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ST 405-Química Sanitária e Laboratório de Saneamento II Profª Maria Aparecida Carvalho de Medeiros CARACTERIZAÇÃO DAS ÁGUAS RESIDUÁRIAS 1. Caracterização da quantidade de esgotos 1.1 Preliminares Os esgotos oriundos de uma cidade e que contribuem à estação de tratamento de esgotos são basicamente originados de três fontes distintas: - esgotos domésticos (incluindo residências, instituições e comércio) - águas de infiltração - despejos industriais (diversas origens e tipos de industrias). No Brasil adota-se predominantemente o sistema separador de esgotamento sanitário, o que separa as águas pluviais em linhas de drenagem independentes e que não contribuem à ETE. Em outros paises, no entanto, adota-se o sistema combinado, no qual os esgotos e as águas pluviais são veiculados conjuntamente pelo mesmo sistema. Neste caso, o dimensionamento da ETE tem de levar em consideração a parcela correspondente às águas pluviais. No presente texto considera-se apenas os três componentes listados acima. Para a caracterização, tanto quantitativa, dos esgotos afluentes à ETE, é necessária a análise em separado de cada um destes três itens. 1.2 Vazão doméstica 1.2.1 Preliminares O conceito de vazão doméstica engloba usualmente os esgotos oriundos dos domicílios, bem como de atividades comerciais e institucionais normalmente componentes de uma localidade. Valores mais expressivos originados de fontes pontuais significativas devem ser computados em separado, e acrescentados aos valores globais. Normalmente a vazão doméstica de esgotos é calculada com base na vazão de água da respectiva localidade. Tal, por sua vez, é usualmente calculada em função da população de projeto e de um valor atribuído para o consumo médio diário de água de um indivíduo, denominado Quota Per Capita (QPC). Antes de se apresentar as fórmulas e os parâmetros de calculo, é importante observar que para o projeto de uma estação de tratamento de esgotos não basta considerar apenas a vazão média. É necessária também a quantificação dos valores mínimos e máximos de vazão, por razões hidráulicas e de processo. Figura 1.1 Sistema de esgotamento separador e combinado. 1.2.3 Vazão média de esgotos De maneira geral, a produção de esgotos corresponde aproximadamente ao consumo de água. No entanto, a fração de esgotos que adentra a rede de coleta pode variar, devido ao fato de que parte da água consumida pode ser incorporada à rede pluvial (ex.: rego de jardins e parques). Outros fatores de influência em um sistema separador absoluto são: a) a ocorrência de ligações clandestinas dos esgotos à rede pluvial, b) ligações indevidas dos esgotos à rede pluvial e c) infiltração.

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Page 1: CARACTERIZAÇÃO DAS ÁGUAS RESIDUÁRIASmariaacm/ST405/Apostila%20te%f3rica%20... · Caracterização da quantidade de esgotos 1.1 Preliminares Os esgotos oriundos de uma cidade e

ST 405-Química Sanitária e Laboratório de Saneamento II

Profª Maria Aparecida Carvalho de Medeiros

CARACTERIZAÇÃO DAS ÁGUAS RESIDUÁRIAS 1. Caracterização da quantidade de esgotos 1.1 Preliminares Os esgotos oriundos de uma cidade e que contribuem à estação de tratamento de esgotos são basicamente originados de três fontes distintas:

- esgotos domésticos (incluindo residências, instituições e comércio) - águas de infiltração - despejos industriais (diversas origens e tipos de industrias).

No Brasil adota-se predominantemente o sistema separador de esgotamento sanitário, o que separa as águas pluviais em linhas de drenagem independentes e que não contribuem à ETE. Em outros paises, no entanto, adota-se o sistema combinado, no qual os esgotos e as águas pluviais são veiculados conjuntamente pelo mesmo sistema. Neste caso, o dimensionamento da ETE tem de levar em consideração a parcela correspondente às águas pluviais. No presente texto considera-se apenas os três componentes listados acima.

Para a caracterização, tanto quantitativa, dos esgotos afluentes à ETE, é necessária a análise em separado de cada um destes três itens.

1.2 Vazão doméstica 1.2.1 Preliminares O conceito de vazão doméstica engloba usualmente os esgotos oriundos dos domicílios, bem como de atividades comerciais e institucionais normalmente componentes de uma localidade. Valores mais expressivos originados de fontes pontuais significativas devem ser computados em separado, e acrescentados aos valores globais.

Normalmente a vazão doméstica de esgotos é calculada com base na vazão de água da respectiva localidade. Tal, por sua vez, é usualmente calculada em função da população de projeto e de um valor atribuído para o consumo médio diário de água de um indivíduo, denominado Quota Per Capita (QPC).

Antes de se apresentar as fórmulas e os parâmetros de calculo, é importante observar que para o projeto de uma estação de tratamento de esgotos não basta considerar apenas a vazão média. É necessária também a quantificação dos valores mínimos e máximos de vazão, por razões hidráulicas e de processo.

Figura 1.1 Sistema de esgotamento separador e combinado. 1.2.3 Vazão média de esgotos

De maneira geral, a produção de esgotos corresponde aproximadamente ao consumo de água. No entanto, a fração de esgotos que adentra a rede de coleta pode variar, devido ao fato de que parte da água consumida pode ser incorporada à rede pluvial (ex.: rego de jardins e parques). Outros fatores de influência em um sistema separador absoluto são: a) a ocorrência de ligações clandestinas dos esgotos à rede pluvial, b) ligações indevidas dos esgotos à rede pluvial e c) infiltração.

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A fração da água fomecida que adentra a rede de coleta na forma de esgoto é denominada coeficiente de retorno (R: vazão de esgotos/vazão de água). Os valores típicos de R variam de 60% a 100%, sendo que um valor usualmente adotado tem sido o de 80% (R= 0,8).

