caderno da tv escola - deficiência auditiva

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CADERNOS DA N. 1/2000 Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escola Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escola Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escola Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escola Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escola Deficiência Auditiva Maria Cristina da F. Redondo & Josefina Martins Carvalho

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOSECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

C A D E R N O S D A

N. 1/2000

Este Caderno complementa a série de vídeos da tv escolaEste Caderno complementa a série de vídeos da tv escolaEste Caderno complementa a série de vídeos da tv escolaEste Caderno complementa a série de vídeos da tv escolaEste Caderno complementa a série de vídeos da tv escola

Deficiência AuditivaMaria Cristina da F. Redondo &Josefina Martins Carvalho

SUMÁRIO

A pessoa surda: do diagnóstico

à participação social

O bebê surdo: tornando-se independente

A criança surda: caminhos da aprendizagem

Atendimento escolar: um processo integrador

Adolescência: construção da identidade pessoal

O surdo adulto: do passado ao futuro

Bibliografia

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Presidente da República

Fernando Henrique Cardoso

Ministro da Educação

Paulo Renato Souza

Secretário de Educação a Distância

Pedro Paulo Poppovic

Secretária de Educação Especial

Marilene Ribeiro dos Santos

Secretaria de Educação a Distância

Cadernos da TV Escola

Diretor de Produção e Divulgação

José Roberto Neffa Sadek

Coordenação Geral

Vera Maria Arantes

Projeto e Execução Editorial

Elzira Arantes (texto) e Alex Furini (arte)

Capa:

Tratamento gráfico sobre reprodução de escultura de Rodin

© 2000 Secretaria de Educação a Distância/MECTiragem: 110 mil exemplares

Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou utilizada de qualquerforma ou por qualquer método, eletrônico ou mecânico, sem autorização,solicitada via carta ou fax.

Ministério da Educação

Secretaria de Educação a DistânciaEsplanada dos Ministérios, Bloco L, Sala 100 CEP 70047-900Caixa Postal 9659 – CEP 70001-970 – Brasília, DFFax: (0XX61) 410 9158 – E-mail: [email protected]: http://www.mec.gov.br/seed/tvescola

CDU 376.352

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REDONDO, Maria Cristina da Fonseca Deficiência auditiva-/ Maria Cristina da Fonseca Redondo,Josefina Martins Carvalho. – Brasília : MEC. Secretaria de Educaçãoa Distância, 2000. 64 p.: il. (Cadernos da TV Escola 1, ISSN 1518-4706)

1. Deficiência Auditiva. 2. Integração Escolar. 3. Educação Especial.

I. Título. II. Redondo, Josefina Martins Carvalho.

5Programa 1

deficiência auditiva traz muitas limitações parao desenvolvimento do indivíduo. Consideran-do que a audição é essencial para a aquisição

da linguagem falada, sua deficiência influi no relacio-namento da mãe com o filho e cria lacunas nos pro-cessos psicológicos de integração de experiências,afetando o equilíbrio e a capacidade normal de de-senvolvimento da pessoa.

Mesmo assim, ainda hoje, a sociedade conhece bempouco os portadores de deficiência. Esse desconhecimen-to se reflete por exemplo na ausência de estatísticas bra-sileiras tanto a respeito de seu número real quanto dasformas de assistência disponíveis, de sua integração so-cial e de sua inclusão no mercado de trabalho.

O retrato da ausência de informação se reflete narara presença desse assunto em noticiários, e na pe-quena oferta de serviços adequados a portadores dedeficiência – apesar de eles corresponderem a cercade 10 por cento da população de países em desenvol-vimento, como o Brasil.

No Brasil existem muitas leis voltadas para os por-tadores de deficiência, indicando a necessidade de di-ferenciação em relação aos demais cidadãos. No en-tanto, mesmo após decretadas, as leis são implanta-das de modo lento e parcial, sendo ignoradas pelamaior parte da população. Os portadores de deficiên-

A PESSOA SURDA:DO DIAGNÓSTICOÀ PARTICIPAÇÃO SOCIAL

AAAAA

[…] o homem pode construir seu mundo simbólico com os materiais

mais pobres e escassos. (Cassirer)

7A pessoa surda: do diagnóstico à participação socialPrograma 16

cia precisam sempre recorrer à legislação para reivin-dicar seus direitos de cidadão.

Como detectar aperda auditiva em uma criança?

Sempre é mais fácil descobrir a perda severa ou pro-funda do que a leve ou moderada. De qualquer for-ma, é importante que os familiares e o pediatra se-jam observadores e atentos, para detectar eventuaissinais de perturbação, desde as primeiras semanasapós o nascimento.

Se o bebê for exageradamente quieto, não virar acabeça procurando a origem de algum barulho forte– como um trovão, por exemplo – ou continuar o cho-ro, mesmo que a mãe tente acalmá-lo apenas com avoz, talvez seja o caso de se preocupar. A mãe precisacomentar isso com o pediatra, para que ele avalie anecessidade de encaminhamento a um especialista.

Quando a perda auditiva é detectada precocemen-te, o profissional se preocupa inicialmente em forne-cer informações aos pais, para que eles saibam o quefazer e, principalmente, possam acolher esse filho eaprender a lidar com a situação inesperada.

Como as pessoas ouvem?O ouvido humano possui três partes – ouvido externo,ouvido médio e ouvido interno –, sendo que cada umadesempenha funções específicas:

• Ouvido externo: é composto pelo pavilhão auricular epelo canal auditivo, que é a porta de entrada do som.Nesse canal, certas glândulas produzem cera, para pro-teger o ouvido.

• Ouvido médio: formado pela membrana timpânica epor três ossos minúsculos, que são chamados de mar-telo, bigorna e estribo, pois são parecidos com essesobjetos. Em contato com a membrana timpânica e oouvido interno, eles transmitem as vibrações sonorasque entram no ouvido externo e devem ser conduzidasaté o ouvido interno.

• Ouvido interno: nele está a cóclea, em forma de caracol,que é a parte mais importante do ouvido: é responsávelpela percepção auditiva. Os sons recebidos na cóclea sãotransformados em impulsos elétricos que caminham atéo cérebro, onde são ‘entendidos’ pela pessoa.

Qualquer tipo de problema em uma das partes do ouvidopode prejudicar a audição, em maior ou menor grau. Hádiferentes tipos de perda auditiva, conforme o local afeta-do (ouvido médio, interno etc.).

Ossículos auditivosno ouvido médio(martelo, estribo ebigorna)Canais

semicirculares

Nervo auditivo

Ouvido interno(cóclea)

Trompa deEustáquio,que leva ànasofaringe

Tímpano Canal auditivointerno

9A pessoa surda: do diagnóstico à participação socialPrograma 18

Idealmente, a surdez deve ser diagnosticada omais cedo possível, mas não é o que acontece namaior parte das vezes. Com freqüência a criança ficasem atendimento até o momento de ir para a escola.Quanto mais tempo se passa, maiores são as dificul-dades de desenvolvimento – tanto no campo da lin-guagem quanto nos níveis social, psíquico e cognitivo.

Quando há problemas, o diagnóstico precoce per-mite que a família seja orientada desde o primeiromomento, recebendo informações de profissionais(médico, psicólogo, fonoaudiólogo) e tendo apoiopara cuidar do desenvolvimento da criança.

Depois de o médico diagnosticar uma perda au-ditiva, e identificar o grau dessa perda, ele precisa en-caminhar a criança para um tratamento fonoaudioló-gico integrado, a ser feito pelo fonoaudiólogo, com aequipe que for considerada necessária. Dependendodo caso, o profissional competente indicará o uso deum aparelho auditivo.

As causas da surdez

Em muitos casos, o diagnóstico médico consegueidentificar a causa mais provável da perda auditiva,mas nem sempre isso é possível. A ocorrência de ges-tações e partos com histórico complicado, bem comoa manifestação de doenças maternas no período pró-ximo ao nascimento da criança, podem inviabilizar aidentificação dessa causa.

Por isso mesmo, em cerca de 50 por cento doscasos, a origem da deficiência auditiva é atribuída a‘causas desconhecidas’. Quando se consegue desco-brir a causa, o mais freqüente é que ela se deva adoenças hereditárias, rubéola materna e meningite.

O conhecimento da história de cada pessoa –

época em que ocorreu a surdez e grau de prejuízo;tipo de atendimento reabilitacional recebido, oral ouoral com sinais/gestos; estimulação feita para a aqui-sição da linguagem; aproveitamento dos resíduosauditivos –, bem como o trabalho com a família,auxiliando-a a aprender a lidar com a diferença dofilho, têm contribuído para que a pessoa com surdezocupe seu lugar na sociedade.

Como evitar ou prevenir a perda auditiva?• Todas as mulheres devem ser vacinadas contra a ru-

béola, que constitui uma das principais causas desurdez congênita em nosso País.

• A criança jamais deve tomar remédio sem receitamédica; um antibiótico, por exemplo, pode conteraminoglicosídeo, substância que geralmente preju-dica a audição de forma irreversível. (Corrêa, 1999)

Primeiras medidas

Inicialmente, a linguagem oral não é a mais impor-tante na comunicação de qualquer criança com suafamília; o contato depende mais da sensibilidade,que se traduz em um toque, uma expressão de feli-cidade ou de tristeza. No caso da deficiência auditi-va, os pais não devem se desesperar, mas sim apren-der como participar da educação de sua criança. Ofuturo dela vai depender muito da atuação deles, emparceria com profissionais como fonoaudiólogo eotorrinolaringologista.

