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Essa é uma publicação da Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil - FEAB

Contato: Blog | feab.wordpress.com E-mail | [email protected]

‘‘SOU ESTUDANTE DE AGRONOMIA, SOU FEAB!’’

Edição, Redação e Organização:

Coordenação Nacional UFSM Gestão 2014 / 2015

Artur Fernando Poffo Costa

Bruna Izabel Balz Cabral

Eduardo Jaehn

Felipe Ferrari da Costa

Hector dos Santos Facco

Kenedy Matiasso Portella

Regis Trentin Piovesan

Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil. E N T R A R , P E R M A N E C E R E T R A N S F O R M A R A UNIVERSIDADE. Ed. FEAB, Santa Maria, Novembro de 2014.

‘‘SOU ESTUDANTE DE AGRONOMIA, SOU FEAB!’’

Coordenação Nacional UFSM Gestão 2014 / 2015

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Apresentação....................................................................................4

Elementos conceituais para pensar a política de assistência estudantil na atualidade....................................................................5

Entrar, permanecer e transformar a Universidade...................................................................................13

A Assistência Estudantil, uma visão a partir da Agronomia.......................................................................................17

SUMÁRIO

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Apresentação

É com muita satisfação que apresentamos aos/as estudantes de Agronomia a cartilha confeccionada pela Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB) sobre a campanha de Assistência Estudantil “Entrar, Permanecer e Transformar a Universidade”. Este primeiro ensaio tem por objetivo colocar em evidência o tema junto ao movimento estudantil da Agronomia, produzindo um exercício de reflexão e organizando nossas pautas para a assistência estudantil, ponto tão necessário na realidade dos/das estudantes de Agronomia atualmente.

Foi nesta perspectiva de debater a assistência estudantil que no mês de maio de 2014, a União Nacional dos Estudantes (UNE) realizou na cidade de Ouro Preto-MG seu III Seminário Nacional de Assistência Estudantil. Com a participação de mais de 700 estudantes de todo o país, a atividade produziu uma série de encaminhamentos, publicados por meio de um caderno de resoluções, que apontam para cinco eixos de ação e uma campanha nacional a ser coordenada por um Grupo de Trabalho Nacional, do qual a FEAB faz parte.

Os eixos elencados foram: Concepção de Assistência Estudantil; a participação estudantil na construção das políticas de permanência; os desafios para a permanência dos Cotistas; a assistência para Prounistas e estudantes que aderiram ao FIES; e as condições de permanência das mulheres na universidade. A escolha dos eixos ocorreu pela identificação destes com os sujeitos que ingressaram no ensino superior por meio do processo e dos programas de expansão das universidades.

O Grupo de Trabalho Nacional foi definido como órgão realizador de uma campanha de caráter permanente. O GT está sendo composto pelos diversos segmentos e entidades representativas do país, com destaque para as UEE's e as Executivas de curso, como é o caso da FEAB. A razão é que, o debate da Assistência Estudantil perpassa pela realidade concreta de cada estudante, que possui especificidades de acordo com o curso, com a região e estado do país. Dessa maneira, articular a campanha com as entidades estaduais e as Executivas de Curso é algo decisivo para um processo de lutas vitorioso para o conjunto dos/as estudantes.

Desta forma, nós da FEAB, além de acompanharmos nacionalmente os trabalhos e formulações do GT da campanha, nos propomos a produzir materiais e pautas específicas que dialoguem com a realidade da assistência estudantil em nosso curso.

Esta cartilha é o primeiro passo desta jornada!

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Elementos conceituais para pensar a política de assistência estudantil na atualidade

Clara Martins do Nascimento*

Introdução Os diálogos realizados nos espaços acadêmicos reservados à discussão da assistência estudantil; a consulta à bibliografia especializada e a preocupação constante com o amadurecimento da temática (pelo envolvimento pessoal com as questões estudantis e por ser objeto de pesquisa de mestrado) nos possibilitaram construir reflexões mais sistemáticas sobre algumas questões conceituais que dizem respeito à assistência estudantil, implementada nas Instituições Federais de Ensino Superior/ IFES sob orientação do Programa Nacional de Assistência Estudantil/ PNAES. O presente ensaio concentra atenção em duas questões que consideramos de extrema importância para a formulação, implementação e avaliação da Política de Assistência Estudantil pelas IFES. Trata-se da problematização do conceito de assistência, necessário à delimitação dos parâmetros legais da assistência estudantil e do conceito de necessidades, para subsidiar a definição das necessidades estudantis. Estas preocupações, de natureza teórica, se não esclarecidas, colocam-se como entraves à delimitação das políticas de assistência ao estudante. A fragilidade da definição do que é assistência estudantil - a qual assistência nos referimos, visto que é desenvolvida no âmbito da educação? E o que entendemos a respeito das necessidades estudantis é responsável por dois equívocos de ordem teórica presentes nas agendas políticas da assistência ao estudante, sendo estes: 1. O entendimento da assistência estudantil como sendo extensão das ações da Política de Assistência Social, o que leva as instituições de ensino a tentarem definir as ações de assistência ao estudante sob as bases da assistência social, enquanto política especifica, e 2. A restrição do conceito de necessidades, quando se trata das necessidades estudantis - sua redução ao plano das necessidades de sobrevivência. Neste ensaio, dialogamos com autores referenciados nas temáticas da assistência e das necessidades, tais como Yasbek (1993), Sposati et al. (2008), Pereira (2008), o que nos possibilitou realizar alguns nexos com a temática da assistência ao estudante. Esperamos, com isto, poder contribuir para o desenho das Políticas de Assistência Estudantilpelas IFES consoantes às políticas educacionais e direcionadas ao atendimento das necessidades reais dos estudantes. Esse objetivo justifica a relevância desta produção.

