta saber sobre o seu próprio corpo.

Segundo Boltanski (1984, p. 49-52), a relação doente-médico é também sempre uma relação de classe, modificando-se a atitude do médico em função principalmente da classe social do doente [...] É em função dessa imagem social que o médico definirá sua estratégia frente ao doente, as diversas estratégias possíveis visando, habitualmente, mas em graus diferentes segundo a classe social do doente, a fazer-lhe reconhecer a autoridade do médico e aceitar sua vontade toda-poderosa, desapropriando-o de sua doença e até mesmo, de certo modo, de seu corpo e sensações.

É interessante, neste momento, nos reportamos às sociedades disciplinares no que diz respeito

as estratégias utilizadas, onde, a disciplina enquanto hábito e exercício, com o fim de apontar se o

indivíduo se conduz ou não conforme as regras instituídas, cria saberes/ verdades. É, a partir

deste estado de coisas, que surgem as Ciências Humanas, que serão a base deste poder, a forma

de saber/ poder. Então, além de nas sociedades disciplinares ocorrer o controle total dos corpos,

através das relações de poder pode-se constituir também um saber. Neste cenário, encontraremos

o dispositivo do exame:

O exame combina as técnicas de hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir. Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e sancionados (FOUCAULT, 1991, p. 164).

Os saberes, portanto, são dispositivos políticos articulados com a estrutura econômica. Cabe

então a seguinte reflexão: não existe saber neutro, quando se parte para uma análise do saber, isto

implica que se faça, também, uma análise do poder, pois os mesmos encontram-se intercalados.

Os discursos ditos científicos produzem, no campo social, verdades. O poder, ou melhor, as

relações de poder, têm necessidade de cada vez mais se tornarem competentes para se enquadrar

na divisão hierárquica das relações.

No caso específico do universo desta pesquisa, podemos entender que em todos os

profissionais que compõem a equipe multidisciplinar, prevalece uma relação de poder respaldado

em um saber de seu especialismo, cada qual, levando em consideração as especificidades de suas

profissões.

Além destas constatações, é pertinente citar que no cotidiano destas relações entre

profissionais de saúde e pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS, estão implícitas questões

advindas das relações conflituosas entre a equipe multidisciplinar, como foi estudado no primeiro

capítulo e as que são próprias das representações do fenômeno HIV/ AIDS, que em suma, é uma

coisa só, são forças em atravessamento que se produzem entre mundos nos processos de

socialização destes agentes sociais.

O fenômeno HIV/ AIDS causou um impacto social:

Desde o início da epidemia de HIV e AIDS mobilizou-se uma série de metáforas poderosas em torno da doença que servem para reforçar e legitimar a estigmatização. Elas incluem a AIDS vista como morte (por exemplo, por meio de imagens como a Grande Ceifeira); AIDS como horror (fazendo com que os infectados sejam endiabrados e temidos); a AIDS como punição (por exemplo, por comportamento imoral); a AIDS como crime (por exemplo, em relação a vítimas inocentes e culpadas); a AIDS como guerra (por exemplo, em relação a um vírus que precisa ser combatido); e, talvez mais do que tudo, AIDS como o Outro (no qual a AIDS é vista como algo que aflige os que estão à parte) (PARKER et al., p. 19).

As classes hegemônicas precisam se organizar para combater os efeitos de ações desviantes

das normas sociais vigentes. Mas, por existirem construções sócio-históricas acerca das relações

entre profissionais de saúde-paciente, estas classes podem se tornar fontes de estigma e

discriminação. Neste sentido, podemos observar nos embates destas relações a utilização, por

parte dos profissionais, de parâmetros respaldadas em um saber/ poder, ou seja, aspectos

relacionados ao nível sócio-econômico, como a relações de classes e linguagem, que será estudo

no próximo tópico deste capítulo.

3.2 Tratamento do Paciente Soropositivo e sua Relação com a Representação Social do

Profissional de Saúde sobre o Nível Sócio-econômico: Classe Social e Linguagem.

A relação profissional de saúde-paciente constitui desdobramentos para o tratamento do

paciente portador do vírus HIV/ AIDS, visto que nesta relação, além das peculiaridades do

fenômeno HIV/ AIDS, existem aspectos concernentes à relação de divisão de classes sociais em

função do nível sócio-econômico da pessoa que precisa dos seus serviços. Logo, a questão do

nível sócio-econômico no tratamento do paciente soropositivo é um importante analisador21.

Começaremos a análise problematizando a questão do nível sócio-econômico de forma ampla:

na construção da relação profissional de saúde-paciente, existe uma relação de saber que lhe

garante um poder perante outros que não possuem o mesmo saber. E, cada forma de atuação,

considerando este pressuposto, precisa de um contexto para que seja acolhida. Então, esta é a

condição sine qua non para que as falas e/ ou discursos destes atores sociais sejam acolhidos por

um cotidiano de ação.

Abre-se espaço para discussão de aspectos relacionados ao Sistema Público de Saúde e seus

modos de implicação com a instituição saúde. Para a compreensão deste tipo de funcionamento,

devemos refletir sobre a lógica de consumo, onde o valor dos serviços está fundamentado

predominantemente no capital financeiro, isto é, se eu tenho como arcar com os custos de um

determinado serviço, posso exigir excelência sobre o mesmo, porém, se não posso comprar o

serviço, não me sinto no direito de exigir um bom atendimento. É um processo muito bem

engendrado pelo capitalismo, onde o corpo social não estranha estas formas de funcionamento

dos serviços.

