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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais Caderno-Base Para os Cursos de Formação Política e Sindical

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistasdo Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

Caderno-BasePara os Cursos de Formação Política e Sindical

1ª EdiçãoBelo Horizonte, setembro de 2010

Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

Expediente

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

Diretoria Colegiada

SUPLENTESFrancisco Alves SaldanhaMaria de Fátima da Silva SantanaMaria Donizetti de Paula Maria Elza Soares MachadoMiguel Ladislau Rita de Cássia Rodrigues

Conselho Fiscal

• Este caderno foi produzido pelo SINDSEP-MG, como subsídio para oscursos de formação política e sindical para dirigentes, representantes sindicais e trabalhadores de base. Gestão 2009-2012

• Pesquisa e Produção dos textos:Helder Molina, Historiador, Mestre em Educação (UFF), Doutorando em Políticas Públicas (UERJ), Educador e Pesquisador Sindical e Assessor de Formação da CUT-RJ.

• Roteiro e Organização: Carlos Henrique de Melo, Mestre em Saúde Pública e Diretor do (Gestão 2009-2012)SINDSEP-MG

Carla Cruz, Jornalista, Especialista em Comunicação e Política e Comunicação Empresarial – UniBH e Assessora da Diretoria do SINDSEP-MG

• Colaboração e Revisão - Carla Cruz

TITULARESAssuero Torres de MatosDirceu Francisco MendesLélio Pereira

SUPLENTES João Santana Pereira da SilvaMarco Antônio dos Santos Walter Ferreira Lopes

TITULARESAilton Ferreira da Silva Arnaldo José Santa Cruz Júnior Carlos Henrique de Melo Carlos Henrique Rodrigues Edilson Alves Coutinho (Diu Bicudo) Geraldo Custódio de Amorim Gilberto Almeida Oliveira Ivone Maria Carvalho RochaJussara Griffo Luiz Roberto dos Santos Azevedo (Luizão)Maria Adelina Braz Maria Aparecida Guimarães Marizete dos Santos MendesRonaldo Vasconcelos dos Santos Rosângela Nogueira da Silva Rosângela Silva Alves Ubiratan Nascimento Vera Lúcia Ribeiro dos Santos Vicente Paulo de FreitasVilma Moreira dos Santos Waldelino Lopes de Moura

SUMÁRIO

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Expediente

Apresentação

Crônicas e Poemas

Elogio da Dialética

O Analfabeto Político

O Sindicato

História do Movimento Sindical, das concepções político-sindicais, da organização e da luta dos trabalhadores

Manifesto Comunista

Qual ecologia? Frei Betto

Ecologia Interior Frei Betto

Ecologia Social Leonardo Boff

Saúde, sociedade e qualidade de vida Paulo M. Buss

Agenda 21

Diretrizes Socioambientais

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Declaração Universal dos Direitos Humanos

As concepções políticas e ideológicas que originaram o sindicalismo brasileiro – A contribuição dos anarco-sindicalistas – Os primeiros anos

A herança de Marx e da Revolução Russa Os comunistas

A repressão ao sindicalismo revolucionário e independente - Tutela e atrelamento do sindicato ao Estado - A Era Vargas e a ditadura militar 11 Ressurgimento do sindicalismo combativo

Sindicatos Gerais: por quê?

Nasce das lutas dos anos 80 e no contexto do novo sindicalismo

Duas décadas de muitas lutas contra a ofensiva privatizante do neoliberalismo

SINDSEP-MG: Instrumento coletivo de luta

O SINDSEP-MG e as tarefas e lutas de hoje

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Sentir que somos Terra nos faz ter os pés no chão - Leonardo Boff

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Concepção e Prática Sindical

SINDSEP-MG: História de um Sindicato de Luta

Trabalhadores se organizam em sindicatos: resposta à exploração capitalista 07

ste caderno de formação que a diretoria do SINDSEP-MG está desenvolvendo em todas as regiões e núcleos do Estado tem como objetivo ser um instrumento de estudo, ação e reflexão, no processo de formação política dos/as trabalhadores/as do serviço público federal de Minas Gerais. Uma iniciativa ousada, corajosa, necessária, e urgente, que esta gestão elegeu como uma de suas metas centrais.

A formação deve ser prioridade, deve ser continuada, abordar outros temas, para compreender a história, a economia, a política, a sociedade, direitos sociais, meio ambiente, saúde, gênero, cultura, educação, o papel do Estado, do serviço público, e dos/as trabalhadores/as do serviço publico federal, que devem devem estar a serviço da sociedade, e da mudança dessa realidade. Democratizar o acesso, produzir políticas públicas para as maiorias, distribuir a renda, socializar os direitos, promover o bem estar e a cidadania plena.

A necessidade de formar novos militantes e dirigentes, refletir criticamente sobre o atual contexto social, político, econômico e ambiental, promover a qualidade de vida, atualizar o conhecimento, politizar as lutas, socializar o debate e aprender coletivamente, humanizar os seres humanos, a elaboração científica das respostas aos nossos atuais desafios, enfim, descobrir coletivamente novas estratégias e formas de lutas. Tarefas urgentes do Movimento Sindical combativo.

A formação sindical é uma ferramenta fundamental para a construção de uma consciência crítica, instrumento eficaz para ação política, e pleno exercício da cidadania ativa e participante. A emancipação dos trabalhadores deve ser obra dos próprios trabalhadores, as mudanças sociais profundas só foram realizadas a custo de muita luta de nossa classe.

Os trabalhadores e trabalhadoras podem e precisam mudar o mundo. A única classe que precisar transformar a realidade concreta é a classe dos/as trabalhadores/as. E a realidade é complexa, contraditória, movida por diferentes interesses sociais, econômicos e políticos, mas não basta só constatar isso.

Como disse Marx, a história da humanidade é a história da luta de classes. Sob o capitalismo, os direitos humanos, sociais e políticos do povo são usurpados, confiscados. O lucro, a acumulação, a exploração e o consumo são as molas que fazer rodar a máquina capitalista, produzindo ao seu redor um mundo de exclusão, violência e barbárie.

Um tempo de incertezas, com profundas e aceleradas mudanças no mundo do trabalho, de globalização, crise do emprego formal e do trabalho assalariado. Um tempo em que a dominação capitalista se traveste de novas formas de gestão, de novos métodos de produção baseados no consumo, no individualismo, na competição e na desenfreada busca de respostas individuais para problemas que só podem ser resolvidos coletivamente.

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

ApresentaçãoFormação, consciência política e ação sindical, hoje

Helder Molina

E

As inovações tecnológicas, o endeusamento do meio produtivo – que transforma o dinheiro num fetiche –, a alienação dos jovens, reforçada pela falta de perspectivas profissionais e a exclusão crescente das massas trabalhadoras são autênticos desafios para os militantes sindicais. Esses fatores são um convite para cada sindicalista se debruçar nos estudos, abandonar as respostas fáceis, os chavões, as palavras de ordem vazias e aprofundar na reflexão sobre a realidade política brasileira.

Essas questões só podem ser compreendidas se a realidade for estudada paciente e atentamente. É essencial conhecer para lutar mais e melhor; debater para apreender a realidade e aprender coletivamente. Mais do que nunca, a formação é essencial para os sindicatos e para todos os movimentos sociais.

O sindicalista deve ler, criticar o que se lê, estabelecer comparações sobre o que se está lendo, buscar dados, informações complementares, abastecer-se de teoria para enfrentar um praticismo cada dia mais despolitizado que assola o sindicalismo atual.

Este caderno contém crônicas e poesias de Eça de Queiroz e Bertold Brecht cujo teor são subsídios para o processo de formação política e sindical que a Diretoria do SINDSEP-MG está implantando. Os textos primorosos levam os leitores à reflexão sobre as conquistas e os dissabores de serem trabalhadores. É também uma forma de resgate e de análise da história do Movimento Sindical e de luta, das concepções políticas e dos desafios atuais da organização dos trabalhadores no Brasil e no mundo.

Fundamental para a formação de antigos e novos militantes, este caderno resgata elementos centrais da história da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (CONDSEF) e do SINDSEP-MG, que nasceram das lutas da década de 80 e no contexto do novo sindicalismo. Em um processo formativo, são essenciais o estudo e o debate crítico sobre economia, política, ideologia, filosofia e luta de classes, que são a base do Manifesto Comunista, de Marx e Engels, presente neste trabalho.

Afinal, uma formação cidadã tem que discutir direitos humanos e sociais, desenvolvimento sustentável, ecologia e meio ambiente, políticas públicas, distribuição de renda e desenvolvimento humano. Para tanto, o SINDSEP-MG reproduz aqui belas reflexões e críticas de Frei Betto e Leonardo Boff sobre a ecologia humana e social, a declaração universal dos direitos humanos, produzida pela Organização das Nações Unidas, o texto de Paulo M. Buss sobre saúde, sociedade e qualidade de vida, as diretrizes socioambientais, os objetivos de desenvolvimento do milênio e a Agenda 21.

Boa leitura. Que as reflexões trazidas por este trabalho incrementem a prática política de cada um e contribuam para o desenvolvimento humano solidário.

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

Há no mundo uma raça de homens com instintos sagrados e luminosos, com divinas bondades do coração, com uma inteligência serena e lúcida, com dedicações profundas, cheias de amor pelo trabalho e de adoração pelo bem, que sofrem e se lamentam em vão. Estes homens são o povo. Estes homens, sob o peso do calor e do sol, trazidos pelas chuvas e pelo frio, descalços, malnutridos, lavram a terra, revolvem-na, gastam a sua vida, a sua força, para criar o pão – o alimento de todos. Estes são o povo e são os que nos alimentam. Estes homens vivem nas fábricas, pálidos, doentes, sem família, sem doces noites, sem um olhar amigo que os console, sem ter o repouso do corpo e a expansão da alma, e fabricam o linho, o pano, a seda, os estofos.Estes homens são o povo e são os que nos vestem. Estes homens vivem debaixo das minas, sem o sol e as doçuras consoladoras da natureza, respirando mal, comendo pouco, sempre na véspera da morte, rostos sujos, curvados, e extraem o metal, o minério, o cobre, o ferro e toda a matéria das indústrias. Estes homens são o povo e são os que nos enriquecem. Estes homens, nos tempos de lutas e de crises, tomam as velhas armas da Pátria e vão, dormindo mal, com marchas terríveis, a neve, a chuva, no frio, nos calores pesados, combater e morrer longe dos filhos e das mães, sem ventura, esquecidos, para que nós conservemos o nosso descanso opulento. Estes homens são o povo e são os que nos defendem. Estes homens formam as equipagens dos navios; são lenhadores, guardadores de gado, servos mal-retribuídos e desprezados. Estes homens são os que nos servem. É por isso que os que têm coração e alma e amam a Justiça devem lutar e combater pelo Povo.E ainda que não sejam escutados, têm na amizade dele uma consolação suprema.

"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro, que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo."

A injustiça passeia pelas ruas com passos seguros.Os dominadores se estabelecem por dez mil anos.Só a força os garante.Tudo ficará como está.Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores.No mercado da exploração se diz em voz alta:agora acaba de começar:E entre os oprimidos muitos dizem:não se realizará jamais o que queremos!O que ainda vive não diga: jamais!O seguro não é seguro. Como está não ficará.Quando os dominadores falarem, falarão também os dominados.Quem se atreve a dizer “jamais”?De quem depende a continuação desse domínio?De quem depende a sua destruição?Igualmente de nós.Os caídos que se levantem!Os que estão perdidos que lutem!Quem reconhece a situação, como pode calar-se?Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã.E o "hoje" nascerá do "jamais".

CRÔNICAS E POEMASO povo

(Eça de Queiroz)

O Analfabeto Político(Bertold Brecht)

O elogio da dialética(Bertold Brecht)

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Mas quem é o sindicato? Ele fica sentado em sua casa com telefone?Seus pensamentos são secretos, Suas decisões, desconhecidas?Quem é ele? Nós somos ele: você, eu, vocês, nós todos.Ele veste a sua roupa, companheiro, E pensa como a sua cabeçaOnde moro é a casa dele, E quando você é atacado, ele lutaMostre-nos o caminho que devemos seguir E nós seguiremos com você.Mas não siga sem nós o caminho correto Ele é sem nós, o mais errado.Não se afaste de nós! Podemos errar e você ter razão.Portanto, não se afaste de nós! Que o caminho curto é melhor que o longo,Ninguém nega. Mas quando alguém o conhece E não é capaz de mostrá-lo a nós,De que nos serve sua sabedoria? Seja sábio conosco! Não se afaste de nós.

Que os sindicatos são instituições consolidadas na vida dos trabalhadores, isso já está claro. No entanto, poucas pessoas sabem da fundamental importância que eles possuem e como foram constituídos até que se tornassem a expressão máxima dos trabalhadores.

É importante resgatar o surgimento das organizações sindicais, desde a República Velha, passando pelo sindicalismo no período Vargas, o surgimento do Novo Sindicalismo e também os desafios e problemas enfrentados pelo sindicalismo contemporâneo.

É com o estudo da História que se obtém a compreensão do presente e a construção de um projeto de futuro.

O Sindicato(adaptado de "O Partido", de Bertold Brecht)

Helder Molina

HISTÓRIA DO MOVIMENTO SINDICAL, DAS CONCEPÇÕES POLÍTICO-

-SINDICAIS, DA ORGANIZAÇÃO E DA LUTA DOS TRABALHADORES

Trabalhadores se organizam em sindicatos:

resposta à exploração capitalista

A história do Movimento Sindical se confunde na do sindicalismo, da sociedade e do modo de produção capitalista. O Movimento surgiu como resposta à exploração de classe dos capitalistas, na violência de classe imposta aos trabalhadores, iniciada no processo da revolução industrial e que permanece até então.

O capitalismo se baseia na compra da força de trabalho, por meio do assalariamento e do lucro dos capitalistas. É produzido pelo trabalho não pago (mais-valia) e pela apropriação direta e indireta do que se produz.

Em uma sociedade sem a apropriação privada da força de trabalho e da produção, os sindicatos teriam outras funções. Os critérios de produção seriam justos, caso cada trabalhador viesse a receber o valor justo pelo seu trabalho; caso houvesse a melhoria na qualidade de vida, na medida em que as sociedades desenvolvidas fossem produtoras do excedente de mercadorias de consumo disponíveis.

A origem do sindicato, como se conhece, está intimamente ligada à Revolução Industrial e à divisão do trabalho construída pelos detentores dos meios de produção capitalista. No final da Idade

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

Média, as corporações de ofícios reivindicavam direitos aos que trabalhavam.

O s o p e r á r i o s t i n h a m d i f i c u l d a d e s d e , individualmente, reivindicar e obter com o patrão todo-poderoso, melhores salários e condições de trabalho mais dignas. Essa luta desigual fez emergir a necessidade de os trabalhadores se unirem em uma só voz, gerando grupos ou categorias do mesmo ofício, representadas pelos seus eleitos. Assim nasceram os sindicatos.

As primeiras experiências pré-sindicais (de lutas dos trabalhadores, anteriores ao surgimento do sindicato) foram desenvolvidas pelos “quebradores de máquinas” ou “luditas”. Em seguida, sugiram os “cartistas”, que apresentaram a Carta do Povo, reivindicando a redução da jornada de trabalho. Os dois eventos ocorreram por volta de 1780, na Inglaterra – berço do industrialismo.

Os sindicatos e as suas formas de luta variam de sociedade para sociedade, embora pese que, nas sociedades mais industrializadas, a sua importância e o seu papel na dinâmica social seja de maior relevo.

Os sindicatos não são estáticos; evoluem com a evolução das sociedades. Atualmente o seu papel não tem o peso ideológico que teve no passado, mas a sua importância é incontornável para as sociedades democráticas. Não há política social e política para o emprego que não tenha nas negociações governamentais um representante dos sindicatos.

O trabalho continua a ter uma centralidade vital para as pessoas. Ocupa os seres humanos em um terço da sua vida. Enquanto o sol aquece, bafeja e ilumina a Terra, as pessoas se encontram enredadas numa atividade que lhes remunera a existência. Essa condição dá sentido à vida na esfera social, tornando-se uma forma de cada um dar a sua contribuição para a sociedade.

A precariedade causada pelo que alguns autores chamam de Terceira Revolução Industrial acabou com o “emprego para toda a vida”, bem como cimentou a angústia em que vivem os assalariados.

O esforço do homem em busca da sua valorização, da conquista de seus direitos e da defesa de seus interesses são elementos comuns no associativismo que possibilitaram a busca da humanização e do exercício da cidadania.

Os operários viam na máquina uma inimiga, por ela ser capaz de realizar o trabalho de vários operários e assim fazê-los perder o emprego. Inicialmente os trabalhadores quebraram máquinas ao identificá-las como responsáveis pela miséria em que se encontravam: foi o Movimento Ludita. Depois começaram a fazer greves, exigindo melhorias nas condições de trabalho e reconhecimento do direito de associação.

Os operários viviam nos subúrbios das grandes cidades. As moradias eram pequenas, sem as mínimas condições de habitação, higiene e salubridade. O salário não era suficiente para manter umia família. Para garantir a subsstência, mulheres e crianças de pouca idade também eram obrigadas a trabalhar. Os trabalhadores uniram-se, formando as trade-unions para lutar por melhores condições de vida. Nasce, assim, a consciência de classe.

Entre os países pioneiros do sindicalismo, a Inglaterra foi a primeira nação a sistematizar esse tipo de a ssociativismo profissional, por meio da organização dos sindicatos de operários. Conquistaram o direito associativista em 1824. Continuaram com as reivindicaçõesda categoria, mas também com objetivos mais globais, com vistas à democratização política e à reformulação da sociedade econômica.

A Comuna de Paris (1871), após dois meses de existência, foi violentamente reprimida pela burguesia, tendo efetivamente retrocedido e atrasado o processo de desenvolvimento do associativismo operário e sindical.

Nos EUA, alguns movimentos grevistas foram realizados pelos operários americanos antes mesmo de 1750. O sindicalismo americano apresentava maior dificuldade em se desenvolver, devido às condições econômicas e políticas da época. Criado em 1805, o sindicalismo americano teve, em 1809, o fato mais marcante: a instituição de um fundo, de autoria dos sapateiros de Nova Iorque, destinado à greve.

Com essa iniciativa, cresce a oposição dos patrões, que se organizam para resistir à pressão dos operários. Depois de enfrentar algumas crises, o sindicalismo norte-americano entrou numa fase de participação na política, recuperando e canalizando suas forças para a formação de Centrais Municipais e Sindicatos Nacionais.

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Com a criação da Federação Americana do Trabalho, inicia-se o grande momento do sindicalismo norte-americano, não só pelas questões organizacionais, mas, sobretudo, pela movimentação frequente de operários em busca de melhorias salariais e outros direitos.

O conhecido episódio de Chicago foi o centro principal da campanha pelas oito horas de trabalho. O movimento levou o Congresso Americano a aprovar a lei de regulamentação da jornada de oito horas de trabalho, em primeiro de maio de 1890.

O século XX foi dominado, em todo o seu transcorrer, pelas ideologias políticas. Aqueles que imaginavam que o vazio deixado pelo declínio da religião faria diminuir ou desaparecer o fervor dos homens e das sociedades em torno das crenças, viram--se surpreendidos pelos acontecimentos. Houve apenas uma troca de símbolos.

Não se lutou mais tanto pela Igreja ou pelo rei, como se fizera nas épocas anteriores. A luta passou a ser por uma causa, uma grande ideia nacional, patriótica ou internacionalista, capaz de mobilizar milhões de homens e mulheres – nações inteiras –, levando o mundo a travar duas guerras mundiais e várias revoluções sociais de enorme repercussão.

Os socialistas utópicos tinham consciência dos males gerados pela industrialização, mas não conseguiram elaborar meios concretos para alcançar a igualdade. Afastados da realidade, pretendiam implantar reformas sem a participação efetiva dos trabalhadores.

