capitulo 2 joelho

85
74 FISIOLOGIA ARTICULAR o joelho é a articulação intermédia do mem- bro inferior. É, principalmente, uma articulação com só um grau de liberdade - a ftexão-exten- são -, que lhe pennite aproximar ou afastar, mais ou menos, a extremidade do membro à sua raiz, ou seja, regular a distância do corpo com re- lação ao chão. O joelho trabalha, essencialmente, em compressão, pela ação da gravidade. De forma acessória, a articulação do joelho possui um segundo grau de liberdade: a rota- ção sobre o eixo longitudinal da perna, que aparece quando o joelho está jlexionado. Do ponto de vista mecânico, a articulação do joelho é um caso surpreendente, visto que de- ve conciliar dois imperativos contraditórios: - possuir uma grande estabilidade em ex- tensão máxima. Nesta posição o joelho faz esforços importantes devido ao peso do corpo e ao comprimento dos braços de alavanca; - adquirir uma grande mobilidade a partir de certo ângulo de ftexão. Esta mobili- dade é necessária na corrida e para a orientação ótima do pé com relação às irregularidades do chão. O joelho resolve estas contradições graças a dispositivos mecânicos extremamente sofisti- cados; porém, como suas superfícies possuem um encaixe frouxo, condição necessária para uma boa mobilidade, ele está sujeito a entorses e luxações. Quando está em ftexão, posição de instabi- lidade, o joelho está sujeito ao máximo a lesões ligamentares e dos meniscos. Em extensão é mais vulnerável a fraturas articulares e a rupturas ligamentares.

Upload: raphaelmarie

Post on 02-Jul-2015

1.932 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

Page 1: Capitulo 2 Joelho

74 FISIOLOGIA ARTICULAR

ojoelho é a articulação intermédia do mem­bro inferior. É, principalmente, uma articulaçãocom só um grau de liberdade - a ftexão-exten­são -, que lhe pennite aproximar ou afastar,mais ou menos, a extremidade do membro à suaraiz, ou seja, regular a distância do corpo com re­lação ao chão. O joelho trabalha, essencialmente,em compressão, pela ação da gravidade.

De forma acessória, a articulação do joelhopossui um segundo grau de liberdade: a rota­ção sobre o eixo longitudinal da perna, que sóaparece quando o joelho está jlexionado.

Do ponto de vista mecânico, a articulaçãodo joelho é um caso surpreendente, visto que de­ve conciliar dois imperativos contraditórios:

- possuir uma grande estabilidade em ex­tensão máxima. Nesta posição o joelhofaz esforços importantes devido ao peso

do corpo e ao comprimento dos braçosde alavanca;

- adquirir uma grande mobilidade a partirde certo ângulo de ftexão. Esta mobili­dade é necessária na corrida e para aorientação ótima do pé com relação àsirregularidades do chão.

O joelho resolve estas contradições graçasa dispositivos mecânicos extremamente sofisti­cados; porém, como suas superfícies possuemum encaixe frouxo, condição necessária parauma boa mobilidade, ele está sujeito a entorsese luxações.

Quando está em ftexão, posição de instabi­lidade, o joelho está sujeito ao máximo a lesõesligamentares e dos meniscos.

Em extensão é mais vulnerável a fraturasarticulares e a rupturas ligamentares.

Page 2: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 75

Page 3: Capitulo 2 Joelho

76 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS EIXOS DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO

o primeiro grau de liberdade está condi­cionado pelo eixo transversal XX' (fig. 2-1, vis­ta interna e 2-2, vista externa do joelho semifie­xionado), ao redor do qual se realizam os movi­mentos de fiexão-extensão no plano sagital. Es­te eixo XX', contido num plano frontal, atraves­sa horizontalmente os côndilos femorais.

Por causa da forma "em alpendre" do colofemoral (fig. 2-3), o eixo da diáfise femoral nãoestá situado, exatamente, no prolongamento doeixo do esqueleto da perna, e forma com este umângulo obtuso, aberto para dentro, de 170-175°:se trata do valgo fisiológico do joelho.

Contudo, os três centros articulares do qua­dril (H), do joelho (O) e do tornozelo (C) estãoalinhados numa mesma reta HOC, que represen­ta o eixo mecânico do membro inferior. Na per­na, este eixo se confunde com o eixo do esque­leto; porém, na coxa, o eixo mecânico HO for­ma um ângulo de 6° com o eixo do fêmur.

Por outro lado, o fato de que os quadrisestejam mais separados entre si que os torno­zelos faz com que o eixo mecânico do membroinferior seja ligeiramente oblíquo para baixoe para dentro, formando um ângulo de 3° coma vertical. Este ângulo será mais aberto quantomais larga seja a pelve, como no caso da mu­lher. Isso explica por que o valgo fisiológicodo joelho é mais marcado na mulher do que nohomem.

O eixo de fiexão-extensão XX' é mais ho­rizontal, assim sendo, não constitui a bissetriz(Ob) do ângulo de valgo: medem-se 81° entre

XX' e o eixo do fêmur e 93° entre XX' e o eixoda perna. Do qual se deduz que, em máxima fie­xão, o eixo da perna não se situa,exatamente portrás do eixo do fêmur, mas por trás e um poucopara dentro, o qual desloca o calcanhar em dire­ção ao plano de' simetria: a fiexão máxima fazcom que o calcanhar entre em contato com anádega, no nível da "tuberosidade isquiática.

O segundo grau de liberdade consiste narotação ao redor do eixo longitudinal YY' da per­na (figs. 2-1 e 2-2), com o joelho em flexão. Aestrutura do joelho toma esta rotação impossívelquando a articulação está em máxima extensão;assim, o eixo da perna se confunde com o eixomecânico do membro inferior e a rotação axialnão se localiza no joelho, mas no quadril que osubstitui.

Na figura 2-1 aparece desenhado um eixoZZ' ântero-posterior e perpendicular aos dois ei­xos mencionados. Este eixo não representa umterceiro grau de liberdade; quando o joelho estáfiexionado, uma certa folga mecânica permitemovimentos de lateralidade de 1 a 2 em no tor­nozelo; porém, em extensão completa, estes mo­vimentos de lateralidade desaparecem totalmen­te: se existissem, deveriam ser considerados pa­tológicos.

Contudo, é necessário saber que os movi­mentos de lateralidade aparecem normalmentesempre que se flexione minimamente o joelho;para saber se são patológicos, é indispensávelcompará-Ios com os do lado oposto, com acondição de que este lado seja normal.

Page 4: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-3

Fig.2-2

2. MEMBRO INFERIOR 77

x

Page 5: Capitulo 2 Joelho

78 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS LATERAIS DO JOELHO

Além das suas yariações fisiológicas de­pendendo do sexo, o ângulo de valgo sofre va­riações patológicas dependendo de cada indiví­duo (fig. 2-4).

Quando este ângulo se inverte, se trata deum genu varo (lado esquerdo da figo 2-4): nor­malmente diz-se que o indivíduo está "camba­do" (fig. 2-6); o centro do joelho, representadopela incisura interespinhosa da tíbia e a incisuraintercondiliana do fêmur, se desloca para fora. Ogenu varo pode ser apreciado de duas maneiras:

- medindo o ângulo entre o eixo diafisá­rio do fêmur e o da tíbia: quando émaior do que o seu valor fisiológico de170°, por exemplo, 180 ou 185°, repre­senta uma inversão do ângulo obtuso;

- medindo o deslocamento externo(fig. 2-5) do centro do joelho com re­lação ao eixo mecânico do membro in­ferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.Observa-se D.E. = 15 mm.

Pelo contrário, quando o ângulo de valgo se"fecha", corresponde ao genu valgo (lado direi­to da figo 2-4): se diz então que o indivíduo é"zambro" (fig. 2-8). Também existem dois mé­todos possíveis para se detectar o genu valgo:

- medindo o ângulo dos eixos diafisários,cujo valor estará menor do que o ângulofisiológico de 170°: por exemplo 165°.

- medindo o deslocamento interno(fig. 2-7) do centro do joelho com re­lação ao eixo mecânico do membro in­ferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.Observa-se D.I = 15 mm.

A medida do deslocamento externo ou in­terno é mais rigorosa do que a do ângulo de val­go, porém requer excelentes radiografias de to­do o conjunto dos membros inferiores deno­minadas "de goniometria" (fig. 2-4). No esque­ma da figura, cúmulo do azar, o indivíduo apre­senta um genu valgo à direita e um genu varo àesquerda. Esta circunstância é estranha, visto

que na maior parte dos casos a deformação é se­melhante e bilateral, porém não é obrigatoria­mente simétrica, já que um joelho pode estarmais desviado que o outro; todavia, existem ca­sos muito raros de desvios em "rajada", ou seja,com os dois joelhos do mesmo lado, como mos­tra o esquema: esta é uma situação muito incô­moda, que provoca um desequilíbrio do lado dogenu valgo; podemos encontrar este caso, quan­do após uma osfeotomia, se hipercorrigiu umgenu varo em genu valgo; assim sendo, é neces­sário operar rapidaménte o outro lado para resta­belecer o equilíbrio.

Os desvios laterais dos joelhos não são raros,visto que com o passar do tempo podem geraruma artrose; de fato, as cargas não estão repartidascom igualdade entre os compartimentos externo einterno do joelho, provocando um desgaste pre­maturo do compartimento interno, uma artroseremoro-tibial interna, no genu varo, ou sob omesmo mecanismo, uma artrose remoro-tibialexterna no genu valgo; isso pode levar a realizar,no primeiro caso uma osteotomia tibiaI (ou fe­moral) de valgização e no segundo caso, uma os­teotomia tibiaI (ou femoral) de varização.

Na atualidade, para prevenir estes proble­mas, se dá muita importância à vigilância dosdesvios laterais dos joelhos nas crianças peque­nas. Isto se deve a que o genu valgo bilateral émuito freqüente nas crianças, e embora desapa­reça progressivamente durante o crescimento, énecessário realizar um seguimento desta evolu­ção favorável com radiografias do conjunto dosmembros inferiores, visto que no caso de per­sistir um desvio importante até o final da infân­cia, seria conveniente avaliar uma intervençãopor epifisiodese tíbio-femoral interna no casode genu valgo, ou externa no caso de genu varo,que deve ser realizada antes do final do períodode crescimento visto que estas intervençõesagem impedindo o crescimento de um lado pro­vocando um maior crescimento do lado "maisdesviado" .

Page 6: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-8

Fig.2-4

Fig.2-6

2. 1'1EMBRO INFERIOR 79

Fig.2-5

Page 7: Capitulo 2 Joelho

80 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DE FLEXÃO·EXTENSÃO

A fiexão-extensão é o movimento principaldo joelho. A sua amplitude se mede a partir daposição de referência definida da seguinte ma­neira: o eixo da perna se situa no prolongamen­to do eixo da coxa (fig. 2-9, perna esquerda). Deperfil, o eixo do fêmur segue sem nenhuma an­gulação, com o eixo do esqueleto da perna. Nes­ta posição de referência, o membro inferior pos­sui o seu comprimento máximo.

A extensão se define como o movimentoque afasta a face posterior da perna da face pos­terior da coxa. Na verdade, não existe uma ex­tensão absoluta, pois na posição de referência omembro inferior está no seu estado de alonga­mento máximo. Porém, é possível realizar, prin­cipalmente passivamente, um movimento de ex­tensão de 5° a 10° a partir da posição de referên­cia (fig. 2-11); este movimento recebe o nome,sem dúvida errado, de "hiperextensão". Em al­guns indivíduos, esta hiperextensão está maismarcada por razões patológicas, provocando umgenu recun1atum.

A extensão ativa, poucas vezes ultrapassa,e por pouco, a posição de referência (fig. 2-9) eesta possibilidade depende essencialmente daposição do quadril: de fato, a eficácia do reto an­terior, como extensor do joelho, aumenta com aextensão do quadril (ver pág. 148). Isto significaque a extensão prévia do quadril (fig. 2-10, per­na direita) prepara a extensão do joelho.

A extensão relativa é o movimento quecompleta a extensão do joelho, a partir de qual­quer posição de fiexão (fig. 2-10, perna esquer­da); se trata do movimento que se realiza nor­malmente durante a marcha, quando o membro"oscilante" se desloca para frente para entrar emcontato com o chão.

A flexão é o movimento que aproxima a fa­ce posterior da perna à face posterior da coxa.Existem movimentos de fiexão absoluta, a partirda posição de referência, e movimentos de fiexãorelativa, a partir de qualquer posição em fiexão.

A amplitude da flexão do joelho é dife­rente dependendo da posição do quadril e se­gundo às modalidades do próprio movimento.

Aflexão ativa atinge os 140° se o quadrilestiver previamente flexionado (fig. 2-12), esomente chega aos 120° se o quadril estiver emextensão (fig. 2-13). Esta diferença de ampli­tude se deve à diminuição da eficácia dos ís­quio-tibiais quando o quadril está estendido(ver pág. 150). Porém, é possível ultrapassaros 120° de flexão çlo joelho com o quadril es­tendido, graças à contração balística: os ís­quio-tibiais se contraem potente e bruscamen­te iniciando a flexão do joelho que termina co­mo uma flexão passiva.

Afiexão passiva do joelho atinge uma am­plitude de 160° (fig. 2-14) e permite que o cal­canhar entre em contato com a nádega. Estemovimento é uma prova muito importante paracomprovar a liberdade da fiexão do joelho. Paraapreciar a sua flexão passiva pode medir-se adistância que separa o calcanhar da nádega. Emcondições normais, a flexão está limitada apenaspelo contato elástico das massas musculares dapanturrilha e da coxa. Em condições patológi­cas, a flexão passiva do joelho está limitada pe­la retração do aparelho extensor -. principal­mente o quadríceps - ou pelas retrações capsu­lares (ver pág. 108).

Embora sempre seja viável detectar umdéficit de flexão diferenciando o grau de fle­xão atingido e a amplitude da flexão máxima(160°), ou também, comprovando a distânciacalcanhar/nádega, o déficit de extensão se de­termina por um ângulo negativo, por exemplo- 60°: este é o que se mede entre a posição deextensão passiva máxima e a retitude. Destaforma, na figura 2-13 também podemos dizerque a perna esquerda está flexionada a 120°,ou, se não pode atingir uma extensão maior,que apresenta um déficit de extensão de-120°.

Page 8: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-9

Fig.2-14

2. MEMBRO INFERIOR 81

Fig.2-10

Fig.2-13

Page 9: Capitulo 2 Joelho

82 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO

Rotação da perna ao redor do seu eixolongitudinal: este movimento só pode ser reali­zado com o joelho flexionado, enquanto com ojoelho estendido o bloqueio articular une a tíbiacom o fêmur.

Para medir a rotação axial ativa, devemosflexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduosentado com as pernas penduradas para fora damesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho ex­clui a rotação do quadril. Na posição de referên­cia, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fo­ra (ver pág. 84).

A rotação interna (fig. 2-16) leva a pontado pé para dentro e intervém, de forma importan­te, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).

A rotação externa (fig. 2-19) leva a pontado pé para fora e também intervém no movi­mento de abdução do pé.

Para Fick, a rotação externa é de 40° comrelação aos 30° de rotação interna. Esta amplitu­de varia com o grau de flexão, visto que, segun­do este autor, a rotação externa é de 32° quandoo joelho está flexionado a 30° e de 42° quandoestá flexionado em ângulo reto.

A medida da rotação axial passiva se rea­liza com o indivíduo em decúbito prono, com ojoelho flexionado em ângulo reto: o examina­dor segura o pé com as duas mãos e o gira, le­vando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e paradentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, estarotação passiva é um pouco mais ampla que arotação ativa.

Finalmente, existe uma rotação axial de­nominada "automática", visto que está, inevi­tável e involuntariamente, ligada aos movimen­tos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.nos últimos graus de extensão ou no início daflexão. Quando o joelho se estende, o pé é leva­do para a rotação extema (fig. 2-20); se indicauma simples regra mnemotécnica para lembraresta associação: EXTensão e rotação EXTerna.De maneira inversa, quando o joelho está flexio­nado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).O mesmo movimento se realiza quando, ao do­brar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é le­vada para dentro. Esta postura também corres­ponde à posição fetal.

Mais adiante vamos estudar o mecanismodesta rotação automática.

Page 10: Capitulo 2 Joelho

82 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO

Rotação da perna ao redor do seu eixolongitudinal: este movimento só pode ser reali­zado com o joelho flexionado, enquanto com ojoelho estendido o bloqueio articular une a tíbiacom o fêmur.

Para medir a rotação axial ativa, devemosflexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduosentado com as pernas penduradas para fora damesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho ex­clui a rotação do quadril. Na posição de referên­cia, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fo­ra (ver pág. 84).

A rotação interna (fig. 2-16) leva a pontado pé para dentro e intervém, de forma importan­te, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).

A rotação externa (fig. 2-19) leva a pontado pé para fora e também intervém no movi­mento de abdução do pé.

Para Fick, a rotação externa é de 40° comrelação aos 30° de rotação interna. Esta amplitu­de varia com o grau de flexão, visto que, segun­do este autor, a rotação externa é de 32° quandoo joelho está flexionado a 30° e de 42° quandoestá flexionado em ângulo reto.

A medida da rotação axial passiva se rea­liza com o indivíduo em decúbito prono, com ojoelho flexionado em ângulo reto: o examina­dor segura o pé com as duas mãos e o gira, le­vando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e paradentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, estarotação passiva é um pouco mais ampla que arotação ativa.

Finalmente, existe uma rotação axial de­nominada "automática", visto que está, inevi­tável e involuntariamente, ligada aos movimen­tos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.nos últimos graus de extensão ou no início daflexão. Quando o joelho se estende, o pé é leva­do para a rotação extema (fig. 2-20); se indicauma simples regra mnemotécnica para lembraresta associação: EXTensão e rotação EXTerna.De maneira inversa, quando o joelho está flexio­nado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).O mesmo movimento se realiza quando, ao do­brar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é le­vada para dentro. Esta postura também corres­ponde à posição fetal.

Mais adiante vamos estudar o mecanismodesta rotação automática.

Page 11: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-16

I"~

Fig.2-21

, (

Fig.2-20

Fig.2-18

2. MEMBRO INFERIOR 83

Fig.2-17

Fig.2-19

Page 12: Capitulo 2 Joelho

84 FISIOLOGIA ARTICULAR

ARQUITETURA GERAL DO MEMBRO INFERIOR. E ORIENTAÇÃO DAS SUPERFÍCIES ARTICULARES

A orientação dos côndilos femorais e dosplatôs tibiais favorece a flexão do joelho(fig. 2-22, segundo Bellugue). Duas extremida­des ósseas móveis uma com relação à outra (a)modelam rapidamente a sua forma em funçãodos seus movimentos (b) (experiência de Fick).Todavia, a flexão não pode atingir o ângulo re­to (c), a menos que não se elimine um fragmen­to (d) do segmento superior a fim de retardar oimpacto com a superfície inferior. O ponto fra­co criado no fêmur se compensa pela transpo­sição para diante (e) da diáfise, o qual deslocaos côndilos para trás. Simetricamente, a tíbia setorna mais fraca atrás e mais forte adiante (f),deslocando para trás a superfície tibial. Destaforma, na flexão máxima, as importantes mas­sas musculares podem situar-se entre a tíbia e ofêmur.

As curvaturas gerais dos ossos do mem­bro inferior representam os esforços que agemsobre eles. Obedecem às leis das "colunascom carga excêntrica" de Euler (Steindler).Quando uma coluna está articulada pelos seusdois extremos (fig. 2-23, a), a curvatura ocupatoda a sua altura, este é o caso da curvatura deconcavidade posterior da diáfise femoral (fig.2-23, b). Se a coluna está fixada embaixo e émóvel em cima (fig. 2-24, a), existem duascurvaturas opostas, a mais alta ocupa 2/3 dacoluna: estas correspondem às curvaturas dofêmur no plano frontal. Se a coluna estivessefixada pelos seus dois extremos (fig. 2-25, a),a curvatura ocuparia as duas quartas partescentrais, o que corresponde às curvaturas datíbia no plano frontal (fig. 2-25, b). No planosagital, a tíbia apresenta três características(fig. 2-26, b):

- a retrotorção (T), deslocamento poste­rior citado anteriormente;

- a retroversão (V), declive de 5-6° dosplatôs tibiais para trás;

- a retroflexão (F), curvatura de concavi­dade posterior de uma coluna móvel emambos os extremos (fig. 2-23, a), comono caso do fêmur.

