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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 3498 CARTOGRAFIA E LEITURA DE MUNDO NO ENSINO DE GEOGRAFIA 1 CRISTIANE DE LURDES XAVIER HAGAT 2 CAMILA BENSO DA SILVA 3 ALANA RIGO DEON 4 Resumo: Este artigo tem por objetivo discutir a importância da cartografia como linguagem que torna possível a leitura de mundo e propicia a aprendizagem de conteúdos geográficos considerando o espaço vivido do aluno. Para isso, faremos uma breve discussão teórica sobre a importância da cartografia no ensino de Geografia no sentido de desenvolver noções de espacialidade e promover a leitura da realidade. Metodologicamente organizamos uma atividade dividida em cinco fases que envolvem a seleção e sistematização dos conceitos, elaboração de atividades que possuem relação com a realidade do aluno, a construção de um croqui, trabalho de campo, leitura do croqui e discussão dos dados analisados. Percebemos na prática que a relação estabelecida entre os conceitos e o espaço vivido, torna possível um olhar para além daquele baseado na experiência dos alunos e que o trabalho com a cartografia é fundamental para desenvolver as noções espaciais. Palavras-chave: Cartografia; Linguagem Cartográfica; Espaço Vivido. CARTOGRAPHY AND THE WORLD READING IN GEOGRAPHY TEACHING Abstract: This paper aims to discuss the cartography importance as the language that makes the world reading possible and provides the geography contents learning considering the space lived by the student. Thus, we are going to make a brief theoretical discussion about the importance of cartography in Geography teaching in the sense of developing notions of spatiality and promote a reality reading. We methodologically organized an activity divided into five phasesthat involve the selection and systematization of the concepts, elaboration of the activities that have relation to student reality, the construction sketch, fieldwork, the reading of the sketch and the discussion of the data analysed. We realized in the practice the relation established between the concepts and the space in whichone live become possible a look beyond of that based on thestudents' experience and that the work with cartography is fundamental to develop spatial notions. Key-words: Cartography, Cartography language; life space. 1 Introdução Fazer a leitura de mundo mediada pela Geografia é um desafio escolar no qual professores e alunos são colocados cotidianamente. As teias tecidas pelos educadores que buscam superar o discurso de disciplina monótona, sem atrativos e 1Texto produzido por integrantes do Grupo de Pesquisa Ensino e Metodologia em Geografia e Ciências Sociais, coordenada pela professora Doutora Helena Copetti Callai (Bolsista de produtividade PQ-CNPQ; NÍVEL 1D). 2 Mestranda em Educação nas Ciências na UNIJUÍ. Bolsista FAPERGS. 3 Mestre em Educação nas Ciências pela UNIJUÍ. 4Mestranda em Educação nas Ciências na UNIJUÍ. Bolsista Taxa Prosup Capes.

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

DE 9 A 12 DE OUTUBRO

3498

CARTOGRAFIA E LEITURA DE MUNDO NO ENSINO DE GEOGRAFIA1

CRISTIANE DE LURDES XAVIER HAGAT2 CAMILA BENSO DA SILVA3

ALANA RIGO DEON4

Resumo: Este artigo tem por objetivo discutir a importância da cartografia como linguagem que torna possível a leitura de mundo e propicia a aprendizagem de conteúdos geográficos considerando o espaço vivido do aluno. Para isso, faremos uma breve discussão teórica sobre a importância da cartografia no ensino de Geografia no sentido de desenvolver noções de espacialidade e promover a leitura da realidade. Metodologicamente organizamos uma atividade dividida em cinco fases que envolvem a seleção e sistematização dos conceitos, elaboração de atividades que possuem relação com a realidade do aluno, a construção de um croqui, trabalho de campo, leitura do croqui e discussão dos dados analisados. Percebemos na prática que a relação estabelecida entre os conceitos e o espaço vivido, torna possível um olhar para além daquele baseado na experiência dos alunos e que o trabalho com a cartografia é fundamental para desenvolver as noções espaciais.

Palavras-chave: Cartografia; Linguagem Cartográfica; Espaço Vivido.

