bloqueios de ramo final

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BLOQUEIOS COMPLETOS DE RAMO BRD e BRE *Daniel Valente Batista MÓDULO III ALTERAÇÕES NO ELETROCARDIOGRAMA DE REPOUSO Introdução O Estudo do Eletrocardiograma é fundamental para o médico de qualquer especialidade. A noção de conceitos básicos da fisiologia cardíaca aliada ao conhecimento básico das três etapas do processo de despolarização cardíaca e do seu processo de repolarização tem um valor inestimável quando se fala do Estudo dos Bloqueios de Ramo Completos e dos Divisionais. Neste texto, serão abordados os Bloqueios Completos de Ramo Direito e Ramo Esquerdo. Os bloqueios divisionais serão abordados num segundo momento. O Ramo Direito, diferente do Ramo Esquerdo, atua fisiológica e anatomicamente como apenas um segmento de condução nervosa. Assim sendo, não há Bloqueios Divisionais do Ramo Direito. Portanto, teremos as seguintes possibilidades de bloqueios: - Bloqueio do Ramo Direito - BRD - Bloqueio do Ramo Esquerdo - BRE - Bloqueio Divisional da Porção Superior do Ramo Esquerdo (Bloqueio Divisional Ântero-Superior) - BDAS - Bloqueio Divisional da Porção Inferior do Ramo Esquerdo (Bloqueio Divisional Póstero-Inferior) BDPI - BRD associado ao BDAS - BRD associado ao BDPI Despolarização Normal Será feita aqui uma breve revisão do processo de despolarização normal que será FUNDAMENTAL para a compreensão dos Bloqueios, ou seja, se você NÃO CONSEGUIR ENTENDER OS CONCEITOS básicos dos vetores e das etapas de despolarização e repolarização normal do coração, bem como entender termos como ‘linha de base isoelétrica’ *Acadêmico da Medicina da Universidade Federal do Ceará e Membro da Liga do Coração

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O texto aborda, basicamente, os mecanismos eltrofisiológicos e morfológicos do diagnóstico no Bloqueio Completo de Ramo Esquerdo e Direito. Liberamos as figuras para uso em aulas desde que informadas a autoria das mesmas, que pertencem ao autor (Daniel Valente Batista)

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Page 1: Bloqueios de ramo final

BLOQUEIOS COMPLETOS DE

RAMO – BRD e BRE *Daniel Valente Batista

MÓDULO III – ALTERAÇÕES NO ELETROCARDIOGRAMA DE

REPOUSO

Introdução

O Estudo do Eletrocardiograma é fundamental para o médico de qualquer

especialidade. A noção de conceitos básicos da fisiologia cardíaca aliada ao conhecimento

básico das três etapas do processo de despolarização cardíaca e do seu processo de

repolarização tem um valor inestimável quando se fala do Estudo dos Bloqueios de Ramo

Completos e dos Divisionais. Neste texto, serão abordados os Bloqueios Completos de Ramo

Direito e Ramo Esquerdo. Os bloqueios divisionais serão abordados num segundo momento. O

Ramo Direito, diferente do Ramo Esquerdo, atua fisiológica e anatomicamente como apenas

um segmento de condução nervosa. Assim sendo, não há Bloqueios Divisionais do Ramo

Direito. Portanto, teremos as seguintes possibilidades de bloqueios:

- Bloqueio do Ramo Direito - BRD

- Bloqueio do Ramo Esquerdo - BRE

- Bloqueio Divisional da Porção Superior do Ramo Esquerdo (Bloqueio Divisional

Ântero-Superior) - BDAS

- Bloqueio Divisional da Porção Inferior do Ramo Esquerdo (Bloqueio Divisional

Póstero-Inferior) – BDPI

- BRD associado ao BDAS

- BRD associado ao BDPI

Despolarização Normal

Será feita aqui uma breve revisão do processo de despolarização normal que será

FUNDAMENTAL para a compreensão dos Bloqueios, ou seja, se você NÃO CONSEGUIR

ENTENDER OS CONCEITOS básicos dos vetores e das etapas de despolarização e

repolarização normal do coração, bem como entender termos como ‘linha de base isoelétrica’

*Acadêmico da Medicina da Universidade Federal do Ceará e Membro da Liga do Coração

Page 2: Bloqueios de ramo final

e a posição de cada eletrodo explorador no corpo do paciente PEÇO que NÃO prossiga a

leitura do texto e procure ,então, um livro-texto para obter maiores detalhes sobre esse

evento.

