caderno graffiti – 47º salão de artes plásticas de pernambuco

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caderno graffiti

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Caderno Graffiti do 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco, 2012.

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caderno graffiti

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caderno graffiti

Page 4: Caderno Graffiti – 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco

realizaçãoapoio institucional

apoio

Governo do estado de Pernambuco

Governador

Eduardo Campos

vice-Governador de pernambuco

João Lyra Neto

Secretário da caSa civil

Tadeu Alencar

secretaria de cultura do estado de Pernambuco

Secretário

Fernando Duarte

Secretário-executivo

Beto Silva

diretoreS-executivoS

Vinícius Carvalho e Beto Rezende

diretor de políticaS culturaiS

Carlos Carvalho

coordenador de arteS viSuaiS

Felix Farfan

diretor de articulação inStitucional

Claudemir Souza

diretor de Formação

Félix Aureliano

diretor de GeStão

José Mário Duarte Coelho

diretora de planejamento

Amara Cunha

GeStoraS de comunicação

Michelle Assumpção e Olívia Mindêlo

Fundação do Patrimônio Histórico e artístico de Pernambuco (FundarPe)

preSidente

Severino Pessoa

diretora de GeStão

Sandra Simone dos Santos Bruno

diretor de GeStão do Funcultura

Emanuel Soares de Lima

diretor de GeStão de equipamentoS culturaiS

Célio Pontes

diretora de preServação cultural

Célia Campos

diretor de produção

Fernando Augusto

Page 5: Caderno Graffiti – 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco

caderno graffiti

Recife, 2012

Page 6: Caderno Graffiti – 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco

S161c Salão de Artes Plásticas de Pernambuco (47.: 2012: Recife, PE) Caderno graffiti/Secretaria de Cultura de Pernambuco, Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco; coordenadora geral Luciana Padilha. – Recife: Zoludesign, 2012. 48p.: il.

ISBN 978-85-60411-06-1

1. artes plásticas – exposições – catálogos. 2. grafitos – exposições – catálogos. 3. arte de rua – exposições – catálogos. 4. grafitos – recife (pe) – prêmios. 5. grafiteiros – brasil. I. Secretaria de Cultura de Pernambuco. II. fundarpe. III. Padilha, Luciana. IV. Título.

cdu 73 cdd 730PeR – BPE 12-0166

Page 7: Caderno Graffiti – 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco

apresentação luciana padilha PáGINA 6

sobre o que podem dizer as paredes

nicole cosh PáGINA 9 prêmio graffiti PáGINA 20

elaine bomfim e derlon almeida PáGINA 24 elvis almeida

PáGINA 30 galo de souza PáGINA 36 wagner porto cruz

PáGINA 42

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6

Uma das novidades do 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco foi a criação de um prêmio para grafitagem, visando adaptar seu edital às especificidades das linguagens atuais das artes e da cultura visual. Privilegiando uma ação de graffiti – a ocorrer em qualquer parte de Pernambuco –, o prêmio buscou adaptar-se ao caráter pontual tantas vezes explorado por grafiteiros, que habitualmente concentram ações num determinado espaço-tempo, potencializando uma reverberação intensa naquele contexto. Desse modo, o prêmio possibilitou que quatro intervenções fossem realizadas em partes diversas do Recife e de Pernambuco, estabelecendo relações com as comunidades onde ocorreram.

Neste Caderno do Prêmio de Grafitagem, apresentamos o trabalho desenvolvido pelos quatro premiados desta edição: Elaine Bomfim e Derlon Almeida (Conversa de Pescador), Elvis Almeida (Graffiti Ativo), Galo de Souza (Oferendas) e Wagner Porto Cruz (Terra da Lua). Nos diversos pontos/comunidades escolhidos, os grafiteiros dedicaram-se a travar relações com a cultura, as formas de sociabilidade e os problemas desses locais, exercitando coletivamente o graffiti como forma de intervenção criativa e crítica sobre a realidade. A vivência colaborativa, somada a práticas pedagógicas e de pesquisa, marca o trabalho desenvolvido, apontando para alguns dos interesses da arte nos dias atuais.

�‌Detalhes‌das‌intervenções‌realizadas‌pelos‌grafiteiros‌premiados‌no‌Museu‌de‌Arte‌Moderna‌Aloisio‌Magalhães.

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Luciana PadilhaCOORDENADORA-gERAL DO 47º Salão de arteS PláSticaS de Pernambuco

Além de imagens e textos dos grafiteiros, este Caderno traz também um olhar crítico. A pesquisadora Nicole Cosh percorre, em um texto produzido especialmente para esta publicação, as atividades e preocupações de cada ação premiada, contextualizando-as politicamente diante da história do graffiti e, em especial, da pixação e da grafitagem, que, desde os anos 1980, problematizam e recriam o Recife e seus arredores.

Desse modo, o Caderno do Prêmio de Grafitagem integra o conjunto de publicações do 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco, ao lado do Caderno de Ensaios e do Catálogo. Estando o Governo do Estado de Pernambuco atento às especificidades do graffiti, esta publicação busca ser mais um espaço de ressonância para essa prática artística, cuja densidade, há muito evidente, exige cada vez mais um olhar engajado e crítico.

