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CONHEÇA, DISCUTA E MILITE COM A JUVENTUDE ÀS RUAS!

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Page 1: BOLETIM JUVENTUDE ÀS RUAS MG #3
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Boletim Juventude às Ruas BH / n. 3

O boletim Juventude às Ruas/BH é uma publicação independente, difundida pela agrupação estudantil Juventude às Ruas,

composta por militantes da Liga Estratégia Revolucionária - Quarta

Internacional e independentes.

Nosso boletim é financiado apenas pelo esforço dos militantes e pelo apoio dos leitores. Não aceitamos nenhum tipo de financiamento advindo da burguesia ou

do seu Estado.

Para saber mais, visite: http://juventudeasruas.blogspot.com

CONHEÇA, DISCUTA E MILITE COM A JUVENTUDE ÀS RUAS!

Frente aos tempos que se abrem, marcados pela crise capitalista e o desenvolvimento da luta de classes internacionalmente, nos colocamos o desafio de forjar uma alternativa revolucionária que se prepare para essa etapa histórica que já nos apresenta muitos exemplos reais de que não merecemos viver uma vida mesquinha, individualista, oprimida, marcada por preconceitos e lutando para sobrevivermos individualmente; esses exemplos mostram que não foi a história que acabou, senão que o que desmorona é a mentira dos que tentaram desde os anos 90 dizer à juventude: “essas são as regras do jogo, aceitem”.

Esses exemplos estão no Chile, na Espanha, na Grécia, no México, na Africa do Sul, no Egito e em muitos outros lugares do mundo, onde a juventude, os trabalhadores e o povo pobre realizam paralisações nacionais, greves, ocupações de colégios e universidades e, somente confiando em suas próprias forças, rechaçam os defuntos que do alto de suas covas milionárias buscam tragar os jovens e trabalhadores (os vivos!) os oferecendo planos de austeridade, violência policial e repressão, machismo, racismo, xenofobia; para salvar um modo de produção baseado na escravidão assalariada, os governos oferecem trilhões a banqueiros e planos de austeridade ao povo trabalhador.

Nos inspiramos nesses; os mais de 30 operários recentemente mortos pela polícia racista da Africa do Sul; Manuel Gutierrez, jovem chileno morto pela polícia por lutar por educação pública, gratuita e de qualidade; as muitas mulheres chilenas que aos 13 anos se recusam o papel de garota frágil, que lhes querem atribuir os conservadores e bispados financiados pelos governos capitalistas e machistas, e lutam contra, denunciando sem medo a série de violações sexuais que vêm sofrendo, as quais a asquerosa polícia chilena, resquício da ditadura de Pinochet, usa para tentar amedronta-las (sem sucesso) em sua legítima demanda; Mariano Ferreyra, jovem trotskista argentino que em 2011 foi morto por burocratas sindicais na Argentina por lutar contra a precarização do trabalho, o que desatou uma grande campanha nacional. Esses são os que devem estar vivos em nossas lutas!

Todos esses dão suas vidas em nome de grandes causas sociais. Mas, ainda nem todos esses lutam por uma revolução socialista, a maior das causas sociais, pois é a única capaz de livrar pela raiz de problemas advindos todos de um modo de produção que é baseado na exploração e opressão, o capitalismo. Por isso achamos que é possível e necessário ir muito mais longe. Resgatar as grandes lições históricas das lutas e revoluções pelas quais a juventude e os trabalhadores passaram na história. Isso só podemos fazer ao nos apropriarmos das sínteses desses processos históricos presentes nas obras de importantes marxistas revolucionários, como Lênin e Trotsky. Aos princípios elaborados por Marx e Engels devem ser somadas essas lições da história da luta da classe trabalhadora, pois a cada grande processo histórico a realidade nos coloca novas perguntas e necessidades. Somente por ser o marxismo revolucionário avesso a qualquer dogmatismo, pois tem como critério a prática na realidade concreta, é que foi possível em cada um desses processos, não só demonstrar a infinita amplitude criativa de seus princípios revolucionários, mas fundamentalmente guiar os trabalhadores e o povo em função dos interesses históricos da classe trabalhadora.

Assim, armados dessas lições podemos buscar vencer, livrar das amarras do capital as relações de produção e humanas e assim não mais sermos obrigados a ver tantos jovens e tanto potencial humano serem desperdiçados em função do interesse de lucro de um punhado de capitalistas.

Para ligar essas grandes aspirações a nossas lutas cotidianas é que, a partir do choque de cada posição com seus resultados e com a experiência dos estudantes, buscamos, através de aproximações sucessivas e fazendo os necessários balanços, desenvolver uma agrupação estudantil que, sob estas bases, busque romper com o isolamento em que estão as entidades estudantis, e torná-las, de burocráticas, em instrumentos para organizar de forma anti-burocrática a luta contra o conhecimento à serviço do mercado, contra o esoterismo intelectual, alimentado pela lógica do produtivismo, contra a repressão dentro e fora da universidade, levantando as questões que são fundamentais dentro da universidade desde às questões políticas nacionais, denunciando o elitismo e a exclusão, e se ligando às lutas dos trabalhadores, por entendermos o papel central destes como possíveis sujeitos históricos da transformação em que acreditamos. O questionamento da universidade de classe é para nós apenas um aspecto da denúncia que fazemos de toda a sociedade capitalista, que não tem mais nada enquanto modo de produção para oferecer à juventude e aos trabalhadores, senão exploração e opressão, se reproduzindo de forma cada vez mais convulsiva.

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Boletim Juventude às Ruas BH / n. 3

O PROJETO DO GOVERNO PARA A EDUCAÇÃO É UM PROJETO DE CLASSE, À SERVIÇO DO MERCADO E DOS BARÕES DA EDUCAÇÃO PRIVADA

Os planos dos governos do PT (Lula e Dilma) para a educação, como REUNI, PROUNI, PRONATEC, etc., representam claramente um projeto de universidade à serviço do mercado, dos barões da educação, das grandes empresas que potencializam seus lucros a partir das pesquisas feitas na universidade pública, usando sua estrutura, das terceirizações, de um maior controle dos rumos da educação pelo capital privado, etc. Um projeto de universidade que se pauta pela criação de “centros de excelência” em pesquisa à serviço do mercado, para desenvolverem conhecimento e tecnologia não à serviço das necessidades da população, mas para serem apropriados pelas grandes empresas, detentoras de direitos sobre patentes e uma série de outros convênios com a universidade pública, através da sua presença em conselhos diretores de fundos de amparo à pesquisa, conformação de acordos com reitorias, órgãos colegiados e conselhos universitários, investimentos milionários, etc. Estes centros de excelência aprofundam seu caráter elitizado e excludente, já que, como são os departamentos com maiores investimentos, se tornam cada vez mais disputados pelos concorrentes do vestibular, filtro de classe da universidade pública. Quem tem mais tempo livre para estudar, ou dinheiro para pagar os melhores cursinhos, ingressa, enquanto milhares de jovens e trabalhadores continuam sendo excluídos. Mesmo que a aplicação imediata de cotas seja uma demanda

mínima e legítima, não podemos deixar de lutar pelo fim do vestibular, para não naturalizar esse processo excludente criado em plena ditadura militar. O outro lado desse projeto nas universidades públicas é a precarização de cursos ou universidades inteiras, onde a maioria das vagas é em cursos precários, com muitos alunos por turma, com a existência de licenciaturas onde por vezes a maior parte das aulas é lecionada por bolsistas (em certos casos pela própria exigência absurda que a lógica do produtivismo impõe ao professor titular da disciplina), e onde o estudante tem pouco acesso aos recursos e à estrutura da universidade pública brasileira, e nessa categoria estão a maioria das vagas abertas pelo REUNI, sob a demagogia da “democratização do acesso”. Mas mesmo aí nestes cursos precarizados estão a menor parcela dos estudantes que cursam ensino superior no Brasil. A imensa maioria hoje amarga caras mensalidades e ensino totalmente voltado para o mercado nas universidades privadas. É fato que, proporcionalmente, o ensino privado só aumenta, se comparado ao número de vagas abertas no ensino público. O PRONATEC, com todo o seu discurso de “formação profissional”, na verdade serve para isentar ás empresas dos custos de capacitação de mão-de-obra, deixando estes custos para o governo, e onde, ao invés de representar melhorias na vida do jovem trabalhador, este é o que mais sofre com as duplas jornadas de trabalho e estudo.