Assistência na educação: de que se trata?

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Do ponto de vista da oferta de serviços, “[...] toda política social é assistencial na medida em que se propõe a prover uma necessidade” (YASBEK, 1993, p. 11). Isso significa dizer que a dimensão assistencial é transversal a essas políticas e se expressa na assistência médica, na técnica, na educacional etc. No campo da Política de Educação Superior, a assistência estudantil é uma das ações assistenciais previstas pelo Estado, através de seus órgãos de representação (nesse caso, o Ministério da Educação/ MEC), estruturada com a proposta de responder às demandas dos estudantes provenientes das classes subalternas, que estão tendo sua participação ampliada no ensino superior público. O assistencial, no Brasil, constituiu-se como “[...] campo concreto de acesso à bens e serviços, enquanto oferece uma face menos perversa ao capitalismo” (YASBEK, 1993, p. 53). A apreensão da assistência estudantil por esta categoria se dá por ser o assistencial “[...] uma das características em que se expressa a ação do Estado brasileiro nas políticas governamentais de corte social” (SPOSATI et al, 2008, p. 22). Historicamente, essa dimensão assistencial das políticas sociais brasileiras esteve expressa no caráter emergencial e focalizado dessas políticas, em contrapartida à “uniformização, universalização e unificação” (SPOSATI et. al, 2008, p. 23) em que deveriam se pautar. Essas distorções conferiram às políticas sociais brasileiras “[...] um perfil limitado e ambíguo: se apoiam muitas vezes, na matriz do favor, do apadrinhamento, do clientelismo e do mando, formas enraizadas na cultura política do país” (YASBEK, 1993, p. 50). Ou seja, no caso brasileiro, o entendimento da dimensão assistencial da política social sofreu distorções históricas: sua lógica estruturadora esteve distante da perspectiva do direito, o que condiz com a especificidade da formação social do país baseada no clientelismo e nas práticas assistencialistas. Nesse sentido, considerando que as políticas sociais possuem uma dimensão assistencial, afirmamos que a assistência estudantil, no âmbito da educação superior, manifesta o próprio caráter assistencial da Política de Educação. Essas ações surgem, no espaço universitário, a partir das reivindicações dos movimentos sociais organizados em defesa do provimento, pelas instituições educacionais e Estado, das condições materiais e imateriais necessárias à permanência dos estudantes nessa modalidade de ensino. Na mesma direção de Sposati e colaboradores (2008), para entender os limites e possibilidades da assistência estudantil enquanto subprograma da política educacional, consideramos que o mecanismo assistencial presente nas políticas sociais “[...] revela-se, ao mesmo tempo, como exclusão e inclusão dos bens e serviços prestados direta ou indiretamente pelo Estado” (SPOSATI et al, 2008, p. 30). Tal mecanismo possui duas faces: uma de inclusão e outra de exclusão. Sua face inclusiva se dá por, de fato, atender às necessidades concretas dos estudantes. Por outro lado, ao estruturar-se por critérios de elegibilidade e reiterar a manutenção do estudante na “[...] condição de assistido, beneficiário

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ou favorecido pelo Estado e não usuário, consumidor e possível gestor de um serviço a que tem direito” (SPOSATI et al., 2008, p. 29) manifesta sua face de exclusão. Essa face de exclusão é reafirmada no entendimento das políticas assistenciais enquanto compensatórias de carência, o que legitima a função do Estado em selecionar o grau de carência da demanda, além de oferecer serviços de baixa qualidade, já que, nessa perspectiva, os serviços públicos se destinam a uma população dita carente e minoritária. Por isso, são prestados em condições precárias quantitativa e qualitativamente. A orientação das políticas sociais sob o viés da focalização, da seletividade e da emergência — que responde à constante retomada do seu caráter assistencialista — aparece como resposta à crise de 1970, que obriga os países periféricos, sob os ditames dos países centrais, a reestruturarem suas agendas políticas tendo em vista os ajustes fiscais para retomada do ciclo expansivo do capital. Mota (2008) ao problematizar o reordenamento da Seguridade Social a partir dos anos 1970, no sentido da focalização, precarização e privatização das ações do Estado no âmbito do social, destaca o impacto de tais medidas no fortalecimento de uma perspectiva assistencial no campo das políticas sociais - caracterizada por respostas estatais de caráter emergencial, contingenciadas e fragmentadas para o enfrentamento da pobreza. Esse movimento de reorientação das políticas sociais, que ganha maior expressividade nos anos 1990, no sentido do seu distanciamento da perspectiva do direito, vem sendo interpretado por alguns autores como uma tendência à assistencialização das políticas sociais. Partilhamos da mesma interpretação de Couto (2011, p. 55) ao considerar que “[...] o risco da assistencialização no quadro da crise em que vivemos não se refere apenas à Assistência Social, mas constitui um risco mais geral que envolve a sociedade brasileira e a política pública em todos os campos”. Assim, essa tendência faz-se presente também na Política de Educação Superior. A autora nos ajuda a entender melhor essa questão: Quando o sujeito está com fome, ele vai ter que ter sanado o seu direito de ter alimentação. Contudo, isso é um programa assistencial, o qual não pode se bastar. Não lhe cabe, assim, dar conta disso como se a tarefa da política social fosse apenas matar a fome de quem está com fome. Esta é uma dimensão essencial, mas ela precisa ser ampliada em suas exigências políticas e socais, sob a forma do direito (COUTO, 2011, p.55). Em resumo, no âmbito das políticas sociais em geral, é a assistencialização, enquanto categoria teórica, que vem “[...] iluminando práticas profissionais e, inclusive, definições governamentais, do ponto de vista do mero acesso a benefícios e projetos [...]” (COUTO, 2011, p. 64). Tal reflexão é uma mediação