Existe uma diferença significativa no desenvolvimen-to da linguagem e da comunicação de crianças que so-frem perda auditiva antes dos 2 anos de idade, em com-paração com as que ficam surdas após ter adquirido a

1 1A pessoa surda: do diagnóstico à participação socialPrograma 11 0

linguagem (por exemplo, no caso de surdez causada pormeningite, depois dos 4 anos de idade). As maiores játiveram a oportunidade de estruturar a memória auditi-va e um sistema lingüístico próprio.

Saber em que momento se instalou a surdez éfundamental para planejar as necessidades deestimulação da criança, seja qual for a idade. Mas tam-bém são necessárias outras informações, tais como:

• se a surdez se instalou antes ou depois do nas-cimento, ou durante o parto;

• se foi detectada nos primeiros anos de vida, eem que fase isso aconteceu;

• qual o grau da perda auditiva – leve, moderada,severa ou profunda;

• se a criança recebeu atendimento especializado(e foi indicada a utilização de aparelho de am-plificação sonora individual);

• como a audição foi estimulada, desde o início;

• qual a reação da família e que tipo de assistên-cia ela recebeu;

• se a surdez está ou não associada a outra defi-ciência, ou a problemas de saúde.

Há mais de uma forma de fazer a avaliaçãoaudiológica, para constatar se houve perda de audi-ção. E os graus de perda também variam bastante. Hápessoas que escutam muito pouco, sendo incapazesde ouvir um avião passando; outras conseguem ou-vir a voz humana, mas não chegam a discriminar oque está sendo dito.

Quando a criança é bem pequena, se realiza o di-agnóstico objetivo, como o Bera (Brain Stam EvocatedResponse: respostas evocadas do tronco cerebral). Esseteste permite avaliar a perda de audição por via audi-

tiva; as respostas são dadas em decibéis (medida desom, cujo símbolo é dB).

Já a criança maior pode cooperar e, nesse caso, éfeito o exame audiométrico, que identifica seu nívelmínimo de audição. Esse exame permite avaliar a audi-ção das diferentes freqüências de tons puros – do graveao agudo –, com especial atenção para a ‘zona da pala-vra’, que fica nas freqüências de 500 a 4 mil hertz (Hz).

Com base no trabalho de Roeser & Downs,Martinez (2000) propõe a seguinte classificação doslimiares de audição:

Deficiente auditivo ou surdo?

Deficiente auditivo é como se autodenominam mui-tos dos surdos adultos, principalmente aqueles queapresentam perda auditiva de leve a moderada, quenão se consideram totalmente surdos. Essa atituderesulta do processo educacional e reabilitacional aque foram submetidos, nos anos 70 e 80, época emque era dada grande ênfase ao oralismo.

Na abordagem oralista, ainda hoje adotada poralgumas instituições, a comunicação se baseia na fala:

Audição normal

Deficiência auditiva suave

Deficiência auditiva leve

Deficiência auditiva moderada

Deficiência auditiva moderadamente severa

Deficiência auditiva severa

Deficiência auditiva profunda

Limiares tonais*

0 a 15 dB

16 a 25 dB

26 a 40 dB

41 a 55 dB

56 a 70 dB

71 a 90 dB

acima de 91 dB

* Média dos limiares tonais em 500, 1.000 e 2.000 Hz.

1 3A pessoa surda: do diagnóstico à participação socialPrograma 11 2

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Audiometria tonal: perda auditiva severa noouvido esquerdo e profunda no direito

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Audiometria tonal: perda auditivaprofunda em ambos os ouvidos

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Audiometria tonal: audição normal no ouvidoesquerdo e perda leve no ouvido direito

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○Audiometria tonal: perdaauditiva moderada em ambos os ouvidos

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(vermelho) Ouvido direito(azul)X Ouvido esquerdo

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(vermelho) Ouvido direito(azul)X Ouvido esquerdo

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surdez vem obtendo oportunidades cada vez maisamplas e melhores de ser vista como um cidadãocomum e de freqüentar escolas comuns, além das clas-ses ou escolas especiais. A inclusão do portador dedeficiência no sistema escolar pode permitir que elegradualmente passe a contar com os mesmos benefí-cios oferecidos aos demais educandos.

Seja qual for o tipo de educação recebida, espe-cial ou não, o surdo não precisa apenas de escola. Éindispensável que lhe seja oferecido atendimento nosaspectos médicos relacionados com a surdez, bemcomo orientação familiar e suporte emocional, pro-curando facilitar o desenvolvimento de suaspotencialidades, levando-o a fazer escolhas e respon-sabilizar-se por elas e oferecendo-lhe as mesmasoportunidades disponíveis para as pessoas que nãosão portadoras de deficiência.

Mas a luta por sua participação social não é umaluta apenas do surdo e de seus familiares. Ao se falarem integração (ou, atualmente, em inserção), é fun-damental que a sociedade faça sua parte, usando detodos os meios para atenuar as dificuldades impos-tas pela surdez.

Receber o surdo e facilitar seu acesso a todos osespaços sociais (escola, parques, festas, empresas,teatros, cinema, museus etc.) é a contrapartida paraque exista realmente integração e participação.

Se o surdo não pode ficar esperando que a sociedadefaça tudo por ele, também não pode lutar sozinho ecompetir com os ouvintes, como se fosse ouvinte.

não se aceita a utilização de gestos ou sinais para re-presentar ou indicar coisas, objetos etc. No oralismo,os resíduos de audição servem como parâmetro paraa aquisição da fala e da linguagem, sendo associadosà leitura da expressão facial.

Entre os mais jovens, e particularmente entreaqueles que apresentam perdas auditivas severas eprofundas, existe um movimento para que assumama própria surdez. Lutam por seus direitos e buscamdivulgar a Língua de Sinais Brasileira (LSB), mostran-do que se trata de uma língua com regras próprias,como a língua portuguesa.

Os que adotam essa linha valorizam sua fala, le-vando em conta que é uma fala diferente, e valorizamtambém seu direito de usar recursos variados para secomunicar, na busca de uma melhor participação so-cial. Rejeitam o termo ‘deficiente’, que embute umconceito de déficit, e defendem uma atitude na qualseja dado valor ao indivíduo, e não à deficiência daqual ele é portador.

Para que a sociedade possa melhor conhecer as pes-soas que têm perda de audição, é importante pensarem cada indivíduo como um ser único, repleto depossibilidades.

Os recursos de comunicação adotados pelo surdo,seja ele mais ou menos oralizado, não podem serusados para caracterizá-lo como pessoa. É precisolevar em conta seu percurso de vida e a forma pelaqual seu modo de se comunicar possibilita suaintegração nos diferentes meios sociais que freqüen-ta, fazendo com que se sinta mais feliz.

No tocante à escolaridade, a pessoa portadora de

1 7Programa 2

O BEBÊ SURDO: TORNANDO-SEINDEPENDENTE

AAAAA

[…] o bebê precisa de alguém que, por um tempo, o coloque

em primeiro lugar numa lista de prioridades. (D.W. Winnicott)

ssim que nasce, e ao longo dos primeiros me-ses de vida, o bebê ainda não é capaz de esta-belecer ligações entre suas emoções e o signi-

ficado delas. Ele depende totalmente da mãe, para sercompreendido e para ser atendido em suas necessi-dades básicas.

Em sua mente adulta, a mãe elabora um significa-do simbólico daquilo que o bebê necessita. Em segui-da, ela transmite – pelo olhar, na voz, na maneiracomo o segura e o amamenta – ‘algo’ que permite tam-bém a ele construir um significado simbólico dasemoções que experimenta.

Assim, nos momentos em que o bebê vive um des-conforto, uma tensão, é a mãe que decodifica a ori-gem do problema e oferece o alívio necessário pararestabelecer o equilíbrio.

A repetição constante dessas vivências com signi-ficado é uma condição para o desenvolvimento dacapacidade de pensar – daí a importância da relaçãomãe-bebê. O conhecimento real e verdadeiro vem daexperiência com o outro.

O bebê abandonado a seu próprio entendimento,deixado a sós, certamente criará significados estra-nhos para suas vivências.

É freqüente que a surdez seja descoberta pelos paisapenas quando a criança tem 1 ou 2 anos. Isso implica

1 9O bebê surdo: tornando-se independentePrograma 21 8

aspecto a ser lembrado é que a criança surda, em seusprimeiros meses de vida, é um bebê com necessida-des peculiares, pois a ausência da audição, interferin-do na aquisição da linguagem e na maneira de conhe-cer o mundo, deixará marcas para o resto da vida.

Principalmente nos casos em que se pode suspei-tar desse tipo de quadro – como nascimento de altorisco, casos de surdez hereditária na família, casamen-tos consangüíneos, ocorrência de rubéola na gravidezou um quadro de meningite após o nascimento – éfundamental que o bebê seja encaminhado para ava-liação médica o quanto antes.

Aprender a falar

Por meio da audição, e do ambiente familiar adequa-do, a criança ouvinte aprende naturalmente o modelode sua língua, processo que ocorre em três estágios:

Linguagem receptiva: a recepção ocorre por intermé-dio da audição: a criança recebe a linguagem de seuambiente lingüístico; ao ouvir a palavra muitas ve-zes, acaba por armazená-la.

Linguagem compreensiva: a criança passa a compre-ender que a palavra ‘papai’ se refere a determinadapessoa (relaciona significante e significado).

Linguagem expressiva: a criança emite a palavra ‘papai’,quando já possui a segurança de seu significado.

Ninguém nasce falando. Esses estágios fazem parteda natureza humana e se sucedem em um espaçomínimo de um ano após o nascimento, quando acriança passa a emitir as primeiras palavras.

