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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 536 (ano VIII) (11/02/2016) ISSN - - BRASÍLIA 2015 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – 1984-0454

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 536

(ano VIII)

(11/02/2016)

 

ISSN- -  

 

 

 

 

 

 

 

 

BRASÍLIA ‐ 2015 

Boletim

Conteú

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rídico-ISSN

–1984-0454

 

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Boletim Conteúdo Jurídico n. 536 de 11/02/2016 (ano VIII) ISSN

 ‐ 1984‐0454 

ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

BoletimConteudoJurıdico

Publicação

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

11/02/2016 Roberto Monteiro Pinho 

» Justiça terá 120 milhões de demandas em 2016?

ARTIGOS 

11/02/2016 Wilmer Cysne Prado e Vasconcelos Neto » Abstrativização do controle difuso de constitucionalidade 

11/02/2016 Kerinne Maria Freitas Pinheiro 

» A interpretação conforme a constituição e a jurisprudência do STF 

11/02/2016 Diego Guimarães Camargo 

» A impossibilidade de bloqueio judicial de verbas municipais, sujeitas ao regime dos 

precatórios, ainda que para satisfazer decisão judicial referente a pagamento de verba 

alimentar 

11/02/2016 Enoque Marques Reis Filho 

» Responsabilidade civil dos pais pelos filhos menores 

11/02/2016 Gabriel Carneiro de Lima 

» Da ilegitimidade da União Federal para figurar em todas as ações de medicamentos 

11/02/2016 Leonardo Toscano de Brito 

» RENAJUD ‐ um sistema ineficiente por falta de diálogo entre os poderes 

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JUSTIÇA TERÁ 120 MILHÕES DE DEMANDAS EM 2016?

ROBERTO  MONTEIRO  PINHO:  Foi  diretor  de  Relações Internacionais  da  Confederação  Geral  dos  Trabalhadores (CGT), editor do Jornal da Cidade, subeditor do Jornal Tribuna da Imprensa, correspondente internacional, juiz do trabalho no regime paritário, tendo composto a Sétima e Nona Turmas e  a  Seção  de  Dissídios  Coletivos  ‐  SEDIC,  é  membro  da Associação Brasileira de  Imprensa  ‐ ABI, escritor,  jornalista, radialista,  palestrante  na  área  de  RH,  cursou  sociologia, direito, é consultor sindical, no setor privado é diretor de RH, especialista  em  Arbitragem  (Lei  9.307/96).  Membro  da Associação Sulamericana de Arbitragem  ‐ ASASUL, Membro do  Clube  Jurídico  do  Brasil,  titular  da  Coluna  Justiça  do Trabalho  do  jornal  "Tribuna  da  Imprensa"  do  RJ,  (Tribuna online),  colunista  da  Tribuna  da  Imprensa  online),  no judiciário brasileiro, através de matérias temáticas, defende a manutenção, modernização  e  a  celeridade na  Justiça do Trabalho,  escreve  em  48  dos  principais  sites  trabalhistas, jurídicos e sindicais do País. 

Pouco menos ou mais de 120 milhões de demandas estarão acumuladas no judiciário brasileiro em 2016. Essa é a previsão de alta fonte do Conselho Nacional de Justiça – CNJ e de técnicos do governo, que teme pela avalanche de ações, “cada vez mais sem solução”. É “a nova demanda chegando pelo elevador e o judiciário subindo pela escada” – comentou a fonte. Em 2002 essa coluna publicou que em poucos anos o judiciário estaria no caos total, moroso e inflado com milhões de novas ações, e com alto percentual de encalhe na execução, este último, considerado pelo colunista o maior entrave principalmente na justiça do trabalho. Os próprios juízes admitem que acendeu a luz vermelha no judiciário brasileiro. De fato a quantidade de processos nos tribunais brasileiros é tão grande que, se fosse interrompido o ingresso de novas ações, os juízes levariam quase dois anos e meio para julgar todo o estoque atual. A conclusão é do estudo "Justiça em Números", divulgado ontem pelo Conselho Nacional de justiça (CNJ), fonte das nossas informações.

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Para uma avaliação pontual lembramos que no primeiro semestre de 2015, somente o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2), competente para os casos do estado de São Paulo, recebeu 222.085 ações trabalhistas. O montante é superior ao que foi registrado durante todo o decorrer de 2013 (201.193 processos) e de 2014 (204.908 processos). “Nos últimos anos o aumento foi de 4%, e a previsão é de um acréscimo de 8% em 2015” (já que os números oficiais ainda não foram divulgados pelo CNJ). Sendo assim é provável que a marca supere os 8%. Em 2011 a Justiça do Trabalho já acumulava 13.3790.697 processos. O estoque de causas aguardando julgamento no início de 2014 era de 70,8 milhões de processos. Ao fim do ano, o número saltou para 71,2 milhões. A morosidade pé inevitável, há duas décadas a JT perece da sua própria ociosidade. Existem processos que ficam a espera de solução há mais de 10 anos, audiências designadas meses após o protocolo, e sentenças prolatadas em quase um ano.

Segundo o levantamento do programa “Justiça em Números” do CNJ, a taxa de congestionamento do Judiciário cresce a cada ano e atingiu 71,4% no ano de 2014. Isso significa que, a cada 100 processos aguardando julgamento, apenas 28,6 são julgados. A taxa está 0,8% maior que a registrada em 2013.

Um estudo elaborado anualmente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e fez um diagnóstico dos tribunais, incluindo as cortes superiores, federais, estaduais, trabalhistas, eleitorais e militares, com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF). Todos compõem o Poder Judiciário nacional. O número de processos finalizados a cada ano pelos magistrados brasileiros cresceu 9,3% desde 2009, mas ainda é inferior ao número de casos novos que ingressam anualmente na Justiça. Segundo dados do relatório “Justiça em Números 2014”, o número de processos tramitando na Justiça brasileira chegou a 95,14 milhões em 2013, sendo que 28,3 milhões

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representam os casos novos e 27,7 milhões os processos baixados no respectivo ano. A quantidade de casos pendentes, de solução definitiva nos tribunais cresce, em média, 3,4% por ano desde 2009, sendo (66,8 milhões em 2013). Em 2015, a previsão extra oficial (números não concluídos pelo CNJ), é de o judiciário brasileiro acumula 104 milhões de ações.

A discussão é efêmera. Não existe outra saída senão a adoção urgente dos dispositivos traduzidos do Novo CPC, (e a nova lei de Mediação) cuja previsão está inserida neste diploma civilista. Da parte do judiciário, pouco se espera. Durante décadas o discurso dos juízes é o mesmo. Reivindicam mais juízes, servidores e aumento salarial, além de um elenco (vide a nova Loman em discussão), de vantagens que triplica o ganho mensal da magistratura. A morosidade galopa ao sabor de palpites, suposições e desculpas inócuas. Recente, temos que o Poder Judiciário terá um reajuste de 7,6% em seu orçamento a partir do dia 1º de abril. Na Justiça do Trabalho, o Congresso reduziu em 8% o orçamento na comparação com 2015. O enxugamento ocorre justamente no momento em que, com a alta do desemprego, cresce o número de ações trabalhistas. O contingente de estagiários também será reduzido em 25% até fevereiro. Para economizar energia, o horário de atendimento ao público foi alterado: será das 11h às 17h a partir do dia 15 de fevereiro. Atualmente, é das 12h às 18h. Mesmo assim o judiciário brasileiro continuará soberbo, e seus integrantes olhando para os seus próprios pés.

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ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE

WILMER CYSNE PRADO E VASCONCELOS NETO: Advogado. Graduado pelo Centro Universitário Christus (turma de 2012.1). Aprovado nos seguintes concursos: Procurador do Estado do Paraná e Procurador do Município de Salvador.

Resumo: O controle de constitucionalidade divide-se em duas espécies: o controle concentrado e o controle difuso. A principal diferença entre essas espécies, além de procedimental, reside nos efeitos, enquanto o difuso resolve um incidente em um processo subjetivo, gerando efeitos inter partes, o concentrado gera efeitos erga omnes (contra todos),uma vez que nesse controle é feita uma análise da lei em abstrato. A teoria da abstrativização consubstancia-se na possibilidade do STF atribuir eficácia erga omnes às decisões proferidas em sede de controle difuso de Constitucionalidade, que originalmente teriam eficácia apenas inter partes, aproximando, assim, o controle concentrado do concreto. De fato, as decisões tomadas pelo Supremo nos casos concernentes ao controle difuso teriam originalmente eficácia apenas entre as partes envolvidas no conflito, mesmo se tratando da cúpula do judiciário competente para exercer o controle concentrado, uma vez tratar-se de processo subjetivo. Entretanto, o STF, ao julgar o Habeas Corpus n° 82.959/SP, declarou a inconstitucionalidade do § 1°, artigo 2°, da lei n° 8072/90, referente à vedação de progressão de regime no que tange aos crimes hediondos, estabelecendo que os requisitos da citada lei deveriam ser analisados caso a caso, estendendo, assim, os efeitos de tal decisão contra todos, abrindo precedente para inúmeras outras decisões semelhantes. A teoria da abstrativização levanta inúmeras discussões de extrema relevância no meio jurídico brasileiro, com importantes implicações práticas, tais como: o papel do senado no controle difuso; limites

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constitucionais de poderes atribuídos ao STF; celeridade processual e aproximação dos controles difuso e concentrado.

Palavras-chave: Teoria da abstrativização. Controle Difuso. Supremo Tribunal Federal. Senado Federal.

1 Introdução

O controle de constitucionalidade difuso configura-se como o meio pelo qual o juiz, diante do caso concreto e de modo incidental, decide acerca da constitucionalidade de determinada norma, atribuindo a tal decisão eficácia inter parts e efeitos ex tunc (retroativos).

Tal modelo diferencia-se do controle abstrato justamente pela característica que lhe é inerente de atribuir ao magistrado ou ao tribunal o poder de declarar, na apreciação do caso concreto, em que há interesse subjetivo em pauta, a inconstitucionalidade de ato normativo do poder público, de modo incidental, de maneira a não aplicar a lei impugnada ao caso concreto.

A discussão de maior relevância concerne à possibilidade do Supremo atribuir de eficácia erga omnes (extensível a todos) às decisões prolatadas em controle difuso. No ordenamento jurídico vigente, o senado federal, após decisão definitiva do STF acerca da inconstitucionalidade do ato normativo, poderá suspender a execução deste, concedendo, portanto, eficácia geral à decisão, característica proeminente da separação de poderes.

Entretanto, surgiu no âmbito do STF uma linha interpretativa, baseada na supremacia da constituição e sua aplicação uniforme a todos, bem como na qualidade do Supremo de guardião máximo da Constituição, que possibilita ao Supremo conferir efeitos gerais às suas decisões, que acaba por desencadear na teoria da

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abstrativização do controle de constitucionalidade incidental, equiparando as decisões tomadas no controle concreto de constitucionalidade às decisões do controle abstrato.

Não obstante, para Gilmar Mendes, precursor da teoria da abstrativização, o STF, ao declarar determinada lei inconstitucional, comunicaria ao Presidente do Senado, que seria encarregado apenas de conferir publicidade à decisão, não tendo o condão de garantir sua eficácia, pois a decisão, por ser ato jurisdicional, já seria dotada de plena efetividade social.

Essa discussão no âmbito do Pretório Excelso tem relevância fundamental na sociedade, uma vez que poderá dotar o sistema jurídico de maior eficácia, celeridade e economia processual. Mas a teoria da abstrativização também encontra doutrinadores que não a veem com bons olhos, pois tal prerrogativa conferiria poder em demasia ao Supremo, além de ser ato não albergado pela legislação vigente.

2. Noção de controle de constitucionalidade

O Direito, entendido como ordenamento jurídico, é um conjunto coordenado de normas que regulam as mais diversas condutas humanas com a finalidade de possibilitar uma melhor convivência em sociedade, uma vez que o homem é um ser essencialmente social, mas necessita de regras que possam solucionar os conflitos que surgem dessas relações sociais. Norberto Bobbio é quem melhor explicita o direito como um sistema:

A nosso ver, a teoria da instituição teve o grande mérito de pôr em relevo o fato de que se pode falar de Direito somente onde haja um complexo de normas formando um ordenamento, e que, por tanto, Direito não é norma, mas um conjunto coordenado de normas,

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sendo evidente que uma norma jurídica não se encontra jamais só, mas está ligada a outras normas com as quais forma um sistema normativo.[1]

Essa é a ideia de ordenamento jurídico como um sistema, ou seja, pontos interligados (as normas) com uma finalidade em comum (possibilitar um melhor convívio social) e como tal pressupõe unidade, ausência de contradições em seu conteúdo, de modo que cada norma deve atuar em conformidade com as demais para que se possa atingir a finalidade maior, devendo ser afastada qualquer contradição ou conflito que possa desvirtuar essa finalidade.

Esse sistema, do qual tratamos, é um sistema escalonado com normas hierarquicamente superiores em relação a outras, com estas devendo obediências àquelas. No topo dessa hierarquia, como norma maior desse sistema a reger todo o ordenamento jurídico encontra-se a Constituição. Dessa forma, todas as demais normas que compõem o ordenamento jurídico devem sempre estar em conformidade com o que essa Carta Magna preceitua, sempre indo ao encontro não apenas de suas prescrições mas também de seus princípios. José Afonso da Silva fala com maestria a respeito da supremacia constitucional.

Significa que a constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação deste a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só

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nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas.[2]

Dessa afirmação constata-se que na constituição, como o próprio nome sugere, se encontram os elementos formadores do Estado, suas normas essenciais que albergam os seu elementos: soberania, território, forma de governo, povo e o bem comum, além dos direitos fundamentais que visam a proteção da dignidade da pessoa humana, e é esse conteúdo que confere à constituição o patamar de norma suprema. Essa matéria constitucional tem uma força tamanha que pode atribuir poder de norma constitucional às normas que formalmente estão fora da Constituição, como os tratados de Direitos Humanos aprovados na forma do art. 5°, parágrafo 3°, da Carta Magna.

Ocorre que com a evolução da sociedade surgem novas condutas a serem reguladas, novos conceitos e novas interpretações, fatores que ensejam a regular atualização do ordenamento jurídico, ou seja, alteração, elaboração e revogação das normas que o compõem, com o intuito de se tentar, o máximo possível, acompanhar a evolução da sociedade, apesar do dinamismo social ser bem maior que evolução do Direito no sentido de norma prescritiva.