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Las palabras que van caminando, en las paredes, buscan la verdad,

dicen la verdad...

lila downs, na música Perro Negro, 20081

As paredes têm dito muita coisa, há muitos anos. Inúmeros são os registros dos mais diferentes tipos de intervenção sobre as paredes, com os mais diferentes propósitos. Aqui, no entanto, abordarei um modo específico de ocupar a parede – o graffiti –, enfocando, sobretudo, as ações realizadas com o fomento do 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco.

Premiação específica e inédita neste Salão, os trabalhos sobre os quais falarei foram selecionados para o Prêmio Projetos de Intervenção em Grafitagem. Os projetos foram: Conversa de Pescador (Elaine Bomfim e Derlon Almeida, PE); Graffiti Ativo (Elvis Almeida Oliveira, RJ); Oferendas (Galo de Souza, PE); e Terra da Lua (Wagner Porto Cruz, PE). As intervenções dos artistas, é preciso também dizer, acompanhei posteriormente – e, portanto, não trato aqui dos momentos específicos das ações.

Trata-se de um olhar sobre o que os artistas comentaram acerca de suas ações e, também, sobre os registros ou vestígios que ainda existem dessas intervenções urbanas. Não vou me ater à análise dos discursos dos artistas, mas, sim, utilizar tais questões como elementos problematizadores para reflexões acerca do que as paredes podem dizer em nosso contexto. Interessa-me perceber o que dizem as paredes, como dizem e como foram entendidas, em seus diversos contextos de fala.

o que as paredes já disseram

Em meados da década de 1980, Recife começou a ser rabiscada por pixadores, que deixavam sua marca em diversos locais da cidade. Lembro-me de dois nomes que via sempre nas paredes do bairro de Campo Grande, no começo dos anos de 1990: Kranon e Kleshe. Assim assinavam em azul, com letras geometrizadas, escritas apressadamente. Várias lendas urbanas versavam sobre

sobre o que podem dizer as paredes

1 Vale comentar que Lila Downs compôs esta parte da música abordando especificamente os graffitis presentes no território mexicano de Oaxaca (onde nasceu), que contêm inúmeras imagens com críticas ao governo local e à sua repressão aos camponeses. Para saber mais sobre o graffiti em Oaxaca: NEVAER, Louis E. V. & SENDYK, Elaine. Protest graffiti: Mexico, Oaxaca; New York, NY: Mark Batty, 2009.

Nesta publicação, as palavras "graffiti" e "pixação" estão de acordo com a grafia corrente entre aqueles que atuam nessas linguagens.

Galo de SouzaOferendas�,‌2011‌Mamam

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esses nomes e até hoje não sei quem de fato eram nem o que queriam escrevendo por todo o bairro – fora se afirmarem como personagens da cidade.

Vendo Kranon e Kleshe – e eu fiquei com esses nomes gravados até hoje na cabeça –, comecei a me interessar em observar outros nomes, tentar decifrar o que diziam os “garranchos” em spray. Na década de 1990, os escritos eram mais relacionados a afirmações de identidade – nomes, siglas de grupos – escritas rapidamente. Esse tipo de assinatura era o que se mais via por aqui naquela época.

Palavras de ordem haviam saído do léxico dos escritores urbanos, uma vez que a maior ameaça – a ditadura militar – já tinha acabado. Contudo, vivemos outras ditaduras, e o que me parece é que as paredes têm sido lugar preferencial para aqueles que querem dizer algo por meio da intervenção com graffiti ou pixação. Tem sido assim há muito tempo, como observaram tão atentamente Celso Gitahy (1999) e Célia Maria Antonacci Ramos (1994).

Certa vez, Galo de Souza me contou2 que as ações realizadas por grafiteiros só aconteceram no Recife a partir dos anos 1990. Nessa década, surge o primeiro coletivo de graffiti, o Subgraff, formado por Moacir Lago, José Rodrigues, Osman Frazão e Guga Cavalcanti. Um pouco depois surgirá o Êxito D’Rua, liderado por Galo. De lá para cá, outras articulações se firmaram e novas configurações – dessa vez em crews3, ou coletivos de artistas – têm ocupado muitas paredes, seja em locais mais centrais do Recife ou em cidades do interior do Estado. O que, a meu ver, só demonstra a força que as paredes têm como lugar de exibição de ideias.

Tanta força que, de 2002 para cá, várias foram as inserções institucionais do graffiti. Fomentando a pintura de locais públicos, como no SPA das Artes Recife (2002)4, ou mesmo trazendo artistas para grafitarem paredes no interior de museus, como no Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (Mamam) em 20075, parece-me que o graffiti tem funcionado – e bem – como elemento de conexão entre as instituições museais e as camadas mais populares da sociedade. Inclusive, o 45º Salão trouxe, em 2002, o coletivo Subgraff e Galo de

2 Em pesquisa de campo acerca das relações entre graffiti e instituições museais no Recife. Para um artigo acerca dessa pesquisa, consultar: COSH, Nicole. “Pixar É Art, Correr Faz Parte” ou Quando os Corres São Outros: Breves Notas sobre Pixação, Graffiti e seus Corres nas Instituições Museais Recifenses. Revista Tatuí, n. 8, p. 48–52, 2010.

