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Trabalho de Conclusão de Curso de Arquitetura e Urbanismo na Unileste. Aluna: Bárbara Castro Orientadora: Carla PaolielloTRANSCRIPT
CENTRO UNIVERSITÁRIO DO LESTE DE MINAS GERAIS
UNILESTE
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
BÁRBARA ARAÚJO DE CASTRO
ARQUITETURA COMO EXTENSÃO DO CORPO
Timóteo | 2013
BÁRBARA ARAÚJO DE CASTRO
ARQUITETURA COMO EXTENSÃO DO CORPO
Trabalho de Conclusão de Curso de Arquitetura
e Urbanismo do Centro Universitário do Leste
de Minas Gerais como requisito parcial para
obtenção do título Arquiteta e Urbanista.
Orientadora: Carla Paoliello
Timóteo | 2013
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, pelo apoio e
incentivo. Ao meu irmão, Álvaro Castro, pelas
longas conversas no telefone, que
proporcionaram o desenvolvimento de ideias. Ao
meu namorado, Vinicius Rodriguez, pelo
incentivo, os livros, compreensão e paciência.
A todos os meus professores, em especial a
Carla Paoliello pelas orientações, paciência,
calma, dedicação e por me mostrar o caminho,
sempre que me sentia fora dele. Amanda Machado
e Danielly Garcia, pelas orientações ao longo
do curso, troca de informação e incentivo que
foram de grande importância no processo de
formação.
Agradeço aos meus colegas do curso e em
especial a Fernanda Fontes, Freddy Cosme,
Hofner Moraes, José Enésio Pinheiro, Paulo
Mello, Luis Azevedo, Silvana Assunção, Luana
Kelem e Samira Marques, pelas tardes e
madrugadas produtivas, pelas conversas,
opiniões, sugestões, críticas e incentivo.
“Os homens não apenas discriminam padrões
geométricos na natureza e criam espaços
abstratos na mente, como também procuram
materializar seus sentimentos, imagens e
pensamentos.”
Yi-Fu Tuan
RESUMO
A obra a seguir se refere à pesquisa da
complexa relação entre corpo e espaço,
abordando conceitos históricos dessa relação.
Questiona-se e busca-se compreender o corpo
contemporâneo, sua forma de perceber o espaço,
a partir do uso de elementos sensoriais e da
semiótica, relacionando-o com a memória e
apresentando registros de como esse corpo
compreende o espaço por meio do movimento.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................... 1
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ........................................................... 13
DESENVOLVIMENTO ................................................................. 43
CONCLUSÃO ....................................................................... 79
BIBLIOGRAFIA .................................................................... 81
8
INTRODUÇÃO
Durante o curso de Arquitetura e Urbanismo do
Unileste, os alunos são instigados a observar
mais e a se sensibilizar para as questões do
cotidiano, a fim de despertá-los para o local
em que vivem e ser mais cientes de como o
espaço arquitetônico é capaz de influenciar o
homem. Abre-se o olhar, percebe-se que as
atividades acontecem em um espaço real que é
feito para pessoas, cada uma com sua percepção
e visão de mundo. Cada pessoa sente e é
influenciada pelo espaço, mas de forma
individual; cada um tende a expressar sua
identidade no lugar onde vive, influenciando e
sendo influenciada por ele. Ao desenvolver e
executar um projeto arquitetônico tem-se
consciência de que não se entrega algo pronto,
leva-se em conta que o usuário intervém no
espaço, insere sua identidade. É preciso
lembrar que as pessoas estão em constante
mutação, interferindo nos ambientes e
tornando-os vivos.
Discutir a relação entre corpo e espaço
arquitetônico e como este demonstra a forte
identidade de seu usuário é ponto de interesse
desta pesquisa. Qual é essa relação? Como ela
acontece? Existe uma fronteira que separa
estes dois elementos? Eram alguns dos
questionamentos feitos inicialmente. A questão
final a ser discutida aqui é “poderia o espaço
arquitetônico ser uma extensão do corpo?”.
É importante esclarecer que ao referir-se ao
corpo, fala-se de seus aspectos físicos e
biológicos, ciente de que este constitui um
indivíduo, dotado de inteligência, cultura,
conceitos e percepções individuais a respeito
do espaço que o cerca. Porém, será tratado
aqui, o corpo como elemento que ocupa o
espaço, que reage e utiliza seus mecanismos de
percepção - visão, audição, tato, olfato,
paladar e propriocepção – para se relacionar
9
com o espaço arquitetônico. Este último é o
espaço criado pelo homem e é o que possibilita
o acontecimento das atividades humanas em seu
interior.
De acordo com o dicionário Aurélio, corpo é “a
substância física de cada homem ou animal;
pessoa, indivíduo” e espaço arquitetônico é
“aquele que é gerado e limitado pelos
elementos arquitetônicos, e no qual
manifestam, para quem nele demora, as
diferentes dimensões da forma arquitetônica
(visual, táctil, auditiva, odorífica)”.
Outra definição de arquitetura é dada por
Silva (1994) e segundo este autor, arquitetura
é
a manifestação cultural, materializada na
modificação intencional do ambiente, com o
propósito de adequá-lo ao uso humano, através
da produção de formas concretas habitáveis
imóveis, caracterizadas por uma organização
instrumental, uma configuração construtiva e
um conteúdo estético.(SILVA; 1994, p.100)
Outro teórico que apresenta uma importante
definição de arquitetura é Zevi (1996)
(...) Que o espaço, o vazio, seja
protagonista da arquitetura, se pensarmos
bem, é, no fundo, também natural, porque a
arquitetura não é apenas arte, nem só imagem
de vida histórica ou vivida por nós e pelos
outros; é também e sobretudo, o ambiente, a
cena onde a nossa vida se desenvolve. (ZEVI;
1996,p.28)
Pode-se entender então, que o espaço
arquitetônico é concebido pelo homem, por meio
da manipulação de elementos, criando formas
concretas com o intuito de abrigar-se. Mas
este pode ir além e expressar a identidade do
usuário, sendo referência sociocultural e
também ter a função de ordenar a partir de um
ponto no universo circundante como apresentado
por Silva (1994, p.91).
