cântigo negro de josé régio (apresentação + biografia)

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Cântico Negro

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Page 1: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Cântico Negro

Page 2: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

José RégioJosé Maria dos Reis Pereira

Nasceu em 1901

Formou-se em Filologia Românica

na Faculdade de Letras de Coimbra

Tese: As Correntes e as Individualidadesna Moderna Poesia Portuguesa

Colabora com as publicações Bysancio e Tríptico

Revista Presença

João Gaspar Simões

Branquinhoda Fonseca

"Literatura Viva"

"A primeira condição duma obra viva é pois ter

uma personalidade e obedecer-lhe"

Natural de Vila do Conde

Inicia a sua vida como professor de liceu No Porto

Em Portalegre, onde permanece trinta anos

Page 3: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

José Maria dos Reis Pereira

José Régio 1961 recebe o prémio Diário de Notícias

1970 Prémio Nacional de Poesia (póstumo)

As suas casas de Vila do Conde e de Portalegre

são hoje museus

faleceu em 1969

Page 4: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces

Estendendo-me os braços, e seguros

De que seria bom que eu os ouvisse

Quando me dizem: "vem por aqui!"

Eu olho-os com olhos lassos,

(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)

E cruzo os braços,

E nunca vou por ali...

Page 5: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

A minha glória é esta:

Criar desumanidade!

Não acompanhar ninguém.

- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade

Com que rasguei o ventre à minha mãe

Page 6: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Não, não vou por aí! Só vou por onde

Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde

Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Page 7: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,

Redemoinhar aos ventos,

Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,

A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi

Só para desflorar florestas virgens,

E desenhar meus próprios pés na areia

inexplorada!

O mais que faço não vale nada.

Page 8: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Como, pois sereis vós

Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem

Para eu derrubar os meus obstáculos?...

Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,

E vós amais o que é fácil!

Eu amo o Longe e a Miragem,

Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Page 9: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Ide! Tendes estradas,

Tendes jardins, tendes canteiros,

Tendes pátria, tendes tectos,

E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...

Eu tenho a minha Loucura!

Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,

E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Page 10: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.

Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;

Mas eu, que nunca principio nem acabo,

Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Page 11: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!

Ninguém me peça definições!

Ninguém me diga: "vem por aqui"!

A minha vida é um vendaval que se soltou.

É uma onda que se alevantou.

É um átomo a mais que se animou...

Não sei por onde vou,

Não sei para onde vou

- Sei que não vou por aí!

Page 12: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

“Não, não vou por aí! Só vou por onde/ Me levam meus próprios

passos.../ Se ao que busco saber nenhum de vós responde/ Por que me

repetis: "vem por aqui!"?”. A meu ver, cada individuo busca as suas

próprias respostas. Uns vivem na igualdade e na simplicidade; outros

escolhem essa fé de viver de modo a continuarem a respirar, a

sentirem-se livres; outros não declaram este tipo de vida como sua,

mantêm-se na sua dúvida, na sua busca espiritual. Penso que não nos

devemos conformar com o que os outros querem, não devemos vender

a nossa originalidade; não podemos seguir os caminhos pisando as

marcas na areia que os outros deixaram. O nosso dever é criarmos o

nosso próprio rumo, vivermos nas nossas ilusões, nos nossos

mundos, escolhermos como queremos viver e decidirmos por quem

somos capazes de morrer. Não podemos ceder à pressão social, como

preconiza o poeta, temos que nos manter fiéis a quem somos e

caminharmos sempre em frente neste caminho que é a vida, sem

olharmos para trás em circunstância alguma.

Page 13: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)
Page 14: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

Não me resta nada, sinto não ter forças para lutar

É como morrer de sede no meio do mar e afogar

Sinto-me isolado com tanta gente à minha volta

Vocês não ouvem o grito da minha revolta

Choro a rir, isto é mais forte do que pensei

Por dentro sou um mendigo que aparenta ser um rei

Não sei do que fujo, a esperança pouca me resta

É triste ser tão novo e já achar que a vida não presta

As pernas tremem, o tempo passa, sinto cansaço

O vento sopra, ao espelho vejo o fracasso

O dia amanhece, algo me diz para ter cuidado

Vagueio sem destino nem sei se estou acordado

O sorriso escasseia, hoje a tristeza é rainha

Não sei a alma existe mas sei que alguém feriu a minha

Às vezes penso se algum dia serei feliz

Enquanto oiço uma voz dentro de mim que diz..

Chorei

Mas não sei se alguém me ouviu

E não sei se quem me viu

Sabe a dor que em mim carrego e a angústia que se

esconde

Vou ser forte e vou-me erguer

E ter coragem de querer

Não ceder, nem desistir eu prometo

Busquei

Nas palavras o conforto

Dancei no silêncio morto

E o escuro revelou que em mim a Luz se esconde

Vou ser forte e vou-me erguer

E ter coragem de querer

Não ceder, nem desistir eu prometo

Não há dia que não pergunte a Deus porque nasci

Eu não pedi, alguém me diga o que faço aqui

Se dependesse de mim teria ficado onde estava

Onde não pensava, não existia e não chorava

Sou prisioneiro de mim próprio, o meu pior inimigo

Às vezes penso que passo tempo de mais comigo

Olho para os lados, não vejo ninguém para me ajudar

Um ombro para me apoiar, um sorriso para me animar

Quem sou eu? Para onde vou? Donde vim?

Alguém me diga porque me sinto assim

Sinto que a culpa é minha mas não sei bem porquê

Sinto lágrimas nos meus olhos mas ninguém as vê

Estou farto de mim, farto daquilo que sou, farto daquilo

que penso

Mostrem-me a saída deste abismo imenso

Pergunto-me se algum dia serei feliz

Enquanto oiço uma voz dentro de mim que me diz...

Page 15: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)

ChoreiMas não sei se alguém me ouviuE não sei se quem me viuSabe a dor que em mim carrego e a angústia que se escondeVou ser forte e vou-me erguerE ter coragem de quererNão ceder, nem desistir eu prometo

BusqueiNas palavras o confortoDancei no silêncio mortoE o escuro revelou que em mim a Luz se escondeVou ser forte e vou-me erguerE ter coragem de quererNão ceder, nem desistir eu prometo

“Tento não me ir abaixo mas não sou de ferroQuando penso que tudo vai passar parece que mais me enterroSinto uma nuvem cinzenta que me acompanha onde estiverE penso para mim mesmo será que Deus me querSerá a vida apenas uma corrida para a morte?Cada um com a sua sina, cada um com a sua sorteNão peço muito, não peço mais do que tenho direitoOlho para trás e analiso tudo o que tenho feitoE mesmo quando errei foi a tentar fazer bemNão sei o que é o ódio não desejo mal a ninguémHá-de surgir um raio de luz no meio da porcariaPorque até um relógio parado está certo duas vezes por diaVou-me aguentando, a esperança é a última a morrerNeste jogo incerto que o resultado não posso preverE quando penso em desistir por me sentir infelizOiço uma voz dentro de mim que me diz... Mantém-te firme”

Page 16: Cântigo Negro de José Régio (apresentação + biografia)