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Brünhilde e a saga do anel Jorge Luján Ilustrações Linda Wolfsgruber Tradução Marcos Bagno Temas abordados Sagas nórdicas e germânicas • Amor x poder • Traição e incesto GUIA DE LEITURA PARA O PROFESSOR PARA QUE POESIA? POESIA PARA QUEM? Em um mundo acelerado pela informação, a poesia para jovens, sem deixar de divertir, constitui valioso caminho de conhecimento e autoexpressão. A descoberta dos recursos expressivos da linguagem é uma conquista importantíssima no processo de desenvolvimento das capacidades verbais do adolescente. Ao longo desse processo, o contato com o texto poético constitui marco importante, na me- dida em que fornece meios para decodificar as diferentes estra- tégias discursivas que povoam, desde sempre, sua passagem para o mundo adulto. O papel desempenhado pelo texto poético em sala de aula liga-se ao fato de ele pôr a própria linguagem em xeque, liber- tando-a dos automatismos. Por essa razão, uma poesia juvenil 96 páginas BRÜNHILDE E A SAGA DO ANEL Jorge Luján tradução Marcos Bagno ilustrações Linda Wolfsgruber O AUTOR Jorge Luján nasceu em Córdoba, Ar- gentina, em 1943. Poeta, músico, arquiteto, é também autor de vasta obra para jovens e crian- ças. Tarde de inverno, Acidente celeste e Ah, as cores! são alguns títulos seus publicados no Brasil. Luján trabalhou com alguns dos maiores ilustradores do mundo e obteve diversos prê- mios ao longo da carreira, incluindo o Prêmio de Poesia para Crianças da Associação do Livro Infantil e Juvenil da Argentina (Alija).Mais infor- mações em: http://www.jorgelujan.com A ILUSTRADORA Linda Wolfsgruber é uma das mais destacadas artistas austríacas, dona de uma obra originalíssima exibida não apenas na Europa, mas também no Japão e nos Esta- dos Unidos. From the Myths of Ancient Sum- mer e Stories from the Life of Jesus são alguns títulos seus publicados pela Groundwood.

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Brünhilde e a saga do anelJorge Luján

Ilustrações Linda WolfsgruberTradução Marcos BagnoTemas abordados Sagas nórdicas e germânicas • Amor x poder • Traição e incesto

GUIA DE LEITURA

PARA O PROFESSOR

PARA QUE POESIA? POESIA PARA QUEM?

Em um mundo acelerado pela informação, a poesia para jovens, sem deixar de divertir,

constitui valioso caminho deconhecimento e autoexpressão.

A descoberta dos recursos expressivos da linguagem é uma

conquista importantíssima no processo de desenvolvimento das

capacidades verbais do adolescente. Ao longo desse processo, o

contato com o texto poético constitui marco importante, na me-

dida em que fornece meios para decodificar as diferentes estra-

tégias discursivas que povoam, desde sempre, sua passagem para

o mundo adulto.

O papel desempenhado pelo texto poético em sala de aula

liga-se ao fato de ele pôr a própria linguagem em xeque, liber-

tando-a dos automatismos. Por essa razão, uma poesia juvenil

96 páginas

Baseado em sagas nórdicas e germânicas da Idade Média, oCiclo do anel, criado por Richard Wagner, é das mais ambiciosasobras de arte do mundo. Cobiça e luxúria, incesto e traição,obediência e ousadia – todas as faces do desejo aí comparecem,orquestradas pelo gênio do compositor alemão.

A partir do libreto das quatro óperas que compõem esse ciclo(O ouro do Reno, A valquíria, Siegfried e O crepúsculo dos deuses), opoeta argentino Jorge Luján nos oferece agora uma nova versãoda história, apoiada exclusivamente na musicalidade dos versos.Nela, Brünhilde desponta como a verdadeira heroína, que desafiaa inflexível lei divina e por amor se humaniza. Entre ninfas edragões, em busca de tesouros roubados ou anéis amaldiçoados,o leitor há de se encantar com a força imagética desta narrativa.

