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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO

MTODOS PARA ESTMULO CRIATIVIDADEE SUA APLICAO EM ARQUITETURA

Giovana Bianchi

Campinas 2008

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO

MTODOS PARA ESTMULO CRIATIVIDADEE SUA APLICAO EM ARQUITETURA

Giovana Bianchi

Orientadora: Profa. Dr a. Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski

Dissertao de Mestrado apresentada Comisso de Ps-graduao da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos para obteno do ttulo de Mestre em Engenharia Civil na rea de Concentrao de Arquitetura e Construo.

Campinas 2008

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FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DA REA DE ENGENHARIA E ARQUITETURA - BAE - UNICAMP

B47m

Bianchi, Giovana Mtodos para estmulo criatividade e sua aplicao em arquitetura / Giovana Bianchi.--Campinas, SP: [s.n.], 2008. Orientador: Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski Dissertao (Mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo. 1. Criatividade. 2. Metodologia. 3. Projeto arquitetnico. 4. Ensino superior Arquitetura. I. Kowaltowski, Doris Catharine Cornelie Knatz. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo. III. Ttulo.

Ttulo em Ingls: Methods which stimulate creativity and their use in architecture design Palavras-chave em Ingls: Creativity, Design methodology, Design education, Architecture rea de concentrao: Arquitetura e Construo Titulao: Mestre em Engenharia Civil Banca examinadora: Silvia Aparecida Mikami Gonalves Pina, Anna Paula Silva Gouveia Data da defesa: 27/03/2008 Programa de Ps-Graduao: Engenharia Civil

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agradecimentosA minha orientadora Doris, por sua sabedoria,

dedicao e entusiasmo e por ter aberto as portas de minha carreira profissional. A todos os professores e amigos que ajudaram de alguma forma nesta pesquisa. A CAPES e a FAPESP pelo apoio financeiro durante meu mestrado.

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MTODOS PARA ESTMULO CRIATIVIDADEE SUA APLICAO EM ARQUITETURA

RESUMO

A globalizao impe novos padres para o profissional de projeto em arquitetura e exige maior produtividade e originalidade no processo criativo. O processo de projeto arquitetnico complexo, com grande nmero de variveis, e depende de decises criativas que transformem informaes em solues projetuais. A resoluo de problemas em arquitetura constitui um desafio que pressupe o suporte de metodologias de projeto e de estmulo criatividade. Este trabalho discute a soluo criativa de problemas em processos de projeto. A literatura sobre criatividade rica e apresenta metodologias de apoio criao que buscam desenvolver a capacidade de conceber idias e propostas novas, estabelecer relaes entre elas, elabor-las e finalmente avali-las e julg-las. Estas tcnicas de estmulo criatividade so apresentadas nesta pesquisa em um amplo levantamento bibliogrfico. Paralelamente a este levantamento, foi realizado um estudo exploratrio em escolas de arquitetura no Brasil e no exterior objetivando investigar se estes mtodos so aplicados na formao de futuros projetistas. Os resultados do levantamento exploratrio demonstram que a maioria das tcnicas selecionadas pela pesquisa (brainstorming, analogia, mapa mental, lista de atributos) so conhecidas e aplicadas pelos docentes no ateli de projeto, mas nem sempre introduzidas de forma deliberada ou contnua em todos os nveis de cursos de arquitetura. Entre as vantagens do uso destas tcnicas, destacam-se: ampliao do repertrio do aluno, discusso e reflexo em grupo, melhor organizao dos problemas, explorao de mltiplas solues e melhor compreenso das questes de projeto. A aplicao contnua destes mtodos conduz a um processo de deciso mais consciente, produzindo resultados mais ricos e bem elaborados. Uma discusso sobre vantagens, desvantagens e resultados da aplicao destes mtodos na opinio de docentes de projeto arquitetnico apresentada como base para pesquisas futuras em ensino de projeto. Palavras chave: criatividade, metodologia de projeto, ensino de projeto, arquitetura

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METHODS WHICH STIMULATE CREATIVITY AND THEIR USE INARCHITECTURE DESIGN

Globalization demands from the design professional more productivity and originality in the creative process. The design process in architecture is complex, involves a large number of variables, and depends on creative decisions that can convert information and data into design solutions. Problem solving in architecture is challenging and the support of design and creativity methodologies is essential. This research discusses the application of creative problem solving techniques in the design process. The publications about creativity are numerous and present methods that support and stimulate the development and assessment of new ideas. These creativity methods are presented in this work along with an investigation of their application by architecture courses in Brazil and abroad. The results of this field study confirm that most of the techniques selected for the investigation (brainstorming, analogy, mind map, attribute listing, bio mimicry) are known and applied in the design studio. In most cases, however, the application of these methods is not guided by formal parameters through the entire course. As advantages to the use of these techniques in design education, are listed by studio instructors: an increase in design repertoire, improved discussion and group reflections, better problem organization, increased exploration of multiple solutions and better comprehension of the design questions. With the continuous application of these techniques, students are lead to a more conscious decision making process and produce better and more elaborated design results. A discussion on advantages, difficulties and results of the application of these methods is presented as a base for further research which may contribute to the field of design methods. Key words: creativity, design methodology, design education, architecture

ABSTRACT

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SUMRIO

LISTA DE FIGURAS .................................................................................... LISTA DE DIAGRAMAS .............................................................................. LISTA DE TABELAS ................................................................................... LISTA DE ABREVIATURAS ........................................................................ 1. INTRODUO .............................................................................................. 2. OBJETIVOS .................................................................................................. 3. FUNDAMENTAO TERICA ...................................................................... 3.1 Conceituao de criatividade ....................................................................... 3.2 Transformao histrica da criatividade ....................................................... Teorias filosficas ........................................................................................ Teorias psicolgicas .................................................................................... 3.3 Abordagens criatividade ............................................................................ 3.4 Criatividade e o Indivduo ............................................................................. Criatividade e conhecimento ................................................................. Criatividade e inteligncia ...................................................................... Teoria das Inteligncias Mltiplas .................................................................. Teoria Trirquica da Inteligncia Humana ...................................................... 3.5 Criatividade como processo ....................................................................... Padres de pensamento ....................................................................... Criatividade e os hemisfrios cerebrais ............................................... Teoria do crebro total ............................................................................... Fases do processo criativo ......................................................................... 3.6 Soluo Criativa de Problemas .................................................................. 3.7 Soluo Criativa de Problemas em Arquitetura............................................. Os problemas e o processo criativo em arquitetura ............................... O projetista e seus mtodos .................................................................. vii

ix x xi xii 01 03 04 04 05 06 06 08 09 09 11 11 13 16 16 18 19 20 22 25 25 30

Experincia e repertrio ........................................................................ 3.8 Ensino para Criatividade ............................................................................ O ensino de projeto arquitetnico ..................................................................... Apoio para projetar ........................................................................................ 4. LEVANTAMENTO DE MTODOS E TCNICAS DE APOIO CRIAO ... 4.1 Caracterizao dos mtodos de estmulo criatividade ............................ 4.2 Possibilidade de aplicao dos mtodos de estmulo criatividade em arquitetura ....................................................................................................... 4.3 Mtodos de Gerao de Idias ................................................................... Combinao de Idias .................................................................................Mtodo: Lista de Atributos .......................................................................................... Mtodo: TRIZ .............................................................................................................

31 33 35 39 42 46 48 51 51 52 53 56 56 58 59 60 61 64 65 66 66 67 68 68 70 73 73 73 73 87 90 99 105 109 113

Associao de Idias ..................................................................................Mtodo: Brainstorming ................................................................................................ Mtodo: Mapa Mental ..................................................................................................

Comparao de Idias ...............................................................................Mtodo: Analogia ....................................................................................................... Mtodo: Bio Mimetismo ..............................................................................................

5. ESTUDO EXPLORATRIO ........................................................................ 5.1 Mtodos de estmulo criatividade ............................................................. 5.2 Questionrio ............................................................................................... Pr-teste ..................................................................................................... 5.3 Levantamento Exploratrio ....................................................................... Definio da Amostra ................................................................................Escolas de Arquitetura no Brasil ..................................................................................... Escolas de Arquitetura no exterior ...................................................................................

6. RESULTADOS ............................................................................................... 6.1 Resultados da Pesquisa Bibliogrfica .......................................................... 6.2 Resultados do Levantamento de Mtodos .................................................. 6.2 Resultados do Estudo Exploratrio .............................................................. 7. CONCLUSO E TRABALHOS FUTUROS .................................................. REFERNCIAS ................................................................................................ ANEXO 1 Glossrio de Termos e Mtodos .................................................... ANEXO 2 Verso Final do Questionrio ......................................................... ANEXO 3 Verso Final do Questionrio em ingls ........................................ ANEXO 4 Verso Final do Questionrio em espanhol ................................. viii

LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Inter-relao entre os elementos da criatividade (ISAKSEN, 1989) ..................... 09 Figura 2. Processo de pensamento (GUILFORD; HOEPFNER, 1971) ............................... 10 Figura 3. Componentes do modelo de soluo criativa de problemas (TREFFINGER et 24 al, 2003) ............................................................................................................................. Figura 4. Esquema do processo de projeto de acordo com Asimow (ROWE, 1995) ......... 29 Figura 5. Os projetistas segundo Jones (1970) ................................................................. 30 Figura 6. Processos para criao (ROSENMANN; GERO, 1993) ..................................... 50 Figura 7. Estratgias da TRIZ (ALTSHULLER, 1984) ........................................................ 54 Figura 8. O espao das solues criativas um superconjunto do espao das solues viveis (GERO, 2000) ......................................................................................................... 55 Figura 9. Mapa Mental (SIQUEIRA, 2007) .......................................................................... 59 Figura 10. Projetos com aplicao de Bio-mimetismo (CASAKIN, 2004) ........................... 62

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LISTA DE DIAGRAMAS

Diagrama 1. Abordagens para o Estudo da Criatividade (IVNYI; HOFFER, 1999) ......... 08 Diagrama 2. Componentes do Processo de Pensamento Criativo (ZINGALES, 1978) ...... 15 Diagrama 3. Quadrantes e Funes do Crebro Total (BOUILLERCE; CARR, 2004) ... 19

Diagrama 4. Fases do Processo Criativo e Quadrantes do Crebro Total (BOUILLERCE; 21 CARR, 2004) ................................................................................................................... Diagrama 5. Conceitos e Ligaes no Processo Cognitivo em Projeto ............................. 32 Diagrama 6. Categorias de Conhecimento em Projeto Arquitetnico ................................ 36

