campos magnÉticos de estrelas g-k e dividing lines no ... · investigamos o campo magnético...

54
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA DEPARTAMENTO DE FÍSICA BACHARELADO EM FÍSICA CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO DIAGRAMA HR Marina Tatiane Ribeiro da Silva Natal-RN Dezembro de 2017

Upload: others

Post on 28-Oct-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA

DEPARTAMENTO DE FÍSICABACHARELADO EM FÍSICA

CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDINGLINES NO DIAGRAMA HR

Marina Tatiane Ribeiro da Silva

Natal-RNDezembro de 2017

Page 2: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Marina Tatiane Ribeiro da Silva

Campos Magnéticos de Estrelas G-K e DividingLines no Diagrama HR

Monografia de Graduação apresentada aoDepartamento de Física do Centro deCiências Exatas e da Terra da Univer-sidade Federal do Rio Grande do Nortecomo requisito parcial para a obtenção dograu de bacharel em Física.

OrientadorProf. Dr. Jefferson Soares da Costa

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Departamento de Física - DF

Natal-RNDezembro de 2017

Page 3: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Silva, Marina Tatiane Ribeiro da. Campos magnéticos de estrelas G-K e Dividing Lines nodiagrama HR / Marina Tatiane Ribeiro da Silva. - 2017. 54f.: il.

Monografia (graduação) - Universidade Federal do Rio Grandedo Norte. Centro de Ciências Exatas e da Terra. Departamento deFísica Teórica e Experimental. Bacharelado em Física. Natal, RN,2017. Orientador: Jefferson Soares da Costa.

1. Campo magnético - Monografia. 2. Diagrama HR - Monografia.3. Dividing Line - Monografia. 4. LSD - Monografia. I. Costa,Jefferson Soares da. II. Título.

RN/UF/CCET CDU 537.612

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Ronaldo Xavier de Arruda - CCET

Page 4: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

ii

Monografia de Graduação sob o título Campos magnéticos de estrelas G-K e

dividing lines no Diagrama HR apresentada por Marina Tatiane Ribeiro da Silva e aceita

pelo Departamento de Física do Centro de Ciências Exatas e da Terra da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, sendo aprovada por todos os membros da banca

examinadora abaixo especificada:

Prof. Dr. Jefferson Soares da Costa

Orientador

Escola de Ciências e Tecnologia

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Prof. Dr. Matthieu Sebastien Castro

Departamento de Física

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Dr. Leonardo Andrade de Almeida

Departamento de Física

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Natal-RN, 8 de Dezembro de 2017

Page 5: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

iii

À terna indiferença do mundo.

Page 6: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

iv

Agradecimentos

Agradeço aos meus pais por todo investimento financeiro e emocional dedicados

à minha formação acadêmica. Aos irmãos de sangue e de alma que me proporcionam a

doçura e força necessárias para seguir pelo árduo caminho às estrelas. Aos professores

que me inspiraram a acreditar que o céu é o objetivo, não o limite. Aos professores

que me ensinaram sobre quem eu não devo ser. A todos os mestres sem titulação que

encontro diariamente em todos os lugares. À Propesq-UFRN e ao CNPq pelo apoio

financeiro despendido na minha iniciação como cientista.

Page 7: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

v

“When I heard the learn’d astronomer,

When the proofs, the figures, were ranged in columns before me,

When I was shown the charts and diagrams, to add, divide, and measure them,

When I sitting heard the astronomer where he lectured with much applause in the lecture-room,

How soon unaccountable I became tired and sick,

Till rising and gliding out I wander’d off by myself,

In the mystical moist night-air, and from time to time,

Look’d up in perfect silence at the stars.”

(Walt Whitman, Leaves of Grass)

Page 8: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

vi

Resumo

Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G

e K. Na nossa amostra, 14 estrelas são conhecidas na literatura por apresentarem sinais

moderados a fortes de atividade magnética. 7 estrelas aparentam não ter passado pela

mistura termohalina, o que poderia ser devido à presença de um campo magnético forte.

Posteriormente, observamos 14 estrelas muito brilhantes que nos permitiram melhorar

nossa habilidade com a espectropolarimetria. Por fim, analisamos a existência de dividing

lines no diagrama Hertzsprung-Russell. Utilizando os dados dos espectropolarímetros

NARVAL e ESPaDOnS, foi possível detectar a polarização circular dentro das linhas

de absorção fotosféricas de nossos alvos. Aqui, usamos o método de Deconvolução em

Mínimos Quadrados (LSD) para criar perfis médios de Stokes V com alta razão sinal-

ruído. Então, detectamos o campo magnético e avaliamos sua relação com as dividing

lines no diagrama HR. A presença da dividing line no diagrama HR faz com que as

estrelas tardias sejam divididas em dois grupos. À esquerda, encontramos estrelas do tipo

solar, com estrutura atmosférica composta por cromosfera, região de transição, coroa e

ventos de tipo solar. À direita, podemos encontrar estrelas com extensa cromosfera e

ventos massivos e frios. Determinamos, indubitavelmente, o campo magnético superficial

de 3 estrelas da nossa amostra e concluímos que outras 18 delas não mostram detecção

de atividade magnética. As estrelas magnéticas estão situadas à esquerda da dividing

line, enquanto as estrelas não-magnéticas se encontram à direita da linha, mostrando

evidências de afiliação entre o comportamento do campo magnético e a dividing line.

Palavras-chave: Campo Magnético, Diagrama HR, Dividing Line, LSD.

Page 9: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

vii

Abstract

We investigate the surface magnetic field of 35 G-K stars. In our sample, 14

stars present moderate to strong signs of magnetic activity, as known from the literature.

Other 7 stars seem not to have been through thermohaline mixing, which could be

due to hosting a strong magnetic field. Subsequently, we observed 14 additional very

bright stars which allowed us to improve our ability with spectropolarimetry. Lastly,

we analysed the existence of dividing lines in the Hertzsprung-Russell diagram. Using

the data from spectropolarimeters NARVAL and ESPaDOnS, it was possible to detect

circular polarisation within the photospheric absorption lines of our targets. Here, we

use the Least-Squares Deconvolution (LSD) method to create high signal-to-noise ratio

mean Stokes V profiles. Then, we detect the magnetic field and evaluate its relation

to the dividing lines in the HR diagram. The presence of the dividing line in the HR

diagram causes the late-type stars to divide into two groups. To the left, we find solar-

type stars, with an atmospheric structure composed by chromosphere, transition region,

crown and solar-type winds. To the right, the stars have extended chromosphere and

heavy cold winds. We unquestionably determined the surface magnetic field for 3 stars

from our sample and concluded that other 18 of them show no detection of magnetic

activity. The magnetic stars lie to the left of the dividing line, as the non-magnetic stars

lie to the right of the line, showing evidence of affiliation between the magnetic field

behaviour and the dividing line.

Keywords: Magnetic field, HR Diagram, Dividing Line, LSD.

Page 10: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Sumário

1 Introdução 1

1.1 Diagrama Hertzprung-Russell . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

1.2 Breve histórico acerca da espectropolarimetria . . . . . . . . . . . . . . . 3

1.3 Amostra estelar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

1.3.1 Campo magnético em estrelas de pouca massa . . . . . . . . . . . 5

1.3.2 Teoria do dínamo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2 Metodologia 7

2.1 Efeito Zeeman . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

2.2 Deconvolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

2.2.1 Transformada discreta de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

2.3 Método dos Mínimos Quadrados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

2.4 Parâmetros de Stokes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

2.4.1 Dedução pela teoria eletromagnética . . . . . . . . . . . . . . . . 13

3 Dados espectropolarimétricos 19

3.1 Espectropolarímetros NARVAL e ESPaDOnS . . . . . . . . . . . . . . . 19

3.2 Medindo o campo magnético estelar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

3.2.1 Imageamento Zeeman-Doppler (ZDI) . . . . . . . . . . . . . . . . 20

3.2.2 Deconvolução em mínimos quadrados (LSD) . . . . . . . . . . . . 21

3.3 A amostra observada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

3.3.1 Gigantes ativas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

3.3.2 Desviantes termohalinas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

Page 11: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

ix Sumário

3.3.3 CFHT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

3.3.4 Algumas propriedades das estrelas da amostra . . . . . . . . . . . 24

3.4 Dividing line no diagrama HR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

4 Resultados e discussões 29

4.1 Campo magnético longitudinal Bl . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

4.1.1 HIP3419 - — Cet . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

4.1.2 HIP117503 - OU And . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

4.1.3 HIP48356 - 39 Hya . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

4.1.4 Estrelas sem atividade magnética . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

4.2 Diagrama HR e dividing line . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

4.3 Análise do campo magnético e temperatura . . . . . . . . . . . . . . . . 34

4.4 Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

5 Considerações Finais 37

Referências Bibliográficas 38

Page 12: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Sumário x

Page 13: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 1

Introdução

A construção de um modelo físico abrangente de estrutura e evolução estelar é um

dos maiores triunfos da Astrofísica do século XX (Uzdensky, 2009), como exemplo desta

conquista, temos o desenvolvimento do diagrama Hertzsprung-Russell, que até hoje é

utilizado para classificar estrelas e sua evolução, também a espectropolarimetria, que veio

como uma maneira de caracterizar a luz da maneira mais acurada possível, isto por volta

de 1990. No entanto, muitos outros aspectos dos ciclos estelares não são devidamente

entendidos, sendo um desses aspectos a origem e a evolução dos campos magnéticos

estelares, de maneira que esta é uma questão fundamental para a Astrofísica moderna.

