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Café e Saúde Livro i

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Café e SaúdeLivro i

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Consumo moderadoCafé e DM 2

Café e demência

ínDiCe

introdução Café e Saúde - mitos e realidades 4

introdução ao estudo da FFUP 6

Café e a Diabetes Mellitus Tipo2 14

A ingestão de café e a demência 16

introdução aos relatórios técnico/científicos do CeMBe 17

reSUMoS DoS reLATórioS TéCniCo/CienTíFiCoS Do CeMBe:

• A relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo2 18

• A relação entre a ingestão de café e a demência 24

4

S eguramente que um dos mitos nu-tricionais mais enraizados na cultu-ra popular é o dos malefícios (assim

como dos benefícios...) do café e da cafeína. Dizemos mitos porque, como acontece tantas vezes no que concerne a alimentação e nutri-ção humanas, as ideias disseminadas sobre o café não encontram – na sua maior parte – qualquer base em dados científicos actuais.

Com efeito, desde a ideia que a cafeína é um poderosíssimo estimulante psíquico (e como tal, quase que como conotada com drogas ilegais...), até que tem efeitos prejudiciais na saúde em geral – em pessoas doentes assim como saudáveis – tudo se ouve em referência ao café. Se esta falta de informação é de qualquer modo justificável no público em geral (natu-ralmente com menor possibilidade de aceder a dados científicos sólidos e de alta qualida-de), já as convicções e recomendações de mui-tos profissionais de saúde (incluindo médicos)

Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa

Mitos e realidades

por António Vaz Carneiro | Director, CEMBE da FML

acerca desta bebida, que na sua maioria se po-dem considerar muito conservadoras (para não dizer hostis...), requerem uma atenção e esclarecimento técnico-científicos que pos-sam ajudar a esclarecer de uma vez por todas o perfil de benefício/risco desta bebida.Como é sabido, o café constitui um dos com-ponentes da alimentação mais ingeridos no mundo inteiro, constituindo a substância

farmacologicamente activa mais utilizada uni-versalmente. A cafeína – a substância activa do café – pertence ao grupo das metilxantinas, mas o café é uma complexa mistura de milha-res de componentes químicos, incluindo car-bohidratos, compostos nitrogenados, lípidos, minerais, vitaminas, alcalóides e compostos fenólicos.Os efeitos do café sobre a saúde têm sido analisa-dos através de estudos epidemiológicos de base populacional, comparando quantidades ingeri-das com resultados (outcomes) clinicamente re-levantes. As principais patologias estudadas in-

“O acOnSelhamentO SObre a tOmada de café pOde cOnStituir uma medida pOSitiva e de fácil adeSãO dO dOente”

o café e a saúde – introdução

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cluem a diabetes mellitus tipo 2 (DM 2), a demência (de Al-zheimer – AD – ou outras), a doença de Parkinson, doenças cardiovasculares e gravidez. Por exemplo, evidência recen-te demonstra ausência de risco do café na doença coronária (Circulation 2006;113:2045-2053), assim como na hiper-tensão arterial nas mulheres (JAMA 2005;294:2330-35) e nos doentes pós-enfarte agudo do miocárdio (Cir-culation 2007;116(25):2944-2951). O café diminui ainda a litíase biliar sintomática em homens (JAMA 1999;281:2106-12) e a incidência de doença de Parkinson (JAMA 2000;283:2674-79). Por outro lado, existem provas de efeitos deletérios do café na grávida, com aumento de risco de aborto espontâneo (N Engl J Med 1999; 341: 1639-44 e 2000; 343: 1839-4, e Am J Obstet Gyne-col 2008;198:279.e1-279.e8)Nesta publicação, o leitor encontrará provas extensivas dos benefícios do café no risco de DM 2 e de demência, assim como um estudo de avaliação do teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal. Trata-se por-tanto de uma abordagem científica dos benefí-cios e riscos que a tomada de café pode ter em determinadas patologias (e apenas nestas).A abordagem dos autores dos textos sobre a DM 2 e a demência foi a das revisões sistemá-ticas da literatura, uma metodologia particu-larmente válida e não enviesada da determi-nação do peso de um factor de risco numa potencial doença (User’s Guides to the Medical Literature. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 2008). Os resultados destas revisões sugerem

um efeito benéfico do café na incidência da DM 2 e da demência. Embora este efeito te-nha dimensões modestas, ele é consistente através dos estudos e apresenta dimensões ní-tidas, pelo que é seguro afirmar o benefício encontrado com a ingestão de café e seus si-milares (chá, sodas, etc.).Baseados nesta evidência científica, será cor-recto recomendar a ingestão de café como medida preventiva na DM 2 e na demência? A resposta a esta questão tem de ser encon-trada na análise da dimensão do risco de base dos consumidores, assim como no efeito da medida preventiva sobre aquele: como nas amostras estudadas o risco de base de doen-ça é pequeno e os efeitos preventivos do café não são de grandes dimensões, a resposta será negativa. Mas isto quer também dizer que, em doentes cuidadosamente seleccionados, o aconselhamento sobre a tomada de café pode constituir uma medida positiva e de fá-cil adesão do doente, em combinação com al-terações de estilo de vida, de dieta e eventuais abordagens farmacológicas.

o café e a saúde – introdução

6

O café tem sido, desde tempos ime-moriais sinónimo de bebida agra-dável, aromática e estimulante,

propriedades que lhe têm trazido cada vez mais adeptos e que fazem dele uma das be-bidas mais apreciadas em todo o mundo. Apesar de ser composto por uma mistura complexa de várias centenas de substâncias, incluindo hidratos de carbono, compostos nitrogenados, lípidos, vitaminas, minerais,

alcalóides e compostos fenólicos, particu-larmente ácido clorogénico e ácido cafeico (Higdnon et al., 2006), não há dúvidas que o teor em cafeína desempenha um papel de-terminante na sua popularidade. De facto, quando nos referimos aos efeitos do café na saúde fazemo-lo atendendo, essencialmen-te, às acções da cafeína. Este composto faz parte das nossas vidas há milhares de anos – o seu consumo parece datar do Período Paleolítico – e é uma das substâncias farma-cologicamente activas (Barone et al., 1996)

Introdução ao Estudo da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

Avaliação do teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal (canal HoreCA)

por Ana Sofia Martins | Nutricionista

mais estudadas mas, mesmo assim, persis-tem as dúvidas e controvérsias acerca dos seus malefícios e benefícios para a saúde.