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Mtodos e Tcnicas de Apoio Criao ............................................................. 43 Tabela 2. Fontes nacionais e internacionais do levantamento de mtodos ....................... 46 Tabela 3. Classificao dos Mtodos de estmulo criatividade (MYCOTED, 2007) ......... Tabela 4. Mtodos de Gerao de Idias selecionados ..................................................... 47 51

Tabela 5. Princpios Inventivos (KIATAKE, 2004) ............................................................... 54 Tabela 6. Objetivos x Princpios Inventivos (KIATAKE, 2004) ............................................ Tabela 7: Descrio dos Mtodos de estmulo criatividade investigados no questionrio 55 65

Tabela 8. Fatores de projeto (HERSHBERGER, 1999) ....................................................... 67 Tabela 9. Distribuio dos cursos de Arquitetura e Urbanismo no Brasil (MEC) ............... 68

Tabela 10. Escolas pesquisadas no Brasil e respostas obtidas .......................................... 69 Tabela 11. Amostra de 14 cursos de arquitetura e urbanismo no Brasil estudados ........... 70 Tabela 12. Escolas pesquisadas no exterior e respostas obtidas ...................................... 71 Tabela 13. Amostra de 14 cursos de Arquitetura e Urbanismo no Exterior ........................ 72 Tabela 14. Tabulao das respostas da Questo 1 (a) Tabela 15. Tabulao das respostas da Questo 1 (b) Tabela 16. Tabulao das respostas da Questo 1 (c) Tabela 17. Tabulao das respostas da Questo 1 (d) Tabela 18. Tabulao das respostas da Questo 1 (e) Tabela 19. Tabulao das respostas da Questo 1 (f) Tabela 20. Tabulao das respostas da Questo 2 Tabela 21. Tabulao das respostas da Questo 3 ..................................................... 75 ..................................................... 77 ..................................................... 79 ..................................................... 81 ..................................................... 83 ..................................................... 84

.......................................................... 85 ......................................................... 86

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LISTA DE ABREVIATURASAIDA Anlise de Interaes em reas de Deciso BOI Ordenao Bsica de Idias CPS Soluo Criativa de Problemas IA Inteligncia Artificial NAF Novidade, Atratividade, Aplicabilidade PDCA Planejar, Fazer, Checar, Agir PIA Anlise de Problemas de Inventrio PIPS Fases de Soluo Integrada de Problemas PMI Mais, Menos, Interessante QFD Desdobramento da Funo Qualidade Q I Quociente de Inteligncia SCAMPER Substituir, Combinar, Adaptar, Modificar, Usar, Eliminar e Reverter SDI Induo Sistematizada Direta SODA Desenvolvimento e Anlise de Opes Estratgicas THRIL Repetio Tripla de Letra Inicial TRIZ Teoria da Soluo Inventiva de Problemas

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1. INTRODUOSe damos prioridade s regras, fica difcil explicar como acontecem as novas idias. Se damos prioridade intuio, s percepes e aos julgamentos subjetivos, fica difcil explicar como projetistas constroem repertrios de conhecimento largamente utilizveis. Projeto arquitetnico seria ento uma prtica hbrida em que a soluo de problemas necessria para a construo de edifcios funcionais se sobrepe e interage com o desenvolvimento de obras de arte arquitetnicas. (SCHN, 1988) A concepo do projeto arquitetnico um processo complexo, que se enquadra em temas que vo desde solues tcnicas at artsticas para responder s questes propostas. O processo de projeto em arquitetura resultado da manipulao criativa de inmeros elementos como volume, espao, textura, luz, materiais e programas somados a componentes tcnicos, como custos, desempenho e tecnologia construtiva. O processo de criao no possui mtodos rgidos ou universais que resolvam a totalidade dos problemas, pois cada caso nico e precisa de solues especficas. Diferentes mtodos, ferramentas, tcnicas e formas de representao so necessrios para dar suporte fase de concepo do projeto, pois so muitas as variveis (sociais, culturais, legais, funcionais, estticas, econmicas, psicolgicas, tecnolgicas, de conforto ambiental entre outras) e escalas (regionais, urbanas, do edifcio ou do objeto) envolvidas. A definio do objeto arquitetnico decorre do domnio e compreenso de referncias, modelos, experincias, elementos e teorias discutidas em manifestos e principais obras sobre arquitetura. As reas que influenciam a concepo do projeto tm crescido devido ao aumento de sua complexidade e envolvem hoje tanto questes sociais, de comportamento e sustentabilidade quanto solues tcnicas, como decises estruturais, de sistemas e servios. Deste modo, a equipe de projetos vm se tornando mais multidisciplinar e precisa contar com a participao de um time de especialistas de diversos campos.

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Nas ltimas dcadas, vemos a consolidao do ensino de arquitetura e urbanismo no Brasil, atravs da expanso dos cursos de graduao e ps-graduao e do aumento das publicaes e eventos na rea. Esta expanso indica que o mercado de trabalho ficar cada vez mais competitivo, exigindo flexibilidade e maior qualificao profissional dos arquitetos para trabalharem em equipe e responderem criativamente aos problemas de projeto que surgiro. Os conceitos de criatividade e processo criativo em projeto arquitetnico ainda hoje so pouco definidos, mesmo que considerados essenciais no trabalho do arquiteto. H quem pense que a criatividade um talento inato, que no pode ser adquirido ou melhorado, e que o processo criativo se resume a um estalo de iluminao, de onde magicamente surge uma idia nova e surpreendente (ALENCAR, 1996). Existe uma extensa bibliografia a respeito de criatividade e de mtodos para seu estmulo, muitos das quais no foram desenvolvidos para aplicao especfica em projeto arquitetnico. Estas tcnicas podem ser utilizadas em diversas etapas do processo criativo com o objetivo de desenvolver a capacidade de conceber diferentes idias ou propostas novas, estabelecer relaes entre elas, elabor-las e finalmente avali-las e julg-las (HIGGINS, 1994). Esta pesquisa dividiu-se em 3 vertentes. Inicialmente, pretendeu-se compreender o conceito de criatividade e os elementos envolvidos no processo criativo e transpor estas definies para o mbito do projeto arquitetnico, buscando descobrir como a criatividade pode ser estimulada no processo de projeto e quais ferramentas podem ajudar os projetistas a lidar com a complexidade e as novas exigncias dos projetos e facilitar a busca por solues adequadas aos novos problemas. Esta reviso apresentada no Captulo 3. Em uma segunda etapa, objetivou-se estudar diversos mtodos de suporte criatividade que possam ser aplicados na fase de concepo do projeto arquitetnico para conduzir a um processo mais eficiente e com resultados de qualidade. Esta etapa est relacionada a um dos temas do Projeto Temtico O processo de projeto em arquitetura: da teoria tecnologia aprovado pela Fapesp em maio de 2006 e desenvolvido pelos pesquisadores da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da UNICAMP (FEC/UNICAMP) e descrita no Captulo 4. A terceira etapa complementar da pesquisa visou investigar se tais mtodos so conhecidos e utilizados pelas escolas de arquitetura e urbanismo do Brasil e exterior na formao dos futuros projetistas. No Captulo 5 descrita a metodologia deste estudo exploratrio e no Captulo 6 so discutidas as vantagens, desvantagens e resultados da aplicao destes mtodos no ensino de projeto, na opinio dos docentes entrevistados. O Captulo 7 apresenta as concluses desta dissertao e futuros trabalhos de interesse dentro deste tema.

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2. OBJETIVOSO objetivo geral desta pesquisa aprofundar o conhecimento sobre o processo criativo em arquitetura e analisar o potencial de aplicao de mtodos de estimulo criatividade para se alcanar melhores resultados neste processo. Uma investigao complementar junto a escolas de arquitetura visa descobrir a insero dos mtodos selecionados no ensino hoje, assim como vantagens e desvantagens de sua aplicao. Para isto, a pesquisa foi dividida em trs etapas: ETAPA 1: FUNDAMENTAO TERICA Investigao sobre criatividade, processo criativo e processo de projeto arquitetnico para compreenso dos fatores envolvidos na busca por originalidade na soluo de problemas em arquitetura. ETAPA 2: LEVANTAMENTO DE MTODOS DE ESTMULO CRIATIVIDADE Levantamento e anlise de mtodos de apoio ao processo criativo, selecionando-os segundo sua aplicabilidade ao processo de projeto em arquitetura. ETAPA 3: ESTUDO EXPLORATRIO Investigao em escolas de arquitetura no Brasil e exterior visando identificar se no ensino de projeto so aplicados os mtodos de incentivo criatividade selecionados e quais suas vantagens e desvantagens na opinio dos docentes.

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3. FUNDAMENTAO TERICACriatividade denota a capacidade de uma pessoa de produzir idias, concepes, invenes ou produtos artsticos novos ou originais. Essa capacidade envolve uma interao entre caractersticas pessoais, como habilidade de pensamento e raciocnio, e caractersticas do ambiente, como valores culturais e sociais e oportunidade para expresso de novas idias (ALENCAR, 1996). Neste captulo faz-se uma reviso dos pontos de vista sobre a criatividade e processo criativo de pesquisadores de vrias reas como Psicologia Cognitiva, Metodologia de Projeto, Inteligncia Artificial (IA) , Filosofia e Artes. Esta reviso tem por objetivo compreender as diferentes vises sobre a criatividade e fundamentar a discusso sobre a criatividade em projeto arquitetnico e sobre os mtodos de apoio criao e sua possvel aplicao em arquitetura. Um glossrio no Anexo 1 ao final da pesquisa conceitua os principais termos deste estudo.

