castro et al 2012_revisão em português

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Oecol. Aust., 16(2): 235-264, 2012 Oecologia Australis 16(2): 235-264, Junho 2012 http://dx.doi.org/10.4257/oeco.2012.1602.05 FLORAÇÕES DE ALGAS NOCIVAS E SEUS EFEITOS AMBIENTAIS Nathália O. de Castro 1 * & Gleyci A. de Oliveira Moser 1 1 Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Faculdade de Oceanografia, Departamento de Oceanografia Biológica, Laboratório de Cultivo e Ecologia do Fitoplâncton Marinho (LABCULT). Rua São Francisco Xavier, 524, 4° andar, sala: 4023, bloco E, Maracanã, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-013. E-mails: [email protected], [email protected] RESUMO O termo florações algais nocivas (FANs) inclui tanto espécies produtoras de toxinas, que podem contaminar consumidores topo através da biomagnificação, quanto os grandes produtores de biomassa, que podem levar à depleção de oxigênio dissolvido na coluna de água e, consequentemente, aumentar as taxas de mortalidade no ambiente marinho, tendo produzido ou não toxinas; além daqueles que provocam efeitos inflamatórios e danos mecânicos à peixes e invertebrados. Em especial, a síntese de toxinas (armazenadas internamente ou secretadas no meio) é considerada uma estratégia do fitoplâncton para reduzir o efeito de potenciais competidores e predadores. Das mais de 5000 espécies conhecidas do fitoplâncton, somente 6% pode ser nociva e menos de 2% produtora de toxina. Originalmente fenômenos naturais comuns às mais diversas regiões do planeta, as FANs apresentam aumento de sua extensão e persistência, relacionadas ao impacto da ação antropogênica responsável pela eutrofização das águas costeiras, transporte de organismos pela água de lastro, crescimento da aquacultura e mudanças climáticas associadas ao crescimento da atividade industrial nos últimos dois séculos. Uma vez que cada espécie apresenta diferentes estratégias adaptativas e responde de diferentes maneiras às modificações do ambiente, defende-se que investigações bem sucedidas serão aquelas que consigam identificar e quantificar as adaptações específicas das espécies causadoras de FANs que levam à sua seleção, em particular às diversas condições hidrodinâmicas e ecológicas. Dessa forma, o presente tabalho visa apresentar uma breve revisão sobre os principais aspectos relacionados ao desenvolvimento dessas florações e, principalmente, relatar alguns casos sobre o impacto de sua ocorrência nas comunidades costeiras. Palavras-chave: alelopatia; biomagnificação; envenenamento; fitoplâncton; ficotoxinas. ABSTRACT HARMFUL ALGAL BLOOMS AND THEIR ENVIRONMENTAL EFFECTS. The term harmful algal blooms (HABs) include both toxin-producing species, which can contaminate top consumers through biomagnification, and high biomass’ producers, that can lead to dissolved oxygen depletion in the water column and, thereby, rise mortality rates in the marine environment, producing toxins or not; as well as those that can cause inflammatory effects and mechanical damage to fish and invertebrates. In particular, synthesis of toxins (internally stocked or released in the medium) is taken as a strategy of the phytoplankton to reduce the effects of potential competitors and predators. Of more than 5000 known species of phytoplankton, only 6% can be harmful and less than 2% produces toxins. Originally natural phenomena common to various regions on our planet, HABs show an increase in their extent and persistence, related to antropogenic impact responsible for coastal water eutrophication, organisms’ transport through ballast water, increase of aquaculture and climate changes associated to the increase in industrial activities for the last two centuries. Once each species shows different adaptative strategies and acts in distinct ways in response to environmental change, it is argued that better investigations will be those that can identify and quantify the specific adaptations of HABs-causing species that are able to lead to their selection, particularly to several hydrodynamic and ecological conditions. Thus, the present work intends to present a summary of the most important aspects linked to the development

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Floração de algas nocivas.

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  • Oecol. Aust., 16(2): 235-264, 2012

    Oecologia Australis16(2): 235-264, Junho 2012http://dx.doi.org/10.4257/oeco.2012.1602.05

    FLORAES DE ALGAS NOCIVAS E SEUS EFEITOS AMBIENTAIS

    Nathlia O. de Castro1* & Gleyci A. de Oliveira Moser11Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Faculdade de Oceanografia, Departamento de Oceanografia Biolgica, Laboratrio de Cultivo e Ecologia do Fitoplncton Marinho (LABCULT). Rua So Francisco Xavier, 524, 4 andar, sala: 4023, bloco E, Maracan, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20550-013. E-mails: [email protected], [email protected]

    RESUMOO termo floraes algais nocivas (FANs) inclui tanto espcies produtoras de toxinas, que podem contaminar

    consumidores topo atravs da biomagnificao, quanto os grandes produtores de biomassa, que podem levar depleo de oxignio dissolvido na coluna de gua e, consequentemente, aumentar as taxas de mortalidade no ambiente marinho, tendo produzido ou no toxinas; alm daqueles que provocam efeitos inflamatrios e danos mecnicos peixes e invertebrados. Em especial, a sntese de toxinas (armazenadas internamente ou secretadas no meio) considerada uma estratgia do fitoplncton para reduzir o efeito de potenciais competidores e predadores. Das mais de 5000 espcies conhecidas do fitoplncton, somente 6% pode ser nociva e menos de 2% produtora de toxina. Originalmente fenmenos naturais comuns s mais diversas regies do planeta, as FANs apresentam aumento de sua extenso e persistncia, relacionadas ao impacto da ao antropognica responsvel pela eutrofizao das guas costeiras, transporte de organismos pela gua de lastro, crescimento da aquacultura e mudanas climticas associadas ao crescimento da atividade industrial nos ltimos dois sculos. Uma vez que cada espcie apresenta diferentes estratgias adaptativas e responde de diferentes maneiras s modificaes do ambiente, defende-se que investigaes bem sucedidas sero aquelas que consigam identificar e quantificar as adaptaes especficas das espcies causadoras de FANs que levam sua seleo, em particular s diversas condies hidrodinmicas e ecolgicas. Dessa forma, o presente tabalho visa apresentar uma breve reviso sobre os principais aspectos relacionados ao desenvolvimento dessas floraes e, principalmente, relatar alguns casos sobre o impacto de sua ocorrncia nas comunidades costeiras.Palavras-chave: alelopatia; biomagnificao; envenenamento; fitoplncton; ficotoxinas.

    ABSTRACTHARMFUL ALGAL BLOOMS AND THEIR ENVIRONMENTAL EFFECTS. The term harmful

    algal blooms (HABs) include both toxin-producing species, which can contaminate top consumers through biomagnification, and high biomass producers, that can lead to dissolved oxygen depletion in the water column and, thereby, rise mortality rates in the marine environment, producing toxins or not; as well as those that can cause inflammatory effects and mechanical damage to fish and invertebrates. In particular, synthesis of toxins (internally stocked or released in the medium) is taken as a strategy of the phytoplankton to reduce the effects of potential competitors and predators. Of more than 5000 known species of phytoplankton, only 6% can be harmful and less than 2% produces toxins. Originally natural phenomena common to various regions on our planet, HABs show an increase in their extent and persistence, related to antropogenic impact responsible for coastal water eutrophication, organisms transport through ballast water, increase of aquaculture and climate changes associated to the increase in industrial activities for the last two centuries. Once each species shows different adaptative strategies and acts in distinct ways in response to environmental change, it is argued that better investigations will be those that can identify and quantify the specific adaptations of HABs-causing species that are able to lead to their selection, particularly to several hydrodynamic and ecological conditions. Thus, the present work intends to present a summary of the most important aspects linked to the development

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    of these blooms and, mainly, report some cases about the impact of their occurrence on coastal communities.Keywords: allelopathy; biomagnification; poisoning; phytoplankton; ficotoxins.

    RESUMENFLORACIONES DE ALGAS NOCIVAS Y SUS EFECTOS AMBIENTALES. El trmino floraciones

    de algas nocivas (FANs) incluye tanto a las especies productoras de toxinas, las cuales pueden contaminar a los consumidores superiores a travs de la biomagnificacin, como a los grandes productores de biomasa, que pueden llevar al agotamiento de oxgeno disuelto en la columna de agua y, por lo tanto, aumentar las tasas de mortalidad en el medio marino, produciendo toxinas o no; as como aquellos que causan efectos inflamatorios y daos mecnicos en los peces e invertebrados. En particular, la sntesis de toxinas (internamente almacenadas o liberadas en el medio) es considerada una estrategia del fitoplancton para reducir los efectos de los potenciales competidores y depredadores. De las ms de 5000 especies conocidas de fitoplancton, solamente el 6% puede ser nocivo y menos del 2% produce toxinas. Originalmente los fenmenos naturales comunes a diferentes regiones del planeta, las FANs muestran un incremento en su extensin y persistencia, relacionado con el impacto antropognico responsable de la eutrofizacin de las aguas costeras, el transporte de los organismos a travs del agua de lastre, el aumento de la acuicultura y el cambio climtico asociado con el crecimiento de la actividad industrial durante los ltimos dos siglos. Debido a que cada especie muestra diferentes estrategias adaptativas y responde de distintas maneras frente a las modificaciones del ambiente, se argumenta que las investigaciones ms exitosas sern aquellas que consigan identificar y cuantificar las adaptaciones especficas de las especies causantes de los FANs que son capaces de conducir a su seleccin, en particular, a diferentes condiciones hidrodinmicas y ecolgicas. Por ello, este trabajo presenta una resea de los aspectos ms importantes relacionados con el desarrollo de esas floraciones y, principalmente, se reportan algunos casos acerca del impacto de esas ocurrencias en las comunidades conteras. Palabras clave: alelopata; biomagnificacin; envenenamiento; fitoplancton; ficotoxinas.

    INTRODUO

    O fitoplncton composto tanto por organismos autotrficos quanto por heterotrficos e mixotrficos, assim como por organismos procariontes e eucariontes. O fitoplncton autotrfico e mixotrfico, durante o processo fotossinttico, atua como ponto de partida do fluxo de carbono (C) na teia trfica, ao converter substncias inorgnicas em compostos orgnicos. Alteraes na composio e estrutura desses organismos provocam impactos na estrutura e dinmica das teias alimentares e at nos ciclos biogeoqumicos, principalmente do carbono e nitrognio (N) (ex. Falkowski & Raven 1997, Cermeo et al. 2006). Assim como o fitoplncton, que apresenta alta diversidade biolgica, o zooplncton pode assumir, na rede trfica pelgica, distintos papis, sejam esses de consumidores, presas, ou at mesmo recicladores de compostos orgnicos e inorgnicos (Vanni 1996, Elser et al. 2001).

    Ao determinarem a estabilidade da coluna de gua e a disponibilidade de recursos, as condies

    hidrodinmicas de uma regio favorecem os organismos mais adaptados e influenciam na estrutura da comunidade e na sua distribuio vertical e horizontal (ex. Balech 1986, Boltovskoy 1970, Brandini et al. 2000). As variaes espao-temporais da densidade e atividade do plncton so, assim, controladas por fatores bottom-up e top-down (Zhou et al. 2009). Fatores abiticos, como temperatura, salinidade, luz, concentraes de nitrognio, fsforo (P), slica (SiO2) e matria orgnica (MO), dissolvida e particulada, constituem fatores bottom-up. J relaes como as de predao, competio e lise celular por ao de vrus representam fatores top-down (Wright & Coffin 1983, Goosen et al. 1999, Almeida et al. 2001, Sherr & Sherr 2002, Riegman & Winter 2003, Merico et al. 2004, Sol et al. 2006).

