c30artigo4 - instrumentos financeiros derivados

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91 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS

JOS A. ENGRCIA ANTUNESI. ASPECTOS GERAIS 1. Noo Preliminar I. Designam-se por instrumentos derivados, ou simplesmente derivados (derivative, Finanzderivate, instruments drivs, derivati), os instrumentos financeiros resultantes de contratos a prazo celebrados e valorados por referncia a um determinado activo subjacente.1 2. Origem Histrica e Relevo Actual I. A origem histrica dos derivados perde-se na noite dos tempos. Na antiga Mesopotmia, existem relatos segundo os quais os reis da Babilnia tero emitido instrumentos que atribuam ao respectivo portador a faculdade de, contra o pagamento do preo nele previsto, exigir a entrega de um mercenrio e dois escravos em data futura.2 Do mesmo modo, sabido que os mercadores gregos negociavam futuros sobre azeite (atravs dos quais fixavam no presente o preo do litro de azeite a ser comprado em determinada quantidade e data futura) e os mercadores holandeses ajustavam opes sobre tulipas (atravs das quais concediam ao beneficirio a faculdade de adquirir, por preo previamente fixado e durante um certo perodo de tempo, uma determinada quantidade dessas flores)3. Ora, todos esses instrumentos e contratos eram destinados, em si mesmos, a circular e a ser negociados entre os prprios mercadores, possuindo assim um valor prprio e independente que, por seu turno, estava associado evoluo do valor dos bens que lhe subjaziam (escravos, azeite, tulipas). II. Apesar desta origem histrica remota, pode afirmar-se que os derivados so, enquanto instrumento financeiro, um fenmeno jurdico intimamente ligado ao movimento de inovao financeira que anima e caracteriza os mercados de capitais das ltimas dcadas.4

1- Sobre os instrumentos financeiros em geral, vide ANTUNES, J. Engrcia, Os Instrumentos Financeiros, Almedina, Coimbra, 2009. Sobre os derivados, vide, entre ns, ASCENSO, J. Oliveira, Derivados, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IV, 41-68, Coimbra Editora, 2003; MONTEIRO, M. Alves, O Mercado Portugus dos Derivados, in: 12 O Economista (1999), 119-127; PEIXOTO, J. Paulo, Funcionamento da Bolsa de Derivados, McGraw-Hill, Lisboa, 2000. Noutros quadrantes, vide CABALLERO, J. Sanz, Derivados Financieros, Marcial Pons, Madrid, 2000; HUDSON, Alastair, The Law on Financial Derivatives, 3rd edition, Sweet & Maxwell, London, 2002; NASSETTI, F. Caputo, I Contratti Derivati Finanziari, Giuffr, Milano, 2007; REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, Nomos, Baden-Baden, 2002; RUTTIENS, Alain, Manuel des Produits Drivs, Eska, Paris, 1997. 2- SWAN, Edward, Bulding the Global Market A 4000 Year History of Derivatives, 30 e segs., Kluwer, The Hague, 2000. 3- JAMES, Simon, The Law of Derivatives, 1, LLP, London, 1999. 4- Sobre a chamada inovao financeira, vide, entre ns, QUELHAS, J. Santos, Sobre a Evoluo Recente do Sistema Financeiro (Novos Produtos Financeiros), Separata do BCE, Coimbra, 1996; noutros quadrantes, vide CAVANNA, Henri (ed.), Financial Innovation, I. Thomson Business, Routledge, 1992; COURET, Alain, Innovation Financire et Rgle de Droit, IAE, Paris, 1990; WIELAND, Aglaia, Finanzinnovationen Analyse von Erfolgsfaktoren fr die Etablierung neuer Finanzinstrumente, Diplomica, Hamburg, 2001.

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O progressivo relevo que a gesto do risco foi assumindo nas empresas e nas economias mundiais modernas, bem assim como a globalizao dos mercados financeiros, a concorrncia entre os intermedirios financeiros, e o progresso extraordinrio das tecnologias de comunicao, conduziram as instituies financeiras, mormente bancrias, a uma dinmica incessante de criao e aperfeioamento de novos produtos ou instrumentos destinados a satisfazer as necessidades das empresas suas clientes, cada vez mais diversificadas e complexas, ligadas cobertura do risco das respectivas actividades econmicas, bem como ao aproveitamento de oportunidades especulativas e arbitragistas5. Expoente mximo da chamada engenharia financeira, dotados de uma crescente complexidade e sofisticao, indiscutvel o relevo econmico dos derivados no contexto das economias modernas6: como salienta Joseph RIZELLO, poucos desenvolvimentos da histria financeira foram responsveis por investimentos mais inovadores e eficientes do que a classe de instrumentos denominados

derivados7. De acordo com um estudo recente, o mercado organizado de derivados movimentou em 2007 mais de 6 bilies de futuros (de valor superior a 1,6 trilies de dlares) e 4 milhes de opes (de valor superior a 700 bilies de dlares), sendo ainda que o volume de derivados negociados fora do mercado organizado ascendeu a mais de 500 bilies de dlares.8 3. Funo Econmica. Vantagens e Riscos I. Os derivados so essencialmente instrumentos financeiros de cobertura dos riscos inerentes actividade econmica (hedging), de especulao (trading) e de arbitragem (arbitrage).9,10 II. Ao contrrio dos valores mobilirios e instrumentos monetrios, que constituem mecanismos de financiamento directo das empresas emitentes, os derivados so essencialmente um meio de salvaguarda das empresas face ao risco de mercado (v.g., oscilaes das taxas de cmbio, taxas de juro, cotaes bolsistas,

5- Na histria recente, a ascenso e o desenvolvimento dos derivados deveu-se sobretudo instabilidade monetria e cambial dos anos 70, com a crise do sistema de Bretton Woods: cf. AAVV, LUtilizzo dei Prodotti Derivati nellImpresa, Egea, Milano, 2002. 6- Sobre a engenharia financeira enquanto aplicao de conhecimentos cientficos (mormente, econmicos e matemticos) criao e desenvolvimento de novos produtos financeiros , vide BIRGE, John, Financial Engineering, Elsevier, Amsterdam, 2008; CASTRO, L. Dez/ MASCAREAS, Juan, Ingeneria Financiera, McGraw-Hill, Madrid, 1991; WIEDEMANN, Arnd, Financial Engineering: Bewertung von Finanzinstrumenten, Bankakad.-Verlag, Frankfurt, 2004. 7- The Development and Evolution of Derivative Products, 1, in: AAVV, The Handbook of Derivatives & Synthetics, 1-19, Probus Publishing, Chicago/ Cambridge, 1994. 8- Bank of International Settlements, Semiannual OTC Derivatives Statistics at the End-June 2007, Basel, 2007. Assinale-se a primazia dos derivados sobre taxas de juro (347 bilies, representativos de mais de do total dos derivados OTC), seguidos dos derivados sobre taxas de cmbio (48 bilies), derivados de crdito (42 bilies), forwards, swaps e opes ligados a capital (9 bilies), e derivados sobre mercadorias (7 bilies) (optamos aqui pela escala curta americana, e no pela escala longa europeia: cf. ALMEIDA, Guilherme, Sistema Internacional de Unidades, 3 edio, Pltano, 2002). 9- Sobre as funes econmicas dos derivados, vide em geral GIRINO, Emilio, I Contratti Derivati, 16 e segs., Giuffr, Milano, 2001; HUDSON, Alastair, The Law on Financial Derivatives, 15 e segs., 3rd edition, Sweet & Maxwell, London, 2002; REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 4 e segs., Nomos, Baden-Baden, 2002. Saliente-se que tais funes econmicas no so necessariamente incuas de um ponto de vista jurdico: as motivaes subjacentes sua utilizao podero ser relevantes, por exemplo, para efeitos da apreciao da responsabilidade dos membros dos rgos de administrao de empresas que tenham investido ou no investido em derivados (SERNETZ, Julia, Derivate und Corporate Governance Kompetenzen und Pflichten des Vorstands von Aktiengesellschaften beim Einsatz von Derivaten, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006). 10- Num sentido muito amplo, poder dizer-se que os derivados so tambm instrumentos de financiamento empresarial, o qual tanto pode ser obtido directamente mediante a angariao pela empresa emitente de fundos financeiros destinados a investimentos empresariais (como o caso tpico dos valores mobilirios) como indirectamente atravs das economias decorrentes da cobertura do risco de perdas nesses mesmos investimentos (ou da estabilizao ou incremento dos ganhos, se a finalidade for arbitragista ou especulativa), como sucede justamente com os derivados.

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inflao), ao risco de crdito (v.g., incumprimento, insolvncia, iliquidez do devedor), ao risco regulatrio (maxime, limites prudenciais aquisio de aces), e de outros riscos econmicos anlogos11. Assim, por exemplo, um industrial que necessite regularmente de uma determinada matria-prima sujeita a uma enorme volatilidade de preo no mercado (v.g., combustvel) pode prevenir-se contra subidas inopinadas dos custos produtivos atravs da celebrao de futuros que fixem hoje o preo a pagar amanh; um comerciante europeu que seja titular de crditos denominados em dlares, temendo uma futura evoluo desfavorvel da taxa de cmbio euro/dlar, pode prevenir-se contra tal risco celebrando um swap de divisas; um banqueiro que projecte adquirir a prazo uma carteira de aces ou outros valores mobilirios pode acautelar-se face os riscos inerentes s subidas ou descidas das respectivas cotaes atravs da concluso de uma opo de compra ou venda sobre esses valores.12

Alm dessa funo econmica protectiva, os derivados servem ainda concomitantemente finalidades de especulao permitindo ao investidor realizar aplicaes lucrativas que visam jogar na antecipao do sentido da evoluo do valor dos activos subjacentes 13 e de arbitragem permitindo ao investidor realizar aplicaes lucrativas que visam tirar partido das imperfeies dos mercados ou preos dos activos subjacentes14. Embora com carcter no necessrio ou exclusivo deste tipo de instrumento financeiro, os derivados possuem frequentemente um efeito de alavancagem financeira (financial leverage, Hebelwirkung): tal significa dizer que, atravs da mobilizao de meios financeiros prprios reduzidos (minimizao de investimento inicial), permitem participar mais do que proporcionalmente nas variaes de valor do activo subjacente (maximizao do ganho ou perda).15