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ilustraçõesLinda Wolfsgruber

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O autOr Jorge Luján nasceu em Córdoba, Ar-

gentina, em 1943. Poeta, músico, arquiteto, é

também autor de vasta obra para jovens e crian-

ças. Tarde de inverno, Acidente celeste e Ah,

as cores! são alguns títulos seus publicados no

Brasil. Luján trabalhou com alguns dos maiores

ilustradores do mundo e obteve diversos prê-

mios ao longo da carreira, incluindo o Prêmio

de Poesia para Crianças da Associação do Livro

Infantil e Juvenil da Argentina (Alija).Mais infor-

mações em: http://www.jorgelujan.com

a ilustradOra Linda Wolfsgruber é uma das

mais destacadas artistas austríacas, dona de

uma obra originalíssima exibida não apenas

na Europa, mas também no Japão e nos Esta-

dos Unidos. From the Myths of Ancient Sum-

mer e Stories from the Life of Jesus são alguns

títulos seus publicados pela Groundwood.

Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

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não cumprirá seu papel enquanto subestimar a inteligência do

leitor, recorrendo a noções simplistas, a banalizações de forma

e conteúdo. Concorrendo com a velocidade dos quadrinhos, do

vídeo e da internet, a poesia deve ser capaz de atentar para te-

mas, experiências e sentimentos que compõem o universo cada

vez mais heterogêneo do adolescente, estimulando-o a indagar,

a criar e a refletir.

No século XIX, o filósofo Friedrich Hegel assinala que, com a

consolidação da sociedade moderna, os jovens tornam-se “novos

cavaleiros medievais”, devendo abrir caminho em um mundo no

qual, muitas vezes, a família, as instituições e a sociedade pare-

cem se chocar com seus ideais. A literatura, por meio da diver-

sidade e complexidade de temas que aborda, pode auxiliá-los a

elaborar tais conflitos.

No contexto contemporâneo, a poesia representa um espaço pro-

tegido em que é possível recuperar o sentido lúdico da experiência

com a palavra, bem como fomentar uma abordagem alternativa à

sua instrumentalização. Fruto de grande liberdade criativa, a poesia

incrementa a potência fabuladora dos que a experimentam. Mergu-

lhando-nos no frescor da língua, ela ajuda a formar leitores ativos.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

FORMAS E TEMAS

Em Brünhilde e a saga do anel, Jorge Luján revela a atualidade do

ciclo d’O anel do nibelungo – conjunto de quatro óperas composto

pelo alemão Richard Wagner. Condensado por Luján em versos

polimétricos, o enredo aborda temas como sexualidade, relações

familiares e regras sociais, questões caras à adolescência.

No centro da trama está a disputa pelo anel mágico de Alberich,

feito com o ouro roubado às ninfas do Reno. A joia, que atiça o

desejo dos que não a possuem e amaldiçoa os que a guardam, é

reclamada por Wotan, chefe dos deuses.

Na versão de Luján, a personagem Brünhilde, filha favorita de

Wotan, assume posição de destaque. A função da valquíria é levar ao

Valhalla, morada dos deuses, a alma dos guerreiros mortos.

Divindade rebelde, Brünhilde

desobedece ao pai por impedir

a morte de Siegmund, corajo-

so cavaleiro – igualmente filho

de Wotan – que, em determina-

do momento da trama, esposa a

própria irmã, Sieglinde. Como

castigo, Brünhilde será conde-

nada a adormecer no alto de um

penhasco, cercada por um círcu-

lo de fogo, até que a desperte o

beijo de um indômito herói, ca-

paz de atravessar as chamas.

Esse jovem será Siegfried, filho

da relação incestuosa de Siegmund

e Sieglinde, por quem Brünhilde se

apaixonará intensamente. Por ele,

a deusa, tornada mortal, perderá

a castidade renunciando de vez ao

mundo dos deuses. Diante da mor-

te de Siegfried, causada pela cobiça

dos que buscam o anel, Brünhilde,

por fim, dará cabo da própria vida.