    Autores como Margalef (1978), Sournia (1982) e Cullen & MacIntyre (1998) mostram que diferenas na disponibilidade de nutrientes associadas aos diferentes regimes hidrolgicos acabam selecionando organismos fitoplanctnicos com distintas adaptaes. A associao entre a forma

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    desses organismos, as condies hidrolgicas e a disponibilidade de nutrientes permite discutir quais as principais adaptaes que os indivduos apresentam para ocupar determinada funo, ou seja, nicho, no ambiente. Dentre as adaptaes aos diferentes regimes hidrolgicos, que demandam controles fisiolgicos para a regulao da profundidade ocupada, destacam-se a presena de flagelos que permitem o desenvolvimento de padres de migraes verticais (Eppley et al. 1968); o desenvolvimento de fototaxia (Hasle 1950); a presena de revestimentos celulares especiais (ex. frstula de diatomceas e estrias helicoidais de euglenofceas), que aumentam a superfcie celular, contribuem para a proteo do material celular e podem aumentar o atrito com a coluna de gua (Leedale 1967, Darley 1977, Duke & Reimann 1977, Dodge 1979); presena de cornos, espinhos, cerdas e plos, que permitem maior flutuao (Walsby & Reynolds 1980); formao de secrees como as mucilagens de diatomceas enriquecidas em nutrientes (McLachlan et al.1965, Blasco 1970, Myklestad 1974); formao de agregados para reduo da taxa de afundamento (Smayda & Boleyn 1966, Bienfang 1981); e desenvolvimento de toxinas contra predadores e competidores, e favorveis captura de presas (Hallegraeff et al. 1995).

    Por responderem rapidamente s variaes fsicas e qumicas da coluna de gua os organismos fito e zooplanctnicos acabam sendo bastante utilizados como indicadores de frentes, correntes, massas de gua e modificaes ambientais, principalmente aquelas relacionadas concentrao de determinados elementos na coluna de gua (Monger et al. 1997, Longhurst 1998, Ryan et al. 2001, Garcia et al. 2004). Entendendo as diferentes adaptaes das espcies de microalgas torna-se possvel descrever os padres de distribuio de sua abundncia em funo dos processos hidrolgicos e da distribuio de nutrientes, alm do potencial impacto da presso de predadores sobre as comunidades (Hallegraeff 2010). Essa compreenso pode contribuir para a determinao das principais causas de floraes algais nocivas (FANs) e, consequentemente, permitir tentativas de previso de sua ocorrncia e de seus efeitos na comunidade marinha. Alm disso, auxilia na avaliao dos efeitos dos impactos humanos (aquacultura, engenharia costeira e mudanas climticas) na regio costeira, capazes de modificar o ambiente.

    Das mais de 5000 espcies do fitoplncton, somente cerca de 6% podem ser nocivas e menos de 2% produtoras de toxinas (Granli & Turner 2006). A sntese de toxinas, armazenadas no interior das clulas ou secretadas no meio, considerada uma estratgia do fitoplncton para reduzir o efeito de potenciais competidores e predadores (Granli & Johansson 2003, Granli et al. 2008, Prince et al. 2010, Weissbach et al. 2010), essas toxinas podem ser bioacumuladas ao longo da teia trfica marinha e muitas podem causar problemas de sade pblica. Portanto, considerando os impactos das FANs, o presente tabalho visa apresentar uma breve reviso sobre os principais aspectos relacionados ao desenvolvimento dessas floraes e, principalmente, relatar alguns casos sobre o impacto de sua ocorrncia nas comunidades costeiras.

    FLORAES ALGAIS NOCIVAS: DEFINIES E ALELOPATIA

    Grandes aumentos da biomassa de microalgas (as chamadas floraes) ocorrem naturalmente nos oceanos associadas s mudanas, principalmente sazonais, no regime de luz solar, disponibilidade de nutrientes e condies hidrodinmicas, que modificam a estabilidade da coluna de gua e, em especial, a profundidade da camada de mistura (Sol et al. 2005).

    Sol et al. (2006) citam que essas floraes so bem comuns e ligadas s interaes fsicas, qumicas e biolgicas particulares de cada local. Em especial, Mas & Garcs (2006) destacam o controle interno que as prprias microalgas exercem na dinmica da florao, atravs de algumas estratgias comportamentais adaptativas, como a fototaxia, capacidade de migrar verticalmente, formao de agregados e cistos, alm da produo de substncias txicas para outros organismos.

    Diversos so os estudos que mostram como a formao de floraes algais pode ser nociva ao desenvolvimento de outras espcies, devido ao grande acmulo de biomassa ou de compostos txicos, capazes de causar efeitos deletrios em competidores ou atuar como mecanismos de defesa contra predadores (Sol et al. 2005, Flynn 2008, Granli et al. 2008).

    A essas floraes d-se o nome de floraes algais nocivas (FANs em portugus e HABs Harmful Algal

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    Blooms em ingls), termo cunhado pela primeira vez em 1974 durante a 1 Conferncia Internacional de Floraes de Dinoflagelados Txicos (Hallegraeff et al. 1995). Nesse contexto, preciso deixar claro que o termo FANs deve ser usado para descrever aumentos em um curto espao de tempo da populao de microalgas que tenha encontrado condies favorveis ao seu desenvolvimento. essencial tambm destacar que o referido termo empregado para as mais diferentes classes de microalgas, como Dinophyceae, Cyanophyceae, Bacillariophyceae, Raphydophyceae e a diviso Prymnesiophyta (que inclui os cocolitofordeos) (Hallegraeff 2010).

    Segundo Van Der Bergh et al. (2002) e Granli et al. (2008), os aumentos excessivos da concentrao de nitrognio e fsforo na coluna de gua, ocasionados pelo aumento do aporte fluvial e da carga de nutrientes

    de origem terrestre ou devido influncia antrpica, so os principais responsveis pelo aumento da produtividade primria, principalmente na regio costeira (a Tabela 1 sumariza as principais causas de FANs discutidas na literatura). Maiores taxas de respirao e eventual decomposio ocorrem e levam maior depleo do oxignio, promovendo, em ltima instncia, condies anxicas at mesmo prximo superfcie. Alm disso, o aumento da biomassa de microalgas leva ao aumento da turbidez. A paulatina deteriorao da coluna de gua (odor, mudana de cor) leva, assim, a alteraes na estrutura da teia trfica e a problemas econmicos diversos, tais quais a proibio da atividade pesqueira e recreativa, caracterizando o primeiro tipo de florao de microalgas nocivas (Hallegraeff et al. 1995, Anderson et al. 2002).

    Tabela 1. Principais causas das FANs (floraes algais nocivas) citadas na literatura causas naturais e aumento de ocorrncia e abrangncia geogrfica das FANs associadas s atividades humanas.

    Table 1. HABs (harmful algal blooms) main causes cited in the literature natural causes and increasing of occurance and geographical range of HABs related to human activities.

    Eventos Causas Referncias

    Estimulao do crescimento das microalgas formadoras de FANs

    1- Naturais

    Eutrofizao natural Hallegraeff (2003)

    Variao climtica natural Gilbert & Pitcher (2001); Hallegraeff (2010)

    2- Antropognicas

    Eutrofizao cultural Van Der Bergh (2002); Hallegraeff (2003); Granli et al. (2008)

    Mudanas climticas globais induzidas pelo homem Hallegraeff (2010)

    Diminuio da circulao confinamento de corpos de gua

    (ex. exploraoo da linha de costa Mediterrneo)

    Garcs et al. (2000)

    Deteco de espcies potencialmente nocivas em reas nasquais esas noforam previamente identificadas

    1- Naturais

    Transporte atravs de correntes hidden flora

    Dale et al. (1993); Mas & Garcs (2006)

    2- Antropognicas

    gua de lastro Hallegraeff (2003)

    Movimentao do estoque de moluscos em maricultura Scholin (1996)

    Material plstico com biofilme e algas epifticas associadas Mas et al. (2003)

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    Dentre os principais organismos citados por Smayda (1997), responsveis por essas floraes, esto os fitoflagelados. Especial importncia tm os dinoflagelados, grupo que, apesar das taxas de crescimento naturais um tanto quanto baixas, apresenta uma alta capacidade de deslocamento e de migrao, que permite aos mesmos controlar a profundidade ocupada e explorar verticalmente as regies mais favorveis (ex. Margalef et al. 1979).

    Outras vezes, as floraes nocivas so formadas por organismos capazes de produzir toxinas e outros metablitos secundrios, os quais so liberados na coluna de gua (Van Der Bergh et al. 2002, Sol et al. 2005). Mas & Garcs (2006) relatam que nesse segundo tipo de florao esto inseridos alguns formadores de grandes biomassas. Calcula-se que das mais de 5000 espcies do fitoplncton, cerca de 300 podem ser nocivas, sendo aproximadamente 80 as produtoras de toxinas (especialmente dinoflagelados) (Granli & Turner 2006).

    H que se citar que ainda existe grande discusso sobre o real valor adaptativo da produo de ficotoxinas. Enquanto alguns autores mostram serem estas respostas naturais do organismo sintetizador em funo das condies ambientais (ex. Yu et al. 2000, Granli et al. 2008), outros consideram as toxinas como resultados de desvios metablicos, produto de interaes indiretas com bactrias, como citado por Kodama et al. (2006) para Pseudo-nitzschia spp., entre outros.

    Diversos autores (ex. Hulot & Huisman 2004, Flynn 2008, Granli et al. 2008) destacam que a possvel produo de toxinas representa uma grande vantagem sobre outros organismos da comunidade. Atividades alelopticas podem acabar inibindo o crescimento de outras espcies competidoras e/ou ocasionando a morte de seus eventuais predadores sensveis (reduo do grazing).

    Granli & Johansson (2003) discutem que as interaes entre as espcies fitoplnctnicas devidas excreo extracelular de substncias (alelopatia), e consequente supresso do crescimento de algas competidoras, acabam afetando a sucesso fitoplnctnica. Exemplos so as inibies do crescimento de Heterocapsa triquetra (dinoflagelado) pela presena de Chrysochromulina polylepis (primnesiofcea), e de Thalassiosira weissflogii (diatomcea) e Rhodomonas sp. (criptofceas) por

    Alexandrium spp., respectivamente documentadas por Schmidt & Hansen (2001) e Fistarol et al. (2004).

    Flynn (2008) destaca que a reduo da presena de predadores somente til quando se trata de um organismo com grande capacidade competitiva. Do contrrio, reduzir a presena de um importante predador pode acabar favorecendo a presena de outras espcies competidoras e at mesmo de outros predadores. O exemplo citado pelo referido autor a liberao de aldedos polinsaturados por diatomceas em coppodes, que acabam reduzindo a populao de coppodes (mesozooplncton), embora aumentando a do microzooplncton ou de flagelados, seus competidores diretos. Dessa maneira, julga-se que manter algum nvel de competio essencial para evitar a especializao da predao sobre um nico tipo de presa.

    Alguns trabalhos citam que uma mesma espcie pode apresentar toxicidades distintas em diferentes localidades (Cembella 1998, Sierra-Beltrn et al. 2005). Lindahl et al. (2007), por exemplo, ao compararem a toxicidade de Dinophysis acuminata entre dois fiordes na Sucia, Gullmar e Kolj, verificaram que em todas as profundidades do primeiro fiorde a toxicidade mdia das clulas de D. acuminata foi superior s encontradas nas amostras do segundo fiorde, uma rea hidrodinamicamente menos ativa. Existem dvidas ainda sobre o porqu dessas variaes quali e quantitativas na produo de ficotoxinas. Mas & Garcs (2006) argumentam que a existncia das variaes de toxicidade deve ser vista com cautela, por exemplo, quando comparados registros histricos, uma vez que eventuais erros na identificao das espcies podem contribuir para interpretaes errneas.