- OBS: Boa parte das ilustrações serão melhor compreendidas se vistas na IMPRESSÃO

COLORIDA.

Despolarização/Repolarização Normal

A Despolarização Cardíaca é um processo que ocorre em Três Etapas Básicas:

1ª Etapa: Depende do RAMO ESQUERDO e é representada pela despolarização da

região ESQUERDA do septo interventricular. Ora, se o coração está ‘todo positivo’ na sua

porção externa a região que despolarizar irá ficar ‘negativa’. Dessa maneira, será criada uma

diferença de potencial entre a Região Esquerda do Septo ( Que Estará Negativa) e na Região

Direita do Septo (Que permanece Positiva). Assim sendo, a primeira etapa da despolarização

irá gerar um vetor que APONTA para a região direita e anterior e FOGE da região esquerda e

mais posterior. Em outras palavras, OBSERVANDO O PLANO TRANSVERSAL DO CORAÇÃO,

iremos ver um Vetor que APONTA para V1 e V2 e FOGE de V5 e V6.

Se o vetor APONTA para V1 e V2 iremos ver uma deflexão POSITIVA nessas derivações

e se FOGE de V5 e V6 iremos observar uma deflexão NEGATIVA no início do QRS nessa

derivação. Esta é a explicação de que podemos observar uma onda Q fisiológica nas

derivações esquerdas do Coração, quais sejam: aVL, DI , V5 e V6

2ª Etapa: A Segunda Etapa da Despolarização irá acontecer quando as Paredes dos

Ventrículos Direito e Esquerdo forem sendo Despolarizadas de acordo com a trajetória dos

Feixes Direito e Esquerdo,respectivamente. Essa segunda etapa irá gerá um vetor orientado

para frente e para direita ( Região do Ventrículo Direito) e outra para trás e para esquerda(

Região do Ventrículo Esquerdo). (Note que estamos descrevendo a orientação do Vetor no

PLANO TRANSVERSAL).

Ora , cria-se, assim, uma competição de vetores ( Direito x Esquerdo) para podermos

definir a resultante dessa segunda etapa. Quem irá ganhar?Obviamente quem tem maiores

cargas e maior massa, ou seja, o VENTRÍCULO ESQUERDO. Dessa maneira, a resultante dessa

segunda etapa irá ser para TRÁS e para ESQUERDA. Sabemos também que esse é o vetor que

será responsável pela orientação do QRS, pois é o vetor de maior magnitude.

Portanto, teremos um vetor que APONTA para V5 e V6 e um que FOGE de V1 e V2.

Como dita acima, é a segunda etapa da despolarização que ‘praticamente’ decide para onde

vai apontar o QRS. Assim sendo, se o vetor FOGE de V1 e V2 nós iremos perceber um QRS

NEGATIVO nessas derivações e se o vetor APONTA para V5 e V6 iremos perceber um QRS

POSITIVO nessas derivações. Essa é a base para que observemos nas derivações Pré-Cordiais (

V1 a V6) uma progressão da onda R e da onda S no sentido de que a onda R AUMENTA na

medida que se avança de V1 para V6 e a onda S DIMINUI nesse mesmo sentido.

Page 3: Bloqueios de ramo final

3ª Etapa: A porção final da Despolarização normal tem pouca importância vetorial e

representa um vetor que aponta para trás, correspondendo a região basal do septo

interventricular.

Resumindo: o Vetor QRS tem a sua Orientação para BAIXO, ESQUERDA E PARA TRÁS.