A classe trabalhadora é produto histórico das contradições geradas pelo capitalismo. Para produzir lucros e acumular riquezas, os patrões

promovem a expropriação da força de trabalho, a exploração de classe e até a violência física e moral.

No Brasil, a classe operária surgiu com o final da escravidão, no período pós-1880. Depois surgiram outras classes trabalhadoras, como com a abolição. No século XX, surge o trabalho assalariado em larga escala, em fábricas.

No início do século XX, o Brasil sofreu forte influência das lideranças comunistas e anarco-sindicalistas socialistas. A influência das experiências europeias entre os trabalhadores veio com a chegada de muitos estrangeiros, que eram trabalhadores qualificados e artesãos.

Houve um predomínio dos anarquistas no início do século XX, que foi decisivo para o nascimento do movimento operário organizado no Brasil (também conhecido por anarco-sindicalista). Eram militantes operários que procuravam (e ainda procuram), por meio das lutas sindicais, derrubar o regime capitalista, o Estado e toda forma de opressão.

O pensamento anarquista se origina na Itália, na Espanha e na França. Os anarquistas só reconhecem a autoridade de uma assembleia. Eles não se submetiam a qualquer poder delegado ou qualquer representação que retirasse do trabalhador a autonomia de decidir e se auto-organizar.

Contrários à herança dos partidos comunistas, eles recusavam e combatiam toda forma de organização centralizada. Nos sindicatos, priorizavam o trabalho no campo da educação e das atividades culturais.

Com isso, buscavam despertar os trabalhadores não somente para a luta por seus interesses específicos, mas para a transformação radical da sociedade. Combatiam, por tanto, a luta meramente economicista e corporativa, que visava apenas à defesa coletiva de seus interesses, contra a exploração do trabalho.

Brasil: da escravidão ao salário

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

No início do século XX, com a chegada dos imigrantes, as primeiras lutas operárias e o enfrentamento do novo patronato capitalista – que saiu da casa grande para a fábrica, mas continuou tratando o trabalhador como escravo –, levaram à criação dos sindicatos e da Confederação Operária Brasileira (COB).

Em 1908 é criada a Confederação Operária Brasileira (COB) composta por cerca de 60 núcleos operários, círculos e sindicatos, associações de classe das principais cidades brasileiras. Rio, São Paulo, Salvador e Recife eram as cidades com maior número de operários fabris.

Assumem uma concepção anticapitalista e de combate às arbitrariedades policiais, organizam fundos e mobilizações de solidariedade às lutas em outros países, a operários em greve, a operários estrangeiros expulsos.

Essas lutas se materializavam em atos públicos, passeatas e manifestações. Os anarco-sindicalistas são laicos e antirreligiosos e combatem a influência do clero nos assuntos políticos e do Estado, principalmente as associações clericais e suas práticas assistencialistas e beneficentes.

Outra concepção importante eram os comunistas, principalmente após a Revolução Russa de 1917, que influenciou o movimento operário mundial, juntando as ideias de Marx (pensador e militante comunista alemão) às ideias operárias contra o capitalismo.

A fundação do Partido Comunista Brasileiro (PCB), em 1922, foi o ponto alto da herança comunista e de sua presença no Movimento Sindical, nas primeiras décadas do capitalismo brasileiro. Os socialistas também foram importantes, pois entendiam que a organização de sindicatos e de greves deviam ser associadas às lutas pela participação eleitoral e parlamentar para transformar o Estado numa perspectiva de atender aos interesses históricos e imediatos das massas trabalhadoras.

Os trabalhistas – corrente também de grande importância do início do século – lutavam na defesa dos interesses dos operários com objetivos de melhorar as condições de vida dos trabalhadores e de conquistar e garantir os direitos deles.

Os primeiros 30 anos foram de intensas lutas e enfrentamentos. A República no Brasil foi construída, desrespeitando e agredindo violentamente o povo trabalhador. As elites escravocratas que tiveram que fechar as senzalas

As concepções políticas e ideológicas que originaram o

sindicalismo brasileiroA contribuição dos

anarco-sindicalistas – Os primeiros anos

Karl Marx

A herança de Marx e da Revolução Russa -

Os comunistas

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

transferiram a exploração para o chão da fábrica, dando continuidade à mentalidade escravista, não g a r a n t i n d o d i r e i t o s e c o n s i d e r a n d o o s trabalhadores como simples objetos de produção e instrumentos de lucros.

O período que vai de 1930 a 1945 é conhecido na história brasileira como Era Vargas ou Estado Novo. Nesse período, o Estado é o principal instrumento da industrialização e da urbanização do Brasil – um projeto de nação capitalista, de conciliação entre o capital e o trabalho, tendo o Estado como árbitro.

Portanto, a Era Vargas registra uma nova etapa na história do Movimento Sindical, das lutas sociais e, especialmente no que se refere a entidades representativas, com uma crescente integração dos sindicatos ao controle do Estado.

Isso se dá mais claramente a partir da criação do Ministério do Trabalho, por Vargas, em novembro de 1930. Em março de 1931 é publicada a lei da Sindicalização: legislação que visava submeter a atividade sindical ao controle do Estado. A lei proibia, dentre outras questões, toda propaganda ideológica no sindicato.

O Estado e a política trabalhista desenvolvida por Vargas estimulavam o corporativismo, isto é, que os sindicatos fossem organizados por uma categoria

profissional e não por ramo de atividade econômica. Em 1932, são promulgadas várias leis sociais e trabalhistas, definindo critérios de aposentadoria, da jornada de trabalho de 8 horas e proteção do trabalho das mulheres.

Enfim, conquistas alcançadas após longos anos de luta dos trabalhadores, sob a direção dos comunistas, anarco-sindicalistas e socialistas-anarquistas, são implantadas pelo governo Vargas, com o intuito de criar uma base social operária para o Estado.

Em 1935 ocorre a formação da Aliança Nacional Libertadora e o levante comunista de 1935, com uma repressão brutal da polícia e de outros órgãos de repressão sobre o movimento operário. O Estado Novo empreendeu uma violenta repressão aos comunistas e a eliminação dos quadros operários.

No período 1930-45 ocorre uma profunda mudança na composição da classe operária, devido a seu crescimento de 500%. A ampla maioria dos trabalhadores é de origem rural, fruto da migração do campo para a cidade.

Nesse período se consolidam várias garantias sociais para o proletariado industrial. Com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o trabalhador conquista o salário--mínimo, a aposentadoria, a estabilidade para operários com mais de dez anos de serviço. É um avanço inegável que faz com que muitos trabalhadores apoiem Vargas.

Na CLT se inserem várias vantagens trabalhistas conquistadas pelos sindicatos e que se estendem a toda categoria profissional, independentemente de o trabalhador ser ou não sindicalizado.

A CLT também garante a tutela do Estado nas negociações entre empregados e empregadores. Sua estrutura se mantém no corporativismo, impedindo os sindicatos de diferentes categorias de uma mesma localidade se articularem entre si. Essa medida garantiu que não houvesse uma grande formação de trabalhadores organizados numa central sindical. A estrutura era vertical e subordinada ao Estado.

O Estado dirigia o funcionamento da organização sindical nos três planos: o sindicato, a federação e a confederação. A Constituição de 1937 e a CLT, de 1943, ratificam a Lei de Sindicalização de 1931.

A repressão ao sindicalismo revolucionário e independente –

tutela e atrelamento do sindicato ao Estado

A Era Vargas e a ditadura militar

Comemoração do Dia do Trabalho na Era Vargas

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

O elemento fundamental da nova estrutura consiste no imposto sindical, em que cada operário é obrigado a pagar o correspondente a um dia de trabalho ao ano, sendo sindicalizado ou não.

Esse imposto é recolhido pelo Ministério do Trabalho e uma porcentagem dele é distribuída aos sindicatos por meio da subvenção social ou seja, a transferência de recursos financeiros públicos para organizações de caráter assistencial e sem fins lucrativos.

Com isso, os sindicatos converteram-se em instituições de assistência social, fornecedores de serviços sociais (serviços médicos, colônias de férias, etc.). A intenção era manter uma burocracia sindical política e economicamente vinculada ao Ministério do Trabalho, já que o Imposto Sindical trazia para o Estado e para as corporações boa quantia de recursos financeiros.

No entanto, a utilização desse dinheiro era vetada para fundos de greve e para propaganda política. Cria-se, assim, uma relação de dependência entre o movimento operário e o Estado.

A estrutura sindical construída no Estado Novo se manteve no período pós-Segunda Guerra Mundial. Entre 1945 e 1964, ocorreu o período conhecido como nacional desenvolvimentista, em que o Estado se associa ao grande capital internacional para ampliar as bases da industrialização e da expansão ao interior.

Um projeto nacional de infraestrutura para a consolidação do modo de produção capitalista baseado na indústria. Cresce, com isso, a importância da classe operária, principalmente nos grandes centros, tendo o ABC Paulista como seu núcleo mais dinâmico.

Os sindicatos continuam subordinados ao poder do Estado, e o controle se dá principalmente pelo imposto sindical, extraído compulsoriamente dos trabalhadores e transformado em recursos financeiros nas mãos dos patrões e dos sindicalistas pelegos (termo que se refere àqueles que utilizam a estrutura sindical para “amortecer” a luta de classes e transforma os aparelhos em ”anteparo” dos conflitos, feito um acolchoado no lombo dos cavalos, para amaciar o atrito e facilitar a montaria do cavaleiro).

É corrente entre os estudiosos da história política e social brasileira identificar esse período como a “redemocratização”, pois se saía de um período de ditadura, marcado pela repressão policial, cooptação ou atrelamento do movimento sindical, cassação dos direitos políticos e prisão das lideranças que se alinhavam contra Vargas e o Estado Novo. Essa ditadura teve seu auge entre 1937 e 1945. Mesmo com a chamada redemocratização, os instrumentos de controle e repressão permaneceram.

O Movimento Sindical, pelo menos nos seus setores majoritários, permaneceu atrelado ao imposto sindical e ideologicamente não se buscou o rompimento dos laços orgânicos que subordinavam os sindicatos ao Estado.

Em 1945 os comunistas tentam impulsionar uma ruptura do sindicalismo com o Estado. Essa busca de alternativa materializa-se na criação do Movimento Unificador dos Trabalhadores (MUP). Eles reivindicavam uma reforma sindical, nos aspectos mais importantes da estrutura oficial, como o direito de organizar sindicatos independentes da chancela do Ministério do Trabalho e ter maior autonomia política para suas ações.

Apesar dessa busca de autonomia, os comunistas continuam participando da Frente Democrática Antifascista, no período inicial da “Guerra Fria”, em aliança com os setores ligados ao Varguismo. “Guerra Fria” é a denominação que se dá ao processo de trégua capitaneado pelos EUA e URSS com o fim da segunda guerra mundial, em que se divide o mundo em dois grandes blocos geopolíticos: o bloco comunista, ou do leste europeu, sob liderança da URSS, e o bloco capitalista, na Europa ocidental e Américas, com hegemonia dos EUA.

Em 1947 o Partido Comunista Brasileiro é colocado na ilegalidade e a repressão aos comunistas volta com toda força. Mesmo assim, ao arrepio da legislação trabalhista e sindical, o movimento sindical busca se organizar de forma autônoma, surgindo várias organizações sindicais independentes, sob forma de plenárias, movimentos horizontais, articulações interestaduais.

Criada na década de 50, a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT ) foi a mais importante, consolidada no início da década de 60, já no governo de João Goulart (1961-1964).

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

No contexto nacional desenvolvimentista, de 1950 até o início da década de 60, o movimento sindical se fortalece. Os sindicatos se transformam em interlocutores importantes dos trabalhadores diante dos patrões e do Estado.

Essa influência institucional crescente torna o sindicalismo participante da vida política nacional.

No entanto, os sindicatos ainda não conseguiram se organizar, nem tampouco superar a dependência do Estado. A crescente industr ial ização e a consequente urbanização, como produto desta, leva a um processo de declínio do campesinato e do trabalho no setor agrário da economia.

A classe operária e o trabalho nas fábricas assumem um protagonismo que tem como desdobramentos a maior influência dos sindicatos operários e urbanos como força política de vanguarda nas lutas e movimentos políticos, principalmente no início da década de 60.

Os fenômenos da industrialização, urbanização e expansão para os estados do interior (Centro-Oeste, Norte) fortalece outros grupos e camadas sociais, como as classes médias, os empresários industriais, a burocracia estatal, os militares e os segmentos da intelectualidade brasileira.

Consolida-se uma sociedade civil diferenciada, urbana e incorporada ao espírito da indústria, do comércio e do consumo. A classe dominante e as classes médias, como acontece historicamente, tornam-se protagonistas dos valores conservadores e individualistas, a partir de então, alimentada pela possibilidade de maior consumo.

No governo de João Goulart há um acirramento dos conflitos de interesses entre esses diferentes grupos. Os embates políticos se aguçam na medida em que o espaço público se alarga.

Os sindicatos assumem a ponta desse processo de confrontação, intensificando as lutas salariais e em defesa de diretos trabalhistas, questionando a crescente dependência econômica do Estado brasileiro em relação ao capital estrangeiro.

A classe operária e os setores do funcionalismo público, como os professores e os estudantes (o movimento estudantil é, nesse contexto histórico, um importante sujeito político coletivo)

intensificam as jornadas de lutas e as exigências por reformas de base, principalmente nos campos da educação, saúde, moradia, emprego e reforma agrária.

Os comunistas, as lideranças independentes vinculadas aos setores progressistas da Igreja e os intelectuais nacionalistas assumem abertamente a defesa das reformas, da ampliação das lutas sociais, da ruptura com a dependência econômica e política externa e, por consequência, a defesa do governo Goulart.

Pressionam o Estado para obter ganhos econômicos, sociais e políticos. A correlação de forças aparentemente possibilitava o avanço dos movimentos sociais, e o governo sinalizava favoravelmente nessa direção.

O Movimento Sindical busca maior autonomia, formando uniões sindicais independentes, como o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT, diferente da Confederação Geral dos Trabalhadores), fundado em 1962, no auge das lutas operárias e estudantis. Intensifica-se assim a participação dos sindicatos na vida política nacional.

Perigosamente, essa crescente influência não resultou em maior aprofundamento da autonomia, fortalecimento coletivo e formação política dos trabalhadores. Não se constituíram movimentos independentes e desatrelados do Estado. Pelo contrário: os movimentos estavam vinculados aos interesses oficiais. O apoio de Goulart aos sindicatos – essa aliança do sindicalismo com o Estado – produziu uma ilusão de poder; uma subestimação das reais forças da classe trabalhadora.

Os sindicatos foram estimulados a radicalizar nos discursos e nas ações políticas, indo muito além do que suas próprias forças garantiam. Um sindicalismo de vanguarda, sem a suficiente retaguarda das massas. Não se nega a necessidade e a coerência da busca pelas lutas de massas e as reivindicações coletivas como instrumentos essenciais para os trabalhadores na busca de seus direitos e na transformação do Estado.

O que se questiona é se as direções compreendem a realidade objetiva e a correlação das forças em disputa no terreno da luta de classes. Na visão sindicalista atual, a capacidade de reação das classes dominantes e dos setores médios urbanos foi

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subestimada, eivada de conservadorismo e de outros valores burgueses.

O fantasma vermelho, a ameaça do comunismo e o medo do barulho nas ruas tão largamente vociferados e ardilosamente fermentados pela direita brasileira não foram devidamente dimensionados pelas forças da esquerda social e política no período 1961-1964. Veio o golpe fascista, executado pelos militares, sob o patrocínio do grande capital estrangeiro e do governo dos EUA.

Uma lição que mais tarde seria apreendida pelo movimento sindical pós-ditadura militar: que as direções não podem substituir as massas. Pelo contrário, somente o movimento concreto da classe pode garantir conquistas e poder político.

A fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) foi produto histórico da luta organizada de um múltiplo e diversificado leque de forças sociais e políticas do Brasil. O resultado foi um amplo movimento de contestação e combate às doutrinas e às práticas violentas e autoritárias do regime militar, em busca do resgate do estado democrático de direito.

A existência da CUT significou, no campo sindical, um rompimento concreto com os limites da estrutura sindical oficial corporativa e um profundo avanço dos trabalhadores na conquista de direitos humanos, civis e sociais.Dados do Censo Sindical, produzido pelo IBGE de

2002, atualizados pelo DIEESE em 2006, indicam que os sindicatos ainda enfrentam os problemas produzidos pelo vendaval neoliberal que varreu o mundo contemporâneo, arrancou raízes, destruiu identidades, disseminou o individualismo e esvaziou os processos coletivos de produção da solidariedade de classe dos trabalhadores.

A ofensiva neoliberal na década de 90 e sua lógica destrutiva produziu profundos e extensos estragos nas economias, nas sociedades e principalmente nos movimentos sociais organizados no Brasil e no mundo. Dentre eles, os sindicatos sofreram grandes perdas no campo combativo e classista que se forjou na década de 80.A CUT não ficou imune a essa ofensiva. A maioria de suas lideranças ficou dividida entre a perplexidade, a resistência fragmentada (setores e correntes minoritárias no interior da CUT) e a “adesão propositiva”.

Da agenda neoliberal faziam parte a remoção do “excesso de proteção” ao trabalho e o “arcaico corporativismo sindical” herdado da Era Vargas. A flexibilização dos direitos trabalhistas, vistos como obstáculo à livre negociação conduzida pelos interesses do mercado é, para os neoliberais, a garantia de relações trabalhistas “modernas e livres”, portanto, sem a necessidade de intermediações dos sindicatos e de “interferência indevida” do Estado. A consequência direta da flexibilização é a precarização do emprego, o subemprego e o desemprego.

Um dos principais obstáculos à consolidação das p o l í t i c a s n e o l i b e r a i s d o gr a n d e c a p i t a l internacionalizado no Brasil foi, sem dúvida alguma, a resistência dos trabalhadores, especialmente os setores mais organizados e combativos, com experiências acumuladas de lutas, reunidos em torno da CUT.

Para as classes dominantes era premente construir uma ferramenta que fosse instrumento de disputa de hegemonia dentro do próprio mundo do trabalho. Não bastava só atacar os sindicatos e as organizações populares; era necessário disputar no próprio campo.

Ressurgimento do Sindicalismo Combativo: da transição da ditadura ao Estado de

direito e ao neoliberalismo

Cartaz histórico da greve dos metalúrgicos da Mannesmann em 1979 (Arquivo: Liga Operária)

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Referências bibliográficas:

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A CONDSEF foi criada durante o 3º Congresso dos Servidores Públicos Federais, realizado entre 28 e 31 de agosto de 1990, no Centro de Convenções, em Brasília. Foi um congresso massivo, que contou com a participação de 1.185 delegados, 331 suplentes e 27 observadores. Por decisão de 65% dos delegados presentes, foi criada a Confederação Democrática dos Trabalhadores no Serviço Público Federal.

Participaram do III Congresso dos Servidores Públicos Federais as seguintes entidades: FASUBRA, SINDSEP-DF, FENASPS, FENASMIT, SINDSEP/MA, ASSIBGE, FETRAMS, SINTRASEF/RJ e SINDFAZ/PR. A finalidade era criar uma Entidade Nacional que aglutinasse todos os trabalhadores e suas federações, Sindicatos Nacionais em uma só entidade com o fito de fortalecer a luta e a organização sindical no combate aos ataques do Governo Federal contra a categoria.

O ano de 1990 foi um marco para os trabalhadores no Serviço Público Federal. Houve um comparecimento massivo para os trabalhadores discutirem e aprovarem a criação da CONDSEF – atualmente a maior Confederação de Servidores Públicos Federais do Brasil, representando aproximadamente 500 mil trabalhadores.

