ccas anuario 2012

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Page 1: Ccas anuario 2012

https://www.facebook.com/pages/CCAS/269355233194146

CCAS. Agenda lotada e dezenas de artigos publicados em 2012.

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CARTA AO LEITORO tempo passa muito rápido e nem nos damos conta de tudo aquilo que conseguimos realizar. 2012 foi um ano muito

importante para o CCAS, pois conseguimos fazer muitas coisas importantes a favor da agricultura sustentável – razão precípua

da existência de nosso conselho.

Nossos conselheiros – empenhados, competentes e que tem muito a contribuir para a agricultura sustentável – estiveram

presentes em vários eventos realizados em 2012 e redigiram muitos artigos ao longo do ano. Para tangibilizar nossa afirmação

organizamos esta publicação: um relato com a participação em eventos e com dezenas de artigos publicados.

Entre os diversos temas abordados por nossos articulistas estão: tecnologias e seus benefícios; produtos seguros e segurança

na agricultura; slow food; boas práticas agrícolas; gestão territorial; biodiversidade; código florestal; etc.

Desejamos uma leitura útil e prazerosa.

Dezembro 2012.

José Otávio MentenPresidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável

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SOBRE O CCASO Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de

2011,com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados a

sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara,sobre o assunto.

O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade,

ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.

Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada,

que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam

por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas,

para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.

A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em

construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores,

pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da

sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa sejam colocados

a disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça.

VISÃO

Valorizar e promover junto a sociedade a agricultura sustentável

MISSÃO

Promover e difundir a agricultura sustentável em todas as etapas de seu processo produtivo.

Zelar pela imagem do produtor rural brasileiro e de seus produtos derivados da agricultura sustentável, bem como pela: segu-

rança alimentar, educação no campo, meio ambiente, cidadania e qualidade de vida da população brasileira.

Promover e incentivar a educação, o uso de tecnologias que incrementem a produção agrícola e qualidade dos alimentos,

fibras e energia produzidas de forma sustentável.

VALORES

O CCAS pautará suas ações dentro dos mais elevados níveis de: ética, transparência, integridade, respeito a diversidade,

credibilidade e imparcialidade.

Valorizar os profissionais e demais agentes que atuem em benefício e defesa da agricultura sustentável.

Page 5: Ccas anuario 2012

CONSELHEIROSAluízio Borém de Oliveira

Angelo Zanaga TrapéAntônio Roque Dechen

Claudio A. SpadottoCiro AntonioRosolem

Coriolano XavierDécio Luiz GazzoniDirceu N. GassenEduardo Peixoto

Elbio SennaJosé Otavio Menten

José Luiz TejonMegidoLuiz Antonio Pinazza

Luiz Carlos BheringNasser Luiz Carlos Corrêa Carvalho

Luiz MadiRumy Goto

ASSESSORIA DE IMPRENSAAlfapress Comunicações

Tatiana Barro de Freitas – Consultora de Comunicaçã[email protected]

Julia Teixeira – Coordenadora de Comunicaçã[email protected]

Alex Mattiuzzo – Gerente de Operações [email protected]

Cid Luis – Diretor [email protected]

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ÍNDICE

JANEIROOS RESULTADOS DO PARA E SEGURANÇA ALIMENTAR: CONTRIBUIÇÃO DA CIÊNCIA E DA TOXICOLOGIA PARA SUA INTERPRETAÇÃO E COMPREENSÃO .............................................................11

ALIMENTOS SEGUROS ...............................................................................................................................13

A SUSTENTABILIDADE NA PRODUÇÃO DE GRÃOS .....................................................................................15

SAIBA MAIS SOBRE O PROGRAMA PAULISTA DE AGRICULTURA DE INTERESSE SOCIAL REGULAMENTADO ONTEM ...........................................................................................................17

PRODUZIMOS ALIMENTOS SAUDÁVEIS ......................................................................................................18

OS SETE DESAFIOS DO AGRIBUSINESS – A JORNADA DOS PRÓXIMOS 10 ANOS ....................................20

FEVEREIROQUEM VIVER VERÁ .....................................................................................................................................23

TEMPESTADE EM COPO DE LARANJA .......................................................................................................25

MARÇOSACOLINHA: SER OU NÃO SER ..................................................................................................................28

ABRILAGRICULTURA SUSTENTÁVEL E AS TECNOLOGIAS ....................................................................................32

CÓDIGO FLORESTAL: METAS E MÉTODOS .................................................................................................34

DE SANTO A PECADOR, O MORANGO ÀS VEZES GERA DÚVIDA NA CABEÇA DO CONSUMIDOR ..............36

MAIOPROJETO CULTIVIDA: UM PROJETO DE SAÚDE PARA A POPULAÇÃO RURAL BRASILEIRA ........................38

Page 7: Ccas anuario 2012

CALOR INSUPORTÁVEL E FOME .................................................................................................................40

SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGRÍCOLA: OBSTÁCULOS A SEREM VENCIDOS ...............................................42

BOAS PRÁTICAS AGRONÔMICAS E AMBIENTAIS E OS PROFISSIONAIS NA AGRICULTURA.........................44

CÓDIGO FLORESTAL ..................................................................................................................................45

O SOLO É A PÁTRIA, CULTIVÁ-LO É ENGRANDECÊ-LA! ..............................................................................46

JUNHOAGRICULTURA E BIODIVERSIDADE .............................................................................................................48

DE QUEM É O AMBIENTE? .........................................................................................................................50

O CANARINHO VOLTOU ..............................................................................................................................52

GESTÃO TERRITORIAL ESTRATÉGICA PARA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL.................................................54

A 150 KM POR HORA ................................................................................................................................56

A EVOLUÇÃO DA AGRICULTURA BRASILEIRA E A RIO+20..........................................................................58

SEGURANÇA ALIMENTAR E AMBIENTAL NA PRODUÇÃO AGRÍCOLA ..........................................................60

FUNDAÇÃO AGRISUS COMPELTA 11 ANOS DE APOIO A AGRICULTURA SUSTENTÁVEL .............................62

JULHOESQUENTA OU NÃO ESQUENTA? E O QUE A AGRICULTURA TEM COM ISSO? ...........................................65

TODOS OS OVOS NUMA CESTA SÓ ...........................................................................................................66

QUANDO O CARNAVAL CHEGAR ................................................................................................................67

SEGURANÇA NUTRICIONAL: A LIÇÃO COMPLETA ......................................................................................69

SEGURANÇA DOS ALIMENTOS ..................................................................................................................71

AGOSTOO JECA INFORMATIZADO ...........................................................................................................................74

Page 8: Ccas anuario 2012

OS GASES DO BOI: QUANTA BOBAGEM! ....................................................................................................76

ONDE ATUAR PARA AUMENTAR A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA? ................................................................78

A ARTE DO ENCANTAMENTO .....................................................................................................................79

BRASIL, MAIOR PRODUTOR DE SOJA? ......................................................................................................81

BENEFÍCIOS DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS PARA A SUSTENTABILIDADE DA AGRICULTURA ................83

MANEJO DA FERRUGEM DA SOJA: CONTRUBUIÇÃO À SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO ....................85

SUSTENTABILIDADE: COBERTURA VERDE PARA REDUÇÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA .......................88

SETEMBRO165 BILHÕES DE DÓLARES NO LIXO .........................................................................................................90

SEGURANÇA NUTRICIONAL E CAPITAL HUMANO.......................................................................................92

MOFO-BRANCO: IMPORTÂNCIA, DISSEMINAÇÃO E MANEJO DA DOENÇA EM LAVOURAS NO BRASIL .....94

OUTUBROBIODIESEL DE ALGAS – O QUÊ, PORQUÊ E PARA QUEM? .........................................................................97

O VELHO ARROZ COM FEIJÃO .................................................................................................................100

OS OBSTÁCULOS A SEREM SUPERADOS PELO AGRO .............................................................................102

QUANTO VALE O AMBIENTE? ...................................................................................................................103

SACOLINHA: VOTO E ATITUDE ..................................................................................................................105

SONHO, URGÊNCIA E ECONOMIA VERDE .................................................................................................107

INTEGRAÇÃO LAVOURA E PECUÁRIA – ILP ..............................................................................................109

CÓDIGO FLORESTAL – CAMINHOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.....................................110

NÃO TEM SEGREDO, O MILHO VAI EXPLODIR! .........................................................................................112

ENGENHEIRO AGRÔNOMO: AGRO SUSTENTÁVEL ....................................................................................114

CERRADOS: UM BIOMA QUE PRECISA SER PRESERVADO .......................................................................116

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NOVEMBROMONITORAMENTO DA SAÚDE DE AGRICULTORES E TRABALHADORES AGRÍCOLAS PONTECIALMENTE EXPOSTOS A AGROQUÍMICOS – UM DESAFIO DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO ......118

O BOI BANDIDO OU MOCINHO? ...............................................................................................................120

MAIS LEI, MENOS EMPREGO, MENOS TÉCNICA, MENOR SUSTENTABILIDADE ........................................123

COISAS DO SÉCULO XXI ...........................................................................................................................125

PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AGRONEGÓCIO NOS PRÓXIMOS 10 ANOS ........................................................................................................................127

SLOW FOOD: UM MOVIMENTO PELO ALIMENTO BOM, LIMPO E JUSTO .................................................129

DEZEMBROINTEGRAÇÃO, LAVOURA-PECUÁRIA, FLORESTA?.....................................................................................132

COORDENAÇÃO, LIDERANÇA E AMBIÇÃO ...............................................................................................134

FILMES DE PVC, PROTEÇÃO E RISCO .....................................................................................................136

PARTICIPAÇÃO EM EVENTOSEVENTO DE DIA DE CAMPO PROPÕE AÇÕES SUSTENTÁVEIS AOS ..........................................................139

CCAS PROMOVE EVENTO PARA PROMOTORES DE MATO GROSSO .......................................................139

CCAS PARTICIPA DO 1º ENCONTRO DO TRABALHADOR RURAL DE ARARAQUARA E REGIÃO ................140

CCAS PARTICIPA DA 3ª EDIÇÃO DO CROP WORLD SOUTH AMERICA 2012 ............................................140

CCAS PARTICIPA DO ENCONTRO INTERNACIONAL DE MOFO BRANCO ..................................................141

CCAS PARTICIPA DO CONGRESSO BRASILEIRO DE FITOPATOLOGIA .......................................................141

CCAS PARTICIPA DO 3º SIMPÓSIO SOBRE RESISTÊNCIA A PRODUTOS FITOSSANITÁRIOS .....................142

CCAS DEBATE SOBRE OS DESAFIOS DA SOJA EM PASSO FUNDO/RS ....................................................142

CCAS PARTICIPA DE DEBATE SOBRE ALIMENTAÇÃO MUNDIAL EM BRASÍLIA/DF ....................................143

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OS RESULTADOS DO PARA E SEGURANÇA ALIMENTAR: CONTRIBUIÇÃO DA CIÊNCIA E DA TOXICOLOGIA PARA SUA INTERPRETAÇÃO E COMPREENSÃO

ALIMENTOS SEGUROS

A SUSTENTABILIDADE NA PRODUÇÃO DE GRÃOS

SAIBA MAIS SOBRE O PROGRAMA PAULISTA DE AGRICULTURA DE INTERESSE SOCIAL REGULAMENTADO ONTEM

PRODUZIMOS ALIMENTOS SAUDÁVEIS

OS SETE DESAFIOS DO AGRIBUSINESS – A JORNADA DOS PRÓXIMOS 10 ANOS

JANEIRO

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OS RESULTADOS DO PARA E SEGURANÇA ALIMENTAR: CONTRIBUIÇÃO DA CIÊNCIA E DA TOXICOLOGIA PARA SUA

INTERPRETAÇÃO E COMPREENSÃOPor Prof. Dr. Angelo Zanaga Trapé; membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Coordenador da

Área de Saúde Ambiental, Coordenador do Programa de Monitoramento de Populações Expostas a Agrotóxicos, Departamento de Saúde Coletiva,

Faculdade de Ciências Médicas-Unicamp.

Em Dezembro de 2011 a ANVISA, divulgou os resultados do PARA, Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos Na divulgação feita em rede nacional pela mídia a ANVISA informou que foram realizadas análises em 2488 amostras de diversos produtos da hortifruticultura para variados ingredientes ativos (i.as.) que compõem os agrotóxicos.

Do total das amostras analisadas segundo a ANVISA, 28% ou seja, 694 apresentaram-se insatisfatórias sendo que o pimentão foi o principal alimento com maior índice de amostras insatisfatórias, perto de 91%.

Para entendermos o significado do parâmetro “insatisfatório” da agência e podermos interpretar os resultados de maneira científica é preciso que a base da avaliação seja a metodologia científica em Toxi-cologia (disciplina da Ciência que estuda os efeitos dos agentes químicos em geral nos seres vivos).

A metodologia em Toxicologia tem como princípio básico para qualquer substância química (medica-mentos, produtos industriais, metais pesados, agrotóxicos), a relação DOSE=RESPOSTA, ou seja, para haver uma resposta nos organismos vivos seja ela benéfica ou não é necessário haver a absorção de uma dose capaz de determinar alguma alteração do organismo boa ou ruim.A Toxicologia moderna ainda mantém o ensinamento de Paracelsus, médico belga que iniciou os conhecimentos científicos nessa disciplina há mais de 500anos: “A dose faz o remédio, a dose faz o veneno”. Portanto não é qualquer dose ou resíduo de uma substância química, no caso os agrotóxicos, que pode ser capaz de determinar alterações prejudiciais nos seres humanos seja de curto, médio ou longo prazo. A Clínica e a Epidemiologia em Toxicologia nos ensinam isto.

No caso dos alimentos, as agências internacionais que regulam níveis de resíduos de substâncias químicas em alimentos ingeridos “In natura” ou processados estabelecem há muitas décadas valores, níveis aceitáveis dessas substâncias (conservantes, corantes, realçadores de sabor, agrotóxicos) sem causar danos à saúde humana pelo consumo cotidiano desses alimentos durante a vida.

Para os alimentos analisados pelo PARA, o parâmetro que deve ser respeitado pela agência reguladora

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ANVISA para que uma amostra seja “satisfatória” ou “insatisfatória” deve ser o limite máximo de resíduos de ingredientes ativos (i. as.) em um determinado alimento, os chamados LMRs, abaixo dos quais não há preocupação em termos de saúde pública.

Voltando aos resultados do PARA de 2010, temos que 28% das amostras, ou seja, 694 foram consid-eradas “insatisfatórias” pela agência, porém quando analisamos cientificamente os dados vemos que deste total, somente 42 ou 1,7% das 2488 amostras tinham algum resíduo acima do parâmetro aceito internacionalmente, o limite máximo de resíduo, LMR. A maior parte 605 amostras ou 24,3% eram detecções de i.as. não registrados para aquela cultura, mas com registro para outras culturas no país.

Avaliando os alimentos realçados pela agência e pela mídia, como os mais “contaminados”, temos o seguinte:

1º) Pimentão- segundo ANVISA, 91% de 146 amostras “insatisfatórias”, porém 84,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima do LMR-0,00% segundo o relatório da ANVISA.

2º) Morango- segundo ANVISA, 64,3% de 112 amostras “insatisfatórias”, porém 51,8% com detecção de i.As. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima do LMR- 3 ou 2,7% segundo o relatório da ANVISA.

3º) Pepino- segundo a ANVISA, 57,4% de 136 amostras “insatisfatórias”, porém 55,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs - 2 ou 1,5%.

4º) Alface- segundo a ANVISA, 54,2% de 131 amostras “insatisfatórias, porém 51,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas baixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabe-lecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs- 0,00%.

5º) Cenoura- segundo a ANVISA, 49,6% de 141 amostras “insatisfatórias”, porém 48,9% com de-tecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs- 0,00%.

Este problema é fitossanitário, de extensão de uso de um agrotóxico de uma cultura para outra(s) e não de saúde pública, pois o parâmetro que deveria ser respeitado pelo órgão regulador, o LMR não foi ultrapassado. Mesmo nos casos de culturas onde ocorreu detecção de resíduos acima dos LMRs pelo relatório, os valores são muito baixos e tem como unidades de valor miligramas do i.a., por Kilo do ali-mento. Do ponto de vista de saúde à luz do método em Toxicologia, principalmente DOSE=RESPOSTA, os valores são muito baixos não indicando riscos para a população consumidora desses alimentos em curto, médio ou longo prazo.

Como conclusão, fazendo uma leitura dos resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóx-icos em Alimentos-PARA da ANVISA, com base na metodologia científica que deve sustentar qualquer estudo, relatório, norma ou portaria, principalmente de uma agência reguladora nacional, podemos dizer que os alimentos analisados em 2010 mostraram uma adequada segurança química, indicando à população brasileira tranquilidade para o consumo desses alimentos.

Janeiro/2012

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ALIMENTOS SEGUROSPor Décio Luiz Gazzoni, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo, pes-

quisador da Embrapa Soja.

Em meados de dezembro de 2011, a ANVISA liberou o resultado das análises de 2.488 amostras de agrotóxicos em frutas e hortaliças, coletadas em pontos de comercialização, como parte do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). Os resultados mostraram quão seguros são os alimentos consumidos pelos brasileiros, pois apenas 5 amostras (0,2%) apresentavam limites de resíduos acima do permitido. O leitor deve pensar que eu estou confundindo as coisas pois, na divulgação efetuada pela mídia, 91% das análises de pimentão; 64% dos morangos; 57% do pepino; 54% da alface e 49% da cenoura foram consideradas “insatisfatórias” pela ANVISA.

Aí está o cerne da questão. Em Ciência não existe “insatisfatória”. Os três parâmetros da Ciência da Toxicologia, que se aplicam ao caso são: 1) Dose Letal 50 (LD50) – é a dose que mata 50% das co-baias em testes científicos; 2) Limite máximo de resíduos (LMR) - quantidade máxima de agrotóxico legalmente aceito no alimento,em decorrência da aplicação adequada de uma substância química (se-guindo todas as Boas Práticas Agronômicas), desde sua produção até o consumo; 3) Ingestão Diária Aceitável (IDA) – quantidade máxima do agrotóxico que, ingerida diariamentedurante toda a vida, não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos científicos atuais. No caso do PARA, apenas 0,2% das amostras ultrapassaram o LMR, estabelecido pela própria ANVISA.

Como se estabelece o LMR? É o valor máximo de resíduo de agrotóxico admitido legalmente em um alimento que, levando em consideração a Ingestão Diária Aceitável (IDA), não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos atuais, mesmo se ingerido por toda a vida.

Como se estabelece a IDA? Em testes científicos, considera-se a maior dose que não causou alter-ações metabólicas perceptíveis, nos organismos em teste. Estabelecida esta dose, ela é dividida pelo fator 100, ou seja, a IDA representa apenas 1% da dose que não causou qualquer problema de saúde em cobaias, nos experimentos científicos.

Vamos a um exemplo prático: Imaginando que um agrotóxico aplicado em maçã tenha LD50 muito alta (seja altamente tóxico), equivalente a 500mg/kg de peso vivo e que o limite máximo de resíduo (LMR) seja de 0,05mg/kg de maçã. Para atingir 50% de probabilidade de intoxicação de uma população de peso médio de 70kg, seria necessário ingerir 35.000mg/pessoa. Como o resíduo é de 0,05mg/kg de maçã, esta pessoa deverá consumir 700 toneladas de maçã. Se ela ingerir apenas maçãs, à razão de 2kg/dia, seriam necessários quase 1.000 anos para atingir a dose que, teoricamente, poderia conferir

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50% de probabilidade de ser afetado pelo agrotóxico.

Outro aspecto muito importante a ressaltar é o contínuo aprimoramento dos métodos de análise e dos equipamentos de detecção de resíduos, que permitem identificar substâncias na ordem de uma parte por trilhão (1ppt). Fazendo uma analogia, 1pptseria o equivalente a identificar a presença de uma determinada substância química, em que apenas uma gota dela foi lançada em uma piscina cheia de água, tendo esta piscina dimensões de 1.000 m de comprimento por 1.000 m de largura e com profundidade de 50 metros. Ou seja, quanto mais precisos forem os métodos de análise e detecção de resíduos de substâncias químicas, mais amostras serão consideradas “insatisfatórias”, o que não é um conceito científico, e não guarda qualquer correlação com impacto benéfico ou adverso desta sub-stância, sobre um organismo vivo. Dito de outra forma, esta classificação (satisfatória ou insatisfatória) é inútil, e não tem qualquer significado científico ou prático.

Como conclusão, fazendo uma leitura dos resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóx-icos em Alimentos-PARA da ANVISA, com base na metodologia científica que deve sustentar qualquer estudo, relatório, norma ou portaria, principalmente de uma agência reguladora nacional, podemos dizer que os alimentos analisados em 2011 mostraram uma adequada segurança química, indicando à população brasileira tranquilidade para o consumo desses alimentos.

Janeiro/2012

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A SUSTENTABILIDADE NA PRODUÇÃO DE GRÃOSPor Dirceu N. Gassen, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo.

A evolução e as mudanças na agricultura dos últimos 20 anos, com o plantio direto, a biotecnologia, a automatização de equipamentos, a agricultura de precisão e eficiência nos processos para o aumento na produção, resultaram em avanços tão importantes quanto os que ocorreram em vários séculos, incluindo o trator e a revolução verde.

Além da evolução na tecnologia, podem ser citadas as significativas mudanças políticas. No passado, as nações controlavam a produção e os estoques, com o pensamento na subsistência familiar e na garantia de disponibilidade de alimentos. As mudanças com a perestróica e o glasnost (reestruturação e transparência), a abertura de mercados, a livre competição e a queda de tensões de guerras entre as grandes potências, aceleraram as mudanças na agricultura.

A necessidade de evoluir e adaptar-se às demandas do mercado, com maior eficiência nos processos de produção, resultaram em inovações tecnológicas e, em um novo perfil de agricultor e de negócios na agricultura. A lógica predominante é a competição com os melhores em qualquer parte do mundo. A agricultura deixa de ser um negócio de proprietários, protegida pelo Estado, para ser parte de uma cadeia de produção de alimentos regida pelo mercado, pela qualidade dos produtos, com base na adoção de boas práticas agrícolas. E o modelo preconizado é o da sustentabilidade com a rastreabi-lidade.

A sustentabilidade objetiva a qualidade de vida, sem esgotamento de recursos naturais e sem gerar contaminantes não assimiláveis pela natureza, reconhecendo a coexistência das gerações futuras.

A partir dos anos 90, a agricultura passou a ser um “livro aberto”, envolvendo a eficiência na produção, menor impacto sobre o ambiente, padrões na qualidade dos produtos, comprometimentos sociais e a certificação como estratégica de controle do consumidor.

A produção com base em boas práticas agrícolas preconizadas e padronizadas pela FAO é definida como o núcleo da agricultura moderna, integrando num só conceito as exigências agronômicas e as de mercado. Tem como objetivo obter produtos saudáveis, livres de contaminações químicas, físicas ou biológicas, orientadas por diretrizes documentadas (certificáveis) e recomendações de caráter geral contemplando todas as atividades e insumos relacionados aos sistemas de produção. Ou seja, fazer as coisas bem e dar garantias disso.

A sustentabilidade na produção de grãos tem a sua base na rentabilidade e nos impactos sobre re-cursos naturais e consequências sociais. O agricultor tem a propriedade da terra, porémdepende de

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conhecimento, atitudes e parcerias para atender as demandas do mercado. O perfil do agricultor pro-prietário da terra e com o domínio dos seus recursos naturais mudou para um gestor da produção de alimentos e guardião da natureza. Hoje o agricultor deve ser um profissional habilitado para a gestão com apoio de especialistas comprometidos com a sustentabilidade na cadeia de produção de alimen-tos. Daí a evidência de que a rentabilidade em agricultura é resultado da aplicação de conhecimento por hectare. Envolvendo aspectos técnicos com metas no aumento da produção por unidade de área e na eficiência de uso dos recursos naturais.

Janeiro/2012

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SAIBA MAIS SOBRE O PROGRAMA PAULISTA DE AGRICULTURA DE INTERESSE SOCIAL REGULAMENTADO ONTEM

Sustentabilidade social no agro: acesso aos mercadosPor José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e

Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

A sustentabilidade é fator essencial no sucesso de qualquer empreendimento, inclusive no agro. Como outras atividades profissionais, o lucro é necessário para que se tenha vida longa. Necessário, mas não suficiente. Aspectos ambientais são, reconhecidamente, fundamentais.

A sustentabilidade social acaba de se expressar na criação do Programa Paulista da Agricultura de Interesse Social, que foi regulamentado em solenidade realizada em 24 de janeiro (ontem), no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo.

Os pequenos agricultores são os responsáveis por 70% da produção de alimentos no Brasil. São mil-hões de agricultores que sabem produzir, mas tem dificuldades em comercializar a produção e auferir lucros. A iniciativa do Governo do Estado de São Paulo de facilitar a aquisição de alimentos produzidos pelos pequenos agricultores, para atender a demanda de instituições públicas, é um marco.

Hospitais, escolas, presídios, etc. têm que comprar alimentos diariamente, seguindo a legislação. Através da Lei 14.591/20011 é possível comprar dos pequenos produtores sem licitação. Isto é uma garantia de mercado. Todo agricultor, inclusive os pequenos, sabem que a primeira etapa para defini-rem o que vão plantar, é saber se há procura pelo produto. Agora, sabendo que tem um mercado seguro, podem planejar a produção.

Certamente será necessário aprimorar a assistência técnica. O produtor tem que se responsabilizar em entregar para seus consumidores de acordo com a necessidade. Isto exige tecnologia e capacitação. Agora, a assistência técnica tem que melhorar.

Janeiro/2012

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PRODUZIMOS ALIMENTOS SAUDÁVEISPor José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e

Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

A principal necessidade básica da humanidade é o alimento. Por esta razão, a SEGURANCA ALIMEN-TAR sempre foi prioridade. Todas as nações, povos e indivíduos se preocupam com a quantidade de alimento produzido e disponibilizado para o consumo. Entretanto, cada vez mais, também há preocu-pação com a qualidade do alimento consumido. Qualidade envolve tanto as características nutricionais como a sanidade dos alimentos.

Por isso, ALIMENTO SEGURO também passou a ser prioridade. É possível promover a saúde aprimo-rando a alimentação. Este é um dos fatores responsáveis pela vida mais longa e saudável das pessoas. A dieta balanceada e constituída de alimentos adequados é cada vez mais assimilada. No Brasil há necessidade, por exemplo, de aumentar o consumo de frutas e hortaliças.

Entretanto, notícias como a que foi divulgada recentemente no Jornal Nacional e no Fantástico sobre a qualidade dos alimentos, prejudica o consumo de hortifruti. A notícia foi baseada em Relatório da ANVISA/Ministério da Saúde. Ficou a imagem que as frutas e hortaliças disponibilizadas a população brasileira estão contaminadas por agrotóxicos e que são prejudiciais a saúde.

É importante realizar o monitoramento de resíduos de defensivos agrícolas em alimentos. Mas é funda-mental interpretar os dados obtidos cientificamente e divulgar para a sociedade de forma conveniente. O que interessa para o consumidor é se os alimentos são saudáveis. Do ponto de vista toxicológico, preocupação deve existir apenas quando o resíduo estiver acima do limite estabelecido cientificamente. Existe ciência envolvida em todo o processo, desde o desenvolvimento dos defensivos agrícolas, pas-sando por rigorosos estudos sobre seus efeitos no homem, até sua aprovação pelo governo. Defensi-vos aprovados são seguros e, utilizados por agricultores bem preparados, contribuem para a produção de alimentos saudáveis.

É isto que o monitoramento vem demonstrando e, infelizmente, foi distorcido. Apenas 3,6% das amostras analisadas no Brasil em 2010 estão com resíduos de defensivos acima do limite estabe-lecido. Estamos em condições semelhantes a da Europa, América do Norte e Ásia. Como o limite

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estabelecido é extremamente seguro, mesmo as amostras com resíduos acima do limite estabelecido, por apresentarem valores muito baixos, não oferecem risco para a população.

Sob o ponto de vista químico, as frutas e hortaliças produzidas no Brasil são saudáveis. As notícias veiculadas não devem interferir no consumo, assim como não devem servir de barreiras a exportação, que deve se ampliar com a conquista de novos mercados.

Sob o ponto de vista agronômico, fica claro que devemos continuar aprimorando processos de produção, incluindo mais assistência técnica, visando a incorporação de todas as boas práticas agrí-colas geradas pela pesquisa brasileira e mundial.

Janeiro/2012

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OS SETE DESAFIOS DO AGRIBUSINESS – A JORNADA DOS PRÓXIMOS 10 ANOS

Por José Luiz Tejon Megido, Diretor Vice Presidente de Comunicação do Conselho Cientifico para a Agricultura Sustentável

(CCAS), Dirige o núcleo de agronegócio da ESPM, Comentarista da Rede Estadão-ESPN.

Com muito mais sensores sendo inventados e usados no mundo, passamos a auscultar, medir e sa-ber coisas que ignorávamos. Mais rastreabilidade, mais análise sensorial, lá vamos no agrobusiness com um dos desafios entre os sete, de significativa importância e predominância: o reino de avatar. Uma geração de clientes e consumidores cada vez mais sensíveis e sensibilizados pelas informações da sustentabilidade em todos os níveis. A Coca-Cola manda analisar os lotes de suco de laranja que recebe para processar seus refrigerantes e detecta resíduos de Carbendazin, por exemplo. Esse defensivo é usado para o controle da pinta preta na laranja. Ela fica antiestética, porém o aspecto de saudabilidade passa a contar. E se tem algo que a Coca-Cola e todos os processadores e redes de varejo do mundo não querem, é ter problemas com reclamações e riscos de saúde dos seus clientes. Portanto, estabelece-se a discussão: os técnicos vão debater se 0,03 ppm na laranja são nocivas ou não, por que o Japão aceita 3 ppm e a Europa 0,2 ppm e o que vão fazer com os Estados Unidos por ter na sua regra zero ou 0,01 ppm, o que é praticamente zero? Um desafio crescente é exatamente esse dos sensores e ampliação da sensibilidade e de baixíssimos limiares à questão da saúde humana e do planeta.

O segundo desafio é sobre as terras agricultáveis. O mundo precisará dobrar sua oferta de alimentos e de energia renovável. Os dados da FAO dizem que 70% desse aumento virá da tecnologia, 10% da intensidade de ciclos agrícolas na mesma área e os restantes 20%, esses sim advindos de novas áreas agrícolas. Quer dizer, terra passou a valer ouro. A expansão de novas fronteiras ficou limitada e a relação de posse das terras agricultáveis muda de figura, sendo um dos ativos que mais valorizaram no mundo nos últimos cinco anos. O Brasil ao lado do Sudão, na África, são as duas reservas maiores do planeta, nesse quesito. O terceiro desafio é o da população: gente. Crescemos à proporção de quatro novos nascimentos por segundo. Seremos 9 bilhões, já somos 7 bilhões. E esse novo habitante está completamente conectado e interligado. A internet amplia a ética situacional do passado e, além das conexões via celular, computador, televisores, ela vem aí agora na nova internet das coisas. Quer dizer, no chuveiro, no micro-ondas, no fogão, no carro, etc. O quarto desafio é não só a produção alimentar, que deve dobrar, mas a qualidade da mesma. Matérias-primas produzidas a partir do campo passam a importar cada vez mais na análise percebida das marcas dos processadores e distribuidores de alimentos, fibras, energia, proteínas e demais derivados do agronegócio. Alimento e energia, sua produção, distribuição e percepção pelos mercados interconectados se transformam em um novo de-

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safio para a gestão de toda a cadeia de valor, desde o antes, passando pelo dentro e pelo pós-porteira das fazendas.