Durante a flexão (fig. 2-27), as curvaturascôncavas do fêmur e da tíbia estão face a face,aumentando, portanto, o espaço disponível paraas massas musculares.

As figuras na margem inferior da páginaexplicam através de uma espécie de "álgebraanatômica" as torções axiais sucessivas dos seg­mentos do membro inferior, vistos desde cimano esquema. "

Torção do fêmur (fig. 2-28): se a cabeça eo colo (1) com o maciço condiliano (2) se unem(a); sem torção (b), o eixo do colo está no mes­mo plano que o eixo dos côndilos; porém, naverdade, o colo forma um ângulo de 30° com oplano frontal (c), de modo que o eixo dos côndi­Ias permanece frontal (d) e é necessário introdu­zir uma torção da diáfise femoral de -300 poruma rotação interna que corresponde ao ângulode anteversão do colo femora!.

Torção do esqueleto da perna (fig. 2-29):se a tíbio-tarsiana (1) e os platôs tibiais (2) seunem (a); sem torção (b), o eixo dos platôs e oeixo da tíbio-tarsiana são frontais; na verdade(c), a retroposição do maléolo externo converteo eixo da tíbio-tarsiana oblíquo para fora e paratrás, o qual corresponde a uma torção do esque­leto da perna de +250 por uma rotação externa.

Se unirmos (fig. 2-30, a) os côndilos (1) eos platôs, parece que os dois eixos deveriam serfrontais (b). Na realidade, a rotação axial auto­mática acrescenta +5° de rotação externa da tí­bia sobre o fêmur em extensão máxima.

Estas torsões escalonadas ao longo domembro inferior (-30° +25° +5°) se anulam(fig. 2-31, a) de tal modo que o eixo da tíbio­tarsiana está quase na mesma direção do que oeixo do colo, ou seja, em rotação externa de30°, provocando um deslocamento de 300 parafora do eixo do pé, na posição de pé, com oscalcanhares juntos e a pelve simétrica (b). Du­rante a marcha, o avanço do membro oscilanteleva o quadril homólogo para diante (c); se apelve gira 30°, o eixo do pé se dirige diretamen­te para frente, no sentido da marcha, o que per­mite um "ótimo desenvolvimento do passo".

Page 13: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 85

a b cFig.2-22 e

c---~ ~+25

+30

a

Fig.2-25+30

c

Fig.2-31O

b

a b

Fig.2-26

~30~;c

Fig: 2-27

b

~30~30

@ ~+5

b a

Fig.2-23

b

a b

Fig.2-24

1.6-+

O-

'G-_~+

-W- Fig. 2-28 b2

a 1W+ --.­

Fi9.2-302 -O~4-

a

Fig.2-29

Page 14: Capitulo 2 Joelho

86 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES DA FLEXÃÜ-EXTENSÃü

o principal grau de liberdade do joelho é oda flexão-extensão, que corresponde ao eixotransversal. Ele está condicionado por uma ar­ticulação de tipo troclear: de fato, as superfí­cies da extremidade inferior do fêmur consti­tuem uma polia ou, mais exatamente, um seg­mento de polia (fig. 2-32), que, por sua forma,lembra um trem de aterrissagem duplo de avião(fig. 2-33). Os dois côndilos femorais, convexosem ambos os sentidos, formam as duas faces ar­ticulares da polia e correspondem às rodas dotrem de aterrissagem; eles se prolongam parafrente (fig. 2-34) pelas duas faces da tróclea fe­moral. Quanto à garganta da polia, está repre­sentada, adiante, pela garganta da tróc1ea femo­ral e, atrás, pela incisura intercondiliana, cujosignificado mecânico será explicado maisadiante. Alguns autores descrevem o joelho co­mo uma articulação bicondiliana; isto é verda­deiro do ponto de vista anatômico, porém doponto de vista mecânico é, sem nenhuma dúvi­da, uma articulação troclear específica.

Na parte tibial, as superfícies estão inversa­mente conformadas e se organizam sobre doissulcos paralelos, incurvados e côncavos, sepa­rados por uma crista romba ântero-posterior(fig. 2-35): a glenóide externa (GE) e a glenóideinterna (Gr) se localizam cada uma num sulcoda superfície (S), além de estar separadas pela

crista romba ântero-posterior na qual se encaixao maciço das espinhas tibiais; adiante, no prolon­gamento desta ~rista, situa-se a crista romba daface posterior da patela (P) cujas duas vertentesprolongam a superficie das glenóides. Este con­junto de superfícies é dotado de um eixo trans­versal (1), que coincide com o eixo dos côndilos(U) quando a articulação está encaixada.

Assim, as glenóides correspondem aos côn­dilos enquanto o maciço das espinhas tibiais sealoja na incisura intercondiliana; fimcionalmen­te, este conjunto constitui a articulação fêmo­ro-tibial. Adiante, as duas vertentes da superfí­cie articular da patela correspondem às duas fa­ces da tróclea femoral, enquanto a crista rombavertical se encaixa na garganta da tróclea, destaforma se constitui um segundo conjunto funcio­nal, a articulação fêmoro-patelar. As duas ar­ticulações funcionais, fêmoro-tibial e fêmoro­patelar, estão incluídas numa única e mesma ar­ticulação anatômica, a articulação do joelho.

Considerada somente sob o ângulo de fIe­xão-extensão e numa primeira aproximação,podemos imaginar a articulação do joelho co­mo uma superfície em forma de polia deslizan­do-se sobre um sulco duplo, côncavo e parelho(fig. 2-36). Porém, como poderemos ver maisadiante, a realidade é mais complexa.

Page 15: Capitulo 2 Joelho

p

Fig.2-34

GI

Fig.2-32

~Fig.2-35

2. MEMBRO INFERIOR 87

Fig.2-33

Page 16: Capitulo 2 Joelho

88 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES EM FUNÇÃO DA ROTAÇÃO AXIAL

As superfícies articulares, tal corno estãodescritas na página anterior, só permitem umúnico movimento que é o da fiexão-extensão.De fato, a crista romba da superfície inferior, aoencaixar-se na garganta da polia em todo o seucomprimento, impede qualquer movimento derotação axial da superfície inferior sob a super­fície superior.

Para que a rotação axial seja factível, deve­se modificar a superfície inferior (fig. 2-37) de talforma que a crista romba reduza o seu compri­mento. Com esta finalidade, se limam (fig. 2-38)as duas extremidades desta crista, de forma que aparte média que permanece forme um pivô, en­caixado na garganta da polia e ao redor do qual asuperfície inferior pode girar. Este pivô é o ma­ciço das espinhas tibiais que forma a vertenteexterna da glenóide interna e a vertente internada glenóide externa; por este pivô central, oumais concretamente, pela espinha tibial interna,passa o eixo vertical (R), ao redor do qual se rea­lizam movimentos de rotação longitudinal. Al­guns autores designam os dois ligamentos cru­zados, denominando-lhes pivô central, conside­rados o eixo de rotação longitudinal do joelho.Esta terminologia parece não ser muito apro­priada, visto que o conceito de pivô significa umponto de apoio sólido, e portanto se deveria re­servar para a espinha tibial interna, que é o ver­dadeiro pivô mecânico do joelho. Quanto ao sis-

--------.-.---

terna dos ligamentos cruzaqos, parece maISapropriado o termo união central.

Esta transformação das superfícies articula­res é mais fácil' de entender quando se utiliza co­rno exemplo um m!Jdelo mecânico (ver o mode­lo lU no final do volume).

Se pegarmos duas peças (fig. 2-39), umasuperior que apresenta urna fenda e outra infe­rior, com uma espiga de tamanho e medidas in­feriores à fenda, as duas peças podem deslizar­se com facilidade uma sobre a outra, mas não

podem girar uma com relação à outra.Se eliminarmos as duas extremidades da

espiga da peça inferior para que permaneça so­mente a sua parte central, cujos diâmetros nãoexcedem o comprimento da fenda (fig. 2-40), sesubstitui a espiga por um pivô cilíndrico, capazde ser encaixado na fenda da peça superior.

Então (fig. 2-41), as duas peças são capazesde realizar dois tipos de movimento, uma em re­lação à outra:

- um movimento de deslizamento da espi­ga central ao longo da fenda, que corres­ponde à fiexão-extensão;

- um movimento de rotação da espiga nointerior da fenda (seja qual for a posiçãona fenda), que corresponde à rotação aoredor do eixo longitudinal da perna.

Page 17: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-39

Fig.2-40

2. MEl\IBRO INFERIOR 89

Fig.2-37 ;

Fig.2-38

Fig.2-41

Page 18: Capitulo 2 Joelho

90 FISIOLOGIA ARTICULAR

PERFIL DOS CÔNDILOS E DAS GLENÓIDES

Vistos pela sua face inferior (fig. 2-42), oscôndilos formam duas proeminências convexasem ambas as direções e alongadas de diante paratrás. Os côndilos não são estritamente idênticos:

seus grandes eixos ântero-posteriores não são pa­ralelos, mas sim divergentespara trás; além disso,o côndilo interno (I) diverge mais que o externo(E) e também é mais estreito. Entre a tróclea e oscôndilos se perfila, de cada lado, a fenda côndilo­trodear (r), a interna normalmente mais marcadaque a externa.

A incisura intercondiliana (e) está no eixoda garganta trodear (g). A face externa da trócleaé mais proeminente do que a interna.

Num corte frontal (fig. 2-43) nota-se que aconvexidade dos côndilos em sentido transversal

corresponde à concavidade das glenóides.Para analisar as curvaturas dos côndilos e

das glenóides no plano sagital, é conveniente rea­lizar um corte vértico-sagital nas direções aa' ebb' (fig. 2-43); de forma que se consegue o perfilexato dos côndilos e das glenóides sobre o ossofresco (figs. 2-45 a 2-48). Então, torna-se eviden­te que o raio da curvatura das superfícies condilia­nas não é uniforme, mas sim que sofre variaçõescomo se fosse uma espiral.

Em geometria, a espiral de Arquimedes (fig.2-44) está construída ao redor de um pequenoponto denominado centro (C), e cada vez que oraio R descreve um ângulo igual, aumenta o seucomprimento na mesma medida.

A espiral dos côndilos é muito diferente; éverdade que o raio da curvatura cresce regular­mente de trás para diante, que varia de 17 a 38 mmno caso do côndilo interno (fig. 2-45) e de 12 a60 mm no caso do côndilo externo (fig. 2-46), po­rém não existe um centro único nesta espiral, exis­te uma série de centros dispostos, por sua vez, so­bre outra espiral mm' (côndilo interno) e nn'(côndilo externo). Portanto, a curvatura dos côndi­Ias é uma espiral de espiral, como demonstrouFick que denominou curvatura voluta à espiraldos centros da curvatura.

Por outro lado, a partir de um certo ponto tdo contorno condiliano, o raio da curvatura come­ça a diminuir, de forma que passa de 38 a 15 mm

pela frente do côndilo interno (fig. 2-45) e de 60 a16 mm pela frente do côndilo externo (fig. 2-46).Novamente, os centros da curvatura se alinhamnuma espiral m'm" (côndilo interno) e n'n" (côn­dilo externo). No total, as linhas dos centros dacurvatura fonnam duas espirais juntas, cuja cús­pide muito aguda (m' e n') corresponde sobre ocôndilo ao ponto t de transição entre dois segmen­tos do contorno condiliano:

- atrás do ponto t, a parte do côndilo for­ma parte da articulação fêmoro-tibial;

- adiante do 'ponto t, a parte do côndilo eda tróclea formam parte da articulaçãofêmoro-patelar.

Portanto, o ponto de transição t representao ponto mais adiantado do contorno condilianoque pode entrar diretamente em contato com a su­perfície tibial.

O perfil ântero-posterior das glenóides(figs. 2-47 e 2-48) é diferente segundo a glenóidede que se trate:

- a glenóide interna (fig. 2-47) é côncavapara cima (o centro da curvatura O estásituado acima) como um raio de curvatu­ra de 80 mm;

- a glenóide externa (fig. 2-48) é convexapara cima (o centro da curvatura O' estásituado para baixo) como um raio de cur­vatura de 70 mm.

Enquanto a glenóide interna é côncava nosdois sentidos, a externa é côncava transversal­mente e convexa sagitalmente (no osso fresco). Oresultado desta afirmação é que se o côndilo femo­ral interno é relativamente estável na sua glenóide,o côndilo externo está numa posição instável so­bre a lombada da glenóide externa e a sua estabi­lidade durante o movimento depende essencial­mente da integridade do ligamento cruzado ânte­ro-externo (LCAE).

Por outra parte, os raios da curvatura doscôndilos e das glenóides correspondentes não sãoiguais, portanto existe uma certa discordância en­tre as superfícies articulares: a articulação dojoelho é uma verdadeira imagem das articulaçõesnão concordantes. O restabelecimento da concor­dância depende dos meniscos (ver pág. 102).

Page 19: Capitulo 2 Joelho

r

Fig.2-47

Fig.2-42

--..•..." \\ .\ Fig.2-43

Fig.2-44

O"

Fig.2-46

Fig.2-48

Page 20: Capitulo 2 Joelho

92 FISIOLOGIA ARTICULAR

DETERMINISMO DO PERFIL CÔNDILO- TROCLEAR

Utilizando um modelo mecânico (fig. 2-49),em 1967, foi demonstrado (Kapandji) que o con­torno da tróc1ea e os côndilos femorais estão de­terminados corno lugares geométricos que depen­dem, por uma parte, das relações estabelecidas en­tre os ligamentos cruzados e suas bases de inser­ção na tíbia e no fêmur e, por outra parte, das re­lações existentes entre o ligamento patelar, a pate­Ia e as asas patelares (ver modelo li ao final do vo­lume). Quando movemos um modelo deste tipo(fig. 2-50), podemos ver o desenho do perfil doscôndilos femorais e da tróc1ea como se fosse aparte envolvente das posições sucessivas das gle­nóides tibiais e da patela (fig. 2-51).

A parte póstero-tibial do contorno côndilo­troclear (fig. 2-51) se determina pelas posiçõessucessivas, numeradas de 1 a 5 (além de todas asintennédias), do platô tibial, "submetidas" ao fê­mur pelo ligamento cruzado ântero-externo(LCAE) (traços pequenos) e o ligamento cruza­do póstero-interno (LCPI) (grandes traços), ca­da um deles descrevendo um arco de círculo cen­trado pela sua inserção femoral, de raio igual aoseu comprimento; note-se que numa flexão máxi­ma, a abertura anterior da interlinha fêmoro-tibialdemonstra a "distensão" do LCAE no final da fle­xão, enquanto o LCPI está contraído.

A parte anterior patelar do contorno côn­dilo-troc1ear (fig. 2-52) está determinada pelasposições sucessivas, numeradas de 1 a 6 (e todasas intermédias), da patela, unidas ao fêmur pelasasas patelares e à tíbia pelo ligamento patelar.

Entre a parte anterior patelar e a parte pos­terior tibial do perfil côndilo-troc1ear existe umponto de transição t (figs. 2-45 e 2-46) que re­presenta a fronteira entre a articulação fêmoro­patelar e a articulação fêmoro-tibial.

Modificando as relações geométricas dosistema dos ligamentos cruzados, é possível tra-

çar uma família de curvaturas dos côndilos e datróclea, a qual demonstra a "personalidade" decada joelho: nenhuma se parece com a outra noplano estritamente geométrico, daí a dificuldadeem se colocarem próteses especificamente adap­tadas a cada uma delas: elas somente podem seruma aproximação relativamente ,fiel.

A mesma dificuldade se apresenta no casodas pIastias ou das próteses ligamentares, porexemplo (fig. 2:53), se a inserção tibial doLCAE se desloca para diante, o círculo descritopela sua inserção feinoral vai deslocar-se tam­bém para diante (fig. 2-54), o que vai induzir umnovo perfil condiliano, no interior do que esta­va antes, determinando por sua vez a aparição deumjogo mecânico que seria um fator de desgas­te das superfícies cartilaginosas.

Mais tarde, em 1978, A. Menschik, de Vie­na, realizou a mesma demonstração com meiospuramente geométricos.

Evidentemente, toda esta teoria do determi­nismo geométrico do perfil côndilo-troc1ear sebaseia na hipótese da isometria, isto é, da inva­riabilidade do comprimento dos ligamentos cru­zados, da qual se sabe atualmente (ver abaixo)que não está confirmada pelos fatos. Isso nãosignifica que não explique corretamente as COllS­

tatações e possa servir de guia no conceito dasoperações sobre os ligamentos cruzados.

Mais recentemente, P. Frain e cols., utili­zando um modelo matemático baseado no estu­do anatômÍco de 20 joelhos, confirmaram a no­ção de curvatura-envolvente e de policentrismodos movimentos instantâneos, insistindo nasconstantes inter-relações funcionais dos liga­mentos cruzados e laterais. O traçado dos veta­res de velocidade em cada ponto de contato fê­moro-tibial, feito por computador, reproduz exa­tamente a envolvente do contorno condiliano.

Page 21: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-54

Fig.2-50

2. MEMBRO INFERIOR 93

Fig.2-52

Page 22: Capitulo 2 Joelho

94 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDESNA FLEXÃO-EXTENSÃO

A forma arredondada dos côndilos poderia fa­zer pensar que eles rolam sobre as superfícies ti­biais; esta é uma opinião errônea. De fato, quandouma roda gira sem resvalar no chão (fig. 2-55) acada ponto do chão corresponde só um ponto daroda; a distância percorrida no chão (OOU) é, por­tanto, exatamente igual à parte da circunferência"desenvolvida" no chão (compreendida entre a re­ferência triangular e o retângulo). Se fosse assim(fig. 2-56), a partir de certo grau de flexão (posiçãoII), o côndilo bascularia para trás da glenóide ­produzindo uma luxação - ou então seria neces­sário que o platô tibial fosse mais longo. A possi­bilidade de um rolamento puro não seria possíveldado que o desenvolvimento do côndilo é duas ve­zes maior do que o comprimento da glenóide.

Supondo agora que a roda resvale sem rolar(fig. 2-57): toda uma porção de circunferência daroda corresponderia a um só ponto no chão. É oque acontece quando uma roda "derrapa" ao desli­zar-se sobre uma superfície gelada. Tal desliza­mento puro é concebível para ilustrar (fig. 2-58) osmovimentos do côndilo na glenóide: todos os pon­tos do contorno condiliano corresponderiam a umúnico ponto na glenóide; porém se pode constatarque, deste modo, ajlexão ficaria limitada prematu­ramente, visto que a margem posterior da glenóide(seta) representa um obstáculo.

Também é possível imaginar que a roda giree resvale ao mesmo tempo (fig. 2-59): ela derra­pa, porém avança. Neste caso, à distância-percorri­da no chão (00') corresponde um maior compri­mento na roda (entre o losango e o triângulo pre­tos) que se pode apreciar desenvolvendo-a no chão(entre o losango preto e o triângulo branco).

Em 1836 a experiência dos irmãos Weber(fig.2-60) demonstrou que, na realidade, as coisasocorriam da seguinte maneira: em várias posiçõesentre a flexão e a extensão máximas, eles marcaramos pontos de contato entre o côndilo e a glenóide nacartilagem. Desta forma, puderam constatar que oponto de contato na tlôia recuava com a jlexão(triângulo preto: extensão - losango preto: flexão)e, por outra parte, que a distância entre os pontos decontato marcados no côndilo era duas vezes maior

que a que separava os pontos de contato da glenóide.Portanto, esta experiência demonstra, sem dúvida

nenhuma, que o côndilo roda e resvala sobre a gle­nóide simultaneamente. De fato, esta é a única ma­neira de se evitar a luxação posterior do côndilo per­mitindo simultaneamente uma flexão máxima (160°:comparar a flexão nas figs. 2-58 e 2-60).

(Estas experiências podem ser Feproduzidascom o modelo m incluído no final do volume.)

Experiências mais recentes (Strasse, 1917)demonstraram que a proporção de rolamento e dedeslizamento não era a mesma durante todo o mo­

vimento de flexão-extensão: a partir de uma exten­são máxima, o côndilo começa a rolar sem resva­lar e depois o deslizamento começa progressiva­mente a predominar sobre o rolamento, de manei­ra que no fim dajlexão o côndilo resvala sem rolar.