Repolarização: De maneira breve, a repolarização terá um vetor que será para BAIXO,

ESQUERDA e PARA FRENTE. Ou seja, se observarmos APENAS o plano Frontal (Olhando o

Coração de Frente) iremos ver que QRS e onda T tem o mesmo sentido (PARA BAIXO E

ESQUERDA), sendo assim, nas derivações desse plano (DI, DII, DIII,aVF,aVL,aVR) o QRS e a onda

T serão sempre CONCORDANTES, ou seja, terão a mesma orientação. Se o QRS é positivo, a

onda T também será e vice-versa.

No entanto, no plano transversal há um pequena diferença da orientação do QRS e

onda T. O primeiro é voltado para ESQUERDA e para TRÁS e a onda T para ESQUERDA e para

FRENTE. Sendo assim, em derivações como V1 e V2, que estão vendo o coração pelo lado

direito e frontalmente, irão enxergar o QRS FUGINDO, ou seja, terão um QRS negativo e a onda

T será enxergada num sentido próximo (PARA FRENTE), tendo ,assim, uma projeção positiva.

Sempre que queremos enxergar bem um detalhe anormal devemos compará-lo com o

normal e, a partir daí, tirarmos as nossas conclusões do que é patológico e do que fisiológico.

Com o Eletrocardiograma não é diferente. Devemos ter na nossa mente as morfologias das

ondas P, QRS e T e suas polaridades em todas as doses derivações, além da noção do que é o

segmento ST, PR...etc. Devemos, portanto, ter o Eletrocardiograma Normal como uma Foto ao

analisarmos qualquer tipo de ECG patológico fazermos as devidas comparações.

‘SEVERINO QUEBRA-GALHO’

A condução no âmbito dos bloqueios sofre um problema relacionado a perda do tecido

especializado na transmissão do impulso nervoso. Assim sendo, inicialmente irá ser

despolarizada a área que ainda tem tecido especializado ( Por exemplo, o território do ramo

esquerdo na vigência do BRD) e depois, na última porção da despolarização, será efetivada a

despolarização do território bloqueado. Mas a condução será feita por tecido nervoso? NÃO.

Mas, então, quem será o responsável por essa condução?

É nessa ora que surge o ‘severino quebra-galho’ do tecido cardíaco: O MÚSCULO. O

Miocárdio, como sabemos, ou pelo menos deveríamos saber, do estudo da Histologia é um

sincício, ou seja, suas células estão em contato através de diversas junções intercelulares e ,

portanto, se necessário, pode ser utilizado como um tecido condutor não especializado. O que

temos de concluir então?

A principal conclusão relacionada a esse fato é de que a condução, por não ser

especializada, SERÁ LENTA e acontecerá na PORÇÃO FINAL dos complexos QRS. Dessa forma, o

da ‘inscrição’ do QRS será feita de maneira normal e a porção final é que estará ALARGADA.

Dessa forma, iremos perceber que um das características MARCANTES dos Bloqueios

Completos de Ramo é o ALARGAMENTO do QRS.

Page 4: Bloqueios de ramo final

Bloqueio do Ramo Direito

A Despolarização Miocárdica no Âmbito do Bloqueio do Ramo Direito tem as suas

peculiaridades e também, assim como na Despolarização Normal, pode ser dividida em Três

Etapas. O Estudo Vetorial dessas etapas será feita de acordo com o PLANO TRANSVERSAL, ou

seja, DAS DERIVAÇÕES PRÉ-CORDIAIS.

1ª Etapa: A primeira etapa da despolarização cardíaca, como dito acima, depende do

ramo ESQUERDO. Assim sendo, na vigência de um BRD, essa primeira etapa não estará

alterada,ou seja, será representada por um vetor que vai para FRENTE e para DIREITA. Assim

sendo, irá ocorrer um deflexão POSITIVA em V1 e V2 e a deflexão NEGATIVA em V5 e V6 ( a

onda ‘q’) continuará existindo.