3.1 CONCEITUAO DE CRIATIVIDADEA questo da criatividade vem sendo discutida h muito tempo e h diversas definies que levam em considerao tanto aspectos sociais quanto psicolgicos. Estudos pioneiros sobre a criatividade sempre a definem como capacidade de produzir idias novas ou originais (GOLDSCHIMDT; TATSA, 2005). Mas a novidade por si s no suficiente para classificar um ato como criador, pois alm de original, ele deve ter propsito e contribuir para a resoluo a uma dada situao. Alencar (1993) destaca que tambm presente em muitas definies propostas o fator relevncia, ou seja, no basta que a resposta seja nova; necessrio que ela seja apropriada a uma dada situao. Enfim, para a autora a criatividade seria uma capacidade complexa que abrange uma interao dinmica entre elementos relativos pessoa, como caractersticas de personalidade e habilidades de pensamento, e ao ambiente, como o clima psicolgico, os valores e normas da cultura e as oportunidades para expresso de novas idias (ALENCAR, 1996). A relevncia no contexto

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investigado um fator de extrema importncia para atribuir valor cientfico, tcnico, social ou esttico ao produto criado. Vernon (1989) ressalta a importncia da aceitao e valor dado pela sociedade ao produto criativo e define criatividade como a capacidade de uma pessoa para produzir idias, concepes, invenes ou produtos artsticos novos ou originais, que so aceitos pelos especialistas como tendo valor cientfico, esttico, social ou tcnico. Cave (1999) entende a criatividade como a traduo dos talentos humanos para uma realidade exterior que seja nova e til, dentro de um contexto individual, social e cultural. Essa traduo pode-se fazer de duas formas: a primeira a habilidade de recombinar objetos j existentes em maneiras diferentes para novos propsitos; a segunda, brincar com a forma com que as coisas esto inter-relacionadas. Em ambos os casos, a criatividade considerada uma habilidade para gerar novidade e, com isso, idias e solues teis para resolver problemas e desafios rotineiros. Boden (1999) faz uma diferenciao entre dois tipos de criatividade, denominadas pela autora de criatividade pessoal (Criatividade P) e criatividade histrica (Criatividade H). A criatividade pessoal ocorre quando o produto criado indito e original do ponto de vista de seu criador, no importando neste caso se a mesma idia j tenha sido concebida antes. Em contrapartida, a criatividade histrica ocorre se um produto original na histria da humanidade, nunca tendo sido desenvolvido por outra pessoa antes. O termo inovao aparece tambm relacionado ao conceito de criatividade, especialmente concretizao e aplicao de novas idias. Inovao definida por Couger (1995) como o processo pelo qual novas idias so colocadas em prtica. Isso envolve, em primeiro lugar, a gerao de idias e, em segundo lugar, o desenvolvimento destas idias em produtos, processos ou servios. Para compreender melhor a evoluo dos conceitos de criatividade importante realizar uma anlise histrica das teorias da criatividade e seus contextos, uma vez que as definies de criatividade dependem de fatores sociais, culturais e tecnolgicos especficos de cada poca.

3.2 TRANSFORMAO HISTRICA DA CRIATIVIDADEOs estudos sobre criatividade aparecem historicamente conectados s doutrinas filosficas e cientficas de cada perodo. As definies sobre o ato de criao evoluram desde a viso filosfica da inspirao divina at o recente cognitivismo, com os estudos a cerca dos processos mentais. No entanto, ainda no existe uma teoria universalmente aceita que defina a criatividade, por isso torna-se importante analisar as diversas vises e a evoluo histrica delas para ter uma compreenso maior

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sobre o assunto. Em sua obra Arte e cincia da criatividade, Kneller (1978) apresenta as principais teorias filosficas e psicolgicas sobre a criatividade, lembrando porm que nenhuma delas concludente.

Teorias filosficasKneller (1978) afirma que o pensamento filosfico foi utilizado para compreender a criao no contexto histrico da antiguidade. As teorias baseavam-se na atividade mental aplicada compreenso da concepo do mundo. Tais teorias perduraram at o aparecimento do mtodo cientfico, quando a criatividade comea, gradualmente, a ter bases mais firmes e verificveis. Em sua obra, Kneller (1978) descreve as quatro principais teorias filosficas: Criatividade como inspirao divina - Uma das primeiras concepes de criatividade sua origem divina. Uma forte expresso dessa crena atribuda a Plato, que ao referir-se aos poetas considerava que no so eles que proferem as palavras de tanto valor quando se encontram fora de si, mas que o prprio Deus que fala e se dirige por meio deles. Criatividade como loucura A criatividade tambm foi concebida como uma forma de loucura, em virtude se sua aparente irracionalidade e espontaneidade. Para Plato haveria pouca diferena entre o frenesi da loucura e a visitao divina. No sculo XIX, Lombroso acreditava que a natureza involuntria e irracional da arte criativa deveria ser explicada patologicamente. Criatividade como gnio intuitivo essa teoria se baseia na noo de gnio surgida no final do Renascimento para explicar a capacidade de criao de Da Vinci e Miguelangelo entre outros. Criatividade e genialidade foram associadas por muitos pensadores durante o sculo XVIII. A criao identificada como uma maneira saudvel e altamente desenvolvida de intuio, transformando o criador em algum raro e diferente, com capacidade de intuir direta e naturalmente em contraposio apurao resultante de longa divagao. Criatividade como fora vital influenciada pela teoria da evoluo de Darwin a criatividade foi tomada como manifestao de uma fora inerente vida. Neste sentido, a matria inanimada no criadora, porque sempre produz as mesmas entidades (como tomos e estrelas), enquanto que a matria orgnica fundamentalmente criadora, uma vez que sempre est gerando novas espcies.

Teorias psicolgicasA criao comeou a ser tratada de forma mais cientfica a partir do sculo XIX com o desenvolvimento da psicologia. O associacionismo, a teoria da Gestalt e a psicanaltica foram as

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principais contribuies e constituiriam uma das bases para a formao dos modernos conceitos de criatividade (KNELLER, 1978). Filsofos como John Locke e David Hume (MACPHERSON, 1979), baseados em Aristteles, diziam que o ser humano aprende por associao, ou seja, a mente liga eventos que ocorrem em seqncia. No associacionismo o pensamento consiste em associao de idias, das mais simples para as mais complexas. Para se criar algo novo, se parte do conhecimento adquirido, em um processo de tentativa e erro, at que atravs da associao de idias se encontre uma combinao que constitua soluo para a situao. Quanto mais associaes adquiriu um indivduo, mais conexes poder fazer e mais criativo ser. O associacionismo alvo de muitas crticas, pois se atm apenas s conexes conhecidas, ignorando o fato de que muitas vezes necessrio afastar-se de associaes e formulaes anteriores para pensar com originalidade. A Teoria da Gestalt surgiu no incio do sculo XX, com as idias de psiclogos, como Max Wertheimer, Wolfgang Khler e Kurt Koffka (SMITH, 1988), que baseados em estudos psicofsicos que relacionavam a forma e sua percepo construram as bases de uma teoria eminentemente psicolgica. Inicialmente era voltada para o estudo da psicologia e dos fenmenos psquicos, mas acabou ampliando seu campo de aplicao e tornou-se uma verdadeira corrente de pensamento filosfico. Essa teoria afirma que o pensamento criador uma reconstruo das gestalt (em alemo, configuraes) deficientes e incompletas. O pensador deve perceber o problema como um todo e entender sua dinmica a fim de reestrutur-lo. Segundo essa teoria no possvel ter conhecimento do todo atravs das partes, e sim das partes atravs do todo. O crebro s pode perceber, decodificar e assimilar uma imagem ou um conceito de fato atravs da percepo do todo. A Gestalt nega a fragmentao das aes e processos humanos, prega a necessidade da compreenso do homem como uma totalidade, resgatando as relaes da Psicologia com a Filosofia. Por sua vez a Teoria Psicanaltica, elaborada por Sigmund Freud (KNELLER, 1978), recupera a importncia da afetividade e tem como seu objeto de estudo o inconsciente. Nessa teoria a criatividade estaria relacionada imaginao ou representao mental, que estaria presente nas brincadeiras e nos jogos da infncia. Assim, a criana produz um mundo imaginrio, com o qual interage recombinando os componentes desse mundo de novas maneiras. Do mesmo modo, o indivduo criativo na vida adulta se comporta de forma similar, fantasiando sobre um mundo imaginrio, que, porm, discrimina da realidade. Kneller (1978) afirma que para Freud, a criatividade origina-se de um conflito no inconsciente, sendo que se a soluo obtida para este conflito for aceita pelo ego ou consciente - temos um comportamento criador. Por outro lado, se a soluo reprimida

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pelo ego, surgir uma neurose. Criatividade e neurose portanto surgem de um conflito no inconsciente, porm a pessoa criativa tem um ego flexvel que aceitas as idias originais do inconsciente enquanto outras pessoas podem ter um ego restrito que barras esses impulsos. Desta maneira, a Teoria da Psicanlise tem se demonstrado uma das mais importantes influncias sobre a teoria da criatividade, propiciando idias fundamentais pesquisa contempornea neste tema.

3.3 ABORDAGENS CRIATIVIDADEA criatividade pode ser estudada a partir do ponto de vista da pessoa que cria, do produto criado, dos processos de criao ou das influncias ambientais e culturais. Estas quatro diferentes abordagens para os estudos da criatividade so descritas no Diagrama 1 (IVNYI; HOFFER, 1999):

Diagrama 1: Abordagens para o estudo da criatividade Fonte: IVNYI; HOFFER,1999

ELEMENTOS Indivduo Criativo Processo Criativo Produto Criativo

CARACTERSTICAS O indivduo criativo o centro do processo criativo e representa a fonte intelectual, o criador. O processo criativo envolve a definio de um problema e a proposta de uma nova soluo. O produto o resultado direto deste processo, a soluo inovativa que emerge e aceita como original. O ambiente criativo o contexto no qual as novas idias surgem e exerce grande influncia sobre a criao.

Ambiente Criativo

Idealmente, estes quatro elementos esto inter-relacionados e devem ser considerados como parte de um retrato total, como mostra a Figura 1.

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Figura 1. Inter-relao entre os elementos da criatividade Fonte: ISAKSEN, 1989.

Estas abordagens diferenciadas da criatividade so citadas por diversos autores, como Alencar e Fleith (2004); Sternberg (1991); Hennessey e Amabile (1988); Kneller (1978). Muitos autores aprofundaram suas pesquisas em um destes elementos, de acordo com a rea de atuao Psicologia, Engenharia, Cincias da Computao (IA) e o foco de seus estudos. Esta pesquisa aprofundou-se especialmente na questo do individuo criativo e do processo criativo, que sero discutidos nas prximas sees.

3.4 CRIATIVIDADE E O INDIVDUOSomente h pouco mais de 30 anos os tericos em criatividade voltaram seu interesse para o uso criativo da mente e comearam a estudar os processos de pensamento racional e a resoluo criativa de problemas. Esta chamada Revoluo Cognitiva, segundo Gardner (1994), levou os pesquisadores a concentrar-se nos processos mentais humanos, buscando comprovar que estes processos seguiam uma regularidade e eram notavelmente estruturados. Neste contexto, as pesquisas focaram-se inicialmente no perfil do indivduo e em como suas caractersticas pessoais, como conhecimento, inteligncia, motivao e personalidade, influenciavam a expresso criativa.

