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Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra Caderno Teórico Disciplina: Introdução à Gestão das Organizações Licenciaturas: Informática de Gestão + Contabilidade e Gestão Pública Ano lectivo de 2008/2009 1º Semestre

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Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra

Caderno Teórico

Disciplina: Introdução à Gestão das Organizações

Licenciaturas: Informática de Gestão + Contabilidade e Gestão Pública

Ano lectivo de 2008/2009 – 1º Semestre

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

2

Índice

Texto nº 1 – A Empresa: Objectivos e Finalidades – J. P. Marques & G. Silva 3

Texto nº 2 – Aptidões dum Administrador Eficaz – R. Katz 19

Texto nº 3 – Administração Contingencial da Empresa – I. Chiavenato 36

Texto nº 4 – A Estrutura Organizacional: Dimensões, Determinantes e Formatos – M. Cunha 55

Texto nº 5 – A Motivação dos Recursos Humanos na Empresa - J. P. Marques & G. Silva 76

Texto nº 6 – O Líder e a Liderança – S. Morgado & J. P. Marques 90

Texto nº 7 – Função Marketing – A. Calheiros, G. Silva, L. Mendes & M. Abreu 108

Texto nº 8 – Inovar sem Risco – E. Neves 113

Texto nº 9 – A Mudança Organizacional e a Inovação – J. P. Marques & P. Santos 147

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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TEXTO Nº 1

A EMPRESA OBJECTIVOS E FINALIDADES João Paulo Marques & Gabriel Silva

1. A empresa enquanto organização social

A empresa enquanto organização social

O Conceito de Organização

O que é organizar?

Sob o ponto de vista conceptual, poderemos considerar três diferentes níveis de resposta ou, três

diferentes visões sobre esta realidade.

— Uma visão operacional

— Uma visão dinâmica

— Uma visão concreta ou social

Na acepção operacional:

Organização corresponde ao "trabalho de estruturação organizacional", e pretende-se a este nível

recobrir o conjunto de tarefas concretas tais como as de:

1. Identificação e quantificação das tarefas a realizar segundo o tipo, o grau de dificuldade e as

competências requeridas pela concretização de um dado trabalho global, como por exemplo

o de fabricar um carro, ou uma porta, ou conceder um crédito ou vender um programa de

férias.

2. Distribuição de tarefas pelas pessoas que as devem realizar, afectando pessoas a postos de

trabalho

3. Agregação de postos de trabalho e agrupamento de pessoas segundo critérios de

homogeneização, de modo a criar diferentes departamentos ou serviços, supervisionados por

um dirigente comum.

4. Delegação da autoridade, com consequente estabelecimento de relações de subordinação e

de comunicação entre as pessoa de modo a melhorar a execução das tarefas.

Nesta acepção organizar significa desenvolver a aplicação dos métodos de divisão técnica do trabalho

como solução para o problema do aumento da produtividade do trabalho humano.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Na acepção dinâmica:

Organização corresponde à acção de organizar com responsabilidade do dirigente.

Organizar é aqui o acto de ordenar os diferentes futuros desejados para a organização, ou

seja organizar corresponde aqui ao trabalho dos dirigentes de topo das organizações.

Assim, nesta acepção a organização consiste no estabelecimento de objectivos, na sua coordenação e

integração em planos coerentes, bem como na respectiva afectação de meios e na contextualização

destes programas de acção.

Então a acção da gestão no plano da organização envolve:

a determinação das actividades necessárias ao alcance dos objectivos planeados (vide

especialização)

o agrupamento dessas actividades numa estrutura lógica (vide departamentalização)

a afectação das actividades a posições e pessoas (vide cargos e tarefas)

Na acepção concreta ou social:

Organização é agora a realidade da própria estrutura organizativa concreta.

Cada estrutura organizativa sendo um conjunto de tarefas agregadas em funções, onde através

da conjugação do esforço de um dado grupo de pessoas se atingem objectivos pré-determinados,

tem uma certa materialidade expressa pelo seu organigrama. Neste caso a organização é assim o

grupo concreto de pessoas, os dirigentes, os professores e os funcionários do ISCAC, que mediante

uma actuação preconcebida e articulada prosseguem uma finalidade comum (recomenda-se a

observação do Guia Escolar 1999/2000 e respectivos organigramas)

Sob este ponto de vista, Organização corresponde ao grupo social concreto, capaz de

formular objectivos que, através das suas actuações articuladas, prossegue uma finalidade comum,

dividindo tarefas, numa base de especialização e estabelecendo redes de comunicação entre si, sendo

toda a estrutura supra ordenada por um ou mais centros de poder que dão direcção à actuação da

organização.

Em síntese:

Organização constitui o trabalho de estruturação da actividade de produção de objectos e serviços

comercializáveis;

Organização constitui o trabalho da actividade de gestão e liderança dos grupos sociais mobilizados

para a produção de objectos e serviços comercializáveis;

Organização constitui a realidade social dos grupos humanos de constituição deliberada e orientados

para uma finalidade comum, que articulando entre si tarefas diferenciadas, procuram desenvolver

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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estratégias de melhoria da produtividade do trabalho global do grupo assim constituído.

2. Os Objectivos nas Empresas/Organizações

Como vimos uma organização é toda a entidade social deliberadamente constituída e orientada para

o cumprimento de objectivos, superando por esta via as limitações naturais que decorrem das

capacidades limitadas de cada sujeito que integra essa organização.

Conceptualmente, o tipo de objectivos assumidos por cada organização, definem a sua natureza e

legitimam como objecto social concreto a sua existência, sendo que todos conhecemos organizações

tão diversas tais como:

as empresas

as mais diversas instituições da administração pública;

as associações de todo o tipo

as fundações

os partidos políticos, ou

os clubes

de que em simultâneo somos empregados, clientes, utentes, associados, ou militantes,...

Isto é:

todas estas entidades compartilham o facto de constituírem conjuntos humanos formalizados

e hierarquizados, orientados, para o cumprimento de determinados fins e para o assegurar da

cooperação e da coordenação de todos os seus membros.

Tais objectos sociais correspondem aos empreendimentos humanos de constituição

intencional, com os quais se pretende atingir determinados objectivos, os quais devem ser sempre

verificáveis.

Tais organizações tendo em comum o facto de constituírem grupos humanos orientados para a

acção, diferenciam-se em função:

dos objectivos particulares de cada organização

das tecnologias utilizadas

dos mecanismos de coordenação e autoridade implementados

dos modos de legitimação do poder operacionalizados.

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A Natureza dos Objectivos

Objectivos = Realidades simbólico-reais

São realidades virtuais e simbólicas, são situações desejadas, i.e., são algo que existe ex-ante e que

condiciona o desenvolvimento da acção.

Funções dos objectivos:

1. O de legitimação da existência da organização (=Fonte de legitimação)

2. O de direccionamento da actividade em relação ao futuro (= Padrões)

3. O de monitorização do funcionamento da organização (= Unidades de medida)

4. O de suporte aos dispositivos de motivação/incentivo (=Tensores motivacionais)

A que critérios devem obedecer o estabelecimento de objectivos?

Devem decorrer da definição de missão da organização

Devem ser operacionalizáveis

Devem ser mensuráveis

Devem ser consistentes

Devem permitir a concentração de recursos e de esforços

e ainda ...

Devem ser fixados para todas as áreas da empresa/organização

Devem organizar-se numa arborescência do geral para o particular

Devem ser datados, a curto, médio e longo prazo

Devem ser realizáveis mas suficientemente ambiciosos

Devem ser específicos

O processo de estabelecimento de objectivos numa organização é um processo de interacção com a

envolvente dessa organização, processo em que os diferentes actores internos e externos jogam um

papel activo. De modo a facilitar a compreensão da natureza desta interacção vejamos os casos da

co-incineração de resíduos industriais perigosos (RIP) e os casos dos efluentes das indústrias do

papel, ou ainda os casos da indústria automóvel, onde independentemente de razões de mera

eficiência produtiva tem de ser considerados nos processos internos de tomada de decisão factores,

tais como os associados à opinião pública, ou à regulamentação económica anti-poluição.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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O desfecho do caso da co-incineração é conhecido, a postura anti poluição da indústria do

papel é também hoje consensual e a estratégia de reciclagem da indústria automóvel constitui um

importante argumento de diferenciação.

Muito genericamente poderemos, identificar como grandes objectivos naturais das organizações

empresariais o do:

Proporcionar competitivamente a satisfação de necessidades de bens e serviços

comercializáveis;

Proporcionar emprego produtivo a todos os factores de produção utilizáveis na economia de

mercado;

Proporcionar o bem-estar social através do emprego dos diferentes factores produtivos;

Proporcionar um retorno justo pela utilização dos diferentes factores produtivos.

Proporcionar um adequado clima social de integração, capaz de satisfazer as necessidades

humanas.

Estes objectivos devem ser vistos dinamicamente no quadro do processo de relação interna e

externa da organização, desenvolvendo-se a partir daí todo o processo de planeamento que conduz

ao estabelecimento de estratégias, planos, programas, políticas e procedimentos os quais conferem à

organização alguma previsibilidade e automatização.

3. As empresas enquanto sistemas abertos: A empresa e a envolvente.

Por sistema, entendemos todo o conjunto de elementos, interrelacionados e que nessa relação

constituem um todo.

Um sistema é dito aberto, quando este se inscreve num ambiente que o pode transformar ou

que ele próprio eventualmente pode transformar.

A organização das empresas papeleiras tem em consideração o impacto social que processos

tecnológicos ambientalmente activos têm numa opinião pública favorável às causas ambientais, bem

como as estratégias de empresas como a Coca-cola, a Benetton, a Nestlé, ou a Levís condicionam a

evolução dos estilos de vida, da cultura e dos hábitos de consumo de uma população.

A empresa é assim uma organização com objectivos próprios, parte de um sistema social mais

vasto no qual se integra. A empresa é assim um sistema que interage com outros sistemas que

constituem o universo social económico tecnológico e cultural de cada civilização, e sendo um

sistema tem objectivos próprios, assim como os tem as suas diversas partes constituintes, sejam estas

os seus diferentes departamentos, serviços ou pessoas que as integram.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Uma rede de interacção entre o sistema empresa e outros sistemas

(stakeholder view)

$ Trabalho $ Bens/Serv. $

Bens/Serv $ $

$ Bens Públicos

Bens/Serv $ $ $ $

Na figura acima, diagramamos dois tipos de fluxos: financeiros, dinheiro que correspondem a

pagamentos, desembolsos ou reembolsos e económicos, ou seja que correspondem a bens e

serviços, que ainda poderemos reagrupar sob a forma de fluxos de:

Consumo (trabalho+ dinheiro)

e os que tornam o consumo possível ( ordenados + bens e serviços)

Ou seja, na perspectiva desta visão, a principal função da empresa na sociedade é a de, na interacção

com os diferentes sistemas que se localizam na sua envolvente, CRIAR E DISTRIBUIR RIQUEZA.

A análise ambiental

Poderemos arrumar os dados referentes à contextualização da actividade da empresa em dois

grandes grupos de informação:

o que se refere ao conhecimento da envolvente imediata ou específica ou também

conhecida como transaccional, que tem como característica essencial o facto de as forças

e actores que a integram se relacionarem directamente com o negócio da empresa, pelo

que as acções e estratégias recíprocas condicionam directamente a posição competitiva da

empresa.

Ou seja:

Os consumidores, cujo conhecimento habilita a empresa com a informação indispensável à

identificação de oportunidades;

Operadores Financeiros Sub

contratantes

Trabalhadores Distribuidores

Empresa

Fornecedores Sócios/Accionistas

Estado

Clientes

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Os concorrentes, cujo conhecimento também habilita a empresa com a informação

indispensável à identificação de oportunidades, pois estes podem não estar a satisfazer

adequadamente necessidades identificadas pelos seus clientes, ou ameaças que estes

poderão eventualmente, pelas mesmas razões, representar para a nossa posição

competitiva;

Os distribuidores, cujo conhecimento igualmente habilita a empresa com a informação

indispensável à identificação de oportunidades, ou as ameaças, à nossa posição

competitiva;

o que se refere ao conhecimento da envolvente mediata ou geral ou também conhecida

como contextual, que tem como característica o facto de as forças e actores que a

integram constituírem o sistema social e económico onde a empresa se insere, pelo que

apenas indirectamente, influenciam o negócio da empresa, e muito menos as acções e as

estratégias da empresa podem condicionar fácil e directamente tais forças e actores.

Ou seja em síntese:

Politico Legais

Situação político institucional Ordem constitucional Legislação

Económica Fiscal Administrativa Laboral

Económicas Valor e evolução do PIB Valor e evolução da taxa de inflação Valor e evolução da taxa de juro Valor e evolução da produtividade Valor e evolução do índice de poder de compra, sua distribuição regional e social Evolução da Balança Comercial Politicas económicas

Sócio-culturais Conflituosidade social Grupos sociais, étnicos ou religiosos Nível de escolaridade Atitude face ao trabalho

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Expectativas face ao trabalho Valores, atitudes, normas de vida, estilos de vida Instituições e legislação de protecção cívica

Tecnológicos: Política de I&D Tecnologias de produção Infra estruturas científicas Ligações Universidade / Empresas Nível de conhecimentos técnicos e científicos Inovação e divulgação de novas tecnologias

Diagrama das forças condicionantes da acção empresarial e dos seus principais parceiros

Mercado de Bens e Serviços Intermédios Mercado de Bens Finais

Mercado de Trabalho Mercado de Capitais

ESTADO

Organizações

Consumidores

Organizações Empresariais

Opinião Pública

Instituições

Organizações Profissionais

Consultores

Fornecedores

Distribuidores Clientes

Concorrentes

Banca

Sindicatos

Sócios ou accionistas

Factoring

Leasing

Seguradoras

A Empresa Os Actores Internos:

+Dirigentes +Quadros

+Trabalhadores

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4. Os recursos das empresas

Os factores trabalho e capital

Conforme irão estudar nas disciplinas de Economia, a teoria económica arruma os inúmeros

factores produtivos utilizados na empresa segundo duas grandes classes: a do trabalho e a do capital,

procurando-se actualmente desenvolver modelos onde um terceiro factor, o conhecimento, seja

considerado.

Os Recursos podem então ser classificados em 3 categorias:

1. Recursos Tangíveis: 1. Recursos físicos materiais, tais como os diferentes equipamentos,

indispensáveis ao desenvolvimento do processo produtivo e a respectiva gestão; e 2. os

recursos financeiros exigidos pelo financiamento do investimento realizado pela empresa e a

respectiva gestão.

2. Recursos Humanos, indispensáveis ao funcionamento geral da organização, tais como: 1.

Habilidades e conhecimento especializados, 2. Comunicação e Aptidões interactivas e 3.

Motivação individual, de entre os quais se destaca o “capital Humano” da empresa;

3. Recursos Intangíveis, os quais incluem o conjunto das competências e capacidades da

organização e dos seus membros, tais como: 1. Tecnologia, que se traduz pelo conjunto dos

conhecimento científicos e técnicos directamente aplicáveis à produção de bens e serviços ou

ao melhoramento dos já existentes; 2. Reputação, a qual configura a imagem e o prestígio

alcançados e 3. Cultura, a qual constitui o conjunto dos valores, crenças, hábitos, atitudes e

comportamentos implícitos ou explícitos, os quais condicionam a actividade global da

organização.

Eficácia versus Eficiência

Em toda e qualquer organização confrontamo-nos com a necessidade de monitorizar o seu

funcionamento.

Para atingirmos este objectivo criamos sistemas de indicadores de desempenho, que nos

permitam proceder a esta monitorização.

Muito genericamente poderemos “arrumar” estes indicadores entre duas grandes classes, a

dos indicadores de Eficácia e a dos indicadores de Eficiência, ou seja entre a avaliação da capacidade

de atingir objectivos, contra os meios e recursos sacrificados na produção/disponibilização por

unidade de produto, respectivamente. Este duplo controle, assume particular importância na medida

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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em que tanto importa avaliar a capacidade de cumprir objectivos, como a de avaliar o custo

suportado pela organização com cada unidade de produto disponibilizado.

A mensuração excessiva

Pretende-se que as organizações, nomeadamente as empresas sejam as unidades sociais mais

eficientes e produtivas de entre todos os grupos humanos. Como vimos a eficácia de uma

organização específica em que medida esta atinge os seus objectivos, enquanto a sua eficiência nos dá

a leitura sobre a quantidade de recursos sacrificados para se obter uma unidade de produto.

Sob pressão da nossa cultura racional as organizações impacientam-se com a sua avaliação,

resultando do esforço de verificação da nossa posição relativa e da sua melhoria situações muitas

vezes indesejáveis sob ponto de vista dos objectivos das organizações.

Na medida em que certos aspectos são mais mensuráveis do que outros, pode-se estimular a

produção de itens de fácil mensuração, contra os que são mais dificilmente avaliáveis assim deformar

alguns dos esforços da organização. Se enfatizo os aspectos de produção numa dada fábrica posso

subalternizar os aspectos qualitativos e se centro a minha análise na qualidade arrisco por exemplo os

aspectos de manutenção ou de controle de custos.

Este problema da dupla avaliação, qualitativa versus quantitativa, não é fácil de no terreno

resolver, sendo apenas importante que as organizações tenham consciência de que muitas das suas

medidas de avaliação, estão longe de serem precisas, podendo assim o processo de atribuição de

demasiada importância a alguns indicadores de êxito da organização em detrimento de outros,

constituir um factor de deformação dos objectivos da organização que inevitavelmente conduz a uma

perda de eficiência e de eficácia que se procura atingir.

Quando o número de cirurgias constituem o principal referencial de avaliação de um serviço,

o número de clientes ligados a uma rede de comunicações, ou por exemplo o número de estudantes,

sem que se ponderem itens, tais como qualidade de vida pós operatória, rendimento e perfil de

consumo ou êxito académico, poderemos facilmente cair em situações em que o desvio entre

objectivos e práticas organizacionais conduzem a perdas de eficiência e eficácia.

5. Os níveis de actuação da Gestão

O principio da divisão técnica do trabalho determina a especialização dos diferentes postos de

trabalho e consequentemente a criação de diferentes órgãos, num movimento em que se procede a

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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uma separação entre tarefas de execução e tarefas de concepção, planeamento, coordenação e

controle. Na organização artesanal do trabalho humano, que dominou até ao desenvolvimento dos

sistemas de produção em fábrica, o artesão controlava o trabalho global associado aos diferentes

processos produtivos, concebendo, planificando e executando, enquanto nos processos de trabalho

em fábrica cada operador domina apenas um fragmento desse trabalho global, decorrendo daqui a

dicotomização das estruturas organizativas, entre execução e direcção e controlo e naturalmente o

trabalho de enquadramento e de gestão.

A racionalidade clássica (the best way) recomendava contra a imprevisibilidade do

comportamento humano, uma concepção de organização do trabalho que seguia uma única solução, a

da especialização sistemática do trabalho. Este modo de organizar gera estruturas organizativas em

que se considera a existência de mais de um nível de coordenação e controle:

O nível institucional ou estratégico

O nível intermédio ou gestionário ou de enquadramento

O nível operacional ou técnico

Hierarquização dos diferentes níveis de gestão Nível

Nível operacional ou nível técnico

Nível Intermédio, ou mediador, ou táctico ou de gestão ou de enquadramento...

Nível Institucional, ou nível estratégico

+IncertezaEficácia

Flexibilidade -IncertezaEficiência

Estabelece Objectivos Avalia alternativas estratégicas+Planifica a Longo prazo Toma decisões globais Estabelece Políticas

Nível Institucional Nível Intermédio

Estabelece Objectivos departamentais+Avalia Resultado Avalia alternativas tácticas Elabora e implementa planos tácticos

Avalia alternativas operacionais Avalia a acção diária Implementa a operação quotidiana

Nível operacional

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6. Os gestores e as suas Funções

Os Gestores e as suas funções

A qualquer nível de execução ou de hierarquia de uma organização, o gestor ou o operador,

para realizarem o seu trabalho, devem dominar um certo número de competências.

Na literatura de gestão no que se reporta ao conceito de competência é abundante a grande

diferença de opiniões, pelo que, entre outras, tomámos a definição de R. Katz para quem:

no caso dos postos de trabalho de administração, competência constitui o domínio de uma

dada forma de habilidade: habilidade técnica; habilidade humana e habilidade conceptual, que

cada dirigente deve possuir.

O que é a competência técnica?

É a habilidade em usar, conhecimentos técnicos apropriáveis,

procedimentos e regras de despacho específicas.

Esta competência habilita o gestor a responder às diferentes situações de trabalho, é uma habilidade

treinável, apropriável e por conseguinte passível de ser melhorada

O que é a competência humana?

Claramente a habilidade ou capacidade de trabalhar em grupo: motivando as pessoas;

envolvendo-as quer verticalmente quer horizontalmente, compreendendo-as enquanto

pessoas e enquanto membros do grupo de trabalho.

Esta competência é mais inata do que apropriável todavia também é treinavél e por conseguinte

melhorável.

O que é a competência conceptual?

Etimologicamente, claramente o que o espírito concebeu, o que é relativo à concepção, à

ideia, à imaginação, é um construto abstracto e geral.

Nesta ordem de ideias: É a habilidade ou capacidade de imaginar a organização como um todo

integrado, de antecipar como é que eventuais alterações numa parte afectam o todo. É a habilidade

ou capacidade de coordenar e integrar os diferentes interesses e actividades

Ao longo dos diferentes postos de trabalho, posicionados na estrutura hierárquica, iremos

encontrar, por partes dos gestores, diferentes necessidades de domínio destas supracitadas

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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habilidades, diferença que se estabelece em função do âmbito de actuação de cada gestor em

particular.

Deste modo a “distribuição” destas competências, como é natural, é muito assimétrica no que

se reporta às competência conceptual, sendo esta mais importante no topo do que na base da

organização; assim como à técnica, é mais importante na base do que no topo, e muito simétrica no

que se reporta ás competências humanas, cujo domínio é exigido a qualquer nível organizacional.

Distribuição das exigências em competências de Gestão pelos diferentes Níveis de Gestão

Ob je cti v o s Op e ra c io n a is

Ob je c ti v o sd e

Ge s tã o

Ob je c ti v o sEs tra té g i co s

AD M IN ISTR AÇÃOM ISSÃO E

GESTÃOESTR ATÉGICA

PIRÂMIDE DE OBJECTIVOS PIRÂMIDE DE COMPETÊNCIAS Tipos de empresas

Poderemos considerar diferentes tipologias para classificar as empresas:

1. Estatuto dos detentores do capital

2. Dimensão

3. Ramo de actividade

4. Predominância dos factores produtivos

5. Âmbito territorial de actuação

6. Nacionalidade

Desenvolvendo alguns destes critérios:

Quanto à dimensão temos:

→ Grandes empresas

→ Médias empresas

→ Pequenas empresas

→ Micro empresas

Critérios

Nível de actividade: volume de negócio, ou volume de operações, nº de trabalhadores,

Património envolvido no negócio: activo líquido total, capitais próprios.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Quanto à actividade temos:

→ Industriais

→ Serviços

Critérios

Principal actividade desenvolvida pela empresa

Quanto à forma de gestão temos:

→ Privadas

→ Públicas

→ Mista

→ Cooperativas

Critérios

Consideração do estatuto do principal accionista.

1.6 -Os Gestores e as suas funções

O Problema

Que actividade é desenvolvem os gestores e os administradores, ou seja em que consiste o

“trabalho” de gestão?

De acordo com os postulados clássicos diríamos que:

planeiam,

organizam,

lideram e

controlam as suas organizações.

Ou talvez não, como o concluem outros autores...

Um dos trabalhos mais interessantes sobre a actividade dos Gestores é da autoria de Henry

Mintzberg.

O Contributo de Mintzberg

De acordo com o autor todos os administradores desenvolvem um conjunto organizado de

actividades mormente de ordem:

interpessoal

informativa

decisória

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Ou seja representam papeis de diferente ordem, que se supra ordenam em função dos objectivos da

organização.

Que papéis interpessoais?

de SIMBOLO

O de LÍDER

O de ELEMENTO DE LIGAÇÃO

O de Símbolo

Personificação dos sucessos e insucessos da organização, o que obriga o administrador a

desenvolver um importante trabalho protocolar.

Ex. saudar, cumprimentar, visitar, almoçar, ocupar tempos livres com iniciativas cooperativas...

O de Líder

Os administradores agem através de terceiros, a liderança é um processo de gestão da

subordinação. Liderar é obter subordinação, usando o poder de que se está investido para obter

obediência e através desta unidade na acção.

O de elemento de ligação

Constantemente os administradores agem no sentido de estabelecer redes internas ou

externas de cooperação que garantem a sobrevivência da organização.

Os Papéis de informação

O DE COLETOR/MONITOR DE INFORMAÇÃO

O DE DISSEMINADOR/DIFUSOR DE INFORMAÇÃO

O DE PORTA VOZ

Os Papéis decisórios

DE ENTREPRENEUR/INOVADOR

DE SOLUCIONADOR DE PROBLEMAS/CONTROLADOR DE TURBULÊNCIAS

DE AFECTADOR DE RECURSOS

DE NEGOCIADOR

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O CICLO DA GESTÃO RECTROACÇÃO

Planeamento

ORGANIZAR LIDERAR

AVALIAÇÃO

CONTROLO

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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TEXTO Nº 2

APTIDÕES DE UM GESTOR EFICAZ de: Robert L. Katz

APTIDÕES DUM ADMINISTRADOR EFICAZ

Embora seja geralmente reconhecido que a selecção e preparação de bons administradores constitui um dos

problemas mais prementes da indústria americana, surpreendente constatar a falta de consenso entre os

executivos e educadores quanto às características que definem um bom administrador. Os programas de

aperfeiçoamento de executivos de algumas das principais empresas e universidades do país reflectem uma

enorme variação de objectivos.

Na base desta diferença, vamos encontrar a procura, por parte da industria, dos traços ou atributos que

permitirão definir objectivamente o "executivo ideal", habilitado a lidar eficazmente com qualquer problema em

qualquer organização. Um observador da indústria americana comentou recentemente:

"A suposição de que existe um executivo - padrão é largamente aceite, tanto aberta como implicitamente.

No entanto, é de presumir que qualquer executivo sabe que uma empresa precisa de vários tipos de

gestores, para diferentes níveis. As qualidades mais necessárias ao encarregado de uma oficina são

provavelmente opostas as exigidas para um vice-presidente coordenador da produção. A literatura referente

ao aperfeiçoamento do executivo está repleta de tentativas de definição das qualidades necessárias aos

executivos e, por si só, elas apresentam-se cheias de lógica. Poucos, por exemplo, poriam em dúvida o facto

de um gestor de topo precisar de possuir uma boa capacidade de julgamento, de capacidade de tomada de

decisões, capacidade para merecer o respeito dos outros e todos os outros  “chavões”  já  gastos  que  qualquer  

homem de negócios poderia mencionar. Mas basta-nos dar uma vista de olhos pelos bons directores de

qualquer empresa para perceber quanto as suas diferentes e particulares capacidades diferem de qualquer

lista ideal das virtudes do executivo"

No entanto, esta busca do estereótipo do executivo tornou-se tão intensa em muitas empresas que, ao

concentrarem-se certas características e qualidades, correm o risco de perder de vista o seu aspecto essencial:

aquilo que um homem pode realizar.

A finalidade deste artigo é apresentar aquilo que poderemos considerar como a maneira mais útil de

abordar a escolha e o aperfeiçoamento de administradores. Esta abordagem baseia-se não tanto naquilo que os

bons executivos são (as suas características pessoais inatas), mas antes naquilo que eles fazem (o tipo de

aptidões demonstram possuir na eficiente execução das suas funções). Tal como utilizadas aqui, aptidões

subentendem uma capacidade que pode ser desenvolvida, não é necessariamente inata, e que se manifesta em

termos de "performance" e não meramente em termos de potencial.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Assim, o principal critério de qualificação do que é uma aptidão devera corresponder à actuação eficaz em

condições variáveis.

Esta abordagem sugere que uma administração eficaz se baseia em três aptidões básicas passíveis de

se desenvolverem, o que logo evita a necessidade de definir características específicas e pode proporcionar

uma maneira útil de observar e compreender o processo de administração. Esta abordagem deriva da

observação directa dos executivos em acção, aliada a estudos em curso sobre administração.

Nas secções que se seguem tentaremos definir e demonstrar o que são estas três aptidões; mostrar que a

importância relativa das três aptidões varia conforme o grau de responsabilidade administrativa; apresentar

algumas das implicações desta variação na selecção, treino e promoção de executivos; e propor formas de

desenvolver estas mesmas aptidões.

A FÓRMULA DAS TRÊS APTIDÕES

Partimos da definição de que um administrador é a pessoa que:

a) dirige as actividades de outras pessoas, e

b) toma a responsabilidade de atingir certos objectivos através do desenvolvimento dessas

actividades.

Dentro desta definição, uma administração bem sucedida parece apoiar-se em três aptidões básicas, a

que chamaremos técnica, humana e conceptual.

Não seria realístico afirmar que estas aptidões não estão inter-relacionadas, no entanto, haverá mérito

em examinar cada uma de per si e desenvolvê-las independentemente.

A aptidão técnica

Tal como a utilizamos aqui, aptidão técnica sugere um conhecimento de, e uma perícia em, um tipo específico

de actividade, particularmente se essa actividade abranger métodos, processos, procedimentos ou técnicas.

É - nos relativamente fácil visualizar a aptidão técnica do cirurgião, do músico, do contabilista ou do

engenheiro, quando cada uma deles está a desempenhar as suas funções. Aptidão técnica implica

conhecimento especializado, capacidade analítica dentro da sua especialidade, e facilidade na utilização das

ferramentas e técnicas da disciplina específica.

Das três aptidões descritas neste artigo, a aptidão técnica é talvez a que nos é mais familiar porque é a

mais concreta e também porque, na nossa era de especialização, é a aptidão mais solicitada ao maior número

de pessoas. A maior parte dos nossos programas de formação vocacional no local de trabalho estão

essencialmente virados para o desenvolvimento desta aptidão técnica especializada.

A aptidão humana

Tal como a utilizamos aqui, aptidão humana é a capacidade do executivo trabalhar eficazmente como membro

de um grupo e de promover uma colaboração dentro da equipa que lidera. Ao passo que a aptidão técnica se

preocupa principalmente em trabalhar com "coisas" (processos ou objectos físicos), a aptidão humana, dirige-se

principalmente ao trabalho com pessoas. Esta aptidão é demonstrada pela forma como um indivíduo percebe (e

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identifica as percepções de) os seus superiores, os seus colegas e os seus subordinados, e a forma como

subsequentemente se comporta.

A pessoa possuidora de aptidão humana bem desenvolvida tem consciência das suas próprias atitudes,

presunções e crenças em relação a outros indivíduos e grupos; é capaz de ver a utilidade e as limitações destes

sentimentos. Ao aceitar a existência de pontos de vista, percepções e crenças diferentes dos seus, está apto a

compreender o que os outros realmente querem dizer através das suas palavras e comportamento. Tem

igualmente a capacidade de comunicar aos outros, nos seus respectivos contextos, aquilo que ele pretende

significar com o seu próprio comportamento.

Uma tal pessoa trabalha no sentido de criar uma atmosfera de aprovação e segurança na qual os

subordinados se sentem livres de se expressar sem receios de censura ou de se ridicularizarem, e isso através

do encorajamento a que participem no planeamento e execução de tudo aquilo que os afecta directamente.

Essa pessoa é suficientemente sensitiva às necessidades e motivações dos outros elementos da sua empresa

para poder ajuizar das possíveis reacções a, e resultados de, várias alternativas de acção que possa vir a

empreender. Devido a essa sensibilidade, ele poderá e virá a actuar duma forma que tenha em conta essas

percepções dos outros.

O verdadeiro talento em trabalhar com outros deve tornar-se numa actividade natural e contínua, já

que isso implica perceptibilidade não só nos momentos de decisão mas também em relação ao comportamento

do indivíduo no dia - a - dia. A aptidão humana não pode ser "uma coisa para de vez em quando". As técnicas

não podem ser aplicadas ao acaso, nem os traços de carácter se podem pôr ou tirar como um sobretudo. E

como tudo o que um executivo diz ou faz (ou deixa por dizer ou por fazer) se vai repercutir nos seus

associados, a sua verdadeira personalidade acaba sempre por transparecer. Donde, para se ser eficaz, esta

aptidão tem que ser desenvolvida natural e inconscientemente, mas também de forma consistente e

demonstrada em todos os actos do indivíduo. Tem que se tornar parte integrante de todo o seu ser.

Porque a aptidão humana desempenha um papel tão vital em tudo o que um administrador faz, é mais

fácil descrever exemplos de atitudes inadequadas do que de performance altamente conseguidas. Talvez a

apreciação de uma situação real sirva para ilustrar o que pretendemos dizer:

Quando se instalou um tapete rolante numa fábrica de sapatos onde, até então, os operários usufruíam

da liberdade de estabelecer o seu próprio ritmo de trabalho, o director da produção pediu ao engenheiro

industrial que projectara o tapete que servisse de encarregado, e isso apesar de lá haver um encarregado

qualificado. O engenheiro, que trabalhava sob as ordens directas do director de produção, protestou; mas

acabou por aceitar o cargo, sob pressão, "até se encontrar um encarregado adequado", apesar de o seu posto

actual ser acima daquelas funções. Travou-se então o seguinte diálogo:

Director de Produção: Tenho tido muita experiência de tapetes rolantes. Quero que mantenha o tapete a

funcionar ininterruptamente, com excepção dos períodos de repouso, e a funcionar a toda a velocidade.

Ponha esta gente a pensar em termos de 2 pares de sapatos por minuto. 70 dúzias de pares por dia, 350

dúzias de pares por semana. Todos eles são operários qualificados nos seus sectores respectivos, e é

apenas uma questão de conseguir que eles trabalhem de maneira ligeiramente diferente. Quero que

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consiga atingir uma média-base de 250 dúzias de pares por semana S " (Esta média-base fora calculada

ligeiramente abaixo da capacidade máxima. Mas era 50% mais elevada do que a do antigo sistema).

Engenheiro: Se vou ser o encarregado do tapete rolante, quero fazer as coisas à minha maneira. Já

trabalhei com tapetes rolantes, e não concordo com a sua teoria de começar por habituar as pessoas à

velocidade máxima. Esta gente nunca viu um tapete rolante. Vai assustá-los. Gostaria de o por a

correr a um terço da velocidade durante umas semanas e então, gradualmente, aumentar a

velocidade.

Acho que devemos começar por estabelecer a média-base (quota de produção abaixo do bónus de

incentivo) num esquema diário em vez de semanal. (Anteriormente os operários eram pagos na base

de peça acabada por dia.)

Sugiro ainda que a média-base diária seja de 45 ou até de 40 dúzias de pares. Tem que se

estabelecer uma média-base suficientemente baixa, para que eles a possam atingir. Assim, logo que

eles reconheçam que podem atingir, esforçar-se-ao por conseguir o bónus.

Director de Produção: Faça como quizer quanto à velocidade; mas não se esqueça de que os

resultados é que contam. Quanto à média-base, não vou discuti-la consigo; estou a dizer-lhe que tem

que atingir as 250 dúzias de pares por semana. Não quero uma média-base diária. "

Temos aqui um caso em que o director de produção estava tão preocupado em obter a produção física

que não prestava qualquer atenção às pessoas através das quais essa produção tinha que ser atingida. Repare-

se, em primeiro lugar, que obrigou o engenheiro que projectara o tapete a servir de encarregado, esperando

aparentemente levá-lo a justificar o seu projecto através da consecução duma produção máxima. No entanto, o

director de produção parecia esquecer

a) que o engenheiro interpretou esta nomeação como uma despromoção, e

b) que o engenheiro precisava de poder controlar as variáveis, já que ficava responsável por uma

produção máxima. Em vez disso, o director de produção impôs uma produção standard e recusou-

se a fazer alterações no ritmo de trabalho.

Além disso, e embora se tratasse de ama situação completamente nova para os operários, o director de

produção pretendia que eles apresentassem de imediato uma produção muito superior à anterior e isso apesar

de os operários irem defrontar-se com um sistema de produção que lhes era desconhece do, de nunca terem

antes trabalhado em equipa, de os operários e o novo encarregado nunca terem trabalhado juntos até ali, e de

o próprio encarregado discordar dos níveis e objectivos de produção. Ao ignorar todos estes factores humanos,

o director de produção não só colocou o engenheiro numa posição delicada e difícil, como também, ao recusar-

lhe "conduzir as coisas à sua maneira", desencorajou qualquer atitude de tomada de responsabilidade que, no

fundo, pretendia, ao nomeá-lo para o cargo.

Nestas circunstâncias, é fácil compreender como se deterioraram as relações entre estes dois

elementos, e como a produção, ao fim de dois meses, se encontrava em apenas 125 dúzias de pares por

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semana (exactamente 75 % do que fora a produção com o antigo sistema).

Aptidão Conceptual

Tal como a utilizamos aqui, aptidão conceptual tem a ver com a capacidade de ver a empresa como um todo;

isso corresponde a reconhecer como as varias funções de uma empresa dependem umas das outras, e como

qualquer alteração em qualquer dos seus sectores se reflecte em todos os outros; e alarga-se a visualizar o

relacionamento da empresa individual com a indústria, com a comunidade, e com as forças políticas, sociais e

económicas da nação em geral. Ao reconhecer este relacionamento è apreender os elementos significativos de

qualquer situação, o administrador fica em posição de actuar por forma a melhorar o bem estar geral de toda a

empresa.

Donde que o sucesso de qualquer decisão dependa da aptidão conceptual das pessoas que tomam as

decisões e das que as põem em execução. Quando, por exemplo, se faz uma alteração importante na política

de marketing, é vital que se considerem os seus efeitos sobre a produção, sobre os serviços de controle,

financeiros e de investigação e sobre as pessoas abrangidas. E mantém-se igualmente vital até ao último

executivo abrangido pela implementação da nova política. Se cada executivo reconhecer o relacionamento geral

e o significado da mudança, será certamente muito mais eficaz a administrá-la. E, consequentemente, muito

maiores são as suas chances de sucesso.

Não é só a coordenação eficaz dos vários sectores da empresa que depende da aptidão conceptual dos

administradores em causa, mas também todo o futuro e o "tom" da organização. As atitudes de gestores de

topo "tonalizam" o carácter geral da capacidade de resposta de uma empresa e determinam a sua

"personalidade empresarial", que distingue a actuação de uma determinada empresa da das outras. Estas

atitudes são o reflexo da aptidão conceptual do administrador (a que alguns chamam de "capacidade criativa" -

a forma como ele se apercebe e reage quanto à direcção em que a empresa se deve expandir, aos objectivos e

políticas da empresa, e aos interesses dos accionistas e dos empregados).

Aptidão conceptual, tal como a descrevemos, é aquilo a que se refere Chester I. Barnard, antigo

presidente da NEW JERSEY BELL TELEPHONE COMPANY, ao dizer : "... o aspecto essencial do processo (da

administração) é o sentir a organização como um todo, e a situação geral em relação a ela." Temos à nossa

volta inúmeros exemplos de falta de aptidão conceptual. Apresentamos seguidamente um caso:

Numa grande fábrica com uma grande tradição de trabalhos por encomenda, a responsabilidade

primária do controle da produção estava entregue aos encarregados e outros supervisores dos escalões

inferiores. Operações do tipo "aldeia" com pequenos grupos de trabalho e organização informal eram a regra.

Logo após a Segunda Grande Guerra, um pesado fluxo de encomendas fez triplicar as necessidades normais de

produção e aumentou severamente a matéria colectável da fábrica. Nessa altura, foi admitido um novo director

de produção que estabeleceu um largo esquema de controlos e formalizou toda a estrutura de produção.

Enquanto durou o "boom", os empregados fizeram todos os esforços para se adaptarem ao novo contexto e

processos. Mas quando a procura baixou para os níveis anteriores a Guerra, surgiram graves problemas

laborais, a fricção era grande entre as chefias de departamentos, e a empresa viu-se a braços com pesados

custos laborais indirectos. A administração optou por regressar ao sistema antigo; despediu o director de

produção e tentou atribuir de novo mais autoridade aos encarregados. No entanto, durante os quatro anos de

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controlo formalizado, os encarregados tinham abandonado os seus velhos hábitos, vários tinham deixado a

empresa, e não se tinham desenvolvido substitutos adequados. Assim, sem a liderança de bons encarregados,

os métodos tradicionais de trabalho por encomenda tornaram-se onerosos e ineficazes.

Neste caso, quando se instalou o novo sistema de controlo de produção e organização formalizada, a

direcção não previu as respectivas consequências no caso só de uma futura redução de actividade. Mais tarde,

quando as condições se alteraram e se tornou necessário reduzir a actividade, a administração outra vez foi

incapaz de prever as implicações da sua actuação e optou pelo antigo sistema que já não era apropriado

naquele momento. A dupla falta de aptidão conceptual deixou a companhia em grave desvantagem

relativamente à concorrência.

Uma vez que o sucesso geral de uma empresa se encontra de pendente da aptidão conceptual dos seus

executivos em determinar e por em execução decisões sobre a política empresarial, esta aptidão é o ingrediente

unificante e coordenador do processo de administração, de alcance global inegável.

IMPORTÂNCIA RELATIVA

É de reparar que, de um modo muito real, a aptidão conceptual engloba os conceitos de aptidão técnica e

aptidão humana dentro da empresa. No entanto, o conceito de aptidão, como a capacidade de converter

conhecimentos em acção, devia permitir-nos fazer a distinção entre as três aptidões: a de levar a cabo as

actividades técnicas (aptidão técnica), a de compreender e motivar os indivíduos e grupos (aptidão humana), e

a de coordenar e integrar todas as actividades e interesses da empresa tendo em vista um objectivo comum

(aptidão conceptual).

Esta divisão de uma administração eficaz em três aptidões básicas é principalmente útil para efeitos de

análise. Na prática, estas aptidões estão tão intimamente interligadas que é difícil determinar onde uma acaba e

a outra começa. No entanto, só porque elas se encontram assim interligadas, não quer dizer que não seja útil

analisá-las separadamente, ou variando a sua ênfase. Ao jogar golfe, a acção das mãos, dos pulsos, das ancas,

dos ombros, dos braços e da cabeça está toda ela interligada; no entanto, para melhorar a tacada, é por vezes

necessário aperfeiçoar um destes elementos separadamente. E também a importância relativa destes elementos

varia em situações diferentes. Do mesmo modo, embora todas três sejam importantes a todos os níveis

administrativos, as aptidões técnica, humana e conceptual do administrador variam em importância relativa nos

diferentes níveis de responsabilidade.

Nos escalões inferiores

A aptidão técnica é responsável por muitos dos grandes avanços da indústria moderna e indispensável a uma

actividade eficiente. No entanto, é mais importante nos escalões inferiores de administração. A medida que o

administrador se afirmar cada vez mais da produção física, esta aptidão técnica torna-se progressivamente

menos importante, desde que tenha subordinados capazes e possa ajudá-los a resolver os seus próprios

problemas. No topo da cadeia hierárquica, a aptidão técnica pode ser quase nula e no entanto o executivo ser

capaz de um desempenho eficiente, se tiver aptidão humana e conceptual apuradas. Por exemplo:

Numa grande empresa produtora de bens de primeira necessidade, o "controller" foi nomeado para

substituir o vice-presidente de produção que fora subitamente acometido de doença grave. O  “controller”  não  

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tinha qualquer experiência de produção, mas trabalhava na companhia há mais de vinte anos e conhecia de

perto muitos dos principais elementos da produção. Ao nomear um corpo de consultores e delegar um invulgar

grau de autoridade nos seus chefes de departamento, pôde dedicar-se ele próprio à coordenação das várias

funções. Deste modo, conseguiu formar uma equipa altamente eficiente. Os resultados traduziram-se em

custos mais baixos, maior produtividade, e um moral muito superior ao que alguma vez existira na divisão da

produção. A administração apostara na capacidade deste homem de trabalhar com as pessoas como mais

importante do que a sua falta de prática na produção técnica... e ganhara a aposta.

Temos inúmeros outros exemplos à nossa volta. Todos nós conhecemos aqueles "directores

profissionais" que se estão a tornar nos protótipos do nosso moderno mundo executivo. Estes homens

transitam com grande à vontade de uma indústria para outra, aparentemente - sem qualquer perda de

eficiência. As suas aptidões humana e conceptual parecem compensar perfeitamente a sua falta de

familiaridade com os aspectos técnicos do seu novo emprego.

Em todos os escalões

A aptidão humana - a capacidade de trabalhar com os outros - é essencial para uma eficaz administração a

todos os níveis. Um estudo recente provou que a aptidão humana é de importância primordial ao nível do

encarregado, fazendo notar que a principal função do encarregado, como administrador, é conseguir a

colaboração entre os elementos de um grupo de trabalho. Um outro estudo reforça este ponto de vista

alargando-o ao grupo administrativo intermédio, acrescentando que o administrador deve essencialmente

preocupar-se em facilitar a comunicação adentro da organização. E um outro estudo, ainda que dedicado

sobretudo ao escalão superior de administração, minimizou a necessidade de auto observação e de sensibilidade

às relações humanas por parte dos executivos desse escalão. Todos estes pontos de vista parecem indicar que

a aptidão humana é de grande importância a todos os níveis, mas repare-se nas diferenças de ênfase.

A aptidão humana parece ser mais importante nos escalões inferiores, em que o número de contactos

directos entre administradores e subordinados é mais elevado. Conforme se vai subindo nos escalões

hierárquicos da administração, o número e frequência destes contactos pessoais diminui, e a necessidade de

aptidão humana torna-se proporcionalmente menor, embora não em absoluto desnecessária. Ao mesmo tempo,

torna-se progressivamente mais importante a aptidão conceptual, face à necessidade de decisões de política

empresarial e acção em larga escala. Neste ponto, a aptidão humana para lidar com as pessoas fica

subordinada ã aptidão conceptual de integração dos interesses e actividades do grupo num todo.

Com efeito, um recente trabalho de pesquisa pelo Prof. Chris Argyris da Universidade de Yale, dá-nos o

exemplo de um director de fábrica extremamente eficiente, o qual, apesar de possuir tão pouco aptidão

humana como se verá, foi mesmo assim muito bem sucedido:

Este director, chefe duma divisão muito autónoma, através da sua forte personalidade e da "pressão"

exercida, tornou os seus supervisores altamente dependentes de si próprio no que respeitava a "recompensas,

penalizações, autoridade, perpetuação, comunicação e identificação".

Como resultado, os supervisores passavam a vida a competir uns com os outros pela preferência do

director. Só lhe contavam aquilo que achavam que ele queria ouvir, e passavam a maior parte do tempo a

tentar descobrir o que ele quereria. Dependiam dele para a definição dos seus objectivos, e a maneira de os

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atingir. Como o director era inconsistente e de comportamento imprevisível, os supervisores sentiam-se

inseguros, e envolviam-se continuamente em disputas interdepartamentais que escondiam do director.

É óbvio que faltava aqui a aptidão humana. No entanto, segundo a avaliação dos seus superiores e

devido aos resultados obtidos no aumento de eficiência, dos lucros e do moral, este director era altamente

eficaz. O Prof. Argyris sugere que os empregados das modernas organizações industriais têm uma certa

tendência para criar um clima de dependência nos seus superiores, dependência essa que indivíduos atentos e

hábeis conseguem utilizar em seu proveito.

Dentro do contexto da fórmula das três aptidões, parece que este director conseguiu tirar proveito

desta dependência na medida em que percebeu o inter-relacionamento de todas as actividades sob o seu

controle, se identificou com a empresa e sublimou os interesses individuais dos seus subordinados em relação

aos seus (da empresa) interesses, definiu os seus objectivos realisticamente, e mostrou aos seus subordinados

a forma de os atingir. Isto parece-nos um excelente exemplo duma situação em que uma forte aptidão

conceptual compensou largamente a ausência de aptidão humana.

No escalão superior

A aptidão conceptual, tal como se viu nas secções precedentes, torna-se cada vez mais crucial nos postos

executivos de maior responsabilidade, onde os seus efeitos são maximizados e mais facilmente observados.

Aliás, pesquisas recentes levam à conclusão de que no escalão superior de administração esta aptidão

conceptual se torna a mais importante de todas. Como disse Herman Wi-Steinkraus, presidente da

BRIDGEPORT BRÁS S COMPANY:

"Uma das lições mais importantes que aprendi neste cargo (a presidência) é a importância de coordenar os

vários departamentos para que formem uma equipa eficaz, e, em segundo lugar, a alternância de ênfase,

de tempos a tempos, sobre a importância dos vários departamento relativamente à empresa. "

Parece, assim, que nos escalões inferiores da responsabilidade administrativa, são mais necessárias as aptidões

técnica e humana. Nos escalões mais elevados, a aptidão técnica torna-se relativamente menos importante,

enquanto que aumenta rapidamente a necessidade de aptidão conceptual. No escalão superior duma

organização, a aptidão conceptual torna-se a mais importante de todas para uma administração bem sucedida.

Um executivo-chefe pode ser falho de aptidões técnica e humana e ser na mesma eficaz se tiver subordinados

com fortes capacidades nesses campos. Mas se possuir fraca aptidão conceptual, poderá pôr em perigo toda a

organização.

IMPLICAÇÕES SOBRE A ACÇÃO

Esta fórmula das três aptidões sugere que poderão resultar notáveis benefícios da redefinição dos objectivos

dos programas de aperfeiçoamento de executivos, através da redefinição da colocação de executivos nas

empresas e da revisão dos procedimentos de avaliação e selecção dos futuros executivos.

Aperfeiçoamento de Executivos

Muitos programas de aperfeiçoamento de executivos podem não estar a atingir resultados satisfatórios pela sua

incapacidade de estimular o desenvolvimento destas aptidões administrativas. Os programas que se

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concentram na mera transmissão de informação ou no aprimoramento de características específicas mostrar-se-

iam largamente improdutivos na sublimação das aptidões administrativas dos candidatos.

Um director de uma grande companhia responsável pelas actividades de aperfeiçoamento dos

executivos da sua empresa descrevia-me recentemente da seguinte forma um programa exclusivamente

informativo:

"O que nós estamos a tentar é juntar os nossos jovens mais promissores com os nossos executivos

mais velhos, em reuniões mensais regulares. E então os jovens podem fazer perguntas sobre os antecedentes

da empresa e “como” e porquê as coisas se faziam dantes."

Nada nos surpreende que nem os executivos mais velhos nem os jovens sentissem que este programa

lhes trazia qualquer melhoria das suas capacidades administrativas. A futilidade de insistir em características

específicas torna-se evidente se repararmos no comportamento dum administrador num certo número de

situações. Ao lidar com estas diferentes situações, ele pode por vezes demonstrar uma característica num caso

- por exemplo, dominador em relação aos subordinados, e uma atitude diametralmente oposta num outro

conjunto de circunstâncias - por exemplo, permissividade face aos seus superiores. E no entanto, em cada

caso, estará provavelmente agindo da .forma mais apropriada para atingir os melhores resultados. Qual, então,

deveremos nós considerar como a característica desejável? Seguidamente, mais um exemplo deste dilema:

Um director de vendas duma empresa da Costa do Pacifico tinha grande reputação de determinação e

dinamismo. No entanto, quando lhe pediram que designasse um assistente substituto de entre os seus vários e

qualificados subordinados, ele esquivou-se deliberadamente a tomar uma decisão. Os seus colegas rapidamente

repararam naquilo que parecia uma obvia incapacidade de decisão.

Mas ao fim de vários meses tornou-se claro que ele tinha estado, discretamente, a dar aos vários

vendedores a oportunidade de demonstrarem as suas atitudes e sentimentos. Consequentemente, foi-lhe

possível descobrir uma forte inclinação por um homem cuja subsequente promoção foi entusiasticamente aceite

por todo o grupo.

Neste caso, a habilidosa táctica do director de vendas fora indevidamente interpretada como

"incapacidade de decisão". A preocupação dos seus parceiros com características irrelevantes levou-os a

negligenciar a sua meritória actuação. Não teria sido mais apropriado concluir que o seu talento humano no

lidar com os outros lhe tinha permitido adaptar-se eficazmente aos requisitos duma situação nova?

Casos como este servem para demonstrar que mais vale julgar um administrador pelos resultados da

sua "performance" do que pelas suas características aparentes. As aptidões são mais fáceis de identificar do

que as características, e têm menos probabilidades de ser mal interpretadas. Além disso, as .aptidões

constituem um ponto de referência de melhor aplicação directa para o aperfeiçoamento do executivo, já que

qualquer melhoria nas aptidões dum administrador resultará necessariamente numa actuação mais eficaz.

Ainda um outro perigo em muitos dos existentes programas de aperfeiçoamento de executivos encontra-

se no injustificado entusiasmo com que algumas empresas e universidades se lançaram em cursos de "relações

humanas". Parece haver aqui dois riscos inerentes:

1. Os cursos de relações humanas podem estar apenas a transmitir informação ou técnicas

específicas, em vez de desenvolverem a aptidão humana dum indivíduo;

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2. Mesmo que se verifique um aperfeiçoamento individual, algumas empresas podem estar a

esquecer es requisitos de treino para posições cimeiras ao colocar toda a ênfase na aptidão

humana. Podem correr o risco de produzir homens com uma aptidão humana altamente

desenvolvida, mas falhos da aptidão conceptual que lhes permitiria tornarem-se administradores

eficazes.

Pareceria, então, importante que o treino dum candidato a um posto administrativo fosse dirigido para o

desenvolvimento das aptidões de que mais necessitara no nível de responsabilidade para que esta a ser

considerado.

Colocação de Executivos

Este conceito das três aptidões sugere de imediato a possibilidade de se criarem equipas de administração

constituídas por indivíduos com aptidões complementares. Por exemplo: uma empresa retalhista do

Centro-Oeste, de dimensão média, tem como presidente um homem de invulgar aptidão conceptual mas com

uma aptidão humana extremamente reduzida. No entanto, tem dois vice-presidentes com aptidão humana

excepcional. Estes três homens constituem uma comissão executiva que se tem evidenciado pelo seu êxito, pois

as aptidões de cada um dos seus membros compensam as deficiências dos outros. Talvez seja também de

assinalar o plano de direcção por "liderança conjunta" constituída por dois elementos, propôs to por Robert P.

Bales, segundo o qual um dos líderes mantêm a "chefia das operações" enquanto o outro assegura a "chefia

social".

Selecção de Executivos

Hoje em dia vem-se recorrendo muito a vários tipos de testes para tentar predeterminar as capacidades de

um possível candidato a um determinado lugar. Os executivos vêm sendo testados a tudo, desde a

"capacidade de decisão" à "conformidade". Estes testes, como o indicava um recente artigo da "FORTTUNE",

deram resultados muito duvidosos no que respeita à actuação "em campo". Não seria muito mais produtivo

preocuparmo-nos mais com aptidão na prática do que com um número de características que não dão

garantias no desempenho?

Esta fórmula das três aptidões toma os testes de carácter desnecessários e substitui-os por

procedimentos que examinam a capacidade de um indivíduo lidar com os problemas e situações reais que virá a

encontrar no seu trabalho Estes procedimentos, que indicam o que é que um indivíduo pode fazer em situações

específicas, são os mesmos tanto para a selecção como para a avaliação do aperfeiçoamento. Serão descritos

mais abaixo, no capítulo sobre o aperfeiçoamento dos talentos do executivo.

Esta fórmula sugere que os executivos não devem ser escolhidos com base na sua aparente posse de um certo

número de características de comportamento, mas sim com base na sua posse das aptidões necessárias para o

nível específico de responsabilidade a que se destinam.

APERFEIÇOANDO AS APTIDÕES

Já há anos que muita gente argumenta, que a capacidade de chefia é inerente a uns quantos indivíduos.

Referimo-nos a "chefes-natos", "executivos-natos", "vendedores-natos". É indubitável que algumas pessoas

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possuem naturalmente, ou de forma inata, maior aptidão ou capacidade em certos campos. Mas as pesquisas

psicológicas e fisiológicas também indicam, primeiro, que aqueles que possuem fortes aptidões ou capacidades

podem aperfeiçoar a sua aptidão pela prática e formação; em segundo lugar, que mesmo aqueles que não

possuem essa capacidade inata podem melhorar o seu performance e eficácia geral.