Quando falamos em Serviço Público de Saúde e Serviço Privado de Saúde, podemos perceber

21 Analisador, segundo René Lourau (1993), são aqueles acontecimentos que podem agitar a Assembléia Geral socioanalítica permitindo fazer surgir, com mais força, uma análise; que fazem aparecer, de um só golpe, a instituição “invisível”.

nitidamente a divisão de classes sociais, ou seja, aqueles que podem exigir dos serviços por que

pagam por eles e os que simplesmente aceitam os serviços oferecidos sem questionar seus

direitos. Podemos observar nas massas que utilizam o serviço público, uma atuação a partir da

lógica que o poder público está lhe dando alguma coisa e que portanto devem se sentir gratos por

isto, enquanto que o contrário é que é verdadeiro, enfim, é direito do cidadão ter sua saúde

garantida e isto requer serviços públicos de saúde de qualidade.

Neste sentido, é importante a observação de que não pretendo nesta discussão reforçar mais a

divisão de classes já existente, entre a questão dos que podem e os que não podem pagar pelos

serviços de saúde, mas sim, considerar que estamos falando de saúde – bem-estar bio-psico-

social, que deveria ser comum a todo o corpo social.

A instituição saúde necessita urgente de análises sobre a sua construção no campo social,

levando em consideração os seus modos de atuação nas classes populares. As instituições estatais de saúde, instituições médicas, portadoras de um discurso-saber sob forma de intervenção maciça e organizada na vida de diversos setores da população, tornam-se as agências políticas de contenção e controle da doença coletiva. Tornam-se, ao mesmo tempo, consequentemente, o local politicamente reconhecido de organização e discussão do problema da saúde com minúsculas, isto é, das condições sociais de existência da população. Ora, estas condições transbordam o Estado e remetem, em última análise, às formas de criação e apropriação sociais da produção e reprodução da vida coletiva. Em outras palavras, remetem à participação dos diversos grupos e classes sociais subordinados no modo de produção social vigente: nas condições de trabalho como nas formas existentes de educação, nas condições de alimentação como no acesso à informação e à produção do saber, nas condições de moradia como nas diversas formas de decisão política que incidem diretamente nos itens anteriores (LUZ, 1986, p. 13-14).

Para problematizar a questão da representação social dos serviços públicos de saúde, requer

que se analise o processo de construção social, histórica, política e econômica do aparelho de

Estado. Portanto, a questão da condição sócio-econômica, quando se fala em serviço público de

saúde, é um dos componentes desta representação social.

A infecção pelo vírus HIV/ AIDS já aponta para uma pluralidade de significados no campo

social. A pessoa infectada pelo vírus, na maioria das vezes, é marcada negativamente por sua

condição sorológica positiva, baseada em uma lógica moral amparada pelas influências do poder

do Estado. estigma nunca surge num vácuo social. Ele tem sempre uma história, que tem influência sobre quando ele aparece e sobre a forma que ele assume. O entendimento desta história e de suas conseqüências prováveis para o indivíduo e comunidades afetadas pode nos ajudar a desenvolver melhores medidas para combatê-lo e para reduzir os seus efeitos (PARKER et al., 2006, p. 12).

Pensar na produção sócio-histórica das relações de saber/ poder, nos auxilia no entendimento

de que estas relações entre sujeito e assujeitado é algo construído socialmente. Portanto, adentrar,

a partir desta perspectiva, no processo de construção do profissional de saúde- agente do saber –

que atua em um Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias, tratando paciente portador do

vírus HIV/ AIDS, torna-se um aspecto preponderante para este estudo.

Neste universo de pesquisa, podemos observar a representação social de que o nível sócio-

econômico é um dos fatores que interferem na dinâmica da relação profissional de saúde –

portador do vírus HIV. Para clarificar o entendimento deste cotidiano, utilizarei fragmentos das

entrevistas com os profissionais de saúde:

“...a maioria são de pobres, porque o doente que tem bom poder aquisitivo vai procurar os

consultórios particulares ou convênios, os doentes que vem para nós, a maioria é gente muito

pobre, ganha um ou dois salários mínimos. São poucos os doentes aqui que tem uma renda

melhor e muitos são desempregados, a própria doença fez com que ele ficasse fora do mercado de

trabalho, muitos também não tem boa qualificação profissional, fica mais difícil ainda estarem

conseguindo um lugar para trabalhar...” (Ginecologista – informação verbal).

“...quem tem plano de saúde ou um nível social melhor, se trata com seu plano de saúde, é

acompanhado por seu médico particular. A grande maioria, é de nível social carente, a epidemia

que no início era de classe média alta, hoje se empobreceu e pegou a população pobre. Interfere

no sentido que o paciente que tem nível social mais baixo, muitas vezes, às vezes não, mas

muitas vezes, é complicado um pouco entender todas as observações que a gente faz em relação à

doença, desde o medicamento, até os cuidados que ele deve ter e muitas vezes você fala e vê que

a pessoa não entendeu, você fala de novo, é um complicador...” (Clínico – informação verbal).