CARTOGRAPHY AND THE WORLD READING IN GEOGRAPHY TEACHING

Abstract: This paper aims to discuss the cartography importance as the language that makes the world reading possible and provides the geography contents learning considering the space lived by the student. Thus, we are going to make a brief theoretical discussion about the importance of cartography in Geography teaching in the sense of developing notions of spatiality and promote a reality reading. We methodologically organized an activity divided into five phasesthat involve the selection and systematization of the concepts, elaboration of the activities that have relation to student reality, the construction sketch, fieldwork, the reading of the sketch and the discussion of the data analysed. We realized in the practice the relation established between the concepts and the space in whichone live become possible a look beyond of that based on thestudents' experience and that the work with cartography is fundamental to develop spatial notions.

Key-words: Cartography, Cartography language; life space.

1 –Introdução

Fazer a leitura de mundo mediada pela Geografia é um desafio escolar no

qual professores e alunos são colocados cotidianamente. As teias tecidas pelos

educadores que buscam superar o discurso de disciplina monótona, sem atrativos e

1Texto produzido por integrantes do Grupo de Pesquisa Ensino e Metodologia em Geografia e Ciências Sociais, coordenada pela professora Doutora Helena Copetti Callai (Bolsista de produtividade PQ-CNPQ; NÍVEL 1D). 2 Mestranda em Educação nas Ciências na UNIJUÍ. Bolsista FAPERGS. 3 Mestre em Educação nas Ciências pela UNIJUÍ. 4Mestranda em Educação nas Ciências na UNIJUÍ. Bolsista Taxa Prosup Capes.

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preocupada apenas com a descrição dos lugares, encontra percalços no caminho da

prática docente que, em muitos casos, impossibilita a construção de uma

compreensão ampliada de mundo pelo olhar geográfico.

Pensar os discursos que transformam a Geografia em uma disciplina

desinteressante não é tarefa fácil. No entanto, é nossa tarefa como professores

construir conhecimento com nossos alunos organizando estratégias didático-

pedagógicas que aproximam os conteúdos dos fenômenos e situações que ocorrem

em seu cotidiano, considerando que as categorias e os conceitos da disciplina são

elementares na compreensão do lugar. Consideramos que o conhecimento do

mundo começa pela dimensão do lugar que a criança vive, habita e interage.

Assim, reconhecemos a importância da cartografia como linguagem que torna

possível a leitura de mundo, do espaço geográfico e, como tal, busca propiciar a

aprendizagem de conteúdos geográficos, de forma que os alunos possam não só

compreender este espaço, mas ter condições de avaliar a sua própria atuação

enquanto sujeito histórico e político. A alfabetização cartográfica é uma destas

tramas da teia que se liga ao desenvolvimento da leitura de mundo. O seu

desenvolvimento na primeira etapa do ensino fundamental é de suma importância

para a construção de uma leitura mais complexa das representações gráficas do

espaço geográfico nas próximas etapas escolares.

Apresentamos neste artigo o desenvolvimento de uma prática teórico-

metodológica denominada “A compreensão do espaço vivido a partir da leitura e

produção cartográfica” envolvendo alunos do 6º ano do ensino fundamental em uma

escola do noroeste do estado do Rio Grande do Sul. A atividade está organizada em

cinco fases, baseadas em Simielli (apud Guerrero 2012):

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1ª Fase 2ª Fase 3ª Fase 4ª Fase 5ª Fase

Seleção e

sistematização

dos conceitos

adequando-os

aos aspectos

cognitivos dos

alunos.

Elaboração de

atividades que

possuem

relação com a

realidade do

aluno:

construção de

croqui do

pátio/terreno da

escola.

Construção de

croqui do trajeto

realizado pelo

aluno até a

escola,

utilizando o

google maps.

Trabalho de

campo para

leitura das

referências

espaciais do

cotidiano.

Leitura do

croqui,

discussão dos

dados do

trabalho de

campo e

produção de um

texto crítico

relacionado à

leitura do

espaço

geográfico em

que o aluno se

insere.

Organizado pelas autoras

Essa discussão é realizada pelos conceitos e noções básicas de cartografia,

adequadas e alinhadas ao desenvolvimento cognitivo dos alunos. Entendemos que

este trabalho é um processo contínuo que acompanha os alunos em sua trajetória

escolar. Deste modo, realizar estudos geográficos com a cartografia oportuniza a

apreensão e compreensão espacial, o contexto em que se produzem e reproduzem

as representações sociais do espaço construídas por eles. É a materialização dos

símbolos e conceitos da cartografia, que tanto seguem uma orientação universal,

como legenda, escala orientação, quanto assumem os contornos do lugar em que

estão sendo produzidos.

