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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 516 (ano VIII) (11/01/2016) ISSN - - BRASÍLIA ‐ 2015 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – -

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 516

(ano VIII)

(11/01/2016)

 

ISSN- -  

 

 

 

 

 

 

 

 

BRASÍLIA ‐ 2015 

Boletim

Conteú

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rídico-ISSN

–-

 

 

 

 

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Boletim Conteúdo Jurídico n. 5

16 de 11/01/2016 (an

o VIII) ISSN

 ‐ 1984‐0454 

ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

BoletimConteudoJurıdico

Publicação

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

11/01/2016 Rômulo de Andrade Moreira 

» O Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça não pode legislar em 

matéria processual

ARTIGOS 

11/01/2016 Flávia Barbosa da Silva » Coisa julgada: conceito e natureza jurídica e coisa julgada formal e material 

11/01/2016 Edenildo Souza Couto 

» Proteção aos direitos fundamentais no Estado de coisas inconstitucional 

11/01/2016 Bruno Machado Tavares 

» A usucapião de terreno em tamanho inferior ao lote mínimo estabelecido pelo município 

11/01/2016 Maykell Felipe Moreira 

» A problemática da 'resposta única' em provas dissertativas de concursos públicos e a ilegalidade 

da sua cobrança frente à abordagem de temas não pacíficos, sem prévia indicação no edital quanto 

às linhas bibliográficas a serem adotadas 

11/01/2016 Jaques Bushatsky 

» Lei do inquilinato e o Novo Código de Processo Civil: breves e iniciais considerações 

11/01/2016 João Paulo Monteiro de Lima 

» Desconsideração da personalidade jurídica: da construção jurisprudencial ao novo Código de 

Processo Civil 

MONOGRAFIA

11/01/2016 Pamilla Correia de Araújo Felix » Indignidade de único herdeiro descoberta após a transmissão de todo o patrimônio 

 

 

 

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O CONSELHO NACIONAL DE PROCURADORES GERAIS DE JUSTIÇA NÃO PODE LEGISLAR EM MATÉRIA PROCESSUAL

RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA: Procurador-Geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos na Bahia. Foi Assessor Especial da Procuradoria Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador - UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCrim. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação dos Cursos JusPodivm (BA), Praetorium (MG), IELF (SP) e do Centro de Aperfeiçoamento e Atualização Funcional do Ministério Público da Bahia.

“Faz muito tempo que nem tudo aquilo que acompanhamos com a consciência de nossa liberdade é realmente consequência de uma decisão livre. Fatores inconscientes, compulsões e interesses não dirigem apenas nosso comportamento, mas também determinam nossa consciência.” (Hans-Georg Gadamer, Hermenêutica da Obra de Arte. Trad. Marco Antonio Casanova. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 49-50).

A Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgão integrante do Grupo Nacional de Direitos Humanos do Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça, tem editado alguns enunciados, entre os quais um chamou

 

 

 

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em especial a nossa atenção: trata-se do Enunciado nº. 6, com o seguinte teor:

“Nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idosa, enfermo ou pessoa com deficiência, é vedada a concessão de fiança pela Autoridade Policial, considerando tratar-se de situação que autoriza a decretação da prisão preventiva nos termos do artigo 313, III, Código de Processo Penal.” (conferir:http://www.compromissoeatitude.org.br/enunciados-da-copevid-comissao-nacional-de-enfrentamento-a-violencia-domestica-e-familiar-contra-a-mulher/).

O equívoco do verbete é gritante, dada a sua clara ilegalidade (porque contraria a Lei nº 12.403/11, que alterou o Código de Processo Penal) e também a sua inconstitucionalidade formal (porque, e sobretudo, viola a Constituição Federal), senão vejamos:

Dispõe o art. 322 do Código de Processo Penal que o Delegado de Polícia poderá (e se trata de um poder-dever) conceder fiança nos casos de infração penal cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a quatro anos, sendo que, nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em quarenta e oito horas (redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). Pouco importa para a lei processual penal a condição pessoal da vítima ou as circunstâncias em que se deu o suposto fato delituoso. A lei não fez nenhum tipo de distinção ou nenhuma outra exigência senão o requisito da pena máxima.

Obviamente que um mero Enunciado do Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça, por mais autorizado que esteja, não tem, na República, ainda, o condão de alterar um texto de lei formal e legitimamente aprovada pelo Congresso Nacional e promulgada pela Presidente da República, ambos legitimados pela soberania popular, o que falta aos Procuradores Gerais de Justiça, ao menos de forma direta.

Outra disposição olvidada pelos senhores Procuradores Gerais, lamentavelmente, foi o art. 22 da Constituição Federal,

 

 

 

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segundo o qual compete privativamente à União legislar sobre, dentre outras matérias, Direito Penal e Processual (incluindo Processo Penal, obviamente). Ora, o Enunciado claramente viola esta cláusula constitucional que reserva à União a iniciativa legislativa em matéria processual penal, como é o caso de uma disposição que trata de fiança, uma medida de natureza cautelar (ou de contracautela, como querem alguns).

Ademais, a Constituição Federal, ao estabelecer no art. 144, que “a segurança pública é um dever do Estado, direito e responsabilidade de todos e será exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”, dá às Polícias federal e civil legitimidade constitucional para exercer as suas atribuições na República, cabendo à primeira exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União e à segunda as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

Logo, é inconcebível que o Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça queira se imiscuir em atividade legislativa especialmente reservada à União, tolhendo, ademais, a autonomia constitucional da Polícia. Neste sentido, conferir no Supremo Tribunal Federal a decisão proferida no julgamento do Habeas Corpus nº. 125.768, relator Ministro Dias Toffoli.

E mais. Vejamos o absurdo do Enunciado em casos práticos. Suponhamos que um homem em uma sexta-feira, em uma

praça pública, discuta com um adolescente e o ameace (art. 147 do Código Penal. Pena máxima: seis meses. Crime de menor potencial ofensivo, cuja ação penal depende de representação). Levado à presença de um Delegado de Polícia, lavra-se o Termo Circunstanciado, na forma do art. 69 da Lei nº. 9.099/95, recusando-se o “autor do fato” (como equivocadamente denomina a Lei dos Juizados Especiais Criminais, como se o sujeito já tivesse sido condenado por sentença transitada em julgado) a assinar o termo de compromisso de comparecer à audiência preliminar de conciliação (composição civil dos danos e transação penal). O que

 

 

 

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diz o referido art. 69 da lei de regência? Como ele não se comprometeu a comparecer à audiência, quando notificado, lavrar-se-á o auto de prisão em flagrante, pois assim autorizou o representante legal do suposto ofendido, oferecendo a representação nos termos do art. 38 do Código de Processo Penal. Então, poderia o Delegado de Polícia arbitrar a fiança? Conforme o art. 322 do Código de Processo Penal sim, pois a pena máxima do crime de ameaça não é maior do que quatro anos, mas segundo o enunciado acima transcrito, não!

Relembremos, para não haver dúvidas, a redação do artigo da lei especial:

“Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.”

“Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.”

Portanto, caso o “autor do fato” não possa ser encaminhado imediatamente ao Juizado Especial Criminal (como nunca poderá, salvo nos estádios de futebol), nem afirme que comparecerá para qualquer tipo de acordo (pois não lhe é conveniente fazê-lo, por exemplo), o Delegado de Polícia não poderá arbitrar a fiança, nada obstante o art. 322 do Código de Processo Penal autorizá-lo. Ele ficará preso aguardando que se faça um requerimento formal a um Juiz de Direito, nada obstante se tratar de um crime de menor potencial ofensivo (art. 98, I da Constituição Federal). Como é uma sexta-feira, caso o fato tenha ocorrido em uma cidade do interior do Brasil, certamente ele aguardará até segunda-feira para ter o seu pedido analisado (pois não haverá plantão judiciário), salvo se o

 

 

 

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Magistrado não teve nenhum compromisso particular na Capital, caso em que ele só chegará na Comarca na terça-feira. Se ele for um homem desventurado e na Comarca não houver Juiz titular, ele deverá escrever uma carta aos senhores Procuradores Gerais pedindo uma ajuda, uma orientação para o seu caso.

Refere-se o Enunciado, outrossim, como se fosse algo que pudesse impedir o arbitramento da fiança pelo Delegado de Polícia, à possibilidade de decretação da prisão preventiva, se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, nos termos do art. 313, III, do Código de Processo Penal (com redação dada pela Lei nº. 12.403, de 2011).

Aqui confundiu-se (?) alhos com bugalhos! O fato de, em tese, ser possível a decretação da prisão preventiva não pode e não deve inviabilizar o arbitramento de uma fiança. A lei não disse isso. Logo, um Enunciado do Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça não poderá dizê-lo. Nunca! Isso é primário. É o Juiz que deve decidir ser o caso de prisão preventiva e, fundamentadamente, decretá-la, não de ofício, porque está vedado por lei, mas a requerimento do Ministério Público ou por representação do Delegado de Polícia.

É bem verdade que o art. 324 do Código estabelece não ser cabível a fiança quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva, nos termos do art. 312. Ora, mas não é o Delegado de Polícia, no momento de uma prisão em flagrante, quando da lavratura do respectivo auto de prisão, que poderá afirmar ser o caso ou não de uma prisão provisória. Ele não tem, constitucionalmente, tal atribuição, nem o Ministério Público, aliás. O Juiz é que o dirá, posteriormente, quando lhe for enviada a cópia do auto de prisão em flagrante com a representação ou o requerimento da medida cautelar. Assim dispõe o art. 310 do Código de Processo Penal. Agora cabe ao Delegado de Polícia, tão-somente, à vista da pena abstratamente cominada ao delito arbitrar

 

 

 

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a fiança, independentemente, repita-se, da condição pessoal da vítima ou das circunstâncias em que foi praticado o crime. Se não o fizer, estará sujeito a responder pelo crime de abuso de autoridade previsto no art. 4º., letra “e” da Lei nº. 4.898/65.

Que me perdoem os meus colegas Procuradores de Justiça, ora Procuradores Gerais. Não é assim que se faz um Enunciado. É preciso atenção no momento de elaborar estas normas. Estudar, conversar detidamente com os assessores, sem açodamento, com calma, discutindo com os diversos atores processuais e não processuais e, sobretudo, ter sempre às mãos a Constituição Federal. É fundamental.

 

 

 

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COISA JULGADA: CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA E COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL

FLÁVIA BARBOSA DA SILVA: Advogada e Médica. Servidora Pública Federal: Perita Médica Previdenciária do INSS. Bacharela em Direito pela Universidade Federal da Bahia em 04/2014. Médica pela Universidade Federal da Bahia em 08/2001. Pós graduada em Processo Civil pela Universidade Estácio de Sá em 11/2014. Pós graduada em Auditoria de Sistemas de Saúde pela Portal F/Universidade Estácio de Sá em 2010. Pós graduação em Direito Administrativo pela Universidade Estácio de Sá em curso.

RESUMO: O presente trabalho visa analisar o instituto da coisa julgada. 

Objetiva‐se  demonstrar  a  evolução  do  entendimento  quanto  sua 

natureza jurídica, se material ou processual e a sua eficácia preclusiva. 

Neste estudo foi realizada a pesquisa bibliográfica, tendo sido utilizado 

o método dedutivo. O Código de Processo Civil em vigor adota a teoria 

processual. A importância da coisa julgada reside em ser um instrumento 

concretizador  da  segurança  jurídica.  A  eficácia  preclusiva  da  coisa 

julgada se  manifesta  no  impedimento  que  surge,  com  o  trânsito  em 

julgado, à discussão e apreciação de questões suscetíveis de influir, uma 

vez  solucionadas,  no  teor  do  pronunciamento  judicial,  ainda  que  não 

examinadas pelo juiz. A doutrina moderna vem adotando a possibilidade 

de desconsideração da coisa julgada material.  

PALAVRAS‐CHAVE:Coisa julgada. Natureza jurídica. Eficácia preclusiva. 

ABSTRACT: This study aims to analyze the institute of the res judicata. 

The objective is to demonstrate the evolution of understanding about 

its  legal  nature,  whether  substantive  or  procedural,  its  effectiveness 

and the extent of preclusive  immutability conferred by res  judicata to 

judicial  pronouncements.  In  this  study  bibliographic  research  was 

performed and the deductive method was the one used. The up to date 

Code of Civil Procedure adopts the procedural theory. The importance 

of res judicata is to be an instrument concretizing of legal certainty. The 

preclusive effectiveness of res judicatais manifested in the impediment 

 

 

 

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that comes with the final judgment, to the discussion and consideration 

of matters susceptible to influence, once solved, the content of judicial 

pronouncement,  although  not  examined  by  the  judge.  The  modern 

doctrine  has   taken  the  possibility  of  mitigating  the  material res 

judicata. 

KEYWORDS: Res judicata. Legal  nature. Preclusive effectiveness. 

SUMÁRIO: 1. Introdução.  2.  Conceito  e  natureza  jurídica  da  coisa 

julgada. 2.1 Conceito. 2.2. Natureza jurídica. 3. Coisa julgada formal e 

material. 3.1. Eficácia preclusiva da coisa julgada. 3.2. Relativização da 

coisa julgada material. 4. Considerações finais. Referências. 

1. INTRODUÇÃO

            O  presente  trabalho  tem  por  objetivo  analisar  de  forma 

pormenorizada  a  coisa  julgada,  demonstrando  a  evolução  do 

entendimento  quanto  à  sua  natureza  jurídica  e  eficácia  preclusiva.  A 

coisa  julgada se  caracteriza  por  ser  um  instituto  de  função 

essencialmente  prática  que  existe  com  a  finalidade  de  assegurar 

estabilidade à tutela jurisdicional e evitar a perenização dos conflitos. 

Uma  vez  transitado  em  julgado  o  processo,  constitui‐se  a 

denominada  coisa  julgada  formal  e,  em  sendo  o  processo  encerrado 

com resolução do mérito, a coisa julgada material, com a consequente 

proteção à imutabilidade do conteúdo da sentença proferida pelo órgão 

julgador. A  noção  mais  comum  de  coisa  julgada  a  identifica  com 

qualquer pronunciamento do  juiz que se tornou imutável por não, ou 

não mais, ser cabível recurso.[1]  

No que concerne a natureza jurídica da coisa julgada delineia‐se 

a percepção da existência da teoria material e da teoria processual. A 

primeira  enxerga  na  sentença  o  fundamento  para  a  formação  de 

relações de direito material das partes no que concerne ao objeto do 

 

 

 

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litígio, confirmando a sentença justa a situação jurídica atual e para ela 

criando um novo fundamento, enquanto a sentença injusta o constitui 

em conformidade com o seu conteúdo. A segunda, por sua vez, enxerga 

a  essência  da  coisa  julgada  na  vinculação  futura  de  todos  os  juízes  à 

declaração contida na sentença, obrigando‐os a julgar o mesmo litígio 

no mesmo sentido.  

A  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada se  manifesta  no 

impedimento  que  surge,  com  o  trânsito  em  julgado,  à  discussão  e 

apreciação de questões suscetíveis de influir, uma vez solucionadas, no 

teor do pronunciamento judicial, ainda que não examinadas pelo juiz. 

Importante  pontuar  as  funções  positiva  e  negativa  da  coisa  julgada. 

Aquela  consiste  em  por  fim  ao  litígio  e  proporcionar  o  resultado 

pretendido pelos litigantes, qual seja extinguir o estado de dúvida em 

que se encontravam e ao mesmo tempo vincular o  juiz em um futuro 

processo ao conteúdo da decisão proferida em um processo anterior. A 

imutabilidade que a caracteriza é o sinal marcante da função positiva 

da  coisa  julgada.   A  sua  função  negativa  constitui  a  proibição 

endereçada aos juízes de julgar novamente os litígios já transitados em 

julgado,  impedindo que o  conflito de  interesses  já  resolvido,  possa  a 

qualquer tempo ser novamente julgado. Trata‐se, a função negativa, do 

reflexo do princípio do ne bis in idem, baseado na idéia de consumação 

da ação.[2] 

A  doutrina  moderna  vem  adotando  a  possibilidade  de 

desconsideração da coisa julgada material, a qual encontra respaldo em 

situações  previstas  no  Código  de  Processo  Civil  (CPC)  em  vigor, 

evidenciando  que  a  segurança  jurídica,  perseguida  pelo  Estado 

Democrático de Direito, é por vezes afastada para rediscussão da lide já 

transitada em julgado. 

No primeiro capítulo de desenvolvimento é iniciada a discussão 

pelo conceito da coisa  julgada, prosseguindo a análise desse  instituto 

demonstrando  as  concepções  quanto  a  sua  natureza  jurídica,  se 

material ou processual. 

 

 

 

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O capítulo seguinte é dedicado à compreensão da questão da coisa julgada formal e material, sua eficácia preclusiva e a tendência moderna à relativização a coisa julgada material.

A  Metodologia  compreende  um  conjunto  de  instrumentos 

produzidos e administrados para a consecução de um trabalho e inclui 

prática  de  estudo  da  realidade  consistente  em  dirigir  o  espírito  na 

investigação da  verdade. A  pesquisa  bibliográfica  é  uma das  técnicas 

decisivas  para  a  pesquisa  em  ciências  sociais  e  humanas.  Ela  é 

indispensável porque a maior parte das fontes escritas é quase sempre 

a  base  do  trabalho  de  investigação,  uma  vez  que  a  pesquisa  jurídica 

fundamentalmente  se  efetiva  por  meio  de  fontes  bibliográficas,  da 

legislação e dos pronunciamentos judiciais.

No desenvolvimento  do  presente  artigo  foi  utilizado  o método 

dedutivo,  partindo‐se  dos  posicionamentos  doutrinários,  bem  como 

dispositivos constitucionais e legais para análise do tema enfrentado. 

A  fim  de  analisar, compreender  e  demonstrar  as  nuances  e 

extensão  da  coisa  julgada  foi realizada  a revisão  bibliográfica  da 

doutrina e análise documental da legislação referentes ao tema objeto 

deste trabalho. 

2. CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA COISA JULGADA

Neste capítulo adentra-se no instituto da coisa julgada, a fim de compreender, precipuamente, o seu conceito e a sua natureza jurídica, perpassando pela divergência de entendimento dos doutrinadores sobre o tema.

2.1 CONCEITO

Para BARBOSA MOREIRA, seria impossível pretender uma convergência de orientações sobre a problemática da coisa julgada sem uma unanimidade de

 

 

 

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vistas quanto à conceituação do instituto, sendo a equivocidade do próprio conceito a partir do qual se elaboram as orientações doutrinárias a razão fundamental para as divergências encontradas.

Entre  os  romanos,  o  particípio iudicata  qualificava  o 

substantivo res para  indicar,  em  relação  a  este,  a  situação  particular 

que advinha de já se ter proferido o julgamento, tal como a expressão in 

iudicium  deducta remetia  a res submetida  ao  conhecimento  do  juiz, 

mas ainda não julgada, sendo ressaltado em ambas as expressões "algo 

que se punha como objeto da atividade cognitiva judicial"[3].

Enfatiza que seria estranho entre os romanos identificar a noção 

de  coisa  julgada  com  a  própria  sentença,  ou  com  o  seu  respectivo 

conteúdo, ou com sua eficácia em geral ou com um dos seus efeitos ou 

ainda com uma qualidade da sentença, mas que o direito moderno tem 

caminhado  no  sentido  de  deslocar  a  tônica  do  conceito,  do 

substantivo coisa para o adjetivo julgada. 

Aponta o autor que na outrora denominada Lei de Introdução do 

Código Civil (LIC), em seu art. 6, § 3°, a coisa julgada é identificada com 

a  sentença  da  qual  não  é  cabível  impugnação  por  meio  de  recurso, 

firmando  a  equação  coisa  julgada=sentença  irrecorrível.  Na  doutrina 

alemã  identificava‐se  a  coisa  julgada  com  o  efeito  declaratório  da 

sentença  insuscetível  de  recurso,  enquanto  Carnelutti  na  Itália 

pretendia  equiparar  a  coisa  julgada  à  eficácia,  ou  imperatividade  da 

decisão, ao passo que o Código Civil  Italiano de 1942 a relacionou ao 

conteúdo da sentença. Considera ser puramente adjetiva a concepção 

de Liebman para o qual a coisa julgada consistiria na imutabilidade do 

comando nascente de uma sentença. 

Considera  ser  a  coisa  julgada  um  instituto  de  função 

essencialmente  prática  que  existe  com  a  finalidade  de  assegurar 

estabilidade  à  tutela  jurisdicional.  Afasta,  por  insatisfatória,  a  noção 

contida na outrora designada LIC por apenas indicar o momento em que 

 

 

 

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se forma a coisa julgada, não informando sobre a essência do fenômeno 

em  si.  Critica  ainda  a  visão  alemã,  pois  a  sentença  não  produz  uma 

declaração, antes a contém[4]. 

Ressalta BARBOSA MOREIRA que não há de se confundir "coisa 

julgada" com "autoridade da coisa julgada", pois a coisa julgada não se 

identifica  nem  com  a  sentença  transitada  em  julgado,  nem  com  a 

imutabilidade da qual ela se reveste, mas sim com a situação  jurídica 

que passa a existir após o trânsito em julgado da decisão judicial[5]. 

ARAGÃO  propõe  o  estudo  do  significado  da  locução  "coisa 

julgada"  para  adentrar  na  conceituação  desta.  O  substantivo 

"coisa",palavra esta por si multívoca, pode corresponder ao vocábulo " 

bem"  tal qual descrito no Código Civil. Remete‐se o autor à Chiovenda 

para  pontuar  que  se  ao  invés  decoisajulgada  fosse  possível 

dizer bem julgado, estabeleceria‐se de modo mais evidente a diferença 

entre coisas julgadas  e questões julgadas  e  contrapõe  a  opinião  de 

Carnelutti para o qual o termores (coisa) não significa bem, mas antes 

simboliza a relação jurídica, o conflito. A palavra "julgada, por sua vez, 

constitui o particípio passado do verbo julgar[6]. 

Deduz  o  autor,  que  da  análise  da  locução  "coisa  julgada" 

facilmente percebe‐se que esta corresponde ao "bem", à "relação", ao 

caso sobre o qual as partes litigaram em juízo após a demanda restar 

solucionada pela sentença que houver rejeitado ou acolhido o pedido 

da parte autora, podendo esse bem ser tanto uma coisa em si quanto 

um direito,  sendo que  este  "bem da  vida"  assegurado às  partes pela 

sentença constitui a coisa julgada. 

Explica  ainda  que  pregressamente  no  Direito  Romano  a 

locução res  iudicata designava  a  própria  sentença,  condenatória  ou 

absolutória, podendo ainda ser sujeita a recurso. Com a contribuição do 

Direito Canônico a expressão res iudicata passou a significar a sentença 

investida da autoridade de coisa julgada. Relembra que o antigo Direito 

Francês  conservou  o  entendimento  romano,  de  modo  que  os 

 

 

 

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julgamentos tinham autoridade de coisa julgada desde que proferidos, 

ainda  que  fossem  cabíveis  recursos.  Porém,  para  o  direito  atual,  a 

locução  "coisa  julgada"  não designa  apenas  o  julgamento  dares, mas 

sim, a autoridade de que fica revestida quando preclui ou se esgota a 

faculdade  de  contra  ele  recorrer,  sendo  pois  a  imutabilidade  do 

julgamento que consubstancia a coisa julgada.[7] 

ALVIM  aponta  que  no  direito  romano  a  coisa  julgada  era  a 

"expressão de exigência de  certeza e  segurança no gozo dos bens da 

vida",  passando  em  julgado  apenas  a  sentença,  assentando  a  coisa 

julgada  num  pressuposto  de  ordem  prática,  qual  seja  garantir  ao 

vencedor  o  bem  da  vida  reconhecido  na  sentença,  não  soando  o 

pronunciamento judicial como verdade, mas sim em lugar da verdade. 

Já  no  direito  medieval  a  coisa  julgada  era  compreendida  como  uma 

presunção  de  verdade  daquilo  que  o  juiz  declarava,  entendimento 

representado  pela  máximares  iudicata  facit  de  albonigrum,  de 

quadratorotundum. ("coisa  julgada transforma o branco em preto e o 

quadrado em redondo")[8]. 

GASTAL pondera que na  raiz de  todas as concepções acerca da 

coisa julgada reside a ideia de que o seu propósito é o de não permitir 

a perenização dos conflitos de modo a ensejar estabilidade e certeza às 

relações  jurídicas, pois a definitividade de que se  reveste o comando 

judicial  após  a  apreciação  de  uma  determinada  relação  jurídica, 

enquanto apresentar os mesmos contornos que a delineavam quando 

judicialmente apreciada, é justamente o que dá sentido ao exercício da 

função jurisdicional[9]. 

2.2 NATUREZA JURÍDICA 

O  estudo  sobre  a  natureza  jurídica  da  coisa  julgada  conduz  à 

percepção de existirem duas correntes principais e conflitantes quanto 

ao  entendimento  de  ser  ela  um  instituto  de  natureza  substancial, 

concepção  abraçada  pela  teoria  material  ou  de  ser  um  instituto  de 

 

 

 

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natureza processual, a compor a denominada teoria processual da coisa 

julgada. 

BARRETO ensina que num primeiro momento, por influência do 

Direito Romano, não se falava em autonomia do direito material ante o 

processual,  de  forma  que  "a  coisa  julgada  nada  mais  era  do  que  o 

próprio  direito  consumado  pela actio,  de  modo  que  a  resiudicata se 

tornava o único e exclusivo efeito do iudicatum.", sendo a coisa julgada 

a própria verdade jurídica reconhecida[10]. 

Analisa ARAGÃO as concepções das teorias material e processual 

entre os diferentes doutrinadores. Destaca Enrico Allorio para o qual "A 

antítese entre a doutrina substancial e a doutrina processual da coisa 

julgada nada mais é que o reflexo dessa mesma antítese entre os dois 

modos,  fundamentalmente  diversos,  de  conceber  a  destinação  do 

processo civil", sendo que a teoria substancial estaria em relação direta 

com  a  concepção  do  processo  como  sendo  um  instituto  destinado  a 

alcançar a composição da lide, enquanto a teoria processual resulta da 

concepção do processo como instrumento para a atuação do direito. 

Pondera  que  uma  sentença  pode  ser  substancialmente  injusta, 

por ter chegado a um resultado incompatível com o direito aplicável à 

espécie  e  ao mesmo  tempo  ser  processualmente  justa  porque  era  a 

solução que o caso comportava em decorrência do material probatório 

proporcionado pelos litigantes, como também pode seguir uma relação 

inversa  e  ser  substancialmente  justa  e  processualmente  injusta, mas 

que  o  Direito  sempre  contou  com  a  possibilidade  de  o  juiz  errar  na 

apreciação da prova e por isso produzir uma sentença injusta. 

A teoria material da coisa  julgada, predominante durante certo 

tempo, enxerga na sentença o fundamento para a formação de relações 

de  direito material  das  partes  no  que  concerne  ao  objeto  do  litígio, 

confirmando a sentença justa a situação jurídica atual e para ela criando 

um  novo  fundamento  (de  extinção  ou  de  constituição),  enquanto  a 

sentença injusta o constitui em conformidade com o seu conteúdo. A 

 

 

 

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teoria é denominada material porque o direito receberia da sentença 

certa, a sua confirmação e a sentença errada criaria o direito diverso do 

previsto no ordenamento jurídico para incidir no caso concreto. 

A  teoria  processual,  a  seu  turno,  nega  qualquer  influência  da 

sentença passada em julgado no direito material e enxerga a essência 

da  coisa  julgada na vinculação  futura de  todos os  juízes à declaração 

contida na sentença, obrigando‐os a julgar o mesmo litígio no mesmo 

sentido. Visa abandonar a disputa sobre o acerto ou erro da sentença, 

considerando  que  o  debate  sobre  o  julgamento  ser  justo  ou  não  só 

conduz a discussões  inúteis  sobre a  injustiça da  sentença, eliminadas 

pela autoridade da coisa julgada[11]. 

