bolsa de valores - portal abvcap · bolsa de valores oestudo do ctom mostra que o perfil de...

5
r Bolsa de valores 26 CAPITAL ABERTO Agosto 2014

Upload: duongtruc

Post on 09-Feb-2019

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

r

Bolsa de valores

26 CAPITAL ABERTO Agosto 2014

Por Bruna Maia Carrion

Isenção fiscal ao investidor que aplicar em PMEs ébem-vinda, mas descompasso entre oferta e demandaainda levará tempo para ser superado

r

problema é a falta de investidor, e não a de com-panhias dispostas a abrir o capital. Assim concluíao estudo do Comitê Técnico de Ofertas Meno-res (CTOM), divulgado em novembro de 2012.

Formado por BM&FBovespa, Comissão de Valo-res Mobiliários (CVM) e outros agentes, o grupobusca fomentar o acesso de pequenas e médiasempresas (PMEs) ao mercado de capitais. E, se a

complicação é demanda, nada como um estímulo tributáriopara fisgar o investidor. Nesse sentido, a Medida Provisória(MP) 651, publica da em 10 de julho, caiu como uma luva: en-tre outras coisas, isentou a pessoa física de pagar imposto derenda sobre o ganho de capital obtido com ações de PMEs.Para entrar na mira do incentivo, a companhia deve ter fatu-ramento de até R$ 500 milhões e valor de mercado máximode R$ 700 milhões. Além disso, precisa estar no Novo Merca-do ou no Bovespa Mais e realizar uma oferta inicial com pelomenos 67% de distribuição primária. A possibilidade de ganhosem pagar imposto, entretanto, não será um medicamento de

efeito rápido. Vai demorar para que o pregão brasileiro sejapovoado pelas pequenas.

Desde que foi formado, em 2012, o CTOM vinha se ar-ticulando para conseguir o benefício. Ao buscá-lo, o gruponão teve exatamente o propósito de desviar a atenção dosinvestidores individuais, acostumados a negociar ações comalta liquidez, para os papéis de pequenas e médias. O sentidoda MP 651 reside, principalmente, na sua combinação com aInstrução 549 da CVM, que, no fim de junho, criou um novotipo de fundo de investimento: o fundo de ações - mercadode acesso (FMA). Para ser enquadrado como FMA, o fundoprecisa ter dois terços de seu patrimônio investido em papéis ~de companhias listadas em segmento do mercado de acesso .~com padrões elevados de governança corporativa (atual- ~mente, o Bovespa Mais é o único nível de listagem do tipo). ~Segundo a MP, pessoas físicas que investirem nesse produto ~poderão usufruir a isenção fiscal. E é por meio deles que a ~MP 651 terá mais chances de fazer o segmento de pequenas ~e médias deslanchar. 3

Agosto 2014 CAPITAL ABERTO 27

Bolsa de valoreso estudo do CTOM mostra que

o perfil de investidor de ofertas deempresas menores varia de país parapaís. No TSXV, mercado de acesso dabolsa canadense, são os institucionaisos principais compradores, mesmoquando o valor emitido pela companhiaé reduzido. Na Austrália, esse públicose interessa mais por ofertas acima deUS$ 100 milhões, enquanto as pessoasfísicas têm participação relevante ememissões de menor valor. Na Coreia doSul e na Polônia, os investidores indivi-duais compram uma parcela significa-tiva dos papéis ofertados por empresasmédias. A Inglaterra tem um dos mer-cados de acesso mais bem-sucedidos domundo, o AIM, em que as empresas depequeno porte atraem as pessoas físicasde grande poder aquisitivo ou os fundosespecializados em PMEs.

