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Bahia a Elite e Os Caminhos Pos Sabinada Dilton

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  • BAHIA: A ELITE E OS CAMINHOS DAPACIFICAO NO PS-SABINADA

    Dilton Oliveira de Arajo*

    RESUMOEm 1837 a Bahia assistiu a uma das mais importantes revoltas de sua histria, a Sabinada.Setores do Exrcito rebelaram-se contra o Governo Imperial e declararam um governoindependente e republicano, que resistiu at maro de 1838. A tomada da cidade de Salvadorpelas foras leais ao governo central foi brutal: mais de 1.000 rebeldes foram mortos em umnico dia, contra cerca de 40 das tropas imperiais. A retomada do controle sobre a capitalda Bahia no trouxe, porm, um completo alvio para a elite que comandava a poltica naProvncia. Nos anos seguintes, esta elite ir manifestar uma obsessiva preocupao em controlar,de forma estreita, as movimentaes de indivduos e grupos sociais considerados nocivos parao sossego pblico. Partindo da anlise das edies de um rgo de imprensa da poca, ojornal Correio Mercantil, este artigo procura examinar as estratgias de controle socialdefendidas pela elite poltica baiana nos anos que se seguiram Sabinada.

    PALAVRAS-CHAVE: Bahia. Elite provincial. Rebelies antiimperiais. Sabinada.

    Durante os anos de 1838 e 1839, aps a derrota do movimento rebelde daSabinada, os polticos legalistas passaram a bradar por reformas nas leis, objetivando

    POLITEIA: Hist. e Soc. Vitria da Conquista v. 5 n. 1 p. 153-175 2005

    * Professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e doutorando em Histria tambm na Ufba. E-mail: [email protected].

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    acabar com a alegada impunidade daqueles que ousaram atacar o trono imperialcom a rebelio que tomou a Cidade do Salvador pouco tempo antes. A revoltahavia provocado enormes distrbios nas relaes sociais e comerciais dominantesna Capital da Bahia e no Recncavo, situao que, na viso dos legalistas, poderiavoltar a acontecer, caso os rebeldes, alguns j circulando pelas ruas, se rearticulassemem torno de novos projetos de subverso da ordem legal.

    Foram anos decisivos para a Bahia e para o Brasil. Nacionalmente,estavam em curso as rebelies do Rio Grande do Sul, do Maranho e doPar. A elite poltica da Bahia, ante esse quadro, mais do que em qualquermomento anterior, passou a entender que era vital a erradicao de prticasrebeldes que ameaavam a estabilidade das relaes sociais e colocavam emrisco a unidade do territrio e o projeto de construo de uma nao quecompreenderia a totalidade dos antigos territrios da Amrica portuguesa,dirigido a partir do Rio de Janeiro.1 A tal projeto, a elite da Bahia prestavaefetivo apoio havia muito tempo.2

    A Sabinada foi o movimento poltico mais contundente ocorrido naBahia durante a primeira metade do sculo XIX, sobretudo pelo fato de tersido o nico a obter uma vitria concreta, desalojando do poder, mesmo quepor um curto perodo, os grupos que o controlavam. A sua ocorrncia, queparece ter sido uma grande surpresa para a elite,3 evidenciou as insatisfaes deum amplo espectro de foras sociais, formadoras de uma aliana que possuainteresses em estabelecer uma outra direo para a poltica provincial, modificandotambm, dessa forma, a relao mantida com o Rio de Janeiro.4 Na viso dosgrupos dominantes, era gente sem fortuna, sem religio e sem moral.5

    1 Sobre o debate a respeito da construo da nao no Brasil, ver, entre outras, as seguintes obras:Guimares (1988); Jancs; Pimenta (2000); Jancs (1996); Kraay (2000).2 Sobre a relao das elites regionais com o projeto centralizador nacional, ver Carvalho (1980);Mattos (1987) e especialmente o artigo de Miriam Dolhnikkof (2003), que apresenta em termosatualizados a discusso entre o nacional e o regional no Imprio brasileiro.3 Ofcio, redigido no mesmo dia da ecloso da Revolta, menciona um boato de rebelio ao qual nofoi dado crdito. Arquivo Pblico do Estado da Bahia. Seo de Arquivos Coloniais e Provinciais(APEB/SACP). Mao 684. Correspondncia para o Governo Imperial. 6 de novembro de 1837.4 Diversamente de Pernambuco, no parecem ter existido na Bahia importantes conflitos intra-elites, ou entre regies econmicas, que tivessem provocado instabilidade poltica de algumagravidade. Considero que esses grupos oposicionistas no eram, efetivamente, faces querepresentavam interesses econmicos dominantes na Provncia, mas sim interesses de camadasintermedirias e baixas da populao, reunindo inquietaes de empregados pblicos, artesos e,paralelamente, de escravos. Para Pernambuco e suas cises entre os grupos economicamentedominantes, ver, por exemplo, Mello (2004).5 De acordo com a Representao Assemblia Geral, assinada por mais de 300 nomes de proprietrios,comerciantes e empregados pblicos vinculados legalidade, que pediam medidas para coibir a aodos rebeldes, publicada, entre outros rgos, no Correio Mercantil de 2 de agosto de 1839.

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    O trauma provocado pela rebelio fortaleceu ainda mais a conscinciaantiliberal da elite, que passou a defender um programa francamente revisionistaquanto s prerrogativas punitivas do Estado, de forma a instrumentaliz-lo ecapacit-lo para banir o chamado monstro rebelde que, a cada cabea quelhe cortavam, reaparecia com uma outra, atormentando os denominadospacficos cidados da Provncia.6 Esse programa, que foi sendo expostonas pginas dos peridicos conservadores, difundia a idia de que erafundamental a pacificao da Provncia nos momentos que viriam pela frente.

    O principal desses jornais foi o Correio Mercantil,7 rgo que searvorou em ser o grande defensor da legalidade, da integridade do Imprioe da punibilidade dos rebeldes da Bahia. Lanou-se ao combate das idiasfederalistas e republicanas, identificando os seus defensores a criminososcomuns, ridicularizando-os e responsabilizando-os por todos os malesocorridos na Bahia no perodo da rebelio e depois dele.

    Este trabalho tem o objetivo de apresentar alguns aspectos dessecombate poltico, pelo qual uma importante faco da elite local evidenciouos seus anseios de construo de uma sociedade na qual o sossego pblicose fizesse presente, marcando uma situao de efetivo controle sobre os grupossociais dominados. O propsito de pacificao no estava garantido com aderrota do movimento rebelde. Para atingi-lo, essa elite teria que travar muitasbatalhas no interior de uma sociedade caracterizada pelas mais profundasdiferenas sociais, raciais, tnicas, nacionais, religiosas e jurdicas.

