brulon reforma gerencial brasileira

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RSP 265 Revista do Serviço Público Brasília 63 (3): 265-284 jul/set 2012 A reforma gerencial brasileira em questão: contribuições para um projeto em construção Vanessa Brulon; Pierre Ohayon e Gerson Rosenberg Introdução Devido à importância do papel desempenhado pela administração pública, sua forma de se organizar passou por mudanças ao longo dos anos em busca de aprimoramento. As críticas aos modelos adotados deram origem a alguns processos de reforma que se disseminaram entre muitos países. O Brasil também sofreu o reflexo desse processo. Os Estados nacionais, que hoje se encontram entre modelos burocráticos e gerenciais, variando de acordo com o país, até o início do século XX seguiam um modelo patrimonial de administração, caracterizado, principalmente, pela ausência de uma clara separação entre patrimônio público e patrimônio privado (B RESSER -P EREIRA , 2009). Schwartzman (2006) explica que o termo “patrimonialismo” é originado nos trabalhos de Weber que, segundo o autor, o usou para se referir à forma de dominação tradicional, que está baseada na crença nas tradições, e é a partir dela que se torna legítima (WEBER, 2009).

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BRULON Reforma Gerencial Brasileira

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RSP

265Revista do Serviço Público Brasília 63 (3): 265-284 jul/set 2012

Vanessa Brulon; Pierre Ohayon e Gerson Rosenberg

A reforma gerencial brasileiraem questão: contribuições para

um projeto em construção

Vanessa Brulon; Pierre Ohayon e Gerson Rosenberg

Introdução

Devido à importância do papel desempenhado pela administração pública,

sua forma de se organizar passou por mudanças ao longo dos anos em busca de

aprimoramento. As críticas aos modelos adotados deram origem a alguns

processos de reforma que se disseminaram entre muitos países. O Brasil também

sofreu o reflexo desse processo.

Os Estados nacionais, que hoje se encontram entre modelos burocráticos e

gerenciais, variando de acordo com o país, até o início do século XX seguiam

um modelo patrimonial de administração, caracterizado, principalmente, pela

ausência de uma clara separação entre patrimônio público e patrimônio privado

(BRESSER-PEREIRA, 2009). Schwartzman (2006) explica que o termo

“patrimonialismo” é originado nos trabalhos de Weber que, segundo o autor, o

usou para se referir à forma de dominação tradicional, que está baseada na

crença nas tradições, e é a partir dela que se torna legítima (WEBER, 2009).

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A reforma gerencial brasileira em questão: contribuições para um projeto em construção

Assim, para Weber (2009), toda domi-nação tradicional tende ao patrimo-nialismo. Entretanto, com críticas fortesao modelo, como o autoritarismo, acorrupção e o nepotismo, esse acabou porser substituído pelo modelo burocrático,na década de 1930, no Brasil.

Para que pudesse atender ao seu novopapel de indutor do desenvolvimentoeconômico, o Estado precisou se trans-formar, por meio da racionalização buro-crática do serviço público (COSTA, 2008a).Esta transformação envolveu a padroni-zação, normatização e implementação demecanismos de controle, como explicaCosta (2008a), em um processo conhe-cido como reforma burocrática da admi-nistração pública. A administração públicaadota, assim, uma forma racional-legal dedominação, descrita por Weber (2009)como aquela que se legitima a partir dacrença em regras e normas. Entretanto, omodelo burocrático também é alvo decríticas, na medida em que sua rigidez einflexibilidade tornam a administraçãopública ineficiente.

Diante das severas críticas direcionadasao modelo burocrático de administração,adotado pela administração pública brasi-leira até o fim do século XX, há umadisseminação das reformas gerenciais,impulsionada principalmente pelo movi-mento da New Public Management. Caracte-rizada principalmente pelo foco em resul-tados, esta nova “onda” de reformas foiposta em prática em muitos países domundo, entre os quais se inclui o Brasil.

Essa disseminação foi impulsionadaprincipalmente por um contexto de crisedo Estado, que leva à necessidade dereconstruí-lo, por meio de processos dereforma (BRESSER-PEREIRA, 2001). Outrofator importante, que levou à tentativa deadoção do modelo gerencial pelos países

emergentes, é o Consenso de Washington.Paes de Paula (2005a) ressalta a impor-tância da reunião e explica que, a partir dela,houve consenso entre os presentes, baseadona reforma posta em prática no ReinoUnido, de que os países emergentes deve-riam adotar as reformas orientadas para omercado, em busca do desenvolvimento.Esse fator facilita a aceitação da reformagerencial como um parâmetro também paraos países da América Latina.

No Brasil, apesar de a reforma geren-cial não ter sido concluída, o modelogerencial de administração assume papelimportante na administração públicahodierna. Pode-se observar no País fortetendência à adoção de reformas adminis-trativas que seguem esse modelo. Umexemplo é o programa Choque de Gestão,posto em prática no Estado de MinasGerais, durante o governo de Aécio Neves.Tal programa acabou se disseminando paraoutros estados do Brasil e é consideradoatualmente modelo de sucesso a serseguido.

Em decorrência da forte visão posi-tiva associada à reforma gerencial no País,o movimento gerencialista se dissemina etenta fundar uma nova administraçãopública. Entretanto, como afirma Paes dePaula (2005b, p. 47), “esse é ainda um pro-jeto em construção”. Como um projetoinacabado, segundo Paes de Paula (2005b),a nova administração pública está sempresendo reinventada, e, por isso, reflexões arespeito dos processos de reforma que lhedão base sempre se fazem atuais. Indo aoencontro de Paes de Paula (2005b), evisando trazer possíveis contribuições paraa construção de uma nova administraçãopública brasileira, o presente trabalho tempor objetivo identificar as possíveisvulnerabilidades presentes no processo dereforma gerencial no Brasil.