2ª Etapa: A Segunda etapa da despolarização já apresenta diferenças importantes em

relação ao fisiológico. Como o Ramo Direito está Bloqueado nesta parte quem irá se

despolarizar é o Ventriculo Esquerdo. Assim sendo,o vetor resultante dessa etapa é a soma de

2 vetores distintos. O primeiro é um que aponta para trás e para esquerda, no sentido da

despolarização ventricular esquerda e o segundo aponta para frente e para direita no sentido

do VD, que, por estar polarizado, encontra-se positivo. O primeiro vetor, devido a maior massa

do VE, é o que predomina nessa etapa. Por isso, o vetor resultante da segunda etapa aponta

para TRÁS e PARA ESQUERDA ,ou seja, FOGE DE V1 e V2 e APONTA para V5 e V6.

3ª Etapa: Essa última parte da despolarização é representada pela ativação do

Ventrículo Direito. É uma etapa que ocorre lentamente, haja vista que é feita miócito à

miócito, sem o auxílio do feixo de condução nervoso especializado. Nessa etapa, o ‘coração’

está todo ‘negativo’, com exceção do VD, que ainda está ‘positivo’ e, por isso, o vetor

resultante irá apontar no Sentido de VD: Para FRENTE e para DIREITA.

Em resumo:

Sempre que um vetor foge de um eletrodo ele gera uma deflexão negativa e sempre que vai

em direção a ele gera um deflexão positiva.

Despolarização no BRD: No Miocárdio normal o processo de Despolarização Ocorre e

é totalmente finalizado para só depois ser dado inicio o processo de Repolarização. Portanto,

entre o Complexo QRS e a onda T nós podemos observar o retorno do Eletro a sua linha de

base normal. A Linha de base do ECG significa simplismente que todo o coração apresenta um

mesmo potencial de ação,ou seja, o coração está todo ‘positivo’ (Polarizado) antes do QRS e

esta todo ‘negativo’( Despolarizado) após o QRS. A linha de base é visível pois os processos

‘Despolarização’ e ‘Repolarização’ acontecem em diferentes momentos.

ETAPAS NO BRD - QRS V1 e V2 V5 e V6

1ª ETAPA Aponta Foge

2ª ETAPA Foge Aponta

3ª ETAPA Aponta Foge

Page 5: Bloqueios de ramo final

ETAPAS NO BRD- ONDA T V1 e V2 V5 e V6

REPOLARIZAÇÃO Foge Aponta

Sempre que um vetor foge de um eletrodo ele gera uma deflexão negativa e sempre que vai

em direção a ele gera um deflexão positiva.

Quando há um Bloqueio Completo de Ramo (Direito ou Esquerdo) o que foi dito acima

muda.

Qual é a última etapa da despolarização no BRD??

É a despolarização do Ventrículo Direito.

Essa etapa é feita de maneira rápida (por fibras especializadas) ou lenta (por tecido

muscular)??

Lentamente, uma vez que o feixe nervoso direito está bloqueado a ativação será feita

lentamente através da condução miócito a miócito.

Ora, como a última porção da despolarização do VD é feito lentamente já vai ter dado

tempo de as células que despolarizaram primeiro (o lado invervado pelo Ramo Esquerda)

começarem o processo de repolarização antes mesmo de terminar a despolarização do

Ventrículo Direito.

Assim sendo, o final do processo de despolarização irá ocorrer ao mesmo tempo do

processo de repolarização. Além disso, enquanto o vetor da despolarização estará apontando

para o Ventrículo Direito o da Repolarização irá apontar para o Ventrículo Esquerdo, pois a

região que está se repolarizando ficará positiva em contraste com a região ainda

despolarizada, que estará negativa. Por isso, tiramos três conclusões básicas daí:

1) Não teremos na vigência do Bloqueio de Ramo Direito (e também no

Bloqueio do Ramo Esquerdo) uma linha de base isoelétrica entre o QRS e a

onda T, pois os processos ocorrerão simultaneamente e o coração não

conseguirá ficar ‘todo positivo’ ou ‘todo negativo’.

