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Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 13, n. 3, p. 205-213, jul./set. 2010DOI: 10.4260/BJFT2010130300027

Autor Correspondente | Corresponding Author

Recebido | Received: 09/09/2009Aprovado | Approved: 24/08/2010

Resumo

No Estado de Santa Catarina (SC), a cachaça de alambique é produzida utilizando-se caldo de cana e melado como substratos, o que geralmente não ocorre nas demais regiões produtoras de cachaça no Brasil. Neste trabalho, foram avaliadas características bioquímicas e moleculares de linhagens de Saccharomyces cerevisiae isoladas a partir de fermentações com ambos os substratos mencionados. Os resultados mostram que a produtividade em etanol foi alta e próxima à máxima teórica nos ciclos fermentativos analisados. Medidas na composição de açúcares e análises da microbiota presente no caldo de cana mostram variação entre as amostras, o que poderia justificar a heterogeneidade da cachaça produzida na região. A espécie de levedura predominante em todas as fermentações foi Saccharomyces cerevisiae e, entre 16 linhagens estudadas, não foi encontrada correlação direta entre a capacidade de fermentar a sacarose e a atividade invertásica presente nas células. Por meio de testes que avaliaram o rendimento em etanol, foi possível sugerir quatro linhagens com características adequadas para a produção de cachaça. Por outro lado, o emprego de técnicas moleculares, como o perfil de restrição do DNA mitocondrial (mtDNA-RFLP), permitiu identificar e avaliar a distribuição das linhagens de leveduras durante os ciclos fermentativos. Este é o primeiro estudo realizado com a cachaça produzida em Santa Catarina.

Palavras-chave: Saccharomyces cerevisiae; Fermentação; Cachaça.

Summary

In the State of Santa Catarina, Brazil, sugarcane brandy is produced using both sugarcane juice and molasses as the substrates, which is not common in the other sugarcane brandy producing regions in Brazil. In the present study, the biochemical and molecular characteristics of strains of Saccharomyces cerevisiae isolated from fermentations with both the above-mentioned substrates, were evaluated. The results showed high ethanol productivity, close to the maximum theoretical values, for all the fermentation cycles analysed. Measurements of the sugar compositions and analyses of the microorganisms present in the sugarcane juice showed variation amongst the samples, which could explain the heterogeneity of the sugarcane brandies produced in Santa Catarina. The predominant yeast species in all the fermentations was Saccharomyces cerevisiae, and no direct correlation was found between the sucrose fermenting capacity and the invertase activity in the cells for any of the 16 yeast strains studied. From the analyses for the yield in ethanol, four strains could be recommended as having desirable characteristics for the production of sugarcane brandy. On the other hand, the use of the mtDNA-RFLP technique allowed for the identification and evaluation of the distribution of the yeast strains during the fermentative cycles. This is the first study carried out with sugarcane brandy produced in Santa Catarina.

Key words: Saccharomyces cerevisiae; Fermentation; Sugarcane brandy.

Caracterização bioquímica e molecular de linhagens de Saccharomyces cerevisiae isoladas de fermentações artesanais

de caldo de cana e melado para a produção de cachaça em Florianópolis-SCBiochemical and molecular characterization of Saccharomyces cerevisiae

strains isolated from artisan-type fermentations of sugarcane and molasses in the production of sugarcane brandy in Florianópolis-SC, Brazil

Autores | Authors

Fernanda BADOTTI Marcelo Goulart DÁRIO

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Departamento de Bioquímica (CCB) e-mail: [email protected]

[email protected]

Carlos Augusto ROSA Universidade Federal de Minas Gerais

(UFMG)Departamento de Microbiologia (ICB)

e-mail: [email protected]

Boris Ugarte STAMBUKUniversidade Federal de Santa Catarina

(UFSC)Centro de Ciências Biológicas Departamento de Bioquímica

Campus Universitário - TrindadeCEP: 88040-900

Florianópolis/SC - Brasile-mail: [email protected]

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o processo fermentativo, além de ser uma técnica rápida, fácil e de relativo baixo custo (SChüLLER, 2004; ARAúJO et al., 2007; GOMES et al., 2007; SILVA et al., 2009; MARINI et al., 2009).