Qual é a origem desses campos magnéticos? Como seus ciclos funcionam? Tais questões

são relevantes porque o problema dos ciclos dos campos magnéticos compreende vários

grupos estelares, como estrelas jovens, estrelas da sequência principal, anãs brancas,

estrelas de nêutrons e outros. Aqui, limitamo-nos a estudar o campo magnético em

estrelas do tipo tardio, especificamente estrelas gigantes G e K. Começaremos este

capítulo com uma breve introdução sobre essas duas ferramentas fundamentais para a

astrofísica e para o nosso trabalho, o diagrama HR e a espectropolarimetria.

1.1 Diagrama Hertzprung-Russell

O diagrama Hertzsprung-Russell (diagrama HR) é uma das ferramentas mais

importantes no estudo da evolução estelar. Originou-se em 1911, quando o astrônomo

Page 14: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 1. Introdução 2

dinamarquês Ejnar Hertzsprung traçou a magnitude absoluta das estrelas contra a sua

cor (disso, a temperatura efetiva). Independentemente, em 1913, o astrônomo americano

Henry Norris Russell usou a classe espectral em relação à magnitude absoluta. Os

resultados dos dois mostraram que a relação entre a temperatura e a luminosidade de

uma estrela não era aleatória, mas sim parecia cair em grupos distintos (ver figura 1.1).

A massa, a idade e até certo nível a composição química estelar e rotação, de-

terminam a luminosidade, raio e temperatura da estrela. Assim, o diagrama HR é um

gráfico da luminosidade em função da temperatura, podendo tomar diversas formas,

dependendo de quais coordenadas estão sendo utilizadas (Gray, 2005).

Figura 1.1: Diagrama HR observacional com 22 mil estrelas do Catálogo Hipparcos e1 mil do Catálogo Gliese de estrelas próximas. As estrelas tendem a estar apenas emcertas regiões do diagrama. A região diagonal é a mais evidente, indo da parte superioresquerda (quente e brilhante) para o canto inferior direito (mais frio e menos brilhante),denominada sequência principal. Na parte inferior esquerda, encontramos as anãs brancase acima da sequência principal estão as subgigantes, gigantes e supergigantes. Retiradode: Wikipedia.

Page 15: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

3 1.2. Breve histórico acerca da espectropolarimetria

1.2 Breve histórico acerca da espectropolarimetria

Uma das ferramentas mais pertinentes da atualidade para estudo de campos

magnéticos, já citada anteriormente, é a espectropolarimetria. Como sugerido pelo nome,

a espectropolarimetria analisa a luz tanto espectroscópica, quanto polarimetricamente.

Logo, é possível medir com a mais alta precisão tanto a distribuição da energia em função

do comprimento de onda, quanto as propriedades do vetor de polarização da radiação

eletromagnética (del Toro Iniesta, 2003).

Ao longo dos séculos, muitas pessoas contribuíram para o desenvolvimento de

instrumentos para medir a polarização de objetos astronômicos. Segundo del Toro Iniesta,

a polarização foi levada à atenção da comunidade científica por acaso. De acordo com a

história, um marinheiro que retornou à Copenhague, vindo da Islândia, trouxe de volta

belos cristais do que agora conhecemos como espato da Islândia ou calcita. Alguns desses

cristais, aparentemente, caíram nas mãos de Erasmus Bartholin, um médico dinamarquês,

matemático e físico, que na época (1669) era professor de medicina na Universidade de

Copenhague. Bartholin observou que as imagens formadas através desses cristais eram

duplas. Além disso, quando o cristal era rotacionado, uma imagem permanecia no lugar,

enquanto a outra girava com o cristal (figura 1.2)1. Esse foi um dos primeiros eventos

relevantes para o início do estudo em polarização.

Figura 1.2: Imagens duplas formadas em calcita.

1Retirado de: http://www2.oberlin.edu/physics/

Page 16: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 1. Introdução 4

Após a descoberta de Bartholin, muitos outros acontecimentos vieram para consu-

mar o estudo da polarização (Trujillo-Bueno, 2002). Alguns deles: em 1808, Etienne-Louis

Malus descobre a polarização a partir da reflexão; em 1818, Augustin Jean Fresnel e

Dominique François Arago encontram a natureza transversal da polarização; em 1828,

William Nicol inventa o primeiro prisma polarizador de calcita; 1852, George Gabriel

Stokes apresenta os parâmetros de Stokes; 1858, E. Liais descobre polarização linear na

coroa solar durante um eclipse; 1908, George E. Hale encontra polarização circular e

linear em manchas solares.

O estudo da polarização e, por conseguinte, da espectropolarimetria é crucial

para nossa compreensão atual sobre campos magnéticos. Nas próximas seções, falaremos

um pouco sobre nossa amostra estelar e algumas características do campo magnético de

tais estrelas.

1.3 Amostra estelar

Nesta pesquisa, utilizamos a amostra de estrelas de Petit et al. (2014), observada

por várias missões e atrelada ao PolarBase 2, uma base de dados que contém todos

os dados estelares obtidos pelos espectropolarímetros de alta resolução ESPaDOnS

(Echelle SpectroPolarimetric Device for the Observation of Stars, Canada-France-Hawaii

Telescope, Havaí) e NARVAL (Telescópio Bernard Lyot (TBL), localizado no Pic du

Midi, França). Desde o início de 2014, observações de 2000 objetos estelares em todo

o diagrama HR estão disponíveis. Os espectros de intensidade estão disponíveis para

todos os alvos e a maioria das observações também inclui espectros simultâneos em

polarização circular ou linear, sendo a maioria das medidas polarimétricas realizadas

apenas em luz polarizada circularmente (Stokes V). Relacionamos nossa amostra com a

proveniente de Aurière et al. (2015) e selecionamos 35 estrelas gigantes e frias, do tipo

tardio.

Espera-se que tais estrelas (gigantes do tipo espectral G-K) abriguem principal-

mente campos magnéticos superficiais fracos, tendo em vista se tratarem de estrelas com2Disponível em http:/polarbase.irap.omp.eu

Page 17: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

5 1.3. Amostra estelar

grandes raios e baixa rotação (Aurière et al., 2015). Ainda assim, atividade na forma de

emissão nos núcleos de linhas cromosféricas fortes, variabilidade fotométrica e emissão

de raios-X é uma característica dessas estrelas que vem sendo registrada há décadas.

Para rotatores lentos, detecções confiáveis de campos magnéticos superficiais por meio

de assinaturas Zeeman (via espectropolarimetria) só puderam ser registradas após a

introdução do ESPaDOnS e NARVAL (Konstantinova-Antova et al., 2008).

Além disso, a região ocupada por essas estrelas no diagrama HR vem sendo

bastante explorada, possibilitando, dessa maneira, a produção de trabalhos (Linsky e

Haisch, 1979; Ayres et al., 1981; Haisch et al., 1990, 1992; Huensch et al., 1996) que

revelaram a existência de uma “dividing line” na região fria do diagrama HR. Estas

“dividing lines” são definidas através das diferenças físicas entre as camadas mais externas

da atmosfera estelar.

1.3.1 Campo magnético em estrelas de pouca massa

Em estrelas frias e de baixa massa, acredita-se que uma intensa atividade mag-

nética resulte da conversão de energia mecânica convectiva e rotacional em energia

magnética proveniente do processo de dínamo. Por meio de medidas espectropolarimé-

tricas e da análise de determinadas características espectrais, pode-se detectar campos

magnéticos da ordem de kilogauss (Uzdensky, 2009).

1.3.2 Teoria do dínamo

A teoria do dínamo descreve o processo através do qual um fluido eletricamente

condutor, estando sob processos de rotação e convecção, atua para manter um campo

magnético. Este modelo é usado para explicar a presença de campos magnéticos em

corpos astrofísicos. Levando-se em consideração o dínamo elétrico, um gerador de ele-

tricidade por transformação de energia mecânica em energia elétrica, podemos definir,

analogamente, o dínamo astrofísico. Neste caso, o movimento do plasma (gás altamente

ionizado, do qual o interior estelar é composto) estelar provocaria a variação temporal

dos campos magnéticos do meio (Nelson, 2008), o que geraria uma corrente elétrica

Page 18: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 1. Introdução 6

mantenedora do campo magnético por indução (Lei de Faraday).

Aqui, dividimos os capítulos da seguinte maneira: o capítulo 2 trata dos métodos

matemáticos aplicados aos cálculos dos campos magnéticos estelares. Em seguida, traze-

mos os dados observacionais no capítulo 3, no capítulo 4 falaremos sobre os resultados

e discussões, finalizando com as considerações finais no capítulo 5.

Page 19: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2

Metodologia

Nosso objetivo é calcular o campo magnético de estrelas. Usaremos o método de

deconvolução em mínimos quadrados (do inglês Least-Squares Deconvolution, a partir

daqui, LSD), que é uma técnica semelhante à correlação cruzada, desenvolvida para

computar perfis médios de milhares de linhas espectrais simultaneamente. De maneira

aproximada, tanto o espectro estelar polarizado quanto o não-polarizado pode ser enten-

dido como uma linha padrão convolvida com um perfil de linha médio. Neste contexto,

extrair esse perfil de linha médio caracteriza um problema de deconvolução linear. Tra-

tamos isto como um problema matricial e buscamos a solução por Mínimos Quadrados.