“...é um nível baixo, fundamental, de pouca materialidade das pessoas, mas ela representa um

pouco a população brasileira que usa o serviço público, se pode pagar um plano de saúde, ela

paga. A gente sempre procura falar com a população a questão do HIV no serviço público,

também é muito boa. A questão do HIV está incorporando outras camadas também, camadas

médias, já tem pessoas bem diferenciadas, tem a população que realmente tem poucas condições,

mas tem aquela que tem algumas condições, que tem consciência, isso sempre melhora porque

quanto mais a pessoa tiver condições materiais, físicas, também de consciência, de informação,

de querer lutar, isso é muito bom, ajuda...” (Socióloga e assistente social – informação verbal).

“...o nível sócio econômico é muito baixo. Aqui em Caxias, é abaixo do nível da pobreza e o

nível de entendimento também é muito ruim e isso dificulta o trabalho realmente. Quanto menos

informação a pessoa tem, mais difícil é você trabalhar com ela, às vezes eles não tem comida,

então como é que vai tomar a medicação, o pessoal que trabalha com a adesão sofre demais com

isso, realmente o sócio-econômico do município é muito ruim, é muito baixo e atrapalha

realmente...” (Farmacêutica bioquímica – informação verbal).

“...muito baixo, muitos com dificuldade de entendimento, pessoas leigas, que não concluíram

nem o ensino fundamental e isso muitas vezes dificulta a aceitação, dificulta o entendimento do

tratamento, acaba dando mais trabalho, são várias aulas para falar sobre o medicamento, várias

tentativas de ensinar usar medicamentos, muitas vezes a gente até convoca a família, quando a

família sabe, para poder ajudar...” (Enfermeira – informação verbal).

“...muito baixo. Dificulta bastante o trabalho, pois a razão se perde frente à emoção. Os

cuidados alimentares, as condições precárias habitacionais, a falta de emprego, a pouquíssima

informação dos familiares, gerando rejeição e abandono, se encarregam, lamentavelmente, de

proporcionar doenças...” (Psicóloga – informação verbal).

“...hoje em dia, tem vários níveis, não é só pessoa que não tem informação, que não tem

leitura, que não tem trabalho que se contamina, é classe média, um nível mais elevado. Agora não

tem mais aquele negócio, é só classe pauperizada, é todo mundo. O meu trabalho, eu acho que é o

mesmo com pessoas que não tem condições como as que tenha, porque se eles não se tratarem

vão adoecer iguais aos outros então eu tenho que ter o mesmo tratamento com todos...”(Técnica

de enfermagem – informação verbal).

“...o nível é baixo, são pessoas pobres...” (Auxiliar administrativo – informação verbal).

A partir destes recortes das entrevistas, podemos perceber que existe um inter-relação entre o

nível sócio-econômico e linguagem neste cotidiano de tratamento dos portadores do vírus HIV/

AIDS, junto aos profissionais de saúde desta equipe multidisciplinar, afinal, “a relação doente-

médico é também sempre uma relação de classe” (BOLTANSKY, 1984, p. 45).

A relação profissional de saúde-paciente respaldada em um suposto saber/ poder é uma

relação assimétrica, logo, a questão sobre o entendimento do tratamento será sempre

responsabilidade do paciente, ou seja, uma via de mão única, onde o profissional de saúde

respaldo no pressuposto que possui um conhecimento superior ao das classes de nível econômico

inferior ao seu, não ousam questionar suas formas de atuação. Qualquer interferência no processo

de tratamento é, imediatamente, considerado como fruto desta condição. O outro agravante na

relação profissional de saúde-paciente portador do vírus HIV/ AIDS é a representação social

sobre os modos de infecção pelo vírus, que caracterizam para as pessoas infectadas um não

conhecimento dos modos de prevenção e dos cuidados com o próprio corpo. Esta lógica

funciona, legitimando os profissionais de saúde como os únicos detentores de um saber sobre o

vírus HIV e suas formas de atuação. Se por um dado é verdade que a situação dos membros das classes populares face ao conhecimento médico e as médicos constitui apenas um caso particular da relação que os não-cientistas, membros das classes populares ou das classes médias, mantém com a ciência e os cientistas, ou seja, essencialmente com aqueles que pertencem às classes superiores e possuem um nível de instrução elevado, numa sociedade submetida a um processo de “intelectualização ou de racionalização crescentes”, não é menos verdade que a delegação ao especialista, do discurso justificador dos comportamentos e das situações mais cotidianas, como acender a luz, por exemplo, não é nunca desesperante nem tão frustrante como no caso dos médicos, porque o objeto que o sujeito abandona às manipulações do especialista e ao seu discurso, não é nada mais do que, o seu próprio corpo. Assim, a relação nova com a doença e com o conhecimento médico, instaurada pelo reconhecimento da única legitimidade do conhecimento oficial, é essencialmente geradora de ansiedades e tensões (BOLTANSKY, 1984, p. 34).

Na conformação destas relações de poder, podemos observar, formas de atuação por estes

profissionais que acabam por infantilizar o paciente em função de sua condição sorológica

positiva. O paciente, além de ser portador do vírus HIV/ AIDS tem uma situação sócio-

econômica baixa22, se o mesmo decidi agir de modo diferente do que lhe foi orientado pelo

profissional de saúde, é, imediatamente, enquadrado como um paciente difícil de se tratar, pois

não quer melhorar, como se a única possibilidade de tratamento fosse a respaldada no

conhecimento da equipe de saúde.