Finalmente, o comprimento do rolamento pu­ro, no início da flexão, é diferente segundo o côn­dilo considerado:

- no caso do côndilo interno (fig. 2-61) esterolamento ocorre apenas nos primeiros 10a 15 graus de flexão;

- no caso do côndilo externo (fig. 2-62) o ro­lamento prossegue até os 20° de flexão.

Isto significa que o côndilo externo rolamuito mais que o côndilo interno, o que explica,em parte, que o caminho que ele percorre sobre aglenóide seja mais longo que o percorrido pelo in­terno. Voltaremos a esta noção importante para ex­plicar a rotação automática (ver pág. 154).

Por outro lado, também é interessante notarque estes 15 a 20° de rolamento inicial correspon­dem à amplitude habitual dos movimentos de jlexão­extensão que se realizam durante a marcha normal.

P. Frain e cols. demonstraram que em cadaponto da curvatura condiliana pode ser definido,por uma parte, o centro do círculo basculante, querepresenta o centro da curvatura condiliana nesteponto e, por outra parte, o centro do movimento,que representa o ponto ao redor do qual o fêmur gi­ra com relação à tíbia; somente quando estes doispontos se confundem existe um rolamento puro, ouentão a proporção de deslizamento com relação aorolamento é mais importante quanto mais afastadoo centro instantâneo esteja do movimento do cen­tro da curvatura.

Page 23: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 95

r------lf - fI II II .\, \

IIIII,f\\\

"­,,~

..•--- ..•••. ~// )<'---I •• \I\\,

"­.•.•.

140-160°

Fig.2-57

O'

Fig.2-59

//

\ \ /\ L ." /'\\ .\. (

,) .J. \

fI .~"'-~/ '-.

j---lf •

I /I .I /I .1/I •

Iff'

, \\ .\\',,-

.•.•-

Fig.2-61 Fig.2-60 Fig.2-62

Page 24: Capitulo 2 Joelho

96 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDESNOS MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO AXIAL

Mais adiante veremos por que os movi­mentos de rotação axial só podem ser realizadosquando o joelho está fiexionado. Em posição derotação neutra (fig. 2-63), joelho fiexionado, aparte posterior dos côndilos entra em contatocom a parte central das glenóides. Este fato éposto em evidência pelo diagrama (fig. 2-64), noqual a silhueta dos côndilos se superpõe portransparência sobre o contorno tracejado dasglenóides tibiais. Também se pode constatarneste esquema que a fiexão do joelho separou omaciço das espinhas tibiais do fundo da incisuraintercondiliana, onde está encaixada durante aextensão (esta é uma das causas do bloqueio darotação axial em extensão).

Durante a rotação externa da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-65), o côndilo externo avança so­bre a glenóide externa, enquanto o côndilo inter­no recua na glenóide interna (fig. 2-66).

Durante a rotação interna (fig. 2-67) pro­duz-se o fenômeno inverso: o côndilo externo

recua na sua glenóide, enquanto o interno avan­ça na sua própria (fig. 2-68).

Os movimentos ântero-posteriores docôndilos nas suas glenóides correspondentesnão são totalmente semelhantes:

- o côndilo interno (fig. 2-69) se deslocarelativamente pouco na concavidade daglenóide interna (1);

- o côndilo externo (fig. 2-70) pelo con­trário, possui um trajeto (L) quase duasvezes maior sobre a convexidade da gle­nóide externa. Durante o seu desloca­mento na glenóide de diante para trás,"ascende" primeiro na vertente anterior,até o vértice da "lombada", e depoisdesce novamente sobre a vertente poste­rior; de forma que muda de "altura" (e).

A diferença de forma entre as duas glenói­des repercute na forma das espinhas tibiais(fig. 2-71). Quando se realiza um corte hori­zontal XX' do maciço das espinhas, pode-seconstatar que a face externa da espinha externaé convexa de diante para trás (como a glenóideexterna), enquanto a face interna da glenóideinterna é côncava (como a glenóide interna).Se a isto juntamos que a espinha interna é niti­damente mais alta do que a externa, se podecompreender que a espinha interna forme umaespécie de ressalto sobre o qual o côndilo inter­no vai embater, enquanto o côndilo externocontorna a espinha externa. Por conseguinte, oeixo real da rotação axial não passa entre asduas espinhas tibiais, mas sim, no nível davertente articular da espinha interna queforma o verdadeiro pivô central. Este deslo­camento para dentro se traduz, justamente, porum trajeto maior do côndilo externo, como vi­mos anteriormente.

Page 25: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-65

Fig.2-66

Fig.2-69

Fig.2-63

Fig.2-64

Fig.2-71

2. .\IEtvillRO INFERIOR 97

Fig.2-68

e

Fig.2-70

Page 26: Capitulo 2 Joelho

98 FISIOLOGIA ARTICULAR

A CÁPSULA ARTICULAR

A cápsula articular é uma bainha fibrosaque contorna a extremidade inferior do fêmur ea extremidade superior da tíbia, mantendo-as emcontato entre si e formando as paredes não ós­seas da cavidade articular. Na sua camada maisprofunda está recoberta pela sinovial.

A forma geral da cápsula do joelho(fig. 2-72) pode ser entendida facilmente se forcomparada com um cilindro ao qual se deprimea face posterior segundo uma geratriz (a setaindica este movimento). Assim se forma umsepto sagital cujas estreitas relações com os li­gamentos cruzados serão tratadas mais adiante(ver pág. 126) e que quase divide a cavidadearticular em duas metades, externa e interna.Na face anterior deste cilindro se abre umaja­nela, na qual vai "inserir-se" a patela. As mar­gens do cilindro se inserem no fêmur na partede cima e na tíbia na parte de baixo.

A inserção sobre o platô tibial é relativa­mente simples (fig. 2-73): passa (linha de pontos)para diante e para os lados externo e interno dassuperfícies articulares; a inserção retroglenóideinterna se une com a inserção tibial do LCPI;quanto à linha retroglenóide externa, contorna aglenóide externa no nível da superfície retroes­pinhal e se funde de novo com a inserção tibialdo LCPI. Entre os dois ligamentos cruzados, acápsula é interrompida e a fenda interligamentarfica ocupada pela sinovial que recobre os dois li­gamentos cruzados; portanto, eles podem serconsiderados como espessamentos da cápsula ar­ticular na incisura intercondiliana.

A inserção femoral da cápsula (figs. 2-74 a2-77) é um pouco mais complexa:

- pela frente (fig. 2-74), ela contorna afosseta supratroc1ear (Fs) por cima; nes­te local a cápsula forma um profundofundo de saco (figs. 2-76 e 2-77), ofun­do de saco subquadricipital (Fsq), cuja

importância veremos mais adiante (verpág. 108).

- dos lados (figs. 2-74 e 2-75), a inserçãocapsular segue ao longo das faces arti­culares da tróc1ea, onde forma os fundosde saco látero-patelares (ver pág. 108),para depois percorrer a certa distância olimite cartilaginoso dos côndilos, emcujas superfícies cutâneas desenha asrampas capsulares de Chevrier (Rch);no côndilq externo, a inserção capsularpassa por cima da fosse ta onde se fixa otendão do poplíteo (Pop), a inserçãodeste músculo é, assim, intracapsular(figs. 2-147 e 2-232);

- atrás e em cima (fig. 2-75), a linha deinserção capsular contorna a margempóstero-superior da cartilagem condi­liana, justamente debaixo da inserçãodos gêmeos (Oe); a cápsula recobre aface profunda destes músculos, sepa­rando-os dos côndilos, neste nível temmaior espessura e forma as calotas con­dilianas (Cco) (ver pág. 120);

- na incisura intercondiliana (figs. 2-76e 2-77, com o fêmur serrado no planosagital), a cápsula se fixa na face axialdos côndilos em contato com a cartila­

gem, e no fundo da incisura, de modoque passa de um lado ao outro da carti­lagem. Na face axial do côndilo interno(fig. 2-76), a inserção capsular passa pe­la inserção femoral do ligamento cruza­do póstero-interno (LCPI). Na faceaxial do côndilo externo (fig. 2-77), acápsula se fixa com a inserção femoraldo cruzado ântero-externo (LCAE).

Também neste caso, a inserção dos cruza­dos se confunde praticamente com a da cápsula,constituindo os reforços da cápsula.

Page 27: Capitulo 2 Joelho

Rch

Fig.2-74

Fig.2-76

Fig.2-73

2. MEMBRO INFERIOR 99

Fig.2-75

Page 28: Capitulo 2 Joelho

100 FISIOLOGIA ARTICULAR

o LIGAMENTO ADIPOSO, AS PREGAS, A CAPACIDADE ARTICULAR

Entre a superfície pré-espinhal do platá ti­bial, a face posterior do ligamento menisco-pate­lar e a parte inferior da tróc1eafemoral existe umespaço morto (fig. 2-78), ocupado pelo corpo adi­poso do joelho equivalente a uma faixa volumosade gordura. Este corpo adiposo (1) tem a forma deuma pirâmide quadrangular, cuja base repousa naface posterior (2) do ligamento menisco-patelar(3) e sobressai da parte anterior da superfície pré­espinhal. Sua face superior (4) é reforçada por umcordão celular adiposo que se estende do ápice dapate1a ao fundo da incisura intercondiliana (figs.2-78 e 2-79): é o ligamento adiposo (5).Aos lados(fig. 2-79, o joelho está aberto pela frente e a pa­tela está separada), o corpo adiposo se prolongapara cima ao longo da metade inferior das mar­gens laterais da pate1a por estruturas adiposas: aspregas alares (6). O corpo adiposo age como "ta­pulho" na parte anterior da articulação; na flexão,ele fica comprimido pelo ligamento patelar e so­bressai em cada lado da ponta da pate1a.

O ligamento adiposo é o vestígio do septomédio, que no embrião divide em dois a articula­ção até a idade de quatro meses. No adulto existenormalmente (fig. 2-78) um hiato entre o ligamen­to adiposo e o septo médio formado pelos liga­mentos cruzados (seta I). As metades externa e in­terna da articulação se comunicam através destehiato e também por um espaço situado acima doligamento (seta li) e atrás da pate1a. Às vezes, osepto médio persiste no adulto e a comunicação sóse estabelece acima do ligamento adiposo.

Esta formação também se denomina plicainfrapatellaris ou ligamento mucoso. O sistemadas plicae (plural do latim plica) é composto (fig.2-83) de três pregas sinoviais, inconstantes porémmuito freqüentes: segundo Dupont, presentes em85% dos joelhos. Na atualidade, são bem conheci­dos graças à artroscopia:

- aplica infrapatellaris (Pif), que prolon­ga o corpo adiposo infrapatelar, existe em65,5% dos casos;

- aplica suprapatellaris (Psp), em 55%dos casos; forma um septo transversalmais ou menos completo, acima da pate-

Ia, podendo separar o fundo de sacosubquadricipital da cavidade articular; elasó é patológica quando obstrui completa­mente o fundo de saco, provocando umquadro de "hidrartrose suspensa".

- aplica mediopatellaris (Pmp) existe em24% dos casos; pode formar um septo in­completo, estendido horizontalmente damargem interna da pate1a até o fêmur, co­mo uma "prateleira" (shelf dos autoresamericanos). Ela pode provocar dorquando a sua margem livre irrita, por atri­to, a margem interna do côndilo interno.Os problemas cessam imediatamentecom a ressecção artroscópica.

A capacidade articular apresenta variaçõesde importância, tanto normais quanto patológicas.Um derrame patológico - hidrartrose ou hemar­trose - pode aumentá-Ia consideravelmente (fig.2-80), sempre que o derrame seja progressivo; olíquido se acumula nos fundos de saco sub-quadri­cipitais (Fsq) e látero-patelares, assim como atráse abaixo das calotas condilianas, nos fundos de sa­cos retrocondilianos (Frc). Segundo a posição dojoelho, a distribuição do líquido varia: na exten­são (fig. 2-81), os fundos de sacos retrocondilia­nos estão comprimidos pelos gêmeos em tensão eo líquido se desloca para diante acumulando-senos fundos de sacos subquadricipital e látero-pate­lares; na flexão (fig. 2-82), são os fundos de sacosanteriores os que estão comprimidos pelo quadrí­ceps em tensão e o líquido se desloca para trás.Entre a flexão e a extensão máximas, existe umaposição denominada "capacidade máxima" (fig.2-80), na qual a pressão do líquido intra-articularé menor: é a posição de semiflexão que adotam, deforma espontânea, os pacientes com derrame arti­cular, porque ela é a menos dolorosa.

Em condições normais, a quantidade de lí­quido sinovial - ou sinóvia - é escassa (apenasalguns centímetros cúbicos). Contudo, os movi­mentos de flexão-extensão asseguram a limpezapermanente das superfícies articulares pela sinó­via, o que contribui para a boa nutrição da cartila­gem e, principalmente, para a lubrificação das zo­nas de contato.

Page 29: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 101

-

Frc

LCAE

Fsq

Fig.2-82

Pmp

Psp

Pif

Fig.2-78

5

1

32

Fig.2-83

Fig.2-79

Page 30: Capitulo 2 Joelho

102 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MENISCOS INTERARTICULARES

A não concordância das superfícies articula­res (ver pág. 90) se compensa pela interposição dosmeniscos ou fibrocartilagens semilunares, cujaforma é fácil de compreender (fig. 2-84): quandouma esfera (E) é colocada sobre um plano (P), elasó entra em contato com o plano através do pontotangencial. Se queremos aumentar a superfície decontato entre ambas, é suficiente interpor um anelque represente o volume compreendido entre o pla­no, a esfera e o cilindro (C) tangencial à esfera. Es­te anel (espaço de cor cinza) tem a mesma forma deum menisco, triangular quando é seccionado, comsuas três faces (fig. 2-85, os meniscos foram des­locados para cima das glenóides):

- superior (1) côncava, em contato com oscôndilos;

- periférica (2) cilíndrica, sobre a qual se fi­xa a cápsula (representada pelos traçosverticais) pela sua face profunda;

- inferior (3) quase plana, situada na perife­ria da glenóide interna (GI) e da glenóideexterna (GE).

Estes anéis estão interrompidos ao nível dasespinhas tibiais com uma forma de uma meia-lua,com um como anterior e outro posterior. Os cor­nos do menisco externo estão mais próximos entresi que os do interno, além disso, o menisco exter­no forma um anel quase completo - tem a formade O - enquanto o interno se parece mais comuma meia-lua - tem a forma de C -. Como nor­

ma mnemônica é simples usar a palavra CItrOEn,para lembrar a forma dos meniscos.

Os meniscos não estão livres entre as duas

superfícies articulares, mas mantêm conexões mui­to importantes do ponto de vista funcional:

- já vimos a inserção da cápsula (fig. 2-86)na face periférica;

- cada um dos cornos se fixa no platô tibial,no nível da superfície pré-espinhal (cor­nos anteriores) e retroespinhal (cornosposteriores):

- o como anterior do menisco externo

(4), pela frente da espinha externa;

- o como posterior do mesmo menisco(5), por trás da espinha externa;

- o como posterior do menisco interno(7), no ângulo póstero-interno da su­perfície retroespinhal;

- o como anterior do mesmo menisco

(6), no ângulo ântero-interno da super­fície pré-espinhal;

- os dois cornos anteriores se unem peloligamento jugal (8) ou transverso, fixa­do à pa.tela através dos tratos do corpoadiposo;

- as asas menisco-patelares (9), fibras quese estendem de ambas as margens da pate­Ia (P) até as faces laterais dos meniscos;

- o ligamento lateral interno (LU) fixa assuas fibras mais posteriores na margem in­terna do menisco interno;

- pelo contrário, o ligamento lateral externo(LLE) está separado de seu menisco pelotendão do mÚsculo poplíteo (Pop), que en­via uma expansão fibrosa (10) à margemposterior do menisco externo; formando oque alguns denominam o ponto do ângu­lo póstero-externo ou PAPE e que des­creveremos mais adiante quando tratar­mos das defesas periféricas do joelho;

- o tendão do semimembranoso (11) tam­bém envia uma expansão fibrosa à mar­gem posterior do menisco (nterno: for­mando simetricamente o ponto do ângu­lo póstero-interno ou PAPI;

- finalmente, diferentes fibras do ligamen­to cruzado póstero-interno se fixam nocomo posterior do menisco externo paraformar o ligamento menisco-femoral(12). Também existem fibras do ligamen­to cruzado ântero-externo que se fixamno corno anterior do menisco interno

(fig. 2-152).

Os cortes frontais (fig. 2-86) e sagitais inter­nos (fig. 2-87) e externos (fig. 2-88) mostram co­mo os meniscos se interpõem entre os côndilos eas glenóides, exceto no centro de cada glenóide enas espinhas tibiais, e corno os meniscos limitamdois espaços na articulação: o espaço supramenis­cal e o espaço submeniscal (fig. 2-86).

Page 31: Capitulo 2 Joelho

p

2

6

4

LU

Fig.2-87

GI

57

Fig.2-85

Fig.2-86

2. MEMBRO INFERIOR 103

Fig.2-84

Fig.2-88

Page 32: Capitulo 2 Joelho

104 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA FLEXÃO-EXTENSÃO

Vimos (pág. 94) anteriormente que o ponto decontato entre os côndilos e as glenóides recua sobreas glenóides no caso da fiexão e avança no caso daextensão; os meniscos seguem este movimento, comose pode constatar perfeitamente numa preparaçãoanatômica na qual se conservaram apenas os liga­mentos e os meniscos. Em extensão (fig. 2-89), a par­te posterior das glenóides está descoberta, principal­mente a glenóide externa (GE). Emflexão (fig. 2-90),os meniscos (Me e Mi) cobrem a parte posterior daglenóide, principalmente o menisco externo que des­ce pela vertente posterior da glenóide externa.

Uma vista superior dos meniscos sobre as gle­nóides mostra que a partir da posição de extensão(fig. 2-91), os meniscos recuam de maneira desigual:na fiexão (fig. 2-92), o menisco externo (Me) recuaduas vezes mais do que o interno. De fato, o trajetodo menisco interno é de 6 mm, enquanto o do exter­no é de 12 mm.

Os esquemas mostram, além disso, que, aomesmo tempo que recuam, os meniscos se defor­mam. Isto se deve a que eles têm dois pontos fixos, osseus comos, enquanto o remanescente é móvel. Omenisco extemo se deforma e se desloca mais do queo intemo, visto que as inserções de seus comos es­tão mais próximas.

Certamente, os meniscos desempenham um pa­pel importante como meios de união elásticos trans­missores das forças de compressão entre a tíbia e ofêmur (setas pretas, figs. 2-94 e 2-95): é necessáriodestacar que, na extensão, os côndilos têm o seu raiode curvatura maior nas glenóides (fig. 2-93) e os me­niscos estão peifeitamente intercalados entre as su­perfícies articulares. Estes dois elementos favorecema transmissão das forças de compressão durante aextensão máxima do joelho. Contudo, no caso da fie­xão, os côndilos têm o seu menor raio de curvaturanas glenóides (fig. 2-96) e os meniscos perdem par­cialmente o contato com os côndilos (fig. 2-98): es­tes dois elementos, junto com a distensão dos liga­mentos laterais (ver pág. 114), favorecem a mobili­dade em detrimento da estabilidade.

Depois de ter definido os movimentos dos me­niscos, vão-se expor os fatores que intervêm neles.Podem-se classificar em dois grupos: os fatores pas­sivos e os ativos.

Só existe um fator passivo do movimento detranslação dos meniscos: os côndilos empurram osmeniscos para diante, como um caroço de cereja quefoge entre dois dedos. Este mecanismo, que pode pa-

recer muito simples, é muito evidente quando se mo­biliza uma preparação anatômica na qual foram eli­minadas todas as conexões dos meniscos, exceto asinserções dos cornos (figs. 2-89 e 2-90): as superfí­cies são muito deslizantes e a "esquina" do meniscoé expulsa entre a "roda" do côndilo e a "base" da gle­nóide (portanto, se trata de uma cunha completamen­te ineficaz).

Os fatores ativos são numerosos:

- durante..a extensão (figs. 2-94 e 2-95), osmeniscos se deslocam para diante graças àsasas meniscQ-patelares (1) tensas pelo as­censo da patela (ver pág. 112), que arrastatambém o ligamento jugal. Além disso, ocorno posterior do menisco externo (fig. 2­95) é impulsionado para diante devido à ten­são do ligamento menisco-femoral (2), si­multânea à tensão do ligamento cruzadopóstero-interno (ver pág. 134);

- durante a ftexão:

- o menisco intemo (fig. 2-97) é impul-sionado para trás pela expansão do se­mimembranoso (3), que se insere na suamargem posterior, enquanto o como ante­rior é impulsionado pelas fibras do liga­mento cruzado ântero-extemo (4) que sedirigem até ele;

- o menisco extemo (fig. 2-98) é impul­sionado para trás pela expansão do poplí­teo (5).