Nos primeiros meses de vida, a criança não precisa daaudição para falar. É a fase de balbucio (primeiro estágioda linguagem expressiva), na qual ela emite sons

uma dificuldade maior na transmissão de significados sim-bólicos às experiências do bebê. Um exemplo: o bebê cho-ra, e a mãe procura acalmá-lo conversando com ele – semque ela saiba, sua voz não chega até ele para tranqüilizá-lo, acalmá-lo e marcar a presença materna. Somente ao vê-la ele pode se assegurar de sua proximidade.

À medida que se repetem experiências desse tipo,o bebê pode desenvolver sentimentos de inseguran-ça e abandono, o que talvez traga como conseqüên-cia uma auto-estima rebaixada.

Por outro lado, quando descobre a surdez do fi-lho, a grande maioria das mães passa a usar menos avoz para se comunicar com ele. Outras diminuem suasfalas diretas com o filho, ou até deixam de se utilizarda palavra. Todos caem no silêncio.

As atitudes maternas de acentuado desalento ou desuperproteção podem ser compreensíveis, mas nãoservem para incentivar o desenvolvimento da criança.

Os pais (e, principalmente, a mãe, pois ela tem con-tato mais intenso e freqüente com o bebê) devem com-preender que há muitas formas de comunicação com obebê, além da linguagem oral: toques, sorrisos, carinhos.Todas essas linguagens devem ser utilizadas no tratocom o bebê, inclusive a oral. Deve-se falar sempre defrente para a criança, olhando para ela, permitindo queela perceba a existência dessa forma de comunicação.

O diagnóstico precoce

É de grande importância que a surdez seja diagnosti-cada o mais cedo possível. E que, assim que for cons-tatada, se inicie o atendimento especializado, que nãose resume ao trabalho com a criança — deve incluirtambém os pais.

No trabalho de estimulação precoce, o primeiro

2 1O bebê surdo: tornando-se independentePrograma 22 0

pelos familiares, ignorando a compreensiva, invisível masdedutível? Pensamos que, desde os primeiros choros einterações com a mãe, a linguagem começa a despontarcomo um todo. (Solange Issler, in Corrêa, 1999, pp. 23-24)

O aparelho auditivo

Em alguns casos, o exame audiométrico indica a pos-sibilidade de adoção de um aparelho de amplificaçãosonora individual (A.A.S.I.). Trata-se de um equipamen-to pequeno, colocado junto ao ouvido da criança, queamplia a intensidade dos sons e os traz para um nívelconfortável para quem precisa usá-lo. Atualmente, háaparelhos com alto nível de sofisticação, que ampliamo som de maneira cada vez mais seletiva. Por exem-plo, nos momentos de comunicação, os sons da fala têm‘prioridade’ sobre os ruídos ambientais.

Os benefícios advindos do uso do aparelho audi-tivo não são percebidos de imediato; é necessário umperíodo de aprendizagem e de adequação auditivaque, às vezes, desanima a criança e seus familiares.

Mas os pais precisam entender o que esse aparelhopode representar para o filho, os benefícios que podetrazer e suas limitações. O uso do aparelho pode sercomparado com o dos óculos, para quem tem deficiên-cias de visão, embora neste último caso a aceitação sejamais fácil, pois o resultado – ver melhor – é imediato.

O aparelho de surdez costuma gerar grandes ex-pectativas, como se fosse capaz de realizar milagres.Muitos pais imaginam que, a partir do uso do apare-lho, seu filho deixará de ser surdo e se transformaráem ouvinte. Mas não é assim.

Para saber quando a criança vai aprender a perceberos sons com o aparelho auditivo, deve-se levar em contaa perda auditiva e, mais ainda, a estimulação recebida.

inarticulados de sensação de prazer e desprazer. É como seestivesse treinando a emissão de sons, sem perceber o queestá fazendo – não precisa da audição, para essa atividade.

O bebê com perda auditiva interrompe o balbu-cio devido à falta de audição normal; não escuta ospróprios sons, e assim seu desenvolvimento lingüís-tico não tem estímulos.

Apoio e orientação à famíliaIdentificada a surdez, o primeiro passo consiste emdar apoio à família e orientá-la em relação às neces-sidades de seu bebê. A estimulação precoce realizadano ambiente doméstico, aliada ao trabalho educacio-nal de profissionais, permitirá que a criança adquiracondições de se comunicar da melhor forma possível,situando-se de modo adequado na sociedade.

No trabalho com os pais, não basta orientá-los emrelação à melhor forma de estimular a audição dosfilhos. Eles precisam ter a oportunidade de manifes-tar suas preocupações e receber esclarecimentos su-ficientes para que se sintam mais seguros. É impor-tante que possam falar de suas angústias por ter umfilho diferente do esperado.

Os pais precisam aprender a escutar os sons emi-tidos pelo bebê, sabendo que eles contêm significa-dos, ou seja, constituem uma linguagem. Essa atitudeequivale à da mãe da criança ouvinte: quando o bebêemite ‘pá’, a mãe dá um sentido ao som, completandoa palavra de acordo com o que entendeu – ‘papai’,‘papa’, ‘você quer comer’ etc.

As crianças adquirem a linguagem, obviamente. A questãoagora é a que tipo de linguagem nos referimos quando di-zemos que só aos 24 meses a criança ‘tem’ linguagem.Referimo-nos à linguagem expressiva, ouvida e percebida

2 3O bebê surdo: tornando-se independentePrograma 22 2

res, que precisam valorizar tais manifestações comouma forma de comunicação e mostrar compreensão.A criança não vai desenvolver a linguagem oral es-pontaneamente, sem estímulos.

Com o início da escolaridade em creches e insti-tuições de educação infantil – comum, ou especial –a criança começa a partilhar com outras as brincadei-ras, as conversas e a atenção do professor.

Para que possa expressar seus desejos e suas neces-sidades, utilizando gestos e/ou sons, a criança surdadeve ser exposta a uma linguagem compreensívelpara ela, como contribuição a sua socialização.

Os pais e professores precisam colaborar para quea criança com deficiência auditiva se comunique comos colegas e com outros adultos. Para isso, é impor-tante deixar claro quais são suas limitações e quaissuas possibilidades.

O desafio do trabalho precoce com a criança sur-da está em criar situações de comunicação que favo-reçam sua expressão e sua interação contínua com aspessoas, utilizando-se do olhar, dos gestos, dos sinais,da linguagem oral etc.

Toda criança adquire a linguagem naturalmente,por meio da interação; a fala é uma das manifesta-ções da linguagem, tal como os sinais, os gestos e aescrita – são formas de estabelecer a comunicação epossibilitar a representação do pensamento.

O atendimento precoce à família e à criança per-mite diminuir as dificuldades dos pais em aceitar seufilho diferente, ajudando-os a ter uma visão mais re-alista e positiva das verdadeiras possibilidades dedesenvolvimento de seu filho surdo.

O desenvolvimento auditivo não acontece logo apósa colocação e o uso do aparelho. Depende de um pro-cesso, que vai ocorrendo com o passar do tempo: ospais e profissionais não podem desanimar.

Quando os pais não têm oportunidade de discutirsuas expectativas e de receber esclarecimentos, às ve-zes se cria uma sensação de decepção e frustração. Eesses sentimentos trazem grandes prejuízos ao desen-volvimento emocional, cognitivo e social da criança.Há crianças que passam a não querer usar o apare-lho, ao perceber que essa sua diferença traz sofrimen-to para os pais.

Algumas famílias deixam às vezes de colocar oaparelho na criança pelos mais diversos motivos:porque ela acordou chorando, porque a babá nãochegou… ou seja, há sempre uma desculpa para nãoutilizá-lo. Há casos em que o aparelho fica mais tem-po na gaveta do que no ouvido da criança.

Não é suficiente usar o aparelho auditivo durantealgumas horas por dia. Ele precisa ser colocado aoacordar e só pode ser retirado para tomar banho epara dormir. Seu uso é tão importante quanto o hábi-to de se alimentar.

O aprendizado do convívio

A partir de 2 a 3 anos toda criança, mesmo que sejasurda, busca conhecer o mundo, se torna cada vezmais consciente de si mesma como pessoa, no conví-vio com outras crianças e com adultos.

Para a criança surda o contato é feito por meio desinais espontâneos e expressões faciais, cujo signifi-cado deve ser compreendido pelos pais e professo-

2 5Programa 3

A CRIANÇA SURDA:CAMINHOS DA APRENDIZAGEM

OOOOO

[…] Agora que eu tenho 6 anos, sou o mais

esperto dos espertos. Então, acho que vou

continuar com 6 anos pra sempre. (A.A. Milne)

objetivo central da educação infantil é favorecero desenvolvimento físico, motor, emocional,cognitivo e social de todas as crianças – ouvin-

tes ou surdas. As experiências e os conhecimentos sãopromovidos e ampliados, por meio de jogos e brinca-deiras, bem como do convívio com outras crianças eoutros adultos, fora do ambiente doméstico.

A socialização, que se inicia antes dos 3 anos, vaise consolidando entre os 4 e os 6 anos de idade. Acriança escolhe com quem quer brincar e conversar,de quem quer ser amiga.

A educação da criança surda em fase de socializa-ção precisa se adequar a suas características pesso-ais. A observação de suas respostas aos primeirosatendimentos escolares e clínicos (estimulação audi-tiva, socialização etc.), serve para indicar o caminhoa seguir: optar pelo ensino especializado (escola eclasse especial), ou pelo ensino comum.