FUNÇÃO SOCIAL DA UNIVERSIDADE: PRODUTIVISMO À SERVIÇO DOS INTERESSES DO CAPITAL

Os interesses das grandes empresas inseridas na universidade pública e dos grandes capitalistas do “mercado de diplomas” são a tônica dos rumos do ensino superior no Brasil, e como consequência o desenvolvimento da pesquisa se torna cada vez mais atrelado aos interesses e ao ritmo do mercado, onde as fundações de amparo impõem, através da burocracia acadêmica e de seus conselhos diretores, as leis do produtivismo como instrumento para distribuir os recursos de acordo com os seus interesses, recursos estes que geralmente estão atrelados diretamente à membros da própria burocracia acadêmica, o que resulta na produção de “conhecimento” totalmente alienado do seu objeto; e uma graduação que se torna cada vez mais uma simples linha de produção de bolsistas em iniciação científica, mestrado e doutorado. A mesma burocracia acadêmica que é correia de transmissão dos interesses do governo na universidade, que reprime estudantes por lutarem contra este projeto, que usa da estrutura de

poder autoritária da universidade para se impôr sobre qualquer um que se contraponha aos seus interesses, é quem oprime o conhecimento produzido e a maioria dos docentes, que não são agentes deste projeto político. Através da burocracia acadêmica se atrela a distribuição de recursos à critérios que cada vez mais transformam o conhecimento, de bem perpétuo da humanidade, em mercadoria à disposição do capital privado, que seleciona o que lhes interessa, e pela influência nos órgãos de fomento à pesquisa, distribuem recursos de acordo com seus desígnios, órgãos estes que muitas vezes abrigam representantes dos capitalistas diretamente em seus conselhos diretores, como FIESP, CNI, etc. Por isso os docentes, devido à precarização das condições de trabalho, são forçados a se tornar cada vez mais trabalhadores sem atividade reflexiva, destinados a reproduzir sem questionar a norma imposta pelos órgãos de fomento, sob pena de perderem suas bolsas de incentivo à pesquisa. Os

estudantes sofrem ainda mais e a maioria da juventude sequer tem acesso à universidade pública; enquanto isso os trabalhadores são historicamente excluídos da universidade que eles mesmos constroem e mantém em pé, marca que vem se aprofundando com o brutal aumento da terceirização dos serviços, que traz contornos quase escravagistas para a já autoritária estrutura de poder da universidade brasileira; as relações trabalhistas dentro da universidade são marcadas por atrasos de pagamentos, contratos flexíveis, omissão de direitos, falta de estabilidade no emprego, etc.

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Portanto, a conclusão é que para responder a esses problemas, comuns à estudantes, técnicos administrativos e professores, é necessário lutar contra o projeto de educação do governo Dilma de conjunto, contra o REUNI, PROUNI e PRONATEC. Pelo fim do vestibular e pela estatização das universidades particulares, para que todas as vagas destas, e dinheiro público a estas destinadas há anos, sejam revertidas em vagas públicas, mantidas com dinheiro totalmente público. Isso mostra que temos motivos materiais fortes para forjar uma união real entre docentes, trabalhadores e estudantes. Ainda mais, esses motivos possibilitam irmos ainda mais longe e nos ligarmos também à juventude e aos trabalhadores que estão fora da universidade pública, totalmente excluídos ou estudando nas universidades particulares, colocando assim a luta dos estudantes e trabalhadores da universidade ao lado dessa histórica luta da maioria da juventude trabalhadora brasileira pelo que deveria ser um direito garantido a todas e todos!

AS GREVES PODEM UNIFICAR E TRANSFORMAR TRABALHADORES E ESTUDANTES EM SUJEITOS POLÍTICOS IMPORTANTES DA SITUAÇÃO NACIONAL

EDUCAÇÃO PÚBLICA, GRATUITA E DE QUALIDADE PARA TODOS! COORDENAR AS LUTAS NACIONALMENTE CONTRA OS ATAQUES DE DILMA!Por conseguinte essa união poderia intervir na situação política nacional, ligando as demandas da comunidade universitária aos trabalhadores do funcionalismo que estão em greve por todo o Brasil – assim como aos que ainda entrarão, dos setores públicos e privados. Isso é fundamental, pois essas greves mostram que há um endurecimento do governo frente ao alinhamento do Brasil com os ritmos da crise mundial. O governo Dilma usa da repressão e ataca o direito

constitucional de greve, cortando pontos e ameaçando substituir os trabalhadores em greve. E esse não é um fato isolado, por todo o país acontece o mesmo. Na USP o dirigente do sindicato, Claudionor Brandão, foi demitido inconstitucionalmente, estudantes foram presos e agora querem demitir dirigentes sindicais para desmantelar o grande poder de mobilização e luta do Sindicato de Trabalhadores da USP, assim como se prevenir frente ao potencial transformador na aliança, que nos últimos anos vem se forjando, entre os trabalhadores dessa universidade e os estudantes em luta. Nas obras do PAC vemos repressão e denúncias, por parte dos movimentos sociais, de que há presos por lutar, torturas, humilhações, práticas que se mantém desde o regime miliar. Em nossa universidade avançam medidas repressivas contra os técnicos administrativos, professores em greve, assim como a proibição de festas, ameaça aos espaços de organização dos estudantes (CA’s e DA’s), aos espaços da moradia e perseguição e punição a vários estudantes por lutarem. Isso ocorre porque os governos (sejam tucanos, sejam petistas, no que tange a isso, que é o fundamental, não há diferenças, apesar de toda demagogia que querem passar nas propagandas eleitorais) e os capitalistas a que representam se preparam para, assim como hoje ocorre na Europa, tentar descarregar os custos da crise que chega ao Brasil nas costas da juventude e dos trabalhadores.

Por outro lado, frente a esse grande perigo também nos aparece uma grande oportunidade. Podemos ir muito além das demandas específicas de cada setor, lutar nacionalmente pela unificação das greves

contra essas medidas repressivas e pelo atendimento das reivindicações das categorias em luta no funcionalismo federal. Para isso é necessário fazer política contra setores ligados ao governo que atuam dentro do movimento de trabalhadores e estudantes para preservar falsas ilusões de que o governo vai atender às suas necessidades, ou seja, burocracias sindicais e estudantis. Assim, para essa luta contra os agentes do governo dentro do movimento, podemos aproveitar a concomitância de tantas greves e exigir das grandes centrais como CUT e UNE (cujas direções são atrelados ao governo), assim como organizar desde a CSP-Conlutas e desde a ANEL (entidades cujas direções, ou seja, o PSTU, são independentes do governo) um grande encontro de trabalhadores e estudantes com delegados eleitos a partir de assembleias nos locais de trabalho e estudo para, tendo como base uma grande campanha contra essas medidas de repressão do governo, ligar esses problemas locais às suas raízes profundas, ou seja, a crise que se aproxima do Brasil e a necessidade dos trabalhadores e da juventude confiarem apenas em suas próprias forças para uma saída independente da crise, uma saída da classe trabalhadora e da juventude, já que a burguesia quer nos impôr a sua saída, ou seja, mais perda de direitos e miséria para os trabalhadores, como hoje faz na Europa. Ao mesmo tempo, se preparar para tal cenário é a única forma de conseguir o atendimento das reivindicações dos setores que estão e/ou entrarão em greve e se adiantar, organizativa e politicamente, a mais ataques advindos da crescente perspectiva de crise econômica também no Brasil.

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DO QUESTIONAMENTO DA UNIVERSIDADE DE CLASSE AO QUESTIONAMENTO DA SOCIEDADE DE CLASSES: PORQUE

ISSO NÃO ACONTECE HOJE?Os planos do governo petista, que dão continuidade e aperfeiçoam os planos tucanos iniciados em FHC, contam com braços e pernas dentro da universidade para concretizar seus interesses. O primeiro e mais importante deles é o que chamamos de burocracia acadêmica, ou seja, um pequeno grupo de professores titulares que se alça sobre o conjunto do corpo docente assumindo cargos de poder dentro da universidade. Como a estrutura de poder, herdada da ditadura militar, é completamente autoritária, essa pequena parcela de professores assume grandes privilégios e detêm o poder dentro da universidade sobre seu funcionamento e distribuição de recursos. Implementam a política do governo na universidade. O Reitor é escolhido em uma lista tríplice diretamente pela presidência (a lista tríplice é um mecanismo instaurado pela ditadura, também) e, por conseguinte, os diretores de unidades são da mesma forma escolhidos pelo Reitor. Os conselhos são completamente antidemocráticos (70% professores; 15% para estudantes e funcionários) e o poder do Reitor é o de ser um interventor na universidade a serviço do governo, o que subordina todos os órgãos de poder e pró-reitorias, e que por isso se configuram como órgãos meramente transmissores dos planos do governo para dentro da universidade. Não há espaço democrático algum, uma vez que essa forma de poder universitária não atende sequer aos princípios democráticos-burgueses levantados há quase 3 séculos pela Revolução Francesa, como o voto universal, a elegibilidade universal e conselhos de poder de acordo com a representação real de cada setor – que no caso da universidade significaria que a maioria dos votantes deveriam ser os estudantes (maioria estudantil). Por outro lado, se essas são as pernas que sustentam o caráter de classe da universidade brasileira, os braços, olhos, bocas e ouvidos, que fazem o trabalho sujo de enganar a comunidade universitária, são os burocratas estudantis e sindicais. Aparentemente são estudantes comuns, funcionários e professores comuns, mas na verdade conseguem uma série de privilégios a partir de sua ligação política com o governo, fazendo parte do mesmo partido, como o PT, por exemplo, e também ligação material com a burocracia acadêmica,

