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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014 27 ISSN 1517-8595 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DO DOCE DE LEITE EM BARRA COM DIFERENTES CONCENTRAÇÕES DE LÍQUOR DE CACAU Gabriel Ramos Ferreira Gonçalves 1 , Josué de Souza Oliveira 2 , Renata Cristina Ferreira Bonomo 3 , Biano Alves de Melo Neto 2 , Cristina Xavier dos Santos Leite 4 , Glece Milene Santana Gomes 5 RESUMO O objetivo deste trabalho foi avaliar a composição química do doce de leite em barra, com diferentes concentrações de líquor de cacau (Theobroma cacao), através das análises de pH, acidez titulável, umidade, açúcar redutor e não redutor, cinzas e proteínas; além de determinar a cor e a atividade de água do mesmo. Os doces foram elaborados com leite integral e sacarose, além da adição (0%, 1%, 2%, 3% e 4%) de líquor de cacau. O experimento foi realizado no Laboratório de Engenharia de Processos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Itapetinga-Ba. Os teores de umidade e açúcar não redutor apresentaram-se dentro dos parâmetros exigidos pela legislação brasileira. Com a adição do líquor de cacau no doce de leite ocorreu um decréscimo nos valores de atividade de água, o que pode facilitar a conservação do produto. A luminosidade do doce de leite reduziu à medida que foi aumentando a concentração de líquor de cacau. Palavras-chave: composição química, cor, atividade de água. PHYSICAL-CHEMICAL CHARACTERIZATION OF “DOCE DE LEITE” BAR WITH DIFFERENT CONCENTRATIONS OF COCOA LIQUOR ABSTRACT The aim of this study was to evaluate the chemical composition of the “doce de leite” bars with different concentrations of cocoa liquor (Theobroma cacao), through the analysis of pH, titratable acidity, moisture, reducing sugar and non-reducing, ash and protein; beyond determining the color and water activity thereof. The candys were prepared with whole milk and sucrose, plus the addition (0%, 1%, 2%, 3% and 4%) of cocoa liquor. The experiment was conducted in the Laboratory of Process Engineering at the State University of Southwest Bahia, Itapetinga-Ba. The moisture and non-reducing sugar were within the parameters required by Brazilian law. With the addition of cocoa liquor in “doce de leite” was a decrease in the values of water activity, which may facilitate the preservation of the product. The brightness of “doce de leite” was reduced as increasing the concentration of cocoa liquor. Keywords: chemical composition, color, water activity. Protocolo 14 2012 68 de 23/12/2013 1 Aluno de Graduação em Engenharia de Alimentos, Laboratório de Processos de Separação, UESB - Praça Primavera, 40, CEP. 45700-000, Itapetinga, BA. Telefone: (77) 3261-8651. E-mail: [email protected]. 2 Professor do Instituto Federal Baiano, Campus Uruçuca. Uruçuca, BA.. E-mail: [email protected]; [email protected]. 3 Doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Professora do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Alimentos, Laboratório de Engenharia de Processos, UESB - Praça Primavera, 40, CEP. 45700-000, Itapetinga, BA. Telefone: (77) 3261-8651. E-mail: [email protected]. 4 Mestre em Engenharia de Alimentos, Bolsista de Desenvolvimento Tecnológico Industrial do CNPq, Laboratório de Engenharia de Processos, UESB. E-mail: [email protected]. 5 Mestre em Engenharia de Alimentos, Professora DEBI, Laboratório de Engenharia de Processos, UESB. E-mail: [email protected].

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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014 27

ISSN 1517-8595

CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DO DOCE DE LEITE EM BARRA COM

DIFERENTES CONCENTRAÇÕES DE LÍQUOR DE CACAU

Gabriel Ramos Ferreira Gonçalves1, Josué de Souza Oliveira

2, Renata Cristina Ferreira

Bonomo3, Biano Alves de Melo Neto

2, Cristina Xavier dos Santos Leite

4 , Glece Milene Santana

Gomes5

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar a composição química do doce de leite em barra, com

diferentes concentrações de líquor de cacau (Theobroma cacao), através das análises de pH,

acidez titulável, umidade, açúcar redutor e não redutor, cinzas e proteínas; além de determinar a

cor e a atividade de água do mesmo. Os doces foram elaborados com leite integral e sacarose,

além da adição (0%, 1%, 2%, 3% e 4%) de líquor de cacau. O experimento foi realizado no

Laboratório de Engenharia de Processos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

Itapetinga-Ba. Os teores de umidade e açúcar não redutor apresentaram-se dentro dos

parâmetros exigidos pela legislação brasileira. Com a adição do líquor de cacau no doce de leite

ocorreu um decréscimo nos valores de atividade de água, o que pode facilitar a conservação do

produto. A luminosidade do doce de leite reduziu à medida que foi aumentando a concentração

de líquor de cacau.