    Com a apresentao desse quadro de incertezas, procurarei evidenciaralguns problemas presentes nas interpretaes dominantes na historiografiabaiana sobre o perodo histrico em foco, sobretudo por compreender queessa historiografia incorpora a idia de que os homens que viveram na Bahianaquele momento, encerrada a Sabinada, teriam passado a vivenciar uma espciede pax poltica imediata, e deixa de ponderar que o discurso feito pelos polticosda poca tinha, precisamente, o objetivo de forjar essa pretendida pacificao

    6 Utilizava-se muito a imagem mtica da Hidra de Lerna, monstro de muitas cabeas, que foi mortopor Hrcules em um dos seus trabalhos.7 O Correio Mercantil foi fundado em 1833, sendo dirigido, at o incio da dcada de 40, por JooAntonio de Sampaio Vianna e, depois de 1839, pelo seu irmo, Luiz Antonio de Sampaio Vianna,assumindo, em vrias quadras conjunturais, a defesa de governos mais conservadores, a exemplo doGoverno regressista de 19 de setembro de 1837, passando oposio quando ocorreu a maioridadee constituiu-se o governo de Limpo de Abreu e Antonio Carlos de Andrada Ribeiro.

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    e estava inserido em uma conjuntura de tenso poltica e social que subsistiriaainda por muito tempo.

    Naquele contexto, compreende-se a razo pela qual os membros daelite repetiam continuadamente o discurso da tranqilidade poltica em quesupostamente vivia a Provncia. A sua imprensa tambm assim se comportava,tentando abafar, da melhor maneira que podia, a exposio pblica dassituaes de inquietao. Numa poca em que a imprensa podia provocarcertos incndios polticos, essa atitude ajudava bastante no processo deisolamento dos focos, impedindo a sua propagao. Mesmo assim, no erafcil a ocultao de certos fatos, de alguns elementos de inquietude que insistiamem aparecer em uma sociedade que alguns pretendiam serena.

    A constatao de que no ocorreram rebelies no perodo no nosdeveria conduzir cegueira quanto s evidncias de que o processo que seseguiu Sabinada foi marcado pelas tentativas dos grupos radicais de serearticularem, de fazerem a sua propaganda, de reorganizarem a sua imprensa,8

    de se vincularem aos grupos sociais que estiveram presentes nas rebeliesanteriores, portando as suas necessidades e bandeiras. Ou seja, era um perodono qual a elite poltica local se mobilizou para construir certa vitria, mas que,em 1839, estava longe de estar consolidada. E ela sabia que haveria, ainda,muitas batalhas na sua trajetria.

    Dessa forma, os interessados na preservao da integridade territorialdo Brasil e na pacificao da Provncia atuaram em vrias frentes. Ao tempoem que adotavam atitudes administrativas e prticas repressivas diretas sobreaqueles que se envolveram na rebelio,9 procuravam dar difuso a certasimagens de terror, de forma a amedrontar as pessoas comuns e a isolar edestruir a liderana rebelde, desmoralizando-a publicamente.

    Entre as muitas imagens utilizadas para provocar o horror e o isolamentopoltico dos rebeldes, costumeiramente chamados de raposas, a deincendirios teve grande importncia. No dia 16 de maro de 1838, durante areconquista de Salvador pelas tropas legalistas, parte da cidade foi queimada.

    8 O principal jornal dos radicais, o Guaycuru, apareceu somente em outubro de 1843, tendo sofridovrios processos judiciais ao longo da sua existncia. Publicaes mais efmeras existiram nas fasesanteriores, a exemplo de O Athleta, que muitas energias exigiu dos redatores do Correio Mercantile dos demais peridicos conservadores.9 A sede de vingana da Legalidade no poupou, no seu primeiro momento, simples professores deprimeiras letras, pelo fato de terem permanecido na cidade, desobedecendo s ordens do Governopara se deslocarem para o Recncavo.

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    O atentado foi atribudo aos rebeldes que, desesperados pela derrota e pelocerco da cidade, teriam ateado fogo aos mais belos edifcios particulares, noqueimando os prdios pblicos porque no teriam tido tempo ou porqueteriam sido impedidos pelas tropas vitoriosas.10

    Independentemente de qualquer julgamento sobre a autoria dosincndios j que no facilmente aceitvel a verso de que os rebeldesapenas teriam tido a inteno ou o tempo de queimar os prdios particulares,deixando de lado os pblicos faz-se necessrio assinalar que o discurso dosvitoriosos sobre esse tema foi pesadamente direcionado para a destruio daimagem dos perdedores. Assim, no teriam existido revolucionrios oucriminosos polticos, mas criminosos comuns, ladres, assassinos e destruidoresda propriedade alheia, que, com archotes e garrafas de aguarrs, atearamfogo cidade, ao perceberem que a derrota era inevitvel.

    Por muito tempo se fez esse discurso. A lembrana da cidade incendiadafoi uma constante nos anos que se seguiram sua reconquista. As pginas dosjornais indicavam sempre que as propriedades haviam sido queimadas pelosmesmos que atacaram o trono de Sua Majestade Imperial, em 1837 (SILVA,1907, p. 94). As iniciativas polticas de velhos e novos rebeldes na dcadaseguinte no se desvencilhariam com facilidade dessa condenao. A imagemde indivduos sem qualquer responsabilidade ante a sociedade que pretendiamadministrar se fixou, em certa medida, s lideranas rebeldes, e acompanhousua trajetria posterior.

    interessante lembrar que um contedo desmoralizador foi adotadotambm para definir aqueles que pegaram em armas nas demais provncias. Aimagem de que ladres e assassinos, sados da mais baixa ral, mobilizavam-se para destruir as propriedades dos homens de bem, seja no Maranho, noPiau, no Par ou no Rio Grande do Sul, era cotidianamente estampada naspginas dessa imprensa. Seriam bandidos, como bandidos tambm seriam osrebeldes da Bahia, esses que, tendo sido absolvidos, ousavam novamente circularpelas ruas da cidade, contaminando-a.

    Se o ano de 1838 foi aquele em que se promoveu a represso, com asprises e o incio dos processos judiciais, 1839 caracterizou-se como um ano

    10 APEB/SACP. Mao 684. Registros de Correspondncias para o Governo Imperial. Ofcio doPresidente da Provncia, Antonio Pereira Barreto Pedroso, ao Ministro do Imprio. 16 de maro de1838.