O quinto desafio é a inovação, a adoção, a gestão da tecnologia e seu ciclo de vida. O problema não é mais contar com uma tecnologia avançada, a necessidade é que precisamos contar com mais do que uma. Essa diversidade tecnológica de ponta vai exigir de agricultores, da indústria química, mecânica, da genética e dos processadores um nível de diálogo on-line. A área acadêmica, a escola e a pes-quisa pública não resistirão à ausência de velocidade, bem como a governança do agronegócio será cada vez mais fundamentada nos conselhos setoriais. Na tecnologia, as reservas dos germoplasmas locais serão fator de gestão de risco e de segurança ambiental, político e de interesse nacional. O sexto desafio é a questão: quem será o produtor rural em 2022? Daqui a 10 anos, quem será, como serão, quantos existirão? Quais os segmentos, os nichos? Quais as competências desse novo quadro humano de produtores para os próximos 10 anos? O presente passou a ser o resultado do futuro. O que já temos agora, quais os sinais que já captamos neste instante que nos revelam a jornada e a janela do amanhã? Antever os movimentos é um desafio essencial para todos os agentes envolvidos no agrobusiness e que será fundamental para a construção de brands que resistam ao tempo. Produto é o que fazemos na indústria ou no campo, marca é aquilo que construímos na mente apaixonada dos seres humanos. E se o produtor é esse universo a ser revisto, incluindo a imprevisibilidade cíclica do mundo, no qual numa crise europeia, por exemplo, começamos a assistir a um êxodo ao contrário: urbanos abandonam as cidades e iniciam novos negócios no campo; as velhas “quintas” passam a ser vistas como fontes de qualidade de vida e também de empreendedorismo; se isso tudo configura uma das questões que mais intrigam os atuais executivos gestores do agronegócio, entra aqui o sétimo desafio: marketing. O velho e bom marketing: agronegócio sem marketing é só agro, sem negócio - que significa colocar a mente humana de todos os stakeholders no centro das mesas de decisões dos negócios e do agronegócio. O quanto sabemos desse exército de novos clientes oriundos da base da pirâmide planetária? Desses atuais 7 bilhões, praticamente a metade é de novos entrantes. Se o macarrão, por exemplo, tem penetração e capilaridade em 100% das residências do Brasil e somos o terceiro maior mercado do mundo nas massas é agora com a ascensão da classe C, quase 100 milhões de consumidores ávidos pela vontade consumista, que começou ver a penetração das novas massas recheadas. Do espaguete ao canelone é a jornada que já está em veloz penetração. E, da mesma forma, nas carnes, leite, hortifruti, fibras, cana, cacau, arroz ou seringueiras.

Terra, pessoas, alimento e energia, o reino de avatar, tecnologia, o produtor do futuro e o marketing. A síntese dos sete desafios do agrobusiness. Como será 2022? Dez anos à frente do nosso tempo?O diálogo com a sociedade é fator sine qua non por parte de todos os agentes envolvidos no agronegó-cio, e construir empresas com uma nova inteligência pedagógica passa a ser vital. Na educação antiga éramos levados a primeiro pensar, depois fazer e, se desse um dia na vida, sentir. A expressão lúdica, moderna, começa pela arte do fazer; ao fazer, sentimos e, ao sentir, pensamos. Essa prudência é sa-grada para não cairmos nos grandes erros das decisões de líderes bem-intencionados, mas que caem no pecado das distrações. A velocidade mudou, é quase instantânea. E todos esses sete macro-desafios do agrobusiness precisam estar embalados pela altíssima velocidade de um novo híbrido: faz, sente e pensa.

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FEVEREIRO

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QUEM VIVER VERÁ

TEMPESTADE EM COPO DE LARANJA

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QUEM VIVER VERÁPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

A epopéia do Código Florestal (PL 1876/99) parece estar chegando ao fim, depois de incendiar de-bates em plenários, no campo e na mídia. Neste momento, vivemos a expectativa da sua votação final. Depois de muita polêmica, o texto revisado pelos senadores (dezembro de 2011) saiu com várias modificações, entre elas aspectos como: detalhamento sobre a recuperação das margens dos rios, agora com faixas fixadas de 30 a 100 m para rios com mais de 10m de largura; fixação de APPs em propriedades maiores (entre 30 e 100m); legislação específica para a agricultura familiar (com apoio técnico e incentivo financeiro para preservar/recuperar a vegetação nativa).

O CCAS – Conselho Científico de Agricultura Sustentável foi ouvir as pessoas, tanto entre seus mem-bros, como entre gestores do agronegócio, para sentir a percepção que ficou da nova Lei. Ouviram informalmente produtores, executivos, pesquisadores, agrônomos -- e o balanço é mais ou menos o seguinte: para o pequeno produtor, o Código representa a resolução de um passivo ambiental que vem de anos (gerado em outro contexto econômico e legal) e que poderia, em tese, até inviabilizar sua atividade, dependendo o alcance do rigor protecionista da lei. Entre os médios e grandes produtores haverá a necessidade de se ajustar a uma legislação mais rigorosa, que se alinha a uma nova tendên-cia de sustentabilidade -- bem mais ampla do que o simples preservacionismo de hoje e envolvendo questões sociais, ambientais e econômicas. Ou seja, passamos a ter uma política bem mais clara com relação à interação entre meio ambiente e agronegócio, sinalizando para a sociedade a busca por um posicionamento de equilíbrio e responsabilidade ambiental na produção de alimentos, na perspectiva de uma agricultura mais sustentável. Agora vem a pergunta: e se a lei não for aprovada?

Dar sobrevida à lei antiga é ficar com uma base legal ultrapassada, com gargalos de funcionalidade jurídica e prática. Pode trazer a ideia de que há um vazio legal e os espertalhões de plantão podem se aproveitar e ampliar a razia florestal -- como, aliás, já aconteceu antes, sem fiscalização eficiente ou com fiscalização marcada por fins políticos ou mecanismos de troca de interesses. Tem mais: para os agri-cultores com a cabeça no século XXI, que sabem do valor da proteção ambiental para a sobrevivência do negócio, pode significar o fantasma de uma legislação tecnicamente incoerente, não isenta e não obedecida por muitos. Um risco de descrédito legal, que pode inclusive inibir a exploração de novas áreas (cerrado/pastagem).

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Naturalmente, vamos encontrar opiniões de que o Código deveria ser mais restritivo do que a forma que tomou após a epopeia dos debates na sociedade e nas casas legislativas federais. Uma lei com menos ranço de “plantation” e de “neocolonialismo”, como advogam seus opositores mais combativos – tanto cidadãos como organizações da sociedade civil. Provavelmente, o tempo vai pedir um debate com maior profundidade no Brasil. Quem viver verá.

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TEMPESTADE EM COPO DE LARANJAPor José Luiz Tejon Megido, Diretor Vice Presidente de Comunicação do Conselho Cientifico para a Agricultura Sustentável

(CCAS), Dirige o núcleo de agronegócio da ESPM, Comentarista da Rede Estadão-ESPN.

Começamos o ano com a ameaça de termos parte da produção do suco cítrico brasileiro proibido de ingressar nos Estados Unidos. Trata-se, neste caso, de uma “tempestade em copo de laranja”. Primeiro que os Estados Unidos, representa 15% do consumo brasileiro. 85% da nossa produção vai para outros mercados. Do ponto de vista da segurança alimentar, a produção brasileira segue os rígidos padrões inter-nacionais e atuamos dentro da lei. Tanto internacional, como local. O fungicida Carbendazin atua contra a pinta preta, que deixa a laranja não estética. O “codex alimentar” aceita universalmente em torno de 1.000 partes por bilhão dos resíduos desse químico. Exportamos para a Europa que tolera 200 partes; o Canadá 1.000. O Ministério da Agricultura do Brasil determina até 5.000 partes por bilhão e o Japão aceita até 3.000. Os Estados Unidos aceitavam da mesma forma até 2009, quando numa intervenção da EPA, a agência ambiental, definiram tolerância zero nesse item. Porém, continuaram recebendo as produções brasileiras, que apresentam em média indicadores em torno de 30 partes por bilhão. A pulverização do Carbendazin foi proibida nos Estados Unidos, mas o tema não foi incluído nos registros do Safety Concern, tanto é que o produto continua sendo usado pelos americanos na produção de maçã, pêssego, morango e outros. A proibição foi exclusiva para a citricultura americana.

O assunto atual é que uma companhia processadora levantou a questão para o FDA, que lendo a nova regra, informou que a tolerância era zero. Essa nota foi levantada e a indústria brasileira já esteve em reunião com os técnicos americanos, para condução da questão em vias racionais. Isso quer dizer, aceitar dentro das faixas atuais em torno de 30 partes por bilhão.

O mais grave da história, não é o aspecto técnico do assunto é o problema do ponto de vista de marketing. O suco de laranja vem caindo á média de 1,6 % seu consumo nos últimos anos, e na década passada caiu 25% nos Estados Unidos, o maior mercado consumidor do mundo, representando isoladamente 40% do globo.

Claro que uma noticia dessas, correndo o mundo e envolvendo o público leigo sobre o assunto, só irá ferir ainda mais as ações de retomada de mercado que o ramo já realiza agora junto aos consumidores. Inclusive a CitrusBr que age com uma campanha de comunicação na Europa, sendo bem recebida: “I feel orange”.

Sobre a possibilidade de não vendermos para os Estados Unidos, considero impossível, pois 80% do suco americano é “blindado“ com a produção brasileira. A curto prazo haveria estoque para a oferta americana continuar, mas a médio e longo prazo os efeitos de alta nos preços e a escassez da oferta versus a de-

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manda, terminariam por paralisar a indústria daquele pais.

Com certeza, trata-se de mais um tema onde a razão e o bom senso irão prevalecer. O que vale para a indústria citrícola é criar de fato o CONSENCITRUS, colocando seus agentes todos em harmonia, e con-tinuar vendendo mais, como o ocorrido em 2011, com negócios de cerca de US$ 2.200 bilhões, o recorde nos últimos 10 anos. Além disso, é vital aproximar o setor da ciência e da pesquisa brasileira objetivando sustentabilidade real e factível; continuar com maior ênfase fazendo marketing e melhorando o seu nível de diálogo com a sociedade, caso contrário sempre haverá o risco de “tempestades em copos de laranja“, terem a possibilidade de serem transformados em tsunamis na indústria.

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SACOLINHA: SER OU NÃO SER

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SACOLINHA: SER OU NÃO SERPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Outro dia fui comprar chocolate no supermercado, como faço habitualmente.Daí veio a surpresa na velha rotina: “não temos sacolinha”, disse a jovem do checkout, escudada na lei que alvejou as sacolas plásticas descartáveisnesse comércio. O que se seguiu foi um desajeitado manejo das guloseimas durante o trânsito e outros afazeres, até chegarem ao destino – em estado de razoável viscosidade.Apesar do desconforto, e mesmo sendo defensor do arbítrio do consumidor, não vou aqui defender o direito das pessoas à conveniência absoluta, pois o mundo mudou e precisamos, todos, rever con-ceitos.

A poluição está aumentando? Sim. A temperatura da terra está aumentando? Sim.Então, não há porque dinamitar atitudes de mudança contributivas, mesmo que tenham um balanço de eco-eficiência mais modesto. Se a margem de contribuição é positiva, ponto.

O caso das sacolinhas plásticas dos supermercados é um ícone dessa questão. Primeiro a constitucio-nalidade da lei foi questionada, daí ela virou acordo setorial e depois ganhou uma espécie de moratória de dois meses, até o “dia D” da proscrição das sacolinhas.

Enquanto acontecia tudo isso, o que mais se discutiu foi como serão as compras agora, ou se vai ter sacola biodegradável para todo mundo, se é pertinente cobrar por ela, qual seria o valor, ou como ficam as sacolas retornáveis. Muito pouco se debateu sobre o suposto ganho ambiental da medida.Ganho ambientalCalcula-se que em São Paulo são usadas mais de 600 milhões de sacolas descartáveis por mês. No Estado, estima-se um volume mensal de 2,5 a 3 bilhões de sacolas. Há quem fale em números meno-res, mais próximos à metade disso, mas não deixa de ser uma coisa simples que assume proporções gigantescas.

Retirar esse volume de circulação representa ganhos ambientais? Aparentemente sim, principalmente pensando-se nas grandes metrópoles: redução do impacto das sacolas nas enchentes das cidades; redução da sua destinação inadequada para rios, lagos, mar e outros locais onde prejudique a fauna; e contribuição para a equação do aquecimento global, já que é um subproduto do petróleo – um dos causadores do aquecimento.

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Como se vê, muito da percepção de impacto ambiental das sacolinhas vem do desperdício, do des-carte incorreto e até de aspectos estruturais, como a inexistência de sistemas eficazes de coleta sele-tiva de lixo.

Mas como é sempre mais fácil rotular um vilão do que olhar sistemicamente para o problema, a sacolinha paga o pato (ela tem sim, a sua culpabilidade) e não se encaminham soluções mais abrangentes e profundas para o meio ambiente, simplesmente porque não se pensa nelas. Olhar sistêmico

Isso tudo vai custar alguma coisa para o consumidor? Provavelmente sim, pois ele pode ter alguma despesa com sacolas retornáveis, ou na compra de sacos de lixo, ou na adoção de outras formas de transporte dos gêneros que comprar. Contudo, não vamos esquecer que as tradicionais sacolinhas tinham um custo de R$ 0,15 a 0,20 para o comércio e isso era naturalmente repassado aos consumi-dores.De outro lado, jáforam feitos estudos sobre o ciclo de vida e emissão de CO2 de sacolas de algodão, ecobags, sacos de papel, papelão, sacolas plásticas tradicionais ou biodegradáveis e as opções de material plástico não foram as de pior desempenho em consumo de matéria-prima e pegada de car-bono.

Contudo, em eco-eficiência não é somente o olhar intrínseco ao produto que conta, mas sim uma visão sistêmica que o analise em todas as suas interfaces na sociedade – da sua funcionalidade especifica a extensões de uso e manejos de descarte.

A tecnologia pode fazer alguma coisa?

Ainda não, mas que ninguém duvide do poder da ciência.O poliuretano(plástico) é um dos materiais mais versáteis e resistentes, desenvolvidos pelo homem. Hoje, ele está presente em tudo. Mas, por seus aspectos de degradabilidade, de recurso festejado transformou-se em preocupação ambiental, sem solução realista à vista.

Recentemente, uma expedição de estudantes de Yale, pesquisando plantas nas florestas tropicais do Equador, sob a liderança do Prof. Scott Strobel, descobriu um fungo que tem a surpreendente capaci-dade de digerir plásticos e sobrevive em ambientes anaeróbios (sem oxigênio).

O fungo recebeu o nome de PestalotiopsisMicrosporae a pesquisa sobre o processo de decom-posição do plástico que ele induz já foi publicada pelos alunos da expedição. Talvez, um dia esse fungo possa ser aplicado nas profundezas de aterros sanitários e neutralizar milhões de toneladas de plástico. Mas, por enquanto, isso é apenas uma promessa; talvez um sonho.

Novos paradigmasE assim voltamos ao nosso mundo da sacolinha. Chegamos a um ponto em que tudo o que represente ganho ambiental tem que ser feito, tem que ser tentado, sem paixões e com a racionalidade da tec-nologia. Nosso horizonte não é hoje, ou o ano que vem, mas sim os 9 bilhões de seres humanos que habitarão o planeta, em cerca de 30 anos.E isso não tem negociação, é direito à vida.

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Nessa perspectiva, é imperativo mudar,edificar uma nova cultura e preparar um mundo novo. Assim contextualizado, o caso das sacolinhas torna-se emblemático e por isso digo: abaixo a sacolinha! Mas tem que fazer isso com transparência, democratização da informação, consciência e educação social. Sem isso não criaremos novos paradigmas e é disso que estamos precisando na questão ambiental.

Março/2012

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ABRIL

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AGRICULTURA SUSTENTÁVEL E AS TECNOLOGIAS

CÓDIGO FLORESTAL: METAS E MÉTODOS

DE SANTO A PECADOR, O MORANGO ÀS VEZES GERA DÚVIDA NA CABEÇA DO CONSUMIDOR

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AGRICULTURA SUSTENTÁVEL E AS TECNOLOGIASPor Aluízio Borém, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS).

É perturbador saber que cerca de 900 milhões de pessoas se encontram famintas ou subnutridas. São também impressionantes os fatos de que a população mundial de 7,1 bilhões alcançará 9,1 bilhões no ano de 2050, correspondendo a um aumento de 43% em 42 anos, e que a oferta de alimentos vai ter que atingir quantidades bem superiores às atuais para atender a essa demanda. Diante desse quadro, a pressão sobre a agricultura para se produzir mais alimentos e de forma sustentável é enorme.

A fome não é fato novo na história mundial. O risco de o crescimento populacional não ser acompan-hado pelo aumento da produção de alimentos foi estudado pelo economista inglês Thomas Robert Malthus (1768-1834) há aproximadamente 200 anos. As ousadas previsões de Malthus não se con-cretizaram até o presente comente em virtude do surgimento de novas fronteiras agrícolas e da inclusão de novas tecnologias ao sistema produtivo. Neste terceiro milênio, mais uma vez faz-se necessário o desenvolvimento de novas tecnologias para ajudar a agricultura a produzir alimentos de forma susten-tável e socialmente responsável.

Um exemplo disso é a prática da Agricultura de Precisão, caracterizada pela aplicação de forma variada de fertilizantes, defensivos agrícolas e outros insumos, conforme as necessidades das diversas áreas da uma mesma lavoura. A Agricultura de Precisão se refere ao gerenciamento localizado de culturas e foi introduzida como prática em prol da produtividade. A tecnologia surgiu da observação de que os requisitos para aplicação de calcário variavam bastante para um mesmo talhão e que seria importante a aplicação diferenciada no campo, de forma que o calcário pudesse satisfazer a necessidade de cada local.

Este conceito, embora tenha sido utilizado por algum tempo, foi abandonado quando os equipamentos de tração mecânica passaram a predominar na agricultura. Hoje com a disponibilidade de microcom-putadores, sensores e sistemas de rastreamento terrestres ou via satélites, a Agricultura de Precisão passou a ser comum em muitas lavouras, contribuindo para a sustentabilidade da agricultura.Com o aparecimento de sistemas de informações geográficas e de rastreamento via satélite, o conceito de gerenciamento localizado de culturas pode ser estendido para o monitoramento de outras opera-ções que não necessariamente aquelas de aplicações localizadas de insumos, mas também para o levantamento de mapas de fertilidade de solos, o monitoramento de colheitas, ou de outras operações mecanizadas. Hoje pode-se definir a Agricultura de Precisão como um conjunto de técnicas que per-mitem o gerenciamento localizado de culturas.

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Uma outra tecnologia que muito tem contribuído para a sustentabilidade na agricultura é o Melhora-mento Genético. O Melhoramento é a arte, ciência e negócio de alteração genética das plantas para benefício do homem. Esta tecnologia tem desenvolvido variedades mais tolerantes aos diferentes estresses bióticos que afetam as lavouras como pragas, doenças, secas, elevados níveis de alumínio toxico no solo, dentre outras, que exigem menor aplicação de insumos. As variedades melhoradas mais produtivas também tem sido apontadas como fator de sustentabilidade da agricultura, pois per-mitem que uma mesma produção seja obtida em menor área, reduzindo a pressão pela adição de novas áreas ao sistema de produção agrícola.

Outras tecnologias estão sendo aprimoradas e a expectativa é que elas terão cada vez maior relevância na agricultura. Dentre estas pode-se citar a nanotecnologia, biotecnologia entre várias outras. Embora os desafios para se alimentar o mundo sejam enormes, as perspectivas são ainda maiores, pois já temos tecnologias para assegurar uma agricultura eficiente e ecologicamente responsável.

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CÓDIGO FLORESTAL: METAS E MÉTODOSPor Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Toda a discussão sobre modificações no Código Florestal Brasileiro tem gerado mais calor que luz. A discussão tem sido, por vezes, parcial e superficial, sem refletir a realidade e a necessidade de nosso país e de nosso planeta.Afinal, qual o objetivo de um Código Florestal? Proteger o quê e para quem? Proteger de quem? Entendo que se procura preservar a água, o clima e, consequentemente, as es-pécies existentes e a biodiversidade. No entanto, o estabelecimento arbitrário de larguras para a mata ciliar e frações de propriedades agrícolas como previsto pode realmente ajudar na realização destes objetivos?

É extremamente simplista dizer que problemas pontuais da agricultura poderiam ser acomodados, as-sim como não se pode dizer que os produtores de arroz e uva do Rio Grande do Sul, os produtores de maçã de Santa Catarina, os produtores de leite e café de Minas Gerais, entre outros, se constituem numa minoria cujos interesses seriam atendidos pela mudança no atual Código Florestal.Por outrolado, levantar a bandeira da impunidade para justificar a manutenção do atual código é, no mínimo, irrespon-sável, uma vez que a legislação brasileira permitiu e mesmo incentivou o desmatamento nestas áreas.

Ora, de um lado temos que o próprio aquecimento atmosférico levará a perdas de 20 % ou mais na produtividade agrícola brasileira, dependendo da espécie, com aumento do risco e custos, além do deslocamento da produção para o Sul do País. Assim, dizer que é possível aumentar a produção brasileira de alimentos sem grandes esforços e sem aumento da área cultivada não passa de falácia. O aquecimento global não afetará apenas a agricultura. Afetará todas as espécies à medida que será modificada, além da temperatura, a distribuição de chuvas. Assim, como é possível discutir o código florestal sem incluir medidas de mitigação do efeito estufa? A modificação do manejo do solo para siste-mas em semeadura direta pode contribuir sobremaneira nesse sentido, uma vez que pode seqüestrar mais de uma tonelada de carbono por ano em um hectare. No Brasil isso passa de 50 milhões de toneladas de carbono por ano. Não é desprezível. A simples recomposição de uma mata, ciliar ou não, poderia fazer tanto? Isso tudo sem diminuir a área de produção de alimentos e sem expulsar pequenos agricultores de seu trabalho.

Para a adequada conservação de áreas e espécies é necessário o levantamento de áreas representa-tivas, tendo em conta sua vocação e capacidade de suporte, através de um zoneamento agro-ecológi-co. E então sim, preservá-las. Do ponto de vista de preservação das espécies, a existência de parques

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contínuos e corredores ecológicos é muito mais efetiva que fragmentos florestais deixados sem uso, muitas vezes em áreas sem água disponível. Os parques podem ser mantidos pela sociedade ou ser-em auto-financiados, como ocorre em outros países. Assim, a conta não cairia em apenas uma parcela da sociedade, como no caso, absurdo, do atual Código Florestal. As reservas florestais, no momento, não levam em conta a vocação da terra. Existe no Brasil zoneamento agro-ecológico para quase todas as espécies, levando em conta a capacidade de uso da terra, um parâmetro técnico, objetivo, que, no entanto, não vem sendo considerado nas discussões do novo Código.

Por exemplo, as matas ciliares, margeando os cursos d’água, vêm sendo exaustivamente discutidas. Qual sua largura? Os valores existentes são completamente arbitrários, assim como os que vêm sendo propostos. Independentemente de seu tamanho, a mata ciliar terá sua eficiência na proteção da água muito afetada pela atividade praticada em seu entorno, seja urbana, seja agrícola. No caso da agricul-tura, simplesmente não se leva em conta a atividade executada no entorno da mata ciliar. Por exemplo, a extensão da mata ciliar poderia ser condicionada não à largura do curso d’água, mas sim ao tipo de conservação do solo que se pratica no entorno. Essa sugestão pode acomodar os objetivos de preser-vação e produção de alimentos, fibras e energia. Porque não vem sendo discutida?

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DE SANTO A PECADOR, O MORANGO ÀS VEZES GERA DÚVIDA NA CABEÇA DO CONSUMIDOR

Por Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-

gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

O médico, neurocientista franco-canadense Dr. David Servan– Schreiber, que resistiu por décadas ao câncer no cérebro, confirmou e subscreveu as suas teses no que diz respeito ao benefício da nutrição e atividade psíquica na prevenção e acompanhamento dos tratamentos convencionais de câncer. Em seu livro “Anticâncer”, publicado em 2007 e traduzido para 40 línguas, relata que “frutas vermelhas como o morango, framboesa, mirtilo, amora e airela, contém ácido elágico (abundantes em morango e framboesa) e múltiplos polifenois. Eles estimulam os mecanismos de eliminação dos cancerígenos e inibem a an-giogênese (formação de vasos sanguíneos capilares). As antiocianinas e proantocianidinas que facilitam também a apoptose (suicídio celular) das células cancerosas. E cita ainda que o consumo destas frutas, mesmo congeladas, elas conservam as moléculas anticâncer”.

É recomendado por órgãos responsáveis da área alimentar e nutricional a ingestão de 400 gramas de frutas e hortaliças por dia, podendo ser divididas em até cinco porções diárias- uma porção refere-se ao con-sumo de 10 moranguinhos. Apesar dessa recomendação e da disponibilidade do morango no mercado, o consumo do morango ainda é temido no Brasil. Isso se dá devido a algumas notícias que o denigrem, as-sim como outras hortaliças e frutas, quanto à possibilidade de contaminação biológica (cepas de bactérias patogênicas) ou química (resíduos químicos tóxicos) ao ser humano que o consome.

Esses medos são gerados muitas vezes pela falta de esclarecimento ao consumidor. A maioria da produção de morangos nacional é proveniente dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Rio de Janeiro,Goiás e Distrito Federal por agricultores altamente treinados por instituições de pesquisas e extensão dos estados em sistemas de produção seguros como, por exemplo, a Produção Integrada de Morango-PIMO, cujo modo de produzir garante a qualidade do produto, contribui para o desenvolvimento humano, considerando: segurança do trabalhador, legislação trabalhista,qualidade de vida dos produtores/comunidades e a conservação do meio ambiente. A PIMO alcançou recentemente esse sucesso e pode ser certificado por empresas técnicas credenciadas pelo INMETRO.

Nesse processo de elaboração, à luz da ciência, atestam-se as normas previamente elaboradas com o produtor para o cultivo seguro do morango. Esse trabalho técnico de fomento à produção de alimentos seguros e certificados conta com a participação ativa das universidades brasileiras,empresas de pesquisa dos Estados/unidades, da Embrapa e é custeado e coordenado pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento em parceria com o CNPq desde 2001.

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MAIO

MAIO

PROJETO CULTIVIDA: UM PROJETO DE SAÚDE PARA A POPULAÇÃO RURAL BRASILEIRA

CALOR INSUPORTÁVEL E FOME

SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGRÍCOLA: OBSTÁCULOS A SEREM VENCIDOS

BOAS PRÁTICAS AGRONÔMICAS E AMBIENTAIS E OS PROFISSIONAIS NA AGRICULTURA

CÓDIGO FLORESTAL

O SOLO É A PÁTRIA, CULTIVÁ-LO É ENGRANDECÊ-LA!

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PROJETO CULTIVIDA: UM PROJETO DE SAÚDE PARA A POPULAÇÃO RURAL BRASILEIRA

Um Programa de Monitoramento da Saúde de agricultores e família com exposição aos Defensivos Agrícolas

Por Prof. Dr. Angelo Zanaga Trapé, Membro do conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS). Em março de 2012 foi lançado o Projeto Cultivida, de inciativa espontânea da empresa Iharaque ape-sar de não ter registros de impactos na saúde humana(intoxicações) por produtos registrados por ela no país, tomou essa iniciativa de organizar este projeto com o envolvimento de profissionais de várias áreas do conhecimento científico, tendo como objetivo a redução e eliminação dos casos de intoxica-ção por defensivos agrícolas em todo o país.

Este projeto de abrangência nacional e com duração de no mínimo cinco anos, teve sua primeira etapa desenvolvida no município de Guaraciaba do Norte na região da Serra de Ibiapaba no final do mês de Março e irá percorrer 12 regiões por ano de vários estados brasileiros do Nordeste, Sul, Sudoeste e Centro Oeste.

Prevê diversas ações com foco em três áreas de atuação:

- Foco no bem estar e na saúde do trabalhador e sua família com investimentos em conscientização e orientações sobre diferentes problemas que afetam esta população tais como saúde da mulher e da criança através de especialistas da área médica e de atividades culturais.

- Foco na atividade agrícola com aumento da rentabilidade por meio da aplicação das Boas Práticas Agrícolas.

- Foco no treinamento e capacitação dos profissionais de saúde dos níveis local, regional e estadual do Sistema Único de Saúde(SUS) para a implantação de Programa de Monitoramento da Saúde de Populações Expostas a Defensivos Agrícolas realizado por profissionais de saúde com experiência em Toxicologia Clínica e Analítica.

O objeto deste artigo é apresentar o escopo desta atividade de saúde relacionada a exposição popu-lacional aos defensivos agrícolas.

O uso de defensivos na agricultura é intensivo e várias publicações têm apontado as intoxicações como um dos principais problemas de saúde, especialmente entre trabalhadores rurais.

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As estatísticas oficiais apresentam um quadro que pode ter outra expressão que só é possível identifi-car na medida em que tenhamos um setor de saúde pública com profissionais capacitados para o at-endimento de uma pessoa exposta aos defensivos agrícolas e com instrumental diagnóstico adequado para a definição do caso suspeito confirmando como intoxicado ou somente como exposto.

A Área de Saúde Ambiental da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp vem desenvolvendo um Programa de Monitoramento da Saúde de Populações Expostas a Defensivos Agrícolas há mais de duas décadas em toda a região metropolitana de Campinas com 42 municípios de também em 9 mu-nicípios do sul de Minas Gerais.

A estrutura operacional e hierárquica deste Programa institucional, que tem se mostrado bastante efici-ente e eficaz para ser reproduzido em outras regiões de outros estados do país, servirá de modelo para a sua reprodução e implantação nas regiões de atuação do Projeto Cultivida.

O treinamento e capacitação orientam os distintos profissionais no encaminhamento de agricultores(as) e familiares a realizarem pelo menos uma vez ao ano ou sempre que necessário uma triagem nos Programas da Saúde da Família (PSFs) mediante uma ficha clínico epidemiológica, além de coleta de sangue para dosagem das colinesterases, enzimas que podem se alterar na exposição aos inseticidas organofosforados e/ou carbamatos. Esta análise laboratorial é realizada pelo nível regional de saúde.Caso nesta triagem nos PSFs ou caso o exame laboratorial se apresentar alterado, o indivíduo é encaminhado para uma consulta médica na qual faz-se uma avaliação rigorosa com outros exames complementares laboratoriais para a confirmação ou não do caso suspeito e reencaminhamento para o município de origem para acompanhamento e monitoramento.

Na primeira etapa ocorrida em Guaraciaba do Norte, CE foram capacitadas as agentes comunitárias de saúde e técnicos do Programa da Saúde da Família(PSF) do município(nível local) e profissionais do Centro de Referência da Saúde do Trabalhador (CEREST), incluindo um profissional médico, além de profissionais do laboratório todos do município de Tianguá (nível regional) que serão referência para o município de Guaraciaba do Norte como para outros 8 municípios que compõem a denominada cha-pada da Serra de Ibiapaba.

Em todas as etapas do projeto o roteiro será sempre este, buscando articular todos os segmentos do setor público de saúde das regiões, hierarquizando responsabilidades e funções e deixando a perspectiva de continuidade de um Programa que esteja capacitado ao atendimento das pessoas expostas aos defensivos atuando de maneira ativa, identificando precocemente qualquer sinal e/ou sintoma que a pessoa exposta possa apresentar, além de apoiar e colaborar no monitoramento sobre o uso seguro e correto dos defensivos agrícolas elemento fundamental na linha do cuidado integral à saúde das populações expostas.