22 Conforme, os profissionais de saúde deste universo de pesquisa, relataram em entrevista.

A questão da linguagem é um outro analisador no estudo da representação social do HIV/

AIDS. Cabe agora as seguintes reflexões: até quando estas questões irão subsidiar as relações

entre profissional de saúde-paciente soropositivo? Será que a questão do HIV/ AIDS só pode ser

considerada a partir do cunho moralista, com fins de divisão de classes? Que poder é esse que

despotencializa as relações?

3.3 A Questão da Vulnerabilidade: Nós e os Outros

A representação social sobre a questão da vulnerabilidade de aquisição do vírus HIV/ AIDS

entre os profissionais de saúde e os pacientes soropositivos têm constituído um duplo sentido

para esta condição, ou seja, nós e os outros. Compreende-se nós como os profissionais de saúde e

os outros como os que não possuem o mesmo status de especialista, constituindo-se, desta

maneira, uma dicotomia entre os que possuem um saber sobre as formas de cuidados com a vida

e os que não sabem se cuidar e, portanto, praticam comportamentos de risco.

Nesta perspectiva, podemos observar como a questão da formatação pelas agências de

formação faz com que os profissionais de saúde se percebam como eminentes aos riscos de

aquisição ao vírus HIV/ AIDS em relação aos pacientes com nível sócio-econômico inferior aos

seus. Mas cabe agora a seguinte indagação: como se dá a relação entre os discursos – sobre a

aquisição ao vírus HIV/ AIDS – e as práticas – suas relações pessoais? Neste sentido, cabe

refletir que o campo de forças da qual emerge o discurso dos profissionais de saúde que os fazem

não vulneráveis ao HIV/ AIDS, promove, também, nos mesmos, a inviabilidade do risco de

infecção pelo vírus quando tecem suas relação extra muros dos aparelhos de saúde, ou seja, extra

vida profissional.

É importante a observação de que no campo social são perpetuados o medo, o preconceito, o

estigma, a discriminação, isto é, a aversão ao HIV/ AIDS. Surge, então, um conflito: como

dissociar estas representações dos embates cotidianos do corpo social? Afinal, os profissionais de

saúde não fazem parte do campo social, logo são partes integrantes deste campo.

O que pretendo trazer para esta discussão são as tensões que são produzidas entre o ethos do

profissional de saúde, respaldado em um saber/ poder e o ethos constituído em sua vivência

pessoal cotidiana. Situações conflitantes, ou seja, que saber é este que os fazem imunes às forças

constituintes das representações sociais dos modos de existir? Bom, para clarificar o que pretendo

trazer para esta discussão, farei as seguintes pontuações: não vivemos todos – corpo social – a

partir de um modo de produção capitalista, onde são produzidas subjetividades que engendram os

modos de ser, sentir e agir no mundo? Então é importante problematizar as divisões que podemos

observar entre os que são considerados como vulneráveis à infecção pelo vírus HIV/ AIDS e os

que não se percebem vulneráveis pelo simples fato de serem profissionais da área de saúde.

Podemos perceber que este estado de coisas é fruto da relação saber/ poder, mas é também um

excelente analisador: o que faz os profissionais de saúde estarem acima do restante da corpo

social, quando se fala em risco de infecção pelo vírus? Não vivem todos em uma sociedade

hedonista e ao mesmo tempo repressora sexualmente? Será que o conhecimento que os

profissionais de saúde possuem em relação à infecção pelo vírus HIV/ AIDS, por si só, os fazem

imunes a contaminação? É como se o que dizem para os outros – os não especialistas – sobre

“relações, fidelidade, prevenção” entre outras coisas não servissem para nós – os profissionais de

saúde. Será que os conhecimentos sobre o HIV/ AIDS são apenas para o trabalho e não para suas

vidas pessoais? Será que no fundo não estão obnubilados por um véu encobridor – saber/ poder –

da possibilidade de infecção pelo vírus? As lógicas que engendram os modos de ser dos

profissionais de saúde com relação às suas vidas pessoais, não são, também, como pensam ser a

vida dos outros – restante do corpo social que não possuem os mesmos conhecimentos sobre o

vírus HIV, ou seja, se vêem longe da AIDS?

Os comportamentos de risco de profissionais em relação a AIDS são moldados pela confluência constante entre a percepção individual e os modos nos quais essas percepções se organizam pelo processo de interação social e repercutem no cotidiano, a despeito da percepção da vulnerabilidade diante do HIV. Ela não é suficiente para mudar significativamente o comportamento em direção ao sexo seguro. A mudança no sentido do sexo seguro implica intervir no cotidiano. Implica ver que a vida cotidiana é a vida do indivíduo e esta não está fora da história e da cultura (ANDRADE & TANAKA, 2002, p. 68).