11- O conceito de risco , pois, absolutamente nodal para a noo de instrumento derivado, sendo este frequentemente descrito como um mecanismo de transferncia de risco: the main economic function of derivatives is to allow individual parties to transform risks (BOARD, John, The Economic Consequences of Derivatives, 156, in: AAVV, Modern Financial Techniques Derivatives and the Law, 156-166, Kluwer, London, 2000); Derivate machen Risiken isoliert handelbar (KRUMNOW, Jrgen, Risikosteuerung von Derivaten, 1, Gabler, Wien, 1996). Sobre o conceito e os tipos de riscos nos derivados, vide NASSETTI, F. Caputo, I Contratti Derivati Finanziari, 4 e segs., Giuffr, Milano, 2007; REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 37 e segs., Nomos, Baden-Baden, 2002; sobre o seu relevo como objecto contratual, vide HENSSLER, Martin, Risiko als Vertragsgegenstand, Mohr, Tbingen, 1994. 12- Esta funo de cobertura pode revestir duas modalidades fundamentais, consoante seja realizada por parte de quem, no sendo titular do activo, deseja precaver-se contra uma subida do seu valor no futuro (long hedge), ou de quem, sendo titular do activo no mercado a pronto, prev uma diminuio futura do seu valor (short hedge). Sobre a funo de hedging dos derivados, vide BRAUN, Wilfried, Finanzderivate im Spannungsfeld betriebswirtschaftlicher Notwendigkeit und rechtlicher Risikobegrenzung, in: Festschrift fr Hugo Hahn, 319-340, Nomos, Baden-Baden, 1997; EIZIRIK, Nelson, Negcio Jurdico de Hedging, in: 90 Revista de Direito Mercantil (1993), 13-22; KANGIS, Peter, The Use of Financial Instruments for Hedging Purposes: Reconciling Theory and Evidence, in: 3 Journal of Financial Services Marketing (1998), 81-97. 13- A dimenso especulativa , hoje como ontem, fundamental no mercado de derivados. Por um lado, cobertura do risco e especulao so duas faces da mesma moeda, s abstractamente sendo cindveis: com efeito, um empresrio s pode cobrir um determinado risco da sua actividade econmica se encontrar no mercado um investidor ou especulador disposto a assumi-lo, sendo os derivados justamente um mecanismo de contratualizao massificada dessa transferncia de risco. Por outro lado, a especulao em derivados vantajosa no confronto com a especulao directa no prprio activo subjacente: assim, por exemplo, se um investidor pretender apostar na valorizao futura de determinadas aces cotadas no PSI-20, pode obter o mesmo resultado sem ter de suportar os respectivos custos financeiros (graas ao chamado efeito de alavancagem financeira, adiante descrito) e organizativos (v.g., deveres de publicidade das participaes, etc.) recorrendo a um futuro ou opo sobre tais aces. Por isso mesmo, faz sentido afirmar que os derivados can be used either to reduce risks or to take risks (HULL, John, Options, Futures and Other Derivatives, 15, 6th edition, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 2005). Sobre o crescente relevo ou protagonismo da funo especulativa, vide CAPRIGLIONE, Francesco, I Prodotti Derivati: Strumenti per la Copertura dei Rischi o Nuove Forme di Speculazione Finanziaria?, in: LVIII Banca, Borsa, Titoli di Credito (1995), 359-371; KLHN, Lars, Kapitalmarkt, Spekulation und Behavioral Finance, 24 e segs., Duncker & Humblot, Berlin, 2006; POITRAS, Geoffrey, Risk Management, Speculation and Derivatives Securities, Academic Press, New York, 2002. 14- Por definio, a arbitragem explora as ineficincias ou discrepncias (mispricing) entre dois preos ou mercados (mercado nacional e estrangeiro, mercado a prazo e a contado, etc.), constituindo os derivados um dos mecanismos por excelncia da sua realizao: assim, por exemplo, uma opo de compra de tipo americano permite a um investidor tirar partido de eventuais cursos dissonantes de uma determinada aco ou obrigao registados durante a vida da opo (DUBIL, Robert, An Arbitrage Guide to Financial Markets, J. Wiley & Sons, New York, 2004). 15- CHIEW, Lilian, Managing Derivative Risks: The Use and Abuse of Leverage, J. Wiley & Sons, New York, 1996; SOMMER, Gottfried, Derivative Finanzinstrumente: Chancen und Risiken der Hebelwirkung, V. Mller, Saarbrcken, 2008. O efeito de alavancagem (e, assim, o risco de ganho ou perda) ser tanto mais elevado quanto maior for o diferencial entre o valor do capital aplicado e do activo subjacente: por essa razo tambm, h quem considere o risco de perda total do capital investido como um dos traos distintivos destes instrumentos (SCHWARK, Eberhard, Brsenrecht, 467, in: Festgabe zum 50-jhrigen Bestehen des BGH, Band II, 455-495, Beck, Mnchen, 2000).

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III. semelhana de outros instrumentos financeiros, os derivados apresentam vantagens mas tambm alguns riscos oscilando as opinies entre o deslumbramento angelical e a crtica satnica.16 Decerto que os derivados desempenham hoje uma importante funo no plano da gesto do risco das empresas, permitindo, alm disso, uma alavancagem financeira dos seus investimentos, uma explorao mais dinmica das oportunidades especulativas e arbitragistas, uma mais transparente e correcta formao dos preos dos activos subjacentes, e at uma maior eficincia e liquidez do mercado de capitais no seu conjunto17. Em contrapartida, no se podem ignorar os riscos associados a tais instrumentos a ponto de haver quem os tenha j reputado de besta selvagem da finana18: entre outros,

tais instrumentos so susceptveis de provocar uma dissociao entre propriedade jurdica e econmica j que, relativamente aos bens e activos em geral (v.g., aces, obrigaes, mercadorias), permite operar uma separao entre titularidade formal ou directa (de primeiro grau) e material ou indirecta (de segundo grau) 19, de originar problemas de cash-flow empresarial tornando muito mais complexas e contingentes as projeces relativas aos fluxos e disponibilidades de caixa (pagamentos e recebimentos) 20, de incrementar a magnitude das perdas dos investidores que, em virtude da estrutura de derivao e do efeito de alavancagem financeira, podem ser virtualmente ilimitadas 21, seno mesmo aumentar o prprio risco sistmico de colapso do sistema financeiro no seu conjunto (efeito de domin).22

16- McCALLUM, John, Derivatives: The Devil Incarnate or the Promised Land?, in: 59 Business Quarterly (1995), 1-5. Sobre o ponto, AAVV, Derivative Finanzinstrumente: Nutzen und Risiken, Deutscher Sparkassenverlag, Stuttgart, 1995; DAMM, Ulrich, Derivate zwischen Nutzen und Risiken, in: XXIX Die Bank Zeitschrift fr Bankpolitik und Bankpraxis (1990), 506-511. 17- Sobre estas vantagens, em particular a gesto do risco empresarial, vide CHANCE, Don/ BROOKS, Roberts, An Introduction to Derivatives and Risk Management, 7th edition, South-Western College Pub., 2006; SCHMITT, Jean, Les Instruments Drivs: Au Service de lEfficience du March de Capitaux Mais en Toute Securit, in: 9/10 Revue de la Banque (1994), 553-557; WESTPHALEN, Stephanie, Derivatgeschfte, Risikomanagement und Aufsichtsratshaftung, Nomos, Baden-Baden, 2000. 18- STEINHERR, Alfred, Derivatives: The Wild Beast of Finance (A Path to Effective Globalisation?), J. Wiley & Sons, London, 1998. 19- A esta dissociao entre propriedade jurdica e econmica corresponde, na linguagem econmica, a distino entre posies naturais e sintticas, e, na linguagem ciberntica, entre original e cpia. Como evidente, assentando a maior parte das normas legais na titularidade jurdica ou formal, os derivados podem funcionar como um factor ou mesmo expediente de manipulao das mesmas (MONGA, Anish, Using Derivatives to Manipulate the Market for Corporate Control, in: XII Stanford Journal of Law, Business and Finance (2006), 186-219). 20- MUNTER, Paul, Cash-Flow Hedges, in: 9 Journal of Corporate Accounting and Finance (1998), 27-32. 21- Com efeito, a seduo do jogo (Spielverlockung) para empregar a expresso de Walther HADDING e Joachim HENNRICHS, Devisentermingeschfte, 455, in: Festschrift fr Carsten Peter Claussen, 447-467, C. Heymanns, Kln, 1997 , nos derivados, maior do que a verificada nos demais instrumentos jurdicos de investimento e mobilizao de riqueza, mormente se comparada com a aquisio directa do activo subjacente, j que, graas ao efeito de alavancagem financeira, permite ao investidor a obteno de lucros fabulosos e rpidos, mas tambm de perdas colossais, com um investimento de capital bastante reduzido: por isso, no falta quem defina jocosamente os derivados como aqueles investimentos feitos no ano transacto que resultaram em perda (GOTTSFIELD, Robert/ LOPEZ, Michael/ HICKS, William, Derivatives: What They Are, What They Cause, Whats The Law, 33, in: 32 Arizona Attorney (1996), 33-47). Esta realidade bem ilustrada em casos conhecidos como os relativos americana Procter & Gamble em 1994 (que incorreu em perdas no valor de 157 milhes de dlares em swaps), ao britnico Barings Bank em 1995 (com perdas no valor de 900 milhes de euros resultantes de derivados sobre divisas), ou francesa Socit Gnrale nos incios de 2008 (com perdas estimadas no valor de 3,6 bilies de euros resultantes de operaes de futuros). Cf. SAMUELSON, Charles, The Fall of Barings. Lessons for the Legal Oversight of Derivatives Transactions in the United States, in: XXIX Cornell International Law Journal (1996), 767-806. 22- Da que Warren BUFFET os tenha definido como financial weapons of mass destruction (STOKES, David, Comment on Practical Derivatives: A Transactional Approach, 500, in: 23 Journal of International Banking Law and Regulation (2008), 500-501). Sobre o tpico, vide BLACK, Fischer, Hedging, Speculation, and Systemic Risk, in: 3 Journal of Derivatives (1995), 6-8; GROUP OF THIRTY, Derivatives: Practices and Principles, 61, Washington, 1993; WALDMAN, Adam, OTC Derivatives and Systemic Risk: Innovative Finance or Dance into the Abyss?, in: 43 American University Law Review (1994), 1023-1091.

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4. Consagrao Legal I. Os derivados constituem uma categoria dos instrumentos financeiros, que se encontram expressamente consagrados no Cdigo dos Valores Mobilirios (abreviadamente CVM). Nos termos do art. 2., n 1, c) a f) deste diploma legal, em conjugao com o seu n 2, so considerados instrumentos financeiros (...) c) os instrumentos derivados para a transferncia do risco de crdito; d) os contratos diferenciais; e) as opes, os futuros, os swaps, os contratos a prazo e quaisquer outros contratos derivados relativos a: i) valores mobilirios, divisas, taxas de juro ou de rendibilidades ou relativos a outros instrumentos derivados, ndices financeiros ou indicadores financeiros, com liquidao fsica ou financeira; ii) mercadorias, variveis climticas, tarifas de fretes, licenas de emisso, taxas de inflao ou quaisquer outras estatsticas econmicas oficiais, com liquidao financeira ainda que por opo de uma das partes; iii) mercadorias, com liquidao fsica, desde que sejam transaccionados em mercado regulamentado ou em sistema de negociao multilateral ou, no se destinando a finalidade comercial, tenham caractersticas anlogas s de outros instrumentos financeiros derivados nos termos do artigo 38. do Regulamento (CE) n. 1287/2006, da Comisso, de 10 de Agosto; f) quaisquer outros contratos derivados, nomeadamente os relativos a qualquer dos elementos indicados no artigo 39. do

Regulamento (CE) n. 1287/2006, da Comisso, de 10 de Agosto, desde que tenham caractersticas anlogas s de outros instrumentos financeiros derivados nos termos do artigo 38. do mesmo diploma.23 II. A fonte prxima do preceito portugus a Directiva 2004/39/CE, de 21 de Abril, vulgarmente conhecida por Directiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros ou DMIF (cf. pontos 4) a 10) da Seco C do Anexo I)24, sendo ainda relevante o Regulamento CE/1287/2006, de 10 de Agosto (cf. arts. 37. a 39.).25 Alm disso, apesar da figura do derivado encontrar entre ns a sua sedes materiae no CVM, mister lembrar que ela hoje tambm utilizada e consagrada em vrios outros diplomas legais e nem sempre com um alcance idntico. Embora limitada ao regime dos fundos de titularizao de crditos, merece destaque a definio prevista no art. 2., n 2 do Regulamento CMVM n 2/2002, de 17 de Janeiro: Para efeitos do presente regulamento, so considerados instrumentos financeiros derivados os que, contratados isoladamente ou incorporados noutros valores, com ou sem liquidao financeira, tenham como activo subjacente, real ou terico, valores representativos de dvida ou direitos de crdito, bem como taxas de juro e divisas, nomeadamente: a) futuros padronizados, forwards e FRAS; b) opes padronizadas, caps, floors e collars; c) swaps e swaptions; e d) warrants, warrants autnomos.26