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A reforma gerencial no mundo

Apesar de apresentar algumas varia-ções nos diferentes países em que foiadotado, o modelo gerencial possui carac-terísticas que podem ser generalizadas.Secchi (2009), por exemplo, identifica comovalores da administração pública gerenciala produtividade, a descentralização, aeficiência na prestação de serviços, aaccountability, entre outros. Indo ao encon-tro de Secchi (2009), o Clad (1998) defendeque as principais características do modelogerencial são: a profissionalização da altaburocracia, a transparência da adminis-tração pública, a descentralização daexecução dos serviços públicos, desconcen-tração organizacional nas atividades exclu-sivas do Estado, e orientação para ocontrole de resultados. Característicassemelhantes estão presentes na caracteri-zação genérica dos modelos gerenciaisapresentada por Holmes e Shand (1995,apud MARTINS, 1997), que também desta-cam a orientação para resultados, adescentralização, a flexibilização, a transpa-rência, entre outras. Modesto (1997) acres-centa às características apresentadas poresses autores o estímulo à privatização, acapacitação de pessoal dirigente, a criaçãode carreiras específicas para altos gestores,a elaboração do conceito de planejamentoestratégico etc.

O modelo gerencial tem, assim, suainspiração nas transformações do setorprivado, que buscam a flexibilização dagestão, a redução dos níveis hierárquicos eo aumento da autonomia dos gerentes paraa tomada de decisão (CLAD, 1998). Mesmoque possa ser caracterizada de formagenérica, a experiência internacional possi-bilita que se observem diferentes enfoquesteóricos, medidas de reforma, estratégias,não havendo reforma que sirva de modelo

(FLEURY, 2001). Neste sentido, O Clad(1998, p. 125) também defende que, apesardas características comuns, “o modelogerencial deve, impreterivelmente, adequar-se ao contexto político-democrático no qualestá inserido o setor público”.

Ainda que não exista processo dereforma que seja sempre tomado comoreferência e adotado como modelo a serseguido, os países que deram início a esseprocesso são citados com frequência

como exemplo, e exerceram forteinfluência nas reformas que se seguiramnos demais países. Como mostra Martins(1997), as reformas gerenciais surgem emresposta à crise do Estado na década de1970, e começam a ser adotadas a partirda década de 1980 por países como ReinoUnido e Estados Unidos. Como pioneirosna adoção do modelo gerencial de

“Essadisseminação foiimpulsionadaprincipalmentepor um contextode crise doEstado, que levaà necessidade dereconstruí-lo, pormeio deprocessos dereforma (BRESSER-PEREIRA, 2001).”

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administração pública, suas reformasservem de referência.

O Reino Unido, primeiro país domundo a adotar o modelo gerencial, teveseu processo de reforma posto em práticadurante o governo de Margaret Thatcher,na década de 1980. Pollitt (1996), a partirde sua análise da reforma gerencial noReino Unido, defende que ela pode ser divi-dida em três fases: de 1979 a 1982, em queo foco estava na economia, com o cortedos gastos totais; de 1982 até o fim dadécada de 1980, em que o foco torna-se aeficiência, sendo marcado pelo aumentodas privatizações; e a partir de 1987, fasemais radical, que é marcada por uma sériede reformas em diferentes setores doserviço público.

Ao longo dessa trajetória, a reformagerencial do Reino Unido, como mos-traram Macedo e Alves (1997), adotoualgumas formas inovadoras de gestão. Aprimeira delas, citada por Macedo e Alves(1997, p. 65), são os chamados “escrutíniosde Rayner”, que os autores caracterizamcomo “pequenos grupos formados porfuncionários departamentais e assessoradospor um grupo central (unidade de efi-ciência); esse, por sua vez, ligado direta-mente ao gabinete do primeiro-ministro echefiado pelo próprio Rayner”, que reali-zam avaliações departamentais.

Uma segunda forma inovadora degestão, citada pelos autores, é o desenvol-vimento de sistemas de informaçõesgerenciais, que tem como principal exem-plo o Management Information System forMinisters (Minis). Atuando como um escru-tínio permanente, o Minis permitia arevisão detalhada das atividades do depar-tamento, bem como das necessidades derecursos humanos (MACEDO E ALVES,1997). Os Citizen’s Charter também sãooutra inovação, que podem ser entendidos

como documentos nos quais estão especi-ficados os objetivos e normas de cadaserviço público, bem como os recursosdisponíveis para sua execução e seusresponsáveis, representando uma aberturaem relação ao modelo burocrático(MACEDO E ALVES, 1997).

Além dessas inovações, Tatcherimplementou amplo processo de priva-tização, operado principalmente pela vendade ativos, como explicam Macedo e Alves(1997). Os autores ressaltam, ainda, aimportância do Next Steps, programaimplantado em 1988, com o objetivo dedar continuidade ao aumento da eficiênciano setor público. Com vistas a reduzir osgastos públicos, houve um corte no quadrode pessoal, bem como a busca por um novomodelo de determinação de pagamentos(MACEDO E ALVES, 1997).

No caso dos Estados Unidos, onde oprocesso ocorreu posteriormente, duranteo governo Reagan, este foi marcado pelomovimento “Reinventando o governo”,de Osborne e Gaebler (1994, p. 338). Nolivro que deu origem ao movimento,Osborne e Gaebler (1994) apresentam 10princípios que, segundo os autores,quando aplicados a qualquer organização,“têm o poder de liberar novas formas depensar – e de agir”, modificando o modelobásico de governo, adotado até então.Assim, os autores defendem que sejaadotado um novo paradigma, que possi-bilite uma nova forma de pensar ogoverno. Segundo Kettl (2000), o movi-mento buscou transformar o governo dosEUA, em um curto período de tempo, paraque adotasse o foco no cliente, aumen-tasse a produtividade e reduzisse oscustos. Diferentemente do Reino Unido,nos EUA houve poucas privatizações,com predomínio maior de parceriaspúblico-privadas (KETTL, 2000).