Diante da necessidade de se manter um sistema uniforme, se faz necessário o surgimento de ferramentas que garantam um compasso entre as partes que o integram, ferramentas que atuem no controle das normas que vão de encontro ao que determina outra norma hierarquicamente superior, normas que vão de encontro ao ordenamento jurídico. Essas ferramentas devem atuar coibindo, prevenindo ou remediando conflito de normas, havendo então o controle preventivo e o repressivo, sendo que, nesse momento, será discutido o controle repressivo em face da Constituição.

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Tendo em mente que o Controle de Constitucionalidade surge em razão da necessidade de manutenção da conformidade do ordenamento jurídico com a Constituição, dado caráter de superioridade, tem-se como pressuposto desse tipo de controle a rigidez e a supremacia constitucional. Como bem conceitua Luís Roberto Barroso ao prelecionar ambas as características como pressupostos ao controle de constitucionalidade:

A supremacia da Constituição revela sua posição hierárquica mais elevada dentro do sistema, que se estrutura de forma escalonada, em diferentes níveis. É ela o fundamento de validade de todas as demais normas [...] A rigidez constitucional é igualmente pressuposto do controle. Para que possa figurar com parâmetro, como paradigma de validade de outros atos normativos, a norma constitucional precisa ter um processo de elaboração diverso e mais complexo do que aquele apto a gerar normas infraconstitucionais.[3]

Diz-se Constituição rígida aquela que exige um processo legislativo qualificado, mais elaborado na sua alteração, um diferencial em relação ao processo legislativo comum, sob pena de se ter normas de patamar formalmente iguais.

A supremacia constitucional consiste em concentrar na Constituição todo o fundamento formal, material e principiológico, sendo ela a lei maior de forma a iluminar todo o ordenamento jurídico, garantido, assim, legitimidade ao controle para, em sua defesa, afastar uma norma que a contrarie.

É nisso em que consiste o controle de constitucionalidade, uma ferramenta que ajuda a elidir o conflito de normas infraconstitucionais com a Constituição, na tentativa de manter a

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conformidade daquelas com estas, garantindo, assim, o respeito à lei maior dentro do ordenamento jurídico, evitando-se as contradições que poderiam gerar insegurança jurídica.

3 Controle de constitucionalidade no Brasil.

3.1 Controle Jurisdicional Misto

A despeito dos dois tipos de controle de constitucionalidade conhecidos, o Brasil adota um sistema que utiliza características de ambos, conhecido como Controle de Constitucionalidade jurisdicional misto: misto, pois o ordenamento jurídico brasileiro permite os dois tipos de controle, concentrado e difuso; jurisdicional porque ambos os controles são exercidos pelo Poder Judiciário. O Controle Difuso, de origem americana, é exercido por qualquer membro do judiciário, o concentrado, de origem austríaca, é exercido pela cúpula do judiciário, o STF, único órgão do Poder Judiciário brasileiro que é competente para exercer o controle concentrado em face da Constituição Federal, exercendo os dois tipos de controle.

Esse modelo de controle de constitucionalidade é relativamente recente, vindo a se consolidar com a Constituição Federal de 1988. A inauguração do Controle de Constitucionalidade por parte do judiciário, no Brasil, se deu por meio do Decreto 848 de 1890, que previa o instituto de controle jurisdicional (incidental) de constitucionalidade, sendo introduzido na Constituição Republicana de 1891 (art. 59, § 1º, “a” e “b” e art. 60, “a”). Contudo, havia certa imaturidade do tema, ocorrendo casos inclusive de responsabilidade de juízes ao afastar uma lei no caso concreto por entendê-la desconforme com a constituição.

Dentro desse contexto o Habeas Corpus serviu de instrumento essencial ao exercício do controle de constitucionalidade, uma vez que a primeira constituição republicana do Brasil tornou o Habeas

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Corpus uma ferramenta de proteção sempre que o indivíduo sofresse ou se achasse em iminente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder.

O controle concentrado de constitucionalidade teve seu marco inaugural em nosso ordenamento jurídico na Constituição seguinte, de 1934, com a regulamentação da intervenção da União em negócios peculiares aos Estados, prevendo que a intervenção, que visava assegurar a observância dos princípios constitucionais e a execução de leis federais, só se efetuaria depois que a Corte Suprema, mediante provocação do Procurador-Geral da República, tomasse conhecimento da lei que a tivesse decretado e lhe declarasse a constitucionalidade (art. 12, § 2º). Pelo que podemos verificar, tal sistema é distinto do vigente atualmente, uma vez que tanto a constituição como a lei prevê um rol de legitimados a propor as ações de controle concentrado, e naquele momento só havia um legitimado e uma ação de controle com um tema específico.

3.2 Procedimento do Controle Concentrado – ADI, ADC, ADO, ADPF

O controle concentrado de constitucionalidade no Brasil, em face da Constituição Federal, é de competência exclusiva do STF, daí o nome de controle concentrado, sendo exercido por meio de ações específicas que, devido a seu procedimento peculiar, permitem uma análise da lei ou ato normativo em abstrato, sem que haja necessariamente caso concreto de aplicação da mesma, motivo pelo qual esse controle também é chamado de controle abstrato de normas. Nessas ações, o STF verifica a conformidade da lei ou ato normativo com a Constituição Federal, tanto do ponto de vista formal, verificando a observância aos preceitos de elaboração da norma, como do ponto de vista material, verificando se o conteúdo da norma afronta ou não os princípios constitucionais.

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São cinco as ações que sevem de instrumento no exercício do Controle de Constitucionalidade Concentrado: ADI, ADC, ADO, ADPF e ADI Interventiva. Cada uma possui características peculiares, porém todas têm em comum a finalidade de manter a ordem constitucional.

A primeira é a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, na qual o impetrante, como o nome da ação sugere, visa que seja declarada a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo por entender que haver uma afronta à Constituição Federal. Sua previsão normativa está no art. 102, I, “a” da Constituição Federal, bem como na Lei 9868/99, possuindo um rol de legitimados a propor-lhe previsto tanto na Constituição, art. 103, tendo por objeto leis federais e estaduais e suas decisões têm efeito vinculantes, erga omnes e, via de regra, ex tunc.

Referente à Ação Declaratória de Constitucionalidade, que visa declarar a constitucionalidade de lei ou ato normativo, poderia se indagar qual a utilidade dessa ação, já que toda lei goza de presunção de constitucionalidade, porém tal presunção é relativa, cabendo prova em contrário, de forma que a jurisprudência, por meio do controle difuso de constitucionalidade, muitas vezes oscila bastante ao manifestar-se a respeito da constitucionalidade ou não de uma norma, o que pode gerar insegurança jurídica, surgindo então a necessidade da declaração de constitucionalidade pelo STF, órgão maior do judiciário, por meio do Controle Concentrado, para que se uniformize a jurisprudência.

A Ação Declaratória de Constitucionalidade está prevista no art. 102, I, “a”, segunda parte da Constituição Federal e na Lei 9868/99, possuindo um rol de legitimados a propô-la previsto tanto na Constituição, art. 103, tendo por objeto somente leis federais e suas decisões têm efeito vinculantes, erga omnes e, via de regra, ex nunc.

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A Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão trata de declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo por ser omisso, insuficiente a sua finalidade (omissão parcial), ou pela ausência de regulamentação por parte de norma infraconstitucional, a qual a própria Constituição delegou essa função. Nesse ultimo caso, a inconstitucionalidade não recai sobre a norma, pois essa ainda não existe, e sim sobre o órgão que detém a competência para tomar iniciativa ou, se a iniciativa já tiver sido tomada, sobre o órgão que detém a competência para elaborá-la.

É prevista no art. 103, § 2º da Constituição e na Lei 9868/99, e seu rol de legitimado é o mesmo das ações anteriores, de modo que seu efeito, em relação ao Legislativo é de dar ciência da omissão. No tocante ao executivo, é concedido o prazo de 30 dias para que seja sanada a omissão.

A arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é uma ação de controle de caráter subsidiário. Por meio dessa ação é feito o controle de normas que não podem ser objeto das demais ações de controle abstrato, como é o caso de lei municipais, bem como das leis ou atos normativos anteriores à Constituição Federal, uma vez que no Brasil não se admite inconstitucionalidade superveniente, não havendo que se falar em declaração de inconstitucionalidade dessas normas.

Além de estar prevista na Constituição Federal (art. 102, § 1º) a ADPF possui procedimento próprio previsto na Lei 9882/99, tem por objeto qualquer ato do Poder Público, lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição. Os legitimados são os mesmo da ADI.

Por fim, a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade Interventiva foi a primeira ação de controle de constitucionalidade abstrato prevista no ordenamento jurídico brasileiro. Tratando-se de um pressuposto de intervenção federal, o STF, ao analisar um caso

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concreto envolvendo um dos entes federativos, a requerimento do Procurador Geral da Republica, fará o controle da ordem constitucional, para ao final do processo aferir se é caso ou não de intervenção.

È prevista no art. 36, III da Constituição Federal e possui duas hipóteses de incidência: assegurar a observância dos princípios fundamentais previstos no art. 34, VII, os chamados Princípio Constitucionais Sensíveis, e no caso de recusa à execução de lei federal, por parte de um dos Estados.

Essas são ações diferenciadas, que em quase nada se parecem com as ações comuns, possuindo procedimento próprio e peculiares, previstos tanto na Constituição como em leis infraconstitucionais específicas. Possuem características muito específicas, como a indisponibilidade da ação por não existir análise de fatos, caso concreto nem partes, só havendo a análise abstrata da lei; a previsão do amicus curiae, que atua no auxílio técnico, dando pareceres com mais propriedade sobre o assunto objeto da lei que está sob análise; audiências públicas, que visam consultar a sociedade a respeito de seus interesses, etc. Características procedimentais que legitimam a decisão a ponto de atribuir efeitos vinculantes e erga omnes ao controle abstrato de normas.

3.3 Procedimento do Controle Difuso brasileiro

No Controle difuso de constitucionalidade, por sua vez, é analisada a constitucionalidade de determinada norma diante do caso concreto, questão que é incidental à análise meritória. O controle difuso, diferentemente do concentrado, é de competência de todos os juízes e tribunais.

Pode ser arguida por qualquer uma das partes do processo, desde que seu direito esteja limitado ou obstado por lei ou ato normativo cuja constitucionalidade seja questionável.

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Também tem legitimidade para arguir a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, em sede de controle difuso, o representante do Ministério Público na qualidade de custos legis ou terceiro interessado, assim como o juiz poderá declarar a inconstitucionalidade da norma em controle difuso de ofício.

Terceiros que não tenham liame subjetivo com a lide, por não poderem se manifestar nos autos, não poderão arguir tal incidente sem que impetrem sua própria demanda, se for o caso. Ainda, esse meio de controle não poderá subsistir se não houver uma lide como objeto principal, um caso concreto no qual incida a lei ou ato normativo, visto que o controle de constitucionalidade difuso não é apto a analisar a lei em abstrato, para tanto existindo as ações de controle concentrado.

Uma vez suscitada essa prejudicial de mérito, questão a ser resolvida pelo julgador antes de chegar ao objeto principal da ação, o juiz fará a análise do caso concreto e, à luz da Constituição, decidirá se a lei ou ato normativo serão ou não aplicados ao caso em apreço.

4 O papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade difuso exercido pelo STF.

O controle difuso de constitucionalidade, de competência do judiciário, tem seus efeitos limitados. Por se tratar de uma questão incidental de um processo onde o objeto principal é outro, por envolver um caso concreto de modo que somente os sujeitos envolvidos no litígio poderão se manifestar, seus efeitos são inter partes, ou seja, a decisão de inconstitucionalidade tomada em sede de controle difuso só gera efeito entre as parte do processo, não tendo o condão de retirar a lei ou ato normativo do ordenamento jurídico, mesmo que essa decisão seja tomada em última instância pelo STF.

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A Constituição Federal prevê hipótese em que será possível a atribuição de efeitos erga omnes às decisões de inconstitucionalidade tomadas pelo STF em sede de controle difuso de constitucionalidade (art. 52, X, CF), onde atribui essa função ao Senado Federal:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

Nesse artigo a Constituição confere ao Senado Federal competência privativa para suspender a execução da lei que o STF tenha declarado inconstitucional em sede de controle difuso. Pela simples interpretação literal do artigo vê-se que o intuito do constituinte originário seria de atribuir ao Senado Federal a função de dar efeito geral às decisões que têm efeito particular, uma vez que essas decisões tendem a resolver uma questão incidental de um processo subjetivo, motivo pelo qual muitos doutrinadores o chamam de controle incidental ou por via de exceção, cuja a participação é restrita aos litigantes e por isso só gera efeitos entre os próprios.

A sentença que liquida a controvérsia constitucional não conduz à anulação da lei, mas tão-somente à sua não-aplicação ao caso particular, objeto da demanda.[4]

Assim se expressa Paulo Bonavides ao tratar do controle de constitucionalidade por via de exceção, ainda se fundamentando em Rui Barbosa: “O ato criminado subsiste no corpo geral das leis ou dos decretos, enquanto o poder competente não o desfizer [...]”. Esse trecho deixa evidente que os efeitos desse tipo de controle só

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se aplica no caso em questão e que deve ser enviado ao poder competente a análise do caso para que se possa estender esses efeitos, após uma análise abstrata, retirando o auto grau de subjetividade do procedimento comum.

Entretanto, o STF já entendeu de forma diferente. A Corte Suprema, em especial o Min. Gilmar Mendes, já manifestou o entendimento no sentido de que o controle de constitucionalidade sofreu grande alteração com a inclusão do controle abstrato, ocasionando uma mutação constitucional.

A amplitude conferida ao controle abstrato de normas e a possibilidade de que se suspenda, liminarmente, a eficácia de leis ou atos normativos, com eficácia geral, contribuíram, certamente, para que se quebrantasse a crença na própria justificativa desse instituto, que se inspirava diretamente numa concepção de separação de Poderes - hoje necessária e inevitavelmente ultrapassada. [5]

Para o Min. Gilmar Mendes, com a ampliação do controle concentrado de constitucionalidade, operada com a Constituição de 1988, esse instituto, previsto no inciso X, do artigo 52 da Constituição Federal, teve seu sentido completamente modificado, uma vez que provocou alterações no modelo de controle incidente, reduzindo seu significado, assim conclui o Ministro:

Assim, parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo

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definitivo, de que a lei é inconstitucional, esta decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão no Diário do Congresso.

Ainda segundo o Ministro, um dos fatores que contribuíram para o fomento do controle concentrado de constitucionalidade e, consequentemente, alteração no sentido do instituto da suspensão de execução pelo Senado Federal, foi o aumento no rol de legitimados para propor esse tipo de ação, que antes se restringia ao Procurador-Geral da República. Dessa forma, o constituinte possibilitou a submissão de qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, aumentando consequentemente sua jurisdição constitucional.