23- Itlicos nossos. O conceito de derivado representa ainda um elemento interpretativo e integrativo auxiliar de um conjunto vasto de normas do CVM, cuja hiptese legal para ele remete expressamente: assim, e j sem falar nas demais normas legais que so aplicveis aos instrumentos financeiros em geral (e, portanto, em princpio, tambm aos derivados), vejam-se, a ttulo exemplificativo, os arts. 111., n 1, h), ii), j), ii), 204., no 1, b), 213., n 5, 248., n 1, a), 289., n 1, a), 290., n 3, f), g) e h), 311., n 3, a) e b), 314.-D, n 1, a), e 378., n 4, todos do citado Cdigo. 24- Jornal Oficial n L 145, de 30 de Abril de 2004, 1-44. Sobre esta directiva, posteriormente alterada pelas Directiva 2006/31/CE, de 5 de Abril, e Directiva 2008/10/CE, de 11 de Maro, vide em geral GONALVES, Renato, Ntulas Comparatsticas sobre os Conceitos de Valor Mobilirio, Instrumento do Mercado Monetrio e Instrumento Financeiro na DMIF e no Cdigo dos Valores Mobilirios, in: 19 Cadernos do Mercado de Valores Mobilirios (2004), 94-103. 25- Jornal Oficial n L 241, de 2 de Setembro de 2006, 1-25. 26- Publicado no Dirio da Repblica, II Srie, de 1 de Fevereiro de 2002. Mesmo fora do domnio jusfinanceiro e at juscomercial, se verifica uma consagrao legal crescente da figura: apenas a ttulo de exemplo, vejam-se as leis tributrias (arts. 4., n 3, c), 5., n 8 do Cdigo do IRS, arts. 78. e 79. do Cdigo do IRC, art. 33., n 1, c) do Estatuto dos Benefcios Fiscais) e as leis contabilsticas (v.g., a projectada NCRF Norma Contabilstica e de Relato Financeiro 27 em Portugal, os IAS International Accounting Standard 7, 32 e 39 no plano internacional).

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II. CARACTERIZAO I. O termo derivado um termo juridicamente polissmico: no existindo uma definio legal e geral da figura, ele vem sendo utilizado pelo legislador, jurisprudncia e doutrina em sentidos diversos, designando, ora uma categoria especial de instrumentos financeiros, ora os contratos negociveis em que assentam, ora ainda as posies jurdicas em que investem os respectivos titulares.27 laia de mera noo preambular, abrimos este estudo definindo os derivados como sendo aqueles instrumentos financeiros que se consubstanciam em contratos a prazo celebrados e valorados por referncia a um determinado activo subjacente28. Ora, a compreenso desta noo apenas se torna verdadeiramente possvel atravs de uma anlise circunstanciada das caractersticas fundamentais que contradistinguem os derivados no universo geral dos instrumentos financeiros (contrato, activo subjacente, prazo, risco, abstraco), bem ainda como dos traos essenciais do respectivo regime jurdico (criao, negociao, circulao, e extino).29 1. Instrumento Financeiro I. Os instrumentos financeiros (financial instruments, Finanzinstrumente, instruments

financiers, strumenti finanziari) so um conjunto de instrumentos juscomerciais susceptveis de criao e/ou negociao no mercado de capitais, que tm por finalidade primordial o financiamento e/ou a cobertura do risco da actividade econmica das empresas. Tais instrumentos encontram-se hoje expressamente consagrados no art. 2., nos 1 e 2 do CVM, podendo ser ordenados em trs categorias fundamentais: os instrumentos mobilirios (ou valores mobilirios), os instrumentos monetrios (ou do mercado monetrio), e os instrumentos derivados.30 II. Os derivados so assim um dos tipos ou categorias dos instrumentos financeiros. Ao nvel macrojurdico, os derivados contradistinguem-se dos demais por serem instrumentos tpicos do mercado de capitais a prazo (Terminmarkt, future markets, march terme): ao passo que os instrumentos mobilirios so instrumentos tpicos do mercado de capitais em sentido estrito (Kapitalmarkt, securities market, march des valeurs mobilires), e os instrumentos monetrios so instrumentos tpicos do mercado monetrio (Geldmarkt, money market, march montaire), o mercado dos derivados caracteriza-se por ser um segmento do mercado financeiro cujas operaes, no lugar de serem objecto de execuo imediata (operaes a

27- Sobre esta polissemia, vide entre ns ASCENSO, J. Oliveira, Derivados, 49, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IV, 41-68, Coimbra Editora, 2000. Noutros quadrantes, GIRINO, Emilio, I Contratti Derivati, 7 e segs., Giuffr, Milano, 2001; HUDSON, Alastair, The Law on Financial Derivatives, 12, 3rd edition, Sweet & Maxwell, London, 2002; SERNETZ, Julia, Derivate und Corporate Governance, 48, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006; ZUNZUNEGUI, Fernando, Ley de Mercado de Valores, 178, Colex, Madrid, 2006. 28- Cf. supra I. 29- Trata-se de caractersticas tendenciais, e no absolutas ou exclusivas. Como veremos, os derivados no constituem uma categoria inteiramente homognea abarcando instrumentos financeiros que no revestem a totalidade daquelas caractersticas gerais (maxime, certos derivados exticos ou hbridos) e inteiramente estanque face s demais categorias de instrumentos financeiros pense-se em certos valores mobilirios e instrumentos monetrios assentes em tcnicas de derivao, como o caso, por exemplo, dos warrants autnomos ou de certas modalidades especiais de obrigaes de caixa (v.g., differential notes). 30- Sobre a noo e os tipos de instrumentos financeiros, vide desenvolvidamente ANTUNES, J. Engrcia, Os Instrumentos Financeiros, Almedina, Coimbra, 2009.

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A contado ou spot), envolvem a existncia de um perodo de tempo mais ou menos longo entre a data da sua realizao e a de execuo dos seus efeitos (operaes a prazo ou forward)31. Ao nvel microjurdico, os derivados so instrumentos financeiros que se contradistinguem dos demais por uma srie de caractersticas que sero justamente analisadas em seguida: assim, por exemplo, ao contrrio dos valores mobilirios, os derivados tm por regra a sua fonte num contrato (e no num documento), so fruto de um acordo negocial (e no de uma emisso em sentido tcnico), so destitudos de representao cartular ou registral prpria (ou at, regra geral, de forma legal obrigatria), e, no que tange aos derivados de mercado organizado, so em nmero tendencialmente ilimitado (podendo ser abertas tantas posies contratuais quantos os interessados) e insusceptveis de transmisso (dado ser sempre possvel aos terceiros abrir novas posies contratuais, bem como aos titulares actuais fecharem as suas posies mediante operaes de sinal contrrio). Entre as principais espcies de

instrumentos derivados, devem mencionar-se os futuros, as opes, os swaps, os derivados de crdito, os contratos diferenciais, os forwards, os caps, floors, e collars, bem assim como uma extensa panplia de outros derivados nominados, inominados, hbridos e sintticos (commodities derivatives, weather derivatives, economic derivatives, freight derivatives, real estate derivatives, structured notes, etc.). 2. Contrato I. Os derivados so instrumentos financeiros que tm a sua gnese usual num contrato: como sublinha a doutrina, os derivados nascem de contratos (Gilles NEJMAN)32, os derivados so contratos (Gnter REINER)33, os derivados so contratos que geram um instrumento financeiro (Emilio GIRINO)34, ou o denominador comum dos instrumentos derivados negociados no mercado organizado ou fora dele , indiscutivelmente, um contrato (Frdric PELTIER).35

31- Em sentido amplo ou lato, o mercado de capitais abrange o mercado de valores mobilirios (capitais de mdio e longo prazo), o mercado monetrio (capitais de curto prazo) e o mercado de derivados (capitais com funes de cobertura de risco, especulao e arbitragem). Sobre o conceito, sentido e evoluo do mercado de capitais, vide, entre ns, FERREIRA, A. Jos, Direito dos Valores Mobilirios, 17 e segs., AAFDL, Lisboa, 1997; noutros pases, vide BONNEAU, Thierry/ DRUMMOND, France, Droit des Marchs Financiers, 13, Economica, Paris, 2005; COSTI, Renzo/ ENRIQUES, Luca, Il Mercato Mobiliare, 1 e segs., Cedam, Padova, 2004; KMPEL, Siegfried, Bank- und Kapitalmarktrecht, 1279, 3. Aufl., Otto Schmidt, Kln, 2004. 32- Les Contrats de Produits Drivs: Aspects Juridiques, 15, Larcier, Bruxelles, 1999. 33- Derivative Finanzinstrumente im Recht, 13, Nomos, Baden-Baden, 2002. 34- I Contratti Derivati, 169, Giuffr, Milano, 2001. 35- Marchs Financiers et Droit Commun, 156, Banque diteur, Paris, 1997. No mesmo sentido, Heribert HIRTE e Thomas MLLERS, para quem o conceito de contrato a prazo tem um significado central para o conceito de derivado (Klner Kommentar zum WpHG, 94, Carl Heymanns, Kln, 2007), havendo mesmo autores que consideram que os dois conceitos so praticamente sobreponveis (MELZER, Philipp, Zum Begriff des Finanztermingeschfts, 370, in: 3 Zeitschrift fr Bank- und Kapitalmarktrecht (2003), 366-372).

98 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

II. Sem prejuzo da sua enorme diversidade, estes contratos revestem usualmente, alm da sua caracterstica fundamental de contratos a prazo36, uma natureza consensual no estando sujeitos a forma legal obrigatria (excepto nos casos em que se insiram em servios de intermediao financeira com o pblico investidor: cf. art. 321., n 1 do CVM)37 , no real cuja formao requer a mera declarao de vontade das partes contratantes 38, sinalagmtica sendo fonte para ambas as partes de obrigaes ligadas entre si por um nexo de reciprocidade 39, patrimonial onde est em regra afastado qualquer intuitus personae, sendo irrelevante a pessoa ou qualidades dos contratantes 40, onerosa envolvendo atribuies patrimoniais para ambas as partes , e aleatria no sentido em que o risco e incerteza que fornece a prpria causa e objecto contratuais.