Inicialmente a sigla CONDSEF designava a Confederação Democrática dos Servidores Públicos Federais. A alteração para a atual nomenclatura – Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal – foi deliberada na Plenária Estatutária, realizada em junho de 1996 na cidade do Rio de Janeiro. A CONDSEF é filiada à Central Única dos Trabalhadores – CUT, DIAP, DIEESE e integra a Coordenação de Entidades de Servidores Públicos Federais – CNESF.

A partir da Plenária Estatutária de julho de 1996, foram incorporados à Estrutura Organizacional da CONDSEF os Departamentos Setoriais, como instâncias organizativas. O objetivo foi de atender as demandas específicas dos diversos setores que compõem a base da CONDSEF.

Atualmente estão estruturados treze departamentos setoriais: Departamento dos Trabalhadores em Saúde (DESC); Departamento dos Trabalhadores em Agricultura e Reforma Agrária (DARA); Departamento do Pessoal Civil dos Órgãos Militares (DOMC); Departamento dos Trabalhadores em Educação (DEC); Departamento dos Aposentados e Pensionistas (DENAP); Departamento dos Trabalhadores da Fazenda (DENFA); Departamento dos Trabalhadores do Meio Ambiente (DENTMA); Departamento Extraordinário dos Trabalhadores dos Ex-Territórios (DEEXT); Departamento de Ciência e Tecnologia (C&T); Departamento de Segurança e da Advocacia Pública (DESAP); Departamento de Infra-estrutura (DINFRA); Departamento dos Trabalhadores do Ministério do Trabalho e Emprego (DEMITRE) e Comissão Nacional de Demitidos e Anistiados.

Sindicatos Gerais: por quê?

CONDSEF: HISTÓRIA, CONCEPÇÃO E ORGANIZAÇÃO

Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

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A concepção da Confederação implica organização, prática de luta e relação com as entidades filiadas. A CONDSEF defende a liberdade e a autonomia sindical, a diversidade e pluralidade na entidade, a organização pela base e os sindicatos gerais. Esses quatro pontos são centrais na formulação do pensamento da Confederação sobre o Movimento Sindical.

Para a CONDSEF, a liberdade e a autonomia sindical têm rebatimento imediato nas finanças, na luta, na capacidade de organização e no relacionamento com as entidades filiadas. As finanças se referem às contribuições e ao posicionamento claro e inequívoco contra o Imposto Sindical Compulsório, determinado pela CLT.

Desde a sua fundação, a entidade entrou na justiça contra o recolhimento. A CONDSEF não é uma entidade cartorial; é um instrumento de luta, independente, com espaço para realizar diversas ações contra a exploração, sempre ao lado do trabalhador.

A existência da CONDSEF é sustentada pela contribuição espontânea de cada filiado aos sindicatos de base. Os recursos são repassados à CONDSEF pelas entidades filiadas. A organização da CONDSEF depende então apenas da capacidade da categoria, que não é burocrática, definida pela luta de classes.

Como bem se sabe, o potencial de luta e organização não é isolado da correlação de forças entre as classes dominantes e os trabalhadores no Brasil e no mundo. Aí repousa a capacidade, que pela independência, concede a liberdade de criar condições favoráveis, influenciando e contribuindo para modificar a conjuntura a favor da representatividade, dos trabalhadores do serviço público, enfim, de todos os explorados. Portanto, a relação com as entidades tinha que expressar tal liberdade.

Busca-se sempre a unidade entre CUT, CONDSEF e Sindicatos Filiados, mas essa unidade é formada com o acúmulo de forças e o consenso; nunca por meio da imposição.

A estrutura da Confederação, com os fóruns de discussão e de deliberação, busca unificar a luta por meio do fortalecendo da categoria e do setor,

mantendo sempre a coerência com a argumentação da liberdade e da autonomia sindical. Portanto, pode-se afirmar sempre que a entidade é independente do Estado, dos patrões, dos partidos e dos governos. A CONDSEF tem clareza que é esse um dos pontos centrais de formação sindical combativa e classista.

Desde a sua fundação, a CONDSEF é filiada à CUT e ligada ao espírito democrático do movimento de esquerda que se formou no Brasil após a Ditadura Militar. Nesse contexto, a entidade defende a ampla democracia e a plena representatividade. As e le ições promovidas pela CONDSEF são congressuais, momento em que os Sindicatos elegem um para cada 100 filiados para representá-los como delegados.

O processo eleitoral com formação de chapa acontece durante a realização dos congressos organizados pela Confederação. Os pleitos adotam o critério de representação proporcional. A CONDSEF não defende a unicidade sindical nem, tampouco, o monolitismo confederativo.

Considera-se um processo de formação e de crescimento político a oportunidade de estabelecer o diálogo com os diversos setores da CUT que existem na categoria que a CONDSEF representa. É importante também unificar linhas comuns para uma ação unificada. As disputas são realizadas e mantidas sempre por meio do diálogo, do convencimento e do exercício democrático do voto.

Assim a Confederação cultiva uma política de diversidade, de pluralidade, de choques de ideias, tendo clareza que o objetivo maior do movimento será sempre levado por todos: a defesa dos trabalhadores, a luta por conquistas e melhoria da qualidade de vida e a destruição da contradição entre capital e trabalho para criar uma sociedade regida pela solidariedade. Se entre os pilares democráticos está a diversidade, a pluralidade, o direito amplo e irrestrito de cada filiado; se cada força de pensamento concorrer aos cargos e votar, fazendo valer o critério da proporcionalidade, o outro princípio que se preza é a participação de base. A aposta, portanto, é em uma entidade com a base organizada. No caso da CONDSEF, a base direta organizada são os sindicatos.

Concepção e Prática Sindical

Entretanto, dialoga-se constantemente com as filiadas, acreditando-se na organização de base em cada Estado. A entidade trabalha com a certeza de que há na categoria um consenso e uma disposição de compor as Organizações por Local de Trabalho (OLT), ou seja, por meio das Delegacias Sindicais, de espaços reais de decisão dos delegados sindicais, etc.

A b a s e o rg a n i z a d a , a l é m d e re fo rç a r a democratização das entidades de base e, por consequência, da CONDSEF são os verdadeiros suportes de luta. Quanto maior o nível de organização, maior a possibilidade de lutar e vencer.

A CONDSEF se apoia nesse processo contínuo de democratização, defendendo a democracia e a p re n d e n d o d i a l e t i c a m e nte a s e to r n a r democrática. Na sociedade atual, a classe dominante só usa a democracia no discurso e a substitui por um autoritarismo velado ou, às vezes, descarado.

Uma das marcas fundamentais nesse processo de organização são os Sindicatos Gerais. A defesa desse modelo organizativo marca toda a história da categoria, pois, as classes de trabalhadores foram criadas pelos sindicatos gerais, com os quais se dialoga até hoje em todos os espaços sindicais, defendendo o papel que cumprem e sua importância estratégica no Movimento Sindical.

Além disso, a defesa dos Serviços Públicos, em que se está aprofundando com o tempo, vem apontando a unidade de todos os setores, não apenas para lutas corporativas, mas, principalmente para lutas de interesse de toda a sociedade que precisa e utiliza os serviços, em defesa da Nação.

Isso impõe ao Movimento Sindical a capacidade de formular um projeto global, tendo clareza de todas as suas fases, em todas as esferas, na relação com a sociedade civil.

Trata-se de um projeto de desenvolvimento solidário em que o Estado assume uma função diferenciada. No lugar da repressão, da dominação direta, o Estado começa a exercer papel-chave na estrutura da sociedade, superando problemas estruturais. Sabe-se que a neutralidade do Estado é impossível.

Por isso, é preciso que as entidades se tornem sempre autônomas em relação ao Estado, mas com um

posicionamento claro de que o Estado deve estar ao lado dos trabalhadores.

A unificação dos diversos setores facilita a posição da categoria, permite uma análise mais profunda e geral e a qualifica com propostas concretas para as diversas ações do Estado. Nesse sentido, a divisão somente faz fragi l izar os movimentos e manifestações dos trabalhadores.

Além disso, os sindicatos gerais não permitem que o governo transfira uma ou outra liderança de um órgão para outro, fragilizando ou mesmo acabando com toda uma direção sindical.

Não se pode calar quando o próprio movimento toma rumos que reforçam a posição das classes dominantes. É preciso estabelecer o diálogo entre os trabalhadores, buscando atraí-los para a unificação da classe. Unificação essa que começa dentro da categoria, mas avança para o conjunto dos trabalhadores com a unificação dos movimentos sociais e da CUT.

Atualmente há sindicatos na base da CONDSEF que são específicos. Não há necessidade de omitir isso.

Tais organizações são fundamentais para a luta e têm dado contr ibuições impor tantes na organização da CONDSEF e das ações conjunturais. Por outro lado, em todos os momentos discutidos e debatidos com os trabalhadores que compõem a classe trabalhadora, é ressaltada a importância dos Sindicatos Gerais.

Não se consegue nada em uma relação despolitizada. A presença dessas entidades propicia um crescimento. É preciso que elas estejam do mesmo lado para fortalecer a luta, ao mesmo tempo em que se busca promover um diálogo permanente sobre o papel das organizações sindicais, sua concepção e prática.

O momento não é de divisão. Muito pelo contrário. Deve-se pensar nos passos para a nossa vitória; para uma campanha unificada, em defesa dos Serviços Públicos, da melhoria das condições de trabalho e de salários. O momento exige um grau de organização e unificação superior para enfrentar um Governo que conseguiu impor mais de cinco anos sem reajuste para o conjunto da categoria.

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

O SINDSEP-MG nasce nas lutas dos trabalhadores brasileiros contra a ditadura militar e contra a crise econômica da década de 70. Esses fatos combinaram arrocho salarial e ausência de liberdade democrática.

O Sindicato é fruto, portanto, do novo sindicalismo que surgiu e se consolidou na defesa da liberdade e da autonomia sindical, da redemocratização da sociedade e do resgate do Estado democrático de direito. O SINDSEP-MG esteve presente nas lutas pela anistia geral e irrestrita, no movimento popular Diretas Já e na Constituinte soberana e democrática. Foram muitas lutas; muitas conquistas.

Mesmo com os direitos conquistados na Constituição de 1988 – entre eles o direito de sindicalização e de organização sindical –, os servidores públicos federais continuavam enfrentando muitas dificuldades.

Em 1989, a inflação no Brasil era exorbitante e os salários dos servidores federais, arrochados. Em Belo Horizonte, um grupo de servidores públicos federais, cansados da ofensiva do governo Sarney contra o Serviço Público, assumem uma tarefa ousada e fundam o SINDSEP-MG.

De lá para cá, muita coisa mudou. Houve muitas lutas. Tantas greves; umas vitoriosas, outras nem tanto. Muitas conquistas. Após 21 anos de organização e luta, a entidade conta com mais de 9 mil filiados em todo o estado de Minas Gerais.

E o objetivo da diretoria colegiada do SINDSEP-MG é ampliar a participação dos trabalhadores nas lutas gerais e no dia a dia do sindicato. Para isso, é importante a organização política na base e nos locais de trabalho intensificar e estimular a ação sindical e a formação política e cidadã, além de aumentar o número de filiados, trazendo cada vez mais servidores para a luta.

Uma das bandeiras de mobilizações do SINDSEP-MG é a defesa do Serviço Público. Essa bandeira vem sendo defendida ao longo das duas décadas de existência da entidade. O processo de privatização e desmantelamento do Serviço Público teve início no governo Collor e foi aprofundado no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC).

Com o projeto neoliberal, a situação do servidor público só foi piorando. Buscando jogar a população (na maioria, excluída dos serviços públicos e das políticas sociais) contra a categoria, o governo aplicou nas costas dos servidores o carimbo de “ m a r a j á s ”. C o m e ç a v a a í a o f e n s i v a d e desestruturação do Serviço Público que dura até hoje.

Os servidores lutaram intensamente na defesa dos serviços públicos e de políticas de Estado para a maioria da população. Os servidores públicos enfrentaram uma enorme ofensiva da mídia e dos grandes empresários, principalmente estrangeiros, na chamada abertura comercial e globalização.

Essa ideologia de mercado tinha o objetivo de leiloar o patrimônio público construído pelo trabalho do povo brasileiro. Com isso, uma agenda de privatizações e de desregulamentação do mercado de trabalho se intensificou, ocasionando flexibilizações e perdas de direitos, principalmente dos servidores públicos. O neoliberalismo foi a política adotada no Brasil

SINDSEP-MG: História de um Sindicato de Luta

Carla Cruz

Helder Molina

Nascem as lutas da década de 80e o contexto do novo sindicalismo

Duas décadas de muitas lutas contra a ofensiva privatizante

do neoliberalismo

Manifestação na Praça 7, em Belo Horizonte, contra o desmonte do Serviço Público promovido pelo governo FHC

Arquivo: SINDSEP-MG

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

durante os governos Collor e FHC que atende aos interesses do capital estrangeiro e da burguesia brasileira, usurpando os direitos e os interesses dos trabalhadores. A política neoliberal produziu uma profunda desregulamentação do mercado de trabalho e a supressão dos direitos sociais, as privatizações do patrimônio público, a abertura comercial, com a consequente destruição da indústria nacional e do emprego.

Atualmente os sindicatos enfrentam uma ofensiva desregulamentadora do capital contra o trabalho materializada em novas formas e conteúdos. A terceirização, a flexibilização, a precarização, a informalização, dentre outros são mostras e efeitos causados pelas investidas do capital contra o trabalho.

A justificativa para a desregulamentação e a flexibilização das normas trabalhistas se baseava numa suposta necessidade de adaptação do país à concorrência internacional, conseguida com a facilidade de contratação e demissão de trabalhadores, eliminando custos e impulsionando a rotatividade da força de trabalho. Essas mudanças facilitaram as contratações por tempo determinado, a subcontratação, a negociação por empresa, enfim, a flexibilidade ou o livre movimento para o capital.

No final da década de 80 e início da década de 90, a luta dos servidores públicos federais, em Minas Gerais, era organizada por meio das Associações. Essas entidades não eram o sindicato propriamente dito, mas tinham caráter sindical.

As negociações salariais, de benefícios e por melhores condições de trabalho eram feitas por intermédio das associações. O sindicato não existia formalmente. Isso porque, até a Constituição de 1988, não era permitida a existência de sindicatos de servidores públicos federais. Havia, contudo, uma ação sindical para pressionar o governo a atender as reivindicações dos servidores.

A partir de 1988, os servidores puderam criar seus sindicatos. O primeiro sindicato a ser fundado foi o

do Distrito Federal - o SINDSEP-DF – em 28 de agosto de 1987. Logo depois, em 26 de abril de 1989, surgiu o SINDSEP-MG. O processo foi árduo. Naquela época, os servidores tinham de ir de repartição em repartição para convencer os outros servidores da necessidade de criar um sindicato. Nascia aí o instrumento de luta dos servidores públicos federais de Minas Gerais contra a exploração.

Como naquela época existiam as associações, quando os servidores conquistaram o direito de fundar o próprio sindicato, muitos servidores não conseguiam perceber a importância dessa conquista.

O primeiro passo rumo à consolidação do SINDSEP-MG como entidade representativa dos servidores públicos federais, em Minas Gerais, foi esclarecer para as pessoas a importância e o poder de um sindicato, ressaltando os benefícios que esse tipo de organização poderia trazer para a categoria.

Surgiu grande polêmica em torno da consequente substituição das associações pelos sindicatos. As ideias foram amadurecendo com o tempo e as duas entidades coexistiam da seguinte maneira: as associações tratavam de assuntos mais específicos da categoria; o sindicato trataria dos assuntos gerais. Ainda durante o governo Sarney, os servidores públicos federais mineiros participaram da histórica greve de 1988, quando conquistaram a Gratificação de Atividade Executiva (GAE), o auxílio-creche, o auxílio-transporte, dentre outros direitos.

Em 1990, já como SINDSEP-MG, as ações do Sindicato foram decisivas para a implantação do Regime Jurídico Único dos Servidores, que durante o governo de FHC foi totalmente descaracterizado.

No mandato de Itamar Franco, os servidores organizaram outra grande greve em 93, quando conquistaram a elevação da GAE para 160%, o pagamento das 12 referências, o direito ao tíquete-refeição e ao plano de saúde. Lutaram e também conquistaram, em parte, o retorno de vários servidores demitidos durante o governo Collor.

Com a chegada de FHC, em 1994, fiel escudeiro e fantoche do Fundo Monetário Internacional (FMI), mais uma vez os servidores foram alvos de uma série de ataques. FHC implantou o mais brutal arrocho na história dos servidores, desmontou órgãos públicos,

SINDSEP-MG: Instrumento coletivo de luta

Carla Cruz

f e z a c o n t r a r r e f o r m a a d m i n i s t r a t i v a e desregulamentou a Lei nº 8.112.

No entanto, a resistência do SINDSEP-MG, ao lado de todos os sindicatos de servidores públicos do país, representou uma grande barreira para que FHC não aplicasse todos os seus planos.

O SINDSEP-MG defende um sindical ismo combativo, autônomo em relação ao Estado, aos patrões e aos partidos políticos, independente e de luta, comprometido com os interesses dos trabalhadores do serviço público de Minas Gerais.

Nesse sentido, o Sindicato adota uma postura crítica e independente em relação ao governo Lula, ao qual grande parte da categoria depositou confiança e

esperança. A entidade reconhece vários avanços para o serviço público e para os servidores, conquistados durante o atual governo.

Houve um processo de resgate do papel do Estado, mas a política de resgate da dignidade dos trabalhadores do serviço público não avançou no ritmo que se esperava. Muitas questões não foram resolvidas, e só com a mobilização coletiva e permanente é que será possível conquistar.

Todos os anos a categoria e o sindicato tiveram de aprofundar nas mobilizações, passeatas, atos regionais e caravanas nacionais, exercendo pressão sobre os poderes legislativo, executivo e judiciário federal. A entidade se posiciona em vigília na luta constante pela implantação de reivindicações e direitos da categoria.

Organizando greves – muitas greves – e demonstrando, de forma clara, a autonomia e a independência perante os governos, patrões e partidos políticos, o SINDSEP-MG permanece ativo nas lutas pelas conquistas dos direitos dos servidores.

Ao defender um serviço público digno e de qualidade, o Sindicato defende todos os direitos do servidor, lutando por um Brasil justo e melhor para todos, sem opressão nem oprimidos.

Referências:

Helder Molina, com informações do SINDSEP-MG e da CONDSEF

O SINDSEP-MG e as tarefas e lutas de hoje

Helder Molina

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Meus caros amigos e companheiros,

Este é o texto original do Manifesto Comunista escrito por Marx e Engels, em 1848, sem os vários prefácios das várias edições em diferentes datas e línguas.

Texto fundamental para compreender a história da sociedade de classes, desde os tempos antigos – escravismo, feudalismo –, até a consolidação do modo de produção capitalista.

É um importante instrumento para compreender a mercadoria, o fetiche, a exploração, a mais-valia, a alienação, a formação da consciência de classe, a luta anticapitalista e o surgimento do movimento operário...

Todo militante sindical e/ou partidário que se considera de esquerda, socialista, que luta contra o capitalismo, deve ler, estudar e conhecer o teor desse Manifesto.

Boa leitura!

Helder Molina (Rio, fevereiro de 2001)

“Por burguesia compreende-se a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social, que empregam o trabalho assalariado. Por proletariado compreende-se a classe dos trabalhadores assalariados modernos que, privados de meios de produção próprios, se vêem obrigados a vender sua força de trabalho para

poder existir.” (Nota de F. Engels à edição inglesa de 1888)

Karl Marx Friedrich Engels

Manifesto do Partido ComunistaKarl Marx e Friedrich Engels em dezembro de 1847

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

Introdução

A história de todas as sociedades que existiram até os dias atuais tem sido a história das lutas das classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de corporação e oficial, numa palavra, opressores e oprimidos em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada, uma guerra que termina sempre, ou por uma transformação evolucionária da sociedade inteira, ou pela destruição das suas classes em luta.

