caso de Ética - comunicação de más notícias

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47 BIOÉTICA CLÍNICA – REFLEXÕES E DISCUSSÕES SOBRE CASOS SELECIONADOS Resumo do caso Paciente de 38 anos recebe diagnóstico de glioblastoma multiforme avançado e inoperável. Ao questionar do que se tra- ta, oncologista – acreditando estar defendendo a própria honestidade pro- fissional – explica taxativamente: “um câncer cerebral maligno que irá matá-lo em pouco tempo”. Paciente entra em quadro depressivo, que apressa sua morte. Exposição dos detalhes Aos 38 anos de idade, homem começa a apresentar cefaléia constante e intensa, acompanhada de vômitos em jato, tontura e visão turva. Acreditando tratar-se de meningite, procura um pronto- socorro. Suspeitando de tumor cerebral, médico que presta o primeiro atendimento trata com sintomáticos e o encaminha ao neurocirurgião de serviço público de referência, que não tem histórico prévio de contato com aquele paciente. Após exames de urgência e complementares, como eletroencefalograma e raios-X de crânio, tomografia computadorizada e ressonância nuclear mag- nética, é indicada cirurgia para retirada de material e confirmação diagnóstica. Durante o procedimento, é tentada, sem sucesso, retirada total do tumor. Tão logo retomou a consciência, o paciente é informado pelo neurocirurgião de que o resultado do exame indicou a presença de “glioblastoma multiforme no cérebro, já em fase avançada”. Assustado, CASO 5 Comunicação de Más Notícias

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Comunicação de Más Notícias, técnicas e formas de procedimento

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BIOÉTICA CLÍNICA – REFLEXÕES E DISCUSSÕES SOBRE CASOS SELECIONADOS

Resumo do casoPaciente de 38 anos recebe diagnóstico de glioblastomamultiforme avançado e inoperável. Ao questionar do que se tra-

ta, oncologista – acreditando estar defendendo a própria honestidade pro-fissional – explica taxativamente: “um câncer cerebral maligno que irámatá-lo em pouco tempo”. Paciente entra em quadro depressivo, queapressa sua morte.

Exposição dos detalhesAos 38 anos de idade, homem começa a apresentar cefaléiaconstante e intensa, acompanhada de vômitos em jato, tontura

e visão turva. Acreditando tratar-se de meningite, procura um pronto-socorro. Suspeitando de tumor cerebral, médico que presta o primeiroatendimento trata com sintomáticos e o encaminha ao neurocirurgião deserviço público de referência, que não tem histórico prévio de contatocom aquele paciente.

Após exames de urgência e complementares, como eletroencefalogramae raios-X de crânio, tomografia computadorizada e ressonância nuclear mag-nética, é indicada cirurgia para retirada de material e confirmação diagnóstica.Durante o procedimento, é tentada, sem sucesso, retirada total do tumor.

Tão logo retomou a consciência, o paciente é informado peloneurocirurgião de que o resultado do exame indicou a presença de“glioblastoma multiforme no cérebro, já em fase avançada”. Assustado,

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totalmente inexperiente no assunto, pede ao médico que “traduza” o diag-nóstico, de forma que possa entender.

Sem hesitar (e confiante de que está garantindo sua postura ética de“jamais mentir a um atendido”), neurocirurgião responde: “um câncer ce-rebral maligno que irá matá-lo em pouco tempo”. Como paliativo, indicaquimioterapia, capaz de prolongar a vida do paciente “por alguns meses”.

Atônito, inconformado (acabara de fazer financiamento de apartamentopróprio e prestes a ser pai pela primeira vez, pois sua mulher estava nosúltimos meses de gestação), o paciente decide nada fazer, pois “de nada iriaadiantar”, entra em depressão, abreviando o tempo de vida que lhe resta.

Eixo CentralComunicação de más notíciasPergunta-base: Para garantir a ética e transparência da relação médico–paciente, deve-se dar diretamente ao paciente toda e qualquer notícia?