III. Sublinhe-se que a expresso contrato, utilizada nas leis portuguesa (art. 2., n 1, e) do CVM) e estrangeiras (contrats financiers, Termingeschfte, contratti a termine), aqui empregue, no no seu sentido tradicional ou tcnico, mas no sentido amplssimo de modelo negocial abstracto apto a gerar vinculaes jurdicas: se existem derivados que correspondem efectivamente a verdadeiros negcios jurdicos bilaterais (v.g., swaps, caps, floors), existem outros que, como melhor veremos adiante, tm a sua origem remota em contratos-tipo ou produtos contratuais, construdos na base de condies negociais padronizadas adequadas constituio futura e massificada de direitos e deveres em mercado pelos investidores interessados (como o caso tpico dos futuros e opes negociados em mercado organizado).41

36- Cf. infra II, 4. 37- Apesar desta natureza consensual, trata-se de contratos que revestem usualmente uma forma escrita voluntria (art. 222. do Cdigo Civil), atenta a sua habitual padronizao pela via de clusulas contratuais gerais ou da remisso para modelos contratuais (master agreements) formulados por organizaes nacionais e internacionais especializadas, com destaque para a ISDA International Swaps and Derivatives Association. Sobre este fenmeno de estandardizao, bem como para modelos contratuais vrios de derivados, vide GOOCH, Anthony/ KLEIN, Linda, Documentation for Derivatives, 157 e segs., Euromoney, London, 1993; HARDING, Paul, Mastering the ISDA Master Agreements (1992 and 2002): A Practical Guide for Negotiation, 2nd edition, FT Prentice Hall, London, 2003. 38- Excepto no caso das opes, que constituem contratos reais quoad constitutionem, uma vez que o pagamento do prmio pelo beneficirio ou optante constitui um requisito constitutivo da formao do prprio contrato. Sobre a distino entre contratos obrigacionais e reais, vide TELLES, I. Galvo, Manual dos Contratos em Geral, 463 e segs., 4 edio, Coimbra Editora, 2002. 39- Tal sinalagma funcional entre as prestaes das partes , todavia, compatvel com mltiplas variantes: por exemplo, pode tratar-se de uma prestao nica (v.g., no caso dos forwards) ou prestaes sucessivas (v.g., no caso dos swaps), assim como podem ser prestaes simtricas (v.g., futuros) ou assimtricas (v.g., o caso das opes, em que uma das partes, o beneficirio, sabe de antemo qual o valor mximo da sua prestao, o prmio). Sobre tal sinalagma, vide REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 13 e segs., Nomos, Baden-Baden, 2002. 40- Ao menos, nos derivados de mercado organizado: cf. NASSETTI, F. Caputo, Profili Civilistiche dei Contratti Derivati Finanziari, 197, Giuffr, Milano, 1997. Por outro lado, os sujeitos dos derivados podem dividir-se em trs grandes categorias: entidades gestoras de mercado, intermedirios financeiros ou dealers (entre os quais se destacam as instituies de crdito, as empresas de investimento, e as empresas seguradoras), e investidores ou end-users (entre os quais se destacam as empresas, os Estados, e os investidores institucionais) (KRAWIECK, Kimberly, More Than Just New Financial Bingo: A Risk-Based Approach to Understanding Derivatives, 14 e segs., in: 23 Journal of Corporation Law (1997), 1-62). Salientando a progressiva emergncia dos derivados do mercado de retalho e do pequeno investidor individual, JACKSON, Carolyn, Have you Hedge Today? The Inevitable Advent of Consumer Derivatives, in: 67 Fordham Law Review (1999), 3205-3260. 41- DRUMMOND, France, Le Contrat comme Instrument Financier, in: Mlanges en Hommage Franois Terr, 661-675, Puf, Paris, 1999; sintomtico tambm que, na praxis financeira germnica, os negcios sobre derivados sejam designados Kontrakte, e no Vertrge (REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 3, Nomos, Baden-Baden, 2002). Com os contratos derivados no se podem confundir outros contratos financeiros a prazo, susceptveis de veicular finalidades ou resultados parcialmente similares, tais como o contrato de reporte (arts. 477. a 479. do Cdigo Comercial) consistente na compra a contado de ttulos de crdito ou valores mobilirios, e na revenda simultnea a termo desses ttulos ou valores, por preo determinado e o contrato de emprstimo financeiro (art. 350. do CVM) especialmente quando associado s chamadas vendas curtas ou short selling (sobre a figura, vide REIS, Clia/ SOUSA, Rita/ VIDAL, Isabel, Operaes de Short-Selling, in: 12 Cadernos do Mercado de Valores Mobilirios (2001), 160-185).

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OS DERIVADOS: 99

3. Activo Subjacente I. Os derivados so instrumentos financeiros assentes em tcnicas de derivao42: como o seu prprio nome inculca, estamos perante instrumentos de segundo grau, que so construdos e valorados por referncia a uma outra realidade primria, ou de primeiro grau, que a lei designa por activo subjacente (underlying asset, Basiswert).43 II. Os activos subjacentes (ou derivantes) so hoje praticamente ilimitados, podendo revestir natureza corprea ou incorprea, real ou virtual, industrial ou financeira, jurdica ou econmica ponto que se trate de realidades tipicamente sujeitas a risco de variao do respectivo valor.44 Entre os mais conhecidos nos dias de hoje, incluem-se os valores mobilirios de natureza real ou meramente nocional (por exemplo, uma aco ou obrigao hipottica de determinada empresa, que nunca foi realmente emitida) , os instrumentos monetrios v.g., certificados de

aforro, papel comercial, obrigaes de caixa , as taxas de juros v.g., Euribor, Libor, Mid, Ribor, overnight, etc. , as divisas v.g., o cmbio euro/dlar, dlar/iene, etc. , os ndices financeiros sobre valores mobilirios, taxas de juros, divisas, e outros (v.g., PSI20, S&P500, Eurostoxx 50, MSCI World, Dow Jones, CAC, Nikkey 255, Dax30) , os ndices econmicos sobre taxas de inflao, de desemprego, de crescimento, de produto nacional interno, e outros (v.g., U.S. gross domestic product, Eurozone HICP inflation index, etc.) , as mercadorias desde produtos agrcolas (v.g., caf, cacau, acar) at recursos naturais (v.g., ouro, prata, ao, platina) ou fontes energticas (v.g., electricidade, gs natural) , as variveis climticas (v.g., degree day, weather index), as tarifas de transporte (v.g., Worldscale Tanker Nominal Freight), e ... os prprios derivados ou seja, derivados de segundo grau, cujo activo subjacente constitudo por um outro derivado (v.g., swaptions de divisas). Em suma, a gama dos activos subjacentes tal que no falta quem defina os derivados como instruments that are based on the price of something else.45

42- Este trao fundamental corresponde, de resto, prpria raiz etimolgica da expresso: do latim, derivatio, que significa o processo pelo qual se obtm um produto a partir da transformao de outro ou outros (Dicionrio da Lngua Portuguesa Contempornea, Academia das Cincias de Lisboa, vol. I, 1116, Verbo, Lisboa, 2001). 43- Trata-se de um aspecto comummente referido na literatura internacional: A financial derivative is a financial instrument based on another basic instrument, which value depends on it (KOLB, Robert/ OVERDAHL, James, Financial Derivatives, 1, 3rd edition, J. Wiley & Sons, 2002); Si definiscono contratti derivati quei contratti il cui valore deriva dal prezzo di una attivit finanziaria sottostante (NASSETTI, F. Caputo, Profili Civilistiche dei Contratti Derivati Finanziari, 2, Giuffr, Milano, 1997); Derivative Finanzinstrumente sind gegenseitige Vertrge deren Wert vom Betrag einer zugrunde liegenden marktabhngigen Basiswert abgeleitet ist (REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 1, Nomos, Baden-Baden, 2002). Mas tambm pelo prprio legislador: vide assim, por exemplo, a Norma Regulamentar do ISP n 9/2007-R, de 28 de Junho, que define os produtos derivados como os instrumentos financeiros cujo valor depende de um activo subjacente de natureza real ou terica (art. 2., c)). 44- correcto observar que esta caracterstica de derivao est tambm presente, de um modo genrico, noutros instrumentos financeiros: com efeito, tambm o valor de uma aco ou de uma obrigao est de algum modo dependente das oscilaes do valor de um activo subjacente, que o patrimnio da entidade emitente. Todavia, ao passo que, nesses e noutros casos, a derivao corresponde a uma caracterstica meramente acessria ou incidental do instrumento financeiro, nos derivados ela emerge em pleno mago ou corao da prpria figura, fornecendo o seu paradigma construtivo ou identidade gentica, em torno do qual gravita toda a sua prpria concepo, estrutura e funcionamento. 45- EASTERBROOK, Frank, Derivative Securities and Corporate Governance, 734, in: 69 University of Chicago Law Review (2002), 733-747. A natureza dos activos, podendo ser extremamente heterognea, no , todavia, indiferente para efeitos do regime jurdico dos instrumentos financeiros derivados: assim, por exemplo, os derivados cujo activo subjacente seja de natureza meramente terica ou virtual (v.g., valores mobilirios nocionais, ndices financeiros, ndices econmicos, etc.) apenas admitem liquidao financeira, estando obviamente excluda a liquidao fsica.

100 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

III. Na esteira do legislador comunitrio, o legislador portugus consagrou um extensssimo elenco de activos relevantes (art. 2., n 1, e) e f) do CVM). Tal elenco deve considerar-se fechado ou exaustivo46: assim sendo, no sero de admitir entre ns alguns tipos de derivados, conhecidos na praxis financeira internacional, que so construdos sobre outros tipos de activos, v.g., derivados sobre resultados de futebol, votaes eleitorais, ou at catstrofes (excepto se associadas a variveis climatricas)47. Muito embora a lei no faa tal exigncia, afigura-se que os activos subjacentes devero ser susceptveis de reproduo ou replicao (Reproduzierbarkeit) permanente: tal significa que tal activo, enquanto varivel da qual depende o cmputo do valor do derivado48, deve ser uma grandeza continuamente mensurvel durante o prazo da sua vigncia at data da sua execuo.49 4. Prazo I. Os derivados so caracteristicamente instrumentos financeiros a prazo50. Tal significa dizer

que os negcios em que se consubstanciam, no lugar de serem objecto de execuo imediata (operaes a contado ou spot), se caracterizam pela existncia de um perodo de tempo mais ou menos longo, que pode ir de alguns meses a algumas semanas ou dias apenas, entre a data da sua celebrao e a data da execuo dos direitos e obrigaes deles emergentes (operaes a prazo ou forward)51. Esse prazo, porm, poder ter uma natureza firme ou condicional, rectius, o prazo ou lapso de tempo intercorrente poder configurar juridicamente um termo ou uma condio. Se existem derivados cuja execuo tem lugar necessariamente numa data de vencimento pr-determinada funcionando o prazo como uma espcie de termo inicial certo (dies certus an certus quando): o caso dos futuros , outros existem em que aquela execuo poder ter ou no lugar nessa (ou at essa) data consoante a vontade do respectivo titular ou beneficirio pelo que ao prazo vai acoplada uma verdadeira condio incerta (dies incertus an incertus quando): o caso das opes, respectivamente, de estilo europeu e americano.