Na prática, o LSD é bastante similar a outras técnicas de correlação cruzada,

com o benefício de ser mais sofisticado no sentido de que esta técnica “limpa” o perfil de

correlação cruzada do perfil de autocorrelação da linha padrão. Particularmente, o LSD

é adequado para medir as assinaturas Zeeman de perfis de linha geradas por campos

magnéticos superficiais através do efeito Zeeman. Considerando o caso de estrelas ativas

frias com alta rotação (como algumas de nossas estrelas), a assinatura da polarização

circular (Stokes V) é muito pequena, de maneira que, ao aplicarmos o LSD, temos

um aumento de cerca de 30 vezes da razão sinal-ruído em relação ao espectro original

(Aurière et al., 2015).

Em suma, para as estrelas que apresentam uma assinatura Zeeman, de polarização

circular (Stokes V) ou não-polarizada (Stokes I), utilizaremos o LSD para construir

os perfis médios de Stokes I e V, aumentando a razão sinal-ruído desses espectros e

Page 20: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 8

determinando o campo magnético em seguida.

Este capítulo é dedicado ao embasamento matemático necessário para se desen-

volver a técnica do LSD.

2.1 Efeito Zeeman

Quando linhas espectrais são formadas na presença de um campo magnético, elas

se ampliam ou se dividem em componentes polarizados diferentemente. Este fenômeno

é conhecido como o efeito Zeeman, em homenagem ao seu descobridor, o físico holandês

Pieter Zeeman, que em 1896 encontrou um alargamento evidente das linhas D de sódio

depois de ligar um eletroímã (del Toro Iniesta, 2003).

Aqui, mostraremos o desenvolvimento matemático do Efeito Zeeman em um

átomo de hidrogênio na presença de um campo magnético fraco. Este efeito é levado em

conta quando fazemos as correções de estrutura hiperfina para determinação dos níveis

energéticos do átomo de hidrogênio, ou seja, quando consideramos a interação entre o

spin do elétron e o spin do núcleo do átomo (Zettili, 2009).

Consideramos, inicialmente, um átomo de hidrogênio que é colocado em um

campo magnético uniforme externo B. O efeito de um campo magnético externo no

átomo é causar um desvio em seus níveis de energia. A interação do campo magnético

com os momentos de dipolo magnético orbital e de spin do elétron, µL e µS, dá origem a

dois termos de energia, ≠µL · B e ≠µS · B, cuja soma chamamos de Energia de Zeeman:

HZ = ≠µL · B ≠ µS · B

= e

2mecL · B + e

mecS · B

= e

2mec(L · 2S) · B

= eB

2mec(LZ + 2SZ), (2.1)

com µL = ≠eL

2mece µS = ≠S

mec, sendo L e S os momentos angulares orbital e de spin e e

me a carga elementar e a massa do elétron, c sendo a velocidade da luz. Por simplicidade,

Page 21: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

9 2.1. Efeito Zeeman

tomamos B ao longo do eixo z: B = Bz. Desconsiderando-se a contribuição das correções

de estrutura fina, o hamiltoniano do átomo de hidrogênio sujeito a um campo magnético

externo uniforme fraco tem a forma:

H = H0 + HZ , (2.2)

com H0 sendo o hamiltoniano imperturbado (como HZ é bem menor do que H0, podemos

tratar este problema com teoria das perturbações independentes do tempo). O objetivo

aqui é encontrar a perturbação na energia em primeira ordem, dessa maneira, faz-se

necessário encontrar a base mais adequada para se diagonalizar o hamiltoniano de

perturbação, HZ . Escolheremos os autoestados |nljmjÍ, com n sendo o número quântico

principal, l o número quântico de momento angular orbital, j o número quântico de

momento angular total e mj o número quântico magnético associado ao momento angular

total.

Escrevendo-se (LZ+2SZ) como (JZ+SZ), em que J = L+S representa o momento

angular total do elétron, podemos reescrever a equação 2.2 da seguinte maneira:

H = H0 + eB

2mec(JZ + SZ). (2.3)

Em um cálculo de perturbação em primeira ordem, temos que a contribuição de

HZ é dada por:

E(1)Z = Ènljmj| HZ |nljmjÍ = eB

2mecÈnljmj| (JZ + SZ) |nljmjÍ . (2.4)

Como Ènljmj| JZ |nljmjÍ = ~mj, usamos o teorema de Wigner-Eckart para o produto

interno e fazemos:

Ènljmj| SZ |nljmjÍ = Ènljmj| J · S |nljmjÍ~2j(j + 1) Ènljmj| JZ |nljmjÍ (2.5)

= j(j + 1) ≠ l(l + 1) + s(s + 1)2j(j + 1) ~mj, (2.6)

Page 22: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 10

em que ~ é a constante de Planck reduzida e s é o número quântico de spin. Podemos

reduzir a equação 2.4 para

E(1)Z = eB~

2mec

C

1 + j(j + 1) ≠ l(l + 1) + s(s + 1)2j(j + 1)

D

mj

= eB~2mec

gjmj

= BµBgjmj, (2.7)

onde µB = eB~2mec

é o magneton de Bohr do elétron e gj é o fator de Landé:

gj = 1 + j(j + 1) ≠ l(l + 1) + s(s + 1)2j(j + 1) . (2.8)

Aqui o fator de Landé será um dos parâmetros utilizados para o ajuste das

máscaras usadas na construção dos perfis LSD.

2.2 Deconvolução

Basicamente, a deconvolução é um processo algorítmico usado para reverter os

efeitos da convolução em dados gravados. Esse conceito é amplamente utilizado em

processamento de sinais e imagens, para filtragem e conversão de dados, por exemplo.

Convolução é uma ferramenta matemática utilizada quando temos a sobreposição de

sinais de dados. Então, a deconvolução busca encontrar uma solução para a equação de

convolução de forma:

f = g ú h, (2.9)

em que f é o sinal gravado, g é o sinal que se deseja recuperar e h é o sinal convolvido

com g. Se a forma de g é sabida, pode-se utilizar uma deconvolução determinística. Em

medidas físicas reais, precisamos adicionar ›, que representa o ruído, desconsiderá-lo nos

Page 23: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

11 2.2. Deconvolução

impediria de obter g corretamente. Assim, a equação tem a forma:

f = (g ú h) + ›. (2.10)

Quanto maior for a relação sinal-ruído (S/N), melhor será a nossa estimativa

para o sinal g, logo, a deconvolução não parece ser um método tão satisfatório, mas se

sabemos a origem do ruído é possível desenvolver técnicas específicas para a solução do

problema, como o LSD, por exemplo.

A deconvolução é feita por meio da transformada de Fourier. Para fins de com-

preensão (e por ser desnecessário um entendimento mais profundo), desconsideremos o

ruído ›. Pelo Teorema da Convolução1, aplicamos a transformada de Fourier em ambos

os membros da equação 2.9:

f = g ú h ∆ f = g · h ∆ g = f/h, (2.11)

sendo f , g e h as funções no espaço de Fourier. Em resumo, aplicamos a transformada de

Fourier em todos os membros da equação 2.9 e isolamos o sinal que queremos recuperar.

Em seguida, aplicamos a transformada inversa de Fourier para obtermos esse sinal.

Considerando a natureza discreta dos nossos dados, temos que é necessário uma aplicação

da transformada discreta de Fourier.

2.2.1 Transformada discreta de Fourier

Como dito anteriormente, neste trabalho tratamos a deconvolução dos espectros

como um problema matricial, então, para fins didáticos, introduziremos o conceito de

transformada discreta de Fourier (a partir daqui, DFT) em sua representação matricial.

Uma DFT de N pontos pode ser expressa como a multiplicação

X = Wx, (2.12)

1O Teorema da Convolução mostra que a transformada de Fourier da convolução entre duas funções

é igual ao produto das funções transformadas, i.e., F{f ú g} = F{f} · F{g} .

Page 24: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 12

em que x é o sinal original, W é a matriz de transformação N ◊N e X é a transformada

discreta de Fourier do sinal x. Podemos definir W como:

W = Êjk

ÔN

, j,k = 0, ..., N ≠ 1, (2.13)

equivalentemente,

W = 1ÔN

S

WWWWWWWWWWWWWWU

1 1 1 . . . 1

1 Ê Ê2 . . . ÊN≠1

1 Ê2 Ê4 . . . Ê2(N≠1)

1 Ê3 Ê6 . . . Ê3(N≠1)

1 ÊN≠1 Ê2(N≠1) . . . Ê(N≠1)(N≠1)

T

XXXXXXXXXXXXXXV

, (2.14)

com Ê = e≠2fii/N sendo um N-ésimo número de de Moivre (ver Wiener (1964)).

2.3 Método dos Mínimos Quadrados

O método dos Mínimos Quadrados é uma técnica de otimização matemática,

atuando de forma a encontrar a função de melhor ajuste para determinado conjunto

de dados, tentando minimizar a soma dos quadrados das diferenças entre os valores

estimados e os dados que foram observados.