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É dentro desse contexto que surge omovimento da New Public Management(NPM), principalmente a partir dasreformas ocorridas em países como oReino Unido, EUA, Nova Zelândia eAustrália. A este respeito, Barzelay (2001)explica que o termo New Public Managementexpressa a ideia de um fluxo cumulativode decisões políticas que levaram amudanças na governança e no geren-ciamento do setor estatal desses países. ANPM, segundo o autor, refere-se aodesenvolvimento de práticas de rotinasinovadoras, voltadas para o aumento dodesempenho. Conforme Osmond e Löffler(1999), a NPM levou a uma visão maiseconômica e gerencial da administraçãopública. Page (2005) complementa essaideia, ao afirmar que a NPM apresentacomo algumas das suas característicasbásicas a busca pelo aumento da performancegovernamental, descentralização, meca-nismos de mercado e accountabillity. Emborapossam ser citadas características básicasda NPM, Ormond e Löffler (1999)destacam que o termo assume diversossignificados em contextos diferentes.

Seguindo o exemplo dos paísespioneiros, como Reino Unido e EUA, outrospaíses guiaram-se pela lógica da NPM, aoimplementar seus processos de reforma. NaAmérica Latina, esse modelo também foiadotado, com muitas tentativas frustradas,como mostra Bresser-Pereira (2002) em suaanálise sobre a NPM neste continente. Con-forme o autor, os países latino-americanosque foram mais adiante no processo dereforma gerencial foram o Brasil e o Chile.

A reforma gerencial no Brasil

Assim como em outros países domundo, no fim do século XX o Brasilpassou por um período que foi considerado

como de crise do Estado burocrático, quelevou à sensação de uma necessidade dereformá-lo e reconstruí-lo. Ainda que apre-sente características em comum com asdemais reformas ocorridas em várias partesdo mundo, a reforma gerencial posta emprática no Brasil também tem suaspeculiaridades, que a distinguem das demais.

A administração pública no Brasil evo-luiu historicamente por meio de trêsmodelos básicos: a administração públicapatrimonialista, a administração burocrá-tica e a administração gerencial. Estas trêsformas se sucederam no tempo, sem quequalquer uma delas tenha sido inteiramenteabandonada.

Analisando a evolução histórica daadministração pública brasileira, pode-severificar que o Brasil passou pelo patri-monialismo, atravessou a fase burocrática,e, após a Reforma Administrativa doAparelho do Estado de 1995, achou-sepronto legalmente para ingressar naadministração gerencial. Entretanto, antesde ingressar no processo de reformagerencial, o Brasil passou por pequenasreformas administrativas que lhe derambase. Para melhor analisá-las, pode-sedividi-las em cinco períodos distintos,como descritos no quadro 1.

No primeiro período que compreendede 1930 a 1945, com uma extensão até1963, existiram estudos não implemen-tados. Houve um esforço de inovação erenovação do aparato governamentalfundamentado no modelo burocrático,introduzido com a criação do Departa-mento Administrativo do Serviço Público(Dasp) em 1936.

O segundo período, de 1964 a 1985, éjustificado pela necessidade de maioragilidade e flexibilidade para atender àsdemandas de um Estado desenvolvi-mentista.

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Quadro 1: As principais reformas administrativas do Estado

Fonte: Elaboração própria adaptada de Marcelino (1988).1

O terceiro período, iniciado em 1986e finalizado em 1988, foi marcado pelademanda da sociedade por contenção degastos governamentais e, ao mesmo tempo,pela necessidade de se criar mecanismos einstrumentos que permitissem uma gestãopública eficaz e eficiente.

O quarto período é caracterizado pelaConstituição de 1988, que, após o regimeautoritário, esmerou-se na abundância denormas, buscando assegurar a garantia dedireitos dos cidadãos e limitar a ampli-tude de poderes do Estado, resultando namais administrativa de todas as Consti-tuições.

Seguindo a “onda” de reformas admi-nistrativas, a reforma gerencial no Brasil éimplementada durante o Governo de

Fernando Henrique Cardoso, a partir de1995. Para que a reforma fosse posta emprática, ocorreu a transformação da Secre-taria de Administração Federal (SAF) emMinistério da Administração Federal eReforma do Estado (Mare), órgão respon-sável pela reforma a ser implantada. Coma nomeação de Luiz Carlos Bresser-Pereirapara ministro do Mare, tem início em 1995a reforma gerencial no Brasil.

Bresser-Pereira (2006a) destaca que areforma gerencial no Brasil tem doisobjetivos. O objetivo de curto prazo éfacilitar o ajuste fiscal, e o de médio prazo,tornar a administração pública maiseficiente e moderna, voltada para o atendi-mento do cidadão. Tendo em vistao alcance desses objetivos, são elaborados

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“A principalestratégia dareforma gerencialno Brasil,segundo Bresser-Pereira (1998),era atacar aadministraçãopúblicaburocrática,consideradainflexível eineficiente.”

os dois principais documentos que dão asbases para a reforma: o Plano Diretor daReforma do Aparelho do Estado e aEmenda Constitucional da ReformaAdministrativa. Bresser-Pereira (1998)explica que, para sua elaboração, esses docu-mentos tomam como base as experiênciasrecentes dos países da Organização para aCooperação e Desenvolvimento Econômico(OCDE), principalmente o Reino Unido,onde a New Public Management teve início.

A principal estratégia da reformagerencial no Brasil, segundo Bresser-Pereira(1998), era atacar a administração públicaburocrática, considerada inflexível eineficiente. O autor destaca também aestratégia de fortalecer a capacidadegerencial do Estado, a partir da adoção deformas modernas de gestão. visando setornar eficiente e democrático. Além disso,outra importante estratégia da reforma eraa mudança nas instituições, consideradapelo autor como um mecanismo parafortalecê-las.

