capÍtulo iv: antiguidade clÁssica - roma

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CAPÍTULO IV: ANTIGUIDADE CLÁSSICA - ROMA Andrea Lúcia Dorini de Oliveira Carvalho Rossi Introdução O estudo sobre a História de Roma deve ser iniciado com discussões a respeito das fontes que já foram feitas anteriormente. No entanto, neste capítulo, será analisada a especificidade das fontes e algumas metodologias de abordagem documental para escrever a História da Sociedade Romana. Para tanto, far-se-á uma discussão rápida sobre as tendências historiográficas dos últimos dois séculos e a produção sobre a Antiguidade Clássica. Este diálogo com a historiografia está diretamente relacionado às concepções de fontes utilizadas para se escrever a História de Roma. A consciência da distância temporal e espacial existente entre a nossa sociedade e a Sociedade Romana, antiga ou moderna, é um dos elementos fundamentais para o estudo de Roma Antiga. Muitas são as constantes referências contemporâneas sobre as identidades da sociedade ocidental com a Sociedade Romana na Antiguidade. Dentre os principais elementos que geram esta relação de identidade estão as origens da religião cristã e da Igreja Católica, os fundamentos do Direito, as bases e as estratégias militares, as práticas políticas e a organização da República, a administração de cidades, os complexos de distribuição de água e de saneamento urbano, o conceito de imperialismo, e muitas outras referências. São fundamentais essas duas discussões, pois o questionamento constante e atual sobre a necessidade de se estudar História Antiga no Brasil. Qual História Antiga deve ser estudada? Nesta relação de identidade, nos Parâmetros Curriculares Nacionais elaborados pelo Ministério da Educação (MEC) se apresenta a necessidade de se estudar a antiguidade da América que é a nossa referência. Nesta relação espacial, o questionamento sobre a importância do estudo da Sociedade Romana se dá, principalmente, no que diz respeito às suas aproximações

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CAPTULO IV: ANTIGUIDADE CLSSICA - ROMA Andrea Lcia Dorini de Oliveira Carvalho Rossi Introduo OestudosobreaHistriadeRomadeveseriniciadocom discussesarespeitodasfontesquejforamfeitasanteriormente.No entanto,nestecaptulo,seranalisadaaespecificidadedasfontese algumas metodologias de abordagem documental para escrever a Histria da Sociedade Romana. Para tanto, far-se- uma discusso rpida sobre as tendncias historiogrficas dos ltimos dois sculos e a produo sobre a AntiguidadeClssica.Estedilogocomahistoriografiaestdiretamente relacionado s concepes de fontes utilizadas para se escrever a Histria de Roma. Aconscinciadadistnciatemporaleespacialexistenteentrea nossasociedadeeaSociedadeRomana,antigaoumoderna,umdos elementos fundamentais para o estudo de Roma Antiga.Muitassoasconstantesrefernciascontemporneassobreas identidadesdasociedadeocidentalcomaSociedadeRomanana Antiguidade.Dentreosprincipaiselementosquegeramestarelaode identidadeestoasorigensdareligiocristedaIgrejaCatlica,os fundamentosdoDireito,asbaseseasestratgiasmilitares,asprticas polticaseaorganizaodaRepblica,aadministraodecidades,os complexos de distribuio de gua e de saneamento urbano, o conceito de imperialismo, e muitas outras referncias. Sofundamentaisessasduasdiscusses,poisho questionamentoconstanteeatualsobreanecessidadedeseestudar HistriaAntiganoBrasil.QualHistriaAntigadeveserestudada?Nesta relao de identidade, nos Parmetros Curriculares Nacionais elaborados peloMinistriodaEducao(MEC)seapresentaanecessidadedese estudar a antiguidade da Amrica que a nossa referncia. Nesta relao espacial, o questionamento sobre a importncia do estudo da Sociedade Romana se d, principalmente, no que diz respeito s suas aproximaes eaosseusdistanciamentoscomoBrasil.Narelaotemporal,a conscincia do distanciamento de dois a trs mil anos tambm de suma importnciaparaquesefaaaanlisedautilizaodedeterminadas fontes documentais para o estudo da Histria da Roma Antiga. O estudo da Histria de Roma, assim como da Antiguidade, deve partir,nestesentido,daconcepodedocumentoedefontequeo historiadortemadotadonodecorrerdotempo.Estaconcepotemque seranalisadaemseusvriosmomentoshistricos.Aconcepode Histria e sobre a escrita da Histria para os romanos antigos, assim como esta mesma concepo no decorrer do tempo desde ento, sofreu muitas mudanas.Estasmudanasforamdeterminantesnasobrevivnciade muitasfontesquehojesousadasparaseescreveraHistriasobrea Sociedade Romana. Segundo Moses Finley, em sua obra Histria Antiga: Testemunhos eModelos,ocampodahistriasocial,incluindoaHistriaAntiga,est constantementeemtransformao(p.4).Oautorfundamentaasua afirmao com a indicao de dois elementos: as alteraes nos volumes dedadosqueohistoriadorutilizacomofonteshistricasassimcomoas tcnicas e tecnologias aplicadas ao estudo destas fontes.ParaFinley,acombinaodestesdoiselementosfazcomquea escritadaHistriaestejaemconstantemudanaequecadadiscurso historiogrficoresultadodopresenteemqueestefoiconstrudo. Segundooautor,todohistoriadortemumaexperinciahistricamaior queadeseuspredecessores,pormaisdestacadosqueestestenham sido. (p. 5). Esta afirmao demonstra que o historiador tem que ter conscincia dequeaescritadaHistriadeveseranalisadasegundoasformasde pensar o conhecimento histrico e como este foi elaborado, quais foram as fonteshistricaseastecnologiasaplicadasparaaconstruodeste conhecimento. Deve-se,portanto,pensarasrelaesexistentesnahistoriografia quanto s fontes histricas e as suas abordagens.Estas relaes esto intrinsecamente ligadas funo social da Histria. Esta funo social est diretamente relacionada necessidade de manuteno do passado