Para uma dada função y(x), o método irá encontrar os valores dos parâmetros

da função que minimizam o erro › entre y(x) e os dados Y . Sendo a e b os parâmetros

da função, por exemplo, o método calcula

›(a,b) =ÿ

n

[Yn ≠ y(xn)]2 , (2.15)

tal que ˆ›

ˆa= ˆ›

ˆb= 0 . Estas condições irão gerar um sistema de equações, de modo

que os autovalores do sistema serão a e b. Caso o ajuste dos dados com a função y(x)

não seja satisfatório, i.e., apresente um erro significativo, uma outra função deverá ser

escolhida para se repetir o processo.

Page 25: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

13 2.4. Parâmetros de Stokes

2.4 Parâmetros de Stokes

Em seu artigo de 1852, intitulado “On the composition and resolution of streams of

polarized light from different sources”, George Gabriel Stokes estabeleceu um formalismo

matemático ideal para descrever o estado de polarização de qualquer feixe de luz. No

mais, demonstrou várias das mais importantes propriedades da luz polarizada, entre as

quais ele observou o seguinte (tradução livre):

Quando qualquer número de fluxos polarizados independentes, com de-

terminadas refrangibilidades, são misturados entre si, a natureza da mistura

é completamente determinada pelos valores de quatro constantes, que são

certas funções das intensidades dos fluxos e dos azimutes e excentricidades

das elipses pelas quais eles são respectivamente caracterizados; de modo que

quaisquer dois grupos de fluxos polarizados que fornecem os mesmos valores

para cada uma dessas quatro constantes são opticamente equivalentes.

Essas quatro constantes às quais Stokes estava se referindo são o que atualmente

conhecemos como parâmetros de Stokes (del Toro Iniesta, 2003). Dessa maneira, os

parâmetros de Stokes foram desenvolvidos como um conjunto de valores que caracterizam

a polarização de dada radiação eletromagnética.

2.4.1 Dedução pela teoria eletromagnética

As equações de onda para os campos elétrico e magnético são dadas (Griffiths,

1999; Jackson, 1999), respectivamente, por:

Ò2E = µ0Á0d2E

dt2 (2.16)

Ò2B = µ0Á0d2B

dt2 , (2.17)

nas quais E e B são os vetores de campo elétrico e magnético, µ0 e Á0 são as constantes

de permeabilidade e permissividade no vácuo, respectivamente. As soluções de onda

plana transversal são as seguintes:

Page 26: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 14

E(r,t) = E0 ei(k·r≠Êt) (2.18)

B(r,t) = B0 ei(k·r≠Êt), (2.19)

tal que k = k n é o número de onda apontando na direção de propagação n e Ê é a frequên-

cia da onda, com Ê = ck e c = 1Ô

µ0Á0. Como os campos são ortogonais, B0 = (n ◊ E0)

c.

Para formar o conjunto dos parâmetros de Stokes precisamos, inicialmente, ex-

pressar as soluções para os campos em polarização linear e circular como dois tipos de

bases para a polarização das ondas planas.

Primeiro, introduzimos a polarização declarando os vetores de base ‘1 e ‘2, tais

que ‘1 · ‘2 = 0 (ver figura 2.1). Em seguida, podemos escrever as soluções como

E1 = ‘1 E1 ei(k·r≠Êt), (2.20)

E2 = ‘2 E2 ei(k·r≠Êt), (2.21)

Bj = 1Ê

(k ◊ Ej), j = 1, 2. (2.22)

x

y

z

k

‘1

‘2

Figura 2.1: Ilustração mostrando a propagação de uma onda linearmente polarizada nadireção de k, ortogonal ao plano (‘1 , ‘2).

Page 27: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

15 2.4. Parâmetros de Stokes

Essas soluções permitem que tenhamos polarizações lineares diferentes uma vez

que há uma onda de amplitude para cada direção ‘j. Se E1 e E2 apresentam a mesma

fase, podemos escrever a solução para a onda de polarização linear – ver figura 2.2 – na

forma

E(r,t) = (‘1 E1 + ‘2 E2) ei(k·r≠Êt). (2.23)

Ey

Ex

z

Figura 2.2: Propagação do vetor de campo elétrico para a polarização linear da direçãodos eixos x e y.

No entanto, se as amplitudes E1 e E2 são iguais, mas diferem em fase por 90¶,

expressamos a onda de polarização elipsoidal como se segue:

E(r,t) = E0 (‘1 ± i‘2) ei(k·r≠Êt). (2.24)

Mais claramente, consideraremos a propagação da onda na direção do eixo z, com

vetores unitários ‘1 = e1 e ‘2 = e2 . Tomando-se as partes reais, nossa solução se torna:

Ex = E0 cos(kz ≠ Êt) (2.25)

Ey = û E0 sin(kz ≠ Êt). (2.26)

Aqui, o campo elétrico varre uma área circular a uma frequência Ê. Para (‘1 + i‘2),

a rotação acontece no sentido anti-horário para um observador que vê a onda chegando.

Esta configuração é conhecida como polarização circular à esquerda ou helicidade nega-

tiva, como mostra a figura 2.3. Para o caso oposto, (‘1 ≠ i‘2), temos a configuração de

Page 28: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 16

polarização circular à direita ou helicidade positiva.

y

x

E

Figura 2.3: Representação da propagação do campo elétrico E de helicidade negativa,ortogonal ao plano (x,y).

Para representar um estado geral da polarização circular, definimos os vetores

unitários complexos ortogonais,

‘± © 1Ô2

(‘1 ± i‘2), (2.27)

tais que ‘ú± · ‘± = 1 e ‘ú

± · ‘û = 0. O campo elétrico se torna

E(r,t) = (‘+ E+ + ‘≠ E≠) ei(k·r≠Êt). (2.28)

Se ‘+ ”= ‘≠ mas possuem mesma fase, a solução representa uma polarização

elíptica. Por outro lado, se as amplitudes têm diferentes fases, o vetor E terá os seus

eixos em rotação.

Em resumo, a polarização de uma onda plana eletromagnética pode ser escrita

em termos dos coeficientes ‘1, ‘2, ‘+ e ‘≠,

‘1 = a1 ei”1 , ‘2 = a2 ei”2 (2.29)

‘+ = a+ ei”+ , ‘≠ = a≠ ei”≠ . (2.30)

Para identificar qual estado do feixe é observado, usaremos os parâmetros de

Stokes, já comentados anteriormente. Estes parâmetros caracterizam a polarização,

dando-nos a informação sobre o seu tipo e sua direção. Como falado acima, essas

Page 29: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

17 2.4. Parâmetros de Stokes

características dependem da amplitude (a1, a2, a+, a≠) e do fator de fase (”1, ”2, ”+,

”≠). Então, novamente considerando um feixe na direção do eixo z, as possibilidades são

limitadas a ‘1 · E, ‘2 · E, ‘+ · E e ‘≠ · E.

Para a base da polarização linear (‘1, ‘2), definimos os parâmetros de Stokes

como segue:

s0 =---‘1 · E

---2

+---‘2 · E

---2

= a21 + a2

2 (2.31)

s1 =---‘1 · E

---2

≠---‘2 · E

---2

= a21 ≠ a2

2 (2.32)

s2 = 2 ReÓ(‘1 · E)ú(‘2 · E)

Ô= 2a1a2 cos(”2 ≠ ”1) (2.33)

s3 = 2 ImÓ(‘1 · E)ú(‘2 · E)

Ô= 2a1a2 sin(”2 ≠ ”1). (2.34)

Para a base da polarização circular (‘+, ‘≠), temos:

s0 =---‘ú

+ · E---2

+---‘≠ · E

---2

= a2+ + a2

≠ (2.35)

s1 = 2 ReÓ(‘ú

+ · E)ú(‘ú≠ · E)

Ô= 2a+a≠ cos(”≠ ≠ ”+) (2.36)

s2 = 2 ImÓ(‘ú

+ · E)ú(‘ú≠ · E)

Ô= 2a+a≠ sin(”≠ ≠ ”+) (2.37)

s3 =---‘ú

+ · E---2

≠---‘≠ · E

---2

= a2+ ≠ a2

≠. (2.38)

Podemos escrever os parâmetros de Stokes na seguinte notação:

S =

S

WWWWWWWWWWU

s0

s1

s2

s3

T

XXXXXXXXXXV

=

S

WWWWWWWWWWU

I

Q

U

V

T

XXXXXXXXXXV

. (2.39)

Em relação à polarização linear, descrevemos os parâmetros de Stokes: I mede a

intensidade relativa; Q fornece a preponderância da polarização linear no eixo-x sobre a

polarização no eixo-y; U e V trazem informações acerca da fase. Quanto à polarização

circular: I mede a intensidade relativa; Q e U trazem informações sobre a fase e V fornece

a diferença entre a intensidade relativa da helicidade positiva e negativa.

Page 30: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 2. Metodologia 18

Page 31: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3

Dados espectropolarimétricos

A necessidade em se obter informações cada vez mais precisas acerca dos pro-

cessos estelares fez com que os astrônomos fundissem duas técnicas já conhecidas, a

espectroscopia e a polarimetria, surgindo, assim, a espectropolarimetria. Como sugerido

pelo nome, a espectropolarimetria analisa a luz tanto espectroscópica (relação entre a

matéria e a radiação eletromagnética), quanto polarimetricamente (medida e interpre-

tação da polarização de ondas transversais, mais notadamente ondas eletromagnéticas).