Sobre as alterações do espaço, destaca-se a
importância da percepção de conforto,
associada a técnicas construtivas. Sabe-se que
10
é a partir do que incomoda o homem que este
vai gerar mudanças no ambiente de maneira a
torná-lo mais agradável.
...a natureza é tão desconfortável. A grama é
áspera, irregular e úmida, e cheia de
horripilantes insetos pretos. [...] Se a
natureza fosse confortável, o gênero humano
jamais teria inventado a arquitetura, e eu
prefiro as casas em vez do ar livre. Numa
casa nós todos sentimos as proporções
apropriadas. (WILDE; 1963. p.909)
Silva (1994) esclarece a importância do
conforto de maneira exemplar colocando outros
aspectos a serem analisados
O guarda-sol na praia é um embrião, quase
caricato, da iniciativa arquitetônica, para
criar uma sombra, ou seja, modificar as
condições ambientais. Sob a cúpula de lona,
cria-se um microclima diferenciado, uma área
onde a temperatura torna-se mais baixa. A
sombra protege os usuários da insolação
exagerada. Isto é, o guarda-sol cumpre a
função de abrigo, no sentido fisiológico do
termo: isentar o usuário da necessidade de
adaptações biológicas severas. Mas há outros
papéis exercidos pelo equipamento. Ao cravar
a haste do guarda-sol na areia, a hipotética
família demarca um lugar e delimita um
território. As demais pessoas tenderão a
respeitar um certo espaço da privacidade, e
evitarão invadi-lo. Por outro lado, a
qualidade do próprio guarda-sol, seu estado
de conservação, etc., poderá indicar a
condição sócio-econômica de seus usuários.
Assim, mesmo que em uma condição embrionária,
a complexidade dos papéis desempenhados pela
arquitetura pode ser sintetizado nas menores
iniciativas de modificação do ambiente.
(SILVA; 1994, p.94)
Observa-se então que, a partir de uma
necessidade biológica (se proteger de uma alta
temperatura), junto com o domínio da técnica
(confeccionar o guarda-sol), o homem modifica
o ambiente, propiciando conforto. Percebe-se
então, claramente, que a habitação surge de
uma necessidade que se inicia do corpo, é como
uma segunda pele, que vem a nos acolher, da
mesma forma que a essência humana está contida
numa complexa estrutura de carne e osso.
Todas as pessoas possuem pontos em comum com
relação a suas necessidades, existe sim uma
temperatura adequada para mantê-los vivos,
necessidade de luz e de ar, porém é possível
proporcionar espaços que são mais do que o
mínimo necessário. Espaços que despertem o
11
usuário para o ambiente que o cerca, o
ambiente que o acolhe.
O homem também insere neste espaço sua
identidade, fazendo como dito anteriormente,
que este seja sua referência de localização.
Cria-se sua forma, sua habitação, seu mundo
particular.
É cedo afirmar que as alterações para
atendimento do conforto ambiental, ou para a
colocação de uma identidade no espaço, serão
conseguidas a partir da flexibilização do
espaço arquitetônico ou modificação do espaço
a partir do próprio corpo. Se o usuário fizer
suas interferências, ele conseguirá apresentar
sua identidade, expressar sua forma pessoal de
ver e sentir o espaço, e assim se sentir
verdadeiramente acolhido, tornando a
arquitetura uma extensão de seu ser? Essa é
uma pergunta que se espera ser respondida com
esta pesquisa.
Welwood (2003) coloca esta percepção do espaço
com duas afirmações interessantes, “(...)
nossa realidade – como vemos as coisas, o que
elas significam para nós, como as sentimos e
como reagimos a elas – é, em grande, parte uma
construção da mente” (Welwood; 2003 p.66). “Se
o nosso mundo é constantemente criado por nós
mesmos – nós somos o mundo; nós não somos nada
mais do que a realidade” (Welwood; 2003 p.94)
Pode-se entender que o mundo é tudo aquilo que
se percebe, a informação após ser processada -
interpretada pelo olhar, passa a ser a
realidade do sujeito, sendo este também um dos
caminhos para entender a arquitetura como
extensão do corpo. É importante compreender
que o ambiente também é reflexo dessa
realidade processada.
Essas são apenas algumas questões
apresentadas, para começar a ter o
entendimento da forte relação entre corpo e
espaço arquitetônico, que será de grande
12
importância nessa pesquisa. Portanto para
melhor compreender essa relação, será estudado
os seguintes autores: Bruno Zevi, Richard
Sennet, Marleau Ponty, Yi-Fu Tuan, Evan Silva,
Bernard Tshumi, Douglas Vieira de Aguiar,
Terezinha Petrúcia da Nóbrega, Adolf Von
Hilderbrand. Que serão detalhados no próximo
capítulo
Existe uma forte relação entre corpo e espaço
arquitetônico e faz-se necessário entender os
pontos de conexão e criar uma postura crítica,
para a elaboração de futuros projetos.
Portanto serão abordados os seguintes
aspectos: a relação entre corpo e espaço, a
apresentação de seus conceitos, o
estabelecimento de pontos de conexão e
fronteiras, o corpo como propositor da
arquitetura, a arquitetura como artifício
sensorial, o corpo como elemento que percebe e
mapeia o espaço, os elementos da percepção, a
relação entre corpo e espaço ao longo da
história, e também registros do corpo
contemporâneo. Assim, chegar-se-á ao objetivo
principal dessa pesquisa, que é revelar o
espaço arquitetônico como extensão do corpo.
13
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A percepção do meio usando da visão, olfato,
audição, paladar e tato é de fundamental
importância para o ser humano, sendo
necessária para sua sobrevivência ao longo da
vida. Ela trabalha também com sistemas
geradores de memória, seja individual ou
coletiva, possibilita o entendimento do espaço
que o cerca.
O espaço arquitetônico, composto por cheios e
vazios, luz e sombra, formas diversas que
despertam o corpo, é por este vivenciado,
mapeado por meio da percepção e registrado
através da memória.