Acredita-se que o Brasil, devido a seuhistórico de investimento em ações,deva seguir um caminho parecidocom o inglês. "Por aqui, a tendência éque o segmento seja formado, princi-palmente, por gestores qualificados",acredita Cristiana Pereira, diretorade desenvolvimento de empresas daBM&FBovespa. Os principais motivospara esse diagnóstico são a maior dosede risco presente nas ações de PMEs ea liquidez em bolsa desses papéis, quetende a ser reduzida.

r

Santa esperaA Instrução 549 e o estímulo fiscal nãosignificam, entretanto, que os gestoresbrasileiros vão investir em PMEs numfuturo próximo. "Asmedidas são para o

. longo prazo. É provável que o mercadodemore quatro ou cinco anos para sedesenvolver", estima Luciana Dias,diretora da CVM. Não é para menos.Atualmente, apenas sete empresas sãoelegíveis ao incentivo fiscal concedidopela MP: CR2 Empreendimentos Imo-biliários, BrasilAgro, HRT, Renar Maçãs,General Shopping, Nutriplant e SeniorSolution. Apenas as duas últimas estãolistadas no Bovespa Mais; as demais, noNovo Mercado. "É pouco. Precisa havermais empresas para que surjam gestoras

28 CAPITAL ABERTO Agosto 2014

Novos mandamentos

A MP 651 já recebeu sugestões de emenda. O deputadofederal Otávio Leite, do PSDB do Rio de Janeiro, apresen-tou três propostas de modificação do texto. Uma delas éa isenção tributária também para pessoas jurídicas queinvestirem em PMEs, permitindo que clubes de investi-mento e fundos de private equityusufruam o benefício.Outra é um crédito tributário para companhias querealizarem IPO. Esse ponto é polêmico: a BM&FBovespae a CVM já se manifestaram contra a ideia, defendendoque o incentivo fiscal para empresas pode levá-Ias a selistar por motivos errados. A terceira possível mudançaé estender o benefício para companhias que emitiremações preferenciais - o que é permitido nos Níveis 1e 2de governança corporativa da Bolsa. (8. MJ

interessadas em montar FMAs", observaRodrigo Sancovsky, sócio da Fama Inves-timentos. Em contrapartida, é necessáriohaver fundos interessados para que asempresas se listem - um impasse que,para ser superado, requer tempo.

Por essa razão, os especialistas ou-vidos pela reportagem creem que so-mente daqui a alguns anos, quando e seo mercado de acesso tiver um númerosignificativo de boas companhias, osFMAs sejam lançados. Eles deverão sevoltar, principalmente, para pessoasfísicas dispostas a correr mais risco e ainvestir no longo prazo - pelas regrasda Instrução 549, esses veículos têmresgate de 180 dias. "Em todos os paí-ses analisados, a liquidez do mercadode acesso é baixa ou se concentra empoucos ativos. Ele é voltado para quemse dispõe a conviver com isso", explicaLuciana. Até os FMAs chegarem, asempresas médias que abrirem o capitalterão de contar, basicamente, com ointeresse de fundos já existentes, comoos da Fama e da Leblon Equities. Elesinvestem, por exemplo, na Senior Solu-tion, empresa de tecnologia da informa-

ção que levantou R$ 50 milhões em sua Quando se considera a desde o IPa até 24 de julho. No caso daoferta pública inicial, em março de 2013. Senior Solution, embora a desvaloriza-

No purgatOrlo oerformance em bolsa ção atinja 17,6%, a companhia está mui-to bem operacionalmente. Sua receita

Quando se considera a performance em líquida aumentou 72% entre o primeirobolsa das sete companhias atualmente das sete comoanhlas trimestre de 2013, quando estreou noelegíveis ao estímulo fiscal conferido pregão, e o mesmo período de 2014; opela MP 651, no entanto, o prognóstico lucro subiu 57%. Tanto a Leblon quan-não é nada animador. Quem investiu em atualmente elegíveis to a Fama têm boas perspectivas paraações dessas empresas no IPa e as de- a companhia no longo prazo. a quetém até hoje não teve lucro algum (veja ao estímulo fiscal da explica a queda no valor das ações, se-tabela na página seguinte) - portanto, gundo seus gestores, é a baixa liquidez,o benefício tributário sobre ganho de típica do mercado de acesso. Essa carac-capital teria sido inócuo, e os investido- MP 651, O orognóstico terística, contudo, tende a mudar comres atraídos pela suposta vantagem não o tempo, conforme a empresa crescer.estariam nada felizes com os prejuízos.Além disso, não pareceria um tanto nãO é nada animador. Luz no horizonteimprudente estimular pessoas físicas A BM&FBovespa faz contato frequentea comprar papéis como os da HRT?