Entretanto, havia parte da doutrina que entendia que isso não interferiria no sentido do texto constitucional, expresso no art. 52, X, defendendo que o aumento de legitimados seria uma forma de garantir a participação da sociedade no controle concentrado. Essa segunda corrente doutrinária concluía que a aplicação do dispositivo constitucional supra seria uma forma de garantir a participação do povo, ou pelo menos de seus representantes, no controle difuso de constitucionalidade, uma vez que o Senado Federal é o representante do povo.

Se o controle concentrado é exercido pelo Supremo Tribunal, por outro lado poderá existir, neste controle, a participação da sociedade civil. A decisão do Supremo Tribunal estará, então, legitimada não somente porque emanou da corte que possui em última instância a complexa responsabilidade da guarda da Constituição. Principalmente, a decisão estatal estará legitimada por ser o resultado de um processo

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jurisdicional em que a sociedade poderá vir a ter participação.[6]

Nesse sentido, a participação do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade, por meio da aplicação do inciso X, do artigo 52, da Constituição, seria a forma de democratizar a decisão de constitucionalidade, podendo, só a partir de então, ter efeitos erga omnes.

Mas o modelo de participação democrática no controle difuso também se dá, de forma indireta, pela atribuição constitucional deixada ao Senado Federal. Excluir a competência do Senado Federal – ou conferir-lhe apenas um caráter de tornar público o entendimento do Supremo Tribunal Federal – significa reduzir as atribuições do Senado Federal à de uma secretaria de divulgação intra-legistativa das decisões do Supremo Tribunal Federal; significa, por fim, retirar do processo de controle difuso qualquer possibilidade de chancela dos representantes do povo deste referido processo, o que não parece ser sequer sugerido pela Constituição da República de 1988, ao menos em sua redação originária.[7]

5 Teoria da Abstrativização.

Conforme mencionado, o Brasil adota o sistema misto de controle de constitucionalidade, no qual subsistem os controles difuso e concentrado. As decisões do Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso, diferentemente do concentrado, possuem eficácia interpartes e efeitos ex tunc, uma vez que neste tipo de controle a inconstitucionalidade da norma é discutida de maneira incidental, dentro de um processo subjetivo.

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Entretanto, o supremo, no julgamento do HC 82.959/SP, declarou a inconstitucionalidade do § 1°, art. 2, da lei n° 8.072/90, concernente à vedação a progressão de regime nos crimes hediondos, afirmando, na ocasião, que os demais requisitos constantes na lei deveriam ser analisados caso a caso pelos magistrados.

Com efeito, ao julgar referido HC, que tratava de processo subjetivo com partes definidas, o STF abriu precedente para a denominada teoria da abstrativização, que consubstancia-se na possibilidade do Supremo atribuir eficácia erga omnes (contra todos) às decisões tomadas em sede de controle difuso, como, de fato, ocorreu neste julgamento, uma vez que o óbice à progressão de regime nos crimes hediondos foi afastado em relação a toda a sociedade, e não apenas em relação às partes envolvidas no processo.

Nesse contexto, o senado teria, de acordo com o Ministro Gilmar Mendes, grande defensor da teoria, apenas a função de publicizar a decisão do Supremo, já que esta seria jurisdicional e capaz de produzir efeitos por si mesma.

Ademais, o § 1°, do art. 2° da lei n° 8.072/90 foi revogado pela lei n° 11.474/07, que alterou a lei dos crimes hediondos. Contudo, a decisão tomada pelo Supremo no HC 82.959/SP desencadeou uma importante discussão dentro do órgão de cúpula do poder judiciário, que se viu diante da possibilidade de conferir maior celeridade aos seu julgados, modulando os efeitos de suas decisões, mas, em contrapartida, subtraindo do Senado Federal função atribuída pela Constituição.

Advirta-se, por sua vez, que o STF, após certa polêmica, por meio da Reclamação 4335/AC, julgada em 2013, rechaçou a aplicação da teoria da abstrativização do controle difuso, estabelecendo que o art. 52, X, da CF, não sofreu mutação

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constitucional, cabendo ao Senado, portanto, a função de suspender a eficácia da lei cuja inconstitucionalidade tenha sido declarada pelo STF, atribuindo à decisão do Supremo eficácia erga omnes.

6 Conclusão

Não obstante o entendimento atual do STF, não se pode negar que hodienarmente a tendência é prestigiar a celeridade e a segurança jurídica, existindo inúmeros dispositivos processuais atribuindo às decisões dos tribunais superiores cada vez mais força vinculante, de modo que a discussão acerca da possibilidade da abstrativização das decisões do STF em controle difuso ainda mostra-se relevante, não sendo impossível imaginar que, num futuro próximo, a teroria da abstrativização possa voltar à tona.

7 Referências

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Brasília: UnB, 1999, p. 21.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 45.

Barroso, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1/2.

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

MENDES, Gilmar Ferreira. O Papel do senado federal no controle de constitucionalidade: um caso clássico de mutação constitucional. Revista de informação legislativa. Distrito Federal: Senado Federal, 04/2004 A 06/2004. p. 149 - 168. v.41 fas.162 .

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DOURADO, Maristela Seixas. O Papel Do Senado Federal No Controle De Constitucionalidade.

DOURADO, Maristela Seixas.O Papel Do Senado Federal No Controle De Constitucionalidade.

Notas:

[1] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Brasília: UnB, 1999, p. 21.

2 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 45.

3 Barroso, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1/2.

4 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

5 MENDES, Gilmar Ferreira. O Papel do senado federal no controle de constitucionalidade: um caso clássico de mutação constitucional. Revista de informação legislativa. Distrito Federal: Senado Federal, 04/2004 A 06/2004. p. 149 - 168. v.41 fas.162 .

6 DOURADO, Maristela Seixas. O Papel Do Senado Federal No Controle De Constitucionalidade.

7 DOURADO, Maristela Seixas. O Papel Do Senado Federal No Controle De Constitucionalidade.

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A INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO E A JURISPRUDÊNCIA DO STF

KERINNE MARIA FREITAS PINHEIRO: Advogada. Pós-graduada em Direito Constitucional. Aprovada no concurso para Analista do MPU em 2013, aprovada no concurso para Procurador do Município de Salvador 2015.

RESUMO: O presente trabalho teve como escopo fundamental apontar os diferentes posicionamentos do Supremo Tribunal Federal quando da utilização da técnica da interpretação conforme à Constituição. A interpretação constitucional, de fato, possui certa especialidade, existindo, para tanto, diversos métodos e princípios que auxiliam o exegeta nessa tarefa. A interpretação conforme, como princípio interpretativo, ao incidir no controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, possui grande relevância na atuação do Judiciário, merecendo análise mais aprofundada.

1 INTRODUÇÃO

Interpretação consiste em uma atividade prática que se dispõe a determinar o sentido e o alcance dos enunciados normativos com o fim de aplicá-los às situações concretas. De fato, cabe ao operador do direito, na análise de cada caso, interpretar a regra jurídica para que dela extraia-se a norma adequada. Para tanto, faz-se necessária a aplicação de determinados métodos de interpretação, tais como, o método gramatical, o teleológico, o histórico, dentre outros, construídos ao longo do tempo para auxiliar o intérprete em sua tarefa.

No entanto, no que se refere à interpretação das normas constitucionais, embora entenda-se que também devem ser

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utilizados os métodos tradicionais de interpretação das leis, a doutrina majoritária e a jurisprudência pátria afirmam que há uma certa especialidade dessa interpretação constitucional se comparada àquela aplicada às normas infraconstitucionais. No sentido da especificidade da interpretação constitucional, leciona Luís Roberto Barroso:

A interpretação constitucional serve-se de alguns princípios próprios e apresenta especificidades e complexidades que lhe são inerentes. Mas isso não a retira do âmbito da interpretação geral do direito, de cuja natureza e características partilha. Nem poderia ser diferente, à vista do princípio da unidade da ordem jurídica e do consequente caráter único de sua interpretação. Ademais, existe uma conexão inafastável entre a interpretação constitucional e a interpretação das leis, de vez que a jurisdição constitucional se realiza, em grande parte, pela verificação da compatibilidade entre a lei ordinária e as normas da Constituição.

Carlos Maximiliano também destaca essa especificidade da seguinte forma:

A técnica a interpretação muda, desde que se passa das disposições ordinárias para as constitucionais, de alcance mais amplo, por sua própria natureza e em virtude do objeto colimado redigidas de modo sintético, em termos gerais.

O Direito Constitucional apoia-se no elemento político, essencialmente instável, a esta particularidade atende, com especial e constante cuidado, o exegeta.

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Ademais, confirmando o entendimento mencionado, o processo de controle de constitucionalidade, por si só, também justifica a especialidade da hermenêutica constitucional, posto que todas as normas legais devem estar de acordo com a norma superior da Constituição, tanto em sua literalidade quanto em seu sentido e finalidade.

2 OS MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

2.1 Métodos hermenêuticos clássicos

Antes do século XX, a interpretação das Constituições era realizada utilizando-se os mesmos métodos aplicados ao Direito Civil e às demais normas infraconstitucionais. Esses métodos são comumente conhecidos como métodos hermenêuticos clássicos ou também como métodos jurídicos.

Segundo eles, a Constituição deve ser interpretada através dos elementos tradicionais apontados por Savigny, jurista alemão do século XIX, já que aquela era considerada apenas uma lei. O intérprete da Constituição deveria restringir-se a buscar o sentido da norma e por esse sentido guiar sua aplicação ao caso concreto, sem formular juízos de valor ou desempenhar atividade criativa.

Os principais métodos jurídicos são os métodos: gramatical (filosófico, literal ou semântico), histórico, sociológico, sistemático (lógico), teleológico, axiológico, genético, popular, doutrinário e evolutivo.

Com efeito, os métodos de Savigny, elaborados com base em institutos jurídicos próprios do direito privado, sem levar em consideração as características peculiares das normas constitucionais, foram bastante criticados pela doutrina. Todavia, não se fala em deixar tais métodos de lado, ao contrário, eles devem ser utilizados em conjuntos com outros métodos, tendo em vista que

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sua utilização isolada revela-se insuficiente para uma interpretação adequada.

2.2 Método científico-espiritual

Segundo esse método, a norma constitucional não deve ser analisada em sua literalidade, mas sim partindo da realidade social e dos valores constantes do texto constitucional. De fato, a Constituição Federal, considerada um instrumento de integração, não deve ser vista apenas sob o ponto de vista jurídico-formal, mas também e, principalmente, sob a perspectiva política e sociológica, como um instrumento de solução de conflitos, de construção e preservação da unidade social. Conforme, ainda, o que entendem aqueles que defendem esse método, o preâmbulo, ao consagrar valores subjacentes à Constituição, torna-se um elemento muito importante para a interpretação do texto constitucional.

Algumas críticas ao método científico-espiritual surgem, na medida em que esse método, ao ser desenvolvido em termos muito vagos, não possui um fundamento filosófico-jurídico claro. Além disso, a indeterminação e a mutabilidade dos resultados obtidos podem enfraquecer a força normativa da Constituição.

2.3 Método tópico-problemático

Segundo afirma Francisco Meton, Theodor Wiehweg foi o grande teorizador atual da tópica que, em sua origem, já vinha de Aristóteles, Cícero e Vico. Para o autor, a tópica parte de um catálogo de verdades consagradas ou aceitas pela maioria dos doutos.

Com efeito, os intérpretes utilizam-se de vários tópicos ou pontos e vista, com o fim de relevar, dentro das várias possibilidades ensejadas pelos múltiplos significados do texto constitucional, a interpretação mais conveniente ao problema. Por meio desse

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método, parte-se de um problema concreto para a norma, atribuindo-se à interpretação um caráter prático na busca da solução dos problemas concretizados.

A possibilidade se conduzir-se a um casuísmo ilimitado e, por consequência, a uma insegurança interpretativa é um dos motivos pelos quais esse método sofre críticas.

2.4 Método hermenêutico-concretizador

Esse método reconhece a importância do aspecto subjetivo da interpretação, ou seja, da pré-compreensão que o intérprete possui acerca dos elementos envolvidos no texto a ser por ele interpretado. Diferente do método tópico-problemático, que parte de um caso concreto para a norma, o método hermenêutico-concretizador parte de Constituição para o problema.

Os defensores do método tópico-problemático criticam o método hermenêutico-concretizador pela amplitude e generalidade das normas constitucionais, o que exigiria uma prevalência da pragmaticidade e praticidade na interpretação, com predominância do problema sobre a norma. Já os defensores do segundo método, entre os quais está José Joaquim Gomes Canotilho, criticam o método tópico-problemático pelo enorme risco de casuísmo na interpretação constitucional, com inevitável insegurança jurídica, conforme visto.

2.5 Método normativo-estruturante

Esse método de interpretação constitucional dá relevância ao fato de não haver identidade entre norma jurídica e texto normativo. O teor literal da norma deve ser analisado à luz da concretização daquela em sua realidade social.

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Segundo Pedro Lenza, a doutrina que defende esse método reconhece a inexistência de identidade entre a norma e o texto normativo. Para ele: “a norma deve ser concretizada não só pela atividade do lesgislador, mas também, pela atividade do Judiciário, da administração, do governo etc”.

Mártires Coelho analisa a aplicação desse método, veja-se:

Na tarefa de concretização da norma constitucional, o intérprete-aplicador deve considerar tanto os elementos resultantes da interpretação do programa normativo, quanto os decorrentes da investigação do domínio normativo, a que correspondem, na doutrina tradicional, respectivamente, a norma propriamente dita e a situação normada, o texto e a realidade social que o mesmo intenta.

Alguns autores criticam esse método afirmando que os elementos metodológicos e dogmáticos do âmbito da norma, por estarem em uma relação direta com ela, seriam hierarquicamente superiores aos demais. Para Paulo Bonavides, este é um ponto falho do método, já que, após abrir-se para a realidade tem sua última postulação assentada numa estrutura jurídica limitativa.

2.6 Método da sociedade aberta de intérpretes da Constituição

Esse método foi desenvolvido por Peter Härbele e gira em torno da ampliação do círculo de intérpretes da Constituição. Alinhado a uma perspectiva típica de um Estado Democrático de Direito, que busca a abertura e não o fechamento no processo de concretização das normas constitucionais, o método visa a integração da realidade social ao processo de interpretação constitucional.