Nesta etapa da pesquisa, apresenta-se a
relação entre corpo e espaço arquitetônico, a
importância da percepção como forma de
conectar ambos e suas modificações ao longo da
história. Será colocado em questão o corpo
contemporâneo e sua relação com a arquitetura,
serão apresentados também teorias e registros
realizados ao longo da pesquisa.
Na pré-história, o ser humano, ainda nômade,
mesmo capaz de desenvolver objetos e
ferramentas, inicialmente ocupava espaços
oferecidos pela natureza por uma questão de
sobrevivência. Era necessário observar, tocar
e sentir cada material, até que fosse possível
dominá-lo e, assim, desenvolver a caça, o
cultivo do alimento, a técnica da arte,
utensílios, ferramentas e então sua moradia.
Com o surgimento da escrita, ocorre uma
evolução social. A percepção continua a se
desenvolver principalmente por meio dessa nova
forma de comunicação, o uso dos desenhos e das
cores e a busca por novas técnicas movem esse
corpo em constante aprendizagem.
Na Grécia antiga, o corpo era sinal de
liberdade de expressão e cidadania. Exibir o
corpo era demonstrar que se estava inserido na
sociedade como cidadão. A diferença entre
14
homem e mulher era esclarecida pela teoria de
que os homens possuíam corpos quentes e as
mulheres corpos frios, sendo considerado
quente o corpo ativo, que exercia atividades
físicas e dominava a fala. Essa visão refletia
a postura do homem como quem anda e age de
forma imponente, enquanto a mulher não teria
essa forma de agir.
“Para o antigo habitante de Atenas, o ato de
exibir-se confirmava a sua dignidade de
cidadão. A democracia ateniense dava à
liberdade de pensamento a mesma ênfase
atribuída à nudez.” (Sennet; 2003, p.30).
Esses conceitos atribuídos à pessoas, acabavam
por serem utilizados nas edificações, de forma
que os espaços abertos com colunas, além de
extensão das praças, era visto como uma área
mais masculina.
Nos edifícios públicos, as salas de jantar
eram como numa casa, cercados por sólidas
paredes, pois os homens não se rescostariam
“de costas para uma colunata aberta” ninguém
entrava sem ser convidado, embora fosse
possível descortinar todo o interior. Quem se
movesse em uma direção ao lado sem paredes,
de frente para a praça, seria notado, pois
estaria no “lado macho, o lado da exposição”
(SENNETT; 2003, p.45)
Em Roma, o sentido da visão sobrepunha os
outros sentidos. A arquitetura apresenta
edificações imponentes e uma malha urbana
definida independente do contexto. Cidades
eram destruídas para a construção do Império
Romano, refletindo uma sociedade que se
alimentava compulsivamente da imagem, e a
própria casa definia hierarquias e formas de
comportamento.
O romano acreditaria no que visse; olharia e
obedeceria a um regime duradouro. A
persistência da cidade corria em sentido
contrário ao tempo durante o qual o corpo
humano ultrapassava fases de crescimento e
decadência, planos derrotados e esquecidos,
lembranças de faces obscurecidas pelo
envelhecimento ou desespero. Num de seus
poemas, Adriano reconheceu que a experiência
que o homem tem de seu corpo conflitava com a
ficção do lugar chamado “Roma”. (SENNETT;
2003 p.45)
15
Os romanos se alimentavam da visão com tal
intensidade que uma das principais atrações
era o anfiteatro que, por meio da pantomima,
comunicava aos espectadores o que acontecia,
transmitindo histórias da cultura romana.
Usava-se de combates sangrentos entre pessoas
e animais, e as histórias nunca eram
modificadas, mas repetidas em grandes números.
Esse corpo romano, sedento por imagens
influenciou muito a arquitetura, que buscava
formas precisas, uma geometria que induzia ao
comportamento de forma imponente. Até mesmo os
cômodos das casas sugeriam como cada coisa
deveria acontecer, ostentando o status social
da família e também a forma com que cada
visitante deveria se portar, como esclarece
Sennett (2003).
Corpo, casa, fórum, cidade, império baseavam-
se em imagens lineares. Os críticos da
arquitetura mencionam a obsessão romana de
organizar o espaço de forma clara e precisa –
espaços ortogonais bem definidos, como a rede
romana; estruturas rígidas, como o arco
romano; prédios rigorosamente desenhados,
encimados por domus – simples transferência
do semicírculo para o plano tridimensional.
Essa linguagem visual, ou desejo de
orientação exata, demonstrava a mesma ânsia
que se expressava no gosto pela repetição
interminável de imagens, até que se
convertessem em verdades inquestionáveis. Era
o reflexo das carências de um povo que não
desfrutava de conforto e vivia em meio a
desigualdades, sem nenhum controle, em busca
de um espaço tranquilizador. A geometria
procurava dar idéia de uma Roma eterna e
essencial, que permaneceria de algum modo a
salvo das rupturas históricas. Embora
dominando essa linguagem, Adriano sabia que
ela não passava de uma ficção. (SENNETT,
2003, p.107)
Na Idade Média, não havia planejamento urbano,
as pessoas recém-saídas do campo, iam para a
cidade, gerando lugares superpovoados. As ruas
não ofereciam um acesso adequado, em caminhos
que nem sempre se conectavam, havia ainda o
uso confuso entre os terrenos, que eram
repartidos conforme a necessidade e
empreendimento de cada proprietário. As
edificações aconteciam sem pensar no entorno,
colocavam-se aberturas onde era mais
conveniente e fechava-se com a mesma falta de
16
critério. Com o intenso comércio, portas e
janelas tornavam-se vitrines em meio a ruas
desordenadas. A casa ainda não explorava
questões de conforto, era o lugar onde tudo
acontecia e não havia uma diferença entre área
pública e privada.
Por outro lado, o espaço religioso evolui, em
busca de catequisar e despertar sensações por
meio da visão, usando da pintura, até chegar
às igrejas góticas, que distorcem a noção de
proporção. Cria-se um espaço exagerado, o
corpo torna-se pequeno diante do sagrado.