Cada criança deve receber atendimento de acordo comsua realidade e suas condições, para vivenciar e ex-plorar ao máximo suas potencialidades.

Algumas crianças surdas têm possibilidade deadquirir e desenvolver a linguagem oral, utilizando afala para se comunicar. Outras, por características pes-

2 7A criança surda: caminhos da aprendizagemPrograma 32 6

leitura da escrita, enfim, tudo aquilo que sirva de meiopara ajudar a desenvolver o vocabulário, linguagem econceito de idéias entre o indivíduo surdo e o outro”.(Marta Ciccone, in Corrêa, p. 22)

Bilingüismo: essa abordagem pretende que ambas aslínguas – os sinais (LSB, a Língua de Sinais Brasileira)e a oral (português) – sejam ensinadas e usadas semque uma interfira/prejudique a outra. Elas se desti-nariam a situações diferentes.

A comunicação com a criança surda

Muitas vezes os pais, professores e outros adultostomam atitudes inadequadas em relação a criançascom perda auditiva, ignorando suas reais limitações.Por exemplo:

• Com freqüência tratam a pessoa com deficiênciaauditiva como se ela fosse incapaz de compreen-der. Falam de maneira pouco natural, apenas comgestos; se usam palavras, falam ‘como índio’, semartigos ou frases completas, utilizando apenaspalavras soltas, como se o outro fosse incapaz deentender as formulações completas.

• Não conseguem agir com naturalidade. Não infor-mam, por exemplo, o que está acontecendo: a mãesai sem dizer onde está indo, como se a criançanão pudesse participar da vida em comum.

• Ao conversar, viram o rosto para outro interlocutor,de modo que a criança não perceba o que estásendo falado. Além de ser uma falta de respeito,diminui a auto-estima da criança.

• Alguns pais enfatizam a deficiência auditiva, es-quecendo que a criança tem um potencial a de-senvolver. Já outros cobram excessivamente dosfilhos, achando que devem compensar a defi-

soais e também em decorrência do ambiente familiarem que cresceram, apresentam linguagem oral míni-ma, que deve ser complementada com outras formasde comunicação (escrita e por sinais).

A criança também pode desenvolver a leitura oro-facial, isto é a leitura labial e a fisionômica, capaci-dade de ler os lábios e a expressão facial de quem fala.Mesmo quando usam um aparelho auditivo adequa-do, os deficientes auditivos em geral fazem também aleitura labial, para compreender melhor a fala dooutro. A leitura labial é uma capacidade inata em to-das as pessoas, mas apenas aquelas que têm perdaauditiva desenvolvem tal habilidade.

Métodos de treinamento

Há vários métodos para o desenvolvimento da lingua-gem de deficientes auditivos empregados no Brasil:

Método oral unissensorial: usa apenas a pista auditi-va. Por meio do aparelho auditivo, integra a audiçãoà personalidade da criança com perda auditiva; nãoenfatiza a leitura labial, nem utiliza a língua de sinais.Exemplos: método Pollack e método Perdoncini.

Método oral multissensorial: usa todos os sentidos:audição com apoio de aparelhos auditivos, visão comapoio da leitura labial, tato etc.; também não utiliza alíngua de sinais. Exemplos: método áudio + visual delinguagem.

Método de comunicação total: “É uma filosofia, nãosimplesmente um outro método, cuja premissa básica éutilizar tudo o que seja necessário para o indivíduo comdeficiência auditiva como meio de comunicação:oralização, prótese auditiva, gestos naturais, linguagemde sinais, expressão facial, alfabeto digital, leitura labial,

2 9A criança surda: caminhos da aprendizagemPrograma 32 8

teúdo que queremos transmitir a ela. Toda situação éboa para falarmos de assuntos variados, de coisas quepodem acontecer ou aconteceram.

Por exemplo: quando a criança come, se lava, seveste, ou passeia pela rua se oferecem ótimas oca-siões para falar com ela a respeito das coisas que estávendo, de como as pessoas estão agindo, das sensa-ções dela e das nossas.

É indispensável interagir com a criança surda a cadamomento, utilizando perguntas e respostas que vãose tornando conhecidas e que ela vai aprendendo.

A partir dessas situações espontâneas de relacio-namento, o professor e os pais podem realizar ativi-dades e brincadeiras que estimulem a interação coma criança, mantendo sua atenção e ajudando-a a seexpressar a partir de gestos, sinais, atitudes corporaise linguagem oral.

Pela repetição das palavras e pela vivência no dia-a-dia, as crianças aprendem a compreender uma lín-gua e a usá-la. Isso vale tanto para as crianças ouvin-tes quanto para aquelas com perda auditiva. No en-tanto, as que têm perda auditiva precisam de maisestímulos, de mais repetições e de mais vivências. Apartir do momento em que a criança surda percebeque cada coisa ou pessoa tem um nome, seu progres-so se torna mais rápido.

O jogo, o brincar de faz-de-conta e o relato de his-tórias infantis são experiências que permitem ampliarseu âmbito de informações e ajudá-la a buscar, a pe-dir, a fazer perguntas, enriquecendo cada vez mais suacomunicação.

Qualquer situação corriqueira, em particular quan-

ciência com atitudes perfeccionistas. Ambos osextremos são prejudiciais.

O desenvolvimento da linguagem

A escola, comum ou especializada, deve preparar acriança surda para a vida em sociedade, oferecendo-lhe condições de aprender um código de comunica-ção que permita seu ingresso na realidade sociocul-tural, com efetiva participação na sociedade.

O trabalho de linguagem, tanto em língua portu-guesa (oral) quanto na Língua de Sinais Brasileira(LSB), é desenvolvido de forma a dar à criança surdaum instrumento lingüístico que a torne capaz de secomunicar.

Os principais recursos utilizados nesse trabalho sãoatividades de imitação, jogos, desenhos, dramatizações,brincadeiras de faz-de-conta, histórias infantis etc. Taisatividades possibilitam, ao mesmo tempo, a aquisiçãode linguagem e a aprendizagem de conceitos e regrasde um código de comunicação, aspectos importantíssi-mos para o processo de integração escolar.

A criança surda adquire sua linguagem ao relacio-nar a experiência que está vivendo com a verbalizaçãoe/ou os sinais que ela observa em outra pessoa (co-legas, pais, professores etc.), bem como ao relacionaro que está sendo falado pelo outro com suas própriasexperiências e também ao comunicar seus pensamen-tos e experiências de forma oral, escrita ou com sinais.

Para Piaget, a linguagem é um sistema para repre-sentar a realidade. É ela que torna possível a comu-nicação entre os indivíduos, a transmissão de infor-mações e a troca de experiências.

A situação comunicativa em um contexto espon-tâneo ajuda a criança a compreender melhor o con-

3 1A criança surda: caminhos da aprendizagemPrograma 33 0

meta. É fundamental conversar com os pais a respei-to desses objetivos e adequar o programa, de manei-ra a permitir que a família colabore, aproveitando oscontextos naturais e cotidianos para estimular a lin-guagem do filho.

A intervenção do professor no campo da comuni-cação e da linguagem com a criança surda pequena nãopode partir de programas rígidos quanto ao conteúdo– como por exemplo listas preestabelecidas de pala-vras. Sempre devemos ter presente o interesse de cadacriança, ‘conversando’ com ela sobre o que vivenciouem casa, com os colegas ou com outros adultos.

Precisamos abordar o desenvolvimento da lingua-gem de uma criança surda em toda sua variedade eem todas suas possibilidades, dando um papel signi-ficativo às funções comunicativas que ela realiza comsuas próprias expressões e ao vínculo comunicativoque ela estabelece com o outro (adulto ou criança).

Para a criança, não é importante apenas ‘falar algo’,mas ser capaz de utilizar a linguagem para transmitirdiferentes intenções, como pedir, afirmar, perguntar etc.

Devemos ainda evitar transmitir apenas o nomedos objetos, procurando sempre mencionar outrosaspectos importantes que suscitem a curiosidade dacriança, levando-a a perguntar (por quê? para quê? oque é?) e a expressar seus sentimentos (eu quero, eunão quero, eu gosto). Isso permitirá estabelecer umacomunicação mais completa, natural e próxima à dacriança ouvinte, sem se limitar à mera nomeação ver-bal de objetos.

É importante utilizar os mais variados recursos decomunicação: além da linguagem oral, recorrer semrestrições aos gestos, às expressões faciais e corporaise a um sistema estruturado de sinais.

do vinculada às idéias e aos interesses da criançasurda, pode ser útil para estimular e desenvolver seuprocesso de comunicação. Por exemplo: se ela gostade carros, de motos, ou de bonecas, seu brinquedopredileto pode servir de motivação para a aprendiza-gem. Ela irá se interessar por saber seus nomes, re-produzir o ruído que fazem, sentir as vibrações dosveículos que passam pela rua, observar as cores dasdiferentes motos, ou reproduzir com suas bonecas ocuidado materno, dando nome aos sentimentos – ‘eugosto’, ‘eu choro’, ‘eu estou triste’, ‘eu estou alegre’ etc.

A compreensão e a realização de uma tarefa exi-gem da criança surda um grande esforço de atenção.Por isso, é compreensível que ela não goste de fazerexercícios de articulação durante muito tempo. O ide-al é apresentar esses exercícios disfarçados, na formade jogos e brincadeiras.

É conveniente aproveitar situações lúdicas parafavorecer a aquisição lingüística. Mas não se podeesquecer que essa estimulação não tem por objetivocriar um ouvinte falante, suprimindo ou ignorando ascaracterísticas peculiares da criança surda.