Nas primeiras épocas históricas, verificamos quase por toda parte, uma completa divisão da sociedade em classes distintas, uma escala graduada de condições sociais. Na Roma antiga encontramos patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos; na Idade Média, senhores feudais, vassalos, mestres, oficiais e servos e, em cada uma dessas classes, gradações especiais.

A sociedade burguesa moderna, que brotou das ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classes. Não fez senão substituir velhas classes, velhas condições de opressão, velhas formas de luta por outras novas.

Entretanto, a nossa época, a época da burguesia, caracteriza-se por ter simplificado os antagonismos de classes. A sociedade divide-se cada vez mais em

dois vastos campos opostos, em duas grandes classes diametralmente opostas: a burguesia e o proletariado.

Dos servos da Idade Média nasceram os plebeus livres das primeiras cidades; dessa população municipal, saíram os primeiros elementos da burguesia.

A descoberta da América, a circum-navegação da África ofereceram à burguesia ascendente um novo campo de ação. Os mercados da Índia e da China, a colonização da América, o comércio colonial, o incremento dos meios de troca e, em geral, das m e r c a d o r i a s i m p r i m i r a m u m i m p u l s o , desconhecido até então, ao comércio, à indústria, à navegação e, por conseguinte, desenvolveram rapidamente o elemento revolucionário da sociedade feudal em decomposição.

A antiga organização feudal da indústria, em que essa era circunscrita a corporações fechadas, já não podia satisfazer às necessidades que cresciam com a abertura de novos mercados. A manufatura a substituiu. A pequena burguesia industrial suplantou os mestres das corporações, a divisão do trabalho entre as diferentes corporações desapareceu diante da divisão do trabalho dentro da própria oficina.

Um fantasma ronda a Europa - o fantasma do comunismo. Todas as potências da velha Europa unem-se numa Santa Aliança para conjurá-lo: o papa e a czar, Metternich e Guizot, os radicais da França e os policiais da Alemanha.

Que partido de oposição não foi acusado de comunista por seus adversários no poder? Que partido de oposição, por sua vez, não lançou a seus adversários de direita ou de esquerda a alcunha infamante de comunista? Duas conclusões decorrem desses fatos:

1. O comunismo já é reconhecido como força por todas as potências da Europa; 2. É tempo de os comunistas exporem, à face do mundo inteiro, seu modo de ver, seus fins e suas tendências, opondo um manifesto do próprio partido à lenda do espectro do comunismo.

Com esse fim, reuniram-se, em Londres, comunistas de várias nacionalidades e redigiram o manifesto seguinte, que será publicado em inglês, francês, alemão, italiano, flamengo e dinamarquês.

PARTE 1 - BURGUESES E PROLETÁRIOS

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Todavia, os mercados ampliavam-se cada vez mais: a procura de mercadorias aumentava sempre. A própria manufatura tornou-se insuficiente, então, o vapor e a maquinaria revolucionaram a produção industrial. A grande indústria moderna suplantou a manufatura; a média burguesia industrial cedeu lugar aos milionários da indústria - chefes de verdadeiros exércitos industriais - os burgueses modernos.

A grande indústria criou o mercado mundial preparado pela descoberta da América. O mercado m u n d i a l a c e l e r o u p r o d i g i o s a m e n t e o desenvolvimento do comércio, da navegação, dos meios de comunicação. Esse desenvolvimento reagiu por sua vez sobre a extensão da indústria; e à medida que a indústria, o comércio, a navegação, as vias férreas se desenvolviam, crescia a burguesia, multiplicando seus capitais e relegando a segundo plano as classes legadas pela Idade Média. Vemos pois, que a própria burguesia moderna é o produto de um longo processo de desenvolvimento, de uma série de revoluções no modo de produção e de troca.

Cada etapa da evolução percorrida pela burguesia era acompanhada de um progresso político correspondente. Classe oprimida pelo despotismo feudal, associação armada administrando-se a si própria na comuna, aqui, República urbana independente; ali, terceiro estado, tributário da m o n a r q u i a , d e p o i s , d u r a n t e o p e r í o d o manufatureiro, contrapeso da nobreza na monarquia feudal ou absoluta, pedra angular das grandes monarquias.

A burguesia, desde o estabelecimento da grande indústria e do mercado mundial, conquistou, finalmente, a soberania política exclusiva no Estado representativo moderno. O governo do estado moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa.

A burguesia desempenhou na história um papel eminentemente revolucionário. Onde quer que tenha conquistado o Poder, a burguesia destruiu as relações feudais, patriarcais e idílicas. Ela despedaçou sem piedade todos os complexos e variados laços que prendiam o homem feudal a seus "superiores naturais" para só deixar subsistir, entre os homens, o laço do frio interesse, as cruéis exigências do "pagamento à vista".

Afogou os fervores sagrados do êxtase religioso, do

entusiasmo cavalheiresco, do sentimentalismo pequeno-burguês nas águas geladas do cálculo egoísta. Fez da dignidade pessoal um simples valor de troca; substituiu as numerosas liberdades, conquistadas com tanto esforço, pela única e implacável liberdade de comércio. Em uma palavra, em lugar da exploração velada por ilusões religiosas e políticas, a burguesia colocou uma exploração aberta, cínica, direta e brutal.

A burguesia despojou de sua auréola todas as atividades até então reputadas veneráveis e encaradas com piedoso respeito. Do médico, do jurista, do sacerdote, do poeta, do sábio fez seus servidores assalariados. A burguesia rasgou o véu do sentimentalismo que envolvia as relações de família e reduziu-as a simples relações monetárias.

A burguesia revelou como a brutal manifestação de força na Idade Média, tão admirada pela reação, encontra seu complemento natural na ociosidade mais completa. Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade humana: criou maravilhas maiores que as pirâmides do Egito, os aquedutos romanos, as catedrais góticas: conduziu expedições que empanaram mesmo as antigas invasões e as cruzadas.

A burguesia só pode existir com a condição de revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais. A conservação inalterada do antigo modo de produção constituía, pelo contrário, a primeira condição de existência de todas as classes industriais anteriores. Essa subversão continua da produção, esse abalo constante de todo o sistema social, essa agitação permanente e essa falta de segurança distinguem a época burguesa de todas as precedentes.

Dissolvem-se todas as relações sociais antigas e cristalizadas, com seu cortejo de concepções e de ideias secularmente veneradas, as relações que as substituem tornam-se antiquadas antes mesmo de ossificar-se. Tudo que era sólido e estável se esfuma; tudo o que era sagrado, é profanado e os homens são obrigados finalmente a encarar com serenidade suas condições de existência e suas relações recíprocas. Impelida pela necessidade de mercados sempre novos, a burguesia invade todo o globo. Necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vínculos em toda parte.

Pela exploração do mercado mundial, a burguesia

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imprime um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países. Para desespero dos reacionários, ela retirou da indústria sua base nacional. As velhas indústrias nacionais foram destruídas e continuam a sê-lo diariamente.

São suplantadas por novas indústrias, cuja introdução se torna uma questão vital para todas as nações civilizadas, indústrias que não empregam mais matérias--primas nacionais, mais sim matérias-primas vindas das regiões mais distantes, cujos produtos se consomem não somente no próprio país, mas em todas as partes do globo. Em lugar das antigas necessidades, satisfeitas pelos produtos nacionais, nascem novas necessidades que reclamam para sua satisfação os produtos das regiões mais longínquas e dos climas mais diversos.

Em lugar do antigo isolamento de regiões e nações que se bastavam a si próprias, desenvolve-se um i n t e r c â m b i o u n i v e r s a l , u m a u n i v e r s a l interdependência das nações. E isto se refere tanto à produção material quanto à produção intelectual. As criações intelectuais de uma nação tornam-se propriedade comum de todas. A estreiteza e o exclusivismo nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis; das inúmeras literaturas nacionais e locais, nasce uma literatura universal.

D e v i d o a o rá p i d o a p e r fe i ço a m e nto d o s instrumentos de produção e ao constante progresso dos meios de comunicação, a burguesia arrasta para a torrente de civilização, mesmo as nações mais bárbaras. Os baixos preços de seus produtos são a artilharia pesada que destrói todas as muralhas da China e obriga a capitularem os bárbaros mais tenazmente hostis aos estrangeiros.

Sob pena de morte, ela obriga todas as nações a adotarem o modo burguês de produção, constrange-as a abraçar o que ela chama civilização, isto é, a se tornarem burguesas. Em uma palavra, cria um mundo à sua imagem e semelhança.

A burguesia submeteu o campo à cidade. Criou g r a n d e s c e n t r o s u r b a n o s ; a u m e n t o u prodigiosamente a população das cidades em relação à dos campos e, com isso, arrancou uma grande parte da população do embrutecimento da vida rural. Do mesmo modo que subordinou o campo à cidade, os países bárbaros ou semibárbaros aos países civilizados, subordinou os povos camponeses aos povos burgueses, do Oriente ao Ocidente.

A burguesia suprime cada vez mais a dispersão dos meios de produção, da propriedade e da população. Aglomerou as populações, centralizou os meios de produção e concentrou a propriedade em poucas mãos. A consequência necessária dessas transformações foi a centralização política. Províncias independentes, apenas ligadas por débeis laços federativos, possuindo interesses, leis, governos e tarifas aduaneiras diferentes, foram reunidas em uma só nação, com um só governo, uma só lei, um só interesse nacional de classe, uma só barreira alfandegária.

A burguesia, durante seu domínio de classe, apenas secular, criou forças produtivas mais numerosas e mais colossais que todas as gerações passadas em conjunto. A subjugação das forças da natureza, as máquinas, a aplicação da química à indústria e à agricultura, a navegação a vapor, as estradas de ferro, o telégrafo elétrico, a exploração de continentes inteiros, a canalização dos rios, populações inteiras brotando na terra como por encanto, que século anterior teria suspeitado que semelhantes forças produtivas estivessem adormecidas no seio do trabalho social?

Vemos pois: os meios de produção e de troca, sobre cuja base se ergue a burguesia, foram gerados no seio da sociedade feudal. Esses meios de produção e de troca, as condições em que a sociedade feudal produzia e trocava, a organização feudal da agricultura e da manufatura, em suma, o regime feudal de propriedade, deixaram de corresponder às forças produtivas já desenvolvidas, ao alcançarem essas certo grau de desenvolvimento.

Entravavam a produção em lugar de impulsioná-la. Transformaram-se em outras tantas cadeias que era preciso despedaçar e foram despedaçadas. Em seu lugar, estabeleceu-se a livre concorrência, com uma organização social e política correspondente, com a supremacia econômica e política da classe burguesa.

Assistimos hoje a um processo semelhante. As relações burguesas de produção e de troca, o regime burguês de propriedade, a sociedade burguesa moderna, que fez surgir gigantescos meios de produção e de troca, assemelha-se ao feiticeiro que já não pode controlar as forças internas que pôs em movimento com suas palavras mágicas. Há dezenas de anos, a história da indústria e do comércio não é

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senão a história da revolta das forças produtivas modernas contra as atuais relações de produção e de propriedade que condicionam a existência da burguesa e seu domínio. Basta mencionar as crises comerciais que, repetindo-se periodicamente, ameaçam cada vez mais a existência da sociedade burguesia.

Cada crise destrói regularmente não só uma grande massa de produtos fabricados, mas também uma grande parte das próprias forças produtivas já desenvolvidas. Uma epidemia, que em qualquer outra época teria parecido um paradoxo, desaba sobre a sociedade - a epidemia da superprodução.

Subitamente, a sociedade vê-se reconduzida a um estado de barbaria momentânea, dir-se-ia que a fome ou uma guerra de extermínio cortaram--lhe todos os meios de subsistência; a indústria e o comércio parecem aniquilados. E por quê? Porque a sociedade possui demasiada c iv i l ização, demasiados meios de subsistência, demasiada indústria, demasiado comércio.

As forças produtivas de que dispõem não mais favorecem o desenvolvimento das relações de propriedade burguesa; pelo contrário, tornaram-se por demais poderosas para essas condições, que passam a entravá-las. Todas as vezes que as forças produtivas sociais se libertam desses entraves, precipitam na desordem a sociedade inteira e ameaçam a existência da propriedade burguesa. O sistema burguês tornou-se demasiado estreito para conter as riquezas criadas em seu seio.

De que maneira consegue a burguesia vencer essas crises? De um lado, pela destruição violenta de grande quantidade de forças produtivas; de outro lado, pela conquista de novos mercados e pela exploração mais intensa dos antigos. A que leva isso? Ao preparo de crises mais extensas e mais destruidoras e à diminuição dos meios de evitá-las.

As armas que a burguesia utilizou para abater o feudalismo voltam-se hoje contra a própria burguesia. A burguesia, porém, não forjou somente as armas que lhe darão morte; produziu também os homens que manejarão essas armas - os operários modernos, os proletários.

Com o desenvolvimento da burguesia, isto é, do capital, desenvolve-se também o proletariado, a classe dos operários modernos, que só podem viver

se encontrarem trabalho e que só o encontram na medida em que esse aumenta o capital. Esses operários, constrangidos a vender-se diariamente, são mercadoria, artigo de comércio como qualquer outro; em consequência, estão sujeitos a todas as vicissitudes da concorrência, a todas as flutuações do mercado.

O crescente emprego de máquinas e a divisão do trabalho, despojando o trabalho do operário de seu caráter autônomo, tiraram-lhe todo atrativo. O produtor passa a um simples apêndice da máquina e só se requer dele a operação mais simples, mais monótona; mais fácil de apreender.

Desse modo, o custo do operário se reduz, quase exclusivamente, aos meios de manutenção que lhe são necessários para viver e procriar. Ora, o preço do trabalho, como de toda mercadoria, é igual ao custo de sua produção. Portanto, à medida que aumenta o caráter enfadonho do trabalho, decrescem os salários.

Quanto mais se desenvolvem o maquinismo e a divisão do trabalho, mais aumenta a quantidade de trabalho, quer pelo prolongamento das horas, quer pelo aumento do trabalho exigido em um tempo determinado, pela aceleração do movimento das máquinas, etc. A indústria moderna transformou a pequena oficina do antigo mestre da corporação patriarcal na grande fábrica do industrial capitalista. Massas de operários, amontoadas na fábrica, são organizadas militarmente.

Como soldados da indústria, estão sob a vigilância de uma hierarquia completa de oficiais e suboficiais. Não são somente escravos da classe burguesa, do Estado burguês, mas também diariamente, a cada hora, escravos da máquina, do contramestre e, sobretudo, do dono da fábrica. Esse despotismo é tanto mais mesquinho, odioso e exasperador quanto maior é a franqueza com que proclama ter no lucro seu objetivo exclusivo.

Quanto menos habilidade e força o trabalho exige, isto é, quanto mais a indústria moderna progride, tanto mais o trabalho dos homens é suplantado pelo das mulheres e crianças. As diferenças de idade e de sexo não têm mais importância social para a classe operária. Não há senão instrumentos de trabalho, cujo preço varia segundo a idade e o sexo.

Depois de sofrer a exploração do fabricante e de

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receber seu salário em dinheiro, o operário torna-se presa de outros membros da burguesia, do proprietário, do varejista, do usuário, etc.

As camadas inferiores da classe média de outrora, os pequenos industriais, pequenos comerciantes e pessoas que possuem rendas – artesãos e camponeses –, caem nas fileiras do proletariado: uns porque seus pequenos capitais, não lhes permitindo empregar os processos da grande indústria, sucumbem na concorrência com os grandes capitalistas; outros porque sua habilidade profissional é depreciada pelos novos métodos de produção. Assim, o proletariado é recrutado em todas as classes da população.

O proletariado passa por diferentes fases de desenvolvimento. Logo que nasce começa sua luta contra a burguesia. Em princípio, empenham-se na luta operários isolados; mais tarde, operários da mesma fábrica; finalmente, operários do mesmo ramo de indústria, da mesma localidade, contra o burguês, que os explora diretamente. Não se limitam a atacar as relações burguesas de produção; atacam os instrumentos de produção: destroem as mercadorias estrangeiras que lhes fazem concorrência, quebram as máquinas, queimam as fábricas e esforçam-se para reconquistar a posição perdida do artesão da Idade Média.

Nessa fase, constitui o proletariado massa disseminada por todo o país e dispersa pela concorrência. Se, por vezes, os operários se unem para agir em massa compacta, isto não é ainda o resultado de sua própria união, mas da união da burguesia que, para atingir seus próprios fins políticos, é levada a por em movimento todo o p r o l e t a r i a d o , o q u e a i n d a p o d e f a z e r provisoriamente.

Durante essa fase, os proletários não combatem ainda seus próprios inimigos, mas os inimigos de seus inimigos, isto é, os restos da monarquia absoluta, os proprietários territoriais, os burgueses não industriais, os pequenos burgueses. Todo o movimento h istór ico está , desse modo, concentrado nas mãos da burguesia e qualquer vitória alcançada nessas condições é uma vitória burguesa.

Ora, a indústria, desenvolvendo-se, não somente aumenta o número dos proletários, mas concentrados em massas cada vez mais

consideráveis; sua força cresce e eles adquirem maior consciência dela. Os interesses e as condições de existência dos proletários se igualam cada vez mais, à medida que a máquina extingue toda diferença do trabalho e quase por toda parte reduz o salário a um nível igualmente baixo.

Em virtude da concorrência crescente dos burgueses entre si e devido às crises comerciais que disso resultam os salários se tornam cada vez mais instáveis: o aperfeiçoamento constante e cada vez mais rápido das máquinas torna a condição de vida do operário cada vez mais precária; os choques individuais entre o operário e o burguês tomam cada vez mais o caráter de choques entre duas classes.

Os operários começam a formar uniões contra os burgueses e atuam em comum na defesa de seus salários, chegam a fundar associações permanentes a fim de se prepararem, na previsão daqueles choques eventuais. Aqui e ali a luta se transforma em rebelião.

Os operários triunfam às vezes; mas é um triunfo efêmero. O verdadeiro resultado de suas lutas não é o êxito imediato, mas a união cada vez mais ampla dos trabalhadores. Essa união é facilitada pelo crescimento dos meios de comunicação criados pela grande indústria e que permitem o contato entre operários de localidades diferentes.

Ora, basta esse contato para concentrar as numerosas lutas locais que têm o mesmo caráter em toda parte, em uma luta nacional, em uma luta de classes. Mas toda luta de classes é uma luta política. E a união que os burgueses da Idade Média levavam século a realizar, com seus caminhos vicinais, os proletários modernos realizam em poucos anos por meio das vias férreas.

A organização do proletariado em classe e, portanto, em partido político, é incessantemente destruída pela concorrência que fazem entre si os próprios operários. Mas renasce sempre e cada vez mais forte, mais firme, mais poderosa. Aproveita-se das divisões intestinas da burguesia para obrigá-la ao reconhecimento legal de certos interesses da classe operária, como, por exemplo, a lei da jornada de dez horas de trabalho na Inglaterra.

Em geral, os choques que ocorrem na velha sociedade favorecem de diversos modos o

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desenvolvimento do proletariado. A burguesia vive em guerra perpétua; primeiro, contra a aristocracia; depois, contra as frações da própria burguesia cujos interesses se encontram em conflito com os progressos da indústria; e sempre contra a burguesia dos países estrangeiros.

Em todas essas lutas, vê-se forçada a apelar para o proletariado, reclamar seu concurso e arrastá-lo assim para o movimento político, de modo que a burguesia fornece aos proletários os elementos de sua educação política, isto é, armas contra ela própria.

Além disso, corno já vimos, frações inteiras da classe dominante, em consequência do desenvolvimento da indústria são precipitadas no proletariado, ou ameaçadas, pelo menos, em suas condições de existência. Também elas trazem ao proletariado numerosos elementos de educação.