Argumentos■ Segundo a psicóloga Adriana Pacheco Pires, no artigo MásNotícias, “má notícia tem sido definida como qualquer informa-

ção que envolva uma mudança drástica na perspectiva de futuro em umsentido negativo”.

■ A recomendação do Gacem é que a verdade sempre seja preserva-da. Em casos como este, no entanto, é preciso dar a informação de formagradual e cuidadosa, respeitando-se as sinalizações que os pacientes dãoquanto ao que desejam realmente saber, em determinado momento.

■ Vale também consultar os “Seis passos recomendados peloEducation For Physicians on End-of-Life Care (EPEC, veja o anexo). Ela-borados pelo Instituto de Ética da Associação Médica Americana (AMA),incluem: Preparando-se (Getting started); O que o paciente sabe? (Whatdoes the patient know?); Quanto o paciente quer saber? (How much doesthe patient want to know?); Dividindo a informação (Sharing the

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information); Respondendo às emoções (Responding to feelings); Plane-jamento e acompanhamento (Planning and follow-up).

■ Para salvaguardar sua postura “direta e objetiva”, o médico pode-ria valer-se do Art. 59 do Código de Ética Médica, que o impede de “dei-xar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e osobjetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta ao mesmopossa provocar-lhe dano, devendo, nesse caso, a comunicação ser feitaao seu responsável legal”

■ De acordo com a Lei Estadual 10.241/99, mais conhecida como LeiCovas, Art. 2º “é direito do paciente: receber informações claras, objetivase compreensíveis sobre: a) hipóteses diagnósticas; b) diagnósticos realiza-dos; c) exames solicitados; d) ações terapêuticas; e) riscos, benefícios einconvenientes das medidas diagnósticas e terapêuticas propostas”

■ Segundo Kipper e Clotet, em Iniciação à Bioética, Beneficência eNão-Maleficência não são princípios “de caráter absoluto” e sua aplica-ção correta é resultado da Prudência, “que sempre deveria acompanhartoda atividade e decisão do profissional da Saúde”.

■ Os autores referem ainda que o princípio da Beneficência exerci-do de maneira absoluta “aniquilaria a manifestação da vontade, dos de-sejos e dos sentimentos do paciente”. Ou seja, se consistiria em atitudepaternalista.

■ Os autores Buckman, Cólon, Miranda & Brody, Maguire & Faulkner,Quill & Towsend, interpretados pela psicóloga Adriana Pacheco Pires,sugerem princípios da comunicação de más notícias, que incluem: esco-lher um momento em que o paciente e o médico estejam descansados etenham um tempo adequado; avaliar o estado emocional e psicológicodo paciente no presente; preparar o paciente, dizendo que tem um as-sunto difícil para discutir com ele; usar uma linguagem clara e simples;expressar tristeza pela dor do paciente; ser humanitário; dar informaçãode forma gradual e programar outro encontro com o paciente mais tarde;ser realista, evitando a tentação de minimizar o problema, mas não tirartodas as esperanças; verificar como o paciente se sente depois de receberas notícias; reassegurar a continuidade do cuidado.

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■ Segundo o Serviço de Atenção Psicossocial Integrada da Unifesp,as respostas dos pacientes às más notícias são altamente variáveis eimprevisíveis. Eles podem expressar sua ansiedade como raiva, que podeser dirigida ao portador da notícia. Se isto acontecer, a relação médico–paciente fica vulnerável e, para ser preservada, são necessárias paciên-cia e compreensão da situação.

■ Para o mesmo núcleo, as principais razões que levam os profissio-nais da saúde a evitar os aspectos emocionais resultantes das más notíci-as são: falta de treinamento; medo de aumentar o estresse do paciente;falta de suporte emocional e prático dos colegas; e preocupação quantoà própria sobrevivência emocional.

Eixos Secundários● Relação médico–paciente● Paternalismo

● Envolvimento da família● Compaixão/Distanciamento

Situações que poderão ser levantadas◆ Como ser sincero e, ao mesmo tempo, ser compassivo comnosso paciente?

◆ Se a suspeita for de que o paciente não tem condições de recebera notícia, seria melhor dá-la à esposa? Como está grávida, poder-se-iaconsiderar a preservação de direitos do filho?