para a construodeumaidentidadenopresente.Aconstruohistoriogrfica sobreaSociedadeRomananofogeaestalgica.Asidentidadeseas diversidadesqueestopresentesentrenseosromanosantigosso refletidas nos discursos historiogrficos que so produzidos. LeGoff,aofalarsobreafunosocialdaHistria,fazuma refernciaaumdosfundadoresdosAnnalesesuaconceposobreo passado e a Histria: [A] interao entre passado e presente aquilo a que se chamou a funo social do passado ou da histria. Tambm LucienFebvre[1949]:Ahistriarecolhesistematicamente, classificandoeagrupandoosfatospassados,emfunodas suasnecessidadesatuais.emfunodavidaqueela interroga a morte. Organizar o passado em funo do presente: assim se poderia definir a funo social da histria. (1992, p. 26) Portanto,nosepodepensaraHistriadeRomaeaspossveis fontesparaasuaconstruosemterclaraarelaopresente-passado. Estarelaoserdeterminantenadefiniodefontesemetodologias, assim como ser determinada pelas identidades e diversidades sociais.importante,nestemomento,resgataretimologicamenteo conceito de fonte que tem a sua origem no latim fons que significa fonte de algumacoisa,origem.SegundoFunari,ousodapalavraremeteuma metfora para fazer aluso capacidade de jorrar informaes histricas do documento a ser estudado pelo historiador (2005). Da mesma forma, como j foi anunciado anteriormente, o conceito deHistriadeveserentendidonestarelaopresente-passado.Pensar sobreasfontesdocumentaisparaoestudodaHistriadeRoma,no presente, remete diretamente uma reflexo sobre as vrias concepes de Histrianodecorrerdotempoedoespaodesdemeadosdoprimeiro milnio antes de Cristo at nossos dias.Sendo Roma o objeto deste captulo, importante a sntese sobre a concepodosromanossobreaHistriaapresentadaporJ acquesLe Goff: A mentalidade histrica romana no foi muito diferente dagrega,quealisaformou.Polbio,omestregregoque iniciouosromanosnopensamentodahistria,vno imperalismoromanoadilataodoespritodacidadee, peranteosbrbaros,oshistoriadoresromanosexaltaroa civilizaoencarnadaporRomaqueSalstioexaltaperante J ugurta,oafricanoqueaprendeuemRomaosmeiosdea combater, a mesma que Tito Lvio ilustra perante os selvagens deItliaeosCartagineses,essesestrangeirosquetentaram reduzirosRomanos escravatura, comoosPersasotinham tentadocomosGregos,queCsarencarnacontraos Gauleses, que Tcito parece abandonar no seu despeito anti-imperialparaadmiraressesbonsselvagensbretese germanos,queelevcomostraosdosantigosromanos virtuosos, anteriores decadncia. Com efeito, a mentalidade histricaromanacomoosermaistardeaislmica dominadapelanostalgiadoscostumesancestrais,domos maiorum. (LE GOFF, 1992, p. 63) Estasnteserefleteosusosdopassadopresentenasvrias experinciasdeescritadaHistriadeRomapelosprpriosromanos.A Histria para os romanos est diretamente vinculada construo de uma identidade que se inicia com a expanso territorial de Roma no perodo de transiodaMonarquiaparaaRepblica.comaguerracontraos cartaginesesqueasexaltaessobreosfeitosromanoscomeamaser uma preocupao para a escrita de uma Histria de Roma. Polbio, como citaLeGoff,umdosprincipaisresponsveispelaconstruodesta identidade histrica dos romanos que relaciona presente- passado. Destamesmaforma,osinteressesdosvriospresentes sobrepostos nos ltimos dois mil anos levaram manuteno, ou no, das fontes que hoje so utilizadas para a construo dos discursos histricos sobre Roma.Aseguir,seroanalisadososdoisltimossculosesuas influncias na historiografia no que diz respeito s concepes de fontes e s produes de discursos histricos sobre a Sociedade Romana. Histria de Roma e o sculo XIX O Positivismo histrico A Histria, para o positivismo, era vista como uma cincia objetiva. Todofatohistricodeveriaserpensadoapartirdeumaperspectivade comprovaoemprica,ouseja,apartirdesuaexistnciareal.Para construir o conhecimento histrico, os positivistas pregavam a utilizao de documentos para se obter o mximo de informaes possveis sobre o fato histrico.Na anlise dos documentos, para os seguidores desta corrente histrica,ohistoriadordeveriaabster-sedejuzosdevaloresnaanlise dosfatos.Parafundamentarestasanlises,osdocumentosutilizados deveriam ser os documentos oficiais, principalmente textuais. Fustel de Coulanges (1830-1889) foi um dos historiadores sobre a Antiguidademaisrepresentativosdestacorrente.EscreveuoclssicoA CidadeAntiga(1864) que analisa a organizao das cidades de Roma e de Atenas. Em sua concepo sobre a Histria, Coulanges (1965) afirma que a "Histria no arte, mas uma cincia pura (...) a busca dos fatos feitapelaobservaominuciosadostextos,damesmamaneiraqueo qumico encontra os seus em experincias minuciosamente conduzidas".A objetividade, a minuciosidade, o detalhe e a dedicao impessoal soasprincipaiscaractersticasdaEscolaPositivistanoquetangeo estudo da Histria no sculo XIX e no incio do XX.Ainda segundo Fustel deCoulange,ahabilidadedohistoriadorconsisteemretirardos documentosoqueconvmenadaaacrescentar...Aleiturados documentosdenadaserviriasefossefeitacomidiaspr-concebidas (Fustel de Coulanges apud LEGOFF, 1992, p. 96).Opapeldohistoriadorsegundoestaescola,buscareescrever aquilo que realmente aconteceu (Leopold von Ranke apud FINLEY, 1994, p. 64). As fontes documentais so caracterizadas por serem documentos escritos que retratam os fatos histricos e so sinnimos de Histria. Cabe aohistoriador,comocientista,extrairahistriacondensada,escondida, nestes documentos. O discurso histrico resultante de erudio cientfica poistodohistoriador,principalmenteodaAntiguidade,deveterum conhecimentoaprofundadodalinguagemutilizadanosdocumentos, principalmenteolatimeogrego.Esteconhecimentoeruditoefilolgico permite a execuo de uma slida crtica interna que resulta na escrita da Histria-Verdade.A maioria dos