Levar em conta as potencialidades e limitações dacriança surda permite que ela manifeste sua espon-taneidade e suas diferenças. Diferenças que não a tor-nam um ser inferior ou menos capaz, mas apenas di-ferente – como todo ser humano.

O papel do professor

O trabalho do professor deve estar marcado pelosobjetivos que ele pretende alcançar na área da lingua-gem e por um programa concreto para cumprir essa

3 3Programa 4

ATENDIMENTO ESCOLAR:UM PROCESSO INTEGRADOR

PPPPP

Deixe uma criança comigo até os 7 anos, e então qualquer

pessoa poderá cuidar dela. (Inácio de Loyola)

artindo do princípio de que a educação é umdireito de todos, o atendimento educacional àspessoas com necessidades especiais, em am-

biente escolar comum ou em grupos especializados,está assegurado na Constituição Brasileira.

Ações como a proposta no capítulo V – “A educa-ção especial” – da Lei de Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional (LDB 9.394/96), vêm demonstrando aabertura do processo de atendimento educacional ea garantia de introduzir nele inovações, objetivandoassegurar maiores possibilidades de integração doportador de deficiência à sociedade.

Nessa nova visão, a inclusão social passa a ser vistacomo um processo de adaptação da sociedade, que in-clui as pessoas com necessidades especiais em todos osambientes sociais. Isso torna possível que, ao mesmotempo, essas pessoas se preparem para assumir seu lu-gar na sociedade, e para desempenhar os papéis ade-quados a cada situação (Ver Sassaki, 1997, p. 41).

A inclusão da criança com surdez na escola regularrequer uma boa preparação tanto do aluno quanto daescola, para que ambos se sintam capacitados a par-ticipar dessa integração.

Para pedagogos como Frazão de Sousa (1999, pp.65-68), a inclusão no ambiente escolar consiste em:

3 5Atendimento escolar: um processo integradorPrograma 43 4

• possibilitar à criança um desenvolvimento den-tro de seus limites pessoais, e não de padrõesimpostos socialmente;

• acreditar que a criança portadora de necessida-des especiais é capaz de uma aprendizagem ricae construtiva.

As crianças portadoras de necessidades educacionaisespeciais, que outrora iam para escolas especializadas,têm atualmente direito de ser matriculadas em qual-quer escola da rede regular. Essa mudança gerou umintercâmbio de experiências, de profissionais e dematerial, provocando a aproximação dos dois sistemaseducacionais: o especial e o regular.

A integração, verbalizada como a melhor práticano processo de educação de crianças portadoras denecessidades especiais, implica reciprocidade. Mas oprocesso pedagógico baseado na integração deve sergradual e dinâmico, adequado às necessidades decada indivíduo.

Na verdade, a integração efetiva implica umamudança total de atitude. Implica desmistificar aquestão do convívio e da educação da criança porta-dora de necessidades especiais e, para isso, é da má-xima importância o papel dos profissionais e espe-cialistas.

Quando o professor recebe em sua classe (de ou-vintes) um aluno surdo, é freqüente que sua primeirareação seja pensar: Como vou falar com esse aluno?Não sou especialista! Como posso assisti-lo?

Não se pode ‘jogar’ a criança surda em uma esco-la ou em uma classe comum, alegando a necessidadede ‘inseri-la’ na escola regular; isso corresponderia aignorar sua necessidade de ter um atendimento cui-dadoso, capaz de possibilitar o desenvolvimento de

todo seu potencial de comunicação.Antigamente, a criança surda freqüentava a esco-

la comum e se convertia em uma ‘grande copiadora’;mas essa atitude não pode servir de exemplo para asnovas vivências.

Integração à escola

Na proposta atual, mais inclusiva, a criança com sur-dez participa do sistema educacional, não está foradele. É esperado que ela, bem como os professores etoda a escola, conte com dispositivos que auxiliem seupleno desenvolvimento escolar, sem sacrifícios.

No entanto, a inclusão na escola comum deveconstituir um processo gradativo, que respeite as di-ferentes necessidades e interesses de cada criança.Antes de tudo, é necessário verificar se ela está pre-parada para freqüentar uma classe comum, na qual asdiferenças (principalmente as que se referem à lingua-gem) serão evidenciadas pela comparação com oscolegas ouvintes.

A integração da criança com surdez em classe comumda escola regular terá mais chances de sucesso se forgradativa e resultar de um estudo de cada caso, indi-vidualmente.

A família precisa fornecer aos professores os da-dos necessários para que eles entendam melhor tudoque a falta de audição pode acarretar e possam pre-ver o tipo de reação da criança no ambiente escolar.Esses dados incluem parecer médico, resultados dasavaliações audiológicas periódicas, informações dafonoaudióloga etc.

Como condição para participar de uma classe co-

3 7Atendimento escolar: um processo integradorPrograma 43 6

mum, o aluno surdo precisa ter adquirido um nívelde linguagem (incluindo um bom vocabulário) sufi-ciente para permitir um diálogo, mesmo que simples,com professores e colegas, além de certo domínio deleitura e escrita. Só assim ele poderá expressar seuspensamentos e sentimentos, e conseguir compreen-der e aplicar os conceitos utilizados nas diferentesdisciplinas.

A escola comum, por sua vez, também precisa dis-por de recursos que tornem viável o processo de in-clusão, como por exemplo:

• assessoria em relação à língua de sinais, se acriança tiver linguagem oral restrita, e às estra-tégias adequadas para propiciar o diálogo, nalinguagem oral e/ou escrita.

• material concreto e visual que sirva de apoiopara garantir a assimilação de conceitos novos.

• contato com professores que tenham vivenciadosituações semelhantes.

• orientação de professores de educação espe-cial – itinerantes ou de salas de recursos. Po-dem ser feitas reuniões para trocar experiên-cias, discutir diferentes enfoques do conteúdoe esclarecer dúvidas a respeito dos planos deatuação e de avaliação.

O processo de aprendizagem

Em todos os níveis escolares (infantil, fundamental,médio e superior), e principalmente quando o alunoapresenta perda auditiva severa ou profunda, é neces-sário levar em conta, tanto para o atendimento escolarcomum quanto para o especializado, que existe um su-jeito que precisa se desenvolver, aprender o conteúdo

programático escolar e adquirir conhecimento do mun-do e de si mesmo (social/escolar/psíquico).

O que caracteriza o aluno (surdo ou não) é sua capa-cidade de aprendizagem, e não a deficiência queapresenta. Existe um sujeito com potencial, no qualse deve investir.

Conforme expõe Marques (1999, p. 38) , o obstá-culo sensorial cria situações comunicativas específi-cas para o surdo, sem impedi-lo de adquirir uma lin-guagem e desenvolver sua capacidade de representa-ção. Os mecanismos mentais envolvidos nesse proces-so também não são os mesmos da pessoa ouvinte; porisso, tornam-se responsáveis pela construção de es-quemas de pensamento e de estratégias intelectuaisque dependem da natureza do desenvolvimentolinguístico-cognitivo de cada um.

Tanto no ensino comum quanto no especializadoo aluno precisa se sentir envolvido no processo deaprendizagem, participar de fato e ser capaz de fazerescolhas com responsabilidade, programando-se parao futuro.

O conteúdo curricular a ser desenvolvido peloprofessor de escola comum é exatamente o mesmotrabalhado com os alunos ouvintes, com base nosParâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). E o mes-mo ocorre com a metodologia de ensino.

O uso de materiais variados (jornais, revistas, pro-pagandas, noticiários de TV, computadores etc.) con-tribui para motivar os alunos, mantê-los atualizadosem relação aos acontecimentos do mundo e dar-lhesuma visão ampla dos conhecimentos.

Todos os alunos serão beneficiados se o profes-

3 9Atendimento escolar: um processo integradorPrograma 43 8

sor proporcionar atividades a partir de centros deinteresse, integrando diferentes disciplinas.

Uma sugestão interessante de um trabalho dessetipo consiste em planejar um estudo do bairro. Osprofessores de Matemática e de Estudos sociais po-dem discutir e trabalhar juntos, organizando váriasatividades relacionadas com o assunto, como: locali-zar bairros diferentes (em relação à escola ou à resi-dência), calcular distâncias, enumerar locais comer-ciais, hospitais, fábricas etc. Trata-se de uma ativida-de que pode ser desenvolvida satisfatoriamente tan-to pelos alunos surdos quanto pelos ouvintes.

O principal papel do professor consiste em pro-mover a compreensão das informações para todos osalunos. As propostas dos Parâmetros curriculares na-cionais e o próprio conteúdo curricular favorecem aintegração, pois se baseiam na interação dos alunosentre si ao longo das atividades – no grupo, na clas-se, na escola e na comunidade.

Faz parte do processo educacional aprender a respei-tar as diferenças e a exercer atividades solidárias.

O processo de integração

Integrar pressupõe o encontro de diversidades, quersejam pessoas, idéias, ou culturas. Ora, para que odiferente seja identificado como tal, é preciso que hajaum padrão considerado ‘normal’. Que padrão é esse?

Para a pedagoga Frazão de Sousa (1999, p. 69),considera-se como normalidade a capacidade de cadaum, dentro de suas possibilidades, ser produtivo paraa sociedade em que vive, demonstrando talento, ap-tidão, e inteligência em relação a determinados aspec-

tos humanos e sociais. A construção da subjetividadeocorre no contato com uma pluralidade de existênci-as. Portanto, a proposta de integração não permiteapenas o acesso democrático; a ‘troca’ de experiênciaspromove desafios que interferem tanto no comporta-mento acadêmico quanto no social.