Finalmente, nos períodos em que a luta de classe se aproxima da hora decisiva, o processo de dissolução da classe dominante, de toda a velha sociedade, adquire um caráter tão violento e agudo que uma pequena fração da classe dominante se desliga dessa, ligando-se à classe revolucionária, a classe que traz em si o futuro.

Do mesmo modo que outrora uma parte da nobreza passou-se para a burguesia, em nossos dias, uma parte da burguesia passa-se para o proletariado, especialmente a parte dos ideólogos burgueses que chegaram à compreensão teórica do movimento histórico em seu conjunto.

De todas as classes que ora enfrentam a burguesia, só o proletariado é uma classe verdadeiramente revolucionária. As outras classes degeneram e perecem com o desenvolvimento da grande indústria; o proletariado, pelo contrário, é seu produto mais autêntico.

As classes médias - pequenos comerciantes, pequenos fabricantes, artesãos, camponeses - combatem a burguesia porque essa compromete sua existência como classes médias. Não são, pois, revolucionárias, mas conservadoras; mais ainda, reacionárias, pois pretendem fazer girar para trás a roda da história.

Quando são revolucionárias, é em consequência de sua iminente passagem para o proletariado; não

defendem então seus interesses atuais, mas seus interesses futuros; abandonam o próprio ponto de vista para adotar o do proletariado.

O proletariado, esse produto passivo da putrefação das camadas mais baixas da velha sociedade, pode, às vezes, ser arrastado ao movimento por uma revolução proletária. Todavia, suas condições de vida o predispõem mais a vender-se à reação para servir às suas manobras.

Nas condições de existência do proletariado já estão destruídas as da velha sociedade. O proletariado não tem propriedade; suas relações com a mulher e os filhos nada tem de comum com as relações familiares burguesas.

O trabalho industrial moderno, a sujeição do operário pelo capital, tanto na Inglaterra como na França, na América como na Alemanha, despoja o proletariado de todo caráter nacional. As leis, a moral, a religião, são para ele meros preconceitos burgueses, atrás dos quais se ocultam outros tantos interesses burgueses.

Todas as classes que no passado conquistaram o Poder trataram de consolidar a situação adquirida submetendo a sociedade às suas condições de apropriação. Os proletários não podem apoderar-se das forças produtivas sociais senão abolindo o modo e apropriação que era próprio a essas e, por conseguinte, todo modo de apropriação em vigor até hoje. Os proletários nada têm de seu a salvaguardar; sua missão é destruir todas as garantias e segurança da propriedade privada até aqui existentes.

Todos os movimentos históricos têm sido, até hoje, movimentos de minorias ou em proveito de minorias. O movimento proletário é o movimento espontâneo da imensa maioria em proveito da imensa maioria. O proletário, a camada inferior da sociedade atual, não pode erguer-se, pôr-se de pé, sem fazer saltar todos os estratos superpostos que constituem a sociedade oficial.

A luta do proletariado contra a burguesia, embora não seja na essência uma luta nacional, reveste-se, contudo, dessa forma nos primeiros tempos. É natural que o proletariado de cada país deva, antes de tudo, liquidar sua própria burguesia.

Esboçando em linhas gerais as fases do

desenvolvimento proletário, descrevemos a história da guerra civil, mais ou menos oculta, que lavra na sociedade atual, até a hora em que essa guerra explode numa revolução aberta e o proletariado estabelece sua dominação pela derrubada violenta da burguesia.

Todas as sociedades anteriores, como se vê, basearam-se no antagonismo entre classes opressoras e classes oprimidas. Mas para oprimir uma classe é preciso poder garantir-lhe condições tais que lhe permitam pelo menos uma existência de escravo.

O servo, em plena servidão, conseguia tornar-se membro da comuna, da mesma forma que o pequeno burguês, sob o jugo do absolutismo feudal, elevava-se à categoria de burguês.

O operário moderno, pelo contrário, longe de se elevar com o progresso da indústria, desce cada vez mais baixo dentro de sua própria classe. O trabalhador cai na miséria e essa cresce ainda mais rapidamente que a população e a riqueza. E, pois, evidente que a burguesia seja incapaz de continuar desempenhando o papel de classe dominante e de impor à sociedade, como lei suprema, as condições de existência de sua classe.

Não pode exercer o seu domínio porque não pode mais assegurar a existência de seu escravo, mesmo no quadro de sua escravidão, porque é obrigada a deixá-lo cair numa tal situação, que deve nutri-lo em lugar de fazer-se nutrir por ele. A sociedade não pode mais existir sob sua dominação, o que quer dizer que a existência da burguesia é, doravante, incompatível com a da sociedade.

A condição essencial da existência e da supremacia da classe burguesa é a acumulação da riqueza nas mãos dos particulares, a formação e o crescimento do capital; a condição de existência do capital é o trabalho assalariado.

Esse se baseia exclusivamente na concorrência dos operários entre si. O progresso da indústria, de que a burguesia é agente passivo e inconsciente, substitui o isolamento dos operários, resultante de sua competição, por sua união revolucionária mediante a associação.

Assim, o desenvolvimento da grande indústria socava o terreno em que a burguesia assentou o seu regime de produção e de apropriação dos produtos. A burguesia produz, sobretudo, seus próprios coveiros. Sua queda e a vitória do proletariado são igualmente inevitáveis.

Qual a posição dos comunistas diante dos proletários em geral? Os comunistas não formam um partido à parte, oposto aos outros partidos operários. Não têm interesses que os separem do proletariado em geral. Não proclamam princípios particulares, segundo os quais pretenderiam modelar o movimento operário. Os comunistas só se distinguem dos outros partidos operários em dois pontos:

1) Nas diversas lutas nacionais dos proletários, destacam e fazem prevalecer os interesses comuns do proletar iado, independentemente da nacionalidade. 2) Nas diferentes fases por que passa a luta entre proletários e burgueses, representam, sempre e em toda parte, os interesses do movimento em seu conjunto.

Praticamente, os comunistas constituem, pois, a fração mais resoluta dos partidos operários de cada país, a fração que impulsiona as demais; teoricamente têm sobre o resto do proletariado a vantagem de uma compreensão nítida das condições, da marcha e dos resultados gerais do movimento proletário.

O objetivo imediato dos comunistas é o mesmo que o de todos os demais partidos proletários: constituição dos proletários em classe, derrubada da supremacia burguesa, conquista do poder político pelo proletariado.

As concepções teóricas dos comunistas não se baseiam, de modo algum, em ideias ou princípios inventados ou descobertos por esse ou aquele reformador do mundo. São apenas a expressão geral das condições reais de uma luta de classes existente,

PARTE 2 - PROLETÁRIOS E COMUNISTAS

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de um movimento histórico que se desenvolve sob os nossos olhos.

A abolição das relações de propriedade que têm existido até hoje não é uma característica peculiar exclusiva do comunismo. Todas as relações de propriedade têm passado por modificações constantes em consequência das contínuas transformações das condições históricas.

A Revolução Francesa, por exemplo, aboliu a propriedade feudal em proveito da propriedade burguesa. O que caracteriza o comunismo não é a abolição da propriedade geral, mas a abolição da propriedade burguesa.

Ora, a propriedade privada atual – a propriedade burguesa – é a última e mais perfeita expressão do modo de produção e de apropriação baseado nos antagonismos de classes, na exploração de uns pelos outros. Nesse sentido, os comunistas podem resumir sua teoria nessa fórmula única: a abolição da propriedade privada.

Censuram-nos, a nós comunistas, o querer abolir a propriedade pessoalmente adquirida, fruto do trabalho do indivíduo, propriedade que se declara ser base de toda liberdade, de toda atividade, de toda independência individual. A propriedade pessoal, fruto do trabalho e do mérito!

Pretende-se falar da propriedade do pequeno burguês, do pequeno camponês, forma de propriedade anterior à propriedade burguesa? Não precisamos aboli-la, porque o progresso da indústria já a aboliu e continua a aboli-la diariamente. Ou porventura pretende-se falar da propriedade privada atual, da propriedade burguesa? Mas, o trabalho do proletário, o trabalho assalariado cria propriedade para o proletário? De nenhum modo.

Cria o capital, isto é, a propriedade que explora o trabalho assalariado e que só pode aumentar sob a condição de produzir novo trabalho assalariado, a fim de explorá-lo novamente. Em sua forma atual, a propriedade se move entre os dois termos antagônicos: capital e trabalho assalariado. Examinemos os dois termos dessa antinomia.

Ser capitalista significa ocupar não somente uma posição pessoal, mas também uma posição social na produção. O capital é um produto coletivo: só pode ser posto em movimento pelos esforços

combinados de muitos membros da sociedade, e mesmo, em última instância, pelos esforços combinados de todos os membros da sociedade.

O capital não é, pois, uma força pessoal; é uma força social. Assim, quando o capital é transformado em propriedade comum, pertencente a todos os membros da sociedade, não é uma propriedade pessoal que se transforma em propriedade social. O que se transformou foi apenas o caráter social da propriedade. Essa perde seu caráter de classe.

Passemos ao trabalho assalariado. O preço médio que se paga pelo trabalho assalariado é o mínimo de salário, isto é, a soma dos meios de subsistência necessária para que o operário viva como operário.

Por conseguinte, o que o operário obtém com o seu trabalho é o estritamente necessário para mera conservação e reprodução de sua vida. Não queremos, de nenhum modo, abolir essa apropriação pessoal dos produtos do trabalho, indispensável à manutenção e à reprodução da vida humana, pois essa apropriação não deixa nenhum lucro líquido que confira poder sobre o trabalho alheio.

O que queremos é suprimir o caráter miserável dessa apropriação que faz com que o operário só viva para aumentar o capital e só viva na medida em que o exigem os interesses da classe dominante. Na sociedade burguesa, o trabalho vivo é sempre um meio de aumentar o trabalho acumulado.

Na sociedade comunista, o trabalho acumulado é sempre um meio de ampliar, enriquecer e melhorar cada vez mais a existência dos trabalhadores. Na sociedade burguesa, o passado domina o presente; na sociedade comunista, é o presente que domina o passado. Na sociedade burguesa, o capital é independente e pessoal, ao passo que o indivíduo que trabalha não tem nem independência nem personalidade.

É a abolição de semelhante estado de coisas que a b u r g u e s i a v e r b e r a c o m o a a b o l i ç ã o d a individualidade e da liberdade. E com razão. Porque se trata efetivamente de abolir a individualidade burguesa, a independência burguesa, a liberdade burguesa. Por liberdade, nas condições atuais da produção burguesa, compreende-se a liberdade de comércio, a liberdade de comprar e vender.

Mas se o tráfico desaparece, desaparecerá também a

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liberdade de traficar. Além disso, toda a fraseologia sobre a liberdade de comércio, bem como todas as bazófias liberais de nossa burguesia só têm sentido quando se referem ao comércio tolhido e ao burguês oprimido da Idade Média; nenhum sentido têm quando se trata da abolição comunista do tráfico, das relações burguesas de produção e da própria burguesia.

Horrorizai-vos porque queremos abolir a propriedade privada. Mas em vossa sociedade a propriedade privada está abolida para nove décimos de seus membros. E é precisamente porque não existe para esses nove décimos que ela existe para vós. Acusai-nos, portanto, de querer abolir uma forma de propriedade que só pode existir com a condição de privar a imensa maioria da sociedade de toda propriedade.

Em resumo, acusa-nos de querer abolir vossa propriedade. De fato, é isso que queremos. Desde o momento em que o trabalho não mais pode ser convertido em capital, em dinheiro, em renda da terra, numa palavra, em poder social capaz de ser monopolizado, isto é, desde o momento em que a propriedade individual não possa mais converter-se em propriedade burguesa declarais que a individualidade está suprimida.

Confessais, pois, que quando falais do indivíduo, quereis referir-vos unicamente ao burguês, ao proprietário burguês. E este indivíduo, sem dúvida, deve ser suprimido. O comunismo não retira a ninguém o poder de apropriar-se de sua parte dos produtos sociais, apenas suprime o poder de escravizar o trabalho de outrem por meio dessa apropriação.

Alega-se ainda que, com a abolição da propriedade privada, toda a atividade cessaria, uma inércia geral apoderar-se-ia do mundo. Se isso fosse verdade, há muito que a sociedade burguesa teria sucumbido à ociosidade, pois que os que no regime burguês trabalham não lucram e os que lucram não trabalham. Toda a objeção se reduz a essa tautologia: não haverá mais trabalho assalariado quando não mais existir capital.

As acusações feitas contra o modo comunista de produção e de apropriação dos produtos materiais têm sido feitas igualmente contra a produção e a apropriação dos produtos do trabalho intelectual. Assim como o desaparecimento da propriedade de c l a s s e e q u i v a l e , p a r a o b u r g u ê s , a o

desaparecimento de toda produção, também o desaparecimento da cultura de classe significa, para ele, o desaparecimento de toda a cultura. A cultura, cuja perda o burguês deplora, é, para a imensa maioria dos homens, apenas um adestramento que os transforma em máquinas.

Mas não discutais conosco enquanto aplicardes à abolição da propriedade burguesa o critério de vossas noções burguesas de liberdade, cultura, direito, etc. Vossas próprias ideias decorrem das relações de produção e de propriedade burguesas, assim como vosso direito não passa da vontade de vossa classe erigida em lei, vontade cujo conteúdo é determinado pelas condições materiais de vossa existência como classe.

A falsa concepção interesseira que vos leva a erigir em leis eternas da natureza e da razão as relações sociais oriundas do vosso modo transitório de produção e de propriedade - relações históricas que surgem e desaparecem no curso da produção a compartilhais com todas as classes dominantes já desaparecidas. O que admitis para a propriedade antiga, o que admitis para a propriedade feudal, já não vos atrevais a admitir para a propriedade burguesa.

Abolição da família! Até os mais radicais ficam indignados diante desse desígnio infame dos comunistas. Sobre que fundamento repousa a família atual, a família burguesa? No capital, no ganho individual. A família, na sua plenitude, só existe para a burguesia, mas encontra seu complemento na supressão forçada da família para o proletário e na prostituição pública.

A família burguesa desvanece-se naturalmente com o desvanecer de seu complemento e uma e outra desaparecerão com o desaparecimento do capital. Acusai-nos de querer abolir a exploração das crianças pelos seus pais? Confessamos este crime. Dizeis também que destruímos os vínculos mais íntimos, substituindo a educação doméstica pela educação social.

E vossa educação não é também determinada pela sociedade, pelas condições sociais em que educais vossos filhos, pela intervenção direta ou indireta da sociedade, do meio de vossas escolas, etc.? Os comunistas não inventaram essa intromissão da sociedade na educação, apenas mudam seu caráter e arrancam a educação da influência da classe

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dominante.

As declamações burguesas sobre a família e a educação, sobre os doces laços que unem a criança aos pais tornam-se cada vez mais repugnantes à medida que a grande indústria destrói todos os laços familiares do proletário e transforma as crianças em simples objetos de comércio, em simples instrumentos de trabalho.

Toda a burguesia grita em coro: "Vós, comunistas, quereis introduzir a comunidade das mulheres!" Para o burguês, sua mulher nada mais é que um instrumento de produção. Ouvindo dizer que os instrumentos de produção serão explorados em comum, conclui naturalmente que ocorrerá o mesmo com as mulheres. Não imagina que se trata precisamente de arrancar a mulher de seu papel atual de simples instrumento de produção.

Nada mais grotesco, aliás, que a virtuosa indignação que, a nossos burgueses, inspira a pretensa comunidade oficial das mulheres que adotariam os comunistas. Os comunistas não precisam introduzir a comunidade das mulheres. Essa quase sempre existiu. Nossos burgueses, não contentes em ter à sua disposição as mulheres e as filhas dos proletários, sem falar da prostituição oficial, têm singular prazer em cornearem-se uns aos outros.

O casamento burguês é, na realidade, a comunidade das mulheres casadas. No máximo, poderiam acusar os comunistas de quererem substituir uma comunidade de mulheres, hipócrita e dissimulada, por outra que seria franca e oficial. De resto, é evidente que, com a abolição das relações de produção atuais, a comunidade das mulheres que deriva dessas relações, isto é, a prostituição oficial e não oficial desaparecerá. Além disso, os comunistas são acusados de quererem abolir a pátria, a nacionalidade.

Os operários não têm pátria. Não se lhes pode tirar aquilo que não possuem. Como, porém, o proletariado tem por objetivo conquistar o poder político e erigir-se em classe dirigente da nação, tornar-se ele mesmo a nação, ele é, nessa medida, nacional, embora de nenhum modo no sentido burguês da palavra.

As demarcações e os antagonismos nacionais entre os povos desaparecem cada vez mais com o desenvolvimento da burguesia, com a liberdade do

comércio e o mercado mundial, com a uniformidade da produção industrial e as condições de existência que lhes correspondem.

A supremacia do proletariado fará com que tais demarcações e antagonismos desapareçam ainda mais depressa. A ação comum do proletariado, pelo menos nos países civilizados, é uma das primeiras condições para sua emancipação. Suprimi a exploração do homem pelo homem e tereis suprimido a exploração de uma nação por outra.

Quando os antagonismos de classes, no interior das nações, tiverem desaparecido, desaparecerá a hostilidade entre as próprias nações. Quanto às acusações feitas aos comunistas em nome da religião, da filosofia e da ideologia em geral, não merecem um exame aprofundado.

Será preciso grande perspicácia para compreender que as ideias, as noções e as concepções, numa palavra, que a consciência do homem se modifica com toda mudança sobrevinda em suas condições de vida, em suas relações sociais, em sua existência social?

Que demonstra a história das ideias senão que a produção intelectual se transforma com a produção material? As ideias dominantes de uma época sempre foram as ideias da classe dominante.

Quando se fala de ideias que revolucionam uma sociedade inteira, isto quer dizer que, no seio da velha sociedade, formaram-se os elementos de uma nova sociedade e que a dissolução das velhas ideias marcha com a dissolução das antigas condições de vida.

Quando o mundo antigo declinava, as velhas religiões foram vencidas pela religião cristã; quando, no século XVIII, as ideias cristãs cederam lugar às ideias racionalistas, a sociedade feudal travava a batalha decisiva contra a burguesia então revolucionária. As ideias de liberdade religiosa e de liberdade de consciência não fizeram mais que proclamar o império da livre concorrência no domínio do conhecimento.

Sem dúvida dir-se-á - as ideias religiosas, morais, filosóficas, políticas, jurídicas, etc., modificaram-se no curso do desenvolvimento histórico, mas a religião, a moral, a filosofia, a política, o direito m a n t i v e r a m - s e s e m p r e a t r a v é s d e s s a s

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transformações. Além disso, há verdades eternas, como a liberdade, a justiça, etc., que são comuns a todos os regimes sociais.

Mas o comunismo quer abolir essas verdades eternas; quer abolir a religião e a moral, em lugar de lhes dar uma nova forma. Isso contradiz todo o desenvolvimento histórico anterior. A que se reduz essa acusação?

A história de toda a sociedade até nossos dias consiste no desenvolvimento dos antagonismos de classes, antagonismos que se têm revestido de formas diferentes nas diferentes épocas.

Mas qualquer que tenha sido a forma desses antagonismos, a exploração de uma parte da sociedade por outra é um fato comum a todos os séculos anteriores. Portanto, nada há de espantoso que a consciência social de todos os séculos, apesar de toda sua variedade e diversidade, tenha sido movido sempre sob certas formas comuns - formas de consciência - que só se dissolverão completamente com o desaparecimento total dos antagonismos de classes.

A revolução comunista é a ruptura mais radical com as relações tradicionais de propriedade; nada de estranho, portanto, que no curso de seu desenvolvimento, rompa, do modo mais radical, com as ideias tradicionais. Mas deixemos de lado as objeções feitas pela burguesia ao comunismo. Vimos acima que a primeira fase da revolução operária é o advento do proletariado como classe dominante, a conquista da democracia.