Criatividade e conhecimentoAs idias criativas no surgem do nada na mente de seus criadores, mas precisam ser criadas a partir do conhecimento anterior. A capacidade de conceber a novidade depende da bagagem de experincias sensoriais e intelectuais. Ao confrontar-se com um novo problema, os indivduos

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acessam o conhecimento em busca de solues atravs da combinao e associao criativa de elementos j conhecidos (BOUILLERCE; CARR, 2004). O conhecimento existente, portanto, modela as novas idias, por isso essencial compreender os meios pelos quais os indivduos acessam e manipulam as informaes. Segundo Newell e Simon (1972) o processamento da informao pelo crebro humano ocorre atravs da interao entre ambiente externo e interno. O ambiente interno composto pela memria de curta e de longa durao; o ambiente externo pelos sensores. Processos mentais permitem a aquisio de informao atravs dos sensores (sentidos), recuperam informaes da memria de longa durao e processam informaes na memria de curta durao. As operaes cognitivas executadas sobre os contedos intelectuais adquiridos

(conhecimento) geram produtos do pensamento, como mostra a representao de pensamento de Guilford e Hoepfner (1971) na Figura 2.

Figura 2. Processo de pensamento Fonte: GUILFORD; HOEPFNER, 1971.

Ward (2004) observa a existncia de uma propenso geral das pessoas de estocar a informao sobre suas experincias em estruturas organizadas de conhecimento e ento acessar este conhecimento para o uso em tarefas subseqentes. Deste modo, algumas vezes o conhecimento proporciona uma ponte para o desenvolvimento de novas idias, outras vezes pode se tornar um bloqueio no caminho. Esta tendncia contraditria apontada nos estudos da psicologia cognitiva foi notada tambm por Sternberg e Lubart (1995), que afirmam que um vasto conhecimento benfico criatividade, favorecendo as associaes, porm pode tambm dificultar a visualizao de uma forma diferente das questes de domnio.

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Em sua obra O cio criativo, De Masi (2000) afirma que a criatividade hoje um fenmeno social onde tudo fruto de idias coletivas. Ele argumenta que o fluxo de informao to grande que h uma interao contnua de idias e experincias e no mais possvel saber se uma idia nossa ou de outro. Neste contexto, a criatividade ao mesmo tempo uma heteropoiese, o que significa que o indivduo adquire materiais de outros; e uma autopoiese, pois ele reelabora estas informao em sua mente at chegar a uma viso nova.

Criatividade e intelignciaDurante a histria, as pesquisas sobre criatividade foram paralelas s tentativas de investigar a inteligncia humana, sendo os dois termos considerados muitas vezes sinnimos (GARDNER, 1996). Duas teorias surgidas nas ltimas dcadas - a Teoria das Inteligncias Mltiplas e a Teoria Trirquica da Inteligncia Humana - buscam esclarecer a definio de inteligncia e entender sua relao com outras virtudes sociais, como a criatividade. Teoria das Inteligncias Mltiplas

Howard Gardner, psiclogo da Universidade de Harvard, prope sua teoria das inteligncias mltiplas como um desafio viso clssica da inteligncia, que afirma que a inteligncia uma capacidade unitria de raciocnio lgico, do tipo exemplificado por matemticos e cientistas (GARDNER, 1994). Contestando a viso unitria da inteligncia, Gardner defende que existem vrias inteligncias autnomas, funcionando em combinao (GARDNER et al, 1998). Sua justificativa para evidenciar a existncia de inteligncias autnomas so estudos com indivduos que sofreram leses cerebrais e podem apresentar prejuzo em capacidades isoladas, como a fala e com indivduos considerados prodgios que se destacam em reas especficas como matemtica ou msica, mas no apresentam realizaes excepcionais em outras reas. Para Gardner, a inteligncia humana seria um mecanismo neural geneticamente programado para ser ativado por certos tipos de informao (GARDNER, 1994). Assim, cada uma das inteligncias propostas acionada por operaes de processamento de informaes particulares. Em sua teoria inicial, ele destaca sete inteligncias: (1) inteligncia lingstica, (2) inteligncia lgicomatemtica, (3) inteligncia espacial, (4) inteligncia musical, (5) inteligncia corporal cinestsica, (6) inteligncia intrapessoal e (7) inteligncia interpessoal. A inteligncia lingstica provavelmente a competncia humana mais exaustivamente estudada, tanto em psicologia quanto em neuropsicologia. Seus mecanismos incluem a fonologia

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(sons da fala), sintaxe (gramtica), semntica (significado) e pragmtica (uso da linguagem). A inteligncia lingstica um recurso crucial para poetas, jornalistas, publicitrios e advogados. A inteligncia lgico-matemtica a capacidade de raciocnio abstrato, desvendada na obra de Piaget (1975). Dependem da inteligncia lgico-matemtica, por exemplo, os cientistas, engenheiros, arquitetos, matemticos, programadores de computador e analistas financeiros. A inteligncia espacial refere-se capacidade de perceber e transformar informaes visuais ou espaciais, recriando imagens mesmo sem referncia a um estmulo fsico original. Esta inteligncia permite conceber imagens em trs dimenses e mover ou rotacionar essas representaes. Alm da arquitetura e das artes visuais, esta inteligncia importante para gegrafos, cirurgies , engenheiros e navegadores. A inteligncia musical a capacidade de criar, comunicar e compreender significados compostos por sons. As reas cerebrais dedicadas a este processamento so distintas das reas de processamento de linguagem e exigido um treinamento formal muito mais intensivo para se atingir uma inteligncia musical de alto nvel. Os principais componentes de informao incluem tom, ritmo e timbre. A inteligncia musical se manifesta em compositores, instrumentistas, peritos em acstica e tambm muitas vezes em matemticos e profissionais do meio artstico. A inteligncia corporal-cinestsica envolve o uso de todo o corpo ou parte dele para resolver problemas ou criar produtos. Aes centrais associadas a essa inteligncia so o controle de operaes motoras amplas e finas e a capacidade de manipular objetos externos. Atletas, danarinos e artistas em geral exemplificam a inteligncia corporal-cinestsica. A inteligncia intrapessoal depende das discriminaes entre os prprios sentimentos, intenes e motivaes, o que conduz ao auto-conhecimento e ao discernimento para tomar boas decises. Deste modo, essa inteligncia permite que os indivduos conheam melhor as prprias capacidades e percebam a melhor maneira de us-las. Professores e profissionais de reas como psicologia tendem a manifestar estes conhecimentos. A inteligncia interpessoal emprega processos centrais para reconhecer, compreender e fazer distines entre sentimentos e intenes de outras pessoas, agir em funo deles e mold-los. Essa inteligncia amplamente utilizada por profissionais de recursos humanos, terapeutas, pais, professores e lderes religiosos. Gardner (1999a) considera que todas as inteligncias possuem igual prioridade, embora em nossa sociedade, as inteligncias lingstica e lgico-matemtica sejam as mais valorizadas, e por

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isso grande parte de nossa testagem esteja baseada na alta valorizao das capacidades verbais e matemticas. importante enfatizar que os indivduos utilizam combinaes de vrias inteligncias (GARDNER, 1994), mas cada um tem um perfil de inteligncia especfico. Este perfil apresenta uma combinao nica com pontos fortes e fracos em cada habilidade utilizada, o que ajuda a explicar as diferenas individuais (GARDNER et al, 1998). A teoria de Gardner teve grande impacto principalmente no campo da educao, com o surgimento de escolas que buscavam desenvolver a gama de inteligncias das crianas e avali-las a partir de atividades variadas e no apenas de testes escritos (GARDNER et al, 1998). Teoria Trirquica da Inteligncia Humana

Robert Sternberg (1985), professor de Psicologia da Universidade de Yale, acredita que muitas teorias da inteligncia so incompletas, por isso buscou desenvolver uma teoria mais concisa, cognitivamente orientada e bastante abrangente, que se compe de trs subteorias: (1) A subteoria componencial trata do processamento da informao e seus componentes na soluo de problemas. Em suas pesquisas, Sternberg notou que as pessoas com Q.I. (Quociente de Inteligncia) mais elevado gastam mais tempo codificando os termos de um problema do que operando estes termos na busca de uma soluo. (2) A subteoria experiencial considera a inteligncia luz da experincia do indivduo em determinadas tarefas. Segundo Sternberg (1985), as pessoas no utilizam os componentes mentais inteligentemente no mesmo grau para resolver um mesmo problema. (3) A subteoria contextual considera a inteligncia individual em relao cultura e s interaes do indivduo com o meio externo. Essas interaes se baseiam em trs processos mentais centrais: adaptao, seleo e transformao do meio. Seu foco explicar os mecanismos mentais usados pelos indivduos para adaptar-se inteligentemente ao mundo externo (STERNBERG, 1990). As teorias de Gardner e Sternberg tm um ponto em comum importante por concordarem que a inteligncia, assim como a criatividade, no uma capacidade global, mas est situada dentro de contextos especficos de atuao. Sobre esta questo, Gardner (2000) afirma que as pessoas so criativas quando conseguem solucionar problemas, criar produtos ou levantar questes numa rea de forma nova, mas que acaba sendo aceita em um ou mais cenrios culturais. Para Gardner, criatividade e inteligncia diferem em dois principais aspectos. Em primeiro lugar, o indivduo criativo apenas em algumas reas de operao, no criativo em tudo. Em segundo lugar, sua produo criativa, alm de indita, deve ter efeito sobre os domnios relevantes. Essa viso de

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criatividade foi criada pelo psiclogo Mihaly Csikszentmihalyi (1996) e abrange portanto trs elementos distintos: (1) o indivduo criador; (2) o domnio de realizao de sua produo; e (3) o campo, ou seja, o conjunto de indivduos ou instituies que julgam a qualidade da obra. O conceito de campo reafirma a questo de que a criatividade envolve inevitavelmente o julgamento de uma comunidade, o que no de todo confivel ou justo. Para Rego (2000), ainda no existe consenso no mundo cientfico quanto criatividade ser uma habilidade distinta ou um aspecto da inteligncia e diversos pesquisadores buscaram relacionar manifestaes de criatividade e inteligncia elevada (COX, 1926; GIBSON; LIGHT, 1967; ROE, 1952). A maior parte dos estudos concluiu que a inteligncia evidencia-se mais como uma capacidade de organizar informaes, empreender escolhas originais, concentrar ateno e realizar corretamente tarefas, e estas habilidades favorecem o ato criador, mas no so condio suficiente para criatividade elevada (EYSENCK, 1999). Levine (1988) argumenta que a inteligncia pode ser mais ou menos requisitada de acordo com a complexidade da atividade mental realizada. Quando queremos responder uma questo especfica, nosso processamento de pensamento entra em ao vasculhando uma vasta coleo de fatos e regras para buscar a soluo, que imediatamente passa a fazer parte de nosso depsito de conhecimento. Todos os indivduos tm o mesmo mecanismo mental, o que pode diferenciar seu desempenho a velocidade de processamento destes mecanismos. Diversos outros componentes pessoais participam do processamento de idias, como argumenta Zingales (1978) atravs do Diagrama 2. Para Zingales, a pessoa criativa utiliza simultaneamente os componentes abaixo, parte involuntariamente, parte conscientemente, para alcanar resultados criativos.