Emoldurando o portal da Notre-Dame, o
visitante contempla esculturas de seres
humanos esculpidas numa escala pouco superior
à sua estatura normal, mas que ainda assim
parecem diminuídas diante do imenso tamanho
da catedral, cuja altura equivale a um ato de
fé. Desde o século XI, os construtores de
igrejas procuravam talhá-las dessa forma,
para mostrar – nas palavras de um moderno
historiador de arte – a “relação entre
valores do homem e os princípios imanentes o
mundo” as figuras apelam diretamente para
quem as observa, convidando-o a fazer parte
da igreja – um gesto de inclusão cuja origem
remonta à linguagem simples da pregação de
São Francisco de Assis. Tal identidade entre
carne e pedra se fortalecera, no ano em que
Jehan de Chelles estava prestes a concluir
sua obra, à medida que os cristãos davam os
primeiros passos para vincular seus próprios
sofrimentos corporais aos padecimentos de
Jesus. (SENNETT; 2003, p.141)
Durante o Renascimento quebra-se com a teoria
do calor do corpo, a partir da descoberta do
sistema circulatório do sangue. Inicia-se uma
revolução científica que mudou por completo a
forma de entender o corpo que reflete na
organização da cidade, cria-se um novo modelo
urbano. A partir desse novo corpo, valorizam-
se as áreas abertas, os grandes espaços, a
liberdade de movimentos e o consumo de
oxigênio, refletindo completamente na
organização do espaço urbano. Até mesmo as
roupas passam a ser mais leves a fim de
facilitar os movimentos e permitir que a pele
respire, desenvolve-se o hábito do banho, o
maior cuidado com a higiene do corpo e do
espaço. As casas passam a ter revestimentos de
gesso, protegendo e facilitando a limpeza, a
17
população fica proibida de esvaziar penicos
nas ruas e o espaço urbano busca um desenho
que permite maior circulação, por meio do uso
de grandes espaços abertos e jardins.
A geração de L’Enfant, por seu turno procurou
dar ao pulmão urbano uma forma visual mais
definida. As autoridades parisienses, em
1765, por exemplo, analisaram diversos
projetos alternativos com vistas à construção
de um jardim mais acessível ao povo da
cidade, a pé ou em carruagens; proibido
qualquer tipo de comércio, suas ruas e
passeios deveriam romper radicalmente com a
malha urbana mais antiga. O movimento através
do pulmão deveria ser uma experiência
sociável. (SENNETT; 2003 p.223)
No período da revolução industrial, o corpo
torna-se individual. A cidade passa por uma
reforma urbana, reorganizando o espaço, áreas
privilegiadas são destinadas às pessoas de
maior poder aquisitivo, enquanto os outros
eram obrigados a ir para a periferia. Com os
avanços tecnológicos, os meios de transporte
público passam a existir e, com eles, surge a
necessidade de se dividir os espaços com
pessoas diversas. Leva-se ao estranhamento, o
corpo passa a se individualizar, respeitar o
espaço do outro para não ter o seu espaço
invadido. É nessa época também que cria-se
consciência da necessidade do conforto, pois
as exageradas horas de trabalho eram
desgastantes, o mínimo de conforto, nos
transportes públicos ou horários de folga,
seria capaz de aumentar a produtividade. A
individualidade do corpo induziu a novas
concepções de espaços, como nos mostra Sennett
(2003)
Cem anos antes, as pessoas defecavam sentadas
em chaises-percés que cobriam o penico —
enquanto conversavam normalmente. Só no
século XIX é que isso passou a ser feito em
cômodos separados, onde estavam instaladas,
também, a banheira e a pia. Ali, calmamente
sentado, entregue aos seus próprios
pensamentos, às vezes lendo ou bebendo, o
indivíduo literalmente se soltava, sem nada
ou ninguém que o perturbasse, gozando do
mesmo isolamento que lhe ofereciam as demais
cadeiras da casa, em que repousava tranqüilo,
após um dia de exaustivo trabalho.(SENNET;
2003, p.276)
18
No início do século XX, com o surgimento de
novos avanços tecnológicos, surgem diversos
movimentos que questionavam a produção
arquitetônica. Existia a idealização de um
corpo perfeito para abrigar as casas que
estavam sendo produzidas. Numa era onde a
velocidade de locomoção, informação e novas
formas construtivas traziam novos
entendimentos da relação entre corpo e espaço,
o corpo estaria sempre vivenciando o ambiente
interno, sendo necessária uma estrutura muito
eficiente nas casas, para atender as
necessidades do morador. Sua locomoção era
feita sempre por meio de transporte
motorizado, as ruas seriam largas,
privilegiando o automóvel, até mesmo os
jardins eram elaborados para serem apreciados
do alto dos prédios. Era a busca do corpo
perfeito no espaço perfeito.
Mais tarde, porém, os arquitetos começam a
questionar esse espaço que era produzido e
principalmente, que corpo é esse. Iniciam-se
estudos sobre esse corpo dotado de
complexidades.
Não é, no entanto, antes do final do
século XIX, que o conceito de espaço é
introduzido na teoria da arquitetura e, de
modo ampliado, nas artes em geral. E é na
arquitetura que um conceito mais
antropológico de espaço se desenvolve; isso
porque é no contexto da arquitetura que o
corpo – o corpo humano – se torna base para a
experiência e a recepção dos espaços
construídos. O papel do corpo é central
(AGUIAR; 2010, p.19)
Cria-se uma relação recíproca entre corpo e
espaço, onde um passa a interferir no outro,
sendo o espaço pensado a partir do corpo. É
necessário entender que este é um complexo
mecanismo, com diferentes formas de perceber o
ambiente ao seu redor, por meio da visão,
audição, tato, paladar e olfato. A leitura do
espaço, não acontece apenas por meio desses
mecanismos, mas também existe a influência de
outros fatores como a memória ou cultura. Ao
vivenciar o espaço, faz-se um entendimento
19
desse conjunto de fatores que geram a leitura
final desse espaço.