O cálculo da vazão doméstica média de esgotos é dado por: Q dméd = Pop. QPC. R (m3/d) 1000

ou Q dméd = Pop. QPC. R (L/s) 86400

onde: Q dmédia = vazão doméstica média de esgotos (m3/d ou l/s) QPC = quota per capita de água R = coeficiente de retorno esgoto/água 1.2.4 Variação da vazão. Vazões máxima e mínima

O consumo de água e a geração de esgotos em uma localidade variam ao longo do dia (variações horárias),ao longo da semana (variações diárias) e ao longo do ano (variações sazonais).

A figura 1.3 apresenta um hidrograma típico da vazão afluente a uma ETE, ao longo do dia. Pode-se observar os dois picos principais: o pico do inicio da manhã (mais pronunciado) e o pico do inicio da noite (mais distribuído). A vazão média diária é aquela na qual as áreas acima e abaixo do valor médio se igualam.

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Figura 1.3 Hidrograma típico da vazão afluente a uma estação de tratamento de esgotos

Tem sido pratica correspondente a adoção dos seguintes coeficientes de variação da vazão média de água (CETESB, 1978; Azevedo Neto e AlvarezO, 1977). K1 = 1,2 (coeficiente do dia de maior consumo) K2 = 1,5 (coeficiente da hora de maior consumo) K3 = 0,5 (coeficiente da hora de menor consumo) Assim, as vazões máxima e mínima de água podem ser dadas pelas fórmulas: Qdmáx= Qdméd. K1. K2= 1,8 Qdméd Q dmín = Q dméd . K3 = 0,5 Q dméd

Caso haja condições de se efetuar medições de vazão, de forma a se compor o hidrograma cobrindo as variações sazonais, deve-se adotar os dados específicos obtidos para situação em estudo. Os coeficientes K1, K2 e K3 são generalizados, podendo não reproduzir com fidelidade a variação de vazão na localidade em análise. Valores super ou subdimensionais afetam diretamente o desempenho técnico e econômico da estação em processo.

SÓLIDOS NOS ESGOTOS Figura 2.1 Sólidos nos esgotos Principais características das águas residuarias

Os quadros 2.1, 2.2 e 2.3 apresentam as principais caracteristicas físicas, químicas e biológicas dos esgotos domésticos.

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Quadro 2.1 Principais características físicas dos esgotos domésticos Parâmetro Descrição - ligeiramente superior à da água de abastecimento

- Variação conforme as estações do ano (mais estável que a temperatura do ar

Temperatura - influência na atividade microbiana - influencia na solubilidade dos gases - influencia na viscosidade do líquido

Cor - esgoto fresco: ligeiramente cinza - esgoto séptico: cinza escuro ou preto Odor - esgoto fresco: odor oleoso, relativamente desagradável.

-esgoto séptico: odor fétido, devido ao gás sulfídrico e a outros produtos da decomposição.

-despejos industriais: odores característicos Turbidez - causada por uma grande variedade de sólidos em suspensão - esgotos mais frescos ou mais concentrados: geralmente maior turbidez

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Em termos práticos, usualmente não há necessidade de se caracterizar a matéria orgânica em termos de proteínas, gorduras, carboidratos etc. Ademais, há uma grande dificuldade na determinação laboratorial dos diversos componentes da matéria orgânica nas águas residuárias, face à multiplicidade de formas e compostos em que a mesma pode se apresentar. Neste sentido, podem ser adotados métodos diretos ou indiretos para a determinação da matéria orgânica: . Métodos indiretos: medição do consumo de oxigênio - Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) - Demanda Última de Oxigênio (DBOu) - Demanda Química de Oxigênio (DQO) . Métodos diretos: medição do carbono orgânico - Carbono Orgânico Total (COT) a) Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) O principal efeito ecológico da poluição orgânica em um curso d'água é o decréscimo dos teores de oxigênio dissolvido. Da mesma forma, no tratamento de esgotos por processos aeróbios, é fundamental o adequado fornecimento de oxigênio para que os microrganismos possam realizar os processos metabólicos conduzindo à estabilização da matéria orgânica. Assim, surgiu a idéia de se medir a "força" de poluição de um determinado despejo pelo consumo de oxigênio que ele traria, ou seja, uma quantificação indireta da potencialidade da geração de um impacto, e não a medição direta do impacto em si. Essa quantificação poderia ser obtida mesmo através de cálculos estequiométricos baseados nas reações de oxidação da matéria orgânica. Assim, no caso do substrato ser, por exemplo, a glicose (C6H1206), poder-se-ia calcular, na equação da respiração, a quantidade de oxigênio requerida para oxidar a dada quantidade de glicose. Tal se constitui no princípio da Demanda Teórica de Oxigênio (Dte O).

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Na prática, no entanto, um obstáculo se apresenta como de difícil transposição: o esgoto possui

uma grande heterogeneidade na sua composição, e tentar estabelecer todos os seus constituintes para, a partir das reações químicas de cada um deles, calcular a demanda resultante de oxigênio, é totalmente destituído de praticidade. Ademais, extrapolar os dados para outras condições não seria possível.

A solução encontrada foi a de se medir em laboratório o consumo de oxigênio que um volume padronizado de esgoto ou outro líquido exerce em um período de tempo pré-fixado. Foi, assim, introduzido o importante conceito da Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO). A DBO retrata a quantidade de oxigênio requerida para estabilizar, através de processos bioquímicos, a matéria orgânica carbonâcea. É uma indicação indireta, portanto, do carbono orgânico biodegradável.

A estabilização completa demora, em termos práticos, vários dias (cerca de 20 dias ou mais para esgotos domésticos). Tal corresponde à Demanda Última de Oxigênio (DBOu). Entretanto, para evitar que o teste de laboratório fosse sujeito a uma grande demora, e para permitir a comparação de diversos resultados, foram efetuadas algumas padronizações: - convencionou-se proceder à análise no 5° dia. Para esgotos domésticos típicos, esse consumo do quinto dia pode ser correlacionado com o consumo total final (DBOu); - determinou-se que o teste fosse efetuado à temperatura de 20°C, já que temperaturas diferentes interferem no metabolismo bacteriano, alterando as relações entre a DBO de 5 dias e a DBO última. Tem-se, desta forma, a DBO padrão, expressa por DBO5

20 . Neste texto, sempre que se referir à DBO simplesmente, está se implicitamente referindo à DBO padrão.