Neste tópico deste capítulo, pretendo chamar a atenção para a necessidade de provocação dos

significados elaborados socialmente e que pautam e moldam as relações sociais. Devemos

problematizar o status de especialista que é produtor de “verdades” sobre os modos de existir no

espaço social. A partir destas reflexões, fundamentarei esta análise utilizando recortes das

entrevistas com os profissionais de saúde sobre as suas percepções sobre os riscos de

contaminação pelo vírus HIV/ AIDS:

“...Se o profissional toma todos os cuidados de biosegurança, é praticamente zero, é só ter

cuidado[...] se eu vou fazer um toque, eu não posso fazer de jeito nenhum sem luva, não posso

fazer nenhum procedimento sem me proteger. Se eu vou fazer uma cirurgia, alguma coisa que

tem risco de respingar sangue ou qualquer líquido que possa estar contaminado pelo vírus, tenho

que estar com uma roupa adequada, proteção nos olhos, tenho que estar com máscara. Então, eu

tenho que me proteger, se eu tiver com as roupas adequadas, porque nós temos os equipamentos

adequados para o profissional que trabalha com doença infecto-contagiosa, se eu me proteger, eu

tenho que me proteger não só da AIDS, da hepatite e de tudo que é doença infecto- contagiosa. A

gente está aqui a muito tempo e nenhum de nós, até hoje, se contaminou...” (Ginecologista –

informação verbal).

“...O risco é zero quase. O médico, ele está sujeito adquirir a nível ocupacional tanto HIV

como hepatite C, B num acidente com material biológico. Normalmente, ocorre ou com cirurgião

numa cirurgia com pacientes infectados, se ele se machucar, entrar sangue, o pessoal que trabalha

com diálise também tem muitos, com o pessoal da enfermagem, também e com o pessoal que

trabalha com a emergência, seriam os riscos, fora isso não tem risco nenhum...” (Clínico –

informação verbal).

“...É pouco, porque eu uso preservativo, faço o teste, meu companheiro também faz. Enfim,

não vejo assim tanto risco, vejo pouquíssimo risco d’eu contrair HIV...” (Socióloga e Assistente

social – informação verbal).

“...Eu já fiz o teste, não estou reatora. Acho que eu tenho uma situação bastante estável, um

relacionamento estável, não acho que eu tenha conduta de risco...” (Farmacêutica bioquímica –

informação verbal).

“...contato de risco, não tenho, tenho um parceiro fixo há 17 anos, relação tranqüila...”

(Enfermeira – informação verbal).

“...me protejo e nunca deixo de usar o preservativo. Assim como incentivo meus filhos aos

cuidados com a proteção...” (Psicóloga – informação verbal).

“...Não, eu procuro na parte de atendimento, estar sempre usando os procedimentos básicos de

proteção com os pacientes...” (Técnica de enfermagem – informação verbal).

Para complementar a discussão sobre os riscos de infecção, por parte dos profissionais de

saúde, utilizarei recortes das entrevistas sobre como entendem a necessidade de fazer teste de

HIV:

“... por mais que a gente tenha cuidado pode ser que uma gotinha de sangue caia no olho da

gente e não perceba. Então a gente faz uma vez por ano, o teste...” (Ginecologista – informação

verbal).

“...já fiz porque eu sou um profissional de saúde e já tive problemas em emergência com

sangue, apesar que a gente usa na emergência, luva, máscara, óculos, mas você está sempre

exposto ao respingo de sangue, de secreção. Então, eu faço, praticamente, todo ano...” (Clínico –

informação verbal).

“...é, eu faço o teste porque eu trabalho com HIV, trabalho com pessoas que fazem teste, então

eu vou fazer também. Como é estar também nessa apreensão? Mesmo eu vendo que não tenha

risco. Se a gente transa de camisinha, minimamente pode ter um risco. É diferente, você faz um

HIV porque tem risco, ai eu venho faço e não tenho, faço porque sou profissional de saúde...”

(Socióloga e Assistente social – informação verbal).

“...não costumo fazer não, eu fiz porque estava testando o kit novo de HIV e nós fomos

testadas, todo mundo. Eu não costumo testar porque eu não acho que o exame de HIV é um

exame de rotina, você tem que fazer o exame se entrou em risco, como, momentaneamente, eu

não tenho entrado em risco, então, normalmente não tenho feito, mas se entrar em risco, eu

faço...” (Farmacêutica bioquímica – informação verbal).

“...eu faço, anualmente, quando tem que fazer exames de rotinas. Mas, não sou obcecada.

Tenho que fazer HIV. Faço anualmente exames de rotina, não por desconfiar de meu parceiro,

mas, rotina...” (Enfermeira – informação verbal).

“...já fiz muitos testes. Hoje, faço menos. Ninguém está livre de contrair o vírus. É uma

doença do momento, dos tempos modernos. Atualmente, lido melhor com esta possibilidade e

realizo testes uma vez por ano, muitas vezes, até para acompanhar e incentivar amigos...”

(Psicóloga – informação verbal).

“...não, eu fiz uma vez, quando eu entrei para o programa, não adianta você ficar fazendo o

teste anualmente, se você correr o risco é válido, mas se não correr. Até porque eu falei: o HIV,

hoje, não tem cara, mas por eu ser, é, atuar nesta área, eu procuro me proteger nessa parte, ter

sempre uma proteção...” (Técnica de enfermagem – informação verbal).