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    em que os legalistas comearam a radicalizar ante a morosidade e a poucaeficcia do sistema que deveria erradicar as prticas rebeldes. No primeironmero do Correio Mercantil desse ano, os seus redatores referiam-se smilhares de famlias que lutavam contra a mendicidade, perdidos os seus chefesou queimadas as suas fortunas pelos archotes dos regeneradores.11 O seueditorial assinalava que isso acontecia enquanto j se faziam presentes, nas ruasde toda a Bahia, muitos homens que tinham tomado parte ativa na rebeldia,por terem sido absolvidos pelo Tribunal do Jri. Os fatos que se descortinavampara os redatores do Jornal provocavam, entre eles e, certamente, em umaparte da sociedade baiana, uma grande frustrao, conduzindo-os, ao longoda fase que se seguiria, a clamar por medidas que alterassem as condiespara que viesse a ocorrer uma efetiva punibilidade dos envolvidos na rebelio.

    O Correio Mercantil assumia o compromisso solene e pblico dezelar pela Constituio e pela ordem pblica, de defender o trono imperiale a integridade do Imprio, bandeiras que estariam ameaadas por forasque insistiam em ressurgir, em ganhar a luz na sociedade baiana, aps osprimeiros momentos da represso.12 A sociedade teria de retomar o seucaminho de prosperidade.

    Os compromissos assumidos no eram novos, pois em nenhummomento da histria da elite baiana, no sculo XIX, houve sequer indicativosde atitudes de confronto com o poder central, seja no antigo Imprio portugus,seja no contexto do Imprio brasileiro, mesmo tendo almejado e, mesmo,pleiteado, algum nvel de autonomia administrativa e fiscal ao longo dessetempo. O pertencimento comunidade nacional parece ter sido bemcompreendido por essa elite regional que, j em meados de 1822, no curso deuma luta contra o domnio portugus sobre a Provncia, no hesitou em aceitaro poder de D. Pedro, conduzindo as demais classes e grupos sociais a umaidia de pertencimento nacional que, com efeito, no era a nica opo polticapossvel naquele momento.

    As tenses raciais e sociais que, segundo Kraay (2001a, p. 328), afligiama sociedade brasileira e haviam motivado a rebelio, continuaram a existir damesma maneira que no perodo anterior, ensejando a fome repressiva dasforas conservadoras da Provncia. No foi suficiente a represso intensa que

    11 Correio Mercantil, 2 de janeiro de 1839.12 Idem.

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    se promoveu contra os rebeldes da Sabinada e contra os africanos e suasrevoltas tentadas na dcada de 30. Assim como a Revolta de 7 de novembrode 1837 teve uma derrota sangrenta, com centenas de mortos e de processossubseqentes,13 tambm foi dura a represso sobre os rebeldes mals, qualse seguiram deportaes e toda uma vigilncia, que se estendeu, pelo menos,por toda a dcada de 40, na busca de indcios de insurreies que noaconteceram (REIS, 2002; GRADEN, 1996).

    No fcil resgatar o que se passou com a populao de Salvadornaquela conjuntura. H uma tendncia natural de que as pessoas desejem edirecionem as suas vidas para uma situao de normalidade, em seu trabalho,em seus compromissos cotidianos, em sua luta pela sobrevivncia da suafamlia. Mas esse cotidiano almejado por muitos certamente no foi plenamentealcanado na Cidade do Salvador. Episdios de inquietude insistiam emaparecer de tempos em tempos, causando certo alvoroo, quer comopossibilidade real, fantasia de alguns, ou notcia plantada por outros tantos,por interesses diversificados.

    No localizamos informaes de que tenham existido rebelies deafricanos depois de 1835. No entanto, isso no significa que o temor quanto sua ocorrncia tenha desaparecido, muito menos a vigilncia, as brigas daimprensa conservadora com as autoridades, as mobilizaes de tropas, asinvestigaes policiais e, inclusive, as prises por suspeita de organizao deinsurreies, as deportaes, alm da desconfiana relacionada presena debatuques, festas, reunies (REIS, 2002), aglomeraes por diversos motivos,at mesmo nos momentos em que esses africanos promoviam os enterramentosde seus parentes e amigos. Essas situaes inquietaram os membros da elitepoltica da Bahia ainda por muito tempo, retirando-lhes a certeza de quepoderiam permanecer tranqilos na gerncia da Provncia.

    Os jornais, e, destacadamente, o Correio Mercantil, estamparam nassuas pginas inmeros relatos do tipo, sobretudo em Salvador, construdoscom base em boatos de insurreies de africanos, mas tambm de inquietaesde ndios e de camponeses, assim como de insatisfaes entre os militares, nalinha dos movimentos que inmeras vezes eclodiram nas dcadas anteriores.

    13 Essa constatao feita nos estudos sobre o tema. Para isso, ver Souza (1987); Viana Filho (1938);Amaral (1909) e Kraay (2001a). O termo derrota sangrenta foi retirado de Kraay (2001b, p. 74).

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    Alguns dos boatos relacionados s insurreies de escravos merecem destaquepelo que exigiram das autoridades e dos vigilantes redatores da imprensaconservadora, na sua trajetria de consolidao do controle sobre aquelesque deveriam estar controlados e no longo processo pela conquista de seusobjetivos mais preciosos.

    Em 4 de janeiro de 1839, a Cidade do Salvador teria vivenciado umamobilizao de tropas frente possibilidade de uma nova malesada. Amera circulao da notcia teria causado forte temor s famlias, principalmenteno subrbio da Barra. O jornal Correio Mercantil afirmou que oComandante das Armas teria corrido os quartis e prendido vrios guardasnacionais e policiais que estariam fora da disciplina, o que criaria dificuldadespara o Comando, em caso de ocorrer a rebelio. Ao final da nota, o jornalrecomendou que as autoridades policiais no se distrassem com ospassatempos da festa, podendo-se bem conciliar essas distraes com asolicitude e vigilncia que urgem nossas circunstncias polticas.14

    Como ocorrera em outros momentos, o Comandante da GuardaPolicial negou que qualquer dos fatos apresentados pelo Correio Mercantiltivesse fundo de verdade, sobretudo quanto indisciplina dos guardas. Sobreos boatos, disse que a informar-lhe, que nada mais houve, que esses temorespnicos, espalhados sem autor certo, e que faria muito melhor o jornal emno dar tanto incremento a essas vozes incertas, pois assim muito se alterampessoas e famlias, pedindo, ao fim, que qualquer informao fossecomunicada diretamente s primeiras autoridades.15