Ao caracterizar a reforma que elemesmo planejou, Bresser-Pereira (2009)afirma que essa pode ser chamada degerencial por ser inspirada na adminis-tração de empresas privadas, visandotornar a administração pública mais efi-ciente. O então ministro a caracteriza,também, como democrática, uma vez que,em sua visão, dá as bases para a existênciade um regime democrático. Ao denominá-la também de social-democrática e social-liberal, explica que a primeira pode serjustificada pela existência de um Estadogarantidor dos direitos socais, e a segunda,pelo reconhecimento do mercado comoótimo alocador de recursos.

Um dos principais aspectos do modeloproposto por Bresser-Pereira diz respeitoaos três setores do Estado moderno e àsformas de propriedade que o autor sugere

para cada setor, como pode ser observadono quadro 2.

A proposta de Bresser-Pereira (1998),explicitada no quadro abaixo, é de que asdiferentes formas de propriedade variemde acordo com o tipo de atividade desem-penhada pelo Estado. Sendo assim, nonúcleo estratégico, onde são tomadas asdecisões estratégicas do Estado, a formade propriedade deve ser a estatal. O mesmose dá no caso das atividades que são

exclusivas do Estado. Entretanto, na visãodo autor, as atividades científicas e sociais,que se caracterizam como serviços nãoexclusivos do Estado, devem ser publi-cizadas2 para as organizações sociais.Estas novas instituições são classificadascomo públicas não estatais, porque sededicam ao interesse público, mas nãofazem parte do aparelho de estado. Como

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essas atividades envolvem direitos huma-nos básicos, constituindo-se como ativida-des de direito privado, mas de propriedadepública, exigem forte financiamento doEstado. É nesse sentido que Bresser-Pereira(1998) defende o processo de publicização,desincentivando a privatização nessescasos. Mas no caso da produção para o mer-cado, a privatização é sugerida, transfe-rindo-se as atividades das empresas estataispara empresas privadas.

A partir da proposta de formas de pro-priedades diferentes para distintos setoresde atuação do Estado, a reforma gerencialno Brasil também previu novas instituiçõesorganizacionais que deveriam ser adotadas.Neste sentido, Bresser-Pereira (1998) pro-põe a criação de agências reguladoras, queservem para a regulamentação dos setoresempresariais não suficientemente compe-titivos, de agências executivas, que execu-tam as atividades exclusivas do Estado, ede organizações sociais, que atuam no

campo dos serviços sociais e científicos –atividades não exclusivas do Estado, masque envolvem direitos humanos básicos –,fazendo parte do setor público não estatal.

Seguindo estas propostas, algumasorganizações sociais foram criadas, visandotornar o Estado mais flexível e eficiente.Entre elas, pode-se citar a Casa de SaúdeSanta Marcelina do Itaim Paulista, fundadaem 1998, em uma parceria com o Governodo Estado de São Paulo, bem como a RádioRoquette Pinto, criada em 2007, na cidadedo Rio de Janeiro, durante o GovernoSérgio Cabral. Entretanto, não houve aexpansão ou criação de novas organizaçõessociais após esse período.

Bresser-Pereira (1998) previu ainda oscontratos de gestão, como instrumentospara contratar as novas instituiçõesorganizacionais. O autor explica que, noscontratos de gestão, são previstos osrecursos necessários, bem como as metasa serem alcançadas. Rezende (2002a)

Quadro 2: Modelos institucionais, formas de propriedade e de administração

Fonte: Adaptado do documento do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Plano Dire-tor da Reforma do Aparelho do Estado. (MARE, 1995, p. 59).

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complementa essa ideia, ao afirmar queessas organizações, criadas a partir dessenovo modelo de delegação e controle,surgem com o propósito de realizarfunções de implementação de políticaspúblicas, mantendo-se controladas pelasagências centrais a partir de mecanismosde controle de performance, denominadoscontratos de gestão. Para Bresser, amudança institucional era a dimensãocentral da reforma, introduzindo, por meiodas novas instituições, um modelo orien-tado por resultados para os diversos setoresburocráticos.

Para tornar ainda mais claro o processode reforma, Bresser-Pereira explica que essaenvolve três dimensões. A primeira dimen-são, a institucional, envolve a criação deinstituições legais e organizacionais, queviabilizem a gestão. A segunda, a dimen-são cultural baseia-se na mudança dosvalores burocráticos para os gerenciais,pondo fim ao patrimonialismo. A terceira,a dimensão-gestão, é considerada porBresser-Pereira (1998) como a mais difícildelas, já que se trata de colocar em práticaas novas ideias gerenciais.

Bresser-Pereira (1998) explica que,enquanto a dimensão cultural permeia todaa reforma, a dimensão institucional podeser representada pela Emenda Constitu-cional da Reforma Administrativa, e adimensão-gestão, em um aspecto maisgeral, pela estratégia de gestão da quali-dade total.

No que diz respeito à Emenda Consti-tucional da Reforma Administrativa,promulgada em maio de 1998, Bresser-Pereira (1998) destaca sua importância, aoafirmar que ela gerou um grande debatenacional sobre a reforma, que a partir daíganhou maior apoio. Conforme Bresser-Pereira (2009), o objetivo da emenda eratornar a Constituição de 1988 mais

compatível com a reforma. Nesse sentido,a emenda constitucional reformulou o capí-tulo da administração pública da Cons-tituição de 1988, e promoveu umaprofunda mudança institucional, queviabilizou a implementação da reforma(BRESSER-PEREIRA, 1998).

Alguns exemplos de alterações que sederam a partir da emenda constitucional,apresentados por Bresser-Pereira (1998), são:a previsão de mecanismos de flexibilizaçãoda estabilidade, a exigência de avaliação paraalcançar a estabilidade no fim do estágioprobatório, a proibição de aumentos emcascata e o reforço do teto e do subteto deremuneração dos servidores. O autor explicaque tais medidas foram adotadas com oobjetivo de melhorar a eficiência e a quali-dade do serviço público, bem como reduzirseus custos. Neste sentido, a ideia essencialda reforma, conforme Bresser-Pereira(2009), era tornar mais flexível o sistemaexistente de estabilidade para os servidorespúblicos, bem como eliminar o RegimeJurídico Único para a contratação de pessoaldo Estado.