documentos utilizados por estes historiadores foram osclssicosliterriosamplamenteconhecidos eusadosnaeducaoda elite europia do sculo XIX. A arqueologia no considerada como fonte histrica,masapenasumsubsdioparailustrarecomprovaroqueos documentos textuais relatam. Alguns dos historiadores que se destacaram nesta corrente e que soconsideradosclssicosparaoestudodoperodosoTheodor Mommsen,queescreveuHistriadeRoma,ojcitadoFustelde Coulanges, que escreveu A Cidade Antiga e Edward Gibbon, que escreveu o clssico A Histria do Declnio e Queda do Imprio Romano. Segundo Peter Burke, este ltimo historiador faz parte de um grupo inovador das abordagens positivistas: Alguns deles dedicaram-se reconstruo de comportamentos e valores do passado, especialmente histria do sistema de valoresconhecidocomocavalaria;outroshistriadaarte, daliteraturaedamsica.Porvoltadofinaldosculo,esse grupo internacional de estudiosos havia produzido um conjunto de obras extremamente importante. Alguns historiadores, como Edward Gibbon em seu Declnio e Queda do Imprio Romano, integraram narrativa dos acontecimentos polticos esse novo tipo de histria sociocultural (1992, p. 12). O Sculo XX e os novos caminhos da Histria de Roma Em relao s correntes historiogrficas predominantes no Sculo XX, sero tratadas as duas tendncias mais significativas: o Materialismo Histrico e a decorrente dos Annales. Neste tpico, estas correntes sero analisadasquantosconcepesdeHistria,defonteseasuafuno social.Nestemomento,nohointuitodeaprofundamentodestas tendncias. Materialismo Histrico OMaterialismoHistricodecorrentedasteoriasdeKarlMarx, filsofo do sculo XIX, e de Friedrich Engels, seu contemporneo. Nesta teoria, a concepo de homem est diretamente vinculada ao conjunto das suasrelaessociais.Destaforma,todoconhecimentoresultantedas prticassociaisdosujeitoemseucontexto.Oshomenssoprodutores, agentes de sua prpria Histria, limitados pelas condies estabelecidas e transmitidas pelas geraes anteriores.AHistria,naconcepodoMaterialismoHistrico,produtoda atividadedohomematravsdasrelaesdohomemcomanaturezae entreosprprioshomens.Estasrelaes,oMaterialismoHistrico denominademododeproduo.Estarelaodeinterdependnciase baseiaestestabelecidaentreabasereal,ouexistnciasocial,ou estruturadasociedade,eaconscinciahumanadossujeitos,ouas formas ideolgicas, ou superestrutura. MarxdesenvolveuumaconcepodaHistria,relacionandoo modo pelo qual a produo material de uma sociedade organizada. Este modo de produo determina a organizao poltica e das representaes intelectuaisdeumadeterminadapoca.Destaforma,adistribuiode classesougrupossociaisnopodeserseparadadasrelaesde produoexistenteentreestesgrupos.Oespaosocialdosindivduos, portanto, composto por um complexo de sentimentos e imagens, assim comosuasreaesrepresentamumsimbolismoespacialqueenvolveo indivduo e o grupo ao qual ele pertence. Em sntese, cada classe social tem as suas formas de agir, pensar e reagir na sociedade de acordo com as suas relaes de produo.Portanto,paraoMaterialismoHistrico,osinteressesdeclasses influenciamaproduodeconhecimentodoshomens.AHistria resultantedestacontradioentreasforasprodutivaseasrelaesde produo. Esta relao , para os seguidores de Marx, o motor da Histria. AliadassteoriasdoMaterialismoHistrico,aspropostasda Hermenuticacontemporneatambmpassamaseressenciaisparaa construodoconhecimentohistrico.Nestaperspectiva,nosedeve confundiropassado(acontecimentosoufatosintangveis)comorelato dopassado(representaoounarrativadofatoouacontecimento) (FUNARI, 1985, p. 4).Diferentedaspropostaspositivistas,osujeitoprodutorde conhecimentonoseeximedasinflunciassociaisnoprocessode interpretao dos documentos histricos. Todo conhecimento produzido decorrente de suas formas de agir, pensar e reagir na sociedade de acordo com as suas relaes de produo, ou seja, o seu papel social.Para esta tendncia, o historiador deve ser o principal crtico social dopresente.elequefazaHistria.EstaHistriadevelevarao desenvolvimento crtico sobre o Homem como agente transformador. Para tanto, necessrio que se analise historicamente os modos de produo, osconflitosentreasclassessociaiseosinteressesdegrupo historicamenteconstitudos.AHistriadeRomafoiamplamenteutilizada porestatendncia.Principalmentenoquedizrespeitosrelaes escravistas, os movimentos sociais e as prticas imperialistas. Estes dois aspectos, no Materialismo Histrico, foram fundamentais para o estudo de Roma. Alguns historiadores so fundamentais para entender a Histria de Roma sob esta perspectiva. O russo Mikhail Ivanovich Rostovtzeff (1870-1952),queescreveuHistriaSocialeEconmicadoImprioRomanoe HistriadeRoma,entre outros, uma das grandes referncias clssicas para se estudar a Sociedade Romana. Suas obras trazem uma riqueza de citaes das fontes textuais e apresentam uma grande inovao quanto utilizaodasfontesarqueolgicasnaconstruodeseudiscurso histrico.H tambm o ingls Perry Anderson (1938) que escreveu a clssica obraPassagensdaAntiguidadeaoFeudalismo.Estaobraanalisaa transiodoescravismoromanoparaofeudalismomedievalediscutea tese sobre a crise escravista como origem da crise da Sociedade Romana. OutrohistoriadorqueescreveusobreRomanaperspectivado MaterialismoHistrico ohngaroGzaAlfldy.Suaobradereferncia para o estudo da Sociedade Romana Histria Social de Roma. Esta obra apresentaumaanlisedasmudanassociaisromanaaolongodeum milnio,daRepblicaaoImprioRomano,apartirdosseusaspectos econmicos e sociais. Muitosoutrosautorespoderiamsercitadosvinculadosaesta correntehistoriogrfica.Noentanto,anfimanomeaodosautores citados acima pode representar uma viso das formas que Roma assume no Materialismo Histrico. O que vale ressaltar quanto s concepes fontes nesta tendncia