    Em resposta ao Comandante da Polcia, o Correio Mercantil exps ainvestigao que havia feito antes de divulgar a notcia. Obtivera, de um Alferesda Guarda Nacional, a informao de que mobilizaes de foras existiramna noite de 2 de janeiro, com a remessa de marinheiros da Fragata Prncipepara as proximidades da Barra, e de que teria ocorrido a priso de guardas ede policiais, fatos estes negados pelo Comandante da Polcia.16

    O Correio Mercantil mantinha uma divergncia com o Comandanteda Polcia, componente de um grupo poltico que, ao longo do ano de 1839,

    14 Correio Mercantil, 4 de janeiro de 1839.15 Correio Mercantil, 7 de janeiro de 1839. Correspondncia do Comandante da Guarda Policial,Antonio Joaquim de Magalhes e Castro.16 Correio Mercantil, 7 de janeiro de 1839. Resposta do Comandante da Guarda.

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    fazia parte da oposio nacional ao Ministrio e ao Governo provincial, ocupadopor Thomaz Xavier Garcia de Almeida. Parece inegvel, apesar disso, que umboato tenha realmente corrido a cidade, o que se depreende do prprio discursodo Comandante da Polcia, que negou a mobilizao de foras e as prises, masrecomendou ao Jornal que no atribusse importncia exagerada aos boatossobre mals. Com isso, reconheceu que eles existiram de fato.

    Se, em janeiro, a Polcia negou ter se mobilizado para conter umainsurreio que se seguiria s notcias correntes, no ms de julho do mesmo ano,entre os dias 16 e 23, admitiu ter havido uma efetiva movimentao policialpara investigar e evitar aquilo que poderia ter tido como conseqncia umanova rebelio de africanos, costumeiramente chamada de malesada pelaimprensa da poca. O Correio Mercantil deu a notcia: Ontem amanheceramalgumas casas da cidade cercada por tropas, e os juzes de paz procederam, naforma da lei, busca das mesmas, fim de descobrirem alguma coisa que tendessea uma nova malesada que, de h muito, se diz achar iminente.17

    A sucesso de boatos, por si s, causava preocupaes aos defensoresda ordem, e algum nvel de transtorno aos ditos pacficos cidados.Vociferava o Correio Mercantil, assinalando a existncia de um continuadoprocesso de boataria:

    Um s dia no h em que notcias aterradoras deixem de vir perturbar osossego das famlias, a quem tudo intimida, porque esto elas bem certasde que, na Bahia, tudo impunidade, e a quadra parece favorvel aosperturbadores do sossego pblico! At os mals nos incomodam! Valha-nos a Providncia!.18

    Rebelio no houve, mas o peridico noticiou que ocorreram prisesde muitos pretos, escravos e forros, expondo os seus votos de que essa aono desse em gua de barrela e de que a polcia conseguisse efetivamentepromover as investigaes e descobrir se os supostos planos e planejadoresexistiam, mediante sua energia e atividade, para que ela continuasse a merecera pblica confiana, indicando que havia uma expectativa social em torno daresoluo desse j incmodo problema.19

    Alguns dias depois, o Correio Mercantil noticiou que os boatoscessavam e que ao susto e terror que tais notcias sempre causam s famlias

    17 Correio Mercantil, 17 de julho de 1839.18 Correio Mercantil, 17 de julho de 1839.19 Correio Mercantil, 18 de julho de 1839.

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    pacficas, tem substitudo esse aptico sentimento de contnua desconfianaem que vivemos todos h muito tempo. Informou, tambm, que, a partirdas suas indagaes sobre a ao da Polcia, veio a saber que foramencontrados uns papis contendo hierglifos ou letras rabes de que seservem os mals. Lidos por um intrprete, estes papis evidenciariam umconvite para uma nova revolta. Eles teriam sido enterrados por um escravopreto, no quintal da casa do seu senhor e encontrados por um escravopardo, que os entregou ao dono da casa, escrivo de paz.20 Na sucessodesses fatos que ocorreu a ao da Polcia, prendendo principalmenteafricanos libertos, como j foi mencionado.

    O Chefe de Polcia, o Juiz Municipal e interino de Direito, EvaristoFerreira de Arajo, enviara correspondncia ao Presidente da Provncia,informando que, no obstante estes fatos, assim isolados, no me pareceremde grande considerao, adotara as providncias que entendeu necessriaspara prevenir inconvenientes ao bem pblico.21 A sua concluso foi, de acordocom o trecho abaixo, que nada houve, mas, mesmo assim, indicava pela adoode providncias para expulsar os africanos que foram presos, por serem elesem todo caso perniciosos:

    No se achou disso coisa alguma que causasse a menor suspeita de que setramava insurreio, sendo somente presos, por amor de toda segurana,alguns pretos, quase todos libertos, para servirem em algumas indagaes,com o que nada se achando, serem os libertos transportados para osportos da Costa dfrica, que irei passando a mandar, se no encontraralguma barreira.22

    A elite poltica baiana desejava pr fim s inquietaes, eliminar apossibilidade de uma nova rebelio mal, assim como de novas inquietaesdos raposas. Embora existam afirmaes de que alguns desses boatos seoriginavam dos traficantes de escravos, que, supostamente, pretendiam afastaros olhos da polcia da atividade ilegal do trfico de africanos (GRADEN, 1996),vale evidenciar a suspeita dos redatores do Correio Mercantil de que osboatos poderiam ser coisa dos prprios raposas. Ao dar a notcia dosboatos sobre as inquietaes mals de janeiro de 1839, o redator perguntara:

    20 Correio Mercantil, 23 de julho de 1839.21 APEB/SACP. Mao 2.949. Ofcio do Chefe de Polcia ao Presidente da Provncia. 26 de julho de1849.22 Idem.

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    Ser isto por acaso estratagema rapostico? Oh l da Polcia?! Olho vivo comos nossos rusguentos, e no menos com os tais mals!!23

    Conquanto as manifestaes religiosas ou de divertimento dos africanostenham provocado seguidas situaes de incmodo s autoridades, comevidncias que no arrefecero nos anos seguintes, foram os liberais radicaisque ocuparam o primeiro lugar nas preocupaes e temores dos conservadorese que tinham no Correio Mercantil um de seus rgos de propaganda e dedoutrina. Voltamos, assim, ao ponto do incio desta exposio, de forma asituar a posio desse ncleo da elite poltica baiana ante o quadro legal e asmedidas adotadas para conter os rebeldes.