A função de articulação de transmissão de forçasde compressão entre o fêmur e a tíbia foi subestimadaaté que os primeiros pacientes submetidos a uma me­niscectomia "de princípio" começaram a sofrer artroseantes da idade habitual, em comparação com os pa­cientes que não foram operados de meniscectomia. Achegada da artroscopia supõe um grande progresso,visto que, por uma parte, permitiu conhecer melhor aslesões meniscais duvidosas naartrografia, ou os falso­positivos, que derivavam numa meniscectomia "à-toa"(na qual se removia o menisco para ver se estava lesa­do!), e, por outra parte, fez possível a meniscectomia"à Ia carte", na qual se extirpa apenas a parte lesada domenisco que provoca a alteração mecânica e que podeser causa de uma lesão das superfícies carti1aginosas.Também permite entender que a lesão meniscal é so­mente uma parte do diagnóstico, visto que com muitafreqüência a lesão ligamentar é a que produz ao mes­mo tempo a lesão menisca1 e a lesão carti1aginosa.

Page 33: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 105

LULCAE

MI~\\~

LCAELCPILLE

I.J I. "J I •• \/11. ~v·

LLEMe GE

Fig.2-90Fig.2-89

Fig.2-93

Mi

Fig.2-91 Fig.2-92 ~/Fig.2-96

1-

Fig.2-97 Fig.2-94 Fig.2-95 Fig.2-98

Page 34: Capitulo 2 Joelho

106 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA ROTAÇÃO AXIAL.LESÕES MENISCAIS

Durante os movimentos de rotação axial,os meniscos seguem exatamente os desloca­mentos dos côndilos sobre as glenóides (verpág. 96). A partir da sua posição em rotaçãoneutra (fig. 2-99), se pode observar como se­guem caminhos opostos sobre as glenóides:

- durante a rotação externa (fig. 2-100)da tíbia sobre o fêmur, o menisco exter­no (Me) é puxado para frente (1) da gle­nóide externa, enquanto o menisco in­terno (Mi) se dirige para trás (2);

- durante a rotação interna (fig. 2-101),o menisco interno (Mi) avança (3), en­quanto o externo (Me) recua (4).

Também neste caso, os meniscos se deslo­cam ao mesmo tempo que se deformam, em vol­ta dos seus pontos fixos, as inserções dos cornos.A amplitude total do deslocamento do meniscoexterno é duas vezes maior do que a do meniscointerno.

Os deslocamentos meniscais na rotaçãoaxial são, principalmente, passivos - arrastadospelos côndilos -; contudo, também existe umfator ativo: a tensão da asa menisco-patelar, de­vido ao deslocamento da patela com relação à tí­bia (ver pág. 112); esta tração arrasta um dosmeniscos para frente.

Os movimentos do joelho podem ocasio­nar lesões meniscais quando estes não seguemos deslocamentos dos côndilos sobre as glenói­des; assim, eles são "surpreendidos" em posi­ção anormal e terminam "esmagados entre a bi­gorna e o martelo". É o caso, por exemplo, deum movimento de extensão brusca do joelho(como um pontapé numa bola): não há tempopara que um dos meniscos se desloque parafrente (fig. 2-102), de forma que, quanto maisforte se estenda o joelho, mais o menisco ficaráentalado entre o côndilo e a glenóide. Este me-

canismo, muito freqüente nos jogadores de fu­tebol, explica (fig. 2-107) as rupturas transver­sais (a) ou as desinserções do corno anterior(b), que se dobra como "um canto de um cartãode visita". O outro mecanismo de lesões menis­cais se deve à distorção do joelho associando(fig. 2-103) um movimento de lateralidade ex­terna (1) e uma rotação externa (2); desta for­ma, o menisco interno é deslocado para o cen­tro da articuláção, para baixo da convexidadedo côndilo interno, o esforço de endireitamentolhe surpreende nesta posição e ele fica entaladoentre o côndilo e a glenóide, provocando umafissura longitudinal do menisco (fig. 2-104), ouuma desinserção capsular total (fig. 2-105), ou,inclusive, uma fissura complexa (fig. 2-106).Em todas as lesões longitudinais citadas, a par­te central livre do menisco pode ficar elevadadentro da incisura intercondiliana, formandoum menisco em "alça de balde". Este tipo de le­são meniscal é muito freqüente nos jogadoresde futebol (durante as quedas sobre uma pernadobrada) e nos mineiros que são obrigados atrabalhar de cócoras nas galerias estreitas dasminas de carvão.

Outro mecanismo de lesão meniscal é aruptura de um ligamento cruzado, por exemploo LCAE (fig. 2-108). O côndilo interno não ficaforçosamente retido na parte posterior, se deslo­ca "cisalhando" o corno posterior do meniscointerno, provocando uma desinserção capsularposterior, ou uma fissura horizontal (ver o de­senho pequeno).

A partir do momento no qual um meniscose rompe, a parte lesada não segue os movimen­tos normais e se encaixa entre o côndilo e a gle­nóide; conseqüentemente, se produz um blo­queio do joelho numa posição de flexão maisacentuada quanto mais posterior seja a lesão me­niscal: a extensão completa torna-se impossível.

Page 35: Capitulo 2 Joelho

2. 1lEMBRO INFERIOR 107

Fig.2-100 Fig.2-99 Fig. 2-101

Fig.2-108

b

Fig.2-107

a

Fig.2-106Fig.2-105Fig.2-104

Page 36: Capitulo 2 Joelho

108 FISIOLOGIA ARTICLLAR

OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE O FÊMUR

o aparelho extensor do joelho se deslizasobre a extremidade inferior do fêmur como sefosse uma corda numa polia (fig. 2-109, a). Atróclea femoral e a incisura intercondiliana(fig. 2-11 O) formam, de fato, um canal verticalprofundo (fig. 2-109, b), por onde a patela des­liza. Desta forma, a força do quadríceps, diri­gida obliquamente para cima e ligeiramentepara fora, se converte numa força estritamen­te vertical.

Portanto, o movimento normal da patelasobre o fêmur durante a flexão é uma translaçãovertical ao longo da garganta da tróclea e até aincisura intercondiliana (fig. 2-111, segundo ra­diografias). Assim, o deslocamento da patela éde duas vezes o seu comprimento (8 cm), sendorealizado com um giro sobre um eixo transver­sal; de fato, sua face posterior, dirigida direta­mente para trás em posição de extensão (A), seorienta diretamente para cima quando a pate1a,no fim do seu trajeto (B), se encaixa, na flexãoextrema, sob os côndilos. Por conseguinte, setrata de uma translação circunferencial.

Este deslocamento tão importante só é pos­sível porque a patela está unida ao fêmur por co­nexões com comprimento suficiente. A cápsulaarticular forma três fundos de saco profundos aoredor da patela (fig. 2-111): por cima, ofundo desaco sllbquadricipital (Fsq) e, a cada lado, osfundos de saco látero-patelares (Lp). Quando apatela se desliza por baixo dos côndilos de A aB, os três fundos de saco se abrem: graças à pro­fundidade do fundos de saco sub-quadricipital, adistância XX' pode transformar-se em XX" (ouseja, quatro vezes mais); e graças à profundida­de dos fundos de saco látero-patelares, a distân­cia YY' pode transformar-se em YY" (ou seja,duas vezes mais).

Quando a inflamação une as duas lâminasdos fundos de saco, estes perdem toda sua pro­fundidade e a patela fica aderida ao fêmur(XX' e YY' se tornam inextensíveis) e não po-

de deslizar-se pelo seu canal: esta retraçãocapsular é uma das causas da rigidez do joelhoem extensão após traumatismos ou infecções.

Na sua "descida" a pate1a é acompanhadapelo ligamento adiposo (fig. 2-112), que passada posição ZT à posição ZZ", modificando 1800a sua orientação. Quando a pate1a "ascende", ofundo de saco subquadricipital se encaixaria en­tre a patela e a tróclea, se algumas fibras separa­das da face profunda do crural não lhe puxassempara cima, e que fo.rmam o chamado músculosubcrural (Msc) ou tensor do fundo de sacosubquadricipital.

Normalmente, a patela só se desloca de ci­ma para baixo e não transversalmente. De fato,a patela está muito bem encaixada (fig. 2-113)na sua fenda pelo quadríceps, mais quanto maioré a flexão (a); no fim da extensão (b), esta forçade coaptação diminui e em hiperextensão (c) in­clusive tem a tendência a inverter-se, isto é, adescolar a pate1a da tróclea. Neste momento (d),tem tendência a deslocar-se para fora, porque otendão quadricipital e o ligamento menisco-pa­telar formam um ângulo obtuso aberto para fo­ra. O que impede realmente a luxação da patelapara fora (fig. 2-114) é a face externa da trócleamuito mais proeminente do que a interna (dife­rença = e). Se, devido a uma malformação con­gênita (fig. 2-115), a face externa está menos de­senvolvida (igualou menos proeminente do quea interna), a pate1a não está suficientemente fixa­da e se luxa para fora durante a extensão com­pleta. Este é o mecanismo da luxação recidivan­te da pate/a.

A torção externa da tíbia debaixo do fêmur,assim como o genu valgo, ao fechar o ângulo en­tre o tendão quadricipital e o ligamento menis­co-patelar, aumentam o componente dirigido pa­ra fora e favorecem a instabilidade externa dapate1a. Estes são fatores de luxação e de sublu­xação externas, de condromalacia patelar e deartrose fêmoro-patelar externa.

Page 37: Capitulo 2 Joelho

c

_~~IIZ~.I

~ .••••.t~,-.:Z'..., -

Fig.2-112

Fig.2-113

dFig.2-115

Page 38: Capitulo 2 Joelho

110 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS LIGAÇÕES FÊMORO-PATELARES

A face posterior da patela (fig. 2-116) es­tá envolvida por uma cartilagem muito espessa(4 a 5 mm), principalmente no nível da cristamédia: é a cartilagem de maior espessura detodo o organismo. Isto pode ser explicado pelasconsideráveis pressões (300 kg, sem mencionaros halterofilistas!) que se exercem neste níveldurante a contração do quadríceps sobre o joe­lho flexionado, por exemplo quando descemosumas escadas ou quando ficamos de pé estandoagachados.

De um lado e do outro da crista média exis­tem duas faces articulares côncavas em ambosos sentidos:

- a face externa, em contato com a super­fície externa abaulada da tróclea;

- a face interna, em contato com a super­fície abaulada interna;

- esta última face se subdivide, por umacrista oblíqua pouco proeminente, numaface principal e uma face acessória, si­tuada no ângulo súpero-interno e que searticula com a margem interna da inci­sura intercondiliana na flexão máxima.

Durante o seu deslocamento vertical aolongo da tróclea quando se realiza uma flexão(fig. 2-117), a patela entra em contato com a tró­clea pela sua parte inferior em extensão máxima,pela sua parte média em flexão de 30° e pela suaparte superior e a face súpero-externa em flexãomáxima. Observando a topografia das lesõescartilaginosas, é possível conhecer o ângulo crí­tico de flexão, e vice-versa, apontando o ângu­lo de flexão dolorosa para prever o surgimentode lesões.

Até agora, as conexões da articulação fê­moro-patelar se constatavam por meio de radio­grafias denominadas "em incidência axial da pa­tela" ou também "em incidência fêmoro-pate­lar", tomando a interlinha "em fileira" (fig. 2­118): se abarcam as duas patelas na mesma pla­ca, flexionando os joelhos a 30° (A), 60° (B) e

90° (C) sucessivamente, com a finalidade de ex­plorar a articulação em toda sua extensão.

Estas radiografias em incidências fêmoro­patelares permitem apreciar:

- o centrado da patela, principalmente naradiografia com flexão de joelho a 30°(A), por correspondência entre a cristapatelar e a garganta troclear, e pelotransbordamento do ângulo externo dapatela com o limite da convexidade ex­terna; este procedimento permite diag­nosticar uma subluxação externa.

- a diminuição da espessura da interlinha,principalmente na sua parte externa, emcomparação com o lado supostamentesadio e utilizando um compasso de pon­tas duras; nas artroses já "avançadas",uma erosão cartilaginosa pode ser ob­servada;

- a densificação óssea subcondral na faceexterna, que representa uma síndromede hiperpressão externa;

- um deslocamento para fora da tubero­sidade tibial anterior com relação àgarganta da tróclea; este sinal só podeser visto nas radiografias com flexão dojoelho de 30° (A) e de 60° (B); repre­senta uma torção externa da tíbia parabaixo do fêmur nas subluxações e nashiperpressões externas.

Atualmente, graças ao escaner, cortes daarticulação fêmoro-patelar em máxima exten­são e inclusive em hiperextensão podem ser rea­lizados, o que era impossível com a radiografia;isto permite observar a subluxação externa dapatela no momento em que a força de coaptaçãoé nula ou negativa, permitindo assim reconheceras instabilidades fêmoro-patelares menores.

Quanto à artroscopia, ela permite diagnos­ticar as lesões cartilaginosas fêmoro-patelaresque não aparecem nas radiografias em incidên­cia axial e os desequilíbrios dinâmicos.

Page 39: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-117

Fig.2-118

2. MEMBRO INFERIOR 111

Fig.2-116

Page 40: Capitulo 2 Joelho

112 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE A TÍBIA

Pode-se-ia imaginar a patela aderida à tíbiapara formar um olécrano (fig. 2-119) como nocotovelo. Esta disposição impediria qualquermovimento da pateIa sobre a tíbia e limitaria demodo notável a sua mobilidade, impedindoqualquer movimento de rotação axial.

De fato, a patela realiza dois tipos de mo­vimento sobre a tíbia, dependendo se realiza fle­xão-extensão ou rotação axial.

Nos movimentos de flexão-extensão (fig.2-120), a patela se desloca no plano sagital. Apartir da sua posição em extensão (A), ela recuadeslocando-se ao longo de um arco de circunfe­rência cujo centro se situa na tuberosidade ante­rior da tíbia (O) e cujo raio é igual ao compri­mento do ligamento menisco-patelar. Ao mesmotempo, bascula 35° sobre si mesma, de formaque sua face posterior, orientada para trás, seorienta para trás e para baixo durante a flexãomáxima (B). De modo que realiza um movimen­to de translação circunferencial, com relação àtíbia. Este retrocesso da pateIa se deve a dois fa­tores: por um lado, o deslocamento para trás (D)do ponto de contato dos côndilos nas glenóidese, por outro, a redução da distância (R) da pate­Ia ao eixo de flexão-extensão (+).

Nos movimentos de rotação axial (figs.2-121 a 2-123), os deslocamentos da patelacom respeito à tíbia se realizam no plano fron­tal. Em rotação neutra (fig. 2-121), a direçãodo ligamento menisco-patelar é ligeiramenteoblíqua para baixo e para fora. Durante a rota­ção interna (fig. 2-122), o fêmur gira em rota­ção externa com relação à tíbia, deslocando apatela para fora: o ligamento menisco-patelarfica oblíquo para baixo e para dentro. Durante arotação externa (fig. 2-123), acontece o contrá-

rio; o fêmur arrasta a patela para dentro, de for­ma que o ligamento menisco-patelar fica oblí­quo para baixo e para fora, porém mais oblíquopara fora que na rotação neutra.

Conseqüentemente, os deslocamentos dapatela com relação à tíbia são indispensáveistanto para os, movimentos de fiexão-extensãoquanto para os de rotação axial.

Graças a um'modelo mecânico se demons­trou (ver modelo II ao final deste volume) que apatela amolda a tróclea e o perfil anterior doscôndilos. De fato, nos seus deslocamentos, a pa­tela está unida à tíbia pelo ligamento menisco­patelar e ao fêmur pelas asas patelares (ver pági­na seguinte). Quando os côndilos realizam seumovimento sobre as glenóides no percurso daflexão do joelho, a face posterior da patela,arrastada por suas conexões ligamentares, gerageometricamente o perfil anterior dos côndilosrepresentado pela curvatura envolvente das su­cessivas posições da face posterior da patela. Operfil anterior dos côndilos depende essencial­mente das conexões mecânicas da pateIa e dasua disposição, assim como o seu perfil poste­rior depende dos ligamentos cruzados.

Já citamos anteriormente (pág. 92) de quemaneira o perfil côndilo-troclear está literalmen­te "fabricado" pela tíbia e a patela, unidas ao fê­mur pelo sistema de cruzados por uma parte, epelo ligamento e as asas patelares por outra.

Certas intervenções cirúrgicas, ao transpora tuberosidade tibial para diante (Maquet) ou pa­ra dentro (Elmslie), modificam as conexões en­tre a patela e a tróclea, e principalmente os com­ponentes de coaptação e subluxação externa, oque explica que eles se pratiquem nas síndro­mes patelares.

Page 41: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-122

o

Fig.2-120

Fig.2-121

2. MEMBRO INFERIOR 113

Page 42: Capitulo 2 Joelho

114 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS LATERAIS DO JOELHO

A estabilidade da articulação do joelho depen­de de ligamentos poderosos, que são os ligamentoscruzados e laterais.

Os ligamentos laterais reforçam a cápsula ar­ticular pelo seu lado interno e externo.

Eles asseguram a estabilidade lateral dojoelho em extensão.

O ligamento lateral interno (fig. 2-124) seestende da face cutânea do côndilo interno até a ex­

tremidade superior da tíbia (LU):

- sua inserção superior se situa na parte pós­tero-superior da face cutânea, atrás e acimada linha dos centros da curvatura (XX') docôndi10 (ver pág. 90);

- sua inserção inferior se situa atrás da zonade inserção dos músculos da "pata de gan­so", sobre a face interna da tíbia;

- suas fibras anteriores são diferentes da cáp­sula e compõem o seu fascículo superficial;

- suas fibras posteriores, que seguem as ante­riores, se confundem mais ou menos com acápsula, formando uma lâmina triangularde vértice posterior; este feixe profundocontém inserções muito próximas à faceperiférica interna do menisco interno na suaface profunda, constituindo assim um pon­to de união essencial, que alguns autoresdenominam o ponto do ângulo póstero-in­terno ou PAPI;

-. sua direção é oblíqua para baixo e paradiante; portanto, cruzada no espaço coma direção do ligamento lateral externo(seta A).

O ligamento lateral externo (fig. 2-125) seestende da face cutânea do côndilo externo até a ca­

beça da fíbula (LLE):

- sua inserção superior está localizada acimae atrás da linha dos centros da curvatura

(yy') do côndilo externo;

- sua inserção inferior se localiza na zona an­terior da cabeça da fibula; no interior dazona de inserção do bíceps;

- se diferencia da cápsula em todo seu tra­jeto;

- está separado da face periférica do meniscoexterno pela passagem do tendão do poplí­teo,que participa no que alguns autores de­nominam o ponto do ângulo póstero-exter­no ou PAPE;

- é oblíquo para baixo e para trás; de for­ma que a sua direção Sy cruza no espaçocom a direção do ligamento lateral inter­no (seta B).

Nestes dois esquemas (figs. 2-124 e 2-125) es­tão desenhadas as asas menisco-patelares (1 e 2) eas asas patelares (3'e 4) que mantêm a patela liga­da à tróclea femoral.

Os ligamentos laterais se contraem duran­te a extensão (figs. 2-126 e 2-128) e se disten­dem na flexão (figs. 2-127 e 2-129). Nos esque­mas (figs. 2-126 e 2-127) vemos a diferença decomprimento (d) do ligamento lateral interno en­tre a extensão e a flexão, além da obliqüidade pa­ra diante e para baixo que é um pouco mais acen­tuada. No lado externo (figs. 2-128 e 2-129), tam­bém se põem em evidência uma diferença de com­primento (e) do ligamento lateral externo e urnamudança de direção: de ser oblíquo para baixo epara trás, ele passa a ser oblíquo para baixo e li­geiramente para diante.

A mudança de tensão dos ligamentos pode serfacilmente ilustrada por um modelo mecânico (fig.2-130): uma cunha C se desliza da posição I à2 numa prancha B, esta cunha está encaixada num"estribo" fixo em a na prancha B; quando a cunha Cse desliza de 1 a 2, o estribo, que supostamente éelástico, se contrai e adquire um novo comprimentoab', a diferença de comprimento e corresponde à di­ferença de espessura da cunha entre as duas posi­ções 1 e 2.