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Diagrama 2. Componentes do processo de pensamento criativo Fonte: ZINGALES, 1978

At os anos 1970, o objetivo dos pesquisadores era delinear o perfil do indivduo criativo e seus traos de personalidade. Nos ltimos 30 anos, novas pesquisas incluram outros componentes s realizaes criativas, como variveis cognitivas motivao, conhecimento, confiana e variveis ambientais - fatores culturais, scio-econmicos e educacionais (AMABILE, 1983). Alencar e Fleith (2003) afirmam que a partir desta data, os estudos buscaram entender, de forma mais sistemtica, a influncia de fatores sociais, culturais e histricos no desenvolvimento da criatividade. A produo criativa no poderia mais ser atribuda apenas a um conjunto de habilidades e personalidade do criador, mas tambm s influncias de elementos do ambiente onde este indivduo est inserido (HENNESSEY; AMABILE, 1988).

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3.5 CRIATIVIDADE COMO PROCESSOA chegada dos computadores e da mdia digital permitiu aos pesquisadores novas oportunidades para entender as caractersticas multi-dimensionais do processo criativo (EDMOND et al, 2005). Com a chamada Revoluo Cognitiva, que buscava o desenvolvimento de sistemas inteligentes a Inteligncia Artificial os pesquisadores comearam a focalizar menos as pessoas e os produtos do comportamento inteligente e mais os processos que levavam a eles. Esta revoluo concentrava-se em esclarecer como os indivduos usam e organizam informaes, resolvem problemas e aprendem. Estabeleceu-se um paralelismo entre as funes do crebro humano e os conceitos presentes nos computadores, tais como codificao, armazenamento, reparao e memorizao das informaes (VIGNAUX, 1995). Segundo Gardner (1999) h duas principais vertentes de estudo da criatividade: os trabalhos idiogrficos, que focam casos individuais com seus destaques e mtodos peculiares, e os trabalhos nomotticos, que buscam estabelecer leis gerais e padres que se apliquem vasta maioria de casos. As experincias e pesquisas da Inteligncia Artificial foram o primeiro passo para a transformao dos estudos em criatividade: deixou-se de focar em estudos idiogrficos para focar-se no processo de criao. Houve esforos de ir alm do indivduo criativo e sua personalidade para examinar os processos cognitivos que operam nas aes criativas. Gardner (1999) afirma que todo trabalho criativo tem regras e a cincia cognitiva busca identificar estas regras atravs do detalhamento do processamento de informaes para o delineamento e soluo de um problema. Estes estudos buscam entender como funciona o raciocnio e a elaborao de idias no processo criativo, assim como a memria, a evoluo de idias, a criatividade e a experincia. Ao invs de focalizar somente o indivduo (seu crebro, sua personalidade e motivao), o foco foi ampliado para incluir uma anlise da rea em que o indivduo criativo opera e dos procedimentos utilizados para emitir julgamentos de originalidade e qualidade (AKIN; AKIN, 1998; GARDNER, 1999).

Padres do PensamentoNo final dos anos 40 do sculo passado, o psiclogo americano Joy Paul Guilford desenvolveu um modelo do pensamento humano que serviu de fundamento pesquisa moderna sobre criatividade. Sua teoria afirmava que a inteligncia no refletia necessariamente a aptido cognitiva

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de uma pessoa nem sua habilidade na busca de solues criativas. Ele propunha que havia uma distino entre dois padres de pensamento: o convergente e o divergente (KRAFT, 2004). O pensamento convergente visa diretamente a uma nica possibilidade correta de soluo para determinado problema. Segundo Guilford (1968), seria o tipo de habilidade mensurada de maneira relativamente confivel em testes de Q.I. (Quociente de Inteligncia), que se baseiam em exerccios no qual se deve procurar, com auxlio da lgica, uma soluo ortodoxa, considerada como certa ou errada de modo claro. No entanto, pessoas criativas destacam-se sobretudo porque seu intelecto, ao confrontar-se com um problema, supera os esquemas mentais j arraigados e trilha novos caminhos. Guilford definia a criatividade justamente como a capacidade de "encontrar respostas inusitadas, s quais se chega por associaes muito amplas". E aqui entra em cena o pensamento divergente ou lateral, com a finalidade de produzir diversas solues possveis (KRAFT, 2004). Portanto, o pensamento convergente busca um mtodo ou padro conhecido e convencional para soluo de um problema, gerando uma nica soluo correta, enquanto o divergente se move em vrias direes em busca da resposta, o que produz uma gama de solues adequadas. Pensamento criativo, pensamento divergente, pensamento lateral ou ampliativo so alguns dos termos usualmente utilizados para se referir a uma modalidade de pensamento que se caracteriza pela presena e produo de idias, especialmente idias novas e originais (ALENCAR, 1996). Guilford (1968) destaca como traos caractersticos do pensamento criativo: Fluncia: aspecto quantitativo das idias, ou seja, abundncia ou quantidade de idias diferentes sobre um mesmo assunto. Flexibilidade: capacidade de alterar o pensamento ou conceber diferentes categorias de respostas. Originalidade: aspecto qualitativo da idia, ou seja, habilidade em conceber respostas infreqentes ou incomuns. Elaborao: facilidade em formular e acrescentar detalhes a uma idia. Sensibilidade para problemas: capacidade de perceber uma tarefa como tal e ao mesmo tempo identificar as dificuldades associadas a ela. Redefinio: dom de perceber questes conhecidas sob um novo vis. A decomposio de um problema sob aspectos parciais muitas vezes ajuda a v-lo sob uma luz totalmente nova.

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Nota-se uma relao entre essas habilidades, como por exemplo entre fluncia, flexibilidade e originalidade, uma vez que, quanto maior o nmero de respostas, maior a probabilidade de se apresentar respostas que se enquadram em distintas categorias e de se chegar a uma resposta original.

Criatividade e os Hemisfrios CerebraisO modelo de Guilford logo cativou alguns pesquisadores, especialmente neurocientistas, que levantaram a seguinte questo: se o crebro domina duas maneiras to diferentes de pensar, no se deveria supor ento que elas ocorrem em regies distintas? As primeiras descobertas sobre a diferenciao cerebral se deram no final do sculo XIX, atravs dos estudos do mdico francs Paul Broca e do neurofisilogo alemo Carl Wernicke (VERLEE, 1986). A partir de observaes clnicas em pacientes com danos cerebrais, os estudos chegaram concluso que leses em certas zonas do lado esquerdo do crebro produziam transtornos na fala, enquanto que isso no acontecia nas leses da mesma zona do hemisfrio direito. Dessa diferenciao funcional relacionada fala surgiu a teoria da dominncia cerebral. O hemisfrio esquerdo, por estar associado capacidade de falar era considerado superior ao direito, que se acreditava no ter nenhum papel importante no pensamento. Essa teoria se apoiava tambm no fato de que, na maior parte das pessoas, a mo direita, controlada pelo hemisfrio esquerdo, dominante (ABIO, 2001). Estudos realizados a partir de 1975, especialmente o trabalho de Roger Sperry (1973), Nobel de Medicina em 1981, e seus colaboradores do Instituto de Tecnologia da Califrnia, desmentiram a teoria de dominncia e permitiram conhecer melhor o funcionamento do processo cerebral. Sperry descobriu que os hemisfrios esquerdo e direito no processam as mesmas informaes, mas dividem tarefas entre si. Cada um dos hemisfrios contribui de maneira diferente no processo mental e so as trocas eltricas entre eles que permitem um funcionamento intelectual contnuo e integrado. Diferentes partes do crebro so responsveis por diferentes funes e isso se expressa especialmente na diferenciao funcional entre os hemisfrios direito e esquerdo. O hemisfrio esquerdo responsvel pelos processamentos lgicos, analticos e racionais e processa todos os aspectos de comunicao tanto verbal quanto a linguagem escrita e corporal. O direito relacionado s funes intuitivas, imaginativas, instantneas e percepo global dos fenmenos, ocupando-se do material no verbal, como imagens, melodias e percepes espaciais. Deste modo, as solues intuitivas encontradas pelo hemisfrio direito so provadas de forma lgica pelo esquerdo (BOUILLERCE; CARR, 2004; KRAFT, 2004).

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A Teoria do Crebro TotalO fsico Ned Hermann (1989) teve grande interesse na relao entre a criatividade e o crebro humano e trabalhou durante duas dcadas em um modelo que ficou conhecido como Teoria do Crebro Total. Seu objetivo era estudar os comportamentos mais elaborados e suas formas de pensamento e sua teoria divide o crebro em quatro quadrantes com funes diferenciadas, como mostra o Diagrama 3. Suas interaes mostram o sistema de operatividade do crebro e suas implicaes para a criatividade e aprendizagem.Diagrama 3: Quadrantes e Funes do Crebro Total Fonte: BOUILLERCE; CARR, 2004

O MODELO DE NED HERMANN CORTICAL: Conceitual, abstrato Cortical Esquerdo Palavra-chave: COMPREENDERPrecisa de dados quantificveis, de modelos Prope idias comprovadas Sente-se a vontade nos sistemas abstratos e lgicos (matemticos)

Cortical Direito Palavra-chave: PROJETARConceitualiza Imagina, projeta idias Gosta de se arriscar, fantasiar Sente-se vontade em representaes artsticas meio a

Lmbico Esquerdo Palavra-chave: FAZERExamina fatos detalhadamente Preocupa-se em seguir as regras e leis Prope aplicaes precisas

Lmbico Direito Palavra-chave: ADOTARAtento humanas qualidade das relaes

Reage com virulncia Sente-se vontade idias Intuitivo, global ao reformular

LMBICO: Concreto, sensvel Apensar de ser um modelo baseado na fisiologia do crebro, ele muito aplicado metaforicamente para mostrar os diferentes tipos de pensamento humano.