    A grande queixa feita nas pginas desse peridico, mas tambm nosdemais jornais legalistas, referia-se s absolvies de vrios rebeldes e suareintegrao nos empregos, anteriormente perdidos por suspenso oupor demisso. Essa situao era tambm abordada por jornalistas da capitaldo pas, a exemplo do autor de um artigo no qual afirmava que asabsolvies que o Jri desta cidade ultimamente tem dado a alguns dosque tomaram parte muito ativa na rebelio de sete de novembro, temlanado profundo descontentamento nos coraes dos bons baianos. Oartigo sustentava que a situao de impunidade estaria causando enormestemores e provocando a sada, da Provncia, de muitos proprietrios, aexemplo do Visconde do Rio Vermelho que, temendo que a impunidadetrouxesse uma nova catstrofe, teria anunciado a venda dos seus prdiosrsticos e urbanos.24

    Entre janeiro e fevereiro apareceu no cenrio jornalstico da capital ainteressante figura do Lavrador do Recncavo, um correspondente do CorreioMercantil, defensor ardoroso da velha legislao portuguesa e opositor deinstitutos jurdicos estabelecidos aps a abdicao do Imperador Pedro I,entre os quais o da liberdade de imprensa, duramente criticada em seusescritos.25 A sua interveno no jornal se fez com longas e contundentes cartas,todas elas dirigidas contra a situao de impunidade que, na sua viso, estavainstaurada. Como conseqncia, inclinava-se para a defesa de um poder a serconcentrado nas mos do Monarca, semelhana dos tempos do absolutismo

    23 Correio Mercantil, 4 de janeiro de 1839.24 Correio Mercantil, 2 de janeiro de 1839. Artigo assinado por Cincinnato, do Dirio do Rio.25 Sobre o Lavrador do Recncavo, apresentei comunicao no V Encontro Regional da ANPUH,realizado em Recife, em outubro de 2004, cuja verso final encontra-se no prelo para publicao.

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    no imprio portugus, quando no havia imprensa no territrio colonial e aopinio pblica era a opinio do Estado (MOREL; BARROS, 2003).

    As suas cartas criaram uma espcie de agitao nas conscinciasconservadoras, pois tocavam pontos nevrlgicos da poltica do momento, ouseja, a absolvio de rebeldes e a sua reintegrao nos antigos empregospblicos. A crtica era dirigida principalmente aos juizados de paz e ao Tribunaldo Jri, rgos que adquiriram grandes poderes durante a dcada de 30, adcada das reformas liberais. Dizia o Lavrador:

    [...] se em maro do ano passado ardiam ainda as casas da Cidade daBahia, em janeiro de 1839 j algumas se reconstroem, e j os ruscondenados morte representam comdias e tragdias nas salas da cadeia,o que tudo prova no ser crime, o fazer rusgas, nem roubar os cofrespblicos, matar os seus concidados, derrubar a forma de governo jurada,e por fim lanar fogo nos bens alheios; tudo isto se pode fazerimpunemente, porque os juzes de paz e o Jri assim o ho decidido, e ossrs. Deputados e Senadores do Imprio parecem consentir nessaimpunidade.26

    Revelava, com palavras mais duras e claras, aquilo que seria o ncleofundamental do programa conservador naquela conjuntura: a adoo dereformas dos cdigos Criminal e de Processo Criminal, mediante oesvaziamento dos poderes atribudos ao Jri e aos juzes leigos, vistos comoresponsveis pelo alegado quadro de impunidade que havia na Bahia e noBrasil. O Lavrador do Recncavo conclua o seu diagnstico da situao coma afirmao: as leis j no enforcam.27

    Ao tempo em que procuravam estabelecer uma situao de temorentre a populao, com a exposio continuada da presena dos antigosrebeldes e com a afirmao da iminncia de uma nova rebelio rapostica,os redatores do Correio Mercantil faziam a sua pregao em favor daspretendidas reformas. Repetiam cotidianamente que j essas ruas se entulham,a cada momento, de homens que cingiram bandas no exrcito rebelde; outrosque exerceram cargos no governo intruso, percebendo dinheiros roubados nao.28 Buscavam fortalecer o Estado e alertar para a sensao de temor,prevenindo quanto a futuras situaes de perigo para aqueles que eram

    26 Correio Mercantil, 28 de janeiro de 1839. Carta do Lavrador do Recncavo.27 Idem.28 Correio Mercantil, 5 de fevereiro de 1839.

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    proprietrios e que tinham algo a perder, pois entendiam que as revoltas eramprovocadas pelo povo pobre:

    No Brasil, [...] o povo baixo, capitaneado quase sempre por obscurosaventureiros, quem tem constantemente erguido a espada de morte contrao Governo, contra as instituies do pas, imolando vtimas inocentes efazendo retrogradar nossa civilizao, pervertendo a moral pblica, edestruindo esses bons hbitos de obedincia popular, que hojedificilmente se restaurar entre ns.29

    Para consolidar as instituies, consideravam que era necessria aexemplar punio: exigir-se a punio inexorvel dos chefes da rebelio daBahia no demonstra, nem esprito de vingana nem sede de sangue; uma talexigncia mil vezes legal, e consigo importa a estabilidade das instituiesque o Brasil tem jurado manter!30 Para o Correio Mercantil no forasuficiente a represso direta que se abateu sobre a populao que haviapermanecido na cidade durante a rebelio, pois no liquidava de formadefinitiva, conforme seu desejo, as fagulhas que poderiam, quem sabe, fazerretornar momentos que se fazia necessrio superar.

    Esse programa centralizador foi sendo consolidado no transcorrer doano de 1839. Apesar das excentricidades dos textos do Lavrador do Recncavo,que pregava a concentrao dos poderes, o Correio Mercantil e, ao queparece, os demais jornais conservadores no dirigiam as suas baterias contrao sistema constitucional; no pretendiam a adoo de um regime toconcentrado a ponto de anular as liberdades que as elites locais passaram aexercer, sobretudo aps a aprovao do Ato Adicional de 1834. A carga eradirigida tambm aos jurados e aos juizados de paz: mas os rus, ospronunciados vagam por toda a parte, a toda hora, por todos os Distritos, eat, ningum crer, andam de brao dado com os Juzes de Paz, que tem porobrigao captur-los!31

    O programa se consubstanciar mais claramente em um texto publicadoem fevereiro de 1839, intitulado Do Esprito Pblico na Bahia. O textodefendia a idia de que no havia, na Provncia, o mais pequeno vislumbredisso que se chama esprito pblico, e que o povo, em razo disso, no

    29 Correio Mercantil, 5 de fevereiro de 1839.30 Idem.31 Correio Mercantil, 21 de fevereiro de 1839. Correspondncia do Promotor Pblico Jos VieiraRodrigues de Carvalho e Silva, ao Presidente da Provncia Thomaz Xavier Garcia de Almeida.

