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CAPÍTULO VI ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 6.1. INTRODUÇÃO As ondas electromagnéticas são geradas pelo movimento não-uniforme de cargas eléctricas 1 . Estas ondas são caracterizadas por um campo eléctrico (E) e por um campo magnético (B) que obedecem às chamadas Equações de Maxwell 2 e à seguinte equação de onda 0 1 2 2 2 2 2 = t S v r S (6.1) em que S representa indistintamente os campos eléctrico ou magnético e εµ 1 = v (6.2) 1 Uma carga eléctrica em repouso cria um campo eléctrico electrostático. Uma carga animada de movimento uniforme cria uma corrente eléctrica estacionária que, por sua vez, gera um campo magnético estacionário. Quando o movimento da carga é não-uniforme criam-se campos eléctrico e magnético variáveis no tempo, os quais verificam as Equações de Maxwell e se propagam na forma de ondas electromagnéticas. 2 As Equações de Maxwell são as equações fundamentais do Electromagnetismo, dado que relacionam os campos eléctrico e magnético com as suas fontes (cargas e correntes eléctricas) e com as propriedades eléctricas e magnéticas do meio. Estas equações podem ser escritas na forma. t D J H rot + = r r r div D r =ρ t B E = rot r r div B r =0 em que rot e div são dois operadores diferenciais e D r e H r são dois campos matemáticos designados por deslocamento eléctrico e excitação magnética. 1

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CAPÍTULO VI

ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS

6.1. INTRODUÇÃO

As ondas electromagnéticas são geradas pelo movimento não-uniforme de cargas eléctricas1.

Estas ondas são caracterizadas por um campo eléctrico (E) e por um campo magnético (B)

que obedecem às chamadas Equações de Maxwell2 e à seguinte equação de onda

012

2

22

2

=∂∂

−∂∂

tS

vrS (6.1)

em que S representa indistintamente os campos eléctrico ou magnético e

εµ1

=v (6.2)

1 Uma carga eléctrica em repouso cria um campo eléctrico electrostático. Uma carga animada de movimento uniforme cria uma corrente eléctrica estacionária que, por sua vez, gera um campo magnético estacionário. Quando o movimento da carga é não-uniforme criam-se campos eléctrico e magnético variáveis no tempo, os quais verificam as Equações de Maxwell e se propagam na forma de ondas electromagnéticas. 2 As Equações de Maxwell são as equações fundamentais do Electromagnetismo, dado que relacionam os campos eléctrico e magnético com as suas fontes (cargas e correntes eléctricas) e com as propriedades eléctricas e magnéticas do meio. Estas equações podem ser escritas na forma.

t

DJHrot

∂+=

rrr

div Dr

t

BE

∂−=rot

rr

div Br

=0

em que rot e div são dois operadores diferenciais e D

re Hr

são dois campos matemáticos designados por deslocamento eléctrico e excitação magnética.

1

é a velocidade de propagação das ondas electromagnéticas num meio de constante dieléctrica

ε e permeabilidade magnética µ.

As ondas electromagnéticas propagam-se no vácuo ou em qualquer meio material. No

primeiro caso, a amplitude das ondas é constante, enquanto nos meios materiais a amplitude

diminui à medida que nos afastamos do emissor devido à existência de perdas. Problema 6.1 – Determine a velocidade de propagação das ondas electromagnéticas no vácuo, sabendo que ε0=8,854×10-12 F/m e µ0=4π 10-7 N/A2. As ondas electromagnéticas incluem as ondas de rádio e de televisão, as micro-ondas,

a luz infra-vermelha, visível e ultra-violeta, os raios-X e os raios-γ, cobrindo uma extensa

banda de frequências que se designa por espectro electromagnético (Figura 6.1).

Figura 6.1 - Espectro electromagnético

A vista humana é sensível à radiação electromagnética com comprimentos de onda

compreendidos entre aproximadamente os 400 e os 700 nm. O comprimento de onda mais

pequeno (maior frequência) do espectro visível corresponde ao violeta, enquanto a luz

vermelha tem o maior comprimento de onda (menor frequência).