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Fases do processo criativoA criatividade humana se manifesta em diversos domnios, tanto artsticos, como pintura, msica, arquitetura e escrita, quanto cientficos, produzindo inmeras descobertas, solues e invenes que possuem valor e originalidade tcnica (AKIN; AKIN, 1998). Em seu trabalho, Kneller (1978) questiona se existiria um padro no ato de criao independente da rea estudada e qual o processo e as condies necessrias na busca da criao. amplamente aceita a existncia de um processo criativo formado por quatro etapas indispensveis: preparao, incubao, iluminao e verificao. Anteriormente a isso, Kneller afirma que ocorre a fase de apreenso, onde surge o impulso para a resoluo de um problema ou aplicao de uma idia. 1. Preparao: investigao minuciosa do objeto de pesquisa e imerso no assunto, buscando materiais para familiarizar-se com o problema e analisando idias alheias - pontos fortes e fracos, erros e acertos. 2. Incubao: fase mais longa e em parte inconsciente. Conexo entre as idias surgidas na preparao, gestao das solues atravs de recombinao, memorizao, distanciamento, rejeio de hipteses. 3. Iluminao: resoluo do problema pela reestruturao imediata da percepo e dos elementos e integrao das idias (inspirao). 4. Verificao: fase de reviso e anlise crtica. Julgamento e experimentao da soluo criada. Segundo Bouillerce e Carr (2004), podemos descrever a criatividade como uma atividade que utiliza o crebro total, pois corresponde a um processo que utiliza alternadamente as potencialidades dos quatro grupos operacionais descritos por Herrmann (1989), como ilustra o Diagrama 4. O pensamento criativo , acima de tudo, caracterizado pela capacidade de soluo de problemas, o que depende de dois elementos cognitivos: a. o conhecimento de repertrio, ou o conjunto de fatos e princpios organizados, pertencentes a algum domnio; b. o conhecimento sistemtico, aplicado para gerar solues aos problemas novos, ou seja, as heursticas, regras e operaes aplicadas na gerao de solues aos problemas, chamada processo criativo.

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Diagrama 4: Fases do Processo Criativo e Quadrantes do Crebro Total Fonte: BOUILLERCE; CARR, 2004

HEMISFRIO ESQUERDO (1) preparaoDefinio da situao Anlise dos fatos Coleta de informaes

HEMISFRIO DIREITO (3) iluminaoEureca Visualizao de idias Conceitualizao

(4) verificaoExame detalhado da idia em relao ao tema posposto Organizao dos fatos Planificao

(2) incubaoMedio, crescimento Percepo sensorial Relao interpessoal

O conhecimento de repertrio reunido durante o processo que conduz ao aprendizado, atravs do pensamento convergente. J o conhecimento sistemtico est ligado s habilidades cognitivas descritas acima e ocorre por meio do pensamento divergente. Os estudos sobre criatividade consideram que ela depende do conhecimento e do desenvolvimento de habilidades que conduzam a pensar diferente e perceber o diferente (PETRECHE et al, 2005). Segundo Clayton (2006), as novas idias surgem a partir da combinao do conhecimento, produtos e processos conhecidos e podem surgir de trs maneiras distintas: acidentalmente, deliberadamente ou continuamente. Se no forem usadas tcnicas especiais para estimular a criatividade, as solues criativas surgem de modo acidental, quando se enxerga o problema de um modo novo ou se aplica a lgica. Entretanto este processo pode tomar muito tempo at que se alcance um resultado satisfatrio. Atravs do uso de tcnicas de apoio ao processo criativo, pode-se deliberadamente principiar a reflexo sobre um problema e desenvolver grande quantidade de novas idias em um processo mais rpido e eficaz. Entretanto muitas pessoas aplicam mtodos que estimulam a criatividade inconscientemente, pois no foram formalmente treinadas a utiliz-los. Atravs de um treinamento formal nas tcnicas de auxlio criao, possvel desenvolver um contnuo processo de investigao, questionamento e anlise que leva a solues mais criativas e melhores. Ao se aplicar conscientemente estas tcnicas, pode-se tambm maximizar as chances de solues criativas acidentais e deliberadas. A apreenso destes mtodos conduz a um constante

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aperfeioamento e a uma flexibilidade mental que facilita a resoluo de problemas (CLAYTON, 2006). Entretanto v-se que a criatividade na soluo de problemas no encorajada pela maioria das organizaes e indivduos. Higgins (1994) afirma que os indivduos no so encorajados a serem criativos na vida familiar, escolar ou profissional. Poucas pessoas conhecem as tcnicas de estmulo criatividade que podem ser aplicadas na soluo de problemas ou desenvolvem habilidades particulares para soluo criativa de problemas. A prxima seo descreve as bases da soluo criativa de problemas e sua caracterizao e aplicao em arquitetura, especialmente no ensino.

3.6 SOLUO CRIATIVA DE PROBLEMASHiggins (1994) afirma que a soluo de problemas parte integral da vida e dos negcios. Quando uma indstria produz um novo produto ou servio ou quando o membro de uma organizao pensa numa nova maneira de reduzir custos ou determinar como a organizao pode funcionar melhor, a soluo de problemas est atuando. Porm, h at alguns anos, a soluo de problemas era definida e estudada como um esforo estritamente racional, deixando de lado um fator vital do processo: a criatividade. A soluo criativa de problemas se caracteriza pelo esforo de qualquer grupo ou indivduo em aplicar criatividade na tarefa de resolver um problema. A expresso soluo criativa de problemas (ou CPS, do ingls creative problem solving) surgiu a partir do trabalho realizado por Alex Osborn (1957) nos anos 50 do sculo XX, um publicitrio que organizou idias-base do processo de soluo criativa de problemas e criou mtodos e tcnicas aplicveis pelas pessoas em geral, como o brainstorming. Osborn realizou um trabalho pioneiro de promoo da criatividade na busca de novas solues em situaes variadas profissionais ou pessoais e quebrou o paradigma de que apenas alguns poucos gnios eram capazes de produzir idias criativas (HUGHES, 1998). As formulaes originais de Osborn para uso e promoo da criatividade, organizadas em um modelo estruturado de soluo de problemas, serviram como blocos fundadores de dcadas de pesquisa e desenvolvimento em reas como administrao, matemtica e engenharia. A palavra problema em CPS no deve ser vista negativamente, como um obstculo, algo deficiente ou errado, que precisa ser corrigido. Problemas so descritos como oportunidades e desafios para mudanas de sucesso e aes construtivas. Os desafios que as pessoas encaram todo dia representam muitas

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oportunidades para crescimento e um problema pode ser visto como uma situao ambgua que necessita de novas opes e planejamento para se obter uma soluo de sucesso (TREFFINGER et al, 1994). As pesquisas na rea da soluo criativa de problemas continuou a ser desenvolvida entre os anos 1970 e 1980, expandindo-se em vrios programas acadmicos e organizaes, como o Creative Education Fundation, Creative Problem Seeking Group, Center for Creative Learning, e conferncias internacionais, como a International Creativity Network (ISAKSEN, 1993). Baseada na contribuio de Osborn, cuja produo considerada a 1 gerao de CPS, a formulao original do processo de soluo de problemas passou por diversas revises, refinamentos e expanses. Hoje a soluo criativa de problemas vista como um processo flexvel, onde muitas ferramentas esto disposio, e no como uma sucesso de etapas fixas ou tcnicas que precisam ser aplicadas numa determinada seqncia. CPS se baseia atualmente na avaliao de informaes, situaes, resultados e mtodos disponveis para serem usados quando necessrio (TREFFINGER et al, 1994). A Figura 3 apresenta o modelo atual da soluo criativa de problemas, que engloba quatro principais componentes: Entender o problema, Gerar idias, Preparar a ao e Planejar a abordagem. O princpio elementar da soluo criativa de problemas alternar fases convergentes e divergentes de pensamento. Dentro destas fases ocorrem oito principais etapas: Analisar a situao Reconhecer um problema Identificar o problema Fazer suposies Gerar alternativas Escolher entre as alternativas Implementar a soluo Controlar

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Figura 3. Componentes do modelo de soluo criativa de problemas Fonte: TREFFINGER et al, 2003.

Cada etapa comea com atividades voltadas a estimular o pensamento divergente e finaliza com atividades convergentes, que fazem a transio para a prxima etapa. O objetivo da fase divergente produzir a maior quantidade de conexes possveis usando mtodos que estimulam a produo de idias, A fase convergente detalha e traduz estas conexes em planos prticos que podem ser implementados (HUGHES, 1998; VAN DER LUGT, 2000). Lawson (1997) afirma que tanto o pensamento convergente quanto o divergente so necessrios a cientistas e artistas. Porm os projetistas de arquitetura, engenharia e desenho industrial, entre outros, so provavelmente os que precisam de ambas habilidades em uma proporo mais equilibrada: os projetistas precisam lidar com problemas externos impostos, satisfazer as necessidades de outros e criar objetos bonitos. O processo criativo em arquitetura segue as mesmas fases da criatividade e Lawson destaca que h necessidade de grande esforo para resolver as demandas muitas vezes incompatveis e conflituosas dos projetos arquitetnicos, como ser debatido na prxima seo.

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Nickerson (1999) argumenta que a relao entre criatividade e soluo de problemas depende de como se define soluo de problemas. Se a definio de soluo de problemas for abrangente o suficiente para incluir solues algortmicas ou aplicaes de mtodos e procedimentos memorizados, ento alguns casos no sero considerados criativos. Entretanto, se for considerada a soluo de problemas como casos que exigem pensamento original, ento por definio, a resoluo de problemas ser criativa. De acordo com a viso atual, Nickerson afirma que a criatividade no considerada parte da resoluo de problemas quando um perito aplica tcnicas e algoritmos que j lhe so familiares. Porm o uso do pensamento criativo extremamente necessrio quando o perito se confronta com problemas novos, nos quais as tcnicas conhecidas no se aplicam. Ainda Feldhusen e Treffinger (1986) acreditam que pensamento criativo e soluo de problemas se combinam em um s conceito complexo, pois defendem que os traos criativos, como fluncia, flexibilidade e originalidade, so tambm componentes indispensveis ao processo de soluo de problemas.