Simplificadamente, o teste da DBO pode ser entendido da seguinte maneira: no dia da coleta, determina-se a concentração de oxigênio dissolvido (OD) da amostra. Cinco dias após, com a amostra mantida em um frasco fechado e incubada a 20°C, determina-se a nova concentração, já reduzida, devido ao consumo de oxigênio durante o período. A diferença entre o teor de OD no dia zero e no dia 5 representa o oxigênio consumido para a oxidação da matéria orgânica, sendo, portanto, a DBO5. Assim, por exemplo, a amostra de um curso d'água apresentou os seguintes resultados (ver Figura 2.3):

Há organismos adaptados funcionalmente para as diversas condições de respiração, distinguindo-

se os seguintes de fundamental importância no tratamento de esgotos:

• organismos aeróbios estritos: utilizam apenas o oxigênio livre na sua respiração • organismos facultativos: utilizam o oxigênio livre (preferencialmente) ou o nitrato como

aceptores de elétron • Organismos anaeróbios estritos: utilizam o sulfato ou o dióxido de carbono omo aceptores de

elétron, não podendo obter energia através da respiração aeróbia

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Pelo fato de ser liberada mais energia através das reações aeróbias que através das reações

anaeróbias, os organismos aeróbios se reproduzem mais rapidamente e a estabilização aeróbia da matéria orgânica se processa a taxas mais rápidas que a anaeróbia. Sendo a taxa de reprodução maior nos organismos aeróbios, a geração de lodo é também maior.

As principais reações para a geração de energia que ocorrem em condições aeróbias, anóxicas e anaeróbias são:

• Condições aeróbias: (1.1)

C6H1206 + 6 O2 ���� 6CO2 + 6H2O

• Condições anóxicas: redução de nitratos (desnitrificação): (1.2)

2N03- -N+2H+ ���� N2+2,502+H20

• Condições anaeróbias: redução dos sulfatos (dessulfatação): (1.3)

CH3COOH + S042- + 2H+

���� H2S + 2 H2O + 2 C02

• Condições anaeróbias: redução de CO2 (metanogênese hidrogenotrófica)(1.4)

4H2+CO2 ���� CH4+2H20

• Condições anaeróbias: metanogênese acetotrófica (1.5)

CH3COO ���� CH4 + CO2

A Figura 1.2. ilustra as principais rotas de decomposição da matéria orgânica na presença dos

diferentes aceptores de elétrons.

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2- PROCESSOS DE CONVERSÃO DAS MATÉRIAS CARBONÁCEA E NITROGENADA

2.1. Conversão da matéria carbonácea 2.1.1. Conversão aeróbia A equação geral da respiração aeróbia pode ser expressa como: (2.1)

C6 H12 06 + 6 02 ���� 6 CO2 + 6 H20 + Energia Matéria orgânica

Tal equação é geral e simplificada, sendo que na realidade ocorrem diversas etapas intermediárias.

A própria composição da matéria orgânica simplificada e neste caso a fórmula molecular da glicose é assumida como representativa da matéria orgânica carbonácea. Analisando-se a reação, podem ser destacados os seguintes aspectos, todos de importância no tratamento de esgotos (Branco, 1976):

• a estabilização da matéria Orgânica (coversão a produtos inertes, como gás carbônico e água);

• a utilização de oxigênio; • a produção de gás carbônico; • a liberação de energia.

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A Equação 2.1 pode ser expressa, de uma forma genérica, para um composto orgânico de fórmula

molecular CxHyOz, da seguinte forma, a qual permite calcular o consumo de oxigênio e a produção de gás carbônico (van Haandel e Lettinga ,1994):

CxHyOz +1/4 (4x + y - 2z) 02 ���� XC02 +y/2 H20 (2.2)

Como referido, as Equações 2.1 e 2.2 são genéricas, enfocando apenas a oxidação da matéria orgânica carbonácea. Outros elementos (como nitrogênio, fósforo, potássio etc) frequentemente fazem parte da composição da matéria orgânica, a qual é mesmo assim passível de sofrer oxidações bioquímicas.

Como já comentado, os principais agentes responsáveis pela estabilização aeróbia da matéria carbonácea contida nos esgotos são os organismos decompositores, representados em sua maioria por bactérias heterotróficas aeróbias e facultativas.

2.1.2. Conversão anaeróbia

A conversão da matéria carbonácea em condições anaeróbias processa-se da seguinte forma:

C6 H12 06 ���� 3 CH4 + 3 C02 + Energia (2.3) Matéria orgânica

Da mesma forma, tal equação é geral e simplificada, representando apenas o produto final de etapas intermediárias. Nela podem ser destacados os seguintes aspectos:

• a não exclusividade da oxidação. Se, por um lado, o carbono do CO2 se apresenta em seu

mais elevado estado de oxidação (+4), o oposto ocorre com o CH4, onde o carbono se encontra em seu estado mais reduzido (-4), podendo ser posteriormente oxidado (por exemplo, por combustão - o metano é inflamável);

• a não utilização de oxigênio; • a produção de metano e gás carbônico; • a liberação de energia (inferior à da respiração aeróbia).

A matéria orgânica foi apenas convertida a uma forma mais oxidada (C02) e em outra forma mais

reduzida (CH4). No entanto, a maior parte do CH4 é desprendida para a fase gasosa, resultando em uma efetiva remoção da matéria orgânica.

A Equação 2.3 pode ser expressa de uma forma genérica, para um composto orgânico CxHyOz como (van Haandel e Lettinga, 1994):

CxHyOz + 4X – Y – 2Z H2O ���� 4X –Y + 2Z CO2 + 4X+ Y – 2Z CH4 (2.4) 4 8 8 A conversão anaeróbia desenvolve-se em 2 etapas:

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• Fase acidogênica: conversão da matéria orgânica a ácidos orgânicos, realizada por bactérias denominadas acidogênicas. Nesta etapa não há remoção de matéria orgânica, mas apenas conversão da mesma.