◆ A quem recorrer no momento de dar uma “má notícia”? (apoiopsicológico, familiares do paciente etc)

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DiscussãoPor Lisbeth Ferrari DuchComunicação de má notícia: não se trata de um momento pon-

tual na relação médico–paciente e, sim, de um processo que deve come-çar quando o profissional chega a uma suspeita diagnóstica e parte paraa investigação propedêutica.

Este processo levará maior ou menor tempo, dependendo de deter-minados pontos a serem considerados, como respeito incondicional àAutonomia do paciente e o compromisso com a veracidade.

Em relação a estas questões, algumas considerações se tornam necessárias,entre elas: Quanto o paciente está pronto para receber as informações?; Quantoquer saber, nesse momento? Como conversar? pois, nesta relação, espera-seque o médico seja o detentor do saber e o paciente, o ponto mais frágil.

Também devem ser levados em conta conceitos de Beneficência ede Não-Maleficência, para que possamos, no momento da informação,pensar na qualidade de vida do doente.

Ao se preocupar com as reações do paciente (o que é louvável), omédico não pode se esquecer das próprias emoções, que precisam terpeso na evolução da comunicação, já que a sensibilidade emocional doprofissional é muito importante para apreciar as necessidades do pacien-te e poder perceber sinais de desagrado, capazes de orientá-lo na abor-dagem dos problemas que vão surgindo.

Por outro lado, também é importante comunicar emoções (não so-mente observá-las), pois, admitir compaixão, por exemplo, pode ser es-sencial para que as condutas médicas sejam aceitas e seguidas, dandoabertura para que se fale ao paciente a verdadeira natureza de sua condi-ção, respeitando a fragilidade de seu estado emocional. Trata-se da rela-ção entre dois indivíduos, ambos sujeitos a emoções que devem aflorarnaturalmente, no decorrer de todo e qualquer diálogo.

A verdadeira escolha do profissional médico não é falar ou não averdade, mas como falar a verdade, respeitando a autonomia e sentimen-tos do paciente (Sherman).

Considera-se, então, que a comunicação de uma má notícia é sempre

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um momento delicado na relação médico–paciente e deve, em princí-pio, ser trabalhada desde o primeiro contato, no estabelecimento de umarelação pautada pela confiança, sinceridade e respeito, visando, sobretu-do, à preservação da dignidade e da autonomia do atendido. Somentedesta forma é possível conquistar sua confiança.

É certo que muitas vezes existe dificuldade em se determinar paraque lado pende a relação Beneficência/Não-Maleficência. Como exem-plo, temos o caso em questão, em que a sinceridade – um tanto brusca –do médico provocou reação negativa por parte do doente.

Num primeiro momento, o profissional deve compartilhar com o aten-dido somente o que é clinicamente conhecido, pois, nesta fase, a respos-ta do atendido ao tratamento é desconhecida.

Leia-se: no início, falar do desconhecido poderá gerar um grau deinsegurança que, certamente, não será bem-vindo.

Argumento importante sustentando a obrigação à veracidade é que aconfiança entre as pessoas é necessária para uma interação profícua(Beauchamp e Childress), proporcionando, por isso, melhor adesão aostratamentos indicados.

Em se tratando de equipe multidisciplinar, o melhor é que o médicoresponsável pelo tratamento seja o principal comunicador, já que cabe aele a hipótese diagnóstica; a escolha dos meios propedêuticos; o diag-nóstico, além da indicação do tratamento. Por seu lado, o doente deveser esclarecido sobre as implicações da terapia proposta e quais as alter-nativas. Deve se evitar que as dúvidas e conflitos individuais, dentro daequipe, sejam transferidos ao paciente.

Na manutenção desse diálogo, é fundamental que o médico e o pacientetenham o apoio de outros profissionais, como psicólogos e assistentes sociais,mas todos dentro de uma mesma linha de conduta frente ao paciente.