Entretanto, vale ressaltar também que parte do
corpo contemporâneo parece encontrar-se
restrito ao seu espaço, não toca e não é
tocado, alimenta-se principalmente por meio da
visão e de equipamentos que funcionam como
extensores da mente, seja o computador,
celular, tablete ou qualquer outro mecanismo,
onde é possível arquivar memórias, conversar
com pessoas distantes sem que seja necessário
estar fisicamente presente, desenvolver
pensamentos ou criar relações sociais sem a
necessidade de um corpo físico. A partir do
entendimento do impacto tecnológico no dia a
dia, pode-se observar o quanto esse corpo se
alimenta o tempo inteiro de informações
visuais, cria-se uma contradição entre
comunicação e ação, um corpo que é
virtualmente sociável e interativo, porém
fisicamente intocável travado por barreiras.
Pode-se dizer que o meio tecnológico induz a
uma não vivência espacial. Sendo impossível
desvincular corpo e mente, faz-se necessário
considerar as barreiras sociais, os
estereótipos do corpo perfeito, criando um
corpo reprimido e mutilado, como nos mostra
Esther (2012).
Pode-se dizer que os avanços científicos no
campo da medicina e da biotecnologia, o
incremento das práticas de “building-body”
(plásticas, implantes, próteses e tatuagens),
a conversão da doença em um fator produtivo
da economia global e a atenção quase que
exclusiva a um ideal de físico perfeito e
saudável tornaram-se fatores incisivos na
maneira como o corpo se inscreve na
contemporaneidade. (Esther; 2012, p77)
As figuras 01 e 02 mostram a influência da
tecnologia na postura desse corpo e na forma
que este se insere no espaço, a partir de
interações virtuais, conseguem estabelecer uma
relação diferente com o lugar. E como se o
corpo fizesse o uso de lugares distintos ao
mesmo tempo, seja por meio do diálogo com o
outro, ou acesso às páginas de navegação que
permitem escapar do contexto físico.
20
Figura 01
Figura 02
21
O uso desse outro espaço, que não é real,
acontece simultaneamente ao uso do espaço
físico. Apesar desse espaço não real, seduzir
e ser capaz de transportar a mente e despertar
sensações, o corpo físico se encontra em um
lugar determinado, existente, e no momento que
ocorre uma interação física, pode-se dizer que
este se encontra em primeiro plano, por ser
concreto, palpável e principalmente por estar
no mesmo lugar que o corpo. A percepção por
meio da memória ou do uso de equipamentos
(celular, tablete, computador...) se encontra
em segundo plano.
Independente de ser um espaço em primeiro ou
segundo plano, ambos despertam sensações, são
registrados pela mente, mapeados e
compreendidos, sendo que esta relação acontece
por meio da existência de um corpo, como
melhor explica Nóbrega (2008).
Desaprendemos a conviver com a realidade
corpórea, com a experiência dos sentidos,
pois privilegiam uma razão sem corpo. No
entanto, a percepção compreendida como um
acontecimento da existência, pode resgatar
este saber. (NÓBREGA; 2008 p. 142)
A percepção é como um fio condutor, do mundo
exterior para o interior da mente, por meio
dela o corpo se situa no espaço,
possibilitando que a mente registre novas
informações e armazene por meio da memória. A
percepção é um acontecimento do corpo e
permite vivenciar e entender o espaço, o
universo que o cerca.
Antes da ciência do corpo – que implica a
relação com outrem – a experiência de minha
carne como ganga de minha percepção ensinou-
me que a percepção não nasce em qualquer
outro lugar, mas emerge no recesso de um
corpo (Marleau-Ponty, 1994, p.21)
Ponty (1994) propõe que a percepção vem de uma
vivência que só é possível a partir de um
corpo físico, que percebe, sente e reconhece o
espaço a partir de sua expressão e símbolos.
22
Considerando os aspectos apresentados, é
importante entender como a arquitetura
influência o corpo, não apenas pela forma, mas
principalmente os símbolos e significados que
nela estão impregnados. É importante destacar
que a semiótica, como estudo dos símbolos e
significados, pode ser uma ferramenta de
grande ajuda para os arquitetos, para a
releitura de significados, entendendo que a
arquitetura é impregnada de significados que
estão sendo, a todo o momento, absorvidos
pelos observadores. Portanto, é necessária uma
releitura e compreensão das formas que estes
atuam sobre o corpo, pois cada percepção
reflete em uma ação.
O corpo passa a ter papel central, busca-se
compreender suas complexidades e relação com o
espaço. Os estudos de fluxo podem ser
entendidos como uma forma de inserir o corpo
no espaço, a espacialidade passa a ser melhor
compreendida a partir do entendimento dos
vazios, local em que se encontra o observador
em movimento.
Objetos devem ser utilizados para construir
um espaço total e criar o que poderia ser
denominado como uma malha cinestética a qual,
embora descontínua, sugere um volume total
contínuo. Nesse sentido, o objeto individual
se torna um componente estrutural; sua
posição dentro do vazio é definida pelo
desenvolvimento espacial mais geral e pela
sua própria capacidade de evocar e estimular
nossa ideia de espaço (HILDERBRAND; 1994,
p.239)
A organização espacial por meio de objetos,
como nos mostra Hilderbrand (1994), molda os
espaços vazios e influenciam na percepção das
dimensões do ambiente. É importante notar a
relação entre o vazio, corpo e espaço, sendo o
vazio o elemento que vai permitir que o corpo
se insira no espaço e o vivencie, é o que
permite a existência de um espaço interior.
Os estudos de fluxo levam a um entendimento de
espaço a partir da relação dos vazios que são
moldados pelos elementos arquitetônicos,
relacionando com o corpo em movimento. Cria-se
23
assim um aspecto peculiar, diferenciado, a
cada projeto, uma identidade por meio dos
fluxos, definindo acessos, área pública e
privada, locais de passagem ou espera, por
meio de obstáculos, barreiras, aberturas e
elementos que abriguem o corpo ou o induz a
outra ação, seja de passagem ou despertar
curiosidade, por meio de formas, texturas,
iluminação, vazios e cheios que despertem uma
sensação.