Nesse sentido, GASTAL considera que na concepção substancial 

da coisa julgada, o julgado vincula os futuros juízes por provocar uma 

modificação no direito pré‐existente, fazendo surgir uma nova situação 

jurídica de direito material. Essa concepção atribui à coisa julgada uma 

consequência que vai repercutir  sobre a situação material, com o fim 

de constituir, modificar ou extinguir o direito, a relação ou o estado que 

é objeto de litígio. 

Pontua  o  autor  que  a  hipótese  da  sentença  injusta  sempre  se 

prestou  à  reflexão  acerca  da  natureza  jurídica  do  instituto  da  coisa 

julgada,  servindo  de  impulso  à  concepção  substancial  desta,  pois  a 

possibilidade de discrepância entre o julgado e o direito material ficaria 

eliminada  se  se  compreendesse  a  coisa  julgada  como  uma  situação 

jurídica nova, que se constitui no plano do direito material, de modo 

que, a sentença poderia ser considerada injusta em relação ao direito 

material pré‐existente, mas não se poderia encontrar dissintonia entre 

a coisa julgada e o novo direito material resultante. 

Explica  ainda  que  a  teoria  processual  da  coisa  julgada, 

desenvolvida no final do século XIX e XX por Stein e Hellwig, sustenta 

que  o  vínculo  que  constrange  futuros  juízes  a  acatar  o  contido  no 

julgado  é  de  cunho  unicamente  processual,  de  forma  que,  a  coisa 

 

 

 

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julgada não afeta a  relação de direito material que é objeto do  juízo, 

permanecendo esta inalterada em todos os seus elementos e que se a 

sentença foi injusta, porque o seu comando discrepava do disciplinado 

pelo  ordenamento  jurídico  para  o  caso  concreto,  esta  discrepância 

subsistirá. 

Alude o autor que se o processo faz atuar o direito, o resultado 

daquele  não  pode  revelar  outra  situação  jurídica  substancial,  senão 

aquela própria cuja atuação constituía o seu propósito. A coisa julgada 

deverá  ser  mais  bem  compreendida  como  um  vínculo,  de  ordem 

processual, para os  juízes que no futuro serão confrontados a decidir 

sobre o mesmo objeto[12]. 

Distinguidas  as  teorias  material  e  processual  da  coisa  julgada, 

resta inclinar‐se ao entendimento de ARAGÃO de que o CPC em vigor 

adota a teoria processual, denominada radical por Allorio, de nenhum 

juiz poder  julgar de novo, ainda que seja no mesmo sentido, causa  já 

composta por sentença passada em julgado, pois se tornar a julgá‐la irá 

ofender a  coisa  julgada.  Entendimento esse  resultante da análise em 

conjunto dos art. 471, 267, V e § 3° e 268 do CPC atual[13]. 

Avançando  na  natureza  jurídica  da  coisa  julgada,  exsurge 

esclarecer se ela é um dos efeitos da sentença ou uma qualidade que a 

ela adere. BARRETO discute que a  sob  tradição do Direito Romano, a 

coisa julgada seria um dos vários efeitos produzidos pela sentença ou 

se identificaria com o próprio efeito declaratório, não participando da 

coisa  julgada  os  efeitos  constitutivos  e  condenatórios  das  sentenças. 

Explica ainda que é possível encontrar em Chiovenda os fundamentos 

iniciais para superação desse entendimento, distinguindo os efeitos da 

sentença da coisa julgada, pois enquanto aqueles valem para todos, a 

coisa julgada se restringe às partes[14]. 

LIEBMAN foi o grande responsável pela visão atual do instituto da 

coisa julgada predominante na doutrina brasileira. Ensina o autor que 

permanecia  o  hábito  de  ver  na  coisa  julgada  o  efeito  próprio  e 

 

 

 

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específico  da  decisão  judicial  e  que  foram  construídas  teorias 

explicando a coisa julgada como ficção de verdade, verdade formal ou 

presunção  de  verdade,  as  quais  foram  finalmente  repelidas  da 

linguagem  científica  pela  sua  imprecisão,  mas  que  a  coisa  julgada 

permaneceu  presa  à  sentença  como  a  decisão  de  uma  questão 

duvidosa. 

Assevera que Carnelutti escreveu que  imutabilidade da decisão 

não  corresponde  ao  seu  caráter  imperativo,  mas  sim  à  sua  função 

declarativa  e  que  a  posição  de  Chiovenda,  de  também  ver  na  coisa 

julgada  um  efeito  da  sentença,  terminava  por  relacioná‐la  com  a 

declaração emitida pelo juiz tal qual as demais várias fórmulas, que ao 

tentar  explicar  a  coisa  julgada,  faziam‐na  equivaler  à  criação  de uma 

declaração irrevogável. 

Problematiza o autor que a decisão judicial tem frequentemente 

eficácia  não  meramente  declarativa,  mas  também  constitutiva, 

surgindo o questionamento sobre as relações existentes entre a coisa 

julgada  e  os  efeitos  da  sentença,  se  seria  ela  considerada  como  um 

efeito  da  sentença  ao  lado  dos  demais  efeitos  existentes  ou  se  seria 

possível distinguir em toda a sentença uma parte que seria suscetível 

de adquirir a autoridade da coisa julgada[15]. 

Esclarece  que  a  coisa  julgada  consiste  na  força  vinculante  da 

declaração,  quer  se  apresente  sozinha,  quer  acompanhada  de  efeito 

constitutivo,  pois  este  nada  tem  a  ver  com  a  coisa  julgada, 

desnecessária para que ele possa ser produzido, de modo que constitui 

erro  lógico  sistematizar  a  coisa  julgada  ao  lado  dos  outros  possíveis 

efeitos da sentença. Enfatiza que "Pode‐se assim reconhecer que uma 

declaração  destituída  da  autoridade  da  coisa  julgada  é  para  quem  a 

obteve pouco menos que inútil", e que a coisa julgada é qualquer coisa 

mais  que  se  ajunta  para  aumentar  a  estabilidade  de  quaisquer  dos 

efeitos da  sentença, de  forma que  identificar  a declaração produzida 

pela sentença com a coisa julgada significa confundir o efeito com um 

elemento novo que o qualifica.[16] 

 

 

 

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No que tange ao enfrentamento do problema da posição da coisa 

julgada  na  teoria  da  sentença,  LIEBMAN  relembra  que  a  lei  confere 

efeitos  à  sentença  mesmo  antes  do  seu  trânsito  em  julgado, 

exemplificando com a execução provisória e com a eficácia executória 

da  sentença não mais  sujeita  aos  recursos ordinários,  devendo‐se de 

igual  modo  reconhecer  que  todos  os  efeitos  da  sentença  podem  se 

produzir antes da sentença transitar em julgado. 

Da afirmação acima exposta, depreende‐se que a eficácia jurídica 

da sentença pode e deve ser distinguida da autoridade da coisa julgada, 

sendo  acolhida  a  distinção  de  Carnelutti  entre  imperatividade  e 

imutabilidade  da  sentença,  pois  esta  é  imperativa  e  produz  todos  os 

seus efeitos ainda antes e independentemente de transitar em julgado. 

Nesse sentido extrai‐se que "a autoridade da coisa julgada não é 

efeito da sentença, como postula a doutrina unânime, mas, sim, modo 

de manifestar‐se e produzir‐se dos efeitos da própria sentença, algo de 

que a esses efeitos se ajunta para qualificá‐los e reforçá‐los em sentido 

bem determinado." 

Critica  o  autor  a  concepção  de  Hellwig,  de  ser  a  coisa  julgada 

efeito  específico  da  sentença  irrecorrível  e  eficácia  declaratória  da 

sentença,  afirmando  que  ele  confundiu  o  efeito  normal  da  sentença 

com a  definitividade  e  incontestabilidade  desse  efeito.  Pontua  que  a 

coisa  julgada  serve  para  evitar  um  novo  pronunciamento  judicial 

contraditório em face de uma sentença anterior, pois a mesma faz com 

que o efeito produzido por uma sentença permaneça irrevogavelmente 

adquirido, não sendo a coisa julgada um efeito diverso, mas sim, uma 

qualidade do próprio efeito[17]. 

Com  a  contribuição  de  LIEBMAN,  a  coisa  julgada  passou  a  ser 

compreendida  não  mais  como  um  dos  efeitos  da  sentença  e  a  ser 

considerada  como  uma  qualidade  que  adere  à  sentença 

potencializando a eficácia natural desta ao conferir‐lhe imutabilidade. 

 

 

 

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BARBOSA  MOREIRA  manifesta‐se  criticamente  à  visão  de 

Liebman  sobre  imutabilidade  dos  efeitos  da  sentença  transitada  em 

julgado e afirma que se alguma coisa escapa ao selo da imutabilidade 

são  justamente os efeitos da sentença, sendo a  imutabilidade apenas 

da própria sentença. 

Esclarece  o  autor  que  os  efeitos  da  sentença,  mesmo  que 

estranhos  ao  conceito  de  coisa  julgada,  em  regra  só  começam  a 

produzir‐se  no  momento  em  que  esta  se  forma  e  só  em  casos 

excepcionais e taxativos, a ela se antecipam. A imutabilidade não é dos 

efeitos  da  sentença, mas  sim,  do  conteúdo  desta,  sendo  importante 

discernir que a imutabilidade do conteúdo da sentença não implica na 

imutabilidade  da  situação  jurídica  concreta  sobre  a  qual  o  incidiu  o 

pronunciamento judicial. A mudança da situação jurídica concreta em 

nada  afeta  a  autoridade  da  coisa  julgada  da  sentença  previamente 

proferida,  uma  vez  que  "A  norma  sentencial  permanece  imutável, 

enquanto  norma  jurídica  concreta  referida  a  uma  determinada 

situação."[18]. 

3. COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL

Adentra‐se nas linhas a seguir na análise dos conceitos referentes 

à  coisa  julgada  formal  e material.  A  lei  de  Introdução  às  Normas  do 

Direito  Brasileiro  (LINDB),  Decreto‐Lei  4657  de  1942,  ementa  com 

redação determinada pela Lei. 12.376/10, dispõe em seu art. 6°,§ 3° que 

“Chama‐se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não 

caiba recurso”, enquanto o art. 467 do CPC prescreve que “Denomina‐

se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a 

sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”

ARAGÃO aponta críticas ao art. 6°,§ 3° da LINDB, ressaltando que 

este se restringe ao aspecto cronológico da passagem da sentença em 

julgado,  sem  cuidar  do  aspecto  ontológico  da  coisa  julgada, 

considerando  que  neste  artigo  cabe  apenas  a  idéia  da  coisa  julgada 

formal,  a  qual  surge  com  a  exaustão  dos  recursos  cabíveis  contra  a 

 

 

 

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sentença ou com a impossibilidade de recurso pela mesma ter nascido 

irrecorrível. 

Alude este doutrinador, que o art. 467 do CPC evoluiu quanto à 

definição  da  coisa  julgada  ao  procurar  conceituar  a  coisa  julgada 

material, porém critica a redação deste artigo, pois considera que não 

é a coisa julgada material que torna imutável e indiscutível a sentença, 

mas  sim  o  trânsito  em  julgado  ou  o  exaurimento  do  duplo  grau  de 

jurisdição.  Uma  vez  não  mais  sujeita  a  recurso  ordinário  ou 

extraordinário,  a  sentença  ou  acórdão  só  produzirá  coisa  julgada 

material se houver solucionado o mérito da causa, uma vez que, se a 

sentença  extinguir  o  processo  sem  apreciação  do mérito,  formará‐se 

apenas a coisa julgada formal[19]. 

No  que  tange  a  coisa  julgada  em  sentido  formal,  CHIOVENDA 

explica que esta corresponde a tornar‐se definitiva a sentença. Elucida 

o autor que se a sentença não esta sujeita a recursos, é por si mesma 

definitiva  e  produz,  logo,  seus  efeitos,  a  não  ser  que  seus  efeitos 

executórios estivessem subordinados a um prazo. Em sendo passível de 

recursos, a sentença tornará‐se definitiva após decorrido o prazo fixado 

em lei para o recurso, sem que o mesmo tenha sido interposto uma vez 

que os prazos recursais são peremptórios. Existe ainda, a possibilidade 

da  parte  aceitar  expressamente  ou  tacitamente  uma  sentença, 

importando em  renúncia   ao direito de  impugná‐la,  tornando‐a desta 

forma definitiva. Assevera o autor, que oferecida uma  impugnação, a 

coisa  julgada  pode  se  formar  mediante  perempção  do  processo  de 

impugnação ou renúncia a ele[20]. 

O trânsito em julgado, fenômeno processual antecedente à coisa 

julgada, representa um momento no curso do processo no qual ocorre 

a transição entre um estado dinâmico a um estado estático.  KLIPPEL e 

BASTOSexplicam que no momento em que a cadeia de atos processuais 

alcança seu ponto final numa lide específica, verifica‐se o trânsito em 

julgado, correspondendo este ao fim da atuação do procedimento para 

a formação de uma determinada norma concreta. Ressaltam os autores, 

 

 

 

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que  não  há  um momento  único  e  estanque  para  a  ocorrência  deste 

fenômeno, em virtude de o procedimento nem sempre alcançar todas 

as possibilidades abstratamente postas à disposição dos litigantes, mas 

que de fato, o trânsito em julgado leva à estabilização da discussão de 

determinada  lide,  sendo  por  isso,  o  antecedente  lógico  da  coisa 

julgada[21]. 

Nesse mesmo sentido, ALVIM ensina que uma vez proferida uma 

sentença de mérito,  a  parte  interessada poderá utilizar‐se  dos meios 

recursais para impugná‐la, podendo aquela ser objeto de modificação. 

Porém, em não sendo mais possível a modificação da decisão judicial, 

por  não mais  ser  cabível  qualquer  recurso,  pelos mesmos motivos  já 

explanados por Chiovenda, a sentença transita em julgado, tornando‐

se imutável como ato processual dentro do mesmo processo no qual foi 

proferida.  A essa imutabilidade conferida à sentença pela preclusão do 

prazo para recurso, chama‐se coisa julgada formal. 

Raciocina o doutrinador que, em se tornando imutável a sentença 

enquanto ato processual, sucede em conseqüência, a imutabilidade do 

conteúdo  do  ato,  cujo  comando,  nele  inserido,torna‐se  definitivo, 

estável,  inatacável, e projeta‐se para fora dos  limites do processo em 

que  fora  praticado,  tornando  também  imutáveis  seus  efeitos,   com a 

sentença  sendo  a  lei  reguladora  da  espécie  decidida,  fenômeno  este 

conhecido como coisa julgada material, sendo a coisa julgada formal um 

pressuposto da coisa julgada material[22]. 

A coisa julgada formal conforme LIEBMAN nada mais é que uma 

qualidade da sentença, quando a mesma já não é recorrível por força 

da preclusão dos recursos, sendo a coisa julgada material a sua eficácia 

específica e propriamente, a autoridade da coisa julgada, condicionada 

à  formação  daquela.  Aponta  o  autor,  que  todas  as  sentenças  são 

suscetíveis de coisa  julgada formal, mas apenas aquelas que acolhem 

ou rejeitam o mérito são suscetíveis de coisa julgada material.  

 

 

 

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LIEBMAN  critica  a  importância  dada  à  distinção  entre  estes 

conceitos e enfatiza que a coisa julgada substancial não é um efeito da 

sentença, mas apenas um aspecto particular daquela qualidade que ela 

logra, quando ocorre a preclusão dos  recursos,  sendo a coisa  julgada 

formal  a  imutabilidade  da  sentença  como  ato  processual  e  a  coisa 

julgada substancial a mesma imutabilidade em relação ao seu conteúdo 

e mormente aos seus efeitos. 

Aprofunda‐se  no  tema  o  autor  ao  problematizar  que  uma 

sentença  que  julgue  os  pressupostos  processuais  não  logra  coisa 

julgada diversa da sentença que acolhe ou rejeita a demanda na análise 

do  mérito.  No  primeiro  caso  a  sentença  terá  um  efeito  meramente 

interno no processo, perdendo sua importância, uma vez findo este. No 

segundo caso, a sentença, ao decidir sobre a relação deduzida em juízo, 

destina‐se a projetar a sua eficácia para fora do processo e a sobreviver 

a este.   A diferença entre as situações descritas repousa no comando 

contido na sentença e nos seus efeitos, permanecendo a coisa julgada 

sempre a mesma[23]. 

BARBOSA  MOREIRA  aponta  que  a  variável  extensão  da 

imutabilidade da sentença abre ensejo à distinção entre coisa julgada 

formal  e  material,  ocorrendo  aquela  quando  a  sentença  se  torna 

imutável  apenas  no  âmbito  do  processo  em  que  foi  proferida,  não 

havendo dessa forma, óbice a que se profira nova decisão com o mesmo 

objeto num outro processo. Já a coisa julgada material ocorre quando 

a  imutabilidade da sentença proferida em um processo prevalece em 

relação à processos distintos, sendo que, a discriminação, em concreto, 

dos  casos  em  que  a  esta  imutabilidade  se  estende  a  todos  ou  se 

restringe a um processo, será a que resulte do direito positivo de cada 

ordenamento jurídico. 

 Pondera que nenhuma decisão deixa de produzir a coisa julgada, 

ao menos em seu sentido formal, uma vez que inexiste no direito dos 

países  do  ocidente,  série  infinita  de  recursos,  não  havendo  processo 

 

 

 

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que não se encerre em um determinado momento, a tornar  imutável 

no seu âmbito, as decisões proferidas[24]. 

3.1 EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA

Antes  de  adentrar  na  análise  da  eficácia  preclusiva  da  coisa 

julgada,  urge  tecer  considerações  acerca da preclusão,  a  qual  não  se 

confunde  com  aquela,  haja  vista  ser  a  coisa  julgada  apenas  uma  das 

várias situações jurídicas sujeitas à preclusão. 

ARAGÃO  ensina  que  no  sentido  técnico  o  termo  preclusão 

exprime a  idéia de extinção de um poder, para o  juiz ou  tribunal e  a 

perda de uma faculdade para a parte, enquanto o princípio preclusivo 

associa‐se à divisão do procedimento em fases distintas, remetendo a 

idéia  de  perda  ou  extinção  de  uma  oportunidade  porque  foi 

ultrapassada a ocasião propícia para exercê‐la. Ressalta que no Brasil 

adota‐se o conceito formulado por Chiovenda para o qual a preclusão 

significa a perda, extinção ou consumação de uma faculdade processual 

que sofre pelo fato de não se haver observado a ordem prescrita em lei 

ao  uso  de  seu  exercício,  ou  de  se  haver  realizado  uma  atividade 

incompatível  com o  exercício  de  uma  faculdade,  uma propositura  de 

uma exceção incompatível com outra e a realização de ato incompatível 

com a  intenção de recorrer ou de  já se haver validamente exercido a 

faculdade, recaindo na consumação[25]. 

A preclusão não é ato, não é praticável,  sendo em verdade um 

acontecimento, um fato, que surge no processo, ou como resultado da 

ausência de outro fato ou como consequência de determinado ato, que 

por ter sido praticado tempestivamente, consumou a faculdade, ou o 

poder, para o juiz, de praticá‐lo uma segunda vez ou como decorrência 

de haver ou não sido praticado algum ato incompatível com a prática 

de outro. Assim, a preclusão surge sempre e necessariamente como um 

efeito,  um  resultado.   Percebe‐se  com  facilidade  a  influência  do 

princípio da preclusão no processo civil brasileiro como, por exemplo, 

 

 

 

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ao dividir o processo nas fases postulatórias, instrutória e decisória e na 

adoção da máxima da eventualidade[26]. 

LIEBMAN interrelaciona o fenômeno da preclusão à coisa julgada 

formal ao dispor que esta é uma qualidade da sentença, quando já não 

é  recorrível  por  força  da  preclusão  dos  recursos[27].   GRINOVER, 

entretanto,  critica  a  posição  da  doutrina  brasileira  em  acolher  a 

distinção estruturada por Liebman entre coisa julgada formal e material 

e  em  equiparar  a  coisa  julgada  formal  à  preclusão.  Assevera  a 

doutrinadora  que  estes  institutos  são  dois  fenômenos  distintos,  na 

perspectiva  de  decisão  irrecorrível,  ligados  entre  si  por  uma  relação 

lógica  de  antecedente‐consequente,  sendo  a  preclusão, 

subjetivamente,  a  perda  de  uma  faculdade  processual  e, 

objetivamente,  um  fato  impeditivo,  enquanto  a  coisa  julgada  formal 

consiste na qualidade da decisão, ou seja, sua imutabilidade dentro do 

processo[28]. 

CÂMARA  conceitua  a  preclusão  como  a  perda  de  uma  posição 

jurídica processual ativa, pelas partes ou pelo juízo, sendo o resultado 

decorrente  de  algum  fenômeno  que  gere  essa  perda.  Configura 

fenômeno essencial ao andamento ordenado do processo, assegurando 

que o processo mova‐se para diante, de forma que, sem a preclusão o 

processo poderia tornar‐se interminável. 

A  preclusão  pode  ser  lógica,  temporal  ou  consumativa.  Na 

preclusão lógica a perda da posição decorre do fato de se ter praticado 

anteriormente algum outro ato que com ela seja incompatível, tal qual 

no cumprimento voluntário da sentença antes de impugná‐la. Ocorre a 

preclusão temporal quando a perda da posição processual decorre da 

ultrapassagem  do  prazo  para  o  seu  exercício  como  ocorre  após  o 

decurso  do  prazo  para  interposição  de  um  recurso.  A  preclusão 

consumativa, aseu turno, ocorre quando a posição processual deixa de 

existir por já ter sido exercida[29]. 

 

 

 

        27 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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Passando a análise da eficácia preclusiva da coisa julgada em si, 

BARBOSA MOREIRA esclarece que esta  se manifesta no  impedimento 

que  surge,  com  o  trânsito  em  julgado,  à  discussão  e  apreciação  de 

questões  suscetíveis  de  influir,  uma  vez  solucionadas,  no  teor  do 

pronunciamento judicial, ainda que não examinadas pelo juiz. A fim de 

evitar dispêndio inútil da atividade processual, simplesmente exclui‐se 

que essas questões possam ser suscitadas com o escopo e atacar a coisa 

julgada. 

Considera o citado doutrinador, que a eficácia preclusiva da coisa 

julgada material é pan‐processual, pois seu efeito preclusivo projeta‐se 

para  fora  do  processo,  fazendo‐se  sentir  nos  eventuais  processos 

subsequentes,  enquanto  que  a  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada 

formal restringe‐se ao interior do processo no qual foi proferida. Essa 

eficácia  preclusiva  visa  excluir  que  o  resultado  do  processo,  após  o 

trânsito em julgado, venha a ser objeto de contestações juridicamente 

relevantescom  base  em  alegações  que  já  tenham  ou  não  sido 

examinadas. 

Explica  BARBOSA  MOREIRA  que  o  expediente  usado  pela  lei 

(art.287  do  CPC  de  1939)  tem  mera  função  instrumental,  pois  a 

preclusão das questões logicamente subordinantes não é um fim em si 

mesma, senão simples meio de preservar a  imutabilidade do  julgado. 

Esclarece,  entretanto,  que  a  preclusão  das  questões  logicamente 

subordinantes apenas prevalece em feitos nos quais a lide seja a mesma 

já  decidida  ou  tenha  solução  dependente  da  que  se  deu  à  lide  já 

decidida, e que,  fora desses  limites,  ficam abertas à  livre discussão e 

apreciação  as  mencionadas  questões,  independentemente  da 

circunstância de terem sido examinadas pelo primeiro juiz ao assentar 

as premissas da sua conclusão.  

Esclarece  o  autor,  que  a  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada 

material atinge as questões de fato, as de direito e as solúveis mediante 

aplicação  de  direito  ao  fato  e  referentes  à  relação  jurídica  ou  cuja 

existência ou inexistência se subordina a relação jurídica sobre a qual 

 

 

 

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versa o pedido. Ressalta, porém, que a eficácia preclusiva não atinge os 

fatos supervenientes, apenas aqueles existentes (que já aconteceram), 

sendo desnecessário, contudo, que fossem conhecidos pela parte[30]. 

A eficácia preclusiva da coisa  julgada encontra‐se positivada no 

art. 474 do CPC em vigor, o qual estabelece que "passada em julgado a 

sentença  de  mérito,  reputar‐se‐ão  deduzidas  e  repelidas  todas  as 

alegações  e  defesas  que  a  parte  poderia  opor  assim  ao  acolhimento 

como à rejeição do pedido.” SÁ alude que o artigo supracitado impede 

que  não  apenas  o  que  a  parte  perdeu  possa  ser  rediscutido,  como 

também  tudo  aquilo  que  ela  poderia  ter  alegado,  mas  não  o  fez, 

ressaltando‐se  que  tal  impedimento  se  refere  aos  argumentos  que 

poderiam ser alegados dentro de uma mesma lide.  Todas as questões 

que foram e poderiam ter sido levantadas em juízo ficam repelidas pela 

segurança que se impõe à coisa julgada como fenômeno de pacificação 

social, de forma que aquilo que não foi alegado torna‐se irrelevante e 

mistura‐se com o objeto litigioso que restou imunizado, como se tivesse 

sido julgado implicitamente. 

Enfatiza o autor que a eficácia preclusiva da coisa julgada consiste 

na preclusão paras as partes discutirem questões apreciadas ou não de 

forma  incidental  em  demanda  anterior  que  possam  influenciar  na 

matéria  já  imunizada,  não  se  tratando de  conferir  eficácia  à  decisão, 

mas sim à coisa julgada, constituindo um efeito inerente a ela. Esclarece 

que  não  se  admite  a  propositura  de  nova  demanda  para  discutir  a 

mesma  lide,  ainda que  com novas  alegações.  Em que pese os  limites 

objetivos da coisa julgada restringirem‐se ao dispositivo da sentença, as 

questões pertencentes a mesma lide que tiveram aptidão de influenciar 

no mérito da demanda anterior são atingidas pela eficácia preclusiva da 

coisa julgada.[31] 

 Frisa  que  a  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada  tem  natureza 

instrumental  e  visa manter  a  imutabilidade  da  decisão  anterior,  uma 

vez  que  a  coisa  julgada  objetiva  gerar  a  imutabilidade  do  que  foi 

decidido  para  determinadas  partes,  sobre  um  pedido  com  base  em 

 

 

 

        29 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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certa  causa  de  pedir.  Qualquer  situação  distinta  configurará  nova 

demanda.[32] 

3.2 RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA MATERIAL

O instituto da coisa julgada configura instrumento de pacificação 

social e concretização da segurança jurídica no Estado Democrático de 

Direito  ao  imutabilizar  o  conteúdo  das  sentenças  transitadas  em 

julgado,  impedindo  a  perenização  do  conflito  acobertado  pelo  seu 

manto. Entretanto, em decorrência da falibilidade inerente à condição 

humana,  as  decisões  judiciais  transitadas  em  julgado  podem  ser 

substancialmente  ou  processualmente  injustas  ou  inconstitucionais, 

resultando  no  questionamento  acerca  da  validade  de  erigir  a  coisa 

julgada a um valor absoluto.

Nesse sentido, surgem argumentos no sentido da relativização da 

coisa  julgada  material.  THEODORO  JÚNIOR  relembra  que  as  idéias 

emanadas da Revolução  Francesa, no que  concerne a delimitação do 

poder  político  do  Estado,  resultaram  na  preocupação  constante  em 

garantir a Supremacia da Constituição, como única forma de assegurar 

aos cidadãos a certeza da tutela da Segurança e da Justiça como valores 

máximos da organização da sociedade. 