Efeitos da cafeínaDepois de ingerida, a cafeína é absorvida de forma rápida e praticamente completa. A sua excreção, bem como a dos metabo-litos resultantes da sua biotransformação no fígado, faz-se sobretudo pela urina. A

semi-vida plasmática é variável (3-7 horas) e depende de determinados factores, in-cluindo: hábitos tabágicos, gravidez, uso de contraceptivos orais e determinadas si-tuações de doença (Arnaud 1999; James, 1997; Nawrot et al., 2003). A cafeína, nas doses tipicamente consumidas, exerce a sua acção pelo antagonismo dos receptores da adenosina (Mandel, 2002). Os efeitos da ingestão moderada de cafeína no Sistema Nervoso Central (SNC) são, como tão bem sabemos, o principal atractivo para o con-

o café e a saúde – introdução ao estudo da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

“em dOSeS mOderadaS, O café nãO prOvOca quaiSquer tranStOrnOS em peSSOaS que gOzem de bOa Saúde fíSica e mental”

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o café e a saúde – introdução ao estudo da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

sumo de café e outras bebidas cafeinadas: aumento do estado de alerta, alívio da fadi-ga física e mental, estímulo do raciocínio, diminuição do tempo de reacção e sensa-ção geral de bem-estar (Nehlig et al., 1992). Além dos efeitos no SNC, a cafeína apre-senta ligeira acção diurética, dilata as vias respiratórias, estimula a produção de áci-do no estômago e aumenta o peristaltismo gastrointestinal (Arnaud, 1999). Em doses moderadas, não provoca quaisquer trans-tornos em pessoas que gozem de boa saúde física e mental. Contudo, em pessoas mais susceptíveis, doses excessivas podem oca-sionar, entre outros, ansiedade, insónia e irritabilidade. De referir que os efeitos da cafeína no SNC variam de pessoa para pessoa. Essas diferenças devem-se não só a factores fisiológicos como, por exemplo, tempo de esvaziamento gástrico, absorção de cafeína pelo intestino e semi-vida plas-mática, mas também a factores genéticos e de personalidade (Nawrot et al, 2003). A maioria dos indivíduos parece saber auto-limitar a ingestão de cafeína, de modo a tirar partido apenas dos seus efeitos benéfi-cos, reduzindo ou prevenindo a ocorrência de efeitos adversos, pelo excesso de consu-mo ou pela ingestão a horas inadequadas.

No que se refere à relação entre consu-mo de café/cafeína e saúde, as evidências científicas reunidas até à data indicam que, para a generalidade da população adulta, a ingestão moderada de cafeína, correspon-dente a cerca de 400 mg/dia – não está as-sociada a efeitos adversos, incluindo efeitos cardiovasculares, diminuição da densidade mineral óssea e osteoporose, alterações do comportamento e aumento da incidência de cancro (Nawrot et al, 2003; Higdon et al, 2006). Pelo contrário, as evidências su-

gerem, de facto, que o consumo de café poderá estar associado, entre outros, a uma diminuição do risco de Doença de Parkin-son (Ross et al, 2000; Hernán et al., 2002; Martyn et al, 2003), Alzheimer (Maia et al, 2002), alguns tipos de cancro (Nkondjock, 2008) diabetes tipo 2 (van Dam, 2006) e cir-rose hepática (Cadden et al, 2007).

Para as mulheres grávidas ou para aque-las que tencionam engravidar, as recomen-dações da American Dietetic Association (ADA 2008) apontam para que a ingestão de cafeína se limite a um máximo de 300 mg/dia. Mais cautelosa, a UK Food Stan-dards Agency recomenda, para as mulheres grávidas, a ingestão de cafeína a um limite máximo de 200mg/dia.

A realidade portuguesa Embora muito se fale da relação entre o consumo de cafeína e a saúde da popula-ção, os dados nacionais acerca da sua con-centração nas mais diversas fontes alimen-tares e, particularmente, nas bebidas que a contêm de forma natural (por exemplo, café e chá), são escassos. No decurso deste ano, no entanto, o Serviço de Bromatologia da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto efectuou um estudo no sentido de avaliar o teor médio em cafeína do café expresso ingerido pelos portugueses, tendo por base as marcas comerciais com maior representatividade no mercado nacional (canal HORECA).

Este estudo fornece informações valiosas, não só para a generalidade dos consumido-res, mas, fundamentalmente, para que os profissionais de saúde possam recomendar níveis de ingestão seguros, adaptados à rea-lidade nacional.

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o café e a saúde – introdução ao estudo da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

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O café representa a maior fonte de in-gestão de cafeína em Portugal, se-guido pelo chá, bebidas refrigeran-

tes, chocolate e alguns medicamentos. Tanto o café como a cafeína em particular, têm suscitado o interesse da comunidade científica, dos profissionais de saúde e do público em geral, no que respeita aos seus efeitos na saúde. Os receios associados ao potencial risco do seu consumo têm sido o

mote para inúmeros estudos epidemiológi-cos ao longo de décadas. É da maior importância um conhecimento real da quantidade de cafeína ingerida por uma determinada população. Apesar de existirem alguns dados na literatura, estes apresentam-se muito variáveis e não adap-tados à realidade portuguesa, onde o café expresso tem características próprias e assu-me tendencialmente uma posição cada vez mais dominante.Os dados relativos ao consumo de café em

Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal (canal HoreCA)

por Susana Casal, Rita Alves, Eulália Mendes, Beatriz OliveiraRequiMte – Serviço de Bromatologia, Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

Portugal, calculados com base nas importa-ções de café, são esclarecedores: verifica-se um ligeiro aumento nos últimos anos e um teor médio per capita, em 2007, equivalente a 4,3kg de café verde (1). A razão quantidade de café/volume de água utilizada na prepa-ração da bebida, a espécie de café (arábica ou robusta), o tipo de bebida e o volume fi-nal desta são alguns dos factores largamente dependentes de particularidades culturais e

regionais e condicionantes do teor de cafe-ína. Mais concretamente, o método de pre-paração da bebida influencia directamente a extracção da cafeína: enquanto no café de fil-tro a extracção é quase total (97-100%), pois é utilizado um grande volume de água (50-300 ml) (2), no café expresso a eficiência extrac-tiva é bastante inferior (75 a 85%) (2). Mais importante ainda será a composição do lote, nomeadamente a utilização de café arábica ou mistura com robusta. Apesar da existên-cia de alguma variabilidade natural, a presen-

o café e a saúde – Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal

“O café expreSSO pOrtuguêS apreSenta, em média, 75 mg de cafeína pOr chávena”

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ça de robusta num lote de café tem implica-ção directa no teor em cafeína, dado que este último apresenta teores em peso seco muito superiores (2,2 a 2,4%) aos do café arábica (1,2 a 1,3%) (2).Na maior parte dos países existe uma prefe-rência pelo café arábica, naturalmente mais aromático e associado à preparação de be-bidas longas, com uma menor quantidade de café por volume de água. Por seu lado, Portugal, juntamente com diversos países do sul da Europa, revela um consumo cada vez maior de café expresso. Esta bebida apresen-ta características distintas das demais. Para além de ser muito mais concentrada (prepa-rada com uma maior quantidade de café e menor de água), beneficia da mistura com café robusta, o que lhe garante uma espuma

mais persistente e um corpo mais intenso. Destas duas premissas se deduz rapidamente que uma chávena de café expresso terá, para um mesmo volume, maior quantidade de cafeína.