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    escaparia em tornar-se presa infalvel de ignbeis tiranos, quando um gnioatrevido se proponha de plantar, sobre essa indolncia e esse indiferentismopopular, o trono de suas perversidades. Essa ausncia de esprito pblicoexplicaria o fato de muitos rebeldes estarem reintegrados nos seus empregosou de no terem sido punidos. Em decorrncia disso, a Bahia estaria vivendouma situao marcada por runas, viuvez, orfandade, misria e lgrimas.32

    Em razo desse indiferentismo que a Bahia estaria sendo arrastada,na viso do Correio Mercantil, para o despenhadeiro. Clamava-se pelaadoo de medidas efetivas de combate quilo que parecia essencial ser atacado,prevenindo-se futuras situaes semelhantes. No era admissvel, para operidico, que os rebeldes retornassem aos seus empregos. Tambm para operidico, a absolvio de rebeldes, mesmo percorrendo os trmites legais,no possua legitimidade, visto serem absurdas as leis que estabeleciam oTribunal do Jri e os juizados de paz, to combatidos em tantos artigos,discursos parlamentares e correspondncias presentes nas pginas do jornal.

    Deve-se compreender, alm de tudo, a frustrao desses grupos deelite diante da devoluo dos cargos pblicos a pessoas que no mereciam asua confiana poltica. Os empregos pblicos eram moeda de troca de apoiopoltico, corriqueiramente distribudos pelos detentores dos cargos pblicosde grau mais elevado, em benefcio de quem lhes dava apoio eleitoral ououtra forma de sustentao local. Assim, para alm das razes apresentadas,no era concebvel a reintegrao de pessoas que no eram da confiana dasfaces monrquicas que disputavam o jogo poltico, pois isso restringiria osespaos para aqueles que, ao invs de se rebelarem para galgar posies,seguiam os trmites habituais para conseguir o seu intento (GRAHAM, 1997). Otrecho abaixo deixa clara a posio dessa faco da elite poltica baiana, emborapossa ser generalizada para toda ela:

    O homem perjuro e traidor ao seu pas, tendo achado apoio nas leis e emalguns julgadores para escapar sano penal de seus crimes, no seria maisconsentido nos empregos da nao; o povo se pronunciaria contra talmedida, e os governantes saberiam respeitar ento a opinio do povo; osempregos da nao devem ser exercidos por membros fiis a quem ela dsalrios para manter ilesas sua integridade e sua honra; aquele, porm, quemais de uma vez faltou a esta confiana, to necessria para a prosperidade

    32 Correio Mercantil, 5 de fevereiro de 1839. Do Esprito Pblico na Bahia.

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    dos pases, embora os tribunais, por virtude de leis ambguas, o julgassemlimpo e puro, no deveria mais servir emprego pblico.33

    Alm do evidenciado propsito de revisar as leis, especialmente aquelasrelacionadas ao aparato judicirio, o peridico compreendia a necessidade dealterar positivamente os hbitos polticos de seu povo, que ainda no sabedevidamente apreciar os benefcios da liberdade poltica.34 Assim, ao ladoda reforma na legislao criminal e processual, fazia-se necessrio um processode mudana pela educao primria, com a fundao de sociedades patriticas,apoiadas pela Assemblia Provincial, cujo nico trabalho fosse o de propalarpelo povo as belas mximas da Religio Catlica e da Moral, dando para elespor si o mais profcuo modelo de exemplar conduta pblica e privada,35 deforma a obter-se uma mudana cultural nas geraes futuras.

    Ao tempo em que os redatores dos jornais conservadores,autodenominados escritores legalistas da Bahia,36 faziam a sua pregaopara garantir a unidade da Provncia da Bahia com o centro, requisito essencialpara a sua sobrevivncia poltica, corriam os boatos e difundiam-se os medosde que a Provncia novamente voltaria a ter uma rebelio de grande monta. Oproblema para ns, hoje, no o fato em si, mas o temor real que o boatocausava a partir do eco que lhe dava o peridico.

    Segundo o jornal, rebeldes soltos estariam organizando uma novarebelio, situao, porm, pouco provvel, considerando que as condiespara preparao de uma nova rebelio eram bastante desfavorveis naquelaconjuntura. Os principais lderes da Sabinada estavam sendo julgados, e vriosdeles sujeitos condenao morte. Entre os componentes da base domovimento, havia uma tendncia recuperao das condies de vida queantes possuam, particularmente a recuperao dos empregos anteriores. Nohavia uma imprensa organizada que favorecesse a divulgao das idias radicais,embora pequenos folhetos fossem distribudos de vez em quando. No entanto,a inquietao provocada pelos boatos digna de nota.

    Algumas pedradas e garrafadas foram lanadas contra a Guarda da

    33 Correio Mercantil, 5 de fevereiro de 1839.34 Idem.35 Idem.36 Assim o Correio Mercantil denominou a frente que deveria formar-se entre os redatores dosjornais para assumir as tarefas de combate anarquia e de aprovao de uma legislao maiscondizente com o estado poltico da Provncia naquela conjuntura.

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    Ribeira s vsperas do entrudo de 1839,37 seguindo-se alguns tiros que teriamespalhado o terror por todas as famlias pacficas. A partir da difundiram-se boatos de que ocorreria uma tremenda revoluo no domingo doentrudo, que tudo iria pelos ares, sem ficar pedra sobre pedra, nem umlegalista vivo!!!38 O Correio Mercantil lamentava a sorte da Bahia:

    Sofre e sofrer [a Bahia], pois a tanto chega a impotncia das leis, a fraquezado poder, e a certeza da impunidade dos culpados, que os homens bons,os cidados probos e honestos fogem espavoridos, e entregam o campoa meia dzia de agitadores, sem f pblica, sem saber, mais que tudo lhechega para levarem a efeito seus danados intentos contra uma maioriarica, ilustrada e poderosa, que observa impassvel e timorata o processo ea sentena do seu indiferentismo social e da sua fatal tibieza!!39