Antes, no entanto, ela incendiará o

Valhalla, inaugurando uma nova

era, de homens livres em relação

aos divinos desígnios.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

MAIS DE PERTO

Linguagem e poiesis em Brünhilde

Para condensar o intrincado enredo da saga, Luján vale-se de

uma linguagem contemporânea, mas que guarda elementos da

eloquência épica. O rigor construtivo de seus versos não decorre

da aplicação de um esquema de rimas e métrica fixos, e sim do

rico trabalho de sonoridades internas, perceptível logo nas pri-

meiras estrofes do volume, em versos aliterados como “A eSpu-

ma inoCente roÇa-lhe os SeioS” ou “Subitamente, uma SombRa

se ERgue/ por uma gREta na pEdRa. Raio nEgRo coRta a água”.

O jogo fônico também se faz presente nas fórmulas mágicas

recorrentes, caras ao universo mítico representado. Por meio de-

las as palavras tornam-se coisas: basta dizê-las do modo correto

para que a enunciação se transforme em ação (como nos mo-

mentos em que Alberich amaldiçoa o amor ou em que Wotan

impõe o castigo à filha).

Trata-se, portanto, de um universo em que a palavra não de-

sempenha apenas função comunicativa: a poesia é criadora de rea-

lidades, chave para que as vontades dos deuses e dos homens se

realizem no mundo. Ao nomear, invocar e pedir, as personagens

de Brünhilde determinam factualmente situações e destinos.

Wagner e o romantismo aLemão Composto por Richard Wagner entre 1848 e 1874, o Ciclo do

anel é atravessado por diversos traços do romantismo alemão, mo-

vimento que teve início entre 1770 e 1780 a partir das reflexões

estéticas de Goethe e Schiller, principais representantes do grupo

que se convencionou chamar posteriormente de Sturm und Drang

(Tempestade e Ímpeto). As proposições artísticas desses jovens,

em contraposição ao classicismo francês oitocentista, revolucio-

naram o modo de fazer e pensar a estética em contexto moderno,

lançando ideias que atravessaram os séculos XVIII e XIX.

Dos diversos traços românticos que compõem o Ciclo do anel

de Wagner, cumpre destacar certo pessimismo em relação à so-

ciedade moderna, plasmado na busca de um passado mítico, de

conto de fadas, de um mundo encantado e misterioso, bastante

distinto do racionalismo iluminista. À volta ao passado mítico se

associa outro elemento caro ao romantismo alemão: a proximi-

dade da cultura popular – sabe-se que Wagner colheu elementos

de diversas sagas nórdicas para compor suas óperas, contrapon-

do-se aos cânones clássicos.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

Sagas são narrativas medievais escritas em versos, constituídas

com base em relatos orais, passados de geração em geração.

São anônimas: tecidas pelo imaginário popular coletivo, contam

heroicamente a trajetória do representante de um clã ou de um

povo, oscilando entre fabulação e História.

Outras marcas românticas no Ciclo do anel são o subjetivismo

radical (as personagens da trama entregam-se a excessos, dando

livre curso à emoção), o questionamento dos valores da sociedade

burguesa ascendente (ligado a temas polêmicos, como a desobe-

diência de Brünhilde às ordens paternas e o incesto de Siegmund

e Sieglinde), a busca de correspondência entre as artes, outra opo-

sição ao classicismo, que as separa rigorosamente. Nesse sentido,

pode-se dizer que Wagner tentou levar às últimas consequências

a afirmação do escritor romântico Novalis de que “música, artes

plásticas e poesia são sinônimos”, procurando elaborar, em suas

óperas, uma “obra de arte total” (Gesamtkunstwerk), síntese de

todos os campos da criação.

Por fim, é interessante notar que essas questões colocadas pelo

romantismo, presentes na obra de Wagner e mantidas em grande

parte por Luján, concernem ao universo juvenil – na adolescên-

cia não são raras as vezes em que os valores sociais são questiona-

dos e as emoções extravasam em face de um mundo que requer

cada vez mais (e mais cedo) a especialização e a fragmentação da

subjetividade.

revoLuções de 1848 e eLementos aLegóricos em Brünhilde

Wagner dedica 26 anos de sua vida à elaboração do Ciclo do

anel, iniciando sua composição em 1848, ano de publicação

do Manifesto Comunista e de intensos conflitos em território eu-

ropeu. Na França, uma revolução eclode: os proletários começam

a reconhecer seus interesses como distintos dos da burguesia,

contestando a universalidade dos ideais propagados pela Revo-

lução Francesa de 1789 (“liberdade, igualdade e fraternidade”).