Palavras-chave: composição química, cor, atividade de água.

PHYSICAL-CHEMICAL CHARACTERIZATION OF “DOCE DE LEITE” BAR

WITH DIFFERENT CONCENTRATIONS OF COCOA LIQUOR

ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate the chemical composition of the “doce de leite” bars with

different concentrations of cocoa liquor (Theobroma cacao), through the analysis of pH,

titratable acidity, moisture, reducing sugar and non-reducing, ash and protein; beyond

determining the color and water activity thereof. The candys were prepared with whole milk and

sucrose, plus the addition (0%, 1%, 2%, 3% and 4%) of cocoa liquor. The experiment was

conducted in the Laboratory of Process Engineering at the State University of Southwest Bahia,

Itapetinga-Ba. The moisture and non-reducing sugar were within the parameters required by

Brazilian law. With the addition of cocoa liquor in “doce de leite” was a decrease in the values

of water activity, which may facilitate the preservation of the product. The brightness of “doce

de leite” was reduced as increasing the concentration of cocoa liquor.

Keywords: chemical composition, color, water activity.

Protocolo 14 2012 68 de 23/12/2013 1 Aluno de Graduação em Engenharia de Alimentos, Laboratório de Processos de Separação, UESB - Praça Primavera, 40,

CEP. 45700-000, Itapetinga, BA. Telefone: (77) 3261-8651. E-mail: [email protected]. 2 Professor do Instituto Federal Baiano, Campus Uruçuca. Uruçuca, BA.. E-mail: [email protected];

[email protected]. 3 Doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Professora do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Alimentos,

Laboratório de Engenharia de Processos, UESB - Praça Primavera, 40, CEP. 45700-000, Itapetinga, BA. Telefone: (77)

3261-8651. E-mail: [email protected]. 4 Mestre em Engenharia de Alimentos, Bolsista de Desenvolvimento Tecnológico Industrial do CNPq, Laboratório de

Engenharia de Processos, UESB. E-mail: [email protected]. 5 Mestre em Engenharia de Alimentos, Professora DEBI, Laboratório de Engenharia de Processos, UESB. E-mail:

[email protected].

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28 Caracterização físico-química do doce de leite em barra com diferentes concentrações de líquor de cacau Gonçalves et al.

Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014

INTRODUÇÃO

Entende-se por Doce de Leite o produto,

com ou sem adição de outras substâncias

alimentícias, obtido por concentração e ação

do calor a pressão normal ou reduzida do leite

ou leite reconstituído, com ou sem adição de

sólidos de origem láctea e/ou creme e

adicionado de sacarose (parcialmente

substituída ou não por monossacarídeos e/ou

outros dissacarídeos) (Brasil, 1997). Pode ser

classificado de acordo com sua consistência,

existindo os tipos cremoso ou tablete,

determinados pelo tempo de cozimento do

produto.

A produção de doce de leite no Brasil é

feita por muitas empresas, desde as caseiras até

as de maior porte, com distribuição em todo o

país. A produção regionalizada, principalmente

na América do Sul, explica a existência de

poucas referências na literatura científica a

respeito desse produto. A maioria dos

trabalhos disponíveis foi desenvolvida na

Argentina ou no Brasil e estão relacionados ao

processamento e à caracterização da qualidade.

Há, entretanto, falta de dados sobre a

composição química de amostras,

especialmente em relação à possibilidade da

ocorrência de fraudes. O doce de leite não

apresenta uniformidade, apesar de ser

produzido em grande volume e amplamente

empregado como um ingrediente alimentício

(Demiate et al., 2001).

A legislação brasileira (Brasil, 1997)

permite que o doce de leite seja acrescido de

ingredientes opcionais, tais como: creme;

sólidos de origem láctea; mono e dissacarídeos

que substitua a sacarose em no máximo de

40% m/m; amidos ou amidos modificados

(menor que 0,5 %), cacau, chocolate, coco,

amêndoas, amendoim, frutas secas, cereais

e/ou outros produtos alimentícios isolados ou

misturados em uma proporção entre 5% e 30%

m/m do produto final. Sendo assim, existem

diversos produtos no mercado, não sendo o

doce de leite tradicional, os quais contêm coco,

chocolate, doce de goiaba, ameixa, amendoim,

dentre outros. O líquor ou massa de cacau pode

ser mais uma opção de ingrediente que pode

ser adicionado ao doce de leite.