O proletariado utilizará sua supremacia política para arrancar pouco a pouco todo capital à burguesia, para centralizar todos os instrumentos de produção nas mãos do Estado, isto é, do proletariado organizado em classe dominante e para aumentar, o mais rapidamente possível, o total das forças produtivas.

Isto naturalmente só poderá realizar-se, em princípio, por uma violação despótica do direito de propriedade e das relações de produção burguesas, isto é, pela aplicação de medidas que, do ponto de vista econômico, parecerão insuficientes e insustentáveis, mas que no desenrolar do movimento ultrapassarão a si mesmas e serão indispensáveis para transformar radicalmente todo o modo de produção. Essas medidas, é claro, serão

diferentes nos vários países. Todavia, nos países mais adiantados, as seguintes medidas poderão geralmente ser postas:

1. Expropriação da propriedade latifundiária e emprego da renda da terra em proveito do Estado;2. Imposto fortemente progressivo;3. Abolição do direito de herança;4. Confisco da propriedade de todos os emigrados e sediciosos; 5. Centralização do crédito nas mãos do Estado por meio de um banco nacional com capital do Estado e com o monopólio;6. Centralização, nas mãos do Estado, de todos os meios de transporte;7. Multiplicação das fábricas e dos instrumentos de produção pertencentes ao Estado, arroteamento das terras incultas e melhoramento das terras cultivadas, segundo um plano geral;8. Trabalho obrigatório para todos, organização de exércitos industriais, particularmente para a agricultura;9. Combinação do trabalho agrícola e industrial, medidas tendentes a fazer desaparecer gradualmente a distinção entre a cidade e o campo;l0. Educação pública e gratuita de todas as crianças, abolição do trabalho das crianças nas fábricas, tal como é praticado hoje. Combinação da educação com a produção material, etc.

Uma vez desaparecidos os antagonismos de classes no curso do desenvolvimento e sendo concentrada toda a produção propriamente falando nas mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá seu caráter político. O poder político é o poder organizado de uma classe para a opressão de outra.

Se o proletariado, em sua luta contra a burguesia, constitui-se forçosamente em classe; se se converte, por uma revolução, em classe dominante e, como classe dominante, destrói violentamente as antigas relações de produção, destrói juntamente com essas relações de produção, as condições dos antagonismos entre as classes e as classes em geral e, com isso, sua própria dominação como classe.

Em lugar da antiga sociedade burguesa, com suas classes e antagonismos de classes, surge uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um é a condição do livre desenvolvimento de todos.

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Devido à sua posição histórica, as aristocracias da França e da Inglaterra viram-se chamadas a lançar libelos contra a sociedade burguesa. Na revolução francesa de julho de 1830 e no movimento reformador inglês, tinham sucumbido mais uma vez sob os golpes dessa odiada arrivista. Elas não podiam mais travar uma luta política séria; só restava a luta literária. Ora, também no domínio literário, tornara-se impossível a velha fraseologia da Restauração.

Para criar simpatias, era preciso que a aristocracia fingisse discursar seus próprios interesses e dirigisse sua acusação contra a burguesia, aparentando defender apenas os interesses da classe operária explorada. Desse modo, entregou-se ao prazer de cantarolar sátiras sobre os novos senhores e de segredar-lhe ao ouvido profecias de mau augúrio.

Assim nasceu o socialismo feudal, no qual se mesclavam lamúrias e libelos, ecos do passado e ameaças sobre o futuro. Se por vezes a sua crítica amarga, mordaz e espirituosa feriu a burguesia, no coração, sua impotência absoluta de compreender a marcha da História moderna terminou sempre por um efeito cômico. À guisa de bandeira, esses senhores arvoraram a sacola do mendigo, a fim de atrair o povo, mas logo que esse acorreu, notou suas costas ornadas com os velhos brasões feudais e dispersou-se com grandes gargalhadas irreverentes.

Uma parte dos legitimistas franceses e a "Jovem Inglaterra" ofereceram ao mundo esse espetáculo divertido. Quando os campeões do feudalismo demonstraram que o modo de exploração feudal era diferente do da burguesia, esquecem uma coisa: que o feudalismo explorava em circunstâncias e condições completamente diversas e hoje em dia caducas. Quando ressaltam que sob o regime feudal o proletariado moderno não existia, esquecem que a burguesia moderna é precisamente um fruto necessário de seu regime social.

Aliás, ocultam tão pouco o caráter reacionário de sua crítica, que sua principal queixa contra a burguesia consiste justamente em dizer que essa assegura que o seu regime o desenvolvimento de uma classe que

fará ir pelos ares toda a antiga ordem social. O que mais reprovam à burguesia é ela ter produzido um proletariado revolucionário, que haver criado o proletariado em geral.

Por isso, na luta política participam ativamente de todas as medidas de repressão contra a classe operária. E, na vida diária, a despeito de sua pomposa fraseologia, conformam-se perfeitamente em colher os frutos de ouro da árvore da indústria e trocar honra, amor e fidelidade pelo comércio de lã, açúcar de beterraba e aguardente.

Do mesmo modo que o pároco e o senhor feudal marcharam sempre de mãos dadas, o socialismo clerical marcha lado a lado com o socialismo feudal. Nada é mais fácil que recobrir o ascetismo cristão com um verniz socialista.

Não se ergueu também o cristianismo contra a propriedade privada, o matrimônio, o Estado? E em seu lugar não predicou a caridade e a pobreza, o celibato e a mortificação a carne, a vida monástica e a igreja? O socialismo cristão não passa de água benta com que o padre consagra o desperto da aristocracia.

3.1.2 O socialismo pequeno-burguês

Não é a aristocracia feudal a única classe arruinada pela burguesia, não é a única classe cujas condições de existência se enfraquecem e perecem na sociedade burguesa moderna. Os pequenos burgueses e os pequenos camponeses da Idade Média foram os precursores da burguesia moderna. Nos países onde o comércio e a indústria são pouco desenvolvidos, esta classe continua a vegetar ao lado da burguesia em ascensão.

Nos países onde a civilização moderna está florescente, forma-se uma nova classe de pequenos burgueses, que oscila entre o proletariado e a burguesia; fração complementar da sociedade burguesa, ela se reconstitui incessantemente.

Mas os indivíduos que a compõem se veem constantemente precipitados no proletariado, devido à concorrência; e, com a marcha progressiva

PARTE 3 - LITERATURA SOCIALISTA E COMUNISTA3.1. O Socialismo Reacionário

3.1.1 O socialismo feudal

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da grande indústria, sentem aproximar-se o momento em que desaparecerão completamente como fração independente da sociedade moderna e em que serão substituídos no comércio, na manufatura, na agricultura, por capatazes e empregados.

Nos países como a França, onde os camponeses constituem bem mais da metade da população, é natural que os escritores que se batiam pelo proletariado contra a burguesia, aplicassem à crítica do regime burguês critérios pequeno-burgueses e camponeses e defendessem a causa operária do ponto de vista da pequena burguesia. Desse modo se formou o socialismo pequeno-burguês. Sismondi é o chefe dessa literatura, não somente na França, mas também na Inglaterra.

Esse socialismo analisou com muita penetração as contradições inerentes às relações de produção modernas. Pôs a nu as hipócritas apologias dos economistas. Demonstrou de modo irrefutável os efeitos mortíferos das máquinas e da divisão do trabalho, a concentração dos capitais e da propriedade territorial, a superprodução, as crises, a decadência inevitável dos pequenos burgueses e camponeses, a miséria do proletariado, a anarquia na produção, a clamorosa desproporção na distribuição das riquezas, a guerra industrial de extermínio entre as nações, a dissolução dos velhos costumes, das velhas relações de família, das velhas nacionalidades.

Todavia, a finalidade real desse socialismo pequeno-burguês é ou restabelecer os antigos meios de produção e de troca e, com eles, as antigas relações de propriedade e toda a sociedade antiga, ou então fazer entrar à força os meios modernos de produção e de troca no quadro estreito das antigas relações de p r o p r i e d a d e q u e f o r r a m d e s t r u í d a s e necessariamente despedaçadas por eles.

Num e noutro caso, esse socialismo é ao mesmo tempo reacionário e utópico. Para a manufatura, o regime corporativo; para a agricultura, o regime patriarcal: eis a sua última palavra. Por fim, quando os obstinados fatos históricos lhe fizeram passar completamente a embriaguez, essa escola socialista abandonou-se a uma verdadeira prostração de espírito.

3.1.3 O socialismo alemão ou o "verdadeiro" socialismo

A literatura socialista e comunista da França, nascida sob a pressão de uma burguesia dominante, expressão literária da revolta contra esse domínio, foi introduzida na Alemanha quando a burguesia começava a sua luta contra o absolutismo feudal. Filósofos, semifilósofos e impostores alemães lançaram-se avidamente sobre essa literatura, mas esqueceram que, com a importação da literatura francesa na Alemanha, não eram importadas ao mesmo tempo as condições sociais da França.

Nas condições alemãs, a literatura francesa perdeu toda significação prática imediata e tomou um caráter puramente literário. Aparecia apenas como especulação ociosa sobre a realização da natureza humana. Por isso, as reivindicações da primeira revolução francesa só eram, para os filósofos alemães do século XVIII, as reivindicações da "razão prática" em geral; e a manifestação da vontade dos burgueses revolucionários da França não expressava a seus olhos, senão as leis da vontade pura, da vontade tal como deve ser, da vontade verdadeiramente humana.

O trabalho dos literatos alemães limitou-se a colocar as ideias francesas em harmonia com a sua velha consciência filosófica ou, antes a apropriar-se das ideias francesas sem abandonar seu próprio ponto de vista filosófico. Apropriaram-se delas como se assimila uma língua estrangeira: pela tradução.

Sabe-se que os monges recobriam os manuscritos das obras clássicas da antiguidade pagã com absurdas lendas sobre santos católicos. Os literatos alemães agiram em sentido inverso a respeito da literatura francesa profana. Introduziram suas insanidades filosóficas no original francês.

Por exemplo, sob a crítica francesa das funções do dinheiro, escreveram da "alienação humana"; sob a crítica francesa do Estado burguês, escreveram "alienação do poder da universidade abstrata" e assim por diante. A essa interpolação da fraseologia filosófica nas teorias francesas deram o nome de "filosofia da ação", "verdadeiro socialismo", "ciência alemã do socialismo", "justificação filosófica do socialismo", etc.

Desse modo, emascularam completamente a literatura socialista e comunista francesa. E como nas mãos dos alemães essa literatura deixou de ser a expressão da luta de uma classe contra outra, eles se felicitaram por ter-se elevado acima da "estreiteza

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francesa" e ter defendido não verdadeiras necessidades, mas a "necessidade do verdadeiro"; não os interesses do proletário, mas os interesses do ser humano, do homem em geral, do homem que não pertence a nenhuma classe nem à realidade alguma e que só existe no céu brumoso da fantasia filosófica.

Esse socialismo alemão que tão solenemente levava a sério seus desajeitados exercícios de escolar e que os apregoava tão charlatanescamente, perdeu, não obstante, pouco a pouco, se inocente pedantismo.

A luta da burguesia alemã e especialmente da burguesia prussiana contra os feudais e a monarquia absoluta, numa palavra, o movimento liberal, tornou-se mais sério. Desse modo, apresentou-se ao " ve rd a d e i ro" s o c i a l i s m o a t ã o d e s e j a d a oportunidade de contrapor ao movimento político as reivindicações socialistas.

Pode lançar os anátemas tradicionais contra o liberalismo, o regime representativo, a concorrência burguesa, a liberdade burguesa de imprensa, o direito burguês, a liberdade e a igualdade burguesa; pôde pregar às massas que nada tinham a ganhar, mas, pelo contrário, tudo a perder nesse movimento burguês.

O socialismo alemão se esqueceu, muito a propósito, que a crítica francesa, da qual era o eco monótono, pressupunha a sociedade burguesa moderna com as condições materiais de existência que lhe correspondem a uma constituição política adequada - precisamente as coisas que, na Alemanha, se tratavam ainda de conquistar.

Para os governos absolutos da Alemanha, com seu cortejo de padres, pedagogos, fidalgos rurais e burocratas, esse socialismo converteu-se em espantalho para amedrontar a burguesia que se erguia ameaçadora. Juntou sua hipocrisia adocicada aos tiros e às chicotadas com que esses mesmos governos respondiam aos levantes dos operários alemães.

Se o "verdadeiro" socialismo se tornou assim uma arma nas mãos dos governos contra a burguesia alemã, representava, além disso, diretamente um interesse reacionário, o interesse da pequena burguesia alemã. A classe dos pequenos burgueses, legada pelo século XVI e desde então renascendo sem cessar sob formas diversas, constitui na

Alemanha a verdadeira base social do regime estabelecido. Mantê-la é manter na Alemanha o regime estabelecido. A supremacia industrial e política da burguesia ameaça a pequena burguesia de destruição certa, de um lado, pela concentração dos capitais, de outro, pelo desenvolvimento de um proletariado evolucionário.

O "verdadeiro" socialismo pareceu aos pequenos burgueses uma arma capaz de aniquilar esses dois inimigos. Propagou-se como uma epidemia. A roupagem tecida com os fios imateriais da especulação, bordada com as flores da retórica e banhada de orvalho sentimental, essa roupagem na qual os socialistas alemães envolveram o miserável esqueleto das suas "verdades eternas", não fez senão ativar a venda de sua mercadoria entre tal público.

Por outro lado, o socialismo alemão compreendeu cada vez mais que sua vocação era ser o representante grandiloquente dessa pequena burguesia. Proclamou que a nação alemã era a nação-modelo e o burguês alemão, o homem-modelo. A todas as infâmias desse homem modelo deu um sentido oculto, um sentido superior e socialista, contrário à realidade.

Foi consequente até o fim, levantando-se contra a tendência "brutalmente destruidora" do c o m u n i s m o , d e c l a r a n d o q u e p a i r a v a imparcialmente acima de todas as lutas de classes. Com poucas exceções, todas as pretensas publicações socialistas ou comunistas, que circulam na Alemanha pertencem a essa imunda e enervante literatura.

3.2 O socialismo conservador ou burguês

Uma parte da burguesia procura remediar os males sociais com o fim de consolidar a sociedade burguesa. Nessa categoria enfileiram-se os economistas, os filantropos, os humanitários, os que se ocupam em melhorar a sorte da classe operária, os organizadores de beneficências, os protetores dos animais, os fundadores das sociedades de temperança, enfim os reformadores de gabinete de toda categoria. Chegou-se até a elaborar esse socialismo burguês em sistemas completos. Como exemplo, citemos a Filosofia da Miséria, de Proudhon.

Os socialistas burgueses querem as condições de

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vida da sociedade moderna sem as lutas e os perigos que dela decorrem fatalmente. Querem a sociedade atual, mas eliminando os elementos que a revolucionam e a dissolvem. Querem a burguesia sem o proletariado. Como é natural, a burguesia concebe o mundo em que domina como o melhor dos mundos.

O socialismo burguês elabora em um sistema mais ou menos completo essa concepção consoladora. Quando convida o proletariado a realizar esses sistemas e entrar na nova Jerusalém, no fundo o que pretende é introduzi-lo a manter-se na sociedade atual, desembaraçando-se, porém, do ódio que ele nutre contra ela.

Outra forma desse socialismo, menos sistemática, porém mais prática, procura fazer com que os operários se afastem de qualquer movimento revolucionário, demonstrando-lhes que não será tal ou qual mudança política, mas somente uma transformação das condições de vida material e das relações econômicas, que poderá ser proveitosa para eles.

Mas por transformação das condições de vida material, esse socialismo não compreende em absoluto a abolição das relações burguesas de produção - o que só é possível por via revolucionária - mas, apenas reformas administrativas realizadas sobre a base das próprias relações de produção entre o capital e o trabalho assalariado, servindo, no melhor dos casos, para diminuir os gastos da burguesia com seu domínio e simplificar o trabalho administrativo de seu Estado.

O socialismo burguês só atinge uma expressão adequada quando se torna uma simples figura de retórica. Livre câmbio, no interesse da classe operária! Tarifas protetoras, no interesse da classe operária! Prisões celulares, no interesse da classe operária! Eis suas últimas palavras, as únicas pronunciadas seriamente pelo socialismo burguês. Ele se resume nesta frase: os burgueses são burgueses no interesse da classe operária.

3.3 O socialismo e o comunismo crítico-utópico

Não se trata aqui da literatura que, em todas as grandes revoluções modernas, formulou as reivindicações do proletariado (escritos de Babeuf, etc.). As primeiras tentativas diretas do proletariado para fazer prevalecer seus próprios interesses de

classe, feitas numa época de efervescência geral, no período da derrubada da sociedade feudal, fracassaram necessariamente não só por causa do estado embrionário do próprio proletariado, como devido à ausência das condições materiais de sua emancipação, condições que apenas surgem como produto do advento da época burguesa.

A literatura revolucionária que acompanhava esses primeiros movimentos do proletariado teve forçosamente um conteúdo reacionár io. Preconizava um ascetismo geral e um grosseiro igualitarismo.

Os sistemas socialistas e comunistas propriamente ditos, os de Saint-Simon, Fourier, Owen, etc., aparecem no primeiro período da luta entre o proletariado e a burguesia período acima descrito (Ver o cap. Burgueses e Proletários). Os fundadores desses sistemas compreendem bem o antagonismo das classes, assim como a ação dos elementos dissolventes na própria sociedade e dominante.

Mas não percebem no proletariado nenhuma iniciativa histórica, nenhum movimento político que lhe seja próprio. Como o desenvolvimento dos antagonismos de classes marcha ao lado do desenvolvimento da indústria, não distinguem tampouco as condições materiais da emancipação do proletariado e põem-se à procura de uma ciência social, de leis sociais, que permitam criar essas condições.

A atividade social substitui a própria imaginação pessoal; as condições históricas da emancipação, condições fantasistas; a organização gradual e espontânea do proletariado em classe, uma organização da sociedade pré-fabricada por eles.

A história futura do mundo se resume, para eles, na propaganda e na prática de seus planos de organização social. Todavia, na confecção de seus planos, têm a convicção de defender antes de tudo os interesses da classe operária, porque é a classe mais sofredora. A classe operária só existe para eles sob esse aspecto de classe mais sofredora.

Mas, a forma rudimentar da luta de classe e sua própria posição social os levam a considerar-se bem acima de qualquer antagonismo de classes. Desejam melhorar as condições materiais de vida para todos os membros da sociedade, mesmo dos mais privilegiados.

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Po r c o n s e g u i n t e , n ã o c e s s a m d e a p e l a r indistintamente para a sociedade inteira e mesmo se dirigem de preferência à classe dominante. Pois, na verdade, basta compreender seu sistema para reconhecer que é o melhor dos planos possíveis para a melhor das sociedades possíveis.

Repelem, portanto, toda ação política e, sobretudo, toda ação revolucionária, procuram atingir seu fim por meios pacíficos e tentam abrir um caminho ao novo evangelho social pela força do exemplo, por experiências em pequena escala que, naturalmente, sempre fracassam.

A descrição fantasista da sociedade futura, feita numa época em que o proletariado, pouco desenvolvido ainda, encara sua própria posição de um modo fantasista, corresponde às primeiras aspirações instintivas dos operários e uma completa transformação da sociedade.

Mas essas obras socialistas e comunistas encerram também elementos críticos. Atacam a sociedade existente em suas bases. Por conseguinte, forneceram em seu tempo materiais de grande valor para esclarecer os operários.

Suas propostas positivas relativas à sociedade futura, tais como a supressão da distinção entre a cidade e o campo, a abolição da família, do lucro privado e do trabalho assalariado, a proclamação da harmonia social e a transformação do Estado numa simples administração da produção, todas essas propostas a p e n a s a n u n c i a m o d e s a p a re c i m e nto d o antagonismo entre as classes, antagonismo que mal começa e que esses autores somente conhecem em suas formas imprecisas. Assim, essas propostas têm um sentimento puramente utópico.