Eles então promovem uma série de protestos reclamando refor-

mas e a instauração de uma república democrática. A revolu-

ção, no entanto, é violentamente reprimida pelo Estado fran-

cês, que massacra os insurgentes. Promulgada a Constitui-

ção e realizadas eleições, sobe Luís Bonaparte (Napoleão III),

sobrinho de Napoleão. Em 1852, ele articula um golpe de Estado,

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

dissolve a república e torna-se imperador, liquidando a possibili-

dade de transformações sociais profundas.

Tais acontecimentos repercutem intensamente nas manifes-

tações artísticas do período, e certamente traços da vontade de li-

bertação social de 1848 encontram-se presentes no Ciclo do anel.

Pode-se pensar no episódio final do ciclo – a destruição do

Valhalla por Brünhilde em “O crepúsculo dos deuses” – como

uma espécie de alegoria dos impulsos revolucionários: os mor-

tais estão livres para viver segundo as próprias vontades, uma vez

que as implacáveis leis divinas foram abolidas: a liberdade vence

a opressão.

Alegoria é a representação de uma ideia concreta por meio de uma

imagem abstrata, artifício muito utilizado na literatura e nas artes

plásticas. Encontramos um bom exemplo de alegoria no famoso

quadro de Eugène Delacroix (1798-1863) A Liberdade guiando

o povo (1830), no qual a ideia da liberdade é representada pela

figura de uma jovem, com os seios desnudos, empunhando a

bandeira francesa.

No entanto, não é apenas nesse episódio que tais impulsos se

fazem sentir; ao contrário, eles atravessam todo o enredo, cris-

talizados nos conflitos entre personagens que desejam manter

tradições (como Fricka) e outros que têm o ímpeto de comba-

tê-las – Brünhilde pode ser considerada a expressão máxima

desse último tipo.

A Liberdade guiando o povo (1830), de Eugène Delacroix

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

música e poesia

No ciclo de óperas, o texto poético que narra a saga do anel en-

contra-se indissociavelmente ligado à música, um dos elementos

constitutivos da obra de arte total almejada por Wagner. Na ópe-

ra, os temas e variações musicais também desempenham função

narrativa, isto é, também ajudam a contar a história para além do

plano verbal. Na adaptação de Luján, contudo, a poesia torna-

-se elemento autônomo, podendo expressar-se de maneira mais

livre (percebe-se que o sistema de métrica e rimas não é fixo,

conforme apontamos), fato que permite certa atualização da lin-

guagem épica. Limitando-se à musicalidade das palavras, o autor

elabora jogos fônicos brincando com aliterações, rimas internas

e variações no ritmo, perceptíveis, sobretudo, nas fórmulas má-

gicas (vale lembrar um dos encantamentos entoados por Al-

berich: “Névoa e noite, noite e névoa,/ Se não vês, algo perdeste”).

Em Itinerário de Pasárgada, o poeta Manuel Bandeira,

discutindo a relação entre música e poesia, procura

distinguir a musicalidade subentendida dos ver-

sos da música propriamente dita. Afirma ele a pro-

pósito de poemas seus que foram musicados: “Foi

vendo a ‘musicalidade subentendida’ dos meus

poemas desentranhada em ‘música propriamente

dita’ que compreendi não haver verdadeiramente

música num poema e que dizer que um verso

canta é falar por imagem. [...] A ‘musicalidade

subentendida’ poderia ser definida por outro mú-

sico noutra linha melódica. O texto será como um

baixo numerado contendo em potência nume-

rosas melodias”. BANDEIRA, Manuel. Itinerário de

Pasárgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira

1992, p. 79.

Por outro lado, ao dispensar a música propriamente dita na

adaptação das óperas, o poeta perde o apoio dos motivos me-

lódicos e harmônicos que auxiliam o avanço do enredo e a ex-

pressão emocional das personagens. Por isso, há momentos de

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

Brünhilde em que a palavra poética representa tão somente o

canto, como é o caso do refrão das ondinas (“Valalaia, valai”),

do das valquírias (“Ho, ho, heia”) e do trinado do pássaro, que só

Siegfried consegue compreender (“Siieg... frii... friiid”).