    Ainda em janeiro, correram boatos de que estaria para eclodir umarusga em Cachoeira. Nesse episdio, porm, os redatores do peridicoapressaram-se em apagar as fascas criadas pelos boatos, interpretando que osdoze guardas municipais de cavalaria, que foram mandados para aquela cidade,destinavam-se a uma diligncia especial e no para conter uma agitao qualquercomo por a j assoalham os inimigos do sossego pblico, os quais noperdem ocasio de tudo barulharem para seus fins sinistros.40

    Boatos no eram novidade na vida poltica da Bahia. A neglignciapara com os que foram difundidos antes da Sabinada custara caro aos legalistas.Um deles foi mencionado na correspondncia enviada pelo Presidente daProvncia da Bahia ao Governo Imperial em 6 de novembro de 1837, ouseja, no mesmo dia em que teve incio o movimento. O ofcio mencionava orecebimento de informaes do Chefe de Polcia sobre a existncia, comose tinha descoberto, de um partido que trama a separao desta Provncia dasdemais do Imprio, assim como a adoo de algumas medidas. Dizia aindaque se os conspiradores no se animam em aparecer sem dvida por faltade apoio.41 Nesse caso, enganaram-se enormemente as autoridades, pois oboato teve como resultado a maior rebelio que ocorreu na Bahia em toda asua histria.

    37 APEB/SACP. Mao 3.374. Comando das Armas (1839).38 Correio Mercantil, 15 de fevereiro de 1839 (Boatos de nova rusga).39 Idem.40 Correio Mercantil, 24 de janeiro de 1839.41 APEB/SACP, Mao 684, Correspondncia para o Governo Imperial, 6 de novembro de 1837.

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    Desde o ano de 1838, divulgavam-se boatos sobre rebelies que seriamcomandadas pelos lderes rebeldes que se encontravam soltos. Um destesboatos, segundo o Correio Mercantil, dizia que

    muito tem dado que falar ultimamente nesta cidade, a reunio dosabsolvidos em Santa Anna! voz pblica que um comit raposaico,composto de Hygino, Guedes Cabral e vrios outros heris de 7 denovembro, trabalha publicamente na Feira de Santana, e se dispe novaregenerao da Bahia.42

    Um texto de data anterior expressava, de certo modo, o aprendizadodessa elite, ao afirmar que mister no desprezar pequenas fascas que podemexcitar novos incndios.43

    Esses relatos sobre possibilidades de inquietaes tornaram-se umaconstante nas pginas do peridico e podiam ser encontrados tambm emdocumentos oficiais da Polcia, do Comando das Armas ou do Presidente daProvncia. Em junho, uma correspondncia do Governo Imperial indicavaque o Ministro da Justia estava inteirado das medidas que o Presidente teriaadotado para evitar que fosse alterada a ordem pblica nessa capital, comose receara, e que a Presidncia teria atendido algumas exigncias que lhefizera o Comandante Superior das Guardas Nacionais de Sento S e Barrapara manuteno da tranqilidade pblica naqueles pontos.44

    No esto claras as formas pelas quais a tranqilidade pblica poderiater sido alterada, mas sabido que, durante o perodo rebelde anterior, oscorpos militares e de guardas estiveram constantemente envolvidos emmovimentaes polticas e reivindicativas, provocando sucessivas quebras daordem (KRAAY, 2001c). A vila da Barra de So Francisco teve efetivoenvolvimento na Sabinada. Em ato datado de 4 de agosto de 1838, oPresidente Thomaz Xavier Garcia de Almeida suspendera do exerccio doscargos o Juiz Municipal, interino de Direito, Joo Jos de Souza Rebello e osJuzes de Paz Francisco Malaquias e Manoel Cabral por terem, naquele municpioda Barra, prestado toda influncia e autoridade para que tambm na dita vilafosse aclamada com todas as solenidades a nefanda rebelio.45

    42 Correio Mercantil, 14 de agosto de 1838.43 Correio Mercantil, 7 de agosto de 1838.44 APEB/SACP. Mao 891. Correspondncia do Ministrio da Justia para o Presidente da Bahia. 12de junho de 1839.45 APEB/SACP. Mao 963. Atos do Governo da Provncia. 4 de agosto de 1838.

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    Uma das mais importantes manifestaes da elite baiana em relao necessidade de preveno das rebelies foi o envio de uma Representao Assemblia Geral, publicada no Correio Mercantil no ms de agosto de1839. Na prtica, a Representao significou uma tomada de atitude por partede numerosos indivduos que, em caso de novas situaes de ruptura daordem, teriam muito a perder, seja em propriedades, escravos, comrcio ouempregos. Provavelmente, o documento foi articulado pelo redator doCorreio Mercantil, bacharel em Direito, ocupante de funo pblica comojuiz de rfos (depois Juiz de Direito), e que, naquele momento, prestavaapoio ao Governo provincial e ao Ministrio.

    J na sua primeira linha, a Representao explicitava que era umamanifestao dos cidados residentes e estabelecidos nos principais ramosda riqueza pblica na provncia da Bahia, uma afirmao certamente necessriapara indicar, de imediato, o peso social daqueles homens, diferenciando-osdos rebeldes, gente sem fortuna, e estabelecer, para a sociedade e para oparlamento, a importncia e urgncia das suas propostas.46

    Os autores da Representao atacavam a alegada inrcia do Congresso,afirmando que estavam rompendo o silncio em que os conservava aesperana de que remdios eficazes emanariam do corpo legislativo, quetendessem a afastar males que no podem estar mui remotos. Para eles, seriafundamental que o Brasil fosse regido por leis que estivessem de acordo coma ndole, educao e costumes dos povos, e para isso era necessrio que aAssemblia adotasse as medidas reclamadas pela sociedade.47 Dessa forma,sintetizando a sua proposta, consonante com as preocupaes jsuficientemente discutidas nos meses anteriores, expressavam-se:

    principalmente o cdigo criminal do imprio um dos primeiros agentesda anarquia prtica, e especulativa, e apesar de ser isto j uma verdade deque carece, assim como a que igualmente se torna precisa no do processo,especialmente na parte que d aos juzes da paz a formao de culpa,porquanto sendo esta a base do processo criminal, estes juzes, uns porignorantes, e outros por causas que a todos so patentes, procedem nestesatos de maneira que raro o processo que no contenha nulidade, e queno se torne mui difcil seu julgamento, resultando destes a impunidadeclssica, e o viverem os cidados virtuosos, e que s cuidam de viver