2) A segunda conclusão é que na vigência do BRD a resultante do QRS no

plano transversal será para FRENTE e DIREITA e a onda T será para TRÁS e

para ESQUERDA, gerando,então, a alteração de repolarização típica do

BRD.

3) A terceira é que se a última etapa da despolarização no BRD aponta para

FRENTE e para DIREITA e ocorre graças a condução muscular...ela será

vista em V5 e V6, como uma onda negativa (Onda S) e está será

espessada(pois ela representa uma etapa lenta de despolarização, uma vez

que o tecido muscular não é especializado na )

Page 6: Bloqueios de ramo final

EM RESUMO:

Alterações Não-Exclusivas Exclusivas

BLOQUEIO DO RAMO

DIREITO

- Alargamento do QRS

- Alteração na Repolarização

- Padrão ‘M’ ou ‘R’ puro em

V1 e V2

- Onda ‘S’ espessada em V5

ou V6

- Ondas ‘q’ podem existir em

V5 e V6

Figura 1 – A Figura acima ilustra bem o ‘porque’ da onda em padrão M ser típica do Bloqueio do Ramo

Direito bem como o fato dela ser melhor vista em V1 e V2. Ora, na despolarização na vigência do BRD

haverá três vetores resultantes de cada etapa. O primeiro aponta no sentido de V1, por isso, observa-

se a deflexão positiva inicial. O segundo foge de V1 e, assim, é vista uma deflexão negativa. O Terceiro

novamente aponta para V1 e tem uma maior duração e comprimento, por isso, forma-se uma

deflexão positiva e de maior amplitude. Ao final, observamos um QRS que é semelhante a letra M.

Também poderá ser visto o padrão do QRS chamado ‘R’puro, onde, como o próprio nome sugere, o

QRS é representado,basicamente, só por uma deflexão postiva. Na ilustração acima também fica claro

que o vetor QRS aponta para frente e para direita e,assim, terá sua resultante positiva em V1 e

negativa em V6. A onda T, por sua vez, irá apontar para trás e para esquerda e, por isso, será vista

como uma deflexão negativa em V1 e uma positiva em V6, o que é visto como uma alteração da

repolarização típica dos Bloqueios de Ramo.

Page 7: Bloqueios de ramo final

Bloqueio do Ramo Esquerdo

A Despolarização do Miocárdio na Vigência do Bloqueio do Ramo Esquerdo também

pode ser dividida em Três Etapas:

1ª Etapa: Na vigência do BRE a primeira porção do septo interventricular a se despolarizar será

a direita, pois ela depende do Ramo Direito, que não está bloqueado. Com isso, essa região irá

ficar ‘negativa’ em relação a sua porção esquerda. Assim sendo, o vetor dessa primeira etapa

irá apontar para Trás e para Esquerda, ou seja, FUGINDO de V1 e V2 e INDO EM DIREÇÃO a V5

e V6. Isso é importantíssimo pois se a primeira ETAPA aponta pra V5 e V6 ela irá gerar nessas

derivações uma deflexão positiva. Assim sendo, NO BRE NÃO HÁ ONDA Q EM V5 e V6, sendo

esse um critério para definição de BRE.

2ª Etapa: A segunda porção a se despolarizar agora é o Ventrículo Direito e haverá, portanto,

um vetor que aponta na direção dele (para frente e direita). Contudo, a massa ventricular

esquerda ( que é cinco vezes maior que a do VD) não irá se desplarizar e ficará ‘positiva’. Assim

sendo, haverá um vetor que também irá apontar na direção do VE e,por ter maior massa e,

consequentemente, maior carga, o vetor resultante dessa etapa também irá se dirigir para trás

e para esquerda.

3ª Etapa: A última etapa da despolarização corresponde a ativação do Próprio Ventrículo

Esquerdo que será feita miócito a miócito e,assim, será lenta e com um vetor que irá apontar

para trás e para esquerda.

Em resumo, no BRE as três etapas da sua ativação tem vetores que se direcionam para trás e

para esquerda (analisando um corte transversal). Sendo assim, o que você espera do QRS em

V5 e V6?