    Mesmo em baixas concentraes celulares, sem a ocorrncia de floraes, pode ocorrer a produo de toxinas. Caso especfico o do desenvolvimento episdico da sndrome do envenenamento diarrico (Diarrhetic Shellfish Poisoning - DSP) associada presena de dinoflagelados do gnero Dinophysis em baixas concentraes celulares (102 a 104cl.L-1) (Hulot & Huisman 2004).

    Na verdade, comuns so as observaes de uma estreita relao entre a disponibilidade de nutrientes e o aumento da atividade aleloptica. Quando h limitao do crescimento por nutrientes e a capacidade competitiva reduzida, a alelopatia

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    torna-se o principal mecanismo de defesa (Granli & Johansson 2003).

    De toda forma, os efeitos produzidos contra predadores e competidores, devido presena dos compostos txicos oriundos de microalgas, somente so efetivos a partir de determinada concentrao mnima (Flynn 2008). Mason et al. (1982) mostram, por exemplo, que a toxina produzida pela cianobactria Scytonema hofmanni somente inibe o crescimento de Synechococcus a partir de uma concentrao de 1,5g.mL-1. Experimentos de Gleason & Paulson (1984) demonstram, por sua vez, que concentraes menores que 1g.mL-1 da toxina de S. hofmanni no conseguem cessar o transporte de eltrons para o fotossistema II de Synechococcus por mais do que dois ou trs dias.

    Nota-se que alguns predadores expostos historicamente a determinadas toxinas parecem apresentar resistncia s mesmas, o que acaba complicando a previso dos efeitos das atividades aleloqumicas de microalgas. Padres de evitao de dinoflagelados txicos (como Gonyaulax tamarensis, atualmente Alexandrium tamarensis), provavelmente deflagrados por comandos qumicos, e a substituio pela predao de espcies de microalgas competidoras so observados em Calanus pacificus e Paracanulus parvus, citados por Huntley et al. (1986).

    Embora a proliferao de microalgas possa ser benfica para a aquacultura, o aumento da concentrao das espcies potencialmente nocivas associado a fatos negativos que causam perdas econmicas nas atividades pesqueiras e em operaes de turismo. Granli et al. (2008), por exemplo, relatam que grandes mortandades de peixes ocorrem aps grandes floraes de cianobactrias capazes de liberar compostos hemolticos que afetam as delicadas membranas das brnquias dos primeiros. Por sua vez, Weissbach et al. (2010) comentam sobre a transferncia das chamadas neurotoxinas sintetizadas por Alexandrium spp. ao longo da teia trfica marinha, e os conseqentes aumentos no nmero de peixes, aves e mamferos com funes fisiolgicas alteradas, e at mesmo mortos.

    Das mais preocupantes questes a respeito da proliferao de FANs nos oceanos e zonas costeiras est a avaliao da extenso dos compostos qumicos na teia trfica marinha, que incluem os possveis

    danos fsicos a populao humana. Anualmente so registrados cerca de 2000 casos de intoxicaes (com aproximadamente 15% de mortalidade) em seres humanos atravs da ingesto de peixes, moluscos e gua contaminados, alm da exposio via contato e inalao (Hallegraeff et al. 1995, Mas & Garcs 2006).

    Em decorrncia dos inmeros casos de intoxicaes e das grandes perdas socioeconmicas observadas, programas de monitoramento tm sido desenvolvidos (Caron et al. 2010). Segundo Van Der Bergh et al. (2002), quatro tipos de polticas podem ser identificadas: preveno, restaurao, melhoramento e nenhuma ao.

    As polticas de preveno abrangem estratgias que procuram minimizar a probabilidade de formao de uma florao algal nociva, seja prevenindo a introduo acidental de microalgas atravs da gua de lastro ou transportadas com peixes e moluscos importados, e at mesmo reduzindo ou eliminando o despejo de efluentes domsticos e industriais que contribuem para o aumento da freqncia e intensidade dessas floraes.

    Medidas de restaurao so implantadas aps a ocorrncia de FANs e estas tentam, atravs do emprego de mo de obra treinada e equipamento especial, controlar a formao de floraes e impedi-las de espalharem-se. A escolha das medidas a serem tomadas utilizam a identificao de espcies chave e so preferencialmente empregadas com base no seu grau de eficincia.

    As estratgias de melhoramento so caracterizadas por programas pontuais e individuais que no focam sua ateno nas condies precedentes ao desenvolvimento das floraes. Compreendem medidas de mitigao, ou seja, medidas que podem reduzir os impactos, como por exemplo, a remoo de agregados de algas e organismos mortos das praias.

    A opo por uma estratgia de ausncia de ao significa a aceitao de todos os possveis danos.

    FATORES QUE CONTROLAM O DESENVOLVIMENTO DE FLORAES

    Floraes algais nocivas so fenmenos naturais que tm ocorrido ao longo da histria da Terra. Virtualmente, toda regio costeira de nosso planeta

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    j foi afetada alguma vez pelo desenvolvimento de FANs, resultados da interao entre os fatores abiticos (temperatura, luz, nutrientes, regime hidrolgico) e biticos (competio, predao, lise viral). Nas ltimas dcadas, nota-se, porm, o aumento crescente dos registros de FANs ao redor do globo (Anderson et al. 2002, Hallegraeff 2010).

    Segundo Anderson et al. (2008) o aumento observado funo tanto da disperso natural de espcies por correntes ou tempestades, quanto e principalmente devido a influncia das atividades humanas, seja em decorrncia do aumento da eutrofizao costeira ou via transporte de microalgas pela gua de lastro, e at mesmo pelo desenvolvimento de tcnicas de anlise mais precisas.

    Em especial, a disponibilidade de nutrientes essencial para o crescimento da biomassa das microalgas marinhas e situaes de alterao dessas so as mais discutidas como as principais causas para o aumento do desenvolvimento, persistncia e expanso de muitas floraes algais (ex. Granli & Johansson 2003, Dyhrman 2008, Granli et al. 2008, Heisler et al. 2008).

    Nas regies costeiras e ocenicas, nitrognio e fsforo esto raramente em concentraes altas o suficiente para sustentar o desenvolvimento simultneo de uma grande variedade de espcies. Dessa forma, a habilidade de competir por nutriente limitante crucial para a proliferao preferencial de determinadas espcies.

    Em estgios avanados do impacto da ao antrpica, o aumento do despejo de efluentes em rios e zonas costeiras principalmente de fertilizantes utilizados pelas atividades agrcolas , a maior deposio atmosfrica e a canalizao de rios para navegao, controle de enchentes ou construo de reservatrios, contribuem para o aumento da eutrofizao do ambiente (CENR 2000, Anderson et al. 2002, Justic et al. 2002, Kesel 2003, Reide-Corbett et al. 2006, 2007, Hyfield et al. 2008, Lohrenz et al. 2008, Eldridge & Roelke 2010). Para se ter idia, no ambiente costeiro, desde o incio da Revoluo Industrial, a carga de fsforo triplicou, enquanto que a de nitrognio aumentou de quatro a dez vezes no Golfo do Mxico e no Mar do Norte, respectivamente (CENR 2000, Smil 2001).

    A eutrofizao, quando associada a padres de circulao restrita ou alta estratificao da coluna de gua, pode elevar a produtividade primria e a decomposio da matria orgnica, reduzindo, muitas vezes drasticamente, os teores de oxignio dissolvido na coluna de gua. Condies anxicas podem ser criadas e aumentos da mortalidade de diversos organismos aerbicos so comuns. Da mesma forma, espcies oportunistas podem se desenvolver, como aquelas que possuem estratgias nutricionais vantajosas, como a afinidade por menor teor de nutrientes, preferncia por formas reduzidas de nitrognio (como amnia e uria) e habilidade mixotrfica (Mas & Garcs 2006). Nesse caso, tem-se o que se chama de floraes algais no-txicas.

    Alm do aumento da biomassa, Granli & Johansson (2003) e Granli et al. (2008) destacam que sob condies de estresse/eutrofizao altera-se o balano entre nitrognio e fsforo na coluna de gua, e a produo de aleloqumicos acaba sendo reforada e tendo sua ao acentuada. Ao eliminarem ou inibirem o crescimento de seus competidores, as algas alelopticas so ento capazes de usar os nutrientes limitantes.

    Granli & Johansson (2003) do como exemplo o aumento da toxicidade de Prymnesium parvum sob condies de nitrognio ou fsforo limitante. Segundo esses autores, em condies de nitrognio e fsforo limitante, P. parvum apresentou efeito negativo sobre T. weissflogii, Prorocentrum minimum e Rhodomonas cf. baltica. J em condies de nitrognio e fsforo suficientes, um efeito positivo foi notado, indicando que a produo de toxina uma resposta qumica aos baixos nveis de nutrientes (Figura 1).

    Heisler et al. (2008) mostram como exemplo da alterao da sucesso fitoplnctnica devida influncia da eutrofizao costeira e reduo da razo N:P a substituio da comunidade de diatomceas na plataforma oeste da Flrida pelo dinoflagelado Karenia brevis.

    Verifica-se que a eutrofizao costeira de origem antrpica no s pode disponibilizar nutrientes em excesso na coluna de gua e acabar levando formao de elevadas biomassas de microalgas, mas tambm age como fator na regulao de alelopatia (Anderson et al. 2008, Caron et al. 2010). importante citar que no s os nutrientes

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    Figura 1. Efeitos da toxicidade de Prymnesium parvum sob diferentes concentraes de nitrognio ou fsforo. Em situaes de nitrognio e fsforo limitante, P. Parvum apresentou efeito negativo em Thalassiosira weissflogii, Prorocentrum minimum e Rhodomonas cf. baltica. O oposto foi observado

    em condies de nitrognio e fsforo repletos. Figura adaptada de Granli & Johansson (2003).Figure 1. Effects of Prymnesium parvums toxicity under different concentrations of nitrogen or phosphorus. In situations of limiting nitrogen and phosphorus, Prymnesium parvum showed a negative effect on Thalassiosira weissflogii, Prorocentrum minimum and Rhodomonas cf. baltica. The

    opposite was observed under conditions of full nitrogen and phosphorus. Figure adapted from Granli & Johansson (2003).

    inorgnicos so utilizados pelas floraes. Para Granli et al. (2008) e Heisler et al. (2008) muitos nutrientes orgnicos (dissolvidos ou particulados) so biodisponveis para dinoflagelados e cianobactrias, em especial as fraes orgnicas de nitrognio e fsforo liberadas pela lise celular dos organismos alvo de suas toxinas.

    Ainda segundo Heisler et al. (2008), o reconhecimento de que a poluio do ambiente marinho contribui para o desenvolvimento e persistncia das FANs no diminui a possibilidade de outros fatores poderem, tambm, promov-las. Descobrir a complexidade e a interao entre esses fatores um grande desafio para a gesto de ambientes costeiros.

    Em especial, as alteraes climticas so destacadas por Granli et al. (2008) e Hallegraeff (2010) como

    importantes fatores para a expanso das FANs nos oceanos. Defende-se que, no caso de um aquecimento do planeta, as temperaturas nos oceanos e o nvel do mar aumentaro, haver desacelerao da circulao ocenica e conseqente aumento da estratificao da coluna de gua. Devido ao aquecimento das guas, a solubilidade do oxignio diminuir, enquanto a eutrofizao nas regies costeiras poder ser elevada mediante a maior precipitao e intemperismo terrestre. A fotossntese ser ento estimulada e, especialmente, haver proliferao de microalgas oportunistas (dinoflagelados e cianobactrias). As zonas anxicas sero expandidas e ocorrero aumentos das emisses de gases estufa como metano (CH4) e xido nitroso (N2O), alm da acidificao dos oceanos devido ao aumento da concentrao de dixido de carbono (CO2) na coluna de gua. Por fim,

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    perdas de ecossistemas, da diversidade e da biomassa marinha sero observadas.