Em suma, vemos que as dificuldades enfrentadas nessa relação tãodelicada são grandes e que, freqüentemente, é difícil estabelecer o limiteentre a obediência aos nossos princípios de fidelidade à veracidade, e orespeito ao princípio de Não-Maleficência. Prevalecerá sempre o bom-senso, alicerçado em uma relação médico–paciente bem constituída.

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Anexo ao Caso 5

Seis passos recomendados pelo EPEC (Education For Physicians onEnd-of-Life Care), elaborados pelo Instituto de Ética da Associação

Médica Americana (AMA)

1) Preparando-se (Getting started)◆ Antes de comunicar qualquer notícia, planeje o que será discuti-

do. Confirme os fatos médicos do caso. Assegure-se de que as informa-ções necessárias estão disponíveis. Caso se trate de uma tarefa poucofamiliar, ensaie o que irá dizer. Não delegue a tarefa.

◆ Crie um ambiente capaz de conduzir a uma comunicação efetiva.Para pacientes pediátricos, tenha retaguarda de alguém do staff que sedisponha a ficar com a criança, enquanto conversa primeiro com os pais.Assegure-se de que esteja em um local adequado e com privacidade.Uma caixa de lenços de papel deve estar às mãos.

◆ Separe um tempo adequado para a conversa. Não exponha osfatos durante intervalos curtos ou entre outras tarefas críticas. Previna-sede interrupções. Desligue telefones celulares e pageres.

◆ Identifique quem, além do paciente, você gostaria que estivessepresente à discussão. Esta pessoa pode ser algum familiar; outras pessoassignificativas ao doente ou tratamento; alguém designado para tomardecisões (tutor); ou outros membros-chave da equipe multidisciplinar,como enfermeira, assistente social ou capelão.

2) O que o paciente sabe? (What does the patient know?)◆ Comece a conversa estabelecendo o que o paciente e sua família

sabem sobre a doença. Com essa informação, assegure-se de que o paci-ente e família estão hábeis a compreender más notícias.

◆ Para descobrir o que estas pessoas sabem sobre a doença, pode-sequestionar: O que você entende sobre a sua doença? Como descreveriasua situação médica? Tem estado preocupado com sua doença ou sinto-mas? O que outros médicos já lhe disseram sobre sua condição ou

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procedimentos que já foram feitos? Quando teve o primeiro sintoma, o queachou que poderia ser? O que o outro médico disse, ao encaminhá-lo (a) amim? Você considerou que poderia estar passando por algo sério?

3) Quanto o paciente quer saber?(How much does the patient want to know?)◆ Depois, estabeleça o quanto o paciente – ou seu pai e/ou sua

mãe, quando se tratar de criança – quer saber. Lembre-se: pessoas rece-bem informações de forma diferente, dependendo da raça, etnia, cultu-ra, religião ou condição sócio-econômica. Cada uma tem o direito de,voluntariamente, aceitar ou negar-se a receber quaisquer informações,e preferir designar alguém para escutá-las em seu lugar. Pergunte aopaciente e familiares como eles gostariam de receber informações. Se aprópria pessoa preferir não receber as notícias críticas, estabeleça quempoderá ser o substituto.

◆ Para descobrir o quanto seu paciente quer saber, utilize as seguintesquestões: Se sua condição tornar-se grave, você quer saber? Você gostariaque eu lhe contasse todos os detalhes sobre a sua condição? Se não, háalguém que poderia substituí-lo nestas conversas? Algumas pessoas realmentenão querem ser informadas sobre o que de errado existe com elas, e prefe-rem que a informação seja dirigida a algum familiar. O que você preferiria?Você quer que eu explique diretamente o que os resultados de exames mos-tram de errado? Com quem eu deveria falar sobre tais assuntos?

◆ Até aqui a conduta visou apenas preparar o paciente para recebera má notícia. Esta preparação deve ocorrer preferencialmente antes danotícia desagradável ser dada. A avaliação inicial e discussões subse-qüentes para preparar o paciente para exames críticos constituem-seem oportunidades de determinar o que o paciente sabe realmente e comoele (ou ela) gostaria de obter tais informações.