Com relação à estratégia de gestão paraa qualidade total, Bresser-Pereira (1998)apresenta dois programas que a represen-tam. O primeiro deles é o Programa deQualidade e Participação na AdministraçãoPública (QPAP), criado em 1996, queassume um caráter mais geral, consti-tuindo-se como programa de mudança deuma cultura burocrática para uma culturagerencial, valorizando a participação e ainiciativa dos servidores. De acordo comos seus objetivos, o QPAP visava àmelhoria contínua do desempenhoinstitucional e tinha como meta o aumentoda satisfação dos usuários com a adminis-tração pública, por meio da consolidaçãoda metodologia de avaliação da gestãopública junto às organizações públicas.

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Embora os objetivos da reforma e doprograma QPAP se complementem, elespossuem características diferentes quanto àsua aplicação, conforme observado no qua-dro 3. Esse programa, ao longo do tempo,tem sofrido algumas modificações. As prin-cipais são as seguintes: (i) em 2000, o seunome mudou para Programa de Qualidadeno Serviço Público (PQSP), já que a refor-ma administrativa tinha, por sua vez, sidoextinta, e lhe foi conferida, a partir de então,uma identidade própria; (ii) em 2005, porintermédio do Decreto no 5.378, de 23 defevereiro, foi criado o Programa Nacionalde Gestão Pública e Desburocratização(GesPública), que resultou da fusão do Pro-grama de Qualidade no Serviço Público edo Programa Nacional de Desburo-cratização (PrND); (iii) , em 2009, o Presi-dente da República, por meio do Decretosem número, de 17 de março, instituiu oAno Nacional da Gestão Pública. Estesmarcos, antes de representarem rupturas,constituem avanços importantes a partir daconcepção inicial do referido programa.

O segundo programa da estratégia degestão para a qualidade total, o Programa deReestruturação e Qualidade dos Ministérios,é voltado para o auxílio dos ministérios, afim de que esses promovam a adequação desua estrutura organizacional de acordo comas diretrizes do Plano Diretor.

Outro importante documento dareforma gerencial brasileira, que se seguiuà emenda constitucional, é o Plano Diretorda Reforma do Aparelho do Estado. Oplano apresenta como proposta básica,conforme Bresser-Pereira (2006b), a trans-formação da administração pública buro-crática em gerencial. No documento,inicialmente, é apresentado um diagnósticodo que é chamado de crise da adminis-tração pública brasileira, que justifica anecessidade de uma reforma gerencial.

Esse diagnóstico se dá a partir da análiseda experiência brasileira de reformaadministrativa, que Costa (2008b) descrevecomo tendo foco nas duas grandesreformas do século passado: a patrimonia-lista e a burocrática. A partir disso, sãoestabelecidas as diretrizes da reformagerencial e são definidas as instituições daadministração pública gerencial. Pontosimportantes são previstos no plano, comoa privatização de empresas estatais,terceirização de atividades de apoio,criação das organizações sociais e demaisinstituições necessárias à reforma, e o forta-lecimento do núcleo estratégico. Alémdisso, é no Plano Diretor da Reforma doAparelho do Estado que são definidas asestratégias e as formas de propriedade decada segmento de atuação do Estado, bemcomo os objetivos globais e específicospara cada um desses setores de atuação.As três dimensões da reforma, explicitadasanteriormente, também são apresentadasno documento, dando, assim, uma claravisão do que viria a ser a reforma gerencialno Brasil.

Costa (2008a) apresenta os pilares doprojeto de reforma, presentes no PlanoDiretor, que o autor classifica como: ajustefiscal duradouro; reformas econômicasorientadas para o mercado; reforma da pre-vidência social; inovação dos instrumentosde política social; reforma do aparelho doEstado.

Na segunda etapa da reforma gerencial,que se constituiu como a etapa deimplementação, houve a criação do Minis-tério do Planejamento, Orçamento eGestão, a partir de uma junção do Marecom o Ministério do Planejamento. Bresser-Pereira (1998) explica que a criação dessenovo ministério se dá devido a uma crençade que o Mare, sozinho, não teria forçaspara a implantação da reforma.

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Quadro 3: Características dos programas da reforma do Estado e do QPAP

Fonte: Elaboração própria, adaptada de Rosenberg (2002)

Assim, o Ministério do Planejamento,Orçamento e Gestão surge com a missãode por em prática a reforma gerencial, cujasdiretrizes foram estabelecidas no Plano Di-retor da Reforma do Aparelho do Estado.Entretanto, na visão de Bresser-Pereira(1998), esse novo ministério não deu adevida atenção à reforma, e, por isso, nãofinalizou a sua implementação da forma pre-vista. Indo ao encontro de Bresser-Pereira,Rezende (2002a) defende que, com aextinção do Mare, o novo ministério quesurge altera substancialmente a política dereformas. O autor explica que poucas enti-dades previstas na nova matriz institucionalforam criadas, mas obteve sucesso nareversão da tendência expansionista dosgastos públicos. Assim, na visão de Rezende(2002a), a reforma teve reduzido resultadoem sua dimensão central, que era a mudan-ça institucional, apesar de ter obtido apoioestratégico para o ajuste fiscal. O Mare nãoconseguiu o mesmo apoio para as políticasde mudança institucional.