    Embora o descrito seja o cenrio previsto para daqui a alguns anos e apesar de ainda no se saber exatamente como o aumento da temperatura global particularmente poder afetar as espcies alelopticas grande parte dessas previses j notada. Hallegraeff (2010) destaca que, no Atlntico Norte, o observado enfraquecimento e contrao do Giro Subpolar para oeste, acaba permitindo a penetrao de guas subtropicais nas pores mais setentrionais desse oceano. Espcies at ento restritas a menores latitudes, como Neoceratium trichoceros (antes limitado ao sul das Ilhas Britnicas), Neoceratium furca, Neoceratium hexacanthum, Noctiluca scintillans e dos gneros Prorocentrum e Dinophysis, passaram a ser encontradas nas proximidades da Pennsula Escandinava nos ltimos 40 anos. Ao mesmo tempo, a observao dessa mudana de distribuio e relao com as alteraes do clima leva, cada vez mais, ao questionamento da prvia existncia de determinadas espcies em regies onde, at o incio dos estudos, elas no eram registradas (Dale et al. 1993).

    A disperso de algas (clulas vegetativas e cistos) pela gua de lastro e crescimento das atividades de aqicultura tambm vm sendo citadas como contribuidoras para esse maior registro de FANs e, principalmente, das alteraes da estrutura da teia trfica marinha e casos de intoxicaes de aves, mamferos marinhos e do prprio homem (Heisler et al. 2008).

    De toda forma, ainda que haja eutrofizao devido ao humana, transporte por gua de lastro e alteraes climticas, no se pode ignorar que o mecanismo de formao de floraes tambm responde aos chamados fatores top-down (Buskey 2008). Mesmo sob condies eutrficas, o incio de uma florao ser controlado pela presena de predadores que no so afetados pelas toxinas do fitoplncton. Hallegraeff (2010) relata que a atividade pesqueira excessiva pode, por exemplo, retirar predadores topo de cadeia e contribuir para o aumento da presso de grazing. Por outro lado, impactos climticos diretamente sobre o zooplncton ou peixes planctvoros podem resultar num estmulo das FANs.

    Tabela 2. Exemplos de espcies citadas na literatura (ex. Proena et al. 2010) por produzirem elevada biomassa e tornarem-se potencialmente

    nocivas comunidade costeira. Table 2. Examples of species cited in the literature (ex. Proena et al. 2010) for producing high biomass and become potentially harmful to the

    coastal community.

    Grupo Espcies nocivas

    Diatomceas Skeletonema spp.

    Dinoflagelados

    Akashiwo sanguinea, Neoceratium fusus, Neoceratium tripos, Cochlodinium

    polykrikoides, Heterocapsa triquetra, Noctiluca scintillans

    Primnesiofitas Phaeocystis spp.

    Pelagofitas Aureococcus anophagefferens, Aureoumbra lagunensis

    Cianobactrias Trichodesmium erythraeum

    Devido aos diferentes impactos, na comunidade costeira, das espcies produtoras de elevadas densidades celulares, uma subdiviso pode ser feita:

    Espcies no-txicas ao homem, mas nocivas aos peixes e invertebrados

    Inclui aquelas que levam a danos mecnicos por obstruo e dano s brnquias, efeitos hemolticos, hepatotxicos e osmoregulatrios (Tabela 3).

    PRINCIPAIS TOXINAS E EFEITOS ASSOCIADOS

    Tendo em vista os diferentes efeitos, pode-se compartimentalizar as espcies potencialmente nocivas da seguinte forma (ex. Hallegraeff et al. 1995, Van Der Bergh et al. 2002, Mas & Garcs 2006, Granli et al. 2008, Caron et al. 2010):

    ESPCIES QUE PRODUZEM ELEVADA BIOMASSA E NO SO DIRETAMENTE TXICAS AO HOMEM

    Diz-se daquelas que, basicamente, levam descolorao da gua (mars marrons, vermelhas) e causam morte de organismos pela reduo do oxignio (Tabela 2).

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    Tabela 3. Exemplos de espcies produtoras de elevada biomassa, capazes de provocar perdas na comunidade de peixes e invertebrados (ex. Hallegraeff et al. 1995, Przeslawski et al. 2008, Moestrup et al. 2009, Caron et al. 2010, Proena et al. 2010).

    Table 3. Examples of high biomass species, which can cause losses in the community of fish and invertebrates (ex. Hallegraeff et al. 1995, Przeslawski et al. 2008, Moestrup et al. 2009, Caron et al. 2010, Proena et al. 2010).

    Grupo Espcies nocivas

    Diatomceas

    Chaetoceros aequatoriali, Chaetoceros affinis, Chaetoceros castracanei, Chaetoceros coarctatus, Chaetoceros contortus, Chaetoceros curvisetus, Chaetoceros dadayi, Chaetoceros danicus, Chaetoceros debilis, Chaetoceros decipiens, Chaetoceros didymus, Chaetoceros cf. gracilis, Chaetoceros laciniosus, Chaetoceros laevis, Chaetoceros lorenzianus, Chaetoceros

    messanensis, Chaetoceros peruvianus, Chaetoceros socialis, Chaetoceros subtilis, Chaetoceros subtilis var. abnormis, Chaetoceros wighamii, Coscinodiscus wailesii, Skeletonema cf. costatum,

    Thalassiosira spp.

    Dinoflagelados Cochlodinium polykrikoides, Karenia spp., Gonyaulax spp., Gymnodinium spp., Pfiesteria piscicida

    Rafidofceas Chattonella cf. marina, Chattonella cf. antiqua, Heterosigma akashiwo, Fibrocapsa japonica

    Primnesiofitas Chrysochromulina spp., Prymnesium spp., Phaeocystisglobosa

    Pelagofita Aureococcus anophagefferens

    Tabela 4. Exemplos de espcies produtoras de elevada biomassa causadoras de danos de ordem bio-econmica (ex. Hallegraeff et al. 1995, Przeslawski et al. 2008, Moestrup et al. 2009, Caron et al. 2010, Proena

    et al. 2010).Table 4. Examples of high biomass species that can cause bio-economic damages (ex. Hallegraeff et al. 1995, Przeslawski et al. 2008, Moestrup et

    al. 2009, Caron et al. 2010, Proena et al. 2010).

    Grupo Espcies nocivas

    DiatomceasCoscinodiscus wailesii, Cylindrotheca

    closterium, Guinardia flaccida, Guinardia delicatula, Thalassiosira sp.

    Dinoflagelados Noctiluca scintillans

    Primnesiofitas Phaeocystis spp.

    Pelagofitas Aureococcus anophagefferens

    Casos de acmulos de biomassa de microalgas associadas ao mau-cheiro so relatados principalmente nas proximidades de regies costeiras impactadas pelo desenvolvimento antrpico (Hallegraeff et al. 1995, Van Der Bergh et al. 2002). No Brasil, diversos so os registros na mdia de manchas, espumas e maus odores nas praias

    Registros desse subgrupo, por exemplo, so encontrados nos trabalhos de Przeslawski et al. (2008) e Caron et al. (2010), que descrevem a ocorrncia de mars marrons a partir da dcada de 80 na poro oeste do Atlntico Norte, em especial na regio costeira de Rhode Island (EUA). Nessa rea verifica-se alto desenvolvimento de Aureococcus anophagefferens, uma microalga que no produz toxinas especficas capazes de levar a fatalidades humanas, mas que afeta negativamente a populao de bivalves pela inibio do movimento dos clios branquiais dos mesmos. O caso mais conhecido o declnio de Mercenaria mercenaria prximo Long Island, a qual era dominante at a dcada de 70 e que, atualmente, est pouco presente devido queda do recrutamento gerada pela danificao dos clios laterais por longo perodo.

    Espcies que podem causar danos de ordem bio-econmica

    Incluem aquelas que provocam alteraes estticas que afetam o turismo e a pesca, por produo de mucilagem, maus odores, espuma e descolorao (Tabela 4).

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    Tabela 5. Resumo dos registros obtidos online de floraes algais modificadoras da ordem esttica nos ambientes costeiros dos principais centros urbanos do Brasil na ltima dcada.

    Table 5. Summary of records found online of algal blooms that aesthetically modify coastal environments in the main urban centers of Brazil on the last decade.

    Local UF Fenmeno Registro Referncia

    Praia da Barra da Tijuca e So Conrado RJ Intenso mau cheiro Junho de 2000 Dirio do Vale (2000)

    Ipanema, Leblon, Arpoador, Barra da Tijuca e So Conrado RJ Mancha escura Fevereiro de 2007 G1 (2007)

    Praia de Copacabana RJ Mancha escura Outubro de 2007 Folha Online (2007)

    Praia de Ponta Negra RN Mancha escura Janeiro de 2008 Tribuna do Norte (2008)

    Baa sul de Florianpolis SC Mar vermelha Abril de 2008 Folha Online (2008)

    Praia de Copacabana RJ Mar marrom Dezembro de 2009 Balocco (2009)

    Praia de Itapirub SC Mancha escura Maio de 2010 Rehm (2010)

    Praias de So Francisco do Sul SC Mancha escura e odor Outubro de 2010 A Notcia (2010)

    Praia dos Ossos RJ Mancha verde Janeiro de 2011 O Globo (2011a)

    Praia de Piratininga RJ Mancha escura e mau cheiro Dezembro de 2011 O Globo (2011b)

    prximas aos grandes centros urbanos, que acabam sendo responsveis por peridicas proibies da

    atividade pesqueira e interdies de trechos para uso recreativo (Tabela 5).

    Finalmente, o segundo ramo da diviso das algas potencialmente nocivas representado por:

    ESPCIES QUE PRODUZEM POTENTES (E VARIADAS) TOXINAS

    Nesta esto inclusas aquelas microalgas que podem atingir diretamente os seres humanos, causando uma variedade de efeitos negativos, por meio da teia trfica (Van Der Bergh et al. 2002) (Tabela 6).

    Segundo Prince et al. (2010) a polaridade desses compostos tem implicaes diretas na forma que os mesmos agem e so transportados pelo ambiente. Von Elert & Juttner (1997) sugerem que compostos hidrofbicos so provavelmente mais alelopticos do que os hidroflicos, uma vez que esses so mais capazes de ultrapassar as membranas celulares dos organismos alvo. Todavia, salienta-se que esse transporte pode

    no ser passivo ou o stio de ao dos compostos pode tomar conta do lado de fora das clulas.

    IMPACTOS NA COMUNIDADE COSTEIRA ORIGINADOS PELA TOXICIDADE DAS MICROALGAS

    Atravs dos principais tipos de intoxicao possvel conhecer as substncias txicas produzidas pelas microalgas marinhas e seu papel nas comunidades costeiras, destacando principalmente o seu significado para a populao humana. As intoxicaes mais conhecidas so nomeadas segundo os sintomas experimentados pelos seres humanos, os quais esto majoritariamente expostos devido ao consumo de organismos filtradores (ou organismos que se alimentam desses) que contenham essas biotoxinas marinhas.