    46 Correio Mercantil, 2 de agosto de 1839. Representao Assemblia Geral.47 Idem.

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    tranqilos sombra de leis que os deviam proteger, expostos ao fuzil epunhal dos assassinos e ladres.48

    A Representao pedia, tambm, uma reforma no sistema de eleies,por considerar que a base do rendimento era sumamente insignificante, oque possibilitava eleies de pessoas de baixa base de renda para a funo dejuzes de paz. Com isso, expunha o carter de sua petio que era a proteoda propriedade e dos proprietrios, buscando restringir ainda mais o nmerodas pessoas que poderiam ser cidados. Afirmava no pretender leis de sangue,nem excepcionais, querem sim [os autores da Representao] leis que protejame assegurem as vantagens reais que a constituio lhes confere.49

    Alguma importncia adquiriu essa Representao no plano nacional.Gerou discusses na Cmara dos Deputados e no prprio Senado, emboratenha sido combatida pela oposio baiana na cmara temporria. Muito sedisse que era coisa de traficantes de escravos. Contribuiu para este julgamentoo fato de que a Representao fora lanada simultaneamente a uma outra, queserviu para desqualific-la: tratava essa ltima do apoio a uma proposta, quetramitava no Senado, de alterao da lei de abolio do trfico, de 1831. Poresta proposta, aqueles africanos que tivessem desembarcado efetivamente noBrasil passariam a ser considerados como escravos, e no como africanoslivres. A associao entre os dois documentos foi inevitvel e criou dificuldadespara os manifestantes baianos.

    A Representao parece ter contribudo para dar impulso discussonacional sobre as reformas dos cdigos, que seriam aprovadas no ano seguinte.Alguns dias depois do envio da Representao, foi publicado, no prprioCorreio Mercantil, o Projeto de Reforma do Cdigo Criminal propostopelo Senador Vergueiro, que prescrevia, no seu artigo 15, o esvaziamento dasmais importantes prerrogativas policiais dos juzes de paz, que passariam paraas mos dos chefes de polcia, delegados e demais juzes.50

    A trajetria da elite poltica aqui enfocada, a sua luta pela eliminaodos rebeldes e da rebeldia do cenrio poltico da Bahia no perodo ps-Sabinada, insere-se de forma indubitvel no leito da poltica implementadapelo centro, a partir do Rio de Janeiro. No entanto, inserir a Provncia daBahia na comunidade nacional, defendendo a ferro e fogo a integridade

    48 Correio Mercantil, 2 de agosto de 1839. Representao Assemblia Geral.49 Idem.50 Correio Mercantil, 8 de agosto de 1839.

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    territorial e poltica, no significava sacrificar a autonomia provincial, aceitandoa centralizao extrema. A elite regional parecia saber disso e procurava garantiruma parte significativa dessa autonomia, mesmo abdicando de certasprerrogativas ligadas ao poder de justia, sem o que no conseguiria, de formaeficaz, impor derrotas importantes aos rebeldes e rebeldia.

    O esvaziamento dos poderes dos juizados de paz, a concentrao dasdecises sobre a magistratura, assim como algumas outras reformas nas forasarmadas, podiam apontar para uma reduo do poder de deciso dessa eliteno plano regional, mas significava, por outro lado, a garantia do apoio docentro e das demais provncias quando ocorressem conflitos internos naProvncia, sem o que se tornaria difcil o enfrentamento com as foras rebeladas.Pernambuco e Bahia, por exemplo, ajudaram-se mutuamente em diversosmomentos, antes e depois dessa fase.

    Paralelamente, as prerrogativas fiscais e a autonomia relativa, conquistadascom o advento da Assemblia Provincial, permaneceram nas mos da eliteregional. A capacidade de decidir sobre a destinao dos recursos, tambm.Do ponto de vista do centro do poder nacional, a lgica a mesma. Julgamos,com Miriam Dolhnikoff, que a reviso conservadora do incio da dcada de 40 com a Lei de Interpretao do Ato Adicional e a reforma do Cdigo deProcesso Criminal , que imps maior grau de centralizao, no significou aanulao da autonomia regional e a subjugao das elites regionais provinciaisa uma elite nacional (DOLHNIKOFF, 2003, p. 442). Ainda segundo a autora:

    Tanto do ponto de vista do discurso conservador, como da legislaoento aprovada, no se tratava de liquidar a autonomia das elites regionais,mas de centralizar a magistratura, medida sem dvida de grande alcance esignificado, mas que de modo algum resultou no fim da decisiva influnciaque essas elites tinham no sistema poltico (DOLHNIKOFF, 2003, p. 442).

    Assim, possvel afirmar, conforme a leitura dos documentosjornalsticos e das fontes oficiais apresentadas e discutidas neste texto, que,efetivamente, no houve contradio entre a poltica de centralizao, ochamado regresso conservador, e as aspiraes da elite poltica queconduziu, embora no sem divergncias internas, a histria da Provncia daBahia nesse perodo crucial. A elite baiana indicou, nas suas campanhas, nosseus posicionamentos diante da iminncia das rebelies dos raposas edos africanos, o caminho que ela entendia devesse ser adotado pela elitepoltica nacional.

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    Na verdade, essa centralizao tinha o objetivo de evitar que gruposmarginais da poltica brasileira e baiana tivessem alguma interferncia na vidapoltica provincial e, qui, nacional. O desejo de acabar com as tenses locaismais perigosas para o status quo, preparando um futuro de tranqilidade,continuadamente expresso na documentao oficial interna e interprovincial,e repetido exausto nos anos seguintes a 1839, revelava que essa tranqilidadeno era algo real, mas objetivo a ser alcanado, um devir histrico.

    BAHIA: THE ELITE AND THE ROADS OFPACIFICATION IN THE POST-SABINADA

    ABSTRACTIn 1837 the state of Bahia witnessed one of the most important revolts of it history theSabinada. Sections of the Army rebelled against the Imperial Government and declared itan independent and republican government, that resisted until March of 1838. The takeover the city of Salvador by the loyal forces of the central government was brutal. More than1.000 rebels were killed in only day, as opposed to about 40 rebels of the imperial troops.The retaking of the control of the capital of Bahia didnt bring, however, a complete relieffor the elite that commanded the politics in the Province. In the following years this elite willmanifest an obsessive concern of the individuals movements and social groups considerednoxious for the public serenity. This paper tries to examine the strategies of social controldefended by the political elite of Bahia in the years after the Sabinada, based on the analysisof the the newspaper Mercantile Mail.

    KEY-WORDS: Bahia. Provincial elite. Rebellions anti-imperials. Sabinada.

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