Ora, se todos as 3 etapas apontam para V5 e V6 é de se esperar um QRS todo positivo e com

um padrão em ‘Torre’, o que de fato ocorre.

Sempre que um vetor foge de um eletrodo ele gera uma deflexão negativa e sempre que vai

em direção a ele gera um deflexão positiva

Repolarização no BRE:

Vimos que no BRE o QRS aponta para TRÁS e ESQUERDA. Vimos também que a última

porção da despolarização foi a ativação lenta do VE. Acontece que enquando o VE ainda está

se despolarizando (lentamente), as células da região do VD e da porção direita do septo

interventricular já começaram a se repolarizar.Assim sendo, o vetor que representa a onda T

irá apontar para FRENTE e para DIREITA, ou seja, será o contrário do vetor QRS e

ETAPAS NO BRE - QRS V1 e V2 V5 e V6

1ª ETAPA Foge Aponta

2ª ETAPA Foge Aponta

3ª ETAPA Foge Aponta

Page 8: Bloqueios de ramo final

justificará,assim, a alteração da repolarização típica dos Bloqueios Completos de Ramo. Ora, o

segmento ST e a onda T (juntos denominados ‘intervalo ST’), representam a repolarização

miocárdica. Se a repolarização na vigência do BRE irá apontar para Frente e Para direita e ela

irá ocorrer ao mesmo tempo em que ocorre o final da despolarização ( ver Despolarização no

BRD, logo acima) haverá uma ‘supralização’ do ST em V1 e V2 e uma’infralização’ do ST em V5

e V6 que será típico do Bloqueio do Ramo Esquerdo.

ETAPAS NO BRE- ONDA T V1 e V2 V5 e V6

REPOLARIZAÇÃO Aponta Foge

Figura 2 – A ilustração acima apresenta as três etapas da despolarização bem como o vetor

repolarização. Observe que as 3 etapas da ativação ventricular na vigência do BRE apontam para trás

e para esquerda, ou seja, na direção de V6 e,por isso, nessa derivação observa-se um QRS totalmente

positivo, chamado de QRS em ‘Torre’. Note que as direções dos vetores QRS e T, representando

despolarização e repolarização miocárdica, respectivamente, estão opostos. Assim sendo, haverá

pseudo-supra em V1 ( bem como em V2 e V3) e pseudos-infras em V6( também em V5) que são típicos

do BRE e não devem ser confudidos com o SUPRA do IAM. Ao lado de cada ilustração há uma foto da

morfologia num ECG real. Observe, também, que a primeira etapa da ativação (desloparização)

ventricular APONTA para V6 e,por isso, não existe a onda ‘q’ fisiológica no BRE.

Page 9: Bloqueios de ramo final

EM RESUMO:

Alterações Não-Exclusivas Exclusivas

BLOQUEIO DO RAMO ESQUERDO - Alargamento do QRS

- Alteração na Repolarização

- Onda T em ‘Torre’ em V5 e V6

- Ausência do onda ‘q’ em V5 e

V6

- Pseudo-Supra em V1 e V2

- Pseudo-Infra em V5 e V6

Tabela 1 – Diferenças na Morfologia do QRS e onda T entre BRE e BRD

Diferenças no ECG BLOQUEIO DO RAMO DIREITO BLOQUEIO DO RAMO ESQUERDO

QRS em V1 e V2 POSITIVO NEGATIVO

QRS em V5 e V6 NEGATIVO POSITIVO

Onda T em V1 e V2 NEGATIVA POSITIVA (Pseudo-Supra)

Onda T em V5 e V6 POSITIVA NEGATIVA (Pseudo-Infra)

Onda Típica Padrão ‘M’ em V1 e V2 Padrão ‘T’ em V5 e V6

Onda ‘q’ em V5 e V6 ???? Pode estar presente. Não

Onda S espessada em V5 e V6??? Sim Não. Onda S ausente

Page 10: Bloqueios de ramo final

Figura 3 – Observe o QRS, o segmento ST e a onda T em V1 e V6 num ECG normal e compare com as

morfologias na vigência de um Bloqueio de Ramo Esquerdo e no Bloqueio do Ramo Direito.