O teor médio em cafeínaO grau de torra do café também á variável, sendo preferidas torras mais intensas na pre-paração de café expresso, com possíveis per-das por sublimação (usualmente compensa-da pela perda de matéria orgânica associada). Também o grau de moagem terá influência directa na extractibilidade da cafeína, sendo superior para moagens mais finas. Acres-ce ainda a preferência de cada consumidor,

com uma natural apetência por uma bebida mais curta ou mais longa, com implicações no teor final em cafeína. Desta forma, e para garantir o cálculo do teor médio em cafeína no expresso português, op-tou-se por analisar as bebidas preparadas de acordo com os padrões mais comuns no nos-so país – café expresso não-doméstico.

ObjectivOAvaliar o teor médio em cafeína do café ex-presso ingerido pelos portugueses, em res-posta a uma solicitação da AICC, tendo por base as marcas com maior representatividade no mercado nacional (canal HORECA).

AmostragemForam avaliados 13 lotes de café (A-J), de

marcas diversas, correspondentes aos de maior representatividade no mercado nacio-nal. Todas as amostras, com excepção da J, foram fornecidas em grão, tendo sido possí-vel controlar o grau de moagem de forma a obter um expresso com o tempo de percola-ção adequado e uma espuma persistente.

MetodologiaTodas as bebidas foram preparadas numa máquina profissional, com uma quantida-de constante de café moído, equivalente a cerca de 6 gramas, e um grau de moagem afinado para cada lote. Os factores variáveis foram essencialmente o lote de café e o vo-lume do café bebida, tendo sido preparados

“pOrtugal, juntamente cOm diverSOS paíSeS dO Sul da eurOpa, revela um cOnSumO cada vez maiOr de café expreSSO”

em dOSeS mOderadaS, O café nãO prOvOca quaiSquer tranStOrnOS em peSSOaS que gOzem de bOa Saúde fíSica e mental

o café e a saúde – Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal

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cafés curtos, médios e cheios, em chávenas idênticas, em duplicado, num total de seis bebidas para cada lote (78 bebidas). A classi-ficação em “curto”, “normal” ou “cheio” foi acompanhada por pessoas com experiência na área e adaptada à chávena escolhida.Após preparação, cada bebida foi devidamen-te homogeneizada, contabilizado o seu volu-me total e retirada uma porção para posterior análise do teor em cafeína. Esta foi quanti-ficada por HPLC, em fase reversa, com de-tecção a 272 nm. O método foi previamente validado, tendo apresentado linearidade em toda a gama de trabalho, reprodutibilidade elevada (1,5%) e taxas de recuperação da ordem dos 101±3%. A variabilidade entre bebidas, em mg de cafeína/ml, foi inferior a 3,2% nos cafés curtos, 2,6% nos médios e 1,8% nos longos, garantindo-se assim a ho-mogeneidade na extracção da cafeína.

resultadosPara cada café expresso, num total de 78 be-bidas, foram avaliados: o volume da bebida, a concentração em cafeína (em mg/ml) e o teor total em cafeína (mg/bebida). Relativamente ao volume das bebidas, veri-ficou-se que o volume médio do café “nor-mal” foi de 28 ml, nos cafés “curtos” de 17 ml e nos “cheios” de 47 ml (Tabela 1). A variabilidade observada nos volumes é, em grande parte, dependente da velocidade de extracção do café e da quantidade e persis-tência da espuma formada. O volume médio de todas as amostras analisadas foi de 30ml, sendo o recomendado para café expresso en-tre 25 e 35 ml (2). Os dados relativos à quantidade de cafeína por chávena estão detalhados na Figura 1. Conforme se pode verificar, o teor em cafeí-na é bastante variável. Alguns lotes fornecem

o café e a saúde – Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal

Tabela 1 voLUMeS MéDioS Do exPreSSo

volume (ml)

“curto” “médio” “cheio”

média 17 28 47

desvio padrão 1 2 2

mínimo 16 25 43

máximo 20 33 53

Tabela 2Teor MéDio eM CAFeínA Por TiPo De exPreSSo

Cafeína (ml)

“curto” “normal” “cheio”

média 62 72 88

desvio padrão 11 15 17

mínimo 45 48 61

máximo 90 98 116

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quase o dobro da cafeína, originando alguma sobreposição de teores. O teor médio em cafeína, para cada tipo de expresso, encontra-se resumido na Tabela 2.Pela observação dos teores médios, facil-mente se percebe que a extracção da cafeína ocorre maioritariamente na primeira porção de líquido extraído, originando diferenças menores do que seria de esperar pela simples variação dos volumes de extracção. Os cafés curtos apresentam, em média, cerca de 70% da cafeína presente no café cheio. Estes valo-res correspondem a uma concentração de ca-feína de 1,2 a 4,7 mg/ml, inteiramente den-tro do descrito para o expresso italiano (2) e com um valor médio de 2,7 mg/ml.No total de amostras analisadas, verificou- -se que os teores em cafeína por chávena va-riaram de 45 a 116 mg, função do volume da bebida e principalmente da composição do lote de café. Para uma melhor percepção da variabilidade em função da composição, apresentam-se na Tabela 3 os resultados mé-dios por lote, independentemente do volu-me da bebida.A variação média entre 54 e 92 mg de cafeína indica claramente a presença de lotes de café 100% arábica (valores médios na literatura de 60 mg) (2). Já os valores mais altos cor-respondem a misturas com robusta, estando descrito para esta espécie de café valores da ordem dos 130 mg por expresso (2).Pode ainda estabelecer-se uma relação entre o teor em cafeína e o custo dos lotes, sendo que as amostras com maior teor em café ro-busta, mais económicas, fornecerão bebidas com maior teor em cafeína.O valor médio final, levando em conta todas a amostras analisadas, situou-se nos 75 mg de cafeína por chávena. O valor obtido pela aplicação de factores de correcção para a cota