Quem Investiu com 200 companhias de capital fecha-A petroleira abriu o capital em outubro do que, acredita, possuem perfil ade-de 2010, com as ações valendo R$ 24 (na quado para um IPa. "Temos recebidoépoca, agrupadas em lotes de R$ 1.200); em acões dessas várias consultas de empresários desdeem 24 de julho, elas eram negociadas a a publicação da MP", relata Cristiana.mísero R$ 1,33, após uma série de previ- Porém, a isenção fiscal pode atrairsões nunca consumadas e uma grave cri- emoresas no IPO e as empresas já presentes na bolsa. Exis-se de governança em sua administração. tem pelo menos 60 companhias que

Na visão dos agentes de mercado,

detém até hOJenãocumprem quase todos os requisitos

todavia, a amostra acima é inadequada para serem elegíveis ao estímulo tri-para avaliar as chances de sucesso do butário da MP, menos um: estar listadamercado de acesso. "AMP não foi feita teve lucro algum. Logo, em segmento especial de governança.para essas companhias; elas são apenas "Nenhuma empresa demonstrou ain-uma consequência dos critérios da me- da o interesse de migrar para o Novodida", diz Fernando Machado, gerente Obenefício tributário Mercado ou o Bovespa Mais. Mas, parada área de mercado capitais do Banco companhias com pouca liquidez, essa éVotorantim. A HRT, por exemplo, se uma boa chance de acessar novamentetornou elegível ao benefício tributário sobre ganho de caoital o mercado", comenta Cristiana.apenas devido a seu péssimo desempe- Entre as companhias que poderiamnho no pregão. Na época do IPa, o valor teria sido inócuo, e mudar de segmento estão, principal-de mercado da empresa beirava os R$ 2,5 mente, as antigas no pregão. Umabilhões, bem superior, portanto, ao teto delas é a rede de lojas de roupas ede R$ 700 milhões exigido pela medida OSinvestidores produtos domésticos Grazziotin, pre-provisória do governo. sente na BM&FBovespa desde 1979.

Das sete companhias, apenas três se Apesar de suas ações serem negociadasenquadram no modelo de empresa pe- atraídos oela suoosta no segmento tradicional há anos, aquena e média que a MP 651 pretende, companhia tem perfil para integrarde fato, contemplar: Nutriplant, Renar

vantagem não o Bovespa Mais, com valor de merca-Maçãs e Senior Solution. Todas são de do de cerca de R$ 380 milhões. Nosmédio porte e fizeram captações modes- últimos cinco anos, seu lucro líquidotas, entre R$ 16milhões e R$ 50 milhões. estariam nada felizes só aumentou; em 2009, somava R$ 28,4A história das duas primeiras não é ani- milhões; em 2013, R$ 50,4 milhões. Nomadora: anos de maus resultados fize- período, as cotações em bolsa também

rram os papéis da Nutriplant e da Renar com os oreJuíZOS ascenderam, de R$ 4,79 para R$ 17 emcaírem respectivamente, cair 82% e 77% 25 de julho. Dentre seus investidores

Agosto 2014 CAPITAl ABERTO 29

Bolsa de valoresrelevantes está, além da Fama, a CreditSuisse Hedging-Criffo, conduzida peloprestigiado Luis Stuhlberger.

Empresas como a Grazziotin estãono radar do Banco Votorantim. A ins-tituição coordenou a oferta da SeniorSolution e tem interesse em intermediarofertas de pequenas e médias. Macha-do vê nelas e nas outras sete compa-nhias listadas no Bovespa Mais que ain-da não fizeram oferta (Altus, Biomm,CAB Ambiental, Desenvix, JP Parti-cipações, Nortec e Quality Software)clientes em potencial. "As empresas quedecidirem migrar podem se beneficiarda isenção e da melhora de governançapara fazer follow-ons", considera.