Nesta disciplina vamos estudar algumas propriedades das ondas electromagnéticas que

têm muito interesse para a Física Experimental, utilizando a luz visível e invísivel como

exemplos deste tipo de ondas.

6.2. ÍNDICE DE REFRACÇÃO

O índice de refracção (n) de um meio é definido pelo quociente da velocidade da luz no vácuo

pela velocidade de fase da onda no meio

n = c / vf (6.3)

2

6.3. FONTES DE LUZ

6.3.1. Introdução

As fontes de luz podem ser naturais (como, por exemplo, o Sol) ou artificiais, se são

fabricadas pelo Homem (como, por exemplo, as lâmpadas e os lasers), primárias, se emitem a

luz por si próprias (como, por exemplo, o Sol e as lâmpadas) ou secundárias, se reflectem

(espelho) ou difundem (Lua) a luz emitida por outra fonte.

O Sol é a fonte natural da luz que ilumina o nosso Planeta. A luz do Sol, apesar de

parecer ser branca, pode ser decomposta (por exemplo, através da sua difracção por um

prisma) num espectro contínuo com sete cores principais, as cores do arco-iris: violeta, anil,

azul, verde, amarelo, laranja e vermelho. A cada cor corresponde uma frequência e, portanto,

uma energia.

A fonte artificial mais comum de luz resulta das transições dos electrões exteriores dos

átomos. Normalmente um átomo está no seu estado fundamental com os seus electrões nos

níveis permitidos de energia mais baixa e consistentes com o Princípio da Exclusão de Pauli.

Os electrões de menor energia estão na órbitra mais próxima do núcleo, formando um

conjunto muito estável. Os electrões de maior energia estão em órbitras exteriores, afastadas

do núcleo, podendo ser facilmente excitados para níveis de maior energia que estejam livres.

Estes electrões são responsáveis pelas alterações de energia no átomo através da emissão ou

absorpção de luz.

6.3.2. Emissão espontânea3

Quando um átomo colide com outro átomo ou com um electrão livre, ou absorve energia

electromagnética (por exemplo de um fotão), os seus electrões exteriores podem ser excitados

para um nível de energia superior.

Após um tempo da ordem de 10-8 s, estes electrões podem fazer transições

espontâneas para estados de energia mais baixos. Estas transições conduzem à emissão

espontânea de um fotão, com as seguintes frequência

f=(E2-E1)/h (6.4)

e comprimento de onda

λ=c/f (6.5)

onde E2 e E1 são os níveis de energia entre os quais se verifica a transição, h é a constante de

Planck e c e a velocidade da luz no vácuo.

3 Na secção 6.2.5.1 veremos o que e a emissão estimulada.

3

A emissão espontânea é um processo incoerente4 dado que a luz emitida por dois

átomos não está correlacionada entre si.

O espectro da luz emitida por um átomo é discreto dado que os níveis de energia de

um átomo também formam um conjunto discreto. Os átomos de um sólido ou de um líquido

estão muito juntos, pelo que os espectros de cada átomo podem-se sobrepor de modo a criar

um espectro contínuo. O espectro da radiação de um gás de baixa densidade é normalmente

discreto, uma vez que os átomos estão suficientemente afastados para que os espectros de

cada átomo não se sobreponham com os dos átomos vizinhos.

6.3.3. Lâmpada incandescente

Consideremos uma lâmpada incandescente de filamento de tungsténio. Quando o filamento é

percorrido por uma corrente eléctrica, há dissipação de calor por efeito de Joule e o filamento

fica incandescente. Os electrões dos átomos do material de que é feito o filamento são

acelerados aleatoriamente, sofrem colisões e emitem um espectro largo de radiação térmica.

A taxa de emissão de radiação térmica (Tert) é dada por

Γert=kT4 (6.6)

onde T é a temperatura absoluta do corpo e k é uma constante de proporcionalidade. Quando

T<600 oC a radiação está concentrada no infravermelho e não é visível. No intervalo

600<T<700 oC a radiação está maioritariamente concentrada no visível. Quando T>700 oC o

corpo torna-se cada vez mais brilhante indo do vermelho ao branco.