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    Tabela 6. Exemplos de espcies citadas na literatura (ex. Kamiyama & Arima 1997, Chorus & Bartram 1999, Villac & Tenenbaum 2001, Fernndez-Tejedor et al. 2004, Camps et al. 2007, Deeds et al. 2008, Moestrup et al. 2009, Ignatiades & Gotsis-Skretas 2010, Proena et al. 2010, Schock et al. 2011) por produzirem, muitas vezes, no s elevada biomassa, mas tambm toxinas e outros metablitos secundrios que so liberados na coluna de gua.Table 6. Examples of species cited in the literature (ex. Kamiyama & Arima 1997, Chorus & Bartram 1999, Villac & Tenenbaum 2001, Fernndez-Tejedor et al. 2004, Camps et al. 2007, Deeds et al. 2008, Moestrup et al. 2009, Ignatiades & Gotsis-Skretas 2010, Proena et al. 2010, Schock et al. 2011) that many times not only produce high biomass, but also toxins and other secundary metabolites that are released into the water column.

    Grupo Espcies nocivas

    Diatomceas

    Amphora coffeaeformis, Nitzschia navis-varingica, Pseudo-nitzschia australis, Pseudo-nitzschia calliantha, Pseudo-nitzschia cuspidata, Pseudo-nitzschia delicatissima, Pseudo-nitzschia fraudulenta,

    Pseudo-nitzschia galaxiae, Pseudo-nitzschia multiseries, Pseudo-nitzschia multistriata, Pseudo-nitzschia pseudodelicatissima, Pseudo-nitzschia pungens, Pseudo-nitzschia seriata, Pseudo-nitzschia

    turgidula

    Dinoflagelados

    Dinophysis acuminata, Dinophysis acuta, Dinophysis bibulbus, Dinophysis caudata, Dinophysis doryphora, Dinophysis exigua, Dinophysis fortii, Dinophysis hastata, Dinophysis miles, Dinophysis

    mitra, Dinophysis norvegica, Dinophysis operculoides, Dinophysis rapa, Dinophysis rotundata, Dinophysis sacculus, Dinophysis scrobiculata, Dinophysis schroederi, Dinophysis tripos, Phalacroma

    rotundatum, Azadinium spinosum, Heterocapsa circularisquama, Prorocentrum arabianum, Prorocentrum arenarium, Prorocentrum belizeanum, Prorocentrum borbonicum, Prorocentrum

    cassubicum, Prorocentrum concavum, Prorocentrum emarginatum, Prorocentrum faustiae, Prorocentrum hoffmannianum, Prorocentrum lima, Prorocentrum maculosum, Prorocentrum

    mexicanum, Prorocentrum rhathymum, Prorocentrum redfieldi, Amphidinium carterae, Amphidinium gibbosum, Amphidinium operculatum, Cochlodinium polykrikoides, Gymnodinium catenatum, Gymnodinium polyedra, Karenia bicuneiformis, Karenia brevis, Karenia brevisulcata, Karenia

    concordia, Karenia cristata, Karenia digitata, Karenia mikimotoi, Karenia papilionacea, Karenia selliformis, Karenia umbella, Karlodinium armiger, Karlodinium corsicum, Karlodinium veneficum, Takayama cladochroma, Alexandrium acatenella, Alexandrium andersonii, Alexandrium catenella,

    Alexandrium cohorticula, Alexandrium fundyense, Alexandrium hiranoi, Alexandrium minutum, Alexandrium monilatum, Alexandrium ostenfeldii, Alexandrium peruvianum, Alexandrium tamarense, Alexandrium tamiyavanichii, Coolia tropicalis, Gambierdiscus australes, Gambierdiscus excentricus,

    Gambierdiscus pacificus, Gambierdiscus polynesiensis, Gambierdiscus toxicus, Gambierdiscus yasumotoi, Gonyaulax polyhedra, Gonyaulax spinifera, Lingulodinium polyedrum, Ostreopsis lenticularis, Ostreopsis mascarenensis, Ostreopsis ovata, Ostreopsis siamensis, Protoceratium reticulatum, Pyrodinium bahamense, Protoperidinium oceanicum, Protoperidinium pellucidum

    CianobactriasMicrocystis spp., Anabaena circinalis, Anabaena lemmermannii, Anabaena spiroides, Aphanizomenon gracile, Aphanizomenon flos-aquae, Cylindrospermopsis raciborskii, Lyngbya wollei, Trichodesmium

    thiebautii

    SNDROME DA AMNSIA OU ENVENENAMENTO AMNSICO POR MOLUSCOS (AMNESIC SHELLFISH POISONING ASP)

    Diatomceas como Amphora coffeaeformis, Nitzschia navis-varingica, Pseudo-nitzschia australis, Pseudo-nitzschia cuspidata, Pseudo-nitzschia fraudulenta, Pseudo-nitzschia multiseries, Pseudo-nitzschia multistriata, Pseudo-nitzschia pseudodelicatissima, Pseudo-nitzschia pungens, Pseudo-nitzschia seriata e Pseudo-nitzschia turgidula so as responsveis pela produo da toxina causadora de ASP, o chamado cido domico (AD), que tambm vem a ser sintetizado por macroalgas como Alsidium corallinum, Chondria armata e Chondria baileyana (Hallegraeff et al. 1995, Camps et al. 2007).

    Atualmente h dez ismeros conhecidos desse cido, que um aminocido tricarboxlico hidrossolvel que atua como um anlogo do neurotransmissor glutamato, uma molcula possuidora de dois tipos de receptores: o cainato e o cido -amino-3-hidroxi-5-metil-4-isoxazoleproprinico (Van Dolah 2000, FAO 2004). O cido domico liga-se com elevada afinidade em ambos e causa a ativao persistente do receptor cainato, resultando em uma grande elevao na concentrao intracelular do on clcio (Ca2+), seguida de ativao dos canais de clcio (Caron et al. 2010).

    Assim sendo, a toxicidade do envenenamento amnsico deriva dos nveis txicos de clcio intracelular, que conduzem estimulao contnua dos neurnios e que podem levar morte do neurnio

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    ou leses em regies do crebro onde as vias glutaminrgicas so altamente concentradas. As regies responsveis pelos processos de aprendizado e memria so particularmente susceptveis e da deriva o nome atribudo sndrome. Entretanto, deficincias de memria ocorrem mesmo sob doses mais baixas de cido domico do que as necessrias para ocasionar danos estruturais (Van Dolah 2000). No h tratamento especfico para as vtimas de ASP e, em algumas situaes, essa intoxicao pode ser letal (Hallegraeff et al. 1995).

    Caron et al. (2010) citam que no ano de 1987, na regio da Ilha de Prince Edward (Canad), Mytilus edulis contaminados foram responsveis por 107 registros de intoxicao e trs de morte. Conforme a legislao vigente no Canad, o nvel crtico para a ingesto humana passou a ser convencionado em 20g de AD/g de carne do molusco.

    Nos EUA, a maioria dos casos de ASP ligada formao de floraes de microalgas do gnero Pseudo-nitzschia, sendo as principais regies de ocorrncia a poro oeste da costa do Pacfico especialmente entre os estados da Califrnia e Washington e as pores nordeste (Baa de Fundy a Baa de Chesapeake) e norte do Golfo do Mxico (Texas Flrida). Em especial, ao longo da costa oeste americana, inmeros so os trabalhos que associam o cido domico s mortalidades de mamferos marinhos e aves. Estudos de Jester et al. (2009) e Leandro et al. (2010) destacam, por exemplo, o aumento da mortalidade de pelicanos (Pelecanus occidentalis) e lees-marinhos (Zalophus californianus) na poro central da Califrnia, atribudo presena de P. australis e P. multiseries e a ingesto de peixes planctvoros como Engraulis mordax e Sardinops sagax.

    J na costa atlntica, Fire et al. (2009) mostram que o cido domico foi detectado entre 1997 e 2008 na urina e fezes de Kogia breviceps (cachalote-pigmeu) e Kogia sima (cachalote-ano) massivamente encalhadas. Entretanto, como os hbitos alimentares desse gnero so pouco documentados, pouco se sabe do real vetor de tal toxina para essas espcies. Por outro lado, nos casos de Eubalaena glacialis, Leandro et al. (2010) demonstram ser Calanus finmarchicus que domina a comunidade de zooplncton do Atlntico Norte o principal vetor.

    SNDROME NEUROTXICA OU ENVENENAMENTO NEUROLGICO POR MOLUSCOS (NEUROTOXIC SHELLFISH POISONING NSP)

    A NSP principalmente gerada a partir da sntese de brevetoxinas por K. brevis (Gymnodinium breve) e, provavelmente, tambm por Karenia mikimotoi (Hallegraeff et al. 1995, Granli et al. 2008). Nos ltimos anos, algumas rafidofceas, at ento relacionadas somente ao aumento da mortalidade de peixes, passaram a se destacar como produtoras de brevetoxinas: Heterosigma akashiwo, Chattonella antiqua, Chattonella marina e Fibrocapsa japonica (Camps et al. 2007). Casos de NSP devido floraes de rafidoficeas so de identificao mais difcil. Todavia, encontra-se no trabalho de Van Apeldoorn et al. (2001) registro de perda de 1700 toneladas de atum Thunnus maccoyii, em abril e maio de 1996, no sul da Austrlia devido ao desenvolvimento de grandes densidades celulares de C. marina.

    As brevetoxinas so politeres, compostos lipossolveis, termoestveis (cido-estvel), inspidas e inodoras, que despolarizam as membranas celulares atravs da abertura voltaica e persistente dos canais de sdio, originando descargas eltricas contnuas (Van Dolah 2000). Dois grupos de politeres so reconhecidamente mais txicos: os anlogos da brevetoxina PbTx-1 e os anlogos da brevetoxina PbTx-2. Enquanto os primeiros contm um esqueleto de dez anis fundidos, os segundos apresentam onze (FAO 2004).

    Ostras, mexilhes e coppodes, como Temora turbinata, Labidocera aestiva, Acartia tonsa, so os principais vetores das brevetoxinas que, segundo Salzman et al. (2006), so capazes de exercer efeito mesmo em baixas concentraes. Para se ter idia, a ingesto de aproximadamente 80g de PbTx-2 suficiente para causar danos fsicos ao homem, como entorpercimento, cimbras, nuseas, vmitos, diarria, calafrios e suadouros. Vale citar ainda que a formao de aerossis pela ao de ondas pode produzir irritaes dermais e problemas respiratrios parecidos com os da asma (Caron et al. 2010).

    Apesar de produzir uma sndrome idntica da ciguatera, Caron et al. (2010) destacam que nenhum bito foi relatado at o presente momento pelo

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    menos no Golfo do Mxico e, diferente da ciguatera, a recuperao geralmente completa em alguns dias.

    Os efeitos da NSP no so sentidos somente pela populao humana, mas tambm por peixes, mamferos marinhos e aves. Para esses, so bastante conhecidos registros de elevada mortalidade no Golfo do Mxico devido floraes de K. brevis, microalga que inibe ao mesmo tempo a presena de Asterionellopsis glacialis na regio (Granli et al. 2008, Prince et al. 2010).

    Impactos na comunidade de mamferos marinhos foram tambm descritos por Trainer & Bdane (1999). Segundo esses, aps o desenvolvimento de florao de K. brevis por um perodo de sete semanas, mais de 200 indivduos da espcie Trichechus manatus latirostris foram encontrados mortos ou agonizantes nas praias da costa oeste da Flrida (EUA) na primavera de 1996. Nesse caso, verificou-se que as brevetoxinas ligaram-se s terminaes nervosas do crebro de T. manatus latirostris de maneira similar encontrada nos mamferos terrestres. Assim, aps inalao e ingesto oral, essas toxinas levaram congesto cerebral, nasofaringeal, pulmonar, heptica e renal.