Fora o fruto do cacau, que é a matéria-

prima de toda a cadeia de produção

agroindustrial do cacau, o bem intermediário

mais importante da cadeia é o líquor, também

chamado de pasta ou massa de cacau, de onde

derivam os demais produtos de cacau e é

básico para se fazer o chocolate cobertura. A

partir da prensagem do líquor, extrai-se a

manteiga de cacau e a torta de cacau (Garcia,

2003).

A composição do doce de leite deve

obedecer às seguintes especificações,

determinadas pelo Ministério da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento (MAPA) (Brasil,

1997): umidade máxima de 30%, açúcares

máximo de 55% exceto a lactose, proteínas

mínimo de 5%, gordura 6 a 9%, cinzas

máximo de 2% e acidez máximo de 5 ml de

soluto alcalino normal.

O doce de leite é um produto de alto

valor nutritivo, aliado ao excelente sabor,

podendo contribuir com significativa

porcentagem de proteínas, vitaminas, minerais

(Lobato, 2007). É um alimento menos

perecível que o leite e de grande aceitação

sensorial (Martins & Lopes, 1980).

O presente trabalho objetivou analisar as

características físico-químicas, atividade de

água e cor do doce de leite em barra com

diferentes concentrações de líquor de cacau.

MATERIAL E MÉTODOS

As amostras de doce de leite contendo

diferentes concentrações de líquor de cacau (0,

1, 2, 3 e 4%) foram elaboradas na Fábrica

Escola do Instituto Federal Baiano, Campus

Uruçuca-BA, e mantidos sob refrigeração até a

realização das análises. O experimento foi

realizado no Laboratório de Engenharia de

Processos da Universidade Estadual do

Sudoeste da Bahia (UESB), Campus de

Itapetinga-BA.

Caracterização Físico-química

Foram realizadas análises físico-

químicas de ph, utilizando-se um pHmetro de

bancada da marca Quimis, devidamente

calibrado; acidez total, determinada através de

titulação com NaOH 0,01 N, utilizando

fenolftaleína 1% como indicador, e resultados

expressos em % de ácido lático; umidade,

obtida por secagem direta da amostra em

estufa, a 105 °C por 12 horas e resultados

foram expressos em porcentagem (p/v); açúcar

redutor e não-redutor, determinado por

titulação; cinzas, determinado com a

calcinação das amostras em mufla a 550 °C até

massa constante e resultados expressos em

porcentagem e proteína, calculada em função

dos teores de nitrogênio determinados pelo

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Caracterização físico-química do doce de leite em barra com diferentes concentrações de líquor de cacau Gonçalves et al. 29

Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014

método de Kjeldahl e utilizando o fator de

conversão 6,25. Todas as análises foram

realizadas em triplicata seguindo as normas do

Instituto Adolfo Lutz (1985).

Determinação da Cor

Medidas instrumentais de cor foram

realizadas em colorímetro MiniScan EZ,

modelo nº 4500L, através de leitura direta da

amostra.

Determinação da Atividade de Água (Aw)

A atividade de água foi determinada

utilizando o aparelho Aqua Lab modelo 4TE,

através de leitura direta da amostra.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização Físico-química

Os resultados obtidos nas análises físico-

químicas do doce de leite estão apresentados

na Tabela 1.

Tabela 1. Caracterização físico-química do doce de leite em barra com diferentes concentrações de

líquor de cacau.

Parâmetros 0% de

liquor

1% de

líquor

2% de

líquor

3% de

líquor

4% de

líquor

pH 7,08 6,81 6,68 6,94 6,5

Acidez titulável Total (%) 0,2 0,32 0,34 0,26 0,5

Umidade (%) 14,13 11,42 11,79 12,91 10,85

Açúcar Redutor (%) 8,34 5,79 5,63 5,85 4,89

Açúcar Não-redutor(%) 53,92 35,88 35,60 36,66 33,35

Cinzas (%) 1,91 1,92 1,83 1,98 2,15

Proteína (%) 6,95 6,45 5,89 4,69 5,24

O doce de leite em barra apresentou uma

redução no nível de pH a medida em que se

aumentou a concentração de líquor de cacau.

Em estudo realizado por Cohen e Jackix

(2004), o valor encontrado para o pH do líquor

de cacau foi 4,99. Isso mostra uma tendência

na redução do pH a medida que se aumenta a

concentração de líquor, pois o líquor puro

possui um pH bastante inferior ao doce de leite

que continha 0% de líquor.