• Fase metanogênica:convesão dos ácidos orgânicos a metano, gás carbônico e água, realizada por bactérias denominadas metanogênicas. A matéria orgânica é novamente convertida, mas pelo fato do CH4 ser tranferido para a atmosfera, tem-se a remoção da matéria orgânica.

Antes da etapa de acidogênese, os compostos orgânicos complexos (carboidratos, proteínas e lipídios) necessitam ser convertidos a compostos orgânicos simples, através do mecanismo de hidrólise. A Figura 2.1 ilustra a sequência de etapas envolvidas na digestão anaeróbia da matéria orgânica. Maiores detalhes sobre os processos de estabilização anaeróbios encontram-se no volume componente desta série, relativo aos sistemas anaeróbios. 2.2. Conversão da matéria nitrogenada 2.2.1. Oxidação da matéria nitrogenada

Outro importante processo de oxidação no tratamento dos esgotos é o referente as formas nitrogenadas. A amônia é transformada em nitritos e estes em nitrato, no fenômeno denominado nitrificação.

Os microrganismos envolvidos neste processo são autótrofos e quimiossintetizantes (ou quimioautótrofos), para os quais o gás carbônico é a principal fonte de carbono. e a energia é obtida através da oxidação de um substrato inorgânico, como a amônia, a formas mineralizadas.

A transformação da amônia em nitritos é efetivada através de bactérias, como as do gênero

Nitrosomonas, de acordo com a seguinte reação: Nitrosomonas

2 NH4+ - N + 3 02 ���� 2NO2

- - N+ 4H+ + 2H2O (2.5)

A oxidação dos nitritos a nitratos dá-se principalmente pela atuação de bactérias, como as do

gênero Nitrobacter, sendo expressa por:

Nitrobacter 2 NO2

- - N + O2 ���� 2 NO3 - - N (2.6)

A reação global da nitrificação é a soma das equações 2.5 e 2.6:

NH4+ - N + 202 ���� NO3

- - N +2H+ + H2O (2.7)

Nas reações 2.5 e 2.6 (bem como na reação global 2.7), deve-se notar os seguintes pontos: • Consumo de oxigênio livre. Este consumo é geralmente referido como demanda nitrogenada. • Liberação de H+, consumindo a alcalinidade do meio e possivelmente reduzindo o pH.

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Continuação Tabela 2.7

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AMOSTRAGEM DE DESPEJOS INDUSTRIAIS

Qualquer planejamento de tratamento de despejos industriais baseia-se em informações obtidas por amostragem. Todas as decisões com relação ao projeto se apóiam nesta fase. Desta maneira o programa de amostragem deverá ser realizado criteriosamente com os cuidados que cada caso requer. A obtenção de bons resultados dependerá de certos detalhes tais como: - que a amostra tomada seja verdadeiramente representativa do despejo: - que sejam utilizadas técnicas de amostragem adequadas: - que se condicione as amostras até serem analisadas. Em processo "batch" a formação de amostra composta pode induzir a resultados errôneos, a menos que a amostragem seja feita com freqüência muito grande, possivelmente contínua, ou o fluxo seja "alisado" por técnica de equalização.

As amostras poderão se coletadas de maneira fortuita ou compacta, maual ou automaticamente.

AMOSTRAGEM FORTUITA

Estas amostras poderão ser coletadas manual ou automaticamente. A automação é necessária quando é feita urna coleta em intervalos regulares de tempo. A amostragem fortuita é utilizada nos seguintes casos:

- quando o despejo objeto da amostragem não flui continuamente como é o caso de descargas de tanques: urna amostra ao acaso desta descarga é suficiente para se obter as características; - quando as características dos despejos são relativamente constantes:

- quando é necessário determinar se uma amostra composta mascara condições extremas de um despejo. É o que ocorre, por exemplo, com uma possível variação de pH. Uma amostra composta pode ter o pH neutro, enquanto que as parcelas que a constituíram podem apresentar uma larga faixa de variação de pH. Um exemplo típico é o caso dos curtumes onde, pela manhã, o pH apresenta-se alto (em torno de 13) e à tarde cai para cerca de 4,5.

Amostras fortuitas são também necessárias no caso de se analisarem gases dissolvidos, cloro residual, sulfatos solúveis, temperatura e pH.

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AMOSTRAGEM COMPOSTA

A fim de se minimizar o número de amostras a ser analisado, é usual misturarem-se diversas amostras individuais. A quantidade de amostras individuais que pode ser adicionada à mistura total, depende da vazão na hora em que a amostra foi tomada. Por exemplo, para cada quatro litros por minuto de vazão ao longo do tempo da amostragem, I ml é adicionado na amostra composta.

A quantidade total da amostra composta depende do número e tipo de análises a serem feitas. A quantidade mínima situa-se em torno de 2 litros. A quantidade mínima de uma amostra individual seria de 200 ml se a amostra fosse coletada em um intervalo de tempo de 1 hora. Quando a amostragem é contínua (em intervalo de cerca de 3 a 5 minutos) a quantidade mínima de amostra deverá ser em torno de 25 mL.

As amostras compostas podem ser formadas com base no fluxo ou no tempo.

Fluxo A quantidade de amostras coletadas ou adicionadas à mistura durante período de amostragem é

proporcional à vazão dos despejos no tempo de amostragem.

Tempo Um outro dispositivo para amostragem composta é a coleta de amostra com um volume fixado depois que uma certa quantidade de despejo tenha passado pelo ponto de amostragem. FREQÜÊNCIA DE AMOSTRAGEM

A freqüência de amostragem depende da vazão e das características dos despejos. Na amostragem fortuita é de uma/hora. Quando os resultados dos exames indicarem baixa variabilidade, a amostra fortuita pode ser tomada ao longo de intervalos de duas, quatro, oito, dezesseis ou mesmo 24 horas. Para alta variabilidade de concentração de despejos é desejável a instalação de um amostrador automático.