A noção de aptidão de administração sugere que podemos esperar melhorar a nossa eficácia

administrativa e preparar melhores administradores para o futuro. Esta noção de aptidão subentende "learning

by doing", isto é, aprender fazendo. As pessoas são diferentes aprendem de maneiras diferentes, mas as

aptidões são desenvolvidas através da prática é relacionadas a aprendizagem com a experiência pessoal e os

antecedentes de cada um. Se for bem feito, o treino nestas aptidões básicas administrativas deverá desenvolver

capacidades executivas mais seguramente e mais rapidamente do que através de qualquer experiência

desorganizada. Quais são, então, algumas das formas de levar a cabo esta formação?

Aptidão Técnica

O desenvolvimento da aptidão técnica tem merecido grande atenção, desde há muitos anos, por parte tanto da

indústria como das instituições de ensino, e muitos progressos se tem feito. Uma boa instrução básica dos

princípios, estruturas e processos da especialidade individual, aliada à própria prática e experiência, durante as

quais o indivíduo é observado e ajudado por um superior, parece ser o sistema mais eficaz. Dada a vasta

quantidade de trabalho dedicado ã formação das pessoas nas aptidões técnicas, desnecessário seria alargarmo-

nos sobre o assunto neste artigo.

Aptidão Humana

A aptidão humana, no entanto, tem sido muito menos compreendida, e só recentemente se vêm fazendo

progressos sistemáticos no seu desenvolvimento. Várias universidades e profissionais dos nossos dias vêm

adoptando muitas e diferentes formas de desenvolver a aptidão humana. Todas estas fórmulas têm as suas

raízes em disciplinas tais como a psicologia, a sociologia e a antropologia.

Algumas destas fórmulas encontram a sua aplicação na "psicologia aplicada", no "engineering humano",

e em toda uma série de outras manifestações que exigem que técnicos especializados ajudem o homem de

negócios nos seus problemas humanos. Como aspecto prático, no entanto, o executivo deverá aperfeiçoar a

sua própria aptidão humana, de preferência a ter que recorrer a conselhos alheios. Para ser eficaz, convirá que

desenvolva o seu próprio ponto de vista em relação à actividade humana, por forma a:

a) identificar os sentimentos e opiniões que ele próprio traz a uma situação;

b) ter uma atitude em relação às suas próprias experiências que lhe permita reavaliá-las e tirar

delas ensinamentos;

c) desenvolver a capacidade de compreender o que os outros estão a tentar comunicar-lhe

(explicita ou implicitamente) através das suas palavras e actos; e

d) desenvolver a capacidade de conseguir com êxito comunicar aos outros as suas ideias e atitudes.

Alguns indivíduos conseguem desenvolver esta aptidão humana sem qualquer formação formal específica.

Outros poderão ser ajuda dos individualmente pêlos seus superiores imediatos, como parte integrante do

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processo de "preparação" que descreveremos mais adiante. Como é óbvio, esta ajuda, para ser eficaz,

dependerá do grau de aptidão humana que o superior possuir.

Para grupos maiores o uso do método dos casos, aliado a "role-playing" improvisado, pode ser muito

mais eficaz. Esta formação pode ser feita numa base formal ou informal, mas de vê ser orientada por um

instrutor qualificado e requer uma sequência de actividades organizada. Constituirá uma aproximação da

realidade tão boa quanto possível numa sala de aulas, e fornecerá uma oportunidade de reflexão crítica que

nem sempre se apresenta na vida real. Um dos aspectos importantes do processo é a auto-análise dos

conceitos e valores do próprio educando, que poderá permitir-lhe o desenvolvimento de atitudes mais úteis em

relação a si próprio e aos outros. Com essa mudança de atitude, é de esperar que talvez lhe apareça também

uma aptidão activa para tratar os problemas humanos.

A aptidão humana também já foi testada em salas de aulas, dentro de limites razoáveis, através de

uma série de análises de descrições detalhadas de situações reais abarcando decisões de administração,

simultaneamente com várias oportunidades de desempenho de papéis em que se pediu ao indivíduo que

interpretasse em pormenor a actuação que sugerira. Deste modo pôde ser avaliada a percepção que o indivíduo

teve da situação gerai, e a sua própria capacidade de a resolver.

No emprego propriamente dito, não deverão faltar oportunidades de um superior observar a

capacidade de um indivíduo trabalhar eficazmente com os outros. As avaliações, aqui, poderão parecer

altamente subjectivas e a sua validade dependente da aptidão humana do avaliador. Mas, no fundo, e em

última análise, toda e qualquer promoção não dependerá ela sempre da apreciação subjectiva de alguém? E

devemo-nos censurar essa subjectividade, ou, pelo contrário, fazer um esforço maior para aperfeiçoar pessoas

dentro das nossas empresas cuja aptidão humana lhes permitirá fazer apreciações eficazes?

Aptidão Conceptual

A aptidão conceptual, tal como a aptidão humana, não tem sido bem compreendida em geral. Têm sido

experimentados vários métodos de aperfeiçoamento desta aptidão, com êxito variável. A maior parte dos

melhores resultados foram conseguidos através da "preparação" de subordinados pêlos seus superiores. Isto

não é uma ideia nova. Isto implica, sim, que uma das principais responsabilidades do executivo é ajudar os

seus subordinados a desenvolver o seu potencial administrativo. Uma das formas de um superior ajudar à

"preparação" do seu subordinado é atribuindo-lhe uma determinada responsabilidade, e depois corresponder

com perguntas explorativas e opiniões, de preferência a dar respostas, cada vez que o subordinado solicitar a

sua ajuda. Quando "Benjamin F. Fairless era presidente-executivo da UNITED STATES STEEL CORPORATION

(agora é presidente do Conselho de Administração), eis como descrevia a sua actividade de "preparação":

"Quando um dos meus vice-presidentes, ou o chefe de uma das nossas companhias de operações, me vem

pedir inspiração, eu respondo-lhe geralmente contrapondo perguntas. Às tantas, está ele próprio a dizer-me

como resolver o problema."

É evidente que este é um processo ideal e inteiramente natural de treino administrativo, e que se aplica

tanto ao desenvolvimento da aptidão técnica e humana como da conceptual. No entanto, o seu êxito depende

necessariamente das capacidades e da boa vontade do superior em ajudar o subordinado. Outra excelente

maneira de desenvolver a aptidão conceptual é trocando de funções, isto é, fazendo rodar pelas diferentes

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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funções da empresa os jovens mais promissores, mas sempre no mesmo nível de responsabilidade. Isto dá ao

indivíduo a oportunidade de, literalmente, "se colocar no lugar do outro".

Há outras possibilidades que incluem: tarefas, especiais, muito particularmente do tipo que envolvam

problemas interdepartamentais? e reuniões da direcção, tais como o plano de Administração Múltipla da

McCORMICK, no qual os executivos mais novos servem de conselheiros à Direcção Geral sobre assuntos de

política empresarial.

Para grupos maiores, o tipo de curso por método dos casos anteriormente descrito pode ser útil, mas

utilizando apenas casos que abranjam política geral de administração e coordenação interdepartamental. Os

cursos deste tipo, geralmente denominados "Gestão Geral" ou "Política de Empresa" vão-se generalizando cada

vez mais.

Também nas salas de aula a aptidão conceptual vem sendo avaliada com razoável eficácia, através da

apresentação de descrições detalhadas de situações concretas e complexas. Nestas, é pedido ao indivíduo que

está a ser examinado que defina uma modalidade de acção que se ajuste às condições subjacentes de cada

situação, e que tome em consideração as implicações dessa acção nas várias funções e sectores da empresa e

no seu meio envolvente.

No emprego, um supervisor atento terá certamente inúmeras oportunidades de observar até que ponto

o indivíduo é capaz de se conjugar a si e ao seu trabalho, com as outras funções e actividades da empresa.

Tal como a aptidão humana, também a aptidão conceptual deve tornar-se uma parte natural, integrante, da

caracterização do executivo. Poder-se-iam indicar diferentes métodos para o aperfeiçoamento de pessoas

diferentes, em função dos seus antecedentes, atitudes e experiência. Mas em qualquer desses casos, deverá

ser escolhido o método que melhor permitirá ao executivo desenvolver a sua aptidão pessoal de "visualizar a

empresa como um todo e de coordenar e integrar as suas várias partes.

Conclusão

A finalidade deste artigo foi a de demonstrar que uma administração eficaz depende de três aptidões pessoais

básicas, que denominámos de técnica, humana e conceptual. O administrador devera possuir:

a) aptidão técnica suficiente para executar a parte mecânica dum determinado trabalho de que é

responsável;

b) aptidão humana suficiente no trabalho com outras pessoas, por forma a tomar-se um eficaz

membro de grupo e a conseguir criar um esforço de cooperação adentro da equipa de chefia;

c) aptidão conceptual suficiente para identificar o inter-relacionamento dos vários factores envolvidos

na sua posição, o que o levara a determinar a acção que provavelmente obterá os melhores

resultados para toda a organização.

A importância relativa destas três aptidões parece variar com o nível de responsabilidade administrativa.

A níveis inferiores, são principalmente necessárias as aptidões técnica e humana. A níveis superiores, a eficácia

do administrador depende sobretudo das aptidões humana e conceptuais. No topo, a aptidão conceptual torna-

se a mais importante de todas para uma administração bem sucedida.

Esta fórmula das três aptidões faz notar que um bom administrador não o é desde o berço; essa

capacidade pode ser cultivada. Ela transcende a necessidade de descobrir características específicas,

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

32

esforçando-se antes por encontrar uma forma mais útil de ver o processo de administração. E como ajuda a

determinar as "aptidões mais necessárias aos diferentes níveis de responsabilidade, pode tornar-se muito mais

útil, na selecção, formação e promoção de executivos.

COMENTÁRIO RETROSPECTIVO

Quando da primeira publicação deste artigo, ha quase 20 anos, havia grande tendência no sentido de se tentar

estabelecer um conjunto ideal de traços de carácter que permitiria distinguir de imediato uma potencial aptidão

executiva. A procura desse tipo de personalidade prosseguia energicamente na esperança de se poder levar a

cabo de forma mais segura a selecção e a formação de administradores.

A finalidade deste artigo foi a de tentar chamar as atenções para aptidões visíveis de "performance",

em vez de para as características inatas / aptidões de administração. E, ao descrever os três tipos de aptidões

(técnica, humana e conceptual), tentamos também realçar a importância da aptidão conceptual como sendo a

capacidade de administração unicamente valida e isto muito antes de o conceito de estratégia empresarial ter

sido bem definido e largamente difundido.

Continua a parecer-nos útil pensar em capacidade de administração em termos destas três aptidões

básicas. E continuamos a achar que a importância relativa destas aptidões varia com o nível de administração

do indivíduo dentro da empresa. Por outro lado, a minha experiência ao longo dos últimos 20 anos, em que

trabalhei lado-a-lado com os principais executivos de uma vasta gama de indústrias, sugere que certos pontos

específicos precisam de ser ou drasticamente modificados ou substancialmente retocados.

Aptidão Humana

Presentemente, sou da opinião que este tipo de aptidão poderá vantajosamente subdividir-se em:

a) capacidade de liderança na sua própria unidade, e

b) aptidão para as relações inter-grupos.

Pela minha experiência, pude constatar que uma elevada capacidade num destes casos corresponde

frequentemente a um desempenho medíocre no outro.

Muitas vezes, os chefes de departamento mais eficientes internamente são os que se dedicaram de

corpo e alma apenas aos valores e critérios das suas funções especializadas, sem reconhecerem que os

diferentes valores de outros departamentos podem ser minimamente válidos. Por exemplo, um director de

produção pode ser altamente eficiente ao por toda a ênfase na obtenção de um elevado grau de confiança nos

seus prazos de produção. Esse director vai opor-se a todas as pressões externas que dêem maior prioridade a

outros critérios que não o da entrega do produto no prazo estipulado. Ou então teremos o caso do director de

vendas muito eficiente que põe toda a ênfase em manter relações positivas com os clientes. Este director irá

fazer resistência a todas as pressões que pretendam pôr a ênfase noutros valores tais como facilidade de

produção ou venda de produtos com margem de lucro mais elevada. Em qualquer destes casos, o director

contará provavelmente com o apoio enérgica dos seus subordinados, que partilham a mesma escala de valores.

Mas irá defrontar-se com um forte antagonismo por parte de outros departamentos com valores incompatíveis.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Na medida em que os valores de dois departamentos estejam em conflito, uma habilidosa relação inter-grupos

terá que recorrer a certas soluções de compromisso. Mas estas concessões são frequentemente interpretadas

como "traição" pelos subordinados departamentais. Assim, o director vê-se obrigado a escolher entre manter o

apoio total dos seus subordinados ou desfrutar da inteira colaboração dos seus pares e/ou superiores. Obter as

duas coisas raramente é possível. Consequentemente, sou forçado a rever a minha inicial avaliação do factor

humano, afirmando agora que as aptidões internas intra-grupo são essenciais nos cargos administrativos dos

escalões inferior e intermédio, e que as aptidões inter-grupo se tornam progressivamente mais importantes

nos escalões sucessivamente mais elevados da administração.

Aptidão Conceptual

Olhando para trás, vejo agora que aquilo a que chamei aptidão conceptual depende inteiramente duma forma

específica de visualizar a empresa. Este "ponto de vista de gestão geral" como se tornou conhecido, implica

pensar sempre em termos de: ênfases e prioridades relativas entre objectivos e critérios conflituantes?

Tendências e probabilidades relativas (em vez de "certezas"); duras correlações e normas entre os elementos

(em vez de relações causa-efeito perfeitamente definidas).

Sou agora muito menos categórico quanto à medida em que esta forma de pensar pode ser

desenvolvida no próprio trabalho. A não ser que uma pessoa tenha aprendido a pensar desta maneira desde

muito cedo, é irrealista esperar que uma grande mudança se verifique ao atingir o "status" de executivo. A

rotação de funções, tarefas especiais inter-departamentos, e o trabalhar com casos, tudo isso fornecera

certamente oportunidades de uma pessoa aperfeiçoar capacidades conceptuais anteriormente adquiridas. Mas

pergunto-me ate que ponto esta forma de pensar poderá ser inculcada numa pessoa já saída da adolescência.

Sob este prisma, então, talvez a aptidão conceptual deva ser considerada como uma capacidade inata.

Aptidão Técnica

Na versão original do artigo, alvitrei que aptidões técnicas específicas são irrelevantes nos níveis superiores de

gestão. Citei, como prova disso, a facilidade com que muitos gestores transitam de uma indústrias para as

outras sem qualquer perda aparente de eficiência.

Presentemente, sou da opinião de que esta mobilidade só é possível nas empresas muito grandes, onde o

director-geral dispõe, a nível de toda a organização, do apoio dum vasto "staff" e de técnicos altamente

competentes e experimentados.

Uma grande empresa já estabelecida há muitos anos atingiu uma boa velocidade de cruzeiro que

permite ao novo director-geral dedicar a sua atenção a decisões estratégicas.

Penso que nas empresas mais pequenas, em que a perícia técnica não é tão dominante, e onde se não dispõe

de tanto "staff" experimentado, o director geral precisa de muito mais experiência pessoal no ramo. Ele precisa

não só de saber quais as perguntas certas a fazer aos seus subordinados, como também tem de conhecer

suficientemente bem os antecedentes da empresa e do ramo para poder sopesar convenientemente as suas

respostas.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Papel desempenhado pela Direcção Geral

No artigo de origem, expressei um ponto de vista demasiado simplista e ingénuo em relação ao papel do

director geral. Os meus longos anos de trabalho com presidentes de empresas, e a minha própria experiência

pessoal como director geral, fizeram-me olhar com muito mais respeito para as dificuldades e complexidade

desse papel. Sei agora que toda e qualquer decisão importante, por ter que atingir o equilíbrio entre tantos

valores, objectivos e critérios antagónicos, será sempre considerada "suboptimal" quando analisada sob um

qualquer prisma isolado. Toda e qualquer decisão ou escolha abrangendo a empresa como um todo, terá

efeitos negativos sobre alguns dos seus sectores.

O director geral tem que tentar aperceber-se dos conflitos a prever com exactidão o seu provável

impacto através da organização. Relutante mas deliberadamente, ele poderá ter que sacrificar os interesses de

um só sector a favor do bem do todo. Ele tem que ter abertura para aceitar soluções adequadas e exequíveis

para o contexto total, de preferência as soluções elegantes ou ideais dum ponto de vista único.

O director geral tem que ser não só um executante eficiente como também um estratega eficaz. É a ele que

cabe a responsabilidade de estabelecer o enquadramento e o rumo das operações da empresa em geral.

Compete-lhe determinar continuamente em que campos a empresa devera colocar a ênfase, em termos de

produtos, de serviços, e de clientes. Tem que definir critérios de "performance" e determinar as competências

distintivas que a companhia devera evidenciar. Precisa, também, de fixar prioridades e "timings". Tem que

estabelecer as normas e os controles, necessários para vigiar a boa marcha, e fixar limites ã actuação

individual. E tem ainda que obter para a empresa os recursos adicionais sempre que necessários.

Além de tudo isto, o director geral tem que saber mudar o seu estilo de gestão e jogar com o equilíbrio

entre as suas diferentes capacidades, de acordo com a alteração de condições ou consoante o crescimento da

sua empresa em tamanho e complexidade. O papel terapêutico (salvar a empresa quando esta se encontre em

situação difícil) exige acção humana drástica e faz sobressair as aptidões conceptual e técnica. O papel de

manutenção (conservar a empresa na sua posição actual) faz realçar a aptidão humana e exige apenas

modestas alterações técnicas e estratégicas. Mas o papel inovador (desenvolver e expandir a empresa) exige

elevada competência tanto ao aspecto conceptual como no de acção inter-grupo, sendo a contribuição técnica

fornecida primordialmente pêlos subordinados.

Na minha opinião, é impossível uma pessoa desempenhar bem todos estes papeis - em constante

mutação, sem qualquer ajuda. Por outro lado, como uma eficaz gestão da empresa como um todo envolve uma

constante sub-optimização, é impossível ao director geral conseguir o apoio contínuo e unânime de todos os

seus subordinados. Se for demasiadamente amistoso ou paterna lista poderá comprometer a sua eficácia ou a

sua objectividade.

No entanto, ele precisa de ter, algures dentro da empresa, um conjunto de indivíduos bem informados,

objectivos, compreensivos e apoiantes, com os quais possa livremente discutir/analisar as suas dúvidas, receios

e aspirações. Por vezes esta função poderá ser desempenhada por um director externo, um consultor externo,

ou pelo auditor da empresa. Mas um tal confidente precisa de possuir aptidões conceptuais e humanas tão

elevadas quanto as do próprio director geral; e, para ser de real utilidade, tem de conhecer a fundo a actividade

da empresa, o seu pessoal chave, e o sector de actividade. Este papel, regra geral, tem sido muito esquecido

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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na discussão/análise de requisitos organizacionais, nas, na minha opinião, o seu correcto desempenho é

essencial para o êxito do director geral e da empresa.

Conclusão

Apercebo-me agora muito melhor de que os gestores a todos os níveis necessitam de alguma competência em

cada uma das três aptidões. Ate os responsáveis de nível mais baixo terão continuadamente de as utilizar. Lidar

com as exigências externas relativas ao departamento de um director requer uma aptidão conceptual; as

limitações dos recursos físicos e financeiros postos à sua disposição põem à prova a sua aptidão técnica; e as

capacidades e exigências das pessoas com quem lida tornam essencial que possua aptidão humana.

Um claro entendimento destas aptidões e das formas de medir a competência de um gestor em cada nível

continua a parecer-me o instrumento mais eficaz do escalão superior, não só para compreender o

comportamento do executivo, mas também para a selecção, formação e promoção de directores a todos os

níveis.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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TEXTO Nº 3

ADMINISTRAÇÃO CONTINGENCIAL DA EMPRESA de: Idalberto Chiavenato

INTRODUÇÃO

As empresas constituem hoje uma das mais maravilhosas e complicadas invenções do génio criativo do homem.

As pessoas costumam admirar as maravilhosas e incríveis criações da moderna tecnologia, mas geralmente se

esquecem de que toda essa tecnologia é inventada, criada, projectada, dimensionada, produzida e

implementada dentro de empresas. As empresas constituem uma das mais complexas e multifacetadas

invenções do homem. Elas se manifestam sob diferentes formas e tamanhos extremamente variados. Elas se

dirigem para objectivos diversos e escolhem ramos de actividades que as levam a produzir produtos ou serviços

multivariados, operando em mercados diferentes. Basicamente, a Administração interpreta os objectivos

propostos pela empresa e os transforma em acção empresarial através de planeamento, organização, direcção

e controle de todos os esforços realizados em todas as áreas e em todos os níveis da empresa, a fim de

garantir o alcance daqueles objectivos. Assim, a administração se preocupa com a eficácia - quando está

voltada para o alcance dos objectivos empresariais - e se preocupa com a eficiência - quando está voltada para

o pleno proveito dos esforços realizados em todas as áreas e em todos os níveis da empresa. O significado e a

amplitude da palavra administração sofreu um formidável aprofundamento e ampliação nos últimos 80 anos. E

o administrador - seja ao nível da dirigente de empresa, gerente de departamento ou supervisor de secção -

passou a ser uma figura indispensável em todos os tipos possíveis de organizações humanas.

Provavelmente, uma das melhores maneiras de se mostrar o aprofundamento e ampliação do

significado da administração, seria percorrer rapidamente a sua trajectória e traçar em rápidas pinceladas os

passos gradativas da chamada teoria administrativa.

OS CINCO MOMENTOS DA TEORIA ADMINISTRATIVA

De facto. a teoria administrativa é uma teoria em crescente expansão e gradativamente abrangente. Começou

como uma teoria de sistema fechado, voltada inicialmente para alguns poucos aspectos e variáveis situados

dentro da empresa e preocupada exclusivamente com os problemas mais concretos e imediatos do ponto de

vista de sua aplicação e foi paulatinamente expandindo e ampliando o seu objectivo de estudo.

Essa expansão e ampliação não se apresenta de maneira uniforme, mas variando enormemente de

acordo com as escolas e teorias administrativas, e de acordo com os aspectos e variáveis que cada uma delas

considerou relevantes na sua época, para fundamentar as suas conclusões ou para solucionar os problemas

então mais importantes com que se defrontavam. No fundo, a teoria administrativa apresenta cinco momentos

bastante distintos em sua complicada linha de desenvolvimento.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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O primeiro momento: ênfase nas tarefas

O primeiro momento nasceu na virada deste século, a partir da Preocupação inicial de alguns engenheiros

americanos em racionalizar e metodizar as tarefas ao nível do operário e melhorar a eficiência do processo

produtivo. Assim, com a Administração Cientifica de Taylor, o primeiro momento reflecte a ênfase sobre a

tarefa. Até então, a escolha do método de trabalho era confiada ao próprio operário que se baseava na sua

própria experiência pessoal anterior para definir como iria realizar as suas tarefas. Taylor procurou tirar do

operário o direito de escolher a sua maneira pessoal de executar a tarefa – no que foi bem sucedido - para

impor-lhe um método planejado e estudado por um profissional especializado no planeamento de tarefas. Essa

administração das tarefas se assentava na organização racional do trabalho do operário que procurava localizar

o método (The Best Way) pelo qual o operário poderia se tornar eficiente.

O segundo momento: ênfase na estrutura

Rapidamente, se verificou que apenas a eficiência dos operários e das suas máquinas e linhas de montagem

não resolvia todos os problemas múltiplos e complexos da empresa como uma totalidade: tornava-se

necessário um estudo mais amplo da estrutura organizacional da empresa em termos globais. Assim, a ênfase

sobre as tarefas foi deslocada para ênfase na estrutura organizacional, marcando o inicio do segundo momento

da teoria administrativa. A ênfase sobre a estrutura organizacional apresenta duas linhas bem distintas e

conhecidas: de um lado a Teoria Clássica de Fayol e, de outro lado, a Teoria da Burocracia de Weber.

A primeira linhagem – a Teoria Clássica iniciada por Fayol - surgiu como uma abordagem

eminentemente normativa e prescritiva: como o administrador deve conduzir-se em todas as situações através

do processo administrativo e quais os princípios gerais da administração que deve seguir para obter a máxima

eficiência. Dentre os princípios gerais avultam os da divisão do trabalho, da especialização, da unidade de

comando, da amplitude de controle e da departamentalização. Mais recentemente, a teoria Clássica foi vestida

com nova roupagem e actualizada com um sentido altamente eléctrico com a Teoria Neoclássica. Mas a

preocupação com as regras do Jogo permaneceu fundamentalmente importante.

A segunda linhagem da ênfase sobre a estrutura organizacional desenvolveu-se a partir da Teoria da

Burocracia de Max Weber adaptada à administração das empresas. Segundo Weber, a organização formal

chamada burocracia apresenta algumas dimensões fundamentais, como formalização (ou seja, a definição por

escrito de todas as actividades, fazendo com que a organização opere de acordo com um conjunto de leis ou

regras aplicáveis a todos os casos, sem excepção), divisão do trabalho ou seja, cada participante tem um cargo

ou posição definidos com deveres oficiais especificados e delimitados), princípio da hierarquia (ou seja, cada

funcionário é submetido a uma hierarquia de autoridade, da qual recebe ordens impessoais), impessoalidade

(ou seja, a burocracia enfatiza os cargos e não as pessoas que os ocupam), selecção do pessoal pela

competência técnica e não por preferências pessoais, separação entre propriedade e administração e,

sobretudo, profissionalização do funcionário.

Dentro de um ponto de vista estritamente técnico, a burocracia atinge o mais alto grau de eficiência no

alcance dos objectivos empresariais, segundo Weber, pois ela representa o tipo de organização humana onde a

racionalidade atinge o seu mais elevado grau. A racionalidade aqui, significa a adequação dos meios para o

alcance de determinados fins ou objectivos. Contudo, certas consequências imprevistas - ou disfunções - podem

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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conduzir o modelo burocrático à ineficiência e à imperfeição. Mais recentemente, esses aspectos críticos da

organização burocrática foram exaustivamente estudados e analisados por muitos sociólogos. E o

desdobramento natural de suas conclusões conduz à Teoria Estruturalista, preocupada não apenas com a

análise organizacional, mas também com a análise interorganizacional, abordando a estrutura organizacional e

carregando fortemente nos conceitos inspirados na sociologia organizacional.

O terceiro momento: ênfase nas pessoas

O terceiro momento da teoria administrativa marca a ênfase sobre as pessoas e foi fruto da profunda influência

das ciências Comportamentais sobre a Administração, numa ferrenha tentativa de humanizar e democratizar as

práticas administrativas da época. É a chamada abordagem humanística, que procura enfatizar as pessoas

dentro das empresas, deixando em segundo plano as tarefas e a estrutura organizacional. A ênfase sobre as

pessoas pode ser desdobrada sequencialmente em duas escolas ou teorias: a Escola das Relações Humanas,

que teve inicio na década de 30, e a Teoria do Comportamento Organizacional que a sucedeu mais

recentemente. Esse terceiro momento marca a introdução de novos conceitos em administração: o de

organização informal, liderança, motivação, comunicação, dinâmica de grupo, estilos de administração,

conciliação dos objectivos empresariais e objectivos individuais, etc. Marca sobretudo, a preocupação de fazer

com que as pessoas participem e compartilhem no gestão das empresas.

O quarto momento: ênfase na tecnologia

O quarto momento da teoria administrativa é a ênfase na tecnologia e surge a partir da cibernética, da

automação, da robotização, da computação e dos seus profundos efeitos sobre as empresas e sua

administração. Muito embora a Administração Científica de Taylor e seus seguidores tenha se preocupado, em

sua época. com a tecnologia, suas incursões neste campo são estritamente limitadas ao nível da tarefa

individual de cada operário e são eminentemente concretas e imediatistas. Por incrível que possa parecer uma

das mais novas arcas de estudo da teoria administrativa é o estudo do papel da tecnologia na determinação da

estrutura e do comportamento organizacional das empresas. Alguns autores chegam ao exagero de salientar

que   existe   um   “imperativo   tecnológico”,     ou     seja,     é     a   tecnologia   quem   determina   a estrutura e o

comportamento organizacional de uma empresa. No fundo, para estes autores, a estrutura e os processos

empresariais nada mais são do que meios que a empresa utiliza para bem operar a sua tecnologia e obter dela

a máxima eficiência possível. A Teoria da Contingência - que assegura não haver nada de absoluto ou de rígido

em Administração - incumbiu-se de absorver rapidamente a preocupação com a tecnologia ao lado da

preocupação com o ambiente para definir uma abordagem mais ampla a respeito da administração e gestão

das empresas, cujas linhas básicas apresentaremos adiante.

O quinto momento: ênfase no ambiente

Com o advento da Teoria de Sistemas e sua gradativa incorporação à teoria administrativa, surge a ênfase no

ambiente e, a partir dai, as empresas passam a ser analisadas como sistemas abertos em contínuo intercâmbio

com o ambiente que as circunda externamente. Verificou-se que apenas o estudo das variáveis intra-

organizacionais – as variáveis endógenas - não proporcionava uma compreensão mais ampla e adequada da

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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estrutura e comportamento organizacionais, tornava-se necessário o estudo das variáveis exógenas, situadas

fora dos limites da empresa e que influenciam poderosamente os seus aspectos estruturais e comportamentais.

As relações de interacção entre empresas e seus ambientes passaram a explicar com mais profundidade certos

aspectos da estrutura organizacional e dos processos operacionais utilizados pelas empresas. Essa ênfase no

ambiente surgiu com o aparecimento da Teoria da Contingência, segundo a qual não existe uma única e

“melhor  maneira”   (the  best  way)  de  organizar  as  empresas.  Pelo   contrário,  as   características  estruturais  das  

empresas dependem das características ambientais que as circundam. Em outros termos, as características

estruturais são condicionadas fortemente pelas características ambientais. Alguns autores chegam a falar em

“imperativo  ambiental”  para explicar  tal  determinismo:  as  “variáveis  ambientais”,  são  variáveis  independentes  e  

os aspectos da estrutura organizacional são variáveis dependentes. Na medida em que uma empresa se situa

em um ambiente instável e mutável, ela precisa adaptar-se adequadamente para poder sobreviver.

PERSPECTIVAS FUTURAS DA ADMINISTRAÇÃO

Esses cinco momentos da teoria administrativa não são consecutivos, lineares e sequenciais. Ao contrário, eles

se sobrepõem, alcançam períodos de grande ressonância, ou de quase-abandono, retornam com novos

ingredientes. Todavia, em tempo algum, a ênfase nas tarefas, na estrutura organizacional e nas pessoas foi

abandonada. As ideias de Taylor, Fayol Weber e Elton Mayo permanecem até hoje, com roupagens que variam

com a moda.

Mas porque essas mudanças constantes na teoria administrativa? A resposta está no facto de que a

teoria administrativa nada mais é do que o suposto repositório das soluções aos principais problemas que

rondam as empresas a cada momento. Realmente, os problemas não mudam. Surgem novos problemas e os

antigos permanecem sob relativo grau de controlo. E a teoria administrativa vai tacteando os novos problemas,

riscando seus contornos e propondo soluções que somente o tempo é capaz de comprovar a sua adequação.

Nas próximas décadas, a tarefa administrativa será incerta e desafiadora, pois deverá ser atingida por um sem-

número de variáveis e de mudanças e transformações carregadas de ambiguidades e de incertezas. O

administrador se defrontará com problemas multifacetados e cada vez mais diferentes e mais complexos do que

os anteriores, e sua atenção será disputada por eventos e por grupos situados dentro e fora da empresa que

lhe proporcionarão informações contraditórias que complicarão o seu diagnóstico perceptivo e sua visão dos

problemas a resolver ou das situações a enfrentar: são as exigências da sociedade, dos clientes, dos

fornecedores, das agências regulamentadoras, são os desafios dos concorrentes. as expectativas da alta

administração, dos subordinados, dos accionistas, etc. Porém. todas essas exigências, desafios e expectativas

sofrem profundas mudanças que a ultrapassam a capacidade que o administrador tem para poder acompanhá-

las de peno e compreende-las adequadamente. Essas mudanças tendem a aumentar, face à inclusão de outras

novas variáveis, à medida que o processo se desenvolve criando uma turbulência que perturba e complica a

tarefa administrativa de planejar, organizar, dirigir e controlar uma empresa de modo eficiente e eficaz.

Existem alguns factores de desafio e de turbulência que estarão presentes nas próximas décadas, a saber:

1. As empresas tendem a se ampliar, na medida em que são bem sucedidas. O crescimento empresarial é,

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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sem dúvida, uma consequência do seu sucesso, seja por que os mercados estão se expandindo, seja

para se beneficiar da economia de escala proporcionada pelo aumento de produção, seja para

concorrer com êxito com as demais empresas concorrentes, à medida que o tamanho da empresa

aumenta, aumentam em proporção muito maior as complicações de sua administração. E é preciso

manter o tamanho da empresa em proporções administráveis.

2. Existe uma tendência para a continuidade de taxas elevadas de inflação. Os custos de energia, de

matérias-primas, de mão-de-obra estão se elevando sensivelmente. A inflação exigirá maior eficiência

da administração das empresas para obter melhores resultados com os recursos disponíveis e imporá

fatalmente novas pressões e ameaças sobre as empresas, para que mantenham seus lucros e sua

própria sobrevivência.

3. A concorrência se torna cada vez mais aguda, à medida que aumentam os mercados e os negócios,

fazendo crescer os riscos na actividade empresarial. Mais do que nunca, o produto ou serviço que

demonstra ser superior - mais avançado, mais seguro, mais desejável - será o mais procurado. O

resultado será um novo sentido de urgência para desenvolver tais produtos e serviços e, para isso,

maiores investimentos em pesquisa e desenvolvimento, aperfeiçoamento das tecnologias e maiores

esforços de vendas por parte das empresas. Isto provocará a dissolução de velhos departamentos e a

criação de novos departamentos com diferentes tarefas e objectivos.

4. Existe uma tendência para uma crescente Sofisticação da tecnologia. Graças ao progresso das

comunicações, do computador e do transporte a jacto, as empresas estão internacionalizando suas

actividades e operações. Não é difícil prever uma série de profundas mudanças na estrutura e

comportamento das empresas em consequência desses desenvolvimentos. A tecnologia proporcionará

cada vez mais eficiência maior, uma precisão mais avançada e a liberação da actividade humana para

tarefas mais complicadas e que exigem planeamento.

5. Haverá maior internacionalização do mundo dos negócios, levando a um esforço, para a exportação ou

para a criação de subsidiárias para fincar o pé em outros territórios estrangeiros.

6. A maior visibilidade das empresas. Enquanto crescem, as empresas tornam-se mais competitivas, mais

sofisticadas tecnologicamente, internacionalizam--se mais, e com isto, sua influência ambiental

necessariamente aumenta. Isto faz com que as empresas chamem mais a atenção do ambiente e da

opinião pública e passem a ser mais visíveis e percebidas pelo público. A visibilidade da empresa - a sua

capacidade de chamar a atenção pode ocorrer de muitas maneiras positivas ou negativas, trazendo

forte impacto sobre sua estrutura e comportamento.

No fundo, Galbraith tem razão: estamos na era da incerteza, cheia de mudanças e transformações, de

turbulências e de instabilidade. E o mundo nunca mais será o mesmo de antes. E resta saber como tudo isto

será absorvido pelas empresas e pela sua administração.

AS EMPRESAS E SUA COMPLEXIDADE

Na moderna sociedade em que vivemos, quase todo o processo produtivo é realizado dentro do que chamamos

de organizações. Assim, a nossa sociedade moderna e industrializada se caracteriza por ser uma sociedade

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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composta por organizações. O homem moderno passa a maior parte do seu tempo dentro de organizações, das

quais depende para nascer, viver, aprender, trabalhar, ganhar seu salário, curar suas doenças, divertir-se, obter

todos os produtos e serviços de que necessita, etc. Uma das razões que explicam a enorme variedade e

densidade de organizações no mundo actual é o facto de que a organização é o mais eficiente meio de

satisfazer um grande número de necessidades humanas. Pelas suas limitações físicas, biológicas, o ser humano

busca, através da cooperação com seus semelhantes, a conjugação de esforços para atingir objectivos que

sozinho não teria condições de atingir, ou, se tivesse condições de atingi-los individualmente com suas próprias

forças e recursos, talvez levasse muito mais tempo e consumisse muitos mais esforços. As organizações são

unidades intencionalmente construídas e reconstruídas, a fim de atingir objectivos específicos. As empresas

nada mais são do que classes de organizações. Elas são organizações lucrativas. Ou seja, são organizações com

objectivos de lucro. Elas constituem a coordenação de diferentes actividades de pessoas com a finalidade de

efectuar transacções planejadas com o ambiente. Com a sua proliferação, as empresas alcançaram elevado

grau de heterogeneidade e diversidade dificultando enormemente o seu estudo. Surgiram algumas tentativas

de classificação de tipos de empresas. Inúmeras tipologias foram criadas para facilitar seu estudo e

comparação, a saber:

1. Classificação quanto ao tamanho. É muito comum a classificação das empresas de acordo com o seu

tamanho, levando-se em conta certos critérios como o número de empregados, o volume de actividades

(operações ou facturação), o património envolvido (capital ou activo fixo), etc. Dentro destes critérios, as

empresas podem variar de um contínuo de tamanhos, pequenas, médias ou grandes. Há, todavia as mini-

empresas e as micro-empresas. Mas qual será efectivamente o limite entre uma e outra destas

classificações?

2. Classificações quanto à actividade. Conforme o tipo de actividade desenvolvida pelas empresas, elas podem

ser classificadas como produtoras de bens (empresas industriais ou artesanais) ou prestadoras de serviços

(actividades especializadas). Porém, muitas empresas industriais estão gradativamente ingressando na área

de serviços para poderem vender seus produtos. Uma outra forma de se visualizar esta classificação é a de

configurar três tipos de empresas: as primárias (ou extractivas), as secundárias (ou de transformação) e as

terciárias (ou de prestação de serviços). Contudo, existem empresas que simultaneamente desenvolvem

actividades primárias, secundárias e terciárias.

3. Classificação quanto à forma de propriedade. Uma terceira forma de classificar as empresas separa-as em

empresas públicas (ou governamentais) e privadas (ou de iniciativa particular), pois a maneira de

administrar é diferente porque são diferentes os objectivos, a obtenção e alocação dos recursos e os

resultados esperados. Contudo, existem empresas para-estatais, que não são públicas e nem privadas, mas

que exemplificam a intervenção estatal na economia. Por outro lado, também existem empresas

multinacionais, nas quais as subsidiárias funcionam de acordo com as decisões e modelos impostos pelas

matrizes. Além do mais, empresas compartilhadas (joint ventures) cuja propriedade é dividida em

proporções diferentes entre várias outras empresas, fazem com que este critério de classificação sofra

críticas.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Classificação quanto a concentração/dispersão de actividades. Refere-se ao grau de concentração ou de

dispersão das actividades empresariais ou de seus recursos. As empresas concentradas se caracterizam pela

existência de recursos processados dentro de única área ou unidade física: as pessoas, máquinas e

equipamentos, os edifícios, etc. se encontram em um só local geográfico. As empresas dispersas se

caracterizam pela existência de recursos esparsos e distribuídos em locais estratégicos diferentes, geralmente

distanciados entre si, provocando problemas de coordenação e de integração. O problema básico da

concentração x dispersão das empresas reside na alocação e administração dos recursos necessários para as

operações e actividades e consequente alcance dos objectivos empresariais.

Todavia, todas estas formas de classificação de empresas resvalam pelo reducionismo: tentam

comparar as empresas através de apenas uma única variável - seja o tamanho, ou o tipo de actividade básica

ou o facto de serem públicas ou privadas ou ainda concentradas ou dispersas - o que nem sempre identifica

completamente as características organizacionais eminentemente complexas e multivariadas e que nem

sempre identifica com precisão as diferenças entre as várias empresas para efeito de comparação. A conclusão

é óbvia: pela sua complexidade, heterogeneidade e diversidade, as empresas ainda carecem de tipologias

adequadas à sua classificação. Ou em outros termos: as classificações de empresas devem levar em conta as

limitações do reducionismo que acabamos de aventar.

OS RECURSOS DAS EMPRESAS

Outro aspecto complicador e o facto de que a empresa constitui um ponto de convergência de inúmeros

factores de produção, isto é, de recursos produtivos. Tradicionalmente, os factores de produção têm sido

apontados genericamente em todo processo produtivo como sendo: natureza, capital e trabalho. Obviamente,

esta colocação também peca pelo exagerado simplismo e pela superficialidade, pois o processo produtivo é

muito mais complexo e envolve um número muito grande de variáveis intervenientes. Além do mais, esta

colocação focaliza o processo produtivo do ponto de vista de um mero sistema fechado, quando, na realidade,

o mesmo apresenta marcantes características de sistema aberto. Face ao intenso intercambio com o ambiente.

Basicamente, as empresas são constituídas de uma infinidade de recursos como pessoas, edifícios, máquinas,

equipamentos, matérias-primas, etc. Elas precisam de dinheiro, de fornecedores, de clientes, para realizar suas

actividades e sobreviver. Em outros termos, as empresas necessitam de recursos obtidos no ambiente externo e

aplicados, processados e transformados em produtos, ou serviços que são distribuídos e colocados novamente

no ambiente externo. No fundo, há um processo contínuo de importação-conversão-exportação assentado

sobre recursos empresariais. Alguns recursos ingressam no sistema com transformadores ou processadores

(como é o caso das máquinas, equipamentos e ferramentas que operam a produção), outros ingressam para

ajudar a importação de outros recursos (caso das actividades de compras, de recrutamento de pessoal, de

contactos bancários para obter dinheiro e financiamentos, etc.), outros ingressam para ajudar a exportação de

outros recursos (caso das actividades de vendas, de colocação de acções no mercado de capitais, etc.),

enquanto outros ingressam para serem processados e transformados em produtos ou em serviços (caso das

matérias-primas, componentes e materiais, ou ainda de dados ou informações que são transformados em

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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serviços pela imprensa ou pelos órgãos de processamento de dados). Esses recursos variam enormemente de

empresa para empresa, em todos os sentidos: na sua natureza, na sua quantidade, na sua qualidade, etc. Os

recursos são os meios que as empresas possuem ou adquirem para realizar suas tarefas e atingir seus

objectivos: são bens ou serviços consumidos na realização das actividades empresariais. Podem ser imaginados

como os insumos necessários para produzir o produto final ou o serviço prestado pela empresa. Os recursos

podem ser próprios ou alheios, isto é, podem ser de propriedades da empresa que os adquire e os incorpora

para utilizá-los em suas actividades ou podem ser obtidos sob empréstimo, aluguer ou locação (leasing). Face à

sua diversidade, os americanos preferem classificar os recursos empresariais em cinco tipos: materials and

machinery, money, man, marketing e management. Preferimos chamá-los respectivamente: recursos físicos ou

materiais, recursos financeiros, recursos humanos, recursos mercadológicos e recursos administrativos.

Normalmente, cada conjunto de recursos similares é administrado dentro de um esquema de divisão de

trabalho e de especialização de actividades. A cada área de recursos corresponde uma especialidade da

administração: Administração da Produção, Administração Financeira, Administração de Recursos Humanos,

Administração Mercadológica e Administração Geral respectivamente. Na medida em que os recursos

disponíveis são correctamente utilizados e aplicados, obtém-se eficiência e, na medida em que se atingem os

objectivos da empresa, obtém-se a eficácia. A eficiência e a eficácia são algumas das principais medidas para se

avaliar uma boa administração, já que quase sempre os recursos são limitados ou escassos

OS NÍVEIS DE GESTÃO DAS EMPRESAS

Como as empresas são muito heterogéneas e diversificadas, assim como o são os seus recursos utilizados,

procuraremos lançar mão de alguns artifícios para facilitar nossa exposição. As empresas constituem sistemas

complexos destinados a atingir objectivos igualmente diferenciados e complexos. Para tanto, ocorre a divisão

do trabalho e a especialização de actividades dos órgãos e dos participantes. Independentemente na sua

natureza ou tamanho, as empresas podem ser analisadas sob o prisma de três diferentes níveis de actuação

empresarial: o nível institucional, o nível intermediário e o nível operacional. Se imaginássemos a empresa como

um conjunto de três círculos concêntricos de tamanhos diferentes, o nível institucional seria o circulo mais

periférico, o nível intermediário o do meio e o nível operacional o circulo interno.

O nível institucional também chamado nível estratégico, corresponde ao nível mais elevado da empresa,

composto dos directores, proprietários ou accionistas e altos executivos. Nele estão o presidente, os directores

e todos os gerentes responsáveis pelos assuntos globais da empresa e que definem os objectivos empresariais

e as estratégias gerais necessárias para atingi-los adequadamente. E o nível que faceia o ambiente externo

extremamente vasto e mutável que circula e envolve a empresa. Além de estar voltado para os objectivos do

negócio e para os interesses do grupo dominante, o nível institucional é predominantemente extroversivo, isto

e, voltado para a realidade ambiental que externamente envolve a empresa. Em outros termos, é composto

pelas camadas da empresa expostas ao ambiente e que estão situadas na periferia organizacional e na

interface com a realidade externa que a empresa precisa atender, é o nível que mantém contacto e interacção

com as forças e pressões ambientais. Lida com a incerteza, exactamente pelo facto de não ter poder ou

controle algum sobre os eventos ambientais presentes e muito menos capacidade de prever com razoável

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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precisão os eventos ambientais futuros. E o nível da empresa que actua como sistema aberto em contínua

interacção com o ambiente externo. NÍVEL INSTITUCIONAL

(Estratégico)

Nível mais elevado

NÍVEL INTERMÉDIO (Táctico)

onde são tomadas Utilização de as decisões recursos

Definição NÍVEL OPERACIONAL Execução de Mudanças dos órgãos planos e Mudanças (Execução de Tarefas) programas Ambiente Produtos externo com o máximo e serviços Adequações Eficiência de eficácia das relações estruturais

tendo em vista a incerteza envolvente

O nível intermediário, também chamado nível mediador, nível tácito ou ainda nível gerencial está colocado entre

o nível institucional e o nível operacional. Cuida da articulação interna entre os dois níveis que respectivamente

estão colocados no topo e na base da organização empresarial. Trata-se da linha do meio de campo. Cuida da

escolha e captação dos recursos necessários, bem como da distribuição e colocação do que foi produzido pela

empresa nos diversos segmentos do mercado. É o nível que lida com os problemas de adequação das decisões

tomadas no nível institucional com as operações e tarefas realizadas no nível operacional. O nível intermediário

é geralmente composto da media administração da empresa, isto é, as pessoas ou órgãos que transformam as

estratégias elaboradas para atingir os o objectivos e empresariais em programas de acção, também chamado

nível mediador pois se defronta com dois componentes completamente diferentes entre si: um componente

extremamente sujeito à incerteza e ao risco, faceando um ambiente externo mutável e complexo, que é o nível

institucional e outro componente extremamente voltado à lógica e a certeza e ocupado com a programação

rotineira e execução de tarefas muito bem definidas e delimitadas do dia-a-dia, que é o nível operacional. É o

nível intermediário quem amortece e limita os impactos e solavancos da incerteza trazido do ambiente externo

pelo nível institucional absorvendo-os e digerindo-os para trazer ao nível operacional trazido do ambiente

externo pelo nível institucional, absorvendo-os e digerindo-os para trazer ao nível operacional os programas,

rotinas e procedimentos de trabalho rigidamente estabelecidos que este deverá seguir para executar as tarefas

básicas da empresa com eficiência permitindo-lhe atender às demandas do ambiente e alcançar os seus

objectivos. Assim, o nível intermediário deve ser flexível, elástico, capaz de amortecer e conter os impactos e

pressões externas para não prejudicar as operações internas que são realizadas no nível operacional bem como

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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deve ser capaz de dilatar ou reduzir cerras demandas e exigências externas para compatibilizá-las com as

possibilidades internas do nível operacional. Em outros termos, como o nível operacional geralmente é dotado

de pouca flexibilidade, cabe ao nível intermediário servir de bolso mediador que possa encompassar os ritmos

mais rápidos ou mais lentos das forças ambientais com as possibilidades rotineiras e quotidianas de acção do

nível operacional. Cabe ao nível intermediário administrar o nível operacional e cuidar das decisões

departamentais.

O nível operacional também chamado nível técnico ou núcleo técnico, é o nível localizado nas áreas

inferiores da empresa, e, portanto, na parte mais intima da empresa. Está relacionado com os problemas

ligados à execução quotidiana e eficiente das tarefas e operações da empresa e orientado quase que

exclusivamente para as exigências impostas pela natureza da tarefa a ser executada e com os materiais a

serem processados, nível onde as tarefas são executadas e as operações são realizadas: envolve o trabalho

básico relacionado directamente com a produção dos produtos ou serviços da empresa. É nele que estão as

máquinas e equipamentos, as instalações físicas, as linhas de montagem, os escritórios e os balcões de

atendimento, etc., cujo funcionamento deve atender a determinadas rotinas e procedimentos programados

dentro de uma regularidade e continuidade que assegurem a utilização plena dos recursos disponíveis e a

máxima eficiência das operações. Pata tanto, o nível operacional exige certeza e previsibilidade na sua

actuação.

Na realidade, não há uma separação nítida e permanente entre os três níveis da empresa, podendo

haver até superposicão entre eles.

A RACIONALIDADE EMPRESARIAL

Para melhor compreensão do funcionamento desses três diferentes níveis da empresa, convém lembrar o

conceito de racionalidade. Racionalidade implica adequação dos meios utilizados aos fins a que se deseja

alcançar. A racionalidade é o imperativo de todas as actividades administrativas de uma empresa e é o que leva

a uma infinidade de comportamentos diferentes para alcançar os seus objectivos. As empresas que alcançam

seus fins eficientemente são funcionalmente racionais. Em cada empresa existe uma racionalidade empresarial:

toda empresa se comporta de acordo com uma racionalidade que lhe é própria. A racionalidade está ligada aos

meios, métodos e processos que a empresa acredita serem capazes de proporcionar o alcance de determinados

fins ou resultados. A racionalidade se fundamenta em uma presunção sobre as relações de causa-e-efeito:

determinadas acções conduzem a certas consequências. Assim, uma acção ou um procedimento é racional, se é

consistente ou congruente com o alcance de objectivos que se pretende atingir ou se ajusta a presunções,

axiomas ou premissas previamente aceites e estabelecidas pela empresa. Existe racionalidade, porque o

comportamento da empresa é planeado e dirigido para certos objectivos que ela pretende alcançar. Para que

haja racionalidade, os meios, procedimentos, métodos e processos, etc., devem ser coerentes com o alcance

dos objectivos desejados. As teorias administrativas de Taylor. Fayol e Weber baseadas em conceitos de

empresa como sistema fechado, se restringiam a determinadas variáveis conhecidas, cujo comportamento era

previsível e situado dentro de relações de causa-e-efeito previamente determinadas. Essas teorias também se

restringiam quase tão somente ao nível operacional das empresas. E, acima de tudo, apregoavam uma

racionalidade total, própria de fenómenos típicos do sistema fechado. Na realidade, os fenómenos típicos do

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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sistema fechado ocorrem nos processos mais íntimos e interiores da empresa, localizados no nível operacional e

mais protegidos da acção ambiental que impõe a mudança e incerteza. No nível operacional predomina uma

racionalidade total, a que denominamos racionalidade técnica, que utiliza a lógica de um sistema fechado e que

se fecha à medida que elimina ou limita a incerteza ambiental e reduz as operações ou tarefas a programas e

procedimentos estritamente previstos e rígidos, rotinizados e programados, para assegurar a maximização da

eficiência. Baseia-se na certeza e na previsibilidade. Todavia, o nível institucional se defronta com o ambiente

externo, operando como um sistema aberto, com grande absorção das incertezas produzidas pela interacção

com as múltiplas e complexas forças ambientais. Esse ambiente complexo e evanescente não revela

inteiramente as alternativas disponíveis e nem o desdobramento das consequências dessas alternativas. Para

lidar com tamanha complexidade e indefinição, o nível institucional tem uma capacidade limitada para reunir e

processar informações esparsas e incompletas ou para prever as consequências das alternativas numa situação

de impervisibilidade, onde nem todas as múltiplas variáveis são conhecidas e o seu comportamento dificilmente

revela as possíveis relações de causa-e-efeito. O nível institucional precisa, então, criar processos para procurar,

aprender e, principalmente, decidir. Se a complexidade fosse abordada e enfrentada em toda a sua enorme

complexidade, ela superaria a capacidade de compreensão da empresa. Esta precisa limitar suas definições de

situações, isto é, precisa tomar decisões dentro de uma racionalidade limitada. Esta exigência requer a

substituição do critério de máxima eficiência - típico da lógica de sistema fechado - pelo critério da eficiência

satisfatória ou relativa - típico da lógica de sistema aberto: a tomada de decisões deve relacionar-se antes com

a satisfação do que com a maximização de resultados. Para tomar uma decisão, a não pode colectar a

totalidade de dados a respeito de um problema, mas apenas os dados que ela tem capacidade e condições de

colectar, obter e processar. O ambiente externo não é captado e interpretado em sua imensa e complexa

totalidade, mas é percebido apenas naqueles aspectos mais relevantes que a empresa consegue descodificar e

interpretar na base da sua racionalidade. Daí, a racionalidade empresarial que predomina no nível institucional.

Assim, as empresas funcionam como sistemas abertos e; consequentemente necessitados de previsibilidade,

certeza e resolução. Para um melhor entendimento do funcionamento do nível institucional deve-se melhor

conceituar o ambiente, enquanto que o nível operacional requer uma melhor conceituação de tecnologia.

Começaremos por falar em ambiente e, posteriormente de tecnologia, a fim de amarrarmos estes dois

conceitos em um outro mais abrangente que é o de gestão de empresas.

O AMBIENTE EMPRESARIAL

As empresas não existem no vácuo e seu funcionamento nada tem de absoluto. Elas vivem dentro de um

complexo contexto caracterizado por mudanças e por uma multiplicidade de forças diferentes. Para se conhecer

adequadamente uma empresa, deve-se compreender também o contexto no qual ela está inserida. O ambiente

representa todo o universo que envolve externamente uma empresa tomada como ponto de referência; é tudo

aquilo que está situado fora da empresa. O ambiente é a própria sociedade maior, constituída de outras

empresas, organizações, grupos sociais, etc. Assim, as empresas não são totalmente auto-suficientes, nem

isoladas, mas funcionam dentro de um contexto, do qual dependem para sobreviver e crescer. É do ambiente

que as empresas obtém os recursos e informações necessários para sua subsistência e funcionamento, e é no

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ambiente que colocam os resultados de suas operações. Na medida em que o ambiente sofre mudanças, todo o

quadro habitual das operações das empresas é tremendamente influenciado por essas mudanças, pois as

condições ambientais externas às empresas contribuem fortemente para tudo aquilo que sucede dentro delas, a

ponto de alguns autores salientarem que as empresas constituem organizações inventadas pelo homem para se

adaptarem a circunstâncias ambientais a fim de alcançarem seus objectivos. Se essa adaptação é conseguida e

os objectivos são alcançados, então a empresa será considerada eficaz e terá condições de sobrevivência e de

crescimento, na medida em que o resultado proveniente de seus produtos e serviços sejam maior do que o

volume despendido na obtenção e aplicação dos recursos.