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Com efeito, na aplicação de uma norma ao caso concreto, tendo em vista a sociedade democrática e pluralista na qual vivemos, os atores sociais surgem como legítimos intérpretes das normas constitucionais, na medida em que, como destinatários dessas normas, ao auxiliar sua interpretação, legitimam a aplicação dessas aos casos concretos.

Conforme anotou Pedro Lenza ao ressaltar as lições de Härbele, o conceito mais amplo de hermenêutica abrange os cidadãos, os grupos políticos, os órgãos estatais e a opinião pública. Estes atores representam forças produtivas de interpretação e atuam como intérpretes constitucionais em sentido lato.

No Brasil, a consequência da aplicação desse método foi a crescente utilização, pelo Judiciário, de audiências públicas e da figura do Amicus curiae.

Os que criticam esse método interpretativo alegam que o alargamento excessivo do círculo de intérpretes pode conduzir a uma quebra da unidade da Constituição e ao enfraquecimento da sua força normativa. Para os críticos, esse método exige um sólido consenso democrático, instituições fortes e uma cultura política desenvolvida.

3 PRINCÍPIOS DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

Todos esses métodos de interpretação constitucional são utilizados ao lado dos princípios específicos para aplicação das normas da Constituição. Os princípios e os métodos de interpretação integram-se num conjunto harmônico para a perfeita busca do sentido constitucional.

Será feita a seguir uma breve análise dos princípios específicos da interpretação constitucional.

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O princípio da unidade da Constituição preconiza que esta deve sempre ser interpretada em sua globalidade. O intérprete deve harmonizar as tensões e contradições existentes com o fim de eliminar aparentes antinomias. Sendo assim, a Constituição compõe um sistema unitário, não havendo hierarquia normativa entre suas regras.

Também com o fim de coordenar e combinar os bens jurídicos em conflito, o princípio da concordância prática ou harmonização surge ao permitir que o intérprete atue de forma a reduzir de forma proporcional o alcance de alguns princípios quando em conflito. Assim, existindo atrito entre dois princípios, deverá ser feita uma ponderação de modo que a afirmação de um deles não signifique o sacrifício total do outro. Esse princípio de interpretação constitucional diferencia-se do princípio da unidade, na medida em que atua nas colisões de direitos nos casos concretos, enquanto o último atua nas contradições normativas abstratas.

O princípio da conformidade funcional ou da justeza impõe ao intérprete o dever de ser fiel à concretização da norma constitucional, de maneira que se mantenham incólumes as funções constitucionalmente estabelecidas. Compreende a delimitação de competências entre os órgãos públicos. Em razão disso, nenhuma interpretação realizada por um órgão pode conduzir a uma usurpação de competência ou de função dos demais.

O princípio do efeito integrador coloca a Constituição como elemento do processo de integração comunitária tendo por principal finalidade a unidade política. Conforme leciona J. J. Canotilho: “Na resolução dos problemas jurídico-constitucionais deve dar-se primazia aos critérios ou ponto de vistas que favoreçam a integração política e social e o reforço da unidade política”.

Por sua vez, o princípio da força normativa aduz que os aplicadores da Constituição, na solução dos conflitos, devem dar

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prevalência aos argumentos que contribuam ou conduzam as normas constitucionais à sua eficácia máxima.

Por outro lado, o princípio da máxima efetividade é invocado no âmbito dos direitos fundamentais. Sem alterar o conteúdo desses direitos, esse princípio dispõe que aos direitos fundamentais deve-se atribuir a maior efetividade possível, a fim de que se garanta a função social deles.

Toda a interpretação normativa tem como pressuposto a superioridade jurídica e axiológica da Constituição. Desse modo, nenhum ato normativo poderá contrapor-se ao conteúdo da Carta Maior. Disso decorre o princípio da Supremacia da Constituição, impondo que todas as regras ou atos de qualquer dos poderes deverá guardar conformidade com o texto constitucional, sob pena de padecerem de inconstitucionalidade.

Além disso, o princípio da presunção da constitucionalidade das leis dispõe que as leis emanadas do Poder Legislativo e os atos da Administração Pública possuem presunção relativa de constitucionalidade, podendo ser elidida mediante controle de constitucionalidade perante o Poder Judiciário.

4 O PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

Algumas normas infraconstitucionais podem possuir conteúdo que dê margem a diversas interpretações. Por isso, são chamadas de normas plurissignificativas ou polissêmicas.

Partindo do pressuposto de que as normas legais são presumidamente constitucionais, o intérprete deve buscar dentre seus diversos significados aquele que guarde conformidade com a Constituição. Assim, fixa-se uma determinada interpretação e afasta-se as demais que não se coadunam com a Carta Política.

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A interpretação conforme a Constituição deverá ser implementada pelo Judiciário e, em última análise, pelo Supremo Tribunal Federal. Desse modo, esse princípio situa-se no âmbito do controle de constitucionalidade das leis e não apenas como regra de interpretação.

4.1 Limites à Interpretação Conforme

O magistrado deve preferir aquela interpretação que esteja de acordo com a Constituição, preservando a norma, ainda que ela possua outra interpretação que seja inconstitucional.

Todavia, deve ser respeitado o texto da lei. Não se admite, portanto, no ordenamento brasileiro, a interpretação contra legem. O intérprete não pode contrariar o texto literal e o sentido da norma para obter sua concordância com a Constituição.

Ademais, se a norma não é plurissignificativa, possuindo apenas um significado, não caberá a interpretação conforme, devendo esse único significado estar de acordo com a Constituição, sob pena de a norma ser declarada inconstitucional. Sendo assim, só admite-se a interpretação conforme quando há espaços de decisão.

Além disso, não é permitido ao intérprete contrariar aquele objetivo que foi pretendido pelo legislador quando da criação da norma, isto é, não é lícito àquele atuar como legislador positivo modificando a finalidade da regra.

4.2 Interpretação Conforme X Declaração de Inconstitucionalidade sem redução de texto

Conforme afirmado, a interpretação conforme a Constituição é uma técnica utilizada pelo Judiciário no controle de constitucionalidade das leis e atos normativos. É utilizada para

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salvar uma norma que possui mais de uma interpretação possível, sendo que ao menos uma dessas interpretações é compatível com a Constituição.

Essa técnica pode ser aplicada em todas as modalidades de controle de constitucionalidade, inclusive no difuso, pois trata-se de um instrumento da hermenêutica constitucional. Nesse sentido, ensina Leo Brust:

Há muito que o uso das chamadas sentenças interpretativas (decisões que incidem apenas nas normas contidas num preceito legal, preservando o seu texto) deixou de ser uma prática limitada ao controle concentrado de constitucionalidade e, por conseguinte, ao Supremo Tribunal Federal. No âmbito do controle difuso de constitucionalidade os juízes e os tribunais também sentiram a necessidade de utilizá-las, para evitar que a declaração pura e simples de inconstitucionalidade acabasse por trazer mais danos que benefícios às partes e ao próprio ordenamento jurídico.

Por outro lado, a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto é utilizada para declarar a inconstitucionalidade de uma hipótese de incidência ou aplicação de uma norma que é constitucional se aplicada a outras situações. Mantém-se a norma vigente pelo fato de ela possuir outras hipóteses de aplicação além daquela considerada inconstitucional. Ao contrário da interpretação conforme, essa declaração pode ocorrer inclusive quando a norma possuir apenas uma interpretação possível.

Além disso, a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto só tem utilidade no controle concentrado e abstrato, posto que, no controle difuso, o Poder Judiciário não precisa imaginar diversas hipóteses de incidência para concluir pela

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inconstitucionalidade desta ou daquela hipótese. A questão da constitucionalidade, nesses casos, será decidida de forma incidente, de acordo com o caso concreto, não havendo também qualquer necessidade de redução de texto.

5. A INTERPRETAÇÃO CONFORME NA JURISPRUDÊNCIA DO STF

5.1 A Súmula Vinculante nº 10

A Súmula Vinculante nº 10 aduz que:

Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

A cláusula de reserva de plenário, conforme dispõe a súmula, está prevista no artigo 97 da Constituição Federal o qual aponta:

Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

Segundo o que entende o Supremo Tribunal Federal, ao utilizar o método da interpretação conforme a Constituição, o Tribunal não precisa observar a cláusula da reserva de plenário, visto que não declara a inconstitucionalidade da norma, mas apenas exclui interpretações não compatíveis com a Constituição. Vejamos:

A parte agravante, em síntese, alega que 'esse STF no julgamento do RE 389.808 (...), por maioria (ocasional) de cinco votos a quatro, conferiu ao art. 6º

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da LC 105 'interpretação conforme a Constituição (portanto não declarando a inconstitucionalidade do dispositivo), firmando o entendimento de que conflita com a Carta da República norma legal atribuindo à Receita Federal - parte na relação jurídico tributária - o afastamento do sigilo de dados relativos ao contribuinte. Não obstante, a decisão foi proferida em sede de controle difuso, não ostentando efeitos erga omnes nem eficácia vinculante.' (...) A decisão agravada está alinhada com a orientação do Supremo Tribunal Federal (...). (...) No caso, conforme assentado na decisão agravada, no julgamento do RE 398.808, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional o art. 6º da LC 105/01. (...) 'É certo que a questão está em revisão no âmbito do Supremo Tribunal, tendo sido admitida, no RE 601.314, a repercussão geral do tema. A despeito disso, os tribunais que seguem a orientação atualmente fixada não necessitam submeter a questão aos respectivos plenários' (Rcl 17.574, Rel. Min. Gilmar Mendes). (Rcl 18598 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgamento em 7.4.2015, DJe de 5.5.2015).

5.2 A jurisprudência do STF e os limites da interpretação conforme

Em sede de controle concentrado e abstrato de constitucionalidade, por meio da ADI 134, o STF concluiu por não declarar a inconstitucionalidade de dispositivo da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul e, ao contrário, conferir-lhe interpretação conforme, com o fim de preservar sua constitucionalidade. Observa-se o teor da ementa:

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AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. LEGITIMIDADE ATIVA DA ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS-AMB. VINCULAÇÃO DE VENCIMENTOS. OBSERVÂNCIA DO MODELO FEDERAL. ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. FUNÇÃO FISCALIZADORA: LIMITAÇÃO AOS ATOS DO PODER EXECUTIVO. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. INOBSERVÂNCIA.

1. Tem legitimidade ativa ad causam a Associação dos Magistrados do Brasil - AMB, uma vez que os textos impugnados promovem vinculação de vencimentos entre os auditores do Tribunal de Contas do Estado e os juízes do Tribunal de Alçada, evidenciando o interesse corporativo da entidade.

2. Vencimentos. Equiparação e vinculação de remuneração. Inconstitucionalidade, excetuadas situações especialmente previstas no próprio Texto Constitucional. Percepção dos vencimentos em virtude do exercício do cargo em substituição. Acumulação de vencimentos não-caracterizada. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Inconstitucionalidade tão-só da expressão "e, quando no exercício das demais atribuições da judicatura, os dos Juízes do tribunal de Alçada", contida no § 2ºdo artigo 74 da Constituição estadual.

3. Poder Legislativo. Função fiscalizadora. Conforme prevê o artigo49, X, da Constituição Federal, a função fiscalizadora do Poder Legislativo está restrita aos atos do Poder Executivo. Não-observância ao princípio da simetria. Inconstitucionalidade da expressão "sobre fatos relacionados a cada um deles", inserida no inciso XX do artigo53 da Constituição do Estado do Rio Grande

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do Sul, que não foi acolhida pela maioria, prevalecendo o posicionamento de se conferir à norma interpretação conforme a Constituição, para excluir do seu alcance os atos jurisdicionais. Ressalva de ponto de vista do Relator. Ação direta de inconstitucionalidade parcialmente procedente.

Em algumas situações, entretanto, o STF tem optado por não utilizar a técnica da interpretação conforme com o receio de atuar como verdadeiro legislador positivo. De fato, conforme visto, a interpretação conforme a Constituição deve obedecer a determinados limites. Essa postura restritiva é verificada no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.344. Segundo o Ministro relator Moreira Alves:

Em face do que se acentuou na parte inicial desse voto, é relevante a fundamentação jurídica da arguição de inconstitucionalidade desse dispositivo no tocante às gratificações, existentes na data da publicação dessa lei Complementar estadual, que não têm o caráter de vantagens pessoais, como as gratificações pelo exercício de função gratificada, pelo exercício de cargo em comissão, de produtividade, e de representação.

Tendo em vista, porém, que é inequívoca a mens legis no sentido de que esse preceito visa a alcançar indistintamente todas as vantagens e gratificações de qualquer natureza que excedam ao teto nele referido, não é possível dar-se lhe outra interpretação, para reduzir o seu alcance, e, assim, torná-lo conforme à Constituição Federal, porque a técnica da interpretação conforme só é utilizável quando a

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norma impugnada admite, dentre as várias interpretações possíveis, uma que a compatibilize com a Carta Magna, e não quando o sentido da norma é unívoco, como sucede no caso presente.

Entretanto, na jurisprudência da Suprema Corte também podemos encontrar julgados nos quais os Ministros utilizam a técnica de modo a criar ou alterar hipóteses de incidência da norma não previstas pelo legislador. Com efeito, na decisão proferida na ADI-MC 4.389, a interpretação conforme serviu de mecanismo para a inserção de significado diverso à norma.

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONFLITO ENTRE IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA E IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERESTADUAL. PRODUÇÃO DE EMBALAGENS SOB ENCOMENDA PARA POSTERIOR INDUSTRIALIZAÇÃO (SERVIÇOS GRÁFICOS).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE AJUIZADA PARA DAR INTERPRETAÇÃO CONFORME AO O ART. 1º, § 2º, DA LEI COMPLEMENTAR 116/2003 E O SUBITEM 13.05 DA LISTA DE SERVIÇOS ANEXA. FIXAÇÃO DA INCIDÊNCIA DO ICMS E NÃO DO ISS. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. Até o julgamento final e com eficácia apenas para o futuro (ex nunc), concede-se medida cautelar para interpretar o art. 1º, § 2º, da Lei Complementar 116/2003 e o subitem 13.05 da lista de serviços anexa, para reconhecer que o ISS não incide sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração

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ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria. Presentes os requisitos constitucionais e legais, incidirá o ICMS.

Segundo o acórdão da ação mencionada, o STF declarou constitucional determinada interpretação dada ao artigo 1º, caput e parágrafo 2º, da Lei nº 116/2003 que trata do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). Ao conceder a esse artigo a interpretação segundo a qual o ISS não deverá incidir sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria, devendo incidir o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), a Corte, a pretexto de realizar uma interpretação conforme a Constituição, acabou por criar uma nova hipótese de incidência do ICMS.