Quando a família pede “não conte” (When the family says “don‘t tell”)◆ Muitas vezes, membros da família pedirão ao médico que não

diga ao próprio paciente seu diagnóstico ou informações importantes.

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Como (nos EUA) é obrigação legal dos médicos obterem consentimentoinformado do paciente, um relacionamento terapêutico efetivo dependede uma aliança também com a família.

◆ Em vez de confrontar o pedido dos familiares respondendo “eutenho que contar a verdade ao meu paciente” pergunte o porquê de nãoquererem que a informação seja dada; do que têm medo; qual é suaexperiência em dar más notícias. Questione se existem contextos pesso-ais, culturais ou religiosos nos quais estão inseridos. Pergunte se desejamestar junto com o paciente, no momento em que perguntar se ele (ou ela)quer saber sobre sua saúde.

◆ Quando o paciente for criança, seus pais poderão não querer queseja informado sobre a doença. Tal instinto de proteção é até compreen-sível, mas pode ser problemático: como é a própria criança a pessoa a sersubmetida aos tratamentos e procedimentos necessários, vai perceber aexistência de um problema e pode se sentir desconfiada e perdida com oque está acontecendo.

◆ Para evitar que isso ocorra é melhor traçar um plano inicial deta-lhando aos pais a situação complicada que pode acontecer. Peça a pre-sença de um psiquiatra (ou psicólogo) especializado em pacientespediátricos, objetivando facilitar a comunicação entre médicos e pais.Também será tarefa do psiquiatra (ou psicólogo) avaliar o nível de com-preensão do paciente, dependendo de sua idade.

◆ Situações como esta podem requerer negociação complexa. Emcasos particularmente difíceis é útil solicitar o apoio do Comitê de Éticada instituição.

◆ Mesmo depois de todos os esforços para convencer os pais sobre anecessidade de comunicação com o paciente, pode ficar definido quedetalhes sobre diagnóstico, prognóstico e decisões sobre tratamento se-rão discutidos somente com eles – os pais. De qualquer forma, vale olembrete: esconder o diagnóstico ou informações importantes sobre oprognóstico ou tratamento do próprio paciente (qualquer que seja a ida-de) não é ética ou legalmente desejável (nos EUA), a menos que o pa-ciente tenha previamente indicado que não quer receber informações.

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◆ Se não houver acordo com os familiares, o profissional pode prefe-rir deixar aquele caso, transferindo-o a algum colega. Não precisa ficarconstrangido ou obrigado ao atendimento, de forma a comprometer oscuidados em saúde, ou sentir-se antiético.

◆ Como já foi mencionado, existem diferenças éticas e culturais, emrelação a lidar-se com informações. Conclusões globais raramente irãoajudar numa decisão individual.

4) Dividindo a informação (Sharing the information)◆ Forneça informações de uma maneira sensível, porém, honesta.

Diga e depois pare. Evite dar toda a informação de uma única vez, comoem um monólogo constante. Use linguagem simples e fácil de entender.Evite jargões técnicos ou eufemismos. Faça pausas freqüentes. Chequepara avaliar o entendimento. Use silêncio e linguagem corporal, comoinstrumentos facilitadores da abordagem. Não minimize a severidade daconversa. Esforços bem-intencionados para “amortecer o impacto” danotícia podem causar incertezas e confusões.

◆ Você pode iniciar as más notícias usando linguagem como: Se-nhor Gonzáles, eu me sinto mal de ter que lhe dizer isso, mas seu tumorexpandiu-se e tornou-se câncer. Ou: lamento que as notícias não sejamboas. A biópsia mostrou que o senhor tem um câncer no cólon. Ou:infelizmente, não há dúvidas sobre os resultados: é câncer. Ou: o relató-rio voltou e não é o que estávamos esperando. Mostrou que há um cân-cer em seu cólon. Ou: temo que tenho más notícias. A biópsia de medulamostrou que sua filha tem leucemia.

◆ A frase “sinto muito” pode sugerir que o médico tem alguma responsa-bilidade sobre a situação. Também pode ser confundida como pena ou indife-rença. Se você usar esta frase, ajuste-a, de maneira a demonstrar empatia. Porexemplo: sinto muito por ter que lhe dizer isso.