A importância do socialismo e do comunismo crítico-utópico está na razão inversa do desenvolvimento histórico. À medida que a luta de classes se acentua e toma formas mais definidas, o fantástico afã de abstrair-se dela, essa fantástica oposição que se lhe faz, perde qualquer valor prático, qualquer justificação teórica.

Eis porque, se, em muitos aspectos, os fundadores desses sistemas eram revolucionários, as seitas formadas por seus discípulos são sempre reacionárias, pois se aferram às velhas concepções de seus mestres apesar do anterior desenvolvimento histórico do proletariado. Procuram, portanto, e nisto são consequentes, atenuar a luta de classes e conciliar os antagonismos.

Continuam a sonhar com a realização experimental de suas utopias sociais: estabelecimento de falanstérios isolados, criação de colônias no interior, fundação de uma pequena Icária, edição in 12 da nova Jerusalém, e para dar realidade a todos esses castelos no ar, veem-se obrigados a apelar para os bons sentimentos e os cofres de filantropos burgueses.

Pouco a pouco, caem na categoria dos socialistas reacionários ou conservadores descritos acima e só se distinguem deles por um pedantismo mais sistemático e uma fé supersticiosa e fanática na eficácia miraculosa de sua ciência social.

Opõem-se, pois, encarniçadamente a qualquer ação política da classe operária, porque, em sua opinião, tal ação só pode provir de uma cega falta de fé no novo evangelho. Desse modo, os owenistas, na Inglaterra e os fourieristas, na França, reagem respectivamente contra os cartistas e os reformistas.

O que já dissemos basta para determinar a posição dos comunistas diante dos partidos operários já constituídos e, por conseguinte, sua posição diante dos cartistas na Inglaterra e dos reformadores agrários na América do Norte.

Os comunistas combatem pelos interesses e objetivos imediatos da classe operária, mas, ao mesmo tempo, defendem e representam no movimento atual, o

futuro do movimento. Aliam-se na França ao partido d e m o c rat a - s o c i a l i s t a , co nt ra a b u rg u e s i a conservadora e radical, reservando-se o direito de criticar as frases e as ilusões legadas pela tradição revolucionária.

Na Suíça, apóiam os radicais, sem esquecer que esse partido se compõe de elementos contraditórios, metade democratas--socialistas, na acepção francesa

PARTE 4 - POSIÇÃO DOS COMUNISTAS DIANTE DOS DIVERSOS PARTIDOS DE OPOSIÇÃO

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da palavra, metade burgueses radicais. Na Polônia, os comunistas apoiam o partido que vê numa revolução agrária a condição da libertação nacional, isto é, o partido que desencadeou a insurreição de Cracóvia em 1846.

Na Alemanha, o Partido Comunista luta de acordo com a burguesia, todas as vezes que essa age revolucionariamente: contra a monarquia absoluta, a propriedade rural feudal e a pequena burguesia reacionária.

Mas nunca, em nenhum momento, esse Partido se descuida de despertar nos operários uma consciência clara e nítida do violento antagonismo que existe entre a burguesia e o proletariado, para que, na hora precisa, os operários alemães saibam converter as condições sociais e políticas, criadas pelo regime burguês, em outras tantas armas contra a burguesia, a fim de que, uma vez destruídas as classes reacionárias da Alemanha, possa ser travada a luta contra a própria burguesia.

E para a Alemanha, sobretudo, que se volta à atenção dos comunistas, porque a Alemanha se encontra nas vésperas de uma revolução burguesa, e porque realizará essa revolução nas condições mais avançadas da civilização européia e com um proletariado infinitamente mais desenvolvido que o

da Inglaterra no século XVII e o da França no século XVIII.

A revolução burguesa alemã, por conseguinte, só poderá ser o prelúdio imediato de uma revolução proletária. Em resumo, os comunistas apoiam em toda parte qualquer movimento revolucionário contra o estado de coisa social e político existente.

Em todos esses movimentos, põem em primeiro lugar, como questão fundamental, a questão da propriedade, qualquer que seja a forma, mais ou menos desenvolvida, de que essa se revista. Finalmente, os comunistas trabalham pela união e entendimento dos partidos democráticos de todos os países.

Os comunistas não se rebaixam a dissimular suas opiniões e seus fins. Proclamam abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente. Que as classes dominantes tremam à ideia de uma revolução comunista! Os proletários nada têm a perder a não ser suas algemas. Têm um mundo a ganhar. PROLETÁRIOS DE TODO O MUNDO, UNI-VOS!

(MARX, Karl e ENGELS, Friedrich, Manifesto do Partido Comunista - 1848)

Foi o biólogo alemão Ernest Haeckel (1834-1919) quem cunhou o termo (Ecologia, que deriva do grego "oikos", que significa casa, e "logos",

conhecimento ou estudo. Na sua definição, "ecologia é o estudo da interdependência e da interação entre os organismos vivos (animais e plantas) e seu meio ambiente (seres inorgânicos)".

Como não se trata apenas de conhecer a natureza, mas sobretudo de cuidar para que seja preservada, talvez o termo mais adequado fosse ecobionomia, pois "nomia" significa o que é de lei ou de direito.

Assim como economia é a obrigação de cuidar da casa, ecobionomia seria o cuidado da vida. Existem basicamente três conceitos ecológicos: o primeiro é o fundamentalista, derivado de uma interpretação literal do texto bíblico e adotado pelo capitalismo - a natureza está aí para quem quiser deitar e rolar, cortar árvore, pôr fogo na mata, aproveitar e, sobretudo, extrair lucros.

QUAL ECOLOGIA?Frei Betto

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Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais

É o que pensa Bush, que se recusa a assinar o Protocolo de Kyoto e qualquer tratado que exija a redução da poluição industrial causada pelos EUA.

O segundo é o conceito que chamo de social-democrata: lutar pela defesa das baleias, dos golfinhos, da não poluição dos rios e das matas. Agora, a fome na África, na Ásia, na América Latina, isso não interessa.

A natureza deve ser tratada como um santuário. Mas o bicho-homem e o bicho--mulher passando fome não é problema nosso.

O terceiro, considero evangélico: não dá para separar o ser humano da natureza. Nós somos natureza e não há nada que se faça à natureza que não repercuta no homem e na mulher. E não há nada que façamos a nós mesmos que não repercuta no meio ambiente.

Quem simbolizou essa unidade no Brasil foi Chico Mendes, assassinado no Natal de 1988. Sua postura ecológica nasceu da militância nas Comunidades Eclesiais de Base do Acre e, em seguida, na CUT e no PT.

Ao defender a Amazônia e propor a reserva extrativista, ele sabia que, assim, evitaria a expansão do latifúndio na região. Com os "empates", Chico impediu o desmatamento no Acre, ao contrário do que ocorreu em Rondônia.

Ele vinculava a defesa do meio ambiente à urgência da reforma agrária em nosso país. De todas as espécies de vida, a humana é a mais sagrada. No entanto, aciona--se o alarme para alertar que, nos próximos 20 anos, a AIDS matará 70 milhões de pessoas no mundo.

Mas não é a AIDS a principal ameaça à vida humana. É a fome, que mata uma criança a cada três segundos. É preciso preservar não apenas o meio ambiente mas o ambiente inteiro: este planeta que, por enquanto, não tem como captar recursos fora de suas fronteiras.

Portanto, sem a partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano, o nosso futuro estará cada vez mais distante do Jardim do Éden e próximo dos círculos abissais de Lúcifer. A prosseguir a atual escala de poluição atmosférica, sem contar a da água, as gerações vindouras já nascerão envenenadas.

São palavras fortes, capazes de sacudir estruturas acomodadas, invadir áreas de conforto. Por um minuto, esquece a poluição do ar e do mar, a química que contamina a terra e envenena os alimentos, e medita: como anda o teu equilíbrio ecobiológico? Tens dialogado com teus órgãos interiores? Acariciado o teu coração? Respeitas a delicadeza de teu estômago?

Acompanhas mentalmente teu fluxo sanguíneo? Teus pensamentos são poluídos? As palavras, ácidas? Os gestos, agressivos? Quantos esgotos fétidos correm em tua alma?

Quantos entulhos - mágoas, ira, inveja - se amontoam em teu espírito?

Examina a tua mente. Está despoluída de ambições desmedidas, preguiça intelectual e intenções inconfessáveis?

Teus passos sujam os caminhos de lama, deixando um rastro de tristeza e desalento? Teu humor intoxica-se de raiva e arrogância?

Onde estão as flores do teu bem-querer, os pássaros pousados em teu olhar, as águas cristalinas de tuas palavras?

Por que teu temperamento ferve com frequência e expele tanta fuligem pelas chaminés de tua intolerância?

Não desperdiça a vida queimando a tua língua com as nódoas de teus comentários infundados sobre a vida alheia.

Preserva o teu ambiente, investe em tua qualidade de vida, purifica o espaço em que transitas. Limpa os teus olhos das ilusões de poder, fama e riqueza, antes que fiques cego e tenhas os passos desviados para a estrada dessinalizada dos rumos da ética.

Ela é cheia de buracos e podes enterrar o teu

Ecologia Interior Frei Betto

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Caderno-base para os Cursos de Formação Política e Sindical

caminho num deles. Tu és, como eu, um ser frágil, ainda que julgues fortes os semelhantes que merecem a tua reverência. Somos todos feitos de barro e sopro. Finos copos de cristal que se quebram ao menor atrito: uma palavra descuidada, um gesto que machuca, uma desconfiança que perdura.

Graças ao Espírito que molda e anima o teu ser, o copo partido se reconstitui inteiro, se fores capaz de amar. Primeiro, a ti mesmo, impedindo que a tua subjetividade se afogue nas marés negativas.

Depois, a teus semelhantes, exercendo a tolerância e o perdão, sem jamais sacrificar o respeito e a justiça. Livra a tua vida de tantos lixos acumulados. Atira pela janela as caixas que guardam mágoas e tantas fichas de tua contabilidade com os supostos débitos de outrem.

Vive o teu dia como se fosse a data de teu renascer para o melhor de ti mesmo - e os outros te receberão como dom de amor. Pratica a difícil arte do silêncio. Desliga--te das preocupações inúteis, das recordações amargas, das inquietações que transcendem o teu poder.

Recolhe-te no mais íntimo de ti mesmo, mergulha em teu oceano de mistério e descobre, lá no fundo, o Ser Vivo que funda a tua identidade. Guarda este ensinamento: por vezes é preciso fechar os olhos para ver melhor. Acolhe a tua vida como ela é: uma dádiva involuntária.

Não pediste para nascer e, agora, não desejas morrer. Faz dessa gratuidade uma aventura amorosa. Não sofras por dar valor ao que não merece importância. Trata a todos como igual, ainda que estejam revestidos ilusoriamente de nobreza ou se mostrem realmente como seres carcomidos pela miséria.

Faz da justiça o teu modo de ser e jamais te envergonhes de tua pobreza, de tua falta de conhecimentos ou de poder. Ninguém é mais culto do que o outro. O que existem são culturas distintas e socialmente complementares.

O que seria do erudito sem a arte culinária da cozinheira analfabeta? Tua riqueza e teu poder residem em tua moral e dignidade, que não têm preço e te trazem apreço. Porém, arma-te de indignação e esperança.

Luta para que todos os caminhos sejam aplainados, até que a espécie humana se descubra como uma só família, na qual todos, malgrado as diferenças, tenham iguais direitos e oportunidades.

E estejas convicto de que convergimos todos para Aquele que, supremo Atrator, impregnou-nos dessa energia que nos permite conhecer a abissal distância

que há entre a opressão e a libertação.

Faze de cada segundo de teu existir uma oração. E terás força para expulsar os vendilhões do templo, operar milagres e disseminar a ternura como plenitude de todos os direitos humanos.

Ainda que estejas cercado de adversidades, se preservares a tua ecobiologia interior, serás feliz, porque trarás em teu coração tesouros."Não conseguimos segurar uma tocha para iluminar o caminho de outra pessoa, sem clarearmos o nosso próprio".

A ecologia social não quer apenas o meio ambiente; quer o ambiente inteiro. Insere o ser humano e a sociedade na natureza. Preocupa-se não apenas com o embelezamento da cidade, com melhores avenidas, com praças ou praias mais atrativas.

Mas prioriza o saneamento básico, uma boa rede escolar e um serviço de saúde decente. A injustiça social significa uma violência contra o ser mais complexo e singular da criação que é o ser humano, homem e mulher. Ele é parte e parcela da natureza.

A ecologia social propugna por um desenvolvimento sustentável. É aquele em que se atende às carências básicas dos seres humanos hoje sem sacrificar o capital natural da Terra e se considera também as necessidades das gerações futuras que têm direito à sua satisfação e de herdarem uma Terra habitável com relações humanas minimamente justas.

Mas o tipo de sociedade construída nos últimos 400 anos impede que se realize um desenvolvimento sustentável. É energívora, montou um modelo de desenvolvimento que pratica sistematicamente a pilhagem dos recursos da Terra e explora a força de trabalho.

Ecologia social Leonardo Boff

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No imaginário dos pais fundadores da sociedade moderna, o desenvolvimento se movia dentro de dois infinitos: o infinito dos recursos naturais e o infinito do desenvolvimento rumo ao futuro. Essa pressuposição se revelou ilusória.

Os recursos não são infinitos. A maioria está se acabando, principalmente a água potável e os combustíveis fósseis. E o tipo de desenvolvimento linear e crescente para o futuro não é universalizável.

Não é, portanto, infinito. Se as famílias chinesas quisessem ter os automóveis que as famílias americanas têm, a China viraria um imenso estacionamento. Não haveria combustível suficiente e ninguém se moveria.

Carecemos de uma sociedade sustentável que encontra para si o desenvolvimento viável para as necessidades de todos. O bem-estar não pode ser apenas social; tem de ser também sociocósmico.

Ele tem que atender aos demais seres da natureza, como as águas, as plantas, os animais, os microrganismos, pois todos juntos constituem a comunidade planetária, na qual estamos inseridos, e sem os quais nós mesmos não viveríamos.

Sentir que somos Terra nos faz ter os pés no chão. Faz-nos desenvolver nova sensibilidade com a Terra, seu frio e calor, sua força, às vezes ameaçadora; às vezes encantadora. Sentir a Terra é sentir a chuva na pele, a brisa refrescante no rosto, o tufão avassalador em todo o corpo.

Sentir a Terra é sentir a respiração até as entranhas, os odores que nos embriagam ou nos enfastiam. Sentir a Terra é sentir seus nichos ecológicos, captar o espírito de cada lugar, inserir-se num determinado local, onde se habita.

Habitando, fazemo-nos de certa maneira prisioneiros de um lugar, de uma geografia, de um tipo de clima, de regime de chuvas e ventos, de uma maneira de morar trabalhar ou fazer história. Ser Terra é ser concreto, concretismo.

Configura o nosso limite. Mas também significa nossa base firme, nosso ponto de contemplação do todo, nossa plataforma para poder alçar voo para além dessa paisagem e desse pedaço de Terra.

BOFF, Leonardo. Saber cuidar, ética do humano, compaixão pela Terra. Vozes. São Paulo, 1999

Saúde é um direito humano fundamental, reconhecido por todos os foros mundiais e em todas as sociedades. Como tal, saúde se encontra em pé de igualdade com outros direitos garantidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948: liberdade, alimentação, educação, segurança, nacionalidade, etc.

A saúde é amplamente reconhecida como o maior e o melhor recurso para o desenvolvimento social, econômico e pessoal, assim como uma das mais importantes dimensões da qualidade de vida.

Saúde e qualidade de vida são dois temas estreitamente relacionados, fato que podemos reconhecer no nosso cotidiano e com o qual pesquisadores e cientistas concordam inteiramente. Isto é, a saúde contribui para melhorar a qualidade de vida e essa é fundamental para que um indivíduo ou comunidade tenha saúde.

A Carta de Ottawa - um dos documentos mais importantes que se produziram no cenário mundial sobre o tema da saúde e qualidade de vida - afirma que são recursos indispensáveis para ter saúde:?

Leonardo Boff

Sentir que somos Terra nos faz ter os pés no chão

Saúde, sociedade e qualidade de vida

Paulo M. Buss

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? • Paz ? • Renda ? • Habitação

• Educação • Alimentação Adequada

? • Ambiente Saudável ? • Recursos Sustentáveis ? • Equidade ? • Justiça Social

Isto implica o entendimento de que a saúde não é nem uma conquista, nem uma responsabilidade exclusiva do setor saúde; é o resultado de um conjunto de fatores sociais, econômicos, políticos e culturais, coletivos e individuais, que se combinam, de forma particular, em cada sociedade e em conjunturas específicas, daí resultando sociedades mais ou menos saudáveis.

Na maior parte do tempo de suas vidas, a maioria das pessoas é saudável. Isto significa que, na maior parte do tempo, a maioria das pessoas não necessita de hospitais, CTI ou complexos procedimentos médicos, diagnósticos ou terapêuticos.

Mas durante toda a vida, todas as pessoas necessitam de água e ar puros, ambiente saudável, alimentação adequada, situações social, econômica e cultural favoráveis, prevenção de problemas específicos de saúde, assim como educação e informação.Isto quer dizer que fatores políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos podem tanto favorecer, quanto prejudicar a saúde.

Para melhorar realmente as condições de saúde de uma população - um objetivo social relevante em

todas as sociedades -, são necessárias mudanças profundas dos padrões econômicos no interior dessas sociedades e intensificação de políticas sociais, que são eminentemente políticas públicas.

Em outras palavras, para que uma sociedade conquiste saúde para todos os seus membros, são necessárias uma verdadeira ação intersetorial e as chamadas políticas públicas saudáveis, isto é, políticas comprometidas com a qualidade de vida e a saúde da população.

Além desses elementos chamados estruturais, que dependem apenas parcialmente da decisão e ação dos indivíduos, a saúde também é decorrência dos chamados fatores comportamentais. Isto é, as pessoas desenvolvem padrões alimentares, de comportamento sexual, de atividade física, de maior ou menor estresse na vida quotidiana e no trabalho, do uso de drogas lícitas (como cigarro e bebidas) e ilícitas, dentre outros, que também têm grande influência sobre a saúde.

Se cada pessoa se preocupar em desenvolver um padrão comportamental favorável à sua saúde e lutar para que as condições sociais e econômicas sejam favoráveis à qualidade de vida e à saúde de todos, certamente estará dando uma poderosa contribuição para que tenhamos uma população mais saudável, com vida mais longa e prazerosa.

Paulo M. Buss é Professor de Saúde Pública e Presidente da Fiocruz

Disponível: http://www.invivo.fiocruz.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=8&infoid=34>

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A Agenda 21 é um documento gerado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano (Rio-92), que foi a mais importante conferência organizada pela ONU em todos os tempos. Ela tem esse nome porque se refere às preocupações com o nosso futuro, agora, a partir do século XXI. Esse documento foi assinado por 170 países, inclusive o Brasil, anfitrião da conferência.

É a proposta mais consistente que existe de como a lcançar o desenvolv imento sustentável, isto é, de como podemos continuar desenvolvendo nossos países e nossas comunidades, sem destruir o meio ambiente e com maior justiça social. É um planejamento do futuro com ações de curto, médio e longo prazos. Em outras palavras, reintroduz uma ideia esquecida de que podemos e devemos planejar e estabelecer um elo de solidariedade entre nós e nossos descendentes – as futuras gerações.

Trata-se de um roteiro de ações concretas, com metas, recursos e responsabilidades definidas. Deve ser um plano obtido por meio de consenso, ou seja, com todos os atores e grupos sociais opinando e se comprometendo com ele. Em resumo, a Agenda 21 estabelece uma verdadeira parceria entre governos e sociedades.