Na fabricação da cachaça, o principal açúcar encontrado no mosto é a sacarose e o primeiro passo para sua utilização pela levedura S. cerevisiae é a hidrólise extracelular, através da enzima invertase. Dessa forma, obtêm-se glicose e frutose, que são transportadas para o interior da célula, degradadas pela via glicolítica até piruvato, e transformadas em etanol e gás carbônico pelo processo de fermentação alcoólica (BARNET, 1981; GANCEDO e SERRANO, 1989). Em geral, a frutose é metabolizada mais lentamente que a glicose, podendo ocasionar fermentações incompletas com consequente perda de produtividade (BERThELS et al., 2004). Vários estudos têm demonstrado ainda a presença de outra via metabólica de utilização da sacarose, que envolve o transporte ativo do açúcar para o interior da célula (BARFORD e MwESIGyE, 1996; BADOTTI et al., 2008).

Em Santa Catarina, a produção de cachaça é artesanal, sendo a bebida destilada em alambiques de cobre. O produto apresenta a peculiaridade de ser produzido também a partir de melado (produto da concentração do caldo de cana), diferentemente do que ocorre em outros Estados produtores de cachaça no Brasil. Diante da escassez de informações a respeito da cachaça produzida no Estado de Santa Catarina, este trabalho propõe avaliar aspectos microbiológicos e bioquímicos da etapa fermentativa para a produção da cachaça, uti l izando caldo de cana e melado como substratos. Também as linhagens de leveduras predominantes no processo fermentativos foram identificadas e caracterizadas, com o intuito de selecionar aquelas que apresentam características adequadas ao processo de fermentação, possibilitando seu emprego como iniciadoras pelos produtores na região estudada.

Material e métodos2

Este estudo foi realizado durante a safra de 2004, em duas destilarias localizadas na região da grande Florianópolis-SC. A destilaria 1 utilizava somente caldo de cana como substrato para a produção de cachaça, enquanto a destilaria 2 utilizava também o melado na produção da bebida.

Na destilaria 1, somente foram coletadas amostras de caldo de cana. Na destilaria 2, foram coletadas amostras do início, meio e fim do processo fermentativo, durante 3 ciclos de produção de cachaça. Essa última destilaria foi escolhida por representar a situação da maioria dos produtores da região no que diz respeito às condições higiênico-sanitárias, aos equipamentos disponíveis, à forma de conduzir o processo e ao conhecimento técnico. O produtor utilizava como inóculo

Introdução1

Cachaça é a denominação típica e exclusiva da bebida produzida no Brasil, que é obtida pela destilação do mosto de cana-de-açúcar fermentado (BRASIL, 2005). Durante o processo fermentativo, uma grande diversidade de microrganismos está presente no mosto. As leveduras são responsáveis pelo consumo dos açúcares e pela formação de etanol e outros compostos secundários, que contribuem para a qualidade organoléptica da cachaça (SChwAN et al., 2001; OLIVEIRA et al., 2005; GOMES et al., 2007). Saccharomyces cerevisiae (S. cerevisiae) é a espécie de levedura predominante por sua maior tolerância ao estresse osmótico e ao etanol, mas os gêneros Kloeckera, Candida, Kluyveromyces e Pichia são comumente isolados. Bactérias também podem estar presentes, principalmente em meios pouco ácidos ou em altas temperaturas (MORAIS et al., 1997; PATARO et al., 1998, 2000; GuERRA et al., 2001, SChwAN et al., 2001; GOMES et al., 2007; VIANNA et al., 2008).