o café e a saúde – Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal

Tabela 3Teor MéDio eM CAFeínA Por LoTe De CAFé, PArA o exPreSSo MéDio

Amostra mg Cafeína /chávena

A 64

B 60

C 56

D 92

E 71

F 88

G 54

H 71

I 79

J 89

K 84

L 75

M 88

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de mercado de cada marca (dados fornecidos pela AICC) não se apresentou significativa-mente diferente, com 77 mg por chávena. Comparativamente com valores reportados para este e outros tipos de bebida, em vários países, o café expresso português tem um volume médio relativamente baixo (30 ml), e um teor de cafeína dentro dos valores re-portados (58-100 mg) (2-5). No entanto este valor é ligeiramente inferior ao usualmente contabilizado em estudos epidemiológicos. Com base em estatísticas de frequência de consumo de café, estes novos valores permi-tirão uma melhor percepção dos teores de ca-feína ingeridos pela população portuguesa.

cOncluSãOO café expresso português apresenta, em mé-dia, 75 mg de cafeína por chávena.

Bibliografia>> European Coffee Report 2007, preliminary edition, European Coffee Federation, The Netherlands, pp.45-46, 2008

>> Petracco M., The cup, in: Espresso Coffee: the science of quality, chpt 8, Illy A & Via-ni R Edts, Elsevier Academic Press, 2nd ed, 2005

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o café e a saúde – Teor médio em cafeína do café expresso consumido em Portugal

Figura 1 Teor eM CAFeínA, Por CHávenA, noS DiFerenTeS TiPoS De exPreSSo

C afé " c u rto "

0

20

40

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80

100

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A B C D E F G HI J K L M

mg/chávena

C afé " n o rm al"

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A B C D E F G HI J K L M

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C afé " c h eio "

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A B C D E F G H I J K L M

mg/chávena

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O café é uma bebida de uso frequen-te e a cafeína a substância farmaco-lógica activa mais usada em todo o

mundo. Associa-se o seu consumo à sensação de prazer presente nos actos sociais e de con-vívio generalizado.A acção farmacológica do café e da sua subs-tância mais activa, a cafeína, têm sido moti-vo de estudo da comunidade científica. Nos últimos 30 anos foram publicados cerca de 37 000 trabalhos científicos, em 5000 revistas especializadas.

Os últimos trabalhos editados nestas publi-cações atribuem ao café inúmeros benefícios, nomeadamente na prevenção da Diabetes Mellitus Tipo II, na doença de Parkinson, na demência e nas Hepatopatias.Estes estudos, na maior parte epidemiológi-cos, são de difícil apreciação quanto ao rigor científico para a maior parte da população.Validar estes estudos, partindo da análise da metodologia utilizada, é fundamental para

Café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

por Serafim Rosas | Endocrinologista

demonstrar o rigor dos mesmos.O Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (CEMBE) da Faculdade de Me-dicina de Lisboa, publicou recentemente, um relatório técnico/científico, sobre a relação entre a ingestão de café e a incidência de dia-betes tipo 2 (DM2), em que procede á análise exaustiva dos estudos publicados na literatu-ra médica (estudos do tipo coorte, prospecti-vos ou transversais, com publicação integral), apreciando o desenho, metodologia, duração dos estudos e factores de enviesamento, carac-

terísticas da exposição ao café, valorizando os trabalhos em função destas características.Foram apreciados 76 trabalhos, 20 dos quais foram seleccionados para análise.Esta revisão sistematizada da literatura confir-ma o benefício do consumo habitual e mo-derado do café, a partir de duas chávenas por dia, verificada em todos os estádios do desen-volvimento da doença, nomeadamente na anomalia da glicemia em jejum, na tolerância

o café e a saúde – Diabetes Mellitus Tipo 2

“a ingeStãO crónica de café beneficia O nível de inSulina nO Sangue”

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o café e a saúde – Diabetes Mellitus Tipo 2

diminuída à glicose e na diabetes tipo2, po-dendo ser verificada através da prova de tole-rância à glicose oral.Foi ainda possível verificar que a ingestão crónica de café beneficia o nível de insulina no sangue e que os efeitos positivos são mais marcados nas glicemias pós-pandriais.Nos doentes com obesidade abdominal, a in-gestão de café também teve efeitos positivos.Os benefícios do café são dose-dependentes (com excepção dos indivíduos mais idosos) e não se verificam nos estudos de ingestão aguda de cafeína, em que existe hiperglicémia transitória.A acção benéfica da cafeína deve-se ao au-mento da sensibilidade à insulina e à melhoria da função das células beta pancreáticas, exis-tindo outras acções possíveis, nomeadamen-te, inibição da G-6-P, diminuição da absorção intestinal da glicose, interferência no metabo-lismo das incretinas intestinais e libertação de catecolaminas, com subsequente aumento do metabolismo e da termogénese do tecido adi-poso castanho. Os benefícios referidos verificam-se em diver-sas populações, parecendo ser independentes de outros factores de risco, dieta e estilos de vida e ocorrem com o uso das variadas moda-lidades de preparação do café, nomeadamen-te com o café instantâneo.Esta revisão sistematizada da literatura permi-te concluir que: “A ingestão crónica do café reduz o risco de Diabetes Mellitus Tipo 2”

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c omo muitos outros alimentos, o café é habitualmente tomado, pela maioria de nós, sem que se faça

ideia do seu efeito biológico concreto.A maior evidência, normalmente, após a in-gestão de uma chávena de café, é a sensação de bem-estar e melhoria das funções cogniti-vas (vigília, atenção, concentração, etc.). Ultimamente, no entanto, alguns dos com-ponentes de café, em especial a cafeína, têm

sido alvo de inúmeros estudos que ajudam a compreender e melhor explicar a sua acção ao nível de vários sistemas, nomeadamente do Sistema Nervoso Central (SNC).A cafeína foi classificada, bioquimicamente, como uma xantina e constatou-se ter uma acção benéfica quer de forma directa, quer melhorando a actividade de muitas outras moléculas ao nível do SNC, nomeadamente a acetilcolina, cuja deficiente acção começa por causar perdas ligeiras da memória e, em última análise, demência.Nesta linha, foi em Junho passado, apresentado um importante trabalho feito no Centro de Es-tudos de Medicina Baseada na Evidência da Fa-culdade de Medicina de Lisboa, pelo Prof. An-tónio Vaz Carneiro e col. sobre, precisamente, a relação entre a ingestão de café e a demência.