Como o ambiente é vasto e complexo, as empresas não podem absorvê-lo, conhece-lo e compreendê-lo

em sua imensa totalidade, o que seria inimaginável. O ambiente e um contexto externo que apresenta uma

enorme variedade de condições extremamente variáveis e complexas, difíceis de serem abordadas no seu

conjunto e analisadas com objectividade. Assim, as empresas precisam tactear, explorar e discernir o ambiente

onde estão colocadas para reduzir a incerteza a seu respeito. Em outros termos, a empresa precisa mapear seu

espaço ambiental. Para lidar com a complexidade ambiental, as empresas passam a seleccionar aspectos

relevantes do seu ambiente e a visualizar o seu mundo exterior apenas naqueles aspectos escolhidos e

seleccionados  daquele  enorme  conjunto.  É  a  chamada  “selecção ambiental”:  apenas  uma  pequena  porção  de  

todas as inúmeras variáveis ambientais possíveis participam realmente do conhecimento e da experiência da

empresa. Assim, os dirigentes que actuam no nível institucional visualizam o ambiente da empresa através de

aspectos tomados como relevantes para a sua empresa. Por outro lado, esses dirigentes passam a perceber

subjectivamente seus ambientes de acordo com suas expectativas, suas experiências, seus problemas, suas

aflições, suas convicções e suas motivações. A maneira pela qual uma empresa percebe e interpreta os eventos

ambientais pode ser completamente diferente da percepção e interpretação que outra empresa tem a respeito

do mesmo ambiente. Em outros termos, um mesmo ambiente pode ser percebido e interpretado

diferentemente  por  duas  ou  mais  empresas.  É  a  chamada  “percepção ambiental”,  que  é  uma  construção,  um  

conjunto de informações seleccionadas e estruturadas em função da experiência anterior, das necessidades e

das intenções da empresa. O que complica ainda mais as coisas é o facto de que as empresas são partes

integrantes dos ambientes de outras empresas e demais organismos da sociedade.

Para facilitar, pelo menos didacticamente, a análise ambiental faremos doravante uma diferenciação

entre ambiente geral e ambiente de tarefa.

Ambiente geral:

O ambiente geral é também chamado macroambiente e é constituído de um conjunto amplo e complexo de

condições e factores externos que envolve e influência difusamente todas as empresas. Não é uma entidade

concreta com a qual a empresa possa interagir directamente, mas um conjunto difuso de condições genéricas e

externas às empresas e que contribui de um modo geral para tudo aquilo que ocorre dentro de cada empresa.

O ambiente geral é constituído de factores económicos, políticos, tecnológicos, sociais, culturais, demográficos,

ecológicos que predominam em um determinado país ou continente.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Ambiente de tarefa:

O ambiente de tarefa é o meio ambiente específico de cada empresa e corresponde ao segmento do ambiente

mais imediato e próximo de cada empresa. Se tomarmos a empresa como um sistema aberto, é do ambiente

de tarefa que a empresa extrai suas entradas e é nele que a empresa coloca suas saídas ou resultados. O

ambiente de tarefa é composto de quatro sectores principais:

1. os consumidores ou usuários dos produtos ou serviços da empresa. Geralmente, este sector é chamado

mercado de clientes ou de consumidores e se encarrega de absorver as saídas ou resultados da

actividade empresarial

2. os fornecedores de recursos para a empresa, isto é, os fornecedores de capital e dinheiro (que é o

mercado de capitais tratado pela área financeira), de materiais e matérias-primas (que é o mercado de

fornecedores tratado pela área de suprimentos e compras), de mão-de-obra (que é o mercado de

recursos humanos tratado pela área de pessoal, de serviços (composto pelas empresas prestadoras de

serviços, como propaganda, processamento de dados, etc.), de equipamento, de espaço de trabalho,

etc. Este sector é constituído do mercado ou mercados que suprem a empresa das entradas e, insumos

necessários às suas operações.

3. os concorrentes, tanto para as entradas (disputam fornecedores de recursos materiais, financeiros,

humanos, etc.), como para as saídas disputando clientes ou usuários. É constituído de empresas que

concorrem entre si, para a obtenção dos recursos necessários e para a conquista dos mercados para a

colocação dos seus produtos ou serviços.

4. os grupos regulamentadores, incluindo o governo, sindicatos, associações entre empresas, associações

de classe, organismos de controle e de fiscalização, etc. Este sector é constituído das instituições que,

de alguma maneira, impõem controles, limitações ou restrições às actividades da empresa, seja

especificando maneiras pelas quais ela deverá se conduzir, seja cerceando algumas de suas decisões,

seja fiscalizando ou controlando suas actividades, etc.

É no ambiente de tarefa que a empresa define o seu domínio, ou seja, a sua área de influência ambiental. É no

ambiente de tarefa que a empresa identifica os pontos em que ela depende de entradas do ambiente e os

pontos de saída para o ambiente. Para mudar seu domínio, a empresa precisa mudar um ou mais dos sectores

acima: clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores. Para tanto, ela precisa alterar seu produto

ou serviço. O domínio de uma empresa é definido pelas suas relações de poder ou de dependência em relação

aos quatro sectores do seu ambiente de tarefa. A empresa tem poder quando as suas decisões influenciam as

decisões de seus clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores, total ou parcialmente. A empresa

tem dependência quando as suas decisões estão subordinadas às decisões tomadas pelos seus clientes, ou

fornecedores, ou concorrentes ou grupos reguladores. Toda estratégia empresarial procura maximizar as

relações de poder e minimizar as relações de dependência, no sentido de garantir o seu domínio e, portanto, a

sua sobrevivência ou crescimento.

Dependendo do produto ou serviço que produza ou preste, a empresa pode ter um ambiente de tarefa

homogéneo: clientes semelhantes, fornecedores semelhantes, concorrentes semelhantes e agências

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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reguladores como tal. A homogeneidade do ambiente de tarefa depende, portanto, do tipo de produto ou

serviço da empresa. Quando o ambiente é homogéneo e simples, a estrutura organizacional da empresa tende

também a ser simples e homogénea dotada de um departamento para cada área específica do ambiente.

Porém, quando face à diversidade de produtos ou serviços, o ambiente de tarefa (é heterogéneo e complexo,

da empresa a sua estrutura organizacional tende a ser altamente diferenciada e descentralizada, com

departamentos específicos para lidarem com as áreas específicas do ambiente de tarefa. Assim, o continuum

homogeneidade-heterogeneidade do ambiente de tarefa é importante na definição dos aspectos de

centralização-descentralização e de simplicidade-diferenciação na estrutura organizacional das empresas.

Por outro lado. o ambiente de tarefa apresenta uma dinâmica que pode variar da estabilidade à

instabilidade. O ambiente estável se caracteriza por um comportamento estático, rotineiro e previsível dos

clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores. O ambiente instável já se caracteriza por um

comportamento mutável. reactivo e imprevisível dos clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos

reguladores, impondo contingências que as empresas não tem condições de antecipar ou prever, chegando em

alguns casos às raias da turbulência e complexidade. Quanto mais estável o ambiente de tarefa mais rotineiras

e padronizadas as actividades da empresa, que tende a utilizar os princípios clássicos de administração ou o

modelo burocrático de organização. Como a estabilidade ambiental permite alguma previsibilidade e certeza à

empresa, esta pode dar-se ao luxo de internalizar sua atenção para a produção no sentido de aumentar ao

máximo a sua eficiência. Porém, quanto mais instável o ambiente de tarefa, as respostas empresariais precisam

adaptar-se rapidamente às novas demandas e exigências ambientais através da constante mudança

organizacional. A empresa torna-se extrovertida na medida em que tem de constantemente mapear as

flutuações e alterações ocorridas no ambiente de tarefa e providenciar rapidamente os ajustamentos internos

para proporcionar respostas eficazes. Assim, os princípios clássicos de administração e o modelo burocrático de

organização não são adequados, pois carecem da flexibilidade e da inovação necessárias, quanto mais dinâmico

o ambiente de tarefa, maiores as contingências e incertezas impostas à empresa. Assim, o ambiente apresenta

coacções, contingências, restrições, problema, desafios, pressões e, sobretudo, oportunidades às empresas. E

toda essa gama variada de influências ambientais penetra nas empresas através do nível institucional.

TECNOLOGIA

Enquanto o ambiente de tarefa constitui a principal fonte externa de coacções e contingências, a tecnologia

constitui a principal fonte interna. Todas as empresas utilizam alguma forma de tecnologia para executar suas

operações e realizar sua tarefa. A tecnologia adoptada pode ser rudimentar (como a faxina e limpeza através

da vassoura ou do escovão) ou sofisticada (como o processamento de dados através do computador). Porém,

uma coisa é certa: todas as empresas dependem de um tipo tecnologia ou de um conjunto de tecnologias para

poderem funcionar e alcançar seus objectivos. A tecnologia é uma variável, ao mesmo tempo, ambiental e

empresarial: externa e interna. A tecnologia é um componente do meio ambiente, na medida em que as

empresas adquirem, incorporam e absorvem tecnologias criadas e desenvolvidas pelas outras empresas dos eu

ambiente de tarefa em seus sistemas. Por outro lado, a tecnologia é um componente empresarial. na medida

em que faz parte do sistema interno da empresa, já incorporada a ele passando assim a influenciá-lo

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poderosamente, e, com isto, influenciando também o seu ambiente de tarefa. Assim, a tecnologia pode ser

compreendida como uma variável ambiental - influenciando a empresa de fora para dentro, como se fora uma

força externa e muitas vezes estranha à empresa, e sobre a qual a empresa possui muito pouco entendimento

e sobretudo controle - e como uma variável empresarial influenciando a empresa como se fora um recurso

próprio e interno influenciando os demais recursos e capaz de proporcionar melhor desempenho na acção e

maior capacidade para a empresa defrontar-se com as forcas ambientais, caracterizadas pelas contingências e

coacções vindas e pelas contingências e coacções vindas do ambiente externo. Daremos preferência, neste

tópico, ao tratamento da tecnologia como uma variável interna, como um recurso da empresa, operado em seu

íntimo através do nível operacional.

Existem tecnologias de capital intensivo (baseadas na utilização intensiva de máquinas e equipamentos,

com ênfase na mecanização e automação) e tecnologias de mão-de-obra intensiva (baseada na utilização

intensiva de pessoas com habilidades manuais ou físicas e com ênfase na manufactura). A tecnologia envolve

aspectos físicos e concretos (hardware) – bem como aspectos conceituais e abstractos (software) – como

políticas, directrizes, processos, procedimentos, regras e regulamentos, rotinas, planos, programas e métodos

de trabalho.

Existe a tecnologia incorporada, que está contida em bens de capital. matérias-primas básicas,

matérias-primas intermediárias ou componentes, etc. A tecnologia não incorporada encontra-se nas pessoas -

como técnicos, peritos, especialistas, pesquisadores – sob a forma de conhecimentos intelectuais ou

operacionais, habilidade mental ou manual para executar as operações, ou em documentos que a registam e

visam assegurar sua conservação e transmissão, como mapas, plantas, desenhos, projectos, patentes,

relatórios, etc. Estas duas formas de tecnologia geralmente se confundem e se entrelaçam.

Na realidade, a tecnologia não somente permeia toda a actividade industrial, como também participa

profundamente em qualquer tipo de actividade humana, em todos os campos de actuação. O homem moderno

utiliza no seu comportamento quotidiano e quase sem o perceber uma imensa avalanche de contribuições da

tecnologia: o automóvel, o relógio, o telefone, as comunicações, etc. Sem toda essa parafernália, o

comportamento do homem moderno seria completamente diferente. Assim, a tecnologia também envolve um

determinado tipo de conhecimento que, a despeito de sua origem, é utilizado na sentido de transformar

elementos materiais - matérias-primas, componentes, etc. - ou simbólicos – dados, informações, etc. - em bens

ou serviços, modificando sua natureza ou suas características. A tecnologia não e coisa, mas sim conhecimento

de como fazer as coisas, para alcançar objectivos humanos. Através dos artefactos que a tecnologia lhe

permite, o homem é capaz de produzir uma infinidade de coisas. Essas coisas em si não constituem tecnologia,

mas o produto dela.

Qualquer que seja o conceito de tecnologia, porém é inquestionável que a tecnologia conduz a uma

maior complexidade da empresa que a utiliza passando a condicionar a estrutura organizacional da empresa,

fazendo dela uma decorrência, uma variável dependente. Apenas para efeito desta exposição, podemos

classificar a tecnologia em dois tipos básicos:

1. Tecnologia flexível: quando as máquinas e equipamentos, as matérias-primas e o conhecimento dos

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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métodos e processos podem ser usados para outros produtos e serviços diferentes. É o caso em que a

tecnologia deve adaptar-se; as demandas dos produtos ou serviços a serem executados, como no caso

das oficinas.

2. Tecnologia fixa: quando não há possibilidade de utilização de outros produtos ou serviços diferentes. É

o caso em que a empresa precisa escolher ou adaptar os produtos ou serviços a tecnologia de que

dispõe. As montadoras de automóveis dispõem de tecnologia fixa, cuja modificação exige elevados

investimentos. As siderúrgicas, as refinarias de petróleo e a grande maioria das indústrias químicas

constituem exemplos de tecnologias fixas.

3. A tecnologia fixa ou estável conduz a uma ênfase no produto e, o processo produtivo envolve tarefas

padronizadas e repetitivas, sujeitas a normas e procedimentos burocratizados, impondo

consequentemente condições de estabilidade e de previsibilidade do nível operacional da empresa.

Neste caso, os princípios da administração cientifica de Taylor (no caso de fábricas) e os princípios do

modelo burocrático de Weber (no caso de escritórios ou de bancos, por exemplo) são perfeitamente

aplicáveis ao nível operacional que funciona como um sistema mecanístico e rotineiro.

Por outro lado, a tecnologia flexível conduz a uma ênfase no cliente e processo produtivo envolve uma

variedade e heterogeneidade de técnicas, sujeitas a constantes modificações e alterações, impondo

consequentemente condições de mudanças e imprevisibilidade no nível operacional da empresa. Neste caso, os

princípios da administração científica ou do modelo burocrático são inviáveis, pois o nível operacional funciona

como um sistema orgânico e mutável.

GESTÃO DE EMPRESAS

A complexidade das empresas afigura-se maior à medida que se analisam as empresas, seja do ponto de vista

endógeno de suas características internas de diferenciação organizacional, de objectivos, de tecnologias

utilizadas, tamanho, descentralização, etc., seja do ponto de vista exógeno de seu contexto ambiental, repleto

de contingências, ameaças, restrições e oportunidades que se alteram e se revezam e jamais se revelam com

antecipação, com clareza ou com nitidez. Ademais, a acelerada mudança e instabilidade ambiental, tendo em

vista o universo de factores interagentes, como as condições económicas, políticas, tecnológicas, legais, sociais,

culturais, demográficas e ecológicas, a crescente limitação e escassez de recursos indispensáveis para

assegurar os insumos necessários às empresas e a concorrência nos mercados passam a exigir estratégias e

respostas empresariais capazes de assegurar a sobrevivência e eficácia empresarial em situações de difícil

diagnóstico e de incerteza. Para tanto, as empresas precisam continuamente realocar, reajustar e reconciliar

seus recursos disponíveis com seus objectivos e oportunidades percebidas no ambiente de tarefa. A moderna

gestão de empresas procura levar em conta três componentes básicos, a saber:

1. O ambiente: isto é, as oportunidades visualizadas no ambiente de tarefa e, mais especificamente bem

como as restrições, limitações, contingências, coacções e ameaças nele existentes. Daí, a análise

ambiental ou seja, a análise das condições e variáveis ambientais, suas perspectivas actuais e futuras,

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percebidas no contexto ambiental.

2. A empresa, isto é, os recursos de que a empresa dispõe, sua capacidade e habilidades, bem como seus

pontos fortes e fracos, compromissos e objectivos e, sobretudo as tecnologias de que dispõe. Daí, a

análise empresarial, ou seja, a análise das condições actuais e futuras da empresa, recursos disponíveis

e recursos necessários (incluindo tecnologias), potencialidades, forças e fraquezas da empresa, sua

estrutura organizacional, sua capacidade e competência.

3. Adequação entre ambos: isto é, qual a postura a adoptar para compatibilizar seus objectivos, recursos,

potencialidades, limitações com as condições ambientais, no sentido de extrair o máximo das

oportunidades externas e expor-se o mínimo às ameaças, coacções e contingências ambientais.

Assim, cada empresa deve ser considerada sob o ponto de vista de eficácia e de eficiência, simultaneamente.

Eficácia é uma medida normativa do alcance de resultados, enquanto a eficiência é uma medida normativa da

realização dos recursos nesse processo. Em termos económicos, a eficácia de uma empresa se refere a sua

capacidade de satisfazer uma necessidade da sociedade através do suprimento de seus produtos (bens ou

serviços), enquanto a eficiência é uma relação técnica entre entradas e saídas. Nestes termos, a eficiência é

uma relação entre os custos e benefícios, quando abordamos, há pouco. a racionalidade empresarial,

verificámos que a eficiência representa a relação entre os recursos aplicados e o produto final obtido: é a razão

entre o esforço e o resultado, entre a despesa e a receita, entre o custo e o benefício resultante. Com a

Administração Científica de Taylor houve uma preocupação com a organização racional do trabalho e com os

métodos de trabalho para estabelecer padrões de desempenho: a eficiência dos operários passou a ser uma

relação entre o desempenho real e o padrão de desempenho estabelecido previamente e arbitrado como

eficiência ao nível de 100%. Assim, a eficiência está voltada para a melhor maneira (the best way) pela qual as

coisas devem ser feitas ou executadas (métodos), a fim de que os recursos (pessoas, máquinas, matérias-

primas) sejam aplicados da forma mais racional possível. A eficiência preocupa-se com os meios, com os

métodos e procedimentos mais indicados que precisam ser devidamente planeados e organizados a fim de

assegurar a optimização da utilização dos recursos disponíveis. A eficiência não se preocupa com os fins, mas

simplesmente com os meios. O alcance dos objectivos visados não entra na esfera de competência da

eficiência: é um assunto ligado à eficácia. À medida que o administrador se preocupa em fazer correctamente

as coisas, ele estará se voltando para a eficiência (melhor utilização dos recursos disponíveis). Porém, quando

ele utiliza estes instrumentos fornecidos por aqueles que executam para avaliar o alcance dos resultados, isto é,

para verificar se as coisas bem feitas são aquelas que realmente deveriam ser feitas, então ele estará se

voltando para a eficácia (alcance os objectivos através dos recursos disponíveis).

Contudo, nem sempre a eficácia e a eficiência andam de mãos dadas. Uma empresa pode ser eficiente

em suas operações (ao nível operacional) e pode não ser eficaz (ao nível institucional), ou vice-versa, pode ser

ineficiente em suas operações e, apesar disso, ser eficaz, muito embora a eficácia fosse bem melhor quando

acompanhada da eficiência. Pode também não ser nem eficiente nem eficaz. O ideal seria uma empresa

igualmente eficiente e eficaz. A eficiência se preocupa em fazer correctamente as coisas e da melhor maneira

possível. Daí a ênfase nos métodos e procedimentos internos, ao nível operacional. A eficácia se preocupa em

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fazer as coisas adequadas para atender às necessidades da empresa e do ambiente que a circunda. Enquanto a

eficiência se concentra nas operações e tem a atenção voltada para os aspectos internos da organização, a

eficácia se concentra no sucesso quanto ao alcance dos objectivos e tem a atenção voltada para os aspectos

externos da organização. Daí a ênfase no mapeamento ambiental, ao nível institucional. Dentro de um ponto de

vista mais abrangente, a eficácia empresarial é a habilidade da empresa de explorar o seu meio ambiente para

obter recursos, mantendo, ao mesmo tempo, uma posição autónoma de negociação. O nível operacional está

voltado predominantemente para a busca da eficiência e esta constitui a sua preocupação fundamental. O nível

institucional está voltado predominantemente para a busca da eficácia, através da adequação da empresa às

necessidades e demandas do seu ambiente de tarefa.

O nível intermediário, por seu turno, está empenhado em compatibilizar as necessidades de eficácia do

nível institucional com as necessidades de eficiência do nível operacional.

Assim, a acção empresarial para ser eficaz e eficiente precisa de ser planeada, organizada, dirigida e

controlada. O planeamento, organização, direcção e controle constituem o chamado processo administrativo.

Quando consideradas separadamente, planeamento, organização, direcção e controle constituem funções

administrativas, quando tomadas em conjunto na sua abordagem global para o alcance de objectivos, formam

o processo administrativo. Processo significa qualquer fenómeno que apresente mudança contínua no tempo ou

qualquer operação que tenha certa continuidade ou sequência. O conceito de processo implica que os

acontecimentos e as relações entre eles sejam dinâmicos, em evolução, sempre em mudança. O processo não é

coisa imóvel, parada, estática, mas móvel, contínua, não tendo começo, nem fim, nem uma sequência fixa e

rígida de eventos. Os elementos do processo agem uns sobre os outros, isto é, cada um afecta todos os demais

e é afectado por eles. Assim, as funções administrativas de planeamento, organização, direcção e controle não

constituem entidades separadas e estanques, mas ao contrário, são elementos interdependentes e

interagentes, com influências recíprocas acentuadas.

Muito embora, a maioria dos autores que tratam do processo administrativo o vejam como uma

sequência ou ciclo repetitivo de funções, na realidade ele compõe um sistema onde o todo é maior do que a

soma das partes, face ao seu efeito sinergístico. Mas, o que é mais importante ainda, é que o processo

administrativo se desenrola diferentemente em cada um dos três níveis da empresa, a saber, no nível

institucional, no nível intermediário e no nível operacional.

Vejamos o planeamento em primeiro lugar. No nível institucional ocorre o planeamento estratégico,

geralmente dimensionado a longo prazo, abrangendo a empresa como uma totalidade. No nível intermediário

ocorre o planeamento táctico, geralmente dimensionado a médio prazo e abrangendo cada departamento ou

divisão da empresa, separadamente. No nível operacional ocorre o planeamento operacional, geralmente

dimensionado a curto prazo e abrangendo as rotinas, procedimentos, programações e regulamentos de cada

cargo ou tarefa.

Quanto à função administrativa de organizar ocorre o mesmo fenómeno. No nível institucional a

organização está voltada para o desenho organizacional da empresa como uma totalidade, principalmente em

termos de diferenciação (divisão de trabalho organizacional), formalização (explicitação das regras e

regulamentos da empresa), centralização (concentração ou disposição do poder), integração (coordenação de

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decisões e acções), etc. No nível intermediário, a organização está voltada para o desenho departamental e

para as opções de configuração de cada um dos departamentos. No nível operacional, a organização está

voltada para o desenho dos cargos e das tarefas.

Quanto à função administrativa de dirigir segue-se o mesmo caminho. No nível institucional a direcção

está voltada para a manutenção da autoridade e poder e para os estilos administrativas de direcção. No nível

intermediário, a direcção é efectuada em termos de gerência, calcada em conceitos de motivação humana,

liderança e comunicação. No nível operacional, a direcção é efectuada em termos de supervisão de primeira

linha.

O mesmo ocorre com a função administrativa de controlar. No nível institucional ocorre o controle

organizacional abrangendo a empresa como uma totalidade. e medindo o desempenho global da empresa,

principalmente através de mensurações contáveis ou índices financeiros. No nível intermediário, o controle está

voltado para o desempenho de cada departamento, seja através de controlo orçamentário, orçamento-

programa, etc.

O Processo Administrativo nos Três Níveis das empresas

Planeamento Organização Direcção Controle

Nível

Institucional

Planeamento Estratégico

e Organizacional

Desenho Organizacional Direcção e estilos de

Administração

Controle Estratégico e

Organizacional

Nível

Intermediário

Planeamento Táctico e

Departamental

Desenho Departamental Gerência: Motivação,

Liderança e

Comunicação

Controle Táctico

Departamental

Nível

Operacional

Planeamento Operacional Desenho de Cargos e de

Tarefas

Supervisão de Primeiro

Nível

Controle Operacional

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TEXTO Nº 4

ESTRUTURA ORGANIZACIONAL: DIMENSÕES, DETERMINANTES E FORMATOS de: Miguel Pina e Cunha

1. Introdução A estrutura é uma das variáveis centrais em teoria das organizações. É fácil perceber

as razões dessa centralidade: se a estrutura pode ser entendida como o esqueleto da organização, torna-se então evidente que o esqueleto influencia e constrange o comportamento da e na organização. Neste capítulo serão abordados os seguintes pontos: as funções da estrutura, as suas dimensões, determinantes e formatos. O texto conclui-se com um breve exercício de «futurismo» no qual são contrastadas as linhas tradicionais e emergentes de estudo da estrutura.

2. As funções da estrutura organizacional

À definição de organização subjaz por norma a ideia da existência de actividades colectivas e coordenadas. E justamente para assegurar a coordenação das actividades que existe uma estrutura. A medida que a organização evolui, assim vai coevoluindo a sua estrutura, tal como ilustrado pelo bem conhecido excerto de Mintzberg, que a seguir se apresenta:

A Sra. Raku fazia cerâmica na sua cave. Isso envolvia uma série de tarefas distintas —

amassar o barro, formar os potes, trabalhá-los enquanto ainda não estão totalmente secos, preparar e aplicar o verniz e introduzi-los no fogo do forno de cerâmica. Porém, a coordenação de todas estas tarefas não apresentava qualquer problema; era ela própria que as fazia.

O problema residia na sua ambição e no facto de os seus potes serem tão atraentes: as encomendas excediam a sua capacidade de produção. Então, ela contratou a Sra. Bisque, que estava desejosa por aprender a fazer cerâmica. Mas isso significava que a Sra. Raku tinha que dividir o seu trabalho. Uma vez que as lojas de artesanato pretendiam cerâmica feita pela Sra. Raku, ficou decidido que a Sra. Bisque amassaria o barro e prepararia o verniz, ficando a Sra. Raku encarregada do resto. E isto requeria coordenação do trabalho — na verdade tratava-se de um pequeno problema, pois com duas pessoas numa oficina de cerâmica, bastava-lhes simplesmente comunicar entre si informalmente. A combinação resultou bem, tão bem que depressa a Sra. Raku estava atolada em encomendas. Tornava-se necessário mais assistentes. Mas desta vez, para fazerem os seus próprios potes. A Sra. Raku decidiu contratá-las logo que saíram da escola de cerâmica local. Deste modo, e enquanto tinha levado algum tempo a treinar a Sra. Bisque, as três novas assistentes sabiam exactamente o que fazer desde o começo e depressa se integraram; mesmo com cinco pessoas, a coordenação não constituía um problema.

No entanto, à medida que foram precisas mais assistentes, começaram a surgir problemas de coordenação. Um dia, a Sra. Bisque tropeçou num balde de verniz e quebrou cinco potes; noutro, a Sra. Raku abriu o forno e descobriu que todos os vasos de pendurar tinham sido envernizados por engano com a cor vermelha. Nessa altura compreendeu que sete pessoas numa pequena oficina de cerâmica não conseguiam coordenar todo o seu trabalho através de um mecanismo de comunicação informal. Para tornar as coisas piores, a Sra. Raku, que agora se intitulava presidente da Ceramics, mc., era forçada a passar cada

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vez mais tempo com os clientes; nesses dias, era mais provável encontrá-la com um vestido Marimekko do que usando um par de jeans. Assim, ela nomeou a Sra. Bisque para gestora da oficina; deveria ocupar-se a tempo inteiro da supervisão e coordenação do trabalho das cinco produtoras da sua cerâmica.

A empresa continuou a crescer. Grandes alterações aconteceram de novo quando foi contratado um analista de estudo do trabalho. Ele recomendou mudanças, que implicavam que cada pessoa desempenhasse apenas uma tarefa para uma das linhas de produtos (potes, cinzeiros, vasos de pendurar e animais de cerâmica) — a primeira amassava o barro, a segunda dava a forma, a terceira enfeitava e assim sucessivamente. Deste modo, a produção adquiriu a forma de quatro linhas de montagem. Cada pessoa seguia um conjunto de instruções estandardizadas, estudadas previamente por forma a garantir a coordenação de todo o seu trabalho. Claro que a Ceramics, mc. deixou de vender para lojas de artesanato; a Sra. Raku só aceitava encomendas de grossistas, a maior parte proveniente de cadeias de supermercados.

A ambição da Sra. Raku era ilimitada, e quando surgiu a oportunidade de diversificar, ela agarrou-a. Primeiro, azulejos, depois acessórios de casa-de-banho e finalmente tijolos de barro. Subsequentemente, a empresa dividiu-se em três divisões — produtos para o consumidor, produtos de construção e produtos industriais. A partir do seu escritório no quinquagésimo quinto andar da Torre de Cerâmica, a Sra. Raku coordenava as actividades das divisões através do balanço do seu desempenho em cada trimestre, tomando pessoalmente medidas sempre que este e os valores de crescimento ficavam aquém do previsto. Foi num dia em que estava à sua secretária analisando essas previsões orçamentais, que a Sra. Raku decidiu dar um novo nome à sua empresa: «Ceramico» (Mintzberg, 1983, pp. 1-2).

Tal como a descrição anterior permite verificar, a estrutura organizacional compreende

fundamentalmente duas componentes: (1) o modo como a organização divide o trabalho em múltiplas tarefas, e (2) a forma como estabelece a coordenação entre elas (Mintzberg, 1979). Numa perspectiva próxima, Robbins (1990) refere a importância da estrutura como decorrente do facto de ela permitir definir a atribuição das tarefas, as relações de autoridade e os mecanismos de coordenação formal das actividades. Na estrutura ainda se englobam os padrões de interacção resultantes dos pontos anteriores.

O estudo da estrutura organizacional tem-se baseado num conjunto de seis premissas, que ajudam a compreender melhor quer o próprio conceito quer a forma como ele tem vindo a ser investigado (Bolman & Deal, 1991):

1. As organizações existem para alcançar objectivos definidos 2. A estrutura de cada organização deve ser desenhada e implementada por forma a

ajustar-se às características específicas dessa organização (em termos de pessoas, estratégia, produtos, tecnologia, etc.)

3. As organizações tendem a funcionar melhor quando a incerteza é controlada por um conjunto de normas elaboradas com a finalidade precisa de evitar a ambiguidade

4. A especialização facilita a obtenção de níveis elevados de desempenho, nomeadamente por facilitar a cada indivíduo o conhecimento completo das suas atribuições

5. A eficácia não é possível sem a correcta coordenação e controlo das actividades individuais

6. Os problemas organizacionais resultam, muitas vezes, de estruturas pouco apropriadas às reais necessidades da organização.

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Não se esgotando no conjunto de relações hierárquicas formalizadas no organigrama, a estrutura cria linhas de comunicação e de relacionamento informais, que dão origem a uma empresa «por detrás do organograma» (Krackhardt & Hanson, 1993), ou estrutura informal. A estrutura informal corresponde ao lado não previsto e não planeado, mas não necessariamente indesejado. Com efeito, a organização informal pode ser comparada ao sistema nervoso central da organização (Krackhardt & Hanson, 1993), que entra em acção sempre que é necessário resolver problemas inesperados e para os quais, portanto, não existe uma resposta da estrutura formal. As redes sociais informais (que podem ser de diversos tipos, como de aconselhamento, confiança e comunicação), são normalmente estáveis ao longo do tempo e desconhecidas dos gestores.

Os anos 80 tornaram óbvia a importância da gestão do informal, ao realçarem a importância de conceitos como a cultura organizacional (e.g. Peters & Waterman, 1982). A comunicação informal pode funcionar, por outro lado, como uma fonte importante de coordenação horizontal. A sua acção é indispensável porque se as organizações prescrevem as linhas de comunicação verticais, elas tendem, nas abordagens clássicas, a não considerar as comunicações horizontais.

Resumindo os respectivos objectivos, a estrutura da organização serve para (Daft, 1998):

1. Designar as relações de reporte formal 2. Identificar o agrupamento dos indivíduos por departamentos e estabelecer as

relações entre esses departamentos 3. Definir o desenho dos sistemas que asseguram a comunicação, coordenação e

integração do trabalho dos diversos departamentos.

3. Dimensões Estruturais Com base no trabalho de Robbins (1990, pp. 82-83), é possível Considerar as

seguintes dimensões estruturais, isto é, o conjunto de dimensões que podem ser usadas para caracterizar a estrutura de uma organização: amplitude de controlo, amplitude vertical, autonomia, centralização, complexidade, componente administrativa, delegação, diferenciação, especialização, estandardização, formalização, integração e profissionalização.

Amplitude de controlo. Esta dimensão é talvez mais conhecida pela expressão inglesa span of control, e refere-se ao número de indivíduos supervisionados por uma chefia. Trata-se de uma dimensão relevante porque cada chefia deverá coordenar um número de indivíduos suficientemente grande para não criar coordenadores em excesso, e suficientemente pequeno para que a coordenação não deixe de existir por impossibilidade de um mesmo indivíduo articular equipas demasiado grandes. Da mesma forma que não há um número mágico para a quantidade ideal de membros de um grupo, não existe uma solução universal para o número de subordinados por chefia. Assim sendo, a amplitude de controlo de determinada chefia depende de um conjunto de variáveis que ajudam a encontrar respostas caso a caso, nomeadamente (e com base em Vasconceilos e Sá, 1993): (1) a diversidade das tarefas desempenhadas pelos subordinados, (2) a complexidade associada a essas tarefas, (3) o grau de dispersão geográfica entre subordinados, (4) a formação e motivação desses subordinados e (5) os mecanismos de controlo organizacional.

É evidente, tendo em conta todas estas variáveis, que diferentes funções requerem respostas adequadas para o seu caso particular, não se satisfazendo com generalidades

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que apontem n como a amplitude de controlo aconselhada. Na GE, por exemplo, a amplitude de controlo é actualmente de 10 a 12 empregados, o dobro de há vinte anos atrás.

Amplitude vertical. A amplitude vertical ou profundidade hierárquica refere-se ao número de níveis hierárquicos que existem entre o topo e a base da organização (inclusive). Quanto maior o número de níveis, maior a amplitude vertical e maiores as probabilidades de surgimento do fenómeno social que Kanter (1983) apelida «mentalidade de elevador», um fenómeno de conformação às regras instituídas, alimentado por uma longa e incontornável cadeia hierárquica, a qual preza mais o respeito pelas regras do que os resultados obtidos e que, por conseguinte, tende a privilegiar os comportamentos aos resultados de trabalho.

A tendência actual é a de considerar que a turbulência dos mercados aconselha as organizações a adoptarem estruturas achatadas. Tais estruturas implicam a diminuição da amplitude vertical, a qual pode apresentar inconvenientes graves ao nível da circulação da informação e do processo de tomada de decisão. Estruturas mais achatadas, i.e., com menor número de níveis hierárquicos, tendem a permitir maior rapidez e menos enviesamentos no processo de circulação da informação. A introdução de tecnologias da informação, por possibilitar a reestruturação dos processos de comunicação e a deslocalização dos centros de decisão, será possivelmente uma causa a favor da diminuição futura da amplitude vertical das organizações.

Autonomia. Refere-se à possibilidade de um indivíduo/grupo/departamento determinar as suas próprias acções. A autonomia numa organização é sempre, em última análise, limitada, porque cada unidade de decisão se deve submeter aos objectivos da própria organização. Em todo o caso, diferentes organizações permitem diferentes margens de influência das actividades. Correntes como a democracia industrial pugnaram, entre outros objectivos, pelo aumento da autonomia no trabalho, e experiências conduzidas em vários locais (particularmente nos países nórdicos) relevaram a importância da autonomia no trabalho. Os grupos semiautónomos da Volvo representam, possivelmente, o exemplo mais conhecido deste tipo de intervenção.

Centralização. A centralização refere-se, em termos simples, ao locus das decisões na organização. Uma organização é tanto mais centralizada quanto mais concentra as decisões nuns poucos lugares (indivíduos, departamentos). Pode-se dizer, deste modo, que a centralização tem a ver com a dispersão decisional. Uma organização centralizada é aquela que concentra as decisões num único ponto da organização (num indivíduo, grupo de indivíduos, ou departamento) ou num número limitado de pontos, ao passo que uma organização descentralizada é aquela que distribui a tomada de decisão por mais pontos. Em vez de tomar as estruturas como centralizadas ou descentralizadas, é preferível falar em grau de centralização/descentralização, uma vez que esta variável deve ser assumida como percorrendo diversas gradações entre dois extremos possíveis.

Complexidade. A complexidade refere-se ao grau de diferenciação existente numa organização: quanto mais diferenciada uma organização, mais complexa. A diferenciação pode ser horizontal (a separação entre unidades do mesmo plano hierárquico, ao nível das tarefas que executam, das qualificações dos seus profissionais, etc.), vertical (profundidade hierárquica) ou espacial (grau de concentração / dispersão geográfica). Quando se aumenta qualquer destes factores, aumenta-se o grau de complexidade da estrutura. A complexidade é uma variável importante porque a ela estão ligados vários processos centrais para os resultados da organização, nomeadamente a comunicação, a coordenação e o controlo.

Componente administrativa. A componente administrativa de uma organização diz respeito à proporção do número de supervisores, gestores e pessoal de apoio, em relação ao número total de trabalhadores. Algumas abordagens recentes da mudança organizacional (como a reengenharia) têm atacado o excesso de componente administrativa de muitas organizações, o qual multiplica o número de postos de trabalho, sorve uma

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quantidade considerável de recursos e não tem um impacto significativo na quantidade ou qualidade do trabalho produzido. As tecnologias da informação permitem redimensionar a componente administrativa e, em caso de excesso, reduzi -l para níveis aceitáveis.

Delegação. A delegação refere-se à quantidade de decisões que o superior atribui ao(s) subordinado(s). A delegação é normalmente conferida uma tónica positiva, a qual resulta do facto de ela permitir o aumento da participação na organização. A semelhança das demais técnicas organizacionais, a delegação não é boa nem má em si mesma: pode é ser bem ou mal utilizada. Subordinados sem preparação ou com falta de vontade para decidir ou participar na decisão, desaconselham obviamente a delegação. Estreitamente relacionado com a delegação, encontram-se conceitos como os de empowerment e autonomia. Todos eles, quando introduzidos de forma sistemática, implicam a redistribuição do poder e a mudança do estilo de chefia (Leana, 1987). Tal como observado por Hoilander e Offerman (1990), assiste-se no presente a um enfoque progressivo no empowerment dos subordinados, por contraponto à centralização no poder dos líderes.

Diferenciação. Se uma organização pode ser entendida como um conjunto de pessoas que trabalham de forma coordenada para o alcance de objectivos comuns, torna-se evidente a necessidade de atribuir diferentes funções a pessoas diferentes. Esta divisão do trabalho persegue o objectivo de distribuir tarefas diferentes por pessoas diferentes, de tal forma que do trabalho de diversos especialistas resulte um produto / serviço que congregue as diversas capacidades e especializações existentes na organização. Ao processo de divisão do trabalho, pode-se chamar diferenciação, sendo esta entendida como a diferença entre as orientações cognitivas e emocionais dos gestores dos diversos departamentos. Os autores desta definição, Lawrence e Lorsch (1967), acrescentam o facto de organizações competindo em envolventes mais instáveis e turbulentas precisarem de aceder a níveis de maior diferenciação interna do que organizações competindo em ambientes mais plácidos. Este mecanismo de diferenciação deverá ser contrabalançado por um mecanismo de integração.

Especialização. Refere-se ao conjunto de actividades que um indivíduo deverá executar no seu trabalho. A especialização pode ser funcional ou social. A especialização funcional é normalmente mais conhecida como divisão do trabalho e consiste na separação de uma unidade funcional em vários segmentos, os quais são depois distribuídos por vários sujeitos. A especialização funcional promoveu, entre outros aspectos, a facilidade de substituição dos empregados. Essa substituição torna-se mais difícil no caso da especialização social. Aqui é o indivíduo que é especializado, e não o trabalho. Neste caso contam-se principalmente aqueles especialistas cujos conhecimentos não são facilmente substituíveis. Um médico especialista, um professor universitário ou um técnico comercial perito numa determinada área, podem ser tomados como exemplos de especialização social. Quanto maior for a especialização, maior será a complexidade, visto que organizações com elevados níveis de especialização precisam normalmente de assegurar mecanismos de coordenação mais sensíveis e apurados.

Estandardização. O desvio aceitável em relação àquilo que está previsto, é denominado estandardização. Com a estandardização visam as organizações diminuir a incerteza, rotinizar os procedimentos, e evitar afastamentos em relação ao planeado. Ao recorrer a processos de estandardização, as organizações criam regras e regulamentos capazes de constranger as condutas individuais e de limitar as alternativas comportamentais disponíveis. Embora a estandardização se possa revestir de vantagens óbvias, ela pode igualmente limitar as possibilidades de aprendizagem organizacional. Para ilustrar com uma consequência positiva e outra negativa, dir-se-ia que se por um lado a estandardização facilita o aumento da eficiência, ela diminui a capacidade de inovação e a busca de soluções criativas para os problemas emergentes.

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Formalização. O grau em que as actividades do empregado se encontram definidas por escrito. A formalização refere-se por isso ao maior ou menor grau em que o indivíduo dispõe da possibilidade de realizar o seu trabalho «à sua maneira». Em funções / organizações muito formais, a possibilidade de o indivíduo imprimir um toque pessoal ao trabalho que executa é consideravelmente limitada, ao passo que em organizações menos formais, essa possibilidade é acrescida. Quando formaliza o trabalho, uma organização espera recolher benefícios decorrentes da previsibilidade das acções individuais; quando evita a formalização, pretende tirar partido das capacidades individuais em termos de criatividade e flexibilidade de resposta a problemas imprevisíveis, por exemplo. A semelhança das restantes dimensões estruturais, a formalização não é, em si mesma, boa ou má. Diferentes funções e diferentes organizações reclamam diferentes níveis de formalização: se o trabalho de um professor universitário é pouco regulamentado por regras, políticas ou procedimentos, o do empregado de uma multinacional de refeições rápidas tende a obedecer a regras muito explícitas e relativas mesmo a aspectos que a maioria das organizações tende a não formalizar.

QUADRO 1 — Ligações verticais e horizontais (Baseado em Daft, 1998)

Ligações verticais Reporte hierárquico A cadeia de comando ilustrada pelas linhas verticais do organograma,

que indica para que nível um problema deve ser passado quando não pode ser resolvido pelo nível inferior.

Regras e planos Documentos que estabelecem a forma de actuação corrente para problemas previstos, permitindo dessa forma resolver um problema sem o passar para um nível mais elevado na hierarquia; os planos, de que é exemplo o orçamento, tornam possível a definição de limites para a tomada de decisão a um determinado nível

Sistemas de informação verticais Visam aumentar a circulação de informação a diferentes níveis, tornando mais verticais eficiente a comunicação ao longo da cadeia (por exemplo, via e-mail).

Ligações horizontais Sistemas de informação Servem para melhorar a facilidade e a rapidez de comunicação entre

diferentes departamentos, recorrendo por exemplo a tecnologias de informação.

Contacto directo A comunicação directa entre pessoas de diferentes áreas (e.g. face-a-face ou por telefone). Podem ser atribuídas funções formais de ligação, o que significa que um indivíduo localizado num departamento assume a responsabilidade de estabelecer a comunicação com outro departamento (e.g. um engenheiro da área de investigação e desenvolvimento pode ser designado como responsável pela articulação com a produção).

Task forces Um comité temporário, que articula pessoas de diferentes departamentos envolvidos num problema comum. Distingue-se das formas anteriores por envolver mais do que dois departamentos. De regresso ao seu departamento, cada representante deve apresentar as conclusões e sugestões da task force.

Integradores Neste caso, é criada uma posição ou departamento responsável, a tempo inteiro, por actividades de comunicação e coordenação. Esta posição ou departamento, ao contrário das task forces, não reporta a nenhum departamento funcional. Exemplos deste papel incluem os gestores de produto ou de projecto.

Equipas Task forces permanentes, muitas vezes usadas em conjunto com integradores. Constituem o mais poderoso instrumento de coordenação horizontal e são aconselháveis quando se colocam necessidades intensas de coordenação durante longos períodos de tempo.

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Profissionalização. O grau em que os trabalhadores usam uma Organização profissional como referência; a dedicação que a sua área de trabalho lhes merece; a autonomia a que consideram ter direito. Quanto mais profissionalizada for a organização, mais os indivíduos que nela trabalham conhecem os limites esperados da sua conduta. Para conseguir níveis elevados de profissionalização (que se refere, como tal, à normalização do comportamento dos indivíduos de um determinado grupo profissional), uma organização pode: (1) contratar indivíduos já profissionalizados, i.e., sujeitos a uma aprendizagem intensiva, ou (2) ela própria investir na profissionalização dos seus colaboradores, definindo comportamentos esperados, fluxos de trabalho, códigos profissionais, etc. Quanto maior for o grau de profissionalização numa organização, menor será o nível de formalização requerido: o profissional internalizou as regras e adquiriu uma cultura profissional, que funciona ela própria como um mecanismo de controlo (Cunha & Cunha, 1999).

4. Determinantes

Nesta secção serão apresentadas as variáveis determinantes do tipo de estrutura de uma dada organização, isto é, aquelas que influenciam a sua estrutura: dimensão, tecnologia, envolvente e estratégia. A escolha, pela organização, de um arranjo organizativo, não é portanto totalmente «desconstrangida», uma vez que o conjunto de imperativos que a seguir se apresenta, limita as escolhas possíveis e estreita os graus de liberdade dos gestores na escolha de um formato estrutural.

Dimensão. A dimensão de uma empresa, ou seja, o seu número de empregados, reflecte-se inevitavelmente na estrutura por ela adoptada. A medida que uma organização cresce, surge a necessidade de ajustar a estrutura a tal crescimento, uma vez que uma empresa de média dimensão não pode funcionar de forma semelhante a uma empresa familiar (recorde-se, a este propósito, o excerto de Mintzberg apresentado no início deste capítulo). O crescimento tende a implicar um aumento dos níveis de formalização e complexidade. A divisão do trabalho envolve um número progressivamente maior de pessoas e de tarefas, que impossibilitam a gestão baseada na comunicação informal, e que numa fase subsequente tornam necessária a evolução para um estágio mais complexo de divisão e coordenação do trabalho. A dimensão da organização constrange portanto as escolhas estruturais possíveis e os processos que nesse contexto estrutural tomam lugar.

Tecnologia. Seja qual for a dimensão da organização, a sua estrutura acaba por depender, em alguma medida, da tecnologia em uso: diferentes meios tecnológicos implicam diversos sistemas de divisão e integração do trabalho. Diferentes tecnologias envolvem a organização em níveis distintos de previsibilidade e eficácia, requerem conhecimentos de níveis diversos, estimulam níveis de participação mais altos ou mais baixos. Em regra, pode afirmar-se que quanto maior a complexidade tecnológica de uma organização, maior a sua complexidade estrutural (Bolman & Deal, 1991). Quanto menos exigente for a tecnologia (em termos de conhecimentos, formação, autonomia, capacidade de decisão), menores serão os esforços requeridos ao nível da especialização e coordenação. Comparem-se, por exemplo, as exigências de coordenação dos empregados de um restaurante e dos membros de uma equipa de cirurgia coronária. A variável tecnológica assume uma importância crucial no funcionamento das organizações contemporâ neas na medida em que a actualização

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tecnológica funciona como condição sine qua non para o desenvolvimento e sobrevivência das organizações.

Envolvente. A envolvente interfere com o funcionamento das organizações. Dessa influência decorre que as organizações que competem em envolventes muito instáveis e turbulentas não deverão adoptar estruturas demasiado rígidas. Este facto foi observado pela teoria contingencial (vide Lawrence & Lorsch, 1967), que defende que diferentes envolventes favorecem diferentes tipos de estruturas. A ideia de contingência não deve, todavia, ser tomada de uma forma determinista, pois que a uma envolvente não corresponde necessariamente «uma melhor estrutura». Se assim fosse, teria que ser rejeitado o princípio da equifinalidade dos sistemas abertos (Katz & Kahn 1978), e aceite um determinismo ambiental que contraria a evidência.

Como regra, porém, estruturas mais orgânicas ou mecanicistas são mais ajustadas ou menos em função das características da envolvente, como ilustrado pelo Quadro 2. Em resumo, este quadro indica que envolventes mais instáveis recomendam estruturas de tipo orgânico e que envolventes mais estáveis favorecem estruturas de tipo mecanicista. Investigação recente, todavia, indicia que as empresas detentoras de melhor registo de inovação misturam características orgânicas e mecanicistas, em vez de apresentarem um modo de funcionamento puramente orgânico ou mecanicista (Brown & Eisenhardt, 1997). Estes dados sugerem a necessidade de considerar a existência de organicismo-mecanicista ou mecanicismo-organicista (sobre a necessidade de síntese.

QUADRO 2 — Características da estrutura, características da envolvente e grau

de ajustamento (retirado de Mabey, Salaman & Storey, 1998, p. 248)

Estratégia. De acordo com a famosa máxima de Chandler (1962), a estrutura deve

seguir a estratégia. Quer isto dizer que a estrutura é inevitavelmente constrangida pela estratégia da organização, devendo articular e integrar funções por forma a facilitar o alcance dos objectivos organizacionais. Deste modo, diferentes estratégias requerem diferentes arranjos organizativos para responder adequadamente a diferentes necessidades. Assim, organizações com estratégias defensivas, prospectoras ou analisadoras (Miles & Snow 1984a), acabam por ter modos de funcionamento profundamente diversos (ver Quadro 3).

Mecanicista Orgânica

Instável X Desajustada V’ Ajustada

Estável V’ Ajustada X Desajustada

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Menos «proclamada» mas não despicienda é a ideia de que a estrutura também pode

constranger a estratégia. Embora tal suposição vá contra as regras enunciadas em qualquer manual de gestão, a existência de níveis de inércia estrutural elevados (vide Cunha, 1996), pode actuar como um obstáculo à mudança e como um contrapeso à redefinição da estratégia. Dada a dificuldade de alterar aquilo que existe, as organizações acabam por vezes por devotar as suas forças à defesa do modo de funcionamento corrente, mesmo que se comecem a acumular os indícios de que esse funcionamento já não serve os propósitos da organização. São diversos os sintomas de falha da estrutura de uma organização relativamente à consecução dos objectivos para que foi criada. Entre eles encontram-se os seguintes (Daft, 1998):

•  Adiamento  ou   falta  de  qualidade  das  decisões.  Tende a ocorrer quando a estrutura canaliza uma quantidade excessiva de decisões para o topo da hierarquia, quando a

QUADRO 3 — Estratégias e processos, segundo a tipologia de Miles e Snow (1984a, p. 48)

Defensiva Prospectora Analisadora

Produto-mercado

Linhas de produto limitadas e estáveis

•  Mercados  previsíveis  

•  Crescimento  por  penetração de mercado

•  Ênfase  na  profundidade

Linhas de produto alargadas Mercados em mudança

•  Crescimento  por  desenvolvimento de produtos e mercados Ênfase no alargamento

Linhas de produto estáveis e mutáveis Mercados previsíveis e em mudança.

•  Crescimento principalmente por desenvolvimento do mercado Ênfase no foco e profundidade

Investigação e desenvolvimento

•  Limitada  a  melhorias  de produto

•  Extensiva  

Ênfase em ser o primeiro no mercado

•  Focada  

•  Ênfase  em  ser  «o  segundo  no  mercado»

Produção

•  Grande  volume-baixo custo

•  Ênfase  na  eficiência  e na engenharia de processos

•  Adaptada  aos  consumidores  Ênfase na eficácia e design do produto

•  Grande  volume-baixo custo

•  Ênfase  na  engenharia  de  processo  e  na gestão de marcas ou produtos

Marketing •  Limitado  às  vendas   •  Grande  ênfase  na  pesquisa  de  mercado

•  Uso  extensivo  de  campanhas  de  marketing

Estrutura •  Funcional   •  Divisional   •  Funcional  e  matricial  

Processos de controlo •  Centralizados   •  Descentralizados  

•  Fundamentalmente centralizados com descentralização nas áreas de marketing e gestão de marcas

Coligação dominante

•  Presidente-produção-

-finanças

•  Presidente-I&D- pesquisa de mercado

•  Presidente-marketing -engenhari de processo

Sequência de planeamento

• Planeamento

- actuação

- avaliação

Actuação

- avaliação

- planeamento

Avaliação

- Planeamento

- Actuação

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informação não chega às pessoas correctas, ou quando a informação que chega às pessoas correctas não tem a qualidade requerida. •  Défice  de  inovação.  A organização não se revela capaz de responder com inovação à mudança da envolvente. Ocorre mais frequentemente na ausência de níveis adequados de coordenação horizontal e de pontos suficientes de contacto com o exterior (Cunha, 1998). Pode também suceder que a organização não disponha de mecanismos adequados de recolha ou de circulação interna de informação. •   Níveis   demasiado   elevados   de   conflitualidade.   Ocorre quando os níveis de coordenação e de ajustamento de objectivos interdepartmentais são insuficientes, o que permite que cada departamento ponha a tónica em objectivos de nível departamental, que dificultam o alcance dos objectivos da organização. Uma vez mais, trata-se de um sintoma mais provável na ausência de mecanismos de coordenação horizontais.

5. Formatos estruturais A mudança das texturas ambientais, combinada com a evolução tecnológica e o desenvolvimento de novas realidades socioeconómicas, tem obrigado as organizações a adaptar as suas estruturas às novas características da envolvente.

Com base em trabalhos como os de Daft (1998), Hrebiniak ei’  ai.  (1989, pp. 12-13) e de Miles e Snow (1984b, pp. 38-41), é possível traçar a evolução das estruturas organizacionais, e assim ficar com uma visão historicamente enquadrada do seu processo evolutivo. Apresentam-se a seguir as principais formas estruturais identificadas na literatura. Esta recolha não é exaustiva, por duas razões: por deixar de fora algumas formas menos referidas (como a agência) e por não se deter na infinidade de formas híbridas que pontuam a prática organizacional (Galbraith, 1995). Não obstante, a exposição deverá ser representativa dos principais formatos estruturais, proporcionando uma visão rápida dos principais arranjos organizativos, nomeadamente: estrutura funcional, estrutura divisional, matriz, estrutura horizontal e estrutura em rede.

Estrutura funcional Neste caso, as actividades são agrupadas por função (ver Fig. 1). Isto é, os empregados com actividades de marketing são colocados num mesmo departamento, os de produção noutro departamento e assim sucessivamente. Dentro de cada departamento, continua a distribuição por áreas de actividade. A estrutura funcional racionaliza o trabalho dividindo tarefas e atribuindo a sua gestão a especialistas na área. As diversas áreas funcionais (produção, comercial, finanças, recursos humanos, etc.) são portanto separadas e controladas centralmente por uma equipa de gestão que articula as suas actividades no sentido de uma estratégia comum.

A estrutura funcional é um formato adaptado a envolventes estáveis. Pressupõe a existência de centralização dos processos de controlo e de decisão, institucionaliza sobretudo a comunicação vertical e encontra-se preparada para integrar níveis elevados de especialização técnica. As linhas de produtos são limitadas e estandardizadas, e a escala de negócio limitada.

A estrutura funcional apresenta diversos pontos fortes. Por um lado, consegue obter níveis apreciáveis de eficiência e mostra-se capaz de dar resposta às exigências de mercados para os quais é importante a estandardização e a quantidade. Por outro, o facto de todos os profissionais de uma determinada área estarem agrupados, facilita o desenvolvimento das respectivas competências. Em contrapartida, trata-se de um formato que não estimula a exposição às actividades de outros departamentos, o que pode dificultar

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a coordenação interdepartamental, criar alguma lentidão na resposta a mudanças na envolvente e constituir uma barreira à inovação.

Algumas organizações têm procurado manter as vantagens deste formato, eliminando os respectivos inconvenientes, recorrendo para isso à introdução de ligações horizontais sobre a base funcional. O culminar deste tipo de prática poderá ser a organização hipertextual. Na organização hipertextual (Nonaka & Ichijo, 1997), coexistem grupos altamente flexíveis e um contexto hierárquico, o que prepara a organização para competir em dois mundos (Rayport & Sviokla, 1995):

(1) um mundo tangível, do material, para o qual fora desenhada a forma estrutural funcional; (2) um mundo imaterial ou virtual, que tem na informação o seu recurso fundamental, e que é melhor abordado pelos formatos horizontalizados.