A maior parte das destilarias produz fermento (pé-de-cuba) de forma espontânea. Nesse processo, leveduras selvagens, provenientes dos equipamentos de moagem e da dorna de fermentação, são multiplicadas usando-se caldo de cana como substrato por 5 a 10 dias, até atingirem concentração suficiente para iniciar um ciclo fermentativo (MORAIS et al., 1997; PATARO et al., 1998, 2000, 2002; SChwAN et al., 2001). Devido à maneira como o fermento é produzido e pelo fato de o caldo de cana ser constantemente adicionado à dorna, diferentes linhagens de S. cerevisiae podem ser isoladas durante o período de produção, o que faz com que a cachaça esteja sujeita a variações no aroma e no sabor (PATARO et al., 2000; GuERRA et al., 2001; GOMES et al., 2007). Outras características do processo fermentativo, tais como constante adição de altas concentrações de açúcar, altas temperaturas e altas concentrações de etanol, podem ser responsáveis pela grande diversidade de linhagens de leveduras encontradas (MORAIS et al.,1997; PATARO et al., 2000, 2002; GuERRA et al., 2001; ARAúJO et al., 2007).

A identificação e a caracterização das populações de S. cerevisiae são fundamentais no entendimento do processo de fermentação da cachaça, já que as características sensoriais da bebida dependem das linhagens que prevalecem durante o processo (PATARO et al., 2002; OLIVEIRA et al., 2004, 2005; GOMES et al., 2007). A análise do perfil de restrição do DNA mitocondrial (mtDNA-RFLP) tem sido apontada como uma técnica eficiente para caracterizar e diferenciar linhagens industriais de S. cerevisiae (GuILLAMóN et al., 1996; LóPEz et al., 2001). Dessa forma, mtDNA-RFLP tem-se mostrado útil para diferenciar linhagens isoladas de um mesmo mosto e para monitorar a persistência e prevalência de linhagens específicas durante todo

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gerada na reação foi quantificada enzimaticamente com glicose oxidase e peroxidase, utilizando-se um kit enzimático comercial (Analisa Diagnóstica Ltda, Brasil). Os açúcares redutores foram quantificados com ácido dinitrosalicílico, como descrito por Miller (1959). A concentração de frutose foi estimada pela diferença entre a concentração de açúcares redutores totais e a concengração de glicose presente nas amostras. A concentração de etanol foi determinada enzimaticamente utilizando-se 0,25 u.mL-1 de álcool oxidase (Sigma, uSA) e 2 u.mL-1 -de peroxidase (Toyobo, Brasil) em tampão fosfato (0,07% h2PO4 e 3,43% hPO4) ph 7,5, contendo 0,014% aminoantipirina e 0,056% fenol (SALGADO et al., 2000). Todas as análises foram realizadas em triplicata.

2.3.2 Determinação da atividade invertásica

A atividade invertásica das leveduras isoladas foi determinada conforme descrito por Silveira et al. (1996). Inicialmente, as células foram multiplicadas em meio yPD em agitador horizontal a 160 rpm e 28 °C, até atingirem uma concentração de 0,7 mg de células (peso seco).mL-1. A seguir, as células foram lavadas duas vezes com tampão de acetato de sódio 50 mM, ph 5,0. e suspensas no mesmo tampão contendo 50 mM NaF (Fluoreto de Sódio), de forma a atingir a concentração de 5 mg de células (peso seco).mL-1. A suspensão foi mantida nesse tampão a 30 °C por 30 min e a seguir incubada por 5 min a 30 °C com 100 mM de sacarose. Após parar a reação enzimática a 100 °C por 5 min as amostras foram centrifugadas e o sobrenadante utilizado para dosar a glicose formada, conforme mencionado no item 2.3.1. A atividade enzimática foi expressa em μmoles de glicose produzida por min e por mg de célula (peso seco).

2.4 Manutenção e identificação das leveduras

As leveduras foram mantidas a 4 °C em meio yPD acrescido de 2% de ágar (Sigma, uSA) e identificadas de acordo com testes fisiológicos padrão (KuRTzMAN e FELL, 1998).