A partir do exposto apresentaremos primeiramente a importância da

cartografia na Geografia escolar no sentido de desenvolver noções de espacialidade

e promover a leitura da realidade a partir do lugar de vivência. Apresentaremos

algumas discussões sobre os desafios e possibilidades do trabalho com a

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cartografia na escola. Por fim, relataremos o passo a passo da atividade teórica

metodológica desenvolvida, baseadas nas cinco fases apresentadas.

2 – A Cartografia na Geografia Escolar A Geografia busca a compreensão do espaço que a sociedade produz por

meio do trabalho ou da intervenção humana na natureza. Esse espaço

compreendido como espaço geográfico se constitui a partir de fenômenos distintos e

complementares como econômicos, sociais, políticos, históricos, culturais. Portanto,

o espaço geográfico é produção humana, em que se articulam sociedade e

natureza.

Nesse sentido, é importante compreender que o conhecimento da ciência

geográfica é a referência para produção da Geografia escolar. Assim, nós, como

docentes mediadores desse processo, precisamos manter a base de sua

originalidade, para que não haja um distanciamento entre ambas.

Straforini (2004) ressalta que a Geografia escolar deve ter o compromisso de

promover a aprendizagem da leitura do espaço geográfico para que os alunos

possam entendê-lo e atuar nele. Esta compreensão é compartilhada por Guerrero

(2012, p.27), quando destaca que:

o pensar geográfico contribui, portanto, para a contextualização do aluno como cidadão do mundo e que se insere no mundo, que lhe pertence e no qual atua. Isso propicia o entendimento do espaço geográfico e o seu papel

nas práticas sociais.

A disciplina de Geografia assume o papel de contribuir à leitura, compreensão

e ação sobre fatos e fenômenos do cotidiano. Assim, ela vai se fazendo presente

nas construções espaciais dos alunos, nas quais os conteúdos escolares podem, ou

ao menos deveriam, se articular com o mundo vivido e experienciado pelos sujeitos.

Para Guerrero (2012), a aprendizagem da cartografia, articulada com os conceitos

geográficos, possibilita a leitura da realidade auxiliando a decodificá-la, a analisá-la e

a compreendê-la de modo mais complexo, na medida em que não se constitui

apenas produtores de mapas, mas leitores do espaço vivido.

Para Lefebvre (2006, p. 81), o espaço é a própria morfologia do social, sendo,

portanto, “o organismo vivo sua própria forma, intimamente ligada às funções e

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estruturas”. Este organismo vivo são as pessoas que produzem a estrutura social

não de modo cartesiano, mas de forma dialógica, em que o espaço é compreendido

como construção social. A representação que se faz deste vivido pode ter na

cartografia aporte para leitura gráfica do espaço e seus fenômenos.

Na cartografia o documento cartográfico mais conhecido é o mapa. Além dele

existem as cartas, as plantas, os croquis, as anamorfoses, as imagens de satélite, o

radar, as fotografias aéreas, etc. De acordo com as convenções internacionais, o

mapa é um instrumento que representa a superfície terrestre (GUERRERO, 2012).

Dessa forma, a leitura de seus símbolos e códigos é imprescindível. Assim, tal como

os alunos aprendem a ler um texto, eles aprendem a ser leitores de mapas. Para

que isso ocorra, é necessária a construção de conceitos específicos da cartografia, a

partir de um processo que se inicia com a alfabetização cartográfica e se

complexifica com o avanço escolar dos estudantes.

Segundo Almeida e Passini, (1991, apud CASTROGIOVANI, 2010), ler mapas

é um processo que começa com a decodificação envolvendo algumas etapas que

devem ser respeitadas para que a leitura seja eficaz. Entre os passos podemos citar:

a compreensão do título; o reconhecimento da legenda na decodificação dos signos

e símbolos representados; a escala na construção da relação entre o espaço real e

o representado; e, por fim, que ele possa estar familiarizado com a linguagem

cartográfica como um todo.