conseguindo bolsas de estudo, dirigindo centros de pesquisas e estudos e, principalmente, impondo divisões nas entidades e nas lutas dos estudantes e trabalhadores das universidades por todo o país para esvaziá-las, conterem o questionamento aos planos do governo, isolarem suas discussões do conjunto dos estudantes e trabalhadores, e preservarem assim seus privilégios materiais e políticos. A atual direção da União Nacional dos Estudantes (UNE) recebe milhões de reais do governo, pois vem se mostrando (ao governo) eficaz no cumprimento desta função. Em 2011 setores a que eles se ligam (no movimento sindical) dividiram o grande movimento nacional de trabalhadores da educação, cujo um dos expoentes foi a greve de 112 dias dos professores estaduais aqui em Minas Gerais. No primeiro semestre de 2012 na FAFICH-UFMG, quando os estudantes se mobilizaram contra o cerceamento dos espaços públicos, e mais especificamente contra o fechamento do Centro Acadêmico de Filosofia (CAFCA), o D.A. FAFICH, que era dirigido por setores ligado ao PT e à UNE, disse que a repressão não era um projeto do governo e sim um ato isolado da diretoria, que deveríamos confiar em uma comissão subordinada à estrutura de poder autoritária da universidade, levando falsas esperanças de que este, que é um projeto nacional, poderia ser revertido por fora de uma intensificação das mobilizações; a comissão não reverteu a repressão e a confiança nesta desmobilizou os estudantes, nos deixando totalmente despreparados para influir na mobilização estudantil nacional dos meses seguintes. Nesse momento levantávamos a necessidade de uma greve nacional para derrotar os projetos do governo, cujo aspecto fundamental também é a grande repressão por todas as universidades (e não só nelas!) do país, enquanto eles nos chamavam de utópicos. Depois, realmente surgiu a greve nacional das universidades federais e nós dizíamos desde o começo desta que seria necessário politizar o debate político no sentido do que colocamos acima para unificar os professores, funcionários e estudantes, dialogar com toda a sociedade, com os trabalhadores, se colocando ao lado da juventude pobre de fora da universidade para assim colocar em xeque os planos do governo, como fizeram e continuam fazendo os estudantes

no Chile e outros lugares do mundo.Como o movimento espontâneo foi forte por todo o país, a direção da UNE tentou capitalizar a discussão por outras vias, dizendo que o problema não eram os planos do governo, que estes na verdade seriam passos iniciais de uma real democratização; que houve “expansão sem qualidade” e que, portanto caberia a nós somente pedirmos (sic) a Dilma um aumento de verbas para a educação, o que depois tentaram dizer que haviam conseguido, quando o governo incluiu no Plano Nacional da Educação (PNE) um imbróglio dizendo que aumentaria a verba para que correspondesse a 10% da educação, até 2020! Tentam nos fazer esperar até 2020 para depois chorarmos sobre o leite derramado. Assim buscam preservar a demagogia do governo, acabar com a greve sem unificá-la nacionalmente enquanto o governo e as reitorias se incumbem de expulsar os que seguem lutando contra os planos do governo através da repressão que reina nacionalmente, além de conseguirem mais votos para seus candidatos ligados aos capitalistas, como é Patrus, em BH. Depois dizem, falseando, que o problema é dos estudantes, que a UFMG é despolitizada e mais um monte de absurdos tentando responsabilizar o conjunto dos estudantes pela desmobilização e pelo beco sem saída articulado por eles mesmos. O mesmo papel também cumpre hoje a atual gestão do nosso DCE, “Onda”. Apesar de não estarem ligados diretamente ao governo e ao PT (mas recebe um apoio não muito bem explicado de conhecido ideólogo da direita brasileira, o jornalista Reinaldo Azevedo), levam a frente um plano de descaracterização do caráter de luta da entidade máxima de organização estudantil na UFMG. Querem cumprir o nefasto papel de imobilizar os estudantes desde o órgão mais importante desses, por exemplo, votando em conselhos diretores em favor da privatização do Hospital Universitário, ou fazendo diversas manobras para minar o apoio à greve. Enquanto a burocracia estudantil se vende no atacado, a gestão “Onda” se vende no varejo.

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Boletim Juventude às Ruas BH / n. 3

POR ISSO É NECESSÁRIO UM MOVIMENTO ESTUDANTIL ALIADO AOS TRABALHADORES, ANTIBUROCRÁTICO, QUE CONCEBA A UNIVERSIDADE NÃO COMO UMA ILHA, SENÃO QUE INTERVENHA NA UNIVERSIDADE A PARTIR DAS PRINCIPAIS QUESTÕES POLÍTICAS NACIONAISSe tivéssemos, na luta contra o fechamento do CAFCA, apostado em seguirmos mobilizados, discutindo e tomando ações políticas contra a repressão e a estrutura de poder da universidade, teríamos nos adiantado à greve nacional, que ao surgir alavancaria ainda mais nosso movimento, pois nos colocaria na mesma posição dos professores e trabalhadores técnicos administrativos que vem sofrendo da mesma forma que os estudantes - passam por repressão, precarização do trabalho, terceirização, defasagem salarial e das condições trabalhistas, ou seja, condições igualmente determinadas pelos mesmos amplos projetos nacionais do governo Dilma. Essa experiência deve servir para tirarmos lições e confiarmos somente na força da mobilização independente de governos, reitorias e diretorias para influirmos na situação política.

LUTAR CONTRA A REPRESSÃO! A estrutura de poder autoritária que é usada para pôr a universidade à serviço do mercado é a mesma que possibilita com que vários estudantes que lutam sejam perseguidos, processados e até mesmo expulsos da universidade. Para se ter uma universidade cujo conhecimento serve aos lucros de empresas privadas e burgueses não se pode ter liberdade de expressão, organização, mobilização, manifestação etc, pois esses princípios são condições fundamentais garantidas para uma universidade que busque desenvolvimento de conhecimento a serviço do povo, dos trabalhadores e da emancipação humana. A repressão do governo é uma realidade nacional aos que se mobilizam, dentro e fora das universidades, pois este quer se preparar para fazer reformas que tirem direitos (como a assistência estudantil nas universidades, por exemplo) do povo e assim descarregarem sobre este os custos da crise capitalista que se aproxima do Brasil. Na UFMG mais especificamente significa a retirada de espaços estudantis, proibição de festas, perseguição e processos aos que lutam ou que se organizam. Igualmente, para nós, lutar contra a repressão é condição para vencermos nossas lutas de agora e estarmos em melhores condições no futuro.

ABAIXO O AUMENTO DO BANDEIJÃO ! FORA FUMP E FUNDAÇÕES! UNIVERSIDADE PÚBLICA COM VERBAS PÚBLICAS, ABAIXO A PRIVATIZAÇÃO E TERCEIRIZAÇÃO! O governo tucano de FHC bem que tentou aumentar o nível de privatização das universidades federais incentivando as fundações privadas; mas com Lula e Dilma esse processo deu passos bem mais largos que antes. O absurdo aumento do bandejão da UFMG, de R$ 2,50 para R$ 4,15, é um grotesco resultado disso, assim como a terceirização em larga escala dos postos de trabalho. Essas fundações, como são FUMP e FUNDEP na UFMG, mas existem muitas outras pelo resto do país, se consolidam dentro da universidade ancoradas na estrutura de poder autoritária desta. Por trás da cortina da tal “meritocracia” há uma enorme farra que transforma dinheiro público em altos lucros privados. Por isso uma condição para revertermos não só esse aumento do restaurante universitário, senão que para lutarmos pela total gratuidade dos restaurantes assim como da moradia é lutarmos contra a estrutura de poder autoritária da universidade e por fora FUMP, Fundep e todas as

fundações privadas das universidades públicas! A abertura de todos os livros de contabilidade da FUMP, o fim o regime universitário autoritário com a dissolução do Conselho Universitário e fim da Reitoria (interventora do governo); com elegibilidade para todos os membros da comunidade acadêmica, onde cada cabeça tenha valor de um voto e, portanto, com maioria estudantil nos conselhos e órgãos de poder na universidade é a única forma de gestão democrática e a favor dos interesses dos estudantes, da juventude e trabalhadores de dentro e fora da universidade.

Devemos lutar por isso já, mas com a perspectiva de fazer dessa luta um exemplo pra maioria dos estudantes da universidade de que é necessário ir além e buscar transformar o caráter da universidade, lutar contra a terceirização (que precariza o trabalho para

aumentar os lucros; humilha e escraviza os trabalhadores) se colocando ao lado desses trabalhadores e lutando pela incorporação dos trabalhadores terceirizados como efetivos da universidade sem necessidade de concurso público, pois já mostram na prática, todos os dias, que são capazes de realizarem o trabalho necessário na função em que assumem; moradia e alimentação gratuitas, porque queremos uma universidade para todos os jovens, trabalhadores, negros e todos que na sua imensa maioria não possuem educação superior pública e gratuita, pois seguem excluídos ou se endividando em universidades particulares, pois o governo oferece o dinheiro público para apropriações privadas de empresários capitalistas, pelo REUNI, pelo PROUNI e pelas fundações privadas baseadas nos privilégios da burocracia que detêm o poder na universidade.