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para o entendimento de como a assistência estudantil vem se configurando nas instituições de ensino superior públicas, expressando o ranço do mecanismo assistencial presente nas políticas sociais que, na particularidade brasileira, convive com a tendência à sua assistencialização. Em outras palavras, a implementação de uma Política de Assistência Estudantil reduzida a benefícios focalizados, emergenciais, destinados a um público específico, é fruto da forma como se configurou o assistencial, no Brasil, nos limites da formação social do país. Por isso, é importante enfatizar que a focalização, a seletividade e o caráter emergencial não são características próprias à Política de Assistência Social, esta também incorpora tais diretrizes, pelo mesmo motivo das demais políticas sociais de caráter assistencial. Assim, fica possível perceber dois equívocos: o primeiro é o de entender essas tendências das políticas sociais como sendo inerentes à Política de Assistência Social. Um segundo erro é o de tentar vincular a assistência estudantil à Política de Assistência Social e, por assumir tal postura, tentar construir os seus parâmetros legais em consonância com os parâmetros daquela política específica. Tais equívocos explicam o fato de estar presente, nos discursos dos estudiosos do tema, nas publicações, assim como nos textos legais das Políticas de Assistência Estudantil das IFES, a relação direta da assistência estudantil com a Política de Assistência Social, como se a assistência ao estudante universitário fosse uma extensão das ações dessa Política. Essas limitações conceituais têm implicações diretas no planejamento e na operacionalização da assistência estudantil, uma vez que a sua vinculação à Política de Assistência Social resulta na tentativa frustrada de explicar a sua estruturação e regulamentação nos limites dessa Política. Na nossa concepção, é justamente a face assistencial das políticas sociais a causa desta confusão de definição da qual a assistência estudantil é vítima. Para evitar tal equívoco conceitual, temos que ter em mente que a assistência tanto assume a forma de um subprograma de uma política setorial (saúde, habitação, educação etc.) como também de uma área específica da política social, ou seja, a Política de Assistência social (SPOSATI et al, 2008). A presença histórica de ações assistenciais do Estado na educação exprime a vinculação da assistência estudantil com as políticas educacionais, destacando, portanto, o seu caráter autônomo da Assistência social enquanto política específica. Tal afirmação exige que nós partamos de uma concepção ampla da assistência social reconhecendo que “[...] além de constituir-se como política setorial específica regida pela Loas, ações assistenciais estão presentes em praticamente todas as outras políticas sociais. Estas ações, entretanto, não são regidas pelo disposto na Lei Orgânica de Assistência Social/ Loas [...]” (BOSCHETTI, 2003, p. 78). Nesse sentido, chamamos atenção para o fato de que a assistência estudantil não está vinculada à Política de Assistência Social

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e, portanto, não se submete aos preceitos de sua regulamentação, devendo, sim, ser entendida enquanto política educacional - uma vez que se trata de ações de cunho assistencial desenvolvidas no âmbito da educação.

Por uma assistência estudantil ampliada: o conceito de necessidades em pauta A importância da teorização crítica do conceito de necessidades, no âmbito da Política de Assistência Estudantil, se dá por ser o foco dessa Política o provimento das condições necessárias à permanência dos estudantes no ensino superior público. O alcance de tal objetivo requer um maior esclarecimento sobre as reais necessidades dos seus estudantes/ usuários. Nesse sentido, é fundamental que os gestores, os profissionais e os intelectuais responsáveis pelo planejamento, implementação e avaliação da assistência estudantil polemizem tal conceito. Se tomarmos como exemplo os Programas de Moradia Estudantil, fica possível perceber a importância da leitura crítica das necessidades estudantis na formulação das ações de assistência a esse público específico. Uma peculiaridade desses Programas é o fato de exigirem articulação com as demais políticas desenvolvidas no espaço universitário, pois, se levarmos em consideração a complexidade das necessidades estudantis, veremos que a convivência nas Casas de Estudantes desencadeia uma série de outras demandas que são fruto da especificidade das condições de vida dos estudantes e, portanto, extrapolam a demanda por moradia, se esta for entendida enquanto teto somente. Sob esse ponto de vista, a discussão desse conceito possibilita nortear o desenho das políticas de satisfação de necessidades, considerando que “[...] não há serviços sociais sem a delimitação daquelas necessidades a serem satisfeitas”. (PEREIRA, 2008, p. 38). A referência às necessidades humanas, no âmbito da política social, constitui um critério de primeira ordem na tomada de decisões políticas, econômicas, culturais, ideológicas e jurídicas (PEREIRA, 2008). Essa mesma autora nos traz que o conceito de necessidades naturais, vitais ou de sobrevivência surgiu como sinônimo de necessidades básicas, identificada por uma dimensão biológica, e complementa que o discurso que justifica tal concepção é o de que tais necessidades “[...] em nada se diferenciam das necessidades animais e, portanto não exigiam para o seu atendimento nada mais do que um mínimo de satisfação”. (PEREIRA, 2008, p. 58). Na crítica a essa concepção restrita das necessidades do homem, autores, como Agnes Heller6, encararam as necessidades como um conjunto e ampliaram seu conceito, considerando que as necessidades de sobrevivência humana não poderiam ser vistas como idênticas às necessidades dos animais. De acordo com PEREIRA (2008), as considerações de Heller sobre tais necessidades apontam que as mesmas não podem ser definidas como naturais, já que suscetíveis de interpretação como necessidades concretas no seio de um