No que tange ao tema de inconstitucionalidade, o autor pontua 

que sempre houve uma preocupação com a desconformidade apenas 

dos atos legislativos com a Constituição, mantendo‐se os atos judiciais 

imunes a ataques, ainda que fossem  inconstitucionais, especialmente 

após ocorrida a coisa julgada, consagrando o princípio a intangibilidade 

da coisa  julgada, de modo que, após a coisa  julgada resguardava‐se a 

segurança  jurídica,  em  detrimento  de  uma  preocupação  com  a 

justiça[33]. 

Ressalta  que  "À  vista  da  busca  sempre  constante  da 

constitucionalidade, pode‐se dizer que o ato que não a contempla tem 

um valor negativo. Fala‐se, assim, do desvalor do ato inconstitucional.", 

 

 

 

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não  podendo  a  coisa  julgada  suplantar  a  lei,  em  tema  de 

constitucionalidade, sob pena de colocar‐se como algo mais importante 

que a lei e a própria Constituição. 

Esclarece o autor que, a regra constitucional prescrita no art. 5°, 

XXXVI  da  CRFB  é  dirigida  ao  legislador  ordinário  na  medida  em  que 

disciplina a edição de outras normas jurídicas pelo legislador, de forma 

que a  intangibilidade da coisa  julgada no ordenamento brasileiro não 

tem sede constitucional, resultando antes da norma contida no art. 457 

do CPC, não estando imune ao princípio da constitucionalidade, o qual 

lhe é hierarquicamente superior[34]. 

Consoante  pontua  CÂMARA,  existem  duas  tendências  na 

doutrina moderna, uma delas negando a possibilidade de relativização 

da coisa julgada como Leonardo Greco eoutra afirmando a necessidade 

de permitir‐se a rescisão a qualquer tempo de sentenças transitadas em 

julgado  que  sejam  "objetivamente  desarrazoadas"  como  Sérgio 

Gilberto  Porto  e  José  Maria  Rosa  Tesheiner,  prevalecendo,  mais 

recentemente, a segunda. 

Posiciona‐se  pelo  entendimento  de  ser  a  coisa  julgada  uma 

garantia  constitucional,  porém  não  absoluta,  sendo  passível  de 

relativização, até mesmo por normas infraconstitucionais, mas que essa 

relativização deve ser  feita por meios processuais adequados como a 

ação rescisória, os embargos do executado e a querela nullitatis[35]. 

Entretanto,  relembra  a  limitação  temporal  para  rescisão  do 

julgado ao prazo de dois anos a contar da formação da coisa julgada e 

que  nos  mecanismos  processuais  supracitados,  a  questão  sobre  a 

inconstitucionalidade da decisão judicial configura a questão principal 

do processo a ser instaurado. 

Não deixa de ressaltar que a relativização da coisa julgada pode 

gerar  instabilidade  e  insegurança  prejudicial  à  pacificação  social  e 

propõe como solução acréscimo de um novo parágrafo único ao art.485 

 

 

 

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do  CPC,  prescrevendo  a  ação  rescisória  como  único  meio  de 

desconstituição de sentença transitada em julgado ao estabelecer que: 

A  sentença  de  mérito  transitada  em  julgado 

que  ofende  a  Constituição  só  deixa  de  produzir 

efeitos  após  rescindida  na  forma  prevista  nesse 

Capítulo,  permitida  a  concessão,  pelo  relator,  de 

medida  liminar  que  suspenda  temporariamente 

seus efeitos se houver o risco de que sua imediata 

eficácia  gere  dano  grave,  de  difícil  ou  impossível 

reparação,  sendo  relevante  a  fundamentação  da 

demanda rescisória[36]. 

Em seu posicionamento, NERY JÚNIOR afirma que 

O  risco  político  de  haver  sentença  injusta  ou 

inconstitucional no caso concreto parece ser menos 

grave  do  que  o  risco  político  de  instaurar‐se  a 

insegurança  geral  com  a  relativização  (rectius: 

desconsideração)  da  coisa 

julgada...Desconsiderar a  coisa  julgada  é 

eufemismo  para  esconder‐se  a  instalação  da 

ditadura,  de  esquerda  ou  de  direita,  que  faria 

desaparecer a democracia que deve ser respeitada, 

buscada e praticada pelo processo. 

Relembra  a  Lei  para  Intervenção  do  Ministério  Público  no 

Processo  Civil,  assinada  em  15.7.1941  por  Adolf  Hitler,  a  qual  dava 

poderes ao Ministério Público para decidir se a lei era justa ou injusta, 

se  atendia  aos  anseios  do  povo  alemão  e  aos  fundamentos  do Reich 

alemão, servindo como instrumento do totalitarismo para interpretar a 

coisa julgada e rescindi‐la. 

Para  o  autor, Desconsiderar a  coisa  julgada  configura  ofensa  à 

CRFB, deixando‐se de dar aplicação ao princípio fundamental do Estado 

Democrático de Direito, só sendo possível abrandar a coisa julgada nas 

 

 

 

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espécies  taxativamente  previstas  em  lei  como  a  ação  rescisória,  os 

embargos  do  devedor  na  execução  por  título  judicial,  a  revisão 

criminale a coisa julgada segundo o resultado da lide[37]. 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer deste trabalho foi discutido sobre o instituto da coisa 

julgada.  Ao  longo  de  cada  capítulo  foram  expostas  considerações 

sobremaneira importantes para o alcance das conclusões obtidas. Com 

isso,  concretiza‐se  a  finalidade do  trabalho de pesquisa monográfica, 

respondendo  às  questões  formuladas  e  atendendo  às  pretensões 

deduzidas no seu desenvolvimento.

Pôde‐se constatar que a  coisa  julgada é um  instituto de  função 

essencialmente  prática  que  existe  com  a  finalidade  de  assegurar 

estabilidade  à  tutela  jurisdicional  e  que  corresponde  ao  "bem",  à 

"relação",  ao  caso  sobre  o  qual  as  partes  litigaram  em  juízo  após  a 

demanda  restar  solucionada  pela  sentença  que  houver  rejeitado  ou 

acolhido o pedido da parte autora, podendo esse bem ser  tanto uma 

coisa  em  si  quanto  um  direito,  sendo  que  este  "bem  da  vida" 

assegurado às partes pela sentença constitui a coisa julgada[38]. 

No  que  tange  a  sua  natureza  jurídica,  vimos  existirem  duas 

correntes principais e conflitantes,  sendo que para uma delas a coisa 

julgada era um instituto de natureza substancial e para a outra ela era 

um instituto de natureza processual e que, uma vez distinguidas ambas 

as  correntes,  pôde‐se  perceber  que  o  CPC  em  vigor  adota  a  teoria 

processual. Foram também demonstradas asfunções positiva e negativa 

da coisa julgada.  

A  coisa  julgada  pode  ser  formal  e/ou  material,  sendo  que 

conforme  LIEBMAN,  a  primeira  nada  mais  é  que  uma  qualidade  da 

sentença, quando a mesma já não é recorrível por força da preclusão 

dos recursos, sendo a coisa julgada material a sua eficácia específica e 

propriamente, a autoridade da coisa julgada, condicionada à formação 

 

 

 

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daquela.  Todas  as  sentenças  são  suscetíveis  de  coisa  julgada  formal, 

mas  apenas  as  que  acolhem ou  rejeitam  o mérito  são  suscetíveis  de 

coisa julgada material[39]. 

Foi  discutida  a  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada,  tendo‐se 

concluído  que  esta  se  manifesta  no  impedimento  que  surge,  com  o 

trânsito em julgado da decisão, à discussão e apreciação de questões 

suscetíveis de influir, uma vez solucionadas, no teor do pronunciamento 

judicial, ainda que não examinadas pelo juiz. 

Pôde‐se  perceber  que  existem  duas  correntes  atuais  quanto  à 

possibilidade  ou  não  de  relativização  da  coisa  julgada material.  Uma 

delas  posiciona‐se  pelo  entendimento  de  ser  a  coisa  julgada  uma 

garantia  constitucional,  porém  não  absoluta,  sendo  passível  de 

relativização, até mesmo por normas infraconstitucionais, mas que essa 

relativização deve ser  feita por meios processuais adequados como a 

ação rescisória, os embargos do executado e aquerela nullitatis, a fim 

de  se  evitar  que  a  possibilidade  de  desconsideração da  coisa  julgada 

gere insegurança jurídica. 

REFERÊNCIAS

ALVIM,  José  Eduardo  Carreira. Elementos  de  teoria  geral  do 

processo.7.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998.

ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e Coisa Julgada. Rio de Janeiro: 

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material in  Relativização  da  coisa  julgada:  enfoque  crítico,  v.2.Fredie 

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janeiro: Lumen Juris, 2011. 

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KLIPEL,  Rodrigo;  BASTOS,  Antonio  Adonias.Manual  de  processo 

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LEAL, Rosemiro Pereira, coordenador e colaborador. O ciclo teórico 

da  coisa  julgada:  de  Chiovenda  a  Fazzalari.  Belo  Horizonte:  Del  Rey, 

2007 

LIEBMAN, Enrico  Tullio.  Decisão  e  coisa  julgada.Revista  Forense, 

mar/1947. 

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sobre  a  coisa  julgada;  Tradução  de  Alfredo  Buzald  e  Benvindo  Aires; 

tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao 

direito  brasileiro  vigente,  de  Ada  Pellegrini  Grinover,  2.ed.  Rio  de 

Janeiro: Forense, 1981. 

LOPES,  BrunoVasconcelos  Carrilho. Limites  objetivos  e  eficácia 

preclusiva da coisa julgada. São Paulo: Saraiva, 2012. 

 

 

 

        35 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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____________.  A  eficácia  preclusiva  da  coisa  julgada 

material. Revista dos Tribunais. São Paulo: jul/1972. 

_____________. Os limites objetivos da coisa julgada no sistema do 

novo Código de Processo Civil.Revista Forense, abr‐jun/1974. 

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(Desconsideração) da coisa julgada e o estado democrático de Direito 

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THEODORO  JÚNIOR,  Humberto.  A  reforma  do  processo  de 

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TUCCI,  José  Rogério  Cruz  e. Limites  subjetivos  da  eficácia  da 

sentença  e  da  coisa  julgada  civil. São  Paulo:  Editora  Revista  dos 

Tribunais, 2006. 

NOTAS:

[1] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.189.

[2] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p. 216; GASTAL, Alexandre Fernandes. A coisa julgada: sua natureza e funções in Eficácia e coisa julgada: atualizada de acordo com Código Civil de 2002. C.A. Alvaro de Oliveira (org). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.195-197.

[3] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ainda e sempre a coisa julgada. Revista dos Tribunais. São Paulo: jun/1970, p.09.

[4]MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ainda e sempre a coisa julgada. Revista dos Tribunais. São Paulo: jun/1970, p.09-11.

[5]Ibid, p.16-17.

[6] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.189-191.

[7] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.192-194.

[8] ALVIM, José Eduardo Carreira. Elementos da teoria geral do processo. Rio de janeiro: Forense, 1998, p.283.

[9] GASTAL, Alexandre Fernandes. A coisa julgada: sua natureza e funções in Eficácia e coisa julgada: atualizada de acordo com Código Civil de 2002. C.A. Alvaro de Oliveira (org). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.187.

 

 

 

        37 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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[10] BARRETO, Lucas Hayne Dantas.Responsabilidade civil do Estado por atos jurisdicionais: releitura à luz do direito fundamental à boa jurisdição. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal da Bahia, 2012, p.157.

[11] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.207-213.

[12] GASTAL, Alexandre Fernandes. A coisa julgada: sua natureza e funções in Eficácia e coisa julgada: atualizada de acordo com Código Civil de 2002. C.A. Alvaro de Oliveira (org). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.188-192.

[13] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.215.

[14] BARRETO, Lucas Hayne Dantas.Responsabilidade civil do Estado por atos jurisdicionais: releitura à luz do direito fundamental à boa jurisdição. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal da Bahia, 2012, p.158.

[15] LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p.15-17.

[16]Ibid., p.19-20.

[17] LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 37-42.

[18] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ainda e sempre a coisa julgada. Revista dos Tribunais. São Paulo: jun/1970, p.11-15.

[19] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.238-242.

 

 

 

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[20] MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil/Giuseppe Chiovenda. Campinas: Bookseller,1998, p. 249-251.

[21]KLIPPEL, Rodrigo; BASTOS, Antonio Adonias Bastos. Manual de Processo Civil, 2.ed.atual. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 451.

[22] ALVIM, José Eduardo Carreira. Elementos da teoria geral do processo. Rio de janeiro: Forense, 1998, p.284-285.

[23] LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 60-61.

[24]MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ainda e sempre a coisa julgada. Revista dos Tribunais. São Paulo: jun/1970, p.14-15.

[25]ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.219-221.

[26]Ibid, p.227-228.

[27] LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p.60.

[28]LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p.68.

[29] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2011, p.507-508.

 

 

 

        39 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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[30] MOREIRA, José Carlos Barbosa. A eficácia preclusiva da coisa julgada material. Revista dos Tribunais. São Paulo, jul/1972, p.15-21.

[31] SÁ, Renato Montans de. Eficácia preclusiva da coisa julgada. São Paulo: Saraiva, 2011, p.210-215.

[32]Ibid p. 234.

[33] THEODORO JÚNIOR, Humberto. A reforma do processo de execução e o problema da coisa julgada inconstitucional. Revista Brasileira de Estudos Políticos, n.89, jan-jun/2004, p.67-71.

[34]Ibid, p.76-81.

[35] CÂMARA, Alexandre Freitas. Relativização da coisa julgada material. Relativização da coisa julgada: Enfoque crítico/Fredie Didier Jr.(organizador), Salvador: jusPODIVM, 2004, p.16-19.

[36] CÂMARA, Alexandre Freitas. Relativização da coisa julgada material. Relativização da coisa julgada: Enfoque crítico/Fredie Didier Jr.(organizador), Salvador: jusPODIVM, 2004, p. 24-27.

[37] NERY JÚNIOR, Nelson. A polêmica sobre a Relativização (Desconsideração) da coisa julgada e o estado democrático de Direito in Relativização da coisa julgada: Enfoque crítico. Fredie Didier Jr.(organizador), Salvador: jusPODIVM, 2004, p.194-200.

[38] ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: Aide Ed, 1992, p.197.

[39] LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. Tradução de Alfredo Buzald e Benvindo Aires; tradução dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao direito brasileiro vigente, de Ada Pellegrini Grinover, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p.60.

 

 

 

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PROTEÇÃO AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL

EDENILDO SOUZA COUTO: Bacharel em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (2011). Aluno laureado pela Instituição supracitada. Pós-graduado em Direito Processual Civil pelo Juspodivm (2015). Assessor de Juiz (TJBA). Professor de diversas disciplinas do Direito;

Resumo: O presente estudo faz análise do Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) e verifica o ativismo judicial estrutural dialógico, nas declarações de ECI, na proteção dos Direitos Fundamentais. O Estado de Coisas Inconstitucional é fenômeno de fatores agressivos aos Titulares dos Direitos Fundamentais. Quando declarado pelo Judiciário, autoriza o ativismo judicial estrutural dialógico. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal declarou o Estado de Coisas Inconstitucional e valeu-se deste tipo de ferramenta para resguardar os Direitos Fundamentais dos presidiários. Ocorre que vários doutrinadores questionaram a legitimidade de tais medidas. Alegaram lesão ao Princípio da Separação dos Poderes; sustentaram que o Judiciário está criando falsa esperança de que as mazelas estruturais brasileiras seriam resolvidas por meio de sentença; apregoaram que o próprio instituto não logrou êxito na Colômbia, país em que o Estado de Coisas Inconstitucional foi declarado pela primeira vez. Este estudo, todavia, revela, com fundamento em doutrina abalizada, que o ativismo judicial estrutural deve ser utilizado para salvaguardar os Direitos Fundamentais todas as vezes em o Estado de Coisas Inconstitucional for declarado.

Palavras-chave: Estado de Coisas Inconstitucional. Ativismo Judicial Dialógico. Direitos Fundamentais.

Sumário: Introdução. 1. Origem da declaração do Estado de Coisas Inconstitucional. 2. O ECI no Brasil: Reconhecimento e

 

 

 

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Consequências. 3. Divergência Doutrinária. 4. Defesa à legitimação do ativismo judicial estrutural dialógico nos casos de declaração de ECI. Conclusão.

INTRODUÇÃO

O Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) corresponde a um fenômeno formado por uma série de fatores agressivos a uma gama de titulares dos Direitos Fundamentais.

Sua verificação, por sua vez, autoriza o ativismo judicial estrutural dialógico.

É bom, de logo, propugnar, que partimos da premissa de que o Estado de Coisas Inconstitucional não é uma ferramenta propriamente dita, mas uma situação fática apurada no mundo empírico.

Sua existência, portanto, independe de qualquer declaração judicial.

Ele é fruto do mau uso das atribuições públicas. Advém do engessamento dos Poderes Públicos frente ao perecimento dos Direitos Fundamentais.

Agora, uma vez percebido e declarado na esfera jurisdicional, o ECI legitima o uso do ativismo judicial estrutural dialógico.

Com efeito, o Juiz Constitucional, no exercício das atividades judicantes, ao reconhecer a existência, em análise empírica, do ECI, busca afastá-lo, exarando decisão que exorbita os sujeitos parciais do processo e alcança todos os Agentes Estatais, mesmo que pertencentes aos Poderes Executivo e Legislativo, dotados de atribuições institucionais suficientes para o cumprimento do

 

 

 

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desiderato perseguido. Este tipo de ato, por sua vez, exige um verdadeiro diálogo entre os Três Poderes, a fim de que a medida judicial seja cumprida.

1. ORIGEM DA DECLARAÇÃO DO ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL

A espécie em apreço foi declarada, pela primeira vez, em 1997 pela Corte Constitucional Colombiana (CCC)[1]. Segundo aquela Casa, para o reconhecimento do Estado de Coisas Inconstitucional, mister se faz a presença dos seguintes elementos:

a. A vulneração massiva e generalizada de vários direitos constitucionais que afetam um número significativo de pessoas;

b. a prolongada omissão das autoridades no cumprimento de suas obrigações voltadas à concessão destes direitos;

c. a inexistência de medidas legislativas, administrativas ou orçamentária necessárias para evitar a violação destes direitos;

d. a existência de um problema social, cuja solução demanda um conjunto complexo e coordenado de ações e que exija destinação orçamentária elevada;

e. a verificação de congestionamento do Judiciário, casos os titulares dos direitos afetados demandassem individualmente.

2. O ECI NO BRASIL: RECONHECIMENTO E CONSEQUÊNCIA.

Recentemente, o Pleno da Suprema Corte do Brasil, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 347/DF[2], após reconhecer o Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) no Sistema Prisional Brasileiro, deferiu, em parte, medida cautelar[3]:

 

 

 

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1. Para determinar aos juízes e tribunais que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão;

2. para determinar que a União procedesse ao desbloqueio do saldo acumulado no Fundo Penitenciário Nacional.

3. para impedir novos contingenciamentos, pelo Executivo, do Fundo supracitado.

A decisão em comento, além de inovadora, ante o uso de instituto genuinamente colombiano, abre precedentes para novas correções, pelo Judiciário, de distorções causadas pela paralisia dos Poderes Executivo e Legislativo em vilipêndio aos Direitos Fundamentais.

3. DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA

Muito embora a decisão destacada acima tenha caráter precário, não tardou para que se verificasse, no bojo do assunto, o surgimento de correntes doutrinárias antagônicas.

De um lado, para os defensores do Estado de Coisas Inconstitucional como legitimador do ativismo judicial estrutural dialógico, por todos o professor Dirley da Cunha Júnior[4], a espécie consubstancia-se em verdadeira arma de defesa dos Direitos Fundamentais.

De outro lado, encabeçada por Raffaele Giorgi e Celso Capilongo[5], tem-se a corrente formada por aqueles que sustentam, em apertada síntese, que o ativismo judicial na declaração de ECI leva o Judiciário a se intrometer na consecução

 

 

 

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das políticas públicas, ferindo o Princípio da Separação dos Poderes, consagrado no Artigo 2º da Constituição Federal de 1988.

Além do mais – alegam - que longe de ser uma solução, seria justamente o oposto, ao criar uma ilusão de que as decisões dos Tribunais estariam aptas a sanar problemas estruturais que acompanham o nosso País desde sua origem.

Sustentam, ainda, que a declaração de Estado de Coisas Inconstitucional não foi capaz de resolver os problemas do Sistema Prisional colombiano.

A celeuma ora apresentada erige na doutrina um “racha” como poucas vezes se viu, bem como uma discussão que se encontra longe de ser findada.

Em uma análise perfunctória pelos largos corredores da internet, por exemplo, logo se vê textos de diversos autores - alguns conhecidos; outros anônimos que muitas vezes sem embasamento técnico adequado - aderem a primeira ou a segunda corrente.

Pois bem.

4. DEFESA À LEGITIMAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL ESTRUTURAL DIALÓGICO NOS CASOS DE DECLARAÇÃO DE ECI.

Entendemos que razão assiste a primeira corrente apresentada neste trabalho.

Primeiro porque o Princípio da Separação dos Poderes deve ser mitigado para permitir a preservação dos limites imanentes dos direitos fundamentais, da forma apregoada, com brilhantismo, por Robert Alexy[6].

 

 

 

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Além do mais, é importante notar que a própria Separação dos Poderes, na maneira como foi pensada por Montesquieu[7] tem sua ratio essendi calcada na limitação do arbítrio: o Poder foi tripartido, justamente, para que os seus detentores, dentro do Sistema de Freios e Contrapesos[8], pudessem criar mecanismo de se conterem.

Se é assim, legitimado encontra-se o Poder Judiciário para impedir a violação dos direitos fundamentais pelos demais Poderes.

Segundo porque os efeitos da declaração do ECI não importam uma usurpação, pelo Judiciário, das funções intrínsecas aos outros Poderes.

Com efeito, o próprio cumprimento das ordens emanadas em tais circunstâncias demanda uma ação estrutural e coordenada, o que exige o diálogo entre as autoridades de Todos os Poderes. Neste sentido, preleciona, com maestria, George Marmelstein Lima, verbis:

Esse processo de diálogo institucional é o que se pode extrair de mais valioso do modelo colombiano. A declaração do Estado de Coisas Inconstitucional é, antes de mais nada, uma forma de chamar atenção para o problema de fundo, de reforçar o papel de cada um dos poderes e de exigir a realização de ações concretas para a solução do problema. Entendida nestes termos, o ECI não implica, necessariamente, uma usurpação judicial dos poderes administrativos ou legislativos. Pelo contrário. A ideia é fazer com que os responsáveis assumam as rédeas de suas atribuições e adotem as medidas, dentro de sua esfera de competência, para solucionar o

 

 

 

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problema. Para isso, ao declarar o estado de coisas inconstitucional e identificar uma grave e sistemática violação de direitos provocada por falhas estruturais da atuação estatal, a primeira medida adotada pelo órgão judicial é comunicar as autoridades relevantes o quadro geral da situação. Depois, convoca-se os órgãos diretamente responsáveis para que elaborem um plano de solução, fixando-se um prazo para a apresentação e conclusão desse plano. Nesse processo, também são indicados órgãos de monitoramento e fiscalização que devem relatar ao Judiciário as medidas que estariam sendo adotadas[9]

Terceiro porque, ao contrário do que é sustentado por alguns defensores da corrente contrária, o ativismo judicial decorrente do reconhecimento do ECI não cria uma falsa ilusão de que todas as mazelas sociais serão resolvidas pelo Judiciário.

Ao contrário, não resta qualquer dúvida, de que a espécie deva recair sobre situações excepcionalíssimas. E a efetivação da ordem depende, conforme dito alhures, de ação coordenada e harmônica de todos os Poderes do Estado.

Quarto porque, de fato, em um primeiro momento, a o ativismo judicial estrutural na Colômbia, com a declaração do ECI, não resolveu as mazelas dos cárceres daquele Estado. Todavia, o argumento é inservível para desautorizar a declaração do ECI.

Isto porque não se pode condenar à morte um instituo tão complexo, por meio de um único resultado obtido.

Acrescente-se a isto que o próprio Judiciário da Colômbia reconheceu os erros da maneira como o ativismo foi praticado: de

 

 

 

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forma autoritária e sem a participação dos Poderes. Estão, por consequência, aplicando as correções devidas para o êxito de suas ações.

Não é por menos que neste estudo defende-se que, ao declarar o ECI, o Judiciário deverá dialogar (daí o uso da expressão dialógica) com os outros Poderes, de sorte que o cumprimento das ordens emanadas seja de forma harmônica. Neste ponto, o Juiz passa a ser um coordenador institucional[10]

Quinto porque, com a eclosão do modelo político do Estado Democrático de Direito, instituído no Brasil, a partir da Constituição Federal de 1988, a Função típica do Poder Judiciário incorporou um poder-dever além do que possuíra no modelo garantista do Estado Liberal ou do modelo provedor do Estado Social (welfare state).

CONCLUSÃO

De tal maneira, conclui-se que não deve o Poder Judiciário deixar de tutelar os Direitos Fundamentais, mormente aqueles ligados à Dignidade da Pessoa Humana, quando os detentores dos outros Poderes deixarem de adotar políticas públicas mínimas para resguardá-los.

Assim, o Estado de Coisas Inconstitucional legitima o ativismo judicial estrutural dialógico.

REFERÊNCIAS:

ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002

CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. JOTAMundo: Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: <http://jota.info/jotamundo-estado-de-coisas-inconstitucional>

 

 

 

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CUNHA, Dirley da. Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: <http://brasiljuridico.com.br/artigos/estado-de-coisas-inconstitucional>.

GIORGI, Raffaele De; FARIA, José Eduardo; CAPILONGO, Celso. Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: <opiniao.estadao.com.br/noticias/geral%2cestado-de-coisas-inconstitucional%2c10000000043>

LIMA, George Marmelstein. O Estado de Coisas Inconstitucional – ECI: apenas uma nova onda do verão constitucional? Disponível em: < http://direitosfundamentais.net/2015/10/02/o-estado-de-coisas-inconstitucional-eci-apenas-uma-nova-onda-do-verao-constitucional/>

MONTESQUIEU, Charles Louis de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Editora, 2005

NOTAS:

[1] LIMA, George Marmelstein. O Estado de Coisas Inconstitucional – ECI: apenas uma nova onda do verão constitucional? Disponível em: < http://direitosfundamentais.net/2015/10/02/o-estado-de-coisas-inconstitucional-eci-apenas-uma-nova-onda-do-verao-constitucional/>. Acessado em18 de dezembro de 2015.

[2] ADPF n. 347/DF. Relator. Ministro Marco Aurélio de Melo. Pode ser conferida em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4783560#>

[3] Decisão disponibilizada no DJe em 14.09.2015

[4] CUNHA, Dirley da. Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: <http://brasiljuridico.com.br/artigos/estado-de-coisas-inconstitucional>. Acessado em 20 de dezembro de 2015.

 

 

 

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[5] GIORGI, Raffaele De; FARIA, José Eduardo; CAPILONGO, Celso. Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: < opiniao.estadao.com.br/noticias/geral%2cestado-de-coisas-inconstitucional%2c10000000043>. Acessado em 20 de dezembro de 2015.

[6] ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002.

[7] MONTESQUEIU, Charles Louis de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Editora, 2005.

[8] Ibid.

[9] LIMA, George Marmelstein. Opcit.

[10] CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. JOTAMundo: Estado de Coisas Inconstitucional. Disponível em: <http://jota.info/jotamundo-estado-de-coisas-inconstitucional>. Acessado em: 23 de dezembro de 2015.