3 Coletivos de artistas do graffiti ou de b-boys ou b-girls (dançarinos/as de break).

4 A ação do Êxito D’Rua, intitulada Beco em Expansão – I Mostra de Graffiti do Recife, reuniu artistas de vários locais da cidade, além de grafiteiros de outros estados, como o paulista Binho e o goiano Kboco. Após essa ação, o SPA fomentou dois trabalhos em 2007 que traziam o graffiti em sua proposta.

5 A exposição Estética da Periferia contou com vários artistas do graffiti. Poderia citar outras ações, porém o espaço aqui é demasiado curto. Para maiores informações, consultar o artigo citado na nota 1.

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elaine bomfim e derlon almeidaConvers�a��de�Pes�cador‌(detalhe),‌2011‌Museu‌de‌Arte‌Moderna‌Aloisio‌Magalhães

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Souza como convidados. Dessa forma, parece-me que a intenção de incluir o graffiti em instituições relaciona-se à busca de museus e outras instituições culturais por diferentes públicos.

Nesta 47ª edição, o Salão de Artes Plásticas de Pernambuco optou pela inclusão da categoria específica de premiação para intervenções em graffiti. Ainda permanecem, a meu ver, dúvidas quanto a essa tipologia de prêmio – uma vez que, sendo o graffiti arte visual, seus artistas deveriam concorrer junto aos demais nas categorias Pesquisa e Produção em Artes Plásticas ou Projeto para Residência Artística no Estado de Pernambuco.

Porém, um dos méritos do prêmio para Projetos de Intervenção em Grafitagem reside justamente nesta especificidade, por permitir aos artistas que se utilizam do graffiti a oportunidade de serem fomentados por suas intervenções – muito embora as intervenções ocorram há anos sem fomento algum, o que apenas denota a força mobilizadora que o graffiti tem, como abordarei a seguir. Acredito que a inclusão de um prêmio para as intervenções em graffiti reacende o debate sobre as funções do Salão e a especificidade das ações artísticas fora das instituições e seu significado. Talvez aí esteja a relevância desse tipo de prêmio: manter a discussão ativa.

quando as paredes falam

Elaine Bomfim e Derlon Almeida propuseram ao Salão intervenções intituladas Conversa de Pescador, na Ilha de Deus, bairro da Imbiribeira, no Recife. E o que dizem os pescadores? No dizer popular, as conversas de pescador são, basicamente, constituídas de histórias que narram seus feitos nos rios ou nos mares. Um desses feitos entrou para a literatura universal contado por Ernest Hemingway em O Velho e o Mar.

Em Hemingway, trata-se de um embate de vida e morte. Na Ilha de Deus, também: entre o que a vida e a morte ali vividas significam para os artistas. Derlon e Elaine – e o rio –, permeados pelas pessoas que ali vivem. Encontro de vida e morte, para ambos – moradores e artistas –, resultando em imagens que expressam o cotidiano e o imaginário da Ilha de Deus.

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As criações de Derlon e Elaine evocam as rotinas locais e foram rapidamente ressignificadas pelas pessoas que viram as ações. Os moradores, de algum modo, participaram das pinturas, fosse vendo ou propondo, dando ideias, opinando. Eles veem algumas dessas imagens até hoje. Como também convivem com as mazelas do cotidiano sem jamais, a maioria deles, terem posto os pés em um museu.

E graffiti é assim, imediato, ocupa os lugares e as pessoas. Está ali para quem quiser ver, ou não, passa na nossa frente sem precisar de “cubo branco”6, autorização ou edital. O graffiti, por meio das ações aqui abordadas ou em várias outras, ocupa as paredes para deixar recados expressos. E o recado que as paredes da Ilha de Deus, por meio das ações de Derlon e Elaine, parecem dizer é: “Estamos aqui quer queiram, quer não”; “E aí? Vão fazer o que conosco e com o nosso rio?”. O grito está dado para quem quiser ouvir. É só ouvir as paredes.

é tempo de parar para ouvi-las

Uma das coisas que o graffiti pode dizer através das paredes é a sua capacidade de mobilização. Aqui, falarei de uma proposta de mobilização mais específica, sugerida por Elvis Almeida em Graffiti Ativo, chamando o público para intervir, tornando-o mais agente na construção das imagens na cidade.

Nessa ação, o artista propôs, inicialmente, sua vinda/estada no Recife, pois reside no Rio de Janeiro. Aqui, realizou oficinas tendo em vista promover o encontro entre diferentes comunidades através de ações em graffiti. Buscando um contato mais estreito com o Recife – cidade que não conhecia quando planejou a ação –, Elvis Almeida realizou uma espécie de exercício de alteridade ao se encontrar com artistas grafiteiros daqui e com os moradores da cidade. No caso, notadamente esse exercício foi realizado com os alunos do Ensino Médio da Escola Lubienska e com jovens frequentadores do Nascedouro de Peixinhos, a quem foi proposta a oficina.