2.5 Análise do perfil de restrição do DNA mitocondrial

O DNA mitocondrial foi isolado como descrito previamente por Querol et al. (1992) e digerido com a enzima Hinf I (Roche Molecular Biochemicals, Germany), de acordo com as instruções do fabricante. Hinf I foi escolhida por ter sido considerada a endonuclease de restrição mais adequada para diferenciar linhagens de S. cerevisiae (QuEROL et al., 1994). Os fragmentos de restrição foram separados por eletroforese em gel de agarose 1% com tampão TBE 0,5X (45 mmol.L-1 Tris-borato, 1 mmol.L-1 EDTA, ph 8), corados com brometo de etídio, visualizados sob luz uV e fotografados. A análise fenética

uma mistura de leveduras selvagens e fermento comercial seco de panificação. Essa mistura de leveduras era multiplicada até concentração suficiente para iniciar um ciclo fermentativo, usando caldo de cana como meio de cultivo. A mesma biomassa de células era utilizada ora para fermentar o caldo de cana, ora para fermentar o melado. As dornas utilizadas na destilaria eram de madeira, com capacidade para armazenar cerca de 2000 L. A fermentação era iniciada com 100 a 150 L de fermento, sendo o restante do volume completado com caldo de cana ao longo do processo. O melado era adicionado em duas ocasiões, no início e no meio da fermentação (cerca de 12 h após o início do processo), diluído em água. A diluição utilizada era imprecisa, o produtor costumava controlá-la pela cor do melado e pela sua experiência prática. O processo fermentativo durava entre 24 e 36 h, dependendo das condições do fermento (que era reutilizado) e da temperatura ambiente.

2.1 Isolamento das leveduras

Amostras dos dois substratos utilizados, caldo de cana e melado, bem como amostras do mosto no início, meio e fim dos ciclos fermentativos, foram coletadas e imediatamente resfriadas a 4 °C. A seguir, as amostras foram convenientemente diluídas com água destilada estéril e plaqueadas em meio wL (wallerstein Laboratory Differential Medium - Difco, uSA), como descrito por Pallman et al. (2001). As placas foram incubadas a 28 °C por 3 a 5 dias, e os diferentes morfotipos foram quantificados e isolados para posterior identificação.

2.2 Testes fermentativos em batelada

Para determinar a eficiência fermentativa (conversão de substrato em etanol), as leveduras foram cultivadas em meio yPD (1% de extrato de levedura, 2% de peptona, 2% de glicose), em agitador horizontal a 28 °C e 160 rpm por 48 h. A seguir, concentrações de biomassa equivalentes foram inoculadas em meio yP (1% de extrato de levedura, 2% de peptona) contendo 2% de diferentes fontes de carbono (glicose, sacarose, frutose). Estes meios foram incubados por 20 h, nas mesmas condições mencionadas. As amostras foram então centrifugadas e a concentração de etanol determinada como descrito no item 2.3.1.

2.3 Análises bioquímicas

2.3.1 Determinação da concentração de açúcares e etanol

Al íquotas das amost ras co le tadas foram centrifugadas (2.600 g, 3 min) e o sobrenadante armazenado a –20 °C, para posterior análise. A sacarose foi dosada enzimaticamente, com base na metodologia descrita por holmes (1997). A concentração de glicose

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dos resultados obtidos por meio do perfil de restrição do DNA mitocondrial foi realizada comparando-se o número e o tamanho das bandas de DNA obtidas para as linhagens de S. cerevisiae analisadas. O dendograma foi construído pelo método uPGMA (unweight Pair Group Method) com base na matriz de dados e utilizando-se o programa de computador TFPGA (Tools for Population Genetic Analyses).