Se a exposição individual torna-se menor com procedimentos de proteção e segurança respeitados, os riscos desses indivíduos ficam bastante reduzidos o que deve ser aliado a outras orientações técni-cas no âmbito das Boas Práticas Agrícolas.

A implantação desta atividade programática contínua por parte dos municípios inseridos no projeto Cultivida, permitirá a geração de dados fidedignos de saúde possibilitando um entendimento de qual é o real impacto desta tecnologia na saúde da população exposta aos defensivos agrícolas em nível nacional orientando ações de prevenção para alcançar o objetivo maior do Projeto de eliminar as intoxi-cações por defensivos agrícolas na população rural brasileira.

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CALOR INSUPORTÁVEL E FOMEPor Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

O que temas aparentemente tão diferentes como aquecimento global e produção de alimentos podem ter em comum? Há algo que possa ser feito que resulte em melhorias nesses dois aspectos? Sugiro pensarmos em como a agricultura – uma das atividades econômicas mais importantes no Brasil - pode e deve contribuir para a solução desses dois problemas.

Segurança alimentar, mais do que socorro emergencial às populações com deficiência nutricional, im-plica em se praticar uma agricultura que seja, ao mesmo tempo, econômica, competitiva e sustentável. Econômica porque é necessário assegurar renda aos que a praticam. Competitiva porque há que se produzir alimentos cada vez mais baratos, mais acessíveis às camadas mais carentes da população e, além disso, produzir os dólares imprescindíveis à economia brasileira. Sustentável porque é funda-mental que se pratique agricultura indefinidamente na mesma área, evitando o desmatamento desne-cessário. E somente se consegue isso praticando uma agricultura que não cause danos permanentes ao ambiente. De acordo com estimativas da FAO, nos próximos 20 anos será necessário dobrar a atual produção de alimentos, além da necessidade de se produzir agroenergia. Essa meta somente pode ser atingida por dois caminhos: aumentar a área cultivada ou aumentar a produtividade das terras já em cultivo. O aumento da área cultivada é praticamente impossível na maior parte do mundo, princi-palmente na Ásia, área mais populosa do planeta, pois todas as regiões agricultáveis já estão em uso. Pior, boa parte delas se encontra em risco de degradação. O Brasil é um dos poucos países do mundo onde existe área a ser ocupada, com regime de chuvas e temperaturas adequadas à agricultura. Mas o aumento da área cultivada implicaria em desmatamento, uma vez que a agricultura ocuparia terras atu-almente sob vegetação natural, o que, certamente, encontra restrições nos anseios dos ambientalistas. O segundo caminho é o aumento da produtividade, através do uso de variedades geneticamente mel-horadas, mais produtivas e através do melhor manejo do solo e dos cultivos, o que tornaria a agricultura competitiva, sustentável e econômica, ajudando a se satisfazer a crescente demanda por alimentos, tanto em quantidade como em qualidade, a demanda por matérias primas e por agroenergia.

O aquecimento global tem como uma de suas causas a emissão atmosférica de gases, entre eles o CO2. A principal emissão desse gás vem da queima de combustíveis fósseis, como o petróleo e o carvão, nos países mais desenvolvidos, mas a queima de vegetação e a agricultura tradicional também contribuem para o problema. Entretanto, o manejo do solo sem aração, sem revolvimento, ou seja, o sistema de manejo conhecido como semeadura direta fixa o carbono atmosférico na matéria orgânica do solo, pelo menos temporariamente. Estima-se que um hectare (área correspondente a um campo

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de futebol) pode fixar em torno de 1 tonelada de carbono por ano na região sul do Brasil, se o solo for bem manejado, se for praticada uma agricultura moderna, econômica, competitiva e sustentável. Sim, porque o aumento da matéria orgânica do solo melhora suas propriedades, conservando melhor a água e os nutrientes. Não é uma boa idéia transformar o carbono, que aqueceria o ambiente, em alimentos, matérias primas e energia, contribuindo para a segurança alimentar, para a resolução do problema da fome e de energia do planeta Terra?

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SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGRÍCOLA: OBSTÁCULOS A SEREM VENCIDOS

Por Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Um sistema de produção agrícola deve ser sustentável. Antes de mais nada deve ter: sustentabilidade econômica, o que permitirá, como consequência, investimentos para se conseguir sustentabilidade social e ambiental. Sistemas de produção com Integração Lavoura-Pecuária, ou mesmo Integração Lavoura-Pecuária-Floresta representam a evolução mais recente da agricultura. Embora muitos aspec-tos estejam ainda para serem descobertos, aprendidos, entendidos para a melhoria do sistema, muito já se fez. Nos primeiros tempos se utilizava como forrageira, principal produtora de palhas, quase unica-mente espécies de braquiárias. Atualmente se encontra uma variedade maior de espécies cultivadas, o que é positivo, já que trabalhar com apenas uma espécie acarreta maiores riscos a todo o sistema, tornando-o mais vulnerável. Embora a utilização de maior número de espécies se constitua numa evolução do sistema de produção em relação ao uso exclusivo da braquiária, com a diversificação, em geral, há necessidade de melhor qualidade de gerenciamento que os sistemas mais simples. Algumas vezes, a não adoção de algumas técnicas ou espécies em rotação se deve mais à deficiência de ger-enciamento e/ou máquinas do que ao clima, por exemplo. Um problema adicional é a instabilidade dos mercados e a falta de gerenciamento da comercialização a longo prazo. Desta forma, ou o agricultor se prende ao seu sistema de rotação, saindo do ótimo econômico, ou obedece ao mercado, saindo do ótimo gerenciamento do sistema. A falta de pessoas capacitadas para um bom gerenciamento do sistema tem sido um dos entraves ao seu desenvolvimento. Aliás, a falta de gente qualificada tem sido um obstáculo ao crescimento de diversas áreas de atividade no Brasil. Há necessidade de se con-vencer as Universidades brasileiras, principalmente as com vocação agrícola, a envolver mais gente e mais recursos na formação de pessoal qualificado no desenvolvimento e gerenciamento de sistemas de produção agrícola.

Um entrave observado na maioria das propriedades que desenvolvem sistemas de produção agrícola com rotação de culturas e algum tipo de integração com a pecuária, é a dependência do uso de adubo nitrogenado para o sucesso do sistema. Na maior parte das propriedades pode se observar carência de nitrogênio no sistema. Mesmo com custos maiores, o resultado econômico do uso de maiores doses de nitrogênio pode ser vantajoso, afinal a integração nada mais é do que um melhor aproveita-mento dos recursos que estão disponíveis. Normalmente, uma propriedade que utilizaria num sistema convencional entre 60 a 80% dos seus recursos, passa a utilizar cerca de 90% a 95% de seus recursos num sistema integrado. Desta forma, um melhor entendimento da dinâmica do N nos sistemas seria

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importante para se tentar melhorá-lo. Ainda, seria interessante que se viabilizasse o uso de mais legu-minosas no sistema, procurando-se diminuir o custo e melhorar a sustentabilidade.

Cabe destacar que apesar de se classificar os sistemas de produção como Integração Lavoura-Pecuária, os estabelecimentos agrícolas apresentam grandes diferenças nas espécies empregadas e nas formas de manejo. De forma geral, é interessante o uso de uma espécie de alto valor agregado no sistema, tais como algodão ou feijão. O problema é que a introdução destas espécies torna o sistema mais complexo e de gestão mais difícil, além de se diminuir, por um ciclo, o aporte de palha.

Em muitas propriedades, mesmo conduzidas em alto nível tecnológico, muitas vezes contando com assessorias específicas, ainda persistem procedimentos em que o mais básico da ciência agronômica é, até certo ponto, negligenciado. Por exemplo, apesar do volume de resultados mostrando a falta de resposta aos micronutrientes em diversas situações, o uso de zinco, manganês, boro, e por vezes out-ros micronutrientes, ainda é generalizado. A análise de solo para fins de fertilidade nem sempre é feita todos os anos, e raramente se encontra um resultado na profundidade de 20 a40 cm - o que ajudaria no diagnóstico de, por exemplo, falta de enxofre. Mais, a quantidade de fertilizantes utilizada nem sem-pre leva em conta o resultado da análise de terra.

Assim, embora não existam mais dúvidas quanto à necessidade, utilidade e benefícios da adoção de sistemas de produção agrícola com rotação de culturas, se possível em semeadura direta e integração com pecuária e/ou florestas, sua adoção mais generalizada ainda depende muito da pesquisa e do ensino nesta área.

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BOAS PRÁTICAS AGRONÔMICAS E AMBIENTAIS E OS PROFISSIONAIS NA AGRICULTURA

PorClaudio A. Spadotto, diretor do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Gerente Geral da Embrapa Gestão Territorial.

Desenvolvimento responsável e na medida certa para o meio ambiente e para a sociedade são os grandes temas da atualidade. Nesse cenário, a atuação dos profissionais na agricultura torna-se priori-tariamente voltada para a interface entre as demandas das atividades produtivas, sejam elas agrícolas, pecuárias, florestais ou agroindustriais,e as necessidades de conservação dos recursos naturais mobi-lizados para a produção e as exigências de preservação dos ecossistemas e da qualidade ambiental. O grande desafio dos profissionais do setor nos próximos anos é conciliar a produção e sua rentabili-dade com os preceitos de responsabilidade social e ambiental. E, assim fazendo, colaborar na busca da sustentabilidade da agricultura brasileira.

Para isso, além da qualificação técnica, outras competências ou habilidades são desejáveis nos profis-sionais, como as qualidades pessoais que levam à rapidez e flexibilidade na busca de resultados, a visão interdisciplinar integradora das especialidades e a capacidade de se comunicar.

A relação agricultura e meio ambiente é tão próxima que para solucionar a grande maioria dos prob-lemas ambientais na agropecuária é necessário entender como funcionam os sistemas de produção. Como exemplos temos que as práticas de conservação de solo na área cultivada mantêm a sua porção mais fértil, além de reduzir a perda de água, evitando o assoreamento e a contaminação de lagos, açudes, riachos e rios. O manejo integrado de pragas leva ao uso mais racional dos defensivos agrícolas e o uso adequado desses produtos minimiza os problemas ambientais e de saúde ocupa-cional e pública. O aumento de produtividade nas atividades agrícolas, pecuárias e de reflorestamento homogêneo, com a adoção de boas práticas e sua integração, faz diminuir a pressão por abertura de novas áreas com desmatamento, contribuindo, assim, para a preservação dos ecossistemas.

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CÓDIGO FLORESTALPor José Luiz Tejon Megido, Diretor Vice Presidente de Comunicação do Conselho Cientifico para a Agricultura Sustentável

(CCAS), Dirige o núcleo de agronegócio da ESPM, Comentarista da Rede Estadão-ESPN.

Chega de debate sobre o código florestal. Bom senso é concentrar o melhor das energias e do conhe-cimento agrotropical brasileiro no pós-sancionamento da lei aprovada na câmara federal.

Os agricultores que plantaram dentro da lei e das orientações agronômicas de suas épocas não podem ser chamados de desmatadores, e nem, de torturadores com a alcunha de “anistiados”! O agronegócio comercial brasileiro é como regra preocupado com os aspectos ambientais e sociais, pois estão sub-metidos às leis de mercado. E não são os supermercados e as agroindústrias processadoras de ma-térias primas vegetais ou animais, que irão correr riscos de terem suas marcas prejudicadas, ou suas vendas cortadas por estarem usando grãos, carnes, fibras ou energia oriunda de práticas predadoras. Isso existe? Sim, mas não é mais a regra. Onde, porém, existe a fraude, o crime, o desmatamento ilícito e o predadorismo, não empreendedorismo, mas o predadorismo contumaz?

Como regra isso tem a concentração de ocorrências nas terras ilegais, na grilagem, e nos que fazem mau uso dos assentamentos e terras devolutas. Para a ilegalidade existe polícia e a mão pesada da lei e da justiça. Para policiar precisa investir em maior vigilância, tecnologia, fiscalização e velocidade nos processos, julgamento, combate à corrupção, e aplicação da lei. E, é exatamente ai, onde há décadas reside o problema, que é histórico na realidade brasileira. Não é o gaúcho que abriu o cerrado enfrentando, inclusive a ilegalidade, o crime e ainda hoje convivendo com a falta de estrutura fora das porteiras das fazendas que está o inimigo do ambientalismo.

Presidenta Dilma, tire da frente essa quizumba dualista de conflito de egos, entre o time dos ambien-talistas versus a galera dos ruralistas, e mande os órgãos colocarem a mão na massa. E essa mão na massa significa dizer: “Ih agora, como é que nós vamos fazer para definir as normas gerais dos programas de regularização ambiental PRA, previstos nos textos da lei, adequando regionalmente a aplicação do código conforme as realidades locais do Brasil? Isso sim representa colocar foco no que interessa, promover a agricultura de baixo carbono e a integração pecuária, lavoura e floresta, a defesa da pesquisa genética tropical, e não àquilo que distrai a atenção do que é verdadeiramente a causa es-tratégica do país. Não corrigimos o presente consertando o passado, e muito menos faremos o futuro nos distraindo com as ilusões do presente.

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O SOLO É A PÁTRIA, CULTIVÁ-LO É ENGRANDECÊ-LA!

Dia 15 de abril, dia nacional da conservação do solo.

Por Antonio Roque Dechen, membro do Conselho Cientifico para Agricultura Sustentável (CCAS), En-genheiro Agrônomo, Vice-Reitor Executivo de Administação da USP e Professor da ESALQ,e Presi-dente da Fundação Agrisus.

A revista O Solo, editada pelo Centro Acadêmico Luiz de Queiroz, de 1909 a 1995, tinha como lema a frase “O Solo é a Pátria, cultivá-lo é engrandecê-la!”. Ao buscar a origem desta frase encontramos a referência no discurso de formatura da turma de 1910 daentão Escola Agrícola Prática de Piracicaba proferido por Arthur Torres Filho e publicado na Revista O Solo número 8, ano 1910.

Ao ler e reler o substanciosodiscurso proferido para uma turma com 14 formandos com essa turma a Escola Prática Agrícola de Piracicaba completava o número de 74 Engenheiros Agrônomos formados no Estado de São Paulo destacam-se as referências à qualidade dos solos, sustentabilidade e quali-dade de vida.

Hoje,passados 100 anos, a sustentabilidade com o foco ampliado para a temática ambiental, social e econômica continua presente no cotidiano da sociedade.

Nas últimas décadas tivemos a oportunidade de vivenciar e acompanhar eventos nacionais e interna-cionais que possibilitaram a mudança do cenário da agricultura brasileira e principalmente inseriram o Brasil como player mundial na produção de alimentos.

Assistimos a Revolução Verde de Norman Borlaug nos anos 70, a segunda revolução verde que foi a conquista do cerrado, graças à transferência dos resultados de pesquisa, o estabelecimento com sucesso da integração Floresta x Lavoura x Pecuária, e adoção do sistema de semeadura direta, a agricultura com ar e água limpos.

Hoje, a sustentabilidade da produção agrícola e a adequação ambiental são indissociáveis, grandes avanços estão ocorrendo na agropecuária brasileira e para continuarmos crescendo e nos firmarmos nas posições de liderança da produção, o Brasil precisa também posicionar-se na liderança da implan-tação de ações de sustentabilidade e, para tanto, retomamos a frase do inicio deste texto: O Solo é a Pátria, cultivá-lo é engrandecê-la, porém nos ajustamos às demandas da sustentabilidade, devemos empenhar todos os nossos esforços para que possamos dizer com orgulho que: “O Solo é a Pátria, cultivá-lo e conservá-lo é engrandecê-la e garante a sustentabilidade e a vida”.

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JUNHO

JUNHO

AGRICULTURA E BIODIVERSIDADE

DE QUEM É O AMBIENTE?

O CANARINHO VOLTOU

GESTÃO TERRITORIAL ESTRATÉGICA PARA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

A 150 KM POR HORA

A EVOLUÇÃO DA AGRICULTURA BRASILEIRA E A RIO+20

SEGURANÇA ALIMENTAR E AMBIENTAL NA PRODUÇÃO AGRÍCOLA

FUNDAÇÃO AGRISUS COMPELTA 11 ANOS DE APOIO A AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

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AGRICULTURA E BIODIVERSIDADEPor Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Quando se discute biodiversidade, Amazônia, pecuária e agricultura são temas normalmente recor-rentes. A noção que se alardeia é a de que o desenvolvimento da agricultura e da pecuária ameaça a Amazônia, a biodiversidade do Brasil e a vida no mundo como conhecemos. Será? Pesquisa publicada recentemente na revista científica Nature estudou a cadeia produtiva de 15 mil produtos e procurou determinar como o consumo em um país afeta a biodiversidade em cada local, mundialmente. Concluiu-se que aproximadamente 30% das ameaças à biodiversidade na Terra vem do comércio internacional. Neste ranking, o Brasil aparece como importador líquido de biodiversidade, ou seja, 76 espécies são impactadas pelos produtos importados pelo Brasil, enquanto que nossa produção para exportação impacta 35 espécies. O que isso significa? O Brasil é um grande exportador de commodities - produtos não industrializados ou semi-industrializados, como, por exemplo, os agrí-colas. Então, toda nossa agricultura pode impactar menos a biodiversidade do que nosso consumo. Em outras palavras: as cidades, onde se consome, podem impactar mais a biodiversidade do que o campo propriamente, onde se produz. O trabalho é muito oportuno no momento em que se discute os vetos ao texto do Código Florestal Brasileiro, que certamente afetarão a produção de alimentos, a estrutura agrária e a renda, principal-mente de pequenos e médios produtores do Sul e Sudeste. Até que ponto vale pagar esse pesado preço social e econômico, uma vez que os hábitos de consumo da população podem ter maior im-pacto na biodiversidade? Até que ponto proibir os agricultores de produzir em suas áreas mais fér-teis, recuperando matas legalmente eliminadas, vai melhorar a biodiversidade do planeta? Perguntas para as quais não há resposta correta no momento. Mas há, sim, indicativos de que o impacto seria pequeno, se houver. Muito mais importantes seriam as mudanças nas cidades e no consumo, como mostra o estudo. Passou da hora de se buscar diagnósticos melhores e, assim, desenvolver ferramentas adequadas para garantir a sustentabilidade da vida. Palpites e ideologias não podem gerar e nutrir leis que preju-diquem nossa renda, nossa economia, nossa sociedade. Alguém poderia, com segurança, apontar quantas e quais espécies foram extintas no Sul e Sudeste do Brasil em função da ocupação dos espaços pela agricultura? Mais importante no momento é saber como será afetado o equilíbrio es-

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tabelecido nestas áreas nos últimos séculos, com a reimplantação de florestas. Ou seja, qual o real benefício desse enorme sacrifício? Nova intervenção em áreas consolidadas não poderia gerar novos problemas? É fundamental lembrar que a recomposição florestal, além de cara, exige o uso de insumos modernos como fertilizantes e defensivos. O desenvolvimento agrícola, utilizando técnicas adequadas em áreas já em uso, pode contribuir mais para manter a biodiversidade, uma vez que os alimentos, matérias primas e agroenergia terão que ser produzidos em áreas já desmatadas ou não. O melhor caminho é o aumento na produtividade com tecnologia, usando mais adequadamente as áreas agrí-colas já consolidadas.

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DE QUEM É O AMBIENTE?Por Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

É definida na Constituição Federal a função social da terra, que é cumprida quando os seguintes req-uisitos são atendidos: a) aproveitamento racional e adequado; b) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; c) observância das disposições que regulam as relações de trabalho e d) exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

A produção de matérias primas, alimentos e agroenergia, segundo técnicas agronômicas adequadas, cumpre a função social da terra, pois produz bens fundamentais à sociedade, respeita o ambiente e gera empregos e renda aos trabalhadores e agricultores. Isso vem ocorrendo, inclusive, em áreas des-matadas legalmente nos últimos séculos.

Com o que se propõe na nova legislação, essas áreas deverão ter a floresta recomposta. Segundo consta, os agricultores deverão arcar com o custo do reflorestamento. Consequentemente, não haverá mais produção de outros bens nessas áreas, postos de trabalho desaparecerão e a renda do agricultor diminuirá. Como fica então a função social da terra, uma vez que será diminuído em diversos graus o bem-estar dos proprietários e trabalhadores?

Atualmente, os bens produzidos nessas áreas são consumidos ou comercializados, gerando trabalho e renda. Quem paga pelos bens é a sociedade, os cidadãos que consomem alimentos, fibras e energia. Nada mais justo, pois são eles que usufruem. Se eu necessito de arroz, compro arroz, se necessito de carro, compro carro, se vou abastecer o carro com álcool, compro álcool. Assim funciona a sociedade e a economia. Os bens têm um valor, segundo sua disponibilidade e necessidade, ou segundo a oferta e a demanda.

Aí vem a questão: quem usufrui do ambiente? Ora, todos nós respiramos, sentimos frio, calor, depen-demos da biodiversidade para sustentar nossa vida no planeta Terra. Assim, como todos os cidadãos usufruem do ambiente, a sociedade usufrui dele. Do mesmo modo que o faz com outros bens.

Seria então correto dizer que o ambiente pertence à sociedade? Talvez. Mas, neste caso, quem cuida dele? Se precisarmos de um serviço, normalmente ele é contratado e pago, como tantos outros bens.

Agora vamos considerar que as áreas desmatadas nos últimos séculos, mesmo que legalmente, sejam reflorestadas, como indica a legislação proposta. Já vimos que a função social da terra nessas áreas

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será prejudicada. Mas, além disso, quem deveria arcar com os custos da recomposição? Se o ambi-ente é da sociedade, um bem público, quem deveria pagar por isso seria a sociedade, ou, no caso do Brasil, o governo. Uma vez recomposta a floresta, alguém deverá cuidar. No caso, os agricultores. Ou seja, os agricultores prestariam um serviço à sociedade, estariam fornecendo um bem a ser consumido por ela e, portanto, deveriam receber por isso. Se a sociedade arcar com os custos da recomposição florestal das áreas legalmente desmatadas, a justiça será cumprida, assim como a Constituição Federal. Sim, porque o trabalho e a renda - gerada atualmente por outros bens -, serão mantidos com os recursos advindos dos serviços prestados pelos agricultores ao plantar e cuidar das florestas, os famosos serviços ambientais. Basta que a remunera-ção dos cuidadores seja equivalente àquela que se obteria, por exemplo, ao valor do arrendamento na região.

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O CANARINHO VOLTOUPor Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Dizem que a gente deixa a roça, mas a roça não deixa a gente. Nasci e passei minha primeira infância no sítio. A casa ficava perto de um pasto e tinha um belo pomar na porta da cozinha, muito comum na época. Logo de manhã, uma das diversões era espantar os canários da terra que alegravam a paisa-gem com seu canto. Outro passatempo era caçá-los (naquele tempo não era crime, nem politicamente incorreto) para que, na gaiola, cantassem por mais tempo e mais perto. Bons tempos.

Fui crescendoe, já na cidade, estudando. Mas as tardes ainda eram passadas no sítio. Depois, a agronomia, os novos amigos, a nova vida e os novos horizontes. Novas técnicas aprendidas e em-pregadas. A agricultura mundial e a brasileira se modificavam a uma velocidade incrível. Novas espé-cies cultivadas, como a soja, invadiam os campos paulistas. O café e o algodão se deslocavam para o Paraná. Novas máquinas eram desenvolvidas, gente deixando o campo, cidades inchando. E a ag-ricultura crescendo, produzindo alimentos cada vez mais baratos, mais acessíveis à população. O uso de sementes melhoradas aumentava, a calagem deu grande impulso às produtividades, os fertilizantes contribuíram muito para que tudo acontecesse.

Com o desenvolvimento acelerado, com o aumento das lavouras, com o uso de cultivares mais uni-formes e mais produtivos, também foi acentuado o problema com pragas e doenças das culturas. Novas tecnologias e novos defensivos eram desenvolvidos e utilizados. E eu crescendo, estudando, aprendendo, trabalhando e ainda visitando o sítio. Mas começava aperceber algo muito triste. Estava desaparecendo uma das boas memórias de minha infância: os canários da terra estavam sumindo. Desaparecendo mesmo. Também me afastei um pouco do sítio, por imposições da vida. Por um bom tempo.

Terminava então uma era na agricultura. Foi descoberto que os defensivos utilizados à época, se via-bilizavam a produção de alimentos e matéria prima cada vez mais baratas,também agrediam os rios, as matas e a fauna. A situação não era sustentável. A sociedade cobrou, a indústria mudou seu rumo e assim também foi com os produtores rurais. Começava então uma nova era na agricultura. Novas exigências, novos produtos, novas técnicas. O manejo integrado de pragas, racional e econômico, se tornou realidade.Aprendemos a usar o cerrado, antes pária da natureza. Reaprendemos a produzir lavouras, carne e leite nas mesmas áreas, com a Integração Lavoura Pecuária. Aprendemos a fazer semeadura direta, mitigando a emissão de gases de efeito estufa. Desenvolvemos agrocombustíveis, como o etanol e o biodiesel, melhorando nossa matriz energética. E nossa agricultura cada vez mais

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competitiva, gerando empregos, divisas, alimentos, matérias primas, energia e sustentando esse país. Suportando o crescimento de nossas cidades. E, agora, também preservando a natureza.

Quis o destino que eu, agora, depois de quase uma vida vivida, depois de ter aprendido muito mais que ensinado, passasse mais tempo no sítio, novamente. Com um pouco de tempo para contemplação do pasto, do pomar e, surpresa, dos canarinhos da terra! O canarinho voltou. Canta novamente no pasto, no pomar. E nossa agricultura cada vez mais produtiva, sustentando esse país.

Feliz de quem pode assistir, depois de sua quase extinção, o retorno dos canários. Feliz de quem pode perceber a evolução de nosso conhecimento resultando no uso racional de produtos menos agressivos à natureza, no desenvolvimento de técnicas para uma agricultura competitiva, econômica e sustentável em favor da vida. Bons tempos!

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GESTÃO TERRITORIAL ESTRATÉGICA PARA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

Por Claudio A. Spadotto, diretor do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Gerente Geral da Embrapa Gestão Territorial.

Logo após a Eco 92, Conferência Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Embrapa, no contexto do replanejamento do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária – SNPA, iniciou a mo-bilização que culminou, de maneira pioneira no Brasil, na criação em 1993 do Programa “Qualidade Ambiental”, de abrangência nacional e voltado a incentivar, reunir e agregar os projetos de pesquisa e desenvolvimento na interface agricultura e meio ambiente. Como resultado sinérgico, no mesmo ano, foi também reestruturada a unidade chamada, desde então, de Embrapa Meio Ambiente.

No início do documento orientador do Programa Qualidade Ambiental, elaborado com a colaboração de muitos e publicado pela Embrapa em 1995, consta que “além do atributo de produtividade, a esta-bilidade no tempo, assim como a equidade social na distribuição dos custos e benefícios, devem ser considerados na avaliação dos processos de desenvolvimento agrícola”. E continuava “o desafio da agricultura sustentável nas condições brasileiras é o de conciliar o aumento da produção agrícola e a manutenção da qualidade ambiental”.

Como pode ser notado, naquela época o desafio era incorporar o conceito de sustentabilidade, já mencionando sua dimensão temporal e considerando seus pilares econômico, social e ecológico. Hoje, o conceito de sustentabilidade é amplamente aceito, apesar de algumas distorções no seu en-tendimento.

Esse ano, com a Rio+20, Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, outra contribuição a ser dada é a inclusão da dimensão espacial na conceituação de sustentabilidade e na sua aplicação, especialmente na agricultura, entendida aqui como compreendendo as atividades de produção agrícola, pecuária e florestal.

A agricultura é difusa no espaço geográfico e, portanto, não considerar sua distribuição e sua dinâmica pode comprometer sua sustentabilidade. E, diante da dinâmica da agricultura, que é tanto temporal como espacial, a gestão territorial se impõe como instrumento de planejamento, implantação e acom-panhamento das políticas públicas e de setores privados do agronegócio.

O território rural vive grandes mudanças no uso das terras devido a processos de expansão, intensifica-

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ção, diversificação e substituição. As ações regulatórias e normativas, assim como o desenvolvimento de outras atividades, como de infraestrutura e urbanização, também transformam os territórios rurais e afetam a competitividade e a sustentabilidade da agricultura e da agroindústria.

Com a integração econômica, seja em nível regional ou global, situações locais são afetadas pelas complexas dinâmicas em que estão inseridas e são mais bem compreendidas se abordadas num quadro mais abrangente. Para a gestão territorial ser estratégica, é necessário enxergar no longo prazo (dimensão temporal) e além dos limites geográficos e setoriais da agricultura (dimensão espacial e re-lações com outros setores). Assim, é requerida uma abordagem que considere os efeitos intrínsecos e extrínsecos da agricultura e da agroindústria, assim como os efeitos externos, causados por outras atividades, que a atingem e a modificam. Nesse contexto, a sustentabilidade pode ser almejada se forem levados em conta a economia, a sociedade e o meio ambiente.

O conceito de gestão territorial vem do reconhecimento das limitações do planejamento meramente técnico, enquanto instrumento efetivo de ordenamento do território. A gestão do território, além do meio físico e dos recursos naturais, inclui os aspectos sociais, econômicos e políticos da tomada de decisão, necessários para direcionar, no tempo e no espaço, várias finalidades, decisões e ações.

Assim, para a efetiva gestão territorial, busca-se tornar o conhecimento do território mais acessível aos gestores para possibilitar-lhes visões estratégicas. A partir de levantamentos extensivos de dados e informações em diferentes escalas, o espaço geográfico passa a ser a unidade integradora e o uso de geotecnologias, convertidas em ferramentas de sistematização de informações e conhecimento, auxilia e aumenta a eficiência da gestão territorial.

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A 150 KM POR HORAPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Aparentemente, as duas grandes discussões da Rio+20 tendem a ser: mudança climática e economia verde. Isso faz repensar o modo de se fazer (bem) as coisas, colocando as pessoas e o planeta em foco, o que, talvez, signifique rever a ideologia e a arquitetura do crescimento, principalmente nos as-pectos em que o PIB é alimentado pelo desperdício.

Na época da ECO 92, por exemplo, a frota mundial de veículos era de 613 milhões e hoje ultrapassa 1 bilhão. No Brasil, era de 13 milhões e quase triplicou em 20 anos, chegando a 35 milhões de veículos. Enquanto isso, a emissão de CO2 no mundo não parou crescer, estabilizou em 2010 (atribuída, princi-palmente, à crise mundial) e hoje atinge o patamar de 30,6 gigatoneladas.

No mesmo período, a população mundial saiu de 5 para 7,5 bilhões de pessoas, e só no Brasil avan-çou de 146 para 200 milhões. Uma imensidão de seres para alimentar – desafio que vem sendo en-frentado, em nosso país, com uma busca pela sustentabilidade da produção de alimentos e energia verde.

De 1992 a 2012, por exemplo, a produtividade média brasileira por unidade de área aumentou 72% no cultivo de milho, 48% na soja, 44% no arroz e 64% no trigo. O consumo de diesel no campo recuou 66%, com uma economia de 1,34 bilhão de litros por safra, evitando-se a emissão de 3,59 bilhões de kg de CO2. Em 1992, com 1 litro de diesel produzia-se 25 kg de milho, soja ou trigo; em 2012, com o mesmo combustível, estão produzindo de 105 a 175 kg desses grãos¹.