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contexto social determinado (PEREIRA, 2008, p. 58). GUARÁ (1998), fundamentada em Agnes Heller, destaca que, segundo a teoria marxiana, as necessidades incluem as seguintes categorias – necessidades naturais, interpretáveis como “necessidades físicas” ou como “necessidades necessárias”, e “necessidades socialmente determinadas“, que se podem compreender como necessidades sociais num sentido amplo (GUARÁ, 1998). O Decreto Nº 7.234 de 19 de julho de 2010 que dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil/PNAES tem como finalidade ampliar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal. No seu cumprimento, cabe às IFES formularem ações nas áreas estratégicas definidas pelo Programa, considerando as especificidades de cada instituição. O fato é que nem todas as IFES possuem programas em todas as áreas estratégicas definidas pelo PNAES. Em alguns casos, ainda prevalece o “tripé” da assistência estudantil: a Bolsa Permanência, os Restaurantes Universitários e as Casas de Estudantes. Somos estimulados a pensar como a IFES vêm interpretando as necessidades dos estudantes, visto que, historicamente, esta foi reduzida a concepção de necessidades de sobrevivência interpretada equivocadamente como necessidades básicas, cujos programas de resposta a estas demandas estariam focalizados nas bolsas (auxílio financeiro), alimentação e moradia.Se mais uma vez tomarmos como referência o Programa de Moradia Estudantil, veremos que o mesmo se estrutura no sentido de oferecer condições de permanência nas instituições de ensino superior público aos estudantes provenientes do interior do estado da sede da IFES ou de outros estados, através da convivência nas Casas de Estudantes, ou seja, através do acesso à moradia. Porém, mesmo sendo a centralidade do programa prover a moradia, não há como ignorar a existência de outras demandas que envolvem “o morar”. Essa ampliação da abrangência dos programas da assistência estudantil só será possível se as diretrizes dos programas incorporarem as reais necessidades dos estudantes, o que requer que interpretação dessas necessidades estudantis seja feita de forma crítica. Tal feito permite extrapolar a dimensão somente biológica das necessidades estudantis, contribuindo teórico-metodologicamente para que a estruturação dos programas da assistência estudantil esteja coerente ao alcance de seu objetivo maior, quer seja, reduzir as desigualdades educacionais. A construção crítica do conceito de necessidades permite que o desenho das necessidades dos estudantes tome como ponto de partida a condição social, e a realidade social na qual esses estudantes estão inseridos. Um primeiro passo a ser dado é a implementação de projetos de avaliação direcionados a captar as reais demandas dos estudantes/usuários da assistência estudantil. Nesse sentido, o resgate de um conceito crítico de necessidades nos permite visualizar as necessidades estudantis nas suas mais variadas dimensões (social, biológica, física etc).

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Considerações finais

A institucionalização das ações de assistência aos estudantes universitários desde o ano de 2007 - com a construção do Plano Nacional de Assistência Estudantil e de forma mais intensa a partir de 2010, com a institucionalização do Decreto Presidencial Nª 7.234 de 19 de julho de 2010 que dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil/ PNAES, atribuiu às IFES a obrigatoriedade de construir suas próprias políticas de assistência ao estudante universitário. Esse referencial legal abriu espaço para a construção de políticas estudantis consoantes às particularidades educacionais das instituições de ensino superior e que estivessem comprometidas com as necessidades estudantis. Além disso, pôs em pauta a necessidade do amadurecimento de questões conceituais e operacionais que contribuíssem para o redirecionamento de tais políticas. Compreende a assistência estudantil as ações de cunho assistencial que são desenvolvidas no âmbito da política de educação e orientadas para o provimento das condições necessárias à permanência dos estudantes no ensino superior. Essas ações devem ser implementadas respeitando as particularidades estudantis, e considerando o contexto educacional brasileiro. Devem estar comprometidas com a ampliação da cobertura de seus serviços, tendo como norte a universalização do acesso. Para garantir tal ampliação, é necessário que os seus gestores, profissionais e intelectuais realizem uma leitura crítica do conceito de assistência assim como do conceito de necessidade, uma vez que o primeiro não se reduz ao provimento de subsídios materiais de forma focalizada/seletiva, e o segundo está para além do atendimento das necessidades restritas de sobrevivência. A garantia das condições necessárias à permanência dos estudantes no ensino superior público é o princípio que norteia as ações dos Programas da Assistência Estudantil. Nesse sentido, o atendimento das necessidades estudantis, por parte desses programas, é ponto chave a ser trabalhado na sua formulação - fato que exige a teorização do conceito de necessidades à luz de uma perspectiva crítica de entendimento da realidade. O conceito de necessidades, enquanto conceito norteador para formulação de ações da assistência estudantil, não pode ser reduzido à ideia de sobrevivência biológica. Esse conceito deve “[...] levar em conta tanto a dimensão natural dos seres humanos quanto a social” (PEREIRA, 2008, p. 181). O seu entendimento contribui para o fortalecimento dessa Política de Assistência Estudantil no âmbito das IFES, na medida em que facilita o seu distanciamento do tripé histórico da assistência – denominado assim por sua restrição à bolsa (renda), alimentação e moradia. Por outro lado, afirmar a não vinculação da assistência estudantil com a Política específica de Assistência Social significa abrir um novo caminho para o