Uma das formas que Wagner encontrou para acentuar o caráter

narrativo da música foi a técnica do leitmotiv (motivo condutor,

em alemão), criada por ele. Trata-se de um tema musical ligado

a uma personagem ou situação da ópera, que se repete sempre

que a personagem aparece ou a situação é encenada. A técnica

do leitmotiv foi amplamente difundida, e não só no plano da arte:

podemos encontrá-la, mutatis mutandis, nos produtos da cultura

de massa, como telenovelas.

arquétipos heroicos em Brünhilde

Percebe-se, em Brünhilde, a presença de arquétipos heroicos,

ou seja, de situações da trama ou características das personagens

que podem ser encontradas, de forma muito semelhante, em

outras narrativas épicas. O motivo da espada Nothung, que só

poderia ser retirada do freixo por Siegmund, assemelha-se à es-

pada Excalibur do ciclo arturiano; o ponto vulnerável do mesmo

Siegmund (nas costas) lembra o calcanhar de Aquiles, persona-

gem central da Ilíada; o sono profundo de Brünhilde, que apenas

o beijo de um destemido herói poderia dissipar, remete ao tema

da Bela Adormecida, observado em contos de fadas medievais. A

presença de motivos semelhantes em obras estrutural e histori-

camente tão distantes enfatiza o aspecto arquetípico, popular e

coletivo das fontes buscadas por Wagner para compor o enredo

de O anel do nibelungo: as histórias, transmitidas oralmente de

uma geração a outra, por vezes fixadas por meio da escrita em

documentos que guardam traços de oralidade, viajam no tempo

e no espaço, incorporando-se às tradições específicas de cada lu-

gar e sofrendo alterações com o correr do tempo.

Muitos arquétipos heroicos presentes em O anel do nibelungo,

de Wagner, podem ser encontrados no romance de traços épicos

de J. R. R. Tolkien O senhor dos anéis, escrito nos anos 1930 e cuja

adaptação cinematográfica hollywoodiana alcançou amplo sucesso.

Tolkien, no entanto, sempre negou qualquer influência de Wagner,

afirmando que ele e o compositor alemão teriam se baseado nas

mesmas sagas medievais para a elaboração de suas obras.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

VERSO E REVERSO

O professor pode desenvolver diversas atividades em sala de

aula com o intuito de ressaltar os elementos poéticos presentes

na adaptação de Luján, bem como discutir os complexos temas

abordados no livro. Apresentam-se a seguir algumas sugestões

de trabalho.

encenação de trechos da obra

Após a leitura de Brünhilde, os alunos dividem-se em gru-

pos a fim de selecionar os trechos que mais lhes interessaram

e, posteriormente, encená-los para o restante da escola. A ativi-

dade pode contar com o auxílio do professor de artes e deve ser

precedida de discussões dedicadas à construção das personagens,

à definição das linhas gerais de interpretação e à criação de al-

gum aparato cênico (cenários, figurinos, iluminação, sonoplas-

tia) que apoie o desenvolvimento da ação dramática. A encena-

ção ajuda a ampliar a compreensão da trama pelos estudantes

(uma pesquisa mais detida sobre o trabalho original de Wagner

pode ser sugerida pelo professor), chamando também a atenção

deles para a musicalidade dos versos, enfatizada pela leitura em

voz alta.

iLustrações aLternativas Em Brünhilde, as ilustrações de Linda Wolfsgruber desempe-

nham importante papel: às vezes, condensam momentos centrais

do enredo; outras, antecipam fatos ainda não contados pelos ver-

sos. Novamente com a ajuda do professor de artes, propõe-se aos

alunos a elaboração de ilustrações alternativas às de Wolfsgruber,

contemplando momentos da trama que lhes pareçam relevantes.