As matrizes de referência do Ministério da Educação (MEC), como os

Parâmetros Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares Nacionais, recomendam

o trabalho com a cartografia de modo que se produza não só uma técnica, mas um

recurso para compreender os fenômenos sociais. Segundo o PNLD (2007, p.9) “a

Cartografia é indispensável ao ensino da Geografia porque possibilita ao aluno

entender a distribuição, na superfície terrestre, dos fenômenos sociais e naturais e

de suas relações, por meio de diferentes formas de representação”.

Os anos finais do ensino fundamental representam uma etapa transitória para

o ensino médio. Os PCNs (1998) orientam que nessa etapa os alunos adquiram as

competências para trabalhar com localização/análise e com a correlação para tornar

o estudante tanto um leitor crítico, quanto um mapeador consciente. Para tal, os

professores podem desenvolver o trabalho em três níveis “estudando um fenômeno

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isoladamente e analisando a sua distribuição espacial, produzindo cartas analíticas;

combinando duas ou mais cartas analíticas; produzindo sínteses ou cartas que

reúnem muitas informações analíticas” (BRASIL, 1998, p.80).

Essa forma de pensar o estudo da cartografia a partir de estudos direcionados

e planejados é tarefa dos professores (as). A sequência de atividades deve estar

contextualizada a estudos geográficos da realidade social dos fenômenos

estudados. A articulação do conteúdo com o mundo vivido cria vínculos de

pertencimento aos lugares, à medida que o aluno se apropria do simbólico

construído pelo coletivo. Por isso, os símbolos cartográficos podem adquirir sentido

desde o lugar em que o sujeito estiver situado.

A atividade a seguir apresentada é uma experiência realizada em uma turma

de 6º ano do ensino fundamental. Esta pode ser uma possibilidade de trabalhar com

a cartografia na escola, de forma a refletir conjuntamente com os alunos sobre esta

prática que, aliada a conceitos, envolve a construção, produção, leitura e

interpretação de mapas no processo de ensino e aprendizagem em Geografia.

3-Desafios e Possibilidades da Cartografia na Escola

O ensino nos anos iniciais do ensino fundamental em Geografia tem como

atribuição principal a alfabetização cartográfica. Esse processo de alfabetização

inicia, por meio de leitura, desenhos (croquis), mapas mentais e outras atividades

lúdicas que ajudam os alunos no seu desenvolvimento cognitivo. Nesta etapa

escolar se desenvolve um olhar sobre os mapas no qual a criança o reconhece

como comunicador de determinados símbolos que representam a superfície

terrestre. No nosso caso, nos anos finais do ensino fundamental, iniciamos um

trabalho de construção cartográfica e da sua linguagem não mais apenas como

comunicadora, mas como produtora de leitura da realidade vivida.

A partir do proposto teoricamente, a atividade com os alunos teve como base

o conteúdo “Linguagem Cartográfica”. Desse modo, possibilitamos a leitura

cartográfica, a qual se baseou em explicações em sala de aula, sobre cada um dos

elementos que constituem os mapas, tais como: o título, a escala, a fonte, a

orientação e a legenda. Esses elementos foram trabalhados com o objetivo de

mostrar suas funções para que eles tivessem compreensão do todo de um mapa.

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Ampliando essas explicações apresentamos diferentes representações da realidade,

diferenciando carta, planta baixa de construção civil, carta topográfica, maquete,

bloco diagrama 3D, croqui, bem como, noções de visões horizontal, oblíqua e

vertical.

Os mapas temáticos também foram trabalhados, para que os alunos tivessem

noções das diferentes legendas, cores, símbolos e os significados de cada um dos

elementos na representação de um mapa, a partir das convenções internacionais.

Com a base conceitual apresentada e buscando construir uma leitura de mundo a

partir do espaço vivido pelos alunos, os levamos até o pátio da escola para que

pudessem fazer a observação do espaço.

Os alunos registraram todos os elementos observados no pátio no caderno,

buscando estabelecer relações com os conceitos construídos em sala de aula. Em

folha ofício os alunos desenharam um croqui somente do terreno/pátio da escola

sem a escala. Conforme ilustra a figura abaixo:

Fig. 1 Croqui do terreno/pátio da escola Fonte: Cristiane Xavier Hagat, 2015

A atividade foi importante, tendo em vista que os alunos se sentiram autores

do seu próprio croqui, tendo a oportunidade de criar símbolos e usar cores para

representar os elementos analisados. Na continuação da atividade, para que eles

pudessem construir as noções de horizontalidade e verticalidade, bem como visão

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oblíqua, realizamos atividade no Laboratório de Informática Educativa.