6.3.4. Lâmpada de descarga

Suponhamos que fazemos uma descarga eléctrica entre dois eléctrodos, contidos num tubo de

vácuo, onde foi injectado um gás a baixa pressão.

Figura 6.2 – Esquema de uma lâmpada de descarga

4 Veremos na secção 6.3.5. que a emissão estimulada da origem a luz coerente.

4

Quando V=0, I=0. À medida que aumenta a tensão V a partir de zero, cresce o campo

eléctrico entre os dois eléctrodos, enquanto a corrente que percorre o circuito permanece nula

uma vez que o gás é um bom isolante. Sob a acção deste campo, as órbitras dos electrões

deformam-se dado que aumenta a força que se exerce sobre estas partículas carregadas. Para

um dado valor da tensão5, o campo eléctrico é suficiente para arrancar um electrão da órbitra

exterior do átomo. Nestas condições: (i) o gás ioniza-se, podendo passar ao estado de plasma,

o quarto estado da matéria; (ii) a tensão aos terminais do gerador diminui; (iii) passa a haver

corrente no circuito; e (iv) os átomos da gás emitem radiação. O valor da tensão de disrupção

do gás depende da forma dos eléctrodos, da distância entre eles, da natureza e da pressão do

gás.

As características da radiação6 dependem da natureza e da pressão do gás e da

temperatura e da densidade do plasma. Estas lâmpadas são muito usadas para obter luz de

várias cores.

6.3.5. Lasers

6.3.5.1. Princípio de funcionamento

Um Laser (Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation) é um dispositivo que

produz um feixe intenso de fotões coerentes por emissão estimulada.

Consideremos um sistema constituído por átomos num estado de energia fundamental

E1 e num estado excitado metaestável de energia E2. Se estes átomos forem irradiados por

fotões de energia E2-E1: (i) os átomos do estado fundamental podem absorver fotões e

transitarem para o estado E2 (absorpção); e (ii) os átomos do estado excitado podem ser

estimulados para decairem para o estado fundamental de energia E1 (emissão estimulada). Einstein mostrou que as probabilidades da absorpção e da emissão estimulada são

teoricamente iguais. Contudo, como à temperatura ambiente a maioria dos átomos está no

estado fundamental, a absorpção é o efeito predominante. Para que exitam mais transições de

emissão estimulada do que de absorpção é necessário criar uma situação em que existam mais

estados excitados do que átomos no estado fundamental. Esta condição, designada por

inversão de população, pode ser atingida através de bombeamento óptico, processo no qual os

átomos são bombeados para níveis de energia superior a E2 por absorpção de radiação

5 Que se designa por tensão de disrupção. 6 Nomeadamente, a sua cor.

5

auxiliar intensa. Estes átomos decaiem, depois, para o estado E2 através de emissão

espontânea (ESP) ou devido a processos não-lineares como, por exemplo, colisões.

6.3.5.2. Tipos de lasers

6.3.5.2.1. Introdução

Existem vários tipos de lasers: (i) de estado sólido (Rubi, Neodimio-YAG), com

comprimentos de onda entre 170 e 3900 nm, contínuos (até 1 kW) ou pulsados (com duração

de alguns nanosegundos e elevada potência (1014 W)); (ii) de gases, com comprimentos de

onda do infra-vermelho ao ultra-violeta; (iii) de líquidos (corantes químicos); (iv) de semi-

condutores; (v) de electrões livres7.

6.3.5.2.2. Laser de ruby

A Figura 6.3 apresenta apresenta o esquema do primeiro laser desenvolvido por Theodore

Maiman. É constituido por um “rod” de rubi com alguns centímetros, rodeado por um tubo

de flash, helicoidal, com um gás que emite luz muito intensa de espectro largo.

Figura 6.3 – Desenho esquemático do primeiro laser de rubi

O rubi é um cristal transparente de Al2O3 com uma pequena quantidade (<0.05%) de

crómio. O “rod” de rubi parece vermelho porque os iões de crómio (Cr3+) tem bandas fortes

de absorpção nas regiões do azul e do verde do espectro visível. A Figura 6.4 mostra os níveis

de energia do crómio que são relevantes para a operação do laser. Quando o tubo de flash

opera, produz um impulso forte de luz durante alguns milisegundos. Os iões de crómio são

excitados por absorpção até aos níveis energéticos indicados na Figura 6.4.