Tal trabalho pode ser iniciado em sala de aula e concluído em

casa. Depois, as ilustrações são apresentadas em grupo, eventual-

mente acompanhadas de explicações sobre as ra-

zões que levaram à escolha da cena, comentários

sobre a(s) técnica(s) empregada(s) e a estratégia

compositiva (cores, jogo de luz e sombra, textura,

posição das personagens etc.). Perguntas como

“Por que determinada personagem aparece no

centro do desenho?”, “De que maneira ela é re-

presentada visualmente?” constituem bom aque-

cimento para a discussão, apresentando a ilustra-

ção como um meio de interpretar a história.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

identificação de arquétipos heroicos nos produtos da cuLtura de massa

Sabe-se que enredos e temas de epopeias e sagas são comu-

mente absorvidos pela cultura de massa em filmes hollywoodia-

nos, canções de bandas de heavy metal, quadrinhos e desenhos

animados. Com base nisso, solicita-se aos alunos a criação de

uma lista de filmes, músicas, livros e desenhos em que identifi-

quem alguns dos arquétipos heroicos presentes em Brünhilde: a

busca por um objeto mágico (no caso, o anel), o motivo da espa-

da, a jovem adormecida, entre outros etc. O professor pode, ele

mesmo, trazer para a sala de aula alguns desses produtos, exibin-

do trechos de filmes, reproduzindo músicas etc. A partir da lista,

analisam-se as diferenças entre o aproveitamento desses arqué-

tipos na cultura de massa e na obra de Luján. O professor deve

chamar a atenção para as formas de linguagem utilizadas pelos

diversos meios. Os filmes “épicos” da indústria, por exemplo, res-

saltam o caráter de aventura das histórias, hipervalorizando as

cenas de ação. Em Brünhilde, ao contrário, a trama é condensada

em versos que exploram a sonoridade poética das palavras. A

partir do debate sobre a pertinência de temas épicos no contex-

to contemporâneo, vale destacar as características românticas de

Brünhilde, relacionando-as a conflitos comuns da adolescência.

OUTRAS VIAGENS(Sugestões de livros e vídeos)

LIVROS

para o professor

• GUINSBURG, J. (org.). O romantismo. São Paulo: Perspecti-

va, 2005.

Volume em que diversos autores, entre os quais Alfredo Bosi e

Benedito Nunes, expõem suas visões sobre o movimento ro-

mântico em contexto internacional e brasileiro. Interessante

para que se possa discutir a complexidade de temas ligados ao

romantismo em Brünhilde e a saga do anel.

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Brünhilde e a saga do anel Jorge LuJán

Elaboração do guia Carolina Serra azul (meStranda em letraS pela FaCuldade de FiloSoFia, letraS e CiênCiaS HumanaS da univerSidade de São paulo); prEparação Fabio Weintraub; rEvisão marCia menin; diagramação am produçõeS.

para o aLuno

• ANÔNIMO. A canção dos nibelungos. 2. ed. São Paulo: Mar-

tins Fontes, 2001. Coleção Gandhara.

Texto em prosa fruto da longa elaboração de lendas em tor-

no do grande mito do paganismo germânico e que serviu de

base para as óperas de Wagner.

• COELHO, Lauro Machado. Uma análise do anel do nibelun-

go. 2. ed. São Paulo: Universidade Falada, 2007.

Audiolivro com informações sobre construção da tetralogia

wagneriana e análises das personagens, da trama e das me-

lodias.

VÍDEOS• Ludwig. Itália, 1972. Direção: Luchino Visconti. Elenco: Helmut

Berger e Romy Schneider. DVD (247 min.), colorido.

O filme aborda a história do rei da Baviera, Ludwig Otto,

conhecido por sua admiração apaixonada pela obra de Ri-

chard Wagner, do qual era mecenas, e que se empenha na

tentativa de viver como nas óperas do compositor.

• Também é possível encontrar no YouTube diversos trechos

das óperas que compõem o Ciclo do anel. Destaca-se a mon-

tagem que o Metropolitan Opera de Nova York fez de A val-

quíria, em 2011, com regência de James Levine, direção de

Robert Lepage e intérpretes como Deborah Voigt (Brünhilde),

Bryn Terfel (Wotan), Eva-Maria Westbroek (Sieglinde) e Jo-

nas Kaufmann (Siegmund). Trechos da montagem podem

ser vistos nos seguintes links:

http://youtu.be/vaBuZ42lTss

http://youtu.be/wFpoHcXtLJA

http://youtu.be/W-ORjaxWYkE