Nesse tipo de ação o graffiti pode ser um catalisador para a expressão pessoal dos participantes. Essa expressão toma forma nas paredes por meio da proposta de oficina. Convém lembrar que esse

6 O espaço asséptico e branco do interior de museus e galerias, conforme O’DOHERTY, Brian. No Interior do Cubo Branco: a Ideologia do Espaço da Arte. Trad. Carlos S. Mendes Rosa. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

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elvis almeidaGraffiti�Ativo��(detalhe),‌2011‌Museu‌de‌Arte‌Moderna‌Aloisio‌Magalhães

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é um expediente de muito sucesso do graffiti, e oficinas têm sido realizadas por artistas com os mais diferentes propósitos. No caso de Elvis Almeida, a ideia era introduzir conceitos, imagens e técnicas relativas ao graffiti para que os participantes pudessem se expressar através dessa linguagem. Os participantes dessas ações, como moradores do Recife, já tinham passado por lugares grafitados.

Uma ação como esta sugerida por Elvis Almeida fortalece o contato entre a expressão artística e o público, tornando-o agente na construção do conhecimento em arte. Os registros das silhuetas de corpo dos participantes da oficina sugerida por Elvis estão ali no Nascedouro há dois anos. São indícios de momentos de contato entre público e arte...

Quando os participantes das oficinas vivenciaram a atividade artística, também conviviam com o outro, que é a cidade. Por mais que os moradores convivam aqui no Recife, seja das imediações do Nascedouro ou da Escola Lubienska, sempre há outros olhares possíveis sobre a cidade e vê-la por meio da intervenção sobre as paredes é uma das maneiras possíveis. E, com certeza, uma das mais ativas.

e oferecê-las para um lugar

Do mesmo modo que o graffiti pode ser um encontro de coletividades em busca de novas relações com a cidade e seu entorno, como no caso das intervenções citadas, também houve a proposta de interação pessoal. Foi o caso de Galo de Souza, com suas Oferendas.

Nessa ação, Galo buscou integrar-se a alguns terreiros do Recife para intervir em suas paredes utilizando-se do graffiti. Diferentemente de ações anteriores, nas quais o artista atuou articulando coletivos ou fortalecendo o graffiti no Estado – pensando sempre em termos de uma coletividade –, aqui Galo encontra a si mesmo e a suas concepções de sagrado.

Foi um encontro do grafiteiro com uma alteridade, no caso com os lugares sagrados onde Galo esteve: Terreiro de Mãe Amara (Dois Unidos), Terreiro de Dito de Oxossi (Alto José do Pinho), Terreiro de Pai Adão (Água Fria) e Daruê Malungo (Chão de Estrelas). Mais

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do que uma ação de graffiti, houve o contato entre o artista e a religiosidade, o sagrado permeando tudo, e a arte como suporte para falar sobre essa relação. Em algumas paredes internas dos terreiros ou em paredes externas, Galo ofereceu suas imagens a serviço do que aqueles lugares gostariam de dizer.

Deixou narradas nas paredes suas oferendas àqueles locais, imagens que faziam parte de seu processo pessoal de encontro com esses lugares. São imagens que possuem significados impregnados da experiência pessoal de contato do artista com os terreiros, mas que, certamente, possuem denotações especiais para quem as vê.

que seja para ser vista

Da mesma forma que Galo, Wagner Porto Cruz também vai a um lugar antropológico7 para deixar seus graffitis. Fora do circuito da cidade grande, onde alguns ainda podem pensar que não há graffiti, o artista propõe Terra da Lua, intervenção realizada a 20 km de Garanhuns, no Agreste pernambucano, em Timbó.

Devo comentar que, diferentemente do que se pode pensar, o graffiti não está apenas nos grandes centros urbanos. É bem verdade que começou a atrair a atenção por conta desses lugares. No entanto, há registros de intervenções em paredes de lugares públicos, em diferentes locais e épocas. Atualmente não é diferente. Por exemplo, encontrei em Petrolina, cidade do sertão pernambucano, uma série de imagens realizadas por meio do molde vazado. O coletivo C.A.I.S. (Central de Artes e Imagem Stencil) sobressai na paisagem da cidade por suas imagens realizadas com estêncil.

Na mesma Garanhuns, onde reside Wagner Porto Cruz, houve propostas, como durante o Festival de Inverno de Garanhuns (FIG), em 2003. Nessa ocasião, aconteceu também uma oficina de graffiti ocupando vários espaços da cidade. Em outras edições do FIG, grafiteiros também participaram de intervenções na cidade e, em 2008, um lambe-lambe do Coletivo Mané a Troá interveio com uma fotonovela colada em diferentes pontos da cidade.

7 Lugar de experiências antropológicas, de contato com o outro, de exercício de alteridade, conforme AUGÉ, Marc. Não-Lugares: Introdução a uma Antropologia da Supermodernidade. São Paulo: Papirus, 1994.

Wagner porto cruzTerra�da�Lua‌(detalhe),‌2011‌Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães

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Como se vê, as intervenções com graffiti estão presentes em lugares que não se espera. Poderia citar muitas outras, mas o caso é que, na intervenção de Wagner Porto Cruz, o circuito de intervenções do graffiti é ampliado, e aquela propriedade mobilizadora do graffiti também pode ser ressaltada. Trata-se de uma integração entre o artista e o grupo, em um de seus momentos específicos. Primeiramente devo aclarar que, também como Galo, Wagner propõe a intervenção em um lugar sagrado. Na comunidade quilombola de Timbó.