Com a explosão da ciência e tecnologia, sobretudo no último século, nossa capacidade de extrair do planeta multiplicou-se. Usamos o que bem se entendeu dos recursos planetários e construímos um modelo de sociedade de consumo no qual um brasileiro pobre talvez tenha mais impacto do que D. João VI sobre o ambiente – e o mesmo talvez aconteça com um pobre da Rússia atual, em relação aos czares.

Se os riscos ambientais são crescentes, ou fazemos algo revolucionário agora ou esperamos um cenário (no momento improvável) de estabilização da população e do consumo de matérias-primas e energia. Tudo isso, com um fator político imponderável: explicar para os mais de 5 bilhões de pobres ou emergentes que o mundo pede “pé no freio” no modelo atual.

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Para a grande maioria deles, isso soa como cantilena, pois buscam isonomia de consumo e de bem-estar. Não querem saber de se excluir do sonho consumista, enquanto cerca de 1 bilhão de consumi-dores -- nos países desenvolvidos – absorvem mais de 50% do que o planeta nos proporciona.

Muitos perguntarão: mas por que investir em economia verde é melhor? Provavelmente, não há ainda uma resposta econométrica taxativa e absoluta para essa pergunta. Mas uma das razões plausíveis está no fato de que podemos estar esbarrando nos limites do planeta.

Há um tempo, falava-se que um aquecimento global de 2 graus era o limite que o homem conseguiria administrar, mesmo assim investindo 1% do PIB mundial em medidas reparadoras. Hoje, segundo aler-tas feitos durante o IX Diálogos Sustentáveis², já apresentamos um aquecimento global de 3 graus, na janela de duas décadas.

Nossa consciência cidadã e o instinto de espécie podem estar se perguntando, secretamente: vai mesmo acontecer? A partir de quando não vai dar mais? Quanto vai custar evitar isso? Qual o princi-pal problema: a mudança climática, o ataque à biodiversidade ou os bilhões de pessoas para tirar da pobreza?

Nossas gerações – dos baby boomers à geração y – nunca imaginaram que veriam isso acontecer, ou que estariam frente a frente com esse dilema. É como entrar a 150 km por hora em uma curva sinalizada com placa para 100 km/hora. Acho que devemos chegar na Rio+20 pelo menos com essa consciência, para então discutir o futuro da nave Terra.

(1) Dados consolidados pelo eng. agrônomo Dirceu Gassen, gerente técnico da Cooplantio e membro do CCAS -- Conselho Científico para Agricultura Sustentável.(2) IX Diálogos Sustentáveis – O Pensamento Econômico e os Limites dos Processos Naturais. Encontro preparatório à Rio + 20, organizado pelo Funbio, institutos Arapyaú, Vitae Civilis e Climate Works. Abril de 2012.

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A EVOLUÇÃO DA AGRICULTURA BRASILEIRA E A RIO+20Por Dirceu N. Gassen, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo.

Em junho de 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro, recebeu o nome de ECO-92, e teve como objetivo conciliar o desenvolvimento econômico com a proteção do meio ambiente. Esse evento foi o marco que consa-grou o conceito de desenvolvimento sustentável, contribuindo para a mais ampla conscientização nas questões ambientais e sociais da humanidade.

A Agenda 21 foi o principal documento gerado na conferência e determinou a impor-tância de todos os países a se comprometerem e refletirem sobre as questões socio-ambientais. O capítulo 29 da agen-da destaca as questões relacionadas à agricultura, com ênfase no desenvolvimento rural sustentável.

Neste mês de junho de 2012, acontecerá o evento Rio+20 e cabe uma análise da evolução e das mu-danças que ocorreram na agricultura brasileira nesses 20 anos. Em 1992, a área sob plantio direto foi estimada em 1,3 milhões de hectares no Brasil, ocupando aproximadamente 4% da área de lavouras. Em 2012, essa área é estimada em 32 milhões de hectares, ou seja, 75% da área de lavouras.

Nesses 20 anos, as produções de grãos por unidade de área (hectare) aumentaram 44% em arroz, 72% em milho, 48% em soja e 64% em trigo. A redução no consumo de combustíveis com a adoção do plantio direto é estimada em 66%, o que equivale a reduzir 42 litros de diesel por hectare todo o ano. Com base em 32 milhões de hecta-res, o agricultor deixou de consumir 1,34 bilhões de litros de diesel na produção de grãos para cada safra. Com isso, deixa de emitir 3,59 bilhões de kg de CO2.

No início da década de 1990, o consumo de 1 litro de diesel produzia aproximada-mente 25 kg de arroz, milho, soja ou trigo. Vinte anos depois, se produz entre 105 e 175 kg desses grãos, com o mesmo consumo de combustível. A soja, por exemplo, consumia 68,3 ml de diesel para produzir 1 kg de grãos. Hoje, o consumo é de 8,8 ml de diesel para a mesma produção.

Da mesma forma, a eficiência no uso de água pode ser demonstrada com o aumento na retenção da mesma no solo e na eficiência da irrigação. Em arroz, por exemplo, o consumo de água para produção de 1 kg de grãos baixou de 3.900 para 1.304 litros, em 20 anos. É importante destacar, ainda, que a planta consome aproximadamente mil litros de água para a produção de 1 kg de grãos. Nesse con-texto, o agricultor é o gestor da eficiência no uso dessa água, produzindo alimentos para o consumo urba-no.

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A atividade biológica é difícil de ser quantificada, mas é evidente com a retomada de fauna nativa em todos os ambientes de agricultura. A adoção de boas práticas agríco-las, como o plantio direto e a não queima de palha, combinada com a consciência de preservar recursos naturais, resultou na retomada de cadeias tróficas mais equilibra-das.

O evento Rio+20 é o momento de colocar na balança os efeitos da soma de todos os processos de eficiência adotados no uso de recursos naturais, que levam o agricultor brasileiro e todos os setores envolvidos com a produção de alimentos a assumirem, com orgulho, os resultados da evolução da agricultura nesses 20 anos.

O plantio direto é o fator que mais influenciou o impacto ambiental positivo nesse período. Os agricul-tores, com o apoio da pesquisa, da genética, da indústria de in-sumos e de todos os segmentos que abrangem a produção de lavouras, determinaram as mudanças necessárias para o benefício de toda a sociedade.

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SEGURANÇA ALIMENTAR E AMBIENTAL NA PRODUÇÃO AGRÍCOLAPor José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e

Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

O conhecimento tecnológico é um dos principais instrumentos disponíveis para que o agronegócio possa enfrentar os desafios atuais. A tendência é de crescente preocupação com o desenvolvim-ento de tecnologias que respeitem a sustentabilidade dos sistemas produtivos, abrangendo aspectos econômicos, sociais e ambientais. Entre as especialidades do agronegócio brasileiro está a produção de citros. O Brasil produz a metade do suco de laranja do planeta cujas exportações trazem de US$ 1,5 bilhão a US$ 2,5 bilhões por ano ao país.

A produção citrícola é uma das mais intensivas na utilização de defensivos agrícolas. Estima-se que 40% dos custos de produção estejam relacionados ao controle químico das pragas e do¬enças dos citros.

Os principais mercados de destino dos produtos citrícolas, Europa e Estados Unidos, possuem ex-igências específicas quanto à presença de contaminantes e “pesticidas” nos produtos importados. Para esses mercados, a lista de defensivos aceitos difere em relação à do Brasil em vários produtos na produção citrícola. Este é o caso do carbendazim, que tem seu uso aprovadoem diversasculturas, incluindo citros, no Brasil e em muitos países.Nos Estados Unidos, entretanto, aAgência de Proteção Ambiental(EPA)não aprovou o uso de carbendazim nos cultivos de laranja, nem estabeleceuum limite aceitáveldesse ingrediente ativoem suco de laranja.Assim, de acordo com a Lei Federal de Alimentos, Medicamentos e Cosméticos, o carbendazim em suco de laranja, em níveis acima do permitido pelas autoridades norte-americanas (≥10 ppb), constitui umresíduo químicoilegal. Por representar um risco comercial, apesar de ter o uso aprovado no Brasil, o carbendazim e o tiofanato-metílico, substância que se converte em carbendazim no interior dos tecidos vegetais, não fazem mais parte da recomendação para o manejo de doenças nos pomares brasileiros. Estes ingredientes ativos, usados principalmente para o manejo de pinta preta e podridão floral, deverão ser substituídos por outros produtos, como aqueles à base de cobre e de estrobilurinas.

A substituição de produtos é comum em todas as culturas e normalmente representa o uso de comp-ostos mais eficientes e mais seguros à saúde humana e ao ambiente. Nos últimos 10 anos a indústria química fez gran¬de progresso em relação aos avanços tecnológicos dos produtos, destacando-se o modo de ação, novos tipos de formulação, redução da quantidade de ingrediente ativo e do número de aplicações. Além disto, hou¬ve grande evolução quanto à seletividade, toxicologia e impacto am-biental.

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Além do desenvolvimento de compostos mais eficientes, parte do melhoramento das moléculas existe para atender às demandas legais que estão em contínuo aperfeiçoamento.

Contando com uma ampla base legal, a legislação brasileira, no que se refere aos agrotóxicos, é recon-hecida como uma das mais rigorosas do mundo. A lei brasileira 7.802/1989, conhecida como “Lei dos Agrotóxicos”, juntamente com seu Decreto regulamentador nº 4074/2002, disciplinama pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercial-ização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagem, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e estabelecem as responsabilidades para cada um dos integrantes da cadeia agrícola, sejam eles o agricultor, o distribuidor, representado pelas cooperativas e revendas, a indústria ou o Poder Público.

A avaliação dos pleitos de registro é realizada concomitantemente pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e pelo Institu-to Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA). A ANVISA reali¬za a avaliação de potencial tóxico à saúde humana, definindo uma classificação toxicológica, que é encaminhada ao MAPA através do Informe de Avaliação Toxi¬cológica (IAT). O IBAMA, por sua vez, faz a avaliação do impacto em diferentes compartimentos ambientais, estabelece uma classificação e encaminha o resultado de sua Avaliação do Potencial de Periculosidade Ambiental (APPA) ao MAPA. Este, além de avaliar a eficiência e praticabilidade agronômica dos produtos, é o órgão que concede o registro federal.

Uma vez concedido o registro, a validade é indefinida. Por essa razão, a Lei de Agrotó¬xicos determina que cabe aos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Saúde e do Meio Ambiente, den-tro de suas respectivas áreas de competência, realizar a reavaliação do registro de agrotóxicos, seus componentes e afins quando surgirem indícios da ocor¬rência de riscos que desaconselhem o uso de produtos registrados ou quando o país for alertado nesse sentido por organizações internacionais responsáveis pela saú¬de, alimentação ou meio ambiente, das quais o Brasil seja membro integrante ou signatário de acordos.

Após o registro federal, para que o produto este¬ja apto para comerciali¬zação, é feito o Cadastro Es-tadual através do órgão competente em cada estado. Os muni¬cípios ficam incumbidos da legislação supletiva sobre o uso e armazenamento desses produtos. O processo de registro garante, portanto, a segurança alimentar e ambiental avaliando as propriedades intrínsecas aos agrotóxicos, exaustivamente estudadas e reportadas. O estudo de tais propriedades é de extrema importância, uma vez que determinam não só a identidade do ingrediente ativo, mas tam-bém seu destino ambiental e a reposta biológica de diferentes organismos.

O uso correto e seguro dos defensivos agrícolas, porém, envolve uma variedade de práticas, desde a aquisição do produto até o contato efetivo do in-grediente ativo com seu alvo. O sucesso do manejo se baseia essencialmente em três premissas: bom produto, bem aplicado e no momento certo. As aplicações seguras, eficazes e econômicas são, hoje, grandes desafios para setor.

Embora ainda haja muito por fazer, é grande o esforço dos diferentes atores da cadeia agrícola para atender as demandas do mercado, priorizar os interesses do consumidor e, ao mesmo tempo, manter a competitividade da produção agrícola, em especial a da citricultura brasi¬leira, em foco.

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FUNDAÇÃO AGRISUS COMPELTA 11 ANOS DE APOIO A AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

Por Antonio Roque Dechen, membro do Conselho Cientifico para Agricultura Sustentável (CCAS), Engenheiro Agrônomo, Vice-Reitor Executivo de Administação da USP e Professor da ESALQ,e Presidente da Fundação Agrisus.

Única Fundação sem fins lucrativos e com recursos exclusivamente privados em sua área de atuação, a Agrisus (www.agrisus.org.br), que iniciou as atividades em 24/04/2001, tem cumprido sua missão de estimular a capacitação e o aperfeiçoamento profissional, bem como incentivar a pesquisa agronômica e a extensão rural, com a finalidade de gerar, desenvolver e difundir tecnologias destinadas a otimizar a fertilidade da terra de forma sustentável e favorável ao meio ambiente.

Nesses 11 anos, a entidade apoiou o treinamento de pesquisadores e estudantes, concedendo grande número de bolsas, bem como a realização de encontros técnicos, congressos, dias de campo e a participação de profissionais nesses eventos. Sua dotação orçamentária para 2012 é de R$1 milhão.

Fundada por iniciativa do engenheiro agrônomo Fernando Penteado Cardoso (ESALQ/USP, formado em 1936), a entidade surgiu como continuidade natural de uma bem-sucedida carreira profissional nos segmentos de fertilizantes e de pecuária de corte. Cardoso, entre muitas atividades, foi fundador do Grupo Manah, seu diretor e presidente de 1947 a 2000, quando o controle da empresa foi vendido. A família então decidiu empenhar uma parte de seus recursospara criar a Fundação.

“Tive a honra de participar de todo o processo de implantação da Fundação Agrisus, desde os enten-dimentos iniciais para a implantação no início do ano 2000, articular o relacionamento com a Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiróz (FEALQ), participar da diretoria da Agrisus desde o início e hoje ser o seu presidente”, conta Antonio Roque Dechen, professor titular da ESALQ, vice-reitor executivo da USP e membro do Conselho Cientifico para Agricultura Sustentável (CCAS), que encabeça a diretoria eleita em outubrode 2010, juntamente com o novo Conselho Curador.

Para marcar o aniversário, foi lançada em março a segunda edição do Catálogo de Projetos, com o resumo das 95 pesquisas apoiadas pela entidade, que já foram concluídas, abrangendo o período de 2002 a 2011. Pode ser consultado no site por ordem alfabética, sequencia de datas, palavras-chave, autor ou instituição. Traz também eventos realizados com financiamento da Fundação e participações individuais. A primeira edição do trabalho foi apresentada em junho de 2010.

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JULHO

ESQUENTA OU NÃO ESQUENTA? E O QUE A AGRICULTURA TEM COM ISSO?

TODOS OS OVOS NUMA CESTA SÓ

QUANDO O CARNAVAL CHEGAR

SEGURANÇA NUTRICIONAL: A LIÇÃO COMPLETA

SEGURANÇA DOS ALIMENTOS

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ESQUENTA OU NÃO ESQUENTA? E O QUE A AGRICULTURA TEM COM ISSO?

Por Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Nos últimos meses tem se acirrado o debate sobre o aquecimento da atmosfera. Recentemente, James Lovelock, um dos principais cientistas a elaborarem a teoria de que a emissão de gases para a atmosfera resultaria em aquecimento global revisou suas previsões iniciais, concluindo agora que o aquecimento não está acontecendo na intensidade inicialmente prevista. Um grupo de cientistas sem-pre argumentou que estávamos em um ciclo de aquecimento e agora estaríamos entrando em um ciclo de esfriamento, dependentes do sol. Por outro lado, “aquecimentistas” demonstram, utilizando com-plexos modelos matemáticos, que o ambiente se aquece como conseqüência da emissão de gases de efeito estufa como o gás carbônico, óxido nitroso e metano.O que a Agricultura tem com isso?

Há estimativas de que a agricultura mundial seria responsável por 14% do total de emissões antrop-ogênicas globais de gases de efeito estufa. No Brasil, embora não exista uma base de dados consis-tente, estima-se que a agropecuária responderia por 75% do gás carbônico e 90% da emissão anual de metano e óxido nitroso. Isso vai do preparo do canteiro de alface até o desmatamento (que nem sempre é devido à agropecuária), passa pelo uso de corretivos e fertilizantes, pela produção de arroz ir-rigado e outros alimentos e chega ao arroto/flatulência do boi. Aliás, já se publicou que a flatulência dos dinossauros teria causado aquecimento global maior que o atual, isso, a mais ou menos 150 milhões de anos. Triste sina, morrer no calor da própria flatulência...

A boa notícia é que a pesquisa agrícola brasileira tem feito a lição de casa. Há mais de 30 anos estu-damos e desenvolvemos técnicas de semeadura e plantio diretos; há mais de 10 anos estamos apre-ndendo e aperfeiçoando as técnicas de cultivo de alimentos e matérias primas junto à criação de gado e mesmo integração da agricultura com florestas. Mais que aceitar essa tecnologia, os agricultores têm se adiantando no seu desenvolvimento, investindo seu próprio capital. Daí o aparecimento de termos como “Boi verde”, “Integração Lavoura Pecuária Floresta”, “Agricultura de Baixo Carbono” e outras. O próprio governo brasileiro se comprometeu com organismos internacionais a diminuir as emissões da agropecuária, e lançou o programa ABC – Agricultura de Baixo Carbono, uma linha de financiamento especial. As boas técnicas agrícolas podem sim colaborar para diminuir a taxa de emissão de gases de efeito estufa. Mas, seria esse o principal objetivo de uma Agricultura Sustentável?

A agricultura tem como função a produção de alimento, matérias primas e energia. Os agricultores já descobriram, por exemplo, que a erosão tolhe seu patrimônio, que a falta de água o empobrece. As-sim, existe a consciência de que a produção e a conservação dos recursos naturais se confundem,

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ninguém no campo quer outra coisa. Daí a necessidade de uma Agricultura Sustentável, que é muito maior que a simples mitigação do efeito estufa. Uma Agricultura Sustentável implica em conservação dos recursos, melhoria do solo, perdas mínimas de nutrientes, alta produtividade e, portanto, uso de tecnologia que permita sua existência infinita. Ora, se durante o processo evitarmos a emissão de car-bono, óxido nitroso e metano, melhor. Então, não importa se o ambiente esquente ou esfrie, precisa-mos de uma agricultura cada vez mais eficiente e sustentável. Isso depende de gente, de ciência, de gestão e, principalmente, de vontade política.

Julho/2012

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TODOS OS OVOS NUMA CESTA SÓPor Claudio A. Spadotto, diretor do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Gerente Geral da Embrapa

Gestão Territorial.

Diz a sabedoria popular que não se deve colocar todos os ovos numa cesta só, devido ao risco de to-dos se quebrarem. Isso parece não ser lembrado para alguns produtos da nossa agropecuária. Como exemplo, temos o próprio ovo de galinha, que tem mais de 70% da sua produção nas regiões sudeste e sul. Um quarto da produção ocorre em cerca de 80 dos 5.565 municípios brasileiros.

Essa concentração geográfica é também observada em outros produtos da nossa agricultura, como o arroz, com quase três quartos (73%) produzidos na região sul, sendo 25% produzidos em aproxi-madamente 30 municípios do Rio Grande do Sul. No caso do feijão, por volta de 90 municípios são responsáveis por uma quarta parte da produção, concentrada nos estados de Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Paraná, Mato Grosso e Bahia.

Entre os produtos voltados em grande parte à exportação, temos que 25% da soja são produzidos em cerca de 40 municípios localizados nos estados de Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul. Metade da soja brasileira é produzida na região centro-oeste. Para o algodão o dado é mais extremo: 25% da produção estão em apenas 10 municípios no oeste baiano.

Por casos como esses, temos que apenas 6% dos municípios brasileiros são responsáveis por cerca de metade da produção de grãos. Dentre esses, em torno de 80 municípios respondem por 25% dos grãos produzidos no país. Outros exemplos poderiam ser citados aqui.

Sabemos que a produção agropecuária depende das condições de solo e clima, da disponibilidade de água, das tecnologias empregadas, da qualificação da mão de obra, da infraestrutura, da oferta de insumos etc. Mas, nesses dias que muito se fala sobre sustentabilidade, não é arriscado para o Brasil, com sua dimensão territorial, produzir importantes produtos agropecuários em poucas regiões? Os riscos de quebra na produção e de problemas no armazenamento, no transporte e na distribuição não são muito grandes? O abastecimento do mercado interno está assegurado? E as exportações, tão importantes para a balança comercial do Brasil com outros países, não estão em situação de alto risco?

Julho/2012

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QUANDO O CARNAVAL CHEGARPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Em julho, o carnaval foi notícia nas lidas do marketing rural. O setor de proteção de cultivos da Basf anunciou o patrocínio da Escola de Samba Unidos da Vila Isabel, para o carnaval de 2013. Com o tema “A Vila canta o Brasil celeiro do mundo – água no feijão que chegou mais um”, a Escola mostrará no desfile a importância da agricultura brasileira, dando ênfase ao seu potencial para responder à cres-cente demanda mundial por alimentos e energia.

Agricultura no espetáculo da Sapucaí: informação, alegria, sensualidade e persuasão brotando da ave-nida -- e se o samba for bom e os deuses globais da audiência forem generosos, pode estar aí a trilha sonora do agronegócio em 2013, nas mentes e percepções urbanas.

Não é a primeira vez que uma marca privada – de produto ou corporativa – promove a valorização do campo ou seus mercados, obtendo reforço de goodwill junto a seus públicos.Nada mais justo e inteli-gente, já que os tempos são de volatilidade de valores.

No marketing urbano, o uso desse tipo de estratégia nos investimentos de marca é bem mais intensivo. No mercado rural, isso quase virou moda nas décadas dos anos 80 e 90, sendo inclusive fator que contribuiu bastante para o entendimento e legitimação social da profunda modernização ocorrida no campo, junto às camadas urbanas daquela época.

Uma das primeiras marcas a investir pesado nessa estratégia foi a Agroceres, com premiadas cam-panhas como “Fique de Olho no Milho” e “Administre, é assim que se ganha”. E a ela seguiram-se outros pesos pesados do setor de inputs para a agricultura, como Massey, Manah, Copas, Bamerindus e Bung – só para ficar entre os projetos de maior expressão.

Atualmente, o marketing rural bem que podia olhar com mais atenção essas estratégias sociais de marcas corporativas. Seja devido à alta volatilidade dos valores nos mercados, seja devido à grande segmentação da demanda, no dentro e pós-porteira. Afinal, fragmentação de mercados rima muito bem com consistência e unidade de percepção.

O exemplo está aí: não faz tanto tempo assim vimos marcantes projetos de comunicação do campo com a sociedade, assinados por banco, indústria de alimentos, agroquímica e cooperativa. A seu tem-po e a seu modo, eles aquecem os negócios das marcas anunciantes e blindam melhor o agronegócio

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perante as pressões da sociedade.

Mas comunicação forte tem que ser humanista no conceito e calar fundo no coração. A campanha America’sFarmFamilies, assinada pela Monsanto, invadiu o campo e as cidades norte-americanas, ex-plorando um ovo de Colombo: mostrou que a família rural e a família urbana são uma coisa só e, juntas, levam adiante a nação. Um banho de criação publicitária, de posicionamento emocional de marca e de marketing social do agronegócio.

Julho/2012

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SEGURANÇA NUTRICIONAL: A LIÇÃO COMPLETAPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Segundo a OMS – Organização Mundial da Saúde, anualmente mais de 200 milhões de crianças menores de 5 anos não atingem seu pleno potencial cognitivo e social, enfrentando níveis de desnu-trição (grave ou crônica) suficiente para retardar o crescimento e interferir no estímulo ao aprendizado.

Para uma sociedade, quando os efeitos da desnutrição infantil se manifestam (bem mais tarde), isso tende a representar baixa produtividade do capital humano, com menor capacidade de realizar trabalho físico e menor agilidade mental. Ou seja: alimentação adequada na infância significa uma economia mais dinâmica e com maior potencial gerador de riqueza, provavelmente com melhores profissionais e melhores salários.

No fundo, todo mundo sabe disso, pois os dados científicos e a mídia corroboram a cada diao sig-nificado cruel da insuficiência alimentar infantil, para os sonhos de bem estar das nações pobres e emergentes – e também para as metas de sustentabilidade e harmonização da economia global.

Em segurança alimentar, o Brasil vem fazendo a lição de casa. Reduziu o índice de menores de 5 anos com baixo peso para 1,8% (Estudo Saúde Brasil 2009, do Ministério da Saúde) e já atingiu um dos objetivos do milênio, definidos pela ONU -- Organização das Nações Unidas: erradicar a extrema pobreza e a fome.

Mas parece que falta ainda um engajamento emocional firme com a bandeira da segurança nutricional, tanto no Brasil como em outros quadrantes do mundo, seja por parte dos indivíduos, ou de governo, empresa, mídia e organizações da sociedade civil.

A base de uma boa nutrição começa por infraestrutura adequada e eficiência na produção e distri-buição de alimentos. Depois requer elasticidade de renda (o que envolve políticas de inclusão social) e também educação e qualidade de informação – para reduzir o impacto da alimentação errada e do desperdício.

O primeiro desafio nós cumprimos com louvor e sustentabilidade. Por exemplo: nos últimos 20 anos aumentamos de 45% a 70%produtividade do algodão, arroz, milho, soja e trigo – a ainda reduzimos em 66% o consumo de óleo diesel durante a safra. O Brasil também avançou na distribuição de renda,

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universalizou a oferta de alimentos, mas ainda ficou a dever na logística – o que onera a cadeia e o consumidor.

A segurança nutricional pode melhor expressar a contribuição do capital humano para o crescimento econômico sustentável. A chave está no equilíbrio entre infraestrutura, produção do campo, poder de compra e educação. Principalmente esta última, pois ela vai potencializar o homem, este sim o fator com maior poder real de alavancagem da sustentabilidade.

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SEGURANÇA DOS ALIMENTOSPor Décio Luiz Gazzoni, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo, pes-

quisador da Embrapa Soja.

As regras de comércio internacional são cada vez mais restritivas em relação à segurança dos ali-mentos. Considera-se um alimento seguro quando a presença de contaminantes físicos, químicos ou biológicos situa-se abaixo dos limites fixados em Lei. Um limite pode ser a ausência total, se assim de-terminar a legislação. O agronegócio brasileiro necessita adaptar-se com rapidez a este novo ambiente mercadológico, porque esta não é apenas uma exigência dos países importadores, ela também está presente no mercado doméstico.

Existem diversas ações destinadas a monitorar a segurança dos alimentos no Brasil. Em dezembro de 2011, a ANVISA divulgou o resultado das análises de resíduos de agrotóxicos, realizadas em 2.488 amostras de frutas e hortaliças, como parte do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). Foi verificado que 1,6% das amostras apresentavam limites de resíduos acima do permitido pelas normas brasileiras. Os resultados do PARA permitem reflexões sobre a segurança dos alimentos produzidos no Brasil.

Embora não sejam os únicos, três dos principais parâmetros da Ciência da Toxicologia envolvidos na temática de inocuidade química dos alimentos são: 1) Dose Letal 50(DL50) – dose que mata 50% das cobaias em testes científicos; 2) Limite máximo de resíduos (LMR) - quantidade máxima de agrotóxico legalmente aceita no alimento; 3) Ingestão Diária Aceitável (IDA) – quantidade máxima do agrotóxico que, ingerida diariamente, durante toda a vida, não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos científicos atuais. Portanto, uma amostra enquadra-se ou não nas disposições legais do país. Por opor-tuno, no caso do PARA, 1,6% das amostras ultrapassaram o LMR legalmente estabelecido no Brasil.

Parâmetros

Como se estabelece a IDA? Em testes científicos, doses crescentes são administradas a cobaias. Para os cálculos de segurança, considera-se a maior dose que não causou alterações metabólicas perceptíveis, nos organismos em teste. Estabelecida esta dose, ela é dividida pelo fator 100, ou seja, a IDA representa apenas 1% da dose que não causou qualquer problema de saúde em cobaias, nos ex-perimentos científicos. Normalmente a dose que não causou qualquer problema toxicológico equivale a 1-10% da dose que ocasionou alguma alteração. Logo, a IDA representa 0,1-0,01% da dose que poderia, eventualmente, ocasionar algum problema de ordem toxicológica. A lógica de dividir por 100 a dose que não causou qualquer problema objetiva garantir a proteção dos consumidores de alimentos

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de qualquer risco toxicológico.

Como se estabelece o LMR? É o valor máximo de resíduo de agrotóxico admitido legalmente em um alimento, considerando a aplicação adequada de uma substância química (seguindo todas as Boas Práticas Agronômicas), desde sua produção até o consumo. Levando em consideração a Ingestão Diária Aceitável (IDA), o LMR não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos atuais, mesmo se esta dose for ingerida diariamente, durante toda a vida.

Como exemplo ilustrativo, suponhamos um agrotóxico aplicado em maçã, que tenha uma DL50 de 500mg/kg de peso vivo (seja moderadamente tóxico, de acordo com a Portaria Nº 3 de 16/1/92 da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde), e que o limite máximo de resíduo (LMR) seja de 0,05 mg/kg de maçã. Para que houvesse 50% de probabilidade de intoxicação de uma população de peso médio de 70 kg, seria necessário ingerir 35.000 mg/pessoa (70kg x 500 mg/kg). Supondo que todas as maçãs tivessem o resíduo máximo de 0,05 mg/kg (50 ppb), cada pessoa, pesando 70kg, deverá consumir 700 toneladas de maçã (35.000 mg÷ 0,05 mg/kg). Se esta popu-lação ingerir apenas maçãs, à razão de 2 kg/pessoa/dia, seriam necessários quase 1.000 anos para atingir a dose que, teoricamente, poderia conferir 50% de probabilidade de esta pessoa ser afetada pelo agrotóxico. Lembrando que, após poucos dias, o organismo se encarrega de eliminar a quase totalidade deste resíduo.

Precisão das análises

O contínuo aprimoramento dos métodos de análise, e dos equipamentos de detecção de resíduos, já permite identificar substâncias químicas na ordem de uma parte por trilhão (1ppt). Fazendo uma analo-gia, 1ppt equivaleria a identificar a presença de uma determinada substância química, em que apenas uma gota dela fosse lançada em uma piscina cheia de água, tendo esta piscina dimensões de 100 m de comprimento por 100 m de largura e profundidade de 5 metros. O resíduo na maçã, do exemplo acima, seria de 50.000 ppt, o que equivaleria a detectar uma gota de uma substância dispersa em 1.000 litros de água.

Logo, quanto mais precisos forem os métodos de análise de resíduos de substâncias químicas, maior será a probabilidade de detecção de resíduos de substâncias químicas, o que imporá exigências cada vez maiores nas cadeias de produção de alimentos, em especial em um ambiente fortemente competi-tivo e com constantes recaídas protecionistas, como é o mercado internacional de produtos agrícolas.

Julho/2012

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AGOSTO

AGOSTO

O JECA INFORMATIZADO

OS GASES DO BOI: QUANTA BOBAGEM!

ONDE ATUAR PARA AUMENTAR A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA?

A ARTE DO ENCANTAMENTO

BRASIL, MAIOR PRODUTOR DE SOJA?

BENEFÍCIOS DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS PARA A SUSTENTABILIDADE DA AGRICULTURA

MANEJO DA FERRUGEM DA SOJA: CONTRUBUIÇÃO À SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO

SUSTENTABILIDADE: COBERTURA VERDE PARA REDUÇÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA

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O JECA INFORMATIZADOPor Ciro Antonio Rosolem, membro do ConselhoCientíficoparaAgriculturaSustentável (CCAS) e professor titular da Faculdade

de CiênciasAgrícolas da UniversidadeEstadualPaulista “Júlio de MesquitaFilho” (FCA/UnespBotucatu).