Sobre o caso analisado, Marina Corrêa Xavier:

A norma criada não pode ser extraída nem dos preceitos constitucionais utilizados como parâmetro nem das disposições objeto da ação direta, inclusive por contrariá-los. Explica-se. A Constituição é clara ao atribuir aos municípios a instituição do Imposto Sobre Serviços de qualquer natureza, desde que (a) não compreendidos no artigo 155, inciso II, e (b) definidos em lei complementar. Em relação ao ponto (a), o artigo 155, inciso II, refere-se apenas aos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Quanto ao ponto (b), a União editou a Lei Complementar 116/2003, que lista os serviços sujeitos ao ISS, e entre eles está a composição gráfica.

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A Constituição define, ainda, em seu artigo 146, inciso I, que cabe a Lei Complementar dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre os entes federados. Em cumprimento ao preceito, a LC 116/2003 dispõe em seu artigo 1º, parágrafo 2º, que, para evitar conflitos, os serviços constantes da lista, salvo exceções expressas, não se sujeitam ao ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. É justamente esse o caso da impressão gráfica em embalagens produzidas sob encomenda para posterior comercialização de outros produtos. Vê-se, portanto, que o novo comando cria hipótese de incidência do ICMS e afasta a incidência do ISS.

Em outro julgado, ao analisar a natureza jurídica da OAB, o STF entendeu não ser possível se fazer uma interpretação conforme ao artigo 79 da Lei 8.906/1994, a fim de entender cabível a exigência de concurso público aos trabalhadores contratados pela OAB. A mencionada norma apenas afirma que à OAB aplica-se o regime celetista. Desse modo, conforme destacou o Ministro Eros Grau, não há, no caso, uma norma plurissignificativa que permita mais de uma interpretação ou a extração de mais de uma norma.

Apesar do que foi decidido pelo Supremo, alguns Ministros apresentaram posicionamento divergente apontando haver ambiguidade na medida em que a natureza jurídica da OAB não estava definida. Caso a entidade fosse considerada de Direito Público, haveria a exigência de concurso, caso fosse considerada de Direito Privado, não haveria tal exigência. Em razão disso, a aplicação da norma do artigo 79 citado, cumulada com o artigo 37 da Constituição Federal geraria uma ambiguidade, permitindo a incidência da interpretação conforme. No entanto, como visto, não foi esse o entendimento do tribunal.

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6 CONCLUSÃO

Conforme exposto, a interpretação da Constituição possui características especiais que a diferem da interpretação das demais leis do ordenamento jurídico. Para tanto, além dos métodos tradicionais de interpretação, utilizados pelo direito privado, faz-se necessária a utilização de métodos específicos, tais com o científico-espiritual, o tópico-problemático, dentre outros.

Aliados a esses métodos, os princípios de interpretação constitucional também são preceitos importantes que auxiliam o exegeta e o operador do direito quando da aplicação das normas da Constituição aos casos concretos.

Considerado por muitos um princípio de interpretação constitucional e, por outros, uma técnica utilizada no âmbito do controle de constitucionalidade, a interpretação conforme a Constituição surge como importante mecanismo da hermenêutica constitucional. Com o objetivo de conferir permanência às leis do ordenamento jurídico, a interpretação conforme garante que, caso aquelas possuam um significado que esteja de acordo com as demais normas da Constituição, não devem ser declaradas inconstitucionais.

Todavia, essa prática possui alguns limites que devem se observados pelo Poder Judiciário. Com efeito, somente as normas polissêmicas ou plurissignificativas dão margem a essa interpretação conforme. Ademais, o magistrado deve observar as finalidades da lei, isto é, os objetivos pretendidos pelo legislador positivo.

O Supremo Tribunal Federal há muito vem adotando essa técnica em sede de controle abstrato e incidental de constitucionalidade. Por vezes, o Supremo possui entendimento no sentido da aplicação da técnica, em outras situações, pela sua não

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aplicação e, em algumas, até mesmo excede os limites dessa interpretação.

Conforme exposto, a jurisprudência do STF ainda não se mostra uniforme e consolidada quanto à aplicação da técnica da interpretação conforme a Constituição. Desse modo, tendo em vista sua importância para a unidade do ordenamento jurídico brasileiro, constata-se a necessidade de que o tema seja objeto de discussões e análises, tanto por parte da jurisprudência como também por parte da doutrina, para que seja aplicado da forma mais adequada à interpretação do texto constitucional.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996.

BRASIL. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em: 27 jan. 2016.

______. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 10. ACÓRDÃO RECLAMADO COM FUNDAMENTO

EM DECISÃO DO PLENÁRIO DO STF. Relator Ministro Roberto Barroso. Brasília: DJe, 5 maio 2015. Disponível em: . Acesso em: 31 jan. 2016.

______. Supremo Tribunal Federal. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. LEGITIMIDADE ATIVA DA ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS-AMB. VINCULAÇÃO DE VENCIMENTOS. OBSERVÂNCIA DO MODELO FEDERAL. ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. FUNÇÃO FISCALIZADORA:

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LIMITAÇÃO AOS ATOS DO PODER EXECUTIVO. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. INOBSERVÂNCIA. Ministro Relator Maurício Corrêa. Brasília: DJ, 25 mar. 2004. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266214 >. Acesso em: 31 jan. 2016.

______. Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade. Pedido de medida liminar. Par.1. do artigo 71 da Lei Complementar n. 46, de 31 de janeiro de 1994, do artigo 2. da Lei Complementar n. 48, de 19 de abril de 1994, e artigo 1. da Lei Complementar n. 50, de 18 de julho de 1994, todas do Estado do Espirito Santo. Ministro Relator Moreira Alves. Brasília: DJ, 25 mar. 1995. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=346988 >. Acesso em: 31 jan. 2016.

______. Supremo Tribunal Federal. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONFLITO ENTRE IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA E IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERESTADUAL. PRODUÇÃO DE EMBALAGENS SOB ENCOMENDA PARA POSTERIOR INDUSTRIALIZAÇÃO (SERVIÇOS GRÁFICOS).Ministro Relator Joaquim Barbosa. Brasília: DJ, 25 maio 2011. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1185299 >. Acesso em: 31 jan. 2016.

______. Supremo Tribunal Federal. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES

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INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DACONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA. Relator Ministro Eros Grau. Brasília: DJ, 29 set. 2006. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=363283>. Acesso em 31 jan. 2016.

BRUST, Leo. A interpretação conforme a Constituição e as sentenças manipulativas. Disponível em: . Acesso em 27 jan. 2016.

COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação constitucional. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

LIMA, Francisco Meton Marques de. O resgate dos valores na interpretação constitucional. Fortaleza: ABC Editora, 2001.

XAVIER, Marina Corrêa. Limites da interpretação conforme a Constituição no STF. Disponível em: . Acesso em: 27 jan. 2016.

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A IMPOSSIBILIDADE DE BLOQUEIO JUDICIAL DE VERBAS MUNICIPAIS, SUJEITAS AO REGIME DOS PRECATÓRIOS, AINDA QUE PARA SATISFAZER DECISÃO JUDICIAL REFERENTE A PAGAMENTO DE VERBA ALIMENTAR

DIEGO GUIMARÃES CAMARGO: Técnico-administrativo do Ministério Público do Estado da Bahia. Graduado pela Universidade Católica do Salvador - UCSal.

Resumo: Esse artigo tem como objetivo demonstrar que são insubsistentes os argumentos dos que defendem que o Judiciário pode bloquear verbas públicas municipais para satisfazer sentença judicial que condena a fazenda pública a pagar verbas alimentícias.

Palavras-chaves: Fazenda Pública; Município; Sequestro de verbas públicas.

1) Introdução

O artigo 100 da Constituição Federal de 88 (CF/88) traz a forma de pagamento, no que atine às execuções contra a fazenda pública. Nele, resta evidente que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios (ressalvado o disposto no parágrafo terceiro do artigo supracitado). Ainda assim, há magistrados que insistem na possibilidade de bloqueio de verbas públicas municipais para o adimplemento de créditos alimentares garantidos por precatório, em total burla, principalmente, ao princípio da isonomia. Tal postura, como se verá, afronta diretamente a Constituição Federal, bem como o entendimento dos tribunais superiores.

2) Desenvolvimento

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Para alguns, seria possível o bloqueio judicial de verbas públicas para garantir o cumprimento de determinação judicial, no caso de verba alimentar. Contudo, o regramento aplicável à execução por quantia certa movida contra a Fazenda Pública demonstra que, mesmo nessas hipóteses, há de ser observada a regra de precedência entre os credores, sob pena de se desvirtuar a igualdade entre eles, residindo, neste ponto, a inconsistência dos que advogam essa tese.

Com efeito, o art. 100, caput, da Carta da República traz norma expressa acerca dos pagamentos devidos pelo Poder Público, merecendo transcrição integral pela sua importância no deslinde do caso em apreço:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

Comentando o teor do verbete legal, Daniel Amorim Assumpção Neves[1] leciona que:

Principalmente em razão da natureza dos bens públicos – de uso comum, de uso especial ou dominicais – considerados inalienáveis e, por consequência lógica, impenhoráveis, o procedimento da execução de pagar quantia certa contra a Fazenda Pública demanda uma forma

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diferenciada daquela existente para a execução contra o particular. Também se costuma afirmar que a especialidade do procedimento está relacionada ao princípio da continuidade do serviço público, já que os bens não poderiam ser afastados de sua utilização pública, sob pena de prejuízo à coletividade. Por fim, o procedimento especial também é justificado no princípio da isonomia, sendo o pagamento por precatórios a única maneira apta a garantir que não haja preferências na ordem de pagamento aos credores da Fazenda Pública.

É certo que, na redação original[2] do citado art. 100 da CF/88, havia previsão textual de que os créditos de natureza alimentícia não se submetiam à expedição de precatório. Os Tribunais Superiores, no entanto, consagraram o entendimento de que tais verbas possuem apenas preferência no pagamento, mas estão também sujeitas à ordem cronológica de adimplemento, sob pena de malferir os direitos legítimos constituídos anteriormente por terceiros de boa-fé.

Tal posicionamento restou abarcado pela Emenda Constitucional nº. 62/2009, que alterou a redação do art. 100, já citado, bem como que modificou a redação do seu § 1º, conciliando, definitivamente, a ordem de preferência dos créditos alimentares com a expedição dos precatórios para os demais créditos:

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios

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previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.

Em sendo assim, levando em consideração o entendimento doutrinário supratranscrito e o regramento constitucional da matéria, tem-se que não pode o juiz determinar, de pronto, a constrição de verbas municipais para o adimplemento de suposto crédito devido a particular, na medida em que isso configura burla à preferência dos demais credores que detém crédito de idêntica natureza.

Nesse ínterim, cumpre trazer à baila julgados proferidos pelo Supremo Tribunal Federal, de forma a demonstrar a correção do entendimento suso mencionado:

EMENTA: AÇÃO CAUTELAR. LIMINAR DEFERIDA AD REFERENDUM. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO EXTRAORDINÁRIO. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. CONDENAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA AO PAGAMENTO IMEDIATO DE INDENIZAÇÃO: FÉRIAS E LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADAS. OFENSA AO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. Ao interpretar o art. 100 da Constituição da República, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que 'mesmo as prestações de caráter alimentar

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[submetem-se] ao regime constitucional dos precatórios, ainda que reconhecendo a possibilidade jurídica de se estabelecerem duas ordens distintas de precatórios, com preferência absoluta dos créditos de natureza alimentícia (ordem especial) sobre aqueles de caráter meramente comum (ordem geral)'(STA 90-AgR/PI, Rel. Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, DJ 26.10.2007). 2. Incidência da Súmula 655 do Supremo Tribunal Federal. 3. Liminar referendada[3].

AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE LIMINAR. BLOQUEIO DE RECURSOS FINANCEIROS MUNICIPAIS. IMEDIATA TRANSFERÊNCIA PARA A CONTA CORRENTE DA AUTORA DA AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OCORRÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM E À ECONOMIA PÚBLICAS. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 100 E 160 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AO ART. 2º-B DA LEI 9.494/97. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA HONORÁRIA. SUBMISSÃO AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS PRECATÓRIOS. 1. Lei 8.437/92, art. 4º, § 1º: configuração de grave lesão à ordem e à economia públicas. Pedido de suspensão de liminar deferido. 2. A tutela jurisdicional pretendida pela agravante, consubstanciada no recebimento dos honorários devidos pelos serviços advocatícios por ela prestados ao Município agravado, só pode ser efetivada

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após o trânsito em julgado da ação ordinária de cobrança ajuizada na origem. 3. O sequestro de recursos municipais, para prover à satisfação de futura e determinada cobrança, reveste-se de consequências extremamente prejudiciais à regular execução dos serviços básicos locais. 4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao interpretar o disposto no caput do art. 100 da Constituição da República, firmou-se no sentido de submeter, mesmo as prestações de caráter alimentar, ao regime constitucional dos precatórios, ainda que reconhecendo a possibilidade jurídica de se estabelecerem duas ordens distintas de precatórios, com preferência absoluta dos créditos de natureza alimentícia (ordem especial) sobre aqueles de caráter meramente comum (ordem geral).Precedentes. 5. Agravo regimental improvido[4].

Na mesma linha, aresto oriundo do Superior Tribunal de Justiça[5] sobre a inviabilidade da constrição de verbas públicas na execução contra a Fazenda Pública:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. TRANSAÇÃO JUDICIAL. DESCUMPRIMENTO. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. INVIABILIDADE DA CONSTRIÇÃO.

1. A execução, contra a Fazenda Pública, de obrigação de pagar quantia está

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sujeita a rito próprio (CPC, art. 730 do CPC e CF, art.

100 da CF), que não prevê, salvo excepcionalmente (v.g., desrespeito à ordem de pagamento dos precatórios judiciários), a possibilidade de expropriação mediante bloqueio ou sequestro de dinheiro ou de qualquer outro bem público, que são impenhoráveis.

2. A transação judicial homologada pelo juiz é título executivo judicial (art. 475-N do CPC, correspondente ao revogado art. 584 do CPC). Não cumprida a obrigação, sua execução judicial deve observar o procedimento comum da execução contra a Fazenda Pública.

3. Recurso especial a que se dá provimento.

3) Conclusão

Diante do que foi supracitado, resta evidente que o sequestro de verbas públicas municipais, para adimplir débitos – ainda que alimentares – não deve ser aceito, seja por ferir o princípio da isonomia, seja por afrontar diretamente o comando da Constituição Federal de 88, ou seja porque essa forma de sequestro não é aceita pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, quiçá do Superior Tribunal de Justiça.