    Como as brevetoxinas podem levar morte de peixes em decorrncia da falta de coordenao motora, paralisia, convulses e falha do sistema respiratrio, impactos de ordem econmica podem tambm ser gerados: cesso das atividades de maricultura, reduo do turismo, necessidade de limpeza de praias devido grande quantidade de peixes (e outros animais) mortos e, como era de se esperar, aumento dos gastos com sade pblica (Kirkpatrick et al. 2004).

    SNDROME DA PARALISIA OU ENVENENAMENTO PARALIZANTE POR MOLUSCOS (PARALYTIC SHELLFISH POISONING PSP)

    Espcies de dinoflagelados como Alexandrium acatenella, Alexandrium andersonii, Alexandrium catenella, Alexandrium cohorticula, Alexandrium excavatum, Alexandrium fraterculus, Alexandrium fundyense, Alexandrium minutum, Alexandrium tamarense, Gymnodinium catenatum e Pyrodinium bahamense var. compressum so produtoras das toxinas responsveis pelo desenvolvimento de PSP, as

    chamadas saxitoxinas (STX). Alm dessas, algumas cianobactrias, tais como Aphanizomenon flos-aquae, podem contribuir (Hallegraeff et al. 1995, Camps et al. 2007, Weissbach et al. 2010).

    Geralmente associadas formao das chamadas mars vermelhas, as saxitoxinas foram os primeiros compostos marinhos de origem fitoplanctnica identificados. Atualmente so consideradas as mais poderosas toxinas marinhas e, provavelmente, as substncias mais perigosas do planeta (Caron et al. 2010).

    Alm desse alcalide com dois grupos guanidnicos, mais de vinte outros congneres podem tambm causar a PSP, sendo, de forma geral, hidrossolveis e termoestveis (FAO 2004). Ao contrrio dos vertebrados, os moluscos (especialmente bivalves) so relativamente imunes e acabam concentrando em seus tecidos, principalmente na glndula digestiva, manto, gnadas e tecidos branquiais, altas quantidades de saxitoxinas que podem ser transferidas ao longo da teia trfica e atingirem predadores topo (Kwong et al. 2006, Caron et al. 2010). Nesse sentido, nota-se que alguns moluscos so capazes de controlar suas taxas de filtrao e fechamento de valvas quando expostos s microalgas causadoras de PSP (ex. Crassostrea gigas e Mya arenaria em relao Alexandrium sp.), enquanto outros realizam detoxificao e ficam apenas com uma pequena parcela da toxina acumulada (Keppler et al. 2005, Tran et al. 2010).

    Nos organismos topo de cadeia, o efeito txico ocorre pelo bloqueio dos canais de sdio eletro-dependentes, interrompendo a formao do potencial de ao nas membranas dos axnios e, conseqentemente, a atividade neuronal (Durbin et al. 2002, Kwong et al. 2006). Segundo Caron et al. (2010), h pouco tempo foi possvel tambm verificar a habilidade de ligao aos canais de clcio e potssio.

    At o presente, no h antdoto para essa toxina, que pode ser fatal para o homem em quantidades to pequenas quanto cerca de 500g (Hallegraeff et al. 1995). Visto que os moluscos podem, em raras ocasies, conter doses da ordem de 10mg em 100mg de msculo, a ingesto de um simples molusco poderia ser fatal a um homem (Van Dolah 2000).

    As saxitoxinas provocam ainda outros impactos, como a morte de peixes (principalmente no estgio

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    larval), aves marinhas e mamferos marinhos, tais como Eschrichtius robustus, Megaptera novaeangliae e Z. californianus (Trainer & Baden 1999, Van Der Bergh et al. 2002, Kwong et al. 2006). Jester et al. (2009) identificaram pela pela primeira vez na Baa de Monterey (Califrnia, EUA) a presena de toxinas de PSP na teia trfica pelgica atravs da deteco de STX em E. mordax (anchova) e S. sagax (sardinha). Anderson et al. (2008) relatam que no noroeste do Oceano Pacfico, A. catenella responsvel pela suspenso peridica das atividades de maricultura.

    Caso interessante ocorreu com E. glacialis na Baa de Fundy. Durbin et al. (2002) e Leandro et al. (2010) citam que esse mamfero cronicamente exposto s neurotoxinas durante os meses de vero, perodo em que se alimenta de C. finmarchicus espcie que se alimenta de A. fundyense e uma das mais abundantes no Atlntico Norte. Verifica-se que, em E. glacialis, as toxinas bloqueiam os canais de sdio e afetam as capacidades respiratrias, o comportamento de forrageio (tempo e freqncia de mergulho, velocidade de natao) e at a capacidade reprodutiva. Julga-se que a alterao da capacidade de mergulho seja capaz de reduzir as taxas de ingesto e tornaria possvel o aumento dos intervalos de nascimento de filhotes. Evidncias para isso existem, uma vez que de 1980 a 1993 os intervalos eram de 3,7 anos, passando para 5,1 anos entre 1993 e 1998, tendo aumentado a uma taxa de cerca de 4 meses/ano. Alm disso, com a capacidade de recuperao de mergulho prejudicada, esses indivduos podem aumentar o seu tempo de exposio superfcie e, consequentemente, aumentar as suas chances de coliso com embarcaes.

    SNDROME DA DIARRIA OU ENVENENAMENTO DIARRICO POR MOLUSCOS (DIARRHETIC SHELLFISH POISONING DSP)

    Diversos dinoflagelados como D. acuminata, Dinophysis acuta, Dinophysis caudata, Dinophysis fortii, Dinophysis hastata, Dinophysis mitra, Dinophysis norvegica, Dinophysis rotundata, Dinophysis sacculus, Dinophysis tripos, Gonyaulax polyhedra, Phalacroma rotundatum, Protoceratium reticulatum, Protoperidinium oceanicum, Protoperidinium pellucidum, Prorocentrum arenarium, Prorocentrum belizeanum, Prorocentrum

    concavum, Prorocentrum maculosum, Prorocentrum lima e Prorocentrum redfieldi so associados DSP (Hallegraeff et al. 1995, Camps et al. 2007).

    Inicialmente as toxinas geradoras de DSP foram divididas em trs grupos: o do cido ocadico (AO) e seus derivados, incluindo as dinofisistoxinas (DTX); o conjunto das iessotoxinas (YTX); e o grupo das pectenotoxinas (PTX). Atualmente, apenas o primeiro grupo realmente considerado promotor de envenenamentos diarricos enquanto as outras toxinas so consideradas isoladamente, uma vez que sua ao no envolve os sintomas caractersticos da referida sndrome (Paz et al. 2008, Suzuki & Quilliam 2011).

    O cido ocadico um cido monocarboxlico nomeado a partir de sua descoberta na esponja Halichondria okadai, podendo ser encontrado nas formas estricas polar e no-polar. Segundo Gauss et al. (1997), o cido ocadico inibe as protenas fosfatases ligando-se na sub-unidade cataltica, o stio ativo da enzima, impedindo o processo de desfosforilao das clulas eucariticas. A diarria associada intoxicao provavelmente ocorre pela hiperfosforilao das protenas e canais inicos no epitlio intestinal, causando um balano hdrico anmalo e a perda de fluidos (Cohen et al. 1990).

    At o presente momento, nenhuma fatalidade foi registrada; contudo, algumas toxinas envolvidas, como o cido ocadico e dinofisistoxina-1(DTX-1), podem gerar tumores gstricos em exposies crnicas (Sugunama et al. 1988, Caron et al. 2010). H que se citar que poucos so os registros de DSP, uma vez que poucas pessoas procuram assistncia mdica quando acometidas dos sintomas de tal sndrome. Alm disso, h a prpria dificuldade dos mdicos em diagnosticarem a DSP devido a existncia de diversas causas para gastroenterites.

    Lee et al. (1987) citam que moluscos contendo mais do que 2g de AO e/ou 1,8g de DTX-1 por grama de hepatopncreas j podem ser considerados inadequados para o consumo humano. Na Europa o limite mximo estabelecido de 160g de AOs/kg de mexilho.

    CIGUATERA (CIGUATERA FISH POISONING CFP)

    O consumo de peixes recifais (principalmente morias, cavalinhas e enguias) capazes de ingerir

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    os dinoflagelados produtores das ciguatoxinas e maitotoxinas (Amphidinium carterae, Gambierdiscus toxicus, Gymnodinium sangieneum, Gymnodinium polyedra, Ostreopsis lenticularis, P. concavum, Prorocentrum hoffmannianum, P. lima, Prorocentrum mexicanum, Prorocentrum rhathytum) responsvel pela contaminao humana por ciguatera (Bravo et al. 2001, Camps et al. 2007, Varkitzi et al. 2010).

    O envenenamento por ciguatera o problema de sade devido ingesto de frutos do mar mais registrado no mundo (10.000 a 50.000 casos/ano). Comum nas reas tropicais e subtropicais (entre 35N e 35S), principalmente no Caribe, Ilhas do Oceano Indo-Pacfico e no Oceano ndico, a ciguatera tambm j foi descrita nas Bahamas, Canad e Chile (Hallegraeff et al. 1995, FAO 2004, Hallegraeff 2010).

    De forma geral representada por compostos de politer consistindo de 13 a 14 anis fusionados, relativamente termoestveis. Enquanto as ciguatoxinas so lipossolveis e acabam provocando diferenas de potencial nos canais de sdio das membranas celulares, e consequentemente induzindo a despolarizao das mesmas e levando a sintomas prolongados que indicam paragem das clulas nervosas ou estragos que requerem regenerao do tecido nervoso; as maitotoxinas so hidrossolveis e levam ao aumento do influxo de ons clcio nas membranas excitveis (FAO 2004).

    H relatos de que a ciguatoxina possa ser transferida atravs de relaes sexuais e da placenta (Salzman et al. 2006, Pumariega & Mullings 2008). Embora no haja registros de reais danos ao desenvolvimento fetal, suspeita-se que o mesmo seja acelerado (FAO 2004). Transferncias atravs do leite materno tambm j foram observadas e as mulheres que amamentam seus filhos relatam dores nos mamilos, enquanto que os bebs apresentam casos de diarria acentuada, havendo tambm a possibilidade de desenvolvimento de problemas visuais, segundo Butera et al. (2008).

    O tempo de recuperao varivel e pode demorar de semanas a anos. Embora no haja antdoto, considera-se que o tratamento, nas primeiras 24 horas, com manitol seja capaz de aliviar a maioria dos sintomas. Os sobreviventes recuperam-se completamente e a preveno absoluta da intoxicao depende da completa abstinncia da ingesto de peixes tropicais recifais (Hallegraeff et al. 1995).

    Embora doses letais de ciguatoxina nos seres humanos ainda no tenham sido determinadas, quantidades to pequenas quanto 0,1g so suficientes para causar danos em um adulto (Salzman et al. 2006). A cinguatera um tipo de envenenamento registrado h sculos. Nas ltimas dcadas, fatores como a eutrofizao cultural e o aquecimento do planeta tm sido associados ao aumento do nmero de casos, passando a cinguatera a ser considerada um indicador de distrbios nos ecossistemas tropicais (Chateau-Degat et al. 2005, Anderson et al. 2008).

    ENVENENAMENTO POR CIANOTOXINAS (CYANOBACTERIAL TOXIN POISONING)

    Produzidas por diversos gneros de cianobactrias, tais quais Anabaena, Cylindrospermopsis, Microcystis, Nodularia, Nostoc e Oscillatoria, as cianotoxinas (anatoxinas, microcistinas, nodularinas e saxitoxinas) so uma srie diversificada de compostos orgnicos com efeitos farmacolgicos diversos que apresentam potentes atividades capazes de induzir a patologias graves mesmo aps curtos perodos de exposio (Hallegraeff et al. 1995). Basicamente trs so os principais grupos em que podem ser classificadas: hepatoxinas, neurotoxinas e dermatoxinas (Chorus 2001, Lagos et al. 1999, Sotero-Santos et al. 2008).