O envolvimento da família é fundamental para aintegração do aluno surdo na escola ou na classe comum.Participando do processo escolar, os pais acompanhamo desenvolvimento de seu filho e colaboram para que elese entrose e se sinta valorizado pessoalmente.

À medida que se integra, a criança se torna maisparticipativa e consegue cursar o ensino fundamen-tal sem que ocorra muita defasagem em relação aosalunos ouvintes.

Ao primeiro indício de descompasso da criança surdaem relação à média da classe, o professor deve buscar for-mas de atenuar as dificuldades (indicar a procura de refor-ço escolar, orientação da psicóloga ou da coordenação).

A avaliação contínua permite ponderar se é o caso demanter a criança na escola comum, ou se seria me-lhor que ela freqüentasse um ensino especializado.

Se não existir entrosamento da família e da crian-ça surda com a escola e com o professor do ensinoregular, o risco de fracasso é grande, principalmentepara o surdo. As conquistas serão lentas e os resulta-dos exigirão muito sacrifício (para ambos os lados).No final, podem ser levantadas questões do tipo: Va-leu a pena? Será que este aluno está aprendendo? O ‘fa-lar bem’ significa uma aprendizagem efetiva?

Na visão inclusiva, que depende do compromis-so de todos, a criança com perda auditiva deve ser

4 1Atendimento escolar: um processo integradorPrograma 44 0

idéias, seus pensamentos e sentimentos. Em termoseducacionais, o profissional deveria enfatizar apenasa pista auditiva (abordagem unissensorial), ou recor-rer à leitura oro-facial, a gestos, à pista auditiva e àescrita, tendo sempre como apoio a fala (abordagemmultissensorial).

Na verdade, poucos conseguiam bom desempe-nho na linguagem oral – em geral, isso era possívelapenas para aqueles que podiam contar com atendi-mento especializado de outros profissionais, o quenão faz parte da realidade da maioria da populaçãobrasileira.

Em função dos resultados obtidos no oralismo e daspesquisas que reconhecem a língua de sinais como lín-gua, os sinais começaram a ser adotados na educaçãodos surdos na forma sintática da língua portuguesa, nométodo denominado Comunicação Total.

A Comunicação Total é uma filosofia segundo a qualos surdos devem ter acesso a todas as modalidades decomunicação disponíveis, escolhendo aquela, ou aque-las, que atende melhor a suas necessidades:

• fala;

• escrita;

• pista auditiva: aproveitamento dos resíduos deaudição, por meio de aparelhos de amplificaçãosonora;

• leitura oro-facial: leitura dos movimentos doslábios e dos músculos do rosto;

• expressão corporal;

• sinais: movimentos com as mãos representandoidéias, usados por comunidades de surdos;

• alfabeto digital: movimentos com as mãos querepresentam as letras de nosso alfabeto.

acolhida dentro de uma proposta globalizadora, quevalorize a escolaridade, os hábitos e as atitudes pre-paratórios para a vida adulta e que possibilite ao alu-no se tornar responsável pelo próprio processo esco-lar e consciente de seus direitos (que são os mesmosdos ouvintes). Também os aspectos cognitivos, emo-cionais e afetivos devem ser considerados.

As escolas vêm buscando adotar métodos e técnicasque propiciem ao aluno com surdez a aquisição ne-cessária de conhecimentos e habilidades, bem comoa formação de valores que o identifiquem como pes-soa única e como parte integrante da sociedade.

Não existe uma metodologia única, específica paraa educação de surdos, mas são necessárias adaptaçõescurriculares para atender às especifidades da cliente-la, seja na escola especial ou na regular. Os educado-res devem considerar, além da metodologia, as neces-sidades específicas dos alunos, com o objetivo de fa-vorecer sua adaptação e sua integração.

A educação especial

Ao longo do tempo, a educação especial tem adotadodiferentes abordagens para atender às necessidadesdas pessoas com surdez e instrumentalizá-las paraatuar socialmente.

No entanto, apesar da posição individual dos pro-fissionais, os pais das crianças surdas devem ser in-formados e orientados em relação às vantagens e li-mitações de cada uma das diferentes abordagens, paraque eles possam participar da decisão.

Até recentemente, acreditava-se que o surdo de-via fazer uso exclusivo da fala para transmitir suas

4 3Atendimento escolar: um processo integradorPrograma 44 2

Os sinais são extraídos da Língua de Sinais Brasilei-ra: o professor, ao ler um texto, se expressa em sinais.A língua de sinais não segue a mesma organização dalíngua portuguesa, pois não possui a mesma sintaxe,nem as mesmas regras gramaticais. Por exemplo:

A reivindicação dos surdos para ter assegurado odireito de usar a língua de sinais em sua vida e naeducação fez com que algumas escolas especiais parasurdos propusessem o bilingüismo na educação.

No bilingüismo, a criança surda é exposta à línguade sinais desde pequena, por uma pessoa que domi-ne essa forma de comunicação, de preferência umsurdo. A língua portuguesa, em sua forma oral e/ouescrita, é ensinada como segunda língua.

O impedimento na audição faz com que as pes-soas surdas tenham maior acesso ao canal visual,tornando a língua de sinais biologicamente naturalpara elas.

A língua de sinais, que sempre existiu, tem passa-do de geração para geração de pessoas surdas. Ficouesquecida e desvalorizada por muito tempo, em vistada valorização da língua oral, que é a falada pela co-munidade ouvinte majoritária.

Naquela época, a linguagem de sinais não era vis-ta como língua, mas sim como mímica, sem uma or-ganização. Essa perspectiva predominou até 1960,quando os estudos lingüísticos comprovaram que setrata de uma língua, com regras próprias.

Ao ter acesso à língua de sinais e à língua portu-

aula, ir

(eu) vou à aula

Língua de Sinais

Língua Portuguesa

Fonte: Quadros, 1997, p. 74.

guesa, o surdo tem a seu alcance um leque mais am-plo de recursos lingüísticos, que atendam melhor asuas necessidades.

O alfabeto manual

4 5Programa 5

ADOLESCÊNCIA: CONSTRUÇÃODA IDENTIDADE PESSOAL

OOOOOdesenvolvimento do ‘eu’ e da identidade pes-soal é o tema mais importante na adolescên-cia, pois se refere tanto ao mundo interno da

pessoa quanto a seu comportamento (no mundo ex-terno). Esse processo se vincula estreitamente à his-tória pessoal de cada adolescente.

Nos primeiros anos de vida, até o momento da en-trada na escola, a família constitui para a criança ogrupo mais importante e quase único de referência.Na adolescência, as interações sociais se expandem demaneira extraordinária, para além da referência fami-liar, nos diferentes grupos aos quais o adolescentepertence – dança, teatro, escola, igreja ou esportes.

Muitas vezes, o adolescente surdo vive sob os cui-dados de pais superprotetores, que não acreditam naspotencialidades do filho e vêem a surdez como umadoença, imaginando que o surdo é incapaz de se cui-dar e de pensar. Nesses casos, a liberdade e a auto-nomia do adolescente são seriamente prejudicadas eele sente insegurança para se comunicar e convivercom pessoas ouvintes.

A precariedade das referências familiares diminuia capacidade de iniciativa do jovem para buscar no-vas referências fora de casa, podendo gerar uma ima-turidade emocional, associada a um enrijecimento

— Eu quero ser EU.

— A vida é minha.

— Quero ter vida própria.

— Confie em mim.

(Falas de um adolescente)

4 7Adolescência: construção da identidade pessoalPrograma 54 6

geral da personalidade – que se traduz em padrõesinfantis, carentes da elaboração correspondente a suaidade cronológica e física.

Muitos adolescentes com surdez – tal como mui-tas pessoas, ouvintes ou não – fazem uma associaçãoerrônea entre inteligência e boa comunicação oral, ouseja, à capacidade de falar bem.

Tal atitude equivocada é prejudicial para o jovemque, diante de sua dificuldade de comunicação oral,começa a se sentir menos competente.

A baixa estima pode levar à acomodação, ao desâni-mo e ao conformismo, induzido pelo medo de enfren-tar situações novas e conflitos.

O próprio surdo com comunicação restrita tendeàs vezes a delegar mais status ao colega que ‘fala bem’(produz fala mais compreensível) e a elegê-lo comorepresentante e porta-voz de seus interesses.

A orientação sexual

Tema sempre presente na adolescência, a orientaçãosexual busca hoje tratar o assunto de um ponto devista cultural, com base na aceitação de diferentesvalores, e não mais como um modelo padronizado decomportamento. Apesar de ser abordado com maiorliberdade, o assunto ainda provoca conflitos entre asgerações.

Algumas escolas, com o apoio dos familiares, cos-tumam convidar médicos e especialistas para ofere-cer palestras aos alunos adolescentes, buscando am-pliar o nível de informações disponíveis e sanar mui-tas dúvidas.

Tratando o assunto com naturalidade, a orienta-

ção sexual enfoca diferentes temas: direito à sexuali-dade, iniciação, responsabilidade, necessidade deproteção (em relação a doenças e gravidez), casamen-to etc. A abordagem dos temas tanto é feita de formaespecífica quanto associada a determinadas discipli-nas, como as referências biológicas ao conhecimentodo próprio corpo dadas em Ciências.

Hoje, a educação sexual é vista com maior natu-ralidade, pois o interesse infantil pelo assunto é re-conhecido como um aspecto positivo do desenvolvi-mento sadio, tanto quanto as dúvidas e questões vi-vidas pelos adolescentes.