Acreditando na via da coletividade, Wagner propõe a interação com essa comunidade. Antes, já passou por outras em diferentes caminhos que a vida o levou. O artista já participou e propôs oficinas, ações com música, procurando a colaboração de outros artistas. Assim desenvolve sua ação em Timbó. Ali, pinta em casas cujos moradores também estão representados. É gente que permanece no mesmo lugar há muito tempo, sai, volta, como nas imagens de paus de arara feitas pelo artista. Ressalto a necessidade presente de escutar o que as paredes desgastadas daquele lugar querem dizer, para então intervir sobre elas. Para ações desse tipo, é mais do que simplesmente passar pelo lugar, mas aprender sobre o lugar e com o lugar, por meio das pessoas que ali vivem, como o fez Wagner Porto Cruz.

E graffiti para mim até agora tem sido isso. Quando as paredes falam, é tempo de parar para ouvi-las e oferecê-las para qualquer lugar que seja para ser vista. Seja no meio do mato das cercanias de Timbó ou em pleno caos urbano do Recife, as paredes podem ser ouvidas pelos artistas – para traduzirem desejos coletivos e pessoais em suas obras – e também por quem as vê – mudas, sem imagens, ou falantes, por meio do graffiti. Resta a nós abrir os olhos para as verdades que querem dizer as paredes.

Nicole Cosh

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Nicole Cosh (Recife, PE, 1981)Vive e trabalha no Recife.Mestre em antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE, 2010) e especialista em arte-educação pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap, 2008). Atua desde 2000 como arte-educadora em instituições museais, como a Fundação Joaquim Nabuco e o Instituto Ricardo Brennand. De 2008 a 2010, realizou consultoria educativa para a Fundação Roberto Marinho, em programas de formação de professores. Atualmente é professora do Ensino Médio e coordenadora do Curso de Bacharelado em Artes Visuais da Aeso/Barros Melo.

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prêmiograffiti

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Elaine Bomfim [DonaCor] (Aracaju, SE, 1980)Vive e trabalha em Aracaju.Produz graffiti desde 2000, havendo integrado os Mutirões de graffiti, as Rosas Urbanas e o Coletivo Êxito d’Rua. É também arte-educadora, artista visual, ilustradora e escritora. graduada em licenciatura em educação artística/artes plásticas pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE, 2005), cursou especialização em arte-educação (Aracaju, 2011). Desde 2011, é professora substituta do Núcleo de Artes e Design da Universidade Federal de Sergipe (UFS).http://donacor.blogspot.com/ http://elainebomfim.carbonmade.com/

Derlon Almeida (Recife, PE, 1985)Vive e trabalha em Recife.Atua como artista plástico desde a adolescência, quando inicia trabalhos com graffiti e cartazes. Ao longo da sua trajetória, aprimorou sua produção através de pesquisas, principalmente sobre pop art, cultura popular e suas iconografias. Realizou diversas exposições individuais, e esteve presente em mostras coletivas. Atualmente, trabalha com artes visuais, ilustração e cenografia. É autodidata. www.derlon.com.br

elaine bomfim e derlon almeida

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

conversa de pescador [parceria com derlon almeida]

O povo veio seguindo os peixes do litoral até chegar na Ilha...

foi gente que veio do litoral e do interior. Os outros dizem que somos pobres,

mas a gente veio seguindo os peixes, a abundância.

História‌de‌pescador

ponto de referência. A Ilha de Deus está localizada no segundo maior manguezal urbano do mundo e tem uma população que vive da pesca e coleta de crustáceos. A comunidade conta com grupos que se organizam para melhorar as condições da Ilha, preservando sua cultura de pescador. Seus moradores apresentam forte identidade com o lugar, um espaço pelo qual eles se unem e se mobilizam. A preservação ambiental é tema importante, uma vez que garante a continuidade dos moradores no local e o seu ganha-pão.

À sua identidade pesqueira também se integra a cultura urbana, devido à sua localização geográfica no Recife e ao preconceito que sofrem todas as áreas marginalizadas da cidade. As histórias trazem elementos da migração forçada, da exploração de grandes empresas, dos personagens que lutaram pela Ilha (como Dona Ceça) e das cascas dos mariscos que fizeram e fazem de aterro para as casas dos homens e das mulheres da Ilha. A população jovem local tem uma produção cultural intensa.

processuais aspectos processuais aspectos processuais aspectos imaginário. Barcos, peixes, crustáceos, sereias... companheiros dos/as pescadores/as da Ilha, alimentos do corpo e da alma, conversa divertida para quem convive diariamente com esse universo. As cores e as texturas do graffiti se destacam nas paredes de madeira e papelão ou de cimento caiado – mais até mesmo que os temas e os traços; misturam-se à decoração feita com os materiais que se tem à mão e com letreiros improvisados anunciando a venda de qualquer coisa nos fiteiros também improvisados.

in>permanência*s. A maresia, o sol, as condições físicas dos suportes utilizados para a pintura, a mudança dos moradores, o deslocamento das memórias: graffitis feitos para não durar, para irem sumindo pouco a pouco, em seu tempo, às vezes rápido

páginas 20 e 21�‌Intervenções‌dos‌grafiteiros‌premiados‌no‌Museu‌de‌Arte‌Moderna‌Aloisio‌Magalhães.‌Em‌sentido‌horário,‌Elvis‌Almeida,‌Galo,‌Wagner‌Porto‌Cruz‌e‌Derlon‌Almeida‌e‌Elaine‌Bomfim.