Dessa maneira, pode-se medir com a mais alta precisão tanto a distribuição da energia

em função do comprimento de onda, quanto as propriedades do vetor de polarização da

radiação eletromagnética (del Toro Iniesta, 2003).

3.1 Espectropolarímetros NARVAL e ESPaDOnS

Na atualidade, os telescópios são acoplados a diversos instrumentos que nos

permitem explorar quase todo o espectro eletromagnético, especialmente no visível.

Neste trabalho, utilizamos os dados obtidos por meio dos espectropolarímetros gêmeos

de alta performance NARVAL e ESPaDOnS (Echelle SpectroPolarimetric Device for the

Observation of Stars). O NARVAL está acoplado ao Telescópio Bernard Lyot (TBL),

localizado no Pic du Midi, França (Donati, 2008b). O NARVAL@TBL fornece um

mapeamento bastante detalhado do campo magnético estelar, além de ser um dos poucos

instrumentos existentes dedicado apenas à detecção do campo magnético de estrelas. O

Page 32: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3. Dados espectropolarimétricos 20

ESPaDOnS, instrumento no qual o NARVAL foi inspirado, está localizado no CFHT

(Canada-France-Hawaii Telescope) e opera desde 2005 (Figura 3.1) (Donati, 2008a).

Figura 3.1: À direita, Telescópio Bernard Lyot (TBL), Pic du Midi, França (retirado de:Wikipedia). À esquerda, CFHT, localizado no Havaí (retirado de: www.cfht.hawaii.edu).

3.2 Medindo o campo magnético estelar

3.2.1 Imageamento Zeeman-Doppler (ZDI)

A presença de um campo magnético leva à divisão dos níveis atômicos de energia

devido ao efeito Zeeman. Consequentemente, as linhas espectrais individuais correspon-

dentes às transições entre os níveis divididos de Zeeman se separam em grupos dos

chamados componentes fi e ‡. A magnitude desta separação depende da força do campo

magnético, da sensibilidade magnética de uma determinada linha espectral (caracteri-

zada pelo fator de Landé médio) e do comprimento de onda central desta linha. Então,

um campo magnético na superfície estelar pode ser detectado por dois efeitos básicos: a

divisão de linhas magneticamente sensíveis e a presença de polarização nos componentes

Zeeman.

Os campos magnéticos típicos das estrelas não degeneradas produzem desdo-

bramento de Zeeman que é muito menor que a largura da linha intrínseca. Apenas os

campos magnéticos muito fortes (da ordem de 1 - 2 kG) das estrelas Ap e as anãs M

ativas podem ser detectados pelo efeito Zeeman ou alargamento de linhas espectrais

em espectros ópticos de alta dispersão (Mathys et al., 1997; Reiners e Basri, 2007). Ao

mesmo tempo, um campo magnético geralmente é a única causa de polarização em

Page 33: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

21 3.2. Medindo o campo magnético estelar

linhas espectrais. Isso significa que a mera presença de um sinal de polarização de linha

é a assinatura de um campo magnético.

O estado completo de polarização da radiação estelar é descrito pelos quatro

parâmetros de Stokes: Stokes I (intensidade total), V (polarização circular) e QU (po-

larização linear). Assim, os quatro parâmetros Stokes são, a princípio, necessários para

um diagnóstico completo de um campo magnético estelar. No entanto, o efeito Zeeman

produz polarização circular que é até 10 vezes mais forte que a polarização linear.

Como os sinais típicos de polarização são de baixa amplitude, estes sinais não

são detectados em linhas espectrais individuais. Em vez disso, métodos de polarização

multi-linha eficientes foram desenvolvidos para balancear assinaturas de polarização

médias sobre todas as linhas de espectro adequadas. Esses procedimentos reduzem o

ruído do fóton ao nível necessário para a detecção de sinais de polarização extremamente

fracos. O método de múltiplas linhas de uso mais comum de deconvolução em mínimos

quadrados (LSD) recupera um perfil médio que, no contexto de Imageamento Doppler

(DI), pode ser tratada como uma única linha espectral com parâmetros médios (Rozelot

e Neiner, 2016).

3.2.2 Deconvolução em mínimos quadrados (LSD)

O método de Deconvolução em Mínimos Quadrados (do inglês Least-Squares

Deconvolution, LSD) foi primeiramente introduzido por (Donati et al., 1997; Donati e

Brown, 1997). Tal método tem o objetivo de aumentar a sensitividade da técnica de

imageamento Zeeman-Doppler, considerando-se que esta técnica é bastante limitada

pelo fato de as assinaturas das linhas espectrais serem bem finas.

Podemos utilizar o LSD para diversos objetivos, tais como a detecção, caracteriza-

ção e mapeamento detalhado da temperatura, campo magnético e abundância química

superficial das estrelas (Kochukhov et al., 2010). Para calcular o campo magnético, ana-

lisamos os perfis LSD obtidos dos espectros de intensidade e polarização circular de uma

estrela-alvo, o que corresponde aos espectros dos parâmetros de Stokes I e V.

Para que obtenhamos um diagnóstico de alta precisão da polarização circular da

Page 34: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3. Dados espectropolarimétricos 22

linha espectral, a técnica de LSD foi aplicada a cada espectro reduzido dos parâmetros I e

V de Stokes. O LSD é uma técnica semelhante à correlação cruzada, que assume que todas

as linhas espectrais têm a mesma forma de perfil, dimensionadas por um determinado

fator e expressadas usando máscaras de linha que resumem os dados atômicos relevantes.

O dimensionamento é feito a partir da otimização de parâmetros livres (fator de Landé

médio, comprimento de onda central da linha e profundidade central da mesma) seguindo

um procedimento semelhante ao empregado por Marsden et al. (2014). As máscaras

foram construídas usando a temperatura e a gravidade adequadas para cada estrela, dos

modelos ATLAS9 de abundância solar (Kurucz, 1993) ou de dados fornecidos pelo Vienna

Atomic Line Database VALD (Kupka e Ryabchikova, 1999). As linhas selecionadas têm

um limite inferior para profundidade intrínseca entre 0,1 e 0,25. O número de linhas

incluídas em cada máscara é principalmente dependente da temperatura e geralmente

compreendido entre cerca de 6500 e 14 000. No final, a relação sinal/ruído (S/N) do

perfil LSD Stokes V é aproximadamente 30 vezes maior que a S/N no espectro original

(Aurière et al., 2015).

Figura 3.2: Perfil LSD de — Cet, refere-se à observação do dia 30 de setembro de 2007.A primeira curva é o perfil LSD do parâmetro de Stokes V (circularmente polarizado) ea última curva é o perfil do parâmetro I de Stokes da radiação não polarizada. A curvado meio é utilizada como parâmetro de controle.

Page 35: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

23 3.3. A amostra observada

3.3 A amostra observada

O principal objetivo deste estudo foi determinar e medir o campo magnético de

estrelas gigantes vermelhas. Inicialmente, começamos com a amostra de estrelas de Petit

et al. (2014) observada por várias missões e atrelada à base de dados do PolarBase (ver

capítulo 1). Em seguida, relacionamos nossa amostra com a proveniente de Aurière et al.

(2015), destas escolhemos 35 estrelas gigantes e frias, do tipo tardio. As 35 estrelas estão

divididas em três grupos, cujas descrições são dadas a seguir.

3.3.1 Gigantes ativas

Este grupo da amostra consiste em estrelas gigantes que estão descritas na litera-

tura como tendo evidência de atividade. São 14 estrelas da amostra, às quais iremos nos

referir por “gigantes ativas”, sendo principalmente objetos de alta rotação, em compa-

ração com outras gigantes (de Medeiros e Mayor, 1999), com alta altividade das linhas

H e K de CaII. Estas estrelas também apresentam grande atividade coronal, observada

pelos altos índices de raios-X, com Lx > 1030 ergs≠1 (Gondoin, 1999, 2005). Também

foram incluídas gigantes com rotação aparentemente baixa, mas que também exibiam

fortes emissões em raios-X (Gondoin, 1999; Schroeder et al., 1998) ou para as quais

foram medidas as variações nas emissões de H e K de CaII (Choi et al., 1995).

3.3.2 Desviantes termohalinas

Grupo de 7 estrelas desviantes termohalinas (a partir daqui, THD). Esta amostra

é composta por gigantes vermelhas que podem ter escapado à mistura termohalina

(Charbonnel e Zahn, 2007b), que é um mecanismo que governa a composição fotosférica

de gigantes brilhantes de baixa massa. Tais estrelas supostamente abrigam um campo

magnético intrínseco e forte e são descendentes de estrelas Ap magnéticas (Charbonnel

e Zahn, 2007a).

Page 36: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3. Dados espectropolarimétricos 24

3.3.3 CFHT

As 14 estrelas restantes são gigantes vermelhas e amarelas muito brilhantes

(Vmag < 4), nas quais campos magnéticos provenientes do dínamo podem ocorrer. Se-

rão chamadas aqui de estrelas “CFHT” por terem sido observadas pelo programa de

snapshots do CFHT, que foi desenvolvido para funcionar mesmo nas piores condições

do céu (Aurière et al., 2015).