7 Este laser de grande potência e larga variedade de comprimentos de onda extrai energia de um feixe de

electrões livres que se movem num campo magnético variável no espaço

6

Figura 6.4 – Níveis de energia envolvidos no funcionamento de um laser de rubi

Depois estes iões transferem a sua energia por relaxação para os estados metaestáveis do

cristal. Quando a população deste estado excitado for superior à do estado fundamental há

emissão estimulada de luz com λ=694.3 nm, correspondente à diferença de energia entre os

dois estados (1.79 eV). Os dois extremos do cristal estão revestidos por prata, sendo a

reflexão de 100% e 99%. Deste modo, através de um processo de reflexões e de estimulações

sucessivas de mais átomos, é possível obter um feixe de fotões bastante intenso.

Os lasers modernos de rubi geram feixes intensos de luz com energias de 50 a 100 J e

pulsos de alguns milisegundos de duração. O feixe pode ter um diâmetro da ordem de 1 mm e

uma divergência ângular de cerca de 0.25 a 7 miliradianos.

6.3.5.2.3. Laser de hélio-néon

A Figura 6.5 apresenta os níveis de energia do hélio e do néon que são relevantes para a

operação de um laser de He-Ne.

O hélio tem um estado excitado E2He a 20.61 eV acima do estado fundamental, para o

qual os átomos são excitados por uma descarga eléctrica. O néon possui um estado excitado

de energia E3Ne que está 20.66 eV acima do estado fundamental e apenas 0.05 eV acima do

estado E2He. Por isso, os átomos de Néon são excitados para o estado E3Ne por colisões com

os átomos de hélio com energia E2He. Os átomos do estado E3Ne podem decair por emissão

espontânea para o estado fundamental ou através de emissão estimulada para o estado E2Ne

de energia 18.70 eV, o qual está normalmente livre, pelo que a inversão de população entre os

estados E3Ne e E2Ne é automaticamente conseguida. A emissão estimulada de luz entre estes

dois estados faz-se em fotões de 632.8 nm, a que corresponde luz vermelha brilhante. Depois

7

da emissão estimulada os átomos do estado E2Ne decaiem para o estado fundamental através

de emissão espontânea.

Figura 6.5 – Níveis de energia do hélio e do néon relevantes para a operação de um laser de He-Ne.

Um laser de He-Ne é constituído por um tubo de vácuo, que contém uma mistura de

15% de hélio e 85% de neon. Nos dois extremos do tubo existem dois espelhos, um plano

totalmente reflector e outro côncavo parcialmente reflector. Este espelho foca a radiação

paralela gerada no espelho plano e actua também como uma lente que transmite parte da luz,

que deste modo emerge como um feixe paralelo (Figura 6.6).

Figura 6.6 – Representação esquemática de um laser de He-Ne

6.3.5.2.4. Comparação dos lasers de rubi e de hélio-néon

Existem duas diferenças fundamentais entre os lasers de rubi e de hélio-neon: (i) o laser de

rubi é de estado sólido, enquanto o de hélio-neon e de gás; e (ii) o funcionamento do laser de

rubi envolve três níveis de energia, enquanto no de He-Ne estão envolvidos quatro níveis

energéticos.

O funcionamento de um laser de quatro estados é mais fácil uma vez que a inversão de

população é fácil de obter dado que não envolve o estado fundamental que é o estado mais

populado.

8

Num laser de três estados de energia, mais de 50% da população do estado

fundamental tem de ser excitada.

6.3.5.3. Aplicações dos lasers

A luz laser é coerente, intensa e muito fina. Os lasers são muito usados em medicina,

industria, aplicações militares e em Física, em tarefas do tipo: (i) alinhamento; (ii) medição de

distâncias entre objectos muito distantes um do outro; (iii) intervenções cirúrgicas; (iv) meios

de diagnóstico; (v) fusão nuclear por confinamento inercial.