A relação entre corpo e espaço arquitetônico é
intensa e difícil de ser definida, da mesma
forma que a arquitetura busca compreender e
abrigar o corpo, proporcionar sensações e
despertar os sentidos. O corpo necessita de
tempo, para sentir e compreender a
arquitetura. Como nos mostra também Zevi
(1996).
o espaço interior, espaço esse que não pode
ser representado de nenhuma forma, que não
pode ser conhecido e vivido a não ser por
meio de experiência direta, é o protagonista
do fato arquitetônico. (Zevi; 1996, p.18)
Não apenas de tempo, o corpo também necessita
de movimento em conjunto com os outros
sensores perceptivos para experimentar o
espaço.
(...) Movimentos tão simples como esticar os
braços e as pernas são básicos para que
tomemos consciência do espaço. O espaço é
experiência do quando há lugar para se mover.
Ainda mais, mudando de um lugar para outro a
pessoa adquire um sentido de direção. Para
frente, para trás e para os lados são
diferenciados pela experiência, isto é,
conhecidos subconscientemente no ato de
movimentar-se. O espaço assume uma
organização coordenada rudimentar centrada no
eu, que se move e se direciona. Os olhos
humanos, por terem superposição bifocal e
capacidade esteroscópica, proporcionam às
pessoas um espaço vívido, em três dimensões.
A experiência, contudo é necessária. (Tuan;
1930, p.13)
É interessante destacar também as formas que
os outros sentidos colaboram para uma noção
espacial. Todos os sentidos podem ser apurados
e refinados, porém alguns tem se atrofiado
cada vez mais, enquanto outros se
24
hipertrofiam, por razões diversas, desde a
necessidade, como também a forma que o espaço
arquitetônico vem propondo a percepção à esse
corpo.
O olfato pode ser usado de forma não tão
eficiente para se relacionar à distância, que
pode ser percebida de acordo com a intensidade
de cada cheiro. Ao atravessar uma praça logo
se percebe que estão vendendo churrasquinho ou
pipoca, sendo possível localizá-los pelo
cheiro. O paladar, ainda que tenha uma forte
interação com o tato e olfato, pouco contribui
para a noção de espaço. O tato, além de
perceber texturas e formas, quando associado
ao movimento proporciona uma ampla percepção
de espaço.
A audição, assim como a visão, apresenta um
forte potencial para a percepção do espaço
arquitetônico, isolada, não nos permite
compreender formas, mas nos orienta e nos
localiza. Tal potencial aparece na instalação
Forty Part Motet de Janet Cardiff (1957),
localizada em Inhotim, na qual a percepção de
um outro espaço por meio de sons. (Figura 03)
Figura 03 | Forty part motet de Janet Cardif
25
De todos os equipamentos sensoriais, pode-se
dizer que a visão é de grande destaque,
potencializada não apenas por uma questão de
luz e sombra, reconhecimento de texturas ou
distâncias, formas e proporções, mas também
pela enorme capacidade do ser humano de dar
significados aos símbolos, não apenas formas e
desenhos, mas também o alfabeto, sinais de
avisos e diversas outras coisas dotadas de
símbolos. É um dos sentidos mais refinados e
pode ser potencializado ainda com a audição,
que auxilia na localização dentro de um
espaço.
[...] As pessoas às vezes se comportam como
animais encurralados e desconfiados. Outras
vezes também podem agir como cientistas frios
e dedicados à tarefa de formular leis e
mapear recursos. Nenhuma das duas atitudes
dura muito. As pessoas são seres complexos.
Os dotes humanos incluem órgãos sensoriais
semelhantes aos de outros primatas, mas são
coroados por uma capacidade excepcionalmente
refinada para a criação de símbolos. (TUAN;
1930, p.5)
Fica claro que o corpo é capaz de compreender
e memorizar o espaço arquitetônico. Pode-se ir
para além, entendendo que o espaço concreto,
dotado de formas, luz e sombra e todos os
elementos que compõe a arquitetura, pode
existir em um mundo físico, porém se este não
for vivenciado por meio do corpo, não for
mapeado e registrado em memória sua existência
é questionável. É possível questionar o que é
real. Até mesmo os espaços virtuais como os
espaços reais nunca visitados, mas vistos por
fotos, ou em livros, com tamanha minúcia, são
capazes de despertar sensações e tornarem-se
reais por meio delas.
Se retomar o que foi dito sobre a semiótica,
quanto a estudo de símbolos, nota-se que a
realidade em cada ser está relacionada a
percepção individual de cada um. Um sentido é
acionado, as informações são levadas ao
cérebro, que registra o que foi percebido e
associa tal informação com os conhecimentos
que já possuímos. Portanto, por mais que se
26
tenha o mesmo espaço ou objeto, cada pessoa
fará uma associação diferente, particular,
relacionada com a memória. Nos casos de
comunidades é possível haver uma memória
coletiva por meio de símbolos fortes que
atingem a toda a população. Esta situação é
particular também de patrimônios históricos.
Existe ainda o que Tschumi (1995) sugere como
uma contradição na relação corpo e espaço,
denominando de violência da arquitetura. De
alguma forma os corpos violam o espaço e o
espaço também viola os corpos, seja pela forma
desse espaço arquitetônico ou pela ação
inesperada do corpo.
27
Na figura 04, a seguir, pode-se observar esse
tipo de violação, neste caso a arquitetura
limita uma ação por meio da forma.
A dimensão dos degraus, força quem passa por
ele a descer em determinado ritmo, descendo
sempre o degrau com o mesmo pé, seguido de um
passo. Dessa forma cria-se um movimento
contínuo, um ritmo um tanto desconfortável,
pelo fato de exercitar mais uma perna que a
outra, tanto no ato de subir como o ato de
descer, também por fugir a sequência a qual se
está acostumado, o corpo torna-se mais atento.