APOIO TOTAL AOS PROFESSORES QUE SE MANTÉM EM GREVE! ABAIXO O CORTE DE PONTOS ÀS CATEGORIAS EM LUTA!

Ainda que o governo tente enfraquecer a greve dos professores das universidades federais (tendo como aliada a imprensa ligada aos capitalistas) esta segue forte em grande parte das instituições de ensino. O fato de alguns cursos voltarem às aulas na UFMG (como História e Filosofia) deve nos fazer fortalecer o apoio de maneira ativa à greve dos professores, ou seja, transformar essa medida (volta às aulas), que os governos e reitorias tentam

usar para enfraquecer a greve, em seu oposto: assembleias amplamente divulgadas, debates, discussões e, fundamentados na consigna de combate aos projetos do governo, mostrarmos que nosso apoio aos professores significa combate a esse caráter de universidade, que buscamos transformar radicalmente através do fim do vestibular e estatização das universidades privadas para que todos tenham o direito de estudar.

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Boletim Juventude às Ruas BH / n. 3

Abaixo reproduzimos artigo do jornal Palavra Operária (http://www.ler-qi.org/spip.php?article3567) sobre debate organizado pelo Sintusp (Sindicato de Trabalhadores da USP). O Sintusp tem como uma de suas atividades militantes a luta contra a ditadura de ontem e hoje. Este sindicato compõe, junto a entidades estudantis e de professores, organizações políticas como a Juventude às Ruas e militantes independentes, a Comissão de Verdade na USP. O Sintusp é agente fundamental para que A CV-USP não fique presa aos entraves colocados pela comissão de verdade criada por Dilma que tem a impunidade como base de sua constituição. A verdade deve ser apurada e fortalecer a luta pela punição dos civis e militares envolvidos com a ditadura militar, contra a repressão na universidade, aos trabalhadores e ao povo.

Na tarde de 9 de agosto, na sede do Sintusp, no campus Butantã, por iniciativa do sindicato se realizou um ato-debate sobre o lançamento da Comissão da Verdade na USP e a luta contra a impunidade dos crimes e criminosos da ditadura militar. Este é um tema nacional que denota duas posições.De um lado o governo federal e os seus seguidores do PT, PCdoB, PMDB e até mesmo a oposição burguesa (PSDB-PPS-DEM) falam em "encontrar a verdade" sobre os crimes perpetrados pelos agentes do Estado no regime militar mas se negam a abrir os arquivos da

ditadura pois sabem que somente assim podem "criar um relato" sem tocar na ferida, isto é, na apuração, julgamento e castigo dos envolvidos - civis e militares, agentes diretos ou mandantes e apoiadores - nas perseguições, cassações, prisões, torturas, mortes e desaparecimentos de militantes e ativistas que resistiram ao golpe militar de 1964 e aos anos de ditadura. De outro estão, principalmente, as famílias de

presos, mortos e desaparecidos que não aceitam "descobrir a verdade" sem punir os responsáveis que seguem livres, impunes e vivendo em ótimas condições e até mesmo em exercício nos órgãos de informação e repressão, nas instituições governamentais, universidades e empresas privadas, inclusive nas redações de jornais e revistas.

A mesa, coordenada por Domenico, estava constituída pela companheira Ângela Mendes, do Coletivo Merlino, que há anos batalha pela apuração, juízo e castigo dos responsáveis pela prisão, tortura e morte do seu ex-companheiro e camarada de militância Luiz Eduardo Merlino em 1971. Esta luta foi responsável por conseguir que a justiça de São Paulo sentenciasse, em foro cível, como torturador o coronel Brilhante Ustra, chefe do DOI-CODI na maior parte do regime militar. Ainda que caiba recurso, esta decisão judicial, fruto da batalha da família Merlino, deixa claro que a impunidade dos agentes da ditadura só pode ser mantida com a cumplicidade do governo federal e dos ditos "progressistas" ligados ao PT, ao PCdoB, PCB e partidos patronais. Também esteve presente o professor e sociólogo Francisco de Oliveira, Magno de Carvalho, diretor do Sintusp,

Mauro Puerro (PSTU) representando a CSP-Conlutas, o professor da USP João Zanetic e Val Lisboa, dirigente da LER-QI.

O professor Chico de Oliveira ressaltou a importância de ligar esta discussão com as perseguições que ocorrem dentro da USP hoje e a >>

uma discussão fraternal com a nova gestão do D.A. FAFICH para o período 2012-2013

PARA FAZER DO DA FAFICH UM INSTRUMENTO DE LUTA DOS ESTUDANTESNo semestre passado nosso DA estava nas mãos de setores da burocracia estudantil, ligados à direção da UNE, entidade diretamente atrelada ao governo, e por isso não foi um instrumento de luta que buscasse integrar os estudantes a partir da necessária luta por um projeto de universidade distinto do que hoje é vigente. Por isso no último processo eleitoral chamamos voto na chapa ligada a ANEL (com membros do PSTU) por ser uma organização estudantil livre do governo. Acreditamos que nossa principal tarefa enquanto movimento estudantil é livrar as entidades de luta dos estudantes, como o DA FAFICH, das cadeias do governo através de estudantes que são agentes diretos deste. Essa segue sendo uma grande necessidade, reverter o estrago causado e fazer do DA FAFICH um instrumento de lutas e liberdade cultural dos estudantes.

Isso não significa que não temos diferenças com a atual gestão. Principalmente no que tange à negativa desses em unificarem todos os estudantes em luta contra o próprio governismo dentro da universidade. Isso se mostrou nas próprias eleições, quando se negaram a unificação com todos os setores anti-governistas na chapa, assim como quando evitaram colocar uma discussão política que mostrasse a necessidade de se lutar por um caráter distinto da universidade, contra o processo de privatização e a repressão do governo, do qual a precarização é consequência, se limitando a dizer que o governo promovia uma “expansão sem qualidade”, o que limitaria a luta dos estudantes a ser levada adiante à ser apenas por “mais qualidade” e com uma

formulação tão abstrata, deixam de lado os problemas concretos mais sentidos na FAFICH pelos estudantes, como a repressão, a retirada dos espaços estudantis, o produtivismo que aliena os bolsistas de seus objetos de pesquisa, as bolsas miseráveis que nós recebemos e a proibição das festas. Isso tudo foi a culminância de um retrocesso da luta pela abertura da porta do CAFCA, onde a atual gestão alimentou falsas ilusões de que uma comissão de “diálogo” com o diretor fosse resolver o problema estrutural da repressão. Afirmaram que os estudantes supostamente não entenderiam se tentássemos elevar o discurso e ir além, e por essa falta de confiança na capacidade de mobilização política, perdemos uma grande oportunidade de ligar nossas demandas especificas com as demandas dos setores que logo em seguida entraram em greve nacionalmente, inclusive estudantes.

Com certeza, a melhor maneira do DA politizar o debate não é evitando em fazer justamente as discussões políticas fundamentais. As campanhas que aqui levantamos, achamos que são fundamentais para retomar o caráter do DA como instrumento de luta dos estudantes. Acreditamos que essa é uma tarefa que ainda pode ser cumprida, pois estamos apenas no início da gestão, e colocamos as ideias e programas aqui citados como contribuição do que achamos que devem ser fortes campanhas a serem priorizadas pelo DA FAFICH.