aampliaodousodefontesliterriaseoaumentodasfontes arqueolgicas. As formas de abordagem destas fontes, no entanto, sempre sonasperspectivaseconmicasesociaiscomonosexemploscitados anteriormente. Dos Annales Histria Cultural Estacorrenteestbaseadanatrajetriadeumarevistafrancesa quesofreualgumasalteraesemsuadenominaodesde1929.De "Annalesd'HistoireconomiqueetSociale",comofoifundadaem1929, passou a ser denominada "Annales d'Histoire Sociale" em 1939, e depois"Annales.conomies,Socits,Civilisations"em1946.Finalmente recebeuottulo"Annales.Histoire,SciencesSociales"em1994e permaneceassimatosnossosdias.Estacorrentepassouaser denominada, a partir de 1979, como Nouvelle Histoire, ou Histria Nova.Decorrentedasmudanasocorridasapartirdadcadade80,a diversidade terico-metodolgica adotada levarou corrente historiogrfica conhecidacomoHistriaCultural.Assimcomonascorrentesanteriores, no sero aprofundados os fundamentos tericos desta corrente. At por que, diferentemente das tendncias anteriores, esta corrente contm uma diversidadetericaabrangentequesecaracterizapela interdisciplinaridade. No que diz respeito Histria de Roma, poucos estudos podem ser destacados da dcada de 30 at a dcada de 70 vinculados aos Annales. No entanto, alguns dos historiadores das duas primeiras fases da revista fazemrefernciasemseusestudossobreasformasdeabordagens utilizadas por historiadores da Antiguidade mas no as estuda diretamente. UmdosmaisimportantesFernandBraudel,queemsuaobraO Mediterrneo se vale de recursos adotados por Edward Gibbon, segundo Burke: Mesmoassim,elessocarregadospelacorrente.Numade suasmaisfamosasanlises,Braudelexaminaoimpriode Felipe II como uma colossal empresa de transporte terrestre e martima,queseexauriuporsuaprpriadimenso,eno poderiaserdiferentenumapocaemquecruzaro Mediterrneodenorteasullevavaumaouduassemanas, enquantoatravess-lodelesteaoestedoisoutrsmeses (Ibid.,p.363).AobservaolembraoveredictodeGibbon sobreoImprioRomanodestrudopeloseuprpriopesoe suas afirmativas sobre geografia e comunicaes, no primeiro captulo do Declnio e Queda. (1992, p. 34) Portanto, at a dcada de 70, poucos historiadores vinculados aos Annales tm como objeto de estudo a Sociedade Romana. Um dos mais representativos, Paul Veyne (1930), escreve Opoeocirco (1976). Esta obra aborda as prticas evergticas romanas e tem como objeto de estudo asprticassociaisromanas.Nestaobra,oautortambmsevaledas influncias sociolgicas de Max Weber e usa a idia dos tipos ideais para fundamentarasuaanlisedaSociedadeRomana.TambmescreveuA SociedadeRomana(1991) em que o foco de abordagem so a estrutura social,aeconomia,odireitoeamentalidadedosromanos.Almde participar da coleo organizada por Phillipe Aris e George Duby, Histria da Vida Privada, no primeiro volume intitulado Do Imprio Romano ao Ano Mil. Esta coleo assume muitas das caractersticas da chamada terceira gerao da Escola dos Annales que aborda, entre outras temticas, a vida cotidiana e privada da sociedade estudada, deixando de lado os aspectos polticos, econmicos e factuais presentes nas abordagens das tendncias anteriores.As fontes utilizadas por Veyne so as literrias e as arqueolgicas, equiparando-as em importncia para a escrita da Histria de Roma. AsconcepesdefontesedeHistriapresentesnestas abordagens sobre a Sociedade Romana seguem o que apresenta J acques Le Goff: Ahistriafaz-secomdocumentosescritos,semdvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos escritos, quando no existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar o seu mel, na falta das flores habituais. (...) Numa palavra, com tudo oque,pertencendoaohomem,dependedohomem,serveo homem,exprimeohomem,demonstraapresena,a actividade, os gostos e as maneiras de ser do homem. (1992, p. 89) Apartirdestasnovascaractersticashistoriogrficas,aquicitadas demaneiranfimaemeramenteexemplar,percebe-seoalargamentodo universodetemasedasabordagenssobreaSociedadeRomananas ltimasdcadasdosculoXX.Estaabrangnciatemcadavezmais demonstrado a necessidade de se revisitar as fontes sobre a Histria de Romaedesefazernovosquestionamentossobasluzesdasteorias antropolgicas,sociolgicas,lingsticas,arqueolgicasemuitasoutras. As possibilidades variadas das tipologias das fontes histricas demonstram aspotencialidadesdenovasabordagensedenovasproblematizaes sobre a Roma Antiga. Estaspossibilidadesterico-metodolgicasdecorrentesdas mudanas historiogrficas recentes demonstram que o leitor-historiador da SociedadeRomanadeveserincentivadoatratartantodeassuntos comuns como de questes pouco usuais, a confrontar opinies divergentes sobreomesmodocumentoeformarsuaprpriainterpretao.Nose devereforarosmodeloseosparadigmasvigentes,masencorajara proliferaocrticadeinterpretaes.Asrazesdaexplicaohistrica encontram-se,sempre,nopresente,nassociedadeseculturasde determinados perodos, nas quais se insere o historiador. Portanto, assim comotodooconhecimentohistrico,aHistriadeRomaestparaser revista,revisitada,repensada,reescritasnovasluzesdasteoriase metodologias historiogrficas da Histria Cultural. Possibilidades para a Histria de Roma Tendoapresentadobrevementeosproblemasquantos concepesdefonteseascorrenteshistoriogrficasdosculoXIXao SculoXXI,valeressaltaranecessidadedelocalizaraspossibilidades documentais para se estudar a Histria da Sociedade Romana. Para tanto, utilizar-se-asdivisescronolgicastradicionaisparaapresentaras referencias das fontes para cada perodo da Histria de Roma. No entanto, valeapenaressaltarqueestapropostaficarprejudicada,poisser possvelperceberumadasmaioresdificuldadespresentesnasfontes histricasparaoestudodaAntiguidade:estacarecedecontinuidadee padronizaodesuastipologias.Estascaractersticasdasfontes documentais para o