O tempo para a formação de amostras compostas também depende da variação da vazão. Para alta variabilidade, as amostras individuais para composição seriam coletadas com uma frequência de 3 minutos até 1 hora. O tempo máximo para a composição de uma amostra composta é controlado pela capacidade de armazenar a amostra individual convenientemente. porém não deverá ser superior a 24 horas. Quando as análises são para a determinação de critérios de projeto para tratamento biológico, tais como DBO, DQO ou COT, a amostra composta deverá ser armazenada por um período de 8 a 12 horas quando as características dos despejos são constantes, ou 2 a 4 horas em caso contrário. A Tabela 3.1 apresenta uma sugestão para os tempos máximos de armazenagem. Tabela 3.1 - Tempos máximos de armazenagem

Parâmetros Alta Variabilidade Baixa Variabilidade

DBO 4 horas 12 horas DQO ou COT 2 horas 8 horas SS 8 horas 24 horas Alcalinidade ou Acidez 1 hora 8 horas pH con tínua 4 horas Nitrogênio e Fósforo 24 horas 24 horas Metais pesados 4 horas 24 horas

PRECAUÇÕES NECESSÁRIAS NO MANUSEIO DAS AMOSTRAS

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- A amostra deve ser coletada onde o fluxo de despejo seja bem misturado (no medidor Parshall ou em qualquer ponto onde haja turbulência). Devem ser evitados locais situados a montante de vertedores devido a sedimentação de sólidos. - As amostras deverão ser tomadas no centro do canal onde a velocidade é mais alta e a sedimentação de sólidos é mínima.

- No caso de análises de gases dissolvidos ou substâncias voláteis não deverá ser introduzido ar para provocar turbulência no despejo, prática normalmente adotada para evitar sedimentação.

- Cuidados especiais deverão ser tomados no caso de análises de líquidos não miscíveis como, por exemplo, mistura de óleo e água. Em locais onde o óleo flutua, é simples obter uma amostra do óleo para análise, porém, é difícil determinar a quantidade de óleo flutuante por dia. Um método comumente utilizado para estimar o volume total, é conduzir o despejo a um "recipiente". Após separar os dois fluidos, é possível medir a espessura da camada de Óleo e assim medir o volume presente.

- O volume de amostra obtido deverá ser suficiente para realizar todas as análises requeridas e também para repetir qualquer análise duvidosa. A Tab. 3.2 discrimina o volume mínimo necessário para análises mais comuns. O valor mais baixo é para despejos concentrados. O volume mínimo de uma amostra tomada ao acaso deve ser l a 2 litros. Porções individuais para uma amostra composta devem ser, no mínimo, de 25 a 100 ml. Dependendo da frequência de amostragem e do volume de amostras individuais, a amostra composta total estaria entre 2 a 4 litros.

- As amostras devem ser armazenadas de maneira a assegurar que as características a serem analisadas não sejam alteradas. Em alguns casos a refrigeração pode ser necessária. Quando a armazenagem de uma amostra interfere com uma análise particular, é preferível tornar amostras separadas para as análises que podem necessitar de técnicas aprimoradas de preservação.

- Cada amostra deve ser rotulada com cartão de identificação, contendo as seguintes informações:

• Designação ou locação de coleta de amostra; • Data e tempo de coleta; • Indicação da amostra composta ou fortuita com tempo apropriado e informação de

volume; • Notação da informação que pode variar, antes que as análises de laboratório sejam

feitas, devendo incluir temperatura, pH e aspecto. AMOSTRAGEM BACTERIOLÓGICA

A amostragem bacteriológica deve ser obtida em garrafas de boca larga com uma capaciciade de,

no mínimo, 300 ml e equipadas com rolha de vidro. As garrafas deverão ser esterilizadas. Um meio para assegurar estas exigências seria o aquecimento em forno por duas horas a 170°C. As garrafas não devem estar completamente cheias para que a mistura possa ser agitada antes das análises.

Durante a amostragem, a boca da garrafa deverá ser colocada na direção da corrente e a rolha deve ser protegida de contaminação. As amostras devem ser armazenadas a 4°C, imediatamente após a amostragem e, no transporte, as garrafas devem permanecer em caixas de gelo.

Preservaçâo das amostras

As amostras deverão ser analisadas tão logo seja possível após a coleta, dado que certos produtos químicos sofrem modificações com o passar do tempo, tais como:

- cations metálicos podem precipitar-se como hidróxidos ou formar complexos;

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- a valência dos íons pode mudar por oxidação ou redução; - cations metálicos podem ser adsorvidas na superfície do vidro, plástico ou recipiente de quartzo.

As características das amostras podem ser modificadas, também, pela atividade microbiológica; - as células podem aumentar a DBO ou DQO; - a produtividade de células pode modificar a DBO e DQO; - o conteúdo de nitrogênio e fósforo orgânico pode ser alterado.

As amostras compostas precisam ser preservadas de tal modo que as características a serem medidas não se alterem em quantidade e qualidade. Métodos especiais de coletas são algumas vezes necessários para evitar estas alterações. Por exemplo, deve-se eliminar o ar dos recipientes quando se analisam: 02, C02, NH3, H2S, cloro livre, pH, dureza, S02, NH4, Fe, acidez e alcalinidade. Na prática, isto significa que o ar não deve entrar nas garrafas e que as mesmas devem ser completamente cheias. O pH será sempre determinado imediatamente depois que a amostra tenha sido coletada e o conteúdo de oxigênio deve ser determinado no local ou ser fixado com sulfato manganoso e iodeto de potássio como no método Winkler.

O procedimento usual para a armazenagem consiste em se colocar as amostras em um refrigerador. A Tabela 3.3 apresenta informações para a armazenagem e a aplicação de refrigeração e congelamento para diversas características de despejos. Se a DQO não pode ser medida por vários dias, é recomendado que o pH seja ajustado numa faixa entre 3 e 5. Preservativos que não influenciem as análises devem ser adicionados imediatamente após a tomada de amostra.