Correlacione as alterações vistas com as informações da Tabela 1. Ao centro, observamos um

complexo QRS normal onde notamos um onda padrão rS em V1. Á direita, observe que a resultante

do QRS é positiva em V1 e este complexo tem uma morfologia de rsR' (onda ‘M’), a típica do Bloqueio

de Ramo Direito. À Esquerda, observa-se a morfologia do QRS no Bloqueio de Ramo Esquerdo onde

observamos um complexo com um padrão rS, onde a onda r é quase inexistente. Costumo dizer que

em ‘V1 e V2’ o QRS no BRD é o ‘inverso’ do normal e no BRE é uma ‘exacerbação’ do normal, ou seja,

se normalmente o QRS é negativo, no BRD ele será positivo e no BRE super negativo.

Page 11: Bloqueios de ramo final

E, ENTÃO, COMO ANALISAR UM ELETROCARDIOGRAMA

NO ÂMBITO DOS BLOQUEIOS COMPLETOS?

Ora, agora que sabemos a base das alterações relacionadas aos Bloqueios Completos e

Divisionais fica mais fácil analisarmos os ECGs de Bloqueios. E qual é a diferença básica entre

analisar um ECG de Bloqueio e um com outra patologia? NENHUMA.

A Análise de todo ECG, independentemente da suspeita, deve seguir o mesmo

protocolo que deve ser padronizado individualmente, mas que deve contemplar todas as

porções do traçado eletrocardiográfico. Por isso, analisar eixo, freqüência, ritmo, a morfologia

e duração das ondas (...)( ver MÓDULO ANÁLISE DE ECG NO REPOUSO). Lembre-se: uma das

maiores causas de erros na interpretação eletrocardiográfica é sair buscando alterações de

maneira desorganizada. Por exemplo, quando você está na Sala de Parada da Emergência

Cardiológica de algum hospital ao chegar um ECG de um paciente você sair

‘desesperadamente’ procurando um Desnivelamento do ST ou alterações da onda T. Isso

gerará erros e, muitas vezes, uma sensação de que ‘não sei de nada’ a cada vez que o ECG não

mostrar o que você deseja ver. O Eletrocardiograma, assim como a grande maioria dos Exames

Complementares, é fácil de analisar e interpretar: é apenas questão de treinamento,

persistência e, obviamente, conhecimento básico sobre a fisiologia cardíaca. Por isso, repito:

se ainda não está claro em sua mente como é a dinâmica de Despolarização/Repolarização

normal do Miocárdio procure um livro e leia e releia o quanto for necessário. Não adianta

decorar ou tentar entender o patológico sem saber o mínimo do fisiológico.

Voltando ao assunto, duas informações básicas que podem ser vistas rapidamente

excluem de pronto a presença de qualquer tipo de Bloqueio. A primeira é o QRS e a segunda o

Eixo:

1) Se ele estiver estreito (menor que 0,11 ou 0,12, varia de acordo com a referência) não

há possibilidade de haver bloqueio completo.

2) Se o QRS estiver estreito o próximo passo é calcular de maneira grosseira o eixo

cardíaco. Se este estiver entre 0° e 90° ( positivo em DI e aVF) não teremos bloqueios

divisionais, pois, como visto acima, é característico dessas entidades os desvios

extremos de eixo ( > - 45° no BDAS e > 120° no BDPI).

Isso é importante de saber porque a grande maioria dos traçados em ambulatórios de

clínica médica os ECGs não terão morfologias de Bloqueios e, por isso, apenas o QRS e o Eixo já

te dizem que eles não estão presentes sem que haja a necessidade de uma análise mais

minuciosa das morfologias das Ondas, ou seja, você ganha tempo.

Contudo, pode ser que os dois itens acima apresentem alteração:

1) Se o QRS estiver alargado?

Quando o QRS estiver alargado de imediato sua atenção deve ser voltada para as

derivações ‘pré-cordiais’: V1 a V6 e você deverá pensar em Bloqueio Completo de

Ramo. Esqueça as derivações do plano frontal ( DI,DII ...).