Ato-debate por uma Comissão da Verdade na USP reúne cerca de 100 trabalhadores e estudantes no Sintusp Por Domenico Colacicco, diretor do SINTUSP

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sua estrutura de poder. Lembrou que a demissão de Brandão, que já vai completar quatro anos, é o maior flagrante das continuidades de uma estrutura e regime autoritários, vigente na USP através do regimento disciplinar de 1972, período da Ditadura Militar. Ressaltou ainda os processos administrativos e criminais que boa parte da diretoria do sindicato está sofrendo por ser um setor consequente dentro da universidade que luta contra a antidemocrática estrutura de poder, onde trabalhadores e estudantes “têm uma representação simplesmente inexistente”.Ângela Mendes, que foi trabalhadora da USP na época da ditadura, num depoimento comovente relatou o momento em que teve que sair da USP, pela forte repressão que tinha se instalado, quando os agentes da polícia apertaram o cerco, procurando-a abertamente pelos corredores da faculdade. Ângela e Merlino eram militantes clandestinos do POC (Partido Operário Comunista) Ângela também denunciou o o processo de criação, pelo governo federal, da Comissão Nacional da Verdade, desmascarando as manobras desde o governo Lula para evitar que se instalasse um comissão de apuração que levasse à verdade e ao juízo dos criminosos da ditadura, o que se comprovou na retirada da palavra “justiça” do nome da comissão, quando o governo aceitou a pressão dos militares a partir da mediação do ministro da Defesa Nelson Jobin.Magno de Carvalho focou nos acontecimentos do pré-golpe de 1964, como a radicalização das ligas camponesas na década de 1950 e do movimento operário que, em sua opinião, se refletia na figura do presidente João Goulart e na sua proposta das “reformas de base”. A burguesia precisava barrar o ascenso da luta de classes e para isso foi buscar alianças com setores da igreja, com o imperialismo norte-americano, colocando o Exército no centro da cena. Por fim, enfatizou que a CNV só tinha sido criada por causa da deliberação da OEA contra o governo brasileiro, senão este

continuaria guardando silêncio para não afetar o pacto com os militares.Logo depois de Magno, interveio Mauro Puerro, representando a CSP-CONLUTAS, saudando a iniciativa do Sintusp e levantando a necessidade de se ampliar o debate e a conscientização da questão para se pressionar a comissão formada pelo governo.Val Lisboa, dirigente da LER-QI, iniciou sua fala elogiando o Sintusp por ser o único sindicato do país a tomar iniciativas como essa. Remetendo ao processo de transição da ditadura disse: “Fala-se de costume que a ditadura do PRI (Partido Revolucionário Institucional) no México, cooptando por mais de 60 anos as organizações operárias e populares, foi a ditadura perfeita. Acredito que podemos dizer que no Brasil assistimos a transição perfeita”. A analogia remetia diretamente ao papel que cumpriram as organizações de esquerda, as direções sindicais e partidos concliadores desde o início do processo de transição, com o PCB à frente no MDB pela aprovação do pacto que se configurou na Lei da Anistia de 1979 que garante até hoje a impunidade dos militares, torturadores e mandantes, numa aliança que envolvia o regime militar, setores da Igreja católica, MDB, Arena e o imperialismo norte-americano.Defendeu a necessidade da esquerda e as organizações sindicais fazerem uma profunda autocrítica sobre nunca terem tomado a bandeira de punição aos militares de maneira concreta, deixando no decorrer dos anos esta luta nas mãos dos familiares das vítimas com suas

escassas forças. A prova cabal da aliança do PT (e PCdoB) no pacto de transição com os militares e a burguesia pode ser encontrada na própria ascensão de Lula e do PT ao governo federal e a convivência pacífica com os militares em nome da impunidade dos crimes do regime militar. Também lembrou que a impunidade e o peso do regime militar pode ser visto nessas eleições quando encontraremos militares da PM, como o comandante da operação de desocupação da Reitoria e o ex-comandante da Rota, lançando-se candidatos. Aproveitou para chamar o movimento estudantil, as organizações da USP, da esquerda, da CSP-Conlutas e as personalidades democráticas a lançar uma campanha de denúncia dessas candidaturas e seus partidos.Val Lisboa terminou propondo ligar a luta pela punição dos militares, torturadores e empresários que apoiaram a ditadura com a luta contra a punição aos 73 estudantes processados pela reitoria da USP e os diretores do Sintusp, exigindo a retirada dos processos e a reintegração de Brandão. Lembrou aos estudantes presentes a necessidade de que o XI Congresso dos Estudantes que se realizará ainda neste mês deveria levar adiante a luta pela democratização radical da universidade, abrindo o debate sobre a instalação de uma Estatuínte Livre e Soberana, sem a ingerência da burocracia universitária, para refundar em bases democráticas a universidade para que possa estar a serviço dos trabalhadores, do povo pobre e suas lutas.

João Zanetic, representando a ADUSP, último debatedor da mesa, aprofundou os casos de repressão que ocorreram na época da ditadura dentro da USP, relembrando o caso do cancelamento do congresso da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e a demissão, pelo Instituto de Química, da professora Ana Rosa Kucinski, sequestrada e morta pela Ditadura Militar na década de 1970.O final foi marcado pela emocionante intervenção de dois representantes dos povos originários da região amazônica que estão lutando para denunciar o massacre que os militares efetuaram contra as tribos indígenas no período da ditadura militar. Concluiram dizendo que “saíram do Acre procurando organizações e movimentos que pudessem apoiar a causa deles por todo o país, vieram até São Paulo procurando organizações de direitos humanos e encontraram o Sintusp”.Após intervenções de trabalhadores, do companheiro Brandão que propôs avançar o debate sobre a luta pela revogação da Lei da Anistia, e da saudação da professora Lúcia Skromov (criadora do Comitê Pró-Haiti), encerrou-se o ato-debate com a certeza de que foi uma importante iniciativa do Sintusp para colocar na ordem do dia a luta contra a impunidade dos crimes da ditadura e por uma comissão da verdade, memória e justiça na USP.

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MANIFESTO COMUNISTA PARA TRABALHADORAS E TRABALHADORES

Publicamos a seguir artigo de Claudionor Brandão, militante da LER-QI, diretor do SINTUSP e atualmente demitido político, que coordenou o grupo de estudos sobre o Manifesto Comunista para trabalhadores, em São Paulo. O Grupo de estudos contou com dezenas de trabalhadores da USP, terceirizados, carteiros, metroviários, professores, bancários, além de trabalhadores do ABC paulista e de outras categorias e familiares. A volta de greves que atingem grandes setores da classe trabalhadora no funcionalismo público e as novas medidas preparatórias que o governo Dilma implementa frente à crise capitalista como projetos de privatização, maior flexibilização trabalhista, demissões apontam para fatos políticos muito novos para uma geração que se formou em anos de crescimento econômico e forte consumismo. Cada vez mais aparecem palavras novas no vocabulário da juventude estudantil e operária no Brasil como arrocho salarial, lay off, demissões, inflação, endividamento. O estudo das ferramentas teóricas necessárias para a compreensão das principais contradições sob as quais segue estabelecido o modo de produção capitalista, e que trazem mais uma vez à tona estes termos, faz-se necessário para todos aqueles que se colocam a perspectiva da transformação social. Claudionor Bandão partiu de contextualizar o estudo do Manifesto Comunista frente uma situação marcada pela principal crise capitalista desde 1929, mostrando como as definições

feitas por Marx e Engels em 1848 seguem vigentes em sua essência. Como já desenvolvemos em outros números do boletim Juventude Às Ruas/UFMG, a atual crise capitalista prepara novos e grandiosos fenômenos políticos, econômicos e sociais que apenas a teoria marxista, historicamente, conseguiu analisar suas estruturas fundamentais para preparar a classe operária e a juventude com uma política de independência de classe. O estudo teórico em nossos dias que parta de compreender as contradições sociais entre as classes fundamentais e que se coloque o compromisso militante de transformação social é o que viemos desenvolvendo nas sessões do Grupo de Estudos Marx-Lênin-Trotsky na FAFICH da UFMG. Após uma primeira etapa de estudos e debates sobre o Manifesto Comunista, o GMLT entrará neste semestre em sua segunda etapa, com a discussão do escrito “Imperialismo, fase superior do capitalismo”, do revolucionário marxista russo Lênin. Convidamos a todos os estudantes que discutem com a Juventude Às Ruas e que tenham interesse pelo marxismo a participarem das sessões do GMLT.

Nos dias atuais, em que uma grave crise de econômica, similar à aberta em 1929, vem evidenciar o aprofundamento da total e irreconciliável contradição existente entre o modo de produção capitalista, em franca decadência, e as forças produtivas despertadas desde a época do desenvolvimento e da consolidação do próprio capitalismo como novo modo de produção, uma tarefa especial se destaca dentre as muitas tarefas importantes colocadas para os revolucionários; esta é a tarefa de promover o reencontro ideológico da vanguarda, e depois também das massas oprimidas, com a estratégia da revolução socialista, e com o horizonte do comunismo.

Daí a importância de reunir setores da vanguarda operária, para estudar e discutir o conteúdo do Manifesto Comunista de Marx e Engels, escrito há mais de 160 anos, mas que será sempre atual enquanto vivermos sob a opressão da sociedade capitalista. Nestes dias em que a burguesia lança mão de todos os meios que dispõe para tentar convencer o proletariado e as demais classes exploradas e oprimidas, de que elas não têm outra saída a não ser o desaparecimento na barbárie resultante da ruína para onde o capitalismo agonizante segue arrastando toda a humanidade, é não só possível, mas também, necessário resgatar a historia da luta de classes e demonstrar para a vanguarda e às massas que existe sim outra saída e que essa saída é perfeitamente viável, pois depende tão somente da ação consciente, organizada e revolucionaria das classes exploradas e oprimidas.