relação entre a ingestão de café e a demência

por Fernando D. Morgado | Neurologista

O trabalho consistiu na pesquisa e selecção das publicações que estudaram a possibilida-de do café poder reduzir o risco de demência e/ou melhorar as capacidades cognitivas das pessoas já com alguns sintomas da doença.Foram avaliadas 34 referências das quais fo-ram seleccionados cinco estudos que obede-ciam aos critérios científicos que permitiam tirar algumas conclusões credíveis. Algumas conclusões do estudo a reter:

-Os resultados são razoavelmente consisten-tes de estudo para estudo ao indicarem que o café melhora as capacidades cognitivas;-Os resultados permitem definir também, na sua maior parte, um padrão dose – de-pendente: quanto maior a ingestão de café, menor é o risco de demência para ambos os sexos. Tendo em conta as susceptibilidades individuais, acrescentamos nós, dado que não é referido nos trabalhos a dose de ca-feína recomendada, embora a população de um dos estudos que serviu de base ao tra-balho tomasse 100 mg ou mais de cafeína por dia. Baseada nesta revisão científica, pode dizer-se que a ingestão diária de café melhora as funções cognitivas e pode reduzir o risco de demência.

o café e a saúde – Café e demência

“a ingeStãO diária de café melhOra aS funçõeS cOgnitivaS e pOde reduzir O riScO de demência”

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por Programa Café e Saúde

O café é a bebida mais ingerida no mundo. Com uma constituição complexa, que inclui a mistura de milhares de componentes químicos, o café encontra-se na primeira linha das preocupações do sistema de saúde e dos consumidores, assim

como das instituições reguladoras dos produtos alimentares.Preocupados em provar a influência da ingestão do café sobre a saúde humana, os inves-tigadores têm efectuado milhares de estudos, a maior parte deles de foro epidemiológico. Nos diversos contextos abordados, o café provou que pode prevenir – pelo menos em parte – doenças como a diabetes mellitus tipo 2, a doença de Parkinson ou hepatopatias, não se tendo provado uma relação entre o consumo de café e um aumento de risco cardiovascular. De facto, um estudo recente veio até mostrar que o café é seguro nos doentes pós-enfarte agudo do miocárdio. Porém, as conclusões destes estudo nem sempre são vistas pela classe médica como válidas uma vez que, à partida, existem dois grandes problemas: em primeiro lugar, a quantifica-ção da ingestão de café – feita através de inquéritos sobre o número de chávenas ingeridas por dia é muito variável, já que quer a capacidade das chávenas quer o teor de cafeína por chávena é dificilmente reprodutível de inquérito para inquérito. Em segundo lugar, existe um conjunto de factores que podem, quando não ajustados, influenciar a relação entre o café e os outcomes clínicos: tabagismo, idade, nível económico, exercício físico, estado de saúde basal, etc. Apesar destes problemas metodológicos, a investigação sobre o café pos-sui excelente qualidade e os dados apresentam grande consistência de estudo para estudo, como podem ver nos dois relatórios técnico/científicos elaborados pelo CEMBE – Relató-rio técnico/científico sobre a relação entre a ingestão de café e a incidência da Diabetes Mellitus tipo 2; Relatório técnico/científico sobre a relação entre a ingestão de café e a demência – que aqui resumimos e que poderá ler na versão integral disponível no site do Programa Café e Saúde.O Programa Café e Saúde, um projecto promovido pela a A.I.C.C. – Associação Industrial e Comercial de Café – e apoiado pela O.I.C. – International Coffee Organization – tem como objectivo reunir informação científica baseada na evidência, informar os técnicos de saúde sobre os benefícios do café para a saúde, desconstruir mitos e alargar o conhecimento de estudos científicos sobre o tema.Este é um dossier de informação que reúne conhecimento científico de profissionais de saúde para profissionais de saúde!

Introdução

o café e a saúde – introdução aos relatórios técnico/científicos do CeMBe

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d evido ao seu consumo generaliza-do, o café encontra-se na primeira linha das preocupações do sistema

de saúde e dos consumidores, assim como das instituições reguladoras dos produtos alimentares. O café tem sido estudado em diversos contextos, tendo sido provado que o seu consumo pode prevenir em parte do-enças como o Parkinson ou hepatopatias, não se tendo provado uma relação entre o consumo de café e um aumento de risco car-diovascular.A maior parte da investigação sobre os efei-tos do café é epidemiológica, apresentando estes estudos sobretudo dois problemas prin-cipais4: em primeiro lugar, a quantificação da ingestão de café – feita através de inquéri-tos sobre o nº de chávenas ingeridas por dia - é muito variável, já que quer a capacidade das chávenas quer o teor de cafeína por chá-vena é dificilmente reprodutível de inquéri-to para inquérito; mesmo quando se assume que uma chávena poderá ter 85-100 mg de cafeína, este teor pode ser alterado por diver-sas formas de moer e filtrar o café. Em se-gundo lugar, existe um conjunto de factores de confundimento que podem, quando não ajustados, influenciar a relação entre o café

Resumo do Relatório técnico/científico sobre a relação entre a ingestão de café e a incidência da Diabetes Mellitus tipo 2

por Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência

e os outcomes clínicos: tabagismo, idade, ní-vel económico, estado de saúde de base, etc. Mesmo um potencial processo de ultrapassar estes obstáculos – comparando a ingestão de café e de descafeinado – é complicado pelo facto de algumas pessoas tomarem desca-feinado por um problema de saúde (tendo tomado café normal até essa altura) ou, em alternativa, nunca ter tomado outro café que não o descafeinado, por uma questão de es-tilo de vida.Apesar destes problemas metodológicos, a investigação sobre o café possui excelen-te qualidade e os dados apresentam grande consistência de estudo para estudo.

o ProBLeMAA questão presente em que é pedida ao CEMBE uma fundamentação científica e clínica é a seguinte:“O café pode reduzir o risco da diabetes mellitus tipo 2?”

estratégia de pesquisa e critérios de selecção da evidência científicaDe forma a identificar e seleccionar a litera-tura relevante, isto é, estudos científicos so-bre a avaliação da associação e causalidade

o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

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o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

entre um factor de risco (neste caso, o con-sumo de café/cafeína) e o desenvolvimento de uma determinada condição patológica ou doença (no presente caso, diabetes mellitus tipo 2) procedemos à pesquisa de estudos comparativos do tipo coorte ou seccionais cruzados e de metaanálises de estudos de co-orte na base de dados Medline (PubMed) até Dezembro de 2007. Foram ainda pesquisadas as listagens de referências dos estudos incluí-dos para análise.