Estes discursos objetivam analisar a relação nós (profissionais) e os outros (usuários), ou seja,

como que o profissional de saúde é produzido para se perceber imune aos riscos de contaminação

pelo vírus HIV/ AIDS. A pessoa infectada é considerada como desviante de uma norma social

moralista e o profissional que tem um saber sobre o vírus e suas formas de infecção, não se

considera em situação de risco, ou melhor dizendo, não se vê representado em algumas situações

de risco. Os trabalhadores da área de saúde se vêem representados a partir dos modos de se

relacionar com seus pares pautados em valores como respeito, fidelidade, amor entre outros, que

são considerados como os “certos” nas suas visões de mundo e por valores sobre a sexualidade

pautados nos mesmos moldes.

3.4 Estratégias para Trabalhar o Cotidiano das Relações Equipe de Saúde-Paciente

O sentido deste tópico de discussão é pensar possíveis estratégias para se trabalhar a relação

na equipe de saúde e as relações da mesma com os pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS. Tal

perspectiva, não tem a intenção de produzir dicotomia, mas esmiuçar as partes, para dar

visibilidade a expansão dos modos de relação entre a equipe de profissionais de saúde e os

pacientes soropositivos.

Podemos em linhas gerais começar provocando os modelos dominantes de produção e/ ou

construção dos modos de relações entre as partes referidas acima, com o fim de constituir espaço

de problematização, de invenção que seja favorecedor de embates por outras vias, ou seja, vias de

reflexão e crítica das práticas cotidianas.

É importante começar esta discussão pensando que quando falamos sobre relações humanas

qualquer que seja a forma de atuação estará atingindo os pólos em ação nesta relação. Partindo

deste entendimento, abre-se espaço para irmos um pouco além, adentrando nos modos de

relações advindas do saber/ poder, que podem engendrar divisões entre sujeitos e assujeitados,

isto é, relações assimétricas. Mas, por acreditar que estas formas de relações são produções

sociais, proponho contrapor-me à lógica de reprodução e afirmar uma perspectiva de criação do

novo, e isto fundamentado no potencial criativo do ser humano.

Está presente nas conformações das relações profissionais de saúde-paciente as representações

sociais do HIV/ AIDS, que funcionam como um referencial multifacetado, conforme estudado

nos capítulos anteriores – estigma, preconceito, discriminação entre outros – que são forças

desestabilizadoras destas relações, uma vez que podemos perceber a partir das mesmas, vários

atravessamentos nos embates cotidianos. Porém, se estes profissionais trabalharem baseados na

via da problematização, poderão favorecer uma relação de diálogo e não de submissão entre as

partes envolvidas na mesma. Lembrando, sempre, a dimensão processual deste empreendimento.

Pensando as relações sociais na equipe de profissionais de saúde, creio ser de extrema

importância para este cotidiano de trabalho e para a qualidade de vida destes profissionais que os

mesmos possam ter clareza dos objetivos das reuniões entre a equipe. Propiciando, neste sentido,

o fortalecimento dos vínculos e como conseqüência desta, ocorrerá o deslocamento da lógica

vertical para a horizontal nos momentos de decisões na equipe, isto é, discussões a partir da

coletividade das decisões. Que o saber/ poder seja um dispositivo para desbravar caminhos para

ações geradoras de outros sentidos para suas práticas de trabalho.

Considerando a estratégia referendada no parágrafo anterior, vale incluir a prática de reuniões

entre a equipe de saúde e os pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS com a finalidade de

fortalecer a adesão dos pacientes ao tratamento e, ao mesmo tempo, problematizar os efeitos do

estigma construído sobre a pessoa em função de sua condição sorológica. Que as reuniões entre

os mesmos propicie um espaço de invenção permanente, que seja acolhedor e instigador de

reflexões críticas, não no sentido depreciativo, mas, do desejo de conhecer as várias

possibilidades que se apresentam naqueles embates no coletivo. Para tal empreendimento,

considerando o número de profissionais que compõem a equipe em relação ao número de

usuários deste serviço, que é infinitamente maior, devemos convocar o poder público a pensar

sobre a necessidade de investimento em infra-estrutura para acolher esta demanda social, visto

que é urgente que se promova, especificamente, discussões a respeito das temáticas em questão,

neste universo de pesquisa.

Os profissionais de saúde deste campo de pesquisa, apesar do complexo atuante de forças que

produzem os seus modos de atuação, são implicados com suas práticas e fundamentam suas

atuações nos entendimentos sobre os seus trabalhos. Procuram fazer o melhor com o que tem em

mãos, mas ocorre uma desmotivação em função da fragmentação da equipe. O ideal, a partir

desta, é convocá-los a criar condições de possibilidade para que essa vontade de potência criadora

se transforme em outros sentidos e, que, os mesmos, possam se deixar afetar pelas práticas e

discursos que serão tecidos nesta outra perspectiva.

Quando se percebe nos discursos dos profissionais de saúde que a possibilidade de mudança

no processo de tratamento do paciente portador do vírus HIV/ AIDS é uma via de mão única, ou

seja, é de responsabilidade do paciente e não da relação que se estabelece entre ambos a partir de

um complexo forças em atravessamento as mesmas, cabe então o seguinte questionamento:

porque o paciente deve ser sempre responsabilizado por qualquer adversidade que possa surgir?

O status de especialista, por si só, garante ao profissional de saúde a certeza de suas práticas?

Trabalhar a partir da dúvida nos flexibiliza a aprender mais sobre as formas de atuação.