FIGURA 1 — Estrutura funcional QUADRO 4 — Características da estrutura funcional

Estrutura divisional Na estrutura divisional, o agrupamento é baseado nos resultados organizacionais. Trata-se portanto de recriar a anterior estrutura funcional, agora no contexto de um determinado grupo de produto (variantes deste formato incluem as estruturas geográfica e por mercado). Cada um destes grupos será dotado de uma estrutura funcional (com os próprios departamentos de marketing, produção, etc.), focalizada num grupo de produto específico, o

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

•  Envolvente  estável  e  pouco  incerta

•  Ênfase  operacional  nos objectivos funcionais

•  Permite  economias  de  escala nos departamentos

•  Respostas  lentas  à  mudança  ambiental

•  Tecnologia    de  rotina  e  com baixos níveis de interdependênca

•  Pequena  ou  média dimensão •  Ênfase  nos  custos   •  Aprofundamento  dos  

conhecimentos

•  Ênfase  na  eficiência  e  na  qualidade técnica

•  Autoridade  formal  pelos gestores funcionais

Facilita o alcance dos objectivos funcionais

Adapatada a um ou poucos produtos

Falta de comunicação interdepartamental

Pouca inovação

Visão restrita dos objectivos organizacionais

Pode amontoar as decisões no topo e levar à sobrecarga decisional da hierarquia

Director geral

Produção I&D Finanças Marketing

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que permite decisões mais rápidas, visto que as linhas de autoridade convergem para um nível hierárquico inferior (ver Fig. 2).

A necessidade de inovar e de dar resposta a novas exigências competitivas, obrigou as grandes empresas a procurar este novo arranjo estrutural, mais flexível e mais dado à inovação e à diversificação. Neste tipo de organização, são formadas divisões a um mercado particular, lançar os seus próprios produtos/serviços e proceder ao seu próprio ajustamento interno. Em termos simples, pode-se dizer que a estrutura divisional centraliza o planeamento e descentraliza as operações.

Este tipo de estrutura foi a resposta de um conjunto de grandes empresas americanas (General Motors, Du Pont, Standard Oil e Sears, Roebuk) às crises que as assolavam. Com a estrutura divisional, cada subsistema faz face a problemas semelhantes aos que antes eram enfrentados pela empresa-mãe, mas agora reduzidos a uma escala menor. Ao nível da administração, os responsáveis ocupam-se de problemas como as relações interorganizacionais, as decisões de investimento, a prospecção de novos mercados, etc. Este tipo de estrutura permite, por exemplo, que o mesmo tipo de actividade possa ser desenvolvido a dois níveis: ao nível da divisão e ao nível central. No caso da I&D, ao nível central estudam-se problemas genéricos da indústria; ao nível da divisão, são considerados aspectos de um produto específico para um determinado mercado. Esta forma estrutural rasgava novos horizontes para as organizações que, aparentemente, podiam crescer indefinidamente e na proporção da existência de novos mercados e de capital disponível para inaugurar uma nova divisão. Nos anos 60 e 70, as organizações viram-se confrontadas, todavia, com a necessidade de garantir níveis de eficiência razoáveis sem perder a capacidade de responder às novas solicitações do mercado. Era necessário, como tal, encontrar uma estrutura capaz de ajustar as vantagens das estruturas funcional e divisional: a matriz.

Entre as desvantagens da estrutura divisional contam-se a perda de economias de escala (visto que em que em cada divisão são desenvolvidas as mesmas funções), e a dificuldade de coordenação entre linhas de produto, já que estas se encontram separadas não apenas em diferentes divisões, mas também em localizações distintas. Nem sempre este tipo de estrutura tem preparada, por exemplo, uma resposta integrada à exigência de um cliente interessado em produtos de diferentes divisões da mesma empresa.

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QUADRO 5 — Características da estrutura divisional

Matriz Para combinar eficiência e capacidade de resposta, algumas organizações adoptaram a matriz como estrutura. A estrutura matricial (uma das variantes possíveis dos formatos estruturais mistos) visa algo que se poderá descrever com um estado de eficiência elástica, usando para o efeito um sistema múltiplo de comando (Davis & Lawrence, 1977). Ao complementar a estrutura funcional com a divisional (isto é, ao implementar em simultâneo estrutura funcional e divisão por produtos; ver Fig. 3), a matriz resulta numa estrutura complexa e algo ambígua, que deverá ser usada apenas se existirem condições favoráveis para a sua implementação.

A estrutura matricial assenta num par de princípios: (1) a autoridade dual, e (2) o equilíbrio de poder. O primeiro refere-se ao facto de os trabalhadores poderem ter dois supervisores; o segundo defende que o poder dos dois supervisores deve ser aproximadamente semelhante (Daft, 1998). Com estes dois princípios, a organização visa expor os trabalhadores a um chefe funcional e a um chefe de projecto. O poder destes dois responsáveis deve ser equilibrado porque, quando tal não sucede, da matriz resta o nome. Para equilibrar o poder dos dois supervisores, a organização deve proporcionar-lhes iguais níveis de influência em termos das decisões de recompensa e promoção dos subordinados, oportunidades de comunicação semelhantes, e a mesma importância no quadro do projecto.

Se a matriz for devidamente implementada, ela permite que sejam obtidos níveis de coordenação e integração, comunicação lateral e circulação da informação, superiores quer aos da estrutura funcional quer aos da divisional. Possibilita igualmente uma afectação flexível dos recursos organizacionais e a aquisição, pelos gestores, de competências mais gerais ou mais específicas, consoante os seus interesses e os da organização. Não custa perceber a razão pela qual se referiu que a estrutura matricial necessita de condições muito especiais para resultar: o equilíbrio necessário entre as componentes funcional e de projecto não é fácil de atingir nem de preservar. Em caso de uma correcta implementação, são potencialmente alcançados níveis elevados de qualidade técnica (tipicamente relacionada com a estrutura funcional) e inovações de produto frequentes (associadas à estrutura divisional). Os inconvenientes deste formato envolvem a dificuldade de manutenção do equilíbrio entre linhas de autoridade, a possibilidade de os empregados se verem envolvidos

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

•  Envolvente  moderada  ou  altamente incerta e mutável

•  Ênfase  operacional na linha de produtos

•  Adaptada  a  envolventes  em  mudança   •  Elimina  as  economias  de  escala nos departamentos funcionais

•  Tecnologia  não- -rotineira e elevada interdependência departamental

•  Grande  importância dos centros de custos

•  Tende  a  aumentar  a  satisfação do cliente porque são claros os pontos de contacto e as responsabilidades

•  Pouca  coordenação  entre  linhas de produto

•  Grande  dimensão,  muitos produtos

•  Autoridade  formal  nos gestores de produto

•  Implica  forte  coordenação   interfuncional

•  Dificulta  a  especialização  e  o aprofundamento das competências

Ênfase na eficácia, adaptação e satisfação do cliente

•  Permite  a  adaptação  a  diferentes  produtos, regiões ou mercados . Descentraliza a tomada de decisão

•  Dificulta  a  integração  e  a  estandardização entre linhas de produto

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em situações de conflito entre as linhas vertical e horizontal (note-se que a unicidade de comando, uma das regras da administração definidas por Fayol, é aqui «desrespeitada»), e a possibilidade de ser despendido muito tempo em processos negociais entre as linhas vertical e horizontal. Para ultrapassar este potencial desequilíbrio de autoridade, algumas organizações ensaiaram a criação de matrizes funcionais ou de matrizes de projecto, nas quais a chefia funcional ou a de projecto, respectivamente, toma a primazia. Nas primeiras, a chefia de projecto serve sobretudo de instrumento de coordenação, ao passo que nas segundas a chefia funcional coordena a afectação de pessoal e presta consultoria interna em áreas da sua especialidade.

QUADRO 6 — Características da estrutura matricial

Estrutura horizontal Recentemente, por influência das diversas abordagens centradas no processo (Denison, 1997; Sutcliffe, Sitkin & Browning, 1997), tem ganho evidência um novo formato

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos •  Envolvente  muito  incerta •  Ênfase  

operacional função e no produto

•  Permite  os  níveis  de  coordenação requeridos para enfrentar exigências duais da envolvente

Experiência de autoridade dual, potencialmente frustrante e confusa

•  Tecnologia  não  rotineira  e  níveis muito elevados de interdependência

•  Sistemas  duais  de planeamento e orçamentação: por função e por produto

•  Partilha  flexível  dos  recursos humanos entre produtos

•  Exige  dos  participantes  boas competências interpessoais

Ênfase na especialização técnica e na inovação de produtos

•  Autoridade  formal  repartida entre os gestores funcionais e de produto

•  Ajustada  ao  caso  de  decisões complexas e mudanças frequentes na envolvente

•  Pode  tomar  muito  tempo  na resolução de conflitos

•  Dimensão  moderada  e  poucas linhas de produtos

•  Permite  desenvolvimento  funcional e por produto

•  Não  funciona  se  for  mantido um software mental verticalista Exige da envolvente pressão para a manutenção do equilíbrio entre poderes

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organizacional: a estrutura horizontal, na qual a base da organização já não mais é a função mas o processo.

Neste caso, a organização já não se estrutura de forma a obter os benefícios da especialização funcional (por exemplo, maior eficiência e possibilidade de aprofundamento da especialização), mas antes os da proximidade multifuncional (como uma maior velocidade de resposta e maior agilidade decorrente da proximidade de profissionais com diferentes especializações). Verifica-se neste formato um achatamento da hierarquia, sendo as decisões delegadas até ao nível mais baixo possível.

Este tipo de organizações baseia-se na actividade de equipas, com um processo (e.g. inovação de produtos, processamento de encomendas) a ser executado por várias equipas (a Kodak, por exemplo, reorganizou a sua estrutura em torno de mais de 1000 equipas). As equipas auto-dirigidas constituem, aliás, a unidade fundamental deste tipo de estrutura, por vezes conhecida como organização baseada em equipas. Tais equipas devem: (1) ter acesso ao conjunto de recursos necessários para executar a tarefa; (2) ser multifuncionais, ou seja, incluir profissionais de diversas áreas, e (3) dotadas do poder suficiente para executar correctamente o seu trabalho.

Este formato estrutural apresenta importantes vantagens ao nível da rapidez, do contacto com o mercado e da comunicação interdepartamental, o que ajuda a aumentar os níveis de inovação e flexibilidade. Todavia, pode ser de difícil adopção, na medida em que requer uma clara mudança da filosofia de gestão. Essa mudança nem sempre é fácil, porque muitos dos problemas das estruturas funcionais persistem na organização baseada em equipas (e.g. mentalidade funcionalista e competição intergrupal; vide Korine, 1999). Os papéis do líder, por exemplo, são severamente alterados, sendo que um incorrecto exercício da liderança pode facilmente destruir as vantagens das equipas. No que se refere aos empregados, aumenta significativamente o potencial de exposição ao mercado e o nível de empowerment, o que rompe em muitos casos com a prática corrente da organização.

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QUADRO 7 — Características da estrutura horizontal

Estrutura em rede O mais recente produto evolutivo em termos de formatos organizativos é a estrutura em rede (ver Fig. 5). Aproveitando o exemplo de Miles (1989), a essência da rede pode ser descrita recorrendo à observação de uma peça de equipamento para hóquei no gelo: design escandinavo, desenvolvida nos Estados Unidos de modo a adaptar-se às exigências dos mercados americano e canadiano, fabricada na Coreia do Sul e distribuída inicialmente no Japão. A rede pode assim ser descrita (Mabey et ai., 1998) como uma entidade económica que engloba um conjunto de organizações ou unidades de negócio, com poucos níveis hierárquicos e recurso extensivo à subcontratação (outsourcing). Trata-se de um formato que releva a importância da confiança e que permite operacionalizar o conceito de cadeia de valor ao reconfigurar a estrutura da organização de uma forma que lhe permite centrar-se nas suas competências nucleares.

A rede (que existe em vários formatos; vide Miles & Creed, 1995), rompe definitivamente com a velha ideia de organização. No exemplo acima apresentado, as funções produtivas estão separadas por várias organizações, as quais por sua vez se podem encontrar espalhadas por diversos países. Com este tipo estrutural, entra em cena uma nova forma de organização, que se afasta radicalmente da estrutura piramidal habitualmente usada para representar a organização (ver Fig. 5). Na rede, a organização procura reter internamente as suas competências nucleares (Hamel & Prahalad, 1994), subcontratando as demais actividades a organizações nelas especializadas. E claro que este formato não deixa de levantar algumas questões que urge resolver, nomeadamente a assunção do papel de integrador dos vários parceiros da rede (ao qual cabe a coordenação do fluxo de trabalho ao longo da cadeia de valor), e a potencial ocorrência de comportamentos oportunistas da parte de algumas organizações envolvidas.

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

•  Envolvente  instável e incerta

•  Ênfase  operacional  no  processo enquanto meio de criação de valor

•  Achatamento  da  hieraquia,  maior contacto multifuncional

Exige uma mudança clara da filosofia de gestão relativamente às formas estruturais dominantes

•  Ênfase  na  rapidez, proximidade do cliente

•  Constituição  de  equipas   multifuncionais para conduzir as subpartes do processo

•  Melhorias  potenciais de rapidez e eficiência

•  O  processo  de  transição  pode  ser  difícil e confuso para os envolvidos

•  Busca  de  vantagem competitiva em envolventes turbulentas

•  Delegação  do  trabalho  ao  mais baixo nível possível

•  Queda  das  barreiras  interdepartamentais

•  Nem  sempre  aos  supervisores  é  fácil  assumir um papel de coaching

Facilitação da colaboração •  Exige  uma  mudança  clara  dos  sistemas de gestão, nomeadamente dos sistemas «moles» (e.g., sistemas de recompensa)

•  Forte  exposição  aos  clientes e fornecedores •  Maior  potencial  motivador  do trabalho

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A estrutura em rede, adoptada por organizações como a Nike ou a Benetton, é antes de mais consequência directa dos avanços tecnológicos na área da informação e da comunicação, que permitem dispersar o trabalho e, por isso, centralizar numa só organização um conjunto de vantagens competitivas disseminadas por diversos países ou mesmo continentes. Entre outros, tem este formato o objectivo de derrubar as barreiras intra e interorganizacionais, ou seja, criar a organização sem limites, descrita por Jack Welch, da General Electric, como se segue (Hirschhorn & Gilmore, 1992, p. 104): «o nosso sonho para os anos 90 é uma empresa sem limites, na qual tenham sido derrubadas as barreiras [estruturais e psicológicas] que internamente nos separam uns dos outros e dos nossos parceiros no exterior». A construção de laços fortes com outras organizações tem demonstrado ser um factor importante de adaptação e de redução da incerteza, nomeadamente por aumentar a comunicação e facilitar a partilha de informação.

FIGURA 5 — Estrutura em rede

Para concluir esta discussão dos novos formatos organizativos, deve ser notado que as

redes não constituem uma solução para todos os problemas e desequilíbrios característicos de formatos anteriores. Aliás, se se considerar o facto de uma empresa subcontratada numa rede poder ter uma estrutura funcionalista, resulta claro que as expectativas podem dar lugar a ilusões ou promessas não cumpridas (Kovács, 1999), nomeadamente a de que a rede contribui para redistribuir o poder e democratizar o trabalho, ou para um melhor cumprimento da responsabilidade social da organização.

QUADRO 8 — Características da estrutura em rede

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

•  Substituição  do  controlo  hierárquico pelo controlo do mercado

•  Ênfase  no  conceito  de   competência nuclear

•  «Enxuta»  ou  «emagrece»  a organização

•  Perda  de  controlo  (i.e.,  aumento  da dependência) de actividades não nucleares

•  Focalização  da empresa nas suas competências nucleares

•  Grande  importância  da rapidez e flexibilidade

•  Pode  favorecer  o  empreendimento interno

•  Maior  dificuldade  com  o  controlo de qualidade de operações não executadas pela empresa

•  Recurso  a  tecnologias  de  informação sofisticadas, para efeitos, por exemplo, de coordenação

•  Recurso  a  estratégias  de parceria

. Grande flexibilidade e rapidez de resposta

•  Maior  instabilidade  estrutural,  dado que os parceiros podem mudar

•  Ajustada  à  exploração  do  conceito de cadeia de valor

•  Poder  centrado  no  integrador da rede

•  Permite  o  rearranjo  e  a  redistribuição rápida dos recursos organizacionais

•  Dificuldade  de  criação  de  uma  cultura «de rede» organizacional

Evita a perda de tempo e o dispêndio de recursos em actividades pouco relevantes

•  Pode  estimular  comportamentos oportunistas •  Possibilidade  de  competição  pelo papel de integrador da rede

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6. Prospectivas Tem sido rápida a evolução das estruturas organizacionais. Essa rapidez permite tecer algumas considerações finais, que funcionam simultaneamente como conclusões e prospectivas, dedicadas aos seguintes tópicos: a evolução conjunta de novas tecnologias, novas envolventes e novos formatos; a vantagem de entender as estruturas como configurações; a necessidade de rever alguns «dados adquiridos» da ciência organizacional.

Novas tecnologias, novas envolventes, novos formatos A evolução dos formatos estruturais das organizações, estimulada pela coevolução das

tecnologias e das paisagens competitivas, tem ilustrado a existência de uma mudança sensível na lógica estruturante: da hierarquia de controlo, passou-se à primazia do processo, o que significa que as formas emergentes assentam já não na função mas na cadeia de valor, definível como «a sequência de actividades que acrescentam valor ao longo do processo que se inicia com a obtenção de matérias-primas e que culmina na colocação do produto (ou serviço) à disposição do consumidor» (Almeida Costa, 1998, p. 79).

Com as estruturas centradas no processo, procuram as organizações aumentar o valor proporcionado ao cliente. Para Nonaka e Ichijo (1995, p. 46), o valor da organização pode ser entendido como:

«a criação de novo conhecimento que é o resultado das actividades da organização. Este conhecimento pode ser a ideia para um produto, um novo processo de produção, novas logísticas, novos sistemas de gestão ou outras inovações que acabem por conduzir a preço baixo, qualidade elevada, excelência de serviço, ou características inovadoras do produto. De acordo com a perspectiva da criação de conhecimento sobre o valor, as organizações devem ser desenhadas por forma a serem capazes de criar novo conhecimento. Por criação de conhecimento organizacional, referimo-nos à capacidade da organização como um todo para criar novo conhecimento, disseminá-lo através de toda a organização, e incorporá-lo nos seus produtos, serviços ou sistemas». Esta mudança de «quadro mental» trouxe uma série de alterações profundas à ideia de

estrutura e ao processo de estruturação, conforme indicado pelo Quadro 9. Com estas mudanças visam as organizações adoptar estruturas que facilitem a criação de valor e que aproximem a empresa do mercado. Organizações que aprendem, guiadas pelo mercado, ou criadoras de conhecimento, são aquelas que usam a estrutura como uma alavanca para a criação de valor — tal como referido por Nonaka e Ichijo — e não apenas como um mecanismo de controlo.

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QUADRO 9 — Estrutura organizacional: Perspectivas e prospectivas

Perspectiva (dominante) Prospectiva (emergente)

Estrutura Processo

Hierarquia Cadeia de valor

Verticalidade Horizontalidade

Controlo de empresas cada vez maiores Aumento da flexibilidade e adaptabilidade

Gestão intermédia: papéis de filtragem e controlo Comparação da visão do topo com a realidade do mercado e da organização, servindo como catalisador activo da mudança

Controlo interno pela hierarquia Controlo externo pelo mercado

Endo-esqueleto Exo-esqueleto

Mercado de vendedores Mercado de compradores

Mercados de massas Nichos fragmentados

Medidas objectivas de qualidade(e.g., % de defeitos) Medidas intangíveis (e.g., satisfação do consumidor)

Recursos materiais e financeiros Informação e tempo

Operações sequenciais Operações simultâneas

A necessidade de entender as estruturas como configurações Uma nova perspectiva, configuracional, de análise das organizações tem vindo a ganhar forma nos últimos anos. Por configuração, entende-se uma «constelação multidimensional de características conceptualmente distintas, que normalmente ocorrem em conjunto» (Meyer, Tsui & Hinings, 1993). Uma grande variedade de características e de processos organizacionais parecem realmente agrupar-se de uma forma regular, o que permite reduzir uma infinidade teoricamente possível de combinações, a um número limitado de configurações. Ou seja: os elementos que se poderiam combinar num não acabar de variações, acabam normalmente por se agregar num conjunto limitado de configurações.

Como explicar este fenómeno? Meyer, Tsui e Hinings (1993) adiantam que os atributos organizacionais normalmente tidos como independentes, são na verdade interdependentes, o que faz com que a enorme variedade possível no caso de cada atributo individualmente considerado, acabe por ser constrangida pelos padrões de interdependência que entre esses atributos se podem entretecer. Acresce que a maioria das soluções teoricamente possíveis não são viáveis na prática, pelo que é possível reduzir uma enorme diversidade de organizações a uma pequena taxonomia de configurações (e.g., Miles & Snow, 1978; Mintzberg, 1979).

Qualquer processo capaz de aproximar entre si as características das diferentes organizações é potencialmente capaz de contribuir para o aparecimento do número limitado de configurações que acima se referiu. Processos como a estandardização de produtos e mercados (Utterback, 1994), o isomorfismo decorrente da luta pela posse dos mesmos recursos (Hannan & Freeman, 1977), a imposição de uma cultura organizacional e a construção sociocognitiva da realidade (Weick, 1979), contribuem para o surgimento de configurações. Procurando superar a perspectiva contingencial, cujas análises se limitam ao

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estudo de um pequeno conjunto de variáveis, a abordagem configuracional procura explicações mais completas e integrativas.

A perspectiva configuracional concebe portanto as organizações como gestalts compostas por elementos que se constrangem mútua e intensamente. Dada esta relação de interdependência entre elementos, defendem os partidários da perspectiva configuracional que não faz sentido estudar componentes isolados em vez de configurações. Em termos críticos é de referir, porém, que os atributos das organizações podem constranger-se de forma mais ou menos intensa. Weick (1976), por exemplo, refere que algumas organiza 9ões podem funcionar como sistemas frouxamente acoplados.

E ainda de notar que o conceito de configuração é usado com um sentido mais englobante pelos autores que estudam o design organizacional, e que o definem como o agregado que inclui as configurações de estrutura, processo e tecnologia (Huber & Glick, 1993). Uma das áreas em que o pensamento configuracional deu origem a resultados fecundos é a da estrutura. Particularmente importante neste campo, revelou-se o trabalho de Henry Mintzberg, cujos livros The Structuring of Organizations (1979) e Structure in Fives (1983) tiveram forte repercussão. As configurações apresentadas por Mintzberg são o resultado da integração do saber acumulado, uma vez que todas elas apresentavam já antecedentes na literatura das organizações. Só a título de exemplo, pode dizer-se que a adhocracia equivale, grosso modo, à organização prospectiva de Miles e Snow (1978) e ao tipo orgânico de Burns e Stalker (1961), e que a burocracia mecanicista havia sido identificada, por exemplo, por Burns e Stalker como se tratando da organização mecanicista, ou por Rosabeth Moss Kanter (1983), que a ela se refere como o tipo segmentalista.

Revendo os «dados adquiridos» A evolução dos formatos organizacionais, e designadamente a substituição do controlo hierárquico pela cadeia de valor, obrigam a repensar a validade de algumas lições da teoria organizacional muitas vezes tidas como dados adquiridos. Dois exemplos:

•  A  ideia  de  que  as  organizações  devem  proteger  o  seu  núcleo  técnico  da  envolvente  (Thompson, 1967), não é necessariamente sustentável (Denison, 1997). Com efeito, se desta forma se pode aumentar a efi— ciência, também é possível que se esteja a proteger a ineficiência. As novas formas de produção estimulam uma maior abertura (e não fecho) às exigências da envolvente. •   Com   o   conceito   de   cadeia   de   valor,   torna-se possível, e de forma relativamente simples, combinar transações hierárquicas e de mercado, o que baralha a separação clássica, estabelecida por Williamson (1975) e neste livro discutida com profundidade no capítulo inicial (Santos, neste volume). O surgimento de conceitos como o de mercados internos mostra como as distinções clássicas podem ter que ser ajustadas às características das actuais envolventes. •   A   persistência   da   ideia   de   que   a   hierarquia constitui a única forma viável de organização (vide Jacques, 1990), é posta em causa pelo sucesso de organizações como a Nike, a Kodak ou a ABB, que recorrem a formatos alternativos e «modernos», com os quais procuram competir em envolventes globais. Com o final do século, e aproveitando a oportunidade para proceder aos habituais

balanços, os observadores dos fenómenos organizacionais facilmente concluirão que a análise dos próximos cem anos promete ser tão estimulante como a dos cem anos que passaram e que conduziram à chamada sociedade das organizações. Nesses anos foi possível assistir à ascensão e afirmação da burocracia (e à sua queda, argumentam alguns

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[vide Lawler & Ledford, 19971), ao crescimento da dimensão, à defesa da beleza da pequena dimensão, à síntese do pequeno dentro do grande, à dominação da função e da sua substituição pelo processo, à criação de redes e de redes dentro de redes (Provan & Sebastian, 1998), etc.

Os próximos anos parecem agora sugerir a necessidade de operar uma síntese entre tensões ou opostos (exploração por investigação e exploração por utilização, controlo e confiança [vide Cunha & Cunha, capítulo 17 neste volume]), pelo que se pode antecipar um período estimulante para os exploradores dos novos formatos. Que, para melhor se aventurarem na exploração deste novo terreno, talvez devam levar a sério a sugestão de Weick (1996) e reflectir sobre a necessidade de deitar fora as ferramentas de exploração usadas no passado. Ou, pelo menos, algumas delas.

TEXTO Nº 5

A MOTIVAÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS NA EMPRESA de: João Paulo Marques & Gabriel Silva

Introdução

Este trabalho, tem como principal objectivo analisar e dar a conhecer a importância da motivação dos Recursos

Humanos na empresa, procurando salientar os diversos contributos teóricos conhecidos e, complementá-los

com uma análise mais prática e concreta.

Assim, na secção 1 daremos uma sucinta definição de Empresa, fazendo, de seguida, na secção 2, uma breve

comparação das teorias organizacionais protagonizadas por Taylor, Fayol e Mayo, sob a perspectiva da

importância que o indivíduo foi assumindo na empresa ao longo da História.

Numa terceira parte, secção 3, procuraremos abordar as teorias das necessidades humanas e da motivação,

desenvolvidas por diversos psicólogos e gestores, visando, essencialmente identificá-las e compará-las. Na

secção 4, descreveremos as principais tendências actuais da motivação, e por último, na secção 5, tentaremos

caracterizar a Motivação, enquadrá-la na empresa, mostrar de que forma ela influencia ou não os resultados da

organização, salientando o papel que os gestores devem assumir neste processo, bem como indicar alguns

instrumentos ao seu dispor para motivar os colaboradores.

Em conclusão, tentaremos fazer uma relação entre as teorias apresentadas anteriormente e o nosso ponto de

vista pessoal.

1 - A empresa e a gestão dos recursos humanos

Existindo muitas definições de empresa, umas mais complexas que outras, torna-se importante neste artigo,

dar uma noção geral que sirva de base à compreensão e enquadramento do tema que pretendemos

desenvolver.

Assim, e de acordo com Drucker (1991), a empresa não é mais que um agrupamento Humano

hierarquizado que mobiliza meios humanos, materiais, de informação e financeiros para extrair, transformar,

transportar e distribuir produtos ou prestar serviços e que, atendendo a objectivos definidos por uma direcção,

faz intervir nos diversos escalões hierárquicos, as motivações relacionadas com a satisfação das necessidades

dos clientes, ou seja, pelo bem estar da comunidade em geral, e a obtenção do lucro, devido pela necessidade

de remunerar o capital investido por parte dos accionistas.

Resumidamente, podemos concluir que os principais objectivos da empresa são a satisfação das

necessidades dos clientes e do bem estar social: e a obtenção de lucro.

A empresa precisa de obter lucros para que possa ter uma certa autonomia financeira, permitindo-lhe

responder às suas necessidades materiais, nomeadamente no que concerne ao alargamento de instalações,

aumento da capacidade de produção, implementação de novas tecnologias, entre outras.

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77

Por outro lado, a satisfação das necessidades dos clientes e o bem estar da comunidade, tem que estar

sempre presente, pois os bens que produz e/ou comercializa devem estar em sintonia perfeita com as

necessidades reais dos consumidores, sob pena de não garantir níveis satisfatórios de procura, e

consequentemente, não assegurar a rentabilidade a médio prazo.

A empresa, tem-se tornado num pólo de desenvolvimento das sociedades modernas, sobretudo nas

economias em regime capitalista, combinando três elementos fundamentais, o Financeiro, o Técnico e o

Humano para com eles atingir os seus objectivos com eficácia e eficiência, ou seja, com um custo mínimo,

obter o máximo rendimento.

Resta salientar que a combinação dos factores (ou elementos) é importante, mas saber distingui-los e

analisá-los é crucial. Dar uma atenção especial ao papel dos Recursos Humanos, uma vez que são estes que

condicionam o desenvolvimento da actividade, pode traduzir-se numa melhoria substancial da produtividade e

qualidade que fazem a diferença nas empresas dos nossos dias (Teixeira, 1998).

2 - TEORIAS DA ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL

2.1 - Taylor, Fayol e Elton Mayo

O papel dos Recursos Humanos na empresa, nem sempre foi encarado como fundamental na organização.

Com efeito, ao longo da História podemos encontrar diversos autores preocupados em estudar as organizações,

a sua estrutura e a melhor forma de maximizar os lucros, aumentar os índices de produtividade e minorar os

riscos de ruptura e desaparecimento das empresas.

Um  dos  primeiros  autores  que  procurou  “dissecar”  a  organização  foi  Taylor,  seguido  de  Fayol.  Ambos  

procuraram a melhoria da eficiência das actividades produtivas, enfatizando no entanto, aspectos diferentes da

empresa. Taylor centrou o seu estudo na análise das tarefas, dos tempos e movimentos na execução de cada

uma  delas,  procurando  minimizar  todos  os  “tempos  mortos”  e  rentabilizar  a  utilização  das  máquinas,  inovação  

introduzida pela Revolução Industrial e muito em voga aquando dos estudos destes autores. Com o estudo das

tarefas, Taylor alertou para a necessidade de adaptação do Homem à máquina, descurando a componente

humana que está sempre subjacente na execução da tarefa. Considerava-se que o trabalhador se orientava

apenas por vantagens financeiras - “homo-economicus”, tentando apenas maximizar os benefícios materiais.

Fayol, preocupou-se nos seus diversos estudos, com a melhoria da eficiência da empresa através do estudo e

estruturação da empresa - ênfase na estrutura. Contudo, a sua abordagem da organização, mantém uma

perspectiva mecanicista, desrespeitadora da condição humana e orientada unicamente para a busca da

eficiência técnica e material.

Com a implementação destas teorias, inicialmente verificou-se um acréscimo substancial nos índices de

produtividade das empresas. Porém, ao longo dos anos, estes índices começaram a baixar, as pessoas

apresentavam-se tristes, apáticas e desmotivadas no seu local de trabalho.

Preocupados com o rigor e racionalização máxima do trabalho, aliados às características apresentadas

pelos empregados, outros autores surgiram e procuraram estudar as causas destes problemas. Foi com Elton

Mayo e com a Escola das Relações Humanas criada na época do Humanismo, que se levaram a cabo algumas

experiências  e  se  concluiu  que  o  factor  Humano,  considerado  até  então  um  simples  “apêndice”  da  máquina,  era  

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substancialmente mais importante que qualquer outro recurso da empresa. Procurou-se analisar o indivíduo e

estudar as suas reacções às diferentes condições de trabalho que se lhe apresentavam.

Mayo centrou o seu estudo na pessoa como trabalhador, designadamente na Motivação, Liderança, nas

comunicações e dinâmica de grupos; Recusou o uso exclusivo de incentivos financeiros para um

comportamento profissional adequado; Há que considerar os incentivos psicológicos (apoio, elogio,

consideração) que fazem parte do universo dos sentimentos Humanos e contribuem para um maior

empenhamento.

Podemos, agora, concluir que o desconhecimento das variáveis psicológicas conduz a percas de

produtividade. Deste modo, as organizações Tayloristas são rotineiras, monótonas, pouco criativas e providas

de uma programação excessiva, subutilizando aptidões humanas específicas.

Com Elton Mayo, embora não se formulem teorias concretas que possam conjugar de forma adequada todos os

factores de produção, privilegia-se o grupo, a equipe e coloca-se o ênfase nas relações entre pessoas no

trabalho, lançando-se as permissas para o estudo e a análise da alteração do comportamento Humano, face a

situações diversas.

Tanto Taylor com Fayol centraram o seu estudo nos aspectos formais da organização e nas relações

entre os métodos de trabalho e as máquinas. Elton Mayo preocupou-se mais com o Homem, com o grupo, com

o clima social no trabalho e com as relações informais que se estabelecem no seio das empresas.

As investigações de Mayo conduziram ao estudo da organização formal e informal. A primeira, segundo ele,

assenta numa estrutura de autoridade, com áreas funcionais, especialização, hierarquia, fixação de objectivos e

sobretudo numa administração do conjunto, não diferenciando os diferentes factores de produção. Por outro

lado, a organização informal assenta num conjunto de acções não previstas pela administração, nomeadamente

de afinidades, sentimentos e objectivos do grupo que não obedecem a qualquer hierarquia formal, mas que

resulta da convivência dos indivíduos no trabalho.

A estrutura informal não estava prevista na organização de Taylor, mas o seu estudo tem demonstrado

que ela é responsável por variações de produtividade directamente ligadas a questões laborais, e por isso, deve

ser tida em conta na análise das empresas.

Nenhum administrador pode ter sucesso se não tiver capacidade para associar as duas estruturas, o

que significa que a produtividade da empresa está ligada não só a questões económicas, mas também

psicológicas.

3 - TEORIAS DAS NECESSIDADES HUMANAS E MOTIVAÇÃO

3.1 - A Pirâmide de Maslow

As nossas atitudes são o resultado de diversos impulsos interiores que queremos satisfazer. Essas atitudes

designamos por necessidades e os impulsos por motivações para as satisfazer.

Convém, pois conhecer essas necessidades para compreender o que as motiva.

Segundo o Psicólogo Abraham Maslow, as necessidades do ser humano são basicamente semelhantes, podendo

ordenar-se numa hierarquia ou série de níveis ascendentes, que designamos por Hierarquia de necessidades

(Figura 1).

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79

Figura 1 - Hierarquia das necessidades de Maslow

AUTO REALIZAÇÃO

ESTIMA

SOCIAIS / PERTENÇA

SEGURANÇA

NECESSIDADES FISIOLÓGICAS

As necessidades fisiológicas correspondem às necessidades básicas (descanso, alimentação) e por isso

são designadas por primárias, sendo as primeiras a ser satisfeitas;

As necessidades de segurança, embora também sejam primárias, surgem a seguir às fisiológicas,

porque só ocorrem depois daquelas estarem satisfeitas. No contexto de trabalho, desde que se obtenha um

rendimento mais ou menos confortável, procura-se manter esta situação, assegurando-a, por exemplo, com a

exigência de um contrato de trabalho, uma protecção suplementar ou até um seguro de vida.

As necessidades sociais ou de pertença, são classificadas como secundárias, bem como as restantes

hierarquicamente superiores, embora não sejam menos importantes. Elas surgem depois do indivíduo ter já

atingido uma certa segurança, procurando inserir-se num grupo social ou de trabalho com o qual se identifica.

As necessidades de estima aparecem acima das sociais porque, depois daquelas serem satisfeitas, o

indivíduo procura ser reconhecido como pessoa de pleno direito, e não apenas como membro de um dado

grupo. Tem necessidade de ser reconhecido, individualmente, pelas suas capacidades, talentos ou técnicas e

podem ser satisfeitas através de uma ocupação profissional adequada.

Esta necessidade, mais que qualquer outra, pode ser utilizada para motivar o pessoal, levando-o a

procurar atingir os objectivos do seu trabalho e da empresa.

As necessidades de auto-realização correspondem à ordem final das necessidades, por isso aparecem

no topo da hierarquia, só sendo satisfeitas depois de todas as outras. Será a realização plena do Homem, a

satisfação de todo o seu potencial. Esta necessidade, como é previsível, nunca é completamente satisfeita, pois

se isso se verificasse a vida tornar-se-ia monótona, além de que romperia com os pressupostos da essência

humana que assentam numa dinâmica constante e na criação de novas necessidades, sempre que se realizam

as outras.

3.2 - As Categorias de Alderfer (Teoria ERG)

Um outro psicólogo, Alderfer, classificou as necessidades humanas de forma bastante simples, dividindo-as em

três categorias, denominadas «As categorias de Alderfer», ou Teoria ERG, utilizando as iniciais das palavras

inglesas:

EXISTÊNCIA - Necessidades existenciais que são as de sobrevivência e reprodução;

RELACIONAMENTO - Necessidades de relacionamento que são de âmbito social;

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CRESCIMENTO - Necessidades de crescimento que correspondem ao desenvolvimento a nível

pessoal, estima e auto-realização.

Estas necessidades, operam simultaneamente e não numa sequência invariável, por isso, quanto menos uma

delas é satisfeita, mais importante se torna para o indivíduo conseguir realizá-la. E, realizando-a, mais

importante se torna realizar a seguinte; Quanto menos for satisfeita uma necessidade, maior relevo terá a

outra.

Discordando ainda de Maslow (Teixeira, 1998), Alderfer, refere que há casos em que os empregados

podem activar as suas necessidades de nível mais elevado sem terem satisfeito completamente as necessidades

do nível inferior, e também, que, quando as necessidades de um nível elevado são frustradas as necessidades

de nível inferior retornam, mesmo já tendo sido satisfeitas.

3.3 - A Perspectiva de Charles Handy

Na obra «Understanding Organisations», Charles Handy, afirma que o Homem é variável e terá muitos motivos

e motivações que a qualquer momento podem constituir uma hierarquia, mas que esta sofre alterações em

determinados acontecimentos, ou até em função da situação particular de cada indivíduo.

Com efeito, para uma pessoa de meia idade a necessidade que lhe advém da empresa pode ser algo

relacionado com a sua reforma, portanto, ligado às necessidades de segurança, enquanto que um jovem em

início de carreira terá concerteza motivações e necessidades mais próximas do reconhecimento e aceitação

social e profissional do seu trabalho.

Embora sob o ponto de vista racional e imediato, as pessoas trabalhem por necessidade (de

sobrevivência económica e também devido à pressão social), existem outros factores, por vezes mais

importantes, e que são geradores de motivação nos trabalhadores, nomeadamente os apresentados na Figura

2, e que se relacionam com a realização , promoção, dinheiro, conhecimento de pessoas, segurança

profissional, satisfação e reconhecimento.

Figura 2 – factores geradores de motivação

Conhecer pessoas

Realização

Promoção

TRABALHO Dinheiro

Segurança profissional

Satisfação

profissional

Reconhecimento

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3.4 - As Teorias de Douglas MacGregor

Na sua obra «The Human side of the Enterprise», Douglas MacGregor, afirma que existem duas abordagens

muito diferentes da gestão e motivação que reflectem as razões pelas quais as pessoas trabalham.

A primeira designou por TEORIA X e baseou-a em três pressupostos:

1. O indivíduo médio tem um desagrado natural pelo trabalho e evitá-lo-á sempre que possível;

2. O trabalho tem importância secundária e os gestores devem coagir os empregados ou motivá-los com

salários ou mostrando consideração;

3. A maioria das pessoas, sendo preguiçosa e sem ambição prefere ser dirigida e evitar responsabilidades;

A segunda designou por TEORIA Y e baseou-a nos seguintes pressupostos:

1. O esforço mental e físico que o Homem faz no trabalho, é tão natural como o descanso, lazer, etc;

2. As pessoas desejam trabalhar e debaixo de circunstâncias correctas obtêm muita satisfação;

3. A maior parte dos indivíduos aprende a aceitar e até procura responsabilidades.

Pesquisas levadas a cabo por diversos psicólogos, sugerem que para a maior parte das pessoas, o trabalho não

é bem aceite apenas devido à necessidade económica ou à pressão da sociedade como pretendia a TEORIA X,

mas que a actividade de grupo também pode satisfazer uma gama de necessidades humanas que todos os

indivíduos partilham e, quando as pessoas têm oportunidade de as satisfazer através do seu trabalho, ficam

motivadas para aí exercer um esforço considerável no sentido de alcançarem esses objectivos, o que parece ir

ao encontro da TEORIA Y.

3.5 - A Teoria dos Dois Factores de Herzeberg

O psicólogo Americano Frederick Herzeberg, ao estudar as fontes de motivação e/ou desmotivação no trabalho,

encarava-as de um ponto de vista pragmático, perguntando a um dado grupo de trabalhadores:

“Quando  está  satisfeito  no  trabalho,  o  que  é  que  o  faz  estar  contente?”

e

“Quando  está  insatisfeito  no  trabalho,  o  que  é  que  o  faz  estar  aborrecido?”

Ao analisar os resultados, Herzeberg concluiu:

As causas de satisfação no trabalho residem no conteúdo do próprio trabalho;

As causas de insatisfação no trabalho residem no ambiente de trabalho;

Como os factores de contentamento no trabalho podem criar uma satisfação positiva (motivação), Herzeberg

designou-as por FACTORES MOTIVADORES.

Aos factores de ambiente de trabalho que precisavam de ser mantidos num padrão razoável a fim de

evitar a insatisfação, chamou-hes FACTORES DE HIGIENE OU MANUTENÇÃO, incluindo neles todos os aspectos

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de base salarial, segurança no emprego, supervisão atenta, justa e apoio ao funcionário, condições de trabalho,

relacionamento interpessoal entre colegas e hierarquia, a gestão da empresa, organização e comunicações.

Enfim, todos os factores que possam ser fonte de descontentamento. A importância destes factores está na sua

possibilidade de causarem insatisfação se não forem adequados. No entanto, há que salientar que a sua

adequação, por si só não constitui uma fonte de motivação; apenas evitarão a insatisfação. Para que a equipe

esteja MOTIVADA, tem que se obter uma conjugação dos Factores Motivadores e dos Factores higiénicos, de

forma a que ambos estejam sempre presentes numa situação de trabalho. (Herzberg, 1967) Resumidamente,

temos:

FACTORES MOTIVADORES FACT. HIGIENE / MANUTENÇÃO

SATISFAÇÃO INSATISFAÇÃO

CONCRETIZAÇÃO

RECONHECIMENTO

O TRABALHO EM SI

CRESCIMENTO /

PROMOÇÃO

RESPONSABILIDADE

CONDIÇÕES DE TRABALHO

POLÍTICA DA EMPRESA

BUROCRACIA

RELAÇÃO COM COLEGAS

RELAÇÃO COM O SUPERIOR

SALÁRIO

Figura 3 – Os factores Motivadores e Higiénicos de Herzberg

Os factores motivadores que Herzeberg identificou, parecem ter surgido do próprio conteúdo da tarefa. E deste

modo, estas motivações estão relacionadas com um nível social mais elevado e com as necessidades

classificadas como secundárias na pirâmide de Maslow, sobrepondo-se às necessidades que ele classificou como

primárias. Sugerem também que, mais uma vez, a TEORIA Y de MacGregor é uma abordagem mais frutífera da

gestão de pessoal do que a TEORIA X.

Os críticos de Herzeberg, referem que a distinção entre factores motivadores e de higiene não se

encontra com frequência nas situações reais de trabalho e que nem sempre se verifica uma relação directa

entre satisfação e produtividade no trabalho.

Pensamos que, a satisfação e produtividade não devem ser analisadas isoladamente, nem tão pouco

independentemente de todo o contexto empresarial, porque isso seria dar relevo apenas ao factor humano,

caindo no mesmo erro de parcialidade e racionalismo, apenas invertendo o factor mais importante (Homem /

Máquina).

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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No entanto, e atendendo ao contexto socio-económico actual, pensamos que é fundamental procurar

um ponto de equilíbrio, analisar as situações sob todos os ângulos, procurar inseri-las no todo que é uma

organização, mas nunca descurar qualquer dos factores que intervêm no processo produtivo, cedendo uma

atenção especial ao factor humano, uma vez que este é o único que reage de forma positiva ou não às

manifestações e mudanças do meio envolvente.

3.6 - As Necessidades humanas de McClelland

McClelland apresentou uma abordagem das necessidades humanas um pouco diferente. Ele defende que, de

entre as necessidades que as pessoas desenvolvem ao longo das suas vidas, há três que assumem particular

importância:

Necessidade de Realização: traduz o desejo de atingir objectivos que signifiquem um desafio, de

fazer algo melhor ou com mais eficiência do que foi feito antes;

Necessidade de Poder: desejo de controlar, influenciar ou ser responsável pelo desempenho de

outros;

Necessidade de Afiliação: desejo de manter relações pessoais estreitas e amigáveis.

Assim, todas as pessoas possuem estes três tipos de necessidades, contudo, uma delas prevalecerá em cada

indivíduo como a de maior peso e aquela que mais se procura satisfazer. (Stoner, 1995)

4- Desenvolvimentos recentes da Teoria da Motivação

4.1 - Teoria da Equidade

Relativamente recente, a Teoria da Equidade foi desenvolvida por Stacy Adams e baseia-se na tese de que um

importante factor para a motivação, o desempenho e a satisfação no trabalho, é a avaliação que o indivíduo faz

sobre a equidade, razoabilidade ou a justiça da recompensa recebida (Stoner, 1995).

Para este autor, a recompensa mais dignificante em situações de trabalho é sem duvida o dinheiro.

Assim, e como corolário da sua teoria, considerava que, para a maioria dos indivíduos as recompensas devem

ser vistas como justas para que sejam motivadoras, o que de facto confirma a percepção generalizada, de que

a desmotivação dos empregados provem muitas vezes de injustiças salariais.

4.2 - Teoria da Expectativa

A Teoria da Expectativa teve os primeiros desenvolvimentos com Vroom, tendo recentemente registado novos

contornos com Nadler e Lawler.

Genericamente, esta teoria é um modelo de motivação que especifica que o alcance de um alto

desempenho, resulta de se perceber a possibilidade de que esse alto desempenho possa ser alcançado e

recompensado se alcançado, e que a recompensa vale o esforço dispendido (Stoner, 1995). Tenta assim, levar

em conta as diferenças entre indivíduos e situações.

Esta abordagem apoia-se nos seguintes pressupostos:

1. O comportamento é determinado por uma combinação de factores do indivíduo e do ambiente;

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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2. Os indivíduos têm necessidades e objectivos diferentes;

3. Os indivíduos decidem entre alternativas de comportamento, baseados nas suas expectativas de que

um determinado comportamento levará a um resultado desejado.

Estes autores, sintetizaram na seguinte fórmula a relação entre a expectativa e a motivação:

Força da motivação = Valência x Expectativa

Em que:

Valência: Valor previsto atribuido a um objectivo (valor da recompensa)

Expectativa: Probabilidade de uma acção conduzir a um resultado desejado

Para Nadler e Lawler, as recompensas que as pessoas podem auferir em situações de trabalho podem ser de

duas formas: intrínseca e extrínseca. A recompensa Intrínseca, assume o carácter de recompensa psicológica

ou interior, experimentada directamente por um indivíduo, enquanto que a Extrínseca é uma recompensa

proporcionada por um agente externo, como um supervisor, podendo assumir formas de expressão material,

monetária ou não.

4.3 - Teoria de Reforço

A Teoria de Reforço, desenvolvida pelo psicólogo Skinner, constitui uma abordagem motivacional de carácter

comportamental, baseada num princípio de aprendizagem, denominado “condicionamento   operante”.   Assim,  

esta explicação da motivação apresenta as seguintes características:

1. Deixa de lado o objecto e o como da motivação para se concentrar nas formas pelas quais se aprende o

comportamento;

2. É uma abordagem da motivação baseada na lei do efeito, ou seja, a ideia de que o comportamento

com consequências positivas tende a ser repetido, enquanto o comportamento com consequências

negativas tende a ser evitado. (Robbins, 1998; Ferreira et al, 1996)

5 - A MOTIVAÇÃO NA EMPRESA

5.1 - A Importância da Motivação

A motivação dos Recursos Humanos na empresa assume hoje em dia, um factor de sucesso primordial, quer

para o indivíduo, quer para a obtenção dos objectivos da organização.

No entanto, ainda hoje é considerado um assunto secundário, pois exige uma observação contínua, procura da

identidade e das necessidades, aspirações e frustrações de cada indivíduo que compõem a organização. Por

isso, este processo requer, sobretudo, o tempo e a disponibilidade que a maioria das nossas empresas ainda

não está em condições de oferecer, criando por exemplo, um departamento de recursos humanos: o que não

acontece, porque a sua dimensão não permitiria suportar os custos que essa inovação traria; outras porque

ainda há muita falta de informação e sensibilização para esta necessidade.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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A motivação pode ser analisada a dois níveis: Pessoal e Empresarial. Neste domínio, a experiência leva-nos a

concluir que, 90% da atitude dos indivíduos em contexto de trabalho é determinada pelo seu próprio espírito,

contra apenas 10% que se devem a forças exteriores.

Então, podemos deduzir que um dado indivíduo ao integrar uma equipe de trabalho já traz consigo uma

cultura própria, uma personalidade mais ou menos vincada, objectivos pessoais delineados e, sobretudo, uma

atitude particular perante tudo aquilo que o rodeia. Se apenas cerca de 10% dependem das forças exteriores,

há então que analisar o indivíduo, conhecê-lo cada vez melhor, para que dentro da organização ele se sinta

satisfeito e motivado (Robbins, 1998).

O tipo de satisfação e aquilo que motiva cada um difere de indivíduo para indivíduo; Enquanto uns

valorizam o esquema salarial, outros importam-se com a forma como a chefia valoriza o seu trabalho, a atenção

que lhes dispensa, o agradecimento que lhes mostra.

Exemplificando: Partindo do pressuposto que existem dois indivíduos numa dada organização, um que

valoriza mais o esquema salarial e outro as relações humanas. No que respeita à empresa, ela possui uma

política assente num esquema salarial racional, em função de medidas racionais de avaliação de quantidades de

trabalho realizadas, subvalorizando o indivíduo enquanto pessoa, pois raramente existe contacto directo

chefia/subordinado. A atitude dos dois trabalhadores perante a organização será a mesma? Certamente que

não. Iremos encontrar dois indivíduos a exercer funções semelhantes, mas o que valoriza o rendimento, terá

concerteza uma motivação maior, por isso obterá melhores resultados.

Analisando racionalmente os resultados obtidos, independentemente da importância dos Recursos

Humanos, enquanto pessoas e não máquinas, concluir-se-ia que o primeiro era mais eficiente que o segundo,

quando, se todos os factores fossem analisados, poderíamos deparar-nos com um resultado completamente

diferente: o segundo, desde que convenientemente motivado, poderia ser tão ou mais eficiente que o primeiro.

Este exemplo, simples, sem grandes conjecturas, serve apenas de ilustração ao qual pode na generalidade dos

casos, acontecer em centenas de empresas. Queremos assim, apenas mostrar que não raras vezes as

organizações falham porque não motivam os seus colaboradores e, sem sequer analisarem as causas, estudam

apenas os números e concluem que os indivíduos não se ajustam às suas necessidades, portanto não servem

para integrar esta ou aquela empresa. Esquecem-se, contudo, que o que faz agir, evoluir ou regredir uma

organização, são sobretudo os meios humanos. Sem estes o sistema não funciona (Ferreira et al, 1996).

5.2 A Motivação e a Eficiência

Muitas vezes, os gerentes e/ou gestores não se convencem que uma equipe convenientemente motivada pode

levar a um grau de aperfeiçoamento que se traduziria numa resposta atempada e mais correcta aos problemas

que envolvem a organização, e , consequentemente, isso revelar-se-ia na concretização dos objectivos da

maioria das empresas, ou seja, na satisfação das necessidades dos clientes de forma mais eficiente que a

concorrência e por conseguinte, num lucro cada vez maior.

Com efeito, estamos convencidos que a motivação e a eficiência de qualquer organização assumem

uma relação proporcional; À medida que os indivíduos se sentem mais motivados, a sua eficiência no trabalho

tende a aumentar, e por conseguinte a produtividade do todo da empresa.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

86

Mas de que modo? Convém, então, esclarecer uma série de conceitos inter-relacionados, e que ajudarão a

compreender a ligação entre produtividade, eficiência e motivação. A Produtividade, para além de poder ser

calculada de forma quantitativa, pode também ser determinada analiticamente ou qualitativamente, da seguinte

forma:

Produtividade = F(Motivação x Organização x Tecnologia)

Deste modo, entendemos que, a produtividade pode ser determinada como função de três elementos da

empresa: Motivação, Organização e Tecnologia. Quanto melhores e mais bem cuidados eles forem, tanto maior

será a produtividade e a eficiência da empresa como um todo.

Assim, convém precisar os conceitos referidos:

Motivação: conseguir dos colaboradores um maior grau de empenho, participação, iniciativa e

dedicação;

Organização: estruturação e disposição dos recursos da empresa da forma mais eficiente;

Tecnologia: conjunto de conhecimentos científicos ou empíricos, directamente aplicados à produção e

melhoria ou utilização de bens ou serviços (Caraça, 1993).

Como vemos, a motivação é apenas um factor influenciador da produtividade e da eficiência, e como tal deve

ser entendido, muito embora lhe devamos toda a atenção neste trabalho.

5.3 - O Papel do Gestor na Motivação

Mas afinal, a quem cabe a «árdua» tarefa de motivar?

A motivação parte de cada um, individualmente. Todo o ser humano, consciente ou inconscientemente,

estabelece as suas metas pessoais, cria as suas aspirações, elabora planos para as atingir. A atitude positiva

que cada um assume perante a vida e os outros pode ser fonte de motivação, não apenas para si próprio, mas

também para os que o rodeiam.

Porém, não raras vezes, nos deparamos com pessoas desprovidas desta capacidade, quer por razões de

personalidade, quer por dificuldades de adaptação ou falta de motivação.

Quando na empresa, nos deparamos com este tipo de pessoas, cabe sobretudo aos gestores e/ou

chefias directas, analisar e procurar compreender estes indivíduos e as razões da sua falta de iniciativa ou

apatia no trabalho. Há que elaborar planos, fases de acção, para se poder «descobrir» o indivíduo e os seus

potenciais máximos, sem interferir ou violar a sua personalidade. Daí referirmos esta tarefa como «árdua», pois

implica uma observação atenta e uma acção cautelosa; A observação atenta servirá para estudar o

comportamento do indivíduo, tentar descortinar  o  “porquê”  da  sua  atitude  e  elaborar  os  planos  de  acção  mais  

adequados a cada um. Por sua vez, a acção terá que ser faseada e cada plano terá que ser colocado em

prática, mais ou menos rapidamente, em função da resposta do indivíduo à fase anterior, sob pena de o retrair

ainda mais.

Podemos então afirmar que o maior ou menor grau de motivação que cada um pode atingir no

trabalho, depende em grande medida da actuação do seu superior hierárquico (Robbins, 1998; Luthans, 1998).

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

87

Este último, por sua vez, para além de motivador deve também ser uma pessoa motivada, revelando sempre

uma atitude positiva perante si, a organização e os outros. Para o gestor estar motivado e transmitir essa

posição aos outros, é necessário acreditar que não há obstáculos que não possam ser ultrapassados com

flexibilidade, criatividade e determinação.

Além disso, se não houver alternativas, trajectórias delineadas e planeadas, de que forma poderá o

Gestor motivar os outros?

A capacidade de resposta, a dinâmica da actuação do gestor na resolução dos problemas, criar-lhe-á

condições para analisar cada trabalhador e incutir nele, da forma mais apropriada e de acordo com os

objectivos definidos, o papel fundamental que cada um terá para que a estratégia resulte. O empenho e

vontade de contribuir, a interiorização de que a sua tarefa, ainda que por vezes rotineira, será importante para

a concretização dos objectivos, irão levar o indivíduo a procurar aperfeiçoar-se cada vez mais, sentindo cada

vez mais confiança nas suas capacidades, uma vontade constante em melhorar e uma alegria maior no

desempenho das suas tarefas.

Na sua função de motivação, o gestor, tem a possibilidade de escolher e utilizar alguns instrumentos,

chamados   “factores  motivadores”,   segundo   as   denominações   dos   diversos autores estudados anteriormente.

Alguns desses factores são por exemplo, o Dinheiro, o Enriquecimento individual de tarefas, o Alargamento de

tarefas, uma maior Participação no trabalho, Horários flexíveis ou Horários comprimidos e Trabalho repartido,

etc (Teixeira, 1998).

Mas, como pode o gestor ou supervisor,do ponto de vista prático, estimular o interesse dos subordinados

pelo trabalho?