Tabela 3.3 - Condições de refrigeração e congelamento de amostras

Condições de Armazenamento Análises

Refrigeração a 4°C Congelamento

Sólidos totais - -

Sólidos em suspensão Até diversos dias -

Sólidos em suspensão Voláteis Até diversos dias -

DQO Até diversos dias -

DBO Até diversos dias num sistema composto de amostragem

Adaptação. Deve-se Utilizar semente de esgoto fresco

COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS DAS ANÁLISES

De posse dos resultados das análises dos efluentes, pode-se passar à interpretação global dos mesmos. É claro que já se deve saber de suas origens e o porquê de suas características. Como sabemos, a matéria orgânica é medida, por tentativas, através dos seguintes testes:

• sólidos voláteis (g de matéria volátil por litro de despejo); • demanda bioquímica de oxigênio (g de oxigênio dissolvido gastos na oxidação de 1 litro de

despejo); • demanda química de oxigênio ou o antigo OC (g de oxigênio gastos na oxidação de 1 litro de

despejo);

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• estabilidade relativa: • demanda de cloro (g de cloro por litro de despejo).

Pela sua representatividade, pode-se considerar, a DBO e a DQO, como as chaves de interpretação inicial e de direcionamento na escolha dos tipos possíveis de tratamento.

a) A DQO é pouco maior que a DBO ( DQO ÷ DBO < 2)*

No caso em que os valores da DBO e da DQO estejam próximos, tem-se uma alta possibilidade de que o despejo seja de características tais que permita o seu tratamento em unidades convencionais (fossas sépticas, filtros biológicos, lodos ativados convencionais, valos e células de aeração, lagoas, etc.). Parte-se, pois, da premissa, confirmada pela baixa relação, de que praticamente toda a matéria orgânica seja biodegradável e que sua remoção seja o objetivo do tratamento. (*) Se possível DBO20 , se não DBO5

Não existe maneira ideal de fixar um quociente único, fixo. O número 2 é simplesmente orientador Serviriam como confirmação da premissa da biodegradabilidades, a ocorrência de algumas das seguintes situações:

- o despejo bruto, depois de deixado envelhecer, deverá ficar com o seu pH reduzido (parte-se da idéia de que o despejo já tenha microrganismos capazes de iniciar a degradação);

- o OD, se inicialmente existente, deverá diminuir, podendo até desaparecer; - para a situação em questão, o fato da matéria orgánica estar solúvel ou em suspensão, é

secundário para todos os tipos de tratamento biológico (com excessão da "estabilização por contato" que é mais adequada para o caso da matéria orgânica estar em suspensão).

Para se saber se a matéria orgânica está em solução ou em suspensão poder-se-ia fazer o teste da DBO da amostra bruta e da amostra decantada (por exemplo 2 horas) ou verificar-se a matéria volátil (SV) está em sua maior parte, na forma de SS ou SO ou seja, a relação entre SSV e SDV.

b) A DQO é sensivelmente maior que a DBO ( DQO _ >> 2) DBO A situação mostrada pela análise, indica a presença, nos despejos, de grande quantidade de matéria orgânica não atacável biologicamente. Duas serão as alternativas: 1ª Alternativa

Se a matéria orgânica não atacável biologicamente não tiver maior importância sanitária (celulose, por exemplo) e houver interesse (quase sempre há) de remover a parte biodegradável, então pode-se pensar em usar os tratamentos convencionais de esgotos sanitários.

O efluente do tratamento terá baixa DBO e a DQO será reduzida apenas parcialmente no que corresponde a sua parte biodegradável. Parte da matéria orgânica não-biodegradável e que esteja em suspensão, poderá ser também removida pela floculação que naturalmente ocorre nos tratamentos biológicos. A matéria não-biodegradável em solução, praticamente não será atacada. O efluente do tratamento poderá ter ainda uma alta DQO mas isso não preocupará pelo fato que essa matéria não putrescível não causará dano ao rio. 2ª Alternativa Se a matéria orgânica não biodegradável de um despejo for um dos óbices, a sua disposição, pouca coisa poderá ser feita com tratamentos biológicos. Ter-se-á que partir para tratamentos físicos ou químicos específicos e não obrigatoriamente utilizados nas estações de tratamento convencionais de esgotos sanitários.

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Obs:

1) Os números 2 e 0,8 são meramente orientativos. 2) A escolha entre filtros biólogicos e lodos ativados (e seus processos modificados) para despejos que podem

receber substâncias tóxicas ou com variação muito rápida de características, deve levar em consideração a maior “estabilidade” de resultados dos filtros biológicos. Estes são mais “inertes” a choques, por duas razões principais:a sua massa de lodo(e, portanto, quantidade de microrganismos) é maior que os processos de lodos ativados, absorvendo melhor as sobrecargas ou efeitos danosos; a exposição do lodo ou líquido em tratamento nos filtros biológicos é gradual (superficial), permitindo a regeneração da película atacada pela ação de tóxicos (desde que a ação tóxica seja rápida). Nos lodos ativados a exposição do lodo é total.

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Princípios de sedimentação

1. INTRODUÇÃO

A sedimentação é uma operação física de separação de partículas sólidas com densidade superior à

do líquido circundante. Em um tanque em que a velocidade de fluxo da água é bem baixa, as partículas tendem a ir para o fundo sob a influência da gravidade. O líquido sobrenadante torna-se em consequência clarificado, enquanto as partículas no fundo formam uma camada de lodo, e são removidas conjuntamente com ele. A sedimentação é uma operação unitária de grande importância em diversos sistemas de tratamento de esgotos.