4) Referências bibliográficas

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[1] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 1078

[2] Art. 100. à exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

[3] AC 2193 REF-MC, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 23/03/2010, DJe-071 DIVULG 22-04-2010 PUBLIC 23-04-2010 EMENT VOL-02398-01 PP-00021.

[4] SL 158 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/2007, DJe-139 DIVULG 08-11-2007 PUBLIC 09-11-2007 DJ 09-11-2007 PP-00031 EMENT VOL-02297-01 PP-00007.

[5] REsp 890.215/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2007, DJ 22/03/2007, p. 315.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS PELOS FILHOS MENORES

ENOQUE MARQUES REIS FILHO: Acadêmico do curso de Direito pela Faculdade AGES.

RESUMO: Esse trabalho procura traçar a responsabilidade civil apresentando seu conceito, os elementos fundamentais para a sua caracterização, além de algumas classificações básicas para uma maior compreensão do tema proposto. A Responsabilidade Civil dos pais pelos filhos menores trata-se de uma responsabilização de terceiros, sua importância é para as vítimas que sofrem alguns tipos de danos, assim, aborda-se e explica-se o questionamento do por que dessa responsabilização.

PALAVRAS CHAVES: Responsabilidade Civil; Culpa; responsabilidade por Terceiros.

INTRODUÇÃO

Neste trabalho, procura-se apresentar a estrutura da responsabilidade Civil e seu conceito. Esta, proporcionando a garantia de segurança aos bens das pessoas, e se caso estes venham ser agredidos, há aplicação no agente causador medidas para obrigar a reparação de danos, decaindo no seu patrimônio ou até mesmo respondendo moralmente.

Como forma de aprofundar o tema, trouxe a baila alguns tipos de obrigações, das quais compreende - se a maneira de aplicação da responsabilização. Utilizou-se as linhas de pensamentos de doutrinadores como Silvio Rodrigues, e Maria Helena Diniz, para maior compreensão da presente analise.

Diante das análises dos temas já mencionados, manteve-se o foco na Responsabilidade Civil dos pais pelos filhos menores, contribuindo para esclarecimentos de dúvidas, tais como: O porquê

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de um terceiro responder pelos atos de outro, o grau da culpabilidade dos pais nos atos praticados pelos filhos, entre outros. O presente trabalho traz pensamentos de doutrinadores para nortear e melhor conduzir a compreensão do tema.

2 RESPONSABILIDADE CIVIL E SEUS ELEMENTOS

A Responsabilidade Civil tem grande importância na seara da vida, garantindo uma maior proteção aos bens jurídicos das pessoas. Sendo conceituada por Savatier como: “A obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado ao outro, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependem”. (SAVATIER, apud Rodrigues, 2008, p. 6). É favorável para uma maior compreensão da afirmação já pronunciada, utilizar a asseveração de Pablo Stolze Gagliano que acredita: “bem jurídico é a utilidade física ou material, objeto de uma relação jurídica, seja pessoal ou real.” (GAGLIANO, 2010, p. 300). Essa proteção induz ao agente do ato a reparar ou indenizar a vítima.

Para que exista a caracterização dessa, é necessário observar alguns elementos fundamentais, sendo eles: ação ou omissão do agente; a Culpa do agente; a Relação de Causalidade; e o Dano experimentado pela vítima.

A Ação ou omissão do agente – sua contribuição na construção da responsabilidade é através da prática de um ato ilícito sendo ele positivo ou negativo. Maria Helena Diniz conceitua o ato ilícito como:

Aquele que é praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual. Causa dano moral ou patrimonial a alguém, criando o dever de reparar tal prejuízo a alguém, só que este não é desejado pelo agente, mas imposto pela lei. (DINIZ, 2010, p. 60)

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Abrange-se esse pensamento com afirmativa de Silvio Rodrigues que assevera: “A ação ou omissão do agente, para construir ato ilícito, envolve a infração de um dever legal, contratual ou social” (RODRIGUES, 2008, p. 20). Porém há possibilidade de responder por um ato ilícito sem o ter praticado, uma vez que esse seja responsável por outro, ocorrendo assim uma responsabilidade por ato de terceiro.

Culpa do agente – é cabível que para a prática de um ato o agente tenha agido com culpa ou dolo. Sendo com culpa quando não há a intenção de se chegar ao ato, mas por imprudência, possível negligência ou imperícia se alcançou o resultado, e dolo o resultado é calculado e esperado pelo agente.

Relação de causalidade – caracteriza-se pela análise da ação da vitima, ou seja, qual a relação do ato desta com o do agente. Amplia-se essa discussão com Luiz Ricardo Magalhães que apresenta em um dos seus trabalhos o seguinte:

Se o lesado consentir em sofrer o dano, não há de se falar em responsabilidade, pois não há relação de causalidade. Não existe ilicitude se o causador do dano agir autorizado. Como exemplo, temos pessoa que perdeu o segredo do cofre e contrata os serviços de um profissional para arromba-los com dinamite mediante termo de responsabilidade, inutilizando e até correndo o risco de perder alguns bens que estão dentro do cofre. (MAGALHÃES, apud DINIZ, 2010, p. 79)

O Dano experimentado pela vítima – esse se trata de um ponto fundamental para o tema, uma vez que havendo a inexistência do dano, material ou moral, torna-se impossível a responsabilização.

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Após compreender todos os elementos para à aplicação da responsabilização, passa-se a ter ciência das possíveis formas da responsabilização que refletirá na suposta análise dos elementos apresentados.

3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA

O autor Sílvio Rodrigues (2010) leciona que não se pode afirmar a existência de formas diversas dessa, mas diferentes formas de olhar a obrigação da reparação de danos. Assim, frisam-se nesse momento duas formas: A primeira a Responsabilidade Objetiva, onde é irrelevante a conduta culposa ou dolosa do agente causador, sendo o ponto chave dessa a relação de causalidade entre o prejuízo sofrido pela vítima e a ação do causador.

A segunda trata-se da Responsabilidade subjetiva, utilizando teoria diversa da já apresentada, sendo que nesta a culpa é vista como o cume da responsabilidade, independente se ela é dolosa ou culposa, é necessária sua averiguação para que possa dessa maneira alcançar a indenização pelos danos sofridos. Para ampliar a compreensão dessas responsabilizações é viável apresentar a visão de Maria Helena Diniz, que leciona a respeito da culpa, acreditando que esta se trata de:

Fundamento da responsabilidade civil, que, em sentido amplo, constitui a violação de um dever jurídico imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreendendo o dolo e a culpa. (DINIZ, 2010, p. 172)

Compreender a culpa é elemento essencial para apreciar a responsabilidade subjetiva. Independe sua modalidade culposa ou dolosa há de se verificar que o ato ocasionou um dano, e este deve

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ser sanado, invocando até terceiro para este feito, em certos casos. Tema este aprofundado mais adiante.

4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

A partir das constatações apresentadas em capítulos anteriores, alega-se nesse momento a classificação do assunto em pauta, de acordo com a sua origem, podendo ser: Responsabilidade Contratual, sendo aquela contraída através de um vinculo jurídico, o contrato, onde um dos sujeitos o credor ou devedor, não cumprindo sua obrigação gerará indenização. Como título informativo, descreve a opinião de Washington de Barros Monteiro a respeito da Obrigação:

Obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através do patrimônio. (BARROS, apud RODRIGUES, 2003, p. 56)

A Responsabilidade Extracontratual emerge do descumprimento de uma norma legal, não necessitando de um vínculo anterior entre os sujeitos. Essa também conhecida como Responsabilidade Aquilina. Segundo Silvio de Salvo Venosa (2003), a lex aquilia é essencial na responsabilidade civil e é de uso limitado, o qual se repreende a culpa por agravo injustamente instigado.

Essa responsabilidade permite uma segurança aos bens daqueles conviventes na mesma sociedade, uma proteção do

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estado para possiveis danos sofridos por alguém garantindo assim uma reparação por parte do infrator.

O autor José Joaquim Calmon Passos, leciona em sua obra “Direito, poder, justiça e processo: Julgando os que nos julgam”, a importância do Estado para dirimir esses conflitos:

O Direito se faz necessário, conatural, mesmo, a toda sociedade humana, porque determinados conflitos que nela se instauram não podem ser resolvidos proveitosamente sem que isso se dê mediante uma solução institucionalizada para o que se retira dos contendores o poder de compô-los unilateralmente. (PASSOS, 2003, p. 28)

Essa afirmação apresenta à transferência do dever de punir, que antes era do ofendido na forma de vingança privada e hoje é do Estado. Uma vez convivendo em uma sociedade, o homem transfere ao Estado o poder para aplicar as penalidades.

5 DA RESPONSABILIDADE DOS PAIS PELOS FILHOS MENORES

Como já mencionado para a caracterização da responsabilidade civil necessita possuir os seus elementos, mas há a possibilidade de responder pelo dano sem ter cometido a ação, sendo essa hipótese instrumento de análise a partir deste momento. Vale ressalvar que para Maria Helena Diniz dano é:

É um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, pois não pode haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo. Consiste na lesão (diminuição ou destruição) que devido a certo evento, sofre

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uma pessoa, contra a sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral. (DINIZ, 2010, p. 60).

A responsabilidade dos pais pelos seus filhos é prevista no Código Civil de 2002, no art. 932 que reza:São também responsáveis pela reparação civil: I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia.

A respeito desse tema desencadeia um questionamento: Como se pode culpar alguém por atos de terceiro? Alguns doutrinadores como Francisco Pontes de Miranda tem seu pensamento fundamentado da seguinte forma:

A culpa do responsável consiste em não haver exercido, como deveria, o dever de vigiar, de fiscalizar (culpa in vigilando) ou de não haver retirado do serviço ou de haver aceito quem não podia exercer com toda correção o encargo (culpa in eligendo) (MIRANDA, apud Santos)

Seguindo essa linha de pensamento, os pais serão responsabilizados por tais atos de seus filhos, devido à má formação lhes dada, ou melhor, por uma desestruturação na base familiar que é responsabilidade dos mesmos, e como demonstra o artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8069, de 1990, que descreve: “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.”

Contribui ainda para o fortalecimento dessa ideia as afirmações de Gilberto Dimenstein, em sua obra: “O cidadão de papel”, do qual descreve no Segundo Capítulo, que determinados

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acontecimento na sociedade é reflexo de uma falha na estrutura familiar. Como assevera na seguinte citação: “A falta de educação para crianças e jovens, pode ter decorrência graves e afetar toda a sociedade, inclusive você.” (DIMENSTEIN, 2009, p.27)

Amplia-se o debate ao ter contato com os temas expostos por Zygmunt Bauman em sua obra “Amor Líquido”, cujo escopo é demonstrar temas que envolvem o relacionamento nos dias atuais influenciando na vida dos cidadãos, e dos novos seres que estão sendo gerados, os futuros participantes desta sociedade. Nota-se mais profundidade sobre o tema em estudo, ao deparar-se com o Capítulo Segundo da obra supracitada, onde o autor descreve a existência de uma relação capitalista nos relacionamentos, até mesmo no desejo de gerar filhos, vistos estes, meramente como objetos de consumo. É notório esse pensamento quando se depara com a seguinte citação:

Esta é uma época em que o filho é, acima de tudo, um objeto de consumo emocional. Objetos de consumo servem a necessidades, desejos ou impulso do consumidor. Assim também os filhos. Eles não são desejados pelas alegrias do prazer paternal ou maternal que se espera que proporcionem – alegrias de uma espécie que nenhum objeto de consumo, por mais engenhoso e sofisticado que seja, pode proporcionar. (BAUMAN, 2004, p.59)

Dessa forma, é correto afirmar a inexistência de uma preocupação na formação dos filhos, e assim como já afirmado posteriormente, deve os pais responder pelos atos de seus descendentes, pois falharam no que era de sua plena responsabilidade.

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Essa linha de pensamento encontra divergência com outros pensadores, como Silvio Rodrigues, afirma que: o pai está sujeito a responder pelos atos do filho, para garantir à pessoa que sofreu o dano, a sua reparação. Percebe-se assim não haver necessariamente a culpabilidade dos pais. Tal afirmação prevista no Código Civil de 2002 no art. 933, que reza: “As pessoas indicadas nos incisos I (Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;) a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.”.

O autor mencionado acima, Silvio, descreve ainda que tal responsabilidade caracteriza-se como uma responsabilidade solidária, garantindo assim uma maior segurança à vítima, caso um não pague o outro deverá assumir. Essa é conceituada por Genival Veloso de França como: “Diz-se que há responsabilidade solidária ou solidariedade passiva quando qualquer um dos sujeitos passivos venha responder juntamente com os demais com mesma intensidade em um determinado ato.” (FRANÇA, 2009, p. 1). Assim, na ausência do cumprimento da reparação pelo infrator àquele responsável, ou até mesmo coautor, responderá.

Além de todos esses fatores, é necessário apresentar a ideia de Marcelo Martins Alto é, que contribui asseverando o seguinte: “[...] vale ressaltar, que as possibilidades fáticas e jurídicas da realização de um direito coletivo pesam mais do que as de um direito individual [...]” (ALTOÉ, 2009, p.102). Desse modo, compreende a necessidade da sensação de segurança para a coletividade. O individual, danos ocasionados por menores, não poderão ficar ilesos de responsabilização, pois estes atos poderiam ocasionar uma insegurança nos conviventes da mesma sociedade, e assim prejudicar a coletividade.

CONCLUSÃO

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Compreendido a importância da Responsabilização civil na seara da vida, bem como o seu conceito e seus elementos (sendo esses de fácil interpretação, e como o nome já diz elementos, ou seja, composição para a caracterização de uma responsabilização civil). Possibilitou-se assim, a fundamentação para o entendimento da diversidade de responsabilidade civil, apesar de terem seus conceitos diferenciados observa-se a mesma finalidade: a de reparar a vítima pelo dano sofrido. Retrocedendo o que já mencionado, onde leciona Silvio Rodrigues não há uma diferenciação entre essas, apenas formas diferentes, de se chegar à responsabilização.

A partir das constatações apresentadas, desenvolveu-se a temática da Responsabilidade dos pais pelos filhos menores, tendo esse o dever de indenizar, para assim garantir a vítima sua devida reparação, respondendo por uma obrigação solidária, uma vez que seus filhos menores não possuem capacidade para contrair tais responsabilizações.

Com tudo isso, pode-se compreender a Responsabilidade Civil, seu conceito, elementos e além de compreender a responsabilização dos pais. Aproveita-se a oportunidade para entender a partir das reflexões de alguns autores a forma a qual está se constituindo a educação dos novos cidadãos, e sua interferência na sociedade. Dessa forma, é preciso uma reflexão acerca dessas atitudes e tomadas de posicionamento para mudar essa realidade.