Quanto ao joelho, à medida que a extensão secompleta, o côndilo se interpõe, como uma cunha,entre a glenóide e a inserção superior do ligamentolateral. O côndilo desempenha a função de urnacunha porque seu raio de curvatura aumenta regu­larmente, de trás para diante, e porque os ligamen­tos laterais se fixam na concavidade da linha doscentros da curvatura. A flexão de 30° que distendeos ligamentos laterais é a posição de imobilizaçãoapós a sutura dos ligamentos laterais.

Page 43: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INrERIOR 115

Fig.2-124 Fig.2-125

Fig.2-130

Fig.2-127 Fig.2-126 Fig.2-128 Fig.2-129

Page 44: Capitulo 2 Joelho

116 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE TRANSVERSAL DO JOELHO

o joelho está sujeito a importantes forçaslaterais e a estrutura das extremidades ósseas(fig. 2-131) representa estas violências mecâni­cas. Do mesmo modo que na extremidade supe­rior do fêmur, se encontram sistemas de trabécu­Ias ósseas que constituem as linhas de força me­cânica:

- a porção inferior do fêmur está estru­turada por dois sistemas trabeculares:um deles se inicia na cortical interna e

se expande ao côndilo do mesmo lado(fibras de compressão) e ao côndilo con­tralateral (fibras de tração); e o outro saida cortical externa e fica numa disposi­ção simétrica; ele é um sistema de trabé­culas horizontais que une ambos os côn­dilos;

- a porção superior da tíbia possui umaestrutura semelhante, com dois sistemasque se iniciam nas corticais interna e ex­terna e se expandem para baixo da gle­nóide do mesmo lado (fibras de com­pressão) e da glenóide contralateral (fi­bras de tração); com trabéculas horizon­tais que unem ambas as glenóides.

Devido à inclinação do eixo femoral parabaixo e para dentro, a força (F) que vai para aporção superior da tíbia não é totalmente verti­cal (fig. 2-132), o que permite que ela seja de­composta numa força vertical (v) e em outratransversal (t) dirigida horizontalmente paradentro. Ao deslocar a articulação para dentro,este componente (t) tem a tendência a acentuaro valgo ao fazer abrir a interlinha em um ângu-

10 (a) aberto para dentro. O sistema ligamentarinterno é o que norn1almente se opõe a este des­locamento.

Quanto mais acentuado é o valgo (fig.2-133), mais fürte é o componente transversal(t): para uma direção F2 que corresponde a umvalgo de 1600 (genu valgo), o componentetransversal t2 é duas vezes maior que no casode um valgo normal de 1700 (Fj e tJ Daí sededuz que quanto mais acentuado seja o val­go, mais ele necessita do sistema ligamentarinterno e maior é a tendência a acentuar-se.

Nos traumatismos das faces laterais do

joelho podem produzir-se fraturas da extremida­de superior da tíbia. Se o traumatismo se loca­liza na face interna do joelho (fig. 2-134), eletem a tendência a endireitar o valgo fisiológicoe determina em primeiro lugar uma fratura com­pleta do platô tibial interno (1), e também umaruptura do ligamento lateral externo (2), se aforça não está esgotada. Quando o ligamento é oprimeiro em romper-se, não se produz a fraturado platô tibial.

Quando o traumatismo se localiza na fa­ce externa do joelho (fig. 2-135), como no ca­so de um choque ocasionado por um pára-cho­ques de um carro, em primeiro lugar, o côndiloexterno se desloca ligeiramente para dentro, pa­ra introduzir-se depois na glenóide externa e fi­nalmente fazer estalar a cortical externa do pla­tô tibial: desta forma, se produz uma fraturamista (afundamento-separação) do platô tibialexterno.

Page 45: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-132

a

Fig.2-133

Fig.2-135

2. MEMBRO INFERIOR 117

Fig.2-131

Page 46: Capitulo 2 Joelho

118 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE TRANSVERSAL DO JOELHO(continuação)

Durante a marcha e a corrida, o joelho estácontinuamente submetido a forças laterais. Em al­guns casos, o corpo está em desequilíbrio internosobre o joelho que suporta o peso (fig. 2-136), oque provoca um aumento do valgo fisiológico euma abertura da inter1inha para dentro. Se a forçatransversal é muito importante, o ligamento lateralinterno se rompe (fig. 2-137): é o que se denomi­na entorse grave do ligamento lateral interno (énecessário reforçar esta,afirmação destacando queuma entorse grave nunca é o resultado de uma sim­ples posição de desequi1íbrio, para que isto aconte­ça é necessário um choque violento).

No outro sentido, um desequilíbrio externosobre o joelho de suporte de peso (fig. 2-138) tema tendência a endireitar o valgo fisiológico e a abrira interlinha para fora. Se a face interna do joelho so­fre um traumatismo violento, o ligamento lateral ex­terno pode sofrer uma ruptura (fig. 2-139): é a en­torse grave do ligamento lateral externo.

Quando existe uma entorse grave do joelho,os movimentos de lateralidade que se realizam aoredor de um eixo ântero-posterior podem aparecer.A exploração destes movimentos anormais se rea­liza tanto com o joelho em máxima extensão comoem ligeira flexão e sempre se compara com o ladosupostamente normal.

Estando o joelho em extensão (fig. 2"141),ou até mesmo em hiperextensão, o peso do mem­bro o desloca nesta direção:

- um movimento de lateralidade externa,ou em va1go, representa uma ruptura asso­ciada do ligamento lateral interno (fig. 2­137) e das formações fibroligamentares lo­calizadas atrás; se trata da convexidadecondiliana interna e do PAPI;

- o movimento de lateralidade interna, ouem varo, representa uma ruptura associadado ligamento lateral externo (fig. 2-138)e das formações fibro1igamentares poste­riores, principalmente a convexidade con­diliana externa.

Com o joelho flexionado 10° (fig. 2-142), osmesmos movimentos anormais representam umaruptura isolada do LU ou do LLE respectivamen­te, visto que as convexidades condilianas estão dis-

tendidas pelos primeiros graus de flexão. O fato deque não se pode estar seguro da posição em que serealizaram as radiografias faz com que não sejafidedigno o diagnóstico radiológico da oscilação dainterlinha interna em va1go forçado ou da oscilaçãoexterna em varo.

Na verdade, é francamente difícil conseguirum relaxamento muscular total num joelho doloro­so que propicie uma exploração válida. Isso indicao caráter quase obrigatório de uma exploraçãocom anestesia geral.

A entorse grave do joelho compromete a esta­bilidade da articulação. De fato, a ruptura de um li­gamento lateral impede que o joelho possa opor-seàs forças laterais que o solicitam continuamente(figs. 2-136 e 2-138).

Nas forças laterais bruscas da corrida e damarcha, os ligamentos laterais não são os únicosque asseguram a estabilidade do joelho; eles estãoreforçados pelos músculos que constituem liga­mentos ativos autênticos e que são os principaisresponsáveis da estabilidade do joelho (fig. 2-140).

O ligamento lateral externo (LLE) está mui­to reforçado pela banda de Maissiat (BM), contraí­da pelo tensor dafáscia lata - esta contração apa­rece no esquema 2-138.

O ligamento lateral interno (LU) também es­tá reforçado pelos músculos da "pata de ganso":sartório (Sa), semitendinoso (St) e reto interno (Ri)- a contração do sartório pode ser observada no es­quema 2-136.

Portanto, os ligamentos laterais estão "prote­gidos" por tendões consistentes. Eles também es­tão reforçados pelo quadríceps cujas expansões di­retas (Ed) e cruzadas (Ec) constituem, na face an­terior da articulação, uma camada fibrosa. As ex­pansões diretas se opõem à oscilação da interlinhado mesmo lado, e as expansões cruzadas impedema oscilação do lado oposto. Cada músculo age so­bre a estabilidade da articulação em ambos os sen­tidos graças a estes dois tipos de expansões. Deforma que se pode entender perfeitamente a impor­tância da integridade do quadríceps para garan­tir a estabilidade do joelho e, inversamente, as al­terações da estática ('joelho que se afrouxa") quesão o resultado de uma atrofia do quadríceps.

Page 47: Capitulo 2 Joelho

Ed

Ec

Fig.2-140

Fig.2-136@

Fig.2-138

2. MEMBRO INFERIOR 119

~

Fig.2-139

Fig.2-141Fig.2-142

Page 48: Capitulo 2 Joelho

120 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ÂNTERO-POSTERIOR DO JOELHO

A estabilidade do joelho é totalmente dife­rente se está ligeiramente flexionado ou se estáem hiperextensão.

Em alinhamento normal com ligeira fie­xão (fig. 2-143), a força que representa o peso docorpo passa por trás do eixo de flexão-extensãodo joelho e a flexão tem a tendência a aumentarpor si mesma se a contração estática do quadrí­ceps não intervém; portanto, nesta posição, oquadríceps é indispensável para a posição de pé.Pelo contrário, se o joelho se coloca em hiperex­tensão (fig. 2-144), a tendência natural ao aumen­to da citada hiperextensão fica rapidamente blo­queada pelos elementos cápsulo-ligamentaresposteriores (em preto), e é possível manter a po­sição de pé sem a intervenção do qltadríceps: setrata do bloqueio. Isto explica por que nas parali­sias do quadríceps é necessário acentuar o gemirecurvatum para que o paciente possa estar de péou caminhar.

Quando o joelho está em hiperextensão (fig.2-145), o eixo da coxa é oblíquo para baixo e pa­ra trás, e a força f desenvolvida pode decompor­se num vetor vertical (v) que transmite o peso docorpo para o esqueleto da perna, e um vetar ho­rizontal (h), que se dirige para trás e que tem atendência a acentuar a hiperextensão: quanto mais-oblíqua para trás seja a força f, mais importanteserá este vetor (h) e mais solicitados estarão oselementos do plano fibroso posterior; um gelllt re­curvatum muito acentuado termina distendendo osligamentos e se agrava a si mesmo.

Embora não se encontre um obstáculo rígidocomo é o caso do olécrano no cotovelo, a limitaçãoda hiperextensão dojoelho é de uma eficácia extre­ma (fig. 2-146). Esta limitação depende, essencial­mente, de elementos cápsulo-ligamentares e deelementos musculares acessórios.

Os elementos cápsulo-ligamentares contêm:

- o plano fibroso posterior da cápsula(fig.2-147);

- os ligamentos laterais e o cruzado pós­tero-interno (fig. 2-148).

A parte posterior da cápsula articular(fig. 2-147) é reforçada por potentes elementos

fibrosos. A cada lado, da face aos côndilos, umengrossamento da cápsula forma os capas con­dilianas (1), na face posterior, onde se inseremfibras dos gêmeos. Partindo da estilóide fibular,se expande um leque fibroso, o ligamento poplí­teo arqueado, no qual dois fascículos podem serdistinguidos:

- o fascículo externo, ou ligamento lateralexterno curto de Valois, cujas fibras fina­lizam ná capa condiliana externa (2) e nosesamóide do gêmeo externo, ou fabela(3), também nesta camada;

- o fascículo interno, que se expande emforma de leque para dentro e cujas fibrasinferiores (4) constituem o ligamentopoplíteo arqueado, arcada onde o poplí­teo se introduz (seta branca) para pene­trar na articulação; constituindo assim amargem superior do orifício de penetra­ção deste músculo através da cápsula.

No lado interno, o plano fibroso capsular es­tá reforçado pelo ligamento poplíteo oblíquo (5),constituído pelo fascículo recorrente, separadodo lado externo do tendão do semimembranoso(6); dirigindo-se para cima e para fora para termi­nar na camada condiliana externa e fabela.

Todas as formações do plano fibroso poste­rior entram em tensão na hiperextensão (fig.2-148), principalmente as capas condilianas (1).Já vimos anteriormente que a extensão provoca atensão do ligamento lateral externo (7) e do liga­mento lateral interno (8). O ligamento cruzadopóstero-interno (9) também entra em tensão du­rante a extensão. De fato, é fácil constatar que asinserções superiores (A, B, C) destes elementosse projetam para diante durante a hiperextensão,ao redor do centro O. Contudo, trabalhos recentesdemonstraram que o ligamento mais tenso nestaposição é o cruzado ântero-externo.

Por último, os fiexores (fig. 2-149) são fato­res ativos de limitação: os músculos da "pata deganso" (10) que passam por trás do côndilo inter­no, o bíceps (11) e também os gêmeos (12) namedida em que estejam tensos pela flexão dorsalda articulação tíbio-tarsiana.

Page 49: Capitulo 2 Joelho

32

5li \\\\\l11111111111111V. ~ 1/j!l11!lll;. '11111I1111

l1\t\7f---'v

4Fig.2-145

Fig.2-147

7

9

8

Fig.2-148

2. MEMBRO INFERIOR 121

Fig.2-144

Fig.2-149

Page 50: Capitulo 2 Joelho

122 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS DEFESAS PERIFÉRICAS DO JOELHO

As diferentes estruturas cápsulo-ligamentares, des­critas até agora de maneira analítica, se organizam em for­ma de um conjunto estruturado e coerente que constitui asdefesas periféricas do joelho (fig. 2-150).

Neste corte transversal do joelho, no nível da inter­linha, se podem reconhecer:

- por dentro, a glenóide interna (1), com o meniscointerno (2);

- por fora, a glenóide externa (3), com o meniscoexterno (4), unido pela frente com o interno peloligamento jugal (5);

- pela frente, a patela (6), recobrindo a tuberosida­de tibial anterior (TTA) (7), e a inserção anteriordo LCAE (8);

- por trás, a inserção posterior do LCPI (9).

Três formações principais são responsáveis pelas de­fesas periféricas do joelho: o ligamento lateral interno, o li­gamento lateral externo e o plano cápsulo-fibroso posterior:

- o ligamento lateral interno (10) apresenta, segun-do F. Bonnel, um impedimento à ruptura de115 kg/cm' e uma deformação à ruptura de 12,5%:

- o ligamento lateral externo (11) apresenta umimpedimento à ruptura de 276 kg/cm' e uma de­formação à ruptura de 19%. Portanto, e sur­preendentemente, é mais resistente e mais elásti­co que o interno;

- o plano cápsulo-fibroso posterior está formadopela convexidade condiliana interna (12), a convexi­dade condiliana externa (13) com o seu sesamóideou fabela (14) e os reforços: o ligamento poplíteooblíquo (15) e o ligamento poplíteo arqueado (16).

As formações acessórias constituem quatro camadasfibrotendinosas de resistência e importância diferentes:

• a camada fibrotendinosa póstero-interna é amais importante. F. Bonnel denomina núcleo fibrotendino­so, o que sem dúvida alguma é correto no caso do póstero­interno, porém de jeito nenhum para as outras. G. Bousquetdestaca um ponto de ângulo póstero-interno, abreviadoPAPI, o que representa um aspecto mais cirúrgico que ana­tômico. Em todo caso, esta camada fibrotendinosa póstero­interna, situada detrás do LU, é constituída por:

- fibras mais posteriores do LU (10 bis),

- margem interna da convexidade condiliana inter-na (12),

- dois prolongamentos do tendão do sernimembra­noso (16), o fascículo refletido (17) que percorrea margem infraglenóide interna e a expansão me­niscal (18), que se fixa na periferia posterior domenisco interno, da qual constitui um ponto im­portante de inserção.

• a camada fibrotendinosa póstero-externa ou PA­PE, bastante menos potente que a interna, visto que o me­rusco externo, neste nível, está separado da cápsula e doLLE pela passagem do tendão do poplíteo (19) que se in­sere no côndilo externo. Contudo, este tendão também temuma expansão meniscal (20) que mantém a parte posteriordo menisco externo. O reforço fibroso se completa com oligamento lateral externo curto (21) E; a margem externa daconvexidade condiliana externa.

• a camada fibrotendinosa ântero-externa (PAAE)é constituída pela'banda de Maissiat (22), que envia umaexpansão (23) para a margem externa da pateIa, e pelas ex­pansões diretas e cruzadas dos vastos (24) que formam aparte externa do aparelho extensor.

• a camada fibrotendinosa ântero-interna (PAAI)é constituída pelas expansões diretas e cruzadas dos vastos(25), reforçadas pela expansão do tendão do sartório (26)que se insere na margem interna da patela.

Os músculos periarticulares também partiCIpamnas defesas periféricas do joelho: com a sua contração per­feitamente sincronizada no percurso do esquema motor ena previsão dos possíveis problemas que o córtex cerebralantecipa, eles se opõem às distorsões articulares, sendouma ajuda indispensável para os ligamentos que só podemreagir passivamente. Entre estes músculos, o mais impor­tante é o quadríceps, sem o qual não é Úável nenhuma es­tabilidade no joelho; pela sua potência e sua perfeita coor­dinação, é inclusive capaz, em certa medida, de compensaras claudicações ligamentares. O seu bom trofismo é umacondição imprescindível para o sucesso de qualquer inter­venção cirúrgica. Sabemos que ele é muito propenso a atro­fiar-se e difícil de recuperar, então concluímos que ele me­rece uma grande consideração por parte dos cirurgiões edos fisioterapeutas.

No lado externo, a banda de Maissiat (22) deve con­siderar-se como o tendão terminal do deltóide glúteo. Nolado póstero-interno se localizam o semimembranoso (16)e os músculos da "pata de ganso": o sartório (27), o reto in­terno (28) e o sernitendinoso (29).

No lado póstero-externo se situam dois músculos: opoplíteo (19), cuja fisiologia será analisada mais adiante, eo bíceps (30), cujo potente tendão reforça o LLE.

Finalmente, por trás, o espaço está ocupado pelos gê­meos que se inserem por cima e nas convexidades condilia­nas: o gêmeo interno (31), cuja lâmina tendinosa de inser­ção cruza em forma de X alongada o tendão do semimem­branoso através da bolsa serosa do gêmeo interno e do se­mimembranoso (32), comunica, amiúde, com a sinovial ar­ticular; o gêmeo externo (33), cuja lâmina tendinosa de in­serção cruza da mesma maneira o tendão do bíceps, porémsem interposição da bolsa serosa.

Page 51: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 123

30

13

1433151916

12

29

6

25

~247

262 /7 fAq.~"w-S~~' ~23// h _f • ~~, :;. =-'~

58

10

11' ..•.\/I /~- -------' -..::3.\ \ \ \ \ \ \ \ \\ -:::::..I'Q.,\\\ ~22

4

27

~19

3

17

1118

9

28

20

Fig.2-150

Page 52: Capitulo 2 Joelho

124 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS CRUZADOS DO JOELHO

Quando se abre pela frente a articulação dojoelho (fig. 2-151, segundo Rouviere), observa-seque os ligamentos cruzados estão situados empleno centro da articulação, alojando-se principal­mente na incisura intercondiliana.

O primeiro que se encontra é o ligamento cru­zado ântero-externo (1), cuja inserção tibial (5) selocaliza (fig. 2-152, segundo Rouviere) na superfí"cie pré-espinhal, ao longo da glenóide interna, en­tre a inserção do como anterior do menisco interno(7) pela frente e a do menisco externo (8) por trás(ver também a figo 2-73). O seu trajeto é oblíquopara cima, para trás e para fora e sua inserção fe­moral (1) se realiza (fig. 2-153, segundo Rouvie­re) sobre a face axial do côndilo externo, no nívelde uma zona estreita e alongada verticalmente emcontato com a cartilagem, na parte mais posteriordesta face (ver figo 2-77). O ligamento ântero-ex­temo é o mais anterior sobre a tíbia e o mais exter­

no sobre o fêmur, fazendo jus ao nome que o iden­tifica, de maneira que é preferível seguir denomi­nando-o ântero-externo e não simplesmente ante­rior, como se faz na atualidade.

Descrevem-se três fascículos:

- o fascículo ântero-interno: o mais longo, oprimeiro que se localiza e o mais expostoaos traumatismos;

--'-'-o fascículo póstero-externo: oculto pelo an­terior, é o que persiste nas rupturas parciais;

- o fascículo intermédio.

Em conjunto, na sua forma se apresenta torci­do sobre si mesmo, visto que suas fibras mais ante­riores sobre a tíbia apresentam as inserções mais in­feriores e mais anteriores no fêmur, e suas fibrasmais posteriores sobre a tíbia se inserem na partemais superior do fêmur, embora todas as suas fibrasnão tenham o mesmo comprimento.