No quadro 2, citado anteriormente, den-tro do tipo de organização encontram-se

aquelas com atividades exclusivas deEstado, cuja função é a de regulamentação.Surge, então, a necessidade de criação dasagências reguladoras no Brasil, onde essas,com autoridades independentes de regu-lação, passam a ser um dos fatos maisinovadores da moderna administraçãopública brasileira. A criação das agênciasocorreu paralelamente ao processo deprivatização, surgindo com isso a supo-sição, inicialmente por parte dos opositoresda reforma, de que a existência desse tipode agência pudesse facilitar ou incentivar atransferência de serviços do setor públicopara o setor privado, o que na realidadenão aconteceu. No quadro 4 estão listadasas agências criadas e pode-se verificar quea maioria surgiu logo após a reforma admi-nistrativa.

A reforma gerencial brasileiraem análise

Diante do exposto, pode-se observarque a reforma gerencial tem-se atrelado aum discurso muito positivo, com a

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Quadro 4: Agências reguladoras no Brasil

Fonte: Elaboração própria, adaptada do site do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

proposta de modernização da adminis-tração pública, tornando-a mais eficiente.Como envolve uma ideia de progresso, édifícil se contrapor ao modelo gerencial,sem que isso desperte a percepção de ircontra o avanço do País.

Por meio de um olhar mais cuidadoso,a reforma gerencial da administraçãopública brasileira deixa transpareceralgumas vulnerabilidades, no que dizrespeito, inclusive, aos seus propósitos prin-cipais. Embora surja com o objetivo desubstituir o modelo burocrático de admi-nistração pública, fortemente criticado porsua rigidez e ineficiência, o modelogerencial ainda apresenta características domodelo burocrático, como a profissionali-zação e a dominação burocrática, nãohavendo, assim, um verdadeiro rompi-mento com o modelo anterior. Paes dePaula (2005a) mostra que se tem hoje uma“burocracia flexível”, com característicasburocráticas que apenas são adaptadas àsnecessidades de flexibilização. Nestesentido, Paes de Paula (2005a, p. 144)mostra contradições no discurso do pró-prio idealizador da reforma, ao afirmar que“embora critique a burocracia, diversasvezes Bresser-Pereira aponta a importânciada existência de uma burocracia pública

capaz de controlar o processo decisório eassegurar a eficiência administrativa”.

Nem mesmo o patrimonialismo podeser considerado como modelo completa-mente superado na administração públicabrasileira. Na visão de Paes de Paula(2005a), o patrimonialismo não foi supe-rado a partir da reforma gerencial, pois “asimples condenação das práticas patrimo-nialistas e a adesão à visão gerencialista nãobastam para uma mudança na culturapolítica” (PAES DE PAULA, 2005a, p. 141).Indo ao encontro de Paes de Paula (2005a),Lima Junior (1998) defende que nuncahouve no Brasil modelo de administraçãopública plenamente instalado, encontrando-se, na verdade, modelos incompletos esuperpostos.

O fato de a reforma gerencial não tersido concluída no País também gera outraspreocupações. Como o Brasil apresentahistórico de vários modelos de administraçãoincompletos, que se superpõem, a presençado patrimonialismo e da rigidez burocráticana administração pública brasileira atual geraresistência à mudança. Assim, como mostrouLima Junior (1998), o processo de reformagerencial não se trata simplesmente de subs-tituir um modelo por outro, dando-se deforma muito mais complexa.

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Nesse sentido, para a consolidação dareforma gerencial, é preciso que asreformas administrativas que a antecede-ram estabeleçam as bases para tal. Emboraexista a condição legal para a implemen-tação da administração gerencial, existemfatos históricos que sugerem que o Brasilainda não apresenta condições para tanto.O primeiro se refere à desconfiguração domodelo burocrático pela transformaçãodos cargos públicos em favoritismo polí-tico. Em seguida, juntou-se à administraçãodireta de forma caótica enorme setorempresarial (empresas públicas), autárquico(autarquias) e fundacional (fundaçõespúblicas), que fugiu ao controle central,pela multiplicação dos órgãos e empresascom alto grau de autonomia de contrataçãonos anos 1980, trazendo consequen-temente os interesses privados para dentroda administração pública. Esta, por último,sofreu o impacto da desorganizada e mal-sucedida reforma realizada na era doGoverno Collor. A administração públicabrasileira não tem visão holística dos seusproblemas e evoluiu de forma descontínuado patrimonialismo para o modelo buro-crático, com resultados heterogêneos,tornando a questão complexa e nãopodendo ser vista de forma planejada.Dessa forma, é importante examinar osdiversos processos de reforma adminis-trativa no Brasil, para melhor compreensãodo momento atual da administraçãopública.

Ao caracterizar a reforma comogerencial, Bresser-Pereira (2009) explicaque essa se baseia nas práticas de empresasprivadas, para que se torne mais eficiente.Entretanto, ao seguir tal lógica, a admi-nistração pública acaba por se preocuparcom a eficiência técnica, e a democra-tização e o interesse público perdemespaço, como defende Paes de Paula

(2005a). Posto que a administraçãoprivada esteja predominantemente voltadapara resultados, a sua transposição para aadministração pública faz com que estaseja orientada por uma lógica de eficiênciaeconômica, afastando-a do seu objetivoprimeiro: a busca do bem comum.

Bresser-Pereira (2009) também carac-teriza a administração pública gerencial

como democrática, já que, na visão doautor, prevê a existência de um regimedemocrático. Entretanto, mecanismos departicipação ou controle social não sãoprevistos na reforma, e as característicascentralizadoras e autoritárias dos modelosanteriores são mantidas. Como mostrouPaes de Paula (2005a), a relação entreEstado e sociedade não é suficientementediscutida, para que possa ser consideradamodelo que segue uma democracia plena.

“Embora existaa condição legalpara a imple-mentação daadministraçãogerencial, existemfatos históricosque sugerem queo Brasil aindanão apresentacondições paratanto.”