A preparação para o trabalho

É comum os adultos se queixarem de que o adoles-cente se sente perdido, sem interesses em relação aseu futuro profissional; que sua auto-imagem é defor-mada e confusa; que ele apela para soluções poucorefletidas, ou influenciadas por amigos e familiares;que dá prioridade ao retorno financeiro e deixa delado valores como ‘gostar’ e ‘poder’.

Para contornar essas dificuldades se torna ne-cessário, ao longo do ensino fundamental e médio,um processo de orientação educacional que colo-que à disposição do adolescente, surdo ou não, re-cursos para combater o desconhecimento de si pró-prio, a incapacidade para identificar o que ele pre-fere e o que são escolhas dos outros. O adolescenteprecisa aprender a compatibilizar suas aspiraçõespessoais com as oportunidades sociais e as condi-ções familiares.

O adolescente portador de surdez sofre tambémas conseqüências de outras circunstâncias: poucasoportunidades de cursos profissionalizantes, desin-

4 9Adolescência: construção da identidade pessoalPrograma 54 8

formação generalizada sobre as exigências e as opçõesdo mercado de trabalho, pouca visualização das pos-sibilidades profissionais em campos de trabalho nãomuito conhecidos e ainda restritos.

O ideal é que o jovem possa ser ativo em suasescolhas, baseando-se na auto-análise, na compreen-são pessoal, no reconhecimento das vantagens e dasexigências de cada ocupação e de seu interesse porela. É preciso, ainda, que identifique os requisitosprofissionais e analise as próprias características pes-soais, para que possa escolher o que fará e venha aser feliz com sua decisão.

Para que o surdo possa ampliar seu conhecimen-to sobre o mundo do trabalho, que a cada dia se tor-na mais competitivo, é imprescindível que ele, comoqualquer outro adolescente, vivencie diferentes re-alidades do universo ocupacional, por meio de vi-sitas a empresas, observação e entrevista com pro-fissionais no próprio ambiente de trabalho e está-gios visando a sondagem de habilidades e interes-ses profissionais.

O processo escolar deve propiciar ao adolescente,surdo ou não, oportunidades de discutir as diferen-tes situações conflitantes, procurando amadurecê-lopara superá-las ou, pelo menos, atenuá-las.

É fundamental que a escola crie condições paraampliar as possibilidades dos jovens para que elesplanejem sua carreira profissional durante o proces-so de ensino fundamental e médio.

O plano de vida de cada aluno se enriquecerá aoser compartilhado com seus colegas de classe, ajudan-do a conduzi-lo à identificação de suas aspirações, li-

mitações e potencialidades e ao reconhecimento dascondições reais do mercado de trabalho.

Um processo de orientação profissional efetivo per-mitirá que o adolescente surdo encontre elementospara vir a competir profissionalmente com trabalha-dores ouvintes, em condições semelhantes.

A questão da capacitação profissional é outro as-pecto importante a ser analisado na educação do ado-lescente com surdez. Embora muitos tenham acessoa cursos profissionalizantes, com freqüência tendema se concentrar na área de informática. É compreen-sível, já que, cada vez mais, as tarefas do dia-a-diadependem da informatização.

No entanto, o mercado de trabalho está em cons-tante transformação e é preciso tomar consciênciadessas mudanças, antes de qualquer decisão. Porexemplo: nos anos 70, o surdo foi apontado como umótimo profissional para operar máquinas de perfurar,dado o intenso ruído advindo dessa operação, preju-dicial para as pessoas ouvintes.

Mais recentemente, ele foi considerado umdigitador muito produtivo, por sua maior capacidadede concentração. Mas, qual será seu futuro se essasfunções desaparecerem, tal como já vem acontecendo?

Será que o surdo poderá competir no mercado detrabalho de igual para igual, uma vez que suas opor-tunidades dependem da lacuna deixada pelos traba-lhadores ouvintes?

A opção escolar

Cursar uma escola especializada, ou encaminhar-separa uma de ensino regular? Esta é uma das escolhas

5 1Adolescência: construção da identidade pessoalPrograma 55 0

que o adolescente surdo precisa fazer.As escolas de educação básica de nível médio

especializadas no atendimento ao surdo são exceçõesregionais (existem, por exemplo, no Rio Grande doSul, no Rio de Janeiro e em São Paulo), constituindoexperiências isoladas.

Ainda está cristalizada a crença de que o surdonecessita de uma sólida base escolar e comunicativana educação fundamental, para poder se integrar naescola comum de ensino médio. Porém, do ponto devista da individualidade, essa não é a única possibi-lidade para todos. Acreditamos que cada sujeito sedesenvolve a partir de seus recursos pessoais e dasoportunidades que o ambiente lhe oferece.

Tal como a maioria da população brasileira, umaparcela significativa de surdos não consegue concluiro ensino fundamental e médio. Outros iniciam o en-sino médio e logo desistem, alegando dificuldades emmanter um curso pago, dificuldade em dominar algu-mas matérias, preferência por trabalhar, ou necessi-dade de fazê-lo, e incompatibilidade do horário es-colar com o trabalho.

Todos esses obstáculos são também enfrentadospelos ouvintes. O jovem surdo precisa combater odesânimo que se manifesta diante das primeiras difi-culdades. Por meio de esforço e motivação pessoal,ele pode atingir maiores níveis escolares (médio esuperior), um fator decisivo para seu futuro, uma vezque a escolaridade é cada vez mais uma exigênciaimportante do mercado de trabalho.

As vivências de inclusão, com o aluno surdo fre-qüentando classes que contam com a orientação de pro-fissionais especializados, mostram avanços nos estudosdo ensino médio e do superior. Espera-se com isso que

o jovem possa obter maiores chances de qualificaçãoprofissional e, conseqüentemente, consiga desempe-nhar uma ocupação mais eficiente e produtiva.

Vida pessoal

Mesmo com diferentes níveis escolares e profissio-nais, a pessoa com surdez precisa ter uma leitura devida que lhe permita acompanhar as mudanças rápi-das no mercado de trabalho e no mundo a sua volta.

Reconhecer as possibilidades pessoais e acompa-nhar o ritmo das mudanças tecnológicas envolve oconhecimento das coordenadas que afetam a vida decada um no lazer, na escolaridade, no trabalho, nasrelações sociais e na vida em sociedade em geral.

Os tabus, valores morais e ‘leis’ do meio social ecultural em que o adolescente – surdo ou não – vivedefinem suas atitudes, seus comportamentos e suascuriosidades em relação a seu amadurecimento e àvida adulta. As questões mais sérias dizem respeito,particularmente, à sexualidade (mudanças físicas eemocionais, vida sexual, escolha do parceiro etc.).

A capacidade de comunicação (oral ou por sinais)do adolescente surdo é a condição fundamentalpara que ele se desenvolva de maneira mais segu-ra, de acordo com os demais jovens de seu grupo,ouvintes ou não.

Com relação à vida afetiva, é freqüente que osjovens portadores de surdez estabeleçam laços amo-rosos dentro da própria comunidade em que vivem,ou seja, é grande a quantidade de surdos que namo-ra entre si. No entanto, a proporção dos namoros en-

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tualmente, devem ser rejeitadas as visõespaternalistas e assistencialistas, bem como aslimitadoras, que vêem com restrições a com-

petição do portador de deficiência no mercado de tra-balho. Hoje em dia, esses profissionais ocupam cadavez mais seus espaços sociais em situação equivalen-te à dos demais cidadãos.

Essa nova realidade depende de um compromis-so social, que precisa ser assumido não só pelo por-tador de deficiência, mas também por sua família esua comunidade, pelas entidades educacionais, pelasempresas públicas e privadas e pela sociedade civilcomo um todo.

É preciso olhar para o surdo como uma pessoa capaz,repleta de possibilidades (e não apenas para sua sur-dez) e concebê-lo como um cidadão que pode pro-duzir e deve ser aceito em todos os meios sociais:empresa, escola, cinema, clube etc.

As reivindicações atuais das pessoas portadoras dedeficiência auditiva têm caráter de urgência, voltan-do-se para a valorização de suas potencialidades epara a garantia de seus direitos de cidadão, conside-rando que, por lei, todos os cidadãos são iguais entresi. Nesse movimento, estão obtendo um progressivo

O SURDO ADULTO:O PASSADO E O FUTURO

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tre surdos e ouvintes vem aumentando. Será reflexode uma integração maior na sociedade?

É possível, mas é provável que isso se deva tam-bém à ampliação da informação a respeito das pes-soas com surdez, graças aos esforços empreendidosno sentido de integrar os surdos e desenvolver suasocialização com as pessoas ouvintes. Em conse-qüência, tem sido maior a abertura para sua parti-cipação, nos diferentes segmentos sociais, em ati-vidades religiosas, esportivas, recreativas, escolarese profissionais.

O surdo não pode ficar esperando uma atitudepaternalista e assistencialista para enfrentar as barrei-ras que surgem pela vida. É preciso encontrar recur-sos internos, educacionais e sociais que possibilitemuma atuação próxima à do ouvinte, mantendo o res-peito a suas limitações auditivas.

As atitudes mais firmes que o surdo assume hoje,reivindicando seu espaço na sociedade, já começama mostrar seus efeitos, como a criação de serviços deintérprete, os programas legendados, a maior ofertaescolar, o aumento do emprego e, enfim, sua maiorvalorização como pessoa.

Conforme a colocação de Antonio de CamposAbreu, presidente da Federação Nacional de Surdos(Feneis), é importante que o surdo represente ‘suaprópria comunidade’, em primeiro lugar, como agen-te e sujeito de transformação e de luta” (Revista daFeneis, ano I, n o 4, outubro/dezembro de 1999, p. 5).