O valor mínimo encontrado para acidez

titulável foi de 0,2% para o doce de leite que

não continha líquor, enquanto o valor máximo

foi de 0,5% para o doce de leite que continha

4% de líquor. Pôde-se observar que conforme

foi aumentando a concentração de líquor nas

amostras de doce de leite, houve um aumento

na acidez total titulável. De acordo com

Zamalloa (1994), para a amêndoa de cacau,

diversos fatores provocam variações em sua

acidez, tais como: variedade, maturação do

fruto, época de colheita, região de plantio e,

principalmente, a condução do processo

fermentativo.

Para umidade, o valor máximo

encontrado foi de 14,13% para a amostra que

continha 0% de líquor, enquanto o valor

mínimo foi de 10,85% para a amostra que

continha 4% de líquor. Com isso, verificou-se

que a ausência do líquor resultou em um doce

com maior umidade. Em estudo realizado por

Cohen e Jackix (2004), foi encontrado um

valor de umidade de 1,67% para líquor de

cacau. Provavelmente essa redução na umidade

do doce de leite pode estar relacionada com a

adição de líquor. Segundo a Portaria Nº 354,

de 4 de setembro de 1997 (Brasil,1997) o

valor máximo permitido para umidade é 30%.

Sendo assim, todas as amostras estão dentro

dos padrões exigidos em relação a umidade.

O valor máximo encontrado para açúcar

redutor foi 8,34% para a amostra que não

continha líquor, enquanto o valor mínimo foi

de 4,89% para a amostra que continha 4% de

líquor. Com isso pôde-se concluir que à

medida que se aumenta a concentração de

líquor de cacau no doce de leite ocorre uma

redução no teor de açúcar redutor. Isso ocorre

devido à baixa quantidade de açúcar redutor

presente no líquor de cacau.

Com o aumento da concentração de

líquor de cacau no doce de leite em barra,

observou-se uma redução no teor de açúcar

não redutor. O valor máximo encontrado foi

53,92% para a amostra que não continha

líquor, enquanto o valor mínimo foi 33,35%

para a amostra que continha 4% de líquor. O

valor máximo permitido pela Agência

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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)

(Brasil, 2005), para açúcar não redutor em

sacarose é 60%. Sendo assim, para açúcar não

redutor, todas as amostras se encontram dentro

dos padrões exigidos pela Legislação vigente.

O teor de cinzas é um dos melhores

indicadores da presença de leite no produto,

pois é um valor constante nessa matéria-prima.

Há uma limitação na legislação que admite o

valor máximo de 2,0% de cinzas no doce de

leite. Como é permitida a adição de

bicarbonato de sódio, e, também de alguns

outros sais na produção do doce de leite,

podem ocorrer valores elevados de cinzas.

Baixos valores, por outro lado, podem indicar

que os produtos foram obtidos com pouco leite

ou outras matérias-primas lácteas. Para cinzas,

o valor mínimo encontrado foi 1,91%,

enquanto o valor máximo foi 2,15% para as

amostras que continham 0% e 4%,

respectivamente. Sendo assim, apenas a

amostra que continha 4% de líquor se

encontrou fora dos padrões exigidos pela

Legislação. Isso pode ter acontecido devido ao

alto teor de cinzas presentes no líquor de

cacau, ou adição elevada de bicarbonato de

sódio ou outros sais durante a produção.

Na quantificação de proteína das

amostras, foi verificado que com o aumento da

concentração de líquor ocorreu uma

diminuição na quantidade de proteína. Em

estudo realizado por Cohen e Jackix (2004) o

líquor de cacau apresentou teor de proteína de

aproximadamente 12,27%. Observou-se que o

teor de proteína no doce de leite em barra

contendo 0% de líquor é inferior ao teor de

proteínas encontrado por esses autores para o

líquor de cacau. Sendo assim, há uma

tendência de aumento do teor de proteínas à

medida que se aumenta a concentração de

líquor, o que não foi observado neste trabalho.

O valor mínimo exigido pela ANVISA para

proteínas é de 6%. Pôde-se verificar que

apenas as amostras que continham 0% e 1% de

líquor estão dentro dos padrões exigidos.

Determinação da Cor

Para a caracterização da cor das

amostras de doce de leite em barra utilizou-se

o sistema de cores CIELAB com seus três

parâmetros: parâmetro L* e as coordenadas

cromáticas a* e b*. O parâmetro L* está

associado à luminosidade das amostras e pode

variar de 0 a 100, sendo que os valores mais

altos de L* (próximos de 100) caracterizam as

amostras mais claras e os menores valores de

L* (menores que 50) caracterizam amostras

mais escuras. A coordenada cromática a* está

associada à dimensão verde-vermelho; valores

positivos de a* indicam amostras na região do

vermelho, valores negativos de a* indicam

amostras na região do verde. A coordenada

cromática b* está associada à dimensão azul-

amarelo; valores positivos de b* indicam

amostras na região do amarelo, valores

negativos de b* indicam amostras na região do

azul.