É possível e necessário ensinar à vanguarda operaria e às próprias massas, a historia da

própria burguesia, que, na sua época, ante a decadência e a ruína da nobreza, do clero e do seu modo de produção feudal, se ergueu como classe revolucionaria, tomou o poder político e ofereceu à humanidade um novo modo de produção que não só superou o feudalismo decadente, mas também permitiu um impulso e um desenvolvimento, até então inimaginável, das forças produtivas. O legado científico de Marx e Engels, contido no Manifesto, nos ensina que nada do existe foi obra de alguma divindade, e que, ao contrário, é produto do desenvolvimento histórico das diferentes formas de organização social experimentadas pela humanidade. O Manifesto ensina e permite ensinar, que a opressão e a exploração a que o proletariado está submetido sob o modo de produção capitalista, assim como todas as crises, miséria e barbárie decorrentes disso, foram produtos da vitória da luta revolucionaria da burguesia, organizada como classe ascendente, contra a nobreza e seu modo de produção feudal, ou seja; da vitória da burguesia em sua época revolucionaria, contra a nobreza e clero decadentes, emergiu o capitalismo em substituição ao feudalismo.

A compreensão desse fato pelos trabalhadores, ganha importância de primeira magnitude, pois permite compreender também que se a burguesia, quando foi classe revolucionaria, pôde conduzir o feudalismo à sepultura e impor o seu novo modo de produção, o proletariado enquanto nova classe revolucionária, pode da mesma forma conduzir o capitalismo decadente à sepultura e erguer sob suas ruínas um novo modo de produção alternativo à barbárie e à exploração e opressão capitalista, ou seja, o

modo socialista de produção. Este, por sua vez, será somente a transição para uma sociedade nova, completamente livre dos entraves morais, ideológicos, políticos que um mundo regido pelo lucro nos impõe. Uma sociedade comunista, onde, como Marx já dizia: “De cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades”.

Contra a fatalidade histórica apregoada pela propaganda burguesa, o manifesto opõe a ação consciente das classes em luta. Contra as teses dos que, no passado pretendiam reformar o capitalismo e dos que no presente pretendem humanizá-lo, o manifesto opõe a tomada revolucionaria do poder pelo proletariado em escala mundial, a abolição das fronteiras nacionais e a expropriação de todos os meios de produção, como condição para planificação da economia e para liberação das forças produtivas em todo o seu potencial. Com essa perspectiva, de ajudar amplos setores da vanguarda a romperem o domínio ideológico a que estão submetidos pela propaganda anticomunista desenvolvida pela burguesia, por mais de oito décadas, a reconquistarem a confiança na luta de classes e abraçarem a esperança no futuro comunista da humanidade, que estamos tentando fazer com que o maior número possível de trabalhadores se apropriem dos ensinamentos do Manifesto Comunista e entendam porque e para que os proletários de todo o mundo devem se unir.

Depoimentos de trabalhadores e trabalhadoras que estão participando do grupo de estudos sobre o “Manifesto Comunista”:

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“O curso sobre o manifesto comunista que estou fazendo com diversos companheiros da LER-QI, tem superado minhas expectativas. Primeiro no sentido de mostrar a imensa importância do manifesto, além de ser um documento extremamente atual, o curso dissipou um preconceito meu, onde julgava o manifesto como sendo escrito de uma forma panfletária. Pelo contrario, passamos em um documento sucinto a ter uma visão geral de como se formou e atua as classes burguesa e operária. Ao contrario, o curso nos revela o manifesto como um dos documentos primordiais para a formação de nossa classe. Muito importante ressaltar, que a leitura e releitura do manifesto se faz muito mais proveitosa quando é acompanhada de discussão criando para mim um grau muito maior de entendimento, para mim está sendo essencial esse formato do curso.” André, trabalhador da USP

“O Manifesto Comunista é um documento que embora tenha mais de cento e cinquenta anos é muito atual e importante para a classe trabalhadora, de modo que me atrevo dizer que deveria ser disciplina obrigatória em escola pública. Isso ajudaria à juventude a desmistificar o surgimento da classe trabalhadora e, também colaboraria com a formação política/critica de toda uma geração de trabalhadores. Os ensinamentos do Manifesto são de uma importância a qual se renovam através dos anos, explicando de maneira clara e objetiva os acontecimentos históricos do surgimento da classe trabalhadora e como isso se desenvolve nos dias atuais.” Eusébio, trabalhador da USP

“O curso sobre o Manifesto Comunista tem sido essencial para meu entendimento histórico sobre o surgimento do capitalismo, do comunismo, das classes e da luta entre elas. A leitura e discussão com os companheiros têm sido muito importantes para esse entendimento e também para a visualização da atualidade do manifesto. Além disso tudo, tenho percebido com o decorrer

do curso, que a teoria é imprescindível para uma prática coerente.” J, trabalhadora da USP

“Entramos agora na segunda metade do estudo sobre o Manifesto Comunista e me foi surpreendente a atualidade deste texto escrito há mais de 160 anos. Obtivemos um olhar histórico sobre os conflitos entre as classes oprimidas e os opressores, pudemos entender que os conflitos e as grandes mudanças/revoluções não acontecem o aconteceram ao acaso, mas por grandes mudanças nos meios de produção e nas relações de trabalho. O trabalho é essencial para a vida do trabalhador. Os problemas e as dificuldades dos trabalhadores não podem ser vistos como uma questão pessoal, como muitos trabalhadores vêem ainda, infelizmente. Há toda uma herança histórica para a condição oprimida dos trabalhadores. Somente uma união maciça entre trabalhadores de todos os setores da produção capitalista e de todos os países do mundo possibilitará vencer esta exploração capitalista do trabalhador. No âmbito da USP, onde trabalhamos, vemos cada vez mais ataques contra os estudantes e trabalhadores. O direito democrático dos trabalhadores e estudantes se organizarem em sindicatos e diretórios acadêmicos para lutarem com força política contra o projeto neoliberal, elitista e excludente de privatização da universidade pública é cada vez mais criminalizado por um reitor imposto pelo governo estadual conservador com largo apoio da mídia e da polícia militar (criada na época da golpe militar). Todos estes a serviço das classes dominantes, dos interesses das grandes indústrias, do capital. Em suma, este curso foi para mim muito importante. Foi um elemento organizador dos meus anseios para uma sociedade justa e igualitária. Um elemento importante para contrapor a idéia difundida pelos meios de comunicação que defendem “o fim da História”, ou seja, o fim dos conflitos, o fim da luta de classes, a vitória soberana do poder daqueles poucos que detêm os meios de produção e da exploração sem fim das

classes trabalhadoras. É muito importante que este Manifesto escrito no longínquo ano de 1848 seja difundido mais e mais por toda a classe trabalhadora. Nas famílias, nos sindicatos, nas escolas, nas periferias. Todos nós que dele tomamos conhecimento mais aprofundado, passamos a ter responsabilidade de divulgá-lo o máximo que pudermos para conseguirmos combater a exploração do homem pelo homem, a má distribuição de renda que gera tanto a fome como o desperdício.” R, trabalhador da USP

“Eu acho que a aprendizagem do curso é muito boa, porque além da gente tá relembrando o passado, a gente tá também aprendendo com o passado, que mudou muitas coisas, que ficou melhor pra burguesia, mas para os trabalhadores tá tudo na mesma, só o que muda é como funciona o feudalismo pro capitalismo, mas em termo de como foi o surgimento, de porque aconteceu, é sempre o crescimento em cima dos trabalhadores, e nos estudos a gente vai lembrando como a gente vai poder aprender a luta pelos nossos direitos e direito de todos. O que me chama muita atenção no livro é que eles vão mudando, vai tendo a melhoria de cargos, dessas coisas, e penso que deve ser exemplo e que aqui poderia ser como é na fabrica de Zanon, todo mundo recebendo o mesmo salário, fazendo todas as coisas. Poderia ser um exemplo pra gente no mundo inteiro. Lendo o manifesto, penso que se não lutarmos pros nossos direitos, vai tudo ser a mesma coisa, porque a burguesia tem muito poder e vai fazendo do jeito que quer. O manifesto tá sendo uma lição pra gente, quanto mais a gente estuda, mais a gente vê coisa importante para que tenha forca de vontade de luta pelo mundo inteiro, porque não é só Brasil, Estados Unidos, mas um mundo inteiro que passa as mesmas coisas.” Silvana, ex-trabalhadora terceirizada da USP que participou da greve da Dima em 2007

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72 DO ASSASSINATO DE LEON TROTSKY

Em 21 de agosto de 1940, Leon Trotsky – ex-presidente do soviet de Petrogrado (São Petersburgo), dirigente do exército vermelho e do partido bolchevique, teórico e ideólogo do movimento marxista revolucionário e fundador da IV Internacional – foi assassinado pelas mãos de um enviado de Stalin (um agente da GPU, polícia secreta stalinista) durante seu exílio forçado no México. Para nós, nada melhor para homenagear este grande revolucionário, que trabalhou durante quase toda a sua vida, inclusive nas condições mais adversas, para prover a classe trabalhadora dos fatores subjetivos e objetivos para sua emancipação, do que nos apropriarmos das suas lições históricas. Neste sentido, reproduzimos abaixo trechos traduzidos de um escrito de

Trotsky de 1931, em pleno estouro da guerra civil espanhola, chamado La revolución española y la táctica de los comunistas, onde Trotsky polemiza com as principais direções do conflito, inclusive com Andrés Nin (dirigente do POUM, também assassinado pelo GPU stalinista. Dos seus arquivos pessoais foi resgatado este escrito de Trotsky), com o qual Trotsky mantinha boas relações pessoais. Nesse momento atual de crise econômica, onde se retomam os traços clássicos do período imperialista, em que, inclusive no próprio estado espanhol, se retomam as perspectivas estratégicas do autonomismo e do anarquismo, achamos de importância vital relembrarmos o legado teórico sobre este assunto deste grande revolucionário.