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Embora Bresser-Pereira (2009) des-taque como uma das principais caracterís-ticas do modelo gerencial o fato de se cons-tituir como modelo democrático, Paes dePaula (2005a) argumenta que ele mantémo autoritarismo, pois o processo decisóriopermanece como monopólio do núcleoestratégico e das instâncias executivas. Navisão da autora, a nova estrutura do Estado,após a reforma, não conseguiu garantir“uma inserção da sociedade civil nasdecisões estratégicas e na formulação depolíticas públicas” (PAES DE PAULA, 2005a,p. 141). Não foi possível a infiltração dasdemandas populares, a partir da novaestrutura do Estado que se consolidou apósa reforma, como mostrou Paes de Paula.Apesar de haver um discurso participativona proposta de reforma gerencial, “naprática se enfatiza o engajamento daprópria burocracia pública ou dos quadrosdas organizações sociais no processo degestão” (PAES DE PAULA, 2005a, p. 147).Indo ao encontro de Paes de Paula, Martins(1997, p. 71) afirma que “parece haver umhiato entre o sistema político-representa-tivo e os imperativos de modernização daburocracia pública”. Assim, a concepçãode democracia da administração públicagerencial parece ser limitada. No quadro5, estão relacionadas algumas falhas daimplantação e aspectos positivos daReforma de 1995, em que se destaca abusca por melhor atendimento ao cidadão,com redução dos gastos públicos.

Uma das principais estratégias dareforma, como visto anteriormente, é amudança nas instituições. Prevista naEmenda Constitucional da Reforma Admi-nistrativa, tal mudança se dá por meio dacriação de novas instituições, como asagências reguladoras, as agências executivase as organizações sociais, descritas acima.Ainda que a mudança institucional seja

considerada uma das principais dimensõesda reforma, e que essa tenha sido muitobem definida no Plano Diretor, ela não foitotalmente implantada. Assim, há uma frag-mentação do aparelho do Estado, com aconvivência de formas organizacionaisantigas e novas (PAES DE PAULA, 2005a).Além de sua implementação não ser tãosimples quanto parece inicialmente, areforma gerencial brasileira apresentavulnerabilidades associadas às suas carac-terísticas mais básicas. A busca de umaadministração pública mais eficiente podetrazer sérias consequências para a socie-dade, como a excessiva ênfase em questõesde âmbito econômico e a negligência dequestões de âmbito social, deixando emsegundo plano aquilo que de fato é impor-tante para a sociedade e servindo deobstáculo para o alcance do bem comum.Entretanto, vale ressaltar que mudançaspositivas também ocorreram comoconsequência do processo de reforma.

Conclusões

Sempre em busca de um melhormodelo de administração pública para oPaís, foram vividas, nos últimos séculos,transformações denominadas de reformasadministrativas, que alteraram o funciona-mento do aparelho do Estado. Entretanto,a passagem do modelo patrimonial para oburocrático, e deste para o modelogerencial, não se deu de forma tão linear eclara quanto parece à primeira vista. Osmodelos de administração pública no Brasilacabaram se sobrepondo, trazendo limi-tações ao seu bom funcionamento. Dentrodesse contexto, o presente estudo buscouidentificar as vulnerabilidades presentes noprocesso de reforma gerencial no Brasil.

A partir dessas reflexões, pode-seconcluir que o modelo gerencial, adotado

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Quadro 5: Características da reforma de 1995

Fonte: Elaboração própria, adaptada de Rezende (2004b)

pela administração pública brasileira apartir de sua reforma mais recente, aindamantém características patrimonialistas e,principalmente, burocráticas dos modelosanteriores. Mas além dos problemastrazidos por essa sobreposição, o modelogerencial possui vulnerabilidades inerentesao próprio paradigma, como o foco naeficiência econômica, que o desvia de suafunção social, bem como a ausência de umademocracia plena, com a manutenção dosprocessos decisórios centralizados nonúcleo estratégico do governo.

Pode-se concluir, ainda, que a reformado Estado, proposta em 1995, em seupleito amplo, não foi concluída pordiversos motivos, desde a falta de autori-

dade para impô-la a todos os setores daadministração pública, até o embate entreo controle requerido pelas agênciasfiscalizadoras e a busca do desempenhoexigida pela própria reforma. Esta, entre-tanto, trouxe vários pontos efetivos paraa sociedade brasileira, pois despertou apreocupação dos órgãos públicos depromoverem melhor atendimento para ocidadão, usuário dos seus serviços. Asinovações trazidas pela reforma, como acriação das agências reguladoras, tambémmerecem destaque.

Ainda que haja críticas ao modelogerencial por suas vulnerabilidades citadasao longo do artigo, não existe hoje umaproposta de reforma bem definida, que

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A reforma gerencial brasileira em questão: contribuições para um projeto em construção

traga um novo modelo de administraçãopública capaz de solucionar os problemasatuais. Entretanto, as mudanças em termosde maior orientação para a sociedade sãourgentes.

Fortemente preocupado com a efi-ciência econômica, o modelo gerencial nãomantém seu foco na sociedade. A funçãosocial da administração pública torna-se,assim, secundária. É nesse sentido quemudanças urgentes em termos de amplia-ção do processo democrático são deman-dadas, com maior participação e controlesocial, bem como maior orientação para oatendimento das demandas da sociedade.A preocupação com a eficiência econômica

não deve ser dispensada, mas relegada aum papel secundário na administraçãopública brasileira, sendo tratada como meioe não como fim.

Como o objetivo da administraçãopública é a busca do bem comum, elaprecisa alterar o seu foco para que cum-pra sua função social. Os aspectos positi-vos trazidos pela reforma gerencial de-vem, assim, ser conciliados com mudançasnesse sentido, somando essas caracterís-ticas ao contínuo processo de construçãode uma nova administração pública bra-sileira.

(Artigo recebido em março de 2012. Versãofinal em julho de 2012).