6.4. PROPAGAÇÃO DA LUZ

6.4.1. Introdução

A propagação da luz, enquanto onda electromagnética, é hoje matemáticamente explicada

através das Equações de Maxwell. Contudo, no passado, a propagação da luz foi estudada

empiricamente usando o Princípio de Huygens e o Princípio de Fermat.

6.4.2. Princípio de Huygens

O Princípio de Huygens foi enunciado no século XVII e demonstrado cerca de um século

depois por Fresnel e Kirchoff. Este Princípio considera que cada ponto da superfície de onda

é um centro emissor de novas ondas (esféricas), com a mesma frequência e com igual

velocidade de propagação. Por exemplo, se um feixe de luz incidir num alvo com um

pequeno orifício, este vai actuar como um novo emissor de ondas esféricas (Figura 6.7).

Figura 6.7 – Comportamento de uma onda plana que incide num alvo com um orificio

6.4.3. Princípio de Fermat

O Princípio de Fermat diz que o percurso da luz entre dois pontos é aquele que corresponde

ao menor tempo de propagação entre eles.

9

6.5. REFLEXÃO E REFRACÇÃO

6.5.1. Introdução

Quando uma onda electromagnética incide sobre a superfície de separação de dois meios,

uma parte da energia volta para trás (reflexão), enquanto a restante energia se transmite ao

outro meio, acompanhada por uma alteração da direcção de propagação (refracção).

6.5.2. Leis da Reflexão

A reflexão de uma onda electromagnética e regida pelas Leis da Reflexão (Figura 6.8):

O raio incidente, a normal e o raio reflectido existem no mesmo plano;

O ângulo de incidência(i) é igual ao ângulo de reflexão (r).

Figura 6.8 – Leis da Reflexão

6.5.3. Lei de Snell

A transmissão de uma onda electromagnética de um meio de indice de refracção n1 para outro

meio de indice n2 é regida pela chamada Lei de Snell (Figura 6.9):

n1 sen α1 = n2 sen α2 (6.7)

Figura 6.9 – Refracção de uma onda electromagnétIca

Se a onda passar dum meio mais refringente (maior indice de refracção) para um meio

menos refringente (como, por exemplo, na passagem da água para o ar), o ângulo α2 é maior

do que α , dado que

10

sen α2 = (n1/n2) sen α (6.8)

podendo existir uma situação de reflexão total quando

α > αc (6.9)

em que

αc = ângulo sen (n2/n1) (6.10)

Quando há reflexão total, não existe transmissão de energia de um meio para outro.

Este princípio é usado nos sistemas de transmissão de informacão como, por exemplo, nas

fibras ópticas.

6.6. INTERFERÊNCIAS E DIFRACÇÃO

6.6.1. Introdução

Interferências e difracção são dois fenómenos importantes que destinguem as ondas das

partículas.

Interferência é a combinação por sobreposição de duas ou mais ondas coerentes da

mesma frequência e comprimento de onda que atingem no mesmo instante um ponto do

espaço8.

Difracção é o fenómeno que acontece quando uma porção de uma frente de onda é

cortada por uma barreira ou obstáculo, com dimensões uma ou duas ordens de grandeza

maiores que o comprimento de onda da onda.

6.6.2. Interferência

6.6.2.1. Introdução

A interferência entre duas ondas apenas ocorre se existir coerência entre as fontes que

originaram as duas ondas. Como um feixe de luz resulta da radiação de milhões de átomos

independentes, a diferença de fase das ondas provenientes destas fontes fluctua aleatoriamente

milhões de vezes por segundo, de modo que duas fontes primárias de luz são incoerentes.

Para obtermos dois feixes de luz coerentes é preciso dividir o feixe proveniente de uma fonte

de luz. A diferença de fase entre duas ondas resulta normalmente de uma reflexão ou de uma

diferença entre os percursos das duas ondas. Uma diferença de percurso ∆r causa uma

diferença de fase

8 Por esta razão, não existe interferência entre os sinais das várias estações de televisão cujos sinais chegam a uma mesma antena receptora. Contudo, se esta antena captar dois sinais da emissora que tiveram percurso diferentes (por exemplo, devido a reflexões) há interferência e a imagem apresentada no écran da televisão tem “fantasma”.