Page 12: Bloqueios de ramo final

Olhando para o plano das pré-cordiais focalize sua atenção em V1 e V2 e observe

se o QRS está ‘positivo’ ou esta ‘negativo’.

1.1) Se o QRS for POSITIVO em V1 e V2:

Se o QRS for positivo e essa positividade for em decorrência de um Bloqueio

Completo este será Direito. Digo isso pois há outras causas de QRS alargado e

positivo em V1 e V2, como a Sobrecarga Ventricular Direita.

1.2) Se o QRS for NEGATIVO em V1 e V2:

Se o QRS for negativo e em conseqüência de um Bloqueio este será Esquerdo.

Lembre-se, contudo, que Sobrecarga Ventricular Esquerda pode alterar tanto a

duração como a amplitude do QRS.

1.3) Se o Bloqueio é de Ramo Esquerdo eu preciso avaliar se há presença de

Bloqueios Divisionais?

Não. Somente o Ramo Esquerdo é que possui fascículos. Sendo assim, NÃO

existe bloqueio divisional do Ramo Direito.

1.4) Se o Bloqueio é do Ramo Direito eu preciso avaliar se há presença de Bloqueios

Divisionais?

Sim. A Presença de BRD não exclui a possibilidade que ele esteja associado a

um Bloqueio Divisional do Ramo Esquerdo (BDAS ou BDPI). Então, proceda

como descrito no item 2, logo abaixo

2) Se o QRS estiver Estreito?

Nesse caso, não haverá Bloqueio Completo de Ramo, mas há possibilidade de se

ter um Bloqueio Divisional do Ramo Esquerdo (BDAS ou um BDPI).

Como sabemos que nos Bloqueios divisionais o que importa é o desvio extremo de

eixo e a morfologia do QRS na parede inferior (DII,DIII e aVF) devemos observar

esses dois elementos:

BDAS: Desvio > -45° e parede inferior com QRS negativos e cm padrão rS

BDPI: Desvio > 120° e parede inferior com QRS positivos e padrão Rs

3) Se QRS estiver Alargado na Presença de um BRD?

Em todo ECG que tenha um BRD deve-se pesquisar os Bloqueios Divisionais e, para

isso, olhe os devios extremos de eixo e a Morfologia do QRS na parede inferios (

DII, DIII e aVF):

BDAS: Desvio > -45° e parede inferior com QRS negativos e cm padrão rS

BDPI: Desvio > 120° e parede inferior com QRS positivos e padrão Rs

Page 13: Bloqueios de ramo final

Figura 4- Corte transversal do Coração Polarizado. Observe que nesse estado o coração,

externamente, é todo ‘POSITIVO’ e não há diferença de potencial entre as regiões. Essa é a morfologia

eletrofisiológica do Coração antes da Despolarização, ou seja, antes do Complexo QRS.

Page 14: Bloqueios de ramo final

Figura 5- A Figura acima esquematiza a primeira etapa da despolarização que é representada pela

ativação da parte esquerda do septo. Como ela se despolarizou a sua porção externa fica ‘negativa’

e,por isso,o vetor resultante dessa etapa aponta para o lado direito do Septo. Assim sendo, é possível

que se observe uma deflexão positiva em V1 e V2 e uma negativa em V5 e V6, bem como nas outras

derivações esquerdas (DI e aVL). Essa é a explicação para a existência de uma onda ‘q’ fisiológica nas

derivações que ‘enxergam’ o lado esquerdo do coração (DI, aVL, V5 e V6)

Page 15: Bloqueios de ramo final

Figura 6 – Note que a 2ª Etapa da despolarização normal ocorre simultaneamente entre as paredes do

ventrículo direito e esquerdo. Diferentemente da 2ª Etapa na vigência de um Bloqueio Completo de

Ramo, onde a porção não bloqueada irá despolarizar antes da bloqueada.

Page 16: Bloqueios de ramo final
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