3.3.4 Algumas propriedades das estrelas da amostra

As propriedades das estrelas da nossa amostra estão dispostas na tabela 3.1. As

primeiras duas colunas mostram a identificação da estrela no catálogo HIPPARCOS

(ESA, 1997) 1 e seu nome. A magnitude na banda V, Vmag, e a classe espectral vêm da base

de dados SIMBAD2. A temperatura efetiva Teff foi calculada através dos dados de B≠V

provenientes do catálogo HIPPARCOS, com o uso da calibração de Flower (1996), já

a luminosidade logL/L§ foi calculada com os dados de paralaxe do HIPPARCOS. O

período de rotação Prot e a luminosidade de raios-X Lx são as provenientes de (Aurière

et al., 2015). A última coluna da tabela indica se a estrela é detectada como magnética

a partir da evidência de uma assinatura de Stokes V significativa em seus perfis LSD

(ver seção 3.2.2), Consideramos que uma observação exibe uma “detecção definitiva”

(DD) se a probabilidade de detecção de sinal dentro da linha for superior a 99,999%,

uma “detecção marginal” (MD) se a probabilidade estiver entre 99,9% e 99,999% e uma

“detecção nula” (nd) em outros casos (Aurière et al., 2015).

1Disponível em: https://heasarc.gsfc.nasa.gov/W3Browse/all/hipparcos.html

2Disponível em: http://simbad.u-strasbg.fr/simbad/

Page 37: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

25 3.3. A amostra observada

Tabela 3.1: Propriedades das gigantes vermelhas da amostra: gigantes ativas, desviantestermohalinas (THD) e estrelas CFHT.

HIP Nome Vmag Tipo Sp Teff log L Prot Lx Det.K L§ dia 1027 erg s≠1

Gigantes Ativas3419 — Cet 2,01 K0 III 4507 2,17 215 1585 DD7493 OP And 6,22 K1 III 4421 1,89 76 25300 DD20885 77 Tau 3,84 K0 IIIb 4939 1,85 140 1996 DD23245 V1192 Ori 7,50 K2 III 4393 1,92 53,3 23500 DD31700 ‹3 CMa 4,42 K0 II-III 4593 2,64 183 624 DD48356 39 Hya 4,11 G7 III 5009 2,20 4690 DD62763 31 Com 4,94 G0 III 5618 1,91 6,8 6325 DD63462 37 Com 4,88 G8 II-III 4544 3,04 111 5200 DD67787 7 Boo 5,71 G5 III 5171 2,34 3720 MD73555 — Boo 3,52 G8 IIIa 4931 2,28 153 nd79043 Ÿ HerA 4,99 G8 III 4982 2,16 2980 DD87933 › Her 3,70 G8 III 4973 1,76 3000 DD105515 ÿ Cap 4,27 G8 III 5074 1,93 68 4482 DD117503 OU And 5,90 G1 III 5266 1,89 24,2 8203 DD

THD33827 5,69 K4 III 4256 2,23 nd54061 – UMa 1,79 K0 Iab 4729 2,5 nd81670 6,07 K2 4290 2,05 nd93733 6,43 K3 III 4238 2,14 nd97081 5,84 M0 III 3778 2,73 nd103145 5,47 K5 III 3942 2,73 nd114200 4 And 5,29 K5 III 4138 2,18 nd

CFHT7607 ‚ Per 3,57 K3 III 4358 2,19 nd9884 – Ari 2,01 K2 III 4568 1,92 nd20889 ‘ Tau 3,53 G9.5 III 4817 1,99 21 DD21421 Aldebaran 0,86 K5 III 3910 2,65 DD23685 ‘ Lep 3,18 K4 III 4053 2,71 nd43813 ’ Hya 3,10 G9 II-III 4887 2,11 nd46390 Alphard 1,97 K3 II-III 4087 2,96 DD50583 “ Leo A 2,37 K1 IIIb 4609 2,47 nd52943 ‹ Hya 3,11 K0/K1 III 4429 2,16 71 nd59316 ‘ Crv 2,98 K2 III 4274 2,93 nd69673 Arcturus -0,05 K1.5 III 4418 2,28 MD72105 ‘ Boo A 2,39 K0 II-III 4910 2,70 nd72607 — UMi 2,08 K4 III 4045 2,66 nd88048 ‹ Oph 3,34 G9 III 4869 2,05 nd

Page 38: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3. Dados espectropolarimétricos 26

3.4 Dividing line no diagrama HR

O diagrama Hertzsprung-Russell (ou diagrama HR) é um gráfico da luminosi-

dade em função da temperatura, podendo tomar diversas formas, dependendo de quais

coordenadas estão sendo utilizadas.

A região do diagrama HR ocupada por estrelas gigantes frias e tardias, como

as da nossa amostra, vem sendo explorada por diversos observatórios, tais como IUE

(International Ultraviolet Explorer), HEAO 1(High Energy Astronomy Observatory 1),

Einstein (HEAO-2), EXOSAT (European X-ray Observatory Satellite) e ROSAT (Ront-

gensatellit), o que possibilitou que alguns trabalhos (Linsky e Haisch, 1979; Ayres et al.,

1981; Haisch et al., 1990, 1992; Huensch et al., 1996) revelassem a existência de uma

dividing line na região fria do diagrama HR. Estas dividing lines são definidas através

das diferenças físicas entre as camadas mais externas da atmosfera estelar.

Quando o conceito de dividing line foi introduzido pela primeira vez (Linsky e

Haisch, 1979; Ayres et al., 1981), não existiam indicadores observacionais da presença da

coroa em estrelas ao lado direito da linha divisória, hoje há evidencias de que algumas

estrelas apresentam emissão coronal, embora muito mais fraca que a emissão das estrelas

que estão ao lado esquerdo da dividing line (Ayres et al., 1997). A região desta linha

divisória no diagrama HR é bem estabelecida, sabemos que as estrelas nessa localidade

sofrem importantes mudanças em suas propriedades físicas e na estrutura atmosférica,

embora o mecanismo responsável por estas mudanças é até hoje pouco compreendido.

Ao lado esquerdo da dividing line, as estrelas de tipo tardio são cercadas pela

cromosfera e coroa estelar. Ao direito, as estrelas apresentam cromosfera em combinação

com o vento estelar.

Rosner et al. (1995) sugerem que uma mudança na natureza do dínamo estelar

pode provocar uma transição na característica topológica dos campos magnéticos das

estrelas evoluídas, fazendo com que essas estrelas se dividam em duas classes, promovendo

a dividing line.

A Figura 3.3 mostra o diagrama HR com nossa amostra estelar, dispondo de

uma dividing line. A presença da linha divisória faz com que as estrelas tardias sejam

Page 39: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

27 3.4. Dividing line no diagrama HR

divididas em dois grupos. À esquerda, encontramos estrelas do tipo solar, com estrutura

atmosférica composta por cromosfera, região de transição, coroa e ventos de tipo solar.

À direita, podemos encontrar estrelas com extensa cromosfera e ventos massivos e frios.

Na imagem, pode-se ver as 35 estrelas da amostra e suas localizações em relação à linha

divisória (em azul) e à sequência principal (em cinza). Os traçados evolutivos foram

obtidos de (Girardi et al., 2000).

Figura 3.3: Diagrama HR com as 35 estrelas da amostra, dispondo a dividing line (emazul), a sequência principal (em cinza) e os traçados evolutivos em relação à massa solar.

Page 40: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 3. Dados espectropolarimétricos 28

Page 41: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 4

Resultados e discussões

Este capítulo é dedicado à apresentação dos resultados obtidos a partir da análise

dos dados espectropolarimétricos de 21 estrelas da nossa amostra. Desses dados, pudemos

construir os perfis LSD dos parâmetros de Stokes I e V e determinar o campo magnético

longitudinal para as estrelas cuja atividade magnética foi detectada. Das 21 estrelas,

determinamos o campo magnético para 3 delas, enquanto as outras 18 estrelas foram

classificadas como nd (detecção nula). Mostramos a disposição da nossa amostra estelar

no diagrama HR, evidenciando a localização das estrelas em relação à dividing line,

como esperado, estrelas com atividade magnética detectada estão dispostas ao lado

esquerdo da dividing line, enquanto o lado direito da mesma só mostra estrelas sem

campo magnético detectável.

4.1 Campo magnético longitudinal Bl

Nesta seção, expomos os valores obtidos para o campo magnético médio, calculado

a partir da determinação dos perfis LSD das estrelas. 3 estrelas tiveram seu campo

calculado inequivocamente (HIP3419, HIP117503, HIP48356), enquanto outras 18 não

tiveram atividade magnética detectada. Sabe-se que as outras 14 estrelas da amostra

possuem atividade magnética (Aurière et al., 2015), porém não calculamos seus campos

magnéticos neste trabalho.

Page 42: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 4. Resultados e discussões 30

4.1.1 HIP3419 - — Cet

O campo magnético de — Cet foi detectado pela primeira vez com o ESPaDOnS e

depois pelo Narval em 2007. Zeeman Doppler imaging (ZDI) e o período de rotação são

apresentados por (Tsvetkova et al., 2013). Esses autores sugerem que essa gigante esteja

possivelmente queimando He em seu núcleo e a classificam como sendo uma candidata

à descendente de estrela Ap (Aurière et al., 2015). Obtivemos os perfis LSD (ver figura

4.1) para 10 dias de observações entre 2007 e 2013, os campos calculados para cada dia

de observação estão na tabela 4.1 e corroboram com o que é mostrado por (Aurière

et al., 2015). Calculamos um campo magnético médio Bmeanl = 3,7 ± 0,3 G.