Resultados e discussão3

3.1 Análise bioquímica do processo fermentativo

A eficiência do processo fermentativo foi avaliada por meio do consumo dos açúcares e da produção de etanol em três diferentes ciclos de fermentação na destilaria 2 (Figura 1a, b, c). Para os três ciclos, foram analisadas amostras de processos que utilizavam caldo de cana e melado como substratos. A concentração média de etanol formada no final da etapa fermentativa (em torno de 10%) correspondeu àquela normalmente obtida para a cachaça (GuERRA et al., 2001). No meio dos ciclos de fermentação, comparando com o início, houve grande consumo de sacarose e aumento dos monossacarídeos glicose e frutose. No final das fermentações, não foi verificada a presença de glicose no vinho, restando apenas traços de sacarose e frutose que não ultrapassaram a concentração de 1%. No início dos processos fermentativos, com ambos os substratos, houve uma grande variação no conteúdo de açúcares (Figura 1). Esse fato pode ter ocorrido porque nenhuma padronização na concentração dos açúcares é realizada antes de se iniciar a fermentação. É importante lembrar que concentrações elevadas de açúcares podem causar prejuízos à eficiência do processo fermentativo, pois aumenta a produção de etanol, composto tóxico para as leveduras (PRETORIuS, 2000; SChwAN et al., 2001). Desta forma, para evitar perdas na produtividade e minimizar variações no sabor da cachaça, medidas da composição de açúcares nos substratos são de extrema importância.

N o s c i c l o s f e r m e n t a t i v o s a n a l i s a d o s , considerando-se a concentração inicial de açúcares no caldo, a produtividade em etanol foi alta e próxima à máxima teórica, variando entre 93 e 100%. Este resultado indica que as leveduras utilizadas pelo produtor estavam bem adaptadas ao processo fermentativo. Como o melado é diluído de forma imprecisa para iniciar a fermentação, o mesmo cálculo não pode ser realizado para este substrato.

3.2 Análise microbiológica dos substratos

A análise microbiológica de três amostras de caldo de cana mostrou que a concentração de microrganismos pode variar significativamente entre as mesmas. Na amostra A, proveniente da destilaria 1, observou-se a

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Sacarose Glicose Frutose Etanol

c

Figura 1. Evolução do processo fermentativo durante três ciclos produtivos (a, b e c). O consumo dos açúcares e a produção de etanol foram analisados para os processos que utilizavam caldo de cana e melado como substratos. O termo “Nova add.” refere-se à segunda adição de melado à fermentação.

predominância de bactérias, enquanto nas amostras B e C (coletadas na destilaria 2), as leveduras predominaram no caldo de cana (Figura 2). Todas as amostras apresentaram uma grande variedade de morfotipos de leveduras (dados não mostrados). Ao contrário do que

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da fermentação foram encontrados bactérias, somente leveduras.

3.4 Identificação das linhagens de leveduras isoladas nas destilarias 1 e 2

O meio de cultivo wL tem sido descrito como um meio ideal para isolar, identificar e acompanhar populações de leveduras em processos fermentativos industriais (PALLMANN et al., 2001). Nesse meio, as colônias adquirem diferentes colorações, formatos e texturas, o que permite quantificar a contribuição de cada uma no processo fermentativo. Neste estudo, a morfologia das leveduras isoladas em ágar wL variou dentro da mesma espécie, o que pode ter ocorrido pelo fato de este meio de cultura ter sido originalmente utilizado para discriminar leveduras isoladas a partir de fermentações vínicas, não apresentando a mesma eficiência para diferenciar leveduras provenientes de fermentações para a produção de cachaça.

A partir dos crescimentos em meio wL, foram isoladas, no total, 547 linhagens de leveduras na destilaria 1 e 1788 linhagens, provenientes de 3 coletas, na destilaria 2. Pelo menos uma amostra de cada morfotipo diferente foi preservada e os morfotipos encontrados em maior concentração foram selecionados para as análises posteriores.