3.7 SOLUO CRIATIVA DE PROBLEMAS EM ARQUITETURAOs problemas e o processo criativo em arquiteturaO processo projetivo total inclui duas estratgias: anlise e sntese. Na anlise, os componentes do projeto so separados e identificados. Na sntese, os componentes se juntam para formar uma soluo de projeto coerente. Voc pode no perceber o processo de projeto arquitetnico em termos de anlise e sntese. Voc pode considerlo como um esforo criativo. Mas o esforo criativo inclui estgios similares: anlise se torna preparao e sntese se torna iluminao. O processo projetivo total realmente um processo criativo (PEA; PARSHALL, 2001). A afirmao de Pea e Parshall (2001) sintetiza o fato de que o processo de projeto em arquitetura segue as mesmas quatro etapas do processo criativo definidas por Kneller (1978): a preparao, a incubao, a iluminao/soluo e a verificao. Estas etapas trabalham ora o pensamento convergente, ora o divergente, que se complementam na busca de solues. Lang (1974) afirma que pode-se considerar o processo de projeto com um conjunto de atividades intelectuais bsicas, organizadas em fases de caractersticas e resultados distintos. Na prtica, algumas atividades podem ser realizadas atravs da intuio, algumas de forma consciente e outras a partir de padres ou normas. Roozenburg e Eekels (1991) apontam que o ciclo

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de projeto tem grande correspondncia com o ciclo da soluo criativa de problemas (CPS) e estabeleceram quatro fases que se fundem gradualmente uma na outra: 1. Desenvolvimento de um registro dos problemas e objetivos do projeto; 2. Formulao de princpios espaciais e fsicos bsicos; 3. Gerao de solues diversificadas; 4. Anlise e seleo de solues com ajuda de critrios explcitos. Lawson (1997) argumenta que h diferenas entre o processo de soluo de problema em arquitetura e em outras reas, principalmente nas cincias exatas. Um experimento comparativo com alunos das duas reas indicou que estudantes de cincias aplicam com mais freqncia processos focados no problema (problem-focusing processes), enquanto estudantes de arquitetura se favorecem de processos focados na soluo (solution-focused processes). Isto se explica porque os problemas de projeto em arquitetura so muito complexos e as tcnicas consomem muito tempo para estrutur-los e chegar soluo. Para a maioria dos arquitetos e projetistas, um dos meios mais eficientes de se alcanar um resultado modificar solues existentes ao invs de comear construlas do zero (BERTEL et al, 2004, LAWSON, 2005). GOUVEIA (1998) argumenta que: Na realidade enquanto a metodologia clssica de projeto parte da anlise para a sntese (das necessidades concepo do programa e formulao espacial), o arquiteto, na prtica, trabalha de maneira inversa: de uma sntese figurativa preliminar num primeiro momento, passando anlise programtica e tcnica e retornando ento novamente sntese na qual todos os dados preliminares se encontram articulados em uma soluo espacial. Os processos focados na soluo se mostram mais efetivos, especialmente no ensino, por envolverem a identificao da soluo baseada na manipulao da experincia anterior armazenada. A soluo alcanada pelo exame dos antecedentes, avaliando critrios e foras impactantes no projeto. Memria de prottipos e projetos so muito teis neste processo, alm de mtodos de estmulo criatividade que podem auxiliar os estudantes a manipular este repertrio (VAN DER VOORDT; VAN WEGEN, 2005). A quantidade de variveis envolvidas no processo de projeto em arquitetura imensa e abrange desde questes tcnicas, como fatores econmicos, funcionais e tecnolgicos, at questes estticas, culturais e sociais, entre outras. Com os avanos tecnolgicos e as mudanas sociais e econmicas ocorridas nos ltimos anos, a complexidade e as exigncias dos projetos vm

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aumentando, assim como a competio e a necessidade de produzir com eficincia e qualidade. Em arquitetura, o processo de criao no possui mtodos rgidos ou universais para soluo de problemas e diversas ferramentas, tcnicas e formas de representao so utilizadas durante a concepo do projeto. Pode-se afirmar que o campo projetivo arquitetnico situa-se numa rea intermediria entre cincia e arte, tendo que responder a questes no perfeitamente definidas e permitindo mltiplas abordagens (KOWALTOWSKI et al, 2006b). O processo de projeto em arquitetura dificultado pela ambigidade, pela indefinio do problema em si e muitas vezes pela falta de informaes, requisitos ou parmetros norteadores. So muitas as variveis (sociais, culturais, legais, funcionais, conforto ambiental, estticas, econmicas, psicolgicas, tecnolgicas, entre outras) e escalas (regionais, urbanas, do edifcio ou do objeto) envolvidas em sua concepo. Em estudo pioneiro sobre os problemas em arquitetura, Rittel (1966) os descreve como sendo mal-definidos (ill-defined ou wicked problems), ou seja, a definio dos problemas preliminar e incompleta, no existindo soluo correta ou errada para a questo. Deste modo, a soluo de problemas em arquitetura se caracteriza por um processo aberto: no h uma soluo definitiva e certa a se alcanar; muitas solues distintas so possveis; no existe um algoritmo de gerao de solues; e no h modo formal de saber quando parar a busca por solues (LAWSON, 1997; BERTEL et al, 2004; HARFIELD, 2007). Rittel (1966) afirma que a natureza dos problemas mal-definidos em arquitetura exige uma permanente retro-alimentao do ambiente do problema, com constante troca de informaes. Principalmente no estgio inicial de projeto, muito tempo e esforo so gastos para definir e redefinir o problema e esclarecer o que necessrio para o desenvolvimento do projeto (ROWE, 1995). Assim diversas pesquisas focaram-se nessas etapas iniciais, na tentativa de dar suporte tomada de deciso, seja buscando criar uma teoria de projeto, seja sistematizando o projeto atravs de mtodos e programas de suporte criao (MOREIRA, 2007; PETRECHE et al, 2005). Porm o processo de projeto em arquitetura no pode ser desenvolvido apenas atravs de mtodos de carter formal e objetivo, pois depende tambm de decises criativas e intuitivas (JOHANNES, 2003). Lawson (2005), analisando o papel do computador como auxiliador do processo criativo, afirma que o processo projetivo em arquitetura no um processo de sub-otimizao, que pode ser convertido em procedimentos. Por envolverem diversas variveis, os problemas arquitetnicos se tornam difceis de serem descritos formalmente ou sub-sistematizados. Como exemplo, ele cita o projeto de algo simples, como uma janela. A janela afeta significativamente a quantidade de calor, luz, som e ventilao, assim como a sensao de conforto, brilho e acstica e fatores psicolgicos como vista, ateno, relaxamento e distrao. Mesmo se fosse possvel otimizar cada um destes fatores

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separadamente, haveria diferentes tamanhos, orientaes e localizaes das aberturas e seria impossvel trabalhar com todos estes fatores paralelamente, sem pensar no todo e na composio do conjunto. Para Lawson, o modo como problema e soluo se misturam em arquitetura faz com que o processo de projeto seja to complexo e desafiador. Recentemente os estudos de 35 anos atrs de Rittel e Weber (1973) sobre problemas maldefinidos em projeto foram reavaliados por Coyne (2005). Coyne afirma que alm da ambigidade dos problemas, o processo de projeto pouco explicitado em termos de objetivos, preceitos e regras seguidas pelos projetistas. Esta questo levou ao surgimento, nos anos 1960, do Movimento dos Mtodos (Design Methods Movement), uma busca de mtodos analticos que tornassem mais explcitos os processos de julgamentos durante o projeto. O movimento pregava o fim da arbitrariedade nas solues, que deveriam ter embasamento lgico. Entretanto esta linha de pensamento no vingou, tendo sido na dcada de 80 substituda pelas pesquisas em design thinking, mais preocupadas com a compreenso dos processos cognitivos envolvidos no projeto (CELANI, 2003). De toda forma, alguns preceitos pregados pelo Movimento dos Mtodos so vlidos at hoje, como a necessidade de estruturao dos problemas, a importncia do programa e a anlise das solues projetuais. Discute-se atualmente que o processo de pensamento extremamente influenciado pela imposio do arquiteto sobre o problema. Harfield (2007), em um estudo sobre o processo de soluo de problemas em arquitetura, concluiu que a viso individual do arquiteto sobre o problema, assim como suas preferncias e opinies, que constroem o problema e limitam seu conjunto de solues. Por esta razo, a formao profissional do arquiteto deve prover contato com teorias, referncias, precedentes e experincia que o habilitem a compreender e desenvolver seu prprio mtodo projetivo. Para Kowaltowski et al (2000) existem muitas definies de projeto, mas essencialmente, projetar uma atividade mental, com tcnicas ou processos que apiam o seu desenvolvimento e ferramentas para a comunicao de solues. Jones (1970) define projeto como a introduo de modificaes em objetos feitos pelo homem, enquanto Asimow (1962) descreve o ato de projetar como a tomada de deciso num ambiente de incertezas e com alta penalidade por erros cometidos. A definio mais prxima do processo de projetar arquitetura a simulao de idias a serem realizadas tantas vezes quantas forem necessrias para ganhar confiana no resultado final (BOOKER, 1964 apud KOWALTOWSKI et al, 2000). Projetar uma atividade de induo e deduo, onde a teoria essencialmente necessita estar atrelada ao problema projetual em questo. Schn

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(1988) e Brawn (2003) descrevem o ato de projetar como uma conversa reflexiva com a situao proposta, que se utiliza do processo de pensamento e expresso (por desenhos, modelos ou memoriais descritivos) para tomar decises no processo. H autores que afirmam que o projeto o resultado do desenvolvimento de uma idia, ou seja, seu produto final, o que em arquitetura equivaleria s plantas, cortes, elevaes e demais desenhos e documentos necessrios para a construo de um edifcio. Porm o projeto um processo dinmico e contnuo em que, mesmo aps iniciada a obra, podem ocorrer alteraes, complementaes e correes. Este processo cclico e pode ser infinito, sob o aspecto de que pode ser sempre prolongado, reavaliado e aperfeioado. Na explorao dos processos de resoluo criativa de problemas em projeto, Rowe (1995) descreve o modelo de etapas proposto por Morris Asimow (Figura 4). Asimow definiu duas estruturas no processo de projeto: uma estrutura vertical envolvendo as etapas das atividades e uma estrutura horizontal com as fases para a tomada de deciso, comuns a todas as atividades. As atividades na estrutura vertical foram categorizadas cronologicamente, sendo: definio do programa de necessidades, estudo de viabilidade, estudo preliminar, anteprojeto, projeto executivo e finalmente o produto final, ou seja, o edifcio. No geral, as seqncias de atividades avanam do abstrato para o mais concreto ao fim do processo. Inmeros loopings so feitos de modo a realimentar o sistema com informaes novas e transpor dificuldades. Na estrutura horizontal, o ciclo se inicia com a anlise, seguida por sntese, avaliao e comunicao, o que se repete em cada etapa realizada. Durante o processo de projeto, ambos os ciclos, tanto horizontal como vertical, so realizados repetidamente at se alcanar a soluo final.

Figura 4. Esquema do processo de projeto de acordo com Asimow (1962) Fonte: ROWE, 1995.