Ao seu alcance, encontram-se um conjunto de práticas que aqui se indicam como sugestões:

1. Dar-lhe participação no estabelecimento das suas metas de trabalho;

2. Conceder liberdade ao seu empregado para executar o seu serviço:

3. Fazer o subordinado participar da análise e da avaliação do seu próprio desempenho;

4. Encorajar as sugestões e melhorias;

5. Reconhecer um trabalho bem feito;

6. Confiar-lhes outras tarefas, fazer rotação de funções:

7. Despertar anseio e orgulho pela posse de habilidades e competências;

8. Criar-lhe a consciência de que participa, fazendo o empregado considerar-se membro da equipa, e

mostrar-lhe que a sua colaboração é valiosa para toda a organização. (Robbins, 1998; Teixeira, 1998)

Os indivíduos são seres complexos que é necessário estudar e estimular de modo fazê-los sentir como parte

integrante de um todo que sem eles não funcionaria da mesma forma. É pois, fundamental criar condições para

que cada um se sinta integrado e motivado dentro do todo que é uma organização.

Um bom sistema de recrutamento de pessoal, em que se conhecem minuciosamente as necessidades

da empresa e do cargo a ocupar, tendo em conta a personalidade do candidato, é um meio decisivo para evitar

desajustes entre o indivíduo e a organização, que se não forem convenientemente estudados, podem ser fonte

de desmotivação.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Igualmente, a criação de uma cultura de empresa, acompanhada de políticas próprias, comunicadas aos seus

colaboradores constituem também um factor de motivação muito importante (Robbins, 1998). Pois, mantendo

as pessoas informadas do rumo da empresa e daquilo que ela pretende atingir, fazendo-os sentir que aqueles

são também os seus objectivos porque participam no processo, são parte integrante e primordial do todo que

ajudam a construir, torná-los-á mais motivados e criar-se-á um elo de ligação Indivíduo/Indivíduo e

Indivíduo/Empresa, que irá manter a equipe junta, unida e disposta a lutar pela sobrevivência e

desenvolvimento da organização.

6 – Conclusões

Sintetizando, e relacionando a nossa opinião com a de Maslow e Alderfer, reforçada por Robbins (1998),

Luthans (1998) e Ferreira et al (1996), aplicada aos Gestores, o trabalho pode ser uma fonte importante de

satisfação (ou insatisfação) para os indivíduos, correspondendo (ou não) às necessidades de crescimento social

e pessoal que quase todo o ser humano manifesta.

Um indivíduo estará muito mais positivamente motivado para o trabalho, quanto maior grau de

satisfação obtiver na sua realização. Talvez, também por essa razão, Maslow e Alderfer pretendam que a

atenção empresarial seja dirigida no sentido de ir ao encontro das necessidades dos colaboradores, procurando

conciliá-las com o que a organização lhes pode proporcionar, de forma a alcançarem um proveito mútuo, ou

seja, simultaneamente, o mais elevado grau de satisfação para o indivíduo e a performance de trabalho mais

eficaz para a organização.

Criadas as condições e circunstâncias adequadas, e um clima social favorável, o pessoal tenderá a

sentir-se mais motivado para se comprometer com grupos e objectivos que lhe proporcionem maior grau de

satisfação.

O presente trabalho, procurou analisar e dar a conhecer as teorias existentes acerca da motivação dos

recursos humanos na empresa, e simultaneamente dar uma perspectiva prática, de acordo com o que se

considera ser fundamental para motivar os indivíduos, as condições em que essa motivação deve ocorrer e as

consequências nos resultados empresariais.

Com efeito, podemos concluir que os recursos humanos, ainda que sejam entre outros, um meio de

produção, conseguem fazer a diferença numa empresa.

Embora, a tecnologia, a estruturação, a organização e os meios monetários sejam fundamentais para

que a empresa se desenvolva, a atitude que os recursos humanos assumam é decisiva nesse desenvolvimento.

Não podemos jamais ignorar que os factores de produção são estáticos, enquanto o ser humano é dinâmico e

complexo, necessitando constantemente de incentivos não só financeiros, mas também psicológicos para agir

com eficiência e eficácia. Nesta perspectiva, concluímos que a motivação incutida nos indivíduos contribui para

a sua satisfação pessoal, para a redução do absentismo e rotatividade e maior produtividade da empresa, e ao

contrário, a sua desmotivação pode levá-la ao fracasso e ineficiência.

Introdução à Gestão das Organizações 2008/2009

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Referências:

Caraça, João G. (1993), Do Saber ao Fazer: Porquê organizar a Ciência?, (“Trajectos”),  1ª  ed.,  Lisbon,  Gradiva.

Drucker, Peter (1991), Introdução à Administração, 2ª ed., Pioneira, São Paulo.

Ferreira, J. M.C.; Neves, J.; Abreu, Nunes de, P. e Caetano, A.(1996), Psicosociologia das Organizações,

Lisboa, MCGraw-Hil de Portugal.

Herzberg,  Frederick,  (1967),  “One  more  time:  How  do  you  motivate  employees?”,  Harvard Business Review.

Luthans, F. (1998), Organizational Behavior, Singapura, MCGraw-Hill Inc..

Robbins, Stephen P. (1998), Organizational Behavior, 8ª ed., New Jersey, Prentice-Hall, Inc..

Stoner, J.; Freeman E. e Gilbert Jr, D. (1995) Management, Prentice-Hall.

Teixeira, S. (1998) Gestão das Organizações, McGraw-Hill.

90

TEXTO Nº 6 O Líder e a Liderança

Sílvia Morgado & João Paulo Marques

INTRODUÇÃO

O tema da Liderança tem sido muito discutido, havendo disparidades entre os

especialistas a respeito, não só do conceito em si como também dos métodos e processos de liderança no interior dos grupos.

A este propósito, está o refrão antigo, que afirmava que “o líder nasce, não se faz”, o que se traduz por outras palavras, na questão antiga e ao mesmo tempo moderna, de saber se a Liderança é uma capacidade inata ou adquirida. Esta proposição, parecerá uma falsa questão, se atendermos a que um líder nasce em cada grupo, e faz-se, dependendo da conjugação de um certo número de factores individuais e não individuais.

Adicionalmente, compreender-se-á também a falácia desta afirmação, se atentarmos nos factos geradores da liderança, tomado o conceito para um grupo em geral. A frase apresentada, está assim, ligada apenas ás características da personalidade dos líderes e só existe quando se verifica a conjugação de um indivíduo com potencial para ser líder e a necessidade que um grupo tem de alguém para assumir essa liderança. A Liderança é sem dúvida uma das funções do grupo e é susceptível de ser assegurada no decurso do tempo pelos seus diferentes membros. E qualquer grupo, como sistema aberto, tem um núcleo que define o comportamento de relação do sistema com o meio, tratando as informações que colhe do meio e tomando decisões adequadas , e igualmente para possuir uma função integradora das diferentes partes, ou seja, o “nós” do grupo.

É para tal que um grupo precisa da função liderança. E para desempenhar essa função, o grupo precisa do líder.

Ser líder não traduz, contudo, só uma qualidade ou característica da personalidade individual, pois se assim fosse esta manifestar-se-ia independentemente das situações e dos grupos, o que não acontece.

É assim, com este enquadramento que analisaremos a função do líder, a liderança em si, os seus processos e as diversas teorias e modelos propostos pelos diversos investigadores. 1.1 Definições de liderança

O tema da liderança é um tema sobre o qual têm incidido vários estudos e pesquisas existindo, assim, várias definições de liderança que variam de autor para autor. Mas geralmente, um líder é identificado como a pessoa que exerce maior influência sobre um grupo, provocando mudanças nas atitudes e acções dos membros do grupo. Considerando este ponto de convergência, pode-se definir a liderança como “o processo através do qual um indivíduo influencia os membros de um grupo em direcção à concretização dos objectivos do grupo ou da organização” (Greenberg e Baron, 1995, pg. 498). As divergências em relação à definição de liderança surgem quando se refere como se deve exercer tal influência, ou seja, que formas de poder usar para influenciar os comportamentos dos subordinados. E estas formas de poder poderão ser coercivas ou não, em

91

que nas primeiras se utiliza a autoridade e as punições para se obter subordinação, em contraposição com as não coercivas, em que os subordinados são respeitados e podem optar por aceitar ou rejeitar a influência exercida. Normalmente os líderes usam formas não coercivas de influenciar os subordinados. Outro ponto geralmente focado nestes estudos é a diferença entre liderança e gestão. Geralmente são termos utilizados indiferentemente e têm tendência a confundir-se, mas convém referir que têm definições distintas. John P. Kotter (1996; 1999), refere essa distinção, dizendo que “Os líderes vêem para além dos planos operacionais dos gestores”. Os líderes criam a missão da organização, desenvolvendo uma visão para levarem a organização rumo ao futuro e estratégias de mudança para se poder alcançar a visão, influenciando e motivando as pessoas a seguirem-no na obtenção dessa visão. Os gestores implementarão essa visão através do planeamento, da orçamentação, de estruturação e de controle e resolução de problemas. Enquanto o gestor é considerado organizado e previsível, produzindo resultados de curto prazo, o líder proporciona mudanças importantes para direccionar a organização para o futuro tendo em vista resultados para o longo prazo. Um gestor poderá ser um líder devido à posição que ocupa na hierarquia da organização, mas isso não significa que todos os gestores sejam líderes, devido ao facto de não terem a capacidade de liderar. Os líderes, por sua vez, poderão também ser gestores, na medida em que para além de criarem a visão também a implementam.

Por outras palavras, poderemos dizer que, o llííddeerr éé aaqquueellee ddiirriiggeennttee ddee eemmpprreessaa qquuee,, aaccttuuaa nnaaqquueellee ppllaannoo ddaa rreeaalliiddaaddee hhuummaannaa qquuee ccoonnssttiittuuii pprreecciissaammeennttee oo rreeiinnoo ddaa ««lliibbeerrddaaddee»» ddee ccaaddaa sseerr hhuummaannoo..

OO qquuee oo llííddeerr ««ppeeddee»» aaooss sseeuuss ccoollaabboorraaddoorreess,, éé qquuee aaccttuueemm mmoottiivvaaddooss ppoorr mmoottiivvooss ttrraannsscceennddeennttaaiiss,, oouu sseejjaa,, qquuee aaccttuueemm aassssiimm ppoorrqquuee qquueerreemm,, ddeevviiddoo aaoo vvaalloorr qquuee aa ssuuaa aaccççããoo tteerráá ppaarraa oouuttrraass ppeessssooaass..

EEmm cceerrttaa mmeeddiiddaa,, ppooddeemm--ssee iimmppoorr ddeetteerrmmiinnaaddaass aaccççõõeess aa uumm ssuujjeeiittoo,, qquuaannddoo ssee tteemm ppooddeerr ssuuffiicciieennttee ppaarraa iissssoo,, oo qquuee nnããoo ssee ppooddee iimmppoorr,, ssããoo aass iinntteennççõõeess qquuee lleevvaamm uummaa ppeessssooaa aa aaccttuuaarr ddee uummaa ffoorrmmaa oouu ddee oouuttrraa.. ÉÉ pprreecciissaammeennttee nnaass ««iinntteennççõõeess»» qquuee aa lliiddeerraannççaa aaccttuuaa..

1.2 Aptidões para a Liderança

Face às mudanças constantes no mundo empresarial o líder terá de dominar certas aptidões para poder actuar com eficácia. Estas aptidões são determinadas acções que os líderes desenvolvem e que se reflectem em resultados. A diversa literatura (Jesuíno, s.d.a; Goleman, 1998; Gregersen et al, 1998) sugere as seguintes aptidões ou qualidades necessárias para o sucesso de um líder:

1. Procurar alcançar sempre melhores formas de fazer as coisas para aumentar a qualidade e os resultados, demonstrando curiosidade, atenção, abertura em relação às mudanças constantes.

2. Ser criativo e inovador para ganhar competitividade no mercado global. 3. Ter visão, demonstrar que sabe para onde quer levar a organização no futuro, levando

as pessoas a seguirem-no nessa visão. 4. Ter a capacidade de comunicar verbalmente e não verbalmente e de ouvir

atentamente.

92

5. Criar uma equipa, apoiando e motivando os membros da equipa. Deverá fomentar o trabalho de equipa, desenvolvendo um clima de aprendizagem, programas de treino específicos e assim, encorajar os membros a desenvolver as suas ideias e fornecendo os recursos necessários para que estes possam realizar o seu trabalho.

6. Partilhar os créditos de uma ideia bem sucedida, demonstrando aos membros com quem trabalha o reconhecimento do seu trabalho. Ou seja fazer, sentir que sem eles não teria sido possível alcançar o sucesso (Kanter, 1997).

Segundo um estudo realizado por Whetten e Cameron (1991) haverá dois tipos de

aptidões para a liderança, as pessoais e as interpessoais, de onde surge o modelo das aptidões pessoais e o modelo das aptidões interpessoais.

Estes modelos resultam de um estudo feito com 400 gestores de sucesso em que estes identificaram quais as aptidões mais relevantes para uma liderança eficaz.

O modelo das aptidões pessoais reflecte as seguintes:

1. Os lideres devem estar conscientes da posição que detêm, sabendo determinar quais os valores e prioridades a seguir e sabendo agir perante as mudanças continuas a que está sujeita a organização.

2. A capacidade de gerirem o tempo e stress face aos vários assuntos que têm de resolver e decidir, delegando funções aos membros que com ele trabalham e partilhando poder, para assim, conseguir liderar a mudança.

3. 3- A capacidade de, através de inovação e de criatividade, conseguir resolver problemas e tomar decisões racionais.

Em relação ao modelo das aptidões interpessoais foram consideradas mais importantes, as seguintes:

1. A capacidade de comunicar abertamente com as pessoas, dando apoio, aconselhando e ouvindo atentamente.

2. A capacidade de influenciar as pessoas com quem trabalha, levando-as a segui-lo de modo a atingir os objectivos propostos e a direccionar a organização rumo à visão por ele definida. Descentralizando o poder que detêm e dando poder às pessoas com quem trabalha, estes sentir-se-ão mais responsáveis e esforçar-se-ão para merecer essa posição.

3. A capacidade de motivar as pessoas. Para as pessoas desempenharem maiores performances na organização o líder terá de criar um ambiente motivador, incentivando-as e recompensando-as pelas performances alcançadas, repartindo os créditos com eles.

4. Saber gerir conflitos será outra aptidão que o líder terá de demonstrar ter, apurando as causas para a existência de tais conflitos e aplicando estratégias adequadas, intervindo de modo a controlar as confrontações e negociar com as partes envolvidas.

Estas aptidões pessoais e interpessoais sobrepõem-se umas às outras e estão interligadas, o que não significa que em determinadas situações não se dê mais ênfase a uma do que a outras (Whetten e Cameron, 1991). Todas estas aptidões apresentadas foram consideradas importantes para uma liderança eficaz mas, dependendo de uma determinada situação e dos diferentes níveis de responsabilidade dos líderes, variará a importância relativa de cada aptidão.

93

1.3 Funções da Liderança

Essencialmente, os líderes eficazes serão responsáveis por “construir” uma organização que enfrente as mudanças e os desafios do futuro. Um estudo apresentado por Henry Mintzberg em 1975, foi um dos primeiros a evidenciar quais as funções ou actividades realmente efectuadas pelos lideres, contrariando as actividades tradicionalmente definidas. Segundo este autor as actividades de planear, organizar, controlar, dirigir, são difíceis de conciliar com as actividades realmente desenvolvidas pelos líderes no seu dia-a-dia (Mintzberg, 1990). À luz deste estudo o líder apresentaria três tipos de papéis: interpessoais, informacionais e decisionais e dentro de cada papel desenvolveria várias funções. O líder possuindo autoridade formal e status dentro da organização mantém relacionamentos com os outros membros da organização, daí surgirem os papéis interpessoais. Através destes, desenvolve relações informais, incrementando a comunicação entre os vários membros da organização e não apenas entre superiores e subordinados, influencia os membros com quem trabalha, motivando-os para alcançar os objectivos organizacionais, e estabelecer relações fora da organização. Quanto aos papéis informacionais o líder normalmente dá e recebe informações ao longo de todo o dia. O líder procura incessantemente informações quer a nível interno ou a nível externo da organização através dos seus superiores, pares, subordinados e contactos externos quer formal ou informalmente. Mas também partilha informações que detém com as pessoas com quem trabalha e fornece informações para o exterior. O líder estabelecerá assim redes de informação. A informação será fundamental para a tomada de decisões. Nos papeis decisionais o líder será empreendedor e inovador, estando atento a novas ideias com o intuito de desenvolver uma ideia para a criação de um novo projecto. Será também controlador de turbulências reagindo a problemas que surjam e tentando resolvê-los. Outro papel decisional será o de afectador de recursos ou seja, cabe ao líder decidir atribuir que recursos de tempo, financeiros, a quem atribui-los dentro do seu departamento. O último papel decisional será o de negociador, pois o líder passa muito tempo negociando com subordinados, com superiores e com pessoas externas à organização. Todas estas actividades de carácter informal referidas por Mintzberg têm, geralmente, características comuns tal como serem actividades fragmentadas e frequentemente interrompidas, em que os contactos são caracterizados pela sua brevidade e variedade e em que a comunicação oral é usada constantemente. John Kotter (1999) é outro autor que se dedicou ao estudo das actividades desenvolvidas por gestores eficazes. Com este estudo, Kotter evidenciou que lideres que limitam as suas interacções a reuniões formais dentro da organização, não têm acesso a informações vitais e não desenvolvem relacionamentos importantes. Mostra como certas actividades, que aparentemente, parecem ser de pouca utilidade, como conversar informalmente dentro da organização com diferentes pessoas ou reuniões de improviso, podem ser bastante eficientes. Face à grande quantidade de informações disponíveis e face às incertezas da actual complexidade organizacional, o líder terá de decidir o que fazer e como alcançar a realização de certas actividades através de várias pessoas apesar do reduzido controlo que exerce sobre eles. E para isso os líderes desenvolvem uma agenda onde estão definidos os planos que traduzem a sua visão e as suas responsabilidades do curto prazo e médio e longo prazo, permitindo-lhes reagir oportunamente e tomar decisões mediante as informações que constam delas. Para além da agenda, os líderes eficazes passam bastante tempo desenvolvendo redes de relacionamento onde há cooperação entre várias pessoas da organização e fora dela,

94

proporcionando-lhes informações necessárias e importantes que não teriam através da cadeia de autoridade formal (Kotter, 1999). Perante estes estudos ressalta a importância das actividades de comunicação e das interacções interpessoais entre o líder e os outros membros da organização, para a realização das funções da liderança, da importância de dar forma à visão estabelecida e de criar uma organização que enfrente os desafios do meio empresarial, motivando e encorajando o envolvimento de todas as pessoas que integram a organização. 1.4 Teorias Explicativas de Liderança

Ao longo deste ponto, iremos referir e desenvolver as principais abordagens à liderança, baseadas nas investigações efectuadas e referidas na vasta literatura sobre o tema. Na tentativa de explicarem as complexidades do processo de liderança, alguns autores / pesquisadores, conceptualizaram a liderança como um traço da personalidade ou como um comportamento, outros identificaram factores situacionais críticos que afectam a eficácia da liderança.

1.4.1 Abordagem dos Traços de Personalidade A abordagem dos traços de personalidade foi uma das primeiras tentativas sistemáticas (Robbins, 1998; Ferreira et al, 1996) para estudar a liderança. Os traços de personalidade foram estudados para determinar o que é que distinguia o líder das demais pessoas, identificando as características distintas e os traços pessoais do líder. Os principais traços identificados pelos autores desta abordagem foram a inteligência, a auto confiança, a determinação, que inclui a persistência e a iniciativa, a integridade e a sociabilidade. Esta abordagem tinha por base identificar a correlação entre os traços do líder e a liderança em comparação com os não lideres, admitindo que estes traços eram universais, em que o líder fosse líder em qualquer situação. Após revisões efectuadas a esta abordagem, diversos autores concluíram esta ser muito limitada, focando apenas o seu estudo no líder e não nos seus subordinados ou na situação, e não existir grande correlação entre as características do líder e a liderança (Ferreira et al, 1996). Foram tecidas algumas críticas à abordagem dos traços de personalidade. Uma delas é a impossibilidade de estabelecer um conjunto de traços definitivos, pois nem todos os traços são igualmente importantes para definir um líder, haverá os que têm maior importância do que outros. Não distingue que traços o líder deve ter para alcançar melhores resultados. Outra crítica a esta abordagem é o ignorar da situação em que a liderança acontece, afirmando que o líder dotado dos traços de liderança é líder em qualquer situação. A situação influencia a liderança ou as características do líder deveriam ajustar-se às exigências da situação, pois as características que fazem dele um líder numa situação podem não o ser noutra situação. Os traços de personalidade são aqui considerados como causa para a capacidade de liderar, não considerando os traços como possíveis resultados da posição de liderança. Outro aspecto negativo é não ter em conta os subordinados, a influência que estes podem ter no processo de liderança

Esta abordagem revelou que os traços de personalidade são insuficientes para diferenciar lideres de não lideres e para explicar a eficácia da liderança de situação para situação. (Ferreira et al, 1996).

95

1.4.2 A Abordagem Comportamental

Outras pesquisas seguiram caminho diverso, o de determinar que comportamento os lideres desenvolviam no exercício das suas funções. Denominada por teoria dos estilos, esta abordagem inclui o estudo das acções dos líderes em relação aos subordinados em vários contextos. Estudos clássicos como a teoria dos três estilos de liderança de White e Lippitt, que analisaram o impacto dos estilos autocráticos, democráticos e liberal ou as teorias X e Y de Douglas McGregor, que representam o estilo autocrático e o estilo participativo e humanístico, respectivamente, contribuíram para o estudo da abordagem comportamental (Robbins, 1998). Outros estudos centraram a sua atenção em dois tipos de comportamento dos líderes, o comportamento orientado para a tarefa e o comportamento orientado para as pessoas, ou centrado no líder ou centrado no subordinado, como é o caso de Blake e Mouton.

1.4.2.1 A teoria dos três estilos de liderança de White e Lippitt.

Segundo esta teoria existem três estilos de liderança verificados, em que os líderes

podem ser autocráticos, democráticos ou liberais. O impacto destes estilos em relação aos subordinados difere drasticamente de um estilo para o outro. O estilo autocrático enfatiza o líder, que o líder é quem impõe não salientando qualquer participação do grupo, havendo centralização das decisões, escassa interacção e reduzida motivação. O estilo democrático caracteriza-se pela preocupação em trabalhar em equipa, solicitando participação do grupo para decisões e definições de objectivos. O líder apoia e estimula o grupo, verificando-se uma elevada interacção e motivação. Quanto ao estilo liberal o líder intervém o menos possível, não querendo tomar iniciativa, verificando-se uma total liberdade para decisões no grupo, com uma participação mínima do líder. Neste estilo a ênfase é nos subordinados (Luthans, 1995).

Outros estudos distinguiram liderança centrada na produção de liderança centrada nas pessoas e afirmaram que os grupos de trabalho com melhores desempenhos tendiam a ser aqueles que apresentavam uma liderança centrada nas pessoas. Naturalmente, constataram que o gestor ao encorajar a participação do grupo na tomada de decisão e ao incentivar as pessoas, aumentou a satisfação dos membros do grupo, ao invés do líder centrado na produção que organizava o trabalho, estabelecendo regras para os membros seguirem, estabelecendo os objectivos a alcançar e fixando quais as tarefas a desenvolver.

1.4.2.2 O Modelo da Grelha de Gestão de Blake e Mouton

Este modelo desenvolvido por Blake e Mouton identifica vários comportamentos de

liderança, usando as duas dimensões anteriormente referidas, a preocupação com as pessoas e a preocupação com a produção.

A grelha de gestão representada na figura 1 mostra no eixo das ordenadas a preocupação pelas pessoas e no eixo das abcissas a preocupação pela produção.

São identificados cinco estilos de liderança. O estilo 1-1, denominado como “gestão empobrecida”, traduz um comportamento de liderança que se caracteriza por fraca

96

preocupação com as pessoas e com a produção, em que o líder faz o mínimo de esforço, mostrando-se indiferente.

O estilo 1-9, denominado “gestão tipo country club”, representa elevada preocupação e atenção para com as pessoas, procurando alcançar um clima agradável e boas relações, em detrimento da produção.

O estilo 5-5, denominado “gestão tipo homem da organização”, traduz um comportamento equilibrado entre níveis moderados de produção e relações interpessoais.

O estilo 9-1, denominado “gestão tipo autoridade-obediência”, ênfatiza as tarefas, para a obtenção de resultados e menos preocupação nas pessoas, considerando-as apenas como um meio para atingir os resultados.

O estilo 9-9, denominado “gestão tipo equipa”, é considerado o mais eficaz, pois exprime muita preocupação quer com a produção, quer com as pessoas, promovendo elevada participação e trabalho de equipa na organização. Este estilo leva as pessoas a dedicarem-se ao seu trabalho, motivadas e com elevado espírito de grupo.

Embora se tenha usado a grelha de gestão de Blake e Mouton para programas de treino para pessoas com funções de liderança, esta apenas apresentou uma estrutura dos estilos de liderança, não mostrando resultados produzidos, mas sim factores dominantes que o líder considera para atingir resultados (Northouse, 1997).

A abordagem comportamental contribuiu para uma melhor compreensão do processo de liderança, ao incluir o que os líderes faziam e como agiam ao considerarem dois tipos de comportamentos na liderança, o centrado na tarefa e o centrado nas pessoas.

Mas, tal como na abordagem dos traços, esta não conseguiu encontrar um estilo universal de liderança capaz de ser eficaz na maior parte das situações e todos os estudos realizados nesta abordagem não apresentaram resultados suficientes para provar que elevada produção e elevado relacionamento é o comportamento de liderança mais eficaz em todas as situações. Uma falha desta abordagem é não incluir os factores situacionais que podem influenciar o sucesso da liderança (Robbins, 1998).

1 2 3 4 5 6 7 8 9 (Baixa) PREOCUPAÇÃO COM A PRODUÇÃO (Alta)

Figura 1 – A Grelha de Gestão de Blake e Mouton.

PR

EOC

UPA

ÇÃ

O C

OM

AS

PESS

OA

S

(Baixa)

(Alta)

1,9 Gestão de clube de

campo Atenção voltada às necessidades que as pessoas têm de relacionamentos satisfatórios.

1,1 Gestão

empobrecida Exercer o esforço mínimo necessá- rio para realizar o trabalho exigido.

5,5 Gestão de organização

adequada Desempenho adequado através de equilíbrio entre a necessidade de fazer o trabalho e manutenção do moral das pessoas a um nível satisfatório.

9,9 Gestão em equipe

A realização do trabalho vem do empreendimen- to das pessoas ; a interdependência através de um interesse comum leva a relações de confiança .

9,1 Autoridade/Obediência

A eficiência nas operações resulta da organização das condições de trabalho, de modo a que elemento humano interfira em grau mínimo.

9 8 7 6 5 4 3 2 1

97

1.4.3 As Abordagens Contingenciais ou Situacionais

Pelas anteriores abordagens concluiu-se que o sucesso da liderança não dependia da universalidade dos traços ou dos comportamentos, mas sim da identificação, em cada situação, dos factores que influenciam a determinação do comportamento mais apropriado. Estas abordagens incluem os seguintes factores: o líder, o grupo e a situação.

Os estudos mais importantes são: - O Modelo do Continuum de Liderança de Tannenbaum e Schmidt - O Modelo Contingencial de Fidler - A Teoria Situacional de Hersey e Blanchard - O Modelo da Teoria Caminho-Objectivo de Robert House

1.4.3.1 O Modelo do Continuum de liderança de Tannenbaum e Schmidt.

Tannenbaum e Schmidt (1973) apresentaram um estudo mostrando os diferentes

padrões de comportamentos de liderança, que um gestor pode adoptar na relação com os seus subordinados, tendo em conta três factores ou forças que influenciam a sua escolha. A figura 2 mostra o continuum dos comportamentos de liderança, onde se encontram dois comportamentos de liderança completamente opostos, aquele que se centra no gestor e aquele que se centra nos subordinados. Mas este continuum não revela apenas dois estilos de liderança, o autocrático e o democrático, mas sim, várias alternativas nas quais o gestor se relaciona com os membros que lidera. Começando pelo extremo esquerdo a ênfase é dada aos interesses do gestor, demonstrando um alto nível de autoridade e controle na liderança. À medida que se avança para o extremo da liderança centrada no subordinado a ênfase é dada aos subordinados de uma forma crescente, verificando-se uma diminuição substancial do controle por parte do gestor e um aumento de liberdade dos subordinados. Cada tipo de acção representada está relacionada com o nível de autoridade usada pelo gestor e com a quantidade de liberdade disponível para os subordinados na tomada de decisão. (Tannenbaum et Schmidt, 1973 ) Liderança centrada Liderança centrada no chefe no subordinado

Figura 2 – O Continuum de liderança de Tannenbaum e Schmidt.

Uso da autoridade pelo gestor

O gestor toma a decisão e anuncia-a

O gestor “vende”  a decisão

O gestor apresenta ideias e solicita questões

O gestor apresenta uma decisão provisória sujeita a mudanças

O gestor apresenta o problema, recebe sugestões e toma a decisão

O gestor define os limites; pede ao grupo que tome a decisão

O gestor permite que os subordinados actuem dentro dos limites definidos por superiores.

Área de liberdade dos subordinados

98

Segundo estes autores, para escolher o padrão de liderança, o gestor deve considerar três forças:

Forças no gestor Forças nos subordinados Forças na situação

Cada uma destas forças influencia o gestor numa situação de tomada de decisão. As forças no gestor são as suas forças internas provenientes da sua própria

personalidade e que influenciam em grande parte o seu comportamento, tais como:

1. O seu sistema da valores e as suas convicções pessoais, como por exemplo o que ele pensa sobre a participação dos subordinados na tomada de decisões que os pode afectar.

2. A sua confiança aos subordinados. Desta dependerá a delegação ou não da tomada de decisão ou resolução de um problema aos subordinados.

3. As suas indicações pessoais em relação à liderança. O gestor pode Ter inclinação para uma liderança directiva ou para trabalhar em equipa, partilhando funções com os seus subordinados.

4. O seu entendimento em relação às necessidades de segurança em situações incertas. Um gestor pode ter maior necessidade de ter previsibilidade e estabilidade no seu ambiente de trabalho do que outro que delega poder no processo de tomada de decisões.

As forças nos subordinados. O gestor para decidir como liderar em grupo tem de ter em conta certas forças nos

subordinados. E maior será a área de liberdade dos subordinados, cedida pelo gestor, se se verificarem as seguintes condições:

1. Se os subordinados tiverem grande necessidade de liberdade. 2. Se os subordinados tiverem disposição de assumir responsabilidades no processo

de tomada de decisão. 3. Se demonstrarem segurança na incerteza. 4. Se se mostrarem interessados no problema. 5. Se compreendem e se se identificam com os objectivos da organização. 6. Se possuem conhecimentos e experiência para resolverem o problema. 7. Se se verificar expectativa de participação nas decisões por parte dos

subordinados.

Ao aumentar a confiança dos subordinados pelo superior, o gestor poderá variar o seu comportamento ao longo do “continuum” dos comportamentos sem ser interpretado negativamente pelos subordinados. Verificar-se-á maior flexibilidade na relação gestor / subordinado.

Forças na situação Certos factores relacionados com a situação também afectam o comportamento do

gestor, tais como: 1. O tipo de empresa, caracterizada pelos seus valores e tradições. Os valores e a

tradição de cada empresa reflectidos através das políticas e directrizes influenciam o comportamento do gestor, levando-o a adoptar um comportamento de acordo com a concepção de gestão dos seus superiores.

99

2. A eficiência do grupo de subordinados. A eficiência do grupo de subordinados dependerá da experiência que o grupo tem em trabalhar em conjunto, da confiança que eles têm na capacidade de resolverem problemas em conjunto, da sua coesão. Perante a eficiência do grupo o gestor passará a responsabilidade da tomada de decisão para o grupo.

3. O problema a ser resolvido. Dependendo da natureza do problema ou da complexidade do trabalho, o gestor delegará mais ou menos responsabilidade aos subordinados, devendo avaliar se os subordinados têm conhecimentos para resolverem o problema, e assim, os contributos de todos os subordinados que tenham conhecimentos sobre o problema. Se se concluir que os subordinados não possuem conhecimentos suficientes para resolver o problema será mais fácil e rápido ele resolvê-lo.

4. A urgência do tempo influenciará o comportamento do gestor na medida em quanto mais urgentes forem as decisões a tomar, mais difícil será a participação dos subordinados no processo de tomada de decisão.

Perante este modelo o gestor terá sucesso se reconhecer estas forças, equilibrando-as e

ponderando-as na escolha do estilo de liderança e agir em conformidade com elas. 1.4.3.2 O Modelo Contingencial de Fiedler

Foi um dos primeiros estudos desta abordagem e propôs que a performance eficaz de

um grupo depende da adaptação entre o estilo do líder e a situação. Quanto aos estilos de liderança este autor assume que um estilo de liderança adoptado

por um determinado gestor é fixo. Segundo este autor é bastante difícil os gestores mudarem de estilo de liderança com os quais tiveram sucesso (Stoner et al, 1995; Robbins, 1998). Perante isto e tendo em conta que nenhum estilo é apropriado para todas as situações, a performance eficaz de um grupo só é alcançada se se alterar a situação para a adaptar ao gestor ou o gestor se adaptar à situação. No caso de uma situação requerer um líder orientado para a tarefa e o líder ser orientado para o relacionamento, ou se modifica a situação ou o líder é substituído.

Para medir os estilos de liderança, orientados para o relacionamento ou orientados para a tarefa, Fiedler desenvolveu um instrumento de medida que chamou de LPC (Least Preferred Coworker) que significa colega de trabalho menos preferido, em que um indivíduo descrevia o colega de trabalho com quem tivera maior dificuldade em trabalhar. Os indivíduos com LPC elevado (favorável) teriam necessidade de manter bons relacionamentos interpessoais, sendo a sua motivação principal o sucesso interpessoal, estando o seu estilo orientado para o relacionamento.

A principal motivação dos indivíduos com LPC baixo (desfavorável) seria o êxito na tarefa, apresentando o seu estilo orientado para a tarefa.

Depois de determinado o estilo de liderança através do LPC, deverá adequar-se à situação.

Fiedler identificou três factores situacionais chave que determinariam a eficácia da liderança:

A relação líder - subordinados, que expressa o grau de confiança e respeito

que os subordinados têm pelo seu líder A estrutura da tarefa, que traduz o grau de estruturação dos procedimentos

ou instruções em relação ao trabalho

100

O poder de posição do líder, que traduz o grau de influência que o líder detém na sua posição na hierarquia da organização.

Após identificar estes factores, Fiedler procede à sua avaliação (Robbins, 1998): A relação líder – subordinados pode ser boa ou pobre, a estruturação da tarefa pode

ser elevada ou baixa e o poder da posição do líder pode ser elevado ou reduzido. Segundo o autor quanto melhor as relações líder – subordinados, quanto mais

estruturadas as tarefas e quanto mais elevado for o poder que o líder detém devido à sua posição maior será o controlo ou a influência que o líder tem, ou seja, mais favorável será a situação.

A relação entre o estilo do líder e as variáveis situacionais resulta em oito categorias de situações diferentes (Ver fig. 2.3).

Pela comparação efectuada entre o estilo orientado para a tarefa e o estilo orientado para o relacionamento, em cada uma das oito categorias, Fiedler concluiu que o estilo orientado para a tarefa é mais eficaz nas situações muito favoráveis ou muito desfavoráveis, isto é, nas categorias 1, 2, 3, 7 e 8, ou seja em situações extremas onde ou o líder tivesse muito poder e influência ou tivesse muito pouco poder e influência, Quanto ao estilo orientado para o relacionamento concluiu que é mais eficaz em situações em que o líder tivesse poder e influência moderados, verificável nas categorias 4, 5 e 6.

Pelo instrumento LPC determinam-se os tipos de situações em que os líderes se ajustam melhor, sendo essas situações definidas pela avaliação dos três factores situacionais. Mas como Fiedler considera o estilo de liderança fixo, ao não se alterar o estilo, haverá apenas, duas maneiras de conseguir uma liderança eficaz, que será ou alterar a situação para que se ajuste ao estilo do líder ou mudar de líder, escolhendo um cujo estilo se adapte à situação.

Figura 3 – Modelo de Liderança de Fiedler.

Este estudo foi considerado uma abordagem válida por muitos pesquisadores para

explicar como a liderança eficaz pode ser alcançada, mas não conseguiu explicar, completamente, porque é que indivíduos com um certo estilo de liderança são mais eficazes

101

nalgumas situações do que noutras. Para além deste aspecto, surgiram problemas com o instrumento LPC, por este não ser bem entendido (Robbins, 1998).

1.4.3.3 Teoria Situacional de Hersey e Blanchard

Este modelo de liderança situacional é uma teoria contingencial que centra o seu estudo

nos subordinados. A eficácia da liderança variaria assim, de acordo com a maturidade dos subordinados.

Segundo estes autores a eficácia da liderança dependerá mais das acções dos subordinados do que do comportamento do líder.

Um factor novo aparece nesta teoria: a maturidade dos subordinados. A maturidade é aqui entendida como a capacidade e a disposição das pessoas em aceitar responsabilidades em relação à realização de uma determinada tarefa (Hersey et al, 1996).

O estudo realizado por estes autores mostrou que o relacionamento entre o líder e subordinados passa por quatro fases, e à medida que os subordinados se desenvolvem, os líderes necessitam de variar o seu estilo de liderança em cada fase.

A liderança situacional utiliza as mesmas dimensões de liderança focadas no ponto anterior, para definir os estilos de liderança: o comportamento de tarefa e o comportamento de relacionamento e combinando-os obtêm-se quatro estilos diferentes e que são:

Estilo 1 – Dirigir: Este estilo de liderança é caracterizado por uma alta orientação para a tarefa e baixa orientação para o relacionamento. Estilo 2 – Persuadir: Este estilo de liderança é caracterizado por uma alta orientação para a tarefa e alta orientação para o relacionamento. Estilo 3 – Participar: Este estilo é caracterizado por uma baixa orientação para a tarefa e alta orientação para o relacionamento. Estilo 4 – Delegar: Este estilo de liderança é caracterizado por uma baixa orientação para a tarefa e baixa orientação para o relacionamento. A maturidade apresenta, também quatro níveis que representam as diferentes

combinações da capacidade e vontade que as pessoas demonstram na realização de tarefas, que são os seguintes:

M1- Este nível mostra a incapacidade e a falta de vontade para assumir responsabilidades. M2 – Neste segundo nível de maturidade verifica-se ainda incapacidade, mas demonstra vontade, sentindo motivação. M3 – Neste nível as pessoas são capazes, mas não demonstram vontade para usar essa capacidade. M4 – Neste nível as pessoas são capazes e têm vontade de realizar determinadas tarefas.

A figura 4 relaciona os estilos de liderança com os níveis de motivação, num modelo

situacional de liderança. Pode-se constatar que à medida que os subordinados aumentam o seu grau de

maturidade, o líder reage diminuindo o controlo sobre as tarefas e diminuindo o comportamento de relacionamento de apoio.

O estilo 1 relacionado com o nível de maturidade1 é apropriado para as pessoas que não tenham capacidade e não estejam motivadas, precisando de direcção. O líder terá de

102

instruir os subordinados sobre as tarefas a realizar, onde e como fazê-lo, tomando uma posição direccionada onde o comportamento de apoio será escasso.

O estilo 2 relacionado com o nível 2 de maturidade, mostra que os subordinados estão empenhados, mas ainda não estão capazes de aceitar responsabilidades, o que levará o líder a continuar orientar o comportamento para a tarefa. Mas devido à vontade demonstrada pelos subordinados, o líder actua, também, ao nível do relacionamento, dando apoio e proporcionando diálogo, de modo a persuadir os subordinados em relação àquilo que o líder pretende.

O estilo 3 relacionado com o nível de maturidade 3, mostra que as pessoas já são capazes de assumir responsabilidades, mas que, por alguma razão lhes falta motivação. Caberá ao líder, nesta fase, apoiar o indivíduo ou o grupo, encorajando-o e desenvolvendo a comunicação nos dois sentidos, diminuindo as orientações relativas à tarefa.

O estilo 4 relacionado com o nível de maturidade 4, mostra que as pessoas são capazes mostrando vontade. Nesta fase já se sentem seguros, dispensando as orientações relativas à tarefa e os comportamentos de apoio e encorajamento por parte do líder. Aqui o líder será observador e monitor.

+ - - TAREFA + M4 M3 M2 M1 Muita Bastante Alguma Pouca Figura 4 – Modelo Situacional de Hersey e Blanchard. Esta teoria de liderança situacional gerou grande interesse, pois mostra uma liderança

mais dinâmica e flexível, em que o líder adapta o estilo ao subordinado, tendo em conta a situação em que o subordinado se encontra (Jesuíno, s. d. b; Robbins, 1998).

À luz desta teoria o líder não tem um estilo fixo de liderança em todos os contextos, nem os subordinados agem da mesma maneira quando desenvolvem tarefas diferentes, podendo até agir de maneira diferente nas várias fases de uma só tarefa. Portanto, a liderança só será eficaz se os líderes forem capazes de mudar o seu estilo próprio tendo em conta as exigências dos subordinados.

1.4.3.4 O Modelo da teoria Caminho – Objectivo de Robert House

A base desta teoria assenta no pressuposto que para uma liderança eficaz será

necessário o líder motivar os subordinados, de maneira a aumentar o seu desempenho na

E3 PARTICIPAR

E 2 PERSUADIR

E4 DELEGAR

E4 DIRIGIR

R

ELA

CIO

NA

MEN

TO

MATURIDADE

103

tarefa e a satisfação. Este modelo apoia-se na teoria motivacional das expectativas, que refere que os

subordinados sentir-se-ão motivados se pensarem que ao conseguirem realizar as suas tarefas estarão a contribuir para os resultados, e acharem que as recompensas pelo seu trabalho são satisfatórias (Northouse, 1997).

A teoria de Caminho – Objectivo surge para explicar como os líderes podem ajudar os subordinados a desenvolver as tarefas, clarificando a percepção destes quanto aos objectivos do trabalho, atribuindo recompensas pelo alcance dos objectivos e fazendo com que os subordinados percebam como podem atingir os objectivos e as recompensas.

O líder escolherá o estilo que melhor se adapte às necessidades dos subordinados e à situação em que se encontram a trabalhar.

Segundo este modelo o líder pode apoiar-se em quatro estilos de liderança (Robbins, 1998; Greenberg e Baron, 1995) :

Liderança directiva, em que o líder diz aos subordinados o que se espera deles, fornecendo-lhes instruções sobre o trabalho a realizar, prazos, regras e orientações especificas em como realizar as tarefas;

Liderança apoiante, caracterizada em estabelecer relações amigáveis com os subordinados, tentando satisfazer as suas necessidades;

Liderança partilhada, em que o líder consulta os subordinados, ouvindo as suas sugestões e tomando-as em conta para a tomada de decisão;

Liderança orientada para a realização, através da qual o líder desafia os subordinados a desempenharem um trabalho de alto nível, procurando um melhoramento contínuo, esperando o máximo por parte dos subordinados e confiando que estes serão capazes de enfrentar os desafios.

House, afirma que o mesmo líder pode adoptar qualquer dos estilos dependendo da

situação, assumindo, assim, que os lideres são flexíveis. Mas para determinar qual o estilo de liderança que motiva mais os subordinados, haverá que identificar as variáveis contingenciais que influenciam o estilo de liderança e que são as características pessoais dos lideres e as pressões e exigências do meio ambiente.

As características pessoais dos lideres, tais como experiência, desejo de controlo e a avaliação da sua competência determinam como o estilo do líder é interpretado pelos subordinados. Se estes forem muito competentes não será necessário um estilo de liderança directivo, será preferível um estilo mais apoiante. O estilo directivo aplicar-se-á no caso de um subordinado ser pouco competente e necessitar de orientação para realizar as tarefas.

Os subordinados com um desejo de controlo interno acreditam que o que lhes acontece é devido ao seu comportamento e preferem um estilo mais participativo, pois permite-lhes sentir que são responsáveis pelo seu trabalho e que fazem parte do processo da tomada de decisão.

Por outro lado, os subordinados com um desejo de controlo externo acreditam que o que acontece é consequência da sorte ou o destino e preferem um estilo de liderança directivo.

As variáveis ambientais incluem a estrutura da tarefa, o sistema formal de autoridade e o grupo de trabalho.

Este modelo pressupõem assim, que se a tarefa é rotineira e estruturada, os objectivos são claros e então não será necessário o líder clarificá-los nem orientar no sentido de como os atingir. Nesta situação um estilo de liderança será considerado pelos subordinados, como desnecessário e até controlador. Porém, no caso das tarefas não serem estruturadas e ambíguas, um estilo directivo poderá aumentar a satisfação e a motivação dos subordinados.

104

Em ambientes de trabalho onde o sistema formal de autoridade é claro, os líderes terão tendência a apoiar mais os subordinados, mas se o sistema formal de autoridade for fraco, a liderança deverá ser directiva, de modo a estabelecer as regras e as exigências do trabalho.

Quanto à terceira variável ambiental, uma liderança directiva pode ajudar a restabelecer a coesão do grupo, no caso de conflitos inter-grupais.

A teoria Caminho – Objectivo centra a sua atenção em ajudar os subordinados a ultrapassar barreiras que surjam no seu caminho, de modo a aumentar as expectativas dos líderes em relação à realização da tarefa e a aumentar a satisfação destes.

1.5 A teoria do futuro: A liderança carismática

Um líder carismático será o líder que através da sua visão pessoal inspira os seus subordinados, provocando alterações profundas nas suas crenças, percepções, valores e acções, tendo um impacto significativo nas suas organizações (Stoner et al, 1995; Goleman, 1998). Os subordinados são aqui considerados como subordinados do líder.

Numa primeira análise desta definição, poder-se-ia concluir que o líder carismático é especial, devido às características pessoais que os distinguem dos não carismáticos. Segundo House, embora as características pessoais do líder carismático sejam importantes, serão as reacções dos subordinados que validarão a liderança carismática (Greenberg e Baron, 1995).

Para este autor as características pessoais dos líderes carismáticos incluem : o líder ser dominante, ter uma energia pessoal muito forte, extremamente confiante, e ter fortes convicções nas suas crenças e valores.

Outras características são apontadas aos líderes carismáticos tais como: 1. Terem uma visão, um objectivo de alto nível, idealizado por eles direccionado para

um futuro melhor. 2. A habilidade de persuasão, influenciando os subordinados a agir de acordo com os

seus objectivos. 3. A habilidade de dar poder, de compartilhar o poder com os seus subordinados. 4. A habilidade de conjugar aspectos múltiplos, de modo a levar os seus subordinados a

compartilhar os seus objectivos, motivações e valores (Stoner et al, 1995).

Para além de possuírem certas características pessoais os líderes demonstram certos comportamentos específicos. Os líderes carismáticos adoptam um modelo de agir especifico, ou seja, definem o propósito das suas actividades de maneira a dar um valor acrescentado àquilo que se propõem fazer, exemplificando pelo seu próprio comportamento os valores que adoptam e ao fazerem isso, dão um significado especial para as acções que pretendem que os subordinados desenvolvam, levando-os a adoptar os valores e crenças do líder.

Os líderes demonstram assim, competência perante os subordinados e muitas vezes desafiam riscos e empreendem comportamentos não convencionais para demonstrar coragem e convicções sobre a visão (Robbins, 1998). Eles partilham a visão de um modo claro com os seus subordinados, descrevendo os seus objectivos ideológicos de uma maneira intensa, e comunicam expectativas elevadas que têm em relação aos subordinados e a confiança que têm neles em como estes irão ao encontro destas expectativas.

Quanto às reacções dos subordinados como resultado da liderança carismática serão de salientar níveis de desempenho superiores aos normalmente esperados.

A liderança carismática estará correlacionada com altos desempenhos do trabalho e satisfação das pessoas. (Greenberg e Baron, 1995).

105

Outra reacção será de uma aceitação inquestionável do líder, com grande lealdade, obediência e devoção perante este.

Outro efeito geralmente verificado será a total confiança na ideologia do líder, em que os subordinados demonstram entusiasmo acerca do líder e da sua ideologia.

A motivação verificada por um esforço maior de trabalho será outro efeito desta liderança, em que os subordinados se predispõem a sacrificar os seus interesses pessoais em prol de um objectivo.

Com a crescente mudança organizacional, em que grandes empresas requerem mudanças profundas, revitalizações, mas desenvolvidas num curto espaço de tempo, a liderança carismática forte apresenta-se como o tipo de liderança mais apropriada (Kotter, 1996).

A existência de um líder capaz de ter um impacto, excepcional nas organizações, faz realçar que certas características podem fazer a diferença. Assim, a liderança carismática é muitas vezes descrita como liderança transformacional, pois existe uma sobreposição entre uma e outra.

Convém, neste ponto, diferenciar líderes transformacionais de transaccionais.

1.5.1 Liderança Transaccional

O líder transaccional será aquele que orienta e motiva os subordinados rumo aos objectivos estabelecidos, clarificando o papel e as exigências da tarefa. Ele exerce influência sobre os subordinados, apenas devido ao facto de compatibilizar os objectivos dos subordinados com os seus.

Segundo um estudo efectuado por Bass, existem dois factores que caracterizam a liderança transaccional, a recompensa contingêncial e a gestão por excepção (Bass,1990).

A recompensa contingêncial refere-se ao processo de troca entre líder e subordinados, em que se trocam recompensas e estatuto por desempenho. O líder tenta chegar a um acordo com os subordinados, sobre o que é necessário fazer e o que é que eles ganharão ao fazê-lo.

A gestão por excepção pode ser activa e passiva. A gestão activa por excepção acontece quando o líder observa atentamente os subordinados com o fim de encontrar possíveis erros ou desrespeito pelas regras, procedendo, em seguida, a acções correctivas.

O líder ao adoptar a gestão por excepção passiva só intervém no caso dos níveis de desempenho estabelecidos não terem sido alcançados.

Estes tipos de gestão utilizam apenas criticas correctivas e medidas negativas de estímulo e encorajamento para os subordinados.

1.5.2 Liderança Transformacional

O líder transformacional será aquele que inspirará os subordinados a transcender os seus próprios interesses para o bem da organização (Robbins, 1998).

Os líderes transformacionais influenciam e motivam os subordinados a fazerem mais do que o que se esperaria, tendo em atenção as necessidades crescentes da organização, aumentando os níveis de consciência dos subordinados em relação à importância dos objectivos idealizados e específicos. Geralmente o líder transformacional possui um sólido conjunto de valores e ideais e o seu comportamento provoca um efeito profundo nos subordinados. Por outras palavras, poderemos dizer como anteriormente apontámos, que, o que o verdadeiro líder, o líder carismático transformacional, pede aos seus subordinados actuem motivados por motivos “transcendentais”, isto é, pensando no bem geral e na organização.

106

Segundo Bass (1990) há quatro factores que caracterizam a liderança transformacional: o carisma, a inspiração, o estímulo intelectual e atenção individual.

O carisma é característico dos líderes transformacionais, pois são considerados indivíduos especiais que influenciam os subordinados provocando alterações nas suas crenças e levando-os a seguirem a sua visão. O líder, através da sua visão pessoal e da sua forte conduta de valores, faz com que os subordinados o respeitem e confiem nele.

A inspiração é característica dos líderes transformacionais pois ao comunicarem as elevadas expectativas em relação aos subordinados, inspiram-nos, levando-os a concretizar maiores esforços para atingirem os objectivos e a partilharem da visão na organização.

Outra característica do líder transformacional será o de estimular os subordinados a serem criativos e inovadores. O líder apoia os subordinados a desenvolverem novas abordagens e estimula os subordinados a pensarem por si próprios e a resolverem problemas por conta própria.

A última característica focada por Bass é a atenção que os líderes dão aos subordinados, apoiando-os e ouvindo as suas necessidades individuais. Através da orientação e do apoio os líderes procuram que os subordinados desenvolvam as suas capacidades.

O líder transformacional terá mais impacto e produzirá efeitos mais profundos do que o líder transaccional, pois consegue níveis de desempenho e dedicação superiores por parte dos subordinados. E segundo Bass, a liderança transformacional tem uma correlação mais elevada com baixa taxa de rotação, elevada produtividade e elevada satisfação dos subordinados, do que a liderança transaccional.

CONCLUSÕES

Cremos que uma ideia muito importante a retirar de toda esta exposição é sobre a

efectiva necessidade e benefício de saber liderar, e não ser somente um mero gestor, um chefe. Podemos afirmar que, liderar é essencial a toda a organização, e muito particularmente à

gestão da mudança. Assim sendo, a mudança, é uma constante na actual envolvente económica, social, tecnológica e política, requerendo das organizações e dos seus líderes uma acção forte e inspiradora de confiança.

Tal missão e trabalho, deverá ser realizado em colaboração com os outros membros das equipas responsáveis na empresa, ou seja, em primeiro lugar com os que lhe estão ligados. Depois, numa fase posterior, o envolvimento de todos os restantes membros da organização nos processos de mudança, será de todo em todo conveniente, no sentido de minimizar os riscos da resistência a essa mudança. Será assim, necessária uma liderança forte, não autocrática, mas somente uma liderança baseada no uso de um estilo mais oportuno e eficaz mediante as circunstâncias e situações concretas, inspirando os seus subordinados a agirem porque querem, motivados e com iniciativa.

Tendo em conta os diferentes níveis de motivação, empenho e capacidade de responsabilidade dos vários membros ou grupos de uma organização e a envolvente situacional, o líder terá deste modo, necessidade de tornar-se competente em todos os ambientes. Será este comportamento de adaptabilidade que o ajudará a melhorar a sua capacidade de comunicar, de aumentar a sua eficácia e de construir relações pessoais e grupais sólidas, contribuindo decisivamente para o sucesso da organização.

107

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Collins.

108

TEXTO Nº 7

FUNÇÃO MARKETING de: António Calheiros, Gabriel Silva, Lara Mendes & Madalena Abreu

Introdução

Nesta parte apresentamos uma função essencial ao normal funcionamento de uma empresa:

o marketing.

Como já sabemos, cada empresa detém a sua própria estrutura de funções, nas quais

diferentes tarefas são agrupadas de forma lógica, obedecendo a um conjunto de objectivos

similares. Naturalmente, o tipo de actividade, a dimensão da empresa, as variáveis internas e

externas que condicionam a vida da empresa, determinarão estes subsistemas da empresa quer

no seu número, na sua especificidade, quer no seu peso dentro da estrutura de poder da

empresa e ainda no conjunto de meios humanos, materiais, financeiros e informacionais que lhe

são afectos.

Também já sabemos que foi Henry Fayol a enumerar aquelas que considerava as funções

essenciais de uma qualquer empresa, a saber: Técnicas, Comerciais, Financeiras, Segurança,

Contabilísticas, Administrativas. Esta elencagem permanece ainda hoje actual mas é comum, e

dados os desenvolvimentos na teoria das organizações, designar as funções empresarias por:

marketing, financeira, recursos humanos e produção.

A Função do Marketing

Na actualidade o marketing é, sem dúvida, uma disciplina que serve de alavancagem à

dinâmica de uma organização. A disciplina do marketing é motor de adequação de uma

oferta específica às necessidades e desejos dos públicos pretendidos, um conjunto de teorias

que explicam a troca de valor ou relações de transacção.

Com efeito, o marketing começou a ser estudado no início do século XX de forma a dar

resposta aos problemas crescentes da distribuição nas empresas, e, logo de seguida, como meio de

aprofundar a reflexão sobre o comportamento de mercado. Hoje em dia, são várias as áreas da

economia, em particular, e actividade organizada, em geral, que apoiam a sua actuação nas

ferramentas do marketing: são novos sectores de aplicação para o marketing como o marketing

social, o marketing político ou o marketing para as instituições educacionais.

109

Interesse-nos aqui olhar o marketing na sua dimensão de função empresarial ou, dito de outro

modo, enquanto paradigma da gestão, um conjunto de acções de gestão que operacionalizam

essa atitude de atenção ao consumidor e suas necessidades.

Segundo Kotler (1997), Marketing é o meio através do qual as organizações identificam

necessidades humanas não satisfeitas, as convertem em oportunidades de negócios, e criam

satisfação para os outros e lucros para si próprias. Podemos, de maneira similar, afirmar que o

Marketing é um sistema total de actividades que se destinam a planear, atribuir preços,

promover e distribuir produtos que satisfazem necessidades, em mercados-alvo, a fim de atingir

os objectivos da organização.