Decidi pela agronomia talvez por ter nascido e sido criado na zona rural e, pouco depois, numa cida-dezinha do interior do estado de São Paulo. Uma das grandes personalidades da região era o Agrôno-mo da Casa da Lavoura. Era autoridade convidada para casamentos, aniversários, inaugurações. Era importante, na década dos 60. Sonhava ser como êle. O engenheiro agrônomo era formado e atuava na transformação da agricultura brasileira, junto a uma população que se urbanizava, mas ainda era consciente das lides rurais, e admirava as conquistas agrícolas. As poucas faculdades formavam, prin-cipalmente, profissionais para a extensão rural, a nobreza da profissão e sonho dos jovens agrônomos.O Brasil crescia, se industrializava e, pouco a pouco, o rural foi perdendo o encanto, o charme e a importância no consciente coletivo urbano. A menina dos olhos passou a ser a indústria, uma vaga no Banco do Brasil ou o serviço público. Aos poucos o agrônomo da Casa da Lavoura não era mais convi-dado para inaugurações. Afinal, neste País, “em se plantando tudo dá” e, assim as lides do campo não tinham mais o charme. Pior, a poeira virou sujeira, tecnologia era coisa de cidade, de futuro. A profissão sentiu os efeitos da opção governamental pelo desenvolvimento industrial a qualquer custo.

Embora sem o charme anterior da profissão, as Faculdades de Agronomia se multiplicavam. Formavam profissionais que, sem encontrar o mesmo campo fértil na extensão rural oficial, encontravam guarida e trabalho em Cooperativas e indústrias, que passavam, de certo modo, a substituir a extensão chapa branca. Ao mesmo tempo, a princípio silenciosamente, era inaugurada a Embrapa, absorvendo e com-plementando a formação dos novos profissionais. As Universidades desenvolveram também esforços para a melhor formação de seus professores. Isso resultou num contingente de profissionais que, em alguns anos, seriam os agentes da nova revolução agrícola brasileira.

Quando se falava em agrônomo e agronomia, a primeira imagem ainda era a botina do Jeca e um canivete na cintura. Mas os botinas tornaram o cerrado produtivo, adaptaram a soja às regiões próxi-mas ao equador,e desenvolveram as técnicas de semeadura direta. Tornaram o Brasil autosuficiente na produção de alimentos e fibras. Desevolveram de modo espetacular o uso do álcool como com-bustível, no auge da crise do petróleo. Tornaram a vinhaça, séiro poluente, em fertilizante. Fizeram da agricultura uma das atividades mais competitivas do Brasil no exterior. Fizeram dos solos marginais dos trópicos o esteio da balança comercial deste País. Mas ainda eram botinas, difícil reconquistar o glam-our industrial-urbano. A tecnologia desenvolvida pela pesquisa encontrava dificuldades no caminho até o agricultor. Daí nasce outro tipo de agrônomo, o consultor, empresário autônomo, com desafios nem sequer sonhados pelos colegas de outrora. A profissão se sofistica junto com a agricultura, com

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novas demandas, exigências tributárias, trabalhistas, barreiras comerciais, econômicas e fitossanitárias. A agronomia não é mais plantar e colher. A botina, sozinha, não resolve mais. Nova revolução nos cur-rículos da Escolas de Agronomia. Mas ainda, nas cidades, novas carreiras, ditas tecnológicas, povoam os sonhos da juventude.

O sonho da ótima situação econômica e o sonho da realização pessoal. Qual seria mais importante? O que sei é que o Agrônomo, em geral, é um ser satisfeito, contente com sua profissão, de bem com suas conquistas, mas querendo mais, conscicentes que são da importância da agricultura na vida moderna. Em levantamentos a que tive acesso, menos de 5 % dos entrevistados mudariam sua forma-ção.Até mesmo sem o reconhecimento e charme de tempos passados. Misteriosa essa profisão. O que fazem? De tudo um pouco, pois a formação é muito ampla. Quando fazem? A qualquer dia e hora, plantas não usam relógio e as distâncias são grandes. Ainda usam botina? Bem poucos. São ricos? Nem tanto, mas são felizes. Afinal, o que importa na vida?

Global Positioning System (GPS), aplicativos, I-pod, Blackberry, agricultura de precisão, engenharia genética, hedge, mercado futuro, fundos de investimento, tratores sem tratorista... Meu Deus, que distância da botina e do canivete. Nesta época de comunicação instantânea, quando se pode, do campo, consultar bases de dados internacionais, o agrônomo ainda é indispensável, ao liderar ações de mundança, adaptação e avanços agrícolas. Armados não mais de botina e canivete, mas com um novo arsenal de técnicas e equipamentos. O perfil desse profissional exige que as Universidades se adaptem, se modifiquem, se modernizem sem perder o fulcro original: formar um profissional que não só atenda às exigências do mercado, mas também atue comoforça motora do desenvolvimento.

São bem conhecidos os termos “Maria chuteira” e “Maria breteira”. Recentemente ouvi de jovens co-legas que nas regiões de grande desenvolvimento agrícola começam a aparecer as “Marias creietes”, aquelas que buscam o Engenheiro Agrônomo (pois o CREA é quem regula a profissão). Seria a volta do charme? A volta do reconhecimento a esse profissional que tanto tem feito pelo Brasil?

Embora tenha sempre existido na agronomia a preocupação com a conservação dos recursos nat-urais, a pressão de ambientalistas que se reflete no consumo exige adaptações nas técnicas produ-tivas e aparecem ainda novos termos como rastreabilidade, boas práticas, etc. E o profissional que já era eclético nos tempos da botina precisa ser ainda mais completo, conhecendo um pouco do solo à estratosfera, da semente à cotação do dolar, dos direitos trabalhistas aos fundamentos do mercado futuro. Muito para um só homem, mesmo um jeca informatizado.

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OS GASES DO BOI: QUANTA BOBAGEM!Por Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

É uma conta relativamente simples: cada boi (que as vacas me perdoem o machismo, mas vou chamar todo mundo de boi mesmo) emite aproximadamente 57 kg de metano (CH4) por ano, em média. Esse valor vezes 200 milhões de cabeças, se chega a um número enorme, equivalente a 63 % do metano emitido no Brasil, ou 48 % dos gases de efeito estufa. Por essas contas, cada kilo de carne consumida equivaleria 300 kg de gás de efeito estufa emitidos. Assustador, não? Verdade? Não.

Dizem que para todo problema existe uma solução simples, rápida e errada. Esse é bem o caso. Em primeiro lugar se considera, nessa conta, que todos os 200 milhões de bois, vacas, bezerros, novilhas emitem a mesma quantidade de gás – primeira mentira – a emissão de gases depende da quantidade de alimento ingerida. Assim, se contarmos o rebanho de mamando a caducando, a conta fica já bem menor. Depois, de onde vem o carbono que o boi emite por flatulência e eructação (arroto: para os íntimos)? Vem do alimento consumido, normalmente do pasto, no Brasil. O carbono consumido como alimento é transformado principalmente em carne, leite e dejetos, que retornam ao chão, mais aquela parte que vai para a atmosfera. Então, para o boi crescer, para a vaca produzir leite, e também para emitir metano, é necessário que se alimente de carbono, ou seja, de capim. De onde vem o carbono do capim? Da atmosfera. Ou seja, o carbono ou metano, emitido pelo boi, é apenas uma devolução do que já estava na atmosfera. Mais simplesmente: o boi não fabrica carbono. Muda sua forma, o que muda um pouco o potencial de aquecimento global, mas não “aparece” carbono no sistema. E se o boi for confinado? Se for confinado, come o carbono do milho, da soja, etc., que também pegaram o carbono da atmosfera.

Bom, se o carbono vem do capim, como será que essa coisa funciona? Como será o balanço de car-bono do pasto?Na região dos cerrados, em diferentes sistemas de uso e manejo da terra, os maiores estoques de C estão relacionados com a presença de forrageiras, resultando na seguinte ordem de-crescente de estoques de C no solo: pastagem permanente > integração lavoura-pecuáriasob plantio direto > lavoura em semeadura direta> lavoura em cultivo convencional. As taxas de acúmulo de C nos solosdo cerrado variam de 0,8 a 2,8 t ha-1 ano-1, dependendo do manejo. Em regiões originalmente sob Mata Atlântica, a pastagem bem manejada fixa 2,7 t ha-1 ano-1 de carbono, em média, enquanto que na região Amazônica a média é de 300 kg ha-1 ano-1. Note-se que são pastagens sob pastejo, ou seja, com boi comendo. É bom lembrar que a pastagem degradada não faz nada disso, porque o capim cresce pouco e, portanto, fixa pouco carbono da atmosfera. Mas, mesmo assim, o boi comendo em pasto ruim só pode emitir o que comeu, ou seja, pode não haver ganho de carbono no solo, mas

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não pode haver emissão líquida, porque mágica não existe.

Agora, vamos retomar aquela conta do início, mas levando em conta que não existe boi sem comida, sem pasto.Contando as estimadas 200 milhões de cabeças de bovinos no Brasil - que ocupariam talvez 70 milhões de hectares de pastos bem manejados. Se considerarmos o sequestro de apenas 1 t ha-1 ano-1 de carbono, a pecuária estaria fixando no solo algo em torno de 70 milhões de toneladas de carbono, ou cerca de 90 milhões de toneladas de metano, equivalentes a aproximadamente 2,0 bilhões de toneladas de CO2, já descontados os gases emitidos. O bandido virou mocinho? Ou será que existem interesses não confessados em prejudicar o desenvolvimento de nossa pecuária?Como já se disse, uma estatística bem torturada revela qualquer coisa.

Resumindo, nossos pastos podem sim produzir proteína de boa qualidade, empregos e renda, ao mesmo tempo que mitigam a emissão de gases de efeito estufa. Basta, para isso, empregarmos o conhecimento que já temos.

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ONDE ATUAR PARA AUMENTAR A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA?Por Claudio A. Spadotto, diretor do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Gerente Geral da Embrapa

Gestão Territorial.

Sabemos da demanda por aumento da produção agrícola, sem incorporar novas áreas. Portanto, é necessário elevar a produtividade. Mas, onde atuar prioritariamente?

Numa primeira aproximação, se considerarmos a produção total agregada de grãos, temos que as maiores produtividades ocorrem em 8 microrregiões, sendo 3 no Mato Grosso e 1 em cada um dos estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Bahia, Paraná e Rio Grande do Sul. Cada microrregião tem cerca de 10 municípios.

Por outro lado, temos que 29 microrregiões têm grandes áreas de produção de grãos, não neces-sariamente em grandes propriedades, e apresentam baixa produtividade. Se elevarmos a produtividade desse grupo para o nível médio, o que significa mais que triplicá-la, teremos um aumento de 3,5% na produção total de grãos.

Se, por sua vez, atuarmos prioritariamente nas 62 microrregiões que também têm grandes áreas de produção de grãos (também não necessariamente em grandes propriedades), mas com média produ-tividade, elevando-a para alta, o que significa aumentá-la em 40-50%, teremos um acréscimo de 10% na produção total de grãos do país.

Os dados aqui rapidamente apresentados são agregados, mas já nos dão um esboço da importância do conhecimento da distribuição espacial da agricultura, base da gestão territorial. Esses cálculos pre-cisam e podem ser feitos e detalhados para cada produto agropecuário e, assim, teremos condições de estabelecer regiões prioritárias de atuação na busca do aumento da produtividade de cada uma delas.

A agricultura é difusa no espaço geográfico e devido à sua distribuição e sua dinâmica, tanto temporal como espacial, a gestão territorial se impõe como instrumento de planejamento, implantação e acom-panhamento das políticas públicas e de setores privados do agronegócio. Na agricultura, assim como em outros setores, a gestão territorial requer a capacidade de produzir e interpretar dados, geoestatísti-cas e mapeamentos, apresentados em estudos, relatórios e sistemas informatizados para o gerencia-mento, tendo o espaço geográfico como base e referência.

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A ARTE DO ENCANTAMENTOPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Outro dia, agora em agosto, estava em uma feira do agronegócio em São Paulo, a Agrinsumos/Induspec,e em meio à techno-arquitetura que caracteriza nossos grandes eventos promocionais do setor, deparei-me com uma troupede saltimbancos, em cativante e divertida performance interativa com executivos, por obra de uma empresa agroquímica.

Automaticamente veio-me à cabeça um imaginário cenário de ambiente competitivo dentro de um circo. Nele, o domador domina, mas não cativa. O trapezista impressiona, mas não compartilha. O mágico surpreende, porém não legitima seus truques. No entanto, o palhaço faz tudo isso com sua presença e atuação: ele diverte, informa, alegra, sonha, seduz, emociona, envolve e integra as pessoas.

Isso tudo para uma plateia multisegmentada, que vai da criança ao vovô, todos rindo e aplaudindo aquele homem vestido para emocionar e conquistar corações. Em certo sentido, marketing é isso. É conquistar o coração das pessoas e abrir caminho para a persuasão, construindo relações de confi-ança mais fortes, entre todos osstakeholders de umamarca.

Talvez os grandiosos eventos techno-comoditizados do agro estejam precisando um pouco da arte do encantamento, pois a cada dia eles absorvem uma fatia crescente das verbas publicitárias, um papel ampliado nos resultados e precisam compensar tudo isso com eficácia redobrada também.

Claro que não se trata de contratar saltimbancos ou artistas teatrais em massa. Longe disso. Estamos falando de colocar um pouco de surpresa, humor e emoção em nossos eventos, para ampliar a sua efetividade mercadológica através de um forte e diferenciado envolvimento de corações e mentes.No início dos anos 90, visitando uma edição do Farm Show, no meio-oeste norte-americano, testemun-hei um saboroso ataque concorrencial de uma empresa de sementes. No jardim de seu stand havia um túmulo, em cuja lápide estava inscrito o nome de um híbrido concorrente, acompanhado do indefectível “rest in peace” (descanse em paz).

De quando em quando, o túmulo recebia breves sessões de condolências aos familiares do falecido, enquanto uma plateia se aglomerava a cada sessão em frente ao stand, rindo, comentando o assunto e gerando um buzz por toda a feira.

Algumas quadras adiante, em outro stand de empresa sementeira, havia um túnel do tempo que dava

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acesso ao miolo da instalação. Fora produzido com design interno e imagens “padrão Hollywood” e mostrava uma viagem pela evolução do conhecimento genético – de Mendell à era da biotecnologia.Nesses dois exemplos, há um denominador comum: informação técnica ou de negócios, temperada com criatividade de marketing, emoção e humor. Faz 20 anos e nunca mais esqueci.

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BRASIL, MAIOR PRODUTOR DE SOJA?Por Décio Luiz Gazzoni, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo, pes-

quisador da Embrapa Soja.

Há dois meses, no VI Congresso Brasileiro de Soja (Cuiabá), tracei um cenário otimista, prevendo que, até 2015, o Brasil seria o maior produtor de soja do mundo. À época, a soja americana, plantada há cerca de 30 dias, media pouco mais de palmo de altura. Nada indicava que, como quase nunca antes na História daquele país, uma seca arrasaria o Meio Oeste americano, dizimando lavouras de milho e soja.

De acordo com o USDA, no início de agosto, quase 40% da soja americana estão em situação ruim ou muito ruim, devido à terrível seca que se alastra pelo país. O milho não fica para trás: quase metade da área plantada são lavouras consideradas ruins ou muito ruins.

No momento, não existem previsões oficiais de perda de safra. No dia 10 de agosto, o USDA divulgará sua mais nova estimativa da safra americana. Arrisco antecipar o anúncio: a safra de milho deve ser reduzida em cerca de 15% e a de soja em 10-12%. Com isto, a produção americana de milho perderia 50 milhões de toneladas, coincidentemente o volume anual que os EUA exportam de milho. Alguém precisará abastecer o mundo. Poderia ser o Brasil, se tivéssemos investido tanto em infraestrutura de transporte e armazenagem, quanto o fizemos em tecnologia e produção. Hoje a produção de milho cresce a cada ano, mas o custo de transporte das regiões de fronteira agrícola é tão alto que, apenas nos anos de crise (preço alto), compensa enviar o milho ao porto.

Já na soja, aventuro-me a dizer que a safra americana, pelas condições desta semana, e as previsões de continuidade da seca para os próximos dias, deve se situar abaixo de 80 milhões de toneladas. Perscruto os sites de previsão de clima de longo prazo, e a melhor aposta de momento é o retorno do El Niño para o próximo verão brasileiro, garantindo chuva farta para as regiões produtoras de grãos. Examino as análises de intenção de plantio, e vejo valores variando entre 27 e 28 milhões de hectares. Com média de 27,5 Mha, e produtividade de 3.150 kg/ha, chegaríamos a 86 milhões de toneladas de soja. Se Deus ajudar o produtor, seremos o maior produtor mundial de soja, como nunca antes na História deste país! E, para ajudar, com o maior preço da História recente da soja e do milho.

Este fato é bom para o ego nacional, pois andávamos sorumbáticos com o pibinho, a marolinha e outras mazelas que nos afligem. O agricultor está fazendo sua parte, que é produzir bem e com sus-tentabilidade. Mas, este fato não obnubila a nossa responsabilidade com o mundo: produzir sempre mais e melhor.

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Mas, não basta produzir: é preciso colocar o produto da colheita na mesa do consumidor. Portanto, o Governo precisa fazer a sua parte, investindo em uma infraestrutura de armazenamento e transportes que esteja à altura do país que mais produz soja no mundo. Se não puder faze-lo, deve criar condições para que a inciativa privada o faça. Isto inclui construir ferrovias, hidrovias, portos e armazéns que per-mitam levar insumos à lavoura e trazer a produção até os portos, de forma tranquila e a custos com-patíveis com nossos concorrentes. Isto também faz parte da sustentabilidade da soja brasileira.

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BENEFÍCIOS DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS PARA A SUSTENTABILIDADE DA AGRICULTURAPor José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e

Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

O agro é o setor onde o Brasil apresenta vantagem em relação aos outros países do mundo.Dispomos de recursos naturais, como solo, água e clima, que nos proporcionam esta situação. Estes recursos sempre estiveram disponíveis.A partir da década de 1970, entretanto, conseguimos utilizar, de maneira sustentável, tais recursos, através de procedimentos apropriados.As boas práticas agrícolas, desen-volvidas ou adaptadas por nossas instituições de ensino e pesquisa, passaram a ser incorporadas pelos nossos produtores rurais.

Com isto, conseguimos sair de uma situação de importadores de alimentos paraum pais citado pelas instituições internacionais como o principal provedor de alimentos para o mundo, nos próximos anos.O Brasil é visto como a fazenda do mundo.Podemos produzir alimentos para atender nossa população e exportarmos para atendermos a demanda internacional.Nos últimos 20 anos conseguimos quase tripli-car a produção de grãos com pequena expansão da área cultivada. A produtividade dobrou.Temos um estoque de terras agricultáveis suficiente para mantermos uma taxa de aumento da produção de 4-5 % ao ano. Tudo isto graças a incorporação de tecnologia nos processos de produção. Houve avanços na liberação de cultivares mais produtivos, adaptados as condições ambientes de diferentes regiões do Brasil.

Os corretivos e fertilizantes passaram a ser utilizados de maneira racional, assim como os defensivos agrícolas. Melhores máquinas e implementos agrícolas estão a disposição dos nossos agricultores. A ocupação de cerrado matogrossense, do oeste baiano e do MAPITO significaram uma revolução verde sem precedentes. Incorporamos sistemas de produção como o plantio direto, que reduziu dras-ticamente a erosão e aprimorou a conservação do solo agrícola. Na próxima safra deveremos ser o maior produtor mundial de soja.Conseguimos produzir alimentos, agroenergia e fibras, respeitando as florestas. Temos a maior área natural protegida do mundo. Estamos aprimorando nosso código florestal para proporcionarmos a segurança jurídica fundamental para que os nossos produtores rurais pos-sam cumprir sua função social.Há necessidade de superarmos, rapidamente, alguns gargalos como infraestrutura e logística. É necessário agregar valor a nossa produção, aprimorando o processamento de matérias primas de origem vegetal e animal.

O investimento em pesquisa e desenvolvimento agrícola deve continuar e se expandir, já que os ob-

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stáculos que teremos pela frente, nos próximos anos, exigirão, ainda mais, inovações tecnológicas.Defesa agropecuária, biotecnologia, agricultura de precisão e nanotecnologia são alguns exemplos de áreas estratégicas, fundamentais para que o Brasil atenda as expectativas do mundo: produzir alimen-tos, energia renovável e limpa e fibras de maneira sustentável.

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MANEJO DA FERRUGEM DA SOJA: CONTRUBUIÇÃO À SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO

Por José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

A ferrugem asiática da soja é uma doença infecciosa causada por um fungo, denominado Phakopsora-pachyrhzi, que pode causar danos e perdas de até 80%.

Daí a necessidade de realizar o manejo da doença, utilizando medidas adequadas. Entre as medidas de controle, destaca-se a aplicação de fungicidas, sempre que necessário. Em algumas situações, são realizadas até cinco pulverizações.

Na safra 2012/13, que começará a ser semeada no Mato Grosso no segundo semestre de 2012, a previsão é que a ferrugem asiática terá início mais cedo, devido a elevada população do fungo no início do desenvolvimento da plantas. Quanto mais cedo se inicia a doença, maior a necessidade de aplicação de fungicidas.

A epidemia de ferrugem deverá se iniciar mais cedo devido a presença de muitas plantas guaxas, voluntárias, tigueras, que se desenvolveram na entressafra devido às condições climáticas favoráveis. Neste ano, o inverno, no principal estado produtor de soja no Brasil, foi chuvoso.Isto permitiu que grãos de soja, perdidos durante a colheita e transporte, germinassem e originassem plantas que permitiram o desenvolvimento da ferrugem, causada por um parasita obrigatório, isto é, o agente causal só se desenvolve na presença de seu hospedeiro, da planta viva. Existem muitas plantas na região urbana, nas margens das rodovias e próximas às áreas que deverão ser cultivadas, produz-indo esporos do fungo. São essas estruturas as responsáveis pelo início da epidemia.

A soja é o principal cultivo agrícola do Brasil. A previsão é da semeadura de mais de 25 milhões de hectares e, se o clima for favorável e as boas práticas agrícolas forem utilizadas, a produção deverá atingir mais de 80 milhões de toneladas, tornando o Brasil o maior produtor mundial de soja, pela pri-meira vez na história. Os Estados Unidos vem sofrendo grandes danos com a estiagem.

A soja está sujeita a mais de 40 doenças que limitam a obtenção de altos rendimentos. Diversas doenças surgiram no Brasil ao longo da expansão do cultivo, a partir de 1970: mancha olho-de-rã, em 1972; cancro da haste, em 1989; nematóide do cisto, em 1992 e oídio, em 1997. O agente causal da ferrugem foi descrito em 1902 no Japão, em 1976 em Porto Rico e em 1990 na África. A ferrugem

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asiática se estabeleceu no Brasil em 2001, no Paraná; em poucos anos já estava em todas as regiões produtoras do país, exceto Roraima. A doença é favorecida por chuvas bem distribuídas e longos períodos de molhamento das folhas, temperatura ótima entre 18 e 26,5* C e o cultivo de variedades suscetíveis. Nestas condições, os esporos germinam na superfície das folhas, penetram diretamente na epiderme, colonizam os tecidos internos da folha e, a partir de 5 dias após a infecção, expressam os sintomas iniciais; após mais quatro a seis dias, inicia-se a reprodução do patógeno, com o surgimento das pústulas/urédias. Estas estruturas podem produzir esporos por cerca de 21 dias.

Anteriormente, havia sido descrito no Brasil, em 1979,a ferrugem americana, causada por Phakopsora-meibomiae; esta ferrugem é muito menos agressiva e não representa preocupação atualmente.

A correta diagnose da ferrugem é muito importante. Existem diversas doenças, como as lesões iniciais da mancha parda, o crestamento bacteriano e a pústula bacteriana que podem ser confundidas. Os sintomas iniciais da ferrugem asiática pontos escuros, com menos de 1 mm de diâmetro, que evoluem para saliências na face inferior das folhas. São nestas pequenas pústulas que são produzidas as es-truturas reprodutivas do fungo, que são disseminadas principalmente pelo vento, permitindo a rápida evolução da doença. As folhas amarelecem precocemente e caem mais cedo; a desfolha prematura causa redução do tamanho dos grãos e presença de grãos verdes. A doença pode causar aborto e queda das vagens, reduzindo a produtividade em até 80%, quando se comparam áreas tratadas e não tratadas com fungicidas.

O manejo integrado da ferrugem é essencial para reduzir o risco de danos e perdas. Diversas medidas devem ser adotadas preventivamente, simultaneamente ou em sequência. Deve ser feita a rotação de culturas com espécies não hospedeiras do agente causal da ferrugem; estão começando a ser utilizadas cultivares resistentes, como a soja Inox; materiais de ciclo mais curtos, semeados o mais cedo possível, em regiões onde foi obedecido o vazio fitossanitário, são importantes para evitar grande população do fungo no início do desenvolvimento das plantas. Vazio fitossanitário significa ausência de hospedeiros do agente causal da ferrugem na entressafra; em diversos estados, existe legislação proi-bindo o cultivo de soja por 60-90 dias. O fungo pode sobreviver em hospedeiros alternativos; existem mais de95 espécies de plantas hospedeiras. São importantes, no Brasil, kudzu, guandu, mucuna preta, des-modium, etc.. O objetivo é eliminar estes hospedeiros para que seja quebrada a ponte verde que per-mite a sobrevivência do patógeno.

Para a aplicação de fungicidas, há necessidade de monitoramento da ferrugem.A primeira pulverização deve ser feita imediatamente antes dos sintomas iniciais. Para se comprovar a presença do fungo na região, pode-se instalar unidades de alerta, áreas de cerca de 100 metros quadrados, semeadas 15-20 dias antes da data de semeadura das lavouras, para constatar a pre-sença das pústulas nas plantas das unidades alerta, antes delas surgirem na lavoura.Deve-se considerar que a ferrugem se inicia pelo baixeiro, nas folhas do terço inferior da planta.

Existem 20 produtos técnicos e 29 fungicidas comerciais a disposição dos produtores rurais para manejo químico da ferrugem. Recomenda-se a aplicação da mistura pronta de produtos com diferen-tes mecanismos de ação, como um triazol e uma estrobilurina. Os fungicidas devem ser aplicados na dose de registro, como a adição de adjuvantes na calda, quando recomendado. O número de apli-cações depende do estádio de desenvolvimento da cultura quando foi iniciado o controle, do período

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residual do produto aplicado e das condições climáticas.

Para evitar o surgimento de populações da ferrugem resistentes a fungicidas, é importante realizar o manejo adequado destes produtos.Recomenda-se a aplicação sequencial de fungicidas com mecanismos de ação diferentes ou a mistura de produtos com estas características, além de obedecer a dose e o intervalo de aplicação.

Os fungicidas devem ser aplicados em condições climáticas apropriadas, para evitar deriva. O pulver-izador deve estar calibrado e regulado, para que as gotas de calda fungicida atinjam o alvo, ou seja, as folhas baixeiras. Para maior sucesso na pulverização, deve-se utilizar gotas finas, com diâmetro abaixo de 220 micrometros, 60 gotas por centímetro quadrado, com volume de calda de cerca de 150 litros por hectare.

Em condições de ocorrência da doença nos estádios iniciais da cultura, pode ser utilizado o tratamento de sementes com fungida específico para ferrugem, fluquinconazole. Esta medida retarda o estabeleci-mento e a evolução da doença, contribuindo para a redução de número de aplicações.

A importância da ferrugem asiática da soja é tão grande que foi criada pelo MAPA, em 2004, uma parceria púbico privada, o Consórcio Anti-Ferrugem , com o objetivo de contribuir com o manejo da doença. Esta entidade estimou as perdas devido a ferrugem de 2001/02 a 2010/11: houve redução na produção de15,2 milhões de toneladas , equivalente a US$ 3,7 bilhões. Neste período os gastos com fungicidas e aplicação, mais os danos na produção e a redução na arrecadação de impostos, proporcionaram perda de US$19,2 bilhões.

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SUSTENTABILIDADE: COBERTURA VERDE PARA REDUÇÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA

Por Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

O primeiro relato histórico do uso de plantas em jardins acima do nível do solo tem a data de 3.000 anos antes de Cristo, na antiga Mesopotânia. Esses jardins acima do nível do solo eram localizados em templos denominados Zigurates e usados para cerimônias religiosas. Somente 78 anos antes de Cristo, antigas civilizações como as dos vales do Rio Tigre e Eufrates, bem como os romanos, desen-volveram jardins ornamentais nos telhados sendo os mais famosos os jardins suspensos da Babilônia. Esses registros de coberturas verdes usadas em edificações, geralmente de grande porte, normal-mente públicas, e em número muito restrito, tinham como base os conhecimentos empíricos e lo-cais. A partir dos meados do século XX as coberturas verdes deixaram de ser “prática de arquitetura empírica”, passando a serem adotadas como soluções ambientais. Tal técnica, adotada principalmente na Alemanha, tiveram as ações iniciadas na década de 50. Já nas décadas de 80 e 90 houve uma combinação crescente entre a consciência pública ambiental e a implementação de pesquisa cientí-fica, as quais produziram não só tecnologias, como também direcionamento de desenvolvimento das coberturas verdes. Assim, surgiu a proposta do telhado verde como parte de uma estratégia de melho-ramento ambiental urbano para redução de gases de efeito estufa, captação de água pluvial, controle térmico, entre outros. Atualmente a Alemanha tem 10% dos telhados planos do país com cobertura verde, equivalente a 5.500 hectares. Os 10 maiores telhados ecológicos do mundo somam uma área total de 418,2 hectares, utilizando apenas plantas ornamentais. No Brasil, apesar do grande potencial do uso dos telhados verdes, esse tema é ainda pouco estudado. O uso de plantas ornamentais nos telhados verdes poderia ser substituído por hortícolas e frutíferas para produção de alimentos. Implementa-se assim, a produção de alimentos em coberturas verdes, a exemplo de projetos semelhantes existentes no Canadá, Estados Unidos, Haiti, Colômbia, Tailândia e Japão.

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SETEMBRO

SETEMBRO

165 BILHÕES DE DÓLARES NO LIXO

SEGURANÇA NUTRICIONAL E CAPITAL HUMANO

MOFO-BRANCO: IMPORTÂNCIA, DISSEMINAÇÃO E MANEJO DA DOENÇA EM LAVOURAS NO BRASIL

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165 BILHÕES DE DÓLARES NO LIXOPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Relatório divulgado nos Estado Unidos, pelo Conselho de Defesa dos Recursos Naturais (NRDC)*, revela que 40% dos alimentos colocados no mercado consumidor norte-americanosãodesperdiçados -- e que a maior parte desses restos de comida rica em nutrientes acaba apodrecendo em aterros sanitários.

Por lá, a opinião pública ainda não dá muita atenção a este fato dramático, embora uma quantidade significativa de energia, terra e água sejamempregadas anualmente para produzir esses alimentos per-didos.

No Brasil, a realidade tende a ser parecida, pois vivemos o mesmo modelo de civilização, assentado na urbanização acelerada e no conceito de sociedade de consumo, dois fatores que estão na origem do problema. A nossa diferença é que aqui ainda faltam levantamentos para fazer um diagnóstico amplo e completo da questão.

Em outro estudo, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos mostra que o desperdício total de alimentos no mercado doméstico alcançou o equivalente a 165,8 bilhões de dólares em 2008 -- ano mais recente para o qual há uma análise completa, desse tipo. São 390 dólares anuais per capita, jogados fora.