Figura 4.1: Perfil LSD de — Cet referente à observação em 30 de setembro de 2007.

Page 43: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

31 4.1. Campo magnético longitudinal Bl

Tabela 4.1: Dias de observação para os quais obtivemos os perfis LSD para — Cet e osvalores de campos magnéticos correspondentes à cada dia de observação.

Observação Bl (G)30/set/2007 4,3 ± 0,201/out/2007 4,3 ± 0,302/out/2007 4,5 ± 0,315/set/2008 4,1 ± 0,320/set/2008 3,1 ± 0,424/set/2008 1,6 ± 0,319/set/2010 1,1 ± 0,214/set/2011 6,2 ± 0,310/out/2011 4,6 ± 0,327/nov/2013 2,8 ± 0,4

4.1.2 HIP117503 - OU And

OU And é uma gigante vermelha ativa bem conhecida, tendo um período de

rotação considerado curto para uma gigante (Strassmeier et al., 1999), além de ter uma

alta atividade em raios-X (Gondoin, 2003; Ayres et al., 2007). Obtivemos os perfis LSD

(ver figura 4.2) para 10 dias de observações entre 2008 e 2015, os campos calculados

para cada dia de observação estão na tabela 4.2 e corroboram com o que é mostrado por

(Aurière et al., 2015). Calculamos um campo magnético médio Bmeanl = 14,5 ± 1,9 G.

Figura 4.2: Perfil LSD de OU And referente à observação em 29 de setembro de 2008.

Page 44: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 4. Resultados e discussões 32

Tabela 4.2: Dias de observação para os quais obtivemos os perfis LSD para OU And eos valores de campos magnéticos correspondentes à cada dia de observação.

Observação Bl (G)21/set/2008 6,1 ± 2,825/set/2008 31,9 ± 1,829/set/2008 43,6 ± 1,502/set/2013 37,3 ± 1,710/set/2013 33,8 ± 1,015/set/2013 -24,4 ± 1,617/set/2013 -35.0 ± 2,130/jun/2015 5,6 ± 2,406/jul/2015 15,7 ± 2,508/jul/2015 29,9 ± 1,9

4.1.3 HIP48356 - 39 Hya

39 Hya é uma estrela ativa que já foi observada em raios-X (Gondoin, 1999). Esta

estrela foi observada somente em 02 de abril de 2008, construímos o perfil LSD (ver

figura 4.3) e calculamos um campo magnético médio Bmeanl = ≠7,3 ± 0,5 G, também

de acordo com (Aurière et al., 2015), que encontrou Bmeanl = ≠7,75 ± 0,58 G para a

mesma estrela.

Figura 4.3: Perfil LSD de 39 Hya referente à observação em 02 de abril de 2008.

Page 45: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

33 4.2. Diagrama HR e dividing line

4.1.4 Estrelas sem atividade magnética

As estrelas cujas atividades magnéticas não foram encontradas, ou seja, não

possuem evidência significativa de uma assinatura de Stokes V (ver figura 4.4), foram

classificadas aqui como “nd”, isto é, detecção nula. As estrelas que receberam esta

classificação estão dispostas na tabela 3.1.

Figura 4.4: Perfil LSD de — Boo referente à observação em 06 de fevereiro de 2008.Perceba que não há distinção do sinal na primeira linha do perfil, que diz respeito aStokes V.

4.2 Diagrama HR e dividing line

Considerando-se as características da dividing line, esperávamos que ao lado di-

reito da mesma tivéssemos apenas as estrelas cuja atividade magnética não foi detectada,

enquanto que ao lado esquerdo teríamos as estrelas consideradas magnéticas. Na figura

4.5, expomos 34 estrelas de nossa amostra, uma delas não foi resolvida neste trabalho,

tampouco em Aurière et al. (2015). Vê-se que há uma predisposição para que as estrelas

com atividade magnética verificada estejam dispostas ao lado esquerdo da linha divisória.

Enquanto vemos que ao lado direito da dividing line há predominância de estrelas não

magnéticas.

Page 46: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 4. Resultados e discussões 34

0.01

0.1

1

10

100

1000

104

104 5000

DL

MS

3.0M�

2.0M�

1.0M�

L/L

Teff

Figura 4.5: Diagrama HR com 34 estrelas da amostra (HIP63462 não foi resolvida aqui,o mesmo em Aurière et al. (2015)), dispondo a dividing line (em cinza), a sequênciaprincipal (em lilás) e os traçados evolutivos em relação à massa solar. As 3 estrelasmagnéticas resolvidas aqui se encontram em vermelho (detecção definitiva em Aurièreet al. (2015)). Os quadrados vazados azuis representam as estrelas com DD, os triângulosroxos vazados as com MD e os círculos vazados em verde as caracterizadas como nd.Perceba que há maior detecção de campo magnético ao lado esquerdo da dividing line.

4.3 Análise do campo magnético e temperatura

34 das 35 estrelas da nossa amostra foram resolvidas em Aurière et al. (2015).

Utilizando os valores médios dos campos magnéticos das estrelas (Bmeanl ) e suas tempe-

raturas efetivas (Teff ), construímos um gráfico relacionando essas duas grandezas a fim

de analisar a relação entre elas (ver figura 4.6). É possível perceber que as estrelas que

não possuem atividade magnética estão dispostas em uma parte extensiva do gráfico,

enquanto as estrelas que tiveram campo detectado começam a aparecer a partir de de-

terminado valor de temperatura, corroborando com o que já havíamos obtido na figura

4.5.

Page 47: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

35 4.4. Discussão

�4

�2

0

2

4

6

8

10

12

3600 4000 4400 4800 5200 5600

|Bl|m

ean

(G)

Teff (K)

DDndMS

Figura 4.6: Gráfico mostrando a relação entre a temperatura efetiva e o módulo docampo magnético médio (Aurière et al., 2015). DD se refere às estrelas para as quaisse foram obtidas detecção definitiva de campo magnético, MD é para as estrelas cujadetecção foi marginal e nd são estrelas que não tiveram atividade magnética detectada.

4.4 Discussão

Rosner et al. (1995) propuseram que a topologia do campo magnético superfi-

cial de uma estrela evoluída determina a natureza de sua atividade superficial. Assim,

analogamente ao Sol, o campo magnético da estrela pode desempenhar um papel im-

portante na mudança da sua estrutura atmosférica apos a dividing line no diagrama

HR. O ponto central é que a mudança na atividade atmosférica modifica a geometria do

campo magnético superficial, inclusive com mudanças na natureza do dínamo magnético.

Como as estrelas cruzam a dividing line, a atividade proveniente do dínamo clássico

pode ser modificada. Por este motivo, o fluxo magnético superficial organizado em larga

escala surge decorrente de campos sementes fracos, localizados nas turbulentas zonas

convectivas dessas estrelas.

Então, o caráter da atividade estelar muda, no entanto a natureza deste campo

Page 48: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 4. Resultados e discussões 36

magnético se mantém essencialmente intacta. Apesar de este fenômeno estar associado

a fenômenos magnéticos, diferentes estudos nesse ramo de pesquisa ainda estão focados

apenas nas observações em raio-X e ultravioleta. Logo, faz-se necessário usar observações

espectropolarimétricas para medir o campo magnético estelar diretamente a partir das

assinaturas de Zeeman que são produzidas nas linhas espectrais (Donati et al., 1997),

nas quais os campos magnéticos associados podem ser reconstruídos com a técnica (ZDI)

(Donati e Brown, 1997).

Page 49: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Capítulo 5

Considerações Finais

O aprofundamento no estudo de campos magnéticos é uma parte relativamente

recente na história da astrofísica. A utilização de métodos multi-linha para calcular

perfis médios de linhas espectrais, caso do LSD, é limitada, considerando-se que poucos

grupos de pesquisa possuem domínio dessa técnica.

Neste trabalho, utilizamos o método do LSD e detectamos, incontestavelmente,

o campo magnético de 3 estrelas, além de confirmar a ausência de atividade magnética

em outras 18. Também analisamos a relação entre o campo magnético e a disposição

das estrelas no diagrama HR, mostrando a presença de uma dividing line no mesmo.

Finalmente, a análise da temperatura efetiva confirma a presença da linha divisória no

diagrama HR.

Para trabalhos futuros, objetivamos detectar os campos magnéticos para as outras

14 estrelas restantes da amostra, cuja presença de atividade magnética foi confirmada por

Aurière et al. (2015). Além disso, utilizar a técnica LSD para amostras estelares maiores,

com a possibilidade de aprimoramento desse procedimento e do trabalho computacional

requerido pelo mesmo. Alguns outros pontos interessantes a serem estudados futuramente

incluem a análise da atividade coronal e a sondagem da atividade cromosférica, por

exemplo.

Dessa maneira, torna-se clara a necessidade de continuidade deste estudo, a fim de

podermos desenvolver modelos cada vez mais objetivos de evolução e estrutura estelar.