5) Respondendo às emoções (Responding to feelings)◆ Pacientes e familiares respondem às más notícias de formas varia-

das. Alguns, emocionalmente, com lágrimas, raiva, tristeza, amor, ansiedade,

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arrependimento, e outras emoções fortes. Outros demonstram recusa, acu-sação, culpa, incredulidade, medo, senso de perda, vergonha, ou ainda,tentam filosofar sobre o porquê de a situação estar ocorrendo. Alguns po-dem expressar reflexões de natureza psicofisiológica (dilemas entre o “lu-tar” ou o “fugir”, tentando correr do consultório ou, por outro lado, perma-necendo totalmente retraídos em si mesmos). Pais podem ficar muitoemotivos, apenas em pensar em contar o diagnóstico ao seu filho.

◆ Lidar com emoções fortes é algo que deixa muitos médicosdesconfortáveis. Dê um tempo para o paciente e a família reagirem. Estejapreparado para enfrentar suas possíveis e variadas reações. Ouça atenta-mente e silenciosamente. Valide suas emoções. Peça a eles para descreve-rem seus sentimentos. Tente reiniciar o diálogo com: Imagino que as notíciassejam difíceis. Ou: Você parece bravo. Pode me contar o que está sentindo?Ou: A notícia assusta você? Ou: Fale-me sobre como está se sentindo arespeito do que acabei de dizer. Ou: O que lhe preocupa mais? Ou: O queesta notícia significa para você? Ou: Eu gostaria que as notícias fossem dife-rentes... Tentarei ajudar Ou: Há alguém para quem você gostaria que eutelefonasse? Ou: Vou ajudar a contar ao seu filho. Ou: Seu papai e mamãeestão tristes agora. Eles irão se sentir melhores quando você melhorar.

◆ Relembre às pessoas de que suas respostas são normais. Deixe àdisposição uma caixa de lenços de papel. Comunicação não-verbal tam-bém pode ser muito útil. Pondere sobre a possibilidade de tocar no paci-ente, de maneira apropriada e tranqüilizadora. Ofereça um copo de água,uma xícara de chá ou outra coisa que possa acalmá-lo.

◆ Conceda tempo para que pacientes e familiares expressem senti-mentos imediatos. Não os apresse. Uma vez que a emoção for expressa-da, a maioria das pessoas estará apta a prosseguir. Compartilhar e enten-der o que aquelas emoções significam reforçará o vínculo médico/paci-ente e facilitará planejamentos e tomadas de decisões futuras.

6) Planejamento e acompanhamento (Planning and follow-up)◆ Estabeleça um plano para os próximos passos. Isso pode incluir

informações adicionais ou solicitação de novos exames. Trate os atuais

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sintomas. Ajude os pais na tarefa de contar à criança detalhes sobre suadoença e o que o tratamento significará para ela. Disponibilize referênci-as apropriadas. Explique seus planos quanto a tratamentos adicionais.Discuta sobre fontes potenciais de apoio como família, amigos, assisten-tes sociais, conselheiros espirituais, grupos de apoio, terapeuta, hóspice,etc. Ofereça opções de apoio aos irmãos da criança doente.

◆ Assegure ao paciente e à sua família que não ficarão abandonadose ressalte que você permanecerá ativamente engajado no plano de trata-mento e ajuda. Indique como o paciente e família podem obter respostasadicionais da sua parte. Estabeleça periodicidade para as consultas deacompanhamento.

◆ Quando der a má notícia, assegure-se de que o paciente estará asalvo, quando deixar o consultório. Voltará para casa sozinho? Dirigin-do? É perturbado, está se sentindo desesperado, ou é um suicida em po-tencial? Tem alguém em casa para oferecer apoio?

Nas consultas seguintes, por vezes, elementos deste protocolo (EPEC)precisarão ser reproduzidos. Com freqüência os pacientes e seus familia-res precisarão que as informações sejam repetidas, para adquirir o enten-dimento completo da situação.

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