 

 

 

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A USUCAPIÃO DE TERRENO EM TAMANHO INFERIOR AO LOTE MÍNIMO ESTABELECIDO PELO MUNICÍPIO

BRUNO MACHADO TAVARES: Pós-graduado em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP; Graduado em Direito pela Universidade Católica de Salvador (UCSal).

Resumo: Este trabalho visa a análise e o estudo de um importante tema no nosso ordenamento jurídico pátrio em vigor, qual seja, a discussão acerca da possibilidade de haver a usucapião especial de imóvel urbano com tamanho inferior ao lote mínimo legalmente estabelecido pelo ente Municipal. Portanto, serão observados a sua previsão constitucional e legal, os requisitos para a usucapião especial urbana e o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal brasileiro.

Palavras-chave: Usucapião – Lote Mínimo – Imóvel Urbano – Usucapião Especial – Entendimento Jurisprudencial do STF.

Abstract: This study concerns the analysis and the study of an important issue in our paternal law in force, namely, the discussion about the possibility of the adverse possession of urban real estate with size smaller than the minimum lot legally established by the municipal one. Therefore, will be observed its constitutional and legal provisions, the requirements for urban adverse possession and the current understanding of the Brazilian Supreme Court.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO 2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL 3. REQUISITOS PARA A USUCAPIÃO ESECIAL URBANA 4. LOTE MÍNIMO ESTABELECIDO PELO MUNICÍPIO 5. ENTENDIMENTO DO STF 6. CONCLUSÃO 7. REFERÊNCIAS.

 

 

 

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1. INTRODUÇÃO

A usucapião é um tema de suma importância para o Direito Civilista, Urbanístico e Constitucional pátrio, visto que o instituto visa a aquisição da propriedade imobiliária urbana de forma originária. Já a usucapião especial urbana tem grande relevância urbanística e constitucional, visando o beneficiamento daquelas pessoas que infelizmente compõem uma significativa parcela da população brasileira, que são as pessoas de baixa renda.

Esses fatores, somados a uma falta de ordenação do solo de forma adequada em grande parte dos municípios brasileiros, acaba por influenciar que muitas pessoas, especialmente aquelas financeiramente desfavorecidas, ocupem imóveis urbanos, muitas vezes abandonados, com intuito de ali estabelecer moradia, como se dono fosse. Atento às necessidades de se estabelecer um adequado ordenamento e ocupação do solo urbano, de regularização e identificação dos proprietários das respectivas unidades imobiliárias, o próprio texto constitucional previu expressamente o instituto da usucapião especial urbana, estabelecendo expressamente os seus requisitos.

A Constituição Federal foi além e previu ainda a usucapião especial rural e a legislação civilista previu outras como a ordinária, a extraordinária e, recentemente, a usucapião familiar, que é estabelecida em razão de uma união estável. No entanto, trataremos no presente trabalho apenas e tão somente da usucapião especial urbana, prevista no Estatuto da Cidade e que tem um viés mais voltado para o Direito Urbanístico.

Além dos requisitos constitucionalmente expressos, veremos ainda uma controvérsia que surgiu acerca da possibilidade de haver reconhecida a usucapião de imóvel urbano, quando o tamanho e dimensões do terreno for inferior ao lote mínimo estabelecido legalmente pela Municipalidade competente. Como

 

 

 

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cediço, os Municípios têm competência para suplementar a legislação federal e estadual acerca do Direito Urbanístico, devendo editar leis que possam estabelecer limites ou regulamentar a matéria cujo interesse seja de âmbito local.

Assim, conforme expressa previsão em legislação federal, há o reconhecimento da competência Municipal para definir a metragem dos lotes urbanos, assim como o estabelecimento do que se considera como lote mínimo. Ou seja, reconhece-se que cada município brasileiro detém a competência de estabelecer legalmente o lote mínimo para atender às peculiaridades de cada cidade. Por fim, veremos se é possível haver a usucapião especial urbana de imóveis cujo terreno seja inferior ao mínimo estabelecido pelo Município competente, dando enfoque ao recente entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria.

2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL

A usucapião especial urbana tem expressa previsão na nossa Constituição Federal de 1988 dentro do título que trata da ordem econômica e financeira e do capítulo que trata da ordem urbana. Portanto, vê-se que o instituto em estudo não tem cunho estritamente patrimonial, civilista, mas sim tem uma destinação mais ampla, ou seja, de ordenação urbana, estando vinculado mais ao Direito Urbanístico do que do Direito Civil propriamente dito.

Especificamente quanto ao tema, a usucapião especial urbana está expressamente prevista no artigo 183 da Constituição Federal, senão vejamos abaixo o dispositivo em sua literalidade:

“Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”

Note-se que o próprio texto constitucional já estabelece os requisitos mínimos para que seja configurada e reconhecida a

 

 

 

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usucapião especial urbana, quais sejam: área de até 250 metros quadrados; pelo período de 05 anos, de forma ininterrupta e sem oposição; com utilização do imóvel para fins de moradia própria ou de sua família; e não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Regulamentando o texto constitucional, foi editada a lei 10.257/2001, dispondo sobre o conhecido Estatuto da Cidade, de modo a disciplinar o tema aqui tratado, além de outros de interesse das Municipalidades. Já na lei federal nº 6.766/1979, que disciplina o parcelamento do solo urbano, o parágrafo único do artigo 1º deixa clara a intenção do envolvimento das três esferas federativas em disciplinar acerca do ordenamento do solo urbano, dispondo o seguinte:

“Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão estabelecer normas complementares relativas ao parcelamento do solo municipal para adequar o previsto nesta Lei às peculiaridades regionais e locais”.

É neste contexto que o legislador constitucional impôs aos Municípios brasileiros o seu direto envolvimento no que diz respeito à adequação e ordenamento do solo e da urbanização da cidade. Imposição muito bem adequada, tendo em vista que os Municípios são os entes que mais se aproximam das peculiaridades locais de cada região do nosso grandioso país.

Já em seguida, no seu artigo 9º, a citada legislação federal disciplina acerca da usucapião especial de imóvel urbano, repetindo integralmente o texto constitucional do artigo 183.

Conforme já comentado anteriormente, esse tipo de usucapião previsto constitucionalmente tem uma certa destinação social, visando amparar pessoas de baixa renda, de modo a regularizar a situação de famílias que, em grande parte, habitam imóveis abandonados, o que demonstra elevado grau de ligação do presente instituto com o Direito Urbanístico e Constitucional, não

 

 

 

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tendo caráter essencialmente civilista e patrimonial. A doutrina de Fernanda Lousada Cardoso discorreu sobre o tema, conforme transcrito abaixo:

“Essa modalidade de usucapião, por visar a aquisição de moradias, não pode ser exercida por pessoas jurídicas, apenas por pessoas físicas. Também em razão do cunho social, cada pessoa só será beneficiada uma única vez, evitando assim a concentração de imóveis pelo mesmo proprietário por meio deste instrumento. Cabe ao autor da ação demonstrar em juízo não possuir outros imóveis durante o período de exercício da posse ad usucapionem”. (destacamos)

Assim, vê-se que o tanto a intenção do legislador constitucional, quanto à do legislador infraconstitucional, foi de estabelecer um instituto de organização do solo urbano e de regularização imobiliária, amparando aquele que cuida do imóvel como se dono fosse, com a única intenção de nele habitar e estabelecer moradia para si e para sua família. Tanto é que esse tipo de usucapião está previsto no texto constitucional no capítulo que trata da política urbana, repita-se, demonstrado que se trata, em verdade, de uma modalidade de aquisição da propriedade urbana que não é essencialmente patrimonialista.

3. REQUISITOS PARA A USUCAPIÃO ESECIAL URBANA

Assim como no texto constitucional, a previsão infralegal elenca expressamente os mesmos requisitos para a aquisição da propriedade urbana de forma originária através da usucapião especial de imóvel urbano. São eles: o interessado deve possuir (i) área ou edificação urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados; (ii) por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição; (iii) utilizando-se para sua moradia ou de sua família; (iv) e desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

 

 

 

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Neste tipo de usucapião há uma nítida limitação no tamanho do imóvel a ser usucapido, repetindo na legislação o comando constitucional que estabelece que o imóvel não poderá ser maior que duzentos e cinquenta metros quadrados, o que demonstra o viés de cunho social do instituto, evitando, assim, a concentração de renda e que terrenos maiores possam ficar nas mãos de poucas pessoas.

Frise-se, desde já, que o ordenamento jurídico citado apenas impõe limitação quanto à metragem máxima do lote.

O outro requisito tem ligação com a questão temporal, ou seja, trata-se da conhecida na doutrina como prescrição aquisitiva ou uma espécie de “prescrição às avessas”, em que o passar do tempo faz com que o interessado esteja adquirindo a cada dia a propriedade imobiliária. Após o passar dos cinco anos, haverá a aquisição da propriedade de forma originária, portanto, sem que esta aquisição tenha qualquer tipo de ligação jurídica com o proprietário anterior ou com as dívidas que este porventura possuía em relação ao imóvel. No entanto, a única ressalva que a lei exige é que a posse seja exercida pelo prazo citado de forma ininterrupta e sem que haja oposição de terceiros.

A seguir, a lei exige que o imóvel seja utilizado para sua moradia ou de sua família, portanto, a destinação não deve ser essencialmente comercial, pelo contrário, a intenção da Constituição Federal e da lei foram de realizar e organizar a ordem social, facilitando a aquisição da propriedade imobiliária para fins de moradia própria e de sua família, de modo a concretizar o importante princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Entretanto, conforme lição de Fernanda Lousada Cardoso, “a lei exige a destinação do imóvel como moradia, mas não impõe o uso exclusivo. Assim, o fim comercial da parte do imóvel não descaracteriza a usucapião, desde que preponderantemente o bem seja usado como residência”.

 

 

 

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Por fim, exige-se que o interessado não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Este é outro requisito que demonstra o relevante cunho social deste tipo de usucapião, em que o único imóvel usucapiendo será suficiente para a moradia do interessado e de sua família, suficiente para o cumprimento do princípio da dignidade da pessoa humana, repise-se.

4. LOTE MÍNIMO ESTABELECIDO PELO MUNICÍPIO

Conforme previsto no texto constitucional, todos os entes federados têm competência para legislar sobre o Direito Urbanístico, porém, desde que cada ente respeite o seu âmbito de interesse, como é o caso da União que tem competência para editar normas gerais, dos Estados para editar normas regionais e dos Municípios para editarem normas de interesse local. Neste contexto, a lei geral editada pela União, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, previu expressamente que o Município poderá estabelecer normas complementares para adequar a previsão de normas gerais às peculiaridades locais.

Assim, de acordo com as peculiaridades dos mais de cinco mil Municípios que existem no Brasil, cada ente municipal terá competência para estabelecer a sua legislação urbanística, desde que atendam as disposições federais e estaduais a respeito do tema, já que se trata de uma competência suplementar.

Entre elas está a competência do Município em estabelecer o tamanho do lote mínimo. A lei do parcelamento do solo urbano é claro em dispor que a legislação local poderá tecer, com maior detalhamento, as peculiaridades de cada local, vejamos abaixo:

“Art. 4º, II: os lotes terão área mínima de 125m2 (cento e vinte e cinco metros quadrados) e frente mínima de 5 (cinco) metros, salvo quando a legislação estadual ou municipal determinar maiores exigências, ou quando o loteamento se destinar a urbanização específica ou

 

 

 

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edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes”. (destaques não constam do original)

O Município, portanto, pode estabelecer a definição de lotes com tamanhos menores ou diferentes daqueles previstos em legislação federal ou estadual, de modo a atender às suas peculiaridades locais. Válido transcrever a doutrina de Fernanda Cardoso a respeito do tema: “a lei 6.766/1979 é expressa ao reconhecer a competência municipal para definir a metragem dos lotes urbanos. Em uma mesma cidade é possível estabelecer mais de um tamanho de lote (...)”

E como restou estabelecido constitucional e legalmente um limite máximo de 250m2 para que se reconheça a usucapião especial de imóvel urbano, a dúvida que imperava no âmbito doutrinário e jurisprudencial era no sentido de ser viável ou não a usucapião em imóveis menores que o limite mínimoestabelecido na legislação municipal. O tema divergiu bastante, sendo que a própria Fernanda Cardoso discorreu sobre o tema, conforme transcrição abaixo:

“Vem aumentando a demanda junto ao Judiciário do reconhecimento de aquisição da propriedade imobiliária por usucapião de área menor que o lote mínimo definido por lei para a região. São situações em que o ocupante tem a posse dos fundos de um terreno ou de apenas um corredor de um grande lote. Nesses casos, há o conflito entre o direito de propriedade e o dever do Ente Público em ordenar o espaço urbano. Há quem entenda pela impossibilidade jurídica do pedido no caso da área usucapienda ser menor que o lote mínimo. Neste caso, buscar-se-ia uma burla à legislação municipal de parcelamento do solo”. (destaques nossos)

Assim, vê-se que há direitos constitucionais em conflito e que a divergência doutrinária e jurisprudencial, de fato, existia. Com o passar do tempo, houve o reconhecimento da repercussão geral

 

 

 

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do tema no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que se posicionou acerca da matéria controvertida.

5. ENTENDIMENTO DO STF

A celeuma, finalmente, chegou ao Supremo Tribunal Federal no ano de 2015 que decidiu da seguinte forma:

“RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI EMENTA: Recurso extraordinário.Repercussão geral. Usucapião especial urbana. Interessados que preenchem todos os requisitos exigidos pelo art. 183 da Constituição Federal. Pedido indeferido com fundamento em exigência supostamente imposta pelo plano diretor do município em que localizado o imóvel. Impossibilidade. A usucapião especial urbana tem raiz constitucional e seu implemento não pode ser obstado com fundamento em norma hierarquicamente inferior ou em interpretação que afaste a eficácia do direito constitucionalmente assegurado. Recurso provido. 1. Módulo mínimo do lote urbano municipal fixado como área de 360 m2. Pretensão da parte autora de usucapir porção de 225 m2, destacada de um todo maior, dividida em composse. 2. Não é o caso de declaração de inconstitucionalidade de norma municipal. 3. Tese aprovada: preenchidos os requisitos do art. 183 da Constituição Federal, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote). 4. Recurso extraordinário provido.” (STF - RE N. 422.349-RS). (destacamos)

Assim, apesar do confronto entre direitos constitucionais – entre o direito de propriedade e o dever do ente público em ordenar o espaço urbano -, prevaleceu aquele que visa dar ao cidadão e à

 

 

 

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sua família a proteção de uma moradia, de modo a concretizar a dignidade da pessoa humana.

6. CONCLUSÃO

A usucapião especial urbana tem previsão expressa no texto constitucional, com grande relevância na prática da organização urbanística e de regularização imobiliária, sobretudo para aqueles que compõem uma grande fatia da população brasileira, que são aqueles menos favorecidos financeiramente.

Dando enfoque à moradia e com intuito habitacional, a usucapião especial urbana tem um prazo menor em relação às outras estabelecidas na legislação civilista, justamente para concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana, facilitando para aqueles a aquisição da propriedade imobiliária, cujo principal intento é de moradia do próprio interessado e de sua família. Os requisitos estabelecidos constitucionalmente para o instituto são razoáveis e condizentes com a finalidade habitacional deste tipo de usucapião.

Viu-se também que os Municípios prestam relevante papel dentro da organização urbanística, cujas competências outorgadas constitucionalmente a estes servem para especificar e detalhar as particularidades de cada municipalidade, adequando a legislação às suas peculiaridades locais. Dentre estas competências está o estabelecimento do lote mínimo em cada Município brasileiro.

Contudo, o que era empecilho para grande parte dos interessados em usucapir imóveis com metragem inferior ao lote mínimo estabelecido na legislação municipal, a recente decisão do STF resolveu por solucionar o impasse.

Assim, em acertada decisão, a nossa Suprema Corte resolveu por priorizar aquele direito que visa dar ao cidadão e à sua

 

 

 

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família a proteção de uma moradia, para viverem dignamente, debaixo de um teto, local em que todas as famílias brasileiras merecem estar, permitindo que a usucapião especial urbana possa incidir em lotes com dimensões menores àqueles estabelecidos como lote mínimo pela legislação municipal.

7. REFERÊNCIAS

CARDOSO, Fernanda Lousada. Direito Urbanístico. 3ª Ed. JusPodivm. Salvador 2012.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 14ª Ed. Saraiva. São Paulo. 2010.

TARTUCE, Fláveio. Manual de Direito Civil. Vol. Único. São Paulo: Editora Método, 2011.

Supremo Tribunal Federal, Informativo nº 783, disponível em < http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo783.htm>, acesso em 04/01/2016.

 

 

 

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A PROBLEMÁTICA DA 'RESPOSTA ÚNICA' EM PROVAS DISSERTATIVAS DE CONCURSOS PÚBLICOS E A ILEGALIDADE DA SUA COBRANÇA FRENTE À ABORDAGEM DE TEMAS NÃO PACÍFICOS, SEM PRÉVIA INDICAÇÃO NO EDITAL QUANTO ÀS LINHAS BIBLIOGRÁFICAS A SEREM ADOTADAS

MAYKELL FELIPE MOREIRA: Servidor Público Federal, escritor de artigos jurídicos e candidato ao cargo de membro do Ministério Público Federal - MPF. Possui Licenciatura em Direito pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce - FADIVALE. Já exerceu a advocacia. Já ocupou as funções de Chefe de Seção Especializada de Benefícios e Sub-Gerente em Unidade da Previdência Social, tendo abdicado das referidas funções visando maior foco nos estudos e pesquisas jurídicas.

Resumo: Tese construída com base no decisório extraído dos autos da AC 0021786-79.2003.4.01.3800/MG. 5ª Turma, e-DJF1 p.1475 de 16/06/2015, que trata da correção, em concursos públicos, de questões dissertativas versando sobre temas não pacíficos, quando não houve previsão editalícia expressa indicando bibliografia a ser adotada. Tal artigo visa apontar as violações cometidas frente aos princípios da vinculação ao instrumento convocatório, da transparência, da boa fé, e lealdade, transformando os referidos procedimentos de admissão aos cargos públicos em verdadeiros jogos de adivinhação que ferem o direito dos candidatos em ter uma prova justa, clara, isonômica e segura aos seus ditames editalícios. Abstract: Thesis builds on the decision-making extracted from the records of the AC 0021786-79.2003.4.01.3800 / MG. 5th Panel, e-DJF1 p.1475 of 06.16.2015, which is a revision of divergent essay questions in admission procedures for public office, when there was no prior notice in the procedure of public notice. This article aims to point out the violations opposite to the principles of linking the bid announcement, transparency, good faith and loyalty, making those admission procedures to public office in real guessing games that hurt the right candidates to have a test fair, clear, and safe isonomic as the dictates of the law governing such procedures. Palavras–chave: Concurso. Arbitrariedade. Instituições. Constitucional. Controle. Keywords: Office. Arbitrariness. Institutions. Constitutional. Supervise.

 

 

 

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Sumário: Introdução. 1. Noções preliminares. 2. O Abuso da Cobrança de ‘Resposta única’, quando, versando a questão de prova sobre tema não pacífico na doutrina e jurisprudência, não houve prévia e expressa indicação editalícia, quanto às linhas bibliografias a serem adotadas pelos candidatos. Conclusão.

Introdução

Como já se sabe, após o STF ter firmado, em sede de repercussão geral, o entendimento de que não cabe ao Judiciário adentrar nas ‘correções ou revisões de provas de concursos' para discutir os critérios de correção adotados pelas Bancas, ficou extremamente difícil se discutir qualquer coisa que seja dentro de um concurso público. O judiciário, ao nosso ver, tem usado mal do 'princípio da soberania das bancas', tendo se utilizado desse 'salvo conduto' para se esquivar de suas responsabilidades judicantes, e se aproveitando disso para reduzir o problema do 'abarrotamento do judiciário' através dessas fugas processuais inapropriadas que, inquestionavelmente, demonstram descaso e abandono do exercício do seu múnus público e da sua tarefa pacificadora de conflitos, a qual deveria, antes de tudo, preocupar-se em corrigir as distorções abusivas cometidas por estas bancas examinadoras.

O presente artigo tem como objetivo central, adentrar na problemática da correção de exames para admissão de candidatos a cargos públicos, especificadamente no que concerne às questões dissertativas versando sobre temas não pacíficos, quando não houve previsão editalícia expressa indicando linhas bibliográficas a serem adotadas pelos candidatos. Face isto, demonstraremos como tais condutas viciam de nulidade os referidos certames, e o aspecto da transgressão de princípios basilares como da vinculação ao instrumento convocatório, razoabilidade, legalidade, transparência, boa fé, e a lealdade que deve nortear toda e qualquer relação jurídica.

1. Noções Preliminares

Refletindo juridicamente sobre o tema, e, com base em julgamento atualíssimo deste ano, cujo teor pode ser conferido nos autos da AC 0021786-79.2003.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal João Batista Moreira, Rel. Conv. Juiz Federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho (Conv.), 5ª Turma, e-DJF1 p.1475 de 16/06/2015, elaboramos o

 

 

 

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presente artigo, para trazer fundamentos à pretensão de milhares de candidatos, que se vendo diante de tais injustiças, muitas vezes não sabem como atacar esses atos pela via judicial. Este estudo, portanto, se funda especialmente no que se refere ao exame das provas dissertativas e à avaliação dos aspectos de legalidade destas, tendo o intuito de dar munição a esses candidatos, sem, contudo, esvaziar a matéria.

Seja pela via da Ação Ordinária ou seja pela via do Mandado de Segurança, uma coisa é pacífica hoje: o judiciário não tem admitido, em hipótese alguma, a chamada 'invasão da reserva do mérito administrativo' em provas de concursos públicos. Mas, de modo prático, do que exatamente se trata a chamada 'reserva administrativa'? Como é sabido, o 'mérito' é o espaço onde age a discricionariedade do administrador, é o conteúdo, e é onde este trabalha o modo como entende o conceito de 'melhor ou pior', ou mesmo 'mais ou menos adequado' no que concerne ao ato a ser praticado. É o "espaço de decisão" onde atua o agente público. Portanto, em hipótese alguma, por mais revoltante que seja, deve o candidato ao deduzir sua pretensão em juízo, recair em erros fatais como buscar convencer o julgador de que a resposta escolhida pela banca é equivocada, ou mesmo de que a sua resposta é a mais aceitável na doutrina ou jurisprudência, pois, sendo o direito uma matéria complexa, onde existem muitas correntes de pensamentos jurídicos e filosóficos sendo debatidos e ventilados o tempo inteiro, escolher aquele que melhor se encaixa no 'conceito de ideal' ou mesmo 'aceitável' é uma questão de opção, de mérito, de conteúdo, e, portanto, estar-se-ia a adentrar no âmbito da discricionariedade do administrador.

Assim, numa eventual lide sobre a temática, não devemos, por exemplo, estar preocupados se o mais correto seria responder de acordo uma ou outra ideologia ou se seria responder de acordo uma corrente mais ou menos adotada, apesar de que fundar-se na jurisprudência e doutrina dominante, nos parece sempre o mais coerente a ser feito. Ademais, não devemos objetivar que o judiciário adentre na estrutura da questão refazendo correções ou revisões, pois, como já dito, não é este o seu papel, e caso o fizesse estaria invadindo a chamada “reserva de administração”, de modo que, passemos a focar apenas nos aspectos de legalidade.

2. O Abuso da Cobrança de ‘Resposta única’, quando, versando a questão de prova sobre tema não pacífico na doutrina e jurisprudência,

 

 

 

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não houve prévia e expressa indicação editalícia, quanto às linhas bibliografias a serem adotadas pelos candidatos.

Para tornar a compreensão ainda mais clara, trataremos aqui de questões práticas e exemplificativas. Ocorre que, em um determinado certame público, o edital do concurso, qual seja a lei vinculatória do procedimento, em um dos seus títulos, dispunha que, em relação ao “conteúdo pretendido pela banca examinadora” na resolução dos estudos de caso, deveria o candidato se ater aos seguintes itens abaixo:

“A Prova de Estudo de Caso constará de 02 (duas) questões práticas, para as quais o candidato deverá apresentar, por escrito, as soluções. Na Prova Estudo de Caso (composta de 02 questões práticas), o candidato deverá desenvolver textos dissertativos. Essa prova pretende avaliar: o domínio de conteúdo dos temas abordados, a experiência prévia do candidato e a adequação às atribuições do Cargo/Área/Especialidade”.

O problema começa quando no momento de aplicação das referidas provas dissertativas, a banca cobrou um tema extremamente complexo e não pacífico na doutrina, onde seriam admitidos, pelo menos 02 (dois) posicionamentos doutrinários e bibliográficos com autores renomados de ambos os lados, mas principalmente do lado oposto ao adotado pela banca. Mas e agora, o que fazer, já que não se pode discutir qual a melhor resposta?

Bem, observe que o edital traz, de maneira clara, aquilo que o examinador pretendia em face do candidato, qual seja: que este demonstre, por meio de um 'texto dissertativo', 'domínio sobre os temas abordados', 'experiência sobre o assunto', e a 'adequação às atribuições do cargo”. Observem ainda que, em momento algum, faz referência a uma solução “objetivista, exata ou direcionada a uma ou outra vertente” - mesmo porque o texto é dissertativo e o tema era notoriamente controvertido e não pacífico, tanto na jurisprudência como na doutrina -, por conseguinte, também não faz menção que sejam observadas Bibliografias X ou Y no desenvolvimento da questão, deixando livre ao candidato desenvolver o texto, dissertando sobre a proposta, desde é claro que, “demonstrando domínio de conteúdo dos temas abordados, dentro de um texto dissertativo, não fugisse ao objetivo da questão”.

Reforçando o referido argumento, um dos itens do presente edital ainda dispunha que a prova constaria de duas questões práticas “para as

 

 

 

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quais o candidato deveria apresentar, por escrito, as soluções”, deixando claro mais uma vez, que o contexto construído pelo edital é um contexto genérico e não direcionado, nada dispondo em momento algum, quanto à observância obrigatória de um padrão bibliográfico “de direita ou esquerda”, restritivista ou expansionista, que fosse de sua predileção e escolha, e que permitisse aos candidatos, previamente conhecerem aquilo que ela, banca, de modo pré determinado esperava que os referidos se atesem em suas propostas de resoluções.

No Julgamento da AC 0021786-79.2003.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal João Batista Moreira, Rel. Conv. Juiz Federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho (Conv.), 5ª Turma, e-DJF1 p.1475 de 16/06/2015, o qual trata-se do carro chefe da construção do presente artigo, o referido relator defendera que “A divergência de opiniões sobre o tema avaliado impunha a divulgação da bibliografia a ser seguida pelos candidatos”. Vejamos a ementa da decisão:

“Concurso público. Procurador Federal de 2ª categoria. Edital n. 01/2002. Prova Discursiva. Língua Portuguesa (uso da vírgula no caso de "aposto de especificação"). Correntes de Opiniões Divergentes. Omissão do Edital e da Banca Avaliadora Quanto à Corrente a ser Observada pelo Candidato. Intervenção do Poder Judiciário. Possibilidade, no Caso Concreto.”