Na Tabela 1, estão descritas a origem e a identificação das 16 linhagens de leveduras predominantes nas duas destilarias amostradas. A espécie predominante foi S. cerevisiae, isolada durante todo o processo fermentativo com ambos os substratos e nas duas destilarias. A concentração desta levedura variou de 2,1 x 107 a 1,8 x 109 uFC.mL-1 para o melado e de 3,4 x 107 a 4,1 x 1010 uFC.mL-1 para o caldo de cana. A maior concentração de leveduras foi encontrada no meio da fermentação – etapa de intensa divisão celular – e os menores valores foram encontrados no final do processo, para ambos os substratos, quando já está ocorrendo morte celular e/ou floculação (sedimentação) das leveduras no mosto. Os gêneros Kloeckera (concentração 6,0 x 105 uFC.mL-1) e Candida (5,0 x 105 uFC.mL-1) foram encontrados apenas no caldo de cana e em pequena concentração no início do processo fermentativo, desaparecendo a seguir. Outros trabalhos já haviam mostrado que linhagens de S. cerevisae predominam, enquanto leveduras não-Saccharomyces tendem a desaparecer ao longo dos ciclos fermentativos para a produção de cachaça (MORAIS et al., 1997; PATARO et al., 2000; SChwAN et al., 2001; GOMES et al., 2007). Ainda, os gêneros Kloeckera e Candida aparecem com frequência associados a processos de produção de cachaça (PATARO et al., 2000; GuERRA et al., 2001; GOMES et al., 2007).

ocorre com o caldo de cana, nenhum microrganismo foi isolado a partir das amostras de melado, provavelmente pela alta concentração de açúcares que este substrato apresenta.

A presença de bactérias durante o processo de fermentação para a produção de cachaça já foi mostrada por outros autores (SChwAN et al., 2001; CARVALhO-NETTO et al., 2008). É importante mencionar que altas concentrações de leveduras não-Saccharomyces e de bactérias, como encontrado na amostra A (Figura 2), podem prejudicar o andamento da fermentação e ocasionar a formação de compostos indesejáveis, que alteram o sabor da cachaça. A implantação de Boas Práticas de Fabricação (BPF) (portaria 368/1997) nas destilarias poderia reduzir significativamente a contaminação do mosto, favorecendo o controle do processo.

3.3 Análise microbiológica do processo fermentativo

Já no início das fermentações do caldo de cana na destilaria 2 (amostras coletadas 1,5 h após adição do substrato ao fermento), o número de bactérias foi reduzido significativamente quando comparado com os valores obtidos na análise do caldo de cana, chegando a zero para algumas amostras. A produção de etanol pelas leveduras faz com que estas predominem ao longo do processo fermentativo; assim, somente leveduras foram isoladas no meio e no final da fermentação do caldo de cana. Com relação ao melado, em nenhuma das etapas

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1

1,5

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70

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LevedurasBactériasFungo/outros

a

c

b

Figura 2. Análise microbiológica de três amostras de caldo de cana. A amostra A foi coletada na destilaria 1 e as amostras B e C, na destilaria 2. Os valores na figura referem-se a 105 uFC.mL-1.

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secretam essa enzima – como C. guillermondii e um dos isolados de Kloeckera sp. – (Tabelas 1 e 2) produziram quantidades significativas de etanol a partir de sacarose, o que sugere a metabolização deste açúcar a partir do transporte ativo pela membrana. De fato, vários trabalhos têm mostrado uma correlação inversa entre os níveis da enzima invertase e a eficiência fermentativa das células (ODA e OuChI, 1991; EChEGARAy et al., 2000; GREIG e TRAVISANO, 2004). Nas condições testadas, os isolados números 03, 04, 15 e 16, identificados como S. cerevisiae, foram os maiores produtores de etanol a