Notas

1 Legenda: Dentro do contexto constitucional, é possível verificar a evolução de como sedeu a centralização das regras que regem a administração pública, como segue: a Constituiçãodo Império, de 1824, nada dispunha sobre administração pública; a primeira Constituição repu-blicana, promulgada em 1891, só tinha dois artigos; a Constituição de 1934 possuía sete artigos;a Constituição de 1946, que redemocratizou o País, tinha 11 artigos; a Constituição de 1967,com seu viés autoritário e concentrador de poder, não passou de 21 artigos; e, finalmente, aConstituição de 1988 alcançou 65 dispositivos sobre administração pública, sendo a maisnormativa, comparada com outros países (MOREIRA NETO, 1999).

2 A palavra publicização foi criada pelo governo para distinguir a propriedade pública nãoestatal da propriedade pública, bem como da propriedade privada. A publicização pressupõe aextinção de órgãos ou entidades estatais e subsequente absorção de suas atividades por organi-zações sociais. O processo de publicização busca assegurar o caráter público e o direito privadoda nova entidade, assegurando-lhe, assim, maior autonomia administrativa e financeira. As orga-nizações sociais são organizações públicas não estatais, mais especificamente fundações de direitoprivado que celebram contrato de gestão com o Poder Executivo, com aprovação do PoderLegislativo, ganhando o direito de fazer parte do orçamento público federal, estadual ou muni-cipal. (PETRUCCI E SCHWARTZ, 1999, p. 46-48).

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Vanessa Brulon; Pierre Ohayon e Gerson Rosenberg

Resumo – Resumen – Abstract

A reforma gerencial brasileira em questão: contribuições para um projeto em construçãoVanessa Brulon; Pierre Ohayon e Gerson Rosenberg

Mudanças no cenário internacional, avanços dos meios de informação e inovação tecnológicacolocam as instituições públicas frente a grandes desafios. Neste sentido, foi instaurado pormeio legal o processo da Reforma do Estado e da Administração Pública no Brasil, em 1995. Omodelo propôs a transferência de práticas das empresas privadas para o setor público, em buscade uma administração gerencial. O presente artigo resulta de uma reflexão acerca do processode implementação da reforma do Estado e das suas consequências na administração públicabrasileira. Assim, tem por objetivo identificar as possíveis vulnerabilidades presentes no proces-so de reforma gerencial brasileiro. Este trabalho finaliza apontando algumas causas que levaramao descrédito da reforma por parte das instituições pública brasileiras, como a dificuldade dasorganizações públicas de se ajustarem à nova estrutura organizacional designada pelo Estado, aresistência à mudança imposta pela reforma, bem como alguns pontos positivos provenientesdessa, entre os quais se pode destacar a criação de diversos programas governamentais com ointuito de melhorar a gestão pública ou a cooperação dos órgãos públicos a fim de reduzir osseus orçamentos e gastos.

Palavras-chave: Reforma gerencial; Administração pública; Brasil

La reforma gerencial brasileña en debate: contribuciones para un proyecto enconstrucciónVanessa Brulon; Pierre Ohayon y Gerson Rosenberg

Los cambios en el ámbito internacional, los avances en la tecnología de los medios decomunicación y innovación tecnológica plantean grandes desafios a los cuales se enfrentan lasinstituciones públicas. En este sentido, se estableció legalmente el proceso de Reforma delEstado y Administración Pública en Brasil, en 1995. Con este fin, propuso la transferencia de lasprácticas privadas para el sector público en busca de una administración gerencial. Este artículoresulta de una reflexión acerca del proceso de implementación de la reforma del Estado y susconsecuencias para la administración pública brasileña. De forma que tiene como objetivo iden-tificar posibles vulnerabilidades presentes en el proceso de reforma de la gestión en Brasil. Seconcluye señalando algunas de las causas que condujeron al desprestigio de la reforma de lasinstituciones públicas brasileñas, tales como la dificultad de las organizaciones públicas deadaptarse a la nueva estructura organizativa designada por el Estado, la resistencia al cambioimpuesto por la reforma, así como algunos buenos puntos, entre los cuales podemos destacar lacreación de diversos programas de gobierno destinados a mejorar la cooperación delaadministración pública o de los organismos públicos a fin de reducir sus presupuestos y gastos.

Palabras clave: Reforma gerencial; Administración pública; Brasil.

The Brazilian managerial reform in question: contributions to a project underconstructionVanessa Brulon; Pierre Ohayon and Gerson Rosenberg

Changes in the international arena, advances in technology and innovation pose publicinstitutions facing great challenges. In this sense, was established by law the process of State andpublic administration Reform in Brazil, in 1995. To this end, proposed the transfer of privatepractices for the public sector in search of a management administration. This article results

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A reforma gerencial brasileira em questão: contribuições para um projeto em construção

from a reflection of the implementation process of state reform and its consequences for theBrazilian public administration. In this sense, aims to identify potential vulnerabilities present inthe process of management reform in Brazil. It concludes by stating some causes that led to thediscrediting of the reform by the brazilian public institutions such as the difficulty of publicorganizations to adjust to the new organizational structure designated by the State, resistance tochange imposed by the reform, as well as some good points, among which we can highlight thecreation of various government programs aimed at improving the cooperation of publicmanagement or public agencies to reduce their budgets and spending.

Keywords: Administrative reform; Public administration; Brazil

Vanessa BrulonMestre em administração pública e doutoranda em administração pela Escola Brasileira de Administração Pública e deEmpresas (EBAPE/FGV). E-mail: [email protected]

Pierre OhayonDoutor em administração de empresas pela Faculdade de Engenharia e Arquitetura (FEA/USP). É professor associado IIda Faculdade de Administração e Ciências Contábeis (FACC/UFRJ). E-mail: [email protected]

Gerson RosenbergDoutor em Tecnologia de Processos Químicos e Bioquímicos pelo Instituto Alberto Luiz Alberto Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE/UFRJ). Atua como tecnologista em Saúde Pública da Fundação OswaldoCruz Fiocruz. E-mail: [email protected]