As causas dessa perda gigante estão associadas a aspectos estruturais de produção e logística, ou de gestão, “no dentro” e “no pós porteira”. Mas também incluemregulamentações, aversão cultural a produtos esteticamente desagradáveis e mais um sem número de outras pequenas ou grandes razões.

Está na hora de lançar um olhar mais atento ao problema, priorizando o desperdício de alimentos dentro de políticas públicas e programas de qualidade das empresas, inclusive com metas para redução das perdas e metodologias para avaliar resultados alcançados.

E, como hoje muito se fala do marketing da sustentabilidade, fazer também o Marketing AntiDesperdí-cio – ou do Desperdício Zero. Não apenas com campanhas pontuais aqui e acolá, mas comações de profundidade em toda a cadeia agro alimentar.

No campo, por exemplo, estimular a busca de mercados secundários para produtos com imper-

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feições. Na agroindústria, fazer uma revisão do design de produtos e uma reengenharia de processos produtivos e logísticos.

Entre os consumidores, certamente há espaço para projetos de marketing educativo, visando difundir conceitos para uma alimentação inteligente -- com porções realistas, compra adequada, estocagem apropriada e quantidades racionais no preparo.

Nos serviços de alimentação, pode-se incentivar cardápios com escolha mais limitada e porções flexíveis, além do treinamento das equipes e campanhas de conscientização. Tudo monitorado com auditoria rigorosa sobre as perdas -- da agroindústria até a mesa.

Quem vai fazer tudo isso? Todos, pois todos perdem com a situação atual e todos ganharão se soluções forem encontradas: governos, empresas e consumidores. Este é um desafio de triplo resul-tado.

(*) NRDC – Natural Resources Defense Council; “Wasted: How America is losing up to 40 percent of its food from farm to fork to landfill”, Dana Gunders, agosto 2012.

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SEGURANÇA NUTRICIONAL E CAPITAL HUMANOPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Segundo a OMS – Organização Mundial da Saúde, anualmente mais de 200 milhões de crianças menores de cinco anos não atingem seu pleno potencial cognitivo e social, enfrentando níveis de des-nutrição (grave ou crônica) suficiente para retardar o crescimento e interferir no estímulo ao aprendizado.

Para uma sociedade, quando os efeitos da desnutrição infantil se manifestam (bemmais tarde),isso tende a representar baixa produtividade do capital humano, com menor capacidade de realizar trabalho físico e menor agilidade mental. Ou seja:alimentação adequada na infância significa uma economia mais dinâmica e com maior potencial gerador de riqueza, provavelmente com melhores profissionais emelhores salários.

No fundo, todo mundo sabe disso, pois os dados científicos e a mídia corroboram a cada diao sig-nificado cruel da insuficiência alimentar infantil, para os sonhos de bem estar das nações pobres e emergentes – e também para as metas de sustentabilidade e harmonização da economia global.

Em segurança alimentar, o Brasil vem fazendo a lição de casa. Reduziu o índice de menores de 5 anos com baixo peso para 1,8% (Estudo Saúde Brasil 2009, do Ministério da Saúde) e já atingiu um dos objetivos do milênio, definidos pela ONU -- Organização das Nações Unidas: erradicar a extrema pobreza e a fome.

Mas parece que falta ainda um engajamento emocional firme com a bandeira da segurança nutricional, tanto no Brasil como em outros quadrantes do mundo, seja por parte dos indivíduos, ou de governo, empresa, mídia e organizações da sociedade civil.

Desafio da produção e sustentabilidade

A base de uma boa nutrição começa por infraestrutura adequada e eficiência na produção e distri-buição de alimentos. Depois requer elasticidade de renda (o que envolve políticas de inclusão social) e também educação e qualidade de informação – para reduzir o impacto da alimentação errada e do desperdício.

O primeiro desafio nós cumprimos com louvor e busca de sustentabilidade.O Brasil também avançou na distribuição de renda, universalizou a oferta de alimentos, só que ainda ficou a dever na estrutura logística – o que acaba onerando as cadeias produtivas e o consumidor.

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Nos últimos 20 anos, por exemplo, aumentamos de 45% a 70%produtividade do algodão, arroz, milho, soja e trigo – e ainda reduzimos em mais de 60% o consumo de óleo diesel durante a safra.

Em proteína animal, de 1960 para cá a conversão alimentar de suínos e frangos evoluiu de 3,0 para 2,2 e de 2,7 para 1,7, respectivamente. E, juntando esses ganhos com o salto gigantesco na produ-tividade dos grãos, o resultado foi surpreendente: hoje, com a utilização de 1hectare, produzimos 7,6 vezes mais suínos e 8,6 vezes mais frangos.

Enfim,atualmente produzimos 1 tonelada de carne (metade frango, metade suíno) com 1/8 da área utilizada para produzir o mesmo volume, 50 anos atrás. É o produtor brasileiro usando tecnologia para aumentar a produção e preservar o planeta, e vem mais por aí, com o impacto de ganhos genéticos em tolerância a stress climático e sanitário, eficiência alimentar e velocidade de crescimento.

O leite na segurança nutricional

Na cadeia produtiva do leite o cenário também é evolutivo, mas aparentemente o sistema agroindustrial leiteiro ainda não desenvolveu o seu pleno potencial produtivo. Nem alcançou os mercados internacio-nais – como ocorrido com soja, café, laranja e as carnes bovinas, suína e bovina. Segundo informa-ções do setor produtivo e processador de leite, a demanda do produto no Brasil cresce a taxas de 7 a 8% ao ano, enquanto a produção vem caminhando nas proximidades de 4-6% ao ano.

Produto considerado estratégico pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o leite desempenha fun-ções nutricionais básicas na alimentação, principalmente de crianças e idosos. Se o Brasil se ad-equasse às quantidades indicadas pela OMS para as diversas idades (média de 210 litros per capita), seriam necessários 38 milhões de toneladas/ano para atender o mercado brasileiro – volume que su-peraria em seis milhões de toneladas a produção brasileira atual, na casa dos 32 milhões de toneladas.

A realidade e o perfil do mercado leiteiro atual é um convite para mudar o futuro do leite: uma consis-tente oportunidade de crescimento e consolidação tecnológica para a cadeia leiteira – e ainda com potencial para melhor equacionar o desafio da segurança nutricional em nosso país.

Esse momento deve ser aproveitado. O Brasil é um ator importante no cenário mundial de lácteos (quinto lugar em produção), mas ainda pode ganhar bem mais expressão com a evolução tecnológica de sua produção e uma melhor coordenação da cadeia produtiva, em todos os seus elos –da fazenda à distribuição.

Fator-chave

Produção crescente no campo, renda para comprar e comida na mesa. Por aí começa a busca pela segurança nutricional plena. Mas ela tambémenvolve saneamento básico, cuidados da saúde e, princi-palmente, aumento da escolaridade. A chave, resumindo, está no equilíbrio entre infraestrutura, poder de compra e educação.

Como nação, este último ponto-chave – a educação – de todos é aquele em que ainda não nos en-gajamosde corpo e alma. Porém, a segurança nutricional passa necessariamente por ele. Tem mais: a educação também vai potencializar o homem, o capital humano, este sim o fator com maior poder real de alavancagem para um crescimento econômico efetivo e sustentável.

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MOFO-BRANCO: IMPORTÂNCIA, DISSEMINAÇÃO E MANEJO DA DOENÇA EM LAVOURAS NO BRASIL

Por Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

O fungo Sclerotinia sclerotiorum é um patógeno introduzido nas lavouras, principalmente por sementes contaminadas, o qual destroi as partes aéreas das plantas que tornam-se esbranquiçadas, originando assim o nome comum da doença: mofo-branco.

No Brasil, produtos agrícolas de importância econômica como o feijão, soja, ervilha,algodão, girassol, tomate, cenoura, batata, fumo e amendoim são altamente suscetíveis a esse fungo.

As perdas ocasionadas por esse patógeno no Brasil podem chegar a 30% em soja, feijão e algodão, no período chuvoso. No inverno, quando a lavoura é irrigada, sem monitoramento adequado da água, geralmente com o excesso de aplicação da água, o feijão, a ervilha e o tomate podem sofrer perdas de até 70%.

A partir da safra 1976-1977, o fungo foi detectado em lavouras de soja, no centro-sul do Paraná. Entre 1982-1983, atacou a soja na região doAlto Paranaíba (MG) disseminando daí para Paracatu (MG), Distrito Federal e entorno. A partir de 1985 detectou-se a rápida disseminação através das sementes infectadas utilizadas na região.

Essa doença tem se destacado no Cerrado com a expansão da cultura do feijoeiro e a forma de dis-seminação mais comum tem sido a presença do micélio (o corpo do fungo) e escleródios (estrutura de resistência do fungo) nas sementes contaminadas utilizadas pelos agricultores. Os escleródios per-manecem viáveis no solo por mais de cinco anos e nem mesmo o fogo os elimina do solo. A severidade da doença tem se agravado com o monocultivo, principalmente do feijão, soja, algodão e girassol.

Atualmente não existem variedades resistentes dentre as espécies atacadas. Isso contribui para invia-bilizar áreas agricultáveis e disseminar a doença por todo o país, a destacar a região do Cerrado nos estados de Goiás, Mato Grosso e sudoeste da Bahia. Estima-se que cerca de 4 milhões de hectares de lavouras foi atacado pelo patógeno, na safra 2011/12, deixando no solo até seiscentos mil escleró-dios/hectare.

Algumas medidas que devem ser utilizadas para o manejo da doença são:- uso de sementes livres de micélio e/ou escleródios,

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- rotação com espécies não suscetíveis: milho, sorgo, milheto, arroz e algumas gramíneas utilizadas como pastagem e uso dessas gramíneas como cobertura morta,- uso adequado da água,- tratamento de sementes e pulverizações das partes aéreas das plantas com fungicidas registrados em orgãos governamentais e recomendados por entidades de pesquisa e extensão brasileiras,- integração lavoura-pastagem,- diversificação de cultivos.

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OUTUBRO

OUTUBRO

BIODIESEL DE ALGAS – O QUÊ, PORQUÊ E PARA QUEM?

O VELHO ARROZ COM FEIJÃO

OS OBSTÁCULOS A SEREM SUPERADOS PELO AGRO

QUANTO VALE O AMBIENTE?

SACOLINHA: VOTO E ATITUDE

SONHO, URGÊNCIA E ECONOMIA VERDE

INTEGRAÇÃO LAVOURA E PECUÁRIA – ILP

CÓDIGO FLORESTAL – CAMINHOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

NÃO TEM SEGREDO, O MILHO VAI EXPLODIR!

ENGENHEIRO AGRÔNOMO: AGRO SUSTENTÁVEL

CERRADOS: UMA BIOMA QUE PRECISA SER PRESERVADO

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BIODIESEL DE ALGAS – O QUÊ, PORQUÊ E PARA QUEM? Por Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Atualmente consumimos nos postos de gasolina o que se chama de Diesel B5. Ou seja, se mistura 5 % de biodiesel no diesel de petróleo e, no momento, está em discussão o cronograma de aumento da porcentagem de biodiesel a ser acrescentado ao diesel nos próximos anos. Existem muitas matérias primas, vegetais e mesmo não vegetais, que podem ser utilizadas, pelo menos teoricamente, para se fazer biodiesel. Assim, além da soja, existem os óleos de palmas, girassol, amendoim, mamona, crambe, pinhão manso, algas e outros microorganismos oleaginosos, etc. Entretanto, aproximada-mente 90% do biodiesel nacional vem do óleo de soja e sebo bovino.

Algas são plantas, no caso das algas oleíferas, plantas minuscúsculas, ou microalgas, mas com grande capacidade de crescimento. Podem dobrar seu peso mais de uma vez por dia, e existem muitas espé-cies de algas que poderiam ser utilizadas, algumas delas com mais 50% de óleo em sua composição. Assim, o cultivo intensivo de algas recebeu especial atenção devido à possibilidade, teórica, de se produzir até 200 vezes mais óleo por hectare em comparação com outros vegetais, sendo seu cultivo possível em água doce ou salgada, desde que haja calor, luz e carbono em abundância.Embora as algas consigam crescer tendo o CO2 como fonte de carbono e luz do sol como fonte de energia - as chamadas culturas fotoautotróficas - nestas condições a produtividade e o teor de óleo são baixos. Assim, foi sugerida a tecnologia chamada fermentação heterotrófica, uma espécie de “adubação” do sistema, que leva a maior produção de biomassa e também ao acúmulo de maior proporção de óleo em tempo menor.

Em cultivos simples, as microalgas podem ser produzidas em tanques abertos com profundidade de pouco mais de 10 cm e alimentadas, por exemplo, com dejetos de suinocultura e águas residuais de esgotos. Este é o método mais natural de cultivo de algas para produção de biodiesel, chamado de lagoa aberta, onde pode-se cultivar algas em áreas quentes e ensolaradas ao redor do mundo. É uma técnica mais próxima do natural, mas a produtividade e a conversão energética não é maximisada, porque há muitos fatores limitantes, como variações na temperatura da água, contaminação por bac-térias ou outros organismos, entre outros.

Algumas empresas de biodiesel desenvolveram um sistema de crescimento vertical/produção em laço fechado, mais eficiente que lagoa aberta. As algas são colocadas em grandes sacos plásticos trans-parentes. Assim aumenta a exposição à luz e se evita a contaminação, aumentando a produtividade das algas e a produção de óleo.

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Um passo tecnológico adiante é a construção de biorreatores em tanques fechados.As usinas são construídas com tonéis grandes e redondos, para cultivar algas em condições ideais. As algas são manipuladas para crescer ao máximo e serem colhidas diariamente, o que, por sua vez, favorece a produção de grandes quantidades de óleo.

Existem ainda testes com outra variação do biorreator, a fermentação fechada. As algas são cultivadas em contêineres fechados e alimentadas com açúcar e fertilizantes para promover o crescimento. Esse método elimina todas as margens de erro, já que permite o controle de todos os fatores ambientais. A vantagem desse processo é que ele permite a produção de biodiesel de algas em qualquer lugar do mundo.

Após a colheita, o material é prensado e/ou sofre extração com extratores químicos de óleo. A seguir o óleo sofre as transformações necessárias para ser misturado ao diesel, de modo, grosseiramente, semelhante aos outros óleos vegetais.

Dentre os fatores críticos na produção de óleo de algas estão os teores de nitrogênio e carbono no sistema, ou seja, não somente a quantidade destes elementos mas também a relação C/N, o que cor-responde, em média a 50 % do custo para produção de algas em sistemas eficientes. O carbono pode ser adicionado ao sistema simplesmente se bombeando gás carbônico para as lagoas ou tanques, ou ainda pode ser utilizado o açúcar, ou a garapa. Olha a boa e velha cana-de-acúcar aí outra vez. O nitrogênio pode ser fornecido por fertilizantes comuns assim como os ouros nutrientes minerais ne-cessários.

Um vegetal com alto poder de crescimento que pode ser cultivado, prensado, tratado quimicamente e produzir biodiesel de alta qualidade. Tentador. Realmente, os resultados alcançados em pequena es-cala, em laboratórios, são animadores. Entretanto, há ainda muitos obstáculos a serem vencidos. Além dos problemas com as lagoas abertas, a grande maioria das experiências na produção de algas para produção de óleo em grande escala falharam. Os principais problemas observados são: o óleo obtido tem um alto teor de ácidos graxos livres e elevado índice de iodo;difícil controle da acidez, temperatura e nutrientes para evitar quedas bruscas na produção e até mesmo a extinção dos cultivares das algas; ataque de cepas selvagens não produtoras de óleo; alto preço dos nutrientes; dificuldades para desid-ratação da alga para extração do óleo; enfim, alto custo de produção. A consequência disso tudo é que, apesar das alegadas alta produtividade e facilidade de produção, o custo de produção de óleo a partir de algas chega a ser cerca de 20 vezes superior, por exemplo, ao do óleo de soja.

Vamos agora colocar o biodiesel de algas dentro da perspectiva de produção de biodiesel no Brasil. Considerando apenas as fontes comuns, utilizadas atualmente, a Associação dos Produtores de Bio-diesel (Aprobio) estima ter capacidade instalada para suprir imediatamente até 10 por cento de adição de biodiesel (ou seja, dobrar a proporção atual do B5) embora não esteja regulamentado ainda pelo governo nem o “B7”. A União Brasileira do Biodiesel (Ubrabio), tem expectativa de que essa evolução continue nos próximos anos, com a mistura alcançando 10 por cento até 2014.

Segundo dados das indústrias, a produção de biodiesel atingiu 2,7 bilhões de litros em 2011, enquanto a capacidade instalada era de 6,9 bilhões de litros.As associações têm intenção de adicionar 20 por cento de biodiesel ao diesel até 2020, embora o governo acene com adição de apenas 10%. Ainda segundo a Aprobio, o Brasil já tem capacidade instalada para os 10% hoje, e poderia ser elevada a mistura de forma gradual até 20 % em 2020.

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Resumindo, o Brasil tem capacidade industrial instalada ou em fase de instalação mais que suficiente para atender a demanda de biodiesel por, pelo menos, mais 10 anos. Temos área e espécies adap-tadas para produção de óleo, seja como safra ou como safrinha, o que pode produzir óleo e garantir renda aos agricultores já instalados. Seria prudente investir, em escala industrial, na produção de bio-diesel de algas, considerando todas as incertezas e custos envolvidos? Lógico que a pesquisa no de-senvolvimento de alternativas deve ser sempre apoiada, mas, no caso das algas ainda estamos longe da aplicação comercial.

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O VELHO ARROZ COM FEIJÃOPor Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

O tema produção de alimentos x produção para exportação é recorrente. Normalmente se confunde ag-ricultura familiar com produção de alimentos para os brasileiros e agricultura empresarial com produção para exportação. A ideologia reza que produzir alimentos para a população é bom,a produção para exportação é nefasta. A cada movimento dos chamados “setores organizados da sociedade” essa dis-cussão vem à tona. A hedionda agricultura empresarial, além de estragar o ambiente, deixa o coitado do brasileiro com fome. Será?

A migração da população para as cidades tem sido importante também no Brasil. Na sociedade mod-erna, urbana, com marido, mulher e filhos trabalhando fora e com mais dinheiro disponível, muda o hábito alimentar. E também o prato típico, o arroz com feijão em algumas regiões, e a mandioca, em outras. Enquanto é reduzido o consumo de alimentos amiláceos, que dão trabalho para serem prepara-dos, aumenta o consumo de frutas, verduras, legumes, carnes, bolos, leite e derivados e, lógico, de pratos prontos. Essa é uma tendência mundial. Recente pesquisa da KantarWorldpanel revelou que, somente nos últimos 3 anos, a participação do arroz com feijão no gasto com alimentação dentro de casa caiu 4 pontos porcentuais. O interessante é que, no mesmo período, o preço real do arroz caiu 5,08 % e do feijão carioca 2,74 %. A queda de preços deveria resultar em aumento no consumo, que não ocorreu. Uma consequência da mudança no hábito alimentar.

E como tem se comportado o lado da produção? Tem faltado arroz e feijão, de modo a tornar legítima a alegação dos “setores organizados”? Nos últimos 10 anos, a produção de arroz no Brasil cresceu139 mil t/ano. Não é muito. Mas o consumo cresceu apenas 66 mil t/ano. Mesmo com o aumento na popu-lação. Isso se explica por que o consumo anual per capita diminuiu de 70 kg para 66 kg. O consumo de feijão per capita tem se mantido próximo a 16,5 kg nos últimos 10 anos, e tem sido atendido pela produção nacional. Em outras palavras, o Brasil é auto-suficiente em alimentos básicos. Tem ocorrido importações e exportações eventuais, em quantidades relativamente pequenas. Se forem computadas as importações e exportações de arroz e feijão nos últimos 10 anos, a conta fica próxima de zero.

Assim, cabe a pergunta: deve-se estimular a produção de arroz e feijão ou das culturas de exportação e produtoras de energia? Todas as previsões indicam que o Brasil deverá continuar a crescer, com mel-horia da situação econômica da população. Isso resultará em menor consumo de arroz, feijão e outras amiláceas, em função da mudança no hábito alimentar. Então produzir alimentos amiláceos para quem? Se a tendência de consumo é declinante, maior produção resultaria em menores preços, inviabilizando a produção, uma vez que as oportunidades de exportação para esses produtos são limitadas.Por outro

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lado, o aumento de produção de produtos energéticos e para exportação gerará renda, empregos e riqueza. A riqueza gira a economia, melhorando a vida de todo mundo. Em resumo, lógico que é necessária, e será ainda por muitos anos, a produção dos alimentos bási-cos, mas a história recente tem mostrado que o equilíbrio entre a produção de alimentos, culturas energéticas, matérias primas e grãos para exportação tem sido muito bom no Brasil, não justificando mudanças drásticas no sistema.

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OS OBSTÁCULOS A SEREM SUPERADOS PELO AGROPor Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Um sistema de produção agrícola deve ser sustentável. Antes de qualquer coisa, deve ter sustentabi-lidade econômica, o que permitirá investimentos para se conseguir sustentabilidade social e ambien-tal. Sistemas de produção como o de Integração Lavoura-Pecuária, ou mesmo Integração Lavoura-Pecuária-Floresta representam a evolução mais recente da agricultura.

Embora a utilização de maior número de espécies forrageiras se constitua numa evolução do sistema de produção em relação ao uso exclusivo da braquiária, com a diversificação, há necessidade de mel-hor qualidade de gerenciamento do que nos sistemas mais simples. Algumas vezes, a não adoção de algumas técnicas ou espécies em rotação se deve mais à deficiência de gerenciamento e (ou) máqui-nas do que ao clima, por exemplo. Um problema adicional é a instabilidade dos mercados e a falta de gerenciamento da comercialização. A falta de pessoas capacitadas para um bom gerenciamento do sistema tem sido um dos entraves ao seu desenvolvimento. Aliás, a falta de gente qualificada tem sido um obstáculo ao crescimento de diversas áreas de atividade no Brasil.

Um problema observado na maioria das propriedades que desenvolvem algum desses sistemas de produção agrícola é a dependência do uso de adubo nitrogenado. Mesmo com custo maior, o resul-tado econômico do uso de maiores doses de nitrogênio pode ser vantajoso. Uma fazenda que utilizaria num sistema convencional entre 60% a 80% dos seus recursos, passa a utilizar cerca de 90% a 95% de seus recursos num sistema integrado. Desta forma, um melhor entendimento da dinâmica de ni-trogênio nos sistemas seria importante para tentar melhorá-lo.

Por outro lado, muitas propriedades, mesmo com alto nível tecnológico, ainda persistem procedimen-tos em que o mais básico da ciência agronômica é negligenciado. Por exemplo, apesar do volume de resultados mostrando a falta de resposta aos micronutrientes em diversas situações, o uso de zinco, manganês, boro, e por vezes outros micronutrientes, ainda é generalizado. A análise de solo para fins de fertilidade nem sempre é feita todos os anos, e raramente se encontra um resultado na profundidade de 20 cm a 40 cm, o que ajudaria no diagnóstico de, por exemplo, falta de enxofre. Mas, a quantidade de fertilizantes utilizada nem sempre leva em conta o resultado da análise de terra.

Assim, embora não existam mais dúvidas quanto à necessidade, utilidade e benefícios da adoção de sistemas de integrados da produção agrícola com rotação de culturas, se possível em semeadura di-reta e integração com pecuária e/ou florestas, sua adoção mais generalizada ainda depende muito da pesquisa e do ensino nesta área.

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QUANTO VALE O AMBIENTE?Por Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Parece ponto pacífico que: se a sociedade como um todo se beneficia da conservação do ambiente ou dos serviços ambientais, é a sociedade quem deve pagar pelo serviço, não o agricultor. Esse ponto ainda está obscuro em toda discussão do Código Florestal brasileiro, uma vez que o ônus parece que recairá nos produtores rurais. Por exemplo: quem pagará pela recomposição da reserva florestal e ma-tas ciliares que foram legalmente cortadas? Isto não está certo.

Olhemos para um exemplo ocorrido recentemente na Holanda. A atividade agrícola estava reduzindo o número de ninhos de pássaros numa determinada área. Ao invés de gritos pela imprensa, denúncias pela TV ou gritos de “veta Dilma”, os técnicos do governo, universidades e ONGs se reuniram com os agricultores para achar uma solução. A solução acordada resultou em perda de produção e, portanto, de renda. Foi estabelecido um consórcio, com a participação de todos interessados. Os agricultores se engajaram na resolução do problema, reduzindo a atividade. Em contrapartida, recebem um valor em euros como compensação pela perda de produtividade resultante da preservação. Evidentemente isso precisa ser fiscalizado, ou seja, as regras estão sendo cumpridas? A estratégia tem resultados positi-vos? Mas, quem fica encarregado do controle? O próprio consórcio, através de técnicos contratados, além de voluntários e os próprios agricultores. E agora o principal: quem paga por tudo isso? Quem se beneficia é a sociedade como um todo, assim o governo assume a conta.Alguém pode imaginar como isso seria resolvido se acontecesse no Brasil?

Apesar do número de interessados no assunto ambiente, o Brasil ainda engatinha quando se trata de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Ou seja, vamos preservar, sou amigo do ambiente, desde que outro pague a conta. Há algumas iniciativas estaduais e apenas uma em nível federal. Mas o PSA em si fica fora, com exceção do Estado de São Paulo, onde o pagamento por serviços ambientais é um dos instrumentos de ação da Política Estadual de Mudanças Climáticas, de 2009. No conjunto de ações previstas aparece o Projeto Mina d’Água, lançado em 2011, que prevê uma compensação no caso de preservação de nascentes consideradas importantes para o abastecimento público. Note que não se fala em agricultura ou produção de alimentos. Assim, isso ainda está muito, muito longe de compensação por renda cessante, o que vai ocorrer daqui por diante. Qual o valor previsto? De R$ 75,00 a R$ 300,00 que cada agricultor poderia receber por mina por ano. Agora, um pouco de aritmética. Se para cada mina for necessário preservar perto de 1 ha, o valor pode ser menor que o ar-rendamento de 1 ha de pasto degradado. Minha gente, quanto vale o ambiente, menos que um pasto degradado?

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É necessário mais seriedade no trato de assuntos importantes. Necessário é preservar o ambiente, necessário é preservar o agricultor. Para isso há necessidade de se regulamentar o PSA em todas as regiões brasileiras, estabelecendo-se valores razoáveis, que remunerem minimamente mais esse ser-viço a ser prestado pela agricultura.

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SACOLINHA: VOTO E ATITUDEPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

A sacolinha plástica dos supermercados voltou. Não dá pra dizer que isso é ruim em si, pois o artefato tem um papel de conveniência que foi consagrado por anos de uso no varejo e, assim, adquiriu um lugar próprio em nossa cultura de consumo.

Mas talvez seja válido perguntar: das razões de cenário ambiental que levaram ao debate e proposta de suspensão da sacolinha no varejo de auto-serviço, meses atrás, o que mudou agora para se passar uma borracha em tudo?

Está certo que a questão nunca foi uma unanimidade. Mas isso, em geral, é o que ocorre quando sur-gem proposições que revisam conceitos e mudam paradigmas.O fato é que continuaremos a jogar no lixo de 2,5 a 3 bilhões de sacolinhas/mês, só no Estado de S. Paulo (segundo estimativas publicadas na imprensa, no auge das discussões).

Pessoalmente continuarei a me abster da sacolinha plástica nas compras, em favor de uma “sacolona” de lona, herança de minha mãe, procedimento que acabei adotando durante os debates que preced-eram a épicaproibição da sacolinha, no início deste ano.Por quê?

Porque ela vem de energia fóssil e tem pegada de carbono, porque o aquecimento da Terra é real (ou pelo menos opinião dominante entre os cientistas), porque as toneladas e toneladas de sacolinhas demoram a degradar e porque não há estrutura suficiente para coleta seletiva e reciclagem de lixo na cidade onde moro.

Na maioria das cidades de porte pelo Brasil afora, aliás, essa situação se repete. Às vezes, até já ex-istem processos organizados de coleta seletiva; mas é comum encontrar um descompasso entre os necessários investimentos e incentivos para a industrialização do lixo, quebrando assim a corrente da eficiência na reciclagem.

Um dos caminhos para mudar essa realidade está no voto, buscando o comprometimento dos can-didatos com políticas que construam uma urbanidade mais sustentável. Agora mesmo teremos uma grande rodada de eleições municipaisque é oportunidade para se debater e alertar as pessoas sobre a importância de plataformas políticas que também tragam ganhos sustentáveis para o dia a dia das cidades.

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Em sustentabilidade o homem é oque mais conta. Seja como beneficiário, seja como agente. Muito antes dos pressupostos e políticas públicas para a chamada economia verde (ainda engatinhando), temos que tomar partido e mudar atitudes pessoais em prol de uma economia e de uma vida mais sustentável.

Isso implica em revisar hábitos, conhecer mais e até votar na sustentabilidade. Não importa se for mili-métrico o avanço. Se os problemas existem, alguma coisa tem que ser feita. Isso é o que nos faz ser uma humanidade.

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SONHO, URGÊNCIA E ECONOMIA VERDEPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Vivemos uma utopia. A ideia de que as utopias acabaram é falsa. Quem está imerso nessa fantasia não percebe, mas vivemos a utopia da técnica e do consumo inesgotáveis – e entre esses dois eixos já se vão 200 a 300 anos de história do mundo ocidental.

Nos últimos três séculos, o homem, a ciência e a tecnologia produziram prodígios. Foram tantos, que se acreditou ser esta uma tríade de “deuses” – e que os recursos planetários não teriam limite, jamais. E agora?

A ciência é a melhor ferramenta para aproximar nosso olhar da realidade. E ela está dizendo que os recursos são finitos, o que significa que um dia vão acabar. Sim, recursos escassos... e a melhor prova disso é que, não fosse essa escassez, nem existiria a chamada ciência econômica.

A ciência diz também que a energia renovável não sustenta a sociedade de consumo global, na qual vivemos hoje. O Brasil até ostenta uma posição privilegiada neste aspecto, pois cerca da metade da energia usada no Brasil é renovável.

Nossa eletricidade provém basicamente de hidroelétricas e agora, cada vez mais, de alternativas renováveis como o uso do bagaço de cana-de-açúcar. Temos também o consagrado etanol e outros ascendentes biocombustíveis, desenvolvidos a partir de oleaginosas e até produtos florestais.

O que não podemos é dormir sobre o sonho do pré-sal e abandonar as políticas estimuladoras da energia renovável – inclusive para as fontes que ainda possuem menor expressão de escala, como é o caso da energia eólica e da energia solar,que se mostram como alternativas viáveis e competitivas, para a realidade específica de certos mercados.

Enquanto sonhamos com o admirável mundo de uma nova economiaharmonizada com o planeta, te-mos antes que entrar de cabeça em uma espécie de varejo da chamada “economia verde”, buscando pelo menos alguma redução imediata no consumo de matérias-primas e energia – e também um corte severo nos desperdícios (nos Estados Unidos, o desperdício de alimentos alcança 40% -- do campo à mesa).*

Além desses desafios urgentes, acho que não faria malcomeçar a se pensar na revisão de alguns con-

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ceitos de crescimento econômico, diminuindo ou eliminando subsídios a setores de forte impacto no consumo de combustíveis fósseis – como o automotivo e petrolífero.

Também há quem fale no planejamento demográfico espontâneo e democrático, nas áreas mais po-bres e populosas do planeta. E isso poderia ser indiretamente estimulado por meiode programas in-tensivos de educação e liberdade da mulher -- um fato que, historicamente, parece estar associado a uma redução significativa nas taxas de natalidade.