Segundo F. Bonnel, o comprimento médio dasfibras do LCAE varia entre 1,85 e 3,35 cm; assimsendo, existe uma grande diferença dependendo dalocalização das fibras.

O ligamento cruzado póstero-interno (2) apa­rece no fundo da incisura intercondiliana, por trás doligamento cruzado ântero-externo (fig. 2-151). A suainserção tibial (6) se localiza (fig. 2-152) na partemais posterior da superfície retroespinhal; inclusive

ultrapassa (figs. 2-153 e 2-154, segundo Rouviere)a margem posterior do platô tibial (ver tambémfigo 2-73). A inserção tibial do cruzado póstero-in­terno está localizada bem para trás (fig. 2-152) dainserção dos cornos posteriores do menisco exter­no (9) e do menisco interno (10). O trajeto do pós­tero-interno é oblíquo para diante, para dentro epara cima (fig. 2-154, joelho flexionado em 90°).Sua inserção femoral (2) ocupa o fundo da incisu­ra intercondiliana (fig. 2-155, segundo Rouviere),e inclusive ultrapassa nitidamente (fig. 2-154) aface axial do côndilo interno, ao longo da cartila­gem, no limite inferior desta face, numa zona deinserção alongada horizontalmente (ver tambémfigo 2-76). O ligamento póstero-interno é o maisposterior sobre a tíbia e o mais interno sobre o fê­mur, por isso merece a sua denominação. De formaque é mais correto denominá-Io póstero-interno.

Descrevem-se quatro fascículos:

- o fascículo póstero-externo: o mais poste­rior sobre a tíbia e o mais externo sobre ofêmur;

- o fascículo ântero-interno: o mais anteriorsobre a tíbia e o mais interno sobre o fêmur;

- o fascículo anterior de Humphrey, in­constante;

- o fascículo menisco·femoral de Wrisberg(3), que se insere no como posterior do me­nisco interno (figs. 2-152 e 2-153) para, a se­guir, aderir-se ao corpo do ligamento ao qualacompanha normalmente na sua face ante­rior (fig. 2-151) e inserir-se finalmente comele na face axial do côndilo interno. Existe,às vezes, um equivalente desta mesma dis­posição para o menisco interno (fig. 2-152):algumas fibras (12) do LCAE se inserem nocomo anterior do menisco interno, próximoà inserção do ligamento transverso (11).

Os ligamentos transversos estão em contatoum com o outro (fig. 2-155, com os ligamentos cru­zados perto da sua inserção femoral seccionados)por sua margem axial, enquanto o ligamento exter­no passa por fora do interno. Estes ligamentos nãoestão livres no interior da cavidade articular, mas es­tão recobertos pela sinovial (4) e estabelecem im"portantes conexões com a cápsula, como veremosna página seguinte.

Page 53: Capitulo 2 Joelho

42

1

4

Fig.2-151

Fig.2-155

102

6

3

2

Fig.2-152

2. MEMBRO INFERIOR 125

32

3

Fig.2-1548

3

Page 54: Capitulo 2 Joelho

126 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÕES DA CÁPSULA E DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Os ligamentos cruzados estabelecem co­nexões tão íntimas com a cápsula articular quepoderia dizer-se que na realidade eles são es­pessamentos da cápsula articular, e que, co­mo tais, são parte integrante dela. Na página98 vimos como a cápsula penetra na incisuraintercondiliana para formar um septo duplo noeixo da articulação. Por comodidade, dizemosque a inserção tibial da cápsula (fig. 2-156)deixava as inserções dos ligamentos cruzadosfora da articulação, quando na realidade a in­serção da cápsula passa pela inserção dos li­gamentos cruzados. Simplesmente, a espessu­ra capsular dos cruzados se "espalhe" pela fa­ce exterior da cápsula e, portanto, no interiordo septo duplo.

Em vista póstero-interna (fig. 2-157),após ter sido removido o côndilo interno e sec­cionado parte da cápsula, o ligamento cruzadoântero-externo aparece nitidamente "incrusta­do" na lâmina externa do septo capsular (o li­gamento cruzado póstero-interno não pode servisto no desenho).

Em vista póstero-externa (fig. 2-158) nasmesmas condições que a anterior, o ligamentocruzado póstero-interno aparece "incrustado"na lâmina interna do septo capsular.

É necessário destacar que nem todas as fi­bras cruzadas têm o mesmo comprimento, nema mesma orientação (ver também figo 2-159):portanto, durante os movimentos não se con­traem todas simultaneamente (ver pág. 130).

Além disso, estes esquemas permitem des­tacar as capas condilianas, intactas no côndilointerno (fig. 2-158) e que se ressecaram no côn­dilo externo (fig. 2-157).

Em corte vértico-frontal (fig. 2-156), quepassa pela parte posterior dos côndilos, pode-seobservar a divisão da cavidade articular emcompartimentos (o fêmur e a tíbia se separaramartificialmente):

- o septo capsular, reforçado pelos liga­mentos cruzados na parte central, e se­parando a cavidade em duas metades,externa 0 interna; este septo é prolonga­do adiante pelo corpo adiposo (ver pág.100);

- cada uma das duas metades da articula­

ção está separada, por sua vez, pelosmeniscos em dois espaços, o superior ousuprameniscal, que corresponde à in­terlinha fêmoro-meniscal, e o interior ouinframeniscal, que corresponde à in­terlinha tíbio-meniscal.

A presença dos ligamentos cruzados é oque modifica profundamente a estrutura destaarticulação troc1ear (do ponto de vista mecâniconão tem nenhum sentido denominá-Ia bicondi­liana). O LCAE (fig. 2-159), tomando como po­sição de partida sua posição média (1), começahorizontalizando-se (2) sobre o platô tibial du­rante a flexão de 45-50°, até alcançar a sua posi­ção mais elevada (3) na flexão máxima; quandodesce, se aloja na incisura interespinhosa, comose o platô das espinhas tibiais estivesse "serra­do", como quando cortamos pão (destaque). OLCPI (fig. 2-160), no percurso da extensão (A) àflexão máxima (B), varre um setor muito maisimportante (aproximadamente 60°) que o LCAEe, com relação ao fêmur "secciona" a incisuraintercondiliana, separando as duas convexidadesda tróc1ea fisiológica constituída pelos dois côn­dilos.

Page 55: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-156

2. MEMBRO INFERIOR 127

Fig.2-157

Fig.2-160

Page 56: Capitulo 2 Joelho

128 FISIOLOGIA ARTICULAR

DIREÇÃO DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Vistos em perspectiva (fig. 2-161), os liga­mentos cruzados aparecem realmente como cru­zados no espaço, um com relação ao outro. Noplano sagital (fig. 2-162) estão cruzados (fig. 2­162), o ântero-externo (LCAE) é oblíquo paracima e para trás, enquanto o póstero-interno éoblíquo para cima e para diante. As suas dire­ções também estão cruzadas no plano frontal(fig. 2-163, vista posterior) visto que as suas in­serções tibiais (pontos pretos) estão alinhadas noeixo ântero-posterior (seta S), enquanto as suasinserções femorais estão a 1,7 cm de distância:conseqüentemente, o póstero-interno é oblíquopara cima e para dentro e o ântero-externo éoblíquo para cima e para fora. Pelo contrário, noplano horizontal (ver figo 2-185) eles são para­lelos e entram em contato entre si através da sua

margem axial.

Os ligamentos cruzados não estão somentecruzados entre si, mas também estão cruzadoscom o ligamento lateral do lado homólogo. As­sim sendo, o cruzado ântero-externo se cruzacom o ligamento lateral externo (fig. 2-165) e ocruzado póstero-interno com o ligamento lateralinterno (fig. 2-166). Portanto, existe uma alter­nância regular na obliqüidade dos quatro liga-

mentos quando eles são considerados por or­dem, de fora p?fa dentro e vice-versa.

~xiste uma diferença de inclinação entreos dois ligamentos cruzados (fig. 2-162); com ojoelho em extensão, o ligamento cruzado ântero­externo (LCAE) é mais vertical, enquanto o pós­tero-interno (LCPI) é mais horizontal; aconteceo mesmo com a direção geral das zonas de inser­ção femorais: a do póstero-interno é horizontal(b), enquanto a do ântero-externo é vertical (a).Uma norma mnemotécnica lembra este fato gra­ças ao adágio clássico: "O externo está em péquando o interno está deitado."

Com o joelho flexionado (fig. 2-164), oLCPI, horizontalizado durante a extensão, se en­direita verticalmente, descrevendo um arco decírculo de mais de 60° com relação à tíbia, en­quanto o LCAE se endireita pouco.

A relação de comprimento entre ambos osligamentos cruzados varia, dependendo de cadaindivíduo, porém, junto com as distâncias dospontos de inserção tibiais e femorais, constitui acaracterística própria de cada joelho, visto quedetermina entre outras, como já vimos, o perfildos côndilos.

Page 57: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO mFERIOR 129

LCPI

Fig.2-166

Fig.2-163

LU

LCAE

LCPI

Fig.2-165

a

LLE

~

Fig.2-161

Page 58: Capitulo 2 Joelho

130 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Existe o costume de considerar os ligamen­tos cruzados como cordas quase lineares, fixaspor inserções pontudas. Isto só é verdadeiro nu­ma primeira aproximação e tem a vantagem deesclarecer a ação geral de um ligamento, porémem nenhum caso permite conhecer as suas rea­ções finas. Por este motivo, é necessário levarem conta três fatores:

1. A ESPESSURA DO LIGAMENTO

A espessura e o volume do ligamento sãodiretamente proporcionais à sua resistência e in­versamente proporcionais às suas possibilidadesde alongamento, podendo-se considerar cada fi­bra como uma pequena mola elementar.2. A ESTRUTURA DO LIGAMENTO

Devido à extensão das inserções, nem todasas fibras possuem o mesmo comprimento. Conse­qüência importante: não se solicita cada fibra aomesmo tempo. Como no caso das fibras muscula­res, se trata de um verdadeiro recrutamento dasfibras ligamentares durante o movimento, o quefaz variar a sua elasticidade e a sua resistência.

3. A EXTENSÃO E A DIREÇÃO DASINSERÇÕES

De fato, as fibras não são sempre paralelasentre si, se organizam muito amiúde segundoplanos "ladeados", torcidos sobre si mesmos,porque as linhas de inserção não são paralelasentre si, mas sim, com freqüência, oblíquas ouperpendiculares no espaço; além disso, a direçãorelativa das inserções varia durante o movimen­to, o que contribui para "o recrutamento"; modi­ficando a direção da ação do movimento, consi­derado globalmente. Esta variação na ação dadireção do ligamento não se realiza somente noplano sagital, mas nos três planos do espaço, oque demonstra suas ações complexas e simultâ­neas na estabilidade ântero-posterior, na estabi­lidade lateral e na estabilidade rotatória.

Assim sendo, a geometria dos ligamentoscruzados determina o perfil côndilo-troclear noplano sagital e também nos outros dois planosdo espaço.

Globalmente, os ligamentos cruzados asse­guram a estabilidade ântero-posterior do joe­lho ao mesmo tempo que permitem os movi­mentos de charneira mantendo as superfíciesarticulares em,contato.

A sua função pode ser ilustrada com ummodelo mecânico' (fig. 2-167) fácil de realizar:duas tábuas A e B (vistas pelo corte) unidas en­tre si por fitas (ab e cd) que se estendem de umlado de uma delas ao lado oposto da outra, deforma que podem bascular uma com relação àoutra, ao redor de duas chameiras: quando a seconfunde com c, e b se confunde com d, porém éimpossível o deslizamento de uma sobre a outra.

Os ligamentos cruzados do joelho têm umamontagem e um funcionamento semelhantes,com a diferença de que não existem apenas doispontos de chameira, mas uma série de pontosalinhados sobre a curvatura do côndilo. Como

acontece no modelo, o deslizamento ântero-pos­terior é impossível.

Seguindo com a demonstração, os liga­mentos estão representados de forma linear(LCAE = ab, LCPI = cd) nas figuras pequenas;nas maiores estão representadas as fibras extre­mas e médias, assim como as linhas de inserção.

Partindo da posição de alinhamento normal(fig. 2-168), ou de uma flexão mínima de 30°(fig. 2-169), na qual os ligamentos cruzados es­tão contraídos igualmente, a flexão faz basculara base femoral bc (fig. 2-170), enquanto o LCPIcd se endireita e o LCAE ab se horizontaliza. No

esquema mais completo (fig. 2-171) com flexãode 60°, a tensão das fibras elementares de cadaum dos ligamentos cruzados varia muito pouco.

Page 59: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 131

A

Fig.2-167

Fig.2-168

~t~dA

Fig.2-169

/////30° /

~/~/I /

I /I /

I i" /I // /~!////

, I \ I

Fig.2-170

Page 60: Capitulo 2 Joelho

132 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS(continuação)

A partir do momento em que a flexão au­menta até 90° (fig. 2-172) e depois até 120°(fig. 2-173), o LCPI se endireita verticalmentee se contrai proporcionalmente mais que oLCAE: no detalhe do esquema (fig. 2-174) sepode observar que as fibras médias e inferioresdo LCAE estão distendidas (-), enquanto as fi­bras ântero-superiores são as únicas que estãotensas (+); pelo contrário, no caso do LCPI asfibras póstero-superiores estão pouco distendi­das (-), enquanto as fibras ântero-inferiores es­tão tensas (+). O cruzado póstero-interno es­tá tenso em flexão.

Em extensão e hiperextensão (fig. 2-175),com relação à posição de partida (figs. 2-176 e2-177), todas as fibras do LCAE estão, pelo con­trário, tensas (+), enquanto só as fibras póstero-su­periores do LCPI estão tensas (+); por outro lado,

em hiperextensão (fig. 2-178), o fundo da incisuraintercondiliana c se apóia sobre o LCAE que secontrai como se fosse um cavalete. O cruzado ân­tero-externo está tenso em extensão e é um dos

freios da hiperextensão.

Então, os trabalhos recentes de F. Bonnelconfirmam o que pensava Strasser (1917); quem,graças a um modelo mecânico, descobriu que oLCAE está tenso na extensão e o LCPI na flexão.Contudo, uma análise mais minuciosa das con­dições mecânicas confirmam que Roud (1913)também estava certo, visto que pensava que oscruzados permanecem sempre tensos em algu­mas de suas fibras. por causa do seu comprimen­to diferente. Como acontece amiúde em biome­

cânica, duas propostas aparentemente contradi­tórias podem ser certas simultaneamente e nãose exc1uirem.

Page 61: Capitulo 2 Joelho

2. :-'JEMBRO INFERIOR 133

d

Fig.2-172

Fig.2-173

\

a

\ I\ I

~\ I\ I\ I\ I\ I II ,I,

IIIIII: \ \ 1200r-I"I "I "I ' .I "I 'IIIIIII

IIIIII

\ I Fig.2-177I

/////300 /

~/II /I /I /I j//I //

V1//'I / I

Page 62: Capitulo 2 Joelho

134 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS(continuação)

Antes, analisando o movimento dos côndilossobre as glenóides (ver pág. 94), se pôde constatarque este movimento combina rolamento e desliza­mento; assim como o rolamento pode ser explica~do com facilidade, mas, como explicar o desliza­mento numa articulação tão pouco encaixada co­mo o joelho? Certamente, intervêm fatores ati­vos; os extensores puxam a tíbia sobre ofêmur pa­ra diante na extensão (ver pág. 146) e inversamen­te os tlexores fazem com que o platô tibial se des­lize para trás na tlexão; porém, quando os movi­mentos numa amostra anatômica são estudados,predomina o papel dos fatores passivos e, maisconcretamente, o dos ligamentos cruzados. Os li­gamentos cruzados solicitam aos côndilos de for­ma que fazem com que se deslizem sobre as gle­nóides em sentido inverso ao do seu rolamento.

Partindo (fig. 2-179) da extensão (I), se ocôndilo rolasse sem deslizar-se deveria recuar à

posição II e a inserção femoral b do cruzado ânte­ro-externo ab deveria situar-se em b', descreven­do o suposto trajeto bb', eventualidade ilustradana figura 2-108 (página 107), e causa das lesõesdo como posterior do menisco interno. Contudo, oponto b só pode deslocar-se ao longo de uma cir­cunferência de centro e e de raio ab (supondo queo ligamento seja inextensível), a conseqüência éque o trajeto real de b não é bb', mas bb", o quecorresponde à posição m do côndilo, mais ante­rior que a posição II de comprimento e. Durante aflexão, o cruzado ântero-externo age dirigindo ocôndilo para frente. Então, pode-se dizer que o li­gamento cruzado ântero-externo é responsávelpelo deslizamento do côndilo para diante, asso­ciado ao seu rolamento para trás.

Do mesmo modo pode-se demonstrar (fig.2-180) o papel do cruzado póstero-interno durantea extensão. Passando da posição I à posição II porum rolamento simples, o ligamento póstero-internocd desloca o côndilo para trás, a trajetória de sua in­serção femoral c não é cc', mas sim cc" numa cir­cunferência de centro d e de raio dc. A conseqüên­cia é que o côndilo se desloca a um comprimento fpara trás para situar-se numa posição m.Durante aextensão, o ligamento cruzado póstero-interno éresponsável pelo deslizamento do côndilo paratrás, associado ao seu rolamento para diante.

Esta demonstração se pode retomar graças aum modelo mecânico (ver modelo m no final des­te volume), que faz reaparecer a tensão alternadados ligamentos representados por elásticos.

Os movimentos de gaveta são movimentosanormais de deslocamento ântero-posterior da tí­bia com respeito ao fêmur. Exploram-se em duasposições: com o joelho tlexionado em ângulo retoe com o joelho ~m extensão máxima.

Com o joelho fiexionado em ângulo reto(fig. 183): o paciente em decúbito supino sobre umplano duro, o joelho que vai ser explorado em ân­gulo reto, o pé apoiado sobre a mesa de exame; oexaminador bloqueia o pé do paciente sentando-seem cima dele, para a seguir segurar com ambas asmãos a extremidade superior da perna; pluando pa­ra ele, explora uma gaveta anterior, empurrandopara trás explora uma gaveta posterior; esta explo­ração deve ser realizada com o pé em rotação neu­tra - gaveta direta -, o pé em rotação externa ­gaveta em rotação externa - e o pé em rotação in­terna - gaveta em rotação interna -. É preferívelesta terminologia à denominação "gaveta rotatóriaexterna ou interna", que tem implícita uma idéiade rotação durante o movimento de gaveta.

A gaveta posterior (fig. 2-181) se manifestapor um deslocamento da tíbia sobre o fêmur paratrás; devido a uma ruptura do cruzado póstero-in­temo. A regra mnemotécnica é simples: gavetaposterior = cruzado posterior.

A gaveta anterior (fig. 2-182) se traduz porum deslocamento para diante da tíbia sobre o fê­mur devido à ruptura do cruzado ântero-externo.Gaveta anterior = cruzado anterior.

Com o joelho em extensão, uma mão seguraa face posterior da coxa, enquanto a mão anterior,segurando a extremidade superior da perna, tentamover a perna de diante para trás e vice-versa: é oteste de Lachmann- Trillat. Se um deslocamento

para frente pode ser percebido, este "Lachmannanterior" é a prova de uma ruptura do LCAE, as­sociada por Bousquet a uma ruptura da camada fi­brotendinosa póstero-externa (PAPE); esta explo­ração é complicada, visto que o movimento é deescassa amplitude e, por conseguinte, difícil de seafirmar.

Page 63: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-183

Fig.2-179

Fig.2-181

2. MEMBRO INFERIOR 135

Fig.2-180

Fig.2-182

Page 64: Capitulo 2 Joelho

136 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO

Sabemos que os movimentos de rotaçãolongitudinal do joelho só são viáveis quando eleestá flexionado. Contudo, na extensão máxima,a rotação longitudinal é impossível: ele está im­pedido pela tensão dos ligamentos cruzados elaterais.

Em visão anterior do joelho em rotaçãoneutra (fig. 2-184, as superfícies se ilustram "se­paradas" devido a uma "elasticidade" anormaldos ligamentos), os ligamentos cruzados estãobem cruzados um com relação ao outro, e suadupla obliqüidade, bem visível em vista de pla­no (fig. 2-185), faz com que esbocem um movi­mento de enrolamento um ao redor do outro.