3.5 Atividade invertásica e capacidade fermentativa das leveduras isoladas

O valor de atividade invertásica das linhagens isoladas variou significativamente, desde leveduras que não apresentaram atividade (por exemplos, os isolados 05, 10 e 11) até outras com altos níveis desta enzima (isolados 01, 04 e 08) (Tabela 2). Não houve relação direta entre os níveis de atividade invertásica das leveduras e a capacidade de fermentar sacarose. Ao contrário, leveduras que aparentemente não

Tabela 1. Linhagens de leveduras isoladas, com origem e identificação demonstradas por metodologia fisiológica padrão.Cepas Origem e local de coleta Identificação

Destilaria 105 Caldo de cana Kloeckera sp.06 Caldo de cana Kloeckera sp.07 Caldo de cana Candida bombicola08 Caldo de cana Saccharomyces cerevisiae09 Caldo de cana Saccharomyces cerevisiae

Destilaria 201 Fermento, início fermentação caldo, início e meio fermentação melado Saccharomyces cerevisiae02 Fermento, final fermentação caldo, início e final fermentação melado Saccharomyces cerevisiae03 Fermento, final fermentação caldo, início e final fermentação melado Saccharomyces cerevisiae04 Caldo de cana, meio fermentação caldo Saccharomyces cerevisiae10 Caldo de cana, meio fermentação caldo Candida. guillermondii11 Caldo de cana Candida guillermondii12 Início fermentação caldo Saccharomyces cerevisiae13 Início fermentação caldo Saccharomyces cerevisiae14 Fermento, caldo de cana, início, meio e final fermentação caldo, início, meio e

final fermentação meladoSaccharomyces cerevisiae

15 Fermento, meio e final fermentação caldo, início e meio fermentação melado Saccharomyces cerevisiae16 Fermento Saccharomyces cerevisiae

Tabela 2. Atividade invertásica e eficiência fermentativa das linhagens isoladas.

CepaAtividade invertásica

(µmol/min/mg)Produção de etanola (g.L-1) a partir de diferentes substratos

2% glicose 2% sacarose 2% frutose01 340,2 3,0 3,6 2,802 11,2 4,0 3,9 3,203 30,0 4,1 4,4 3,504 247,0 3,8 4,1 3,305 0,0 2,7 1,9 2,406 35,1 3,4 3,3 2,307 22,5 3,1 3,3 2,708 105,9 3,4 3,0 2,609 66,9 3,4 3,3 2,710 0,5 3,0 2,5 2,111 0,0 3,4 3,3 2,612 75,5 3,3 3,3 2,713 20,5 3,1 2,9 2,214 18,4 3,8 2,9 3,015 52,0 4,0 4,1 3,316 30,0 4,0 4,3 3,7

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exemplo, menos de 25% de similaridade com as linhagens 12 e 02) (Figura 4). Assim, a distância geográfica pode ser um fator determinante para as populações de leveduras presentes em uma dorna de fermentação.

Conclusões4

A utilização da técnica do mtDNA-RFLP mostrou-se útil para o estudo da diversidade e comportamento de linhagens S. cerevisiae durante o processo fermentativo. Por outro lado, as análises bioquímicas, tais como produtividade em etanol e eficiência no consumo de açúcares, foram fundamentais na seleção de linhagens melhor adaptadas à produção de bebidas alcoólicas, como a cachaça. A partir das análises realizadas neste trabalho, foi possível apontar quatro linhagens de S. cerevisiae como candidatas a leveduras iniciadoras para a produção de cachaça na região de Florianópolis. A união de técnicas bioquímicas e moleculares permite a identificação de linhagens com elevada capacidade fermentativa e a identificação e análise da presença das mesmas nos mostos com alta precisão. Assim, é

partir de sacarose (Tabela 2). Estas linhagens também apresentaram boa capacidade fermentativa em glicose e frutose, açúcares gerados na clivagem da sacarose e que, portanto, são substratos de importância para a produção de cachaça. Com base nesses resultados, as linhagens de S. cerevisiae mencionadas anteriormente podem ser sugeridas como iniciadoras para a produção de cachaça nesta região estudada.