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entendimento das configurações atuais das ações de assistência aos estudantes nas IFES e nas outras modalidades de ensino. Não encontraremos os fundamentos teóricos que expliquem o movimento real da constituição da assistência na educação pela via da assistência social enquanto política específica, e sim, na apropriação do que é o fenômeno da assistência, em sentido lato, no Brasil, e como ele se materializa na relação Estado, capital e classe trabalhadora, e sua especificidade no âmbito das políticas setoriais, como é o caso da educação. Enfatizamos, desse modo, a necessidade urgente de que as Políticas de Assistência Estudantil sejam estruturadas nas IFES levando em consideração a conjuntura da educação superior no Brasil, o que possibilitará a essas ações assumirem corpo próprio e legislações específicas, estreitas ao cenário da educação.

Referências

BOSCHETTI, Ivanete. Assistência social no Brasil: um direito entre a originalidade e o conservadorismo. 2 ed. Brasília, 2003.

BRASIL. Decreto nº 7234 de 19.07.2010. Dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES. Brasília, 19 de julho de 2010.

COUTO, Berenice.Assistência Social em debate: direito ou assistencialização. In: O trabalho do/a Assistente Social no Suas : Seminário Nacional / Conselho Federal de Serviço Social – Gestão Atitude Crítica para Avançar na Luta. Brasília: CFESS, 2011.

GUARÁ, I. M. F. R. Breve introdução à teoria das necessidades. IN Serviço Social e Sociedade, Ed. Cortez, nª 57 – ano XIX, 2008.

MOTA, Ana Elizabete. O Mito da Assistência Social. São Paulo: Cortez, 2008.PEREIRA, P. A. P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2008.

SPOSATI, Aldaíza de Oliveira et al. A Assistência na trajetória das políticas sociais brasileiras: uma questão em análise. 10 ed. São Paulo: Cortez, 2008.

YASBEK, Maria Carmelita. Classes subalternas e assistência social. São Paulo: Cortez, 1993.

*Clara Martins do Nascimento é Mestranda do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco.

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Entrar, permanecer e transformar a Universidade

Uma leitura sobre o atual cenário das lutas pela Assistência Estudantil no Brasil e o papel do movimento estudantil.

Patrick Campos Araújo*

Um breve histórico das mudanças recentes no ensino superior brasileiro

Ao longo dos últimos onze anos, o ensino superior brasileiro viveu um processo de reconfiguração. Este processo possui duas características principais. Uma é o fim do ciclo de sucateamento das instituições públicas, que teve seu auge com os governos neoliberais na segunda metade dos anos noventa. A outra é o início de um ciclo de expansão, baseada na ampliação da quantidade de vagas ofertadas, tanto no setor público quanto no setor privado. Mesmo não ocorrendo uma Reforma Universitária stricto sensu, como era a proposta dos movimentos de educação e do movimento estudantil consolidada no PL 7200/06, uma série de programas e de políticas foram implementadas a partir do ano 2003, com o objetivo de atender algumas das demandas e reivindicações, tanto dos movimentos quanto do setor empresarial. Entre as ações, merecem destaque quatro políticas que tiveram impacto direto em algumas estruturas do chamado modelo tradicional de Universidade. Modelo este que foi estabelecido durante os anos sessenta, quando da última Reforma Universitária. A primeira destas ações foi o Programa Universidade Para Todos. O PROUNI foi baseado na política de aquisição de vagas no setor privado para serem ofertadas por meio de bolsas integrais e parciais para estudantes de baixa renda, através de processos de seleção pública realizados pelo MEC. A segunda ação foi o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, o REUNI. Na verdade, o REUNI se caracteriza como a segunda fase do processo de expansão, pois este se compreendeu no período de 2003 a 2007, através da denominada Expansão I. Esta primeira fase, segundo o relatório da Comissão para Análise sobre a Expansão das Universidades Federais, “teve como principal meta interiorizar o ensino superior público federal, o qual contava até o ano de 2002 com 45 Universidades Federais e 148 campus/unidades”. Já o REUNI propriamente dito, “tinha como objetivo principal criar condições para a ampliação do acesso e permanência [...] pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas Universidades Federais. Também havia a possibilidade de criação de novos campi para o interior do país...”. Desenvolvido através de etapas, e em meio a muitas lutas, resistências