EvolueaoA visão dos agentes de mercado é quea MP 651 saiu quase tão boa quanto oesperado. Alguns pontos ficaram defora e já há emendas propostas (leiaquadro na página 28). Diferentementedo que pleiteava o Comitê Técnico deOfertas Menores, a MP deu a isençãofiscal apenas aos investidores de veí-culos enquadrados na Instrução 549,deixando de fora os fundos de privateequity, por exemplo. "Da forma comoestá, a medida é boa para nossa indús-tria, pois fomenta o mercado de capitaiscomo uma opção de desinvestimento.Mas queremos estender os incentivospara os investidores de fundos fechados

também", comenta Clóvis Meurer, pre-sidente da Associação Brasileira de Pri-vate Equity e Venture Capital (ABVCap).

Outra crítica remete aos valores: o li-mite de R$ 500 milhões de faturamentoe R$ 700 milhões de valor de mercadoacaba excluindo muitas companhias.Empresas maiores do que o previstopela MP, porém com capitalização infe-rior a R$ 1,5 bilhão - valor de mercadomédio das companhias que abrem ocapital no Brasil - ficaram numa po-sição desfavorável. São muito grandespara que seus acionistas individuais sebeneficiem da isenção fiscal e pequenasdemais para satisfazer os critérios doinvestidor institucional estrangeiro,um dos principais focos dos bancosde investimento nos roadshows. "Umlimite de R$ 1 bilhão de faturamento evalor de mercado contemplaria muitasempresas consideradas pequenas pelosbancos de investimento", analisa San-covsky, da Fama.

Até que a MP seja convertida em lei,o investidor deve se manter ainda maiscauteloso, devido à insegurança jurídicade sua aplicação. Na visão de Pedro Rud-ge, da Leblon Equities, um dos pontosque pode emperrar a aprovação da MPé outra iniciativa contida nela: a possi-bilidade de empresas que aderirem aoprograma de Regularização Fiscal (Refis)pagarem 30% da dívida com a ReceitaFederal em dinheiro e os outros 70% em

FalIa o ganhoNenhuma das companhias elegíveis à isenção concedida pela MP 651 está bem na bolsa

créditos decorrentes de prejuízo fiscal."Por um lado, isso é ótimo, pois algumasempresas em que investimos conse-guirão arrumar a casa e quitar dívidascom facilidade; por outro, pode atrasara aprovação pelo Congresso", diz. Emano de eleição, um tema delicado comorenúncia fiscal pode gerar mais embatedo que de hábito.

A isenção de imposto de renda nãopassa, portanto, de mais uma peça nocomplicado" quebra-cabeça de comolevar PMEs à bolsa. "Ela não é um remé-dio que vai curar tudo, mas pode ajudarse for aliada a outras medidas", avaliaMachado, do Votorantim. Algumaspeças já estão no lugar. A ampliação daInstrução 476 da CVM para oferta deações ficou em audiência pública atémarço e deve ser anunciada em breve.Além disso, a BM&FBovespa isentouas empresas do mercado de acesso doscustos de listagem e se propôs a pagarpara elas duas coberturas de analistasdurante um par de anos após a estreiaem bolsa. O BNDES também vem fa-zendo sua parte: anunciou, em abril, oplano de investir R$ 1bilhão em ofertasde pequenas e médias empresas queacessarem o mercado de capitais.

Esforço há, sem dúvida, para estimu-lar a ponta da demanda. Agora é contarcom a recuperação do cenário econômi-co e com a vontade dos empresários debuscar recursos para investir. ~~

Empresa Data de listagem Valor captado Valor de mercado em 24/7 Desempenho desde o IPOaté 24/7

RenarMaçãs 281212005 R$16 milhões R$ 30 milhões ·780J0

BrasilAgro 2/512006 R$ 583 milhões R$ 563 milhões ·110J0

CR2 23/412007 R$ 308 milhões R$145 milhões ·810J0

General Shopping 30/7/2007 R$ 287 milhões R$ 411milhões ·420J0

Nutriplant 19/1212007 R$ 21milhões R$ 22 milhões - 820J0

HRT 25/1012010 R$ 2.48 bilhões R$ 396 milhões -950J0

Senior Solution 8/312013 R$ 57 milhões R$108 milhões ·180J0r

30 CAPITALABERTOAgosto 2014

Fontes, BM&FBovespa e Icnnnmetiea