REFERÊNCIAS:

ALTOÉ, Marcelo Martins. Direito versus dever tributário: colisão de direitos fundamentais. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

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BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos; tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.

DIMENSTEIN, Gilberto. O cidadão de papel: a infância a adolescência e os Direitos humanos no Brasil. 16ª Edição. São Paulo: Editora Ática: 1994.

DINIZ, Maria Helena – Dicionário Jurídico universitário. São Paulo: Saraiva, 2010.

FRANÇA, Genival Veloso de – Responsabilidade Solidária – Disponível em: http://adimes-rj.com.br/arquivo/resp_solidaria.pdf. Acessado em 25/10/2014.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil - Parte Geral - Vol. 1 - 14ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, poder, justiça e processo: julgando os que nos julgam. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v.4. Responsabilidade Civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

SANTOS, Uélton - Responsabilidade dos Pais separados - Revista eletrônica – Âmbito Jurídicohttp://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=338 Acessado em: 25/10/2014.

VENOSA, Silvio De Salvo, Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral. - vol. 2. Editora Atlas

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DA ILEGITIMIDADE DA UNIÃO FEDERAL PARA FIGURAR EM TODAS AS AÇÕES DE MEDICAMENTOS

GABRIEL CARNEIRO DE LIMA: Técnico Judiciário do Tribunal Regional Federal da 5ª Região- Sede, graduado em Direito pela Faculdades Integradas Barros Melo- Olinda- PE em 2011, Especialista em Direito Público pela Faculdade Estácio (2013), Pós-graduado em Direito Constitucional pela Anhanguera- Uniderp (2015).

Resumo: A saúde é um direito de todos e dever do Estado, conforme previsto nos artigos 196 e seguintes da Constituição Federal de 1988. O próprio Supremo Tribunal Federal já decidiu em inúmeras oportunidades que existe solidariedade entre União Federal, Estados, Municípios e Distrito Federal para responder por demandas que envolve o direito à saúde, visto ser uma obrigação constitucional de todos os entes federativos. No entanto, é necessário compreender quais os limites dessa solidariedade, especialmente no tocante ao fornecimento de medicamentos.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Direito administrativo. Ilegitimidade. Medicamentos. Sistema Único de Saúde.

1- Introdução

Diariamente várias ações judiciais são propostas em face da União Federal objetivando o fornecimento de medicamentos. É certo que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, previsto nos arts. 196 e seguintes da CF/88. Não pode também deixar de considerar que os recursos financeiros são escassos, não sendo suficientes para atender todas as demandas. Além disso, o orçamento público é pautado pelo princípio da legalidade e não pode haver despesas sem sua previsão orçamentária. Importante frisar esse ponto das escolhas trágicas e do princípio da legalidade orçamentária para demonstrar que a proliferação de ordens judiciais

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deferindo todo tipo de medicamento pode ocasionar sérios danos às finanças da União, bem como impactar no desenvolvimento das políticas públicas previstas e aprovadas através do Congresso Nacional, quando da elaboração das leis orçamentárias.

É necessário analisar em quais casos a União deve responder solidariamente pelo fornecimento de medicamentos, pois em alguns casos a imputação dessa responsabilidade ao referido ente federativo configura um verdadeiro bis in idem como se demonstrará no decorrer do presente estudo.

2- Da legitimidade da União

2.1- Responsabilidade solidária dos entes federativos

O STF já reafirmou a jurisprudência de que todos os entes federativos são responsáveis solidários pelo fornecimento de medicamentos. Isso quer dizer que quaisquer entes podem figurar no polo passivo de ações judiciais nas quais se discuta a obrigação de fornecer fármacos.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 855.178-SE. RELATOR: MIN. LUIZ FUX. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente ou conjuntamente.

Ou seja, o STF reconheceu que todos os entes possuem legitimidade e obrigação de fornecer medicamentos e tratamento

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médico para a população que deles necessitarem. No entanto, observando melhor a legislação e a jurisprudência nota-se que essa legitimidade não é ampla ou irrestrita, possuindo certos limites.

2.2- Limites à responsabilidade da União em fornecer medicamentos

Quando o julgado do STF menciona a responsabilidade solidária de todos os entes federativos em prover tratamento médico para a população que deles necessitarem pode levar à errônea conclusão que a União é responsável solidariamente de fornecer todo e qualquer tipo de medicamento.

É preciso compreender os limites desse julgado, bem como explicar alguns dispositivos constitucionais relacionados à saúde. Como se extrai do art. 198 da CF/88, as ações e os serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e integralizada e constituem em um sistema único. Além disso, uma das diretrizes desse sistema é a descentralização, com direção única, em cada esfera de governo (art. 198, inciso I da CF/88). Então as ações relacionadas à saúde são repartidas entre os entes federativos, que em seu conjunto formam o Sistema Único de Saúde (SUS).

O SUS é regulado pela lei nº 8.080/90, a qual define bem as atribuições comuns de todos os entes na área da saúde, bem como as competências específicas de cada ente da federação dos arts. 15 ao 18 da referida lei. Na análise dos arts. 17 e 18, percebe-se que a atribuição de fornecer medicamentos compete especificamente aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, principalmente pelo fato de estarem mais próximos à população. Além do mais, a União Federal presta auxílio financeiro para o desenvolvimento destas ações de saúde, conforme o art. 16, XIII e deve promover a descentralização para as unidades Federadas e para os municípios dos serviços e ações de saúde (art. 16, XV da lei nº 8.080/90).

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É importante salientar que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), é o ente competente para autorizar a comercialização de medicamentos no país. Exerce de certa forma um controle de índole técnica e administrativo, atestando a eficácia e a segurança de determinado fármaco. Assim, não pode um ente ser compelido a fornecer medicamento que sequer foi registrado na ANVISA, vedação presente no art. 19-T, I da lei nº 8.080/90. No entanto, tal entendimento ainda não foi pacificado pelos tribunais superiores.

Após o seu registro na ANVISA, existe todo um protocolo para a sua incorporação, exclusão ou alteração na lista do SUS. Essa atribuição administrativa é desenvolvida pelo Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS e tem seu procedimento previsto no art. 19-Q da lei nº 8.080/90. Cabe salientar que nesse procedimento serão observados critérios como a eficácia do medicamento comprovada cientificamente, bem como a economicidade (verificação se existe algum tratamento de custo inferior disponível). Incorporado o medicamento nessa lista, os entes indubitavelmente são obrigados a fornecê-los.

Então a baliza desse julgado para a legitimidade da União para responder em demandas que envolvam o fornecimento de medicamentos é a seguinte: ela só será legitimada passiva se o medicamento for registrado na ANVISA e se estiver na lista do SUS. Nesse caso, o seu fornecimento integra as políticas públicas previstas, devendo à União promovê-las, sem criar embaraços. Nesse caso o judiciário ao obrigar o fornecimento de determinado tratamento médico não está determinando políticas públicas, mas apenas concretizando políticas públicas legalmente previstas e evitando que a União incorra em ilegalidades ou arbitrariedades, efetuando o seu devido controle.

2.3- Medicamentos de alto custo e sem registro na ANVISA

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Para complementar o presente estudo, é importante mencionar 2 situações palpitantes, de extrema relevância e que ainda não foram solucionadas pelo STF, mas estão com Repercussão Geral reconhecida. É a questão dos medicamentos de alto custo e daqueles que não tem registro na ANVISA. Seguem as ementas:

SAÚDE – MEDICAMENTO – FALTA DE REGISTRO NA AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – AUSÊNCIA DO DIREITO ASSENTADA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL –CONFIGURAÇÃO. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da obrigatoriedade, ou não, de o Estado, ante o direito à saúde constitucionalmente garantido, fornecer medicamento não registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária –ANVISA. (RE 657718 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 17/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-051 DIVULG 09-03-2012 PUBLIC 12-03-2012 REPUBLICAÇÃO: DJe-092 DIVULG 10-05-2012 PUBLIC 11-05-2012 ). SAÚDE - ASSISTÊNCIA - MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO -FORNECIMENTO.Possui repercussão geral controvérsia sobre a obrigatoriedade de o Poder Público fornecer medicamento de alto custo. (RE 566471 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 15/11/2007, DJe-157 DIVULG 06-12-2007 PUBLIC 07-12-2007 DJ 07-12-2007 PP-00016 EMENT VOL-02302-08 PP-01685 ).

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Com base nesses temas com Repercussão Geral reconhecidas, é possível afirmar que quando o seu mérito for solucionado pelo STF, teremos um panorama mais seguro a respeito da obrigação ou não de fornecer medicamentos nesses 2 casos. A definição de mérito é crucial para o planejamento dos entes públicos nas ações relativas à saúde, bem como para conferir mais segurança jurídica para as decisões judiciais em ambos os sentidos. Sem dúvidas, caso o STF declare que o Poder Público é obrigado a fornecer medicamentos não registrados na ANVISA, bem como aqueles que possuam alto custo, tal decisão irá impactar nas finanças públicas, gerando uma necessária priorização nos gastos efetuados pelo Poder Público, direcionando mais recursos para as ações de saúde. 3- Conclusão

Conforme visto no presente esboço, a União Federal só será legitimada passiva em ações envolvendo o fornecimento de medicamentos caso o mesmo seja registrado na ANVISA e integre a lista de procedimentos do SUS. Fora desses casos, a legitimação pertence aos Estados, Municípios e ao Distrito Federal, conforme consta na divisão de atribuições no âmbito do SUS.

É crucial ficar atento como o STF irá se posicionar sobre a obrigação do Poder Público em fornecer medicamentos não registrados na ANVISA, bem como fármacos que possuam alto custo. Com tais decisões de mérito, poderá reanalisar esse tema, conferindo ao mesmo uma maior segurança jurídica, que será crucial para os entes públicos, bem como para a sociedade em geral. 4- Referências

- LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. Editora Saraiva. 19ª Ed. São Paulo. 2015.

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RENAJUD - UM SISTEMA INEFICIENTE POR FALTA DE DIÁLOGO ENTRE OS PODERES

LEONARDO TOSCANO DE BRITO

Resumo: O presente texto busca demonstrar como a criação do RENAJUD – Registro Nacional Judicial -, sistema que autoriza que o magistrado insira restrições sobre bens automotores em circulação, apesar de ter demandado grande interlocução entre o DENATRAN, DETRANs de todo o país, Conselho Nacional de Justiça, e Ministério de Justiça, através da Secretaria de reforma do judiciário, restou ineficiente pelo “esquecimento” do simples fato de que os órgãos de execução não foram sequer instados a participar do processo. Na espécie, traremos um esboço da situação no DPRF – Departamento de Polícia Rodoviária Federal -, o que demonstrará a carência de fundamentação jurídica ao se determinar que agentes da autoridade de trânsito executem atos, senão próprios de oficiais de justiça, que demandariam entabulação por meio de convênio, acordo de cooperação ou instrumento congênere, o que não foi feito por parte dos poderes e órgãos envolvidos na criação do sistema.

Palavras-chave: RENAJUD. Deficiência na interlocução. Carência de atribuição dos órgãos de execução. Ausência de depósito judicial. Ofensa à separação dos poderes. Direito individual se sobrepondo ao direito público. A situação no DPRF.

1. Introdução. Conceito

De início, importante termos em mente o que é o RENAJUD[1], e mais, o porquê do seu surgimento. Para isso, nada melhor do que o conceito extraído do próprio site do CNJ, vejamos:

“O RENAJUD é umsistema on-line derestrição judicial deveículos criado peloConselho Nacional deJustiça (

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CNJ), queinterliga o Judiciário aoDepartamento Nacionalde Trânsito(DENATRAN). (...)”

Acrescentamos que tal sistema foi implementado através de um Acordo de Cooperação Técnica[2]celebrado pela União por intermédio dos Ministérios das Cidades, Ministério da Justiça, e o Conselho Nacional de Justiça, sendo o penúltimo participante representado pela Secretaria de Reforma do Judiciário.

Seu objetivo consiste em facilitar o tráfego de informações entre o Poder Judiciário, DENATRAN e DETRANs, que coordenados pelo Ministério das Cidades, gerenciam a inserção e exclusão de gravames nos bens automotores que trafegam pelo país.

O acordo tem como finalidade portanto, que os questionamentos e ou decisões judiciais acerca de restrições de busca e apreensão (restrição de circulação), ou mesmo de impedimento de transferência de veículos (restrição de transferência) seja inserido pelo próprio magistrado do processo em tramitação.

Anteriormente à criação do RENAJUD, era necessário consulta, via ofício, a cada um dos Estados da Federação, para que o juízo tivesse conhecimento se determinada parte no processo possuía ou não veículo, e mais, após uma resposta positiva, remetia-se novo expediente ao DETRAN a fim de incluir a restrição judicial no sistema DENATRAN, observemos a justificativa exposta no site do CNJ:

“Antes, para obterinformações sobre osveículos, o juiz tinhaque enviar um ofício,em papel, para os 27DETRAN'S de todo opaís. Somente depoisde ter resposta aoofício, o magistradoconsegui

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a fazerrestrição judicial, o quelevava meses para seconcretizar.”

O Sistema RENAJUD permitiu então ao Poder Judiciário a inclusão da restrição judicial via programa de dados, dispensando o envio de ofícios aos Departamentos de Trânsito Estaduais, nada mais coerente, em época de grande avanço da informática e de disseminação do princípio da eficiência do poder público.

As restrições acrescidas pelo magistrado ao sistema informatizado podem ir desde o simples impedimento de transferência de propriedade, até mesmo à restrição de circulação do automotor. Dúvidas não há que essa ferramenta veio substituir os antigos mandados físicos, passando então a serem tratadas como mandados virtuais.

Fixada a premissa quanto à natureza jurídica do RENAJUD, verdadeira ordem virtualizada, passemos ao estudo da legalidade do recolhimento de veículos, oriundos de restrição cível ou trabalhista, pelos órgãos executivos, em especial as Polícias.

Assinala-se que a matéria comporta dois viés, o primeiro, aponta para a discussão acerca da legalidade do cumprimento da ordem judicial por agentes policiais, a segunda, trata da obrigatoriedade de tais órgãos recolherem e guardarem os veículos com restriçãojudicial decorrente de ação cível ou trabalhista por simples consulta ao RENAJUD, fazendo as vezes de depósito judicial.