estudo de Roma geram lacunas e problemas para a abordagem de determinadas problematizaes cronolgicas e temticas. O Perodo Arcaico: Monarquia ou Realeza Romana Espacialmenteetemporalmente,adelimitaodeabordagemda MonarquiaouRealezaromana est limitada na regio do Lcio, na pennsulaitlica,noinciodoI milnio a.C. H muitas discusses sobre aslacunasexistentesnoestudo deste perodo da Histria de Roma devidosfragilidadesexistentes emrelaosfonteshistricas utilizadas. Para o positivismo, o estudo polticoefactualdesteperodofoi baseadonosdocumentosescritos produzidospelosromanosaofinaldoperodorepublicanoeinciodo Principado.AtravsdosrelatosdeVerglio,emEneida(19a.C.),eTito Lvio, em Histria de Roma (Ab Urbe Condita libri) (19 a.C.), as origens de Romasofundamentadaspelamemriacoletivarepresentada, principalmente, pelos mitos de origem.MuitodoqueseconheceatravsdaHistriadesteperodofoi influenciadopelavisohistoriogrficadosculoXIX.Noentanto,h grandesavanossobreosestudosdasorigensdeRomaedospovos Regio do Lcio em destaque na Pennsula Itlica Montes em torno de Roma: Campidolio, Quirinal, Viminal, Esquilino, Clio, Aventino e Palatino. visinhoscomaincorporaogradativaefundamentaldosestudos arqueolgicos desenvolvidos a partir do sculo XIX.AsescavaesnosarredoresdeRomaenaprpriacidadede Roma possibilitaram a explorao da documentao arqueolgica sobre as influnciasetruscasnaconstituiodaUrbsedaprpriaSociedade Romana. Os vestgios dos artefatos de metais, de cermicas, das rsticas residncias,dasurnasfunerrias,dostemplosprimitivoseinscries latinas esto proporcionando uma reviso dos estudos sobre as origens de Roma.Estarevisofazcomqueaproduohistoriogrficasobreo perodo monrquico esteja aberta a novas possibilidades e investigaes histricas. Espacialmente,aregioemqueRomasedesenvolveu denominada Septimontium, ou seja, regio entre os sete montes que so aselevaesdo Palatino,do EsquilinoedoClio, juntamentecomo pomoerium(recinto sagrado) sua volta. Aessarea agregou-sea povoaoexistente nosmontesQuirinal e Viminal. Dentro dos limitesdessacidade situavam-seo Frum,oupraado mercado, e o Capitlio, a fortaleza central localizada no monte Capitolino (ou Campidlio). Do Capitolino at as margens do Rio Tibre, se estende o Campo de Marte. Os povos vizinhos que estavam em contato direto com Roma e que influenciaramoseupovoamentoforamosetruscos,mbrios,latinos, sabinos, volscos e samnitas. Tambm h a possibilidade de influncia de povos externos provncia itlica como os gregos, os fencios, os samnitas e os celtas. Asescavaesarqueolgicasnosubsoloromanoeemtodaa regio da Urbs proporcionaram nas ltimas dcadas um grande avano no estudohistricosobreoperodo.Noentanto,muitoaindaestparaser feito. O Perodo da Repblica Romana OperodocorrespondentechamadaRepblicaRomana correspondeporvoltade500anos.umperodocaracterizadopor grandesmudanasnaSociedadeRomana.Asuaconfiguraoterritorial sofre alteraes drsticas e definitivas. A historiografia caracteriza o incio deste perodo com a expulso dos etruscos de Roma.Asinformaeshistricasparaestadeterminao,assimcomoa maioria das informaes do perodo anterior, so baseadas nos relatos de romanosapartirdoIIIsculoa.C.Poucossoosrelatossobrea Repblica,produzidosnomesmoperodo,quesobreviveram.Tambm possvel estudar este perodo atravs da coletnea de inscries latinas do Vsculoa.C.aoVsculod.C.publicadasnoCorpusInscriptionum LatinarumpublicadopelaLoebLibrarydaUniversidadedeHarvard, distribudoemquatrovolumes.Estasinscriessodecorrentesde escavaesarqueolgicas.Asfontesarqueolgicassoasmais abundantes para o estudo dos primeiros sculos da Repblica romana. As Fonte: Museu da Civilizao Romana (Museo della Civilt Romana) Sala XVIII: Maquete da Roma arcaica fontestextuaiseliterriasparaoestudodaRepblicadevemser analisadas tendo como marco divisor as Guerras Pnicas, guerra entre os romanos e os cartagineses. Dentre as fontes histricas textuais que so utilizadas para o estudo da Repblica romana, sero apresentadas algumas possibilidades. OhistoriadorgregoPolbio(210a.C.130a.C.),dacidadedeMegalpolisnaArcdia,escreveuaobraHistriadoMediterrneoque aborda o perodo de 264-146 a. C. Polbio viveu na Repblica Romana e foipreceptordeCipioAfricano,generalromanoqueliderouaTerceira Guerra Pnica que datada de171 a 168 a.C. Esta obra foi escrita com informaes que Polbio coletou nos arquivos pblicos romanos etambm baseadonatradioromana.Oseuprincipalobjetivoeraexplicaraos gregos as razes da ascenso de Roma (HARTOG, 2001, p. 113-115). A metodologiadeescritadePolbiosefundamentanatradiogregade valorizar o testemunho contemporneo e a Histria recente. Polbio narra osacontecimentosdasuageraoeosacontecimentosdagerao imediatamenteanterior.SuaconcepodeHistriadeumaseqncia lgica de causas e efeitos. A sua obra se fundamenta na anlise crtica das fontesexistentesedatradioromana,descrevendocomos acontecimentos e as motivaes e valores que os motivam. Seu objetivo a constituio de uma viso global dos acontecimentos e no uma simples cronologia de fatos. Esta obra uma das principais fontes para se estudar osegundosculoa.C.eoscaminhosdeRomanoperododasGuerras Pnicas. Seoshistoriadoresqueregistraramasaesantesdens negligenciaramoelogiodaprpriahistria,talvezseja necessrio exortar todos escolha e aceitao das memrias, pornohavernenhumaoportunidadedemelhoramentomais acessvelaoshomensqueacincias das aesdopassado. (Polbio, 3.1) Outro historiador que escreve sobre o final da Repblica Salstio (86-35a.C.)narraosacontecimentospolticosfinaisdoltimoperodo republicanodeRoma.Salstioconsideradoointrodutordahistria filosficanahistoriografialatina.SuasobrasmaisconhecidassoA ConspiraodeCatilina,escritaem43-42a.C.,AGuerradeJugurta, escrita de 41-40 a.C. e Histria (39 a.C.), que