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e situações contraditórias, o resultado do REUNI foi à ampliação das vagas nos cursos de graduação, com ampliação dos cursos noturnos e a construção de novas instituições que atenderam a ideia de interiorização das Federais. A terceira ação foi o estabelecimento do Exame Nacional do Ensino Médio como mecanismo de avaliação universal para ingresso através do Sistema de Seleção Unificado (SISU). O fim do vestibular em diversas instituições e a adesão ao ENEM criou um cenário de grande mobilidade acadêmica e geográfica entre os estudantes de todo o país. Por meio do SISU, diferente do vestibular tradicional de cada instituição, os estudantes podem disputar vagas em instituições de todos os estados do país. Por fim, a quarta ação foi à aprovação da Lei 12.711, ou Lei de Cotas, que estabeleceu a reserva de vagas nos Institutos e Universidades Federais para estudantes oriundos de escolas públicas e para estudantes negros e pardos.Estas quatro ações foram o carro chefe do enfrentamento a um dos problemas históricos da educação superior brasileira, a questão do acesso. A consequência deste processo é que em cerca de dez anos (2003 a 2013) foi triplicada a quantidade vagas no sistema de ensino superior brasileiro. Este aumento, todavia, tem uma característica preocupante: a hegemonia do setor privado. Atualmente, das 2.416 instituições de Ensino Superior existentes, cerca de 75% são privadas. Por óbvio que estas mudanças, tímidas do ponto de vista das demandas dos movimentos, mas avançadas quando se comparadas com a trajetória da educação superior em toda a história do Brasil, modificaram em alguns aspectos aquilo que é chamada de condição tradicional da universidade. Uma destas modificações diz respeito ao sujeito que hoje ingressa na universidade brasileira. E é acerca das condições que envolvem estes sujeitos que este texto busca tratar.

A questão do ingresso e da permanência Com o REUNI, o PROUNI, o FIES, a Lei de Cotas, o SISU e a ampliação dos cursos de graduação nos Institutos Federais e sua vertiginosa ampliação, um setor da sociedade que historicamente foi mantido distante do ensino superior, agora vem conquistando este espaço. Notadamente estudantes de escolas públicas, mulheres, negras/os, indígenas e quilombolas são algumas das expressões deste setor. Estes sujeitos constituem um novo perfil de estudante. Diferente do passado recente, onde ingressava na universidade apenas aquele que tinha condições de sustentar seus estudos, estes novos estudantes ingressam na Universidade demandando políticas que lhes garantam a permanência. É uma inversão de valores que tem sua origem no ingresso destes estudantes no espaço universitário. Outrora, as necessidades sempre existiram, todavia

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com os sujeitos mantidos distante da universidade. O que ocorre agora é a presença cada vez maior destes dentro do espaço universitário. Essa nova conformação do espaço universitário é marcada pelo aprofundamento das contradições históricas da universidade brasileira, pensada e construída majoritariamente para ser um espaço de poucos para poucos, oriundos das melhores safras da elite nacional que podia manter seus filhos em condições apropriadas durante o período necessário para sua formação, vivendo com plenitude a condição de estudante. Ingressam agora na Universidade os trabalhadores, pais e mães, moradores das periferias e das cidades de interior. São “produtores de conhecimento”, agora, os produtores da riqueza da sociedade. Sujeitos que precisam conciliar longas jornadas de trabalho, com o horário da faculdade. Que saem de casa para viver numa outra cidade e estado contanto unicamente com o apoio da instituição de ensino. Estas são algumas das razões que colocam no centro do debate acerca das transformações necessárias da universidade, a questão da assistência estudantil. Em síntese: a ampliação do acesso à universidade, trouxe para dentro desta um novo sujeito, que apenas poderá ficar se lhe forem garantidas as condições de permanência. Algumas políticas já foram criadas com esta perspectiva. Em 2008 foi lançado o Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), que tem na sua definição o objetivo de garantir:

“A permanência de estudantes de baixa renda matriculados em cursos de graduação presencial das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES). O objetivo é viabilizar a igualdade de oportunidades entre todos os estudantes e contribuir para a melhoria do desempenho acadêmico, a partir de medidas que buscam combater situações de repetência e evasão. O PNAES oferece assistência à moradia estudantil, alimentação, transporte, à saúde, inclusão digital, cultura, esporte, creche e apoio pedagógico. As ações são executadas pela própria instituição de ensino, que deve acompanhar e avaliar o desenvolvimento do programa”.

O PNAES foi uma importante conquista do movimento estudantil e dos movimentos de educação, com destaque para o Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE). Hoje é a principal política de assistência estudantil do país, mas que carece de uma atenção muito especial. Uma de suas principais limitações hoje diz respeito ao orçamento. Este gira em 2014 em torno dos R$ 700 milhões de reais, num cenário onde o FONAPRACE diz que o mínimo necessário seriam R$ 1,5 bilhão para subsidiar todas as bolsas e auxílios existentes. Ou seja, o recurso é insuficiente, o que impede que o Plano se realize por completo.

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Por isso, ao longo do último ano o conjunto do movimento estudantil vem se mobilizando para lutar pela ampliação dos recursos do PNAES, bem como para discutir com profundidade o tema da Assistência Estudantil, que sem dúvidas já se tornou bandeira da maioria das entidades estudantis de todo o país.

A luta pela Assistência Estudantil

É com base nessa leitura da situação concreta que os diversos setores do movimento estudantil brasileiro têm destacado como uma de suas pautas centrais, a questão da Assistência Estudantil. Garantir que a rede do movimento estudantil trabalhe de maneira articulada, com uma base de ação nacionalizada, mas que ao mesmo tempo consiga atingir de maneira específica cada estudante é sem dúvidas algo inédito do ponto de vista da luta pela Assistência Estudantil. Em especial num contexto onde a proposta é de incorporar pautas que, dialogando com a questão da Assistência Estudantil, atinjam todas as estruturas da Universidade. Por esta razão a campanha se intitula “Entrar, Permanecer e Transformar a Universidade”. Afinal de contas, a mudança do perfil dos estudantes é apenas um passo, uma parte da reconfiguração do ambiente de lutas pela transformação da universidade. Transformação que apenas ocorrerá por meio de muitos enfrentamentos, que precisam ser feitos pelo conjunto da comunidade universitária, mas que tem no movimento dos estudantes sua força motriz. É na luta pela assistência estudantil que ganha mais espaço o debate acerca da reformulação curricular e da formação profissional. Questões que passam desde o período de permanência dos estudantes nas instituições de ensino, ao período de aulas práticas, teóricas, dos conteúdos das disciplinas e das condições de desenvolvimento do aprendizado, principalmente nos cursos em tempo integral. É na luta pela assistência estudantil que ganha volume as discussões sobre o fortalecimento do tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Afinal, se não estiverem asseguradas as condições de permanência dos estudantes, ficam extremamente prejudicadas também sua capacidade de desenvolver pesquisa ou ser “extensionista”. É pensando estas, entre outras questões, de maneira integrada, que o debate da assistência estudantil pode ser tido como uma das principais lutas do movimento estudantil hoje, pois certamente irá definir os rumos da universidade brasileira.