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

demais. Nada dura, e a única coisa que fica é ter estado lá. O resto é conversa, palavras jogadas fora.

i’m<possibilidades de abarcar todo o ambiente. O local que escolhemos para pintar é ao redor de um grande viveiro de crustáceos, as casas que circundam essa lagoa artificial. O registro fotográfico com uma máquina digital simples se torna difícil, porque o espaço de chão que temos para nos afastar da pintura é pequeno. Há graffitis por toda a Ilha, e novas pinturas se misturam com as antigas, dialogando com momentos e grafiteiros que por ali passaram em outros projetos. O brilho das cores do spray explode com o sol fortíssimo que bate na Ilha, pede cada vez mais mãos de cores, e salpicos de cores aderem naturalmente àqueles barracos, refletindo a identidade criativa de quem vive do que a natureza local oferece.

input/output.: As crianças, as mulheres, os homens, os moradores nos cercam, se aproximam, curiosos e divertidos. Querem tocar nas tintas, querem que pintem a sua casa, suas camisas, a sua pele. Querem participar, sugerir temas. Esses são os resultados da intervenção: a interação, o diálogo.

Elaine Bomfim [DonaCor]

�‌Graffiti‌que‌já‌estava‌na‌ilha‌antes‌da‌ação‌Conversa de Pescador.‌Foto:‌Vanessa‌Silva‌‌e‌Sueny‌Santos

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

elaine bomfim e derlon almeidaConvers�a��de�Pes�cador,‌2009‌Ilha‌de‌Deus‌Foto:‌Vanessa‌Silva‌‌e‌Sueny‌Santos

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Convers�a��de�Pes�cador,‌2009‌Ilha‌de‌Deus‌Foto:‌Vanessa‌Silva‌‌e‌Sueny‌Santos

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Elvis Almeida (Rio de Janeiro, RJ, 1985)Vive e trabalha no Rio de Janeiro.graduando em gravura pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Realizou cursos diversos, como administração e gestão de projetos culturais (Programa Incubadora Furnas Sociocultural, 2007), Encontros sobre História da Arte – Décadas de 1950 a 1970 (Redes Maré, Rio de Janeiro, 2010) e serigrafia (Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, 2008). Participou da Vi bienal internacional de arte Siart (La Paz, Bolívia, 2009). Recebeu, em 2011, o Prêmio Funarte interações Florestais

elvis almeida

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

Cheguei no Recife no dia 25 de setembro de 2009, com o objetivo de realizar meu projeto em quarenta dias. Mentalmente, eu possuía um cronograma e um ensaio de minhas ações. Seriam quatro oficinas sobre a técnica e um pouco da história do graffiti, oferecidas a dois grupos de jovens da cidade. Também faria algumas pinturas pelo litoral.

Fiquei alojado em um apartamento no bairro de Boa Viagem, o que me fez desistir da ideia de pintar em torno da praia logo de início. Percebi que havia planejado pinturas com base no litoral do Rio de Janeiro e que, estando no Recife, não daria certo. Então decidi que pintaria pelas ruas, sem determinar um norte. Elaine Bomfim, a DonaCor, foi a amiga que melhor me apresentou as ruas. Daí então foram Bomba do Hemetério, Mangabeira, Ilha de Deus, Lagoa do Araçá, Peixinhos, Torre, Recife Antigo, Parnamirim e tantos outros lugares dos quais não me recordo o nome das placas.

Conheci jovens no Nascedouro de Peixinhos e na Escola Lubienska e pude compartilhar a tinta com as crianças da Ilha de Deus. O aprendizado através de experiências tão distintas, porém tão próximas, foi extremamente enriquecedor para minha construção como artista e como pessoa, de modo que o maior resultado desse projeto é o meu mais sincero agradecimento.

Elvis Almeida

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elvis almeida�Pintura‌coletiva‌‌com‌Elaine‌Bomfim‌‌na‌Ilha‌de‌Deus.

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

elvis almeida�Pintura‌com‌amigos‌‌na‌Lagoa‌do‌Araçá,‌‌casa‌de‌Galo‌de‌Souza.

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prêmio de fomento para projetos de grafitagem

elvis almeida�Oficina‌de‌stencil‌oferecida‌aos‌alunos‌do‌Nascedouro‌de‌Peixinhos,‌em‌Olinda.

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elvis almeida�Oficina‌de‌pintura‌mural‌oferecida‌aos‌alunos‌de‌uma‌escola‌na‌Ilha‌de‌Deus.