Ora, quando a contextualização editalícia exposta pela Banca só nos leva a um raciocínio lógico: que ante um tema notoriamente polêmico, controverso, não pacífico, o qual nem os grandes juristas se entendem ou dão as mãos a respeito, se o edital não pede, não exige uma predileção, não pode a Banca exigir logo no momento do julgamento das soluções dadas tal posição tão singular e que apenas reflete o seu posicionamento preferencial, o que configuraria indiscutível arbitrariedade (alteração das regras do jogo no meio do jogo), de modo que, tendo o candidato demonstrado “domínio do conteúdo abordado” (ainda que seja embasando em corrente oposta), a solução por ele abordada não pode ser totalmente descartada com a consequente atribuição de pontuação 'zerada'. Nesse caso, o que deve ser observado é se, realmente existe uma 'divergência bibliográfica sobre a temática envolvida', se a resposta for positiva, a segunda questão é: 'houve especificação no edital quanto a observância obrigatória de uma bibliografia x ou y? se não houve, como poderia a banca cobrar do candidato atos de adivinhação quanto à corrente de

 

 

 

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predileção da banca? De modo que, tendo o candidato elaborado uma construção dissertativa e juridicamente fundada em posicionamento também aceitável e aplicável 'na prática' forense e doutrinária, que não seja apenas fruto dos seus “devaneios jurídicos”, e, não fugindo à proposta da questão, a nota desse candidato deve ser avaliada e pontuada normalmente, de acordo o seu desempenho na 'exposição do seu conhecimento', e jamais “zerada”.

Outro fato que endossa a arbitrariedade é que, nesse mesmo exemplo, em um dos demais itens o edital previa um tópico intitulado de “critérios para atribuição de nota zero”, dentre os quais responder de acordo corrente diversa à adotada pela banca não constava dentre esses itens. Mas porque não constava? Simples, porque o edital não exigiu, em momento algum, que os candidatos se vinculassem a uma corrente 'a' ou 'b' na resolução do caso, e prova disso é que não deixou expresso em nenhum ponto da referida lei editalícia qualquer observância quanto a referências bibliográficas a serem seguidas pelos mesmos. Ora, nos parece muito óbvio que, sendo o tema divergente, com correntes admitidas de ambos os lados, não havendo especificação da banca quanto a corrente bibliográfica a ser adotada como critério avaliativo, nem constando dentre os critérios de atribuição de nota zero a fuga a essa observância, não pode a banca exigir tal postura do candidato. Voltamos a repetir, seria cobrar do candidato 'atos de adivinhação'.

Deve ser dito ainda que, quando é posto no edital um “rol” que estabelece critérios para atribuição de “nota zero”, por possuir 'natureza de punibilidade', tal rol não pode ser tratado ou entendido como um rol exemplificativo, mas sempre de forma ‘taxativa e restritiva’, jamais se podendo interpretá-lo de maneira extensiva, isto porque, na ciência do direito, é notório que só se interpreta ampliativamente rol que estabelece direitos, já aqueles que impõe sanções, são interpretados sempre de maneira “literal”, dado o princípio da tipicidade e da legalidade estrita.

Desta maneira, ao não especificar as referências bibliográficas pretendidas sobre um tema tão complexo e controvertido, a própria banca, ao nosso ver, em alto e bom som, já avisava que o que ela pretendia avaliar referia-se à “construção das soluções dadas aos casos, através de um texto na modalidade dissertativa, onde o candidato demonstrasse o “domínio de conteúdo dos temas abordados”, a experiência, dentre os demais critérios 'escritos' no edital.

 

 

 

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Inobstante o exposto, não temos uma postura dura e inarredável, longe disso, temos inclusive, um posicionamento bastante flexível quanto a essa temática, de modo que, entendemos ainda que, se previamente ao referido concurso, a banca já tivesse realizado, mesmo que através de concursos anteriores, a 'exposição de como ela enxerga a construção jurídica daquela temática” - deixando claro em outros certames, qual a sua adoção doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto - seria até dispensável essa previsão expressa no edital, uma vez que, ocorrendo isso, já haveria um ‘acervo’ de entendimentos daquela organizadora que os candidatos teriam por obrigação conhecer e seguir na sua preparação, todavia, quando se trata da primeira vez que a Banca cobra determinado posicionamento ‘controverso’ e 'não pacífico' em um exame dissertativo seu, com defensores de ambos os lados e sem especificar a bibliografia a ser adotada, seria admitir-se a cobrança de verdadeiros 'atos espíritas' em face dos candidatos, violando a isonomia, a transparência e a boa fé, haja vista que o certame passaria a se caracterizar como uma "álea", uma típica loteria, onde alguns viriam a acertar, e outros não, mesmo dominando o tema, sob a adoção de outra perspectiva, ademais também aceitável.

Por outro lado, não se discute, como já dito no início, qual a melhor ou pior resposta, nem mesmo qual a mais ou menos adequada, entre as correntes possíveis, inclusive o próprio candidato deve admitir sim a possibilidade de a banca adotar uma 'linha doutrinária' menos aceita inclusive do que aquela por ele adotada na sua resolução, devendo por outro lado questionar a violação da Banca em face do seu próprio edital, que não trouxe essas especificações quanto a predileções num sentido ou noutro no que concerne a bibliografias obrigatórias. O próprio CNJ, visando afastar a insegurança jurídica causada por parte de algumas organizadoras mais polêmicas, editou a Resolução nº 75/2009, que visa nortear os exames da magistratura, onde era muito comum esse tipo de conduta arbitrária, especialmente quando em nosso país, não se tem uma legislação que regule os procedimentos dos concursos públicos. Na verdade, é uma das poucas temáticas onde se admite que o 'violador dos direitos' seja o mesmo que edita a lei que regulará o procedimento – no caso, o edital.

Conclusão

Por fim, defendemos que não se pode admitir que Bancas de Concursos, pautadas numa “soberania” intocável, pratiquem atos

 

 

 

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arbitrários, sem a hombridade de reconhecerem seus tropeços organizativos, praticando claramente “abusos graves”, que a elas nada afetam, mas que tem a capacidade de levar a ruínas a preparação de anos e anos de muitos candidatos, de maneira lamentável. Sabemos que a chamada “reserva de administração”, termo invocado no RE 632.853/CE – Informativo 782/STF –, traz um núcleo reservado à atuação do administrador contra a invasão dos outros Poderes, especificamente no que tange ao mérito, todavia, este núcleo não é absoluto, nem mesmo os direitos fundamentais são absolutos, registre-se, pois, apesar de não competir ao Judiciário substituir a Banca Examinadora para reexaminar o conteúdo de questões nem se os critérios de correção são os mais indicados ou não, por outro lado, se houver ilegalidade, arbitrariedade, omissão editalícia (tipo de arbitrariedade), abusividade ou erro grosseiro, este poder fiscalizatório e de controle da legalidade do ato, deixa de ser um mero poder, e passa a ser um “Poder-Dever”, e, portanto, deve agir o judiciário fiscalizando esses atos, e declarando-os nulo na ocorrência desses abusos.

Referências

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 22ª edição, revista ampliada e atualizada. Ed. Lumen Juris. Rio de janeiro, 2009, pág.95.

MEIRELLES, Hely Lopes; ALEIXO, Décio Balestero; BURLE FILHO, José Emmanuel. Direito administrativo brasileiro. 38. Ed. Atual. São Paulo: Editora Malheiros, 2012.

Rel. Des. Federal João Batista Moreira, Rel. Conv. Juiz Federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho (Conv.). AC 0021786-79.2003.4.01.3800/MG. 5ª Turma, e-DJF1 p.1475 de 16/06/2015.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005.

TJPR - Órgão Especial - MSOE - 1172523-0 -Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Dartagnan Serpa Sa - Por maioria - J. 20.10.2014.

DANTAS, Alessandro. Concurso público: controle das provas discursivas pelo Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3617, 27 maio 2013. Disponível em:. Acesso em: 6 dez. 2015.

MORAES, A.D. Direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

 

 

 

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CRETELLA JÚNIOR, J. Direito administrativo brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

SEABRA FAGUNDES, MIGUEL. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário, 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

DE COUTO SILVA, ALMIRO. Correção da prova de concurso público e seu controle jurisdicional. Ed. Del Rey, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil: versão atualizada até a Emenda n. 64/2010. Disponível em: http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_04.02.2010/CON1988.pdf. Acesso em: 16.05.14.

______. Lei nº 4.717 de 29 de junho de 1965 (regula a ação popular). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4717.html.

 

 

 

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LEI DO INQUILINATO E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: BREVES E INICIAIS CONSIDERAÇÕES (*)

JAQUES BUSHATSKY: Advogado, diretor da Mesa de Debates de Direito Imobiliário (MDDI), sócio correspondente para São Paulo da Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário (ABAMI) Coautor:  JOSÉ HORÁCIO CINTRA GONÇALVES PEREIRA

O novo Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105, de 16.3.2015, com entrada em vigor após um ano de sua publicação) acarretará, sem dúvida, alterações nas ações previstas na Lei do Inquilinato (Lei nº. 8.245/91, com as modificações introduzidas pelas Leis nos. 12.112/09 e 12.744/12), em face da aplicação subsidiária do estatuto processual (art. 79, Lei nº. 8.245/91), mesmo tendo em vista a ressalva do parágrafo 2º, do art. 1046 do novo diploma: “Permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente este Código”.

Neste artigo pensamos em destacar algumas das mais relevantes novas regras procedimentais que deverão ser aplicadas nas ações de despejo e de consignação em pagamento de aluguel e acessórios da locação previstas nos artigos 58 e 67, da Lei do Inquilinato, além, por evidente, daqueles procedimentos já previstos na própria Lei nº. 8.245/91.

No fundo, adiante-se, a pretensão do novo Código é emprestar a tão sonhada celeridade à solução dos conflitos, vindo a propósito: “pretende-se que em torno do princípio da instrumentalidade do processo se estabeleça um novo método do pensamento do

 

 

 

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processualista e do profissional do foro. O que importa acima de tudo é colocar o processo no seu devido lugar, evitando os males do exagerado processualismo e ao mesmo tempo cuidar de predispor o processo e o seu uso de modo tal que os objetivos sejam convenientemente conciliados e realizados tanto quanto possível. O processo há de ser, nesse contexto, instrumento eficaz para o acesso à ordem jurídica justa.”, no dizer de Cândido Rangel Dinamarco[1].

Almeja-se (e o futuro dirá se tal se faz adequadamente) a eficácia veloz[2], tão necessária aos que tiveram direitos violados. Celeridade que, diga-se, poderá ser alcançada até mesmo por formas que não sejam, exatamente, aquelas prescritas na lei, como se extrai, por exemplo, do texto do novo art. 277: “Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade”.

Em primeiro lugar observa-se que os procedimentos “ordinário” e “sumário” que foram referidos respectivamente nos artigos 59 e 68 da Lei do Inquilinato passam a ter a denominação única de “procedimento comum”, conforme art. 318 e parágrafo único do art. 1.049, ambos do novo Código de Processo Civil. Portanto, a partir da vigência da nova lei adjetiva, as ações previstas nesses dispositivos da Lei do Inquilinato seguirão o “procedimento comum” previsto no Livro I, Título I, do novo estatuto processual.

Veio em boa hora essa reunião: o “procedimento sumário” já foi denominado “procedimento sumaríssimo”; a Constituição Federal o chamou, cogitando das “causas cíveis de menor complexidade”, de “procedimento sumariíssimo” e somente recebeu a atual designação em 1.995, talvez numa busca, pelo legislador, de razoável precisão terminológica através da supressão do sufixo que traduzia evidente incompatibilidade entre o significado e o significante, pois as extremadas síntese, concisão e velocidade não existiam. E, a realidade forense era conhecida: há anos entenderam

 

 

 

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os magistrados que o procedimento ordinário tramitava melhor que o sumário e, via de regra, passaram a decretar que processos ajuizados como sumários, seguissem como ordinários.

Por sua vez, o art. 59 da Lei do Inquilinato estabelece, de forma taxativa, as hipóteses de ações de despejo que autorizam a concessão de liminar para desocupação em quinze dias.

Pois bem, diante desse quadro comporta indagar se as ações de despejo, com fundamento diverso dos previstos nos incisos I a IX do art. 59, poderiam autorizar também a antecipação de tutela provisória. A resposta nem sempre foi pacífica, sendo suficiente atentar para as considerações expostas pelo ilustre Gildo dos Santos, em seu livro “Locação e Despejo” [3].

Todavia, agora diante do novo Código de Processo Civil que preconiza “um processo mais célere e mais justo” e, para tanto, deixa claro “que a resposta do Poder Judiciário deve ser rápida não só em situações em que a urgência decorre do risco de eficácia do processo e do eventual perecimento do próprio direito, mas, também em hipóteses em que as alegações da parte se revelam de juridicidade ostensiva deve a tutela ser antecipadamente (total ou parcialmente) concedida, independentemente depericulum in mora, por não haver razão relevante para a espera, até porque, via de regra, a demora do processo gera agravamento do dano” [4], tudo para possibilitar que todos os cidadãos tenham acesso à efetiva justiça[5].

A resposta para a eventual concessão de tutela provisória – de urgência ou de evidência – para todas as demais hipóteses de ação de despejo, ao menos em princípio, será, sem dúvida, afirmativa quando da vigência do novo estatuto processual.

Com efeito, e apenas para ilustrar esse nosso entendimento, isto é, a possibilidade de concessão de tutela provisória para as

 

 

 

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ações de despejo, independentemente das hipóteses do art.59, inciso I a IX, bem como da verificação de periculum in mora, podemos citar, como exemplo, ação de despejo por falta de pagamento em que, embora tenha ampla garantia, é vedada ao réu a emenda da mora, conforme a restrição imposta no parágrafo único do art. 62.

Assevere-se que não é nova a certeza de que a antecipação de tutela caiba nas questões locatícias[6], podendo ser buscado entendimento do Superior Tribunal de Justiça relatado pelo emérito Ministro Paulo Galloti[7] ou a conclusão do então Desembargador, hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, em sua obra "Tutela Antecipada e Locações"[8]: “A antecipação de tutela encontra campo fértil no terreno das locações. A urgência tão característica nessa forma de tutela jurisdicional afina-se com a densidade social do tema locatício, sempre desafiador não só de sensibilidade do juiz, mas também de sua prontidão no atuar a lei”

Em conclusão, pensamos ser perfeitamente atual a aplicação de tais antecipações nas locações. Por uma, não se vislumbra qualquer incompatibilidade entre a antecipação de tutela e a matéria locatícia, sob o prisma processual; por duas, as tutelas de urgência e de evidência[9] parecem desenhadas para as mais corriqueiras patologias das locações: desrespeito ao contrato, presença de risco de dano de difícil ou impossível reparação, clara conjugação dos requisitos de despejo (sendo a falta de pagamento a situação mais presente); por três, se aceita como correta a assertiva de que a velocidade processual auxilia enormemente o mercado, incentiva as locações em geral, atende as necessidades sociais. Enfim, a concessão de tutela ante a demonstração de risco do dano irreparável ou da evidência acelera o processo, resgata a confiança da sociedade, outorga segurança jurídica e torna a retomada do imóvel equilibrada.

 

 

 

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A Exposição de Motivos destaca ainda, um ponto no que nos interessa: “pretendeu-se converter o processo em instrumento incluído no contexto socialem que produzirá efeito o seu resultado. Deu-se ênfase à possibilidade de as partes porem fim ao conflito pela via da mediação ou da conciliação. Entendeu-se que a satisfação efetiva das partes pode dar-se de modo mais intenso se a solução é por elas criada e não imposta pelo juiz”.

Assim sendo, como regra, o juiz deverá designar audiência de conciliação ou de mediação (por se tratar de medida impositiva, cogente) mesmo que o autor manifeste, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, porque nessa hipótese, necessária, ainda, idêntica manifestação do réu (ambas a partes devem manifestar, expressamente, desinteresse na composição consensual). Portanto, mesmo o autor não pretendendo conciliar, o juiz deverá designar a aludida audiência de conciliação e determinar a citação do réu para que, querendo, manifeste também o seu desinteresse, por petição, com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência (art. 334, §§ 4º e 5º, novo CPC).

Vejamos para melhor elucidar o seguinte exemplo: ação de despejo por falta de pagamento, embora o autor tenha manifestado, de forma expressa, o seu desinteresse para conciliar, o magistrado, por imposição legal, deverá designar audiência de conciliação e mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência (art. 334, caput, novo CPC). Com 10 (dez) dias de antecedência o réu manifesta, por petição, o seu desinteresse.

Presumindo que tudo ocorra dentro dos prazos estabelecidos, o réu terá, como seu aliado, um tempo maior para contestar ou para emenda da mora, com evidente prejuízo para o autor, cumprindo ressaltar, ainda, que “o não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionada com multa de até dois por

 

 

 

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cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado” (art. 334, § 8º, do novo Código de Processo Civil). Por conseguinte, deverá merecer avaliação séria a aplicabilidade e a efetividade desses métodos de solução, em contraponto à necessidade da agilidade (motivadora do novo código, não esqueçamos) retratada pelas liminares e antecipações: esses longos períodos dedicados à solução consensual serão convenientes? A prática responderá.

Ainda quanto às saudáveis tentativas de conciliação e mediação, é certo que dentre os métodos adequados de solução de conflitos, por vezes possa outro, que não a mediação ou a conciliação, se mostrar apropriado, como é o caso da “consulta a especialista” quando a matéria puder ser assim solvida[10]. Nessas hipóteses os envolvidos no processo poderão se valer da possibilidade de ajuste no procedimento, como prevê o novo artigo 190.

Tratando especificamente das conciliações, olhamos para o esplêndido Setor de Conciliações do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, dando destaque para as soluções alcançadas antes de qualquer instauração de processo, exatamente os acordos “pré-processuais”, arriscando enxergar aí, num trabalho feito com muito empenho e voluntariado, um caminho que poderá ser seguido.

Realmente: durante a semana nacional da conciliação de 2014, entre os dias 24 e 28 de novembro, foram designadas na Capital, 6.829 audiências pré-processuais; destas, foram realizadas 3.327; e nestas, foram alcançados 2.197 acordos. Ou seja, 32% dos que concordaram ir ou 66% dos que foram à audiência, viram o problema resolvido. Tudo indica que o caminho apontado pelo novo Código poderá ser frutuoso, desde que bem aplicado, quando for possível fazê-lo.

 

 

 

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Quanto às ações de consignação em pagamento, reguladas pelo art. 67, da Lei n. 8.245/91, merecem diante na nova legislação somente dois apontamentos: por primeiro, a recordação de que a inicial atenderá ao disposto no novo art. 319, por força da atualização comandada pelo parágrafo 4º[11] do art. 1046; e por segundo, o destaque de que a Lei das Locações não contemplou, em momento algum, a consignação extrajudicial que vinha regrada no art. 890 parágrafo 1º, do atual Código.

Exatamente porque omissa a respeito, a Lei das Locações não contem qualquer incompatibilidade com essa modalidade introduzida na legislação processual em 1.994, que obteve sucesso imediato, a ponto de terem sido ajuizadas somente 137 ações judiciais de consignação de aluguel na Capital de São Paulo, durante o ano de 2014 (algo como 11 ações por mês, quantidade irrisória): no mais, as situações não solucionadas através de outros métodos, renderam consignações extrajudiciais.

Pois bem. O novo código de processo manteve a fórmula do depósito extrajudicial no parágrafo 1º do artigo 539, nada havendo a contrapor à franca utilização em sede das locações.

Por derradeiro, a contagem dos prazos processuais: o novo Código de Processo Civil estabelece, em seu art. 219, que na contagem dos prazos em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis, o que se aplica somente aos prazos processuais (art. 219 e seu parágrafo único), portanto, os prazos fixados na Lei do Inquilinato se submetem, sem dúvida, a essa forma de contagem seja para emenda da mora, seja para contestação e também para os prazos de desocupação porque, inegavelmente, o caráter processual dos prazos previstos pela aludida Lei do Inquilinato.

A nova lei foi amplamente debatida, estudada, é resultado de elaboração tenaz e profícua. Sabemos todos que este é somente o

 

 

 

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início, não sendo exagerado recordar o Sermão da Sexagésima, do Padre Antonio Vieira: "Palavras sem obras são tiros sem balas: atroam, mas não ferem".

Por isso, certamente a prática forense, a concretização da obra, consistirá fonte necessária para o aprimoramento da nova legislação, que trouxe algumas inovações corajosas, interessantes, as quais somente nós, advogados, juízes, promotores, a Sociedade enfim, poderemos concretiza-las, transformar os textos em Justiça, benéfica a todos.

(*) Artigo selecionado e originalmente publicado em “Opinião Jurídica - Direito Imobiliário”, volume III. São Paulo. ed. Universidade Secovi.2015.

Notas:

[1] Dinamarco, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros. 2001, p. 309-310.

[2] O artigo 4º do novo Código é incisivo: “As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

[3]Santos, Gildo dos. Locação e Despejo – Comentários à Lei 8.245/91. 6ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010,. n. 194, p. 413/415.

[4]Anteprojeto  do  Novo  Código  de  Processo  Civil  ‐  Exposição  de 

motivos.  Sítio 

em:http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. 

Acessado em: 11.05.2015.

[5] Vale recordar as palavras do Professor Kazuo Watanabe, desembargador aposentado do TJSP: “o princípio de acesso à justiça, inscrito na Constituição Federal, não assegura apenas acesso formal aos órgãos judiciários, e sim um acesso qualificado que propicie aos indivíduos o acesso à ordem jurídica justa, no

 

 

 

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sentido de que cabe a todos que tenham qualquer problema jurídico, não necessariamente um conflito de interesses, uma atenção por parte do Poder Público, em especial do Poder Judiciário. Assim, cabe ao Judiciário não somente organizar os serviços que são prestados por meio de processos judiciais como também aqueles que socorram os cidadãos de modo mais abrangente, de solução por vezes de simples problemas jurídicos, como a obtenção de documentos essenciais para o exercício da cidadania e até mesmo de simples palavras de orientação jurídica. Mas é, certamente, na solução dos conflitos de interesses que reside a sua função primordial, e para desempenhá-la cabe-lhe organizar não apenas os serviços processuais como também, e com grande ênfase, os serviços de solução dos conflitos pelos mecanismos alternativos à solução adjudicada por meio de sentença, em especial dos meios consensuais, isto é, da mediação e da conciliação”. Acesso aos 13.06.2012, emhttp://www.tjsp.jus.br/Egov/Conciliacao/Default.aspx?f=2.

[6] Na síntese sempre eficaz de Waldir Arruda Miranda Carneiro: “Aliás, anote-se, se a própria lei do inquilinato contempla casos de concessão de despejo liminarmente, é evidente que nem mesmo o legislador considerou empecilho a possibilidade de reforma ulterior da decisão” (Anotações à lei do inquilinato: lei nº. 8.245, de 18 de outubro de 1991- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p.476).

[7]“RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO. ARTIGO 273 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CABIMENTO. 1. A antecipação de tutela é cabível em todas as ações de conhecimento, inclusive nas ações de despejo.2. Recurso provido”. (REsp 595.172/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, 6ª Turma, julgado em 21/10/2004, DJ 01/07/2005 p. 662).

[8] Fux, Luiz. Tutela Antecipada e Locações. 2ª. ed. Rio de .Janeiro: Destaque, p.120.

[9] Artigos 294, 300, 303 e demais úteis do novo Código de Processo Civil.

 

 

 

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[10] Nesse caminho, Fernanda Levy: “Como podemos perceber por essas breves pinceladas, há muitas opções em meios de gestão de conflitos para além do Poder Judiciário, ficando esse portfólio sempre em aberto, como um convite permanente para a imaginação e implementação da adequação do meio ao caso concreto, na eterna busca da harmonização das relações”. (Levy, Fernanda Rocha Lourenço. Cláusulas Escalonadas – A mediação comercial no contexto da arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2013).

[11] “Parágrafo 4º: As remissões a disposições do Código de processo Civil revogado, existentes em outras leis, passam a referir-se às que lhes são correspondentes neste Código”.

 

 

 

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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA: DA CONSTRUÇÃO JURISPRUDENCIAL AO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

JOÃO PAULO MONTEIRO DE LIMA: Especialista em direito processual civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp e advogado.

RESUMO:  O  trabalho  aborda  as  principais  características  da  teoria  da 

desconsideração  da  personalidade  jurídica,  apontando  aspectos  desde 

sua  origem  até  o  atual  rito  processual  construído  pela  doutrina  e 

jurisprudência, diante da falta de prevista legal. Ao fim, destaca‐se como 

ficará o instituto com a vigência do novo código de processo civil. 

Palavras‐chave: Desconsideração – personalidade jurídica – novo código 

de processo civil. 

SUMÁRIO:  . Introdução  . Considerações gerais sobre a desconsideração 

da personalidade jurídica: conceito, origem e requisitos  . Teoria maior x 

teoria  menor  .  A  forma  inversa  de  desconsideração  da  personalidade 

jurídica  . Desconsideração da personalidade jurídica x despersonalização 

da  pessoa  jurídica  .  Previsão  legal     .  O  rito  processual  da 

desconsideração  da  personalidade  jurídica:  construção  doutrinária  e 

jurisprudencial  . A desconsideração da personalidade jurídica no código 

de processo civil de 2015 – lei 13.105/15  . Conclusão. 

 INTRODUÇÃO

O  presente  estudo  busca  uma  abordagem  do  instituto  da 

desconsideração  da  personalidade  desde  sua  construção  doutrinária  e 

jurisprudencial, até sua previsão específica no Novo código de processo 

civil,  que  entrará  em  vigor  no  mês  de  março  de  2016,  salvo  eventual 

alteração no prazo da vacatio legis. 

Para tanto, a pesquisa teve início destacando conceito, origem 

e requisitos da desconsideração, apontando, também, as teorias maior e 

 

 

 

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menor, bem como sua disciplina no Código de 1973 e na jurisprudência 

atual. Ao fim, destacou‐se a desconsideração da personalidade jurídica à 

luz do Novo CPC. 

Com isso, espera‐se que o leitor reforce o debate atinente ao 

tema, a fim de enriquecer ainda mais o conteúdo que deu ensejo a esta 

leitura. 

  CONSIDERAÇÕES  GERAIS  SOBRE  A  DESCONSIDERAÇÃO  DA 

PERSONALIDADE JURÍDICA: CONCEITO, ORIGEM E REQUISITOS 

No  direito  brasileiro  prevalece  a  separação  patrimonial 

existente entre o patrimônio de uma empresa e de seus sócios, de modo 

que os bens daquela não se confundem com os destes. Assim, a pessoa 

jurídica  tem existência distinta da dos  seus membros (texto previsto no 

art.  20 do  código  civil  de 1916),  regra esta que,  apesar de não  contida 

expressamente no código civil atual, é consequência lógica da identidade 

da pessoa jurídica. 

Mitigando  a  proteção  normativa,  contudo,  surgiu  a  teoria  da 

desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine), também 

chamada teoria da penetração na pessoa jurídica (disregard of the legal 

entity), que autoriza, em casos excepcionais, que a personalidade jurídica 

seja desconsiderada, a  fim de que os bens dos sócios sejam alcançados 

pelas dívidas da pessoa jurídica. 

O Superior Tribunal de Justiça conceitua a desconsideração da 

personalidade jurídica nos seguintes termos: 

Desconsiderar a personalidade  jurídica consiste 

em  ignorar  a  personalidade  autônoma da  entidade 

moral,  excepcionalmente,  tornando‐a  ineficaz  para 

determinados  atos,  sempre  que  utilizada  para  fins 

fraudulentos  ou  diferentes  daqueles  para  os  quais 

fora  constituída,  tendo  em  vista  o  caráter  não 

absoluto da personalidade jurídica, sujeita sempre à 

 

 

 

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teoria  da  fraude  contra  credores  e  do  abuso  do 

direito. (REsp 1208852, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 

DJ 12/05/2015). 

Impende destacar, ademais, que a responsabilização do sócio 

ou  administrador,  uma  vez  desconsiderada  a  personalidade  jurídica,  é 

integral, ou seja, além de suas quotas sociais, afastando a regra de que a 

responsabilidade do sócio  limita‐se ao seu capital social. Nesse sentido, 

somente  se  pode  falar  em  desconsideração  quando  existente  uma 

sociedade  personificada,  devidamente  registrada  (artigo  45  do  código 

civil). 