28
Figura 04 | pessoa descendo a escada
29
Existem ainda outras diversas formas do espaço
arquitetônico induzir uma ação. Nas imagens a
seguir (figura 05 e 06), é possível notar que
a condição do corredor na faculdade além de um
lugar de passagem, de certa forma propõe que
as pessoas se encontrem por ali e tenham
conversas rápidas.
Na figura 06, além de local de encontro devido
a proteção e o mural de avisos, as pessoas
escoram no pequeno muro de contenção, colocam
bolsas ou até mesmo sentam. Neste caso é
possível notar o corpo violando a arquitetura
a partir de usos que não foram pré-
estabelecidos, mas que acabam por acontecer.
30
Figura 05 | Corredor do curso de
Arquitetura no Unileste
Figura 06 | Frente do NEXCAU no curso de arquitetura do
Unileste
31
A Figura 07 evidencia como a forma pode
influenciar no comportamento. Trata-se da
influência no fluxo de pessoas em um grande
corredor, completamente preenchido por
elementos. As áreas cheias são vitrines com
objetos coloridos e brilhantes, os grandes
vazios também são tomados por objetos
decorativos, ainda maiores. Deve-se lembrar
que a área em questão é em maior parte
comercial, apesar de oferecer formas de lazer.
Porém mesmo sendo um local voltado para o
consumo, a arquitetura sufoca esse corpo. É
possível reparar que as pessoas nem se quer
olham por onde andam, observam sempre as
laterais desse grande corredor, e não olham
para quem passa ao seu lado.
32
Figura 07 | Interior do Shopping do Vale do Aço
33
Existem ainda outras formas de conduzir a
relação entre corpo e espaço, a arquitetura
internacional é um traz uma visão diferente
dessa relação.
O entendimento da relação corpo e espaço pode
ser melhor observada no edifício H2O Expo, dos
arquitetos holandeses NOX.
Neste local, os arquitetos criam novas
possibilidades de percepção do espaço
arquitetônico a partir de um ambiente que se
modifica constantemente de acordo com o
usuário. Existe uma relação por meio de ação e
reação, possível por meio de sensores que
modificam o espaço de acordo com os movimentos
de cada corpo também por meio da iluminação
que cria a ilusão de texturas e instiga os
outros sentidos, gerando reações diversas.
Figura 08
34
Figura 09
35
Outro exemplo da interação entre corpo e
espaço pode ser percebido por meio da
instalação In Orbit, de Tomás Saraceno,
Formada por uma rede suspensa que modifica com
a presença de cada corpo. Por meio da
distribuição de cargas que tencionam a
estrutura, modificando a forma de andar por
essa rede. Portanto o corpo altera no espaço
que por sua vez altera no movimento do corpo.
(figura 10 e 11)
36
Figura 10
Figura 11
37
Yayoi Kusama em sua obra Obliteration room,
permite a interação entre pessoas e espaço
arquitetônico por meio do uso de cores. A
delicadeza da obra permite perceber de que
forma esse espaço foi ocupado ao longo do
tempo e até mesmo que tipo de corpo o ocupa.
38
Figura 12 | The obliteration room
39
Soho, um edifício comercial em Pequim (figura
13) apresenta a interação entre corpo e espaço
de outra forma, além do comércio possui uma
área de entretenimento. Os cheios e vazios
possibilitam a interação entre os elementos
arquitetônicos e a visualização do exterior e
entendimento do fluxo, as pessoas se
visualizam passando por esta ampla área de
conexão.
40
Figura 13 | Soho, Zaha Hadid
41
Entender o corpo como um complexo sistema
capaz de mapear e registrar o espaço em
memória, usando da percepção é de fundamental
importância para a arquitetura. A arquitetura
está conectada com esse corpo, através do
conforto, das técnicas e elementos simbólicos,
que representam esse corpo no espaço físico,
influência em na postura e na forma de agir ao
mesmo tempo está apta a ser modificada por
ele. É de grande importância também, o
entendimento da percepção como forma de
conexão entre corpo e espaço, como elemento
que lê o que é real e registra o espaço na
mente, ou seja, possibilita a criação de
memórias.
A arquitetura influência o espectador e por
ele é influenciada.
42
43
DESENVOLVIMENTO
A partir do questionamento “Poderia a
arquitetura ser uma extensão do corpo?”
investigou-se o conceito de espaço
arquitetônico e corpo. A proposta para a etapa
do TCC2 é realizar quatro intervenções que
mostrem as questões aqui abordadas,
relacionadas ao corpo, espaço, percepção e
memória.
44
INTERVENÇÃO 1
MEMÓRIA + CORPO + ESPAÇO
INTERVENÇÃO 2
ESPAÇO + OBJETO + CORPO
45
INTERVENÇÃO 1
MEMÓRIA + CORPO + ESPAÇO
A primeira intervenção está relacionada com a
memória. Como foi discutido no capítulo
anterior, a memória tem a capacidade de
despertar sensações, reviver lugares e
situações.
Essa intervenção consiste em registrar por
meio de entrevista, um espaço existente em
memória e relaciona-lo com o espaço real, que
será fotografado.
Nessa intervenção, a parte escrita será
relacionada com a fotografia do espaço real, a
fim de possibilitar um paralelo entre espaço
imaginário e espaço real.
Serão entrevistadas quatro pessoas, duas
relacionadas à memória do espaço público e as
outras duas ao espaço privado.
Uma analogia à essa intervenção seria um
fragmento do livro Cidades Invisíveis, do
Italo Calvino e a figura 14.
46
Agora contarei o que a cidade de zenóbia tem de
extraordinário: embora situada em terreno seco, ergue-
se sobre altíssimas palafitas, e as casas são de bambu
e zinco, com muitos bailéus e balcões, postos em
diferentes alturas, com andas que superam umas as
outras, ligadas por escadas de madeira e passarelas
suspensas, transpostas por belvederes cobertos por
alpendres cônicos, caixas de reservatório de água,
cata-ventos, desdobrando roldanas linhas e guindastes
(Calvino; 2001, p.36)
Figura 14 | releitura de Zenóbia
47
INTERVENÇÃO 2
ESPAÇO + OBJETO + CORPO
A segunda intervenção é na verdade um conjunto
de intervenções que relacionam corpo, espaço e
objeto. Conforme visto no capitulo anterior, o
corpo pode alterar o espaço, assim como pode
alterar o espaço assim como pode ocorrer o
oposto, uma troca que acontece constantemente
por meio da percepção. Também é de grande
importância o objeto, como elemento que
interage com o corpo, também capaz de alterar
o espaço.