A equação de pesquisa electrónica realizada foi:1. “Diabetes Mellitus, Type 2”[Mesh]2. “Coffee”[Mesh]3. “Caffeine”[Mesh]4. 2 OR 35. Cohort Studies [MeSH, PT]6. Comparative Study [MeSH, PT]7. Prospective Studies [MeSH, PT]8. Follow-Up Studies [MeSH, PT]9. Cross-Sectional Studies [MeSH, PT]10. Review [MeSH, PT]11. Meta-Analysis [MeSH, PT]12. Risk Factors [MeSH]13. Risk Assessment [MeSH]14. Risk Reduction Behaviour [MeSH]15. Regression Analysis [MeSH]16. Multivariate Analysis [MeSH]17. Proportional Hazards Models [MeSH]18. OR/5-1719. 1 AND 4 AND 18

O conjunto das referências obtidas com esta estratégia de pesquisa foi avaliado por dois dos autores (António Vaz Carneiro e João Costa) de forma independente. Os autores conside-raram para análise os estudos que cumprissem os seguintes critérios de inclusão:

1. Estudos de coorte prospectivos ou estudos transversais (seccionais cruzados)

2. Exposição a café/cafeína durante um perí-odo de tempo adequado

3. Avaliação do desenvolvimento de novos casos de diabetes mellitus tipo 2 ou de in-tolerância à glucose

4. Estudos com publicação integral.

Os autores extraíram de forma independente para cada estudo, de acordo com uma folha de recolha de dados sistemática, os seguintes dados:1. Publicação2. Desenho, metodologia e duração do es-

tudo3. Possíveis factores de enviesamento dos

estudos, como estudos não prospectivos, métodos inadequados de avaliação da ex-posição ao factor de risco ou avaliação das variáveis clínicas, e a taxa de perdas duran-te o seguimento

4. Características (tempo, quantificação) da exposição ao factor de risco (café/cafeína)

5. Análise de resultados (variáveis considera-das e estimativas das associações encontra-das).

resultados da pesquisa da literaturaForam analisados 76 estudos de coorte pros-pectivos e transversais (seccionais cruzados), que tivessem sujeito os doentes a uma expo-sição de café/cafeína durante um período de tempo adequado. Para análise final foram seleccionados 20 estudos cujas características correspondiam aos parâmetros predefinidos de qualidade.

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CoMenTárioSA diabetes mellitus tipo 2 é uma doença caracterizada por um progressivo desenvol-vimento de complicações vasculares (micro e macro), que são factores responsáveis pela triplicação do risco de morte cardiovascular, quando se comparam estes doentes com a população em geral. Dois terços a três quar-tos dos diabéticos morrem de DCV, sendo esta mortalidade 2 a 4 vezes superior rela-tivamente à população não diabética. No que concerne ao AVC, a diabetes aumenta o risco relativo entre 1.8 a 6.0, sendo um dos principais factores de risco para esta patolo-gia nas mulheres.• Embora factores genéticos possam ser im-

portantes na etiologia da DM 2, existe evi-dência de boa qualidade que esta patologia se associa a um conjunto de factores de ris-co moduláveis.

• Está bem provado por diversos tipos de estu-dos que a obesidade constitui um factor de risco importante para a DM 2 e que a perda de peso com uma dieta equilibrada retarda a incidência desta patologia. O mesmo efeito se verifica com o exercício físico e a inges-tão moderada de álcool, carne e cereais. Por outro lado, o tabagismo aumenta o risco de DM 2.

• A ingestão de café tem sido extensivamente estudada como componente da dieta que pode influenciar a DM2.

• A presente revisão sistematizada da literatu-ra confirma o benefício da ingestão crónica de café em todos os estádios do metabo-lismo da glucose: a anomalia da glicémia em jejum (AGJ), a tolerância diminuída à glucose (TDG) e a diabetes mellitus tipo 2 (DM 2).

• A ingestão do café beneficia também o ní-

vel de insulina no sangue e os efeitos be-néficos são mais marcados nas glicemias pós-prandiais.

• Os benefícios da ingestão crónica de café verificam-se também em doentes com ou sem alterações basais do metabolismo glu-cídico e em que este diagnóstico foi feito com recurso à provas de tolerância à gluco-se (o que compensa o sub-diagnóstico da DM 2 quando se utilizam apenas os inqué-ritos, especialmente nos idosos).

• A dose de café que apresenta benefícios é relativamente pequena (a partir de 2 ou mais chávenas por dia).

• Mesmo nos doentes com aumento do perí-metro abdominal (um conhecido factor de risco para o síndrome metabólico e para a DM 2) a ingestão de café teve um efeito benéfico na incidência de DM 2.

• Com excepção dos pacientes mais idosos, os benefícios do café são dosedependen-tes (isto é, dependentes da dose ingerida - quanto mais café se bebe, menor é o risco de DM 2) e estão presentes também nos descafeinados.

• O benefício do café não se verifica nos es-tudos de ingestão aguda de cafeína, em que parece verificar-se uma hiperglicémia tran-sitória (que de qualquer maneira baixa ao fim de 30 mn pós-ingestão).

• Estes dados do café na DM 2 são sólidos, já que se revelam consistentes mesmo quando se controlam para os outros factores de ris-co para as complicações cardiovasculares: idade, dieta, IMC, tabagismo, consumo de álcool e actividade física.

Potenciais mecanismos para a acção do café na DM 2• A consistência dos resultados entre popu-

o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

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lações estudadas sugere uma relação causal entre o café e o risco de DM 2. Razões pos-síveis incluem os efeitos sobre a estimula-ção da termogénese, inibição da hidrólise hepática da G-6-P, diminuição da absorção intestinal de glucose, inibição das incretinas intestinais e o aumento da sensibilidade pe-riférica à insulina (cafeína, magnésio, ácido clorogénico), assim como a libertação de catecolaminas, com subsequente aumento de metabolismo e termogénese do tecido adiposo castanho.

• Embora o conteúdo em cafeína seja idên-tico, chávena por chávena, em café fervido ou filtrado, a concentração de diterpenos (cafestol e kahweol) – que aumentam a taxa de colesterol e de doença coronária – é me-nor nesta última técnica de preparação do café.