11

∆Φ = 2 π ∆r / λ (6.11)

Quando duas ondas coerentes, da mesma frequência e comprimento de onda mas com

fases diferentes, interferem, o resultado é uma onda da mesma frequência e comprimento de

onda, com uma amplitude que depende da diferença de fase entre as duas ondas:

Se as duas ondas estiverem em fase a interferência é construtiva. A amplitude

resultante é igual à soma das amplitudes das ondas individuais e a intensidade

(proporcional ao quadrado da amplitude) é máxima;

Se as duas ondas estiverem em oposição de fase a interferência é destructiva. A

amplitude resultante é igual à diferença entre as amplitudes das ondas individuais e a

intensidade é mínima;

Se as duas ondas tiverem a mesma amplitude, a intensidade máxima da interferência é

quatro vezes a intensidade de cada onda e a intensidade mínima é zero.

6.6.2.2. Experiência de Young

Suponhamos que um feixe de luz incide num corpo opaco, com dois pequenos orifícios,

separados por uma distância d. Como cada um destes orifícios vai actuar como uma nova

fonte de luz, obtemos dois feixes de luz coerente, que vão interferir entre si (Figura 6.10).

Figura 6.10 – Incidência de um feixe de luz num alvo com dois orifícios

O resultado da interferência num écran, situado a uma distância L>>d do corpo

opaco, consiste numa sucessão de zonas muito iluminadas (interferência construtiva) e

escuras (interferência destrutiva). Vamos agora ver como se relacionam a frequência (f), a

distância entre os orifícios (d), a distância do écran ao corpo opaco (L) e a distância entre uma

zona muito iluminada e o centro do ecran (ym) (Figura 6.11).

12

Figura 6.11 – Desenho esquemático da experiência de Young

Seja P um ponto de uma zona muito iluminada. As duas ondas tem de chegar em fase, pelo

que

ωt – kr = ωt - kr* +2 π m (6.12)

ou seja

∆r = r* - r = m λ (6.13)

Mas

∆r = d senθ (6.14)

pelo que

senθ = m λ / d (6.15)

Se admitirmos que L>>d

tanθ = ym / L (6.16)

e

tanθ ≅ senθ (6.17)

Da igualdade anterior concluimos que

λ = ym d / L m (6.18)

f = c L m / ymd (6.19)

em que c representa a velocidade de propagação da luz no vácuo.

Estas duas últimas expressões mostram que a Experiência de Young permite

determinar o comprimento de onda e a frequência de um feixe de luz que incide num alvo

com dois orifícios.

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6.6.3. Difracção

6.6.3.1. Introdução

A difracção é um fenómeno mais complexo que a interferência. É costume estudar em

pormenor as difracções de Fraunhofer e de Fresnel.

A difracção de Fraunhofer acontece quando o alvo está muito afastado da fonte

geradora de difracção, de modo que os raios luminosos estão praticamente paralelos quando

atingem o alvo.

A difracção de Fresnel ocorre quando o alvo está muito próximo da fonte que produz

a difracção.

6.6.3.2. Difracção por uma fenda

No estudo das interferências admitimos que cada orifício é uma fonte pontual de luz.

Suponhamos, agora, que o corpo opaco possui uma fenda de largura a. Cada ponto da fenda

vai comportar-se como uma fonte de luz, pelo que o número de ondas que vão interferir no

écran é muito maior. Deste modo, as interferências construtivas são mais intensas e as

interferências destrutivas são ainda menos intensas. A Figura 6.12 apresenta a intensidade

luminosa no écran.

Figura 6.12 – Efeito num alvo de uma fenda sobre um feixe de luz

O máximo de intensidade luminosa acontece no ponto P, dado que existem sempre dois

pontos da fenda, um à esquerda e o outro à direita da linha a tracejado da Figura 6.13 a igual

distância do ponto P. Ou seja, as ondas provenientes dos dois pontos estão em fase, pelo que

dão origem a uma interferência construtiva e, portanto, a uma zona brilhante.