Sua  origem,  para  parte  majoritária  da  doutrina,  ocorreu  nos 

Estados Unidos, em 1809. Vejamos: 

Muito se discute acerca da origem histórica do 

Instituto  da  Desconsideração  da  Personalidade 

Jurídica. Para a maioria da doutrina, apesar de existir 

desde  o  Império  Romano  –  onde,  em  razão  da 

evolução  social,  se  chegou  a  conceber,  embora 

timidamente,  a  subjetividade  patrimonial  das 

corporações  –  o  Instituto  teve  sua  origem  nos 

Estados Unidos, em 1809, quando do julgamento do 

caso Bank of United States v. Deveaux, seguido pelo 

julgamento do caso Salomon x Salomon Co, em 1897, 

na Inglaterra[1]. 

No Brasil, Rubens Requião foi um dos primeiros doutrinadores 

a defender a aplicação da teoria, na década de 60, ainda que sem previsão 

legal. O código de defesa do consumidor, do ano de 1990, foi a primeira 

lei a prever a teoria, que, posteriormente, foi positivada pela lei Antitruste, 

do ano de 1994, pela lei de crimes ambientais, de 1998, pelo código civil 

de 2002 e, por fim, pela lei do CADE, do ano de 2011. 

 

 

 

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Em que pese aos requisitos para sua aplicação, o código civil, no 

artigo 50, dispõe que, para que seja aplicada, deve‐se observar, no caso 

concreto,  o  abuso  da  personalidade  jurídica,  que  se  caracteriza  pelo 

desvio  de  finalidade  ou  pela  confusão  patrimonial  entre  sociedade  e 

sócios. Outrossim, o simples encerramento irregular das atividades não é 

suficiente  para  autorizar  a  desconsideração  e  o  redirecionamento  da 

execução contra o patrimônio pessoal dos sócios (STJ, EREsp 1.306.553 – 

SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti). 

O código de defesa do consumidor, lei 8.078/90, em seu artigo 

28, caput, por sua vez, traz como requisitos: o abuso de direito, o excesso 

de poder, a infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou 

contrato  social,   falência,  estado  de  insolvência,  encerramento  ou 

inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. No §5º 

do  mesmo  artigo,  prevê,  ainda, que  poderá  ser  desconsiderada  a 

pessoa jurídica  sempre  que  sua  personalidade  for,  de  alguma  forma, 

obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.  

Com efeito, é notório que o CDC expressa outras possibilidades 

permissivas de desconsideração da personalidade jurídica, até mesmo em 

razão  de  seu  caráter  protecionista,  chamando  atenção  para  o §  5º 

supracitado, que permite a desconsideração diante do mero prejuízo ao 

consumidor.   

De igual modo, a lei de crimes ambientais, n. 9.605/98, prevê 

de modo expresso a desconsideração da personalidade  jurídica em seu 

artigo 4º, sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento 

de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente, sendo este o único 

requisito legal. 

Por fim, destaca‐se, em relação ao artigo 50 do código civil, que 

só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a 

prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios 

que nela hajam incorrido (Enunciado número 7 da I Jornada de direito civil 

 

 

 

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– CJF/STJ), não se admitindo sua utilização  ilimitada, a  fim de satisfazer 

tão‐somente os interesses do credor. 

 TEORIA MAIOR X TEORIA MENOR 

Fabio Ulhoa Celho[2] aponta a existência de duas teorias: teoria 

maior e teoria menor. De acordo com o autor, no que diz respeito à teoria 

maior: 

(...)  a  primeira  é  a  teoria  mais  elaborada,  de 

maior  consistência  e  abstração,  que  condiciona  o 

afastamento episódico da autonomia patrimonial das 

pessoas  jurídicas  à  caracterização  da  manipulação 

fraudulenta ou abusiva do instituto”, distinguindo‐a 

de  institutos  jurídicos  distintos,  que  apesar  de 

também  implicarem  a  afetação  de  patrimônio  de 

sócio  por  obrigação  da  sociedade,  com  ela  não  se 

confundem.  Exemplo  destes  institutos  são  a 

responsabilização por ato de má gestão, a extensão 

da responsabilidade tributária ao administrador, etc. 

(...) 

A  teoria maior  foi  expressamente  adotada  pelo  artigo  50  do 

código civil, tratando de requisitos mais rigorosos para desconsideração 

da personalidade da pessoa jurídica. 

Para  a  aplicação  da  teoria  menor,  entretanto,  exige‐se  tão‐

somente o prejuízo ao credor, o que se observa na lei 9.605, em seu artigo 

4º, e no artigo 28 do código de defesa do consumidor. 

Nesse  sentido  vale  registrar  a  conceituação  adotada  pelo 

Superior  Tribunal  de  Justiça  nos  autos  do  Recurso  Especial  n.  279273, 

assim ementado: 

RESPONSABILIDADE  CIVIL  E  DIREITO  DO 

CONSUMIDOR.  RECURSO  ESPECIAL.  SHOPPING 

 

 

 

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CENTER  DE  OSASCO‐SP.  EXPLOSÃO. 

CONSUMIDORES.  DANOS  MATERIAIS  E  MORAIS. 

MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. PESSOA 

JURÍDICA.  DESCONSIDERAÇÃO.  TEORIA  MAIOR  E 

TEORIA  MENOR.  LIMITE  DE  RESPONSABILIZAÇÃO 

DOS SÓCIOS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 

REQUISITOS.  OBSTÁCULO  AO  RESSARCIMENTO  DE 

PREJUÍZOS  CAUSADOS  AOS  CONSUMIDORES.  ART. 

28, § 5º. 

‐ Considerada a proteção do consumidor um dos 

pilares  da  ordem  econômica,  e  incumbindo  ao 

Ministério  Público  a  defesa  da  ordem  jurídica,  do 

regime  democrático  e  dos  interesses  sociais  e 

individuais  indisponíveis, possui o Órgão Ministerial 

legitimidade  para  atuar  em  defesa  de  interesses 

individuais  homogêneos  de  consumidores, 

decorrentes de origem comum. 

‐ A teoria maior da desconsideração, regra geral 

no sistema jurídico brasileiro, não pode ser aplicada 

com a mera demonstração de estar a pessoa jurídica 

insolvente para o cumprimento de suas obrigações. 

Exige‐se, aqui, para além da prova de insolvência, ou 

a  demonstração  de  desvio  de  finalidade  (teoria 

subjetiva  da  desconsideração),  ou  a  demonstração 

de  confusão  patrimonial  (teoria  objetiva  da 

desconsideração). 

‐ A teoria menor da desconsideração,  acolhida 

em  nosso  ordenamento  jurídico  excepcionalmente 

no  Direito  do  Consumidor  e  no  Direito  Ambiental, 

incide  com  a mera  prova  de  insolvência  da  pessoa 

jurídica  para  o  pagamento  de  suas  obrigações, 

independentemente  da  existência  de  desvio  de 

finalidade ou de confusão patrimonial. 

 

 

 

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 ‐  Para  a  teoria  menor,  o  risco  empresarial 

normal  às  atividades  econômicas  não  pode  ser 

suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa 

jurídica,  mas  pelos  sócios  e/ou  administradores 

desta,  ainda  que  estes  demonstrem  conduta 

administrativa proba,  isto é, mesmo que não exista 

qualquer prova capaz de identificar conduta culposa 

ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores 

da pessoa jurídica. 

‐  A  aplicação  da  teoria  menor  da 

desconsideração  às  relações  de  consumo  está 

calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28, do 

CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se 

subordina  à  demonstração  dos  requisitos  previstos 

no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de 

causar,  a  mera  existência  da  pessoa  jurídica, 

obstáculo  ao  ressarcimento  de  prejuízos  causados 

aos  consumidores.  ‐  Recursos  especiais  não 

conhecidos. (STJ, REsp: 279273‐SP, Relator: Ministro 

ARI PARGENDLER, DJ 04/12/2003).  

Em  resumo,  a  teoria  maior,  mais  rigorosa,  terá  aplicação 

quando o caso concreto sujeitar‐se às normas de direito civil.  Neste caso, 

como já visto, o mero encerramento irregular das atividades não autoriza, 

por si só, a desconsideração e o redirecionamento da execução contra o 

patrimônio pessoal dos sócios. 

A  teoria  menor,  contudo,  que  incide  com  a  mera  prova  de 

insolvência da pessoa jurídica, é aplicável aos ramos do direito protetivo, 

tais  como  o  direito  do  consumidor,  ambiental,  trabalhista  e  tributário. 

Nestes  casos,  inclusive,  admite‐se  a  desconsideração  em  virtude  do 

simples encerramento irregular das atividades da empresa devedora. 

 

 

 

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 A  FORMA  INVERSA DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE 

JURÍDICA 

Pela forma típica de desconsideração da personalidade jurídica 

os sócios ou administradores da pessoa  jurídica devedora são atingidos 

pelos efeitos da execução contra esta movida. 

Admite‐se, todavia, com base em uma interpretação teleológica 

do código civil,  a desconsideração  inversa ou  invertida, que  transfere a 

responsabilidade  pelas  dívidas  dos  sócios  à  empresa,  nos  casos  de 

confusão patrimonial. 

O Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial n. 

948.117/MS,  relatado  pela  Ministra  Nancy  Andrighi,  julgado  em 

22/06/2010, referente à desconsideração invertida, destacou que: 

(...) A desconsideração inversa da personalidade 

jurídica  caracteriza‐se pelo  afastamento  da 

autonomia  patrimonial  da  sociedade, 

para, contrariamente  do  que  ocorre  na 

desconsideração  da  personalidade propriamente 

dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, 

de  modo  a responsabilizar  a  pessoa  jurídica  por 

obrigações do sócio controlador. IV Considerando‐se 

que  a  finalidade  da disregard  doctrine é  combater 

a utilização  indevida  do  ente  societário  por  seus 

sócios, o que pode ocorrer também nos casos em que 

o sócio controlador esvazia o seu patrimônio pessoal 

e o integraliza na pessoa jurídica, conclui‐se, de uma 

interpretação teleológica  do  art. 50 do CC/02,  ser 

possível a desconsideração inversa da personalidade 

jurídica,  de  modo  a  atingir  bens  da  sociedade  em 

razão  de dívidas  contraídas  pelo  sócio  controlador, 

conquanto  preenchidos  os requisitos  previstos  na 

norma (...)  

 

 

 

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Flávio Tartuce[3] traz como exemplo do instituto em estudo: 

“(...)  a  situação  em  que  o  sócio,  tendo 

conhecimento do divórcio, compra bens com capital 

próprio  em  nome  da  empresa  (confusão 

patrimonial).  Pela  desconsideração,  tais  bens 

poderão  ser  alcançados  pela  ação  de  divórcio, 

fazendo com que o instituto seja aplicado no Direito 

de Família (...)”. 

No âmbito das Cortes estaduais a aplicação da desconsideração 

invertida também é incontroversa, valendo destacar: 

PROCESSUAL CIVIL. DISREGARD DOCTRINE - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE FORMA INVERSA. DÍVIDA DO SÓCIO QUE AUTORIZA A PENHORA DE BENS DA PESSOA JURÍDICA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1.O FUNDAMENTO ÉTICO QUE INFORMA A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA EMPRESA DEVEDORA PARA ALCANÇAR OS BENS PARTICULARES DO SÓCIO TAMBÉM AUTORIZA A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE FORMA INVERSA PARA ALCANÇAR OS BENS DA PESSOA JURÍDICA POR DÍVIDA NÃO PAGA DO SEU CONTROLADOR. 2. PRECEDENTE DO EGRÉGIO STJ - RESP 948.117/MS, DA RELATORIA DA MINISTRA NANCY ANDRIGHI. 3.CABE AO JUIZ DA EXECUÇÃO, DIANTE DA CIRCUNSTÂNCIA CONCRETA QUE SE LHE

 

 

 

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APRESENTAR, A VERIFICAÇÃO DA OCORRÊNCIA DAS HIPÓTESES AUTORIZADORAS DA DESPERSONALIZAÇÃO (ART. 50, DO CÓDIGO CIVIL). 4.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 5.SEM CUSTAS E SEM HONORÁRIOS. (TJDF, DVJ: 314932720088070007, Relator: ASIEL HENRIQUE, DJ: 22/03/2011).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE SENTENÇA - PENHORA DE BEM PERTENCENTE À EMPRESA DA QUAL É SÓCIO O EXECUTADO - TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE FORMA INVERSA - DISREGARD DOCTRINE - POSSIBILIDADE - MATÉRIAS NÃO SUBMETIDAS À ANÁLISE PELO JUIZ A QUO - OFENSA AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO - CONHECIMENTO PARCIAL - RECURSO IMPROVIDO. I - É possível aplicar a regra da desconsideração da personalidade jurídica na forma inversa quando haja a evidência de que o devedor se vale da empresa ou sociedade à qual pertence, para ocultar bens que, se estivessem em nome da pessoa física, seriam passíveis de penhora. II - As matérias não submetidas ao crivo do Juiz de 1ª instância não podem ser objeto de análise em sede de agravo de instrumento, sob pena de ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição. (TJMS, AG: 15353, Relator: Des. Josué de Oliveira, DJ 21/02/2006).

LOCAÇÃO DE IMÓVEIS - DESPEJO C.C. COBRANÇA - EXECUÇÃO CONTRA

 

 

 

        91 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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FIADORES - PESSOA JURÍDICA EM QUE OS DEVEDORES SÃO OS ÚNICOS SÓCIOS - DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA- BLINDAGEM PATRIMONIAL - ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL - ADMISSIBILIDADE - DECISÃO MANTIDA -RECURSO IMPROVIDO. Admissível a desconsideração inversa da personalidade jurídica para que o patrimônio da empresa responda pela obrigação pessoal de seus sócios, quando o conjunto probatório colacionado aos autos evidencia a utilização da sociedade para o fim de ocultar os bens dos devedores. (TJSP, AI: 4903736620108260000, Relator: Clóvis Castelo, DJ 14/02/2011).

Por fim, na IV Jornada de Direito Civil foi aprovado o Enunciado 

n. 283, que assim dispõe: “É cabível a desconsideração da personalidade 

jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da 

pessoa  jurídica  para  ocultar  ou  desviar  bens  pessoais,  com  prejuízo  a 

terceiros”.

  DESCONSIDERAÇÃO  DA  PERSONALIDADE  JURÍDICA  X 

DESPERSONALIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA 

A melhor doutrina, no que tange aos conceitos ora estudados 

(desconsideração  e  despersonalização),  aponta  tratar‐se  de  institutos 

distintos. 

Para o professor Pablo Stolze Gagliano[4]: 

“Assim  sendo,  o  rigor  terminológico  impõe 

diferenciar  as  expressões:  despersonalização,  que 

traduz a própria extinção da personalidade jurídica, e 

 

 

 

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o  termo desconsideração,  que  se  refere  apenas  ao 

seu  superamento  episódico,  em  função  de  fraude, 

abuso ou desvio de finalidade”. 

Na mesma obra o professor Pablo Stolze Gagliano[5] também 

destaca: 

“Entretanto,  reconhecemos  que,  em  situações 

de  excepcional  gravidade,  poderá  justificar  a 

despersonalização, em caráter definitivo, da pessoa 

jurídica,  entendido  tal  fenômeno  como  a  extinção 

compulsória,  pela  via  judicial,  da  personalidade 

jurídica.  Apontam‐se  os  casos  de  algumas  torcidas 

organizadas que, pela violência de seus integrantes, 

justificariam o desaparecimento da própria entidade 

de existência ideal ”. 

Na  despersonalização,  que  é  definitiva,  portanto,  ocorre  a 

extinção da pessoa  jurídica, ao passo que na desconsideração, além de 

temporária,  a  pessoa  jurídica  é  preservada,  mas  a  regra  de  separação 

entre  o  patrimônio  da  empresa  e  de  seus  sócios  é  afastada 

momentaneamente. 

 PREVISÃO LEGAL 

A  desconsideração  da  personalidade  jurídica  pode  ser 

encontrada nos seguintes dispositivos legais: 

Código civil (lei  . / ): 

Art.  50.  Em  caso  de  abuso  da  personalidade 

jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou 

pela  confusão  patrimonial,  pode  o  juiz  decidir,  a 

requerimento  da  parte,  ou  do  Ministério  Público 

quando  lhe  couber  intervir  no  processo,  que  os 

efeitos  de  certas  e  determinadas  relações  de 

 

 

 

        93 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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obrigações  sejam  estendidos  aos  bens  particulares 

dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. 

Código  de  defesa  do  consumidor  (lei 

. / ):  

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

§ 1° (Vetado). § 2° As sociedades integrantes dos grupos

societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

§ 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.

§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Lei do CADE (lei 12.259/2011)

Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da

 

 

 

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parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social.

Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

Lei de crimes ambientais (lei 9.605/98)

Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

 O RITO PROCESSUAL DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE 

JURÍDICA: CONSTRUÇÃO DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL

Em razão da falta de previsão legal quanto ao rito processual da 

desconsideração  da  personalidade  jurídica,  apesar  de  pacífica  sua 

aplicação no direito brasileiro, doutrina e jurisprudência buscaram suprir 

a omissão legislativa, apontando os aspectos processuais da teoria. 

Inicialmente, é pacífico o entendimento de ser desnecessário o 

ajuizamento  de  ação  autônoma,  podendo  o  juiz,  incidentalmente, 

determinar a desconsideração. Nesse sentido: 

FALÊNCIA.  ARRECADAÇAO  DE  BENS 

PARTICULARES  DE SÓCIOS‐DIRETORES  DE 

EMPRESA  CONTROLADA  PELA FALIDA. 

DESCONSIDERAÇAO  DA  PERSONALIDADE 

JURÍDICA (DISREGARD  DOCTRINE).  TEORIA 

MAIOR.  NECESSIDADE  DE FUNDAMENTAÇAO 

ANCORADA EM FRAUDE, ABUSO DEDIREITO OU 

CONFUSAO PATRIMONIAL. RECURSO PROVIDO. 

(...) 

 

 

 

        95 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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2. A  jurisprudência  da  Corte,  em  regra, 

dispensa  ação  autônoma  para se  levantar  o 

véu da pessoa jurídica, mas somente em casos 

de  abuso de  direito  ‐  cujo  delineamento 

conceitual  encontra‐se  no  art. 187 do CC/02 ‐, 

desvio de finalidade ou confusão patrimonial, é 

que se permite tal providência. Adota‐se, assim, 

a" teoria maior "acerca da desconsideração da 

personalidade  jurídica,  a  qual  exige  a 

configuração objetiva de tais requisitos para sua 

configuração.  (...)  (STJ, Quarta  Turma,  REsp 

693.235‐MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,  DJ 

30/11/2009)  

Ainda,  é  desnecessária  a  citação  dos  sócios  em  prejuízo  de 

quem  foi  decretada  a  desconsideração,  porquanto  os  direitos 

constitucionais à ampla defesa e ao contraditório são garantidos com a 

intimação  da  constrição,  permitindo‐se  a  defesa  posterior,  mediante 

embargos, impugnação ao cumprimento de sentença ou objeção de pré‐

executividade. Assim entende o STJ: 

DIREITO  CIVIL  E  DO  CONSUMIDOR. 

DESCONSIDERAÇÃO  DA  PERSONALIDADE 

JURÍDICA.  PRESSUPOSTOS  PROCESSUAIS  E 

MATERIAIS.  OBSERVÂNCIA.  CITAÇÃO  DOS 

SÓCIOS  EM  PREJUÍZO  DE  QUEM  FOI 

DECRETADA  A  DESCONSIDERAÇÃO. 

DESNECESSIDADE.  AMPLA  DEFESA  E 

CONTRADITÓRIO  GARANTIDOS  COM  A 

INTIMAÇÃO  DA  CONSTRIÇÃO.  IMPUGNAÇÃO 

AO  CUMPRIMENTO  DE  SENTENÇA.  VIA 

ADEQUADA  PARA  A  DISCUSSÃO  ACERCA  DO 

CABIMENTO  DA  DISREGARD.  RELAÇÃO  DE 

CONSUMO.  ESPAÇO  PRÓPRIO  PARA  A 

INCIDÊNCIA  DA  TEORIA  MENOR  DA 

 

 

 

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DESCONSIDERAÇÃO.  ART.  28,  §  5º,  CDC. 

PRECEDENTES. 

(...) 

2. A superação da pessoa jurídica afirma‐se 

como um incidente processual e não como um 

processo  incidente,  razão  pela  qual  pode  ser 

deferida  nos  próprios  autos,  dispensando‐se 

também a citação dos sócios, em desfavor de 

quem foi superada a pessoa jurídica, bastando 

a  defesa  apresentada  a  posteriori,  mediante 

embargos,  impugnação  ao  cumprimento  de 

sentença ou exceção de pré‐executividade. (...) 

(STJ,  REsp  1096604‐DF,  Rel.  Min.  Luis  Felipe 

Salomão, DJ 02/08/2012.) 

A  quarta  turma  do  STJ,  recentemente,  alterando  seu 

entendimento,  admitiu  a legitimidade  recursal  da  pessoa  jurídica  para 

impugnar a desconsideração de sua personalidade  jurídica, defendendo 

que: quando o anúncio de medida excepcional e extrema que desconsidera 

a personalidade jurídica tiver potencial bastante para atingir o patrimônio 

moral da sociedade, à pessoa jurídica será conferida a legitimidade para 

recorrer daquela decisão (REsp 1208852, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 

12/05/2015). 

Por  fim,  a  desconsideração  é  autorizada  por  decisão 

interlocutória. 

 A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO 

DE PROCESSO CIVIL DE   – LEI  . /  

O novo código de processo civil ‐ lei 13.105/15, que entrará em 

vigor em março de 2016, supera a falta de previsão legal em relação aos 

aspectos  processuais  da  desconsideração  da  personalidade  jurídica, 

dispondo em seus artigos 133 a 137 o procedimento legal do incidente. 

 

 

 

        97 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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O  Novo  código,  a  bem  da  verdade,  positiva  a  construção 

jurisprudencial  de  nossos  tribunais,  aqui  já  estudadas,  pondo  fim  a 

qualquer espécie de controvérsia sobre o tema, ditando, também, novas 

regras. 

No artigo 133, caput, o NCPC aponta como legitimados para o 

pedido  de  instauração  do  incidente  a  parte  ou  o  Ministério  Público, 

quando lhe couber  intervir no processo.   Afasta‐se, pois, a possibilidade 

de desconsideração por iniciativa do juiz. 

Ademais,  o  Novo  Código  traz  previsão  expressa  da 

desconsideração inversa da personalidade jurídica (artigo 133, §2º). 

Além disso, o incidente de desconsideração é, de acordo com 

novo código, cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no 

cumprimento  de  sentença  e  na  execução  fundada  em  título  executivo 

extrajudicial (artigo 134, caput), dispensando‐se sua instauração quando 

a desconsideração  da  personalidade  jurídica  for  requerida  na  petição 

inicial, hipótese em que, de início, será citado o sócio ou a pessoa jurídica 

(artigo 134, §2º). 

Igualmente,  com  exceção  do  pedido  requerido  na  petição 

inicial, a  instauração  do  incidente  sempre  suspenderá  o  processo,  de 

acordo com a regra disciplinada no §3º, do artigo 134.  

Em  continuidade,  o  NCPC,  prestigiando  os  direitos 

constitucionais  do  contraditório  e  da  ampla  defesa,  determina  que, 

instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica deverá ser citado para 

manifestar‐se  e  requerer  as  provas  cabíveis,  dando‐lhe  prazo  de  15 

(quinze) dias (art. 135). 

Por  fim, destaca o Novo código que o  incidente em estudo é 

resolvido por decisão interlocutória (art. 136, caput), logo, recorrível por 

agravo de instrumento (artigo 1.015,  inciso IV), entretanto, se proferida 

pelo relator, passível de agravo interno (artigo 136, parágrafo único). 

 

 

 

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 CONCLUSÃO 

Diante do exposto, podemos concluir: 

a)  no  direito  brasileiro  prevalece  a  separação  patrimonial 

existente  entre  o  patrimônio  de  uma  empresa  e  de  seus  sócios. 

Entretanto,  mitigando  a  determinação  legal surgiu  a  teoria  da 

desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine), também 

chamada teoria da penetração na pessoa jurídica (disregard of the legal 

entity). 

b)  uma  vez  desconsiderada  a  personalidade  jurídica 

a responsabilização do sócio ou administrador é integral. 

c)  a  origem  da  teoria  da  desconsideração  da  personalidade 

jurídica deu‐se, para parte majoritária da doutrina, nos Estados Unidos, 

em 1809. No Brasil, Rubens Requião foi um dos primeiros doutrinadores a 

defender a aplicação da teoria, na década de 60, ainda que sem previsão 

legal. O código de defesa do consumidor, do ano de 1990, foi a primeira 

lei  a  prever  a  teoria,  que,  posteriormente,  foi  positivada  em  outras 

legislações. 

d)  a doutrina aponta a existência de duas teorias: teoria maior 

e  teoria  menor.  A  teoria  maior,  prevista  no  artigo  50  do  código  civil, 

disciplina  requisitos  mais  rigorosos  para  desconsideração  da 

personalidade  jurídica.  Para  a  aplicação  da  teoria  menor,  entretanto, 

exige‐se tão‐somente o prejuízo ao credor 

e)  admite‐se, com base em uma  interpretação teleológica do 

código  civil,  a  desconsideração  inversa  ou  invertida,  que  transfere  a 

responsabilidade  pelas  dívidas  dos  sócios  à  empresa,  nos  casos  de 

confusão patrimonial. 

f)    existe  uma  evidente  diferença  entre  desconsideração  da 

personalidade jurídica e despersonificação. Na despersonalização, que é 

definitiva,  ocorre  a  extinção  da  pessoa  jurídica,  ao  passo  que  na 

desconsideração, além de temporária, a pessoa jurídica é preservada, mas 

 

 

 

        99 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55034  

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a regra de separação entre o patrimônio da empresa e de seus sócios é 

afastada momentaneamente. 

g)   a teoria da desconsideração é expressamente prevista nos 

seguintes dispositivos: art. 50 do código civil, artigo 28 do código de defesa 

do  consumidor,  artigo  34  da  lei  12.259/11  e  artigo  4º  da  lei  de  crimes 

ambientais. 

h)  em razão da falta de previsão legal quanto ao rito processual 

da desconsideração da personalidade jurídica, doutrina e  jurisprudência 

buscaram suprir a omissão legislativa, apontando os aspectos processuais 

da teoria. 

i)    O novo código de processo civil supera a falta de previsão 

legal  em  relação  aos  aspectos  processuais  da  desconsideração  da 

personalidade  jurídica,  dispondo  em  seus  artigos  133  a  137  o 

procedimento legal do incidente. 

REFERÊNCIAS 

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: 

Saraiva, 2005. V. 2. 

BITTENCOURT, Hayna. A desconsideração da personalidade jurídica – modalidades e possibilidade. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/rcursodeespecializacao_latosensu/direito_processual_civil/edicoes/n1_2013/pdf/HaynaBittencourt.pdf. Acesso em 21 Dez. 2015.

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 3. ed. São Paulo: Método, 

2013. V. único.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil ‐ parte geral. 13 

ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 

Notas:

 

 

 

100  

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 ‐ 1984‐0454 

[1] BITTENCOURT, Hayna. A desconsideração da personalidade jurídica – modalidades e possibilidade. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/rcursodeespecializacao_latosensu/direito_processual_civil/edicoes/n1_2013/pdf/HaynaBittencourt.pdf. Acesso em 21 Dez. 2015.

[2] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. V. 2, p. 35.

[3] Manual de direito civil. 3. ed. São Paulo: Método, 2013. V. único, p. 153.