• Também o tipo de café é importante: as variedades arábicas contêm metade da con-centração de cafeína das variedades robus-ta (que é mais consumida no nosso país). Outros dados sugerem que o benefício do café na DM 2 possa ser devido a alguns dos seus componentes como o ácido clorogéni-co, quinidos e trigonellina.

• A utilização do modelo Homeostasis Model Assessment (HOMA) confirma que a acção benéfica da cafeína é devida a um aumento da sensibilidade à insulina e da melhoria da função das células beta pancreáticas.

Problemas com os estudos sobre o café e a DM 2• A metodologia de obtenção de informa-

ção por inquéritos auto-preenchidos é um processo com potenciais viéses (nomea-damente de lembrança – recall bias). Por exemplo, os inquiridos podem pecar por

excesso no que concerne a actividade física (isto é, sobrestimam o tempo e a intensida-de do exercício físico), mas por defeito no que concerne a ingestão de álcool (subes-timam a quantidade de bebidas alcoólicas que ingerem) ou de tabagismo (reportam menor número de cigarros fumados por dia). Mesmo assim, vários estudos procura-ram ultrapassar estes problemas quer com inquirições detalhadas no início e no fim do estudo, quer com medições fisiológicas específicas. Estas medidas confirmaram de uma maneira geral as informações dadas pelos pacientes dos estudos.

• Muitos dos estudos foram efectuados em classes médias e médias-altas. Poderá não ser possível extrapolar os resultados para outras classes socioeconómicas diferentes

• Os estudos que reportam diagnósticos de DM 2 feitos por médicos ou por consulta a processos clínicos têm encontrado uma associação maior entre o café e a DM 2, quando comparados com testes directos (PTGO), mas as diferenças são relativamen-te pequenas.

• Os resultados por vezes diferentes encon-trados nos estudos podem ser devidos, para além de diferentes metodologias de diagnóstico de DM 2, à avaliação de vari-áveis ou a diferenças nas amostras popu-lacionais.

ConCLUSõeSO café constitui uma complexa mistura de produtos químicos fisiologicamente activos, cuja composição depende (pelo menos em parte) de factores agrícolas, de manufactura (torrefacção), de mistura e de modo de con-fecção (filtragem, fervura, etc.).

o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

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o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

As associações entre o café e a DM 2:• são consistentes e importantes• seguem um padrão dose-dependente• mantêm-se em pacientes obesos e seden-

tários, com ingestão ou não de álcool, em novos e velhos, mulheres e homens (ainda que de modo variável)

• verificam-se em diversas populações (euro-peias, norte-americanas, asiáticas)

• parecem ser independentes de outros fac-tores de risco conhecidos da dieta e estilos de vida

• estão presentes em todas as modalidades de confecção, incluindo o café instantâneo.

Baseada nesta revisão sistematizada da litera-tura, a resposta à pergunta inicialmente co-locada é que“A ingestão crónica de café reduz o risco da diabetes tipo 2”

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o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a Diabetes Mellitus Tipo 2

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O café constitui um dos componen-tes da alimentação mais frequente-mente ingeridos no mundo inteiro,

sendo a cafeína a substância farmacologica-mente activa mais utilizada universalmente. O café tem uma constituição complexa-mistura de milhares de componentes quí-micos, incluindo carbohidratos, compostos nitrogenados, lípidos, minerais, vitaminas, alcalóides e compostos fenólicos – com a cafeína (que pertence ao grupo das meti-lxantinas) como principal componente e a sua substância activa. Devido ao seu consumo generalizado, o café encontra-se na primeira linha das preocupa-ções do sistema de saúde e dos consumido-res, assim como das instituições reguladoras dos produtos alimentares. O café tem sido estudado em diversos contextos, tendo sido provado que o seu consumo pode prevenir – pelo menos em parte – doenças como a diabetes mellitus tipo 21, a doença de Pa-rkinson ou hepatopatias, não se tendo pro-vado uma relação entre o consumo de café e um aumento de risco cardiovascular. De facto, um estudo recente veio até mostrar que o café é seguro nos doentes pós‐enfarte agudo do miocárdio.

Resumo do Relatório técnico/científico sobre a relação entre a ingestão de café e a demência

por Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa

A maior parte da investigação sobre os efei-tos do café é epidemiológica, apresentan-do estes estudos sobretudo dois problemas principais6: em primeiro lugar, a quantifi-cação da ingestão de café – feita através de inquéritos sobre o número de chávenas in-geridas por dia – é muito variável, já que quer a capacidade das chávenas quer o teor de cafeína por chávena é dificilmente repro-dutível de inquérito para inquérito; mesmo quando se assume que uma chávena pode-rá ter 85‐100 mg de cafeína, este teor pode ser alterado por diversas formas de moer e filtrar o café. Em segundo lugar, existe um conjunto de factores de confundimento que podem, quando não ajustados, influenciar a relação entre o café e os outcomes clínicos: tabagismo, idade, nível económico, exercí-cio físico, estado de saúde basal, etc. Mesmo um potencial processo de ultrapassar estes obstáculos – comparando a ingestão de café e de descafeinado – é complicado pelo facto de algumas pessoas tomarem descafeinado por um problema de saúde (tendo tomado café normal até uma determinada altura) ou, em alternativa, nunca ter tomado outro café que não o descafeinado, por uma questão de estilo de vida.

o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a demência

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o café e a saúde – relação entre a ingestão de café e a demência

Apesar destes problemas metodológicos, a investigação sobre o café possui excelente qualidade e os dados apresentam grande consistência de estudo para estudo.

o ProBLeMA A questão presente em que é pedida ao CEMBE uma fundamentação científica e clínica é a seguinte:

“O café pode reduzir o risco da demência?”

estratégia de pesquisa e critérios de selecção da evidência científica De forma a identificar e seleccionar a lite-ratura relevante, isto é, estudos científicos sobre a avaliação da associação e causali-dade entre um factor de risco (neste caso, o consumo de café/cafeína) e o desenvol-vimento de uma determinada condição pa-tológica ou doença (no presente caso, de-mência) procedemos à pesquisa de estudos comparativos do tipo coorte ou seccionais cruzados e de meta-análises de estudos de coorte na base de dados Medline (PubMed) até Maio de 2007. Foram ainda pesquisadas as listagens de referências dos estudos inclu-ídos para análise.