A questão posta é de extrema e vital importância. A título de exemplo do impacto das nossas conclusões, exemplificamos que no DPRF – Departamento de Polícia Rodoviária Federal[3], já são mais de 2.637 veículos recolhidos por restrição judicial. Esse número pode dobrar, se considerarmos as restrições inseridas após a data do recolhimento do bem. Só na 20ªSRPRF/SE, 49 veículos foram recolhidos por restrição, mas atualmente, 127 automotores se encontram com restrição judicial.

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Regional Quantidade Regional Quantidade

SRPRF/GO

189 14ª SRPRF/PB 131

SRPRF/MT

47 15ª SRPRF/RN 95

SRPRF/MS

6 16ª SRPRF/CE 44

SRPRF/MG

21 17ª SRPRF/PI 7

SRPRF/RJ

34 18ª SRPRF/MA 13

SRPRF/SP

484 19ª SRPRF/PA 102

SRPRF/PR

239 20ª SRPRF/SE 49

SRPRF/SC

204 21ª SRPRF/RO 170

SRPRF/RS

76 1º DRPRF/DF 25

10ª

SRPRF/BA

337 2º DRPRF/TO 46

11ª

SRPRF/PE

198 3º DRPRF/AM 3

12ª

SRPRF/ES

6 4º DRPRF/AP 19

13ª

SRPRF/AL

70 5º DRPRF/RR 22

TOTAL 2637

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A primeira questão restou pontuada após provocação da Superintendência Regional em Sergipe, tendo a Consultoria Jurídica da União exarado o parecer nº 312/2009 AGU/CONJUR/DPRF/MJ, concluindo pela ausência de atribuição da instituição policial federal, entendimento outrora adotada também pela AGU/CGU/NAJ/SE Nota nº 58/2009, ambos encartados nos autos do processo nº 08672001700/2009-67.

Segundo os Advogados da União, compete aos oficiais de justiça, e não aos Policiais Rodoviários Federais, forte nos art. 830 a 843 do CPC, a atribuição de executar mandados judiciais de natureza cível, vejamos:

Art. 839. O juiz pode decretar a busca e apreensão de pessoas ou de coisas. (...)

Art. 842. Omandado serácumprido por doisoficiais de justiça, umdos quais o lerá aomorador, intimando-o aabrir as portas. (omissis)

Art. 843. Finda adiligência, lavrarão osoficiais de justiça autocircunstanciado,assinando-o com astestemunhas. (grifo nosso)

Assim dispôs o parecerista, Dr. Wendel Landim B. Sampaio:

“Ademais, da leitura do artigo 20 da lei 9503, e 23 de setembro de 1997, e do Decreto nº 1655, de 03 de outubro de 1995, que definem competências da Polícia Rodoviária Federal, não está expressa a competência para a retenção/apreensão de veículos

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mediante consulta aos sistemas indicados”

No mesmo sentido, a Coordenadora da AGU/CONJUR/SE, Dra. Adriana Limoeiro, in verbis:

“(…) não existecompetência expressapara a PolíciaRodoviária Federalrealizar a Busca eApreensão de veículosdeterminada por JuízoCível.”

Considerando a problemática, a CONJUR/DPRF confirmou o entendimento por meio do parecer nº312/2009 AGU/CONJUR/DPRF/MJ, e aduziu:

“(…) restituo os autos aessa 20ªSuperintendênciaRegional de PolíciaRodoviária Federal,ratificando oposicionamentoadotado pelos nobresAdvogados da Uniãoque opinaram pelaimpossibilidade debusca e apreensão emveículo pela PolíciaRodoviária Federal porintermédio de consultasaos sistemas Detrans eTribunais de Justiça.”

Não bastasse, pacífico é o entendimentojurisprudencial, expresso nos excertos abaixo, de que arealização deste tipo de diligência não é atribuição daPolícia Rodoviária Federal:

“As funções das polícias rodoviárias estadual e federal são exercidas na defesa exclusiva dos interesses da segurança pública. Não se cuidado de matéria atinente a descumprimento de ordem judicial, nem ocorrência de ilícito penal, ou mesmo questão relativa a legislação administrativa de trânsito, inviável a expedição de ofício a elas,

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diante de caráter de mero inadimplemento contratual da questão.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.033.564-0/ GUARULHOS. TJ-SP, 34ª CÂMARA, 05/04/2006)

“Alienação Fiduciária. Busca e Apreensão. Expedição de Ofícios à Policia Rodoviária Estadual. Inviabilidade. Questão que foge às funções policias, cuja atribuição é exercida no interesse da segurança pública e não se dedicar à elucidação de questões meramente patrimoniais e particulares. Decisão mantida.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO 905.409-0/0, TJ-SP, 34ª CÂMARA )

“ARRENDAMENTO MERCANTIL – LEASING – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS ÀS POLÍCIAS RODOVIÁRIA ESTADUAL E FEDERAL PARA A APREENSÃO DO VEÍCULO – INADMISSIBILIDADE. Inadmissível o concurso da Polícia Rodoviária, mediante ordem judicial, na apreensão do bem objeto de arrendamento mercantil. “ (AGRAVO DE INSTRUMENTO 67.803.00/5. 11ª CÂMARA. TJ-SP. 04/12/2000)

Do exposto, é possível extrairmos que não compete aos agentes da Polícia Rodoviária Federal, tampouco aos integrantes das demais forças policiais, federal ou estadual, a execução da

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ordem virtualizada, ao menos NÃO nos moldes como posto o Acordo de Cooperação Técnica nº 105/2009.

As conclusões advindas dos pareceres AGU acima mencionados, no sentido da não “competência” do órgãos policiais, a exemplo do DPRF, são motivadas pela ausência de acordo de cooperação técnica, convênio ou instrumento congênere que autorize a agentes do Executivo implementarem a ordem judicial.

Ao nosso singelo entendimento, há grave falha no Acordo de Cooperação Técnica nº 105/2009. não suprida até o momento, uma vez que o Ministério da Justiça, conforme já acima explicitado, fez-se presente por intermédio da Secretaria de Reforma do Judiciário, e não como órgão de execução. Essa é a conclusão que advém do parecer nº 118/2013/MVM/CJU-SE/CGU-AGU e despacho do coordenador geral da CJU-SE nº 138/2013.

Neste contexto, temos que, para inserção do MJ/DPRF ou outros órgãos policiais no Acordo de Cooperação Técnica, necessárias serão reuniões de trabalho, a fim de se delimitar as atribuições de cada um, explicitando-se inclusive, a quem compete a guarda do bem, problema abaixo tratado.

Pois bem, de natureza solar o equívoco constante no Acordo que originou o RENAJUD, uma vez que, implementada a ordem de busca e apreensão, suplantando a discussão quanto à possibilidade de execução dessa ordem, questionamos: a quem compete o encaminhamento e a guarda do bem?

A resposta nos parece óbvia, uma vez que a ordem de busca e apreensão advém de demanda judicial de natureza cível ou trabalhista, cabendo o ônus pela guarda de atribuição do depositário fiel, ou mesmo do Poder Judiciário, se não houver a nomeação do primeiro.

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O que não se revela possível é que o judiciário imponha aos órgãos do Poder Executivo a responsabilidade pela remoção e guarda de bens oriundos de processos de natureza individual e privada, muitas vezes capitaneados inclusive, por instituições financeiras, impondo à toda sociedade o ônus, socializando as perdas, e ferindo de morte a separação dos poderes (art. 2º da CF/88[4]).

Saliente-se que, por muitas vezes, os autores das ações judiciais (Instituições financeiras em sua maioria) após o recolhimento do veículo, ao se depararem com o estado de conservação do mesmo, simplesmente pedem desistência, motivo pelo qual os automóveis são abandonados, permanecendo por tempo indefinido nos postos de polícia, batalhões e delegacias, mormente porque tais bens, por possuírem restrição NÃO PODEREM SER INCLUÍDOS EM LEILÃO, forte na Resolução do CONTRAN[5] nº 331/09.

Art. 3o. (…)

Parágrafo único. O veículo que acusar pendência judicial, pendência administrativa ou que estiver à disposição da autoridade policial não será levado a leilão, sendo sua destinação definida em razão do problema detectado.

É preciso salientar que, apesar do esforço hercúleo deste CNJ e dos magistrados que compõem o Judiciário, por vezes, demandas se alongam no tempo, permanecendo os veículos por prazo muito superior ao que previsto no CTB para inclusão dos veículos em leilão (60 dias - art. 328, alterado pela Lei 13.160/2015)

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Por fim, ainda em relação ao aspecto da responsabilidade da guardo do bem, temos que, em todo o país, há milhares de veículos em pátios dos órgãos policiais, ainda apreendidos por ordem de mandado físico (busca e apreensão), dos quais, muitos com processo já extinto e em arquivo, e sem que o M.M. Juízo tenha determinado a retirada da restrição ou mesmo a venda do bem.

A realidade atual é que, ao apreender um veículo objeto de constrição judicial, a instituição policial tem assumido o dever de guarda e vigilância dobem, transferindo ao Poder Executivo a responsabilidade por qualquer dano, isso porque, em face do elevado custo de manutenção, a maioria, senão todos os tribunais do país NÃO DISPÕEM DE DEPÓSITO JUDICIAL.

É certo que, assim como o Poder Judiciário, todos os demais poderes têm buscado reduzir custos, e no caso do Executivo, em especial os órgãos de trânsito. O grande aumento da frota nacional, não vem acompanhado do acréscimo de repasse.

A caótica situação, também no âmbito do DPRF, por exemplo, deu ensejo à regulação da matéria (recolhimento de veículos ao pátio), e esclarecimento que NÃO COMPETE AO PRF atuar como vigilante de tais veículos, isso já no início de 2008, havendo sido publicadas instruções normativas internas a regulamentar o tema, vejamos:

Instrução Normativa[6] nº 02/08 da Direção Geral:

Art. 5º A partir do prazodefinido no artigo 2º, ospátios das Delegaciase Bases Operacionaisdo DPRF não podemmais ser utilizadoscomo depósito deveíc

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ulos enquadradosnas situaçõeselencadas na presenteInstrução Normativa.

Parágrafo único. A guarda e segurança dos veículos não poderão ser realizadas por Policiais Rodoviários Federais. (grifo nosso)

Esse entendimento também restou esposado na Instrução Normativa Nº 02/08, agora da Coordenação Geral de Operações – CGO, a qual instituiu o Manual de Procedimentos Operacionais, dispondo no artigo 21 que, para manter veículos sob guarda, as regionais da PRF deverão dispor de vigilância 24hs, cercamento, iluminação, controle de entrada e saída, e limpeza, tudo com vistas a resguardar a Administração de eventuais responsabilidade perante o extravio do patrimônio de terceiros.

Nesse diapasão, se estabeleceram requisitos mínimos para guarda e vigilância de bens recolhidos em virtude medidas administrativas previstas no Código de Trânsito Brasileiro!

Saliente-se que a cooperação entre órgãos, poderes é essencial à eficiência, contudo, o “repasse de responsabilidade”, e somente do seu ônus, não representa medida democrática, ofendendo a separação dos poderes, e mais, impondo à sociedade o custo que deveria ser suportado pela parte ativa ou passiva do processo judicial.

A realidade demonstrou que, apesar dos esforços no sentido de cumprir o previsto no Código de Trânsito Brasileiro, os órgãos de trânsito no país não têm sido capazes de absorver as demandas externas, sobretudo, pelo aumento vertiginoso da frota (cerca de 119% nos últimos 10 anos[7]).

Em face desse panorama é que se faz necessário um realinhamento do Acordo que originou o RENAJUD, agora a envolver os principais órgãos de execução (a ponta do iceberg),

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tratando a problemática de maneira macro, definindo assim procedimentos operacionais juridicamente alinhados.

3. Conclusão

O problema relativo ao recolhimento/apreensão dos veículos com restrição de circulação exige diálogo entre TODOS os envolvidos, sendo atores principais os órgãos que realizam a atividade fim. Nesse sentido, equívoco o que acordo celebrado (RENAJUD), que apesar de representar um avanço substancial, agilizando o conhecimento por parte dos órgãos de execução, restou prejudicado no seu principal mister de tornar a decisão judicial eficiente, mormente esses interlocutores não terem sequer sido consultados acerca da implementação do sistema e suas consequências.

A vedação à atuação dos agentes de polícia encontra óbice nos dispositivos do CPC, de forma que somente por meio de tratativas (acordo, convênio) por parte do Ministério da Justiça, entendemos possível sanar essa irregularidade.

Por fim, faz-se necessária a interlocução entre os atores (judiciário – Denatran – Ministério da Justiça), este último por meio da SENASP, de forma a que fixem atribuições, entre elas aquela de guarda do veículo. Esse ônus deve ser suportado pelo Poder Judiciário, com repasse às partes litigantes em juízo, e não pelo Poder Executivo, sob pena de sermos eficiente do ponto de vista da medida administrativa de recolhimento e ineficiente economicamente, repartindo com toda a sociedade os gastos, os quais que devem ser privativos das partes em litígio.

4. Referências

Mobilidade Urbana – o automóvel ainda é prioridade. 2011.Ano 8. Edição 67 – 20/09/2011. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2578:catid=28&Itemid=23. Acesso em 25/10/2015.

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Conselho Nacional de Justiça. Sistemas. Disponível em:http://www.cnj.jus.br/sistemas/renajud/documentos-renajud .Acesso em 20/12/2015.

Polícia Rodoviária Federal. Legislação Interna. Disponível em: https://www.prf.gov.br/portal/processo-eletronico/aspectos-legais/legislacao-relacionada/legislacao-interna .Acesso em 20/12/2015.

DENATRAN. Resoluções do CONTRAN. Disponível em:http://www.denatran.gov.br/download/resolucoes/resolucao_contran_331_09.pdf.Acesso em 03/08/2015.

B. Sampaio, Dr. Wendel Landim - Nota nº 58/2009, AGU/CGU/NAJ/SE.

Limoeiro, Dra. Adriana - Parecer nº 312/2009 AGU/CONJUR/DPRF/MJ.

Argolo, Dr. Francisco - Parecer nº 118/2013/MVM/CJU-SE/CGU-AGU.

NOTAS:

[1]http://www.cnj.jus.br/sistemas/renajud

[2]http://www.cnj.jus.br/images/programas/renajud/1-termo-aditivo.pdf

[3]Dados extraídos da Comissão Nacional de Leilões do DPRF. Ano 2014.

[4]Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

[5]http://www.denatran.gov.br/download/resolucoes/resolucao_contran_331_09.pdf

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[6]https://www.prf.gov.br/portal/processo-eletronico/aspectos-legais/legislacao-relacionada/legislacao-interna

[7]http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2578:catid=28&Itemid=23