* Patrick Campos Araújo é 1º Diretor de Assistência Estudantil da UNE.

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A Assistência Estudantil, uma visão a partir da Agronomia

Coordenação Nacional da FEAB

Como já apresentado nesta cartilha, nos últimos anos vem ocorrendo a ampliação do número de vagas nas universidades brasileiras e a democratização do acesso ao ensino superior, esse processo é fruto de uma série de políticas de expansão e de inclusão como o REUNI, o ProUni, a Lei de Cotas, o FIES e o SISU. Estas políticas, apesar de não transformarem as estruturas básicas da educação, geraram um interessante cenário onde há a emergência de novos atores na universidade e, ao mesmo tempo, novas demandas colocadas para esta, fazendo com que a luta pela transformação da educação ganhe novos contornos e passe a ser encarada por amplos setores da sociedade como uma necessidade urgente. A Agronomia também está inserida neste contexto. A relativa democratização do acesso vem transformando o perfil dos/das estudantes presentes em nosso curso e hoje cada vez mais se encontram filhas e filhos da classe trabalhadora podendo estudar. Se no passado o movimento estudantil da Agronomia lutou contra a Lei do Boi (que destinava uma cota de 50% das vagas no cursos de agrárias pra filhos de latifundiários), hoje se coloca o desafio de democratizar de fato a universidade e um dos passos para isso é garantir as condições de permanência para o novo sujeito que ingressa nela. Isso é assim, pois somente as políticas de acesso não garantem que estes novos sujeitos consigam concluir o Ensino Superior. Devemos lutar por políticas que garantam a permanência da/do estudante na Universidade. Políticas básicas como moradia, alimentação e transporte são o mínimo. Mas devemos pautar também uma nova concepção em assistência estudantil, que contemple questões como o apoio ao material pedagógico (tema tão importante na realidade da Agronomia), construção de creches para mães e pais estudantes, acesso a lazer e cultura, assistência médica e psicossocial, auxílio para intercambistas, entre outros. No que se refere ao tema da moradia, devemos sempre defender prioritariamente a construção de mais Casas de Estudante Universitário (CEU´s). Frisamos este ponto, pois tem aumentado exponencialmente no Brasil a concessão de bolsas para o auxílio aluguel, em detrimento da construção de novas moradias. Entendemos a política de bolsas para auxílio moradia como uma política paliativa que, embora possa ser importante momentaneamente, não resolve o problema da moradia numa perspectiva de longo prazo e deixa os/as estudantes reféns de uma política de governo que pode acabar a qualquer momento. Além disso, a concessão destas bolsas contribui para fortalecer a especulação imobiliária na região de inserção da universidade e não proporciona o mesmo ambiente de interação social e cultural proporcionado por uma Moradia Estudantil na universidade.

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Da mesma forma que a moradia, o tema da alimentação também é central e se caracteriza como elemento básico que deve estar colocado na política de assistência estudantil das universidades. Temos visualizado no país uma série de universidades (novas ou velhas) que ainda não garantem este direito aos/as estudantes ou então o disponibiliza com a cobrança de altos valores, restringindo o acesso à alimentação a poucos. Quando existem, os RU´s muitas vezes são precários, sem contar com as infinitas filas enfrentadas pelos/as estudantes para acessar a alimentação. Já o tema do transporte tem também estreita ligação com as condições que a/o estudante terá para realizar suas atividades com plenitude, pois se configura hoje como condição básica para o acesso a cidade como um todo. Quando falamos em transporte para as/os estudantes nos remetemos ao acesso à universidade, ao estágio, à atividades extra curriculares, ao lazer e à cultura. O Estado deve pensar também políticas que proporcionem aos/as estudantes o direito de livre acesso a cidade, a partir da democratização e da melhoria da qualidade do transporte público. Para tudo isso pautamos um financiamento de 2,5 bilhões para a Assistência Estudantil através do Plano Nacional de Assistência Estudantil – PNAES e defendemos que as políticas de Assistência Estudantil passem a ser centrais na intervenção do governo no campo da educação. Para além do financiamento, também acreditamos ser central a democratização na gestão dos recursos e na implementação da política de assistência estudantil garantindo efetiva participação das/os estudantes. Por isso, convidamos todas e todos estudantes de Agronomia a se somarem nessa luta pela transformação da universidade. Queremos Entrar, Permanecer e Transformar a Universidade, democratizando-a e aproximando-a das reais necessidades do povo.