A equação de pesquisa electrónica realizada foi: 1. “Dementia”[Mesh] 2. “Coffee”[Mesh] 3. “Caffeine”[Mesh] 4. 2 OR 3 5. Cohort Studies [MeSH] 6. Comparative Study [PT] 7. Prospective Studies [MeSH] 8. Follow-Up Studies [MeSH] 9. Cross-Sectional Studies [MeSH]

10. Review [PT] 11. Meta-Analysis [PT] 12. Risk Factors [MeSH] 13. Risk Assessment [MeSH] 14. Risk Reduction Behavior [MeSH] 15. Regression Analysis [MeSH] 16. Multivariate Analysis [MeSH] 17. Proportional Hazards Models [MeSH] 18. OR/5-17 19. 1 AND 4 AND 18

O conjunto das referências obtidas com esta estratégia de pesquisa, foi avaliado por 2 os autores (António Vaz Carneiro, João Costa e Dra. Margarida Borges) de forma indepen-dente. Os autores consideraram para análise os estudos que cumprissem os seguintes cri-térios de inclusão: 1. Estudos de coorte prospectivos ou estu-

dos transversais (seccionais cruzados) 2. Exposição a café/cafeína durante um pe-

ríodo de tempo adequado 3. Avaliação do aparecimento de casos de

demência, independentemente da classi-ficação nosológica desta

4. Estudos com publicação integral. Os autores extraíram de forma independen-te para cada estudo, de acordo com uma folha de recolha de dados sistemática, os seguintes dados: 1. Publicação 2. Desenho, metodologia e duração do es-

tudo 3. Possíveis factores de enviesamento dos

estudos, como estudos não prospectivos, métodos inadequados de avaliação da ex-posição ao factor de risco ou avaliação das variáveis clínicas e a taxa de perdas durante o seguimento

4. Características (tempo, quantificação)

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da exposição ao factor de risco (café/cafeína).

5. Análise de resultados (variáveis consideradas e estimativas das associações encontradas).

resultados da pesquisa da literatura Foram obtidas 34 referências de acordo com a estratégia de pesquisa referida, tendo sido incluídos para análise 5 estudos, de acordo com os critérios de inclusão explicitados. CoMenTárioS O café é a substância psicoactiva mais utiliza-da no mundo. Como estimulante leve, o café aumenta a actividade do sistema nervoso cen-tral (SNC), resultando num estádio de alerta e excitação, melhorando a performance em tarefas cognitivas que requerem rapidez ou vi-gilância. Melhora ainda a memória. O declínio cognitivo, até chegar por vezes à demência, está acima de tudo relacionado com a idade: até aos 60 anos mantém-se es-tável, a partir desta idade começa a diminuir o tempo de reacção, a rapidez perceptual e o nível de processamento da informação. A maioria (>2/3) dos doentes geriátricos consome para cima de 100 mg de café por dia, embora com tendência para ir dimi-nuindo com a idade mais avançada.

Potenciais mecanismos para a acção do café na demência O principal mecanismo pelo qual o café pode ter efeitos benéficos na demência é o antagonismo não-selectivo dos receptores adenosínicos (principalmente os A1 e A2A) – o único efeito que ocorre na ingestão re-gular de café – resultando em estimulação colinérgica. O antagonismo pode atenuar o efeito do péptido tóxico que se acumula no cérebro dos doentes com AD (um efeito do-

cumentado em estudos animais). Existe evidência científica de boa qualida-de que a suplementação com vitaminas C e E diminui o risco de AD. A interpretação causal deste achado é que estes compostos baixam o stress oxidativo associado ao en-velhecimento e ao risco de doenças neuro-degenerativas, um facto observado em estu-dos que utilizam antioxidantes na dieta. • A cafeína possui efeitos antioxidantes e

poderia exercer efeitos similares aos das vitaminas acima indicadas.

• O café, como xantina que é, pode ter um efeito benéfico directo. Esta possibilidade nasceu de estudos sugerindo que uma ou-tra xantina – a propentofilina – poderia se protectora da AD.

• O diagnóstico de AD é habitualmente precedido por uma longa fase pré-clínica, pelo que, se o café tem efeitos protectores, então estes devem ter a sua acção durante esta fase patogénica alargada da doença.

Tem de se exercer um grau de precaução na análise sobre o benefício do café sobre a AD. Existem várias hipóteses explicativas de uma relação não causal: • em primeiro lugar, uma mortalidade selec-

tiva nos consumidores de café e uma so-brevivência nos não consumidores poderia aumentar artificialmente o efeito (entre os casos e os controlos); no entanto, evidência recente não confirma qualquer aumento do risco de doença coronária, por exemplo, nos bebedores de café.

• em segundo lugar, os efeitos podem ser de-vidos aos factores de confundimento, por ex. estilos de vida associados ao consumo de café (tabagismo, álcool – embora este úl-timo esteja associado a um menor risco).

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• em terceiro lugar, os pacientes mais jovens terão tendência a beber mais café e os mais velhos a esquecer o nível de ingestão regu-lar, enquanto desenvolvem precisamente AD.

• em quarto lugar, existe o problema do viés causa-efeito: os doentes com AD sofrem uma progressiva degenerescência do stria-tum e têm baixos níveis de dopamina e se-rotonina – um contexto de menor apetên-cia para o tabagismo, o álcool e também para o café. Existe de resto evidência que demonstra um efeito protector do café na incidência da doença de Parkinson.

• em quinto lugar, pode existir um factor ge-nético ou ambiental desconhecido que au-mente a apetência para o café e simultane-amente diminua a incidência de AD. Por exemplo, em certos estudos verificou-se que os doentes com AD eram já fracos bebedo-res de café na idade jovem (25-30 anos).

ConCLUSõeS O café é uma bebida muito popular em todo o mundo e tem na sua constituição uma complexa mistura de produtos quími-cos fisiologicamente activos, cuja compo-sição depende (pelo menos em parte) de factores agrícolas, de manufactura (torrefac-ção), de mistura e de modo de confecção (filtragem, fervura, etc.). As associações entre o café e a demência: • verificam-se em diversas populações de

doentes, com progressivas alterações cog-nitivas – das clinicamente pouco significa-tivas à AD.

• os resultados são razoavelmente consisten-tes de estudo para estudo.

• os resultados permitem definir, na sua maior parte, um padrão dose-dependente:

quanto maior é a ingestão de café, menor o risco de AD.

Baseada nesta revisão científica, a resposta à pergunta inicialmente colocada é que “A ingestão crónica de café pode reduzir o risco da demência”

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