Com a ajuda do Google Maps, orientamos os alunos a entender o espaço

tridimensional representado de forma bidimensional, aliado à concepção de que

devido ao formato da Terra, não há „em cima‟ nem „em baixo‟. (CALLAI, 2000, apud

CALLAI, 2005). Por isso, e para tal, eles levaram consigo o desenho realizado em

aula anterior para visualizar como tinham visto a escola e como poderiam vê-la em

uma perspectiva verticalizada e oblíqua com a localização de suas casas, da escola,

do bairro. Possibilitamos a relação do vivido com os conceitos trabalhados.

Num segundo momento, no uso do Google Maps, os alunos ficaram mais

livres e puderam observar o seu município, os bairros, as ruas onde moram, bem

como outros municípios do Brasil e do mundo. Visitaram outras curiosidades, entre

elas, estádios de futebol, o Pão de Açúcar no Rio de Janeiro e o Parque da Disney

nos Estados Unidos. Destacamos a importância da atividade, pois os alunos

conseguiram abstrair a diferença entre visão oblíqua do seu desenho/croqui da

escola e a visão vertical com o programa Google Maps.

Finalizamos a etapa no laboratório observando o trajeto que cada aluno

realiza para chegar até a escola. Para tal utilizamos a tecla “print” para copiar a

imagem do trajeto que cada aluno faz, e, posteriormente, realizamos a impressão.

Na terceira fase do trabalho foram devolvidos os croquis do terreno/pátio da escola e

os avaliamos considerando a posição vertical e a forma como havia sido construído

o 1º croqui, de forma que o croqui final pudesse representar mais fielmente o

espaço. Coletivamente, discutimos quais os símbolos a serem representados no

croqui, de modo que ficasse mais fiel à imagem. Foram construídos os seguintes

símbolos5 na legenda: ruas/avenidas, vegetação, habitação, indústria, escola, açude,

“minha casa”.

Com a imagem impressa, iniciamos o processo de transferência para a

representação no papel vegetal. Este processo exigiu muita atenção e concentração

dos alunos para cada detalhe e foram necessárias várias aulas para sua realização.

A finalização, que segue na figura representada a seguir, demonstra o esforço em

ser fiel aos símbolos criados pela turma.

5Cada aluno registrou na legenda todos os símbolos ou parte deles conforme a localização da casa

de cada um mostrada na imagem.

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Fig. 2 Croqui do “Trajeto da minha casa até a escola”

Fonte: Cristiane Xavier Hagat, 2015

Para concluir esta fase, fizemos a leitura do croqui em conjunto. Na primeira

leitura constatou-se que na maioria das representações havia pouca vegetação.

Cada consideração feita por um aluno era acrescida por ideias de outros e mediada

pela professora. Isso fez com que os alunos percebessem que o croqui não

mostrava tudo o que havia no bairro. Desta forma, planejamos fazer um trabalho de

campo no bairro, para observar e produzir dados para uma nova discussão em sala

de aula para a próxima etapa da atividade.

O trajeto foi realizado a partir de um roteiro pré-elaborado considerando as

questões ambientais, sociais e culturais do bairro. Todo o trabalho de campo foi

devidamente registrado e fotografado. O simples fato de sair da sala de aula faz com

que os alunos sintam-se motivados a realizar as observações do espaço por eles

vivido. No entanto, não podemos confundir trabalho de campo com um passeio. Ao

contrário, “essa observação precisa ser guiada, de tal modo que não apenas situe o

sujeito no lugar e sim se constitua propositivamente na compreensão e intervenção

no espaço geográfico” (SILVA, HAGAT, 2015 p. 197).

Feitas todas as observações e seu devido registro, voltamos para a escola

com o objetivo de dar continuidade ao estudo fazendo a discussão no grande grupo.

Os alunos fizeram uma leitura detalhada do bairro onde moram e enfatizaram várias

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vezes os problemas de infraestrutura e a falta de cuidados com o meio ambiente.