    A saxitoxina, a anatoxina-a e a anatoxina-a(s) so neurotoxinas produzidas pelos gneros Anabaena, Aphanizomenon, Planktothrix (Oscillatoria), Trichodesmium, Lyngbya e Cylindrospermopsis (Chorus & Bartram 1999, Lagos et al. 1999, Proena et al. 2009, Ferro-Filho et al. 2010).

    A saxitoxina tambm sintetizada por dinoflagelados causadores de PSP atua ao nvel dos canais de sdio dos axnios, bloqueando-os e impedindo a propagao do impulso nervoso, o que culmina na paralisia dos msculos respiratrios, seguida de morte por parada respiratria (Camps et al. 2007, Ferro-Filho et al. 2010). As anatoxinas so potentes bloqueadores neuromusculares ps-sinpticos de receptores nicotnicos e colinrgicos. A ao se d porque a anatoxina-a liga-se irreversivelmente aos receptores de acetilcolina, uma vez que no degradada pela acetilcolinesterase (Ministrio da Sade 2003). A anatoxina-a um organofosforado natural (N-hidroxiguanidina fosfato de metila) e tem um mecanismo de ao semelhante

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    anatoxina-a, pois inibe a ao da acetilcolinesterase, impedindo a degradao da acetilcolina ligada aos receptores. Recebe uma denominao diferente devido intensa salivao que provoca, embora ambas levem fadiga muscular e paralisia, causando morte por parada respiratria e/ou cardaca (Sotero-Santos et al. 2008).

    As microcistinas e nodularina so hepatotoxinas com ao mais lenta, produzidas por gneros como Microcystis, Anabaena, Nodularia, Oscillatoria, Nostoc e Cylindrospermopsis (Carmichael 1994, Chorus & Bartram 1999, Magalhes et al. 2001, Azevedo et al. 2002, Figueiredo et al. 2004, Kankaanpa et al. 2007, Sipi et al. 2008). Em resumo, essas toxinas so representadas por peptdeos cclicos que atuam por inibio das fosfatases proticas de clulas eucariontes e tm como rgo alvo o fgado. Nesse, acabam sendo as responsveis pela destruio da sua estrutura interna e levam, numa situao extrema, hemorragia intra-heptica, choque hipovolmico e morte (Figueiredo et al. 2004, Yuan et al. 2006).

    A principal forma de exposio humana s cianotoxinas o consumo de gua contaminada. Por outro lado, exposio relacionada com os usos recreacionais, quer por consumo acidental, quer por contato da gua contaminada com a pele e mucosas, ou por inalao, tambm tm importncia relativa, bem como o consumo de alimentos dietticos que sejam produzidos base de cianobactrias, e as exposies intravenosas (unidades de hemodilise) (Hitzfeld et al. 2000, Azevedo et al. 2002, Drr et al. 2010).

    Nas ltimas dcadas tem sido demonstrado que vrias microcistinas e nodularinas so carcinognicas (Falconer 1991, Ohta et al. 1994). Zhang et al. (2009), por exemplo, destacam que, na China, diversos casos de aumento da incidncia de cncer heptico podem ser relacionados ingesto de gua contaminada por microcistinas. Segundo medida provisria da Organizao Mundial de Sade (OMS), o valor guia de microcistina-LR no consumo humano 1g/L e 20g/L para uso recreativo (WHO 2003). Na Austrlia e Canad, os valores guia aplicados so 1,3g/L e 1,5g/L, respectivamente. Com relao aos impactos na comunidade marinha, Krienitz et al. (2003) observaram o aumento da mortalidade de Phoenicopterus minor, no leste da frica, associado

    floraes de cianobactrias e acmulo de microcistinas em suas penas.

    Em muitos pases da Amrica do Sul, o desenvolvimento de floraes de cianobactrias potencialmente nocivas fator de preocupao para a sade pblica, uma vez que diversas cidades utilizam como fonte de gua potvel reservatrios eutrofizados sujeitos poluio de origem antropognica (Drr et al. 2010). No Brasil a ingesto de cianotoxinas foi, por muitos anos, considerada a principal forma de exposio humana. Na prtica, o primeiro registro de mortes associadas hepatoxinas de cianobactrias foi observado a partir de Fevereiro de 1996, atravs da exposio intravenosa em uma clnica de dilise em Caruaru (Pernambuco) (Jochimsen et al. 1998). Segundo Azevedo et al. (2002), nessa clnica, dos 131 pacientes, 116 experimentaram distrbios visuais, nuseas, vmitos e fraqueza muscular, sendo que, paulatinamente, 100 pacientes desenvolveram insuficincia heptica. Ao trmino daquele mesmo ano, 52 bitos foram atribudos a chamada Sndrome de Caruaru.

    Estudos subseqentes ao caso de Pernambuco mostraram que, h poca do ocorrido, tal clnica no recebia gua das estaes de tratamento municipais, mas sim gua sem tratamento distribuda por caminhes-pipa. Alm disso, levantamentos posteriores nos prprios reservatrios de abastecimento de gua mostraram que cianobactrias dos gneros Aphanizomenon, Oscillatoria, Microcystis, Anabaena e Cylindrospermopsis eram dominantes nesses locais desde o incio da dcada de 90. Anlises qumicas e biolgicas confirmaram ainda a presena de microcistinas e cilindrospermopsinas (alcalides hepatotxicos) no filtro de carvo ativo utilizado no sistema de purificao de gua da prpria clnica (Azevedo et al. 2002, Drr et al. 2010).

    ENVENENAMENTO AZASPIRCIDO DE MOLUSCOS (AZASPIRACID SHELLFISH POISONING AZP)

    O envenenamento por azaspiracida o mais recente problema de sade gastrointestinal descoberto (FAO 2004). Seu primeiro registro foi na Holanda em 1995, aps uma srie de relatos de fraca diarria subsequentes ingesto de M. edulis que fora importado da Irlanda (Furey et al. 2010). Inicialmente

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    associado ao dinoflagelado Protoperidinium crassipes, ultimamente relacionado Azadinium spinosum, espcie recentemente descoberta.

    Representado por uma famlia de politeres cidos com anel azaspiro pouco comum, amina cclica e anel carboxlico ausente, apresenta como principais compostos os azaspircidos 1 a 3 (AZA1, AZA2 e AZA3).

    J registrado na Europa (Irlanda, Inglaterra, Noruega, Frana e noroeste da Espanha), noroeste da frica e Chile (Vale 2004), o azaspircido e anlogos no ficam confinados no hepatopncreas de mexilhes e ostras vetores. Julga-se que o risco humano menor do que o de ASP (Unio Europia), sendo citadas pela FAO (2004) as concentraes entre 23 e 86 g/pessoa (valor mdio 51,7 g/pessoa) como suficientemente txicas para o homem. Embora no haja, at a presente data, registros de toxicidade para organismos marinhos, recomendvel que mais monitoramentos sejam feitos ao longo do tempo.

    Tabela 7. Exemplos de eventos reportados na literatura de floraes que ocorreram no sudeste e sul do Brasil.Table 7. Examples of reported events in the literature of blooms that occurred in the southeastern and southern Brazil.

    Regio Evento / Espcie / Local Publicao Deteco de toxina

    Sudeste Florao de Microcystis sp. / Lagoa de Jacarepagu (RJ) Magalhes et al. (2001) Sim (microcistina)

    Sul Presena de Gymnodinium catenatum /Armao do Itapocoroy (SC) Proena et al. (2001) Sim (gonyautoxina)

    SudesteColapso da populao de cladoceras /

    Florao de Microcystis aeruginosa / Lagoa de Jacarepagu (RJ)

    Ferro-Filho et al. (2002a) Sim (microcistina)

    Sul

    Aumentos da densidade de Dinophysis acuminata e Pseudo-nitzschia spp., sem efeitos diretos no ambiente / Complexo

    estuarino de Paranagu (PR)

    Mafra-Jnior et al. (2006)

    No (para cido ocadico e domico)

    Sim (dinofisistoxina-1, ou dinofisistoxina-2 ou

    dinofisistoxina-3

    SudesteManchas verdes / Microcystis aeruginosa / Lagoa de Jacarepagu e praia da Barra da

    Tijuca (RJ)

    Gomes et al. (2009) Sim (microcistina)

    Sul

    Presena de maiores densidades de Gymnodinium catenatum no outono e de Dinophysis acuminata entre o inverno e a primavera / Armao do Itapocoroy (SC)

    Tavares et al. (2009) No

    SulAlterao de parmetros imunolgicos

    de mexilhes / Floraes de Dinophysis. acuminata (SC)

    Mello et al. (2010) Sim (cido ocadico)

    Nos ltimos anos, cada vez mais toxinas (ex. azaspircidos, pectenotoxinas, yessotoxinas, trichotoxinas) vm sendo descritas na literatura especializada (FAO 2004, Camps et al. 2007, Tubaro & Hungerford 2007, Schock et al. 2011). Embora ainda no completamente compreendidas, a tendncia que esse nmero cresa cada vez mais.

    FLORAES ALGAIS POTENCIALMENTE NOCIVAS NO BRASIL

    Embora Hallegraeff (2003) cite que a freqncia de floraes fitoplanctnicas aumentou desde a dcada de 70, os estudos no Brasil so recentes, com nfase para a regio sul-sudeste, sendo ainda poucos os trabalhos que consideram relaes entre a ocorrncia dos episdios e as flutuaes sazonais de variveis oceanogrficas em escalas temporais detalhadas (Gianesella-Galvo et al. 1995). A tabela 7 resume alguns eventos de floraes reportados na literatura que ocorreram no sudeste e sul do pas.

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    Inicialmente meramente descritiva, a pesquisa brasileira registrou poucos eventos de florao e conseqente mortalidade de peixes, moluscos e crustceos. No incio da dcada de 90, uma postura mais experimental e descritiva foi iniciada, dando nfase aos estudos de toxinas e desenvolvimento de bioensaios. Essa mudana de abordagem coincidiu com a implementao, em 1991, do Harmful Algal Blooms Program by the Intergovernamental Oceanographic Comission (IOC, UNESCO) (Odebrecht et al. 2002).

    Grande destaque tem sido dado ao desenvolvimento de floraes de cianobactrias associadas ao aumento da eutrofizao costeira e, em menor escala, s condies climticas locais favorveis. Dentre as toxinas produzidas pelo grupo encontram-se hepatotoxinas, neurotoxinas, citotoxinas e dermatotoxinas (Sotero-Santos et al. 2008).

    mundialmente conhecido o trgico acidente ocorrido em 1996, em Caruaru (Pernambuco), quando mais de 50 pacientes de hemodilise morreram devido aos efeitos de hepatoxinas (microcistinas) (Jochimsen et al. 1998, Azevedo et al. 2002, Yuan et al. 2006). Floraes da cianobactria Microcystis aeruginosa so freqentes e as de Cylindrospermopsis esto se tornando cada vez mais comuns (Lagos et al. 1999, Ferro-Filho et al. 2010).