[4] Novo curso de direito civil - parte geral. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 270.

[5] Idem. p. 269.

 

 

 

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PAMILLA CORREIA DE ARAÚJO FELIX

INDIGNIDADE DE ÚNICO HERDEIRO DESCOBERTA APÓS A TRANSMISSÃO

DE TODO O PATRIMÔNIO

Recife 2014 (Atualizada em janeiro 2016)

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Resumo

Dentro de um esquema extremamente didático, que conta com regras bem definidas

que é o processo de sucessão pós-morte em que se tem como herdeiros

necessários os parentes arrolados na nossa legislação civilista, bem como até onde

poderá os herdeiros e seus descendentes poderá ir, há causas que não foram

abrangidas por nosso legislador.Já que em casos como a indignidade que antes

taxativamente fechados, atualmente se dá margem para mais possibilidades, ocorre

que ficou de fora da regulamentação causas de indignidade descobertas após o

prazo estabelecido para que a mesma seja suscitada, já que a causa de indignidade

só fora descoberto após a extinção do mesmo.Ademais nesse caso como se

processaria a indignidade de herdeiro único descoberta findo o prazo decadencial de

seu levantamento, bem como depois de já haver te sido transmitido todo o

patrimônio para esse único herdeiro.Nesse caso como deveria ser procedido o

processo civilista de sucessão, e quais as questões que estariam rodeando tal

situação, já que não se poderia apenas prever os aspectos meramente legalista,

mas se deveria considerar a realidade das situações, bem como aplicar a interação

de vários institutos legais para que se possam balancear quais direitos e obrigações

o herdeiro único que se tornou indigno teriam, e quais as possibilidades estaria

rodeando a herança do falecido, sejam os créditos ou os débitos.

PALAVRAS-CHAVE: Sucessão legítima. Herdeiro único. Prescrição.

Indignidade

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Abstract

Within an extremely didactic scheme, which has well defined rules which is the

process of succession in postmortem that has the necessary heirs relatives enrolled

in our tort law, and how far can the heirs and their descendants could go, there are

causes that were not covered by our legislador.Já that in cases such as unworthiness

before exhaustively closed, currently gives rise to more possibilities, which is left out

of the regulatory causes of indignity discovered after the deadline for it to be raised,

since the cause of unworthiness out only discovered after the termination of this case

mesmo.Ademais sue as heir only the indignity of ending the discovery deadline of

your survey, and after you have already been transmitted to all equity herdeiro.Nesse

case like this one should be proceeded civilista the succession process, and what

issues were surrounding this situation, since not only could predict the merely

legalistic aspects, but it should consider the reality of the situations as well as apply

the interaction of various legal institutions so that they can balance rights and

obligations which the sole heir who became unworthy would, and what would be the

possibilities surrounding the estate of the deceased, whether credits or debits.

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Key-words: Legitimate succession. Sole heir. Prescription. Unworthiness. Sumário

1 Introdução 7 2 Aspectos gerais do Direito Sucessório 8 2.1 Concepção 9 2.2 Saisine 10 2.3 Legitimação para suceder 13 2.3.1 Sucessão Legítima 14 2.3.2 Herdeiro Necesário 16 3 Do processo de Sucessão 18 3.1 Da vocação hereditária 19 3.2 Das impossibilidades para suceder 20 3.3 Excluídos da sucessão por ilegitimidade, indignidade e legitimados a suscitar a indignidade

21

3.4 Herança vacante e herança jacente 25 3.5 Prazo prescricional para a petição de herança

27

4 Transmissão patrimonial e a ilegitimidade por indignidade 29 4.1 Da transmissão patrimonial 29 4.2 Único herdeiro legítimo descoberto como homicida após a transmissão de todo o patrimônio

31

5 Conclusões 34 Referências 37

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11

1 Introdução

O presente trabalho visa explanar aspectos da sucessão

hereditária, no que tange a sucessão legítima com enfoque mais precisamente ao

caso da sucessão operada em favor do cônjuge, mais precisamente o que está

disposto no artigo 1838 CC/02.

Para a presente discussão irá se considerar que só haverá o

cônjuge como herdeiro legitimo, e que não haverá herdeiros testamentários, logo

nesse caso deverá ser considerado o regime de bens escolhido para reger o

patrimônio do casal, que entre as diversas possibilidade poderá ser o regime legal

da atualidade, mais comum, pois não requer quaisquer requisitos específicos, qual

seja o da comunhão parcial dos bens, onde teríamos que o cônjuge seria ao mesmo

tempo meeiro e herdeiro único do morto.

No presente, o cônjuge supertiste que teve sua indignidade

descoberta após o término do processo sucessório, bem como teve o patrimônio

adjudicado para si, incorporando o patrimônio hereditário ao seu patrimônio pessoal,

bem como houve o decurso do prazo prescricional da possibilidade de petição de

herança, passando pelos aspectos gerais da sucessão legítima e da vocação

hereditária, além dos aspectos sobre o impedimento de suceder operado pela

indignidade.

Porém, o que se busca aferir, não de maneira exaustiva, é como se

daria o procedimento da exclusão da herança por indignidade após a finalização do

processo sucessório, bem como quem seria o legitimado a suceder nesse caso.

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12

2 Aspectos Gerais da Sucessão legítima.

A sucessão como é cediço é o instituto legítimo para a transmissão

de direitos, bens e deveres seja em vida ou post mortem. Porém a sucessão legítima

que possui livro próprio em nosso ordenamento civilista é a sucessão legítima post

mortem, ou seja a sucessão operada após a morte, é aquela ocorrida por força da

lei, aplicada antes da sucessão testamentária, onde em geral os beneficiários são os

familiares, leia-se descendentes/cônjuge, ascendentes do de cujus.

Esse tipo de sucessão pós-morte é aberta no lugar do último

domicílio do falecido, bem como a lei que a regerá,para determinar a capacidade

legitima para suceder, será a lei vigente quando da abertura da mesma, outro

aspecto que se deve considerar é a possibilidade de se incluir no rol de herdeiros

necessários a companheira (o), oriunda da união estável, onde só haverá a

sucessão dos bens adquiridos onerosamente durante a vigência da dita união, com

regras próprias no que tange a concorrência entre os herdeiros, pois se concorrer

com filhos comuns terá direito a quota equivalente de cada filho, porém se com

descendentes somente do falecido só terá direito a metade do que couber a cada

filho, já se não houver qualquer herdeiro terá direito a totalidade da herança.

Dentro dessa discussão e seguindo o que rege o nosso Codex

civilista, ocorrerá a vocação hereditária primeiramente do cônjuge concorrendo com

os descendentes, ascendentes. Ressaltando que o parentesco mais próximo exclui

de plano o mais remoto, bem como cumpre observar o processo de inventário que

irá determinar a quota parte de cada herdeiro na herança do de cujus.

No processo de sucessão ter-se-á que observar tudo quanto disser

respeito ao patrimônio do falecido, pois tanto o ativo quanto o passivo deverá ser

exposto, para que com a transmissão definitiva dos bens patrimoniais seja feita sem

ônus ao sucessível.

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13

No que tange a capacidade para suceder o próprio Código Civil,

afastou o que poderia ser um empecilho a determinados entes familiares,

transformando-a em legitimidade para suceder, tudo adiante explanado.

2.1 Concepção

Como dito alhures a sucessão no direito brasileiro é a substituição

de uma pessoa por outra em tudo quanto diga respeito ao objeto a ser sucedido,

sendo as sucessões operadas dentro do que dispõe o ordenamento jurídico pátrio.

Contudo, a sucessão neste vergastada é a operada pós-morte, que tem regulação e

procedimento próprio.

Como ensina Washington de Barros Monteiro (2012, p. 11):

Num sentido amplo, a palavra sucessão significa o ato pelo qual uma pessoa toma

o lugar de outra, investindo-se, a qualquer título, no todo ou em parte, nos direitos

que lhe competiam. No direito das sucessões, entretanto, emprega-se o vocbulo

num sentido mais restrito, para designar tão somente a tarsnferencia da herança,

ou do legado, por morte de alguém, ao herdeiro ou legatário,s eja por força de lei,

ou em virtude de testamento (hereditas nihil aliud est quam successio in universum

jus, quod defunctus habuit).

A sucessão, no questionado ramo do direito civil, tem, pois, como pressuposto, do

ponto de vista subjetivo, a morte do autor da herança.

Aprioristicamente o conceito de sucessão pós-morteb só passará a

existir a partir do momento em que não viver mais o proprietário originário do

patrimônio, no caso em questão a sucessão tratada será a sucessão mortis causa,

logo os conceitos e definições comumente utilizados como o ato de continuidade

não se encaixarão, pois a sucessão operada no âmbito legal será aquela em que se

porá o papel transmissor como fundamento para seu reconhecimento.

Assim se tem que o direito sucessório é aquele que só aparecerá

quando houver a morte de uma pessoa física, frise-se que somente acobertará a

pessoa física, e quando a mesma possuir herdeiros, contudo tal direito apesar de

surgir apenas após a morte de alguém, é direito que assiste aqueles que

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sobrevierem ao falecido, como afirma Paulo Lôbo, “o direito das sucessões não é

dos mortos, mas sim dos vivos. São estes os reais titulares e destinatários dele” (

2013, p.15).

Sendo assim para que exista tal direito se faz necessário a

ocorrência não só de uma morte, bem como a coexistência de herdeiros

sobreviventes do mesmo, levando em consideração que sempre deverá existir o

direito patrimonial, seja ativamente ou passivamente, e desde que sejam integrantes

de relações privadas, tendo em vista que para relações não patrimoniais, bem como

para manifestações de última vontade poderá o de cujus se valer do testamento

para reger como se dará alguns fatos da sua vida que fogem ao âmbito pura e

estritamente patrimonial.

Logo como ensinado por Paulo Lôbo (2013, p. 17),

supramencionado, “o direito das sucessões diz respeito às consequências jurídicas

do evento morte da pessoa física”. Não podendo surgir ou sufragar em vida do

proprietário primário do patrimônio, se desfazendo, ou dando em sucessão todo o

seu patrimônio, tendo em vista as regras próprias de garantia da reserva para os

herdeiros necessário.

2.2 Saisine

No direito brasileiro há um fenômeno que garante que a herança se

transmite automaticamente a partir do evento morte , consequentemente da abertura

da sucessão, sem necessidade de consentimento ou aceitação por parte dos

herdeiros beneficiados ou qualquer tipo de decisão, como ocorre em sistemas

jurídicos alienígenas, a essa automaticidade de transferência dá-se o nome de

saisine.

Reconhecido inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça, Superior

Tribunal de Justiça (Brasil), Recurso Especial nº 1.125.510 - RS (2009/0131588-0),

3ª Turma, relator Ministro Massami Uyeda, DJe: 19/10/2011 ( em SILVA, disponível

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15

em http://jus.com.br/artigos/23156/a-formula-saisine-no-direito-sucessorio).

O Princípio da Saisine, corolário da premissa de que inexiste direito sem o respectivo titular, a herança, compreendida como sendo o acervo de bens, obrigações e direitos, transmite - se, como um todo, imediata e indistintamente aos herdeiros. Ressalte-se, contudo, que os herdeiros, neste primeiro momento, imiscuir-se-ão apenas na posse indireta dos bens transmitidos. A posse direta ficará a cargo de quem detém a posse de fato dos bens deixados pelo de cujus ou do inventariante, a depender da existência ou não de inventário aberto.

Tal instituto é assim operacionalizado nacionalmente, pois para o

direito brasileiro a morte não deixa um vazio na titularidade do patrimônio deixado

pelo falecido, mas por força de lei já se transmite a titularidade, ainda que

precariamente e não definitivamente, aos sucessíveis, tornando relativos os poderes

de consentimento e aceitação, que em ordenamentos jurídicos estrangeiros são

poderes quase absolutórios.

Pelo princípio da Saisine, o patrimônio do de cujus será transferido

automaticamente aos seus herdeiros sucessíveis no momento da abertura da

sucessão, segundo o disposto no artigo 1.784 do Código Civil de 2002:

Art. 1.784: "Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde

logo, aos herdeiros legítimos e testamentários."

Tal princípio é apenas mais uma ficção legal, como afirmado por

Rodrigo Alves de Silva (disponível em http://jus.com.br/artigos/23156/a-formula-

saisine-no-direito-sucessorio):

O princípio da saisine é de uma ficção jurídica, que autoriza uma apreensão possessória de bens do de cujus pelo herdeiro vocacionado, legítimo ou testamentário, ope legis. Este, independentemente de qualquer ato, ingressará na posse dos bens que constituem a herança do antecessor falecido, de forma imediata e direta, ainda que desconheça a morte do antigo titular.

É mister inferir que no momento da transmissão da posse e da propriedade, o herdeiro recebe o patrimônio tal como se encontrava com o de cujus. Logo,

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transmitem-se, também, além do ativo, todas as dívidas, ações e pretensões contra ele existentes.

Arrematado por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka

(disponível em http://jus.com.br/artigos/4093):

A sucessão considera-se aberta no instante mesmo ou no instante presumido da

morte de alguém, fazendo nascer o direito hereditário e operando a substituição

do falecido por seus sucessores a título universal nas relações jurídicas em que

aquele figurava. Não se confundem, todavia. A morte é antecedente lógico, é

pressuposto e causa. A transmissão é conseqüente, é efeito da morte. Por força

de ficção legal, coincidem em termos cronológicos, (1) presumindo a lei que o

próprio de cujus investiu seus herdeiros (2) no domínio e na posse indireta (3) de

seu patrimônio, porque este não pode restar acéfalo. Esta é a fórmula do que se

convenciona denominar ‘droit de saisine’.

Por ser uma ficção legal, os efeitos de tal princípio são de

igualmente de ordem estritamente legal, tendo em vista, que se a partir do momento

da morte, o patrimônio do falecido é automaticamente transmitido aos seus

herdeiros, independem de qualquer atitude dos sucessíveis, não admitindo atitudes

voláteis de quem quer que seja.

A conseqüência lógica legal de tal instituto é que a partir de então

começam a correr para eles prazos e questões de direito, que nem sempre serão

positivos, tendo em vista que os prazos sucessórios são prescricionais, como a

prescrição do direito de abertura de sucessão definitiva, como também positivação

de direitos, pois os mesmos poderão tomar posse imediatamente dos bens, tomando

medidas conservatórias do patrimônio, bem como defendendo a posse de terceiros

estranhos, além das ações concernentes à própria sucessão.

Esse princípio apenas se tem por finalizado após todo o processo

sucessório, pois a transmissão que se operou de forma precária com a definição do

quinhão hereditário de cada legitimado sucessível estará definido, e portanto, a

transmissão não definitiva que fora operada por força da saisine passa a não mais

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existir, passando a cada sucessível a posse definitiva de seu quinhão hereditário,

quando houver mais de um herdeiro.

Contudo, no caso de herdeiro único, não haverá maiores

discordâncias ou discussões sobre a questão patrimonial, tudo será repassado

automaticamente aquele, então este terá total domínio sobre o patrimônio, mesmo

antes da finalização do processo sucessório, ou até mesmo antes da pseudo-

partilha que se operaria nesse caso, já que se está diante de herdeiro único,

tornando definitiva a saisine operada.

2.3 Legitimação para suceder

Legitimação como o próprio nome diz, não pode se confundir com

a capacidade para atos da vida civil, tendo em vista ser mais ampla que esta, pois

alcança sujeitos de direito que não são pessoas civilmente capazes no momento da

abertura da sucessão, mas que ainda assim são sujeitos titulares de direito como os

civilmente incapazes, que não possuem essa capacidade para os atos da vida civil,

porém são legítimos a suceder.

Logo, temos como legitimados todos aqueles que por sua condição

de sujeitos de direitos ligados ao de cujus serão herdeiros do mesmo, conforme

disposição legal, ou seus legatários assim atribuídos de tal por testamento. Como

regra qualquer sujeito de direito que guarde vínculos de parentesco, afetivo, moral,

assim reconhecido por testamento serão pessoas legítimas a suceder. Logo, como

afirmou Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 13), no direito das sucessões “ a

legitimidade passiva é a regra e a ilegitimidade, a exceção”.

A legitimação para suceder está elencada no Código Civil de 2002,

que trouxe alguns aspectos interessantes quanto à linha sucessória, pois erigiu a

condição de concorrência o cônjuge supérstite, bem como o companheiro, além de

incluir no rol dos sucessíveis, em caso de jacência ou vacância, a Fazenda Pública,

seja ela Municipal, Estadual ou Federal, quando não houver herdeiros conhecidos,

ou quando todos renunciarem a seu quinhão hereditário.

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18

O rol de sucessíveis elencados no Código Civil de 2002 são:

A) as pessoas físicas, tendo em vista que não cabe sucessão

legítima para as pessoas jurídicas;

B) os nascituros;

C) as pessoas físicas ainda não concebidas, ou prole eventual de

determinadas pessoas, contempladas em testamento;

D) as pessoas jurídicas designadas em testamento;

E) as entidades não personificadas, porém existentes, também

determinadas em testamento;

F) as pessoas jurídicas futuras, que serão constituídas com

legados deixados pelo testador, sob a forma de fundações.

Ainda nesse diapasão dos sucessíveis, há de se fazer uma

ressalva, pois apesar de não estar inclusa no rol dos herdeiros legítimos, a Fazenda

Pública, quando não houver quaisquer das pessoas elencadas no Código civilista,

figurará como sucessível legitimada pela jacência da herança.

2.4 Sucessão Legítima

Tendo em vista que a sucessão poderá se dar de duas formas

originárias e uma secundária, quais sejam as originárias, a sucessão legítima ou

legal , ou a sucessão testamentária, como forma de vontade última do de cujus, ou

ainda por que não se falar na sucessão secundária que é a operada quando a

herança resta jacente.

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19

Nesse intróito tem-se que a sucessão legítima se dará por força de

lei, qual seja, a sucessão vergastada no Codex civilista, obedecendo à ordem de

vocação e critérios elencados no mesmo, não podendo ser operada com alterações.

Sendo que essa somente se dará se, e quando houver herdeiros

necessários, que serão aqueles os quais a lei de forma assecuratória erigiu a um

patamar de proteção irrefutável, salvo as exceções de indignidade quando provadas,

sendo esses os entes familiares mais próximos do de cujus.

Eles serão legitimados a suceder o de cujus na totalidade, ou em

partes de seu patrimônio, quando houver ou não testamento a ser aberto, bem como

poderá não haver testamento a ser aberto, ou ser esse inválido, ou até mesmo

caduco. Como ensina Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 9), “a vocação legítima

prevalece quando não houver ou não puder ser cumprido o testamento”.

Continua ainda Venosa ( 2014, p. 123):

A ordem de vocação hereditária fixada na lei vem beneficiar os membros da

família, pois o legislador presume que ai residam os maiores vínculos afetivos do

autor da herança. No mundo contemporâneo, o conceito de família deve ser

revisto. Há tendências de o âmbito familiar ficar cada vez mais restrito a pais e

filhos, sendo bastante tênues, de modo geral, os vínculos com os colaterais. Por

outro lado, o próprio legislador vem dando guarida às ligações estáveis sem

casamento, com reflexos no campo patrimonial, como faz o Código Civil de

2002.

Os beneficiários de tal sucessão serão aqueles que o legislador

civilista, fez questão, de erguer ao patamar de herdeiros constituídos legalmente,

sem que para isso necessitem provar que preenchem qualquer condição que lhes

dessem a investidura de sucessores do de cujus, tendo em vista que a lei os ergueu

ao patamar de necessários legalmente.

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20

2.5 Herdeiro Necessário

O legislador civilista, apesar da ordem de vocação hereditária,

buscou assegurar a entes determinados segurança quando da sucessão, para que

não ficasse na livre disposição do de cujus como iria se proceder tal, logo, foram

assim constituídos herdeiros obrigatórios, independente da vontade daquele.

Segundo disposto por Washington de Barros Medeiros ( 2012, p..

123):

Herdeiro necessário é o descendente ou ascendente sucessível, não afastado

da sucessão por indignidade ou deserdação. Combate POLACCO semelhante

terminologia, que tacha de ambígua e supérflua, porque dá a entender, contra

a verdade dos fatos, que exista outro titulo de sucessão, tertium genus a

acrescentar-se ao testamento e à lei. Ademais, afirma ainda o notável

professor da Universidade de Roma, a noção moderna de herdeiro necessário

contraria a do direito romano, perante o qual herdeiro necessário era aquele

que recolhia a herança ipso jure, independente de qualquer ato de aceitação e

até mesmo contra a sua vontade (etiam nolentes).

O direito positivo brasileiro empresta, porém, a essa expressão sentido

especifico e técnico: herdeiro necessário vem a ser o descendente, ascendente

ou cônjuge sucessível (art. 1.845). Sua compreensão difere bastante da de

herdeiro legítimo, indicada no art. 1.829 do Código Civil. Todo herdeiro

necessário é legitimo, mas nem todo herdeiro legitimo é necessário, também

designado como legitimário, reservatório, obrigatório ou forçado.

Portanto herdeiros necessários são aqueles herdeiros em que o

legislador tutelou de forma especial, sendo, portanto, uma sucessão legitimária, ou

seja, herdeiros legítimos, consagrados como sendo aqueles afetos ao âmbito

familiar, doméstico, e porque não dizer domiciliar. Como bem acentua Paulo Lôbo

(2013, p.74), “provém da concepção, primitiva e antiga, de ter o patrimônio de ficar,

primacialmente, no círculo estreito da comunidade doméstica”.

Continua ainda Paulo Lôbo (2013, p. 74):

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21

A finalidade da qualificação legal dos herdeiros necessários, entre os herdeiros

legítimos, diz respeito à proteção da parte da herança que não pode ser

destinada a outros parentes ou a estranhos, mediante ato de liberalidade

(doação, testamento, partilha em vida), denominada legítima a parte indisponível.

No mesmo sentido, como ensinado por Silvio de Salvo Venosa

(2014,p. 167):

Quando a lei estabelece uma herança necessária, está-se colocando no meio-

termo. Permite sempre o testamento, mas restringe o alcance quando há

qualquer herdeiro na linha descendente, ou, em sua falta, na linha ascendente. A

plena liberdade de testar fica para quando os herdeiros já estão mais distantes

na linha do parentesco, quando então a lei presume que diminuem os vínculos

afetivos.

Dessa forma, se tem que apesar da liberdade que se tem de dispor

do patrimônio pessoal essa liberdade não é absoluta, tendo em tudo que observar

os ditames legais, como forma de assegurar uma segurança jurídica, a quem

depende do autor da herança, bem como quem presumidamente contribuiu para a

construção do mesmo.

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22

3 DO PROCESSO DE SUCESSÃO

Após a morte de alguém o Código Civil de 2002 é categórico ao

afirmar que se faz necessário abrir o processo sucessório, para que se possa saber

o que o falecido deixou de ativo, bem como o passivo, ou seja, haverá o arrolamento

de todo o patrimônio deixado, além das possíveis dívidas que perduraram, além de

se apurar quem seriam seus herdeiros, se houve ou não testamento, para então se

proceder a divisão dos bens, ou seja, sua partilha, e por fim ocorre a transmissão

que encerrará o processo sucessório.

Dentro desse processo poderá haver circunstâncias que tornarão o

processo longo e dificultoso, pois deverá ser nomeado um inventariante, que será

responsável por arrolar, administrar, arrolar e colacionar os bens, até que por fim

ocorra a partilha, os quinhões venham a ser separados e os bens venham a ser

finalmente transmitidos em definitivo.

Nos aspecto pessoal, os herdeiros virão a se tornar públicos e

conhecidos, dentro desse processo de publicidade e de pessoalidade haverá de ser

apurado a verdade real das condições de cada possível herdeiro, para que se possa

verificar que não há razões para exclusão de algum ou alguns herdeiros por

situações que o tornaram indignos, muito mais como uma carga moralista, porém

ocorrem casos em que além da própria moral, a indignidade será legal, pois é

compatível com práticas ilícitas e antijurídicas, quando ocorrerem situações tais o

herdeiro será excluído, e com essa exclusão quem passará a suceder em seu lugar

seriam os seus descendentes que passarão a suceder como se fossem o indigno,

porém o prazo para que seja proposta a indignidade será no máximo de quatro anos

contados a partir da abertura da sucessão, sendo esse prazo decadencial.

Conforme ensinamento de Giselda Maria Fernandes Novaes

Hironaka:

“O prazo de quatro anos traçado pela lei é decadencial, já que o

direito de requerer a exclusão do indigno, que nasce para o

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interessado no momento da abertura da sucessão, é o direito

potestativo que a lei assegura, e é sabido que os direitos

potestativos sujeitam sempre a prazos decadenciais para seu

exercício”.

Ainda no que tange ao aspecto do herdeiro poderemos ter os

institutos da renúncia, aceitação, deserdação (que só ocorrerá testamentalmente e

por extenso). O que afasta a renúncia sobremaneira, em seus efeitos da exclusão

por indignidade, é que esta é pessoal, não se transmite aos herdeiros do indigno, já

aquela se operará para toda a sua linha hereditária, ou seja, ultrapassa a sua

pessoalidade atingindo os que forem seus herdeiros.

3.1 Da Vocação Hereditária

A vocação hereditária é a ordem de preferência e substituições que

a lei assegura aos herdeiros legítimos do falecido. Na atual conjuntura civilista temos

a seguinte ordem de vocação: os descendentes, ascendentes, cônjuge sobrevivente

concorrendo com os descendentes, incluindo aqui os companheiros, e por fim os

parentes colaterais até o quarto grau, fazendo-se uma ressalva, de que os parentes

mais próximos excluirão da sucessão os parentes mais remotos.

Como ensina Paulo Lôbo (2013, p. 74):

Todos os herdeiros legítimos são titulares de direito sucessório em relação à

herança deixada pelo de cujus. Todavia, em razão da ordem de vocação

hereditária, o exercício do direito fica sujeito à precedência nessa ordem ou à

falta que precederia cada titular. Se vivos forem os herdeiros de primeira classe

ou os de primeiro grau da mesma classe, os da classe ou grau seguintes não se

investem na qualidade de herdeiros, porque a legitimação para suceder não se

concretizou. Antes da sucessão, para essas pessoas, havia potencia, mas não

ato; eram herdeiros potenciais, ou em estado de expectativa, até porque não há

direito à herança de pessoa viva. O critério decisivo é o da coexistência entre o

herdeiro potencial e o de cujus na data do falecimento deste.

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A ordem de vocação somente é alterada se na classe anterior não

houver herdeiros necessários legitimados a compor a sucessão, ou seja, os da

classe seguinte só herdam se inexistentes os da classe anterior, levando-se em

consideração para o caso de parentes colaterais os parentes mais próximos aos

mais remotos, que inclusive se encerra no quarto grau.

Segundo Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 123):

A regra geral estabelecida no ordenamento é que os mais próximos excluem os

mais remotos, ou seja, havendo descendentes do falecido, não serão chamados

os ascendentes, e assim por diante. Tal regra veio a sofrer algumas exceções,

com leis posteriores ao Código de 1916, como veremos. O atual diploma civil

introduz a posição de vocação hereditária concorrente do cônjuge em

propriedade, juntamente com os descendentes sob determinadas condições e

juntamente com os ascendentes.

Sendo assim, na atual conjuntura do ordenamento jurídico

brasileiro, houve uma evolução no que tange ao direito sucessório, pois houve uma

redução grutual da possibilidade de suceder aos parentes de quarto grau, não

podendo a sucessão ser operada infinitamente para parentes colaterais não

próximos, ou seja, que o ultrapassam o grau definido em lei.