O agronegócio já mostrou sua ótima capacidade de reação em prol da sustentabilidade. Hoje, por ex-emplo, produzimos 1 tonelada de carne (metade frango, metade suíno) com 1/8 da área utilizada com o mesmo objetivo, 50 anos atrás. Em sustentabilidade, o campo já comprovou que tem soluções. Mas esse é um desafio que, para ser equacionado 100%, precisa do compromisso de toda a sociedade.

(*) Fonte: NRDC – Natural ResourcesDefenseCouncil, Estados Unidos, agosto 2012.

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INTEGRAÇÃO LAVOURA E PECUÁRIA – ILPPor Décio Luiz Gazzoni, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Engenheiro Agrônomo, pes-

quisador da Embrapa Soja.

Os ILPs são sistemas produtivos que incentivam a diversificação, a rotação, a consorciação e a sucessão das atividades agrícolas e pecuárias dentro da propriedade rural de forma planejada, constituindo um mesmo sistema. Uma das razões para sua adoção é a utilização racional do solo, durante todo o ano, aproveitando o sinergismo lavoura/pecuária para aumentar a produção e o lucro da propriedade.

A melhoria do manejo do solo está no fulcro da lógica de uso do ILP. Para iniciar um ILP deve-se elimi-nar qualquer forma de erosão e os sulcos de enxurrada, as plantas daninhas perenes e as trilhas de caminhamento do gado, as camadas compactadas, e corrigir a acidez e a fertilidade do solo. Uma vez implementado o ILP, deve-se evitar intervenções drásticas no solo. Com o manejo adequado do solo, a retenção e oferta de (infiltração, distribuição e armazenamento) é otimizada. As raízes das plantas crescem em maior profundidade, explorando maior volume de solo em busca de nutrientes e de água e aumentando a tolerância à deficiência hídrica, as plantas têm melhor nutrição, aumentando a produ-tividade das lavouras e das forrageiras.

A vantagem do agricultor está no incremento na produção anual de grãos, fibras, madeiras, lã, leite e carne. Essa maior oferta abre possibilidades ao pecuarista, especialmente aquele que possui um rebanho de dupla aptidão (leite e carne), inclusive em diversificar seu negócio com pecuária: aumento do rebanho; oportunidade de criar e recriar melhor os machos devido à maior oferta de pasto; uso de confinamento ou semi-confinamento. É possível produzir, a pasto, melhores carcaças em menor tempo e com menor custo restando, em alguns casos, apenas um acabamento em confinamento. E a vantagem coletiva é a conservação do meio ambiente, em especial quando o sistema de plantio direto é utilizado.

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CÓDIGO FLORESTAL – CAMINHOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Por Elbio Senna, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Gestor da Área Jurídica da Cooplantio.

Os vetos da presidente Dilma Rousseff a nove itens da Medida Provisória (MP 571/2012) que atualiza o Código Florestal (Lei12.727), aprovado pelo Congresso Nacional em 2012, significaram a SEGU-RANÇA JURÍDICA que o produtor precisava para continuar fazendo o Brasil crescer, sem que para isso houvesse perdas às questões ambientais.

Evidentemente que as alterações promovidas pelo Governo não agradaram“gregos e troianos”, pois existem neste contexto posições muito antagônicas, mas, pelas avaliações da maioria dos envolvidos neste debate,os vetos mantêm o ponto de equilíbrio necessário a eficácia da nova legislação, na me-dida em que não acarretarão grandes perdas, nem para ruralistas, nem para ambientalistas.

Sabidamente, temos com o novo marco legal, que foi amplamente debatido pela sociedade, Con-gresso e entidades, de forma transparente e democrática, uma legislação moderna, capaz de supor-tar o avanço do crescimento agrícola do país, com sustentabilidade, atendendo as mais prementes questões ambientais e mantendo-nos entre a vanguarda dos países conservacionistas, bem como garantido segurança jurídica para futuros investimentos.

Os vetos realizados pela Presidente têm a principio as seguintes implicações:

- manter a obrigação de proteger áreas de preservação permanente (tambémconhecidas como APPs) em áreas urbanas;-evitar novos desmatamentos, particularmente nas regiões do bioma Cerrado localizados na Amazônia Legal;- dispensar autorização prévia para o plantio de espécies florestais nativas e exóticas;- determinar o fim do prazo de 20 dias para que o proprietário rural passe a fazer parte do Programa de Regularização Ambiental;- recuperar os critérios para a recomposição de matas, conforme previsto originalmente no texto do Código Florestal; vedar a recuperação de Áreas de Preservação Permanente por meio do plantiocon-tínuo de árvores frutíferas;- proibir a regra para recomposição de faixa de apenas 5 metros de Área de Proteção Permanente às margens de rios intermitentes com até 2 metros de largura, para qualquer tamanho de propriedade;- vetar a regra que restringia a recomposição de Área de ProteçãoPermanente em imóveis com mais

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de 4 módulos fiscais a 25% do seu tamanho;- manter a exigência de averbação da reserva legal no cartório de registro de imóveis, o que é dispensado após o registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR), também regulamentado.

Com as normas aprovadas estão fixadas as premissas para uma nova ordem ambiental com vistas a atender de forma mais equânime o binômio desenvolvimento/sustentabilidade, vez que, ante o cres-cimento constante da população e da demanda internacional por alimentos, urge a necessidade de aumentarmos a produção, com qualidade e eficiência, utilizando as melhores técnicas e práticas agrí-colas, sem descuidar da preservação do meio ambiente em que vivemos, por questão de sobrevivên-cia das espécies que habitam o planeta, inclusive o homem.

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NÃO TEM SEGREDO, O MILHO VAI EXPLODIR!Por José Luiz Tejon Megido, Diretor Vice Presidente de Comunicação do Conselho Cientifico para a Agricultura Sustentável

(CCAS), Dirige o núcleo de agronegócio da ESPM, Comentarista da Rede Estadão-ESPN.

Não abordo aqui o milho pipoca, alimento que explode literalmente, e teve o seu consumo ampliado durante a grave crise da recessão de 29. Na falta e na dificuldade, o ser humano sempre buscou saídas curiosas, e uma que proliferava e alimentava naqueles anos terríveis era exatamente a pipoca, comida in natura e muito barata.

O milho sempre foi o cereal de maior potencial genético de produção. Obter 70 sacas de soja por hectare em média é trabalho árduo. Conseguir 140 sacas de milho por hectare é obrigação. No ano de 1983 a Agroceres, que liderava o mercado de sementes híbridas de milho no Brasil, ao lado da Globo, realizou a maior campanha publicitária do agronegócio, com envolvimento da população urbana: em 83 Fique de Olho no Milho (tudo o que era visto no campo era visto nos grandes centros urbanos).

O país colhia cerca de 50 milhões de toneladas de grãos, e todos entendíamos que esse volume era insatisfatório. Enquanto a produtividade média brasileira era inferior a 2 mil kg por hectare, os concur-sos de produtividade de milho obtinham, com os materiais genéticos daquela época, marcas de 12 a 16 mil kg/ha. Dessa forma, um grupo de idealistas, liderados pelo saudoso Ney Bittencourt de Araújo idealizavam o salto das safras nacionais a partir do milho.

Com a descoberta criativa da safrinha (2ª safra) que hoje virou “safrão”, e uma audaciosa ação da Coamo, exportando lotes iniciais do milho brasileiro, em paralelo ao crescimento da avicultura e da suinocultura no país, o milho caminha nesta safra para mais de 70 milhões de toneladas, com um con-sumo estimado de 23 milhões e um excedente exportador de quase 13 milhões. O ex-ministro Alysson Paullinelli, presidente da Abramilho, diz: “precisamos construir um novo país agrícola. Somente a China vai precisar importar mais de 40 milhões de toneladas de milho nos próximos anos.”

No exterior, os programas de biocombustíveis, do etanol a partir do milho, exerceram uma pressão inesperada na disputa pelo cereal, e os problemas climáticos acentuaram ainda mais a insegurança sobre o abastecimento global de alimentos. O mundo precisará, por questões de segurança alimentar, de uma agropecuária desenvolvida nas condições tropicais do planeta. E aí estamos já iniciando a exportação não apenas de produtos, mas como de serviços, na área do conhecimento da agricultura tropical.

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Os desafios são proporcionais às oportunidades. Poderemos duplicar a safra brasileira com o milho, mas precisamos da “coordenação inteligente das cadeias produtivas”. Temos o mercado interno com a produção de proteínas dependente do custo da ração para termos competitividade e podermos penetrar em mercados onde a escala e o preço são fatores críticos de sucesso. Dessa forma, repre-sentantes de vários setores do agronegócio devem orquestrar uma grande ação de governança das cadeias produtivas dos grãos e seus derivados.

O mercado interno é e continuará sendo um gigantesco fator de segurança para todos os empreend-edores atuando no Brasil. De olho no exterior, o maior inimigo nacional do agronegócio não está mais no antes ou no dentro da porteira das fazendas e sim no pós. A produção adicional que temos, como resultado da competência do agricultor tropical, com a tecnologia adaptada às exigências do Brasil, apresentam seus resultados comprovados nas colheitas auferidas. Entretanto, precisamos deixar o próprio milho ao relento, por falta de estrutura de armazenamento, problemas de estradas, transportes, portos, seguro, crédito e proteção ao risco do produtor com preços mínimos de contenção.

Nem sempre contaremos com os preços internacionais nos patamares atuais, e precisamos resistir, daqui a duas safras, a inevitável escala, produtividade e custo pós-porteira das fazendas. Sementes e fertilizantes já demoram para chegar nas mãos dos agricultores.O jogo do campo passou a ser deci-dido cada vez mais nas cidades, na governança e nas decisões políticas velozes, o que não é hábito em nossa história. Muito precisa ser feito, porém nada será comparado à livre iniciativa de modernos líderes do setor, de tomarem para si os enfrentamentos que precisam ser feitos.

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ENGENHEIRO AGRÔNOMO: AGRO SUSTENTÁVELPor José Otavio Menten, Presidente do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo, Mestre e

Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da USP/ESALQ.

No dia 12 de outubro comemora-se o DIA DO ENGENHEIRO AGRÔNOMO. Foi neste dia, em 1.933, que o presidente Getúlio Vargas regulamentou a profissão de Engenheiro Agrônomo no Brasil. Trata-se de uma das profissões mais ecléticas e importantes para o Brasil e para o mundo.O agro é respon-sável pela produção, processamento e distribuição de alimentos saudáveis, energia limpa e renovável e fibras, além de cuidar do meio ambiente,da paisagem e dos recursos naturais, essenciais para a produção agropecuária sustentável.Dentre os profissionais que atuam no agro, nas ciências agrárias, o Engenheiro Agrônomo tem uma grande responsabilidade.É o profissional que tem atribuições para atuar no “antes da porteira” (insumos, máquinas e equipa-mentos, planejamento, crédito e seguro rural), “dentro da porteira”(produção de animais e vegetais) e “depois da porteira”(processamento, armazenamento, transporte e comercialização de produtos ag-ropecuários). Trata-se do profissional que apresenta competência para planejar, coordenar, fiscalizar e executar atividades no agro, nas áreas de produção, ensino, pesquisa, extensão e fiscalização. Pode liderar equipes constituídas por diversos profissionais de nível técnico e tecnológico.Estima-se que existam mais de 100.000 Engenheiros Agrônomos atuando no Brasil. E que são necessários cerca de 150.000 para atender, adequadamente, as necessidades do setor. No Brasil existem cerca de 5.000.000 de propriedades rurais e cerca de 25.000.000 de produtores rurais.O agro é responsável por mais de 25% do PIB do Brasil e de mais de 30 % dos empregos e das exportações. É o setor responsável pela balança comercial positiva do país.É mais barato criar empregos no agro que nos demais setores da economia. O Brasil apresenta vantagem competitiva, em relação aos outros países do mundo, no agro.Temos terras agricultáveis de boa qualidade, clima favorável e a maior reserva de água doce do mundo. Temos tecnologia agrícola tropical de qualidade, produzida em nossas universidades e institutos de pesquisa.A produtividade de grãos, no Brasil, do-brou nos últimos 20 anos. Os produtores agrícolas são tecnificados e competentes para incorporarem novas tecnologias. O Brasil é visto pelos órgãos internacionais(FAO, OCDE) como o celeiro do mundo, a “grande fazenda”. Estima-se que, até 2050, o mundo vai necessitar de 70% a mais de alimentos. O Brasil deve ser o responsável por 40% deste aumento na produção mundial. A agroenergia(etanol, bio-diesel, biomassa) vai ocupar, cada vez, maior espaço na matriz energética mundial.Podemos aumentar muito as nossas florestas plantadas.Tudo isto sem necessitar desmatar novas áreas. É um grande desafio e uma grande oportunidade. Para assumirmos este papel de protagonistas precisamos formar profissionais cada vez mais quali-

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ficados. O Engenheiro Agrônomo demandado tem que apresentar sólida formação básica e profis-sional, incluindo aspectos ambientais e sociais. Deve apresentar características pessoais exigidas pela sociedade(ética, liderança, capacidade de trabalhar em equipe), domínio de idiomas e informática, capacidade de gestão e de comunicação.Há necessidade que as Escolas tenham qualidade e formem profissionais competentes.É necessário que atendam todas as áreas de conhecimentos e conteúdos necessários para a formação apropriada. Atualmente são cerca de 230 Instituições de Ensino de En-genharia Agronômica no Brasil.Em 2010 foram oferecidas mais de 17.000 vagas e tínhamos mais de 50.000 estudantes matriculados. Ainda em 2.010 ingressaram nas Escolas de Engenharia Agronômica mais de 14.000 novos estudantes e formaram-se quase 6.800 Engenheiros Agrônomos. São estes Profissionais que podem fazer a diferença. Assumindo a responsabilidade técnica de ativi-dades relevantes para o Brasil.Produzindo cada vez mais, respeitando o homem e o ambiente, Os Engenheiros Agrônomos podem atuar nas áreas de produção de vegetais, produção de animais, processamento de produtos agropecuários, biotecnologia, engenharia a de biossistemas, economia, administração e sociologia rural e recursos naturais /manejo ambiental.Podem atuar em empresas privadas e instituições públicas, nas áreas de produção, consultoria/assessoria,transferência de tecno-logia, pesquisa, ensino, fiscalização etc.Existe um mercado de trabalho bastante aquecido e um futuro promissor. A Engenharia Agronômica é a profissão “do hoje”, do Brasil que tem vocação para o agro.

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CERRADOS: UM BIOMA QUE PRECISA SER PRESERVADOPor Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-

gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

Avance por alguns minutos em qualquer direção a partir de um ponto no Centro Oeste rumo ao interior. Impossível não notar nesse trajeto as plantações, pastagens e plantas nativas que compõem a paisa-gem. A agropecuária brasileira destaca-se como uma das mais fortes do mundo e seu crescimento leva riquezas e oportunidades aos mais diversos cantos do Cerrado.

O lado preocupante dessa expansão é que ela se tornou a maior ameaça para a conservação do riquíssimo bioma do Cerrado, que já teve 55% de sua área desmatadas ou transformadas. A preser-vação de uma área só acontece quando seus habitantes deixam de ver o desmatamento como ne-cessário para a sobrevivência. Por isso, com o desenvolvimento da região,investimento em pesquisa, bem como a determinação de governos, agricultores, pecuaristas para disseminar as melhores práticas de produção agropecuária em cada propriedade fará a sociedade reivindicar ainda mais a preservação da biodiversidade na região. Entendendo esse desafio, a Rede de Sementes do Cerrado uma associação técnica sem fins lucra-tivos com base em Brasília que visa dentre outros temas, a conservação,recuperação e melhoria da qualidade das sementes e mudas de espécies nativas, implantou o projeto Semeando o Bio-ma Cerrado.Este projeto patrocinado pela Petrobrás,permite a rede empreender uma série de ações ambientais:identificação de árvores matrizes,coleta/comercialização de sementes para produção de mudas e a divulgação da legislação de espécies nativas do bioma. Uma das ações mais importantes é implementada nas escolas de ensino fundamental da educação ambiental com objetivo de elevar a conscientização sobre a conservação do Cerrado. Com a continuidade de projetos nos moldes do-Semeando o Bioma Cerrado- conhecimento científico e a participação ativa da sociedade, é possível continuar a produzir alimentos de alta qualidade e desen-volver a região sem destruir o bioma Cerrado. Pensando nisso, todo consumidor brasileiro,principalmente os habitantes do Planalto Cental - Homo cerratensis - (segundo o eco-historiador nativo de Anápolis/GO,Professor Paulo Bertran) deveríamos exigir das cadeias produtivas/empresas produtoras de ali-mentos na região a certificação oficial da produção e responsabilidade ambiental como fatores impor-tantíssimos para o desenvolvimento e mitigação dos impactos ambientais no bioma.

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NOVEMBRO

NOVEMBRO

MONITORAMENTO DA SAÚDE DE AGRICULTORES E TRABALHADORES AGRÍCOLAS PONTECIALMENTE EXPOSTOS A AGROQUÍMICOS – UM DESAFIO DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO

O BOI BANDIDO OU MOCINHO?

MAIS LEI, MENOS EMPREGO, MENOS TÉCNICA, MENOR SUSTENTABILIDADE

COISAS DO SÉCULO XXI

PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AGRONEGÓCIO NOS PRÓXIMOS 10 ANOS

SLOW FOOD: UM MOVIMENTO PELO ALIMENTO BOM, LIMPO E JUSTO

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MONITORAMENTO DA SAÚDE DE AGRICULTORES E TRABALHADORES AGRÍCOLAS PONTECIALMENTE EXPOSTOS A AGROQUÍMICOS – UM DESAFIO DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO

Por Prof. Dr. Angelo Zanaga Trapé, Membro do conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS).

Os agroquímicos, defensivos agrícolas ou no Brasil chamados de agrotóxicos compõem uma tec-nologia utilizada para a produção agrícola do país e no mundo.Como toda tecnologia seja química, mecânica ou automotiva é perigosa e dependendo de como elas são utilizadas podem determinar um risco que no caso dos agroquímicos é a probabilidade de uma pessoa ou população adoecer pela exposição a esses agentes.

Muito tem se falado sobre os impactos da utilização dos agroquímicos na saúde das pessoas tanto que se expõem no trabalho como na ingestão de alimentos que podem conter resíduos dos agroquímicos. Para este grupo populacional os dados de programas de análise de resíduos de agrotóxicos em ali-mentos governamentais de estados e da federação mostram uma excelente segurança não havendo níveis residuais suficientes em alimentos capazes de gerar qualquer efeito na saúde dos consumidores em geral.

Em relação aos agricultores e trabalhadores agrícolas com potencial exposição na produção dos ali-mentoshá ainda muitas dúvidas e incertezas sobre qual é a realidade da saúde destas pessoas em relação ao uso da tecnologia agroquímica.

Os dados oficiais apresentados pelo SINITOX, Sistema Nacional de Informações Toxicofarmacológicas do Ministério da Saúde aponta 1168 casos de intoxicação ocupacional com3 óbitos em 2009 para uma população rural estimada pelo IBGE de 20 milhões de pessoas.

Há uma discussão latente que diz respeito à chamada subnotificação de casos pelos serviços de saúde públicos e privados. Os epidemiologistas chamam de “o silêncio epidemiológico das intoxica-ções por agrotóxicos”, ou seja para cada caso notificado muitos deixaram de ser por diversos motivos, principalmente pelo desconhecimento técnico científico por parte da grande maioria dos profissionais de saúde, especialmente os médicos, da Toxicologia dos agroquímicos.

A maior parte das escolas formadoras de profissionais de saúde não tem em sua grade curricular disciplinas de Toxicologia em especial a Toxicologia Clínica na qual se capacita o futuro médico entre

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outros a identificar um caso suspeito, diferenciar o que é exposição, de contaminação e intoxicação e investigar o caso e concluir se realmente o indivíduo avaliado estava ou não com algum efeito na saúde determinado pela exposição aos agroquímicos.

Fica então difícil estabelecer o que é caso,o que é somente exposição e notificar os casos confirmados gerando uma base estatística confiável.O agronegócio brasileiro, carro chefe da economia nacional, vem sofrendo fortes ataques nesse campo. Quais dados estatísticos têm hoje os diversos setores do agronegócio brasileiro em relação ao uso de agroquímicos e saúde humana?Quais programas de saúde os setores tem desenvolvido para a proteção da saúde das pessoas envolvidas na produção agrícola e potencialmente expostas a agroquímicos?

A falta de dados e a desinformação criamo ambiente propício para a disseminação de informações equivocadas para toda sociedade, como se o agronegócio fosse gerador de alimentos contamina-dos, agressor ambiental e causadorde efeitos prejudiciais na saúde das populações seja consumidora como trabalhadora. Aqui perde a Ciência e ganha a Ideologia.

Monitorar a saúde de todas as pessoas envolvidas na produção agrícola, gerar um banco de dados com base científica que possa ser apresentado e divulgado para toda sociedade regularmente, anu-almente, mostrando os resultados de avaliação clinico epidemiológica e laboratorial dessas pessoas de acordo com protocolos científicos previamente estabelecidos, este é o desafio moderno que o agronegócio brasileiro deveria enfrentar e realizar.

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O BOI BANDIDO OU MOCINHO?Por Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

É uma conta relativamente simples: cada boi (que as vacas me perdoem o machismo, mas vou chamar todo mundo de boi mesmo) emite aproximadamente 57 kg de metano (CH4) por ano, em média; isso vezes 200 milhões de cabeças, se chega a um número enorme (11,4 milhões de t), equivalente a 63 % do metano emitido no Brasil, ou 48 % dos gases de efeito estufa. Por essas contas, cada kilo de carne consumida equivaleria 300 kg de gás de efeito estufa emitidos. Assustador, não? Verdade? Mais ou menos!

Antes de mais nada, de onde vem esse carbono emitido pelos bovinos? O alimento do boi, forragem ou grãos, fixa energia solar através da fotossíntese, na forma de diversos compostos como a celulose, amido, proteínas, etc, que contém carbono. No processo de fotossíntese, a planta retira o carbono do ar, incorporando-o naqueles compostos. Quando ingerido o alimento, micro-organismos que vivem no trato digestivo de ruminantes degradam a celulose da matéria vegetal para extrair energia química nela fixada por meio da fotossíntese. Um dos sub¬produtos é o gás metano. Além disso, óxido nitroso pode ser emitido do esterco e da urina. A adubação da pastagem com nitrogênio também pode emitir mais um pouco de óxido nitroso.

Dizem que para todo problema existe uma solução simples, rápida, e errada. Esse é bem o caso. Em primeiro lugar se considera, nessa conta, que todos os 200 milhões de bois, vacas, bezerros, novilhas emitem a mesma quantidade de gás – primeira mentira – a emissão de gases depende da quantidade e da qualidade de alimento ingerida. Assim, se contarmos o rebanho de mamando a caducando, a conta fica já bem menor. Depois, de onde vem o carbono que o boi emite por flatulência e eructação (arroto, para os íntimos)? Vem do alimento consumido, normalmente do pasto, no Brasil. O carbono consumido como alimento é transformado principalmente em carne, leite e dejetos, que retornam ao chão, mais aquela parte que vai para a atmosfera. Então para o boi crescer, para a vaca produzir leite, e também para emitir metano, é necessário que se alimente de carbono, ou seja, de capim. De onde vem o carbono do capim? Da atmosfera. Ou seja, o carbono, ou metano, emitido pelo boi é apenas uma devolução do que já estava na atmosfera. Mais simplesmente: o boi não fabrica carbono. Muda sua forma, o que muda um pouco o potencial de aquecimento global, mas não “aparece” carbono no sistema. E se o boi for confinado? Se for confinado, come o carbono do milho, da soja, etc, que tam-bém pegaram o carbono da atmosfera.

Bom, se o carbono vem do capim, como será que essa coisa funciona? Como será o balanço de carbono do pasto?A simples a conversão de cerrado para pastagem, ao contrário do que muitos acr-editam, acumula em média 1,3 Mg ha-1 ano-1 de C, com amplitude de -0,9 a 3,0 Mg ha-1 ano-1. A

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variação ocorre em função do manejo que se emprega. Pode-se concluir que a recuperação de uma área de 24 milhões de ha de pastagem degradadas que se estima existir no cerrado, com melhoria do manejo, resultaria em acúmulo de 36 milhões de t de C por ano. Repare que esse número é mais de três vezes maior que os 11,4 milhões supostamente emitidos por ano pelo rebanho brasileiro.Ainda na região dos cerrados, em diferentes sistemas de uso e manejo da terra, os maiores estoques de C estão relacionados com a presença de forrageiras, resultando na seguinte ordem decrescente de estoques de C no solo: pastagem permanente > Integração Lavoura-Pecuária sob plantio direto > lavoura em semeadura direta> lavoura em cultivo convencional.

Em regiões originalmente sob Mata Atlântica, a pastagem bem manejada fixa 2,7 t ha-1 ano-1 de car-bono, em média, enquanto que na região Amazônica a média é de 300 kg ha-1 ano-1. Note-se que são pastagens sob pastejo, ou seja, com boi comendo. O simples fato de se adubar a pastagem, ou seja, melhorar o nível de proteína, pode diminuir aproximadamente em 15% a quantidade de metano emitido por kilo de matéria seca ingerida. Assim, é bom lembrar que a pastagem degradada é bem menos eficiente porque, além do baixo teor de proteína, o capim cresce pouco e, portanto, fixa pouco carbono da atmosfera. Mas, mesmo assim, o boi comendo em pasto ruim só pode emitir o que comeu. Ou seja, pode não haver ganho de carbono no solo, mas não pode haver emissão líquida, porque mágica não existe.

Para o boi em confinamento, a introdução de tortas com elevado teor de gordura nas dietas pode auxiliar na mitigação de metano entérico. Recentemente, uma tese apresentada à Escola Superior de Agricultura, em Piracicaba, comparou as emissões de carbono de três sistemas de produção, ou seja, a média brasileira, um sistema intensivo a pasto e um sistema intensivo a pasto com terminação em confinamento. Quanto mais intensivo o sistema, maior foi a emissão de carbono, mas a produção foi muito maior.

Assim, os sistemas intensivo a pasto e intensivo a pasto com terminação no cocho resultaram em emissões de carbono 29 e 38 % menores por kg de carne produzida. Isto é, a produção de grãos resulta em maiores emissões de GEE provenientes de combustíveis fósseis utilizados na fase de produção, mas o uso estratégico dos grãos na fase final de terminação aumenta a produtividade do sistema de forma a reduzir a produção de metano por unidade de carne e reduzir o impacto desta atividade sobre o clima.

Agora, vamos retomar aquela conta do início, mas levando em conta que não existe boi sem comida, sem pasto.Contando as estimadas 200 milhões de cabeças de bovinos no Brasil, que ocupariam talvez 70 milhões de hectares de pastos bem manejados. Se considerarmos o seqüestro de apenas 1 t ha-1 ano-1 de carbono, a pecuária estaria fixando no solo algo em torno de 70 milhões de toneladas de carbono, ou cerca de 90 milhões de toneladas de metano, equivalentes a aproximadamente 2,0 bilhões de toneladas de CO2, já descontados os gases emitidos. O bandido virou mocinho? Ou será que existem interesses não confessados em prejudicar o desenvolvimento de nossa pecuária?Como já se disse, uma estatística bem torturada revela qualquer coisa.

O governo brasileiro assumiu, em uma convenção em Genebra, compromisso voluntário de reduzir as emissões de carbono no País entre 36,1 e 38,9 % até 2020. Nesta previsão a pecuária deverá con-tribuir com quase 2/3, recuperando pastagens e implantando sistemas integrados lavoura-pecuária e lavoura-pecuária-floresta. A proposta do governo implica em investimento estimado em mais de R$ 50 bilhões. Para fazer frente ao investimento foi instituído o Programa de Agricultura de Baixo Carbono, que vem capengando desde sua divulgação, e até agora não vem cumprindo as metas estabelecidas.

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Resumindo, nossos pastos podem sim, produzir proteína de boa qualidade, empregos e renda, ao mesmo tempo que mitigam a emissão de gases de efeito estufa. Basta para isso que os pastos sejam bem manejados, bem administrados, ou seja, que se use o conhecimento que já temos e que esta-mos desenvolvendo. Para isso precisamos decapacidade de investimento e de gente com treinamento adequado. Do peão ao gerente.

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MAIS LEI, MENOS EMPREGO, MENOS TÉCNICA, MENOR SUSTENTABILIDADE

Por Ciro Antonio Rosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

As relações de trabalho no campo são regulamentadas pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), da mesma forma que na cidade. Mas, além da CLT, existe a NR 31 (Norma reguladora 31), de março de 2005, tem por objetivo estabelecer os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho em áreas rurais. Ali são definidos uma série de procedimentos, cuidados e normas. Por exemplo, a distância entre colchões de beliche deve ser de, no mínimo, 110 cm, ou ainda, devem ser considerados 0,60 m de mictório para cada trabalhador. A falta de observação deste conjunnto de normas caracteriza o tal “trabalho escravo”, que tanto temos visto na mídia. A punição normalmente é severa, indo desde a imposição de pesadas multas até detenções temporárias e boqueio de crédito. Essa legislação é tida como um transtorno no meio rural.

Após 7 anos de vigência desta norma, quais as consequências nas fazendas?É fato conhecido há muito tempo que, na maioria dos casos, a melhor técnica recomenda que o fertilizante seja colocado no solo, abaixo e ao lado das sementes. Mas, ao contrário disso, qualquer pessoa que viaje pelas áreas agrícolas mais importantes do País notará que, na maioria dos casos, se coloca todo o fertilizante na superfície do solo. Isso leva, muitas vezes, a aumento de risco da atividade, menor eficiência do insumo e enfim, perda de produtividade. O caso mais clássico é o do fósforo, elemento caro e finito, em boa parte importado. Outro problema muito comum é uso de máquinas distribuidoras de corretivos e fertilizantes em velocidade e espaçamentos maiores que os ideais, o que tambem resulta em menor eficiência do insumo, terreno manchado, lavoura irregular, aumento de risco e perda de produtividade e de qualidade. Essas falhas por certo diminuem a sustentabilidade do sistema. Bem, e porque, sabendo disso, os agricultores não adotam o que seria o certo? Porque a indústria de máquinas acaba, em função da demanda, por oferecer máquinas que não seriam as mais adequadas para a agricultura brasileira? Um exemplo dessas máquinas são as semeadoras sem espaço para fertilizante. A resposta de 100% dos agricultores quando colocados frente a este questionamento é dizer que o aspecto operacional acaba prevalecendo. Ou seja, as máquinas precisam ter um altíssimo rendimento de campo, mesmo que em detrimento da melhor tecnologia. Por quê? Porque de outro modo seria necessário mais máquinas e, consequentemente, mais operadores. As máquinas existem, assim como existe financiamento favorecido para sua aquisição. Mas, e os operadores? Outra resposta unânime: quanto menos gente, melhor! Melhor porque as leis são inadequadas, porque há pouca

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gente treinada, porque os riscos de gerar empregos, treinar pessoas acaba sendo maior que o risco de usar tecnologia inapropriada. Gente, alguma coisa está errada. O agricultor assume o riscode fazer uma agricultura pior para escapar do risco de trabalhar com funcionário mal preparado, amparado por uma legislação exagerada.

Uma legislação que resulta em desemprego, desestimula treinamento, aumenta o risco da atividade e compromete a sustentabilidade do sistema precisa ser modificada. Mas, enfim, de quem é a respon-sabilidade? Não é mesmo interessante? Onde o governo exige dos outros, sobra governo. Onde o governo deveria esta presente com educação e treinamento, falta governo. Soa familiar?