Portanto, existe uma clara diferença entre o marketing e as vendas:

O marketing tem um foco de interesse externo, é o processo que determina o que o cliente

quer e depois desenvolve um produto para satisfazer aquela necessidade, gerando igualmente

lucro satisfatório. As vendas têm um foco de interesse interno, já que se trata de produzir um

produto e depois tentar persuadir o cliente a comprá-lo, tendo como efeito tentar alterar a

procura do cliente.

Podemos também afirmar que o marketing tem uma função numa economia de mercado:

“gere” o circuito directo e indirecto, os fluxos físico e de comunicação entre a produção, a

oferta, e os potenciais consumidores, a procura, equilibrando essas trocas relativamente às

quantidades, espaço e tempo.

O objectivo do Marketing é criar valor percebido como tal pelos clientes. O valor

transferido para o cliente é igual a: VALOR TOTAL PARA O CLIENTE – CUSTO TOTAL DO

CLIENTE. O que quer dizer que o valor total para o cliente é o conjunto de benefícios

esperados de determinado produto ou serviço. Portanto, a fim de se determinar o valor para o

consumidor, é comum determinar quais os benefícios que os consumidores valorizam e, em

seguida, o como avaliam os valores relativos das vária ofertas concorrenciais.

A gestão de marketing, desdobrando-se nas fases sequenciais de análise, decisão,

implementação e controlo consiste: na análise do mercado, nas decisões estratégicas de

marketing e, por fim, no marketing operacional.

Essencialmente, o marketing, enquanto função de gestão é subdividido em estratégico e

operacional.

O Marketing estratégico desenvolve as seguintes tarefas:

–Análise das necessidades: definição do mercado de referência.

–Segmentação do mercado: macro e micro segmentação.

–Análise da atractividade: mercado potencial, ciclo de vida.

110

–Análise da competitividade: vantagem concorrencial defensável.

–Escolha de uma estratégia de desenvolvimento.

–Escolha do segmento alvo

O Marketing Operacional, por seu turno, e partindo do trabalho efectuado na fase da

estratégia, desempenha as seguintes actividades:

–Plano de marketing (objectivos, posicionamento, táctica).

–Marketing mix (produto, preço, promoção e distribuição).

–Orçamento de marketing.

–Operacionalização.

–Controlo.

Especificamente, com o intuito de se desenvolver uma estratégia de marketing eficaz, as

empresas devem ter em consideração os seus concorrentes, tal como os seus clientes actuais e

potenciais. Devem analisar continuamente os seus concorrentes e desenvolver estratégias de

marketing competitivo que a posicionem efectivamente contra eles e lhe dêem a mais forte

vantagem competitiva possível.

A análise da concorrência passa pela identificação dos principais concorrentes utilizando uma

análise do sector e uma análise do mercado. A empresa recolhe informações sobre os

objectivos, estratégias, forças, fraquezas e padrões de reacção do concorrente. Com essa

informação vai poder seleccionar os concorrentes que vai atacar ou evitar. Chegado a este

ponto, a empresa questiona-se sobre a estratégia a escolher. Logicamente, a melhor estratégia

de marketing competitivo a utilizar depende: da posição que a empresa ocupa no sector, dos

seus objectivos e das oportunidades e recursos.

Após o estudo do conceito, análise do mercado, elaboração das estratégias, etc, devemos

agora proceder à sua aplicação através de decisões sobre as variáveis, i.e., o marketing mix ou

composto do marketing (os chamados 4 P’s):

Produto.

Preço.

Comunicação.

Distribuição.

Na perspectiva dos consumidores, os 4 P’s são perspectivados nos 4 C’s, ou seja:

Necessidades e desejos do Cliente.

Custo para o Cliente.

Conveniência.

111

Comunicação.

O marketing-mix constitui a ferramenta operacional do gestor de marketing, sendo

através dele que se procura atingir os mercados escolhidos com os produtos e serviços

genericamente concebidos, de modo a atingir os objectivos pretendidos pela organização

Mas qual é afinal o significado da variável, provavelmente, mais importante do marketing-mix?

Com efeito, um produto pode ser uma mercadoria, um serviço, um lugar, uma pessoa ou

uma ideia. Mais, um produto é um conjunto de atributos tangíveis e / ou intangíveis, que

incluem a embalagem, cor, preço, qualidade e marca, mais os serviços e reputação do

vendedor.

A política de produto de uma empresa comporta várias decisões. Assim sendo, as principais

decisões sobre o produto podem ser agregadas em cinco grupos, a saber:

ATRIBUTOS DO PRODUTO, i.e., fixar as características intrínsecas de cada um dos

produtos

MARCA

EMBALAGEM, essencialmente, a sua concepção

ROTULAGEM

SERVIÇOS

Além destas decisões sobre o produto individual, há ainda que tomar decisões quanto à

política da gama, o que implica escolher o portfólio de actividades da empresa e os respectivos

produtos.

O preço representa a quantia, em moeda, consumida para obter um produto ou serviço,

ou, de forma mais aproximada à percepção do consumidor, a soma de valores que os

consumidores trocam pelos benefícios de possuir ou utilizar um produto (mercadoria, serviço,

lugar, pessoa ou ideia).

A atribuição de preços pode ser.com efeito, um processo complexo, sendo, sem dúvida,

uma decisão que evolui da mera táctica para se tornar numa arma estratégica fundamental num

mundo concorrencial.

A comunicação é outra variável do marketing-mix determinante, especialmente nos

produtos massificados.

Tecemos apenas algumas considerações basilares nesta matéria. Sem dúvida que a

comunicação deve ser dirigida a alvos bem definidos. O que quer dizer que os meios, a escolha

dos meios a utilizar depende dos alvos a atingir, da mensagem a transmitir e da intensidade que

112

se deseja. Ex.: os vendedores, a televisão, a rádio, a imprensa e os cartazes. A mensagem é,

então, o conteúdo base de informação que é transmitida através da política de comunicação

Existem um conjunto vasto de ferramentas que podem ser usadas no âmbito da

comunicação em marketing. Usualmente, podem ser agregadas em cinco formas, a que é usual

chamar de mix da comunicação:

Vendas pessoais: A apresentação directa de um produto a um cliente potencial por meio de

um representante da organização de vendas.

Publicidade: Tipo de comunicação em massa, impessoal e a pagar, em que o patrocinador

está claramente identificado.

Promoção de vendas: Actividade estimuladora da procura que se destina a complementar a

publicidade e facilitar as vendas pessoais.

Relações públicas: Esforço de comunicação planeado por uma organização para contribuir

para atitudes geralmente favoráveis e opiniões dirigidas à organização e aos seus produtos.

Marketing directo: Técnicas de comunicação individualizada e interactiva geralmente pedindo

uma resposta directa do consumidor.

Os intermediários são empresas que oferecem serviços relacionados directamente com a

compra e/ou venda de um produto à medida que fluí do produtor para o consumidor.

Os intermediários, agentes ou distribuidores, no seu conjunto formam um determinado

canal de distribuição. Na verdade, o papel da distribuição é colocar o produto no mercado alvo

da empresa, o que implica:

Providenciar a sua venda e a transferência de propriedade.

Promover o produto.

Armazenar o produto.

Assumir alguns riscos durante a distribuição.

Será ainda conveniente lembrar-mos que os intermediários executam frequentemente estas

actividades para o produtor ou o consumidor.

Nesta linha, podemos concluir que a política de distribuição de uma empresa envolve

decisões relativas a:

Canais de distribuição.

Funções dos canais de distribuição.

Selecção dos canais de distribuição.

Tipos de canais de distribuição.

A gestão e organização dos canais de distribuição.

113

TEXTO Nº 8 Inovar sem Risco

Eurico Neves

CAPÍTULO I – INOVAR: COMO, QUEM E PORQUÊ?

A vontade de inovar é seguramente comum à totalidade das empresas. A moda recente em torno do

conceito «inovação» mais não tem feito do que aguçar este desejo. Na inovação as empresas procuram a

resposta aos problemas que as afligem diariamente ou a possibilidade de ultrapassar as suas

concorrentes e de aumentar as suas vendas. Inovar pode ser ainda uma oportunidade de diversificar a

produção e de atacar novos mercados ou uma forma de as empresas melhorarem a sua imagem de

marca, tornando-se um símbolo apetecível de modernidade e eficiência.

Para a maior parte das empresas «inovação» significa novas tecnologias. Embora o conceito de

inovação seja bastante mais vasto e atinja todas as áreas de actividade de uma empresa, neste livro

tomaremos este conceito como bom e abordaremos apenas a inovação tecnológica. É um facto que a

inovação não tem que ser necessariamente tecnológica e pode ser apenas uma nova forma de

apresentar, distribuir ou vender um produto (e veja-se como exemplo a inovação das crescentes redes de

«franchising» que revolucionaram os conceitos estabelecidos de distribuição). Mas é igualmente verdade

que nos dias de hoje não há absolutamente nenhum domínio de actividade que não repouse nalguma

forma de tecnologia, e no qual uma inovação tecnológica não possa representar ganhos significativos de

competitividade. Dando razão às empresas, «inovação» significa cada vez mais «novas tecnologias».

Se todas as empresas desejam inovar e aceder a novas tecnologias, muito poucas são as que

sabem como. Para a maioria a inovação tecnológica aparece como algo de quase inabordável, apenas ao

alcance dos grandes grupos industriais dotados de departamentos de investigação próprios. Inovação e

investigação são conceitos que andam normalmente de mãos dadas. Isto acontece porque o modelo de

inovação que prevalece no espírito da maior parte dos gestores de empresas é o designado modelo linear

de inovação. Segundo este modelo, ilustrado na Figura 1, um processo inovador é sempre desencadeado

por um projecto de investigação básica 1 , a que se segue, caso tenham sido obtidos resultados

interessantes, uma fase de desenvolvimento da tecnologia. Concluída esta etapa, que visa transformar os

resultados de investigação em algo de comercializável, a nova tecnologia daí resultante é produzida e

finalmente vendida.

1 Por investigação básica entendem-se os projectos destinados a adquirir, aprofundar ou desenvolver conhecimentos científicos, em

oposição à investigação aplicada destinada a converter tais conhecimentos em produtos, processos ou serviços comercializáveis. A

investigação aplicada é neste livro mais correntemente designada por «desenvolvimento» (o «D» de I&D).

114

Segundo este modelo linear o número de inovações que finalmente chegam ao mercado está

directamente condicionado pelo volume de investigação científica efectuada. Um grande investimento em

investigação (por exemplo com objectivos militares) deverá assim conduzir a um número elevado de

descobertas que mais tarde ou mais cedo encontrarão o seu caminho até ao mercado. A períodos de

grande agitação científica (como por exemplo os motivados pelas guerras mundiais ou pela conquista

espacial) seguem-se assim fases de introdução rápida de inovações no mercado, de que são exemplos o

avião a jacto, o radar ou os computadores.

Não sendo o único modo possível de representar a introdução de novos produtos, processos ou

serviços no mercado (como se verá mais à frente), o modelo linear ajusta-se contudo a uma grande

parte das inovações importantes das últimas décadas. Mas isto não significa de modo algum que só as

empresas «investigadoras» possam inovar. Não é necessário «inventar» para «inovar». Por vezes basta

aproveitar as invenções de outros. Com uma parte de leão da investigação básica a ser desempenhada

pelos (ou para) os poderes públicos, e sem que estes tenham o interesse ou a capacidade de levar as

eventuais descobertas até ao mercado, o caminho fica aberto para quem o souber aproveitar. Nem a

Boeing nem a Airbus inventaram o avião a jacto e contudo estas duas empresas dominam actualmente o

mercado deste tipo de aviões para transporte de passageiros. A Compaq nem existia quando apareceram

os primeiros computadores e é agora um gigante na área dos computadores pessoais. O sucesso destas

empresas assentou em grande parte em saberem construir as suas inovações sobre as descobertas que o

mundo científico lhes ofereceu.

Uma empresa que queira inovar não está portanto obrigada a percorrer todas as etapas do

modelo linear. Diferentes empresas poderão, de acordo com as suas diferentes culturas tecnológicas e os

seus distintos recursos, empreender o processo em diferentes fases do seu percurso linear. Poderão

iniciá-lo desde o ponto de partida, desempenhando elas mesmas a investigação básica que se espera

conduza a descobertas de impacto nos mercados, ou poderão «apanhar o comboio em andamento»

numa das suas etapas intermédias. É claro que quanto maior for a base tecnológica de uma empresa,

mais a montante poderá esta iniciar o processo (e assim deter um maior controle sobre este e os seus

resultados). Pelo contrário, quanto mais pobre tecnologicamente ela for, mais a jusante terá que efectuar

a sua entrada no processo e mais dependente fica de terceiros. Mas só fica de fora quem quiser. A etapa

do modelo linear pela qual uma empresa inicia o seu processo inovador condiciona o seu modo de aceder

à inovação. Dando nomes às diferentes formas de abordar o processo, obtemos o gráfico da figura

seguinte, com cinco dos principais modos de obter inovações:

115

Podem-se ilustrar as diferentes possibilidades de aceder à inovação que se deparam às empresas

com um exemplo simples:

Imagine-se um distraído proprietário de uma vivenda, que sempre que sai de casa se esquece de

desligar as luzes e o aquecimento e de liga o alarme.

Se ao feitio distraído se associar um espírito empreendedor, poderá tal personagem pensar em

instalar em sua casa um sistema inovador capaz de lhe resolver o problema. Por exemplo um circuito

electrónico que quando accionado pela volta da chave na fechadura da porta, no sentido de a fechar,

dispara automaticamente os disjuntores da iluminação e do aquecimento central da residência, e activa o

relé de comando do sistema de alarme. Se possuir os conhecimentos suficientes de electrónica para

desenhar um tal circuito, e a habilidade para o montar e instalar, então terá «feito» a sua própria

inovação. Se esta resultar em pleno poderá mesmo vendê-la aos vizinhos.

Se lhe faltarem os conhecimentos para desenhar o circuito, mas lhe sobrar a habilidade para o

instalar, poderá sempre «encomendar» o projecto a um gabinete de engenharia e depois montá-lo ele

próprio. Ou então comprar um circuito próximo do que necessita (por exemplo um vulgar circuito de um

sistema de abertura e fecho de um portão de garagem por comando remoto) e adaptá-lo ao seu caso

particular.

No caso de os seus conhecimentos de electrónica e electricidade serem demasiado reduzidos

para lhe permitir aceder a uma das soluções acima descritas, mas continuando o proprietário com

vontade de resolver ele próprio o seu problema, poderá tentar «aprender» rapidamente o suficiente

sobre sistemas semelhantes ao que deseja, de modo a ser então capaz de montar uma solução.

Finalmente, se não dispuser do tempo, da vontade, ou dos meios para optar por uma destas

soluções resta a este homem contentar-se unicamente com o que o mercado lhe oferece, mesmo

correndo o risco de a solução oferecida não ser exactamente a que resolve o seu problema particular. O

proprietário da nossa história terá neste caso que «comprar» um sistema já pronto e aprender a

trabalhar com ele. Mas tendo sido o primeiro da sua rua a instalar um tal sistema, não terá deixado de

inovar. Provavelmente tornar-se-á mesmo uma referência para os vizinhos que lhe virão pedir conselho

antes de comprarem sistemas semelhantes.

Tal como este empreendedor proprietário também as empresas deverão procurar o modo de inovar

adaptado aos seus meios, competências e disponibilidades.

Uma empresa «investigadora» com capacidades próprias de investigação e desenvolvimento

(I&D) e recursos materiais e humanos suficientes, poderá assim «fazer» a sua própria tecnologia,

cumprindo uma a uma todas as etapas do processo de inovação.

Já empresas tecnologicamente menos evoluídas, sem departamentos internos de investigação,

mas ainda assim dotadas de recursos técnicos razoáveis (empresas «tecnologicamente competentes»),

podem apanhar o «comboio da inovação» na segunda estação, seja «encomendando» a etapa anterior a

um organismo especializado de I&D, seja adquirindo os direitos de uma ideia e «adaptando-a» à sua

situação particular. As empresas poupam-se assim à fase mais demorada e arriscada do processo, sendo

que em contrapartida devem compensar de algum modo a organização responsável por essa fase.

Deverão assim pagar um preço a acordar pelo trabalho de investigação «encomendado», mais elevado se

116

quiserem ficar com a exclusividade dos resultados, mais baixo se não se importarem de os partilhar com

outras empresas. De qualquer forma, menos do que teriam de gastar para chegarem elas próprias a

esses mesmos resultados.

Organizações sem capacidade de desenvolvimento, mas «tecnologicamente despertas», podem por sua

vez «aprender» as especificidades de uma nova tecnologia de modo a passarem a produzi-la elas

próprias (eventualmente com algum valor acrescentado) e comercializá-la em seguida, pagando os

direitos respectivos ao seu criador. Esta modalidade é interessante para empresas em fase de despertar

tecnológico pois permite-lhes rotinar o seu pessoal em processos inovadores, sem terem de arcar de

início com os riscos do seu desenvolvimento. Em contrapartida os acordos de licenciamento podem ser

bastante limitativos em termos de crescimento de mercado ou no domínio oferecido sobre a tecnologia

licenciada, mas tudo dependerá das capacidades de negociação das empresas.

Se uma empresa quiser rapidamente tornar-se dona de uma nova tecnologia (seja para

comercializá-la num dado mercado, seja para consumo interno) sem passar pelas fases do seu

desenvolvimento ou produção, resta «comprá-la» a quem a comercialize. É o que se passa quando uma

firma adquire os direitos de representação de uma tecnologia «chave na mão» ou quando compra uma

nova máquina para a sua linha de montagem. Nestes casos, o domínio da firma sobre a nova tecnologia

é reduzido e consequentemente é também limitada a sua capacidade de evoluir tecnologicamente em

resultado do uso da inovação. Pelo contrário o risco é reduzido e os resultados comerciais podem ser

rápidos. Os maiores benefícios poderão contudo ser ainda alcançados pelas empresas que forem capazes

de assegurar um maior domínio e intervenção sobre a tecnologia que adquiriram. Empresas

«adormecidas tecnologicamente» podem desta forma despertar para as vantagens da inovação

tecnológica.

Mas para além das possibilidades tecnológicas de «quem» inova, um outro factor terá que ser

levado em linha de conta quando da escolha do modo de inovar pelas empresas. Quando prestes a iniciar

um processo de inovação, uma empresa não se pergunta apenas «como é que eu posso inovar?», mas

principalmente «por que é que eu quero inovar?». Porquê iniciar um processo arriscado, onde se vão pôr

em jogo uma boa parte dos recursos materiais e humanos de uma empresa com resultados incertos?

A resposta a esta pergunta terá que ser procurada no mercado (normal num mundo cada vez

mais aberto e liberal) e é ao tentar analisar esta componente crucial da inovação que o modelo linear,

em que nos temos baseado até aqui, revela as suas limitações. Existe um grande número de inovações

que não resultam directamente do desenvolvimento comercial de descobertas científicas, antes seguem

um percurso quase inverso. São inovações cuja origem se encontra numa atempada detecção de

necessidades do mercado, muitas vezes passíveis de serem satisfeitas com uma simples evolução de

tecnologias já existentes. Por sua vez, esta evolução, baseada em conhecimentos tecnológicos já

existentes, pode abrir novos caminhos à investigação e conduzir ao alargamento do conhecimento

científico. A inovação deixa assim de poder ser exclusivamente representada como o resultado de uma

sucessão linear de etapas para passar a aparecer como um processo interactivo em que novas

tecnologias necessitam de ser constantemente desenvolvidas e aperfeiçoadas, não só no seu desem-

penho técnico mas igualmente em termos da sua aceitação no mercado. Os exemplos clássicos de um

117

percurso não-linear da inovação incluem casos como o da invenção do aeroplano pelos irmãos Wright –

sem nenhuns conhecimentos de aerodinâmica e coroados de sucesso à custa de melhorias sucessivas no

desenho do seu engenho – ou o desenvolvimento da computação paralela como uma tentativa de resol-

ver as limitações em termos de velocidade impostas por um único processador.

O reconhecimento das limitações do modelo linear na explicação de algumas inovações conduziu

ao aparecimento de modelos não-lineares, em que as diferentes fases do processo interagem umas com

as outras em vez de simplesmente se sucederem. Num tal modelo, cada nova etapa na direcção da

comercialização de um produto põe em questão as etapas anteriores, à medida que parâmetros como

competitividade, «design», preço final e aceitação pelos mercados vão sendo introduzidos. Estes

parâmetros complementam as questões puramente técnicas, obrigando em cada etapa à reconcepção

total ou parcial do projecto. O mercado e as suas exigências aparecem assim como constantes de todo o

processo. Nestes modelos já não é a investigação tecnológica, conduzida no interesse público ou privado,

a originar forçosamente o desenvolvimento de novos produtos comercializáveis, mas sim o mercado que

os pede, estimulando o engenho dos cientistas nas empresas.

Um possível modelo não linear de inovação é o que se representa na figura seguinte:

O modelo não linear da inovação aplica-se particularmente bem no caso de «pequenas» inovações,

normalmente simples melhoramentos de tecnologias já existentes. Ao contrário o desenvolvimento da

maioria das inovações radicais continua a poder representar-se por modelos lineares.

A adopção por uma empresa de uma prática de inovação de acordo com um modelo não linear,

118

não representa por si só nenhuma nova forma de acesso a novas tecnologias. Para obtê-las uma

empresa terá que continuar por optar entre «fazê-las», «encomendá-las», «adaptá-las», «aprendê-las»

ou «comprá-las». Mas ao introduzir a componente «mercado» na origem e ao longo de todo o processo,

tal prática de inovação introduz pela primeira vez o factor motivação. Ou a resposta à pergunta «porquê

inovar?».

Segundo esta nova óptica mercantilista, o modo como uma empresa irá inovar deixa de ser apenas

função dos seus recursos tecnológicos para passar a ser igualmente dependente dos objectivos

pretendidos com a inovação. Objectivos que estão por sua vez directamente relacionados com a atitude

da empresa perante os seus mercados.

Esta atitude pode por exemplo ser uma atitude ofensiva, pela qual uma empresa pretende com a

inovação melhorar a sua posição no mercado, superando tecnologicamente as suas concorrentes.

É a atitude típica dos líderes de mercado, das empresas que aspiram a sê-lo ou daquelas com um

rápido padrão de crescimento à custa da frequente introdução de inovações. Como a empresa

dinamarquesa Bang & Olufsen, por exemplo, produtora de equipamento áudio, que tem como lema:

«uma inovação importante cada dois anos».

Mas a atitude pode ser também uma atitude imitativa, pela qual uma empresa ao inovar se limita

a seguir os passos das suas competidoras directas, de modo a não se deixar atrasar irremediavelmente.

É a atitude a que estão obrigadas todas as empresas inseridas em áreas de actividade de grande

dinamismo, e que devem rapidamente adaptar-se às últimas modas do seu sector. A electrónica de

consumo é uma dessas áreas. Sempre que a Sony ou a Phillips (os líderes de mercado) introduzem uma

inovação absoluta (como o leitor de CDs, o walkman ou o vídeo gravador) inicia-se entre os seus

competidores uma corrida a inovações semelhantes e se possível, ainda mais perfeitas.

Finalmente a motivação para inovar pode provir ainda de uma atitude defensiva, quando uma

empresa necessita de inovar para resolver os problemas que lhe aparecem pela frente. É a atitude mais

frequente entre as pequenas empresas, confrontadas diariamente com problemas de diversa índole,

muitos dos quais só podem ser resolvidos pelo recurso a inovações. Sendo que por vezes há males que

vêm por bem. A urgência de resolver um problema pode constituir uma boa oportunidade de modernizar

uma empresa e adaptá-la às novas tendências do mercado. A indústria portuguesa de moldes surgiu em

«Empurrão tecnológico» versus «Puxão do mercado» Os conceitos de «empurrão tecnológico» do inglês 'technology push' – e «puxão do mercado» – de

"market-pull" – são usados frequentemente para descrever o processo de inovação. Segundo o primeiro a inovação é provocada pela investigação científica, a que se segue a comercialização de descobertas tecnológicas. De acordo com o segundo as inovações resultam principalmente de necessidades do mercado que «aguçam o engenho» dos investigadores.

Não é claro qual dos dois conceitos predomina actualmente no total de inovações registado na Europa. Estudos contraditórios existem quanto à influência de cada um deles, mas existe uma relativa unanimidade quanto à prevalência do «empurrão tecnológico» nas grandes inovações enquanto o «puxão de mercado» é responsável por mais de 90% das pequenas inovações.

119

parte por essa razão.

Consoante a atitude de uma empresa perante os mercados, a sua justificação para empreender

um processo de inovação tecnológica terá assim uma motivação ofensiva, imitativa ou defensiva. Ao

«como» e ao «quem» da inovação vem agora juntar-se o «porquê». A tabela representada abaixo (Fig.

4) resume as respostas possíveis a cada uma destas três perguntas: como, quem e porquê inovar?

Inovar, como?

•   Fazendo: desenvolvendo

internamente, através de

projectos de I&D, novas

tecnologias.

•   Encomendando: cooperar

com instituições de I&D em

projectos adaptados às

necessidades da empresa.

•   Adaptando: desenvolver e

aplicar, de uma forma inovadora,

tecnologias já existentes, de

acordo com as necessidades e

competências da empresa.

•   Aprender: adquirir o saber-

fazer (licenças) necessário para

produzir inovações.

•  Comprar: Comprar tecnologias

já adaptadas às necessidades da

empresa.

Inovar, quem?

•   Investigadores: Empresas

com departamento de I&D ou

equivalente, capazes de uma

visão tecnológica a longo prazo.

•   Tecnologicamente com-

petentes: Empresas com uma

forte componente de engenharia,

sem grandes limitações

financeiras e com ligações

tecnológicas exteriores.

•   Tecnologicamente des-

pertas: Empresas com entre um

a cinco engenheiros (em funções

técnicas), capazes de adoptar e

adaptar soluções integradas,

eventualmente com recurso a

aconselhamento exterior.

•   Adormecidas: Empresas sem

capacidade tecnológica e ainda

sem percepção da necessidade

de a criar.

Inovar, porquê?

•  Para  responder  a  um  problema

importante da empresa:

Inovação defensiva;

•  Para assegurar o crescimento a

médio/longo prazo e ultrapassar

os concorrentes: Inovação

ofensiva;

•   Para   acompanhar   os   seus  

concorrentes: Inovação imi-

tativa;

Fig. 4 - Inovar: Como, Quem e Porquê

No exemplo do proprietário empreendedor, dado anteriormente a propósito das diferentes

formas de aceder à inovação, a motivação assentava claramente numa atitude defensiva. No caso a

necessidade de resolver um problema prático do dia-a-dia, com consequências nefastas na conta da

electricidade e na segurança do potencial inovador. Mas podemos igualmente considerar o mesmo

exemplo com uma das duas outras motivações apresentadas acima, seja a imitativa (o desejo de seguir o

exemplo de um vizinho) ou a ofensiva (identificar a necessidade de um tal sistema entre os vizinhos e

desenvolvê-lo tendo em vista fundamentalmente a sua venda).

Ao introduzir o factor motivação estamos contudo a condicionar as opções relativas à forma de

inovar que se apresentam ao proprietário. Se por exemplo a sua motivação para inovar for ofensiva fica

automaticamente excluída a hipótese de compra do sistema, uma vez que dificilmente alguém comprará

120

a um vizinho um sistema que pode comprar directamente nas lojas, sem ter que recorrer a um interme-

diário extra.

Reconhece-se assim que a escolha do modo de inovar (ou a resposta à pergunta «como inovar?») não é

unicamente função das capacidades de quem inova mas igualmente dos objectivos pretendidos com a

inovação (a resposta à pergunta "porquê inovar?»). Podemos assim representar o «como inovar» como

função de uma tabela de duas entradas: o «quem» e o «porquê».

A análise desta matriz permite-nos uma aproximação ao processo inovativo muito mais completa

do que a fornecida pela simples relação entre a capacidade tecnológica da empresa e o modo de inovar.

De facto a inovação é sempre um fenómeno complexo, incerto e arriscado o que justifica que as

empresas utilizem para o abordar os meios mais convenientes às suas necessidades e não apenas

aqueles para os quais se julgam naturalmente adaptadas. O facto de uma empresa possuir um

competente departamento de investigação, não quer assim dizer que deva recorrer à investigação básica

para resolver todos os problemas que se lhe deparam no caminho. Por vezes pode ser mais prático

recorrer a tecnologias já desenvolvidas (por organismos públicos por exemplo, ou mesmo por empresas

concorrentes) e construir a partir de dados já conhecidos, do que perder tempo a investigar o que já foi

investigado. No caso oposto, uma empresa «adormecida» não está necessariamente limitada apenas a

comprar tecnologia. Se desejar tomar uma atitude ofensiva, destacando-se no seu sector por uma oferta

tecnológica superior à da concorrência, pode optar por produzir e vender sob licença um produto,

processo ou serviço que seja inovador para a sua região ou no seu sector. Se tiver sucesso na sua

inovação, esta empresa poderá eventualmente passar mesmo a ocupar um lugar de liderança no seu

sector. Mas se quiser continuar nessa posição não poderá manter a sua atitude «adormecida». As suas

121

novas responsabilidades de líder obrigá-la-ão a assumir uma atitude tecnologicamente mais desperta de

modo a poder defender-se (e contra-atacar) dos assaltos da concorrência.

Este exemplo mostra claramente que a inovação não é um fenómeno estático. A sua adopção por

uma empresa terá como efeitos previsíveis causar, ou forçar, uma evolução na sua cultura tecnológica.

Esta mesma evolução pode ser conseguida igualmente sem inovação, à custa do investimento em

recursos materiais e principalmente humanos. Uma empresa tecnologicamente adormecida pode por

exemplo passar para um estado de vigília tecnológica pela simples contratação de um engenheiro dotado

de hábitos regulares de leitura de revistas técnicas. Oportunidades tecnológicas que até aí passavam

despercebidas a esta empresa podem assim começar a ser regularmente avaliadas. Mas, a menos que ao

novo engenheiro sejam dados reais poderes na gestão da empresa (o que é raro, e normalmente apenas

acontece com as mudanças de gerações dirigentes nas empresas familiares), dificilmente tal contratação

será suficiente para que a empresa passe a aproveitar essas oportunidades. Estando as decisões nas

mãos da administração e continuando esta «adormecida», bem lhe podem apresentar boas

oportunidades tecnológicas que o mais provável é que elas continuem a ser ignoradas.

Maiores possibilidades de ser bem sucedida tem a progressão tecnológica da empresa mercê de

um processo inovador por ela própria desencadeado. A tomada da decisão de inovar e a sua

consequente implementação na empresa devem contribuir para uma mudança sustentada na sua cultura

tecnológica que lhe permitirá passar de um modo definitivo para um escalão tecnológico superior e deste

modo alargar os seus horizontes de inovação. Sendo assim o «como inovar» deixa de ser uma simples

variável de saída do «quem» e do «porquê» para ir por sua vez condicionar estas duas variáveis. A

progressão tecnológica ideal de uma empresa será contudo a resultante da combinação das duas

componentes de mudança acima descritas: as mudanças culturais forçadas pela adopção de uma ino-

vação e as provocadas pelo investimento em infra-estruturas materiais e humanas.

A compra de uma nova tecnologia, por exemplo, terá como efeito provável o de fazer evoluir

uma empresa «adormecida» para um estado de maior atenção às novas tecnologias. Tal dever-se-á ao

normal trabalho de pesquisa de mercado e comparação da oferta que precede qualquer investimento

importante num novo equipamento. Poder-se-á dizer que no fim desse trabalho de pesquisa, a empresa

estará num estado tecnológico «semidesperto». Mas se essa (semi) evolução não for acompanhada de

um esforço em assegurar de uma forma permanente o acesso a informação sobre novas tecnologias, a

empresa voltará ao estado de «adormecida» passado pouco tempo. O mesmo acontece com cada um

dos outros estados tecnológicos como se representa na figura seguinte.

É contudo importante referir que o sentido da progressão tecnológica das empresas, como

resultado da incorporação de inovações, pode nem sempre ser o ascendente. Tal como um processo de

inovação bem sucedido «empurra» uma empresa para cima na escala tecnológica, um processo de

resultados infelizes pode muito bem «puxá-la» para baixo. Um processo de inovação mal gerido (com

resultados abaixo das expectativas e custos bastante acima) deixa normalmente marcas indeléveis nas

empresas, especialmente nas mais pequenas e menos habituadas a lidar com processos semelhantes. O

que implicará, mais do que uma estagnação tecnológica, um provável retrocesso. Isto é, uma empresa

desperta para a inovação pode, após um projecto falhado, tornar-se na mais adormecida das empresas,

122

a força de tão cedo não querer tornar a ouvir falar de inovação ou novas tecnologias.

Antes de iniciar um processo de inovação uma empresa deve, deste modo, estar consciente dos

riscos do mesmo e dotar-se dos meios necessários para os enfrentar. No Capítulo III abordar-se-á a

minimização do risco da inovação, enquanto o Capítulo IV trata dos mecanismos presentemente

colocados à disposição das empresas para as ajudar na sua procura de novas tecnologias. Mas

principalmente uma empresa deve ser capaz de se relacionar de uma forma familiar com as várias

maneiras de «fazer» tecnologia, como com as de as «encomendar», «adaptar», «aprendê-las» ou

«comprá-las» de forma a poder escolher a que mais lhe convêm em cada momento. Com esse objectivo,

o Capítulo II analisa um a um os diferentes modos de inovar, fornecendo exemplos práticos de sucesso

da sua aplicação.

CAPÍTULO II – INOVAR: DO FAZER AO COMPRAR

No capítulo anterior abordaram-se as diferentes formas de aceder à inovação, obtendo uma matriz

possível dos modos de inovar de acordo com as capacidades tecnológicas das empresas e com a sua

atitude perante o mercado.

Referiu-se também que, uma vez iniciado o processo inovador, este poderá afectar toda a cultura

e posicionamento da empresa, aumentando as suas capacidades tecnológicas e alterando a sua maneira

de se comportar nos mercados. Estas transformações por sua vez aumentarão as possibilidades da

empresa de inovar mais e melhor e motivarão novas evoluções no seu funcionamento e atitude.

A escolha do modo de aceder à inovação é assim um fenómeno em permanente evolução, onde

caminhos que antes pareciam vedados às empresas se podem abrir mais cedo do que o esperado, ou

onde soluções antes menosprezadas podem afinal revelar-se como as mais eficazes. Se não é credível

pretender que uma empresa sem pessoal técnico qualificado se decida de um dia para o outro a conduzir

projectos de investigação básica, ou esperar que um líder de um mercado competitivo abdique da

pesquisa científica e mantenha a sua posição só a comprar tecnologia, não é menos verdade que muitas

boas oportunidades são perdidas por falta de ponderação sobre todas as possibilidades existentes.

123

Não se devem mistificar as exigências e as dificuldades dos projectos de I&D destinados a

«fazer» novas tecnologias, como também não se devem menosprezar as possibilidades de evolução

tecnológica abertas por uma simples compra de um equipamento inovador. Ambos os processos, tal

como todos os outros situados entre estes dois extremos, apresentam vantagens e inconvenientes e cabe

a cada empresa optar em cada momento pelo modo de aceder à inovação que mais se ajusta às suas

capacidades e que melhor satisfaz os seus objectivos.

Se será melhor fazer ou comprar, encomendar, adaptar ou aprender, é algo que cabe às

empresas decidir. Mas será que estas estão suficientemente familiarizadas com estes processos de forma

a tomarem a decisão mais correcta?

O mais provável é que muitas delas se ponham a elas próprias perguntas do género de: «como

posso colaborar com os meus clientes na investigação de melhores soluções?», «a quem é que posso

encomendar novas tecnologias?» ou «existem apoios para a adaptação de inovações pela minha

empresa?».

Nas páginas seguintes tenta dar-se respostas a perguntas como estas, analisando um por um os

diferentes modos de acesso à inovação e ilustrando-os com exemplos da sua aplicação com sucesso por

parte de empresas portuguesas.

O Fazer

«Fazer» tecnologia utilizando os seus próprios meios técnicos e humanos, percorrer uma a uma todas as

fases do processo inovador e no final ser a única detentora dos seus resultados, é sem dúvida a forma

mais prestigiosa e atraente de inovar que se apresenta às empresas. Apresenta decerto inúmeras

vantagens, entre as quais a menor não será certamente a possibilidade de a empresa se estar a colocar

um passo à frente de todos os seus competidores. Mas apresenta também dois inconvenientes de peso:

a investigação é gulosa e caprichosa. É gulosa porque é terrivelmente exigente em termos de recursos

necessários e imprevisível em termos de estimação de custos ou de duração previstos para um projecto.

E é caprichosa uma vez que os seus resultados são bastante incertos, com taxas de sucesso a rondar os

10% ou inferiores.

Pode assim muito bem acontecer que uma empresa portuguesa que pensa gastar 10 000 contos

durante um ano e meio para desenvolver internamente um novo sistema automático para afinação e

mistura de componentes de fabrico de lápis, chegue ao fim de três anos tendo gasto 20 000 contos para

desenvolver um sistema com capacidade para fabricar apenas metade dos lápis previstos. Ou pior ainda,

que não tenha chegado a nenhum resultado.

E não se pense que falhanços destes apenas acontecem a pequenas ou médias empresas (PME).

Os gigantes japoneses da electrónica de consumo andaram durante mais de vinte anos a desenvolver

aplicações de televisão de alta definição analógica, gastando milhões de ienes no processo, até

descobrirem finalmente que o futuro da televisão estava no digital e que era preciso recomeçar tudo

outra vez.

Tudo isto para dizer que o caminho da inovação, quando percorrido desde a investigação básica

até à comercialização final dos seus resultados, é longo, tortuoso e carregado de riscos. O que não quer

124

dizer que não valha a pena iniciá-lo. Uma vez concluído com sucesso a recompensa poderá ser de modo

a fazer esquecer as agruras do caminho.

O caminho da investigação básica é tão rico em ensinamentos e tão recheado de atalhos, que

mesmo que os resultados não sejam os esperados o balanço final pode ser bastante positivo. Não é

impossível que uma empresa que investiga à procura da solução para o problema "A" termine por

encontrar  a  solução  para  o  problema  ‘B’,  onde  se  calhar  ‘B’  é  mais  importante  que  ‘A’.  Afinal  a  penicilina  

foi descoberta dessa forma.

E, como se viu no capítulo anterior, se uma empresa inserida num sector de actividade competitivo

deseja assumir uma atitude ofensiva (procurar o que os outros não têm) então a investigação torna-se

uma necessidade e não uma opção. É o caso das empresas inseridas em mercados tão dinâmicos como

os dos computadores pessoais ou da electrónica de consumo, onde as novidades se sucedem sem

descanso e onde as empresas aparecem e desaparecem num abrir e fechar de olhos. Se uma empresa se

encontra num segmento de mercado menos dinâmico, mas visa melhorar a sua posição ultrapassando

em cota de mercado empresas com tantos ou mais recursos que ela própria, a investigação surge

igualmente como a solução mais óbvia. Nestes casos em que a investigação surge como um imperativo,

a dimensão da empresa não é um óbice ao processo.

Mercados extremamente dinâmicos como o da produção de software são caracterizados pela

existência de inúmeras empresas de reduzido tamanho e forte capacidade de investigação. O que é

importante é que a empresa dimensione o projecto de investigação de acordo com a sua própria

dimensão. Os milhões de ienes perdidos pela Sony a investigar a tecnologia errada para a televisão do

futuro podem não ter tido reflexos de relevo na estratégia da empresa, mas os 10 000 contos a mais

gastos pela fábrica de lápis podem muito bem levá-la ao fundo. Tal como uma micro-empresa de três

engenheiros pode correr o risco de ter um deles um ano cometido a 100% a um projecto de

desenvolvimento de um software revolucionário (a custo de uma sobrecarga de trabalho corrente sobre

os outros dois), mas dificilmente poderá aguentar mais do que um mês com dois dos engenheiros a

trabalhar no projecto. Ao contrário, um grande grupo industrial pode sempre aumentar as suas equipas

de investigação se necessário sem que a sua laboração se ressinta disso.

Um importante trabalho de cálculo e redução do risco impõe-se portanto, antes da decisão final

de embarque num projecto de I&D, de modo a não empenhar a sobrevivência da empresa a algo de tão

incerto como os resultados de uma investigação básica. Se o risco tiver sido correctamente analisado

(dentro das limitações naturais que projectos deste tipo impõem), e principalmente minimizado na sua

máxima possível extensão, então, mesmo que o projecto não forneça resultados assinaláveis, dificilmente

a empresa o poderá encarar como um falhanço total, uma vez que a sua capacidade tecnológica terá

progredido e as hipóteses de sucesso numa nova tentativa serão maiores. No Capítulo III abordar-se-á a

questão da minimização do risco inerente à inovação, particularmente importante no caso da

investigação tecnológica. Mas antes é importante focar as diversas facetas dos projectos de I&D e o seu

interesse para as empresas.

Normalmente, quando se pensa em empresas investigadoras, a primeira imagem que vem à

cabeça é a de grandes grupos industriais desenvolvendo as suas ideias no maior segredo em laboratórios

125

recheados de pessoas de bata branca. Este modelo aproxima-se bastante da realidade em casos como o

da indústria farmacêutica. Um mercado caracterizado por uma concorrência feroz, onde a progressão

tecnológica é constante e onde a mínima vantagem sobre os concorrentes pode valer uma progressão

espectacular em termos de cota de mercado (ou não estivesse em jogo a saúde de todos nós).

As características deste mercado são de modo a que todas as importantes indústrias

farmacêuticas (incluindo as nacionais, como a Bial ou a Atral-Cipan) disponham de estruturas de I&D

permanentes e em constante actividade e que uma grande parte dos seus projectos seja desempenhado

em «stand-alone», ou seja, sem a colaboração de nenhuma outra firma. O que em termos gráficos, e

socorrendo-nos do modelo linear (por uma questão de simplicidade, embora muitas das inovações do

campo farmacêutico, como doutros sectores «investigadores», possam ser representadas por modelos

não lineares) pode ser representado da forma seguinte:

Tal tipo de investigação exige obviamente grandes recursos por parte das empresas.

Conhecendo-se a reduzida taxa de sucesso da investigação tecnológica (em termos de projectos iniciados

versus resultados colocados no mercado) uma empresa que queira apresentar um produto novo todos os

anos deverá ter algo como várias dezenas de projectos de investigação básica a decorrer de forma

simultânea. O que exige grandes meios técnicos e humanos fora do alcance da maioria das PME e

mesmo de muitos grupos industriais importantes.

A investigação básica é tão cara e tão arriscada que mesmo muitas das empresas citadas no

nosso exemplo – indústrias farmacêuticas – têm que pôr por vezes de lado o seu desejo de secretismo e

cooperar com outras empresas em grandes projectos, demasiado importantes, ou urgentes, para uma só

empresa. É o caso presente da luta contra a SIDA, travada conjuntamente pelos mais importantes

laboratórios farmacêuticos mundiais.

A este tipo de cooperação em I&D dá-se normalmente a designação de cooperação horizontal.

Duas ou mais empresas do mesmo ramo compartilham os custos e os riscos da investigação básica, após

o que cada uma procede ao desenvolvimento dos eventuais resultados. Isto virá a dar origem ao

surgimento no mercado de produtos que compartilham a mesma base científica mas apresentam

características diferentes de acordo com a empresa que os desenvolveu. O modelo linear da inovação

aplicado a um consórcio horizontal encontra-se na figura seguinte:

126

O estabelecimento de consórcios horizontais entre várias PME, ou entre uma ou mais PME e

empresas de maior porte, é uma primeira abordagem realista da possibilidade de «fazer» inovação por

parte das pequenas e médias empresas, desde que dotadas de estruturas de I&D. O que é muito

arriscado para uma só pequena empresa pode tornar-se abordável a um grupo equilibrado delas.

Principalmente se for possível dispor de ajudas públicas.

E neste campo a investigação em consórcios horizontais é uma das modalidades mais apoiadas

pelos poderes públicos, que dispõem neste tipo de projectos de uma maior margem de manobra para

conceder subsídios às empresas, uma vez que os resultados vão beneficiar um conjunto de empresas ou

um sector, e não uma única organização.

Os programas de I&D apoiados pela Comissão Europeia são na sua maioria deste tipo, com a

obrigatoriedade de o consórcio incluir pelo menos empresas de dois países diferentes. Estes projectos

transnacionais de cooperação horizontal podem ser bastante interessantes para as empresas, que

compartilham mais depressa os seus segredos com uma organização estrangeira (potencialmente com

mercados-alvo diferentes) do que com uma empresa concorrente do mesmo país.

Uma terceira possibilidade de empreender projectos de I&D, talvez a mais interessante para as

PME, é a associação em consórcios verticais entre uma grande empresa, realizadora de investigação pré-

competitiva, e os seus fornecedores. Nestes consórcios, a grande empresa, uma vez na posse dos

primeiros resultados da sua investigação (ou na necessidade de criar os meios para os obter) transfere

competências e conhecimentos para os seus fornecedores para que estes desenvolvam processos ou pro-

dutos compatíveis com a sua nova tecnologia.

Esta é uma modalidade extremamente interessante para as pequenas empresas, porque lhes

permite simultaneamente fidelizar um cliente e manter-se a par da evolução tecnológica, aumentando e

modernizando as suas competências, processos ou produtos. Por outro lado apresenta também

vantagens para as grandes empresas, permitindo-lhes repartir parte dos custos da sua investigação e

integrar os seus fornecedores no novo processo desde o seu início.

A representação gráfica da investigação em consórcios verticais encontra-se na Figura 9:

Exemplos de sucesso: Servotrol Casos de participação em projectos de investigação por parte de empresas como a Servotrol contribuem para a

desmistificação dos programas de I&D como uma reserva exclusiva dos grandes grupos industriais. Sendo uma pequena empresa baseada quase exclusivamente nas competências técnicas do seu director e

principal quadro técnico, operando na área dos sistemas de comando automático, a Servotrol foi o principal motor de um projecto apoiado pelo programa europeu Esprit – o programa europeu de investigação na área das tecnologias de informação, e um dos mais importantes programas de I&D europeus.

O projecto, desenvolvido por um consórcio europeu onde para além da Servotrol pontificavam uma fábrica de vidros portuguesa (como potencial utilizador) e indústrias e organismos de investigação portugueses, ingleses, espanhóis e alemães, visou o desenvolvimento de um sistema multi-sensor inteligente para fornos e caldeiras destinado a controlar a viscosidade do vidro no estado líquido. Partindo das ideias da Servotrol, no final recompensada com os direitos de comercialização da tecnologia, o projecto foi conduzido a bom termo, com o desenvolvimento de um sensor inovador, sem concorrência, no mercado, e com um potencial de utilização considerável na indústria vidreira.

127

Uma grande vantagem deste tipo de colaboração vertical é o de ser um passo no sentido de

resolver um dos principais entraves que se colocam ao sucesso das inovações tecnológicas: a falta de

tecnologias complementares que permitam um melhor aproveitamento da nova tecnologia. Um estudo

americano2 revelava que este era mesmo o factor mais importante no retardar do aparecimento de novas

tecnologias no mercado. Esta dificuldade era particularmente notória nas inovações menos abruptas,

simples evoluções de tecnologias já existentes, enquanto no caso de inovações maiores, ou revoluções, a

falta de mercado ganhava tanta importância como a falta de tecnologias complementares. A cooperação

em I&D entre grandes empresas e os seus fornecedores pode permitir resolver ou minorar este problema

através do desenvolvimento paralelo de uma tecnologia principal e das tecnologias que a irão permitir

explorar. Empresas como a Bosch na Alemanha têm desenvolvido e estimulado este sistema através de

uma colaboração estreita com os seus fornecedores da região de Baden-Wurttenberg, sob os bons auspí-

cios do governo regional (um dos mais activos na Alemanha no apoio à inovação tecnológica). Em

Portugal a constituição de clubes de fornecedores de grandes empresas (como aconteceu recentemente

com os fornecedores da Auto-Europa) pode, se devidamente apoiada e incentivada pela empresa

compradora e pelas estruturas tecnológicas nacionais, ser um trampolim para um aumento deste tipo de

cooperação tecnológica.

A investigação em consórcios verticais ou horizontais é sempre uma boa solução para que empresas

dotadas de um bom potencial tecnológico mas recursos limitados, possam desenvolver de raiz as suas

próprias inovações. O que não quer dizer que seja uma modalidade acessível. O número de organizações

capazes de «fazer» as suas próprias inovações, mesmo em consórcio, é reduzido, e para uma empresa

poder integrar este «clube exclusivo» é importante que consiga reunir as seguintes condições:

Poder cometer pessoal a 100% ao projecto de investigação. Uma condição que afasta logo um

importante número de empresas, especialmente PME, onde os recursos humanos não abundam.

Entre clientes, fornecedores e parceiros estratégicos, contar com empresas investigadoras entre

as suas relações.

Possuir necessidades tecnológicas a longo prazo. A investigação demora tempo e não é

2 J. Langrish et al., Wealth from Knowledge. A Study of Innovation in Industry (New York, NY Haslted/John Wiley, 1972). Factores de maior relevância no retardar da introdução de novas tecnologias no mercado: 32.5% – insuficiente desenvolvimento de uma tecnologia complementar; 22.5% – falta de mercado; 7.6% – falta de visão empresarial para inovar.

128

seguramente uma solução para problemas que exigem uma solução imediata.

Estar familiarizado com os programas públicos de apoio à investigação, ou saber a quem recorrer

para obter os conhecimentos que lhe faltem nesta área. Uma condição essencial para obter os

financiamentos públicos que podem aliviar a empresa de parte dos custos do projecto.

Se uma empresa não reunir pelo menos três das quatro condições expostas acima, então deve

interrogar-se seriamente sobre as suas eventuais vantagens em «fazer» investigação, comparativamente

com as das outras formas de aceder a inovações. Para que um consórcio de investigação seja bem

sucedido, é de facto importante que as empresas nele participantes detenham uma cultura

«investigadora», e que possam trazer valor acrescentado ao projecto em curso. Se essa cultura não

existir, e o interesse da empresa for unicamente o de dispor dos resultados da maneira mais conveniente

possível, então o melhor é mesmo chamar os especialistas. Ou seja, encomendar o trabalho de

investigação a quem o faz por vocação.

O Encomendar

Se as ideias de potenciais inovações fervilham numa empresa mas esta não dispõe do equipamento, das

pessoas, da cultura científica ou da vontade necessárias para empreender um processo de investigação,

então só tem a ganhar em associar-se com quem o faça por ela. Como por exemplo uma universidade,

ou um centro de investigação.

Este é um dos tipos de colaboração científica mais divulgados e promovidos entre as PME. Pela sua

proximidade dos mercados uma empresa inovadora está em óptima posição para identificar tecnologias

em falta no seu sector. Tecnologias que lhe permitiriam, por exemplo, facilitar a produção, melhorar a

distribuição de produtos, ou aumentar a eficiência e o desempenho destes, melhorando a sua aceitação

por parte dos consumidores. Outras empresas deparam no seu dia a dia com problemas que não

conseguem solucionar só com as tecnologias existentes e que requerem novos conceitos técnicos. As

empresas com um maior espírito inovador conseguirão, quando confrontadas com uma destas

necessidades tecnológicas, definir com precisão as condições de entrada (os dados do problema) e de

saída (o que a tecnologia deve oferecer) da inovação em falta. Resta-lhes encontrar quem lhes forneça

uma base científica que faça funcionar a «caixa preta» capaz de lhe solucionar os problemas.

129

Tome-se por exemplo o caso do sector de pedras decorativas, sector no qual as empresas

portuguesas são responsáveis por um quarto da produção europeia. Uma empresa mais inovadora

poderá reparar numa procura acentuada para pedras de formatos mais sofisticados, e identificar a

necessidade de um sistema de corte mais eficiente do que os sistemas mecânicos tradicionais, de modo a

permitir obter as pedras desejadas. Uma empresa mais capaz tecnologicamente poderá mesmo definir os

níveis de produtividade e de precisão necessários para um tal sistema, e até sugerir possíveis soluções,

nomeadamente o laser ou o jacto de água. Mas seguramente que não poderá conceber ela própria o

sistema, pois não domina tais tecnologias. Mas organizações como o Instituto Nacional de Engenharia e

Tecnologia Industrial (INETI) ou o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) dominam-nas e têm como

principal actividade a condução de projectos de investigação nesta e noutras áreas.

A associação entre uma empresa, ou um grupo de empresas, de um dado sector e um ou mais

organismos de investigação aparece assim como uma solução vantajosa tanto para as empresas (que

beneficiam dos resultados) como para as instituições de I&D (que desempenham a função para a qual

foram concebidas). A aplicação do modelo linear a este tipo de projectos de I&D terá a forma

representada na figura seguinte:

Se este sistema permite a uma empresa, ou a um grupo de empresas, libertar-se da componente

mais onerosa do processo, as fases seguintes, nomeadamente a de desenvolvimento, não deixam por

isso de lhes exigir uma forte capacidade tecnológica.

Exemplos de sucesso: Mecanova A inovação através da cooperação entre instituições de I&D e empresas, em que as primeiras

fornecem os meios e as segundas os objectivos, é uma das soluções interessantes para as PME sem capacidade de investigação própria, mas com uma ideia clara quanto às suas necessidades tecnológicas. É também uma das modalidades mais apoiadas no nosso país, o que é normal atendendo à concentração dos meios de I&D nas universidades e outros organismos públicos.

A Mecanova foi uma das empresas portuguesas que soube aproveitar as potencialidades desta forma de inovação. Esta firma foi criada por um grupo de engenheiros, na sua maioria provenientes da firma Mecânica Exacta, que viram uma oportunidade de mercado no desenvolvimento de uma máquina de fabrico de rolhas de cortiça «inteligente», capaz de observar a cortiça e decidir o melhor ângulo de brocagem de modo a melhorar a produtividade do processo.

Com uma excelente visão tecnológica mas sem os conhecimentos de tecnologias de informação que lhes permitissem o desenvolvimento integral da máquina, os criadores da Mecanova souberam procurar ajuda qualificada e encontrá-la no INETI levando ao surgimento de um projecto comum onde o INETI se encarregou da pesquisa básica no campo optoelectrónico e a Mecanova da sua aplicação prática numa máquina «comercializável», disponível no mercado desde 1995.

130

A investigação cooperativa não deve assim ser encarada como uma poção mágica, capaz de

transformar empresas adormecidas tecnologicamente em empresas inovadoras da noite para o dia.

Deverá antes ser entendida como uma forma de administração inteligente de recursos por parte de

empresas dotadas de fortes conhecimentos técnicos na sua área de actuação.

O sucesso de este tipo de projectos assenta fortemente na capacidade de as empresas neles

envolvidas definirem correctamente as variáveis da tecnologia que necessitam. Mas igualmente em serem

capazes de transformar os resultados científicos, que lhes são fornecidos pelos institutos de investigação,

em aplicações práticas suficientemente desenvolvidas e testadas, e passíveis de serem produzidas e

comercializadas a preços atraentes.

Dependendo das estruturas que os organismos de investigação disponham para suportar a venda

das suas capacidades científicas, o auxílio por estes prestado às empresas pode ultrapassar a simples

fase científica e estender-se a fases mais a jusante do processo inovador. Como por exemplo ao desenho

de protótipos do produto final, ao teste e validação das aplicações ou mesmo à realização de estudos de

mercado e de viabilidade da tecnologia. Ou então a colaboração pode versar fases a montante da

investigação científica como a identificação das necessidades tecnológicas das empresas. Evidentemente,

quanto mais completa for a colaboração do organismo de investigação, menor terá que ser a participação

tecnológica da empresa e mais acessível será este tipo de cooperação científica a empresas de menores

conhecimentos técnicos (e maior será o número de PME a quem os organismos de I&D podem vender os

seus serviços de investigação). Mas é importante não esquecer que sendo a empresa a usuária e a

proprietária do resultado final, é a ela que lhe cabe a definição do produto e a sua afinação tendo em

vista o mercado em que se insere. Quanto menor for a participação da empresa no processo inovador,

menor será o seu domínio da tecnologia desenvolvida e por conseguinte menores serão as possibilidades

de que o produto esteja suficientemente amadurecido e adaptado ao mercado quando do seu

lançamento.