Então, o desafio proposto foi que, junto com um colega, aprofundassem essas

questões, trocando ideias e produzissem um texto levando em conta o seguinte

questionamento: “O que pode ser feito para que o nosso bairro proporcione uma

vida melhor para quem mora ou circula nele?”. A ideia foi sistematizar aquilo que foi

representado no croqui colocando o olhar sobre esse espaço vivido próximo à sua

realidade.

4- Considerações Finais

Quando iniciamos esta proposta de estudo, sabíamos que seria um grande

desafio. Este artigo foi sendo delineado concomitantemente com a construção do

conhecimento com os alunos. O trabalho ainda encontra-se em andamento, por isso,

ainda não concluímos a produção textual, descrita como uma das fases da pesquisa.

O próximo passo é, a partir das produções textuais, construir com os alunos

conceitos de paisagem, espaço e lugar.

Essa fase da atividade é de fundamental importância, pois faz a relação entre

os conceitos e o aprendido. Conforme Young (2011), os relacionamentos dos alunos

da cidade onde vivem como um “conceito” de cidade deve ser diferente da sua

experiência de conhecer o lugar onde vivem.

É importante que os alunos não confundam a Londres de que fala o professor de Geografia, com a Londres onde vivem. Até certo ponto, é a mesma cidade, mas o relacionamento do aluno com ela, nos dois casos, não é o mesmo. A Londres onde vivem é um „lugar de experiência‟. Londres como exemplo de uma cidade é um „objeto de pensamento‟ ou um „conceito‟. (YOUNG, 2011, p.615)

Dessa forma, os alunos precisam construir uma forma conceitual de pensar e

analisar a diferença entre a sua cidade como exemplo de um conceito e a sua

experiência de viver nessa cidade. É olhar a cidade na sua dimensão material e

simbólica. Caso não consigam fazer essa diferenciação, terão problemas em

aprender geografia por analogia. Isso requer que os alunos pensem na cidade em

relação ao governo, ao comércio e não apenas descrevam suas experiências de

vida na cidade (YOUNG, 2011).

Nessa perspectiva, sabemos que não existe um pensamento único universal

da mesma forma que a visão que temos do mundo não é a única possível. Neste

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sentido, o estudo realizado com os alunos a partir da cartografia é apenas uma das

muitas maneiras que temos para desenvolver as noções de espacialidade e, para

além da representação, possibilitar a formação de sujeitos leitores de realidades,

educando-os para a cidadania.

A aprendizagem deste processo se faz na dinâmica em que professores (as)

e alunos (as) partilham conhecimento. No decorrer do caminho os (as) estudantes

dão outros indicativos e vão construindo as noções geográficas a partir daquilo que

vivem desde o lugar em que estão, mas na relação com que foi orientado (a) pelo (a)

professor (a). Portanto, a tarefa mediadora do professor é fundamental à

aprendizagem dos conceitos geográficos.

Desenvolver esta atividade foi fundamental para reconhecermos a relação

dos (as) alunos com o seu entorno. Percebemos que para além da construção

teórica da cartografia, a realidade empírica se impõe e vai dando forma e sentido ao

espaço. As categorias e conceitos da disciplina são o meio pelo qual construiremos

a compreensão do espaço geográfico, não somente, mas a possibilidade de uma

ponte para leitura de mundo através das lentes geográficas.

Referências

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LEFEBVRE, Henri. A produção do espaço. Trad. Doralice Barros Pereira e Sérgio Martins (do original: La production de l‟espace. 4e éd. Paris: ÉditionsAnthropos, 2000). Primeira versão: início - fev.2006. MELO, Fabiano Antônio. Aulas tediosas, alunos alienados. In: PASSINI, Elza Yasuko et al (Org.). Prática de ensino de geografia e estágio supervisionado. São Paulo: Contexto, 2007. SILVA, Camila Benso da. HAGAT, Cristiane de Lurdes Xavier. Geografando dentro e fora da escola: Reflexões sobre Trabalho de Campo. In: Callai et al. (Org.). Diálogos com professores: Cidadania e Práticas Educativas. Ijuí: Editora Unijuí, 2015. SIMIELLI, M. E. Cartografia no Ensino Fundamental e Médio. In: CARLOS, A. F.A.(org). A Geografia na sala de aula. 2º. Ed. São Paulo: Contexto, 2000. STRAFORINI, Rafael. Ensinar geografia: desafio da totalidade mundo nas séries iniciais. São Paulo: Annablume, 2004, 190p.