Queremos a garantia das condições básicas de estudo – Pelo auxílio material pedagógico

Nós, como futuros Engenheiros/as Agrônomos/as, temos uma diversidade grande de campos de atuação profissional, desta forma, nossa formação se dá a partir de aulas e atividades em diversos ambientes. Desde aulas em laboratórios onde há manipulação de produtos químicos até aulas a campo sob o sol forte. Isso nos exige uma série de materiais didáticos específicos que vão desde jaleco e botina até chapéu e protetor solar. Tendo em vista que muitos/as estudantes de Agronomia em nosso país se encontram em situação de vulnerabilidade sócio econômica, com dificuldades de garantir sua permanência e as condições pedagógicas básicas na universidade se faz necessário que a universidade garanta estas condições mínimas para que todas/os possam estudar com qualidade.

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Defendemos uma assistência estudantil que proporcione que todos/as os/as estudantes possam estudar com plenitude, tendo as mesmas condições de acesso ao conhecimento. Desta forma, queremos e defendemos o auxílio financeiro para a aquisição de materiais pedagógicos para as/os estudantes de Agronomia!

Pelo fim da exigência de carga horária para acesso a Bolsa Permanência

Quando pensamos em Assistência Estudantil, devemos ter em mente que esta se constitui como um direito e não um favor. Um direito que visa assegurar a todos/as os/as estudantes a equivalência de condições para o pleno exercício da formação universitária. Fazendo com que as/os estudantes universitários não precisem cumprir duplas jornadas envolvendo trabalho e universidade e possam acessar todos os recursos necessários a sua formação. Neste sentido, políticas que concedem auxílio financeiro a estudantes de baixa renda, como o Programa Bolsa Permanência, recém criado pelo governo federal, que concede auxílio de R$ 400,00 mensais para estudantes com renda inferior a 1,5 salários mínimos por mês, representam um avanço no sentido da permanência. Contudo, devemos lutar para que esta e outras políticas sejam de fato universalizadas. Atualmente para se acessar a política a/o estudante tem que cursar uma graduação de carga horária mínima de 5.000 horas, o que praticamente faz com que a política inexista. Inviabiliza com que a grande maioria dos/das estudantes de Agronomia e de outros cursos possam ter acesso a esta bolsa. Exigimos o fim imediato do limite mínimo de carga horária para acesso a Bolsa Permanência! É preciso rever o programa, de maneira que este possa atender ao maior número possível de estudantes e esteja em sintonia com o PNAES! Além disso, a bolsa permanência não deve concorrer com demais bolsas, como as de iniciação científica, monitoria e extensão, assim como com as demais políticas de permanência ofertadas pela universidade. Queremos o direito de acesso pleno a universidade! Por uma Assistência Estudantil emancipadora!

Pela Estruturação de uma Política de Assistência Estudantil também nas Universidades Privadas Temos dimensão que o processo de expansão do ensino superior no Brasil esteve fortemente balizado na expansão da rede privada de educação. Processo este sustentando em grande medida pelo apoio financeiro do Estado. Esta questão demonstra limites e pode ser alvo de uma série de críticas, uma vez que as universidades privadas se colocam prioritariamente em busca da obtenção de lucros, enxergando na educação uma mercadoria e não a garantia de uma função social.

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Grande parte das universidades pagas no Brasil tem uma formação profissional limitada e não realizam sequer o tripé do ensino, da pesquisa e da extensão, tem estruturas internas profundamente anti democráticas, não se relacionam com a comunidade local e não são concebidas no sentido de satisfazer as necessidades do povo e promover um desenvolvimento justo da sociedade. Acreditamos que, em virtude do grande aporte de recursos econômicos públicos para a manutenção destas universidades, via investimentos diretos e isenções fiscais, deve haver um maior controle social das mesmas por parte da população. Visualizamos também, que com a expansão de programas como o PROUNI e o FIES, e com a consequente entrada de camadas populares nestas universidades, deve ser oferecido aos/as estudantes as devidas políticas de assistência estudantil, que possibilitem sua permanência na universidade e façam com que as/os estudantes pobres (que são muitos nas universidades privadas hoje) não precisem cumprir jornadas exaustivas como estudantes e trabalhadores/as. Na Agronomia esta necessidade é ainda mais gritante, uma vez que em nosso curso possuímos uma extensa e diversa carga horária de atividades dentro e fora de sala de aula e as tarefas demandadas dos/das estudantes cotidianamente são inúmeras. Por isso, as universidades precisam criar as condições para que as/os estudantes possam ter dedicação exclusiva a sua formação.

Mensagem Final

O que pretendemos com esta campanha, é construir um amplo debate e mobilização junto aos/as estudantes de Agronomia do Brasil, articulando esta pauta também com outras entidades estudantis, sobretudo a partir do GT nacional da campanha “Entrar, Permanecer e Transformar a Universidade”. Buscamos, com isso, construir, como já citado, uma outra concepção em Assistência Estudantil na educação superior brasileira, reafirmando direitos e expandindo conquistas. Convidamos os/as estudantes a se inserir nesta luta que se refere, essencialmente, às questões concretas que vivenciamos em nosso dia a dia nas universidades. Não queremos uma universidade que forme profissionais para manter o status quo da sociedade. Queremos uma universidade que esteja colocada a serviço da transformação social. Por isso, o desafio que se coloca atualmente é:

ENTRAR, PERMANECER E TRANSFORMAR A UNIVERSIDADE!

Coordenação Nacional da FEABSanta Maria/Frederico Westphalen - Gestão 2014/2015

Sou estudante de Agronomia, sou FEAB!

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