Durante a rotação interna da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-186, vista anterior), a direção dos li­gamentos é nitidamente mais cruzada no planofrontal (detalhe), enquanto no plano horizontal(fig. 2-187, vista superior) entram em contato en­tre si através da sua margem axial (detalhe); des­ta fOffi1a,se enrolam um ao redor do outro (fig.2-188) e se contraem mutuamente (fig. 2-189) co­mo as cordas de um "torniquete", conseguindo aaproximação das supeifíâes da tiNa e do fêmur,embora a rotação interna se bloqueie rapidamente.

Simultaneamente, como o centro desta ro­tação - marcado com uma cruz - (fig. 2-187)não coincide com o centro da articulação (de fa­to corresponde à vertente interna da espinha ti­bial interna), este movimento distende o LCPI(-) e contrai o LCAE (+) assim como a sua ex­pansão para o como anterior do menisco inter­no, que se desloca para trás.

Durante a rotação externa da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-190, vista anterior), os ligamentostêm a tendência a tornar-se paralelos (detalhe),enquanto no plano horizontal (fig. 2-191, vistasuperior) estão mais cruzados, porém perdem ocontato de sua margem axial, distendendo o"torniquete" e permitindo uma ligeira separa­ção das superfícies articulares (fig. 2-193). Porconseguinte, a rotação externa não está limitadapela tensão dos ligamentos cruzados.

Contudo, o fato de que o centro de rota­ção não coincida com o centro da articulação

(fig. 2-191) determina, por razões inversas àrotação interna, uma distensão do LCAE (-) euma tensão do LCPI (+) assim como do freiomenisco-femoral (seta branca) que se insere nocorno posterior do menisco interno, deslocan­do-o para diante.

Os ligamentos cruzados impedem a rota­ção interna do joelho estendido.

A rotação, interna contrai o LCAE e dis­tende o LCPI.

A rotação externa contrai o LCPI e dis­tende o LCAE.

Donald B. Slocum e Robert L. Larson (J. Bone andJoint Surg., março 68) analisaram a estabilidade rotatóriadojoelho fiexionado nos esportistas, principalmente nos jo­gadores de futebol, que quando giram bruscamente para olado oposto da perna que suporta o peso solicitam brusca­mente o seu joelho em rotação externa. Estes autores de­monstraram a função relevante que desempenha a parte in­terna da cápsula:

- o seu terço anterior está excessivamente exposto àruptura se o traumatismo em valgo-rotação exter­na ocorre com o joelho tlexionado em 30 a 90°;

- o seu terço posterior é vulnerável sempre que ojoelho esteja estendido;

- o seu terço médio, assimilado a um fascículo pro­fundo do ligamento lateral interno, se rompequando o traumatismo ocorre com o joelho emtlexão de 30 a 90°.

Além disso, se o joelho está tlexionado em 90° oumais, o ligamento cruzado ântero-externo começa a disten­der-se durante os 15-20 primeiros graus de rotação externa,para a seguir contrair-se e inclusive romper-se enrolando­se na face axial do côndilo externo se a rotação externacontinua.

Finalmente, a metade posterior do menisco interno,pelas suas conexões capsulares com a tíbia, pode impedir,por si mesma, a rotação externa com o joelho tlexionado.

Em conclusão, um traumatismo em valgo-rotaçãoexterna com o joelho tlexionado produz sucessivamente eseguindo uma força crescente:

- uma ruptura do terço anterior da cápsula;

- uma ruptura do ligamento lateral interno, come-çando com a camada profunda primeiro e conti­nuando com as fibras superficiais;

- uma ruptura do ligamento cruzado ântero-externo;

- uma desinserção do menisco interno.

Page 65: Capitulo 2 Joelho

J~Fig.2-192

\ Fig.2-191

Fig.2-190

Fig.2-185

Fig.2-193

Fig.2-188

Fig.2-189

Page 66: Capitulo 2 Joelho

138 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO(continuação)

A função dos ligamentos laterais na esta­bilidade rotatória do joelho pode ser explicadapor razões simétricas.

Em posição de rotação neutra (fig. 2-194,vista superior, côndilos transparentes), a obli­qüidade do LU para baixo e para diante, e doLLE para baixo e para trás, faz com que esbo­cem um movimento de enrolamento ao redor da

porção superior da tíbia.

A rotação interna (fig. 2-195) se opõe aeste enrolamento, e diminui a obliqüidade dosligamentos laterais, embora sua tendência seja ade converter-se em paralelos (fig. 2-196, vistapóstero-intema: superfícies "separadas"); comob enrolamento diminui, as superfícies articulares

estão menos coaptadas pelos ligamentos laterais(fig. 2-197) - enquanto estão mais coaptadaspelos ligamentos cruzados. O "jogo" que permi­te a distensão .dos ligamentos laterais é compen­sado pela tensão dos cruzados.

Ao contrário; a rotação externa (fig. 2-198)aumenta o enrolamento (fig. 2-200), com o qualas superfícies articulares se aproximam (fig.2-200) e se limita o movimento, enquanto oscruzados se distendem.

Os ligamentos laterais limitam a rotaçãoexterna, os cruzados a rotação interna.

A estabilidade rotatória do joelho em ex­tensão está assegurada tanto pelos ligamentoslaterais quanto pelos ligamentos cruzados.

Page 67: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 139

Fig.2-197

Fig.2-194

Fig.2·199

~

Fig.2-198

Fig.2-200

Fig.2-196

Page 68: Capitulo 2 Joelho

140 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO INTERNA

Junto com os testes estáticos de estabilida­de do joelho, tão clássicos como a exploração dalateralidade ou da gaveta, se elaboraram testesdinâmicos de estabilidade (ou de instabilidade)que pretendem a aparição de um movimentoanormal inclusive no percurso de um movimen­to de prova. Estes testes dinâmicos de instabili­dade são numerosos (cada escola de cirurgia dojoelho propõe mais um em cada congresso!), porisso é necessário tentar classificá-los e, princi­palmente, destacar os mais significantes.

O mais prático é classificar estes testes di-nâmicos em dois grupos:

- os testes em valgo-rotação interna e

- os testes em valgo-rotação externa.

Em primeiro lugar vamos analisar os testesdinâmicos em valgo-rotação interna.

O teste de Mac-Intosh ou lateral PivotShift Test é o mais conhecido e utilizado. Po­

de ser explorado com o paciente em decúbitosupino (fig. 2-201) ou em inclinação de 45°(fig. 2-202). No primeiro caso (fig. 2-201), amão que segura o pé pela planta força uma ro­tação interna, enquanto o próprio peso domembro aumenta um valgo no joelho. No se­gundo caso (fig. 2-202), a mão segura o pé pe­la face anterior do tornozelo passando por trásdele e provocando uma rotação interna com aextensão do punho. A posição de partida dojoelho é a extensão (fig. 2-201), a mão livreempurra o joelho para diante para esboçar aflexão e para baixo para aumentar o valgo. Du­rante este movimento de flexão (fig. 2-202),para os 25-30°, após ter experimentado umaresistência, se percebe de repente um desblo­queio, enquanto se aprecia e se observa o côn-

dilo femoral externo pular, literalmente, paradiante do platô tibia1 externo.

A positividade do teste de Mac-Intosh, ouseja, a existência de um ressalto externo em rota­ção interna, diagnostica uma ruptura doLCAE. De fato, o LCAE, ao limitar a rotação in­terna, se o joelho está em extensão e rotação in­terna (fig. 2-203), o côndilo femoral externo sesubluxa posteriormente (SLP) sobre a vertenteposterior (1) da "lombada" da glenóide externa;é mantido nesta situação pelo tensor da fáscia la­ta (TFL) e pelo valgo que coaptam o côndilo so­bre a glenóide. Enquanto a fáscia lata passa pelafrente da lombada, o côndilo permanece blo­queado em subluxação posterior, porém quandose ultrapassa este ponto devido a uma ftexãocrescente (fig. 2-204), o côndilo supera o vértice(S) e se bloqueia para diante (2), sobre a verten­te anterior onde permanece retido (fig. 2~204) pe­lo LCPI. Um fato importante é a sensação de res­salto que o paciente percebe espontaneamente.

O jerk test de Hughston é o inverso do Mac­Intosh. Explora-se também com o paciente em de­cúbito supino simétrico (fig. 2-205) ou em um de­cúbito intermédio (fig. 2-206), com uma inclina­ção de 45°, com as mesmas posições das mãos. Adiferença está em que a posição de partida é defle­xão de 35-40° para estender de novo o joelho,mantendo a rotação interna do pé e a limitação emvalgo do joelho. O côndilo femoral externo parte,então, de sua posição (fig. 2-203) mais "adianta­da" (em pontilhado) correspondendo a um conta­to (2) com a vertente anterior da glenóide externa,para "pular" bruscamente (1) em subluxação pos­terior, sem ficar retido pelo LCAE quando seaproxima à extensão. A positividade do jerk testtambém indica uma ruptura do LCAE.

Page 69: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-201

Fig.2-202

Fig.2-205

Fig.2-206

2. MEMBRO INFERIOR 141

Page 70: Capitulo 2 Joelho

142 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS DE RUPTURADO LIGAMENTO CRUZADO ÂNTERO-EXTERNO

(continuação)

Embora os testes de Mac- Intosh e deHughston sejam os mais utilizados, os mais fá­ceis de explorar e os mais fidedignos, não são osúnicos que permitem diagnosticar uma rupturado ligamento cruzado ântero-externo (LCAE).Podem-se utilizar outros três testes; se trata dostestes de Losee, de Noyes e de Slocum.

O teste de Losee (fig. 2-207) se exploracom o sujeito em decúbito supino, o examinadorsegura o calcanhar com uma mão mantendo ojoelho fiexionado em 30°, com a outra mão man­tém o joelho pela sua face anterior, enganchan­do o seu polegar na cabeça da fíbula. Simulta­neamente realiza uma rotação externa com a pri­meira mão, o que impede qualquer subluxaçãoposterior do côndilo externo, e um valgo com aoutra mão; conduzindo o joelho em extensão re­laxando a rotação externa - este último ponto émuito importante, visto que no caso contrárioseria em todos os casos negativo. Quando a ex­tensão se completa, o polegar da mão que segu­ra o joelho desloca a fíbula para diante: quandoo teste é positivo, se produz um ressalto do pla­tô tibial para diante ao final da extensão.

O teste de Noyes (fig. 2-208), ou fiexionrotation drawer test, se explora também com opaciente em decúbito supino, com o joelho fie­xionado em 20 a 30° e rotação neutra, as mãosdo examinador se limitam a segurar a perna, e éunicamente o peso da coxa o que provoca umasubluxação posterior do côndilo externo (1) euma rotação externa do fêmur. É possível redu­zir esta subluxação empurrando a porção supe­rior da tlôia para trás (2), como quando se ex-

pIora uma gaveta posterior, daí o nome inglêsdeste teste que indica também uma ruptura doLCAE.

O teste de Slocum (fig. 2-109) se exploracom o paciente em decúbito supino, semigiradopara o lado oposto e com o membro a explorarsobre a mesa de exame; desta forma, quando ojoelho está em extensão, o próprio peso da per­na provoca um valgo automático - rotação in­terna; o fato de não ter que segurar o membro éde grande ajuda nos pacientes obesos. As duasmãos do examinador se colocam no nível dojoelho, a um e outro lado da interlinha, de formaque se pode flexionar progressivamente, en­quanto o valgo aumenta. Como no teste de Mac­Intosh, aparece um ressalto nos 30-40° de flexão,e como no teste de Hughston, se reproduz emsentido inverso quando o joelho se estende. Esteteste de Slocum também diagnostica uma ruptu­ra do LCAE.

Embora os cinco testes sejam indicativosde uma ruptura do LCAE, existem duas circuns­tâncias nas quais não são exatos:

- no caso das adolescentes hiperlaxas:podem ser positivos sem existir umaruptura do ligamento, daí a necessidadede explorar também o lado oposto quepode ser também hiperlaxo;

- uma lesão importante da camada fibro­tendinosa póstero-interna impede o blo­queio do côndilo externo sob a ação dovalgo e pode dificultar a aparição de umressalto.

Page 71: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-208

- __ n_

Fig.2-207

~

Fig.2-209

2. MEMBRO INFERIOR 143

Page 72: Capitulo 2 Joelho

144 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO EXTERNA

A exploração de um joelho não seria com­pleta sem os testes dinâmicos em rotação externa,que procuram um ressalto externo em rotaçãoexterna.

O teste em rotação externa, valgo e exten­são ou pivot shift reverse test (fig. 2-210) estáconstituído pela mesma manobra que o teste deMac-Intosh, no qual a rotação interna se substituipela rotação externa da perna realizada pela mãoque segura o pé; partindo de uma flexão entre60-90°, a extensão progressiva combinada comuma pressão contínua na face externa do joelhosempre consegue que a extensão não ultrapasse os30° (fig. 2-211), produzindo-se um ressalto brus­co do côndilo femoral externo para a pendenteposterior da glenóide tibial externa.

De fato, quando o joelho está fiexionado, emrotação externa (fig. 2-212), o côndilo externo, que jánão é retido pela tensão do LCPI em rotação externa(RE) se subluxa para diante (SLA) sobre a pendenteanterior da lombada da glenóide externa (seta 1); du­rante a extensão progressiva (fig. 2-213), o tensor dafáscia lata (TFL) passa para diante do ponto de con­tato entre o côndilo e a glenóide, embora o côndiloexterno esteja deslocado para trás (fig. 2-212) na suaposição normal (pontilhado), ultrapassando brus­camente o ponto mais proeminente da lombada epara entrar em contato (seta 2) com a vertente pos­terior da glenóide. A percepção do ressalto, pelopróprio paciente em ocasião dos episódios de ins­tabilidade e pelo examinador quando realiza estamanobra, se deve à redução brusca da subluxaçãoanterior do cándilo externo, o que é possível devi­do à ruptura do LCPI.

O teste em rotação externa, valgo e flexão(fig. 2-214) se explora com a mesma manobra,porém partindo da máxima extensão: o ressaltoque se percebe quando a flexão atinge os 30°corresponde (fig. 2-212) à subluxação anterior(SLA) do côndilo externo que pula bruscamente(S) de sua posição normal (seta 2) na pendenteposterior da glenóide externa a uma posição anor­mal (seta 1) na vertente anterior, o que é possívelgraças à ruptura do LCPI.

Outros três testes permitem diagnosticar umalesão da camada fibrotendinosa póstero-externa (oPAPE) e do LLE em ausência de ruptura do LCPI.

O teste da gaveta póstero-externo ou póste­ro-Iateral drawer test de Hughston: os pés se apói­am planos na mesa de exame, os quadris fiexionados45° e os joelhos 90°. Sentando-se sobre o pé do pa­ciente, o examinador pode bloquear a rotação dojoelho sucessivamente em rotação neutra, externa15° e interna 15°. Segurando com ambas as mãos aporção superior da tíbia, se procura uma gaveta pos­terior em suas três posições. O teste é positivo quan­do se aprecia !lma sublu.xação póstero-externa doplatá tibial externo, enquanto o platõ interno nãorecua - é, portanto, uma verdadeira gaveta rotató­ria - pela rotação externa do pé. Esta gaveta rotató­ria externa se detém em rotação neutra e desapareceem rotação interna pela tensão do LCPI intacto.

O teste em hipermobilidade externa deBousquet ou HME se explora com o joelho flexio­nado em 60°; ao acrescentar uma pressão na por­ção superior da tíbia para tentar que se deslize pa­ra baixo e para trás dos côndilos, se percebe umressalto posterior enquanto o pé gira em rotaçãoexterna. Portanto, também neste caso se. trata deuma verdadeira gaveta rotatória externa.

O teste de recurvatum e rotação externa sepode explorar de duas formas, procurando, em am­bos os casos. um bom relaxamento do quadríceps:

- em extensão: ambos os membros inferio­

res, segurados pela parte anterior do pé. seelevam em extensão, o que comporta, nomembro lesado, um recurvatum e uma ro­tação externa, representados por um deslo­camento da tuberosidade tibial anterior

(TTA) para fora; a subluxação póstero-ex­terna do platô tibial externo conduz a umgenu varo.

- em flexão: enquanto uma mão segura o pée dirige progressivamente o joelho para aextensão, a mão que mantém o joelho per­cebe a subluxação póstero-externa da tíbiarepresentada por um recurvatum, um genuvaro e um deslocamento para fora da tube­rosidade tibial anterior.

Todos estes testes, com freqüência difíceis dedemonstrar em um paciente acordado, com um re­laxamento muscular imperfeito, aparecem nitida­mente sob anestesia geral.

Page 73: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 145

Fig.2-211

'--

Fig.2-210

Fig.2-214

Fig.2-213

Page 74: Capitulo 2 Joelho

146 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS EXTENSORES DO JOELHO

o quadríceps crural é o músculo exten­sor do joelho. Trata-se de um músculo potente:sua superfície de secção fisiológica é de 148cm2, o que num trajeto de 8 em lhe confere umapotência de trabalho de 42 kg. O quadríceps étrês vezes mais potente do que os flexores; o fa­to da sua luta contra a gravidade o explica. En­tretanto, vimos que quando o joelho está em hi­perextensão a ação do quadríceps não é necessá­ria para manter a posição de pé (ver pág. 120);porém quando se inicia uma mínima flexão, umaintervenção enérgica do quadríceps é necessáriapara evitar a queda por flexão do joelho.

O quadríceps (fig. 2-215) é constituído, co­mo o seu nome o indica, por quatro corpos mus­culares que se inserem por um aparelho exten­sor, na tuberosidade tibial anterior (TTA):

- três músculos monoarticulares: o crural(Cr), o vasto externo (VE) e o vasto in­terno (VI);

- um músculo biarticular: o reto anterior(RA), cuja fisiologia, um tanto específi­ca, será analisada na página seguinte.

Os três músculos monoarticulares são so­mente extensores do joelho, embora tenham umcomponente lateral, no que se refere a ambos osvastos; é necessário destacar, falando no vastointerno, que é mais potente do que o externo,desce mais para baixo e que seu relativo predo­núnio está destinado a opor-se à tendência que apatela tem para luxar-se para fora. A contraçãode ambos os vastos, geralmente equilibrada, en­gendra uma força resultante dirigida para cima,no eixo da coxa. Todavia, se um dos vastos pre­dominasse sobre o outro, como seria o caso deum vasto externo predominante sobre um vastointerno insuficiente, a patela se "escaparia" parafora: este é um dos mecanismos causadores daluxação recidivante da patela, que sem dúvidaalguma é sempre externa. Pelo contrário, é pos­sível evitar a subluxação externa da patela refor­çando seletivamente o vasto interno.

A patela é um osso sesamóide que pertenceao aparelho extensor do joelho entre o tendão

quadricipital por cima e o ligamento menisco­patelar por baixo. Sua função é primordial, vis­to que aumenta a eficácia do quadríceps deslo­cando para diante a sua força de tração. Somen­te devemos traçar o esquema das forças com esem patela para estar convencido deste fato.

A força Q do quadríceps efetuada sobre apatela (fig. 2-216) se pode decompor em doisvetores: uma ~orça Ql' dirigida para o eixo deflexão-extensão, que encaixa a patela na tróc1ea,e uma força Q2' qirigida no prolongamento doligamento menisco-patelar. Por sua vez, estaforça Q2' aplicada sobre a tuberosidade anteriorda tíbia pode decompor-se em dois vetores per­pendiculares entre eles: uma força Q3 dirigidapara o eixo de flexão-extensão, que encaixa a tí­bia sobre o fêmur, e uma força tangencial Q4'único componente eficaz para realizar a exten­são: faz com que a tíbia se deslize para diantesobre o fêmur.

Se a patela é extirpada - operação deno­minada "patelectomia" - e se segue o mesmoraciocínio (fig. 2-217): a força Q do quadríceps,supondo que seja idêntica, se dirige tangencial­mente para a tróc1ea e diretamente sobre a tube­rosidade tibial anterior; se pode decompor emdois vetores: Q5' força de coaptação que encaixaa tíbia sobre o fêmur, e Q6' força eficaz para aextensão; o componente tangencial Q6 diminuiconsideravelmente enquanto o componente cen­trípeto Q5 aumenta.

Se compararmos agora as forças eficazesem ambas as hipóteses (fig. 2-218), se podeconstatar que Q4 é 50% maior que Q6: a pate/a,afastando o tendão quadricipital como um cava­lete, aumenta nitidamente a eficácia do quadrí­ceps. Também se pode constatar que na ausênciade patela a força de coaptação Q5 aumenta, po­rém este efeito favorável é contrariado pela per­da de amplitude da fiexão, devido tanto ao en­curtamento do aparelho extensor, quanto à suafragilidade. Assim, a patela é muito útil, o queexplica a má reputação e a escassa freqüência dapatelectomia.