São as seguintes as principais aplicações da sedimentação no tratamento de esgotos:

. Tratamento preliminar. Remoção da areia (sedimentação de partículas inorgânicas de maiores dimensões)

- Caixa de areia

. Tratamento primário. Decantação primária (sedimentação dos sólidos em suspensão do esgoto bruto)

- Tanques convencionais, com remoção frequente do lodo

- Fossas sépticas

. Tratamento secundário. Decantação final (remoção dos sólidos biológicos)

- Decantadores secundários nos sistemas de lodos ativados - Decantadores finais nos sistemas de filtros biológicos - Decantadores finais nos sistemas de reatores anaeróbios de manta de lodo

- Lagoas de sedimentação, após lagoas aeradas de mistura completa

. Tratamento do lodo. Adensamento (sedimentação e adensamento do lodo primário e/ou do lodo biológico excedente) - Adensadores por gravidade . Tratamento físico-químico. Sedimentação após precipitação química

- Polimento de efluentes do tratamento secundário - Remoção química de nutrientes - Tratamento físico-químico (coagulação química) de despejos domésticos e, principalmente, industriais

Além destes, a sedimentação ocorre em diversas outras unidades de tratamento de esgotos, como lagoas de estabilização, mesmo que estas não tenham sido especificamente projetadas para tal.

Na maior parte das aplicações, o principal objetivo é o de se produzir um efluente clarificado, ou seja, com baixas concentrações de sólidos em suspensão. No entanto, é também frequente a situação em que se deseja obter, concomitantemente, um lodo adensado, para facilitar o seu posterior tratamento.

As Figuras 1.1 e 1.2 apresentam os esquemas de dois tipos de decantadores, um retangular, de fluxo horizontal, e outro, circular, de alimentação central. Detalhes acerca do dimensionamento destes

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decantadores são apresentados em diversos volumes da série. No presente capítulo são apresentados apenas os princípios básicos da sedimentação.

2. TIPOS DE SEDIMENTAÇÃO

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No tratamento de esgotos, tem-se basicamente os quatro tipos distintos de sedimentação descritos

no Quadro 2.1. É provável que durante uma operação de sedimentação mais de um tipo ocorra em um dado tempo, sendo mesmo possível que os quatro ocorram simultaneamente.

3. SEDIMENTAÇÃO DISCRETA 3.1. Velocidade de sedimentação

A sedimentação das partículas discretas pode ser analisada através das leis clássicas de Newton e Stokes. Segundo estas leis, a velocidade final de uma partícula em sedimentação em um líquido é constante, ou seja, a força de atrito se iguala à força gravitacionaI. Esta velocidade terminal é atingida no meio líquido em frações de segundos. A Figura 3.1 mostra as forças intervenientes na partícula em sedimentação, ao passo que a Figura 3.2 ressalta o fato de que a velocidade de sedimentação das

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partículas discretas é constante.

Segundo a lei de Stokes, a velocidade de sedimentação discreta de uma partícula (vs) em fluxo laminar é dada por:

onde: Vs = velocidade de sedimentação da partícula (m/s) g = aceleração da gravidade (m/s2) υ = viscosidade cinemática da água (m2/s) ρs = densidade da partícula (kg/m3) ρ1 = densidade do líquido (kg/m3) d = diâmetro da partícula (m)

A viscosidade cinemática υ e a densidade da água ρ1 são função da temperatura T. No entanto, a variação da densidade da água, dentro da faixa usual de temperaturas, pode ser considerada, em termos práticos, desprezível, podendo-se adotar o valor de 1000 kg/m3. A influência da viscosidade da água é mais representativa, e pode ser vista no Quadro 3.1 (Tchobanoglous e Schroeder, 1985; Huisman, 1978).

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Na interpretação da Equação 3.1, são importantes as seguintes considerações:

• Vs é proporcional a (ρs - ρl) / ρl • Vs é proporcional a d2

O fato de Vs ser proporcional ao quadrado do diâmetro da partícula ressalta a importância de se

aumentar o tamanho das partículas objetivando uma remoção mais rápida das mesmas. Como um exemplo, quando o diâmetro da partícula dobra, a velocidade de sedimentação aumenta quatro vezes.

Exemplo 3.1 Calcular a velocidade de sedimentação de um grão de areia, tendo-se os seguintes dados:

• diâmetro do grão: d = 0,7 mm • densidade da areia:ρs = 2650 kg/m3 • densidade do líquido: ρl = 1000 kg/m3 • temperatura do líquido: T = 25°C

Solução: Pelo Quadro 3.1, para a temperatura de 25°C, a viscosidade cinemática da água υ é O,90x10-6 m2/s. O diâmetro da partícula é O,7x1O-3 m. Pela Equação 3.1, tem-se:

3.2. Conceito do tanque de sedimentação de fluxo horizontal ideal

A sedimentação discreta de uma partícula pode ser analisada, tanto através de uma coluna de sedimentação sem fluxo, quanto através de um tanque de fluxo horizontal com velocidade de escoamento horizontal (Vh) constante. A Figura 3.3 mostra as zonas representativas deste tanque ideal. As considerações teóricas são relativas à zona onde a sedimentação efetivamente ocorre (zona de sedimentação).

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Para a análise teórica da sedimentação é necessário assumir que:

• na zona de entrada as partículas estão uniformemente distribuídas • as partículas que tocam a zona de lodo são consideradas removidas • as partículas que atingem a zona de saída não são removidas por sedimentação

As principais dimensões da zona de sedimentação encontram-se apresentadas na Figura 3.4.

�� H ���� L

Fig. 3.4. Dimensões da zona de sedimentação

No tanque de sedimentação ideal com velocidade horizontal constante, a sedimentação discreta de uma partícula ocorre de forma idêntica à que ocorreria numa coluna de sedimentação (ver Figura 3.5).

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O tempo gasto para a partícula atingir o fundo é dado por:

• coluna de sedimentação: tempo = distância/velocidade t= H (3.2) vs

• tanque de fluxo horizontal: tempo = volume/vazão t= V/Q = H.A/Q (3.3) Combinando-se as Equações 3.2 e 3.3, tem-se que: Vs= Q/A (3.4)

Esta equação é de grande importância em termos do dimensionamento dos tanques de sedimentação. Caso se deseje remover partículas com velocidades de sedimentação iguais ou inferiores a vs, e conhecendo-se a vazão de água a ser tratada Q, obtém-se a área superficial necessária através da relação:

A = Q/Vs (3.5)

A velocidade de sedimentação a ser adotada para o projeto (vs, ou vo) é também denominada taxa de aplicação superficial, expressa em unidades de velocidade (m/h), ou de vazão por unidade de área (m3/m2.h)

Na interpretação da Equação 3.4, deve-se notar que:

• Vs pode ser obtida através de experimentos com o líquido a ser tratado ou com valores de literatura (em um dimensionamento, Vs é um parâmetro de projeto)

• a remoção de partículas discretas depende apenas da área superficial (A) e não da altura (H) e do tempo (t).