Para dar um exemplo concreto, uma instituição de pesquisa científica do campo biotecnológico

pode desenvolver para uma pequena empresa de cosméticos uma nova pasta de dentes com excelentes

propriedades anticárie mas dotada de um sabor tão intragável que ninguém é capaz de a usar. Se a

empresa se limitar a recolher a receita de preparação desenvolvida pelos cientistas, produzi-la em grande

escala e embalá-la em bisnagas, guiada por uma fé cega nos resultados científicos, está condenada a um

fracasso certo. Cabe à empresa testar em condições de mercado os resultados científicos e desenvolvê-

los nas direcções indicadas por tais testes, mesmo que para isso se tenham que sacrificar algumas das

suas propriedades.

Em Portugal, de qualquer forma, o papel das empresas nos projectos cooperativos está destinado a ser

importante pois são ainda poucas as instituições de I&D que fazem acompanhar os seus serviços

científicos por serviços de validação, consultadoria ou informação de apoio à inovação. Organizações

como o INESC ou o ISQ têm dado alguns passos nesse sentido, mas a inter-relação entre os diferentes

serviços oferecidos é ainda fraca, tal como o é o conhecimento e o interesse das empresas por estes

serviços «paralelos», portanto de uma importância primordial na obtenção de resultados. Voltar-se-á a

esta questão no Capítulo V, quando se abordar os sistemas de inovação no nosso país.

131

Pese embora a carência de serviços complementares ao trabalho de I&D, o «encomendar» uma

inovação continua a ser uma excelente solução, principalmente para empresas possuidoras de um

espírito inovador, mas com carências científicas numa dada área. É verdade que o risco e o investimento

necessários a este tipo de projectos são ainda importantes, uma vez que estes implicam uma aposta

numa tecnologia ainda não existente. No fundo é de «fazer» tecnologia que se continua a tratar, embora

agora quem «faça» e quem a «utilize» sejam entidades distintas.

Resta dizer, como compensação, que os projectos de I&D cooperativa são dos mais apoiados

pelos poderes públicos, quer por via indirecta através do financiamento das instituições de I&D

(reduzindo assim os custos de utilização destas para as empresas), quer por via directa, através da

participação nos custos totais de projectos deste tipo. O que ajuda fortemente a torná-los atractivos para

as empresas.

E que empresas estão aptas a participar em projectos deste tipo? Um leque bem mais vasto do que as

capazes de «fazer» inovações, mas constituído principalmente por empresas que apresentem o seguinte

perfil:

Possuam necessidades tecnológicas a médio/longo prazo. Como se referiu anteriormente a

investigação, seja em consórcios horizontais verticais ou cooperativos, não é solução para

problemas urgentes.

Dispondo de pessoal com capacidade para acompanhar os projectos de investigação e liderar o

seu desenvolvimento.

Com uma sólida relação estabelecida com as estruturas tecnológicas da sua região,

nomeadamente com as universidades.

Familiarizadas com os programas públicos de apoio a esta forma de inovação, ou que saibam a

quem recorrer para preparar as propostas a estes programas.

As empresas que reúnam as condições acima são sem dúvida aquelas que melhores resultados

podem retirar dos projectos de investigação cooperativa. Ao contrário, para uma empresa com

necessidades tecnológicas a curto/médio prazo, podem ser mais vantajosas outras formas de aceder à

inovação. Como por exemplo a adaptação de tecnologias.

O Adaptar

«Fazer» ou «encomendar» novas tecnologias são duas formas de aceder a inovações, distintas na forma

e nos recursos exigidos, mas similares na atitude requerida e no risco envolvido. Ambos são processos

complexos que para serem levados a bom termo exigem das empresas uma cultura orientada para a

inovação e uma atitude claramente ofensiva perante os mercados.

Mas como se viu anteriormente a necessidade de inovar não se limita a este tipo de empresas. A

inovação pode surgir como a resposta a um problema prático do dia-a-dia, seja ele a necessidade de

diminuir os custos de produção ou de melhorar as características de um produto para satisfazer um

cliente importante. Problemas cujo carácter urgente não se compadece com o ritmo de um projecto de

investigação ou cuja solução não será suficientemente compensadora para que se corram os riscos que

os projectos de I&D sempre acarretam mas que por outro lado são problemas para os quais não existe

132

uma solução «chave-na-mão» no mercado.

A solução para estes casos poderá estar na adaptação às necessidades da empresa de resultados

de projectos de investigação conduzidos por outros. Esta é uma solução mais rápida, mais barata e

menos arriscada do que desenvolver uma nova tecnologia de raiz. A adaptação de novas tecnologias

poderá até nem ser motivada pela necessidade de resolver um problema particular, mas ser antes

provocada pela constatação de como uma inovação concebida para um determinado fim poderia, com

algumas modificações, ser adaptada igualmente a outros objectivos. Ou seja, empurrão tecnológico e

puxão de mercado, podem igualmente motivar a adaptação de resultados de investigação pelas

empresas.

O que torna a possibilidade da adaptação de tecnologias tão interessante é fundamentalmente a

profileração de matéria-prima. Neste preciso momento milhares de organizações em todo o mundo estão

a trabalhar em projectos de I&D com vista à obtenção de determinados resultados. Muitas delas são

organizações públicas que mesmo que cheguem a resultados interessantes não dispõem da capacidade

de os comercializar. Outras são organizações privadas que vão atingir resultados diferentes dos que

esperavam e desadaptados às suas necessidades e que por isso vão abandonar os projectos sem os

desenvolver. Outras ainda são organizações que uma vez atingidos os seus objectivos técnicos, esperam

alcançar o máximo retorno do investimento realizado e por isso se dispõem a transferir os resultados

alcançados para empresas não concorrentes.

Como consequência de tudo isto existem milhares de descobertas tecnológicas, fruto de grandes

investimentos, que se encontram totalmente ou parcialmente desaproveitadas. E que podem ser

aplicadas em fins diferentes daqueles para as quais foram concebidas, com proveito tanto de quem aplica

como de quem detém os direitos por um processo de transferência de tecnologia que pode ser

representado de acordo com o modelo seguinte:

Esta forma de aceder à inovação permite às empresas inovadoras rentabilizarem os seus

133

resultados tecnológicos e às adaptadoras superarem as suas carências e investir em produtos, processos

ou serviços já desenvolvidos e eventualmente com provas dadas. Por vezes com um sucesso estrondoso.

Veja-se o exemplo da Microsoft: o famosíssimo MS-DOS, na base do seu enorme sucesso como empresa,

teve origem na adaptação de um sistema operativo desenvolvido inicialmente por uma outra empresa.

A diminuição do risco que resulta deste processo de transferência de tecnologia, permite que

mesmo empresas sem nenhum perfil tecnológico possam aceder a inovações, desde que saibam criar as

condições necessárias à sua adaptação e implementação, por exemplo através do recurso a ajudas

externas.

O dono de uma mercearia de bairro, por exemplo, sente diariamente a perda de clientes para as

grandes superfícies e pressente que algo de inovador tem que ser feito para prender os seus clientes,

mas provavelmente não lhe passa pela cabeça que essa inovação possa ter uma base tecnológica. Mas

porque não?

Um sistema baseado em computadores pessoais, equipados de aparelhos de leitura óptica, poderia, a um

custo unitário bastante baixo, substituir as velhas máquinas registadoras com enormes ganhos em

termos de eficiência, tempo e, principalmente, de capacidade de gestão de stocks.

O desenvolvimento de um tal equipamento por uma associação nacional ou regional de pequenos

comerciantes permitiria dotar todos os seus membros do respectivo hardware e software a um preço

acessível. Tal prática já é utilizada com sucesso pela associação de farmácias de Portugal, mas apesar da

aparente simplicidade da transferência do sistema para os pequenos minimercados e da crise que estes

atravessam, motivada por uma concorrência agressiva que por enquanto as farmácias não têm que

enfrentar, esta ainda não se realizou.

A ligação do computador de cada comerciante a um organismo central que recebesse a

informação de stocks disponíveis de todos os associados de uma forma automática, permitiria ainda

como vantagem adicional a constituição de centrais de compras de média dimensão o que permitiria o

acesso dos comerciantes às mercadorias a preços mais baixos, com o consequente aumento de

competitividade. No fundo, a reprodução a uma escala associativa dos avançados sistemas de informação

Exemplos de sucesso: Tecnotron A Tecnotron Sistemas de Automação S.A. é uma pequena empresa com cerca de 30 pessoas, fundada em

1991, e com uma atenção aos programas europeus de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico superior à média. Sendo assim, a Tecnotron soube aproveitar as oportunidades abertas pelo programa europeu «VALUE» (com o objectivo de promover a exploração de resultados de projectos europeus de I&D) para adquirir os direitos de exploração e comercialização para Portugal de uma tecnologia de controle integrado de facilidades de produção, adaptada a diferentes sectores, e desenvolvida por um consórcio integrado pelo INESC no âmbito de um projecto ESPRIT (programa europeu de I&D na área das tecnologias de informação).

Sem capacidades de investigação próprias para desenvolver um produto semelhante, mas com recursos técnicos para o seu desenvolvimento e «customização» a Tecnotron conseguiu, apostando na valorização de um resultado ainda não testado de um projecto de I&D, obter um produto competitivo e perfeitamente integrado na sua estratégia empresarial em condições muito mais competitivas do que se, por exemplo, se candidatasse à representação para Portugal de um produto comprovado.

Tal estratégia permitiu-lhe ainda desenvolver as suas potencialidades tecnológicas duma forma que a simples venda de uma tecnologia não lhe permitiria.

A tecnologia da Tecnotron encontra-se implementada em fabricantes nacionais de componentes para a indústria automóvel desde 1993.

134

electrónica já utilizados pela maioria das grandes superfícies.

Se parece óbvio que o preço final de venda de qualquer um destes sistemas não seria de molde a

afastar nem a mais pequena das mercearias, atendendo aos baixos preços actualmente praticados para

equipamentos informáticos, já os custos de desenvolvimento seriam incomportáveis para o dono de uma

pequena loja de bairro, cujos únicos recursos humanos disponíveis são os seus familiares chegados. Mas

decerto que o dono desta pequena loja estaria disposto a contribuir moderadamente para os esforços de

investigação aplicada de uma associação sectorial, que (utilizando os seus próprios meios ou procurando

competências externas) poderia aplicar as contribuições dos seus associados num projecto de inovação

de benefícios para todos, e candidatar-se ainda a um financiamento nacional ou comunitário de pelo

menos 50% dos custos totais do projecto.

Se um exemplo como o acima descrito parece perfeitamente viável, não deve deixar de ser dito

que quem mais pode ganhar com a adaptação de novas tecnologias não são as empresas «adormecidas

tecnologicamente» mas sim aquelas que se encontram em rápida ascensão tecnológica. Tipicamente,

empresas de constituição recente, dotadas de pessoal capaz e atento aos fenómenos da inovação, mas

ainda sem as possibilidades de conduzirem os seus próprios projectos de investigação.

Para estas empresas a «adaptação» é um meio de rapidamente se afirmarem como empresas de

alta tecnologia e de iniciarem uma escalada que mais cedo ou mais tarde as levará ao clube das «investi-

gadoras».

Outro grupo tipicamente utilizador da adaptação como forma de acesso à inovação é o constituído pelas

«spin-off» das universidades, empresas propositadamente criadas para adaptar, desenvolver e

comercializar os resultados mais interessantes dos projectos de I&D conduzidos pelas universidades.

E mesmo empresas com um perfil nitidamente investigador podem chegar por vezes à conclusão

de que lhes é mais compensador adaptar resultados da investigação de outros do que perder tempo a

tentar descobrir o que já foi descoberto e patenteado.

A adaptação de tecnologias é particularmente vantajosa para empresas com necessidades

tecnológicas a médio prazo, que disponham de uma prática regular de vigília tecnológica e que estejam

habituadas a recorrera ajudas externas, nomeadamente na área da mediação tecnológica. É ainda

importante que disponham no seu seio das competências técnicas capazes de desenvolver a tecnologia

no sentido que interessa à empresa. Ou seja, nada que esteja completamente fora do alcance de uma

grande número de firmas. Mas se estas exigências ainda parecerem exageradas, é sempre possível

inovar «aprendendo», como se vai ver a seguir.

O Aprender

Ao abordar a adaptação de tecnologias na secção anterior, após se ter descrito anteriormente a

realização e a encomenda de novas tecnologias, concluiu-se a descrição dos modos de inovação mais

complexos. Qualquer uma destas formas de aceder à inovação conduzirá ao aparecimento de novos

produtos, processos ou serviços, que tanto podem ser radicalmente novos como pequenos

melhoramentos de técnicas já existentes. A introdução destas inovações, quando bem aceites pelos

mercados, trará benefícios directos às empresas que as originaram, colocando-as em vantagem sobre as

135

outras empresas do mesmo sector. Às restantes empresas, assim colocadas em desvantagem, restam

apenas duas formas de reagir. Ou iniciam também elas um processo inovador semelhante, na esperança

de que este as conduza a resultados iguais ou se possível ainda superiores, ou optam por se aliar aos

seus concorrentes aprendendo com eles os segredos das novas tecnologias, pagando por isso o preço

justo.

Uma empresa que opte por esta segunda solução pode adquirir desta forma o conhecimento ou o

saber-fazer de uma nova tecnologia, após o que passa a poder produzi-la e comercializá-la ela própria,

com a sua própria marca. Uma possibilidade que pode apresentar vantagens para ambas as partes

envolvidas.

Para a detentora da inovação poderá ser uma forma de rentabilizar o investimento efectuado no seu

desenvolvimento. Mas ao fazê-lo necessita de assegurar-se de que ao transferir os seus conhecimentos

tecnológicos não está a favorecer um concorrente directo. É assim normal que, como condições do

negócio, imponha como limitação o uso da tecnologia transferida apenas em certos mercados que, ou

não lhe interessam especialmente (por falta de rede comercial, por especificidades próprias) ou lhe estão

vedados (por regulamentos políticos, por exemplo). É também possível que imponha limitações à outra

parte no seu domínio sobre a tecnologia, através, por exemplo, da proibição de lhe introduzir alterações.

Para a empresa mais atrasada tecnicamente, o licenciamento é uma forma rápida e segura de

dar um pulo tecnológico. Mas pelo seu lado necessita assegurar-se de que as condições impostas pela

outra parte não são demasiado limitativas em termos comerciais e especialmente em termos de domínio

sobre a tecnologia. O «aprender» dos segredos de uma nova tecnologia deve assim ser encarado por

uma empresa não apenas como uma possibilidade de alargar a sua oferta de produtos, processos ou

serviços, mas como uma forma de enriquecer a sua cultura tecnológica. Como o início de um processo

que idealmente a colocará num outro patamar de conhecimentos técnicos e lhe permitirá no futuro

desenvolver as suas próprias tecnologias liberta de quaisquer condições impostas por outrem. Um

processo que se pode representar na figura seguinte:

Este processo de transferência de tecnologia é muitas vezes utilizado por grandes empresas, de

136

perfil investigador, para penetrar em mercados fechados, onde os concursos públicos impõem uma quota

mínima de incorporação nacional. Para contornar as limitações políticas, transferem tecnologia para

empresas locais.

Algo de semelhante ao que se passa presentemente no nosso país com a possível transferência

da tecnologia de fabrico de comboios pendulares da Fiat Ferroviária (vencedora do concurso para o

fornecimento do novo equipamento para a linha do norte) para a Sorefame, com vista a aumentar a

integração nacional no projecto, ou ao passado nos anos oitenta entre a Westinghouse inglesa e o grupo

EFACEC, com a transferência da tecnologia de equipamento de automação de redes de energia, num

processo que é descrito em caixa separada.

Em casos como estes cabe à empresa «importadora» da tecnologia saber aproveitá-la em função

dos seus próprios interesses, e não só em função dos da empresa «exportadora».

O caso da EFACEC é exemplar por resultar numa evolução tecnológica desta empresa graças à

incorporação da tecnologia da Westinghouse.

Uma evolução amadurecida no mercado nacional, a que a EFACEC estava limitada por imposição

do acordo de transferência de tecnologia, e que lhe permitiu, uma vez o prazo contratual terminado, ter

de imediato um novo sistema mais evoluído pronto para competir com sucesso nos mercados externos.

Muitas outras empresas inovadoras começaram o seu percurso pelo licenciamento de tecnologias. O pri-

meiro automóvel produzido pela BMW nos finais dos anos vinte era de facto um Austin Seven construído

sob licença. E não deixa de ser curioso que nos anos noventa a BMW tenha comprado o grupo Austin-

Rover, fechando assim um ciclo na sua história de constante progressão tecnológica.

Mas para que uma empresa possa efectivamente progredir com as tecnologias que assimila, à

imagem da EFACEC ou da BMW, é essencial que durante a fase de negociação das condições de

transferência, dedique pelo menos tanta atenção à margem de manobra a obter sobre o uso da

tecnologia como às condições comerciais. É importante lembrar que as limitações sobre o uso da

tecnologia podem pesar muito menos a curto prazo do que os royalties a pagar por cada equipamento

produzido sob licença, mas arriscam-se a ter consequências bem mais negativas a longo ou mesmo a

médio prazo.

Exemplos de sucesso: EFACEC Sistemas de Electrónica, S.A. Em 1988 a firma inglesa de equipamentos de automação para redes de energia Westinghouse ganhou o

concurso para automação do despacho nacional de energia da EDP, e de acordo com os regulamentos do mesmo, viu-se forçada a encontrar um parceiro português, que assegurasse uma forte incorporação nacional no projecto. A escolha recaiu na EFACEC, na altura com um nome feito em sistemas de energia e transformadores, mas sem experiência relevante na área da automação. A incorporação da tecnologia Westinghouse deu origem a uma divisão autónoma dentro do grupo, e a partir de 1991 a uma companhia: a EFACEC Sistemas de Electrónica, S.A..

Com os sistemas licenciados pela Westinghouse, a EFACEC arrebatou a maior parte dos projectos de automação da EDP a partir de 1989. Em 1993, quando terminou a limitação de exportação de sistemas imposta pelo acordo de licenciamento, os conhecimentos ganhos pelos seus engenheiros já lhe tinham permitido desenvolver um novo sistema de comando e evoluir as unidades remotas de base Westinghouse, tomando a empresa competitiva em concursos internacionais, contra empresas da dimensão da Siemens ou ABB.

Em 1996 a EFACEC Sistemas de Electrónica é uma das principais empresas do grupo EFACEC e um dos maiores investidores nacionais privados em I&D.

137

Quanto maior for a possibilidade de introduzir valor acrescentado na tecnologia cuja licença de

fabrico se adquiriu, mais rápida será a evolução tecnológica da empresa e mais depressa esta estará

pronta a desenvolver as suas próprias inovações. Ao mesmo tempo essa possibilidade aumenta a sua

capacidade de penetração no mercado, pois permite à companhia alterar ou evoluir a tecnologia de

acordo com as mudanças e os gostos do seu mercado, algo que não poderá fazer se o acordo a impedir

de «mexer» na tecnologia.

As limitações de mercado podem também ter efeitos mais negativos do que uma empresa pode

supor à primeira vista. Muitos dos acordos de transferência proíbem à empresa licenciadora a exportação

da tecnologia durante um certo período de tempo. Algo que poderá pôr a empresa em dificuldades à

medida que esta for evoluindo e descobrir, por exemplo, que o seu mercado nacional ou regional não

evolui à velocidade desejada e a exportação aparece como a única solução.

Em resumo, aprender sim mas não a qualquer preço, aparece como a filosofia mais correcta para

empresas com uma visão tecnológica, e não puramente comercial, da inovação. Encarado nesta óptica o

licenciamento de novas tecnologias pode revelar-se como uma estratégica arma de inovação, com

importantes vantagens na poupança de custos e na diminuição do risco de inovar. De tal importância que

mesmo empresas habituadas a desenvolver as suas próprias inovações não hesitam por vezes em

recorrer a ela. É assim que o novo Mazda 121 é de facto um Ford Fiesta construído sob licença (como se

pode constatar comparando os dois modelos). O «aprender» não deve ser encarado como uma rendição

de uma empresa à superioridade tecnológica de outra, mas sim como uma forma de aliança estratégica

com vantagens mútuas. E particularmente adaptada às empresas com bom domínio do seu mercado, ou

confrontadas com uma oportunidade tecnológica a curto prazo que não podem deixar passar em claro.

A Compra

Após se ter percorrido os diferentes modos de aceder à inovação, chega-se agora ao modo mais simples,

menos exigente e que mais rápidos resultados pode apresentar: a compra de tecnologia já desenvolvida

e pronta a utilizar. Ultrapassadas as etapas da «realização», «encomenda», «adaptação» ou

«licenciamento» de novas tecnologias, a modalidade de compra representa a última oportunidade das

empresas para embarcarem no «comboio da inovação». Perdê-la significa ficar remetido de vez ao

mundo das velhas tecnologias. A compra de tecnologia é pois um derradeiro «apeadeiro» a não perder,

caso não se tenha conseguido (ou não se tenha querido) entrar no comboio mais cedo.

Comprar tecnologia é por exemplo adquirir um novo sistema de desenho baseado em

computadores (CAD – Computer Aided Design) a um fabricante especializado. Mas é também assegurar

uma representação para Portugal de um software inovador de gestão de fabrico e vendê-lo «tal-qual»,

ou configurado para os parâmetros de cada cliente (mas sem desenvolvimento próprio).

Este é sem dúvida o modo mais banalizado de inovar. Tão banalizado que muitas empresas, ao

comprarem por exemplo um novo equipamento para modernizar a sua linha de produção, nem sequer se

dão conta de que estão a inovar. O que muitas vezes as leva a menosprezar o risco inerente à introdução

dessa inovação e a comprometer dessa forma o sucesso da sua implementação na empresa. Porque se o

risco da compra de tecnologia é bastante menor do que o risco das modalidades abordadas

138

anteriormente, ele não deixa por isso de ser real. Para além do risco financeiro, que pode ser calculado à

priori com mais ou menos exactidão (investimento efectuado versus resultados esperados) outros riscos

existem bem mais difíceis de estimar, como os de uma eventual impreparação do pessoal, ou da própria

cultura da empresa, para assimilar a inovação. Mas não são só os riscos que as empresas ignoram.

Frequentemente as oportunidades oferecidas por uma compra de tecnologia também lhes passam

despercebidas.

Tal como acontece com as outras modalidades de aceder à inovação, a compra de tecnologia,

como processo inovativo que é, deve ser abordada não só pela sua componente comercial mas

igualmente no âmbito da estratégia tecnológica da empresa e da contribuição que pode dar para a

evolução desta. A introdução de um novo equipamento numa fábrica obriga normalmente à formação

técnica do pessoal que com ela vai lidar: operários, mas igualmente pessoal de manutenção ou de

supervisão. Esta formação vai seguramente aumentar a cultura tecnológica dos empregados da fábrica e

possivelmente também o seu interesse por novas tecnologias. Se este interesse for devidamente

aproveitado e estimulado é toda a cultura tecnológica da empresa que pode sair beneficiada. A empresa

torna-se mais aberta e atenta às inovações.

Uma empresa poderá assim pela simples compra de um novo equipamento passar de um estado

«adormecido» para um estado pelo menos «semi-alerta» em termos de novas tecnologias. Em alguns

casos o aumento do nível técnico de algum do seu pessoal pode ser o primeiro passo para a constituição

na empresa de um núcleo «inovador», que passa a estudar regularmente outras formas de melhorar a

produtividade desta. Por vezes este núcleo pode mesmo atrever-se a propor e a implementar soluções

próprias, concebidas e desenvolvidas internamente, e a empresa pode tornar-se num modelo de

inovação quase sem dar por isso. No seu núcleo «inovador» poderá encontrar-se mesmo o embrião de

um futuro departamento de I&D. Este processo pode parecer demasiado ambicioso, mas muitas das

empresas hoje tidas como inovadoras começaram desta forma (como é o caso da Chitas, cujo exemplo é

descrito em caixa).

A compra de tecnologia como forma de evolução técnica da empresa pode ser representada da

seguinte maneira:

Uma evolução semelhante poderá acontecer em firmas ocupadas com a representação de

tecnologias exteriores, mesmo que estas não disponham de capacidades produtivas próprias. Nestes

139

casos é frequentemente o serviço pós-venda que beneficia da formação recebida, quando do esta-

belecimento do acordo de representação, para aumentar as suas competências técnicas. No contacto

directo com os clientes, e com os seus problemas, estes técnicos poderão começar a propor evoluções do

produto ou sistema vendido, para numa fase posterior passarem a ser eles próprios a conceber novas

tecnologias especialmente adaptadas à resolução dos problemas encontrados. Tal como para o

licenciamento de tecnologias, também quando da sua compra é essencial que as empresas não se

concentrem apenas nas condições comerciais da transferência e assegurem para si o máximo grau de

domínio e intervenção sobre a inovação que vão adquirir. Neste sentido a intensidade e qualidade da

formação prestada quando da venda, a liberdade de introduzir futuros melhoramentos ou adaptações e a

garantia de receber informação sobre futuras evoluções introduzidas pelo fabricante da tecnologia,

podem ser tão ou mais importantes do que o simples preço a pagar.

Uma atenção especial a estes factores contribui ainda para assegurar uma mais eficaz absorção

da tecnologia na empresa, ajudando a ultrapassar possíveis barreiras culturais ou técnicas. No caso da

introdução de novidades mais radicais é mesmo aconselhável que as empresas façam preceder a compra

da inovação de uma auditoria tecnológica à empresa, de modo a aconselhar-se sobre os acertos da

compra e sobre a estratégia a seguir para a sua implementação. Em Portugal existem organizações,

parcialmente financiadas por projectos europeus, que desempenham auditorias desse tipo sem qualquer

custo para as empresas e lhes podem prestar assistência durante a fase de negociação do contrato de

compra e venda de tecnologia. Essas organizações e as suas actividades são descritas em pormenor no

Capítulo IV.

Sendo a mais simples das formas de aceder à inovação, a compra de tecnologia não deve assim ser

menosprezada nem nos seus riscos, nem nas suas potencialidades.

Para uma empresa de pequenos recursos o impacte (seja ele positivo ou negativo) da compra de um

novo sistema pode comparar-se ao da decisão de empreender um projecto de I&D de grande orçamento

para um grupo industrial de grande dimensão.

A maior vulnerabilidade das pequenas empresas, limitadas à opção de compra de tecnologia

como forma de inovar, faz mesmo com que estas tenham tantas ou mais razões de que as organizações

investigadoras para tentar diminuir o risco associado ao processo de inovação.

Exemplos de sucesso: Chitas A compra pura e simples de tecnologia não deve ser menosprezada como factor de inovação, desde que

realizada de uma forma que permita à empresa compradora alargar os seus horizontes tecnológicos, e não seja só um trocar de equipamento velho por novo.

A empresa Chitas – do sector de metalomecânica de precisão, com menos de 30 empregados – é disso um bom exemplo. Criada em 1983 por José Chitas, com apenas cinco operários, a empresa decide dar um salto tecnológico em 1990 com a compra de duas máquinas computorizadas, com um índice de produtividade cinco vezes superior à do equipamento convencional. A instalação do equipamento foi acompanhada por um processo de formação específica de seis operários no CEMFIM (Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica) e por uma aposta, na internacionalização, traduzida na participação em feiras no estrangeiro e mailing directo a potenciais clientes.

Tal aposta revelou-se frutuosa a partir de 1993, ano em que ganhou os seus primeiros clientes internacionais, entre os quais se conta presentemente o CERN (Centro Europeu de Pesquisas Nucleares), sendo o objectivo para 1996 de atingir 20% de facturação em exportação.

140

CAPÍTULO V – INOVAR: A PEÇA QUE FALTA

No início deste livro foi dito que as empresas portuguesas são tão inovadoras como quaisquer outras e

elogiou-se o espírito inventivo dos portugueses. Viu-se em seguida que a inovação está ao alcance de

qualquer empresa, independentemente dos seus recursos e da sua cultura tecnológica, uma vez que há

sempre um meio de aceder à inovação adaptado às características de cada um. Finalmente falou-se dos

diversos mecanismos existentes para apoiar as empresas na sua busca de inovações tecnológicas e

referiu-se a vantagem temporária de que gozam as empresas portuguesas em relação às suas

concorrentes estrangeiras ao disporem de uma série de programas nacionais financiados pelos fundos

estruturais «injectados» no nosso país.

Então o que falta afinal às empresas portuguesas para inovarem mais e melhor do que as suas

congéneres além fronteiras? Se há em Portugal um espírito inovador, modos de inovar adaptados às

especificidades de cada um e mecanismos financeiros suficientes, qual é a peça que falta no «puzzle» da

inovação nacional para que se complete um quadro de sucesso?

Na realidade a peça fundamental em falta é um conjunto de peças mais pequenas: organizações

intermediárias. Organismos que aproximem as empresas da inovação encurtando a distância que as

separa do acesso a novas tecnologias.

Viu-se neste livro que o caminho a percorrer até uma inovação bem sucedida, não sendo nunca

inabordável, é necessariamente longo. A figura seguinte resume as etapas mais importantes deste

percurso.

Fig. 29 - O percurso de uma empresa até uma inovação bem sucedida

O cumprimento de cada uma das etapas capaz representadas acima exige por parte dos

intervenientes no processo, a implicação de esforços e recursos distintos para cada etapa. Para inovar

não basta às empresas possuir os recursos técnicos necessários para desenvolver ou implementar novas

tecnologias, são-lhes igualmente exigidas uma série de outras capacidades. Uma empresa capaz de uma

inovação de sucesso tem que ser capaz de olhar simultaneamente para dentro de si mesma, para a sua

estratégia e posicionamento, e para fora, para os movimentos dos mercados em que se insere, por forma

a ser capaz de identificar as suas necessidades tecnológicas. Deve igualmente estar apta a especificar ou

141

seleccionar as tecnologias que satisfaçam essas necessidades, por entre todos os conhecimentos

científicos, resultados de investigação e tecnologias já existentes ou em vias de desenvolvimento. Em

seguida deve ser capaz de «vender» as suas ideias e projectos a eventuais parceiros com quem possa

dividir os riscos da inovação, a contento de todas as partes. E finalmente deve estar preparada para gerir

com sucesso o desenvolvimento e a implementação da sua inovação.

Não é difícil compreender que muitas empresas, portanto potencialmente inovadoras, desanimem

perante um tão vasto quadro de exigências. Reunir no seu seio um conjunto tão amplo de competências,

em áreas tão distintas como as que vão do conhecimento científico ao marketing e da perspectiva

tecnológica à gestão de processos inovadores, não está ao alcance de muitas empresas. A inovação fica

assim muito longe, demasiado longe, para uma larga maioria delas.

Se por estes motivos as empresas não se conseguem aproximar da inovação, a única solução, a

empreender pelos responsáveis pelo sistema de inovação (ou seja pelos poderes públicos), será a de

aproximar a inovação das empresas. Como? Colocando «à sua porta» as competências que lhes faltam

para inovar. Ou seja, criando os tais intermediários da inovação.

Fig. 30 - Um caminho mais curto até à inovação

A qualidade de um sistema de inovação está assim em larga escala associada ao número e ao tipo dos

seus organismos intermediários.

Organizações de transferência de tecnologia na Alemanha

Organizações

Englobadas em estruturas de I&D:

Oficinas de «transferência de tecnologia» em universidades 161

Oficinas de «transferência de tecnologia» em institutos não universitários 125

Centros de homologação e controle técnico 14

Centros de consultadoria e desenvolvimento 110

Centros de demonstração e aplicação 105

142

Englobadas em associações industriais ou comerciais: 239

Autónomas:

Agências de transferência de tecnologia 49

Redes de transferência de tecnologia 7

Agências de informação 51

Centros de Inovação empresarial ou tecnológica 177

TOTAL: 1038

A absorção de novas tecnologias numa dada região, particularmente por parte de pequenas

empresas, está com efeito intimamente ligada ao número de organizações intermediárias existentes

nessa mesma região ou país e com o tipo de serviços por elas prestado. O que justifica a atenção

prestada a estas organizações nos países tecnologicamente mais desenvolvidos.

A tabela representada na caixa acima, demonstrativa do caso alemão (onde existem mais de

1000 organizações deste tipo, entre as quais já mais de 200 na antiga RDA) fornece-nos igualmente uma

amostra da variedade do tipos de organismos intermediários existentes.

Sendo vários os aspectos a levar em ponta num processo inovador é normal que em sistemas

mais desenvolvidos se assista a uma especialização dos agentes intermediários que, sujeitos a uma

elevada procura, se concentram em áreas específicas desse mesmo processo: a prestação de informação

especializada, por exemplo, ou os testes de novas tecnologias, a sua homologação, etc.

Independentemente do seu grau de especialização, os agentes intermediários podem ser

divididos em três grandes categorias, correspondentes às três necessidades básicas das empresas no seu

percurso até à inovação, como se representa na figura seguinte:

Fig. 31 — Os principais tipos de intermediários em função das necessidades das empresas

Em toda a Europa uma importante percentagem dos agentes intermediários destinados a facilitar

a absorção de tecnologia pelas empresas encontra-se ligada a instituições de I&D. Esta é uma situação

natural atendendo à concentração de competências científicas e técnicas verificada nestas instituições,

nomeadamente nas universidades, ao seu papel de centros regionais de excelência tecnológica e aos

143

elevados montantes de financiamentos públicos que normalmente recebem. Por outro lado a maior parte

dos organismos públicos ou semipúblicos que desenvolvem acções de I&D não têm nem condições nem

vocação para explorar eles próprios os eventuais resultados dos seus projectos e têm por isso todo o

interesse em transferi-los para a indústria. E os organismos públicos que financiaram parte dessas acções

têm também todo o interesse em ver tais resultados serem aproveitados de modo a beneficiar a

economia da região. Dessa conjugação de interesses resultou, em vários países europeus, o apoio

público à criação de agências de transferência de tecnologia nas instituições de I&D, principalmente nas

universidades. Vocacionadas inicialmente apenas para a promoção da transferência dos seus próprios

resultados, muitas dessas estruturas evoluíram desde a sua função inicial de simples self-service de

tecnologias para passarem a oferecer uma gama completa de serviços de apoio às PME.

Um exemplo típico desta situação é fornecido pelo caso espanhol. No âmbito do programa

nacional de I&D foi criada uma rede de 76 OTRI (Oficinas para a Transferência dos Resultados de

Investigação) espalhadas pelas universidades públicas ou privadas, centros públicos de investigação ou

associações industriais. Cada OTRI dispõe normalmente de um pessoal de 2 ou 3 técnicos, a tempo

inteiro ou parcial. A rede é administrada por um organismo central em Madrid que gere uma base de

dados onde os resultados científicos provenientes das diversas instituições são partilhados por todas as

OTRI. Estas têm assim por missão não só a promoção dos seus próprios resultados, mas também os de

outras organizações que se revelem mais adequados às necessidades da indústria local. Várias destas

OTRI souberam aproveitar as oportunidades deste projecto para treinar pessoal qualificado em

transferência de tecnologia e montar progressivamente uma completa gama de serviços de inovação que

as empresas da região souberam aprender a reconhecer. Este salto qualitativo permitiu-lhes participar

noutros projectos, nomeadamente a nível europeu como a rede dos Innovation Relay Centres, o que lhes

permitiu aumentar ainda mais a sua gama de serviços e concluírem a sua progressão de centros de

informação especializada para agentes intermediários completos.

Os centros de homologação, demonstração e aplicação são por sua vez um dos tipos de agentes

intermediários de implementação mais recente à escala europeia. Na sua maioria, este tipo de actividade

é albergado por organizações que desempenham simultaneamente actividades próprias de investigação.

Os benefícios da existência deste tipo de centros para as empresas é evidente. A demonstração ou

homologação pública de tecnologias, permite às importadoras de tecnologia conhecer previamente as

suas características, potencialidades e eventuais problemas, enquanto as exportadoras vêem facilitada a

penetração no mercado dos seus novos produtos, processos ou serviços. Para serem eficientes é contudo

necessário que estes centros sejam em primeiro lugar independentes dos fornecedores de tecnologia (o

que nem sempre acontece, especialmente se o centro de demonstração é simultaneamente uma

instituição de I&D) e em seguida que ofereçam serviços complementares que facilitem a absorção de

inovações pelas empresas, tais como a prestação de informação e aconselhamento sobre o uso de novas

tecnologias.

Ao contrário do que acontece na Alemanha, nem todos os centros de demonstração europeus

são albergados por instituições de investigação. Mais de metade do número de centros deste tipo

existentes na Europa são orientados sectorialmente e muitos são albergados por associações sectoriais

144

regionais. Mas o principal papel normalmente desempenhado pelos agentes intermediários existentes em

associações industriais ou comerciais é o de ajudarem os seus membros a identificar as suas

necessidades tecnológicas. Sendo que estas são normalmente comuns a um mesmo sector, uma

associação de industriais de um determinado ramo de actividade encontra-se numa óptima posição para

identificar as inovações que podem dar maior competitividade à generalidade dos seus associados. Por

estes motivos as associações sectoriais têm-se especializado na perspectiva e vigília tecnológica,

desenvolvendo igualmente competências na prestação de serviços de assistência à participação dos seus

membros em programas nacionais ou comunitários de incentivo à inovação. Tal como acontece com os

intermediários localizados em estruturas de I&D, também alguns dos agentes albergados por associações

sectoriais têm sabido alargar as suas competências sobre o processo da inovação para passarem a

oferecer uma gama completa de serviços aos seus clientes (se bem que numa escala menor do que a

verificada com, por exemplo, as universidades). É o caso, entre outras, da poderosa associação alemã de

engenheiros electrotécnicos e electrónicos (VDI/VDE), actualmente uma das principais organizações de

inovação no seu país.

Se os intermediários localizados em organizações de I&D se especializam principalmente no

campo da divulgação da oferta tecnológica e aqueles localizados em associações sectoriais se concentram

na identificação da procura, a actividade mais genérica de conciliar oferta e procura e de assistir as

empresas a obter meios de financiamento que lhes permitam custear os seus projectos (as chamadas

actividades de «corretagem tecnológica») é idealmente desempenhada por organizações independentes

quer dos exportadores, quer dos importadores de novas tecnologias: os organismos autónomos. Para

além das actividades mencionadas acima, estas organizações têm ainda um papel importante no

aconselhamento das empresas sobre direitos de propriedade intelectual ou na assistência à preparação

de propostas para programas públicos. Em países de tradição mais liberal, como o Reino Unido, um

grande número de intermediários deste tipo são organizações privadas, que vivem de cobrar

percentagens sobre os acordos de transferência de tecnologia por eles facilitados, ou sobre os montantes

públicos recebidos graças à sua assistência. Mas na maior parte dos outros países europeus,

nomeadamente em Portugal, os agentes intermediários privados são quase inexistentes, uma vez que as

empresas ainda não estão mentalizadas para pagarem por este tipo de serviços, e este papel tem

forçosamente que ser desempenhado por organismos públicos.

Aliás, o panorama português no que respeita a qualquer um dos três tipos de intermediários

referidos (englobados em organizações de I&D, em associações sectoriais ou organismos autónomos) é,

verdade seja dita, desanimador.

As universidades nacionais têm vindo progressivamente a criar centros de serviços de

investigação aplicada para a indústria (como é o caso do INESC de Lisboa e Porto, associados

respectivamente ao Instituto Superior Técnico e à Faculdade de Engenharia do Porto), mas tais centros

limitam-se ao papel de investigadores, não desempenhando de forma alguma o papel de intermediários

para a inovação, uma vez que não disponibilizam serviços de informação, de disseminação de tecnologias

externas ou de aconselhamento sobre a absorção de inovações. Mais avançada nesta área encontra-se a

Universidade do Minho, que com a Tecminho dispõe de um efectivo organismo intermediário ao serviço

145

da indústria da sua região e que participa já em projectos europeus neste campo. Mas com uma ou outra

excepção, os organismos intermediários de inovação existentes em universidades são raros e sem

coordenação entre eles. O que atendendo à disponibilidade de pessoal qualificado, à existência de infra-

estruturas telemáticas e à disponibilidade de matéria--prima nelas existente (em termos de resultados

para divulgação), não deixa de constituir uma oportunidade perdida, quer para as universidades, quer

para o seu tecido industrial envolvente.

O estado das coisas em Portugal neste aspecto pôde ser recentemente observado quando a

Agência de Inovação, no âmbito das suas actividades como Innovation Relay Centre (ou seja financiadas

por fundos comunitários) levou a cabo um exaustivo levantamento dos resultados existentes em nove

universidades ou centro públicos de investigação, com vista à sua posterior valorização junto e potenciais

clientes nacionais ou estrangeiros. Uma acção sem dívida interessante, principalmente na falta de

qualquer esforço púbico nesse sentido, mas que deparou com grandes dificuldades devido à falta de

estruturas existentes nos organismos de I&D que servissem de interface a um trabalho deste tipo. Na

falta delas, os consultores da Agência de Inovação apenas puderam contar com a colaboração dos

departamentos de relações exteriores, sem o mínimo de conhecimentos, quer sobre os resultados, quer

sobretudo sobre as especificidades dos processos de transferência de tecnologia. Por sua vez as únicas

pessoas que poderiam verdadeiramente fornecer indicações úteis (os chefes de projecto, na sua maioria

professores catedráticos) dispunham de pouca disponibilidade de tempo para ajudar na tarefa. Alguns

encontravam-se também apenas capazes de fornecer explicações técnicas e quando inquiridos sobre

possíveis condições comerciais e de propriedade intelectual para a transferência da tecnologia, eram

incapazes de fornecer uma resposta devido à inexistência de uma estratégia da sua organização para

estes casos. Outros mostravam-se exageradamente motivados, esperando um imediato sucesso

comercial para a «sua» tecnologia e desanimando totalmente quando confrontados com as dificuldades

naturais destes processos. Em pouquíssimos casos foi uma universidade ou centro de investigação capaz

de acompanhar eficientemente um processo de valorização de um seu resultado, mesmo que só até à

fase de disseminação de um perfil comercial da sua tecnologia. Este projecto revelou a falta que

estruturas do tipo OTRI fazem nas universidades portuguesas, bem como a falta de uma base de dados

nacional com todos os resultados dos projectos de I&D co-financiados pelos poderes públicos. Com este

projecto a Agência de Inovação espera contribuir para a criação de seis novas empresas destinadas a

explorar os resultados mais interessantes entre os identificados. Quantas poderiam ter sido já criadas se

este mesmo exercício fosse regularmente conduzido pelas próprias universidades?

Os poucos organismos não-públicos de I&D existentes no nosso país, têm pelo seu lado dedicado

uma maior atenção à transferência dos seus resultados, quanto mais não seja porque, ao contrário das

universidades, necessitam de os rentabilizar. Organizações deste tipo, como por exemplo o Instituto de

Soldadura e Qualidade, com um bom registo de participação em projectos comunitários do programa dos

Materiais Industriais, têm apostado cada vez mais na transferência de tecnologia. Mas para o fazerem, e

na falta de apoios nacionais, tiveram que socorrer-se mais uma vez dos apoios comunitários — no caso a

participação na rede dos Innovation Relay Centre. Uma atitude que em alguns casos lhes possibilitou

verem 75% dos custos das suas actividades de transferência das suas próprias tecnologias para a

146

indústria, cobertos pela União Europeia! Com benefícios para as empresas (que receberam as

tecnologias), para o ISQ (que as transferiu) e para a própria União Europeia que viu reforçar-se a

competitividade de uma das suas zonas economicamente mais atrasadas. E, claro, para o estado

português, apesar de este não ter contribuído para a história. A situação é assim potencialmente melhor

entre as organizações de I&D privadas do que entre as públicas, no que respeita à transferência de

resultados mas, infelizmente, o volume de investigação privada em Portugal é tão baixo que o panorama

global não se altera significantemente.

A situação entre as associações sectoriais não é muito melhor. A maior parte das organizações

deste tipo existentes em Portugal orgulha-se de possuir actividades de transferência de tecnologia, e são

elas as responsáveis por que Portugal apresente uma «performance» razoável nos indicadores europeus

de intermediários de inovação. Mas quantas de entre elas possuem pessoal com formação específica em

transferência de tecnologia? Quando da convocatória pública para a selecção de organizações nos

estados-membros para a rede europeia de «Innovation Relay Centres», que permitiria a organizações

com actividades nesta área verem uma importante parte dos seus custos cobertos pela União Europeia e

os seus meios substancialmente alargados, nenhuma associação deste tipo se apresentou a concurso, o

que diz bem da importância relativa que as actividades de transferência representam para as associações

sectoriais nacionais.

Finalmente, no campo dos intermediários albergados por agentes autónomos apenas se pode

identificar uma organização nacional cujas actividades se situam por inteiro na promoção tecnológica e

na transferência de tecnologia: a Agência de Inovação. Criada em 1993, como uma sociedade anónima

de capitais inteiramente públicos (com 50% do capital a pertencer à JNICT e os outros 50% ao IAPMEI),

provenientes na sua maioria dos fundos europeus de coesão através do programa STRIDE, o percurso da

Agência da Inovação até hoje não tem sido propriamente um estímulo para o surgimento de mais

iniciativas privadas nesta área. Tendo na sua concepção a intenção de se autofinanciar com a venda de

serviços à indústria, rapidamente a Agência se viu a sobreviver apenas da sua participação em projectos

europeus como o dos Centros de Suporte à Inovação (Innovation Relay Centres), projecto em que foi a

pioneira em Portugal, e da gestão financeira do seu capital social. Actualmente a Agência de Inovação

procura ainda o seu rumo, orientando-se progressivamente para a gestão de projectos racionais no

campo da inovação, como algumas medidas do programa PRAXIS XXI ou o plano tecnológico regional do

Norte, mas abandonando a estratégia de venda de serviços às empresas, reconhecidamente pouco

rentável.

Qual é então o panorama global dos agentes intermediários para a inovação no nosso país?

Alguns (poucos) esforços isolados por parte de organizações de I&D, associações sectoriais pouco activas

e com poucos recursos e um único organismo autónomo. Se há uma peça em falta no «puzzle» da

inovação portuguesa é sem dúvida ao nível do sistema de organizações intermediárias.

147

TEXTO Nº 9

A Mudança Organizacional e a Inovação

de:João Paulo Marques e Paulo Santos

INTRODUÇÃO

É hoje perfeitamente reconhecido que o nível de vida de uma nação depende da

Ciência e da Tecnologia. Os progressos significativos alcançados a nível mundial com as novas tecnologias da micro-electrónica e dos computadores, por exemplo, têm proporcionado avanços em todas as áreas da actividade humana, quer a nível social, económico e particularmente a nível empresarial. Assim, a elevada taxa de mudança tecnológica imprimida pela concorrência entre as indústrias a nível internacional, tem obrigado as empresas, concretamente uma grande parte das empresas portuguesas, a deterem as suas atenções nos aspectos tecnológicos como factores potenciadores da produtividade.

Nesta linha, as dificuldades decorrentes do mercado único europeu, bem como a crescente concorrência e competitividade das empresas estrangeiras que actuam no mercado português, tem levado as empresas nacionais a uma maior preocupação entre outros, pelos aspectos de melhoria dos seus parques tecnológicos, bem como a deterem as suas atenções sobre os mecanismos internos que lhes permitam ter acesso, de forma mais barata e eficaz, aos novos processos tecnológicos e know-how, ou seja, à inovação. É testemunho desta realidade, por exemplo, o estudo evidenciado em Marques (1998).

Este trabalho visa, fundamentalmente, descrever do ponto de vista teórico, os principais elementos enquadradores da temática da mudança organizacional, a sua relação com a cultura da empresa ligados intimamente ao conceito de inovação e aos seus diferentes processos.

Assim, a importância deste tema está directamente ligada à constante mudança que se está a operar ao nível de todo o mundo económico, e em particular à taxa elevada de mudança tecnológica.

A preocupação de garantir uma abordagem ampla do assunto, determinou a estruturação do presente trabalho em cinco secções, para descrever a problemática do tema em análise e o seu enquadramento de acordo com alguma literatura existente.

A secção 1, de natureza introdutória, visa apresentar os conceitos fundamentais sobre a problemática da mudança organizacional, as suas causas, o contexto e a necessidade de uma adaptação permanente através do planeamento.

Descrevemos, depois, nas secções 2 e 3, as diversas contribuições teóricas sobre a cultura para a mudança e a gestão das resistências individuais e organizacionais à mudança, assim como a discussão do processo de mudança.

A análise da mudança de cultura será apresentada na secção 4, fazendo-se uma ênfase especial nos aspectos particulares deste processo, bem como da importância de uma liderança forte.

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Finalmente, na secção 5, discutir-se-á a temática da Inovação, do seu conceito, fontes de inovação e cultura inovadora.

1. – O CONCEITO, CONTEXTO E CAUSAS DE MUDANÇA. 1.1. - Conceito de mudança

Vivemos num mundo de instabilidade e de incerteza, provocados pela velocidade das transformações que a todos os níveis, evoluem na nossa sociedade.

Neste contexto, as organizações redescobrem-se diariamente na árdua tarefa da sobrevivência, na sua análise permanente do mercado. Novas tarefas são exigidas às pessoas e às empresas, visando melhorar os processos de decisão e as respectivas capacidades de resposta às exigências dos mercados. Na sua permanente interacção com o meio envolvente, a empresa tem de se certificar que produz bens ou serviços que correspondam ao que pretendem os consumidores, em condições competitivas.

Segundo Câmara et al (1997), quando surge uma disfunção entre aquilo que a empresa produz ou fornece e o que o mercado está disposto a absorver, entra-se numa zona de risco, devendo repensar a sua forma de actuação e, se necessário, mudar para sobreviver.

«O sucesso tem que ser assumido como um conceito passageiro e substituído pelo conceito de sobrevivência. A competitividade atinge os limites do suicídio organizacional e nem todas as organizações conseguem sobreviver» (Ferreira, 1994, p.8). «A mudança pode, pois, ser definida como a alteração da estrutura e de forma de funcionamento de uma organização, com o propósito de a tornar mais competitiva e ajustada às realidades do mercado» (Câmara, et al, 1997, p. 165).

Mas, se um contexto de mudança pode significar perigo devido à instabilidade, incerteza e competitividade, também poderá representar oportunidade, se a mudança for encarada como um desafio colectivo a vencer pela organização.

De acordo com Ferreira (1994), a sobrevivência e o sucesso não vai passar por quem tem recursos, mas sim pelas pessoas e pelas organizações que melhor souberem combinar e optimizar os seus recursos e souberem construir climas motivadores, criativos e solidários. Torna-se então necessário que, a cultura da empresa seja "sólida" e "forte" e que potencie e privilegie um clima saudável com dinâmica de mudança. 1.2. - Contexto e causas da mudança O mundo hoje, é cada vez mais global, em que cada país é um pequeno mundo interagindo com o mundo global. A sociedade pós-industrial está a ser substituída por uma sociedade onde a matéria-prima se chama informação. As imagens diárias de um mundo sem fronteiras reflectem uma clara percepção de um novo mundo em construção.

«O mundo entendido como uma "aldeia global", a partir da década de 70, continua de forma imparável a caminho de uma "completa" globalização» (Ferreira, 1998, p.4).

Para Santos (1994), globalização significa que os mercados são globais, isto é, que em cada mercado estão presentes grandes e pequenas empresas oriundas de todo o globo e que, portanto, as regras do jogo estratégico em cada mercado se caracterizam por uma globalização do lado da oferta.

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De acordo com Ferreira (1998), o mundo global surge como resultado de uma profunda reorganização económica e social a nível mundial (quer a nível das economias "ocidentais", mas também nas economias ex-comunistas, nos países sub-desenvolvidos e países asiáticos emergentes).

Na mesma linha de pensamento encontra-se Kotter (1996), quando afirma que a globalização, tem origem na associação de um conjunto de factores de natureza económico-social (figura 15), tais como:

O desenvolvimento tecnológico – Desenvolvimento rápido das comunicações, das auto-estradas da informação cada vez mais globais e as novas tecnologias da informação.

Integração económica internacional - O acordo "GATT" e os grandes fluxos globais de capitais que levam a um capitalismo global.

Maturidade dos mercados domésticos nos países desenvolvidos - Crescimento lento dos mercados domésticos das economias desenvolvidas que levaram as empresas a entenderem o mercado global como um mercado natural para o seu desenvolvimento.

Colapso do comunismo a nível mundial - Mais países aderiram ao sistema capitalista e como consequência a privatização de muitas empresas dos países com anteriores regimes socialistas.

Figura 1. Contexto de mudança na organização

Fonte: Adaptado com as mínimas alterações de Kotter (1996, p. 19) Com a globalização da economia e dos mercados surgem mais perigos (mais e

maior concorrência), mas também mais oportunidades (maiores mercados) para as empresas, forçando-as a fortes melhoramentos, não só para competir e prosperar, mas também para simplesmente sobreviver (Kotter, 1996).

Desenvolvimento Tecnológico

Integração económica

internacional

Maturidade dos mercados nos

países desenvolvidos

Colapso do comunismo e

regimes socialistas

Globalização dos mercados e da concorrência

Mais perigos Mais oportunidades

Grandes mudanças nas organizações

150

Neste contexto de grande concorrência a nível global, por forma a diminuir o risco e o perigo e/ou para capitalizar nas oportunidades, as empresas, têm então de se tornar fortemente competitivas. Para isso, segundo Kotter (1996), as empresas terão de proceder a mudanças internas em larga escala. Ainda segundo o mesmo autor, as modalidades típicas de mudança organizacional incluem, os programas objectivando a qualidade, reengineering, fusões e aquisições, a mudança estratégica e a mudança de cultura.

Na opinião de Robbins (1998), os factores de mudança resumem-se a seis forças (apresentando alguns exemplos) que estão na origem da mudança nas organizações, a saber:

Natureza da força de trabalho - maior diversidade cultural associado a

fenómenos migratórios; mobilidade da força de trabalho entre empregadores; novos colaboradores que, devido ao ritmo da mudança, possuem inadequadas aptidões, etc.

Novas tecnologias - Informática, telecomunicações e robotização; implementação de programas de total quality management assim como de reengineering, etc.

Choques económicos - Choques petrolíferos; crash da bolsa; flutuações cambiais e de cotações bolsistas, etc.

Concorrência - Concorrentes a nível global; concorrência a nível de pequenas empresas que desenvolvem produtos inovadores e com muita diferenciação; fenómenos de concentração empresarial, etc.

Alterações sociais - Aumento da taxa de divórcios; casamento tardio pelos jovens; mudanças de hábitos, etc.

Política internacional - Colapso da União Soviética; invasão iraquiana ao Kuwait; reunificação da Alemanha, etc.

1.3. - Causas intrínsecas e causas extrínsecas

A mudança poder-se-á classificar em dois grandes grupos tendo em conta a origem da mudança (Câmara et al, 1997): As mudanças intrínsecas que são as que decorrem da própria estrutura da empresa e das normas que regem a sua organização e a prestação de trabalho. A mudança, neste caso, é imposta pela própria empresa, por motivos intrínsecos que podem ter a ver com a sua continuidade e sobrevivência ou por necessidade de aumentar a sua competitividade. A mudança será extrínseca, quando é imposta por alterações radicais do meio envolvente. É o caso dos choques económicos e da mudança de hábitos de consumo, por exemplo.

1.4. - Mudança planeada

Por seu lado, Robbins (1998, p. 629) opõe À mudança ocasional, acidental ou espontânea, o conceito de mudança planeada, definindo esta última como «change activities that are intentional and goal oriented». Tratam-se das mudanças que são proactivas e propositadas, intencionalmente implementadas pela gestão da empresa e orientadas para um determinado objectivo. Têm como objectivo central melhorar as

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vantagens competitivas da empresa, adaptando-as às mudanças "ambientais", assim como mudar o comportamento dos colaboradores.