    No estado do Rio de Janeiro, a questo da florao de cianobactrias j foi tratada em alguns estudos (ex. Semeraro & Costa 1972, citado em Oderbrecht et al. 2002, Tenenbaum et al. 1998, entre outros). Ferro-Filho et al. (2002a) mostram, por exemplo, como o desenvolvimento de floraes de M. aeruginosa na lagoa de Jacarepagu so potencialmente nocivas para a populao de cladceras na regio. Segundo esses autores, a lagoa de Jacarepagu um corpo de gua raso e oligo-halino conectado a outras duas lagoas e ao Oceano Atlntico por um estreito canal e, acima de tudo, bastante impactada pelas descargas de esgotos domsticos e industriais das pores urbanas circundantes, o que a torna hipereutrfica. Alm do efeito txico produzido pela presena de microcistinas na gua, nos meses de Dezembro de 1996 e Fevereiro de 1997, pde-se tambm observar o detrimento da densidade de cladceras em funo do aumento da biomassa das cianobactrias, uma vez que as ltimas representam uma fonte nutricional pobre para as primeiras.

    Por outro lado, a populao de coppodes foi positivamente correlacionada com a presena do gnero Microcystis no trabalho de Ferro-Filho et al. (2002a). A provvel razo para esse resultado o comportamento seletivo que esses coppodes tm contra a ingesto de cianobactrias txicas, o que bastante comum para algumas espcies do zooplncton e um fator extremamente importante para a estruturao da comunidade zooplanctnica (Demott & Moxter 1991, Burnsd & Hegarty 1994, Engstrm et al. 2000), aliado ao aumento indireto da oferta de alimento (detritos e bactrias) durante a florao de Microcystis (Hanazato & Yasuno 1987, Hanazato 1991).

    Ferro-Filho et al. (2002b) e Gomes et al. (2009) citam que o zooplncton da lagoa de Jacarepagu capaz de acumular grandes quantidades de microcistinas a partir do sston (fator de bioacumulao da ordem de 29.000). Consequentemente, esse grupo age como vetor dessas toxinas para nveis trficos superiores, em especial para peixes, os quais podem ser consumidos e comercializados pela populao humana local. Como as concentraes de microcistinas presentes no tecido muscular do pescado estiveram acima (at cinco vezes) dos valores recomendados pela OMS para consumo humano, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente passou a proibir a pesca na regio a partir do ano de 2007.

    Ainda segundo Gomes et al. (2009), a proliferao de cianobactrias na lagoa de Jacarepagu responsvel por grandes manchas verdes na praia da Barra da Tijuca, o que leva peridicas interdies de alguns trechos dessa para uso recreativo, uma vez que a exposio (seja via ingesto, epidrmica ou at mesmo respiratria) s toxinas dessas cianobactrias pode causar manchas e coceiras na pele, rinite alrgica, diarria e dor abdominal.

    Apesar dos estudos realizados na regio sudeste do Brasil e do aumento do registro de casos relacionados aos processos de eutrofizao antropognica, a implementao de tcnicas para deteco das toxinas ainda incipiente e muito voltada para a deteco de microcistinas, necessitando, ento, ser melhorada na regio.

    Situao mais avanada encontrada na regio sul, onde, a partir do grande desenvolvimento da aquacultura, houve o estabelecimento de

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    programas para monitoramento de ficotoxinas e, consequentemente, para o aumento do conhecimento sobre as FANs. O melhor exemplo ocorre no Estado de Santa Catarina, o nico onde h legislao especfica para o assunto e onde a maricultura de bivalves tem motivado a realizao de bioensaios e anlises de HPLC especficas para diversas toxinas, as quais j indicaram a presena de toxinas diarricas (DSP) e paralisantes (PSP) em moluscos da regio (Proena et al. 2001, Mafra-Jnior et al. 2006).

    Tavares et al. (2009) citam que, em Santa Catarina, o cultivo de bivalves comeou no incio da dcada de 90. Aps 15 anos, a produo de moluscos no Estado foi responsvel por cerca de 95% do total nacional. Em paralelo, passaram a ser cada vez mais registrados casos de intoxicaes associadas ingesto de moluscos, sendo o primeiro surto de DSP completamente detectado no vero de 2007. Segundo Proena et al. (2001), a implantao de programas de monitoramento na rea costeira de Santa Catarina, ainda na dcada de 90, foram os responsveis pela primeira descrio da ocorrncia, em guas brasileiras, do dinoflagelado txico G. catenatum.

    Amostras obtidas por Tavares et al. (2009) na Enseada da Armao do Itapocoroy, regio costeira onde a criao de mexilho (Perna perna) desenvolvida desde 1990, mostraram ser o incio e magnitude das floraes de espcies txicas diretamente relacionados aos processos oceanogrficos. A distribuio sazonal assim diferenciada: no outono h maior probabilidade de casos de PSP, em virtude das elevadas densidades de G. catenatum (1,6 x 104cl.L-1), enquanto no perodo de inverno-primavera a dominncia de D. acuminata (>103cl.L-1) pode levar mais registros de DSP.

    Fato similar j havia sido mencionado por Rrig et al. (1998) tambm na Enseada da Armao do Itapocoroy. Segundo esses autores, na primavera os gneros de organismos produtores de toxinas mais abundantes seriam Dinophysis, Prorocentrum e Pseudo-nitzschia. Nessa estao, a rea estaria mais sujeita a sofrer com casos de DSP e ASP. J entre o final da primavera e durante o vero, em virtude da presena de Trichodesmium spp., a possibilidade de produo de cianotoxinas seria maior.

    Mello et al. (2010) chamam a ateno que, em especial as floraes de D. acuminata, esto

    crescendo em uma frequncia alarmante ao longo da costa de Santa Catarina, e afetando negativamente a economia da regio, j que podem ter efeitos sobre o sistema imunolgico de bivalves, especialmente quando esses acumulam altas concentraes de toxinas em seus tecidos. Essa capacidade de acmulo varia de espcie para espcie: P. perna, por exemplo, mostra grande capacidade de acmulo de AO e baixa de eliminao da toxina, enquanto C. gigas tem comportamento exatamente oposto. Mello et al. (2010) defendem que a melhor compreenso de quais bivalves so imunologicamente mais sensveis s algas txicas durante os perodos de floraes em Santa Catarina, pode servir como uma estratgia para o melhor controle de intoxicaes potenciais ou outras condies estressantes que podem afetar ainda mais os bivalves cultivados.

    Sob as diretrizes do projeto internacional GloBallast (The Global Ballast Water Management Programme), do qual o Brasil faz parte, experimentos esto em progresso, focalizando os aspectos fisiolgicos do fitoplncton transportado por navios atravs da gua de lastro.

    Trabalho de Persich et al. (2006), na regio do esturio da Lagoa dos Patos, mostra que o dinoflagelado causador de PSP, A. tamarense, aparentemente teve sua distribuio expandida na regio durante as duas ltimas dcadas, muito provavelmente a partir do transporte de clulas dessa espcie pela gua de lastro de navios de carga oriundos da Amrica do Norte ou Japo. Para se ter idia, floraes nocivas de A. tamarense foram registradas na costa argentina no incio da dcada de 80 e na costa uruguaia no comeo dos anos 90, porm, a primeira documentao dessas no sul do Brasil ocorreu somente em 1996.

    Persich et al. (2006) salientam, entretanto, que se deve considerar tambm a possibilidade das populaes de Alexandrium terem se estabelecido na Amrica do Sul muito antes, mais precisamente durante o ltimo perodo glacial, quando as guas dos oceanos eram mais frias e o transporte entre os hemisfrios era natural.

    Dinoflagelados potencialmente nocivos como os do gnero Dinophysis so bastante associados Corrente do Brasil (CB) e sua distribuio dada em funo da mistura dessa massa de gua com outras mais frias (Brandini et al. 2000, Odebrecht et

  • FLORAES DE ALGAS NOCIVAS E SEUS EFEITOS AMBIENTAIS

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    al. 2002, Proena & Mafra Jr. 2005). Haraguchi & Odebrecht (2010) citam, por exemplo, que no extremo sul do pas, produtores de toxinas diarricas, como D. acuminata, D. caudata, D. fortii, D. mitra, D. rotundata e D. tripos so encontrados, principalmente, nas guas costeiras durante o vero, poca em que a CB acaba sendo misturada com guas de origem subantrtica. No inverno, essas espcies estendem-se pela plataforma continental e atingem guas ocenicas at a latitude mdia de 40S.

    CONSIDERAES FINAIS

    As floraes algais nocivas esto associadas a conhecidos e diversos eventos de mortalidade de peixes e intoxicaes que atingem diretamente os seres humanos. Dois grupos distintos podem ser reconhecidos dentro das chamadas floraes algais nocivas (Gilbert & Pitcher 2001). Ao primeiro esto associadas as espcies produtoras de toxinas (auttrofas e hetertrofas) que podem contaminar os consumidores primrios, secundrios e at predadores topo atravs do processo de bioacumulao. J o segundo, inclui os grandes produtores de biomassa, que podem levar hipoxia e anoxia e, consequentemente, a grandes taxas de mortalidade no ambiente marinho aps as densas concentraes terem se desenvolvido, tendo produzido ou no toxinas.

    Em especial, a sntese de toxinas considerada uma estratgia do fitoplncton para reduzir o efeito de potenciais competidores e predadores, embora somente possuam efeitos significativos quando esto disponveis em quantidades suficientes. Das mais de 5000 espcies de microalgas marinhas, cerca de 300 podem ser nocivas e somente 80 produtoras de toxinas. Destaca-se que diversas toxinas no so prejudiciais aos herbvoros imediatos, mas podem bioacumular ao longo da teia trfica e causar prejuzos somente para os organismos de maior nvel trfico.

    As FANs so consideradas fenmenos naturais reportados ao longo de todo o globo. Nas ltimas dcadas, porm, nota-se o aumento da extenso e persistncia das mesmas, que pode estar associado influncia do impacto da

    ao humana. A eutrofizao das pores mais prximas costa, devido ao despejo de esgotos, fertilizantes, aumento da deposio atmosfrica e aumento das taxas de eroso, associado ao transporte de organismos e cistos pela gua de lastro, ao aumento das atividades de aquacultura e pesca e s mudanas climticas nos ltimos duzentos anos, contribuem todos para o padro recentemente observado. Alm disso, em paralelo, o aumento da preocupao cientfica em explicar, prever e controlar eventuais efeitos deletrios comunidade costeira, tambm contribui para o aumento da abrangncia geogrfica dessas floraes.

    De toda forma, estudos sugerem que a chave para explicar os fenmenos de FANs reside na identificao e quantificao das adaptaes especficas que levam seleo de espcies causadoras de FANs em particulares condies hidrodinmicas e ecolgicas. Acredita-se ainda que novas tecnologias e a maior troca de informaes entre os diferentes grupos de pesquisa esto, paulatinamente, melhorando a compreenso, deteco, previso e monitoramento da ocorrncia de FANs e toxinas relacionadas. Exemplos so os avanos nas tecnologias de observao in situ (kits rpidos de deteco de ficotoxinas, redes de sensores, veculos autnomos, flow Cam todos em contnuo desenvolvimento e j sendo comercializados) e a identificao de algumas espcies (especialmente herbvoras) como indicadoras de quantidades perigosas de toxinas no ambiente. Em especial, as anlises baseadas em caractersticas genticas (DNA ambiental, sondas moleculares especficas, entre outros) vm sendo cada vez mais aprimoradas em vrios pases, inclusive no Brasil (ex. Menezes et al. 2010), e substancialmente aplicadas em virtude da rapidez e segurana associadas. Por fim, vale citar ainda que a integrao entre os experimentos em laboratrio e as observaes em campo um passo essencial para o futuro do controle e mitigao das FANs.

    AGRADECIMENTOS: Nathlia Castro Bolsista CAPES. Gleyci Moser Bolsista do Programa Procincia UERJ/FAPERJ.

  • CASTRO, N.O. & MOSER, G. A.O.

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