A minha intenção neste sub-capítulo é problematizar os encontros e convidar os leitores a

acreditar que é possível o que muitas vezes é visto como impossível.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intenção por meio deste Trabalho de Conclusão de Curso em Psicologia foi a de destacar,

de forma breve, a possibilidade de refletir os modos de atuação dos profissionais de saúde junto

aos pacientes soropositivos a partir da lógica da problematização. No transcorrer do presente

estudo refleti, inicialmente, sobre os aspectos relacionados a constituição destes profissionais

pelas agências formadoras – academias – e como estas funcionam com o fim de promover a

reprodução de um modo de produção dominante. Nesse sentido, podemos considerar que as

relações sociais na equipe multidisciplinar, neste contexto de pesquisa, são moldadas por estas

lógicas hegemônicas, ou seja, são relação de saber/ poder que aliadas às representações sociais do

HIV/ AIDS, produzem inter-relações deficitárias na equipe de profissionais de saúde. Estes, por

não analisarem os entendimentos que possuem de suas práticas, acabam despotencializando os

encontros dos mesmos. Posteriormente, a representação social do HIV/ AIDS foi tomada como

ponto de partida para análises da interferências das mesmas na atuação dos profissionais de saúde

que trabalham neste Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias. Já na parte final,

considerando os objetos desta pesquisa, propus pensar em possíveis estratégias para se trabalhar o

cotidiano destas relações, não no sentido de produzir modelos de atuação, mas de provocar

dúvidas e questionamentos constantes nos interessados por este estudo em questão.

Neste trabalho não tenho a pretensão de responder perguntas, nem tampouco a intenção de

esgotar as análises da representação social do HIV/ AIDS neste universo de pesquisa, mas ousar

pensar além ou aquém das lógicas vigentes instituídas. Trata-se, então, de um movimento que

precisará de uma certa lentidão para compor de outro jeito os sentidos à respeito do HIV/ AIDS.

A pesquisa desenvolvida corroborou a hipótese inicial de que as representações sociais que os

profissionais de saúde tem em relação ao HIV/ AIDS interfere em suas práticas de trabalho junto

aos pacientes portadores do vírus, pois os significados elaborados socialmente – paciente

portador do vírus HIV/ AIDS como um desviante de uma norma social – conduzem os

profissionais a atitudes que acabam despotencializando os seus embates cotidianos. É importante

a observação de que os referidos, se percebem implicados com suas práticas, mas não pararam

para refletir sobre os seus modos de implicação com suas práticas de trabalho. Se estes

estranhassem os entendimentos à respeito do HIV/ AIDS e a representação que possuem do

pessoa portadora do vírus, estariam promovendo rupturas com as forças constituintes destes

modos de atuação.

A partir destas considerações, ouso indicar temas para futuras indagações, uma vez que

considero que esta pesquisa tem o fim de provocar movimentos nas conformações das relações

sociais. Logo, creio ser de suma importância convocar estes profissionais a estranhar às análises

constituídas neste ato de pesquisar. Fundamento a necessidade urgente de provocação destes, na

constatação de que os mesmos foram produzidos para atuar respaldados em um saber que os

garante um poder diante daqueles que necessitam de seus serviços. Assim, constróem verdades

sobre os pacientes portadores do vírus HIV/ AIDS fixando para tais identidades através de

práticas, discursos e procedimentos de seu tecnicismo com o fim de atender objetivos sociais de

promover a saúde. Um outro tema que merece questionamento é: como entendem a instituição

saúde frente ao fenômeno HIV/ AIDS, ou seja, é possível estar bem ou bem-estar sendo portador

do vírus HIV segundo a lógica dos profissionais de saúde que atuam neste Centro Municipal de

Saúde em Duque de Caxias? Ou HIV/ AIDS é sinônimo apenas é mal-estar? Considerando esta

perspectiva, os profissionais de saúde devem ter durante seus embates a tarefa cotidiana de

questionar as formas como os sistemas de verdade sobre o paciente soropositivo são produzidas e

assim, esta se torna a principal ação a ser promovida e, isto, obviamente, contrapõe o ato de

desvendar e descrever verdades sobre os mesmos. Enfim, problematizar os significados

elaborados socialmente e atribuídas às realidades sociais.

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TORRES, M. Um País de Desigualdades. Boletim ABIA, Rio de Janeiro, N. 44, Jan./ Mar., 2000. Entrevista com Otávio Cruz Neto.

APÊNDICE

APÊNDICE A

ROTEIRO PARA ENTREVISTA

Nome:

Idade:

Escolaridade:

Profissão:

Cargo/ função:

Local de moradia:

Cor:

Religião:

Renda:

BLOCO 1 – FORMAÇÃO, EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL E HIV/ AIDS

1 – Qual é sua formação?

2 – Quanto tempo tem de formado?

3 – Por que escolheu esta profissão?

4 – A quanto tempo trabalha nesta unidade de saúde?

5 – Já tinha experiência de trabalho com HIV/ AIDS? Hoje como pode conceituar sua experiência

a partir do trabalho nesta unidade de saúde com este público alvo?

6 - Você recebeu capacitação para trabalhar com HIV/ AIDS? Caso tenha recebido, qual foi a

capacitação? Como se sente em relação a esta? Caso contrário, em que esta se fundamentando

para trabalhar com a questão HIV/ AIDS? Qual seria a saída para esta situação?