Page 50: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Referências Bibliográficas

Aurière, M., Konstantinova-Antova, R., Charbonnel, C., Wade, G. A., Tsvetkova, S., Petit,

P., Dintrans, B., Drake, N. A., Decressin, T., Lagarde, N., Donati, J.-F., Roudier, T.,

Lignières, F., Schröder, K.-P., Landstreet, J. D., Lèbre, A., Weiss, W. W., e Zahn, J.-P.

(2015). The magnetic fields at the surface of active single g-k giants. Astronomy &

Astrophysics, 574:A90.

Ayres, T. R., Brown, A., Harper, G. M., Bennett, P. D., Linsky, J. L., Carpenter, K. G.,

e Robinson, R. D. (1997). Digging deeper in the coronal graveyard. The Astrophysical

Journal, 491(2):876–884.

Ayres, T. R., Hodges-Kluck, E., e Brown, A. (2007). X-Ray and Ultraviolet Spectroscopy

of Intermediate-Mass, First Crossing Giants. apjs, 171:304–330.

Ayres, T. R., Linsky, J. L., Vaiana, G. S., Golub, L., e Rosner, R. (1981). The cool half

of the h-r diagram in soft x-rays. The Astrophysical Journal, 250:293.

Charbonnel, C. e Zahn, J.-P. (2007a). Inhibition of thermohaline mixing by a magnetic

field in Ap star descendants: implications for the Galactic evolution of 3He. aap,

476:L29–L32.

Charbonnel, C. e Zahn, J.-P. (2007b). Thermohaline mixing: a physical mechanism

governing the photospheric composition of low-mass giants. aap, 467:L15–L18.

Choi, H.-J., Soon, W., Donahue, R. A., Baliunas, S. L., e Henry, G. W. (1995). A Study

of Variability in a Sample of G and K Giants. pasp, 107:744.

Page 51: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

39 Referências Bibliográficas

de Medeiros, J. R. e Mayor, M. (1999). A catalog of rotational and radial velocities for

evolved stars. aaps, 139:433–460.

del Toro Iniesta, J. C. (2003). Introduction to Spectropolarimetry. Cambridge University

Press.

Donati, J.-F. (2008a). Espadons the new generation stellar spectropolarimeter.

http://www.ast.obs-mip.fr/projets/espadons/espadons.html.

Donati, J.-F. (2008b). Narval the espadons twin spectropolarimeter atop pic du midi.

http://www.ast.obs-mip.fr/projets/narval/v1/.

Donati, J.-F. e Brown, S. F. (1997). Zeeman-Doppler imaging of active stars. V. Sensi-

tivity of maximum entropy magnetic maps to field orientation. aap, 326:1135–1142.

Donati, J.-F., Semel, M., Carter, B. D., Rees, D. E., e Collier Cameron, A. (1997). Spec-

tropolarimetric observations of active stars. mnras, 291:658.

Flower, P. J. (1996). Transformations from Theoretical Hertzsprung-Russell Diagrams

to Color-Magnitude Diagrams: Effective Temperatures, B-V Colors, and Bolometric

Corrections. apj, 469:355.

Girardi, L., Bressan, A., Bertelli, G., e Chiosi, C. (2000). Evolutionary tracks and

isochrones for low- and intermediate-mass stars: From 0.15 to 7 Msun, and from

Z=0.0004 to 0.03. aaps, 141:371–383.

Gondoin, P. (1999). Evolution of X-ray activity and rotation on G-K giants. aap,

352:217–227.

Gondoin, P. (2003). The corona of HD 223460 (HR 9024). aap, 409:263–274.

Gondoin, P. (2005). The relation between X-ray activity and rotation in intermediate-

mass G giants. aap, 444:531–538.

Gray, D. F. (2005). The Observation and Analysis of Stellar Photospheres. Cambridge

University Press, 3rd ed edition.

Page 52: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Referências Bibliográficas 40

Griffiths, D. J. (1999). Introduction to Electrodynamics. Prentice Hall, 3rd ed edition.

Haisch, B., Schmitt, J. H. M. M., e Fabian, A. C. (1992). Disappearance of coronal x-ray

emission in stars with cool dense winds. Nature, 360(6401):239–241.

Haisch, B. M., Bookbinder, J. A., Maggio, A., Vaiana, G. S., e Bennett, J. O. (1990).

IUE and einstein survey of late-type giant and supergiant stars and the dividing line.

The Astrophysical Journal, 361:570.

Huensch, M., Schmitt, J. H. M. M., Schroeder, K.-P., e Reimers, D. (1996). ROSAT

X-ray observations of a complete, volume-limited sample of late-type giants. aap,

310:801–812.

Jackson, J. D. (1999). Classical electrodynamics. Wiley, 3rd ed edition.

Kochukhov, O., Makaganiuk, V., e Piskunov, N. (2010). Least-squares deconvolution of

the stellar intensity and polarization spectra. Astronomy & Astrophysics, 524:A5.

Konstantinova-Antova, R., Aurière, M., Iliev, I. K., Cabanac, R., Donati, J.-F., Mouillet,

D., e Petit, P. (2008). Direct detection of a magnetic field at the surface of v390 aurigae

– an effectively single active giant. Astronomy & Astrophysics, 480(2):475–479.

Kupka, F. e Ryabchikova, T. A. (1999). VALD - The Vienna Atomic Line Database: A

Survey. Publications de l’Observatoire Astronomique de Beograd, 65:223.

Kurucz, R. (1993). ATLAS9 Stellar Atmosphere Programs and 2 km/s grid. ATLAS9

Stellar Atmosphere Programs and 2 km/s grid. Kurucz CD-ROM No. 13. Cambridge,

Mass.: Smithsonian Astrophysical Observatory, 1993., 13.

Linsky, J. L. e Haisch, B. M. (1979). Outer atmospheres of cool stars. i - the sharp

division into solar-type and non-solar-type stars. The Astrophysical Journal, 229:L27.

Marsden, S. C., Petit, P., Jeffers, S. V., Morin, J., Fares, R., Reiners, A., do Nascimento,

J.-D., Auriere, M., Bouvier, J., Carter, B. D., Catala, C., Dintrans, B., Donati, J.-F.,

Gastine, T., Jardine, M., Konstantinova-Antova, R., Lanoux, J., Lignieres, F., Mor-

genthaler, A., Ramirez-Velez, J. C., Theado, S., e and, V. V. G. (2014). A BCool

Page 53: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

41 Referências Bibliográficas

magnetic snapshot survey of solar-type stars. Monthly Notices of the Royal Astrono-

mical Society, 444(4):3517–3536.

Mathys, G., Hubrig, S., Landstreet, J. D., Lanz, T., e Manfroid, J. (1997). The mean

magnetic field modulus of AP stars. aaps, 123:353–402.

Nelson, O. R. (2008). Sobre a natureza dos processos físicos de aquecimento da atmosfera

de estrelas do tipo solar. PhD thesis, UFRN.

Petit, P., Louge, T., Théado, S., Paletou, F., Manset, N., Morin, J., Marsden, S. C., e Jef-

fers, S. V. (2014). PolarBase: A database of high-resolution spectropolarimetric stellar

observations. Publications of the Astronomical Society of the Pacific, 126(939):469–

475.

Reiners, A. e Basri, G. (2007). The First Direct Measurements of Surface Magnetic

Fields on Very Low Mass Stars. apj, 656:1121–1135.

Rosner, R., Musielak, Z. E., Cattaneo, F., Moore, R. L., e Suess, S. T. (1995). On

the origin of �dividing lines� for late-type giants and supergiants. The Astrophysical

Journal, 442:L25.

Rozelot, J.-P. e Neiner, C., editores (2016). Cartography of the Sun and the Stars.

Springer International Publishing.

Schroeder, K.-P., Huensch, M., e Schmitt, J. H. M. M. (1998). X-ray activity and

evolutionary status of late-type giants. aap, 335:591–595.

Strassmeier, K. G., Serkowitsch, E., e Granzer, T. (1999). Starspot photometry with

robotic telescopes. UBV(RI)_C and by light curves of 47 active stars in 1996/97. aaps,

140:29–53.

Trujillo-Bueno, J. (2002). Astrophysical spectropolarimetry. Cambridge University Press,

1st ed edition.

Page 54: CAMPOS MAGNÉTICOS DE ESTRELAS G-K E DIVIDING LINES NO ... · Investigamos o campo magnético superficial de 35 estrelas dos tipos espectrais G e K. Na nossa amostra, 14 estrelas

Referências Bibliográficas 42

Tsvetkova, S., Petit, P., Aurière, M., Konstantinova-Antova, R., Wade, G. A., Charbonnel,

C., Decressin, T., e Bogdanovski, R. (2013). Magnetic field structure in single late-type

giants: — Ceti in 2010-2012. aap, 556:A43.

Uzdensky, D. A. (2009). Magnetic Fields in Stellar Astrophysics. Em astro2010: The

Astronomy and Astrophysics Decadal Survey, volume 2010 de ArXiv Astrophysics e-

prints.

Wiener, N. (1964). Extrapolation, interpolation and smoothing of stationary time series.

The MIT Press, 1st m.i.t. paperback ed. edition.

Zettili, N. (2009). Quantum Mechanics: concepts and Applications. Wiley, 2nd ed edition.