2. - A CULTURA PARA A MUDANÇA E AS RESISTÊNCIAS À MUDANÇA

2.1. - A cultura de mudança

Em trabalhos anteriores, explicitámos a razão de ser da cultura organizacional, concluindo que algumas funções desta, passavam por conferir um sentimento comum de identificação aos colaboradores, melhorando a eficácia destes e da própria organização. Vimos que, a cultura em harmonia com os seus valores, permitiria o alinhamento e o direccionamento em relação à missão e objectivos da empresa. Verificámos também que, os valores em que assenta a cultura de empresa, deveriam ser percebidos, partilhados e colocados em prática (e não ficarem no papel). Dissemos que, a atitude da empresa e seus colaboradores face à mudança, tinham como subjacente o tipo de cultura prevalecente e que, uma atitude de abertura pela empresa face à mesma, era um requisito essencial para a sobrevivência e o seu sucesso.

Face à necessidade imposta à empresa de se voltar para o exterior, para antecipar as alterações do mercado, deve a empresa possuir uma cultura e estrutura flexíveis, por forma a proporcionar rapidez na resposta ao mercado e alinhada com os seus objectivos estratégicos (Câmara et al, 1997).

Segundo este autor, deste modo, há necessidade de reinventar a forma como as empresas funcionam, em particular, no trabalho em equipa e na polivalência. Assim, para melhor responder ao mercado, deverão as empresas caminhar para modificações na repartição do poder dentro das mesmas, dando à hierarquia não tanto um papel decisor e autoritário, mas sobretudo um papel de coordenação e de alocação dos recursos disponíveis, de acordo com as prioridades estratégicas.

De facto, a cultura pode ser usada como uma alavanca da mudança para garantir que a organização se mova na direcção dos objectivos e das finalidades que a empresa pretende alcançar.

Para que a organização institucionalize e entenda a mudança como um fenómeno natural, sendo a abertura e a apetência pela mesma, característica importante da sua cultura, torna-se necessário que, esta assente numa matriz de valores que traduzam uma cultura "forte", de valorização focalizada no mercado e no cliente. Esses valores passam por uma gestão participativa, humanista, potenciadora do desenvolvimento das pessoas e que aposte na sua formação, em conjugação com uma liderança democrática e visionária, em que a visão seja também comunicada e partilhada.

Parece-nos evidente que, uma cultura que privilegie esses valores terá como consequências: - Maior identificação e comprometimento dos colaboradores para com a empresa. - Maior produtividade e empenho. - Motivação e moral elevados. - Flexibilidade dos colaboradores e da organização.

152

O tipo de cultura enunciada, assim como as suas benéficas consequências, levará a empresa a uma predisposição natural para a mudança e para enfrentar processos contínuos de melhoria.

Para melhor sustentar esta afirmação, Roldão (1996), estabelece uma relação entre a motivação proveniente de uma cultura de empresa, que promova um clima aberto e se caracterize por uma filosofia de enriquecimento de tarefas e por uma qualificação dos colaboradores, como muito relevantes na estrutura da flexibilidade. O mesmo autor e Moura (1997), realçam o factor flexibilidade como característica essencial da pessoa que institucionaliza a mudança e que aprende ao longo da vida.

Por outro lado, Rousseau (1998), preconiza que uma cultura em que os seus valores fomentem a identificação e o comprometimento dos colaboradores, fará com que estes aceitem com maior facilidade a mudança. Este autor acrescenta que, uma identificação forte promove a flexibilidade para a mudança.

Como vimos, a cultura para a mudança exige flexibilidade a todos os níveis, identificação pelos colaboradores para com a empresa e sua cultura, motivação e moral elevados e qualificação dos colaboradores. Tal não se compadece com uma cultura de exclusão das pessoas, que afaste a participação, iniciativa e criatividade, como também, com uma organização formal virada para si própria, em que a decisão não é partilhada e uma liderança autocrática com deficiências de comunicação. Uma empresa com uma caracterização deste tipo, apresentará concerteza dificuldades de mudança (Moura, 1997).

Se este tipo de empresa pretender alterar o status quo, concerteza que irá encontrar barreiras à mudança e esta será lenta e dolorosa. É o que acontece também em empresas com   culturas   antigas   ou   “fortes”  mas   caracterizadas   por   não   serem   flexíveis   (Luthans,  1995; Williams, 1993).

2.2. - Resistências à mudança A resistência é por um lado, positiva, porque dá ao comportamento das organizações previsibilidade e estabilidade. Se não houvesse um certo grau de resistência à mudança, o comportamento organizacional tornava-se imprevisível e caótico (Robbins, 1998). Segundo este autor, também a resistência à mudança pode ser uma fonte de con-flito funcional e diminuir a capacidade de adaptação e o progresso organizacional.

A resistência à mudança pode não se manifestar de forma aberta e reconhecível, podendo muitas vezes ser invisível, sabotando os planos de mudança. Essa resistência, pode traduzir-se em perdas de lealdade à organização, desmotivação para o trabalho, aumento do número de erros e maior absentismo (Robbins, 1998).

A gestão da resistência à mudança, tem que ser feita de forma muito cuidadosa, procurando desarmar os mecanismos de resistência através da comunicação, da participação e da partilha da visão de futuro por todos os membros da organização.

Segundo Robbins (1998), os factores de resistência à mudança dividem-se em individuais (pelos colaboradores) e organizacionais (pelas próprias empresas ou organizações).

153

2.2.1. - Resistência individual A resistência individual à mudança reside em regra nas seguintes causas (figura 2): Figura 2. Fontes de resistência individual à mudança

Fonte: Robbins, 1998, p.633. O hábito - o ser humano é um animal de hábitos. Para lidar com a

complexidade da vida quotidiana, todos nós recorremos a comportamentos habituais ou respostas programadas. Quando confrontados com a mudança, a necessidade de alterar esses hábitos ou rotinas, estes aparecem como uma fonte de resistência.

A segurança - todas as pessoas têm necessidade de se sentir seguras, e a mudança constitui uma ameaça a essa segurança. A mudança pode criar nas pessoas o receio de desempenhar novas tarefas e de não serem capazes de as desempenhar (especialmente com novos equipamentos, computadores por exemplo).

Factores económicos - a mudança pode constituir uma ameaça à manutenção do posto de trabalho, ou a redução de benefícios.

Medo do desconhecido - a mudança representa insegurança e incerteza face àquilo que é conhecido.

Informação selectiva - todos nós filtramos a realidade através da nossa percepção. Por isso, todos os indivíduos têm tendência para processar a informação recebida, por forma a manter intactas as suas percepções procurando ignorar a informação que ponha em causa o mundo que criaram. Perante uma situação de mudança, tentam ignorar ou minimizar os aspectos destas que põem em causa o seu mundo.

2.2.2. - Resistência organizacional

A generalidade das empresas são por natureza conservadoras, sendo por isso refractárias à mudança. Robbins (1998), aponta seis causas principais de resistência organizacional de acordo com a figura 3:

ResistênciaIndividual

Medo do

descon

hecido Factores

económicos

Segurança

Háb

ito

Informação

selectiva

154

Figura 3. Fontes de resistência organizacional à mudança

Fonte: Robbins, 1998, p.635. Inércia estrutural - as organizações têm mecanismos estruturais para garantir

estabilidade. Por exemplo, cada empresa tem as suas próprias políticas que procuram assegurar a integração das pessoas na cultura da empresa. Uma modificação dessa cultura ou det al parâmetros funcionais irá contar com a resistência da própria cultura ou estrutura, que tenta manter a estabilidade criada. Assim, a própria cultura pode ser ela mesmo, fonte de resistência à mudança.

Âmbito da mudança - se o processo se circunscrever a um ou poucos subsistemas da organização, o seu âmbito limitado tende a anular os efeitos da mudança, que são neutralizados pelos sistemas mais vastos e poderosos em que se integrem e que ficaram de fora do processo.

Inércia de grupo - mesmo que alguns membros dos grupos aceitem modificações das suas responsabilidades, ditadas pela gestão, se o grupo, como tal, resistir a essas mudanças, a disponibilidade individual para as aceitar é neutralizada pela pressão de grupo.

Ameaça aos conhecimentos técnicos (Know how) - a mudança pode pôr em causa os conhecimentos técnicos de membros da organização por se tornarem numa situação de redundância. Essa obsolescência do Know how de membros da organização, vai ditar uma resistência orgânica à adopção de novos métodos de trabalho.

Ameaça à estrutura de poder existente - uma empresa como estrutura de poder que é, qualquer mudança que ponha em causa a repartição do poder no seu interior, encontrará resistências individuais e institucionais.

Ameaça à alocação de recursos - um processo de mudança organizacional, que envolva uma alteração nas prioridades de negócio, determinará que há

Resistênciaorganizacional

Ameaça aos

conhecimentos

técnicos (

)

Know-How

Âmbito da

mudança

Inér

cia d

egr

upo

Inércia

estrutural

Amea

ça à

aloca

ção

de re

curso

s

Ameaça à estrutura

de poder existente

155

sectores que ganham mais recursos que outros que ficam mais limitados nas suas dotações. Daí que os sectores potencialmente afectados resistam ao processo de mudança que os vai prejudicar.

Embora as organizações sejam assediadas por muitas forças exigindo mudanças, é importante reconhecer que forças opostas mantêm a organização num estado de equilíbrio e apoiam a estabilidade ou o Status quo.

Para compreender como isso acontece, Kurt Lewin elaborou a teoria do "campo de forças" (Stoner, et al, 1995). De acordo com esta teoria, cada comportamento é resultado de um equilíbrio entre forças "impulsionadoras" e "restritivas". As forças impulsionadoras empurram para um lado e as restritivas para o outro. O desempenho resultante é uma conciliação dos dois conjuntos de forças. Um aumento nas forças impulsionadoras pode aumentar o desempenho, mas também pode aumentar as forças restritivas. Portanto, a redução nas forças restritivas é normalmente um meio mais eficaz de encorajar a mudança do que o aumento nas forças impulsionadoras.

A teoria de Lewin poder-se-á sintetizar no seguinte modelo (figura 4).

Figura 4. Diagrama do campo de forças (baseado na teoria do campo de forças de Kurt Lewin)

Nota: O tamanho da seta equivale ao tamanho da força.

Fonte: Stoner, et al, 1995, p.414. 2.3. - Como superar a resistência à mudança? Robbins (1998), sugere um conjunto de tácticas aos responsáveis pela mudança, para melhor lidarem com a resistência à mesma, isto é, para conseguirem neutralizar ou mesmo inverter os comportamentos e atitudes que se opõem à mudança.

A comunicação - a resistência pode ser reduzida através de acções de comunicação dirigidas aos colaboradores, explicando o sentido e a lógica da

Forças de mudança

Nova tecnologia

Normas de desempenho do grupo

Concorrência de outros grupos

Pressões do supervisor

Medo da mudança

Complacência dos membros

Habilidades bem aprendidas

Nível actualde desempenho

Nível mais altode desempenho

Matérias-primas melhores

Forças que mantêm o status quo

Forç

as im

puls

iona

dora

s

Forç

as re

strit

ivas

156

mudança. Esta táctica parte do princípio que a resistência radica na falta de comunicação ou numa comunicação deficiente. Se os colaboradores conhecerem os factos e se os mal-entendidos forem esclarecidos, a resistência dissipar-se-á.

A participação - se os colaboradores puderem dar o seu contributo à preparação da mudança, o seu envolvimento pode assumir grande importância, reduzindo a resistência. É difícil às pessoas resistirem a um processo de mudança em que participaram.

A facilitação e apoio - os condutores da mudança podem colocar à disposição dos colaboradores envolvidos na mudança, um conjunto de meios para os auxiliar a ultrapassar a insegurança, o medo e o stress. Por exemplo a terapia, dispensas de trabalho etc.

A negociação - se a resistência à mudança partir de um grupo organizado e poderoso, que tenha poder para a bloquear, pode ser necessário negociar com alguns indivíduos ou grupos, certas adaptações ao processo de mudança.

A coacção - trata-se de uma medida de último recurso e consiste em tentar vencer a resistência à mudança pela força ou pela ameaça do seu uso. Esta medida desacredita totalmente o processo de mudança, criando um espírito de desconfiança e revolta em relação a ele.

3. GESTÃO DA MUDANÇA 3.1. - Os agentes da mudança nas empresas

Robbins (1998), aponta quatro componentes ou agentes essenciais da mudança: A estrutura da empresa As tecnologias utilizadas As pessoas que constituem a organização O Layout do espaço físico da empresa As estruturas organizacionais não são imutáveis. As alterações do ambiente

externo e a forma de organização do trabalho, internamente, exigem alterações de estrutura.

Uma mudança da estrutura da empresa implica, uma modificação das relações do poder, dos mecanismos de controlo e de coordenação, do perfil das funções e do número de níveis hierárquicos, com o consequente aumento da autonomia de cada função. Desta forma, poder-se-á alargar o âmbito de actuação de cada gestor eliminar escalões hierárquicos, tornar a organização mais horizontal e menos burocrática. Poderá ainda, aumentar-se a descentralização para obter maior rapidez na tomada de decisões.

Um segundo vector de mudança, pode consistir na tecnologia utilizada no desenvolvimento do negócio da empresa. Hoje em dia, as alterações tecnológicas levam as empresas a introduzirem novos equipamentos ou métodos de trabalho. A introdução de novas tecnologias é frequentemente provocada por inovação ou factores de

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competitividade. Essas tecnologias residem na automação e computorização na gestão da informação.

A terceira componente da mudança prende-se com as pessoas. Consiste em mudar as pessoas, as suas mentalidades, comportamentos, atitudes e a forma como trabalham em conjunto. Por vezes há necessidade de mudar as tarefas, perspectivando o enriquecimento das mesmas, por forma a desenvolver pessoal e profissionalmente os colaboradores, estimulando-os para a criatividade, iniciativa e autonomia.

Por fim, o layout. Este aspecto deve ser tido em conta na mudança nos espaços físicos de trabalho, em particular, as necessidades sociais, segurança no trabalho, ergonomia e decoração, etc.

3.2. - Gestão das reacções à mudança

Num processo de mudança, existem interesses, sentimentos e pensamentos contraditórios numa organização.

De acordo com Ragen (1999), por um lado, os líderes acreditam que a mudança é no melhor interesse do negócio e da empresa e acham que, dever-se-ia implementar o processo o quanto antes.

Por outro lado, os colaboradores normalmente não vêem ou não querem ver as vantagens da mudança; de qualquer modo não conseguem visualizar de imediato as vantagens que possam existir. Daí que, pelas várias razões focadas no ponto anterior, resistam à mudança. A acrescentar que, os colaboradores vêem na mudança, o "fantasma" da perda do posto de trabalho (muitas vezes com razão), não reconhecendo muitos líderes que, se trata de um valor fundamental para os primeiros: a segurança do emprego.

De acordo com Ragen (1999), normalmente, mudanças organizacionais significativas, provocam muitas vezes ansiedade e stress, confusão, revolta e medo. Se porventura essas reacções não forem geridas, a organização irá ter muitos custos com esse facto, entre outros, aumento do turnover, perdas de produtividade, redução da credibilidade na gestão da empresa e diminuição do moral e motivação.

Também neste sentido, Difonzo e Bordia (1998), afirmam que os colaboradores vivem com muita incerteza e insegurança um processo de mudança organizacional. Este facto, tem como consequências a generalização de rumores, a redução dos níveis de confiança e moral, assim como o aumento da ansiedade.

Consideram estes os autores e Ragen (1999) que, se os condutores do processo de mudança deixarem que isso aconteça, é porque há lacunas graves na estratégia de comunicação da mudança, devendo a mesma comunicação ser clarificada, utilizada eficazmente na difusão da visão, objectivos, valores e das decisões relacionadas com a mudança.

Minorar e superar as reacções adversas e ambiguidades num processo de implementação da mudança, passa não só pela comunicação e informação, como também promover espaços de discussão sobre o futuro da empresa e sobre a mudança em particular.

Passa de igual modo, pela indispensável colaboração e cooperação de "todos" no planeamento colectivo da mudança e pela instauração ou continuação da confiança entre gestores e colaboradores (Difonzo e Bordia, 1998).

É certo que, estas medidas: comunicação, abertura à discussão, colaboração e iniciativa, são importantes no sucesso de um processo de implementação de mudança,

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mas só existirão se, a cultura da empresa assim o permitir (se forem práticas correntes), isto é, se forem coerentes e convergentes com a sua cultura. Dito por outras palavras, se a cultura de uma empresa for caracterizada por valores como a participação, iniciativa, autonomia etc. então o processo de mudança tem mais garantias de ter sucesso (Difonzo e Bordia, 1998).

Para superar obstáculos (relacionados com atitudes e comportamentos) à gestão de um processo de mudança, Kurt Lewin (Luthans, 1995; Robbins, 1998; Stoner et al, 1995), desenvolveu um modelo sequencial de três etapas, igualmente aplicável a indivíduos, grupos ou organizações inteiras. Este implica "descongelar" o padrão actual de comportamento, "mudar" ou desenvolver um novo padrão e em seguida "recongelar" ou reforçar o novo comportamento.

Descongelar - implica tornar óbvia a necessidade de mudança a ponto do indivíduo, do grupo ou da organização poder facilmente vê-la e aceitá-la. Para isso é necessário que exista um clima de abertura e confiança.

Mudar - a mudança implica indicar um agente de mudança treinado, que irá liderar os indivíduos, os grupos ou toda a organização durante o processo. No decorrer desse processo o agente de mudança irá alimentar novos valores, atitudes e comportamentos através de processos de identificação e interiorização.

Recongelar - significa transformar em norma o novo padrão de comportamento, usando para isso mecanismos de apoio ou reforço.

3.3. - O processo de mudança Quer a mudança tenha causas intrínsecas ou extrínsecas, o ponto de partida para a

mudança, é a situação presente (Status quo), que é insatisfatória e que cria um estado de frustração, suficientemente forte para gerar uma massa crítica que faça desencadear a mudança (figura 5).

De acordo com Câmara et al (1997), essa insatisfação activa e potenciadora de mudança na empresa está necessariamente ligada à existência de uma visão futura, que se afigura alcançável embora com esforço, e que se traduz num cenário muito mais positivo e desejável que assegurará o sucesso continuado da empresa.

O aspecto crítico da mudança consiste no processo de transição entre a situação presente e a visão futura, a qual não só exige uma liderança forte, como pressupõe um adequado controlo do rumo e do ritmo da mudança.

Figura 5. O processo de mudança

Situaçãoactual

Transição

MUDANÇA

Visãofutura

Insatisfação

Frustração

Massa críticapara mudar

Estimular

Orientar

Direccionar

Atraente

Apelativa

Alcançável

159

Num processo de mudança, há certos factos a ter em conta: Necessidade de manter o consenso de base sobre a necessidade de mudar,

"base social de apoio" à mudança. Não se deve abrandar o ritmo, ao ponto de por em causa esse consenso e de

regresso ao estádio anterior. O processo de mudança não deve ser implementado a uma velocidade que não

se consegue acompanhar, correndo o risco de distorções no processo. Hoje, poucas são as empresas que não estejam de alguma forma envolvidas

nalgum tipo de transformação. A probabilidade dos programas de mudança fracassarem é grande, porque,

segundo Kotter (1996), as empresas são sobregeridas e sublideradas. É que a mudança e um processo de mudança que necessita muito mais de liderança do que de gestão.

O sucesso de um processo de mudança passa pela liderança porque, de acordo com Kotter (1996), está na sua essência a resposta à melhor condução do processo, porque este, deve ser liderado mais do que gerido. À liderança compete neste processo, estabelecer o rumo, desenvolver a visão e as estratégias para a sua execução. Compete-lhe ainda, alinhar as pessoas à sua visão, levando-as a entendê-la, assim como as estratégias para a executar, por forma a aceitá-las como válidas. Cabe à liderança motivar e inspirar as pessoas para a necessidade de mudança.

Este autor, durante a década de 80, observou os esforços de mais de uma centena de empresas que pretendiam tornar-se mais competitivas implementando processos de mudança, concluindo que há oito erros típicos cometidos pelas empresas.

Permitir demasiada complacência - "deixar-se andar na onda", "sem querer andar na crista da onda", isto é, enredadas na sua própria inércia e rotina, sem ambição nem emoção, sem dar entender a urgência de mudança.

Inexistência de uma equipa coesa de interessados na mudança - não deve ser a mudança personalizada por uma só pessoa - o líder, devendo este circundar-se por uma equipa motivada e que tenha poder para pôr em prática a mudança.

Subestimar o poder da visão - sem uma visão, os esforços de mudança diluem-se por uma série de projectos confusos, por vezes incompatíveis.

Não comunicar a visão - a mudança requer sacrifícios que as pessoas só aceitarão se compreenderem a razão da sua necessidade.

Permitir obstáculos à nova visão - muitas iniciativas falham devido às barreiras com que deparam as pessoas que tentam agir. As mais comuns são a burocracia e o sabotadores influentes.

Inexistência de vitórias de curto prazo - os esforços perdem ímpeto se não houver objectivos de curto prazo para celebrar.

Declarar vitória cedo de mais - depois de trabalharem empenhadamente, as pessoas são tentadas a declarar vitória à primeira grande melhoria. A concentração e o empenho afrouxam e a empresa pode regressar ao passado.

Não enraizar a mudança na cultura da empresa - a mudança só sobrevive se estiver enraizada na cultura da empresa. Há comportamentos e valores que têm de acompanhar as mudanças.

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Para rectificar ou evitar estes erros típicos, Kotter (1996), afirma que a empresa

deve adoptar um processo de oito etapas sequenciais para liderar a mudança. As oito etapas da liderança da mudança 1. Criar um sentimento de urgência Fazer crer às pessoas que a mudança é urgente porque a velocidade das transformações no ambiente a isso obrigam. Levar as pessoas a não relaxarem sobre o sucesso e a precaverem-se quanto a eventuais crises e a estarem atentas a novas oportunidades para a empresa. Se não transformar a complacência num sentimento de urgência, não se conseguirá a cooperação necessária para que a mudança aconteça. 2. Criar uma Equipa (team) de interessados na mudança Ninguém consegue liderar sozinho um processo de mudança. Os oito passos para a liderança da mudança exigem uma equipa de líderes. Mas uma equipa cuidadosamente seleccionada e com espírito de equipa. 3. Definir e desenvolver uma visão e a estratégia para a executar A visão é essencial num processo de mudança porque clarifica a direcção que a empresa está a tomar, motiva as pessoas a agir e ajuda a coordenar as acções. 4. Comunicar a visão (da mudança) Para mobilizar a força de trabalho em torno da visão é essencial comunicá-la eficazmente. A má comunicação é a melhor forma de desmotivar os empregados e matar qualquer transformação. 5. Levar as pessoas a agir Nesta fase do processo deve-se revestir de autoridade (empowerment) um conjunto alargado de pessoas, para que ajam, removendo as barreiras que podem impedir a mudança. Encorajar um conjunto de pessoas a chamarem a si a responsabilidade da tomada da decisão e a aceitarem o risco, sendo devidamente compensadas por isso. 6. Criar vitórias de curto prazo Dever-se-á planear a mudança faseadamente, com objectivos a atingir. As vitórias de curto prazo são importantes para a motivação dos colaboradores empenhados, dando-lhes um feedback positivo e para minar os resistentes, mostrando-lhes que a mudança está em marcha e a produzir resultados. 7. Consolidar a transformação Embora as vitórias de curto prazo sejam importantes, celebrá-las excessivamente pode ser contraproducente. Dever-se-á utilizar as vitórias de curto prazo para motivar todos para desafios e projectos mais ambiciosos, na linha do desenvolvimento da visão da mudança. 8. Ancorar a mudança à cultura da empresa O maior impedimento para criar e desenvolver a mudança num grupo ou empresa, é a cultura. A maior parte da mudança nas normas e valores num processo de mudança, deve ser levada a cabo no fim do processo de transformação e não no princípio.

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Nenhum processo de mudança pode ter sucesso sem lidar com a cultura da empresa, porque esta tem uma influência profunda na forma como as pessoas se comportam.

Há quem defenda que os projectos de mudança devem iniciar-se pela mudança da cultura. No entanto, a cultura não é algo que se possa mudar facilmente. Só fazendo primeiro a mudança convencendo as pessoas a tentarem novas práticas e produzindo resultados, se pode ancorar essas novas atitudes e hábitos na cultura da empresa.

Influente e difícil de mudar, a cultura de empresa pode constituir uma ameaça a um esforço de transformação que faça apelo a diferentes valores ou normas de comportamento. É, nestes casos necessário mudá-la para a adequar às novas práticas. A tarefa exige acção e paciência: acção para encorajar as pessoas a aceitarem a nova cultura; paciência para esperar que a nova cultura se consolide. Mas nem todos os programas de transformação exigem o desmantelar da totalidade da cultura. Em muitos casos o essencial pode manter-se válido.

.4. - A MUDANÇA DE CULTURA 4.1. - O contexto da mudança de cultura Num processo de transformação ou mudança, há que eventualmente mudar a cultura, isto se esta for incompatível com a nova visão e estratégia (Kotter, 1996).

Como vimos no ponto anterior, a cultura deverá ser o último passo na implementação / liderança de um processo de mudança. Foi o que aconteceu na transformação levada a cabo pela A.T.&T., uma das maiores empresas do mundo; Segundo Goshal (1995), neste processo de transformação que necessitou de alguns anos para se concretizar, só após as fases de reposicionamento estratégico e da reestruturação das operações, finalmente desenvolveu-se a "revolução cultural". O processo foi difícil e moroso, mas com sucesso, só possível por uma liderança forte (Goshal, 1995). Facto este que, está em consonância com Kotter (1996), quando este afirma que a mudança necessita muito mais de liderança do que de gestão.

Se por um lado, a mudança só terá sucesso se estiver enraizada e interiorizada na cultura da empresa (Kotter, 1996), por outro, para que haja uma predisposição ou abertura à(s) mudança(s), necessário se torna que, na cultura da empresa se encontrem certas características relevantes para considerá-la uma cultura de ou para a mudança.

Poder-se-á dizer que, para se encarar a mudança como um fenómeno natural, uma empresa possuidora de uma cultura (caracterizada) de mudança, terá mais facilidade de adequar-se ou adaptar-se às exigências da envolvente, não só ao nível estrutural, tecnológico, mas também ao nível cultural. É o caso da organização que é focalizada externamente (no mercado e no cliente), estará mais apta a alterar a sua cultura do que a que está focalizada internamente (Williams, 1993).

Se a cultura da empresa não for possuidora de características potenciadoras de flexibilidade, então mais dificuldades terá em adaptar-se à velocidade da mudança e assim, sempre que se justificar implementar a mudança, ter-se-á que eventualmente proceder à mudança de cultura.

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4.2. - Conceito de mudança de cultura Por definição, a mudança de cultura é o processo de formação ou modelagem da cultura de uma organização, em ordem a melhorar a sua eficiência, ajudando-a a gerir com benefício das mudanças ocorridas no seu ambiente, nos seus mercados, na sua propriedade (administração), na sua liderança, nos seus produtos ou na sua tecnologia (Williams, 1993).

4.3. - Factores que influenciam a mudança de cultura Os factores que podem influenciar a mudança da cultura de empresa nas organizações são, segundo Williams (1993) os seguintes: crises financeiras, segmentação do mercado, mudanças nas expectativas dos clientes, iniciativas da concorrência, mudança na legislação ou tendência para a privatização.

De acordo com Thévenet (1986) e Luthans (1995), os factores que podem provocar a mudança de cultura são, os líders, ou melhor, a mudança do líder e as forças em torno do mercado que podem colocar a empresa numa situação de sobrevivência.

Isto está na linha de pensamento de Schein (1985), quando afirma que, o líder é o único verdadeiro criador de cultura e é o principal actor na mudança da mesma. Por isso, quando uma empresa muda de líder, é natural que mude de cultura. Por outro lado, se a empresa deseja mudar de cultura, é natural que seja necessário mudar de líder, embora não seja condição obrigatória.

De acordo com Robbins (1998), a evidência sugere que a mudança de cultura será tanto mais "fácil" de implementar, se a maior parte, ou todas as seguintes condições se verificarem:

Crise grave (Crise financeira, perda de grande parte dos clientes, obsolescência da tecnologia face a um grande concorrente) - trata-se de um choque que afecta inevitavelmente o Status quo e põe em causa a cultura actual, como que ineficaz para enfrentar tal crise.

Mudança na liderança - como vimos, um novo líder na empresa influenciará concerteza a cultura existente numa empresa, já que é portador de novos valores e experiências.

Novas ou pequenas organizações - nas pequenas organizações é mais fácil implementar uma nova cultura devido à simplicidade da estrutura das primeiras, permitindo a comunicação de valores com maior facilidade. Nas novas organizações, torna-se mais fácil a implementação de uma nova cultura, porque a cultura ainda não está suficientemente sedimentada.

Cultura "fraca" ou "débil" - as culturas "fracas" são mais permeáveis à mudança pela simples razão que, quanto mais "forte" ou antiga for a cultura, mais consolidada e interiorizada está nas pessoas.

4.4. - Processo de mudança de cultura Ao pretender-se implementar um processo de mudança de cultura de empresa, torna-se necessário previamente conhecer as forças relacionadas com a propensão da empresa para mudar a sua cultura. Williams (1993), com base na análise que fez de algumas organizações, foi-lhe possível evidenciar uma relação de forças, que se

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estabelecem num processo de mudança de cultura, conforme explicitado na figura seguinte.

Figura 6. Modelo de campo de forças relacionado com a propensão de uma organização para mudar de cultura

FORÇAS INCENTIVANDO A MUDANÇA DE CULTURA

FORÇAS RESTRINGINDO A MUDANÇA DE CULTURA

Mudança para o topo Organização baseada na carreira

Influências do poder externo Baixa rotação

Visão do futuro Sucesso

Poder do líder Ambiente estável

Aceitação da necessidade de mudar Critério de sucesso não visível

Externamente focalizada Vazio de autoridade

Crise ou oportunidade

Fonte: Williams, 1993, p. 106.

Robbins (1998), sugere por seu turno, um conjunto de considerandos a ter em conta no processo de mudança da cultura:

- Ter gestores de topo que compreendam, interiorizem e que considerem como válidos os novos valores da nova cultura a ser implementada, para que sirvam de modelos de comportamento.

- Criar novas histórias, símbolos e rituais para substituir os actuais. - Seleccionar, cativar e apoiar colaboradores que adoptem e defendam os novos

valores numa fase de validação. - Redesenhar todo o processo de socialização, por forma a adequar-se aos novos

valores. - Mudar o sistema de recompensas com vista a encorajar a aceitação dos novos

valores. - Trabalhar para obter um clima de grande confiança, através da cooperação e

participação de "todos" na construção da nova cultura. - Afastar subculturas ou comportamentos não consensuais localizados, através

de rotação de pessoal, transferência ou limitações nas tarefas. - Substituir comportamentos, normas formais e regulamentos que sejam muito

rígidos. Por seu lado, Luthans (1995) acrescenta ainda:

Sensibilizar para a necessidade da mudança de cultura explicando o contexto da sua mudança.

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Possibilitar espaços de discussão da nova visão, futuro e estratégia da empresa, as quais sem uma cultura compatível não terá sucesso.

Enfatizar a comunicação como instrumento imprescindível da gestão da cultura.

4.5. - O líder e a gestão da cultura Nem sempre é necessário mudar de líder para mudar a cultura porque, esta pode ser gerida, adaptada e sofrer evoluções. Depende afinal do perfil do líder, no que concerne à sua capacidade de gestão da cultura.

A gestão da cultura numa empresa, pressupõe o desenvolvimento de valores partilhados pelos seus membros, fomentando a identidade comum. Por outro lado, esta gestão da cultura, terá que fundamentar-se no desenvolvimento de uma forte identidade através de uma partilha de valores que se manifestem em padrões de actuação desejáveis ao contexto organizacional e, simultaneamente, gerir o efeito da transformação dos valores em pressupostos básicos que não sejam mais tarde indutores de perda de flexibilidade organizacional (Schein, 1985). Segundo este autor, o líder é o principal actor da mudança e gestão da cultura.

Neste contexto e de acordo com Thévenet (1986) e Schein (1985), o papel do líder na gestão da cultura é diferente, consoante se trate dos diferentes estádios ou fases de desenvolvimento da empresa.

Assim, na primeira fase - criação da empresa, o líder transfere as suas hipóteses básicas e a visão da empresa que idealiza. Os seus valores serão "transportados" para a jovem organização, tendo como objectivo assegurar a sua estabilidade e fortalece-la em torno de um equilíbrio social e emocional (Thévenet, 1986).

Na fase de crescimento da empresa, a cultura toma um papel mais activo, em particular quanto às formas de funcionamento, políticas e decisões (consolidação da cultura). Neste estádio precisa Schein (1985), o líder deve averiguar em que medida a cultura pode ajudar ou servir de obstáculo à organização no desempenho da sua missão. Em último caso, o líder deve ser capaz de utilizar as suas capacidades para proceder às adaptações necessárias. Resta saber, se o líder terá a capacidade ou perfil para proceder a essa adaptação. Aqui, o líder é um observador da cultura, encarregado de explorá-la, de utilizar os seus pontos fortes e prevenir incoerências em relação às hipóteses fundamentais (Thévenet, 1986).

Na fase de maturidade, a cultura desempenha plenamente o seu papel. Os problemas surgem se se descobre que, esta não permitiu que a empresa pudesse enfrentar os desafios da organização. Neste caso, o líder deve munir-se de uma grande força psicológica e de uma motivação e ter consciência do que ocorre com a organização, para desempenhar o seu papel de "motor" da evolução da cultura (Schein, 1985); (Thévenet, 1986).

O líder proporá novas direcções para a empresa, mas tendo em consideração, a importância da segurança e estabilidade dos seus membros. É este o paradoxo do papel de gestor da cultura que desempenha ou deve desempenhar o líder: este deve impulsionar e gerar um sentimento de segurança durante todo o processo de mudança de cultura (Thévenet, 1986). Estas três fases correspondem às três funções de gestor da cultura do líder: criação, consolidação e maturação.

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De referir que, e segundo Schein (1985), o modelo das três etapas de Kurt Lewin (modelo este desenvolvido por Schein), é válido e indispensável num processo de mudança de cultura.

A cultura organizacional, como vimos, pode simplesmente evoluir e adaptar-se. Caso o não tenha feito, a empresa terá mesmo de mudar a sua cultura, numa tentativa de responder mais eficientemente às necessidades do mercado numa perspectiva de sobrevivência. Por vezes, essa mudança tem subjacente a eliminação de constrangimentos à criatividade e inovação.

5. - CULTURA E INOVAÇÃO 5.1. - A necessidade de inovar A rapidez da difusão tecnológica no mundo, a explosão do comércio mundial, a evolução das tecnologias da informação, entre outros aspectos, tudo isto faz com que a empresa actual viva sob uma pressão concorrencial nunca antes conhecida.

Os produtos e os serviços são postos em causa cada vez mais rapidamente. Para assegurar  a  sua  continuidade,  a  empresa  “está  condenada”  a  fazer  evoluir  a  sua  oferta  em  permanência. É que, «é preciso que nos convençamos de que é o produto que faz o êxito da empresa. Uma marca, mesmo que conhecida e apreciada, não consegue viver se os seus produtos envelhecerem. Quando já não se possui o produto competitivo, nem o ma-terial, nem a marca e a sua notoriedade, nem os meios poderão fazer nada» (Prouvost, 1992, p. 19). Inova-se antes de mais, para assegurar a continuidade e a sobrevivência da empresa.

Peters (1987), assim o entende quando afirma, que as empresas que têm conseguido sobreviver ao caos por terem optado por um ritmo de inovação rápida e constante, são as únicas com grandes probabilidades de sobrevivência nos próximos anos. Nesta linha de pensamento, Kanter et al (1997) acrescenta ainda que, de facto, a inovação sistemática e perpétua passou a fazer parte da cultura e actividade destas empresas, como forma de assegurar o sucesso futuro.

Inovar não é um fim em si mesmo. É um meio de assegurar os objectivos de continuidade, desenvolvimento e rentabilidade da empresa.

Afirma Prouvost (1992) que, quando corre tudo bem na empresa, quando os seus produtos de hoje têm sucesso, "ninguém" põe em causa que esses mesmos produtos, no futuro, já não se venderão. Quando isso acontecer, será talvez demasiado tarde.

Deverá porventura existir na empresa, um sentimento de urgência como diz Kotter (1996), isto é, uma atitude permanente da empresa que examine o mercado e a realidade competitiva que a envolve, identificando potenciais crises, assim como eventuais oportunidades.

Afinal, inovar também porque, como diz Prouvost (1992), devemos ser os primeiros a chegar ao mercado. O primeiro agarra uma parte que em seguida, será muito difícil aos outros conquistar.

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5.2. - Definição de inovação Após análise à diversa bibliografia constatámos que, vários autores concentravam as suas definições nas fases do processo de inovação, isto é, a ideia, tradução da ideia em novos produtos, etc, e colocação dos mesmos no mercado com grande sucesso.

Assim é em Philips (1991, p.484) que, considera inovação como «the movement of an idea from its conception to commercial sucess, either as a product or a process».

Essa associação de conceitos está também patente em Kanter et al (1997) quando afirmam que, a inovação é o processo de dar às ideias utilização prática e produtiva, acrescentando que, se trata do desenvolvimento de ideias em produtos, que resultam após colocação no mercado, num grande sucesso.

Para Prouvost (1992), trata-se do lançamento no mercado, com sucesso de um produto ou de um serviço novo após um processo de desenvolvimento de uma ideia.

Das definições anteriores resulta que, a inovação se avalia pela bitola do cliente e não pela do produtor, isto é, pelo comportamento dos clientes e não pela tecnologia integrada. Concluir-se-á que, para que seja inovação, para além da concretização da ideia, é necessário que esta tenha resultado num sucesso comercial. Doutra forma não será inovação. Estas definições têm conteúdo muito preciso e limitado, ao contrário das seguintes.

Assim, Kuczmarski (1996, p.1), refere-se a inovação como «a mindset, a pervasive attitude, or a way of thinking focused beyond the present into the future».

Este autor, entende inovação como uma atitude natural e permanente que permite à empresa ver para além do presente e criar a visão do futuro. Esta definição tem como subjacente, que a empresa e os seus negócios, são conduzidos por uma lógica e atitude de inovação extensível à empresa como um todo e não só ao produto ou serviço.

Por outro lado Drucker (1998), define inovação como, o esforço para criar uma mudança intencional e centrada no potencial económico ou social de uma empresa.

Nesta definição está implícito que a inovação é resultante de um espírito empreendedor, da personalidade e capacidades empresariais não só dos líderes, mas também da empresa no seu conjunto, dirigidos para a prática sistemática da inovação.

A este propósito, isto é, que a inovação resulta duma prática sistemática e intencional enquadra-se na primeira classe da taxonomia proposta por Freeman e Perez (1988) que integra quatro classes (Dosi et al, 1988):

1. Inovações incrementais: ocorrem quase continuamente em qualquer indústria sobretudo como resultado de invenções e melhorias sugeridas por técnicos da produção ou utilizadores.

2. Inovações radicais: são o resultado descontínuo de actividades de I.&D. nas empresas ou em organismos universitários e estatais.

3. Mudanças de sistema de tecnologia: são grandes mudanças tecnológicas que afectam vários sectores da economia ou originam outros. Baseiam-se numa combinação de inovações radicais e/ou incrementais e de inovações organizacionais e de gestão que afectam várias empresas. Foram o caso das inovações em materiais sintéticos, na petroquímica e no equipamento usado na estrusão na indústria de plásticos.

4. Mudanças no "paradigma técnico-económico": correspondem às revoluções tecnológicas que ocorrem nos sistemas de tecnologia e conduzem à emergência

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de uma nova gama de produtos, serviços e indústrias, afectando directa ou indirectamente quase todos os outros sectores da economia.

Caraça (1986, p.335), apresenta uma visão também abrangente do conceito de

inovação, alargando as suas fronteiras até à àrea do social, do serviço à comunidade, considerando-a como, «a primeira introdução de um novo produto, processo ou sistema na actividade comercial ou social normal de um país». 5.3. - Fontes e determinantes de inovação Hoje é necessária uma inovação regular e permanente, para todas as empresas de todos os tamanhos e feitios (Peters, 1990).

Existem obviamente, inovações que provêm de rasgos de genialidade. No entanto, a maioria destas e, especialmente, as de maior sucesso, resultam de uma procura consciente e intencional de oportunidades de inovação (Drucker, 1998).

Na linha deste último autor, está Philips (1991) quando afirma que, em muitas indústrias, as inovações ocorrem através dos esforços de investigação incremental no interior das empresas, quer seja em produtos ou processos, e raramente inovações do tipo radical que signifiquem um corte radical com a tecnologia existente. Assim, as preocupações com a inovação centram-se antes de mais nos pequenos melhoramentos que são introduzidos, sem esquecer contudo, a pressão do mercado sobre as actividades da empresa (Marques, 1998).

Kline e Rosenberg (1986) identificaram dois tipos de forças que afectam a actividade da inovação que interactuam entre si. De um lado está a força do mercado, que proporciona mudanças contínuas nas oportunidades de comércio para categorias específicas de inovações; aliás a grande maioria de inovações tecnológicas foram realizadas em resposta às condições de mercado (Stoner et al, 1995); por outro lado, encontra-se a força do progresso nas áreas científicas e tecnológicas de ponta, sugerindo por vezes possibilidades para novos produtos, ou melhoramentos na performance dos mais antigos, ou ainda produzindo outros produtos a mais baixo custo.

Esta força do progresso tecnológico e científico por sua vez, é fruto da experiência e aprendizagem do processo de inovação no interior das empresas. É que, e de acordo com Drucker (1987), à medida que se cresce no processo de aprendizagem, os intervenientes, engenheiros, investigadores, terão muitas oportunidades de acumular em Know-how experiências necessárias a uma evolução potencial. Nesta mesma linha de pensamento, Drucker (1998), para quem uma inovação sistemática e intencional inicia-se com a análise das fontes de novas oportunidades, identificou sete fontes de oportunidade inovadora que se encontram facilmente no interior das empresas ou das indústrias:

1. Ocorrências inesperadas - o sucesso ou fracasso inesperados, podem revelar mudanças latentes, no mercado, nos produtos, na tecnologia, etc., e por isso oportunidades a explorar, fazendo-nos afastar as noções pré-concebidas, os nossos pressupostos, as nossas certezas;

2. Incongruências - as incongruências, de natureza qualitativa, reflectem realidades económicas contraditórias, onde determinados valores e expectativas dos consumidores se contradizem com a realidade concreta:

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3. Necessidades de processo - baseia-se nas necessidades sentidas pelas empresas relativamente aos processos produtivos, dependendo da existência de conhecimento científico e técnico novos;

4. Estrutura de sector empresarial ou do mercado - reflecte as alterações e mudanças na estrutura das indústrias, derivada de um rápido crescimento de um sector económico (ex: sector automóvel), ou quando esse sector atinge o dobro do seu tamanho, ou devido a convergências de tecnologias que até então eram vistas separadamente;

5. Alterações demográficas - relaciona alterações na estrutura etária da população, na sua composição, no aumento ou diminuição das taxas de mortalidade ou natalidade, no emprego, etc., que possam constituir oportunidade inovadora;

6. Alterações na percepção - prende-se com as diferenças de percepção que podem ocorrer, por parte das empresas, derivadas do enfoque perspectivado pela expressão: "o copo está meio cheio, ou o copo está meio vazio";

7. Novos conhecimentos - engloba as formas tradicionalmente entendidas como fontes de inovação, podendo ter ou não carácter científico. Esta fonte é a mais arriscada, incerta e imprevisível, já que quase nunca se baseia em um só factor, mas na convergência de vários tipos de conhecimentos, e nem todos eles científicos ou tecnológicos.

5.4. - Princípios da inovação Drucker (1998) elegeu cinco essenciais princípios que devem enquadrar a actividade inovadora, para permitir que as organizações inovem com maior eficácia:

Atenção ao mercado - como a inovação é conceptual e perceptiva, os possíveis inovadores precisam de ver, perguntar e ouvir. Seguidamente, devem procurar potenciais utilizadores para estudarem as suas expectativas e necessidades.

Simplicidade - para ser eficaz, uma inovação deve ser simples e centralizada. O maior elogio que uma inovação pode receber mede-se pelas seguintes palavras: «Isto é óbvio! Por que motivo não pensei nisso? É tão simples!» Mesmo a inovação que cria novos utilizadores e mercados deverá ser direccionada para uma aplicação específica.

Especificidade - as inovações eficazes começam por ser pequenas. Tentam fazer algo específico. Poderá ter sido a ideia elementar de colocar o mesmo número de fósforos em todas as caixas (costumavam ser 50) que deu aos suecos um monopólio mundial durante meio século. Pelo contrário, ideias que «revolucionam uma indústria» dificilmente funcionam.

Aspirações à liderança - ninguém poderá prever ser uma determinada inovação se transformará num grande negócio ou num feito modesto. Mas uma inovação de sucesso deverá aspirar, desde o início, a representar um standard, a determinar a direcção de uma nova tecnologia ou indústria. Se uma inovação não aspira à liderança desde o início, é pouco provável que seja inovadora o suficiente.

Persistência - acima de tudo, uma inovação requer mais trabalho do que genialidade. Exige conhecimento. Os inovadores raramente trabalham em mais

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do que uma área. Thomas Eddison, por exemplo, trabalhava estritamente no campo eléctrico. Na inovação, existe talento, ingenuidade e conhecimento. Mas quando tudo está dito e feito, o que a inovação exige é trabalho árduo, centralizado e intencional.

5.5. - A cultura e o ambiente de inovação A criatividade e a inovação dependem do elemento humano e da cultura organizacional existente. Assim, mais e mais organizações buscam meios de encorajar e estimular a criatividade e a inovação tanto ao nível individual quanto ao nível organizacional (Peters, 1990). Explicitamente, o autor considera a cultura e os recursos humanos da empresa, como factores essenciais ao desenvolvimento da inovação.

Nesta linha, encontra-se Robbins (1998), quando considera para além destes, também a variável estrutural, como de significativa importância à criação de um clima propício à inovação na organização.

Na nossa perspectiva, consideramos que a cultura terá igualmente influência nos outros factores, estrutura organizacional e recursos humanos. Todas estas variáveis em conjunto, contribuem dinamicamente para a criação de um ambiente interno que pos-sibilite um clima para a exploração de novas ideias e novos modos de realizar as coisas.

Poder-se-á então considerar que, possa existir uma cultura para a inovação, isto é, uma cultura que dada as suas características, catalize o desenvolvimento da inovação. Uma cultura será orientada para a inovação se o líder e os gestores o forem. Como disse Drucker (1998), a organização será inovadora se o líder tiver visão inovadora e capacidade empresarial para levar a cabo a inovação.

Também Prouvost (1992) refere que, um líder animado de espírito inovador é uma condição necessária, mas não suficiente para a inovação na empresa. Considera o autor que, na empresa todos devem sentir-se investidos do poder e do dever de contribuir para a inovação. Kuczmarski (1996) partilha desta última opinião, isto é, que deverá existir um total envolvimento de todos os membros da empresa; os gestores de inovação, que dirigem as equipas de inovação; os gestores de topo, que dirigem essas equipas, devendo estes actuar positivamente e proactivamente, apoiando e motivando os gestores de inovação; as equipas de inovação que devem possuir optimismo, auto-confiança e paixão pela inovação.

Como vimos, para se criar um ambiente de inovação na empresa, ter-se-á de atender a três ordens de factores: estrutura organizacional, recursos humanos e cultura organizacional, esta última como que inspiradora das primeiras. 5.5.1. - Estrutura organizacional

Representa um papel muito importante numa estratégia de inovação, porquanto as organizações com estruturas rígidas e pesadas, com elevada formalização com a decisão centralizada, inibem a comunicação interna entre departamentos e bloqueiam a iniciativa individual. Autores como Stoner et al (1995), Robbins (1998), Prouvost (1992), Kuczmarski (1996) e Clark (1995), sublinham esse facto.

Numa estratégia de inovação, torna-se necessário um alto grau de integração entre as várias unidades da organização, ou seja, estruturas horizontais constituídas por equipas

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multidisciplinares e multifuncionais de inovação, que poderão incluir representantes da investigação, marketing, produção, engenharia e vendas. O objectivo deste tipo de estrutura, é o de encorajar formal e até informalmente, a comunicação inter-departamental e a partilha de informações acerca de projectos, ideias e tecnologias. Com este facto obtém-se maior performance, rapidez e qualidade a menor custo (Kanter et al, 1997).

Deverão as organizações apostar em estruturas flexíveis, com grande mobilidade que possibilitem o nascimento e desenvolvimento de ideias, assim como a iniciativa individual e autonomia versus responsabilidade. Isto, só poderá acontecer se, a cultura da empresa o possibilitar, isto é, se a sua cultura estiver em consonância com tais valores e princípios.

5.5.2. - Recursos humanos

Trata-se de um elemento-chave numa estratégia de inovação ou mudança. Se queremos uma organização inovadora, dever-se-ão recrutar pessoas imaginativas, criativas e produtivas, assim como possuidoras de bons conhecimentos técnico-científicos.

Às pessoas envolvidas no processo de inovação, pedir-se-á apetência pelo risco e pela aprendizagem contínua, que não tenham medo de errar, iniciativa, proactividade, flexibilidade, responsabilidade e disciplina, gosto pelo trabalho em equipa, empenho pela excelência e confiança em si e nos outros. Oferecer-se-á segurança de emprego, motivação baseada num sistema de recompensas com base na performance, mas também numa cultura organizacional aberta, de valorização, participativa, que proporcione autonomia e "independência", que por sua vez favoreça a criatividade e auto-estima. (Stoner et al, 1995; Kanter et al, 1997).

Segundo Stoner et al (1995), são seis os princípios que deveriam fazer parte duma cultura que estimule a criatividade e motivação dos recursos humanos para a inovação.

1. Desenvolver aceitação às mudanças. Os membros da organização têm que acreditar que a mudança tanto irá beneficiá-los como beneficiará a organização. Essa crença terá mais probabilidade de surgir se os membros participarem com seus superiores na tomada de decisões, e se questões como a estabilidade no trabalho forem tratadas com cuidado durante o planeamento e a implementação de mudanças.

2. Encorajar novas ideias. Dos gestores de topo aos superiores de nível mais baixo têm que deixar claro através de palavras e acções que novas abordagens serão bem-vindas. Para encorajar a criatividade, os gestores devem estar dispostos a ouvir as sugestões dos subordinados e a implementar as que sejam promissoras - ou levá-las aos gestores de nível mais alto.

3. Permitir mais interacção. Um clima permissivo e criativo é estimulado quando se dá aos indivíduos a oportunidade de interagir com membros do seu próprio grupo ou det al grupos de trabalho. Essa interacção encoraja a troca de informações úteis, o livre fluxo de ideias e novas perspectivas sobre os problemas.

4. Tolerar o fracasso. Muitas ideias novas mostram-se pouco práticas ou inúteis. Os gestores eficazes aceitam e permitem o facto de que tempo e recursos serão investidos experimentando novas ideias que não vão funcionar.

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5. Estabelecer objectivos claros e dar a liberdade para alcançá-los. Os membros da organização devem ter um propósito e um direccionamento para a sua criatividade. Fornecer directrizes e restrições razoáveis também dará aos gestores algum controlo sobre a quantidade de tempo e de dinheiro investidos no comportamento criativo.

6. Mostrar reconhecimento. Os indivíduos criativos motivam-se para trabalhar duro em tarefas que lhes interessam. Mas, como todos os indivíduos, eles gostam de ser recompensados por uma tarefa bem realizada. Ao mostrar reconhecimento através de coisas tangíveis como bonificações e aumentos de salário, os gestores demonstram que o comportamento criativo é valorizado na sua organização.

5.5.3. - Cultura organizacional

Parece evidente que a propensão para a inovação numa organização, assim como, esta poder tornar-se mais inovadora, passa pela dinâmica, caracterização e pelo desenho da cultura organizacional, sendo esta e a inovação factores de sucesso na gestão das empresas.

Peters (1997) faz alusão a este trinómio, cultura-inovação-sucesso, quando afirma que, a inovação sistemática e perpétua passou a fazer parte da cultura e criatividade das empresas como forma de assegurar o sucesso futuro (Kanter et al, 1997).

A cultura é importante para fomentar um clima e um espírito de animação e motivação em torno da inovação, podendo apoiar ou inibir o desenvolvimento e o uso de ideias criativas. Deverá promover um ambiente que encoraje a exploração de novas ideias e novos modos de realizar as coisas (Stoner et al, 1995). A cultura para a inovação deverá:

Ser capaz de encorajar a participação, a iniciativa individual, o espirito de equipa e de cooperação.

Caminhar no sentido de homogeneizar comportamentos de forte cumplicidade, comprometimento e identificação em torno do objectivo de inovação, assim como fomentar o espírito inovador.

Promover a comunicação interna de forma horizontal, eficiente e descentralizada por forma a procurar obter sinergias entre os envolvidos na inovação, tal como divulgar o espírito inovador.

Procurar a descentralização da decisão, privilegiando a autonomia a níveis hierárquicos mais baixos.

Ser valorizadora das potencialidades das pessoas, humanista e de desenvolvimento pessoal.

Proteger e incentivar quem queira correr riscos a pensar criativamente. Focalizar-se no mercado e no cliente, o que exige flexibilidade a todos os níveis. Ser adaptativa, flexível, propensa à mudança e fomentar a aprendizagem contínua

quer a nível individual ou organizacional (learning organization). Uma cultura para a inovação, assente nestes princípios, só será possível se, as "faces visíveis da cultura organizacional", forem coerentes entre si potenciando uma cultura de acção inovadora. Desta forma, a liderança deverá ser democrática, transformacional e visionária, e com a sua visão partilhada, orientar estrategicamente a empresa para a inovação. Deverá ainda ter capacidade empreendedora e espírito inovador.

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Por outro lado, o estilo de gestão do líder deverá ser participativo e com abertura às sugestões e às contribuições de todos, possibilitando a descentralização da decisão e a autonomia.

Assim, podemos concluir que a inovação deverá estar alicerçada na cultura da empresa para ganhar consistência. Esta por sua vez, consubstanciar-se-á na estratégia através de valores, sendo um desses valores estratégicos - a inovação.

De acordo com Kuczmarski (1996), a inovação é um estado de espírito, é uma

nova forma de pensar a estratégia e as práticas da empresa. Para o mesmo autor, a inovação não deverá só caracterizar a gestão da empresa,

mas mais do que isso, um valor cultural com poder para ganhar vantagem competitiva. No actual contexto competitivo, as empresas deverão então considerar, a inovação

permanente e sistemática e a abertura e apetência pela mudança, conjugada com a indispensável flexibilidade organizacional, como valores prevalecentes da sua cultura e de base da sua estratégia e visão de futuro, sob pena de perder poder concorrencial.

CONCLUSÕES

É já um lugar comum, a definição de que vivemos actualmente num contexto altamente instável, onde as verdades de hoje não o serão amanhã. Esta mudança permanente, que se verifica a todos os níveis, social, económico, político e tecnológico, etc., tem-se manifestado com características e consequências imprevisíveis. Nesta linha, poder-se-á dizer que o contexto tecnológico actual é um contexto altamente incerto, já que, o seu dinamismo e a sua complexidade são muito elevados.

O conceito de dinamismo do contexto tem a ver com a taxa e frequência de mudança, que, no caso da inovação tecnológica se caracteriza, como ficou dito anteriormente, por um sem número de pequenas inovações com características iminentemente incrementais e raramente de natureza radical, que suponham um corte com a tecnologia anterior.

A complexidade do contexto da inovação tecnológica tem a ver com a diversidade das influências com que a empresa tem de se confrontar, com o nível de conhecimentos necessários para tratar tais influências, e com a inter-relação existente entre as diversas influências do contexto.

Assim, já não basta dispor de tecnologia avançada, de uma sólida estrutura financeira, de uma boa posição no mercado ou de Know-How, para assegurar o sucesso ou mesmo a sobrevivência a tais influências contextuais. Torna-se necessário que essas vantagens sejam sustentadas por uma estratégia apoiada na visão, na cultura e baseada na inovação, tal como na institucionalização da mudança pela empresa.

Em síntese, no mundo dos negócios de hoje, em constante efervescência, a apetência, a atitude e o espírito com que as empresas encaram a inovação e a mudança, são requisitos estratégicos-chave para o sucesso e sobrevivência das organizações.

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