“A cadeia do capitalismo se vê de novo ameaçada em romper-se no seu elo mais débil: chegou a vez da Espanha. O movimento revolucionário de desenvolve neste país com uma força tal que priva de antemão a reação internacional da possibilidade de crer em um rápido restabelecimento da ordem na península Ibérica.

Indiscutivelmente, o Estado Espanhol pertence ao grupo dos países mais atrasados da Europa. Mas seu atraso tem um caráter peculiar, determinado pelo grande passado histórico deste país. Enquanto a Rússia dos czares sempre se encontrava muito atrasada em relação aos seus vizinhos do Ocidente e avançava lentamente e sob pressão, o Estado Espanhol conheceu períodos de grande florescimento, de superioridade sobre o resto da Europa e de domínio sobre a América do Sul. O poderoso desenvolvimento do comércio interior e mundial vencia o isolamento feudal das províncias e o particularismo das regiões nacionais do país. O aumento da força e da importância da monarquia espanhola se encontrava indissoluvelmente ligado àqueles séculos determinados pelo papel centralizador do capital comercial e a formação gradual da nação espanhola” (cap. 1, A velha Espanha)

“As contradições dentro do exército correspondem normalmente aos distintos batalhões. Quanto mais qualificado é o batalhão, quanto mais inteligência se exige da parte dos soldados e dos oficiais, mais aptos são estes para assimilar as ideias revolucionárias. Enquanto a cavalaria se inclina habitualmente pela monarquia, os artilheiros se aliam às fileiras de republicanos. Não há nada de surpreendente que a aviação, esse novo corpo, tenha se posto do lado da revolução e trago para esta os elementos de aventureirismo individualista próprios destes. Porém, a última palavra deverá ser dita pela infantaria.” (cap. 2, O exército espanhol e a política)

“A vida social do Estado Espanhol está fadada à mover-se em um círculo vicioso enquanto não exista uma classe capaz de tomar em suas mãos a solução dos problemas revolucionários. A entrada do proletariado espanhol na arena histórica muda radicalmente a situação e abre novas perspectivas. Para entendermos plenamente este fenômeno, devemos observar antes de tudo que a segurança da dominação econômica da grande burguesia e o crescimento da importância política do proletariado privou definitivamente à pequeno

burguesia da possibilidade de ocupar um posto dirigente na vida política deste país. A questão de saber se estas sacudidelas revolucionárias atuais podem conduzir a Espanha a uma verdadeira revolução capaz de transformar as bases da existência nacional, se reduz, por conseguinte, em saber se o proletariado espanhol é capaz de tomar em suas mãos a direção da vida nacional. Na nação espanhola não há outro pretendente a este papel. A experiência histórica da Rússia nos mostrou nestes tempos de um modo bastante evidente o peso específico do proletariado, concentrado espacialmente pela existência da grande indústria, em um país com uma agricultura atrasada, presa nas redes de relações sociais semi-feudais.” (cap. 3, O proletariado espanhol e a nova revolução)

“Para arrancar aos camponeses do localismo e das influências reacionárias, o proletariado tem necessidade de um programa revolucionário-democrático claro. A falta de terras e de água, a escravidão do arrendamento, colocam como ordem do dia a confiscação das grandes propriedades agrárias em benefício dos camponeses pobres. As cargas fiscais, as dívidas insuportáveis do Estado, a rapina burocrática e as aventuras africanas colocam

no seu lugar a questão do governo barato, o qual poderia ser estabelecido, não pelos proprietários dos latifúndios, os banqueiros, os industriais e os nobres liberais, senão pelos trabalhadores mesmo.

A dominação do clero e as riquezas da Igreja colocam um objetivo democrático claro: separar a Igreja do Estado e desarmá-la, cedendo suas riquezas ao povo. Essas medidas decisivas serão apoiadas inclusive pelos setores mais supersticiosos do campo quando se convençam de que as quantias destinadas até hoje para a Igreja, o mesmo que as riquezas desta, não irão parar, depois da secularização, nos bolsos dos liberais livre pensadores, senão que estarão destinadas à fecundação da economia campesina exaurida.

(…)Pode esperar-se que a revolução espanhola salte por cima do período do parlamentarismo? Teoricamente, tal possibilidade não está excluída. Se pode supor que o movimento revolucionário alcançara, em um período relativamente breve, uma força tal que não deixará às classes dominantes nem tempo nem lugar para o parlamentarismo. Sem dúvida, uma perspectiva tal é pouco provável. O proleta- >>

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riado espanhol, apesar de suas excelentes qualidades combativas, não conta ainda com um partido revolucionário reconhecido entre as massas nem com a experiência da organização soviética. Além disso, entre as fileiras comunistas, pouco numerosas, não há unidade, nem um programa de ação claro e admitido por todos. Deste modo, a questão das 'Cortes' têm sido posta na ordem do dia. Nessas condições, temos que observar que a revolução terá que passar por uma etapa parlamentarista. Isso não exclui de nenhum modo a tática de boicote com respeito às Cortes fictícias de Berenguer, do mesmo modo que os trabalhadores russos boicotaram com sucesso a Duma de Buliguin em 1905 e conseguiram levá-la ao fracasso. A questão tática relativa ao boicote deve resolver-se sobre a base da correlação de forças em cada etapa dada da revolução.” (cap. 4, O programa da revolução)

“Na realidade, apesar das poderosas proporções tomadas pela luta, os fatores subjetivos da revolução – partido, organização das massas, consignas – se encontram extraordinariamente atrasados em relação às tarefas do movimento, e este atraso é hoje o seu principal perigo. O desenvolvimento semi-espontâneo das greves, determinando sacrifícios e derrotas, ou terminando em nada, constitui uma etapa completamente inevitável da revolução, um período de despertar das massas, de sua mobilização e sua entrada em luta. Não podemos esquecer que tomam parte do movimento não só a “elite” dos trabalhadores, senão toda a massa extremamente explorada. Vão à greve trabalhadores das fábricas, mas também artesãos, choferes, padeiros, trabalhadores da construção, e finalmente, os assalariados diaristas agrícolas. Os veteranos exercitam seus músculos, os novos recrutas aprendem a

lutar. Através destas greves a classe começa a sentir-se classe.

De qualquer modo, o que na etapa atual constitui a força do movimento – seu caráter espontâneo – pode converter-se amanhã em sua debilidade. Admitir que o movimento siga adiante entregue à si mesmo, sem um programa claro, uma direção própria, significaria admitir uma perspectiva sem esperanças. Não podemos esquecer que se trata nada menos que da conquista do poder. Mesmo as greves mais turbulentas, mais frequentes, não podem resolver este problema. Se no processo da luta, o proletariado não tiver a percepção da clareza de seus objetivos e de seus métodos, de dar robustez e coesão às suas fileiras, se iniciará inevitavelmente a desmoralização. Os mais amplos setores, impulsionados pela primeira vez pelo atual movimento, cairão na passividade. Na vanguarda, à medida em que sintam o chão desabar sobre seus pés, começarão à serem retomadas as ações de grupos isolados e os aventureirismos em geral. Neste caso, nem os camponeses, nem os pobres urbanos encontrariam um bom direcionamento. As esperanças inflamadas se converteriam rapidamente em desengano e exasperação. Se criaria na Espanha uma situação até certo ponto parecida com a da Itália depois do outono de 1920. Se a ditadura de Primo Rivera não foi uma ditadura fascista, senão uma ditadura de camarilhas militares tipicamente espanhola, que se apoiava em determinados setores das classes possuidoras, no caso de produzirem-se as condições acima indicadas – passividade, atitude passiva do partido revolucionário e um caráter espontâneo do movimento de massas –, na Espanha poderá surgir um terreno propício para um tipo de fascismo autêntico. A grande burguesia poderia apoderar-se das massas pequeno-burguesas, solapadas de sua estabilidade, decepcionadas e desesperadas, e

dirigir toda a sua indignação contra o proletariado. Hoje ainda estamos muito longe disto. Mas não há tempo á perder.” (cap. 5, Comunismo, anarco-sindicalismo, socialdemocracia)

Prinkipo, Turquia24 de janeiro de 1931

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Neste período de eleições municipais, diversos candidatos, desde os reformistas bem intencionados, até de partidos bem mais atrelados ao regime e ao status quo, chamam a juventude à influenciar a situação política, a serem sujeitos. Em suma, chegam dizendo da necessidade de “uma juventude militante”, para “transformar a sociedade”. Para dialogar com esta conjuntura irônica, e ao mesmo tempo apresentar a nossa visão de militância e política, reproduzimos abaixo um texto originalmente publicado no periódico Revolución, difundido pela Juventude do PTS (Partido del Trabajadores Socialistas, organização irmã da LER-QI na Argentina. Para saber mais visite http://www.pts.org.ar).