É um programa estratégico, universal, para alcançarmos o desenvolvimento sustentável no século XXI. A Agenda 21 serve de guia para as ações do governo e de todas as comunidades que procuram desenvolvimento, sem com isso destruir o meio ambiente. Da mesma forma que os países se reuniram e fizeram a Agenda 21, as cidades, os bairros, os clubes, as escolas também podem fazer a Agenda 21 Local.

Portanto, com a implantação das Agendas 21 podemos garantir um Meio Ambiente equilibrado para as futuras gerações, cumprindo assim, nosso dever mencionado na Constituição do Brasil.

Se você quiser, poderá montar uma Agenda 21 na sua comunidade, município ou empresa.

"A Agenda 21 vem se constituindo em um instrumento de fundamental importância na construção dessa nova ecocidadania; num processo social no qual os atores vão pactuando paulatinamente novos consensos e montando uma Agenda possível rumo ao futuro que se deseja sustentável" (Gilney Viana - Secretário de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável, Ministério do Meio Ambiente, do Governo Federal).

A Agenda 21 Brasileira é um processo e um instrumento de planejamento participativo para o desenvolvimento sustentável, que tem como eixo central a

A Agenda 21 Brasileira

Agenda 21

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sustentabilidade, compatibilizando a conservação ambiental, a justiça social e o crescimento econômico.

O documento é resultado de uma vasta consulta à população brasileira, sendo construída a partir das diretrizes da Agenda 21 global. Trata-se, portanto, de um instrumento fundamental para a construção da democracia participativa e da cidadania ativa no país.

A primeira fase foi a construção da Agenda 21 Brasileira. Esse processo que se deu de 1996 a 2002. Foi coordenado pela Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável (CPDS) e da Agenda 21 Nacional, tendo o envolvimento de cerca de 40 mil pessoas de todo o Brasil. O documento Agenda 21 Brasileira foi concluído em 2002.

A partir de 2003, a Agenda 21 Brasileira não somente entrou na fase de implantação assistida pela CPDS, como também foi elevada à condição de Programa do Plano Plurianual, PPA 2004-2007, pelo atual governo.

Como programa, a Agenda 21 adquire mais força política e institucional, passando a ser instrumento fundamental para a construção do Brasil Sustentável, estando coadunada com as diretrizes da política ambiental do Governo, transversalidade, desenvolvimento sustentável, fortalecimento do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) e participação social, adotando referenciais importantes, como a Carta da Terra.

Portanto, a Agenda 21, que tem provado ser um guia eficiente para processos de união da sociedade, compreensão dos conceitos de cidadania e de sua aplicação, é hoje um dos grandes instrumentos de formação de políticas públicas no Brasil.

A posse do Governo Luiz Inácio Lula da Silva coincidiu com o início da fase de implantação da Agenda 21 Brasileira. A importância da Agenda como instrumento propulsor da democracia, da participação e da ação coletiva da sociedade, foi reconhecida no Programa Lula e suas diretrizes, inseridas tanto no Plano de Governo quanto em suas orientações estratégicas.

Outro grande passo foi a utilização dos princípios e estratégias da Agenda 21 Brasileira como subsídios para a Conferência Nacional de Meio Ambiente, Conferência das Cidades e Conferência da Saúde. Essa ampla inserção da Agenda 21 remete à necessidade de elaborar e implantar políticas públicas em cada município e em cada região brasileira.

Para isso, um dos passos fundamentais do atual governo foi transformá-la em programa no Plano Plurianual do Governo - PPA 2004/2007, o que lhe confere maior alcance, capilaridade e importância como política pública. O Programa Agenda 21 é composto por três ações estratégicas que estão sendo realizadas com a sociedade civil: implantar a Agenda 21 Brasileira; elaborar e implantar as Agendas 21 Locais e a formação continuada em Agenda 21.

A prioridade é orientar para a elaboração e implantação de Agendas 21 Locais com base nos princípios da Agenda 21 Brasileira que, em consonância com a Agenda

Implantação da Agenda 21 Brasileira (a partir de 2003)

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global, reconhece a importância do nível local na concretização de políticas públicas sustentáveis. Atualmente existem mais de 544 processos de Agenda 21 Locais em andamento no Brasil – quase três vezes o número levantado até 2002.

Em resumo, são estes os principais desafios do Programa Agenda 21:

? • Implantar a Agenda 21 Brasileira. Passada a etapa da elaboração, a Agenda 21 Brasileira tem o desafio de fazer com que todas as suas diretrizes e ações prioritárias sejam conhecidas, entendidas e transmitidas, entre outros, por meio da atuação da Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Brasileira - CPDS; implantação do Sistema da Agenda 21; mecanismos de implantação e monitoramento; integração das políticas públicas; promoção da inclusão das propostas da Agenda 21 Brasileira nos Planos das Agendas 21 Locais.

? • Orientar para a elaboração e implantação das Agendas 21 Locais. A Agenda 21 Local é um dos principais instrumentos para conduzir processos de mobilização, troca de informações, geração de consensos em torno dos problemas e soluções locais e estabelecimento de prioridades para a gestão de um estado, um município, uma bacia hidrográfica, unidade de conservação e até um bairro ou uma escola.

? • O processo deve ser articulado com outros projetos, programas e atividades do governo e sociedade, sendo consolidado, dentre outros, a partir do envolvimento dos agentes regionais e locais; análise, identificação e promoção de instrumentos financeiros; difusão e intercâmbio de experiências; definição de indicadores de desempenho.

? • Implantar a formação continuada em Agenda 21. Promover a educação para a sustentabilidade com a disseminação e o intercâmbio de informações e experiências por meio de cursos, seminários, workshops e de material

? • Essa ação é fundamental para que os processos de Agendas 21 Locais ganhem um salto de qualidade, por meio da formulação de bases técnicas e políticas para a sua formação; trabalho conjunto com interlocutores locais; identificação das atividades, necessidades, custos, estratégias de implantação; aplicação de metodologias apropriadas, respeitando o estágio em que a Agenda 21 Local em questão está.

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Não adianta você ficar só estudando e conhecendo mais sobre a natureza. É preciso combinar estudo e reflexão com ação. Você pode agir sozinho, procurando políticos ou a imprensa, por exemplo, para denunciar ou protestar contra os abusos, poluições, depredações. Também pode agir em grupo. Quando estamos unidos, somos mais fortes e capazes de encontrar soluções para enfrentar os problemas ambientais.

É horrível quando a gente vê alguém jogando lixo no chão. As ruas, praças e qualquer logradouro público não são terra de ninguém; pertencem a todos. Você não jogaria lixo na casa de alguém, jogaria? Pois é: a rua pertence a todos; possui muitos donos. O lixo espalhado, além de atrair ratos, moscas, mosquitos, cria um aspecto horrível de poluição em sua cidade. E, depois, custa muito dinheiro de impostos para limpar; dinheiro que poderia estar sendo usado para outras obras. Um amigo do planeta só joga seu lixo nos locais apropriados ou guarda no bolso e traz para colocar na lixeira da própria casa.

A água que você usa não sai da parede. Ela vem de algum rio ou manancial. Os rios estão sendo agredidos pela poluição e pelo desmatamento, o que torna a água potável menos disponível e eleva o custo de seu tratamento. Quanto à energia, existe a elétrica ou então vem de fontes como gás, petróleo, lenha e carvão. Elas vão escassear cada vez mais e algumas não são renováveis, como o petróleo, por exemplo.

Evite consumir além do necessário. Adquira o indispensável em alimentos, objetos, roupas, brinquedos, etc. As lojas e supermercados estão cheios de inutilidades que só fazem gastar mais e mais recursos naturais na fabricação. Reflita antes de comprar. Rejeite produtos descartáveis como copos, garrafas, etc. Além de poluírem e aumentar o volume de lixo, também apressam o esgotamento dos recursos naturais. Reutilize as sacolas de compras. Prefira alimentos naturais, evitando enlatados, empacotados, refrigerantes, alimentos industrializados, que além de mais caros, podem causar alergias e outros males e às vezes nem têm grandes funções nutritivas.

Não Desperdice

Diretrizes Socioambientais

Só Jogue Lixo no Lugar Certo

Poupe Água e Energia

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Cada animal ou planta é um ser vivo como você e tem tanto direito à vida, à liberdade e ao bem-estar quanto nós. Embora você não perceba, sua vida está interligada com a de todos os outros seres. É essa interligação que forma a teia da vida que garante a sobrevivência de todos. Por ter perdido essa noção, nossa espécie vem causando tanto prejuízo e poluição à natureza, com consequências cada vez mais graves para a nossa qualidade de vida. Os seres humanos são os únicos com capacidade de modificar em profundidade seu meio ambiente. Nós temos usado essa capacidade para piorar as coisas. Agora precisamos fazer o contrário para nossa sobrevivência.

Para fabricar papel é preciso cortar árvores. Logo, poupar papel é uma forma de defender as árvores. Utilize os dois lados da folha de papel. Leve sua sacola de compras ao supermercado. Faça coleta seletiva em sua casa. Recicle o papel, fabricando novo papel a partir do papel usado. A outra forma de ajudar é defendendo as árvores existentes e plantando novas árvores. Adote uma árvore. Cuide dela com carinho e respeito.

Use o menos possível o automóvel, programando suas saídas. Ele provoca poluição do ar. Acostume-se a ouvir música sem aumentar muito o volume do som. Som alto provoca poluição sonora. Enfim, reveja seu dia a dia e tome as atitudes ecológicas que julgar mais corretas e adequadas para você. Não espere que alguém venha fazer isso por você. Faça você mesmo.

É fácil separar o lixo seco (inorgânico: papel, plástico, metal, vidro) do lixo molhado (orgânico: restos de comida, cascas de frutas, etc.). Você estará contribuindo para poupar os recursos naturais, aumentar a vida útil dos depósitos públicos de lixo, diminuir a poluição. É só ter boa vontade e duas vasilhas diferentes ao lado da pia da cozinha e um lugar para depositar o lixo seco até alcançar um volume que permita sua venda ou doação.

Proteja os Animais e as Plantas

Proteja as árvores

Evite Poluir Seu Meio Ambiente

Faça Coleta Seletiva do Lixo

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Existem certos produtos de limpeza que não se degradam na natureza, como sabões, detergentes, etc. Ao comprar esses produtos, procure certificar-se de que são biodegradáveis. Evite o uso de venenos e inseticidas. Uma casa limpa é suficiente para afastar insetos e ratos. Os inseticidas são altamente nocivos para o meio ambiente e para a saúde das pessoas.

Estude e leia mais sobre a natureza, mesmo que não seja tarefa da escola. Tenha em casa livros e revistas que falem sobre a natureza. Faça um álbum de recortes com figuras de animais e plantas. Procure no dicionário palavras como saúde do trabalhador, r e c i c l a g e m , r e a p r o v e i t a m e n t o, h a b i t a t , biodegradáveis, etc. Quanto mais você souber, melhor poderá agir em defesa da natureza.

Só Use Biodegradáveis Conheça Mais a Natureza

Participe Desta Luta!

OS OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIOComo um dos desdobramentos da Rio 92, aconteceu a Cúpula do Milênio, realizada em setembro de 2000, na sede da ONU, em Nova York. Na ocasião, líderes de 191 países assinaram a Declaração do Milênio. Esse documento oficializou o pacto para priorizar a eliminação da fome e da extrema pobreza no planeta até 2015.

Foram estabelecidos os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, com 18 metas socioeconômicas em áreas como renda, educação, saúde infantil e materna, combate a doenças, saneamento, habitação, meio ambiente, igualdade de gêneros e parcerias pela sustentabilidade.

No Brasil, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) receberam o nome de “8 jeitos de mudar o mundo”, que passou a ser o movimento brasileiro pela divulgação, mobilização e cumprimento dos ODM.

Os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio são:

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BALANÇO DOS OBJETIVOS DO MILÊNIO

Objetivo 1

Metas Indicadores

Proporção da população que ganha menos de US$1 por dia

Índice de hiato de pobreza (incidência x grau de pobreza)

Parcela do quartil mais pobre no consumo nacional

Prevalência de baixo peso em crianças com menos de cinco anos

Proporção da população com consumo calórico abaixo do nível mínimo

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção de pessoas com renda menor que US$ 1 (um dólar) por dia

Erradicar a pobreza extrema e a fome

Reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção de pessoas que sofrem de fome

Objetivo 2 Atingir o ensino básico universal

Taxa de matrícula no ensino primário

Proporção de alunos que iniciam o primeiro ano e atingem o quinto

Taxa de alfabetização de 15 a 24 anos

Garantir que, até 2015, todas as crianças, de ambos os sexos, completem o ensino básico

Metas Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

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Objetivo 3 Promover igualdade de gênero e autonomia das mulheres

Metas Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Razão entre meninos e meninas no ensino básico, médio e superior

Razão entre mulheres e homens alfabetizados na faixa etária de 15 a 24 anos

Parcela das mulheres assalariadas no setor não agrícola

Proporção de mulheres exercendo mandatos no parlamento nacional

Eliminar disparidades de gênero no ensino básico e médio, de preferência até 2005, e em todos os níveis de educação, no mais tardar,até 2015

Objetivo 5 Melhorar a saúde materna

Razão de mortalidade materna

Proporção de partos assistidos por profissionais de saúde qualificados

Reduzir em três quartos, entre 1990 e 2015, a razão de mortalidade materna

Metas Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Metas Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Objetivo 4 Redução da mortalidade infantil

Taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos ·

Taxa de mortalidade infantil ·

Proporção de crianças de 1 ano vacinadas contra o sarampo

Reduzir em dois terços, entre 1990 e 2015,

a taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos

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Prevalência de HIV entre mulheres grávidas com idades entre 15 e 24 anos HIV

Taxa de utilização de anticoncepcionais

Número de crianças tornadas órfãs pelo HIV/aids

Até 2015, ter detido e começado a inverter a propagação do HIV/aids

Metas Indicadores

Prevalência e taxa de mortalidade associadas à malária

Proporção da população das zonas de risco que utilizam meios de proteção e de tratamento eficazes contra a malária

Medidas de prevenção e tratamento

Prevalência e taxa de mortalidade ligadas à tuberculose

Proporção de casos de tuberculose detectados e curados no âmbito de tratamento de curta duração sob vigilância direta

Até 2015, ter detido e começado a inverter a incidência da malária e de outras doenças importantes

Objetivo 6 Combater HIV/aids, malária, e outras doenças

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

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Objetivo 8 Estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento

Avançar no desenvolvimento de um sistema comercial e financeiro aberto, baseado em regras, previsível e não discriminatório (incluindo o compromisso de boa governança, desenvolvimento e redução da pobreza - ambos em âmbito nacional e internacional)

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Reduzir pela metade, até 2015, a proporção da população sem acesso permanente e sustentável à água potável segura.

Proporção da população com acesso sustentável a uma fonte de água tratada

Proporção da população com as melhores condições de saneamento

Proporção da população com posse segura do lugar de habitação (Desagregação Urbana/rural de vários indicadores acima podem ser relevantes para o monitoramento de melhoria de vida dos habitantes de bairros degradados)

Até 2020, ter alcançado uma melhora significativa nas vidas de pelo menos 100 milhões de habitantes de bairros degradados.

Mudança nas áreas terrestres cobertas por florestas

Área terrestre protegida para manter a diversidade biológica

PIB por unidade do uso de energia

Emissão de dióxido de carbono (per capita)

Integrar os princípios do desenvolvimento sustentável nas políticas e programas nacionais e inverter a perda de recursos ambientais

Metas Indicadores

Objetivo 7 Garantir a sustentabilidade ambiental

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

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Meta 2

Objetivo 8 Estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento

Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Proporção de exportações (por valor, excluindo armas) admitidas sem o pagamento de tarifas alfandegárias e cotas

Tarifas médias e cotas sobre produtos agrícolas, têxteis e vestuário

Subsídios domésticos e de exportação agrícola em países da OCDE

Proporção da APD outorgada para reforçar as capacidades comerciais

Acesso aos mercados. Atender às necessidades especiais dos países sem acesso ao mar e dos pequenos Estados insulares em desenvolvimento (mediante o Programa de Barbados e as conclusões da vigésima segunda Assembléia Geral)

Meta 1

Ajuda Pública para o Desenvolvimento (APD) como porcentagem da renda nacional bruta dos países doadores, membros do Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD)

Proporção da Ajuda Pública para o Desenvolvimento (APD) para serviços sociais básicos (educação básica, cuidados de saúde primários, nutrição, água salubre e saneamento)

Proporção de APD não vinculada

Proporção de APD para meio ambiente aos pequenos estados insulares em via de desenvolvimento

Proporção de APD para o setor de transporte em países sem acesso ao mar

Assistência oficial para oDesenvolvimento. Atender às necessidades especiais dos países menos desenvolvidos (inclui um regime isento de tarifas e quotas para as exportações); um programa reforçado de redução da dívida dos países pobres muito endividados (PPME)

Indicadores

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Meta 3

Proporção de dívida bilateral oficial de Países Muito Pobres Endividados (PPME) cancelada

Serviço da dívida como porcentagem das exportações de bens e serviços

Proporção da APD provida como perdão da dívida

Número de países que tenham atingido pontos de decisão e de cumprimento a favor dos PPME

Sustentabilidade da dívida. Tratar globalmente o problema da dívida dos países em desenvolvimento, por meio de medidas nacionais e internacionais de modo a tornar a sua dívida sustentável em longo prazo.

Objetivo 8 Estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento

Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Meta 4

Objetivo 8 Estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento

Indicadores

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Taxa de desemprego na faixa etária entre 15 e 24 anos

Proporção da população com acesso a medicamentos essenciais a preços acessíveis numa base sustentável

Linhas de telefone por 1mil habitantes

Computadores pessoais por 1mil habitantes

Outros: Em cooperação com os países em desenvolvimento, formular e executar estratégias que permitam que os jovens obtenham um trabalho digno e produtivo. Em cooperação com as empresas farmacêuticas, proporcionar o acesso a medicamentos essenciais a preços

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Preâmbulo

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;

Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum;

Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão;

Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações;

Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla;

Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades;

Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso, a Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente essa Declaração, esforce-se, por meio do ensino e da educação, para promover o respeito a esses direitos e liberdades e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, para assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOSA Declaração Universal dos Direitos Humanos é um dos documentos básicos das

Nações Unidas. Foi assinada em 1948. Nela, são enumerados os direitos que todos os seres humanos possuem.

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Artigo I.

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir na relação entre eles com espírito de fraternidade.

Artigo II.

Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou outra condição.

Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer esteja sujeito a outra limitação de soberania.

Artigo III.

Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo IV.

Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.

Artigo V.

Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

Artigo VI.

Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei.

Artigo VII.

Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole esta Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Artigo VIII.

Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.

Artigo IX.

Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.

Artigo X.

Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.

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Artigo XI.

Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.

Artigo XII.

Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Artigo XIII.

Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado.

Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a esse regressar.

Artigo XIV.

Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XV.

Todo homem tem direito a uma nacionalidade. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.

Artigo XVI.

Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução.

O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado.

Artigo XVII.

Todo ser humano tem direito à propriedade, individualmente ou em sociedade com outros. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.

Artigo XVIII.

Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou de crença e a liberdade de manifestar

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essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em público ou em particular público ou em particular.

Artigo XIX.

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

Artigo XX.

Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Artigo XXI.

Todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.

Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; essa vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.

Artigo XXII.

Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.

Artigo XXIII.

Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.

Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.

Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.

Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.

Artigo XXIV.

Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.

Artigo XXV.

Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis; e direito à segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

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A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.

Artigo XXVI.

Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.

A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.

Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.

Artigo XXVII.

Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir das artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios.

Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor.

Artigo XXVIII.

Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos nesta Declaração possam ser plenamente realizados.

Artigo XXIX.

Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade seja possível. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XXX.

Nenhuma disposição desta Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.

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