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Galo de Souza (Recife, PE, 1978)Vive e trabalha no Recife.Inicia sua trajetória ainda criança, como pixador. Impulsionado pelo rap e por informações que chegavam através de revistas, músicas e filmes, realiza seus primeiros graffitis aos 16 anos. Fundou o coletivo Êxito D'Rua, colaborando com a atuação estética e social do graffiti por meio de mutirões, oficinas, revistas (como a Salve S/a), música, seminários. De suas participações em eventos, destacam-se os ii e iii Fórum Social mundial (Porto Alegre e Belém, 2003 e 2009), turnéplan – lära av Syd (Suécia, 2002), enlazando alternativas 2 e 3 (Viena e Lima, 2006 e 2008). Realizou exposições individuais no 45o Salão de artes Plásticas de Pernambuco (Recife, 2002), no mada Festival (Natal, 2005), no projeto Wholetrain (Metrorec, Recife, 2007), no projeto lado b (Museu Murillo La greca, Recife, 2008) e no Sesc-Casa Amarela (Recife, 2009), além de haver participado de mostras coletivas em diversas partes do Brasil e do mundo.www.galodesouza.blogspot.comwww.inboladarecord.com

galo de souza

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Existem muitas definições para a cultura de matrizes africanas, algumas colocadas segundo historiadores e outras contadas pelos próprios povos de matrizes africanas. As dos historiadores acabam ficando restritas ao meio acadêmico e demoram em chegar às comunidades, enquanto os povos de matrizes africanas cultuam sua origem, sua ancestralidade, através da oralidade.

As histórias que escutei me fizeram conhecer uma cultura que fala de vários povos que vieram da África e que passaram por muitas situações difíceis, que ainda hoje atravessam. Esses povos de matrizes africanas têm uma grande desvantagem diante da grade de programação de informações que é produzida pelas grandes mídias e pelos espaços comerciais, pois a eles se colocam contrários por considerarem-nos como concorrentes ideológicos, visto que um grande número de rádios, TVs, jornais e emissoras de comunicação são de grupos católicos ou evangélicos.

O Brasil, com o segundo maior número de africanos depois da África, deveria ter espaços relevantes para a cultura africana – não como imposição, mas como reconhecimento cultural e intelectual de seu povo. Uma população que não se enxerga, não se valoriza e, por conseguinte, põe em risco a continuação afetiva de sua cultura, como preservação e conhecimento, não levando para os mais novos a voz da ancestralidade e o respeito aos cultos.

Oferendas é um convite para as pessoas conhecerem melhor esses povos de matrizes africanas, transmitindo, com novos meios, suas histórias ancestrais de períodos violentos – quando homens brancos roubavam e vendiam homens negros, quando a própria Igreja não acreditava na igualdade racial e na mitologia africana. Eu descobri essas lindas histórias graças a Jorge Ben e seus cânticos. Depois, soube mais através de amigos que me contavam sobre essas matrizes e pensei em como, apesar de toda a tecnologia hoje disponível, o que me fez conhecer essas belas histórias foram as formas orais de expressão, exploradas pelos contadores de história que mantêm viva a cultura africana, dos escravos nascidos em outros continentes. Eu também descobri a beleza da África.

Galo de Souza

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Galo de SouzaSímbolo�–�Daruê�Malungo

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Dito�d’Oxos�s�i,‌2010‌Alto‌José‌do‌Pinho

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Galo de SouzaSímbolo�–�Sítio��do�Pai�Adão

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Símbolo�–�Terreiro��de�Mãe�Amara

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Wagner Porto Cruz, o Parente (Olinda, PE, 1975)Vive e trabalha na comunidade ribeirinha de Inhumas, garanhuns, PE.Através de sua mãe, costureira que fazia as mais belas colchas de retalho já vistas, foi envolvido pela arte. Aos 12 anos, começa a trabalhar pintando letreiros e, observando artífices locais, aprende serigrafia. Passa a produzir HQs e cartuns – participa de vários salões de humor e ilustra jornais no Recife. Funda o coletivo Boizinho Alinhado. Herda o tradicional Mamulengo Tomé e passa a viajar pelo País com seu “brinquedo”. É reconhecido como Mestre pela Fundação Joaquim Nabuco, que mantém importante acervo seu no Museu do Homem do Nordeste (Recife). Recebeu os prêmios rumos educação, cultura e arte (Instituto Itaú Cultural, São Paulo, 2008/2010), culturas Populares (Ministério da Cultura – MinC, 2007), capoeira Viva (MinC, 2007), entre outros. Desenvolve espetáculos de literatura oral que integram graffiti e mamulengo. Faz cordel, xilogravura e escreve para crianças.

wagner porto cruz

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[...] Na terra da lua... Eu faço uma rua de prata e metal... Vou exercitar meu

embaixador... Quarta-feira, eu dou um passeio por lá.