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Deste modo, as informaes do projeto recebidas pelo projetista, passam por uma anlise, so sintetizadas e retornam na comunicao de idias, que so novamente avaliadas. A qualidade do projeto depende da habilidade do projetista em receber, organizar, analisar, sintetizar, relacionar e avaliar as informaes, estabelecendo conexes e convertendo-as em uma soluo projetual. Rittel (1966) recomenda que os estudos de projeto devem se concentrar em trs questes bsicas: desenvolvimento de teorias para compreender melhor o pensamento do projetista durante o processo; desenvolvimento de metodologias de pesquisa das relaes entre planos em funo de objetivos; e busca por mtodos e ferramentas novas para suporte e auxlio dos arquitetos durante o projeto.

O projetista e seus mtodosMuitas pessoas descrevem o projetar como uma das atividades mais criativas da humanidade. Precisamos nos afastar da noo somtica do salto criativo dentro do desconhecido. Pensadores criativos caracteristicamente trabalham muito duro (LAWSON, 1997). Jones (1970) apresenta trs diferentes vises sobre os projetistas e seus mtodos (Figura 5). Se o projetista visto como uma caixa preta, que gera solues criativas mas no capaz de explicar como isso acontece, os mtodos sero focados em facilitar e apoiar o processo criativo nebuloso. Se o processo criativo do projetista um caixa transparente, onde cada etapa descrita e explcita, os mtodos tendem a ser mais sistemticos e focar a decomposio dos problemas em subproblemas. A terceira viso assume o projetista como um sistema organizado, com habilidades para buscar idias e solues, combinada avaliao de seus prprios processos. Esta viso a mais aplicada atualmente e seus mtodos do suporte ao pensamento abstrato e s reflexes e estratgias do projetista.

Caixa preta

Caixa transparente Sistema organizado Figura 5. Os projetistas segundo Jones (1970)

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fundamental entender os padres de pensamento dos projetistas, dentre os quais se destacam: raciocnio, memria, evoluo de idias, criatividade e experincia. Desse modo possvel investigar formas de auxiliar o processo, facilitando o armazenamento e a percepo das relaes existentes entre as informaes que fazem parte da concepo do projeto. Diversas pesquisas tm sido conduzidas com o objetivo de esclarecer os processos de raciocnio dos projetistas. Dentre as variadas maneiras particulares de se projetar, alguns procedimentos comuns de tratamento de informaes puderam ser identificados. Recursos de coleta e anlise de dados, como entrevistas com profissionais de destaque, observaes, estudos de caso e comparao da atuao de profissionais experientes e novatos, so ferramentas usadas para buscar compreender a forma de utilizao da criatividade e do conhecimento na resoluo de um problema de projeto (PETRECHE et al, 2005). Segundo Cross (1999), as pessoas so projetistas (considerando que utilizam o raciocnio e a criatividade para solucionar tarefas do dia a dia) mas algumas pessoas so muito bons projetistas (no sentido de encontrarem solues melhores e mais rapidamente para o problema apresentado). O autor considera que a anlise dos mecanismos cognitivos de bons profissionais o caminho para aprender como essas pessoas pensam. As informaes iniciais recebidas pelo arquiteto precisam ser processadas e ordenadas, formando conceitos, princpios e referncias. Na construo semntica, idias so ns e as relaes entre elas so ligaes. O Diagrama 5 apresenta alguns exemplos de conceitos e relaes associados ao processo de projeto em arquitetura (SEGERS et al, 2001). Durante o processo projetivo, estas relaes so exploradas, tanto mentalmente quanto graficamente, em desenhos e esquemas. O projetista deve ter habilidade para selecionar os conceitos e relaes com que ir trabalhar no projeto. Ao trabalhar estas ligaes de forma grfica, com textos, desenhos e maquetes, ele pode ordenar informaes e construir idias (SERGERS et al, 2001).

Experincia e repertrioSegundo Gardner (1999), os indivduos no so criativos no geral, mas em seus campos de conhecimento especfico. Sternberg e Lubart (1995) tambm afirmam que o conhecimento especfico na rea de atuao de fundamental relevncia para as realizaes criativas. necessria especializao em uma determinada rea para poder resolver uma tarefa complexa, que exige lidar adequadamente com um conjunto de conhecimento, recursos e instrumentos especficos ao tema. A capacidade de manejar uma tarefa complexa um produto conjunto do conhecimento e dos recursos

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presentes num indivduo, em outras pessoas, em elementos do ambiente e em vrios investimentos tecnolgicos.Diagrama 5. Conceitos e Ligaes no Processo Cognitivo em Projeto Fonte: SEGERS et.al, 2001

PROCESOS COGNITIVOSNecessidades Conceitos Idias e Noes Contexto Atributos Solues Semelhante Unificado Complementar Interseccionado Restrito Distante

REPRESENTAO GRFICAEsboos Palavras Figuras e Imagens Modelos Textos Setas Crculos Contorno Proximidade Referncia Diagrama

Ns

Ligaes

Nos estudos de Sternberg (1985) sobre a criatividade e a inteligncia, ele argumenta que uma mesma tarefa pode ser mais ou menos nova para uma pessoa ou numa cultura, e por isso o grau em que um problema requer inteligncia vai variar de pessoa para pessoa e de cultura para cultura. A capacidade de elaborar tarefas e situaes novas e a capacidade de automatizar o processamento de informaes interagem: quanto mais a pessoa capaz de automatizar o processamento de informaes, mais recursos mentais pode dedicar ao processamento da novidade. (STERNBERG, 1985) A experincia em uma tarefa ou problema inicia-se no totalmente novo at atingir um grau de completa automatizao. Estudos realizados por Ericsson e Smith (1991) visaram comparar o desempenho de peritos e novatos no processo de soluo de problemas de um conjunto comum de tarefas. Os padres de pensamento apresentados na resoluo da tarefa diferia muito entre os dois grupos. Os peritos possuam uma memria maior e mais bem organizada das informaes de seu domnio e eram mais acurados ao executarem as tarefas, visto que os padres de informaes armazenadas permitem a eles operar com maior autonomia. Os principiantes utilizavam mtodos heursticos ou frgeis, enquanto os peritos utilizavam mtodos mais slidos, ricos em conhecimento, o que resultava em melhor representao dos problemas com diagramas e modelos mentais. Segundo Gardner (1998) experincia definida pelo tempo em uma tarefa e prtica e pelo esforo para se aumentar a prpria capacidade ao longo do tempo. A criatividade exige tempo e

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esforo e se manifesta na histria como resultado de muito trabalho (BOUILLERCE; CARR, 2004). A principal qualidade que destaca os peritos o pensamento flexvel, ou seja, a aplicao de diferentes estratgias de soluo de problemas, dependendo da tarefa e do grau de experincia nela. Esse processo de pensamento pode ser melhor apreendido atravs do uso de mtodos especficos de estmulo ao pensamento criativo. Na literatura, encontramos diversos mtodos de estmulo criatividade que podem ser aplicados a cada uma destas etapas, como veremos no Captulo 4.

3.8 ENSINO PARA A CRIATIVIDADEOs desafios do novo mercado de trabalho, cada vez mais competitivo, exigem profissionais flexveis e qualificados, com habilidade para adaptar-se continuamente s mudanas em ritmo cada vez mais acelerado. Richard Florida (2003) observa que a nova economia exige empresas criativas, onde os Trs Ts talento, tecnologia e tolerncia so valorizados. Isso significa profissionais talentosos, investimentos em tecnologia e abertura diversidade de idias, culturas e pessoas. Este ambiente pode ser criado tambm no ensino superior e diversos autores, como Alencar (2002), Sternberg (1991) e Iashin-Shaw (1994), tm chamado a ateno para importncia de se estimular o potencial criador dos estudantes atravs de prticas efetivas. Horng et al (2005) afirma que muitos pases tm considerado a criatividade um conceito chave nas novas estratgias e currculos de ensino. H um reconhecimento da necessidade de capacitar o aluno soluo de problemas e ao pensamento criativo, entretanto muitas falhas tm sido constatadas no que diz respeito promoo da criatividade nos vrios nveis de ensino (ALENCAR; FLEITH, 2004). Diversos autores nos Estados Unidos, Canad e Alemanha observam que a educao universitria no encoraja o pensamento criativo e independente (PAULOVICH, 1993 apud ALENCAR; FLEITH 2004); inibe a expresso da criatividade e pune os alunos mais criativos (TOLLIVER, 1985 apud ALENCAR; FLEITH 2004) e que a maioria dos graduados formados pelas escolas e universidades so treinados simplesmente para aplicar o j conhecido de maneira convencional (CROPLEY, 1997). Os processos educacionais recompensam apenas aqueles que chegam resposta correta e no aqueles que experimentam novas abordagens e vises e exploram caminhos desconhecidos (HUGHES, 2003). No Brasil, segundo Alencar e Fleith (2004), vrios autores (CASTANHO, 2000; ALENCAR, 1997; ROSAS, 1985) observam que, com exceo das escolas e/ou departamentos de artes, h pouco espao para o desenvolvimento da criatividade nos cursos universitrios. E que um ambiente que no apie a criatividade pode inibir ou reprimir as habilidades criativas do indivduo, influenciando

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a percepo de suas prprias habilidades criativas (ALENCAR, 2002). Alencar (1990) ainda observa que existem muitas idias errneas a respeito da criatividade, como a de que criatividade seria uma caracterstica inata e portanto no poderia ser aprendida ou adquirida. Muitos questionamentos e propostas tm sido feitos no sentido de tornar o aluno consciente de suas potencialidades e talentos. A abertura na educao deve concentrar esforos no sentido de uma preparao de indivduos para que sejam capazes de resolver problemas que hoje no temos como prever (ALENCAR, 1996). Os profissionais do futuro devem ser capazes de lidar com o desconhecido e dispostos busca permanente de novas solues, o que exige uma nova abordagem de ensino com novas metodologias que formem estes efetivos solucionadores de problemas. Alencar e Fleith (2004) realizaram uma pesquisa junto a alunos universitrios buscando investigar quais seriam os principais fatores que favorecem a criatividade no ensino superior. Na opinio dos estudantes, as prticas docentes relevantes para o desenvolvimento da criatividade incluem fatores de incentivo como: estimular os alunos anlise de diferentes aspectos de um problema; levar o aluno a perceber e conhecer pontos de vista divergentes sobre o mesmo problema ou tema de estudo e fazer perguntas desafiadoras que motivem os estudantes a pensar e raciocinar. Um trabalho complementar viso de Alencar e Fleith foi realizado po