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COISAS DO SÉCULO XXIPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Os norte-americanos são bastante afeitos a conceituar e rotular as transformações que ocorrem na sociedade. Como agora, quando começam a se referir mais e mais ao chamado “foodmovement” (movimento da comida), que vem aumentando e traduz o crescente interesse das pessoas em saber de onde a comida vem e como foi produzida.

Pelo mundo afora, o setor alimentar começa a ficar sob vários focos de pressão: propostas de novas regulamentações para refrigerantes; movimentos pelo direito dos animais; campanhas de saúde públi-ca contra o uso de antibióticos na ração animal; ambientalistas relacionando agricultura e mudanças climáticas; petições online para banir certos ingredientes de alimentos industrializados etc.

Pensando-se sistemicamente, o que está em jogo não é essa ou aquela questão em particular, mas a confiança da opinião pública nas cadeias produtivas de alimentos. Esse, talvez, tenha que ser o foco de nossas reflexões.Parece que o sistema alimentar – ou pelo menos suas grandes indústrias e cadeias produtivas – está sofrendo crescente assédio de seus consumidores, cada vez mais céticos e ariscos.

E não vamos nos iludir se isso ainda não chegou plenamente ao Brasil. No mundo sem fronteiras e totalmente conectado, uma proposta de mudança local – como rótulo especial para alimentos com OGMs (Califórnia),ou novo manejo de matrizes suínas (fornecedores McDonalds, EUA) – traz sim um potencial de gerar transformações ou políticas mais amplas, nacionais e internacionais.

Há muito empresário do agronegócio brasileiro e mundial de olho nessas evoluções e já fazendo a sua lição de casa. A PepsiCo, por exemplo, tem um programa de sustentabilidade e rastreabilidade na cultura da batata, com o qual monitora todos os seus fornecedores e oferece suporte técnico para práticas agrícolas sustentáveis, produtividade e gestão da produção.

De acordo com a empresa, o programa tem impacto direto na reputação das suas marcas Lays e Ruf-fles. Já foi implantado no Peru, Equador e Colômbia, e agora vai para o Caribe. Bem aqui no Brasil,há uma empresa paulista de suinocultura, verticalizada da granja ao frigorífico (Bressiani), que já se orga-nizou para ter rastreabilidade de todos os ingredientes usados na alimentação dos animais que cria e abate. Isso é marketing em sintonia com o futuro.

Pode ser que alguém ainda pense em rotular o “movimento da comida” como uma “irracionalidade” re-

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strita a certos mercados e grupos de consumidores. Estrategicamente, contudo, é preferível perguntar-se: quem poderá ser o próximo?

Antes de responder, no entanto, já comece a pensar em um dos princípios estratégicos do marketing contemporâneo: na nossa aldeia global, é preferível contar antes a sua própria história, do que esperar que ela seja contada por outros. São coisas do século XXI...

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PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AGRONEGÓCIO NOS PRÓXIMOS 10 ANOS

Por José Luiz Tejon Megido, Diretor Vice Presidente de Comunicação do Conselho Cientifico para a Agricultura Susten-tável (CCAS; Publicitário, jornalista e escritor de 28 livros em autoria e coautoria; Autor do blog Cabeça de Líder, da Revista

Exame; Professor de MBA da ESPM e da FGV.

Sob a inspiração de dois admiráveis líderes do setor no Brasil, os ex-ministros Alysson Paolinelli e Ro-berto Rodrigues, participamos do Centro Oeste Tempo 3, em Brasília, em novembro. O evento teve como foco o planejamento estratégico do desenvolvimento sustentável do agronegócio para os próxi-mos 10 anos.

Presentes nas apresentações Maurício Lopes, presidente da Embrapa; phd Antônio Licio; Marcelo Dourado, superintendente da Sudeco; senador Rodrigo Rollemberg; Rodrigo Mesquita, fundador da Agência Estado e membro do MIT no Brasil; representantes dos ministérios da Integração Nacional, da Agricultura, da CNA; Jose da Costa Carvalho Neto, presidente da Eletrobras; Fernando Barros; e per-sonalidades fundamentadas em profundos estudos sobre as questões e os desafios do agronegócio brasileiro para os próximos 10 anos.

Um dos estudos extraordinariamente surpreendentes foi do economista, Antônio Licio, mostrando que não temos nos cerrados brasileiros mais do que 7 ou 8 milhões de hectares disponíveis para grãos, e, como nas demais regiões brasileiras, já esgotamos áreas virgens. A revelação é de que não existem alternativas fora da tecnologia, da pesquisa e do uso intenso do conhecimento já disponível no Brasil.

O trabalho também esclarece que não conseguiríamos, mesmo que quiséssemos, ultrapassar 20% do total da área brasileira, para o plantio e a criação. A mãe natureza determina isso, independentemente de leis, códigos ou outras ingerências humanas. Plantar e criar fora do que a sabedoria natural já deter-mina, seria inviável, e conduziria essas tentativas ao prejuízo inexorável. Sobre o aspecto da demanda futura, por mais que façamos, não conseguiremos ampliar a oferta de maneira superior ao que se es-pera de demanda para os próximos 10 anos.

Carnes de frango, suíno , bovina, grãos, milho, soja, óleo de soja, arroz, trigo são produtos que vão solicitar o equivalente a 50 milhões de ha adicionais, o que será impossível de ser feito, neste espaço de tempo. A noticia é boa para produtores rurais. Preços continuarão consistentes e demanda superior a oferta. O estudo está lastreado na tendência da renda mundial, e do efeito de elasticidade de renda. Para os consumidores, a luta antidesperdício será essencial, mas não há cenário de produtos baratos nessa cesta básica do grosso do agronegócio global.

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Será na pecuária que o avanço tecnológico precisará galopar em altíssima velocidade. Os estudos ainda revelam que se passarmos, no Brasil, para uma produtividade de uma cabeça e meia por ha, podemos liberar 20 milhões de ha adicionais para a agricultura. Quer dizer, fazer duas ou três safras por ano será fundamental, como também, crescer na produtividade do milho, marcantemente potencial, saindo de uma produtividade média de cerca de 3.500 kg/ha, para mais de 10 mil, pois este cereal permite.

Dados apresentados também revelam que jogamos fora, todo ano, cerca de US$ 5 bilhões, por culpa da infraestrutura e logística. Se eliminássemos a burocracia desnecessária no transporte das mercador-ias, da origem ao destino, diminuiríamos em até 20% o custo pós-porteira das fazendas.

Na concentração da produção, os dados revelam a necessidade de acesso de tecnologia aos peque-nos e médios, e a carência de uma revisão da extensão rural e da força ao cooperativismo. Das cerca de 4 milhões e 500 mil propriedades rurais no Brasil, apenas 500 mil produzem 87% de toda produção nacional. Quer dizer, temos em torno de 4 milhões de propriedades com baixíssima produção e fora da renda e da tecnologia.

A notícia boa é a de que temos conhecimento, tecnologia, propostas, como a integração lavoura-pecuária-florestas, por exemplo; e técnicos, pesquisadores, gestores e gente competente. Precisamos colocar esse conhecimento e essas pessoas protegidas das provocações político-partidárias, e pro-mover um debate produtivo fora de desejos ideológicos, reunidos exclusivamente pelo firme desejo e necessidade de colocar o Brasil acima de tudo.

Para isso, torna-se essencial o diálogo com a sociedade. Rodrigo Mesquita mostrou a importância da governança das redes sociais para o futuro do agronegócio. Não bastará apenas comandar a tecnolo-gia e fazer choques de gestão do lado de dentro das porteiras. Será preciso engajar e comover toda a sociedade em função da causa da produção com sustentabilidade e saudabilidade.

Não se terá de criar mais um site ou um portal, e sim de uma central de conhecimento sobre origens, destinos, fontes, opiniões e percepções dessa vasta rede. O mundo hoje virou uma central de comu-nicação de muitos para muitos, e não mais de poucos para muitos como no passado. Do meu lado mostrei que o pensamento do setor urbano sobre o campo não é uma massa escura, tenebrosa e negativa, como pensam muitos. Trata-se de uma colcha de retalhos claros, aspiracionais e positivos, mesclados com outros desinformados e negativos, porém há uma relatividade nessa percepção que precisa ser estudada e compreendida.

O fato é que a sociedade urbana brasileira mudou muito nos últimos 30 anos, e, da mesma forma a agrícola. Precisamos apresentar competentemente uma para a outra. Meu conselho e opinião é: fazer propaganda do agronegócio brasileiro sim, mas tem que ser tão bem feito, que não pode parecer pro-paganda. A necessidade é a de elevar o valor estimativo pelos ativos do campo e pelo agricultor como categoria profissional na sociedade, sem o que a democracia pode vir a ser indesejavelmente perversa aos destinos da segurança e dos negócios energéticos, agropecuários e alimentares da nação. Sem comunicação competente não se joga o jogo democrático.

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SLOW FOOD: UM MOVIMENTO PELO ALIMENTO BOM, LIMPO E JUSTO

Por Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

Como pode ao mesmo tempo comer bem e ajudar a preservar o meio-ambiente e a diversidade? Tem-se a impressão que com a modernização das cidades e a proliferação da comida estilo fast-food essa tarefa se torna cada dia mais difícil. Uma possível solução é proposta pelo movimento SLOW FOOD. Deve-se comer devagar, isto é, slow, para apreciar e pensar de onde se originam os alimentos e, com isso, rever o nosso estilo de vida.

O Slow Food é uma ideia, um movimento e uma organização não lucrativa com raízes na cidade de Bra, região do Piemonte, na Itália. O grupo por trás da ideia, liderado pelo atual presidente do movimento Carlo Petrini, começou a se encontrar por volta de 1980 com o intuito de promover tradições da região, entre elas a música e a cultura culinária, que se viam ameaçadas de caírem no esquecimento por conta de mudanças no estilo de vida acarretadas pela velocidade da vida contemporânea. Quando, em 1986, o símbolo maior do fast-food, isto é, da comida rápida, a lanchonete McDonald’s inaugurou uma filial aos pés das famosas escadarias da Pizza di Spagna em Roma, este grupo organizou um protesto e se inspirou para criar o nome SLOW FOOD e seu símbolo: um simpático caracol para designar o movimento. Hoje o SLOW FOOD possui mais de 80 mil membros espalhados por 104 países.

O conceito central a nortear as ações do movimento é o de eco-gastronomia, segundo o qual a qualidade da comida e da bebida à mesa está intimamente ligada ao trabalho de produtores rurais, ao meio-ambiente e a preservação da bio-diversidade. Portanto, para o SLOW FOOD, comer bem não é apenas uma questão de prazer, é também uma bandeira que significa questionar o estilo de vida simbolizado pelo fast-food: comida a ser engolida apressadamente num shopping center, feita a partir de insumos encontrados na ponta final de uma longa cadeia de produção cujo objetivo primordial é a obtenção do lucro. Lutar pela boa comida significa valorizar a biodiversidade local e o conhecimento tradicional do seu cultivo e consumo.

Um dos principais eventos promovidos pelo SLOW FOOD é o Salão do Gosto / Terra Madre realizado a cada dois anos em Turim. O último aconteceu no final do mês de outubro de 2012 e reuniu 22 mil produtores, acadêmicos e gastrônomos em torno da luta por um alimento Bom, Limpo e Justo. Vários produtos brasileiros estiveram presentes levados pelas mãos de produtores e chefes de cozinha com destaque para frutas como jatobá, pequi, umbu e para a mandioca.

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O SLOW FOOD se articula localmente através de seus convivium, organizações que unem associados e produtores de acordo com as especificidades de cada região. No Brasil existem 32 representações do movimento. Se você se identificou com a filosofia do SLOW FOOD procure um convivia através do site http://www.slowfoodbrasil.com/.

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DEZEMBRO

DEZEMBRO

INTEGRAÇÃO, LAVOURA-PECUÁRIA, FLORESTA?

COORDENAÇÃO, LIDERANÇA E AMBIÇÃO

FILMES DE PVC, PROTEÇÃO E RISCO

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INTEGRAÇÃO, LAVOURA-PECUÁRIA, FLORESTA?Por Ciro AntonioRosolem, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Facul-

dade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

Os diversos tipos de Integração Lavoura-Pecuária (ILP), ou Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) são o mais recente e significativo avanço na agricultura tropical. A integração agrega valor ao trabalho do agricultor, melhora sua vida econômica, diversifica a atividade agrícola, diminui as variações de produtividade de safra para safra, é muito recomendável do ponto de vista da sustentabilidade do sistema, uma vez que pode melhorar o solo, diminuir perdas de nutrientes e ajudar na mitigação da emissão de gases de efeito estufa. Uma maravilha. Após alguns anos e muitas experiências, alguma água já passou embaixo da ponte. Não seria hora de uma avaliação precisa dos prós e contras dos diversos sistemas de integração?

A Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) tem sido a menina dos olhos da EMBRAPA, que tem investido tempo e dinheiro em seu desenvolvimento e divulgação. Tanto, que é uma das atividades prioritárias dentro da linha de financiamento de Agricultura de Baixo Carbono, do Governo Federal. Será que essa modalidade realmente tem tantos méritos? As vantagens que tem sido atribuídas são: eleva-ção da renda do agricultor, correção solo e produção de grãos, melhoria do pasto, conforto animal.

Poucos tem se dedicado aos problemas. Seria mesmo uma integração? Dois ou três anos de lavoura, depois pasto e floresta. Assim, não me parece correto o termo ILPF, talvez integração Pecuária-Floresta fosse mais certo. Como fica então a estrutura montada para produção de lavouras? A floresta somente será colhida em nove ou dez anos, no mínimo. E o pasto como fica? Sabe-se que o pasto recém refor-mado produz muito mais, e que essa produtividade cai ano a ano se não for adubado. No terceiro ou quarto ano do pasto a produtividade pode ser igual à inicial, dependendo do estado de degradação em que estava. Assim, como fica a sustentabilidade? Sabe-se hoje que, pelo menos até 6-8m da linha do eucalipto, existe concorrência pela água, além da concorrência pela luz, o que resulta em pasto menos produtivo em pelo menos 2/3 da área, dependendo da largura do renque de eucalipto. Assim, como fica a produtividade do sistema? Uma vez colhidas as árvores, com o pasto já em degradação, como arrancar os tocos e formar nova pastagem? Assim, como ficam os custos? Árvores distantes umas das outras desenvolvem galhos, que não devem estar presentes em toras. Há que se fazer desgalhamento, deixando os galhos no pasto. Alguém já perguntou a um peão como seria fazer o rodeio de uma boiada nelore no meio de árvores e galhos?

Há muitos agricultores e pecuaristas aderindo à ILPF, com ou sem financiamento oficial. Há realmente vantagens, mas, será que superam as desvantagens? A Integração Lavoura Pecuária (ILP) está con-

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solidada no País, em diversas modalidades. A grande maioria dos problemas se encontram, se não resolvidos, pelo menos equacionados. Já a ILPF ainda carrega incógnitas importantes, merecendo estudos aprofundados e mais abrangentes. Por se tratar de atividade que interfere significativamente no uso futuro da área, acho que não deveríamos ir com tanta sede ao pote.

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COORDENAÇÃO, LIDERANÇA E AMBIÇÃOPor Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos

do Agronegócio da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Nos anos 70, uma família operária ou de classe médiagastava cerca de 200 minutos para preparar uma refeição trivial. Hoje, nas camadas sociais médias das mega cidades, com a mulher inserida no mercado de trabalho, são gastos cerca de 15 minutos. O que significa isso?

Quer dizer que a conveniência dominou o consumo alimentar, aumentando a presença de comida industrializada, semi-preparada, com porções reduzidas e embalagens facilitadoras. Significa,também, que os apelos sensoriais da maioria dos alimentossão expostos e “percebidos” pelas pessoas já no ponto de venda (é o marketing dos alimentos).

Nesse cenário, cresce a importância da escala, da eficiência e da qualidade na produção. Sustentabili-dade também conta, seja para garantir a produtividade futura, seja para criar novos apelos de consumo e agregação de valor. E ainda há um trio de influência crescente na escolha dos alimentos, que ésua origem, segurança sanitária ou nutricional.

Juntando tudo, temos o combustível para a hegemonia de um modelo de gestão da produção ru-ral marcado fortemente pela coordenação entre setores, dentro das próprias cadeias produtivas.Ele também é conhecido como “marketing reverso”, pois em geral vem sendo capitaneado por grandes marcas do pós-porteira. Veja alguns exemplos.

A Pepsicodesenvolve há três anos um programa de coordenação entre bataticultores do Equador, Colômbia e Peru, com o objetivo de alinhar seus fornecedores a padrões melhores de tecnologia, produtividade, perfil de produto e sustentabilidade.

Uma grande rede de supermercados e uma marca de agroquímicos desenharam uma parceria em ação técnico-educativa para maior capacitação do campo em controle fitossanitário de hortifrutis, de olho na segurança e qualidade dos produtos.

A qualidade da carne suína tem a ver com aspectos do manejo pré-abate dos animais e hoje já se vê a integração de agroindústrias com especialistas de empresas de genética,buscando melhorias no manejo final dos cevados, nas granjas fornecedoras.

São ações de coordenação dentro das cadeias, todas visando ganhos de percepção e valor na ponta

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do consumo. Emergem no campo silenciosamente e estão construindo um novo ambiente competitivo para o produtor. E por que não liderar ou co-liderar esses processos, antecipando-se e buscando parcerias no pós-porteira – seja individualmente ou através de associações e cooperativas?

Preparar-se para essa realidade emergente pode ser uma sintonia com o futuro. Talvez precise de um empurrãozinho de ambição competitiva e liderança. Afinal, com mudança não se discute; fica-se de olho, até porque pode vir a ser uma grande oportunidade.

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FILMES DE PVC, PROTEÇÃO E RISCO Por Luiz Carlos Bhering Nasser, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS); Pós-Doutor em Biolo-

gia Ambiental e Professor do UniCEUB.

As últimas décadas têm sido marcadas pelo uso crescente de plásticos para embalar alimentos. Dentre estes, pode-se destacar o poli (cloreto de vinila) (PVC) por ser versátil e compatível com vários plastifi-cantes. O PVC na forma de filme é amplamente utilizado para embalar frutas, legumes, carnes, queijos, sanduíches, entre outros, uma vez que é comum sua utilização não somente nos estabelecimentos comerciais, mas também nas residências.

As embalagens de alimentos, dentre suas funções, visam proteger o produto da contaminação externa (a exemplo de agentes químicos, físicos como cabelos, agentes microbianos, roedores). Porém, a possibilidade de que ocorra contaminação do produto por constituintes da própria embalagem não pode ser negligenciada, principalmente por estar diretamente relacionada com a saúde humana con-siderando a segurança alimentar e a qualidade dos alimentos.

Felizmente existem legislações que regulamentam os materiais e os aditivos que podem ser utilizados na produção de embalagens que estarão em contato direto com produtos alimentícios, suas concen-trações e seus limites de migração permitidos de forma a não afetar a saúde do consumidor Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA); Grupo do Mercado Comum (GMC) – MERCOSUL; Comuni-dade Européia (CE), FDA (Food and Drug Adminstration).

Alguns dos aditivos utilizados em materiais de embalagem podem apresentar potencial carcinogênico, segundo indicam estudos epidemiológicos. Dentre os plastificantes comumente utilizados o estearato de butila, citrato de acetil-tribulila, sebacato de alquila e adipatos apresentam baixa toxicidade, já os ftalatos têm seu potencial carcinogênico e histogênico mais acentuado.

Em avaliação da migração (ANVISA - RDC 105/99; 17/08, 51/10; CE - Diretivas 2005/79, 2002/72, 82/711 e 85/572) de alguns plastificantes utilizados na produção de filmes de PVC encontrados no mercado para estarem em contato com alimentos, sendo estes testados utilizando simulantes de alimentos (atestados por órgãos federais) (5±1°C e 20±2°C) e alimentos como queijo mussarela e presunto (5±1°C - como encontrado no mercado), os plastificantes apresentaram maior tendência a migração à temperatura mais elevada e em maiores concentrações para o produto mais gorduroso (queijo). Em alguns casos os limites especificados por legislação foram excedidos. Estes dados foram resultados de tese de Doutorado defendida pelo Programa de Pós-graduação de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa pela professora do Departamento de Engenharia de

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Agronegócios da Universidade Federal Fluminense-Volta Redonda, Nathália Ramos de Melo.

Os ensaios de migração, regulamentados, podem não ser adequados para avaliar a forma real como as embalagens vêm sendo utilizadas no contato com os alimentos nos dias de hoje, principalmente em uso doméstico. As embalagens são desenvolvidas para uma utilização previamente determinada, uma embalagem que é ótima para um produto pode não ser adequada para outro. Um filme de PVC contendo determinados plastificantes (como ainda encontramos no nosso mercado) é adequado para uso em contato direto com produtos secos, frutas, verduras, produtos ricos em água, mas devem ser evitados em contato com produtos como queijos, carnes prontas, maionese, pratos prontos como lasanhas, no geral, devem ser evitado seu contato com produtos gordurosos.

Dezembro/2012

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Participação em eventos

EVENTO DE DIA DE CAMPO PROPÕE AÇÕES SUSTENTÁVEIS AOS PRODUTORES RURAIS

CCAS PROMOVE EVENTO PARA PROMOTORES DE MATO GROSSO

CCAS PARTICIPA DO 1º ENCONTRO DO TRABALHADOR RURAL DE ARARAQUARA E REGIÃO

CCAS PARTICIPA DA 3ª EDIÇÃO DO CROP WORLD SOUTH AMERICA 2012

CCAS PARTICIPA DO ENCONTRO INTERNACIONAL DE MOFO BRANCO

CCAS PARTICIPA DO CONGRESSO BRASILEIRO DE FITOPATOLOGIA

CCAS PARTICIPA DO 3º SIMPÓSIO SOBRE RESISTÊNCIA A PRODUTOS FITOSSANITÁRIOS

CCAS DEBATE SOBRE OS DESAFIOS DA SOJA EM PASSO FUNDO/RS

CCAS PARTICIPA DE DEBATE SOBRE ALIMENTAÇÃO MUNDIAL EM BRASÍLIA/DF

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EVENTO DE DIA DE CAMPO PROPÕE AÇÕES SUSTENTÁVEIS AOS PRODUTORES RURAIS

Em busca de ações mais sustentáveis no campo, uma equipe de professores da Unesp/ Faculdade de Ciências Agronômicas, coordenada pela professora e conselheira do CCAS – Conselho Científico para Agricultura Sustentável, Rumy Goto, realizou no mês de março um Dia de Campo. O objetivo do evento foi transmitir o conceito de sustentabilidade através do melhor uso de água de irrigação e de fertilizantes.

“Sabemos que a produção de hortaliças depende totalmente do fornecimento adequado de água, sendo que, tanto a falta quando o excesso são prejudiciais, quer seja do grupo das folhosas, raízes ou tubércules”, explica Rumy.

Ao todo, 28 produtores de pimentão, tomate e pepino participaram do evento. Todos eles fazem parte do Projeto de Olericultura – Grupo de Pirajuí, do SEBRAE-SP.

Abril/2012

CCAS PROMOVE EVENTO PARA PROMOTORES DE MATO GROSSO

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) promoveu um encontropara os promotores de meio ambiente de Mato Grosso, na manhã de ontem, no Hotel Deville de Cuiabá. O tema escolhido foi “A Comunicação na Agricultura Sustentável” comandado pelo membro do CCAS, Coriolano Xavier. Na ocasião, José OtavioMenten, presidente do CCAS, apresentou as atividades do conselho e seus objetivos e mostrou, ainda, a importância da informação. Ressaltou que os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que co-mungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. “São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõe a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas”, refor-çou.

A iniciativa em realizar o encontro foi muito elogiada pelos promotores da região e outros eventos estão sendo estudados, para dar continuidade a essa troca de informações. Para Coriolano Xavier, o CCAS deve continuar procurando levar conhecimento para todas as pessoas envolvidas com as atividades do campo. “Temos que valorizar e promover junto a sociedade e seus representantes legais, como os promotores públicos, a agricultura sustentável, que na prática pode ser resumida como ações que incrementem a produção agrícola e qualidade dos alimentos, fibras e energia, produzidas de forma sustentável”, diz Coriolano Xavier.

Junho/2012

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CCAS PARTICIPA DO 1º ENCONTRO DO TRABALHADOR RURAL DE ARARAQUARA E REGIÃO

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participa do1º Encontro do Trabalhador Rural na cidade de Araraquara, interior de São Paulo. O evento acontecerá no dia 29 de maio, das 08h às 17h30, no Centro Internacional de Convenções “Dr. Nelson Barbieri”.

O presidente do CCAS, José Otavio Menten, estará presente para ministrar a palestra “Agrotóxico, Boas Práticas e Manuseio”. “Precisamos levar conhecimento aos trabalhadores do campo, desenvolver ações que ajudem no dia a dia e garantam qualidade de vida e segurança”, destaca Menten.

Outros temas também serão abordados: prevenção da intoxicação, mapa de risco e inspeção em ambiente rural. Esse é o primeiro evento destinado ao trabalhador do campo organizado pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador. Para participar é preciso se inscreve pelo e-mail: [email protected] ou pelo telefone: (16) 3331-6232.

Maio/2012

CCAS PARTICIPA DA 3ª EDIÇÃO DO CROP WORLD SOUTH AMERICA 2012

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participa da 3º Edição do Crop World South America 2012, uma das mais importantes conferências de agronegócios da América Latina. O evento acontecerá nos dias 22 e 23 de maio, na Amcham Business Center, em São Paulo/SP, das 08h às 18h.

No segundo dia do evento, o presidente do CCAS, José Otavio Menten, estará presente para participar do painel que discutirá análises, tendências e projeções da oferta e demanda mundial no mercado de produção e proteção agrícola nos próximos 20 anos.

“É uma excelente oportunidade de estreitarmos o relacionamento com os profissionais do setor e tam-bém apresentarmos o CCAS que valoriza e incentiva a discussão sobre temas do setor agrícola desde agricultura sustentável, alimentos saudáveis até biotecnologias, código florestal etc.”, declara Menten.

Interessados em participar podem efetuar a inscrição por meio do telefone: (11) 4689-1935 ou obter mais informações através do site: http://www.cropworldsa.com.br/

Maio/2012

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CCAS PARTICIPA DO ENCONTRO INTERNACIONAL DE MOFO BRANCO

Evento reuniu cooperativas, agricultores, consultores e palestrantes de diversos países

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participou do Encontro Internacional de Mofo Branco nessa semana, no SlavieroConvention Center, na cidade de Ponta Grossa, PR. O evento, organizado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, teve como tema “Globalizando o problema, fundamentando soluções” e contou com a participação de cooperativas, agricultores, consultores e palestrantes de diversos países.

“O objetivo foi debater a situação atual do mofo branco: os problemas causados pela doença e as inovações para seu manejo”, explica José Otavio Menten, presidente do CCAS que ministrou uma pal-estra nessa quarta-feira, para falar sobre a situação atual e perspectivas do uso de produtos químicos no manejo de mofo branco.

O evento termina hoje. Mais informações através do site:http://www.eventos.uepg.br/eimofobranco/

Julho/2012

CCAS PARTICIPA DO CONGRESSO BRASILEIRO DE FITOPATOLOGIA

Presidente do conselho fez palestra sobre o impacto no ensino de fitossanidade no Brasil

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participou do 45º Congresso Brasileiro de Fitopatologia, na cidade de Manaus/AM. O tema central do evento foi “Fitopatologia Tropical e Sus-tentabilidade” que teve como objetivo reunir, discutir e divulgar informações e novas tecnologias para o desenvolvimento da fitopatologia no país.

O presidente do CCAS, José Otavio Menten, fez uma palestra sobre “CONFEA e o impacto no ensino da fitossanidade no Brasil”. “Nosso foco é apontar as necessidades de aprimoramento da matriz de conhecimento na área de defesa vegetal, como a inclusão dos conteúdos das principais doenças nas culturas de importância econômica, toxicologia de defensivos agrícolas, tecnologia de aplicação, pra-gas agrícolas e urbanas”, destaca Menten.

Para saber mais informações, acesse: www.sbfito.com.br Agosto/2012

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CCAS PARTICIPA DO 3º SIMPÓSIO SOBRE RESISTÊNCIA A PRODUTOS FITOSSANITÁRIOS

Presidente José Otavio Menten coordena evento realizado pela ESALQ/USP

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participa do 3º Simpósio sobre Resistência a Produtos Fitossanitários, nos dias 03 e 04 de outubro, no anfiteatro da engenharia da ESALQ/USP, em Piracicaba, interior de São Paulo.

O tema principal será “Planejamento do Sistema de Produção de Cultivos: chave para o manejo da resistência” e está sob coordenação do presidente do CCAS, José Otavio Menten, também professor associado da universidade. “Nosso objetivo é difundir novos conhecimentos sobre resistência a produ-tos fitossanitários para os alunos e também profissionais da área”, destaca Menten.

O simpósio tem carga horária de 16 horas e conta com 200 vagas. Para se inscrever é preciso enviar a ficha de inscrição preenchida e comprovante de pagamento da taxa de inscrição para o e-mail da organização do simpósio. Mais informações através do telefone: (19) 3417-6604 / 3417-6601 ou pelo e-mail: [email protected].

Setembro/2012

CCAS DEBATE SOBRE OS DESAFIOS DA SOJA EM PASSO FUNDO/RS

Conselheiro Dirceu Gassen coordena painel sobre a proteção do potencial de produção da soja

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participa do evento “Atualização soja para altos rendimentos: o desafio dos 100 sacos por hectare” que será realizado nessa quarta-feira, dia 12 de setembro, no Centro de Eventos da Universidade de Passo Fundo/RS. A programação do evento está dividida em dois painéis: “A proteção do potencial de produção da soja” e “A construção do po-tencial de produção da soja”.

O primeiro painel será coordenado pelo conselheiro do CCAS, Dirceu Gassen, que abordará temas importantes como plantas daninhas, doenças e eficiência nos métodos de aplicação para o melhor resultado na proteção das plantas. “É importante trocarmos informações e experiências que ajudem no dia a dia do campo e, consequentemente, cooperam para o avanço da nossa agricultura”, destaca Gassen. O conselheiro também fará uma palestra durante o segundo painel sobre “A lógica da planta da soja: os requerimentos e as características de manejo para altos rendimentos”.

O evento começa às 8h com encerramento previsto às 18h, no mesmo dia. Mais informações para inscrições pelo telefone: (54) 3311-1235.

Setembro/2012

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CCAS PARTICIPA DE DEBATE SOBRE ALIMENTAÇÃO MUNDIAL EM BRASÍLIA/DF

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) participa do Seminário Centro-Oeste Tempo 3 – Bases para o planejamento estratégico do desenvolvimento sustentável, que acontece nessa terça-feira, dia 13, na cidade de Brasília/DF. Durante o evento serão debatidas questões ligadas ao abastecimento de alimentação mundial já que o Brasil está entre os principais produtores de alimentos.

Representando o CCAS, José Luiz Tejon, diretor vice-presidente de comunicação do conselho, falará da importância da comunicação como elemento estratégico no envolvimento com a sociedade e mídia. A participação está marcada para às 14h20, no Auditório do Parlamundi, prédio da LBV, Brasília/DF.

Estarão reunidos especialistas, ministros de Estado, parlamentares e dirigentes de empresas estatais, entre eles: Alysson Paulinelli, Roberto Rodrigues e Katia Abreu que juntos deverão pensar estrate-gicamente sobre o futuro do país, em especial da região Centro-Oeste que tem potencialidades e condições naturais que ajudarão no desenvolvimento do sistema.

Novembro/2012

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