46- Nesse sentido, aponta a enumerao fechada dos vrios activos referidos nas subalneas i) a iii) da alnea e) do art. 2., n 1 do CVM, bem como a lista adicional de activos previstos nas alneas a) a g) do art. 39. do Regulamento CE/1287/2006, de 10 de Agosto, aplicvel por fora do art. 2., n 1, f) do mesmo Cdigo. No sentido da taxatividade dos elencos legais dos activos, vide, em ordens jurdicas congneres, REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 10 e segs., 25 e seg., Nomos, Baden-Baden, 2002; MELZER, Philipp, Zum Begriff des Finanztermingeschfts, 370, in: 3 Zeitschrift fr Bank- und Kapitalmarktrecht (2003), 366-372. 47- Por exemplo, as chamadas CAT calls ou CE puts (catastrophe equity put options) negociadas na Chicago Board of Trade (sobre os derivados de seguro em geral, vide BRIYS, Eric/ VARENNE, Franois, Insurance: From Underwriting to Derivatives, J. Wiley & Sons, New York, 2001). 48- Sendo fundamental que o valor do derivado fique dependente do valor do activo subjacente, j indiferente a natureza, directa ou indirecta, dessa dependncia: assim, por exemplo, um futuro tanto pode derivar o seu valor de uma concreta aco ou mercadoria como de um ndice de aces ou de um cabaz de mercadorias. 49- Numa boa parte dos casos, tal significar que o activo seja transaccionvel num mercado a pronto lquido, embora nem sempre seja necessariamente assim: pense-se em activos meramente nominais ou construdos, como, por exemplo, os derivados de cestas (basket-derivatives, Korb-Derivate) que, ao contrrio dos derivados sobre ndices (v.g., Dow Jones), funcionam por referncia a um cabaz ou cesta de activos (v.g., as aces de algumas empresas) seleccionados ad hoc pelos prprios contratantes. 50- Sobre os derivados como operaes a prazo e sobre a essencialidade do elemento temporal , vide ASCENSO, J. Oliveira, Derivados, 47, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IV, 41-68, Coimbra Editora, 2000; noutros quadrantes, CAPRIGLIONE, Francesco, Essenzialit del Termine nelle European Call Options, 501, in: LVII Banca, Borsa, Titoli di Credito (1994), 598-504; CORDIER, Jean, Les Marchs Terme, Puf, Paris, 1992; ELLER, Roland (Hrgs.), Handbuch Derivativer Instrumente, 9, Schffer-Poeschel, Stuttgart, 1996. 51- A distino entre operaes a prazo (forward transactions, Termingeschfte) e a contado (spot transactions, Kassageschfte) nem sempre ser fcil (cf. ainda os arts. 15. e segs. do Regulamento CMVM n 3/2007, de 9 de Novembro). Muito embora as operaes a prazo impliquem usualmente um prazo de execuo superior a dois dias (cf. art. 38., n 2 do Regulamento CE/1287/2006, de 10 de Agosto), necessrio advertir para a possibilidade de existncia de operaes financeiras hbridas a meio caminho entre o mercado a prazo e a contado (MELZER, Philipp, Zum Begriff des Finanztermingeschfts, 370 e segs., in: 3 Zeitschrift fr Bank- und Kapitalmarktrecht (2003), 366-372), alm de no repugnar reconhecer a natureza de derivado, a ttulo excepcional, a produtos negociados em prazo inferior, mormente a certos contratos executados no dia seguinte (v.g., os contratos day-ahead negociados no Powernext) ou at no prprio dia (intraday trading: cf. BINDER, Jens-Heinrich, Daytrading als Finanztermingeschft i.S.d. 2, Abs. 2A WpHG, in: 34 Zeitschrift fr Unternehmens- und Gesellschaftsrecht (2005), 329-369; REINER, Gnter, Daytrading in Niemandsland zwischen Kassa- und Termingeschft, in: 14 Zeitschrift fr Bankrecht und Bankwirtschaft (2002), 211-217).

101 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS: 101

II. Esta essencialidade do factor tempo , no apenas inteiramente consistente com a funo primacial de cobertura de risco dos derivados j que, consistindo o risco na oscilao das variveis econmicas no futuro, apenas uma operao a prazo, executvel em data futura, lhe poder fazer face , como tambm determinante de vrios aspectos do respectivo regime jurdico mormente, conformando o contedo das prestaes contratuais. Assim, por exemplo, num contrato de futuros sempre aposto um termo certo inicial ou suspensivo que assume natureza de termo essencial , o qual confere justamente a este derivado a sua fisionomia tpica de instrumento financeiro cujos efeitos jurdicos principais (entrega de activo subjacente, pagamento do preo acordado, pagamento do saldo diferencial) se produzem apenas em data futura pr-determinada. 5. Risco

celebr-los num estado de dfice informativo, visam justamente negociar sobre tal incerteza, fazendo desta a verdadeira causa e objecto negociais.52 II. Sublinhe-se, porm, que pode ser diferenciada a distribuio do risco contratual: ao passo que uma boa parte dos derivados possuem uma estrutura simtrica de risco j que, implicando deveres recprocos de liquidao fsica ou pecuniria para ambas as partes, envolvem uma concomitante distribuio mtua de ganhos e perdas (v.g., futuros, swaps) , outros existem que se caracterizam por um perfil de risco assimtrico, em que uma das partes sabe de antemo qual o seu risco ou perda mximos (v.g., o caso das opes, cujo comprador ou beneficirio sabe partida que incorre numa perda mxima correspondente ao respectivo prmio).53 6. Abstraco

I. Os derivados so instrumentos financeiros tipicamente estocsticos e aleatrios. Tal significa dizer, desde logo, que os negcios em que se consubstanciam envolvem prestaes negociais cujo an e quantum no possvel determinar no momento da respectiva celebrao para uma ou ambas as partes dependendo de um evento futuro de natureza estocstica, apenas determinvel em definitivo no momento da respectiva execuo. Mas significa mais: trata-se de negcios em que o risco fornece o prprio objecto contratual, no sentido em que as partes contratantes, mais do que simplesmente

I. Por ltimo, os derivados so ainda instrumentos financeiros abstractos no sentido em que, uma vez criados, se tornam autnomos ou independentes em face dos respectivos activos subjacentes: muito embora economicamente o derivado constitua uma duplicao do activo subjacente (pelo que o valor do primeiro deriva do valor do segundo), de um ponto de vista jurdico encontramo-nos perante instrumentos juscomerciais a se cuja existncia e validade totalmente independente das vicissitudes jurdicas desse activo.

52- Com efeito, pode dizer-se que a condicionalidade estocstica , de certo modo, prpria de qualquer contrato, j que nestes sempre as partes trocam um presente certo por um futuro incerto: assim, por exemplo, num simples contrato de compra e venda, o perecimento das coisas sem culpa do devedor pode acarretar a extino da obrigao, por impossibilidade objectiva (art. 790. do Cdigo Civil). Todavia, ao contrrio dos contratos comuns, nos contratos aleatrios de que os derivados so um exemplo o risco e a incerteza (Unsicherheitfaktor) funcionam, no como vicissitude colateral e no desejada, mas, verdadeiramente, como a prpria causa e objecto do acordo entre as partes. Sobre o ponto, vide tambm HENSSLER, Martin, Risiko als Vertragsgegenstand, 14, Mohr, Tbingen, 1994. 53- GROUP OF THIRTY, Derivatives: Practices and Principles, 30 e segs., Washington, 1993. Por isso tambm, na teoria econmica, os derivados so por vezes descritos como operaes de soma zero (zero-sum), j que os ganhos (ou perdas) de uma das partes correspondem exactamente s perdas (ou ganhos) da contraparte: ou seja, so instrumentos que no criam ou produzem valor, mas simplesmente operam transferncias de valor entre os agentes econmicos (cf. HAZEN, Tom, Rational Investment, Speculation, or Gambling? Derivative Securities and Financial Futures and Their Effects on the Underlying Capital Markets, 1006 e segs., in: 86 Northwestern University Law Review (1992), 987-1037).

102 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

II. Esta caracterstica de abstraco conhecida de outros instrumentos juscomerciais de circulao e mobilizao de riqueza. Com efeito, bem sabido que determinados ttulos de crdito (letras, livranas, cheques) so caracterizados pela sua abstraco, no sentido em que os direitos cartulares abstraem das relaes jurdicas fundamentais que lhe estiveram na origem: assim, por exemplo, o sacador de uma letra de cmbio no se pode recusar a efectuar o pagamento a um portador mediato e de boa-f com fundamento na nulidade do negcio subjacente respectiva emisso (art. 17. da Lei Uniforme das Letras e Livranas)54. Ora, no caso dos derivados, a abstraco absoluta e pura, j que os direitos e obrigaes deles emergentes se tornam totalmente imunes s vicissitudes jurdicas (mormente, invalidade ou inexistncia) do activo subjacente: que se trate de aces, obrigaes, mercadorias, ndices, ou taxas de juro, o contrato derivado, uma vez celebrado validamente, passa a constituir um negcio a se stante, dotado de total impermeabilidade jurdica, sendo assim irrelevante, por exemplo, se o processo de emisso de aces ou obrigaes subjacentes a um contrato de futuros enferma de irregularidades, se os emprstimos subjacentes a um swap de taxa de juros so nulos, e assim por diante. III. ESPCIES I. O mercado de derivados um mercado em contnuo crescimento desde os finais dos anos 80, sendo essa expanso caracterizada por uma

tal profuso de modalidades e variantes, em quantidade e qualidade, que inviabiliza a formulao de classificaes estveis na matria: no surpreende assim que haja mesmo quem considere que a instabilidade e a averso sistematizao so caractersticas institucionais dos derivados55. Alis, isso mesmo acabou por ser reconhecido de alguma forma pelo prprio legislador portugus, que expressamente consagrou o carcter aberto e no taxativo do elenco legal dos derivados, ao abranger genericamente quaisquer outros contratos derivados relativos aos activos subjacentes legalmente relevantes (art. 2., n 1, f) do CVM).56 II. Sem prejuzo desta advertncia, a literatura jurdica e econmica especializada tem procurado agrupar os instrumentos derivados em diferentes espcies ou tipologias, de acordo com uma diversidade de critrios ordenadores.57 1. Os Arqutipos: Futuros, Opes, Swaps I. O critrio mais divulgado classifica os derivados de acordo com o contedo da posio jurdico-contratual. Segundo este critrio, podemos distinguir entre trs espcies fundamentais de derivados: os futuros (que conferem a ambas as partes posies recprocas de compra e venda sobre o activo subjacente em data e por preo previamente fixados), as opes (que conferem a uma das partes direitos potestativos de compra ou de venda do activo subjacente em ou at data futura, por preo previamente fixado), e os swaps (que conferem s partes posies

54- Tal abstraco, alm de limitada sobretudo aos chamados ttulos de crdito abstractos, meramente relativa, pois no vale no plano das relaes cartulares imediatas, est sujeita exceptio doli, e no impede a invocabilidade das excepes no mbito de aces judiciais no cambirias. Sobre a distino entre ttulos de crdito abstractos e causais, bem como sobre o significado e alcance da autonomia cartular, vide ANTUNES, J. Engrcia, Os Ttulos de Crdito, Coimbra Editora, 2009, em curso de publicao; MARTINS, A. Soveral, Ttulos de Crdito e Valores Mobilirios, vol. I, 27 e segs., Almedina, Coimbra, 2008; VASCONCELOS, P. Pais, Direito Comercial Ttulos de Crdito, 26 e seg., AAFDL, Lisboa, 1997. 55- GIRINO, Emilio, I Contratti Derivati, 44, Giuffr, Milano, 2001. Assim, por exemplo, impossvel afirmar com segurana se uma swaption deve ser classificada como um swap ou uma opo, tal como no possvel distinguir claramente entre um futuro sobre um ndice de aces e um domestic currency swap construdo sobre um tal ndice. 56- Sublinhe-se que o aspecto agora referido natureza aberta ou exemplificativa do elenco legal dos instrumentos financeiros derivados distinto da (embora conexo com a) questo da natureza aberta ou fechada dos activos subjacentes previstos na lei. Sobre tal questo, vide supra III, 3. 57- Sobre as diferentes tipologias dos derivados, vide NASSETTI, F. Caputo, I Contratti Derivati Finanziari, 21 e segs., Giuffr, Milano, 2007.

103 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS: 103

jurdicas permutveis relativas a determinadas quantias pecunirias em data ou datas futuras previamente fixadas). II. Os futuros, opes e swaps so assim comummente qualificados na doutrina como os arqutipos58, grupos59, formas60, ou categorias61 essenciais dos derivados. Estas espcies de derivados tambm por vezes designados core derivatives (Henry HU)62 so relevantes na medida em que fornecem a base estrutural fundamental de todos os produtos derivados, sendo as demais espcies e subespcies resultantes da respectiva combinao ou articulao. Os derivados so, como o sabemos, contratos a prazo, mediando um intervalo de tempo entre os momentos da respectiva celebrao e execuo: ora, tambm j o vimos, os derivados, ou bem que so a prazo firme ou negcios a termo (futuros), ou bem que so a prazo condicional ou negcios condicionais (opes), ou bem que so variantes ou combinaes entre tais elementos firmes e condicionais63. Muito embora os swaps no escapem verdadeiramente a esta regra, o seu enorme relevo prtico e complexidade operacional tm justificado, que na literatura especializada, eles venham sendo autonomizados como um terceiro tipo fundamental.64

2. Derivados de Primeira, Segunda e Terceira Gerao I. Outro critrio interessante aquele que classifica os derivados de acordo o contedo da sua concepo ou gestao financeira. Segundo este critrio, os derivados podem ser ordenados em trs grandes famlias ou geraes: os derivados de primeira gerao que abrangem os arqutipos de derivados (futuros, opes simples, swaps), relativos a activos subjacentes tradicionais (aces, juros, divisas, mercadorias) e primacialmente objecto de liquidao fsica (entrega do activo contra pagamento do preo) , os derivados de segunda gerao que compreendem variantes ou modalidades especiais daqueles tipos primognitos (v.g., forwards, caps, floors, derivados de crdito) relativos a outros tipos de activos, sobretudo de natureza financeira e nocional (v.g., ndices financeiros, ndices econmicos, variveis climatricas, tarifas de transporte, risco de crdito, etc.), e que so quase exclusivamente objecto de liquidao financeira (pagamento do diferencial de valor) , e os derivados de terceira gerao que designam uma classe de novos produtos financeiros de estrutura hbrida e complexa, resultante da combinao de derivados de primeira e/ou segunda gerao

58- GIRINO, Emilio, I Contratti Derivati, 47, Giuffr, Milano, 2001. 59- HUDSON, Alastair, The Law on Financial Derivatives, 15, 3rd edition, Sweet & Maxwell, London, 2002. 60- GOTTSFIELD, Robert/ LOPEZ, Michael/ HICKS, William, Derivatives: What They Are, What They Cause, Whats The Law, 34, in: 32 Arizona Attorney (1996), 33-47. 61- ASCENSO, J. Oliveira, Derivados, 52, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IV, 41-68, Coimbra Editora, 2000. 62- Hedging Expectations: Derivative Reality and the Law and Finance of the Corporate Objective, 13, in: 21 The Journal of Corporation Law, (1995), 3-51. 63- Neste sentido, em diferentes ordenamentos jurdicos, vide GROUP OF THIRTY, Derivatives: Practices and Principles, 29 e seg., Washington, 1993; HIRTE, Heribert/ MLLERS, Thomas (Hrsg.), Klner Kommentar zum WpHG, 94 e segs., Carl Heymanns, Kln, 2007; NEJMAN, Gilles, Les Contrats de Produits Drivs: Aspects Juridiques, 17, Larcier, Bruxelles, 1999. 64- REINER, Gnter, Derivative Finanzinstrumente im Recht, 1, Nomos, Baden-Baden, 2002.

104 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

(v.g., opes sobre forwards, swaptions, two strike interest rate caps, foreign exchange contigent forwards, swaps exticos, derivados sobre derivados) ou at de derivados com outros instrumentos financeiros (v.g., credit-linked notes, synthetic convertible notes, interest differential notes).65 II. Este critrio, de matriz fundamentalmente econmica e no jurdica, relevante, no apenas por colocar em perspectiva a enorme e aparentemente imparvel dinmica de desenvolvimento do mercado dos derivados no universo dos instrumentos financeiros, como tambm por permitir uma melhor compreenso sistemtica das similitudes e diferenas operacionais dos novos produtos germinados na praxis financeira e bancria.66 3. Outras Classificaes I. Ao lado destes critrios fundamentais, muitos outros existem, que se revestem de enorme utilidade para nos dar a conhecer o carcter multifacetado deste instrumento financeiro. II. Assim, de acordo com o critrio da sua previso legal, podemos distinguir entre derivados nominados ou inominados, consoante

se encontram expressamente previstos na lei (maxime, futuros, opes, swaps) ou so fruto da pura inventiva da autonomia privada (v.g., caps, floors, swaptions, derivados exticos e hbridos, etc.); de acordo com o critrio da sua criao e negociao, podemos distinguir entre derivados uniformes ou de balco, consoante a respectiva constituio e transaco ocorre de forma estandardizada em mercados organizados (maxime, futuros e opes padronizadas) ou de forma individualizada ao balco dos intermedirios financeiros (v.g., swaps, collars, forwards); de acordo com o critrio do activo subjacente, podemos distinguir entre derivados financeiros e mercadolgicos, consoante lhes subjazem entidades de natureza puramente financeira (financial derivatives: v.g., uma aco, uma divisa, uma taxa de juro, um ndice financeiro) ou de natureza agrcola, comercial ou industrial (commodities derivatives: v.g., um metal precioso, um tipo de cereal, cabeas de gado); de acordo com o critrio da sua liquidao, podemos distinguir entre derivados com liquidao fsica ou financeira, consoante esta consiste na entrega do activo subjacente e pagamento do preo respectivo (physical settlement) ou simplesmente no pagamento do saldo diferencial entre o valor contratado e o valor de referncia do activo no vencimento (cash settlement); e assim por diante.

65- De acordo com Kimberly KRAWIECK, estima-se que, nos incios dos anos 90, fossem j negociados no mercado mais de 1200 diferentes modalidades de derivados (More Than Just New Financial Bingo: A Risk-Based Approach to Understanding Derivatives, 9, in: 23 Journal of Corporation Law (1997), 1-62). A dinmica de tal ordem que no deixa de surpreender os prprios profissionais do sector: segundo Warren BUFFET, o leque dos instrumentos financeiros est apenas limitado pela imaginao dos homens (men) e, por vezes, ao que parece, dos loucos (madmen) (cf. STOKES, David, Comment on Practical Derivatives: A Transactional Approach, 500, in: 23 Journal of International Banking Law and Regulation (2008), 500-501). 66- Sobre este critrio, vide BRAUN, Wilfried, Finanzderivate im Spannungsfeld betriebswirtschaftlicher Notwendigkeit und rechtlicher Risikobegrenzung, 321 e seg., in: Festschrift fr Hugo Hahn, 319-340, Nomos, Baden-Baden, 1997; CLOUTH, Peter, Rechtsfragen der ausserbrslichen Finanz-Derivate, 10 e segs., Beck, Mnchen, 2001; WINTER, Stefan, Derivative Finanzinstrumente der dritten Generation, 214, in: AAVV, Derivative Finanzinstrumente, 211-237, Schffer-Poeschel, Stuttgart, 1995.

105 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS: 105

IV. REGIME JURDICO I. Em via geral, os derivados esto sujeitos ao mesmo regime jurdico aplicvel aos demais instrumentos financeiros, por fora da remisso genrica do art. 2., n 2 do CVM. Tal no significa, todavia, que no existam importantes especialidades no que concerne respectiva criao, negociao, circulao, e extino, que importa brevemente assinalar.67 II. Cuidamos nesta oportunidade, naturalmente, apenas do regime jusfinanceiro dos derivados. Mas mister salientar que este instrumento financeiro vai ganhando hoje outras importantes incidncias jurdicas, que tm merecido uma crescente ateno por parte do legislador e da doutrina: como sublinha Steven EDWARDS, derivatives encapsulate a plethora of legal issues.68

Apenas a ttulo de exemplo, recorde-se o relevo que os derivados possuem hoje no direito societrio especialmente no plano da governao das sociedades69 e da responsabilidade dos rgos de administrao e de fiscalizao70 , no direito da contabilidade sobretudo, aps o acolhimento dos IAS 32 e 39 e do IFRS 7, na sequncia do Regulamento CE/1606/2002, de 19 de Julho, que veio determinar a obrigatoriedade da adopo das normas internacionais de contabilidade (IAS/ IFRS)71 , no direito da insolvncia mormente, tendo em conta o regime jusinsolvencial especial dos contratos a prazo (art. 107. do Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas)72 , no direito fiscal mormente, atento o tratamento fiscal autnomo dos proveitos ou ganhos e custos ou perdas dos derivados, hoje expressamente previsto em sede de IRC (arts. 78. e 79. do Cdigo do

67- Essas especialidades so especialmente ntidas no caso dos chamados derivados de mercado organizado razo pela qual a estes nos referiremos prevalentemente em seguida. 68- Legal Principles of Derivatives, 1, in: Journal of Business Law (2002), 1-32. 69- Especialmente por fora do efeito de dissociao entre a propriedade econmica e jurdica do capital social, que os derivados so susceptveis de criar: um exemplo disto mesmo pode ser encontrado no chamado fenmeno do esvaziamento do voto (emptying vote), consistente na dissociao entre propriedade de capital e titularidade do voto emergente do recurso a derivados (sobre o fenmeno, vide ANTUNES, J. Engrcia, Os Hedge Funds e o Governo das Sociedades, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IX, Coimbra Editora, em curso de publicao; sobre o risco sistmico resultante do investimento em derivados pelos hedge funds, vide WYNKOOP, Noah, The Unregulables? The Perilous Confluence of Hedge Funds and Credit Derivatives, in: 76 Fordham Law Review (2008), 3095-3126). 70- Episdios como o colapso do britnico Barings Bank em 1995 (na sequncia de perdas no valor de 900 milhes de euros resultantes de derivados sobre divisas) ou o rombo sofrido pela francesa Socit Gnrale em 2008 (estimado em 3,6 bilies de euros, resultante de operaes de futuros) ilustram bem esta importncia. Sobre o tema, vide EASTERBROOK, Frank, Derivative Securities and Corporate Governance, in: 69 The University of Chicago Law Review (2002), 733-747; KRAWIEC, Kimberly, Derivatives, Corporate Hedging, And Shareholder Wealth: Modigliani-Miller Forty Years Later, in: University of Illinois Law Review (1998), 1039-1102; PARTNOY, Frank, Adding Derivatives to the Corporate Law Mix, in: 34 Georgia Law Review (2000), 599-629; RANDOW, Philipp von, Derivate und Corporate Governance, in: 25 Zeitschrift fr Unternehmens- und Gesellschaftsrecht (1996), 594-641; SERNETZ, Julia, Derivate und Corporate Governance Kompetenzen und Pflichten des Vorstands von Aktiengesellschaften beim Einsatz von Derivaten, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006. 71- Os International Accounting Standards (IAS) e os agora denominados International Financial Reporting Standards (IFRS) constituem um conjunto de regras universais de construo e apresentao da informao financeira, tendo por objectivo, num mundo marcado pela globalizao dos mercados internacionais, assegurar um alto grau de transparncia, genuinidade e comparabilidade das informaes financeiras prestadas pelas empresas (EPSTEIN, Barry/ JERMAKOWICZ, Eva, IFRS 2008 Interpretation and Application of International Accounting and Financial Reporting Standards, J. Wiley & Sons, New York, 2008). Sobre as incidncias juscontabilsticas dos derivados, vide entre ns CORREIA, M. Anacoreta, Instrumentos Financeiros Derivados Enquadramento Contabilstico e Fiscal, 17 e segs., UCP Editora, Lisboa, 2000; noutros quadrantes, para maiores desenvolvimentos vide ALSHEIMER, Constantin, Die Rechtsnatur derivativer Finanzinstrumente und ihre Darstellung im Jahresabschlu, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2000; em especial para a situao norte-americana, vide MAULSHAGEN, Almut/ MAULSHAGEN, Olaf, Die Neuregelung der Bilanzierung derivativer Finanzinstrumente nach US-GAAP, in: 53 Betriebs-Berater (1998), 2141-2145. 72- Sobre as incidncias jusinsolvenciais dos derivados, vide, entre ns, FERNANDES, L. Carvalho/ LABAREDA, Joo, Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas Anotado, 403, Quid Juris, Lisboa, 2008. Para maiores desenvolvimentos, cf. BOSCH, Ulrich, Differenz- und Finanztermingeschfte nach der Insolvenzordnung, in: Karlhans, Fuchs (Hrsg.), Klner Schrift zur Insolvenzordnung: das neue Insolvenzrecht in der Praxis, 2. Aufl., 1009-1042, ZAP Verlag, Berlin, 2000; EDWARDS, Franklin/ MORRINSON, Edward, Derivatives and the Bankruptcy Code: Why the Special Treatment?, Columbia Law School, Research Paper n 258, New York, 2002; RANDHANIE, Karen, Derivatives Contracts of Insolvent Companies, in: 18 New York Law Journal of International & Comparative Law (1999), 269-302.

106 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

IRC)73 , no direito internacional privado mormente, atenta a frequente dimenso transnacional das operaes sobre instrumentos financeiros derivados (arts. 3. e segs. da Conveno de Roma sobre a Lei Aplicvel s Obrigaes Contratuais)74 , alm de outros ramos.75 1. Criao I. Em primeiro lugar no plano da respectiva criao , os derivados so o resultado de um contrato: ao contrrio dos demais instrumentos financeiros (valores mobilirios e instrumentos monetrios), que so instrumentos financeiros consubstanciados em documentos fsicos ou electrnicos e objecto de uma emisso em sentido tcnico, os derivados so instrumentos financeiros que emergem de acordos negociais.76 II. Os derivados de mercado organizado correspondem a contratos totalmente estandardizados. Usualmente, apresentam-se sob a forma de um documento dotado de uma ficha tcnica, que define a natureza do produto, o activo subjacente, o valor nominal de contrato, os limites mnimos e mximos de variao de preo, as modalidades de liquidao, o primeiro e ltimo dia de negociao, e demais condies negociais padronizadas previamente definidas pela entidade gestora (arts. 17. e 18. do Regulamento

CMVM n 3/2007, de 5 de Novembro). Uma vez colocados negociao, os investidores interessados procedem a ofertas de compra e venda que daro origem a operaes de abertura de posies de compra ou de posies de venda, as quais so objecto de liquidaes dirias (ajuste dirio de ganhos e perdas) e de liquidao final no termo do prazo contratual. III. Este trao permite distinguir os derivados dos demais instrumentos financeiros. Com efeito, os valores mobilirios e os instrumentos monetrios so instrumentos financeiros objecto de representao autnoma (em forma documental ou escritural), sujeitos em regra a um registo de emisso prprio, e colocados no mercado em nmero tendencialmente limitado (excepto no caso das unidades de participao em fundos de investimento abertos) por uma entidade emitente que se responsabiliza pelo respectivo cumprimento (arts. 43. e segs. do CVM)77. Ao invs, os derivados so meros produtos contratuais construdos por profissionais especializados (mormente, entidades gestoras do mercado e intermedirios financeiros) e contendo um conjunto de condies contratuais estandardizadas aptas a fundar vinculaes jurdicas por parte dos investidores interessados com um mnimo de custos de transaco (art. 207. do CVM, art. 4., n 1, e) do Decreto-Lei

73- Sobre as incidncias juscontabilsticas dos derivados, vide entre ns CORREIA, M. Anacoreta, Instrumentos Financeiros Derivados Enquadramento Contabilstico e Fiscal, 143 e segs., UCP Editora, Lisboa, 2000; noutros quadrantes, MAY, Gregory, Taxing Derivative Contracts, in: 12 The Journal of Taxation of Investments (1995), 115-129; KRAUSE, Haiko, Die Besteuerung hybrider Finanzinstrumente, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006; SIX, Martin, Hybride Finanzierung im internationalen Steuerrecht, Lide, Wien, 2008. 74- PINHEIRO, L. Lima, Direito Aplicvel s Operaes Bancrias Internacionais, 607 e segs., in: 67 Revista da Ordem dos Advogados (2007), 573-627. 75- Pense-se assim no direito dos seguros: cf. BURGHARD, Peter, Einsatz und Risiken derivativer Finanzinstrumente in Versicherungsunternehmen, Verlag Versicherungswirtschaft, Karlsruhe, 1995. 76- Num sentido semelhante, entre ns, FERREIRA, A. Jos, Operaes de Futuros e Opes, 176 e segs., in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, 121-188, Lex, Lisboa, 1997. Noutros quadrantes, a mesma ideia surge sublinhada amide: Ao contrrio dos valores mobilirios, que existem graas respectiva emisso por parte de uma pessoa colectiva, os derivados apenas existem graas a uma negociao (PELTIER, Frdric, Marchs Financiers et Droit Commun, 156, Banque diteur, Paris, 1997). 77- Sobre a emisso de valores mobilirios, vide CMARA, Paulo, Emisso e Susbcrio de Valores Mobilirios, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, 201-241, Lex, Lisboa, 1997; PIRES, F. Almeida, Emisso de Valores Mobilirios, Lex, Lisboa, 1999.

107 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS: 107

n 357-C/2007, de 31 de Outubro, art. 17. do Regulamento CMVM n 3/2007, de 5 de Novembro)78: estamos agora perante instrumentos destitudos de qualquer suporte representativo (seja consubstanciado em ttulos ou em registos em conta) e em nmero tendencialmente ilimitado (podendo ser abertas tantas posies contratuais quantos os investidores interessados), que no responsabilizam seno as entidades gestoras do mercado, os intermedirios financeiros e investidores envolvidos.79 2. Negociao I. Em segundo lugar no plano da respectiva negociao , os derivados podem ser transaccionados em mercado organizado (exchange-listed derivatives, brslich Derivate) ou em mercado de balco (over-the-counter, ausserbrslichen Markt, march gr gr).80 II. Os derivados de mercado organizado correspondem a contratos padronizados (assentes em condies contratuais gerais elaboradas pela

entidade gestora do mercado e aprovadas pelas autoridades de superviso), de estrutura plurilateral complexa (que contam necessariamente com a interveno da entidade gestora do mercado como contraparte central, alm dos intermedirios financeiros e clientes ou investidores), e negociados de forma massificada (dispondo de oferta permanente no mercado, alm de sistema informtico de negociao e cmara de compensao prprios): tal o caso tpico dos futuros e das opes padronizadas81. Entre os mercados organizados, so exemplos histricos conhecidos a Chicago Mercantile Exchange (CME) constituda em 1972, a Chicago Board of Options Exchange (CBOE) em 1973, a International Financial Future Exchange (LIFFE) em 1982, o March Terme dInstruments Financiers (MATIF) em 1990 ou a Swiss Options and Futures Exchange (SOFFEX) em 199882, destacando-se actualmente na Europa os mercados de derivados da Euronext (Euronext.Liffe), que dispem de uma plataforma de negociao (Liffe Connect) e uma cmara de compensao (LCH. Clearnet) prprias.83

78- Sobre a estandardizao como caracterstica dos derivados, vide tambm RUDOLPH, Bernd, Derivative Finanzinstrumente: Entwicklung, Risokomanagement und bankaufsichtrechtliche Regelung, 6 e seg., in: AAVV, Derivative Finanzinstrumente, 3-41, Schffer-Poeschel, Stuttgart, 1995. 79- Visto ainda de outro modo: ao passo que os valores mobilirios e os instrumentos monetrios so criados em execuo de um determinado contrato autnomo prvio celebrado entre a entidade emitente e os investidores (v.g., contrato de sociedade, contrato de emprstimo, contrato de subscrio, etc.), os derivados (sobretudo de mercado organizado) so puros padres ou modelos contratuais estandardizados, usualmente elaborados pela entidade gestora de mercado, que so pr-existentes ao prprio acordo de vontade dos investidores. 80- Sobre o ponto, vide BAIR, Sheila, Regulatory Issues Presented by the Growth of OTC Derivatives, in: AAVV, The Handbook of Derivatives & Synthetics, 699-713, Probus Publishing, Chicago/ Cambridge, 1994; CLOUTH, Peter, Rechtsfragen der ausserbrslichen Finanz-Derivate, Beck, Mnchen, 2001; MEDJAOUI, Khadija, Les Marchs Terme Derivs et Organiss dInstruments Financiers tude Juridique, LGDJ, Paris, 1996; RUIZ, E. Daz/ ABADIN, E. Abril/ LARRAGA, Pablo, Productos Financieros Derivados y Mercados Organizados, Civitas, Madrid, 1997. 81- Tais derivados encontram-se subordinados s regras gerais aplicveis negociao nos mercados regulamentados e nos sistemas de negociao multilateral (arts. 202. e segs. do CVM), devendo ainda ter-se presente as regras especiais previstas nos arts. 17. e segs. do Regulamento CMVM n 3/2007, de 5 de Novembro, e no art. 37. do Regulamento CE/1287/2006, de 10 de Agosto. 82- Em Portugal, a Bolsa de Derivados do Porto, constituda em 1996, foi a primeira bolsa oficial de futuros e opes, tendo chegado a movimentar cerca de cinco milhes de contratos no ano da sua inaugurao, vindo mais tarde a ser alvo da fuso no quadro da Bolsa de Valores de Lisboa e do Porto (1999), a qual, ela prpria, aderiria posteriormente ao mercado de bolsa pan-europeu Euronext (2002). 83- NYSE/ EURONEXT, Regulamento I Regras de Mercado Harmonizadas, de 29 de Fevereiro de 2008. Retenha-se ainda que as entidades gestoras que tenham outros instrumentos financeiros (que no apenas valores mobilirios) admitidos negociao devem ter por capital mnimo obrigatrio 2 500 000 euros (Portaria n 1619/2007, de 26 de Dezembro).

108 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

III. Por seu turno, os derivados de mercado de balco consistem em contratos individualizados (adaptados s necessidades especficas do investidor concreto, o que no exclui a normalizao mnima das suas condies)84, de estrutura tipicamente bilateral (de que so apenas partes os investidores, o que no exclui a interveno de intermedirios financeiros especializados)85, e negociados caso a caso (o que no exclui a existncia de modelos de compensao uniformes, v.g., netting by novation, close-out netting)86 tal o caso, designadamente, dos forwards, caps, floors, collars, e tantos outros derivados87. O mercado de balco ou over-the-counter (OTC), genericamente relativo ao segmento das operaes dos intermedirios financeiros realizadas fora das formas

organizadas de negociao, vai hoje adquirindo um relevo crescente, sendo as suas foras simultaneamente as suas fraquezas: acrescida flexibilidade negocial e moldabilidade substantiva contrapem-se a sua mais reduzida fungibilidade e liquidez, alm do risco de incumprimento das contrapartes.88 IV. Assinale-se, enfim, que a distino referida substancialmente indiferente do ponto de vista da qualificao geral deste instrumento financeiro89, alm de no excluir a existncia de derivados mistos ou de charneira, situados a meio caminho entre os mercados organizado e de balco: assim sucede, por exemplo, com as chamadas flexible exchange options, opes transaccionadas em mercados regulamentados de contedo parcialmente negocivel.90

84- Os derivados de balco no excluem o recurso a clusulas contratuais gerais, sendo at frequente a sua negociao assentar em modelos contratuais formulados por organizaes internacionais, como a ISDA International Swaps and Derivatives Association (cf. FRANZEN, Dietmar, Design of Master Agreements for OTC Derivatives, Springer, Berlin, 2000). Sobre os derivados de balco em geral, vide KLINGNER-SCHMIDT, Ulrike, Ausserbrsliche Finanztermingeschfte (OTC-Derivative), in: AAVV, Handbuch zum deutschen und europischen Bankrecht, 1213-1233, Springer, Berlin, 2004; McLAUGHLIN, Robert, Over-The-Counter Derivatives, McGraw-Hill, New York, 1998. 85- Tais contratos so geralmente precedidos da celebrao de um contrato estandardizado (Master Agreement), que vai funcionar como uma espcie de contrato-quadro no seio do qual as partes iro concluir futuramente sucessivas e peridicas transaces contratuais, geralmente por telefone ou por via electrnica, sendo posteriormente reduzidas a escrito mediante a confirmation (BEIKE, Rolf/ BARCKOW, Andreas, Risk-Management mit Finanzderivaten, 8, 3. Aufl., Oldenburg, Mnchen, 2002; EDWARDS, Steven, Legal Principles of Derivatives, 2, in: Journal of Business Law 2002, 1-32). 86- Entre ns, vide MACHADO, S. Santos, Close-Out Netting e Set-Off Da Validade e Eficcia das Clusulas de Close-Out Netting e Set-Off nos Contratos sobre Instrumentos Financeiros, in: 17 Cadernos do Mercado de Valores Mobilirios (2003), 9-17; noutros quadrantes, BENZLER, Marc, Nettingvereinbarungen im ausserbrsliche Derivatehandel, 59 e segs., Nomos, Baden-Baden, 1999; BOSCH, Ulrich/ HODGSON, Stephen, German Legislation on Netting of Financial Derivatives, in: Butterworths Journal of International Banking and Financial Law (1995), 304-323; DE BIASI, Pierluigi, Il Netting nei Contrati Derivati, in: XIII Diritto della Banca e del Mercato Finanziario (1999), 232-256. 87- Os produtos negociados no mercado OTC so hoje insistematizveis, renovando-se diariamente. Para alm dos contratos adiante estudados (v.g., forwards, caps, floors, collars, derivados de crdito, etc.), existe um sem nmero de operaes e produtos cuja incluso no universo dos derivados controversa: o caso, por exemplo, dos chamados turbo, discount, index, e basket certificates (FISCHER, Ernst/ GREISTORFER, Peter/ REICHMANN, Sommersguter, Turbo-Zertifikate: Darstellung, Bewertung und Analyse, in: 50 sterreichisches Bankarchiv (2002), 995-1005). 88- CLOUTH, Peter, Rechtsfragen der ausserbrslichen Finanz-Derivate, 9, Beck, Mnchen, 2001. 89- Sublinhando tambm que o actual conceito de derivado abrange indistintamente os derivados de mercado organizado e de balco, vide ASSMANN, Heinz-Dieter/ SCHNEIDER, Uwe (Hrsg.), Wertpapierhandelsgesetz Kommentar, 118, 4. Aufl., O. Schmidt, Kln, 2006; HIRTE, Heribert/ MLLERS, Thomas (Hrsg.), Klner Kommentar zum WpHG, 92, Carl Heymanns, Kln, 2007. 90- BARCLAY, William, Flex Options: A New Generation of Derivatives, in: AAVV, The Handbook of Derivatives & Synthetics, 43-53, Probus Publishing, Chicago/ Cambridge, 1994.

109 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

OS DERIVADOS: 109

3. Circulao I. Depois tambm no plano da sua circulao , os derivados de mercado organizado so objecto de compensao, e no de transmisso em sentido tcnico.91 Com efeito, os valores mobilirios (e uma boa parte dos instrumentos monetrios) so instrumentos financeiros que conferem aos seus titulares posies jurdicas (obrigacionais, reais, societrias, complexas) susceptveis de negociao e transmisso autnomas para terceiros: so tipicamente instrumentos circulantes, concebidos para ser transaccionados em mercado secundrio, o que tambm explica a necessidade de adopo de uma forma de representao cartular ou escritural. Ao invs, os derivados de mercado organizado so instrumentos que investem os seus titulares em posies juscontratuais que no so tale quale passveis de transmisso para terceiros: os titulares actuais podem desfazer-se das suas posies mediante a realizao de operaes de sinal contrrio s posies detidas (extinguindo-se as posies atravs de compensao: cf. art. 259., n 3 do CVM), sendo que aos terceiros interessados sempre ser possvel abrir novas posies

contratuais no mercado (tornando assim desnecessria a transmisso das posies j existentes).92 II. Os prprios derivados de mercado de balco, encontrando-se em teoria sujeitos s regras gerais em matria da cesso da posio contratual (arts. 424. e segs. do Cdigo Civil) e da transmisso singular de crditos e dvidas (arts. 577. e segs., 595. e seg. do Cdigo Civil), esto usualmente sujeitos a regras transmissivas prprias, decorrentes da sua j assinalada estandardizao. Assim, nos termos do art. 7. do contrato-quadro da ISDA International Swaps and Derivative Association, nenhum direito ou obrigao contratual poder ser transferido por qualquer das partes sem acordo prvio e escrito da contraparte, excepto em caso de transmisso universal do patrimnio ou de insolvncia da contraparte.93 4. Extino I. Por fim no plano da sua extino , os derivados podem ser fundamentalmente objecto de uma liquidao fsica ou financeira. Tal significa dizer que a execuo das prestaes contratuais na data do seu vencimento pode ser

91- Em sentido semelhante, vide ASCENSO, J. Oliveira, Derivados, 64, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. IV, 41-68, Coimbra Editora, 2000; noutros quadrantes, COTRET, Laurent, La Ngociabilit des Instruments Financiers, 185 e segs., Diss., Reims, 2004; GIRINO, Emilio, I Contratti Derivati, 280, Giuffr, Milano, 2001; SERNETZ, Julia, Derivate und Corporate Governance, 58, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006. 92- Por outras palavras: ao passo que a entrada e sada dos investidores no mercado (secundrio) de valores mobilirios se efectua, em regra, mediante sucessivos negcios jurdicos bilaterais de transmisso realizados sobre os instrumentos existentes, a entrada e sada no mercado de derivados realiza-se, tambm em regra, mediante sucessivos negcios unilaterais de criao de novos instrumentos (em sentido semelhante, vide MEDJAOUI, Khadija, Les Marchs Terme Derivs et Organiss dInstruments Financiers tude Juridique, 334 e segs., LGDJ, Paris, 1996; MELZER, Philipp, Zum Begriff des Finanztermingeschfts, 366, in: 3 Zeitschrift fr Bank- und Kapitalmarktrecht (2003), 366-372). Excepcionalmente, as posies juscontratuais inerentes a estes instrumentos podem ser objecto de transmisso, maxime, no caso de sucesso mortis causa (arts. 2024. e 2025. do Cdigo Civil). 93- Subject to Section 6(b)(ii), neither this Agreement nor any interest or obligation in or under this Agreement may be transferred (whether by way of security or otherwise) by either party without the prior written consent of the other party, except that: (a) a party may make such a transfer of this Agreement pursuant to a consolidation or amalgamation with, or merger with or into, or transfer of all or substantially all its assets to, another entity (but without prejudice to any other right or remedy under this Agreement); and (b) a party may make such a transfer of all or any part of its interest in any amount payable to it from a Defaulting Party under Section 6(e). Any purported transfer that is not in compliance with this Section will be void. Sobre a transmisso dos derivados OTC, vide NEJMAN, Gilles, Les Contrats de Produits Drivs: Aspects Juridiques, 105 e segs., Larcier, Bruxelles, 1999.

110 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIRIOS

realizada segundo duas modalidades: uma modalidade fsica (physical settlement), consistente na entrega do activo subjacente contra o pagamento do preo respectivo, ou uma modalidade puramente financeira (cash settlement), consistente no mero desembolso do saldo ou diferencial pecunirio entre o preo do activo fixado na celebrao do contrato (strike price ou preo de exerccio) e apurado no vencimento do mesmo (spot price ou preo de referncia).94 II. Ao passo que este trao conjuntural no domnio dos valores mobilirios e instrumentos monetrios (por exemplo, no caso dos warrants autnomos95), ele assume foros estruturais no plano do regime jurdico dos instrumentos derivados havendo mesmo quem o repute, porventura de forma excessiva, como a sua caracterstica essencial.96 Sublinhe-se, todavia, que estas modalidades alternativas no so, nem absolutas, nem equivalentes. Elas no so absolutas no sentido em que no se verificam necessariamente em

relao totalidade dos derivados: como bvio, os instrumentos financeiros derivados construdos sobre activos tericos, nocionais ou virtuais no admitem liquidao fsica (v.g., futuros sobre ndices de aces, opes sobre taxas de inflao, swaps sobre taxas de juro), podendo mesmo existir outros instrumentos construdos sobre activos fsicos ou reais que no admitam liquidao financeira (v.g., determinados derivados sobre electricidade negociados no mercado Powernext, que so liquidveis exclusivamente mediante o fornecimento fsico de energia elctrica). Mas tambm no so equivalentes na prtica negocial: se bem que ocasionalmente os investidores utilizem o mercado de derivados como meio de aceder propriedade de um determinado activo maxime, para satisfazer uma necessidade prpria ou de um cliente (v.g., futuros sobre mercadorias) , a liquidao , na maioria dos casos, de natureza puramente financeira, preenchendo plenamente as suas funes de mecanismo de gesto de risco, especulao e arbitragem mediante o desembolso de meros fluxos ou saldos pecunirios diferenciais.97

94- Outra particularidade dos derivados de mercado organizado a sua liquidao diria, atravs do mecanismo dos ajustes dirios de ganhos e perdas (arts. 207., n 2, 259., n 1, c) do CVM, art. 14. do Regulamento CMVM n 5/2007, de 5 de Novembro): trata-se de um mecanismo de salvaguarda do sistema que visa assegurar o pagamento dirio do saldo dos ganhos e prejuzos dos investidores verificados por referncia cotao diria do derivado (margins calls), no constituindo assim seno a repetio, dia a dia, da operao de liquidao a realizar no termo do contrato (sobre este sistema, conhecido comummente por MTM ou mark-to-market, vide BOWEN, John, Mark to Market, Probus Publishing, Chicago, 1994). Desta perspectiva, pode assim dizer-se que os derivados ao invs dos valores mobilirios e instrumentos monetrios so ainda objecto de duas modalidades obrigatrias de liquidao: a liquidao final realizada no vencimento, com efeito extintivo do contrato e que pode ser, em princpio, executada em espcie ou dinheiro e a liquidao diria realizada antes do vencimento, desprovida de efeitos extintivos e executada necessariamente atravs de transferncias escriturais. 95- Como sabido, os warrants autnomos admitem liquidao fsica ou financeira (art. 2., n 1, b) e n 2 do Decreto-Lei n 172/99, de 20 de Maio): cf. SILVA, H. Marques, O Warrant no mbito do Mercado de Valores Mobilirios, 358, in: AAVV, Direito dos Valores Mobilirios, vol. II, 351-400, Coimbra Editora, 2000. 96- BONNEAU, Thierry/ DRUMMOND, France, Droit des Marchs Financiers, 171, Economica, Paris, 2005. No mesmo sentido, sublinhando o relevo do mecanismo compensatrio acima referido, Julia SERNETZ: Die Glattstellen eines Terminkontrakt bedeutet, dass der Terminkontrakt nicht durch physische Leistung erfllt wird, sondern durch den Abschluss von Gegengeschften, d.h. entweder durch den Verkauf eines erworbenen Kontrakts oder durch den Rckkauf eines verkauften Kontrakts (Derivate und Corporate Governance, 58, Peter Lang, Frankfurt am Main, 2006). discutida, todavia, a natureza jurdica desse mecanismo, havendo quem fale de confuso (DANNHOFF, Martin, Das Recht der Warentermingeschfte Eine Untersuchung zum deutschen, internationalen und U.S.-amerikanischen Recht, 42, Nomos, Baden-Baden, 1993) e de compensao (HENSSLER, Martin, Risiko als Vertragsgegenstand, 545, Mohr, Tbingen