Os dados referentes à cor do doce de

leite em barra foram apresentados na Tabela 2.

Os resultados para valores médios de L*

indicam que as amostras de doce de leite em

barra perderam luminosidade, tendendo a ser

mais escuras à medida que foi aumentando a

concentração de líquor. O que também pode ter

influenciado no decréscimo da luminosidade

L* é que à medida que se aumenta a

concentração de líquor, há uma redução na

atividade de água, pois a luminosidade e

atividade de água são diretamente

proporcionais.

Tabela 2. Resultado das análises de cor das amostras de doce de leite nas escalas L, a e b.

Análise de Cor

% líquor L* a* b*

0 64.91 11.07 35.1

1 43.36 13.36 23.59

2 39 12.63 20.3

3 38.2 12.13 19.27

4 40.53 8.47 11.36

L* – representa luminosidade na qual 100 é

valor máximo indicativo da cor branca e 0

valor mínimo indicando a cor preta.

a* – varia do vermelho ao verde.

b* – varia do amarelo ao azul.

Pode-se observar que o valor de a* foi

afetado à medida que aumentou a concentração

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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.16, n.1, p.27-32, 2014

de líquor, diminuindo a intensidade da

coloração vermelha.

Os resultados encontrados para o

parâmetro b* indicam que o doce de leite está

na região do amarelo, sendo que há uma

diminuição do amarelo a medida que se

aumenta a concentração de líquor.

Determinação da Atividade de Água (Aw)

A atividade de água é um fator que afeta

diretamente nas características dos alimentos e

na sua estabilidade. Na Tabela 3 encontram-se

os resultados obtidos para atividade de água

(Aw) nas formulações. A partir dos resultados

é possível observar que ausência de líquor

implica em um doce com maior atividade de

água, porém, para as amostras que continham

líquor, a atividade de água não apresentou

comportamento decrescente nas diferentes

concentrações.

A atividade de água tem sido

considerada como uma propriedade

fundamental no controle de qualidade de

alimentos (Alzamora, 1984), uma vez que

expressa o teor de água que se encontra no

estado livre para ocorrerem as transformações

ou crescimento de microrganismos. Segundo

Barufaldi & Oliveira (1998) a faixa de Aw

onde os microrganismos se desenvolvem está

compreendida entre 0,65 a 1, sendo que entre

0,75 e 0,65 apenas aqueles especializados,

como mofos ou bolores osmofílicos, podem

desenvolver. Em Aw iguais a 0,8, são

necessárias de quatro a cinco semanas para

ocorrer deterioração, enquanto que em Aw ≤

0,7, necessita-se de meses.

A alta concentração de solutos no doce

de leite resulta em uma atividade de água

normalmente abaixo de 0,85, constituindo o

principal fator de conservação do produto.

Com um teor de umidade relativamente baixo

(30%) e um teor de açúcar relativamente alto

(60%), o doce de leite apresenta uma grande

estabilidade microbiológica, entretanto, fungos

e leveduras podem ocorrer quando o produto

for estocado à temperatura ambiente por

longos períodos de tempo (Ferramondo et al.,

1984).

Portanto a adição de líquor atua como

efeito desidratante, e ao interagir com as

moléculas de água presentes no doce, ocorre

um decréscimo na atividade de água, e

consequentemente, há um aumento na vida de

prateleira.

Tabela 3. Atividade de água das amostras de doce de leite com diferentes concentrações de líquor de

cacau.

% líquor Atividade de água

0 0,8137

1 0,7767

2 0,7855

3 0,7951

4 0,7782

CONCLUSÃO

O doce de leite em barra da Fábrica

Escola do Instituto Federal Baiano, Campus

Uruçuca-BA, apresenta-se em conformidade

com a legislação nos parâmetros umidade e

açúcar não redutor. Os parâmetros que estão

fora dos padrões estabelecidos pela lei vigente

requerem um maior controle de qualidade por

parte dos fabricantes durante a produção do

doce de leite em barra.

A atividade de água das cinco

formulações encontra-se entre 0,7 e 0,9, o que

confere ao doce de leite uma boa estabilidade

microbiológica.

A luminosidade do doce de leite reduziu

à medida que foi aumentando a concentração

de líquor de cacau.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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