48
INTERVENÇÃO 2
ETAPA 1 : ESPAÇO
ETAPA 2 : OBJETO
ETAPA 3 : CORPO
O mesmo espaço sendo modificado pelo
corpo e objeto
O mesmo objeto modificando a percepção
do espaço em corpos distintos
Corpo sendo modificado por diferentes
objetos em um mesmo espaço
49
INTERVENÇÃO 2
PARTE 1
ESPAÇO + OBJETO + CORPO
Na primeira parte da segunda intervenção, será
feito um registro fotográfico, com o objetivo
de mostrar o espaço sendo alterado pelo uso de
objetos e do próprio corpo.
As áreas escolhidas para essa intervenção
foram: a área da prefeitura de Timóteo,
Feirarte em Ipatinga e a praça da estação em
Coronel Fabriciano.
As áreas escolhidas apresentam como
característica em comum os usos diferenciados
de acordo com horário e dia da semana.
A figura 15 ilustra um pouco sobre a forma de
registro que será feita nesses locais.
50
Figura 15
51
INTERVENÇÃO 2
PARTE 2
ESPAÇO + OBJETO + CORPO
Na segunda parte, será trabalhado o objeto
como elemento para alterar o espaço e assim
modificar a percepção. Como foi visto no
capítulo anterior, a percepção é o meio pelo
qual o corpo mapeia e reconhece o espaço.
Alterando o espaço, modifica-se a forma de
entendê-lo e de agir.
A figura 16 representa uma das possibilidades
de intervenção.
52
Figura 16
53
Figura 17
54
Um mesmo objeto será usado em diferentes
lugares e será registrado para sobrepor as
diferentes formas de corpos distintos reagirem
a um mesmo elemento, evidenciando como este
interfere na postura e ação desses corpos.
Os locais escolhidos são distintos, apresentam
usuários de diversas idades e fluxos
diferenciados, são eles: um local de espera, o
ponto de ônibus em frente a Unileste em
Coronel Fabriciano (figura 18); uma área de
lazer, a praça 29 de Abril em Timóteo (figura
22); um local de passagem, a calçada em frente
ao camelô em Timóteo (figura 26); uma área
privada, o interior de uma loja em Timóteo
(figura 30).
55
Figura 18 | ponto de ônibus em frente a Unileste.
56
Figura 19 | Fluxograma do ponto de ônibus.
57
Figura 20 | Materiais do ponto de ônibus
58
Figura 21 | Ponto de ônibus
59
Figura 22 | parque em Timóteo
60
Figura 23 | Fluxograma do parque
61
Figura 24 |
materiais do
parque
62
Figura 25 | Praça
63
Figura 26 | camelô em Timóteo
64
Figura 27 | Fluxograma do camelô
65
Figura 28 | materiais do parque
66
Figura 29 | materiais do parque
67
Figura 30 | loja em Timóteo
68
Figura 31 | Fluxograma da loja
69
Figura 32 | Materiais da loja
70
Figura 33 | Loja
71
INTERVENÇÃO 2
PARTE 3
ESPAÇO + OBJETO + CORPO
A terceira parte da segunda intervenção
consiste em modificar um mesmo lugar por onde
passam as mesmas pessoas. Esta intervenção
assim como as outras, também se relaciona com
a percepção, mas a partir de outra abordagem.
Questionando a influência do meio nesse corpo,
em seu comportamento e postura.
A obra análoga mostra possibilidades de
modificações no espaço por meio de objetos, de
forma que alteram o ambiente e comportamento
do corpo.
72
Figura 34 | Cosmococas de Hélio Oiticica
73
Figura 35 | Cosmococas de Hélio Oiticica
74
A intervenção consiste em modificar o espaço
por meio de objetos distintos em tempos
diferentes. Será realizado um conjunto de
intervenções, totalizando três intervenções
que vão acontecer em dias diferentes em um
mesmo local, por onde passam as mesmas
pessoas.
O local escolhido foi a frente da sala nexcau,
na Unileste, por onde passam professores,
funcionários diversos e alunos.
75
F
Figura 36 | Frente do Nexcau
76
F
Figura 37 | Fluxograma
77
Figura 38 | Materiais do nexcau
78
Figura 39 | Nexcau
79
CONCLUSÃO
A pesquisa parte do seguinte questionamento:
“poderia a arquitetura ser uma extensão do
corpo?”.
Durante o desenvolvimento, são definidos os
conceitos de corpo e espaço arquitetônico, a
partir de teorias que tratam da relação entre
corpo e espaço, abordando desde o contexto
histórico até o contemporâneo, assim como a
complexidade do corpo, memória, percepção e
semiótica.
No decorrer pesquisa foi possível revelar a
percepção como elemento fundamental na relação
entre corpo e espaço, quanto forma de
compreender o entorno, que acontece por meio
de subjetividades, o corpo percebe, interpreta
e armazena informações desse espaço, o mapeia.
O espaço por sua vez, além de influenciar o
corpo, é por ele influenciado, modificado por
meio da postura, da ação e por vezes até mesmo
violado.
Torna-se claro o entendimento da arquitetura
como extensão do corpo por meio da percepção,
comunicação através das formas e símbolos
presentes na arquitetura, que são
interpretados pelo corpo; também por meio da
memória, quanto forma de registrar os locais
das vivências humanas, junto a seus
significados, influenciando o corpo através do
tempo.
Contudo, esta relação será desenvolvida na
proposta de tcc2, tendo como objetivo a
prática das hipóteses que foram abordadas,
trabalhando com os elementos corpo, espaço,
percepção e memória.
80
81
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