Princípios de aeração 1. INTRODUÇÃO

A aeração é uma operação unitária de fundamental importância em um grande número de processos aeróbios de tratamento de esgotos. Desde que o líquido esteja deficiente de um gás (oxigênio, no caso em questão), há uma tendência natural do gás passar da fase gasosa, onde se encontra em quantidade satisfatória, para a fase líquida, onde está deficiente. O oxigênio é um gás que se dissolve mal no meio líquido. Por esta razão, há em vários sistemas a necessidade de se acelerar o processo natural, de forma a que o fornecimento de oxigênio possa se dar em uma taxa mais elevada, equivalente à taxa do seu consumo, pelas bactérias. Entre os processos de tratamento de esgotos a utilizarem a aeração artificial encontram-se as lagoas aeradas, os lodos ativados e suas variantes, os biofiltros aerados e alguns outros processos mais específicos. Dentre os processos de tratamento do lodo, a digestão aeróbia utiliza também a aeração artificial.

Há duas formas principais de se produzir a aeração artificial:

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• introduzir ar ou oxigênio no líquido (aeração por ar difuso) • causar um grande turbilhonamento, expondo o líquido, na forma de gotículas, ao ar, e

ocasionando a entrada do ar atmosférico no meio líquido (aeracão superficial ou mecânica)

Dentre estas duas modalidades, há diversas variantes, descritas nos itens 7 e 8. A Figura 1.1 apresenta esquematicamente os princípios da aeração por ar difuso e aeração mecânica.

2. FUNDAMENTOS DA TRANSFERÊNCIA DE GASES 2.1. Concentração de saturação de um gás Quando um líquido é exposto a um gás, ocorre um contínuo intercâmbio de moléculas da fase líquida para a fase gasosa e vice-versa.Tão logo a concentração de solubilidade na fase líquida seja atingida, ambos os fluxos passam a ser de igual magnitude, de modo a que não ocorra uma mudança global das concentrações do gás em ambas as fases (Figura 201). Este equilíbrio dinâmico está associado à concentração de saturação do gás na fase líquida.

Nas condições de equilíbrio, as velocidades de absorção (Vg) e de liberação (V1) do gás são iguais, ou seja:

Vg = V1

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As concentrações de saturação nas duas fases são proporcionais a estas velocidades: kg.Cg = k1.Cs (2.2) onde: kg e k1= constantes de proporcionalidade Cg = concentração do gás na fase gasosa (mg/l) Cs = concentração do gás na fase líquida (mg/l) Assim, Cs = Kg/K1. Cs (2.3)

Fazendo kg/k1 = kD, tem-se: Cs = kD .Cg (2.4)

Portanto, a concentração de saturação é diretamente proporcional à concentração na fase gasosa. O

coeficiente kD é denominado coeficiente de distribuição, e depende da natureza do gás e do líquido, e da temperatura. Para a difusão do oxigênio na água, kD assume os seguintes valores (Popel, 1979):

Observa-se, portanto, que quanto maior a temperatura, menor a solubilidade do gás no meio líquido. A maior agitação das moléculas na água faz com que os gases tendam a passar para a fase gasosa. A concentração Cg pode ser obtida através da lei universal dos gases: pV=nRT (2.5) onde: p = pressão parcial do gás na fase gasosa (Pa) V = volume ocupado na fase gasosa (m3) n = número de moles do gás no volume V (mol/m3) R = constante universal (8,3143 J/Kmol) T = temperatura (°K)

Desenvolvendo-se a Equação 2.5 e introduzindo-a na Equação 2.4 e, concomitantemente, corrigindo-se a pressão para aquela do vapor da água, obtém-se a equação que estabelece a concentração de saturação de um gás na água, em função da temperatura e da pressão:

Cs=kD. dv. (Pa-Pv). PM/RT (2.6) onde:

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dv = distribuição volumétrica do oxigênio no ar atmosférico (0,21 ou 21 % do ar é representado por oxigênio) PM= peso molecular do oxigênio (32 g/mol) Pa = pressão atmosférica (101.325 Pa nas CNTP) Pv = pressão de vapor da água (ver Quadro 2.2)

Exemplo 2.1 Calcular a concentração de saturação de oxigênio na água pura nas seguintes condições:

. temperatura = 20°C

. pressão atmosférica ao nível do mar Solução: Com base nas notações anteriores, tem-se: kD = 0,337 dv = 0,21 Pa = 101.325 Pa Pv = 2.330 Pa PM = 32 g/mol R = 8,3143 J/Kmol T= 293 °K (= 20°C) Utilizando-se a Equação 2.6, obtém-se: Cs=kD. dv. (Pa-Pv). PM/RT =

0,0337 X 0,21 X (101.325 - 2.330) . 32 / 8,3143 X 293 = 9,2 mg/L

De forma a evitar a necessidade desta sequência trabalhosa de cálculos, existem algumas fórmulas empíricas (a maioria baseada em análises da regressão) que fornecem diretamente o valor de Cs (mg/L) em função de, por exemplo, a temperatura T (°C). Uma fórmula frequentemente empregada é:

Cs = 14,652 - 4,1O22x1O-1.T + 7,991Ox1O-3.T2 - 7,7774x1O-5.T3 (2.7)

A altitude exerce uma influência na solubilidade de um gás, por ser inversamente proporcional à pressão atmosférica. Quanto maior a altitude, menor a pressão atmosférica, e menor a pressão para

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que o gás se dissolva na água. Esta influência pode ser computada pela seguinte relação (Qasim, 1985):