so narrativas histricas de fatos acontecidos em Roma (78-67 a.C.). Marco Tlio Ccero (106 43 a.C.) umadasprincipaisrefernciasparao estudodofinaldaRepblica.Suasobras discorrem sobre vrios temas e so fontes histricas fundamentais para muitos temas deestudosobreaSociedadeRomana. Cceroescreveusobrevriosassuntose muitasdesuasobraspermaneceram. Dentre os temas que foram abordados por Ccero esto as leis, a poltica, a oratria, areligio,afilosofiaemuitosoutros.Algumasdesuasobrasmais importantessoDaRepblica,DasLeis,Sobreaadivinhao,Sobrea naturezadosDeuses,SobreaOratria,SobreaAmizade,Sobrea Velhice,Cartasatico,CartasaBruto,CartasaQuinto,Cartasaos familiares, Sobre os ofcios e Sobre a oratria. UmadasfontesmaissignificativasparaoestudodaHistriade Roma desde a fundao da cidade at os fins da Repblica a obra de TitoLvio(59a.C17d.C.).HistriadeRoma(AbUrbeConditalibri) uma referncia para o estudo desde a fundao da cidade em 753 a.C. at o incio do I sculo d. C. A obra original com 142 livros no foi preservada. O que chegou at os tempos atuais foram 35 livros, apenas uma pequena parte do que teria sido a grandiosa obra de Lvio. Alguns autores discutem sobre a natureza da obra e seu objetivo. No entanto, no h dvidas sobre as possibilidades de estudo da obra tanto para analisar o momento em que foi produzida a Histria de Roma assim como os costumes e as tradies da Sociedade Romana.Tambm se deve ressaltar as contribuies de J lio Csar com seu relato sobre a Guerra Glica (50 a.C.) e a Guerra Civil (? 45 a.C.). Relatos muitoimportantesparaoestudossobreasprticaspolticasemilitares, alm de proporcionar uma anlise sobre a estrutura social romana. Almdestas,tambmpodemserindicadasasfontesliterriasde vrias naturezas produzidas no final da Repblica. As comdias de Plauto Busto de Marco Tlio Ccero (Fonte: Museu Capitolino)(230-280a.C.)edeTerncio(185-159a.C.);aspoesiasdeQuintonio (239-169a.C.),deLucrcio(99-55a.C.),deCatulo(84-54a.C.),de Horcio (65-8 a.C.) e de Ovdio (43-17 a.C.). Cada uma destas fontes pode proporcionar o estudo dos costumes e das formas de pensar da Sociedade Romana.Valeressaltarqueasfontestextuaiseliterriassomais abundantesnasegundametadedaRepblicaRomanadevidos mudanasdasprticaspoltico-administrativasassumidaspelosromanos apsaGuerradoPeloponeso.Anecessidadedemanutenodas informaesdeinstituiespolticascomooSenadogeraoprocessode registrodasatividadesadministrativasanuais.Umadasprincipaisfontes utilizadasporaquelesquesepreocupamemescreverasmemrias coletivas dos romanos so as atas senatoriais. Tambm as leis passam a ser escritas e registradas pelo ao Senado, os conhecidos senatusconsulta. AsinscrieseosregistrosnoSenadotambmoferecempossibilidades de estudos temticos sobre a Sociedade Romana. As fontes literrias passam a ser copiadas e difundidas por toda a extensoterritorialqueseampliasignificativamentenosltimostrs sculosdaRepblica.AsinflunciasgregasapartirdoSculoIIIa.C. tambm podem ser consideradas como fator que determina as mudanas emrelaosprticasliterriasedifusoartsticaentreosromanos, principalmente no que tange ao teatro, poesia e filosofia. Esta mesma expansopoltico-territorialproduziuumaculturamaterialmais diversificada o que leva a uma abundncia de possibilidades nos estudos dasfontesarqueolgicasemsuasvriastipologias.Umdiferencial significativo o incio da cunhagem das moedas que passam a circular por todoterritriodedomnioromano.Anumismtica,cincia queestudaos processosdecunhagemdemoedasesuadistribuio,umadas possibilidades para a anlise da Sociedade Romana na Repblica. Imprio Romano Para Pierre Grimal (1999), este perodo inicia-se com a organizao do imperium romano sobre o Mar Mediterrneo. O significado para palavra imperiumassumeasrelaesdepoderpoltico-econmico-militarque Romapassaarepresentarapartirdoseuprocessodeexpansoque inicia-se na pennsula itlica e atinge o todo o Mar Mediterrneo, o mare nostrum para os romanos. Guarinello sintetiza este processo de forma exemplar: A criao do Imprio Romano foi um processo de alianas de cidades da Itlia, capitaneado pela mais forte, sobre um mundo urbanoenfraquecidoporseusconflitosinternose externos.A expansoimperialistateve,portanto,razesestruturais derivadas dos conflitos internos das cidades e do fato de que asmaiorespodiamresolverosseusprpriosconflitos, expandindo-se sobre as menores. Mas, se seu fundamento foi poltico e militar, a expanso produziu efeitos drsticos sobre o prprio conquistador. (2006, p. 15) Desta forma, a ampliao da cultura material e imaterial produzida a partir deste processo de expanso gera uma maior abrangncia temtica ehistoriogrfica.Onmerodedocumentosproduzidos,eque permaneceram,referentesaoImprioRomanodesproporcionalaos perodosanteriores.Sovriososfatoresquedeterminamesta preservao:aampladifusoliterria,anecessidadederegistros administrativos,aproduodeculturamaterialqueatendaasnovas atividadeseconmicas,oaumentopopulacionalemgrandescentros,a diversidade de culturas unidas pelas prticas imperialistas, as mudanas e osavanosmilitares,asvariaeseinovaesdasatividadesculturais, religiosas e sociais e muitos outros elementos. Portanto, devido grande diversidadedefonteshistoriogrficasdecorrentesdaculturamateriale imaterialcomaexpansodoImprioRomano,aamplitudede possibilidadesdefontesparaoestudodaSociedadeRomana significativa. Esta a justificativa para que se possa entender a razo da grandeproduohistoriogrficasobreoperodoimperialromano.Outro diferencial gerado pelas mudanas a ampliao dos locais de produo das fontes. As provncias romanas passam a ser produtoras de culturas e estas tambm so analisadas para o estudo da Sociedade Romana. A produo do conhecimento histrico sobre o final da Repblica e os sculos iniciais