Page 75: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-216 Fig.2-215

2. MEMBRO INFERIOR 147

Fig.2-217

Page 76: Capitulo 2 Joelho

148 FISIOLOGIA ARTICULAR

FISIOLOGIA DO RETO ANTERIOR

o reto anterior somente representa a quintaparte da força total do quadríceps e não poderealizar a extensão máxima sozinho, porém o fa­to de ser um músculo biarticular lhe confere uminteresse especial.

Graças a seu trajeto para diante do eixo deflexão-extensão do quadril e do joelho, o retoanterior é tanto flexor do quadril quanto exten­sor do joelho (fig. 2-220), porém sua eficácia co­mo extensor de joelho depende da posição doquadril, assim como a sua ação como flexor doquadril está relacionada com a posição do joe­lho. Isto se deve (fig. 2-219) a que a distânciaentre a espinha ilíaca ântero-superior (a) e amargem superior da tróclea é menor em flexão(ab) do que em extensão (ab). Esta diferença decomprimento (e) determina um alongamento re­lativo do músculo quando o quadril está em fle­xão e o joelho se flexiona sob o peso da perna(lI); nestas condições, para obter a extensão dojoelho (lU), os outros três fascículos do quadrí­ceps são muito mais eficazes que o reto anterior,já distendido pela flexão do quadril.

Pelo contrário, se o quadril passa de umaposição de alinhamento normal (I) à extensão(IV), a distância entre as duas inserções do re­to anterior aumenta (ad) um certo comprimen­to (f) que contrai o reto anterior (encurtamen­to relati vo), e aumenta outro tanto a sua eficá­cia. Isto é o que acontece durante a marcha oua corrida, ao distender o membro posterior(fig. 2-223): pela ação dos glúteos o quadril seestende, enquanto o joelho e o tornozelo tam­bém se estendem; assim, o quadríceps desen­volve a sua máxima potência, graças à eficáciaaumentada do reto anterior. O glÚteo máximo é

sinérgico-antagonista do reto anterior: anta­gonista no que diz respeito ao quadril e sinér­gico no joelho.

Na fase de apoio unilateral da marcha,quando o membro oscilante avança (fig. 2-222),o reto anterior se contrai para realizar a flexão doquadril e a extensão do joelho ao mesmo tempo.Então, constata-se que a condição biarticular doreto anterior é útil nos dois tempos da marcha:na fase de impulso do membro posterior e na fa­se de avanço do merp.bro oscilante.

Durante a ação de ficar de pé, partindo daposição de cócoras, o reto anterior desempenhaum papel muito importante, visto que é o únicodos quatro fascículos do quadríceps que não per­de sua eficácia durante o movimento. De fato,enquanto o joelho se estende, o quadril, sob aação do glúteo máximo, também se estende, no­vamente o reto anterior se contrai na sua inser­

ção superior, conservando assim um compri­mento constante no início da ação. Neste caso seconstata outra vez a função exercida como trans­missor de força por um músculo potente da raizdo membro, o glúteo máximo, sobre uma articu­lação mais distal, o joelho, por um músculo bi­articular, o reto anterior.

Finalmente, ao contrário, a flexão do joelhosob a ação dos ísquio-tibiais favorece a flexão doquadril pelo reto anterior. Isso pode ser útil nosalto, com os joelhos flexionados (fig. 2-221): osretos anteriores possuem muita eficácia na flexãodos quadris. É outro exemplo da relação antago­nismo-sinergia entre os ísquio-tibiais, que são fle­xores do joelho e extensores do quadril, e o retoanterior, flexor do quadril e extensor do joelho.

Page 77: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 149

Fig.2-219

Fig.2-223 - Fia. 2-222 Fig.2-221

Page 78: Capitulo 2 Joelho

150 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS FLEXORES DO JOELHO

Os fiexores do joelho formam parte docompartimento posterior da coxa (fig. 2-224);se trata dos músculos ísquio-tibiais: bíceps CfU­

ral (B), semitendinoso (ST), semimembranoso(SM), os músculos da "pata de ganso": reto in­terno (Ri), sartório (Sa) e o semitendinoso (quetambém forma parte dos ísquio-tibiais), o poplí­teo (ver pág. seguinte); os gêmeos (Ge) não sãorealmente fiexores do joelho, mas sim extenso­res do tornozelo (ver pág. 218).

Contudo, os gêmeos desempenham um pa­pel importante na estabilização do joelho: se in­serem por cima dos côndilos, quando se con­traem, durante a fase do passo, isto é, quando ojoelho e o tornozelo se estendem ao mesmo tem­po, deslocam os côndilos para frente, de formaque são antagonistas-sinergistas do quadríceps.

Todos estes músculos, exceto dois, são bi­articulares: a porção curta do bíceps e o poplí­teo que são monoarticulares (ver página seguin­te). Portanto, os fiexores biarticulares possuemuma ação simultânea de extensão do quadril esua ação sobre o joelho depende da posição doquadril.

O sartório (Sa) é fiexor, abdutor e rotadorexterno do quadril, ao mesmo tempo que éfiexore rotador interno do joelho.

O reto interno (Ri) é principalmente adutor eacessório da fiexão do quadril, ao mesmo tempoque é fiexor do joelho, de maneira que tambémforma parte dos ratadores internos (ver pág. 152).

Os ísquio-tibiais são tanto extensores doquadril (ver pág. 52) quanto flexores do joelho,e sua ação no joelho está condicionada pela po­sição do quadril (fig. 2-225). Quando o quadrilse flexiona, a distância ab que separa as inser­ções destes músculos aumenta regularmente,visto que o centro do quadril O, ao redor doqual o fêmur gira, não se confunde com o pon-

to a, ao redor do qual se orientam; deste modo,quanto mais se flexiona o quadril, maior é o en­curtamento relativo dos ísquio-tibiais e mais secontraem. Quando o quadril está flexionado40° (posição lI), o encurtamento relativo aindapode ser compensado pela flexão passiva dojoelho (ab = ab'), porém no caso de uma flexãode 90° (posição lU) o encurtamento relativo étal, que emboHl o joelho esteja flexionado emângulo reto, ainda persiste um encurtamentorelativo importante (f). Se a flexão do quadrilultrapassa os 90° (posição IV), é muito difícilmanter os dois joelhos (fig. 2-226) em máximaextensão: a elasticidade dos músculos, que di­minui bastante com a falta de exercício, quasenão absorve o encurtamento relativo (g). A en­trada em tensão dos ísquio-tibiais pela fIe­xão do quadril aumenta a sua eficácia comofIexores do joelho: quando, no percurso deuma escalada (fig. 2-227), um dos membros in­feriores avança, a flexão do quadril favorece aflexão do joelho. Ao contrário, a extensão dojoelho favorece a ação dos ísquio-tibiais comoextensores do quadril: é o que se produz duran­te os esforços de endireitamento do tronco apartir de uma posição de inclinação para frente(fig. 2-226), e também durante a escalada,quando o membro inferior, situado anterior­mente, passa a ser posterior.

Se agora (fig. 2-225), o quadril se estendecompletamente o quadril (posição V), os ísquio­tibiais se alongam relativamente (e), o que ex­plica que a fiexão do joelho seja menos intensa(ver figo2-13); isso ressalta a utilidade dos mús­culos monoarticulares (poplíteo e porção curtado bíceps), que conservam a mesma eficácia in­dependentemente da posição do quadril.

A potência global dos fiexores do joelho éde 15 kg, ou seja, um pouco mais de um terço dado quadríceps.

Page 79: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 151

Fig.2-224

Fig.2-226

Fig.2-227

Page 80: Capitulo 2 Joelho

152 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ROTADORES DO JOELHO

Os flexores do joelho são, ao mesmo tem­po, os seus rotadores; se dividem em dois gru­pos segundo o seu ponto de inserção na perna(fig. 2-228):

- os que se inserem por fora do eixo ver­tical XX' de rotação do joelho: são osrotadores externos (RE), representados(fig. 2-231) pelo bíceps (B) e o tensorda fáscía lata (TFL). Quando deslocama parte externa do platá tibial para trás(fig. 2-229), fazem o joelho girar de talforma que a ponta do pé se dirige direta­mente para fora. O tensor da fáscia latasó age como flexor-rotador externoquando o joelho está flexionado; numjoelho totalmente estendido, perde a suaação de rotação para transformar-se emextensor: "bloqueia" a extensão. A por­ção curta do bíceps (fig. 2-232, B ') é oúnico músculo rotador externo monoar­tiCldar; o que significa que a posição doquadril não repercute em absoluto sobrea sua ação.

- os que se inserem por dentro do eixovertical XX' de rotação do joelho: sãoos rotadores internos (RI), representa­dos (fig. 2-231) pelo sartório (Sa), o se­mitendinoso (ST), o semimembranoso(SM), o vasto interno (VI) e o poplíteo(fig. 2-232, Pop). Quando deslocam pa­ra trás a parte interna do platá tibial (fig.2-230), o joelho gira de tal forma que aponta do pé se dirige para dentro. Agemcomo freios da rotação externa com ojoelho flexionado, de forma que prote­gem os elementos cápsulo-ligamentaresquando estes são requeridos violenta­mente durante um giro inesperado parao lado oposto ao da perna que suporta o

peso. O poplíteo (fig. 2-234, vista poste­rior) é a única exceção desta disposiçãogeral: se insere na face posterior da por­ção proximal da tíbia, para penetrar, aseguir, na cápsula do joelho debaixo daogiva que forma o ligaj1lento poplíteoarqueado (ver também figo2-147); antesde que isso aconteça, ele envia uma ex­pansão que se insere na margem poste­rior do menisco externo; no interior dacápsula

-porém para fora da sinovial- se desli­za entre o ligamento lateral externo e omenisco externo (fig. 2-232) para termi­nar fixando-se no fundo de uma fossetaque ocupa a parte inferior da superfíciecutânea do cándilo externo. É o únicorotador interno monoarticular, de formaque a sua ação não está influenciada pe­la posição do quadril. Esta ação pode sercompreendida com facilidade por umavista superior do platô tibial (fig. 2­233): o poplíteo (seta preta) desloca aparte posterior do platá tibial para fora.

Embora esteja situado por trás da articula­ção, o poplíteo é extensor do joelho: durante aflexão, a fosseta de inserção do poplíteo se des­loca para cima e adiante (fig. 2-232), estendendoo músculo e reforçando a sua ação como rotadorinterno. Pelo contrário, quando se contrai com ojoelho flexionado e, especialmente, em rotaçãoexterna, desloca a fosseta para baixo e atrás, pro­vocando um deslizamento do cándilo externo pa­ra a extensão. Em resumo, o poplíteo é tanto ex­tensor quanto rotador interno do joelho.

Em conjunto, o grupo dos rotadores inter­nos é mais potente (2 kg) do que o grupo dos ro­tadores externos (1,8 kg); porém, esta diferençanão tem muita importância.

Page 81: Capitulo 2 Joelho

Fig.2-230 Fig.2-229

Fig.2-232

Fig.2-234

RE

Page 82: Capitulo 2 Joelho

154 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AUTOMÁTICA DO JOELHO

Já vimos (ver pág. 84) que o fim da extensãose acompanha de uma ligeira rotação externa eque o início daflexão não épossível sem uma ligei­ra rotação interna, e tudo isso de forma automáti­ca, sem intervenção de nenhuma ação voluntária.

Esta rotação automática é evidente numa pre­paração anatômica com a experiência de Round:

- duas varetas transversais e horizontais, para­lelas entre si quando o joelho está em exten­são, são introduzidas (fig. 2-235, vista supe­rior) no platô tibial e no maciço condiliano;

- se o fêmur se flexiona sobre a tíbia

(fig. 2-236), que permanece fixa, se podecomprovar como o eixo do fêmur se in­clina para trás e para dentro (o desenhorepresenta um joelho direito); no caso deuma flexão de 90°, pode-se constatar queambas as varetas formam, no plano hori­zontal, um ângulo de 30° aberto para fo­ra e para trás (Roud propõe 45°);

- quando o eixo do fêmur numa direção sa­gital se situa outra vez (fig. 2-237) pode­se observar que a vareta tibial se orientanesta situação de dentro para fora e de tráspara diante; o que indica uma rotação in­terna da tíbia sobre o fêmur. Esta vareta

forma um ângulo de 20° com a perpendi­cular ao eixo do fêmur. Portanto, a ftexãodo joelho se acompanha de uma rotaçãointerna automática de 20°. A diferençade 10° se deve a que a vareta femoral (nãoilustrada aqui), por causa do valgo fisioló­gico do joelho, não é perpendicular ao ei­xo diafisário, mas sim que forma com eleum ângulo de 80° (ver figo 2-3);

- esta experiência também pode ser realizadano sentido inverso: partindo de uma posi­ção de ftexão em ângulo reto, em que as va­retas divergem (fig. 2-236), para alcançar amáxima extensão na qual as varetas são pa­ralelas (fig. 2-235): deste modo se eviden­cia uma rotação externa automática con­temporânea da extensão do joelho.

A rotação interna da tíbia aparece porque du­rante a ftexão do joelho (fig. 2-238) o côndilo ex­terno recua mais do que o interno: com o joelho

estendido, os pontos de contato a e b estão alinha­dos sobre uma transversal Ox; a ftexão provoca oretrocesso do côndilo interno de a para a' (5-6 mm)e do côndilo externo de b para b' (10-12 mm); ospontos de contato a' e b' que correspondem à fle­xão estão alinhados sobre Oy que junto com Oxformam um ângulo xOy de 20°. Para que Oy este­ja transversal, é necessário que a tíbia realize umarotação interna de 20°.

Este retrocesso diferencial dos côndilos se de­

ve a três fatores:

1) A desigualdade do desenvolvimento docontorno condiliano (figs. 2-239 e 2-240).Quando se desenvolvem as superfícies ar­ticulares do côndilo interno (fig. 2-239) ese comparam com o desenvolvimento dassuperfícies do côndilo externo (fig. 2-240)pode-se constatar que o desenvolvimentobd' da curvatura posterior do côndilo ex­terno é um pouco maior do que o do inter­no (ac' = bc'). Isso explica, em parte, que ocôndilo externo rode mais do que o interno.

2) A forma das glenóides: o côndilo internorecua pouco, visto que está dentro de umaglenóide côncava (fIg. 2-241), enquanto ocôndilo externo se desliza sobre a verten­

te posterior da glenóide externa convexa(fIg. 2-242).

3) A orientação dos ligamentos laterais:quando os côndilos recuam sobre as gle­nóides, o ligamento lateral interno entraem tensão mais rapidamente (fig. 2-241)que o externo (fig. 2-242); deixando esteúltimo ao côndilo externo mais margem deretrocesso, devido à sua obliqüidade.

Além disso, existem pares de rotação:

- a ação predominante dos músculos ftexo­res-rotadores internos (fig. 2-243), múscu­los da "pata de ganso" (seta preta) e poplí­teo (seta branca);

- a tensão do ligamento cruzado ântero-ex­temo no fim da extensão (fig. 2-244): o li­gamento passa por fora do eixo, de formaque a sua tensão provoca uma rotação ex­terna.

Page 83: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 155

RE

RI

y

x

Fig.2-236

Fig.2-244

Fig.2-238

Fig.2-240

o .------:

Fig.2-237

Fig.2-239

Fig.2-241 Fig.2-242

Page 84: Capitulo 2 Joelho

156 FISIOLOGIA ARTICULAR

o EQUILÍBRIO DINÂMICO DO JOELHO

Ao final deste capítulo, parece que a estabilidade dojoelho, articulação frouxamente encaixada, se mantémgraças a um milagre constante. É por este motivo que ten­tamos expor num esquema sinóptico (fig. 2-245) os prin­cipais testes com relação às estruturas implicadas. A es­colha destes testes pode gerar discusão, assim como a suainterpretação, embora se baseie nas publicações mais re­centes. De todo modo, devemos ser conscientes de que setrata de uma classificação provisória.

1) A gaveta anterior em rotação neutra, ou ga­veta "direta", pode existir, em menor grau, deforma fisiológica; portanto, sempre será neces­sário comparar com o lado supostamente nor­mal. Contudo, quando seu sinal é claro (+)diagnostica uma ruptura do LCAE. Quando eleé muito acentuado, se une uma ruptura do LLIà anterior. Porém, cuidado com uma falsa ga­veta anterior que corresponderia à redução deuma subluxação posterior espontânea por rup­tura do LCPI!

2) A gaveta anterior em rotação interna de15° constitui um sinal claro de ruptura doLCAE que pode estar unido com uma lesãoda CFTPE (camada fibrotendinosa póstero­externa ou PAPE).

3) A gaveta anterior em rotação interna de30° traduz uma ruptura do LCAE associada àdo LCPI, e quando se percebe um ressalto seassocia a uma desinserção do corno poste­rior do menisco externo.

4) O ressalto externo em valgo, rotação internae ftexão, ou lateral pivot shift de Mac-Intosh eo jerk test de Hughston são sinais claros deruptura do LCAE.

5) A gaveta anterior em rotação externa,quando é moderado (+) indica uma lesão daCFTPE (PAPE), e se pode-se perceber umressalto se associa a uma desinserção do cor­no posterior do menisco interno.

6) A gaveta posterior em rotação neutra ou ga­veta posterior direta é o sinal infalível da rup­tura do LCPl.

7) O ressalto externo em valgo, rotação externae extensão ou pivot shift reverse test, assim co­mo o ressalto externo em valgo, rotação exter­na e flexão, indicam uma ruptura do LCPI.

8) A gaveta posterior em rotação externa tra­duz uma lesão da CFTPE (PAPE), podendo-seassociar a uma ruptura do LCPI.

9) A gaveta posterior em rotação interna seriaum sinal específico da ruptura do LCPI asso­ciada a uma lesão da CFTPl (PAP/).

10) Um movimento de lateralidade em extensão,de forma que provoque um ligeiro valgo (+)corresponde a uma ruptura do LLI; quando ovalgo é mais acentuado (++) indica uma lesãoassociada da convexidade condiliana intema:

por último, quando é muito acentuada (+++)existe, além disso, uma ruptura do LCAE.

11) Um movimento de lateralidade externa emligeira ftexão (10-30°) indica uma ruptura as­sociada do LU, da convexidade condiliana in­terna e da CFTPI, assim como uma lesão docorno posterior do menisco interno.

12) Um movimento de lateralidade interna emextensão indica, quando existe um varo mode­rado (+), uma ruptura do LLE que pode estarou não associada a uma ruptura da banda deMaissiat, e quando é acentuado (++), uma rup­tura associada da convexidade condiliana ex­

terna e da CFTPE (PAPE).

13) Um movimento de lateralidade interna emligeira ftexão (I 0-30°) indica as mesmas lesõesque no caso anterior, porém sem que a rupturada banda de Maissiat esteja associada.

14) O teste de recurvatum, rotação externa evalgo ou inclusive o teste de suspensão do de­do polegar do pé indicam uma ruptura associa­da do LLE e da CFTPE (PAPE).

Para entender a mecânica do joelho é necessáriocompreender que o joelho em movimento realiza umequilíbrio dinâmico e, principalmente, abandonar a idéiade um equil1brio de dois termos, como o dos dois pratosde uma balança. Contudo, uma tábua de vela (fig. 2-246)é muito mais representativa, visto que corresponde a umequilíbrio de três termos:

- o mar, que segura a tábua, corresponde à açãodas supeifícies articulares;

- o vento, que bate na vela, é a força motora, ouseja, os músculos;

- o indivíduo, que dirige o movimento pelas suasconstantes reações em função do vento e do mar.corresponde ao sistema ligamentar.

O funcionamento do joelho está determinado, emtodo momento, pelas reações mútuas e equilibradas des­tes três fatores, superfícies articulares, músculos e liga­mentos em equilíbrio dinâmico trilateral.

Page 85: Capitulo 2 Joelho

2. MEMBRO INFERIOR 157

LAT.INT.EXT

+-;;@Y

'@VUREC/RE(Suspensão)

(j) TA/R0(Direto)

// ""± ® TAlRE

++ + "\ +çj+ +

@ TP/R0 (Direto) IRes. VURE/EX (J)(Pivot Shift Reverse Test)Res VURE/FL

Res. VURI/FL @(Lateral Pivot Shift)Res. VURI/EX

Fig.2-245

DI

Fig.2-246