Na cadência do reisado, na voz rouca quase sumida de mestre Oliveira Catuaba, essa pequena peça ficou gravada em minha memória, até que a ouvi novamente através de Juarez, bisneto do samba de coco, coco que fazia tremer o Timbó nos tempos de Mãe Velha. Ele já havia abandonado o brinquedo por falta de um pandeiro e de, ao menos, um cúmplice – isso mudou quando nos conhecemos... A grande chance aconteceu quando eu, já sedento pelas paredes históricas e tão degradadas da comunidade, lancei a proposta ao 47º Salão: o renascente samba de coco teria um bom cachê; a comunidade, uma belíssima festa (20 de novembro – Consciência Negra!); e eu teria A PAREDE! Foi preciso muita criatividade pra não perder a data sagrada, não coincidente com o desembolso. Às 6h30 da manhã, no dia previsto, após meia légua de caminhada, o boneco Juazeiro – “o tampa do pandeiro”, repentista embolador – despertava a plenos pulmões. Seu quase xará e principal inspirador “guerreava”: ritmo e poesia espalhados no vento! Ao meu lado, o guerreiro grafiteiro Rivelino aprovava tudo com um grande sorriso. O andaime, é verdade, era um pouco estranho. Já sonhando com a possibilidade de uma sede para o samba de coco, dispus velhas estroncas de madeira de modo a compor uma pequenina casinha coberta de palhas, “saltando” da parede: um ponto de transição entre as imagens congeladas no graffiti e as imagens vivas – especialmente vivas nessa celebração – de verdes, amarelos, vermelhos, crianças (muitas crianças). Antigas e novas histórias desfilavam pelos sambas, pela parede. A fartura da festa a realimentava; muitas mãos pequeninas se revezavam entre zabumbas e tintas; o antigo monturo, onde estacionavam seus cavalos – e motos – os frequentadores dos barzinhos que ladeiam a pequenina escola municipal, renascia como local de festa. O grande artista mirim, autor dos mais fabulosos carros que eu já vi, Leonardo, que hoje trabalha em alguma “firma” no Sudeste, observava encantado: “– Dá uma força, Léo. / – Não, hoje eu queria só olhar... / – Que honra, pega a zabumba, então. Se o samba parar, eu paro. /

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– Deixa comigo...”. O samba não parou. Foi preciso a gambiarra, uma bela estrela de Natal reciclada pelas meninas do coco – Jamilles, Dayanne, Andréa, Filó... Mestre Fida coroou “a sede” com um de seus guerreiros corta-vento, que ajudava a espalhar no ar os versos entoados. E nesse dia muitos se encorajaram a cantar... Era tarde da noite, e resolvi dar por terminada a imagem, “mas não terminou ainda”, diziam alguns. “É bom que a gente, com mais festa, termina depois”, dizia eu, mesmo sabendo que uma ação dessas não termina nunca... No bom da festa, fui embora. De saída, uma pequenina me indaga: “Parente, posso pintar mais uma flor?”. SEMPRE, SEMPRE que você quiser...

A ação de grafitagem Terra da Lua contou com a fundamental colaboração da musicista Danielle, de minhas pequenas Ewa e Iami, dos artistas Rivelino, Suzemar, Fida, Juarez e Marconi, das merendeiras Suzana e Patrícia e de toda a comunidade-gente-boa do Timbó, em especial suas crianças.

Wagner Porto Cruz

Wagner porto cruz, o ParenteBatendo�melê‌Graffiti‌sobre‌lona‌Foto:‌Marconi‌Rodrigues

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Wagner porto cruz, o ParenteSaudação�do�cavalheiro�na�bes�ta‌(detalhe)‌Foto:‌Marconi‌Rodrigues

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Wagner porto cruz, o ParentePapagaio�cantador‌Porta‌da‌bodega‌Foto:‌Marconi‌Rodrigues

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47º salão de artes Plásticas de Pernambuco

coordenadora-Geral

Luciana Padilha

coordenadora-executiva

Rosa Melo

coordenação doS bolSiStaS

etapa I – Bebel Kastrup etapa II – Clarice Hoffmann

equipe de produção

Adah Lisboa Janaisa Cardoso gustavo Neves

produção-executiva

Cláudia Moraes (Página21)

aSSiStente de produção-executiva

Leonardo Bouças

coordenação editorial

Clarissa Diniz e Lorena Taulla

reviSão de texto

Consultexto

deSiGn de montaGem e GráFico

Luciana Calheiros e Aurélio Velho (Zoludesign)

FotoGraFiaS daS expoSiçõeS

Paulo Melo Jr.

vídeodocumentariSta

Lia Letícia

planejamento de comunicação

Dani Acioli (Aponte Comunicação)

coordenação da ação de intercambiStaS de arte-educação

Lucia Cardoso

educador núcleo de mediação

Niedja Santos

impreSSão publicaçõeS

MXM gráfica e Editora

comiSSão de premiaçãopeSquiSa e produção em arteS pláSticaS, FotoGraFia, GraFitaGem, reSidênciaS artíSticaS e vídeo-documentário

Breno Laprovítera Luisa Duarte Maria do Carmo Nino Ricardo Basbaum Rodrigo Braga

premiadoS 47º Salão de arteS pláSticaS de pernambucoFomento para projetoS de GraFitaGem

Elaine Bomfim e Derlon Almeida | conversa de pescador Elvis Almeida | Graffiti ativo galo de Souza | oferendas Wagner Porto Cruz | terra da lua

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