E tu, porque não militas? (Che, ¿y vos por qué no militás?)Cristina e seus amigos do governo têm tentado tomar como mérito próprio um suposto regresso da juventude à militância. Buscaram apoiar-se nesse tipo de discurso que se fazia contra o “não se meta”, o “algo será feito” e todos esses tantos prejuízos herdados da ditadura de Videla. Era o início do novo “mito” da militância Nac & Pop. Temos que dizer de todas as formas à estes jovens, homens e mulheres kirchneristas, que isso tudo não é nenhuma novidade. Da parte do governo não é mais que uma manobra de cooptação da juventude para o seu próprio projeto político. Nós jovens já voltamos a política muitos anos antes, deixando mais de 30 mortos na Praça de Maio, em dezembro de 2001, derrubando 5 presidentes em uma semana, colocando em pé assembléias populares, participando dos movimentos de desempregados, ocupando fábricas e colocando-as para produzir, como em Brukman e Zanon. O paradigma antipolítico do neoliberalismo não foi posto em questionamento quando quiseram os K, senão um década atrás, abrindo o processo político que hoje estamos vivendo. A pergunta que nos surge a todos é: uma juventude militante à serviço de quê? Porque a palavra militância não é uma abstração, não se pode reivindicar “a militância” em si mesma. Quando o kirchnerismo fala em militância, o faz para pô-la à serviço de seu modelo “nacional e popular”, ou seja, uma atividade política dirigida desde o Congresso e a Casa Rosada, construída de cima para baixo. É este modelo de militância de que falam os K, onde nós, jovens, teríamos que dedicar nossa vida para recompôr o Estado que uma parte dessa mesma geração pôs em questionamento, trocando o “fora todos!”1 de 10 anos atrás, pelo “nunca menos” de hoje.

Mas o governo tem muitas outras coisas das quais poderia fazer bandeiras, embora de acordo com a premissa do duplo discurso, não parece ser boa opção utilizá-las. A onda Nac & Pop ainda não chegou a um ponto tão alto de cinismo, mas o governo seguramente poderia gabar-se orgulhosamente de garantir lucros milionários para um punhado de empresários, e defender isso como princípio, com unhas e dentes. Na Argentina do crescimento econômico, se atam os destinos do país ao monocultivo de soja dos proprietários de terra e às atividades de extração de recursos naturais, enquanto se reprime com violência aos povos originários que defendem suas terras ancestrais das mega-mineradoras, das petroleiras e da soja. Na Argentina da inclusão social se paga muito menos, em situações mais precárias, à ampla maioria dos trabalhadores que são terceirizados ou com contratos temporários, e temos uma legislação trabalhista herdada do menemismo2 e que este governo não modificou nem um pouco.

Cristina Kirchner não deve em nada aos melhores expoentes da direita quando se lança contra os trabalhadores do metrô em greve, e não abre a boca sobre os subsídios milionários que envia à Igreja Católica, enquanto milhares de escolas por todos os lados do país não contam com a infra-estrutura mais elementar para garantir educação pública e de qualidade. O governo pode ficar contente em entregar a “Asignação Universal por Filho”, mas a realidade é que destina o triplo desse valor em dinheiro para cumprir com os vencimentos da dívida externa, dívida esta que essas mulheres e seus filhos não contraíram mas vão seguir pagando até a morte, e que representam o seu submetimento às vontades políticas dos donos do mundo, os grandes capitais internacionais. Longe do que clamam o coro de cínicos e entusiastas do 678 e Carta Abierta3, vivemos em um país onde a injustiça, a desigualdade e a opressão são humilhantes. A injustiça de ter que trabalhar como uma mula a vida inteira e receber como recompensa uma aposentadoria miserável; ou de ser terceirizado e

receber metade do salário de um funcionário efetivo pelo mesmo trabalho. A desigualdade que faz com que tipos como Ricardo Fort4 gastem milhares de dólares em uma única noite ostentando uma opulência repugnante enquanto os trabalhadores da sua indústria têm a vida entregue fazendo horas extras para poder chegar ao final do mês; a desigualdade que faz com que um punhado de burocratas e empresários desfrutem de vidas milionárias enquanto milhões se arrastam na lama. A opressão que se infiltra como veneno em todos os âmbitos de nossa vida, condicionando nossa sexualidade à heteronormatividade, pretendendo que as mulheres sejam escravas do lar e da família, e que se tenha que fumar escondido um baseado nas praças para não ser pego pela polícia, detido e escorraçado.

O governo nacional busca uma militância jovem que se resigne ante esta infâmia, que não a moleste. Pretendem com a Asignação Universal por Filho esconder a falta de acesso à moradia digna que sofrem mais de 10 milhões de pessoas, e para todos aqueles que queiram denunciar este engodo existe a ameaça de que te matem à tiros, como fizeram em Jujuy e no Indoamericano. Paro os que não se conformam com o “nunca menos” o governo também tem seu arsenal preparado. Seus brutamontes sindicais, verdadeiros policiais da ditadura patronal nos locais de trabalho, se encarregam de manter a ordem mediante a violência e a intimidação, situação que com o assassinato de nosso companheiro Mariano Ferreyra encontrou sua máxima expressão5. O governo persegue e reprime a todos que estão a sua esquerda, e o faz com muito mais vigor do que expressa contra os empresários genocidas aos quais garante enorme lucros. Mas para a esquerda do que está o governo não existe nenhuma barreira. Os mais de meio milhão de votos que obteve a Frente de Esquerda (FIT – Frente de Izquierda e de los trabajadores) nas eleições primárias é uma clara mostra deste fato. A expressiva participação da esquerda neste processo é o resultado de ser uma referência viva nos processos reais do movimento estudantil e da classe trabalhadora. Não é um produto mediático, tampouco um “milagre”. É fruto de uma militância cotidiana, bancando no dia a dia nossas bandeiras.

No lado contrário, desde o governo pretendem que fiquemos à esperar enquanto eles solucionam as coisas. Mas, como souberam dizer os estudantes do Maio Francês, nós somos demasiado jovens para esperar. Desde a Juventude do PTS buscamos declarar guerra à todas as injustiças cometidas não somente por este, mas por todos os governos; estamos em guerra contra esta sociedade capitalista organizada para que poucos vivam do trabalho de muitos; buscamos subverter todas as ordens existentes e para isso também lutamos contra qualquer regulamentação que nos imponham sobre nossos corpos e nossas vidas; estamos contra o individualismo raivoso que é comumente difundido, e que visa culminar em uma vida organizada como uma corrida entre lobos, onde a pessoa que temos ao lado é ou um competidor ou uma mercadoria, e onde o único amor possível é o socialmente aceito, condenando milhares de homossexuais, lésbicas, bissexuais e transsexuais à terem que esconder seu amor e seu desejo na escuridão de um closet. Nós militamos para pôr em pé toda uma nova geração trabalhadora e estudantil que seja o aríete da História, não da História morta que se conta através de placas e estátuas, mas da História viva dos trabalhadores, quando se colocam a andar com os passos de homens e mulheres livres. Nós militamos pela organização desde as bases, pelo poder dos trabalhadores, pela revolução socialista, por uma sociedade sem exploradores nem exploradores. Não militamos para gerir a pobreza, nem para aceitar as coisas como são, senão que para transformá-las radicalmente. Militamos, desde as bases e desde agora, por uma nova sociedade e por novos valores revolucionários. E tu, porque não militas?

notas:1- Que ficou conhecido pela sua importância histórica em todo o mundo, cuja tradução é “Que se vayan todos!”. O “Nunca menos” é uma das consignas centrais da campanha política de Cristina Kirchner, para se referir à uma política salarial que supostamente nunca reduziria o já reduzido salário dos trabalhadores.

2- O governo de Menem(1989-1999), aplicou vários ajustes à legislação trabalhista, por exigência do FMI, para receber os pacotes de resgate à crise da dívida pública no final da década de 90 e no início dos anos 2000.

3- 678 é um programa jornalístico da televisão argentina que se propõe a criticar o que divulga a mídia de massa. Carta Abierta é um coletivo de intelectuais argentinos organizados desde 2008, apoiadores do governo Kirchner.

4- Conhecido filho de um grande industrial do chocolate na Argentina(dono da Felford

Chocolate Company), famoso por aparecer frequentemente na televisão argentina.

5- Para saber mais sobre o caso do assassinato do jovem militante do PO(Partido Obrero), que lutava contra a precarização trabalhista, veja em http://www.pts.org.ar/spip.php?mot239.

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