3.2 Das impossibilidades para suceder

No que tange a capacidade para suceder, todo ser capaz, e desde

que estivesse ligado ao falecido por grau de parentesco estaria apto a suceder,

contudo como leciona Arnoldo Rizzardo (2013, p.81):

Em principio, havendo o parentesco até determinado grau, existe o direito

de suceder. A regra é a capacidade. Estar viva e ter um parentesco

especifico são os requisitos bastantes para a pessoa adquirir a capacidade,

que deverá ser considerada ao tempo da abertura da sucessão, ou

regulando-se conforme a lei então em vigor.

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Sendo assim, desde que cumpridos tais requisitos estariam às

pessoas legitimadas a suceder, contudo o Código Civil Brasileiro de 2002 cuidou

de enumerar casos que essa legitimidade presumida perde o lugar para a sua

exclusão, “incutindo a idéia de que são taxativamente enumeradas as situação”.

(RIZZARDO,2013,p.81)

Logo, tem-se que embora haja a capacidade sucessória, existem

situações específicas em que essa capacidade é perdida, e se instaura o processo

de exclusão hereditária, nesse momento opera-se a impossibilidade para suceder,

como informado por Arnoldo Rizzardo:

No tratamento do Código Civil, embora a pessoa tenha a capacidade para

ser contemplada na sucessão, Há, no entanto, determinados eventos e

circunstâncias que afastam tal condição. Aqui, cuida-se da indignidade, ou

de uma incapacidade que surge em vista de atos praticados pelo herdeiro.

Aqui, a exclusão, por incidência de hipóteses legais, é ab intestato, isto é,

independente de manifestação da vontade do autor da herança.

Tais circunstâncias e situações tornam os sujeitos de direito que a

priori teriam a legitimidade a suceder, ilegítimas como irá se demonstrar por

conseguinte.

3.3 Excluídos da sucessão por ilegitimidade, indignidade e legitimados a

suscitar a indignidade

Apesar do direito sucessório não versar acerca da capacidade civil

para a sucessão, mas sim tratar como legitimação, haverá nesse rol pessoas que

em hipótese alguma poderão

figurar como legitimadas a suceder, tendo em vista a ordem moral

e social existente quanto à elas, não poderão, de forma sucinta, figurar como

herdeiras, tampouco legatárias as pessoas que :

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26

a)escreveram o testamento particular ou cerrado, a pedido do

testador, porque este não podia ou não sabia escrever, e bem assim o cônjuge, ou

companheiro, os ascendentes e os irmãos dela;

b) as testemunhas de um testamento;

c) o concubino do testador casado, salvo aqui a posição de

companheiro de pessoa casada que se encontre separada de fato ou judicialmente;

d) os que participarem da feitura ou validação do testamento;

e) há restrições especificas e legais para o estrangeiro ser

legitimado a suceder.

Contudo, o que irá interessar serão os excluídos da sucessão por

indignidade, tendo em vista que é uma desvantagem inerente aqueles que são

herdeiros , ou seja, tais herdeiros poderão ser excluídos da herança quando

incorrerem em conduta considerada como um desvio moral do comportamento

esperado do homem comum.

Como bem afirmou Paulo Lôbo (2013, p. 174):

As condutas podem ser ilícitos penais ou como imorais, mas são tidas como

suficientemente graves e atentatórias, de modo a ensejarem sanção específica,

no campo civil, que é a exclusão da herança a que fariam jus os que a

cometeram. A sanção da exclusão alcança tanto os herdeiros legítimos, quanto

os testamentário, quanto os herdeiros testamentários e os legatários. Essas

condutas compõe o conceito de indignidade sucessória. Indignidade é a privação

do direito hereditário imposta pela lei a quem cometeu condutas ofensivas à

pessoa, à honra e aos interesses do de cujus (Itabaiana de Oliveira, 1986, n.191)

e a seus familiares.

A penalidade para a indignidade é a exclusão do possível sucessor

ao sucedido, como acentua Washington de Barros Monteiro (2012, p. 75):

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Indignidade constitui pena civil cominada a herdeiro acusado de atos criminosos

ou reprováveis contra o de cujus. Com a prática desses atos, incompatibiliza-se

ele com a posição de herdeiro, tornando-se incapaz de suceder.

Fator bastante controverso na didática da exclusão de herdeiro por

indignidade está no fato de que excluído, o indigno é automaticamente substituído

por seus herdeiros como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão, contudo

há de se verificar que por se tratar de uma pena civil, em comparação as

penalidades penais, não poderia essa ter a possibilidade de passar da pessoa do

indigno.

As hipóteses legais para se operar a exclusão por indignidade são

taxativas, ou seja, a sua tipicidade é fechada não podendo outras condutas, ainda

que sejam semelhantes ou até mais graves servir de fundamento para a exclusão do

herdeiro, por serem hipóteses de restrições de direitos.

As hipóteses são:

A) Serão excluídos aqueles que participaram, seja como autor,

coautor, ou autor intelectual, do homicídio ou da tentativa de homicídio dolosos do

de cujus ou de seu familiar, desde que próximo. Não se atém o legislador civilista a

condenação penal condenatória, tampouco ao seu transito em julgado, tendo em

vista que a sanção civil de exclusão não depende da sanção penal pela prática

delituosa, todavia, se houver decisão penal absolutória ela prevalecerá sobre o

âmbito cível, para evitar conflitos de decisões judiciais, cabendo uma exceção, como

bem acentuado por Paulo Lôbo (2013, p.n 176):

Contudo, se a decisão judicial absolutória não for de mérito, isto é, quando se

ativer a fundamentos de natureza formal sem ter sido reconhecida a inexistência

material do fato, não prevalecera sobre o juízo cível, que poderá concluir

livremente pela exclusão do herdeiro, que é fundada essencialmente na

reprovação moral da conduta.

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B) Igualmente serão excluídos da herança, com o mesmo critério

de não vinculação do juízo cível ao juízo penal, aqueles que ofenderem a honra do

de cujus, sendo lançada à pessoa ou à memória do ofendido, ampliando-se o leque

aqui também para seu cônjuge ou companheiro. Ressalvada aqui que devem ser as

condutas tipificadas como crimes contra a honra, e a denunciação caluniosa na

esfera penal, apenas alcançando a pessoa do de cujus.

Situação essa bem apontada por Paulo Lôbo (2013, p. 177):

Em razão da natureza punitiva da exclusão do herdeiro, o STJ entende que a

melhor interpretação jurídica acerca da questão consiste em compreender que o

Código Civil não se contenta com a acusação caluniosa em juízo qualquer,

senão em juízo criminal (REsp 1185122). A lei penal também admite a isenção

da pena se o ofensor se retratar cabalmente da calunia ou da difamação. Mas a

isenção da pena produz efeitos apenas no âmbito criminal, não vinculando o

juízo cível, que pode decidir pela exclusão da herança do ofensor, em virtude de

sua natureza de reprovação moral. A decisão do juízo penal para qualificação do

crime contra a honra não é pré-requisito para a decisão no juízo cível da

exclusão do herdeiro.

C) Também serão excluídos da herança por indignidade aqueles

que de alguma forma violenta ou com o uso de meios fraudulentos tenham inibido,

limitado ou impedido o de cujus de elaborar seu testamento.

Quanto a possibilidade de se levantar as situações que ocorreram

para tornar um sucessível indigno, elas deverão ser suscitadas por aqueles que

tiverem interesse na exclusão do possível indigno, tendo em vista que essas

situações não poderão ser conhecidas ex officio pelo juízo do inventário, tendo

inclusive que ser levantada em ação própria para tal, portanto há a legitimidade para

suscitar a indignidade de um herdeiro, como bem ensina Washington de Barros

Monteiro ( 2012, p. 80):

A indignidade não opera ipso jure. Trata-se de pena que só se aplica mediante

provocação dos interessados. Para que se exclua o herdeiro da sucessão

preciso se torna que a indignidade seja reconhecida por sentença, proferida em

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ação ordinária intentada com esse escopo pelo interessado. A indignidade

depende, portanto, de procedimento judicial, sendo pronunciada officio judicis.

Se não tiver deixado o de cujus , testamento para confirmar tais

condições de deserdação, estarão os legitimados a suceder com a incumbência de

levantar tais condições, para que no juízo cível venha ser reconhecida e como forma

de punição moral, venha a ser excluído da herança o indigno.

Como pontuado por Washington de Barros Monteiro (2012, p. 80):

Referida ação é de natureza estritamente privada; jamais poderá ser ajuizada

pelo representante do Ministério Público. O interessado vem a ser o coerdeiro, o

legatário ou donatário favorecido com a exclusão do indigno, o Município, o

Distrito federal ou a União (na falta de sucessores legítimos e testamentários) e

qualquer credor, prejudicado com a inércia dos referidos interessados. Se menor,

deverá ser representado por seu representante legal.

Contudo, apesar de ser a exclusão por indignidade uma penalidade

civil para reconhecimento de uma atitude ignóbil do pretenso sucessor, a pretensão

de demandar para que se exclua o tal extingue-se num prazo decadencial de quatro

anos após a abertura da sucessão.

3.4 Herança vacante e herança jacente

Durante o processo de sucessão pode ocorrer que não haja

herdeiros conhecidos, bem como herdeiros que não vieram a juízo reclamar os seus

quinhões, nesse momento à herança se tornará jacente, e ao final do processo

culminar na sua vacância. Os institutos da jacência e da vacância, são parecidos e

estão intimamente interligados, sendo aquela uma ponte para esta.

A jacência da herança é dever primordial do Estado de proteção

dos bens suscetíveis de sucessão, pois considerar-se-á assim quando o falecido não

houver deixado herdeiro necessários conhecidos, bem como não houver deixado

testamento, ou declaração de última vontade, sendo a declaração de herança

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jacente um dever do Estado, já que de ofício o juiz deverá determinar a arrecadação

dos bens, por um período de cautela, já que o Estado deverá comunicar a

inexistência de herdeiros conhecidos, conforme ensinamento de Paulo Lôbo ( 2013,

p. 166):

Se do certificado de óbito não contar a existência de cônjuge, companheiro ou

parente sucessível, o oficial do registro público tem o dever de comunicar tal fato

ao juiz. Os cônsules brasileiros, no exterior, têm o mesmo dever de

comunicação, quanto às pessoas cujos bens devam ser inventariados no Brasil.

A jacência da herança se conclui quando ultimado o prazo de um

ano da publicação do edital, prazo esse que se dá para que haja a manifestação de

possíveis herdeiros do de cujus, para se habilitar nos autos da sucessão e reclamar

o patrimônio do mesmo, findo esse prazo se não houver qualquer

habilitação/manifestação nesse sentido a herança passa de jacente para vacante,

tudo conforme o disposto nos artigos 1.819 a 1.823, combinado com o artigo 39,

parágrafo único do Código Civil de 2002.

Uma segunda hipótese em que poderá ocorrer a jacência seria

quando todos os herdeiros, sem exceção, renunciarem a seus quinhões, e a partir

de então ocorrerá como no primeiro caso, será declarada a sua vacância, porém

aqui não serão observados os prazos prescricionais de um ano para que a herança

se torne vacante, já que a renúncia se opera para todos da linha sucessória dos

renunciantes, logo a herança torna-se vacante de imediato.

No que tange a vacância, após a declaração judicial de vacância

resultada da herança jacente com prazo de um ano expirado, que é requisito

fundamental, os bens ficarão livres para que se possa transmitir a propriedade para

a Fazenda Pública, que será definitiva após cinco anos transcorridos da morte do de

cujus.

Nos dois casos na herança jacente e vacante os credores do de

cujus poderão reclamar os valores para quitar os seus créditos, em qualquer

momento do processo, sendo-lhes assegurados seus direitos.

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Contudo, há de se fazer uma ressalva, como bem pontuado por

Paulo Lôbo (2013, p. 167):

No direito brasileiro,que tem a saisine, a herança não jaz sem herdeiro, porque a

herança jacente e a herança vacante são procedimentos de verificação se é

herdeira a Fazenda Pública, sendo este seu atual significado.

3.5 Prazo prescricional para a petição de herança

A petição de herança é o exercício da pretensão de um ou de vários

herdeiros contra quem possua toda a herança, com o intuito de incorporação a esta

para posterior partilha entre os sucessores legitimados, com a finalidade única do

reconhecimento da qualidade sucessória e a restituição de tudo à herança em

desfavor de quem a possua, seja na condição de herdeiro, seja por quaisquer títulos.

Os legitimados a promoção da petição de herança são todos

aqueles que se investirem na condição de herdeiros, inclusive ao ente estatal

(LÔBO, p. 277) que poderão reivindicar a posse de todos os bens, independente do

domínio, ou de títulos, entretanto, ao legatário só caberá o pedido de execução do

legado, ou seja, a posse direta do bem legado.

Rege ainda o nosso Código a possibilidade de mesmo depois de

finda a sucessão, ou seja, mesmo que os bens já tenham sido transmitidos, um

herdeiro que anteriormente não estava nessa condição possa em ação própria

entrar com um peticionamento de herança.

Conforme ensinamento de Humberto Theodoro Júnior (2007,

p.279):

A petição de herança julgada após a partilha acarreta a nulidade, cujo

reconhecimento independe de nova ação. A invalidade in casu é automática,

decorre do simples fato de ter sido a partilha ultimada sem a presença do

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32

investigando vitorioso. O cumprimento da sentença de petição de herança faz-se

por meio de simples pedido de retificação de partilha, já que inexiste coisa

julgada oponível ao herdeiro não participante da herança.

Os efeitos da sentença de petição de herança, todavia, não prejudicam os

terceiros de boa-fé que tenham adquirido, de boa-fé, bens partilhados em favor e

herdeiro aparente. Nesse caso, o dissídio fica restrito aos sucessores, devendo

haver reparação ao herdeiro ausente do processo de inventário pelos que

dispuseram do acervo, mantendo-se válida a disposição feita ao adquirente de

boa-fé.

O prazo prescricional para a petição de herança será em até dez

anos após ter sido aberto o processo de sucessão, porém há de ser comprovado

que o peticionante tem capacidade legítima para suceder, nesse momento e desde

que reconhecido pelo juízo a condição de herdeiro, será reclamado o seu quinhão

da cota parte que coube a cada herdeiro legítimo, esse prazo é decadencial, logo

quando o mesmo se acaba não poderá em qualquer hipótese ser reclamada a

herança, mesmo que surjam fatos novos, muito embora a ação de reconhecimento

de paternidade, por ser de natureza personalíssima, seja imprescritível a petição de

herança, por ter natureza patrimonial, só poderá ser iniciada dentro do prazo acima

exposto.

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33

4 Transmissão patrimonial e a ilegitimidade por indignidade

4.1 Da transmissão patrimonial

Tendo em vista que o meio de se transmitir formalmente a herança

é através do processo de inventário, a sua finalização e, portanto, transmissão

patrimonial no caso de processo sucessório se dará apenas com a finalização da

partilha quando há mais de uma herdeiro, quando não há, ocorre a adjudicação dos

bens para esse único herdeiro. Tendo em vista, que é ela quem põe fim ao

condomínio indivisível que é a herança.

O momento de transmissão da herança, ainda que precária, no

direito civil brasileiro, dá-se imediatamente a morte do sucessível, contudo,

transmite-se a herança como um todo indivisível, não só o patrimônio ativo, como

também o patrimônio passivo,nesse diapasão são transferidos os bens e as dívidas

como um conjunto só, como um condomínio indivisível, onde não se pode falar em

dívidas de um ou outro herdeiro, mas da dívida do próprio espólio.

A universalidade da transmissão está posta no Código Civil, e traz

em si a idéia de que a transmissão assim operada com os mesmos caracteres como

a posse estaria para o de cujus, demonstrada na citação de Marcos Catalan, em

Transmissão possessória- um conflito aparente (disponível em :

http://www.academia.edu/4343476/Transmissao_possessoriaum_conflito_aparente_.

.), em que afirma:

Nada obsta a aplicação do que se encontra disciplinado no mencionado art.

1.206, ous e j a , q u e a p o s s e t r a n s m i t e - s e a o s h e r d e i r o s

o u l e g a t á r i o s d o p o s s u i d o r c o m o s m e s m o s carac teres .

Dali se extrai que haverá successio possessionis quando a transmissão

possessória for a t í t u l o u n i v e r s a l e access io possess ion is

q u a n d o a t r a n s m i s s ã o p o s s e s s ó r i a f o r a t í t u l o singular.

Isso implica dizer que o sucessor universal terá que continuar de direito a posse

do seu antecessor e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do

antecessor para os efeitos legais.

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34

Não tratou o legislador do momento em que a transmissão de

posse se transforma em transmissão de direito, tendo os sucessíveis que aguardar

até o ultimato da partilha, conforme discorreu Gisele Leite , em Algumas linhas

críticas sobre direito sucessório em face do NCC,( dispnivel em :

http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/7836-7835-1-PB.htm):

Silencia o novo codex quanto à transmissão do domínio e da posse,

expressando doravante apenas transmissão de herança que abarca todas as

espécies de direito e, não apenas os relativos à propriedade.

Não estabeleceu com precisão quando exatamente a transferência de direitos se

opera, atinando somente com a abertura da sucessão.

Logo, segue-se ao processo de inventário para que seja sanado o

passivo, e fique somente o ativo, com o intuito de se dividir o quinhão de cada

herdeiro, procedendo-se a partir daí a partilha de todos os bens ativos do de cujus,

no caso de haver mais de um herdeiro apto a tal condição e não haver legados a

serem observados.

Cumpre observar ainda, que a transmissão operada pela saisine

não se trata de uma transmissão efetiva, mas de uma sucessão precária como

aludido por Antonio Menezes Cordeiro na obra ‘ A Posse: perspectivas dogmáticas

actuais’, citado por Sylvia Cristina Arinelli Gonçalves (disponível

http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=4067&), na obra :

A sucessão na posse é um fenômeno de sucessão próprio sensu e não uma

mera transmissão; visto que na sucessão a posse permanece estática e na

transmissão, a situação transita de uma esfera para outra.

Contudo, tendo em vista a possibilidade de haver apenas um

herdeiro sobrevivente ao de cujus, passasse do pagamento das possíveis dívidas

do mesmo a adjudicação de todos os bens ao herdeiro único, já que não haverá a

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35

necessidade de partilhamento de bens, onde há uma saída da transmissão efetuada

de maneira precária, para uma transmissão definitiva de patrimônio, apossando-se

definitivamente o herdeiro de tudo o quanto era do de cujus, sem qualquer possível

interferência de terceiros, já que não há mais ninguém que possa reclamar a

herança. Finalizando com isso o processo de sucessão, e transmitindo o patrimônio

de forma definitiva ao herdeiro único, após a observação de todos os procedimentos

legais para tal, como o pagamento dos tributos relativos a herança e a transferência

de titularidade de propriedade do proprietário originário, de cujus, para o proprietário

atual, qual seja o sucessível único.

4.2 Único herdeiro legítimo descoberto como homicida após a transmissão de

todo o patrimônio

Para tal hipótese de estudo, considerar-se-á que o de cujus, o

momento de seu falecimento não possuía descendentes ou ascendentes, possuindo

apenas seu cônjuge, que como visto, é herdeiro necessário que exclui in tontum

todos os herdeiros mais remotos, já que esses não passam apenas a aspirantes

sucessíveis, e não herdeiros necessários, legalmente constituídos.

Depois de finalizada o processo sucessório, em que se constatou

que nunca houve testamento e o único herdeiro legítimo do de cujus é o seu

cônjuge, como o prazo para petição de herança de dez anos, e considerando que o

prazo para quaisquer reclamações quanto ao direito hereditário seria os quatro anos,

e que decorrido tal prazo se descobre que na verdade a morte se deu de forma

suspeita, abre-se o inquérito e é apurado que o culpado por tal homicídio é o tal

herdeiro único.

Pelas regras materiais do direito, bem como pelas regras

processuais estaria o assassino poderá estar acobertado pelo direito adquirido,

graças ao prazo prescricional, ocorre que ao passo que poderá haver a coisa

julgada, se está diante de um caso clássico de indignidade, o que geraria a exclusão

de herdeiro, ou seja, seria o caso da aplicação de um instituto que retroagiria ao

momento da abertura da sucessão, implicando na indignidade do herdeiro.

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O que se questiona é se com tal apuração, bem como após todo o

processo penal em que há de fato a condenação do herdeiro, e transitando em

julgado tal julgado o prazo fluiu, estaria o herdeiro resguardado e continuaria o

mesmo sendo o herdeiro? Ou seria ele excluído, tendo em vista que restou

comprovada a sua indignidade? Ademais por ser herdeiro legítimo único, em todas

as linhas sucessórias familiares, seja ela na linha reta ou colateral, a herança

restaria como vacante ou jacente, dando legitimidade a Fazenda Pública suscitar a

indignidade?

Tendo em vista que após a apuração do crime de homicídio tem

natureza pública, sendo o Ministério Público o ente legítimo para começar a devida

ação penal e dar prosseguimento a mesma, até levar a condenação do acusado, e

não podendo figurar como autor num processo de exclusão por indignidade de

herdeiros, estaria a Fazenda Pública legitimada a propor tal ação, mesmo que com a

não vinculação do juízo penal ao juízo cível, com o intuito de ver a herança que até

então não era vacante, assim se tornar?

Logo, se considerarmos essas nuances, bem como considerando

que haveria o retrocesso da regra da exclusão do indigno, sendo o herdeiro excluído

da herança por indignidade já que cometeu o crime de homicídio contra seu

cônjuge, também devemos considerar o regime de bens do casal, tendo em vista

que além de herdeiro o assassino seria possivelmente, se nos ativermos ao regime

de bens legal, que atualmente é o de comunhão parcial de bens, seria ele meeiro,

ou seja, a metade de todos os bens do antigo casal.

Há de se considerar também que em nosso sistema penal não há a

possibilidade de penalidade em pecúnia propriamente dita.

Ainda que houvesse o retrocesso e a vinculação do juízo cível ao

juízo penal, com a condenação do cônjuge supérstite por indignidade naquela

esfera, e homicídio nessa esfera, permaneceria o mesmo ainda em poder dos bens

que antes partilhou com sua vítima, o que demonstra um contracenso e até mesmo

uma aberração jurídica, se se pensasse no possível retrocesso da regra da

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indignidade infligindo sobre um processo hereditário já finalizado, e já assegurado

pelo manto da coisa julgada, bem como com o instituo do direito adquirido.

Doutro lado deve-se também considerar que os bens podem não ter

sido conservados, já que quatro anos é um lapso temporal relativamente grande, e

como o assassino era o real proprietário, poderá ter se desfeito de tudo quanto

herdou, se acaso a regra retrocedesse como seria o impacto sobre aqueles que

adquiriram os bens legalmente,estariam resguardados como os adquirentes de boa-

fé como na petição de herança, o que seria a aplicação mais razoável, e a única

aceitável, seria a regra que estaria protegido o terceiro adquirente de boa-fé que

adquiriu os bens, e o caso se resolveria, para o herdeiro, apenas em perdas e

danos, sendo abatido do valor das suas meação, e os valores seriam revertidos

como herança vacante.

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5 Conclusões

Tendo em vista que o sistema jurídico brasileiro de sucessões, está

firmado sobre a conduta moral dos agentes sucessíveis, e que a indignidade se trata

de pena civil para coibir que determinadas situações, e atitudes dos que porventura

queiram herdar patrimônio de um sucedendo que lhe seja parente afeto com a

obrigatoriedade de tal, não se pode falar em legalismos extremos, tampouco deixar

de observar a realidade social atual.

Pois,muito embora a perda da herança pelo indigno seja uma forma

de punição, não se poderá pensar em desprender a metade do patrimônio do

cônjuge supertiste, ao de cujus, quando mesmo que de forma indireta tenha

contribuído para a consolidação patrimonial, seja contribuindo diretamente

adquirindo bens em conjunto com este, seja simplesmente administrando a vida

familiar para que o cônjuge falecido pudesse ter como prioridade constituir um

patrimônio sólido para a entidade familiar.

No que tange a possibilidade de uma condenação na esfera penal

por crime cometido pelo cônjuge supérstite contra o cônjuge falecido não se pode

olvidar que a pena privativa de liberdade já estaria sendo o meio mais útil e eficaz

para privar o então herdeiro de usufruir do patrimônio remanescente do de cujus,

contudo, não se pode esquecer que metade do patrimônio, se levarmos em

consideração o regime de comunhão, tendo em vista que o cônjuge somente será

herdeiro se não em regime de separação total de bens, onde perde essa qualidade,

restaria o cônjuge supérstite prejudicado na sua meação.

Tendo em que a condenação penal não terá o condão de

modificabilidade da relação patrimonial do acusado, e apenas restaria o ônus

patrimonial civilista, e como não se pode notar a existência de herdeiros que possam

a vir a reclamar a herança a qualquer tempo, estar-se-ia diante de uma das

situações de herança vacante, já que o prazo para se alegar a indignidade restou

decaído, e que fora ultrapassado os quatros anos para possível peticionamento de

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herança,ai ter-se-ia de fato um confisco dos bens, como punição por crime cometido,

mas não precluso.

Ocorre que em nosso ordenamento jurídico é tido como ilegal o

confisco de bens, seja em que condições forem, para apenar um sujeito de direitos,

não se poderia, com isso privar um herdeiro, ainda que enquadrado nas

possibilidades de exclusão por indignidade, depois do patrimônio herdado ter sido

incorporado ao seu patrimônio, senão estaria se aplicando a pena de confisco de

bens do sucessor, já que estaria nessa condição, pois findo o processo sucessório.

Por outro lado, e dentro de uma concepção meramente legalista, se

levando apenas o que estritamente a lei manda, sem levar em consideração a

realidade social, ou até mesmo o que mostra o direito consuetudinário estaríamos

demonstrando um retrocesso na deserdação por indignidade de uma pessoa que de

fato ainda assim estaria retendo a metade de todos os bens do de cujus.

Demonstrando com isso a grande lacuna existente em nosso

ordenamento como uma situação tão grave, pois se por um lado temos um meeiro,

que não pode ser privado de seu patrimônio graças à personalidade de não confisco

de nossas penas, por outro lado temos um herdeiro legítimo indigno que, legalmente

deveria perder todo o patrimônio herdado, e frise-se já transmitido, para o ente

público, o que na sua aplicabilidade teria a natureza de confisco o que é vetado pelo

ordenamento jurídico pátrio, revelando um verdadeiro paradoxo legal.

Pois, se por um lado tem-se a possibilidade de suscitar uma

exclusão de herança por indignidade, movendo o patrimônio hereditário para o ente

público legitimado a suceder, como explanado alhures, por outro temos um herdeiro

único, que não passou por todo o processo de inventario, graças a sua condição de

único, e que após o pagamento das possíveis dividas do de cujus teve a totalidade

do patrimônio adjudicada para ele, portanto, um processo mais célere que um

inventario que segue os tramites normais, sendo o patrimônio definitivamente

incorporado ao seu patrimônio pessoal, e ainda a condicionante do decurso do prazo

para o peticionamento de herança, abre-se uma lacuna gigantesca no direito

sucessório brasileiro.

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Tal lacuna não foi prevista pelo legislador pátrio, dessa forma o

judiciário pátrio quando da aplicação legal dos institutos sucessórios deverá se ater

tão somente ao que dispõe o Código Civilista, mas deverá sobretudo observar o que

está posto na realidade social do processo de inventário que lhe chegue as mãos.

Já que de um lado poderá se tratar de herdeiro único, por outro

deverá ser observado se há alguma possibilidade de exclusão por indignidade, ainda

que sem testamento válido para isso, chamando-se o ente público que possa ser

interessado na deserdação do então herdeiro único, para que não se adjudique

todos os bens, passando a integrar o patrimônio deste e possa incorrer num futuro

confisco de bens, para suscitar todas e quaisquer hipóteses que dêem maior

segurança jurídica a relação de sucessão definitiva do patrimônio do de cujus.

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Referências

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