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acesso a concursos públicos (Lei 8.112/90) e a empre-sas privadas de médio e grande porte (Lei 8.213/91).

Não há dúvida de que a comunicação é um aspec-to essencial em todas as relações humanas. E a ver-dade é que raramente os surdos com perdas severase profundas apresentam uma habilidade de comuni-cação – pela fala ou por escrito – semelhante à dosouvintes. Mas o surdo pode utilizar outros recursospara estabelecer uma comunicação efetiva, além dalinguagem verbal, como a leitura oro-facial e o uso desinais (ou gestos).

O mercado de trabalho

O desconhecimento das possibilidades profissionaisdas pessoas que portam alguma deficiência tem di-ficultado seu acesso ao mercado de trabalho. Porisso, é importante divulgar, junto aos diferentes seg-mentos sociais, dados atualizados e confiáveis a res-peito da experiência profissional de portadores dedeficiência auditiva que participam do mercado detrabalho.

Estudos recentes, como o de Ribas (1966), junto aempresários paulistanos, revelam a avaliação positi-va dos profissionais portadores de deficiência. Elesdispensam tratamento especial, têm bom desempe-nho e realizam trabalho de qualidade, além de seremassíduos e demonstrarem estabilidade emocional.

A ampla divulgação dessas informações pode in-fluir no aprimoramento dos processos educacionaise no desenvolvimento de novas propostas de reabili-tação. Trata-se de uma ótima maneira de reduzir atospreconceituosos e discriminatórios por parte da po-pulação em geral.

Mesmo as empresas que se abrem à contratação dotrabalhador com surdez questionam suaspotencialidades, dando excessivo valor às dificuldadesde comunicação (pela fala ou por gestos), sem levartanto em conta a valorização de suas capacidades.

A exagerada preocupação com as restrições de co-municação dos surdos tem feito com que, com freqüên-cia, esse trabalhador deixe de ser aproveitado, apesar desua evidente qualificação. É importante esclarecer que,embora muitos surdos apresentem linguagem oral pou-co inteligível, essa fala diferente tende a ser compreen-dida com maior facilidade no convívio diário, diminu-indo aos poucos o impacto decorrente dessa diferença.

Uma das restrições efetivas para o trabalho depessoas portadoras de surdez pode ser o ruído exces-sivo no ambiente. Na verdade, esse ruído pode cau-sar a perda dos resíduos auditivos, que são muitoúteis para alguns portadores de surdez, bem comoocasionar dor. Evidentemente, tais fatores dificultama adaptação ao trabalho.

Além do ambiente ruidoso, há outras ocupaçõescontra-indicadas: as que exigem elaboração ou exe-cução de textos com domínio extenso da língua por-tuguesa e as que dependem da audição para operarmáquinas, ou para identificar ruídos que tragam ris-co de vida, como o de empilhadeiras.

Não se pode dizer que o trabalhador surdo tenha ummaior potencial, ou seja mais produtivo que os ou-vintes em determinadas funções. Mas ele tampoucopode ser considerado menos capaz.

Cada indivíduo precisa ser visto como realmenteé, como uma força de trabalho com potencial produ-

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tivo a ser desenvolvido. Na análise da adaptação e dodesempenho do trabalhador se deve observar suapossibilidade de demonstrar seus interesses e habili-dades e, principalmente, seu ajustamento à funçãoque está exercendo, seja surdo ou não.

De modo geral, as pessoas portadoras de surdez têmprocurado se preparar melhor para atender às exigên-cias do mercado de trabalho, no que se refere à escola-ridade, avançando em seus estudos e se empenhandoem concluir cursos do ensino médio e do superior.

A procura de cursos ligados a Processamento de Da-dos é acentuada, pois muitos surdos costumam encontrartrabalho nessa área: digitação, operação de computador,serviços auxiliares de administração e contabilidade.

Entre os que já ocupam essas funções, muitosbuscam ascender profissionalmente cursando facul-dades que oferecem habilitações em Tecnologia deProcessamento de Dados e Análise de Sistemas.

Mas o estudante com surdez enfrenta várias bar-reiras para ingressar no ensino superior. Além das quesão comuns a todos os jovens que fazem vestibular,existem aquelas que são impostas ao surdo ao longode seu percurso educacional, influenciando o desen-volvimento de sua fala e de sua escrita.

Ações como as propostas pelo MEC (Aviso Circu-lar 277/96) vêm buscando maior igualdade de opor-tunidades para eles no ensino superior, com o uso deintérpretes de sinais e maior flexibilidade na avalia-ção das redações dos estudantes com surdez.

São raros os universitários surdos formados emengenharia, biblioteconomia ou química. Os que cur-saram a faculdade de pedagogia esperaram por lon-go tempo uma oportunidade – e apenas recentemen-te conseguiram se colocar, em escolas especializadas.

Essa conquista resulta da valorização do surdocomo profissional e do fato de as escolasespecializadas estarem adotando a língua de sinaisnas abordagens educacionais, abrindo o campo doensino de crianças surdas.

As inúmeras barreiras impostas pela sociedadedesestimulam a participação do surdo no mercado detrabalho. Sabendo das dificuldades de competir emigualdade de condições, ele se sente discriminado,diferente e diminuído diante do ouvinte, desacredi-tando de seu futuro profissional.

É importante que fique claro para a sociedade e,particularmente para as empresas: será que as restri-ções impostas ao candidato surdo se devem ao fatode ele não atender ao perfil exigido pelo cargo, ou elasresultam apenas do desconhecimento das reais limi-tações criadas pela surdez?

Mesmo o surdo que já venceu o obstáculo do aces-so à vaga e da manutenção do emprego não vê grandeschances de ascensão profissional. Isso acontece porque,em geral, as empresas não sabem que podem contarcom a assessoria de entidades especializadas, ou deintérpretes da língua de sinais, para facilitar a participa-ção do surdo em cursos de treinamento, atualização ereciclagem profissional, dentro da própria empresa.

Muitos dos profissionais surdos apontam o traba-lho como fonte de realização, satisfeitos por teremtido uma chance de mostrar sua capacidade de traba-lho, por terem muitos amigos na empresa e gostaremdo ambiente de convívio. Assim, eles podem se sentirrealizados profissionalmente, demonstrando que al-guns trabalhos independem da comunicação oral.

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Para muitos outros predomina o descontentamentotrazido pelos baixos salários, pela realização de tarefasincompatíveis com seus interesses, pela sensação depoder produzir melhor em outras ocupações e tambémpelas dificuldades de ascensão profissional.

A interação social oferecida ao portador de surdezno ambiente de trabalho propicia a ampliação de seunúcleo de relações, graças ao convívio com colegas ou-vintes, bem como com seus familiares e amigos. A par-ticipação em atividades esportivas e de lazer dentro daempresa é outro fator que fortalece a integração.

O resultado da inclusão da pessoa com surdez emcomunidades variadas se reflete nos casamentos comcolegas de trabalho ou da escola. Outro exemplo dessaaproximação é a ocorrência de casamentos entre pro-fessores e portadores de surdez.

Integração crescente

Embora os casamentos entre surdos e ouvintes venhaaumentando significativamente, em comparação comas gerações anteriores, ainda é comum encontrarmossurdos que namoram e se casam entre si.

O resultado disso é a alta proporção de pais sur-dos com filhos ouvintes, situações nas quais os filhosdesempenham um papel fundamental. Desde peque-nas, tais crianças se tornam intérpretes naturais deseus pais, convivendo naturalmente com ambas aslínguas: a língua portuguesa e a língua de sinais.

É de grande valia seu papel na participação dospais na sociedade; desde cedo, essas crianças se tor-nam mensageiras de recados e informantes para seuspais surdos, mantendo-os informados a respeito dosfatos importantes e dos acontecimentos do dia-a-dia.

Os aparelhos eletrônicos como o fax, ou o TTD

(telefone com teclado numérico e alfabético, no qualas mensagens são digitadas, permitindo o diálogoentre as pessoas que o possuem) contribuem muitopara facilitar as conversas a distância entre surdos, oumesmo entre surdos e ouvintes. Mas a colaboraçãodos filhos cujos pais são surdos continua a ser básicapara a diminuição de barreiras na comunicação.

A cada dia, as pessoas portadoras de surdez semostram mais ativas, participando das mais diversasatividades: muitas freqüentam clubes, principalmenteos esportivos, ou são membros atuantes de associaçõesde surdos e de grupos religiosos. Tal como os outrosjovens, os surdos também gostam de passear comamigos ou familiares, viajar, ir a cinemas e a festas.

O fato de não ficarem confinados em atividadessegregadas, restringindo-se à família ou apenas a gru-pos de surdos (escolas e clubes) revela seu grande in-teresse em alcançar um melhor entrosamento social.

O desenvolvimento das atividades escolares e,principalmente, a participação no mercado de traba-lho, fazem do próprio surdo o grande divulgador daspossibilidades do cidadão portador de surdez nasmais diversas e qualificadas ocupações.

Sua eficiência e sua satisfação contribuem para di-minuir os preconceitos e a discriminação, estimulan-do a maior absorção de mão-de-obra e ampliando oquadro que os representa no mercado de trabalho.

O Decreto-Lei no 3.298, de 20 de dezembro de 1999,dispondo sobre a Política Nacional para a Integraçãoda Pessoa Portadora de Deficiência, compreende umconjunto de orientações normativas que objetivamassegurar o pleno exercício dos direitos individuaise sociais das pessoas portadoras de deficiência.

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