7 – Você têm conhecimento de cursos de especialização em HIV/ AIDS?

BLOCO 2: EQUIPE MULTIDISCIPLINAR

1 – Quais os profissionais que compõem a equipe multidisciplinar nesta unidade de saúde

trabalhando com HIV/ AIDS?

2 – Como são as relações entre a equipe?

3 – Existem reuniões entre os profissionais de saúde da equipe multidisciplinar? Qual a

periodicidade? Qual a finalidade delas?

4 – Existe alguém responsável em dirigir as mesmas?

5 – Todos os profissionais têm a mesma voz nos momentos de decisão?

6 – Caso não existam reuniões, como as decisões e ações são tomadas?

BLOCO 3: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO HIV/ AIDS

1 – O que pode me falar sobre o fenômeno HIV/ AIDS? E sobre a pessoa portadora de HIV/

AIDS?

2 – O que representa o trabalho com pacientes soropositivos para você? Como isto repercute em

sua vida profissional?

3 – Como você percebe a transmissão do HIV/ AIDS, atualmente?

4 – De acordo com seus conhecimentos e experiência com HIV/ AIDS o que as pessoas devem

fazer para evitar a infecção pelo vírus?

5 – Você considera que o paciente com HIV/ AIDS se sente marginalizado e estigmatizado pela

sua condição?

6 – Caso afirmativo, como você percebe que esta discriminação se dá?

7 – Qual o nível sócio-econômico dos usuários dessa unidade de saúde? O que representa isto

para sua prática?

BLOCO 4: RELAÇÃO PROFISSIONAL DE SAÚDE – PACIENTE

1 – Como você percebe sua relação com os pacientes soropositivos? E como os pacientes se

relacionam com você? Os mesmos entendem sua proposta de trabalho?

2 – Ter uma boa relação com seus pacientes e/ ou usuários é importante? Por quê?

3 – Você compreende o que seu paciente e/ ou usuário está precisando ou pretende quando lhe

solicita seus serviços?

4 – Você percebe determinadas atitudes dos pacientes como agressivas e/ ou invasivas em relação

a sua prática profissional? Fale sobre.

5 – Como você reage frente a uma situação em que seu paciente está emocionalmente abalado e

exigindo uma solução para sua questão? Como você maneja esta situação?

BLOCO 5: ESTRATÉGIAS

1 – Como você percebe sua saúde atualmente?

2 – Poderia qualificar o risco de aquisição do HIV?

3 – Costuma fazer o teste de HIV? Por que?

4 – O que poderia melhorar em sua relação com a equipe de saúde? Na relação profissional de

saúde e paciente portador do HIV/ AIDS?

5 – Você percebe por parte do poder público, empenho em relação a pesquisas com a temática

HIV/ AIDS?

APÊNDICE B

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado(a),

Gostaríamos de contar com sua participação no estudo intitulado Representação Social, HIV/

AIDS e Atuação dos Profissionais de Saúde. Trata-se de um Trabalho de Conclusão de Curso

em Psicologia realizado no Curso de Graduação em Psicologia do Centro Universitário Celso

Lisboa – Rio de Janeiro, sob a orientação do Professor Doutor em Psicologia Marcus Vinícius de

Araújo Câmara.

A pesquisa tem como foco de estudo as Representações Sociais do HIV/ AIDS. Tem como

objetivo: Analisar as representações sociais do HIV/ AIDS na equipe de profissionais de saúde

que atuam no Centro Municipal de Saúde em Duque de Caxias tratando pacientes soropositivos.

Metodologia: o estudo é de abordagem qualitativa. O instrumento de coleta de dados é um

roteiro de entrevista estruturada a ser aplicada a profissionais de saúde sobre o atendimento a

pacientes soropositivos. Ressaltamos que os aspectos contidos na Resolução CNS 196/ 96. II. 14

sobre pesquisa envolvendo seres humanos serão respeitadas pelo pesquisador, dentre eles: a

garantia do sigilo que assegure a privacidade dos participantes quanto aos dados confidenciais

envolvidos na pesquisa; os responsáveis pela realização do estudo se comprometem a zelar pela

integridade e bem-estar dos participantes da pesquisa; serão respeitados os valores culturais,

sociais, morais, religiosos e éticos, bem como os hábitos e costumes dos participantes; serão

assegurados aos participantes da pesquisa os benefícios resultantes do estudo, sejam em termos

de retorno social, acesso aos procedimentos, condições de acompanhamento e produção de

dados; a liberdade do participante de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em

qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo.

Declaro estar ciente das informações deste Termo de Consentimento e concordo em participar

da pesquisa. Autorizo a utilização dos dados neste trabalho – Trabalho de Conclusão de Curso – e

em outros estudos desenvolvidos pelo autor.

Rio de Janeiro, de de 2006.

____________________________________

Participante

____________________________________

Pesquisadora

____________________________________

Orientador

Pesquisadora:

Nome:

Endereço:

Tel.:

E-mail:

Orientador:

Nome:

Endereço:

Tel.:

E-mail:

CEP – Comitê de Ética em Pesquisa

Secretaria Municipal de Saúde – RJ

Endereço:

Tel.: E-mail: