busca da independência: uma história de vida pela conquista da terra

2
Seu Bendito Rodrigo de Carvalho, de 75 anos de idade, se orgulha de chamar de seu a pequena área de 8 hectares que comprou na comunidade Recanto, que fica a 10 km de Piracuruca. O agricultor que passou a vida trabalhando em lavouras para sobreviver e sustentar sua família, após décadas de trabalho, conseguiu comprar sua própria terra e hoje produz somente por prazer e para o consumo da família. Ele é casado com Maria do Carmo Ferreira, 73 anos de idade, com quem teve quatro filhos. Seu Bendito tem uma história bonita de superação e, mesmo com as adversidades que marcaram sua família, hoje ele se diz feliz com o que construiu. O agricultor conta que sempre viveu da terra, plantando e colhendo. Durante 30 anos ele trabalhou como lavrador na comunidade São João do Adelino, no município de Piracuruca. Durante esse tempo, ele conheceu e casou com Dona Maria do Carmo, que era da cidade de São José do Divino. A família morava nas terras do patrão, um homem bom que os tratava muito bem, mas o agricultor alimentava consigo a vontade de ter um pedaço de chão onde pudesse produzir e chamar de seu. A casa própria foi conquistada com a ajuda do filho Pedro Rodrigues de Carvalho, hoje falecido. Na época, o jovem morava em Manaus e preocupado com o bem estar da família ajudou os pais a construírem uma casa na sede do município de Piracuruca, “Pedro mandava dinheiro, a gente foi se ajeitando e construindo a casa na cidade, porque morando lá era mais fácil de tudo, de escola, de médico, era uma facilidade”, explica o agricultor. A família do agricultor se mudou para Piracuruca, mas ele continuou os trabalhos nas terras do patrão. Quando chegou a época de se aposentar, Seu Bendito teve algumas dificuldades porque não tinha como provar que era lavrador e nem os anos de serviços prestados, já que não trabalhava com carteira assinada. Visando ajudar, o patrão ofereceu a ele um pedaço de terra com 30 hectares para que trabalhasse, produzisse e conseguisse comprovar seu oficio. Seu Piauí Ano 5 | nº 105 |Agosto| 2011 Piracuruca - Piauí Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Busca da Independência Uma história de vida pela conquista da terra 1 Seu Bendito em sua área produtiva na comunidade Recanto em Piracuruca. O agricultor usa palhas para cobrir o canteiro e evitar a evaporação rápida da água.

Upload: articulacaosemiarido

Post on 23-Jul-2016

220 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Seu Bendito Rodrigo de Carvalho, de 75 anos de idade, se orgulha de chamar de seu a pequena área de 8 hectares que comprou na comunidade Recanto, que fica a 10 km de Piracuruca. O agricultor que passou a vida trabalhando em lavouras para sobreviver e sustentar sua família, após décadas de trabalho, conseguiu comprar sua própria terra e hoje produz somente por prazer e para o consumo da família. Ele é casado com Maria do Carmo Ferreira, 73 anos de idade, com quem teve quatro filhos. Seu Bendito tem uma história bonita de superação e, mesmo com as adversidades que marcaram sua família, hoje ele se diz feliz com o que construiu.

O agricultor conta que sempre viveu da terra, plantando e colhendo. Durante 30 anos ele trabalhou como lavrador na comunidade São João do Adelino, no município de Piracuruca. Durante esse tempo, ele conheceu e casou com Dona Maria do Carmo, que era da cidade de São José do Divino. A família morava nas terras do patrão, um homem bom que os tratava muito bem, mas o agricultor alimentava consigo a vontade de ter um pedaço de chão onde pudesse produzir e chamar de seu.

A casa própria foi conquistada com a ajuda do filho Pedro Rodrigues de Carvalho, hoje falecido. Na época, o jovem morava em Manaus e preocupado com o bem estar da família ajudou os pais a construírem uma casa na sede do município de Piracuruca, “Pedro mandava dinheiro, a gente foi se ajeitando e construindo a casa na cidade, porque morando lá era mais fácil de tudo, de escola, de médico, era uma facilidade”, explica o agricultor.

A família do agricultor se mudou para Piracuruca, mas ele continuou os trabalhos nas terras do patrão. Quando chegou a época de se aposentar, Seu Bendito teve algumas dificuldades porque não tinha como provar que era lavrador e nem os anos de serviços prestados, já que não trabalhava com carteira assinada. Visando ajudar, o patrão ofereceu a ele um pedaço de terra com 30 hectares para que trabalhasse, produzisse e conseguisse comprovar seu oficio. Seu

Piauí

Ano 5 | nº 105 |Agosto| 2011Piracuruca - Piauí

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Busca da IndependênciaUma história de vida pela conquista da terra

1

Seu Bendito em sua área produtiva na comunidade Recanto em Piracuruca.

O agricultor usa palhas para cobrir o canteiro e evitar a evaporação rápida da água.

Bendito assim fez, construiu um barraco nas terras que ficava na comunidade Recanto e começou sua produção.

Quando f inalmente conseguiu a aposentadoria, Seu Bendito conta que o ex- patrão pediu que o mesmo continuasse nas terras. Porem, o patrão faleceu e os filhos procuraram o agricultor para dizer que respeitariam a vontade do pai, ele poderia ficar com os 30 hectares de terra que o patrão havia lhe arranjado, mas pediam que Seu Bendito comprasse mais 14, que formavam os 44 hectares de terra que o patrão tinha na região. O agricultor conta que até tinha um dinheiro guardado, mas dava para comprar somente parte, e assim ele fez, agradeceu a oferta e negociou apenas os 8 hectares das terras onde morava. Seu José Bendito afirma que não se arrepende do negócio, hoje ele pode dizer que comprou com seus esforços as suas terras.

Porem, o agricultor também precisava resolver outro problema que dificultava a vida na comunidade, a escassez de água na região. Seu Bendito contava apenas com a boa vontade de um vizinho que disponibilizava a água de um poço sempre que precisava. Com a chegada do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais, da Articulação no Semi-Arido Brasileiro ( Asa Brasil) a família do agricultor foi beneficiada com a cisterna de 16 mil litros de água, que é utilizada para beber e cozinhar. Ele conta que com a água para beber as coisas melhoraram muito, mas para ele a chegada da cisterna calçadão do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), que tem capacidade de armazenar 52 mil litros de água, que é utilizada para a produção de alimentos, foi uma das melhores coisas que aconteceu nos últimos anos “imagine que eu passei a ter a água que precisava e posso dizer que é minha, porque se vem do céu, vem de Deus e é de todos e agora eu tenho terra e a água guardada, tenho tudo”, diz.

Seu Bendito e Dona Maria são aposentados, a família vive entre a cidade de Piracuruca e a comunidade Recanto porque o agricultor conta que já não tem a saúde de antigamente. Recentemente teve que fazer uma cirurgia e ficou um tempo afastado de seu terreno, mas ele não conseguiu ficar muito tempo longe, “se a gente que é velho fica muito tempo parado, as juntas emperram aí é pior”, brinca. O agricultor fez em sua área uma horta onde produz macaxeira, abóbora, maxixe, cebola, coentro, pimentão, tomate, além de plantar milho e feijão. Tudo o que produz hoje é apenas para o consumo da família. Ele diz que aprendeu com o pai algumas técnicas que ajuda a conservar a água que coloca nas plantas, como a coberta dos canteiros para evitar o contato direto do sol e a cobertura da cova com folhas e galhos secos que retarda a evaporação da água. Outra coisa que não usa no quintal é agrotóxico. O sobrinho dele, o agricultor Domingos Soares, que é adepto da agroecologia foi quem ensinou sobre os defensivos naturais, agora antes que as pragas ataque ele preveni com o remédio que aprendeu com o sobrinho.

O agricultor conta que usa uma mistura feita a base de cinza e cal. Ele usa 4 litros de cinza com 4 litros de cal e mistura em 8 litros de água, depois peneira a substância e usa um quarteirão para cada oito litros de água e borrifa nas plantas. O agricultor explica que antes de usar em toda horta, ele fez o teste com o feijão, “eu aguei duas vezes e não deu um inseto, nem nos canteiros e nem no feijão, aí eu vi que o negocio era bom mesmo e agora não uso outro tipo de remédio, só ele...”, afirma.

Seu Bendito diz que hoje se sente realizado. Tem seu pedaço de terra e pode deixar alguma coisa para os filhos e netos. De todas as coisas que viveu, o agricultor afirma que carrega apenas uma tristeza no coração, o filho Pedro não poder compartilhar do que conquistou. Ele diz que a dor da perda de um filho não se cura, mas ele sabe que Pedro onde estiver olha por eles “o que a gente tem de maior riqueza são os filhos, porque a gente não esquece filho, mas Pedro deve está olhando pela gente, onde ele estiver”, afirma o agricultor.

2

Coberta morta com folhas secas ajuda a reter a água e serve de adubo.

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Piauí

Apoio:

www.asabrasil.org.br