3.6 Análise do perfil de restrição do DNA mitocondrial (mtDNA-RFLP)

Foram obtidos dez perfis diferentes (únicos) entre as 11 linhagens de S. cerevisiae analisadas (Figura 3), o que permite constatar alto polimorfismo genético entre as linhagens de levedura nas destilarias estudadas. Dentre os fatores atribuídos à alta diversidade de linhagens de leveduras em processos fermentativos, estão as condições de estresse enfrentadas pelas mesmas ao longo dos ciclos de fermentação (GuERRA et al., 2001; ARAúJO et al., 2007).

Com base nos perfis moleculares obtidos, foi construído um dendograma, a partir do qual foi possível observar a formação de três grandes grupos de linhagens de leveduras (Figura 4). O primeiro grupo foi composto pelas linhagens representadas pelos números 03, 04, 14, 15, 13 e 01; o segundo foi formado pelas linhagens números 08, 09, 12 e 02. A linhagem 16, cujo perfil apresentou-se divergente dos demais, formou o terceiro grupo. As linhagens 03 e 04 apresentaram 100% de similaridade, sendo que ambas foram isoladas na destilaria 2; entretanto, o isolado 04 foi encontrado somente em ciclos fermentativos que utilizavam caldo de cana como substrato, enquanto o isolado 03 foi encontrado com os dois substratos em estudo. As linhagens 14, 15 e 13 apresentaram similaridade superior a 75%, sendo todas isoladas a partir da destilaria 2. A linhagem 13 foi encontrada somente no início da fermentação com caldo de cana, enquanto as linhagens 14 e 15 foram encontradas em fermentações com caldo de cana e com melado (Figura 4). O fato de as linhagens que apresentam grande similaridade terem sido isoladas em diferentes substratos – o que significa diferentes ciclos de fermentação – porém na mesma destilaria, pode ser explicado pela proximidade física das dornas, pelo produtor utilizar o mesmo fermento iniciador para ambos os processos ou, ainda, pela utilização comum de alguns equipamentos.

As linhagens 08 e 09 foram as únicas isoladas na destilaria 1 identificadas como S. cerevisiae e apresentaram a maior similaridade dentre aquelas pertencentes ao segundo grupo. É interessante observar que estas linhagens apresentaram perfil semelhante entre elas (~60% de similaridade) e distinto daqueles apresentados pelas linhagens isoladas na destilaria 2 (por

PM 01 02 03 04 08 09 12 13 14 15 16

Figura 3. Perfis de restrição do DNA mitocondrial obtidos a partir das linhagens identificadas como Saccharomyces cerevisiae. PM: padrão de peso molecular; linhagens 01, 02, 03, 04, 08, 09, 12, 13, 14, 15 e 16.

Similaridade (%)

0 25 50 75 100

3

4

14

15

13

1

8

9

12

2

16

Figura 4. Dendograma das linhagens de Saccharomyces cerevisiae construído com base nos perfis obtidos pela técnica do mtDNA-RFLP.

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Finalmente, as leveduras isoladas a partir dos ciclos fermentativos que utilizavam caldo de cana como substrato mostraram-se bem adaptadas ao processo, o que leva a crer que o mesmo resultado seria obtido com o melado, já que as mesmas linhagens foram utilizadas. Com relação às análises microbiológicas, foi possível observar grandes diferenças entre os dois substratos avaliados. O melado apresentou ausência de microrganismos, enquanto uma amostra de caldo de cana apresentou predominância de bactérias. Neste último caso, a amostra foi coletada na destilaria 1, local onde se sugere a implantação de Boas Práticas de Fabricação.

Agradecimentos

Este trabalho recebeu financiamento parcial do CNPq e da FAPESC. Estendemos nossos agradecimentos aos produtores das destilarias envolvidas neste trabalho, que permitiram o acesso às instalações e aos processos fermentativos.

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