14

Figura 6.13 – Explicação esquemática da difracção da luz por uma fenda

Consideremos, agora, um ponto P* tal que as ondas provenientes das duas

extremidades da fenda estejam em fase

a sen θ =λ (6.20)

Qualquer que seja o ponto C existe sempre um ponto C* tal que as ondas originadas nestes

pontos chegam a P* com uma diferença de percurso de λ/2, ou seja, em oposição de fase.

Nestas condições temos uma interferência destrutiva e, portanto, uma zona escura. Podemos

observar que:

Os pontos sem luz ocorrem quando

a senθ = m λ (6.21)

Quanto maior for a largura da fenda, mais estreito será o espectro do primeiro

máximo;

Se L>>a temos que

y=Lλ/a (6.22)

representa a distância do máximo central ao primeiro mínimo.

6.6.3.3. Difracção por duas fendas

Suponhamos agora que temos duas fendas de largura a separadas por uma distância d=10a.

Verificamos que o máximo central é mais intenso, o primeiro mínimo acontece em

adsen λλθ ==

10 (6.23)

mas agora existe um conjunto de nove riscas entre o máximo central e o primeiro mínimo.

15

Figura 6.14 – Imagem da difracção da luz por duas fendas de largura a, separadas por uma distância igual a

10a.

Quando aumenta o número de fendas, a intensidade do máximo central também

aumenta (Figura 6.15)

Figura 6.15 – Difracção da luz por duas, três e quatro fendas

6.6.3.4. Difracção por uma rede

Suponhamos, agora, que a luz incide sobre uma rede de difracção, constituída por um grande

número de riscas ou fendas (N), igualmente espaçadas (d), numa superfície plana (existem

redes de difracção de plástico com 10000 fendas por centímetro, o que significa que d=10-4

cm).

Se a largura de cada fenda for muito pequena de modo a criar feixes largamente

difractados, o resultado das interferências de todas as ondas num alvo situado numa região

longínqua da fonte de difracção tem as seguintes características:

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Os máximos de interferência acontecem quando

d sen θ = mλ (6.24)

A posição dos máximos de interferência não depende do número de fontes

O primeiro mínimo de interferência ocorre quando

sen θmin = θmin = λ/Nd (6.25)

O máximo de interferência é tanto mais estreito quanto maior for o número de fontes.

6.6.3.5. Resolução de uma rede de difracção

A resolução de uma rede de difracção é definida pelo Critério de Rayleigh, o qual especifica

que duas cores são separadas por uma rede de difracção se o máximo de uma risca ocorrer a

uma distância angular que corresponde, pelo menos, ao mínimo da outra cor.

A equação

N d sen θ =λ (6.26)

estabelece que a separação angular dθ entre um máximo e um mínimo para um mesmo

comprimento de onda é dada por

dθ = λ/N d cos θ (6.27)

Figura 6.16 – Separação de duas cores por uma rede de difracção

Por outro lado, a equação

d sen θ =mλ (6.28)

estabelece a relação entre as variações do comprimento de onda e da separação angular

dθ =mdλ/d cos θ (6.29)

Igualando (6.27) e (6.29) obtemos

λ/N=mdλ (6.30)

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ou seja

R=λ/dλ=mN (6.31)

em que R representa a resolução da rede.

A resolução da rede aumenta com o número de fontes e com a ordem do máximo.

6.6.3.6. Hologramas

Um holograma é uma fotografia tri-dimensional que se obtem utlizando uma rede de

difracção.

A realização de um holograma envolve as seguintes etapas (Figura 6.17):

Um feixe laser é dividido em dois feixes

Um dos feixes vai incidir no objecto a ser fotografado

A luz reflectida pelo objecto vai interferir com o feixe de referência

A interferência construtiva é registada numa chapa fotográfica

Figura 6.17 – Etapas para a realização de um holograma

Quando queremos visualizar o holograma temos de iluminar o filme com um laser. As

riscas de interferência do filme vão funcionar como uma rede de difracção, produzindo uma

imagem tri-dimensional do objecto que foi fotografado.

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