de nossa resultado do grande nmero de documentos textuaiseliterriosamplamenteconhecidoselidosdesdeoperodo medieval. O conhecimento histrico produzido a partir do sculo XIX sobre Romafoi,emgrandeparte,resultantedaanlisedestadocumentao textual e literria e se tornou determinante para o que se conhece sobre a SociedadeRomanaatomomento.Asgrandesrefernciasclssicas sobreomundoromanotmcomoprincipalobjetodeanlise,emsua maioria, o perodo em questo. A historiografia tem denominado o perodo correspondente aos dois primeirossculosdoImprioRomanocomoAltoImprioouPrincipado Romano. As possibilidades de fontes neste perodo so abundantes. Cada vez mais se tm explorado as potencialidades arqueolgicas advindas dos processosdeescavaesiniciadosnosculoXIX.Aanlisedacultura materialeimaterialresultantedosprocessosdeescavaestem produzidosvisesinovadorassobreaSociedadeRomana.Umdos grandesexemplosdestaexploraosoascidadesdePompiae HerculanosoterradaspelaerupodoVesvionoanode79d.C.As escavaes em Pompia e Herculano propiciaram um grande avano dos estudossobreavidasocialromana.Ostemasligadosaocotidiano, religiosidade, sexualidade, s relaes familiares, a alimentao e muitos outrostiveramumaavanosignificativocomaexploraodesta documentao. Emrelaosfontesliterrias,ariquezadevariedadese possibilidades de explorao extendida. O I sculo d.C. apresenta uma diversidade de fontes aqui apenas exemplificada.Em relao escrita da Histria de Roma e suas tradies, podem ser citados dois nomes significativos: Veleio Patrculo (19 a.C. 31 d.C.), queescreveuHistriaRomanaeTcito(55120d.C.),queescreveu Anais e Histria. Este ltimo autor, Tcito, foi muito mais referenciado que o primeiro. Suas obras apresentam um relato dos Imperadores Augusto a Domiciano. ApoesiapodeserrepresentadaporLucano(39-65d.C.),poeta pico,J uvenal(60140d.C.),poetastiro,eMarcial(38102d.C.), epigramtico.Suasobraspodemserfontesdeinformaessobreas prticas sociais romanas. Emrelaoproduoliterriaemprosa,humavariedadede estilo e de temas. Columela (10 70 d.C.) escreveu DeReRustica, obra sobreasprticasagrcolasromanas.PlniooVelho(2379d.C.), enciclopedista, escreveu HistriaNatural, uma coletnea de verbetes que retratam o conhecimento da natureza. Quintiliano (30 95 d.C.), orador e retrico,escreveuaobraInstitutioOratoria(95d.C.).ValrioMximo escreveuFatoseDitosMemorveis(31d.C.).PlniooJ ovem(61114 d.C.), advogado e cnsul, escreveu Cartas e PanegricodeTrajano (100 d.C.). Sneca (4 a. C. 65 d. C.), filsofo estico, escreveu vrias obras como Questes naturais, os tratados Sobre a tranqilidade da alma, Sobre abrevidadedavidae,talvezsuaobramaisprofunda,asCartasMorais dirigidasaLuclio.Petrnio(2766d.C.),queescreveuSatyricon,e Apuleio(125180d.C.),queescreveuMetamorfose,soexemplosde romancistasquesatirizamaSociedadeRomanadesua poca.Suetnio (69 141 d.C.), bigrafo dos imperadores do I sculo, escreveu A Vida dos Doze Csares, obra de referncia para estudos sobre as prticas polticas romanas e a vida social. NoIIIsculod.C.,inicia-seumamudananaliteraturalatina, substituindo-sealiteraturagreco-latinapelaliteraturaromanocrist. Esta fase se d com o Decreto de tolerncia do Cristianismo, no ano de 260, que permite aos cristos manifestar publicamente sua doutrina moral ereligiosa.Destacam-seTertuliano,MincioFlix,Cipriano,Arnbioe Lactncio, alm dos Padres da Igreja: Santo Ambrsio, So J ernimo e Santo Agostinho. Todasasfontescitadasnestecaptuloforamapenaselencadas para mostrar a riqueza de possibilidades com que o historiador se depara ao se propor a estudar a Sociedade Romana. Vale ressaltar que um dos maioresproblemasrelacionadossfontessobreaAntiguidade,e conseqentementeHistriadeRoma,aimpossibilidadedeseobter anlisesseriais.Asfontesdisponveismuitasvezesseapresentam fragmentadaseincompletas,oquefazcomqueohistoriadorbusque teorias e metodologias que possibilitem o estudo destas caractersticas no intuito de desvelar a Sociedade Romana. Enfim, a Histria de Roma ainda est para ser escrita a partir das possibilidades do presente. Referncias bibliogrficas BOURD,GuyeMARTIN,Herv. AsEscolasHistricas.Lisboa:Editora Europa-Amrica, 2000. BURKE,Peter.AEscoladosAnnales:aRevoluoFrancesada Historiografia(1929-1989).2.Ed..Trad.NiloOdlia.SoPaulo,Editora UNESP, 1992. COULANGES, Fustel de. "Histoire des institutions politiques de lancienne France",inEHRARD,J .&PALMADE,G.P.LHistoire.2.Ed.,A.Colin, 1965. DONFRIO, Salvatore. Literatura Latina. In: Literatura Ocidental Autores e Obras Fundamentais. So Paulo. tica, 2004. FINLEY, Moses I. Histria Antiga: testemunhosemodelos. Trad. Valter L. Siqueira. So Paulo, Martins Fontes, 1994. FUNARI,PedroPauloAbreu.Arqueologia.SoPaulo,tica,1988. (Princpios, 145). _________________________.Anlisedocumentaleoestudoda Antiguidade Clssica. Campinas, UNICAMP, 1995. Primeira Verso, 58. _________________________.Letrasecoisas:ensaiossobreacultura romana. Campinas, Editora da UNICAMP, 2002. GRIMAL, Pierre. O Imprio Romano. Lisboa, Edies 70, 1993. GUARINELLO,Norberto.OImprioRomanoeNs.In:SILVA,Gilvan Venturada&MENDES,NormaMusco.RepensandooImprioRomano. Vitria/ES, EDUFES, 2006. pp. 13 -20. HARTOG,Franois(org.).AHistriadeHomeroaSantoAgostinho. Traduo de J acyntho Lins Brando. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. LEGOFF,J acques.HistriaeMemria.2.Ed.Trad.IreneFerreira.Campinas, Editora da Unicamp, 1992. Sugestes de leituras Sobre os artefatos arqueolgicos, interessante visitar os seguintes sites: Museu Palatino de Roma: http://archeoroma.beniculturali.it/museo_palatino/index.htm Museu da Civilizao Romana:http://www.museociviltaromana.it/ Museu Capitolino:http://www.museicapitolini.org/ Museu do Mercado de Trajano e Fruns Imperiais:http://www.mercatiditraiano.it/ Reconstituies virtuais de algumas runas romanas:http://www.capitolium.org/eng/virtuale/virtuale.htm Mapas sobre Roma Antiga:http://www.ucm.es/info/antigua/Cartografia/roma1.htm Livrosquepoderoserusadosparaaprofundamentosspbreos temas indicados neste captulo: BEARD,MaryeHENDERSON,J ohn.AntigidadeClssica.Uma brevssima introduo. trad. Marcus Penchel. Rio de J aneiro, J orge Zahar, 1998. BOURD,GuyeMARTIN,Herv. AsEscolasHistricas.Lisboa:Editora Europa-Amrica, 2000. BURKE,Peter.AEscoladosAnnales:aRevoluoFrancesada Historiografia(1929-1989).2.Ed..Trad.NiloOdlia.SoPaulo,Editora UNESP, 1992. FINLEY, Moses I. Histria Antiga: testemunhos e modelos. Trad. Valter L. Siqueira. So Paulo, Martins Fontes, 1994. Atividades propostas AfraseAHistriamestredavida,deCcero,foiutilizada frequentementenodecorrerdostempos.Reflita,apartirdaleitura realizadadestecaptulo,sobreaconcepodeHistriaeassuafuno social. Algumas datas essenciais Monarquia (753 a 509 a.C.) 753Fundao de Roma, Primeiras cabanas no Monte Palatino 600 A rea do Frum drenada, Primeiras inscries latinas 616-579 Tarqunio Prisco 579-543 Srvio Tlio 543-509 Tarqunio Soberbo, Construo do Templo Capitolino Repblica (509 a.C. a 27 a.C.) 509 Expulso dos Reis Etruscos 494 Disputa entre plebeus e patrcios pelos direitos, Construo de novos templos 450 Primeira lei: as Doze Tbuas 390 Roma saqueada pelos Gauleses 378 Construo dos muros da cidade, Romanizao da Itlia 338 Ampliao da cidadania Romana 312 Construo da Via Apia 287 Trmino da disputa com os patrcios 280 Comea a cunhagem de moedas 272 Roma assume o controle de toda a Itlia 264-241 Primeira Guerra Pnica (contra Cartago): Roma conquista a Siclia, Primeiras lutas de gladiadores 218-201 Segunda Guerra Pnica: Anbal derrotado: 206 A Espanha dividida em duas provncias Romanas 214-167 Guerras Macednicas, Helenizao da Sociedade Romana; Comdias de Plauto e Terencio; Poesias de Enio197-133 Guerras na Espanha149-146 Terceira Guerra Pnica: Cartago destruda, A frica torna-se uma provncia Romana 148 A Macednia torna-se uma provncia romana 133 A sia convertida numa provncia romana; estatutos da terra de Tibrio Graco 123-122 Leis de Caio Graco 113-101 Guerra contra a Cmbria 107-86 Sete Consulados de Mrio;104 Reformas do exrcito 91-87 Guerra Social; a cidadania romana estendida a toda a Itlia 88-85 Primeira Guerra Mitridtica 82-81 Ditadura de Sula: proscries, reformas; surgimento de Pompia 73-71 Revolta de Esprtaco 73-63 Terceira Guerra Mitridtica 63 Consulado de Ccero; Conspirao de Catilina 60 'Primeiro Triunvirato' (Pompeu, Csar, Crasso) 58-50 Csar conquista a Glia;55 54 Expedies a Bretanha, Discursos, Tratados e Cartas de Ccero; Poesias de Catulo e Lucrcio; Histrias de Csar;55 Teatro de Pompia 49-45 Csar ganha a Guerra Civil contra Pompeu e os Republicanos 46 Frum de Csar 44 Assassinato de Csar 43 Segundo Triunvirato (Antnio, Otvio, Lpido); proscries, assassinato de Ccero 39 Histrias de Salstio,clogas de Virglio 32-31 Otvio ganha a Guerra Civil contra Marco Antnio;31 Fim da Guerra do cio 30 Morte de Marco Antnio 29 Gergicas de Virglio O Imprio (27 a.C. a 476 d.C.) 27 Otvio torna-se o primeiro imperador Augustus, Panteo de Agripa 19 Eneida de Virglio, Poesias de Horcio, Tibullus, Propertius, Ovdio; Histrias de Tito Lvio 16 a.C. -6 d.C. Conquista das provncias do Danbio 13 Teatro de Marcelo 9 Ara Pacis Augustae 2 Frum de Augusto 1 d.C. Nascimento de Cristo 9 Derrota de Varo 14 Morte de Augusto, Res Gestae de Augusto 14-37 Tibrio, Vida e Morte de Cristo 37-41 Calgula 41-54 Cludio 43 Conquista da Bretanha 54-68 Nero , Tratados e Tragdias de Sneca; Poesias de Persius e Lucano; Satyricon de Petrnio 60-61 Revolta de Boadiceia 64 Incndio de Roma; primeiras perseguies aos Cristos 66-70 Revolta dos J udeus 68-69 Galba, Oto, Vitellius 69-79 Vespasiano, Histrias e Tratados de Plnio o Velho 79 Erupo do Vesvio (Soterramento de Herculano e Pompia) 80 Coliseu 79-81 Tito 81-96 Domiciano, Epigramas de Marcial, Retrica de Quintiliano 96-98 Nerva, Histrias de Tacito, Cartas de Plnio o J ovem, Stiras de J uvenal 98-117 Trajano 107 Conquista da Dcia 112 Frum de Trajano 117-138 Adriano 122 Biografias de Suetnio 138-161 Antonino Pio 142 Muralhas de Adriano, Muralhas Antoninas, Novelas e Oratria de Apuleio; as Leis de Caio 161-180 Marco Aurlio180-192 Cmodo 193-235 Dinastia Severiana 212 Caracala estende a cidadania romana a todos os habitantes livres do imprio 216 Banhos de Caracala 260 Decreto de Tolerncia do Cristianismo 271 Muralha de Aureliano 272 A Dcia cedida aos Gdos 284-305 Diocleciano 293 Estabelecimento da Tetrarquia 307-337 Constantino I 312 Derrota de Maxentio na Ponte Milvio 315 Arco de Constantino 324 Fundao de Constantinopla 410 A Bretanha se defende sozinha 455 Os Vndalos saqueiam Roma 476 Queda do Imprio Romano do Ocidente Glossrio Emprico baseado em experincias. Erudio instruo vasta e variada adquirida com a leitura. Filologia cincia que estuda a lngua e suas modificaes. Informaes sobre a autora DocentedeHistriaAntigadaUniversidadeEstadualPaulistaJ liode MesquitaFilho-UNESP,campusdeAssis,desdeoanode2002. graduadaecursoumestradoedoutoradonamesmainstituioemque leciona. Sua dissertao de Mestrado foi Poder e Mito: o Pincipado sob a perspectivaliteraturalatina(umaleituradeSuetnio,TcitoePlnioo J ovem) defendida em 1996. Sua tese de Doutorado foi intitulada Princeps e Basileus nos Discursos de Dion Crisstomo defendida em 2001 sob a orientaodoDr.IvanEsperanaRocha.LecionanoEnsinoSuperior desde1995eatualmentedesenvolveoprojetodeps-doutoradocomo ttuloOPensamentoMticoeFilosficoemDionCrisstomojunto UniversidadeEstadualdeCampinasUNICAMPsobasupervisodo Prof. Dr. Pedro Paulo Abreu Funari.